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1189 Interferência entre a deformação regional varisca e a instalação de granitóides – implicações estruturais na implantação dos campos de aplito-pegmatitos (Minho, NW Portugal) Interference between variscan deformation and the emplacement of granitoids – structural implications on the intrusion of aplite- pegmatite fields (Minho, NW Portugal) Pamplona, J., Leal Gomes, C.L. & Dias, P. Núcleo de Investigação Geológica, Ordenamento e Valorização de Recursos, Universidade do Minho, Campus de Gualtar, 4710-057 Braga [email protected] SUMÁRIO O padrão de distribuição dos corpos filonianos aplito-pegmatíticos graníticos está fortemente condicionado pelos campos de tensões das fases de deformação varisca (D 2 e D 3 ) e pela estruturação que estas determinam no encaixante, mas também é consequência da interferência dessas fases de deformação com as etapas de ascensão e instalação dos maciços graníticos. A cinemática complexa tangencial (tardi-D 2 ) - transcorrente dextrógira e tangencial (sin-D 3 ) - transcorrente sinestrógira (tardi-D 3 ) determinam o modo de implantação dos corpos filonianos. Palavras-chave: granitos, corpos filonianos, deformação varisca, cinemática, instalação SUMMARY The pattern of cartographic distribution of aplite-pegmatite bodies is strongly affected by stress and deformation of D 2 and D 3 related to Variscan Orogeny, and depends on host-rocks structures. The aplite-pegmatite distribution and its internal geometries also results from interference between deformation phases and rising / emplacement of granitic plutons. Complex kinematics - tangencial late D 2 , dextral transcurrent and tangential sin-D 3 and sinistral transcurrent late-D 3 are decisive to dyke intrusion. Key-words: granites, dyking bodies, variscan deformation, kinematics, emplacement Introdução O padrão de distribuição cartográfica dos corpos filonianos no autóctone e parautóctone do Minho evidenciam uma forte influência, tanto da deformação regional, como da interferência desta com a instalação dos maciços granitos sin- tectónicos, desde os mais precoces (tardi-D 2 ) até aos mais tardios (sin a tardi-D 3 ). No sector em estudo, aquando da implantação dos granitóides, o encaixante encontra-se bastante estruturado. Os maciços quando se instalam também impõem, localmente, uma deformação que é bem visível, por exemplo, na adaptação das trajectórias de xistosidade à morfologia dos maciços e na afectação de importantes corredores de cisalhamento estabelecidos na sua vizinhança (Fig.1). O contraste de competência entre os maciços graníticos e o encaixante metassedimentar em conjugação com modificações do campo de tensões ao longo das últimas fases da deformação varisca permite sucessivas reactivações dos corredores de cisalhamento referidos, de molde a que também sucessivas gerações de corpos filonianos aplito- pegmatíticos e quartzosos se instalem, definindo padrões de distribuição cartográfica próprios, resultantes de cinemáticas distintas.

Interferência entre a deformação regional varisca e a ... · continuidade do fraccionamento magmático, a intrusão de alguns corpos aplito-pegmatíticos ... do achatamento apical

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Interferência entre a deformação regional varisca e a instalação de

granitóides – implicações estruturais na implantação dos campos de

aplito-pegmatitos (Minho, NW Portugal)

Interference between variscan deformation and the emplacement of

granitoids – structural implications on the intrusion of aplite-

pegmatite fields (Minho, NW Portugal)

Pamplona, J., Leal Gomes, C.L. & Dias, P.

Núcleo de Investigação Geológica, Ordenamento e Valorização de Recursos,

Universidade do Minho, Campus de Gualtar, 4710-057 Braga

[email protected]

SUMÁRIO O padrão de distribuição dos corpos filonianos aplito-pegmatíticos graníticos está fortemente condicionado pelos campos de tensões das fases de deformação varisca (D2 e D3) e pela estruturação que estas determinam no encaixante, mas também é consequência da interferência dessas fases de deformação com as etapas de ascensão e instalação dos maciços graníticos. A cinemática complexa tangencial (tardi-D2) - transcorrente dextrógira e tangencial (sin-D3) - transcorrente sinestrógira (tardi-D3) determinam o modo de implantação dos corpos filonianos.

Palavras-chave: granitos, corpos filonianos, deformação varisca, cinemática, instalação

SUMMARY The pattern of cartographic distribution of aplite-pegmatite bodies is strongly affected by stress and deformation of D2 and D3 related to Variscan Orogeny, and depends on host-rocks structures. The aplite-pegmatite distribution and its internal geometries also results from interference between deformation phases and rising / emplacement of granitic plutons. Complex kinematics - tangencial late D2, dextral transcurrent and tangential sin-D3 and sinistral transcurrent late-D3 are decisive to dyke intrusion.

Key-words: granites, dyking bodies, variscan deformation, kinematics, emplacement

Introdução O padrão de distribuição cartográfica dos corpos filonianos no autóctone e parautóctone do Minho evidenciam uma forte influência, tanto da deformação regional, como da interferência desta com a instalação dos maciços granitos sin-tectónicos, desde os mais precoces (tardi-D2) até aos mais tardios (sin a tardi-D3). No sector em estudo, aquando da implantação dos granitóides, o encaixante encontra-se bastante estruturado. Os maciços quando se instalam também impõem, localmente, uma deformação que é bem visível, por exemplo, na adaptação das trajectórias

de xistosidade à morfologia dos maciços e na afectação de importantes corredores de cisalhamento estabelecidos na sua vizinhança (Fig.1). O contraste de competência entre os maciços graníticos e o encaixante metassedimentar em conjugação com modificações do campo de tensões ao longo das últimas fases da deformação varisca permite sucessivas reactivações dos corredores de cisalhamento referidos, de molde a que também sucessivas gerações de corpos filonianos aplito-pegmatíticos e quartzosos se instalem, definindo padrões de distribuição cartográfica próprios, resultantes de cinemáticas distintas.

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O presente trabalho propõe a integração de resultados de análise geométrica relativa a diferentes maciços e respectivos campos filonianos, no sentido da aquisição de um modelo cinemático de interferência deformação/intrusão que seja coerente para este sector (Fig. 1).

Fig.1: Mapa geológico simplificado com a localização dos campos filonianos objecto de estudo: 1-Antiforme de Viana do Castelo-Caminha ; 2- Serra de Arga; 3 – Granito de Crasto (Vilar de Mouros). Adaptado de [1, 2, 5].

Análise estrutural Campo filoniano associado ao Antiforme de Viana do Castelo-Caminha A ascensão e instalação de granitos no final de D2 associada a retrocisalhamentos NNW-SSE com vergência para W [2, 3, 4] determina, na continuidade do fraccionamento magmático, a intrusão de alguns corpos aplito-pegmatíticos (Fig.2A). Localmente a pressão de fluidos gerada pelas massas magmáticas é muito elevada originando brechas hidráulicas no encaixante (sectores proximais ao maciço). É de notar que os corpos filonianos que intruíram no final de D2 foram, posteriormente, sujeitos a dobramento em D3. A trancorrência dextrógira sin-D3 gerou corredores en-échelon, com distensão local, e dobramento que permitiram a instalação dos granitos em impulsos sucessivos [2, 4]. A interferência entre a transcorrência regional e a instalação do granito provocou o dobramento da xistosidade, a modificação angular dos filões instalados em cisalhamentos conjugados (em relação com a amplificação do maciço), a rotação de alguns filões – com o mesmo sentido de rotação do maciço - ou sectores de escape lateral que levaram à concentração dos corpos filonianos em zonas

marginais. A transcorrência dextrógira também induziu a reactivação dúctil-frágil de corredores de cisalhamento precoces que foram intruídos por corpos filonianos en-échelon (Fig.2B). A modificação do campo de tensões tardi-D3 foi responsável por nova reactivação, agora sinestrógira, dos corredores de cisalhamento, provocando um dobramento suave NE-SW que gerou padrões de interferência do tipo1 (doma-bacia) com as dobras D3 [3] e, ainda, estruturas Riedel as quais foram aproveitadas pelos corpos filonianos para se instalarem (Fig.2C).

Fig.2: Esquema da evolução estrutural do antiforme de Viana do Castelo-Caminha - cinemática e padrões de distribuição cartográfica dos corpos filonianos. A – adaptado de [2, 4]; B – adaptado de [3].

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Campo filoniano da Serra de Arga A instalação diapírica do maciço granítico de Arga condicionou fortemente as estruturas do encaixante, fundamentalmente no que diz respeito à criação, no sector proximal, de um conjunto de cisalhamentos tangenciais, radiais e em cone-sheets, múltiplas vezes preenchidos por rochas filonianas. A interacção da deformação promovida pela instalação do diapiro com a deformação regional sin a tardi-D3 está patente no modo como as diferentes superfícies S2 e S3, axiais e de cisalhamento se adaptaram à morfologia elíptica do plutonito. Também se expressa na crenulação e no dobramento observados nos sectores proximais do encaixante contíguos às zonas de extravasamento lateral do diapiro. A complementaridade entre a evolução diapírica, com maior influência em sectores próximos do maciço, e a deformação regional, com maior influência em sectores afastados, reflecte-se no arqueamento e deformação do enxame “sill” [5]. A interferência entre a deformação regional e o diapirismo promove o escalonamento temporal das diferentes gerações de aplito-pegmatitos e a sua distribuição não homogénea pelos diferentes sectores do campo filoniano [5]. No decurso da instalação do diapiro este passa por várias etapas (Fig.3) responsáveis, em fases mais precoces (amplificação e expansão lateral), por um aumento da tensão centrífuga sobre o encaixante. Nas fases finais ocorre contracção do diapiro durante o arrefecimento. Este processo interage com a deformação regional segundo as trajectórias de tensões traçadas na Fig.3. Na etapa de amplificação (Fig.3A), nos sectores distais mais próximos do diapiro, o ângulo de conjugação entre os filões cruzados alarga-se, enquanto que nos sectores distais mais afastados continuam a definir-se fracturas conjugadas. Nos sectores proximais os filões radiais e os paralelos a S2 começam a sofrer deformação dúctil, decorrente do achatamento apical do encaixante, motivado pela amplificação e também dependente do encurtamento associado a D3. Durante o processo a S2 é dobrada por D3 [5]. A etapa de expansão lateral (Fig.3B) é marcada pelo amadurecimento do diapiro que contraria a compressão de D3 gerando pontos triplos a NW e SE. Nos sectores distais intensifica-se a deformação dos filões cruzados e nos sectores proximais, na sequência da expansão lateral, opera-se a emissão do enxame “sill”, dobrado pela inércia da expansão lateral (sectores proximais) e por acção da D3 (sectores distais). No final desta etapa uma S3 de plano axial está definida [5]. As etapas de dissipação do diapirismo – amortecimento e contracção (Fig.3C,D), promovem a cicatrização de fracturas subparalelas ao contacto com o plutonito, por filões peri-graníticos essencialmente pegmatíticos. Nesta etapa assiste-se

a um deslocamento tangencial que tende posteriormente para uma transcorrência sinestrógira, a qual gera trajectórias de cisalhamento esquerdo moldadas ao contorno do maciço [5].

Fig.3: Representação esquemática da evolução estrutural do campo filoniano da Serra de Arga - cinemática e padrões de distribuição cartográfica dos corpos filonianos. Adaptado de [5].

Campo filoniano associado ao Granito do Crasto (Vilar de Mouros) A evolução estrutural do campo filoniano associado ao granito do Crasto decorre de sin-D3 a tardi-D3 (Fig.4). A definição, em transtensão, de uma estrutura pull-a-part desenvolvida numa zona de cisalhamento dextrógira permitiu a intrusão do granito do Crasto em sin-D3. O seu domínio apical tardio, a sul, acolhe os correspondentes diferenciados pegmatíticos menos evoluídos. A interacção entre a intrusão do granito sincrónica de D3 e a deformação regional, gerou a crenulação e o dobramento de S2 e, ainda, a adaptação das superfícies axiais e de S3 ao contorno do plutonito (Fig.4A). O incremento da compressão D3, promoveu movimentos tangenciais, os quais por

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filter-pressing incrementaram a intrusão filoniana apical e en-échelon (Fig.4B). A modificação da compressão máxima em episódio tardi-D3 para um rumo aproximadamente E-W é responsável pela génese, no sector proximal do plutonito, de um cisalhamento dúctil-frágil tardio que possibilita a implantação dos aplito-pegmatitos mais evoluídos do corredor de Real (Fig.4C). A transcorrência sinestrógira ulterior proporciona a instalação do corredor de Castelhão com filões de quartzo intra-graníticos, enquanto que no corredor de Real se observa um paralelização dos filões sin e tardi-D3 (Fig.4D).

Fig.4: Representação esquemática da evolução estrutural do campo filoniano associado ao granito de Crasto (Vilar de Mouros) - cinemática e padrões de distribuição cartográfica dos corpos filonianos.

Conclusão O padrão de distribuição cartográfica heterogéneo dos corpos filonianos, o seu escalonamento temporal e a sua cinemática de instalação e evolução geométrica está dependente de dois aspectos: (1) a modificação do campo de tensões no decurso da deformação varisca; (2) a interferência entre a deformação regional varisca e a instalação dos maciços graníticos parentais. A sucessão de etapas de evolução morfológica dos maciços, em particular no caso dos diapiros, tanto na amplificação e expansão lateral centrífuga (compressão e ocasional pushing-a-side sobre o encaixante), como no amortecimento e contracção centrípeta (tracção sobre o encaixante), influencia o modo de instalação e deformação dos corpos filonianos, fazendo-se sentir mais fortemente nos sectores proximais. Nos diversos maciços graníticos existe paralelismo ao nível dos padrões de instalação filoniana relacionados com a transcorrência dextrógira ou com movimentos tangenciais sin-D3 – intrusão apical e en-échelon. A génese de cisalhamentos esquerdos moldados aos maciços e a implantação de filões, por vezes, em estruturas Riedel é característica da transcorrência sinestrógira tardi-D3.

Referências Bibliográficas [1] Pereira, E., Carvalho, G. S., Noronha, F., Ferreira, N., Monteiro, J., & Ribeiro, A. (1989) - Carta Geológica de Portugal- Folha 1 - 1/200 000. Serviços Geológicos de Portugal, Lisboa. [2] Pamplona, J. (2001) – Tectónica do antiforma de Viana do Castelo – Caminha (ZCI) - Regime de deformação e instalação de granitóides. Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, Braga, p.197. [3] Pamplona, J., Gutiérrez-Alonso, G. & Ribeiro, A. (2005) - Superposition of shear zones during orogenic development: an example from the NW Iberian Variscan Belt (Viana do Castelo NW Portugal). Journal of Structural Geology (submetido). [4] Pamplona, J., Silva, P., Miranda, M. & Ribeiro, A. (2006) – Multiphase rising and emplacement of Variscan granites: an example of the Viana do Castelo – Caminha antiform. (em preparação). [5] Leal Gomes, C. (1994) – Estudo Estrutural e paragenético de um sistema pegmatóide granítico. - O campo aplito-pegmatítico de Arga – Minho (Portugal). Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, Braga, p. 695. [6] Roberts, J.L. (1970) – The intrusion of magma into brittle rocks. In Newal and rast, mechanism of igneous intrusio. Gallery Press, Liverpool, pp. 287-338.