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Título: Guia sanitário para criadores de pequenos ruminantes Editor: Álvaro Mendonça Edição: Instituto Politécnico de Bragança · 2012
5300-253 Bragança · Portugal Tel. (+351) 273 303 200 · Fax (+351) 273 325 405 http://www.ipb.pt
Design: Serviços de Imagem do Instituto Politécnico de Bragança Tiragem: 2600 exemplares Impressão: EscolaTipográfica–Bragança Depósito legal: 350250/12 ISBN: 978-972-745-137-1 Versão digital: http://hdl.handle.net/10198/7264
Colaboração CientíficaProf.DoutorÁlvaroPegadoMendonça–ESA/IPB
Prof.DoutoraAnaCláudiaCoelho–UTADDra.AnaPaulaFigueiras–DSVRN/DGAV
Dr.DuarteDizLopes–ESA/IPB-ClinicaVeterináriaSantiagoProfDoutorFilipeSilva–UTAD
Dr.HélderQuintas–ESA/IPB-ACRIGA,AssociaçãodeCriadoresdeGadoProf.DoutoraIsabelPires–UTADProf.DoutorLuísCardoso–UTAD
Dra.MadalenaMonteiro–LNIV/INRBProf.DoutorMiguelSaraivaLima–FMV/UTLLisboa
Prof.DoutorNunoAlegria–UTADDr.RaimundoMaurício–ESA/IPB
Prof.DoutorRamiroValentim–ESA/IPBProf.DoutoraYolandaVaz–FMV/UTLLisboa
Relatório do ProjectoOTSA (POCTEP) 0108-OTSA-2-E. Observatório Transfronteiriço de Sanidade Animal
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Guia sanitário para criadores de pequenos ruminantes
Doenças pulmonares em pequenos ruminantes
Hélder Quintas
Sanidade Animal, Clínica de Grandes Animais. Departamento de Ciência Animal, Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Bragança.
ACRIGA – Associação de Criadores de Gado.
As doenças pulmonares são uma causa importante de doença em pequenosruminantes de todas as idades e raças. Na sua origem estão frequentemente en-volvidas váriasbactérias, virus eparasitasque, associadosou isoladamente,quan-doencontramcondiçõesambientaisfavoráveis(i.e.mauarejamento,sobrelotação,etc),podemcausarelevadamorbilidade,mortalidadeegrandesperdaseconómicasnasexplorações.Comoagentesmaisimportantespodemosdestacarasdesignadas“Pasteurelas”causademortesúbitaemjovensedepneumoniaemjovenseadultos.Muitasvezesestasbactériasaparecemassociadasavirus(i.e.VírusRespiratórioSin-cicial,VirusParainfluenza)ouamicoplasmascontribuindoparaoaparecimentodeprocessosrespiratórioscomplexos.Emanimaisadultos(>2anos)algunsviruspodemcausar,entreoutrossintomas,pneumoniascrónicasprogressivascomoéocasodaMaedinosovinosedovirusdaArtriteeEncefaliteCaprina(CAEV).Osparasitaspul-monaresnormalmentenãoprovocamsintomatologiaempequenosruminantes,masem grandes infestações podem causar graves broncopneumonias.
Etiologia e epidemiologiaAsdoençaspulmonaresnumefetivotemorigemmultifactorial(Figura1)eos
agentes patogénicos causam problemas quando os fatores ambientais propiciam o seu desenvolvimento e as defesas do animal se encontram debilitadas.
Como fatoresambientaispredisponentesdedoençapulmonarnospequenosruminantes podemos destacar:
• Elevadadensidadepopulacional;• Ventilaçãoinadequada(i.e.ausênciadeventilação,correntesdear);• Excessodepartículasemsuspenção(i.e.poeiras);• Máhigienecomacumulaçãodeestrumesechorumes;• Elevadahumidade;• Variaçãobruscadatemperatura(ex.noitesfriasseguidasdediasquentes);• Temperaturasextremas(i.e.muitoquenteoumuitofrio);• Situaçõesstressantes:transporteinadequado,produçãointensiva,subnu-
triçãoedoençasconcomitantes(ex.MaedieCAEVpodempredisporainfe-ções por bactérias nos adultos).
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Figura 1 – Etiologia multifactorial das pneumonias em pequenos ruminantes.
Nosanimaismaisjovensaspneumoniaslimitamosíndicesdecrescimentoesãoumadasprincipaiscausasdemortalidade.Outrosfatoresquepodemcontribuirparaessasituação,paraalémdosjáreferidosparaanimaisadultos,são:
• Nãoingestãodequantidadesuficientedecolostronasprimeirashorasdevida;
• Alimentaçãoartificial inadequada/fornecimento rápidode leite (exemplo,tetinamuitolarga)podecausarpneumoniasporaspiração;
• Co-habitaçãocomgrandequantidadedeanimaisadultos.
Patogenia e transmissãoMuitas das bactérias que causam problemas respiratorios em ovinos e caprinos
encontram-se,emboraemnúmeroreduzido,naárvorerespiratóriadestesanimais.Assim,napresençadequalquerumdosfatoresanteriormentereferidospodemen-contrarcondiçõesparasemultiplicarememgrandenúmeroecausarpneumonias,querdeformaagudaoudeformacrónica.Portanto,algumasdoençasrespiratóriaspodemnãosercontagiosas,aonãosernecessáriaatransmissãoanimalaanimalparaelasocorrerem.Masé importanteabordartodasasdoençasrespiratóriascomosefossemcontagiosas(i.e.transmissãoaerógena)querasmedidastomadasnoefetivoquernaprópriaproteçãopessoal.
Asdoençasprovocadasporvírussãocontagiosas.Osvírussozinhosnãocausamdoençarespiratóriaagudamaspodemestarenvolvidosempneumoniasdeevoluçãoaguda se associados a bactérias.
Naspneumoniasdeevoluçãocrónicacausadasporvírus(i.e.Maedi,CAEV,ade-nomatose)atransmissãodá-seemfasesmuitoprecocesdavidadoanimalpensando-
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-sequeoleitematernopossaserumaviaimportantedetransmissão.Atransmissãodelarvaspulmonaresdá-seporingestãodosestadosinfestantes
presentes nas pastagens (ex. Dictyocaulus filaria) ou em hospedeiros intermediários como as lesmas e caracois (ex. Muellerius capillaris, Protostrongylus rufescens).Apre-sençadeanimaisportadoresperpetuaaparasitosepeladisseminaçãodeformaspa-rasitáriasatravésdasfezes.Osníveisdeinfestaçãoaumentamcomaidadepeloqueéumproblemamaisfrequenteemadultos.Asinfeçõessecundáriasbacterianaspodemagravar as pneumonias parasitárias.
Características clínicas e PatológicasPasteureloses
Pasteurelose era o nome classicamente dado a quadros de pneunomia agu-da ou de septicémia provocados por bactérias pertencentes ao género Pasteurella. Comareclassificaçãodosagentes,hojeenglobasobretudodoençasprovocadasporMannheimia haemolytica, Pasteurella multocida e Bibersteinia trehalosi.
Mannheimia haemolyticaéoprincipalagentededoençarespiratóriaempeque-nosruminantes.Éjuntamentecomasenterotoxémiasumadasprincipaiscausasdemorte súbita(morterápida)emanimaisjovens(<3meses).Causaaindapneumoniasemanimaisjovenseadultos(Figura2).Osanimaisafetadosapresentamdepressão,febre (>41ºC), descarga nasal, tosse e dificuldade respiratória. Nos casos crónicosocorre perda progressiva de peso.
Figura 2 – Quadros de pasteurelose (Mannheimia haemolytica) à necropsia: consoli-
dação pulmonar (A); quadros hemorrágicos (B); deposição de fibrina em pneumonias crónicas (C).
Muitasvezes infecõesprimáriasporvirus respiratório sinsicial, adenovirusouparainfluenzatipo3predispoemàinfeçãosecundáriaporM. haemolytica ou Pasteu-rella multocida.
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Figura 3 – (A) Rinite atrófica em caprino; (B) pneumonia por P. Multocida associada ao
A. Pyogenes, o agente mais frequentemente isolado em abcessos pulmonares.
TalcomoM.haemolytica,Pasteurella multocida pode provocar pneumonias em pequenosruminantes.Commaiorgravidadeemanimaisjovensondetambémpodeseracausadequadrosdesepticemia.Podeaindaestarassociadaariniteatróficaeatrofiadoscornetosnasais.Empneumoniascrónicaspodemaindaaparecerabcessospulmonares provocados por Arcanobacterium pyogenes (Figura 3).
Apasteurelose sistémicaafetaprincipalmenteovinosentreos6e9mesesecaracteriza-seporsepticemiaagudaemortessúbitaseécausadapelaBibersteinia trehalosi (antiga M. haemolyticabiotipoT).Apesardepoucoisoladaemcaprinoséjáuma das principais causas de morte em ovinos de recria em alguns países europeus.
Mycoplasmas Mycoplasma ovipneumoniaeassociadoàsbactériasresponsáveispelaspas-
teureloses ou a outras bactérias (ex. Bordetellaspp.)provocamumapneumoniacró-nicanãoprogressivaquepodeafetaranimaisestabuladoscommenosdeumano.Sãomuitasvezesachadosdematadouro(Figura4).
Figura 4 – Consolidação vermelha/acastanhada na região pulmonar anteroventral sem efeitos adversos aparentes no crescimento.
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M. mycoides subs mycoides,agentedaagalaxiainfeciosa,tambémpodeserre-sponsávelporpneumoniasemanimaisjovenseadultos.
VírusDiversosvíruspodemestarenvolvidosemdoençarespiratóriaempequenosru-
minantes.Ovirusrespiratóriosinsicial,adenoviruseoparainflurenzatipo3parecemestarenvolvidosemsindromesrespiratóriosjuntamentecomdiversasbactérias.
Outrosvirusatingemsobretudoanimaisadultos(>2anos).Ovírusdoadenocar-cinoma pulmonar ovino (adenomatose) tem a particularidade de provocar uma des-carganasalcupiosa(Figura5),dificuldaderespiratória,especialmenteapósexercício,eemagrecimentoprogressivo.Éumadoençafatalemsemanasoumeses,eamortepode ser acelerada se ocorrerem infeções bacterianas associadas. É uma doença rara em caprinos.
Figura 5 – Prova do “carro de mão” para colheita do abundante líquido espumoso que
permite o diagnóstico clínico e pormenor ao corte de pulmão.
Maedi-Visnaéumadoençacrónicaeprogressivadosovinosadultosprovocadaporum lentivirus.Os sintomasquemais chamamaatençãoparaestadoença sãoadificuldaderespiratória(“baterosfoles”)eperdaprogressivadepeso.Paraalémdapneumonia(Maedi:Figura6)estadoençapodeapresentaroutrasformas,comoanervosa (Visna),causarproblemasarticularesemamites.Adoença transmite-se,principalmente,pelaingestãodecolostroeleitedemãesportadoras,mastambém,pelocontatodiretoatravésdesecreçõesnasaisdeanimaisinfetados.Operiododeincubaçãoélongopoisossintomasapenassemanifestamapartirdos3–4anos.
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Figura 6 – Maedi, necropsia: pulmão não colapsa à abertura da cavidade toracica e apresenta as impressões das costelas na sua superficie.
OvírusdaArtrite – Enfefalite Caprina é um lentivírus similar ao anterior que pro-
vocaumquadroclínicosemelhanteaodescritoanteriormentenoscaprinos,incluindopneumoniacrónicaprogressiva.
Otumor nasal enzootico é uma neoplasia de origem viral que pode atingir ovi-nosecaprinosadultos.Asmassastumoraispodemserunilateraisoubilaterais(Figura7)eprovocamumasecreçãoseromucosaabundante,dandoumaspeto“lavado”aonariz.Osanimaisafetadosapresentamdificuldaderespiratóriaeperdadepeso.Nosefetivosatingidosamortalidadepodeirdeesporádicaamuitosignificativa.
Figura 7 – Massa tumoral visível no nariz e face assimétrica provocada pelo seu cresci-mento. Aspecto à necropsia das massas tumorais apresentando crescimento bilateral.
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ParasitasDictyocaulus filaria pode esporadicamente provocar ligeiros problemas res-
piratóriosemovinosecaprinosjovens.Osanimaisadultosdesenvolvemumaforteimunidadeemrelaçãoaesteparasitapeloqueosproblemassãorarosemadultos(Figura 8). Protostrongylus rufescens e Muellerius capilarissãonormalmenteachadosdenecropsiaemovinos.Noentanto,oscaprinossãomaissusceptíveisàinfestaçãopor Muellerius capillaris queosovinos.Estesdoisultimosparasitaspodemcausardifi-culdaderespiratóriaeperdadepesoemanimaisjovens.
Figura 8 – Em fortes infestações podem ser encontradas, durante a necropsia ao corte da traqueia, grande quantidade de parasitas pulmonares.
AoestrosedospequenosruminantesécausadapelafaselarvaldamoscaOes-trus ovis(Figura9)epodeprovocar,entreoutrossintomas,dificuldadaderespirató-ria,corrimentonasalsanguinolentoeproblemasnervosos(falsotorneio).
Figura 9 – Larvas de Oestrus ovis na cavidade nasal de um caprino.
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Oquisto hidático é a forma larvar do parasita dos carnívoros Echinococcus gra-nulosus que pode infestar os ovinos e caprinos. Se atingir os pulmões pode provocar sintomatologiarespiratória.Éumadoençadedeclaraçãoobrigatória.
DiagnósticoDadasasdiferentescausasdedoençarespiratóriaempequenosruminanteso
diagnósticodeveserfeitoexclusivamentepeloMédicoVeterinárioAssistentedaex-ploraçãotendoemcontaahistóriaclínicadoefetivo,programasdeprofilaxiamedico--sanitáriaemcurso,dadosdenecropsiaassociadosaoisolamento/identificaçãolabo-ratorialdoagentee/outestessorológicosrealizados.
Tratamento e controloOtratamentodepneumoniasdeorigembacterianaégeralmentefeitocoman-
tibióticoseanti-inflamatórios.Aescolhadoprincipioativo,doseeduraçãodo tra-tamento deve ser feita apenas peloMédico Veterinário, combase no diagnósticorealizado.Nuncasedevemuniformizartratamentos,aplicarsub-dosagensneminter-romper tratamentos por aparente melhoria clínica do animal.
Nãohátratamentoparaaspneumoniascrónicasdeorigemvírica (i.e.Maedi,CAEV,adenomatose).Oseucontrolodeveserfeitocombaseemestratégiasdede-teçãoe abatedeanimaispositivos.Apasteurizaçãodo leite fornecidoaos recém--nascidoséumprocedimentoquepodeminimizaratransmissãodestasdoenças.
Osparasitaspulmonarespodemserprevenidospelautilizaçãoregulareestraté-gicadedesparasitantesnaexploraçãoincluídosnosprogramasprofilaticosemcurso.Asdosesnoscaprinosdevemserajustadastendoemcontaassuasespecificidades(1,2a1,5xadose/kgdosovinos).
Asestratégiasdeprevençãorequeremumacompreensãoclaradopapelqueosfatores predisponentes tem na doença pulmonar nos ovinos e caprinos. Todos estes fatores devem ser regularmente revistos e controlados em efetivos com pneumo-nias.Devegarantir-sesemprecamasecae limpa,boaalimentação,águapotáveleboa ventilação.Dividirosanimaisporidades,evitaraestabulaçãonomesmoespa-çodeanimaisjovenseadultos,umaelevadadensidadedeanimaiseaindatodososprocedimentosstressantes.Todososanimaiscompradosdenovoparaaexploraçãodevem ser mantidos isolados dos restantes durante 2 semanas.
Existemvacinaspolivalentes(associadasàsdasclostridioses)paraasdesigna-daspasteurelosesquedevem ser utilizadas semprequeestadoença sejaumpro-blemanaexploração.AescolhadasvalênciasdavacinaeocalendáriodevacinaçãodeveserfeitopeloMédicoVeterinário.Aprimo-vacinaçãoincluiaadministraçãodeduas doses com um intervalo de aproximadamente 4 semanas. Deve ser assegurada arevacinaçãoanual.Oultimoterçodagestaçãoéaalturaidealparaavacinaçãodemodoagarantiratransmissãodeimunidadeviacolostro.Osanimaisjovenspodemser vacinados a partir das 3 semanas de idade.
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