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ISSN 2237-2318 Revista Científica do Claretiano – Centro ... música, pois “[...] sólo ella puede expresar, o dicho, directamente encarnar, justamente en virtud de su carácter

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Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 3, n. 1, p. 7, jan./jun. 2013 1

Revista Científica do Claretiano – Centro Universitário

Batatais - SP

v. 3, n.1, p. 1-209, jan./jun. 2013

ISSN 2237-2318

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Claretiano – Centro Universitário Linguagem Acadêmica – Revista Científica / Claretiano – Cen-tro Universitário – Batatais, SP.Coordenadoria Geral de Pesquisa e Iniciação Científica (CPIC), v. 3, n. 1 (jan/jun. 2013)

ISSN 2237-2318

Semestral1. Linguagem Acadêmica 2. Periódico científico I. Claretiano – Centro Universitário

Ficha Catalográfica

Claretiano - Centro UniversitárioRua Dom Bosco, n. 466 – Castelo

14300-000 – Batatais (SP)Fone: (16) 3660-1770 – Ramal: 1680

E-mail: [email protected]

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REITORIA

ReitorDr. Pe. Sérgio Ibanor Piva

Pró-Reitor AdministrativoPe. Luiz Claudemir Botteon

Pró-Reitor AcadêmicoProf. Ms. Luís Cláudio de Almeida

Pró-Reitor de Extensão e Ação ComunitáriaMs. Pe. José Paulo Gatti

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4 Educação, Batatais, v. 3, n. 1, p. 1-209, junho, 2012

Editor ResponsávelRafael Archanjo Coordenador Geral de Pesquisa e Iniciação Científica (CPIC)

Conselho EditorialAdriana Lúcia Carolo (CLARETIANO-SP)Alexandre Pavanati (UNISUL-SC)Aline Sommerhalder (UFSCAR-SP)Antônio Donizetti Gonçalves de Souza (UNIFAL-MG)Aparecida Dinalli (CLARETIANO-SP)Carmen Aparecida Malagutti de Barros (CLARETIANO-SP)Christian José Quintana Pinedo (UFT-TO)Ednilson Turozi de Oliveira (CLARETIANO, FAVI, FASBAM-PR)Elvisney Aparecido de Oliveira (CLARETIANO-SP)Fatima Chechetto (UNESP)Fernando Donizete Alves (UFSCAR-SP)Fernando Figueiredo Balieiro (UFSCAR-SP)Jaime Sánchez Bosch (Studium Theologicum-PR)Jussara Bittencourt de Sá (UNISUL-SC)Juscelino Pernambuco (UNESP)Karina Marcela Capato (UNAERP-SP)Karyn Siebert Pinedo (UFT-TO)Luiz Fernando Tavares Meireles (CLARETIANO-SP)Marialba Rita Maretti (CLARETIANO-SP)Pablo Rodrigo Gonçalves (CLARETIANO-SP)Pedro Guilherme Fernandes da Silva (IFAL-AL)Renato Luis Tâme Parreira (CLARETIANO-SP)Ricardo Boone Wotckoski (CLARETIANO-SP)Rodrigo Ferreira Daverni (CLARETIANO-SP)Ronaldo Mazula (CLARETIANO-SP)Silvia Beatriz Adoue (UNESP)Semíramis Corsi Silva (CLARETIANO-SP)Stefan Vasilev Krastanov (UFMS-MS)Consultor Ad hocJuan Acha (CLARETIANO-SP)Produção Editorial Equipe Editorial – ClaretianoImagem de capa”A Incredulidade de São Tomás”Caravaggio (1571-1610)Colaboração Kelly dos Reis Canavez

Revista Científica do Claretiano – Centro Universitário

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Sumário / Contents

Editorial

Música e liturgia na religiosidade popular cristã: um enfoque sociocultural / Music and liturgy in popular christian religiosity: a sociocultural perspective

José Reinaldo Felipe Martins Filho

Relações intertextuais entre Dom Casmurro, de Machado de Assis, e Capitu – Memórias Póstumas, de Domício Proença Filho / Intertextual relations between “Dom Casmurro”, by Machado de Assis”, and “Capitu – Memórias Póstumas”, by Domício Proença Filho

Vanessa Vergani Machado

Da música à Literatura Inglesa: Iron Maiden, Samuel Taylor Coleridge e Edgar Allan Poe / English literature music: Iron Maiden, Samuel Taylor Coleridge and Edgar Allan Poe

Eduardo Henrique Marinheiro

A Genealogia da moral como um pressuposto de aversão ao comunitarismo religioso: uma leitura das aflições de Nietzsche / The Genealogy of Morals as an assumption aversion religious communitarism: a reading of Nietzsche woes

André Luiz Rocha da SilvaStefan Vassilev Krastanov

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LINGUAGEM ACADÊMICA

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O pedagogo empresarial e a coordenação de práticas pedagógicas docentes para a formação continuada por competências dentro da empresa / The corporate pedagogue and a coordination of pedagogical practice of education to the continued education for competences within the company

Adriano Teodoro Nepomuceno Ribeiro

A importância social da responsabilidade e do planejamento educacional para os gestores públicos / The social importance of responsibility and educational planning for public managers

Edson Garcia Ferraz Júnior

A importância e os benefícios da implantação de um programa de educação financeira nas empresas / The importance and the benefits of implementing a financial education program in business

Aline de Fátima Guedes da SilvaRandal Farago

A tragédia grega como elemento constitutivo da formação integral do homem grego: uma análise segundo Jean-Pierre Vernant / The greek tragedy as a constitutive element of the integral formation of the Greek man: a second analysis Jean Pierre Vernant

Deucyr João Breitenbach

Influência do empreendedorismo para secretária executiva em seu ambiente de trabalho / The influence of the executive secretary for entrepreneurship in your workplace

Tatiana de Oliveira Marchiori

Análise de tradução de poesia: um estudo de caso de “The sick rose”, de William Blake / Translation of poem analysis: a case study of “The sick rose”, by William Blake.

Marcela da Fonseca Ferreira

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7Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 3, n. 1, p. 7, jan./jun. 2013

Editorial

LINGUAGEM ACADÊMICA

A Revista Linguagem Acadêmica chega ao 5º número, afinada com o seu histórico ainda incipiente e pilar de construção, o de fomentar a dúvida, a inquietação, que na leitura aristotélica, conduzem ao princípio da sabedoria, ou, como diria Kant, ao “ousar pensar”. A presente edição, assim como toda a identidade do periódico, está imbuída desse conceito, desde a sua imagem de capa – ilustrada pela obra barroca do artista ita-liano Caravaggio, que nos traz uma alegoria do princípio da dúvida na imagem de Tomás (Tomé).

Por um lado, questionamo-nos se o periódico, dado seu caráter he-terogêneo, não seria mais bem nomeado em flexão plural, afinal, seu se-dimento é originário de múltiplas linguagens e conotações, contempladas aqui pela Filosofia, Literatura, Música, Educação, Administração, Gestão, nas produções de alunos e ex-alunos das áreas de Graduação e Pós-gra-duação, pesquisadores externos à instituição; por outro, aferimos que as produções se homogeneízam em razão da coluna cervical que as regem: o tratamento científico das observações, isto é, a linguagem acadêmica.

Não se trata somente de mais uma edição da revista Linguagem Aca-dêmica, mas de uma realidade que se consolida gradativamente enquanto Projeto Editorial, contribuindo para a sedimentação de um dos braços das áreas de Iniciação Científica (I.C.) e para a formação do perfil de pesqui-sador em estudantes e professores. Com esse norte, seguimos atrelados à nossa Missão e ao Projeto Educativo, estimulando a “[...] investigação da verdade”, e zelando pelo “[...] ensino e difusão da cultura” (MISSÃO E PROJETO EDUCATIVO, 2007, p. 11).

Boa leitura!Prof. Rafael Archanjo

Editor / Coord. Geral de Pesquisae Iniciação Científica

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9Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 3, n. 1, p. 9-29, jan./jun. 2013

Música e liturgia na religiosidade popular cristã:um enfoque sociocultural1

José Reinaldo Felipe Martins Filho2

Resumo: A proposta deste estudo consiste em apresentar a expressão religiosa do canto litúrgico, apontando para a experiência idiossincrática advinda da religiosidade popular, seus elementos culturais e o modo como se torna um objeto de estudo para a Sociologia da Religião. Para isso, pretendemos 1) compreender os aspectos socioculturais que perpassam a dinâmica da vida religiosa, particularmente manifesta pela música oriunda da religiosidade popular; 2) considerar a religiosidade como fator determinante da cultura e uma das maiores marcas identitárias de uma sociedade; e 3) sublinhar o valor da experiência religiosa enquanto geradora de vida social, sobretudo por seu caráter eminentemente coletivo. Émile Durkheim, sobre a coletividade da vida religiosa, e Max Weber, a partir de uma concepção individualizante da religião, nos servirão de fundamento teórico.

Palavras-chave: Música. Canto. Religiosidade. Sociologia da Religião.

1 Orientadora: Adriana Duarte de S. Carvalho. Doutoranda em Ciência Política pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Mestre em Sociologia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Graduada em Ciências Sociais pela mesma instituição. Tutora do Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>.2 Mestrando em Filosofia pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Especialista em Sociologia e Ensino de Sociologia, pelo Claretiano – Centro Universitário e em Docência do Ensino Superior, pela Faculdade Brasileira de Educação e Cultura (FABEC). Bacharel em Filosofia, pelo Instituto de Filosofia e Teologia Santa Cruz. Licenciado em Filosofia, pela Faculdade Católica de Anápolis (2011). E-mail: <[email protected]>.

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1. INTRODUÇÃO

Desenvolver uma análise sociológica das comunidades religiosas do catolicismo brasileiro requer observá-las sob o prisma do cientista que analisa, coleta dados, descreve e avalia. Nesse sentido, uma autêntica análise do ser humano, em seu aspecto social e comunitário, não pode prescindir dos elementos que constituem sua identidade, sua cultura. A religiosidade surge com papel determinante, moldando consciências e refletindo o arquétipo do pensamento de toda uma época – particular-mente, a época contemporânea. Tratar a sociedade requer considerá-la em seu aspecto religioso. Se, de um lado, com as caravelas colonizadoras, o cristianismo desembarcou, pela primeira vez, nessas terras pós-atlânticas – aflorado por milhares de missionários católicos e protestantes que, de vários modos, trouxeram a crença cristã aos povos latinoamericanos –, de outro, vigente nas práticas indígenas dos Astecas, dos Maias e de tantas outras civilizações que há muito habitavam esse “Novo Continente”, a ex-periência religiosa já havia imprimido ao povo que aqui se desenvolveria uma de suas mais determinantes marcas identitárias. A América das cores, das tradições e da variedade cultural é, portanto, a mesma da diversidade religiosa.

Com efeito, afirma Bastian (cf. 1997), sob o pretexto de compreen-der o sentido da religião para a sociedade contemporânea, a Sociologia da Religião se propõe a redefinir seu objetivo no interior das sociedades secularizadas. De sua parte, isso não pode ser concretizado partindo de um olhar provinciano de uma modernidade pensada a partir da Europa. Antes, devem-se pensar os limites da secularização e, quiçá, desenvolver aproximações comparativas entre os modelos desenvolvidos pelos teóri-cos da sociologia e os elementos extraídos da religiosidade popular. Como nos adverte Isambert (1992, p. 13), “[...] falar de religião popular é sempre contrapô-la a outra coisa, a uma outra forma de religião”.

Ao longo da maior parte do século 19, caracterizavam-se com a no-ção de religiosidade popular tudo o que, de alguma forma, representasse o supersticioso, o grosseiro, o curioso, o vulgar (cf. CESAR, 1976, p. 7). Em

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nossa investigação, optamos por concordar com Süss (1979), quando, de modo pertinente, defende o catolicismo popular e estabelece para ele um limite frente à religiosidade popular global, tendo em vista que esta “[...] abrange todos os costumes e vivências religiosas do povo, sejam eles de origem africana, indiana, protestante, católica, espírita ou pagã” (SÜSS, 1979, p. 28). A religiosidade popular a que nos referimos é aquela que se identifica, de modo íntimo, à experiência.

A música tradicional cristã, alcançando as parcelas mais populares de nossa sociedade, consegue expressar as verdades da fé, bem como a ín-tima relação entre o humano e o divino, tornando-se experiência concreta na vida de um povo concreto. Isso confirma o nível simbólico atribuído à música, pois “[...] sólo ella puede expresar, o dicho, directamente encarnar, justamente en virtud de su carácter abstracto, las regiones más profundas de nuestro ser, la dinámica de nuestros sentimientos, nuestro inconsciente, la armonia universal, as verdades transcendentes, etc.”3 (FUBINI, 2001, p. 61). Trata-se de um fenômeno social muito bem retratado por Durkheim (1975), que se pode notar no seguinte fragmento:

[...] tais representações coletivas são o produto de uma imensa coo-peração que se estende não apenas no espaço, mas no tempo; para produzi-las, uma multidão de espíritos diversos se associaram, mistu-raram, combinaram suas ideias e sentimentos; longas séries de gera-ções acumularam aí a sua experiência e o seu saber. (DURKHEIM, 1975, p. 216).

Também na música litúrgica dos últimos séculos se pode notar os sinais dessa representação coletiva. Chegando ao Brasil colonial, o canto polifônico da missa romana se mudou na polifonia das vozes da folia de reis ou do Divino, ou mesmo nas congadas, organizadas segundo crité-rios melódicos semelhantes. A constituição das letras, em sua maioria de 3 Tradução: “[...] somente ela pode expressar, justamente em virtude de seu caráter abstrato, as regiões mais profundas de nosso ser, a dinâmica de nossos sentimentos, nosso inconsciente, a harmonia universal, as verdades, etc.” (tradução nossa).

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cunho catequético ou doutrinal, servia como instrumento para a evan-gelização de povos, na maioria das vezes, impossibilitados de alcançar recursos como a alfabetização. As frases e versos das folias, dos ofícios, das contemplações dos mistérios do terço, propagavam-se sob a forma da repetição memorizada. Reproduziam-se os louvores religiosos de maneira automática, nos moldes da propagação oral e coletiva. Em termos socio-lógicos, enquanto ser de relações e mediações sociais, a religiosidade é um importante dado na constituição do homem, aferindo-lhe novas perspec-tivas comportamentais, sobretudo nos ditames da ética. Isso repercutirá diretamente sobre sua interação com o grupo social ao qual pertence, re-configurando o comportamento do próprio grupo (cf. VAN DER POEL, 1992).

2. A CONTRIBUIÇÃO DA SOCIOLOGIA DA RELIGIÃO

Durkheim e o caráter coletivo

Vários autores da Sociologia se dedicaram ao estudo das religiões. Dentre eles, destaca-se Émile Durkheim, que, a despeito dos demais, con-siderou-a sob o prisma das sociedades pequenas, nas quais a religião pode ser considerada como uma “coisa social” (ÓDEA, 1969). Para esse autor, no que se refere à questão religiosa, um questionamento firma-se como primordial, qual seja: a diferença entre o sagrado e o profano. Durkheim é bastante enfático ao afirmar que:

[...] o sagrado e o profano foram sempre e por toda a parte conce-bidos pelo espírito humano como gêneros separados, como dois mundos entre os quais nada há em comum [...] uma vez que a noção de sagrado é, no pensamento dos homens, sempre e por toda a par-te, separada da noção de profano; [...] mas o aspecto característico do fenômeno religioso é o fato de que ele pressupõe uma divisão e

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bipartida do universo conhecido e conhecível em dois gêneros que compreendem tudo o que existe, mas que se excluem radicalmente. As coisas sagradas são aquelas que os interditos protegem e isolam; as coisas profanas, aquelas às quais esses interditos se aplicam e que devem permanecer à distância das primeiras. (DURKHEIM, 1991, p. 20).

Conforme esse relato, a participação na ordem do sagrado, dada nos rituais ou cerimônias, nos cantos ou danças místicos, confere um prestígio social todo especial, ilustrando uma das funções da religião, que pode ser definida como um sistema unificado de crenças e de práticas relativas às coisas sagradas. Tais práticas unificam determinado grupo social, cons-tituindo-o como comunidade moral – uma das características do que se entende por “igreja” – através do compartilhamento coletivo de crenças, essenciais ao desenvolvimento da religião. Nesse sentido, o ritual (e, por ele, também as práticas litúrgicas) deve ser considerado um mecanismo para reforçar a integração social. Durkheim conclui que a função subs-tancial da religião é a criação, o reforço e a manutenção da solidariedade social. Enquanto persistir vida em sociedade, persistirá a religião (cf. TI-MASHEFF, 1971) – e não há forma de religiosidade mais autêntica que aquela oriunda da experiência comunitária.

O objetivo que impele o esforço do sociólogo em As formas elemen-tares da vida religiosa pode ser definido como a busca por “[...] saber qual a religião mais primitiva e mais simples” (DURKHEIM, 1975, p. 205). Noutras palavras, aquela que mais se aproxima da origem remota da expe-riência religiosa, ainda não contaminada com influências estranhas e ulte-riores. Para isso, almeja definir o que convém entender por religião, para que não haja generalizações descabidas, ou denominações inadequadas de religião como qualquer “[...] sistema de ideias e práticas que nada teria de religioso, ou deixar de lado fatos religiosos sem perceber sua verdadeira natureza” (DURKHEIM, 1975, p. 205). Antes de tudo, deve-se prestar à acuidade do investigador rigorosa cautela ao procurar definir uma reli-gião como a primeira ou, ainda, ao tentar apresentar um sistema de ideias

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como religioso. É imprescindível para a Sociologia realizar uma profunda análise dos sinais exteriores, que permitem reconhecer o fenômeno reli-gioso, onde quer que se encontre, impedindo que seja confundido com outro fenômeno. Na verdade, segundo aponta Durkheim, os seres huma-nos foram obrigados a criar a noção do que é religião e religioso, mesmo que não acreditem, em sentido estrito, em alguma religião específica; nós, seres humanos, precisamos “[...] representar, de alguma maneira, as coisas no meio das quais vivemos, sobre as quais a todo o momento emitimos ju-ízos e que precisamos levar em conta em nossa conduta” (DURKHEIM, 1975, p. 206). Tratar a vida social impõe, nalguma medida, examinar a experiência religiosa como doadora de sentido social.

Na tentativa de relacionar as análises de Durkheim acerca do fenô-meno religioso e o que procuramos deduzir partindo da experiência reli-giosa popular, vale a pena considerar o seguinte fragmento: “[...] é preci-so começar por retroceder até a sua forma [da religião] mais primitiva, e mais simples, procurar dar conta dos caracteres pelos quais ela se define neste período de sua existência” (DURKHEIM, 1975, p. 207). Devemos admitir que há algo de arcaico e/ou primitivo4 na religiosidade popular, algo que lhe confere anterioridade às práticas estabelecidas e firmadas institucionalmente. Aliás, tratando da origem dos rituais, não podemos prescindir do fato de que nasceram da fusão das culturas, da incorporação de diferentes valores culturais, manifestos pela música, pela dança, pelos símbolos concretos, como forma de representação coletiva. De uma forma brilhante exprime o autor:

Na base de todos os sistemas de crenças e de todos os cultos deve necessariamente haver um certo número de representações funda-mentais e de atitudes rituais que, malgrado a diversidade das formas que umas e outras puderam revestir, em todas as partes têm a mes-ma significação objetiva e em todas as partes preenchem as mesmas funções. São estes elementos permanentes que constituem o que há de eterno e de humano na religião; eles são todo o conteúdo ob-jetivo da ideia que se exprime quando se fala de religião em geral. (DURKHEIM, 1975, p. 208, grifo do autor).

4 Por primitivo não evocamos nenhum conteúdo pejorativo ou inferior. Referimo-nos ao primitivo em ordem cronológica. Ou seja, primitivo porque primeiro.

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Note-se, sobretudo, o seguinte trecho: “[...] são estes elementos per-manentes que constituem o que há de eterno e de humano na religião”. Mas o que significa, na linguagem de Durkheim, esse “eterno” na religião? Penso que, em primeiro lugar, seja de crucial importância distanciá-lo da figura do divino, de um eterno absoluto, imutável e criador, de uma força cósmica da qual tudo provém e em relação à qual todas as coisas firmam dependência direta. Trata-se, pois, do conceito de eterno compreendido em termos sócio-históricos, como a permanência, sempre latente, de toda atividade humana, desde suas origens mais arcaicas. A religião é um dos elementos que possibilitam a compreensão dessas “representações funda-mentais” do ser humano enquanto indivíduo, tomando-o ainda antes de sua abordagem em sociedade. Assim, “o que há de eterno” na religião se confunde com o que nela “há de humano”, como que as duas faces de uma mesma moeda, os dois componentes de um mesmo enfoque temático. A religiosidade, portanto, antepondo-se à própria constituição social – de algum modo gerando-a – se apresenta como um dos mais ricos aspectos culturais da humanidade, definida por Durkheim como “[...] expressão abreviada da vida coletiva inteira” (cf. DURKHEIM, 1975, p. 224). Nela se encontram todos os elementos da vida coletiva. Mais que isso, pode-mos nomeadamente afirmar que a religiosidade constitui a vida coletiva, determinando-a.

Aliás, nestes termos conclui Durkheim:

A religião é uma coisa eminentemente social. As representações re-ligiosas são representações coletivas que exprimem realidades cole-tivas; os ritos são maneiras de agir que nascem no seio dos grupos reunidos e que são destinados a suscitar, a manter ou a refazer certos estados mentais desses grupos. Mas então, se as categorias são de ori-gem religiosa, elas devem participar da natureza comum a todos os fatos religiosos: elas também devem ser coisas sociais, produtos do pensamento coletivo. (DURKHEIM, 1975, p. 212).

Retomamos, de um modo diferente, a mesma questão proposta an-teriormente. De fato, para usar o trocadilho, trata-se de um assunto “re-

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fletido e repetido” desde o início de nosso texto. Para Durkheim(1975, p. 212), “[...] a religião é uma coisa eminentemente social”. Não se restrin-gindo a isso, o autor ainda esclarece o motivo que subjaz e dá força ao ad-vérbio “eminentemente”. Os fenômenos religiosos são representações de todo um grupo social e, consequentemente, trazem em si as mais profun-das marcas identitárias do grupo do qual se originam. Ao mesmo tempo, “[...] como toda instituição humana, a religião não começa em parte algu-ma” (DURKHEIM, 1975, p. 210), não tem um ponto de início estabele-cido no horizonte temporal. Daqui se pode compreender a bipolaridade imposta ao termo “religiosidade”, simultaneamente expresso como fonte para a vida social, bem como uma de suas características fundamentais. A religião nasce do ser humano, gêmea do mesmo parto no qual se suscita a vida em sociedade. Isso significa assegurar que “[...] as representações que a exprimem têm, portanto, um conteúdo completamente diferente das representações puramente individuais e pode-se de início estar seguro de que as primeiras acrescentam alguma coisa às segundas” (DURKHEIM, 1975, p. 216).

Em se tratando de religiosidade, são as representações coletivas que, por primeiro, conferem sentido às representações individuais, e não o con-trário. Isso talvez possa ser explicado pelo próprio ideal de transcendên-cia imposto pelo conceito de religião. A religião visa projetar o indivíduo para além de si, diante do que a comunidade pode figurar simbolicamente como o primeiro transcendente. Da comunidade para o indivíduo atuam as representações religiosas e entende-se daí o seu papel de anterioridade.

Max Weber: um olhar a partir do indivíduo

Por conseguinte, vale, contudo, examinar uma análise diferente da-quela desenvolvida no tópico anterior. Sobretudo quando nos referimos à religiosidade popular brasileira, devemos admitir que esta não se limita ao aspecto comunitário da religião. Pelo contrário, há elementos particulares e individuais que, aliás, são os maiores responsáveis pela conservação desse

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modelo religioso e por sua transmissão ao longo da história. Trata-se da idiossincrasia como característica fundamental na análise do fenômeno religioso. Enquanto Durkheim propõe o contato com o tema religião pelo viés da comunidade, Max Weber parece representar esse modelo de uma forma diferente, propondo a leitura sociológica da religião a partir do in-divíduo religioso.

Se Durkheim preocupou-se com as religiões primitivas, Weber con-centrou sua atenção nas religiões ditas mundiais, ou seja, aquelas que con-seguiram atrair um grande número de fiéis, afetando, em larga medida, o curso global da História. Um ponto de intersecção que talvez possamos encontrar entre ambos os autores consiste na comum compreensão do ser humano como ser religioso. Para Weber, as concepções religiosas eram cruciais e originárias das sociedades humanas, pois o homem, como tal, sempre esteve à procura de sentido e de significado para a sua existência, não simplesmente de ajustamento emocional, mas de segurança cognitiva ao enfrentar problemas de sofrimento e de morte (cf. ÓDEA, 1969). We-ber procurou buscar na religião os signos de transcendência e de esperan-ça que ultrapassam os limites da realidade imanente, por vezes tão dura. Desse modo, a preocupação de Weber estava em destacar a capacidade de integração racional dos sistemas religiosos mundiais como resposta aos problemas básicos da condição humana: contingência, impotência e es-cassez. Segundo esse autor, ao criar respostas para esses problemas – res-postas que se tornariam parte da cultura estabelecida de uma sociedade –, a religião influiria diretamente sobre o comportamento de determinado grupo social, nas atitudes mais íntimas de cada humano e em sua prática em relação ao restante do grupo. Trata-se de um movimento do indivíduo para o grupo, e não o contrário.

Os dogmas religiosos e sua interpretação são partes integrantes dessa visão de mundo. É preciso, pois, entendê-los para compreender a condu-ta dos indivíduos e dos grupos – no caso de Weber, nomeadamente, a sua mudança cultural e de modelos cognitivos. No que se refere ao nosso tema, as práticas tradicionalmente constituídas da religiosidade popular podem assumir o papel de verdadeiros dogmas, sedimentados no imagi-nário coletivo a partir de sua apropriação por parte dos indivíduos.

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Weber nas pesquisas de Flávio Pierucci

Partindo das análises de Weber, o sociólogo Flávio Pierucci aponta para a forte ação da religião como solvente das tradições sociais e o seu avanço enquanto prática de um indivíduo apartado de seu grupo. Se, de um lado, o privilégio do caráter religioso comunitário pode passar alheio aos valiosos aspectos do âmbito individual, de outro, como veremos, a exacerbada ênfase no indivíduo é capaz de indicar a falência de modelos religiosos com base universalista, tal como parece ser o caso da religiosi-dade popular. Isso demonstra Pierucci em seu texto Religião como solven-te, em que, “[...] em oposição à visão de Durkheim, para quem a religião atua como religação dinamogênica do indivíduo com a sociedade a que pertence, sustenta que hoje a força social da religião está na capacidade de dissolver antigas pertenças e linhagens religiosas estabelecidas” (PIE-RUCCI, 2006, p. 111). Para esse autor,

[...] a conversão religiosa individual como ruptura individualizante de laços outrora consolidados é o próprio avesso daquela religião que tanto impactou Durkheim na fase final de sua produção sociológica, a saber: uma religião que consagra ritualmente e, nisso, re-atualiza psicologicamente a antiga coesão de um grupo humano dado. (PIE-RUCCI, 2006, p. 125).

Em sua argumentação, Pierucci se apropria de duas importantes crí-ticas dirigidas a Durkheim e ao seu modelo de compreensão da religião. A primeira, de Raymond Aron (1967 apud PIERUCCI, 2006, p. 125-126), afirma:

Durkheim diz que a sociedade é criadora de religião quando está em efervescência. […] Os indivíduos são postos num estado psíqui-co tal, que sentem forças impessoais ao mesmo tempo imanentes e transcendentes, e uma explicação da religião como essa embute uma explicação causal segundo a qual a efervescência social é favorável ao surgimento da religião. […] Ora, a partir do momento em que o

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culto é dirigido à sociedade, não existem senão religiões tribais ou nacionais. Com isso, a essência da religião seria a de inspirar aos ho-mens um apego fanático a grupos parciais e a de consagrar a um só tempo o apego de cada um a uma coletividade e a hostilidade a ou-tras. Definitivamente, parece-me inconcebível definir a essência da religião pela adoração que o indivíduo devota ao grupo, porquanto, pelo menos aos meus olhos, a adoração de uma ordem social seria precisamente a essência da impiedade. Afirmar que os sentimentos religiosos têm por objeto a sociedade transfigurada não é salvar, é degradar essa experiência humana da qual a sociologia [da religião] pretende dar conta.

Outra crítica a Durkheim parece importar para Pierucci, qual seja, a de Clifford Geertz:

Em lugar e no lugar da comunidade solidária agregada por repre-sentações coletivas (o sonho de Durkheim), apareceu a rede simme-liana, difusa e privada de centro, conectada por afiliações genéricas, multidirecional e abstrata. A religião não se enfraqueceu enquanto força social, pelo contrário. Parece ter-se reforçado no período re-cente, só que mudou – e muda cada vez mais – de forma. (GEERTZ apud PIERUCCI, 2006, p. 126).

Ainda que verdadeiras, tais conceituações afirmam uma periculo-sidade sem precedentes para a religiosidade popular e sua conservação. Note-se, de passagem, a conclusão feita pelo próprio Pierucci aos argu-mentos relacionados à visão webberiana de uma religiosidade individual em oposição ao modelo de Durkheim:

[...] pelo menos no Brasil atual, um dos aspectos mais salientes da “força social” que ainda tem a religião (não toda e qualquer religião, notar bem, mas sim um tipo determinado de religião) está justa-mente nessa sua capacidade estatisticamente comprovada de dissol-ver antigas pertenças e dilapidar linhagens religiosas estabelecidas. (PIERUCCI, 2006, p. 126).

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Aqui certamente não se enquadram as práticas religiosas populares, que, ao contrário, reafirmam laços consanguíneos e conterrâneos, aproxi-mam gerações ao redor de uma mesma crença constituída como patrimô-nio cultural de um povo específico.

3. A EXPRESSÃO MUSICAL DA RELIGIOSIDADE POPU-LAR: UM ENFOQUE

Antes de adentrarmos no universo da religiosidade popular e sua re-lação com a música, enxerguemos, pois, a forte influência da cultura sobre nossas atividades cotidianas. Como exemplo, observemos nossas roupas, nosso modo de pronunciar a língua portuguesa, nossa típica culinária. To-dos esses aspectos sugerem a riqueza que nos distingue dos demais seres humanos de maneira geral. Somos humanos como eles, mas humanos ao nosso modo. Brasileiros, da “Terra verde e amarela”, onde as tradições ru-rais integram o cenário cultural da zona urbana e, num misto de ruralida-de e urbanização, modelam o cotidiano de nossas vidas. Nesse sentido, é muito importante o nosso esforço comum em prol de entender e respeitar a cultura de nosso povo, sensivelmente expressa pela religiosidade popu-lar.

Conforme a concepção cristã católica, a liturgia é viva e dinâmica. Isso significa que o contexto celebrativo, unido ao conteúdo da fé celebra-da, sempre partirá da realidade concreta, das vivências locais de determi-nado povo. Daí o fato de existirem celebrações que, apesar de possuírem um mesmo núcleo comum, herdado da tradição eclesial, também apre-sentam características próprias de cada localidade. Vejamos, por exemplo, quantos elementos culturais já estão inseridos nas celebrações populares: as palmas durante o hino de louvor e o santo, o canto no momento do abraço da paz, a acolhida fraterna por parte do presidente da celebração. Vários outros exemplos poderiam ser enumerados. Apesar de o catolicis-mo brasileiro se distinguir de outras comunidades católicas da África, da Ásia e do restante do Oriente ou da Europa, por exemplo, não se exclui de

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participar de um mesmo cristianismo católico, com tradições e ritos com teor universalista.

Ao longo do período que vai do século 14 ao 16, desenvolveu-se no catolicismo o modelo litúrgico clerical que, com suas novas prescrições litúrgicas, por sua vez concentradas no intimismo e na prática particular, provocou o progressivo distanciamento entre aquele que conduz a cele-bração e os demais participantes. Recordamos, ainda, que foi esse o mo-delo litúrgico dos primeiros colonizadores enviados ao Brasil, bem como aquele que prevaleceu, a duras penas, por várias décadas até a reforma li-túrgica do Concílio Vaticano II, somente realizada no início da década de 60 do último século. Nesse cenário, que já remete ao século XIV, nasce-ram as práticas populares e devocionais de relacionamento com o sagrado – sempre crescentes, devido ao desconhecimento da língua latina e, por decorrência, ao descompasso em relação ao andamento da celebração. Da-ta-se daí o nascimento da reza do rosário, das adorações ao santíssimo sa-cramento, das confrarias em homenagem aos santos, das novenas e ofícios a Maria, enfim, de uma série de práticas que se enquadram no que hoje denominamos por religiosidade popular. Tais práticas se sucederam nos séculos, alcançando o período atual. Trata-se de um fenômeno social que nos coloca em confronto com questões determinantes para a nossa socie-dade, das quais, por sua importância, pretendemos tratar neste estudo.

Como é possível, por exemplo, explicar o fato de que os versos usa-dos na década de 1980 por benzedoras da região sul de Minas Gerais em suas orações contra espinhela caída e quebrante tenham uma origem que remonta ao século 14? A resposta para tal questionamento está na própria origem da experiência religiosa popular brasileira, em muito herdada da colonização europeia e das influências advindas da etnia bantu, africanos das margens do rio Congo, trazidos ao Brasil como escravos durante o período escravocrata brasileiro. Com a chegada dos portugueses ao Brasil, chegaram também duas distintas tradições religiosas, a saber: a oficial, da Igreja, da universidade e da corte, e a popular, dos analfabetos, pobres e so-fridos. Na religiosidade popular, a opção se concentrou nos elementos da tradição oral dos pobres da Europa. Desse modo, mesmo que haja elemen-

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tos na experiência religiosa popular tirados da pregação e das celebrações oficiais, também existem aqueles que somente se encontram na tradição oral. Isso inclui desde os elementos seculares dos antigos celtas às contri-buições advindas dos povos quilombolas e indígenas, partícipes ativos na construção da nação brasileira. O Bendito de Padre Cícero, por exemplo, só pode ter surgido no Brasil.

Basta que passemos em revista as variadas letras dos cantos marianos, oferecimentos dos terços, hinos aos santos padroeiros, folias e congadas, para tão logo percebermos quão antiga é a sua composição. A esse elemen-to atribuímos o fato de que, em sua origem, o canto próprio da experiência popular religiosa se encontra intimamente vinculado à prática litúrgica institucional da Igreja, sendo ela a sua maior fonte. Hinos compostos na alta Idade Média são entoados por comunidades interioranas sem que de-les se reconheça a origem específica. Cantos belíssimos, que expressam a oração de um povo e que se estendem desde os séculos passados. Como exemplos, podemos observar as letras dos hinos oferecidos ao Divino, for-ma carinhosa pela qual é denominado o Espírito Santo. Em sua compo-sição, muitas delas consideram textos cuja origem remete ao tradicional Veni Creator Spiritus, de Santo Tomas de Aquino, ainda no século 13. É assim que, novamente com Fubini (2001, p. 61), devemos concordar que “[...] a música não pode e não sabe expressar conceitos nem sentimentos individuais” (FUBINI, 2001, p. 61).

O costume de cantar folias vem da Idade Média. A fórmula Deus vos salve, existe em francês (na própria oração da Ave Maria, je vous salue Ma-rie), em inglês, alemão, holandês e, segundo Van der Poel, já é encontrada na Penísula Ibérica no século 13, por exemplo nos trechos que seguem:

Dios vos salve, Apolônio amigo. / Oí fablar de tu fazienda, vengo fablar contigo.Si tu me conosciesses habriés placer comogo, / ca non ando pidien-do nin só homne mendigo. [...]Amigo, Dios vos salve!, folgad, sed plasentero! / Cras dise que vaya-des. Fabladla, non senero;

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mas catad nol’digades chufas de pitoflero: / que las monjas non se pagan Del abad fasanero. (LIVRO DE APOLÔNIO, apud LO-PEZ, 1969, p. 136).

Também todos os sete hinos do popular Ofício de Nossa Senhora (século 15) começam com a mesma fórmula, por exemplo, nas vésperas: Deus vos salve relógio / que andando atrasado / serviu de sinal do verbo encarnado (trata-se aqui do relógio de Acaz, que foi sinal da salvação de Ezequias – cf. Is 38,8ss; 2Rs 20,1-12). Essa mesma fórmula, de origem tão antiga, entoamos nos cantos tradicionais e populares. Fazemos com que se torne cultura viva de um povo que exprime sua relação com o sagrado pelo canto e a música: “Deus vos salve, casa santa, / Deus vos salve, casa santa! / Onde Deus fez sua morada / onde Deus fez sua morada, ai, ai!”. Nesse sistema devocional, como salienta Valente (1999, p. 119), “[...] é o corpo inteiro, caixa de ressonância que fala, emanando energia”. O corpo, dessacralizado ao longo do período medieval e posto como profano, sím-bolo de oposição ao sagrado, é devolvido ao seio da expressão litúrgica sob a forma da dança, da gesticulação. Assim, a música, como na antiga con-cepção grega de “mousiké”, é tomada como elo integrador das diferentes formas pelas quais o ser humano se manifesta, como vemos no relato de Lia Tomás (2002, p. 39), pois “[...] no conceito de mousiké achava-se com-preendido um conjunto de atividades bem diversas, ainda quando elas se integravam em uma única manifestação”.

Música e religiosidade: a interpelação entre o divino e o humano

A música é uma forma arquetípica no inconsciente humano, ima-gem primordial e criadora, energia e configuração de traços que pre-dispõem as pessoas a certas experiências, sentimentos e pensamen-tos. (ZUMTHOR, 1985, p. 07).

Na fábula grega retratada pela ópera L’Orfeu, de Cláudio Montever-di, uma das primeiras óperas de que se tem notícia, a música já apresenta

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a bipolaridade de seu alcance, equacionando, simultaneamente, o poder de tranquilizar e perturbar, trazer ira e amor. Nesse sentido, segundo D’Olivet (2002), para muitos povos – e aqui também se enquadram as co-munidades religiosas contemporâneas – a harmonia, a melodia e o ritmo não são mais do que o envelope físico de um princípio intelectual conhe-cido, cuja presença despertou na alma humana um pensamento análogo e, por esses meios, produziu não apenas o prazer sensorial dependente da forma, mas também o efeito moral do princípio, o sentimento religioso do relacionamento interpessoal com a divindade, o compromisso social com os integrantes de um mesmo corpo social (cf. D’OLIVET, 2002, p. 19). Por isso, entre os elementos que possibilitam uma autêntica interface de comunicação entre o divino e o humano, podemos apresentar a músi-ca e seu papel tão pertinente. Neste fragmento, Hoy Hart consegue defi-nir com maior propriedade o que entendemos pelo conceito de música: “[...] a música é o primeiro movimento de expressão do ser humano. Atrás da linguagem ou do canto há uma multiplicidade de expressões e evoca-ções sonoras, das mais puras e sofisticadas às mais estranhas e primitivas” (HART, 2004).

A experiência religiosa, com as nuances próprias a cada religião, per-mite ao ser humano o confronto consigo mesmo, com seu ser mais pró-prio, um verdadeiro mergulho para dentro de si, sua constituição, seus valores. Nos termos de Albano (2007, p. 21), “[...] a exploração desse universo é uma aventura que reconcilia o ser humano consigo mesmo”. O divino, portanto, mostra-se como o vasto horizonte de confrontos que se integram no interior do próprio ser humano, em sua constituição e em sua vivência. Dessa forma, a transcendência necessária à experiência religiosa implica uma constante descoberta de si mesmo. Nesse itinerário, a música assume o papel de interface comunicativa, tornando-se o modo pelo qual a expressão religiosa do indivíduo, na particularidade de sua experiência, em sua idiossincrasia, estende-se à divindade e à comunidade como um todo, fortalecendo os laços de unidade e compromissos mútuos entre si. As palavras de Argaráte parecem bem ilustrar o que evidenciamos. Para esse autor, “[...] a música explora a profundidade da alma; vai realizando a

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unidade do homem consigo mesmo, criando a unidade dos que se amam” (ARGARÁTE, apud FONSECA, 2000, p. 29).

O dar-se todo do humano no eterno pressupõe o que designamos por zona de interface, ou seja, o canal imprescindível para que se estabeleça a relação intersubjetiva em sua plenitude. Pelas vias do canto, da músi-ca, da dança, do corpo em sua múltipla constituição, institui-se o salto necessário para o contato com o grande Outro, o Divino, o Eterno. Os louvores, as súplicas, a ação de graças, todas essas formas assumem o papel de comunicação com o divino; trata-se de falar-lhe, de dialogar com Ele. Nesse processo, a música, por seu caráter de abstração, possibilita o con-tato com aquele que, em si mesmo, se mostra abstrato. Ainda conforme Argaráte (apud FONSECA, 2000, p. 29), “[...] a música ressoa no mais profundo da alma humana, que atrai e põe para fora os sentimentos mais profundos”.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em tom de finalização, uma figura se apresenta salutar: aquela res-ponsável pela construção de muitas e muitas conclusões. Figura presente em nossas comunidades interioranas, das quais emanam profundos en-sinamentos, não poucas vezes oriundos da simplicidade da vida cotidia-na, que, também à investigação científica, muito tem a contribuir. Ora, refiro-me à tecelã, que para ultrapassar as inúmeras adversidades que a vida lhe impõe, dedica-se, incansavelmente, ao duro trabalho de tecer suas colchas de retalho. Tecendo colchas, constrói o seu futuro, o futuro cul-tural de uma nação; constrói a história de um povo, o qual sua produção abrigará, protegerá e será a garantia de aconchego e afago. Em que nos assemelhamos à figura da tecelã? Tecer uma colcha não é trabalho fácil. A cada novo ponto dado é necessário garantir-lhe a segurança e a solidez, a durabilidade e a beleza, ao que, num cuidado admirável, instaura-se o trabalho de arrematar. Arrematar não é o mesmo que concluir. Enquanto ao ato de conclusão está impregnada a interpretação de algo estático e aca-

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bado, fixo e intransponível, ao modo do arremate, erige-se a ideia de uma mera garantia – mera, pelo fato de que outras virão por sua decorrência. Assim também ocorre ao findar de um trabalho científico. Não se trata, à conclusão, de algo estático e acabado, mas de um assegurar de todas as ideias centrais até então adquiridas, as quais serão o trampolim adequado para as possíveis construções vindouras. Desse modo, também nas ciên-cias fazemos arremates. Chegamos, pois, ao momento de, também nós, arrematarmos o que construímos:

1) Ao longo de nosso texto, frisamos, por várias vezes, o papel que a música e o canto possuem enquanto agregadores dos diferen-tes elementos que constituem o homem. Esse aspecto pode ser definido como dado de sua natureza intrínseca, seu movimento estruturante e interior. Entretanto, como sabemos, há entre os seres humanos a necessidade de projetar-se ao outro, seja ele de ordem concreta ou abstrata (como acontece quando nos referi-mos ao Outro absoluto, o ser supremo, a divindade). Quanto a isso, a linguagem dá testemunho, como ponte de acessibilidade intersubjetiva, do sujeito, enquanto pólo de sentido, ao outro sujeito, doador de significado: por confirmação ou revogação. Em unanimidade, os autores abordados concordam acerca da anterioridade do canto em relação à linguagem oral e, por isso, a validade de sua função comunicativa. Desse modo, servindo como referência transcendente do âmbito imanente, a música e o canto podem ser afirmados como importantes formas de expressão da religiosidade, enquanto apelo do humano pelo contato com o divino.

2) A partir da constatação da música e do canto como expressões da religiosidade, podemos definir o modo como o próprio conceito de religiosidade, ou melhor, como a religiosidade en-quanto experiência concreta de um povo, influi sobre o cotidia-no dos grupos sociais: I) em primeiro lugar, recordo, aos mol-des da teoria de Durkheim, o papel da religiosidade enquanto geradora de vida social. O ímpeto pelo senso religioso, comum a todos os humanos, pode, portanto, ser apontado como um

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dos fatores ou fenômenos mantenedores da vida em sociedade. Assim, ao mesmo tempo em que se institui a prática religiosa como uma atividade eminentemente coletiva, firmam-se as re-lações grupais, solidificam-se os laços comunitários, institui-se um ethos comum e funda-se uma moral coletiva, capaz de reger a vida do grupo. Esses traços podem ser apontados como essen-ciais para a instituição da vida em sociedade (mesmo que ain-da primitivamente); II) por conseguinte, vale lembrar o fator determinante da religiosidade sobre a cultura, configurando-a. Com a mesma intensidade pela qual a religião determina a cul-tura, esta torna-se ferramenta de manutenção da religiosidade através da conservação dos costumes, das práticas sociais, das ideologias religiosas. Assim, o aspecto religioso de certo grupo social torna-se uma de suas maiores marcas identitárias.

Pela via da religiosidade popular encontramos um dos mais ricos as-pectos do ser humano, também para a Sociologia, qual seja: sua experiên-cia religiosa. Notadamente, o rumo para o qual aponta o curso da História não é dos mais otimistas quando pensamos em uma prática religiosa volta-da para o social ou para a convivência grupal. Cresce, conforme a ilustra-ção de Pierucci e Weber, a solvência das comunidades religiosas, das religi-ões com apelo universalista de salvação, em prol de um relacionamento de cunho intimista com o sagrado. Fugindo desses parâmetros, a experiência religiosa popular, a exemplo de outros sistemas religiosos, pode encontrar--se à beira de um colapso. Por uma via mais branda, graças à presença de elementos profundamente individualizantes e da possibilidade de ade-quação de suas regras – sem a dogmatização e estatização de preceitos – a religiosidade popular talvez encontre nesse crescente fenômeno um vasto campo de propagação, firmando permanência num contexto religioso de maior amplitude. Qual dessas vias será percorrida é um dado que, com precisão, ainda não podemos prever.

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Title: Music and liturgy in popular christian religiosity: a sociocultural perspective.Authors: José Reinaldo Felipe Martins Filho.

ABSTRACT: The purpose of this study is to show the religious expression of the liturgical chant, pointing to the idiosyncratic experiences from the popular religiosity, their cultural elements and their contribution to the sociology of religion. In this way, I intend to: 1) understand the sociocultural aspects of this religious life dynamics, especially manifested by the music stemming from popular religiosity; 2) consider the religiosity as a determinant factor of the culture and one of the largest of identity marks of the society; 3) highlight the value of religious experience while generating social life, mostly by it’s eminently collective character. Émile Durkheim, about the collectivity of the religious life and Max Weber, starting from a conception individualizing of religion, will provide the theoretical foundation.Keywords: Music. Chant. Religiosity. Sociology of Religion.

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Relações intertextuais entre Dom Casmurro, de Machado de Assis, e Capitu – Memórias Póstumas, de Domício Proença Filho1

Vanessa Vergani Machado2

Resumo: Neste trabalho, objetivou-se visualizar, baseando-se especialmente nos estudos de Bentes (in MUSSALIM; BENTES, 2005) e Fiorin (2006), as relações intertextuais existentes entre as obras Dom Casmurro, de Machado de Assis, e Capitu – Memórias Póstumas, de Domício Proença Filho. O romance de Proença Filho foi elaborado a partir da história contada em Dom Casmurro, na qual se tem a narração unilateral de Bentinho sobre a grande incerteza de sua vida: a traição de sua esposa, Capitu, e de seu melhor amigo, Escobar, que ele sugere serem verdadeiras. O que há em Capitu – Memórias Póstumas é a versão autodefensiva da esposa acusada, que argumenta, em seu desabafo póstumo, contra os pontos levantados pelo marido no texto original de Machado de Assis. Está nesses pontos a concentração deste estudo, e, com as teorias aqui utilizadas, foi possível confirmar a existência de um diálogo discorde entre eles e, por conseguinte, entre as duas obras.

Palavras-chave: Dom Casmurro. Capitu – Memórias Póstumas. Intertextualidade.

1 Orientadora: Maria Cecília de Oliveira Adão: Doutora em História pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Mestre em História pela mesma instituição. Docente do Claretiano – Centro Universitárionos cursos de Licenciatura em História, Filosofia, Educação Física, Gerenciamento de Recursos Humanos e Pedagogia (PARFOR). E-mail: <[email protected]>.2 Especialista em Ensino de Português, Literatura e Redação pelo Claretiano – Centro Universitário. Graduada em Letras pela mesma instituição. E-mail: <[email protected]>.

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1. INTRODUÇÃO

Uma das obras mais ilustres e intrigantes da literatura mundial, o romance Dom Casmurro, de Machado de Assis, publicado em 1900, é a terceira obra da trilogia realista machadiana, ao lado de Memórias Póstu-mas de Brás Cubas (1881) e Quincas Borba (1891). No conhecido texto, o leitor acompanha a aflição do narrador, o protagonista Bentinho, que, pretendendo induzir o “fino leitor” e a “castíssima leitora” a adentrarem seu universo casmurro e recalcado, deita nas palavras suas memórias, de-sabafando acerca da grande incerteza de sua vida, tema central do livro: a traição de sua esposa, Capitu, e de seu melhor amigo, Escobar, que ele insinua serem verdadeiras.

Entretanto, como bem o sabem leitores de cabeceira, vestibulandos, curiosos e entusiastas da obra, em Dom Casmurro, conta-se, apenas, com a visão de Bentinho sobre a situação, que, em verdade, é parcial. Desse modo, há indagações fundamentais a serem feitas partindo-se desse relato impregnado de obscuridades: teriam sido culpados de adultério Escobar e Capitu? E por que razão Machado de Assis escolheu transferir ao leitor a sentença de inocentá-los ou condená-los? Ora, não há maneira de res-ponder a tais questões, pois, para isso, são necessárias as versões dos perso-nagens em xeque, bem como as de “testemunhas” imparciais no contexto. Além disso, nem o próprio Machado poderia, caso não o quisesse, escla-recer tal impasse, uma vez que, sendo “mero” autor, não necessariamente precisa ter o domínio de seus personagens.

Todavia, como afirma o próprio narrador, em seu capítulo Convi-vas de boa memória, “Nada se emenda bem nos livros confusos, mas tudo se pode meter nos livros omissos” (ASSIS, 2008, p. 105). Nesse sentido, objetivando responder àquelas questões, alguns autores se lançaram ao desafio de emendar trechos, unir partes, supor ideias e, com isso, propor resoluções, valendo-se do aval oferecido por Bentinho, bem como de criar outras perspectivas para tais fatos. Foi isso o que fez, por exemplo, o escri-tor Domício Proença Filho (1998), em seu Capitu – Memórias Póstumas, concedendo voz à dita personagem e apresentando sua versão do drama

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do Dr. Bento Santiago. Questionado, numa entrevista, sobre a respon-sabilidade que sentia em “reescrever” Machado, Proença Filho explica: “Nunca tive nem tenho a pretensão de reescrever Machado. Entusiasta de sua obra, busquei apenas dialogar com o seu texto e com a sua fortu-na crítica” (GRUPO EDITORIAL RECORD, 2011). É a esse diálogo mencionado por Proença Filho que se apega este estudo.

O que se pretende no presente trabalho é visualizar as relações exis-tentes entre esses dois textos, o original e seu fruto, alcançando os níveis de intertextualidade que as obras refletem. Na busca por afirmações e re-futações, aprovações e reprovações, bem como semelhanças e diferenças, é que se pauta o estudo, destinado, especificamente, a estabelecer a ponte entre tais romances, na qual se observará os limites de independência e subordinação que existem nessa conexão, além das singularidades de cada obra.

Para tanto, serão utilizados estudos feitos acerca desse fator de análi-se textual – a intertextualidade –, como também de variadas definições a seu respeito, baseando-se, especialmente, em Bentes (2005), mas também em outros autores, iniciando pela apresentação das concepções de “tex-to” e, depois, de “intertextualidade” nas quais se fundarão este trabalho, para que se possa, em seguida, partir à análise dos romances. Com esse suporte, se confirmará a existência de relação intertextual entre o relato de Bentinho e a resposta de Capitu – da Capitu de Proença Filho, não menos “oblíqua” e “dissimulada”, embora um pouco mais despida, que a de Machado de Assis.

2. TEXTO E INTERTEXTUALIDADE

Como dito, começaremos a explanação deste estudo abordando a concepção de texto que utilizaremos neste trabalho. Desse modo, o que deveríamos fazer é iniciar a sua conceituação apresentando, de saída, a definição mais bem aceita entre os linguistas ou a mais atual surgida na área, porém, como este se trata de um trabalho sobre relações intertextu-

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ais, optamos por utilizar a metodologia do diálogo também nesta seção, considerando que a noção de “texto”, tal como a de tantos outros termos e expressões, sempre terá à sua disposição mais de uma explicação. Portanto, exporemos brevemente a definição de “texto” em sua trajetória, dividin-do-a em três momentos, colocando-a como resultante de um complexo de reflexões obtidas ao custo de muitos estudos.

Antes, o que se concebia como “texto” era qualquer sequência lin-guística possuidora de coerência, o que significa que essa primeira defini-ção estava concentrada no arranjo do material linguístico. Tal concepção pressupõe, portanto, a existência de “não textos”, ou seja, de sequências linguísticas incoerentes entre si. Em suma, o que aqui se tinha era o texto, oral ou escrito, reconhecido como uma estrutura “pronta” e “acabada”; era a ênfase no seu aspecto “físico”, “palpável”. Consequentemente, é tido como uma unidade dotada de um início e um fim, adquirindo, inclusive, a acepção de “elemento linguístico maior que a frase” (BENTES, 2005).

Por exemplo, para Weinrich (1971, apud FÁVERO; KOCH, 1988, p. 22), que pode ser incluído como partícipe desse momento da definição do termo, como menciona Bentes (2005, p. 253) para ilustrar a sua expo-sição, o “texto” é caracterizado por meio de fatores como: “a) a seqüência coerente e consistente de signos lingüísticos; b) a delimitação por inter-rupções significativas na comunicação; c) o status do texto como maior unidade lingüística”.

Essa conceituação contrasta com outra, posterior, a qual toma o tex-to não como mera materialização linguística, mas como participante de um exercício mais amplo de comunicação. Nesse momento, passa-se a le-var em consideração as circunstâncias de planejamento e construção da verbalização do texto, bem como suas condições de recepção (BENTES, 2005). O que temos, então, é a inclusão do interlocutor e sua resposta na produção textual, ainda que essa resposta não seja aquela aguardada pelo locutor. Assim, se antes o centro do conceito de “texto” estava na organização dos constituintes linguísticos e na extensão do arranjo, agora podemos dizer que a palavra-chave dessa segunda definição é “interação”.

As palavras de Bakhtin (1986 apud BENTES, 2005, p. 255), filóso-

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fo russo de destaque na lista dos grandes teóricos do discurso, tido como um dos maiores pensadores do século 20, fornecem um melhor esclareci-mento dessa compreensão:

Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro. [...] A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. Se ela se apóia sobre mim numa extremidade, na outra se apóia sobre meu interlocutor. A palavra é o território co-mum do locutor e do interlocutor.

Além das diferenças entre as variadas concepções de “texto”, há, tam-bém, “fusões” e “confusões” entre diferentes acepções do termo. Ocorre, por exemplo, que alguns autores aceitam a palavra “discurso” como sinô-nima de “texto”, como também existem os que as empregam com signi-ficados distintos. Isso se deve pelo fato de que, em algumas línguas, tais como o alemão e o holandês, não existe essa diferenciação, pois não há, em seu léxico, a palavra “discurso”, não havendo, portanto, uma separação entre esse vocábulo e o “texto”. Além do mais, não podemos nos esquecer de que existe o campo de estudos dedicado exclusivamente à Análise do Discurso, que, em meio às suas propostas, difere os sentidos dessas duas palavras (ALEIXO, 2011). Podemos nos servir de Fávero e Koch (1988, p. 25), também citadas por Aleixo (2011, p. 115-116), para representar essa distinção:

Texto em sentido amplo, designando toda e qualquer manifestação da capacidade textual do ser humano (uma música, um filme, uma escultura, um poema etc.), e, em se tratando de linguagem verbal, temos o discurso, atividade comunicativa de um sujeito, numa situ-ação de comunicação dada, englobando o conjunto de enunciados produzidos pelo locutor (ou pelo locutor e interlocutor, no caso dos diálogos) e o evento de sua enunciação.

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Como é possível observar na citação, além de uma discriminação entre os vocábulos, ocorre, nesse terceiro entendimento, uma ampliação do sentido de “texto”, passando-se a incorporar ao termo os diferentes ti-pos de manifestação comunicativa humana, como a música, a pintura, os gestos etc., restringindo a linguagem verbal ao “discurso”, compreendido, por sua vez, como atividade comunicativa envolta na situação de comuni-cação. Grosso modo, poderíamos afirmar, com base em Fiorin (2006), que Bakhtin partilha dessa conceituação.

Com essa explicação do que é “texto” dividida em três momentos, as-sinala-se o problema de qualquer definição: haverá, sempre, mais de uma acepção para um único conceito, seja concordante, seja discordante de uma anterior. No que concerne à conceituação de “texto”, não é diferente; teóricos contemporâneos ou não divergem em suas definições, e o que im-porta é encontrar aquela compatível com a análise textual que se propõe realizar, porém sem desconsiderar as demais. Nesse sentido, sendo a inten-ção deste estudo dissertar sobre os níveis de intertextualidade evidencia-dos entre dois romances, a definição mais próxima dos pressupostos que aqui serão utilizados pode ser representada pela fala de Koch (1997 apud BENTE, 2005, p. 255), a qual poderíamos encaixar naquela segunda con-cepção de “texto”, que o entende em sua situação de interação:

Poder-se-ia, assim, conceituar o texto, como uma manifestação ver-bal constituída de elementos lingüísticos selecionados e ordenados pelos falantes durante a atividade verbal, de modo a permitir aos parceiros, na interação, não apenas a depreensão de conteúdos se-mânticos, em decorrência da ativação de processos e estratégias de ordem cognitiva, como também a interação (ou atuação) de acordo com práticas socioculturais.

É claro que, embora haja a intenção do diálogo entre os diferentes momentos apresentados, não há o intuito de compará-los nem de colocá--los em debate; ao contrário, o recurso foi usado, como já dito, para se traçar a trajetória da conceituação do termo e, assim, chegar-se à definição

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apropriada para este trabalho, demonstrando, com isso, que ela não foi subitamente produzida nem é estática. Em verdade, a intenção primeira é alcançar o outro conceito em que se postula este estudo, o qual constitui fator de grande importância para a compreensão global de um texto: a intertextualidade.

Interessante fator de coerência textual, a intertextualidade é, em suma, o processo de recorrer-se a textos anteriores a um dado texto para compreendê-lo integralmente. O curioso é que nós, locutores e, também, interlocutores de textos, não notamos o quanto nos servimos, no coti-diano, de nosso prévio conhecimento de outros textos para produzirmos e recebermos textos novos (BENTE, 2005). Daí a atenção que deve ser dada às informações que acumulamos em nosso dia a dia e à influência que elas exercem em nós. É tal como afirmam Fiorin e Savioli (2007, p. 20):

A percepção das relações intertextuais, das referências de um texto a outro, depende do repertório do leitor, do seu acervo de conheci-mentos literários e de outras manifestações culturais. Daí a impor-tância da leitura, principalmente daquelas obras que se constituem as grandes fontes da literatura universal. Quanto mais se lê, mais se amplia a competência para apreender o diálogo que os textos travam entre si por meio de referências, citações e alusões. Por isso cada li-vro que se lê torna maior a capacidade de aprender, de maneira mais completa, o sentido dos textos.

Esse ato recorrente de orientar-se, de influenciar-se por “textos” anteriores para produzir ou para receber “textos” novos, é chamado, por Bakhtin, de “dialogismo”, porém, antes de prosseguirmos com essa afir-mação, é preciso esclarecer a utilização das aspas para destacar a palavra “textos”. Na realidade, o significado que carrega o termo “dialogismo” para o filósofo não traz em seu bojo a ligação ao conceito de “texto”, pois, de acordo com ele, devem-se chamar “dialogismo” as relações entre “enun-ciados”, o que quer dizer que, para compreendermos o raciocínio bakhti-niano, devemos substituir a palavra “textos”, na afirmação do início deste parágrafo, por “enunciados”.

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A confusão entre os conceitos de “dialogismo” e “intertextualidade” é muito comum não só entre leigos no assunto, como também entre teó-ricos do texto, que costumam firmar uma associação, que é errônea, entre os dois termos. Por esse motivo, faz-se necessário, neste estudo, antes de partirmos a um desenvolvimento mais pleno sobre o elemento protago-nista deste estudo – a intertextualidade –, exercitarmos, mais uma vez, o diálogo, tal como fizemos anteriormente, na exposição de “texto”, expli-cando a causa de tal equívoco, bem como a relação que existe entre os dois conceitos.

Segundo Fiorin (2006), o conceito de “dialogismo”, sobretudo per-tencente ao universo bakhtiniano, é confundido com o de “intertextu-alidade”, o que chega a ser ilógico, uma vez que esse termo nem sequer aparece na obra do filósofo. E o engano possui um marco histórico: ele se dá no momento em que a semioticista Júlia Kristeva (1967) apresenta, na França, um estudo no qual ela introduz o termo “intertextualidade” como pertencente à análise de Bakhtin, e Roland Barthes passa a difundir essa ideia. O problema é que eles entenderam como sendo “texto” o que Bakhtin chama “enunciado”, um erro condenável porque há, na obra do filósofo, uma distinção entre essas duas nomenclaturas. Para ele, o “tex-to” é “[...] uma realidade imediata, dotada da materialidade, que advém do fato de ser um conjunto de signos”, enquanto o enunciado é [...] uma posição assumida por um enunciador, é um sentido”. Fiorin (2006, p. 52) resume: “O enunciado é da ordem do sentido; o texto, do domínio da manifestação”.

Nesse sentido, fundamentando-nos no que afirma o próprio Fiorin (2006), linguista estudioso da teoria bakhtiniana, poderíamos dizer, uma vez que existe essa distinção entre “dialogismo” e “intertextualidade” e, para Bakhtin, entre “enunciado” e “texto”, que há dialogismo, ou relações dialógicas, entre enunciados (que são os sentidos) e, também, entre textos (que são as manifestações dos sentidos), devendo, porém, chamar-se “in-tertextualidade” somente as relações dialógicas materializadas em textos.

Em outras palavras, mais simples, ocorre intertextualidade quando um texto, em sua composição, se remete a outro(s), ou seja, “dialoga” com

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outro(s), reafirmando ou rebatendo assuntos em comum, consolidando ou negando ideias, fazendo menções, com o intuito de destacá-las, contes-tá-las, ironizá-las, estilizá-las, denegri-las, incorporá-las etc., adicionando a elas novas impressões, inerentes à própria produção. Por exemplo, neste artigo, caracterizado como de revisão bibliográfica, no qual nos utiliza-mos da manifestação escrita para a produção de seu texto e com ela tra-balhamos nos objetos aqui analisados, recorremos, como se afirmou no início desta seção, à intertextualidade, servindo-nos de citações diretas e indiretas de diversos autores para ratificar as informações que apresenta-mos e defendemos.

O uso de citações de um texto ou mais feito por outro, seja de forma explícita, seja de forma implícita, é o meio mais comum e o modo prima facie de estabelecer-se intertextualidade. Nos textos jornalísticos, científi-cos e, especialmente, literários, isso acontece com frequência; os autores fazem constantes referências a textos anteriores, podendo ser essa alusão ao gênero discursivo, à estrutura textual, ao tema, à história, a personagens etc. Geralmente, nesse último tipo de texto – o literário –, a citação ocorre de maneira implícita, isto é, o escritor costuma não indicar de onde reti-rou as passagens aludidas, pois pressupõe que seu leitor já tenha o mesmo acervo de informações que ele possui a respeito do texto citado (FIORIN; SAVIOLI, 2007). No entanto, devemos ressaltar que essa generalização não deve ser tomada como regra, já que, como se verá na seção a seguir, trabalharemos com um texto literário que se utiliza, em praticamente toda a sua extensão, de citações explícitas e, inclusive, diretas para remeter-se ao texto a partir do qual ele foi produzido, pois, como se notará, deste é de-pendente para que se ocorra uma compreensão global do intertexto.

A melhor maneira para se explicar as ocorrências intertextuais em seus níveis variáveis sempre será por meio de exemplos. É fato: só com-preendemos o funcionamento do texto no próprio texto; só visualizamos as formas de linguagem na comunicação real. Portanto, sem mais, vamos partir à análise dos textos propostos neste trabalho, a qual confirmará a refutação feita ao final do parágrafo anterior e muitos exemplos oferecerá para a elucidação do conceito de intertextualidade.

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3. A INTERTEXTUALIDADE ENTRE OS DOIS ROMANCES

Para Bakhtin, o jogo de enunciados, isto é, das relações dialógicas, pode ou não manifestar-se no fio do discurso, havendo meios para a ocorrência dessa manifestação. Falamos da incorporação assumida da(s) “voz(es)” de outro(s) pelo enunciador em seu enunciado, a qual constitui a maneira mais nítida do diálogo entre os sentidos proposto pelo filósofo – que a denomina, inclusive, de “concepção estreita de dialogismo” – e representa, quando revelada em textos, a prima facie, como afirmamos an-teriormente, de intertextualidade (FIORIN, 2006).

De um modo geral, existem duas possibilidades de inserção do dis-curso alheio no enunciado: na primeira, nomeada “discurso objetivado” por Bakhtin, a “voz” do outro é francamente referenciada e claramente apartada da “voz” do enunciador, ou seja, ela é demarcada; na segunda, a outra voz é “diluída” nas palavras do enunciador, ou seja, está internali-zada na fala deste, não havendo, consequentemente, uma separação mui-to clara entre o texto citante e o texto citado, e havendo, portanto, uma “bivocalidade” (FIORIN, 2006). Como veremos a partir deste momento na análise que iniciaremos, esses modos de inserção do discurso do outro num novo texto possuem exemplos clássicos de sua ocorrência no roman-ce metaficcional a que nos propomos comentar, os quais reafirmam as de-finições até aqui apresentadas e evidenciam a intertextualidade entre ele e a sua obra inspiradora.

No intertexto Capitu – Memórias Póstumas, a primeira possibilidade de introduzir no enunciado o discurso alheio, mencionada no parágrafo anterior, é a grande “anfitriã” do leitor, o “convidado de honra” desse ro-mance, recebendo-o, contextualizando-o, adentrando-o na história que vem contar, história essa contada por Capitu, que, no momento em que resolve tecer seu relato, já se encontra morta (por esse motivo, o título), vindo, portanto, do além-túmulo contar sua versão sobre as acusações a ela feitas por seu ex-marido, Bentinho, em Dom Casmurro. Por isso, há o abuso, especialmente nas primeiras cenas do texto, de citações diretas e in-

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diretas da primeira obra, que são as principais maneiras de demarcação do discurso alheio, para que ocorra a retomada de trechos e se possa construir a outra versão da história. Domício Proença Filho, autor dessas memórias de Capitu, justifica o uso desse recurso como um meio de assegurar leal-dade ao seu texto-origem, destacando, inclusive, que todas as transcrições são acompanhadas de comentários da narradora, havendo, por trás deles, obviamente, a “[...] perspectiva crítica da nova narrativa” (GRUPO EDI-TORIAL RECORD, 2011).

Utilizemo-nos da intertextualidade e deixemos que a própria Capitu justifique seu método. Façamos como Proença Filho (1998) e ofertemos a voz à moça dos olhos de ressaca, para que ela mesma afirme o porquê do uso de transcrições e paráfrases em seu desabafo:

Não há como fugir dos fatos. Vivemos, eu e Bentinho uma realida-de comum, em vários aspectos relatada no seu livro. Ao retomá-la, reproduzirei, com freqüência e por vezes literalmente, passagens de seu texto, para que não me acusem de falsear os fatos, e, sempre que tal ocorrer, situarei, para maior destaque e para garantia de distan-ciamento, suas palavras entre aspas. Prefiro assim, até porque ficarão bem mais evidentes as minhas ponderações. Longo foi o tempo em que fui sendo julgada sem direito de defesa. E apenas na palavra do outro. Por isso, tenho por legítimo valer-me dela para melhor di-lucidá-la. Mesmo com o risco de paráfrase. (PROENÇA FILHO, 1998, p. 16).

Chamamos de “discurso direto”, com base em Fiorin (2006), ou de “citação direta”, aquilo a que Capitu se referiu, podemos assim entender, como reprodução literária. Já ao que ela se refere como “palavra do ou-tro” sob o risco de paráfrase é chamado de “discurso indireto” (FIORIN, 2006), ou “citação indireta”. Sem mais, vejamos um excerto retirado do intertexto que estamos analisando, em que a narradora pratica a intertex-tualidade que anuncia no início de seu texto, utilizando-se de citações di-retas e indiretas para construir seu discurso:

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O pai de Bentinho é eleito deputado e vem para o Rio de Janeiro, com a família. O agregado vem também e ganha quarto próprio no fundo da chácara. As febres voltam a Itaguaí. Seus serviços são reconvocados. Mas diante da convocação, ele se deixa estar calado, assume aquela sua falsa seriedade, suspira, e acaba confessando que nunca fora homeopata! “Tomara esse título para ajudar a propagan-da da nova escola, e não o fez sem estudar muito e muito; mas sua consciência não lhe permitia aceitar mais doentes” “— Mas você curou das outras vezes”, diz o Dr. Santiago; “— Creio que sim; mas o mais acertado é dizer que foram os remédios indicados nos livros. Eles sim, abaixo de Deus. Eu era um charlatão!...” Bentinho me dis-se que, nesse momento, segundo o testemunho de sua mãe, muito emocionado, as lágrimas molhavam-lhe as palavras; mas, logo refei-to, prosseguiu no seu discurso estudado: “— Não negue, os motivos do meu procedimento podiam ser e eram dignos; a homeopatia é a verdade, e, para seguir a verdade, menti; mas é tempo de restabelecer tudo”. (PROENÇA FILHO, 1998, p. 21).

No caso que apresentamos, Capitu serve-se, como dissemos, dessas duas maneiras de representação do discurso alheio. Ela está narrando o modo como José Dias foi “agregado” à família Santiago, e, para iniciar essa explicação, utiliza-se, de início, de falas breves e objetivas, bem demarca-das e ritmadas pelo uso do ponto final ao fim de cada uma. A intenção, aqui, é “encurtar” o assunto e ir direto ao ponto, e Capitu só se utiliza desse recurso porque conta com a prévia leitura do texto original feita por seu leitor. Ela compreende que seu interlocutor já sabe do que ela está falando e, por isso, quer abreviar o assunto para chegar aonde pretende. Então, ao final dessa sequência de cenas estabelecida no início do parágra-fo, ela emenda uma citação indireta da fala de José Dias, para, em seguida, partir a uma transcrição ipsis litteris de sua fala, iniciando o tema central desse capítulo, em que Capitu justifica, com as transcrições literárias do texto de Bentinho, sua opinião acerca do agregado e, também, sua opinião acerca do que ela supõe ser a visão de seu ex-marido, além de apresentar José Dias ao leitor. Após uma sequência de citações diretas, a narradora apresenta, outra vez, uma citação indireta.

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As citações diretas e indiretas constituem-se exemplos de “intertex-tualidade explícita” por haver a indicação da fonte a que elas se remetem (KOCH; TRAVAGLIA, 1990 apud BENTES, 2005). Elas são recursos utilizados como apoio ao enunciado recente, ou seja, para ilustrá-lo, com o intuito de reafirmar ou negar a ideia apresentada, ironizá-la, condená-la etc. As citações diretas são caracterizadas pelo uso de um verbo introdutor e de travessão; já as indiretas, além do verbo introdutor, trazem a con-junção integrante “que”. Entretanto, essas não são as únicas maneiras de demarcar o discurso alheio no texto; Fiorin (2006) ainda nos traz outras duas formas de utilizar-se de citações alheias. Trata-se do uso do recurso “aspas”, que, basicamente, destaca termos ou expressões, com o intuito de remetê-los a um enunciado anterior, e do recurso “negação”, que, como o próprio nome já diz, está relacionado à negação de um enunciado anterior.

Pode aqui ocorrer uma confusão, a qual já nos adiantamos em escla-recer: Capitu afirma, no começo de sua narrativa, como podemos notar na citação que apresentamos no início desta seção, que se servirá de “aspas” para destacar a fala dos outros personagens em seu romance. Ela se propõe a sempre indicar o discurso alheio se utilizando de tal sinal gráfico, como se esse fosse o único ou o melhor meio capaz de assegurar a veracidade das referências diretas à fala do outro. Porém, como se percebe no decorrer do intertexto, não é isso o que ela faz o tempo todo, talvez para que a leitura não fique cansativa ou repetitiva às vistas do leitor. É fato: não há como escapar do travessão em um diálogo, e, além do mais, nesses casos, ele indi-ca melhor a fala do outro do que as próprias aspas, embora estas também sejam usadas como recurso à pontuação de uma citação direta, como já sabemos, especialmente em textos científicos, podendo ser tal ocorrência observada neste mesmo artigo. O que acontece é que as aspas servem, es-pecialmente, para um tipo específico de delimitação do discurso alheio, para o qual demonstraremos um exemplo a seguir, extraído do intertexto que estamos analisando.

Aceitei, enfim, como Bentinho, a teoria. Mas não concordo que mi-nha vida se casa à definição. Se a dele coincide, o problema é dele. Eu,

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Capitu, cantei todo o tempo e com empenho um duo temperado de ternura, e depois um trio, com o nascimento do meu filho. Se retor-nei ao duo, assegurei, porém, a afinação e a harmonia. Mas não nos precipitemos. Voltemos às conseqüências das denúncias do agrega-do. Não foi absolutamente como o Sr. Bento Santiago narrou no seu relato infeliz. (PROENÇA FILHO, 1998, p. 31, grifos do autor).

Anteriormente ao excerto apresentado, Capitu está a recordar o tre-cho de Dom Casmurro em que Bentinho nos conta sobre a história de seu amigo Marcolini acerca da relação entre a vida e a ópera. Na citação que extraímos, ela dá a sua opinião a respeito de tal teoria, encaixando-a na sua vida, assim como o faz o ex-marido no seu relato, e, ainda “imitando” a obra anterior, destaca, por meio de itálico, algumas palavras que perten-cem à fala de Bentinho, as quais ele utiliza, em seu texto, para encasar sua teoria particular ao universo da ópera. Devemos entender que o mesmo efeito que as aspas possuem sobre uma palavra que se pretende destacar tem o recurso da escrita em itálico ou mesmo do sublinhado, usuais para a demarcação de citações. E foi isso o que fez Proença Filho (1998) para remeter-se não só ao texto-origem de sua obra, como também para inserir a fala de Capitu no universo de vocábulos referentes à ópera, uma vez que é para isso que o recurso “aspas” (manifestado pelo itálico, em nosso caso) serve: para circunscrever termos ou expressões que identificam a menção à fala de outra pessoa ou a um universo particular de vocábulos.

Ainda nesse excerto, mais especificamente em seu final, temos um exemplo do outro recurso à demarcação do discurso alheio que menciona-mos: a negação, cujo próprio nome já explicita sua função. Notemos que no trecho “[...] Não foi absolutamente como o Sr. Bento Santiago narrou no seu relato infeliz” (PROENÇA FILHO, 1998, p. 31), duas vozes se confrontam: a que é a favor da versão de Bentinho sobre o momento em que ele percebe estar enamorado de Capitu depois de ouvir a conversa entre sua mãe, D. Glória, e o agregado, José Dias – versão essa que é o “relato infeliz” ao qual a narradora se refere –, e a que concorda com Ca-pitu, que, na sequência do excerto, vai dar a sua explicação do fato. Sem

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mais, a negação é, em suma, isto: a refutação de um enunciado, na qual se estabelece, automaticamente, o diálogo com o seu sentido contrário, ou seja, o da afirmação.

Assim como no discurso direto e no discurso indireto há contornos externos muito bem definidos para a sua demarcação, os recursos “aspas” e “negação” apresentam nítidas provações de sua intertextualidade: nas aspas, notamos o diálogo por meio dos sinais gráficos ou estilísticos, como o itálico; na negação, por meio do advérbio negativo. Todavia, como dis-semos no início desta exposição, há uma segunda maneira de se inserir um discurso anterior em um novo texto, e, nesta, não existe algo que expli-cite essa citação. É o que Koch e Travaglia (1990 apud BENTES, 2005) chamam de “intertextualidade implícita”. Aqui, encaixam-se mais cinco tipos de intertextualização: a polêmica clara, a polêmica velada, a paródia, a estilização e o discurso indireto livre (FIORIN, 2006), os quais também são passíveis de serem evidenciados no romance de Proença Filho (1998).

Não sei se disse que saí do Brasil como se nossa vida fosse um jar-dim de roseiras floridas. Conformadas, foi o que escrevei; agora me lembro. A família levou-nos ao cais, com emoção e carinho. D. Glória cheia de cuidados com o filho, que não se expusesse demais aos ventos do navio, que não fosse pegar uma pneumonia; José Dias amargava, mas sem demonstrá-la, a sua frustração, por mais uma vez, não voltar à Europa, e logo à Suíça, belíssima, vocês vão adorar, e fi-quem tranquilos, eu cuido da casa e dos velhos, Capitu, se em algum momento sentir que eu posso ser de alguma valia, é só escrever, que viajo em seguida... (PROENÇA FILHO, 1998, p. 218, grifo nosso).

Como se pode notar já na primeira leitura, no excerto anterior, não há uma demarcação propriamente dita entre a voz da narradora Capitu e a voz do personagem José Dias; elas misturam-se ao final do trecho, mas, mesmo assim, são claramente percebidas. Por isso, com base em Fiorin (2006), entendemos que o recorte em destaque na citação traz palavras tidas como bivocais, o que nos leva a afirmar a ocorrência de discurso in-direto livre. Capitu está narrando a sua despedida da família de Bentinho,

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quando de sua embarcação para a Suíça, motivada pelas discussões em tor-no da paternidade de Bentinho em relação a Ezequiel, filho do casal. O re-lato com o qual contamos é a versão de Capitu dessa despedida, mesclada com a fala de José Dias ao final, entremeada em seu discurso. Percebe-se, nitidamente, a voz do agregado no trecho destacado, embora não haja de-marcações que a evidenciem, e percebe-se, também claramente, no início do parágrafo, que Capitu está descrevendo a cena com suas próprias pa-lavras. Tal como nos explica Fiorin (2006), “[...] são dois tons diferentes que permitem perceber duas vozes distintas”, pois o tom sereno de Capitu começa, no final do trecho, a contrastar com a euforia e o entusiasmo de José Dias ao imaginar a viagem da narradora. Por conseguinte, há trechos que poderiam ser das duas vozes. O período “[...] por mais uma vez, não voltar à Europa, e logo à Suíça [...]” poderia ser atribuído, na forma em que está, à voz da narradora, mas também a José Dias, se compreendermos que o início da fala deste se encontra nesse ponto, com o lamento por não participar da viagem.

Muitas vezes ocorre, no intertexto Capitu – Memórias Póstumas, de a protagonista dessa versão, Capitu, colocar em xeque os ditos de Bentinho na primeira obra. Não surpreende: a narradora pretende defender-se das acusações de seu ex-marido, e isso o faz questionando seus apontamen-tos, condenando-os e explicando o porquê dos achismos do esposo. É por esse motivo que temos uma polêmica constantemente estabelecida, vezes clara (na maior parte das vezes e, por que não, em quase todo o texto), vezes velada (em alguns momentos), poderíamos assim afirmar. Ora ela transcreve trechos da fala de Bentinho, como vimos, e os contrapõe à sua voz; ora ela direciona o leitor a com ela concordar, sem necessariamente expor fala alguma, intentando, com isso, induzir o leitor a partilhar de seu drama, tal como no trecho: “[...] E você, se um dia amou como eu amei, desejou como eu desejei, vai certamente me entender” (PROENÇA FI-LHO, 1998, p. 14).

Quando ela age como nesse exemplo, conduzindo o leitor a acompa-nhar seu raciocínio e construindo uma “teia” discursiva que o induz a re-negar o relato de Bentinho, mas sem trazer para sua fala a ideia que rebate

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a sua afirmação, deixando subentendido, portanto, que quem dela discor-dar estará, automaticamente, concordando com a versão de Dom Casmur-ro, podemos concluir que está se criando uma “polêmica velada”, isto é, não expressamente aberta. É o que acontece, por exemplo, na construção discursiva daquele excerto no parágrafo anterior. Notemos a existência de duas vozes em oposição: a que compreenderá Capitu por compartilhar de experiência semelhante à dela e a que não a compreenderá pelo motivo contrário, estando, por conseguinte, do lado de Bentinho. Como a inten-ção da narradora é obter a “absolvição” do leitor, ela argumenta de forma que o convença, pois joga com a crença de que este já tenha passado por sensações tais como as dela.

Quando Capitu busca, entretanto, com a exposição da fala de seu ex-marido, questionar ou negar os apontamentos dele, afrontando-o e defendendo a sua posição, o que temos é chamado de “polêmica clara”. Vejamos um exemplo no excerto a seguir:

Bentinho vivia repetindo que sua mãe era boa criatura. Não era bem assim. D. Glória, apesar da aparente mansidão e da emotividade, era uma matriarca autoritária e dominadora. Um mérito lhe reco-nheço: era dona de uma personalidade forte. Provou-o, quando lhe morreu o marido, o Dr. Pedro de Albuquerque Santiago. Ela estava com trinta e um anos. Em pleno fulgor da maturidade. [...] Naquela conversa vespertina de 1857, já chegara aos seus quarenta e dois. Bo-nita ainda e ainda jovem, procurava, entretanto forçar o empenho da natureza e escondia “os saldos da beleza e da juventude” [...]. Fora re-almente muito bonita, verdade se diga. [...] Mas antes devo justificar a restrição do meu juízo: D. Glória era, de fato, autoritária. De um autoritarismo cercado de palavras mansas, mas fundadas em decisão que não admitia contestações. Era a senhora de classe dominante, capaz de tentar, como tentou, conduzir o destino do filho. Seus me-nores gestos sempre traziam segundas intenções [...]. (PROENÇA FILHO, 1998, p. 24-26).

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Nesse recorte, temos a réplica de Capitu à afirmação feita por Benti-nho em sua obra: “Minha mãe era boa criatura [...]” (ASSIS, 2008, p. 23). Ela discorda do ex-marido e ainda justifica sua opinião. Nessa passagem de Capitu – Memórias Póstumas, o que temos é um nítido exemplo de polêmica clara no diálogo entre os dois textos, com Capitu polemizando e discutindo a afirmação de Bentinho e apresentando críticas à sogra, em-bora concorde com o ex-marido em certos trechos, como, por exemplo, ao dizer que a mãe de Bentinho “[...] fora realmente muito bonita, verdade se diga [...]” (PROENÇA FILHO, 1998, p. 25), uma vez que é isso que consta na primeira obra. O interessante é observar que, claramente, o dis-curso de Capitu é moldado a partir do de Bentinho, mas é no de Capitu que os dois enunciados estão formalmente delimitados. O ponto de vista de Bentinho, como se pode notar em todo o decorrer do romance, serviu de “rotunda” às afirmações de Capitu.

Um desses nítidos momentos em que a fala de Bentinho serve de embasamento para o discurso de Capitu, estabelecendo-se, mais uma vez, uma polêmica clara, se encontra no final do romance. No entanto, em vez de transcrever a fala do ex-marido, a narradora diz “glosar” suas palavras, subvertendo, com ironia, o texto original, diluindo-o em seu discurso, criando, com isso, uma paródia. Para compreendermos como essa paródia acontece, vejamos, primeiramente, um trecho do último capítulo de Dom Casmurro, o qual será transformado no relato de Capitu:

[...] O resto é saber se a Capitu da Praia da Glória já estava dentro da de Matacavalos, ou se esta foi mudada naquela por feito de algum caso incidente. Jesus, filho de Sirac, se soubesse dos meus primeiros ciúmes, dir-me-ia, como no seu cap. 9, vers. I: “Não tenhas ciúmes de tua mulher para que ela não se meta a enganar-te com a malícia que aprender de ti”. Mas eu creio que não, e tu concordarás comigo; se te lembras bem da Capitu menina, hás de reconhecer que uma estava dentro da outra, como a fruta dentro da casca.E bem, qualquer que seja a solução, uma coisa fica, e é a suma das sumas, ou o resto dos restos, a saber, que a minha primeira amiga e o meu maior amigo, tão extremosos ambos e tão queridos também,

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quis o destino que acabassem juntando-se e enganando-me... A terra lhes seja leve! [...]. (ASSIS, 2008, p. 213).

Agora, acompanhemos um trecho do último capítulo de Capitu – Memórias Póstumas:

E, ao término deste meu relato, se você se lembra bem do Bentinho menino, há de concluir comigo – e gloso as palavras dele – que o fruto que estava dentro da casca era o Dr. Bento Santiago. Que a cas-murrice e a solidão lhe tenham sido leves. Faço minhas, por fim, as palavras do salmista e deixo-as à sua meditação: E as suas línguas per-deram a força, voltando-se contra eles mesmos. Todos os que os viam fi-caram assombrados. (Davi, salmo 63). (PROENÇA FILHO, 1998, p. 225, grifos do autor).

Analisemos: a intenção de Capitu no final de seu texto é, além de negar as injúrias feitas por Bentinho, ironizar o discurso dele, parodian-do o capítulo em que o esposo termina a sua narrativa. Ela subverte as conclusões de Bentinho e as transforma nas suas, propondo uma leitura diferente e contrária à do texto anterior. E isso não ocorre apenas nesse momento do intertexto, mas, sim, na obra em si, o que nos oferece o aval para podermos afirmar que Capitu – Memórias Póstumas é um exemplo de leitura na qual teríamos o que Sant’Anna (1985 apud BENTES, 2005) chama de “intertextualidade das diferenças” e o que Maingueneau (1976 apud BENTES, 2005) explica como fenômeno da “[...] subversão de um texto por outro”. Nesse sentido, se a intenção de Proença Filho (1998) tivesse sido criar uma confissão de Capitu, na qual toda a sua construção reafirmasse o conteúdo de Dom Casmurro e orientasse o leitor para uma conclusão parecida com a do texto retomado, teríamos o que Mainguene-au (1976) postula como fenômeno de “captação de um texto por outro” e o que Sant’Anna (1985 apud BENTES, 2005, p. 270-271) chama de “intertextualidade das semelhanças”.

A proposta da “intertextualidade das diferenças” está diretamente ligada à concepção de paródia, pois ela traduz, como vimos, a relação dia-

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lógica existente num texto novo que contradiz ou ironiza um texto antigo. Ora, é isso o que faz Proença Filho (1998) em todo o seu romance; portan-to, podemos afirmar que Capitu – Memórias Póstumas é uma paródia de Dom Casmurro. Sua intenção é a do contraste, o que significa que, obvia-mente, o intertexto conta com a prévia leitura do seu romance inspirador para que o leitor alcance uma compreensão completa da história. Sem que isso aconteça, não é possível que o leitor estabeleça a conexão necessária para que haja intertextualidade entre os dois romances, embora, com os recursos utilizados por Proença Filho (1998), de retomadas das passagens de Dom Casmurro, ele consiga alcançar um sentido lógico e cadente para o desenrolar do texto e o compreenda globalmente.

Não poderíamos afirmar, porém, que a ponte que une Capitu – Me-mórias Póstumas a Dom Casmurro seja a da estilização – outra forma de intertextualidade que, tal como a paródia, “imita” um texto anterior –, uma vez que esta não possui a intenção de negar nem de ironizar. Tal como explica Fiorin (2006, p. 43), na estilização, “[...] as vozes são convergentes na direção do sentido, as duas apresentam a mesma posição significante”, ou seja, a intenção, aqui, é a da reafirmação. Por esse motivo, não podemos deixar de mencionar que é notória a “imitação” que Proença Filho (1998) pretende fazer do estilo machadiano, reconhecido por sua ambiguidade e ironia, além do diálogo também estabelecido com outras obras, especial-mente com Memórias Póstumas de Brás Cubas, a qual serviu, também, de inspiração para a criação do título. É como afirma o próprio autor:

Na elaboração do texto das Memórias, tive sempre a preocupação de manter uma “atmosfera” machadiana. Nessa direção é que associei Capitu a outros personagens do Bruxo do Cosme Velho e às nar-rativas em que se inserem. A seleção de palavras e a construção dos diálogos tinham sempre como iluminação este procedimento. A re-ferência a Aurélia é uma homenagem a José de Alencar, o pioneiro criador dos perfis de mulher na nossa literatura. (GRUPO EDITO-RIAL RECORD, 2011).

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Desse modo, o que poderíamos supor, em um caso isolado, é que houve um processo de estilização no título Capitu – Memórias Póstumas, pois a intenção desse nome é apenas dialogar com dois textos de Macha-do de Assis, Dom Casmurro e Memórias Póstumas de Brás Cubas, sem a intenção de ironizá-los ou negá-los. O intuito é apenas informar o leitor, já de início, que, assim como Brás Cubas escreveu seu texto já depois de morto, Capitu o fez, havendo, portanto, uma convergência de sentido no entendimento do título, o que já implica, mais uma vez, o conhecimen-to prévio do leitor – se ele não tiver lido as Memórias Póstumas de Brás Cubas, não conseguirá estabelecer a conexão existente entre os dois textos. Porém, ainda assim, não poderíamos afirmar que há estilização entre Dom Casmurro e Capitu – Memórias Póstumas.

De uma maneira geral, podemos afirmar a ocorrência de intertextu-alidade entre Dom Casmurro e Capitu – Memórias Póstumas pelo simples fato de que essa obra não existiria sem aquela e, menos ainda, sem o pon-tapé inicial ofertado por Machado de Assis em sua construção misteriosa da incerta história de Bentinho, embora haja a crença veemente, por parte desse narrador “casmurro”, na traição de sua esposa e de seu melhor ami-go. A intertextualidade está declarada em todo o texto-fruto, em todos os seus capítulos, desde seu título até seu ponto final, e o mais interessante é conhecer esse outro lado da mesma história para conseguir-se formar um juízo a respeito da cigana oblíqua e dissimulada. Mas Proença Filho faz uma ressalva, a qual não pode ser esquecida por aqueles que se propõem à leitura de sua obra: “Essa é a minha perspectiva. Cabe a cada leitor con-cordar ou não com elas e chegar às suas próprias conclusões. Literatura é linguagem” (GRUPO EDITORIAL RECORD, 2011).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Capitu – Memórias Póstumas é a obra inaugural de uma coleção denominada À Sombra do Texto em Flor, título esse que já pressupõe a compreensão de que as obras nela incluídas foram derivadas de outros

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textos, o que não foi diferente com o romance que aqui analisamos. O que evidencia essa relação de “sombra” da narrativa de Machado de Assis (2008) para com o relato de Capitu criado por Proença Filho (1998) é, justamente, essa relação de subordinação, que, vale ressaltar, só existe de Capitu – Memórias Póstumas para Dom Casmurro, e nunca o contrário. Afinal, essa é a lei primeira para o estabelecimento de relações entre tex-tos, e, além disso, o autor das reminiscências de Capitu não teve a preten-são de equiparar-se a Machado de Assis. Seu propósito único é mostrar uma nova possibilidade de leitura para o drama de Bentinho, ofertando voz, como dissemos, à grande “vítima” da história: Capitu, dos olhos de ressaca (GRUPO EDITORIAL RECORD, 2011).

A análise que foi realizada neste trabalho procurou mostrar exata-mente isto: o grande acerto de Domício Proença Filho em ser justo com a famigerada personagem machadiana, oferecendo-lhe um direito de de-fesa, mesmo que post mortem, baseando-se nas entrelinhas deixadas por Bentinho em sua amarga narração. Para isso, utilizamo-nos de estudos e teorias referentes ao fator de análise textual que se encaixou perfeitamente no trabalho que procuramos fazer: a intertextualidade, que define o tipo de relação existente entre textos produzidos a partir de outro.

Com esse suporte, conseguimos confirmar a existência de intertex-tualidade entre os textos que escolhemos para serem examinados, porém a leitura dessa relação entre eles não deve se esgotar aqui. A discussão sobre o fenômeno que acontece nos diálogos entre os textos vai além do estudo que fizemos, e a nossa intenção foi apenas apontar possíveis explicações para a sua ocorrência em Capitu – Memórias Póstumas, a qual consegui-mos, com sucesso, realizar.

REFERÊNCIAS

ALEIXO, F. A coesão lexical no texto “Circuito Fechado”, de Ricardo Ramos. Linguagem Acadêmica, Batatais, v. 1, n. 1, p. 113-133, jan./jun. 2011. Disponível em: <http://sm.claretiano.edu.br/upload/4/revistas/sumario/pdf/29.pdf>. Acesso em: 09 out. 2011.

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ASSIS, M. Dom casmurro. 6. ed. São Paulo: Martin Claret, 2008. (Coleção A obra-prima de cada autor).

BENTES, A. C. Lingüística textual. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A. C. (Orgs.). Introdução à lingüística: domínios e fronteiras. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2005. v. 1.

FÁVERO, L. L.; KOCH, I. G. V. Lingüística textual: introdução. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1988.

FIORIN, J. L. Introdução ao pensamento de Bakhtin. São Paulo: Ática, 2006.

FIORIN, J. L.; SAVIOLI, F. P. Para entender o texto: leitura e redação. 17. ed. São Paulo: Ática, 2007.

GRUPO EDITORIAL RECORD. Entrevista: Capitu – memórias póstumas. Disponível em: <http://www.record.com.br/autor_entrevista.asp?id_autor=3996&id_entrevista=188>. Acesso em: 20 set. 2011.

PROENÇA FILHO, D. Capitu – memórias póstumas. Rio de Janeiro: Artium, 1998. (Coleção À sombra do texto em flor).

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Title: Intertextual relations between Dom Casmurro, by Machado de Assis”, and Capitu – Memórias Póstumas, by Domício Proença Filho.Author: Vanessa Vergani Machado.

ABSTRACT: In this article, we aimed to see, basing on especially the studies of Bentes (in MUSSALIM; BENTES, 2008) and Fiorin (2006), the intertextual relations in the works of Dom Casmurro, by Machado de Assis, and Capitu – Memórias Póstumas, by Domício Proença Filho. The novel of Proença Filho was prepared from the story in Dom Casmurro, in which there is a unilateral narration by Bentinho about the great uncertainty of his life: the betrayral of his wife, Capitu, and his best friend, Escobar, which he supposes to be true. What’s in Capitu – Memórias Póstumas is the self-defensive version of the accused wife, who argues in his posthumous outburst against the points raised by the husband in the original text by Machado de Assis. The concentration of this study is in these points, and, through the theories have been used here, it was possible to establish a discordant dialog between them and, therefore, between two novels.Keywords: Dom Casmurro. Capitu – Memórias Póstumas. Intertextuality.

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Da música à Literatura Inglesa: Iron Maiden, Samuel Taylor Coleridge e Edgar Allan Poe1

Eduardo Henrique Marinheiro2

Resumo: A música e a literatura estão no cerne deste trabalho como dois elementos diretamente relacionados. Isso porque, por meio da música, é possível espalhar e difundir literatura para o maior número de pessoas possível, e vice-versa. As duas músicas escolhidas para serem abordadas foram compostas pelo Iron Maiden, banda britânica criada nos anos 70 pelo baixista Steve Harris (1956), que ainda realiza turnês mundiais – a última delas realizada de 2010 a 2011, denominada The Final Frontier. Neste texto, serão comentados os textos literários e as músicas de nome “Rime of the Ancient Mariner” e “Murders in the Rue Morgue”. A primeira música possui cerca de treze minutos e faz parte do álbum Powerslave, lançado em 1984. A obra homônima na qual a música foi inspirada foi escrita por Samuel Taylor Coleridge (1772-1834) e inaugurou a fase do Romantismo na Inglaterra ao ser lançada em um livro de poemas chamado Lyrical Ballads (Baladas Líricas). Conta a história de um velho marinheiro que mata uma ave fazendo com que a embarcação seja amaldiçoada. Sua tripulação morre de sede, e o velho marinheiro fica só, à deriva em alto-mar. No fim, depois de ser salvo por um eremita, é fadado a contar sua história por inúmeras vezes até o fim de sua vida. A história nos mostra como respeitar tudo o que Deus criou. A segunda, por sua vez, foi lançada no álbum Killers de 1981, e possui cerca de quatro minutos. A obra, também homônima, foi escrita por Edgar Allan Poe (1809-1849) e conta a história de um crime que abala a cidade de Paris. O narrador principal, juntamente com seu amigo Dupin, investiga a fundo o assassinato de duas mulheres em um apartamento. Extremamente brutal e desumano, o crime intriga não só a população, mas a polícia parisiense. Após minuciosa investigação, chega-se à conclusão de que o autor do crime fora um grande orangotango que fugira de seu dono. Essa obra revolucionou os contos policiais e investigativos da literatura. Essa fusão “literatura e Heavy Metal” será o principal tema deste artigo, que conta com duas grandes obras da literatura em língua inglesa.

Palavras-chave: Iron Maiden. Samuel Taylor Coleridge. Rime of the Ancient Mariner. Edgar Allan Poe. Murders in the Rue Morgue.

1 Orientador: Renato Alessandro dos Santos. Doutorando em Estudos Literários pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Mestre em Estudos Literários e Licenciado em Letras pela mesma Instituição. Autor de “Mercado de Pulgas” (2011). E-mail: <[email protected]>.2 Especialista em Formação de Tradutores em Língua Inglesa pelo Claretiano – Centro Universitário. Graduado em Letras pela mesma instituição. E-mail: <[email protected]>.

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1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tratará da música como meio de divulgação e di-fusão da literatura por meio de canções cujas letras são baseadas em temas literários e/ou obras de grandes autores. Uma vez que a música é, por si só, um elemento com um elevado e rápido grau de divulgação, a literatura tem um imenso ganho em relação a isso, visto que a probabilidade de mais leitores interessados aumenta consideravelmente com os ouvintes interes-sados em conhecer e aprofundar-se no estudo de obras que serviram de base e de inspiração para a composição de determinada canção.

Dessa maneira, duas obras de dois grandes autores estrangeiros serão abordadas a seguir. Estas duas obras – “A Balada do Velho Marinheiro”, de Samuel Taylor Coleridge e “Assassinatos na Rua Morgue”, de Edgar Allan Poe – serviram de inspiração para, respectivamente, a composição de “The Rime of the Ancient Mariner” e de “Murders in the Rue Mor-gue” da banda britânica Iron Maiden.

Originada em Londres, Iron Maiden teve o nome inspirado em uma câmara de tortura medieval – a “dama de ferro” (Figura 1). Outras fontes defendem que o nome da banda esteja diretamente relacionado à primei-ra-ministra britânica Margaret Hilda Thatcher, cujo apelido era “Dama de Ferro”, em razão do governo de convicção que escolhera seguir, em que a única coisa que importava era sua opinião.

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Figura 1. Câmara de tortura: “dama de ferro”.Fonte: Vilarino (2009).

Criada em 1975 pelo baixista Steve Harris – que, 37 anos depois, ainda continua como líder – Iron Maiden ficou conhecida por ser uma das bandas pioneiras no surgimento da NWOBHM (New Wave of British Heavy Metal), nome criado pela imprensa para designar o que, no Brasil, ficou conhecido como a Nova Onda do Heavy Metal Britânico, em uma influência notada até hoje em grupos como Slipknot, Metallica, Dream Theater e até mesmo no Guns n’ Roses.

Com sonoridade pesada e melódica e batidas marcantes, suas le-tras são geralmente inspiradas em lendas (como em “The Number of the Beast”, “Flight of Icarus”), livros (como em “Seventh Son of a Seventh Son”, baseada no livro The Seventh Son, de Orson Scott Card, de 1951,

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que conta a história de uma criança que possuía o dom da clarividência), filmes, histórias e poemas (como em “The Trooper”, baseada em “The Charge of the Light Brigade”, de Alfred Tennyson).

Nomes como William Shakespeare (1564-1616) são também muito explorados, como na canção “Dance of Death” (baseada em Hamlet) e na canção “The Evil That Men Do” (baseada em uma citação do mesmo poeta, que o vocalista Bruce Dickinson sempre recita no início da música: “The good that men do is oft interred with their bones; but the evil that men do lives on”. Essa citação do vocalista foi inspirada em um dos versos da peça Julius Caesar de William Shakespeare, no Ato III:

Friends, Romans, countrymen, lend me your ears!I come to bury Caesar, not to praise him.The evil that men do lives after them;The good is oft interred with their bones.So let it be with Caesar […]. (THORNLEY, 1968, p. 45).

Na obra, Julius Caesar é assassinado por Brutus e por Cassius, pois estes acreditavam que ele queria fazer de si mesmo rei. Esses versos fazem parte de um grande discurso que Antony faz para uma multidão de roma-nos, sobre o corpo de Julius Caesar. A canção em si nada diz sobre a peça de Shakespeare, apenas utiliza a ideia retirada desses versos, de que o bem que os homens fazem é geralmente enterrado com seus ossos, porém o mal que eles fazem sobrevive.

Da mesma maneira, várias citações são feitas, como “introduções” às músicas, como é o exemplo da música “The Trooper”, já citada ante-riormente, em que o vocalista recita parte do poema “The Charge of the Light Brigade”: “Into the valley of death, Rode the six hundred [...] Cannon to right of them, Cannon to left of them, volley’d and thundered”. Na can-ção Aces High, há um pronunciamento de guerra de Winston Churchill (1874-1965), presente em um dos seis volumes de The Second World War, escritos por ele, que, como detentor do maior posto da Marinha Real bri-tânica na época (First Lord of the Admiralty), pôde relatar as histórias do modo que realmente aconteceram:

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We shall go on to the end. We shall fight in France, we shall fight in the seas and oceans, we shall fight with growing confidence and gro-wing straight to the air; we shall defend our island whatever the cost may be. We shall fight on the beaches, we shall fight on the landing--grounds, we shall fight in the fields and in the streets, we shall fight in the hills; we shall never surrender. (THORNLEY, 1968, p. 168).

Isso coloca em evidência a maestria e as referências culturais contidas nessas canções, algo que apenas aqueles que passam a conhecer a fundo tais composições têm a oportunidade de saber.

Sendo assim, esse tema nos remete a uma questão: até que ponto a difusão de grandes bandas cujas músicas são compostas com base na lite-ratura estrangeira serve de veículo mediador para o conhecimento de tais literaturas pelos respectivos ouvintes ao redor do mundo?

Elaborar uma resposta plausível para essa pergunta não é tarefa fácil, uma vez que boa parte dos fãs de bandas como o Iron Maiden – pelo me-nos no Brasil – não conhece a fundo a origem das músicas e composições, talvez pelo pouco conhecimento literário e também pela imposição da língua estrangeira. Porém, há uma parte de fãs que passaram a conhecer (e até mesmo a gostar dela) a literatura estrangeira a partir do anseio pelo conhecimento profundo da origem das composições, assim como as obras nas quais seus ídolos se inspiraram para a composição de tais músicas.

Foram escolhidas, então, as duas obras já mencionadas – “The Rime of the Ancient Mariner”, de Samuel Taylor Coleridge, e “Murders in the Rue Morgue”, de Edgar Allan Poe – para serem analisadas. A primeira, que será abordada em seguida, é baseada no poema homônimo do autor Samuel Taylor Coleridge, poeta que, com Wordsworth, inaugurou o Ro-mantismo inglês com o livro de poemas Baladas Líricas. A segunda, da qual trataremos mais adiante, é baseada na obra também homônima de Edgar Allan Poe, outro grande e renomado poeta da Literatura escrita em língua inglesa.

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2. DESENVOLVIMENTO

“The Rime of the Ancient Mariner” (“A Balada do Velho Marinhei-ro”) é o poema mais extenso de Samuel Taylor Coleridge, e um dos po-emas estrangeiros mais estudados. Seu autor foi uma criança com vasta imaginação e, aos oito anos de idade, “já era uma personalidade”, como citam Henry Thomas e Dana Lee Thomas em Vidas de Grandes Poetas (1956). Entrou para o Christ’s Hospital em Londres, escola onde o en-sino era rigoroso e o tratamento, severo. Coleridge parecia viver em uma outra dimensão e, certa vez, enquanto perambulava pelas escuras ruas de Londres, encontrou um cavalheiro que lhe forneceu um cartão de biblio-teca, o que lhe permitiu o acesso e fez com que o garoto devorasse vários livros. Quando completou dezoito anos, entrou para a Universidade de Cambridge, na Inglaterra, numa época em que os professores seguiam uma severa política de disciplina. Enquanto isso, na Europa, a Revolu-ção Francesa estava a todo vapor. “The Watchman” (ou “O Sentinela”, em português) foi sua primeira tentativa fracassada de alavancar uma carreira como escritor. Tratava-se de um jornal de caráter político que não teve boa aceitação por parte dos leitores. Conheceu, ainda na juventude, o poeta William Wordsworth (1770-1850), jovem com quem Coleridge cultivou a amizade digna de dois grandes amigos. Os dois discutiam ideias pessoais e chegaram a planejar um livro de versos juntos. Samuel Taylor Coleridge disse, ainda, em uma nota à edição de 1817: “Estou em débito para com o Sr. Wordsworth pelos dois últimos versos dessa estrofe. Foi num passeio agradável de Nether Stowey a Dulverton, em companhia dele e de sua irmã no outono de 1797, que este poema foi planejado e em parte com-posto” (FRANCA NETO, 2005, p. 212).

Tal nota fazia referência aos versos de número 224 a 227 do poema “A Balada do Velho Marinheiro”, que dizem:

I fear thee, ancient Mariner!I fear Thy skinny hand!And thou art long, and lank, and brown,As is the ribbed sea-land.

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A tradução escolhida para ser analisada foi a de Alípio Correia de Franca Neto, que traduziu esses versos da seguinte forma:

Me assustas, velho Marinheiro;Me assustam as mãos fracas!És alto, esbelto, a tez, curtidaComo o areal com marcas (FRANCA NETO, 2005, p. 145).

Coleridge era também vívido usuário e dependente de ópio, numa tentativa de amenizar as dores causadas pelo reumatismo, doença que o acompanhou durante toda a vida. Uma de suas obras mais conhecidas, Kubla Khan, foi escrita em boa parte sob influência da droga. Segundo Vidas de Grandes Poetas, de Henry Thomas e Dana Lee Thomas, em uma de suas alucinações pelo uso do ópio, Coleridge3 passou a escrever os se-guintes versos de Kubla Khan:

In Xanadu did Kubla KhanA stately pleasure-dome decree;Where Alph, the sacred river, ranThrough caverns measureless to manDown to a sunless sea […]. (THOMAS; THOMAS, 1956, p. 114).

Quanto à tradução dessa estrofe, não há especificações do autor no livro, talvez por se tratar de uma obra dos anos 1950. Porém, é feita da seguinte forma:

Em Xanadu ordenou Kubla KhanQue majestoso palácio de delícias fosse construído;Onde o Alph, o rio sagrado, corre,Através de cavernas imensuráveis para o homem, Rumo a um mar sem sol [...]. (THOMAS; THOMAS, 1956, p. 114).

3 Coleridge morreu em 25 de Julho de 1834, em Highgate, Inglaterra.

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O poema, como já citado, foi escrito com a ajuda de seu amigo William Wordsworth, inaugurando o período do Romantismo na Ingla-terra. Uma parte de três de seus Mystery Poems (ou Poemas de Mistério, em português), a “Balada do Velho Marinheiro” marcou a abertura das Lyrical Ballads (ou Baladas Líricas, em português).

Como relatado por G. C. Thornley, em An Outline of English Lite-rature,

Coleridge’s poem, The Rime of the Ancient Mariner, appeared in the first edition of the Lyrical Ballads. An old sailor describes some strange misfortunes that happened to his ship. It was in the ice of the South Pole when he shot a great bird; for this crime a curse fell on the ship. The wind failed, the water-supply ended, and all the other sailors died of thirst. The old mariner was then left […]4. (THOR-NLEY, 1968, p. 91-92).

A obra foi escrita em sete partes e conta a história de um velho ma-rinheiro (o adjetivo “velho” foi adotado e preservado no título por já ter sido o nome como foi consagrado em português, diferentemente de “an-cient”, que em português se traduz por “antigo”) que aborda uma de três pessoas em uma festa nupcial a fim de contar-lhe uma história. A princí-pio, o convidado nupcial tenta ir embora, porém é pego numa espécie de feitiço do velho marinheiro, e passa a ouvir a história “como uma criança de três anos”.

Trata-se de uma embarcação, com destino ao Polo Sul, navegando por lugares jamais vistos por nenhuma criatura viva, até que sua tripulação é surpreendida por uma ave marinha de bom agouro, o albatroz.

4 Tradução: “O poema de Coleridge, A Balada do Velho Marinheiro, apareceu na primeira edição das Baladas Líricas. Um velho marinheiro descreve algumas estranhas desgraças que ocorreram com seu navio. Isso aconteceu no gelo do Polo Sul, quando ele acertou um grande pássaro; por esse crime uma maldição caiu sobre o navio. O vento cessou, os suprimentos de água acabaram, e todos os outros marinheiros morreram de sede. O velho marinheiro então foi deixado [...]” (Tradução nossa).

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The Sun came up upon the left,Out of the sea came he!And he shone bright, and on the rightWent down into the sea.

Segundo Franca Neto, quatro versos (25 a 28) indicam o rumo to-mado pela embarcação: “As direções do nascer do sol e do seu ocaso indi-cam que o navio está seguindo para o Sul.” (FRANCA NETO, 2005, p. 211).

Vale a pena citar, também, a forma como Coleridge personificava o Sol, com a utilização do pronome “ele” – em inglês “he” – ao passo que o pronome a ser utilizado no caso do Sol seria o pronome “it”. Várias figuras de linguagem – como a prosopopeia, neste caso, que ocorre quando carac-terísticas humanas são atribuídas a seres inanimados – se fazem presentes na obra.

A embarcação recebe uma maldição depois que o velho marinheiro, com sua balestra (uma espécie de arco e flecha parecido com uma espin-garda) abate o pássaro de bom agouro que seguia a embarcação. A sede chega e deixa a todos com a garganta tão seca que mal conseguem proferir sequer uma palavra. Uma estrofe muito difundida e popularizada que re-trata essa sede é:

Water, water, every whereAnd all the boards did shrinkWater, water, every whereNor any drop to drink (FRANCA NETO, 2005, p. 126).

A banda Iron Maiden, em sua música “The Rime of the Ancient Ma-riner”, resgata essa estrofe e a anterior, do mesmo modo como ela foi es-crita por Coleridge em seu poema original, num sinal de que a Literatura Inglesa está presente nas letras da banda. A estrofe anterior, que ajuda na tarefa de relatar as consequências da maldição sobre a embarcação, é:

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Day after day, day after day,We stuck, nor breath nor motion;As idle as a painted shipUpon a painted ocean. (FRANCA NETO, 2005, p. 126).

Então, após dias parados e com sede, o marinheiro avista uma embar-cação que se aproxima ao longe, mesmo sem vento e sem maré. Tal parte é especificada pela música: “But how can she sail with no wind in her sails, with no tide?”. “Em inglês, a personificação da palavra “morte” é do gê-nero masculino, o que no caso faz da Morte e Vida-em-Morte um casal.” (FRANCA NETO, 2005, p. 212).

Esse casal que se aproxima nessa embarcação “fantasma” joga dados, disputando a tripulação e o velho marinheiro. Vida-em-Morte ganha o velho marinheiro, e o deixa viver, matando sua tripulação, que cai morta, um a um.

O velho marinheiro fica solitário durante uma semana, até que a maldição começa a se quebrar, e o albatroz, outrora pendurado em seu pescoço pelos outros tripulantes como sinal de culpa por sua morte, co-meça a cair. A chuva, sinal de mudança, chega e alivia o velho marinheiro, por graça da santa Mãe. Conforme relatado por dois autores franceses no Dicionário de Símbolos:

A chuva, filha das nuvens pesadas e da tempestade, reúne os símbo-los do fogo (relâmpago) e da água. Ela apresenta também a dupla significação de fertilização espiritual e material. [...] Caindo do Céu, ela exprime ainda um favor dos deuses, também de duplo sentido, espiritual e material. (CHEVALIER; GHEERBRANT, 1995, p. 237).

É quando um espírito leva o navio de volta para o Equador, país natal do marinheiro, em obediência à tropa angélica, porém ainda clamando por vingança. Sua penitência é imposta pelos espíritos, e a embarcação subitamente afunda como pedra. O velho marinheiro é salvo por um pe-queno barco onde havia um eremita e mais dois tripulantes. Ao chegar à

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terra firme, o velho marinheiro suplica ao Eremita do Bosque que o absol-va, porém sua penitência acaba concretizada.

E, até o fim de sua vida, o velho marinheiro terá que contar sua his-tória para as pessoas que encontra; caso contrário, seu peito irá queimar como fogo. Ensinando, assim, a respeitar e a amar todas as coisas que Deus criou.

3. POE, OS CRIMES DA RUA MORGUE E IRON MAIDEN

A outra obra da qual trataremos neste trabalho é de Edgar Allan Poe. Nascido em 1809, em Boston, Edgar Allan Poe ficou órfão quando criança, sendo adotado por uma rica família de quem herdou o sobreno-me “Allan”. A família o mandou para a Inglaterra em um internato a fim de fazer do garoto um verdadeiro cavalheiro, o que deu certo. Porém, ao voltar para os Estados Unidos, alguns vícios adquiridos durante sua estada na Inglaterra vieram à tona, como o vinho.

Chegou a alistar-se no exército, chegando ao posto de sargento, antes de abandonar a carreira. Foi o que se poderia chamar de “criança--problema”. Começou, ainda jovem, a escrever seus primeiros versos, que receberam críticas positivas da imprensa. Decidiu, então, seguir a carreira literária.

Encontrou muitas dificuldades na vida. Uma delas, a enfermidade de sua esposa, que passou por fases de melhora e piora de seu estado, até que acabou por falecer após longos seis anos. Com isso, Poe passou a beber e alterou estados de insanidade antes de se recuperar totalmente.

Eis que finalmente Edgar Allan Poe passa a ser reconhecido mun-dialmente por sua estranha poesia ao ganhar o seu primeiro prêmio pela obra “O Escaravelho de Ouro”. Lançou “O Corvo”, superando as expecta-tivas de todos, porém não ficou rico com tais realizações, uma vez que seu primeiro prêmio lhe rendeu apenas cem dólares, e “O Corvo” foi vendido por dez dólares.

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Em 1842, solucionou um crime de um caso real que intrigava a po-lícia de Nova York – o assassinato de Mary Cecilia Rogers – ao escrever o conto “O Mistério de Marie Roget”, cujo final que escreveu acabou sendo a solução confirmada do crime da vida real. Isso resultou em prestígio para Poe, embora não tenha sido o suficiente para lhe propiciar uma situação financeira melhor.

Conheceu Mrs. Whitman em uma conferência e acabou como seu noivo. Entretanto, sua vida boêmia, marcada por bebedeiras fez, com que ela selasse por vez o fim do noivado. Ainda assim, não desistira de seu sonho de conseguir lançar uma revista. Foi para Richmond, a fim de ela-borar o projeto para tal realização, quando encontrou uma velha amiga de infância, passando a cortejá-la. Noivou novamente, anunciando seu casa-mento. Porém, isso nunca se concretizou.

Em 1847, seu trabalho como poeta foi descoberto por Charles Bau-delaire (1821–1867) – um poeta francês conhecido como um dos precur-sores do Simbolismo com a obra As Flores do Mal, em 1857 – o que fez com que seu nome ficasse conhecido na Europa (VEINOTTE, 2009).

Foi encontrado em Baltimore em estado deplorável, e acabou mor-rendo no hospital, proferindo estas palavras: “O God!... Is all we see or seem. But a dream within a dream?” (THOMAS; THOMAS, 1956, p. 236).

Sua obra “Assassinatos da Rua Morgue”, da qual trataremos a seguir, foi escrita em 1841 e marcou o surgimento dos romances policias da épo-ca. Assim como “Escaravelho de Ouro”, escrito dois anos depois, foi pre-miada. Trata-se de um conto que se passa em Paris, narrado em primeira pessoa, que relata a história de um homem que conhece um jovem muito inteligente e perspicaz chamado Auguste Dupin, com quem acaba mo-rando e a cultivando uma grande amizade. Fica espantado com a grande habilidade que seu amigo possui de solucionar casos e mistérios e com a chamada “transparência” do homem, sendo capaz de “decifrar” o que uma pessoa esteja pensando em dado momento, algo como um Sherlock Holmes à francesa.

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Um horroroso assassinato ocorre na cidade, mais precisamente na Rua Morgue, e intriga não só a polícia como toda a população parisiense. Duas mulheres (mãe e filha) foram brutamente assassinadas no quarto andar de seu apartamento. O detalhe crucial é que o cômodo onde foram encontradas estava hermeticamente fechado por dentro e totalmente des-truído. A polícia não foi capaz de solucionar o caso e, após ouvir algumas testemunhas por inúmeras vezes, acabou prendendo um suspeito, Adol-phe Le Bon, embora não houvesse nada que o pudesse incriminar.

Dupin ficou interessado pelo caso, embora não tivesse demonstrado, e passou – juntamente com o narrador protagonista – a investigar o caso a fundo. Essa investigação representava, na realidade, certo divertimento para Dupin.

Investigaram o caso com extrema minúcia, analisando a cena do cri-me, os relatos das testemunhas, os suspeitos, as possibilidades, tudo isso liderado por Dupin, que deixava seu amigo perplexo enquanto falava, como se fosse um monólogo. Deram atenção especial aos relatos pertinen-tes à voz que se ouvira antes do crime: “rápida, estridente, desigual, áspera” que cada pessoa fez à polícia (GOUVEIA, 1990, p. 28-29).

No final das contas, o verdadeiro “assassino” foi capturado. O que re-presenta uma grande surpresa, especialmente, por se tratar de um grande orangotango, da raça de Bornéu, que havia escapado de seu proprietário. Um animal desse porte teria força suficiente para ter realizado tais atroci-dades com as vítimas, pois seria capaz de entrar pela janela do apartamen-to e fechá-la em seguida, enfim, de cometer o crime.

Após o relato de Dupin ao delegado, o suspeito outrora preso foi solto imediatamente e o caso foi enfim solucionado.

O narrador protagonista, assim como na obra, relata a história na primeira pessoa e, ao mesmo tempo, participa da história como perso-nagem principal. “É o narrador que é também o personagem central” (GANCHO, 1999, p. 29).

Na canção do Iron Maiden, a letra é também escrita em primeira pessoa, com narrador personagem, relatando o acontecido da mesma ma-neira como ocorreu na história original, porém sem a estrutura de conto policial.

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O nome da canção, assim como em “A Balada do Velho Marinheiro”, permaneceu inalterado pelos compositores do Iron Maiden, seguindo o título em inglês da obra “Murders in the Rue Morgue”. A palavra “rue” é utilizada no lugar de “street” por se tratar de uma forma arcaica na língua inglesa, porém ambas significam “rua” na língua portuguesa.

Algumas pequenas adaptações foram feitas na canção, em que o pro-tagonista está andando pelas ruas de Paris em uma noite chuvosa, quando ouve gritos e corre para a cena do crime. Lá encontra duas mulheres dei-tadas lado a lado e grita por socorro. Uma multidão aparece e ele sente-se aliviado por terem ouvido seu chamado, porém essa multidão vem apon-tando para ele, que, sem falar francês, não pode se explicar e corre deses-perado.

E agora esse homem deve fugir da polícia, que na época era chamada de “Gendarmes”, a cavalaria francesa de polícia medieval. Diz ainda, na canção, que deve encontrar seu caminho “Down south to Italy” (em por-tuguês, “para baixo em direção à Itália”), onde estará a salvo da jurisdição da polícia da França. Outra frase que retrata isso é “I’ve gotta find my way across the border for sure” – em português, “tenho que encontrar meu ca-minho além da fronteira certamente” (HARRIS, 1981).

O protagonista mostra sinais de grande preocupação e teme a per-seguição por parte de “olhos que fitam”, como fica demonstrado nestes versos: “But I can’t wipe the scene from my mind”; “And the Gendarmes are chasin’ me”; “Well I’m moving through the shadows tonight”; “Away from the staring eyes”; “And they’ll be looking for me” (HARRIS, 1981).

As traduções dos trechos citados anteriormente são, respectivamen-te: “Mas eu não posso tirar a cena da minha cabeça”; “E os Gendarmes estão me perseguindo”; “Bem, estou andando pelas sombras esta noi-te”; “Longe dos olhos que fitam”; “E eles estarão procurando por mim” (HARRIS, 1981, tradução nossa).

Ao final da canção, o protagonista acaba deixando um ar de mistério, dizendo que o crime não sairia de sua cabeça e confessando que já havia feito isso antes, como mostram as passagens: “But I know that it’s on my mind”; “And I’ve got to say I’ve done it before”. Em português, “Mas eu sei

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que isso está em minha mente”; “E eu tenho que dizer já fiz isso antes”.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Voltamos, portanto, à ideia de que a música – não somente da banda Iron Maiden – exerce uma grande influência na cultura literária dos ou-vintes, que passam de certo modo a conhecer a fundo as obras nas quais seus ídolos se inspiraram para compor uma determinada canção. A habi-lidade de interpretação é também extremamente explorada nesses casos, uma vez que o ouvinte, como fã, procura entender o que a música quer dizer, baseando-se nas influências de seus compositores. Isso é poesia, é literatura, e a música faz o importantíssimo papel de divulgá-las.

A influência, segundo Aldridge (1918 apud NITRINI, 1997, p. 130):

Ajuda a expor por que um escritor exprime um pensamento ou um sentimento daquele modo determinado. Compreender uma fonte mostra o processo de composição e ilumina o pensamento de um autor. Segundo este autor, podemos analisar uma passagem alta-mente poética em Shakespeare e elucidar os valores estéticos que aí encontramos, mas não podemos estar seguros de que Shakespeare passou pelo mesmo processo estético e emocional na criação da obra que passamos na nossa experiência de sua interpretação. Mas se nós conhecemos que certas passagens de A Tempestade são paráfrases de Montaigne, então ficamos sabendo algo concreto sobre o pensa-mento de Shakespeare e seu processo de composição.

Essa citação de Aldridge representa o que alguns ouvintes de músicas cujas composições são de cunho literário procuram fazer. É impossível, por exemplo, interpretar o que Steve Harris (1956), ao escrever “Rime of the Ancient Mariner”, quis dizer exatamente com sua composição, se não tivermos o conhecimento de que, há cerca de duzentos anos, Samuel Taylor Coleridge lançava a primeira edição de Lyrical Ballads.

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Não podemos, entretanto, generalizar a música como mediadora universal de divulgação anglo-literária. A razão pode estar na intensa falta de cultura que algumas músicas proporcionam aos seus ouvintes, músi-cas essas que fazem parte da atual indústria musical, que, diferentemente do passado, busca apenas o lucro com o curto e momentâneo estouro de vendas, e não a qualidade musical, ou, talvez, ao fato de que a música nem sempre pressupõe cultura, podendo significar apenas diversão.

Do mesmo modo, os ouvintes não podem ser generalizados, uma vez que a maior parte dos ouvintes de músicas que, como as apresentadas neste trabalho, foram baseadas em obras literárias de respeitosos autores, não conhece ou até mesmo não sabe da existência de uma obra por trás de determinada canção.

REFERÊNCIAS

CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain. Dicionário de símbolos (mitos, sonhos, costumes, gestos, formas, figuras, cores, números). Rio de Janeiro: José Olympio, 1995.

COLERIDGE, Samuel Taylor. A balada do velho marinheiro. Disponível em: <http://www.geocities.com/Athens/Troy/8413/balada.htm>. Acesso em: 21 mai. 2009.

FRANCA NETO, Alípio Correia de. A balada do velho marinheiro. Cotia: Ateliê Editorial, 2005.

GANCHO, Cândida Vilares. Como analisar narrativas. São Paulo: Ática, 1999.

GOLDSTEIN, Norma. Versos, sons, ritmos. São Paulo: Ática, 1989.

GOUVEIA, Ricardo. Os assassinatos da rua Morgue. São Paulo: Scipione, 1990.

HARRIS, Steve. Murders in the rue Morgue. Intérprete: Paul Di’Anno. In: IRON MAIDEN. Killers. Londres: EMI, 1981. 1 CD. (37 min.). Faixa 03.

_______. Rime of the Ancient Mariner. Intérprete: Bruce Dickinson. In: IRON MAIDEN. Powerslave. Londres: EMI, 1984. 1 CD. (50 min.). Faixa 8.

NITRINI, Sandra. Literatura comparada. São Paulo: Edusp, 1997.

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THOMAS, Henry; THOMAS, Dana Lee. Vidas de grandes poetas. Rio de Janeiro: Globo, 1956.THORNLEY, G. C. An outline of english literature. London: Longman, 1968.

VEINOTTE, Barry. Charles Baudelaire – Biography. Disponível em: <http://www.veinotte.com/baudelaire/baudelaire2.htm#top>. Acesso em: 26 mai. 2009.

VILARINO, Cristine Vieira. Compêndio de instrumentos de tortura e execução na Idade Média européia. Disponível em: <www.geocities.com/adtenebras/compendio.htm>. Acesso em: 21 mai. 2009.

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Title: From music to English Literature: Iron Maiden, Samuel Taylor Coleridge and Edgar Allan Poe.Author: Eduardo Henrique Marinheiro.

ABSTRACT: Music and literature are essential parts of this project, regarded as two directly related elements. This is because, through music, it is possible to scatter and to broadcast literature to the highest number of people, and vice versa. The two chosen songs were composed by Iron Maiden, a british band created on the 70’s by the bassist Steve Harris, which still goes on world tours – last tour performed from 2010 to 2011, named The Final Frontier Tour. Thus, “Rime of the Ancient Mariner” and “Murders in the Rue Morgue” are the titles of both the songs and the literary texts. The first song is about thirteen minutes long and is part of the Powerslave album launched in 1984. The homonymous poem in which the song was inspired was written by Samuel Taylor Coleridge (1772-1834) and inaugurated the Romanticism in England when launched in a poems book named Lyrical Ballads. It tells the story of an ancient mariner who kills a bird causing the vessel to be cursed. His crew dies of thirst, and the ancient mariner remains alone, drifting on the high seas. Eventually, after being saved by a hermit, he is bound to tell his story several times until the end of his life. The story shows us how to respect all the things God created. The second, for its part, was launched in the album Killers from 1981, and is about four minutes long. The book, also homonymous, was written by Edgar Allan Poe (1809-1849) and tells the story of a crime that stuns the city of Paris. The main narrator, with his friend Dupin, deeply investigates the murder of two women in an apartment. Extremely brutal and inhuman, the crime intrigates not only the population, but also the police. After thorough investigation, it is concluded that the author of the crime had been an orangutan which had fled from his owner. This book made a revolution on the police and investigative tales in literature. This fusion

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“literature and heavy metal” will be the main theme in this article, which counts on two great works from the English Literature.Keywords: Iron Maiden. Samuel Taylor Coleridge. Rime of the Ancient Mariner. Edgar Allan Poe. Murders in the Rue Morgue.

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A Genealogia da moral como um pressuposto de aversão ao comunitarismo religioso: uma leitura das aflições de Nietzsche

André Luiz Rocha da Silva1

Stefan Vasilev Krastanov2

Resumo: O presente artigo tem como pano de fundo a distinção dos dois tipos de sujeito presentes na Genealogia da moral, de Nietzsche, o homem seguidor e o indivíduo artista. Essa distinção formulada a partir do ato interpretativo quer mostrar a diferença fundamental das concepções de vida: a vida como permissão e cumprimento do plano divino, adepta do cristianismo e consolidada pela prática do medo, e vida como devir, sustentada por Nietzsche como efetividade. Construída essa base, é criado um esquema possível que sustenta a obra genealógica de Nietzsche sobre o seguinte foco: a aversão nietzschiana ao comunitarismo religioso, isto é, à negação da vida. Assim, quer-se mostrar como a consciência de culpa e a necessidade de pertencimento atuam num ciclo vicioso e silencioso no âmbito cultural, reiterando a ação da classe sacerdotal e o papel do asceticismo como fatores primordiais para a formação de rebanho, a consolidação do comunitarismo religioso.

Palavras-chave: Comunitarismo Religioso. Vida como Efetividade. Classe Sacerdotal. Formação de Rebanho. Medo.

1 Graduando em Filosofia pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). E-mail: <[email protected]>.2 Doutor em Filosofia pela Universidade Federal de São Carlos (UFScar). Mestre em Filosofia pela Sofiiski Universitet Kliment Ohridsky (Bulgária). Licenciado em Filosofia pela mesma instituição. Professor adjunto da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Autor de “Nietzsche: Pathos Artístico versus Consciência Moral” (2010). E-mail: <[email protected]>.

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Este texto tem um propósito específico: analisar, no discurso do fi-lósofo e no decurso da obra em questão, as aflições que o fazem distinguir dois tipos de homem: o homem seguidor e o homem criador. A identifi-cação desses dois tipos de homem, extraídos do interior da obra e, sobre-tudo, a partir do fator interpretativo, permite estabelecer, na medida do possível, um alinhamento das inquietações do autor com as suas respec-tivas consequências, sendo que, nessa implicação e diante dessa caracteri-zação dual, entre o âmbito ético e o estético, cria-se a base que sustenta a intenção posterior.

Não somente ao alinhamento das aflições de Nietzsche se presta essa intenção. É possível extrair, nesses momentos aflitivos que abarcam toda a obra do autor, um mecanismo que oferece uma explicação sobre o pro-blema da distinção entre esses dois tipos de homem e, especificamente, a condição mantenedora na qual a estrutura histórica e cultural do homem seguidor se mantém. A figura desse tipo de homem prescrito, que, aliás, é intitulado por Nietzsche como o representante da rebelião moral escrava3, pode ser analisada em sua peculiaridade, sendo fundamentalmente extra-ída do invólucro fragmentado e múltiplo que compõe a obra, mais ainda, das aflições e ironias que a constituem, adotadas como comunitarismo religioso.

Dessa forma,deve ser considerado doravante o comunitarismo reli-gioso como um termo específico que quer apontar para a estrutura cícli-co-gregária extraída do interior da obra, mesmo tendo-se atentado que tal conceito não tenha sido designado propriamente por Nietzsche, como no modo em que se é proposto aqui. Assim, nesse segundo momento des-ta investigação que tenta explorar pela via da interpretação as aflições de Nietsche com relação à condição gregária, parece ser fundamental adotar tal termo, que, por ora, sustente todos os conceitos que Nietzsche lança de forma fragmentada na obra, tais como: formação de rebanho, cons-ciência de culpa, castigo e punição, homem baixo e comum, homem das comunidades etc.3 Em vários momentos na obra, Nietzsche usa termos de efeito, que não só fundamentam o seu percurso genealógico, na sua totalidade, mas exaltam também sua aversão irônica aos elementos atacados.

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Comunitarismo religioso, portanto, não pode ser entendido como exatamente um conceito nietzschiano, pois sua disposição nessa proble-mática atua como a compreensão genérica da relação abrangente entre fator histórico, meios de propagação da necessidade de pertencer e meca-nismos de atuação da vida comunitária que, de acordo com a perspectiva de Nietzsche, estão longe de designar a vida em seu modo efetivo: eis a leitura das aflições de Nietzschena Genealogia4.

Esses dados levantados são, antes de uma explicação teorética sobre um autor, um ato filosófico que toma a obra como base, mas transcende--a em consonância com a própria perspectiva nietzschiana, pois, assim como afirma a estudiosa brasileira dos escritos de Nietzsche, Vânia Aze-redo, “[...] toda leitura é já uma interpretação” (AZEREDO, 2003, p. 39) e, em se tratando da obra específica de Nietzsche (2003, p. 53), “não se cabe atribuir à Genealogia o preceito de verdade, de certeza ou avaliação absoluta”. Contudo, à maneira perspectiva do autor é que se conduz esta exposição, limitando-se especificamente ao tema do comunitarismo, mas ao mesmo tempo ampliando as visões e as possibilidades contidas na obra em questão, a Genealogia da moral.

Considera-se, sob a condição interpretativa afirmada, que Nietzsche, no curso da Genealogia, tem como principal foco a aversão ao aspecto uni-versalizador das individualidades, logo, à condição de agrupamento dos indivíduos que, formalizada pela tradição moral religiosa, desencadeia o que o autor considera como condição doentia de vida: o comunitarismo religioso como expressão máxima da necessidade de uma verdade tran-quilizante e sua implicação inerente, a negação da vida como efetividade e ato criativo.

O homem nietzschiano é, enquanto anterior à moral e posterior ao dever, um ser hábil que possui a capacidade transformadora do mundo;

4 A Genealogia da Moral de Nietzsche é constituída por três dissertações específicas: a “Primeira dissertação” trata especificamente sobre “Bom e mau, bom e ruim”;a “Segunda dissertação” desenvolve os temas: “Culpa, má consciência e coisas afins”; e a “Terceira dissertação”, finaliza com a questão: “O que são ideais ascéticos?”. Com efeito, é no conjunto dessas três dissertações que se cria, ao menos imaginariamente, uma linha mestra que sustenta o tema em questão.

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aquele que, anteriormente à consciência moral, se encontra entre as apti-dões do desvelamento, da interpretação de si e, logo, da capacidade artísti-co-criadora, da possibilidade nova do conhecimento. Esse homem, como sendo a expressão de si mesmo diante do mundo, parece ser contrário a toda sorte de limitação pessoal, o que permite dizer que a postura de Niet-zsche com relação à moral e ao comportamento ocidental contemporâneo é resultado de sua inquietação com relação à fixidez, ao normatismo e ao determinismo, ou seja, ao comunitarismo que funda a nova concepção de mundo, a do homem religioso, resignado.

A negação do comunitarismo religioso no trabalho genealógico de Nietzsche5 é a negação da tradição ascético-filosófica em peculiaridade específica, mas não menos importante que, como se percebe, por muito tendeu o homem a mentir a si mesmo diante de sua imensidão, de suas vontades. Assim, pode-se dizer que onde começa a vida, satisfeita por si em uma possibilidade a partir do indivíduo crente nela, termina a doença que corroía o homem em suas inculcações mentidas. Entretanto, a doença ainda é o fato por ser analisado e superado.

A religião e, sobretudo, o propósito cristão presente no papel do sa-cerdote ante à massa e, inclusive, na tradição filosófica, denunciados por Nietzsche na Genealogia, atuam nessa tendência ao pertencimento e re-signação, porque pertencimento e resignação estão para o comunitarismo religioso assim como a fixidez, a verdade e o valor dos valores, para a mo-ral. No primeiro caso, com as bases disseminadas pelo comportamento conservador cristão, caracterizado pelo seu modo reativo; e no segundo, pela prática cultural baseada num ideal de bondade somente possível pela ascensão do cristianismo, em que se pode, a partir do trabalho genealógi-co de Nietzsche, percorrer e entender tal trajeto da tradição, sobretudo as diferenças entre a tradição filosófica que se manteve tradicionalmente ascética e a proposta de Nietzsche que resgata da filosofia pré-socrática o sentido da vida como efetividade.5 O trabalho genealógico, desenvolvido por Nietzsche, deve ser entendido mais como um impulso interpretativo por meio de influências marcantes em seu modo de filosofar e intenções a que propriamente se destina, que um recurso autenticamente histórico, transcrito sobre fatos e totalmente esgotado. O método genealógico desse filósofo é antes de tudo, um ato interpretativo da própria história.

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Com efeito, a respeito da diferença entre a vida no sentido nietzs-chiano e a vida de acordo com a concepção cultural, aliás, fator indispen-sável dessa exposição, o pesquisador Krastanov, na sua obra intitulada Pa-thos artístico versus consciência moral, ressalta que a vida como efetividade pode ser mais bemdesignada, de acordo com o pensamento de Nietzsche, pelo termo alemão “Wirklichkeit”(KRASTANOV, 2011, p. 32), ou seja, mais próximo a um movimento da realidade que a uma condição fixa da vida como um substantivo significador de um período de tempo limitado. E a negação da vida como efetividade caracterizará o homem que se sus-pendeu do devir e das suas múltiplas possibilidades em prol de um único propósito: a resignação, a negação dos instintos humanos em prol da pu-reza do coração6.

É sob esse solo carregado de dualidades, onde o comunitarismo religioso se abstém da vida como aspecto trágico, que Nietzsche parece oferecer as bases para se pensar o problema da formação das comunidades religiosas, o porquê do seu surgimento e o modo como atua para a sua sustentação e alastramento. Dessa maneira, esboçando esse plano que servirá para se construir a problemática da formação e consequente necessidade de comunidades, ao mesmo tempo em que se mostram as aflições do autor, é que se conduz essa trajetória por questões fundamentais, como: quais elementos viabilizam, primeiro, uma distinção entre dois tipos de homem no interior da Genealogia? O que significa para o autor uma vida enquanto condição doentia? Ademais, estaria a moral e, sobre-tudo, o comunitarismo religioso, intrinsecamente adversos à arte como ato e sentimento criador? Qual o motivo central?

6 Assim como em outros momentos da obra, Nietzsche deixa perceber suas aflições ao fazer alusões pretensiosas a termos e atitudes totalmente opostos à condição da vida enquanto efetividade: “pureza de coração” e “condição doentia” de vida se mostram, assim, como resultado de um processo de afastamento do homem de suas múltiplas possibilidades, o que culminará em última instância, no “sofrimento do homem pelo homem”.

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A questão da inversão dos conceitos de bom e mau em bom e mal7 é o fator decisivo para a estruturação das dissertações subsequentes no trabalho interpretativo de Nietzsche diante da História e, principalmente, sobre o foco ético-moral. O problema da ação e da reação como mudança do comportamento surge como um dos elementos que moldam o homem do ressentimento e elucida a fantástica formação de rebanho. O ressen-timento, tão comum no projeto comunitarista, aliás, torna-se a própria reação depressiva frente à força nobre, à moral nobre que, ironicamente, por um tempo, afirmara a vida. Com efeito, diz Nietzsche (2009, p. 116, grifo do autor):

A formação de rebanho é avanço e vitória essencial na luta contra a depressão. O crescimento da comunidade fortalece também no indivíduo um novo interesse, que com frequência bastante o eleva acima do elemento mais pessoal do seu desalento, sua aversão a si mesmo.

De forma polêmica, Nietzsche apresenta o sujeito seguidor como aquele que não mais “[...] age e cresce espontaneamente, busca seu opos-to apenas para dizer Sim a si mesmo com ainda maior júbilo e gratidão” (NIETZSCHE, 2009, p. 26) – como o fazia o grego antigo analisado por Nietzsche – e, sim, tem como necessidade esse “[...] dirigir-se para fora, em vez de voltar-se para si” (NIETZSCHE, 2009, p. 26). E se ainda não ficou clara essa primeira aflição do autor, que ressalta a passagem de bom e mau para bom e mal, ele mesmo a diz: “[...] a moral escrava sempre requer, para nascer, um mundo oposto e exterior, para poder agir em absoluto – sua ação é no fundo reação” (NIETZSCHE, 2009, p. 26).

7 A oposição inicial definida por Nietzsche, entre “bom e mau, bom e mal” parece querer, além de mostrar o modo e o porquê desta passagem significativa, ressaltar o aspecto ativo e nobre daquele que se lança à vida como parte integrante e precursora dela, presente somente no primeiro âmbito. Esses aspectos significam, em última instância, a possibilidade de uma vida estética, autoformuladora e múltipla: dizer sim à vida, como ato nobre, é o ato daquele que se mostra sadio, o artista.

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Percebe-se que, no interior dessa proposta, trata-se mais especifica-mente do desencadeamento do que o autor chama de “[...] sofrimento do homem pelo homem” (NIETZSCHE, 2009, p. 96) pela negação da vida, como um fator específico, que dos problemas gerais expostos na Genea-logia. Estando,pois, o tema centralizado na questão da formação e manti-mento do modelo comunitário e suas consequências inerentes e, mesmo se sabendo que tal afirmação atinge outros liames, cabe atentar ao fato de que a especificidade da proposta é construída por dois pilares específicos e primordiais de fundamentação: a formação de rebanho e o papel da classe sacerdotal, ou seja, o seu modus operandi.

Sendo o primeiro a irrupção da luta contra a depressão, a doença de-senvolvida no espírito pelo sentimento de menoridade o que caracteriza o porquê do ressentimento (NIETZSCHE 2009), e a segunda a atuação in-tencional de fornecer o fármaco e o alívio da enfermidade, é o ciclo o mais interessante e silencioso a ser atentado na sua complexidade. Pois, mesmo estando essas duas disposições fantásticas fortemente relacionadas, não se pode concluir ligeira e facilmente que a relação entre seguidor e líder seja uma atuação recíproca de procura da cura e prestação benéfica de algum tipo de favor ou, se se quiser, uma relação harmoniosa e despretensiosa entre crença e benefício da crença, como é dito no processo tradicional.

Pelo contrário se atribui a relação: o poder e a constituição da verda-de, enquanto consolidação da comunidade, subsidiam as potencialidades individuais ao oferecer, como promessa de força semelhante e de salvação comum, a ideia de pertencimento como fator de efetivação da vida. Pois, a classe sacerdotal, enquanto detentora dos “valores naturais”, principia, favorece e aprova a formação dos grupos, pois se apropria das diferenças subjetivas e as transforma em meio de dominação da massa e fortaleci-mento de si.

Aqui já se percebe a existência de um meio para efetivação da vida, um projeto oposto à perspectiva de Nietzsche sobre a moral grega, encon-trada pré-rebelião escrava, quando os indivíduos nobres “[...] não tinham de construir artificialmente a sua felicidade, de persuadir-se dela, menti-la para si” (NIETZSCHE, 2009, p. 27, grifo do autor) como se é feita, de

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acordo com o autor, pela moral vitoriosa e consequentemente pela prática comunitário-religiosa.

Entendidos esses elementos destacados, pode-se dizer que a relação entre a moral num sentido geral e a formação de rebanho num sentido estrito são, para Nietzsche, um e mesmo problema. Pois, tratando-se da “[...] vontade que se volta contra a vida” (NIETZSCHE, 2009, p. 11), é a compaixão o interesse e a ferramenta de ambas: o bem e a honestidade são reflexo dela na moral, assim como o justo e o sagrado são dela reflexo na religião cristã. Porém, o que se pode tentar resolver nessa limitação do problema do comunitarismo religioso é o modo pelo qual atua esse meio de dominação; pela maneira como ocorre a apropriação das capacidades humanas para fins de resignação, ou seja, investigar o segundo caso. Afi-nal, deixa entrever o autor, a resignação não significa outra coisa a não ser a negação da vida, o que, em sua expressão maior, isto é, comunitária, significa a aversão do homem a si mesmo. É nesse meio, contudo, ainda nebuloso e confuso que a relação entre rebanho e classe sacerdotal vai se constituindo, ao mesmo tempo em que o problema do valor dos valores vai surgindo.

Nesta altura, a questão dos valores e sua relação com a formação e desenvolvimento das comunidades religiosas permitem salientar que a contribuição de Nietzsche merece destaque, principalmente, pela sua atenção ao valor da compaixão, que, incrivelmente, foi tornado símbolo máximo do comportamento moral-religioso e, consequentemente, objeto necessário do tratamento dos valores morais. As palavras do autor alertam e estabelecem que:

Este problema do valor da compaixão e da moral da compaixão (– eu sou um adversário do amolecimento moderno dos sentimentos –) à primeira vista parece ser algo isolado, uma interrogação à parte; mas quem neste ponto se detém, quem aqui aprende a questionar, a este sucederá o mesmo que ocorreu a mim – uma perspectiva imensa se abre para ele, uma nova possibilidade dele se apodera como uma vertigem, toda espécie de desconfiança, suspeita e temor salta adian-

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te, cambaleia a crença na moral, em toda moral – por fim, uma nova exigência se faz ouvir. (NIETZSCHE, 2009, p. 11, grifo do autor).

Nietzsche considera que, no âmbito histórico, a classe sacerdotal, o ápice do ideal de conservação, do asceticismo – que, aliás, significará a própria qualidade da moral ocidental – desenvolveu e desenvolve um pa-pel decisivo no processo de valoração e conscientização dos valores, prin-cipalmente pela sua autenticação de domínio e força, ou seja, pela prática da compaixão: a formação da consciência de bem e do “[...] novo amor, o mais profundo e sublime de todos os tipos de amor” (NIETZSCHE, 2009, p. 24, grifo do autor). Entretanto, ainda existe algo a ser descoberto do interior dessa compaixão.

Domínio e força são termos “traduzidos” pelo filósofo, desmascaran-do a atuação do ideal religioso (e ascético em geral, como afirma o autor) que se mostra indubitavelmente como certo, necessário e desprovido de algum problema antropológico, pois, pelos fins de conservação da vida, “Tomava-se o valor desses ‘valores’ como dado, como efetivo, como além de qualquer questionamento; até hoje não houve dúvida ou hesitação em atribuir ao ‘bom’ valor mais elevado que ao ‘mau’, [...] E se o contrário fosse verdade?” (NIETZSCHE, 2009, p. 12).

É nesse “[...] processo silencioso e, por isso, tendencioso” (NIETZSCHE, 2005, p. 878) que o autor parece querer recuperar o sta-tus humano ao nível da arte, não num sentido estrito de produção de arte, mas como uma vida artística, pois, sob uma visão estética do mundo em seu fluxo desinteressado, destaca-se que o ato de conservar a vida pode ser em si mesmo a sua condição doentia; e o sentido dado a essa doença pode ser justamente o veneno o qual logrou resultado: tornar fixo o que é efetivo, consumando o valor moral (e o próprio “valor”) em detrimento de toda e qualquer particularidade ou diferença pode ter sido a mais ou-sada e perigosa tentativa de controle no mundo, eis que o comunitarismo religioso torna-se um grande problema e a compaixão começa a ser posta em dúvida.

Por sua vez, e por consequência, a formação de rebanho se mostra como o resultado da prática ascética, inculcada por elementos práticos e

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ordenadores da classe sacerdotal, em que o medo, a consciência de culpa e o castigo constituem a fórmula da dominação comunitária e ao mesmo tempo de negação das individualidades. E se se pode montar um esque-ma que explique a questão do comunitarismo religioso em seu aspecto problemático, é por esses elementos que se pode erigir tal possível desen-cadeamento. É preciso, pois, entender melhor que medo é este e como se desenvolve como um ciclo vicioso, como se forma a consciência de culpa e qual o significado do castigo, ou melhor, como o castigo se torna um símbolo.

Nietzsche considera que o poder sacerdotal autentica e promove uma nova moral, desenvolve um novo comportamento, especificamente, a partir da nova significação de bom e mau – que outrora se manifestava como forte e fraco – em bom e mal. Sendo tornado bom o que se entende por valor “[...] mais elevado no sentido da promoção, utilidade, influência fecunda para o homem (não esquecendo o futuro do homem)” (NIETZS-CHE, 2009, p. 12, grifo do autor), tudo o que não lhe convém é contra-riado como sendo mal, perigoso. A nova moral e o novo comportamento humano em suas diretas relações são definidos agora, de acordo com o pensamento do autor, como o despojo: o cenário da simplicidade, da prá-tica da compaixão e do seguimento.

Agora, sobretudo por “[...] Esse Jesus de Nazaré, evangelho vivo do amor, esse ‘redentor’ portador da vitória e da bem-aventurança aos po-bres, aos doentes e aos pecadores” (NIETZSCHE, 2009, p. 24), como ironicamente afirma o filósofo, é que se passa a designar aquele que se mostra “puro” e envolvido no ideal de resignação como o homem bom; e, em contrapartida, mal fica sendoo outro que se contrapõe a tudo o que é de tal natureza pura. Ademais, é exatamente nesse ponto que a primeira aflição pode ser percebida: “A rebelião escrava na moral começa quando o próprio ressentimento se torna criador e gera valores” (NIETZSCHE, 2009, p. 102). Referindo-se à nova classe de homens sobre a terra, o res-sentimento, grande resultado do poder sacerdotal, consistirá no novo modo de se pensar e agir, antagonicamente, a partir da descrença no ho-mem e na vida efetiva, na ação e no ato criador.

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É sob o foco do cumprimento das leis obrigatórias e castradoras do impulso criador, possíveis pela “[...] vitória do homem comum” (NIETZSCHE, 2009, p. 25) que se forma a consciência desse novo homem: ação e criação – que, por ora, são elementos centrais da filosofia nietzschiana, sobretudo de sua concepção estética do mundo – passam a ser confundidas, com a mudança no âmbito dos valores, com reação e negação: a expressão máxima de um comunitarismo religioso qualquer.

A nova tendência, a qual aflige o autor e o impulsiona a superar, res-significa os conceitos de bom e mau,relação de forças e de poder,em bom e mal, reação à força e consequente negação. Marcada pela sua característica peculiar, “[...] a moral escrava diz Não a um ‘fora’, um ‘outro’, um ‘não-eu’ – e este Não é seu ato criador” (NIETZSCHE, 2009, p. 26, grifo do autor). É, pois, a partir da inversão exposta por Nietzsche que o novo comporta-mento pode ser destrinchado e problematizado.

Tendo esses parâmetros em vista, tem-se já a contradição áspera en-tre esses dois tipos de homem expostos: de um lado está o homem que integralmente vive e constrói a possibilidade de vida a partir de seu pró-prio impulso de criação, pois pode interpretá-lo a partir de si mesmo – dizendo “Sim a si mesmo” (NIETZSCHE, 2009, p. 26) – e, de outro, o homem que espera, que obedece e é, pelo modelo moral, desvinculado de seu próprio impulso criador, de sua própria vontade, pois que, paciente aos sofrimentos, está envolto em um ideal de pureza do coração, como diz propriamente o autor.

O homem do ressentimento pode, doravante, a partir da crença na redenção e na fixidez da vida, “[...] graças ao falseamento e à mentira para si mesmo” (NIETZSCHE, 2009, p. 34), imprimir como força a fraqueza, como ação no mundo uma simples reação. A fraqueza e a reação são os novos atributos de valor, duas possibilidades peculiares da compaixão.

Assim delineado, percebe-se que a relação entre a moral, num senti-do geral, e a formação de rebanho, num sentido estrito, são, para Nietzs-che, um e mesmo problema. Acontece que, em se tratando da “[...] vonta-de que se volta contra a vida” (NIETZSCHE, 2009, p. 11), é a compaixão o interesse e a ferramenta de ambas: na moral agindo pelos costumes, pela

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prática cultural; na formação de rebanho pela prática sacerdotal, força li-mitada e objetiva em sua forma de conscientização. Porém, como se dis-se, trata-se de entender, nessa limitação do problema do comunitarismo religioso, o modo pelo qual atua esse meio de dominação sacerdotal: a maneira como ocorre a apropriação das capacidades humanas para fins de resignação.

Que o comunitarismo religioso seja a negação da vida, enquanto efe-tividade e potencialidade dos sujeitos, já é algo visto. Mas, como se encar-regam de se manter em um movimento de negação da efetividade em prol de uma vida resignada? Afinal, seria possível apresentar o início do ciclo da resignação? E, se o puder, qual o fator determinante?

Assim como a fé na verdade é passada de geração em geração, seja direta ou indiretamente, o processo de formação de rebanho e seu modo operante também é resultado da tradição e de alguma necessidade que o permeia, porque a tradição não é outra coisa a não ser:

Uma autoridade superior à qual se obedece, não porque ordene o útil, mas porque ordena. Em que esse sentimento da tradição se dis-tingue de um sentimento geral do medo? É o temor de uma inteli-gência superior que ordena, de um poder incompreensível e indefi-nido, de alguma coisa que é mais que pessoal – há superstição nesse temor. (NIETZSCHE, 2008, p. 30, grifo do autor).

O predomínio das individualidades, da concepção própria do mun-do, isto é, da vontade subjetiva, como bem se percebe no pensamento nietzschiano, parece não poder estar em consonância com o homem das comunidades, visto que, enquanto o primeiro se lança contra e além da ordenação e do cumprimento, o outro se limita ao ordenado e ao conjunto constituído. A cultura e os preceitos tradicionais são os dados imediatos a esse homem das comunidades; seu modelo e sua tendência. Ter-se-ia en-contrado a chave da problemática, o início do ciclo da resignação e uma das maiores aflições de Nietzsche na Genealogia?

Nietzsche, principalmente na segunda dissertação, intitulada “[...]

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culpa, má consciência e coisas afins” (NIETZSCHE, 2009, p. 43), per-mite mais rigorosamente tal investigação, que, aliás, só é possível por meiodaquela exposição inicial da inversão dos valores, como já foi dito. Segundo o autor, a crença na comunidade é o resultado da confiança no líder, cuja maior ação é a compaixão. Mas nem a crença, que se destina ao aspecto, ao modo, ao local, nem a confiança no líder, propriamente, conso-lidam ou subsidiam o início do ciclo da resignação; muito menos podem ser destacados como os fatores determinantes.

O filósofo considera que existe uma prática uniforme da qual se pode retirar elementos preciosos para a decifração. Como foi mostrado, culpa, má consciência e a prática do castigo atuam num mecanismo inte-ressante e problemático, na formação e mantimento de uma consciência de compaixão, mais precisamente, no mantimento de uma necessidade de pertencimento: a compaixão é o que se vende, mas sua matéria-prima está contida na “[...] tarefa de criar um animal capaz de fazer promessas” (NIETZSCHE, 2009, p. 44). Com essas palavras, diz o autor:

O imenso trabalho daquilo que denominei “moralidade do costu-me” [...] – o autêntico trabalho do homem em si próprio, durante o período mais longo de sua existência, todo esse trabalho pré-histórico encontra nisto seu sentido, sua justificação, não obstante o que nele também haja de tirania, dureza, estupidez e idiotia: com a ajuda da moralidade do costume e da camisa de força social, o homem foi realmente tornado confiável. (NIETZSCHE, 2009, p. 44, grifo do autor).

O processo pelo qual o homem se torna confiável só é possível pelo

fato da conscientização, contanto que se tenha claro que “algumas ideias devem se tornar indeléveis, onipresentes, inesquecíveis, ‘fixas’, para que todo o sistema nervoso e intelectual seja hipnotizado por essas ‘ideias fi-xas’” (NIETZSCHE, 2009, p. 46). E, sendo a consciência fruto de um contrato não amigável entre o animal que naturalmente esquece e aquilo que se deve lembrar, é por meiodos costumes e, em especial, no método

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ascético-religioso de se gravar na memória, que se percebe a eficácia da dominação sacerdotal por excelência:

Pois os costumes são, enquanto obra dos antepassados, também seus preceitos e ordens. Esta suspeita permanece e aumenta: de quando em quando exige um imenso resgate, algo monstruoso como paga-mento ao “credor”. Segundo esse tipo de lógica, o medo do ancestral e do seu poder, a consciência de ter dívidas para com ele, cresce ne-cessariamente na exata medida em que cresce o poder da estirpe, na medida em que ela mesma se torna mais vitoriosa, independente, venerada e temida. (NIETZSCHE, 2009, p. 72, grifo do autor).

A tradição, os costumes, o comportamento de um povo carregam mais que marcas universais e preceitos organizacionais. No caso específico das comunidades, justifica-se a prática de um determinado comportamen-to para fortalecimento da própria comunidade, sendo que esta representa-rá, subliminarmente, a própria força do conjunto e uma tentativa de efeti-vação da vida sobre o critério seguidor, que, aliás, poderiam ser chamados de vários nomes, mas não é o caso de pô-los em uma lista.

A força do conjunto e a falsa efetivação, isto é, o poder da comuni-dade, podem ser considerados, portanto, como o avanço de suas manifes-tações histórico-culturais pelo constante resgate, pela constante necessi-dade de uma memória que justifique o próprio poder. Na memória, estão contidos o símbolo e a prática do castigo, da punição, logo, o temor: “O sentimento de culpa em relação à divindade não parou de crescer duran-te milênios, e sempre na mesma razão em que nesse mundo cresceram e foram levados às alturas o conceito e o sentimento de Deus” (NIETZS-CHE, 2009, p. 73).

Com esses detalhes apreendidos, dominação e força passam a se apre-sentar como elementos não tão óbvios, porque, além de estarem envoltos na caldeirinha problemática onde se guarda a tradição e a promessa de uma vida melhor, emerge de vez a outra em forma de condição devedora e assustadora, uma dívida para com o credor, e o susto dele em forma de castigo. Com efeito, Nietzsche diz que “[...] inquestionavelmente se deve buscar o genuíno efeito do castigo, antes de tudo, numa intensificação da

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prudência, num alargamento da memória, numa vontade de passar a agir de maneira mais cauta, desconfiada e sigilosa” (NIETZSCHE, 2009, p. 66, grifo do autor). Poderia estar o medo mediando o público crente e a classe que faz crer? Nesse sentido, se poderia abstrair algum ato criador de dentro desse ciclo de resignação regido pela reação e pela receptividade?

Tanto em Aurora8 quanto na Genealogia,Nietzsche parece ressaltar este fato importante: para que se possa manter uma comunidade, é preci-so que nela se tenha como temor o principal exercício, a prática da conten-ção. Tal prática, além de minar ou até mesmo interromper o processo de irrupção artística, como ato e sentimento criador, conduz os indivíduos a uma verdade sutil e estéril, onde qualquer manifestação se mostra como uma reação ao temor e respeito ao poder, algo tão mecânico quanto ina-propriado a uma vida estética. Assim, nesse processo de castração e expro-priação das individualidades, encontra-se um fato interessante: “Todos os instintos que não se descarregam para fora voltam-se para dentro – isto é o que chamo de interiorização do homem: é assim que no homem cresce o que depois se denomina sua ‘alma’” (NIETZSCHE, 2009, p. 67, grifo do autor).

Nietzsche argumenta aludindo que, do mesmo modo que o credor, aquele que é digno de algum crédito apresenta-se como superior ao de-vedor; como numa relação de poder econômico, o fiel das comunidades posiciona-se na condição “natural” de submissão e pagamento, pois que o líder comunitário, a figura do sacerdote, representa o próprio poder divi-no em sua manifestação terrena, pois que estes são os escolhidos do divino para o processo de salvação.

A redenção, a expiação ao nível comunitário e a utilidade no âmbito pessoal fundem-se pelas duas vias do medo: num primeiro momento, o medo da morte; num segundo, o medo do ancestral, com quem se percebe ter dívidas. Contudo, o medo do ancestral, para uma investigação sobre

8 Em Aurora, (2008, p. 29), tópico 9, Nietzsche já aborda o “conceito da moralidade dos costumes”, ressaltando a força que os costumes aplicam aos indivíduos, finalizando do seguinte modo: “Sob o domínio da moralidade dos costumes, toda forma de originalidade tinha má consciência; o horizonte dos melhores tornou-se ainda mais sombrio do que deveria ter sido” (NIETZSCHE, 2008, p. 32).

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o comunitarismo religioso, se sugere como o mais relevante, não por ser ele a chave para se entender a necessidade de religião em geral, mas por-que nele está intrínseca a necessidade de recorrer àquele que se apresenta como o próprio símbolo de desencadeamento do plano divino: o sacerdo-te, o maior representante do valor do novo bem no mundo.

O fato de se ter duas possíveis causas para o medo, e concomitante a ele uma única saída possível, a religião, mostra admissível que não só procuram os homens do ressentimento as comunidades para fins de edu-cação para redenção individual, confortando-lhes em relaçãoao problema da finitude humana, mas, tendo-lhes dado a oportunidade da autopromo-ção para a comunidade, em nível de proximidade com seu antepassado, ou se se quiser, para com o credor, poder-se-á transferir todas as indivi-dualidades e perspectivas em prol de uma força maior: a comunidade, o local onde o poder, culturalmente, se mostra confiável e compartilhado, logo, verdadeiro e imprescindível. Esse ato de transferir as perspectivas in-dividuais para o fortalecimento de uma comunidade, que, em última ins-tância, destina-se à divindade, pode ser a mais inaceitável das ações para uma concepção efetiva da vida, eis a maior aflição de Nietzsche. Nas suas palavras:

[...] a convicção prevalece de que a comunidade subsiste apenas gra-ças aos sacrifícios e às realizações: reconhece-se uma dívida [Schuld], que cresce permanentemente, pelo fato de que os antepassados não cessam, em sua sobrevida como espíritos poderosos, de conceder à estirpe novas vantagens e adiantamentos a partir de sua força. [...] O que lhes pode dar em troca? Sacrifícios (inicialmente para alimen-tação, entendida do modo mais grosseiro), festas, música, homena-gens, sobretudo obediência. (NIETZSCHE, 2009, p. 71, grifo do autor).

Nietzsche, nesse percurso genealógico que tem como preocupação a interpretação do mundo e da História, parece não querer deixar separada a ideia de ancestral, que mais leva à concepção de paganismo e seus rituais, da figura da classe sacerdotal cristã, a qual também promove os sacrifí-

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cios, festas, música etc. O medo do ancestral é a necessidade de redenção em sentido prático, enquanto parte do processo civilizador; por isso, a necessidade de agrupamento e de conformidade, afinal, trata-se de uma vida preestabelecida e predisposta à verdade, ao bem, ao novo bom. E se o medo é a causa de um comunitarismo religioso cristão, o sentimento de culpa lhe serve de ferramenta de condução: “O advento do Deus cristão, o deus máximo até agora alcançado, trouxe também ao mundo o máximo de sentimento de culpa” (NIETZSCHE, 2009, p. 73).

Ora, culpa, castigo e um certo pagamento de dívidas consolidam a fórmula de uma aversão nietzschiana ao comunitarismo religioso, prin-cipalmente porque contêm em si a propagação do medo, o grande “[...] sofrimento do homem com o homem” (NIETZSCHE, 2009, p. 68, grifo do autor). Em suma, a classe sacerdotal desempenha, concretamente, o papel do credor, pois lhe é concebido tal poder, ao passo que aquele que não paga ou não aceita o sistema burocrático que funciona para o bem tem desde já a sua consequência: o castigo.

O castigo, segundo Nietzsche, e, aliás, a sua ideia é o mais impor-tante, é uma força fundamental para que aqueles que não se envolvem tão facilmente no plano comunitário da resignação – ou da tradição, como foi anunciado – sintam-se diante dele como inferiores e culpados: “O castigo teria o valor de despertar no culpado o sentimento da culpa, nele se vê o verdadeiro instrumentum dessa reação psíquica chamada ‘má consciência’, ‘remorso’” (NIETZSCHE, 2009, p. 54, grifo do autor).

A culpa é extraída desse modelo como sendo a própria consciência, a consciência de não-pagamento, logo, a má consciência. A respeito desse homem que grava na consciência o símbolo da culpa e do castigo, o filó-sofo diz: “[...] esse homem da má consciência se apoderou da suposição religiosa para levar seu automartírio à mais horrenda culminância. Uma dívida para com Deus: este pensamento tornou-se para ele um instrumen-to de suplício” (NIETZSCHE, 2009, p. 75, grifo do autor). Poderiam ser medidos os malefícios de um pertencimento? O comunitarismo religioso seria a máxima expressão da negação da vida para Nietzsche?

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Segundo o filósofo, a classe sacerdotal desenvolveu a sua força e do-mínio através de um entrelace entre o medo ontológico, da finitude, e o sistema burocrático de dívidas para com um credor, conquistado no pro-cesso de internalização cultural, até mesmo em harmonia com a tradição pagã, que desenvolvera também a prática do medo e do castigo. Quer-se dizer, portanto, que a condição doentia da vida se mostra como o próprio ciclo, logo, adversa ao ato e sentimento criador pela negação da intenção a partir de si, pois, por um fator determinante: “[...] o último terreno con-quistado pelo espírito da justiça é o sentimento reativo!” (NIETZSCHE, 2009, p. 58, grifo do autor).

A questão dos valores, do processo burocrático da formação da cons-ciência inversa (a má consciência) e o problema do comunitarismo reli-gioso estão intrinsecamente interligados, pois que a essa altura em que os seguidores já pertencem e almejam o propósito anunciado, a comunidade já se consolidou perante os indivíduos. Num processo lento, misto, mas muito eficaz, não há mais o que se entrever, o ciclo já está consumado. Segundo Nietzsche (2009, p. 56):

Aumentando o poder de uma comunidade, ela não mais atribui tanta importância aos desvios do indivíduo, porque eles já não podem ser considerados tão subversivos e perigosos para a existência do todo: o malfeitor não é mais “privado da paz” e expulso, a ira coletiva já não pode se descarregar livremente sobre ele – pelo contrário, a partir de então ele é cuidadosamente defendido e abrigado pelo todo, prote-gido em especial da cólera dos que prejudicou diretamente.

Sem dúvida, para Nietzsche, o asceticismo foi promovido e cons-cientizado em seu mais alto grau pela classe sacerdotal, símbolo da moral escrava. A necessidade da verdade e de uma ordem contra a destruição regeu a vida e formulou toda a cultura ocidental em seu aspecto mais pe-culiar: pela negação da efetividade, pela abstenção das perspectivas e pelo desprezo do ato propriamente humano:

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Sob influência dessa idiossincrasia, colocou-se em primeiro plano a “adaptação”, ou seja, uma atividade de segunda ordem, uma reativi-dade; chegou-se mesmo a definir a vida como uma adaptação inter-na, cada vez mais apropriada, a circunstâncias externas [...] Mas com isso se desconhece a essência da vida, a sua vontade de poder. (NIET-ZSCHE, 2009, p. 62, grifo do autor).

Sendo a vida essa vontade de poder que se realiza de vários modos, qualquer castração prática ou teórica a contradiz. E assumi-la sem as ar-mas da fixidez e da inconstância talvez seja a atitude mais compatível com o autodesfecho de sua vontade, onde não mais se necessitaria “mentir para si mesmo”; opor a si mesmo “um não” ou “gravar em si uma memória” (NIETZSCHE, 2009). Assim, a necessidade de pertencimento, ou me-lhor, a estrutura comunitarista,a qual se considera como sendo a maior aflição de Nietzsche, só pode ser considerada como a forma de negação da vida e do ato criador. E, finalizando à sua maneira, mesmo que o homem tenha consciência de que sofre de si mesmo, de que se conserva à vida e se detém dela, mesmo assim, nas últimas palavras do autor na Genealo-gia da moral, “[...] o homem preferirá ainda querer o nada a nada querer” (NIETZSCHE, 2009, p. 140, grifo do autor).

REFERÊNCIAS

AZEREDO, V. D. Nietzsche e a dissolução da moral. Ijuí: UNIJUÍ, 2003.

KRASTANOV, S.V. Nietzsche: pathos artístico versus consciência moral.Jundiaí: Paco, 2011.

NIETZSCHE, F. W. Aurora. São Paulo: Escala, 2008.

_______. Genealogia da moral. São Paulo:Companhia das Letras, 2009.

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Title: The Genealogy of Morals as an assumption aversion religiouscommunitarism: a reading of Nietzsche woes.Authors: André Luiz Rocha da Silva; Stefan Vassilev Krastanov.

ABSTRACT: This article has as its background the distinction of two types of subject present in Nietzsche’s Genealogy of Morals, the man follower and the individual artist. This distinction formulated from the interpretive act wants to show the fundamental difference of views of life: the life as permission and fulfillment of the divine plan, adept at Christianity and consolidated the practice of the fear, and life as becoming, as supported by Nietzsche effectiveness. Built this base, it is possible to set up a scheme that supports the genealogical work of Nietzsche on the following focus: Nietzsche’s aversion to religious communitarism, in other words, the negation of life. So, there isthe intention to show how consciousness of guilt and the need of adequacy to act in a vicious cycle and silent in the cultural, reiterating the action of the priestly class and the role of asceticism as primary factors for the formation of flock, the consolidation of religious communitarism.Keywords: Religious Communitarism. Life as Effectiveness. Priestly Class. Formation of Flock. Fear.

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O pedagogo empresarial e a coordenação de práticas pedagógicas docentes para a formação continuada por competências dentro da empresa1

Adriano Teodoro Nepomuceno Ribeiro2

Resumo: Este trabalho busca ampliar a visão das demandas, encontradas nas empresas, do trabalho do pedagogo. Os treinamentos de formação continuada dentro da empresa são realizados por profissionais das áreas específicas das necessidades de capacitação, mas que nem sempre estão preparados para enfrentar os desafios dos processos de ensino e aprendizagem para adultos. Esses profissionais geralmente têm conhecimento técnico, mas deixam a desejar quanto às metodologias adequadas para exercer interatividade e conseguir a transcendência. Muitas vezes, falta-lhes preparo para a condução do ensino, por meio do desenvolvimento das competências, o que se mostra hoje como sendo o caminho mais adequado para a formação profissional de adultos. Objetiva, também, analisar a necessidade das empresas em congregar, em seus quadros, uma ou mais pessoas, com a percepção desse novo caminho do mundo empresarial, um profissional que possa, também, preparar e acompanhar os facilitadores da mediação dos treinamentos e avaliar os programas com condições de intervir, interagir e nortear as práticas pedagógicas, sanando ou minimizando a necessidade de aprimoramento pedagógico para a maioria dos profissionais que ministram treinamentos de formação continuada, de áreas técnicas, dentro das empresas.

Palavras-chave: Pedagogo Empresarial. Formação Continuada. Prática Pedagógica. Competências. Educação Profissional para Adultos.

1 Orientadora: Alessandra Corrêa Farago. Mestre em Educação pelo Centro Universitário Moura Lacerda (CUML), Especialista em Planejamento e Gestão de Organizações Educacionais pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Licenciada em Letras pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Bebedouro (UNIFAFIBE). Docente do Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>.2 Especialista em Pedagogia Empresarial pelo Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>.

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1. INTRODUÇÃO

O presente estudo é uma pesquisa exploratória, de natureza qualita-tiva, sendo caracterizado, segundo a natureza dos dados, como uma pes-quisa bibliográfica.

A busca das empresas por funcionários proativos está ditando a ne-cessidade da formação continuada, indo contra as tendências de tempos atrás, quando o profissional deveria conhecer o máximo possível das atri-buições de seu cargo, deixando toda a bagagem sociocultural e o relacio-namento interpessoal em segundo plano. As empresas, então, precisam congregar, em seus quadros, uma ou mais pessoas, com a percepção desse novo caminho do mundo empresarial, um profissional que possa também preparar e acompanhar os facilitadores da mediação dos treinamentos e avaliar os programas com condições de intervir, interagir e nortear as prá-ticas pedagógicas.

A relevância da pesquisa se dá devido à percepção da necessidade de aprimoramento pedagógico para a maioria dos profissionais que minis-tram treinamentos de formação continuada, de áreas técnicas, dentro das empresas. Esses profissionais geralmente têm conhecimento técnico, mas deixam a desejar quanto às metodologias adequadas para exercer interati-vidade e alcançar a transcendência, o que majoraria a geração de conteúdo de aprendizagem, levando o aprendiz a superar os seus limites. Muitas ve-zes, falta-lhes preparo para a condução do ensino por meio do desenvol-vimento das competências. Isso sinaliza para as empresas a necessidade de participação do pedagogo nas ações desenvolvidas em treinamentos de formação continuada, dentro da organização, por profissionais de áreas específicas das demandas de capacitação e que carecem ou desconhecem as atribuições pedagógicas, didáticas e os métodos que norteiam o ensino por competências, nos processos de ensino e aprendizagem para adultos, o que se mostra, hoje, como sendo o caminho mais adequado para a sua formação profissional.

Dessa forma, o presente artigo foi estruturado em três seções. Na primeira, é exposta a definição e conhecimento do público envolvido na

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formação profissional dentro das empresas; na segunda, demonstra-se a estruturação e os norteadores da formação profissional por competências; na terceira, defende-se a consolidação da necessidade de um profissional para gerir esses trabalhos dentro das organizações.

2. A FORMAÇÃO PROFISSIONAL NA EMPRESA

As empresas encontram, entre outros desafios, dificuldades em criar condições para que ocorra o desenvolvimento e/ou aperfeiçoamento dos conhecimentos e das habilidades necessárias para o desempenho de seus profissionais. A aprendizagem, por meio, principalmente, de formação continuada, vem sendo adotada como um dos recursos para fazer frente ao crescente desenvolvimento tecnológico, buscando subsidiar a decor-rente falta de disponibilidade de profissionais capacitados no mercado de trabalho.

Vivemos em um mundo onde o conhecimento está em constante mudança e com uma velocidade muito grande. Vivemos também uma grandiosa intelectualização nos processos de produção, o que exige um conhecimento mais amplo e profissionais mais bem capacitados. Essas exigências estão em todo o mercado de trabalho, que está cada vez mais competitivo e que está buscando, nos recursos humanos, o diferencial que garanta lugar nesses mercados e que faça a empresa se sobressair em rela-ção a seus concorrentes. Esse recurso, que são as pessoas, precisa apresen-tar um querer próprio para se desenvolver, ter postura ética.

Então, temos como um dos papéis da educação profissionalizante, diante das mudanças de comportamento nas organizações, segundo Lo-pes (2011), fornecer um novo modelo de racionalização dos processos produtivos, como reorganização do trabalho, requalificação profissional, desenvolvimento de novas competências e flexibilidade do processo.

Embora o quesito tecnicamente qualificado seja fundamental para uma empresa progredir, este não é mais suficiente para fazer a dife-

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rença, pois, em um mundo globalizado em que hoje se vive, a parte tecnológica está quase se igualando a todas as partes do globo ter-restre; os serviços também são muito semelhantes, mas o humano não [...] Assim, diante dos níveis de exigência ocorrida no mundo empresarial, surge a Pedagogia Empresarial, um ramo da Pedagogia que se ocupa em delinear frentes para que ocorra o desenvolvimento dos profissionais, como um diferencial entre as empresas. Ela procu-ra favorecer uma aprendizagem significativa e o aperfeiçoamento do capital intelectual (produto da Pedagogia Empresarial) para o de-senvolvimento de novas competências que atendam ao mercado de trabalho. Isso tudo aliado às competências dos profissionais da área administrativa e psicológica [...] é muito importante que o DRH seja composto por três áreas de conhecimento – Administração, Pedagogia e Psicologia – para que os profissionais, dentro de suas es-pecificidades, possam desenvolver os três quesitos fundamentais do trabalhador – o CHA “(Conhecimento, habilidade e Atitude)” e o SSS “( Saber (a mente precisa do conhecimento), Satisfação (saúde, moradia, alimentação, lazer) e o Sagrado (realização pessoal))”, im-portantes para assegurar o sucesso de qualquer empresa. (LOPES, 2011, p. 29-35).

Nas empresas, cada vez mais, está se optando pela formação conti-nuada de seus colaboradores, com processos de aperfeiçoamento e espe-cialização da mão de obra e buscando desenvolver competências comple-mentares para um melhor desenvolvimento das atividades que lhes são atribuídas ou mesmo com a finalidade de uma ascensão profissional.

Dentro de uma empresa, temos uma população de candidatos à aprendizagem, geralmente adulta, o que nos leva a perceber que pode-mos e devemos, segundo alguns estudos, lançar mão de certos métodos e conhecimentos para trabalhar essa aprendizagem. Os métodos sugeri-dos pela Andragogia, que é a “[...] arte ou ciência de orientar os adultos a aprender” (KNOWLES apud WIKIPÉDIA, 2013), destacam que a relação de ensino-aprendizagem para esse tipo de público deve ter o pro-fessor como um mediador ou facilitador de aprendizagem e coloca a rela-ção entre facilitador e participantes como uma relação horizontal, em que

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ambos estão ali para a troca de experiências e absorção de conhecimentos, sempre fazendo uso de experiências e experimentos.

Segundo Rodrigo Goecks (2003, p. 02),

Algumas pesquisas afirmam que estudantes adultos aprendem ape-nas 10% do que ouvem, após 72 horas. Entretanto são capazes de lembrar 85% do que ouvem, vêm e fazem, após as mesmas 72 horas. Não basta apenas, portanto, o envolvimento do ser humano na es-fera do “pensar”, através de estímulos lógicos e racionais. É necessá-rio o envolvimento na esfera do “sentir”, proporcionando estímulos interiores e emocionais. Desta forma, o sentir estimula o “querer”, transformando em vontade e ação.

O adulto busca, em sua aprendizagem, a absorção de conhecimentos para aplicação em tempo real. Ele quer fazer uso do que lhe foi passado já na sequência de sua vivência profissional, o que aumenta a possibilidade de que a aprendizagem seja concreta e significativa quando aplicada nesses moldes. A aprendizagem é a absorção de conhecimento, é a possibilidade de vivenciar novas experiências e de adquirir competências. Segundo o manual Avaliação de competências, conhecimentos e experiências para con-tinuidade de estudos:

Os saberes adquiridos pelos jovens, adultos e trabalhadores são di-versos e de natureza distinta, conforme a senda percorrida por cada pessoa. As aprendizagens ocorrem em contextos formais ou não, numa multiplicidade de situações experimentadas na vida, de intera-ção da pessoa consigo mesmo, com os outros, com a vida e com o tra-balho. Esse processo dinâmico de aquisição de saberes, onde os no-vos saberes são construídos integrando os já adquiridos é chamado também de aprendizagem experiencial (Pires 2007) na qual ocorre o desenvolvimento das competências. Ou seja, as aprendizagens e as competências vão se consolidando e se revelando no percurso de vida de cada um, o que marca, aliás, a dimensão de historicidade e de temporalidade da construção do conhecimento. (SENAI, 2011a, p. 16).

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Uma informação alocada não necessariamente se transforma em co-nhecimento quando uma pessoa a recebe. Somente quando ela se integra ao conhecimento já existente é que ela passa a ser considerada uma apren-dizagem efetiva. Numa organização, essa aprendizagem se dá principal-mente em ocasiões onde o participante vivencia ou ao menos consegue visualizar as situações, identificando a empregabilidade do que se está bus-cando transmitir através dessa informação.

Segundo Canabrava e Vieira (2006, p. 47),

A aprendizagem organizacional ocorre quando as pessoas, viven-ciando situações dentro da organização, questionam tais situações e passam a buscar soluções para elas, isso lhes permite identificar, na ação, descompassos existentes entre os resultados esperados e obti-dos. A reflexão sistemática levará as pessoas a mudarem a compre-ensão que possuem do fenômeno organizacional, o que facilitará o realinhamento de expectativas e de resultados e, consequentemente, a modificação da teoria praticada na organização.

3. A FORMAÇÃO PROFISSIONAL POR COMPETÊN-CIAS

Os métodos de formação e avaliação por competências são de grande valia na lida com pessoas adultas e que já estão no mercado de trabalho. Quando desenvolvemos e avaliamos as competências estimuladas e adqui-ridas, não estamos impondo a decoração de conteúdos e nem sujeitando os participantes às tradicionais avaliações classificatórias, as tão temidas e traumatizantes “provas”, que inibem e comprometem o rendimento de adultos, que já trazem da Educação Básica essa aversão pelos métodos ava-liativos tradicionais.

Como podemos compreender o termo “competências” relacionan-do-o com a aprendizagem na empresa?

O conceito de competências é abordado pelo Parecer CNE/CEB nº 16/99 como “a capacidade de mobilizar, articular e colocar em ação valo-

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res, conhecimento e habilidades necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho”. Reforça a au-tonomia e a mobilidade que deve ter o trabalhador diante da instabilidade do mundo do trabalho e das rápidas transformações que caracterizam as relações de produção (RAMOS, 2001 apud SENAI, 2011a, p. 16).

Ramos (2002, p. 405) faz referência a duas vertentes da qualifica-ção, como sendo: “[...] a dimensão conceitual da qualificação – que re-conhece a aprendizagem por vias formais – e a experimental, que destaca as competências construídas e demonstradas na experiência concreta de trabalho”. E é nessa segunda linha que nos pautamos para compreender o valor da iniciativa de se promover o ensino por competências na formação continuada dentro das organizações.

O ensino por competências ou educação orientada para competên-cias, como apresenta Chaves (2004), não se baseia na absorção de conte-údos e informações em que a expectativa é que essa aprendizagem seja o resultado mais ou menos automático e que, quase sempre, não vai além da apresentação de parte dos conteúdos a serem absorvidos, tendo outra parte creditada aos materiais didáticos.

Os currículos utilizados nesse tipo de educação, “o tradicional”, por sua vez, são centrados, não na análise e na tentativa de solucionar problemas, mas em disciplinas, que são o repositório dos conteúdos informacionais mencionados, e que, em geral, são apresentadas aos alunos de forma abstrata, totalmente desvinculada dos problemas fundamentais que um dia levaram o ser humano a se interessar por esse tipo de questão. (CHAVES, 2004).

Propondo-se que a Educação Profissional seja orientada para com-petências, o que se pretende é que a formação continuada seja organizada não mais em função de conteúdos e informações a serem transmitidos, mas, sim, em função de competências e habilidades que as pessoas devem desenvolver em continuidade com as competências e habilidades que vi-nham desenvolvendo no seu dia a dia de trabalho.

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A Educação Profissional por Competências busca ampliar as habi-lidades por meio do desenvolvimento das capacidades técnicas do indi-víduo e tem como base o princípio integrador, segundo o qual os saberes necessários são integrados para execução de atividades profissionais con-forme as exigências de mercado. Paralelo a essa ação, podemos levar em conta a aplicação de competências transversais, que levam o indivíduo a reconhecer e assimilar, dentro do processo de aprendizagem, diversos co-nhecimentos, habilidades e atitudes, que não sejam necessariamente téc-nicos e que o levam a ampliar seus horizontes culturais e sociais.

Para Lopes (2011, p. 54):

O ensino por competências não é disciplinar, na medida em que as habilidades e competências a serem formadas exigem conteúdos de diferentes disciplinas. Por isso, sua organização normalmente é por módulos, supondo que cada módulo englobe conteúdos e atividades que sejam capazes de formar determinado conjunto de habilidades [...] Diferentes módulos permitem a formação de conjuntos de ha-bilidades e competências que visam transcender a uma qualificação profissional específica.

Em função dessa organização curricular não disciplinar, o currículo por competências pode ser considerado um currículo integrado, pois as competências por si expressam uma integração de conteúdos. Essa carac-terística de ser integrado muitas vezes traz para o currículo por competên-cias a positividade conferida à integração curricular.

Essa forma de ensino se caracteriza pela condição de transferir os saberes, como recursos ou insumos, por meio de modelos mentais adap-tados e flexíveis, tais como análises, sínteses, inferências, generalizações, analogias, associações, transferências, entre outros, em ações próprias de um contexto profissional específico, gerando desempenhos eficazes.

Segundo o Norteador da Prática Pedagógica, (SENAI, 2011b), tra-balhar a perspectiva da Educação Profissional por Competências nos re-mete à adoção de uma prática pedagógica que:

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Privilegia metodologias ativas centradas no sujeito que aprende, a partir de ações desencadeadas por desafios, problemas e projetos;Desloca o foco do trabalho educacional do ensinar para o aprender, do que vai ser ensinado para o que é preciso aprender no mundo contemporâneo e futuro;Valoriza o docente no papel de facilitador e mediador do processo de aprendizagem;Visa formar alunos com autonomia, iniciativa, pró-atividade, capa-zes de solucionar problemas, alcançar a metacognição, realizar auto--avaliação e por conseqüência, conduzir sua autoformação e aperfei-çoamento;Enfatiza a importância do planejamento sistemático das atividades pedagógicas pelos docentes em termos de atividades e projetos para o exercício das competências pretendidas, bem como do processo de avaliação. (SENAI, 2011b, p. 10).

A quebra do paradigma do ensino ou dos ensinadores, transfor-mando-o no modelo em que os métodos devem priorizar o aprender ou a aprendizagem, sendo esses profissionais incumbidos da transmissão do conhecimento reconhecidos como mediadores e facilitadores desses pro-cessos de aprendizagem.

Os mediadores e facilitadores devem sempre ter condições de ana-lisar o conjunto de competências proposto para cada atividade que se ofereça a ministrar ou mediar e apresentar propriedade na ciência dos conhecimentos, habilidades e atitudes que estão a ele relacionados, ten-do isso como suporte para o desenvolvimento do trabalho e, quando o treinamento for direcionado especificamente a uma função, basear-se no perfil profissional de origem desse público. Essas competências podem ser básicas (fundamentos técnicos e científicos), de gestão (capacidades so-ciais, organizativas e metodológicas) ou específicas (capacidades técnicas) e uma mesma competência pode estar presente em mais de uma situação de aprendizagem desafiadora (SENAI, 2009 apud SENAI, 2011a, p. 18).

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É importante que o mediador tenha a perspicácia de trabalhar o sen-timento de competência, que é o estímulo à autoestima e a melhora da percepção que o aprendiz tem de si mesmo. Isso é possível, dentre outras formas, quando evidencia a resolução de um problema ou a conclusão de um trabalho por parte do aprendiz. É fundamental que esse mediador propicie situações de aprendizagem ou estudos de casos, com graus de dificuldades que permitam ao aprendiz apropriar-se progressivamente da descoberta e do sucesso nas atividades.

4. O PAPEL DO PEDAGOGO EMPRESARIAL

Estamos vivendo agora uma situação de globalização, que não é um processo simples.

Ao contrário, se de um lado traz benefícios para muitos, alarga ho-rizontes, estimula o desenvolvimento; por outro lado, pressiona por maior produtividade, por diversificação, impõe novos padrões de conduta, força a aquisição de novas competências e alija do mercado aqueles que não se dispõem a mudar e a aprender, ou o que é pior, aqueles que não têm oportunidades para isso. (CANABRAVA; VIEIRA, 2006, p. 28).

É preciso então, que a organização entenda o papel do pedagogo empresarial como, segundo as mesmas autoras, um investimento estraté-gico e prioritário e que confere um diferencial competitivo à organização, principalmente porque essa organização, hoje, é forçada a se manter em contínuos processos de mudanças, de forma a enfrentar as demandas dos clientes e as pressões da concorrência.

Nesse momento, torna-se clara a potencialidade de um profissional com conhecimentos pedagógicos, andragógicos, didáticos e principal-mente direcionados ao âmbito empresarial para coordenar as ações e prá-ticas pedagógicas, fornecendo uma base àquele que detém o conhecimen-to específico da necessidade do posto de trabalho, mas que muitas vezes peca na condução do trabalho.

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Toda essa dimensão de estrutura, na maioria das vezes, foge do do-mínio daquele profissional que tem o know how da matéria ou do assun-to a ser passado aos participantes, o que pode transformar uma excelente transmissão de conteúdos numa fraca ou pífia absorção de capacidades. É, então, muitas vezes, posta em questão a eficácia do treinamento.

Um profissional de área técnica pode, apesar de todo seu conheci-mento, não estar preparado para mediar uma situação de aprendizagem. A mediação da aprendizagem é uma ferramenta importante em todo con-texto cujo objetivo essencial seja a ação de ensinar e aprender.

A mediação é um tipo especial de interação entre alguém que ensi-na (o mediador) e alguém que aprende (o mediado). Essa interação deve ser caracterizada por uma interposição intencional e planejada do mediador que age entre as fontes externas de estímulo e o apren-diz. (MÉIER; GARCIA, 2007 apud SENAI, 2011b, p. 21).

Atitudes simples, mas pontuais, fazem a diferença quando a intenção é trazer os participantes para junto do docente, que, em certas vezes, co-nhece demais o assunto, mas tem dificuldades em transmiti-lo ou acredita que os participantes têm a mesma facilidade que ele no entendimento, ou mesmo que a absorção desse conhecimento será igual para todos os parti-cipantes do treinamento.

Mais uma vez, o pedagogo empresarial pode agir, apresentando e acompanhando a adoção de critérios para a avaliação dos índices de aprendizagem e aceitabilidade dos métodos aplicados, para casos já em andamento ou a preparação desse profissional para situações que antece-dem o início dos trabalhos. O pedagogo empresarial pode, então, se valer desse norte para a coordenação das práticas pedagógicas, dirigindo essa metodologia e propagando-a entre os multiplicadores e instrutores, que farão a mediação didática, pedagógica e técnica aos treinandos de cada programa de capacitação dentro da organização.

Contextualizar é outro princípio orientador de práticas pedagógi-cas que fortalece a aprendizagem significativa e duradoura. Como lem-

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bra Cenci (2009), não é possível transferir o conceito e cabe ao professor contextualizá-lo nas mais diversas maneiras possíveis a fim de que os alu-nos venham a compreendê-lo. Com isso, dá-se a possibilidade de que os participantes, além de se apropriar desses conceitos, o percebam em várias situações do dia a dia. Essa generalização é o que caracteriza o conceito propriamente dito.

O pedagogo empresarial é quem fará o link com a gestão da orga-nização, com a incumbência de colher, preparar e difundir os trabalhos necessários, por meio das “[...] informações para subsidiar o planejamento das ações a serem desenvolvidas, fazendo com que o diferencial competiti-vo da organização sejam as pessoas, uma vez que o diferencial por meio do avanço tecnológico é, relativamente, fácil de ser conquistado” (CANA-BRAVA; VIEIRA, 2006, p. 16).

Com a abertura dos mercados deste começo de milênio, as tecnolo-gias de ponta estão mais acessíveis e, com o fomento à inovação, vemos a facilidade de uma empresa estar frente a frente com o que há de mais mo-derno e avançado em seus ramos de atividades. E, como citaram as autoras acima, o diferencial de uma organização pode estar nas pessoas. Entretan-to, essa organização precisa priorizar o treinamento e desenvolvimento dessas pessoas e, para isso, contando com esse profissional, o pedagogo empresarial, terá alguém voltado para o sucesso desse trabalho.

Cabe, então, ao pedagogo empresarial mais esta atribuição, que seria a de definir, juntamente com as lideranças, e selecionar o público para cada fase dos trabalhos, quer sejam treinamentos ou ações de desenvolvimento, pois muitas vezes esses trabalhos são postos a perder, devido aos critérios de seleção, trazendo-se para um treinamento, por exemplo, um colabora-dor que não tem interesse ou motivação para participar do programa. Ao pedagogo empresarial cabe, também, promover a conscientização desses trabalhadores quanto ao valor dessas possíveis capacitações e a motiva-ção destes na participação. É, também, papel do pedagogo empresarial, a conscientização das lideranças, que muitas vezes dificultam a participação de seus colaboradores nos programas de treinamento em que são convo-cados ou convidados, abrindo mão da qualificação de sua força de mão de

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obra, muitas vezes por motivos de quadro enxuto de colaboradores ou alta demanda de produção e trabalho.

Dessa forma, o pedagogo empresarial deve ser subordinado direta-mente da alta direção da empresa e responder diretamente a quem possa intervir em situações de impasses dessa natureza.

As empresas buscam, cada vez mais, pessoas inovadoras e compro-metidas com seus processos e programas e o método de Formação Profis-sional por Competências tem como algumas de suas premissas desenvol-ver a autonomia, a iniciativa e a capacidade de resolver problemas.

Assim, podemos afirmar que, para o desenvolvimento de capacida-des que levem ao domínio de competências, a ênfase dos processos de ensino e de aprendizagem deve recair sobre situações problema, projetos, pesquisa, estudos de caso entre outros, todos eles relacio-nados com o mundo de trabalho e considerando o contexto sócio cultural. (SENAI, 2011b, p. 36).

Cabe ao mediador dos projetos de capacitação, no caso, o pedagogo empresarial, a implementação, o acompanhamento e a preparação do pro-fissional envolvido no trabalho, no caso, o docente, instrutor, consultor ou mesmo um colaborador da empresa, que agirá como facilitador, caso necessite, ou o acompanhamento e troca de experiências, caso já seja um profissional mais preparado didática e pedagogicamente. Nesses casos de Educação Profissionalizante para adultos, em que se envolvem os ambien-tes e a cultura da empresa, faz-se necessária a observação da transcendên-cia e da relação de interdisciplinaridade, para embutir nos treinamentos técnicos as questões de atitude, ética, comportamento, assiduidade, res-ponsabilidade social, entre outros temas transversais de difícil abordagem no dia a dia de trabalho, mas que, com a conotação de bate-papo e a expo-sição como assunto informal ou apresentação de situações problema, leva à reflexão e debate entre os participantes e uma assimilação mais eficaz, principalmente por parte da população mais resistente ao cumprimento dessas questões.

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Podemos dizer, então, que o pedagogo empresarial será a ferramenta para contextualizar e relacionar os conhecimentos, experiências e práti-cas pedagógicas, que se converterão em aprendizagem significativa, não somente focados na capacitação e qualificação técnica, mas na formação geral dos envolvidos, enquanto cidadãos e elementos modificadores do processo, no que diz respeito às relações sociais, culturais, trabalhistas e até mesmo econômico/financeiras.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A relevância desta pesquisa existe devido à percepção da necessidade de aprimoramento pedagógico para a maioria dos profissionais que minis-tram treinamentos de formação continuada, de áreas técnicas, dentro das empresas e que nem sempre estão preparados para enfrentar os desafios dos processos de ensino e aprendizagem para adultos. Esses profissionais geralmente têm conhecimento técnico, mas deixam a desejar quanto às metodologias adequadas para exercer interatividade e conseguir a trans-cendência. Muitas vezes, falta-lhes preparo para a condução do ensino, por meio do desenvolvimento das competências, o que vem se mostrando ser o caminho mais adequado para a formação profissional de adultos, e isso sinaliza uma necessidade de participação do pedagogo nos méto-dos que norteiam o ensino por competências, nos processos de ensino e aprendizagem dentro da empresa.

Através das análises feitas no decorrer desta pesquisa, tento questio-nar a carência das organizações quanto à assertividade nas investidas em direção à formação continuada de seus colaboradores e examino as carac-terísticas necessárias para o profissional que estará apto a desenvolver e coordenar os projetos de melhoria no âmbito organizacional.

A qualificação, grande parte das vezes, já está presente nos colabo-radores de uma empresa, porém o mundo das organizações deve analisar, cada vez mais, a necessidade de formação continuada para os seus seg-mentos de funcionários, e, muito mais, deve examinar as vantagens de se

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preparar pessoas com capacidades multifuncionais, visto que esse tipo de funcionário não está disponível no mercado e nem se prepara da noite para o dia, nem de um mês para o outro.

Uma saída, então, é trabalhar, criar, desenvolver as competências em seus colaboradores, e para isso é preciso um programa de treinamento/desenvolvimento que contemple uma multidisciplinaridade condizente com as competências que se espera/deseja que sejam adquiridas e desen-volvidas por cada segmento de funcionários e por cada participante.

Para isso, as empresas devem contar com um profissional (ou pro-fissionais) que esteja preparado para detectar, agrupar, conduzir e forma-tar essas demandas e, consequentemente, tenha condições de interagir, atuar e mediar as situações de aprendizagem que serão necessárias e seus percalços, que serão inevitáveis, devido à natureza da ocorrência de pú-blico adulto, formado por profissionais que acreditam ter conhecimento suficiente para a função que exercem ou que se sentem ameaçados com a descoberta de suas deficiências, bem como a resistência exercida pelas lideranças e diretoria da empresa quanto aos custos e paradas gerados pela execução dos programas.

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Title: The corporate pedagogue and a coordination of pedagogical practice of education to the continued education for competences within the company.Author: Adriano Teodoro Nepomuceno Ribeiro.

ABSTRACT: This study seeks to increase the vision of the demands found in companies, of the work of the pedagogue. The training actions developed in continued education within the company are performed by professionals in specific of the capacity building needs, but they are not always prepared to meet the challenges of the teaching processes and learning for adults. These professionals have generally technical expertise, but are lacking regarding suitable methodologies to exercise interactivity and to achieve the transcendence. It lacks preparation for the conduct of teaching, through development of competences, what shows up today as being the most adequate path for professional training of adults. It also analyzes the need for companies to bring more experienced people who have a good perception in the business market, professionals who can also prepare, teach and create training projects in a position to intervene, interact and guide pedagogical practices, remedying or minimizing the need to improve education for most professionals who teach continued education training in technical areas within the company.Keywords: Corporate Pedagogue. Continued Formation. Pedagogical Practice. Competences. Professional Education for Adults

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A importância social da responsabilidade e do planejamento educacional para os gestores públicos

Edson Garcia Ferraz Júnior1

Resumo: O corrente artigo sobre a importância social da responsabilidade e do planejamento educacional para os gestores públicos aponta, lato sensu, o estado atual da legislação, sua adequação às necessidades da educação, delineando aspectos histórico-sociais que demandam a implantação de mecanismo que fomente a eficácia das políticas na área. O ponto central está na importância da responsabilização para os gestores públicos em educação, sem incentivo a um “Código Penal Educacional”. Aborda-se a necessidade de maior participação popular na cobrança de uma educação de qualidade, ao passo em que frisa a responsabilidade para gestores públicos como mecanismo contra o mau gestor, aquele que deixa de cumprir obrigações exequíveis em educação. Por fim, aponta-se a importância de que todos, incluindo gestores, sintam-se parte do processo educativo, assimilem de fato a importância do que fazem com vistas à consolidação de um direito tão nobre e com reflexos que transcendem gerações: o direito social à educação.

Palavras-chave: Educação. Sociologia. Legislação. Responsabilidade Educacional. Gestor Público.

1 Mestre em Ensino na Sociedade do Conhecimento pela Universidade de Veneza (UNIVE – Itália). Especialista em Direito Educacional pelo Claretiano – Centro Universitário, e em Ciências da Educação pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL). Graduado em Administração Legislativa pela mesma instituição. E-mail: <[email protected]>.

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1. INTRODUÇÃO

O espeque legislativo brasileiro é amplo na seara educacional e, espe-cialmente após a Constituição de 1988, o legislador traçou importantes princípios e práticas com vistas a assegurar acesso à educação escolar a todos os brasileiros, regulando competências dos entes federativos, finan-ciamento e avaliação, no ímpeto de garantir qualidade.

No entanto, verifica-se o acesso precário a uma educação de qualida-de, conforme índices que apontam estados com o cumprimento de metas na área até o ano que entra.

Assim, com fulcro principalmente em levantamentos bibliográficos, almeja-se contextualizar a eficácia da legislação educacional corrente e a importância de um mecanismo de responsabilidade com foco no direcio-namento da educação que nossa sociedade almeja.

Para tanto, são abordados pontos do Direito Educacional e de Ges-tão Pública na área. Ainda, considera-se o histórico fisiologismo na con-dução do bem público no Brasil, facilmente apontado com reiteração nos noticiários de nosso país, o que interfere, inegavelmente, na seara da con-versão da norma em política pública efetiva.

Por fim, denota-se a notoriedade de que as políticas em Educação devam ser moldadas com vistas à formação do cidadão em 20 ou 30 anos e aqueles que têm o poder para zelar, precipuamente, pelo cumprimento de tais políticas são, via de regra, agentes com mandato eletivo muitas vezes atrelados mais aos “quatro mágicos anos” que à observância de parâmetros sóbrios para o fomento de projetos educacionais que, por sua característi-ca, potencialmente despontam benesses mais visíveis em um lapso tempo-ral maior que o da permanência do agente. É nesse ponto que se reforça a educação como política de Estado, não de governo.

Nesse ínterim, o mérito e relevância da discussão em torno da res-ponsabilização educacional e da importância do planejamento na área são ascendentes e reflete ampla expectativa acerca do tema, objeto de aborda-gem deste artigo.

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2. HISTÓRICO E POSSÍVEIS DIRECIONAMENTOS

São recorrentes as abordagens contemporâneas acerca da respon-sabilização educacional. A Constituição Brasileira de 1988, a Lei de Di-retrizes e Bases da Educação Nacional e diversas leis esparsas abordam, majoritariamente, aspectos principiológios que devem nortear o desen-volvimento da educação no país. Muitos são os contratos sociais, abarca-dos em leis, acerca de métricas que devem ser adotadas para que o Brasil, em efeito, desenvolva uma educação acessível e de qualidade. No entanto, inobstante o denso espeque legislativo, verifica-se que o direito público subjetivo de acesso à educação, garantido na própria carta magna do país, nem sempre é tratado como direito pelas diversas instâncias do Executivo. É cada vez mais saliente que a dissonância entre programas de Estado e programas de governo, o que desencadeia a inconteste irresponsabilidade social em diversas políticas públicas, sendo a educação uma delas.

É inegável que a história de nosso país contribuiu para a composição de um sistema educacional que necessita de mais que leis e acordos abstra-tos. Essa preocupação tem sido crescente nos últimos anos, o que trouxe ao debate o tema da accountability americana, que remete à necessidade de prestação de contas e responsabilização de gestores caso não cumpram metas educacionais, inclusive fomentando debates acerca de um Projeto de Lei de Responsabilidade Educacional.

Pode-se questionar o porquê de países como França ou Inglaterra não necessitarem desse tipo de postura estatal na seara da educação, o que nos remete à assertiva de Joaquim (2009) acerca da cidadania no Brasil:

No caso brasileiro, tivemos a cidadania concedida, principalmente nos períodos de colônia, império, república velha e períodos de re-gimes autoritários. Houve, também, omissão do poder público na realização de um ensino popular, uma vez que os governos prioriza-ram a preparação de uma elite intelectual, como aconteceu no Brasil Império. ( JOAQUIM, 2009, p. 202-03).

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Isso explica, em parte, as dificuldades na efetivação de políticas pú-blicas no país, envolvendo a educação. Carvalho (2008) aponta que, no Brasil, diferente do que ocorreu em países como a Inglaterra, em que pri-meiro houve conquista e solidificação dos direitos individuais, posterior-mente os Políticos e Sociais, no Brasil ocorreu exatamente o inverso, e exemplo clássico disso é verificável na criação da Consolidação das Leis Trabalhistas. Inegável avanço no campo do trabalho, no entanto forma-tado em gabinete, distante da participação popular, o que não ocorreu de maneira diferenciada na área da educação2. O grande dilema que insiste perpetuar a estrutura de poder do Brasil, em alusão à “cidadania concedi-da” exposta por Joaquim (2009, p. 202-203).

O que se verifica no campo educacional nos dias de hoje remonta ao passado de descaso com a educação popular e encontra lastro em leis que atribuem uma responsabilidade compartilhada, sendo difícil individuali-zar a engrenagem que emperra o avanço qualitativo no ensino.

Imbuído nessa preocupação, o Projeto de Lei (PL) 7420/06, traz na sua justificação:

É indispensável que a implementação dessa legislação resulte em po-líticas públicas efetivamente comprometidas com a qualidade, com o real acesso de cada brasileiro ao saber e à elevação do nível geral de escolaridade da população. Para tanto, é fundamental firmar com-promissos com a elevação da qualidade e definir responsabilidades dos gestores públicos com relação a eles. Enfim, estabelecer uma le-gislação de responsabilidade educacional, voltada para a qualidade, com procedimentos claros para sua promoção e com penalidades para aqueles que não os implementarem. (BRASIL, 2006).

Assim, constata-se clara preocupação com a “distribuição de deve-res” na gestão pública educacional. A responsabilidade até existe, fazendo justiça ao disposto no artigo 208, §3º da CF/88, no entanto são raros os casos de punição de gestores por responsabilidade educacional, principal 2 Le mort saisi le vif (THIERS apud FAORO, 2001, p. 661).

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mente pela facilidade que a própria legislação oferece a argumentos como: “eu não pude agir em função da falta de apoio do Estado” ou mesmo “o partido x, que detém poder no âmbito federal ou estadual, não nos dá apoio para o implemento de uma educação acessível e de qualidade”. A CF estabelece prioridades na oferta do ensino para cada ente federado e, ao mesmo tempo, abre brechas para que a responsabilidade seja “compar-tilhada” pelo bom e pelo mau gestor, dificultando a promoção de políticas efetivas, daí a importância de uma sistemática que separe “o joio do trigo” e permita um tratamento à educação como direito difuso, personalíssimo, inalienável, e não mero instrumento propagandista de gestões políticas que sempre possuem fórmulas prontas para todas as mazelas, embora estas nunca sejam efetivamente verificadas no campo educacional.

E a abordagem da “questão política” tem fundamental importân-cia para o desenvolvimento da educação, posto que gestores públicos em educação necessitam de maior autonomia (e da consequente responsabi-lidade) para o desenvolvimento de sistemas de ensino coerentes com as demandas sociais, inclusive para que possamos abordar educação como “política de Estado” em efeito. É preciso desprender a educação dos fisio-logismos, da corrupção. Gestor público deve ser orientado por uma linha mestra de desenvolvimento estatal, não por práticas que remetem ao “Es-tamento” de Raymundo Faoro, em sua obra Os Donos do Poder: formação do Patronato Político Brasileiro.

Há muita resistência quando se aborda responsabilização educacio-nal, até mesmo por aqueles gestores que atuam com boa-fé, pelo justificá-vel receio de cometer “crime de responsabilidade educacional” em decor-rência de fatores que estão fora de sua alçada. É aí que entra a necessidade de estruturação da autonomia do gestor público, da atribuição clara de competências e responsabilidades, para que este se sinta parte da educação e atue de maneira compromissada. Importante salientar que a responsa-bilidade educacional deve ser vista como instrumento garantidor de uma educação de qualidade, não como ferramenta de açoite ou perseguição.

Inconteste é a importância da educação para o desenvolvimento de um país. Seu papel distinto é perceptível, já em território brasileiro, com

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a famosa catequização. A preocupação de Pombal não foi imotivada, uma vez que a própria orientação de vida, de condutas, é construída, não ape-nas, mas com relevado destaque, no ambiente de educação formal. Assim, Portugal percebeu a importância da educação na formação política dos que habitavam sua colônia e o quanto os interesses políticos podem ser almejados pelo controle do processo educacional.

Dada sua vital importância no campo político, verifica-se que, ao longo da história, os governos têm destacado especial importância em seu “controle”, um processo nem sempre profícuo ao povo. Grande exemplo de preocupação com a educação como instrumento de “corrupção da per-sonalidade” vem do exterior. A Alemanha nazista, por intermédio de sua Juventude Hitlerista, não media esforços em educar as crianças consoante as métricas do partido nazista, como forma de, ao longo do tempo, legiti-mar as ideologias de um poder então dominante, enraizá-lo.

Os exemplos precedentes corroboram a assertiva de que a educação, por ser instrumento estratégico de dominação política, necessita de esfor-ços que envolvam o povo, de modo que este a guie, consoante aspirações da nação, e não seja dominada por grupos, utilizando-a como meio de legitimação de interesses.

E a preocupação com a responsabilidade e planejamento educacio-nais, com olhos atentos àqueles que atuam em políticas públicas advém, inclusive, de um processo de amadurecimento do povo brasileiro que, im-buído pela democracia em solidificação, pela consciência de que a nação deve ser construída e moldada pelo próprio povo, empresta distinta re-flexão de Ihering (2009, p. 57): “A atitude de um homem ou de um povo em presença de um ataque dirigido contra o seu direito é a mais segura pedra de toque de seu caráter”. E a responsabilização é fruto desse especial “toque de caráter” que denota o anseio pelo desenvolvimento de um sadio processo educacional em nosso país.

Em uma análise histórica das Constituições, é inegável que a pro-mulgada em 1988 registra sólida preocupação com os direitos individuais, políticos e sociais. Dez artigos são destinados à educação. Em seu art. 205, não apenas consta o dever compartilhado entre Estado e família no pro-

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cesso educacional, mas se preocupa em denotar que esta tem o condão de preparar a pessoa para o exercício da cidadania, ou seja, de modo a prepa-rar essa pessoa para o pleno exercício de seus direitos individuais, políticos e, por conseguinte, sociais. Mais que elemento norteador, referido artigo atribui à família e ao Estado a mais importante das responsabilidades edu-cacionais: formar cidadãos.

Ainda, leis infraconstitucionais, como a famosa Lei 9.394/96, ou “Lei Darcy Ribeiro”, externa ampla preocupação inerente à efetividade dessa educação cidadã. O texto de “Apresentação” da Lei 9.394/96 chama a atenção para a necessidade de quebra de paradigmas, para a disposição do povo a novos desafios, para uma responsabilização conjunta, que aqui não tem o condão de estabelecer culpados, mas sim fomentar a união, o sentido de pertencimento.

Jamil Cury traça o condão, o sentido desse desafio na “Apresentação” da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996:

O desafio é uma provocação ao outro, provocação em que o outro é convidado e chamado a uma cantoria em diálogo e em disputa. No desafio, a sucessiva recomposição do tema, em ato e na voz de cada qual, acaba por tomar o tema inicial como ponto de partida para sucessivas mudanças. O desafio não deixa de ser um intertexto e um jogo de vozes.O desafio, como nas cantorias populares, é a perda de fé no outro como alguém absolutamente maior que eu, como alguém que quer se pôr hierarquicamente acima de mim. O desafio é a chamada prá-tica que, nela mesma, altera o campo do real e dentro dele a própria lei. (BRASIL, 2005, p. 25).

Cury é enfático acerca do que aqui se define como “chamada pessoal da responsabilidade”, por intermédio da participação crítica, da constru-ção que reflete parâmetros arquitetônicos moldados pelos anseios da so-ciedade, não de um governo.

O autor da “Apresentação” da Lei 9394/96 já adverte indiretamente, no trecho citado, que “leis não bastam”. Não se pode esperar que a legisla-

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ção, “de per si”, resolva os problemas educacionais, ou qualquer problema social. Ademais, é importante ressaltar que, no Brasil, são inúmeras as leis, decretos, que tratam da educação e de métricas operacionais em suas mais diversas vertentes.

Quando se aborda a importância da responsabilidade e do planeja-mento educacional para os gestores públicos, é necessário ter sempre em mente que não se defende, neste artigo, a criação de um “Código Penal Educacional”, mas fomentar políticas e instrumentos legais que permeiem a mentalidade em reuniões para planejamento acadêmico, elaboração curricular e de material didático, enfim, acerca da crucial importância de todo e qualquer processo decisório inerente à educação. O gestor, em seus mais variados níveis, deve considerar a importância de seu trabalho não pela possibilidade de retaliação estatal, mas pela indelével contribuição que seu trabalho poderá trazer para o desenvolvimento de pessoas que go-vernarão o país em alguns anos, que esse gestor pode fazer a diferença no auxílio à formação de uma mentalidade que, no futuro, não seja permeada pela necessidade do policiamento ostensivo como forma de mantença de uma “pax social” ou por midiáticos julgamentos, como o do “Mensalão”.3

De todo modo, é fundamental a composição de uma estrutura que garanta o comprometimento dos envolvidos em um processo, se quiser-mos que este tenha êxito. As primeiras preocupações acerca da educação tangenciam a sua qualidade. ENEM, ENADE, SARESP, inúmeros são os instrumentos que possuem especial preocupação em aferir a qualida-de daquilo que é ensinado nos mais variados níveis escolares, inclusive com o ímpeto de balizar a distribuição de recursos pelo governo federal, de modo que regiões educacionalmente deficitárias sejam contempladas com maior esforço do Ministério da Educação, seja pecuniário, seja no auxílio ao planejamento estratégico.

No entanto, apesar da importância, tais avaliações recortam a saúde do sistema educacional em dado momento e, mesmo assim, possui caráter 3 Alusão à Ação Penal 470, em curso no STF, que trata, em suma, de suposta compra de deputados com vistas à facilitação no trâmite de leis.

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duvidoso, pela forma como são formatadas atualmente. Em rol exemplifi-cativo, destaca-se a preocupação em preparar o aluno para o SARESP ou, tratando do ensino superior, em preparar o aluno para o exame da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

Tais condutas mascaram a realidade educacional. Voltando ao ensino básico, recentemente o governo do estado de São Paulo alardeou a popu-lação por ter atingido as metas do IDEB (Índice para o Desenvolvimento da Educação Básica) até 2013, o que consta no próprio sítio da Secretaria da Educação. Como se pode atingir uma meta educacional até o ano sub-sequente? Ainda assim, como se pode colocar com exacerbado alarde um índice que assegura o estado ter uma educação de qualidade, quando, ao menos na cidade de Campinas, alunos sofrem com a falta de professores, são encaminhados ao Ensino Médio sem uma sólida alfabetização?

Dessa monta, as avaliações possuem grande importância para aferi-ção da educação, mas não compõem o único elemento e a responsabilida-de do gestor público entra neste aspecto, tanto na definição dos elementos de avaliação quanto na segurança de que recursos são corretamente aloca-dos e retornam de maneira eficaz, ou seja, os alunos de fato aprendem em função da estratégia traçada por dado investimento.

Escolas são avaliadas, inclusive, por seus recursos, bibliotecas, salas de informática. O que a responsabilização educacional deve aferir é se essa avaliação contempla a eficácia desses recursos no aprendizado ou se a mera existência desses recursos é suficiente para alavancar a “nota” de uma rede de ensino por si só.

Em todo campo, existem bons e maus gestores. A responsabilização precisa, primeiramente, abranger “desvios de conduta” de maneira maciça para que, em um futuro próximo, não haja necessidade daquilo que, no Direito Penal, se denomina “Preceito Secundário”, ou seja, penalização. O gestor educacional não deve ser responsabilizado, evidentemente, se os alunos não obtiverem desempenho em determinados índices educa-cionais. No entanto, caso os recursos destinados ao fomento da educação não sejam corretamente utilizados, ou se os instrumentos de regulação de um sistema regional de ensino forem “convenientemente ineficazes”, a res-

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ponsabilização do agente público é imperiosa, para que um direito públi-co subjetivo, inalienável, não seja negado àqueles que amanhã sofrerão as consequências de um duvidoso sistema de ensino.

Ainda, mais que traçar com maior propriedade as responsabilidades, é necessário que a população tutele uma educação eficaz. Liberati (apud JOAQUIM, 2009, p. 251), inerente aos instrumentos de proteção à edu-cação, expõe que: “[...] o direito à educação encontra-se no rol dos interes-ses metaindividuais passíveis de serem protegidos pela via da ação civil pú-blica, sendo considerado direito de todos e, deste modo, informado pelo princípio da universalidade, tendo o Poder Público o dever de prestá-lo”.

Tal assertiva remete ao artigo 205 da Constituição Federal de 1988, uma vez que preparar a pessoa para o exercício da cidadania envolve, so-bretudo, torná-la cônscia de seus direitos e deveres e, no que tange aos direitos, à maneira de cobrá-los em caso de descumprimento pela parte responsável.

Ressalta-se aqui uma preocupação acerca da estrutura de uma res-ponsabilização educacional: a sua utilização para fins políticos. Lem-brando que educação deve ser uma política de Estado e não de governo, é imperativo que seja adotada a cautela necessária para que o gestor não seja penalizado mais por pertencer ao partido de oposição que por con-duta inadequada no processo educacional. Ao passo em que é necessária cautela para a não criação de um “Código Penal Educacional”, também é necessária igual cautela para que eventuais responsabilizações não tenham espaço para vinganças oriundas de fisiologismos políticos, o que, infeliz-mente, ocorre em demasia no Brasil.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Verifica-se, pelo corrente artigo, que é salutar a existência de um mecanismo de responsabilidade educacional com vistas à efetivação das métricas e políticas na área. Conforme essa necessidade, é importante que essa responsabilização não seja vista como a necessidade de criação de um

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“Código Penal Educacional”, mas sim de construções legais e sociais que aproximem o gestor e sociedade do processo educacional, em um processo simbiótico, com vistas ao fomento de uma sociedade mais justa e igualitá-ria, que de fato exerce a cidadania.

Conclui-se, ainda, que não é a criação de leis que resolverá lacunas em educação, mas sim um compromisso social, em que cada cidadão, não somente o gestor público, chame para si a responsabilidade educacional.

Ao abordar o caráter difuso da educação, fica saliente que o foco da responsabilidade deve estar em seu caráter diretivo, não punitivo. É ne-cessário que gestores cumpram leis e planejamentos com boa-fé nos pro-cessos educacionais para que haja uma educação verdadeiramente focada tanto no aspecto quantitativo (abrangência) como qualitativo. Alguns instrumentos de avaliação foram explicitados para apontar que elas não são suficientes para nortear uma educação com responsabilidade.

Por fim, salienta-se que a responsabilidade no campo educacional jamais deve ser tratada como “objetivo final”, mas como meio para que, no futuro, eventuais ações punitivas sejam desnecessárias, posto que enrai-zados profícuos comportamentos, pela constante cobrança consciente e sadia da sociedade. A gênese do corrente artigo está na eliminação e cons-tante prevenção do cenário exposto por Oakeshoot (apud THE VOICE OF LIBERAL LEARNING, 1989, p. 86) acerca da relação entre educa-ção e governo, para quem: “Governos modernos não estão interessados em educação, estão preocupados apenas em impor ‘socialização’ de um tipo ou de outro sobre os fragmentos sobreviventes de um compromisso educacional que algum dia foi considerável”.

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Title: The social importance of responsibility and educational planning for public managers.Author: Edson Garcia Ferraz Júnior.

ABSTRACT: The current article about the social importance of responsibility and educational planning for public managers points, broadly, the current state of the law, its suitability to the needs of education, outlining the historical-social aspects that require the deployment of mechanism that promotes the effectiveness of policies in the area. The attention is on the importance of responsibility for public managers in education without encouraging an “Educational Criminal Code”. The article treats the importance of the popular participation to demand the quality on education, while stress the responsibility for public managers as a mechanism against bad manager, who fails to fulfill obligations enforceable in education. Finally, it points the importance of everyone, including managers, feel part of the educational process, assimilating in fact the importance of what they do for consolidating so noble right and with reflections that transcend generations: the social right on education.Keywords: Education. Sociology. Legislation. Educational Responsibility. Public Manager.

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A importância e os benefícios da implantação de um programa de educação financeira nas empresas

Aline de Fátima Guedes da Silva1

Randal Farago2

Resumo: O presente estudo tem como objetivo principal demonstrar a importância de as empresas implantarem um programa interno de educação financeira, o qual proporcione aos seus colaboradores uma conscientização sobre o uso do dinheiro e um melhor conhecimento sobre finanças. Nas empresas, é notória a importância de um controle financeiro, pois se trata de uma ferramenta de gestão que controla e proporciona uma visão geral das receitas e despesas, além de demonstrar excessos de gastos e carência de recebimentos. Com essa ferramenta, a empresa é capaz de traçar metas e objetivos e, por conseguinte, obter lucro. Assim como nas empresas, na vida pessoal também se faz necessário esse controle, pois é crescente o número de créditos disponíveis no mercado, o que exige conhecimento na hora de adquiri-los. Esse conhecimento hoje é restrito às pessoas das áreas de finanças, contabilidade e economia. Em decorrência dessa falta de conhecimento, as pessoas se endividam e esse endividamento traz consequências pessoais e profissionais. Uma pessoa com dívidas, com seu orçamento completamente desorganizado, acarreta prejuízos para a empresa, pois se torna improdutiva. Assim, a partir de um levantamento bibliográfico, foram analisados alguns conceitos fundamentais relacionados ao tema e, em seguida, apresentados os principais benefícios que são obtidos com a inserção de um programa de conscientização sobre a utilização do dinheiro.

Palavras-chave: Planejamento Financeiro. Educação Financeira. Finanças Pessoais. Endividamento. Crédito.

1 Especialista em Gestão Empresarial (MBA) pelo Claretiano – Centro Universitário. Graduada em Administração pela mesma instituição. E-mail: <[email protected]>.2 Doutorando em Administração pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Graduado em Matemática pela mesma instituição. Docente em cursos de Graduação e Pós-Graduação (lato sensu) nas instituições: Moura Lacerda, UNIFAFIBE e Claretiano – Centro Universitário. Professor convidado do UniSEB-COC e MBA-USP (Fundace). E-mail: <[email protected]>.

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1. INTRODUÇÃO

Profissionais que mantêm seu controle financeiro (orçamento) em ordem são mais produtivos que os demais? Uma vida financeira “saudá-vel” influencia a produtividade do profissional? Um programa de edu-cação financeira nas empresas aumentaria a sua produtividade? Quais os benefícios da sua implantação?

Tais questionamentos são fundamentais para que se possa principiar este trabalho.

Sabe-se que é importante, necessário e imprescindível um controle rigoroso de receitas e despesas em qualquer organização, isso é indiscutí-vel; mas, e na vida pessoal? Será que todos mantêm um controle sobre seus ganhos e gastos?

Assim como nas organizações de pequeno, médio ou grande porte, familiares ou não, é necessário, até mesmo por questões de convivência familiar e “sobrevivência” financeira, um controle constante sobre as re-ceitas e despesas pessoais, ainda mais com a quantidade de créditos dis-poníveis no mercado e a facilidade de adquiri-los. Todavia, a maioria das pessoas não faz seu controle financeiro com regularidade.

Esse controle, na maioria das vezes, não é feito simplesmente por “preguiça” ou “falta de tempo”. Segundo Leal e Melo (2008), o nível de estudo da pessoa influencia sua prática de controle financeiro e, conse-quentemente, de investimento.

Infelizmente, não se tem a Educação Financeira como disciplina nas grades curriculares. Obter conhecimento em números, em análises um pouco mais profundas, em como investir para não perder, torna-se privi-légio daqueles que têm um curso voltado para as áreas de Administração, Ciências Contábeis e Economia (LEAL; MELO, 2008).

Como consequência dessa falta de conhecimento no assunto, as pes-soas endividam-se, e tal endividamento resulta em problemas pessoais (na família) e profissionais (na empresa). Pereira (2009) relata que a maioria das pessoas não tem controle sobre os seus gastos; na maioria das vezes, o salário recebido é utilizado totalmente para quitar dívidas, e isso, que-

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rendo ou não, desmotiva. Não significa, porém, que a empresa remunera mal esse colaborador; pelo contrário, é ele quem não sabe gerir a renda re-cebida. Um funcionário com dívidas, segundo Robbins (2005), torna-se improdutivo, gerando estresse no mesmo. Além disso, traz consequências, como o presenteísmo, ou seja, o corpo do profissional está presente, mas a mente está ausente, o que pode ser mais grave para a empresa do que o próprio absenteísmo (GOETZEL et al., 2004 apud OGATA; SIMUR-RO, 2009). De que adianta a pessoa estar ali, mas não render 100% no trabalho que lhe é solicitado?

É importante mencionar, ainda, o número crescente de pedidos de adiantamento de férias e 13º salário, bem como a solicitação de emprés-timos consignados, outro “erro” adquirido pelas empresas em parceria com os bancos, pois muitas delas não fazem uma análise antecipada sobre quanto emprestar ao colaborador ou mesmo procuram compreender o motivo deste para adquirir tal valor, visando orientá-lo.

Nesse sentido, é interessante as empresas adotarem um programa interno de educação financeira para seus colaboradores, especialmente aquelas de serviço braçal, em que o grau de escolaridade é bem menor. Com pouco investimento, a empresa conseguirá conscientizá-los sobre a importância do planejamento financeiro, fazendo-os entender, inclusive, que, com o salário que recebem, é possível manter o orçamento em dia. O importante, na maioria dos casos, não é o quanto o funcionário ganha, mas, sim, o quanto ele gasta (CERBASI, 2004; 2012).

É desestimulante, certamente, trabalhar o ano inteiro e não poder desfrutar de alguns dias de passeio com os familiares. Muitos funcioná-rios, inclusive, vendem suas férias para quitar dívidas, deixando de lado sua vida particular e social. Tudo isso influencia seu desempenho profis-sional.

Trabalhador consciente, com o orçamento em dia, ou seja, com a vida financeira “saudável”, pode produzir mais, pois não tem preocupa-ções. Ele passa a entender que o problema, na maioria das vezes, como já foi mencionado anteriormente, não está no quanto ele ganha, mas, sim, no quanto ele gasta, no mau uso que faz do seu dinheiro.

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O tema do presente trabalho, apesar de novo e com poucos estudos, é importante para a Gestão Empresarial, uma vez que é possível perce-ber, em algumas empresas, funcionários desmotivados, insatisfeitos, e essa desmotivação e insatisfação, por vezes, não são verificadas mais detalha-damente, sendo sempre relacionadas a problemas salariais, o que não é verdade. Será mais lucrativo para a empresa ensinar seus colaboradores a gerir o orçamento pessoal do que lhe proporcionar um valor maior de receita, que, com o tempo, caso ele não mude seus hábitos, também não será suficiente para mantê-lo.

O presente trabalho é uma pesquisa exploratória, de natureza qua-litativa, sendo caracterizado, segundo a natureza dos dados, como uma pesquisa bibliográfica. Assim, será feito um levantamento bibliográfico e uma revisão teórica sobre planejamento financeiro, psicologia comporta-mental (presenteísmo), endividamento, inadimplência e educação finan-ceira. Como a temática ainda não é muito difundida no Brasil, serão utili-zados, também, artigos de diversos autores, os quais apresentam pesquisas e análises sobre o assunto em questão, bem como informações contidas em institutos financeiros que já tratam da temática deste trabalho.

Para melhor entendimento, o presente trabalho foi estruturado em duas seções.

Na primeira seção, serão apresentados alguns conceitos de planeja-mento financeiro. Nesse momento, evidencia-se a importância dessa prá-tica tanto nas empresas como na vida particular de qualquer indivíduo, bem como realizar um comparativo entre os dois ambientes para enfatizar a semelhança entre ambos. Será abordado, também nessa seção, de forma breve, um dos fatores psicológicos mais comuns na atualidade, o estresse. Este pode ser sentido devido a vários fatores (ambientais, organizacionais e individuais), e em todos eles o indivíduo pode ter sua produtividade afetada.

Na segunda seção, será abordado o tema do presente estudo, a edu-cação financeira nas empresas. Serão apresentados os principais benefícios que são obtidos com a inserção de um programa de conscientização aos funcionários sobre a utilização do dinheiro; benefícios esses voltados tan-to para a organização quanto para o seu colaborador.

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2. PLANEJAMENTO FINANCEIRO: UMA QUESTÃO DE QUALIDADE DE VIDA

Nesta primeira seção, será apresentado o conceito de planejamen-to financeiro, do ponto de vista de alguns autores, conceito esse que terá como foco dois ambientes: o empresarial e o familiar. Tal comparação se faz necessária para que fique clara a importância da gestão dos recursos financeiros nos dois ambientes supracitados, bem como para dar conti-nuidade à temática em questão.

Segundo Gitman (2004), o planejamento financeiro é um instru-mento de orientação para a direção, a coordenação e o controle de ações mensuráveis que deverão ser tomadas futuramente, para que estas atinjam os resultados esperados.

Marques (2009) acrescenta que o planejamento financeiro é uma ferramenta de gestão que controla especificamente as despesas e as recei-tas de uma empresa, procurando identificar excessos de gastos, bem como a carência de recebimentos, para que possa, mediante as informações ob-tidas, traçar metas e objetivos, buscando o equilíbrio financeiro e, conse-quentemente, o lucro.

No planejamento financeiro de uma empresa, muitas atividades são necessárias e estão interligadas. Já no ambiente familiar, essas atividades são mais simples, embora necessitem do mesmo controle e determinação.

Nesse sentido, o planejamento financeiro pessoal, com foco geral no ambiente familiar, trata-se de um processo em que ocorre o gerenciamen-to do dinheiro, objetivando a satisfação pessoal3. É uma forma de contro-lar a situação financeira que inclui programações de recebimentos, gastos e investimentos (MACEDO JUNIOR, 2007).

Ainda segundo Macedo Junior (2007, p. 26), “[...] um bom planeja-mento pode fazer mais por seu futuro do que anos de trabalho e, em geral, é o grande diferencial entre sonhadores e realizadores”4.

3 Satisfação pessoal: conquista de um emprego com melhor remuneração, realização de uma viagem, compra de um novo carro, de uma nova casa, entre outros (MACEDO JUNIOR, 2007). 4 Sonhadores e realizadores: os sonhadores guiam-se, geralmente, pela intuição e sensação, não têm os “pés no chão”. Já os realizadores realizam mesmo. Buscam atingir as metas estabelecidas e procuram cumpri-las à risca. Vivem a realidade do momento para atingir sonhos futuros (MACEDO JUNIOR, 2007).

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O autor complementa ressaltando que o planejamento é realizado com o objetivo de atingir não somente o sucesso material, mas também o pessoal e o profissional. A partir do momento em que as finanças pesso-ais estão organizadas, com algumas reservas disponíveis, é possível optar por trabalhar no que se gosta e, também, realizar viagens que antes eram impossíveis.

Para que o planejamento financeiro seja bem-sucedido, é necessária a participação de todos os colaboradores (esposa, marido e filhos), quando se tratar de uma família completa. Caso contrário, ele não surtirá efeito (CERBASI, 2004).

O principal benefício obtido ao se planejar as finanças é que se passa a gastar menos do que se ganha, a agir de acordo com as reais possibili-dades e a iniciar a sua primeira poupança (MACEDO JUNIOR, 2007).

Os autores Eid Júnior e Garcia (2005, p. 07) ressaltam essa impor-tância, esclarecendo que:

É por meio do planejamento que você conhece em detalhe seus ga-nhos, além de aprender a poupar, gastar adequadamente e controlar as finanças para atingir seus objetivos. O planejamento financeiro é, mais do que nunca, fundamental para uma vida familiar equilibrada e agradável.

Ainda segundo os autores, para que todas as importâncias descritas anteriormente sejam realmente alcançadas, é necessário um bom modelo de planejamento financeiro, o qual aborde todos os fatores que possam interferir na vida financeira.

Empresa versus família

Segundo Hoji (2009, p. 11), o objetivo econômico e financeiro de uma empresa é:

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A maximização de seu valor de mercado, por meio de geração contí-nua de lucro e caixa no longo prazo, executando as atividades ineren-tes ao seu objetivo social, pois, com o aumento do valor da empresa, o proprietário [...] (acionista [...] cotista [...] ou o proprietário de uma empresa individual) aumenta sua própria riqueza.

O autor ressalta que existem vários envolvidos no processo de ge-ração de lucro de uma empresa. São eles: bancos, fornecedores, clientes, concorrentes, comunidade, governo, investidores, entre outros.

Já em uma família, o seu objetivo econômico e financeiro é, também, de longo prazo e não difere tanto do objetivo econômico e financeiro de uma empresa. O autor define-o como “[...] a maximização de seu patri-mônio por meio da profissão (objetivo pessoal de longo prazo, correspon-dente ao objetivo social de empresa)” (HOJI, 2009, p. 13).

O autor destaca, também, o princípio da continuidade que ocorre em diversas famílias tradicionais, existentes há várias gerações, nas quais todos trabalham durante anos e, após certa idade, aposentam-se e são substituídos pela nova geração.

Nível de conhecimento e qualidade do planejamento financeiro

Claudino et al. (2009), em uma pesquisa realizada com servidores públicos técnico-administrativos de uma instituição pública, visando obter informações relacionadas ao nível de conhecimento em educação financeira e endividamento dos colaboradores, revelam que a maior parte dos entrevistados possuem um grau de endividamento considerado nor-mal, mas outra boa parte já encontra-se em risco de sobre-endividamento. Sobre o grau de conhecimento em finanças pessoais, o mesmo foi detecta-do como insuficiente. Muitos dos entrevistados não têm controle rigoroso sobre os seus gastos, e, consequentemente, não realizam um planejamento financeiro adequado.

Todavia, acredita-se que esse controle não é feito apenas por pregui-ça ou falta de tempo. Segundo Leal e Melo (2008), há uma relação direta

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entre o nível de educação financeira do indivíduo e o grau de qualidade do seu planejamento pessoal. Os autores afirmam que tal conhecimento se torna privilégio dos estudantes de Administração, Economia e Ciências Contábeis, os quais se demonstram, também, como os mais interessados no assunto.

A consequência dessa falta de conhecimento no assunto é o endivi-damento, o qual, por sua vez, resulta em problemas pessoais (na família) e profissionais (na empresa), dentre os quais é possível citar o estresse e o presenteísmo.

Estresse e presenteísmo – queda na produtividade

Toda organização com fins lucrativos, sem exceção, tem como prin-cipal objetivo o lucro; nenhuma organização se mantém em funciona-mento apenas para gerar emprego e produzir produtos à população (MA-XIMIANO, 2000).

É sabido, também, que nenhuma organização realiza seus processos operacionais sozinha; uma organização é composta de pessoas, de colabo-radores.

Nesse sentido, para que a empresa se torne produtiva, para que gere lucro, é necessário que os seus colaboradores estejam motivados com o trabalho exercido, satisfeitos com o ambiente organizacional no qual pas-sam a maior parte do seu dia.

Muitas empresas não dão importância aos sentimentos, às emoções, aos fatores que atingem tanto a vida pessoal quanto a profissional de seus colaboradores. Pelo contrário, preocupam-se apenas com a queda na pro-dutividade que porventura ocorra em cada mês; elas não verificam deta-lhadamente o motivo dessa queda.

Na maioria das vezes, a queda na produtividade do indivíduo está relacionada a fatores externos à organização. Infelizmente, é praticamente impossível, apesar de ser necessário, o ser humano conseguir separar sua vida pessoal da profissional.

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Um dos fatores psicológicos mais comentados na atualidade, carac-terizado até mesmo como a “doença do século 21”, é o estresse, o qual ocorre, segundo Robbins (2005), devido a fatores ambientais, organiza-cionais e individuais.

Como exemplo de fatores ambientais causadores do estresse nos funcionários, Robbins (2005) cita uma possível especulação de recessão econômica, a qual, por sua vez, gera insegurança ao trabalhador.

Já os fatores organizacionais são mais amplos e estão relacionados à pressão no cumprimento de metas, à carga excessiva de tarefas, chefes insensíveis, colegas desagradáveis, entre outros (ROBBINS, 2005).

Os fatores individuais, ainda segundo o autor, incluem problemas familiares (problemas no casamento ou com os filhos), econômicos (falta de dinheiro) e características de personalidade (pessoas com pensamento negativo).

Segundo Robbins (2005, p. 441):

Os problemas econômicos enfrentados pelos indivíduos que sempre gastam mais do que têm [...] podem gerar estresse e desviar a atenção do trabalho. Independentemente da faixa salarial [...]. Algumas pes-soas são péssimas administradoras de seu dinheiro ou sempre que-rem ter o que não podem pagar.

De acordo com Pereira (2009):

Hoje, boa parte dos trabalhadores tem quase a totalidade de seu sa-lário comprometida com dívidas, empréstimos e afins. O salário cai na conta simplesmente para pagar aos bancos e outros credores. Os produtos que deveriam trazer alegria trazem dores de cabeça e desâ-nimo; a produtividade cai.

Todavia, a causa do endividamento não está diretamente relacionada à remuneração da empresa ao colaborador; pelo contrário, está relaciona-da ao mau uso que ele próprio faz do seu dinheiro, ou seja, à gestão de sua renda. Um funcionário com dívidas, conforme afirma Pereira (2009), tor-

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na-se improdutivo. Aliado a essa improdutividade surge o presenteísmo, ou seja, o corpo do colaborador está presente, mas sua mente está ausente, ele não consegue mais render 100% no trabalho que lhe é solicitado.

Goetzel et al (2004 apud OGATA; SIMURRO, 2009, p. 57):

[...] analisaram as dez condições de saúde mais comuns nas empre-sas e concluíram que o presenteísmo é responsável por custos mais elevados com assistência médica do que com absenteísmo, sendo o responsável por 18 a 60% de todos os custos.

Remp (2004 apud OGATA; SIMURRO, 2009, p. 57) complemen-ta, ressaltando que: “[...] o presenteísmo constitui-se num fator quase in-visível, mas que drena significativamente a produtividade dos trabalhado-res”.

Desse modo, é possível detectar o quão importante se torna a rea-lização de um planejamento financeiro para as famílias em geral, prática essa muito importante em qualquer organização. Detecta-se, também, o quanto a organização se torna responsável em ajudá-lo nessa jornada. “É hora das empresas perceberem que a educação financeira é uma grande aliada da responsabilidade no trabalho, do desempenho de suas equipes e da busca de bons resultados” (PEREIRA, 2009).

Uma vida financeira organizada produz tranquilidade ao indivíduo e, consequentemente, maior rendimento deste em seu trabalho.

3. EDUCAÇÃO FINANCEIRA: UM INVESTIMENTO NE-CESSÁRIO

Como afirma Cerbasi (2012), “Educação financeira não vem de ber-ço, e ainda não vem da escola também”.

Apesar de ser de vital importância, infelizmente não se tem a Educa-ção Financeira como disciplina obrigatória nas grades curriculares; isso se torna privilégio apenas de países desenvolvidos.

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Em decorrência dessa falta de informação, de educação, percebe-se que muitas famílias se endividam devido à má administração do seu din-heiro e, com isso, procuram sempre o caminho mais fácil na hora do “ap-erto”, ou seja, os empréstimos.

Na atualidade, é cada vez mais crescente o número de créditos ofe-recidos à população, a qual não sabe administrá-los corretamente e até mesmo evitá-los, optando por uma forma em que não ocorram os juros.

Para agravar ainda mais essa situação, as empresas, em parceria com os bancos, passaram a disponibilizar o conhecido empréstimo consignado aos seus colaboradores. Esse tipo de empréstimo, praticado com taxas de juros menores que as do mercado, traz garantias ao banco e diminuem o risco de inadimplência, pois o mesmo é descontado em folha de paga-mento.

Entre os benefícios financeiros, as linhas de crédito (como o em-préstimo consignado) são tão populares quanto os planos de saúde, como se o endividamento estivesse na base de nossa pirâmide de ne-cessidades. Crédito é útil, mas desde que usado com planejamento e inteligência, preferencialmente por quem já poupa. Não é o que acontece com quem é incentivado a se endividar antes de ser convi-dado a participar, por exemplo, de um plano de previdência privada. (CERBASI, 2012).

Como aponta Cerbasi (2012), é preciso certo grau de conhecimento ao adquirir esse empréstimo, ou mesmo uma orientação prévia da empresa ao colaborador que o solicita. Certamente a pessoa que se submete a um empréstimo desse tipo está passando por problemas financeiros pelo fato de não ter informações suficientes sobre como controlar suas finanças.

Segundo a OCDE (2004, p. 223 apud SAITO; SAVOIA; PETRO-NI, 2006, p. 1122):

Educação financeira sempre foi importante aos consumidores, para auxiliá-los a orçar e gerir a sua renda, a poupar e investir, e a evitar que se tornem vítimas de fraudes. No entanto, sua crescente relevân-

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cia nos últimos anos vem ocorrendo em decorrência do desenvol-vimento dos mercados financeiros, e das mudanças demográficas, econômicas e políticas.

Ainda de acordo com a OCDE (2005 apud SAITO, SAVOIA; PE-TRONI, 2006, p. 02):

A Educação Financeira pode ser definida como o processo em que os indivíduos melhoram a sua compreensão sobre os produtos fi-nanceiros, seus conceitos e riscos, de maneira que, com informação e recomendação claras, possam desenvolver as habilidades e a con-fiança necessárias para tomarem decisões fundamentadas e com segurança, melhorando o seu bem-estar financeiro. Desta forma, a Educação Financeira extrapola o simples oferecimento de informa-ções financeiras e de conselhos, sendo que estas atividades devem ser regulamentadas, em específico, no que refere à proteção dos clientes.

Percebe-se, dessa forma, que a educação financeira é necessária não somente para saber controlar as finanças e aprender a poupar; ela extrapo-la esse simples conceito, estendendo-se aos conhecimentos obtidos para que se tenha condições e informações necessárias para realizar, com segu-rança, futuros investimentos e, consequentemente, aquecer a economia do país.

Nesse contexto, o investimento da empresa em um programa de edu-cação financeira que proporcione aos seus colaboradores conhecimentos básicos de finanças, bem como sugestões de como controlar seu orçamen-to mês a mês, indicando a eles onde é possível economizar e reduzir cus-tos, torna-se indispensável.

Segundo Massaro (2013):

Em um mundo ideal, a empresa pagaria o salário aos empregados (integralmente e tempestivamente) e esses usariam os recursos rece-bidos da forma mais racional e sensata possível, e tudo estaria resol-vido. Mas no mundo real, os empregadores precisam começar a se

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preocupar com a forma como seus empregados administram suas próprias finanças, sob o risco de acabarem gerando um problema (inclusive financeiro) para elas mesmas.

Com o programa em ação, o trabalhador se sentirá amparado pela empresa, e esta, por sua vez, terá como recompensa o bom desempenho desse trabalhador em suas tarefas.

Como inserir o programa – parceria com institutos

A educação financeira não pode ser entendida somente como a in-clusão e apresentação de palestras relacionadas ao tema; ela deve ser tra-tada como responsabilidade social na empresa, estendendo-se, inclusive, a todos os familiares (DOMINGOS, 2010).

Para a implantação do programa, de acordo com Domingos (2010), é importante que a empresa conscientize-se de que:

• É fundamental evitar a disponibilização de crédito consignado aos colaboradores antes de conhecer com maiores detalhes a sua real necessidade, pois, a conscientização da aquisição do crédito solicitado é um dos primeiros passos para inserção do programa.

• É importante desenvolver novos hábitos e costumes relaciona-dos à utilização do dinheiro; o colaborador deverá estar ciente disso.

• O programa deve ser estendido a todos os colaboradores, sem exceção, inclusive àqueles com alto salário. Como foi mencio-nado anteriormente, o problema não está no quanto se ganha e sim no quanto se gasta; e isso atinge até os mais altos salários da empresa.

Assim como as empresas, diversos institutos já vêm disponibilizan-do em seus sites informações sobre educação financeira. Eles procuram, de uma forma simples, mas objetiva, orientar o consumidor sobre o uso

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consciente do dinheiro. Alguns deles até propõe a formação de parcerias, o que se torna uma ótima opção para a empresa.

O Banco Central do Brasil (BACEN), por exemplo, disponibiliza em sua página um Programa de Educação Financeira (PEF-BC) que tem como objetivo:

[...] disseminar conhecimentos sobre assuntos econômico-financei-ros para a sociedade, oferecendo-lhe condições para refletir a respei-to da responsabilidade de cada pessoa no planejamento e na admi-nistração econômica, apercebendo-se do papel do Banco Central e dos agentes financeiros, de forma a gerar uma consciência que se reverta em práticas para a melhoria da qualidade de vida. (BRASIL, 2013).

O PEF-BC está aberto a futuras parcerias com instituições públicas, organizações não governamentais, empresas públicas e privadas, desde que ambas visem ao mesmo objetivo, ou seja, contribuir com o exercício da cidadania (BRASIL, 2013).

O Serasa Experian também apresenta em sua página uma parte desti-nada à orientação financeira. Lá estão disponibilizados diversos simulado-res que realizam cálculos on-line, os quais estão relacionados a orçamento, como quitar as dívidas do cartão de crédito, como planejar a aposenta-doria, entre outros. Além dos simuladores, o site disponibiliza guias de orientação ao consumidor.

Outro instituto que apresenta um excelente espaço para orientação de seus clientes quanto ao uso consciente do dinheiro é o Itaú. O espaço é bem dinâmico e composto por vídeos de fácil entendimento, cada um de-les responde determinada dúvida relacionada ao controle do orçamento. Há, também, vários simuladores, artigos e testes.

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Benefícios à empresa e ao colaborador

A princípio, imagina-se que a inserção do programa traga benefícios somente para o colaborador, mas, na realidade, é uma “via de mão dupla”, proporcionando recompensas também para o empregador.

Para este último, é possível mencionar, com tamanha segurança, a redução dos pedidos de empréstimo consignado, adiantamentos salariais (vales), de décimo terceiro e férias, além, é claro, do aumento da produti-vidade (MASSARO, 2013).

Em um programa inserido pela Volvo do Brasil, por exemplo, foi constatada uma redução de 60% nos pedidos de auxílio financeiro ao se-tor de RH. Como incentivo, a empresa fornece diplomas aos participan-tes que conseguem reduzir o endividamento (MARQUES, 2009).

O colaborador, por sua vez, trabalha mais motivado, pois sente de perto a preocupação da empresa em ajudá-lo e orientá-lo. Ele passa a obter informações que antes não faziam parte de sua rotina. E é dessa forma, consciente e preparado para gerir suas receitas, com a sua vida financeira em ordem, que ele passará a produzir mais, pois não terá mais preocupa-ções. E passará a entender que o problema, na maioria das vezes, como já foi mencionado, não está no quanto ele ganha, mas, sim, no quanto ele gasta, no mau uso que faz do seu dinheiro (CERBASI, 2012; DOMIN-GOS, 2010; MASSARO, 2013).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a revisão bibliográfica realizada, foi possível perceber a impor-tância da elaboração de um planejamento financeiro tanto no ambien-te familiar como no ambiente empresarial. Percebeu-se, também, que a grande maioria dos trabalhadores não mantém um controle rigoroso so-bre suas receitas e despesas, o que os levam ao endividamento. Todavia, ficou constatado que esse controle não é feito somente devido à falta de

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interesse do trabalhador, mas, também, porque ele não possui um conhe-cimento mínimo para entender essa prática. Ficou constatado que um trabalhador com dívidas se torna improdutivo, pois carrega consigo pro-blemas emocionais, como, por exemplo, o estresse.

Portanto, antes que isso ocorra, é fundamental que as empresas pro-curem uma forma de orientar seu colaborador na utilização do dinheiro que é recebido por ele, pois, de certa forma, ela também é responsável por essa situação ao, por exemplo, oferecer aos seus colaboradores o em-préstimo consignado. Em algumas ocasiões, quando utilizado de forma consciente, esse empréstimo é válido, pois é praticado com taxas menores que as do mercado. Porém, é preciso uma análise prévia, uma orientação antes da sua aquisição.

Dessa forma, recomenda-se, como já foi feito no decorrer do presen-te trabalho, a implantação de um programa interno de Educação Finan-ceira, o qual proporcione ao colaborador um conhecimento básico sobre finanças pessoais, que o ajude a identificar onde estão seus maiores gastos e como fazer para reduzi-los. É preciso conscientizar esse trabalhador no uso do dinheiro recebido; é como se fosse um processo de treinamento desse colaborador em uma nova função dentro da empresa, só que um treinamento que proporcionará a ele uma satisfação pessoal. É bem prová-vel que esse programa, se transmitido a todos os colaboradores da empresa (até àqueles com mais altos salários), proporcione retornos para ambas as partes.

Antes da implantação, sugere-se uma pesquisa aprofundada com todos os colaboradores da empresa visando constatar o seu nível de co-nhecimento sobre finanças pessoais e se o planejamento financeiro já é praticado por eles. Sugere-se, também, um levantamento junto ao Depar-tamento Pessoal (ou responsável) sobre a frequência de solicitações de adiantamentos salariais, 13º salário, férias e acordos rescisórios. Com esse levantamento, será possível realizar comparações visando testar a eficácia do programa implantado.

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Authors: Aline de Fátima Guedes da Silva; Randal Farago.

ABSTRACT: This study’s main objective is to demonstrate the importance of companies to deploy an internal program of financial education, which provides their employees an awareness of the use of money and a better knowledge about finance. In companies it is notorious the importance of financial control, because it is a management tool that tracks and provides an overview of incomes and expenditures, as well as demonstrates excessive spending and lack of receipts. With this tool the company is able to set goals and objectives and therefore make a profit. Just as in business, in personal life the control is also necessary because it is increasing the number of credits available in the market, which requires knowledge when acquiring them. That knowledge is restricted to those of financing, accounting and economics areas. Due to this lack of knowledge people get into debt and that debt brings personal and professional consequences. A person in debt with his/her budget completely disorganized, it is detrimental to the company, becoming unproductive. Thus, as from a bibliographical survey, some fundamental concepts related to the topic were analyzed and then presented the main benefits that are obtained by inserting an awareness program on the use of money.Keywords: Financial Planning. Financial Education. Personal Finance. Indebtedness. Credit.

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A tragédia grega como elemento constitutivo da formação integral do homem grego: uma análise segundo Jean-Pierre Vernant

Deucyr João Breitenbach1

Resumo: A presente pesquisa procura demonstrar a inter-relação existente entre o pensamento de Jean-Pierre Vernant e a concepção de tragédia grega, conforme os pressupostos da identidade trágica e da ambiguidade e reviravolta encontrada naquele que transita pela estrutura do trágico, a dizer, as condições sociais e psicológicas da tragédia grega. Por meio do pensamento racional, Jean Pierre Vernant, um dos mais renomados helenistas da atualidade, principalmente no que confere ao estudo e pesquisa da época clássica dos gregos, apresenta a tragédia como elemento essencial de formação integral do homem inserido na cidade. Para Vernant, o essencial de toda tragédia se desenvolve na existência cotidiana, num tempo humano, opaco, feito de presentes sucessivos e limitado num além da vida terrena. Num tempo divino, onipotente, que abrange em cada instante a totalidade dos acontecimentos, ora para ocultá-los, ora para descobri-los, mas sem que nada se escape a ele, nem se perca no esquecimento. Unir humano e divino, teoria e prática, mito e política, religião e vida social, são estes o alicerce que caracterizam o ambiente trágico como elemento constitutivo da tragédia grega.

Palavras-chave: Tragédia. Formação do Homem Grego. Identidade trágica.

1 Especialista em Gestão Educacional pela Fundação Educacional Getúlio Vargas (FGV), na área de Tecnologias da Inteligência e Comunicação. Especialista em História Cultural e Moderna. Graduado em Filosofia pela Universidade Católica Dom Bosco. Tutor do Claretiano – Centro Universitário. Atua como Pesquisador nas áreas de Educação, Filosofia e Ciência da Informação. E-mail: <[email protected]>.

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1. INTRODUÇÃO

Comumente, entre nós, modernos, a palavra “tragédia” é aplicada para designar um acontecimento funesto ou sinistro. Encontra-se a pala-vra “tragédia” em todos os meios de comunicação. Não raramente, a de-signação “tragédia” evoca eventos que, de certa forma, nos lembram de algo ruim, caracterizado por fatalidade, irracionalidade, formas diversas de violência à dignidade humana e planetária.

A atualidade do trágico é tão forte que não se pode pensá-lo fora de nós. O trágico se faz mais presente do que nunca, basta analisar a própria compreensão de morte, quando não em seus limites normais de velhice, ou mesmo física e biológica, diante de acontecimentos inesperados, a ex-pressão utilizada para tal acontecimento é sempre “tragédia”.

Esta pesquisa fomenta explicitar diversamente ora o homem e sua autonomia, ora o homem e sua relação com o divino, sua perspectiva com o âmbito social e político da cidade, bem como sua convicta relação com a designação trágica que se faz existir quando da citação dos preceitos da tragédia grega como elemento de formação do homem grego.

Trata-se de analisar a tragédia em um momento fundamental da vida social da Grécia Antiga, bem como o desenvolvimento da pólis2 e dos ho-mens que, por meio desta prática, se reconhecem como membros dignos da cidade e de suas atividades.

A tragédia grega marca um período profundamente necessário para o florescimento da base cultural, social e política da Grécia, delineando novos elementos à organização da cidade. A tragédia, devido ao formato da ação dramática, apresenta em cena a montagem de uma experiência que visa esclarecer a existência do homem e seu destino3.2 A pólis é o centro principal a partir do qual se organiza historicamente o período mais importante da evolução grega. Estado e pólis são equivalentes. Embora já no período clássico existam formações estatais de maior extensão territorial, trata-se sempre de confederações de cidades, Estados mais ou menos independentes. Só na pólis se pode encontrar aquilo que abrange todas as esferas da vida espiritual e humana e determina de modo decisivo a sua estrutura (JAEGER, 2003, p. 106-107).3 Potência misteriosa e personificada, (nomeadamente, na tragédia grega e no estoicismo), rege o devir universal, incluindo o curso da história humana, sem qualquer possibilidade de intervenção da vontade ou da previsão do homem. Contrariamente ao determinismo, o destino é uma lei cega, fixada de antemão, que o homem não conhece e à qual está sujeito e não consegue escapar. Como tal, significa uma recusa da autonomia e liberdade. (cf. www.ocanto.esenviseu.net/lexd.htm). Acessado em: 09/09/2012.

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Demonstrar-se-á que a tragédia grega comporta vários significados e elementos que por vezes não a definem por completo. Vernant4 afirma que, à luz da dramaturgia, o homem não aparece delineado como uma natureza estável, uma essência que poderia ser delimitada e definida, mas como um problema; ele adquire a forma de uma interrogação, de um questionamento.

Na tragédia, o personagem trágico é uma criatura ambígua, enigmá-tica e desconcertante: ao mesmo tempo agente e agido, culpado e inocen-te, livre e escravo, destinado por sua inteligência a dominar o universo e incapaz de governar a si mesmo, associando o melhor e o pior. Nesse senti-do, duas questões colocaram em movimento este trabalho de pesquisa. A primeira refere-se à estrutura da tragédia enquanto fortemente necessária para a busca de uma identidade do homem grego. E a segunda é relativa à contribuição que esse modo de se expressar trouxe em termos de bene-fícios para o desenvolvimento social e humano do homem grego inserido na pólis.

Não obstante as limitações de uma primeira aproximação dessa com-plexa temática em Vernant, este texto pretende cobrir os aspectos princi-pais concernentes à construção do processo de elaboração da tragédia gre-ga e, com isso, irradiar parte de uma qualidade inerente à tragédia, a saber, provocar admiração e prazer naquele que transita na estrutura do trágico.

2. TRAGÉDIA GREGA: CONDIÇÕES SOCIAIS E PSICO-LÓGICAS

A tragédia, compreendida em seus aspectos de maior importância, se refere a um gênero literário original, possuidor de regras e caracterís-ticas próprias, não é especificamente algo determinado e bem explicado.

4 Vários motivos conferem caráter de relevância a esta pesquisa. A princípio, Vernant é um estudioso cujo método está caracterizado pela historiografia. Pelos clássicos, Vernant procura aproximar o universo grego do contemporâneo, fugindo das teorias consagradas sobre a Grécia antiga. Jean-Pierre Vernant nasceu em Provins, na França, em 4 de janeiro de 1914.

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Pelo contrário, atuam na tragédia dois elementos opostos, mas ao mesmo tempo estreitamente solidários um com o outro, o coro e a personagem trágica.

A tragédia necessita unir humano e divino. Vernant e Vidal-Naquet (2005, p. 08-09), ressaltam que, diante do aspecto trágico dado à tragé-dia, é preciso igualmente que esses dois planos não deixem de aparecer como inseparáveis um do outro, e se o forem, não é tragédia. Por isso, toda tragédia desenrola-se, necessariamente, sobre dois planos, e são esses dois planos que vão provocar uma tensão, pois está inserido tanto no nível dos homens da cidade real, quanto dos deuses, das forças religiosas que obscu-ramente agem no mundo.

Não há decisão humana mediante as próprias ações humanas que não esteja inscrita em um ambiente para os homens lidarem com as encru-zilhadas criadas pelos deuses. “Onde há decisão humana, há deuses pro-vocando seu destino”, afirmam Vernant e Vidal-Naquet (2005, p. 15). E é a relação do homem com os deuses que o homem trágico vivencia como sendo problemático por se situar entre dois universos diferentes e contra-ditórios, onde, por um lado, a preocupação se volta para o bem da pólis e, por outro, há forte presença de valores heroicos.

No caso do homem trágico, sua participação ocorre na vida humana, na vida social tal qual ele mesmo vivencia no mundo real, só que por meio de influências divinas, nunca por si só e do seu jeito, mas sempre com um cunho divino que lhe ocupa.

Vernant (2002a, p. 372) mostram que, “[...] o homem trágico é um homem duplo, dilacerado, problemático. Um homem que se pensa como ele é, porque se reconhece na imagem de si que os outros lhe oferecem”. A tragédia grega quer demonstrar, a partir de dados concretos, questões sobre o homem, sua natureza, sua problemática, sua relação com seus atos. Segundo Vernant e Vidal-Naquet (2005, p. 73): “Todos os trágicos gregos recorreram à ambigüidade como meio de expressão e como modo de pen-samento. Mas o duplo sentido assume um papel bem diferente conforme seu lugar na economia do drama e o nível da língua em que o situam os poetas trágicos”.

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As ambiguidades, as reviravoltas, as palavras com duplo sentido, as contradições e tensões são aspectos que fornecem à tragédia grega bene-fícios próprios e que fazem realmente a diferença no contexto da análise trágica dos dramas, das representações diante da pólis e dos “heróis” da Grécia Antiga.

A tragédia se destaca como criadora de um personagem que não se compreende em nada. O que marca o espetáculo trágico, diz Vernant, são dois mundos de diferentes realidades, pois:

[...] ora projetada num longínquo passado mítico, herói de uma ou-tra época, carregado de um poder religioso terrível, encarnado todo o descomedimento dos antigos reis da lenda, ora falando, pensando, vivendo na própria época da cidade, como um burguês de Atenas no meio de seus concidadãos. (VERNANT; VIDAL-NAQUET, 2005, p. 13).

Essas contradições se dão em um espaço cênico e, em vez de estabe-lecer a comunicação e o acordo entre as personagens que representam, su-blinham, ao contrário, uma rixa de ideias em que cada personagem desen-volverá um tipo de interpretação. É aí que se afirma que “[...] cada herói, fechado no universo que lhe é próprio, dá à palavra um sentido e um só” (VERNANT; VIDAL-NAQUET, 2005, p. 74).

Segundo Vernant, essas obras dos dramaturgos elaboram um modo novo de se compreender o homem em suas relações com o próprio ho-mem e com os deuses, também consigo mesmo e com seus atos. É essa a característica que vai ressaltar no herói trágico sua visão trágica; não há visão trágica fora da tragédia. Essa ambiguidade das palavras “[...] o dramaturgo joga com ela para traduzir sua visão trágica de um mundo dividido contra si mesmo, dilacerado pelas contradições” (VERNANT; VIDAL-NAQUET, 2005, p. 73-74).

O momento histórico da tragédia descrita por Vernant faz parte de uma estrutura na qual se apresentam personagens no palco, que camu-flam, na atualidade do espetáculo, todas as aparências da existência real.

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O que se representa no momento são lendas heroicas, ausentes da reali-dade quotidiana do público. Vernant chama essa ausência da realidade de “[...] ‘consciência do fictício’ por ser justamente um fato de fingimento, do imaginário, em que se constitui como espetáculo dramático responsável por provocar piedade e temor em quem as assiste (VERNANT; VIDAL--NAQUET, 2005, p. 162).

Nesse novo quadro do imaginário dado à tragédia, sua condição so-cial aparece delimitada com muita precisão em meio ao que se pode atri-buir como forma de aspecto trágico do personagem que representa para um determinado público.

O coro antigo, ainda em meados de seu desenvolvimento, quando ainda não se faziam presentes nem atores nem protagonistas nos espe-táculos, davam qualidade unicamente ao “lirismo coral” (VERNANT; VIDAL-NAQUET, 2005, p. 02), que eram cantos. Mais tarde, inseridos os protagonistas do drama no coro, infligem essa lei, dialogam entre si e são trazidos à cena para que os espectadores os vejam.

O que realmente privilegia a tragédia no campo social é sua escrita, pois somente depois de escrita e de representada é que ela assume para si um valor e sentido próprio. A tragédia, diz Vernant (2005), em si mesma, sem provocar repercussão nos demais que a representam ou que a assistem não se torna o que é, uma tragédia grega.

O essencial de toda tragédia se desenvolve na existência quotidiana, num tempo humano, opaco, feito de presentes sucessivos e limita-dos num além da vida terrena, num tempo divino, onipotente, que abrange a cada instante a totalidade dos acontecimentos, ora para ocultá-los, ora para descobri-los, mas sem que nada escape a ele, nem se perca no esquecimento. (VERNANT, 2005, p. 20).

Na tragédia, não se intensifica de um lado o mundo humano real, e, de outro, o mundo divino, mundo dos deuses. Nesses dois campos, “[...] interligados coerentemente, as intenções humanas são claramente ligadas às influências divinas” (VERNANT, 2006, p. 53). Se não há dimensão humana interligada com dimensão divina, não há tragédia.

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Vernant (2005, p. 04) destaca que o domínio próprio da tragédia se dá não somente em atos humanos ou então em atos divinos separados do humano, pois, nessa zona fronteiriça, os atos humanos vêm articular-se com as potências divinas e, por isso, é a tragédia revelada como verdadeira prática completa de sentido, “[...] um sentido que ultrapassa o homem e a ele escapa” (VERNANT, 2005, p. 07). Tanto o divino quanto o humano devem se unir para que haja tragédia.

Mais do que representar heróis que mantêm contatos com deuses e são mais importantes do que os homens, “[...] na tragédia o próprio ho-mem trágico quer se expressar apresentando problemas humanos, proble-mas do homem na cidade e da cidade, porém, a presença do trágico na sociedade grega só existe na tragédia” (VERNANT, 2000, p. 46). Esta é um fenômeno literário que cria o trágico: “[...] quando a tragédia funcio-na, então podemos dizer que existe um homem trágico, e esse homem trá-gico não é trágico por que é, mas porque está na tragédia” (VERNANT, 2002b, p. 364).

A tragédia só existe quando ela começa no trágico, sai do trágico, volta no trágico. Ela é algo que é, nunca deixou de ser, sempre foi. Vernant diz que, para que possa existir uma tragédia, “[...] é preciso reunir algumas condições, mas estas condições devem ser levadas em conta por poetas, espetáculos, um gênero que lhes dêem o aspecto particular que a tragédia soube formatar. Afora isto, não existe trágico” (VERNANT, 2002a, p. 364-365).

Não se vê florescer uma invenção de tragédia grega se limitando à produção de obras literárias, de fenômenos religiosos destinados aos ci-dadãos e adaptados a eles, de espetáculo, imitação, da criação de um sujei-to que, para Vernant, é o indivíduo em seu próprio nome, aquele que se mostra com certos traços que fazem dele um ser singular especificamen-te. Maior que isso, a tragédia abrange, segundo Vernant e Vidal-Naquet (2005, p. 214) “[...] uma consciência trágica, o advento de um homem trágico”.

A consciência trágica através do espetáculo demonstra, por meio da mensagem trágica, um conhecimento sobre o universo conflituoso, abrin-

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do-se a uma visão problemática do mundo. Essa nova consciência trágica só vem à tona porque, diante da nova condição de imagem do homem, os cidadãos fazem tanto de si mesmos como de sua cidade lugar de tragédia.

A consciência trágica não faz referência somente ao cidadão que se preocupa diante da cidade com sua própria imagem exterior, mas diante de todas as suas condições sociais. No segredo de sua consciência pessoal, ela mostra “[...] uma imagem fictícia, encenada segundo as necessidades da atualidade, um simulacro como a publicidade” (VERNANT, 2002b, p. 343-344).

A tragédia, como esclarecem Vernant e Vidal-Naquet (2005, p. 271), não era o reflexo do contexto da cidade na qual estava inserida, era uma instituição social, religiosa e política que se constituiu como um espetácu-lo formador de cidadania. Por isso, é a própria consciência do fictício que está armada na tragédia.

Segundo Werner Jaeger5 (2003, p. 296-297), “[...] a elaboração da consciência trágica se reveste de um conteúdo dado pela tragédia na trans-gressão dos atos do personagem que não se reconhece mais”.

A tragédia é considerada também uma forma de educação que não se trata somente de um divertimento, mas, no espetáculo trágico, en-contram-se dois aspectos que definem a vida política grega: primeiro, a responsabilidade da comunidade pela organização de todos os detalhes práticos, e segundo, um aspecto religioso vinculado ao aspecto político, posto que fizesse parte das Dionisíacas urbanas.6

5 Essa obra famosa de Jaeger é um dos marcos da cultura do nosso tempo, sendo um estudo profundo e completo sobre os ideais de educação da Grécia Antiga. Jaeger estudou a interação entre o processo histórico da formação do homem grego e o processo espiritual através do qual os gregos chegaram a elaborar seu ideal de humanidade.6 “Com origem na época de Péricles, as Grandes Dionísias ou Dionisíacas Urbanas constituíam um ponto culminante e festivo na vida religiosa, intelectual e artística da cidade-Estado de Atenas. Enquanto as mais modernas Dionisíacas rurais, que aconteciam em dezembro, possuíam um caráter puramente local e eram patrocinadas de per si pelos diferentes demos da Ática, Atenas ostentava todo o brilho representativo de capital nas Grandes Dionisíacas, de seis dias de duração. Especialmente depois da fundação da confederação naval ática, embaixadores, comerciantes e tributários afluíam a Atenas nesta época de toda a Ásia Menor e das Ilhas do Egeu” (BERTHOLD, 2001, p. 113).

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Em uma primeira aproximação, pode-se entender a tragédia contan-do os problemas da cidade no momento presente, sem se remeter a um passado longínquo, porém a tragédia não é isso, não existe para represen-tar os problemas dos cidadãos naquele momento, mostrando personagens daquele momento.

As tragédias representadas adotam como tema a lenda dos heróis e, por isso, a tradição oral como instrumento. Assim, ponderou Vernant (2002b, p. 362), “[...] as tragédias não falam do presente das cidades. Na tragédia, não se pode contar as próprias desgraças das pessoas, histórias que chocam as pessoas”.

O modo trágico, diz Vernant, é um modo patético que coloca per-guntas sobre o homem, evidencia interrogações na vida desse homem, mostra questionamentos que privilegiam as ações e não a cidade presente tal qual ela se encontra.

A tragédia não é isso. A tragédia é representar personagens maiores, heróis dos tempos antigos, lendas que todos conhecem que, claro, vão emocionar, mas como as fábulas que se contam às crianças as emocionam. Ao mesmo tempo, sabem que não é de verdade. (VER-NANT, 2002a, p. 363-364).

A tragédia se torna a “mola mestra” entre um passado distante, pas-sado do mito, passado das narrativas épicas das grandes lendas heroicas, e um presente das instituições políticas, como o advento de uma nova mentalidade sobre a concepção de uma cidade democrática, uma cidade coletiva.

Vernant (2002b, p. 442-443) sugere, ainda, que “[...] a passagem do mito para a razão deve muito à ‘mola trágica’, já que ela teria impulsionado a cristalização de idéias como função, oposta é claro, à realidade”.

O que faz a tragédia é apresentar aos olhos do público figuras lendá-rias da cidade heroica falando e agindo diante dos espectadores de forma que estes se sintam incluídos na peça de maneira atual. Sua encenação im-plica um estar presente, uma presença real de personagens, pois “[...] essa

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presença, na língua dos trágicos, de uma multiplicidade de níveis, dá ao texto uma profundidade particular e exige que a leitura se faça, ao mesmo tempo, em vários planos” (VERNANT, 2005, p. 19).

A tragédia, afirma Vernant (2002a, p. 215-216), depois de escrita, “[...] só se tornava em sentido e em valor uma tragédia, quando encenada”.

Toda tragédia possui algo que vai além do homem trágico; este é pego de surpresa por acontecimentos que não esperava. E mesmo pensan-do realizar o certo diante da ação, cai e se torna resultado do próprio ato. Por isso, uma das máximas da tragédia é ter como base ninguém escapar ao seu destino. É esse, segundo Vernant (2005, p. 20), “[...] um dos aspec-tos da ironia trágica”.

Tratar do destino do homem trágico que “[...] quer guiar-se por seu próprio ethos (caráter), mas está subordinado ao gênio mau (daímon)” (COSTA; REMÉDIOS, 2005, p. 09), é tarefa fundamental para o estudo da tragédia grega. Por isso, “[...] através do desequilíbrio interno, incons-ciente (hybris), caracterizador do herói trágico, delineando-se o seu ethos com o daímon e a falha trágica que é a Hamartía, o personagem se esta-belece na relação com o expectador no efeito trágico” (COSTA; REMÉ-DIOS, 2005, p. 10).

Na concepção de Vernant, para que haja tragédia, o texto referente à própria representação diante dos cidadãos deve significar ao mesmo tem-po: “[...] no homem, o que se chama daímon é o seu caráter e inversamen-te, no homem, o que se chama caráter é realmente um daímon, um demô-nio” (VERNANT; VIDAL-NAQUET, 2005, p. 15). Até mesmo aqui se confunde no homem trágico seu aspecto de caráter muito importante.

O que não se pode confundir na tragédia é que o sacrifício, entendi-do como sacrifício do bode, não é o de um animal, mas um sacrifício hu-mano. A tragédia (2005b, p. 268), apresenta um homem empenhado na ação; é com a ação e pela ação que ocorre o sacrifício. Não é somente um sacrifício em honra aos deuses ou a atos divinos, mas por meio do sangue, está ligado com a cidade selvagem que a cerca.

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Note que Vernant e Vidal-Naquet (2005, p. 270-271) afirma que “[...] se há sacrifício do bode quando não de seres humanos, esse se torna, mediante o sacrifício, um animal desviado de seu sentido”.

Esse sacrifício humano não é estranho à tragédia, mas, em relação às práticas sociais da cidade grega, ele é duplamente desviado, é um sacrifício representado e, como sacrifício humano e não animal, um sacrifício cor-rompido.

O sacrifício é corrompido porque, ao invés de homenagear os deuses com gratuidade, os cidadãos gregos utilizam sacrifícios humanos, contra-riando, assim, o nascimento de cada indivíduo particular a partir do ins-tante em que os olhos se abrem para a luz, pois é desde aí que o homem está em dívida com os deuses.

É por meio do sacrifício que os homens vão poder criar um conta-to com os deuses, porém esse contato não será aceito totalmente quando tirado o bode como elemento de sacrifício e colocado o homem em seu lugar. O que os deuses desejam dos homens “[...] são cantos, procissões, danças, jogos, concursos e banquetes nos quais se consomem em comum a carne dos animais ofertados em sacrifício” (VERNANT, 2002a, p. 175).

Diante de todo esse drama trágico apresentado em um espetácu-lo para o público da cidade, havia algo mais intenso que caracterizava a tragédia. Sua estrutura mostrava aspectos em conformidade com as de-mais formas de instituições sociais da cidade grega, “[...] a tragédia estava presente na religião e no trabalho principalmente e, também fomentava como que um instrumento fundamental para a política que emergia na pólis” (VERNANT, 1999, p. 38).

A tragédia para os gregos aparece como a expressão de um tipo par-ticular de experiência humana ligada a condições sociais e psicológicas da cidade e do indivíduo.

A tragédia instaura, no sistema das festas públicas da cidade, um novo tipo de espetáculo; além disso, como forma de expressão espe-cífica, traduz aspectos da experiência humana até agora desapercebi-dos; marca uma etapa na formação do homem interior, do homem como sujeito responsável. (VERNANT, 2005, p. 01).

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A finalidade da tragédia, diz Vernant (2002b, p. 290-291), “[...] não é demonstrar a realidade social da pólis grega, mas questioná-la”. Não é apenas uma forma de arte, “[...] é uma instituição social que, pela funda-ção dos concursos trágicos, apresenta-se diante da religião e dos órgãos políticos e judiciários para a cidade que a assiste” (VERNANT, 2006, p. 37).

A busca pelo homem fez da tragédia uma busca pelo desconhecido. Mais do que analisar tragédias, buscando encontrar nelas algo religioso, ela comporta em si mesma algo de moral que tem como base a imaginação mítica.

Vernant (2002a, p. 347-348) destaca que a tragédia não pode ser ex-plicada reduzindo-a a certo número de condições sociais. Para ele (VER-NANT, 2005, p. 09-10), “[...] a tragédia comporta algo de maior impor-tância em todas as suas dimensões como fenômeno social e psicológico”.

É a condição humana que está em jogo na tragédia, ela propõe ao espectador um questionamento sobre si, seus limites. Ela traz consigo uma espécie de saber segundo o qual o homem, perante a vida social da cidade, preside a ordem de sua atividade.

Há tragédia quando, pela montagem dessa experiência imaginária que constitui um roteiro, com sua progressão dramatizada, como diz Aristóteles, dessa simulação de um sistema coerente de ações seguidas que conduzem à catástrofe, a existência humana acede à consciência, ao mesmo tempo exaltada e lúcida, tanto por seu preço insubstituível quanto por sua extrema vaidade. (VERNANT, 2005, p. 219).

A tragédia, além de utilizar lendas de heróis, confronta-as e as com-para aos novos modos de pensamento que marcam o advento do direito no quadro da cidade.

Na Grécia, segundo Vernant (2002b, p. 158), “[...] o pensamento jurídico tornou-se a verdadeira matéria da tragédia grega, pois favorecia o pensamento social da cidade”. E mesmo a resposta de Vernant e Vidal-

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-Naquet (2005, p. 18) sobre a pergunta “o que é tragédia grega?” é como segue: “[...] talvez a expressão de uma crise que se evidencia particular-mente no plano Institucional do direito público”.

Os gregos não têm a idéia de um direito absoluto, fundado sobre princípios, organizado num sistema coerente. Para eles há como que graus de direito. Num pólo, o direito se apóia na autoridade de fato, na coerção; no outro, põe em jogo potências sagradas: a ordem do mundo, a justiça de Zeus. (VERNANT, 2005, p. 03).

Esse debate jurídico será uma matéria da tragédia, porém a tragédia é bem diferente de um debate jurídico. Seu objeto é o homem que em si próprio vivencia esse debate, que por vezes é ambíguo, cheio de sentidos e nisso o homem trágico é coagido a fazer uma escolha definitiva.

O pensamento social que os gregos ocupavam era caracterizado pelo pensamento jurídico, um novo tipo de pensamento estava se desenvolven-do, era a Democracia, e esse pensamento, nas tragédias, era confrontado com as potências sagradas.

O mundo dos homens deveria se relacionar com o mundo dos deu-ses. Vernant (2005, p. 93) retrata que a “[...] potência de Zeus não está im-plicada apenas nas realidades naturais. Ela se exerce também nas ativida-des humanas e nas relações sociais”. A tragédia se ocupava do pensamento da cidade, fundamentalmente o pensamento social.

A tragédia torna possível, diante de uma cidade nova, democrática, o conhecimento de si mesma e por isso um questionamento sobre suas atitudes. Em outras palavras, a tragédia é uma ordem e uma desordem. A norma só é colocada para ser transgredida; por isso, o paralelo com o deus Dioniso, deus da confusão, deus da transgressão.

Através do espetáculo trágico, a própria cidade se questiona. Ora os heróis, ora o coro, encarnam sucessivamente valores cívicos e valores anticívicos. A tragédia também faz interligar-se o que a cidade sepa-ra, e essa interferência é uma das formas fundamentais da transgres-são trágica. (VERNANT, 2005, p. 280).

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A tragédia comporta em sua matéria um pensamento jurídico em pleno trabalho de elaboração. Vernant diz que a tragédia e as demais prá-ticas sociais, o vocabulário técnico do Direito na obra dos trágicos mostra as afinidades com os temas prediletos da tragédia, sendo esse vocabulário pertencente à competência dos tribunais.

Os poetas trágicos utilizam esse vocabulário do direito jogando de-liberadamente com suas incertezas, com suas flutuações, com sua falta de acabamento: imprecisão de termos, mudanças de sentido, incoerências e oposições que revelam discordâncias no seio do pró-prio pensamento jurídico, traduzem igualmente seus conflitos com uma tradição religiosa, com uma reflexão moral de que o direito já se distinguiria, mas cujos domínios não estão claramente delimitados em relação ao dele. (VERNANT, 2005, p. 04-05).

A tragédia que Vernant destaca cria, na concepção grega, debates so-bre temas políticos e morais que ocupavam as reflexões dos cidadãos e, por isso, delimitavam no tempo e no espaço uma forma de estudar o homem trágico diante da cidade e diante de si mesmo, seu momento histórico.

O Direito para os gregos não é uma construção lógica. Seus proce-dimentos são “pré-jurídicos”, não são fundados sobre princípios, ou então provêm de uma ideia de direito absoluto. Há, diante dos gregos, como que graus de Direito, pois num polo se utiliza coerção; no outro, põe-se em jogo potências sagradas que vão fornecer um aspecto trágico ao Direito.

A tragédia evidencia, principalmente, problemas morais que dizem respeito à responsabilidade do homem. A própria noção de Diké (justiça), comporta algo de irracional para os cidadãos; é isso que a tragédia mos-tra. “Uma Diké contra outra Diké, um direito que não está fixado; mas, se transforma em seu contrário, uma vez que os heróis trágicos são obri-gados a assumirem a vontade divina sem nenhuma restrição e negação” (VERNANT, 2005, p. 04-05). A tragédia, bem entendido, é algo muito diferente de um debate jurídico.

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Interrogando-se, a tragédia vai além da busca por um simples Di-reito ou mesmo de uma atividade política na qual os gregos se dedicaram com afinco e determinação; ela quer ultrapassar esses limites fazendo o que o Direito não pode fazer.

A leitura de Vernant sobre a tragédia aponta principalmente para uma reflexão acumulada sobre a comunicação, não só para um jogo de pa-lavras, mas para uma procura sobre que papel tem o homem no universo, quem é esse homem que se diz dono de si mesmo. É isso que os poetas se preocuparam em redigir nos textos trágicos, mediante a escrita dos poetas em torno da busca do homem e de seu papel no Universo.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa, que procura a explicitação sobre a concepção de tra-gédia grega em Vernant, continua ainda como uma meta muito árdua a ser percorrida.

Essa consideração não mitiga o valor e os ganhos com esta pesquisa. Contudo, o seu autor está ciente de que o processo de investigação está iniciado. Há obstáculos que precisam ainda ser superados em um processo subsequente de pesquisa.

Entender Vernant e correlacioná-lo à estrutura da tragédia, como ele mesmo fez, é tematizar a combinação de polos – à primeira vista, antagô-nicos, a Antiguidade e o mundo contemporâneo, o mito e a política – que indagam sobre homens em busca de algo ainda não explicado totalmente. Quanto mais se busca fechar uma resposta ao problema sobre a autono-mia humana, a identidade trágica do homem grego, a consciência do fictí-cio, a concepção de tragédia, tanto mais esse problema se dilata.

É pela tragédia que o homem retorna a um aprofundamento maior de sua essência, frente à uniformidade. Tal como no drama antigo, trata--se de um despertar que é, ao mesmo tempo, a curiosidade pelo outro e a consciência de si.

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Vernant ressalta que não se pode falar dos homens fora dos grupos nos quais esses homens estão inseridos, fora de seu contexto social preciso. Inversamente, não existe contexto social que não possua uma dimensão humana, ou seja, mais que uma simples convivência, a mentalidade que existe entre os indivíduos é um fator predominante para a realidade social.

Não existe instituição que não implique, enquanto está viva, crenças, valores, emoções e paixões, isto é, todo um conjunto de representações e de sentimentos. Assim, toda e qualquer pretensão de transformação parte de um problema que sustenta um horizonte a ser alcançado.

A tragédia se solidifica como expressão social importante na Anti-guidade. Para o homem grego, ela se instaura no sistema das festas pú-blicas da cidade, como um novo tipo de espetáculo, não mais como um fenômeno tipicamente oral, transmitido pelos poetas. Além disso, como forma de expressão específica, traduz aspectos da experiência humana até então despercebidos. E, como tal, marca uma etapa na formação do ho-mem interior, do homem como sujeito responsável. A tragédia abrange, para os gregos, muito mais do que simples produções literárias, pois é au-xílio para a formação integral do homem no interior da pólis.

A tragédia é uma instituição social que, pela fundação dos concursos trágicos, se assemelha e se organiza da mesma forma que seus órgãos po-líticos e religiosos. Quando analisada, a tragédia caracteriza um determi-nado momento da Grécia, sua forma específica de ser e existir, que com-promete sua repercussão. Mais do que respostas acabadas e finalizadas, ela traduz uma concepção interligada aos demais fatores sociais dos gregos.

O objeto da tragédia é o homem que vivencia esse debate entre deci-são humana e decisão divina. A tragédia, segundo Vernant, não pode ser reduzida a certo número de condições sociais. Pelo contrário, ao instituir os concursos trágicos, os gregos inventaram, de fato, um tipo de espetá-culo cuja novidade, no plano das condutas sociais e das obras literárias, instala no centro da cidade uma ágora.

A tragédia abrange duas dimensões cruciais. A primeira é a tragédia enquanto gênero artístico, apresentada para um público. Ela corresponde à dimensão social da tragédia, ou seja, uma instituição social que, na pólis,

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por influências de outras características gregas, como mito, teatro, religião e política, se torna uma ação digna de atenção por parte do homem que vive na cidade.

A identidade trágica – a consciência do fictício, a ambiguidade e re-viravolta inserida na vida social e artística da cidade grega – é fundamen-talmente didático-pedagógica, pois visa à formação integral do homem grego. Na religião, afastar-se do divino para o homem grego era o mesmo que não ser mais si mesmo. A tragédia só existe porque o religioso e o social se entrelaçam mutuamente. Na religião grega, a preocupação é com quem está aqui embaixo, na terra, pois a religião grega não assegura a sal-vação em outro mundo.

Na Grécia, toda manifestação coletiva importante, no quadro da ci-dade e da família, do público e do privado, comporta um aspecto de festa religiosa. Por política, a correlação com a tragédia se dá pela cidade que está agora centralizada na ágora, espaço comum.

É na ágora que se desenvolve a vida política dos gregos; esse plano não exclui o religioso, mas sim, segundo Vernant, ele se torna uma religião política. A tragédia é uma das formas novas da cidade democrática. O pla-no do político, como a tragédia, é um plano problemático e que convida à reflexão. Assim, pode-se afirmar que a tragédia é a expressão de uma crise que se evidencia particularmente no plano institucional do Direito públi-co. A tragédia é uma instituição social. A cidade vivia com uma imagem de um homem da tradição heroica, e viu surgir então um homem total-mente diferente, o homem cívico, aquele cuja responsabilidade é discutida e que nada mais têm a ver com a epopeia.

A segunda dimensão da tragédia, segundo Vernant, é a sua essência. Responde à pergunta: “quando uma tragédia é uma tragédia?”. Há, na tra-gédia grega, elementos que a intensificam e a diferenciam, por exemplo, moira (destino) do personagem e herói trágico, a hamartía (falha trágica), a hybris (desequilíbrio interno, inconsciente), o daímon (gênio mal, es-pírito mal), o ethos (caráter) trágico e a kathársis (purificação, purgação). Essas características são partes fundamentais para o fenômeno trágico. Somente pelo fenômeno trágico é que acontece na ação dramática da re-

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presentação, tanto pelo personagem quanto pelo público, a consciência trágica. Assim, toda tragédia, na especificação grega, deve comportar, em suas estruturas, esses elementos que formam o trágico.

O sentido trágico coloca o indivíduo inserido na cidade, confron-tando-se consigo mesmo, indagando-se sobre as questões mais profun-das de seu ser. Por isso, a cidade grega vivia com uma imagem do homem oriunda da tradição heroica, que viu surgir o homem político, o homem cívico, o homem do Direito grego, aquele cuja responsabilidade é discu-tida nos tribunais em termos que nada mais têm a ver com a epopeia. Di-ferentemente da Filosofia que, segundo Vernant, é a arte de construir um discurso para resolver os problemas, a tragédia grega é o inverso, pois tudo é contradição, até mesmo os deuses estão em luta. O mundo é enigmático, o homem é problemático, visto que na tragédia o homem está em busca de uma identidade. Nas tragédias, a pergunta “o que é o homem?” é central e viva.

Repensar a tragédia grega na contemporaneidade é, sim, possível. A repercussão dela vem interagindo com os problemas humanos de tal forma que não mais assusta os homens a indagação de tal expressão. Sabe--se que, apesar da distância, existe nos gregos algo próximo de nós, algo que partilhamos com eles. Em países que estão doravante em busca de sua identidade, que procuram raízes para si, não sabem quem são, o público tem a sensação de descobrir, pelo estranhamento, o ponto de partida do qual somos oriundos e que funda nossa diferença. A busca pelo conheci-mento de si, os livros de autoajuda, os estudos sobre as relações humanas, as doenças psíquicas, todos esses aspectos de uma busca atual sobre o in-divíduo já se faziam presentes na tragédia, não da mesma forma e inten-sidade como se conhece o homem contemporâneo, mas em essência já estavam presentes.

O que se chama de fim das ideologias, o surgimento das formas ex-tremas da barbárie nos países de velha civilização, a preocupação frente aos perigos acarretados pelos progressos de desenvolvimento técnico, es-ses são aspectos que, diante da política, geram indagações tais quais se fa-zia diante de uma representação trágica, que apresenta problemas da pólis.

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E, ainda no século 21, pode-se retornar a esse meio que é a tragédia, identificando quando uma política é saudável ou desleal com seu povo, pois se abre o jogo para todos quantos querem entendê-la.

Os gregos representam, nas formas muito diversas nas quais se ex-pressaram, especialmente para nós, do século 21, algo de vivo e até mes-mo, em alguns sentidos, exemplar. Com a condição de que na atualidade as pessoas ainda se deem ao trabalho de tentar entender o que diziam os gregos, o que trouxeram.

Portanto, a tragédia grega não é de forma alguma distante de nós. A grande esfera de conhecimentos que desenvolveu no campo da investiga-ção sobre o indivíduo e seu destino, sobre o Direito e a política, a religião e a vida social grega e que, se destacam na medida em que cada cidadão se insere na vida social da cidade grega, autorizado, desde sempre a manter sua relação mediante as diversas práticas sociais dos indivíduos da cidade.

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Title: The greek tragedy as a constitutive element of the integral formation of the greek man: a analysis according to Jean Pierre Vernant.Author: Deucyr João Breitenbach.

ABSTRACT: This research try to demonstrate the inter-relationship between the theories of Jean-Pierre Vernant and the conception of the Greek Tragedy, according to the assumptions of the tragic identity and the ambiguity and turnaround found in the one who transits through the structure of the tragic, to say, the social and psychological conditions of the Greek Tragedy. Through rational thought, Jean-Pierre Vernant, one of the most renowned hellenists currently, mainly in that award to the study and research of the classic age of the greeks, introduces the tragedy as essential element of integral formation of the man inserted in the city. For Vernant, the essence of the whole tragedy develops in everyday existence, in a human time, opaque, made of successive presents and limited in a beyond earthly life. At a divine time, omnipotent, that includes in each moment the totality of the events, now to conceal then, now to find them, but without anything to escape it, or get lost in oblivion. Uniting human and divine, theory and practice, myth and politics, religion and social life, they are the foundation that characterize the tragic environment as constitutive element of the greek tragedy.Keywords: Tragedy. Formation of the Greek Man. Tragic Identity.

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A influência do empreendedorismo para secretária executiva em seu ambiente de trabalho

Tatiana de Oliveira Marchiori1

Resumo: Compreendendo o tema empreendedorismo desde a origem da palavra até sua importância estratégica para o desenvolvimento econômico de um país que é hoje um fenômeno global, vistas as profundas mudanças nas relações internacionais entre nações e empresas, no modo de produção, nos mercados de trabalho e na formação profissional, o profissional de secretariado executivo empreendedor é um perfil cada vez mais procurado pelas organizações, nas quais um dos principais objetivos é a busca de eficácia. Investir na disseminação organizada do empreendedorismo será fator fundamental de progresso econômico e social e também contribuirá como fonte de geração de novos empregos. O referido estudo, com o tema “A influência do empreendedorismo para a secretária executiva em seu ambiente de trabalho”, teve como objetivo conhecer melhor o perfil empreendedor e verificar se o mesmo exerce influência positiva no ambiente de trabalho desse profissional. Percebeu-se, após a realização do estudo, que o espírito empreendedor deve existir em todas as profissões, porém, a de secretário executivo, na atualidade, é a que melhor se encaixa conforme a literatura consultada.

Palavras-chave: Empreendedorismo. Secretária Executiva. Influência Positiva. Ambiente de Trabalho. Teorias e Métodos.

1 Especialista em Gestão Secretarial (MBA) pelo Claretiano – Centro Universitário. Graduada em Secretariado Executivo Trilíngue pela mesma instituição. E-mail: <[email protected]>.

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1. INTRODUÇÃO

A capacidade de inovação é um instinto que distingue os seres hu-manos dos outros animais. Esse instinto pode ser observado na História, desde a construção das pirâmides até as expedições ao planeta Marte. Enquanto as ferramentas mudaram em função da inovação tecnológica, a capacidade de inovar esteve sempre presente em todas as civilizações, proporcionando invenções como a roda e a luz elétrica, sendo, portanto, uma conjunção de características pessoais, administrativas e econômicas.

Inovação é, talvez, um dos assuntos mais discutidos do mundo dos negócios nos dias atuais. Os livros mais modernos de Administração apontam para esse sentido como uma das características essenciais para o sucesso no século 21.

Apesar das inúmeras divergências quanto à conceituação de empre-endedorismo, há consenso no que se refere ao tipo de comportamento humano composto por iniciativa, gestão de meios escassos, nível de acei-tação de risco e falha. Para um economista, o empreendedor é aquele que congrega recursos, trabalho, materiais e outros ativos, combinando-os de forma a gerar maior valor, por meio da inovação. Para um psicólogo, é uma pessoa motivada pelas necessidades de obter satisfação, recompensa material, reconhecimento social ou mesmo independência pessoal.

O empreendedorismo tem sido muito difundido no Brasil nos úl-timos anos, particularmente na década de 1990, e hoje ser um empreen-dedor é quase um imperativo, pois é importante lembrar que, por trás de novas ideias que vem revolucionando a sociedade, há sempre um visioná-rio, que, com seu talento, somado à análise, planejamento e capacidade de implementação, é responsável por empreendimentos de sucesso.

A notoriedade da questão do empreendedorismo na atualidade foi a razão para a escolha do tema em questão, e por entender que o assunto poderia trazer benefícios acadêmicos no curso de Gestão em Secretariado.

O trabalho se inicia com uma revisão da literatura, discorrendo sobre a contextualização do secretariado, enfatizando os progressos da profis-são, as leis que a amparam e a nova postura que as organizações exigem no

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atual mercado de trabalho, além de fomentar a expectativa desse profissio-nal, mediante as novas responsabilidades do mercado de trabalho atual.

Continuando a pesquisa bibliográfica, a literatura aborda a influên-cia do empreendedorismo para o trabalho do profissional de secretariado, destacando as características da liderança e da comunicação, ferramentas que são consideradas de total relevância para o sucesso do profissional em questão. Segue, ainda, abordando algumas teorias e métodos empreende-dores que são utilizados em empresas e que, no cotidiano do profissional em secretariado executivo, podem perfeitamente ser utilizados para se ob-ter sucesso na carreira.

2. DESENVOLVIMENTO

Contribuindo para ampliar a questão do empreendedorismo, este estudo concentrou-se em conhecer melhor o perfil empreendedor para, posteriormente, fazer uma reflexão e verificar se o mesmo exerce influ-ência positiva no ambiente de trabalho do profissional em secretariado executivo.

Segundo Ribeiro (1990), a profissão de secretariado executivo tem se modificado ao longo dos tempos. Sua história é marcada por muitos desafios, acompanhando o desenvolvimento econômico e social da huma-nidade e surpreendendo com sua capacidade de adaptar-se às mudanças empresariais, transformando-se em assessor de muita responsabilidade.

Seu papel nas organizações está sendo revisto constantemente, es-tabelecendo novas atitudes. Esse processo de ampliação das suas respon-sabilidades chegou a transformar uma função em profissão. Ao deparar com o histórico da profissão, percebeu-se que ela teve que passar por uma revolução. Os profissionais tiveram que se especializar para não ficar fora do mercado.

A história do crescimento da profissão é motivo de muito orgulho para os profissionais da área, pois estão enfrentando e vencendo os desa-fios que surgiram, tendo plena consciência de que muitos ainda irão sur-

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gir. Nesse contexto, pretende-se discorrer sobre o tema da importância do empreendedorismo, no âmbito do profissional de secretariado executivo.

De acordo com Souza (1993) a organização de uma empresa pode ser sumariamente definida como a maneira de agrupar suas diversas ativi-dades administrativas e operacionais num dispositivo adequado à realiza-ção dos objetivos da empresa. É necessário, portanto, cuidado especial no planejamento, implantação e reformulação da organização porque deles dependem em grande parte, o sucesso administrativo e operacional da empresa.

Dornelas (2005) cita que a primeira definição de empreendedoris-mo é creditada a Marco Polo, sendo o empreendedor aquele que assume os riscos de forma ativa, físicos e emocionais, e o capitalista assume os ris-cos de forma passiva. Na Idade Média, o empreendedor deixa de assumir riscos e passa a gerenciar grandes projetos de produção, principalmente com financiamento governamental.

No século 17, surge a relação entre assumir riscos e o empreendedo-rismo, bem como a criação do próprio termo “empreendedorismo”, que diferencia o fornecedor do capital, capitalista, daquele que assume riscos, empreendedor. Mas, somente no século 18 capitalista e empreendedor foram complemente diferenciados, certamente em função do início da industrialização.

Com as mudanças históricas, o empreendedor não é apenas o ge-rente ou o proprietário da empresa. De acordo com Chiavenato e Sapiro (2003), o espírito empreendedor está presente em todas as pessoas que – mesmo sem fundarem a própria empresa – estão preocupadas e focadas em prospectar oportunidades pioneiras, iniciar projetos criativos, assumir riscos e inovar continuamente nas organizações em que trabalham. Esse exemplo de espírito empreendedor deve ser uma característica constante do profissional de secretariado executivo.

No século 20, tem-se a definição mais moderna citada por Joseph Schumpeter: “o empreendedor é aquele que destrói a ordem econômica existente pela introdução de novos produtos e serviços, pela criação de novas formas de organização ou pela exploração de novos recursos e ma-teriais” (DORNELAS, 2005, p. 39).

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Atualmente, a definição mais comumente usada nos meios organiza-cionais, segundo Dornelas (2005, p. 39), é a seguinte:

O empreendedor é aquele que detecta uma oportunidade e cria um negócio para capitalizar sobre ela, assumindo riscos calculados. Ca-racteriza a ação empreendedora em todas as suas etapas, ou seja, criar algo novo mediante a identificação de uma oportunidade, dedicação e persistência na atividade que se propõe a fazer para alcançar os ob-jetivos pretendidos e ousadia para assumir os riscos que deverão ser calculados.

Outro aspecto que valorizou o uso e disseminação do termo “empre-endedorismo”, segundo Dornelas (2005), está diretamente relacionado à competição econômica globalizada. Por isso, o momento atual pode ser chamado de a era do empreendedorismo, pois são os empreendedores que estão eliminando barreiras comerciais e culturais, encurtando distâncias, globalizando e renovando os conceitos econômicos, criando novas rela-ções de trabalho e novos empregos, quebrando paradigmas e gerando ri-quezas para a sociedade.

O empreendedorismo se tornou uma clara opção para a geração de empregos e formação de uma classe empresarial ativa e globalizada, seu estudo se tornou ainda mais interessante e procurado. Além disso, é de conhecimento de todos a alta capacidade de novas empresas de gerarem empregos, diversificarem a prestação de serviços e produtos e, principal-mente, da sua predisposição natural por buscar a diferenciação pela ino-vação, exercendo papel importante no processo de melhoria da qualidade de vida da população.

O empreendedorismo preocupa-se com a descoberta e exploração de oportunidades lucrativas e atualmente é um importante fator para criar mudanças e ajudar as organizações a adaptar-se às mudan-ças criadas por outras. O velho conceito de empreendedor – preo-cupado com a criação de um novo negócio ou empreendimento pró-prio – sofreu uma ampliação formidável. Hoje ele também está no seio das organizações (CHIAVENATO; SAPIRO, 2003, p. 347).

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De acordo com Filion (1999), na literatura sobre empreendedoris-mo, há muita confusão a respeito da definição do termo “empreendedor”. Pode-se aceitar que o empreendedorismo consiste no fenômeno da ge-ração de negócio em si, relacionado tanto com criação de uma empresa, quanto com a expansão de alguma já existente, a exemplo do desenvol-vimento de uma unidade de negócio no contexto da grande corporação. Tanto no ato da criação de negócios como nas empresas já existentes, o empreendedorismo voltado para a busca e exploração de oportunidades tende a acelerar a expansão dos empreendimentos, o progresso tecnológi-co e a geração de riqueza.

Torna-se fundamental que o profissional de secretariado executivo promova boa relação na organização e tenha conhecimento de relações humanas, para melhor desenvolver suas aptidões e habilidades.

A liderança nos últimos anos tem sido motivo de muita discussão entre os acadêmicos e empresários. Segundo Bergamini (1994), a lideran-ça é um fenômeno e toda a preocupação que o envolve exerce indiscutível atração sobre as pessoas, como também cientistas e pesquisadores, não é um fenômeno exclusivo dos homens. Alguns animais, como os gorilas e elefantes, conhecem e seguem seus líderes. Tem sido investigada há muito e assim apresenta inúmeras interpretações; é o conjunto da compreensão de todas elas que oferece uma visão mais completa sobre o assunto. Desse modo, a compreensão da evolução da liderança é extremamente impor-tante e elaborar um retrospecto dela é essencial (BERGAMINI, 1994).

Crosby (1999) define a liderança como uma determinação de cami-nhos procurando alcançar tudo por meio de pessoas através de um plane-jamento daquilo que o líder realmente deseja.

Azevedo e Costa (2005) afirmam que, além de formação profissio-nal, as empresas precisam de líderes, assim a atuação do profissional de secretariado executivo exige qualidades de liderança, ao manter relaciona-mentos interpessoais e participar de atividade em equipe. Ser líder requer um estilo positivo em que não faltem coragem e autoconfiança para assu-mir as responsabilidades inerentes à sua profissão.

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As atitudes do profissional de secretariado executivo, por mais que sejam eficazmente realizadas, precisam ser complementadas por uma ca-pacidade de liderar. A liderança pode ser baseada em traços, nas situações e no comportamento, ou seja, analisar se o líder é nato, se tem capacidade para liderar de acordo com a situação em que se encontra ou se pode ser desenvolvida e aperfeiçoada na medida em que o líder cultiva um deter-minado comportamento. Apontam Carvalho e Gisson (1998, p. 105): “O novo profissional deverá, antes de nada, ajudar a empresa a alcançar as mudanças requeridas. Deve comandar sem medo as mudanças que se fizerem necessárias”.

A citação acima confirma que o ambiente atual exige que a organiza-ção tenha uma postura de liderança participativa, além de capacidade para superar obstáculos, desvencilhando-se das barreiras e objetivando alcan-çar as metas propostas por meio do trabalho em equipe. Simultaneamen-te, deve haver liderança suficiente para lapidar a capacidade individual de cada membro da equipe, fator que implicará as inovações, planos e con-cretizações de novos empreendimentos, em conformidade com a empresa e com as pessoas envolvidas.

O profissional de secretariado executivo tem o papel de alavancar a equipe rumo às metas, atribuindo tarefas de cunho responsável, estabe-lecendo critérios de tarefas participativas, visando sempre às transforma-ções necessárias e práticas para a empresa. Dessa forma, torna-se impres-cindível que esse profissional tenha, além dos atributos já mencionados, também uma boa comunicação.

Na organização, um papel importantíssimo é o da comunicação in-terpessoal, relação na qual uma parte transmite e a outra compreende, possibilitando o processo de desenvolvimento das atividades. Quando ocorre desvio ou distorção e bloqueio no fluxo de comunicação podem existir grandes problemas dentro da organização.

Segundo Limongi-França et al. (2002), o conteúdo das informações transmitidas possibilitam a expressão das emoções, a explicitação dos va-

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lores sociais, a perpetuação da cultura de um grupo, o registro e a dissemi-nação das descobertas e dos avanços tecnológicos. E a forma como é feita a comunicação colabora para o desenvolvimento humano, pondo à dispo-sição a tecnologia como meio de receber, enviar e registrar informações.

Diante do que foi exposto sobre a comunicação, percebe-se que as relações interpessoais exigem comunicação eficaz, uma vez que se torna impossível se relacionar sem que haja comunicação, seja ela por meio de um diálogo, de um e-mail, de linguagem corporal ou escrita.

Dentro de um grupo ou de uma organização, a comunicação cumpre quatro funções básicas: controle, motivação, expressão emocional e informação. [...] a função final da comunicação relaciona-se com seu papel como facilitadora de tomada de decisões. Ela proporciona as informações de que as pessoas e os grupos precisam para tomar as decisões e transmite os dados que permitem identificar e avaliar al-ternativas. (ROBBINS, 2004, p. 120).

Afirma Weinsinger (1997, p. 150) que: “O sucesso do funcionamen-to de uma equipe, um departamento ou um grupo tem relação direta com a eficácia da comunicação entre seus membros na situação de grupo”. Esse autor afirma, ainda, que o secretário executivo necessita de habilidades de comunicação, para se comunicar interpessoalmente, transmitindo e rece-bendo mensagens orais e escritas.

Entende-se que a eficácia da comunicação resulta no sucesso da equi-pe em conjunto com os trabalhos realizados. Algumas teorias e métodos empreendedores são essenciais para entender a natureza e a formação de um empreendedor.

Para Dolabela (1999, p. 12), na teoria de aprender a empreender, faz-se necessário: “Um comportamento pró-ativo do indivíduo, o qual deve desejar aprender a pensar e agir por conta própria, com criatividade, liderança e visão de futuro, para inovar e ocupar o seu espaço no mercado, transformando esse ato também em prazer e emoção”.

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No campo científico e acadêmico, a formação empreendedora pode ser caracterizada por situações que contribuem diretamente para que essa ação aconteça. Entre elas, podem-se citar duas teorias que incidem dire-tamente: a primeira é a natureza da ação, caracterizada por buscar fazer algo inovador ou diferente do que já é feito. Teoricamente, o empreen-dedorismo está ligado diretamente às modificações de processos (ou de produtos).

A segunda é a falta ou inexistência de controle sobre as formas de execução e recursos necessários para se desenvolver a ação desejada, liber-dade de ação.

Essas duas teorias são consideradas importantes na ação empreende-dora, uma execução de algo sem controle e sem métodos com uma nova concepção. Da mesma forma, nem todas as ações desenvolvidas com risco, sem controle dos processos, são ações empreendedoras, pois nem sempre são ações inovadoras.

Filion (1999) estabelece um modelo com quatro teorias fundamen-tais para que uma ação seja empreendedora (visão, energia, liderança e relações), visando à formação do profissional empreendedor. Destacam--se como principal característica as relações, as quais, segundo o autor, se obtém pelos conhecimentos fundamentais e necessários dentro de uma estrutura de mercado: as informações necessárias para a tomada de deci-sões e o conhecimento da realidade do mercado.

Atualmente, as organizações possuem uma grande necessidade de buscar e desenvolver profissionais com perfil empreendedor, devido ao fato de estes serem os responsáveis pelas modificações, criações e visões inovadoras para se obter um destaque maior e uma diferenciação positiva frente à concorrência.

Os empreendedores são visionários, dotados de ideias realistas e inovadoras, baseados no planejamento de uma organização, intervêm no planejado e propõem mudanças. O empreendedor desenvolve um papel otimista dentro da organização, capaz de enfrentar obstáculos internos e externos, sabendo olhar além das dificuldades, com foco no melhor resul-tado.

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Além das teorias acima comentadas, o empreendedor tem um perfil de liderança para obter êxito em suas atividades, como é o grande respon-sável por colocar em prática as inovações, métodos e procedimentos que propôs, deverá estimular os envolvidos na realização das atividades, de for-ma a alcançar as metas traçadas.

Dornelas (2005) explica que o empreendedorismo está diretamente ligado à mudança nas concepções administrativas ocorridas a partir do século 20 e, mais especialmente, nas últimas duas décadas deste. Essas mudanças estão diretamente ligadas ao avanço tecnológico que exige um número cada vez maior de empreendedores qualificados e dinâmicos.

Portanto, a ênfase em empreendedorismo surge muito mais como consequência das mudanças tecnológicas e sua rapidez, e não apenas um modismo. Esta é uma teoria básica.

Em resumo, os empreendedores são mais capacitados para ações no-vas, grandes e para definir contextos, enquanto o administrador está mais voltado à organização dos recursos e tomar decisões no dia a dia. Uma característica específica do empreendedor é o conhecimento profundo do negócio em que atua, faceta de poucos.

As características de um empreendedor, de acordo com o Dornelas (2005, p. 39) são “[...] iniciativa para criar um novo negócio e paixão pelo que faz; utilização dos recursos disponíveis de forma criativa transfor-mando o ambiente social e econômico onde vive; aceitar assumir riscos e a possibilidade de fracassar”.

Existe a teoria de que, para ser um bom administrador, é preciso ser também um empreendedor, o foco na liderança é fundamental. Segundo Chiavenato (1982) a administração funciona como decodificadora dos objetivos fixados pela alta direção, transformando-os em planos e progra-mas. Assim, o administrador direciona e conjuga liderança, motivação e esforços dentro do grupo, lidando então com pessoas. E, ao lidar com pes-soas, surge a principal ferramenta gerencial, a liderança.

Para Dornelas (2005, p. 39), “O empreendedor é aquele que destrói a ordem econômica existente pela introdução de novos produtos e servi-ços, pela criação de novas formas de organização ou pela exploração de novos recursos e materiais”.

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Não há como ser empresário bem sucedido sem ser dinâmico, sem possuir certo grau de ansiedade, de busca de respostas, sem possuir um sentido investigativo e reflexivo e, principalmente, sem ter consciência da mutabilidade dos conceitos, das regras, das formas do mercado e, em con-sequência, da gestão empresarial.

Essa dinâmica administrativa pode ser desenvolvida por meio de es-tudos. Ao contrário do que se pensava até há bem pouco tempo, as carac-terísticas de um empreendedor não são natas e podem se desenvolver com estudos e treinamentos ao longo do tempo. Essas atribuições agregam vá-rias metodologias, dentre as quais a grande maioria é formada por técnicas desenvolvidas por meio de estudos e necessidades.

Segundo Dolabela (1999), a teoria de que o empreendedor é fruto de hereditariedade já não tem muitos adeptos nos meios acadêmicos, e que é possível aprender a ser empreendedor, mediante uso de políticas diferenciadas do ensino tradicional. O empreendedor é, com frequência, considerado uma pessoa que sabe identificar as oportunidades de negó-cios, os nichos do mercado e que sabe se organizar para progredir.

Assim, a teoria essencial do trabalho do empreendedor consiste em definir contextos, o que exige análise e imaginação, um equilíbrio entre as funções do lado direito e do lado esquerdo do cérebro.

É destacado nos estudos sobre o empreendedor a necessidade e va-lorizar o ser e não o ter, ou seja, o empreendedor busca, através do seu trabalho crescer internamente, valorizar suas idéias e percepções, dar vazão a capacidade que o ser humano possui de criar, de inovar, de desenvolver. Os lucros financeiros são apenas conseqüência disso. (DOLABELA, 1999, p. 259).

Para o empreendedor; o ser é mais importante do que o saber. A em-presa é a materialização dos nossos sonhos. É a projeção da nossa imagem interior, do nosso íntimo, do nosso ser em sua forma total. O estudo do comportamento do empreendedor é fonte de novas formas para a com-preensão do ser humano, em seu processo de criação de riquezas e de re-

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alização pessoal. Sob esse prisma, o empreendedorismo é visto também como um campo intensamente relacionado ao processo de entendimento e construção da liberdade humana.

Um empreendedor, portanto, é todo aquele administrador que apro-veita ideias para nichos de mercados não explorados, ou de certa forma deficientes. Sua principal característica é a postura diferente, que inova e busca agregar valor, para o cliente, ao seu produto ou serviço, independen-temente de ser empresário ou não. Ser empreendedor é ter iniciativa, bus-car informação e oportunidade, correr riscos calculados, ter persistência e comprometimento, além de um bom planejamento e monitoramento.

Hoje as empresas necessitam de empreendedores, seja para iniciar um novo negócio, para lançar um novo produto ou serviço, seja para gerir um negócio em andamento.

Shinyashiki (1995) explica, entretanto, que, para uma empresa se desenvolver, não basta apenas um gestor empreendedor. Para que se tenha crescimento, é necessário que todos tenham iniciativa; por exemplo, nas organizações modernas, cada colaborador precisa ter atitude de um em-preendedor, pois uma organização é um complexo, uma unidade formada por partes que devem equilibrar-se.

Para um bom planejamento e desenvolvimento de um empreendi-mento, segundo Dornelas (2005), pode-se contar com vários métodos, como o plano de negócios, que elenca, planeja e esclarece todos os ele-mentos que compõem o desenvolvimento de um novo negócio, novo produto ou mesmo de novas estratégias. Então o plano de negócios vem captar, quantificar e até mesmo mensurar os recursos financeiros necessá-rios para um negócio.

Faz-se necessário que um empreendedor planeje todas as atividades, mesmo antes da formação da empresa, sempre pesquisando, avaliando as tendências, a concorrência do produto, enfim, daquele ramo ou setor pretendido. Em seguida, um plano de negócios vem a agregar uma com-preensão ampla e ordenada do negócio, bem como, para ter uma direção

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clara na execução das tarefas, tanto de implementação de um projeto de instalação de uma nova empresa, como manutenção e equilíbrio de uma já existente, lançamento de um novo produto ou ampliação de uma em-presa.

Gracioso (2003) também enfatiza que os empreendedores são gesto-res com postura ética ilibada e com grande capacidade para formar equi-pes eficientes e motivadas. Esses aspectos possibilitam que as organizações se tornem lideres de mercado, ofereçam produtos melhores do que os con-correntes e com preços competitivos, pois equipes bem estruturadas co-metem menos erros, evitam desperdício e tem foco nas estratégias e metas definidas para atender prazos e qualidade.

Outro método destacado por Santos e Pereira (1995) é a capacidade do empreendedor em buscar novas oportunidades para o negócio, o que ajuda a dinamizar a formação e o crescimento de empresas, porque permi-te o seu desenvolvimento através de uma cultura empreendedora.

Para o autor, uma oportunidade é um rumo de ação, que é possível e vale a pena seguir. As oportunidades surgem de alguns preceitos básicos, que são: organização, direcionamento estratégico, nicho de oportunida-des e suas fontes e processos de identificação.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O empreendedorismo é um assunto de fundamental importância para a formação acadêmica, auxiliando no desenvolvimento e preparação de futuros profissionais para as novas tendências organizacionais, que exi-gem cada vez mais dinamismo, comprometimento e ideias inovadoras de seus colaboradores, servindo também como norteador para selecionar e identificar melhores oportunidades e estratégias dentro das organizações.

O profissional de hoje se encontra mais capacitado e conscientizado da sua importância na organização e do seu crescimento e investimento no futuro da mesma, isto é, a profissão exige qualificação e a competitividade.

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Portanto, empreendedor é o diferencial numa organização. Diferen-cial este que, fazendo uma analogia a uma peça automotiva, pode repre-sentar uma peça que une como as engrenagens do motor às rodas, ou seja, é ela quem faz com que todo o conjunto se movimente, dando às rodas a força e assumindo todos os riscos previamente calculados, impactos que serão causados pelo caminho a ser tomado. A diferença entre o diferen-cial mecânico e diferencial empreendedor é que o mecânico tem um lugar específico e o empreendedor, não, mesmo assim continua a ser uma peça importante para o sucesso de uma organização.

Ao consultar Dornelas (2005), constatou-se que o empreendedor de sucesso possui características extras, além dos atributos do administrador, e alguns atributos pessoais que, somados a características sociológicas e ambientais, fazem com que este venha a promover a inovação organiza-cional, fator que faz a diferença não apenas na carreira executiva, mas em todos os segmentos organizacionais. Essas características são inatas e se destacam no profissional de secretariado, como características próprias de liderança estão ligadas ao processo de desenvolvimento. Assim, concor-dando com o que Dolabela (1999) enfatiza, o empreendedor cria e aloca valores para indivíduos e para a sociedade, ou seja, é fator de inovação tecnológica e crescimento econômico.

Este estudo buscou investigar a influência do empreendedorismo no ambiente de trabalho da secretária executiva, então, entendeu-se que, para a influência se tornar positiva, essa pessoa empreendedora precisa ter características diferenciadas, como originalidade, ter flexibilidade e faci-lidade nas negociações, tolerar erros, ter iniciativa, ser otimista, ter auto-confiança e ter intuição e ser visionária para negócios futuros.

Um empreendedor é um administrador, necessita ter conhecimentos administrativos, ter uma política para a empresa, ter diligência, prudência e comprometimento. Entre as principais características que transformam o empreendedor em vencedor, podemos citar: iniciativa, autoconfiança, aceitação do risco, otimismo e entusiasmo.

Ângelo (2003) entende que essas atitudes derivam do posiciona-mento e da atitude do intra-empreendedor, que, por sua vez, opta pela

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busca da inovação, mesmo compatibilizando os interesses externos.Características relevantes do empreendedor, segundo Dornelas

(2005), são tomada de decisão, saber explorar a área de atuação e segurar oportunidades; são pontos fundamentais para alcançar sucesso na carreira e, que exercem influência no cotidiano desse profissional.

O empreendedorismo influencia de maneira positiva o ambiente de trabalho dessas profissionais, capacitando-as cada dia, incentivando-as a desenvolver novas ideias, adquirir maiores conhecimentos sobre a carreira e, acima de tudo, se tornarem responsáveis pelo desenvolvimento e cresci-mento de algo que, para muitos, é considerado um risco.

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Title: The influence of the executive secretary for entrepreneurship in your workplace.Author: Tatiana de Oliveira Marchiori.

ABSTRACT: Understanding the theme of entrepreneurship, since the origin of the word to its strategic importance to the economic development of a country is now a global phenomenon, given the profound changes in international relations between nations and companies in the mode of production, labor markets and vocational training. The professional executive secretarial profile entrepreneur is increasingly sought by the organizations in which one of the main objectives is the search for effectiveness. Investing in the organized dissemination of entrepreneurship is a key factor of economic and social progress and also contribute as a source of generating new jobs. The study

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on the theme “The influence of entrepreneurship to the executive secretary on your workplace” aimed to better understand the entrepreneurial profile and check if it exerts a positive influence in this professional environment. It was noticed after the study that the entrepreneurial spirit should exist in all professions, however, the executive secretary today is the one that best fits according to the literature.Keywords: Entrepreneurship. Executive Secretary. Positive Influence. Working Environment. Theories and Methods.

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Análise de tradução de poesia: um estudo de caso de “The Sick Rose”, de William Blake

Marcela da Fonseca Ferreira1

Resumo: Este artigo se inicia com uma apresentação sobre a vida e obra de William Blake, bem como sobre o contexto histórico e a escola literária a que esse autor pertenceu. É feita, também, uma breve apresentação sobre seu tradutor neste trabalho, no caso, Alberto Marsicano. Na sequência, é realizada uma interpretação do poema “The Sick Rose”, de William Blake, e, a partir dessa interpretação, é analisada a tradução para o português do poema, feita por Alberto Marsicano, publicado no livro William Blake – O casamento do céu e do inferno & outros escritos. Por meio de comparação do texto de partida e do texto de chegada, são apontadas e analisadas as estratégias que o tradutor utilizou no seu trabalho, destacando os resultados obtidos na tradução.

Palavras-chave: Tradução. Análise. Poesia. William Blake.

1 Especialista em Formação de Tradutores de Língua Inglesa pelo Claretiano – Centro Universitário. Graduada em Letras pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). E-mail: <[email protected]>.

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1. INTRODUÇÃO

William Blake é um dos mais importantes poetas do Romantismo inglês, quase inclassificável dentro de sua escola literária por ser conside-rado um homem à frente do seu tempo. Não somente um gênio da Litera-tura Inglesa, como também da arte, Blake, por meio de suas características próprias, agrupando estilos variados como poeta, pintor, místico e visio-nário, tem um importante papel na literatura mundial.

“The Sick Rose”, escrito por Blake e publicado em 1784, é um po-ema de forma compacta, composto por duas estrofes, com rimas alterna-das. Tal poema foi traduzido para o português por Alberto Marsicano, publicado no livro William Blake – O casamento do céu e do inferno & outros escritos.

Este artigo tem a pretensão de, primeiramente, interpretar o signi-ficado do poema e, a partir dessa interpretação, analisar, na tradução de Alberto Marsicano, quais estratégias foram utilizadas como recursos para traduzi-lo e se o tradutor manteve a mesma impressão do texto de partida.

O trabalho inicia-se com a biografia de William Blake e, nessa pers-pectiva, é feita uma breve apresentação do contexto histórico e da escola literária a que o autor pertenceu. Além disso, também é exposta a biogra-fia do tradutor.

Com base nos estudos sobre a vida, o contexto histórico e a esco-la literária de Blake, foi possível fazer uma interpretação do poema “The Sick Rose”, realizando um estudo de caso, contendo análise da tradução, amparada por pesquisa bibliográfica. A partir dessa interpretação, com-parando texto de partida e texto de chegada, são apontadas e analisadas as estratégias que o tradutor utilizou no seu trabalho, destacando os resulta-dos obtidos na tradução.

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2. WILLIAM BLAKE: O POETA E A TRADUÇÃO DE “THE SICK ROSE”

William Blake nasceu em Londres, no ano de 1757. Era filho de um comerciante que, desde sua infância, sempre o incentivou à leitura de au-tores como Swedenborg, Jakob Boheme e Paracelso.

Blake, ainda criança, manifestou seus dons artísticos, associados também à crença religiosa. Segundo Marsicano (2007, p. 09):

As primeiras manifestações de vidência surgiram no futuro poeta aos quatro anos, quando vislumbrou a face de Deus na janela e deu um grito. Mais tarde, ao passear pelos campos de Peckam, encontrou uma árvore repleta de anjos de asas iridescentes, e num descampado avistou Ezequiel calmamente sentado. Ao relatar esses fatos à sua mãe, acabou por levar uma surra.

Foi assim seu envolvimento com misticismo e a religião, o que, mais tarde, exerceu grande influência sobre sua obra. Aos 14 anos, o futuro po-eta iniciou o aprendizado de artes em gravuras. Logo, passou a frequentar o estúdio de James Basire, um famoso gravador da época. Nessa fase, Blake tomou gosto pela leitura de Spencer, dos elizabetanos, Locke, Bacon e Winckelmann. Seus primeiros poemas foram escritos na adolescência.

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Figura 1 Portrait of Blake, engraved by Schiavonetti after Phillips, 1808.Fonte: <http://www.blakearchive.org/blake/about-blake.html>.

O gênio artístico de Blake desenvolveu-se paralelamente, na escrita e na pintura. Em 1778, começou a trabalhar com gravuras. Após quatro anos, o poeta casou-se com Catherine Boucher. Já em 1784, em sociedade com James Parker, abriu um atelier de impressão e, assim, juntos às gravu-ras, imprimia seus textos com uma gravura para cada exemplar, ou seja, cada exemplar era exclusivo. Nesse mesmo ano, suas obras foram expostas na Royal Academy novamente (sua primeira exposição foi em 1780).

Informa Marsicano (2007, p. 10), que: “Independente dos precon-ceituosos editores de sua época, gravava e imprimia livremente seu traba-lho, através de minucioso domínio técnico da arte da gravura, da qual foi um revolucionário”.

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Obras de Blake

Dentre os trabalhos que William Blake produziu e ilustrou, há aqueles que talvez sejam mais relevantes por trazerem temáticas mais po-lêmicas. No entanto, todos os livros são citados no presente artigo por ordem cronológica: Poetical Sketches (1783), There is no Natural Religion (1788), All Religions Are One (1788), Songs of Innocence (1789), Book of Thel (1789), The French Revolution: A Poem in Seven Books (1791), A Song of Liberty (1792), The Marriage of Heaven and Hell (1793), Visions of the Daughters of Albion (1793), America, A Prophecy (1793), Songs of Experience (1794), Songs of Innocence and of Experience (1794), Europe, a Prophecy (1794), The Book of Urizen (1794), The Song of Los (1794), The Book of Ahania (1795), The Book of Los (1795), Night Thoughts (1797) – ilustrações –, Milton (1804), Grave (1808), Everlasting Gospel (1818), Je-rusalem (1820), The Ghost of Abel (1822), Dante’s Divine Comedy (1825) – ilustrações –, o qual não foi finalizado, devido à sua morte em 12 de agosto de 1827, e O livro de Jó da Bíblia (1826) – ilustrações.

As características marcantes de Blake aparecem, por meio de seus trabalhos, ao longo de sua vida, em formato místico ou revolucionário, pelo fato de o poeta criticar a Igreja e a alta sociedade como explorado-res da classe menos favorecida. Outras reflexões sobre questões humanas também caracterizam a obra de Blake, proporcionando, assim, o seu devi-do mérito como artista e poeta.

Contexto histórico

A história de vida do poeta estava inserida em um cenário em que a Inglaterra passava por um processo de industrialização. O trabalho agrá-rio dos camponeses foi substituído por uma produção industrial altamen-te mecanizada.

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Com o advento do comércio internacional, estabeleceu-se uma pro-dução maciça de bens de consumo que emanavam uma grande quantida-de de recursos naturais e insumos para a produção; esse processo gerou uma grande concentração de capital em poder da burguesia industrial. A exploração dos trabalhadores passou a ser extrema; eles trabalhavam e viviam em condições subumanas, uma vez que seu labor se dava em con-dições inóspitas, e o crescimento urbano, devido ao grande processo de migração para a cidade, não comportou o inchaço urbano com infraes-truturas básicas necessárias para atenderem à demanda (VIZIOLI apud STEIL, 2007).

Na América colonial do mesmo período, a sua própria burguesia ha-via se formado. Assim, a Inglaterra tentou impedir o crescimento e o co-mércio com medidas estatais que causaram revolta entre os colonos. Esse fato culminou na Guerra de Independência, com o triunfo das colônias. Na França, ocorreu a Revolução Francesa, que consolidou os princípios do liberalismo. Em suma, as revoluções burguesas completaram uma tran-sição de um período feudal para o capitalismo.

No período vivido por William Blake (Londres, 1757-1827), a In-glaterra abandonava um sistema de produção essencialmente agrário e artesanal para ingressar em outro de cunho industrial, dominado pela máquina. A intensificação do comércio externo, a exploração massiva do carvão e a instalação de fábricas têxteis mais modernas e produtivas concentravam cada vez mais o capital nas mãos da bur-guesia, e uma grande massa de trabalhadores fora submetida a con-dições subumanas de vida, num espaço urbano despreparado para recebê-los. (VIZIOLI apud STEIL, 2007, p. 10).

Do outro lado do Atlântico, a burguesia colonial da América do Norte havia firmado o seu próprio mercado interno. A metrópole inglesa tentou reprimir a expansão do comércio para outros países, aumentando os impostos e a fiscalização na América, o que pro-vocou a Guerra da Independência (1775–1783), com triunfo das Colônias Americanas. Logo veio a Revolução Francesa, resultan-

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do na vitória do poder da burguesia da França sobre a aristocracia monárquica e a monarquia absolutista. As revoluções burguesas en-tão completaram a transição do sistema feudal para o capitalismo. (STEIL, 2007, p. 10).

Nesse contexto, Blake era um homem à frente do seu tempo, pois, em seus textos, deixava evidente sua indignação em relação à imposição da Igreja e aos valores dos interesses políticos.

Diante das revoluções que ocorriam, o poeta escreveu sobre temas que envolviam reflexões sobre o rápido desenvolvimento do homem e sobre o que havia em seu íntimo. O trabalho do poeta teve grande reper-cussão em relação à Revolução Francesa e à Revolução Americana, ques-tionando valores e pensamentos arraigados na sociedade da época, devido aos seus princípios libertários.

Escola literária

William Blake está inserido na tendência literária denominada Pré--romantismo ou Primeiro Romantismo, que surgiu na Inglaterra, no fim do século 18. Nessa fase de transição, o movimento artístico e intelectual da época distancia-se do Neoclassicismo e apresenta características pró-prias, como, por exemplo, a indignação e a revolta em relação à ordem social e a religião da época.

O liberalismo passou, então, a ser referência ideológica e, dessa for-ma, os poetas dessa tendência literária rejeitavam as formas rígidas conti-das na literatura, como, por exemplo, a exatidão de métricas nos versos.

Nesse período, os românticos opuseram-se à racionalização e à meca-nização que fora causadas pelo avanço da modernidade.

É relevante destacar que a crítica contra a religião, presente nos po-emas de Blake, estava relacionada à mentalidade da Igreja, caracterizada pela hipocrisia e pelo fato de ela ser extremamente rigorosa, e não contra a religiosidade; pelo contrário, a exaltação da espiritualidade estava presen-

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te em suas obras românticas. Nesse sentido, compreende-se que o autor era religioso, porém não concordava com alguns princípios que a Igreja pregava.

Assim como Blake, outros artistas também se preocupavam com te-mas relacionados à alma humana, investigando a natureza e a personalida-de do indivíduo, como Lord Byron e William Wordsworth.

Esses artistas romperam com as regras estabelecidas da época, as quais eram consideradas exageradamente formais, rigorosas e tradicionais.

O Romantismo não foi um movimento que pertenceu apenas à Eu-ropa: outros países e colônias também foram contaminados pelos novos pensamentos da época, gerando uma mudança social mundial.

Blake foi um grande gênio romântico de seu tempo, absolutamente original, pois possuía características próprias, agrupando estilos variados como poeta, pintor, místico e visionário.

É possível afirmar que Blake é um poeta romântico mesmo que fora do período que se convencionou chamar de romantismo. Temos em mãos um autor que tem muito de dândi e que é apontado por muitos autores como o mais completo artista do seu tempo. Blake, além de poeta, foi pintor, criando um estilo único de pintura tanto na expressão quanto no modo de fazer. Criou um estilo de pintura conhecido por Iluminated printing, que consiste em, numa única superfície de cobre, imprimir o desenho, técnica muito similar à da pintura em aquarela: tanto na técnica do poeta quanto na da aqua-rela é quase impossível que o artista retoque algum eventual erro. (LOPES; LISBOA, 2009).

3. SOBRE O TRADUTOR ALBERTO MARSICANO

Steil (2007) elenca vários tradutores que se ocuparam de traduzir os poemas de Blake.

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Alberto Marsicano, além de autor/tradutor, é, também, músico, con-tista e citarista. Unindo as peças clássicas indianas a referências encontra-das na natureza, Marsicano é introdutor do Sítar no Brasil. Discípulo de Ravi Shankar e Krishna Chakravarty da Universidade de Benares (Índia).

Ele escreveu os livros Idiomalabarismos (poesia); Sendas Solares (po-esia); Rimbaud por Ele Mesmo; Jim Morrison por Ele Mesmo; A Música Clássica da Índia. São obras traduzidas por ele: O casamento do céu e do inferno, de William Blake; Haikai (antologia da poesia clássica japonesa); Sijô – Poesiacanto Coreana Clássica (antologia da poesia clássica coreana); Trilha Estreita ao Confim, de Matsuo Bashô; e O Olho Imóvel pela Força da Harmonia (Antologia poética de Wordsworth).

Em parceria com John Milton, traduziu, também, a antologia do po-eta John Keats, Nas Invisíveis Asas da Poesia e A Música Clássica da Índia.

Marsicano também gravou os CDs Benares; Benares – Music for Hea-ling and Yoga; Impressionismos; Raga do Cerrado; Quintessencia; Electric Sitar (lançado, também, na Rússia e na China); Isto não é Um Livro de Viagem (com o poeta Haroldo de Campos) e Sitar Hendrix, o qual foi indicado para o Grammy, nos Estados Unidos.

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Interpretação proposta do poema “The Sick Rose” – William Blake

Figura 2: Hand-coloured print, issued c.1826. A copy held by the Fitzwilliam Museum, London.

Fonte: <http://en.wikipedia.org/wiki/The_Sick_Rose>.

O poema “The Sick Rose” foi publicado no ano de 1794, incluído na coleção intitulada Songs of Innocence and Experience.

A rosa, tradicionalmente, sempre simbolizou a inocência, a mulher, a vida, a beleza natural, o amor e até mesmo a feminilidade. Durante o século 18, muitos poetas utilizavam a natureza para representar a mulher. Há inúmeros poemas que descrevem a forma feminina por meio da paisa-gem, por exemplo, usando colinas, cavernas e flores silvestres. É relevante salientar que “Rose” é também um nome próprio feminino, que também remete à simbologia feminina. Observa-se, no poema, que o substantivo está escrito com letra maiúscula, o que pode sugerir, também, o nome de uma mulher.

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No primeiro verso, “O Rose, thou art sick!”, o eu lírico está alertando a rosa de que ela está doente. O ponto de exclamação deixa evidente a lamentação e o alerta do orador em relação à doença da rosa.

Já no segundo verso, “The invisible worm”, surge outro “personagem”, o verme. Assim, a rosa e o verme tornam-se elementos antagônicos. Se, por um lado, a rosa representa a beleza, a mulher, a pureza, a inocência e o amor, por outro, o verme reproduz uma imagem negativa, repugnante, agressiva, nociva à saúde, cuja aparência pode ser interpretada como uma imagem fálica. O verme é símbolo da morte e da decadência.

O verme, logo abaixo do primeiro verso, intensifica a ideia de que este corrompeu a rosa, tornando-a doente. Ou seja, o causador da doença da rosa é o verme. A invisibilidade do verme explica o desconhecimento da rosa em relação à sua doença, a qual é imperceptível e destruirá sua vida.

Uma das interpretações que podem ser feitas do poema é que o verme corresponde aos inúmeros malefícios da sociedade da época em relação à mulher. Por exemplo, pode significar uma repreensão ao sexo casual e/ou prostituição, pois um vírus (verme) contaminou seu corpo (a prostituição era, como é até hoje, uma prática comum em Londres, e doenças como a sífilis, por exemplo, eram incuráveis). Pode ser, ainda, uma referência à re-lação sexual de uma mulher virgem, a qual perde a inocência, (cometendo o pecado, de acordo com a concepção judaico-cristã de Blake), destruindo a vida por se entregar aos desejos da carne.

Independentemente dessas várias possibilidades de se interpretar o poema, há um significado em comum entre essas possíveis ramificações, isto é, o poema traz a questão da mulher vista como vítima de algum mal que a destrói.

Nesse sentido, o terceiro e o quarto verso da primeira estrofe “That flies in the night”/ “In the howling storm” criam uma imagem assustadora, simbolizando a noite como perigosa, promíscua.

Os próximos versos “Has found out thy bed”/ “Of crimson joy” reme-tem à ideia de que o verme se alojou na rosa, sendo prejudicial à sua saúde. Deduz-se, então, que a rosa não teve nenhuma reação ao verme, que está alojado em seu corpo, e, assim, está se sentindo bem. No verso “Of crimson

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joy”, demonstra-se que há prazer, alegria, sentimentos opostos aos do eu lírico, que lamenta a doença até então desconhecida pela rosa.

Os últimos versos “And his dark secret love”/ “Does thy life destroy” parecem confirmar que existe o “amor”, porém este vem acompanhado de adjetivos negativos, “dark secret”, sentimento obscuro, proibido, ame-açador, que destruirá a vida da rosa. Entende-se aqui que esse sentimento prazeroso da rosa, que levará à sua morte, é um engano, talvez até uma inocência das consequências que o “amor” promíscuo, obscuro e sombrio pode trazer.

Alguns sutis elementos presentes no poema podem ressaltar essa possível interpretação. Primeiramente, algumas afirmações em relação à rosa podem ser feitas. Por exemplo, que ela está doente, o “amor” do ver-me está destruindo sua vida e há prazer em seu leito. Quanto ao verme, este, ao contrário da rosa, está relacionado à noite, à tempestade, alojou-se na rosa, é invisível e é o agente causador da destruição da vida da rosa.

Outro elemento que permite auxiliar a interpretação é a pintura que acompanha o poema de Blake. Na arte do poema “The Sick Rose”, há três botões de rosas, sendo que um está aberto e dentro dele há uma mulher com os braços estendidos. O outro botão remete à ideia de uma mulher ajoelhada e, no último, há um botão de rosa destruído.

Se partirmos do pressuposto de que a rosa é a mulher que está ado-ecida devido a alguma doença sexualmente transmissível ou pela perda da virgindade e da inocência, a rosa com mulher, a de braços estendidos olhando para cima, pode simbolizar um pedido de ajuda a Deus, causan-do a impressão de que ela está sendo devorada, corrompida, contaminada. O outro botão, que remete à imagem da mulher de joelhos, cabisbaixa, ca-racteriza um posicionamento de dor, arrependimento e, por ser um botão murcho, caracteriza a figura feminina definhando devido a algum mal que lhe causou sofrimento. O último botão de rosa está dilacerado, demons-trando, talvez, a destruição, a morte por causa da doença.

Os três botões transmitem a ideia do ciclo da doença, juntamente com as ramificações dos galhos da roseira. Eles estão posicionados em cír-culo, sendo que um está aberto (recepcionando a doença), o outro está

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murcho (doente, em fase de sofrimento e dor) e o outro já está destruído (morto). Assim, surge a ideia do ciclo inverso à vida, ou seja, do ciclo da morte, da doença: inicia já com a rosa aberta adquirindo seu “verme”; após essa fase, ela murcha adoecida, com dor; e, finalmente, morre dilacerada.

O poema, de forma compacta, é composto por duas estrofes, com ri-mas alternadas. Nesse poema, tal estrutura pode ser entendida como uma produção de ritmo ameaçador. Blake utiliza, também, o recurso da ima-gem, a qual auxilia, por meio de símbolos multifacetados, possibilidades de interpretações.

Análise da tradução de Alberto Marsicano

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The Sick Rose

O Rose, thou art sick!The invisible wormThat flies in the night,In the howling storm,

Has found out thy bedOf crimson joy,And his dark secret loveDoes thy life destroy.

A Rosa doente

Oh, Rosa! Estás doente:O verme invisívelQue voa pela noite displicenteNa tempestade terrível,

Teu leito descobriuDe gozo carmesim,E seu amor, secreto e sombrioTe consome a vida enfim.

Neste tópico, serão analisados quais foram os recursos utilizados no processo tradutório de Marsicano e se foi mantida a mesma impressão do texto de partida.

É relevante observar que o tradutor modificou consideravelmente a pontuação ao longo do texto. No primeiro verso, no poema em português, a vírgula é inserida após a interjeição “Oh” e, logo após, o nome “Rosa” é

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introduzido o ponto de exclamação. Nessa perspectiva, compreende-se que o texto de partida intensifica a perplexidade do eu lírico em relação à doença da rosa. Há, assim, uma mudança de tom. Enquanto o texto de partida transmite o tom de alerta e de lamentação, dá-se mais ênfase ao tom de alerta na tradução.

O tradutor ainda opta por acrescentar, em seu texto, dois pontos no final do primeiro verso. Desse modo, esse recurso possibilita uma “ex-plicação”, um “esclarecimento” da causa da doença da rosa, facilitando a interpretação do poema ao leitor, um recurso que o texto de partida não possui.

No terceiro verso da primeira estrofe, o adjetivo “displicente” e, no oitavo verso, o advérbio “enfim” foram estrategicamente acrescentados na tradução para manter a rima do poema. Cabe ressaltar que tais termos não prejudicaram o sentido dos versos.

Outro recurso usado por Marsicano é a inversão de frases: ele opta por fazer inversão da frase no quinto e no sexto versos. Assim, ele transmi-tiu o sentido do verso em inglês e manteve a rima do poema em português.

Ainda no quinto verso, o autor utiliza o tempo verbal present perfect, “has found out”; assim, o tradutor modifica-o pelo pretérito perfeito “des-cobriu”, pois tal estrutura verbal não tem correspondente em português.

Em resumo, foram utilizadas, como recursos por Marsicano, as se-guintes estratégias: acréscimo, inversão, modificação, omissão e pontua-ção.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É interessante destacar que o trabalho de tradução deste poema de-sempenha um importante papel, pois, além de trazer o prazer da leitura romântica de Blake, que tem importância literária mundial, são transmi-tidos temas profundos.

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Ressalta-se que tal poema, para ser traduzido, necessita de uma com-preensão e até mesmo sensação da multiplicidade de tons e de registros do poeta. A poesia carrega uma linguagem sinistra e metáforas bem estrutu-radas, o que dificulta o trabalho do tradutor de fazer o leitor estrangeiro perceber essa mudança de tom. Nesse sentido, pode-se afirmar que, ao analisar o trabalho do tradutor de maneira global, é alcançado o objetivo de passar para os leitores as reflexões sobre o principal tema do poema.

Levando em consideração que a estrutura da língua portuguesa se diferencia consideravelmente da estrutura da língua inglesa, os elementos primordiais, como o conteúdo, o enredo, o sujeito lírico, a interlocução, as rimas alternadas, todas essas características do texto de partida foram trazidas, de forma satisfatória, ao texto de chegada.

Apesar de o tradutor não corresponder literalmente, em algumas passagens, ao poema na língua de partida, é preciso salientar que foi pre-servado o tom de lamentação e a interlocução com a “rosa/Rosa” corroída pelo verme, características fundamentais do poema. Observa-se que as opções de estratégias utilizadas pelo tradutor foram aplicadas de maneira coerente durante o texto.

REFERÊNCIASBLAKE, W. O casamento do céu e do inferno e outros escritos. Tradução de Alberto Marsicano. Porto Alegre: L&PM, 2007.

______. The Book of Thel. In: EAVES, M.; ESSICK, R. N.; VISCOMI, J. (Eds.). The William Blake Archive. Disponível em: <http://www.blakearchive.org/>. Acesso em: 1 jul. 2013.

LOPES, M. S.; LISBOA, E. G. G. O cordeiro: o paganismo no poema de William Blake. Ciberteologia – Revista de Teologia & Cultura, São Paulo, ano 2, n. 14, jun. 2009. Disponível em: <http://ciberteologia.paulinas.org.br/ciberteologia/wp-content/uploads/2009/06/01cordeiro.pdf>. Acesso em: 1 jul. 2013.

MARSICANO, A. Apresentação. In: BLAKE, W. O casamento do céu e do inferno e outros escritos. Tradução de Alberto Marsicano. Porto Alegre: L&PM, 2007.

STEIL, J. Profecia poética e tradução. America a prophecy, de William Blake, traduzida e comentada. Santa Catarina: UFSC, 2007. (Dissertação de Mestrado).

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Title: Translation of poem analysis: a case study of “The Sick Rose”, by William Blake.Author: Marcela da Fonseca Ferreira.

ABSTRACT: This article begins with a presentation about the life and the work of William Blake and the historical context and literary school that the author belonged. It is also made a brief presentation about the translator in this work, Alberto Marsicano. Therefore, it is done an interpretation of the poem “The Sick Rose”, by William Blake and, from this interpretation, an analyses of the Portuguese translation of the poem made by Alberto Marsicano, published in the book William Blake – O casamento do céu e do inferno & outros escritos. Through comparison of the source text and target text are noted and analysed the strategies that the translator used in the work, showing the results gotten in the translation.Keywords: Translation. Analysis. Poem. William Blake.

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202 Educação, Batatais, v. 1, n. 1, p. 180-188, jan./dez. 2011

POLÍTICA EDITORIAL

Linguagem Acadêmica – Revista Digital Científica

do Claretiano – Centro Universitário

É uma publicação digital semestral, do Claretiano – Centro Universitário, des-tinada à divulgação científica dos cursos, bem como de pesquisas e projetos co-munitários.O objetivo principal é publicar trabalhos que possam contribuir com o debate acerca de temas variados do ensino acadêmico.A Revista Linguagem Acadêmica destina-se à publicação de trabalhos inéditos que apresentem resultados de pesquisa histórica ou de investigação bibliográfica originais, visando agregar e associar à produção escrita a produção fotográfica, vídeo ou áudio, sendo submetidos no formato de: artigos, ensaios, relatos de caso, resumos estendidos, traduções ou resenhas.Serão considerados apenas os textos que não estejam sendo submetidos a outra publicação.As línguas aceitas para publicação são o português, o inglês e o espanhol.

Os trabalhos serão analisados da seguinte forma:

a) Analisados pelos editores, o texto pode ser desqualificado se: não estiver den-tro das normas da ABNT, apresentar problemas na formatação ou tiver redação inadequada (problemas de coesão e coerência).

b) Numa segunda etapa, os textos selecionados serão enviados a dois membros do conselho editorial que avaliarão as suas qualidades de escrita e conteúdo. Dois pareceres negativos desqualificam o trabalho e, havendo discordância, o parecer de um terceiro membro é solicitado.

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203Educação, Batatais, v. 1, n. 1, p. 180-188, jan./dez. 2011

c) Conflito de interesse: no caso da identificação de conflito de interesse da parte dos revisores, o editor encaminhará o manuscrito a outro revisor ad hoc.

d) O autor será comunicado do recebimento do seu trabalho no prazo de até 8 dias; e da avaliação do seu trabalho em até 90 dias.

e) O ato de envio de um original para a Revista Linguagem Acadêmica – Re-vista Digital Científica do Claretiano – Centro Universitário, implica, auto-maticamente, na seção dos direitos autorais a ele referentes, devendo a revista ser consultada em caso de republicação. A Revista não se responsabilizará pelo conteúdo dos textos, sendo eles de responsabilidade dos seus autores, sobre os quais recaem as respectivas responsabilidades legais relativas às informações ne-les veiculadas. Ademais, não se responsabilizará por textos já publicados em ou-tros periódicos. Cumpre ressaltar que a publicação de artigos não é remunerada.

f ) Cabe ao autor conseguir as devidas autorizações de uso de imagens/fotogra-fias com direito autoral protegido, devendo estas ser encaminhadas, quando ne-cessário, junto com o trabalho para a avaliação. Também é do autor a responsabi-lidade jurídica sobre uso indevido de imagens/fotografias.

g) Pesquisas envolvendo seres vivos: o trabalho deve ser aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição onde o trabalho foi realizado e cumprir os princípios éticos contidos na resolução 196/96. Na parte “Metodologia”, é preci-so constituir o último parágrafo com clara afirmação deste cumprimento. 

A Revista aceitará trabalhos para publicação nas seguintes categorias:

Artigo científico de professores, pesquisadores ou estudantes: mínimo de 8 e máximo de 15 páginas. Relatos de caso ou experiência: Devem conter uma abordagem crítica do even-to relatado; mínimo de 5 e máximo de 8 páginas.

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Traduções de artigos e trabalhos em outro idioma, desde que devidamente au-torizadas pelo autor original e comprovadas por meio de documento oficial im-presso; mínimo de 8 e máximo de 15 páginas.

Resumos estendidos de trabalhos apresentados em eventos científicos ou de te-ses e dissertações; mínimo de 5 e máximo de 8 páginas.

Ensaios: mínimo de 5 e máximo de 8 páginas.

Resenhas: devem conter todos os dados da obra (editora, ano de publicação, cidade etc.) e estar acompanhadas de imagem da capa da obra; mínimo de 5 e máximo de 8 páginas.

Submissão de trabalhos

1) os trabalhos deverão ser enviados:

a) Em dois arquivos, via e-mail, (attachment), em formato “doc” (Word for Windows). Em um dos arquivos, na primeira página do trabalho, deverá constar apenas o título, sem os nomes dos autores. O segundo arquivo deverá seguir o padrão descrito no ítem 2, incluindo os nomes dos autores.b) Em caráter de revisão profissional.c) No máximo com 5 autores.d) Com termo de responsabilidade devidamente assinado, escaneado de forma legível e enviado para o e-mail [email protected]

2) O trabalho deve incluir:

a) A expressão “TÍTULO”: seguida do título em língua portuguesa, em Times New Roman, corpo 12, negrito.

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b) A expressão “TITLE”: seguida do título em língua inglesa, em Times New Roman, corpo 12, normal.

c) A expressão “AUTORIA”: seguida do(s) nome(s) do(s) autor(es) e dos dados de sua(s) procedência(s) – filiação institucional, última titulação, e-mail, telefo-nes para contato. Obs.: os telefones não serão disponibilizados ao público.

d) A expressão “RESUMO”: seguida do respectivo resumo em língua portugue-sa (entre 100 e 150 palavras). Sugere-se que no resumo de artigos de pesquisa seja especificada a orientação metodológica.

e) A expressão “PALAVRAS-CHAVE”: seguida de 3 até 5 palavras-chave em língua portuguesa, no singular.

f ) A expressão “ABSTRACT”:” seguida do respectivo resumo em língua inglesa (entre 100 e 150 palavras).

g) A expressão “KEYWORDS”: seguida de 3 até 5 palavras-chave, em língua inglesa, no singular.

h) O texto do trabalho.

i) Os vídeos, as fotos ou áudios são opcionais. Todo o material de mídia digital deve ser testado antes do envio e não ultrapassar 5 minutos de exibição.

3) O formato do texto do trabalho:

a) Em Times New Roman, corpo 12, entre linhas 1,5 e sem sinalização de início de parágrafo.

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b) Para citações longas, usar corpo 10, entre linhas simples, recuo duplo, espaço antes e depois do texto. Citações curtas, até 3 linhas, devem ser colocadas no interior do texto e entre aspas, no mesmo tamanho de fonte do texto (12).

c) Tabelas, quadros, gráficos, ilustrações, fotos e anexos devem vir no interior do texto com respectivas legendas. Para anexos com textos já publicados, incluir referência bibliográfica.

d) As referências no corpo do texto devem ser apresentadas entre parênteses, com nome do autor em letra maiúscula, seguida de vírgula, seguida de espaço, da expressão “p.”, espaço e o respectivo número da(s) página(s), quando for o caso. Ex.: (FERNANDES, 1994, p. 74). A norma utilizada para a padronização das referências é a da ABNT, em vigência.

e) As seções do texto devem ser numeradas, a começar de 1 (na introdução) e ser digitadas em letra maiúscula; subtítulos devem ser numerados e digitados com inicial maiúscula.

f ) As notas de rodapé devem estar numeradas e destinam-se a explicações com-plementares, não devendo ser utilizadas para referências bibliográficas.

g) As referências bibliográficas devem vir em ordem alfabética no final do artigo, conforme a ABNT.

h) As expressões estrangeiras devem vir em itálico.

Modelos de Referências Bibliográficas – Padrão ABNT:

Livro no todoPONTES, Benedito Rodrigues. Planejamento, recrutamento e seleção de pes-soal. 4. ed. São Paulo: LTr, 2005.

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207Educação, Batatais, v. 1, n. 1, p. 180-188, jan./dez. 2011

Capítulos de Livros BUCII, Eugênio; KEHL, Maria Rita. Videologias: ensaios sobre televisão. In: KEHL, Maria Rita. O espetáculo como meio de subjetivação. São Paulo: Boi-tempo, 2004. cap. 1, p. 42-62.

Livro em meio eletrônicoASSIS, Machado de. A mão e a luva. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. Dis-ponível em: <HTTP://machado.mec.gov.br/imagens/stories/pdf/romance/marm02.pdf> Acesso em: 12 jan. 2011.

Periódico no todoGESTÃO EMPRESARIAL: Revista Científica do Curso de Administração da Unisul. Tubarão: Ed. Unisul, 2002-.

Artigos em periódicos SCHUELTER, Cibele Cristiane. Trabalho voluntário e extensão universitária. Episteme, Tubarão, v. 9, n. 26/27, p. 217-236, mar./out. 2002. Artigos de periódico em meio eletrônicoPIZZORNO, Ana Cláudia Philippi et al. Metodologia utilizada pela bibliote-ca universitária da UNISUL para registro de dados bibliográficos, utilizando o formato MARC 21. Revista ACB, Florianópolis, v. 12, n. 1, p. 143-158, jan./jun. 2007. Disponível em: <http://www.acbsc.org.br/revista/ojs/viewarticle.php?id=209&layout=abstract>. Acesso em: 14 dez. 2007.

Artigos de publicação relativos a eventos PASCHOALE, C. Alice no país da geologia e o que ela encontrou lá. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE GEOLOGIA, 33. 1984. Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro, SBG, 1984. v. 11, p. 5242-5249.

JornalALVES, Márcio Miranda. Venda da indústria cai pelo quarto mês. Diário Cata-rinense, Florianópolis, 7 dez. 2005. Economia, p. 13-14.

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208 Educação, Batatais, v. 1, n. 1, p. 180-188, jan./dez. 2011

SiteXAVIER, Anderson. Depressão: será que eu tenho? Disponível em: <http://www.psicologiaaplicada.com.br/depressao-tristeza-desanimo.htm>. Acesso em: 25 nov. 2007.

VerbeteTURQUESA. In: GRANDE enciclopédia barsa. São Paulo: Barsa Planeta Internacional, 2005. p. 215.

EventoCONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA MECÂNICA, 14., 1997, Bauru. Anais... Bauru: UNESP, 1997.

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209Educação, Batatais, v. 1, n. 1, p. 180-188, jan./dez. 2011

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