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Estruturas e Processos

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  • 84 HSM Management 98 Maio-Junho 2013 hsmmanagement.com.br

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    Cumplicidade o

    1 tradeoffO clima de cOnfiana cOm interdependncia que jOrge paulO, marcel e betO deliberadamente cOnstruram a primeira das trs pernas principais de seu mOdelO de gestO inOvadOr, cOmO mOstra repOrtagem

    Ilustrao: Murien Freg

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    mesmo que eles passem mais tempo no exterior do que no brasil, ningum ousa questionar a brasilidade de jorge paulo, marcel e beto. afinal, se at so chamados informal-mente pelo nome em vez do sobrenome, os trs empresrios no diferem muito da maioria de nossos jogadores de futebol. no entanto, quando se trata de sua capacidade de evitar

    burocracia e papelada, levantam-se dvidas sobre a autenti-cidade do dna. entre esses homens, e at entre eles e suas equipes, palavras e apertos de mo dispensam carimbos em cartrio, e-mails comprobatrios, processos decisrios de mltiplas instncias. no se trata de um simples alinhamento; a relao deles

    se baseia em um tipo avanado de confiana. na definio de jos salibi neto, cKO da Hsm, e sandro magaldi no livro mo-vidos por ideias (ed. campus/elsevier), esse tipo se rege pela cumplicidade. de origem latina, a palavra remete a enroscar, dobrar enrolando, fazendo-nos pensar em um tipo de inter-dependncia que serve como uma luva para a agilidade neces-sria no mundo dos negcios atual, conforme salibi e magaldi.faz mais de 40 anos que o trio 3g interdependente. desde

    que se conheceram no banco garantia, tm convvio intensi-vo, trocando informaes, tendo ideias, correndo riscos, mo-vimentando bi lhes de dlares (at hoje, mais ganhando do que perdendo), todos juntos. s vezes concordam, s vezes discordam, mas sempre ficam bem. como explicar um relacionamento to maduro

    e produtivo entre scios? O principal vetor parece ser justamente o da cumplicidade, essa confian-a com interdependncia. a seguir, HSM Manage-ment apresenta as principais caractersticas que sugerem como eles construram o sentimento.

    Forma inteligente de atuar. temos o sonho grande comum, mas damos certa liberdade para o indivduo tambm, para ele se realizar dentro da sua individualidade essa forma de atuar em trio , sem dvida, a responsvel por boa parte do nosso sucesso, analisa jorge paulo. e ningum quer roubar a cena para si; cada um respeita a individualida-de do outro e o ajuda a crescer. marcel acrescenta:foi timo cada um ter arrumado um

    negcio para tocar sozinho em algum momento e assim se realizar. no caberamos os trs em um negcio s juntos e ao mesmo tempo; seramos animais muito grandes para um negcio s. no incio, o jorge ficou tocando o banco, o beto foi tocar as lojas americanas e eu fui tocar a brahma ne-gcios grandes o suficiente para ocupar cada um de ns. para ele, o fato de cada um poder tomar decises sem pedir permisso aos outros, em um mecanismo de deferimento, faz toda a diferena do mundo.fazer isso requer uma con-vico muito forte.

    Personalidades (e histrias) semelhantes. todos sempre gostamos de sonhar sonhos grandes e de construir coisas. e, alm disso, sempre nos entusiasmamos com fa-cilidade, pondera marcel. sempre quisemos negcios que durassem, que ficassem para as futuras geraes. e gosta-mos de lidar com os mais jovens, comenta jorge paulo. O fato de marcel e beto terem educao formal de primeira linha e serem workaholics como ele tambm os aproximou, conforme o livro sonho grande. alm disso, temos um grande diferen-cial, acho, que muitos brasileiros tm: a atitude. no ficamos perdendo muito tempo com o passado, com o que aconteceu ou deixou de acontecer. no deu certo? partimos para outra, lembra marcel.haBilidades comPlementares. a autora de sonho grande, cristiane correa, definiu os trs para HSM Mana-gement: jorge paulo o estrategista, a pedra fundamental dessa cultura. foi ele quem trouxe para o brasil os conceitos de meritocracia e partnership. marcel o administrador por excelncia. no garantia, era o responsvel pela mesa de ope-raes, o corao do banco. na brahma, foi o responsvel por transformar uma cervejaria envelhecida em uma mqui-na de ganhar dinheiro. beto quem abre novas frentes. quan-do o garantia comprou as lojas americanas, em uma poca em que bancos no compravam empresas, mesmo sem ne-

    nhuma experincia ele foi tocar a varejista. depois montou a gp, o primeiro private equity do brasil. e, at no que se refere s Ongs dos trs, foi quem primeiro deu apoio ao empreen-dedorismo, trazendo a endeavor para c.emPatia natural. O fato que nos damos bem: pesca-mos juntos a vida toda, pescamos de mergulho. Hoje pesco menos, mas pescamos juntos a vida toda, conta jorge paulo.resPeito Pela vida Pessoal de cada um. quem d o depoimento jorge paulo: eu sempre trabalhei muito e, ao mesmo tempo, sempre consegui jogar tnis, praticar pesca submarina e conviver com minha famlia, que superlegal. acontece o mesmo com meus scios: cada um tem seus in-teresses, hobbies especiais, todos tm famlia.sorte. nas palavras de marcel, o fato de o jorge ser dez anos mais velho que a gente foi importante: ele cumpriu aquela funo do irmo mais velho, que d liga relao.A reportagem da redao de HSM MAnAgeMent.

    Jorge Paulo o estrategista. Marcel, o administrador por excelncia. Beto quem abre novas frentes

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    Prazer. essa sociedade um dos grandes prazeres da minha vida. no apenas financeiramente; timo chegar minha idade e saber que tenho dois scios com quem pretendo fazer mais coisas, comenta jorge paulo.admirao. tenho dois scios espetaculares, o marcel e o beto, diz jorge paulo.O jorge uma pessoa especial. O crebro dele j veio com a maioria dos arquivos que eu e o beto copiamos depois, afirma marcel. beto, por sua vez, vive contando com a admirao dos dois amigos, como no episdio relatado em sonho grande em que prometeu vestir-se de odalis-ca e danar na praa mau, no centro carioca, caso a empresa conseguisse uma margem ebitda (lucro antes dos juros, impostos, depreciao e amor-tizao) de 6%. ele cumpriu.Futuro comum. nas palavras de jorge paulo: como temos vrios negcios juntos, estamos educando nossas famlias juntas sobre os ne-gcios que temos; no pretendemos que nenhum membro das famlias tenha um papel executivo em nenhuma das empresas em que possu-mos participao, mas achamos produtivo os diversos membros co-nhecerem os outros, trocarem ideias, com o objetivo de que deem valor quilo que ns construmos. queremos que entendam que o conjunto vale mais do que qualquer coisa individualmente. estamos tentando fazer com que nossos familiares continuem essa sociedade de trs, por-que esta funciona muito bem.gosto Pelo risco. um fator que nos manteve juntos todo esse tempo foi a aptido para correr riscos. jamais teramos feito o que fizemos se no tivssemos topado juntos correr alguns riscos. a competncia que nos distingue da maioria dos outros empresrios, diz jorge paulo.segurana. s vezes, eu no concordava com alguma coisa que os dois faziam, ou eles no concordavam comigo, mas ns sabamos que, se algo desse errado, poderamos contar um com o outro, comenta marcel.

    vale a pena fazer um adendo sobre o fato de os trs praticarem pesca submarina juntos, que at poderia ser um elemento da lista por si s, mais importante do que parece. imagine o leitor que, no momento em que mergulham no fundo do mar, um tubaro ou uma garoupa mais agressiva ataque um membro do grupo. Os outros forosamente tero de se arriscar para defender o amigo. pois no nada incomum a situa-o de ameaa e proteo nesse esporte e, segundo os manuais de psi-cologia social, do tipo que fica registrada na pele para sempre, criando potencialmente interdependncia. na cumplicidade 3g, um elemento extra, hors-concours, quase um re-

    foro positivo: eles criam uma espcie de cumplicidade ampliada, ins-tilando o sentimento no corpo de funcionrios e em sua atuao social.

    cuMplicidAde AMpliAdA evidente que os scios jorge paulo, marcel e beto no conseguem re-plicar com todos os outros donos internos de suas empresas o mesmo grau de cumplicidade que cultivam entre si. mas, em muitos casos, o que era confiana entre os executivos j se tornou cumplicidade em alguma medida, dando um passo adiante para incluir esse senso de dependncia. a confiana dos scios reverberada nas empresas ligadas 3g capital

    pelo fato de todos conhecerem as regras do jogo, tanto devido cultura tradu-zida em princpios como por causa do mtodo. isso ficou claro, por exemplo, no depoimento que joo castro neves, presidente da ambev, deu a HSM Ma-nagement: temos um princpio, o 7, que prega o bom senso e a simplicidade em tudo que se faa, o que tem a ver com disciplina. brincamos que temos

    Marcel Telles (acima) foi entrevistado por HSM Management em janeiro-fevereiro de 2011, quando avisou: Temos interesse em empresas estveis onde possamos aplicar nossos conceitos bsicos de eficincia, gente e cultura nesse tipo de empresa, eles tm grande efeito e cujo negcio no possa ser totalmente virado de cabea para baixo por uma inovao ou nova tecnologia. Jorge Paulo Lemann concedeu entrevista ao CKO e diretor-editorial Jos Salibi Neto em duas edies: na de maro-abril de 2001 e na de janeiro-fevereiro de 2008 (abaixo), ano em que compraria a Anheuser-Busch

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    reunies marcadas para 2020; que nossa reunio do sistema de gerncia precisa ocorrer todo dia 15. isso disciplina, isso cria simplicidade. tambm cria confiana. e, segundo se deduz de castro neves, a rotina, ligada ao mtodo, tima para gerar um ambiente de confiana, apesar de ser considerada algo chato.e a cumplicidade? O fato de os resultados de cada um in-

    terferirem na remunerao varivel do outro cria uma de-pendncia na prtica. isso que faz, como diz o consultor vicente falconi, com que pessoas bem encaixadas na cultura 3g toram o nariz para quem tem desempenho sofrvel. e, somando a dependncia formal confiana, verifica-se certa cumplicidade entre os funcionrios das empresas do trio.cada vez mais, jorge paulo, marcel e beto tentam expandir

    esse senso de cumplicidade para alm das fronteiras organi-zacionais, investindo em melhorias para a sociedade. partici-pam de organizaes no governamentais, como a endeavor, voltada ao estmulo do empreendedorismo, a fundao estu-dar, que oferece bolsas de estudo a talentos promissores sem recursos, a fim de que tenham acesso a um ensino de primeira linha joo castro neves, ceO da ambev, foi um dos benefi-ciados por bolsa nos anos 1990, e a fundao brava, com a qual tentam influenciar positivamente a gesto pblica. esta, tocada por beto, financia o trabalho de consultoria de vicente falconi para revolucionar a administrao pblica. as boas intenes demonstradas por essas fundaes,

    consideradas Ongs srias, comprometidas e eficazes, so um construtor natural de cumplicidade com a sociedade.

    entendendo o trAdeoff por que o ttulo desta reportagem fala em tradeoff? O ter-mo, consagrado por michael porter, significa abrir mo de uma coisa para ter outra. e exatamente isso que o trio jorge paulo-marcel-beto faz todos os dias ao optar pela cumplicidade. alguns exemplos: cada um tem de saber tolerar o erro do outro; devem lidar com o cime que sua relao eventualmente desperte em outros executivos; precisam controlar seu ego em prol da equipe e, como esportistas competitivos que so, supe-se que tenham um mnimo de altivez; pelo bem das empresas em que so acionistas, e para no fechar portas para nenhum talento, determinaram que os filhos no podem trabalhar nelas. scios que brigam e pem tudo a perder constituem

    a regra, no a exceo. a cumplicidade a vacina para isso, mas, dados os tradeoffs, no para qualquer um. como salibi e magaldi alertam, a cumplicidade , sempre, uma construo e requer esforo. na lista de cmplices empresariais notrios do livro movidos por ideias h pou-cos nomes, como os de bill gates e steve ballmer, ou os de bill Hewlett e dave packard. e, graas a uma mistura explosiva das lies aprendidas com o modelo de partner-ship do goldman sachs e com o autoconhecimento, o trio 3g tambm est l.

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    O crebro do Jorge j veio com a maioria dos arquivos; eu e o Beto s copiamos. O que software para mim e para o Beto j era hardware no Jorge. Com essa analogia ele-gante, Marcel Telles descreveu a HSM Management a ascendncia que Jorge Paulo Lemann tem sobre os dois.

    Muitas das razes do modelo de gesto 3G remetem mesmo a Jorge Paulo, a sua personalidade, a suas expe-rincias ou aos benchmarkings que pessoalmente fez. Mas que ningum se iluda: um livro sobre a aventura 3G jamais poderia ser uma jornada de heri do tipo Odis-seia. Deve, no mnimo, fazer uma verso contempornea dOs Trs Mosqueteiros.

    Jorge Paulo caberia bem no papel do estrategista Athos, mentor do grupo; impetuoso, Beto inspiraria Por-thos; e Marcel faria as vezes do equilibrado e persisten-te Aramys. Eles lutam muito melhor juntos do que se-parados, quando fortalecem e protegem uns aos outros. J DArtagnan teria intrprete rotativo: um dia, poderia ser um dos executivos formados pelo trio, como Joo Castro Neves, CEO da Ambev; em outro, um estagirio recm-aprovado no disputadssimo programa de trai-nees da Ambev. No lugar de espadas cruzando no alto ao grito todos por um, tm smartphones mo para tro-

    car ideias em voz baixa nas viagens, estejam no deserto de Gobi ou num parque temtico.

    fundamental entender o trio de empresrios como trio, em vez de eleger um artfice isolado do sucesso, como teimam em fazer alguns. Embora a jornada do heri seja charmosa aos de fora, o que salta aos olhos eles realmen-te terem achado um modo de atuar em equipe, algo supre-mamente difcil em se tratando de scios.

    Segundo Marcel nos disse em entrevista, o trio sempre teve essa coisa de defer, ou deferir em ingls; todos se consultam, mas o que um decidir est decidido. E, se o barco afundar, quem decidiu sabe que pode contar com os outros para segurar o mastro.

    Na prtica, a comunicao intensa: eles se falam ou se escrevem o tempo todo e se encontram ao vivo tambm. As esposas estudam juntas, os filhos acampam em turma.

    Esses mosqueteiros contempor neos adoram traba-lhar workaho lics so normais, ensinou-lhes a cul-tura Goldman Sachs, tanto quanto os de Alexandre Dumas gostavam de lutar. Mas esse trao talvez tenha sido mal compreendido: eles aproveitam, e valorizam, a vida privada.

    3 MosqueteIros de sMartPhone, Por adriana salles gomes