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UNIRIO - UNIVERSIDADE FEDRAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CEDERJ - CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Caderno didático de Artes Visuais na Educação - Licenciatura em Pedagogia – EAD –
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - Fundação Centro de Ciências e Educação
Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro-Universidade Aberta do Brasil - UNIRIO – UAB - CEDERJ © 1
MATERIAL DIDÁTICO IMPRESSO
CURSO: PEDAGOGIA DISCIPLINA: ARTES VISUAIS E EDUCAÇÃO
AUTORA: Patricia Horvat
AULA 2
TÍTULO: COMPETÊNCIAS, HABILIDADES E A LINGUAGEM DA ARTE.
META
Apresentar as competências e atitudes recomendadas ao ensino de Artes
Visuais, apontando para a noção de que a sensibilidade, instrumentalizada pelas Artes
Visuais, tem um papel mediador entre o conhecimento e a ação.
OBJETIVO
1 – Conhecer as competências e conteúdos atitudinais relacionados ao ensino e à
aprendizagem das Artes Visuais e à Educação Estética.
PRÉ-REQUISITOS
Para o bom aproveitamento do conteúdo desta Aula, recomenda-se a leitura dos
Parâmetros Curriculares Nacionais - Artes. É importante, também, ter em mão um bom
dicionário da Língua Portuguesa.
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INTRODUÇÃO Os conteúdos atitudinais dos PCN-Artes, que você conheceu em nossa primeira
aula, referem-se a conteúdos próprios do âmbito artístico em seus processos de
criação, de comunicação/expressão e recepção da obra de arte. Propomos, agora, uma
observação dessas atitudes a partir dos seguintes aspectos: percepção, criação,
comunicação e educação, antes de prosseguirmos em nossa disciplina.
COMPETÊNCIAS E ATITUDES NA RELAÇÃO ENSINO-APRENDIZAGEM EM
ARTES VISUAIS
Os Parâmetros Curriculares Nacionais insistem que nossas reações ante a obra
de arte, ante as novas produções contemporâneas, ante a nossa imaginação etc., são
indicativos de que a Educação Artística deve incluir, em suas preocupações, certos
conteúdos atitudinais, visando a atingir certas competências em Artes. Tais
competências, como expressas nos PCN, são a percepção, a conceitualização e a
produção (PCN- Artes: 29), que você conheceu em linhas gerais em nossa primeira
aula. Mas, como lidar com atitudes, pois, rigorosamente falando, atitudes não se
transmitem e não se ensinam, como ocorre com os conteúdos factuais e científicos das
diversas disciplinas escolares?
Uma atitude não é adquirida por memorização, mas, sim, é algo interiorizado e
assumido por um sujeito. Este fato incide diretamente na lide docente que pretende
conseguir que as atitudes possam ser assumidas, transformadas individualmente e
realizadas pelo sujeito. E as atitudes próprias do âmbito artístico passam pelo
conhecimento, pela observação, pela interpretação e, finalmente, pela tomada de
consciência dos diferentes processos implicados na Arte, como já vimos:
criação/produção, conhecimento/reflexão e percepção/interpretação.
Como surge no texto dos PCN:
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Produzir refere-se ao fazer artístico (como expressão, construção,
representação) e ao conjunto de informações a ele relacionadas, no âmbito
do fazer do aluno e do desenvolvimento de seu percurso de criação. O ato de
produzir realiza-se por meio da experimentação e uso das linguagens
artísticas (PCN Artes, 1998: 50).
O fazer artístico, a produção, constitui-se em um tipo de ação linguística não
verbal que expressa na instância imagética uma idéia geral, circunscrita pela forma, de
muitas impressões, pensamentos e sentimentos que o indivíduo compreende
intuitivamente. As linguagens artísticas são compostas pelos pensamentos e
sentimentos, e são efetivadas no mundo por meio dos instrumentos e técnicas
apropriados para revelar um determinado resultado figural, ou imagem. Equivaleriam à
organização das palavras pela gramática, no que concerne à expressão escrita e
falada, que, por sua vez, também é precedida pelos pensamentos e, muitas vezes,
pelos sentimentos.
Apreciar refere-se ao âmbito da recepção, incluindo percepção,
decodificação, interpretação, fruição de arte e do universo a ela relacionado.
A ação de apreciar abrange a produção artística do aluno e a de seus
colegas, a produção histórico-social em sua diversidade, a identificação de
qualidades estéticas e significados artísticos no cotidiano, nas mídias, na
indústria cultural, nas práticas populares, no meio ambiente(PCN Artes, 1998:
50).
A apreciação artística, que podemos chamar de contemplação, difere da leitura e
da escuta, pois remete diretamente às intuições e representações mentais, ou seja, em
um primeiro momento ela é uma representação sensível de alguém que passa para o
âmbito das representações sensíveis do observador, sem ser mediada pelo filtro da
racionalidade, pelo conhecimento construído, transmitido, aprendido segundo valores
instituídos. Isso quer dizer que, ao contemplarmos uma obra de arte, estamos
inteiramente livres, e o que sentimos e pensamos depende apenas de nós mesmos. É
o que acontece quando sentamos, sem pressa, diante de uma montanha ou do mar e,
em vez de pensarmos com palavras identificando a montanha ou as ondas, deixamo-
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nos levar por um sentimento meio vago que identifica a monumentalidade da montanha
ou a profundidade e infinitude do mar. Logo depois, começamos a especializar nosso
olhar e vemos detalhes, como as árvores na encosta ou as ondas e os identificamos,
começamos a traduzi-los mentalmente com as palavras do mundo comum a outros, e
procuramos compreender o que vimos e sentimos, desejando dar coerência à imagem
diante de nós. Passamos, então, para o primeiro estágio da contextualização:
Contextualizar é situar o conhecimento do próprio trabalho artístico, dos
colegas e da arte como produto social e histórico, o que desvela a existência
de múltiplas culturas e subjetividades (PCN Artes, 1998: 50).
Tais atitudes derivam, certamente, de valores e normas individuais e coletivas.
Por isso, são de natureza “relativa”, ou seja, dizem respeito a determinada pessoa,
povo, época e lugar. Isso nos leva a entender a sua “verdade” como algo limitado, e a
relativizar todo juízo de valor. Cientes do fato de que é o ser humano que confere às
obras de arte o seu valor, os valores mudam em função do tempo e do lugar, e dos
diferentes contextos culturais, atuando como base da identidade individual e coletiva,
pois valores são compartilhados por grupos humanos nas sociedades e culturas.
Segundo Stuart Hall,
O que denominamos “nossas identidades” poderia
provavelmente ser mais bem conceituado como as
sedimentações através do tempo daquelas diferentes
identificações ou posições que adotamos e procuramos
“virar” como se viessem de dentro, mas que, sem
dúvida, são ocasionadas por um conjunto especial de
circunstâncias, sentimentos, histórias e experiências
únicas e peculiarmente nossas, como sujeitos
individuais. Nossas identidades são, em resumo,
formadas culturalmente (HALL, 1997: 26).
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Antes de observamos quais são essas atitudes, vamos diferenciar os métodos
usuais pelos quais podem ser alcançadas:
a) por definição: adquirir atitudes por definição significa ler ou escutar definições ou
caracterizações de formas de comportamento, o que pode vir a ser um começo
para sua adoção, mesmo que saibamos que sua apreensão necessita da
experimentação e da prática contextualizada;
b) por observação: o ser humano costuma adotar comportamentos que observa em
outras pessoas, quando lhe parecem exemplares, interessantes, atraentes etc.
Do mesmo modo, evita os comportamentos que assomam negativos,
inadequados etc. A adoção de modelos exemplares que lhe pareceram bem
sucedidos é uma forma de imitação de um ato para a consecução de um fim.
Aqui também é necessária, após a fase de detecção e seleção de modelos
comportamentais, sua experimentação e compreensão, para que se tornem
atitudes capazes de se adaptar à diversidade de situações.
c) por imitação: pela qual o ser humano repete condutas, formas de responder ante
estímulos e situações determinadas. Neste caso, chega a formas exteriorizadas
de comportamentos e atitudes, cujos maneirismos são internalizados, mas sem
que estes sejam compreendidos, elaborados e conscientizados, para se
tornarem internalizados e pessoais . É necessário, também aqui, um processo de
experimentação e compreensão, para que este método consiga atingir seus
objetivos;
d) por treinamento: a repetição de situações e respostas às mesmas pode conduzir
a uma apropriação de determinadas atitudes, que passam a fazer parte de um
comportamento geral;
e) por interpretação: que parte da compreensão de determinadas atitudes e
comportamentos segundo a subjetividade de cada pessoa, adaptando-os aos
contextos e situações particulares;
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f) por tomada de consciência: partindo da observação, passando pela reflexão e
pelo raciocínio, o indivíduo opera uma ordenação, segundo a sua índole, do que
foi observado, compreende-o, e, transformando-o em sua versão elaborada,
abre-se a via para a tomada de consciência do modo de atuar e analisar essa
atuação de modo crítico. Este método determinará a criação, a continuidade, a
mudança ou o abandono de comportamentos e atitudes.
Segundo os PCN Artes:
Os valores e atitudes são apreendidos nos modelos de convívio que
envolvem os alunos e a equipe de educadores. Tais conjuntos de valores e
atitudes devem ter coerência com os conceitos e práticas a eles relativos. São
conteúdos do âmbito da afetividade e se referem às ações regidas por
O termo apropriação genericamente é entendido como o ato por meio do
qual um sujeito toma posse de algo que não lhe pertencia e o torna próprio.
Esse sentido remete ao verbo apropriar, tomar como sua propriedade,
arrogar-se o direito sobre algo. Esse é um sentido jurídico. Quando se trata
de subjetividade discursiva, no entanto, devemos entender o termo como
sendo uma adaptação, uma combinação de elementos externos com o
nosso substrato interno, que é um arranjo subjetivo. Por exemplo, o ato de
enunciar implica um processo de apropriação da língua em que o
locutor/enunciador constrói um universo de referência discursiva que é
parte integrante da enunciação. Para Roland Barthes, a enunciação contém
em si a apropriação do discurso e as ciências humanas deverão ter em conta
que a linguagem deverá ser perspectivada em tudo o que faz o real do
homem (trabalho, cultura, história, instituições, etc.). Portanto, devemos
prestar atenção para não confundir apropriação com cópia e/ou imitação.
(CEIA, C.) e-dicionário de termos literários –
http://www2.fcsh.unl.pt/edtl/verbetes/A/apropriacao.htm
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sentimentos de solidariedade, respeito mútuo, cooperação, tolerância à
diversidade, diálogo, companheirismo (PCN-Artes, 1998: 46).
Verifiquemos o que, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais, constitui-se como
conteúdos do Ensino de Arte, antes de prosseguirmos:
Os conteúdos a serem trabalhados nos três eixos podem levar ao
conhecimento da própria cultura, impulsionar a descoberta da cultura do outro
e relativizar as normas e valores da cultura de cada um. O fazer, o apreciar e
o contextualizar relacionados na aprendizagem mantêm atmosfera de
interesse e curiosidade na sala de aula acerca das culturas compartilhadas
pelos alunos, tendo em vista que cada um de nós, no exercício da vida
cotidiana, participa de mais de um grupo cultural.
Tendo em conta os três eixos como articuladores do processo de ensino e
aprendizagem, acredita-se que para a seleção e a organização dos
conteúdos gerais de Artes Visuais, Música, Teatro e Dança por ciclo é preciso
considerar os seguintes critérios:
• conteúdos que favoreçam a compreensão da arte como cultura, do artista
como ser social e dos alunos como produtores e apreciadores;
• conteúdos que valorizem as manifestações artísticas de povos e culturas de
diferentes épocas e locais, incluindo a contemporaneidade e a arte brasileira;
• conteúdos que possibilitem que os três eixos da aprendizagem possam ser
realizados com grau crescente de elaboração e aprofundamento (PCN Artes,
1998:51).
E lemos a definição:
Assim, os conteúdos gerais do ensino de Arte são:
• a arte como expressão e comunicação dos indivíduos;
Cabe ressaltar que as relações de ensino e aprendizagem de Arte não acontecem no vazio, mas sempre se ligam a determinado espaço cultural, tempo histórico e a condições particulares que envolvem aspectos sociais, ambientais, econômicos, culturais, etários. As relações entre arte e ensino-aprendizagem propiciam que o aluno seja capaz de situar o que conhece e de pensar sobre o que está fazendo a partir da experiência individual e compartilhada de aprender. Isso traz consciência do desenvolvimento de seu papel de estudante em arte e do valor e continuidade permanente dessas atitudes ao longo de sua vida (PCN Artes, 1998: 49).
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• elementos básicos das linguagens artísticas, modos de articulação formal,
técnicas, materiais e procedimentos na criação em arte;
• produtores de arte: vidas, épocas e produtos em conexões;
• diversidade das formas de arte e concepções estéticas da cultura regional,
nacional e internacional: produções e suas histórias;
• a arte na sociedade, considerando os artistas, os pensadores da arte, outros
profissionais, as produções e suas formas de documentação, preservação e
divulgação em diferentes culturas e momentos históricos (PCN Artes,
1998:52)
Examinemos com atenção esses conteúdos:
a) A arte como expressão e comunicação dos indivíduos: consideremos que a Arte
é um fenômeno que comunica significados esteticamente, ou seja, os
significados dependem das qualidades formais com que são apresentados. Ou
seja, modificando-se a forma, o significado também mudará. A expressividade
da Arte reside na forma particular e única pela qual cada obra apresenta a sua
mensagem, e é determinada pela intuição do artista. Perguntamo-nos, aqui,
pelos elementos intrínsecos à obra, o temperamento, a composição, os gestos
que a fomaram, a densidade, os contrastes, texturas e ritmos.
b) Os elementos básicos das linguagens artísticas, modos de articulação formal,
técnicas, materiais e procedimentos na criação em arte e os produtores de arte:
vidas, épocas e produtos em conexões: em outras palavras, a forma como
pontos, retas e planos se organizam em dimensões espaciais, e quais os
instrumentos e materiais são apropriados para cada indivíduo expressar o que
conhece sensivelmente e tem a intenção de apresentar imageticamente. Aqui,
tem-se em vista os elementos pertinentes à obra e nela aparentes, pois cada
artista trabalha com os materiais disponíveis no tempo e lugar em que vive e as
figuras da sua imaginação são ordenadas simbolicamente de acordo com o seu
ambiente cultural. Perguntamos aqui o quê e como a obra representa tal qual
representa, os seus detalhes específicos.
c) Diversidade das formas de arte e concepções estéticas da cultura regional,
nacional e internacional: produções e suas histórias: o contexto de realização da
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obra de arte, as posturas estéticas, as heranças filosóficas, as formas de
aproveitamento e transformação dos valores das tradições intelectuais e dos
costumes, a cosmologia e a imagem de mundo, as concepções científicas e as
tecnologias. Perguntamos por que a obra de arte é tal qual é.
d) A arte na sociedade, considerando os artistas, os pensadores da arte, outros
profissionais, as produções e suas formas de documentação, preservação e
divulgação em diferentes culturas e momentos históricos: ou seja o ambiente
social e os contextos históricos que influenciam o psiquismo e a vida prática do
artista e de seus contemporâneos. Perguntamos aqui à obra de arte o que
determinou a sua criação.
Vejamos, então, quais são as atitudes que se relacionam e permitem que esses
conteúdos sejam ensinados/aprendidos. Devemos ter como premissa que tais atitudes
devem ser compreendidas e assumidas, em primeiro lugar, pelos professores.
Comecemos pelas atitudes relacionadas à produção/criação. Tais atitudes
incidem, via de regra, na relação do criador consigo mesmo, com seu contexto, com
seu presente cultural, com sua própria história. Como toda atitude, elas estão
fundamentadas em valores que, como sabemos, mudam em função do ambiente
cultural que os determine. Assim, o modo de incentivar ou reprimir a criatividade é
diferente em cada época e lugar, e deriva, por exemplo, da concepção que se tem do
que é Arte e dos atributos que se acredita serem necessários para denominar alguém
artista. Destacamos, aqui, alguns valores contemporâneos no ensino de Arte:
i) a busca pela originalidade e pela inovação;
ii) o respeito pelos processos criativos;
iii) a perda do medo do erro e do equívoco;
iv) o desejo de experimentação;
v) o reconhecimento da alteridade da obra e a autocrítica construtiva.
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Essas atitudes implicam o incentivo à criatividade e a tomada de consciência de
suas dificuldades e da relevância dos processos artísticos para além de seus resultados
imediatos.
As atitudes relacionadas com a comunicação da Arte, por sua vez, levam-nos a
considerar tanto o potencial expressivo, o conteúdo significativo e as características do
objeto que os comunica, como as características dos seus receptores. Além disso,
participar de processos de transmissão da criação artística, implica adquirir certos
conhecimentos artísticos que servem como instrumentos interpretativos e que
permitem vertentes diversas de abordagem para a compreensão da obra.
Em linhas gerais, a atitude que caracteriza o início do aprendizado dos assuntos
concernente à Arte é, em um primeiro estágio, ou a rejeição pelos fatos do mundo
sensível, ou o interesse em compreender as emoções e afetos que perpassam o
comportamento das pessoas diante do mundo associado ao interesse pelo mundo da
vida. Quando o sujeito da arte, aquele que a está abordando, seja na sua feitura ou na
sua observação, ainda não possui mecanismos interpretativos para associar a imagem
expressiva ao mundo em que ela se insere e que representa, em geral, ou assume um
posicionamento reativo, de defesa, que nega o que está vendo, ou se pecipita na
projeção de sentimentos e valores pessoais sobre a obra de arte, na vontade de ser
compreendido, no entusiasmo na comunicação.
ATIVIDADE 1
Leia o trecho de Umberto Eco a seguir:
Admitida a aptidão da consciência ao organizar o material sensitivo numa forma
unitária e significante, (...) o sujeito não se reconhece nem reconhece como experiência
sua nada que não se conforme com o princípio unitário em que ele consiste e do qual
não poderia nunca separar-se sem se destruir a si próprio. Porque a relação conteúdo
de consciência-sujeito não é formal, mas formativa; não se trata de continência, mas de
produtividade: a unidade do sujeito consciente distingue-se da síntese que este produz
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e objetiva-se a si própria, ao reconhecer-se não na síntese produzida, mas no ato que
produz a síntese (ECO, 1995: 46)
De acordo com as declarações de Umberto Eco, marque a frase correta:
( ) A Arte é uma livre expressão do ego psicológico do artista.
( ) Nossas vivências e experiências são fundamentais para a abordagem das obras de
arte.
( ) A Arte evolui através dos tempos e, por isso, a Arte Renascentista é mais
desenvolvida do que a Arte Micênica.
( ) Para interpretar corretamente uma obra de arte o observador deve projetar nela
seus próprios gostos e preferências.
( ) Todas as coisas que existem no mundo que nos cerca podem ser chamadas de
Arte.
Resposta comentada: Umberto Eco nos diz, no trecho citado, que a consciência
humana se constitui por meio do processo de dar forma aos conteúdos da experiência.
É mediante este processo que o artista expressa uma idéia capaz de ser compreendida
por outras pessoas. Desse modo, a Arte não é a livre expressão do ego de um artista
qualquer, nem são obras de arte todas as coisas existentes no mundo, tais como
pássaros e plantas. Além disso, dizer que a Arte de uma época é mais ou menos
desenvolvida do que a de outra época, é algo equivocado, pois as obras, em cada
época e sociedade, expressam idéias e compreensões de mundo que lhes são
próprias, e podem ser julgadas entre si em termos de “melhor” ou “pior”, “mais” ou
“menos”. Por isso, a exclusiva projeção automática dos nossos gostos e preferências a
obras de arte de outras épocas ou de outras sociedades nos impedem de perceber e
compreender as obras em toda a sua riqueza. Nossas vivências e experiências são
fundamentais para a percepção e a compreensão das obras de arte de todos os tempos
e lugares, pois elas remetem à experiência humana no mundo, e não aos gostos e
preferências pessoais ou de uma sociedade específica.
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PERCEBER A ARTE OU “FALANDO AOS FUTUROS PROFESSORES”.
Quando nos aproximamos das obras de Arte e nos habituamos a observá-las,
percebemos que a Arte é um modo intencional de expressão através de uma linguagem
formal que não é estruturada segundo as regras da lógica e da gramática que ordenam
a comunicação verbal. As regras que constituem as formas no imaginário não são as da
razão social, são as regras da intuição, que absorve o mundo e o ordena formalmente
no nosso interior, para que o expressemos em pequenos trechos, sob aquela mesma
forma. O que em nós é um sentimento oceânico e atemporal, nós o externamos em
momentos, pois não poderíamos pintar uma tela que abrangesse o mundo, ou escrever
um poema sobre tudo ao mesmo tempo. O mundo tem uma simplicidade que prioriza a
particularidade e está impregnado da consciência de uma comunidade
permanentemente humana. Este é um conhecimento intuitivo que é próprio a cada ser
humano comum, e o artista dele se distingue apenas por conseguir conhecer e exprimir
certas coisas simples com nitidez, vivacidade e complexidade maiores.
Daí decore a possibilidade de qualquer pessoa poder compreender a Arte,
compreensão esta subjacente ao seu próprio gosto, que há de ser substancialmente
semelhante ao gosto de quem a ciou. O aspecto de universalidade da Arte, reside na
capacidade de um observador reproduzir internamente em si mesmo o ato expressivo e
criativo que produziu a obra observada. Se o artista expressa sentimentos vividos,
aquele que os experimentou também, os reconhecerá (cf. HORVAT, 1997).
Se para compreender a Arte é necessário o reconhecimento da experiência
vivida, como conferir experiência a quem pouco viveu? Podemos dizer aqui que a
capacidade para a apreensão estética não ganha por ter vivido muito tempo, ou por ter
tido uma vida com grande variedade de experiências. Tudo depende da maneira como
os acontecimentos foram vivenciados.
Para observarmos e percebermos com acuidade sensível e com curiosidade o
que está fora de nós, é preciso que nos ocupemos do que vemos ou sentimos em um
estado de contemplação, momento em que não queremos nada daquilo que vemos,
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não temos nenhum desejo ou intenção, não produzimos nenhum julgamento de gosto,
não exercemos nossa vontade controle sobre o objeto da contemplação. É o momento
em que apreenderemos o objeto intuitivamente. Um exemplo disso é o das crianças
que olham as nuvens, identificando nelas o que conhecem e inventando nomes para
aquelas formas que não se assemelham a nada visto antes. As crianças não pretendem
nada com aquelas nuvens desconhecidas, mas lembram-se delas por toda a vida,
como figuras no seu imaginário.
Ainda que a apreensão da Arte seja acessível a todos via contemplação, a vida
acelerada e repleta de solicitações e apelos não favorece os momentos contemplativos,
nem na vida das crianças. Assim, para incentivar a criatividade com certa rapidez,
precisamos fazer uso dos instrumentos mais direcionados, a linguagem verbal e, com
ela, os conhecimentos teóricos. Precisamos abandonar o olhar do vôo do pássaro e
baixá-lo à terra firme, e lidarmos com o âmbito da objetividade prática, com o
positivismo das equações de funcionamento da percepção, dadas pela psicologia, e
com as regras da linguística, da semiótica e da gramática.
Nessa ação educacional considera-se que as pessoas, no caso, os
alunos, estarão aprendendo arte à medida que forem capazes de
perceber, agir efetivamente em arte e compreendê-la não apenas
como objeto, mas como campo de sentido e âmbito perceptivo,
sensível e cognitivo. Eles poderão perceber, imaginar, recordar,
compreender, aprender, fazer conexões e formar idéias, hipóteses
ou teorias pessoais sobre seus trabalhos artísticos e de outros,
assim como sobre o meio em geral, pois situam a arte nas culturas
em diversos tempos da história e situações sociais e sabem
perceber, distinguir e argumentar sobre qualidades (PCN Artes,
1998: 50).
Para consegui-lo, necessitamos de algumas ações relacionadas com a
percepção e a interpretação da obra de arte. Pensemos juntos: o artista criou a obra e
sua mensagem foi emitida, chegando ao espectador, seja lá quem for. Esse espectador
pode receber a mensagem artística diretamente (em museus, galerias, ateliês de
artistas etc.) ou de forma indireta, mediante reproduções da obra (fotografias, vídeos,
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transparências, Internet etc.). Mesmo que as circunstâncias da percepção e suas
possibilidades variem substancialmente – referimo-nos aqui às mudanças de escala, à
anulação de certos sentidos na percepção indireta etc. –, algumas das atitudes podem
ser semelhantes. Em todo caso, trata-se de adotar um comportamento que permita
receber a maior quantidade de informação possível, da melhor maneira possível, e que
produza o melhor aproveitamento possível.
Todo esse processo supõe que o espectador deve evitar os obstáculos que –
sejam de origem individual, coletiva, social ou cultural – estejam privando-o de uma
recepção ótima da obra de arte. O sujeito que apreende é o centro da Educação
Artística, logo, essas atitudes serão prioritárias no trabalho docente, tanto no âmbito
escolar, quanto nos contextos não formais, como o museu, incluindo o entorno familiar,
os meios de comunicação ou, mais recentemente, a Internet. Por outro lado, interpretar
a obra de arte implica, além de um uso das estruturas e instrumentos interpretativos
adequados, atitudes que favoreçam a criatividade, ou seja, atitudes de recepção
positiva da obra.
Em primeiro lugar, é necessário respeitar a obra. Respeitar implica aceitar o
criado em todas as suas dimensões, tal como se nos apresenta, sem querer que se
pareça com outras obras, ou que seja de outro modo. Isso significa que são
necessárias atitudes como a tolerância, a compreensão da diversidade, a aceitação da
mudança, da inovação, a aceitação da alteridade, a capacidade de pôr-se no lugar do
criador, a empatia, a abertura, a flexibilidade etc.
Consideremos que estar diante de uma obra de arte é o mesmo que estar diante
da expressão do sentimento e do pensamento de um outro ser humano, totalmente
Empatia é um termo de origem grega, associando endo e pathos, em que pathos significa sentimento, e endo significa para dentro. Logo, entendamos empatia como “sentir-se no outro”, “projetar-se afetivamente no outro”, “colocar-se sensivelmente no lugar do outro”. Por sua vez, simpatia, também do grego, é a junção de syn, junto, e pathos, significa “sentir junto com o outro”, aproximar-se dele. Essa sutil diferença ente os dois termos é importante nos estudos de Estética e de Filosofia da Arte.
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disponível para a nossa compreensão. Tendemos a compreender esta alteridade, antes
de mais nada, comparando-a a nós mesmos, trazendo-a para o nosso universo e,
então, aceitamos nela aquilo com o qual concordamos e rejeitamos aquilo do qual
discordamos, e descartamos este “resto” como se fosse um erro. Por exemplo, quando
dizemos diante de uma obra “qualquer criança faz isso”, queremos, com isso depreciar
a obra, mas estamos depreciando antes todas as crianças, pois banalizamos as suas
expressões e, depois, estaremos depreciando a nós mesmos, pois o que ocorreu é que
ou não tínhamos elementos cognitivos para compreendê-la, ou não prestamos
suficiente atenção ao observá-la. Abordamos e dizemos as coisas com os pensamentos
e as palavras de que dispomos, direcionamos nosso olhar para aquilo que nos
interessa, que é, em geral, aquilo que parece ajustar-se aos nossos desejos e objetivos,
ao nosso pequeno mundo interno. Mas, não será esse nosso universo particular restrito
demais para nele cabermos nós e todos os outros?
Figura 2.1. Constantin Brancusi (1876 -1957) – escultura em calcáreo. Pinacoteca de Munique. (Foto: P. Horvat)
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É necessário que o docente amplie seus valores e seus esquemas
interpretativos. E isso ocorre, em primeiro lugar, quando assumimos que são relativos
e, a partir dessa ótica, que são mutáveis e subjetivos. Além disso, implica reconhecer
que existem infinidades de valores, que cada criação artística tem seus próprios
valores, e que não se deve pretender que tais valores sejam “universais” ou “eternos”.
Reiteramos que é preciso ver as obras pelo que elas são, e não de acordo com aquilo
que acreditamos que devam ser, pois que, objetivamente, não o serão.
Isso nos leva à questão quanto às teorias interpretativas, que são esquemas de
referência para a interpretação das obras de arte. Adotar um único sistema de relações
e funções para interpretar as produções artísticas – assim como para qualquer outra
coisa ou fenômeno – é um engano freqüente, e a atitude de circunscrever aquilo que é
interpretado em um conjunto de tipificações prévio é uma das causas principais do
fracasso da interpretação. Obviamente, todos os sistemas conclusivos são
reducionistas, logo, as atitudes em relação à observação, percepção e análise da obra
de arte devem evitar a restrição em uma vertente única de apreciação e interpretação
da obra. A abertura e a flexibilidade em relação ao que observamos, assim como a
aceitação de suas qualidades são fundamentais na abordagem de obras de Arte, para
que não rechacemos o desconhecido pelo simples fato de ser desconhecido. Um olhar
persistente, atento e tolerante pode facilitar, em boa medida, o processo de fruição
artística.
Certamente, podemos dizer que todos nós temos idéias e valores morais
herdados, que, por tradição, assimilamos como verdadeiros. Questioná-los e relativizá-
los deveria ser um objetivo prioritário na Educação Artística, sem o que tendemos a nos
aproximar de forma equivocada dos objetos artísticos, o que nos obstaculiza, inclusive,
o conhecimento, a compreensão, a valorização e a fruição de muitas criações. Essas
novas realidades tornadas visíveis, passam a ser inapreensíveis para aqueles que se
atém aos hábitos cognitivos previamente estabelecidos, projetando-os na alteridade. A
acomodação às estruturas de visualidade corriqueiras reproduz juízos que não se
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adequam à abordagem de formas diferentes, derivando em interpretações lacunares e
insatisfatórias, muitas vezes desnecessárias.
As atitudes frente à recepção da obra de arte podem ser, então, assim
resumidas: substituir os preconceitos e a projeção dos nossos costumes habituais, aos
quais nos apegamos como se fossem valores universais; dispor-se à compreensão do
diferente como uma possibilidade de conhecimento e compreensão de si e do mundo,
resgatando o maior número possível de categorias lógicas e de impressões emotivas,
implementando-as nos mais diversificados modos de interpretação e apreensão;
aventar tanto quanto possível a existência de uma interpretação válida para um evento
imagético, acreditando-o passível de compreensão; observar atentamente as formas
gerais e os detalhes trazendo-os para o âmbito da sensibilidade, buscando remeter ao
sentimento e à emoção; predispor-se à fruição.
Certamente, tais atitudes implicam relativizar as críticas universalistas, as
concepções e critérios estabelecidos, para sermos capazes de sentir e experimentar
por nós mesmos. Conhecer quais são as obras de arte ou as imagens visuais mais
valorizadas pelos especialistas não implica que não possamos apreciar outras que não
estão nos catálogos e nas listas tradicionais. O fato de que uma obra de arte
comunique simbolicamente, transmita significados ou nos sugira intenções, é
argumento suficiente para justificar a recepção do objeto artístico e, sob este ponto de
vista, é possível valorizá-lo precisamente por sua capacidade de anunciar-nos algo.
Isso não significa que a nossa valorização pretenda ser universal. Longe disso,
tornamo-nos mais conscientes de seu caráter particular, nosso. Tornamo-nos mais
conscientes de nós mesmos quanto ampliamos o nosso universo cognitivo com
representações que, a princípio, não nos eram familiares e que, muitas vezes, só delas
nos apercebemos, de fato, tempos depois de as termos visto.
Por isso, as atitudes relacionadas com a recepção da obra de arte devem buscar
a manutenção do equilíbrio entre nossas concepções de vida e de mundo – que se
ampliam a partir do contato com as obras de arte, derivadas da autonomia, da liberdade
de imaginar e representar, não da realidade factual dada, mas da possível – e devemos
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exercitar critérios de juízo que derivam em juízos de gosto que demonstrem ter validade
em algum momento de nossas vidas. Trata-se de compreender que cada qual pode ter
gostos próprios, baseados em argumentos, e que na atualidade, como em todos os
tempos e lugares, são possíveis muitos gostos próprios. Significa saber que podem
existir, em cada época, sociedade e lugar, critérios dominantes e de minorias, critérios
de especialistas e de leigos, critérios da mídia a serviço das ideologias etc., mas que
todos têm a possibilidade e o direito de existir e de conviver no sistema da Arte.
Assim, pretender dizer o que é válido de uma vez para sempre, e o que não o é,
é algo que carece de sentido. Se o fizermos, deixaremos de perceber a diversidade da
Arte, do mundo das imagens, da imprensa, da publicidade, do cinema, do teatro etc. No
mundo das imagens visuais, encontramos soluções muito divergentes em todos os
âmbitos da expressão e da criação; reconhecemos propostas muito diversas e, ao
menos formalmente, não parece que existam tendências únicas e unívocas. Quando,
além disso, pretendemos que nosso estudantes sejam também criadores, a fixação em
valores rígidos pode se tornar um obstáculo para o desenvolvimento pessoal, a
motivação e a autoestima dos mesmos.
É nesse sentido que chamamos a atenção para o cuidado que se deve tomar
com a palavra apropriação, que, muitas vezes leva professores a sugerirem aos seus
alunos que copiem obras de arte, sob o nome de “releituras”. Perguntemo-nos, como é
possível uma releitura anterior à leitura? Se há múltiplas maneiras de se “ler” e
interpretar uma obra de arte, e se essas maneiras são precisamente as relações que
fazemos da imagem vista com o contexto em que ela foi realizada, assim como com o
contexto em que está sendo vista, seja o histórico, o cultural, o psicológico, o pessoal, o
da metalinguagem, ou o da ciência a que a obra se referir, como podemos esperar que
alunos em fase de aprendizado já conheçam estes âmbitos interpretativos? Teriam eles
condições de “reler” o que nem “leram” e, portanto, desconhecem? Apenas lhes restaria
um exercício de destreza manual em que repetiriam traços, provavelmente tortos e de
resultado quase irreconhecível, ou um exercício lúdico de traçar a esmo, à revelia da
imagem apresentada previamente, o que equivaleria a uma dança qualquer das mãos,
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que, sem harmonizar-se com a música, pareceria um contorcionismo. Ou poderiam eles
apenas projetar-se psicologicamente, e encontrar na obra a catarse dos sentimentos
que ainda não nomearam?
A Arte pode ser, sim, uma facilitadora para a expressão e liberação de tensões
recônditas, mas essa função psicanalítica não é a função principal da Arte nos nossos
dias, mas um instrumento da análise psicológica individual, que, nas escolas, estaria
aparentada aos testes psicométricos. A função da Arte como via de sensibilização da
percepção e de conhecimento, como alargamento dos horizontes de compreensão
estaria na abordagem estética, que tem muitas vertentes, desde a fenomenológica, à
linguística e à filosófica, no aprendizado técnico, cujo exercício proporciona a
percepção de detalhes, na abordagem cultural, que traz a compreensão da situação do
fruidor, na abordagem histórica, que o contextualizará no mundo em vive. É, então,
necessário fornecer ao estudante elementos para que possa “ler” e interpretar uma
imagem à sua maneira. Apresentar as “palavras” e a “gramática”, então, ensinar a
“escrever” e, só então, fazê-lo expressar-se com seu próprio poema. Desse modo, uma
imagem vista e percebida se tornaria um trampolim para a feitura de uma outra, em que
os dados particulares se mesclariam aos contextuais e aos comuns.
Quando conseguimos reconhecer que cada elemento criativo é diferente de
todos os demais – pelo fato de ter sido realizado por uma pessoa determinada, em um
momento concreto e um contexto específico, utilizando ferramentas e materiais
particulares – podemos orientar nosso olhar para a busca da especificidade daquilo que
estamos percebendo, aquilo que o faz especial, diferente e único. É um olhar que evita
comparações com modelos, protótipos etc., e nos oferece a possibilidade de motivar,
interessar, valorizar uma criação pelo que é, em vez de julgá-la pelo que acreditamos
que deveria ser, ou pelo que não é.
Estamos falando, então, da eliminação de prejuízos (ou “juízos prévios”) e
preconceitos. Os preconceitos e prejuízos herdados supõem a aplicação de filtros
cognitivos, ou estruturas de compreensão que nos levam, caso não tenhamos cuidado,
a rechaçar aquilo que não se adequar ou não se encaixar perfeitamente a eles. Este
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fenômeno, altamente prejudicial ao ensino de Artes Visuais, pode ser exemplificado
pela reação de boa parte das pessoas às obras da arte contemporânea: ao não se
encaixar naquilo que as pessoas consideram, por sua formação e seus filtros
cognitivos, ser artístico, são negadas como tais. Usemos uma metáfora para
compreender o processo de negação de que falamos: a chave que temos para abrir
esta porta (a porta das obras da arte contemporânea) não a abre, e, em geral,
considera-se que a chave é perfeita, e a porta é que não é artística. Cabe a nós
pensarmos o problema de outro modo: talvez não estejamos usando a chave
adequada.
Para a superação de juízos antecipados e preconceitos, devemos fazer as
seguintes perguntas a nós mesmos:
a) por que ter uma só chave? Existe apenas a chave que trago comigo,
ou posso obter outras e novas chaves?
b) Se a chave que possuo foi criada pela tradição que, por exemplo,
apresenta a porta da arte renascentista europeia como a Arte, e minha
chave abre esta porta. Mas isso significa que só exista esta única porta
da Arte? Não existiriam várias portas? Novas portas não estão sendo
constantemente geradas, ou portas antigas não estão sendo
modificadas?
c) Apesar de estar habituada(o) com um certo tipo de Arte, seria correto
desqualificar outras formas de Arte?
d) Não seria mais interessante para mim e para meus alunos conhecer
outras formas de Arte, ampliando o nosso horizonte de compreensão
do fenômeno artístico, ampliando a nossa percepção visual, a nossa
atitude perante as obras e, antes de tudo, ao humano?
Como nos diz Ricardo Viadel: Educar artisticamente é lograr um melhor e mais
profundo conhecimento, e um maior e mais intenso gozo, prazer, fruição, felicidade e
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emoção, tanto do mundo como da cultura material (VIADEL, 2003: 17). Podemos
perceber, portanto, que a Arte se relaciona com toda a cultura material e imaterial em
geral, e que adquirir competências artísticas é algo que nos traz, além dos
conhecimentos, o prazer e a fruição, objetivos prioritários na Educação contemporânea.
Realmente, a fruição se incrementa com a predisposição e com a abertura ao novo, às
possibilidades de determinado elemento artístico ou visual, a partir do abandono ou da
redução de preconceitos e prejuízos, permitindo a adoção de novas atitudes em relação
às obras e às formas de expressão humanas.
Falamos, então, de “chaves” que nos permitiriam abrir as portas específicas das
obras de arte visual. E, ainda que existam “chaves-mestras” que permitem a abertura
de várias portas, não existe uma única chave para todas as portas da Arte, seja no
passado, seja no presente, de todas as culturas e em todos os momentos. Assim,
propugnamos o abandono dos esquemas interpretativos fechados, que visam a
fornecer modelos para todos os tempos e lugares, que, invariavelmente, prejudicam a
criação, a percepção e a fruição da Arte.
Continuando em nossa metáfora, algumas das novas chaves podem ser assim
resumidas em algumas atitudes:
a) querer abrir a porta, ter curiosidade por saber o que há por trás dela,
enfim: curiosidade e desejo pelo conhecimento artístico;
b) imaginar que por trás de cada porta pode haver algo surpreendente,
interessante e, com isso, tomar consciência da potencialidade da Arte;
c) evitar querer que o que está atrás da porta seja algo já conhecido. Ao
contrário, desejar a surpresa. Em outras palavras: aceitar lidar com o
inesperado e não fugir daquilo que não se ajusta aos nossos esquemas
prévios;
d) uma vez aberta a porta, buscar fruir do que encontramos, em vez de
buscar o que não existe, nem querer que exista outra coisa; evitar os
preconceitos, fugir dos valores prévios, do juízo universal, e aceitar a
diversidade, para fruir daquilo que encontramos;
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e) ser generoso com a aprendizagem, e estar aberto às pequenas coisas
e pequenas aprendizagens como sendo sementes que podem crescer
e desenvolver-se;
f) ter paciência, porque algumas aprendizagens operam a médio e a
longo prazo; ter consciência de que as experiências não são todas
imediatas, e de que o conhecimento artístico é extenso e complexo;
g) desejar saber mais, ampliar aquilo que aprendemos, sabendo que as
competências adquiridas têm um sentido e um valor que jamais se
perderão.
Você pode perceber, então, que para lidar com Arte, bem como para incluir
elementos e obras artísticas em sua prática docente, é necessário obter algumas
chaves, sem as quais não podemos penetrar no mundo da Arte. Vamos, então,
conhecer algumas delas, em nossas próximas aulas.
ATIVIDADE 2
Observe atentamente o desenho a seguir. Descreva o que ele significa para
você.
É possível que você tenha interpretado o desenho em questão como duas
pessoas em pé numa sala, uma mais próxima da janela do que a outra. Mas considere
agora o seguinte fato: esse mesmo desenho foi mostrado diversas vezes para pessoas
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dos mais distintos povos e lugares. Em uma comunidade rural africana, por exemplo, as
pessoas que o viram disseram que tratava-se de duas pessoas caminhando, e uma
delas levava um pacote na cabeça. Você já viu alguma imagem de pessoas levando
cargas na cabeça, não é mesmo? Tente ver o desenho dessa forma. Agora, reflita e
disserte sobre as distintas interpretações do mundo e da vida que um desenho pode
suscitar e por que a prática docente requer “chaves” interpretativas distintas no
tratamento das obras visuais.
Resposta comentada: As coisas que vemos, ouvimos, sentimos, pensamos, falamos e
fazemos são permeadas e condicionadas por nosso mundo de compreensão. A partir
dele é que vemos e interpretamos as coisas. Pessoas distintas, com mundos de
compreensão distintos, vêem as coisas de modo também distinto. No caso em pauta, a
interpretação do desenho como sendo duas pessoas numa sala é a mais comum em
sociedades urbanizadas, enquanto a segunda interpretação que apresentamos é mais
comum em sociedades rurais, nas quais as pessoas têm o hábito de carregar coisas na
cabeça. Há, portanto, diferentes maneiras de se perceber uma imagem, e a nossa não
é a única, nem é a “correta”, bem como as demais não são “erradas”. Aprender novas
chaves para a produção, a recepção e a interpretação das obras visuais, portanto, é
uma condição fundamental para o aperfeiçoamento do processo educativo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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2007.
BOSI, A. Reflexões sobre arte. São paulo: Ática, 1989.
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CARAMELLA, E. História da Arte – Fundamentos semióticos. São Paulo:
EDUSC, 1998.
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CEIA, C. e-dicionário de termos literários – Disponível em
http://www2.fcsh.unl.pt/edtl/index.htm (07/06/2009)
ECO, U. A definição da Arte. Rio de Janeiro: Elfos, 1995
HALL, S. “A centralidade da cultura; notas sobre as revoluções culturais de
nosso tempo”, in: Educação e Realidade. Porto Alegre, v. 22. jul/dez, 1997.
HORVAT, P. “A Estética de Benedtto Croce”, in: Gávea – Revista de História
da Arte e da Arquitetura. Rio de Janeiro, v.15, n 15. jul,1997.
MYERS, B., COPPLESTONE, Trewin. The Macmillan Encyclopedia of Art.
London: Macmillan, 1979.
VIADEL, R. M. (coord.). Didáctica de la educación artística para Primaria.
Madrid: Pearson, 2003.
ZANINI, W. Tendências da Escultura Moderna.São Paulo: Cultrix, 1971.