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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017
ISSN 2236-1855 3592
IMPRESSOS ESTUDANTIS E REDES DE INTELECTUAIS: a formação de uma elite letrada nas cidades de Piracicaba e São Luís
Daniel Ferraz Chiozzini Isis Sanfins Schweter
Mary Jones Ferreira de Moura Aquino
Introdução
Entre os anos 1930 e 1960, o Brasil assistiu a criação e circulação de impressos
estudantis em diversas instituições educacionais, sobretudo relacionados ao Movimento da
Escola Nova. Nos anos 2000, esses documentos foram redescobertos como potenciais fontes
e objeto de pesquisa no âmbito da História da Educação. Ainda assim, foram relativamente
pouco estudados se comparados aos impressos educacionais como um todo. Segundo Amaral
(2002), essa situação está relacionada à sua inconstante periodicidade, dificuldade de acesso
ou pelo teor dos textos que foram produzidos, supostamente inferiores aos produzidos em
outras modalidades de impressos. No entanto, há que se registrar um avanço recente em
estudos voltados para impressos desenvolvidos em diferentes instituições. Segundo a autora,
a pertinência desses materiais está no fato de serem reveladores de “configurações específicas
da vida e da cultura escolar, em que se pode constatar denúncias, expectativas e idealizações
(principalmente dos alunos) referentes à educação e ao cotidiano das escolas” (AMARAL,
2002, p.123).
O presente texto trata da comparação de parte dos resultados de duas pesquisas que
investigaram como se deu o processo de criação e desenvolvimento de jornais estudantis
denominados Avante, Folha Estudantil, Estudante de Atenas e O Liceu, no Colégio de São
Luiz e no Liceu Maranhense, situados na cidade de São Luís, no estado do Maranhão; e O
Sud Menucci, no Instituto de Educação Sud Menucci, na cidade de Piracicaba, no estado de
São Paulo. A perspectiva histórica comparada busca sinalizar um aspecto pouco explorado
em investigações dessa natureza: a relação dessa imprensa com uma rede de intelectuais das
cidades mencionadas.
Ambas as pesquisas contemplaram a análise de duas dimensões desses periódicos,
que estão articuladas entre si. A primeira delas é sua materialidade, envolvendo os processos
de diagramação, formatação, técnicas de produção, composição de título e subtítulo, entre
outros. A segunda é seu conteúdo, envolvendo produções textuais que desvelam diversas
dimensões acerca da organização do trabalho escolar, tais como currículo, normas de
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conduta, espaço físico da escola, entre outras, além de ser um meio do alunado se posicionar
acerca de temas mais amplos, como a situação da educação no país ou o lugar da mulher na
sociedade. Ou seja, os impressos foram tomados como fonte e objeto de pesquisa.
Na sequência, buscou-se a relação da imprensa estudantil não apenas com
organizações associativas estudantis (clubes, grêmios etc.), mas com uma rede de
sociabilidade mais ampla, assim definida por Sirinelli (1996):
Todo grupo de intelectuais organiza-se também em torno de uma sensibilidade ideológica ou cultural comum e de afinidades mais difusas, mas igualmente determinantes, que fundam uma vontade e um gosto de conviver. São estruturas de sociabilidade difíceis de apreender, mas que o historiador não pode ignorar ou subestimar. (...) O meio intelectual se constitui, a menos para seu núcleo central, um “pequeno mundo estreito”, onde os laços se atam, por exemplo, em torno da redação de uma revista ou do conselho editorial de uma editora. A linguagem comum homologou o termo “redes” para definir tais estruturas. (SIRINELLI, 2003, p. 248)
Nesse sentido, foram investigadas evidências reveladoras do lugar ocupado pela
escola e pelos sujeitos que dela fizeram parte em uma rede de sociabilidade que envolveu a
elite letrada das cidades em questão. Ou seja, os impressos se constituíram o meio pelo qual
esse lugar e as relações em questão se tornaram inteligíveis. Embora sejam retomados
aspectos da materialidade e de seu conteúdo – envolvendo os impressos sobretudo na
condição de objeto de pesquisa – será privilegiado o impresso como fonte de pesquisa para
compreensão de tais redes de sociabilidade.
Desenvolvimento
O desenvolvimento de impressos estudantis também esteve muito associado às
reformas educacionais para o ensino secundário dos anos 1930, ocorridas por meio do
Decreto-lei nº 18.890/31 e complementadas pelo decreto-lei de nº 21.2141/32 (Reforma
Francisco Campos) e, posteriormente, pelo decreto-lei de nº 4.244/42 e as “leis orgânicas do
ensino”, que compuseram a chamada “Reforma Capanema”. Essas duas reformas do período
tiveram um profundo impacto no ensino secundário, pois “fixaram a estrutura
organizacional” (SOUZA, 2008, p. 145) que antes se limitava a cursos preparatórios e aos
exames parcelados que ainda predominavam no país.
A Reforma Francisco Campos (1931), nas palavras de Dallabrida e Souza (2014),
“conferiu, em nível legal, organicidade ao ensino secundário brasileiro por meio de várias
estratégias curriculares inovadoras” (p. 13), de caráter menos humanista e mais científico no
currículo com “espaço maior e inovador aos eixos das Ciências da Natureza e do
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nacionalismo” (DALLABRIDA; SOUZA, 2014, p. 14). Além disso, essa organicidade do ensino
secundário teve como propósito um maior controle do trabalho do docente e da participação
do discente nas instituições de ensino, seja no ensino público ou particular.
O caráter disciplinar da reforma levou a uma mudança no sistema de avaliação, que
passou a ser de forma regular e não mais parcial, além de estabelecer uma maior
permanência do estudante secundarista na escola, demandando atividades escolares que
viabilizassem esse acréscimo. Uma das atividades escolares sugeridas na época foi a produção
de jornal escolar.
A principal referência do período para a produção desses jornais foi a obra denominada
“Jornais Escolares”, de Guerino Casassanta, publicada em 1939 pela Biblioteca Pedagógica
Brasileira. Nessa investida do Movimento da Escola Nova, o autor fez um inquérito dos
jornais escolares produzidos pelas escolas mineiras ao longo da década de 1930 e deu todas
as dicas sobre como produzir um jornal nas escolas primárias, secundárias e normais.
Segundo Casassanta (1939) o jornal escolar é uma atividade para auxiliar a tarefa da
educação e tem “por objetivo vitalizar os trabalhos, imprimir-lhes movimento, cooperar para
que os programas tenham a eficácia educativa que deles se espera” (p. 37). Embora não seja
novidade a presença dos jornais nas instituições escolares, pois, segundo Amaral (2002),
“alunos de determinadas escolas, desde fins do século XIX, editaram vários periódicos”, o
importante nesse período é “salientar a profusão de impressos estudantis que circularam em
várias cidades brasileiras entre as décadas de 1930 e 1960” (p. 123).
A obra de Casassanta explicita o papel atribuído à atividade extraclasse, incluindo a
produção de um jornal e envolvendo uma ação educativa para além dos muros da escola. O
ponto de partida, no entanto, era o papel ativo dos estudantes. Uma breve explanação do
conteúdo dos jornais traz como a sociabilidade dos estudantes é contemplada pelas
publicações. No caso de São Luís, o grêmio estudantil do Liceu Maranhense (Colégio do
Estado de ensino secundarista, criado em 1838, na cidade de São Luís, Maranhão), chamado
de Centro Liceista, destacou no primeiro exemplar de seu jornal Alvorada a “Solenidade da
Posse do Centro Liceista”, que contou atuação artística de estudantes. Assim,
Destacou-se a atuação dos jovens artistas Luiz Pimenta e Maria Regina Borges, o primeiro no violino e a outra no piano. A segunda parte da Hora de Arte foi constituída pela magistral representação da peça trágica em 1 ato “Regina”, de autoria do consagrado poeta maranhense Assis Garrido (...).Revelaram, nesta representação, seus valores artísticos, os jovens poetas Ubiratan Rayol e Reginaldo Telles de Sousa, bem com a já credenciada Srta. Conceição Maia, filha do ilustre professor Vicente Maia (Jornal Alvorada, São Luís, 10 de maio de 1946, p. 4).
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Além disso, o jornal também publicou notícias sobre acontecimentos da escola, como,
por exemplo, a recepção dada aos calouros com a exibição de uma peça teatral realizada pelo
teatro estudantil. Ainda no Alvorada, também em 1946, foram publicados pelos alunos
poesias, homenagens a personalidades nacionais e estaduais, incluindo os professores, além
de assuntos referentes a outras escolas da cidade, em forma de homenagem ou reivindicando
melhorias.
No Liceu Maranhense, a prática de publicar jornal estudantil era frequente na década
de 1950. A cada mudança do grupo eleito no grêmio, mudava-se também o nome do jornal.
No ano de 1946, o nome do jornal estudantil era Alvorada; em 1956 passou a ser chamado de
O Estudante de Atenas, com o primeiro número apresentando a posse da nova diretoria do
grêmio. Permaneceram as publicações dos concursos, das homenagens aos professores,
homenagens a outras escolas, porém percebe-se na primeira página do jornal de 1956 e em
local de destaque, as palavras do presidente do grêmio quanto à participação da União
Maranhense de Estudantes Secundários (UMES) em ações conjuntas, pois “Todos os
Grêmios, juntamente com a atual diretoria da U.M.E.S., estão unidos para uma única
finalidade: engrandecer o estudante maranhense’” (O Estudante de Atenas, Ano 1, número 3,
04 de setembro de 1956, p 1).
Os exemplares de “O Sud Mennucci”, publicados em Piracicaba, também retratam
situações análogas. Um dos pontos é a referência à cultura clássica e sua associação a uma
educação de excelência, que tem sua maior representação na memória coletiva das cidades de
São Luís e Piracicaba. O editorial do primeiro exemplar do periódico assim fez sua
apresentação:
Dispomo-nos a pugnar pelo Educandário a que pertencemos e esperamos de seu corpo docente e discente, todo apoio que temos certeza, dignar-se-ão de nos prestar, como pessoas compreensivas e altruístas que são. Esperamos seja “O Sud Mennucci” acolhido com consideração, pois tentaremos, por seu intermédio, firmar as relações de amizade entre a juventude normalista, dando combate à indiferença, ao separatismo e isolacionismo que deparamos às vezes, não sem tristeza, na massa estudantil. Pugnaremos pela união dos nossos num só coração, para que, futuro a dentro, possa Piracicaba mostrar sempre o brilho de sua vontade e de seu saber, continuando a doar, para o Brasil, homens que, satisfazendo um Diógenes, não necessitariam de luz de sua lanterna para mostrar no rosto a retidão do seu caráter e hombridade de suas ações.
O autor também expôs que a união dos estudantes permitiria que Piracicaba pudesse
mostrar “o brilho de sua vontade e de seu saber” continuando a doar para o Brasil homens
‘iluminados’ pela luz de Diógenes. O filósofo grego da Atenas Antiga perambulava pelas ruas
com uma lamparina, durante o dia, alegando estar procurando um homem honesto.
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A ideia de os alunos do Instituto de Educação mostrarem o “brilho de sua vontade e do
seu saber” remete a uma construção histórica da memória coletiva da instituição. A antiga
Escola Normal, depois Instituto de Educação Sud Mennucci, é lembrada pelos habitantes da
cidade de Piracicaba como espaço de excelência de educação, de onde entravam e saiam os
melhores alunos, a elite pensante da cidade. Esse discurso está presente nos jornais locais da
cidade1, nas falas dos alunos organizadores do jornal e também na atuação da Associação de
ex-alunos da Escola Normal, que até hoje procura manter consagrada essa memória
idealizada da instituição.
De acordo com Pollack (1992), a memória é um fenômeno construído social e
coletivamente, submetido a flutuações e mudanças constantes que, entretanto, apresenta
pontos invariáveis e imutáveis, resultantes de um trabalho de organização e enquadramento.
Elemento que constitui identidade ao indivíduo e ao grupo, a memória é um fenômeno
construído, em nível de grupo e em nível individual, sendo resultado também de um trabalho
de organização inerente aos atos de gravar, recalcar, excluir (POLLACK, 1992, pp. 203-204).
Esse enquadramento da memória aparece em vários tipos de publicações. Os jornais
locais da cidade de Piracicaba, especialmente em datas comemorativas, apresentam textos
que enaltecem a escola. Em exemplar publicado no dia 21 de abril de 1953 – data do
aniversário da instituição e período em que o jornal dos alunos foi publicado – o Jornal de
Piracicaba apresenta na primeira página o seguinte texto:
A Escola Normal “Sud Mennucci, comemora hoje o seu 56º aniversário de fundação, marcando assim uma brilhante etapa dedicada à grandeza do ensino paulista. O tradicional educandário de nossa cidade vem cumprindo não só sua nobre missão de educar a mocidade, como também influindo decisivamente para o nosso progresso. Da “Sud Mennucci” tem saído inteligências luminares que honram o magistério e também outras profissões liberais. Nossa Escola Normal é, inegavelmente, um orgulho para nossa terra, um motivo de esperança para a Pátria estremecida e, aos jovens, um incentivo para as lutas do ensino imperecível.
A ideia de a escola contribuir para o “progresso” da cidade e servir como “esperança
para a Pátria” faz parte de um discurso nacionalista presente no contexto da Primeira
República, onde a instrução pública era vista como salvação da nação. A missão de educar a
mocidade cabia ao Sud Mennucci, sendo a escola considerada um “orgulho” para a cidade.
1 Algumas páginas de jornal selecionadas em uma hemeroteca foram encontradas no arquivo da escola, onde estão
inúmeras notícias sobre a Escola Normal Sud Mennucci, depois Instituto de Educação. Na primeira página da mesma, se encontra a informação de que foi “feita pelos alunos do Centro Cívico em 1968”. A maior parte se refere às comemorações dos aniversários da instituição e outras mostram notícias sobre a escola. Estas notícias eram publicadas pelos principais jornais locais da cidade de Piracicaba e serão usadas ao longo do texto na tentativa de entendimento das questões colocadas.
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Essa perspectiva também está no material produzido pela Associação de ex-alunos,
anteriormente mencionada. Em seu impresso2, datado de 2007, novamente essa construção
está presente, por meio de artigos de ex-alunos que legitimam essa memória consagrada.
Num desses artigos, escrito pela historiadora piracicabana Marly Therezinha Germano
Perecin3 – também ex-aluna da instituição – é narrada a história da educação em Piracicaba,
mostrando o envolvimento e as articulações do Partido Republicano Paulista em relação às
diversas iniciativas educacionais na cidade. Por meio do discurso nacionalista republicano, a
autora descreve como ocorreu na cidade o processo de criação e construção de escolas
primárias e secundárias. Dentre essas iniciativas, Perecin destaca a história do Instituto de
Educação Sud Mennucci.
Num ponto do artigo, a autora afirma que, por conta do desenvolvimento urbano
iniciado a partir do início da república, que envolveu a abertura de ruas e a construção de
redes de esgoto, Piracicaba se tornou uma cidade ‘limpa, arborizada e dotada de praças
aconchegantes nas tardes de verão’. No ano de 1911, com 48 mil habitantes, passou a ser
considerada a segunda cidade paulista em número de escolas, contando com quarenta
unidades e se tornando conhecida como Ateneu Paulista4, aposto que vem sendo repetido
através dos tempos. (PERECIN, 2007, p. 22)
Sobre isso, a autora afirma:
A antiga boca do sertão, no século XVIII, havendo passado pela fase de fronteira agrícola, no século XIX, surpreendia com o seu florescimento cultural, fruto da expansão das escolas e da manifestação de sua jovem elite pensante. (PERECIN, 2007, p. 23)
A partir desse ponto, Perecin passa a descrever o processo que culminou na
construção do prédio em que está instalada a escola até hoje, na rua São João, no centro da
cidade. Destaca a beleza e a grandiosidade de sua edificação, que, segundo ela, apresentava
características de um palácio:
2 O documento intitulado Reunião Anual da Associação dos ex-alunos, ex-professores e amigos da Escola “Sud Mennucci”, datado de 2007, está arquivado na Biblioteca da Escola Estadual Sud Mennucci. A publicação foi elaborada por ex-alunos da instituição e integrantes desta associação.
3 Marly Theresinha Germano Perecin é uma historiadora piracicabana que publicou vários textos dedicados à história tradicional da cidade e, em particular, à história do Instituto de Educação Sud Mennucci. Seus textos – que estão colocados na dissertação – são representativos de uma história institucional, produzida no âmbito do IHGP (Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro).
4 Perecin explica que Ateneu, em sentido lato, diz respeito à Academia, estabelecimento de ensino superior dedicado às artes e à literatura. Também, segundo ela, é um termo de origem grega, Athénaion, templo de Atenas na Grécia antiga, e lugar onde os literatos liam suas obras. Conclui afirmando que essas características refletiram o processo de transformação experimentado por Piracicaba nas primeiras décadas do século XX, por isso o adjetivo para a cidade.
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Ninguém escapa ao impacto de sua grandeza interior, nem ao sortilégio de sua beleza plástica, a criança, ou o desconhecido, que venham pela rua São João, a meio do calor e da luminosidade do sol piracicabano. Todo aquele que ascendeu as escadarias daquela acrópole, ao adentrar, queda-se, perplexo, no Saguão. Mágica penumbra, ali, esconde formas e imagens, que à dilatação das pupilas, se apresentam, paulatinamente, ao espectador desavisado, insinuando-se em seu imaginário e despertando misteriosas interrogações remanescentes de um passado, onde até as paredes falavam. – Qual o desvendamento do mistério?
- Faça-se a luz! Ilumine-se a mente interior, afastem-se as trevas da ignorância e da presunção! – Esta é chave do código ao desavisado forasteiro que penetra o limiar, a ante-sala do “Ateneu Paulista”. (PERECIN, 2007, p. 26)
Nesse sentido, a autora ressalta ainda que, passado um século da construção da Escola
Normal, datada de 1917, saíram daquela instituição grandes mestres do magistério
secundário e superior, ‘milhares de soldados anônimos da grandeza da Pátria’5 nas escolas
primárias. Percebe-se, por essa descrição, a tal construção da memória coletiva da cidade em
relação a essa instituição pesquisada. A própria designação da cidade como Ateneu Paulista
mostra, de certa forma, essa imagem de cidade das escolas, sendo o Sud Mennucci, o local
por excelência para a formação de professores na cidade. (PERECIN, 2007, p. 26)
Assim como Piracicaba é denominada “Ateneu Paulista”, São Luís do Maranhão é
usualmente referida como Atenas Brasileira. Daí deriva a denominação de um dos jornais
estudantis investigados e citados anteriormente, O Estudante de Atenas. A construção dessa
caracterização é facilmente perceptível na memória coletiva e na chamada “historiografia
institucional” da cidade. O mito da “Atenas Brasileira6” aparece ligado a atuação de
intelectuais literários e de impressos, constituindo a ideia de uma fase de riqueza cultural do
Maranhão. Além disso, existem interpretações na historiografia maranhense sobre a
constituição da cidade clássica – aspectos arquitetônicos, literários e culturais – e da cidade
moderna – o aparecimento de novos bairros, presença de intelectuais nas discussões políticas
e culturais da cidade.
5 A ideia de progresso e grandeza da Pátria, presente nos discursos da historiadora citada e também nos textos dos alunos que escreviam no jornal, mostra que o discurso republicano da instrução pública estava presente e permanece dentro da memória desses sujeitos quando se referem à antiga Escola Normal e depois Instituto de Educação Sud Mennucci.
6“O mito da Atenas Brasileira esteve vinculado à fase de esplendor que os maranhenses obtiveram na economia, quando o Maranhão foi incorporado ao sistema mercantilista por meio da atuação da Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão, fundada pelo marquês de Pombal na segunda metade do século XVIII. [...] A classe alta do Maranhão transfigurava a imagem dos ludovicenses através da erudição propagada naquela época. Assim, dentro deste contexto, as atividades intelectuais ganhavam expressividade, dando origem à ideia de Atenas Brasileira. Então, nomes como os de Odorico Mendes, João Lisboa, Gonçalves Dias, Sousândrade, Humberto de Campos, Cândido Mendes e outros, expandiram no Maranhão uma cultura literária que passaria a ganhar destaque nacional”. (Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, n.42, setembro de 2012. Edição eletrônica).
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Um capítulo importante dessa efervescência intelectual está associado à chegada do
Movimento Modernista dos anos 1920. Enquanto no eixo Rio - São Paulo a arte brasileira era
um tema que suscitava intensas discussões e que culminaria na Semana da Arte Moderna de
1922, no Maranhão, particularmente na capital, tal efervescência cultural resultou, segundo
Corrêa (1989, p. 36), apenas em uma renovação literária voltada para uma “reedição da
mitologia da Atenas Brasileira”. O Movimento Modernista é entendido como um movimento
que “chegou tardiamente à capital maranhense, cujo contexto literário estava arraigado a um
passadismo estético (Simbolismo e Parnasianismo)”, conforme destaca o suplemento
Cultural e Literário Guesa Errante7 na sua edição de número 221. Assim, esse “chegar
tardiamente” aconteceu nos anos de 1940 e 1950, com a presença de jovens intelectuais e
literatos chamados pela historiografia local de “Geração Maranhense de 45”, devido ao fato
de terem se engajado na política, chegando a governar o Maranhão na década de 1960.
Porém, mesmo que possa ser afirmado que a política, economia e cultura maranhense
estivessem em descompasso em relação a outros centros urbanos do país, o mesmo não
acontecia com os jornais. Assim, como os demais centros urbanos, os jornais compreendiam
lugares de circulação de ideias, fossem elas modernas ou não. As informações circulavam em
torno da produção jornalística, que envolvia agentes sociais, como o governo, grupos
políticos, escolas, associações comercial ou industrial, agremiações culturais, fazendo da
imprensa um espaço de debate e disputa de ideias.
Um dos sujeitos que ganhou notoriedade nesse cenário foi o professor Luís Moraes
Rêgo, que era diretor da Escola Normal no ano de 1934. No livro Questões de Educação:
Contribuição aos problemas educacionais maranhenses, o autor afirma que o Maranhão se
aproximou do movimento educacional em curso no país naquele momento devido ao contato
dos educadores do Maranhão com o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, publicado
em 1932. Em seu texto, apresentou também um programa de renovação educacional em que
propunha que a escola se inserisse no mundo moderno, discutindo a finalidade da educação
(função social – com base na atividade e na produção), o papel do Estado (dever do Estado
em proporcionar uma educação integral e pública de caráter oficial, laica, gratuita e
7 O Suplemento Cultural e Literário “Guesa Errante”, do Jornal Pequeno, foi publicado pela primeira vez em três de março de 2002 e, após exatas 53 edições de publicações semanais, que cobriu um espaço de 12 meses, resultou no primeiro Anuário Suplemento “Guesa Errante”, publicado no dia primeiro de março de 2003. O nome do Suplemento, segundo o editorial do “Guesa Errante”, foi uma homenagem ao Poeta Joaquim de Sousa Andrade, o Sousândrade, e a sua obra O Guesa, além de homenagear a Língua Portuguesa. SANTOS, Amarilis Cardoso. PROJETO EDITORIAL DO SUPLEMENTO CULTURAL E LITERÁRIO “GUESA ERRANTE”: ENTRE A TEORIA E A PRÁTICA. REVISTA CAMBIASSU. Publicação Científica do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Maranhão - UFMA - ISSN 0102-3853. São Luís - MA, Ano XVIII, Nº 4 - Janeiro a Dezembro de 2008.
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obrigatória), a incorporação dos estudos do magistério à universidade (elevando a formação
docente) e a autonomia técnica e administrativa dos profissionais para desenvolver a obra
educacional. Por fim, mencionou ainda a adaptação da escola para os interesses regionais e
destacou a limitação na implementação dessas proposições diante a fragilidade financeira do
estado.
Ainda na década de 1930, é perceptível em parte da bibliografia consultada a
configuração de um movimento de intelectuais pela valorização da cultura popular, a
valorização das “coisas da terra”, que aos poucos foi transformando e legitimando aspectos
culturais antes marginalizados, mas agora destacados devido à importância dos estudos
regionais que intelectuais faziam no âmbito nacional. Essa preocupação de estudar a
formação cultural maranhense surgiu “como parte da cultura nacional” (CORRÊA, 2012,
p.56), marcada pelo enriquecimento da História do Brasil “nas primeiras décadas do século
XX com o nacionalismo militante de Olavo Bilac e Coelho Neto” (SOUZA, 2008, p.103).
Assim, essa valorização das manifestações culturais maranhenses teve sua expressão
observada por Corrêa (2012), que constatou o valor dado para a construção da identidade
cultural na imprensa da época.
No Jornal O Imparcial de 05/10/1930, intitulado “As Tradições Brasileiras”, tem-se mais claramente a crescente valorização da cultura popular, bem como a importância dos intelectuais nesse processo de intermediações entre as manifestações culturais e a cidade, de modo a criar, nesse meio, uma consciência valorativa do popular (...) (p. 94).
Essa circulação da ideia da valorização da cultura popular pode ser identificada
também no meio educacional na cidade de São Luís por meio dos jornais estudantis. Como
uma aluna que expressou seu encantamento pelas festas de São João e pelo “bumba meu
boi”, elemento da cultura popular maranhense, sendo ainda caracterizado como pertencente
às origens africanas. Assim, nas festas de São João:
Existe ainda, o “bumba meu boi”, que o nosso povo gosta muito. O “bumba meu boi” foi trazido da África, pelos pretos. Com penas e fitas, fazem uma roda e um homem fica debaixo de um boi de papelão, dansando, enquanto outros cantam, pulando num pé e noutro (Jornal Aurora, 29 de setembro de 1936, p.8).
Nesse contexto, Fulgêncio Pinto, um dos autores maranhenses do período, se dedicou
ao mesmo tema em no jornal local O IMPARCIAL, no artigo, intitulado “Terra enfeitada e
rica”, de 10 de julho de 1941:
Seria louvável, adotar-se nas nossas escolas, nesta época de operosidade e renovação patriótica, um trabalho tão pretensioso, a fim de despertar na
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alma da mocidade maranhense, o interesse pelo conhecimento daquilo que é nosso (PINTO, 1941 apud CORRÊA, 2012, p. 84).
Dessa forma, Fulgêncio Pinto, para concretizar seu desejo na formação de uma
consciência entre os maranhenses sobre a cultura local, propôs que as escolas adotassem um
livro como material didático para que, assim, os estudantes pudessem desenvolver uma
consciência de valorização das coisas da terra, pois acreditava que “a escola se constituía num
meio eficaz para obtenção dessa consciência” (CORRÊA, 2012, p. 84). Nota-se, portanto, que
o jornal oficial e o jornal estudantil foram meios utilizados para fazer circular as ideias
daquele período. Logo, é possível afirmar que a prática dos intelectuais de fazer circular suas
ideias nos jornais locais ocorria também no espaço escolar com a produção de jornais
estudantis. Cabe ainda ressaltar que desde o início do século XX, estudantes
Liam, produziam e declamavam poesias em língua portuguesa e estrangeira. Dentro e fora das salas de aula encontravam meios de praticar essa cultura ornamental nos saraus, nos bailes, nos encontros familiares, no teatro, nas agremiações literárias e na imprensa estudantil. (SOUZA, 2008, p. 127)
No momento em que ocorria esse debate sobre a cultura maranhense, mais
precisamente em 1941, o então interventor federal Paulo Ramos nomeou para Diretor da
Instrução Pública o professor Luiz de Moraes Rêgo, que procurou, no exercício de sua função,
expandir o ensino primário no interior do Maranhão. Também incentivou a produção de
impressos por parte dos professores e alunos, pois, para ele, essa produção fazia parte da
formação de ambos. Rêgo expressou suas iniciativas nesse sentido no mesmo ano, em
relatório apresentado ao interventor federal. Além disso, no livro Memorial Balsense, de
Raimundo Floriano, verifica-se a relação da criação de um grupo escolar na cidade de Balsas,
interior do estado, com o período de permanência do professor Luiz Rêgo na Diretoria da
Instrução Pública. Floriano relata esse fato da seguinte forma no livro:
Luiz Rêgo empenhou-se no mister de plantar Grupos Escolares Estaduais em todas as cidades maranhenses onde elas só existiam nas esferas municipal ou particular. Assim, nasceu em Balsas aquele que, mais tarde, seria denominado Grupo Escolar Professor Luiz Rêgo. (FLORIANO, 2014, p. 62)
Outro dado é que, ainda nesse período, em particular na capital São Luís, as políticas
de modernização do espaço urbano – que em algumas capitais brasileiras já havia ocorrido
no início do século XX – foram discutidas e executadas com algumas alterações nas áreas
mais antigas da cidade. Com a implantação de um plano de reforma urbana na cidade,
seguindo a “onda modernizadora” iniciada na Era Vargas, os representantes do governo
estadual ou do governo municipal intentavam dar uma nova fisionomia para a capital
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maranhense e expor tais medidas em relatórios e jornais da época, conforme Juliana Barbosa
demonstra em sua monografia denominada “PELA HORA DA MORTE”: Os efeitos da
Segunda Guerra Mundial no custo de vida em São Luís, ao relatar que:
Em diversas reportagens de jornais e fala dos governadores se observa que a preocupação primordial do governo era com o enquadramento de São Luís no molde das cidades modernas, daí a elaboração de um plano de reformas urbanísticas que visava dar uma nova fisionomia para a cidade (BARBOSA, 2005, p. 23).
Mais uma vez, os jornais são utilizados como meio de distribuição de ideias e ações
para construção da imagem positiva dessas mudanças urbanas. Desse modo, as ações
políticas tardias possibilitaram a conservação da arquitetura mais antiga da cidade e
reforçaram, ao mesmo tempo, no meio da intelectualidade, um culto ao passado glorioso e à
sua riqueza cultural erudita. Além disso, essas ações políticas também suscitaram debates
como a relevância da conservação da arquitetura colonial e o argumento de que tal
preservação associaria a cidade ao atraso, retirando-a dos moldes da modernidade.
Com o fim do Estado Novo e, consequentemente, com o fim do governo estadual de
Paulo Ramos, o debate girou em torno da liberdade e da democracia no país nas esferas
política, econômica ou social. No caso maranhense, esse período foi marcado como “a época
dos lançamentos literários e a arrancada para a terceira oligarquia do Maranhão8”.
(Rosemary Rêgo, suplemento cultural e literário Guesa Errante, do Jornal Pequeno, órgão da
imprensa local, 10 de setembro de 2010). Nesse contexto, jovens intelectuais realizavam
embates literários e de resistência política, através das organizações de grupos literários, com
debates, produções literárias em livros e revistas, além de publicações em jornais. Todo esse
movimento de jovens intelectuais tinha o intuito de fazer uma intervenção intelectual na
realidade maranhense, tanto no aspecto cultural quanto no político-econômico.
Assim, fica evidente a pertinência da produção de impressos no período por parte de
grupos de literatos, estudantes, profissionais de diversas áreas e instituições, que deles se
utilizavam para divulgação de suas ideias. Outra evidência nesse sentido pode ser verificada
no primeiro editorial do Jornal Avante, periódico estudantil do Colégio de São Luiz, escola de
propriedade do professor Luiz Rêgo. Abaixo, destaca-se um trecho do referido editorial:
Era nosso desejo, há muito tempo, fundar um órgão de imprensa, ou simplesmente um jornal, para que, por intermédio desse periódico, pudéssemos exprimir nossas ideias e pensamentos, e, desse modo, formar ao
8 Período marcado pela presença de Vitorino Freire no cenário político maranhense que congregou à sua volta os grandes coronéis do Maranhão. Mais informações (PINTO, 1982), (COSTA, 2001).
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lado dos nossos colegas dos outros colégios que tem o seu jornal organizado. (Avante, 31 de outubro de 1949)
Deve ser também destacada ma nota do professor Luiz Rêgo – na primeira página do
jornal– que aponta a importância da construção de jornais nesse contexto estudantil e na
sociedade da época. O texto parabenizou a iniciativa dos estudantes de sua escola de produzir
um jornal que estivesse de acordo com a tradição dos jornais estudantis de outrora:
Parabéns. Assim me dirijo a meus prezados alunos, aplaudindo a sua atitude e estimulando o seu dedicado esforço, em fazerem ser publicado este jornalzinho. Bem compreendo o entusiasmo com que o jovem estudante prepara o seu artigo, e com que alegria verifica-o publicado. É que passei por essa fase, e guardo a melhor saudade do trabalho que empenhei com os colegas de minha época, e relembro os instantes de alegria com que líamos e relíamos o nosso pequeno jornal. Tenho acompanhado o interesse o e entusiasmo a que se vem entregando um grupo de ginasianos do meu Colégio, jovens decididos em manifestar os seus anseios de estudantes de ideal, por intermédio da palavra escrita e divulgada. Venho acompanhando o trabalho vontadoso em conseguirem alguns anúncios, a cooperação e a ajuda de professores, a colaboração de colegas e o esforço para o preparo material do jornalzinho. Daí bem se justificarem os meus parabéns. Os meus votos são por que o jornal se constitua o arauto dos sentimentos de uma mocidade sadia em inteligência e em coração. (Luiz Rêgo, Avante 31 de outubro de 1949).
Cabe lembrar que, neste caso, o jornal estudantil Avante também propagou a imagem
de intelectualidade da escola quando expressou, no seu primeiro editorial, que a produção do
jornal deveu-se ao desejo dos alunos da escola em ter um impresso, tão organizado quanto os
jornais de outras escolas e, também, pondo em destaque a figura do professor Luiz Rêgo,
então diretor do colégio e muito conhecido na cidade pela sua atuação na educação
maranhense.
Cabe destacar outros nomes que estão inseridos na intelectualidade maranhense da
segunda metade da década de 1940, conhecidos na cidade como a “Geração Maranhense de
45” 9: José Tribuzi Pinheiro Gomes (Bandeira Tribuzi); José de Ribamar Ferreira (Ferreira
9 Entende-se como grupo de intelectuais modernistas maranhenses aqueles que renovaram e vitalizaram o ambiente cultural estadual no pós-guerra, estando vinculados pelo pertencimento ao estado e por desenvolverem características comuns entre os seus membros. Na historiografia tradicional, essa geração foi geralmente representada como “portadora de um projeto coletivo para o Maranhão” e “somatório do gosto literário e da preocupação com os problemas econômicos e sociais” (sua nova tônica). Desse modo, a noção de “geração” exerce um papel importante no conjunto das imagens e representações sobre o Maranhão, delimitando socialmente um “dever simbólico” a todos e cada um, o dever de deixar o seu quinhão de contribuição às “glórias” da terra-mãe, a Atenas Brasileira. (COSTA, Wagner Cabral da. Sob o signo da morte: decadência, violência e tradição em terras do Maranhão. Campinas, SP: [s.n.], 2001. p 65).
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Gullar); José Carlos Lago Burnett (Lago Burnett); José Ribamar Ferreira de Araújo
Costa (José Sarney), Lucy Teixeira; Carlos Madeira, Domingos Vieira Filho; Luis Carlos
Bello Parga; Erasmo Dias; José Brasil; Franklin de Oliveira; Osvaldino Marques, entre
outros. Esse grupo costumava se encontrar na Movelaria Guanabara para realizarem os
debates para que pudesse traçar caminhos de intervenção intelectual na realidade
maranhense, participando de atividades literárias, escrevendo em revistas como A Ilha,
Malazarte, Legenda, etc. (Pinto, 1982). Logo, as ações modernistas, recebidas de forma
impactante em São Luís a partir da segunda metade década de 40 e nos anos 50, foram
interpretadas como:
...um sinal de mudança radical, afirmando-se como um paradigma de modernismo e modernidade nacional. Tal paradigma seria retomado e consolidado, cuidadosamente, pelo trabalho de muitos intelectuais, entre os quais os próprios modernistas paulistas e vários críticos literários atuantes nas décadas de 1950 e 1960, que estabeleceram uma história-memória do movimento modernista em todo país (GOMES, 1999, p. 12).
Sendo assim, embora seja necessário investigar o que viria a ser “moderno” ou
“modernismo” para a sociedade ludovicense, é nítida a articulação entre os estudantes e uma
rede de intelectuais da qual faziam parte diversos impressos, incluindo os estudantis. Cabe
aqui uma assertiva que pode ser generalizada para diferentes veículos de comunicação: “uma
revista é antes de tudo um lugar de fermentação intelectual e de relação afetiva, ao mesmo
tempo viveiro e espaço de sociabilidade (...)” (SIRINELLI, 2003, p. 249). As ideias eram
fermentadas em diversos veículos de comunicação, incluindo os jornais estudantis, ganhando
circulação e legitimidade.
Nessa perspectiva, foi constatado que, em cada um dos impressos investigados,
considerando as prescrições presentes no período em questão, são perceptíveis
singularidades que resultam dos “usos criativos” que os estudantes desenvolveram a partir da
apropriação de parâmetros que estavam postos no ideário escolanovista. A dinâmica de
organização associada à concepção e desenvolvimento de cada um dos jornais também revela
que, nesse processo, os estudantes, mesmo quando autônomos em relação a grêmios, clubes
ou entidades representativas, estiveram inseridos em uma rede e se articularam com sujeitos
do espaço extraescolar, possibilitando evidenciar uma relação entre imprensa
É dado sempre às chamadas “gerações do Maranhão” um lugar que definem como um dispositivo no campo político ou intelectual que pode converter trajetórias da história do Maranhão, como se estivesse reservado a essas “gerações”, autodefinidas e autoconsagradas em campos distintos, o papel de reabilitar o Maranhão segundo as representações dos agentes sociais sobre um passado. Ele é percebido como passado de apogeu, cuja modernidade poderia ser delimitada em elementos pensados a partir de padrões explicativos da questão do que é entendido como desenvolvimento. GONÇALVES, Maria de Fátima da Costa. A reinvenção do Maranhão dinástico. São Luís: Edições UFMA; PROIN(CS), 2000. p. 92.
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estudantil e intelectuais. Em alguns casos, foi constatada a expansão do impresso a
ponto dos jornais passarem a ter anunciantes, assinantes e circular fora dos muros da
escola. Tanto em Piracicaba como em São Luís os impressos também evocaram sua ligação
com uma tradição letrada e de excelência no campo da educação, na qual reiteravam a
caracterização das respectivas cidades como Atenas Paulista e Atenas Brasileira, já presente
na memória coletiva regional.
Fontes e Referências
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