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INSTITUTO EDUCACIONAL ALFA APOSTILA BASES SÓCIOANTROPOLÓGICAS DOS DESCENDENTES AFRO/INDÍGENAS MINAS GERAIS 2013

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INSTITUTO EDUCACIONAL ALFA

APOSTILA

BASES SÓCIOANTROPOLÓGICAS DOS

DESCENDENTES AFRO/INDÍGENAS

MINAS GERAIS

2013

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INTRODUÇÃO À HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA

Exigências éticas, epistemológicas, pedagógicas desencadeadas pela implantação

das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e

Africana (BRASIL, 2004a, 2004b) instigam conhecer, esquadrinhar condições, contextos,

redes de relações em que as mulheres e os homens, ao longo da história da nação, vêm

aprendendo e ensinando a exercer cidadania.

Ciente das desigualdades e discriminações que atingem a população negra,

convicto de sua função mediadora entre o Estado, sistemas de ensino e demandas da

população na sua diversidade social, étnico-racial, o Conselho Nacional de Educação

(CNE) interpretou as determinações da Lei 10.639/2003 que introduziu, na Lei 9394/1996

das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a obrigatoriedade do ensino de história e

cultura Afro-Brasileira e Africana. E, ao orientar a execução das referidas determinações,

colocou, no cerne dos posicionamentos, recomendações, ordenamentos, a educação das

relações étnico-raciais. Desta forma, configurou política curricular que toca o âmago do

convívio, trocas e confrontos em que têm se educado os brasileiros de diferentes origens

étnico-raciais, particularmente descendentes de africanos e de europeus, com nítidas

desvantagens para os primeiros (HENRIQUES, 2001; JACCOUD, 2002; PAIXÃO, 2006).

As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino de História e Cultura Afro-

Brasileira e Africana, nos termos do Parecer CNE/CP 3/2004 (BRASIL, 2004a) e da

respectiva Resolução CNE/CP1/2004 (BRASIL, 2004b), estabelecem a educação das

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relações étnico-raciais, como um núcleo dos projetos político-pedagógicos das instituições

de ensino de diferentes graus e como um dos focos dos procedimentos e instrumentos

utilizados para sua avaliação e supervisão. Dizendo de outro modo, ao se avaliar a

qualidade das condições de oferta de educação por escolas e universidades, tem-se, entre

os quesitos a observar, a realização de atividades intencionalmente dirigidas à educação

das relações étnico-raciais.

Salienta, o referido texto legal, que o processo de educar as relações entre pessoas

de diferentes grupos étnico-raciais tem início com mudanças no modo de se dirigirem

umas às outras, a fim de que desde logo se rompam com sentimentos de inferioridade e

superioridade, se desconsiderem julgamentos fundamentados em preconceitos, deixem de

se aceitar posições hierárquicas forjadas em desigualdades raciais e sociais.

A educação das relações étnico-raciais tem por alvo a formação de cidadãos,

mulheres e homens empenhados em promover condições de igualdade no exercício de

direitos sociais, políticos, econômicos, dos direitos de ser, viver, pensar, próprios aos

diferentes pertencimentos étnico raciais e sociais. Em outras palavras, persegue o objetivo

precípuo de desencadear aprendizagens e ensinos em que se efetive participação no

espaço público. Isto é, em que se formem homens e mulheres comprometidos com e na

discussão de questões de interesse geral, sendo capazes de reconhecer e valorizar visões

de mundo, experiências históricas, contribuições dos diferentes povos que têm formado a

nação, bem como de negociar prioridades, coordenando diferentes interesses, propósitos,

desejos, além de propor políticas que contemplem efetivamente a todos.

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Por isso a educação das relações étnico-raciais deve ser conduzida, tendo-se como

referências os seguintes princípios (BRASIL, 2004b, p. 17): “consciência política e histórica

da diversidade; fortalecimento de identidades e de direitos; ações de combate ao racismo e

a discriminações”.

Para desencadear, executar, avaliar processo de educação das relações étnico-

raciais é preciso que se compreenda como processos de aprender e de ensinar têm se

constituído, entre nós, ao longo dos 507 anos de história de formação da nação.

É sabido que aprender-ensinar-aprender, processo em que mulheres e homens ao

longo de suas vidas fazem e refazem seus jeitos de ser, viver, pensar, os envolve em

trocas de significados com outras pessoas de diferentes faixas etárias, sexo, grupos

sociais e étnico-raciais, experiências de viver. Tratar, pois, de ensinos e de aprendizagens,

é tratar de identidades, de conhecimentos que se situam em contextos de culturas, de

choques e trocas entre jeitos de ser e viver, de relações de poder.

Nós, brasileiros oriundos de diferentes grupos étnico-raciais – indígenas, africanos,

europeus, asiáticos –, aprendemos a nos situar na sociedade, bem como o ensinamos a

outros e outras menos experientes, por meio de práticas sociais em que relações étnico-

raciais, sociais, pedagógicas nos acolhem, rejeitam ou querem modificar. Deste modo,

construímos nossas identidades – nacional, étnico-racial, pessoal –, apreendemos e

transmitimos visão de mundo que se expressa nos valores, posturas, atitudes que

assumimos, nos princípios que defendemos e ações que empreendemos.

Estes complexos processos, na nossa experiência brasileira, se desenvolvem com a

finalidade de manter ou superar projeto de nação racializado, no qual, conforme Seyferth

(2002, p. 36), não há espaço para negros, indígenas e mestiços, classificados ao longo dos

séculos, cada vez com maior sutileza, como pertencentes a raças bárbaras.

Contraditoriamente, salienta, a referida autora, “aspectos significativos de suas culturas

têm sido incorporados como expressões da cultura popular singular necessária ao princípio

da nacionalidade”. A nação brasileira se projetou branca conforme mostram proposições e

argumentos de Romero (1943) e Vianna (1938); por isto, explica Seyffert (2002, p. 37), a

migração europeia teve entre seus objetivos “o clareamento da população (que também

significa ocidentalização), supondo-se que, num processo histórico de mestiçagem fossem

prevalecer as características da ‘raça branca’”.

Fortalecida por políticas desta natureza, se estabelece, no Brasil, a branquitude

como norma inquestionável, da mesma maneira que em outras sociedades que tentam se

universalizar como brancas e, portanto, herdeiras do mundo ocidental europeu. É o que

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apontam estudos como os de Tatum (2003, p. 93), em relação à experiência estado

unidense, e os de MacDonald (2006), no que diz respeito à sul-africana. Neste sentido, de

acordo com Bento (2002, p. 48), ao discutir racialidade e produção de conhecimentos, em

nosso país:

É oportuno salientar que branquitude é o reconhecimento de que raça, como um

jogo de valores, experiências vividas e identificações afetivas, define a sociedade. Já raça

é uma condição de indivíduo e é a identidade que faz aparecer, mais do que qualquer

outra, a desigualdade humana.(grifo meu).

Estudos como os de Piza (2000, citado por BENTO, 2002, p. 49) e de Tatum (2003,

p. 93-95), realizados em contextos diferentes, são esclarecedores quando mostram que

pessoas brancas não costumam sentir-se pertencentes a um grupo étnico-racial, ou dão

pouca atenção para sua identidade racial, uma vez que ser e viver como brancos é a

norma aceita pela sociedade. Segundo Piza (2000, apud Bento 2002, p. 49), “aspectos da

atitude branca – neutra, não reconhecível, negada, expurgada do seu potencial político –

envolvem séculos de pensamentos e atos racistas”. E no entender de Bento (2002, p. 48),

não poderia ser diferente, pois “pessoas criadas numa sociedade racializada têm uma

visão de mundo marcada por essa racialidade”.

Por tal razão, entre outras, salienta MacDonald (2006, p. 50), embora os cidadãos,

com base em determinações legais sejam iguais na perspectiva do Estado, seguindo a

lógica liberal, podem ser desiguais na sociedade. É nesta perspectiva, segundo Schaub

(2002, p. 53), que se costuma incentivar alguns “desiguais” a educar-se em níveis

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superiores de escolarização, a fim de que possam fazer parte de “uma aristocracia no

interior da massa social democrática” e que se reforça, junto a eles, “a convicção de que

pertencem a uma classe de excelência e de grandeza humana”.

Os que se deixam assimilar por essas ideias, costumam expressar o sentimento de

que seus méritos e qualidades são proeminentes, se julgam mais persistentes e

esforçados do que a maioria dos integrantes do grupo social ou étnico-racial a que

pertencem. Assim, não é raro que oriundos de grupos marginalizados pela sociedade,

entre eles negros, qualifiquem pessoas de seus grupos de origem como preguiçosos,

incompetentes, sem ambição. Revelam, eles, desconhecer, ou conveniência em ignorar,

as estruturas e relações que mantêm as desigualdades sociais e étnico-raciais.

Como se vê, é complexa, mas não impossível, a tarefa de tratar de processos de

ensinar e de aprender em sociedades multiétnicas e pluriculturais, como a brasileira.

Abordá-los pedagogicamente ou como objeto de estudos, com competência e sensatez,

requer de nós, professores(as) e pesquisadores(as): não fazer vista grossa para as tensas

relações étnico-raciais que “naturalmente” integram o dia-a-dia de homens e mulheres

brasileiros; admitir, tomar conhecimento de que a sociedade brasileira projeta-se como

branca; ficar atento(a) para não reduzir a diversidade étnico-racial da população a

questões de ordem econômico-social e cultural; desconstruir a equivocada crença de que

vivemos numa democracia racial. E, para ter sucesso em tal empreendimento, há que ter

presente as tramas tecidas na história do ocidente que constituíram a sociedade

excludente, racista, discriminatória em que vivemos e que muitos insistem em conservar.

A sociedade brasileira sempre foi multicultural, desde os 1500, data que se

convencionou indicar como de início da organização social e política em que vivemos.

Esteve sempre formada por grupos étnico-raciais distintos, com cultura, língua e

organização social peculiares, como é o caso dos povos indígenas que por aqui viviam

quando da chegada dos portugueses e de outros povos vindos da Europa. Também os

escravizados, trazidos compulsoriamente para cá, provinham de diferentes nações e

culturas africanas conhecidas por pensamentos, tecnologias, conhecimentos, inclusive

acadêmicos, valiosos para toda a humanidade. No entanto, esta diversidade não foi e hoje

o é, com muita dificuldade, aceita. Fala-se e pensa-se como se a realidade fosse

meramente uma construção intelectual; como se as desigualdades e discriminações,

malgrado as denúncias e reivindicações de ações e movimentos sociais não passassem

de mera insatisfação de descontentes.

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Antes de prosseguir, cabe ilustrar, com texto didático divulgado em escola primária

nos anos 1920, um dos meios com que se foram formando e reforçando representações

negativas dos marginalizados pela sociedade, no caso os povos indígenas. O trecho citado

do livro Historia resumida do Brasil; programa completo do primário (1927) ensinava

palavras e atitudes preconceituosas que, em diferentes formas e conotações, ainda se

manifestam em nossa sociedade. Sobre os primeiros habitantes do Brasil, assim discorre o

mencionado livro:

O Brasil, antes de ser descoberto não tinha cultura de espécie alguma; não havia

villas nem cidades; estava pelo contrário todo coberto de matos e era habitado por

numerosas tribus de Índios selvagens (p. 7, grifo do livro)

Como se teria, enquanto sociedade, chegado a estas compreensões e

consequentes posturas?

As ideias e iniciativas dos europeus expansionistas, no século XVI, criaram um

sistema mundo cujos valores e objetivos, embora, é claro, com novos contornos, ainda

perduram nas relações entre pessoas, grupos sociais e étnico-raciais, entre nações

(DUSSEL, 2000). A visão segura de que eram superiores permitiu, aos europeus,

consolidar projetos de domínio de civilizações não europeias (LIAUZU, 1992). Por meio da

ocupação de terras, da exploração de riquezas, nos diferentes continentes, buscaram

transformar povos e suas culturas, em constructos europeus (RODNEY, 1981).

Em seus próprios territórios tratavam, os colonialistas, de convencer os demais

cidadãos quanto à inferioridade e até mesmo animalidade dos indígenas, africanos e

aborígenes. Entre outros recursos, valeram-se dos zoos humanos que, segundo Blanchard

(2001), foram comuns na França, Alemanha, Inglaterra, no final do século XIX. Em jardins

zoológicos, ao lado das jaulas dos animais, expunham-se “seres exóticos” que, no seu

pensar, “até assemelhavam-se a humanos”.

No que convencionaram chamar de colônias, tentaram, tendo-o conseguido até

certo ponto, desnortear os habitantes que lá estavam quando da sua chegada, fosse pelo

extermínio físico, fosse por meio da educação oferecida na nova instituição que

introduziram, a escola. Quanto às consequências da eliminação física de pessoas e

comunidades são contundentes as palavras do Chefe Riruako relativamente à experiência

de povos da Namíbia, durante a colonização alemã, no início do século XX:

Alguns pensam que somente os mortos foram vítimas. Quando crianças perdem

seus pais, esta perda não é sentida apenas pela família e comunidade, mas também pelas

gerações que se seguem. Quando um povo é deslocado de seus territórios, perde o

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sentido de segurança e de pertencimento. Sofre experiências de medo, ansiedade e perde

a esperança no futuro. Disto resulta privação de conhecimentos, objetivos e aspirações

que poderiam auxiliar a construir o futuro de prosperidade para suas famílias e

comunidades (KUAMBI, 2006, p. 47).

Nas escolas, o convencimento para adesão à visão de mundo, jeito de ser e viver do

colonizador era violenta. Segundo depoimentos ouvidos de pessoas que cursaram o

ensino fundamental entre os anos 1940-1960, no Mali e na Namíbia: as crianças malienses

tinham de cantar hinos em que repetiam ser “descendentes dos gauleses”; jovens

namíbios, ao dissertar sobre as características das raças humanas, se viam obrigados, se

desejassem aprovação, a salientar que os negros eram “ignorantes por natureza” (SILVA,

2003, p.190). Da mesma forma, na Nigéria, de acordo com Adeyinka Olanrewaju (2006),

nas escolas considerava-se uma ofensa, os alunos se manifestarem na língua de seus

povos e se o fizessem, eram punidos. Lamentável é constatar, salienta o referido autor,

que ainda hoje, em estabelecimentos do ensino secundário, a norma persiste. Estes fatos

levam a concluir que os tormentos do passado de escravidão e colonialismo ainda são

perceptíveis na África, conforme observa Kaké (1998, p. 27) ao defender a necessidade do

conhecimento e estudo dessas formas de relações entre povos.

DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A

EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS E PARA O

ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E

AFRICANA

O Conselho Nacional de Educação, pela Resolução CP/CNE nº 1, de 17 de junho

de 2004 (DOU nº 118, 22/6/2004, Seção 1, p. 11), instituiu diretrizes curriculares nacionais

para a educação das relações étnico-raciais e para o ensino de história e cultura afro-

brasileira e africana, a serem observadas pelas instituições, em todos os níveis e ensino,

em especial, por instituições que desenvolvem programas de formação inicial e continuada

de professores. A resolução tem por base o Parecer CP/CNE nº 3, de 10 de março de

2004, homologado pelo Ministro da Educação, em 19 de maio de 2004.

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As decisões do Conselho Nacional de Educação cumprem a Lei nº 10.639, de 9 de

janeiro de 2003 (DOU nº 8, 10/1/2002, Seção 1, p. 1), que altera a Lei nº 9.394, de 20 de

dezembro de 1996 (LDB), para tornar obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-

Brasileira na Educação Básica. A lei dispõe que o conteúdo programático incluirá o estudo

da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira

e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro

nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.

Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no

âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de

Literatura e História Brasileiras. Estabelece, ainda, o dia 20 de novembro como “Dia

Nacional da Consciência Negra". A resolução determina que as instituições de ensino

superior incluirão, nos conteúdos de disciplinas e atividades curriculares dos cursos que

ministram, a educação das relações étnico raciais, bem como o tratamento de questões e

temáticas que dizem respeito aos afrodescendentes, nos termos explicitados no citado

Parecer CP/CNE 3/2004.

O cumprimento das referidas diretrizes curriculares será considerado na avaliação

das condições de ensino e na avaliação institucional, realizadas em processos de

credenciamento e recredenciamento de instituições de ensino superior e na autorização,

reconhecimento e renovação de reconhecimento de cursos superiores.

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A educação das relações étnico-raciais tem por objetivo a divulgação e produção de

conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e valores que eduquem cidadãos quanto

à pluralidade étnico-racial, tornando-os capazes de interagir e de negociar objetivos

comuns que garantam, a todos, respeito aos direitos legais e valorização de identidade, na

busca da consolidação da democracia brasileira.

O ensino da história e cultura afro-brasileira e africana tem por objetivo o

reconhecimento e valorização da identidade, história e cultura dos afro-brasileiros, bem

como a garantia de reconhecimento e igualdade de valorização das raízes africanas da

nação brasileira, ao lado das indígenas, europeias, asiáticas.

Nas instituições de ensino superior, a educação das relações étnico-raciais e o

estudo de história e cultura afro-brasileira e história e cultura africana poderão ser

desenvolvidos em:

� disciplinas curriculares;

� atividades complementares;

� conteúdos de disciplinas curriculares;

� iniciação científica / práticas investigativas;

� extensão (cursos e serviços);

� atividades extracurriculares (por exemplo, no dia 20 de novembro, de cada ano,

programar evento que assinale o Dia Nacional da Consciência Negra).

Na organização curricular dos cursos superiores (licenciaturas) destinados à

formação de professores para a Educação Básica, a História e Cultura Afro-Brasileira deve

ser disciplina obrigatória, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e

História Brasileiras.

As instituições de ensino, em todos os níveis, devem promover ampla divulgação do

Parecer CP/CNE 3/2004 e da Resolução CP/CNE nº 1/2004.

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LEI Nº 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003

Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e

bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a

obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências.

O P R E S I D E N T E D A R E P Ú B L I C A

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos

seguintes arts. 26-A, 79-A e 79-B:

"Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e

particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.

§ 1º O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo

da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira

e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro

nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.

§ 2º Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados

no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de

Literatura e História Brasileiras.

§ 3º (VETADO)"

"Art. 79-A. (VETADO)"

"Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como 'Dia Nacional

da Consciência Negra'."

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182º da Independência e 115º da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque

Atos do Poder Legislativo

(DOU nº 8, 10/1/2002, Seção 1, p. 1)

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RESOLUÇÃO Nº 1, DE 17 DE JUNHO DE 2004.

Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-

Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.

O Presidente do Conselho Nacional de Educação, tendo em vista o disposto no art.

9º, § 2º, alínea “c”, da Lei nº 9.131, publicada em 25 de novembro de 1995, e com

fundamentação no Parecer CP/CNE 3/2004, de 10 de março de 2004, homologado pelo

Ministro da Educação em 19 de maio de 2004, e que a este se integra, resolve:

Art. 1° A presente Resolução institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a

Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-

Brasileira e Africana, a serem observadas pelas Instituições de ensino, que atuam nos

níveis e modalidades da Educação Brasileira e, em especial, por Instituições que

desenvolvem programas de formação inicial e continuada de professores.

§ 1° As Instituições de Ensino Superior incluirão nos conteúdos de disciplinas e

atividades curriculares dos cursos que ministram, a Educação das Relações Étnico-

Raciais, bem como o tratamento de questões e temáticas que dizem respeito aos

afrodescendentes, nos termos explicitados no Parecer CP/CNE 3/2004.

§ 2° O cumprimento das referidas Diretrizes Curriculares, por parte das instituições

de ensino, será considerado na avaliação das condições de funcionamento do

estabelecimento.

Art. 2° As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-

Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africanas constituem-se de

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orientações, princípios e fundamentos para o planejamento, execução e avaliação da

Educação, e têm por meta, promover a educação de cidadãos atuantes e conscientes no

seio da sociedade multicultural e pluriétnica do Brasil, buscando relações étnico-sociais

positivas, rumo à construção de nação democrática.

§ 1° A Educação das Relações Étnico-Raciais tem por objetivo a divulgação e

produção de conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e valores que eduquem

cidadãos quanto à pluralidade étnico-racial, tornando-os capazes de interagir e de negociar

objetivos comuns que garantam, a todos, respeito aos direitos legais e valorização de

identidade, na busca da consolidação da democracia brasileira.

§ 2º O Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana tem por objetivo o

reconhecimento e valorização da identidade, história e cultura dos afro-brasileiros, bem

como a garantia de reconhecimento e igualdade de valorização das raízes africanas da

nação brasileira, ao lado das indígenas, europeias, asiáticas.

§ 3º Caberá aos conselhos de Educação dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios desenvolver as Diretrizes Curriculares Nacionais instituídas por esta Resolução,

dentro do regime de colaboração e da autonomia de entes federativos e seus respectivos

sistemas.

Art. 3° A Educação das Relações Étnico-Raciais e o estudo de História e Cultura

Afro-Brasileira, e História e Cultura Africana será desenvolvida por meio de conteúdos,

competências, atitudes e valores, a serem estabelecidos pelas Instituições de ensino e

seus professores, com o apoio e supervisão dos sistemas de ensino, entidades

mantenedoras e coordenações pedagógicas, atendidas as indicações, recomendações e

diretrizes explicitadas no Parecer CP/CNE 3/2004.

§ 1° Os sistemas de ensino e as entidades mantenedoras incentivarão e criarão

condições materiais e financeiras, assim como proverão as escolas, professores e alunos,

de material bibliográfico e de outros materiais didáticos necessários para a educação

tratada no caput deste artigo.

§ 2° As coordenações pedagógicas promoverão o aprofundamento de estudos, para

que os professores concebam e desenvolvam unidades de estudos, projetos e programas,

abrangendo os diferentes componentes curriculares.

§ 3° O ensino sistemático de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na

Educação Básica, nos termos da Lei 10.639/2003, refere-se, em especial, aos

componentes curriculares de Educação Artística, Literatura e História do Brasil.

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§ 4° Os sistemas de ensino incentivarão pesquisas sobre processos educativos

orientados por valores, visões de mundo, conhecimentos afro-brasileiros, ao lado de

pesquisas de mesma natureza junto aos povos indígenas, com o objetivo de ampliação e

fortalecimento de bases teóricas para a educação brasileira.

Art. 4° Os sistemas e os estabelecimentos de ensino poderão estabelecer canais de

comunicação com grupos do Movimento Negro, grupos culturais negros, instituições

formadoras de professores, núcleos de estudos e pesquisas, como os Núcleos de Estudos

Afro-Brasileiros, com a finalidade de buscar subsídios e trocar experiências para planos

institucionais, planos pedagógicos e projetos de ensino.

Art. 5º Os sistemas de ensino tomarão providências no sentido de garantir o direito

de alunos afrodescendentes de frequentarem estabelecimentos de ensino de qualidade,

que contenham instalações e equipamentos sólidos e atualizados, em cursos ministrados

por professores competentes no domínio de conteúdos de ensino e comprometidos com a

educação de negros e não negros, sendo capazes de corrigir posturas, atitudes, palavras

que impliquem desrespeito e discriminação.

Art. 6° Os órgãos colegiados dos estabelecimentos de ensino, em suas finalidades,

responsabilidades e tarefas, incluirão o exame e encaminhamento de solução para

situações de discriminação, buscando-se criar situações educativas para o

reconhecimento, valorização e respeito da diversidade.

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Parágrafo único. Os casos que caracterizem racismo serão tratados como crimes

imprescritíveis e inafiançáveis, conforme prevê o Art. 5º, XLII da Constituição Federal de

1988.

Art. 7º Os sistemas de ensino orientarão e supervisionarão a elaboração e edição de

livros e outros materiais didáticos, em atendimento ao disposto no Parecer CP/CNE

3/2004.

Art. 8º Os sistemas de ensino promoverão ampla divulgação do Parecer CP/CNE

3/2004 e dessa Resolução, em atividades periódicas, com a participação das redes das

escolas públicas e privadas, de exposição, avaliação e divulgação dos êxitos e dificuldades

do ensino e aprendizagens de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e da Educação

das Relações Étnico-Raciais.

§ 1° Os resultados obtidos com as atividades mencionadas no caput deste artigo

serão comunicados de forma detalhada ao Ministério da Educação, à Secretaria Especial

de Promoção da Igualdade Racial, ao Conselho Nacional de Educação e aos respectivos

Conselhos Estaduais e Municipais de Educação, para que encaminhem providências, que

forem requeridas.(*)

Art. 9º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as

disposições em contrário.

ROBERTO CLÁUDIO FROTA BEZERRA

(DOU Nº 118, 22/6/2004, SEÇÃO 1, P. 11)

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

INTERESSADO: Conselho Nacional de Educação / DF.

ASSUNTO: Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-

Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.

CONSELHEIROS: Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (Relatora), Carlos Roberto

Jamil Cury, Francisca Novantino Pinto de Ângelo e Marília Ancona-Lopez.

PROCESSO Nº: 23001.000215/2002-96.

PARECER CP/CNE Nº: 3/2004 (*),APROVADO EM: 10/3/2004.

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RELATÓRIO

Este Parecer visa a atender os propósitos expressos na Indicação CNE/CP 06/2002,

bem como regulamentar a alteração trazida à Lei 9394/96 de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional, pela Lei 10639/2003 que estabelece a obrigatoriedade do ensino de

História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na Educação Básica. Desta forma, busca

cumprir o estabelecido na Constituição Federal nos seus Art. 5º, I, Art. 210, Art. 206, I, § 1°

do Art. 242, Art. 215 e Art. 216, bem como nos Art. 26, 26 A e 79 B na Lei 9.394/96 de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que asseguram o direito à igualdade de

condições de vida e de cidadania, assim como garantem igual direito às histórias e culturas

que compõem a nação brasileira, além do direito de acesso às diferentes fontes da cultura

nacional a todos brasileiros.

Juntam-se a preceitos analógicos os Art. 26 e 26 A da LDB, como os das

Constituições Estaduais da Bahia (Art. 175, IV e 288), do Rio de Janeiro (Art. 303), de

Alagoas (Art. 253), assim como de Leis Orgânicas, tais como a de Recife (Art. 138), de

Belo Horizonte (Art. 182, VI), a do Rio de Janeiro (Art. 321, VIII), além de leis ordinárias,

como lei Municipal nº 7.685, de 17 de janeiro de 1994, de Belém, a Lei Municipal nº 2.251,

de 30 de novembro de 1994, de Aracaju e a Lei Municipal nº 11.973, de 4 de janeiro de

1996, de São Paulo.

Junta-se, também, ao disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.096,

de 13 de junho de 1990), bem como no Plano Nacional de Educação (Lei 10.172, de 9 de

janeiro de 2001).

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Todos estes dispositivos legais, bem como reivindicações e propostas do

Movimento Negro ao longo do século XX, apontam para a necessidade de diretrizes que

orientem a formulação de projetos empenhados na valorização da história e cultura dos

afro-brasileiros e dos africanos, assim como comprometidos com a de educação de

relações étnico-raciais positivas, a que tais conteúdos devem conduzir.

Destina-se, o parecer, aos administradores dos sistemas de ensino, de

mantenedoras de estabelecimentos de ensino, aos estabelecimentos de ensino, seus

professores e a todos implicados na elaboração, execução, avaliação de programas de

interesse educacional, de planos institucionais, pedagógicos e de ensino. Destina-se,

também, às famílias dos estudantes, a eles próprios e a todos os cidadãos comprometidos

com a educação dos brasileiros, para nele buscarem orientações, quando pretenderem

dialogar com os sistemas de ensino, escolas e educadores, no que diz respeito às relações

étnico-raciais, ao reconhecimento e valorização da história e cultura dos afro-brasileiros, à

diversidade da nação brasileira, ao igual direito à educação de qualidade, isto é, não

apenas direito ao estudo, mas também à formação para a cidadania responsável pela

construção de uma sociedade justa e democrática.

Em vista disso, foi feita consulta sobre as questões objeto deste parecer, por meio

de questionário encaminhado a grupos do Movimento Negro, a militantes individualmente,

aos Conselhos Estaduais e Municipais de Educação, a professores que vêm

desenvolvendo trabalhos que abordam a questão racial, a pais de alunos, enfim a cidadãos

empenhados com a construção de uma sociedade justa, independentemente de seu

pertencimento racial. Encaminharam-se em torno de 1000 questionários e o responderam

individualmente ou em grupo 250 mulheres e homens, entre (1) Belém – Lei Municipal nº

7.6985, de 17 de janeiro de 1994, que “Dispõe sobre a inclusão, no currículo escolar da

Rede Municipal de Ensino, na disciplina História, de conteúdo relativo ao estudo da Raça

Negra na formação sociocultural brasileira e dá outras providências”

Aracaju – Lei Municipal nº 2.251, de 30 de novembro de 1994, que “Dispõe sobre a

inclusão, no currículo escolar da rede municipal de ensino de 1º e 2º graus, conteúdos

programáticos relativos ao estudo da Raça Negra na formação sociocultural brasileira e dá

outras providências.

São Paulo – Lei Municipal nº 11.973, de 4 de janeiro de 1996, que “Dispõe sobre a

introdução nos currículos das escolas municipais de 1º e 2º graus de estudos contra a

discriminação” crianças e adultos, com diferentes níveis de escolarização. Suas respostas

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mostraram a importância de se tratarem problemas, dificuldades, dúvidas, antes mesmo de

o parecer traçar orientações, indicações, normas.

Questões introdutórias

O parecer procura oferecer uma resposta, entre outras, na área da educação, à

demanda da população afrodescendente, no sentido de políticas de ações afirmativas, isto

é, de políticas de reparações, e de reconhecimento e valorização de sua história, cultura,

identidade. Trata, ele, de política curricular, fundada em dimensões históricas, sociais,

antropológicas oriundas da realidade brasileira, e busca combater o racismo e as

discriminações que atingem particularmente os negros.

Nesta perspectiva, propõe à divulgação e produção de conhecimentos, a formação

de atitudes, posturas e valores que eduquem cidadãos orgulhosos de seu pertencimento

étnico-racial - descendentes de africanos, povos indígenas, descendentes de europeus, de

asiáticos – para interagirem na construção de uma nação democrática, em que todos,

igualmente, tenham seus direitos garantidos e sua identidade valorizada.

É importante salientar que tais políticas têm como meta o direito dos negros se

reconhecerem na cultura nacional, expressarem visões de mundo próprias, manifestarem

com autonomia, individual e coletiva, seus pensamentos. É necessário sublinhar que tais

políticas têm, também, como meta o direito dos negros, assim como de todos cidadãos

brasileiros, cursarem cada um dos níveis de ensino, em escolas devidamente instaladas e

equipadas, orientados por professores qualificados para o ensino das diferentes áreas de

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conhecimentos; com formação para lidar com as tensas relações produzidas pelo racismo

e discriminações, sensíveis e capazes de conduzir a reeducação das relações entre

diferentes grupos étnico-raciais, ou seja, entre descendentes de africanos, de europeus, de

asiáticos, e povos indígenas. Estas condições materiais das escolas e de formação de

professores são indispensáveis para uma educação de qualidade, para todos, assim como

o é o reconhecimento e valorização da história, cultura e identidade dos descendentes de

africanos.

Políticas de Reparações, de Reconhecimento e Valorização, de Ações

Afirmativas

A demanda por reparações visa a que o Estado e a sociedade tomem medidas para

ressarcir os descendentes de africanos negros, dos danos psicológicos, materiais, sociais,

políticos e educacionais sofridos sob o regime escravista, bem como em virtude das

políticas explícitas ou tácitas de branqueamento da população, de manutenção de

privilégios exclusivos para grupos com poder de governar e de influir na formulação de

políticas, no pós-abolição. Visa também a que tais medidas se concretizem em iniciativas

de combate ao racismo e a toda sorte de discriminações.

Cabe ao Estado promover e incentivar políticas de reparações, no que cumpre ao

disposto na Constituição Federal, Art. 205, que assinala o dever do Estado de garantir

indistintamente, por meio da educação, iguais direitos para o pleno desenvolvimento de

todos e de cada um, enquanto pessoa, cidadão ou profissional. Sem a intervenção do

Estado, os postos à margem, entre eles os afro-brasileiros, dificilmente, e as estatísticas o

mostram sem deixar dúvidas, romperão o sistema meritocrático que agrava desigualdades

e gera injustiça, ao reger-se por critérios de exclusão, fundados em preconceitos e

manutenção de privilégios para os sempre privilegiados.

Políticas de reparações voltadas para a educação dos negros devem oferecer

garantias a essa população de ingresso, permanência e sucesso na educação escolar, de

valorização do patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro, de aquisição das competências

e dos conhecimentos tidos como indispensáveis para continuidade nos estudos, de

condições para alcançar todos os requisitos tendo em vista a conclusão de cada um dos

níveis de ensino, bem como para atuar como cidadãos responsáveis e participantes, além

de desempenharem com qualificação uma profissão.

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A demanda da comunidade afro-brasileira por reconhecimento, valorização e

afirmação de direitos, no que diz respeito à educação, passou a ser particularmente

apoiada com a promulgação da Lei 10639/2003, que alterou a Lei 9394/1996,

estabelecendo a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileiras e africanas.

Reconhecimento implica justiça e iguais direitos sociais, civis, culturais e

econômicos, bem como valorização da diversidade daquilo que distingue os negros dos

outros grupos que compõem a população brasileira. E isto requer mudança nos discursos,

raciocínios, lógicas, gestos, posturas, modo de tratar as pessoas negras. Requer também

que se conheça a sua história e cultura apresentadas, explicadas, buscando-se

especificamente desconstruir o mito da democracia racial na sociedade brasileira; mito

este que difunde a crença de que, se os negros não atingem os mesmos patamares que os

não negros, é por falta de competência ou de interesse, desconsiderando as

desigualdades seculares que a estrutura social hierárquica cria com prejuízos para os

negros.

Reconhecimento requer a adoção de políticas educacionais e de estratégias

pedagógicas de valorização da diversidade, a fim de superar a desigualdade étnico-racial

presente na educação escolar brasileira, nos diferentes níveis de ensino.

Reconhecer exige que se questionem relações étnico-raciais baseadas em

preconceitos que desqualificam os negros e salientam estereótipos depreciativos, palavras

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e atitudes que, velada ou explicitamente violentas, expressam sentimentos de

superioridade em relação aos negros, próprios de uma sociedade hierárquica e desigual.

Reconhecer é também valorizar, divulgar e respeitar os processos históricos de

resistência negra desencadeados pelos africanos escravizados no Brasil e por seus

descendentes na contemporaneidade, desde as formas individuais até as coletivas.

Reconhecer exige a valorização e respeito às pessoas negras, à sua descendência

africana, sua cultura e história. Significa buscar, compreender seus valores e lutas, ser

sensível ao sofrimento causado por tantas formas de desqualificação: apelidos

depreciativos, brincadeiras, piadas de mau gosto sugerindo incapacidade, ridicularizando

seus traços físicos, a textura de seus cabelos, fazendo pouco das religiões de raiz africana.

Implica criar condições para que os estudantes negros não sejam rejeitados em virtude da

cor da sua pele, menosprezados em virtude de seus antepassados terem sido explorados

como escravos, não sejam desencorajados de prosseguir estudos, de estudar questões

que dizem respeito à comunidade negra.

Reconhecer exige que os estabelecimentos de ensino, frequentados em sua maioria

por população negra, contem com instalações e equipamentos sólidos, atualizados, com

professores competentes no domínio dos conteúdos de ensino, comprometidos com a

educação de negros e brancos, no sentido de que venham a relacionar-se com respeito,

sendo capazes de corrigir posturas, atitudes e palavras que impliquem desrespeito e

discriminação.

Políticas de reparações e de reconhecimento formarão programas de ações

afirmativas, isto é, conjuntos de ações políticas dirigidas à correção de desigualdades

raciais e sociais, orientadas para oferta de tratamento diferenciado com vistas a corrigir

desvantagens e marginalização criadas e mantidas por estrutura social excludente e

discriminatória. Ações afirmativas atendem ao determinado pelo Programa Nacional de

Direitos Humanos, bem como a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, com o

objetivo de combate ao racismo e a discriminações, tais como: a Convenção da UNESCO

de 1960, direcionada ao combate ao racismo em todas as formas de ensino, bem como a

Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e

Discriminações Correlatas de 2001.

Assim sendo, sistemas de ensino e estabelecimentos de diferentes níveis

converterão as demandas dos afro-brasileiros em políticas públicas de Estado ou

institucionais, ao tomarem decisões e iniciativas com vistas a reparações, reconhecimento

e valorização da história e cultura dos afro-brasileiros, à constituição de programas de

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ações afirmativas, medidas estas coerentes com um projeto de escola, de educação, de

formação de cidadãos que explicitamente se esbocem nas relações pedagógicas

cotidianas. Medidas que, convêm, sejam compartilhadas pelos sistemas de ensino,

estabelecimentos, processos de formação de professores, comunidade, professores,

alunos e seus pais.

Medidas que repudiam, como prevê a Constituição Federal em seu Art.3º, IV, o

“preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”

e reconhecem que todos são portadores de singularidade irredutível e que a formação

escolar tem de estar atenta para o desenvolvimento de suas personalidades (Art.208, IV).

EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS

O sucesso das políticas públicas de Estado, institucionais e pedagógicas, visando a

reparações, reconhecimento e valorização da identidade, da cultura e da história dos

negros brasileiros depende necessariamente de condições físicas, materiais, intelectuais e

afetivas favoráveis para o ensino e para aprendizagens; em outras palavras, todos os

alunos negros e não negros, bem como seus professores, precisam sentir-se valorizados e

apoiados. Depende também, de maneira decisiva, da reeducação das relações entre

negros e brancos, o que aqui estamos designando como relações étnico-raciais. Depende,

ainda, de trabalho conjunto, de articulação entre processos educativos escolares, políticas

públicas, movimentos sociais, visto que as mudanças éticas, culturais, pedagógicas e

políticas nas relações étnico-raciais não se limitam à escola.

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É importante destacar que se entende por raça a construção social forjada nas

tensas relações entre brancos e negros, muitas vezes simuladas como harmoniosas, nada

tendo a ver com o conceito biológico de raça cunhado no século XVIII e hoje sobejamente

superado. Cabe esclarecer que o termo raça é utilizado com frequência nas relações

sociais brasileiras, para informar como determinadas características físicas, como cor de

pele, tipo de cabelo, entre outras, influenciam, interferem e até mesmo determinam o

destino e o lugar social dos sujeitos no interior da sociedade brasileira.

Contudo, o termo foi ressignificado pelo Movimento Negro que, em várias situações,

o utiliza com um sentido político e de valorização do legado deixado pelos africanos. É

importante, também, explicar que o emprego do termo étnico, na expressão étnico-racial,

serve para marcar que essas relações tensas devidas a diferenças na cor da pele e traços

fisionômicos o são também devido à raiz cultural plantada na ancestralidade africana, que

difere em visão de mundo, valores e princípios das de origem indígena, europeia e

asiática.

Convivem, no Brasil, de maneira tensa, a cultura e o padrão estético negro e

africano e um padrão estético e cultural branco europeu. Porém, a presença da cultura

negra e o fato de 45% da população brasileira ser composta de negros (de acordo com o

censo do IBGE) não têm sido suficientes para eliminar ideologias, desigualdades e

estereótipos racistas. Ainda persiste em nosso país um imaginário étnico-racial que

privilegia a brancura e valoriza principalmente as raízes europeias da sua cultura,

ignorando ou pouco valorizando as outras, que são a indígena, a africana, a asiática.

Os diferentes grupos, em sua diversidade, que constituem o Movimento Negro

brasileiro, têm comprovado o quanto é dura a experiência dos negros de ter julgados

negativamente seu comportamento, ideias e intenções antes mesmo de abrirem a boca ou

tomarem qualquer iniciativa.

Têm, eles, insistido no quanto é alienante a experiência de fingir ser o que não é

para ser reconhecido, de quão dolorosa pode ser a experiência de deixar-se assimilar por

uma visão de mundo, que pretende impor-se como superior e por isso universal e que os

obriga a negarem a tradição do seu povo.

Se não é fácil ser descendente de seres humanos escravizados e forçados à

condição de objetos utilitários ou a semoventes, também é difícil descobrir-se descendente

dos escravizadores, temer, embora veladamente, revanche dos que, por cinco séculos,

têm sido desprezados e massacrados.

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Para reeducar as relações étnico-raciais, no Brasil, é necessário fazer emergir as

dores e medos que têm sido gerados. É preciso entender que o sucesso de uns tem o

preço da marginalização e da desigualdade impostas a outros. E então decidir que

sociedade queremos construir daqui para frente.

Como bem salientou Frantz Fanon, os descendentes dos mercadores de escravos,

dos senhores de ontem, não têm, hoje, de assumir culpa pelas desumanidades

provocadas por seus antepassados. No entanto, têm eles a responsabilidade moral e

política de combater o racismo, as discriminações e juntamente com os que vêm sendo

mantidos à margem, os negros, construir relações raciais e sociais sadias, em que todos

cresçam e se realizem enquanto seres humanos e cidadãos. Não fossem por estas razões,

eles a teriam de assumir, pelo fato de usufruírem do muito que o trabalho escravo

possibilitou ao país.

Assim sendo, a educação das relações étnico-raciais impõe aprendizagens entre

brancos e negros, trocas de conhecimentos, quebra de desconfianças, projeto conjunto

para construção de uma sociedade justa, igual, equânime.

Combater o racismo, trabalhar pelo fim da desigualdade social e racial, empreender

reeducação das relações étnico-raciais não são tarefas exclusivas da escola. As formas de

discriminação de qualquer natureza não têm o seu nascedouro na escola, porém o

racismo, as desigualdades e discriminações correntes na sociedade perpassam por ali.

Para que as instituições de ensino desempenhem a contento o papel de educar, é

necessário que se constituam em espaço democrático de produção e divulgação de

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conhecimentos e de posturas que visam a uma sociedade justa. A escola tem papel

preponderante para eliminação das discriminações e para emancipação dos grupos

discriminados, ao proporcionar acesso aos conhecimentos científicos, a registros culturais

diferenciados, à conquista de racionalidade que rege as relações sociais e raciais, a

conhecimentos avançados, indispensáveis para consolidação e concerto das nações como

espaços democráticos e igualitários.

Para obter êxito, a escola e seus professores não podem improvisar. Têm que

desfazer mentalidade racista e discriminadora secular, superando o etnocentrismo

europeu, reestruturando relações étnico-raciais e sociais, desalienando processos

pedagógicos. Isto não pode ficar reduzido a palavras e a raciocínios desvinculados da

experiência de ser inferiorizados vivida pelos negros, tampouco das baixas classificações

que lhe são atribuídas nas escalas de desigualdades sociais, econômicas, educativas e

políticas.

Diálogo com estudiosos que analisam, criticam estas realidades e fazem propostas,

bem como com grupos do Movimento Negro, presentes nas diferentes regiões e estados,

assim como em inúmeras cidades, são imprescindíveis para que se vençam discrepâncias

entre o que se sabe e a realidade, se compreendam concepções e ações, uns dos outros,

se elabore projeto comum de combate ao racismo e a discriminações.

Temos, pois, pedagogias de combate ao racismo e a discriminações por criar. É

claro que há experiências de professores e de algumas escolas, ainda isoladas, que muito

vão ajudar.

Para empreender a construção dessas pedagogias, é fundamental que se desfaçam

alguns equívocos. Um deles diz respeito à preocupação de professores no sentido de

designar ou não seus alunos negros como negros ou como pretos, sem ofensas.

Em primeiro lugar, é importante esclarecer que ser negro no Brasil não se limita às

características físicas. Trata-se, também, de uma escolha política. Por isso, o é quem

assim se define. Em segundo lugar, cabe lembrar que preto é um dos quesitos utilizados

pelo IBGE para classificar, ao lado dos outros – branco, pardo, indígena - a cor da

população brasileira.

Pesquisadores de diferentes áreas, inclusive da educação, para fins de seus

estudos, agregam dados relativos a pretos e pardos sob a categoria negros, já que ambos

reúnem, conforme alerta o Movimento Negro, aqueles que reconhecem sua ascendência

africana. É importante tomar conhecimento da complexidade que envolve o processo de

construção da identidade negra em nosso país. Processo esse, marcado por uma

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sociedade que, para discriminar os negros, utiliza-se tanto da desvalorização da cultura de

matriz africana como dos aspectos físicos herdados pelos descendentes de africanos.

Nesse processo complexo, é possível, no Brasil, que algumas pessoas de tez clara e

traços físicos europeus, em virtude de o pai ou a mãe ser negro(a), se designarem negros;

que outros, com traços físicos africanos, se digam brancos. É preciso lembrar que o termo

negro começou a ser usado pelos senhores para designar pejorativamente os

escravizados e este sentido negativo da palavra se estende até hoje. Contudo, o

Movimento Negro ressignificou esse termo dando-lhe um sentido político e positivo.

Lembremos os motes muito utilizados no final dos anos 1970 e no decorrer dos anos 1980,

1990: Negro é lindo! Negra, cor da raça brasileira! Negro que te quero negro! 100% Negro!

Não deixe sua cor passar em branco! Este último utilizado na campanha do censo de

1990.

Outro equívoco a enfrentar é a afirmação de que os negros se discriminam entre si e

que são racistas também. Esta constatação tem de ser analisada no quadro da ideologia

do branqueamento que divulga a ideia e o sentimento de que as pessoas brancas seriam

mais humanas, teriam inteligência superior e por isso teriam o direito de comandar e de

dizer o que é bom para todos. Cabe lembrar que no pós-abolição foram formuladas

políticas que visavam ao branqueamento da população pela eliminação simbólica e

material da presença dos negros. Nesse sentido, é possível que pessoas negras sejam

influenciadas pela ideologia do branqueamento e, assim, tendam a reproduzir o

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preconceito do qual são vítimas. O racismo imprime marcas negativas na subjetividade dos

negros e também na dos que os discriminam.

Mais um equívoco a superar é a crença de que a discussão sobre a questão racial

se limita ao Movimento Negro e a estudiosos do tema e não à escola. A escola, enquanto

instituição social responsável por assegurar o direito da educação a todo e qualquer

cidadão, deverá se posicionar politicamente, como já vimos, contra toda e qualquer forma

de discriminação. A luta pela superação do racismo e da discriminação racial é, pois, tarefa

de todo e qualquer educador, independentemente do seu pertencimento étnico-racial,

crença religiosa ou posição política. O racismo, segundo o Artigo 5º da Constituição

Brasileira, é crime inafiançável e isso se aplica a todos os cidadãos e instituições, inclusive,

à escola.

Outro equívoco a esclarecer é de que o racismo, o mito da democracia racial e a

ideologia do branqueamento só atingem os negros. Enquanto processos estruturantes e

constituintes da formação histórica e social brasileira, estes estão arraigados no imaginário

social e atingem negros, brancos e outros grupos étnico-raciais. As formas, os níveis e os

resultados desses processos incidem de maneira diferente sobre os diversos sujeitos e

interpõem diferentes dificuldades nas suas trajetórias de vida escolar e social. Por isso, a

construção de estratégias educacionais que visem ao combate do racismo é uma tarefa de

todos os educadores, independentemente do seu pertencimento étnico racial.

Pedagogias de combate ao racismo e a discriminações elaboradas com o objetivo

de educação das relações étnico/raciais positivas têm como objetivo fortalecer entre os

negros e despertar entre os brancos a consciência negra. Entre os negros, poderão

oferecer conhecimentos e segurança para orgulharem-se da sua origem africana; para os

brancos, poderão permitir que identifiquem as influências, a contribuição, a participação e a

importância da história e da cultura dos negros no seu jeito de ser, viver, de se relacionar

com as outras pessoas, notadamente as negras.

Também farão parte de um processo de reconhecimento, por parte do Estado, da

sociedade e da escola, da dívida social que têm em relação ao segmento negro da

população, possibilitando uma tomada de posição explícita contra o racismo e a

discriminação racial e a construção de ações afirmativas nos diferentes níveis de ensino da

educação brasileira.

Tais pedagogias precisam estar atentas para que todos, negros e não negros, além

de ter acesso a conhecimentos básicos tidos como fundamentais para a vida integrada à

sociedade, exercício profissional competente, recebam formação que os capacite para

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forjar novas relações étnico-raciais. Para tanto, há necessidade, como já vimos, de

professores qualificados para o ensino das diferente áreas de conhecimentos e, além

disso, sensíveis e capazes de direcionar positivamente as relações entre pessoas de

diferentes pertencimento étnico-racial, no sentido do respeito e da correção de posturas,

atitudes, palavras preconceituosas. Daí a necessidade de se insistir e investir para que os

professores, além de sólida formação na área específica de atuação, recebam formação

que os capacite não só a compreender a importância das questões relacionadas à

diversidade étnico racial, mas a lidar positivamente com elas e sobretudo criar estratégias

pedagógicas que possam auxiliar a reeducá-las.

Até aqui apresentaram-se orientações que justificam e fundamentam as

determinações de caráter normativo que seguem.

HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA –

DETERMINAÇÕES

A obrigatoriedade de inclusão de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nos

currículos da Educação Básica trata-se de decisão política, com fortes repercussões

pedagógicas, inclusive na formação de professores. Com esta medida, reconhece-se que,

além de garantir vagas para negros nos bancos escolares, é preciso valorizar devidamente

a história e cultura de seu povo, buscando reparar danos, que se repetem há cinco

séculos, à sua identidade e a seus direitos. A relevância do estudo de temas decorrentes

da história e cultura afro-brasileira e africana não se restringem à população negra, ao

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contrário, dizem respeito a todos os brasileiros, uma vez que devem educar-se enquanto

cidadãos atuantes no seio de uma sociedade multicultural e pluriétnica, capazes de

construir uma nação democrática.

É importante destacar que não se trata de mudar um foco etnocêntrico

marcadamente de raiz europeia por um africano, mas de ampliar o foco dos currículos

escolares para a diversidade cultural, racial, social e econômica brasileira. Nesta

perspectiva, cabe às escolas incluir no contexto dos estudos e atividades, que proporciona

diariamente, também as contribuições histórico-culturais dos povos indígenas e dos

descendentes de asiáticos, além das de raiz africana e europeia. É preciso ter clareza que

o Art. 26A acrescido à Lei 9394/1996 provoca bem mais do que inclusão de novos

conteúdos, exige que se repensem relações étnico-raciais, sociais, pedagógicas,

procedimentos de ensino, condições oferecidas para aprendizagem, objetivos tácitos e

explícitos da educação oferecida pelas escolas.

A autonomia dos estabelecimentos de ensino para compor os projetos pedagógicos,

no cumprimento do exigido pelo Art. 26A da Lei 9394/1996, permite que se valham da

colaboração das comunidades a que a escola serve, do apoio direto ou indireto de

estudiosos e do Movimento Negro, com os quais estabelecerão canais de comunicação,

encontrarão formas próprias de incluir nas vivências promovidas pela escola, inclusive em

conteúdos de disciplinas, as temáticas em questão.

Caberá, aos sistemas de ensino, às mantenedoras, à coordenação pedagógica dos

estabelecimentos de ensino e aos professores, com base neste parecer, estabelecer

conteúdos de ensino, unidades de estudos, projetos e programas, abrangendo os

diferentes componentes curriculares. Caberá, aos administradores dos sistemas de ensino

e das mantenedoras prover as escolas, seus professores e alunos de material bibliográfico

e de outros materiais didáticos, além de acompanhar os trabalhos desenvolvidos, a fim de

evitar que questões tão complexas, muito pouco tratadas, tanto na formação inicial como

continuada de professores, sejam abordadas de maneira resumida, incompleta, com erros.

Em outras palavras, aos estabelecimentos de ensino está sendo atribuída

responsabilidade de acabar com o modo falso e reduzido de tratar a contribuição dos

africanos escravizados e de seus descendentes para a construção da nação brasileira; de

fiscalizar para que, no seu interior, os alunos negros deixem de sofrer os primeiros e

continuados atos de racismo de que são vítimas. Sem dúvidas, assumir estas

responsabilidades implica compromisso com o entorno sociocultural da escola, da

comunidade onde esta se encontra e a que serve, compromisso com a formação de

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cidadãos atuantes e democráticos, capazes de compreender as relações sociais e étnico-

raciais de que participam e ajudam a manter e/ou a reelaborar, capazes de decodificar

palavras, fatos e situações a partir de diferentes perspectivas, de desempenhar-se em

áreas de competências que lhes permitam continuar e aprofundar estudos em diferentes

níveis de formação.

Precisa, o Brasil, país multiétnico e pluricultural, de organizações escolares em que

todos se vejam incluídos, em que lhes seja garantido o direito de aprender e de ampliar

conhecimentos, sem ser obrigados a negar a si mesmos, ao grupo étnico/racial a que

pertencem e a adotar costumes, ideias e comportamentos que lhes são adversos. E estes,

certamente, serão indicadores da qualidade da educação que estará sendo oferecida pelos

estabelecimentos de ensino de diferentes níveis.

Para conduzir suas ações, os sistemas de ensino, os estabelecimentos e os

professores terão como referência, entre outros pertinentes às bases filosóficas e

pedagógicas que assumem, os princípios a seguir explicitados.

CONSCIÊNCIA POLÍTICA E HISTÓRICA DA DIVERSIDADE

Este princípio deve conduzir:

- à igualdade básica de pessoa humana como sujeito de direitos;

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- à compreensão de que a sociedade é formada por pessoas que pertencem a

grupos étnico-raciais distintos, que possuem cultura e história próprias, igualmente valiosas

e que em conjunto constroem, na nação brasileira, sua história;

- ao conhecimento e à valorização da história dos povos africanos e da cultura afro-

brasileira na construção histórica e cultural brasileira;

- à superação da indiferença, injustiça e desqualificação com que os negros, os

povos indígenas e também as classes populares às quais os negros, no geral, pertencem,

são comumente tratados;

- à desconstrução, por meio de questionamentos e análises críticas, objetivando

eliminar conceitos, ideias, comportamentos veiculados pela ideologia do branqueamento,

pelo mito da democracia racial, que tanto mal fazem a negros e brancos;

- à busca, da parte de pessoas, em particular de professores não familiarizados com

a análise das relações étnico-raciais e sociais com o estudo de história e cultura afro-

brasileira e africana, de informações e subsídios que lhes permitam formular concepções

não baseadas em preconceitos e construir ações respeitosas;

- ao diálogo, via fundamental para entendimento entre diferentes, com a finalidade

de negociações, tendo em vista objetivos comuns; visando a uma sociedade justa.

FORTALECIMENTO DE IDENTIDADES E DE DIREITOS

O princípio deve orientar para:

- o desencadeamento de processo de afirmação de identidades, de historicidade

negada ou distorcida;

- o rompimento com imagens negativas forjadas por diferentes meios de

comunicação, contra os negros e os povos indígenas;

- o esclarecimentos a respeito de equívocos quanto a uma identidade humana

universal;

- o combate à privação e violação de direitos;

- a ampliação do acesso a informações sobre a diversidade da nação brasileira e

sobre a recriação das identidades, provocada por relações étnico-raciais.

- as excelentes condições de formação e de instrução que precisam ser oferecidas,

nos diferentes níveis e modalidades de ensino, em todos os estabelecimentos, inclusive os

localizados nas chamadas periferias urbanas e nas zonas rurais.

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AÇÕES EDUCATIVAS DE COMBATE AO RACISMO E A

DISCRIMINAÇÕES

O princípio encaminha para:

- a conexão dos objetivos, estratégias de ensino e atividades com a experiência de

vida dos alunos e professores, valorizando aprendizagens vinculadas às suas relações

com pessoas negras, brancas, mestiças, assim como as vinculadas às relações entre

negros, indígenas e brancos no conjunto da sociedade;

- a crítica pelos coordenadores pedagógicos, orientadores educacionais,

professores, das representações dos negros e de outras minorias nos textos, materiais

didáticos, bem como providências para corrigi-las;

- condições para professores e alunos pensarem, decidirem, agirem, assumindo

responsabilidade por relações étnico-raciais positivas, enfrentando e superando

discordâncias, conflitos, contestações, valorizando os contrastes das diferenças;

- valorização da oralidade, da corporeidade e da arte, por exemplo, como a dança,

marcas da cultura de raiz africana, ao lado da escrita e da leitura;

- educação patrimonial, aprendizado a partir do patrimônio cultural afro-brasileiro,

visando a preservá-lo e a difundi-lo;

- o cuidado para que se dê um sentido construtivo à participação dos diferentes

grupos sociais, étnico-raciais na construção da nação brasileira, aos elos culturais e

históricos entre diferentes grupos étnico-raciais, às alianças sociais;

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- participação de grupos do Movimento Negro, e de grupos culturais negros, bem

como da comunidade em que se insere a escola, sob a coordenação dos professores, na

elaboração de projetos político-pedagógicos que contemplem a diversidade étnico-racial.

Estes princípios e seus desdobramentos mostram exigências de mudança de

mentalidade, de maneiras de pensar e agir dos indivíduos em particular, assim como das

instituições e de suas tradições culturais. É neste sentido que se fazem as seguintes

determinações:

- O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, evitando-se distorções,

envolverá articulação entre passado, presente e futuro no âmbito de experiências,

construções e pensamentos produzidos em diferentes circunstâncias e realidades do povo

negro. É meio privilegiado para a educação das relações étnico-raciais e tem por objetivos

o reconhecimento e valorização da identidade, história e cultura dos afro-brasileiros,

garantia de seus direitos de cidadãos, reconhecimento e igual valorização das raízes

africanas da nação brasileira, ao lado das indígenas, europeias, asiáticas.

- O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana se fará por diferentes

meios, em atividades curriculares ou não, em que: - se explicite, busque compreender e

interpretar, na perspectiva de quem o formule, diferentes formas de expressão e de

organização de raciocínios e pensamentos de raiz da cultura africana; - promovam-se

oportunidades de diálogo em que se conheçam, se ponham em comunicação diferentes

sistemas simbólicos e estruturas conceituais, bem como se busquem formas de

convivência respeitosa, além da construção de projeto de sociedade em que todos se

sintam encorajados a expor, defender sua especificidade étnico-racial e a buscar garantias

para que todos o façam; - sejam incentivadas atividades em que pessoas – estudantes,

professores, servidores, integrantes da comunidade externa aos estabelecimentos de

ensino – de diferentes culturas interatuem e se interpretem reciprocamente, respeitando os

valores, visões de mundo, raciocínios e pensamentos de cada um.

- O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, a educação das relações

étnico raciais, tal como explicita o presente parecer, se desenvolverão no cotidiano das

escolas, nos diferentes níveis e modalidades de ensino, como conteúdo de disciplinas,2

particularmente, Educação Artística, Literatura e História do Brasil, sem prejuízo das

demais3, em atividades curriculares ou não, trabalhos em salas de aula, nos laboratórios

de ciências e de informática, na utilização de sala de leitura, biblioteca, brinquedoteca,

áreas de recreação, quadra de esportes e outros ambientes escolares.

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- O ensino de História Afro-Brasileira abrangerá, entre outros conteúdos, iniciativas e

organizações negras, incluindo a história dos quilombos, a começar pelo de Palmares, e

de remanescentes de quilombos, que têm contribuído para o desenvolvimento de

comunidades, bairros, localidades, municípios, regiões (Exemplos: associações negras

recreativas, culturais, educativas, artísticas, de assistência, de pesquisa, irmandades

religiosas, grupos do Movimento Negro). Será dado destaque a acontecimentos e

realizações próprios de cada região e localidade.

- Datas significativas para cada região e localidade serão devidamente assinaladas.

O 13 de maio, Dia Nacional de Luta contra o Racismo, será tratado como o dia de

denúncia das repercussões das políticas de eliminação física e simbólica da população

afro-brasileira no pós abolição, e de divulgação dos significados da Lei áurea para os

negros. No 20 de novembro será celebrado o Dia Nacional da Consciência Negra,

entendendo-se consciência negra nos termos 2 § 2°, Art. 26A, Lei 9394/1996 : Os

conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de

todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e

História Brasileiras.

- Em História da África, tratada em perspectiva positiva, não só de denúncia da

miséria e discriminações que atingem o continente, nos tópicos pertinentes se fará

articuladamente com a história dos afrodescendentes no Brasil e serão abordados temas

relativos: - ao papel dos anciãos e dos gritos como guardiões da memória histórica; - à

história da ancestralidade e religiosidade africana; - aos núbios e aos egípcios, como

civilizações que contribuíram decisivamente para o desenvolvimento da humanidade; - às

civilizações e organizações políticas pré-coloniais, como os reinos do Mali, do Congo e do

Zimbabwe; - ao tráfico e à escravidão do ponto de vista dos escravizados; - ao papel dos

europeus, dos asiáticos e também de africanos no tráfico; - à ocupação colonial na

perspectiva dos africanos; - às lutas pela independência política dos países africanos; - às

ações em prol da união africana em nossos dias, bem como o papel da União Africana,

para tanto; - às relações entre as culturas e as histórias dos povos do continente africano e

os da diáspora; - à formação compulsória da diáspora, vida e existência cultural e histórica

dos africanos e seus descendentes fora da África; - à diversidade da diáspora, hoje, nas

Américas, Caribe, Europa, Ásia; - aos acordos políticos, econômicos, educacionais e

culturais entre África, Brasil e outros países da diáspora.

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- O ensino de Cultura Afro-Brasileira destacará o jeito próprio de ser, viver e pensar

manifestado tanto no dia a dia, quanto em celebrações como congadas, moçambiques,

ensaios, maracatus, rodas de samba, entre outras.

- O ensino de Cultura Africana abrangerá: - as contribuições do Egito para a ciência

e filosofia ocidentais; - as universidades africanas Tambkotu, Gao, Djene que floresciam no

século XVI; - as tecnologias de agricultura, de beneficiamento de cultivos, de mineração e

de edificações trazidas pelos escravizados, bem como a produção científica, artística (artes

plásticas, literatura, música, dança, teatro) política, na atualidade .

- O ensino de História e de Cultura Afro-Brasileira, far-se-á por diferentes meios,

inclusive, a realização de projetos de diferentes naturezas, no decorrer do ano letivo, com

vistas à divulgação e estudo da participação dos africanos e de seus descendentes em

episódios da história do Brasil, na construção econômica, social e cultural da nação,

destacando-se a atuação de negros em diferentes áreas do conhecimento, de atuação

profissional, de criação tecnológica e artística, de luta social (tais como:Zumbi, Luiza

Nahim, Aleijadinho, Padre Maurício, Luiz Gama, Cruz e Souza, João Cândido, André

Rebouças, Teodoro Sampaio, José Correia Leite, Solano Trindade, Antonieta de Barros,

Edison Carneiro, Lélia Gonzáles, Beatriz Nascimento, Milton Santos, Guerreiro Ramos,

Clóvis Moura, Abdias do Nascimento, Henrique Antunes Cunha, Tereza Santos, Emmanuel

Araújo, Cuti, Alzira Rufino, Inaicyra Falcão dos Santos, entre outros).

- O ensino de História e Cultura Africana se fará por diferentes meios, inclusive a

realização de projetos de diferente natureza, no decorrer do ano letivo, com vistas à

divulgação e estudo da participação dos africanos e de seus descendentes na diáspora,

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em episódios da história mundial, na construção econômica, social e cultural das nações

do continente africano e da diáspora, destacando-se a atuação de negros em diferentes

áreas do conhecimento, de atuação profissional, de criação tecnológica e artística, de luta

social (entre outros: rainha Nzinga, Toussaint-Louverture, Martin Luther King, Malcon X,

Marcus Garvey, Aimé Cesaire, Léopold Senghor, Mariama Bâ, Amílcar Cabral, Cheik Anta

Diop, Steve Biko, Nelson Mandela, Aminata Traoré, Christiane Taubira).

Para tanto, os sistemas de ensino e os estabelecimentos de Educação Básica, nos

níveis de Educação Infantil, Educação Fundamental, Educação Média, Educação de

Jovens e Adultos, Educação Superior, precisarão providenciar:

- Registro da história não contada dos negros brasileiros, tais como em

remanescentes de quilombos, comunidades e territórios negros urbanos e rurais.

- Apoio sistemático aos professores para elaboração de planos, projetos, seleção de

conteúdos e métodos de ensino, cujo foco seja História e Cultura Afro-Brasileira e Africana

e a Educação das Relações Étnico-Raciais.

- Mapeamento e divulgação de experiências pedagógicas de escolas,

estabelecimentos de ensino superior, secretarias de educação, assim como levantamento

das principais dúvidas e dificuldades dos professores em relação ao trabalho com a

questão racial na escola e encaminhamento de medidas para resolvê-las, feitos pela

administração dos sistemas de ensino e por Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros.

- Articulação entre os sistemas de ensino, estabelecimentos de ensino superior,

centros de pesquisa, Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, escolas, comunidade e

movimentos sociais, visando à formação de professores para a diversidade étnico/racial.

- Instalação, nos diferentes sistemas de ensino, de grupo de trabalho para discutir e

coordenar planejamento e execução da formação de professores para atender ao disposto

neste parecer quanto à Educação das Relações Étnico-Raciais e ao determinado nos Art.

26 e 26A da Lei 9394/1996, com o apoio do Sistema Nacional de Formação Continuada e

Certificação de Professores do MEC.

- Introdução, nos cursos de formação de professores e de outros profissionais da

educação, de análises das relações sociais e raciais no Brasil; de conceitos e de suas

bases teóricas, tais como racismo, discriminações, intolerância, preconceito, estereótipo,

raça, etnia, cultura, classe social, diversidade, diferença, multiculturalismo; de práticas

pedagógicas, de materiais e de textos didáticos, na perspectiva da reeducação das

relações étnico-raciais e do ensino e aprendizagem da História e cultura dos Afro-

brasileiros e dos Africanos.

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- Inclusão de discussão da questão racial como parte integrante da matriz curricular,

tanto dos cursos de licenciatura para Educação Infantil, os anos iniciais e finais da

Educação Fundamental, Educação Média, Educação de Jovens e Adultos, como de

processos de formação continuada de professores, inclusive de docentes no ensino

superior.

- Inclusão, respeitada a autonomia dos estabelecimentos do Ensino Superior, nos

conteúdos de disciplinas e em atividades curriculares dos cursos que ministra, de

Educação das Relações Étnico-Raciais, de conhecimentos de matriz africana e/ou que

dizem respeito à população negra. Por exemplo: em Medicina, entre outras questões,

estudo da anemia falciforme, da problemática da pressão alta; em Matemática,

contribuições de raiz africana, identificadas e descritas pela Etno-Matemática; em Filosofia,

estudo da filosofia tradicional africana e de contribuições de filósofos africanos e

afrodescendentes da atualidade.

- Inclusão de bibliografia relativa à história e cultura afro-brasileira e africana às

relações étnico-raciais, aos problemas desencadeados pelo racismo e por outras

discriminações, à pedagogia antirracista nos programas de concursos públicos para

admissão de professores.

- Inclusão, em documentos normativos e de planejamento dos estabelecimentos de

ensino de todos os níveis - estatutos, regimentos, planos pedagógicos, planos de ensino -

de objetivos explícitos, assim como de procedimentos para sua consecução, visando ao

combate do racismo, a discriminações, ao reconhecimento, valorização e respeito das

histórias e culturas afro-brasileira e africana.

- Previsão, nos fins, responsabilidades e tarefas dos conselhos escolares e de

outros órgão colegiados, do exame e encaminhamento de solução para situações de

racismo e de discriminações, buscando-se criar situações educativas em que as vítimas

recebam apoio requerido para superar o sofrimento e os agressores, orientação para que

compreendam a dimensão do que praticaram e ambos, educação para o reconhecimento,

valorização e respeito mútuos.

- Inclusão de personagens negros, assim como de outros grupos étnico-raciais, em

cartazes e outras ilustrações sobre qualquer tema abordado na escola, a não ser quando

tratar de manifestações culturais próprias de um determinado grupo étnico-racial.

- Organização de centros de documentação, bibliotecas, midiotecas, museus,

exposições em que se divulguem valores, pensamentos, jeitos de ser e viver dos diferentes

grupos étnico-raciais brasileiros, particularmente dos afrodescendentes.

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- Identificação, com o apoio dos Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, de fontes de

conhecimentos de origem africana, a fim de selecionarem-se conteúdos e procedimentos

de ensino e de aprendizagens.

- Incentivo, pelos sistemas de ensino, a pesquisas sobre processos educativos

orientados por valores, visões de mundo, conhecimentos afro-brasileiros e indígenas, com

o objetivo de ampliação e fortalecimento de bases teóricas para a educação brasileira.

- Identificação, coleta, compilação de informações sobre a população negra, com

vistas à formulação de políticas públicas de Estado, comunitárias e institucionais.

- Edição de livros e de materiais didáticos, para diferentes níveis e modalidades de

ensino, que atendam ao disposto neste parecer, em cumprimento ao disposto no Art. 26A

da LDB, e para tanto abordem a pluralidade cultural e a diversidade étnico-racial da nação

brasileira, corrijam distorções e equívocos em obras já publicadas sobre a história, a

cultura, a identidade dos afrodescendentes, sob o incentivo e supervisão dos programas

de difusão de livros educacionais do MEC - Programa Nacional do Livro Didático e

Programa Nacional de Bibliotecas Escolares ( PNBE).

- Divulgação, pelos sistemas de ensino e mantenedoras, com o apoio dos Núcleos

de Estudos Afro-Brasileiros, de uma bibliografia afro-brasileira e de outros materiais como

mapas da diáspora, da África, de quilombos brasileiros, fotografias de territórios negros

urbanos e rurais, reprodução de obras de arte afro-brasileira e africana a serem

distribuídos nas escolas da rede, com vistas à formação de professores e alunos para o

combate à discriminação e ao racismo.

- Oferta de Educação Fundamental em áreas de remanescentes de quilombos,

contando as escolas com professores e pessoal administrativo que se disponham a

conhecer física e culturalmente a comunidade e a formar-se para trabalhar com suas

especificidades.

- Garantia, pelos sistemas de ensino e entidades mantenedoras, de condições

humanas, materiais e financeiras para execução de projetos com o objetivo de Educação

das Relações Étnico raciais e estudo de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, assim

como organização de serviços e atividades que controlem, avaliem e redimensionem sua

consecução, que exerçam fiscalização das políticas adotadas e providenciem correção de

distorções.

- Realização, pelos sistemas de ensino federal, estadual e municipal, de atividades

periódicas, com a participação das redes das escolas públicas e privadas, de exposição,

avaliação e divulgação dos êxitos e dificuldades do ensino e aprendizagem de História e

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Cultura Afro-Brasileira e Africana e da Educação das Relações Étnico-Raciais; assim como

comunicação detalhada dos resultados obtidos ao Ministério da Educação, à Secretaria

Especial de Promoção da Igualdade Racial, ao Conselho Nacional de Educação, e aos

respectivos conselhos Estaduais e Municipais de Educação, para que encaminhem

providências, quando for o caso.

- Inclusão, nos instrumentos de avaliação das condições de funcionamento de

estabelecimentos de ensino de todos os níveis, nos aspectos relativos ao currículo,

atendimento aos alunos, de quesitos que avaliem a implantação e execução do

estabelecido neste parecer.

- Disponibilização deste parecer, na sua íntegra, para os professores de todos os

níveis de ensino, responsáveis pelo ensino de diferentes disciplinas e atividades

educacionais, assim como para outros profissionais interessados a fim de que possam

estudar, interpretar as orientações, enriquecer, executar as determinações aqui feitas e

avaliar seu próprio trabalho e resultados obtidos por seus alunos, considerando princípios

e critérios apontados.

OBRIGATORIEDADE DO ENSINO DE HISTÓRIA E

CULTURA AFRO-BRASILEIRAS, EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES

ÉTNICO-RACIAIS E OS CONSELHOS DE EDUCAÇÃO

Diretrizes são dimensões normativas, reguladoras de caminhos, embora não

fechadas a que historicamente possam, a partir das determinações iniciais, tomar novos

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rumos. Diretrizes não visam a desencadear ações uniformes, todavia, objetivam oferecer

referências e critérios para que se implantem ações, as avaliem e reformulem no que e

quando necessário.

Estas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-

Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, na medida em que

procedem de ditames constitucionais e de marcos legais nacionais, na medida em que se

referem ao resgate de uma comunidade que povoou e construiu a nação brasileira,

atingem o âmago do pacto federativo. Nessa medida, cabe aos conselhos de Educação

dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios aclimatar tais diretrizes, dentro do

regime de colaboração e da autonomia de entes federativos, a seus respectivos sistemas,

dando ênfase à importância de os planejamentos valorizarem, sem omitir outras regiões, a

participação dos afrodescendentes, do período escravista aos nossos dias, na sociedade,

economia, política, cultura da região e da localidade; definindo medidas urgentes para

formação de professores; incentivando o desenvolvimento de pesquisas bem como

envolvimento comunitário.

A esses órgãos normativos cabe, pois, a tarefa de adequar o proposto neste parecer

à realidade de cada sistema de ensino. E, a partir daí, deverá ser competência dos órgãos

executores - administrações de cada sistema de ensino, das escolas - definir estratégias

que, quando postas em ação, viabilizarão o cumprimento efetivo da Lei de Diretrizes e

Bases que estabelece a formação básica comum, o respeito aos valores culturais, como

princípios constitucionais da educação tanto quanto da dignidade da pessoa humana

(inciso III do art. 1), garantindo-se a promoção do bem de todos, sem preconceitos (inciso

IV do Art. 3) a prevalência dos direitos humanos (inciso II do art. 4) e repúdio ao racismo

(inciso VIII do art. 4).

Cumprir a Lei é, pois, responsabilidade de todos e não apenas do professor em sala

de aula. Exige-se, assim, um comprometimento solidário dos vários elos do sistema de

ensino brasileiro, tendo-se como ponto de partida o presente parecer, que junto com outras

diretrizes e pareceres e resoluções, têm o papel articulador e coordenador da organização

da educação nacional.

II - VOTO DA RELATORA

Face ao exposto e diante de direitos desrespeitados, tais como:

� o de não sofrer discriminações por ser descendente de africanos;

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� o de ter reconhecida a decisiva participação de seus antepassados e da sua

própria na construção da nação brasileira;

� o de ter reconhecida sua cultura nas diferentes matrizes de raiz africana;

- diante da exclusão secular da população negra dos bancos escolares,

notadamente em nossos dias, no ensino superior;

- diante da necessidade de crianças, jovens e adultos estudantes sentirem-se

contemplados e respeitados, em suas peculiaridades, inclusive as étnico-raciais, nos

programas e projetos educacionais;

- diante da importância de reeducação das relações étnico/raciais no Brasil;

- diante da ignorância que diferentes grupos étnico-raciais têm uns dos outros, bem

como da necessidade de superar esta ignorância para que se construa uma sociedade

democrática;

- diante, também, da violência explícita ou simbólica, gerada por toda sorte de

racismos e discriminações, que sofrem os negros descendentes de africanos;

- diante de humilhações e ultrajes sofridos por estudantes negros, em todos os

níveis de ensino, em consequência de posturas, atitudes, textos e materiais de ensino com

conteúdos racistas;

- diante de compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em convenções,

entre outro os da Convenção da UNESCO, de 1960, relativo ao combate ao racismo em

todas as formas de ensino, bem como os da Conferência Mundial de Combate ao

Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Discriminações Correlatas, 2001;

- diante da Constituição Federal de 1988, em seu Art. 3º, inciso IV, que garante a

promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e

quaisquer outras formas de discriminação; do inciso 42 do Artigo 5º que trata da prática do

racismo como crime inafiançável e imprescritível; do § 1º do Art. 215 que trata da proteção

das manifestações culturais;

- diante do Decreto 1.904/1996, relativo ao Programa Nacional de Direitos Humanas

que assegura a presença histórica das lutas dos negros na constituição do país;

- diante do Decreto 4.228, de 13 de maio de 2002, que institui, no âmbito da

Administração Pública Federal, o Programa Nacional de Ações Afirmativas;

- diante das Leis 7.716/1999, 8.081/1990 e 9.459/1997 que regulam os crimes

resultantes de preconceito de raça e de cor e estabelecem as penas aplicáveis aos atos

discriminatórios e preconceituosos, entre outros, de raça, cor, religião, etnia ou

procedência nacional;

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- diante do inciso I da Lei 9.394/1996, relativo ao respeito à igualdade de condições

para o acesso e permanência na escola; diante dos Arts 26, 26 A e 79 B da Lei

9.394/1996, estes últimos introduzidos por força da Lei 10.639/2003, proponho ao

Conselho Pleno:

a) instituir as Diretrizes explicitadas neste parecer e no projeto de Resolução em

anexo, para serem executadas pelos estabelecimentos de ensino de diferentes níveis e

modalidades, cabendo aos sistemas de ensino, no âmbito de sua jurisdição, orientá-los,

promover a formação dos professores para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e

Africana, e para Educação das Relações Ético-Raciais, assim como supervisionar o

cumprimento das diretrizes;

b) recomendar que este Parecer seja amplamente divulgado, ficando disponível no

site do Conselho Nacional de

Educação, para consulta dos

professores e de outros

interessados.

Brasília-DF, 10 de março

de 2004.

Conselheira Petronilha

Beatriz Gonçalves e Silva –

Relatora

III - DECISÃO DO CONSELHO PLENO

O Conselho Pleno aprova por unanimidade o voto da Relatora.

Sala das Sessões, 10 em março de 2004.

Conselheiro José Carlos Almeida da Silva – Presidente

(*) DESPACHOS DO MINISTRO (DOU Nº 95, 19/5/2004, SEÇÃO 1, P. 19)

Em 18 de maio de 2004

Nos termos do art. 2º da Lei nº 9.131, de 24 de novembro de 1995, o Ministro de

Estado da Educação HOMOLOGA o Parecer no 03/2004, do Conselho Nacional de

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Educação, Conselho Pleno, que trata das diretrizes curriculares nacionais para a Educação

das Relações Étnico-Raciais e para o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e

Africana, regulamentando a alteração trazida à Lei nº 9394/96 de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional pela Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece a

obrigatoriedade do ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira nos estabelecimentos de

ensino fundamental e médio, conforme consta do Processo nº 23001.000215/2002-96.

TARSO GENRO

Nota: O projeto de resolução, anexo a este parecer, foi transformado na Resolução

CP/CNE nº 1/2004, publicada no DOU Nº 118, 22/6/2004, SEÇÃO 1, P. 11.

A ÁFRICA PELA DIÁSPORA

O termo diáspora é utilizado para referirmo-nos ao processo de desenraizamento

vivenciado por populações deslocadas de seus locais de origem, geralmente de forma

violenta e forçada. A diáspora pode ser – e efetivamente foi - vivenciada por diferentes

populações de formas também distintas. A possibilidade de maior ou menor enraizamento

e a multiplicidade de experiências socioculturais vivenciadas na nova morada são alguns

dos elementos que delimitam essas diferenças, ao longo da história.

Entre os séculos XVI e XIX, mais de 11 milhões1 de africanos foram trazidos à força

para as Américas, para trabalharem como escravos. No Brasil, entre 1550 e 1850,

aproximadamente, teriam desembarcado entre 3,6 e 5,6 milhões1 de africanos. Ainda que

as estimativas apresentem grandes variações, é inegável que este processo configurou-se

como um dos maiores movimentos diaspóricos dos tempos modernos.

Essas populações africanas na diáspora vivenciaram não somente a violência da

viagem transatlântica no julgo do tráfico negreiro para as Américas, mas toda a rede de

usurpações sofridas no processo escravizatório. Podemos considerar populações na

diáspora tanto os africanos que aportaram na costa do continente americano, quanto

também todos aqueles considerados seus descendentes. Essa população, em geral,

possui registros culturais elaborados na ligação simbólica que se estabeleceu em terras

americanas com seu território ancestral. Grande parte desses registros culturais passou a

ser partilhado por grupos de diferentes origens e referências étnico-culturais, a partir de

séculos de convivência, nem sempre harmoniosa.

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Podemos dizer que as culturas diaspóricas, como

de resto todas as culturas, são híbridas, permeáveis. Não

é diferente para o caso das culturas afrodescendentes. O

pesquisador africano Carlos Lopes defende a importância

da compreensão e do estudo das culturas diaspóricas

para entendimento do que é, hoje, a África. Segundo ele,

não é somente importante que o Brasil compreenda a

história da África, mas que a África compreenda a história

das populações africanas na diáspora como pressuposto

de estudo de sua própria história. Recuperando o

historiador Elikia M’Bokolo, Carlos Lopes afirma, em

entrevista à Revista Palmares, que “Os africanos do

continente têm que aceitar que as diásporas têm a outra metade da memória”.

Carlos Moore nos convida a compreender as complexas formas de percepção da

África na diáspora, sobretudo o desafio da passagem de uma África mítica a uma África

real, capaz de subsidiar lutas dos diferentes povos da África em prol de sua emancipação

social, política e também cultural. Segundo o autor: “Durante muito tempo, as diásporas

africanas escravizadas no exterior tiveram de forjar uma visão idílica desse continente para

existir, resistir e se manter. Por razões evidentes – que têm a ver com a brutalidade com a

qual a África viva foi arrancada dos africanos escravizados no exterior da África -, a

imagem que se tem desse continente, elaborada carinhosamente pelo imaginário dos

deportados, via de regra, foi uma idealização. Para preservar o rico legado ancestral que

nos permitiu atravessar o horror de viver em estado de escravidão racial nas Américas por

mais de quatro séculos, foi necessário idealizar essa África da qual tínhamos sido

arrancados para sempre. A África aparece, nessa visão, como um lugar quase sem

tensões internas ou contradições inerentes à sua própria experiência histórica” (MOORE,

2008, p. 11-12).

Essa idealização, que Carlos Moore atribui a uma necessidade mesma de

sobrevivência física e cultural tem seus desdobramentos, inclusive nos processos

educativos que se põe em marcha no Brasil contemporâneo. Isso se torna visível, por

exemplo, em práticas pedagógicas que – em benefício da legítima e urgente valorização

da história e cultura afrobrasileira e africana – omitem dados, análises e contribuições

reflexivas sobre a sua história e cultura, com vistas a combater a visão negativa

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perpetuada durante anos nos processos educativos. Assim, em benefício de uma legítima

positivação, o que ocorre muitas vezes é a idealização da África e suas heranças.

Este texto é um convite a que você, professor/a, procure repensar as percepções

ingênuas construídas sobre a África e os africanos (também da diáspora), rompendo tanto

com aquelas ideias que informavam um continente e seus povos como símbolos natos de

destruição, maldição e ruína – o chamado afro-negativismo -, quanto também àquelas

percepções que, em benefício da necessária positivação, silenciaram na escola o estudo

das contradições e conflitos observados na história do continente e ainda hoje presentes

em sua realidade (como a corrupção, a subserviência política, o julgo europeu e asiático

com submissão econômica e cultural, a miséria e as guerras, entre outros). Embora tais

mazelas não devessem ser generalizadas para todo o continente, ignorá-las - ou até

justificá-las - pode conduzir a um afro centrismo ingênuo, por vezes transformado naquilo

que Carlos Lopes chamou de tese da superioridade africana. Este texto é também um

convite a pensar melhor no valioso cultivo do nosso sentimento de pertença à experiência

do continente africano, sentimento que liga a África e os africanos ao Brasil por laços

históricos conhecidos, mas ainda não totalmente compreendidos ou valorizados.

A recomposição do imaginário sobre a África é também parte importante da

implementação de programas educativos que, centrados no ensino de história e cultura

africana e afro-brasileira, voltam-se à promoção de uma (re)educação das relações étnico-

raciais, em nosso país. Tal perspectiva, no entanto, precisa se pautar pela busca de uma

compreensão real da história e da cultura dos povos africanos e afrodescendentes. No

nosso caso, é significativa a abordagem da história africana do ponto de vista de suas

relações com o Brasil, sem ingenuidades ou supressões, mantendo, evidentemente, a

positivação como suposto educativo, mas sem idealizações acerca da África, da rica

ancestralidade que nos liga, dos laços contemporâneos, enfim, de sua/nossa história. É a

partir da aposta de que é possível – e necessário – reconstruir imagens estereotipadas –

qualquer que seja sua perspectiva – que este texto se orienta.

Esperamos que ele possa representar um efetivo convite à reflexão crítica e à

elaboração de propostas pedagógicas inovadoras. Mas para isso, é preciso compreender

alguns dos pressupostos e argumentos que estão presentes tanto na tese da inferioridade

africana quanto naquela que, visando ultrapassar essa visão, erigiu uma “pirâmide

invertida”, como nos diz Carlos Lopes.

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EM SALA DE AULA

Se objetivamos desconstruir estereótipos e caminhar em direção a uma visão mais

realista do continente, na perspectiva de sua diversidade, é importante, em primeiro lugar,

investigar as representações que os alunos carregam acerca do continente. Pode-se,

então, iniciar os estudos sobre o continente africano propondo que os alunos descrevam o

que pensam sobre a realidade africana, que tipo de imagens vêm à sua memória, o que

sabem sobre a história e a geografia desse continente (é comum que identifiquem a África

como um país e não se deem conta de que trata-se de um continente, constituído por mais

de 50 países). Outra alternativa consiste em levar para sala de aula um conjunto de

imagens do continente (imagens diversas, que mostrem tanto as mazelas econômicas e

sociais quanto a riqueza das diferentes formas de organização política, econômica e social,

com sua diversidade sociocultural, sua produção artística, etc.; da mesma forma, tanto

imagens que evidenciem as belezas naturais, com sua grande diversidade de paisagens,

quanto àquelas que mostrem a destruição de florestas, queimadas, uso não sustentável

das riquezas, etc.), em comparação e similitude a outras partes do mundo (também neste

caso, mostrando situações diversas, imagens que enfatizem tanto aspectos positivos

quanto negativos). Pode-se propor aos alunos que selecionem aquelas imagens que

acreditam referir-se ao continente africano e aquelas que pensem referir-se a outras

realidades. A partir do levantamento dessas imagens e representações pode-se começar a

discutir em sala de aula a origem de tais representações e as razões do predomínio de

equívocos e estereótipos. Enfim, propor que reflitam sobre as representações construídas,

como forma de convidá-los a problematizar e rever parte dessas representações.

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IDENTIDADES EM CONTRAPONTO: DA TESE DA

INFERIORIDADE À PIRÂMIDE INVERTIDA

Não é de hoje que vem se forjando a tese da inferioridade africana. Hegel, no século

XIX, já postulara que “A África não é uma parte histórica do mundo. Não tem movimentos,

progressos a mostrar, movimentos históricos próprios” (HEGEL, citado por ARNAUT e

LOPES, 2005).

Essa ideia foi mantida praticamente intocada, inclusive nos meios acadêmicos, pelo

menos até meados do século XX. E mesmo nos dias atuais ainda é comum (embora não

seja aceitável) que os africanos sejam descritos como não civilizados, pouco afeitos ao

trabalho intelectual e, nesta tradição, considerados incapazes de pensar a sua própria

história.

Muitos livros didáticos no Brasil contribuíram para reforçar essa ideia, especialmente

porque divulgaram imagens de africanos como sujeitos inteiramente dominados e

oprimidos pelo processo de escravização. Essa representação – sustentada também por

concepções pretensamente científicas do século XIX - contribuiu muito para difusão da

ideia de que as sociedades africanas são incapazes de se autogovernar, por serem

associadas a atributos como os de ingenuidade ou primitivismo.

Felizmente, lutas sociais e políticas e também embates científicos têm permitido a

superação destes postulados relativos ao que seria uma inferioridade genética ou inata dos

africanos, considerando que não existe inferioridade ou superioridade racial9... . Mas, se

não há raças do ponto de vista biológico, há ainda racismo em diferentes partes do

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planeta, inclusive no Brasil. Assim, se como operadores biológicos que justifiquem

hierarquizações, as ideias em torno do conceito de “raças humanas” perderam validade e

credibilidade científica e também social, as classificações raciais são ainda, infelizmente,

critérios utilizados no pensamento e vivência social para discriminar, excluir e impedir o

acesso a bens e direitos.

Mas a ideia de “raça” não tem sido apropriada apenas numa perspectiva de

hierarquização – e consequente inferiorização de alguns grupos humanos -, nas formas

como opera o racismo. Ela também tem sido utilizada - em meio a polêmicas e

controvérsias – como estratégia de afirmação de identidades negadas e silenciadas por

séculos, como é o caso da identidade negra. Assim, mesmo reconhecendo a inexistência

de raças, do ponto de vista biológico, muitos grupos reivindicam um pertencimento étnico-

racial, afirmando a validade desse conceito do ponto de vista social, enquanto estratégia

de mobilização e luta. Esse movimento de afirmação e valorização da identidade negra, a

partir da ideia de pertencimento étnico-racial, também tem história, uma história que se liga

às lutas travadas por africanos nos processos de emancipação política e por

afrodescendentes da diáspora, espalhados por diferentes partes do mundo.

Foi no contexto de luta anti-colonialista que se forjou o que chamamos de pan-

africanismo, ideologia política criada fora da África que predicava que a Diáspora e a África

tinham um destino comum. Dessa forma, a emancipação dos afro-americanos, por

exemplo, estava vinculada à emancipação dos povos do continente – e vice-versa.

De acordo com Carlos Lopes, os africanos têm muita dificuldade em aceitar a

identidade que não seja a pan-africana. Isso tem a ver com a história política do

continente. Porque os africanos tiveram que afirmar a sua identidade em contraponto. A

práxis identitária africana é o contraponto. Existe toda uma literatura, uma produção de

mídia, uma produção artística de inferiorização do africano. Ele sente necessidade de fazer

aquilo que chamo de pirâmide invertida. Faz tudo ao contrário e inverte a pirâmide. O que

é mau passa a ser bom, o que é bom passa a ser mau. Ele sobrevaloriza as coisas

africanas e subvaloriza a influência externa, que também está presente. Os africanos são

diversos, embora tenham dificuldades em aceitar isso. Mesmo o africano que não é negro

tem de se posicionar para defender sua identidade. Ele quase rejeita as outras

características do padrão, para se expressar dos pontos de vista intelectual, artístico e

identitário. (...). Esse debate será ultrapassado aos poucos. À medida que vão ocorrendo

às discussões sobre a questão das identidades, começa-se a admitir que a África

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contemporânea seja de fato uma mistura, como todos os países e continentes o são.

(LOPES, 2004, p. 1).

O conceito de “pirâmide invertida”, como nos diz Carlos Lopes, diz respeito a esse

processo de afirmação de uma superioridade africana e, junto a isso, de uma suposta

“homogeneidade” ou de que os africanos teriam, naturalmente, algo em comum. Esse algo

passa a ser, muitas vezes, a “raça negra”, enquanto uma identidade comum. Outro

pensador africano crítico aos usos e apropriações do conceito de raça é Kwame Anthony

Appiah. Dialogando com o movimento pan-africanista, este filósofo também nos adverte

sobre os riscos do apelo ao conceito de raça, mesmo que numa perspectiva social, vir a

contribuir para um congelamento, fixação, essencialização e homogeneização de uma

identidade negra.

A “raça” nos incapacita porque propõe como base para a ação comum a ilusão de

que as pessoas negras (e brancas e amarelas) são fundamentalmente aliadas por

natureza e, portanto, sem esforço; ela nos deixa despreparados, por conseguinte, para

lidar com os conflitos “intraraciais” que nascem das situações muito diferentes dos negros

(e brancos e amarelos) nas diversas partes da economia e do mundo. (APPIAH, 1997:

245)

As “situações muito diferentes dos negros” (e de quaisquer outros grupos), como

nos lembra Appiah, são fruto de processos históricos diversos. Assim, se é fato que a

experiência do racismo constitui um elemento de identidade entre grupos que,

historicamente, foram discriminados e inferiorizados em função de seu fenótipo ou de sua

ancestralidade comum, também não se pode ignorar que as experiências sociais

vivenciadas por indivíduos desses grupos são diversas e não se restringem às opressões e

discriminações do racismo. E as diferentes experiências históricas, que levaram às tais

“situações muito diferentes”, a que se refere Appiah, precisam ser conhecidas e estudadas,

se queremos efetivamente caminhar no sentido de uma compreensão da complexidade e

diversidade que caracteriza o continente africano.

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É preciso considerar que há desdobramentos significativos dessas questões no

cenário educativo brasileiro atual, quando vivenciamos o processo de investimentos em

uma educação antirracista ou educação das relações étnico-raciais. É comum

encontrarmos professores que optam por estudar a história e cultura africana resgatando a

mitologia e a literatura africana, com vistas a favorecer uma valorização da herança e

produções culturais africanas. Esse movimento, instigante e inovador, sobretudo para os

estudantes, pode – e deveria - ser acompanhado de análises históricas e sociológicas do

continente, o que nem sempre ocorre. Essa exclusão da análise propriamente histórica e

sociológica tem, por vezes, contribuído para um retorno ao que seria uma África ancestral,

mítica, a-histórica ou compreendida apenas por seus traços considerados valiosos no seio

da positivação da auto-estima dos brasileiros afrodescendentes.

Da mesma forma que na historiografia10 há o que se chama de “pirâmide invertida”,

também nas práticas educativas se tem observado movimento semelhante. Se num

primeiro momento de positivação das identidades e histórias subvalorizadas essa

estratégia possa ser instigante, por outro lado, ela pode ser capaz de gerar representações

equivocadas e idealizadas acerca da África, funcionando, na verdade, para impedir a

compreensão crítica e o posicionamento reflexivo dos alunos a respeito da história, da

cultura e da relação Brasil-África. Sem a intenção de desqualificar práticas educativas

voltadas ao trabalho com história e cultura africana e afro-brasileira, precisamos nos

debruçar sobre o que tem sido ensinado aos estudantes, neste momento, para

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entendermos as implicações disso quanto ao alcance de nossos objetivos. Vale a pena,

então, refletirmos sobre o que diz uma professora a respeito da história da África.

[...] Eu mostrei isso prá eles, que naquela época, as tribos, os primeiros negros eles

eram reis e rainhas, moravam em palácios, eles tinham os escravos deles, mas dentro da

tribo deles lá, os egípcios, os escravos não eram pessoas que eram judiados não, era

como a organização das abelhas, os trabalhadores, todos tinham a sua hierarquia, todos

eram respeitados dentro da sua hierarquia, ninguém sofria nem era maltratado, eles eram

chamados de escravos, mas na verdade eles eram servidores, né, dos reis e rainhas [...] É

necessário primeiramente compreender os depoimentos dos professores a partir das

dificuldades que vários deles têm de acesso a bibliografia atualizada e reflexiva a respeito

da História Africana. Mesmo em cursos de formação, muitos estereótipos ou formulações

equivocadas são veiculados. Tomamos também os depoimentos como significativas

maneiras pelas quais os professores se expressam a respeito do tema, posicionando-se

neste contexto de aproximações com a história do continente e de experimentações de

abordagem da África.

ÁFRICA NO PLURAL

Na África vivem em interação cultural mais de 2.000 povos diferentes, que possuem

os mais variados modos de organização socioeconômica, política e cultural, contando

também com uma infinidade de fluxos migratórios populacionais e trocas entre povos nas

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mais diferentes fronteiras e espaços do continente. Podemos compreender as mais

variadas dinâmicas culturais que se estabeleceram, se estabelecem e se recriam

cotidianamente no continente.

É interessante, então, que pensemos na África como um continente complexo e

plural, em que a marca mais forte é a diversidade sociocultural. Várias Áfricas, várias

culturas! Uma África que chegou ao século XXI tendo vivenciado muitas histórias, algumas

cheias de conflitos e opressão... outras, produzidas na vivência cotidiana, em grupos de

convívio e em família, uma vida feita por pessoas reais que têm visões de mundo,

identidades culturais e relações peculiares com a natureza e com o seu passado histórico.

Nenhuma dessas pessoas ou grupos, isoladamente, contudo, explica por si a história do

continente. É preciso olhar para as várias histórias para entender a(s) história(s) da África,

conforme nos propõe a escritora nigeriana Chimamanda Adichie, em “O perigo de uma

única história”.

Se entendemos por cultura o conjunto de experiências e manifestações vivenciais

expressas por um grupo na sua relação de mediação com o mundo, podemos, então,

pensar que a África possui uma variedade bastante grande de culturas. Seu perfil cultural

não pode, por isso, ser reduzido a uma identidade única16, como se existisse uma

“essência africana”.

Como já dissemos, a África é um continente portador de muitas expressões

culturais, que podem variar conforme a matriz cultural ou origem do grupo, conforme a

região, a organização social, política, e, mesmo, de acordo com as relações que os grupos

estabelecem com o meio ambiente. As variações são inúmeras e sabemos que a tentativa

de construir uma identidade africana levou a minimizar-se e a desprezar-se a enorme

diversidade cultural desse continente, expressa em sua medicina, filosofia, astronomia,

matemática e nas manifestações artísticas e arquitetônicas, por exemplo. Enfim, “toda

identidade humana é construída e histórica” (APPIAH, 1997).

No entanto, é comumente difundida a ideia de que a África é um continente em

permanente guerra, assolado por miséria, fome e terríveis doenças. Da mesma maneira,

difunde-se que o continente africano é um cenário de paisagens naturais exóticas e

inexploradas: desertos despovoados, savanas cheias de leões e elefantes e paisagens à

espera de aventuras e safáris. Não é raro que encontremos pessoas que imaginam um

continente envolto em misticismo, com uma população envolvida com crenças primitivas

ou amaldiçoadas, ou de pessoas produtoras de uma arte “grosseira” e primitiva.

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Difundidas geralmente por documentários, jornais e revistas, e até mesmo na

escola, essas representações estereotipadas a respeito do continente e dos africanos

orientam-se pela desinformação e pelo etnocentrismo que pautou a relação, sobretudo da

Europa com a África, nos últimos séculos. Nessas representações um fato isolado é tido

como significativo para compreensão da história e cultura de todo o continente. Assim

ocorrem com as guerras civis, as doenças e a fome que, simbolicamente, expressam o que

seria a “face” do continente, a sua marca. Embora problemas sociais, políticos,

econômicos e culturais evidentemente existam na África, precisamos evitar tomá-los como

a única forma de compreender o continente. Algumas pessoas tentam ver tendências

africanas inatas para a guerra civil, o que é incorreto; outras tributam até mesmo uma

maldição19 a populações de origem africana.

Essas ideias absurdas foram e são ainda difundidas, sobretudo desde a

intensificação da relação da Europa com o continente, durante o longo processo de

colonização da África; expressam uma noção negativa que se tentou passar à história

como justificativa para a violência imposta ao continente.

Por várias destas razões, há pessoas que supõem que as populações africanas não

têm cultura nem história ou, no máximo, teriam desenvolvido apenas formas primitivas de

organização social e política e de produção cultural.

Diferentemente, podemos entender quase todas as guerras civis que assolaram e

ainda assolam o continente como resultantes de um complexo processo de agressão

cultural, política e material vivenciado pelas populações africanas durante séculos,

sobretudo a partir da colonização. Isso não quer dizer que não existiam guerras e conflitos

em África antes da chegada dos europeus. Mas se estudarmos com maior cuidado boa

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parte dos conflitos mais recentes, veremos não raízes inatas para a guerra, mas sim o

resultado das experiências de violência sofridas pelos africanos também a partir do contato

com outras culturas e povos. Alguns deles são resultantes do aprofundamento de antigas

guerras historicamente travadas entre grupos africanos em disputa por territórios e

riquezas, como se vê em outros continentes, mas que em África se perpetuaram ou se

acirraram em função dos sistemas de dominação e expropriação sofridos pelo continente.

O mesmo exercício de discernimento vale para o caso das expressões culturais

africanas, tidas por vezes como inferiores, atrasadas ou primitivas. As culturas africanas,

por serem diferentes de culturas como as europeias, foram muitas vezes classificadas

erroneamente como inferiores ou bárbaras. Elas são diferentes, inclusive entre si, movidas

por formas expressivas próprias, que também se transformam ao longo dos tempos. Pense

nisso sempre que você se deparar com uma imagem, texto ou representação sobre a

África e suas culturas.

COMO PODEMOS ESTUDAR A HISTÓRIA DA ÁFRICA?

Durante muito tempo se pensou que a África não tinha história porque boa parte de

sua população não tinha linguagem escrita tal como o têm, há muito, por exemplo,

algumas sociedades europeias e orientais. Essa ideia levou alguns estudiosos a classificar

a África de “bárbara e atrasada”.

Hoje sabemos o quanto essa noção equivocada prejudicou o estudo da história

africana e das populações afrodescendentes! A renovação dos estudos históricos e a

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revisão dessa postura negativa em relação à África resultaram na compreensão de que a

história africana pode e deve ser estudada pela interpretação e crítica de fontes de

natureza variada, tais como as fontes orais, arqueológicas, e também escritas, dentre

outras. De acordo com J. Ki-Zerbo, é preciso reconhecer que no que concerne ao

continente africano haverá três fontes principais para estudo histórico: os documentos

escritos, a arqueologia e a tradição oral (1982, vol. 1, p. 28). O estudo histórico do

continente a partir destes três tipos de fontes é apoiado pela linguística e pela antropologia.

Mas é preciso levar em consideração que há dificuldades de acesso a fontes para os

estudos históricos. Muitas delas foram destruídas com o tempo, pela ação humana e pelo

jogo de interesses em cada momento da história – como em todos os pontos do planeta. A

dinâmica histórica e os interesses em disputa em cada momento permitem ou impedem a

sobrevivência das fontes e sua organização e distribuição no tempo e no espaço. É

importante pensar, também, que as fontes históricas são fragmentárias, encontram-se

muitas vezes sob forte dispersão. Além disso, a história da África não nos permite pensar

numa homogeneidade de experiências históricas do continente, mas num complexo

mosaico de experiências simultâneas em diferentes pontos do continente e não raro

díspares.

Outra questão importante para o estudo da história africana e para análise das

fontes é a interdisciplinaridade. O estudo da história da África requer a colaboração de

diferentes áreas do conhecimento. Por fim é crucial que o estudo da história africana se

realize do ponto de vista africano, e não permaneça predominantemente atrelada, como

costuma ocorrer, a padrões eurocêntricos. Evidentemente que esta centralidade na África

não impede que se estabeleçam todas as conexões entre o continente e os demais povos

e Estados, mas sem perder de vista a reciprocidade, ou seja, estudando a África e as

relações que se estabelecem historicamente com os diferentes pontos do continente.

Um bom exemplo desta centralidade está no uso das palavras. É comum o uso de

expressões euro centradas para designar estruturas e processos vivenciados no decurso

da história da África. Assim ocorre com o uso frequente de termos como civilização,

império, reino, Estado para se referir à história e experiência de grupos e sociedades na

África. A consideração acerca da provável inadequação de uso de um ou outro vocábulo

destes para se referir aos africanos e à sua experiência pode ser rica oportunidade para

repensar em sala de aula novas maneiras de abordar o estudo da história da África.

Vamos compreender um pouco mais os desafios implicados no estudo da história

africana a partir de fontes de natureza diversa.

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FONTES ORAIS

Consideradas por alguns historiadores como fontes privilegiadas, as fontes orais

merecem tratamento tão cuidadoso para história africana quanto fontes de qualquer outra

natureza. Como nos alerta Elikia M’Bokolo, elas também não estão livres de fabulações.

Podemos considerar a extensa variedade de fontes orais para estudo da história

africana, com destaque para as fontes produzidas no seio do que se convencionou chamar

de tradições orais, em que estão aquelas de origem histórica, panegírica, religiosa,

individual, nas formas de poesia, listas, narrativas, didáticas ou comentários. (M’BOKOLO,

2009, p. 49).

Comparece também à análise historiográfica das fontes orais o questionamento a

respeito da temporalidade a que se remetem – elas nos falam, afinal, dos tempos

passados ou das formas como os povos do presente lidam com a sua história?

Essas questões nos mostram o rigor e a delicadeza exigidos do historiador no

trabalho com as fontes orais, sobretudo no caso das narrativas de origem, abundantes em

todas as áreas culturais e políticas na África (M’BOKOLO, 2009, p. 48).

Entre alguns grupos africanos é comum que encontremos os doma e os delis. Os

doma (também chamados pelos europeus de “tradicionalistas”) são considerados os mais

nobres transmissores de histórias de origem e trajetória social de um grupo africano, não

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podendo mentir nunca e nem mesmo faltar à própria palavra. Se um doma mentisse ele

estaria perdendo a capacidade de criar uma ordem social e, mesmo, comprometendo a

sua própria existência como humano. Para um doma, a verdade ancestral é uma força que

o mantém vivo, sendo que ele tem o papel social de perpetuá-la para as novas gerações.

Os domas são, quase sempre, pessoas idosas, consideradas depositárias da memória de

seu grupo ou de sua família. Em várias regiões africanas existem escolas de iniciação ao

exercício da récita e da transmissão oral. Essas escolas, normalmente escolas que formam

os doma, guardadas suas especificidades, têm em comum “a fé na palavra que emana do

ser supremo como instrumento de criação de todo o universo” (HERNANDEZ, 2005, p.29).

Os delis (chamados de Gritos, ou Gris) são também contadores de histórias, que

incorporam uma carga ficcional à suas narrativas. Em suas viagens, escutam histórias das

famílias e as contam em narrativas muitas vezes heroicas e épicas25, capazes de

transformar as tradições em glória, esperança e sonho. São o que se poderia chamar de

animadores públicos e tecem mundos com palavras, músicas e coreografia. “Diéli quer

dizer sangue, e a circulação do sangue é a própria vida” (LIMA, 1998, p.26).

Mas o que pode representar um manancial instigante para compreensão dos

registros culturais africanos, pode também contribuir para simplificar ou cometer

reducionismos. Caso venham a ser tomadas de maneira desconectadas de seu contexto

de produção, as narrativas orais podem favorecer uma compreensão linear e factual da

história africana, promovendo-se o que Carlos Moore chama de uma “recitação linear,

desprovida de dinamismo social orgânico e sem interconexões das sociedades africanas

ou com as sociedades extra-africanas (2008, p. 175).

J. Ki-Zerbo alerta que “o texto oral retirado de seu contexto é como peixe fora da

água: morre e se decompõe. Isolada, a tradição assemelha-se a essas máscaras africanas

arrebatadas da comunhão dos fiéis para serem expostas à curiosidade dos não-iniciados.

Perde sua carga de sentido e de vida” (1982, vol. 1, p. 28).

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FONTES ARQUEOLÓGICAS E BENS CULTURAIS

A arqueologia é uma ciência que estuda a história através da análise de objetos e

vestígios considerados testemunhos da existência humana em algum ambiente. Esses

objetos e vestígios podem ser variados, como ossos, peças feitas de osso, cerâmicas,

artefatos em ferro, vidro, metal e pedraria, além de pegadas, rastros e outros. Na África, a

arqueologia já ofereceu aos estudiosos muitos indícios acerca da existência de sociedades

antigas, as mais antigas do planeta. Há também vestígios de sociedades organizadas,

muitas delas com sofisticada capacidade artística e técnica, como é o caso de

comunidades da região de Ifé, Oió e Benin, além do Egito Faraônico.

Onde foi possível descobrir registros artísticos, a arqueologia mostrou às

sociedades ocidentais que a África não deixa a desejar do ponto de vista da capacidade de

produzir cultura e expressões artísticas criativas e belas. Pela contribuição da arqueologia

foi possível compreender parte da história da África relacionada, por exemplo, à

metalurgia, a partir da descoberta de sítios em que foi comum a metalurgia do ferro no

período da chamada África Antiga.

Da mesma maneira que o domínio do ferro, a arqueologia permitiu compreender

parte desta história africana pela análise de registros materiais típicos de práticas

agrícolas, como mostraram escavações em sítios cerâmicos.

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Por meio das escavações arqueológicas, é possível recuperar uma série de objetos

da cultura material de povos que se deslocaram pelo continente africano no tempo. Os

registros de ocupação do território (na sua já conhecida variedade de relevo e clima)

permitiu aos arqueólogos e aos estudiosos de outros campos do conhecimento a

compreensão da complexa história africana em períodos longevos.

A existência de algumas sociedades africanas em tempos os mais remotos também

pode ser estudada através dos objetos rituais, ligados à economia e artísticos, como

estátuas, espadas, ferramentas, adornos, etc. A variedade de formas, usos e materiais

utilizados também pode conferir análises significativas ao estudioso da história e cultura

africana. Apesar de sua variedade e riqueza para compreensão da história, as fontes

arqueológicas não podem ser estudadas homogeneamente em todo o continente. Segundo

G. Mokhtar27 (1983, p. 12), as escavações não se distribuem de maneira uniforme em

todo o continente. Em diversas partes não há a mesma densidade de escavações que

podem ser encontradas, por exemplo, ao longo da costa africana, no interior da chamada

franja setentrional e principalmente no vale do NiÉ importante também lembrar que os

bens materiais são produzidos em contextos específicos em que práticas e concepções de

mundo conferem a estes bens usos determinados. Assim, é valiosa a compreensão, por

exemplo, de que numa determinada sociedade uma estatueta tenha sido produzida para

representar o poder de um grupo sobre outro, ou a capacidade de um elemento natural de

modificar ou controlar a vida humana.

A análise de registros culturais precisa, portanto, levar em consideração as práticas

culturais a eles relacionadas e também a trajetória social e histórica destes mesmos

objetos/registros e práticas. Pensemos que todas as manifestações culturais são

relevantes para compreensão do mosaico cultural africano, sendo as festas, ritos, saberes,

modos de fazer, a música, os modos de vestir, a rica e diversa alimentação, as

concepções políticas, as cosmogonias, etc.

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FONTES ESCRITAS, MANIFESTAÇÕES ARTÍSTICAS E

ICONOGRÁFICAS

Diferentemente do que se pode pensar, a África também tem acervos escritos.

Neste caso, o que se entende por escrita é o registro comunicativo escrito em qualquer

suporte (não apenas em livros, mas em papirus, em pedra, em paredes e lapas, em tecido

e outros) e com utilização de códigos discursivos próprios das sociedades africanas,

incluindo neste caso também os hieróglifos. As chamadas escritas autóctones africanas

incluem os hieróglifos egípcios (uma das mais antigas formas de escrita da humanidade),

sistemas gráficos como o da núbia antiga, o copta, o tifinagh (sistema de escrita milenar

utilizado pelos povos tuaregues), o ge’ez (sistema de escrita etíope), dentre outros. Há

também os ideogramas, que são sistemas escritos comunicacionais utilizados em regiões

do Camarões e da Nigéria.

Há também fontes escritas sobre a África que são de origem estrangeira – árabes e

europeias. Esse dado confere à história africana algumas peculiaridades, como já

observou M’Bokolo, 2009. São importantes os relatos escritos deixados tanto por africanos

quanto por viajantes e boa parte dos relatos até hoje encontrados foram produzidos por

sujeitos como imperadores, traficantes de escravos, comerciantes, militares e

exploradores, missionários, naturalistas e administradores coloniais. Hoje sabemos que há

uma infinidade de fontes arquivísticas e narrativas depositadas em instituições africanas,

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como é o caso, por exemplo, das Bibliotecas do Marrocos, da Argélia, do Níger, e em

arquivos ultramarinos nas ex-metrópoles.

As fontes escritas são absolutamente variadas, como podemos supor.

Correspondências, diários, narrativas literárias, relatos de viagem, fontes oficiais, registros

demográficos, registros comerciais, religiosos, etc. Como é possível perceber, as fontes

escritas têm sua origem tanto na produção individual quanto grupal podendo ser oficiais ou

não. Há também as fotografias, tecidos, desenhos, pinturas, mapas, dentre outros... Os

mapas, por exemplo, produzidos principalmente pelas sociedades de geografia da Europa,

são fonte riquíssima para se entender a história da África; hoje sabemos que a

representação do espaço africano mudou muito ao longo da historia, um indício de que

nem sempre a África foi vista pelos europeus da mesma forma como a vemos nos dias de

hoje. Os tecidos, por outro lado, informam que a África produziu culturas materiais com

uma infinidade de variações têxteis e uma tinturaria que indica um apurado gosto estético,

variado, ontem e hoje.

As fontes artísticas são de natureza também variada, não sendo possível

categorizá-las numa tipologia única. O que se considera, por exemplo, como arte saariana

antiga mais significativa deve ser procurada, sobretudo nas figurações rupestres

(SALAMA, 1983, p. 536). O Egito africano antigo, por ter sido um receptáculo de

influências, configurou uma arte plural e dinâmica que não pode ser compreendida sem

estudo da ética, do direito, das concepções políticas, religiosas, morais e econômicas

daquela sociedade. (YOYOTTE, 1983, passin). Não custa alertar para o fato de que é

mutável no tempo e no espaço o que se considera arte ou manifestação artística.

Então, ao abordar essa questão das fontes com seus alunos, você poderá

proporcionar a eles a percepção de que a história pode ser estudada a partir de uma ampla

variedade de registros humanos e a história da África não foge a essa regra. O importante,

em todas as situações, é procurar contextualizar as fontes, realizando uso crítico e

reflexivo das mesmas, sem mitificações ou omissões. Estudos comparativos podem ser

valiosos, como também análise de posições historiográficas distintas para um mesmo fato

histórico. Não custa reforçar também o alerta de que nem sempre será possível

encontrarmos fontes para elucidação de toda a história e isso, como você sabe, não é

atributo apenas do estudo da história da África. Em alguns casos, fazer os alunos

pensarem sobre a destruição das fontes é a melhor maneira de abordar a história da África

e da diáspora.

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REFLEXÕES SOBRE A PRÁTICA PEDAGÓGICA:

O Professor e as Mudanças

Não é fácil para nenhum educador colocar em prática tantas mudanças acerca do

currículo escolar. Neste prisma, torna-se imperativo ao professor adotar uma decisão. Ser

apolítico nestas circunstancias implica em pactuar com a injustiça e a desigualdade em

sala de aula. Muitos ainda abraçam a postura reacionária. No mini-dicionário escolar

Aurélio, encontra-se definido reacionário como aquele que se opõe a quaisquer inovações

no campo das atividades humanas. Logo, aquele que se recusar, enquanto educador, a

adjudicar identidade ao negro, ao indígena ou outros povos inferiorizados cultural e social e

deve restaurar seus conceitos sobre a prática docente e o que esta preconiza. Nesta

acepção, Santos (2001, p.105) assevera que

(...) no cotidiano escolar a educação antirracista visa a erradicação do preconceito,

das discriminações e de tratamentos diferenciados. Nela estereótipos e ideias

preconcebidas, estejam onde estiverem (meios de comunicação, material didático e de

apoio, corpo discente e docente etc.) precisam ser duramente criticados e banidos. É o

caminho que conduz a valorização da igualdade nas relações. E para isso, o olhar crítico é

ferramenta mestra. Lecionar, neste ensejo exige clareza de objetivos, metas as quais se

quer chegar em qualquer processo de ensino-aprendizagem. Entretanto não se observa

que, no decorrer desse período houve uma grande troca de experiências, situações reais

de vivência entre diferenças. Diferenças essas que, se não forem mediadas num contexto

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de equidade motivam uma atmosfera de desigualdade, pois (...) na educação, nem sempre

os agentes estão conscientes de que a manutenção dos preconceitos seja um problema.

Dessa forma interiorizamos atitudes e comportamentos discriminatórios que passam a

fazer parte do nosso cotidiano, mantendo e/ ou disseminando as desigualdades sociais.

(CAVALLEIRO, 2001, p. 152).

A intervenção nos casos de discriminação, racismo, preconceito e demais formas de

desagregação social é fundamental para que não se perpetuem atos contra a humanidade

em nome da superioridade de uma “raça” em detrimento de outra. Cavalleiro (2001) infere

que A ausência de iniciativas diante de conflitos raciais entre alunos e alunas mantém o

quadro de discriminação. Diante desses conflitos, o “silencio” revela conivência com tais

procedimentos. Para a criança discriminada indica menosprezo pelo seu sofrimento. E,

principalmente explicita que ela não pode contar com nenhum apoio em outras situações

semelhantes (p. 153).

O dia-a-dia de uma escola pode ser o meio de dissipação ou dispersão de atitudes

preconceituosas. Assumir a situação, concebendo que a desigualdade existe é basilar para

uma mudança, na medida em que se compreende a escola como aparelho ideológico pois,

Mesmo admitindo que a escola transmita os valores das classes dominantes, cabe

refletir: os alunos seriam sempre de modo homogêneo, aceitando tudo, como se fossem

maquinas? (...) O processo de transmissão de ideologia na escola não ocorre sem conflito.

Aos valores da classe dominante que os professores conservadores impõem na sala de

aula, os alunos reagem de modo dinâmico (...) (MEKSENAS, 2003, p.81)

Nestes termos, cabe a equipe escolar – diretor, apoio pedagógico, professores,

funcionários afins – colocar em exercício os preceitos da 10.639, já que uma criança não

internaliza apenas o que lhe atinge sensorialmente (xingamentos, agressões físicas), mas

também atos subliminares. Cavalleiro (2001), assegura que o não-verbal (gestos, olhares e

outras atitudes) no cotidiano escolar expressa tanto o tipo de relacionamento aceito e

valorizado, quanto o não aceito, não valorizado, desejado. A autora ainda destaca dois

itens importantes para a formação de sentimentos racistas. Um deles é o afastamento que

tende a evitar contato físico e diálogo, por muito oriunda de uma relação distante entre

professores e alunos. O outro é a rejeição, no qual abdica-se de toda e qualquer relação

proximal, seja por contato físico ou verbal com o outro, no caso o negro. (CAVALLEIRO,

2001)

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ATIVIDADES DE FIXAÇÃO

1- Ciente das desigualdades e discriminações que atingem a população negra,

convicto de sua função mediadora entre o Estado, sistemas de ensino e

demandas da população na sua diversidade social, étnico-racial, o Conselho

Nacional de Educação (CNE) interpretou as determinações da

Lei_____________ que introduziu, na Lei 9394/1996 das Diretrizes e Bases da

Educação Nacional, a obrigatoriedade do ensino de história e cultura Afro-

Brasileira e Africana. Estamos nos referindo a lei número (complete a frase):

a) 10.639/2003

b) 10.649/2004

c) 10.659/2003

d) 10.669/2002

2- A sociedade brasileira sempre foi multicultural, desde os 1500, data que se

convencionou indicar como de início da organização social e política em que

vivemos. Sobre esse tema, marque a alternativa incorreta:

a) Esteve sempre formada por grupos étnico-raciais distintos, com cultura, língua e

organização social peculiares, como é o caso dos povos indígenas que por aqui

viviam quando da chegada dos portugueses e de outros povos vindos da

Europa.

b) Também os escravizados, trazidos compulsoriamente para cá, provinham de

diferentes nações e culturas africanas conhecidas por pensamentos, tecnologias,

conhecimentos, inclusive acadêmicos, valiosos para toda a humanidade. No

entanto, esta diversidade não foi e hoje o é, com muita dificuldade, aceita.

c) A sociedade brasileira sempre foi formada por grupos homogêneos e a

discriminação nunca existiu.

d) Fala-se e pensa-se como se a realidade fosse meramente uma construção

intelectual; como se as desigualdades e discriminações, malgrado as denúncias

e reivindicações de ações e movimentos sociais não passassem de mera

insatisfação de descontentes.

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3- Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no

âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística

e de Literatura e História Brasileiras. Estabelece, ainda, “o Dia Nacional da

Consciência Negra”. Esse deve ser comemorado em:

a) 15 de novembro

b) 20 de novembro

c) 22 de novembro

d) 25 de novembro

4- A educação das relações étnico-raciais tem por objetivo a:

a) O ensino da história e cultura afro-brasileira e africana.

b) Garantia de reconhecimento e igualdade de valorização das raízes africanas da

nação brasileira, ao lado das indígenas, europeias, asiáticas.

c) Divulgação e produção de conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e

valores que eduquem cidadãos quanto à pluralidade étnico-racial, tornando-os

capazes de interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos,

respeito aos direitos legais e valorização de identidade, na busca da

consolidação da democracia brasileira.

d) Nas instituições de ensino superior, a educação das relações étnico-raciais e o

estudo de história e cultura afro-brasileira.

5- A demanda por reparações visa a que o Estado e a sociedade tomem medidas

para ressarcir os descendentes de africanos negros, dos danos psicológicos,

materiais, sociais, políticos e educacionais sofridos sob o regime escravista, bem

como em virtude das políticas explícitas ou tácitas de branqueamento da

população, de manutenção de privilégios exclusivos para grupos com poder de

governar e de influir na formulação de políticas, no pós-abolição. Visa também a

que tais medidas se concretizem em iniciativas de combate ao racismo e a toda

sorte de discriminações. Sobre esta marque a alternativa correta:

a) Cabe ao Estado promover e incentivar políticas de reparações, no que cumpre

ao disposto na Constituição Federal, Art. 205, que assinala o dever do Estado de

garantir indistintamente, por meio da educação, iguais direitos para o pleno

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desenvolvimento de todos e de cada um, enquanto pessoa, cidadão ou

profissional.

b) Sem a intervenção do Estado, os postos à margem, entre eles os afro-

brasileiros, dificilmente, e as estatísticas o mostram sem deixar dúvidas,

romperão o sistema meritocrático que agrava desigualdades e gera injustiça, ao

reger-se por critérios de exclusão, fundados em preconceitos e manutenção de

privilégios para os sempre privilegiados.

c) Políticas de reparações voltadas para a educação dos negros devem oferecer

garantias a essa população de ingresso, permanência e sucesso na educação

escolar, de valorização do patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro, de

aquisição das competências e dos conhecimentos tidos como indispensáveis

para continuidade nos estudos, de condições para alcançar todos os requisitos

tendo em vista a conclusão de cada um dos níveis de ensino, bem como para

atuar como cidadãos responsáveis e participantes, além de desempenharem

com qualificação uma profissão.

d) Todas as alternativas estão corretas.

6- Sobre a palavra reconhecer, marque a alternativa incorreta:

a) Reconhecimento requer a adoção de políticas educacionais e de estratégias

pedagógicas de valorização da diversidade, a fim de superar a desigualdade

étnico-racial presente na educação escolar brasileira, nos diferentes níveis de

ensino.

b) Reconhecer exige que se questionem relações étnico-raciais baseadas em

preconceitos que desqualificam os negros e salientam estereótipos

depreciativos, palavras e atitudes que, velada ou explicitamente violentas,

expressam sentimentos de superioridade em relação aos negros, próprios de

uma sociedade hierárquica e desigual.

c) Reconhecer é também valorizar, divulgar e respeitar os processos históricos de

resistência negra desencadeados pelos africanos escravizados no Brasil e por

seus descendentes na contemporaneidade, desde as formas individuais até as

coletivas.

d) Reconhecer não exige a valorização e respeito às pessoas negras, à sua

descendência africana, sua cultura e história. Não significa buscar, compreender

seus valores e lutas, não ser sensível ao sofrimento causado por tantas formas

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de desqualificação: apelidos depreciativos, brincadeiras, piadas de mau gosto

sugerindo incapacidade, ridicularizando seus traços físicos, a textura de seus

cabelos, fazendo pouco das religiões de raiz africana; pois todas essas coisas

são normais.

7- Convivem, no Brasil, de maneira tensa, a cultura e o padrão estético negro e

africano e um padrão estético e cultural branco europeu. Porém, a presença da

cultura negra e o fato de _____ da população brasileira ser composta de negros

(de acordo com o censo do IBGE) não têm sido suficientes para eliminar

ideologias, desigualdades e estereótipos racistas. Qual é esse percentual?

a) 55%

b) 35%

c) 45%

d) 65%

8- A obrigatoriedade de inclusão de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nos

currículos da Educação Básica trata-se de decisão política, com fortes

repercussões pedagógicas, inclusive na formação de professores. Com esta

medida, reconhece-se que:

a) Além de garantir vagas para negros nos bancos escolares, é preciso valorizar

devidamente a história e cultura de seu povo, buscando reparar danos, que se

repetem há cinco séculos, à sua identidade e a seus direitos.

b) A relevância do estudo de temas decorrentes da história e cultura afro-brasileira

e africana não se restringem à população negra, ao contrário, dizem respeito a

todos os brasileiros, uma vez que devem educar-se enquanto cidadãos atuantes

no seio de uma sociedade multicultural e pluriétnica, capazes de construir uma

nação democrática.

c) Ampliar o foco dos currículos escolares para a diversidade cultural, racial, social

e econômica brasileira.

d) Incluir no contexto dos estudos e atividades, que proporciona diariamente,

também as contribuições histórico-culturais dos povos indígenas e dos

descendentes de asiáticos, além das de raiz africana e europeia.

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GABARITO

Nome do Aluno:_________________________________________________________________

Curso:_________________________________________________________________________

Disciplina:______________________________________________________________________

Data de envio: __________/____________/_________________.

Questão Letra

1

2

3

4

5

6

7

8

________________________

Assinatura do Aluno