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Rev Inst Ciênc Saúde2008;26(4):467-76

Lesões cancerizáveis na cavidade bucalLesions considered malignant that affect the mouth

Rosemary Baptista Martins*Élcio Magdalena Giovani**Halbert Villalba***

ResumoO carcinoma espinocelular representa 8% das neoplasias malignas que acometem o homem

no Brasil sendo responsável por 95% das neoplasias que acometem a cavidade bucal, porém, oprocesso de carcinogênese é insidioso, levando a alteração celular sem necessariamente apre-sentar manifestação clínica da doença. Contudo, a identificação das lesões consideradas can-cerizáveis pode representar a cura do paciente. O presente trabalho tem por objetivo revisar osaspectos clínicos, histológicos, manobras diagnósticas e condutas terapêuticas para as lesõescancerizáveis que acometem a cavidade bucal, destacando: a leucoplasia – caracterizada porlesão branca não removível à raspagem e não classificada como outro tipo de lesão; a eritropla-sia – caracterizada por lesão vermelha que não se associa clinica ou patologicamente com ne-nhuma outra lesão; a queilite actínica – que ocorre pela exposição prolongada e contínua àradiação actínica, manifestando-se principalmente como lesão em lábio inferior, tornando-o res-secado, esbranquiçado geralmente com superfície lisa e consistência fibroelástica a endurecida;o líquen plano - considerado doença auto-imune e manifestando-se clinicamente em quatro tipos,reticular, placa, atrófico e erosivo, contudo, apenas a forma erosiva é descrita com potencial detransformação maligna em apenas 2% destes casos. O reconhecimento dessas patologias na ca-vidade bucal por meio dos exames clínicos e físicos diários realizados pelos cirurgiões-dentistasem todos os seus pacientes pode representar a diferença entre a cura, qualidade de vida e so-brevida dos mesmos.

Palavras-chave: Carcinoma de células escamosas; Neoplasias bucais; Leucoplasia bucal; Eri-troplasia; Queilite; Líquen plano

AbstractThe spinocellular carcinoma represents 8% of the malignant neoplasms that affect men in Bra-

zil and is responsible for 95% of the neoplasms that affect the mouth. The cancer process is insi-dious and promotes cell changes that are not necessarily followed by clinical manifestations of thepathology. However, the identification of the lesions considered malignant can represent the curefor the patient. This work has the objective of reviewing the clinical and histological aspects as wellas the diagnosis maneuvers and therapeutical procedures for malignant lesions that affect themouth, such as: leukoplakia – characterized by being a white lesion not removed when rubbed outand that is not classified as any other type of lesion; erythroplakia – a red lesion that is not linkedclinically or pathologically to any other lesion; actinic cheilitis – that happens by a long term expo-sure to actinical radiation that appears mainly as a lesion in the lower lip, it turns into a dry and whi-tened plain surface that ranges from fibroelastic consistency to a hard one; lichen planus –considered to be autoimmune disease and that appears in four clinical aspects: reticular, plates,atrophic and erosive, but only the erosive form is described as having a potential to malignancyin 2% of the cases. Recognizing these pathologies in the oral environment by means of daily clini-cal and physical examinations carried out by dentists in all their patients may represent the diffe-rence among cure, quality of life and life extension for them.

Key words: Carcinoma, squamous cell; Mouth neoplasms; Leukoplakia, oral; Erythroplakia;Cheilitis; Lichen planus

* Professora Assistente da Disciplina de Clínica Integrada da Universidade Paulista (UNIP) – Campus Indianópolis. E-mail: [email protected]** Professor Doutor Titular da Disciplina de Clínica Integrada e Professor do Curso de Pós-Graduação – Mestrado em Odontologia da UNIP – Campus Indianópolis.*** Professor Doutor Titular das Disciplinas de Patologia e Clínica Integrada da UNIP – Sorocaba.

Introdução

Algumas lesões podem anteceder o câncer bucal edesta forma são denominadas como lesões pré-canceri-záveis ou pré-malignas, apesar de nem todas progredirempara câncer e também, nem todo câncer de boca originar-se destas lesões.

O carcinoma espinocelular representa 95% das neo-plasias malignas que acometem a mucosa oral e 8% dasneoplasias malignas que acometem o homem no Brasil.Apenas 15% de todos os casos ocorrem com diagnósticonos estadios iniciais da lesão e, aproximadamente 50%dos pacientes já chegam aos centros de tratamento commetástases no momento do diagnóstico7. Este fato re-

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força a importância da identificação de lesões pré-can-cerizáveis com a finalidade de aumentar os índices dediagnósticos de lesões ainda iniciais.O processo de carcinogênese é de difícil identifica-

ção, contudo, o consumo de tabaco e de bebidas alcoó-licas são os fatores de risco mais significativos. Este pro-cesso depende também do genoma celular (fatoresgenéticos), agentes infecciosos e imunológicos, sendoque as lesões cancerizáveis representam a primeira evi-dência clínica do processo de carcinogênese19.Este trabalho procura demonstrar a representatividade

destas lesões cancerizáveis como evidência clínica doprocesso de carcinogênese e direcionar o reconheci-mento dos cirurgiões-dentistas e profissionais da saúdepara o diagnóstico e tratamento, contribuindo para a pre-venção, cura e qualidade da sobrevida dos pacientescom risco de câncer.Em relação às lesões cancerizáveis destacam-se a leu-

coplasia e a eritroplasia, além da queilite actínica e líquenplano, apesar deste último ainda ser motivo de muita con-trovérsia7,19,26.

Revisão da literatura

Leucoplasia

Segundo a Organização Mundial da Saúde19 (1978), aleucoplasia bucal é definida como: “mancha ou placabranca que não pode ser caracterizada clínica ou histo-patologicamente como nenhuma outra doença”19. Con-tudo, esta é uma definição genérica, sendo que o diag-nóstico depende da exclusão de outras doenças, além deestar relacionada apenas a aspecto clínico, portanto trata-se de um termo clínico, sem caracterização histológica desua agressividade7,26.Axell et al.1 (1984) propuseram uma revisão no conceito

de lesões brancas e pré-cancerizáveis, acrescentando aoconceito original da OMS a seguinte característica: “nãoestando associada etiologicamente com nenhum agentequímico ou físico, exceto o tabaco”, visando eliminar le-sões provenientes de causas locais (fatores irritativos ouiatrogênicos).Dentre as lesões pré-cancerizáveis, a leucoplasia é a

mais comum e prevalente, ocorrendo preferencialmenteno gênero masculino e acometendo indivíduos nas faixasetárias acima dos 40 anos de idade29, numa variação en-tre 1 e 3% dos indivíduos adultos24. As lesões brancas quesurgem em pacientes não fumantes, e que não apresen-tam fatores irritativos locais mostram evolução clínica maisagressiva7.Apesar de desconhecida sua etiologia, alguns fatores

estão relacionados à sua patogenia como: o fumo, ál-cool, fatores modificadores irritativos crônicos locais (pró-teses ou dentes mal posicionados resultando em trauma),radiação ultravioleta e microrganismos, contudo, dentreestes, apenas o fumo tem sido fortemente relacionadocomo agente etiológico, sendo que 80% dos casos de leu-coplasia oral ocorrem em pacientes tabagistas26,29.As leucoplasias podem se apresentar como manchas

ou placas brancas, de coloração homogênea ou não,lisa, rugosa ou ainda verrucosas, isoladas, únicas ou múl-

tiplas e de tamanhos variados. São classificadas como ho-mogêneas ou não homogêneas14.As leucoplasias homogêneas apresentam aspecto

em placa uniforme branco, assintomáticas, podendo ounão apresentar fissuras, sua superfície é lisa ou corru-gada com textura fina ou áspera, as bordas das lesõessão bem ou mal delimitadas à mucosa bucal normal (Fi-gura 1). Mostram regressão espontânea principalmenteapós eliminação dos fatores irritativos, contudo uma le-são mais silenciosa desta variação de leucoplasia po-derá evoluir para uma lesão mais agressiva, com as-pectos clínicos variados que normalmente se dá devidoao tempo de prevalência do estímulo e avanço daidade11,22.As leucoplasias não homogêneas (Figura 2) apresen-

tam aspecto maculo-nodular, ou seja, um misto de placasbrancas entremeadas por manchas ou áreas vermelhas,com contornos irregulares, nodulares e exofíticas, geral-mente apresentando maior potencial para a transformaçãomaligna11.As leucoplasias acometem qualquer região da cavi-

dade bucal como os lábios, língua, soalho bucal e mucosajugal, porém, as lesões de língua e soalho bucal requeremespecial cuidado por serem áreas de grande incidênciade câncer oral7,11,26.Microscopicamente pode-se observar em muitas le-

sões hiperparaqueratose ou hiperortoqueratose e acan-tose (espessamento da camada córnea e espinhosa res-pectivamente), no entanto pode ocorrer atrofia epitelialem algumas lesões, sendo mais comum este aspecto naseritroplasias. No tecido conjuntivo subjacente pode-seobservar infiltrado inflamatório crônico com graus varia-dos de intensidade. O processo inflamatório parece es-tar associado principalmente ao grau de injúria local e/oucom a gravidade da displasia epitelial, apesar de apenas5 a 25% dos casos de leucoplasia, mostrarem displasiacelular que são graduados em displasia leve, moderadaou severa (Figura 3). Quando se observa o envolvimentodisplásico em toda a espessura epitelial, sem rompi-mento da membrana basal, a lesão é denominada de car-cinoma in situ14.

Figura 1. Leucoplasia homogênea em rebordo alveolar

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Figura 2. Leucoplasia não homogênea em dorso de língua

Figura 3. Fotomicrografia de leucoplasia

Esta diversidademicroscópica ressalta a importância dese diagnosticar precocemente este tipo de lesão e aumentaa importância da conduta clínica criteriosa7,26. Portanto, odiagnóstico definitivo é microscópico e o material a ser co-letado para análise anatomopatológica poderá ser prove-niente principalmente de biópsia (excisional ou incisional),citologia e punção aspirativa por agulha fina (PAAF)18.A eleição do tipo de exame complementar dependerá,

portanto, da região afetada, da extensão da lesão, doacesso e grau de dificuldade em proceder com cirurgia lo-cal, bem como da suspeita diagnóstica clínica. A regiãode escolha deverá ser a área cujo aspecto clínico apre-senta-se mais agressivo (áreas vermelhas e irregulares),podendo-se realizar biópsias múltiplas. Em lesões gran-des, múltiplas, utiliza-se o teste de Shedd para eleger amelhor região a ser biopsiada. Este teste consta da apli-cação de corantes vitais (azul de toluidina) nas lesõesbrancas, promovendo a coloração de áreas commaior de-pósito de queratina e alterações celulares, estas áreas de-verão ser então removidas cirurgicamente e avaliadasmicroscopicamente2.

O procedimento de biópsia visa afastar a possibilidadede outras patologias, além de identificar presença de dis-plasia epitelial, carcinoma in situ, ou ainda, um carcinomaepidermóide invasivo2,22.Algumas lesões brancas devem ser consideradas no

diagnóstico diferencial clínico como: linha alba, mucosamordiscada, queratose irritativa, estomatite nicotínica ecandidose hiperplásica, porém, tais lesões regridem es-pontaneamente depois de afastado o fator irritativo, ou nocaso da candidose, após uso de anti-fúngico14.Outras lesões como líquen plano, nevo branco es-

ponjoso e leucoplasia pilosa também podem asseme-lhar-se às lesões de leucoplasia, porém, deve-se levarem consideração os seguintes aspectos: o líquen planogeralmente apresenta-se com aspecto rendilhado ou es-triado, podendo, mais raramente, apresentar-se emforma de placa, porém, geralmente acometem a mu-cosa jugal de forma bilateral e as estrias de Wickham su-gerem o diagnóstico clínico diferencial; o nevo brancoesponjoso é uma lesão rara, geralmente acometendocrianças na faixa etária entre recém-nascidas até a pu-berdade, com aspecto homogêneo sendo extensas, po-dendo afetar toda a mucosa bucal, o traço familiar deveser pesquisado e considerado no diagnóstico; a leuco-plasia pilosa é caracterizada por lesão branca com ca-racterísticas de cílios ou pêlos não removíveis à raspa-gem, podendo ser uni ou bilateral, acometendoprincipalmente borda lateral de língua de pacientes imu-nossuprimidos3-5,12,23-24.O tratamento preferencial para as leucoplasias deve ser

cirúrgico com remoção completa da lesão, pois alguns tra-balhos têm demonstrado que mesmo as lesões com au-sência da displasia epitelial, poderão evoluir para o cân-cer4,23,25, porém, este tratamento radical muitas vezes éimpossibilitado devido ao tamanho ou volume das lesões.Neste caso, há indicação para múltiplas biópsias, asquais visam buscar a nível microscópico áreas represen-tativas e orientar a remoção de lesões prioritárias, ava-liando-se também as características das lesões e os fa-tores relativos ao paciente7,26.Outras formas de tratamento podem ser consideradas

como a utilização do laser de CO2 para a excisão da le-são que proporciona ótimos resultados quanto à cicatri-zação, a criocirurgia ou eletrocauterização também po-dem ser utilizadas, porém, a grande desvantagem destastécnicas é a inviabilidade da realização do exame anato-mopatológico adequado de toda a lesão5.Contudo, é comum, casos de recorrências de leuco-

plasias, principalmente das lesões maiores, fazendo-senecessário um acompanhamento rigoroso destes pa-cientes por longos períodos4-5.Alguns autores sugerem tratamento de quimiopreven-

ção, tanto como opção de tratamento, quanto de pre-venção de recidivas, sendo que os quimioterápicos maisutilizados são o ácido retinóico (derivados da vitamina A)e mais recentemente as drogas inibidoras das cicloxige-nases7-8,26. Destes, o ácido retinóico pode proporcionarefeitos indesejáveis (fotofobia, queilite, eritema facial etc.)o que requer a suspensão da droga, e com isto, nota-seque ocorre, com grande freqüência, recidivas25 e a utili-zação das drogas de inibição das cicloxigenases ne-

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cessita de maiores estudos e relatos na literatura7-8,26. Ouso tópico de bleomicina tem demonstrado redução clí-nica da lesão e do grau de displasia epitelial de algumasleucoplasias tratadas25.

Eritroplasia

Segundo a Organização Mundial da Saúde19 (1978), eri-troplasia é um termo clínico utilizado para identificar man-cha ou placa vermelha que não pode ser caracterizada clí-nica ou patologicamente com nenhuma outra condição.A eritroplasia é uma condição clínica rara, bem menos

comum que as leucoplasias, porém seu significado clínicoé mais complexo, sendo considerada a principal lesãopré-cancerizável da boca, pois geralmente exibem pa-drões histológicos de intensa atipia epitelial, com grandepotencial de degeneração, sendo que 90% dos casos járepresentam um carcinoma in situ ou micro-invasivo7,26.A etiologia, epidemiologia e incidência da eritroplasia

são difíceis de serem determinadas. O fumo apresenta pa-pel importante na patogênese dessas lesões, da mesmaforma que na leucoplasia, porém, a eritroplasia apresentapotencial de transformação maligna dezessete vezesmaiores do que as leucoplasias24-25.A eritroplasia apresenta-se clinicamente como man-

chas ou placas avermelhadas, sem sinais de inflamação,assintomática, bem demarcada, podendo medir desdepoucos milímetros até centímetros com textura aveludadae macia (Figura 4). Quando se apresentam endurecidaspodem indicar carcinoma invasivo. Ocorrem com maiorfreqüência na borda da língua, soalho bucal, área retro-molar e palato mole, podendo apresentar-se sob formasde múltiplas lesões, incidindo principalmente no gêneromasculino numa faixa etária entre 55 a 74 anos30.A grande totalidade de lesões eritroplásicas (90%)

apresenta-se com displasia epitelial severa, carcinoma insitu, ou carcinoma espinocelular invasivo. Geralmente es-tas lesões apresentam o epitélio da superfície atróficocom graus variados de atipia, com ausência de querati-nização, tornando evidente a microcirculação adjacente(aspecto vermelho) e geralmente o tecido conjuntivo apre-senta-se com inflamação crônica na área subjacente7,26

(Figura 5); portanto a biópsia se faz necessária e o exameanatomopatológico dará o diagnóstico definitivo.Devem-se afastar outras possibilidades patológicas

como lesões vasculares, candidoses eritematosas, mu-cosites inespecíficas ou sarcoma de Kaposi. Os heman-giomas planos e as telangiectasias não se incluem a es-tes, pois possuem características clínicas próprias2,26.O tratamento consiste em inicialmente eliminar fatores

irritativos locais para averiguação da remissão da lesão.As lesões que eventualmente persistirem além de 14 dias,deve-se obrigatoriamente proceder à biópsia, principal-mente se o tratamento de escolha for laser, criocirurgia oueletrocirurgia, pois estas modalidades impossibilitam oexame histopatológico completo da lesão18. O tratamentode escolha que melhor se enquadra, levando-se em con-sideração as condições favoráveis a ela, é a cirurgia,com ressecção completa da lesão, realizando margem desegurança adequada ao padrão microscópico reveladopor ocasião da biópsia (Técnica de Moh)7.

Figura 4. Eritroplasia em palato duro

Figura 5. Fotomicrografia de eritoplasia

Como a eritroplasia possui alto potencial de maligniza-ção, sendo descrito recorrências, há necessidade de ri-goroso acompanhamento destes pacientes, estabele-cendo medidas preventivas como quimioprevenção,inclusão de exames do trato aerodigestivo superior e sus-pensão dos usos do fumo e álcool7,26.

Queilite actínica

Trata-se de lesão cancerizável por conseqüência daexposição prolongada e contínua à radiação solar, es-pecificamente à radiação ultravioleta (faixa UVB320-280nm)21, afetando preferencialmente o lábio inferior, po-rém, o fumo também é um fator relacionado à suaetiopatogenia17,21.Esta lesão afeta principalmente homens brancos (po-

pulação de pele clara), que trabalham em atividades deintensa exposição solar, como pescadores e agricultores,com pouca resistência aos raios solares, sendo rara emnegros (devido à maior quantidade de melanina na peleconferindo efeito protetor) e mulheres (uso cotidiano de

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batom com fotoprotetores)22. A transformação maligna daqueilite actínica pode chegar a 17% dos casos, ocasio-nando carcinoma que se desenvolve lentamente, produ-zindo metástases tardiamente17.A queilite actínica caracteriza-se por alterações crôni-

cas, que se desenvolvem ao longo de anos, gerando le-sões epiteliais irreversíveis21. Geralmente apresentam-se por manchas, placas vermelhas ou brancas, compresença ou não de áreas ulceradas ou descamativas,com ressecamento, atrofia no vermelhão do lábio e en-tremeada por áreas eritematosas irregulares ou hiper-queratóticas, que podem evoluir para erosões, ulcera-ções, fissuras ou ainda vesículas7,22 (Figuras 6 e 7). Asprincipais queixas dos pacientes se relacionam ao res-secamento, ardência, secura, queimação, descamaçãopersistente e dificuldade de mobilidade labial, podendotambém ocorrer sangramentos espontâneos7,26. As le-sões com aspecto branco não ulcerado aparecem emaproximadamente 29% dos casos, já as lesões ulceradasou erosivas compreendem 48% do total de lesões, sendoque 23% ocorrem com um misto de lesão branca e ero-siva conjuntamente17.

Figura 6. Queilite actínica em lábio inferior

Figura 7. Queilite actínica em lábio inferior

É através das queilites actínicas que se desenvolvegrande parte dos carcinomas de lábios o que requer cui-dados por parte dos cirurgiões-dentistas em relação a si-nais precoces de malignização. Estes sinais podem serrepresentados por áreas elevadas e infiltradas, úlcerasque não se reparam, áreas eritematosas aveludadas ouainda placas localizadas com aumento de hiperquera-tose26.As queilites actínicas apresentam-se sob diversos as-

pectos microscópicos, com alterações do tecido conjun-tivo e epitelial, desde atrofia epitelial ou hiperqueratose emestádios iniciais, até displasias que podem ser classifica-das como leve, moderada ou severa. O tecido conjuntivosubepitelial apresenta-se em degeneração hialina cha-mada de elastose solar, onde há desidratação das fibraselásticas com formação de material amorfo, acelular, ba-sofílico na lâmina própria, com diversos graus de infiltradoinflamatório linfoplasmocitário17,21 (Figuras 8 e 9).

Figura 8. Fotomicrografia de queilite actínica

Figura 9. Fotomicrografia de queilite actínica

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Geralmente o diagnóstico clínico é bastante caracte-rístico e relativamente fácil, porém, é indispensável à rea-lização de biópsia incisional para averiguar o grau dasmodificações microscópicas presentes7,26.Imediatamente após o diagnóstico clínico de queilite ac-

tínica deve-se recomendar aos pacientes a utilização deprotetores solar nos lábios, redução da exposição solar eaos pacientes fumantes, orientar para suspensão do uso.Além destas orientações iniciais devem-se prescrever po-madas corticosteróides para controlar o processo infla-matório, e observar a regressão destas lesões por umcurto espaço de tempo. Porém, quando as lesões não re-gredirem, deve-se lançar mão de tratamentos cirúrgicosque incluam a vermelhectomia, criocirurgia, cirurgia a la-ser de CO2, 5-fluorouracil tópico, ácido tricloroacético eácido retinóico a 0,05%20.O acompanhamento por longos períodos deve ser

realizado em todos os pacientes quaisquer que tenhamsido as medidas terapêuticas utilizadas, além da adver-tência para utilização de medidas preventivas com foto-protetores21.

Líquen plano

A transformação em carcinoma de uma lesão de lí-quen plano é bastante controversa, há trabalhos que con-sideram que os portadores de líquen plano apresentammaior potencial de malignização comparado a populaçãonormal; outros que colocam em duvida a natureza pré-ma-ligna do líquen plano9; além de outros trabalhos que con-sideram como interpretação de certas características dolíquen plano como lesões displásicas (displasias lique-nóides), confundindo-as15.O líquen plano é uma condição inflamatória crônica,

mucocutânea benigna, de etiologia associada às alte-rações imunológicas, acometendo preferencialmenteadultos, cuja relação parece associar-se a distúrbios deordem emocional7,9. Pode apresentar-se simultanea-mente tanto na cavidade bucal como na pele, ocor-rendo também apenas lesões intra-bucais ou cutâneasisoladas12.Distribui-se igualmente entre as raças acometendo 0,1

a 2,2% da população adulta acima dos 30 anos de idade,podendo variar em média de 5 a 10 anos antes para o gê-nero masculino ao gênero feminino4-5,23,27, porém, afe-tando preferencialmente o gênero feminino numa propor-ção de 3:25,23,27. Considerações relevantes devem serfeitas em relação aos pacientes portadores de hepatite C,devido ao crescente número de pessoas contaminadas eque apresentam quadros exacerbados de lesões de lí-quen plano associadas, afetando principalmente jovensdo gênero masculino, sendo a forma erosiva do líquen amais prevalente. Quando existe co-infecção em indiví-duos com hepatite C com o vírus HIV, as manifestaçõesbucais tornam-se mais prevalentes, sendo que os pa-cientes tratados com Interferon com associação de Riba-varina, as lesões de líquen plano tornaram-se mais exu-berantes12.As lesões bucais do líquen plano são expressas de ma-

neira polimorfa podendo ser, bolhosa, em placa, papular,atrófica, erosiva/ulcerativa e reticular, sendo as formas

Figura 10. Líquen plano reticular

atrófica e erosiva/ulcerativa, as mais apontadas como le-sões com potencial para transformação maligna6,13. Estaslesões apresentam um risco de 2% de casos relatadoscom transformação maligna13.Os tipos reticular, em placa ou papular são mais co-

muns (Figura 10), geralmente assintomáticas e comu-mente percebidas pelos cirurgiões-dentistas em exa-mes de rotina ou pelos próprios pacientes6. Apresentamcomo características clínicas, estrias brancas (estriasde Wickham) que se entrelaçam (aspecto reticular),dispondo-se simetricamente nas mucosas jugais, gen-giva, palato, língua e vermelhão dos lábios, porém,quando se apresentam em pápulas, podem não serestáticas, melhorando ou piorando em semanas ou me-ses10. Quando se apresenta em placa na região dorsalda língua, pode ser pouco evidente, pois se assemelhaà placa ceratótica com atrofia de papilas27. Geralmenteos padrões reticulares são diagnosticados através dosachados clínicos, identificando-se os sinais patogno-mônicos que são as estrias brancas entrelaçadas. Estacaracterística clínica clássica pode apresentar-se alte-rada, quando há na lesão infecção por cândida, mu-dando sua aparência clínica28.Os tipos erosivos formam um grupo mais significativo

porque apesar de menos comuns do que os padrões re-ticulares (exceto nos caso onde há contaminação com ovírus da hepatite C, conforme mencionado anteriormente)(Figura 11), causam sintomatologia dolorosa, ardor e quei-mação durante a alimentação. São formadas por áreas eri-tematosas atróficas com vários graus de ulcerações, po-rém, na periferia destas lesões, sempre apresentam finasestrias brancas irradiadas16. Quando acometem a gengivapodem sugerir um quadro de gengivite descamativa, omesmo observado para lesões de pênfigo vulgar e pen-figóide benigno de mucosa. Essas lesões são diferencia-das após a realização da biopsia incisional do tecido pe-rilesional e avaliação através da microscopia óptica e deimunofluorescência16,18. A forma clínica mais rara descritapara o líquen plano é a bolhosa que se apresenta quandoo componente erosivo for severo levando à separação ouruptura epitelial18.

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Figura 11. Líquen plano erosivo

Figura 12. Fotomicrografia de líquen plano

Algumas manifestações bucais como lupus eritema-toso, estomatite ulcerativa e reações liquenóides (me-dicamentosa e por amálgama) podem gerar caracte-rísticas histológicas semelhantes ao líquen plano. Nãoexiste uma atipia celular intensa no líquen plano, e suascaracterísticas imunopatológicas não são específicas.Geralmente apresentam graus variados de queratosena superfície do epitélio, apresentando um padrão or-toqueratótico quando o espécime biopsiado for de umalesão reticulada, ou paraqueratótico se a lesão for ero-siva10. A camada espinhosa pode apresentar-se variá-vel e as cristas epiteliais podem ser hiperplásicas comformato pontiagudo ou em forma de “dente de serra”,ou ainda podem estar ausentes28. Degeneração hidró-pica da camada basal, acompanhada de infiltrado delinfócitos T abaixo do epitélio é evidente. Corpos colói-des, citóides, hialinos ou de Civatte formando o cha-mado ceratinócitos em degeneração são observadosno epitélio e na interface com o conjuntivo3,28 (Figuras12, 13 e 14).

Figura 13. Fotomicrografia de liquen plano

Figura 14. Fotomicrografia de líquen plano

Discussão

O câncer mais prevalente na cavidade bucal é o car-cinoma espinocelular que representa 95% das neoplasiasmalignas. Apenas 15% de todas as ocorrências se dãopor diagnósticos iniciais e 50% dos pacientes procuramtratamentos em estádios avançados da doença, commetástases já instaladas7. Lesões cancerizáveis ou pré-malignas são lesões que podem, mas não necessaria-mente antecedem, o câncer bucal, porém, são manifes-tações de grande importância devido à possibilidade dediagnóstico precoce de câncer e de todas as suas im-plicações.Fatores como consumo de tabaco e bebidas alcoólicas,

agentes infecciosos e imunológicos e fatores genéticossão comumente relacionados ao processo de carcinogê-nese, contudo as lesões cancerizáveis representam a pri-meira evidência clínica deste processo19.Dentre as manifestações bucais, a leucoplasia, a eri-

troplasia, a queilite actínica e o líquen plano são relacio-nados às lesões cancerizáveis7,19,26. Destas, a leucopla-

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sia, que segundo a Organização Mundial de Saúde19

(1978) é definida como mancha ou placa branca que nãose caracteriza clinica ou histologicamente com nenhumaoutra doença, é a mais comum e prevalente, contudo,quando estas lesões estão relacionadas a fatores quími-cos ou físicos (irritativos ou iatrogênicos), exceto pelo usode tabaco, mostram evolução clínica menos agressiva,pois mostram regressão espontânea depois de eliminadoos fatores agressores, porém são mais preocupantes eagressivas quando ocorrem pelo uso de tabaco, sendoque 80% dos casos de leucoplasia ocorrem nestes pa-cientes7,26,29.As leucoplasias são classificadas como homogêneas e

não homogêneas e podem apresentar-se sob vários as-pectos clínicos acometendo qualquer região da cavidadebucal como os lábios, língua, soalho bucal e mucosa ju-gal, porém, as lesões de língua e soalho bucal requeremespecial cuidado por serem áreas de grande incidênciade câncer oral7,11,26.As leucoplasias apresentam histologicamente grandes

diversidade morfológica que vão desde hiperparaquera-tose, hiperortoqueratose, acantose, atrofia epitelial, infil-trado inflamatório crônico no tecido conjuntivo subjacentecom graus variados de intensidade, demonstrando dis-plasia celular graduadas em leve, moderada ou severa.Quando se observa o envolvimento displásico em toda aespessura epitelial, sem rompimento da membrana basal,a lesão é denominada de carcinoma in situ14.O diagnóstico definitivo deve ser realizado por meio de

estudo microscópico e o material a ser coletado paraanálise anatomopatológica poderá ser proveniente prin-cipalmente de biópsia (excisional ou incisional), citologiae punção aspirativa por agulha fina (PAAF)7,18,26.As leucoplasias fazem diagnóstico diferencial com linha

alba, mucosa mordiscada, queratose irritativa, estomatitenicotínica, candidose hiperplásica (lesões que regridemespontaneamente depois de afastado o fator irritativo) ouainda com líquen plano, nevo branco esponjoso, leuco-plasia pilosa3-5,12,14,22,25.O tratamento para as leucoplasias deve ser preferen-

temente o cirúrgico com remoção completa da lesão4,23,25,porém, podem ser considerados tratamentos com utiliza-ção de laser de CO2, criocirurgia, eletrocauterização5,além de tratamentos que incluem o uso de quimioterápi-cos como o ácido retinóico e drogas inibidoras das ciclo-xigenases7-8,26.A principal lesão pré-cancerizável da boca é a eritro-

plasia apresentando uma condição clínica rara, direta-mente relacionada ao uso de fumo e álcool, com padrõeshistológicos de intensa atipia epitelial, cujo potencial detransformação maligna é dezessete vezes maior do queas leucoplasias, com grande potencial de degeneração,sendo que 90% dos casos já representam um carcinomain situ ou micro-invasivo7,22-23,26.A aparência clínica da eritroplasia se dá por manchas

ou placas avermelhadas sem sinais de inflamação, as-sintomática, com textura aveludada e macia e quando seapresenta endurecida pode indicar carcinoma invasivo30.Histologicamente apresenta-se com displasia epitelial se-vera, carcinoma in situ ou carcinoma espinocelular inva-sivo, com ausência de queratinização e tecido conjuntivo

com inflamação crônica. A biópsia é o exame comple-mentar de eleição para o diagnóstico definitivo7,26.A eritroplasia faz diagnóstico diferencial com lesões

vasculares, candidoses eritematosas e mucosites2,26. Otratamento deve ser realizado por meio de cirurgia comressecção completa da lesão e com margem de segu-rança, entretanto, são considerados tratamentos alterna-tivos o laser de CO2, a criocirurgia ou eletrocirurgia, con-tudo, desde que realizado a biópsia anteriormentepossibilitando diagnóstico através do exame anatomopa-tológico7,18. Devido ao seu alto risco de malignização, oacompanhamento rigoroso deste paciente deve ser rea-lizado, commonitorização e estadiamento da lesão e con-trole quimioterápico, além de suspensão do uso de fumoe álcool7,26.A queilite actínica é uma lesão cancerizável por conse-

qüência da exposição prolongada e contínua à radiaçãosolar, especificamente à radiação ultravioleta21, afetandoprincipalmente o lábio inferior, porém, o fumo também é umfator relacionado à sua etiopatogenia16,21. Sua malignizaçãochega a 17% dos casos, ocasionando carcinomas de pro-gressão lenta e metástases tardias16. Histologicamentecaracteriza-se por alterações crônicas e lesões epiteliaisirreversíveis21, que vão desde atrofia epitelial ou hiperque-ratose em estádios iniciais, até displasias que podem serclassificadas como leve, moderada ou severa. O tecidoconjuntivo subepitelial apresenta-se em degeneração hia-lina chamada de elastose solar, onde há desidratação dasfibras elásticas com formação de material amorfo, acelu-lar, basofílico na lâmina própria, com diversos graus de in-filtrado inflamatório linfoplasmocitário16,21. Clinicamentepossuem aspecto de manchas ou placas vermelhas oubrancas, podendo apresentar áreas ulceradas, descama-tivas, ressecadas, atróficas ou vesiculares7,24, o que tornao diagnóstico clínico relativamente fácil e característico,contudo é a biópsia incisional que dará o diagnóstico de-finitivo e o grau de modificações celulares7,26.O tratamento inclui desde uso de pomadas tópicas de

corticosteróides e aplicação de ácido retinóico à cirurgiacom laser ou criocirurgia. Nos casos mais avançados é in-dicada vermelhectomia20. Os pacientes devem ser acom-panhados por longos períodos quaisquer que tenhamsido as medidas terapêuticas utilizadas, além da adver-tência para utilização de medidas preventivas com foto-protetores21.A transformação em carcinoma de um líquen plano é

muito discutida e controvérsia. É uma condição inflama-tória crônica, de etiologia associada às alterações imu-nológicas, acometendo preferencialmente adultos, cuja re-lação parece associar-se a distúrbios de ordememocional7,9, podendo manifestar na cavidade bucal, oulesões cutâneas, ou em ambas simultaneamente12. Afetapreferencialmente o gênero feminino numa proporção de3:25,25,27. Contudo, devido a crescentes contaminaçõescom o vírus da hepatite C que apresentam quadros exa-cerbados de lesões de líquen plano associadas, afetandoprincipalmente jovens do gênero masculino, sendo aforma erosiva a mais prevalente. Quando há co-infecçãoentre hepatite C e o HIV, as manifestações bucais do lí-quen plano são mais prevalentes, e quando os pacientessão tratados com Interferon associado de Ribavarina, as

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lesões de líquen plano tornaram-se ainda mais exube-rantes12.O líquen plano intra-oral se apresenta de maneira poli-

morfa podendo ser, bolhosa, em placa, papular, atrófica,erosiva/ulcerativa e reticular, sendo as formas atrófica eerosiva/ulcerativa, as mais apontadas como potencialpara malignização6,13.As mais comuns são os tipos reticular, em placa ou pa-

pular, geralmente assintomáticas6, apresentando comocaracterísticas clínicas, estrias brancas (estrias de Wick-ham) que se entrelaçam (aspecto reticular), dispondo-se simetricamente nas mucosas jugais, gengiva, palato,língua e vermelhão dos lábios10.Os tipos erosivos apesar de menos comuns do que os

padrões reticulares, causam sintomatologia dolorosa,ardor e queimação durante a alimentação. São formadaspor áreas eritematosas atróficas com vários graus de ul-cerações, porém, na periferia destas lesões, sempreapresentam finas estrias brancas irradiadas17. A formamais rara é a bolhosa que se apresenta quando o com-ponente erosivo for severo levando à separação ou rup-tura epitelial18. Essas lesões são diferenciadas após arealização da biopsia incisional do tecido perilesional eavaliação através da microscopia óptica e de imuno-fluorescência17-18.Não existe uma atipia celular intensa no líquen plano10.

A camada espinhosa pode apresentar-se variável e ascristas epiteliais podem ser hiperplásicas com formatopontiagudo ou em forma de “dente de serra”, ou ainda po-dem estar ausentes28. Degeneração hidrópica da camadabasal, acompanhada de infiltrado de linfócitos T abaixo do

epitélio é evidente. Corpos colóides, citóides, hialinos oude Civatte formando o chamado ceratinócitos em dege-neração são observados no epitélio e na interface com oconjuntivo3,28.

Conclusões

1. O cirurgião-dentista deve estar informado e atentopara as lesões potencialmente malignas, no que diz res-peito ao diagnóstico precoce, sendo um diferencial napromoção da saúde, gerando prognóstico favorável paraos pacientes com risco de câncer bucal.2. A eritroplasia representa a lesão cancerizável mais

importante quanto ao potencial de transformação ma-ligna, e apesar de rara, é uma das lesões com maior difi-culdade no diagnóstico clínico. O tratamento consisteprincipalmente em remoção cirúrgica das lesões maligni-zantes e/ou remoção dos fatores predisponentes na faseinicial, tendo ótimo prognóstico.3. O líquen plano de forma atrófica/erosiva tornou-se

mais prevalente em pacientes com co-infecção pelo vírusda hepatite C com o vírus HIV, e apesar de ser a únicaforma de líquen com potencial de transformação malignana cavidade bucal, o cirurgião-dentista deve ficar atentoàs suas manifestações clínicas pelo aumento na incidên-cia desses casos.4. A proservação para os pacientes portadores ou com

história de lesão malignizante, independente da lesão, éobrigatória e devem ser realizados frequentemente paraavaliar recidiva das lesões e, se necessário, nova inter-venção cirúrgico-terapêutica.

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Recebido em 26/9/2008Aceito em 28/11/2008

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