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MARIA LUISA DA SILVA PINTO JORGE
ÁREA DE VIDA, ATIVIDADE DIÁRIA E DENSIDADE
POPULACIONAL DE COTIAS NA ESTAÇÃO DE
PESQUISAS
PINKAITI – AMAZÔNIA ORIENTAL (SE-PARÁ)
São Paulo 2000
MARIA LUISA DA SILVA PINTO JORGE
ÁREA DE VIDA, ATIVIDADE DIÁRIA E DENSIDADE
POPULACIONAL DE COTIAS NA ESTAÇÃO DE
PESQUISAS
PINKAITI – AMAZÔNIA ORIENTAL (SE-PARÁ)
Dissertação apresentada ao Instituto de
Biociências da Universidade de São Paulo,
para a obtenção de Título de Mestre em
Ciências, na Área de Ecologia.
Orientador: Prof. Dr. Carlos A. Peres
São Paulo 2000
Jorge, Maria Luisa S. P.
• Área de vida, atividade diária e densidade populacional de cotias na
Estação de Pesquisas Pinkaiti – Amazônia Oriental (SE-Pará)
• 106 páginas
• Dissertação (Mestrado) – Instituto de Biociências da Universidade de
São Paulo. Departamento de Ecologia Geral.
• 1. Cotia, 2. Dasyprocta, 3. Área de Vida, 4. Densidade populacional, 5.
Atividade diária. 6. Amazônia Oriental, 7. Pinkaiti. I. Universidade de
São Paulo. Instituto de Biociências. Departamento de Ecologia Geral.
Comissão Julgadora:
Prof(a). Dr(a). Prof(a). Dr(a).
Prof(a). Dr(a). Prof(a). Dr(a).
Prof. Dr. Carlos A. Peres
Orientador
Ao Guilherme,
pelo amor, pelo carinho, pela
dedicação, pela paciência, por me
entender melhor do que ninguém
e por nunca deixar de acreditar no
meu trabalho.
Paca, tatu, cotia não.
(Folclore brasileiro)
(E quem foi que disse que não!)
AAGGRRAADDEECCIIMMEENNTTOOSS
Ao Prof. Dr. Carlos Peres, meu orientador, pelo incentivo ao longo deste trabalho
e pela leitura das partes mais importantes desta dissertação.
À Cláudia, companheira de todas as etapas deste trabalho, pelo companheirismo,
pelo incentivo, pelas tantas conversas, enfim, por inúmeras razões, difíceis de enumerar
em poucas linhas.
Aos meus pais, pelo eterno apoio e compreensão e aos meus irmãos, por
momentos de convívio sempre muito gostosos e divertidos.
Ao Paulo, meu ajudante de campo durante todo o período de coleta de dados.
Pela persistência e pela crença de que as cotias do Pinkaiti podiam ser capturadas, pela
criatividade para resolver diversos problemas no campo e pelas tantas histórias
contadas, que me fizeram dar boas risadas.
Aos cozinheiros do Projeto, Novinho, Zezinho e Nílson, pelas conversas, pelas
pescarias, pelo divertimento e pela comida, é claro!
À comunidade Mebengokré de A’Ukrê, por permitir que eu trabalhasse naquela
área, mas principalmente por propiciar o convívio com uma cultura tão diferente, o que
enriqueceu tremendamente a minha estadia. Em especial, às minhas irmãs, Noití e Pãt-
kietí, ao Beptoti, ao Y-Karuro e ao Takire.
Àqueles que conviveram comigo temporariamente no Projeto e que tornaram as
permanências sempre mais agradáveis: Bia Baker, Kiko, Aili, e Scott.
Aos companheiros de sala, no Depto. de Ecologia: Pedro, Solange, Letícia e Ceci;
aos outros colegas de departamento; e àqueles que viraram colegas de departamento,
mas que já eram amigos muito especiais e que a proximidade física e de interesses só
fez aumentar a nossa amizade: Luís, Fê e Jorge (e a Rê também, apesar de não ser
exatamente do mesmo departamento).
Ao time de futsal feminino da Biologia, pelos momentos de descontração.
Aos amigos da turma de graduação, aos outros amigos da Biologia, aos amigos
da Geologia e aos outros amigos em geral, com os quais eu sempre tive boas conversas,
tomei muita cerveja e dei muita risada.
Ao Rodolfo, a Paula, ao Pingo e a Pati, grandes amigos, que me ajudaram em
diversas partes do meu trabalho, seja de forma prática, seja através de importantes
discussões.
Ao Prof. Dr Waldir Mantovani pelo constante apoio em inúmeras questões e por
substituir o meu orientador em alguns momentos importantes.
Aos funcionários do Depto. de Ecologia Geral, pelo suporte técnico.
À Conservation International do Brasil, pelo apoio logístico no Projeto Pinkaiti e,
em especial, à Prof. Dr. Barbara Zimmerman, diretora do Projeto.
À Rosânia, funcionária do Projeto, pelo apoio em Redenção.
À CAPES, pela bolsa de Mestrado e à FAPESP e à WWF, por auxílios financeiros
para o desenvolvimento da pesquisa.
RREESSUUMMOO
O objetivo central do presente estudo foi quantificar o padrão de ocupação do espaço e
de atividade diária e a densidade populacional das cotias (Dasyprocta aguti) em uma área na
Amazônia Oriental, assim como de que forma são afetados pela oferta de alimentos. O estudo
foi conduzido de janeiro de 1997 a julho de 1998, na Estação de Pesquisas Pinkaiti, no sudeste
do Pará, Brasil, em dois locais, um com altas densidades de castanheiras (Bertholletia excelsa) e
outro, 2 km distante do primeiro, ausente de castanheiras adultas. A metodologia escolhida
para acompanhar os animais foi a rádio-telemetria e o método que se mostrou mais eficiente na
captura dos animais foi a utilização de cães de caça. No total, dez cotias foram capturadas e
receberam rádios-colares, porém somente quatro (três fêmeas e um macho, todos adultos)
puderam ser acompanhados de forma regular, pois os animais com colares exibiram alta taxa de
mortalidade.
Uma das fêmeas foi capturada em na área fora do castanhal e acompanhada durante 12
meses. As outras duas fêmeas e o macho foram acompanhados durante três meses na área de
castanhal, durante a estação chuvosa de 98 (de novembro a fevereiro). Os métodos escolhidos
para estimar a área de vida foram o do Mínimo Polígono Convexo e o da Média Harmônica,
curvas de densidade 95% e 75%. Os dois métodos foram testados quanto à estabilidade em
relação à variação do tamanho amostral e à correlação temporal entre e dentro das diferentes
temporadas de campo. Além disso, a densidade foi estimada para as populações de cotias do
castanhal e da área sem castanheiras por meio do método de censo por transecção em
varredura. Os censos foram feitos em julho-agosto de 97, fevereiro, maio e julho de 98, além de
fevereiro de 99. O tamanho da área de vida da fêmea da área fora do castanhal (Ffc), no período
de 12 meses foi 6,9 ha (MH 75%) ou 9,2 ha (MPC) e houve variação temporal tanto no tamanho
da área de vida, quanto no padrão diário de atividade deste indivíduo, apesar de apresentar
alto grau de sobreposição entre temporadas. Os tamanhos da área de vida dos indivíduos do
castanhal, no período de novembro de 97 a fevereiro de 98 foram semelhantes entre si (MH
75%: Fc1=2,7 ha; Fc2=2,3 ha; Mc=2,6 ha; MPC: Fc1=4,1 ha; Fc2=3,5 ha; Mc=4,0 ha), sendo que o
tamanho da área de vida de Ffc no mesmo período (MH 75%: 5,8 ha; MPC: 6,4 ha) foi
significativamente superior ao dos outros três. A densidade média total encontrada foi de 37
ind/km2. Todavia, a estimativa realizada dentro do castanhal (58 ind/km2) foi quase três vezes
maior do que a realizada fora dele (23 ind/km2).
Os resultados obtidos neste estudo indicam uma correlação apenas parcial entre o
tamanho da área de vida de cotias e a oferta de alimentos no chão da mata, evidenciando a
importância da armazenagem dispersa (“scatterhoarding”) em amenizar os efeitos das
temporadas de escassez de alimentos. No entanto, como previsto pelas principais teorias de
forrageamento, o estudo mostra claramente que altas densidades de castanheiras resultam em
populações de cotias consideravelmente maiores, compostas por animais com áreas de vida
mais restritas.
AABBSSTTRRAACCTT
The main objective of this study was to quantify the use of space, daily activity patterns,
and the population density of agoutis (Dasyprocta aguti) in eastern Brazilian Amazonia, as well
as how these variables are affected by food availability. The study was carried out from
January1997 to July1998 at the Pinkaiti Research Station, southeastern Pará, Brazil, within two
separate study areas, one with a high density of Brazil-nut trees (Bertholletia excelsa) and another
2 km apart where no adult Bertholletia trees were observed. I used radio-telemetry to follow the
study animals and the most successful of a wide range of capture techniques employed was the
use of hunting dogs. In total, 10 agoutis were captured and radiocollared, although only four
(three females and one male, all adults) could be followed on a regular basis, because animals
with transmitters exhibited high mortality rates.
One of the females was captured outside the Brazil-nut tree grove and was radio-tracked
during a 12-month period. The other two females and the male were regularly located during a
3-month period within the Brazil-nut grove, during the rainy season of 1998 (November -
February). In all cases, I used the Minimum Convex Polygon (MCP) and the Harmonic Mean
(HM; 95 % and 75 % density curves) to estimate home range size. The stability and statistical
power of these methods were tested in relation to variation in sample sizes within and between
different sampling seasons. In addition, population densities inside and outside the Brazil-nut
grove were estimated using a “drive” line-transect census technique in which parallel transects
were sampled simultaneously by multiple independent observers. The censuses were
performed in July-August 1997; February, May and July, 1998; and February 1999. The home
range size of the female outside the Brazil-nut grove (Ffc), in the entire 12-month study period,
was 6.9 ha (75% HM) and 9.2 ha (MCP) and temporal differences both in home range size and
daily activity patterns of this individual were examined, despite the high observed overlap
across seasons. Home range size estimates for the radiotracked animals within the Brazil-nut
grove, between November1997 and February1998, were similar to one another (75 % HM:
Fc1=2,7; Fc2=2,3 ha; Mc=2,6 ha; MCP: Fc1=4,1 ha; Fc2=3,5 ha; Mc=4,0 ha); whereas the equivalent
values for Ffc (75 % HM: 5,8 ha; MCP: 6,4 ha) were significantly higher. The overall mean
density of the agouti population at the study area was 37 ind./km2. However, the local density
estimate inside the Brazil-nut grove (58 ind./km2) was over twofold higher than that outside (23
ind./km2).
Results obtained in this study indicate that agouti home range size and their food supply
on the forest leaf-litter are only weakly correlated, highlighting the importance of seed
scatterhoarding in buffering the effects of seasonal food scarcity. However, as predicted by
mainstream foraging theory, the study clearly shows that high Brazil-nut densities results in
considerably larger population densities consisting of animals with consistently smaller home
ranges.
i
ÍÍNNDDIICCEE
CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO E ÁREA DE ESTUDO...............................................1-1
1. Prefácio...........................................................................................................1-1
2. A família Dasyproctidae...............................................................................1-2
2.1 Relações supra-familiares................................................................................1-2
2.2 Histórico da infra-ordem Caviomorpha...........................................................1-2
2.3 Características morfológicas e distribuição geográfica .....................................1-3
2.4 Importância ecológica .....................................................................................1-4
2.5 Objetivos ........................................................................................................1-8
3. Área de estudo...............................................................................................1-8
3.1 Localização geográfica e características naturais da região ..............................1-8
3.2 A população de cotias da área de estudo ..........................................................1-9
3.3 Relevância conservacionista da área.............................................................. 1-10
3.4 A implantação da Estação de Pesquisas Pinkaiti ........................................... 1-11
4. Estrutura da dissertação .............................................................................1-12
5. Referências Bibliográficas...........................................................................1-13
CAPÍTULO 2: PROCEDIMENTOS, ESFORÇOS E RESULTADOS DE CAPTURA DE
Dasyprocta aguti (DASYPROCTIDAE, RODENTIA) EM UMA ÁREA NA
AMAZÔNIA ORIENTAL............................................................................................
.....................2-1
ii
1. Introdução......................................................................................................2-1
2. Material e Métodos........................................................................................2-3
2.1 Formas de captura utilizadas no presente estudo ............................................2-3
3. Resultados......................................................................................................2-5
3.1 1a viagem (27/01/1997 a 03/03/1997 – 31 dias) ..............................................2-6
3.2 2a viagem (04/04/1997 a 06/06/1997 – 64 dias) ..............................................2-7
3.3 3a viagem (19/07/1997 a 03/09/1997 – 47 dias)..............................................2-8
3.4 4a viagem (10/10/1997 a 26/11/1997 – 48 dias) ..............................................2-8
3.5 5a viagem (11/01/1998 a 27/02/1998 – 48 dias)...............................................2-9
3.6 6a viagem (15/04/1998 a 14/05/1998 – 30 dias) ..............................................2-9
3.7 Resultados Gerais...........................................................................................2-9
4. Discussão e conclusões ...............................................................................2-12
5. Referências Bibliográficas...........................................................................2-14
CAPÍTULO 3: ANÁLISE DOS MÉTODOS DE ESTIMATIVA DE ÁREA DE VIDA
MÍNIMO POLÍGONO CONVEXO E MÉDIA HARMÔNICA QUANTO À
CONSISTÊNCIA EM RELAÇÃO AO NÚMERO DE LOCALIZAÇÕES E À CORRELAÇÃO
TEMPORAL 3-1
1. Introdução......................................................................................................3-1
2. Material e Métodos........................................................................................3-4
2.1 Número mínimo de localizações......................................................................3-5
2.2 Determinação da correlação temporal .............................................................3-6
3. Resultados......................................................................................................3-7
iii
3.1 Número mínimo de localizações......................................................................3-7
3.2 Determinação da correlação temporal .............................................................3-9
4. Discussão......................................................................................................3-12
5. Conclusões ...................................................................................................3-14
6. Referências Bibliográficas...........................................................................3-15
CAPÍTULO 4: ÁREA DE VIDA E ATIVIDADE DIÁRIA DE UMA FÊMEA ADULTA DE
Dasyprocta aguti (DASYPROCTIDAE, RODENTIA) E A SUA RELAÇÃO COM A
OFERTA DE FRUTOS NO CHÃO DE UMA MATA NA AMAZÔNIA ORIENTAL ........4-1
1. Introdução......................................................................................................4-1
2. Materiais e Métodos......................................................................................4-2
2.1 Captura e monitoramento...............................................................................4-2
2.2 Área de vida, atividade e dados comportamentais............................................4-3
2.3 Pluviosidade e censo de frutos.........................................................................4-4
3. Resultados......................................................................................................4-5
3.1 Tamanho da área de vida ................................................................................4-6
3.2 Distribuição espacial das localizações .............................................................4-7
3.3 Padrão diário de atividade............................................................................. 4-11
3.4 Precipitação e oferta de frutos no chão da mata ............................................. 4-14
3.5 Relação entre oferta de frutos, área de vida e o padrão diário de atividade...... 4-15
4. Discussão......................................................................................................4-17
5. Conclusões ...................................................................................................4-19
6. Referências Bibliográficas...........................................................................4-19
iv
CAPÍTULO 5: ÁREA DE VIDA E DENSIDADE POPULACIONAL DE COTIAS
(Dasyprocta aguti, RODENTIA): COMPARAÇÃO ENTRE DUAS ÁREAS COM
DIFERENTES DENSIDADES DE CASTANHEIRAS (Bertholettia excelsa,
LECYTHIDACEAE) EM UMA MATA DA AMAZÔNIA ORIENTAL ..........................5-1
1. Introdução......................................................................................................5-1
2. Material e Métodos........................................................................................5-3
2.1 Captura e monitoramento...............................................................................5-3
2.2 Área de vida ...................................................................................................5-3
2.3 Densidade Populacional .................................................................................5-3
3. Resultados......................................................................................................5-4
3.1 Áreas de vida dos indivíduos do castanhal ......................................................5-6
3.2 Comparação entre o tamanho da área de vida dos indivíduos do castanhal e o da
fêmea de fora do castanhal (Ffc)..............................................................................5-9
3.3 Densidade de Dasyprocta aguti dentro e fora do castanhal ......................... 5-11
4. Discussão......................................................................................................5-13
4.1 Tamanhos de área de vida dos indivíduos do castanhal ................................. 5-13
4.2 Densidade de cotias, tamanho de área de vida e sua relação com oferta diferencial
de castanhas ........................................................................................................ 5-14
5. Conclusões ...................................................................................................5-16
6. Referências Bibliográficas...........................................................................5-17
CAPÍTULO 6: CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................6-1
v
ÍÍNNDDIICCEE DDEE FFIIGGUURRAASS
CAPÍTULO 1
Figura 1.1: Mapa de distribuição dos gêneros Dasyprocta (cinza esc.) e Myoprocta
(cinza esc. com hachura); extraído de Ximenes (1999).........................1-4
Figura 1.2: Mapa de localização da área de estudo; a partir de Instituto
Socioambiental (1996) .............................................................................1-8
Figura 1.3: Climadiagrama do município de Redenção (08º 05' S 50º 30' O), a 220
km sudeste da Estação de Pesquisas Pinkaiti, PA. Dados
metereológicos de setembro de 1985 a março de 1989.........................1-9
Prancha 1
CAPÍTULO 2
Prancha 2
CAPÍTULO 3
Figura 3.1: Variação da média das estimativas do tamanho de área de vida em
função do número de localizações.........................................................3-8
Figura 3.2: Variação dos desvios padrões das estimativas de área de vida em
função do número de localizações.........................................................3-9
Figura 3.3: Variação no valor do índice de “Schoener” amostral e crítico (α=0,05) e
nas estimativas de tamanho de área de vida utilizando MPC, MH 75%
e MH 95% em função da variação no intervalo mínimo entre
localizações consecutivas. .................................................................... 3-11
vi
CAPÍTULO 4
Figura 4.1: Estimativa do tamanho da área de vida de Ffc pelo método da Média
Harmônica (75%), por temporada de campo. As barras de erro
representam o erro de localização deduzido pela simulação de Monte
Carlo. ........................................................................................................4-7
Figura 4.2: Estimativa do tamanho da área de vida de Ffc, pelo método da Média
Harmônica (75%), por períodos dentro das temporadas (os dados por
temporada estão separados em dois grupos de tamanhos amostrais
próximos e que amostram períodos semelhantes)...............................4-7
Figura 4.3: Mapas da área de vida de Ffc estimada pelo método do Mínimo
Polígono Convexo e da Média Harmônica, densidades de 95%, 75%,
50%, 25%. Os centros de maior permanência estão representados pelos
pontos.......................................................................................................4-9
Figura 4.4: Sobreposição das áreas de vida de Ffc estimadas pelo método de Média
Harmônica. As cores correspondem às temporadas, conforme a figura
4.3, e os pontos representam os centros de maior permanência. ...... 4-10
Figura 4.5: Área de vida de Ffc quando ativa (azul) e inativa (roxo). Os pontos
cinzas indicam os centros de atividade com todos os dados. ........... 4-11
Figura 4.6: Tamanho da área de vida (MH 75%) de Ffc ativa e inativa (os valores
encima das barras eqüivalem ao número de localizações de cada
estimativa). ............................................................................................ 4-11
Figura 4.7: Freqüência relativa das localizações em que Ffc estava ativa.............. 4-12
Figura 4.8: Freqüência relativa do animal ativo e tamanho da área de vida de Ffc ....
................................................................................................................ 4-13
Figura 4.9: Curva de precipitação (barras) e disponibilidade de frutos (linhas) da
Estação de Pesquisas Pinkaiti, dados de abril de 1996 a agosto de
1998......................................................................................................... 4-14
vii
Figura 4.10: Relação entre a oferta de frutos no chão da mata e o tamanho da área
de vida (ha) de Ffc (A) e o padrão diário de atividade (B). ............... 4-15
CAPÍTULO 5
Figura 5.1: Esforço diário de coleta de dados. As linhas tracejadas verticais
separam as temporadas de campo. .......................................................5-5
Figura 5.2: Área de vida dos indivíduos do castanhal (Fc1 = linha azul; Fc2 = linha
vermelha; Mc = linha cinza), calculada pelo Mínimo Polígono Convexo
e pela Média Harmônica, curvas de densidade de 95%, 75%, 50%, 25%.
Os centros de maior permanência estão representados pelos pontos. ....
..................................................................................................................5-7
Figura 5.3: Variação temporal do tamanho da área de vida dos indivíduos do
castanhal ..................................................................................................5-8
Figura 5.4: Mapas das áreas de vida dos indivíduos do castanhal, separados por
mês. As cores correspondem às mesmas da figura 5.2. .......................5-8
Figura 5.5: Áreas de vida e localizações dos indivíduos do castanhal e das
castanheiras com DAP ≥ 60 cm..............................................................5-9
Figura 5.6: Áreas de vida dos quatro indivíduos acompanhados neste estudo (MH,
95%, 75%, 50%, 25% e centros de atividade)....................................... 5-10
Figura 5.7: Variação mensal do tamanho da área de vida dos quatro indivíduos
acompanhados na Base de Pesquisas Pinkaiti, de novembro de 1997 a
fevereiro de 1998. .................................................................................. 5-11
Figura 5.8: Média (± desvio padrão) da densidade de D. aguti nas diferentes
estações do ano (dentro do castanhal) e nas áreas dentro e fora do
castanhal, na estação seca..................................................................... 5-12
viii
ix
ÍÍNNDDIICCEE DDEE TTAABBEELLAASS
CAPÍTULO 1
Tabela 1.1: Estudos desenvolvidos com dispersão de sementes por cotias e cotiaras
..................................................................................................................1-5
CAPÍTULO 2
Tabela 2.1: Cronograma das viagens de campo........................................................2-5
Tabela 2.2: Eficiência de captura de cotias na E. P. Pinkaiti, de jan/97 a jul/98.. 2-10
Tabela 2.3: Dados dos indivíduos capturados ........................................................ 2-11
Tabela 2.4: Situação dos indivíduos capturados até o final do estudo ................. 2-12
CAPÍTULO 3
Tabela 3.1: Principais métodos de análise de área de vida; modificado de Van
Winkle (1975)...........................................................................................3-3
Tabela 3.2: Número de localizações dos quatros indivíduos de D. aguti
acompanhados neste estudo ..................................................................3-5
Tabela 3.3: Intervalos mínimos e tamanhos amostrais em que a correlação
temporal foi eliminada ......................................................................... 3-10
Tabela 3.4: Correlação de Spearman entre tamanho amostral, índice de “Schoener”
(t2/r2) e estimativas da área de vida, utilizando a Média Harmônica,
densidades de 95% (MH 95) e 75% (MH 75) e o Mínimo Polígono
Convexo ................................................................................................. 3-11
x
CAPÍTULO 4
Tabela 4.1: Estimativas de tamanho de área de vida de Ffc .....................................4-6
Tabela 4.2: Sobreposição das áreas de vida das temporadas de Ffc ...................... 4-10
CAPÍTULO 5
Tabela 5.1: Indivíduos acompanhados durante o estudo ........................................5-5
Tabela 5.2: Tamanho da área de vida (ha) ± desvio padrão, dos indivíduos
acompanhados no castanhal ..................................................................5-6
Tabela 5.3: Área de vida (ha) das três cotias do castanhal .......................................5-7
Tabela 5.4: Tamanho da área de vida (ha) ± desvio padrão dos quatro indivíduos
acompanhados neste estudo, no período de Novembro de 97 a
Fevereiro de 98. ..................................................................................... 5-11
Tabela 5.5: Densidade de D. aguti na estação de Pesquisas Pinkaiti .................... 5.12
Tabela 5.6: Densidade de cotias da Estação de Pesquisas Pinkaiti, estimado a partir
de censos por transecção e dados de rádio-telemetria....................... 5-13
1-1
CCaappííttuulloo 11::
IINNTTRROODDUUÇÇÃÃOO EE ÁÁRREEAA DDEE EESSTTUUDDOO
1. Prefácio
Cotias e cotiaras (Dasyprocta e Myoprocta, Dasyproctidae, Rodentia) são
importantes dispersores de sementes de grande porte1 devido a um comportamento
bastante especializado denominado armazenagem dispersa (“scatterhoarding”; Morris,
1962). Este comportamento consiste no enterramento de sementes para futuro consumo
e permite a germinação daquelas que por algum motivo não são mais recuperadas. Esta
característica torna a família Dasyproctidae especialmente importante na dinâmica de
uma grande variedade de árvores neotropicais de diferentes famílias (e.g. Leguminosae,
Palmae, Lecythidaceae, etc.) cujas sementes possuem tais características.
Neste contexto, torna-se de grande relevância compreender os padrões de
ocupação do espaço por dasiproctídeos e sua relação com a distribuição espacial de
espécies arbóreas cujas sementes são por eles dispersas. Entretanto, a ecologia de cotias
e cotiaras ainda é pouco conhecida, com grande carência de estudos de longo prazo.
Áreas preservadas que combinem (i) grande abundância de dasiproctídeos e (ii)
a presença de espécies arbóreas com sementes de grande porte são especialmente
adequadas para o desenvolvimento de estudos deste tipo. A Estação de Pesquisas
Pinkaiti (7o 46’ 14”S; 51o 57’ 43”W), localizada no sudeste do Pará (Amazônia Oriental),
possui alta densidade de cotias (Peres et al., 1997).e de algumas espécies arbóreas que
possuem sementes de grande porte, como castanheiras (Bertholettia excelsa,
Lecythidaceae), inajás (Maximiliana maripa, Palmae) e tucuns (Astrocarium vulgare,
Palmae). A estação faz parte da Área Indígena Kayapó (AI Kayapó) que, juntamente
com outras áreas indígenas contíguas, compreende uma área de aproximadamente 11
1 Sementes grandes, de alto valor energético, que são muito procuradas e predadas por mamíferos e aves
em geral
1-2
milhões de hectares de flora e fauna pouco alterados. Portanto, a E. P. Pinkaiti se
configura como local ideal para o desenvolvimento de um estudo ecológico com cotias,
como o acima descrito.
2. A família Dasyproctidae
2.1 Relações supra-familiares
Cotias e cotiaras (Dasyprocta e Myoprocta) pertencem a um grupo de roedores
(Ordem Rodentia) originalmente restrito à América do Sul e denominado infra-ordem
Caviomorpha. Juntamente com algumas famílias africanas os caviomorfos compõem a
subordem Hystricognathi. Esta subordem possui diversas características
sinapomórficas que sustentam o monofiletismo do agrupamento (Carrol, 1988).
Se pacas forem separadas de cotias e cotiaras (classificação proposta por Cabrera,
1961, e que será adotada neste estudo) atualmente são reconhecidas 12 famílias com
representantes não extintos na infra-ordem Caviomorpha (Nowak 1991). Destas, as que
possuem representantes em ambientes florestais podem ser divididas genericamente
em três grandes grupos (Emmons & Feer, 1990): os porcos-espinhos, da família
Erethizontidae; os caviomorfos mais parecidos com ratos, da família Echimyidae; e o
grupo dos grandes caviomorfos terrestres, que inclui quatro famílias, das quais três são
mono-específicas: as capivaras (Hydrochaeris hydrochaeris, Hydrochoeridae), as
pacaranas (Dinomys branickii, Dinomyidae), as pacas (Agouti paca, Agoutidae) e as cotias
e cotiaras (Dasyproctidae). Estes grupos têm semelhanças morfológicas entre si, mas
não necessariamente monofiléticos.
2.2 Histórico da infra-ordem Caviomorpha
Os primeiros registros de roedores caviomorfos na América do Sul são
provenientes da Patagônia e da Bolívia e datam do Oligoceno Inferior (~35 milhões de
anos atrás) (Luckett & Hartenberger, 1985). No Oligoceno Médio (~30 m.a.a.) já podem
ser reconhecidas 7 famílias diferentes, nos registros da Bolívia (Carrol, 1988).
1-3
Não se sabe ao certo por onde os ancestrais dos caviomorfos chegaram à América
do Sul. Existem duas hipóteses divergentes em relação à sua origem. A primeira,
defendida por Patterson e Wood (1982), sugere que os caviomorfos não podem ser
provenientes da África pois seus registros são tão antigos quantos os das famílias
africanas e que, portanto, seriam mais próximos de um grupo norte-americano
chamado Franimorpha, pois estes possuem algumas características incipientes dos
Hystricognathi, apesar de não pertencerem a esta subordem. No entanto, esta última
afirmação é contestada por Korth (1984). Já Lavocat (1980 apud Carrol, 1988) sustenta a
idéia de que os caviomorfos são mais próximos dos Hystricognathi africanos,
afirmando ser possível eles terem atravessado o Oceano Atlântico e confirmando o
monofiletismo do grupo. Nos dois casos, o grupo ancestral deve ter chegado ao
continente sul-americano por ilhas flutuantes, pois nesta época o continente não possuía
ligações por terra com os demais.
2.3 Características morfológicas e distribuição geográfica
Os dois gêneros da família Dasyproctidae (Dasyprocta e Myoprocta) são muito
semelhantes, tanto morfologicamente (prancha 1 – figuras A e B) quanto no aspecto
comportamental. São roedores de porte médio com peso que varia de 600 a 4000g e
comprimento total que vai de 320 a 620mm (Nowak, 1991). São animais diurnos,
terrestres e cursoriais e se alimentam principalmente de frutos e sementes (Henry,
1999).
A principal diferença entre os dois gêneros é o tamanho corporal. Myoprocta
chega a ser 1,6 vezes menor do que Dasyprocta, onde as duas espécies ocorrem
simpatricamente (Dubost, 1988). Além disso, cotiaras possuem uma pequena cauda (5 a
6 cm), com um tufo de pêlos brancos na ponta, sendo que nas cotias, a cauda é
praticamente residual.
A família Dasyproctidae se distribui desde o Sul do México até o Norte da
Argentina e está associada principalmente a ambientes florestais, em altitudes que vão
desde o nível do mar até 2000m (Nowak, 1991). Os dois gêneros têm distribuição
parcialmente sobreposta. Cotias podem ser encontradas na totalidade da distribuição da
1-4
família, ao passo que cotiaras se restringem à região amazônica (figura 1.1). A
distribuição mais ampla das cotias ainda não foi bem explicada, mas parece decorrer do
fato destas serem animais menos exigentes ecologicamente, podendo ocorrer em
diferentes tipos de ambientes, ao passo que cotiaras são restritas a ambientes florestais
menos alterados (Dubost, 1988).
Figura 1.1: Mapa de distribuição dos gêneros Dasyprocta (cinza escuro) e Myoprocta (cinza
escuro com hachura); extraído de Ximenes (1999)
2.4 Importância ecológica
Roedores são importantes predadores de sementes (Van der Pijl, 1972). Cotias e
cotiaras não fogem à regra, apresentando uma dieta baseada em frutos e sementes
disponíveis no chão dos ambientes em que vivem (Smythe et al., 1982, Dubost, 1988
Henry, 1999).
No entanto, dasiproctídeos parecem ser também importantes dispersores de
alguns tipos de sementes (Prance & Lovejoy, 1985). A partir da década de 80, mas
principalmente na década de 90, diversos trabalhos têm sido publicados, descrevendo a
importância das cotias na dispersão de sementes de grande porte, nas florestas
neotropicais. A tabela 1.1 apresenta alguns destes trabalhos.
1-5
Tabela 1.1: Estudos desenvolvidos com dispersão de sementes por cotias e cotiaras
Referência Espécie arbórea (Família) Local Hallwachs, 1986 Asquith et al., 1999
Hymeneae courbaril (Leguminosae)
Costa Rica
Smythe, 1989 Astrocarium standleyanum (Palmae)
Panamá
Forget, 1990 e 1994 Vouacapoua americana (Leguminosae)
Guiana Francesa
Forget, 1992 Gustavia superba (Lecythidaceae)
Guiana Francesa
Forget, 1996 Carapa procera (Meliaceae)
Guiana Francesa
Forget & Milleron, 1991 Virola nobilis (Myristicaceae)
Panamá
Peres & Baider, 1997 Peres et al., 1997
Bertholettia excelsa (Lecythidaceae)
Brasil
Wenny, 1999 Guarea glabra e G. kunthiana (Meliaceae)
Guiana Francesa
A dispersão de sementes é importante pois aumenta a probabilidade de
recrutamento, por causa da diminuição da influência de fatores de mortalidade
dependentes de densidade e de distância, como predação, parasitismo e competição
intra-específica (Janzen, 1970). Diversas espécies arbóreas das florestas neotropicais têm
as suas sementes dispersas por animais, sendo que o tipo de dispersão zoocórica mais
comum nas florestas neotropicais é a endozoocoria (Howe & Smallwood, 1982).
Entretanto, algumas espécies produzem sementes grandes demais para serem dispersas
via endozoocoria e são muito predadas por possuírem valor nutritivo elevado.
Huber, em 1910, já descreve as cotias como os principais dispersores de castanha-
do-Pará. O autor observou que estes animais abriam os frutos e enterravam parte das
sementes no solo da mata, para utilizá-las mais tarde como reserva alimentar.
Posteriormente, comportamento similar foi descrito por Morris (1962) para um grupo
de cotiaras, da espécie M. exilis, que o autor estudou em cativeiro. Os animais foram
observados enterrando sementes no chão, sendo que cada unidade alimentar era
enterrada em um local distinto dos outros. O comportamento foi denominado pela
primeira vez “scatterhoarding” (aqui traduzido por “armazenagem dispersa”) e é
1-6
amplamente utilizado atualmente. Parece ser um comportamento comum entre
diversos grupos de roedores que armazenam nozes em geral (Vander Wall, 1990)e
confere às cotias e cotiaras um papel fundamental na dispersão deste tipo de semente,
pois as sementes enterradas e não recuperadas por algum motivo, aumentam a sua
chance de sobrevivência.
Os autores citados na tabela (tabela 1.1) comprovaram que a dispersão via
armazenagem dispersa é indispensável para o recrutamento das espécies em questão,
pois suas sementes apresentam taxas muito altas de predação quando não enterradas,
mesmo no caso de espécies que têm suas sementes dispersas primariamente por aves e
mamíferos arborícolas (V. nobilis – Forget & Milleron, 1991; G. glabra e G. kunthiana –
Wenny, 1999).
Além disso, este tipo de dispersão também pode influenciar no padrão de
distribuição de algumas espécies. Tanto Forget (1994), Forget e col. (1999) como Peres &
Baider (1997) e Peres e col. (1997) afirmam que o padrão de dispersão a curtas distâncias
(<20m) proporcionado por cotias e cotiaras, juntamente com características edáficas de
uma região, determinam a distribuição agregada de espécies como acapu e castanheira.
Contudo, apesar da importância ecológica desses animais, poucos trabalhos têm
sido desenvolvidos enfocando a ecologia comportamental, alimentar e espacial de
dasiproctídeos em ambientes naturais. O primeiro estudo de campo mais detalhado e
completo com uma população desta família foi realizado por Smythe (1978). O autor fez
um extenso trabalho de história natural com uma população de cotias (D. punctata), na
Ilha de Barro Colorado, Panamá, descrevendo aspectos de dinâmica populacional,
ocupação do espaço e de comportamento em geral.
Alguns outros estudos foram desenvolvidos com populações de cotias da
América Central (Murie, 1977, Panamá; Clark & Galef, 1977, Panamá; Rodríguez &
Vaughan, 1985, Costa Rica). Murie (1977) analisou o comportamento de reencontro de
sementes enterradas e concluiu que os animais as reencontram usando principalmente o
olfato. Clark & Galef (1977) estudaram os padrões de interação agressiva e de utilização
do espaço e concluíram que cotias não são essencialmente territorialistas, podendo até
1-7
ser indiferentes à presença de outros indivíduos, mas criam uma hierarquia de
utilização de determinada área quando esta apresenta importante fonte de alimento em
épocas de escassez e que interações agonísticas aumentam na época reprodutiva.
Rodríguez & Vaughan (1985) foram os primeiros a definir o tamanho da área de vida de
uma cotia, utilizando rádio-telemetria ,estimativa que foi de 3,9 ha. No entanto, são
estudos de curta duração, com resultados específicos e nenhuma discussão mais ampla.
Dubost (1988) foi o primeiro a conduzir um trabalho com dasiproctídeos sul-
americanos. Ele estudou uma população de cotiaras (M. exilis) na Guiana Francesa,
abordando aspectos ecológicos gerais, como seleção de hábitat, atividade diária, área de
vida e organização social. Dentre suas diversas conclusões, o autor afirma que as
cotiaras são muito eficientes na exploração do espaço que usam e que reduzem suas
atividades na época seca, alimentando-se essencialmente das sementes enterradas.
Além disso, que apesar da semelhança morfológica e comportamental com cotias, as
duas espécies exploram tipos de ambientes diferentes.
Recentemente Henry (1994, 1997 e 1999) publicou uma série de trabalhos
abordando a ecologia alimentar de cotias, assunto fundamental para a compreensão da
interação entre cotias e sementes e que, até então, não havia sido devidamente
estudado. Seus trabalhos foram realizados na Guiana Francesa e o autor concluiu que
cotias se reproduzem o ano inteiro, independente de variações na oferta de alimento,
mas que variações ambientais podem influenciar na taxa reprodutiva (1994), que a dieta
destes animais é baseada principalmente em frutos e sementes (1999) e que não varia
muito entre machos, fêmeas grávidas e não grávidas (1997). Todos estes resultados
parecem confirmar a importância da armazenagem dispersa nos padrões de
alimentação destes animais.
Ainda assim, a literatura carece de estudos a longo prazo sobre questões
ecológicas relacionadas padrões de ocupação do espaço por cotias e suas relações com
variações ambientais.
1-8
2.5 Objetivos
Diante do panorama apresentado, o presente trabalho teve como objetivo central
estudar os padrões de ocupação do espaço de uma população de cotias e seu
relacionamento com a oferta de recursos alimentares.
Para tanto, buscou-se documentar as variações temporais e espaciais na área de
vida, na atividade diária e na densidade populacional das cotias e comparar com as
variações na oferta de frutos e sementes na chão da mata.
3. Área de estudo
3.1 Localização geográfica e características naturais da região
A Estação de Pesquisas Pinkaiti (7o 46’ 14”S; 51o 57’ 43”W) é uma reserva
biológica de 10.000 ha, situada no Sudeste do Estado do Pará, dentro da Área Indígena
Kayapó, próxima da aldeia de A’Ukrê, às margens de um afluente de segunda ordem
do rio Xingu, o Rio Riozinho (figura 1.2).
Figura 1.2: Mapa de localização da área de estudo; a partir de Instituto Socioambiental (1996)
A área está situada na bacia hidrográfica do Rio Xingu que pertence à Bacia
Amazônica. Seu relevo é definido por grandes extensões de planície, com presença de
morros residuais. Enclaves de relevo altiplano, já característico do relevo do Planalto
1-9
Central, também ocorrem na região. A altitude varia de 200 a 450m acima do nível do
mar (RADAM, 1974).
O clima é quente e úmido, com três meses de seca intensa, entre junho e agosto.
Não há dados completos de precipitação e temperatura para a Estação do Pinkaiti, mas
sabe-se que em Redenção, cidade localizada 220 km a leste de Pinkaiti, as chuvas anuais
estão em torno de 1650mm, com precipitações mensais de 200mm na época chuvosa e
30mm na seca. A temperatura média anual é de 27,5o C (figura 1.3).
Figura 1.3: Climadiagrama do município de Redenção (08º 05' S 50º 30' O), a 220 km sudeste da
Estação de Pesquisas Pinkaiti, PA. Dados metereológicos de setembro de 1985 a março de 1989.
Nas planícies, a vegetação predominante é do tipo florestal (prancha 1 - figura
C), com fisionomias heterogêneas, como floresta de palmeiras, com dominância de inajá
(Maximiliana maripa, Palmae), mata de cipó (sensu Balée & Campbell, 1990) e mata de
terra firme, (RADAM, 1974). Nos planaltos mais a leste, a vegetação presente é o
cerrado (prancha 1 – figura D), que ocorre na suas diversa formas, de campestre a
florestal.
3.2 A população de cotias da área de estudo
Segundo revisão feita por Ximenes (1999) D. aguti é a espécie presente na área de
estudo e esta espécie faz parte do grupo leporina, que inclui outras quatro espécies:
D. leporina, D. croconata, D. prymnolopha e uma espécie não determinada. A espécie D.
1-10
aguti tem distribuição disjunta, com representantes na Amazônia, entre os rios Madeira
e Tocantins e no leste do país, próxima ao litoral, nos Estados da Paraíba, Pernambuco,
Bahia, Espírito Santo (na vertente leste da Serra do Espinhaço), Rio de Janeiro e São
Paulo (também na vertente leste da Serra do Mar). Para todas as localidades, a espécie
ocorre entre as quotas altimétricas de 0 e 900 m. Possui garupa alaranjada, salpicada de
negro ou marrom e a coloração do corpo varia de cinza-oliváceo a marrom claro
misturado com oliva (prancha 1 – figura E).
A população da área de estudo teve a sua densidade populacional estimada em
cerca de 44 ind/km2 (Peres et al. ,1997), densidade alta se comparada com outras
estimativas (Tikal, Guatemala: 8 ind/km2 – Cant, 1977; Cocha Cashu, Peru: 5 ind/km2,
Janson & Emmons, 1990).
3.3 Relevância conservacionista da área
A região oriental da Amazônia é uma área de muitas riquezas minerais (e.g.,
ouro, ferro, etc.) e vegetais (e.g., mogno, castanheira, cedro, jatobá, etc.). Tem sofrido
grandes impactos antrópicos nas últimas décadas devido ao crescimento populacional
humano e às migrações para o Centro-Oeste e Norte do Brasil para a exploração das
suas riquezas naturais e para exploração agropecuária (Diegues, 1999).
A Área Indígena Kayapó (AI Kayapó) é uma área de aproximadamente 3,3
milhões de hectares, com 2000 “Mebengocré”2 vivendo nela (censo de 1990). É uma área
contígua com a AI Menkragnoti, com 5 milhões de hectares e 700 Mebengocré (censo de
1994). A AI Menkragnoti ainda faz fronteira com mais duas terras indígenas, a AI Baú,
de 1,85 milhões de hectares e 130 Mebengocré (censo de 1994) e a AI Capoto/Jarina, de
600 mil hectares e 800 Mebengocré (censo de 1995) (Instituto Socioambiental, 1996).
Portanto, o conjunto compreende uma área de aproximadamente 11 milhões de
hectares, onde vivem menos de 4000 pessoas.
2 Auto denominação do índios Kayapó, que será aqui utilizada, pois Kayapó é uma denominação criada
por outros grupos, de conotação pejorativa, que significa “cara de macaco”.
1-11
Os povos Mebengocré têm um histórico de luta e defesa de suas terras; por isso,
os 11 milhões de hectares que lhes pertencem ainda possuem boa parte da sua flora e
fauna em estado primário de conservação. Esta situação é bem diferente da que ocorre
nas áreas no entorno das Áreas Indígenas, pois estas já foram quase completamente
desmatadas, principalmente na porção que está a leste das AIs. Portanto, as terras
Mebengocré ainda servem de barreira para a frente de ocupação agropecuária do
sudeste do Pará.
Contudo, os Mebengocré têm deixado grupos madeireiros e garimpeiros
explorarem seus recursos minerais e vegetais (principalmente ouro e mogno) em troca
de dinheiro ou mantimentos. Por isso, é extremamente importante e necessário
incentivar, criar e apoiar formas alternativas de renda para as comunidades
Mebengocré, que possibilitem a conservação da área.
3.4 A implantação da Estação de Pesquisas Pinkaiti
A implantação da Estação de Pesquisas Pinkaiti ocorreu em 1992 e foi uma idéia
conjunta entre a Dr. Barbara Zimmerman e a comunidade da aldeia A’Ukrê, com o
objetivo de criar formas alternativas geração de recursos para a comunidade e estudar a
fauna e flora da região. Para a instalação física da Estação de Pesquisas houve apoio
financeiro das instituições “David Suzuki Foundation” e “Conservation International”
(CI), sendo que a última ainda financia as instalações físicas e paga parte dos
funcionários.
Atualmente a Estação conta com instalações para a permanência na área, como
uma casa principal, para guardar equipamentos, cozinha, banheiro e locais para dormir
(prancha 1 – figura F). O acesso é feito de avião monomotor até a aldeia e de barco a
motor de polpa da aldeia até a base. A comunicação é feita via rádio-amador e a energia
é obtida a partir de placas solares. Além disso, a Estação conta com um cozinheiro
permanente e um escritório de apoio em Redenção (Pará), cidade mais próxima, de
onde sai o avião para a aldeia.
1-12
4. Estrutura da dissertação
Decidiu-se estruturar esta dissertação em capítulos independentes, pois esta se
mostrou a melhor forma de evidenciar os diferentes tipos de abordagens que foram
tratados no estudo. Como o item área de estudo já foi apresentado neste capítulo, não
será incluído nos capítulos que se seguem.
No capítulo 2 será discutida a metodologia de captura dos animais. Os resultados
incluem as descrições das armadilhas, procedimentos, esforços e resultados de captura
e uma discussão a respeito das dificuldades encontradas.
A dos melhores dados a serem utilizados para o cálculo do tamanho da área de
vida foram precedidas de uma análise da consistência de dois métodos de cálculo de
área de vida em relação ao número de localizações e à correlação temporal entre
localizações consecutivas, que será apresentada no capítulo 3.
Finalmente os capítulos 4 e 5 visaram atingir o escopo principal do trabalho. O
capítulo 4 buscou explorar as variações temporais dos padrões de ocupação do espaço e
de atividade diária das cotias e compará-las com as variações na oferta de frutos e
sementes, enquanto no capítulo 5 estes padrões e a densidade de cotias foram
comparados em nível espacial, isto é, entre dois locais com oferta diferencial de um
determinado tipo de alimento, a castanha-do-Pará.
Considerações finais serão apresentadas no capítulo 6, com o intuito de integrar e
resumir todas as informações contidas neste estudo. Com isso, a presente dissertação
tenta (i) representar de forma fiel todos os passos seguidos neste trabalho, (ii)
evidenciar as dificuldades encontradas, (iii) mostrar como elas foram resolvidas e (iv)
aumentar o conhecimento sobre questões ecológicas de uma espécie tão importante na
dinâmica de dispersão de diversas espécies arbóreas e ainda tão pouco conhecida.
1-13
5. Referências Bibliográficas
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2-1
CCaappííttuulloo 22::
PPRROOCCEEDDIIMMEENNTTOOSS,, EESSFFOORRÇÇOOSS EE RREESSUULLTTAADDOOSS DDEE CCAAPPTTUURRAA DDEE
DDaassyypprrooccttaa aagguuttii ((DDAASSYYPPRROOCCTTIIDDAAEE ,, RROODDEENNTTIIAA)) EEMM UUMMAA ÁÁRREEAA
NNAA AAMMAAZZÔÔNNIIAA OORRIIEENNTTAALL
1. Introdução
Estudos de ecologia com mamíferos, que abordam aspectos como
comportamento, deslocamento, atividade diária e área de vida, necessitam do
acompanhamento de indivíduos identificados individualmente, por um determinado
período. Para tanto, os indivíduos precisam ser encontrados e reencontrados com certa
freqüência e, principalmente em estudos comportamentais, observados em suas
atividades cotidianas.
A forma mais simples de se fazer isto é a observação direta dos animais em suas
condições naturais. No entanto, diversas espécies de mamíferos possuem hábitos e
comportamentos crípticos, o que dificulta a observação direta. Nestes casos, os animais
precisam ser capturados, manuseados para obtenção das informações necessárias e
marcados, para que o estudo possa ser desenvolvido (ASM, 1998).
Diversos métodos de captura já foram desenvolvidos e estes variam conforme o
grupo a ser estudado. Os mamíferos com metodologia de captura mais bem definida
atualmente são os terrestres com peso abaixo de 0,5 kg (denominados “pequenos
mamíferos”) e os morcegos. Manville (1949) fez uma compilação de técnicas para
captura e marcação de mamíferos onde falou principalmente de tipos de armadilhas
para capturar pequenos mamíferos e citou rapidamente a utilização de redes para
capturar morcegos. Posteriormente, Day e col. (1980) e Jones e col. (1996) descreveram
as redes de neblina como a melhor forma de capturar morcegos.
A dificuldade de captura parece aumentar conforme o tamanho do animal
aumenta (Jones et al., 1996), por isso descrições sobre metodologia de captura de
mamíferos de médio e grande porte são muito variáveis. Alguns métodos específicos,
2-2
utilizados com grupos específicos, já foram descritos, como por exemplo, as armadilhas
de curral, desenhadas para capturar grupos de ungulados ou de cangurus (ASM, 1998).
Armadilhas tipo gaiola como as de pequenos mamíferos, mas com dimensões
maiores, armadilhas para os pés, cevas com drogas anestésicas são algumas das formas
de capturas descritas para médios e grandes mamíferos (acima de 1 kg), herbívoros ou
carnívoros (Day et al., 1980; Jones et al., 1996). Dardos com anestésicos também são
citados (Manville, 1949; Day et al., 1980; Jones et al., 1996; ASM, 1998), mas não são
muito recomendados por causa das chances de matar, machucar permanentemente ou
mesmo perder um animal machucado (ASM, 1998). Zwickel (1980) é o único dentre
todos a falar na utilização de cães para a captura de mamíferos e aves.
Como é possível notar, principalmente para mamíferos de médio e grande porte,
devido ao aumento na dificuldade de captura, os tipos de metodologia variam
conforme algumas características intrínsecas dos grupos a serem estudados– como
organização social, hábitos, tipos de alimentação e comportamentos anti-predatórios – e
para diversos destes grupos a metodologia ainda não está padronizada e precisa ser
desenvolvida.
Cotias são roedores de porte médio (3 a 5 kg), diurnos, terrestres e cursoriais
(Nowak, 1991), que se alimentam principalmente de frutos e sementes (Smythe, 1978;
Henry, 1999). São normalmente abundantes, mas vivem sozinhas ou aos pares. Por
serem presas muito visadas, possuem comportamento críptico e dificilmente são
visíveis na mata, principalmente em locais onde a densidade de predadores é alta. Em
geral, sua presença é percebida depois de emitirem um som de alarme característico e
correrem. Por conseguinte, para acompanhar estes animais, se faz necessário
capturá-los e marcá-los.
Somente três trabalhos de acompanhamento de cotias já foram desenvolvidos em
ambientes naturais (Smythe, 1978, na Ilha de Barro Colorado, Panamá; Clark & Galef,
1977, também em IBC; Rodríguez & Vaughan, 1985, na Costa Rica). Nos três casos a
metodologia de captura utilizada foi a armadilha do tipo gaiola (“Tomahawk”) e, mesmo
assim, este o método se mostrou muito pouco eficiente. Smythe (1978) capturou 87
2-3
indivíduos – a maioria jovens - com um esforço de 100 armadilhas armadas durante
quatro anos. Os outros dois trabalhos não evidenciaram seus esforços de captura, mas
como são trabalhos de acompanhamento de um ou dois indivíduos por curtos períodos
de tempo (menos de seis meses), ficou evidente que houve dificuldade em capturar e
acompanhar estes animais.
A carência de trabalhos de longo prazo, com populações de cotias, em ambientes
naturais, poderia decorrer de um desinteresse sobre questões ecológicas relacionadas
com este grupo. Mas esta parece não ser uma hipótese plausível, visto que inúmeros
estudos já foram publicados evidenciando a importância das cotias na dinâmica de
ecossistemas naturais, principalmente na predação e dispersão de sementes (tabela 1.1).
A dificuldade de capturar e acompanhar estes animais parece ser um grande
empecilho no desenvolvimento de um maior número de estudos ecológicos. No
entanto, não existem trabalhos que abordem este assunto. Em virtude disso, este estudo
se propõe a apresentar uma discussão sobre diversas formas de captura, analisando
suas vantagens e desvantagens. Além disso, problemas de acompanhamento de
indivíduos a longo prazo serão discutidos. Desta forma, pretende-se auxiliar no
planejamento de futuros estudos com cotias, pois acredita-se que esta é uma etapa
importante do trabalho, que, no entanto, é bastante negligenciada em publicações.
2. Material e Métodos
A descrição da área de estudo pode ser encontrada no capitulo 1 da presente
dissertação.
2.1 Formas de captura utilizadas no presente estudo
Armadilhas tipo gaiola: armadilhas da empresa “Tomahawk” para a captura de
mamíferos de médio porte. São gaiolas de metal com o formato de um prisma de base
quadrada e um sistema de desarme automático (prancha 2 – figura A). Foram utilizados
sete exemplares de 80x40x40cm.
2-4
Arapuca: armadilha utilizada para a capturar aves de pequeno porte. Foi feita de
madeira e tem o formato de uma pirâmide de base quadrada. O desarme era
automático e consistia de uma forquilha e duas varetas. Um dos lados da arapuca ficava
erguido, seguro por uma das pontas de uma das varetas, que estava envergada e
apoiada na forquilha. A outra ponta da vareta envergada ficava próxima ao solo e
apoiada em uma das pontas da segunda vareta, que por sua vez, tinha a sua outra
ponta apoiada no chão, dentro da armadilha. Um toque na vareta que estava dentro da
armadilha era suficiente para desarmar o sistema e fechá-la. As dimensões da arapuca
foram adaptadas para o tamanho de uma cotia (70x70cm de base e 50cm de altura)
(prancha 2 – figura B).
Cercado: feito com tela de arame, com aproximadamente 2m de diâmetro, 1m de
altura e uma porta de 1m de largura. A porta ficava erguida e presa por um fio que
deveria ser cortado para que ela caísse (prancha 2 – figura C). O desarme era manual,
portanto era necessário que uma pessoa ficasse na espera, para capturar o animal.
Também era importante acostumar o animal a comer em determinado local (iscá-lo ou
cevá-lo) e saber exatamente de que lado ele estava vindo para colocar a porta no lugar
certo.
Buraco: sistema com o mesmo princípio das armadilhas tipo “pitfall” utilizadas
na captura de répteis, anfíbios e pequenos mamíferos. No entanto, para capturar as
cotias, os buracos foram construídos com dimensões maiores (1,5m de profundidade e
1m de diâmetro). Sua entrada era tampada com folhas, gravetos ou um pedaço de
madeira compensada, que funcionava como a porta de um alçapão. A isca era colocada
encima do buraco para forçar o animal a andar sobre ele.
Laço: um ou mais laços eram colocados em volta da isca. Os fios do laço estavam
presos na ponta de uma árvore, que por sua vez, estava envergada e era sustentada por
uma corda presa a um sistema de gravetos (prancha 2 – figura D). Um dos gravetos
ficava por cima da isca e se o graveto fosse movido o sistema disparava, a árvore
voltava a posição normal e o animal ficava preso no fio suspenso. Era necessário que
uma pessoa estivesse próxima à armadilha para que o animal permanecesse pouco
tempo preso no laço.
2-5
Catapulta: adaptação do laço. Tinha o mesmo sistema de armação, só que o laço
foi substituído por uma rede circular que permanecia estendida no chão, presa na
árvore envergada, por diversos fios de nylon (linha de pesca de 0,60 de diâmetro)
(prancha 2 – figura E). As redes utilizadas foram tarrafas de pesca de 3m de diâmetro.
No caso da catapulta, o sistema de desarme foi manual (vide cercado).
Dardo: pistola - modelo CO2PI & PI - e dardos com micro-transmissores da
empresa Dan Inject. Uma ceva era montada para atrair um animal. Uma pessoa
permanecia na espera, há aproximadamente três metros do local e, de preferência,
suspensa no ar, para atingir o animal com o dardo. Assim que o animal fosse atingido,
era localizado com um receptor e uma antena, ambos da empresa Telonics (prancha 2 –
figura F).
Cães: consistiu em levar um ou dois cães, acostumados a caçar cotias, ao local de
captura e esperar que eles entocassem um animal dentro do oco de uma árvore ou de
um buraco para retirá-lo posteriormente.
3. Resultados
Foram realizadas sete viagens de campo, cujo tempo de permanência variou de
um a dois meses (tabela 2.1).
Tabela 2.1: Cronograma das viagens de campo
ViagemMeses de
permanênciaEstação do ano Chegada Partida
Nº de dias de
permanência
1ª jan e fev auge da est. chuvosa 25/01/97 03/03/97 37
2ª abr e mai fim da est. chuvosa 04/04/97 06/06/97 63
3ª jul e ago auge da est. seca 19/07/97 03/09/97 46
4ª out e nov trans. seca/chuva 10/10/97 26/11/97 47
5ª jan e fev auge da est. chuvosa 11/01/98 27/02/98 47
6ª abr e mai fim da est. chuvosa 15/04/98 14/05/98 29
7ª julho auge da est. seca 25/06/98 21/07/98 26
Total 295
2-6
3.1 1a viagem (27/01/1997 a 03/03/1997 – 31 dias)
Nesta viagem todos os esforços foram direcionados para a captura de animais
dentro de um castanhal, onde estava sendo desenvolvido um estudo de demografia e
dinâmica populacional de castanheiras (Baider, 2000), para que posteriormente os
dados fossem utilizados em conjunto.
Na primeira metade da 1a viagem (de 27/01 a 14/02) foram utilizadas as sete
armadilhas “Tomahawk”, doze arapucas e dois buracos no castanhal. Os alimentos
utilizados como isca foram castanhas, abóbora, milho e pasta de amendoim, alimentos
muito apreciados por cotias, segundo Smythe (1978). Não houve nenhuma captura
(tabela 2.2) nesta fase.
Como foi possível notar a partir deste esforço inicial que os animais não estavam
visitando as armadilhas, como procedimento alternativo, foram montadas estações com
ceva sem qualquer tipo de armadilha, com o intuito de habituar os animais a visitar
determinados locais para, então colocar armadilha. Depois de um tempo, somente
castanhas foram utilizadas como fonte de alimento, pois os outros não eram procurados
pelas cotias.
A partir de 8/02, iniciou-se a montagem de estações com isca em diversos pontos
do castanhal e as armadilhas só foram colocadas depois que as estações estavam sendo
visitadas por cotias por aproximadamente 3 dias. Para saber se de fato o animal que
estava visitando a estação era uma cotia, o solo ao redor da estação era afofado para a
identificação das pegadas.
Dez estações foram montadas e todas foram visitadas por cotias. Foi colocado
algum tipo de armadilha em sete delas (três cercados, três laços e uma catapulta – três
estações foram desativadas por falta de pessoal para ficar nas esperas). Foram
observadas cotias comendo a ceva ou se aproximando em três estações. Em uma delas,
onde foi colocado o laço, foi possível observar que o animal que tinha visitado a estação
(antes da armadilha ser colocada) se assustou com a armadilha e não voltou mais. Nos
outros dois locais onde o laço também foi armado, o sistema não funcionou. O local
onde foi colocada a catapulta também não foi mais visitado, mas como não ficou
2-7
provado que o sistema assustou o animal, ele foi utilizado nas viagens subsequentes. Já
o cercado teve resultados mais favoráveis. Dos três locais onde eles foram armados, em
um o animal chegou a entrar na armadilha, mas o sistema de desarme falhou
(tabela 2.2).
3.2 2a viagem (04/04/1997 a 06/06/1997 – 64 dias)
Nesta fase iniciou-se um esforço de captura em uma área distante de castanhais.
Este local ficava próximo à base da Estação de Pesquisas e será denominado “base”. As
sete armadilhas “Tomahawk” e um cercado automático (que não necessitava de espera)
foram armados neste local.
No castanhal, o mesmo procedimento da 2ª metade da 1ª viagem foi utilizado.
Para minimizar o problema de manufatura das armadilhas, como cercado e catapulta,
diversos materiais como roldanas, cordas, telas de arame e tarrafas de pesca, foram
adquiridos na cidade. Os buracos que tinham sido feitos na 1ª viagem foram reativados.
Para cobrir as entradas dos buracos foram compradas tábuas de compensado de
1 m X 1 m que serviram como tampas de alçapão.
No castanhal, foram montadas 27 estações não simultâneas. Catorze das 27 (52%)
foram visitadas e algum tipo de armadilha foi montada (quatro cercados, oito catapultas e
dois buracos). Foram feitas 23 esperas de manhã e 25 esperas à tarde (variando de 1 a 3
pessoas simultaneamente). No total, foram avistadas cotias 63 vezes, em 12 esperas
diferentes. Provavelmente o número real de animais avistados está mais próximo de 12
do que de 63, pois em diversas esperas foi possível reconhecer que o mesmo animal
estava visitando a estação vários dias seguidos.
Dois indivíduos foram capturados, um deles em um cercado e o outro em uma
catapulta (tabela 2.2). O indivíduo capturado no cercado escapou por falhas na
armadilha. O indivíduo capturado na catapulta foi identificado, marcado e recebeu um
rádio-transmissor. O animal foi encontrado morto 20 dias depois da captura (tabela 2.3).
Como dito anteriormente, na base foram utilizadas sete armadilhas “Tomahawk” e
um cercado, durante aproximadamente 50 dias. Três indivíduos foram capturados, dois
2-8
machos no cercado e uma fêmea na “Tomahawk” (tabela 2.2). Um dos machos ainda era
muito jovem (1100g) e ,por precaução, o colar não foi colocado de forma muito justa em
volta do pescoço, o que possibilitou a sua retirada alguns dias depois. O segundo
macho foi encontrado morto no início da viagem seguinte. A fêmea permaneceu viva e
com o rádio-colar ao longo de todo o período de estudo (tabela 2.3).
3.3 3a viagem (19/07/1997 a 03/09/1997 – 47 dias)
Como o procedimento da viagem anterior pareceu eficiente, ele continuou a ser
utilizado. No castanhal, foram montadas 17 estações por um período de nove dias. Dez
(59%) foram visitadas por cotias e em todas foi colocado algum tipo de armadilha
(quatro cercados, cinco catapultas e um buraco). Duas catapultas foram visitadas por cotias,
no entanto, novamente as armadilhas falharam (tabela 2.2). Em um dos casos, a árvore
não foi suficientemente forte para levantar a armadilha e no segundo caso, os fios
arrebentaram. Nenhum animal foi capturado no castanhal e não houve esforço de
captura na base.
3.4 4a viagem (10/10/1997 a 26/11/1997 – 48 dias)
Como as armadilhas manufaturadas estavam demonstrando pouca
confiabilidade (quatro em sete capturas não foram concluídas por causa de falhas na
armadilha), decidiu-se adquirir uma pistola e dardos com transmissores. Algumas
estações com castanha foram montadas para cevar os animais. Após 15 dias entre
cevagem e espera, uma cotia foi capturada (tabela 2.2), mas ficou impossibilitada de
andar e teve que ser sacrificada (tabela 2.3). Um dia depois, outra cotia também foi
atingida, mas o transmissor caiu e ela não foi mais encontrada.
Diante deste panorama pouco favorável, o programa foi radicalmente
modificado. Iniciou-se a captura com dois cães de caça, trazidos de Redenção (cidade
mais próxima da Estação de Pesquisas). Esta metodologia tinha sido evitada até então
pois acreditava-se que a introdução de cães na mata seria prejudicial para a
comunidade de vertebrados terrestres da área.
2-9
Com o auxílio dos cães, em 12 dias, quatro indivíduos (três fêmeas e um macho)
foram capturados no castanhal (tabela 2.2). Além disso a média de peso das cotias
capturadas também aumentou (tabela 2.3). Não houve esforço de captura na base.
3.5 5a viagem (11/01/1998 a 27/02/1998 – 48 dias)
Como quatro indivíduos estavam sendo acompanhados, diminui-se o esforço de
captura e retornou-se ao procedimento padrão de captura (estações com ceva e
posterior montagem de armadilhas), pois a pistola não seria mais utilizada e os cães não
foram levados.
Onze estações foram montadas no período de 12/01 a 24/01 e doze no período
de 31/01 a 19/02. Na primeira etapa cinco estações foram visitadas por cotias (45%). Na
segunda etapa somente quatro estações foram visitadas (33%). Por algum motivo
desconhecido, nesta temporada os animais visitaram pouco as estações, mesmo antes de
qualquer tipo de armadilha ser colocada. Nenhuma armadilha foi montada e
consequentemente nenhum animal foi capturado. Novamente, não houve esforços de
captura na base.
3.6 6a viagem (15/04/1998 a 14/05/1998 – 30 dias)
Como os três indivíduos do castanhal foram encontrados mortos, reiniciou-se o
programa com cães, que foram novamente enviados de Redenção. No entanto, um dos
cães tinha morrido na viagem anterior e o outro sozinho não foi tão eficiente. Além
disso, o tempo de permanência foi mais curto do que o planejado, pois eu contrai
malária em meados de maio, o que com que eu fosse obrigada a retornar para São Paulo
antes do previsto. Em 20 dias de esforços com um cachorro, um indivíduo foi capturado
no castanhal (tabelas 2.2) e foi encontrado morto na viagem seguinte.
Não houve esforço de captura na 7ª viagem, visto que era a última.
3.7 Resultados Gerais
Ao todo, quinze indivíduos caíram nas diversas armadilhas. No entanto, por
causa de falhas de diversos tipos, somente dez receberam rádio-colar. Destes dez,
2-10
somente quatro puderam ser acompanhados por algum tempo, pois os outros
morreram ou retiraram os colares. Dos quatro animais acompanhados, somente um
sobreviveu até o final do trabalho (tabela 2.2).
Tabela 2.2: Eficiência de captura de cotias na E. P. Pinkaiti, de jan/97 a jul/98
ViagemForma
de captura
Esforço de
captura
no castanhal
Esforço
de captura
na base
nº de
capturas
nº de animais
em que o colar
foi colocado
nº de animais
acompanhados por
algum tempo
nº de animais que
sobreviveu até o
final do estudo
1ª Tomahawk 7 x 12 dias
arapuca 12 x 12 dias
buraco 2 x 7 dias
laço 3 x (3+3+3)* dias
cercado 3 x (3+3+3)* dias 1 0 0 0
catapulta 2 x (3+3+3)* dias
2ª Tomahawk 7 x 50 dias 1 1 1 1
buraco 2 x (3+3+3)* dias
cercado 4 x (3+3+3)* dias 1 x 50** dias 1 / 2 0 / 2 0 / 0 0 / 0
catapulta 8 x (3+3+3)* dias 1 1 0 0
3ª buraco 1 x (3+3+3)* dias
cercado 4 x (3+3+3)* dias
catapulta 5 x (3+3+3)* dias 2 0 0 0
4ª dardos 1 x 10 dias 2 1 0 0
cães 2 x 12 dias 4 4 3 0
6ª cães 1 x 20 dias 1 1 0 0
Total 15 10 4 1 *o cálculo do esforço levou em consideração a cevagem prévia, o período de adaptação à armadilha e o período de espera com a armadilha armada ** utilzou-se o mesmo procedimento para calcular o esforço, excluindo o período de adaptação à armadilha
De todas as formas, a captura auxiliada por cães foi a mais eficaz, pois foi o
método com o qual se capturou mais animais em menos tempo (quatro cotias em doze
dias). Além disso, foi o método que permitiu a captura dos indivíduos maiores
(tabela 2.3) e que exigiu o menor investimento prévio, pois não necessitava de
cevagem, da montagem da armadilhas, nem de esperas. Dentre as armadilhas, a
catapulta e o cercado com desarme manual foram as mais bem sucedidas. Também
possibilitaram algumas capturas (quatro indivíduos no cercado e três na catapulta –
tabela 2.2), no entanto, o tempo de investimento foi muito maior do que em relação à
captura com cães e a porcentagem de falhas foi muito grande (4 em 7). A gaiola
“Tomahawk” possibilitou a captura de um indivíduo na base de pesquisas, mas é difícil
avaliar a sua eficiência pois poucos exemplares foram utilizados. As outras armadilhas
(arapuca, laço e buraco) não possibilitaram a captura de nenhum animal, demonstrando
grande ineficiência. A pistola também demonstrou baixa eficiência (tabela 2.2).
2-11
Além disso, ficou evidente que as cotias precisam de habituação prévia para
entrar nas armadilhas e que, ainda assim, às vezes, algumas delas deixam de visitar o
local no momento que a armadilha é colocada.
Tabela 2.3: Dados dos indivíduos capturados
Medidas Morfométricas (mm)
corpo cauda orelha tarso
1 masculino cercado 1100 340 13.7 28.8 106.6
2 masculino cercado 2120 420 19.2 41.2 116.6
3 masculino catapulta 1800 404 17.3 39.7 103.5
4 feminino gaiola 3460 470 15.3 44.4 100.6
5 feminino pistola 3100 510 18.4 42.3 113.6
6 feminino cães 4000 20.0 43.0 116.0
7 masculino cães 2950 486 21.5 46.2 110.6
8 feminino cães 3050 425 23.9 45.8 118.6
9 feminino cães 3950 440 22.4 43.7 108.1
10 masculino cães 1500 365 17.0 41.6 106.2
Forma de
capturaIndiv. sexo Peso (g)
Ficou evidente também que houve grande diferença no sucesso de captura entre
indivíduos do castanhal e da base. Apesar de terem sido capturados sete indivíduos no
primeiro local e somente três no segundo (tabela 2.3), o esforço no segundo foi muito
menor (vide descrição das viagens). A área fora do castanhal ficava bem próxima da base
da Estação, onde os pesquisadores dormem, descansam e se alimentam. É provável que
as cotias da área fora do castanhal sejam mais habituadas a presença humana pois vêm
tendo contato com pesquisadores desde a fundação do Projeto, em 1992, o que facilitou
à sua aproximação e entrada nas armadilhas. Além disso, uma diferença na oferta de
recursos alimentares também pode ter influenciado na variação na taxa de captura.
Segundo Harris e col. (1990), em estudos com rádio-telemetria,
aproximadamente um terço dos animais capturados são perdidos por alguma razão
(morte do animal, problemas com o rádio ou emigração). Neste estudo, nove das dez
cotias capturadas foram perdidas (tabela 2.4), taxa muito superior à sugerida por Harris
e col. (1990).
2-12
Tabela 2.4: Situação dos indivíduos capturados até o final do estudo
Indivdata da
capturasexo cl. etária
local de
captura
data em que
o rádio foi
reencontrado
nº de dias que o
animal
permaneceu
com o colar
provável
situação
do animal
época da
provável
morte do
animal
1 10-Abr-97 masculino juvenil base 24-Abr-97 14 tirou o colar
2 11-Abr-97 masculino adulto base 21-Jul-97 101 morreu junho
3 09-Mai-97 masculino juvenil castanhal 02-Jun-97 24 morreu maio
4 04-Jun-97 feminino adulto base sobreviveu
5 02-Nov-97 feminino adulto castanhal foi sacrificado
6 16-Nov-97 feminino adulto castanhal 18-Nov-97 1 tirou o colar
7 18-Nov-97 masculino adulto castanhal 19-Abr-98 152 morreu março-abril
8 19-Nov-97 feminino adulto castanhal 19-Abr-98 151 morreu março-abril
9 20-Nov-97 feminino adulto castanhal 20-Abr-98 151 morreu março-abril
10 10-Mai-98 masculino juvenil castanhal 26-Jun-98 47 morreu maio-junho
Dessas, duas devem ter tirado o colar (ind. 1 e 6), visto que os rádios foram
encontrados pouco tempo depois (14 e 1 dias, respectivamente) e não havia nenhum
indício de restos do animal, e uma foi sacrificada por problemas na captura (ind. 5). Os
outros seis indivíduos provavelmente foram predados ou morreram por alguma causa
desconhecida.
4. Discussão e conclusões
O que se encontra na literatura sobre capturas de mamíferos de médio a grande
porte (> 1 kg) são compilações gerais em livros sobre metodologia (Schemnitz, 1980;
Wilson et al., 1996). Estudos que comparem a eficiência nas formas de captura em
relação a determinada população ou comunidade estudada foram feitos apenas com
pequenos mamíferos (Bergstrom, 1986; Woodman et al., 1996; Lambin & MacKinnon,
1997, entre outros).
Neste estudo ficou claro que a melhor forma para capturar as cotias da Estação
de Pesquisas Pinkaiti foi a caça com cães, metodologia que aparentemente não havia
sido utilizada com cotias ainda (Clark & Galef, 1977; Smythe, 1978; Rodríguez &
Vaughan, 1985).
2-13
Apesar de parecer um método muito estressante para os animais e perturbador
para a dinâmica da mata, as cotias demonstraram se recuperar rapidamente do estresse
a que foram submetidas e censos feitos nos dias subseqüentes à utilização dos cães na
mata, para determinar o grau de perturbação da fauna, também indicaram que este
procedimento não espantou temporariamente outros animais.
Zwickel (1980) indica a utilização da mesma metodologia na captura de patos,
aves de chão, e pequenos antílopes africanos. Este último exemplo é particularmente
interessante, pois Dubost (1987, 1988) considerou que cotias têm hábitos muito
parecidos com os destes pequenos ungulados africanos.
Estudos ecológicos com outros grupos de mamíferos de florestas neotropicais de
médio a grande porte citam a metodologia de captura, mas não discutem a sua
eficiência e nem porque foram escolhidas dentre outras. Beck-King e von Helversen
(1999) desenvolveram um estudo com uma população de pacas (Agouti paca), na Costa
Rica, mas só conseguiram capturar e acompanhar por meio de rádio dois indivíduos
(um macho jovem e uma fêmea adulta). As capturas foram feitas com buscas em
buracos onde normalmente as pacas descansam de dia. Fragoso (1998) acompanhou
dois grupos de queixadas (Tayassu pecari) na Ilha de Maracá (Roraima, Brasil). Sete
indivíduos foram capturados e acompanhados e a capturas foram feitas com auxílio de
dardos com anestésicos. Em nenhum dos dois casos, há qualquer tipo de discussão ou
referência citada que discuta metodologia escolhida.
Quanto a alta taxa de mortalidade dos indivíduos capturados no presente
estudo, a explicação mais plausível seria que os rádio-colares atrapalharam os animais
em suas funções cotidianas, deixando-os mais vulneráveis. No entanto, os pesos do
rádio-colares estavam dentro do valor estipulado para não atrapalhar o animal (5% do
peso corpóreo).
Segundo White e Garrot (1990) poucos estudos se interessaram em determinar o
impacto de rádio-transmissores no comportamento dos animais, sendo que a maioria
deles foi feita com aves voadoras. Neste estudo, este impacto não foi determinado
experimentalmente, pois não foi possível acompanhar animais sem colar. Portanto, é
2-14
possível que, de fato, o equipamento tenha aumentado a probabilidade dos animais
terem sido predados, visto que seu comportamento de fuga é a corrida e uma diferença
na velocidade, por menor que seja, pode ser decisiva no momento de escapar.
Todavia, os seis indivíduos encontrados mortos, o foram entre os meses de abril
e junho, independente do mês em que foram capturados, sendo que alguns
permaneceram com o colar mais de 100 dias (tabela 2.4). Este resultado parece indicar
que o fato dos animais passarem a andar com o colar não parece ser a única explicação
para as suas mortes e que pode existir uma época em que as taxas de mortalidade são
mais altas, no final da estação chuvosa. Esta também foi a época em que mais
indivíduos jovens foram capturados (tabela 2.4) e que maior número de indivíduos foi
avistado nas esperas (resultados 2ª viagem), indicando ser um período em que há mais
jovens na população ou em que os jovens estão mais vulneráveis. Seria possível,
portanto, imaginar que há um aumento na taxa de predação de cotias nesta época do
ano devido a uma maior densidade de jovens. Isto, somado a um possível aumento na
vulnerabilidade dos indivíduos com colar, pode ter determinado a alta taxa de
mortalidade dos indivíduos com colar, nesta época.
Para ser confirmada, esta hipótese precisa ser testada com mais rigor e para tanto
é necessário fazer um estudo demográfico com a população de cotias da Estação de
Pesquisas Pinkaiti, por meio de um programa de capturas e recapturas sistemático.
Como ficou demonstrado neste estudo, a melhor forma de capturar sistematicamente
grande número de animais é a caça auxiliada por cães.
No caso desta hipótese estar correta, a dinâmica populacional das cotias desta
região pode ser fundamental para o recrutamento das árvores cujas sementes são
enterradas por estes animais.
5. Referências Bibliográficas
American Society of Mammalogists (ASM), 1998. Guidelines for the capture, handling and care
of mammals as approved by the American Society of Mammalogists. Journal of
Mammalogy, 79(4): 1416-1431.
2-15
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3-1
CCaappííttuulloo 33::
AANNÁÁLLIISSEE DDOOSS MMÉÉTTOODDOOSS DDEE EESSTTIIMMAATTIIVVAA DDEE ÁÁRREEAA DDEE VVIIDDAA MMÍÍNNIIMMOO
PPOOLLÍÍGGOONNOO CCOONNVVEEXXOO EE MMÉÉDDIIAA HHAARRMMÔÔNNIICCAA QQUUAANNTTOO ÀÀ CCOONNSSIISSTTÊÊNNCCIIAA EEMM
RREELLAAÇÇÃÃOO AAOO NNÚÚMMEERROO DDEE LLOOCCAALLIIZZAAÇÇÕÕEESS EE ÀÀ CCOORRRREELLAAÇÇÃÃOO TTEEMMPPOORRAALL
1. Introdução
Diversos métodos para o cálculo de área de vida vêm sendo desenvolvidos e
aprimorados desde que Burt definiu pela primeira vez este conceito, em 1943. O
“Mínimo Polígono Convexo” (MPC – Mohr, 1947) foi o primeiro método a ser proposto
para estimar a área de vida de um animal. É um método simples e objetivo e em revisão
feita no início da década de noventa (Harris et al., 1990), ainda era o método mais
utilizado. Segundo Swihart & Slade (1985b), é um método muito estável para espécies
com área de vida que não varia ao longo do tempo, não necessitando de tamanho
amostral muito elevado (entre 20 e 50). No entanto, passa a ser extremamente instável
quando o(s) indivíduo(s) amostrados varia(m) sua área de vida ao longo do tempo,
sendo que a curva da estimativa em função do número de localizações pode não atingir
uma assíntota (Jennrich & Turner, 1969; Anderson, 1982; Swihart & Slade, 1985b). Além
disso, possui outros problemas como a impossibilidade de calcular e mapear centros de
atividade e a grande influência que sofre de localizações extremas ocasionais (“outliers”)
(Jennrich & Turner, 1969; Anderson, 1982; Harris et al., 1990).
Começaram, então a surgir métodos probabilísticos como alternativa ao MPC3,
para tornar as estimativas mais consistentes e menos influenciadas por localizações
extremas. No entanto, os primeiros métodos probabilísticos a surgir pressupunham
distribuições normais dos dados4, o que quase sempre era violado, pois dados
geográficos não têm razão para pressupor uma distribuição normal. Além disso,
3 Existem outros métodos não-probabilísticos que, por serem menos utilizados, não serão discutidos
4 Denominados, portanto, métodos probabilísticos paramétricos.
3-2
determinavam o centro de atividade como sendo a média aritmética da distribuição,
definição que normalmente não tem nenhum significado biológico (Dixon & Chapman,
1980).
Posteriormente, no início da década de oitenta, surgiram outros métodos
probabilísticos que não pressupunham nenhuma distribuição prévia e que foram, por
isso, denominados não-paramétricos. A ausência de distribuição prévia lhes conferiu
grande vantagem em relação aos métodos paramétricos, pois suas formas e centros de
atividade se aproximavam mais da realidade ecológica dos animais. Mesmo assim,
ainda apresentavam e apresentam alguns problemas. Em primeiro lugar, todos têm
problemas de comparabilidade, pois possuem parâmetros subjetivos e algoritmos
complexos (Harris et al., 1990). Além disso, necessitam de um tamanho amostral grande
pois como a função de distribuição é definida a posteriori, por interpolação dos próprios
dados, são necessárias várias localizações para definir uma distribuição consistente
(Worton, 1987; Ackerman et al., 1990). Segundo Harris et al. (1990), dentre os métodos
probabilísticos não-paramétricos, o mais simples matematicamente e mais utilizado até
então era o da “Média Harmônica” (MH – Dixon & Chapman, 1980). Um resumo dos
métodos de estimativa de tamanho de área de vida está apresentado na tabela 3.1.
A partir do surgimento dos métodos probabilísticos não-paramétricos e em
revisões posteriores, diversos autores passaram a afirmar que os métodos
probabilísticos deveriam pressupor independência temporal entre os dados (Schoener,
1981; Anderson, 1982; Swihart & Slade, 1985a,b; Worton, 1987, 1989; Ackerman et al.,
1990; Harris et al., 1990) sendo que alguns afirmaram que a correlação temporal entre os
dados poderia subestimar os tamanhos de área de vida (Swihart & Slade, 1985a,b;
Ackerman et al., 1990; Harris et al., 1990).
Localizações consecutivas independentes temporalmente devem ocorrer quando
o intervalo de tempo entre uma localização e a seguinte for suficiente para que o animal
possa ter percorrido grande parte da sua área de vida, fazendo com que a segunda
localização não seja uma função da localização anterior (Swihart & Slade, 1985a).
Portanto, este intervalo deve depender da velocidade de deslocamento do animal e do
tamanho da área de vida deste.
3-3
Tabela 3.1 Principais métodos de análise de área de vida; modificado de Van Winkle (1975)
Não-Probabilísticos
Mínimo Polígono Convexo
(Mohr, 1947)
Gradeado
(Siniff & Tester, 1965)
Probabilísticos
Paramétricos Não-Paramétricos
Univariados Bivariados Bivariados
Distribuição não especificada
(Hayne, 1949)
Distribuição Normal Circular
(Calhoun & Casby, 1958)
Média Harmônica
(Dixon & Chapman, 1980)
Distribuição de Pearson
(Dice & Clark, 1953)
Distribuição Normal Elíptica
(Jennrich & Turner, 1969)
Transformação de Fourier
(Anderson, 1982)
Distribuição Normal Circular
(Harrison, 1958)
Kernel
(Worton, 1989)
Recentemente alguns autores têm contestado este pressuposto. Lair (1987)
questionou se um conjunto de dados independentes poderia explicar um fenômeno que
é determinado por ações que são dependentes entre si e se dados correlacionados
temporalmente não apresentariam informações ecológicas e comportamentais melhores
do que dados independentes temporalmente. Reynolds & Laundre (1990) e DeSolla et
al. (1999) demonstraram que a eliminação de dados para alcançar independência
geraram uma subestimativa nos tamanhos de área de vida que eles estimaram com
moscas, tartarugas e coiotes.
É importante ressaltar que existe uma forte correlação entre o número de
localizações e o intervalo mínimo entre localizações consecutivas em dado período, de
tal forma que, quanto maior o intervalo mínimo, menor o número de localizações
possíveis e vice-versa. Por isso, se os dois parâmetros têm influência sobre a estimativa
do tamanho da área de vida, utilizando um método probabilístico, é necessário
determinar qual dos dois tem maior influência, para definir se localizações dependentes
temporalmente deveriam ser eliminadas ou não.
3-4
Utilizando dados coletados de uma população de cotias (Dasyprocta aguti,
Rodentia) em uma área de floresta amazônica, no Sudeste do Pará, o presente estudo
apresentou dois objetivos distintos e complementares. Em primeiro lugar, pretendeu-se
analisar dois métodos, um não-probabilístico (o MPC) e outro probabilístico não-
paramétrico (a MH) quanto à sua consistência em relação à variação no número de
localizações. Em segundo lugar, tencionou-se determinar se havia correlação temporal
entre localizações consecutivas e qual seria o intervalo mínimo entre localizações
consecutivas necessário para eliminar a correlação, neste caso específico, utilizando o
método probabilístico da MH. Se, de fato houvesse um problema de correlação
temporal, seria necessário determinar a sua influência sobre a estimativa da área de
vida. Se a hipótese de correlação fosse verdadeira, seria importante definir qual dos
dois parâmetros (N mínimo e correlação temporal) teria maior influência sobre as
estimativas de tamanho da área de vida para, então definir o melhor procedimento a ser
seguido.
2. Material e Métodos
A descrição da área de estudo se apresenta no capítulo 1 da presente dissertação.
Para a realização destas análises, foram utilizados os dados de quatro indivíduos
adultos (três fêmeas e um macho) de cotia (D. aguti) acompanhados via rádio-
telemetria. Destes, uma fêmea localizava-se em uma área sem castanheiras (Ffc); os
outros três foram capturados em uma área de castanhal (Fc1, Fc2 e Mc).
Para Ffc foram feitas 507 localizações (90 dias no total), separadas em cinco
temporadas (tabela 3.2a). Os intervalos entre as temporadas foram de 44, 35, 48 e 43
dias, respectivamente. O total de localizações para os indivíduos do castanhal foi de
142, para Mc, 137 para Fc1 e 152 para Fc2, perfazendo um total de 32 a 34 dias (tabela
3.2b, c, d). Os indivíduos do castanhal foram acompanhados nos períodos de novembro
e dezembro de 97 e janeiro e fevereiro de 98, sendo que o intervalo entre as duas
temporadas foi de 35 dias. Foram utilizados doze grupos de dados em todas as análises:
as cinco temporadas e o total de dados de Ffc e duas temporadas para Mc, Fc1 e Fc2.
3-5
Tabela 3.2: Número de localizações dos quatros indivíduos de D. aguti acompanhados neste
estudo
a) Ffc b) Fc1
período nº de diasnº de
localizaçõesperíodo nº de dias
nº de
localizações
jul-ago 97 24 123 out/nov 97 12 39
out/nov 97 16 139 jan/fev 98 19 98
jan/fev 98 17 80 TOTAL 31 137
abr/mai 98 16 82
jun/jun 98 17 83
TOTAL 90 507
c) Fc2 d) Mc
período nº de diasnº de
localizaçõesperíodo nº de dias
nº de
localizações
out/nov 97 14 44 out/nov 97 14 47
jan/fev 98 20 108 jan/fev 98 20 95
TOTAL 34 152 TOTAL 34 142
2.1 Número mínimo de localizações
Curvas da variação da estimativa do tamanho da área de vida foram feitas em
função do número de localizações, para os grupos de observações descritos no item
anterior. Os grupos de localizações foram selecionados aleatoriamente por causa da
distribuição não uniforme dos dados (Harris et al., 1990). Para cada valor de x (número
de localizações) foram estimados 30 ou 50 valores de y (tamanho da área de vida), 30
para o total de dados de Ffc e 50 para o restante dos grupos de dados (as cinco
temporadas de Ffc e as duas temporadas dos três indivíduos do castanhal). Foram
utilizadas repetições de localizações na seleção dos blocos de dados para diminuir a
influência das variações aleatórias. Utilizaram-se os métodos MPC e MH para estimar
os tamanhos de área de vida com o auxílio do Programa HOME RANGE (Ackerman et
al., 1990). Para a MH, foram utilizadas as curvas de densidade de 95% e 75% (Dixon &
Chapman, 1980). Para confeccionar as curvas foram usados os valores das média (±
desvio padrão).
3-6
2.2 Determinação da correlação temporal
O índice da razão de “Schoener” (t2/r2 – Swihart & Slade, 1985a) foi utilizado
para calcular o intervalo mínimo necessário para eliminar a correlação temporal. Para
tanto, foi necessário determinar os valores do índice para diferentes intervalos e este
cálculo foi feito utilizando-se o Programa HOME RANGE (Ackerman et al., 1990).
Curvas da razão de “Schoener” em função das localizações foram feitas para os
doze grupos de dados (as cinco temporadas e o total de localizações para Ffc e as duas
temporada para os três indivíduos do castanhal – tabela 3.2). Para tanto, foram
selecionados grupos de dados em que localizações consecutivas possuíam intervalos
mínimos variando de 0 a 420 minutos, com acréscimos de 30 minutos entre cada
intervalo mínimo estipulado. O nível de significância utilizado para determinar o valor
crítico do índice foi 0,05 (α=0,05). Além disso, a curva de diminuição do número de
localizações em função do aumento do intervalo mínimo também foi usada, afim de
determinar a correlação entre este parâmetro e o índice de correlação temporal.
Estimativas do tamanho da área de vida (MH 95% e MH 75%) foram calculadas
para determinar a influência da diminuição da correlação temporal, utilizando-se os
mesmos grupos de observações com diferentes intervalos mínimos que foram utilizados
para o cálculo da variação do índice. Os tamanhos de área de vida também foram
estimados pelo MPC para comparar com os valores estimados pela MH, pois, visto que
o MPC é um método não-probabilístico, estes valores só deveriam sofrer influência da
diminuição do número de observações e não da correlação temporal.
Testes de Correlação de Spearman foram realizados com o auxílio do Programa
STATISTICA (StatSoft Inc., 1995) para correlacionar o tamanho amostral com o índice
de “Schoener” e estes dois valores com as estimativas de tamanho de área de vida, pelos
métodos da MH 95%, MH 75%) e do MPC.
3-7
3. Resultados
3.1 Número mínimo de localizações
Como era esperado, a curva que se estabilizou de forma mais consistente foi a
que utilizou as 500 localizações de Ffc (figura 3.1). Mesmo assim, para a maioria das
estimativas, as curvas passaram a se aproximar de um patamar quando os tamanhos
amostrais ultrapassaram 50, mostrando que a partir deste valor há uma tendência à
estabilização, tanto para Ffc quanto para os indivíduos do castanhal. Mesmo assim,
algumas exceções foram encontradas: para Ffc – abril-maio de 98, a curva não mostrou
uma tendência à estabilidade, e para Fc1 – novembro-dezembro de 97, os valores se
estabilizaram com um tamanho amostral inferior a 40.
Além disso, as estimativas feitas pelo MPC apresentaram curvas com variações
mais suaves, seguidas daquelas feitas pela MH 75%. A Média Harmônica 95% foi a que
apresentou as curvas com as variações mais bruscas, resultado semelhante ao
encontrado por Harris e col. (1990).
Comparando-se os três métodos quanto a estabilidade nos desvios, MH 75% e
MPC foram os que apresentaram os menores valores tanto com tamanhos amostrais
pequenos quanto grandes, mas as curvas das estimativas que utilizaram o MPC
apresentaram menos variações entre valores do que as que utilizaram MH. De forma
geral, os desvios padrões apresentaram uma tendência a diminuir conforme o tamanho
amostral aumentou
(figura 3.2), com algumas exceções. Com relação à Ffc, as temporadas de abril-maio e
junho-julho de 98 apresentaram desvios superiores àqueles apresentados no restante
das temporadas, sendo que a primeira foi justamente a temporada cuja curva de
estimativa de área de vida não se aproximou de uma assíntota e a segunda foi a que
gerou as estimativas com valores mais altos, fatores que podem ter influenciado estes
resultados. Já para os indivíduos do castanhal, nenhuma curva mostrou um padrão
muito diferente das outras, talvez com exceção da curva do Mc-98, que apresentou
desvios um pouco maiores com tamanhos amostrais inferiores a 40.
3-8
MH 95%
0
1
2
3
4
5
0 20 40 60 80 100
0
3
6
9
12
15
0 100 200 300 400
MH 75%
0
1
2
3
0 20 40 60 80 100
0
2
4
6
8
0 100 200 300 400
MPC
0
1
2
3
4
0 20 40 60 80 100
0
2
4
6
8
10
0 100 200 300 400
Fc1-97 Fc1-98 Fc2-97
Fc2-98 Mc-97 Mc-98
total jul-ago 97 out-nov 97
jan-fev 98 abr-mai 98 jun-jul 98
Mé
dia
da á
rea
de v
ida
Nº de localizações
Figura 3.1: Variação da média das estimativas do tamanho de área de vida em função do
número de localizações
3-9
MH 95%
0.00
0.50
1.00
1.50
2.00
0 20 40 60 80 100
0.0
1.0
2.0
3.0
4.0
0 100 200 300 400
MH 75%
0.00
0.25
0.50
0.75
1.00
0 20 40 60 80 100
0.0
0.5
1.0
1.5
2.0
0 100 200 300 400
MPC
0.00
0.25
0.50
0.75
1.00
0 20 40 60 80 100
0.0
0.5
1.0
1.5
0 100 200 300 400
Fc1-97 Fc1-98 Fc2-97
Fc2-98 Mc-97 Mc-98
total jul-ago 97 out-nov 97
jan-fev 98 abr-mai 98 jun-jul 98
De
svio
pad
rão
da
áre
a d
e v
ida
Nº de localizações
Figura 3.2: Variação dos desvios padrões das estimativas de área de vida em função do número
de localizações
3.2 Determinação da correlação temporal
Todos os grupos de dados apresentaram correlação temporal entre localizações
consecutivas quando todas as localizações foram usadas e os intervalos mínimos para
3-10
eliminar estas correlações variaram entre 90 e 270 minutos, sendo que em alguns grupos
de dados não foi possível eliminá-las (tabela 3.3).
Tabela 3.3: Intervalos mínimos e tamanhos amostrais em que a correlação temporal foi
eliminada
Ind. Período N totalInterv. Mín.
s/ correlaçãoN intervmin N int /N total
Ffc jul-ago 97 123 90 68 55%
out-dez 97 139 180 46 33%
jan-fev 98 80 270 27 34%
abr-mai 98 82 180 36 44%
jun-jul 98 83 180 48 58%
jul97-jul98 507 240 175 35%
Fc1 nov-dez 97 39 60 33 85%
jan-fev 98 98 90 41 42%
Fc2 nov-dez 97 44 não atingiu - -
jan-fev 98 108 180 42 39%
Mc nov-dez 97 47 60 37 79%
jan-fev 98 95 não atingiu - -
Testes de correlação de Spearman mostraram que a correlação temporal é
inversamente proporcional ao tamanho amostral, resultado significativo (α=0,05)em
mais de 80% das análises (10 em 12. Já em relação às estimativas de área de vida,
praticamente todas se correlacionaram positivamente com o tamanho amostral e,
portanto, negativamente com o índice de “Schoener” (tabela 3.4), como mostra o
exemplo da figura 3.3a.
Algumas estimativas, no entanto, apresentaram resultados diferentes do padrão
(Fc2 e Mc– novembro-dezembro 97 - tabela 3.4), isto é, se correlacionaram positivamente
com o índice de “Schoener” e negativamente com o tamanho amostral (figura 3.3b). No
entanto, são exatamente os grupos de dados em que o N amostral inicial era pequeno
(tabela 3.2) e em uma delas o índice não alcançou o valor crítico (tabela 3.3), e isto pode
ter influenciado os resultados.
3-11
Tabela 3.4: Correlação de Spearman entre tamanho amostral, índice de “Schoener” (t2/r2) e
estimativas da área de vida, utilizando a Média Harmônica, densidades de 95% (MH 95) e 75%
(MH 75) e o Mínimo Polígono Convexo
N x t2/r
2 N x MH 95 N x MH 75 N x MPC t2/r
2 x MH 95 t
2/r
2 x MH 75 t
2/r
2 x MPC
r p r p r p r p r p r p r p
Ffc jul-ago 97 5 -0.983 0.000 0.500 0.450 0.600 0.350 0.975 0.017 -0.500 0.450 -0.600 0.350 -0.975 0.017
out-dez 97 15 -0.939 0.000 0.952 0.000 0.952 0.000 0.967 0.000 -0.867 0.000 -0.862 0.000 -0.901 0.000
jan-fev 98 15 -0.953 0.000 0.506 0.052 0.547 0.034 0.693 0.004 -0.525 0.043 -0.574 0.024 -0.779 0.000
abr-mai 98 14 -0.642 0.012 0.740 0.002 0.757 0.001 0.876 0.000 -0.360 0.201 -0.333 0.238 -0.507 0.061
jun-jul 98 15 -0.981 0.000 0.631 0.011 0.790 0.000 0.943 0.000 -0.630 0.012 -0.828 0.000 -0.935 0.000
jul97-jul98 15 -0.814 0.000 0.571 0.025 0.339 0.209 0.898 0.000 -0.710 0.003 -0.437 0.101 -0.754 0.000
Fc1 nov-dez 97 16 -0.644 0.007 0.979 0.000 0.858 0.000 0.813 0.000 -0.602 0.013 -0.736 0.000 -0.718 0.001
jan-fev 98 16 -0.295 0.262 0.901 0.000 0.874 0.000 0.985 0.000 -0.128 0.625 -0.098 0.713 -0.276 0.292
Fc2 nov-dez 97 16 -0.979 0.000 -0.410 0.112 -0.552 0.026 0.583 0.018 0.422 0.101 0.552 0.026 -0.542 0.030
jan-fev 98 16 -0.745 0.000 0.672 0.004 0.503 0.046 0.905 0.000 -0.553 0.026 -0.246 0.348 -0.666 0.005
Mc nov-dez 97 16 -0.756 0.000 0.435 0.089 -0.172 0.512 0.944 0.000 -0.307 0.242 0.371 0.153 -0.727 0.001
jan-fev 98 16 -0.341 0.190 0.759 0.000 0.859 0.000 0.854 0.000 -0.408 0.112 -0.263 0.319 -0.703 0.002
Ind. Período N
0.0
0.5
1.0
1.5
2.0
0 90 180 270 360 450
0
15
30
45
0.0
0.5
1.0
1.5
2.0
2.5
0 90 180 270 360 450
0
30
60
90
120
150
Nº
de
lo
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s
0.0
1.0
2.0
3.0
0 90 180 270 360 450
0.0
3.0
6.0
9.0
12.0
0 90 180 270 360 450
t2/r2 amostral t2/r2 crít. nº local.
MH 95% MH 75% MPC
Intervalo mínimo
Figura 3.3: Variação no valor do índice de “Schoener” amostral e crítico (α=0,05) e nas
estimativas de tamanho de área de vida utilizando MPC, MH 75% e MH 95% em função da
variação no intervalo mínimo entre localizações consecutivas.
3-12
4. Discussão
Jennrich e Turner (1969), Anderson (1982) e Swihart e Slade, (1985b) afirmaram
que o MPC é não é estável mesmo com tamanhos amostrais superiores a 100. Já
Anderson (1982) demonstrou que o método da “Transformação de Fourier” é bastante
estável nas suas estimativas a partir de n=30. Ackerman e col. (1990) afirmaram que os
métodos probabilísticos não-paramétricos, em geral, devem ser estáveis a partir de
n=50, no entanto, não citaram suas fontes de referências e nenhum outro autor fez este
tipo de análise com o método da MH. Neste estudo, foi possível perceber que, salvo
raras exceções, as curvas mudaram claramente seu comportamento, se aproximando de
uma assíntota, a partir de um tamanho amostral igual a 50. No entanto as curvas de
Ntotal>500 mostraram nitidamente que uma verdadeira assíntota só foi atingida com
tamanhos amostrais superiores a 100.
Portanto, há um problema, pois sabe-se que é muito difícil atingir tamanhos
amostrais superiores a 100 em estudos sobre área de vida. Harris e col. (1990) sugeriram
dois procedimentos quando as curvas de estimativa de tamanho de área de vida não se
estabilizam: (i) corrigir os valores que não se estabilizaram a partir de equações de
regressão derivadas dos valores que se estabilizaram ou (ii) padronizar o tamanho
amostral, mesmo sem atingir estabilidade de estimativa.
O primeiro procedimento parece mais indicado pela sua forma menos arbitrária
e mais robusta de resolver o problema, apesar de transformar valores reais de área de
vida em valores hipotéticos (Harris et al., 1990) o que pode ser um problema.
Em vista disso, efetuou-se uma tentativa preliminar de utilizar esse
procedimento, onde todas as localizações de Ffc foram usadas para calcular a equação
de regressão. Como resultado inicial, ficou claro que não é simples determinar qual a
função que melhor descreve os dados, pois diversas curvas se adequaram bem a eles.
Mesmo assim, o Modelo de Saturação da Taxa de Crescimento (“Saturation Growth-
Rate Model”: y=ax/(b+x) – CurveExpert® 1.34) foi utilizado. Testes com esta equação
demonstraram que ela se adequou melhor a alguns grupos de dados do que a outros,
fato visível pela simples análise das curvas (figuras 3.1 e 3.2) onde já foi possível
3-13
constatar que estas apresentam comportamentos diversos. Portanto, a utilização deste
procedimento pareceu diminuir diferenças entre temporadas e entre indivíduos que
poderiam estar refletindo questões ecológicas importantes.
Em vista do que foi apresentado, os resultados deste procedimento não
pareceram confiáveis, fato que fez com que a segunda alternativa fosse utilizada, isto é,
a padronização dos tamanhos amostrais. Neste caso, o valor escolhido foi 80, que foi um
valor atingido por todos os indivíduos nas amostragens de 2 meses e superior a 50. No
entanto, nas estimativas para os períodos inferiores a dois meses, valores padronizados,
menores que 50 foram usados, apesar de serem pouco estáveis, pois as comparações
eram relevantes. Mesmo assim, é importante deixar claro que futuras análises
relacionadas ao procedimento de regressão são recomendadas e que estas não foram
realizadas no presente estudo pois desviavam muito do seu escopo geral.
Quanto à escolha do melhor método, de maneira geral os dois métodos
pareceram apresentar resultados confiáveis para a sua utilização com tamanhos
amostrais superiores a 50. No entanto, a metodologia da MH com densidade de 95%
apresentou desvios relativamente grandes e por esta razão recomenda-se a utilização de
curvas de densidade menores (como por exemplo 75%) quando o método da MH for
utilizado. Esta recomendação também é feita pelos próprios autores da MH (Dixon &
Chapman 1980), que a justificam afirmando que curvas de densidade menores sofrem
menos influência de localizações extremas ocasionais. Neste ponto, o MPC se mostrou
ter sido pouco influenciado. A grande vantagem da utilização de um método
probabilístico não-paramétrico (como MH 75%), combinado com o MPC, é que o
primeiro possibilita a localização de centros de maior intensidade de uso, o que não é
possível com o segundo.
Em relação à correlação temporal, os índices de “Schoener” ultrapassaram o
valor crítico em intervalos mínimos diversos (tabela 3.3), não sendo possível padronizar
um intervalo mínimo em que as localizações são independentes para todos os conjuntos
de dados sem ter que eliminar muitas localizações. Além disso, estas variações podem
refletir variações biológicas entre os grupos de dados (Swihart et al., 1988) e este
resultado é muito semelhante com o encontrado para as variações das estimativas das
3-14
áreas de vida em função do tamanho amostral, pois como foi possível constatar, os dois
fatores estão muito relacionados.
De qualquer maneira, a eliminação dados para alcançar independência temporal
teve influência negativa ou nenhuma (mesmo com tamanhos amostrais superiores a 80)
nas estimativas de área de vida, por isso, esta não parece ser um pressuposto na decisão
de quais dados utilizar, apesar de diversos autores afirmarem que violação desta
condição pode subestimar as estimativas de área de vida utilizando um método
probabilístico (Schoener, 1981; Anderson, 1982; Swihart & Slade, 1985a,b; Worton, 1987,
1989; Ackerman et al., 1990; Harris et al., 1990). Reynolds e Laundre (1990) e DeSolla e
col. (1999), que também estudaram a influência da correlação temporal sobre as
estimativas, chegaram as mesmas conclusões apresentadas neste trabalho.
Neste caso novamente, a padronização do intervalo mínimo parece ser o melhor
procedimento a ser utilizado, pois outro fator deve ser levado em consideração, que é o
peso que cada localização tem sobre todo o bloco de localizações, pois dez localizações
em um dia representam informações diferentes de dez localizações em dez dias
(Ackerman et al., 1990).
5. Conclusões
De forma geral, as análises metodológicas demonstraram que os pressupostos
relacionados aos métodos de estimativa de área de vida precisam ser constantemente
testados e revistos e que, em vista disso, estudos deste tipo são fundamentais.
Com relação à escolha de um método, tanto o Mínimo Polígono Convexo
(Mohr, 1947) quanto a Média Harmônica (Dixon & Chapman, 1980) com curva de
densidade de 75% apresentaram resultados semelhantes em relação à variação no
tamanho amostral, portanto os dois são indicados em estudos semelhantes a este.
Por fim, pareceu mais importante e seguro se preocupar em utilizar o máximo de
localizações para os diferentes tipos de comparações e padronizar os dados tanto em
relação ao tamanho amostral quanto em relação ao intervalo entre localizações
3-15
consecutivas, se preocupando de forma secundária em utilizar um tamanho amostral
assintótico e um intervalo em que localizações consecutivas sejam independentes.
6. Referências Bibliográficas
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4-1
CCaappííttuulloo 44::
ÁÁRREEAA DDEE VVIIDDAA EE AATTIIVVIIDDAADDEE DDIIÁÁRRIIAA DDEE UUMMAA FFÊÊMMEEAA AADDUULLTTAA DDEE
DDaassyypprrooccttaa aagguuttii ((DDAASSYYPPRROOCCTTIIDDAAEE ,, RROODDEENNTTIIAA)) EE AA SSUUAA RREELLAAÇÇÃÃOO CCOOMM AA
OOFFEERRTTAA DDEE FFRRUUTTOOSS NNOO CCHHÃÃOO DDEE UUMMAA MMAATTAA NNAA AAMMAAZZÔÔNNIIAA OORRIIEENNTTAALL
1. Introdução
Área de vida é uma idéia que foi introduzida pela primeira vez por Seton (1909
apud Burt, 1943). No entanto, foi Burt (1943) quem definiu formalmente e nomeou este
conceito. Em sua definição ele diz que a área de vida é “a área percorrida pelo
indivíduo nas suas atividades normais de forrageamento, acasalamento e cuidado
parental”. Desde então, este conceito vem sendo aprimorado e o parâmetro ecológico
definido por ele vem sendo intensamente estudado.
Sabe-se que a área de vida varia conforme diversos parâmetros biológicos,
ambientais e populacionais. O tamanho do corpo de um animal e a sua taxa metabólica
estão intimamente relacionados com a quantidade de alimento que o animal ingere
diariamente e portanto com a área de vida deste animal (MacNab, 1963, Calder, 1983).
O tipo de dieta, o padrão de forrageio animal e a oferta de alimento também interferem
no tamanho e forma da área de vida de um animal, pois alimentos podem variar quanto
à sua abundância no ambiente e a facilidade de ser encontrado (Harestad & Bunnell,
1979; Swihart et al., 1988). Além disso, relações intra-específicas, tanto de competição,
quanto de acasalamento também devem interferir nas características da área de vida de
um animal (Damuth, 1981).
Portanto, estudar a área de vida dos indivíduos de uma população deve gerar
uma melhor compreensão do comportamento destes indivíduos para diversas questões
como alimentação, reprodução e interações sociais em geral.
Cotias são roedores caviomorfos neotropicais de porte médio e ampla
distribuição nas Américas do Sul e Central. Têm hábito diurno, são terrestres e
solitárias, ou, às vezes, vivem aos pares (Smythe, 1978; Emmons & Feer, 1990). Enterram
4-2
sementes, uma a uma, no chão da mata para posterior utilização (“scatterhoarding -
Morris, 1962) e isto lhes confere grande importância no recrutamento de espécies
vegetais, cujas sementes são grandes e nutritivas e geralmente associadas a uma alta
taxa de predação pós-dispersão (tabela 1.1).
No entanto, pouco se sabe a respeito da área de vida e da ecologia
comportamental de cotias em grande parte da sua distribuição geográfica. Em vista
disso, este trabalho se propôs a estudar a ecologia espacial de uma população de cotias,
na floresta amazônica. Além disso, parâmetros como atividade diária e oferta de frutos
no chão da mata também foram estudados e sua variação foi relacionada com a
variação do tamanho e da forma da área de vida.
2. Materiais e Métodos
A descrição da área de estudo pode ser encontrada no capítulo 1.
2.1 Captura e monitoramento
A captura foi realizada com o auxílio de uma armadilha “Tomahawk”, do tipo
gaiola, com 80x40x40 cm de dimensão (para maiores detalhes, vide capítulo 2). O
indivíduo capturado foi pesado, medido e recebeu um colar com rádio-transmissor
“Telonics”. O transmissor possuía um sistema que mantinha suas baterias ligadas por
um período de 14 h em um ciclo de 24 h. Optou-se por acionar o sistema de forma que
estivesse sempre ligado durante o dia (das 5 h 30 min às 19 h 30 min), já que se sabe que
cotias são animais diurnos (Smythe, 1978, Emmons & Feer, 1990).
O animal focal foi acompanhado por meio de um receptor “Telonics”, acoplado a
uma antena e, quando possível, observado diretamente, com o auxílio de um binóculo
“Delta” 8x42. As localizações foram feitas por meio de triangulações telemétricas ou
observações diretas, a partir de um sistema de trilhas em grade, com espaçamento de 50
m entre elas. Para cada registro foram anotadas as seguintes informações: (1) animal, (2)
hora, (3) localização, (4) atividade (ativo ou não a partir da oscilação do sinal do rádio)
e, quando possível, (5) tipo de atividade (descansando, deslocando-se rapidamente,
4-3
deslocando-se lentamente, comendo ou participando de interações sociais).
2.2 Área de vida, atividade e dados comportamentais
O tamanho da área de vida foi estimado utilizando-se o Programa HOME
RANGE (Ackerman et al., 1990), pelos métodos da Média Harmônica, curva de
densidade de 75% (Dixon & Chapman, 1980) e do Mínimo Polígono Convexo (Mohr,
1947). Houve preferência na utilização da curva de densidade de 75%, no método da
Média Harmônica, porque ela se apresentou mais estável em relação a diminuição do
tamanho amostral do que a curva de 95% (para maiores detalhes vide capítulo 3). Para
verificar variações temporais nas distribuições espaciais do indivíduo focal, dois tipos
de agrupamento dos dados foram feitos no cálculo do tamanho da área de vida:
utilizando (i) as localizações por temporada de campo (1 mês a 2 meses) e (ii) grupos de
localizações, de tal forma que cada temporada fosse dividida em dois blocos, o que
representou períodos de 15 dias a um mês, conforme a temporada. Além disso, o
tamanho da área de vida referente a todo período de acompanhamento também foi
determinado.
As localizações foram transformadas em coordenadas cartesianas e, a partir
destas, mapas de área de vida foram desenhados com o auxílio do Programa
Microsoft® EXCEL. As coordenadas das curvas de densidade da Média Harmônica
foram exportadas do Programa HOME RANGE (Ackerman et al., 1990) e também
desenhadas no mesmo programa. Os cálculos de sobreposição entre mapas foram feitos
a partir da sobreposição gráfica de pares de mapas e da contagem de pixels em comum
entre eles. Para esta parte da análise utilizou-se um programa de tratamento de figuras
que, neste caso, foi o Programa Corel PHOTO-PAINT™.
Erros de triangulação foram calculados para os tamanhos de área de vida,
estimados com todas as localizações e com as localizações por temporada. Para tanto,
foram colocados 15 rádio-transmissores no local de estudo e suas posições reais foram
comparadas com aquelas determinadas por triangulação. A distância média e o desvio
padrão entre as duas posições foram calculados e, assim, foi determinada uma
distribuição normal dos erros. Para estimar os erros dos valores de área de vida foi feita
4-4
uma simulação de Monte Carlo, isto é, as áreas de vida foram calculadas 100 vezes para
cada grupo de dados, sendo que a cada coordenada (x, y) era somado um valor gerado
aleatoriamente, a partir da distribuição normal dos erros. Um coeficiente de variação
(desvio padrão/média) foi calculado para cada conjunto de dados e, a partir dos
coeficientes, foi determinado um erro de triangulação para cada valor de tamanho de
área de vida. Os cálculos foram feitos com o auxílio do Programa Microsoft® EXCEL.
Para a análise da padrão diário de atividade foram calculadas as freqüências
relativas de atividade por hora, por indivíduo, por temporada. A atividade foi separada
em duas categorias (ativo/inativo) determinadas a partir da oscilação no sinal do rádio
ou por observações diretas. Localizações em quem o animal foi considerado ativo foram
aquelas em que este estava se movimentando muito (mudando de lugar ou em um
mesmo local) ou em que foi possível observar o animal se alimentando. Já as em que foi
considerado inativo foram aquelas em que o animal estava parado em um mesmo local
e, ao mesmo tempo, o sinal do rádio não oscilava. Acredita-se que as localizações do
animal inativo representam momentos em que ele estava descansando. A partir destes
resultados, curvas de atividade foram desenhadas e a freqüência relativa média de
atividade de cada animal por temporada foi determinada, somando-se as freqüências
relativas de cada hora e dividindo-as pelo número de horas.
Análises estatísticas foram feitas com o auxílio do Programa STATISTICA
(StatSoft Inc., 1995) e a descrição das análises utilizadas pode ser encontrada em Zahr
(1999).
Dados comportamentais e de alimentação não puderam ser coletados de forma
sistemática e por isso serão utilizados para complementar os resultados sistemáticos e
reforçar as conclusões.
2.3 Pluviosidade e censo de frutos
Estes dados fazem parte de uma coleta de dados conjunta de C. Baider e M. L.
Jorge e serão utilizados neste estudo assim como na tese de doutoramento de C. Baider
(Baider, 2000).
4-5
Leituras diárias de um pluviômetro foram feitas de março de 1996 a março de
1998, durante os períodos de permanência na base de pesquisas. Os dados eram sempre
coletados diariamente, no início da noite. Em alguns casos, os dados foram coletados
com medidas acumuladas e nestes casos optou-se por dividir o total de precipitação do
período pelo número de dias amostrados. Quando haviam poucas medidas em
determinado mês, estas não foram utilizadas, como foi o caso de dezembro de 1996 e
setembro de 1997. A curva de precipitação anual foi confeccionada a partir da média da
precipitação mensal do dois anos de coleta (parte de 1996, 97, e parte de 98).
Para determinar a oferta de frutos no chão da mata, foram utilizados os dados de
um censo de queda de frutos, realizado entre abril de 1996 e março de 1998 (Baider,
2000). Para a realização deste censo uma trilha de 5000 m foi marcada com fitas a cada
50 m e percorrida mensalmente para a verificação da presença de frutos caídos no chão,
utilizando-se uma faixa de 50 cm para cada lado. Quando algum(ns) fruto(s) era(m)
encontrado(s), procurava-se a árvore de onde ele(s) provinha(m), da qual era medido o
DAP. Um valor de 1 a 4 era atribuído para a quantidade de frutos no chão (1 - muito
pouco e 4 - muito; Fournier, 1974). Nos meses de dezembro de 1996, setembro de 1997 e
janeiro de 1998 os censos não foram realizados.
Para quantificar a disponibilidade de frutos no chão da mata, foi calculado um
índice, segundo Develey & Peres (2000). Tal índice é constituído por:
I=∑ABi*rank
onde ABi é a área basal do indivíduo (ABi=πr2), com o raio em metros. A curva do
índice de frutos eqüivale a média do três anos de coleta de dados.
A área em que foi feito o censo de frutos tem grau de similaridade alta (Jaccard
Ij=0,34 e de Sorensen Is=0,51; R. Salm, dados não-publicados) com a área onde o animal
acompanhado vivia.
3. Resultados
Uma fêmea adulta (3460g) foi acompanhada durante um ano (21/07/1997 a
4-6
20/07/1998), perfazendo um total de 366 localizações (denominada Ffc – fêmea de fora
do castanhal - por causa de comparações que serão feitas com indivíduos capturados
dentro de um castanhal, no capítulo que se seguirá). Este período foi dividido em cinco
temporadas de campo que variaram de um a dois meses, intercaladas por períodos de
aproximadamente um mês sem coleta de dados. A seguir serão feitas análises do
tamanho da área de vida, da distribuição espacial das localizações e do padrão diário de
atividade deste indivíduo. Variações temporais destes parâmetros serão relacionadas
com a oferta de frutos no chão da mata ao longo do ano.
3.1 Tamanho da área de vida
O tamanho da área de vida deste indivíduo durante o período total de
acompanhamento foi de 6.9 ±±±± 0,4 hectares (MH 75%) ou 9.2 ±±±± 0,4 hectares (MPC) (tabela 4.1).
As áreas ocupadas em cada temporada foram menores do que a área ocupada durante o ano
inteiro, com exceção de junho-julho de 98 (figura 4.1). As temporadas em que o animal
apresentou menor área de vida foram julho-agosto de 97 e janeiro-fevereiro de 98. Em
outubro-dezembro de 97 e abril-maio de 98, ela apresentou área de vida de valores
intermediários. Separando-se cada temporada em dois grupos de dados que amostravam
períodos semelhantes, as áreas de vida da primeira, segunda e última temporadas
mostraram pequena variação entre períodos, o que não ocorreu para os períodos das
temporadas de janeiro-fevereiro e abril-maio de 98 (figura 4.2).
Tabela 4.1: Estimativas de tamanho de área de vida de Ffc
Período n MH 75% t2
/r2
obs t2
/r2
crít MPC
21/jul 97 - 20/jul 98 366 6.9 ± 0.40 1.11 1.85 9.2 ± 0.38
21/jul - 27/ago 97 83 3.3 ± 0.41 1.76 1.66 4.6 ± 0.38
11/out - 9/dez 97 79 4.9 ± 0.41 1.06 1.70 5.6 ± 0.31
14/jan - 26/fev 98 60 3.3 ± 0.36 1.10 1.68 5.1 ± 0.35
16/abr - 13/mai 98 70 5.7 ± 0.57 0.81 1.66 5.5 ± 0.40
26/jun - 20/jul 98 74 7.1 ± 0.45 1.13 1.71 8.1 ± 0.35
4-7
0
2
4
6
8
julago97 outdez97 janfev98 abrmai98 junjul98 jul97-jul98
áre
a d
e v
ida (
ha)
Figura 4.1: Estimativa do tamanho da área de vida de Ffc pelo método da Média Harmônica
(75%), por temporada de campo. As barras de erro representam o erro de localização deduzido
pela simulação de Monte Carlo.
0
2
4
6
8
Jul/97 Set/97 Nov/97 Jan/98 Mar/98 Mai/98 Jul/98
áre
a d
e v
ida (
ha)
Figura 4.2: Estimativa do tamanho da área de vida de Ffc, pelo método da Média Harmônica
(75%), por períodos dentro das temporadas (os dados por temporada estão separados em dois
grupos de tamanhos amostrais próximos e que amostram períodos semelhantes).
3.2 Distribuição espacial das localizações
As localizações não se distribuíram de forma homogênea em nenhuma das
temporadas estudadas e as curvas de densidade de Média Harmônica demonstraram
4-8
haver locais onde o animal permaneceu por mais tempo, que serão denominados
centros de maior permanência (figura 4.3).
Apesar de não haver homogeneidade na distribuição das localizações e os
tamanhos variarem, a área de vida do animal foi restrita e estável ao longo do ano, o
que ficou demonstrado pela grande sobreposição das áreas de cada temporada
principalmente nas curvas de maior densidade (figura 4.4). A curva de junho-julho de
98, que circunscreveu a maior área, incorporou quase completamente todas as outras.
Nas curvas de menor densidade, que destacam os centros de maior permanência,
é possível perceber que a temporada de janeiro-fevereiro de 98 se separou
geograficamente das demais, o que também ficou evidenciado pelo cálculo da
sobreposição entre as temporadas (tabela 4.2). As temporadas que apresentaram maior
sobreposição em quase todas as curvas de densidade foram outubro-dezembro de 97 e
abril-maio de 98, as duas de tamanho intermediário. Já as que apresentaram menor
sobreposição foram julho-agosto de 97 e janeiro-fevereiro de 98, as duas de menor
tamanho.
Para relacionar os centros de maior permanência com os períodos de atividade e
de inatividade, separou-se as localizações em que o animal estava ativo daquelas em
que ele estava inativo. As mapas mostraram que os locais de maior permanência foram
praticamente os mesmos nos períodos de atividade e de inatividade, indicando que os
locais de descanso diurno e os de sítios de alimentação estiveram associados (figura
4.5).
Os tamanhos de área de vida nos períodos em que o animal estava ativo são
maiores do que quando este estava inativo (figura 4.6). Somente na temporada de
outubro-dezembro 97 eles são praticamente do mesmo tamanho. A comparação entre o
número de localizações do animal ativo e inativo mostrou que estas foram bastante
desiguais. Para julho-agosto de 97 e janeiro-fevereiro de 98 esta diferença pode estar
influenciando na estimativa da área de vida. No entanto, no geral, padrão encontrado
na comparação entre valores de área de vida não está relacionado com o número de
localizações (rs=0,35; p=0,32; n=5).
4-9
N
21/jul 97 - 20/jul 98
26/jun - 20/jul 9816/abr - 13/mai 9814/jan - 26/fev 98
11out - 9/dez 9721/jul - 27/ago 97
200m
N
21/jul 97 - 20/jul 98
26/jun - 20/jul 9816/abr - 13/mai 9814/jan - 26/fev 98
11out - 9/dez 9721/jul - 27/ago 97
Mínimo Polígono Convexo
Média Harmônica
200m
Figura 4.3: Mapas da área de vida de Ffc estimada pelo método do Mínimo Polígono Convexo e
da Média Harmônica, densidades de 95%, 75%, 50%, 25%. Os centros de maior permanência
estão representados pelos pontos.
4-10
50% 25%
95% 75%
Figura 4.4: Sobreposição das áreas de vida de Ffc estimadas pelo método de Média Harmônica.
As cores correspondem às temporadas, conforme a figura 4.3, e os pontos representam os
centros de maior permanência.
Tabela 4.2: sobreposição das áreas de vida das temporadas de Ffc
MH 95% MH 75% MH 50% MH 25%
julago97 x outdez97 60% 54% 56% 68%
julago97 x janfev98 29% 10% 1% 0%
julago97 x abrmai98 52% 58% 49% 55%
julago97 x junjul98 46% 47% 41% 26%
outdez97 x janfev98 49% 35% 1% 0%
outdez97 x abrmai98 79% 85% 86% 82%
outdez97 x junjul98 66% 72% 61% 41%
janfev98 x abrmai98 45% 35% 4% 0%
janfev98 x junjul98 40% 40% 13% 0%
abrmai98 x junjul98 83% 77% 63% 46%
4-11
26/jun-20/jul 9816/abr-13/mai 98
14/jan-26/fev 9811/out-16/nov 9723/jul-27/ago 97
Figura 4.5: Área de vida de Ffc quando ativa (azul) e inativa (roxo). Os pontos cinzas indicam os
centros de atividade com todos os dados.
0
1
2
3
4
5
6
7
8
julago97 outnov97 janfev98 abrmai98 junjul98
áre
a d
e v
ida (
ha)
ativa inativa
65
21
5276
48
31
29
53
41
34
Figura 4.6: Tamanho da área de vida (MH 75%) de Ffc ativa e inativa (os valores encima das
barras eqüivalem ao número de localizações de cada estimativa).
3.3 Padrão diário de atividade
De maneira geral, o padrão diário de atividade encontrado em todas as
temporadas foi bimodal, isto é, o animal foi encontrado maior número de vezes ativo no
período da manhã e no final da tarde (figura 4.7). Mesmo assim, é possível perceber que
4-12
as curvas por temporada não mostraram padrões exatamente iguais. Algumas
temporadas apresentaram períodos de completa inatividade e picos de atividade bem
acentuados (julho-agosto de 97 e abril-maio de 98), outras apresentaram picos e vales
menos acentuados, seja porque o animal esteve, em geral, menos ativo (outubro-
novembro de 97) ou , pelo contrário, porque esteve, no geral, mais ativo (janeiro-
fevereiro de 98).
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
5:30 7:30 9:30 11:30 13:30 15:30 17:30 19:30
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
5:30 7:30 9:30 11:30 13:30 15:30 17:30 19:30
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
5:30 7:30 9:30 11:30 13:30 15:30 17:30 19:30
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
5:30 7:30 9:30 11:30 13:30 15:30 17:30 19:30
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
5:30 7:30 9:30 11:30 13:30 15:30 17:30 19:30
26/jun-20/jul 98
16/abr-13/mai 9814/jan-26/fev 98
11/out-16/nov 9723/jul-27/ago 97
Fre
qüência
rela
tiva
Hora
Figura 4.7: Freqüência relativa das localizações em que Ffc estava ativa
Nas temporadas de julho-agosto de 97 e outubro-dezembro de 97, tanto a
proporção entre localizações ativa/inativa, quanto os mapas de atividade e inatividade
parecem ter relação com as curvas de atividade diária. Esta foi a temporada em que o
animal foi mais fiel a um único sítio de descanso de diurno (figura 4.5) e, ao mesmo
tempo, os dois períodos de atividade estão bastante separados (figura 4.7). Outubro-
dezembro de 97 foi a temporada em que os tamanhos de área de vida do animal ativo e
inativo praticamente se igualaram (figura 4.6) e também foi o período em que a
4-13
distribuição das localizações em que o animal estava ativo se apresentou de forma mais
difusa ao longo do dia (figura 4.7), indicando que o animal descansava por períodos
menores, mais vezes e em lugares diferentes. Nas outras temporadas, estas relações são
menos evidentes.
Por causa desta variação nas curvas de atividade, valores de freqüência relativa
média por temporada foram definidos, pois pareceram ser bons indicativos gerais do
padrão diário de atividade e tornaram os dados entre temporadas mais comparáveis
(figura 4.8). A partir desta transformação, pôde-se separar as temporadas em dois
blocos distintos: julho-agosto de 97, janeiro-fevereiro de 98 e junho-julho de 98 foram
temporadas em que o animal esteve ativo em mais da metade das localizações; já em
outubro-novembro de 97 e abril-maio de 98 o animal esteve ativo em somente um terço
ou menos das localizações.
0
2
4
6
8
JulAgo97 OutNov97 JanFev98 AbrMai98 JunJul98
áre
a d
e v
ida
(h
a)
0.0
0.2
0.4
0.6
0.8
fre
qü
ên
cia
re
lativa
do
an
ima
l a
tivo
área de vida
atividade
Figura 4.8: Freqüência relativa do animal ativo e tamanho da área de vida de Ffc
Como pareceu haver uma relação entre a variação no tamanho da área de vida e
o padrão de atividade, (figura 4.8), foram feitas análises de correlação de Pearson e de
Spearman (Zahr, 1999). Os resultados da correlação paramétrica foram significativos
quando os pontos da última temporada foram eliminados (r= -0,96; p=0,04; n=4), mas
não o foram quando todas as temporadas foram utilizadas (r= -0,28; p=0,65; n=5). Na
correlação não-paramétrica, não houve correlação em nenhum dos dois casos (rs = -0,80;
4-14
p=0,20; n=4 rs = -0,20; p=0,75; n=5,) Apesar da amostra ser pequena, este resultado pode
indicar, que exceto para o período de junho e julho (que corresponde ao início da
estação seca), as épocas em que o animal percorreu as maiores distâncias também foram
aquelas em que ele esteve menos ativo.
3.4 Precipitação e oferta de frutos no chão da mata
A área de estudo apresentou duas estações pluviométricas bem definidas nos
anos de 96, 97 e 98: uma estação seca que ia de abril/maio a setembro e uma chuvosa no
restante dos meses do ano, isto é, outubro a março/abril. Junho, julho e agosto foram
meses de seca praticamente absoluta. Maio e setembro foram meses de transição, em
que a quantidade de precipitação foi baixa. A estação chuvosa apresentou três picos,
um em outubro, um em janeiro e um em março (figura 4.9). A curva da oferta de frutos
no chão foi praticamente unimodal, com um grande pico no auge da estação chuvosa,
isto é, em janeiro. Mais de 50% deste pico de janeiro foi determinado pela queda de
frutos de árvores da espécie Tetragastris altissima (Burseraceae) (Baider, 2000) que,
segundo Smythe e col. (1982) são frutos utilizados por cotias e ocorriam na área de vida
de Ffc. Além disso, árvores de outras espécies cujos frutos e sementes também são
importantes na dieta de cotias , como por exemplo o inajá (Maximiliana maripa, Palmae),
também estavam com frutos caindo neste período.
0
50
100
150
200
250
300
Jul Ago Set Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai
pre
cip
itação (
mm
)
0
10
20
30
40
50
60
70
índic
e d
e fru
tos
no c
hão d
a m
ata
chuva
frutos-
chão
Figura 4.9: Curva de precipitação (barras) e disponibilidade de frutos (linhas) da Estação de
Pesquisas Pinkaiti, dados de abril de 1996 a agosto de 1998.
4-15
3.5 Relação entre oferta de frutos, área de vida e o padrão diário de
atividade
As curvas de área de vida e de atividade foram comparadas com as curvas de
oferta de frutos no solo da mata (figura 4.10).
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Jul-Ago Out-Nov Jan-Fev Abr-Mai Jun-Jul
índic
e d
e fru
tos n
o c
hão
da m
ata
0
1
2
3
4
5
6
7
8
áre
a d
e v
ida (
ha)
frutos no chão
área de vida
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Jul-Ago Out-Nov Jan-Fev Abr-Mai Jun-Jul
índic
e d
e fru
tos n
o c
hão
da m
ata
0.0
0.1
0.2
0.3
0.4
0.5
0.6
0.7
freqüência
rela
tiva
do a
nim
al ativo
frutos no chão
atividade
B.
A.
Figura 4.10: Relação entre a oferta de frutos no chão da mata e o tamanho da área de vida (ha)
de Ffc (A) e o padrão diário de atividade (B).
Julho e agosto foram o auge da estação seca (figura 4.9) e também uma época em
que a baixa oferta de frutos no chão da mata já perdurava por um longo período (desde
março/abril). Em observações não sistemáticas, este foi o único período em que o
animal foi observado algumas vezes (sete, no total) roendo frutos velhos de tucum
(Astrocarium tucuma - Palmae) e sementes velhas de paxiúba (Socratea exorrhiza –
Palmae), o que indica que eram alimentos armazenados. É provável, portanto, que o
auge da estação seca tenha sido uma época em que o animal estava utilizando
4-16
principalmente recursos armazenados. A atividade do animal foi alta (52% das
localizações) e os dois picos foram bem definidos (figura 4.7). Isto está provavelmente
relacionado com o fato dos dias serem muito quentes e secos, incentivando o animal a
se tornar mais ativo no início e no final do dia.
Outubro, novembro e dezembro foram meses de transição entre as estações seca
e chuvosa. Os dias já estavam mais frescos e índice de frutos no chão da mata começou
a se elevar. A atividade do animal diminuiu um pouco (34% das localizações) e se
espalhou ao longo do dia (figura 4.7). Os mapas de atividade e inatividade se
sobrepuseram quase completamente (figura 4.5) e o tamanho da área de vida aumentou
(figura 4.1). Observações não sistemáticas mostraram que o animal estava se
alimentando de frutos encontrados no chão da mata. Parece, então, ter havido uma
mudança de comportamento, tanto em termos de atividade, quanto de forrageamento.
Janeiro e fevereiro (principalmente janeiro) foram o auge da estação chuvosa e
também quando houve a maior taxa de queda de frutos. Foi o período em que o animal
esteve mais ativo (60% das localizações) e suas localizações ainda estavam bem
espalhadas ao longo do dia (figura 4.7). Também foi o único período em que o centro de
maior permanência esteve claramente deslocado dos demais (figura 4.4). A área de vida
sofreu uma leve diminuição em janeiro e uma diminuição brusca em fevereiro (figura
4.2), parecendo ocorrer uma resposta atrasada da área utilizada por Ffc ao aumento na
oferta de frutos no chão.
Abril e maio foram os meses de transição entre a estação chuvosa e a seca e o
índice de frutos no chão voltou a diminuir bastante. Foi o período em que o animal
esteve menos ativo (30% das localizações) e novamente dois picos de atividade se
definiram (figura 4.7). Foram observados dois eventos de alimentação de sementes
enterradas, indicando que o animal já começava a utilizar recursos armazenados. O
comportamento da curva de área de vida não foi muito estável dentro da temporada,
sendo que em abril o animal ocupou uma área relativamente grande e em maio o
tamanho da área ocupada diminuiu bastante (figura 4.2).
Junho e julho foram novamente meses de seca e a oferta de frutos voltou a
4-17
diminuir. O animal passou a ficar mais tempo ativo (55% das localizações). No entanto,
a distribuição da atividade ao longo do dia foi um pouco diferente das demais
temporadas. A moda no período da manhã se apresentou mais tardia do que o usual. O
tamanho da área de vida foi o maior de todo o período de observação e permaneceu
estável entre os dois meses. O animal pode ter ido mais longe por causa da dificuldade
de encontrar alimento, assim como em julho e agosto de 97. No entanto, outro fator
pode ter influenciado no aumento da área de vida. Neste período, Ffc foi observada
quatro vezes próxima de outro indivíduo e alguns censos feitos no local registraram
maior número de pares na mata. Portanto, o início da estação seca pode ter coincidido
com uma época de acasalamento de Ffc, aumentando, portanto, a distância que ela
percorreu diariamente.
Resultados dos testes de correlação de Spearman não foram significativos nem
quando o índice foi relacionado com os valores de área de vida, nem quando foi
relacionado com os padrões diários de atividade (rs Frutos no chão da mata X Área Vida =-0,60;
p=0,28; n=5) (rs Frutos na chão da mata X Atividade =0,60; p=0,28; n=5).
4. Discussão
O tamanho da área de vida de uma fêmea adulta de Dasyprocta aguti ao longo de
um período de 12 meses foi estimado em 7 ha (MH 75%) ou 9 ha (MPC). Outros autores
já estimaram o tamanho da área de vida de outras espécies de Dasyprocta com diferentes
metodologias. A estimativa de Smythe (1978), na Ilha de Barro Colorado (Panamá) foi
de 1 a 2 ha (captura e recaptura), Cant (1977) estimou o tamanho da área de vida dos
indivíduos do Bosque Tikal (uma mata com forte sazonalidade, na Guatemala) em 10 ha
(censo por transecção) e Rodríguez & Vaughan (1985) estimaram o tamanho da área de
vida de um indivíduo, no Refúgio de Fauna Silvestre Dr. Rafael Lucas Rodríguez
Caballero (uma região de floresta tropical seca, na Costa Rica) em 4 ha (rádio-telemetria
e período de acompanhamento de 2 meses). Como as metodologias são diferentes, não é
possível determinar se as variações encontradas são resultado de diferenças ecológicas
ou metodológicas, por isso estes dados não são comparáveis. O único estudo
4-18
comparável a este seria o de Rodríguez & Vaughan (1985), que em um mesmo período
de amostragem encontrou valores próximos aos que foram encontrados neste estudo.
Mesmo assim, pode-se afirmar que os resultados deste estudo são os mais fiéis
quanto à estimativa da área de vida tanto por causa da metodologia utilizada (rádio-
telemetria) quanto do tempo de amostragem (um ano), com a única ressalva de que
somente um indivíduo pôde ser acompanhado ao longo de um ciclo anual completo.
No entanto, o presente estudo e os anteriores demonstraram a dificuldade de capturar e
acompanhar este tipo de animal, reforçando a importância de informações como estas.
O animal focal ocupou uma área bastante estável ao longo do ano de estudo,
resultado que condiz com as características fisiológicas da espécie. Smythe (1978) já
havia constatado isto anteriormente e neste próprio estudo isto pôde ser corroborado
pela observação de três outros indivíduos, que serão tratados no próximo capítulo.
Os padrões diários de atividade também foram semelhantes aos encontrados por
Smythe (1978) para Dasyprocta punctata e por Dubost (1988) para Myoprocta exilis. Mas
novamente, as comparações devem ser feitas com ressalvas pois as metodologias
utilizadas foram diferentes.
Quanto à relação entre a variação no tamanho da área de vida e no padrão de
atividade ao longo do ano, Smythe e col. (1982) afirmaram ter observado que cotias na
Ilha de Barro Colorado andavam menos e descansavam mais em épocas de abundância
de frutos no chão da mata, ocorrendo o inverso quando havia pouco fruto no chão.
Estes resultados são parcialmente contrários ao que foi encontrado no presente estudo e
isto pode ter ocorrido por causa de diferenças de comportamento entre a duas
populações decorrentes diferenças ambientais ou porque um dos dois estudos não
apresentou dados que representem o padrão geral da população. Apesar do presente
trabalho ser vulnerável a generalizações, pois os dados se referem ao acompanhamento
de um único indivíduo, os resultados de Smythe e col. (1982) derivam de uma
compilação de informações, em sua maioria não-sistemáticas, portanto, estudos futuros
deverão ser feitos para melhorar a discussão.
Finalmente, alguns autores afirmam que a variação sazonal na oferta de frutos no
4-19
chão da mata influencia no comportamento, na atividade, no tamanho da área de vida
(Smythe et al., 1982) e em épocas de reprodução (Henry, 1994) das cotias. Ao mesmo
tempo, sabe-se que estes animais utilizam muito das sementes armazenadas na época
de escassez. Henry (1999) observou que na Guiana Francesa 64% da dieta de cotias
compreende polpas de frutos na época de muita oferta e que quando a oferta diminui
73% da dieta passa a ser de sementes. Os resultados do presente estudo demonstraram
que as curvas de variação do tamanho da área de vida e do padrão diário de atividade
se relacionaram parcialmente com a variação na oferta de frutos no chão da mata,
corroborando as afirmações colocadas anteriormente e evidenciando que o
comportamento de armazenagem dispersa deve ter um papel muito importante na
sobrevivência destes animais.
5. Conclusões
Pelo presente estudo, a área de vida de uma fêmea adulta, acompanhada em
uma floresta na Amazônia oriental durante um ano, foi estimada em 7 hectares pela
Média Harmônica 75% e 9 hectares pelo Mínimo Polígono Convexo, além de ter se
mostrado estável durante o período de acompanhamento. No entanto, as localizações
não se distribuíram homogeneamente e locais de maior utilização foram determinados.
Padrões diários de atividade apresentaram distribuição bimodal. Tanto a área de vida
quanto atividade diária variaram ao longo do ano e estas variações se relacionaram
somente parcialmente com a oferta de frutos no chão da mata.
6. Referências Bibliográficas
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5-1
CCaappííttuulloo 55::
ÁÁRREEAA DDEE VVIIDDAA EE DDEENNSSIIDDAADDEE PPOOPPUULLAACCIIOONNAALL DDEE CCOOTTIIAASS
((DDaassyypprrooccttaa aagguuttii,, RROODDEENNTTIIAA)):: CCOOMMPPAARRAAÇÇÃÃOO EENNTTRREE DDUUAASS ÁÁRREEAASS CCOOMM
DDIIFFEERREENNTTEESS DDEENNSSIIDDAADDEESS DDEE CCAASSTTAANNHHEEIIRRAASS ((BBeerrtthhoolleettttiiaa eexxcceellssaa,,
LLEECCYYTTHHIIDDAACCEEAAEE)) EEMM UUMMAA MMAATTAA DDAA AAMMAAZZÔÔNNIIAA OORRIIEENNTTAALL
1. Introdução
Algumas florestas neotropicais possuem estações bem demarcadas quanto a
quantidade de chuva. A forte sazonalidade destas áreas influencia a produção de frutos
(Fleming, 1979; Foster, 1982) e esta, por sua vez, parece influenciar na demografia das
populações de frugívoros (Smythe, 1982; Terborgh, 1986; Van Shaik et al., 1993).
Cotias (Dasyprocta spp.) são mamíferos terrestres essencialmente
frugívoros/granívoros (Henry, 1999), portanto dependem da oferta de frutos e
sementes no chão da mata para sobreviver. Mesmo assim, possuem um mecanismo de
armazenagem de alimentos para suprir as suas necessidades energéticas em épocas de
escassez (Smythe et al., 1982).
Este comportamento é denominado “armazenagem dispersa” (“scatterhoarding”
– Morris, 1962) e consiste no enterramento de sementes de forma dispersa, para
posterior utilização. Diversos autores têm evidenciado a sua importância para o
recrutamento de espécies arbóreas, produtoras de sementes de grande porte (tabela 1.1).
A importância do mecanismo de armazenagem dispersa se deve ao fato de que as
sementes destas espécies são grandes e nutritivas e consequentemente, sofrem altas
taxas de predação quando permanecem expostas no chão da floresta.
Castanheiras (Bertholettia excelsa, Lecythidaceae), em particular, produzem frutos
grandes (11-15 cm de diâmetro), globosos e lenhosos, denominados pixídios (ou
popularmente chamados de ouriços). Cada pixídio possui por volta de 17 sementes de
grande porte (21 x 47 mm de tamanho – Peres & Baider, 1997) e muito nutritivas (17-
25% de proteínas e 70-72% de lipídios – Pesce, 1985). São frutos funcionalmente
5-2
indeiscentes pois quando o fruto cai no chão, apenas um pequeno opérculo se abre,
sendo insuficiente para a liberação das sementes (Mori & Prance, 1990). As sementes só
são liberadas se o fruto for aberto por algum animal. Esta ação é feita principalmente
por cotias e, ocasionalmente, por macacos-prego (Cebus apella, Primates) e outros
roedores menores, como Proechimys (Echimyidae) e Sciurus (Sciuridae) (Baider, 2000).
Peres & Baider (1997) afirmaram que o mecanismo de armazenagem dispersa,
juntamente com outros fatores como características edáficas da região, determina o
padrão de distribuição das castanheiras, já que estas árvores se agrupam em agregados
naturais de alta densidade de indivíduos adultos, sugerindo uma dependência em
dispersão feita por agentes que se locomovem a pequenas distâncias, pois têm área de
vida pequena e estável ao longo do tempo, como é o caso das cotias (Smythe, 1978).
Em relação à influência da produção de frutos sobre a demografia das
populações de cotias, Smythe e col. (1982) afirmam que a população de cotias na Ilha de
Barro Colorado é sensível às variações temporais na oferta de frutos, mesmo possuindo
o mecanismo de reserva de suprimentos para épocas de escassez. Adler (1998) também
observou esta dependência em populações de Proechimys semispinosus, de ilhas no Canal
do Panamá. Proechimys é também um roedor caviomorfo e apresenta o mesmo
mecanismo de armazenagem dispersa de alimentos (Forget, 1991), com a diferença que
as sementes não são enterradas, mas escondidas debaixo de folhas e raízes ou dentro de
troncos caídos.
No entanto, não se sabe se populações de cotias são sensíveis a variações na
quantidade de um único recurso alimentar. Visto que castanheiras e cotias possuem
uma relação de mutualismo muito estreita, podendo até ser considerada de
dependência no que diz respeito à espécie arbórea (Huber, 1910; Peres et al., 1997; Peres
& Baider, 1997), o objetivo do presente trabalho foi determinar se a relação inversa
também é verdadeira, isto é, se há relação entre a distribuição espacial dos frutos
produzidos por castanheiras dentro de um castanhal e a ocupação do espaço das cotias
do mesmo castanhal. Além disso, também comparou-se as populações de cotias de
dentro e de fora de um castanhal, quanto à densidade demográfica, ao tamanho da área
de vida e à sobreposição das áreas, para determinar se a presença de grandes
5-3
quantidades de castanha-do-Pará no chão da mata influencia a demografia de cotias da
região.
2. Material e Métodos
A descrição sobre a área de estudo pode ser encontrada no capítulo 1 da presente
dissertação.
2.1 Captura e monitoramento
Os animais foram capturados e acompanhados em dois locais distintos: um
castanhal, que possui densidade de 1,7 castanheiras com DAP > 60 cm por hectare
(daqui para frente denominado “castanhal”) e uma área com densidade de castanheiras
próxima de zero (“área fora do castanhal”) (Baider, 2000). A distância entre os dois
locais é de aproximadamente 2 km. No castanhal foi aberto um sistema de trilhas em
grade, com espaçamento de 100 m entre si, totalizando 60 ha. O sistema de trilhas da
área fora do castanhal totalizou 10 ha, com espaçamento de 50 m entre as trilhas.
As formas de captura, marcações e monitoramentos estão descritas no capítulo 3
da presente dissertação, com a diferença que as capturas dos indivíduos do castanhal
foram feitas com o auxílio de cães de caça (resultado apresentado e discutido no
capítulo 2).
2.2 Área de vida
Novamente a metodologia utilizada para estimar os tamanhos das áreas de vida,
para desenhar os mapas, para calcular erros de triangulação e para as análises
estatísticas seguem aquelas descritas no capítulo 3.
2.3 Densidade Populacional
A densidade foi estimada para as populações de cotias do castanhal e da área
fora do castanhal por meio do método de censo por transecção em varredura, uma
variação do censo por transecção (Emmons, 1984; Peres, 1999). Esta variação pressupõe
5-4
que vários participantes façam o censo ao mesmo tempo em trilhas paralelas e próximas
entre si e é recomendada para refinar a amostragem na área de interesse (C. Peres, com.
pess.).
A velocidade média de caminhada em todos os censos foi de 600 m/h e estes
sempre foram feitos entre 6h30min 8h (um dos períodos de maior atividade dos animais
– Smythe, 1978). A cada registro (auditivo ou visual) de uma cotia, eram anotados: (1) a
hora; (2) a posição do observador na trilha; (3) o número de indivíduos detectados; e (4)
a distância perpendicular do animal (ou animais) em relação à trilha. No castanhal, as
trilhas percorridas tinham 600 m de extensão e o número de participantes em cada
censo variou de quatro a sete. Na área fora do castanhal a extensão das trilhas era de
700 m e os censos envolveram três participantes. Em ambos os locais, o espaçamento
entre as trilhas era de 100 m.
Os censos foram realizados em julho e agosto de 1997, fevereiro de 1998, maio de
1998, julho de 1998 e fevereiro de 1999. A análise dos dados foi feita com o auxílio do
Programa DISTANCE 3.5 (Thomas et al., 1994). Para determinar a função de detecção
que melhor se ajustou a cada grupo de dados, o índice AIC (“Akaike Information
Criterium” – Buckland et al., 1993) foi utilizado. Este índice considera a função que
melhor se ajusta aos dados (pelo teste de X2) e utilizando o menor número de
parâmetros. Este procedimento é denominado princípio da parcimônia ou da economia
de passos, sendo que o menor valor de AIC determina a melhor função. Valores de AIC
só são comparáveis entre análises em que os dados foram agrupados e selecionados da
mesma forma.
3. Resultados
Quatro indivíduos adultos foram acompanhados (tabela 5.1). Duas fêmeas (Fc1 e
Fc2) e um macho (Mc) foram capturados dentro do castanhal e foram acompanhados
durante três meses, separados em duas temporadas de campo, (figura 5.1). Uma fêmea
(Ffc) foi capturada fora do castanhal e acompanhada durante um ano, separado em
cinco temporadas de campo que variaram de um a dois meses. Os indivíduos do
5-5
castanhal não foram acompanhados por mais tempo porque foram predados entre
fevereiro e abril de 1998. Discussões sobre predação de cotias com rádio-colar foram
apresentadas no capítulo 2. Análises sobre a variação temporal na área de vida e
atividade de Ffc foram feitas no capítulo anterior (capítulo 4).
Tabela 5.1: Indivíduos acompanhados durante o estudo
IndivíduoLocal de
capturasexo Peso (g)
Data da
primeira
localiz.
Data da
última
localiz.
Total de
localiz.
Total de
dias
F fc fora-castanhal fêmea 3460 21/07/97 20/07/98 366 91
F c 1 castanhal fêmea 3050 20/11/97 25/02/98 109 32
F c 2 castanhal fêmea 3950 20/11/97 25/02/98 117 34
M c castanhal macho 2950 20/11/97 25/02/98 114 34
0
2
4
6
8
10
Nov/97 Dez/97 Jan/98 Fev/98 Mar/98
0
2
4
6
8
10
Nov/97 Dez/97 Jan/98 Fev/98 Mar/98
0
2
4
6
8
10
Nov/97 Dez/97 Jan/98 Fev/98 Mar/98
0
2
4
6
8
10
Jul/97 Ago/97 Set/97 Out/97 Nov/97 Dez/97 Jan/98 Fev/98 Mar/98 Abr/98 Mai/98 Jun/98 Jul/98 Ago/98
Ffc
Mc
n°
de
loca
liza
ções
Figura 5.1: Esforço diário de coleta de dados. As linhas tracejadas verticais separam as
temporadas de campo.
5-6
3.1 Áreas de vida dos indivíduos do castanhal
No período de novembro de 1997 a fevereiro de 1998, os indivíduos do castanhal
apresentaram áreas de vida de tamanhos semelhantes, tanto pelo método da Média
Harmônica (75%) quanto pelo Mínimo Polígono Convexo (tabela 5.2), com leve
sobreposição entre as áreas de Fc2 e Mc (figura 5.2).
Tabela 5.2: Tamanho da área de vida (ha) ± desvio padrão, dos indivíduos acompanhados no
castanhal
Período Indiv. n MH 75% t2/r
2obs t
2/r
2crít MPC
Fc1 109 2.7 ± 0.21 0.81 1.72 4.1 ± 0.23
20/nov 97 - 25/fev 98 Fc2 117 2.3 ± 0.22 0.90 1.70 3.5 ± 0.19
Mc 114 2.6 ± 0.25 0.75 1.75 4.0 ± 0.15
Fc1 35 1.1 ± 0.28 0.72 1.47 1.4 ± 0.11
20/nov - 7/dez 97 Fc2 32 2.1 ± 0.19 1.51 1.54 2.3 ± 0.15
Mc 38 1.6 ± 0.16 1.59 1.59 2.1 ± 0.12
Fc1 39 1.4 ± 0.23 0.75 1.55 2.6 ± 0.20
12/jan - 8/fev 98 Fc2 41 2.3 ± 0.25 1.44 1.58 2.5 ± 0.19
Mc 37 1.2 ± 0.23 0.87 1.48 1.8 ± 0.18
Fc1 38 2.0 ± 0.23 1.40 1.55 1.9 ± 0.12
12/fev - 25/fev 98 Fc2 41 2.3 ± 0.26 0.85 1.50 3.4 ± 0.22
Mc 39 0.3 ± 0.08 1.35 1.50 0.7 ± 0.07
Em análise mensal, os tamanhos das áreas de vida variaram muito (tabela 5.3).
As médias de cada mês calculadas a partir dos resultados dos três indivíduos foram
próximas, no entanto, no mês de fevereiro, o desvio padrão foi elevado por causa da
grande diminuição na área de vida de Mc. Quanto às variações por indivíduo, ao longo
do tempo, as duas fêmeas apresentaram valores mais próximos entre si e Mc apresentou
valores inferiores aos das duas, o que indica que fêmeas tendem a ter uma área de vida
maior do que machos. No entanto, o número reduzido de indivíduos observados torna
necessário que outros animais sejam acompanhados para confirmar esta afirmação.
5-7
200mN
Mínimo Polígono Convexo Média Harmônica
Figura 5.2: Área de vida dos indivíduos do castanhal (Fc1 = linha azul; Fc2 = linha vermelha; Mc
= linha cinza), calculada pelo Mínimo Polígono Convexo e pela Média Harmônica, curvas de
densidade de 95%, 75%, 50%, 25%. Os centros de maior permanência estão representados pelos
pontos.
Tabela 5.3: Área de vida (ha) das três cotias do castanhal
Fc1 Fc2 Mc X ± DP Ffc
Nov-Dez 97 2.1 1.1 1.6 1.6 ± 0.5 4.0
Janeiro 98 1.4 2.3 1.2 1.6 ± 0.6 3.1
Fevereiro 98 2.0 2.3 0.3 1.5 ± 1.1 0.9
X ± DP 1.8 ± 0.4 1.9 ± 0.7 1.0 ± 0.7 1.6 ± 0.7 1.5 ± 0.8
As tendências de variação não apresentaram nenhum tipo de padrão, visto que o
tamanho da área de vida de Fc1 apresentou o seu menor valor em janeiro de 98, o de Fc2
foi em novembro-dezembro de 97 e o de Mc sofreu uma contínua queda, apresentando
seu menor valor em fevereiro de 98 (figura 5.3). Além disso, todas as áreas de vida
sofreram algum tipo de deslocamento ao longo do tempo, e neste caso, as áreas de Fc2 e
5-8
Mc deixaram de se sobrepor (figura 5.4). Estes resultados devem ser analisados com
cautela pois os tamanhos amostrais são inferiores a 50 (vide capítulo 3).
0
1
2
3
Fc1 Fc2 Mc
áre
a d
e v
ida
(h
a)
Nov-Dez 97 Janeiro 98 Fevereiro 98
Figura 5.3: Variação temporal do tamanho da área de vida dos indivíduos do castanhal
Novembro-Dezembro 97 Fevereiro 98Janeiro 98
200mN
Figura 5.4: Mapas das áreas de vida dos indivíduos do castanhal, separados por mês. As cores
correspondem às mesmas da figura 5.2.
As cotias do castanhal incluíram em suas área de vida mais de uma castanheira
adulta (com DAP>60cm) (figura 5.5). Além disso, os centros de maior permanência não
coincidiram com a distribuição de nenhuma castanheira adulta e as localizações do
animais ativos e inativos são próximas umas das outras. Fc1 e Mc, animais que viviam
mais na borda do castanhal, apresentaram algumas localizações mais agrupadas. Nos
dois casos estas localizações se localizavam em locais de sub-bosque mais denso, como
5-9
tabocais ou clareiras formadas a partir de árvores caídas (obs. pess.). As castanheiras
próximas das localizações agrupadas de Mc não produziram muitos frutos na safra de
97/98. Já Fc2 possui localizações menos agrupadas, mas que também estão associadas
com locais de sub-bosque denso.
castanheirasloc. indefinidasativainativa
Fc1
Fc2
Mc
Fc1
Fc2
200mN
200m 200m
200m
Figura 5.5: Áreas de vida e localizações dos indivíduos do castanhal e das castanheiras com
DAP ≥ 60 cm
3.2 Comparação entre o tamanho da área de vida dos indivíduos do castanhal
e o da fêmea de fora do castanhal (Ffc)
Comparando-se o mesmo período entre os quatro indivíduos (Novembro 97 a
Fevereiro de 98) parece claro que há uma diferença entre o tamanho da área de vida dos
5-10
indivíduos do castanhal e de Ffc (figura 5.6 e tabela 5.4). No entanto, se os conjuntos de
dados forem separados em meses, par formar três períodos semelhantes de
amostragem, a média do tamanho da área de vida de dos três períodos de Ffc não foi
significativamente diferente do restante (Teste de Kruska-Wallis - H(3, n=12)=2,79,
p=0,42). Isto ocorreu porque apesar da área de vida de Ffc ter sido maior em
novembro/dezembro de 97 e janeiro de 98, diminuiu muito em fevereiro de 98,
chegando a um valor próximo ao de Mc, o que fez com que, na média, as diferenças
deixassem de ser evidentes (figura 5.7).
Ffc
McFc2
Fc1
200m
Figura 5.6: Áreas de vida dos quatro indivíduos acompanhados neste estudo (MH, 95%, 75%,
50%, 25% e centros de atividade)
5-11
Tabela 5.4: Tamanho da área de vida (ha) ± desvio padrão dos quatro indivíduos
acompanhados neste estudo, no período de Novembro de 97 a Fevereiro de 98.
Indiv. n MH 75% t2
/r2
obs t2
/r2
crít MPC
F c 1 109 2.7 ± 0.21 0.81 1.72 4.1 ± 0.23
F c 2 117 2.3 ± 0.22 0.90 1.70 3.5 ± 0.19
M c 114 2.6 ± 0.25 0.75 1.75 4.0 ± 0.15
F f c 102 5.8 ± 0.51 1.09 1.74 6.4 ± 0.34
0
1
2
3
4
5
Nov-Dez 97 Janeiro 98 Fevereiro 98
áre
a d
e v
ida (
ha)
Ffc Fc1Fc2 Mc
Figura 5.7: Variação mensal do tamanho da área de vida dos quatro indivíduos acompanhados
na Base de Pesquisas Pinkaiti, de novembro de 1997 a fevereiro de 1998.
3.3 Densidade de Dasyprocta aguti dentro e fora do castanhal
A densidade total de cotias encontrada na Estação de Pesquisas Pinkaiti foi de
37 ind/km2 (tabela 5.5). Além disso, os dados foram separados em três blocos,
dependendo do local e da época do ano (castanhal – seca; castanhal – chuva; fora do
castanhal – seca). O esforço amostral foi parecido nos três blocos de coleta de dados e o
teste do X2 mostrou que as distribuições propostas pelo programa se adequaram bem
aos dados coletados (tabela 5.5).
Foram encontradas diferenças de densidade tanto sazonais como espaciais. A
densidade encontrada no castanhal na estação seca foi duas vezes maior do que na
chuvosa (figura 5.8a) e o mesmo aconteceu quando os dois locais foram comparados (a
5-12
densidade de cotias dentro do castanhal também foi duas vezes maior do que fora -
figura 5.8b).
Tabela 5.5: Densidade de D. aguti na estação de Pesquisas Pinkaiti
local épocaDensidade
(ind/km2)
Intervalo de
Confiança
(95%)
nº ind.
detectados
Distância
percorrida
(km)
Distância
Perpendicular
Efetiva (m)X
2 g.l.
cast + f-cast todas as épocas 36.7 27.9 - 48.2 118 116.73 23.9 0.961 3
castanhal todas as épocas 40.2 30.2 - 53.6 83 49.25 23.5 0.996 3
castanhal seca 97/98 57.5 41.9 - 78.9 65 23.35 24.2 0.936 3
castanhal chuvas 98/99 26.6 16.1 - 44.1 28 25.90 20.3 0.982 3
fora-castanhal seca 98 22.9 15.2 - 34.4 25 18.23 30.0 0.984 6
a - Comparação entre estações do ano, no castanhal
0
20
40
60
80
seca 97/98 chuvas 98/99 todas as temp
b - Comparação entre o castanhal e a área fora do castanhal,
na seca
0
20
40
60
80
castanhal fora-castanhal cast + fora-cast
Figura 5.8: Média (± desvio padrão) da densidade de D. aguti nas diferentes estações do ano
(dentro do castanhal) e nas áreas dentro e fora do castanhal, na estação seca.
Valores de área de vida, calculados com os dados de rádio-telemetria foram
utilizados para calcular a densidade de cotias dentro e fora do castanhal e comparar
estes resultados com as estimativas feitas pelos censos. Como nenhuma sobreposição foi
encontrada entre indivíduos vizinhos do castanhal (Fc1 e Mc), não foi possível incluir
este parâmetro nas estimativas, mesmo sabendo que isto pode estar errado. O valor
estimado para o castanhal, na estação chuvosa, foi superior àquele estimado pelo censo
(tabela 5.6). Já para a área fora do castanhal, na seca, as estimativas foram semelhantes
(um censo foi realizado na estação chuvosa, onde foram percorridos 11,30km e só foram
detectados cinco indivíduos, por isso não foi possível incluí-lo na análise).
5-13
Tabela 5.6: Densidade de cotias da Estação de Pesquisas Pinkaiti, estimado a partir de censos
por transecção e dados de rádio-telemetria.
local época
Densidade
estimada pelo
censo
Densidade
estimada por
rádio-telemetria
castanhal seca 97/98 57.5
castanhal chuvas 98/99 26.6 43.2
castanhal todas as épocas 41.9
não-castanhal seca 98 22.9 19.2
cast + f-cast todas as épocas 35.4
4. Discussão
4.1 Tamanhos de área de vida dos indivíduos do castanhal
De forma geral, os três indivíduos acompanhados dentro do castanhal
apresentaram áreas de vida de tamanho semelhante e com pouca sobreposição. Como
no castanhal a densidade de castanheiras é muito alta, as áreas de vida das cotias não
pareceram ser determinadas pela distribuição das castanheiras em fase reprodutiva e
muito menos por aquelas que produzem mais frutos. Os animais pareceram escolher
locais onde o sub-bosque era mais denso e carregar os frutos e sementes para estes
locais (obs. pess.). Experimentos de remoção de ouriços (Baider, 2000) confirmaram esta
hipótese. Estes locais ainda foram utilizados como sítios de descanso diurno. Este
padrão de ocupação do espaço, onde os sítios de descanso diurno coincidem com os
sítios do animal ativo também foram encontrados para Ffc (capítulo 3).
A ausência de padrões temporais mensais semelhantes entre os três indivíduos
do castanhal pode indicar que análises mensais não são suficientes para mostrar uma
tendência, isto é, que o período de um mês é insuficiente pois o tamanho amostral é
pequeno. De fato, nas análises feita no capítulo 2 foi possível demonstrar que tamanhos
amostrais inferiores a 50 localizações são pouco estáveis na estimativa da área de vida.
Além disso, no capítulo 3 esta hipótese se confirmou, pois foi possível observar que nos
períodos dentro das temporadas, que possuíam tamanhos amostrais menores do que
50, houve maior variação entre os valores. Portanto estas variações devem ser
5-14
observadas com cautela. Mesmo assim, é possível que a ausência de padrão indique que
variações ambientais gerais, como a oferta de alimentos, não foram suficientemente
importantes a ponto de influenciar da mesma forma na variação dos tamanhos das
áreas de vida das três cotias e que fatores intrínsecos a cada indivíduo devem ter sido
mais relevantes.
4.2 Densidade de cotias, tamanho de área de vida e sua relação com oferta
diferencial de castanhas
A estimativa de densidade de D. aguti na Estação de Pesquisas Pinkaiti
(37ind/km2) é superior a estimativas feitas em outros locais (Tikal, Guatemala: 8
ind/km2, Cant, 1977; Cocha Cashu, Peru: 5 ind/km2, Janson & Emmons, 1990). Só não é
superior a estimativa feita na Ilha de Barro Colorado (84 ind/km2 – Wright et al., 1994).
O valor encontrado neste estudo se aproxima do encontrado por Peres et al. (1997) (44
ind/Km2), para o mesmo local. Portanto, pode-se dizer que a Estação de Pesquisas
Pinkaiti possui uma alta densidade de cotias.
Para determinar se as diferenças de densidade entre épocas do ano e locais
ocorreram por causa de problemas metodológicos ou se são realmente evidências de
variações demográficas, foi necessário analisar os resultados com base na teoria de
censo por transecção. São cinco os pressupostos básicos desta metodologia (Buckland et
al., 1993): (1) todos os animais na linha de transecção devem ser detectados; (2) os
animais são detectados em sua localização inicial; (3) os animais se movem mais
devagar do que o observador; (4) distâncias perpendiculares são estimadas com
exatidão; e (5) detecções são eventos independentes.
É difícil determinar se as estimativas de distância perpendicular foram exatas.
Contudo, se houve um desvio, ele ocorreu em todas as épocas e locais de forma
semelhante (pois sempre foram utilizados os mesmos observadores), em vista do que o
erro deve ter influenciado todas análises da mesma maneira. Por conseguinte, os
resultados levam a crer que a densidade de indivíduos de cotia no castanhal é maior na
estação seca do que na chuvosa e que o castanhal comporta mais indivíduos por área do
que a área fora do castanhal.
5-15
No entanto outros pressupostos podem estar sendo violados. O grau de detecção
dos animais pareceu diferente nas duas estações do ano. Na estação chuvosa o solo
estava mais úmido e a serrapilheira mais fina, portanto se fazia menos ruído para
caminhar e tanto o observador quanto os animais estavam menos perceptíveis.
Detecções de cotias são principalmente auditivas, isto é, o animal é percebido quando
emite vocalizações de alarme e corre, após já ter detectado o observador e se sentir
ameaçado (Smythe, 1978). É possível que o comportamento de fuga seja diferente nas
duas estações, isto é, cotias emitem mais vocalizações na estação seca e fogem mais
silenciosamente na estação chuvosa, pelo fato de haver maior propagação de ruídos na
primeira e os animais estarem sob maior estresse (tanto por causa do barulho quanto
pela dificuldade de encontrar alimento). Mesmo assim, esta diferença no
comportamento só pode ter influenciado na estimativa de densidade se, por causa disto,
os pressupostos (1) e (2) foram violados na época chuvosa, ou seja, nem todos os
animais que estavam na linha de transecção foram detectados e alguns foram
detectados depois que se moveram.
Apesar de muitas suposições serem levadas em consideração para que esta
hipótese esteja correta, esta ainda parece ser mais plausível do que supor que há mais
cotias na estação seca do que na chuvosa, pois segundo as análises do capítulo 2, a taxa
de predação parece aumentar na transição entre a estação chuvosa e a seca, portanto, o
esperado seria que a densidade fosse menor na seca. Além disso, Adler (1998) com
Proechimys, quanto Smythe et al. (1982) com cotias, também afirmam que a densidade
destes roedores diminui nos períodos de seca, quando há menor oferta de alimento.
A partir destas evidências, é possível afirmar que as diferenças de densidades
encontradas entre estações do ano no castanhal foram causadas por problemas de
detecção dos animais e estes resultados permitem dizer que censos de cotia feitos em
diferentes épocas do ano devem ser analisados com cuidado.
Já em relação às diferenças de densidade dentro e fora do castanhal, outro tipo de
análise deve ser feito. Como os censos foram realizados nas mesmas épocas, o raciocínio
desenvolvido nos parágrafos anteriores não pode ser levado em consideração. De fato,
se o mesmo raciocínio fosse considerado, os animais sob maior estresse alimentar
5-16
deveriam ser os de fora do castanhal, pois este é o local onde, por não haver
castanheiras nem outras espécies arbóreas muito procuradas por cotias, em altas
densidades, há menos oferta de alimento, e por conseguinte, o grau de detecção neste
local aumentaria e os valores de densidade deveriam estar superestimados. Os
resultados deste trabalho mostraram exatamente o contrário, que a densidade
populacional de cotias dentro do castanhal foi duas vezes maior do que fora, reforçando
a hipótese de que eles refletem variações ecológicas mais do que variações
metodológicas.
Peres et al. (1997) não encontraram os mesmos resultados, trabalhando na mesma
área de estudo. Estes autores mostraram que a densidade de cotias não variou entre
dois locais com diferentes densidades de B. excelsa (170 ind/km2 e 0,2 ind/km2, com
DAP ≥ 50cm). No entanto, acredita-se que a estimativa feita no presente estudo foi mais
acurada, pois foi utilizado o método do censo por transecção em varredura, que tem
como objetivo refinar a amostragem em determinado tipo de ambiente (C. Peres, com.
pess.), ao contrário do método do censo por transecção, utilizado no estudo de Peres et
al. (1997), que pretende amostrar um maior número de ambientes de determinada área
(Peres, 2000). Resultados obtidos por Adler (1998) com Proechimys, e Smythe et al. (1982)
com cotias também reforçam a hipótese de que a diferença de densidade entre as
populações de dentro de fora do castanhal são resultado da diferença na oferta de
alimentos, pois os dois trabalhos encontraram a mesma relação de densidade e oferta de
alimentos no ambiente.
5. Conclusões
Pelo presente estudo, foi possível constatar que (i) machos e fêmeas de cotia
apresentaram tamanhos de área de vida semelhante, (ii) houve pouca sobreposição
entre áreas de vida e (iii) a área de vida da fêmea de fora do castanhal foi duas vezes
maior do que as áreas dos indivíduos de dentro do castanhal, no mesmo período de
amostragem. Além disso, censos realizados dentro e fora do castanhal determinaram
que a densidade de cotias é maior dentro do castanhal e que esta variação reflete mais
uma variação no tamanho da área de vida e do que um aumento na sobreposição entre
5-17
indivíduos vizinhos. Por fim, a partir dos resultados encontrados neste trabalho, é
possível afirmar que castanhais parecem sustentar populações de cotias maiores do que
locais onde não há castanheiras, provavelmente por causa da grande quantidade de
ouriços disponíveis para estes animais ao longo do ano.
6. Referências Bibliográficas
Ackerman, B. B., F. D. Leban, M. D. Samuel and E. O. Garton, 1990. User’s Manual for Program
Home Range. 2nd Ed. Technical Report 15, Forestry, Wildlife Experiment Station, University
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6-1
CCaappííttuulloo 66::
CCOONNSSIIDDEERRAAÇÇÕÕEESS FFIINNAAIISS
Uma das maiores dificuldades encontradas neste trabalho, assim como em vários
outros envolvendo o estudo de mamíferos de médio e grande porte, foi a captura dos
animais. Tornou-se evidente, a partir das discussões apresentadas no capítulo 2, que a
melhor forma para capturar cotias foi a caça com cães, metodologia cuja utilização
ainda não foi registrada em literatura para estes animais .
Além da dificuldade de captura, grande parte (~60 %) dos indivíduos morreu.
Por um lado, isto deve refletir um aumento na vulnerabilidade destes animais por causa
dos colares; por outro, no entanto, é possível que a taxa de mortalidade de cotias seja de
fato alta no Pinkaiti.
As análises metodológicas demonstraram que os pressupostos relacionados aos
métodos de estimativa de área de vida necessitam ser constantemente reavaliados a
partir de dados reais.
Com relação à escolha de um método, tanto o Mínimo Polígono Convexo quanto
a Média Harmônica – com curva de densidade de 75% – apresentaram resultados
semelhantes em relação à variação no tamanho amostral, sendo igualmente suscetíveis
a números de localizações muito baixos (e.g. < 40). As estimativas obtidas utilizando-se
os dois métodos foram similares , tendo o MPC a grande vantagem de ser um método
mais simples, direto, e que envolve poucos cálculos. Por outro lado, a MH permite que
sejam construídos mapas de probabilidade de utilização do espaço, que abrem um
outro horizonte para a interpretação de dados de área de vida.
Os dados disponíveis mostraram ser mais importante e seguro utilizar-se o
máximo de localizações para os diferentes tipos de comparações e padronizar os dados,
tanto em relação ao tamanho amostral quanto em relação ao intervalo entre observações
consecutivas. A utilização de um tamanho amostral assintótico e um intervalo em que
localizações consecutivas sejam independentes deve ser um cuidado secundário
6-2
A área de vida de uma fêmea adulta, acompanhada durante um ano, foi
estimada em 7 ha pela Média Harmônica 75% e 9 ha pelo Mínimo Polígono Convexo,
além de ter se mostrado estável durante o período de acompanhamento. No entanto, as
localizações não se distribuíram homogeneamente e locais de maior utilização puderam
ser determinados. Padrões diários de atividade apresentaram distribuição bimodal.
Tanto a área de vida quanto a atividade diária variaram ao longo do ano e estas
variações se relacionaram apenas parcialmente com a oferta de frutos no chão da mata,
reforçando a importância do comportamento de armazenagem dispersa para a
sobrevivência dos indivíduos em épocas de escassez.
Além disso, foi possível constatar que machos e fêmeas de cotia apresentaram
tamanhos de área de vida semelhantes e que houve pequena sobreposição entre áreas
de vida de dois indivíduos vizinhos. A área de vida de uma fêmea em uma área fora do
castanhal foi duas vezes maior do que as áreas dos indivíduos de uma área de
castanhal, no mesmo período de amostragem. Além disso, censos realizados dentro e
fora do castanhal determinaram que a densidade de cotias é maior dentro do castanhal
e que esta variação reflete mais uma variação no tamanho da área de vida do que um
aumento na sobreposição entre indivíduos vizinhos. Por fim, a partir dos resultados
encontrados neste trabalho, é possível afirmar que castanhais podem sustentar
populações maiores de cotias do que locais onde castanheiras adultas não ocorrem,
provavelmente por causa da grande quantidade de recurso (castanhas) disponíveis para
estes animais ao longo de todo o ano