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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS
CENTRO DE LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO
PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO ESTRATÉGICA EM ESPORTES
GUILHERME NETTO ROMAGUERA
LINHA BURRA: Os valores do esporte deixados em posição de impedimento por uma cultura (midiática) ultrapassada.
CAMPINAS 2013
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS
CENTRO DE LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO
PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO ESTRATÉGICA EM ESPORTES
GUILHERME NETTO ROMAGUERA
LINHA BURRA: Os valores do esporte deixados em posição de impedimento por uma cultura (midiática) ultrapassada.
Monografia apresentada ao curso de Pós graduação em Comunicação Estratégica em Esportes, como requisito parcial para a obtenção do título de especialista, sob a orientação do professor Me. Alexandre Gomes de Almeida.
CAMPINAS 2013
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"(...) A minha TV tá louca, me mandou calar a boca e não tirar a bunda do sofá.
Mas eu sou facinho de marré-de-sí, se a maré subir eu vou me levantar. Não quero saber se a-cabo nem se minha assinatura vai mudar tudo que aprendi.
É triste o fim do seriado, um bocado magoado sem saber o que será de mim. Ela não SAP quem eu sou,
Ela não fala a minha língua. Enquanto pessoas perguntam 'por que', outras pessoas perguntam 'por que não?'
Até porque não acredito no que é dito, no que é visto. Acesso é poder e o poder é a informação. Qualquer palavra satisfaz.
A garota, o rapaz e a paz quem traz, tanto faz. O valor é temporário, o amor imaginário e a festa é um perjúrio.
Um minuto de silêncio é um minuto reservado de murmúrio, de anestesia. O sistema é nervoso e te acalma com a programação do dia, com a narrativa.
A vida ingrata de quem acha que é notícia, de quem acha que é momento. Na tua tela querem ensinar a fazer comida uma nação que não tem ovo na panela,
que não tem gesto. Quem tem medo assimila toda forma de expressão como protesto!
Num passado remoto perdi meu controle... Era vida em preto e branco, quase nunca colorida reprisando coisas que não fiz,
finalmente se acabando feito longa, feito curta que termina com final feliz.. Eu não sei se pay-per-view ou se quem viu tudo fui eu.
A minha tv tá louca." (O Teatro Mágico - Xanéu nº 5)
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Resumo
O esporte, atualmente, é um dos fenômenos mais populares do mundo! Independentemente das "modalidades escolhidas", do tipo de prática ou mesmo da visão comercial, mercadológica e torcedora, ele está presente em todos os locais. Muitas vezes não nos damos conta de como isso é apresentado para a população, principalmente a parcela que tem menos acesso às informações. A mídia hoje apresenta apenas o que é de seu próprio interesse e pode trazer resultados para sua corporação. A seleção de notícias e eventos a serem apresentados e a forma como eles são mostrados, é totalmente estruturada e projetada para que possa transmitir exatamente a conotação que se deseja. Esse fenômeno, chamado Agenda Setting, faz com que muitas vezes o público não tenha acesso real às informações, ou seja, fique desprovido dos demais pontos de vista ou mesmo tenha sido privado de determinados conhecimentos por eles não serem do interesse do veículo de informação. Mas, no esporte também é assim? Sim! O esporte possui diversas manifestações e objetivos, porém o Alto Rendimento é a manifestação mais presente e mais imposta pela mídia, fazendo com que ela seja considerada a mais popular, "correta" e praticada de todas, quando na verdade deveria ser apenas o "produto final" de pequena parte de seus praticantes. Toda a base esportiva deveria ser formada pelo Esporte-educação e pelo Esporte-participação. Em ambas as manifestações, a parte inclusiva, socializante, participativa e, fundamentalmente, COOPERATIVA está fortemente presente. No Alto Rendimento essas características são colocadas em segundo plano em favorecimento à competição exacerbada e ao culto da vitória. Em um período com as maiores competições esportivas mundiais sendo sediadas no Brasil, será que é possível um outro enfoque parra tornar o esporte mais democrático? A mudança é difícil e de cunho cultural, o que a torna mais difícil ainda, porém há meios e alternativas para tornar possível uma valorização esportiva correta e benéfica à todos. Palavras-chave: Esporte, mídia, agenda-setting, manifestações esportivas.
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SUMÁRIO RESUMO iv
INTRODUÇÃO 06
DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA 10
OBJETIVOS 10
METODOLOGIA 12
CAP.01 ESPORTE = JOGO (?!) 13
1.1 Diferenciações e manifestações 13
CAP.02 INFORMAÇÃO E/É PODER 23
2.1 O "Quarto poder" 24
2.2 Algumas Teorias da Comunicação 26
2.3 A teoria da Agenda (Agenda Setting) 29
2.4 A Espiral do Silêncio 33
CAP.03 A SAÚDE EM JOGO 38
3.1 Conceitos 39
3.2 Estilo de vida e condição de vida 43
3.3 Benefícios da atividade física como promoção da saúde 46
CAP.04 DE VIRADA É MAIS GOSTOSO 50
4.1 Jogos competitivos (x) jogos cooperativos 51
4.2 Jogando os paradigmas para escanteio 57
CAP.05 APITO "FINAL" 62
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 66
ANEXOS 72
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Introdução
Atualmente, o esporte é tratado com um foco principal e exagerado em
apenas uma de suas manifestações: o Alto Rendimento. Em grande parte, isso
acontece por influência da mídia, que em seu Agenda Setting1 contempla
somente (ou quase isso) essa manifestação. Em seu conteúdo observamos
entrevistas de jogadores e demais personagens dessa manifestação, onde
estes apresentam uma visão Maquiavélica do esporte, onde "os fins justificam
os meios", ou seja, o que vale é a vitória...e ponto!
Diante disso, e alavancado pelos grandes eventos esportivos que
acontecerão no Brasil num futuro próximo, o esporte precisa ser reconhecido
como o que realmente é: um fenômeno cultural carregado de diversos valores
e contribuições para uma vida mais harmoniosa onde todos podem "venSER2".
Estamos vivendo uma época em que os valores estão muito perdidos e
aflorados ao mesmo tempo. Uma época marcada pelos avanços e pela
acentuada revolução tecnológica. Uma época que os relacionamentos
humanos estão perdendo espaço para o relacionamento virtual. Uma época
que, apesar de moderna, mantém os mesmos padrões darwinianos de que os
mais fortes sobrevivem. Uma época em que competir é mais importante e
gratificante do que cooperar. Uma época que nos espantamos e nos
emocionamos com atitudes honrosas, onde na verdade isso deveria ser um
hábito.
1 Agenda Setting é um termo jornalístico usado para definir o que é notícia e qual relevância ela tem. Se deve ou não ser apresentada ao público e como deve ser apresentada. Por isso, representa um instrumento de poderosíssima persuasão e manipulação populacional. Será tratado mais a fundo no segundo capítulo. 2 Termo criado por BROTTO (2001).
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Será que é possível mudar isso? Mudança leva tempo, ainda mais
quando é de cunho cultural. Mas temos um instrumento importantíssimo em
mãos: o esporte, suas manifestações e seus eventos cada vez mais
gigantescos, modernos, lucrativos, populosos e vistosos no mundo todo.
Contudo, há controvérsias...será que todo mundo sabe o que é o
ESPORTE e tudo o que nele se insere?
Como podemos deixar isso ao alcance de todos? Como apresentar uma
face até então oculta de uma das coisas que o senso comum mais acredita que
conhece? Este é o desafio proposto no estudo para que possamos usufruir do
que ele tem de melhor. Mas vale ressaltar que: O ESPORTE É O QUE
FAZEMOS DELE...
E justifico com a citação de PIERRE PARLEBÁS (1997):
"o desporto não possui nenhuma virtude mágica. Ele não é em si mesmo nem socializante nem anti-socializante. Ele é aquilo que se fizer dele. A prática do judô ou do rúgbi pode formar tanto patifes como homens perfeitos, preocupados com o fair-play."
O esporte é sim uma das manifestações mais poderosas que temos
culturalmente. Um dos fenômenos sociais com maior alcance. Extremamente
globalizado. Pode ser considerado como meio de vida. Como lazer. Como
educação. É um espetáculo! (TUBINO, 1992; 2001) Porém, precisamos deixar
de lado o senso comum e o comodismo de achar que ele fará tudo por si só.
Se for bem utilizado, o esporte é uma poderosíssima ferramenta para
complementar a educação, para nos ensinar virtudes, seja fazendo, refletindo
ou sentindo. E, como uma representação cotidiana, nos ensina coisas para
serem usadas na nossa vida: autoconhecimento, altruísmo, lealdade,
companheirismo, cooperação, fair play, superação, respeito à diversidade,
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disciplina, busca por objetivos, tolerância à frustração, entre muitos outros
comportamentos benéficos.
Ainda, os mediadores (professores, técnicos ou qualquer outra
nomenclatura usada) são importantíssimos no quesito "responsabilidade" sobre
os aprendizados e exemplos. As ações e atitudes presentes nesse processo
são cada vez mais relevantes na formação do caráter e dos valores das
pessoas inseridas em sua prática.
Contudo, Rodrigo Falcão nos alerta que:
"Qualquer forma de conhecimento não passa por osmose. Portanto, para desenvolver competências para a vida utilizando o esporte é necessário estrutura de trabalho, avaliação sistemática dos processos, verificação de impactos das ações nos sujeitos, flexibilidade metodológica e objetivos em longo prazo. O esporte é um elemento de nossa cultura que pode servir para compreender melhor o ser humano em diferentes áreas do conhecimento. Por isso ele é tão diverso, paradoxal e fascinante."
E é justamente nessa linha de raciocínio que o presente estudo almeja
introduzir na mídia as representações do esporte que são deixadas em
segundo plano em detrimento do Alto Rendimento. Não obstante, pretendemos
mostrar como utilizá-las, como torná-las parte integrante do Agenda Setting
midiático, trabalhando os valores presentes no esporte por quem faz dele algo
benéfico pensando no bem-estar individual e coletivo, e não apenas em ser
melhor do que o outro. Desejamos quebrar o paradigma que diz que para um
vencer, muitos outros devem perder.
Como exemplo vivo dos valores que o esporte pode nos ensinar, cito o
maratonista Vanderlei Cordeiro de Lima e a seguinte situação: no berço do
esporte, em Atenas (2004), na prova mais tradicional do esporte Olímpico
(prova que deu início aos primeiros Jogos). Liderava a maratona com boa
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vantagem para o 2º colocado e foi atrapalhado por um irlandês que o usou para
protestar. Perdeu rendimento, o psicológico e a concentração não eram mais
os mesmos...foi ultrapassado por 2 competidores. Ao entrar no Estádio
Olímpico de Atenas para completar a prova, mesmo diante das adversidades
encontradas e do gostinho da medalha de ouro ter sido tirada, completou a
volta fazendo aviãozinho e erguendo as mãos aos céus. Como "retribuição" foi
ovacionado pelos espectadores. Não reclamou, não apelou, não xingou e nem
reivindicou a medalha de ouro...apenas comemorou....
O ESPORTE É O QUE FAZEMOS DELE...
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Delimitação do problema
O esquartejamento do fenômeno esporte, os problemas causados pelo
senso comum e a quantidade de benefícios dos quais somos privados por
estarmos presos a uma cultura midiática-esportiva ultrapassada e burra.
Objetivos
Geral
Aproveitar a grande epidemia esportiva que será sediada no Brasil com
eventos de grande porte do ano de 2013 até o final de 2016 e apresentar o
esporte como deve ser apresentado: uma manifestação popular, inclusiva,
saudável, recheada de valores fundamentais para o "COM-viver" e que traz
inúmeros benefícios ao indivíduo enquanto ser bio-psico-social.
Específicos
Apresentar o esporte como via de Promoção à Saúde e possibilitar a
criação de hábitos mais saudáveis;
?
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Identificar o esporte como uma representação da vida cotidiana para
conscientização de sua importância no desenvolvimento da criticidade e
autonomia em cada pessoa inserida no processo;
Enfatizar o esporte não apenas como Alto Rendimento, mas todas as
questões de valores presentes no mesmo, como: cooperação, atitude,
respeito, disciplina, força de vontade, conquistas, perdas, tomadas de
decisões etc.;
Apresentar soluções possíveis para se inserir o esporte na mídia
valorizando seus valores e as pessoas que fazem dele um meio para
atingir um bem-comum. Para um ganhar, nem sempre os outros
precisam perder;
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Metodologia
Será feito um estudo bibliográfico visando analisar as Teorias da
Comunicação, como, quando e onde elas se manifestam e a influência que
possuem no modo de pensar da população, a formação de suas opiniões e,
conseqüentemente, suas ações nos meios sociais que possam nos trazer
resultados a curto, médio e longo prazo.
Também será analisada a bibliografia esportiva e da Educação Física
para nortearmos as ações que podem e devem ser utilizadas aproveitando-se
dos diversos elementos físico-esportivos, ligados a um bem-estar social,
inclusivo, participativo, cooperativo e democrático. Tornar o esporte um meio
para educar e beneficiar a população que faz uso dele e, ainda, observar
situações em que ele pode se transformar ainda mais democrático, se fará
presente nas avaliações bibliográficas.
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Esporte = Jogo (?!)
Antes de mais nada precisamos de definições! Para que todos possam
entender o contexto do trabalho, é necessário que seja falada a mesma língua.
Portanto, as definições aqui presentes são as que nortearão o estudo.
Para definir precisamente uma palavra muito comum como esporte,
muitas de suas conotações precisam ser eliminadas e seus significados devem
ser limitados de maneira que possam restringir seu uso.
Segundo PINTO (2007), o esporte na atualidade constitui-se em um
fenômeno multidimensional essencialmente humano, resultado de um processo
histórico e cultural complexo e conflitante, tendo como princípios constitutivos a
educação, o lazer e o desempenho, manifestando-se em diferentes ambientes
com características variadas, e tendo no jogo sua origem e principal
característica.
1.1 Diferenciações e manifestações No Brasil, há 15 anos temos uma lei responsável por instituir normas e
dar outras providências relacionadas ao esporte. Tal lei, de nº 9.615 de 24 de
março de 1998, é popularmente conhecida como Lei Pelé. Em seu Capítulo II,
já trata dos princípios fundamentais do esporte enquanto direito individual do
cidadão. Esses princípios são nomeados como: da soberania; da autonomia;
da democratização; da liberdade; do direito social; da diferenciação; da
identidade nacional; da educação; da qualidade; da descentralização; da
segurança; e da eficiência. Todos esses princípios norteadores do desporto
1
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nacional são caracterizados tendo como base as diferenciações das
manifestações desportivas existentes.
Logo no capítulo seguinte, a referida Lei já reconhece o desporto de 3
maneiras distintas. A primeira delas trata o desporto educacional, e caracteriza-
o:
"praticado nos sistemas de ensino e em formas assistemáticas de educação, evitando-se a seletividade, a hipercompetitividade de seus praticantes, com a finalidade de alcançar o desenvolvimento integral do indivíduo e a sua formação para o exercício da cidadania e a prática do lazer".
Aliado a isso, segundo TUBINO (1992; 2001), também podemos ver o
esporte classificado em 3 manifestações. Sobre o esporte-educação ele afirma:
Esporte-educação; Focalizado na escola, tem por finalidade democratizar e
gerar cultura pelo movimento de expressão do indivíduo em ação como
manifestação social e de exercício crítico da cidadania, evitando a exclusão e a
competitividade exacerbada. Deve-se levar aos alunos a possibilidade de
refletir criticamente sobre aspectos negativos (como utilização de drogas para
melhorar o rendimento), assim como aspectos positivos (caracterizados pela
geração de novos empregos, desenvolvimento de pesquisas científicas em
diversas áreas etc).
Ainda, dentro deste modelo, o mesmo TUBINO (2006) o sub-divide em
esporte educacional e esporte escolar. O esporte educacional é aquele
baseado em princípios educacionais, como participação, cooperação,
coeducação, cor-responsabilidade e inclusão. Já o esporte escolar, "é aquele
que permite uma aproximação com o esporte de desempenho, ao compreender
as competições entre escolares”.
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Assim, podemos ver que o esporte é pedagógico e, por conseguinte,
educativo, tendo em vista a sua possibilidade de proporcionar obstáculos e
desafios, fazendo com que o aluno experimente as regras e aprenda a lidar
com o próximo e, porque não dizer, o esporte torna-se educativo quando a sua
prática não for uma obrigação, mas um prazer para o aluno.
Sob esta perspectiva do esporte-educação, Chaves (2006) classifica a
Educação Física como:
“uma área de conhecimento da cultura corporal de movimentos que integra o aluno nessa perspectiva, formando o cidadão que irá produzi-la, reproduzi-la e transformá-la, instrumentalizando-o para usufruir dos jogos, dos esportes, das danças, das lutas e das ginásticas em benefício do exercício crítico da cidadania, pautada em valores éticos e morais”.
Assim, devemos ter em mente que, quando uma prática pedagógica
estiver promovendo o desenvolvimento esportivo o qual contemple a
generosidade e o respeito às regras e aos adversários, a noção de consciência
sobre a prática esportiva e sua ideologia, aí o esporte irá se mostrar educativo.
Por outro lado, "uma prática excludente e seletiva, que impede crianças,
adolescentes e jovens de serem livres e de desenvolverem sua autonomia e
criticidade, contradiz os atributos educativos." (MINISTÉRIO DO ESPORTE,
2004, p. 11).
Diante dos fatos, o professor - tendo consciência da ferramenta valiosa
que possui em suas mãos (esporte) -, deve aprofundar o desenvolvimento de
atitudes afetivas e coletivas, fazendo com que seus alunos reconheçam e
respeitem sem discriminação, as características pessoais, físicas, sexuais e
sociais do próximo. Em outros termos, o profissional deve adotar uma prática
educativa que negue as desigualdades que acabam inviabilizando seu trabalho
com os alunos.
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Voltando à "Lei Pelé", o desporto de participação é a segunda forma de
manifestação, descrita como sendo:
"de modo voluntário, compreendendo as modalidades desportivas praticadas com a finalidade de contribuir para a integração dos praticantes na plenitude da vida social, na promoção da saúde e educação e na preservação do meio ambiente".
De acordo com TUBINO (1992; 2001), essa segunda manifestação se
define da seguinte maneira:
Esporte-participação (ou popular): Referenciadas pelo princípio do prazer
lúdico, as atividades ocorrem em espaços não comprometidos com o tempo e
livres de obrigações da vida cotidiana, apresentam como propósitos a
descontração, a diversão, o desenvolvimento pessoal e a interação social.
Em suma, essa manifestação é caracterizada simplesmente pela prática
de atividades esportivas de modo voluntário e prazeroso por seus praticantes.
Sem determinação ou obrigação de resultados, tal prática é tida como a mais
democrática e inclusiva de todas, proporcionando objetivos individuais e prática
livre independentemente do sujeito.
Por fim, o desporto de rendimento é caracterizado e "sub-caracterizado"
pela Lei Pelé da seguinte maneira:
"praticado segundo normas gerais desta Lei e regras de prática desportiva, nacionais e internacionais, com a finalidade de obter resultados e integrar pessoas e comunidades do País e estas com as de outras nações. Parágrafo único. O desporto de rendimento pode ser organizado e praticado: I — de modo profissional, caracterizado pela remuneração pactuada em contrato formal de trabalho entre o atleta e a entidade de prática desportiva; II — de modo não-profissional, compreendendo o desporto: a) semiprofissional, expresso em contrato próprio e específico de estágio, com atletas entre quatorze e dezoito anos de idade e pela existência de incentivos materiais que não caracterizem remuneração derivada de contrato de trabalho; b) amador, identificado pela liberdade de prática e pela inexistência de qualquer forma de remuneração ou de incentivos materiais para atletas de qualquer idade."
17
Ainda, de acordo com TUBINO (1992; 2001), podemos entendê-lo
assim:
Esporte-performance: Traz consigo os propósitos de novos êxitos e a vitória
sobre os adversários. Ligados às entidades organizacionais (Ligas,
Federações, Confederações, Comitês Olímpicos) que organizam as
competições dentro de sua área e têm a função de zelar pelo cumprimento das
regras e dos códigos de ética. É exercido sobre regras universalmente
preestabelecidas, e apresenta uma tendência a ser praticado pelos talentos
esportivos, o que marca seu caráter antidemocrático. Há também seus
aspectos positivos, como uma atividade cultural que proporciona intercâmbio
internacional; surgimento de várias profissões especializadas aos esportes;
turismo etc; (TUBINO, 2001 apud DARIDO & RANGEL, 2005).
Tal manifestação e caracterização esportiva sabemos que é a mais
difundida e, talvez, a mais conhecida e discutida de todas. Independentemente
de ser discutida de forma científica ou popular, isto serve para nos mostrar a
enorme parcela da população que é atingida por essa manifestação.
Neste caso, temos que nos preocupar apenas com o real entendimento
do conceito. Uma divulgação distorcida, incompleta ou manipulada dessas
manifestações pode gerar um falso entendimento aliado à formações de
opiniões defasadas e erradas.
Todas elas são definições simples, todavia extremamente perspicazes.
Mas o que não conseguimos enxergar é que parece que elas nada adiantaram,
pois na realidade o que acaba servindo de modelo para todas as classificações
é o esporte-performance (Alto Rendimento). Como exemplo disso, podemos
ver que um ambiente de lazer acaba servindo como aparato para a busca de
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novos talentos, seja no clube, em praças ou mesmo em alguém que vê
potencial em um garoto jogando bola na rua.
Sabendo agora as definições do esporte, veremos algumas
diferenciações muito relevantes em relação ao Jogo. Porém, o que não
podemos descartar de forma alguma é a sua presença na escola, pois o
esporte é um patrimônio cultural da humanidade, como foi afirmado por TANI
(1998). A riqueza do esporte com sua diversidade de significados e
manifestações é extremamente útil ao ambiente escolar para que se possa
educar os alunos.
Muitas vezes o jogo é tido como sinônimo de esporte e, na verdade, o
jogo é um elemento do esporte. Segundo ROGER CAILLOIS (1990), o jogo é
uma atividade:
1. Livre – uma vez que, se o praticante for a ela obrigado, o jogo perderia
de imediato a sua natureza de diversão atraente e alegre;
2. Delimitada – circunscrita a limites de espaço e de tempo, rigorosa e
previamente estabelecidos;
3. Incerta – sem um desenrolar determinado e/ou resultado obtido
previamente;
4. Improdutiva – pois não gera bens, nem riquezas nem elementos novos
de espécie alguma. Além de conduzir a uma situação idêntica à do início
da partida;
5. Regulamentada – regras que podem ser combinadas previamente com o
consenso dos participantes e que será seguida à risca;
6. Fictícia – um momento de se “desligar” da realidade, onde o mundo em
que se está inserido é outro;
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Ainda podemos destacar algumas outras peculiaridades dos jogos que
são importantíssimas nas suas manifestações. O próprio fato de ser um espaço
de manifestação pessoal e de recriação do mundo, assim como o jogo
simbólico sendo um instrumento de manifestação do lúdico através da
subjetividade, coloca o indivíduo em constante desenvolvimento de sua
personalidade. O jogo ainda é capaz de ensinar a criar, a imaginar, a
reconhecer o outro e a enfrentar o novo, o diferente, o inusitado.
Ainda, HUIZINGA (1998), define o jogo como:
"uma atividade voluntária exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e alegria e de uma consciência de ser diferente de vida cotidiana"
Com o jogo sendo uma prática tão única e própria de acordo com cada
indivíduo, FREIRE (2002) ainda compara-o a um caleidoscópio, sendo
impossível reproduzi-lo de forma idêntica por mais de uma vez. O que confirma
a afirmação de CAILLOIS como o jogo sendo Incerto.
Após as caracterizações, feitas baseadas em diversos autores e
buscando apresentar da melhor forma possível esses fenômenos que o senso
comum julga serem tão conhecidos, faz-se necessária algumas ponderações.
TUBINO (2006) constata a influência exercida pelo esporte de
rendimento sobre o esporte escolar e alerta: “o esporte-educação não deve ser
compreendido como uma extensão do esporte de desempenho para a escola”.
O esporte como meio de ensino pode ser caracterizado como esporte da
escola justamente por apresentar tais diferenças. O esporte na escola
caracteriza-se pela simples mudança de ambiente em que o esporte de Alto
Rendimento apenas é transferido do ambiente dos clubes e associações
20
esportivas para dentro do contexto escolar, mantendo formas de trabalho,
métodos de ensino e, muitas vezes, falta de pedagogia, representada por um
trabalho mecânico e tecnicista que é feito somente por repetições de gestos
para aprimorar a técnica dos atletas (e não alunos).
Para transformá-lo em esporte da escola, temos que nos atentar não só
à mudança de ambiente, mas também a algumas ações necessárias para o
seu bom desenvolvimento de acordo com a política pedagógica da instituição e
de preceitos básicos para não cair numa armadilha e formar cidadãos
esportivamente descaracterizados e deseducados. A busca real é por formar
cidadãos críticos e autônomos, compromissados com a sociedade e seu pleno
desenvolvimento.
Sendo assim, BROTTO (2001) cita PAES (1998), quando afirma que
“quando se pensa no esporte como meio de educação, é preciso ter convicção
de que o importante não é o jogo, mas sim quem joga”.
O esporte da escola não deve ser comparado ao esporte presente em
clubes ou instituições que visam somente resultados competitivos. É verdade
que uma das manifestações do esporte nos remete a uma comparação com a
vida cotidiana onde há sempre um “perde-ganha”, tomada de decisões rápidas
diante de imprevistos, resolução de conflitos e etc. Porém, é muito natural
deixar que o aluno compreenda e saiba lidar com todas as possibilidades de
resultado possíveis, não deixando que fique ligado somente à competição e à
vitória. A competição também pode ser benéfica, mas seu culto exacerbado é
extremamente prejudicial, principalmente em uma fase em que a criança está
se desenvolvendo do ponto de vista biológico, psicológico e social, e essa
pressão pode prejudicar em vários aspectos.
21
Complementando, Sadi et al (2004) apud PINTO (2009), aponta dois
princípios norteadores do esporte de rendimento que podem se manifestar no
esporte educacional, mas devem ser combatidos pois "são expressões
máximas e esdrúxulas que se deseja negar numa sociedade efetivamente
fraterna e democrática". Trata-se do individualismo e da hipercompetitividade.
A hipercompetitividade não deve ser confundida com competição, já que esta
última pode ser pedagogicamente utilizada com finalidades educacionais. O
individualismo, por sua vez, deve ser substituído por manifestações coletivas e
cooperativas. A competição e a cooperação devem ser incentivadas e
promovidas na escola, de forma educacional, permitindo maior aproximação do
fenômeno esportivo com a educação.
Indo ainda mais a fundo em suas manifestações, influências e
caracterizações, ELENOR KUNZ (2006) aponta os meios de comunicação
como principais difusores do chamado esporte-performance:
"O conceito de esporte que se vincula hoje à Educação Física é um conceito restrito, pois refere apenas ao esporte que tem como conteúdo o treino, a competição, o atleta e o rendimento esportivo, este, aliás, é o conceito ‘estrito’ do esporte que aqui considero. Esse conceito fica reforçado através, especialmente, dos meios de comunicação, que colocam sempre o ‘esporte-espetáculo’ no centro de suas programações esportivas, o que acelera, também, o processo de transformação do esporte-espetáculo em mercadoria."
A indústria capitalista e os meios de comunicação em massa - que
elegeram o esporte performance como seus carros-chefes - não entendem que
não há a necessidade de "bitolar" o cidadão apresentando-os apenas à uma
manifestação esportiva. Principalmente no âmbito escolar, tal atitude deveria
ser completamente modificada. Ampliar o conceito de esporte no cotidiano
escolar não significa extinguir definitivamente o esporte de rendimento da
escola, pois seria o mesmo que negar a própria realidade, já que este existe e
22
é conhecido pelos alunos. Ao contrário, Elenor Kunz propõe que esse esporte
seja problematizado, para que temas como a mercantilização do próprio
esporte e de seus atletas, o uso de doping, o treinamento especializado
precoce, a discriminação da mulher no esporte, a violência nas disputas
esportivas e diversas outras mazelas do esporte em sua dimensão do
rendimento passem a ser um campo fértil para a ocorrência de aprendizagens
significativas, de forma a levar os alunos a um esclarecimento que os liberte da
“coerção auto-imposta3” que vivenciam.
Finalizando, PINTO (2009) afirma:
"é fato que as três dimensões do esporte (e quantas mais existirem) entrelaçam-se de tal forma que separá-las torna-se muitas vezes tarefa impossível. No entanto, a excessiva influência de uma sobre a outra pode, em outras situações, confundir as finalidades do esporte em seus respectivos contextos, como é o caso do esporte em sua dimensão do rendimento, que tem alterado o transcurso do esporte (...)"
Enfim, nessa sucessiva inversão de valores no contexto performance-
escola, o que realmente seria de extrema valia seria se a inversão fosse
contrária, ou seja, se o esporte escolar (com finalidades realmente
educacionais) pudesse contribuir para uma maior humanização do esporte em
sua dimensão de rendimento. Os valores presentes em tal manifestação são
muito maiores e muito mais benéficos do que a cultura estabelcida no esporte-
performance, seus praticates e interessados diretos e indiretos.
3 Ainda segundo Kunz (2006), a maioria dos alunos não vivencia o esporte de rendimento em sua plenitude, devido a suas elevadas exigências técnicas; no entanto, ainda o consideram como melhor para eles.
23
Comunicação E/É poder A formação de nosso caráter muito tem a ver com nossas questões
culturais e o que recebemos de informações culturais durante nossa vida.
Sabendo-se que não é possível uma dicotomia entre os diversos fatores que
formam nossa personalidade, tudo o que é adquirido culturalmente estará
presente em nossa formação, seja através da cultura cognitiva, afetiva,
corporal, verbal, da natureza, entre outras.
REINACH (2007) explica a educação do ponto de vista biológico e
separa os seres vivos em 3 grupos, brevemente explicados a seguir:
Grupo 01 - Contém as formas mais simples de vida, onde toda a informação
necessária para sua sobrevivência encontra-se codificada em seu DNA.
"Bactérias não precisam aprender, elas já nascem com toda a informação de
que necessitam e transmitem essa informação a seus descendentes".
Grupo 02 - Caracterizado essencialmente pelos vertebrados. Também
nascem com grande parte da informação que necessitam em seu DNA, porém
nesse DNA está programada a formação de um cérebro sofisticado capaz de
captar e estocar informações. Podem aprender uma quantidade enorme de
fatos, comportamentos e informações que se tornam indispensáveis para sua
sobrevivência. "Entretanto, toda a informação é extinta com a morte do animal,
pois a espécie não tem métodos de armazenamento ou transmissão dessas
informações para seus descendentes".
Grupo 03 - Grupo denominado de "Animais culturais" e que compreende o
Homem. Além das informações genéticas e do cérebro sofisticado capaz de
2
24
captar e estocar informações, a grande e importantíssima diferença é que
somos capazes de transmitir essas informações a outros membros de nossa
espécie...é o que chamamos de cultura! Cada ser humano não tem de
readquirir toda a informação através da experiência direta, pode recorrer ao
enorme depósito de informação que nossa espécie acumulou ao longo dos
anos. "O homem biológico de hoje é idêntico a um homem pré-histórico, é a
educação que faz cada um de nós progredir em 20 anos o equivalente aos 20
mil anos de cultura da humanidade".
Assim, estamos cada vez mais suscetíveis ao que recebemos e
captamos de informações do meio, além do que sofremos de influência das
nossas comunicações, sejam elas diretas, segmentadas ou de massa.
2.1 O "Quarto Poder" Já faz um bom tempo que a mídia é conhecida e aceita como o "Quarto
poder4". Mas, por que será que, popularmente, foi dado esse nome aos
veículos informativos? O "Quarto poder" é uma expressão criada para
qualificar, de modo livre, o poder das mídias ou do jornalismo em alusão aos
outros três poderes "modernos5" típicos do Estado democrático
(Legislativo, Executivo e Judiciário). Esta expressão refere-se ao poder
dos veículos de comunicação quanto à sua capacidade de manipular a opinião
pública a ponto de ditar regras de comportamento, influenciar as escolhas dos
indivíduos e, por fim, da própria sociedade.
4 Termo criado pelo deputado inglês McCaulay em 1828. É traduzido do termo em inglês Fourth Estate (ao pé da letra: quarto estado) (TRAQUINA, 2012) 5 Incialmente, quando da criação do termo, tinha como referência os três états (estados) da Revolução Francesa: o clero, a nobreza e o troisième état - que engloba os burgueses e o povo. (adaptado de TRAQUINA, 2012).
25
Podemos citar como exemplo, o filme do diretor Barry Levinson que, no
Brasil é chamado de "Mera Coincidência". Lançado em 1997, o longa mostra
como uma Assessoria de Imprensa pode influenciar e manipular a opinião
pública, e coloca como ponto central do filme a famosa pergunta e resposta:
"Por que o cachorro balança o rabo? - Porque ele é mais esperto...se o rabo
fosse mais esperto, balançaria o cachorro". Cabe dizer que o título original do
filme, em inglês é "Wag the dog" (algo como: balance o cachorro), o que
comprova a intenção de mostrar os meios de manipulação aos quais a
população é submetida pela grande mídia, o quarto poder.
Além disso, o Quarto Poder, recebeu esse nome pelo fato de a
informação e o conhecimento serem os maiores bens a serem adquiridos por
um cidadão. É através desse conhecimento (conseguido através da
informação) que ele poderá exercer seu papel crítico e atuar de forma
autônoma em questões relevantes, de seu interesse e fundamentais para sua
formação como um ser bio-psico-social.
TRAQUINA (2012) esclarece alguns pontos sobre isso:
"Segundo Bentham, a opinião pública era uma parte integrante da teoria democrática do Estado. A opinião pública era importante como instrumento de controle social. Numa opinião pública esclarecida, podíamos encontrar um tribunal que reunia 'toda a sabedoria e toda a justiça da nação'.Mas como é que esta opinião pública ia ser alimentada com os ingredientes necessários para que pudesse tomar as suas decisões? Como podia esta opinião pública exprimir-se? Para Jeremy Bentham, a resposta era simples: a imprensa. Segundo o historiador George Boyce, a imprensa atuaria como um elo indispensável entre a opinião pública e as instituições governantes (BOYCE, 1978). Os jornais eram vistos como um meio de exprimir as queixas e injustiças individuais e como uma forma de assegurar a proteção contra a tirania insensível. Portanto, a legitimidade jornalística está na teoria democrática e, segundo os seus teóricos, assenta claramente numa postura de desconfiança (em relação ao poder) e numa cultura claramente adversarial entre jornalismo e poder."
26
Ainda, TRAQUINA (2012) continua e cita MILL (1821), mostrando a
lucidez que existia desde aquela época ao dizer:
"É tão verdadeiro que o descontentamento do povo é o único meio de remover os defeitos dos governos viviosos, que a liberdade de imprensa, o instrumento principal para criar descontentamento, é, em todos os países civilizados visto por todos - exceto os adeptos do mau governo - como uma segurança indispensável e a maior salvaguarda dos interesses da humanidade."
2.2 Algumas Teorias da Comunicação Com o objetivo de dar base para que os leitores desse trabalho
entendam-o de forma global e completa para que formem sua opinião a
respeito do assunto, apresentaremos, resumidamente, alguns conceitos
básicos que ajudarão a definir o que é Comunicação e como ela é produzida.
A produção de notícias, chamada de Newsmaking no âmbito jornalístico,
sofre diversas influências desde seu processo de acontecimento, "criação" e
publicação.
AGUIAR e PROCHNIK definem o Newsmaking:
“A produção de notícias não é determinada pela vontade pessoal do jornalista, nem somente pela determinação da empresa onde ele trabalha, mas sim por uma intensa negociação entre todos os envolvidos no processo. O cotidiano da produção é pautado, principalmente, pelo tempo e espaços escassos e colabora para uma distorção inconsciente por parte do profissional.”
Tais distorções, inconscientes ou não, podem acontecer por ação
pessoal, social, ideológica, cultural, do meio físico e tecnológico, histórica. Há
também o quesito de seleção de notícias de acordo com o seu valor, os
chamados valores-notícia. WOLF (2009) cita GOLDING-ELLIOTT (1979) para
esclarecer os valores notícia, onde diz que:
"Os valores/notícia são a qualidade dos eventos ou da sua construção jornalística, cuja ausência ou presença relativa os
27
indica para a inclusão num produto informativo. Quanto mais um acontecimento exibe essas qualidades, maiores são suas chances de ser incluídos."
Ainda, são divididos em duas "categorias", os valores notícias
substantivos (que têm a ver com os acontecimentos) e os valores notícias
contextuais (que tem a ver com o contexto do dia-a-dia em que ocorre).
Classificando-os de forma bem sucinta, podemos entendê-los como:
VALORES NOTÍCIAS SUBSTANTIVOS
Conflitos e controvérsias – A presença da violência fornece mais valor-
notícia.
Inesperado – Acontecimentos que surpreendem a expectativa. São os mega-
acontecimentos.
Notabilidade – Acontecimentos visíveis ou tangíveis têm mais valor-notícia. A
cobertura jornalística está mais voltada para acontecimentos do que para
problemáticas.
Notoriedade - Quanto maior for a celebridade ou importância hierárquica dos
indivíduos envolvidos no acontecimento, maior valor notícia terá.
Novidade – Acontecimentos mais novos têm maior valor-notícia.
Proximidade - Quanto mais próximo ao receptor, maior o valor-notícia. A
proximidade pode ser geográfica ou cultural e, sofre interferências de acordo
com fatores econômicos, políticos ou culturais.
Relevância - Tem a ver com a capacidade do acontecimento ter impacto sobre
as pessoas ou o país.
Ritmo – A tirania do tempo leva à escolha de assuntos.
Tempo – Pode aparecer de duas maneiras:
28
atualidade – Uso de ganchos para falar sobre determinado
acontecimento.
efeméride – Aniversários, datas comemorativas.
CONTEXTUAIS
Concorrência – A busca pelo "furo". Os jornalistas andam juntos, com o medo
de permitir um furo para a concorrência
Dia noticioso – Há dias ricos e pobres de acontecimentos com valor-notícia.
Assim, em algumas épocas do ano, assuntos com baixo valor-notícia têm mais
noticiabilidade, como nas férias, Carnaval, Natal etc.
Disponibilidade – Facilidade para fazer a cobertura do acontecimento.
Equilíbrio – O valor-notícia tem relação com a quantidade de notícias sobre
esse assunto que já existem ou que foram publicadas há pouco tempo.
Visualidade – Para a TV este é um valor-notícia fundamental, mas também
ocorre em outros meios. Elementos visuais associados à informação dão maior
valor-notícia.
Em relação ao trabalho do jornalista e sua importância para o conteúdo
e contexto das notícias, podemos destacar alguns fatores:
Amplificação – Quanto mais amplificado o acontecimento, mais possibilidade
de notar a notícia.
Consonância – Insere novidades num contexto ou numa história já conhecida
para facilitar a compreensão pelo público.
Dramatização – Reforça o lado dramático dos acontecimentos.
Personalização – Valoriza as pessoas envolvidas no acontecimento e o lado
emocional como forma de agarrar o leitor.
Relevância – Demonstrar a importância do fato para o público.
29
Simplificação – Quanto menos ambíguo, maior noticiabilidade. O dever de
escrever de forma mais simples.
2.3 A teoria da agenda (Agenda Setting)
Antes de falarmos sobre o Agenda Setting, precisamos dizer que o que
deveria nortear os trabalhos jornalísticos mundiais é o conceito explícito na
Teoria do Espelho. Tal teoria diz que as notícias são como são porque a
realidade assim as determina. Central à teoria é a idéia-chave de que o
jornalista é um comunicador desinteressado, isto é, um agente que não tem
interesses específicos a defender e que o desviam de sua missão de informar,
procurar a verdade, contar o que aconteceu, doa a quem doer (TRAQUINA,
2012).
Entretanto, como já vimos em algumas das Teorias da Comunicação,
principalmente, a do Newsmaking e a dos valores notícias, sabemos que os
fatores culturais e os interesses de determinadas partes populacionais é o que
determina na hora de decidir como, quando, onde e se a notícia deverá ser
publicada.
A Teoria da Agenda descreve o significativo e às vezes controverso
papel da mídia em determinar quais são os assuntos que estão no centro da
atenção pública e da ação.
Para isso, criou-se a hipótese da Agenda Setting. Shaw (1979) apud
Wolf (2009) para definí-la como:
"em conseqüência da ação dos jornais, da televisão e dos outros meios de informação, o público é ciente ou ignora, dá atenção ou descuida, enfatiza ou negligencia elementos específicos dos cenários públicos. As pessoas tendem a incluir ou excluir dos próprios conhecimentos o que a mídia inclui ou
30
exclui do próprio conteúdo. Além disso, o publico tende a conferir ao que ele inclui uma importância que reflete de perto a ênfase atribuída pelos meios de comunicação de massa aos acontecimentos, aos problemas, às pessoas (...) A asserção fundamental da agenda-setting é que a compreensão das pessoas em relação a grande parte da realidade social é modificada pelos meios de comunicação de massa."
A imprensa pode não conseguir, na maior parte do tempo, dizer às
pessoas o que pensar, por outro lado ela se encontra surpreendentemente em
condições de dizer aos próprios leitores sobre quais temas pensar alguma
coisa (COHEN, 1963 apud WOLF, 2009).
Desta forma, a partir do momento que o destinatário da informação
passa a recebê-la de forma incompleta, distorcida e manipulada e passa a não
ter controle sobre a exatidão da realidade social apresentada, ele perde sua
autonomia cognitiva crítica e passa a analisar o conteúdo apenas com a visão
pretendida pelo veículo informativo, criando assim um direcionamento oculto
para que este chegue à conclusão que é de interesse dos autores do
newsmaking.
"Salientando essa crescente dependência cognitiva da mídia, a hipótese da agenda-setting postula um impacto direto - ainda que não imediato - sobre os destinatários, que se configura segundo dois níveis: a) a 'ordem do dia' dos temas, argumentos, problemas, presentes na agenda da mídia; b) a hierarquia de importância e de prioridade com que esses elementos estão dispostos na 'ordem do dia'." (WOLF, 2009).
Os efeitos do agendamento e seu funcionamento foram discutidos por
MCCOMBS (2009) dizendo o seguinte:
"Anos atrás, um seminário em Taipei discutiu esta ampla repetição dos efeitos da mídia originalmente descoberto nos Estados Unidos e chegou à conclusão de que os efeitos do agendamento - a transferência bem-sucedida da saliência da agenda da mídia à agenda do publico - ocorrem em qualquer lugar no qual exista um sistema político relativamente aberto e um sistema midiático razoavelmente aberto. É possível argumentar que não existe um sistema político perfeitamente aberto em qualquer pais do mundo hoje, nenhum sistema onde
31
o principio de um homem, um voto, funcione plenamente para todo adulto na população."
Ainda, como agravante das influências que sofremos em relação às
manipulações das informações e seu espaço conseguido na agenda pública,
há o fato de que existem muitos temas e, conseqüentemente, muitas formas de
abordá-los, o que torna praticamente impossível que todos os temas ocupem o
lugar disponível em veículos noticiosos devido à falta de espaço/tempo deles
para tratar de todos os assuntos. A isso remete-se a importância de se ter os
valores notícia bem definidos. Todavia, sua democratização deveria fazer-se
imprescindível para que não sejamos a autoridade máxima no assunto na hora
de escolher o que o público deve ou não saber.
Mesmo com o surgimento da internet e seus inúmeros sites com ainda
mais infinitas segmentações de assuntos, não é possível que haja espaço para
todos os temas serem abordados. Na verdade, espaço há, o que não há é
tempo disponível do público para que possa se interessar e se aprofundar em
cada assunto proposto e livremente discutido. Aliado a isso, o fator da
credibilidade dos temas tratados e sua veracidade é limitante ao verdadeiro
conhecimento e formação crítica.
IRWIN (2003) cita HUXLEY (1931) em sua obra (Admirável mundo
novo), que entre os temas nela abordados e que remontam grande parte de
suas preocupações ideológicas - como a liberdade individual em detrimento do
autoritarismo do Estado - , ele diz que: "A sobrevivência da democracia
depende da capacidade de grandes maiorias de fazer escolhas de um modo
realista, à luz de uma informação suficiente".
Como "estratégia de defesa" ao dizer que a teoria do agendamento não
é uma forma de manipulação da opinião pública, alguns críticos dizem que
32
tanto a mídia quanto o público apenas respondem aos ambientes que o
envolvem, e comprovam, assim, nossa natureza cultural. Sobre isso,
MCCOMBS (2009) rebate:
"Contudo, nesta discussão sobre o papel dos veículos noticiosos como um elo entre 'o mundo exterior e as imagens em nossas cabeças', Walter Lippmann introduziu a idéia de pseudoambiente, o mundo que existe em nossa mente - uma imagem freqüentemente imperfeita e que está sempre em completa vis-à-vis à realidade. Nosso comportamento é uma resposta a esse pseudoambiente, e não ao ambiente propriamente dito"
Portanto, faz-se extremamente aceitável uma analogia entre a
observação de Lippmann e o Mito da Caverna de Platão. Bem como uma
relação interessante entre esses dois fatores e a idéia da Matrix.6
Mesmo utilizando-se dessa linha de raciocínio, não pretendemos ou
muito menos compactuamos com a idéia de que a notícia é somente fabricada.
Muito pelo contrário, apenas objetivamos apresentar suas diversas faces para
que todos possam ser críticos quanto às suas manifestações e tenham a
capacidade de se tornarem autônomos quanto às escolhas de sua visão de
mundo e suas atitudes visando uma melhor COM-vivência7 na sociedade.
MCCOMBS (2009) conclui:
"Jornalismo é uma atividade empírica baseada em observação verificável, e a falha em observar este aspecto ético profissional tem sido base para escândalos proeminentes no jornalismo (...). Mas quando os eventos e as situações de cada dia são refratados através das lentes profissionais das organizações noticiosas, o resultado freqüentemente é uma imagem do mundo, um pseudoambiente, que está longe de ser isomórfico tendo mais avaliações sistemáticas daquele ambiente (...) O resultado é que os veículos noticiosos apresentam uma visão limitada do ambiente mais amplo, algo como a visão altamente limitada do mundo exterior disponível através de uma estreita fresta das janelas de alguns edifícios contemporâneos. Esta
6 Filme de Lana e Andy Wachowski. Seu tema central se dá mostrando o mundo no qual vivemos como uma Matrix - um sistema de inteligência artificial que manipula a mente das pessoas, criando a ilusão de um mundo real. 7 Termo criado por BROTTO (2001)
33
metáfora é ainda mais eficiente se a vidraça for um pouco opaca e tiver uma superfície irregular."
2.4 A Espiral do Silêncio Uma das teorias do jornalismo que muito tem a ver com a Agenda
Setting é a teoria da Espiral do Silêncio. Proposta a partir das pesquisas da
alemã Elisabeth Noelle-Neumann, defende que a minoria acaba se calando
pelo medo, mas não um medo de ser destruído, e sim um medo do isolamento,
medo de ser repreendido pela massa e, assim, ser banida ou excluída de seu
grupo. A partir daí a pessoa se cala.
Segundo LAGE (1998):
"A idéia central desta teoria situa-se na possibilidade de que os agentes sociais possam ser isolados de seus grupos de convívio caso expressem publicamente opiniões diferentes daquelas que o grupo considere como opiniões dominantes. Isso significa dizer que o isolamento das pessoas, de afastamento do convívio social, acaba sendo a mola mestra que aciona o mecanismo do fenômeno da opinião pública, já que os agentes sociais têm aguda percepção do clima de opinião. E é esta alternância cíclica e progressiva que Noelle-Neumann chamou de Espiral do Silêncio"
Esta Espiral do Silêncio e seu funcionamento são bem explicados na
Figura 1, a seguir. Com isso, podemos verificar sua influência na massa e na
opinião pública8.
8 Opinião pública é definida como sendo uma opinião que se pode exprimir em público sem medo de sanções ou represálias. Não necessariamente representa a opinião da maioria
34
Figura 1 - Teoria da Espiral do Silêncio 01
35
Mais uma imagem que ilustra bem tal teoria é a da Figura 2:
Figura 2 - Teoria da Espiral do Silêncio 02
36
As imagens falam por si só, mas para ser bem claro vamos explicar uma
delas: Na Figura 1, primeiro chega um Rapaz Azul todo feliz e entusiasmado,
que se encontra com pessoas beges (cinzas? marrons?); depois o Rapaz Azul
tem uma idéia e conta para a massa bege. Nos quatro quadros seguintes, os
caras da massa bege ficam vermelhos de raiva, e passam a condenar as idéias
do Rapaz Azul, e eles se unem e insistem que aquilo é uma bobagem, até
deixá-lo chateado a ponto de se calar. A massa bege isola o Rapaz Azul, que
vai ficando cinza, e a distância dele para os demais diminui, até que ele se
torna bege como a cor da massa. Ele se conforma, e se torna parte da massa
bege (HEAVYRICK, 2012).
Em ambos os casos, de acordo com a opinião pública, o idealizador não
deveria mostrar sua "revolução" e seus interesses, mesmo que isso agradasse
e atendesse à maioria. Mas se a maioria poderia ser a favor, como a opinião
pública é contra? Simples, quem manda na opinião pública e no que deve e
merece ser divulgado para que a grande massa tenha conhecimento são os
donos dos meios de comunicação e seus agentes de comunicação...o Quarto
poder!
Portanto, se a opinião, mesmo que seja da maioria, for contrária aos
seus próprios interesses, ela não será divulgada. Pelo contrário, tais veículos
informativos serão utilizados para mostrar o outro lado dessa opinião pública e
definí-lo como o lado certo, mesmo que para isso ele tenha que ser distorcido e
manipulado.
HEAVYRICK (2012) exemplifica esta estratégia:
"Vamos supor que na tirinha lá em cima, o Rapaz Azul esteja chegando na massa bege para dizer que uma das melhores formas de se viver em sociedade, seria limitando a quantidade de dinheiro que uma pessoa pode acumular, assim acabando
37
com os milionários, fazendo-os retornarem este dinheiro para que o Estado possa dividi-lo para as pessoas mais pobres. Agora imagine que a massa bege acha esta idéia absurda, e para que ela não se difunda, começa a massacrar as idéias do Rapaz Azul, para que ele se cale e se conforme com a situação como ela está. Podemos dizer que neste caso, a opinião pública é contra a limitação do acúmulo de riquezas por um indivíduo. Mas na realidade, sabemos que se consultássemos a grande maioria do povo, esta idéia iria adiante - não porque o povo é bonzinho, e sim porque é pobre em sua grande maioria. Mas se a maioria seria a favor, como a opinião pública é contra? Simples: quem são os donos dos meios de comunicação? Ora, os ricos. Se este rico conseguir fazer valer a sua idéia no meio social, através da propaganda, através das novelas que mostram pessoas vivendo felizes em casas luxuosas, através de programas matinais que mostram cozinhas e alimentos chiques, ele consegue fazer com que a maioria do povo engula a sua idéia de que riqueza é essencial para o bem estar... e assim, este ideal burguês se torna opinião pública, quem for contra, é contra o dinheiro, e mais que isso, é contra o bem estar social!"
Agora, com essas caracterizações já bem definidas, é pedido que fiquem
atentos a isso durante os próximos capítulos, para que possamos entender os
porquês de o Brasil não apresentar essa estrutura informativa focada na
"salvaguarda dos interesses da humanidade". Que tais conceitos fiquem vivos
durante o desenvolvimento do trabalho para que possamos analisar as
informações de agora e confrontá-las com as informações que nos são
impostas culturalmente por esse "Quarto poder" deficitário (leia-se interesseiro)
que é uma questão mundial, mas focaremos principalmente no Brasil.
38
A saúde em jogo
Dentro das manifestações e caracterizações esportivas vistas no
primeiro capítulo deste trabalho, destacamos a caracterização do Esporte-
participação como a mais democrática, inclusiva e ao alcance de uma maior
parcela da população.
Diante disso, faz-se necessário atentar à essa manifestação ligada à
saúde. A prática de atividades físicas visando a saúde está inserida
principalmente no Esporte-participação. Ela se faz presente nas outras formas,
como no Esporte-educação, por exemplo, é possível uma orientação e
ensinamentos visando hábitos de vida mais saudáveis, enquanto no Esporte-
performance há a questão de condicionamento físico, nutrição etc que são
também relacionadas à saúde.
O que muita gente não sabe, porém, é que a prática de atividades físicas
com foco na saúde não pode estar presente apenas como forma de remediar
algum problema. Não deveríamos ter tais atitudes apenas quando o caso já é
grave, quando já passou a ser pré-requisito assumido pelo médico. A
Promoção da Saúde é a forma mais essencial e benéfica para uma prática de
atividade física saudável, orientada e visando adquirir hábitos melhores. A tão
falada Qualidade de Vida está completamente ligada a tais atitudes, tornando-
se impossível uma dicotomia entre Qualidade de Vida e atividades físicas.
Todavia, talvez quase que como uma sina, mais uma vez um tema ligado à
Educação Física tem seus valores tratados de maneira supérflua e, mesmo
assim, é tido como de entendimento de todos.
3
39
Apesar de programas - televisivos ou não - voltados à questão da saúde,
o espaço dado pela mídia à essa manifestação no que diz respeito ao seu
entrelaçamento com o conceito de esporte, jogo e atividade física ainda não é
satisfatório. Assim, por não ser uma forma tão difundida por nossos meios de
comunicação, ter ciência dos conceitos, estudos e formas de se promover algo
que realmente seja voltado à saúde e possa trazer benefícios para a mesma,
torna-se então primordial para seu entendimento e agregação ao que é
fundamental.
3.1 Conceitos
Atualmente um dos temas mais comentados, mais buscados, porém
mais “indefinido” é o conceito de Qualidade de Vida (QV). Mesmo os
estudiosos da área, dada sua complexidade, tratam-no através de uma visão
polissêmica. Segundo MINAYO et al. (2000), Qualidade de Vida é uma
expressão com tão numerosos sentidos possíveis que, querendo dizer muito,
acaba por pouco significar.
Entretanto, sabemos que a QV possui duas vertentes a serem
analisadas: a visão subjetiva do indivíduo, visto a caracterização deste termo
pela ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS, 2002) que se dá como “a
percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e
sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos,
expectativas, padrões e preocupações.”; e a visão objetiva, que nada mais é do
que as condições de vida presentes no meio físico do dia-a-dia de cada
indivíduo, tais como acesso à higiene, lazer, alimentação, saúde etc.
40
Dentro da visão subjetiva de QV, é notória a influência cultural, histórica
e das classes sociais em relação ao seu conceito, uma vez que o indivíduo faz
parte dessa sociedade e adota os estilos de vida9 coerentes ao meio em que
vive, sempre de acordo com sua própria condição de vida9.
“A definição de Qualidade de Vida da OMS inclui a valorização do contexto cultural em que se insere a pessoa avaliada, refletindo a importância da atividade e do desenvolvimento intelectual no ambiente, sua capacidade de influenciar a integração das informações e o impacto sobre seu próprio bem-estar. Reflete, assim, o valor individualizado de bens disponibilizados e também o nível organizacional da interação indivíduo e sociedade.” (VILARTA; GONÇALVES, 2004)
Tratando o indivíduo através de uma visão totalitarista, sem dar ênfase à
visão biológica mecanicista de saúde, sabemos que a Qualidade de Vida
também é diretamente ligada aos estresses cotidianos, que contribuem com a
atual “epidemia” de doenças crônico-degenerativas. Doenças estas,
desconhecidas até algum tempo atrás e que acompanharam o progresso
tecnológico da atual sociedade capitalista. Outro fator diretamente ligado à
aparição destas doenças e de influência muito relevante na Qualidade de Vida
do indivíduo é a crescente taxa de sedentarismo que, segundo MINISTÉRIO
DA SAÚDE (2002) o Censo de 2000 indica que 80% da população brasileira
vive em cidades ligadas ao sedentarismo.
Caracterizada como um movimento corporal voluntário, realizado pela
musculatura esquelética, que leva ao gasto energético maior do que no nível
de repouso, a Atividade Física tem um grande obstáculo a ser vencido: as
facilidades presentes no mundo moderno. Com os avanços tecnológicos,
acabamos sendo influenciados cada vez mais pela sociedade a ter uma vida
sedentária, por vivermos em um mundo globalizado que torna-se 9 Estilo de vida e Condição de Vida são termos usualmente utilizados e de grande influência na Qualidade de Vida. Serão discutidos mais adiante, ainda neste capítulo.
41
extremamente informatizado e robotizado, fazendo-nos até mesmo repensar na
antiga utopia da possibilidade de criação de um Frankenstein10.
Uma geração mais recente sequer é capaz de pensar na possibilidade
de ter uma televisão sem controle remoto. E cogitar a possibilidade de se
levantar para mudar de canal ou regular o som, é um absurdo digno dos
homens da caverna. Uma prática regular de Atividade Física tem seus
benefícios comprovados e, por mais que digamos que o tempo é curto,
podemos nos beneficiar ao deixar o carro na garagem e irmos a pé para o
trabalho ou não apertar o botão do elevador e resolvermos encarar um lance
de escadas, por exemplo.
“A Atividade Física é defendida nesse trabalho como um dos elementos fundamentais para a melhoria da Qualidade de Vida; entretanto, é importante esclarecer que não compactuamos com os defensores de um descabido culto ao corpo, que persegue valores estéticos a todo custo e pasteurizam a construção de uma consciência corporal11 sensata, que respeite os limites de cada um enquanto ser bio-psico-social” (VILELA JR., 2004).
Podemos ver hoje em dia, uma grande associação da Atividade Física à
preocupação estética, o chamado “Culto ao Corpo”. Um meio
comprovadamente eficaz na promoção à saúde - como a Atividade Física -
passa aos olhos do indivíduo apenas como um meio de se alcançar a beleza e
satisfação própria com sua imagem corporal. A Educação Física Escolar,
portanto, como um dos primeiros contatos do indivíduo com a Atividade Física,
passa então a ser uma das principais responsáveis na conscientização do
mesmo em relação aos benefícios de tal Atividade Física ligada à Promoção da
Saúde e não somente à estética.
10 Personagem fictício da obra literária “Frankenstein”, da autora Mary Shelley. Obra que ficou famosa por “idealizar” a criação de um ser-humano em laboratório. 11 Consciência corporal refere-se ao sentimento de mundo, ou seja, o homem enquanto ser práxico é capaz de identificar suas carências e agir em conformidade com sua razão.
42
Por sua vez, a Promoção da Saúde, ao contrário do que muitos pensam,
não significa simplesmente prevenir de doenças. WHO (1986) apud Vilarta &
Gonçalves (2004) que através da Carta de Ottawa, resultante da I Conferência
Internacional sobre Promoção da Saúde nesse mesmo ano, define a Promoção
de Saúde como “o processo de capacitação da comunidade para atuar na
melhoria da sua Qualidade de Vida e Saúde, incluindo uma maior participação
no controle desse processo”. Também a Carta de Ottawa (1986) apud
Ministério da Saúde (2002) diz que a Promoção da Saúde:
“representa um amplo processo social e político, ela não engloba apenas as ações dirigidas para o fortalecimento das habilidades e capacidades dos indivíduos, mas, também, das ações direcionadas para as mudanças nas condições sociais, ambientais e econômicas, de forma a aliviar seu impacto sobre a saúde pública e individual. A promoção da saúde é o processo que possibilita às pessoas aumentar o controle sobre determinantes da saúde e dessa forma, melhorar sua saúde”.
Prevenir doenças pode ser um dos focos da Promoção à Saúde, mas
não é o principal dentro desse estudo, que vê a Promoção à Saúde como um
meio de “Educação em Saúde” que conta com 2 aspectos principais: as ações
sócio-políticas e a autonomia do indivíduo em relação à sua própria saúde. E,
justamente por essa ligação à autonomia foi que surgiu a Promoção à Saúde,
visto que ela veio como uma reação à acentuada medicalização da saúde tanto
no próprio sistema de saúde quanto na sociedade. Dado esse fato, podemos
ver uma “responsabilidade múltipla” que conta com ações: do Estado na
implementação de políticas públicas saudáveis; da comunidade para agir em
conjunto, comunitariamente; dos indivíduos para o desenvolvimento de
habilidades; do sistema de saúde em sua reorientação dos serviços; e também
dos profissionais, responsáveis em criar ambientes mais favoráveis.
43
Porém, cabe ressaltar que a Promoção à Saúde como Educação em
Saúde não é uma estratégia facilmente alcançada a curto ou médio prazo, e
sim um trabalho a ser realizado a longo prazo e que assegure a aquisição de
atitudes, conhecimentos e competências, garantindo assim, a autonomia e
hábitos de Atividade Física ligados à Qualidade de Vida.
Essa mesma Educação em Saúde ligada à autonomia e Qualidade de
Vida tem ainda como objetivo manter o indivíduo informado sobre as questões
de saúde, compreendendo-a como um direito e não como um dever e podendo
re-elaborar seus conhecimentos para a formação de valores, para então
problematizar e facilitar discussões a respeito do tema sempre que forem
abordados novos programas e mensagens relacionadas a isso. Sendo assim,
tal indivíduo terá uma valorização de seus conhecimentos, práticas e
comportamentos.
3.2 Estilo de Vida e Condição de Vida
Diante de uma necessidade iminente de se avaliar e entender como se
dá a integração de fatores biológicos, sociais e culturais no âmbito da
Qualidade de Vida para que seja possível analisar suas influências no modo de
vida das pessoas, há uma grande discussão para se saber o que mais importa:
estabelecerem-se vínculos de adoção de aspectos positivos ligados ao estilo
de vida ou se apropriar da melhoria das condições gerais de vida.
VILARTA & GONÇALVES (2004) caracterizam o estilo de vida como:
“os hábitos aprendidos e adotados durante toda a vida, relacionados com a realidade familiar, ambiental e social. Seria, portanto, o resultado da integração de muitos fatores que compõem a existência humana. O conjunto de adaptações biológicas e culturais experimentadas durante toda a vida
44
resulta em características que, dependendo do tipo adotado, podem refletir sobre aspectos de saúde e bem-estar: Os agires reforçados positiva e negativamente, desde os primeiros anos, podendo, ao longo do ciclo da vida, ter muitos dos seus componentes alterados segundo as diferentes influências recebidas. (...) Numa perspectiva bem imediatista, estilo de vida é então definido como as ações habituais que refletem as atitudes, os valores, e as oportunidades na vida das pessoas em que devem ser valorizados elementos concorrentes ao bem-estar pessoal, como o controle do estresse, a nutrição equilibrada, a atividade física regular, os cuidados preventivos com a saúde e o cultivo de relacionamentos sociais.”
No entanto, se na teoria é uma maravilha, na prática não podemos nos
deixar iludir achando que “querer é poder”. O Estilo de Vida, que também é um
fator subjetivo e, portanto, de escolha individual, é subsumido pelas Condições
de Vida em que o indivíduo está inserido, visto que essa, ao contrário do Estilo
de Vida, é conceituada por ser um fator objetivo de determinação social. Ou
seja, por mais boa vontade que tenha o indivíduo em adotar Estilos de Vida
saudáveis, existe um fator limitante que é a Condição de Vida que traz em sua
concepção as condições financeira, de infra-estrutura, habitação, saneamento,
transporte, segurança, entre outras capazes de “podar” a ação do indivíduo em
busca de seu bem-estar. Portanto, as opções individuais não são escolhas
livres, mas sim opções a partir das Condições de Vida da coletividade.
As Condições de Vida, determinadas pela realidade social em que se
vive, disponibilidade de elementos circunstanciais e ambientais presentes, são
capazes de potencializar os efeitos positivos intrínsecos em hábitos saudáveis
do Estilo de Vida.
Muitas condições de risco discutidas sobre o Estilo de Vida podem ser
vistas e discutidas no “Modelo de estágios” que segundo PROCHASTA &
DICLEMENTE (1983) apud VILARTA & GONÇALVES(2004):
“estrutura-se sobre o argumento de que as pessoas apresentam-se em diferentes situações de realidade para
45
mudar a vida em direção ao mais saudável. Na ótica de seus proponentes, uma vez avaliada a condição pessoal específica e o nível de prontidão, podem ser aplicados os procedimentos adequados para atingir o objetivo desejado, aumentando assim a chance de o indivíduo manter a nova condição”.
ROBERTS, ROBERGS & HANSON (1997) apud VILARTA &
GONÇALVES (2004) para citar as intercorrências e variáveis relacionadas ao
processo dos quatro estágios, segundo eles resumidos em:
Pré-contemplação: Ausência da conscientização sobre a mudança.
A pessoa pode também negar sua necessidade ou assumir a posição
de que os custos superam os benefícios. Mesmo para os
conhecedores dos riscos associados a alguns hábitos, é elevado o
número daqueles que, incluídos nesse estágio de pré-contemplação,
tendem a minimizar a severidade ou a probabilidade de
acometimento por conseqüências adversas.
Contemplação: O indivíduo torna-se motivado a partir de fatos e
estímulos dados pelo ambiente, pela família e equipe de saúde.
Ações educacionais podem facilitar essa mudança ao estimular a
percepção global sobre os custos e os benefícios de longo prazo.
Ação: A pessoa, envolvida na prática regular de exercício ou
atividade física, teria maior chance de permanecer nesse estágio ao
definir metas possíveis de serem atingidas a curto e longo prazo.
Aumentaria suas chances de manter o novo comportamento quando
são adequadas suas preferências pessoais às respectivas
necessidades. Vale, também, adaptar o programa de exercícios para
atingir sucessos imediatos e reduzir os riscos de conseqüências
adversas, como lesões e agravos do sistema locomotor.
46
Manutenção: Para evitar o retorno ao estágio anterior, adotam-se
preventivas diferenciadas, durante o acompanhamento da prática da
atividade física. Não basta a presença de profissional com o estímulo
oral, utilizando “palavras de ordem” ou congratulações pela meta
atingida: as pessoas precisariam estar segundo a racionalidade de
modelo, separadas para reconhecer e se auto gerenciar com a
progressão do programa de atividade física, além de controlar
situações familiares e de trabalho, relacionadas ao risco. Os
programas de intervenção também estimulariam a capacidade de
decisão, definindo limites flexíveis que permitam alterações não
comprometedoras das metas e dos objetivos iniciais.
3.3 Benefícios da atividade física
como promoção da saúde
Em defesa aos benefícios fisiológicos que a atividade física regular,
orientada por profissionais capacitados, é capaz de proporcionar aos seus
praticantes, analisaremos tais benefícios da atividade física como promoção da
saúde.
Contando com uma enorme colaboração dos avanços tecnológicos
crescentes da atual sociedade capitalista, as facilidades “impostas” no
cotidiano dos indivíduos são claramente influenciadoras de um estilo de vida
ligado ao sedentarismo, que cresce juntamente com a tecnologia.
47
Hoje, além das facilidades para execução das tarefas do dia-a-dia,
desde irmos para o trabalho, durante o expediente e retorno do trabalho, essas
descobertas tecnológicas contribuem até mesmo para que durante o momento
de lazer o indivíduo não pratique quaisquer atividades físicas, dando a ele
opções de se divertir sem ao menos ter que sair de casa, o que caracteriza o
lazer-sedentário.
Um dos maiores benefícios para a saúde acontece quando pessoas
sedentárias passam a adotar estilos de vida mais ativos, iniciando e mantendo
um programa regular de atividade física moderada. Despertar esse interesse
pela atividade física em pessoas sedentárias, porém, não é fácil e torna-se um
grande desafio do profissional da área de saúde.
Combater tais hábitos é essencial e, quanto mais cedo iniciarmos o
combate, maior será a chance conseguirmos fazer com que tais indivíduos
adotem a atividade física como prática orientada regular diária. Devido a isso,
um programa de implementação da atividade física no cotidiano de crianças é
essencial para que ela acostume-se a isso e leve como hábito para a vida toda,
evitando desperdiçar horas em frente à televisão, vídeo-game, computador e
outros atrativos tecnológicos dos dias atuais.
Segundo VILELA JR. (2004) há uma estimativa de que, no mundo todo,
mais de 60% dos adultos – cerca de 3,6 bilhões de pessoas! – não realizam
atividade física em nível suficiente para que possam colher os benefícios da
mesma. Esses benefícios podem estar ligados diretamente às condições de
morbidade, uma vez que segundo a OMS (2002): “mudanças no estilo de vida,
especialmente relacionadas à prática de atividade física regular, são capazes
de prevenir quase 60% dos casos de diabetes tipo II”.
48
NIEMAN (1999) apud VILELA JR. (2004) em relação ao resultado de
inúmeras pesquisas científicas que corroboram os benefícios da atividade física
regular para a saúde. Os principais estão descritos na Tabela 1, encontrada na
página seguinte.
Além dos benefícios individuais alcançados pelos praticantes regulares
de atividade física, com a implementação de projetos da comunidade ligados à
atividade física como promoção à saúde é possível constatar um grande
impacto na economia de um país. Nos últimos anos os gastos com saúde têm
crescido significativamente em muitos países. Nos mais desenvolvidos (que
possuem IDH acima de 0,75) a expectativa de vida aumentou e isto determinou
um incremento nos gastos com saúde. O estilo de vida das pessoas nos países
desenvolvidos (válido também para muitos países em desenvolvimento) está
associado majoritariamente às causas de morbidade e mortalidade, as
chamadas doenças associadas ao estilo de vida (KIRSTEN, 2000 apud VILELA
JR., 2004).
Tabela 1 - Benefícios da Atividade Física Regular paraa Saúde BENEFÍCIO DA ATIVIDADE FÍSICA EVIDÊNCIA CIENTÍFICA
Aptidão geral do corpo Melhoria da aptidão cardíaca e pulmonar Muito alta Melhoria da força / massa muscular Muito alta Doenças cardiovasculares Prevenção de doenças coronarianas Muito alta Regressão da asteroclerose Média Tratamento de doenças cardíacas Alta Prevenção do derrame Média Câncer Prevenção do câncer de colo Muito alta Prevenção do câncer de mama Média Prevenção do câncer uterino Média Tratamento do câncer Baixa Diabetes Prevenção do diabetes melito não insulino-dependente Muito alta Tratamento do diabetes melito não insulino-dependente Alta Tratamento do diabetes insulino-dependente Baixa Melhoria de qualidade de vida do diabético Alta Osteoporose Auxílio na melhoria da densidade óssea Muito alta
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Prevenção da osteoporose Alta Tratamento da osteoporose Média Colesterol / lipoproteínas no sangue Colesterol total do sangue mais baixo Baixa LDL–colesterol mais baixo Baixa Triglicerídeos mais baixo Alta Aumento do HDL-colesterol Alta Hipertensão arterial Prevenção da hipertensão arterial Muito alta Tratamento da hipertensão arterial Muito alta Nutrição e qualidade da dieta Melhoria da qualidade da dieta Média Aumento da ingestão energética total Alta Controle do peso Prevenção do ganho de peso Muito alta Tratamento da obesidade Baixa Manutenção do peso perdido Alta Bem-estar psicológico Melhoria do humor Muito alta Atenuação dos efeitos do estresse mental Alta Alívio / prevenção da depressão Muito alta Redução da ansiedade Muito alta Aumento da auto-estima Muito alta Fonte: NIEMAN (1999) apud VILELA JR (2003) adaptada por ROMAGUERA (2006).
Apresentados os benefícios, fica claro e fácil perceber que:
“Projetos de promoção da saúde, muito mais que economia aos cofres públicos, constituem um significativo investimento no capital humano. Mudanças de estilo de vida e de comportamentos (para o indivíduo e para grupos) não são fáceis de serem alcançadas, mas quando isso ocorre, fica claro o impacto de tais projetos na melhoria da qualidade de vida das pessoas” (VILELA JR., 2004).
50
De virada é mais gostoso
Apontar os erros e/ou os culpados é uma coisa extremamente fácil e
utilizada por nossa cultura. O que raramente acontece é mostrar alternativas
para uma mudança de concepções e atitudes a respeito do que foi criticado.
A valorização do esporte-performance, o culto à vitória, a banalização
dos valores humanos em detrimento de objetivos conquistados e a influência
da mídia na opinião pública, podem sim serem combatidas! Uma das
manifestações dos jogos mais ricas e fortalecidas para combater essa
alienação imposta ao povo são os Jogos Cooperativos. Mas, todo mundo sabe
de sua existência? Ou melhor, todo mundo sabe como eles funcionam?
Em sua essência, os Jogos Cooperativos encontram-se dentro da
caracterização de Esporte-educação. Entretanto, tem um caráter tão
democrático e definições tão agregadas de valores, que pode (e deve!)
facilmente ser inserido em todos os contextos possíveis. Mesmo no alto
rendimento, principalmente nos esportes coletivos, se não houver cooperação
não haverá conquista de resultados. A partir do momento que o individual e o
ego falam mais alto que o grupo, os destaques individuais (mesmo que sejam
muitos e poderosos) somem. Até mesmo nos esportes individuais a
cooperação se faz presente, seja no elo treinador-atleta, atleta-atleta (na
questão de respeito) ou qualquer outra relação (afetiva ou não) que possa
acontecer em sua prática.
4
51
4.1 Jogos competitivos (x) jogos
cooperativos
Vimos até aqui uma tendência da esportivização da Educação Física na
mídia, e não apenas uma esportivização considerando as diferentes
manifestações, pelo contrário, enfatizando apenas uma delas. No principal
âmbito da Educação Física - a escola, onde temos nosso primeiro contato com
a disciplina e com o esporte - não podemos descartar a forte influência
midiática e, portanto, a competição que se faz muito presente neste contexto.
CORREIA (2007), atenta para a existência de um “mito da competição”, que é
reforçado pelo fato de muitos acharem que o aluno já tem que se acostumar
dali mesmo a lidar com a competitividade que vai encontrar no mundo fora da
escola, destacando isso como se fosse a única forma de sobrevivência.
Penso que seja muito mais fácil para os leitores entenderem sobre o
conceito de competição ligado ao esporte sem conseguir enxergar algum
vínculo deste fenômeno cultural à cooperação. Para tanto, farei uma
caracterização mais precisa dos Jogos Cooperativos.
Para nos nortearmos, fico com a definição de BROTTO (2001) a respeito
das diferenças entre Competição e Cooperação. A Competição é definida como
um processo onde os objetivos são mutuamente exclusivos, as ações são
individualistas e somente alguns se beneficiam dos resultados. Por outro lado,
a Cooperação é um processo onde os objetivos são comuns, as ações são
compartilhadas e os resultados são benéficos para todos. Basicamente, em
poucas palavras, a diferença passa a aparecer quando eu paro de me
52
preocupar em ter ações contra o outro (competição) e passo a promover
atitudes com o outro (cooperação).
Os Jogos Cooperativos surgiram da preocupação com a excessiva
valorização dada ao individualismo e à competição exacerbada. Uma das
principais referências em Jogos Cooperativos, TERRY ORLICK (1989)
apresenta-os como:
“uma atividade física essencialmente baseada na cooperação, na aceitação, no envolvimento e na diversão, tendo como propósito mudar as características de exclusão, seletividade, agressividade e exacerbação da competitividade dos jogos ocidentais.” (ORLICK, 1989 apud CORREIA, 2007)
Outra afirmação de ORLICK (1989) para sustentar a relevância dos
Jogos Cooperativos, é que nós não ensinamos nossas crianças a terem prazer
por buscar conhecimento, ensinamos a se esforçarem para conseguirem notas
altas. Da mesma maneira, não as ensinamos a gostar dos esportes, nós as
ensinamos a vencer jogos. Diante disso, BROTTO (2001) cita Spencer KAGAN
(1994) que, inteligentemente nos diz que “as crianças não jogam jogos
competitivos, elas os obedecem”. Isso devido ao fato de elas conhecerem
apenas este tipo de jogo e, uma vez que não lhes foi dada nenhuma outra
opção, não há como ter escolha, há apenas a obediência e a submissão ao
que já existe.
Ainda seguindo a linha de raciocínio de BROTTO (1995; 2001), aponto
os Jogos Cooperativos como um exercício de convivência, em que através
destas atividades poderemos nos expressar autêntica e espontaneamente,
como alguém que é importante e tem valor, essencialmente, por ser quem é, e
não pelos pontos que marca ou resultados que alcança.
53
Para BROWN (1995), a transformação dos jogos competitivos em jogos
cooperativos produz grande relação com as questões políticas das classes
socialmente desfavorecidas, pois: “uma de nossas tarefas é educar para não
aceitar passivamente a injustiça (...) como educadores, temos que transmitir
outros valores. Podemos oferecer a alternativa da solidariedade e do senso
crítico diante do egoísmo e da resignação”. CORREIA (2007) ainda completa
dizendo:
“Com essa perspectiva, os Jogos Cooperativos ganham uma visão e um papel transformador, aproximando-se das abordagens crítico-emancipadoras da Educação Física escolar. Destaca a importância dos Jogos Cooperativos porque libertam da competição, pois o interesse se volta para a participação, eliminando a pressão de ganhar ou perder produzida pela competição; libertam da eliminação, pois procura incluir e integrar todos, evitar a eliminação dos mais fracos, mais lentos, menos habilidosos etc.; libertam para criar, pois criar significa construir, exigindo colaboração, permitindo a flexibilização das regras e mudando a rigidez das mesmas facilita-se a participação e a criação; libertam da agressão física, pois buscam evitar condutas de agressão, implícita ou explícita, em alguns jogos.”
Um grande papel dos Jogos Cooperativos se dá como estimulador da
prática regular de atividade física ligada à promoção da saúde, pois tais jogos
não excluem ou rotulam seus participantes, pelo contrário, têm um papel
fundamental na inclusão esportiva de sujeitos que podem ser ainda mais
beneficiados com a atividade física do que os considerados mais favorecidos
fisicamente ou mais habilidosos. Diante disso, ROMAGUERA (2006) faz um
link da importância da prática inclusiva no âmbito da promoção à saúde e diz:
“podemos afirmar que é comum que os alunos passem a procurar de forma mais voluntária, práticas de exercícios físicos regulares fora do âmbito escolar, como programas prazerosos de integração corporal que tragam benefícios físicos, psicológicos e espirituais. Porém, fica claro observar que os indivíduos que não tenham tido uma iniciação correta nas atividades físicas regulares e tenham se sentido excluídos das aulas de Educação Física, pouco se interessarão também em procurar algum tipo de atividade física fora da escola,
54
aumentando a chance de este vir a ser mais um indivíduo sedentário”
Ainda no âmbito da saúde, CORREIA (2007) apud FARINATTI e
FERREIRA (2006) atentando à perspectiva multifatorial da saúde, onde a
prática dos Jogos Cooperativos pode contribuir para a saúde individual em
aspectos como: as emoções; a aprendizagem; o relacionamento pessoal; a
auto-estima; a necessidade de conhecimento e as condutas comportamentais.
Baseado em tais afirmações, vemos ainda mais forte a necessidade de
termos práticas pedagógicas mais educativas e voltadas à inclusão, sem
beneficiar os mais habilidosos ou tidos como “estereótipos ideais” em
detrimento dos demais, o que nos remete a ver os jogos cooperativos como
uma prática fundamental no ensino do esporte-educação. CORTEZ (1999), ao
analisar, sob a prática dos jogos cooperativos, as atitudes dos alunos em
relação a alguns fatores (ação aleatória; interação social; papel do desafio no
‘fluir’; pensamento reflexivo e; solução de problemas e cooperação), pôde
identificar mudanças ocorridas no nível de satisfação, alegria, auto-estima,
integração e competição dos alunos.
A cooperação veio para substituir um modo de jogar em que para ter um
vencedor, tem que existir diversos perdedores. Para ilustrarmos um pouco
melhor as diferenças entre Jogos Cooperativos e Jogos Competitivos, vejamos
a Tabela 2 a seguir:
55
Tabela 2- Jogos Cooperativos e Jogos Competitivos Jogos cooperativos Jogos competitivos
Jogar com o outro – cooperação. Jogar contra o outro – competição. Joga-se para superar desafios. Joga-se para derrotar os outros. Para que o objetivo de cada um seja alcançado, o objetivo de todos também deve ser.
Para que o objetivo de alguém seja alcançado, todos os outros devem ser incapazes de conseguir seus objetivos.
O que a pessoa A faz, beneficia ela própria e também a pessoa B e vice-versa.
O que A faz só beneficia a si própria e pode até prejudicar B e vice-versa.
Surge quando trabalhamos juntos para conseguir um objetivo comum, com êxito para todos.
Surge quando nosso objetivo é conseguir um resultado melhor, gerando oposição com outros.
Há maior sensibilidade às necessidades dos outros e todos se ajudam com freqüência; a qualidade das produções coletivas é maior.
Há menor sensibilidade às necessidades dos outros e as pessoas se ajudam com pouca freqüência; a produção coletiva tem qualidade menor.
O jogo é possível para todos O jogo é possível só para uns poucos Devemos ganhar...juntos; somos parceiros e amigos; há interdependência e vontade de continuar jogando.
Devemos ganhar...do outro; somos adversários e inimigos; há rivalidade e vontade de acabar logo com o jogo.
São divertidos para todos, que têm um sentimento de vitória
São divertidos para alguns e a maioria tem um sentimento de derrota.
Há mistura de grupos que brincam juntos, e ninguém é rejeitado ou excluído.
Alguns são excluídos, ficando de fora por sua “falta” de habilidade, e todos aprendem a ser desconfiados.
Os jogadores aprendem a ter um senso de unidade e a compartilhar o sucesso.
Os perdedores ficam de fora do jogo e simplesmente se tornam observadores.
Desenvolvemos autoconfiança porque todos são aceitos.
Os jogadores não se solidarizam, ficando até felizes quando algo de “ruim” acontece aos outros.
A habilidade de perseverar (continuar tentando) é fortalecida diante das dificuldades.
Há pouca tolerância à derrota e isso desenvolve um sentimento de resistência diante das dificuldades.
Para cada um o jogo é um caminho coletivo de evolução (co-evolução).
Poucos se tornam bem-sucedidos nos jogos.
BROTTO, F. O. (1995), adaptado por ROMAGUERA, G. N., 2010
Ainda, para DARIDO & RANGEL (2005), em todas as atividades da
Educação Física na escola, todos devem ter oportunidade de brincar sem se
sentirem excluídos da atividade, e é importante também que os alunos
reconheçam que algumas brincadeiras exigem mais a cooperação do que
outras.
Mesmo assim, caracterizar os Jogos Cooperativos e os
Competitivos, não significa dizer que há uma maneira certa e outra errada de
se jogar. Pelo contrário, apenas fica ilustrada a presença dos tipos de Jogos no
esporte, onde poderemos sempre encontrar elementos das duas
manifestações e, por isso, não dá para considerar que cooperação e
56
competição se opõem, mas sim se compõem. Apenas saliento que, no âmbito
do esporte-educação, o extremo culto à vitória é uma forma errada e até
mesmo banal de se apresentar o esporte aos alunos (não atletas!).
Tendo isto em vista, DARIDO & RANGEL (2005) afirmam que se os
alunos entenderem que um jogo pode ter competição sem, no entanto, ser
necessário desrespeitar as regras ou utilizar a violência para a resolução de
conflitos, este jogo deve ser aproveitado. Ressaltando também que, em
situações competitivas normalmente surgem dúvidas sobre quem chegou
primeiro, de quem é a bola etc. Essas situações podem ser resolvidas sem
maiores problemas dentro do que entendemos por resoluções de conflitos, já
que isto não pode ser ignorado nem evitado, uma vez que elas podem ocorrer
inclusive no cotidiano dos alunos. Porém, se com a mediação do professor for
criada uma perspectiva de cooperação dentro da competição, esses conflitos
poderão ser resolvidos de forma amistosa, através do diálogo, do respeito
mútuo, e não da agressão moral ou física.
A intervenção do professor neste contexto se faz ainda mais necessária,
pois há a possibilidade de se aprender através do jogo possível, onde ações
com o intuito de modificar determinadas regras e/ou a maneira de jogar, além
de tornar a atividade mais lúdica, facilitam o aprendizado por proporcionar aos
“menos habilidosos” a chance de atingir os objetivos mais facilmente e, assim,
integrarem-se e sentirem-se mais acolhidos pelos demais. Esta estratégia do
jogo possível também ajuda na sistematização de conteúdos onde o esporte
pode ser ensinado em fases, pois com as modificações feitas no jogo, os
objetivos e meios para atingi-lo podem ser diferentes a cada intervenção e,
57
portanto, fazer com que o aluno esteja mais focado em cada ação a ser
tomada.
4.2 Jogando os paradigmas para escanteio O esporte, suas manifestações, a mídia, o mercado e o cidadão...um
mesmo time ou adversários? Nas relações presentes hoje em dia, acredito que
possamos formar duas equipes:
Tabela 3 - Equipes (Valores e Desejos)
EQUIPE 01 - VALORES X EQUIPE 02 - DESEJOS
Esporte-educação Defesa Esporte-performance (espetáculo)
Esporte-participação Meio de campo Mídia
Ataque Mercado capitalista
C I D A D Ã O A equipe VALORES encontra-se em inferioridade numérica e de
recursos para se valer de seu material promocional. Sua defesa é
extremamente sólida - talvez apenas por isso ainda consiga se manter no jogo.
Seu meio de campo vem ganhando adeptos, porém ainda sem a devida
orientação de quem entende do assunto. E seu ataque...bom, seu ataque, por
não contar com um meio de campo capaz de encarar um adversário imponente
como o da equipe DESEJOS, é praticamente inexistente.
Em contrapartida, a equipe DESEJOS utilizou-se muito bem nos últimos
tempos da influência do seu meio de campo sobre seu ataque para valorizar a
sua defesa. Hoje em dia é dificílimo encontrar alguém que critique abertamente
58
o esporte-espetáculo proporcionado pela mídia. Pior do que isso, são cada vez
mais raros os que sabem que existe uma outra forma de manifestação
esportiva que não seja essa. Para o senso comum é apenas uma questão de
mudança de local de sua prática, pois os objetivos devem ser sempre os
mesmos. Portanto, essa é a sua maior e praticamente intransponível defesa.
No centro disso tudo está o cidadão que deveria ter as informações para
poder escolher para onde ir, o que quer, tornar-se crítico, autônomo e
participante das ações públicas visando o bem comum. Ao invés disso, temos
uma alienação cada vez maior e uma manipulação de conceitos e valores em
prol dos interesses midiáticos, políticos e organizacionais, oferecendo "em
troca" o entretenimento e os produtos ligados ao esporte-performance. Em
pleno século XXI estamos diante de uma clara política de pão e circo
globalizada, caracterizada pela Figura 3.
Figura 3 - Pão, circo e a globalização
59
A partir do momento que a mudança é de cunho cultural devido à
lavagem cerebral executada durante anos, o processo torna-se ainda mais
difícil e delicado. Ninguém pode chegar chutando o balde e dizendo que está
tudo errado e deve mudar da água para o vinho. Tudo tem o seu lado bom e o
seu lado ruim...o próprio mercado de produtos esportivos tem o seu lado
benéfico, pois movimenta uma quantia extraordinária na economia do país,
assim como a Copa do Mundo e as Olimpíadas gerarão dividendos jamais
vistos em eventos em território nacional.
Porém, os principais veículos de comunicação só trazem aos olhos do
público o esporte-performance tratando-o como espetáculo, e só valorizam as
outras manifestações esportivas quando há algum interesse (principalmente
mercadológico) por trás disso. Mesmo quando dá abertura para mostrar o
Esporte-educação ou o Esporte-participação, eles não são devidamente
explicados. Pelo contrário, só são tratados visando o poder de compra cada
vez maior da população ligada aos esportes no mundo. A indústria capitalista
do esporte nos impõe o Esporte-performance como a principal e melhor
manifestação. Para reforçar ainda mais o argumento é só ver como essa
indústria forma exércitos de consumidores ligados ao lazer, seja com o tênis do
ídolo, o relógio, a camiseta, o sucesso, a expectativa de riqueza, entre outros.
Aprendemos no sub-capítulo anterior que mesmo jogos Cooperativos e
Competitivos, com tantas diferenças, ainda são capazes de se
complementarem. Da mesma maneira, VALORES e DESEJOS também podem
caminhar juntos, desde que haja uma possibilidade de escolha, desde que
saibamos da existência de ambos e saibamos diferenciá-los, podendo escolher
60
o que acharmos ser de maior valia para nós enquanto seres bio-psico-
SOCIAIS.
Recentemente, em dezembro de 2012, durante uma corrida cross
country em Navarra, na Espanha, Iván Fernández Anaya deu uma lição de
honestidade, ao deixar o campeão olímpico Abel Mutai ganhar a prova. O
queniano liderava com folga e nos últimos metros diminuiu o ritmo e começou a
cumprimentar o público, achando que já teria cruzado a linha de chegada. O
espanhol, segundo colocado, não deu uma de espertinho e nem se aproveitou
da situação para ultrapassar o rival. Iván seguiu atrás de Abel Mutai e,
gesticulando, levou o queniano até a vitória, o que iria acontecer normalmente,
se ele não tivesse se enganado no percurso. Diante disso me pergunto: será
que só a vitória interessa mesmo? A conquista a qualquer custo é o que vale?
Acho isso um tanto quanto Maquiavélico, afinal, os fins nunca podem justificar
os meios!
Iván Fernández Anaya tem apenas 24 anos e é tido como um atleta
extremamente promissor no atletismo espanhol. Ele poderia muito bem colocar
em seu portfólio mais uma conquista. Mas Iván mostrou que pode sim fazer
parte do Alto Rendimento esportivo sem ser extremamente competitivo e
focado apenas em resultados. O resultado é realmente importante, coroa tudo
o que foi feito durante o processo, mas enganar a si mesmo tendo um
resultado admirável e um processo sujo não vale a pena! Infelizmente a
sociedade competitiva mundial não pensa assim.
Muitas vezes sequer conseguimos diferenciar nossas NECESSIDADES
de nosso DESEJOS. O ego acaba falando mais alto, o ter toma medidas
exponenciais e se sobrepõe ao ser. Vivemos em um culto ao individualismo e à
61
vitória que nos coloca em um paradoxo definido pela presença de uma era
socialmente mais desenvolvida (do ponto de vista do networking e das redes
sociais), mas com os valores mais antissociais possíveis!
Contudo, os nossos valores intrínsecos e nossas admirações com
atitudes louváveis como a de Anaya, mostra que podemos sim trilhar um outro
caminho. Isso passa efetivamente por um governo compromissado em
desenvolver uma sociedade mais crítica e autônoma. A partir disso - criando-se
um ele entre o que é oferecido, as informações necessárias e a criticidade e
autonomia dos envolvidos no processo - poderemos observar um jogo mais
equilibrado entre as equipes VALORES e DESEJOS.
Agregando-se a isso, como papel afetivo fundamental dos professores,
“uma de nossas tarefas é educar para não aceitar passivamente a injustiça (...) como educadores, temos que transmitir outros valores. Podemos oferecer a alternativa da solidariedade e do senso crítico diante do egoísmo e da resignação” (BROWN, 1995).
A Cooperação surge como uma perspectiva de acabar com o paradigma
de que para se ter um vencedor é necessário que se tenha vários perdedores.
Assim, com isso em mente, abre-se a possibilidade para que possamos
incentivar, orientar e cativar nossos mais diferentes alunos em seu processo
para que chegue ao objetivo desejado, independentemente de como se dê sua
prática de ensino aprendizagem se comparada aos demais indivíduos que
fazem parte de seu meio.
Principalmente no âmbito da educação afetiva, o exercício da COM-
vivência deve ser um hábito para que todos possam venSER.
62
Apito "final"
"Mudar é difícil, porém também é necessário e urgente". É com essa
frase - dita por Paulo Freire quando exercia o cargo de Secretário Municipal de
Educação de São Paulo - que pretendemos deixar uma reflexão acerca das
manifestações esportivas existentes no Brasil de hoje e as futuras
conseqüências do que isso pode nos trazer. Uma era que adota o discurso
politicamente correto baseado em "deixar pessoas melhores para o mundo de
amanhã", não pode se contradizer e ser direcionada erroneamente no âmbito
esportivo como anda acontecendo.
"Mesmo no domínio original da opinião pública, há mais o que considerar do que simplesmente as descrições e explicações do como os mass media influenciam nossas visões dos assuntos públicos. Para os jornalistas este fenômeno sobre o qual nós agora referimos como sendo o papel de agendamento dos veículos noticiosos é uma formidável questão ética de largo impacto sobre que tipo de agenda a mídia está dando preferência. 'O que o público precisa saber' é uma frase recorrente no repertório teórico do jornalismo profissional. A agenda da mídia realmente representa o que o público precisa saber? (GUREVICH et al, 1990). Num momento de dúvida, o diretor executivo do telejornal Nightline da rede ABC uma vez perguntou: 'Quem somos nós para imaginar que devemos estabelecer uma agenda para a nação? O que nos tornou mais inteligentes do que qualquer outra pessoa?' (BETTAG, 2000). Em boa medida, o jornalismo está estabelecido na tradição dos contadores de histórias. Contudo, bom jornalismo é mais do que simplesmente contar uma boa história. É contar histórias que possuam utilidade cívica significativa. Este papel que a mídia tem de definir a agenda liga o jornalismo e sua tradição de contar história à arena da opinião pública, uma relação com consideráveis conseqüências para a sociedade." (McCOMBS, 2009)
Exatamente pelo fato de a mídia se considerar "mais inteligente do que
as outras pessoas" e determinar um agendamento noticioso do que deve ou
não ser tratado, é que devemos ter mais cuidado e nos posicionarmos melhor
63
quanto à uma busca pelo senso crítico e pela autonomia em todos os quesitos
de nossas vidas. No caso do presente trabalho, vimos e comprovamos que o
esporte tem influência direta em diversos âmbitos. Desde a formação de nosso
caráter, desenvolvimento da personalidade, busca por algo mais democrático,
socialização e inclusão, hábitos de vida saudáveis, entre outros. Por isso,
podemos dizer que, como seres bio-psico-sociais que somos, devemos sim
tomar partido dos determinantes de nossa vida e exigir dos órgãos
responsáveis um tratamento mais adequado, igualitário, menos omisso e mais
transparente no que diz respeito a assuntos do nosso interesse!
Esportivamente falando, o que não pode acontecer é deixar-se levar por
um esporte fortemente proposto pela mídia como sendo o ideal e representado
de uma única forma. Tal manifestação esportiva que nos é imposta pelos meios
de comunicação trata somente da performance, do resultado, da superação de
obstáculos de uma forma Maquiavélica onde os fins justificam os meios. Atletas
se dopando, desrespeitando o adversário para tirar vantagem e até esquema
de manipulação de resultados não é o esporte ideal, não é o esporte que
queremos principalmente para as crianças.
Todas as nossas ações imediatistas refletem num futuro que pode não
ser tão distante assim! Será que existe mesmo a necessidade de se saber
quem é melhor em TODAS as coisas? A competição pode sim ser um meio
para se aprender várias coisas, mas não necessariamente deva ser um
objetivo final! Atualmente, muitas vezes temos competido em lugares, com
pessoas e em momentos que não precisaríamos, e muito menos, deveríamos
(BROTTO, 2001).
64
Assim, ROMAGUERA (2006) acredita em um diálogo, uma troca de
informações entre os envolvidos no processo educacional, onde o indivíduo
saiba lidar consigo mesmo, e afirma:
“Um indivíduo, para que tenha o poder de comunicar-se, posicionar-se e lidar com o meio, tem que saber de suas limitações, de seus poderes e fraquezas e ter consciência crítica sobre os aspectos que influenciam sua vida, buscando meios para exercer o controle sobre determinantes de seu viver. (...) Para a construção de uma sociedade democrática é preciso, então, uma mudança de atitudes em busca de ações que estimulem a criticidade e a reflexão, valorizando cada indivíduo e dando a ele oportunidades de manifestação e participação no processo de decisões.”
Do ponto de vista esportivo, cultural, social e fenomenológico, vimos que
a sociedade está sendo privada descaradamente dessa possibilidade
autônoma. Como que em uma "censura mascarada", ela não recebe a
informação, fica impossibilitada de formar sua opinião e seu ponto de vista e,
por conseguinte, não toma atitudes que possam melhorar sua visão de mundo,
sua socialização e, principalmente, sua Qualidade de Vida a que tem direito e
que pode gerar frutos a curto, médio e longo prazo. Nesse sentido, a censura
acima citada, se caracteriza pelo fato de que os cidadãos pensam estar bem
informados e no controle de suas atitudes, mas a mídia apresenta apenas o
que é de seu próprio interesse, sem dar o devido espaço às outras
manifestações esportivas. Quando isso acontece, o espaço é demasiado curto,
o tema é tratado superficialmente e logo após o foco do Esporte-performance
volta à tona, mascarando, assim, a "abertura democrática" dada por ela para
apresentar um outro ponto de vista.
Ainda, os poucos que tentam diversificar as opiniões, tratar o esporte
com os devidos valores e benefícios que atinjam realmente a uma massa maior
e seja, portanto, mais democrático, são taxados de idealistas, utópicos ou
65
loucos. Devido a isso, muitos dos que poderiam ser partes atuantes em uma
melhoria do ponto de vista esportivo-cultural-social, acabam sofrendo as
sanções da Espiral do Silêncio.
66
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Anexos
Lista de figuras
Figura 1 - Teoria da Espiral do Silêncio 01 34
Figura 2 - Teoria da Espiral do Silêncio 02 35
Figura 3 - Pão, circo e a globalização 58
Lista de tabelas
Tabela 1 - Benefícios da Atividade Física Regular para a Saúde 48
Tabela 2 - Jogos Cooperativos e Jogos Competitivos 55
Tabela 3 - Equipes (Valores e Desejos) 57