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GESTÃO DA ZONA COSTEIRA E OS TERRENOS DE MARINHA
JORGE ARZABE
BRASÍLIA – DF, 2011
1
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGASFGV MANAGEMENT – NÚCLEO BRASÍLIAPós-Graduação em administração públicaTURMA – 2011
GESTÃO DA ZONA COSTEIRA E OS TERRENOS DE MARINHA
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao
Curso Intensivo de Pós-Graduação em Administração Pública
Pós-Graduação lato sensu, Nível de Especialização
Programa FGV Management
Orientadora: Prof. Ana Paula Zambrotti
Brasília – DF, novembro 2011
2
Página de Aprovação
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
PROGRAMA FGV MANAGEMENT
Curso Intensivo de Pós-Graduação em Administração Pública
O trabalho de Conclusão de Curso GESTÃO COSTEIRA E OS TERRENOS DE MARINHA,
elaborado por JORGE ARZABE e aprovado pela Coordenação Acadêmica do Curso Intensivo de
Pós-Graduação em Administração Pública, foi aceito como requisito parcial para obtenção do
certificado do curso de Pós-Graduação, nível de especialização, do Programa FGV Management.
Data
Armando Santos Moreira da Cunha
Profª. Ana Paula Zambrotti
3
Termo de Compromisso
O aluno Jorge Arzabe, abaixo-assinado, do Curso Intensivo de Pós-Graduação em
Administração Pública, do Programa FGV Management, realizado nas dependências da FGV
Brasília, no período de 09 de junho de 2010 a 1º de setembro de 2011, declara que o conteúdo
do trabalho de conclusão de curso intitulado: Gestão Costeira e Terrenos de Marinha, é
autêntico, original, e de sua autoria exclusiva.
Brasília, 22 de novembro de 2011
JORGE ARZABE
4
INDICE
Sumário ____________________________________________________ pg.4
1 Introdução ___________________________________________________pg. 4
2 Zona costeira no Brasil ________________________________________ pg. 8
3 Terrenos de marinha __________________________________________pg. 15
3.1Tipologia dos bens em terrenos de marinha ____________________________pg. 17
3.2Experiência brasileira “PROJETO ORLA” ___________________________ pg. 21
3.3Projetos de Lei para alteração dos “Terrenos de Marinha” _________________pg.29
4 Zona costeira na União Europeia ________________________________pg. 34
5 A definição da faixa de segurança, critérios balizadores pg. 42
5.1 Faixa de segurança e tipologias pg.44
5.2 Faixa de segurança e limites da orla pg. 45
5.3 Faixa de segurança e padrão de assentamento pg. 48
5.4 Faixa de segurança e tipos de usos pg.49
5.5 Faixa de segurança e zoneamento pg. 50
5.6 Faixa de segurança e proteção ambiental pg.52
6 Conclusão___________________________________________________ pg.52
7 Referências bibliográficas ______________________________________pg.54
5
SUMÁRIO
. Os terrenos de marinha e seus acrescidos são parte indissociável da Zona
Costeira, por se tratar de patrimônio público tem papel diferenciado no ordenamento
territorial desse território, a pesquisa propõe a atualização do conceito de terrenos de marinha
como elemento vital para consolidar a Política Nacional de Gerenciamento Costeiro.
1. INTRODUÇÃO
O ordenamento territorial da zona costeira é tema central no equacionamento
do desenvolvimento sustentável sendo necessário para harmonizar os conflitos decorrentes
dos múltiplos interesses que recaem sobre o uso desse território. No Brasil, parte considerável
da zona costeira, na qual se incluem os terrenos de marinha e seus acrescidos, são patrimônio
público da União.
As políticas voltadas para gestão da zona costeira também estão sendo
desenvolvidas na esfera internacional, sendo tema frequente do Direito Público Internacional.
É interessante notar a convergência de problemas e soluções tomadas por diferentes países
para conduzir uma gestão integrada da zona costeira.
6
No Brasil, a implementação do Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro1
representa o referencial teórico para a articulação de políticas ambientais, patrimoniais, do
turismo, além de outras voltadas ao desenvolvimento econômico, social e urbanístico das
faixas de costa.
O Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro tem diversos pontos de convergência
com a Recomendação de 2002 do Parlamento Europeu para os Países Membros. Do mesmo
modo, a análise da implementação daquela Recomendação, feita em 2007 na União Europeia,
revela pontos em comum com as dificuldades apresentadas na implementação do Projeto Orla
brasileiro.
Dentre os problemas comuns ao Brasil e a União Europeia veremos a falta de
informações, a dificuldade de articulação entre os órgãos de estado responsáveis pelas
políticas setoriais, as dificuldades de garantir recursos para a melhoria da gestão e o
acompanhamento dos seus resultados, falta de metodologia para análise das situações e
resultados da aplicação da política.
Para Reschke e Krug2, a articulação entre os três entes de governo e a
sociedade civil representa um desafio, na medida em que lida com a diversidade de situações
encontradas na extensa faixa de costa, que atinge 8.500km, com aproximadamente 300
municípios litorâneos, que perfazem, segundo o último censo, população em torno de 31
milhões de habitantes.
1 A Lei nº 7.661/88, institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro.2 Projeto Orla – Manual de Gestão – apresentação.
7
No Brasil os terrenos de marinha3 representam terras públicas da União4 que se
localizam ao longo da costa brasileira, seu uso e gozo têm natureza jurídica de direito público
e de direito privado.
A existência desses terrenos remonta ao período colonial. Há necessidade de
um novo olhar sobre esse instituto jurídico centenário, que permita dialogar com o Plano
Nacional de Gerenciamento Costeiro, com o princípio da precaução do Direito Ambiental,
com as políticas de inclusão social desenvolvidas pelo Governo Federal, com as futuras
gerações e com todos aqueles que direta ou indiretamente usam a costa brasileira.
Essa atualização do conceito de terreno de marinha deve incluir a ótica da
preservação ambiental e paisagística, da inclusão social, do respeito aos direitos coletivos e
difusos, da urbanização da orla e da utilização das áreas para agricultura, aquicultura, do
apoio às atividades marítimas (portos, marinas, piers, etc.), das atividades de lazer e do
turismo e do livre acesso às praias.
Nesse sentido, o estudo investigativo aqui proposto tem como escopo
contribuir para o aprimoramento da legislação voltada aos terrenos de marinha, partindo da
análise do ordenamento territorial da zona costeira existente no Plano Nacional de
Gerenciamento Costeiro.
3 Segundo o art. 2º do Decreto-Lei nº 9.760/46, são terrenos de marinha aqueles, em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar-médio de 1831, situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés; assim como aqueles que contornam as ilhas situadas em zona onde se faça sentir a influência das marés. A influência das marés é caracterizada pela oscilação periódica de 5 (cinco) centímetros pelo menos, do nível das águas, que ocorra em qualquer época do ano. 4 Os terrenos de marinha pertencem a União de acordo com o art. 20, VII, da Constituição Federal.
8
Assim, a questão da utilidade e da atualidade do instituto dos terrenos de
marinha no atual processo de ordenamento da zona costeira deverá passar também pela
discussão da manutenção desse patrimônio como público, dos motivos que sustentam a
manutenção desse patrimônio como público, ou seja os interesses públicos que estão em jogo,
e, por outro lado, o que não mais se justifica permanecer como patrimônio estatal.
O capítulo primeiro vai discorrer sobre a zona costeira brasileira, terrenos de
marinha, o Projeto Orla – instrumento de ordenação territorial -, e o debate que hoje se trava
para modificar o instituto “terrenos de marinha” no Congresso Nacional.
Será feita uma apresentação da Lei nº 7.661/88 e do Decreto nº 4.300/04 que a
regulamenta. Serão descritos os órgãos que conduzem a gestão dessa política a nível
Nacional, Estadual e Municipal. Ainda, nesse capítulo, serão descritas as categorias de
classificação da orla marítima e as diretrizes para atuação em cada situação física e
socioeconômica.
A descrição normativa dos terrenos de marinha, apresentação e análise dos
projetos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal que pretendem extinguir ou alterar
esse instituto jurídico.
O segundo capítulo vai descrever o tratamento dado a zona costeira na Europa,
a partir das recomendações aos Países Membros.
O aprimoramento dos debates em torno das questões de planejamento e do
ordenamento territorial da zona costeira são urgentes. A legislação brasileira, e por que não
9
dizer, o próprio estado brasileiro, ainda tateia na organização de políticas setoriais e,
sobretudo, na convergência dessas políticas em macro objetivos dentro de territórios
específicos.
Existe hoje um projeto de emenda constitucional e diversos projetos de lei
voltados para extinguir ou alterar o instituto jurídico dos terrenos de marinha. Todas as
propostas legislativas estão centradas na alteração da metodologia de demarcação com
extinção de parte do patrimônio público e sua destinação para particulares.
O presente trabalho deverá contribuir para as discussões voltadas a modificar o
instituto dos terrenos de marinha, inserindo aspectos trazidos da análise do Plano Nacional de
Gerenciamento Costeiro.
2. ZONA COSTEIRA NO BRASIL
A zona costeira tem no Brasil relevo constitucional. Protegida no Capítulo do
Meio Ambiente, a zona costeira carateriza-se como bem jurídico difuso e transgeracional. A
Zona Costeira abriga no Brasil parte considerável das terras públicas da União.
Como imposição constitucional cabe ao Poder Público e à coletividade
assegurar a efetividade desse direito ambiental na zona costeira com as seguintes ações (art.
225, § 1º, da Constituição Federal):
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e
ecossistemas;
10
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades
dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem
especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei,
vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua
proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de
significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará
publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que
comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a
preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função
ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
A proteção constitucional dirige-se ao Estado, convocando-o para medidas
protetivas e ao planejamento territorial. Ao erigir a Zona Costeira como patrimônio nacional,
o constituinte deu relevo à fragilidade desse território, impondo um cuidado diferenciado que
assegure a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais (art.
225, §4, da CF).
A Lei nº 7.661, de 16 de maio de 1988, foi recepcionada em sua integralidade
pela Constituição Federal que começou a viger em 05 de outubro do mesmo ano. A Lei nº
7.661/88 institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC), parte integrante do
11
Plano Nacional para os Recursos do Mar (PNRM) e da Política Nacional do Meio Ambiente
(PNMA).
A lei que institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC)
conceitua Zona Costeira como o espaço geográfico de interação do ar, do mar e da terra,
incluindo seus recursos renováveis ou não, abrangendo uma faixa marítima e outra terrestre,
que serão detalhadas quando da elaboração do plano nacional (art.2º, parágrafo único da Lei
nº 7.661/88).
A organização desse território deve prever o zoneamento do uso e das
atividades na Zona Costeira, dando prioridade à conservação e proteção dos recursos naturais,
dos sítios ecológicos de relevância cultural e dos monumentos que integram o patrimônio
natural, histórico, paleontológico, espeleológico, arqueológico, étnico, cultural e paisagístico.
Mais que isso, a elaboração e execução do PNGC deve contemplar, entre
outros, os seguintes aspectos: urbanização; ocupação e uso do solo, do subsolo e das águas;
parcelamento e remembramento do solo; sistema viário e de transporte; sistema de produção,
transmissão e distribuição de energia; habitação e saneamento básico; turismo, recreação e
lazer; patrimônio natural, histórico, étnico, cultural e paisagístico.
A arco de políticas a serem cotejadas quando da aplicação do PNGC envolve,
obrigatoriamente, competências legislativas dos três entes federados, não sendo possível
afastar as competências dos entes. Vejamos por exemplo o art. 6º, da Lei nº7.661/88:
12
Art. 6º. O licenciamento para parcelamento e remembramento do solo, construção, instalação,
funcionamento e ampliação de atividades, com alterações das características naturais da Zona Costeira,
deverá observar, além do disposto nesta Lei, as demais normas específicas federais, estaduais e
municipais, respeitando as diretrizes dos Planos de Gerenciamento Costeiro.
§ 1º. A falta ou o descumprimento, mesmo parcial, das condições do licenciamento previsto neste artigo
serão sancionados com interdição, embargo ou demolição, sem prejuízo da cominação de outras
penalidades previstas em lei.
§ 2º Para o licenciamento, o órgão competente solicitará ao responsável pela atividade a elaboração do
estudo de impacto ambiental e a apresentação do respectivo Relatório de Impacto Ambiental - RIMA,
devidamente aprovado, na forma da lei.
A partir desse olhar podemos inferir que sobre os terrenos de marinha,
propriedade originária da União, incidem legislação federal, estadual e municipal.
O Decreto nº 5.300, de 7 de dezembro de 2004, define os limites da zona
costeira brasileira, que abrange uma faixa marítima e uma faixa terrestre:
art. 3º …
I-faixa marítima: espaço que se estende por doze milhas náuticas, medido a partir das
linhas de base, compreendendo, dessa forma, a totalidade do mar territorial;
II-faixa terrestre: espaço compreendido pelos limites dos Municípios que sofrem
influência direta dos fenômenos ocorrentes na zona costeira.
O conceito de municípios abrangidos pela faixa terrestre da zona costeira,
abrange os defrontantes com o mar, assim como os não defrontantes com o mar desde que
localizados nas regiões metropolitanas litorâneas ou aqueles que, contíguos às capitais e às
grandes cidades litorâneas, apresentem com essas o fenômeno da conurbação. Apresentam-se
também abrangidos no conceito municípios não defrontantes com o mar, distantes até
13
cinquenta quilômetros da linha de costa, que contemplem atividades ou infraestrutura de
grande impacto ambiental na zona costeira ou ecossistemas costeiros de alta relevância.
Destacam-se como princípios fundamentais da gestão da zona costeira,
enumerados no Decreto, com impactos na área terrestre, além dos já estabelecidos na Política
Nacional do Meio Ambiente, os seguintes:
Art. 5º .….
IV- a integração da gestão dos ambientes terrestres e marinhos da zona costeira, com a construção e
manutenção de mecanismos participativos e na compatibilidade das políticas públicas, em todas as
esferas de atuação;
VI- a não fragmentação, na faixa terrestre, da unidade natural dos ecossistemas costeiros, de forma a
permitir a regulamentação do uso de seus recursos, respeitando sua integridade;
VII- a consideração, na faixa terrestre, das áreas marcadas por atividade socioeconômico cultural de
características costeiras e sua área de influência imediata, em função dos efeitos dessas atividades sobre
a conformação do território costeiro;
VIII- a consideração dos limites municipais, dada a operacionalidade das articulações necessárias ao
processo de gestão;
IX- a preservação, conservação e controle de áreas que sejam representativas dos ecossistemas da zona
costeira, com recuperação e reabilitação das áreas degradadas ou descaracterizadas;
X- a aplicação do princípio da precaução tal como definido na Agenda 21, adotando-se medidas
eficazes para impedir ou minimizar a degradação do meio ambiente, sempre que houver perigo de dano
grave ou irreversível, mesmo na falta de dados científicos completos e atualizados;
XI- o comprometimento e a cooperação entre as esferas de governo, e dessas com a sociedade, no
estabelecimento de políticas, planos e programas federais, estaduais e municipais.
Dos princípios elencados no art. 5º do Decreto nº 5.300/04, se destacam a
gestão participativa, a utilização do princípio de precaução como elemento norteador da ação,
14
a não fragmentação dos ecossistemas, com a respectiva preservação e reabilitação dos
mesmos.
À luz interpretativa dos princípios acima elencados estão colocados os
objetivos para a gestão da zona costeira, art. 6º do Decreto nº 5.300/04:
I- a promoção do ordenamento do uso dos recursos naturais e da ocupação dos espaços costeiros,
subsidiando e otimizando a aplicação dos instrumentos de controle e de gestão da zona costeira;
II- o estabelecimento do processo de gestão, de forma integrada, descentralizada e participativa, das
atividades socioeconômicas na zona costeira, de modo a contribuir para elevar a qualidade de vida de
sua população e a proteção de seu patrimônio natural, histórico, étnico e cultural;
III- a incorporação da dimensão ambiental nas políticas setoriais voltadas à gestão integrada dos
ambientes costeiros e marinhos, compatibilizando-as com o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro
- PNGC;
IV- o controle sobre os agentes causadores de poluição ou degradação ambiental que ameacem a
qualidade de vida na zona costeira;
V- a produção e difusão do conhecimento para o desenvolvimento e aprimoramento das ações de gestão
da zona costeira.
Para o alcance dos objetivos, dada a diversidade do território da zona costeira,
o Decreto nº 5.300/04, em seu anexo II, classifica a orla marítima em três classes, de acordo
com o grau de preservação e dispõe sobre estratégias de intervenção de acordo com cada
situação:
Classe A - Trecho da orla marítima com atividades compatíveis com a preservação e conservação das
características e funções naturais; possui correlação com os tipos que apresentam baixíssima ocupação,
com paisagens com alto grau de conservação e baixo potencial de poluição.
15
Estratégia de intervenção predominante – Ação Preventiva - Pressupondo a adoção de ações para
conservação das características naturais existentes.
Classe B - Trecho da orla marítima com atividades compatíveis com a conservação da qualidade
ambiental ou baixo potencial de impacto; possui correlação com os tipos que apresentam baixo a médio
adensamento de construções e população residente, com indícios de ocupação recente, paisagens
parcialmente modificadas pela atividade humana e médio potencial de poluição.
Estratégia de intervenção predominante – Ação de Controle - Pressupondo a adoção de ações para usos
sustentáveis e manutenção da qualidade ambiental.
Classe C - Trecho da orla marítima com atividades pouco exigentes quanto aos padrões de qualidade ou
compatíveis com um maior potencial impactante; possui correlação com os tipos que apresentam médio
a alto adensamento de construções e população residente, com paisagens modificadas pela atividade
humana, multiplicidade de usos e alto potencial de poluição sanitária, estética e visual.
Estratégia de intervenção predominante – Ação Corretiva - Pressupondo a adoção de ações para
controle e monitoramento dos usos e da qualidade ambiental.
As disposições legais sobre a Zona Costeira permitem à Administração Pública
planejar e organizar da melhor forma o aproveitamento dessa região, a exploração e
conservação dos seus recursos naturais, assim como dirigir e orientar as ações públicas e
privadas voltadas ao desenvolvimento sustentável desse território.
A zona costeira brasileira na parte terrestre apresenta urbanização intensa e
consolidada, em que pesem as precariedades na oferta de serviços coletivos e problemas
relacionados com a deterioração ambiental, são riquezas sociais produzidas através de
investimentos privados e, sobretudo, públicos. Assim, as terras urbanas da zona costeira, são
produtos de processos sociais geradores de valores econômicos, ou seja, são objetos de fortes
disputas travadas entre diferentes grupos de interesse. A exclusão sócio territorial é produzida
por meio dessas disputas5 .
5 Projeto Orla – Implementação em territórios com urbanização consolidada, pág. 18.16
3. TERRENOS DE MARINHA
A faixa de área pública, conhecida como Terrenos de Marinha e Acrescidos de
Marinha, pertence a União e está contida no conceito de Zona Costeira. O instituto jurídico
dos Terrenos de Marinha e seus Acrescidos se consolidou no Brasil Império, no ano de 1818,
estabelecendo faixa de 15 braças craveiras ( 33 metros) para o lado do continente a partir dos
limites onde chegavam as águas do mar.
Segundo Almeida: “Os terrenos de marinha aportam no Brasil junto com a
legislação portuguesa sobre a propriedade. Em Portugal, se dava uma importância econômica
às marinhas de sal. Havia legislação dispondo que as terras sobre as quais se preparava o sal
pertenciam ao Patrimônio Real e que as marinhas de sal, ou salinas, deveriam ficar
reservadas apenas para o Estado”.6
A Coroa Portuguesa inaugura no Brasil o conceito de terra de marinha como
trecho de propriedade pública (primeiro da Coroa depois da União), esse instituto previsto nas
ordenações filipinas de forma restrita, alarga-se inovando o que hoje denominamos direito
administrativo brasileiro.
Desde sua origem, as terras de marinha tem cunho arrecadatório e comercial,
por outro lado teve como objeto assegurar às populações o livre acesso ao mar e às áreas
litorâneas, assim como garantir a defesa nacional. Essas foram as motivações e justificativas
6 Almeida, José Mauro de Lima O' de, Terrenos de Marinha, Proteção Ambiental e as Cidades, Ed. Paka-
Tatu,
Belém, 2008, pag. 54.17
que fundamentaram a reserva desse patrimônio público que se estende em faixa contínua ao
longo da costa brasileira há mais de dois séculos.
Segundo o Prof. Obede Pereira de Lima7 a expansão urbana das cidades
litorâneas brasileiras nos Séculos XVII e XVIII, e, principalmente depois da chegada da
Família Real Portuguesa ao Rio de Janeiro, no início do Século XIX, desenvolveu atividades
exploratórias principalmente na orla marítima onde edificações como armazéns e trapiches
estavam sendo feitos nas terras à beira-mar, contra as quais representara à Coroa o Provedor
da Fazenda. É nesse contexto que surge a preocupação da Coroa Portuguesa em regular o
aproveitamento das áreas ao longo do litoral. Desse modo, retira-se do conceito das sesmarias
e da capitanias hereditárias as terras de marinha, por serem essas necessárias a administração
e a defesa do país.
Na atualidade a existência dos terrenos de marinha como propriedade pública
tem trazido diversos debates no Congresso, inclusive com a propositura de um Projeto de
Emenda Constitucional (PEC 53) e um Projeto de Lei nº 1.117/11, os dois com objetivo de
rever tanto a existência dessas áreas como bens públicos da União, e, ainda, no segundo caso,
revendo a data da configuração da orla para fins de demarcação desse território.
A discussão dos terrenos de marinha e seus acrescidos ainda não alcançou o
tema do ordenamento territorial, principalmente no que tange a sua incidência dentro da Zona
Costeira e seu papel na consolidação da Política Nacional de Gerenciamento Costeiro.
7 Lima, Obéde Pereira de; in “Terrenos de marinha e seus acrescidos: aspectos físicos,
socioambiental e legal”, III Simpósio Brasileiro de Ciências Geodésicas e Tecnologias de Geoinformação,
UFPE, 2010.18
Os melhores trabalhos que apontam a situação atual dos terrenos de marinha
observam sua importância para proteção ambiental e a necessidade de compatibilização com a
legislação urbanística, há uma convergência quanto à necessidade de atualização da legislação
que trata dos terrenos de marinha junto à legislação contemporânea.
. Como afirma Almeida, um dos problemas da legislação referente aos terrenos
de marinha e sua desarticulação com a moderna legislação ambiental que surgiu a partir dos
movimentos históricos relacionados ao meio ambiente8
3.1 TIPOLOGIA DOS BENS PÚBLICOS EM TERRENOS DE MARINHA
O conteúdo jurídico dos terrenos de marinha abrange três categorias clássicas
do direito administrativo, os bens de uso comum, com sua natureza de direito coletivo, difuso
e transgeracional, os bens de uso de especial que constituem bens afetados a um determinado
uso público, que, nessa medida, também podem ter natureza de direito difuso e
transgeracional e, por fim, os bens dominiais, aqueles que embora públicos, têm seu uso
privado regulado por direito público, podendo haver ou não retribuição por sua utilização.
Conforme o Capítulo III do Código Civil os bens públicos são aqueles
pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno, o art. 99 desse código, divide os
bens públicos em três categorias, os bens de uso comum, os bens de uso especial e os bens
dominiais. Os dois primeiros por estarem afetados são inalienáveis, isso quer dizer que os
bens de uso comum pertencem a todos os brasileiros indistintamente, não podendo seu uso ser
restringido salvo quando o interesse público assim o exigir, por outro lado os bens de uso
8 Almeida, José Mauro de Lima O' de, Terrenos de Marinha, proteção ambiental e as cidades, pg. 51.19
especial são aqueles vinculados a determinada atividade pública, seja da administração estatal,
seja para preservação ambiental ou da cultura de povos indígenas.
Os bens dominicais ou dominiais, pertencem as pessoas de direito público
como parte de direito real integrante de seu patrimônio, esses bens se regem por normas de
direito privado e normas de direito público. Assim, exige-se todas formalidades do processo
licitatório para alienação ou destinação dos bens dominiais, e, por outro lado, pode-se
formalizar contratos de arrendamento, compra e venda e outros, típicos do direito privado. Os
bens dominiais, em regra, podem ser alienados.
Nos terrenos de marinha convivem essas três tipologias de bens públicos.
Assim as praias, calçadões, praças, ruas, belvederes e alguns monumentos históricos podem
ser considerados bens de uso comum. Prédios públicos, escolas, universidades, hospitais,
áreas reservadas para defesa do Estado, reservas ambientais, monumentos históricos de acesso
restrito, reservas indígenas são considerados bens afetados a determinado objetivo social,
patrimônio que o Estado utiliza para garantir direitos e oferecer serviços. Por fim, os demais
imóveis dentro da faixa dos terrenos de marinha e acrescidos são disponibilizados pelo Estado
para uso particular por meio de retribuição, resguardado o uso gratuito para a moradia de
população considerada de baixa renda e investimentos de cunho social, p.ex. galpões para
reciclagem de lixo ou para guarda de barcos artesanais de pesca.
Se há semelhanças entre os bens de uso comum e os bens de uso especial
dentro ou fora dos terrenos de marinha, o mesmo não se pode afirmar quanto aos bens de uso
dominial. As diferenças são substanciais e merecem uma reflexão.
20
A primeira diferença reside no texto constitucional no qual podemos encontrar
bens dominiais nos incisos I, III, IV e VII, do art. 20 da Constituição Federal. Ou seja,
existem na órbita constitucional bens dominiais em três tipologias de áreas, terrenos marginais
e seus acrescidos, terrenos de marinha e seus acrescidos, e os demais, conhecidos nos
registros do patrimônio da União como “nacionais interiores”, tipologia pouco conhecida pelo
Direito Administrativo, que equivale a todos os terrenos com exclusão dos terrenos de
marinha e marginais com seus respectivos acrescidos. Vale acrescentar que o inciso IV do
mesmo artigo, resguardou nas ilhas costeiras com sede de município os terrenos de marinha,
com a consequente existência dos bens de uso dominial nessa faixa. Vejamos:
“Art. 20. São bens da União:
I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos;
…..
III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de
um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele
provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais;
IV as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas
oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas
afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II; (Redação dada
pela Emenda Constitucional nº 46, de 2005)
VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;”
Por fim, a faixa de fronteira tem regramento próprio para os bens dominiais, que passa por
controle do Conselho de Defesa Nacional, art. 20, §2º da CF:
§ 2º - A faixa de até cento e cinquenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres,
designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do território nacional, e sua
ocupação e utilização serão reguladas em lei.
21
No Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) há hipótese de
manutenção do regime enfitêutico somente nos terrenos de marinha em áreas urbanas,
havendo ainda possibilidade de remição dos aforamentos, ou seja, a aquisição por particular
do domínio direto, é o que se lê no art. 49 do ADCT. Esse artigo anuncia que lei ordinária
disporá sobre a enfiteuse em imóveis urbanos.
Art. 49. A lei disporá sobre o instituto da enfiteuse em imóveis urbanos, sendo facultada aos foreiros, no
caso de sua extinção, a remição dos aforamentos mediante aquisição do domínio direto, na
conformidade do que dispuserem os respectivos contratos.
§ 1º - Quando não existir cláusula contratual, serão adotados os critérios e bases hoje vigentes na
legislação especial dos imóveis da União.
§ 2º - Os direitos dos atuais ocupantes inscritos ficam assegurados pela aplicação de outra modalidade
de contrato.
§ 3º - A enfiteuse continuará sendo aplicada aos terrenos de marinha e seus acrescidos, situados na faixa
de segurança, a partir da orla marítima.
§ 4º - Remido o foro, o antigo titular do domínio direto deverá, no prazo de noventa dias, sob pena de
responsabilidade, confiar à guarda do registro de imóveis competente toda a documentação a ele
relativa.
Aqui surge a diferenciação dos bens dominiais urbanos nos terrenos de
marinha e seus acrescidos e nos demais terrenos urbanos da União, somente naqueles poderá
ser utilizado o regime enfitêutico, observando que no direito privado não há mais previsão
para esse tipo de contrato. Podemos afirmar que após a Constituição Federal de 1988 não há
como constituir contratos enfitêuticos em área rural, e, nas áreas urbanas, só serão possíveis
dentro da faixa de segurança dos terrenos de marinha.
22
Ou seja, fora dos limites da faixa de segurança - que ainda aguarda
regulamentação -, os terrenos de marinha em áreas urbanas que se encontrem aforados,
poderão ter remidos pelo particular, podendo outros serem aforados apenas na faixa de
segurança.
Fora da faixa de segurança, deverá a União garantir os direitos dos ocupantes
com outra modalidade contratual, §2º do mesmo artigo.
Caberá ao legislador definir em lei o que deve se considerar como faixa de
segurança para os fins do art. 49, §3º, onde continuará sendo observado o regime enfitêutico,
podendo fora dessas áreas ser alienado o patrimônio público, quando não existir interesse
público, econômico ou social em manter o imóvel no domínio da União.
3.2. A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA “PROJETO
ORLA”
O Projeto de Gestão Integrada da Orla Marítima – Projeto Orla - é uma ação
conjunta entre o Ministério do Meio Ambiente, por intermédio de sua Secretaria de Mudanças
Climáticas e Qualidade Ambiental (SMCQ), e o Ministério do Planejamento, Orçamento e
Gestão, no âmbito da sua Secretaria do Patrimônio da União (SPU/MPOG). Suas ações
buscam o ordenamento dos espaços litorâneos sob domínio da União, aproximando as
políticas ambiental e patrimonial, com ampla articulação entre as três esferas de governo e a
sociedade. Os seus objetivos estão baseados nas seguintes diretrizes9:
9 http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=1123
Fortalecimento da capacidade de atuação e articulação de diferentes atores do setor público e
privado na gestão integrada da orla, aperfeiçoando o arcabouço normativo para o ordenamento
de uso e ocupação desse espaço;
Desenvolvimento de mecanismos de participação e controle social para sua gestão integrada;
Valorização de ações inovadoras de gestão voltadas ao uso sustentável dos recursos naturais e
da ocupação dos espaços litorâneos.
A concepção de gestão adotada pelo Projeto é amparada nas políticas
ambiental e patrimonial brasileira e tem como base a seguinte legislação:
Constituição Federal art. 20 e art. 225, §4º, o primeiro define o patrimônio da União e o segundo define
a Zona Costeira como patrimônio nacional e especifica que sua utilização far-se-á, na forma da lei,
dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos
recursos naturais.
Lei nº 7.661/88 - institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC), cujo detalhamento é
estabelecido em documento específico, no âmbito da Comissão Interministerial para os Recursos do
Mar (CIRM).
PNGC II - Resolução CIRM N° 005/97 - que estabelece normas gerais visando a gestão ambiental da
Zona Costeira do País, lançando as bases para a formulação de políticas, planos e programas estaduais e
municipais. Cria o Grupo de Integração do Gerenciamento Costeiro (GI-Gerco).
Decreto nº 5.300/04 - regulamenta a Lei n.° 7661/88 e estabelece critérios de gestão da orla marítima.
Lei nº 11.481/07 – prevê medidas voltadas à regularização fundiária de interesse social em imóveis da
União, permite a aplicação da Concessão de Direito Real de Uso e da Concessão de Uso Especial para
Fins de Moradia nos terrenos de marinha.
24
Lei nº 9.636/98 - dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis
de domínio da União, incluindo os localizados na orla marítima.
Decreto-Lei nº 9760/46 – dispõe sobre bens imóveis da União.
A gestão do Projeto Orla se dá por meio de articulações nos três níveis da
federação da seguinte forma:
. Esfera nacional – Coordenação Nacional (MMA-SMCQ / MP-SPU-GRPUs), e GIGERCO;
. Esfera regional – OEMA e CTE;
. Esfera local – Conselho Gestor (inclui representações de governo e da sociedade civil organizada),
Executivo (Prefeitura) e Legislativo (Câmara de Vereadores) Municipais.
A implementação se dá na forma de oficinas que se desenvolvem em etapas
sucessivas e abordam aspectos da ordenação do território. O primeiro passo e a geração de
insumos e a mobilização dos atores estaduais, que uma vez consolidada inicia a construção de
articulações junto aos municípios.
As oficinas de capacitação municipais do Projeto Orla são realizadas com
intuito de se elaborar diagnóstico, classificação, formulação de cenários e planejamento de
ações, incluindo a temática da regularização fundiária. Esses elementos são suficientes para
construção do Plano de Gestão Integrada da orla, produto final da oficina.
No Plano de Gestão estarão delineadas as ações necessárias para a solução das
questões relacionadas ao uso e ocupação dos espaços litorâneos, identificadas e discutidas
25
durante o processo de capacitação, da qual participam representantes de setores com
interesses incidentes na orla. Assim, o conjunto das ações definidas no Plano fortalece e
efetiva o compromisso de compartilhamento administrativo, servindo também de parâmetros
para a avaliação do andamento das atividades previstas10.
A primeira oficina municipal inicia-se com um processo de sensibilização no
qual são passados os fundamentos do Projeto Orla, da gestão costeira e patrimonial. Em
seguida é construído um diagnóstico juntamente com a classificação e delimitação da orla e
dos cenários.
Na segunda oficina consolida-se o diagnóstico e se organiza as ações que
enfeixam o Plano de Gestão Integrada, para tanto, é feita a sistematização dos quadros de
problemas e as linhas de ação voltadas ao enfrentamento daqueles. Parte-se para a instalação
de uma gestão sustentável na orla, fundamentada no planejamento, meios e cronogramas
específicos.
Na construção do Plano de Gestão Integrada realizado nas oficinas municipais,
alguns parâmetros devem ser avaliados, dentre deles destacam-se:
a) Parâmetros ambientais:cobertura vegetal nativa (%); valores cênicos; integridade dos ecossistemas;
fragilidade dos ecossistemas; presença de unidades de conservação; condição de balneabilidade;
degradação ambiental; presença de efluentes; presença de resíduos sólidos na orla; potencial para
aproveitamento mineral; aptidão agrícola; potencial de extração vegetal; potencial pesqueiro; aptidão
para maricultura.
b) Parâmetros sociais: presença de comunidades tradicionais; concentração de domicílios de veraneio
(segunda residência); infraestrutura de lazer/turismo; cobertura urbana ou urbanização; domicílios
10 Projeto Orla – Manual de gestão.26
servidos por água (%); domicílios com serviço de esgoto (%); domicílios servidos por coleta de lixo
(%); domicílios servidos por energia elétrica (%); formas de acesso.
c) Parâmetros econômicos: pressão imobiliária; uso agrícola; uso para extração vegetal; uso dos
recursos pesqueiros; uso para maricultura; uso para tráfego aquaviário ou portuário; uso industrial;
aproveitamento mineral; atividades petrolíferas; atividades turísticas.
O Projeto Orla alcança diversas dimensões necessárias para o ordenamento
territorial, dentre dos passos que ainda devem ser superados destaca-se, dentre outras
dimensões, a falta de atratividade do projeto para os municípios.
Vejamos algumas recomendações, classificadas de acordo com o último
relatório de avaliação produzido pelo Ministério do Meio Ambiente em parceria com o
Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão11 :
Dentre as recomendações de interesse geral para o fortalecimento da base
institucional, técnica e programática do Projeto Orla, destacam-se, dentre outras que podem
contribuir para a acessibilidade à sua base de informações e para a sua difusão mais eficaz do
Projeto:
a) Reformular o portal unificado do Projeto Orla com acesso na página do MMA e da MP/SPU da
internet, incluindo conteúdos tais como: legislação básica de interesse ao Projeto, experiências exitosas,
possíveis fontes de recursos para implementação dos PGIs, exemplos e modelos de normatizações
(regimento interno dos CGs e das CTEs), fórum de discussão para encaminhamento de dúvidas e troca
de experiências, boletim informativo, banco de dados sobre o perfil dos municípios, agenda de eventos,
entre outros.
11 Todas recomendações do texto foram retiradas da “Avaliação da implementação do projeto orla e
estratégias para o seu fortalecimento”; IBAM; 2008.27
b) Programar avaliações expeditas e periódicas do Projeto – a cada dois anos – para evitar hiatos e rever
encaminhamentos. As avaliações poderão ser executadas por meio de instrumentos de pesquisa
simplificados e com possibilidade de análises rápidas das informações coletadas, a exemplo de alguns
instrumentos utilizados na presente avaliação, e ficariam a cargo da Coordenação Nacional, com o
apoio das Coordenações Estaduais. Recomenda-se que essa avaliação periódica observe a cadência dos
mandatos políticos e dos orçamentos municipais, de modo a tirar partido do tempo político e do tempo
orçamentário da vida municipal;
c) Aprimorar e ampliar a série de publicações do Projeto Orla detalhando alguns aspectos e
complementando outros tais como:
- Elaborar um fluxograma do processo de implementação do projeto que detalhe as etapas e produtos
esperados, indicando os responsáveis pela elaboração, encaminhamento e aprovação;
- Incluir nos manuais uma diretriz para flexibilização do número de oficinas e do tempo de sua
realização, de acordo com as necessidades de cada município, seguindo a metodologia do Projeto;
- Incluir na série de publicações do Projeto Orla um manual sobre “Padrões para Uso e Ocupação do
Solo na Orla Marítima Brasileira”, incluindo: aspectos gerais de ordenamento físico territorial,
urbanismo, saneamento, legislação incidente na orla, uso das praias, posturas, padrões ou indicadores de
qualidade – conforme as categorias, classificações ou combinação de elementos paisagísticos da orla
constantes dos outros manuais. O objetivo é orientar as Prefeituras Municipais quanto ao planejamento,
o licenciamento de projetos relativos aos espaços construídos e a fiscalização do uso e da realização de
atividades nas praias.
As recomendações também se dirigem a metodologia, de modo a promover
novas adequações na metodologia de elaboração e na estrutura dos PGIs às peculiaridades
locais, considerando, integrar um quadro na estrutura do PGI para identificar fontes de
28
receitas específicas - recursos previstos em LDOs e PPAs municipais (coleta de lixo,
equipamentos públicos, controle das ocupações, vigilância sanitária, entre outros).
Vale esclarecer que os pleitos de recursos costumam visar a necessidade de
investimentos, mas muitas das ações previstas nos PGIs dependem mesmo é de recursos para
o custeio, referente mais às chamadas “atividades-meio” do que às atividades-fim”. Esta
preocupação com a identificação de possíveis receitas deve incluir as esferas estadual e
federal.
Na mesma linha de destacar as atividades-meio e de buscar mais agilidade na
execução dos PGIs, recomenda-se criar um item ou quadro na estrutura dos PGIs para
identificar ações e projetos a serem detalhados e executados pelo Executivo Municipal, que
não dependam de aprovação de órgãos das esferas estadual ou federal, bem como de
deliberações do Comitê Gestor.
Promover, nas Câmaras Municipais dos municípios da orla – uma iniciativa de
informação e esclarecimento quanto à incidência e às implicações da legislação de interesse
do Projeto Orla para os Municípios.
Indicar ao MEC e à CAPES o interesse do Projeto Orla na promoção de cursos
de graduação e pós-graduação direcionados para a formação de pessoal para o planejamento e
na gestão territorial com ênfase na orla.
29
Definir critérios de enquadramento para priorização dos municípios a serem
atendidos por programas de fomento (gestão ambiental, turismo, desenvolvimento
institucional, etc.).
Elaborar mapeamento das fontes de financiamento como um portfólio de
possíveis alternativas de recursos para a execução dos projetos e ações previstos nos PGIs.
Divulgar aos estados e municípios as LPMs homologadas, nos trechos da orla
que já a possuem e, identificar, demarcar e homologar as LPMs nacionalmente e dar ampla
divulgação aos interessados.
Atribuir às CTEs a função de elaboração de pareceres técnicos de apoio aos
Comitês Gestores e às Prefeituras na tomada de decisão sobre as questões que dependam de
aprovação dos órgãos ambientais estaduais e federais e da autorização da SPU.
Celebrar Convênios e Acordos de Cooperação Técnica com Universidades
Federais e Estaduais e entidades afins para apoiar, de forma regionalizada, o Projeto Orla e
garantir a sua continuidade tanto para novos PGIs como para a revisão de PGIs já elaborados.
Por meio do G-17 que integra o GI-GERCO, articular a alocação de recursos
de programas federais de outros ministérios, não integrantes da Coordenação Nacional, para
apoiar os municípios na implementação das ações e projetos previstos nos PGIs.
Incentivar colegiados regionais existentes e operantes, como os Comitês de
Bacias Hidrográficas e Consórcios Intermunicipais, a fazerem parte do desenho institucional
30
do Projeto, com o objetivo de contribuírem para a tomada de decisão dos Comitês Gestores
em assuntos que extrapolam os limites municipais, dando respaldo técnico e apoio financeiro,
quando couber, na execução das ações e projetos previstos nos PGIs;
A falta de atratividade resulta das responsabilidades que o ente municipal
assume sem contrapartida de recursos ou de incentivos legais que decorram da pactuação do
Plano de Gestão Integrada. Não há, ainda, nenhum tratamento diferenciado para aqueles
municípios que se responsabilizam com o Plano de Gestão Integrada do Projeto Orla. Assim,
dois municípios vizinhos, um com Projeto Orla pactuado e com PGI em andamento e outro
que se recuse a pactuar o Projeto Orla, concorrem em pé de igualdade frente a recursos para
urbanização, saneamento, preservação ambiental, ou qualquer outra atividade para a qual
existam recursos federais ou estaduais.
3.3. PROJETOS DE LEI PARA ALTERAÇÃO DOS “TERRENOS DE MARINHA”
31
A discussão em torno da modificação da legislação dos terrenos de marinha se
centram na questão da dominialidade, sendo poucas proposições que discutem as questões
ambientais, limitações administrativas12, regras de natureza urbanística ou que discutam a
questão do ordenamento territorial13.
. Parte significativa das alterações patrimoniais transfere de forma gratuita14 15ou
onerosa16 1718para os particulares detentores de contratos de aforamento ou cessionários de
direitos as terras hoje pertencentes a União19. As proposições também tratam da transferência
do domínio da União para Estados e Municípios.
12 PL nº 1082/11, do Dep. Cleber Verde, propõe impedir a transferência de terrenos de marinha a pessoa
física ou jurídica estrangeira.
13 PL nº 256/11, Senador Walter Pinheiro, propõe sobre a transferência de bens imóveis da União ao
Distrito Federal e aos Municípios.
14 PEC nº 39/11. autores Deputados Arnaldo Jordy, José Chaves, Zoinho, propõe revogar o inciso VII, art.
20 da
CF.
15 PL nº 1117/11, autor Dep. Lourival Mendes, propõe modificar e transferir os terrenos de marinha.
16 PEC nº 603/98, autora Dep. Laura Carneiro – propõe a extinção do §3º, do art. 49 do ADCT.
17 PL nº 3.215-A, autor Dep. Adolfo Marinho – disciplina o art. 49, do ADCT.
18 PEC nº 56/2009, autor Senador Marcelo Crivella, Acrescenta o art. 97 ao ADCT.
19 PEC nº 53, autor Senador Almeida Lima, revoga o inciso VII, do art. 20 da CF e o § 3º do art. 49, do
ADCT.32
A motivação para privatização dos terrenos de marinha segue dois caminhos. O
primeiro surge da hipótese da bitributação20, o segundo argumenta sobre o valor cobrado pela
União pela ocupação.
A hipotes de bitributação tem origem na ideia de que além do Imposto Preidal
e Territorial Urbano (IPTU), os ocupantes dos terrenos de marinha pagam a taxa de ocupação
ou o foro. Aqui há confusão entre imposto e receitas patrimoniais. As receitas patrimoniais,
foro, taxa de ocupação, aluguéis, pagamentos a título de arrendamento ou cessão onerosa, são
resultado da ocupação de um terreno público, assemelhado ao pagamento de um aluguel se o
terrenos fosse privado.
O segundo, que discute o alto valor cobrado a título de receitas patrimoniais,
não procede, nesse campo a União age como se particular fosse, tendo como base de cálculo
para cobrança o valor do terreno atualizado. Por outro lado, apenas uma parcela da população
paga essas receitas patrimoniais, sendo que as famílias com rendimento até cinco salários
mínimos estão isentas desse pagamento2122. Pode-se afirmar que menos de 8% da população
brasileira tem renda familiar acima de cinco salários mínimos, sendo, portanto, uma
reivindicação de parcela pequena da população brasileira, que detêm forte poder
reivindicatório. A outra parcela, mais de 90% da população, ganha com a propriedade pública
nas ações de regularização fundiária e provimento habitacional, assim como, na preservação
das áreas de uso comum e dos serviços públicos, das quais são mais dependentes.
20 Nesse sentido PL nº 676/07 do Senador Gerson Camata
21 Art. 1º do Decreto-Lei nº 1.876, de 15 de julho de 1981, com redação da Lei nº 11.481/07.
22 O PL nº 6752/10, de autoria do Senador José Sarney, propõe isentar a cobrança de foros, taxas de
ocupação dos últimos cinco anos para pessoas carentes ou de baixa renda, com renda familiar igual ou inferior a
cinco salários mínimos.33
O Projeto de Emenda a Constituição nº 603/98, propõe revogar o § 3º, do art.
49 do ADCT, ou seja, tem como efeito imediato a retirada da faixa de segurança na qual não
poderá se alienar o domínio pleno do imóveis. A partir daí todos imóveis em terrenos de
marinha, localizados em área urbana ficariam passíveis de remição.
O Projeto de Emenda a Constituição 56/09, acrescenta o art. 97 ao ADCT,
permite a alienação aos foreiros, ocupantes, arrendatários e cessionários, mediante pagamento
de valor equivalente à parcela do domínio detida pelo Poder Público. Essa PEC, de autoria do
Senador Marcelo Crivella, amplia em muito a anterior, pois o art. 49 restringe-se aos contratos
de aforamento, prevendo a extinção ou preservação dessa forma contratual. A PEC 56/09,
viabiliza a alienação de todos imóveis dominiais sobre os quais exista alguma forma
contratual entre particulares e a administração pública.
Os Projetos de Emenda a Constituição nº 53/07 e 39/11 têm em comum a
proposta de extinguir da legislação brasileira os terrenos de marinha. A segunda proposta
inclui a revogação do § 3º, do art. 49 do ADCT. O art. 2º da PEC nº 53/07 e o art. 3º da PEC
nº 39/11 são idênticos, sendo que na segunda proposição há a transferência do domínio pleno
para os ocupantes, as áreas e terrenos (sic) sob a sua posse, desde que quites com as suas
obrigações. A PEC nº 39/11 acrescenta às áreas que devem permanecer com a União aquelas
destinadas ao adestramento das Forças Armadas ou que seja de interesse público, nos termos
da lei.
As quatro PECs acima analisadas não fazem menção ao art. 21, X, nem ao 225
da CF:
34
“Art. 21, IX - elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de
desenvolvimento econômico e social;”
“Art. 225, § 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-
Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro
de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos
naturais.”
As propostas de alteração ou extinção do instituto “terrenos de marinha” em
sede constitucional, não alcança o princípio da unidade da constituição, que exige que uma
disposição constitucional não pode ser considerada de forma isolada nem pode ser
interpretada exclusivamente a partir de si mesma. Esse princípio aponta para uma unidade
interna do texto constitucional. Essa unidade tem um sentido teleológico, que exige um olhar
interpretativo integrado, que se perde ao retalhar o texto constitucional.
Quanto a legislação infraconstitucional merece destaque o PLS nº 53/91, de
autoria do Senador Maurício Corrêa, que dispõe sobre o livre acesso as praias de terrenos de
marinha, esse projeto foi encaminhado a Câmara dos Deputados com o nº 1.828/91, e tem
como mérito garantir o uso do bem praia, bem de uso comum do povo.
O PLC nº 116/07, da Dep. Elcione Barbalho, tem como objetivo alterar o
Código Tributário Nacional de modo a não fazer incidir IPTU sobre imóveis da União ainda
que ocupados ou possuídos por particulares.
No caminho inverso o PL nº 676/07, do Senador Gérson Camata, pretende
alterar o Decreto-Lei nº 9.760/46 de modo a só permitir a cobrança de foro e de taxa de
ocupação quando não incidir sobre aqueles imóveis o Imposto Predial e Territorial Urbano –
IPTU.
35
O PL nº 6.752/10, do Senador José Sarney, propõe isentar as pessoas carentes
ou de baixa renda do pagamento dos foros ou taxas de ocupação devidos nos últimos 5 anos, a
tentativa da proposta seria isentar os ocupantes de baixa renda dos valores devidos a título de
ocupação quando do primeiro cadastramento.
O PL nº 1.082/11, do Dep. Cleber Verde, busca condicionar a transferência de
direitos reais para estrangeiros ou pessoas jurídicas brasileiras com participação de capital
estrangeiro.
O PLS nº 256/11, do Senador Walter Pinheiro, trata de autorizar a União a
transferir aos municípios a gestão patrimonial dos terrenos de marinha e seus acrescidos,
situados em área urbana ou de expansão urbana, mantendo-se o regime enfitêutico requerido
pelo § 3º, do art. 49 do ADCT.
O PL nº 3.215/00, do Dep. Adolfo Marinho, pretende extinguir a enfiteuse em
imóveis urbanos, públicos ou particulares, repetindo, por assim dizer, o disposto no caput do
art. 49 do ADCT, contudo, não trata da sua exceção ou seja o §3º.
O PL nº 1.117/11, do Dep. Lourival Mendes, ao pretende modificar o instituto
de terrenos de marinha, torna sem efeito ou excetua desse conceito as áreas que contenham
sede de município. O mesmo projeto pretende determinar a posição das linhas do preamar
médio tendo como referência o ano de 2011.
36
Assim como as PECs as propostas de alteração do instituto terrenos de marinha
na legislação infraconstitucional não aborda o tema na sua totalidade e não o relaciona, senão
superficialmente, a legislação urbanística, ambiental e na questão do ordenamento territorial.
4. ZONA COSTEIRA NA EUROPA
As áreas costeiras são de fundamental importância para a Europa como o lar de
uma alta porcentagem de seus cidadãos e uma parcela crescente de suas atividades.
Segundo o Relatório de 2002, solicitado pelo Parlamento Europeu sobre as
zonas costeiras da Europa23, as atividades econômicas, de transportes, de cunho residencial e
de lazer na zona costeira dependem das características físicas, da beleza da paisagem, do
património cultural, dos recursos naturais e da riqueza da diversidade biológica marinha e
terrestre.
Isto não significa, no entanto, a relação apenas das pessoas que vivem ou
trabalham na zona costeira. A complexidade da economia demonstra que a maioria dos
europeus, incluindo aqueles que vivem longe das áreas costeiras ou mesmo em países sem
litoral, tem relações com essas áreas. Quase todos os europeus usa os recursos da zona
costeira como fonte de alimentos e matérias-primas, sendo também um importante mercado,
vital para o transporte e comércio. Além disso, as áreas costeiras são o destino de férias
preferido dos cidadãos europeus e fornecem alguns dos habitats e paisagens mais belas. A
23 “Recommendation of the European Parliament and of the Council of 30 May 2002 concerning the
implementation of Integrated Coastal Zone Management in Europe”37
solução para os problemas da zona costeira, é de importancia estratégica para todos os
europeos.
A União Européia tem desenvolvido diversas ações relacionadas ao
conhecimento e formulação de estratégias voltadas para o uso racional e sustentável da Zona
Costeira.
Tendo em conta o art. 175 do Tratado que intituiu a Comunidade Européia, que
aborda a Zona Costeira como sendo de grande importância ambiental, econômica, social,
cultural e recreativa para a Europa, o Parlamento Europeu fez sua primeira Recomendação24
sobre a aplicação da gestão integrada da Zona Costeira da Europa, em 30 de maio de 2002.
A União Européia para cumprir compromissos internacionais, incluindo as
obrigações com base em acordos internacionais como o Capítulo 17 da Agenda 21,
propõe uma estratégia europeia de gestão integrada das zonas costeiras.
Essa estratégia tem como objetivo promover uma abordagem colaborativa ao
planejamento e gestão das áreas costeiras, incluindo a participação direta dos cidadãos.
A estratégia define o papel da UE como fomentador dos processos de liderança
e facilitador do processo de implementação a nível local, regional e nacional de gestão
integrada das zonas costeiras dos Estados-Membros.
24 “Recommendation of the European Parliament and of the Council of 30 May 2002 concerning the
implementation of Integrated Coastal Zone Management in Europe”38
A Comissão de Helsínquia sobre a proteção do mar Báltico, as Convenções de
Oslo e de Paris sobre a proteção do nordeste do Atlântico e a Convenção de Barcelona para a
proteção do mar Mediterrâneo, da qual a União Européia é signatária, têm dado passos
importantes para integrar o planejamento espacial em suas atividades. Isto constituirá um
bloco de construção essencial para a continuação dos trabalhos sobre ordenamento do espaço
marítimo no contexto da proposta de estratégia marinha25.
Não obstante, a zona costeira da Europa sofre com a destruição do habitat, a
contaminação da água, erosão costeira e esgotamento dos recursos, a
superexploração dos recursos limitados da zona costeira (incluindo o seu reduzido
espaço). Hoje se verifica conflitos cada vez mais freqüentes entre os usos, como p.ex. entre a
aquicultura e turismo. Áreas costeiras também sofrem com sérias dificuldades relacionadas
aos direitos sócio-econômicos e culturais, como a desintegração do tecido social,
marginalização, desemprego e destruição da propriedade pela erosão.
As zonas costeiras da Europa enfrentam uma série de problemas biofísicos e
humanos inter-relacionados. As zonas costeiras são sistemas naturais complexos e dinâmicos
sujeitos às forças das correntes de água, ao transporte de sedimentos e às freqüentes
tempestades. São também particularmente vulneráveis à sobre-exploração ou exploração
inadequada das atividades humanas.
O problema bio-físico nas zonas costeiras é incrementado pelo fato do
desenvolvimento não ser mantido dentro dos limites da capacidade de tolerância do ambiente
local algumas das manifestações mais comuns deste problema são:
25 http://ec.europa.eu/environment/iczm/ia.htm39
Erosão costeira generalizada, muitas vezes agravada pela inadequada infra-estrutura humana (incluindo
as erigidas "em defesa do litoral") e desenvolvimento muito próximo à costa,
obras de engenharia em algumas áreas portuárias têm ajudado a acelerar erosão perto da costa, porque
não levam em conta as dinâmicas e processos que caracterizam a zona costeira.
Destruição do habitat, com perda da biodiversidade, como resultado da construção desordenada, do mal
uso da terra, da sobre-exploração dos mares, sendo que esse problema assume importância significativa
nas regiões em rápida expansão econômica, como os países Europa Central e Oriental.
A contaminação do solo e recursos hídricos, como a poluição de fontes marinhas inclusive por
efluentes derramados em rios e poluição causada nos países vizinhos, a partir de resíduos agrícolas a
montante, o que afeta a qualidade das águas costeiras;
Problemas relacionados à qualidade e quantidade dos recursos hídricos, com o problema de "intrusão
salina", ocasionado pela sobreexploração dos aquíferos costeiros, o que constitue um sério problema em
muitas áreas da bacia do Mediterrâneo, os danos ao aqüífero é geralmente uma redução permanente dos
recursos hídricos disponíveis.
Em muitos casos, esses problemas são os problemas básicos físicos e
biológicos porém, há também problemas de ordem social, tais como:
O desemprego e instabilidade social resultante do declínio das indústrias tradicionais como a pequena
pesca costeira, em muitas áreas costeiras de pesca;
a forte competição por recursos, p. ex. a limitada disponibilidade de áreas adequadas
aquicultura resultado da alocação de espaço para outros usos;
A destruição do património cultural e a desintegração do tecido social causado pela
expansão (em especial do turismo), p.ex. muitas das ilhas da Europa - a partir do
Arquipélagos das Canárias, da Suécia e da Finlândia - estão passando por este problema;
40
A perda de património e de oportunidades de desenvolvimento, com a gradual erosão costeira, a nível
local, a erosão costeira é vista como a ameaça mais concreta para a manutenção dos
níveis de renda em muitas áreas que vivem do turismo;
Marginalização e emigração, agravadas pela falta de infra-estrutura adequada
e falta de um desenvolvimento global da economia local em muitas áreas periféricas e isoladas do
litoral, essas deficiências tem causado a migração, que, impõe dificuldades para comunidade local se
manter adequadamente, crescer e manter-se viva.
Estes exemplos ilustram como os recursos naturais e a estrutura social em
muitas áreas costeiras da Europa estão atualmente passando por um processo degenerativo
irreversível.
Voltando aos temas enfrentados na primeira Recomendação de 2002, tomemos
a perspectiva da União Européia que orienta os Estados-Membros a levar em conta nas
estratégias de desenvolvimento sustentável para zona costeira os seguintes objetivos:
a) proteção do ambiente costeiro, com base em uma abordagem sustentável preservando a integridade e
o funcionamento dos ecossistemas, assim como a gestão sustentável dos recursos naturais dos
componentes terrestres e marinhos da zona costeira;
b) o reconhecimento da ameaça para as zonas costeiras por conta das alterações climáticas e dos
perigos decorrentes do aumento do nível do mar e a crescente freqüência e violência das tempestades;
(c) medidas de proteção costeira adequados incluindo a proteção das povoações costeiras e do seu
patrimônio cultural;
41
(d) opções de emprego; oportunidades económicas sustentáveis e funcionamento de um sistema social e
cultural nas comunidades locais;
(f) terra acessível suficiente para o uso coletivo, tanto para fins recreativos como por razões estéticas;
(g) no caso de comunidades costeiras remotas, a manutenção ou a promoção da sua coesão;
(h) uma maior coordenação das ações tomadas por todas as autoridades envolvidas no mar e em terra,
na gestão da interação de mar-terra.
A mesma Recomendação ao tratar da formulação de estratégias nacionais
elenca como princípios necessarios para assegurar uma boa gestão da Zona Costeira, dentre
outros, os seguintes:
a) uma ampla perspectiva global (temática e geográfica) que terá em conta a interdependência e a
disparidade dos sistemas naturais e das actividades humanas com impacto em zonas costeiras;
b) uma perspectiva de longo prazo, que levará em conta o princípio da precaução e as necessidades das
gerações presentes e futuras;
c) desenvolver a gestão adaptativa durante um processo gradual que irá facilitar a adaptação a
problemas e seu conhecimento. Isto implica a necessidade de uma base científica sólida sobre a
evolução da zona costeira;
d) observância às especificidades locais e a grande diversidade das zonas costeiras europeias, o que
tornará possível responder às suas necessidades práticas com soluções específicas e medidas flexíveis;
e) trabalho com processos naturais, observando a capacidade dos ecossistemas, o que tornará as
atividades humanas ecológicamente sustentáveis, socialmente responsáveis e economicamente viáveis a
longo prazo;
f) envolver todas as partes interessadas (parceiros económicos e sociais, as organizações que
representam os moradores da zona costeira, organizações não-governamentais e o setor empresarial) no
42
processo de gestão, por exemplo por meio de acordos e baseado na responsabilidade compartilhada;
g) apoio e envolvimento de órgãos administrativos relevantes a nível nacional, regional e local, entre os
quais links apropriados devem ser estabelecidos ou mantidos com o objetivo de melhorar a coordenação
das diferentes políticas existentes. Parceria com e entre as autoridades regionais e locais deve aplicar-se
quando for o caso;
h) a utilização de uma combinação de instrumentos que visam facilitar a coerência entre os objectivos
de política sectorial e coerência entre o planeamento e gestão.
Em 2007, foi apresentado Relatório ao Parlamento Europeu e ao Conselho com
uma avaliação da gestão integrada da Zona Costeira na Europa26, que aborda os resultados da
Recomendação de 2002.
A Comissão responsável fez uma pesquisa com os países costeiros de modo a
conhecer os impactos da Recomendação de 2002, apenas alguns países e regiões se
envolveram efetivamente na recolha e análise de indicadores específicos para a zona costeira.
Fazendo a UE perceber que continua a faltar uma metodologia para vincular os esforços à
Recomendação de 2002.
Enquanto a metodologia para avaliar os impactos espaciais de políticas da UE
progrediu 27 , as lacunas nos dados e a falta de sistemas eficazes de compartilhamento de
informações ainda são uma barreira para sua utilização mais ampla e dinâmica nos processos
de decisão.
26 http://ec.europa.eu/environment/iczm/ia.htm
27 http://www.gencat.net/mediamb/sosten/deduce/deduce.htm43
O Relatório de 2007 conclui que para apoiar o acompanhamento das
Recomendações e auxiliar a Comissão, mais investimentos serão necessários na capacidade
de reunir informações, analisá-las e informar os tomadores de decisão relevantes e o público
em geral. Do mesmo modo, a partir de iniciativas já tomadas dentro da União Européia deve-
se melhorar o marco jurídico voltado para construir uma infra-estrutura mais eficaz para o uso
e a disseminação da informação espacial.
Para abordar estes e outros desafios corretamente e para melhor preparar e
responder a possíveis catástrofes, uma abordagem territorial coerente e transversal é
necessária. Dado que os planos e programas hoje definem o quadro para os próximos anos, há
uma necessidade urgente de que as decisões de planejamento e investimento atuais
incorporarem os riscos relacionados aos possíveis efeitos da mudança climática e a prevenção
de desastres.
A União Européia discute por exemplo, como forma de colaboração
internacional a Cruz marítima, cooperação frenteiriça e transnacional a ser desenvolvida no
âmbito do objetivo de cooperação e de políticas de coesão.
As ações desenvolvidas na UE para aprimorar a gestão integrada da zona
costeira se assemelham aos esforços brasileiros em sede do Projeto Orla, havendo inclusive
forte interface na análise da Recomendação de 2002, feita em 2007, com a avaliação feita do
Projeto Orla em 2008, sendo essa mais detalhada.
44
5. A DEFINIÇÃO DA FAIXA DE SEGURANÇA – CRITÉRIOS
BALIZADORES
Não há solução legislativa simples para zona costeira . A heterogeneidade
física, econômica, cultural e institucional exige uma resposta flexível
que aborde as diversas estratégias para encontrar soluções para problemas reais.
45
Na zona costeira brasileira, como dito no primeiro capítulo, coexistem a
propriedade pública e a propriedade privada. A principal discussão gira em torno da
permanência do interesse público na preservação dos terrenos de marinha como propriedade
pública. Esse capítulo deve fazer breves considerações sobre esse tema.
Os terrenos de marinha representam um patrimônio público de fundamental
importância para a gestão da Zona Costeira. Recurso estratégico do estado brasileiro
possibilita uma ação espacial para o desenvolvimento sustentável do país, sendo território
privilegiado para ações estatais de longo prazo e para defesa de direitos individuais, coletivos
e difusos.
O Poder Constituinte previu a possibilidade de remição dos aforamentos fora
da faixa de segurança, que por sua vez não foi regulamentada por lei até a presente data.
De acordo com o art. 49, §3º das Disposições Constitucionais Transitórias há
necessidade de se definir a faixa de segurança de modo a manter essas áreas como patrimônio
público, podendo o estado se desonerar da gestão patrimonial dos imóveis urbanos não
necessários para a manutenção do interesse público, na forma de remição dos aforamentos.
Para dar a moldura ao conceito de faixa de segurança, a ser definido na zona
costeira, devemos retomar a classificação apresentada no anexo do Decreto nº 5.300/04. Dois
aspectos são fundamentais e devem ser levados em consideração, o de natureza físico-
ambiental e o de natureza urbanística, é exatamente na conjunção desses dois planos que deve
ser construído o conceito de faixa de segurança.
46
O conceito de faixa de segurança deverá ser regulado por lei e permitirá a
remição apenas de imóveis urbanos que se encontrem fora dessa faixa, conforme o art. 49, do
ADCT:
Art. 49. A lei disporá sobre o instituto da enfiteuse em imóveis urbanos, sendo facultada aos
foreiros, no caso de sua extinção, a remição dos aforamentos mediante aquisição do domínio
direto, na conformidade do que dispuserem os respectivos contratos.
….
§ 3º - A enfiteuse continuará sendo aplicada aos terrenos de marinha e seus
acrescidos, situados na faixa de segurança, a partir da orla marítima.
5.1 FAIXA DE SEGURANÇA E TIPOLOGIAS
Podemos eleger diversas tipologias geográficas, com diferentes naturezas para
servir de referencial de diferenciação na caracterização da faixa de segurança. Pode-se
estabelecer classificações a partir: de elementos naturais (relevo, clima, solo, vegetação, etc.);
de elementos econômicos (preço da terra, formas de propriedade, divisão fundiária, etc); de
elementos culturais (padrões estéticos, gêneros de vida, tipo de população, etc); elementos
administrativos (normas e padrões de uso, zoneamentos, etc.); entre várias outras
possibilidades. Podemos afirmar que toda tipologia é parcial e arbitrária28.
28 Moraes, Antônio Carlos Robert; Classificação das praias brasileiras por níveis de ocupação: proposta de
uma tipologia para os espaços de praias; in Projeto Orla, Subsídios para um Projeto de Gestão, pg. 33.47
Nesse capítulo, aproveitaremos algumas tipologias e situações já conhecidas,
que podem ser utilizadas para caracterização da faixa de segurança. Iniciaremos com a
distinção do conceito de limite de costa e faixa de segurança, abordaremos questões de ordem
urbanística, questões relacionadas ao uso, e questões relativas a defesa ao meio ambiente, no
contexto urbano, sendo esse o limite da incidência do art. 48 do ADCT.
5.2 FAIXA DE SEGURANÇA E LIMITES DA ORLA
Os limites da orla podem ser caracterizados como áreas, definidas legalmente,
necessárias para orientar as ações de controle e restrição de atividades que possam alterar de
forma negativa as características ambientais, estéticas e de acessibilidade à orla29.
Para Muehe, o limite de 33m dos terrenos de marinha não contribuem para
caracterização do limite da orla, devendo, para tanto, ser considerada as tipologias de praias.
“Se tomarmos como exemplo uma praia dissipativa, sujeita a ondas de tempestade com altura na
arrebentação frequentemente superior a 3m, veremos que a adoção de um limite, por exemplo, de 100m
medido a partir da posição do nível de baixa do mar, ultrapassaria apenas ligeiramente a crista das
dunas frontais Não representaria, por conseguinte, segurança contra eventos associados a mudanças
globais, como elevação do nível do mar e intensificação das tempestades. Em vista desse exemplo, seria
razoável o estabelecimento de um limite de 200m, ou mesmo superior. Entretanto, 200m poderia ser um
29 Muehe, Dieter, Definição de limites e tipologias da orla sob os aspectos morfodinâmico e evolutivo, in
Projeto Orla – Subsídios par um projeto de gestão, pg. 16.48
limite excessivo para a região Nordeste e Norte, considerando o clima de ondas menos agressivo que a
do sul e sudeste30.”
Assim como na UE, há aqui uma evidente preocupação com as mudanças
climáticas, sendo a elevação do nível do mar uma variável que deve ser considerada no
estabelecimento do limite terrestre da orla, haja visto o incremento do descongelamento de
geleiras durante a década de 1990 e a tendência histórica de elevação da temperatura
climática.
Os critérios hidrodinâmicos e morfodinâmicos são fundamentais para definição
do limite de orla. O critério hidrodinâmico se relaciona com a exposição ou não da praia às
ondas de tempestade, podendo a praia ser caracterizada como abrigada quando protegida da
ação direta das ondas ou exposta, quando não protegida.
O critério morfodinâmico atenta para as diferenças topográficas entre praia e
antepraia, tendo classificação própria. Temos ainda o critério morfológico que classifica as
praias como destacadas ou aderentes ao litoral.
As categorias acima apresentadas nos ajudam a perceber o grau de exposição
natural das áreas de costa a processos erosivos. Assim, a amplitude da retrogradação e a
ocorrência ou não de inundação das áreas baixas estão condicionadas a diversas variáveis que
devem ser avaliadas com a previsível taxa de elevação do nível do mar.
30 Muehe, op. cit.49
Os limites estabelecidos em outros países para a orla são variados, conforme
Muehe31 , chegando a 500m na Grécia. As larguras mais frequentes são de 50 e 100m. Países
como Colômbia, Indonésia, Costa Rica e Venezuela adotam uma faixa de 50m de largura.
França, Noruega, Suécia e Turquia adotam o limite de 100m, enquanto na Espanha essa faixa
pode variar de 100 a 200m. Limites ainda mais largos são adotados por alguns países para
restrições específicas como instalação de novas industrias, proteção de manguezais ou
proibição de construção de casas de veraneio.
O professor Muehe, observa que as questões sobre a segurança da costa em
função da elevação do nível marinho e os efeitos decorrentes, como aceleração do processo de
erosão/inundação, torna pertinente a discussão sobre o estabelecimento de uma faixa mínima
de proteção da costa brasileira a exemplo do que ocorre em outros países, especialmente pela
ocupação inadequada que acontece na maior parte da Zona Costeira do Brasil32.
Esses limites de proteção da orla são organizados em forma de limitações
administrativas. São, na mais das vezes, regras urbanísticas e ambientais, que definem zonas
non aedificandi, gabaritos de construção e zoneamento de usos. As limitações administrativas
devem contribuir para evitar os danos causados pela desenfreada especulação imobiliária,
contendo-a quando possível, exigindo quando necessário ao interesse público a remoção de
construções.
A área de proteção de orla, ou a faixa mínima de proteção da costa, como a
chama o prof. Muehe, tem elementos caracterizadores que devem ser tomados em
31 op.cit. pg. 21.
32 op.cit. pg. 2950
consideração quando da elaboração do conceito de faixa de segurança, não se confundindo os
dois conceitos.
O conceito de faixa de segurança está inscrito com o objetivo único de
discriminar as áreas, que estejam ocupadas por particulares sob o regime contratual de
aforamento, que possam ou não ser remidas, ou seja, serve para definir as propriedades que
podem passar para o domínio privado, quando houver interesse da administração.
Desse modo, recomenda-se que as áreas expostas a processos erosivos devam
compor o conceito de faixa de segurança, afinal, qual seria a motivação para a administração
pública privatizar áreas que mais cedo ou mais tarde seriam tragadas pelo mar. Essa hipótese
é concreta, e ocorre tanto em desembocaduras fluviais instáveis, a exemplo da foz do rio São
Francisco, como em cordões litorâneos e pontais estreitos, caso do pontal de Conceição da
Barra no estado do Espírito Santo. O mesmo raciocínio se aplica as áreas de dunas ativas.
Nesses casos, deve a administração pública verter esforços para declarar essas áreas como non
aedificandi.
5.3 FAIXA DE SEGURANÇA E PADRÃO DE ASSENTAMENTO
. Outro ponto que deve ser considerado é o padrão de assentamento, do qual
observaremos dois tipos, aqueles que se organizam por traz de uma avenida ou rua e aqueles
que se organizam com as vias posteriores as ocupações, quando as vias dão acesso às
residências.
51
Conforme Macedo33, os loteamentos de praia se organizam em função de uma
via principal de acesso, seja ela uma rodovia ou uma simples via urbana, que pode ou não
correr paralela a praia. Nos loteamentos construídos a partir da década de setenta, muitas
vezes as vias terminam antes de chegar na praia. Denomina-se de loteamento clássico aquele
que possui uma via beira mar, e os demais de loteamento contemporâneo.
O interesse público primordial, que se defende tanto na legislação brasileira
como na de outros países, é o livre acesso às praias. Toda ocupação é voltada para a
exploração máxima dos valores paisagísticos ligados à praia e ao mar, pois esses são os focos
de atração desse tipo de ocupação34.
Assim, parece que atende ao interesse público que as áreas que se caracterizam
por loteamentos contemporâneos, ou seja, que não possuem acesso ao mar por via pública,
devem permanecer dentro do conceito de faixa de segurança por dois motivos, primeiro por
existir interesse de resguardar o acesso ou de abrir vias de acesso a praia, e, segundo, pelo
risco que esse tipo de ocupação sofre por efeitos da erosão. Vale salientar que diversos são os
artifícios de projeto voltados a inibir o acesso as praias, como barreiras de acesso de veículos
à praia, ausência de vias beira mar, até a proibição de atividades de lazer como excursões e
outras.
33 Macedo, Sílvio Soares; Paisagem, litoral e formas de urbanização, in Projeto Orla – Subsídios para um
projeto de gestão, pg. 52.
34 op.cit. pg. 50.52
A eliminação da via beira mar, diz Macedo, é um grande paradoxo, pois é uma
posição urbana saudável que acaba com o movimento excessivo de veículos, mas, por outro
lado facilita o fechamento e a privatização de muitas praias35.
5.4 FAIXA DE SEGURANÇA E TIPOS DE USOS
As áreas destinadas a concessões públicas, portos, aeroportos, rodovias,
ferrovias, usinas eólicas, etc. devem permanecer como bens públicos. Possíveis contratos de
aforamento existentes nessas áreas devem ser substituídos por outros de cessão onerosa ou
arrendamento, o que permite que a utilização do terreno público acompanhe o prazo das
concessões ou permissões. Essas áreas devem fazer parte da faixa de segurança, inclusive
porque parte delas são fundamentais para segurança nacional.
5.5 FAIXA DE SEGURANÇA E ZONEAMENTO
A partir do quadro orientador para obtenção de zoneamento (anexo I, do
Decreto nº 5.300/04) foi construída a classificação da orla marítima (anexo II, do mesmo
Decreto), com três classes (A, B e C). A classe A representa a orla marítima não urbanizada, a
classe B representa a orla em processo de urbanização e, a classe C designa a orla marítima
com urbanização consolidada.
35 op.cit. pg.55.53
A definição de área urbana no Brasil tem sua origem na legislação tributária
(Lei nº5.112/66), quando da definição do fato gerador do imposto sobre a propriedade predial
e territorial urbana (IPTU), vejamos:
Art. 32. ...
§ 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal;
observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos
incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público:
I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;
II - abastecimento de água;
III - sistema de esgotos sanitários;
IV - rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;
V - escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel
considerado.
§ 2º A lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes
de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio,
mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior.
A caracterização de área urbana para fins de fixação dos limites da faixa de
segurança, não deve incluir áreas de expansão urbana ou em processo de urbanização, essas
áreas acabam sendo capturadas pela especulação imobiliária, devendo o poder público
garantir o planejamento da sua ocupação, evitando a urbanização desordenada.
Retornando a classificação do Anexo II do Decreto nº 5.300/04, somente a
classe C, seria passível de ficar de fora da faixa de segurança.
54
A exclusão da Classe B do conceito de faixa de segurança, nas áreas urbanas,
poderia ser prevista a partir de um Plano de Gestão Integrada instituído com ampla
participação e em prática por determinado prazo.
Propõe-se que o exclusão pontual de áreas da faixa de segurança, a partir da
hipótese acima proposta, se dê a partir de um Plano de Uso dos recursos naturais, que,
percebendo as dinâmicas locais, possa permitir a propriedade privada sem causar prejuízo
para o interesse público.
A definição sobre o que é necessário para preservação do interesse público
deve considerar: a pacificação dos conflitos urbanos com afetação de áreas para interesse
social – regularização fundiária e provimento habitacional, qualidade ambiental, preservação
das paisagens urbanas, preservação de monumentos históricos e culturais, portos públicos,
áreas afetadas para defesa e para administração pública, acesso as praias, dentre outras
necessidades de ordem pública.
5.6 FAIXA DE SEGURANÇA E PROTEÇÃO AMBIENTAL
As áreas que já estão protegidas na legislação ambiental, como por exemplo
restingas, dunas, manguezais, além de não suportarem estruturas urbanas convencionais
devem manter-se dentro da faixa de segurança.
Conforme Macedo36, o parcelamento dos territórios protegidos ambientalmente
pode significar sua destruição imediata, pois os ecossistemas costeiros não podem ser
36 Op.cit. pg. 6155
reduzidos a partes dissociadas entre si, sem que ocorra uma perda significativa de suas
características. O autor observa que que os loteamentos litorâneos seguem, ainda, a forma em
xadrez, não sendo projetados em função da dinâmica ambiental dos lugares sobre os quais se
assentam.
6. CONCLUSÃO
A existência dos terrenos de marinha no Brasil favorece em grande medida a
gestão da Política Nacional do Gerenciamento Costeiro (PNGC), havendo motivos
necessários e suficientes para sua manutenção.
O “Projeto Orla” conforme visto é o instrumento adequado para aplicação da
PNGC, segue os melhores padrões de ordenamento da zona costeira, estando a frente das
recomendações da União Europeia em quase todos pontos analisados. Acreditamos que o
Brasil já possui a base para se tornar um exemplo mundial na gestão costeira, havendo ainda
que ampliar sua experiência nos municípios o que exige um maior investimento em todas as
esferas. A avaliação da Politica Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC) demonstra que
estamos no caminho certo, e aponta as melhorias necessárias.
A definição da faixa de segurança, que aguarda mais de 23 anos, importa em
diversas tentativas legislativas de privatização dos terrenos de marinha, sem a adequada
reflexão de suas consequências.
O aperfeiçoamento do instituto jurídico dos terrenos de marinha passa, sem
dúvida, pelo mandamento constitucional da definição da faixa de segurança. Para tanto,
56
elencamos alguns tópicos para sua definição legal:
I - Inclusão necessária na faixa de segurança (além das áreas já afetadas – bens de
uso especial e bens de uso comum do povo):
a) loteamentos ou terrenos que se encontram ligados ao mar sem vias de acesso
expresso (avenidas ou ruas);
b) as áreas necessárias para concessões públicas;
c) as áreas ambientalmente protegidas;
d) as áreas susceptíveis a processos erosivos ou de inundação, assim como
vulneráveis a desmoronamentos;
e) todas áreas classificadas como A e B do Anexo II do Decreto nº 5.300/04;
II - Definir a exclusão da faixa de segurança para as áreas classificadas com B no
Anexo II do Decreto nº 5.300/04, vinculadas a:
a) existência de Plano Diretor Municipal;
b) existência de Plano de Gestão Integrada, em funcionamento a mais de 3
anos, com atualizações sucessivas, em harmonia com o PDOT;
c) existência de licenciamento ambiental e urbanístico da área a ser excluída.
Por fim, resta lembrar que a definição da faixa de segurança não impede a
permanência de áreas públicas fora da faixa de segurança, lembrando que a alienação de bens
públicos é poder discricionário da administração pública e deve estar em conformidade com o
interesse público.
57
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Almeida, José Mauro de Lima O’ de, Terrenos de Marinha Proteção Ambiental e as Cidades, Ed. Paka-Tatu, Belém, 2008.
Lima, Obéde Pereira de; in “Terrenos de marinha e seus acrescidos: aspectos físicos,
socioambiental e legal”, III Simpósio Brasileiro de Ciências Geodésicas e Tecnologias de
Geoinformação, UFPE, 2010.
Projeto Orla – Guia de implementação, Ministério do Meio Ambiente, Secretaria de Qualidade Ambiental; Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Secretaria do Patrimônio da União, Brasília, 2005.
Projeto Orla – Fundamentos para uma gestão integrada, Ministério do Meio Ambiente, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Brasília, 2006.
Projeto Orla – Manual de Gestão, Ministério do Meio Ambiente, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Brasília, 2006.
Projeto Orla – Subsídios para um Projeto de Gestão, Ministério do Meio Ambiente, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Brasília, 2006.
Projeto Orla – Implementação em territórios com Urbanização Consolidada - Ministério do Meio Ambiente, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Brasília, 2006.
“Recommendation of the European Parliament and of the Council of 30 May 2002 concerning the
implementation of Integrated Coastal Zone Management in Europe”
Rufino, Gilberto D’Ávila, Patrimônio Costeiro e seus fundamentos jurídicos, in Projeto Orla – Subsídios para um projeto de gestão, MMA e MPO, Brasília, 2004.
Silva, José Afonso da, Curso de Direito Constitucional Positivo, 23ª Ed. Malheiros Editores, São Paulo, 2004.
IBAM Instituto Brasileiro de Administração Municipal “Avaliação da implementação do projeto orla
e estratégias para o seu fortalecimento”;; 2008.
Legislação citada:
Constituição Federal
Lei nº 7.661/88
Decreto nº 5.300/04
58
Decreto-Lei nº 9.760/46
Lei nº 9.636/98
Projetos Legislativos analisados:
PL nº 1082/11, do Dep. Cleber Verde, propõe impedir a transferência de terrenos de marinha a
pessoa física ou jurídica estrangeira.
PL nº 256/11, Senador Walter Pinheiro, propõe sobre a transferência de bens imóveis da União ao
Distrito Federal e aos Municípios.
PEC nº 39/11. autores Deputados Arnaldo Jordy, José Chaves, Zoinho, propõe revogar o inciso VII,
art. 20 da CF.
PL nº 1117/11, autor Dep. Lourival Mendes, propõe modificar e transferir os terrenos de marinha.
PEC nº 603/98, autora Dep. Laura Carneiro – propõe a extinção do §3º, do art. 49 do ADCT.
PL nº 3.215-A, autor Dep. Adolfo Marinho – disciplina o art. 49, do ADCT.
PEC nº 56/2009, autor Senador Marcelo Crivella, acrescenta o art. 97 ao ADCT.
PL nº 6752/10, de autoria do Senador José Sarney, propõe isentar a cobrança de foros, taxas de
ocupação dos últimos cinco anos para pessoas carentes ou de baixa renda, com renda familiar igual
ou inferior a cinco salários mínimos.
PL nº 676/07,do Senador Gerson Camata, altera o Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946,
que dispõe sobre bens imóveis da União e dá outras providências, para isentar o foreiro e ocupante do
pagamento de foro e taxa de ocupação no caso que especifica.
PEC nº 53, autor Senador Almeida Lima, revoga o inciso VII, do art. 20 da CF e o § 3º do art. 49, do
ADCT.
Sítios eletrônicos:
http://www.demaniomarittimo.com/giurisprudenza.htm
http://www.minambiente.it/home_it/index.html?lang=it
59
http://appinter.csm.it/incontri/relaz/8531.pdf
http://www.legifrance.gouv.fr/affichTexte.do?cidTexte=JORFTEXT000000317531&dateTexte=20110717
http://bibliothequeenligne.espaces-naturels.fr/outilsjuridiques/?arbo=les_fiches&sel=reste:fiche&val=0:13
http://www.littoral.ifen.fr/uploads/media/bilan_loi_littoral.pdf
http://www.marm.es/es/costas/legislacion/
http://www.ecologistasenaccion.org/IMG/pdf/Informe__Infracciones_Ley_Costas.pdf
http://translate.google.com.br/translate?hl=pt-BR&langpair=en|pt&u=http://www.info.gov.za/speeches/1998/9905141232p1009.htm
http://translate.google.com.br/translate?hl=pt-BR&sl=en&tl=pt&u=http%3A%2F%2Fwww.sweden.se%2Feng%2FHome%2FSociety%2FSustainability%2FFacts%2FEnvironment%2F
http://translate.google.com.br/translate?hl=pt-BR&langpair=en |pt&u=http://www.ungreece.org/
http://ec.europa.eu/environment/iczm/ia.htm
http://www.gencat.net/mediamb/sosten/deduce/deduce.htm
http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=11
60