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32º Encontro Anual da Anpocs 27 a 31 de Outubro de 2008 - Caxambu, MG GT 01: A cidade nas ciências sociais Coords.: Heitor Frúgoli (USP) e Laura Graziela Gomes (UFF) A cidade dos políticos: gabinetes, escritórios e centros sociais Karina Kuschnir PPGSA/IFCS/UFRJ [email protected]

KarinaKuschnir a Cidade

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Como os políticos interagem com a população de uma grande cidadedurante os seus mandatos parlamentares? Como se dá a conexão política emespaços urbanos? A dinâmica da própria cidade e do espaço urbano afeta essaconexão? O trabalho procura responder essas questões a partir do estudo decaso do Rio de Janeiro, com pesquisa realizada com vereadores, deputadosestaduais e federais deste estado, a partir das legislaturas de 2004 e 2006.

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  • 32 Encontro Anual da Anpocs 27 a 31 de Outubro de 2008 - Caxambu, MG

    GT 01: A cidade nas cincias sociais Coords.: Heitor Frgoli (USP) e Laura Graziela Gomes (UFF)

    A cidade dos polticos: gabinetes, escritrios e centros sociais

    Karina Kuschnir PPGSA/IFCS/UFRJ

    [email protected]

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    Como os polticos interagem com a populao de uma grande cidade durante os seus mandatos parlamentares? Como se d a conexo poltica em espaos urbanos? A dinmica da prpria cidade e do espao urbano afeta essa conexo? O trabalho procura responder essas questes a partir do estudo de caso do Rio de Janeiro, com pesquisa realizada com vereadores, deputados estaduais e federais deste estado, a partir das legislaturas de 2004 e 2006.

    A investigao iniciou-se em 2007 e ainda se encontra em andamento. Portanto, os resultados que ora apresentamos so parciais.1 O trabalho tambm fruto da colaborao de uma equipe de bolsistas de iniciao cientfica May Martins (PIBIC/UFRJ), Las Salgueiro (PIBIC/Faperj), Patrcia Soares (PIBIC/Faperj) e Juliana Marques no mbito do Laboratrio de Antropologia Urbana (LAU), por mim coordenado no IFCS/UFRJ.2

    A pesquisa vem desenvolvendo uma base de dados acerca das atividades e representaes dos polticos tendo como foco a relao parlamentar-eleitor. As fontes incluem trabalho de campo, questionrio qualitativo, resultados eleitorais georeferenciados, material de imprensa, alm de estudos de caso etnogrficos. A escolha dessas diversas fontes reflete uma abordagem metodolgica multidisciplinar que valoriza a reflexo terica com contribuies de disciplinas como antropologia, sociologia, cincia poltica e comunicao ancorada sobretudo na pesquisa emprica, na produo de objetos situados em contextos histricos e espaciais especficos (Kuschnir, 2007).

    Dentro do objetivos mais amplos de compreender prticas e representaes acerca da poltica em contextos urbanos, o projeto busca mapear as formas de conexo entre polticos e populao. Isto , como o modelo institucional poltico apropriado, atualizado e significado pelos atores sociais? Nos interessa responder essa pergunta tanto do ponto de vista dos polticos-parlamentares, com seus projetos e discursos, quanto da populao

    1 Pedimos por isso no citar sem autorizao da autora ([email protected]),

    especialmente em funo do calendrio eleitoral, uma vez que os objetivos desta pesquisa so estritamente acadmicos. Para mais informaes, ver pgina do LAU Laboratrio de Antropologia Urbana, IFCS/UFRJ: www.lau-ufrj.blogspot.com. 2 Aproveito para agradecer s pesquisadoras citadas pela inestimvel contribuio que tm dado

    a este projeto. Parte dessa colaborao pode ser vista no VII Graduao em Campo Seminrios de Antropologia Urbana NAU/USP Setembro de 2008 (www.n-a-u.org).

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    com quem interagem, considerando, claro, que ambos so parte de redes sociais mais complexas.

    Dentre as formas de conexo eleitoral levantadas, focalizamos especialmente os chamados Centros Sociais mantidos por parlamentares no Rio de Janeiro. Centro Social o nome dado para um certo tipo de atendimento mantido por polticos para a populao. H bastante variao quanto s caractersticas de cada Centro Social, como veremos adiante, e cabe ressaltar que mesmo no Brasil e em diversos pases de lngua portuguesa esse um nome tambm freqentemente associado a projetos e polticas pblicas.

    No caso brasileiro, os Centros Sociais mantidos por polticos tm tido uma conotao bastante negativa por parte da imprensa, onde quase sempre aparecem associados a noes como curral eleitoral e clientelismo. Essa negatividade contrasta com a avaliao em geral bastante positiva feita pela populao que freqenta esses locais, vistos muitas vezes como espaos de soluo para diversos tipos de problemas, como veremos adiante.

    A investigao do papel dos Centros Sociais nas atividades dos polticos no Rio de Janeiro tem um carter indito e desafiador. No existem trabalhos sistemticos sobre o tema, embora diversas monografias apresentem estudos de casos importantes (como por ex. Siqueira, 2006). H tambm um enorme desafio no s em reunir esses dados dispersos e parciais, mas principalmente em produzir novos dados a partir do contato com as pessoas e instituies envolvidas Casas Legislativas, parlamentares, assessores, imprensa, associaes de moradores e populao dos bairros onde se localizam os Centros.

    Diversas fontes indicam a crescente importncia que esses estabelecimentos vm ganhando nas relaes entre polticos e populao desde 1982. Em levantamento anterior (Kuschnir, 2000a), observei que pelo menos um tero dos vereadores da Cmara Municipal do Rio de Janeiro era eleito atravs de votaes concentradas geograficamente. Esse comportamento

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    eleitoral estava estreitamente relacionado, na maioria dos casos, com mandatos organizados em torno de um ou mais Centros Sociais de assistncia populao.

    Em pesquisas informais, a imprensa tem corroborado esses dados, apresentando percentuais ainda maiores.3 Em 2004, levando-se em conta apenas as 42 cadeiras da Cmara Municipal (hoje so 50), havia pelo menos 18 vereadores (43%) frente de Centros como esses (Magalhes, 2004).

    Note-se que no quadro acima constam nove dos 15 vereadores mais votados da CMRJ. Em outras estimativas, o nmero de vereadores ligados aos Centros Sociais chega a 32 (64%) do total de 50 cadeiras (Dariano, 2004). Em 2006, a nova Assemblia Legislativa do Rio de Janeiro contava com pelo menos 50% de deputados cujas bases eleitorais estavam apoiadas em

    3 A pesquisa tem acumulado desde 1992 um acervo de matrias da imprensa escrita e na

    Internet sobre a atuao dos parlamentares. Nosso objetivo tem sido utilizar esse material como como fonte de consulta e no como objeto de anlise, ao menos por enquanto.

    Fonte: Magalhes, 2004.

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    ,07

    5,37

    10,67

    15,97

    21,27

    estabelecimentos de assistncia privada populao (Otvio, 2006). H fortes indcios de que esse nmero seja ainda maior no caso da Alerj.

    Uma conseqncia importante dessa relao entre polticos e centros de assistncia populao a associao estreita entre o perfil do pblico atendido e o comportamento eleitoral resultante. Vemos abaixo um caso paradigmtico, numa anlise georeferenciada desses dados. No cartograma da direita foram registrados cerca de 14 mil endereos dos usurios atendidos no centro social de um vereador carioca. Na imagem esquerda, temos o mapa eleitoral desse mesmo vereador. As ilustraes (reduzidas aqui por motivos de espao) deixam evidente a correspondncia entre atendimento e voto.

    Conforme os dados parciais de que j dispomos, esse um fenmeno distribudo pelas zonas mais empobrecidas da cidade (capital) e do estado do Rio de Janeiro, recebendo crescentes investimentos por parte de polticos e suas redes de financiadores. Embora alguns setores da populao e da imprensa condenem essas prticas, os Centros Sociais so muito mais visveis na cidade hoje do que h anos atrs, quando funcionavam de forma disfarada (Kuschnir, 2000b). Polticos que recebiam a populao em escritrios de atendimento improvisados nos fundos de um imvel sem fachada, hoje so patronos de cinco ou at nove Centros Sociais com servios que vo de odontologia a cursos de bal, informtica, cabelereiro e manicure. O deputado Albano Reis, por exemplo, identifica-se como pioneiro na rea e no se furta em afirmar: sou clientelista assumido, de carteirinha na mo e tudo (Dariano, 2004).

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    Esse orgulho de patrocinar um Centro Social visvel tambm na pgina do vereador Renato Moura na Internet (www.renatomoura.com.br, foto ao lado). No texto que acompanha a notcia, o projeto promete mudar para melhor a vida de milhares de pessoas da Zona Oeste do Rio de Janeiro e afirma j ter atendido a 6 mil pessoas em apenas quatro meses de funcionamento. Segundo o vereador, o Centro possui uma equipe de mdicos e funcionrios altamente qualificada para atender a populao, com servios gratuitos para beneficiar a comunidade, tais como: pediatria, clnica geral, fisioterapia, ginecologia, fonoaudiologia e assistncia social. O vereador justifica o empreendimento:

    Estou ligado poltica h muitos anos e sempre quis ter uma oportunidade para mostrar que, tendo respeito pelo cidado e vontade poltica, seria possvel transformar um sonho em realidade e mudar para melhor a vida da populao. Recebi este voto de confiana e hoje, como vereador, me orgulho de ter tornado realidade uma promessa da minha campanha. (grifos meus)

    Nas falas dos moradores, apresentadas na mesma pgina, surgem categorias recorrentes nesses contextos de atendimento, conforme mostrei em trabalhos anteriores (Kuschnir, 2000b). Os usurios elogiam os Centros atravs de cinco tipos bsicos de argumentao: 1) Atendimento rpido de necessidades mdicas; 2) Proximidade da residncia; 3) Limpeza e organizao das instalaes; 4) Atendimento de melhor qualidade do que as demais; 5) Segurana; e 6) Cumpre promessas de campanha no cumpridas por outros polticos. Essas qualidades so contrapostas aos defeitos da regio ou de outros servios disponveis, principalmente o pblico, tais como ausncia de opes de atendimento, demora, falta de profissionais, instalaes precrias e risco de violncia. Observamos um evidente amlgama de diferentes significaes para categorias como cidado, servio pblico, populao e Estado. Assim, quando alguns moradores afirmam J fiz tratamento em outros hospitais pblicos, mas foi aqui... ou No tm comparao com os outros postos de sade, esto percebendo o Centro Social como mais um servio pblico? Quando o vereador afirma que criou o Centro por respeito ao cidado, qual o conceito de cidadania operante nessa fala?

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    fundamental destacar que os Centros Sociais muitas vezes tm estreitas relaes com o poder constitudo, recebendo o ttulo de utilidade pblica por indicao das casas legislativas e sano do prefeito ou do governador. Isso lhes garante iseno de impostos e eventualmente contratos em convnios com os governos estadual e municipal, prestando servios como creches, atendimento mdico e centros de capacitao profissional. H denncias de que vrios Centros funcionam como entidades que propiciam a arrecadao de dinheiro pblico atravs de superfaturamento em compras de equipamentos, remdios e outros servios (Campos, 2004). Embora sofram algumas sanes no perodo eleitoral em funo da legislao, notrio que operam abertamente nas demais pocas do ano.

    Em 2008, mapeamos os 50 vereadores da Cmara Municipal do Rio de Janeiro eleitos em 2004. A equipe de pesquisa dedicou-se por vrias semanas a visitas e telefonemas a gabinetes, escritrios polticos e centros sociais para chegar aos resultados abaixo apresentados. A maioria dos polticos municipais no fornece informaes para o pblico em geral sobre sua forma de atuao parlamentar, projetos e prticas polticas, que ultrapasse o nvel da mera propaganda eleitoral.4 Questes muito simples como: onde encontrar o(a) vereador(a)? so de difcil resposta para a populao e at mesmo para pesquisadores da rea. Por isso, todos os gabinetes foram visitados ou consultados para identificar as formas de contato possveis entre populao e o poltico. Queramos saber se, alm do gabinete, havia algum endereo fora da Cmara Municipal onde se pudesse encontrar o parlamentar ou seus assessores: escritrios polticos, partidos, centros sociais etc. Uma vez obtidos esses endereos, novos telefonemas e visitas foram feitos para tentar determinar do que se tratavam.5 O trabalho foi bastante difcil, uma vez que assessores e secretrias so treinados para no informar qualquer coisa que possa ser negativa reputao do parlamentar, em especial quando imaginam

    4 Esse papel informativo tem sido exercido por algumas organizaes no-governamentais como

    a Transparncia Brasil (http://www.transparencia.org.br/) cujo site nos serviu de fonte de apoio ao longo de toda a pesquisa. 5 Cerca de 10% dos endereos obtidos no puderam ser contactados, seja por estarem

    fechados ou no terem sido informados corretamente.

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    23; 46%

    22; 44%

    5; 10%

    Centros Sociais Outros atendimentos No atendem

    ser de interesse da imprensa. S com o convvio certas informaes vo aparecendo, da a importncia do trabalho de campo nesse tipo de pesquisa.

    Conforme pode ser visto abaixo, dos 50 vereadores pesquisados, 23 possuem Centros Sociais, 22 possuem alguma forma de atendimento (ver adiante) e 5 declararam no realizar qualquer tipo de atendimento populao:

    Os 23 vereadores ligados a Centros Sociais identificam-se claramente como tal, enquanto os 22 vereadores associados com outros atendimentos estruturam suas prticas de forma variada, como atravs de escritrios polticos ou at de atendimentos realizados no prprio gabinete da Cmara. O caso mais comum desse ltimo tipo o atendimento ligado aos servios de sade municipal ou estadual (o que tambm uma caracterstica marcante nos Centros Sociais). Num outro caso, por exemplo, tratava-se de um Centro de defesa da pessoa com deficincia localizado na casa legislativa.

    Grande parte dos Centros Sociais identificados so entidades formais, com CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurdica). Mas com a aproximao

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    das eleies municipais de 2008, muitos candidatos(as) sem mandato vm abrindo Centros Sociais de modo informal, em galpes, garagens, depsitos etc.

    Em relao s caractersticas dos vereadores que mantm Centros Sociais, em comparao com os demais, verificou-se que no h diferenas significativas no que diz respeito a espectro ideolgico, escolaridade ou nmero de mandatos. Dezenove so de partidos de centro ou direita; 12 possuem escolaridade superior e 13 possuem dois ou mais mandatos, sendo 10 novatos. A proporo bastante semelhante a do perfil da Cmara Municipal como um todo.

    Dos 23 vereadores que possuem Centros Sociais, 10 possuem um Centro Social apenas e 13 tm mais de um Centro Social em geral, aqueles que possuem mais mandatos, possuem at oito ou nove Centros.6 No total, foram identificados 61 Centros Sociais mantidos por vereadores da capital do Rio de Janeiro.

    Apenas a varivel da distribuio geogrfica dos votos do parlamentar mostrou-se efetivamente significativa na explicao dos Centros Sociais. Dos 61 Centros identificados, 60 encontram-se nas Zonas Norte (e subrbio) e Zona Oeste da cidade; enquanto somente um localiza-se na Zona Sul, conforme demonstra o mapa abaixo: Zona Oeste Zona Norte e Subrbio Zona Sul

    6 Em alguns casos ainda no foi possvel precisar o nmero de Centros Sociais devido

    dificuldade de visit-los por estarem em regies consideradas pelos prprios moradores como perigosas. Em um dos casos, o Centro chamado de Grupo Comunitrio.

    LAU Laboratrio de Antropologia Urbana

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    Esse mapa corresponde ao mapa invertido do IDH (ndice de Desenvolvimento Humano) do Rio de Janeiro, ou seja: h mais Centros onde h menores indicadores de IDH, conforme mostramos abaixo:

    Observamos ainda que a maioria dos vereadores que possuem Centros Sociais tm perfis de votao individual altamente concentrados, com grande variao entre o maior e o menor percentual de votos obtidos por zona. Alguns exemplos seguem abaixo:7

    7 Numa prxima etapa da pesquisa sero apresentados estudos mais detalhados acerca da

    relao entre comportamento eleitoral e formas de conexo eleitoral para todos os parlamentares do RJ.

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    Rj _zonas _capital-utm.shp0.09 - 0.630.63 - 2.562.56 - 5.925.92 - 11.1811.18 - 20.83

    PSDB - Vereadora Lucinha - 2004

    Rj _zonas _capital-utm.shp0.01 - 0.160.16 - 0.490.49 - 2.172.17 - 7.127.12 - 20.48

    PFL (DEM ) - Vereadora Leila do Flamengo - 2004

    Rj _zonas _capital-utm.shp01 - 34 - 78 - 1718 - 27

    PFL (DEM ) - Vereadora Rosa Fernandes - 2004

    Rj _zonas _capital-utm.shp0.01 - 0.10.1 - 0.240.24 - 0.530.53 - 3.323.32 - 34.06

    PTdoB - Vereador Jorge Pereira - 2004

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    Levantamento sobre os anos de fundao dos Centros Sociais no se mostraram conclusivos, mas pudemos observar que o nmero de Centros vm crescendo nos ltimos 16 anos, perodo que coincide com os governos de Csar Maia e de seu ex-aliado Luiz Paulo Conde na prefeitura do Rio de Janeiro. Alguns acreditam que h tolerncia e incentivo por parte do prefeito atravs de contratos com essas entidades que tm favorecido esse crescimento. Outro dado que refora essa hiptese o fato de que os Centros poderiam se reverter em importante capital poltico para o grupo da prefeitura, uma vez que esto localizados justamente nas reas onde este grupo eleitoralmente mais fraco.

    Os atendimentos realizados pelos Centros Sociais podem ser divididos em cinco categorias principais:

    I - Atendimentos mdicos: clnico geral, oftalmologista, ginecologista, dentista, dermatologista, fisioterapeuta, psiclogo, cardiologista, pediatra, fonoaudilogo, nutricionista, psiquiatra, neurologista, ortopedista.

    II Cursos: informtica, idiomas, cabeleireiro, confeiteiro, acompanhante, estamparia, artesanato, eletricista, telemarketing, manicure, garom, refrigerao, montagem e manuteno de computadores, entrelice, desenho, modelo e manequim, educacional.

    III - Atividade fsica: teatro, ginstica, dana de salo, capoeira, king-boxing, futebol, yoga, lambaerbica, hidroginstica, alongamento, natao, karat, jiu-jitsu, jazz, ballet, dana do ventre, aeroboxe, basquete, voli, handball, ginstica olmpica.

    IV - Atividades alternativas: acupuntura, massoterapia, fitoterapia, auriculoterapia, drenagem linftica, shiatsu, massagem corporal, cromoterapia, RPG.

    V - Atendimento jurdico e assistncia social.

    Dentre os 23 vereadores que administram Centros Sociais, os servios se distribuem da seguinte forma:

    I - Atendimentos mdicos: 19 vereadores II Cursos: 14 vereadores V - Atendimento jurdico e assistncia social: 11 vereadores III - Atividade fsica: 9 vereadores IV - Atividades alternativas: 7 vereadores

    Calculamos que os 61 Centros levantados realizam em mdia 600 mil atendimentos ao ano, podendo haver variaes entre 30 mil atendimentos/ano num centro e menos de 1/3 disso em outro. Consideramos 10 mil atendimentos/ano como uma mdia razovel, sem discriminar que uma mesma pessoa pode ser atendida diversas vezes num ano. (No Rio de Janeiro, dependendo do partido, um mandato pode exigir de 15 a 25 mil votos.)

    Para ter acesso a esses servios, preciso preencher uma ficha cadastral com dados pessoais (nome, endereo e telefone). Em alguns casos

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    tambm so solicitados: nmero de identidade (14 vereadores); comprovante de residncia (12 vereadores); CPF (4 vereadores); ttulo de eleitor (3 vereadores); certido de nascimento (3 vereadores) e comprovante escolar (1 vereador).

    Em geral, todos os servios so gratuitos (20 vereadores) ou cobrados simbolicamente (3 vereadores). Para alguns alunos, possvel marcar hora com antecedncia (9 vereadores) ou pegar uma senha para ser atendido (7 vereadores). O acesso s aulas em alguns casos condicionado ao uso de uniforme (8 vereadores), que pode ser apenas uma camiseta branca comum, onde posteriormente gravado o smbolo do Centro.8 O funcionamento dos Centros Sociais tambm costuma ser apoiado por veculos como kombis e carros de som.

    No temos ainda levantamento sistemtico do pblico de todos os Centros Sociais, mas evidente o foco nos servios em algumas categorias populacionais: crianas em idade escolar, jovens em fase de profissionalizao, mulheres e idosos. Muitos servios so voltados para este ltimo grupo, seja com foco em sade, seja na forma de terapias ocupacionais, como cursos de artesanato e atividades de recreao.

    Uma caracterstica bastante comum nesses Centros Sociais o uso de faixas e cartazes com incentivo aos freqentadores e valorizao do local. Neste material de comunicao, duas palavras se destacam por seu valor simblico: trabalho e famlia. Como outras pesquisas j mostraram (Kuschnir, 2000), o trabalho uma palavra-chave que, quando associada ao nome do poltico, se torna uma forma de responder ao estigma da ocupao. Slogans como Quem trabalha tem histria para contar ou O trabalho que faz acontecer demonstram claramente uma busca de valorizao daquele poltico em particular como algum que trabalha, diferente dos demais.

    Outra palavra muito freqente no ambiente dos Centros Sociais a famlia e suas variantes relacionais: Venha fazer parte dessa famlia; O cuidado que voc merece; Honrando o seu voto. Associa-se prestao de

    8 Desde 2006, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) proibiu a distribuio de camisetas, bons e

    outros brindes com nome e nmero dos candidatos. Em muitos casos, isso continuou a ser feito utilizando-se smbolos associados ao grupo poltico como flores, personagens ou grafismos. Com a aproximao das eleies, esse mesmo recurso tambm utilizado para disfarar a fachada do Centro, substituindo o nome dos polticos por seus smbolos.

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    servio pelo poltico-parlamentar palavras que expressam valores do universo relacional da pessoa: famlia, amizade, carinho, apadrinhamento, cuidado, honra.

    Em geral, essas faixas e cartazes produzidas pelos prprios parlamentares tambm evidenciam a atuao do grupo poltico no espao urbano onde o Centro Social se localiza. Dizeres como A populao agradece ao prefeito ... e ao vereador ... a iluminao pblica da rua... so tpicos sinalizadores de que o poltico agiu como mediador entre o poder pblico e a regio onde atua. Essa esfera de influncia uma rea poltica (Kuschnir, 2000) que se irradia pelas ruas ao redor dos Centros Sociais.

    Essa rea poltica se distribui de maneira seletiva, no-uniforme, recortando a cidade a partir de certos tipos de ocupao. Em vrios casos estudados, havia uma clara discriminao ao pblico morador de favelas. Essa discriminao se manifesta por motivos econmicos quando, por exemplo, um Centro Social exige uma camiseta, um pagamento ou mesmo a compra de material para um curso, por exemplo. Mas pode ser tambm social, ao evitar a contratao de moradores de favelas como funcionrios, ao no colocar propaganda do Centro nas reas faveladas ou evitar relao com suas associaes de moradores (seja por serem associadas a movimentos sociais de esquerda ou em alguns casos ao trfico de drogas).

    Nos trs estudos de caso desenvolvidos ao longo da pesquisa, ficou evidente que a maior parte do pblico desses Centros Sociais constitudo por uma pequena classe mdia, moradora de reas semi-urbanizadas da cidade, que dispe de alguns recursos para financiar a freqncia ao Centro, como por exemplo: tempo disponvel, dinheiro para transporte e compra de material para realizao de certos cursos. Alguns freqentadores deixam claro que teriam como pagar por servios semelhantes aos oferecidos nos Centros Sociais mas no o fazem por gostarem dos outros freqentadores, do ambiente e dos funcionrios. Isto , tudo indica que essa freqentao implica pertencimentos a redes de sociabilidades de repercusso mais ampla.

    Esse pblico freqentador dos cursos profissionalizantes, em alguns casos, pode agir como um importante agente de irradiao dos efeitos dos Centros Sociais nas reas mais empobrecidas. o que ocorre, por exemplo,

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    em um conjunto de Centros mantidos por uma vereadora onde os alunos de cursos de manicure, cabelereiro e outros, tm como contrapartida ao seu diploma a obrigao de prestar servios comunitrios gratuitos para moradores de uma comunidade carente. A formatura da turma coincide com a prestao desses servios, em meio a festas e celebraes ligadas ao nome do poltico em praas e reas de lazer da regio (Siqueira, 2006).

    Embora esse tipo de evento remeta ao uso dos Centros como meio de conquista de votos, indica tambm uma ampliao de redes sociais por parte dos moradores que vivenciam experincias profissionais e pessoais que vo muito alm do ato de votar. Muitos dos servios prestados pelos Centros Sociais exprimem esse duplo significado. A maioria das atividades promovidas opera no mbito do complementar, do acessrio. No se trata, na maioria das vezes, de relaes de subsistncia ou dependncia, como no sentido clssico do clientelismo. Isso fica evidente pelo teor das mediaes por polticas pblicas mais cosmticas do que estruturais iluminao ao invs de saneamento bsico, por exemplo ou no tipo de bens em jogo nas trocas cursos e servios, ao invs de alimentos e material de construo.

    A quantidade de parlamentares novatos frente de Centros Sociais mostra a vitalidade dessa forma de conexo poltica. Nos Centros, o poltico passa a ter capacidade de execuo, atuando em alguns casos, como disse um deles, como uma mini-prefeitura dentro da cidade. Isso pode estar associado a um quadro mais geral de desvalorizao do trabalho do Legislativo no Brasil por parte tanto de polticos quando da populao.

    Quais as repercusses dessas prticas para as representaes e aes polticas na sociedade contempornea hoje? At que ponto estamos diante de reelaboraes de antigas prticas, que nos remetem ao conceito de clientelismo, ou a novas formas de organizar as relaes entre polticos, populao, instituies e espao urbano? Que formas so essas e quais os papis sociais e categorias em jogo? De que maneira a organizao social da cidade afeta a produo dessas categorias? Essas so algumas perguntas que a continuao dessa pesquisa pretende responder.

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    Bibliografia

    CAMPOS, Cidinha. 2004. Veja a integra das denncias elaboradas por Cidinha. Disponvel em http://www.pdt-rj.org.br/primeirapagina. asp?id=486, 18/11/2004.

    DARIANO, Daniela. 2004. Os Coronis do asfalto, Jornal do Brasil, 16/11/2004.

    KUSCHNIR, Karina. 2000a. Eleies e representao no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Relume-Dumar/Nuap.

    _____. 2000b. O cotidiano da poltica. Rio de Janeiro, Jorge Zahar. (Coleo Antropologia Social)

    _____. 2007. Antropologia da poltica. Rio de Janeiro, Jorge Zahar. MAGALHES, Vera. 2004. Vereadores do Rio de Janeiro profissionalizam o

    prtica de troca de votos por favores, Primeira Leitura. So Paulo, novembro.

    OTVIO, CHICO. 2006. Jornal O Globo. SIQUEIRA, RAZA ALVES. 2006. Dissertao de Mestrado. Rio de Janeiro, Iuperj.