Upload
vonga
View
217
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
1
Infinita Saudade Poemas & Textos
2
Copyright 2013 (1ª Edição): Maurélio Machado
Direitos desta edição reservados ao Autor da Obra.
A Editora não responde pelos conceitos emitidos pelo Autor.
Projeto Editorial e Diagramação: Antônio Ramos da Silva
Fotografias: Rose Bona
Revisão Técnica e Ortográfica: Antônio Ramos da Silva
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO
NA PUBLICAÇÃO (CIP)
ELABORADO PELO AUTOR
Machado, Maurélio.
Infinita Saudade. Machado Maurélio, Florianópolis, Bookess
Editora 2013.
1. Poemas e Textos 2. Poemas e Textos Brasileiro
3. Machado Maurélio 4. Titulo.
ISBN –
PERMISSÃO DO AUTOR PARA PRESCRIÇÃO E CITAÇÃO
Resguardados os direitos do Editor, o Autor concede
autorização de uso e transcrição de trechos desta Obra, desde
que seja solicitada autorização por escrito e que cite a fonte.
3
MAURÉLIO MACHADO
Infinita Saudade Poemas & Textos
1ª edição
4
5
DEDICATÓRIA
Esse livro é dedicado a todos aqueles que buscam no amor, o
refúgio da alma.
Aos Poetas e Poetisas que dorme sob as carícias de nosso
Deus.
Fotografando Rosas; sempre com perfumes nas mãos, e
bondade no coração.
Dedico o seguinte pensamento:
―Somos estrelinhas brilhantes de uma partitura composta por
Deus e tocada em uma Flauta de Bambu‖.
Antônio Ramos da Silva
6
7
Sumário
Dedicatória (05)
Sumário (07)
Apresentação (09)
A Infância é Bela (11)
Aquela Mulher (12)
Enamorados (12)
Castelo de Sonhos (13)
Despedida (14)
Tenho Medo (15)
Infinita Saudade (15)
Flagrante Delito (16)
Novo Amor (17)
Ocaso (18)
Receita de Amizade (19)
Será Amor? (20)
Versos que se Perderam (21)
Brumas (25)
Desejos (25)
Ele Chorou! (26)
Gente Inocente (27)
Inesquecíveis (28)
Minha Mãe (31)
Nosso Mundo Poeta (34)
Homenagem Póstuma (35)
Legado (38)
Madrugada do Medo (40)
Nem tudo que Reluz é Ouro (42)
Pequenos Negócios, Grandes Encrencas (44).
8
Trágica Ocorrência (47)
Família (49)
Interpretando os Sinais (51)
Leitura Proibida (54)
O Observador (56)
Para Sempre Amor (60)
Sem Explicações (63)
Silêncio (65)
A Última Música (67)
9
APRESENTAÇÃO
Infinita Saudade. É uma obra tatuada de amor à flor da pele,
uma composição de sentimentos com espasmos de loucura,
que se abriga nas poesias e textos vividos no cotidiano, pois
composições brilham em um canto de uma partitura familiar
composta por DEUS, e flauteada ao som da época. São versos e
palavras que em alguns momentos gritam de dor e clama o
prazer, noutras, ensina a viver. Letras que expressam a alma,
pura e verdadeira, confundem com o ser, mesmo lendo não
sou quem sou, compreendo, pois aqui não farei um dossiê, não
darei detalhes, creio que o tempo para quem cria e vive;
mesmo que desprovido, onde o universo não se ocupa, está
contido na razão, e em meio às dúvidas peço que faças uma
releitura, porque o poeta de verdade não tem medo de expor
sua vida em versos e reversos e assim Maurélio Machado se
contempla.
Sou massa do tudo e do nada ao mesmo tempo, sou um
viajante, ao mesmo tempo anjo que caminha ou flutua, tanto
perdido, outras se encontrando além do além, às vezes me
encontro com a brisa, às vezes me encontro no vento, que
tempestuoso brilha, sou assim meio sem compasso e sem
medo de ver acidar as palavras, falo o que sinto e penso.
Não leio o que as mãos dos homens escrevem, leio o que o
homem nele se inspira, sou somente a semente, um ser que
tenta capturar um pouco de energia que está a circundar. Eu
sou Maurélio!
Antônio Ramos da Silva
10
11
A INFÂNCIA É BELA
Na vida da princesa ―BELLA‖
São vários livros encantados,
Que para as crianças contadas
São as maravilhas mais belas.
Contos. Outros... Sempre a esperar.
Rapunzel aquela das tranças
Que foi presa no alto do castelo
Sempre vivenciando esperanças,
E pelo nobre príncipe encantado
Teve a única chance de escapar.
Triste sina da pobre Cinderela...
Sempre a limpar o chão do castelo
E as irmãs ilegítimas a gargalhar.
Mas aquele sapatinho de cristal
Permitiu com o príncipe se casar.
Branca de Neve e seu destino.
Pelas mãos da bruxa veio parar
Na floresta cheia de anãozinhos
Envenenada chegou a desmaiar,
Um beijo apaixonado a curar...
Felizes. Todas as belas princesas,
Outras estórias... Irreais irão contar.
Neste mundo intenso da fantasia
Vários curiosos mistérios a narrar
Infância bela. Vamos relembrar.
12
AQUELA MULHER
Surgiu tão de repente
Sentou-se ao meu lado
Num banco da rodoviária
Timidamente sorriu
Contou-me um pouco de sua vida
Perguntou sobre os meus dias
Não perguntei seu nome
Nem ela soube do meu
Instantes de doce calmaria
Ela se foi.
Eu voltei para casa
Em companhia da solidão.
ENAMORADOS
Captar os sentimentos
Da mulher apaixonada
Vivências de momentos.
No domingo ensolarado
Lindíssima bela amada
Sentindo tudo realizado.
Buscando suave frescor
Meiga criatura desejada
Satisfazemos nosso amor.
13
Castelo de sonhos
O castelo está ficando majestoso encantadoramente maravilhoso.
Em seus fundamentos usamos a sapiência, com humildade, às
pedras das paredes acrescentamos paciência, com humanidade.
Lindos os vitrais, com variadas violetas, multicoloridas borboletas...
O exterior do palácio, acabamentos com sobriedade, uma paixão,
necessidade...
Internamente, a luminosidade intensa, uma fé imensa...
Nas arandelas e lustres amarelados, nossos anseios passados...
Nos móveis, madeiras maciças, os tecidos em verde e marfim,
felicidades sem fim...
Nos salões, salas e saletas, cores em profusão, nossa ardente paixão...
No ambiente geral, utensílios e quadros de família, nossa espinhosa
trilha...
Cortinas, toalhas, almofada: rendadas e bordadas, nossas guerreiras
escaladas...
Na biblioteca livros de raros e numerosos autores, os conselheiros,
nossos senhores...
Nos extensos e verdejantes jardins, cravos, rosas, violetas e jasmins...
Nas paredes, belas e múltiplas heras, as lindas primaveras...
Árvores, frutos, pássaros de rara beleza, em nossa fortaleza...
O conjunto de toda a propriedade, nossa imensa saudade...
Na moradia... O ameno e confortante calor, de nosso amor...
Passeando por verdes gramados, entes queridos, amados...
Nossas crianças, esperadas esperança, filhos adorados, por quem
temos vivido!
14
DESPEDIDA
Lembro bem do último dia de verão
Dos finais das férias encantadoras
Que nós tínhamos tido até então.
Águas límpidas do mar espraiadas
Passeávamos na orla do balneário
Sorridentes, livres, de mãos dadas.
O colorido biquíni realçava a beleza
Do teu corpo perfeito e encantador
Excepcional obra-prima da natureza.
Todos os rapazes da praia te olhavam
Como se fora a bela musa de Ipanema.
Passeavas sorrindo. Eles se encantavam.
Chegara ao fim, era o dia da triste partida...
Ao mar, decidimos dar um último mergulho.
Deliciar-nos com o frescor na despedida.
Mergulhastes do alto da pedra do Arpoador
Fizestes ouvidos moucos quando eu te falei
Das rochas, das correntes, do mar ameaçador.
Só pude por instantes te desejar boa sorte
Não esperava a infausta e trágica ocorrência
Ver o mar avermelhado, tingido de morte.
15
TENHO MEDO
De acordar deste lindo sonho,
Inapelável mente retornar àquele
Lugar rude e tristonho
Sem o sol, estrelas ou luar.
De enfrentar a dura e fria realidade,
Ou de ser mais um na multidão
Adentrar no jogo fútil de vaidades
Martirizando meu próprio coração.
De amanhecer no descaminho
Perdido entre cinzas e horror
Vítima incauta do torvelinho
Só, sem esperança e sem amor!
INFINITA SAUDADE
Não sei se é mais triste ficar
Ou se bem mais tristonho partir.
Mas sozinho sem amor... Amar?
Sem ter ninguém para repartir?
16
FlaGRante DeLito
Alexandra a festinha promovia
Muitos amigos compareceram
Falatório, néon, sorrisos, alegria,
Desinibidos, os jovens se liberam...
Rolou samba, merengue e hip-hop.
Espumantes, cerveja e euforia.
Sertanejo, bolero e muito rock.
Estava declarada a mega folia
Alexandra que amava Antônio,
O viu dançando com a amiga Lia
Lia que era a namorada do Sitonio,
Rebolava e alegremente sorria.
E o garoto, o bem-amado Gedeão,
Brindava com os amigos no bar
Cambaleante ―colara‖ no balcão
Uma a mais, mais uma a brindar.
Enciumada, na sombria madrugada,
Alexandra categoricamente exigiu
Antônio me esclareça a ―parada‖
Senão vou-te mandar pra P.Q.P.
E foi bem assim que tudo ocorreu,
Antônio e Lia saiu para a sacada...
Envolvidos, um beijo lânguido se deu...
Flagrante delito azarou a namorada...
Ah!... Antônio ―se mandou‖ com a Lia.
Alexandra foi consolada por Gedeão
Sitonio ―mergulhou no copo‖ da nostalgia
E a festa? Acabou, só confusão!
17
NOVO AMOR
Ai que saudades que deu
Ai que saudades me dão...
Você desapareceu...
E eu fiquei a esperar.
Quando você voltou
Tinha outra em seu lugar.
Todo o romance mudou,
Não suportei a lhe esperar.
Digo-lhe meu ex-amor,
Sinto-me tão bem!
Nossa separação indolor,
Não se explica para ninguém.
Nosso caso teve um fim
Você sumiu, desapareceu.
Sem sequer precisar de mim,
Pé na estrada escafedeu.
Eu abandonado e sozinho
Procurei por outra mulher,
Que me desse um carinho
Pudesse-me compreender.
18
OCASO
Mentes em desalinho
Amores dispersos,
Cinzas de outrora.
Finjo viver azul.
E tu que és flor!
Lá fora os escárnios,
O cupido ri
Da armação tardia,
Sobre as almas gêmeas
Desajustadas.
Medo jorrando pelos poros,
A incerteza agonia,
A inquietude inunda,
Corpos macerados,
Vultos sorriem nas sombras,
Tristes destinos.
O sol faísca no poente...
Estrelas engolidas
Por plúmbeas nuvens,
Vidas... Vidas...
Não se ouvem os cantos
Das sereias, nem de pássaros,
Ou o ribombar das ondas escandalosas
Sobre inóspitos rochedos,
Sonhos inatingíveis.
Tomo as tuas em minhas mãos,
Talvez em outra vida, amor?
Lágrimas cobrem retinas,
Escasseia a luz,
Mudez, silêncio
Quebrado pelo baquear
De sonhos vãos.
19
RECEITA DE AMIZADE
Agir com toda honestidade
Sempre com muita calma
Praticar a solidariedade
Doar-se de corpo e alma.
Decência, justiça e humildade,
Carinho, paciência e calor.
Infalível à receita de amizade,
Siga no reto caminho do amor!
20
SERÁ AMOR?
Silencia a tempestade,
Ventos se acalmam,
Tormentas ao chão
Nosso amor é assim.
Tu tão distante,
Eu muito mais longe de ti...
O quê há de fato
Entre nossos sonhos?
Não mais nos amamos,
Sequer se encontramos,
Dois corpos separados
Corações enamorados,
Num delírio de ciúmes...
Subterfúgios amorosos,
Clandestinidade de delírios,
Fantasias eróticas ocultadas,
E a realidade... Nada... Nada?
O tempo soprou a juventude.
O vento carregou a ternura.
Flores com carinho semeadas,
Rigidez nas sombras do ataúde.
Sol resplandecendo na manhã,
Cantos de pássaros, Jaçanãs...
Os sonhos a se realizar nos lençóis,
Doce amada em entrega total
Nua, desejo dourado...
O corpo ao lado... Noite de emoções...
Atrações duradouras
Clímax final... Ideal?
Sabe-se não... Orgasmo total?
No auge das palavras soltas ao relento.
A paixão surgindo entre os seixos rolados,
Pela cascata límpida saltando do alto.
Amor, tempestade visceral.
21
VERSOS QUE SE PERDERAM
Trovas deveras engraçadas,
Doces poesias apaixonadas,
Alguns poemas grandiosos
E crônicas esplendorosas.
No átimo – o relampejo,
Alegrias, tristezas, desejos.
Espalharam-se pelos ventos;
Velhos amores. Sobejos.
Soltos nas asas do Condor
Enlaçados a nuvens celestiais,
Os cantos de um grande amor,
Largados em vácuos abissais.
Suaves brisas sopraram do norte
Aos ouvidos do poeta cantador;
Captou-as todas... Tremenda sorte,
Versos do âmago do semeador!
Na magia de raros momentos
Ingenuidade de um sofredor,
Sentir e partilhar sentimentos
Cá alma transbordante de amor.
Aposentado não tem moleza não...
Acordei bem cedinho
Direto para o banheiro,
Durante o chimarrão
Afago o gato companheiro.
Felino! Atentem os fofoqueiros...
E o café da manhã?
Trivial, fora o suco de maçã...
22
Ah! E um cigarrinho depois.
As eternas crianças
Meus filhos, esperanças.
Manda-se para o trabalho...
“Pô” e eu aqui na folga, “CARALHO”.
Não quero ser peso
Acho que não atrapalho.
A mulher chama,
Reclama
Como todas que conheço
Eu mereço...
Não quero que ninguém ouça
Nem tome conhecimento
No momento.
Ponho-me a lavar a louça.
E daí? Macho faz assim mesmo
Lava, passa cozinha e varre,
Tudo certinho,
Tudo limpinho.
Enquanto isso ouve música,
Da pesada
E compenso esta lavada...
Debruço-me na varanda,
O mundo me parece igual,
Tudo normal.
Mulherada desfilando na passarela
Os velhos de olho no bumbum delas.
Ainda brilha o sol,
Logo... Logo o arrebol.
Penso em ligar a televisão,
Mas que desperdício, não...
Opto pelo computador
Inspiração sem teor
23
Registro umas ilusões,
Encontro de corações,
Refúgio dos poetas
“POETEIROS”, estetas.
Pois bem,
Suaves momentos
E o relógio intervém...
―Vige‖, quase meio-dia.
Deixo parte desta alegria
Para alimentar as minhas feras
Tudo em paz e harmonia,
Família reunida,
A simples e boa comida,
E começa tudo outra vez.
Sou o único requisitado
E meio amuado,
Lavo a louça “TRAVEIZ”.
Volto mansinho à varanda
Olho os pássaros em revoadas
E nas calçadas
Vejo a mesma correria,
O dia a dia...
Acendo mais um cigarro
Fico a observar a fumaça,
A multidão passa
Não atrapalho ninguém,
Já fui neurótico também...
Pego dois livros:
Intercalo nas leituras,
Entre as fanfarrices do “JABOR”
E os versos escritos para o meu amor.
Alguns instantes depois
Retorno ao computador.
24
Só mais um cigarrinho,
Estou agora em meu ninho.
Rabisco alguns pensamentos
Caricaturas de poesia,
Meus solitários momentos
De mais um dia.
Anoitece.
A lua aparece
Cercada de estrelas,
É tão gratificante vê-las
Nesta suavidade a brilhar.
Ponho-me a sonhar,
Acendo mais um cigarro,
Abro uma cervejinha,
Jamais saio da linha,
Pois que o jamais não existe...
Estou um pouco triste
Um tanto sozinho...
Aliso os poucos cabelos,
Alinho-me na cadeira de balanço
E jamais me canso
De perscrutar o infinito;
É tudo tão bonito...
Os familiares assistem a Globo;
E o velho lobo fica a sonhar na varanda.
Pensa que a vida é bela e o amor é lindo
E “ABESTADO” sorrindo
Atira-se na cama.
Alguém o chama...
Amanhã... Ah! Amanhã,
Repete quase tudo de novo.
Eu, só com meus botões.
E os outros na televisão.
“PLIM... PLIM”.
25
BRUMAS
Um pranto silencioso
Num cantinho da praça
Sob a brusca neblina
Choro de alma vazia
Lembranças indeléveis
Dos beijos e abraços
Melodiosas primaveras
Lembranças do que era uma vez...
Lágrimas do que nunca mais...
Que fui fazer da minha vida?
Destruindo a sua para sempre?
DESEJOS
Nem aí para as imperfeições
Ditas de pecados mundanos
Que toda esta coisa se expluda
No colo dos inúteis e canalhas,
Mas que renasçam as flores
E belos sonhos então se realizem,
Que os pássaros voejem livres;
Sequem para sempre lágrimas
Da miséria, do desamor e solidão,
E os sorrisos retornem límpidos
No colorido flanar de borboletas,
Que o amor prevaleça na alma
Dos que tem amor no coração.
26
Ele Chorou!
Às cinco da manhã levantou-se,
Réstias de esperanças
Empertigou-se
Olhou as crianças e a mulher, dormitavam...
De mansinho, calado, saiu...
Sem café, estômago vazio...
Partiu
A busca de trabalho
De dignidade
Do pão de cada dia
Do agasalho
Da necessidade... Circulou
Pelos quatro cantos
Da selva de pedra
Desencantos
Nada encontrou...
Humilhado,
Sem tostão, esfomeado,
Sentou-se no banco da praça
E chorou...
Estrela
O poetinha feneceu
Do seu brilho na terra
Um corpo luminoso nasceu.
Longínqua da serra,
Brilha no universo
A cantarolar a liberdade
Em prosa e verso.
Uma estrela mutante.
Volatilidade, a poesia no ar...
27
GENTE INOCENTE
Na capela de paredes caiadas
Pequenos olhares sorridentes
Crianças do colégio ajoelhadas
Imaculadas almas penitentes!
POESIA
A poesia não é uma produção constante
Que se traduz
Pelo tempo empregado.
O verso é o momento,
Que reluz
Em lampejos de luz,
Harmonia,
Instantes de fantasia.
28
INESQUECÍVEIS
Lembrança porque não foges de mim?
Lembro um olhar, lembro um lugar...
Eu sou o último romântico,
Chove chuva, chove sem parar.
Canto e canto, meu canto está no ar,
Pois é proibido fumar!
As minhas mãos estão vazias,
As tuas mãos estão tão frias...
Boêmia sonhada noite de boêmia,
Aqui me tens de regresso, confesso:
Amei a namoradinha de um amigo meu.
―Besame, besame mucho‖,
Cantei... Cantei... Cantei ―Yesterday‖.
Saudades do beijo que nunca te dei,
Meu primeiro amor...
Amélia que era mulher de verdade,
Chega de saudade,
O barquinho vai, à tardinha cai,
No mar... O amor se esvai...
A cantar. A canção, a cantar...
Não. Não posso ficar nem mais um minuto com você,
Nos lençóis macios, meu benquerer...
29
Pois, ninguém me ama,
Ninguém me quer, mas eu sou teu homem,
Tu és a minha mulher.
Trazes-me o café na cama,
Mais que nada, chega de tristeza,
Pois as rosas, as rosas não falam,
Elas simplesmente exalam,
Perfume de gardênia,
Meu sorrir, minha pequena,
O Rio de Janeiro continua lindo,
Então, quero ver-te sorrindo,
Em nossa canção, nossos momentos,
Lágrima no escuro te amar
Para rua me levar.
Vem... Eu te amo, juro...
Bete balanço segue tua estrela,
Vamos juntos ver a banda passar.
Um sonho de primavera,
Para sempre contigo ficar.
Tudo que passamos agora não existe mais,
O deserto que atravessei,
Fera, ferida, formosa fera,
Mais perto de algum lugar.
Lembranças, um fio de cabelo no meu paletó,
Ai, este samba, samba de uma nota só.
30
Chora peito, me mata de uma vez,
Sonhar, sonhar contigo,
Um sonho que se sonha só...
Meu amigo, irmão camarada, querido,
Vamos curtir a festa
Vem vamos nesta,
Amor. Amar... Amor!
Em sonhos te beijo, deusa do asfalto, querida.
Meu benquerer foi no carnaval que passou,
Fui feliz, bem que eu te quis,
Vem vamos embora que esperar não é saber,
Cara de palhaço, roupa de palhaço,
Vai sonhar contigo por toda a vida...
Help! Não espera acontecer...
As rosas não falam, pois não aprendi a te esquecer.
Seria tão diferente, se a gente que a gente amasse,
Amasse um pouquinho a gente, seria tão diferente,
Ah! Seria tão diferente, seria tão diferente...
31
MINHA MÃE
Saudade de ti minha santa querida
E da poesia do jovem poeta sonhador
Um quase menino: Casimiro de Abreu,
De versos inesquecíveis, tempo fugidio.
Vocês nos deixaram um imenso vazio!
Oh! que saudades que tenho
Da aurora de minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
A sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!
Lembro-me de teu olhar enternecido
No teu nobre e tímido semblante
O enlevo, a dedicação, terno amor.
Dos doces sorrisos alvos e brandos
Daqueles meigos carinhos, quantos.
Como são belos os dias do despontar da existência!
— Respira a alma inocência como perfumes a flor;
O mar é — lago sereno,
O céu — um manto azulado,
O mundo — um sonho dourado,
A vida — um hino de amor.
Da infância à juventude fugaz
Foram passos imperceptíveis
E pouco tempo para te dedicar
Ah! Sinto no peito o amargor
Não ter te dedicado mais amor.
32
Que aurora, que sol, que vida,
Que noites de melodia naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar! O céu bordado d'estrelas,
A terra de aromas cheia as ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar.
Nas noites insones nos embalavas
Medicavas corpos doentios e febris
Tu davas o conforto, mal dormias,
Ao lado da cama, noites sombrias.
Oh! Dias da minha infância!
Oh! Meu céu de primavera!
Que doce à vida não era
Nessa risonha manhã!
Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã!
Naqueles velhos Natais de outrora
E nas festas familiares quanta alegria
Eras a maravilhosa estrela brilhante
Que transbordava ternura constante.
Livre filho das montanhas, e ia bem satisfeito,
Da camisa aberta o peito,
— Pés descalços, braços nus,
— Correndo pelas campinas
A roda das cachoeiras, atrás das asas ligeiras,
Das borboletas azuis!
Muito céleres as vidas transcorreram
Invernos, primaveras, outonos,
Verões nós filhos crescemos,
Esbranquiçados os teus nobres cabelos transformados.
33
Naqueles tempos ditosos ia colher as pitangas,
Subia a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo.
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar!
Doce graça. Tivestes a vontade Divina
Da felicidade de teus netos conhecerem,
Antes de tua triste e amarga partida
No instante de dor sorrias para a vida!
―Oh! Que saudades que tenho‖.
* Poesias: ―Mãe‖ de minha autoria entrelaçada com ―Meus oito anos‖.
Casimiro de Abreu.
34
NOSSO MUNDO POETA
Percebi no choro de tristeza,
A candura, a pureza, orvalhar,
Olhos de crianças,
Múltiplas e sadias... Esperanças.
Anúncio de melodiosa aurora, brilho,
Trinar de pássaros surge agora,
Homenagem aos florais,
Cintilantes e multicores vitrais.
Cantar, estribilhos sensíveis,
Plangentes versos incríveis,
Sonatas de harmoniosas canções,
Tanger de sinos, palpitar de corações.
Percebi nos sonhos, a singeleza,
Na amizade; unissonante nobreza
E, no poetar solitário e galante,
Deste único mundo fascinante,
Belezas em versos e prosas,
Maravilhas, ternuras harmoniosas,
Livres e sós lamentos do sofrer,
No cântico de amar e viver!
No alvorecer, este alegre mundo de poesia,
Enaltecedor de sensíveis alegrias,
À nossa terra, os versos,
Essência do esteta,
Ao nosso mundo,
O MUNDO POETA!
35
HOMENAGEM PÓSTUMA
Em 16/06/1958, morreram em trágico acidente aéreo em São José
dos Pinhais - PR o Governador de SC, Dr. Jorge Lacerda, além de
vários políticos e assessores do governo do estado.
Decorridos alguns meses da tragédia o então prefeito de São Bento
do Sul - SC chamou seu assessor/motorista e lhe disse:
Jovelino, vamos amanhã à Florianópolis fazer uma visita ao túmulo
do Dr. Jorge, providencie um saco de algodão e encha de terra,
pegue-a lá dos fundos da garagem.
- Mas para quê Senhor Prefeito?
Não lhe interessa, apenas faça o que eu mandar!
(Obedece quem tem juízo, manda quem pode – pensou o
funcionário).
Sem alternativas, tomou as providências que a Excelência
determinara.
Seguiram n'outro dia à Florianópolis, num Jeep Willis (único veículo
leve do patrimônio da prefeitura).
Após longa jornada por estradas empoeiradas, lá chegaram - suados,
em roupas amarelecidas e exaustos. Hospedaram-se num hotelzinho
simples e barato (sem estrelas) perto do antigo cais do porto.
Tomaram uma ducha fria e saíram em direção ao mercado municipal
para adquirirem junto à loja do Saul Saad ternos de linho branco,
baratinhos... Baratinhos...
36
Diga-me Senhor Turco quanto custa aquele dali? – o prefeito
apontava com o dedo rígido, como se estivesse atirando com uma
arma.
- Brá vozeis eu fazo baratinho, baratinho, só drinta e treis gruzeiro.
E se levar dois ternos, tem desconto? Aventurou-se o administrador
municipal.
- Mas gompadre, o brezo é guase de gusto, Saul não bode baixa
mais...
Está bem, vamos provar... Onde é o provador?
- Saul não dem brovador, brovem atraiz do balcão.
Dito e feito, após alguns minutos foram acertar as contas.
Quanto que devemos Senhor Turco?
- Zezenta e zeis gruzeiros, Saul não gobrou a embalagem...
O prefeito tirou do bolso do paletó o talão de cheques de sua conta
pessoal e ordenou ao subalterno que preenchesse o valor.
Jovelino começou a preencher, mas ―estaqueou‖.
- Senhor prefeito 66 é com S ou com Z?
E eu lá sei ―seo iguinorante‖? – vamos logo, preencha dois cheques
de trinta e três e fica resolvido.
Resolvida a questão ―interrogatória‖, lá se foram os cavalheiros ao
quarto do hotel.
Alinharam-se primeiro, passaram uma água de cheiro no cangote e
se dirigiram ao ponto de táxi nas proximidades.
- Para o cemitério municipal ordenou ao motorista!
Chegamos. Jovelino, rápido, pegue o saco e as velas!
- Olha aí é este o túmulo do querido Governador, apontou o prefeito.
37
De joelhos ante a lápide, rezaram por longos minutos. Levantaram-
se, acenderam meia dúzia de velas colocando-as frente à lápide.
Em tom solene o Prefeito apanhou o saco de terra, derramando-a
sobre o túmulo e proferiu as seguintes palavras: Querido
Governador Lacerda, lhe trago parte da terra que Vossa Excelência
tanto amou, e, desatou a chorar.
Jovelino, comovido, soluçava e chorava copiosamente.
Uma velhinha fazia a limpeza n'um túmulo próximo, observando-os.
Intrigada com o chororô daqueles homenzarrões metidos em ternos
de linho branco, indagou:
- Mas meus senhores, porque tanto choro se ela morreu há mais de
150 anos?
E o Prefeito: - Jovelino apague as velas, recolha a terra, choramos no
buraco errado...
* Há muito me narraram como caso verídico.
O nome do prefeito foi omitido e o do motorista e assessor é
fictício.
38
LEGADO
O sol escaldante rompe as trevas... Severino e Anastácia,
pobres anciões alquebrados seguem em direção ao roçado.
Vida dura a da terra dos Mandacarus, do Carcará, das
miserabilidades. Trabalham duro, sulcos vicejam profundos
nas faces lavadas pelo tempo.
Entardecer, a luminosidade é escassa, na estrada escura
acendem as velhas candeias, que titubeiam e lançam ao ocaso
suas trôpegas centelhas.
A noite parece murmurar e o silêncio se faz ouvir no farfalhar
das folhas secas pisoteadas pelas sandálias endurecidas pelo
cansaço.
Os filhos se foi há muito para o Sul, ansiado paraíso dos que
buscam por milagres mesmo que para alcançá-los tenham que
passar por labirintos escuros e sorver o fel de águas pútridas.
Jamais tiveram notícias de José, Severiano ou de Domingos.
Escafederam-se pelo mundo de Deus.
O casal vislumbra o casebre de lúgubre aparência: a riqueza
que ―Padim Cícero‖ lhes deixou, um belo legado...
Tênues raios de lua lambem o alpendre deteriorado. Apáticos,
derreados, largam os instrumentos que quase sempre lhes
proporcionaram o plantio da macaxeira, do feijão e de plantas
para sua caquética subsistência.
39
- Chegamos: Balbuciou Severino.
Na mão o velho e enegrecido lampião, fez-se a luz!
- Não temos lenha para o fogão resmungou entre dentes
caqueados a velha Anastácia. Pálida, sem cores, quase sem
vida numa súplica olhou para Severino.
- Vou até lá, velha, volto num instante!
- De posse do velho machado abriu a porta do casebre,
tropeçou na soleira.
- Meu Deus, quanto sangue, gritava desesperada Anastácia.
Noutro dia ouvia-se o badalar lastimoso dos sinos da ermida.
Não era um, mas dois caixões de defuntos frente ao altar da
pequena capela. Alguns anciões maltrapilhos pigarreavam nos
toscos bancos enegrecidos, crianças de olhos esbugalhados
tentavam enxergar as tristes passagens.
O caboclo autorizado pelo pároco da cidade próxima pediu
silêncio à minguada plateia, persignou-se e após encomendou
as almas dos desafortunados aos céus.
Ao final da celebração disse: ―do fundo do poço só brotam
saudade‖.
40
MADRUGADA DE MEDO
Ocorreu nos idos de 1974, numa cidade vizinha, onde eu
cursava o científico. Morava junto com os meus primos, Mike
e Omar, seus três filhos e uma irmã dele, Ivone, muito doente,
em cadeira de rodas, com graves problemas neurológicos, não
se comunicava e ficava o tempo todo com um olhar distante. O
médico afirmara que ela pouco ouvia e enxergava.
Eu estudava à noite, e, durante o dia elabora meus temas, lia,
escrevia algumas cartas e ouvia música, em alto e bom som...
Meus primos e as crianças; quase toda a tarde nos ausentava,
ocasiões em que eu ficava a cuidar da Ivone.
Preparava meus drinks (cuba libre) e ouvia música alta
(Rolling Stones, Johnny Cass, Beatles e rock da pesada).
Certo dia... Olhei para Ivone e percebi seu rosto iluminado,
um suave sorriso e lágrimas enchendo seus tristes olhos. Eram
as músicas, lembranças, saudades? Mas se ela não ouvia?
De vez enquanto eles me flagravam: "ô guri baixe o som para
não perturbar a doente"... Assim procedia, mas para nosso
desencanto, meu e da Ivone, perdia-se nestes momentos nosso
único elo de comunicação. No inverno daquele ano ela faleceu.
O velório foi na casa de uma tia. E, eu, designado a cuidar do
casarão, à noite, onde ela falecera. Lá estava quase uma da
madrugada, sem dormir, deitado, a pensar no ocorrido...
41
Quarto enorme, escuridão total, porta escancarada para o
corredor principal...
Um ruído estranho, andar sorrateiro pode ser ouvido, um
objeto se estatela frente à porta do quarto.
Repentinamente avistei aqueles olhos brilhantes, flamejantes a
se aproximarem da minha cama.
Suava frio, puxei o cobertor até o pescoço... Mal respirava,
nem piscava...
Estava inerte, gelado e aqueles olhos flamejantes lentamente se
aproximando.
Meu olho fixo neles, o grito preso na garganta, pensava
horrorizado: é chegada há minha hora!
E aí a ocorrência, um corpo se atirando sobre meu cobertor,
olhos faiscando, o gemido aterrorizante.
Mesmo paralisado consegui gritar histérico e num esforço
tremendo consegui acender a lâmpada do abajur, suava em
bicas.
Luz e finalmente o vi: trêmulo, olhar assustado, acuado no
parapeito da janela.
Era o gatinho angorá de minha prima...
Não consegui mais dormir.
Amanhecia uma chuva fina molhava a vidraça embaçada.
Fui acompanhar Ivone à sua derradeira morada!
42
NEM TUDO QUE RELUZ É OURO
Sentia-se a própria Garota de Ipanema desfilando na orla da
praia.
Em sua cabeça a música do Tom e do Vinicius:
―Olha que coisa mais linda mais cheia de graça é ela menina
que vem e que passa num doce balanço a caminho do mar.‖
Pouco se importava com a galera que se agitava toda ao seu
rebolativo passar...
As mulheres sentiam ciúmes e os homens eram tomados de
ardentes e inconfessáveis desejos por ela.
O último domingo do verão 2011, ah! Teria que curtir em
grande estilo.
Estendeu na areia a toalha estampada com a logomarca do
Flamengo, armou o guarda-sol rubro-negro e a cadeira de
praia.
Livrou-se num safanão da canga estampada que cobria o
corpanzil tatuado, deixando a mostra o fio dental dourado que
lhe cingia partes das partes íntimas.
Da enorme bolsa de palha esverdeada retirou o bronzeador
preparado com carinho por ela mesma, uma receita porreta
que a vizinha lhe ensinara.
43
De soslaio sondou a vizinhança... Fez sinal para a magrela que
estava babando desesperadamente na barraca ao lado.
- Moço, ai moço, por favor, me acuda? Preciso de sua ajuda.
Que foi minha princesa? – Dorival levantou prontificando-se
frente ao mulherão.
- Passa o bronzeador nas minhas costas e nas pernas? Pediu
Maria deitando-se teatralmente sobre a toalha rubro-negra.
É para já sorriu Dorival tomando das mãos da donzela o frasco
milagroso.
À medida que ia esfregando o líquido cremoso Dorival não
conseguia disfarçar a excitação e Maria suspirava suavemente
incitando cada vez mais o pobre vivente.
Ele suava frio, ela havia baixado a parte superior do biquíni e
ele agora já massageava seus seios, tocando levemente com os
dedos os endurecidos mamilos.
Seus amigos ao lado não compreenderam quando Dorival
passou repentinamente a agredi-la com violência, proferindo
palavras de baixo calão.
- Socorro gritava desesperada Maria, acudam que este cara é
louco...
Os vizinhos separaram os corpos, agora nus, entrelaçados na
areia e prontamente compreenderam sobre o surto que
acometera o bom amigo: EITA BICHONA DANADA. Nem
tudo que reluz é ouro.
44
PEQUENOS NEGÓCIOS, GRANDES ENCRENCAS.
Essa aconteceu aqui em São Bento do Sul - SC na década de 60.
Adinoran não era flor que se cheirasse, viu o vizinho desfazendo-se
de umas tralhas e vasculhando o lixo deparou-se com aquela caixa
cor-de-rosa.
Apanhou-a e seus olhos brilharam, em embalagens perfeitas lá
estavam: oito engrenagens niqueladas de tamanhos diversos para
bicicletas NSU OPEL.
Uma raridade valiosa pensou com seus botões carregando-a para
casa.
- Bom dia!
- Bom dia! Respondeu-lhe seu Otti da mecânica de bicicletas.
- Meu vizinho acaba de chegar da Alemanha e trouxe uma
encomenda que fiz a ele, coisa rara, infelizmente de pouca serventia
para mim.
Então pensei, porque não negociar com o seu Otti? São perfeitas para
aquela bicicleta antiga que ele tem exposta na vitrine da oficina.
Abriu a caixa e mostrou a mercadoria novinha em folha.
- Não valem nada: disse-lhe com franqueza o alemão, é peças
antigas, inservíveis, um lixo...
Desolado Adinoran fechou a caixa saindo aborrecido do
estabelecimento.
Logo a frente visualizou a lojinha do turco Alkmin.
45
Entrou.
-Bom dia!
-Yvi günler, respondeu o turco meio desconfiado.
- Alkmin meu amigão, meu vizinho acaba de chegar da Alemanha e
trouxe a encomenda que eu lhe fiz.
Abriu a caixa dizendo: são peças raras para bicicletas e sei que o seu
Otti da oficina em frente está precisando, infelizmente não me dou
bem com o alemão e pensei que talvez você pudesse negociar com
ele, são muito valiosas.
Os olhos do turco cintilaram de ganância. Mas valem algum
dinheiro? Perguntou com desdém...
- No mínimo uns Cr$ 4.500,00 (cruzeiros da década de 60), estou
negociando-as em troca de mercadoria.
Com muita lábia Adinoran conseguira sem muito esforço trocar as
engrenagens por algumas panelas e utensílios domésticos da lojinha
do patrício.
Alkmin não perdeu tempo e em poucos minutos lá estava frente ao
alemão da oficina.
- Bom dia seu Otti!
- Bom dia! Olhou para o turco de soslaio.
46
- Meu vizinho acaba de chegar da Alemanha e trouxe uma
encomenda que fiz a ele pensando no senhor, coisa rara, infelizmente
de pouca serventia para mim, veja que maravilha...
Seu Otti olhou para caixa e numa gargalhada exclamou: Nem vem
que não Tem, o Adinoran há pouco esteve aqui e lhe expliquei que
estas peças não valem nada. Nadica de nada scheisse (1).
Alkmin, puto da vida, saiu vociferando da mecânica.
Daquele dia em diante Adinoran passava em frente à loja do turco,
ligeirinho e do outro lado da calçada e por vezes ouvia-o
esbravejando: ―Adinoran filho de égua, safado, devolva mercadoria
para a lojinha".
******
(1) scheisse – merda em alemão
* fato verídico, preservados os verdadeiros nomes das pessoas.
47
TRÁGICA OCORRÊNCIA
O telefonema no meio da madrugada:
Alô, seu Tertuliano?
- Ele mesmo que fala, é quem, por favor?
Aqui é do 8ºDP, o Delegado de plantão, o senhor pode comparecer com
urgência? ...vou-lhe passar o endereço, anote, por favor, e venha rápido.
- Tudo bem, pode falar Doutor.
E assim foi... Tertuliano sequer acordou a esposa que dormia pesadamente.
Chegou trêmulo a delegacia, e se apresentou ao plantão que o encaminhou
ao delegado.
- Pois não Doutor: Sou o José Tertuliano, o senhor me ligou...
Sente-se bom homem, as notícias não são nada agradáveis...
- Mas o que aconteceu doutor? Fale-me, por favor, homem!
Seu filho chama-se Gerson, pois não? ...
- Sim doutor, mas o que ocorreu?
Sinto muito, ele foi assassinado há poucas horas no Complexo do Alemão.
A notícia foi como uma tapa na cara do pobre vivente.
- Senhor delegado. Nós moramos na zona leste, ele não poderia estar na
favela a estas horas, estava vindo para casa, da zona norte.
Mas ocorreu seu José, coisas acontecem abaixo das nuvens sem a nossa
vontade ou conhecimento.
- Mas o Gerson é um filho bom, trabalhador, quase nunca sai de casa de
noite, sempre nos fala aonde vai, não acredito que tenha acontecido algo
com ele.
Todos dizem o mesmo, mas vem cá meu amigo, vamos até o IML anexo à
delegacia.
José seguiu o delegado, pernas bamboleando, lágrimas aflorando aos olhos,
sensação de vazio e um ardume intenso e dolorido no estômago.
Por favor, entre disse-lhe o policial... Aqui temos o IML provisório: mas qual
mesmo o sobrenome de Gerson?
- Antunes Senhor... Sobrenome Antunes...
48
Ok. Por favor, vamos descobrir o corpo e o Senhor reconhecerá ou não como
seu filho, basta um sinal, combinado?
- Está bem! Balbuciou tragicamente o desesperado cidadão.
Descobriram o corpo – o estrago fora enorme, muitas balas alojadas em
regiões fatais.
E aí balbuciou o delegado... Reconhece?
- Não sei, minhas vistas estão turvas, mas não se parece com meu filho.
Mas como não? – Não é o Gerson Tertuliano seu filho?
- Esse é seu nome, mas aquele ali não é seu corpo! Tenho certeza e o alívio
em meu coração!
Sinto muito cara, nosso IML está cheio de corpos que ainda não foram
reconhecidos. Vem comigo, temos este aqui, que vou tirar da gaveta que tem
o mesmo sobrenome de vocês... Ranger do arquivo mórbido, cadáver já
esbranquiçado pela rigidez da morte, hei-o... Toda a esperança, as certezas
de um enorme engano correram como águas ligeiras das corredeiras para o
mar...
- Deus meu! Não pode Deus..., meu filho! ... Não posso crer... Tertuliano!
No lusco-fusco da madrugada uma figura grotesca Ziguezagueava pelas
calçadas esburacadas do bairro mal iluminado, olhos fixos num ponto
indefinido, a baba escorrendo lhe pelo canto da boca, quase em grunhidos
balbuciava palavras desconexas. No horizonte o céu acinzentado anunciava
mais um dia comum...
Histórias de violência se repetem diariamente principalmente nas grandes
metrópoles do mundo.
A violência destrói o que ela pretende defender: a dignidade da vida, a
liberdade do ser humano. (João Paulo II)
49
FAMÍLIA
Eles eram muito pobres e carentes.
O peixe que o pai pescava na hora do almoço ia para um prato único
e era dividido junto com o pirão (1) como se fosse uma pizza entre os
familiares.
Formavam um casal e quatro filhos, duas filhas e dois filhos.
Vorazes, devorava a delícia diária, sempre o mesmo cardápio.
Não conheciam talheres ou pratos mais sofisticados, diria até
comuns.
As encrencas (2) durante as refeições eram constantes, normais.
Saíam com fome da mesa, pois as refeições eram frugais.
Por vezes alguns se saiam bem, conseguiam ―roubar‖ parte da
comida da parte que caberia ao irmão ou irmã.
Como vizinho de praia, observava-os constantemente.
Achava tudo ridículo: a maneira dos seus comportamentos, a
aparente conformidade com a vida, à passividade com a situação,
mas eu era diferente, moço criado com mimos, fartura... Devoção!
As férias se foram, esqueci-me deles todos e de suas ―manias‖.
O tempo, o senhor de todas as coisas soprou lentamente, ao futuro,
novas ocorrências... Tive notícias deles.
O pai já velhinho falecera nos braços do único amor que lhe
acompanhou por toda a vida. A mãe falecera pouco tempo depois.
Os filhos, duas irmãs e dois irmãos?
50
Ivo era o mais velho. Hoje é conhecido na cidade de Joinville de Dr.
IVO, um especialista em gastronomia.
Helena, a moça de mais idade trabalha como assessora numa
multinacional em Curitiba.
Júlia a terceira filha é nutricionista numa grande rede de
supermercados.
Marcelo o caçula está sendo procurado pela polícia. Tem várias
passagens nas delegacias dos Estados do Sul por tráfico, homicídios,
tentativas de assassinatos, estupros e fraudes.
E a vida continua...
(1) Pirão - Papa grossa de farinha de mandioca misturada em água
ou em caldo.
(2) Encrencas – intriga, desordem.
51
INTERPRETANDO OS SINAIS
A qualquer momento poderá acontecer coincidências significativas.
Podemos estar mergulhados no nosso dia a dia quando
aparentemente sem aviso, um acontecimento casual nos chama a
atenção.
Aristides era um homem reservado, de poucas palavras e muitas
ações. De família humilde descendente de Açorianos, casou-se com
Maria Silva após desacertos com a primeira mulher.
Foi pai de dois meninos e uma menina no primeiro casamento e de
um menino no segundo.
Exercera a pesca como atividade principal durante muitos anos, após
entrou para a polícia civil, exercendo sua profissão de soldado, cabo
e sargento por diversas cidades do estado.
Galgando postos tornou-se delegado de polícia em Biguaçu, na
grande Florianópolis, sua cidade natal.
Em uma das centenas de ações, após troca de tiros com assaltantes
foragidos da penitenciária estadual alcançou êxito em prendê-los,
não sem consequências: fora ferido gravemente no peito, razão pela
qual se aposentou meses seguintes.
Muito tempo transcorrera daquele incidente quase fatal, mas
Aristides estava bem.
Sua principal diversão era assistir aos treinos do Figueirense – o
Furacão do Estreito no campo do modesto Biguaçu Futebol Clube,
cultivar sua pequena horta e tocar violão (na adolescência fora cantor
de baile na região).
52
Certo dia levantou-se, cortou a barba, tomou banho e colocou suas
roupas e calçados dominicais e achegando-se à filha mais velha,
vizinha de sua casa, solicitou-lhe a presença dos familiares para uma
reunião.
Lá estava aquele homem sério em seu terno preto, gravata cinza de
expressão enigmática...
Quase todo o familiar presente anunciou: Hoje vou morrer às três
horas da tarde!
- Mas, ó. Ó. Ó... Que brincadeira é essa coisa papai!
- Não acredito no que estou a ouvir balbuciavam outros.
O velho pirou de vez. - Pensaram.
Mas ele nem aí para os indignados.
Ditou-lhes detalhes de como queria a cerimônia fúnebre, a
destinação de seus parcos bens à família e demais preparos...
Após a indignação geral, o susto, mau agouro... Cada um de per si
tratou dos afazeres diários, nem aí para as "caduquices do velho‖.
Pois se ele estava bem de saúde, antes fora, pescador, policial e
delegado, agora aposentado, com certeza teria ainda muitos anos
para azucrinar o pessoal. Pelas três horas da tarde, como de costume,
a filha foi levar um cafezinho ao quarto do pai, meu avô paterno.
Estarrecida constatou: Ele falecera conforme previra na manhã. O
diagnóstico médico? - Morte natural.
*****
53
Anotações:
A grande maioria de nós já teve esta espécie de
experiência, descartando-a como sincronia,
relacionando os fatos apenas a uma grande
coincidência.
Precisamos interpretar os sinais dos sonhos e
pensamentos.
CARL JUNG, afirmava que a sincronia era um
princípio sem causa no universo, uma lei que
funcionava para mover os seres humanos na
direção de um crescimento maior de sua
consciência do livro: "A visão celestina‖ editora.
Objetiva Limitada, Rio de Janeiro, edição 2001.
54
LEITURA PROIBIDA
O garoto tinha lá os seus doze anos e pedradas de idade.
Seu maior defeito ou qualidade era a curiosidade.
Vasculhava gavetas das cômodas do quarto dos pais, dos
móveis das salas, da pequena biblioteca... Mexia em tudo.
Certa vez ao entrar dissimuladamente no escritório do pai sua
atenção fixou-se num livro sobre a escrivaninha.
O título? ―PORNO‖
Surrupiou em silêncio o exemplar e escondeu-se no fundo da
biblioteca da casa.
Sentou-se sobre o macio carpe.
Começou a folhear com a curiosidade que lhe queimava a
alma.
Nas páginas amareladas contos pornôs de personagens
héteros, gays e travestis.
Relatos de práticas bizarras e orgias regadas a muito álcool e
drogas pesadas, estórias estas ocorridas no Brasil e na Europa.
Leram por alguns minutos, suas mãos tremulavam e sua
sexualidade se manifestava.
Seu pênis estava ereto e levemente umedecido.
Não suportou, começou a se masturbar freneticamente.
O ranger da porta de acesso à biblioteca lhe soou como um
alarme, tarde demais...
A sua frente o pai, faces avermelhadas, olhos faiscantes,
rangendo os dentes.
Fred! Quem te autorizou a pegar este livro?
Pai, ele estava sobre a mesa e tive vontade de ler e conhecer
seu conteúdo.
Mas, precisava se masturbar e lambuzar o carpe deste jeito?
55
Fred recolheu o seu pequeno mastro, ora murcho e caiu em
prantos.
O pai, compreensivo sussurrou: desculpe-me, a culpa foi
minha, deixei o livro sobre a mesa.
56
O OBSERVADOR
Luzes fugazes; observo-as constantemente do alto das torres da
Matriz e constato que as estórias se repetem: a crescente degradação
destas frágeis almas, a rebeldia, os tabus do sexo, o desejo de
modificar a realidade.
O jovem casal acomodado no penúltimo degrau da escadaria da
igreja troca tímidas carícias. São estudantes de uma escola do
período noturno que gazeiam a última aula, geralmente as quartas e
sextas-feiras para namorar.
Passa por momentos difíceis, a moça, quase uma criança estava
embarrigada. São muito novos, pré-adolescentes e ainda não
contaram aos pais sobre a situação, têm muito medo diante do
imprevisível, da reação dos seus e da sociedade.
O local é ideal para refletirem e tomarem uma decisão: já pensaram
até em aborto, mas descartaram a hipótese, pois já curtem o filho que
em alguns meses nascerá com certeza já o aceitaram e irão enfrentar
todas as dificuldades que dai advirão.
Ouço seus lamentos e me compadeço com a situação que os
constrange. Quisera poder ajudá-los.
No local, ninguém os incomoda embora seja frequentado por
diversas tribos, turmas da pesada como a do PANCADÃO, da
Esquadrilha de fumaça e outras gangues da periferia.
Há um mútuo respeito entre eles com raros casos de bate-boca ou de
confrontos mais violentos, cada grupo marca o seu território.
57
Estão por aqui para curtir, extravasar desejos, intoxicar-se de amor,
som, álcool e drogas. Menosprezam o patrimônio público e religioso,
alvos constantes de depredações.
Pensam: a noite é uma criança, a vida é curta, objetivos futuros são
para os caretas, e que se danem os garis com a limpeza pelas
manhãs.
Não aprecio seus modos libertinos, no entanto os compreendo,
também tive percalços semelhantes em tempos idos. Os jovens
fascinam e surpreendem: anjos e demônios a perambular pelas
noites sombrias. Os odores da maconha e do crack contrastam com
o aroma dos incensos queimados na catedral.
Abusados, inconsequentes, rolam pelos gramados ao lado tentando
repetir o sonho utópico que alguns de seus ídolos viveram em
Woodstock.
Alguns destes filhos da mãe urinam pelas escadarias e defecam atrás
das moitas, sem nenhum constrangimento. Nauseia-me a rudeza
destas insanas atitudes. A polícia em rondas noturnas não os
incomoda, parece haver um acordo tácito entre eles: se não houver
depredações, não haverá abordagens.
No final das contas, eles estão defecando e andando para as
pequenas ocorrências, que se estrepem os vizinhos incomodados.
O casal de enamorados retira-se antes da meia-noite, cabisbaixa, na
consciência o fardo da irresponsável ignorância. Talvez não os aviste
mais por aqui.
Ouço o badalar dos sinos e constato o correr da ampulheta célere à
madrugada.
58
Nuvens plúmbeas cedem, aos poucos, espaços aos primeiros raios de
sol. Lentamente, tais quais Zumbis, os cambaleantes jovens deixam o
local, a maioria trôpega pelas calçadas, outros a acelerar suas motos e
carros. Mais uma noite de vigília, das sombras eu os espreito
constantemente. As cenas selvagens se repetirão nas próximas
noitadas.
Tréguas? Só aos domingos de manhã quando a posse da escadaria é
retomada pelos fiéis que se dirigem às missas das seis e nove horas.
Vejo poucos jovens entre eles. A maioria silenciosa é de senhores e
senhoras idosas e de algumas crianças que os acompanham. Sobem
lentamente os degraus, parando vez por outra para refazer o fôlego.
Ouço os primeiros acordes do órgão da igreja e o cântico do coral a
entoar os Ângelus acompanhados por tímidas vozes dos fiéis
assentados nos toscos bancos de madeira.
Os penitentes fazem fila diante dos confessionários onde decantarão
suas impurezas e deslizes, aguardando do supremo representante da
igreja a devida punição e o divino perdão.
Pausa. O silêncio quebrado pelos passos do homem de preto que se
dirige à sacristia. Breve tocar de sinetas. O padre se paramenta, os
cristãos ficam de pé e em harmonia todos se persignam.
O vozeirão do padre dá início à liturgia:
―Pelo sinal da Santa Cruz, livrai-nos Deus, Nosso Senhor, dos nossos
inimigos. Amém‖. A seguir dirige-se ao púlpito solicitando a todos
que se sentem para ouvir a parábola dominical. Entre rezas e
cânticos alguns frequentadores se compenetram outros nem tanto.
São de causar ojeriza os ares de santidade do casal decrépito frente
ao altar.
- Que se danem velhos babacas!
59
As freirinhas da irmandade de Nossa Senhora do Bom Parto me
emocionam com suas vozes celestiais, adoráveis cânticos.
- Ah! Que desperdício estas clausuras...
O menino, cristão recém-confirmado ora em silêncio no meio dos
colegas irrequietos. Semblante tristonho, olhos lacrimejantes, a
expressão facial é deveras comovente. Creio que lhe vem à mente a
miséria que cerca e aos seus e as orações são, certamente, apelos ao
Divino, por uma vida mais digna para todos.
A missa termina com a consagração e o troar dos sinos nas
gigantescas torres. Eles saem apressados espremendo-se entre as
portas da igreja, semblantes de bons samaritanos a descer as
escadarias ladeadas pelos painéis cerâmicos da Via Sacra. Eu os
conheço, a todos, a maioria gente de bem, mas alguns nem queiram
saber...
Na praça em frente, crianças se divertem correndo entre os labirintos
dos canteiros floridos, os idosos descansam nos bancos coloridos de
madeira e observam o movimento dos carros e transeuntes. Alguns
camelôs postados nas imediações fazem a alegria da petizada
vendendo balões coloridos, cata-ventos, pipocas, sorvetes e outras
guloseimas. Nos bares, o vozerio crescente de fregueses assíduos dos
domingos. Das casas próximas, os aromas da comida típica e o som
de um rádio a tocar velhas canções das terras de além-mar. Após o
meio-dia, a cidade emudece quase por completa, retomando um
ritmo mais lento à tardezinha. Não foi por livre arbítrio a escolha
deste lugar, sou uma espécie de degredado a purgar erros de vidas
pregressas, resquícios de existências passadas. O sol se põe, o
domingo esmorece e minha missão é observar e zelar por este
rebanho divergente das terras de Passaredo.
(Parte da Antologia do Livro: Vida, Motivos: Degraus).
60
PARA SEMPRE AMOR
O nevoeiro se dissipava na curva o rio, impossível prever as tramas
do destino. Uma luz delgada e insone aparecia nas brechas cinza da
neblina, o parto matinal da natureza.
O badalar de um campanário próximo anunciava os fins dos anos
sessenta. Novas esperanças, promessas seculares, a maioria que não
será cumprida se repetem em ladainhas na passagem do ano.
Marcelo, sob os efeitos caleidoscópicos do néon brindava à saúde do
noivado com Helena. Eles se conheceram a dois anos passados na Praia
do Sonho no litoral catarinense. A apaixonaram-se perdidamente. No luau
ele lhe declamara uma poesia que dizia mais ou menos assim:
―Um dia vou acreditar neste sonho, deixar que as águas me levem,
me deitem na praia, permitindo que o vento me embale até a
manhã de sol chegar‖. ―E, quando meus olhos se abrirem
encontrarão os teus anilados olhares a me sorrir.‖
Da bela fantasia romântica daquela noite surge a magia, a afeição e a
necessidade de estarem sempre juntos. Pouco tempo depois a data
marcante, inesquecível: a solenidade do matrimônio.
A comemoração com os familiares e amigos, sem pompas, mas
agradável selou o enlace dos enamorados.
Alguns anos mais... Nascem Alice e Fernando gêmeos univitelinos,
saudáveis e belos.
Nos semblantes dos pais e avós a expressão exultante:
- Obrigado meu Deus, são encantadores.
61
Mas, inexorável, o tempo passa a vida imperceptivelmente se esvai e
o destino se põe a pregar peças: algumas agradáveis outras não...
Helena fora buscar os exames com o mastologista (há tempos
constatara um nódulo na mama esquerda).
- Bom dia senhorita! Tenho consulta marcada com o Doutor Cássio.
- Um momento, ah!...Senhora Helena? Pode adentrar ao consultório,
por favor!
- Bom dia Doutor. Cássio, como tem passado?
- Bom dia Senhora Helena! Estou com o resultado de seus exames.
Sinto-lhe informar que as indicações foram positivas: carcinoma
maligno.
- Ai! Meu Deus...
- Se acalme, pela progressão terá de submeter-se a uma mastectomia
e posteriormente a várias sessões de quimioterapia.
Ela saiu arrasada do consultório.
Como transmitir a notícia a Marcelo?
Os olhos marejados de lágrimas, o envelope nas mãos trêmulas
dispensaram maiores explicações ao marido.
- Acalme-se querida, tudo dará certo, vamos proceder de acordo com
as indicações médicas e rezar muito para que Deus nos auxilie e dê
forças nesta amarga hora.
A intervenção cirúrgica ocorreu dias depois, tudo conforme prevista.
Helena iniciou as sessões de quimioterapia – uma das mais
importantes arma contra o câncer. Marcelo acompanhava-a a clínica
nestas ocasiões, pois após as sessões ela sentia-se muito mal, fraca,
enjoada e deprimida. E ainda tinha umas 25 para terminar parte do
tratamento.
62
Certo dia Marcelo ouviu uns gritos aterrorizantes vindos do
banheiro da suíte do casal. Abriu a porta e deparou-se com Helena
sentada no beiral da cama olhando fixamente para o espelho a sua
frente. Uma lâmina fria parecia-lhe ultrapassar a garganta: estava
mudo, petrificado!
- Helena querida! Disse ao recuperar as forças, tudo bem, vamos
vencer querida!
Ela havia perdido todos os cabelos e chorava copiosamente.
Marcelo deitou-a na cama, cobriu-a e disse: Meu bem! Preciso sair
um instante, volto em seguida, saiu...
Após algum tempo Helena ouviu o ranger da porta do quarto e
inquietou-se ao ver Marcelo.
- O que significa isto querido?
- É solidariedade que também chamo de amor!
Ele havia raspado todo o cabelo e abraçava-a com ternura.
* História verídica passada em nossa pequena cidade.
Os nomes dos personagens são fictícios.
63
SEM EXPLICAÇÕES
Nasceram na mesma época, com poucos meses de diferença.
Maria e Bruno eram vizinhos de apartamento no Bairro da
Urca no Rio de Janeiro. Frequentaram o mesmo jardim de
infância e dividiram os mesmos brinquedos. Cantavam as
singelas músicas de crianças e participava das lúdicas
brincadeiras comandadas pela professorinha Camila.
Os pais proporcionaram-lhes uma infância privilegiada num
local de beleza invejável.
O destino os abençoara grandiosamente e seus caminhos de
luz lhes indicavam um futuro de sucessos e felicidades.
Passados alguns anos ainda dividiam os sentimentos de
fraternal amizade: acampamentos, esportes, brincadeiras e
cinema.
Tratavam-se como bons irmãos bastavam um olhar para que
se compreendessem e admirassem-se mutuamente.
Já na adolescência, ela optou pela Faculdade de Letras, ele de
Direito. Maria estudava no mesmo bairro, o da Urca, Bruno na
Fundação Getúlio Vargas em Botafogo.
Neste período tiveram muito pouco contato, alguns encontros
casuais, um bate-papo informal e nos últimos encontros as
festas de formatura de ambos.
64
Já não havia aquele encantamento dos tempos de infância,
agora eles pertenciam a mundos completamente diferentes.
Ambos mudaram!
Ela tornara-se uma romântica incorrigível, uma bela mulher
em busca da felicidade.
Ele um homem muito ambicioso, violento e autoritário.
Muitos anos se passaram, ela tornou-se diretora de um colégio
importante no Rio e escrevia belas crônicas e poesias para um
semanário da cidade, ele cumpria pena por envolvimento em
assaltos, assassinatos e tráfico de drogas.
Os caminhos são diversos, nem sempre escolhemos os que nos
dignificam.
―O que vale na vida não é o ponto de partida, mas sim a firme
caminhada".
65
SILÊNCIO
Ele estava muito estressado,
Que dia, sós problemas...
Chegou até o rochedo da ilha arfando.
Observou por segundos aquela paisagem anilada,
Despiu-se, ficando só com a sunga negra.
Mergulhou do alto para encontrar-se com o mar.
Um arrepio percorreu lhe o corpo,
Água morna e relaxante.
Perspectiva diferente:
A vida marinha, calmaria, águas calmas, suave brisa.
No oceano, algas, peixes de diversas espécies e cores, conchas,
crustáceos e águas vivas.
Que belo mergulho! Num mundo encantador.
Pensara: quisera que ela estivesse aqui comigo, me sinto tão só
nesta imensidão!
Mas juro!
Guardarei todo o flash de meu olhar para relatar a
maravilhosa aventura sentida. As ondas estavam em calmaria
e o percurso do aventureiro marinho renovava as energias,
sentia-se perfeito.
66
Tarde agradável, o sol iluminando a praia semideserto, os
corpos seminus de jovens e donzelas, clima ameno, convite ao
amor!
Ela deveria estar lá aguardando por ele que fora mergulhar!
Não conseguia visualizá-la entre os banhistas.
Este tempo, Ah! Este eterno portador de falácias! Ela me disse
que viria.
O horizonte já se tingia de rubro e nada do esperado amor.
O sol resolvera mergulhar lentamente nas águas mornas do
Atlântico.
De repente o grito desvairado.
Correria, aglomeração.
Náuseas e vertigens e choro desconsolado...
Era ela boiando, sem vida entre as ondas que chicoteavam os
rochedos próximos.
Silêncio sepulcral.
67
A ÚLTIMA MÚSICA
Jéssica nossa única filha não se sentia bem nos últimos tempos.
Levada ao consultório médico, o Dr. Hans foi sincero: câncer
na laringe.
Um golpe tremendo para nós e Jéssica que era cantora.
Procuramos contornar a situação com palavras de esperanças e
bom humor, mas tudo nos parecia tão artificial, fora de
propósito, inútil. O tempo dando o aviso, nossa filha estava
definhando. Sem solução médica estávamos desesperados sem
ter um ponto de apoio.
Minha mulher acreditava em Cristo, eu era um ateu convicto
(tantas barbáries no mundo, injustiças, catástrofes etc... deixei
de acreditar).
Todos os recursos médicos foram tentados, a doença não dava
sinais de regressão. O desespero tomou conta dos familiares e
a esperança lançada na lata do lixo.
Chorávamos minha mulher e eu na calada da noite,
desesperados. A menina a cada dia mais pálida e fraca,
definitivo sopro de vida.
Bem me lembro, foi no início de primavera que eu falei ao
Senhor: ―leve-me e deixe-a‖ já que não podes-lhe conceder a
cura, não prolongue mais os sofrimentos. Chorei a noite inteira
acreditando no impossível: a cura.
68
Na manhã seguinte algo estranho ocorreu: Jéssica que não
conseguia levantar-se do leito estava à mesa da cozinha
tomando um café com leite. Fiquei perplexo: amor, que ótimo
vê-la aqui!
E ela: Pai fez um esforço tremendo para aqui estar e creio quê
valeu a pena, é meu derradeiro instante, um dos últimos
desejos.
Poucos minutos depois a encontrei sem vida aos pés da mesa
da cozinha...
Apenas 21 anos, fora a última música da menina dos olhos
celestes. Vestida de flores
Naquela manhã o sol nasceu tímido, a brisa apresentara-se
amena, árvores desfolhadas mostravam sua beleza e os Ipês
douravam a paisagem. Jacatirões e Manacás da Serra
floresciam em explosão, paparicados com os circulantes voos
de borboletas. Os campos floridos de Chuvas de Prata,
Margaridas, Begônias e Bocas de Leão encantavam o cenário
incomum.
Os viventes respiravam os leves ares da estação.
De a capelinha o badalar dos sinos anunciava a primeira santa
missa dominical. As andorinhas revoavam entre as torres da
casa de Deus e pousavam nos fios elétricos ainda umedecidos
pelo orvalho.
69
O padre devidamente paramentado dava início ao santo e
sagrado ofício.
Meus pensamentos entorpecidos levaram minha alma ao no
nosso quintal, brincando de roda contigo e com as crianças.
Em dado momento voltei à realidade:
―Olhai os lírios do campo, como são belos, eles não trabalham
e nem fiam. No entanto, nem Salomão em toda a sua glória se
vestiu como qualquer deles.‖
A mente bloqueou novamente e senti alguém me pegando
pela mão. Então ouvi as amargas palavras: - convido os fiéis a
conduzirem o caixão funerário à sua última morada.
Seguindo o féretro, as pessoas murmuravam frias e inaudíveis
orações.
O caixão foi colocado sob os travessões no túmulo.
O Padre persignou-se mais uma vez, e antes de encomendar o
corpo ao portal celeste, olhou para o alto. Num galho da
Araucária no alto do morro pousara um Sabiá... Seu canto
tristonho parecia dar-te o último adeus.
Por instantes os presentes ficaram extasiados com o cantar.
Logo a seguir o Padre prosseguiu com o ritual fúnebre.
Eu e nossos filhos estávamos velando por ti neste triste belo
dia. Estavas vestida de flores, ainda era inverno em nossos
corações, mas tu sorrias iluminada, envolta de primavera.