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Jurisprudência da Quarta Turma

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Jurisprudência da Quarta Turma

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA

RECURSO ESPECIAL N. 92.478 - PR (Registro n. 96.0021690-8)

Relator: Ministro Barros Monteiro

Recorrentes: Condomínio Fazenda Mineira e outro

Advogados: Antônio Carlos de Andrade Vianna e outros

Recorrida: Marília de Souza Canabrava

Advogados: Marileidi Marchi e outros

341

EMENTA: Execução - Transação - Falta de assistência de advo­gados - Nulidade - Inocorrência.

- Restrita a audiência à tentativa de conciliação das partes, não se faz imprescindível a presença dos advogados de todas elas.

Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas pre­cedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Junior. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira.

Brasília-DF, 7 de fevereiro de 2002 (data do julgamento).

Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente.

Ministro Barros Monteiro, Relator.

Publicado no DI de 20.5.2002.

RELATÓRIO

o Sr. Ministro Barros Monteiro: Condomínio Fazenda Mineira e Dé­cio de Souza Canabrava opuseram embargos à execução, fundada em tran­sação, que lhes move Marília de Souza Canabrava, argüindo, dentre outras alegações, a inexigibilidade do título, visto que o acordo ocorreu numa reu­nião, sem designação de audiência nos autos nem assistência de advogados.

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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342 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

o MM. Juiz de Direito da Comarca de Paraíso do Norte julgou-os improcedentes.

A Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade, negou provimento à apelação interposta pelos Embargantes, em acórdão que registra a seguinte ementa:

"Apelação. Embargos à execução. Título judicial. Caso de acor­do homologado em juízo. Eficácia. Improcedência. Improvimento.

A parte, em sendo maior e capaz, pode celebrar acordo em audiên­cia pondo fim à lide.

A transação, devidamente homologada, constitui-se em título ju­dicial hábil para embasar processo executivo." (fl. l31).

Inconformados, o Condomínio Fazenda Mineira e Décio de Souza Canabrava manifestaram recurso especial com fulcro nas alíneas a e c do permissivo constitucional, alegando negativa de vigência ao art. 2.!l. da Lei n. 8.906, de 4.7.1994 e dissídio jurisprudencial com aresto do Tribunal de Alçada Cível de São Paulo. Aduziram que a conciliação pressupõe estejam os litigantes acompanhados de seus advogados regularmente constituídos.

Oferecidas as contra-razões, o recurso foi admitido na origem, subindo os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Barros Monteiro (Relator): Na Ação de Divisão n. 69/ 1989, promovida por Marília de Souza Canabrava, o MM. Juiz de Direi­to, em audiência, propôs a conciliação às partes, a qual terminou por ser aceita, conforme termo constante de fls. 13/14 destes autos.

Não se dispõe de dados sobre o estágio em que se encontrava aquela lide no momento da transação, mas é certo que, comparecentes as partes interessadas, foi ela homologada pelo doutor Juiz de Direito.

O reclamo, no caso, é o de que a audiência se realizou sem que os pro­movidos estivessem assistidos por advogados.

A irresignação, todavia, não se justifica, pois a tentativa de conciliação é dirigida às partes, pessoalmente, e não a seus advogados. Sérgio Sahione FadeI observa que, "independentemente de provocação do interessado, de

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 343

ofício, o juiz intimará as partes para que compareçam, pessoalmente, inde­pendentemente de seus advogados, ao início da audiência de instrução e jul­gamento, e tentará conciliá-las, possivelmente através de concessões e tran­sigências mútuas" (Código de Processo Civil Comentado, tomo lU, p. 8).

Cingindo-se a audiência à tentativa de conciliação, tornava-se dispensá­vel a presença dos srs. advogados.

Pontes de Miranda leciona que "o Código de 1973, arts. 447-449, introduziu o procedimento conciliatório. Na doutrina estrangeira frisa-se que, apesar de estar incluso no processo, é procedimento independente, cuja finalidade é obter-se solução amigável e tem de ser antes de se acentuar a contenciosidade. Com ele, as pessoas que exerceram a pretensão à tutela jurídica recebem a prestação em tentativa de levar o acordo, mesmo que consista em renúncia, desistência ou transação ou outro resultado solutivo. A conciliação não está submetida às exigências que a lei faz ao profe­rimento das sentenças, porque, assinado o termo pelas partes, apenas tem de ocorrer a homologação, que tem a eficácia de sentença, e é sentença (art. 449, verbis: 'terá valor de sentença'). Os pressupostos são os que existem para os atos constitutivos das partes (capacidade para ser parte, capacida­de processual e poder de representação legal). O que se há de exigir para

c. a conciliação é o que o sistema jurídico, no plano do Direito Privado (ou Público, se a parte é entidade estatal), faz obrigatório para a existência e a validade dos negócios jurídicos, especialmente das transações" (Comen­tários ao Código de Processo Civil, tomo V, p. 15, 3i1. ed., atualizada por Sérgio Bermudes).

É ainda da jurisprudência desta Casa o entendimento de que, tratan­do-se de direito disponível, é lícito à parte, maior e capaz, ainda que desacompanhada de seu patrono, firmar acordo que lhe pareça adequado à solução do litígio (REsp n. 77 .399-SP, relator Ministro Gilson Dipp). Em julgado do qual foi relator o Ministro Assis Toledo, assim decidiu a egré­gia Quinta Turma deste Tribunal:

"Petição de acordo assinada pelo advogado do autor e pelo réu diretamente, sem a intervenção do advogado do último. Transação váli­da, em tese, que só poderá ser anulada em ação própria, provando-se a existência de vício que a torne nula ou anulável." (REsp n. 50.669-7-SP). .

Não se pode falar, portanto, na espécie, em contrariedade à norma de lei federal, mais ainda em relação ao art. 2.Q. da Lei n. 8.906, de 1994, da

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344 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

qual a decisão recorrida, a rigor, nem sequer tratou. À sua vez, a dissonância interpretativa não é passível de aperfeiçoar-se à falta de cumprimento das prescrições contidas nos arts. 541, parágrafo único, do CPC, e 255, §§ p.

e 211., do RISTl

Do quanto foi exposto, não conheço do recurso.

É como voto.

RECURSO ESPECIAL N. 108.136 - PR (Registro n. 96.0058809-0)

Relator: Ministro Barros Monteiro

Recorrentes: Accor S/A e outro

Advogados: Pedro Augusto de Freitas Gordilho e outros

Recorrido: PHD e MAD Assessoria Comercial S/C Ltda

Advogado: Eloi Tambosi

Advogada: Ana Frazão (presente no julgamento) (pela recorrente)

EMENTA: Marca registrada - Palavra comum - Utilização pela ré.

- Registrada uma marca, não pode outra empresa industrial, comercial ou de serviços dela lançar mão, em havendo similitude de atividades. Precedentes do STJ.

Recurso especial conhecido e provido parcialmente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar

e Aldir Passarinho Junior. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira.

Brasília-DF, 5 de março de 2002 (data do julgamento).

RST], Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA

Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente.

Ministro Barros Monteiro, Relator.

Publicado no DI de 24.6.2002.

RELATÓRIO

345

o Sr. Ministro Barros Monteiro: Cuida-se de ação ordinária propos­ta por Accor e Ticket - Serviços, Comércio e Administração Ltda contra PHD e MAD Assessoria Comercial S/C Ltda, objetivando que a Ré se abs­tenha de utilizar a marca "Ticket", sob pena de multa, destruição de ma­terial e ressarcimento de perdas e danos.

Julgada improcedente a ação em I Q grau, a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade, negou provimento ao ape­lo das Autoras, em acórdão cujos fundamentos se resumem na seguinte ementa:

"Nome comercial. Uso indevido. Empresas do mesmo ramo. Mar­cas, no entanto, inconfundíveis. Palavra estrangeira incorporada à lin­guagem corrente. Usurpação não configurada. Ação improcedente. Apelo improvido." (fi. 307).

Inconformadas, as Autoras manifestaram este recurso especial com ful­cro nas alíneas a e c do permissor constitucional, apontando negativa de vigência aos arts. 5Q

, XXIX e XXXVI, da Constituição Federal; 59 e 65, item 17, da Lei n. 5.772/1971, além de dissídio interpretativo. Primeiro, asseve­raram já se encontrar registrada a marca "Ticket" há cerca de vinte anos, não se havendo mais que discutir acerca de sua registrabilidade, questão sobre a qual já se operou a prescrição. De outro lado, sustentaram que o registro dela perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial confere ao seu titular o direito de propriedade e uso exclusivo em todo o territó­rio nacional, impedindo terceiros de fazer uso de marca igualou semelhante, que se destine a assinalar artigos ou serviços idênticos, similares ou afins. Por fim, ressaltaram ter a referida marca adquirido notoriedade no segmento de intermediação de aquisição de produtos.

Contra-arrazoado, o apelo extremo foi admitido, subindo os autos a esta Corte.

É o relatório.

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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346 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

VOTO

O Sr. Ministro Barros Monteiro (Relator): Assiste razão, em parte, às Recorrentes.

As instâncias ordinárias reconheceram que a co-autora Accor detém o registro da marca "Ticket" e admitiram que a Ré, utente da marca Ticket Paranaense S/A - Ticketpar atua no mesmo ramo comercial das demandan­tes (serviços de intermediação na aquisição de produtos).

A despeito de serem as Autoras titulares da marca ora em questão, ne­garam-lhes tanto a sentença como o v. acórdão o direito à utilização exclu­siva, visto cuidar-se na espécie de nome comum, vulgar, corriqueiro, que se incorporou à linguagem corrente no País. Para a decisão ora recorrida, o vocábulo Ticket é marca não registrável, havendo invocado, para tanto, o disposto no art. 65, item 20, da Lei n. 5.772, de 21.12.1971.

Vale dizer, as instâncias ordinárias consideraram de nenhuma eficácia o registro obtido pela co-autora Accor.

Assim o fazendo, contrariaram de maneira frontal a norma do art. 59 do Código da Propriedade Industrial então vigente (Lei n. 5.772/1971). Primeiro, ao acórdão recorrido não era dado "cassar", pura e simplesmen­te, o registro concedido há vários anos pelo INPI. Segundo, a palavra Ticket, tal como asseveram as ora recorrentes, não foi empregada na sua acepção semântica original, qual seja, "bilhete", "nota de caixa", etc. Foi, sim, re­gistrada como marca para designar uma atividade de intermediação na aqui­sição de produtos.

De sorte que, não relacionado o termo Ticket com o produto, merca­doria ou serviço a distinguir (art. 65, item 20, acima citado), era perfeita­mente admissível o seu registro como marca, como de resto o foi pelo Instituto Nacional da Propriedade. Se o referido vocábulo estivesse umbilicalmente vinculado ao serviço de produção e distribuição de "bilhe­tes", poder-se-ia censurar o registro efetuado junto ao INPI. Entretanto, no caso, o registro teve em mira uma outra atividade exercida pelas acionantes: a de serviços de intermediação para aquisição de produtos.

Assim, não é por cuidar-se de um nome já incorporado à linguagem corrente do brasileiro que se poderá obstar o uso exclusivo da marca "Ticket" pelas Autoras.

Mas, o que mais releva para a justa composição desta lide é a circuns­tância de empregar a Ré a palavra Ticket em Ticket Paranaense S/A -Ticketpar para desempenhar suas atividades no mesmo ramo comercial das

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 347

suplicantes, tal como reconhecido pelas instâncias ordinárias. Nesse passo, a confusão decorrente do uso da mesma marca junto aos consumidores pode acarretar o desvio de clientela e, conseqüentemente, provocar concorrência desleal, ato lesivo inspirador da legislação pertinente à propriedade industrial.

Em precedente de que fui relator (REsp n. 210.076-RJ), esta Quarta Turma já teve ocasião de decidir:

"Marca registrada. Palavra comum. Sua utilização pela ré em nome de fantasia. Inadmissibilidade.

- Registrada uma marca, não pode outra empresa industrial, comer­cial ou de serviços utilizá-la na composição de seu nome comercial, em havendo similitude de atividades. Precedentes da Quarta Turma.

Recurso especial conhecido e provido parcialmente."

Naquele julgado fez-se remissão a um outro, oriundo também deste Órgão fracionário, relator o eminente Ministro Athos Carneiro (REsp n. 7.359-CE), de cujo voto se colhe:

"Ora, mantido o registro, incide a norma do artigo 59 da citada Lei n. 5.772/1971, pela qual 'será garantida no território nacional a propriedade da marca e o seu uso exclusivo àquele que obtiver o re­gistro de acordo com o presente Código, para distinguir seus produ­tos, mercadorias ou serviços, de outros idênticos ou semelhantes, na classe correspondente à sua atividade' (grifos nossos).

Registrada uma marca, não pode, pois, outra empresa industrial, comercial ou de serviços utilizá-la na composição de seu nome comer­cial, em havendo similitude de atividades (Lei n. 4.726, de 13.7.1965, art. 49), ou para 'todas as classes', em se cuidando de marca notória (CPI, art. 67). E a proteção aplica-se no território nacional, como está no próprio texto da lei, embora quiçá, lege ferenda, tal ampla pro­teção possa ser em certos casos menos adequada em país de dimensões continentais. Esta observação, contudo, é menos pertinente no caso concreto, em que a Autora expande sua rede de emissoras no territó­rio nacional, como se vê de fi. 13 e fi. 15.

O v. aresto, destarte, contrariou os artigos 159 e 65, n. 17, do Código de Propriedade Industrial."

Apenas não se pode considerar aperfeiçoada aqui a dissidência juris­prudencial, não somente porque as recursantes deixaram de mencionar as

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348 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

circunstâncias que identifiquem ou assemelhem as hipóteses confrontadas (arts. 541, parágrafo único, do CPC, e 255, § 2l1., do RlSTJ), mas, também, porque, de todo modo, claramente distintas as bases fáticas em que se as­sentaram os decisórios em cotejo. De anotar-se, outrossim, que a espécie dos autos reúne situação particular que não a enfocada pela egrégia Terceira Turma quando do julgamento do REsp n. 242.083-RJ, relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, feito do qual participaram as ora recorren­tes sem a obtenção de êxito.

A ação é julgada procedente, em parte, para o fim de ser condenada a Ré a abster-se do uso da marca "Ticket", a qualquer título e de qualquer forma que possa confundir-se com aquela das Autoras, sob pena de respon­der pela multa diária de R$ 1.000,00 (hum mil reais), a partir de noventa dias contados da intimação pessoal da parte e depois do trânsito em julga­do. A pretendida destruição do material afigura-se inócua, uma vez que des­tituído de nenhum valor. Ficam ainda arredados as perdas e danos por não comprovados na fase cognitiva, consoante diretriz de há muito traçada por esta Corte.

Do quanto foi exposto, conheço do recurso pela alínea a do admissor constitucional e dou-lhe provimento parcial, a fim de julgar procedente, em parte, a ação, na forma acima estabelecida. A Ré, vencida na parte substan­cial do litígio, arcará com as custas do processo em proporção de 2/3, fi­cando o restante a cargo das Autoras. Responderá também pelos honorários advocatícios da parte contrária, arbitrados em 10% sobre o valor atualiza­do da causa, já considerada aí a sucumbência parcial das demandantes.

É o meu voto.

VOTO-MÉRITO

o Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: Sr. Presidente, acompanho o voto do eminente Ministro-Relator, conhecendo do recurso e dando-lhe parcial provimento, com uma observação quanto a esse segundo fundamen­to: embora seja um nome comum, foi registrado como marca, e a outra em­presa lhe está fazendo concorrência no mesmo ramo de atividade.

VOTO

o Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Sr. Presidente, acompanho o voto do eminente Ministro-Relator, conhecendo do recurso e dando-lhe parcial provimento.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA

RECURSO ESPECIAL N. 115.599 - RS (Registro n. 96.0076753-0)

Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar

Recorrente: Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul

Recorrido: Clube dos Caçadores do Rio Grande

Advogado: Paulo Henrique Arigony Souto

349

EMENTA: Meio ambiente - Patrimônio cultural - Destruição de dunas em sítios arqueológicos - Responsabilidade civil - Indeniza­ção.

o autor da destruição de dunas que encobriam sítios arqueológi­cos deve indenizar pelos prejuízos causados ao meio ambiente, espe­cificamente ao meio ambiente natural (dunas) e ao meio ambiente cultural (jazidas arqueológicas com cerâmica indígena da Fase Vieira).

Recurso conhecido em parte e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira e Bar­ros Monteiro votaram com o Sr. Ministro-Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.

Brasília-DF, 27 de junho de 2002 (data do julgamento).

Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Presidente em exercício.

Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Relator.

Publicado no DI de 2.9.2002.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: O Ministério Público do Es­tado do Rio Grande do Sul ajuizou ação civil pública contra o Clube dos Caçadores de Rio Grande, que teria destruído parcialmente dunas e sítios

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350 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

arqueológicos existentes na área de sua propriedade, o que constitui aten­tado à preservação do meio ambiente e violência ao patrimônio cultural e arqueológico brasileiro.

O MM. Juiz julgou procedente a ação e determinou ao Réu abster-se de destruir o meio ambiente e o patrimônio cultural, condenando-o ao pa­gamento de indenização ao Erário Público - pelo quantum a ser definido em liquidação - por ter causado os referidos danos.

O Réu apelou, aduzindo que os danos se deram tão-somente em face do não-conhecimento da existência, naquela região, de áreas de sítios ar­queológicos.

A egrégia Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Gran­de do Sul deu provimento parcial ao recurso, para afastar a indenização, em acórdão assim ementado:

"- Meio ambiente. Sítio arqueológico, onde apareceram peças de cerâmica de antigas civilizações.

- Proteção pela Constituição Federal e leis pertinentes, sendo vedada a derrubada de duna que encobria tais elementos históricos.

- Apelo provido em parte, para afastar a indenização." (fi. 236).

Rejeitados os embargos declaratórios, o Ministério Público Estadual interpôs recursos extraordinário e especial, este com fundamento no art. 105, IlI, a, da CF. Defende a anulação dos acórdãos recorridos, porque: a) é omisso o aresto que apreciou a apelação, quanto às alegações de destrui­ção ambiental e responsabilidade objetiva, e por não expor as razões pelas quais afastou a indenização referente ao dano cultural; b) o que apreciou os declaratórios deixou de suprir as omissões e/ou contradições apontadas, ocorrendo, assim, contrariedade ao art. 458, II e IlI, do CPC. Aduz que o aresto recorrido, prolatado no julgamento da apelação, reconheceu a práti­ca dos danos e o nexo causal, mas afastou a indenização, o que implica afronta ao art. 14, § p., da Lei n. 6.938/1981. Pleiteia a condenação do Re­corrido ao pagamento de indenização por danos causados ao meio ambiente (dunas) e ao patrimônio cultural (sítios arqueológicos), no valor a ser apu­rado em liquidação de sentença.

Admitido o recurso especial, sem as contra-razões, subiram os autos.

O douto representante do Ministério Público Federal opinou pelo co­nhecimento e provimento do recurso, para que seja cassado o v. acórdão re­corrido e restabelecida a sentença, visto que, "diante da efetiva comprovação

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 351

nestes autos da relação de causalidade entre a conduta do Recorrido e a ocorrência do dano ao meio ambiente, forçoso seria concluir pela conde­nação da Entidade-ré ao pagamento de indenização prevista no artigo 225, § 3ll., da Carta Magna, mesmo porque, em se tratando de dano ambiental, tanto a doutrina quanto a jurisprudência têm entendido que a responsabi­lidade expressa no artigo 14, § 1ll., da Lei n. 6.938/1981 é objetiva, logo, independe da comprovação de culpa".

O feito me veio por redistribuição, porque envolve questão relativa ao pagamento de indenização por dano ao meio ambiente, matéria da compe­tência da Segunda Seção.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar (Relator): 1. Inexistiram omis­sões no r. acórdão proferido na apelação, razão pela qual deveriam mesmo ser rejeitados os aclaratórios. A egrégia Câmara examinou os temas relacio­nados com a existência dos danos e com a responsabilidade atribuída ao Réu, concluindo por afastar a condenação indenizatória, pelo que nada ha­via a suprir ou esclarecer.

2. No que diz com o mérito, tenho que o Recorrente tem razão.

O r. acórdão reconheceu a existência do fato danoso:

"No caso, segundo os elementos dos autos, houve a destruição parcial de uma duna, a fim de adaptar o local ao amortecimento das balas disparadas pelos caçadores, possivelmente em torneios, tanto que, nas palavras de Jonas Marcos Manna de Otero, o presidente da Enti­dade-ré, 'efetivamente, ao ser edificada uma obra qualificada como pára-balas em uma linha de tiro, a associação removeu parte de uma duna, erguendo-a, o que propiciou a construção' (fl. 130).

As dunas são bem protegidas, e definem-se, de acordo com a Re­solução n. 4/1985, do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambien­te), como formações arenosas, produzidas pela ação do vento, no todo ou em parte, ficando estabilizadas ou fixadas pela vegetação. De acor­do com o art. 3ll. da mesma resolução, integram os bens considerados

reservas biológicas.

Através de tal trabalho, vieram à tona materiais pré-históricos, chamados de cerâmicos, ou líticos, formados no período que vai do ano

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352 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

200 a 1.750 antes de Cristo (a.C.), a que os estudiosos denominaram 'Tradição Vieira' ou 'Cerâmica Vieira'.

Tais riquezas são objetos de cerâmica, revelando uma era primi­tiva, posto que confecção dos antigos habitantes da região.

A matéria despertou o estudo de várias pessoas e entidades, como se constata dos relatórios anexos aos autos.

De modo que, sem dúvida, pela importância desses sinais reveladores de habitantes antiqüíssimos, a proteção legal mostra-se incontestável, segundo os diplomas mencionados na inicial e na sen­tença." (fl. 237).

Também a imputação da autoria ficou referendada:

"Não se admite a versão de que entidade não provocou os danos, ou não tinha conhecimentos da importância histórica dos elementos que afloravam nas areias.

Em primeiro lugar, quanto à efetivação de estragos, em 10 de ju­lho de 1992, o coordenador de arqueologia do Centro de Cultura de Pessoas flagrou empregados contratados pelo Requerido destruindo a duna, a fim de 'efetuar o plantio de vegetação rasteira' (fl. 15).

Ademais, as fotos revelam uma realidade indesmentível, como a de fl. 28, onde se constata a retirada da areia." (fl. 238).

Sobre o elemento subjetivo, consciência com que foram praticados os atos, igualmente admitida a sua presença:

"No pertinente ao conhecimento do valor histórico, arqueológi­co e paleontológico, o representante do Requerido é confesso, quan­do admite ser 'do conhecimento de toda a comunidade que a beira da lagoa é local que abriga vários sítios arqueológicos' (fl. 130).

Talvez não fosse do conhecimento do Requerido, o que parece difícil, dada a profissão de seu presidente, posto que engenheiro, a importância dos elementos encontrados. Mas, quanto à destruição da duna, não poderia ignorar, porquanto as leis de proteção ao meio am­biente já são antigas, como o Decreto-Lei n. 25, de 30.11.1937, cujos dispositivos a respeito encontram-se transcritos à fl. 11 O.

A Constituição Federal, como visto, também mantém a tutela aos bens de valor natural e arqueológico - aspecto igualmente ressaltado.

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 353

De outra parte, verbalmente, houve a comunicação do apreço his­

tórico das peças que emergiram do solo." (fi. 238).

Assim, embora desnecessária a comprovação do elemento culpa para

a verificação da responsabilidade pelo dano ambiental, conforme é da nos­sa jurisprudência, também ele se encontra na hipótese em exame:

"O poluidor é obrigado, independentemente de culpa, a indeni­

zar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afe­tados por sua atividade." (REsp n. 20.401-SP, Segunda Turma, reI. o

eminente Ministro Hélio Mosimann, DJ de 21.3.1994; no mesmo sen­tido, o REsp n. 20.401-SP e o AgRg no Ag n. 179.321-SP).

No caso dos autos, o Recorrente alega que o r. acórdão, além das omis­

sões e contradições apontadas, causou ofensa ao disposto no art. 14, § P\

da Lei n. 6.938/1981, que assim dispõe:

"Art. 14. Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não-cumprimento das medidas neces­

sárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará aos transgressores:

1- ( ... )

n - ( ... ) IH - ( ... )

IV - ( ... )

§ 1.\1.. Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste ar­

tigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a tercei­

ros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos

Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente."

Portanto, presentes todos os pressupostos para o reconhecimento da

responsabilidade civil do agente causador do dano ao ambiente, com agres­

são às dunas e ao patrimônio cultural e arqueológico, destruindo-se jazidas de precioso material da cerâmica indígena, impunha-se a manutenção da

sentença proferida pelo Dr. Bento Fernandes de Barros Jr. - não só na parte

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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354 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

em que impôs ao Réu o dever de abster-se de continuar a prática proibida, como também na que lhe atribuiu a obrigação de indenizar os danos causa­dos com a destruição da duna e de sítios arqueológicos existentes nas depen­dências do clube, cujo valor será apurado em liquidação por arbitramento.

Posto isso, conheço em parte do recurso e lhe dou provimento para restabelecer a sentença.

É o voto.

RECURSO ESPECIAL N. 151.321 - MG (Registro n. 97.0072796-3)

Relator: Ministro Cesar Asfor Rocha

Recorrente: Banco do Brasil SI A

Advogados: Pedro Afonso Bezerra de Oliveira e outros

Recorrido: Corrêa e Andries Tecidos Ltda

Advogado: Antônio Celso do Valle Almeida

Recorrida: Têxtil Duomo SIA

Advogados: Marcus Rafael Bernardi e outro

EMENTA: Ação anulatória de título - Duplicata sem causa -Ônus da sucumbência.

O banco-endossatário que resiste aos pedidos do sacado para que seja (a) sustado o protesto, por ele solicitado, e (b) anulada a duplicata sem aceite que não tem causa subjacente, responde pelos encargos sucumbenciais.

Precedentes.

Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recur­so. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Ruy Rosado de Aguiar e Aldir

RSTJ, Brasília, 3.15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDENCIA DA QUARTA TURMA 355

Passarinho Junior. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Barros Monteiro. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira.

Brasília-DF, 9 de abril de 2002 (data do julgamento).

Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente e Relator.

Publicado no DJ de 5.8.2002.

RELATÓRIO

o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: Corrêa e Andries Tecidos Ltda ajui­zou ação de desconstituição de contrato cumulada com anulação de título, precedida de uma medida cautelar de sustação de protesto, contra o Banco do Brasil S/A e litisdenunciada Têxtil Duomo S/A, alegando ter havido a devolução das mercadorias referidas na duplicata protestada.

Na contestação, o Banco-réu alegou ser proprietário de boa-fé da du­plicata, em função do endosso traslativo recebido da Têxtil Duomo S/A, sendo obrigatório o protesto para garantia do seu direito de regresso con­tra a endossante. Assim, "não pode assumir a responsabilidade advinda da realização da operação comercial entre a Têxtil Duomo Ltda e a Corrêa e Andries Tecidos Ltda", e que o fato da denunciada "ter comunicado ao Ban­co a respeito da devolução das referidas mercadorias não quita o crédito do Banco do Brasil" (fi. 24).

O pedido foi julgado procedente, em 1 a. instância, condenados os Réus, na ação principal, ao pagamento, na proporção de 50% para cada qual, das custas processuais e nos honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor da causa, sendo condenado apenas o Banco ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, também arbitrados em 20% sobre o valor da causa, relativamente à medida cautelar.

À apelação interposta pelo Banco do Brasil, o egrégio Tribunal de Al­çada do Estado de Minas Gerais deu parcial provimento a fim de "preva­lecer o protesto e a validade da duplicata em epígrafe com relação à sua sacadora para, tão-somente, assegurar o direito de regresso do Apelante con­tra a mesma" (fi. 98). O v. acórdão restou assim ementado:

"Processual Civil e Comercial. Duplicata simulada. Endosso à

instituição bancária. Protesto. Legitimidade. A instituição bancária que levou a protesto duplicata simulada, recebida de boa-fé por meio de

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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356 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

endosso, possui legitimidade para responder à medida cautelar de

sustação de protesto e à ação declaratória de nulidade propostas pela sacada. Reconhecido é o direito de regresso do Banco-endossatário contra emitente de duplicata mercantil sacada sem lastro causal. Ape­lação provida em parte."

Os embargos declaratórios foram rejeitados com aplicação de multa de 0,5% sobre o valor da causa.

Daí o recurso especial afirmando negativa de vigência aos artigos 535 do Código de Processo Civil, pelo não-acolhimento dos embargos declara­

tórios, e 20, também do CPC, para que sejam excluídos da condenação os ônus sucumbenciais, porquanto não houve a efetiva sucumbência do Recor­

rente, cujo objetivo "ao protestar os títulos e ao apresentar a contestação,

foi garantir seu direito de regresso contra a endossante-cedente das dupli­catas".

Alega, também, violação aos artigos 13, 14 e 25 da Lei n. 5.474/1968,

aos artigos 8ll. e 43 do Decreto n. 2.044/1908 e ao artigo 17 do anexo I do Decreto n. 57.663/1966, além do dissídio com julgados desta Corte e de outros Tribunais que teriam decidido pela obrigatoriedade do protesto, e

por entender o Recorrente que, na qualidade de endossatário mediante en­

dosso pleno, não seria parte legítima para figurar no pólo passivo da ação.

Sem contra-razões no prazo, o recurso foi admitido na origem.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha (Relator): Não há ofensa ao artigo

535, CPC, pela rejeição dos declaratórios quando ausente omissão no aresto recorrido, nem configura negativa de prestação jurisdicional a decisão con­

trária aos interesses da parte.

No mais, a pretensão do Recorrente já foi examinada diversas vezes

nesta Corte, proclamando a jurisprudência assente, em casos desta nature­

za, a legitimidade passiva do Banco-endossatário e a sua responsabilidade

pelos ônus da sucumbência, ressalvado seu direito de regresso contra o

endossante, a exemplo dos seguintes precedentes:

"Processo Civil. Honorários de advogado. Protesto de duplicata.

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 357

Se a instituição financeira desconta a duplicata mercantil, e a leva

a protesto por falta de aceite ou de pagamento, ainda que para o só

efeito de garantir o direito de regresso, responde pelos honorários de

advogado, na ação de anulação do título, se nesta ficar provado que

esta não tinha causa. Recurso especial conhecido, mas não provido."

(REsp n. 146.993-PR, relator Min. Ari Pargendler, DJ de 4.6.2001).

"Duplicata. Protesto. Desconto. Legitimidade. Banco.

O banco que recebe em operação de desconto duplicata sem cau­sa age com negligência e corre risco do seu negócio, sendo, por isso,

parte legítima na ação de cancelamento do protesto movida pelo sa­cado, perante quem responde solidariamente com o emitente ou

endossante, pelos danos, custas e honorários, ressalvado seu direito de

regresso." (REsp n. 263.541-PR, relator Min. Ruy Rosado de Aguiar,

DJ de 26.3.2001).

"Agravo interno. Direito Comercial. Processo Civil. Duplicata

sem causa. Endosso. Protesto. Cancelamento. Perdas e danos. Honorá­

rios advocatícios. Endossatário. Agravo desprovido.

- O banco-endossatário que recebe por endosso traslativo dupli­

cata sem causa e a leva a protesto, o qual vem a ser cancelado em juízo, em ação promovida pelo sacado, responde pelos danos decorrentes do

protesto, bem como pelo ônus da sucumbência." (AgRg no Ag n. 309.545-RS, reI. eminente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ

de 11.3.2002).

"Endosso. Duplicata sem aceite. Ação de nulidade movida pelo sacado. Encargos da sucumbência.

O endossatário que leva a protesto duplicata não aceita, ainda que isso seja necessário para assegurar o direito de regresso, assume o risco

de colocar-se como réu, em ação movida pelo sacado e deverá, se ven­

cido, arcar com o pagamento de custas e honorários." (REsp n.

248.273-GO, relator Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 26.6.2000).

"Título de crédito. Direito de regresso. Ônus da sucumbência.

1. Embora haja precedente da Corte em outra direção, a Turma

consolida posição no sentido de que se o banco, como apurado nas ins­

tâncias ordinárias, não se cercou das devidas cautelas ao remeter para

protesto duplicata não aceita, dando causa ao protesto e, assim, ao pro­

cesso, deve responder pelos ônus da sucumbência.

RST], Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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358 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

2. Recurso especial conhecido, mas improvido." (REsp n. 206.718-SP, relator Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 12.6.2000).

"Protesto. Sustação. Endossatário. Sucumbência.

O banco-endossatário, que recebeu por endosso traslativo dupli­cata sem causa e a levou a protesto, posteriormente sustado em ações promovidas pela empresa-sacada, responde pelos encargos da su­cumbência juntamente com o endossante (art. 20 do CPC). Preceden­te da Quarta Turma." (REsp n. 147.585-RS, relator Min. Barros Monteiro, DJ de 31.8.1998).

"Comercial e Processual Civil. Duplicata não aceita. Sustação de protesto. Anulação. Endosso. Sucumbência. Honorários.

O banco-endossatário que resiste aos pedidos do sacado para que seja (a) sustado o protesto, por ele solicitado, e (b) anulada a dupli­cata sem aceite que não tem causa subjacente, responde pelos encar­gos sucumbenciais juntamente com o endossante, se ambos figuraram na lide.

Recurso especial conhecido, mas desprovido." (REsp n. 94.041-PR, por mim relatado, DJ de 1.2.1999).

Do voto que proferi nesse último julgado, extraio as seguintes consi­derações:

"Ao discorrer sobre o princípio da sucumbência, Chiovenda (in Instituições de Direito Processual, vol. lU, p. 285), na remissão feita por Luiz Carlos de Potilho (in RF 246/221), observou que 'o fun­damento dessa condenação é o fato objetivo da derrota, e a justifica­ção desse instituto está em que a atuação da lei não deve representar uma diminuição patrimonial para a parte a cujo favor se efetiva; por ser interesse do Estado que o emprego do processo não se resolva em prejuízo de quem tem razão e por ser, de outro turno, interesse do co­mércio jurídico que os direitos tenham um valor tanto quanto possí­vel, nítido e constante'.

Essa, certamente, foi a motivação que teve o legislador do Código de Processo Civil vigente quando, no seu art. 20, impôs ao vencido pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advo­catícios.

RST], Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDENCIA DA QUARTA TURMA 359

Em comento a tal dispositivo, o mestre Pontes de Miranda (in Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo I. p. 416) leciona que 'hoje não há qualquer especialização de ações para que incida o art. 20. Não importa se a ação é declaratória, constitutiva positiva ou ne­gativa, condenatória, mandamental ou executiva. Não mais se limita a sanção às ações do ato ilícito absoluto ou relativo. Pressuposto neces­sário é um só: ter havido perda da causa, pelo autor, ou pelo réu, ou quem quer que seja perdente'.

Observa-se, portanto, que, em tese, havendo pretensão resistida e sendo esta solucionada com a decretação da derrota de uma das par­tes, aquela que for sucumbente deverá arrostar com o ônus da verba honorária, que é devida ao patrono do contendor vitorioso.

Na hipótese em exame, é evidente que o banco-recorrente resis­tiu contra a pretensão da recorrida de evitar que o protesto fosse ti­rado e que fosse anulada a cambial, quando deveria ter procurado, ape­nas, ressalvar o seu direito de regresso como endossatário (contra o que, diga-se de passagem, a recorrida em nenhum momento se insur­giu).

Não deveria ter ido além, como foi e sem sucesso, para também se insurgir contra a sustação do protesto e a anulação da duplicata.

Sendo assim, evidente que não se pode deduzir que tenha ele sido exitoso na sua postulação, nem muito menos que a recorrida tenha sido vencida.

É certo que o banco agiu de boa-fé, como igualmente é verdadei­ro ter ele agido por lícita motivação para resguardar o seu direito de regresso.

Contudo, a atividade bancária é tipicamente de risco e no mo­mento mesmo em que lhe foi passado o endosso, com ele vieram to­dos os riscos ínsitos nas operações desse jaez, inclusive o de que pu­desse não ter sido consumado o negócio subjacente que daria causa ao título, sobretudo porque, na hipótese, a duplicata não estava aceita nem havia nenhuma prova da entrega de mercadoria, motivos que aumen­tam de insegurança o negócio realizado."

Estando o v. acórdão recorrido em harmonia com esse entendimento, incide, na espécie, o verbete n. 83 da Súmula desta Corte.

Diante do exposto, não conheço do recurso especial.

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360 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RECURSO ESPECIAL N. 203.225 - MG (Registro n. 99.0009786-6)

Relator:

Recorrente:

Advogados:

Recorrido:

Advogado:

Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira

Fiat Automóveis SI A

João Dácio Rolim e outros

Ronaldo Salgado

Geraldo Magela S. Freire

Sustentação oral: Luís Carlos Martins (pela recorrente)

EMENTA: Direitos do Consumidor e Processual Civil - Veículo com defeito de fabricação - Responsabilidade do fabricante - Inde­nização - Código de Defesa do Consumidor - Reexame de provas -Honorários de advogado - Compensação - Possibilidade - Arts. 21, CPC, e 23, Lei n. 8.906/1994 - Precedentes - Cópias de documentos não autenticadas - Art. 385, CPC - Insuficiência de elementos de prova da falsidade - Recurso desacolhido.

I - Tendo o Tribunal de 22. grau extraído das provas dos autos a culpa do fabricante pelos danos causados ao veículo adquirido pelo autor, resta inviável o reexame do tema na instância especial, a teor do Verbete Sumular n. 7 -STJ.

11 - A só falta de autenticação das cópias das notas fiscais jun­tadas aos autos, sem a conjugação de outros elementos que indi­quem vícios nos documentos, não implicam sua falsidade.

111 - Na linha da jurisprudência desta Corte, a compensação de honorários prevista no art. 21, CPC, não é incompatível com o art. 23 do Estatuto da Advocacia.

IV - Não há vício em acolher-se a inversão do ônus da prova por ocasião da decisão, quando já produzida a prova.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer dos re­cursos. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Junior.

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA

Brasília-DF, 2 de abril de 2002 (data do julgamento).

Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente.

Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Relator.

Publicado no DI de 5.8.2002.

RELATÓRIO

361

O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: O Recorrido aJUIZOU ação contra a Recorrente, buscando a restituição da quantia paga pela aqui­sição de um Fiat Tempra zero quilômetro, modelo 1995, para utilização como táxi, pedindo ainda indenização por perdas e danos e danos morais pelo "desconforto, insegurança e intranqüilidade emocional e psicológica" (fi. 44) advindos dos defeitos constatados no veículo.

O Juiz de 1>1. grau desacolheu a pretensão, aos fundamentos de que a reclamação dos defeitos junto à concessionária da Ré se dera após longo desgaste do veículo e quase um ano de uso e que as provas dos autos evi­denciavam descuido na conservação do bem e desgaste natural.

O Tribunal de Alçada de Minas Gerais proveu parcialmente a apela­ção do Autor para condenar a Ré ao ressarcimento do valor pago, mais cor­reção monetária e juros de meio por cento ao mês, afastando a indenização dos danos morais e dos emergentes. O acórdão, da relatoria do Juiz Belizário de Lacerda, recebeu esta ementa:

"Apelação. Código de Defesa do Consumidor. Substituição de automóvel. Risco à segurança. Reiterados defeitos. Inteligência do ar­tigo 12 do CDC. Culpa. Onus probandi. Fase de desgaste do auto­móvel. Garantia. Danos materiais. Isenção tributária. Danos morais. Profundidade. Tutela antecipada. Incabível em 2>1. instância.

- A negativa de vigência de dispositivos legais não implica na nulidade da sentença, mas na sua improcedência, questão a ser anali­sada no mérito do recurso.

- Se o automóvel zero quilômetro apresenta reiterados defeitos, em curto espaço de tempo, comprometida fica a segurança daqueles que dele se utilizam.

- Constatada pelo magistrado a hipossuficiência do consumidor e a verossimilhança de suas alegações, impõe-se a inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 6>1., inciso VII, do CDC.

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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362 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

- Provando o consumidor a ocorrência do dano, através de notas fiscais de ordem de serviço, as quais demonstram que o mesmo teve que levar seu veículo à oficina autorizada por 13 (treze) vezes em 16 (dezesseis) meses, o que resulta na evidência do desajuste geral de fa­

bricação, e do nexo causal, incumbe ao fabricante a prova de uma das excludentes de responsabilidade discriminadas no artigo 12, § 3Q

, do CDC, regra de aplicação obrigatória.

- O pagamento do preço do veículo deve ser concomitante à sua devolução ao fabricante.

- A isenção tributária não pode ser indenizada, eis que o Autor

não pagou pelos impostos e continuará não pagando, caso venha a ad­

quirir outro automóvel.

- Não é qualquer aborrecimento, insegurança ou desgaste emo­cional que são indenizáveis a título de danos morais, sendo necessá­rio que o sofrimento experimentado pela vítima seja profundo e con­

tundente.

- Se o Autor requestou indenização pelos dias em que deixou de trabalhar com o veículo, mas não provou o quantum, impossível a condenação do Réu nesse particular.

- Não há se falar em tutela antecipada em nível de 2l1. instância, salvo em matéria de competência originária da instância ad quem." (fls. 207/208).

Os embargos de declaração opostos pela Ré foram acolhidos para, sa­nando a omissão, desacolher a impugnação referente à falta de autenticação

das cópias das notas fiscais.

Os declaratórios do Autor restaram igualmente acolhidos para arbitrar "os honorários advocatícios em 12% sobre o valor da condenação, a serem pagos ao advogado do Apelante [Autor], já descontada a sucumbência do Apelado [Ré]" (fl. 240).

Opostos novos embargos declaratórios pela Ré, foram eles rejeitados.

O recurso especial da Ré indica violação aos arts. 21 e 385, CPC; 12 e 18, CDC; 23 da Lei n. 8.906/1994, e 1.009, CC, além de divergência jurisprudencial. Sustenta a Recorrente: a) a nulidade das cópias não auten­

ticadas das notas fiscais como elemento de prova; b) a inviabilidade de in­terpretar-se em conjunto as normas referentes à responsabilidade por fato

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 363

do produto e por vícios de qualidade ou quantidade (arts. 12 e 18, CDC); c) a impossibilidade de compensação dos honorários de advogado.

O recurso especial adesivo do Autor aponta ofensa ao art. 6ll., VI, CDC, e pretende a procedência do seu pedido, na parte em que restou vencido.

Contra-arrazoado o adesivo, foi o especial principal admitido na ori­gem.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira (Relator): 1. Em rela­ção ao art. 385, CPC, da simples falta de autenticação das cópias das no­

tas fiscais não se extrai a conclusão de sua falsidade, sem a conjugação com outros elementos que possam indicar vícios nos documentos. Ademais, no caso, as instâncias ordinárias se fundaram no conjunto probatório dos au­tos, como assentou a Câmara julgadora:

"O reconhecimento da veracidade dos documentos apresentados em cópias não autenticadas o foram dentro do princípio da livre apre­ciação das provas inscrito no artigo 131 do CPC, não havendo que se falar em violação ao artigo 385 do CPC e do princípio do contradi­tório." (fl. 252).

Esse entendimento coaduna-se com a jurisprudência desta Corte, como se vê no REsp n. 278.889-GO (DJ de 5.3.2001), relator o Ministro José Arnaldo da Fonseca, com esta ementa:

"Recurso especial. Documentos apresentados sem estarem devi­damente autenticados. Impugnação sem indicação do vício. Mera afir­

mação genérica e imprecisa de que não são autênticos. Inocorrência de violação aos arts. 384 e 385 do CPC.

Recurso não conhecido."

2. A compensação de honorários prevista no art. 21, CPC, não é in­compatível com o art. 23 do Estatuto da Advocacia, conforme decidiu a Se­gunda Seção desta Corte, no REsp n. 155.135-MG (DJ de 8.10.2001), relator o Ministro Nilson Naves, assim ementa do, no particular:

RST], Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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364 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

"Honorários de advogado. Procedência parcial da ação. Compen­

sação. Direito autônomo. [ ... ]

1. O Código de Processo Civil, no art. 21, ordena se aplique a

regra da compensação, enquanto a Lei n. 8.906/1994, no art. 23, es­

tabelece que os honorários pertencem ao advogado, tendo ele direito

autônomo para executar.

2. Sucede, no entanto, que tais normas não são incompatíveis en­

tre si, sendo lícito entender-se que uma não incomoda a outra, convi­

vendo ambas perfeitamente no mundo jurídico.

3. Em caso de sucumbência recíproca, admite-se, por conseguin­

te, a compensação, ao ver de precedentes da Quarta Turma, entre ou­

tros, os REsps n. 149.147 e 186.613, cuja orientação foi, no presente

caso, acolhida pela Segunda Seção, por maioria de votos. Improcedên­

cia da alegação de ofensa a texto de lei federal."

Inexiste a apontada violação, assim, aos arts. 21, CPC; 23 da Lei n.

8.906/1994, e 1.009, CC.

3. Quanto ao mais, a pretensão encontra óbice no enunciado n. 7 da

Súmula-ST}, uma vez que o Tribunal se fundou nas provas dos autos e de­

las extraiu a culpa do fabricante pelos danos causados ao veículo adquiri­

do pelo Autor. Com efeito, o voto-condutor do acórdão esmiuçou o conjunto probatório e examinou a espécie com rigor e propriedade, como se colhe

das razões do voto-condutor do acórdão, verbis:

"As razões de recorrer do Apelante tiveram como ponto princi­

pal a questão da culpa e da inversão do onus probandi.

Alega o Apelante que provou o fato constitutivo de seu direito, ou

seja, o nexo de causalidade e a existência do dano.

Para elidir tais fatos, deveria o Apelado provar uma das excluden­

tes de responsabilidade presentes no artigo 12, § 3ll., do CDC, o que

não fez.

Ab initio, importante verificar a natureza do defeito reclamado,

em virtude da diferença de efeitos entre os danos de responsabilidade

pelo fato do produto (vício de segurança) e os por vício do produto

(vícios 'de adequação ou qualidade).

A propósito, Zelmo Denari faz um sugestivo paralelo entre as

duas possibilidades:

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 365

um produto ou serviço é defeituoso quando não corresponde à legítima expectativa do consumidor a respeito de sua utilização ou fruição, vale dizer, quando a desconformidade do produto ou serviço compromete a sua prestabilidade ou servibilidade. Nesta hipótese, podemos aludir a um vício ou de­feito de adequação do produto ou serviço.

Por outro lado, um produto ou serviço é defeituoso, da mes­ma sorte, quando sua utilização ou fruição é capaz de adicionar riscos à segurança do consumidor ou de terceiros. Nesta hipóte­se, podemos aludir a um vício ou defeito de segurança do produto ou serviço.' (p. 104).

No caso em epígrafe, estão em discussão sucessivos defeitos ocor­ridos em automóvel, mais precisamente em táxi.

O veículo zero quilômetro foi levado por 13 (treze) vezes à ofi­cina, no espaço de 16 (dezesseis) meses. Duas destas vezes foi para revisão de rotina, apesar de que mesmo aí existia a reclamação por defeitos outros.

Alguns dos defeitos relacionavam-se a vazamento de óleo no re­servatório da direção hidráulica, corte de energia em movimento, pro­blemas no chicote da injeção e rumurosidade anormal no sistema de freios.

Todos os defeitos acima apresentados comprometem, e muito, a segurança daqueles que se utilizam do veículo, podendo resultar em grave acidente.

Além do mais, dada a quantidade e a variedade dos defeitos, nunca se sabe o que aparecerá no dia seguinte, quando o veículo estiver em funcionamento, quiçá em alta velocidade.

O fato de tratar-se de um táxi agrava ainda mais o risco, pois é veículo que transporta, diariamente, um enorme número de pessoas.

Assim, não resta dúvida de que o preceito legal aplicável é o ar­tigo 12 do CDC, responsabilidade pelo fato do produto.

É claro que os defeitos de qualidade estão contidos na responsa­bilidade pelo fato do produto, mas este segundo é mais específico.

Ultrapassada esta fase, importante investigar a questão da culpa do fabricante.

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366 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Entendo que é de se aplicar a inversão do ônus da prova, nos moldes dos artigos 6.2., inciso VIII, e 12, § 3.2., ambos do CDC.

O artigo 12, § 3.2., do CDC não traz uma opção ao magistrado, mas uma regra de aplicação obrigatória.

Então, provando-se a existência do dano e o seu nexo de causa­lidade, cabe ao fabricante apresentar a sua contraprova, restringindo­-se esta à alegação de que não colocou o produto no mercado, que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste ou a culpa do defeito é exclusiva do consumidor.

O artigo 6.2., inciso VIII, do CDC, já comporta certa ingerência do magistrado, mas ingerência no sentido de que, constatada por ele a verossimilhança das alegações e a hipossuficiência do consumidor, é de se deferi-la.

A hipossuficiência do consumidor é de evidência mediana, pois adquiriu veículo que é sua ferramenta primeira de trabalho.

As suas alegações são revestidas de veracidade, principalmente porque trouxe ao bojo dos autos inúmeras notas de serviço.

Assim, como se disse, a inversão do ônus da prova previsto no artigo 6.2., inciso VIII, também deve ser considerado.

Para responder indagação do Apelado, abro um parêntese para dizer que a inversão do ônus da prova é questão que pode e deve ser levantada pelo magistrado, de ofício, em I II e 2ll instâncias, apesar de que o Apelante ao mesmo referiu-se na inicial e na apelação.

Examinemos, pois, se o nexo de causalidade e o dano encontram­se provados.

É de se dizer que, se no prazo de 16 meses, um veículo zero qui­lômetro teve que ir à concessionária por 13 vezes, ele certamente apre­senta número de defeitos muito além do normal, que só pode decor­rer da má qualidade de fabricação.

O vício de fabricação aqui nasceu de um desajuste geral, o que causa, a cada dia, o aparecimento de novas avarias. É a conseqüência da má fabricação por excelência.

O risco à segurança oriundo desses defeitos é indubitável e já foi examinado no item anterior.

O nexo de causalidade está justamente na venda de produto de­feituoso ao consumidor que causou-lhe a insegurança, inviabilizando a permanência do Autor com o veículo.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 367

Vazia a argumentação de que os defeitos, se existiram, foram con­sertados no prazo de 30 dias, pois, em caso contrário, o consumidor não teria recebido o automóvel.

Ora, quantas vezes levamos um produto para o conserto e apenas ao utilizá-lo notamos que não foi ajustado?

Pois bem, fixada a existência do nexo de causalidade e do defei­to, em virtude do disposto no artigo 12, § 3Q

, do CDC, é o fabricante que deve provar que o mesmo não é oriundo de sua culpa, ou seja, que não nasceu de fabricação inadequada, ou decorre do mau uso feito pelo consumidor. Isto a Ré poderia ter realizado através de perícia na ins­tância a quo, o que, apesar de exortada a especificar provas, não o fez.

Dizer que o Autor fazia mal uso do veículo porque estava com farol e lanterna quebrados é ir longe demais, eis que um esbarrão de terceiros pode ter causado o fato, como inúmeras outras coisas, não in­dicando a utilização fora dos parâmetros exigidos.

Quanto ao tempo que levou o consumidor para pedir a substitui­ção do bem, temos que ainda o fez quando o produto não estava em fase de desgaste, devendo apresentar-se em sua plena capacidade de produção, contando defeitos mínimos e muito esporádicos.

O bem foi adquirido em 14.3.1995, e em 18.2.1996, após exaus­tivas idas e vindas às concessionárias de serviço autorizado, o Autor notificou a Ré, em caráter peremptório, para consertar o veículo sob pena de ter que substituí-lo.

A notificação deu-se após 11 (onze) meses de uso, período em que um automóvel ainda não passou a fase de desgaste, tanto, que a maior parte das montadoras concede garantia de 1 (um) ano.

A decadência, obviamente, nos termos do artigo 27 do CDC, ain­da está longe de ocorrer.

Impõe-se, pois, o ressarcimento do Apelante dos danos por ele sofridos, devendo o Apelado indenizar-lhe do valor que pagou pelo veículo, mais correção monetária e juros de 0,5% a.m., a contar da data do efetivo desembolso da quantia.

A devolução do veículo à Ré deve ser concomitante ao recebi­mento do seu valor em pecúnia.

A isenção tributária não pode ser indenizada, eis que o Autor não pagou pelos impostos e continuará não pagando, caso venha a adqui­rir outro automóvel.

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368 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

o IPVA e as despesas de emplacamento também não são devidos, uma vez que não representam danos, mas conseqüência natural da pro­priedade do bem.

O mesmo se diz da indenização a título de danos morais.

A insegurança, a intranqüilidade e o desgaste emocional experi­mentados pelo Autor não têm a profundidade necessária para configurar danos morais.

O sofrimento deve ser contundente.

Não é um simples aborrecimento ou desgaste emocional que enseja o dano moral, caso contrário, qualquer pretensão resistida, e, a final julgada procedente, implicaria em tal ressarcimento, o que toca as raias do absurdo.

A indenização pelos danos emergentes, resultado dos dias em que o taxista não pôde trabalhar, em princípio, seria aceitável.

Entretanto, o Autor não trouxe aos autos a prova do montante que recebia, em média, por dia de trabalho, tornando impossível a conde­nação da Ré nesse particular." (fls. 212/218).

( ... )

"O artigo 12 do CDC prevê, a meu sentir, a mais ampla e com­pleta reparação de danos e isto inclui, naturalmente, a devolução do valor pago pelo produto defeituoso, que, justamente através de seu uso, colocou em risco a vida do Embargado e demais passageiros, o que acaba por ter por conseqüência o desfazimento do negócio jurídico, com a entrega do produto defeituoso.

Em outras palavras, não é apenas o mau resultado da utilização que se pretende ressarcir, mas todo e qualquer prejuízo relacionado ao defeito que coloca em risco o consumidor.

Então, a natureza da condenação é indenizatória, embora a con­seqüência seja a restituição das parcelas, que é exatamente o dano so­frido pelo Apelado em razão do defeito do veículo, e o artigo aplicá­vel é o 12 do CDC, mantendo-se a inversão do ônus da prova ali pre­conizada e naqueles moldes, a despeito do inconformismo do Embargante, inexistindo a contradição aventada.

Quanto à inversão do ônus da prova previsto no artigo 6>1., inciso VIII, do CDC, também inexiste qualquer contradição, omissão ou obs­curidade, pois, como restou claro no acórdão embargado, por estarem presentes os seus pressupostos, foram reconhecidos em 2l!. instância e

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 369

abrangeram todo o processo, incluindo a fase probatória, ocasião em que a Apelada teve oportunidade de produzir todas as provas que jul­gasse necessárias.

Com relação ao vício do produto, já foi mais do que debatido no acórdão. O veículo apresentava inúmeros defeitos, dentre outros, va­zamento de óleo no reservatório da direção hidráulica, corte de ener­gia em movimento, problemas no chicote da injeção, rumurosidade no sistema de freios, etc .... Tudo isto demonstra um desajuste geral do veículo, que coloca em risco a integridade física daqueles que dele se utilizam, não existindo qualquer contradição com o fato de que o seu proprietário, um taxista, rodou com ele muitos quilômetros, pois o uso do automóvel não prova diminuição dos riscos, mas, sim, agravamen­to dos mesmos.

Como se viu, exceto na questão da impugnação dos documentos, o que a Embargante busca é abrir nova discussão do que foi decidi­do, pretendendo ver a causa resolvida segundo os articulados que lhe convêm, e não julgada como efetivamente posta em juízo, o que não admite." (fls. 238/240).

Por fim, é de registrar-se que esta Corte tem precedente que corrobo­ram a orientação do acórdão impugnado, como, por exemplo, os AgRg no Ag n. 353.219-AM (DJ de 13.8.2001) e 350.590-RJ (DJ de 7.5.2001) e o REsp n. 195.659-SP (DJ de 12.6.2000), todos da relatoria do Ministro Menezes Direito, com estas ementas, no pertinente:

- "Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Importa­dor. Veículo. Defeito de fábrica. Súmula n. 7 -ST].

1. Extrai-se do conjunto probatório dos autos que o veículo apre­sentou defeito mecânico desde o início de sua utilização, sendo neces­sária a remessa do mesmo para outro Estado, o que acarretou irreme­diável avaria. Segundo o acórdão, portanto, trata o presente caso de de­feito do produto e também do serviço prestado, aplicando-se regular­mente as disposições contidas nos artigos 12 e 34 do Código de De­fesa do Consumidor.

[ ... ]

3. Não restaram caracterizadas, portanto, quaisquer irregularida­des aos referidos artigos, ensejando a pretensão recursal o reexame de provas, vedado a teor da Súmula n. 7-ST].

4. Agravo regimental desprovido."

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370 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

- "Agravo regimental. Recurso especial não admitido. Veículo novo. Defeito de fábrica. Código do Consumidor.

1. O defeito apresentado, mormente por tratar-se de veículo zero quilômetro já com sucessivas idas à oficina, diminuiu o valor e com­prometeu a qualidade do produto, além de impossibilitar a utilização do bem.

2. Regular a aplicação do artigo 18, §§ 1ll. e 2ll., da Lei n. 8.078/ 1990, estando a decisão em harmonia com os precedentes desta Cor­te ao determinar a substituição do bem.

3. O dissídio não restou caracterizado. A Recorrente não realizou o indispensável cotejo analítico, conforme exigido pelo artigo 541, parágrafo único, do Código de Processo Civil. O precedente colacio­nado também não guarda a necessária identidade fática com a hipótese destes autos.

4. Agravo regimental desprovido."

- "Código de Defesa do Consumidor. Compra de veículo novo com defeito de fábrica. Responsabilidade do fabricante.

1. Comprado veículo novo com defeito de fábrica, é responsabi­lidade do fabricante entregar outro do mesmo modelo, a teor do art. 18, § 1ll., do Código de Defesa do Consumidor.

2. Recurso especial conhecido e provido."

4. A divergência jurisprudencial, por sua vez, não se caracterizou, à míngua do cotejo analítico e da dessemelhança fática entre as situações des­critas no acórdão impugnado e nos paradigmas, restando descumprido o comando do art. 541, parágrafo único, CPC.

5. Ante o exposto, não conheço do recurso especial.

VOTO

O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, substancialmente, tra­ta-se de matéria de fato: aplica-se a Súmula 7-STJ. Tal como anotou o Sr. Ministro-Relator, e nos termos do acórdão recorrido, à espécie se aplica a norma do art. 12 do Código de Defesa do Consumidor e, conseqüentemente, o seu § 3ll., no sentido de que o fabricante, o construtor, somente não será responsabilizado se provar o que consta dos itens l, II e lII. E, desse ônus, vê-se que a Ré não se desincumbiu.

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 371

Quanto à oportunidade para o exame da questão da inversão do ônus da prova, o momento próprio é o da sentença. Não cabe ao juiz dizer, logo depois da contestação, terminada a fase postulatória, se vai haver ou não inversão do ônus da prova. Esse é um aspecto que o magistrado sopesará quando do exame do merecimento da causa.

Por essas razões, não vejo ofensa aos artigos apontados pela Ré. Tam­bém não é o caso de acolhimento do recurso adesivo. Daí porque não co­nheço dos recursos.

RECURSO ESPECIAL N. 302.131 - MG (Registro n. 2001.0010148-8)

Relator: Ministro Cesar Asfor Rocha

Recorrente: Loraine Maria Figueiredo Oliveira

Advogados: Elio Oscar Gonçalves da Silva e outro

Recorrido: José Cláudio de Oliveira

Advogados: Édio Wilson Mortoza e outro

EMENTA: Civil - Dentista - Cobrança de honorários - Prescri­ção ânua.

Nos termos do artigo 178, § 62., IX, do Código Civil, a ação dos dentistas para cobrar honorários prescreve em 1 (um) ano.

Recurso conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Ruy Rosado de Aguiar, Aldir Passarinho Junior, Sálvio de Figueiredo Teixeira e Barros Monteiro.

Brasília-DF, 23 de abril de 2002 (data do julgamento).

Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente e Relator.

Publicado no DI de 19.8.2002.

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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372 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: O Recorrido ajuizou ação ordiná­ria de cobrança contra a Recorrente para o fim de receber dela honorários relativos a tratamento dentário realizado em seu prol e de seu filho.

Em 1>t grau, a ação foi julgada parcialmente procedente tendo o egré­gio Tribunal a quo negado provimento à apelação da Ré onde se debatia apenas sobre a ocorrência da prescrição ânua de que trata o art. 178, § 6>t, IX, do Código Civil, que foi afastada como retrata a seguinte ementa:

"Cobrança. Honorários de dentista. Prescrição. Artigo 178, § 6>t, inciso IX, do CC. Inaplicabilidade.

- Em matéria de prescrição não se admite interpretação analógica ou extensiva, razão pela qual não se pode estender, também aos den­tistas, a regra inserida no artigo 178, § 6>t, inciso IX, do CC, já que tal categoria não foi ali expressamente mencionada." (fi. 66).

Os declaratórios foram rejeitados, o que ensejou a interposição do re­curso especial em apreciação por alegada violação ao art. 178, § 6>t, IX, do Código Civil, bem como por dissídio com os julgados que indica, ao fun­damento de que teria ocorrido a prescrição.

Devidamente respondido, o recurso foi admitido na origem.

Era o de importante a relatar.

VOTO

O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha (Relator): O Recorrido ajuizou ação ordinária de cobrança contra a Recorrente para o fim de receber dela ho­norários relativos a tratamento dentário realizado em seu prol e de seu fi­lho.

Nesta fase, discute-se apenas se houve ou não a prescrição ânua na for­ma prevista pelo art. 178, § 6>t, IX, do Código Civil, que assim dispõe:

"Art. 178. Prescreve:

§ 6>t. Em um ano:

IX - a ação dos médicos, cirurgiões ou farmacêuticos, por suas visitas, operações ou medicamentos, contado o prazo da data do últi­mo serviço prestado."

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 373

o egrégio Tribunal a quo, ao não dar pela ocorrência da prescrição ânua, não decidiu, data venia, com o seu costumeiro acerto.

Inicialmente, devo destacar que mencionado dispositivo refere-se tanto a farmacêuticos como a médicos e cirurgiões. Ora, se esta última catego­ria de profissionais - cirurgiões - compreendesse somente os médicos, ha­veria uma redundância desnecessária em a lei reportar-se a "médicos e ci­rurgiões", do que é lícito concluir que nessa categoria também estão com­preendidos outros profissionais da área médica, como os dentistas, por exemplo.

É que o dentista também é um cirurgião e há de se ter por subsumidas nas expressões "visitas, operações ou medicamentos" tanto as intervenções cirúrgicas propriamente ditas como também as consultas. realizadas no pró­prio consultório, bem assim os procedimentos preventivos e curativos a que

o também odontólogo está legalmente apto a proceder, e ainda a prescri­ção e a aplicação de especialidades farmacêuticas de uso interno e externo, incluindo-se aí as anestesias.

Aliás, a egrégia Terceira Turma, sob a relatoria do eminente Ministro Ari Pargendler já decidiu, no REsp n. 167.882-PE (DJ de 13.8.2001), que "a ação dos dentistas para cobrar honorários prescreve em 1 (um) ano, na forma do artigo 178, § 6Q

, IX, do Código Civil".

Diante de tais pressupostos, conheço do recurso e dou-lhe provimen­to para, desconstituindo as doutas decisões das instâncias ordinárias, pro­nunciar a prescrição e extinguir o processo com julgamento do mérito, con­denando o Autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios no valor de R$ 500,00, corrigidos a partir desta data até o seu efetivo pagamento.

RECURSO ESPECIAL N. 311.089 - RJ (Registro n. 2001.0031271-3)

Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior

Recorrentes: Leonardo de Carvalho Iespa e outros

Advogados: Patrícia Felix Tassara e outros

Recorrido: Renato Ambrósio Júnior

Advogados: Hélio Saboya Ribeiro dos Santos Filho e outros

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374 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

EMENTA: Civil e Processual - Ação de indenização - Improce­dência - Condenação na esfera criminal não transitada em julgado - Acolhimento de preliminar em embargos infringentes - Prescri­ção da pena em concreto - Reflexo na órbita civil - CC, art. 1.525 -CP, art. 110, § 22. - Acórdão - Nulidade não verificada - Súmula n.

7-STJ.

I - Não transitada em julgado a decisão sobre a culpa do réu no acidente automobilístico, pendente que se encontrava o mérito de exame em sede de embargos infringentes, o acatamento da pres­crição da pena em concreto pelo Tribunal Estadual não autoriza a aplicação do disposto no art. 1.525 do Código Civil, por desinfluente nesta órbita.

11 - Não padece de nulidade acórdão que enfrenta fundamenta­damente a controvérsia fática, apenas com conclusão desfavorável à pretensão da parte-autora.

111 - "A pretensão de simples reexame de prova não enseja re­curso especial" - Súmula n. 7-STJ.

IV - Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, não conhecer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constan­tes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Par­ticiparam do julgamento os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira, Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha e Ruy Rosado de Aguiar. Custas, como de lei.

Brasília-DF, 16 de outubro de 2001 (data do julgamento).

Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente.

Ministro Aldir Passarinho Junior, Relator.

Publicado no DJ de 25.2.2002.

RELATÓRIO

o Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Leonardo de Carvalho Iespa

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 375

e outros interpõem, pelas letras a e c do art. 105, IH, da Constituição Fe­deral, recurso especial contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim ementado (fl. 277):

"Responsabilidade civil. Acidente de trânsito. Efeitos da senten­ça penal extintiva da punibilidade. Valoração da prova. Princípio do livre convencimento do juiz.

A prescrição penal retroativa atinge a pretensão punitiva, rescin­dindo a sentença condenatória e extinguindo os seus efeitos principais e acessórios, pelo que não tem nenhuma repercussão na esfera civil. Caberá, então, ao juiz do cível apreciar livremente a prova, indican­do os motivos que lhe formaram o convencimento. Em face de duas versões opostas existentes nos autos, merece acolhida aquela que for a mais consentânea com o conjunto probatório. A sede e o sentido das avarias nos veículos envolvidos no acidente de trânsito permitem in­ferir a dinâmica do evento, pois, de acordo com as regras da experiên­cia comum, avarias nas laterais indicam que os veículos estavam em­parelhados no momento da colisão e não um atrás do outro.

Provimento do recurso."

Sustentam os Recorrentes que a decisão violou o art. 1.525 do Códi­go Civil, eis que o reconhecimento da autoria e da culpa do Réu já fora objeto de julgamento na esfera criminal, não sendo possível, senão mediante prova contrária, o que não foi feito, concluir-se pela não-responsabilidade do Recorrido pelo sinistro.

Aduzem que a prescrição retroativa, da qual se beneficiou o Réu, so­mente existe se fixada a pena em concreto, em decreto condenatório, salien­tando que no tocante à autoria e à materialidade do fato, elas mantiveram­-se íntegras, não sendo desconstituída a decisão penal nesse estrito aspecto.

Destacam os Recorrentes que existem graus de influência da decisão criminal no cível, e que o Tribunal Estadual atribuiu à prescrição efeito máximo, quando, na verdade, a prescrição decretada da pena em concreto não o possuía, sobejando, como explicitado, a autoria e a materialidade do fato, a manter a incidência do disposto no art. 1.525 do Código Civil.

Invocam dissídio jurisprudencial com o REsp n. 163.786-SP, de relatoria do eminente Ministro Ruy Rosado de Aguiar.

Também pedem a nulidade do aresto por omissão, eis que adotou fun­damentação sem embasamento lógico e suficiente para a versão dos fatos

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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376 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

adotada na conclusão sobre a dinâmica do acidente, afirmando que restou ofendido o art. 131 do CPC, tecendo, ainda, considerações acerca da pro­va colhida, e que não foi devidamente valorada pela Corte a quo.

Contra-razões às fls. 335/347, com preliminares de falta de prequestionamento e óbice da Súmula n. 7 do STJ, bem assim de ausência de comprovação do dissídio, porquanto no paradigma o ilícito já havia sido julgado na instância criminal, enquanto, aqui, não houve trânsito em julgado sobre a culpa das partes envolvidas no acidente, restando a matéria preju­dicada ainda em grau de embargos infringentes. Discorre o Recorrido so­bre os fatos, destacando a conclusão do juízo criminal monocrático de que os carros estavam emparelhados e não que o dos Recorridos estivesse à frente.

Afirma o Recorrido, citando doutrina, que não constitui sentença condenatória a decisão que reconhece a prescrição da pretensão punitiva, ainda que com base na pena em concreto.

O recurso especial foi admitido na instância de origem pelo despacho presidencial de fls. 349/352.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): Trata-se de recurso especial, aviado pelas letras a e c do permissivo constitucional, em que se alega, a par de divergência jurisprudencial, violação aos arts. 525 e 131 do CPC, e 1.525 do Código Civil.

No tocante à nulidade do aresto por omissão no enfrentamento dos aclaratórios e desfundamentação do julgado, é de se rejeitar de plano a assertiva.

O acórdão apreciou, minuciosamente, a prova dos autos, apenas que, em sua ótica, o acidente não foi provocado pelo Réu. Não há que se con­fundir decisão desfavorável com decisão omissa ou desfundamentada, e, na espécie, o que pretendem os Recorrentes, sob alegação de equívoco na valoração da prova, é a sua efetiva reapreciação para forcejar uma conclu­são no sentido da interpretação fática que sustentam, data venia.

Com relação ao dissídio, tenho que o mesmo também não se configura.

De efeito, a especificidade entre as hipóteses fático-jurídicas há de ser rigorosa, sob pena de não se caracterizar a divergência.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 377

No acórdão paradigma, REsp n. 163.78 6-SP, de relatoria do eminen­te Ministro Ruy Rosado de Aguiar, inobstante a extinção da punibilidade pela prescrição da pena em concreto, foi, realmente, firmado que "isso não faz desaparecer o juízo de culpabilidade formulado contra o Réu, condenan­do-o a certa pena, a partir do que foi possível reconhecer a prescrição pela pena aplicada".

Acontece, porém, que na hipótese dos autos, o juízo criminal singular absolveu o Réu, salientando a ausência de perícia técnica. Em grau de ape­lação, foi ele igualmente absolvido pela Juíza-relatora no Tribunal de Al­çada Criminal, que restou vencida (fls. 247/248). Opostos embargos infringentes, o 1.\1. Grupo de Câmaras Cíveis daquela Corte, em preliminar, declarou extinta a; punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva.

Verifica-se:, assim, que as situações retratadas não são iguais, posto que enquanto no paradigma pressupunha-se decisão condenatória definitiva de mérito" aqui havia ainda pendência em sede de embargos infringentes, por­quanto a condenação fora tomada por maioria de votos, aliás reformando, como já frisado, sentença absolutória de la instância.

Embora a, prescrição seja, evidentemente, calculada em face da conde­nação já havida, a ela não se pode dar o efeito, quando pendente o exame do mérito pelo órgão ad quem, de se entender como chancelada a decisão a quo quanto ao mesmo, sob pena de causar-se, por intermédio de um bene­fício dado ao acusado, uma verdadeira punição, como se fora uma espécie de antecipação do veredito negativo, e com reflexos inclusive na área civil.

Daí porque, tenho eu, se não esgotado o mérito pela pendência de embargos infringentes sobre o mesmo, como na espécie, a prescrição afas­ta a aplicação do disposto no art. 1.525 do Código Civil, não repercutin­do nesta esfera, pelo que possível a investigação ampla, tal como procedi­da, da culpa do Réu no sinistro.

A: prescrição, para o efeito pretendido pelos Recorrentes, somente com o trânsito em julgado da decisão condenatória.

Não identifico, portanto, ofensa à indigitada norma legal.

Ante o exposto, não conheço do recurso especial.

É como voto.

VOTO-MÉRITO

O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: Sr. Presidente, também não

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378 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

conheço do recurso especial, acentuando a peculiaridade do caso diante do precedente invocado no recurso.

VOTO

O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: Sr. Presidente, também não conheço do recurso especial. A uma, porque não demonstrado o dissídio. A duas, porque não caracterizada a violação da lei federal.

RECURSO ESPECIAL N. 316.384 - PR (Registro n. 2001.0039412-4)

Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar

Recorrentes: Regina Mara Teixeira e outro

Advogado: Luiz Carlos da Rocha

Recorrido: Banco do Estado do Paraná S/A

Advogados: Francisco Affonso de C. Beltrão e outros

EMENTA: Alienação fiduciária - Busca e apreensão - Defesa do devedor.

A defesa do devedor na .~ção de busca e apreensão de bem alie­nado fiduciariamente em garantia não está limitada ao cumprimento da obrigação, mas pode versar sobre a validade das cláusulas do ne­gócio, critérios e índices adotados para a definição do valor da dívi­da. Precedentes.

Recurso conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior, Barros Monteiro e Cesar Asfor Rocha votaram com o Sr. Ministro-Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Mi­nistro Sálvio de Figueiredo Teixeira.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA

Brasília-DF, 18 de setembro de 2001 (data do julgamento).

Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente.

Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Relator.

Publicado no DI de 12.11.2001.

RELATÓRIO

379

o Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: O Banco do Estado do Paraná S/A propôs contra Regina Mara Teixeira ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente. Disse ser credor da importância de R$ 27.912,09 (vinte e sete mil, novecentos e doze reais e nove centavos), representada pelo saldo devedor apurado na conta da Ré, que resultou no instrumento parti­cular de confissão de dívida celebrado entre as partes. Afirmou que neste contrato, para assegurar o cumprimento da obrigação, foram instituídas duas garantias: alienação fiduciária do veículo descrito na inicial e emissão de nota promissória. Com o não-cumprimento da obrigação, requereu a bus­ca e apreensão do veículo em caráter liminar.

Em contestação, a Ré alegou: 1) o saldo devedor era de R$ 8.016,92 (oito mil e dezesseis reais e noventa e dois centavos), devidamente atuali­zado, conforme laudo anexado no processo; 2) o contrato de abertura de conta-corrente celebrado com o Banco é nulo, por representar valor bem superior ao devido; 3) cobrança de juros abusivos e capitalizados. Citou o art. 253 do Código Comercial e as Súmulas n. 121 e 596 do STF; 4) é ne­cessária a aplicação do Código de Defesa do Consumidor às operações ban­cárias, nos termos dos arts. 2.2., 47 e 54 do CDC; 5) o contrato celebrado entre as partes foi de adesão e, por ser hipossuficiente, pediu a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6.2., VIII, do CDC, e a revisão do contra­to em relação às cláusulas leoninas; 6) o Banco não cumpriu seu dever de informação, em afronta ao art. 6.2., III, também do CDC; 7) ofensa aos arts. 51 e 52 do CDC e ao art. 170 da CF; 8) cumulação de comissão de per­manência e correção monetária, em contrariedade à Súmula n. 30 do STJ; 9) ilicitude das cláusulas que dispõem sobre a fórmula para o cálculo da correção monetária; 10) a comissão de permanência está embutida na for­ma de juros incidentes sobre o capital, com taxas desconhecidas pela Ré e impostas pelo Banco; 11) utilização da TR como índice de atualização mo­netária sem base jurídica; 12) o contrato de alienação fiduciária não é vá­lido, uma vez que a dívida não existe; 13) a alienação fiduciária em garantia

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380 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

não pode figurar secundariamente em contratos de abertura de saldo deve­dor de conta-corrente, com características de penhor, eis que o veículo ob­jeto do acordo já era de propriedade da Ré.

O pedido liminar foi deferido e depois confirmado na sentença de pro­cedência da ação. A Ré apelou, e a egrégia Sexta Câmara Cível do Tribu­nal de Alçada do Estado do Paraná negou provimento ao recurso:

"Alienação fiduciária. Ação de busca e apreensão. Mora. Argüi­ção de defesa estranha ao comando geral do § 2.2 do art. 3.2 do Decreto­-Lei n. 911/1969. Inaplicabilidade das disposições do Código de De­fesa do Consumidor. Apelação improvida.

Na ação de busca e apreensão fulcrada no Decreto-Lei n. 911/ 1969, a defesa do devedor em mora só pode versar sobre as hipóteses elencadas no § 2.2 do art. 3.2, quais sejam: o pagamento do débito ven­cido ou o cumprimento das obrigações contratuais.

Inaplicável, por sua vez, a invocação ao Código de Defesa do Consumidor em virtude de que as cláusulas foram livremente pactua­das, e sendo o apelado instituição financeira, os juros e encargos defluem de regras de mercado, não estando sujeitos à Lei de Usura, não podendo o devedor argumentar a onerosidade excessiva do contra­to, ainda mais, quando já inadimplente." (fl. 171).

Colhe-se do voto do eminente relator da apelação:

"A matéria contida na contestação e repisada na apelação extra­vasa os limites da defesa delimitada pelo já referido artigo e parágra­fo do Decreto-Lei n. 911/1969, visto que, o fiduciante em mora, 'na contestação só poderá alegar o pagamento do débito vencido ou cum­primento das obrigações contratuais'.

Inaplicável na espécie, por sua vez, o Código de Defesa do Con­sumidor, vez que, a modalidade do contrato, na forma pactuada, está prevista expressamente em lei e, sendo o autor instituição financeira, os juros e encargos defluem de regras de mercado, não estando sujei­ta, pois, à Lei de Usura, consoante a Súmula n. 596 do STF.

É de se consignar que mesmo tratando de matéria estranha ao procedimento, o ínclito julgador monocrático, bem repeliu o alegado

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 381

excesso de cobrança, vez que não demonstrado, sendo de se salientar a oportunidade concedida para a produção da prova pericial então pre­tendida; corretamente assentou de que as instituições pertencentes ao Sistema Financeiro Nacional não estão adstritas aos limites fixados na Lei de Usura (STF, Súmula n. 596); que não ocorre a auto-aplicabi­lidade do limite constitucional de juros; ser possível a adoção da TR como índice de atualização monetária, desde que pactuado e que não ocorreu a cumulação da correção monetária com a comissão de per­manência, para um mesmo período." (fls. 172/174).

Irresignados, a Autora e Edie Lafitte Teixeira interpuseram recurso especial, alíneas a e c, alegando ofensa ao art. 253 do Código Comercial; aos arts. 6ll., VIII; 47, 48, 51 e 52 do Código de Defesa do Consumidor, e ao art. 3ll., § 2ll., do Decreto-Lei n. 91111969, bem como divergência jurisprudencial. Aduzem contrariedade à lei federal e dissídio, nos seguin­tes termos: a) ao limitar a matéria discutida em contestação, com base no art. 3ll., § 2ll., do Decreto-Lei n. 911/1969, o egrégio Tribunal a quo diver­giu da jurisprudência dominante no STJ e em outros tribunais estaduais. Ainda sustentam que, como o bem objeto do contrato celebrado entre as partes já integrava o patrimônio da Ré, o seu real motivo foi cobrir saldo devedor de conta-corrente, a discussão sobre o valor do débito, apresenta­da em contestação, deve ser devidamente enfrentada; b) as garantias do Có­digo de Defesa do Consumidor são aplicáveis aos usuários de serviços ban­cários, tendo o r. acórdão recorrido negado vigência ao art. 6ll., VIII, daquele Código, ao aplicar, exclusivamente, o art. 3ll., § 2ll., do Decreto-Lei n. 9111 1969. Defendem a interpretação harmônica dessas normas. Citam julgados dessa Turma e de outros tribunais estaduais, bem como o art. 51 do CDC; c) que a notificação efetivada pelo Banco é ineficaz, pois pretendida quan­tia superior à devida. Manifestam-se pela iliquidez do débito e conseqüen­te inexistência de inadimplemento e mora; d) insistem nas matérias dedu­zidas na contestação: capitalização de juros (art. 4ll. do Decreto n. 22.626/ 1933), auto-aplicabilidade do § 3ll. do art. 192 da Constituição Federal de 1988 e limitação de juros em 12% a.a., ilegalidade da TR como índice de correção monetária (art. 1ll. da Lei n. 8.177/1991, Lei n. 8.660/1993, Re­solução n. 2.097/1994 do Bacen, art. 5ll. da LICC, Lei n. 4.357/1964, Lei n. 6.899/1981, Súmula n. 176 do STJ e art. 115 do Código Civil brasilei­ro). Citam as Súmulas n. 121 e 596 do STF e 93 do STl Pleiteiam, assim, a anulação do acórdão recorrido, para que a egrégia Câmara aprecie todas as matérias deduzidas na contestação.

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382 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Nas contra-razões, o Recorrido combate as teses dos Recorrentes e cita as Súmulas n. 7,28 e 126 do STJ e 282 e 596 do STF.

o recurso não foi admitido na origem, tendo as Recorrentes manifes­tado embargos de declaração, que foram acolhidos parcialmente, manten­do-se, porém, a decisão anterior.

Os Recorrentes interpuseram o Ag n. 316.524, ao qual dei provimento.

Vieram-me os autos.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar (Relator): A assertiva do r. acórdão recorrido, de que "a defesa do devedor somente pode versar sobre o pagamento do débito vencido ou o cumprimento das obrigações", não consoa com os precedentes desta Turma, pois tem prevalecido o entendimen­to de que, depois da vigência do CDC, aplicável ao contrato bancário ga­rantido com alienação fiduciária (REsps n. 291.637-RS, 250.072-RJ e 235.410), o devedor pode alegar a ilegalidade ou a abusividade de cláusu­las que levaram à formação da dívida que está sendo cobrada:

"- Admissível a ampla defesa outorgada ao devedor em face da necessidade de verificar-se se caracterizada ou não no caso a mora debitoris." (REsp n. 264. 126-RS, Quarta Turma, reI. o eminente Min. Barros Monteiro, DJ de 27.8.2001).

"- Na ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciaria­mente, a contestação não sofre a limitação prevista no art. 35l., § 25l., do Decreto-Lei n. 911/1969 se ilegítimas as exigências do credor, como na espécie, sendo possível ao Réu alegar, na defesa, contrariedade à lei ou ao contrato." (REsp n. 185.812-MG, Quarta Turma, reI. o eminente Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 29.5.2000).

"I - A limitação, prevista no art. 35l., § 25l., do Decreto-Lei n. 911/ 1969, da matéria da contestação em ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente, só é cabível quando legítimas as exigências do credor." (REsp n. 209.109-RS, Quarta Turma, reI. o eminente Min. Sálvio de Figueiredo, DJ de 13.12.1999).

Essa orientação se firmou a partir do princípio de que uma das par­tes não pode ser submetida à única alternativa de cumprir o contrato, assim

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 383

como exigido pelo credor, pelos valores por ele unilateralmente contrata­dos, sem que possa discutir critérios e índices, e mesmo a validade de cláu­sulas constantes do contrato de adesão. Limitar a defesa à prova de cumpri­mento da obrigação é o mesmo que retirar de uma das partes o acesso ao juiz para discutir os termos em que o negócio está sendo executado. Na literalidade da lei, que nessa parte se entende superada, as alternativas do Réu eram duas: provar que pagou antes ou provar que pagou agora. No en­tanto, pode ser posta em dúvida a própria legalidade da exigência. No caso dos autos, as alegações da Ré repõem princípios já acolhidos em Súmulas (121-STF e 30-STD, além de outros temas de orientação consolidada.

Posto isso, conheço do recurso pela alínea c, porquanto vez demons­trada a divergência com precedente deste Tribunal, e lhe dou provimento, para que o egrégio Tribunal prossiga no exame da apelação.

É o voto.

RECURSO ESPECIAL N. 328.646 - DF (Registro n. 2001.0078287-5)

Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior

Recorrente: Viplan - Viação Planalto Ltda

Advogados: Diana de Almeida Ramos e outros

Recorrida: Interamericana Companhia de Seguros Gerais

Advogados: Adriana Nazaré Dornelles Britto e outros

EMENTA: Civil e Processual - Acórdão - Nulidade não configu­rada - Acidente de trânsito - Ação indenizatória regressiva movida por seguradora - Anterior transação realizada entre o segurado e a

empresa-ré - Quitação e renúncia a reivindicações futuras - Sub-ro­gação inexistente - CC, art. 988 - Processo - Extinção - CPC, art. 267, VI.

I - Não se configura a nulidade do acórdão se o Tribunal a quo enfrentou as questões propostas, apenas que com conclusão desfa­

vorável à parte.

II - A transação feita entre o segurado e a empresa causadora do acidente põe fim ao litígio, daí não advindo, para a companhia

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384 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

seguradora, direito à sub-rogação para efeito de postular indeniza­ção, regressivamente, pelos valores pagos a seu cliente pela cober­

tura do sinistro.

IH - Recurso especial conhecido em parte e provido, para ex­tinguir o processo, nos termos do art. 267,VI, do CPC.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, co­nhecer em parte do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram do julgamento os Srs. Minis­tros Sálvio de Figueiredo Teixeira, Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha e Ruy Rosado de Aguiar. Custas, como de lei.

Brasília-DF, 18 de outubro de 2001 (data do julgamento).

Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente.

Ministro Aldir Passarinho Junior, Relator.

Publicado no DJ de 25.2.2002.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Viplan - Viação Planalto Ltda interpõe, pelas letras a e c do art. 105, IH, da Constituição Federal, recurso especial contra acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, assim ementado (fi. 143):

"Processo Civil. Ação de reparação de danos. Acidente de veí­culos. Interesse de agir. Ainda que o segurado tenha firmado acordo com a Ré dando plena e geral quitação por todos os danos, tem inte­resse de agir a autora-seguradora, porquanto a quitação dada refere-se

tão-somente a valor inferior à franquia, e esta efetivamente tem o di­reito de obter o que dispendeu no conserto do automóvel danificado.

Presunção e concorrência de culpa. Caracterização. A jurisprudên­cia já consagrou o entendimento da presunção juris tantum de culpa do motorista que abalroa a traseira de carro que lhe segue à frente, não

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 385

infirmada pela Ré. Como o conjunto probatório não configura a culpa do motorista segurado, incabível o reconhecimento judicial da culpa concorrente como pretende a Apelante. Sentença mantida. Recurso improvido."

Alega a Recorrente que a decisão violou o art. 535, II, do CPC, eis que se omitiu na apreciação do art. 988 do Código Civil.

Aduz que o segurado deu plena quitação à Ré, mediante acordo ami­gável, pelo que não pode ela ser acionada pela empresa-seguradora, desta­cando que no recibo não constou qualquer alusão a tal cobertura, nem res­salva correspondente à franquia apenas.

Diz que não há sub-rogação em tal situação, alegando ofensa ao art. 988 da lei substantiva civil e divergência jurisprudencial.

Contra-razões às fls. 184/188, reportando-se aos fundamentos do acórdão recorrido, pugnando pela sua manutenção.

O recurso especial não foi admitido no Tribunal de origem (fl. 190), subindo a esta Corte por força de provimento dado ao Ag n. 320.950-DF (fi. 197).

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): Trata-se de recurso especial em que se discute, em preliminar, a nulidade do acórdão por omis­são e, no mérito, sobre a existência ou não de sub-rogação da empresa-se­guradora, quando o segurado firma acordo diretamente com o causador do acidente, recebendo determinada importância a título de ressarcimento e dando-lhe quitação plena relativamente ao ato ilícito causado.

No tocante à prefaciaI, a mesma é de ser rejeitada, porquanto a maté­ria controvertida foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de Justiça, ape­nas com resultado desfavorável à parte, o que não é motivo à nulificação do julgado.

Quanto ao mérito, dispõe o art. 988 do Código Civil que:

"Art. 988. A sub-rogação transfere ao novo credor todos os direi­tos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e os fiadores."

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386 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNALDE]USTIÇA

o voto-condutor do aresto a quo deu a seguinte solução (fls. 146/147):

"Aprecio, prima facie, a preliminar argüida pela Ré de ausên­

cia do interesse de agir da Autora, haja vista que o acordo firmado pelo segurado com a empresa dá plena e geral quitação por todos os danos,

havendo renúncia expressa ao direito de pleitear indenização a qual­quer título, judicial ou extrajudicialmente.

Como se colhe de fls. 43/44, o instrumento contratual firmado entre a Viplan - Viação Planalto Ltda e Jorge Vicente Alves de Araújo não tem validade contra terceiros, isto é, contra a seguradora-autora.

Em verdade, o Sr. Jorge Vicente deu quitação tão-somente pelo prejuízo que sofrera, que se resumiu inclusive ao pagamento de valor

inferior à franquia, pois o restante o seu seguro pagou (fls. 24/26). Resulta claro que a seguradora não está vinculada à transação feita entre o segurado e a Viplan.

Isto posto, rejeito a preliminar."

Todavia, a orientação da egrégia Terceira Turma do STJ é em sentido oposto, como se infere do acórdão prolatado no REsp n. 76.952-RS, de

relatoria do eminente Ministro Costa Leite, assim ementado:

"Civil. Seguro. Sub-rogação.

Se houve renúncia ao direito, mediante acordo entre o segurado e a outra parte, não há como dizê-lo transferido à seguradora, vale di­zer, em tal hipótese, não se perfaz a sub-rogação, que legitimaria a pretensão de reembolso. Não reponta a relação jurídica substancial que

vincularia as partes. Recurso não conhecido." (unânime, DJU de 1.7.1996).

Aduziu o ilustre Relator em seu voto, verbis:

" ... A questão crucial, em última análise, está em saber se o

acórdão negou vigência ao art. 988 do Código Civil. Tenho que não. Se houve renúncia ao direito, segundo os termos do acordo, não há como dizê-lo transferido à seguradora, vale dizer, não se perfez a sub­

-rogação que, no caso, legitimaria pretensão de reembolso. Iniludi­velmente, não reponta a relação jurídica substancial que vincularia as

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 387

partes. Como bem acentuou o acórdão, 'se houve infração contratual entre a seguradora e o segurado, isto é questão a ser solvida entre eles, porquanto o contrato não opera efeitos senão entre as partes contra­

tantes' ."

Ainda em outro julgamento, firmou o mesmo Colegiado, que:

"Acidente de trânsito. Ação de indenização. Acordo. Ação de re­gresso anterior.

1. Feito o acordo entre as partes, não é possível o ajuizamento de ação de indenização. O anterior julgamento de ação de regresso não interfere com a autonomia da vontade manifestada pelas partes, não sendo mais possível examinar a existência do direito a regresso em tal

circunstância.

2. Recurso especial não conhecido." (Terceira Turma, reI. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, REsp n. 194.362-MG, unânime, DJU de 13.12.1999).

De efeito, se a sub-rogação nasce de um direito originário de outrem, no caso, do segurado sinistrado, os atos praticados pelo mesmo têm influên­cia direta no instituto, porquanto são a sua própria fonte. Inexistente o di­reito à indenização, que desapareceu após o acordo, com a quitação e re­núncia sobre postulações futuras, não há o que ser transferido, mediante sub-rogação, à seguradora.

A Empresa-ré não possui relação alguma com a seguradora, nem se obriga por contrato a ressarci-la. Esta é uma vinculação que somente en­volve segurado e seguradora. Daí, os atos praticados pelo primeiro têm efei­to amplo no que tange a terceiros, caso da Ré, que não estão sujeitos à avença celebrada com a seguradora.

Destarte, não configurada a sub-rogação, na espécie, pela extinção do direito do segurado pela quitação e renúncia dadas à Ré, houve contrarie­dade, por má aplicação, do art. 988 do Código Civil.

Ante o exposto, conheço em parte do recurso especial e dou-lhe pro­vimento, para extinguir o processo com base no art. 267, VI, do CPC, con­denando a Autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa.

É como voto.

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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388 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RECURSO ESPECIAL N. 337.188 - SP (Registro n. 2001.0090538-1)

Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior

Recorrente: American Airlines Inc

Advogados: Santiago Moreira Lima e outros

Recorrido: Fábio Eduardo de Peiri Spina

Advogada: Áurea Lúcia Ferronato

EMENTA: Processual Civil - Ação de indenização - Atraso de vôo - Transação realizada em audiência, por preposto da companhia aérea - Não-comparecimento do advogado - Ausência que não inva­lida o ato - Audiência - Prazo mínimo - Questão despicienda.

I - Salvo situações excepcionais, em que se identifique ter ha­vido vício de vontade da parte, legalmente presumível ou concreto, é válida a transação realizada em audiência, no curso de ação indenizatória, ainda que ao ato não haja comparecido o advogado da empresa-ré, e independentemente da discussão sobre a fluição in­tegral ou não do prazo de dez dias para a realização da mesma, pre­visto no art. 277 c.c. 241, I, do CPC.

11 - Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, não conhecer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constan­tes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Par­ticiparam do julgamento os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira, Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha e Ruy Rosado de Aguiar. Custas, como de lei.

Brasília-DF, 18 de outubro de 2001 (data do julgamento).

Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente.

Ministro Aldir Passarinho Junior, Relator.

Publicado no DI de 25.2.2002.

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 389

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Adoto o relatório que integra o acórdão recorrido, verbis (fl. 133):

"Trata-se de ação de indenização, decorrente de atraso de vôo, proposta pelo ora recorrido em face da ora recorrente, encerrada pelo acordo, devidamente homologado, lavrado na audiência de conciliação, oferta de contestação e eventual julgamento, de fls. 73/74. Inconforma­da, a Ré interpôs a apelação, preparada, de fls. 77/81, pleiteando seja decretada a nulidade do processo, porque foi citada em prazo inferior a 10 dias, previsto no art. 277, segunda parte, do CPC, e, também, porque o acordo foi celebrado sem a presença do seu advogado.

O recurso não foi recebido, conforme decisão de fl. 82, da qual, todavia, foi interposto agravo de instrumento, que foi, por maioria, provido, para determinar o regular processamento da apelação, confor­me acórdão de fls. 99/101 do apenso.

Recurso recebido (fl. 114v.) e respondido pelo Autor (fls. 118/ 124), propugnando pelo improvimento, com aplicação ao Agravante de pena, por litigância de má-fé."

O 1 Q. Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo negou provi­mento à apelação, em decisão que recebeu a ementa seguinte (fl. 133):

"Prazo. Procedimento sumário. Audiência de conciliação. Conta­gem do prazo a partir da citação e, não, da juntada do aviso de rece­bimento da respectiva carta. Cumprimento do disposto no art. 277 do CPC. Recurso improvido.

Transação judicial. Intervenção de advogado. Desnecessidade. Recurso improvido.

Litigância de má-fé. Indenizatória. Argumentação baseada em normas juridicas de interpretação controvertida. Condenação descabida. Recurso improvido."

Opostos embargos declaratórios (fls. 138/140), foram eles rejeitados às fls. 144/145.

Inconformada, American Airlines Inc interpõe, pelas letras a e c do art. 105, 111, da Constituição Federal, recurso especial em que sustenta ofensa

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390 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

ao art. 277 do CPC, porquanto o mandado citatório foi juntado aos autos sem observância do prazo mínimo de dez dias, e embora a Ré tivesse ad­vogado constituído nos autos, o MM. Juiz singular homologou acordo em audiência sem a presença do patrono.

Aduz que, não tendo a audiência respeitado tal lapso de dez dias, ela era nula e, conseqüentemente, também a transação nela realizada, invocando contrariedade aos arts. 241, I, e 270, do mesmo Código.

Reclama, igualmente, da ausência do seu advogado, com vulneração aos arts. 4Jl. da Lei n. 8.906/1994, e 37 do CPC.

Traz à colação decisões paradigmáticas.

Contra-razões às fls. 165/170, dizendo da imprestabilidade do dissídio, e que não há nulidade, porquanto a manifestação das partes, ainda que sem seu advogado, é válida.

O recurso especial foi admitido na instância de origem pelo despacho presidencial de fls. 181/182.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): A discussão trava­da no recurso especial refere-se, em essência, à validade da transação rea­lizada entre as partes, durante audiência de conciliação de ação indenizatória por atraso de vôo, impugnada em seguida pela ré, American Airlines Inc, ao argumento de que, inobservado o prazo de dez dias do art. 277 do CPC, o ato não poderia ser realizado, sob pena de nulidade, o que também resul­tou da ausência do advogado da Ré.

Estou em que a decisão não merece reparo.

Independentemente do curso ou não do aludido prazo de dez dias, essa questão, tenho eu, é despicienda.

Não identifico nulidade na transação realizada em juízo, inclusive sob assistência e intervenção do magistrado, registrando-se que inexistia inte­resse de menores e que a parte-ré é uma pessoa jurídica e compareceu por intermédio de seu representante legal, munido de carta de preposição, con­soante consta da ata de fls. 73/74.

Ora, se um acordo pode ser realizado extrajudicialmente, sem a pre­sença do advogado, não vejo porque tal não possa acontecer em juízo, em

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JURISPRUDÉNCIA DA QUARTA TURMA 391

que a audiência é presidida por juiz imparcial, conhecedor das normas le­gais, e que não permitiria qualquer espécie de manobra lesiva ao interesse de um ou de outro, tampouco coação.

Ademais, se o advogado, para transacionar em nome da parte, neces­sita de poderes especiais, a pressupor que quem decide, em essência, é, sem­pre, a própria parte, não vejo porque ela não possa acordar sobre seus di­reitos, seja dentro ou fora do processo, independentemente da presença do seu causídico. Faço apenas a ressalva para circunstâncias especiais, como aquelas em que há suposição de fraude, dolo, simulação, enfim, algum ví­cio de vontade, ou em que a parte seja menor ou de tal forma ignorante que demande se lhe dê salvaguardas especiais, a serem examinadas caso a caso. Não se cuida, aqui, data venia, de ato privativo de advogado, inexistindo violação ao art. 411. da Lei n. 8.906/1994, nem, tampouco, aos demais dis­positivos legais elencados pela parte.

Nessa linha de pensamento encontra-se o REsp n. 222.936-SP, de relatoria do eminente Ministro Ruy Rosado de Aguiar, que guarda a seguin­te ementa:

"Transação. Advogado.

A transação pode ser celebrada sem a assistência de advogado.

Precedentes.

Penhora. Intimação.

Efetuada a penhora em razão de acordo entre as partes, nele cons­tando que valia como ato de penhora e depósito, desnecessária nova intimação dos executados.

Recurso não conhecido." (Quarta Turma, unânime, DJU de 18.10.1999).

Ante o exposto, não conheço do recurso especial.

É como voto.

Relator:

RECURSO ESPECIAL N. 343.666 - SP (Registro n. 2001.0 1 00455-8)

Ministro Barros Monteiro

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392 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Recorrente: Demarchi Comércio de Roupas e Acessórios Ltda

Advogados: João Alberto Godoy Goulart e outros

Recorrido: Banco de Crédito Nacional S/A - BCN

Advogados: Jorge Manuel Lázaro e outros

EMENTA: Execução - Conversão em ação monitória - Admissi­bilidade no caso, ainda que já citado o devedor.

- Não tendo ainda havido a constrição de bens nem o oferecimen­to de embargos pelo devedor, possível é a conversão da execução em ação monitória, à falta de qualquer prejuízo. Aplicação dos princí­pios da instrumentalidade das formas, economia e celeridade pro­cessuais.

Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar, Aldir Passarinho Junior e Sálvio de Figueiredo Teixeira.

Brasília-DF, 4 de dezembro de 2001 (data do julgamento).

Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente.

Ministro Barros Monteiro, Relator.

Publicado no DJ de 20.5.2002.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Barros Monteiro: Demarchi Comércio de Roupas e Acessórios Ltda interpôs agravo de instrumento contra a decisão que, na execução por quantia certa contra devedor solvente movida pelo Banco de Crédito Nacional S/A, deferiu pleito do Exeqüente no sentido de conver­ter-se a ação de execução em monitória.

A Décima Segunda Câmara do 1 Q Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, à unanimidade, negou provimento ao recurso, em acórdão assim fun­damentado:

RST], Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 393

"Certo é que o artigo 264 do nosso Código de Processo Civil estabelece não ser permitido ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu.

Todavia, no caso em apreço, a execução foi ajuizada dia 12 de maio de 1999 (fi. 18), quando ainda não havia sido editada a Súmula n. 233 do Superior Tribunal de Justiça, que deixou pacificado não ser o contrato de abertura de crédito título executivo, ainda que acompa­nhado do extrato da conta-corrente. Referida súmula só foi publicada no Diário do Judiciário da União do dia 8 de fevereiro de 2000. Por­tanto, quando da entrada do pedido inicial em juízo, prevalecia o en­tendimento exposto na Súmula n. 11 deste Tribunal e não se pode afir­mar que o Exeqüente, ora agravado, tenha laborado em erro.

Como esclarecido pelo prolator da decisão combatida (fi. 59), a execução encontra-se ainda em seu nascedouro, sem penhora e oposi­ção de embargos.

Exagerado apego a formalismo estéril seria impedir a conversão, que não traz prejuízo algum à ora agravante, à exceção - é evidente - da possibilidade de criar tumulto processual e procrastinar o efeti­vo pagamento da dívida, que, pela leitura das razões recursais apresen­tadas, não é totalmente negada.

Na realidade, apenas depois de opostos embargos não pode o pe­dido inicial de execução ser modificado (RT, volume 719/165). E, como doutrina Araken de Assis (in Manual do Processo de Execução, 3.a. ed., Ed. Rev. dos Tribunais, p. 245, n. 70), todo e qualquer defeito da inicial, à exceção da ilegitimidade, comporta corrigenda.

Ao deferir a conversão, o ilustre prolator da decisão adotou como razões de decidir o exposto pelo Agravado na petição protocolizada em 18 de agosto findo (fis. 35/37), como explicado (fi. 59). Portanto, não existe a alegada nulidade.

E também não cabe condenação em honorários de advogado, à vista da ausência de embargos.

3. Ante tais considerações, nega-se provimento ao agravo e revo­ga-se a suspensão determinada à fi. 45 (item 1)." (fis. 64/65).

Ainda inconformada, a Executada manifestou este recurso especial com

arrimo na alínea a do permissor constitucional, apontando violação ao art. 264 do Código de Processo Civil. Defendeu a impossibilidade de ser a exe­cução convertida em ação monitória. Argumentou que "a alteração da causa

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394 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

de pedir, do pedido e do próprio procedimento, se possível, o é apenas an­tes da citação do executado", diferentemente do que ocorreu na hipótese dos

autos.

Contra-arrazoado, o apelo extremo foi admitido na origem, subindo os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Barros Monteiro (Relator): Aparelhada a execução com

base em contrato de abertura de crédito, editou o Superior Tribunal de Jus­tiça a Súmula n. 233, de conformidade com a qual "o contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extrato da conta-corrente, não é tí­

tulo executivo". A despeito de já citada a devedora, não foram localizados bens de sua propriedade passíveis de suportarem a penhora.

Houve por bem então o Banco-recorrido requerer a conversão da exe­

cução em ação monitória. Deferida a postulação, insurge-se a Executada,

invocando contrariedade ao art. 264 do Código de Processo Civil.

Tenho, todavia, que, na espécie em exame, inexiste afronta à indigitada

norma de lei federal em face da situação particular que ostenta este feito.

É que, no caso, a conversão pretendida pela instituição financeira não acarreta prejuízo à ora recorrente. Em verdade, a resistência desta última à

transformação funda-se em mero capricho ou na possibilidade de auferir vantagem pecuniária (percepção dos honorários advocatícios) com a extinção

da execução. De convir-se que a referida conversão só lhe trará benefícios, desde que estará ela livre do ato constritivo no limiar da demanda e ainda poderá, com amplitude, defender-se em relação à alegada dívida. Encontra

plena aplicação à hipótese sub judice, assim, a norma do art. 250 e pará­grafo único da lei processual civil. Pas de nullitté sans grief. A conversão

deferida pelo MM. Juiz de Direito atende aos princípios da instrumentali­dade das formas, da economia e celeridade processuais. Não se compreen­

de que, por simples apego à forma e com o possível intuito de alongar o

desfecho da lide, deva-se primeiro extinguir o processo executivo para so­mente depois permitir o aforamento da nova causa, a ação monitória.

Do quanto foi exposto, não conheço do recurso.

É como voto.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 395

VOTO

O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: Acompanho o Ministro­-Relator, não conhecendo do recurso, em face das peculiaridades da espécie.

RECURSO ESPECIAL N. 399.028 - SP (Registro n. 2001.0147319-0)

Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira

Recorrentes: Antônio Nival Leônidas e outros

Advogados: Gueorgui Wiazowski e outros

Recorrida: Companhia Brasileira de Trens Urbanos

Advogados: Marcelo Oliveira Rocha e outros

EMENTA: Direito Civil - Danos morais - Morte - Atropelamen­to - Composição férrea - Ação ajuizada 23 anos após o evento - Pres­crição inexistente - Influência na quantificação do quantum - Pre­cedentes da Turma - Nascituro - Direito aos danos morais - Dou­trina - Atenuação - Fixação nesta Instância - Possibilidade - Re­curso parcialmente provido.

I - Nos termos da orientação da Turma, o direito à indenização por dano moral não desaparece com o decurso de tempo (desde que não transcorrido o lapso prescricional), mas é fato a ser considera­do na fixação do quantum.

11 - O nascituro também tem direito aos danos morais pela morte do pai, mas a circunstância de não tê-lo conhecido em vida tem influência na fixação do quantum.

111 - Recomenda-se que o valor do dano moral seja fixado des­de logo, inclusive nesta Instância, buscando dar solução definitiva ao caso e evitando inconvenientes e retardamento da solução jurisdicional.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da

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396 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Junior.

Brasília-DF, 26 de fevereiro de 2002 (data do julgamento).

Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente.

Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Relator.

Publicado no DJ de 15.4.2002.

RELATÓRIO

o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: Do relatório da sentença, colho:

"Antônio Nival Leônidas, Gisleine Leônidas Lima e Antônio Leônidas Filho ajuizaram ação de rito sumário contra Cia Brasileira de Trens Urbanos - CBTU, alegando que o pai deles foi atropelado por composição férrea da Requerida, vindo a falecer há vinte e três anos, quando os dois primeiros autores contavam 5 e 3 anos de idade, ten­do o terceiro autor nascido dois meses após o acidente. Houve ação para indenização por danos patrimoniais ajuizada então pela mãe dos Autores, tendo esta findado por acordo. Quando do evento, a família era totalmente dependente do pai, o qual era o sustentáculo econômico do lar, enquanto a mãe cuidava dos Autores, então pequenos. Com a morte, a família ficou desprotegida, advindo daí conseqüências dano­sas para os filhos, ora autores. Alinha, então, a inicial os danos que decorreram da falta de assistência que o pai propiciava à família, o sofrimento dos filhos, a probabilidade de que a vida dos Autores te­ria sido bem menos pesada se o pai não tivesse falecido, pedindo, a fi­nal, a condenação da Requerida ao pagamento de indenização no va­lor correspondente a dois mil salários mínimos para cada autor." (fl. 319).

Afastada a preliminar de prescrição e realizada prova pericial, adveio sentença julgando improcedente o pedido. O 1!J. Tribunal de Alçada Civil de São Paulo negou provimento ao recurso dos Autores, consoante esta ementa:

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 397

"Responsabilidade civil. Indenização. Dano moral. Atropelamento em via férrea. Pedido formulado pelos filhos em face da morte do pai. Evento ocorrido há mais de vinte e cinco anos. Tempo suficiente para apagar os sinais da dor. Reflexos do infortúnio que não podem ser afe­ridos em perícia de natureza psicológica com a finalidade de demons­trar comprometimento do plano de vida dos Autores. Dano moral inexistente. Reparação inviável. Ação julgada improcedente. Sentença confirmada. Negado provimento ao recurso."

Na ocasião, a Turma julgadora, em primeiro lugar, afastou as alega­ções da Ré, suscitadas em contra-razões, segundo as quais aos eventos ocor­ridos anteriormente à Constituição de 1988 não seriam devidos os danos morais, e que, na transação celebrada em anterior ação de indenização ajui­zada pela mãe dos Autores contra a Ré, estariam abrangidos também os da­nos morais.

De outro lado, houve por bem o Colegiado julgar improcedente o pe­dido, nestes termos:

"O recurso deles, contudo, não merece prosperar.

É que a dor, o sofrimento emocional causado pelo impacto da morte deve ser contemporâneo ao fato.

O tempo ameniza a dor e, paulatinamente, o sofrimento da pes­soa se acaba.

C·· .) Note-se que a ação foi ajuizada vinte e três anos depois do epi­

sódio que vitimou o pai dos Autores.

Hoje, Antônio Nival conta pouco mais de 31 anos; Gisleine, 28 anos, e Antônio Leônidas, 25 anos de idade, todos adultos.

A personalidade de cada um dos autores foi formada, ao longo de todos esses anos, sem a figura paterna.

As conclusões apresentadas no laudo psicológico, de fls. 171/184, em nada contribuem para o desfecho favorável ao pedido dos Autores.

O ser humano encontra formas e meios, em seu próprio mecanis­mo psicológico, para enfrentar a dor decorrente da morte.

Os reflexos psicológicos sobre cada pessoa podem mudar, mas o resultado será, ordinariamente, o mesmo, a adaptação à nova vida sem a presença do ente querido.

Tudo o mais será especulação.

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398 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Não se trata de preconceito ou resistência à tese da reparabili­da de do dano moral.

A existência da dor contemporânea ao fato lesivo é exigência mais do que razoável, sob pena de se premiar 'a dor eterna', sabidamente inexistente porque tudo o tempo apaga.

Não se pode admitir que os Autores, passados mais de vinte e cin­co anos, pretendam a reparação de um dano que corresponderia a um profundo sentimento de tristeza atualmente inexistente.

Tristeza causada por desgostos e sofrimentos, que o tempo apa­gou, que já não é mais sentida. Se não há mais sentimento, sensação de perda, não há que se falar em dano moral.

Dizer que a perda do pai causou-lhes frustração em seus respec­tivos projetos de vida, como parece ser o propósito do laudo psicoló­gico, a caracterizar o dano moral permanente, é inaceitável.

( ... ) Os reflexos da morte do pai, passados longos anos, já não podem

ser sentidos e aferidos.

Contingências do momento em que o fato ocorreu já não estão presentes.

O impacto e a intensidade do evento estão ausentes.

A própria potencialidade do episódio esvaiu-se com o passar do tempo.

Não é possível estabelecer qualquer liame entre o fato e o psiquismo de cada um dos autores.

Dano moral, por isso, não pode ser considerado existente e pos­sível de reparação.

Fundamento suficiente para a rejeição do pedido."

Rejeitados seus declaratórios, os Autores manifestaram recurso espe­cial apontando contrariedade ao art. 159 do Código Civil.

Com as contra-razões, foi o recurso admitido.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira (Relator): 1. Trata-se de

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 399

ação de indenização por danos morais ajuizada em junho/1998, decorrente do falecimento do pai dos Autores, ocorrido em 14.10.1975. Discute-se nos autos se o decurso de tempo entre o evento e a postulação em juízo impli­caria na perda do direito à indenização por danos morais.

2. Primeiramente, embora não esteja em controvérsia, é de registrar-se

que a prescrição restou afastada em decisão irrecorrida, ao fundamento de que, nos termos do art. 169, I, Código Civil, não corre prescrição contra os absolutamente incapazes. Assim, segundo as instâncias ordinárias, "a pre­sente ação não se encontra fulminada pela prescrição, vez que à data dos fatos os Autores eram menores impúberes, vindo a prescrição somente co­meçar a correr na data do décimo sexto aniversário de cada um".

3. No mérito, esta Turma tem orientação no sentido de que o direito

à indenização por dano moral não desaparece com o decurso de tempo (des­de que não transcorrido o lapso prescricional), mas é fato a ser considera­do na fixação do quantum. A propósito do tema, confiram-se os seguin­tes julgados:

• "1. O deferimento da indenização pelo dano moral sofrido com a morte do marido e pai dos Autores independe de prova do efetivo sofrimento, que decorre da natureza das coisas. O decurso de mais de 17 anos entre o fato e o ajuizamento do pedido é fator a ponderar na fixação do quantum indenizatório." (REsp n. 153.155-SP, DJ de 16.3.1998, relator o Ministro Ruy Rosado de Aguiar) .

• "Civil. Ação indenizatória. Acidente rodoviário. Morte de espo­sa e genitora. Ação promovida 19 (dezenove) anos após o sinistro. Dano moral. Subsistência da verba, porém, com atenuação pelo efei­to do tempo.

I - O direito de os parentes da vítima falecida em acidente ro­doviário postularem indenização por dano moral não desaparece en­quanto não flui, integralmente, o lapso prescricional vintenário.

11 - Em tais circunstâncias, todavia, o quantum do ressarcimen­to deve ser fixado de modo a considerar a atenuação da dor da perda do ente querido pelo decurso do tempo desde a data do óbito até o ajuizamento da ação, dezenove anos depois." (REsp n. 228.537-SP, DJ

de 28.8.2000, relator o Ministro Aldir Passarinho Junior).

No primeiro caso, assim se expressou o Ministro-Relator:

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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400 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

"O longo tempo decorrido entre o fato gerador do dano e o pe­dido judicial não é causa para a sua rejeição, pois, para isso, existem os prazos prescricionais, a limitar o período útil para a sua manifes­tação. Exercida oportunamente a ação, é o quanto basta para ser exa­minada a existência do alegado direito. A demora pode, isto sim, in­fluir na estimativa do quantum, pois é bem possível que a dor a ser considerada no momento do pedido é bem diversa daquela existente nas proximidades da morte, pois o tempo seda a dor moral."

Do voto-condutor do segundo julgado, colho:

"De efeito, o direito dos autores existe até que a prescrição ocor­ra, e, mesmo sendo ela vintenária, não há discriminação da lei quan­to a qual parcela indenizatória deveria ser desconsiderada em face do tempo decorrido desde o sinistro. Pensar-se de outra forma, é criar res­trição sem que haja norma legal a tanto autorizadora.

Assim, a melhor exegese está com o aresto paradigmático, que não subtrai o direito da parte à percepção do dano moral, eis que assegu­rada está a sua vindicação por duas décadas, mas, sim, adequa o res­sarcimento à atenuação da dor pelo tempo, pela superação do impac­to da perda do ente familiar nos anos em que se seguiram, mesmo sem a percepção de uma quantia que visaria a aliviar dificuldades materiais paralelas, possibilitando melhor recuperação do sofrimento tido pelos autores."

4. À vista desses precedentes desta Corte e desta Turma, e por conven­cimento próprio, tenho por devidos os danos morais, cumprindo assinalar, outrossim, que esta Turma, por outro lado, tem prestigiado o entendimen­to de ser recomendável que o valor do dano seja fixado desde logo, inclu­sive nesta Instância, buscando dar solução definitiva ao caso e evitando in­convenientes e retardamento da solução jurisdicional.

Destarte, sem embargo do exorbitante valor postulado, diante das cir­cunstâncias do caso, notadamente o lapso temporal decorrido entre o evento e o ajuizamento da ação, além da situação socioeconômica dos Autores, e considerando os precedentes desta Corte em casos semelhantes, fixo a in­denização em 100 (cem) salários mínimos para os três autores, em conjunto, o que corresponde a R$ 18.000,00 (dezoito mil reais) na data de hoje, re­cordada a lição do Professor Yussef Cahali, ao tratar do direito do nasci­turo:

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 401

"E também ao nascituro se assegura o direito de indenização dos danos morais decorrentes do homicídio de que foi vítima seu genitor. É desimportante o fato de ter nascido apenas após o falecimento do pai. Mesmo que não o tenha conhecido, por certo, terá o menino, por toda a vida, a dor de nunca ter conhecido o pai. Certo, esta dor é me­nor do que aquela sentida pelo filho que já conviveu por muitos anos com o pai e vem a perdê-lo. Todavia, isso só influi na gradação do dano moral, eis que sua ocorrência é incontroversa. Todos sofrem com a per­da de um familiar, mesmo aquele que nem o conheceu. Isso é normal e presumido. O contrário é que deve ser devidamente provado." (Dano Moral, RT, 2ll. ed., n. 4.8.4, p. 162).

5. Pelo exposto, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento par­

cial, para, aplicando o direito à espécie (art. 257, RISTJ), julgar parcial­mente procedente o pedido de indenização, fixando os danos morais em R$ 18.000,00 (dezoito mil reais), cujos valores deverão ser atualizados a par­tir da data deste julgamento.

Condeno a Ré, diante de sua sucumbência, ao pagamento das despe­sas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.

RECURSO ESPECIAL N. 404.706 - SP (Registro n. 2002.0003753-9)

Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar

Recorrente: Lílian Chiaroni

Advogados: Sebastião Augusto Migliorini e outros

Recorrida: Viação Cometa S/A

Advogados: Nélson Ferreira e outros

Recorrida: Companhia Real Brasileira de Seguros

Advogados: Tânia Regina Pedro e outros

EMENTA: Responsabilidade civil - Olfato - Paladar - Indeni­zação.

RST], Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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402 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

A perda do olfato e do paladar é causa de incapacidade que atin­ge gravemente a pessoa, prejudica sua vida de relação, impede-a de usufruir de alguns prazeres da vida e mesmo prejudica a defesa da sua saúde, o que exige indenização compatível.

Recurso conhecido e provido em parte para deferir verba indenizatória equivalente a 400 salários mínimos.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento. Os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira e Barros Monteiro votaram com o Sr. Ministro-Relator. Presidiu o julga­mento o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. Ausente, ocasionalmen­te, o Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.

Brasília-DF, 27 de junho de 2002 (data do julgamento).

Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Presidente em exercício.

Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Relator.

Publicado no DI de 2.9.2002.

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: Lílian Chiaroni promoveu ação de indenização contra Viação Cometa S/A, para reparação dos danos sofri­dos no acidente de trânsito provocado pelo ônibus em que viajava a Auto­ra, o qual, em razão de alta velocidade, colidiu com um caminhão que tran­sitava em sentido contrário, resultando do acidente inúmeras vítimas.

Citada, a Ré contestou, requerendo a denunciação à lide da Real Se­guradora S/A.

Deferida a denunciação, a denunciada apresentou resposta.

O MM. Juiz julgou parcialmente procedente a ação e condenou a Ré ao pagamento de indenização pela perda do paladar e do olfato da Autora, no valor de 1.000 salários mínimos, bem como às custas processuais. Jul­gou procedente a lide secundária, cabendo à Companhia Real Brasileira de

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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JURISPRUDÊNCIA DA QUARTA TURMA 403

Seguros, Argos Companhia de Seguros, Companhia de Seguros Minas Brasil

e Iochpe Seguradora S/A, ressarcirem a Ré-denunciante quando esta efetuar

o pagamento, observado o limite da apólice.

Apelou a Ré para pedir a improcedência do pedido ou a redução do valor da indenização; impugnou a correção monetária cumulativa e o

percentual dos juros moratórios. Pleiteou, ainda, a atualização do valor se­gurado, bem como a exclusão do ônus da sucumbência, na lide secundária. Também apelaram a denunciada, alegando igualmente a improcedência do pedido ou a redução do valor da indenização, e a Autora, para obter a in­

teira procedência do pedido.

A egrégia Décima Segunda Câmara Especial de Julho de 2000 do 12

Tribunal de Alçada Civil de São Paulo deu provimento em parte aos recur­

sos da Ré e da denunciada, desprovendo o da Autora, em acórdão assim

ementado:

"Responsabilidade civil. Acidente de trânsito. Responsabilidade

objetiva do transportador. Desnecessidade da demonstração da culpa de seu preposto. Diminuição do olfato e do paladar e alteração psíquica. Ausência de seqüela incapacitante para o exercício da profissão de pro­

fessora pública. Não demonstrada a existência de dano material indenizável. Indenizatória procedente em parte. Recursos da Ré e da denunciada parcialmente providos, desprovido o da Autora.

Dano moral. Responsabilidade civil. Acidente de trânsito. Neces­sidade de hospitalização e afastamento das atividades habituais por tem­

po limitado. Diminuição em definitivo do olfato e do paladar e alte­ração psíquica. Cabimento. Indenização reduzida a cem salários míni­

mos, atualizados conforme a sua evolução, cancelada a correção mo­netária, em duplicidade. Juros moratórios a contar da citação, à taxa legal de 6% a.a. Indenizatória procedente em parte. Recursos da Ré e

da denunciada parcialmente providos, desprovido o da Autora.

Denunciação da lide. Responsabilidade civil. Acidente de trânsi­

to. Condenação da denunciada ao ressarcimento do prejuízo pela per­da da demanda até o limite atualizado do seguro. Previsão do paga­

mento de indenização por danos pessoais, não distinguindo entre os

físicos e os morais. Indenizatória procedente em parte. Recursos da Ré

e da denunciada parcialmente providos, desprovido o da Autora." (fi.

400).

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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404 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Rejeitados os embargos de declaração, a Autora interpôs recurso espe­cial (art. 105, IIl, a e c, da CF), no qual alega ofensa aos arts. 159, 1.518 a 1.532 e 1.537 a 1.553 do CC, além de divergência jurisprudencial. Sus­tenta que o v. acórdão recorrido deixou de examinar a prova documental carreada aos autos, consistente no laudo pericial. Aduz que o nexo causal, a relação entre dano e causa, a lesão permanente, a perda da função, o grau de incapacidade e a limitação na sua ascensão profissional não foram de­vidamente sopesados para o fim de arbitrar o valor do dano moral. Por isso, entende insuficiente a indenização, fixada em apenas cem salários mínimos.

A ré, Viação Cometa S/A, e a litisdenunciada, Companhia Real Bra­sileira de Seguros, apresentaram contra-razões.

O Tribunal de origem inadmitiu o recurso, subindo os autos em vir­tude de provimento do Ag n. 402.596-SP.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar (Relator): Não ocorreram as alegadas ofensas à legislação processual, porquanto a egrégia Câmara ana­lisou a prova e concluiu pela procedência apenas parcial do pedido. A ex­tensão do dano foi avaliada em razão do conjunto probatório dos autos, e não apenas em função do laudo pericial, pelo que inexistiu ofensa a preceito legal sobre julgamento.

No entanto, tenho que a Recorrente demonstrou ser insuficiente, para a situação dos autos, a indenização de apenas o valor equivalente a 100 sa­lários mínimos para quem perdeu definitivamente o olfato e o paladar em conseqüência das múltiplas lesões sofridas, especialmente do traumatismo craniano. Com essa diminuição dos sentidos, tenho por razoável seja deferida a verba equivalente a 400 salários mínimos, mais adequada aos nossos pre­cedentes, considerando as circunstâncias do fato, com graves lesões corpo­rais e psíquicas, período longo de recuperação, com as seqüelas definitivas apontadas no r. acórdão. O desconforto que decorre dessa incapacidade per­manente e o prejuízo para a sua vida de relação, bem como a privação de alguns prazeres da vida e a dificuldade para a defesa de sua saúde, que para isso também servem o olfato e o paladar, justificam a quantificação do dano acima do que tem sido dado para injúrias passageiras.

Não é caso de deferir-se indenização pelo prejuízo profissional, por­que este não ficou reconhecido nas instâncias ordinárias, menos ainda de

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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]URISPRUDENCIA DA QUARTA TURMA 405

pensão mensal a tal título (embora a perda da chance de progressão funcio­nal, se admitido o fato, ensejasse tal reparação).

Posto isso, por ofensa ao disposto no art. 159 do CC, decorrente da insuficiente reparação concedida, estou em conhecer do recurso e lhe dar provimento parcial a fim de elevar a indenização ao valor equivalente a 400 salários mínimos.

É o voto.

RSTJ, Brasília, a. 15, (161): 339-405, janeiro 2003.

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