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Sobre los contenidos de los medios de cfomunicación
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Copyright 2013
ISSN 1887-4606
Vol. 7(3) 447-489
www.dissoc.org _____________________________________________________________
Artculo _____________________________________________________________
Algumas consideraes discursivas
sobre as eleies presidenciais
brasileiras de 20101
Roberto Leiser Baronas Departamento de Letras
Universidade Federal de So Carlos/ Universidade Federal do Mato Grosso
(Brasil)
Discurso & Sociedad Vol. 7(3), 447- 489 448
Roberto Leiser Baronas. Algumas consideraes discursivas sobre as eleies
presidenciais brasileiras de 2010.
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Resumo
Neste artigo, com base num carrefour epistemolgico entre a Anlise do Discurso de base
enunciativa e a Semitica Social, procuramos analisar discursivamente, por um lado, como
a fala de atores polticos so destacadas pela mdia dos contextos e cotextos originais de
produo e submetidas ao regime discursivo da aforizao e, por outro, buscamos
descrever os recursos semiticos utilizados pelos suportes miditicos na circulao de
fotografias desses atores polticos. Trabalhamos mais especificamente com a
(des)textualizao de pequenos enunciados e o emprego de recursos semiticos na
publicao de fotografias atribudas aos principais candidatos a Presidente da Repblica
do Brasil, nas eleies de 2010, publicados nos jornais brasileiros Folha de S. Paulo e
Estado de S. Paulo, durante as eleies presidenciais brasileiras de 2010.
Palavras-chave: Discurso, mdia, aforizao, recurso semitico, eleies presidenciais.
Abstract
In this article, based on an epistemological crossing between Discourse Analysis of
enunciative basis and Social Semiotics, we seek analyse discursively, on one hand, how
political actors speech are detached by the media from their contexts and original production cotexts and submitted to the discursive regime of aforization and, on the other
hand, we seek describe the semiotic ressources used by media supports in the circulation of
these actors photographs. We work, more specifically, with the de(textualization) of short statements and the employment of semiotic ressources in the publication of photographs
assigned to the main candidates for the Presidency of Republic, in 2010 elections,
published in Brazilian newspapers Folha de S. Paulo and Estado de S. Paulo, during the
presidential election of 2010.
Keywords: Discourse, media, aforization, semiotic ressource, presidential elections.
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Roberto Leiser Baronas. Algumas consideraes discursivas sobre as eleies
presidenciais brasileiras de 2010.
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Primeiras palavras...
Neste trabalho, inicialmente procuramos delimitar o espao terico-
metodolgico no qual nos inscrevemos para o tratamento dos corpora
mobilizados no estudo. Para tanto, realizamos uma breve aproximao
epistemolgica entre a Anlise de Discurso de orientao francesa,
especificamente a de base enunciativa, desenvolvida por Dominique
Maingueneau (2007, 2010a, 2010b; 2011 e 2012) e a Semitica Social,
proposta por Theo Van Leeuwen (2005). Em seguida, descrevemos como os
enunciados dos atores polticos so (des)textualizados de seus contextos e
cotextos originais e submetidos ao regime discursivo da aforizao. Depois,
levantamos alguns dos recursos semiticos empregados na publicao das
fotografias dos atores polticos, procurando compreender em que medida
esse trabalho de recorte do verbal e do no-verbal, produzido pela mdia
interfere na interpretao do acontecimento histrico dado em narrativa,
fornecendo ao leitor uma espcie de percurso dentico de interpretao.
Como recorte temporal, elegemos o perodo de abril a outubro de 2010.
Como suportes miditicos, elegemos os jornais Folha de S. Paulo -
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ - Estado de S. Paulo www.estadao.com.br - todos em suas verses online. Frequentamos os mais variados textos que do em narrativa a agenda dos candidatos e os fatos
polticos que marcaram a campanha presidencial brasileira.
Convm destacar que nosso objetivo, entretanto, no apenas testar
as proposies terico-metodolgicas de Maingueneau e de Van Leeuwen
em dados urdidos na geografia brasileira, mas, sobretudo, a partir desses
dados forjados no cadinho miditico braslico, realizar uma calibrao das
ferramentas de anlise propostas por esses tericos. Apesar de as teorizaes
de Maingueneau e de Van Leeuwen serem forjadas em espaos
epistemolgicos distintos, em nosso trabalho, essa aproximao se justifica
por um lado, em razo da constituio multissemitica dos objetos que
frequentamos analiticamente e, por outro, pelo fato mesmo de ambos
mostrarem como os textos (verbais e/ou no-verbais) ao sofrerem
determinados destaques ou se constiturem a partir de certos recursos
semiticos engendram certos enquadramentos, percursos interpretativos
para os leitores.
Um pouco de teorias...
No contexto europeu atual, segundo Johannes Arguenmller (2007), os
estudos do discurso podem ser compreendidos a partir de trs grandes
escolas: a francesa; a anglo-saxnica e a germnica. No caso brasileiro
contemporneo, os estudos do discurso podem ser analisados a partir das
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escolas francesa (tributria das reflexes de Michel Pcheux, Michel
Foucault, Greimas, Charaudeau e Maingueneau); eslava (alicerada a partir
das reflexes de Mikail Bakhtin e de seu crculo de estudos) e anglo-
saxnica (constituda com base nas reflexes de Norman Fairglough, Van
Dijk e Wodak). Num rpido exame sobre os diferentes trabalhos publicados no
domnio do discurso, inscritos na escola francesa de Anlise do Discurso,
nos ltimos anos, na geografia brasileira, possvel constatar a presena de
pelo menos trs grandes tendncias de estudos discursivos, a saber, a
materialista; a historicista e a enunciativa. Embora cada uma dessas
tendncias tenha o discurso como objeto de observao, cada uma delas
constri objetos tericos distintos, se constituindo dessa forma em
programas de pesquisa2 distintos.
A tendncia enunciativa3 por sua vez alm de buscar respaldo nas
contribuies de Michel Pcheux e de Michel Foucault alicera-se tambm
em Mikail Bakhtin; mile Benveniste e Oswald Ducrot. Surge na geografia
francesa em meados dos anos noventa do sculo passado e sua principal
preocupao compreender por um lado como certas palavras que circulam
na mdia podem assumir a condio de palavras-acontecimento, produzidas
por uma comunidade linguageira a partir de uma formao interdiscursiva
carregando consigo toda uma memria interdiscursiva e, por outro, como
certos textos circulam: se inteiros, aos pedaos, em versos, em frmulas.
Ambas buscam compreender em que medida essa circulao determina o
que pode e deve ser (re)dito enquanto debate no espao pblico.
Os recentes trabalhos de Sophie Moirand (2007 e 2010) acerca das
palavras-acontecimento na sua relao com a memria interdiscursiva,
comunidade linguageira e formao interdiscursiva so timos exemplos de
uma das visadas da tendncia enunciativa. Os exemplos abaixo publicados
em diferentes suportes miditicos brasileiros nos mostram um dos possveis
funcionamentos analtico-tericos das propostas de Sophie Moirand.
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(1): Reportagem publicada no jornal Correio do Povo de Porto Alegre em
12/03/1999.
(2): Reportagem publicada na Revista poca em 18/12/2001.
(3): Reportagem publicada no site blogdolago.com em 27/09/2012.
(4): Reportagem publicada no site esportes.terra.com.br 01/10/2012.
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(5): Reportagem publicada no site revistalingua.uol.com.br 02/10/2012.
Os cinco textos anteriormente elencados nos mostram um breve percurso da
palavra-acontecimento apago. Essa palavra irrompe nos variados suportes miditicos brasileiros em 1999, aps o blecaute ocorrido em
diversos estados das regies Sul e Sudeste do Brasil. poca, o significante
blecaute disputava com apago de forma bastante acirrada a preferncia dos
suportes miditicos na interpretao dos acontecimentos que diziam a falta
de energia. Em 2001, o blecaute em diversas regies brasileiras se repete, no
entanto, a mdia o interpreta como apago. De l para c, o significante apago passou a ser a designao no s para a falta de energia, mas para os mais diferentes acontecimentos, que dizem de alguma carncia, de algum
problema. Como se pode observar nas manchetes anteriores, esse elemento
lingustico pode significar tanto a falta de mo de obra especializada na
indstria brasileira quanto a falta de iniciativa do time de futebol paraguaio
Cero Portenho na sua partida frente ao Clon ou mesmo a dificuldade de
leitura dos nossos alunos nos diferentes graus de ensino. Essa palavra
apago desde a sua irrupo carrega consigo um valor disfrico, algo da ordem da falta, da carncia, do problema, que (re)atualizado a cada nova
textualizao. Assim, ao dizer do Apago profissional e mo de obra assistida ou O apago da leitura, por exemplo, as matrias evocam interdiscursivamente, mesmo que de soslaio, os efeitos de sentidos
disfricos apensos ao blecaute ocorrido em 1999. Em outros termos, o
elemento apago em cada uma das suas (re)atualizaes, em termos de
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designao de novos acontecimentos discursivos, carrega consigo traos
disfricos produzidos antes, independentemente e outro lugar. Sobre os
traos de um discurso que emergem em outro, constituindo novos momentos
discursivos nos diz Moirand (2007, p. 04):
Um momento discursivo no forosamente espetacular, como foi o 11 de setembro
de 2001 ou como pode ser um tremor de terra devastador. Um fato ou um evento
constitui um momento discursivo quando se d a ler numa abundante produo
miditica em que alguns traos permanecem por um certo tempo em discursos
produzidos ulteriormente a propsito de outros eventos. Podemos evocar ainda o
maio de 68 a propsito dos problemas da Escola francesa em 2004, ou retomar o escndalo do sangue contaminado a propsito da crise da vaca louca, ou da questo
dos OGM. So esses traos discursivos que nos importam, pois eles reconstroem a
superfcie discursiva a propsito de outros eventos (novos momentos discursivos) e
entram na roda dos discursos produzidos sendo transmitidos pelas mdias.
Os atuais trabalhos de Dominique Maingueneau (2007, 2010a, 2010b; 2011
e 2012) se inscrevem numa outra possibilidade de pensar a Anlise de
Discurso de base enunciativa e tm buscado compreender de forma acurada
a circulao dos textos verbais na nossa sociedade, isto , como certos
textos circulam: inteiros, em fragmentos, adaptados, em edies originais,
traduzidos. E tambm: por que, de um texto integral, frequentemente
circulam apenas partes: estrofes, versos, finais, comeos, pequenas frases,
pontos culminantes.
No entendimento de Dominique Maingueneau (2011), poucas
pessoas hoje em dia contestariam a ideia de que o texto constitui a nica
realidade emprica sobre a qual se debrua o lingista: unidades como a
frase ou a palavra so necessariamente retiradas de textos. O texto , com
efeito, no entendimento do pesquisador francs, a contraparte do gnero do
discurso, que o quadro de toda a comunicao pensvel. Maingueneau
mobiliza o termo gnero do discurso para atividades como registrar o nascimento, o debate televisivo, o sermo, entre outros.
Um problema se pe, no entanto, quando preciso tratar de
enunciados curtos que se apresentam fora do texto, geralmente constitudos
de uma nica frase. Dominique Maingueneau conceitua essas pequenas
frases como enunciados destacados. Eles so de tipos muito diversos: slogans, mximas, provrbios, ttulos de artigos da imprensa, interttulos,
citaes clebres, etc. Para o estudioso francs devem-se distinguir duas
classes bem diferentes, segundo o seu destacamento:
1) constitutivo: o caso em particular das frmulas (provrbios, slogans, divisas)
que por sua prpria natureza so independentes de um texto particular; 2) ou resulta
da extrao de um fragmento de texto: encontra-se em uma lgica de citao.
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O texto a seguir se constitui num bom exemplo do que Maingueneau
considera como destacamento constitutivo:
(6): Reportagem publicada na Folha de S.Paulo 13/09/2009.
O ttulo do comentrio de Fernando de Barros e Silva, publicado na Folha
de S. Paulo em 13 de setembro de 2007 H algo muito podre no reino faz aluso frase shakespereana do Hamlet H algo de podre no reino da Dinamarca. Todavia, dada a grande circulao deste enunciado nos mais
diversos campos e suportes, essa pequena frase perdeu sua marca de autoria
e se transformou numa espcie de slogan se tornando profundamente
independente do texto de Willian Shakespeare.
O excerto a seguir se constitui num bom exemplo do que
Maingueneau denomina destacamento que resulta de um processo de
extrao.
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(7): Reportagem publicada no site g1.globo.com 15/08/2008.
A matria anterior foi publicada no site de notcias G1 da Globo.com em 16
de setembro de 2008 e traz como manchete o seguinte enunciado: Pergunta para o Bush, diz Lula sobre crise americana. Esse enunciado foi retirado de um discurso proferido pelo ento presidente Lula em cerimnia de
inaugurao da UFERSA Universidade Federal do Semi-rido em Mossor no Rio Grande do Norte em setembro de 2008. Na ocasio disse
Lula:
Vocs viram que a crise americana j est a h algum tempo. A imprensa s fala
nisso. Imagine, Wilma, se fosse dez anos atrs. Imagine se os Estados Unidos
dessem o espirro que deram com essa crise imobiliria l, certamente o Brasil teria
pegado pneumonia. Agora, eles esto em crise. A imprensa, de vez em quando, fica
doida: Mas, presidente Lula, e a crise americana? Perguntem para o Bush. A crise dele, no minha. Eu tenho que cuidar do meu pas para no permitir que ele seja contaminado por esta crise, e por isso que diversificamos a nossa
balana comercial. Antigamente o Brasil tinha muitas coisas com a Europa e com os
Estados Unidos e ainda queremos ter mas hoje ns temos mais com a Amrica do Sul e com a Amrica Latina, temos mais com a frica, com o Oriente Mdio,
com a sia. Hoje no dependemos de um ou de dois pases. Hoje ns temos um
fluxo de balana comercial diversificado. Alm disso, o FMI no est mais aqui para
dar palpite nas coisas que ns fazemos, e temos 207 bilhes de dlares de reserva,
sagrados, para no permitir que este pas seja vtima de especulao imobiliria ou
financeira. (grifos nossos).
O enunciado em negrito deixa claro que o enunciador jornalista no somente
destacou de um texto maior um (pequeno) enunciado, mas tambm realizou
um trabalho de interpretao desse enunciado, como se pode ver
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comparando as duas verses: segundo o jornalista, Lula disse: Pergunta para o Bush. Por sua vez, Presidente Lula tinha dito: Mas, presidente Lula, e a crise americana? Perguntem para o Bush. A crise dele, no minha. Todo o restante da fala do presidente completamente esquecida pelo enunciador jornalista. Essa extrao no se exerce de maneira indiferenciada sobre todos os
constituintes de um texto, pois frequentemente o enunciador sobreassevera
alguns de seus fragmentos e os apresenta como destacveis. A
sobreasseverao uma modulao de enunciao que habilita formalmente
um fragmento como candidato a uma destextualizao. Trata-se de uma
operao de colocao em relevo no tocante ao restante do desenvolvimento
textual que se efetua com a ajuda de marcadores diversos: de ordem
aspectual (genericidade), tipogrfica (posio saliente em uma unidade
textual), prosdica (insistncia), sinttica (construo de uma forma
pregnante), semntica (recurso aos tropos), lexical (utilizao de conectores
de reformulao), etc. A reportagem a seguir publicada no jornal Folha de S.
Paulo em 21/05/2012 se constitui num bom exemplo do que Maingueneau
define como sobreasseverao.
(8): Reportagem publicada no Jornal Folha de S. Paulo 21/05/2012.
Segundo o UOL em matria publicada em 21/05/2012: Uma das redaes consideradas pela Fuvest (Fundao Universitria para o Vestibular) como
uma das melhores do vestibular 2012 da USP (Universidade de So Paulo)
continha uma mensagem subliminar pedindo a sada do reitor da instituio,
Joo Grandino Rodas. Na verdade o que o UOL compreende como mensagem subliminar se constitui num exemplo bastante interessante do
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que Dominique Maingueneau conceitua como sobreasseverao. Com
efeito, o locutor destaca determinados elementos lingusticos ao longo da
redao, formando o enunciado Fora Rodas. Esse enunciado, produzido alhures, visto que se constitui numa representao metonmica das
manifestaes contrrias a atitude do Reitor da USP em autorizar a entrada e
a permanncia da Polcia Militar no campus da USP na cidade de So Paulo
- SP, dado a ler na redao do vestibulando como uma espcie de
antecipao do que deve ser retomado. Trata-se de uma estratgia do
vestibulando, buscando identificar seu posicionamento ideolgico frente
reitoria com o posicionamento da banca de correo das redaes.
No entendimento de Maingueneau, as divergncias entre o
enunciado fonte e o enunciado destacado so reveladoras de um estatuto
pragmtico especfico para os enunciados destacados. Esses ltimos
revelam, com efeito, um regime de enunciao que o pesquisador prope
chamar enunciao aforizante. Entre uma aforizao e um texto no existe uma diferena de tamanho, de forma, de sistematicidade lingustica,
mas de ordem enunciativa. O esquema a seguir exemplifica as duas ordens
discursivas propostas por Maingueneau:
Enunciao
Aforizante Textualizante
Destacada por natureza Destacada de um texto
Para Maingueneau a enunciao se organiza em duas ordens do enuncivel:
a enunciao textualizante e a enunciao aforizante. Esta ltima, por sua
vez, se organiza em enunciao aforizante destacada por natureza e
enunciao aforizante destacada de um texto. No entendimento do terico
francs por meio da aforizao o locutor se coloca alm dos limites
especficos de um determinado gnero do discurso:
O aforizador assume o ethos do locutor que fala do alto, de um indivduo em
contato com uma Fonte transcendente, ele no se enderea a um interlocutor
colocado no mesmo plano que ele e que pode responder, mas a um auditrio
universal. Ele instado a enunciar a sua verdade, que prescinde de toda a
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negociao, exprimindo uma totalidade vivida: seja uma doutrina ou uma certa
concepo de existncia. Por intermdio da aforizao vemos coincidir sujeito da
enunciao e Sujeito no sentido jurdico e moral: algum que se coloca como
responsvel, afirmando valores e princpios diante do mundo, se endereando a uma
comunidade para alm dos locutores empricos que so seus destinatrios.
Este, no entanto, , para Maingueneau, o ponto central do problema, o aforizador no um locutor, o suporte da enunciao, mas uma
conseqncia do destacamento, isto , no se trata apenas de outra instncia enunciativa, distinta tanto da do locutor/alocutrio quanto da do
enunciador/enunciatrio, mas uma instncia supraenunciativa em contato com uma Fonte Transcendente. Desse modo, quando se extrai um
fragmento de texto para fazer uma aforizao, um ttulo de uma matria na
imprensa, por exemplo, converte-se ipso facto seu locutor original em
aforizador.
O desenvovimento recente de uma configurao miditica totalmente
nova, que associa diretamente a mdia impressa, o rdio, a televiso, a
internet e a telefonia mvel, permitiu aumentar para nveis sem precedentes
o destacamento e a colocao em circulao das aforizaes.
Um certo nmero de frases sem texto so tomadas em um
processo de tipo pandmico: durante um perodo curto vemos circular em
todas as mdias e s vezes com uma frequencia muito elevada, com estatutos
muito diversos: ttulo de um artigo de jornal ou de uma pgina da internet,
frase que circula na parte de baixo do monitor de um canal de informao
televisiva, ttulo de um vdeo sobre o YouTube, etc. Como exemplos
podemos citar o enunciado Que vergonha, Barack Obama4, proferido por
Hillary Clinton nas ltimas eleies presidenciais americanas (23 de
fevereiro de 2008), ou o enunciado de Slvio Berlusconi : Obama jovem,
belo e bem bronzeado5 (06 de novembro de 2008). Nesse sentido, segundo
Maingueneau (2012) :
Podemos falar de uma panaforizao , termo que combina o pan pandemia e
aforizao . A panaforizao figura nas manchetes dos jornais, se infiltra nas
conversaes ordinrias, suscita debates de todas as espcies nas mdias : sobre os
fruns, os talk-shows televisivos, no correio dos leitores, etc. Antes de desaparecer
substituda por outras.[...] Com a emergncia da Internet e a interconexo
generalizada dos suportes de informao num mundo globalizado, a aforizao
entrou num novo regime, que ainda no conseguimos medir todas as suas
implicaes polticas, sociais, cognitivas. A panaforizao se ope termo a termo
sentena da cultura humanista que pervaleceu at segunda guerra mundial: sua
validade no est ligada a sua profundidade temporal, a seu pertencimento a um
Thesaurus antigo e Tradio que a perpetuou, mas ao fato de que ela satura de
repente o espao miditico, que se impe como objeto de discurso, como o que no
podemos deixar de falar.
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Um exemplo que ilustra bem o funcionamento das panaforizaes a
pequena frase Vada a bordo, cazzo, dita pelo comandante Gregrio De Falco da Capitania do Porto de Livorno ao capito do navio Costa
Concrdia Francesco Schettino em 17 de janeiro de 2012, quando do
naufrgio do navio.
(9): Reportagem publicada no site geek.com.br 22/01/2012.
(10): Reportagem publicada no site g1.globo.com 18/01/2012.
As matrias acima publicadas em diferentes suportes nos mostram como a
frase Vada a bordo, cazzo, por conta da sua intensa circulao ganhou o status de panaforizao.
Defendo que a teoria das frases sem texto proposta por Dominique Maingueneau se configura num preciso ferramental para dar conta,
sobretudo, da maneira mesmo, como certos textos circulam atualmente nas
mdias. No entanto, dado o carter multissemitico dos textos miditicos
atuais, que mobilizam em sua constituio diferentes materialidades
significantes, especialmente os que se assentam na comunicao poltica,
objeto nosso de reflexo neste artigo, cremos ser pertinente mobilizar na
juno com a teoria de Maingueneau a teoria Semitica Social de Theo Van
Leuuwen.
O livro Introducing social semiotics6 de Theo Van Leeuwen
inaugura a introduo aos conceitos e mtodos do escopo de estudos da
semitica social. A obra discute ao longo de suas pginas alguns dos
princpios que tornam a semitica social uma nova e distinta abordagem
dentro do campo de estudos semiticos de maneira geral, bem como,
lingusticos, comunicacionais e sociais. Nessa direo, delineia-se que
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semitica social no uma teoria pura, homognea, terminada, distante de
suas relaes fronteirias nem um campo auto-suficiente. Isso se aplica
porque a tentativa do autor deste livro tambm o de aproximar o termo
social da semitica, que feito justamente para envolver a esta teoria com
diversas teorias sociais.
No entendimento de Theo Van Leuuwen, assim como nas teorias
lingusticas, que, em algum momento de histria, mudaram seus focos da
sentena ao texto e do contexto gramtica do discurso, a semitica social
modificou seu foco do signo para o modo como, em inter-relao, os
indivduos lanam mo de certos recursos semiticos para produzirem as
aes e os mecanismos comunicativos, assim como utiliz-los para
interpretar em contextos especficos de situaes e prticas sociais, os quais
podem ou no alterar a forma de produo e a manifestao.
Recursos em semitica social so, portanto, significantes, aes
observveis e objetos que foram esquadrinhados para o domnio do social,
da comunicao e que tm, por essa natureza significativa-social, um
potencial semitico-terico constitutivo, seja por todas as suas utilizaes
alhures, seja pelas atualizaes que deles so feitas ou pela fresta aberta a
uma futura utilizao. E exatamente por todos esses potenciais de usos
anteriores que tais recursos so conhecidos, compartilhados e considerados
relevantes pelos usurios em uma comunicao, verbal ou no-verbal. Essas
utilizaes ocorrem em um contexto histrico-social, e nesta situao em
especfico podem haver regras de uso as melhores prticas a serem seguidas , que regulam como recursos especficos semiticos podem/no podem e devem/no devem ser usados. Alm disso, esses recursos no esto
restritos fala nem escrita tampouco produo de imagens.
Utilizando um interessante esquema argumentativo, qual seja, definir
aspectos e anlises dos mecanismos semiticos desenvolvidos e aplicados a
diversas imagens, filmes, arquitetura, propagandas e at mesmo a ao
formato, design e funcionalidade de brinquedos para crianas, bem como as
verdades que estes representam, o autor coloca trs questes bsicas que, em
sua perspectiva, os semioticistas trazem luz em suas pesquisas: a) eles
coletam, documentam e sistematizam em catlogos de pesquisas semiticas
inclusive a histria desses catlogos; b) investigam como essas pesquisas so usadas ao longo da histria, em contextos culturais e institucionais o seu plano, o seu ensino, a sua justificativa, a sua crtica etc.; c) contribuem
para a descoberta e o desenvolvimento de novas pesquisas semiticas e
novos usos para as pesquisas semiticas j existentes.
Nesse sentido, da ideia originada em Halliday, de que Gramtica no
simplesmente um conjunto de regras para se redigir boas sentenas, e sim
um recurso para busca de significados, Leeuwen aprofunda essa reflexo,
defendendo que gramtica pode ser usada em outros modos/suportes
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semiticos, definindo que recursos semiticos como aes e
artefatos/mecanismos, que ns usamos para comunicao, sejam elas
produes de sentido por meios fisiolgicos com ou sem aparelho vocal, com msculos usados para criar expresses faciais e gestos etc. sejam elas pelos significados tecnolgicos com caneta, tinta e papel, com computadores e software, com tesouras e mquinas de costura etc.
Tradicionalmente, essa busca por significados na comunicao, ou aquilo
que comum entre interlocutores, no que tange aos sentidos, chamado de
signo. Com efeito, para Van Leuuwen h tambm uma espcie de gramtica
que regula o funcionamento dos textos multissemiticos.
A semitica social no estaria centrada apenas no discurso, mas em qualquer troca cultural que exija a busca de conhecimentos. Para nossa
anlise em relao s eleies brasileiras, interessa particularmente os
recursos das dimenses de anlise da semitica social que Leeuwen aborda.
O autor dimensiona seu trabalho algum desses recursos. Entre eles: 1)
Discurso, que conceito-chave para estudar como os recursos semiticos
so usados para a construo de representaes sobre o que est
acontecendo no mundo; 2) Gnero, que trata da compreenso de como os
recursos semiticos so usados para promulgar interaes comunicativas interaes que envolvem alguma forma de representao como, por exemplo, se so conversas face a face ou se so retirados de outros tempos
e/ou lugares, como livros e outras mdias; 3) Estilo, um conceito que o
espao terico privilegiado para estudar como os indivduos usam recursos
semiticos na execuo dos gneros e, mais e alm disso, como esses
mesmos indivduos deixam certas marcas, pistas, trilhas para expressar suas
identidades e valores ao faz-lo; 4) Modalidade, conceito que crucial para
estudar como indivduos usam recursos semiticos para criar valores de
verdade ou de realidade de suas representaes, para se comunicar, por
exemplo: se uma imagem e/ou assero so postas a circular para ser
tomadas como verdade ou como fico, a verdade comprovada ou
conjectural etc., e sempre na tenso de certo interesse nesta representao de
verdade, ou seja, as verdades so diferentes a depender de quem a produz.
Apesar de discuti-las separadamente, para fins didticos, todas essas
dimenses nunca ocorrem isoladamente e so sempre parte de cada evento
comunicativo e cada artefato semitico utilizado como recursos de
construo e compreenso dos objetos. De acordo com o autor, somente se
pode ter uma viso multidimensional destes conceitos ao olh-los
conjuntamente.
Para Van Leeuwen ainda, a semitica social aborda dois temas
intimamente relacionados, quais sejam: os recursos materiais de
comunicao e a forma como os seus usos so socialmente regulados. O
primeiro tema trata de como os recursos materiais de comunicao podem
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ser fisiolgicos ou tcnicos. Como recursos fisiolgicos, incluem-se o
nosso aparelho vocal, msculos que usamos para criar expresses faciais,
gestos e outras aes fsicas que realizam parte do no-verbal das
comunicaes inter-humanas. Pode-se dizer que se trata tambm de uma
utilizao sempre socialmente regulada. Em consonncia com o autor, a
voz, por exemplo, pode produzir uma vasta variedade de sons. Mas, na
maioria das situaes, evocada a produzir apenas sons da fala, e apenas os
sons da fala apropriados a uma dada situao, idade, gnero, classe social e
papel dos falantes envolvidos. O mesmo se aplica ainda ao no-verbal das
comunicaes. A tese de que, desde cedo, tendemos a observar e a imitar
os elementos socialmente permitidos ou, mais ainda, as formas desejveis
de comunicao no-verbal; muitas vezes ns somos explicitamente
instrudos termo de Leeuwen por esses elementos permitidos, como em seus exemplos: Olhe para mim enquanto voc fala ; No coloque as mos em seus bolsos; Sente-se direito mesa etc. Isso no quer dizer que no exista espao para a liberdade, para uma pitada de estilo individual,
no modo como nos comunicamos, verbal ou no verbalmente H, no
entanto, mais em algumas situaes do que em outras. Entretanto, em geral,
a comunicao sempre ocorre dentro ou s vezes em oposio a alguma coisa dos limites socialmente definidos de situaes especficas. Se, por ventura, nos afastamos para alm dessas fronteiras sociais, ora mais ou ora
menos visveis, algumas sobrancelhas sero arqueadas nos desaprovando; mas, se persistirmos um pouco mais alm em superar esses limites, pode
haver outras consequncias e mais graves: no vamos ser os mais aptos a esta situao particular e seremos afastados de alguns acontecimentos
institucionais e sociais.
Em contrapartida, pelos os recursos tcnicos, Leeuwen entende que
so elementos que podem ampliar o potencial de nossos recursos
fisiolgicos. Ns podemos comunicar no s com a nossa voz, mas tambm
com instrumentos musicais; no s com expresses faciais e gestos, mas por
meio das roupas que usamos e pela maneira como tratamos nossos corpos.
Isso inclui at mesmo a comunicao por meio de modalidades sensoriais,
as quais no temos controle articulatrio consciente, como, exemplo,
quando usamos certas fragrncias para comunicar algo sobre ns mesmos (a
intensidade e o cheiro de perfumes que passamos para ir a um encontro,
festa etc.) ou sobre espaos particulares, ao perfumarmos uma sala, um
banheiro etc. Por fim, temos tecnologias desenvolvidas para preservar
nossos atos comunicativos: escrever e gravar para retransmitir ou distribuir
por meio de distncias. Por exemplo, telefonia, radiodifuso, arquivos de
computador, entre outros. O uso desses recursos tambm socialmente
regulado, por exemplo, por meio de quem ou a quem sero permitidos os
acessos a tais arquivos, sejam eles em papis, sejam digitalizados.
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O escopo da semitica social , portanto, a unio desses dois
aspectos de recursos semiticos, sua natureza material ou tcnica e a potencialidade semitica que eles tm , e a regulao social da sua utilizao, a par e passo com sua histria. Isto significa que semitica social
em grande medida sobre o como das comunicaes. Como podemos utilizar todos esses recursos materiais para produzir sentido X e/ou Y? Van
Leeuwen argumenta no ser possvel dissolver estas questes sem entender
um como sem o qu, e arriscaramos, do mirante do discurso, nem sem um por que da circulao discursiva desses recursos. E como feito isso em suas teorizaes? Esta resposta repousa na compreenso que traz de
discurso.
No nosso entendimento, o autor usa explicitamente uma concepo
foucaultiana de discurso, bem como a forma de ser fazer a anlise dos
discursos, aspectos terico-metodolgicos que o aproximam da Anlise de
Discurso, quer seja na sua vertente historicista, quer seja na sua vertente
enunciativa. Com efeito, discursos que so possibilitados a partir de
princpios de controle, de delimitao e de rarefao, isto , discursos como
ordens reguladoras e definidoras das construes de saberes socialmente
circulantes, edificadores de aspectos da realidade.
A ideia de socialmente construda define-se como conhecimentos que tm sido desenvolvidos em contextos sociais especficos e em formas
adequadas aos interesses dos atores sociais nesses contextos, sejam eles
grandes contextos corporaes multinacionais sejam eles pequenos uma famlia em particular; sejam contextos fortemente institucionalizados a imprensa , sejam aqueles relativamente informais conversas familiares mesa de jantar, entre amigos em um restaurante, etc. Um dos exemplos que
Van Leeuwen apresenta parece bastante interessante. Segundo o terico,
tomemos um discurso sobre operaes especiais de guerra. Esses discursos podem ser destacados por jornalistas ocidentais ao relatar os EUA
em uma coligao militar de intervenes nos lados do oriente, mas podem
tambm ser utilizados em certos tipos de conversao, dilogos cotidianos
prosaicos, em aeroportos, em romances policiais, em filmes de Hollywood,
em jogos de computador, em documentrios... Tais discursos,
frequentemente, servem ao interesse de pas e/ou pases e de certas
instituies miditicas, em que textos, dilogos, imagens e outros elementos
so produzidos acerca do tema. Todavia, como seguem uma orientao
ideolgica de sentido, normalmente, esses discursos deixam de fora, ou mais
margem, acontecimentos factuais como bombardeios areos, terrestres,
mortes de civis, para concentrarem seu centro de sentido em a elite das foras terrestres envolvidas em operaes especiais, isto , habilidades de combate altamente superiores, quer seja em tecnologia, quer seja em
grupamentos e equipamentos de trabalho, rpida e eficiente insero ao
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territrio inimigo; a criao palpvel e visvel de um inimigo, ou seja, a representao do mal, como um senhor da guerra desptico, tirano ou super-
terroristas, levando luta um exrcito de homens aos frangalhos,
indisciplinados e mal preparados/equipados; a ideia de salvao de vtimas
fracas deste inimigo, a saber, as populaes locais, a ONU, a manuteno da
paz e agncias humanitrias de alimentos que, de acordo com esse discurso,
no podem operar sem a proteo das foras de elite.
Discursos so, portanto, recursos para representao, conhecimentos
sobre algum aspecto da realidade que podem ser utilizados quando esse
aspecto da realidade tem de ser representado. Podem existir vrios discursos
sobre um determinado aspecto da realidade, que produzem efeitos de
sentido de maneiras diferentes, ou seja, incluindo ou excluindo coisas
diferentes e servindo a interesses diversos. Qualquer discurso pode ser
realizado por gneros diferentes e mltiplas combinaes de recursos
semiticos. Discursos combinam dois tipos de elementos, quais sejam,
representaes de prticas sociais e as legitimaes destas prticas sociais7.
Com isso temos que, para a questo de um o qu da comunicao, na
semitica social, Van Leeuwen faz uma abordagem via as estruturas
discursivas e suas regulaes. Todavia, a fim de edificar um como acontecem as comunicaes, o autor envereda por dois conceitos bastante
difundidos e conhecidos no campo dos estudos da linguagem: a teoria dos
atos de fala, marcadamente envolta nas concepes do filsofo ingls Austin
e teorias sobre gnero, que aproxima, sobretudo, a semitica, tal como ele
entende, do vis social.
Todavia, a propsito de nosso trabalho, compreender com as frases sem texto e as fotografias dos atores sociais em textos da mdia sobre as eleies presidenciais brasileiras, engendram determinados percursos de
interpretao, nos debruaremos mais detidamente na questo dos gneros.
Deixamos apenas a ressalva de que neste gesto de recorte no h nenhuma
valorao depreciativa ante a teoria dos atos de fala, e sim apenas questes
terico-metodolgicas.
Gnero, em diversas teorias dentro do campo de estudos da
linguagem, um termo-conceito geralmente usado para definir um tipo de texto. Textos adquirem certo padro genrico quando tm caractersticas que podem tambm ser reconhecidos em outros textos semelhantes. A razo
para isso que as pessoas que produzem os textos parecem seguir certas
regularidades ao lhes produzirem, vezes mais, vezes menos tcitas. O
filsofo russo Mikhail Bakhtin, em Esttica da criao verbal, traz uma
definio seminal acerca da concepo de gnero, que para alm de decisiva
pelo seu contedo, com certeza est mais que alicerada pelo uso e desuso em diversos trabalhos. Na clebre definio, tem-se que:
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Todas as esferas da atividade humana, por mais variadas que sejam, esto sempre
relacionadas com a utilizao da lngua. No de surpreender que o carter e os
modos dessa utilizao sejam to variados como as prprias esferas da atividade
humana, o que no contradiz a unidade nacional de uma lngua. A utilizao da
lngua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos), concretos e nicos, que
emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da atividade humana. O enunciado
reflete as condies especficas e as finalidades de cada uma dessas esferas, no s
por seu contedo (temtico) e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleo operada nos
recursos da lngua recursos lexicais, fraseolgicos e gramaticais , mas tambm, e, sobretudo por sua construo composicional. Estes trs elementos (contedo
temtico, estilo e construo composicional) fundem-se indissoluvelmente no todo
do enunciado, e todos eles so marcados pela especificidade de uma esfera de
comunicao. Qualquer enunciado considerado isoladamente , claro, individual,
mas cada esfera de utilizao da lngua elabora seus tipos relativamente estveis de
enunciados, sendo isso que denominamos gneros do discurso. (BAKHTIN, 1997a,
p.280 grifos do autor)
Para Van Leuuwen so de trs tipos de caractersticas-padro a sedimentar
os gneros: contedo, forma e funo. Gneros como os Western (histrias
que envolvem lutas, tiroteios, bangue-bangue) e os famosos e tradicionais
contos de fadas so normalmente caracterizados com base em seus
contedos. Westerns so caracterizados normalmente em um determinado
tempo e lugar e usam aes e caractersticas das personagens em tramas
tpicas ao padro genricas. Contos de fadas, da mesma forma, so definidos
a partir de bases consolidadas. No entanto, de acordo com Van Leeuwen,
no se deve ficar restrito a esses tipos de texto. Contedo, um o qu de um texto, claramente importante em qualquer tipo de texto. Na semitica
social, no entanto, o contedo um recurso estudado sob o ttulo de
discurso, em vez de sob o ttulo de gnero.
Textos tambm podem ser caracterizados com base no meio de
expresso ou meios eles usam para circular. Para o autor, o quarteto de
cordas poderia ser um exemplo dessa abordagem orientada ao estudo do
gnero. Dessa forma, no exemplo, gnero: um quarteto de cordas um
quarteto de cordas, porque compreende quatro instrumentos de cordas,
independentemente de como eles so tocados. Essa abordagem de forma
orientada comum em relao s formas de expresso em que a
representao no est em primeiro plano ou no considerada importante como exemplo de Leeuwen tem-se a msica.
Os textos ainda podem ser tpicos em termos pelo o que eles fazem.
O gnero de propaganda, a exemplo, definido pela sua funo de venda de
produtos ou servios. Atualmente, tambm de ideias, vide as campanhas
polticas. O gnero de notcia definido pela sua funo de fornecer
informaes sobre ltimos acontecimentos de interesse pblico. As
combinaes so possveis tambm. O gnero de revista publicidade, por
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exemplo, definido com base na sua funo publicidade como, bem como o seu meio, a revista.
A abordagem de gnero da semitica social tem se concentrado nas
funes do texto diante das interaes sociais, no que as pessoas fazem para
si ou para outros por meio de textos. Como tais acontecimentos se
desenrolam sequencialmente. Esta abordagem de gnero concentra-se na
forma como os diferentes tipos de comeo-meio-fim estruturam e ajudam a aprovar prticas comunicativas. Mas a abordagem da semitica social
tambm ressalta que o estudo do texto por si s no suficiente. As
sequncias de aes comunicativas que compem gneros esto incrustadas
em prticas sociais que contm tambm outros elementos: atores, tempos,
lugares e assim por diante. A semitica social debrua-se no s nas aes,
isto , o que feito aqui com palavras (ou imagens, ou msica)?, mas tambm em Quem faz isso?, 'Para quem faz?, Onde faz?, Quando? Em outras palavras, vai dos elementos estruturais s condies de produo
desses gneros.
Portanto, gnero pode ser um tipo de texto definido em termos da
sua estrutura e das suas condies de produo como um evento
comunicativo. Alm disso, so formas de atingir objetivos comunicacionais,
tais como contar uma histria, persuadir as pessoas a fazer e acreditar em
coisas, instruir pessoas em alguma tarefa, e assim por diante. Eles so
analisados como constituintes de etapas dadas em padres funcionais, como a identificao de um problema, a proposta de uma soluo, e assim
por diante. Cada estgio, ainda, um passo no caminho para cumprir tais
metas comunicativas. Gneros podem, assim, ser vistos como as aes de
comunicao de dadas prticas sociais que, por sua vez, como vimos, so
aes que as pessoas fazem para si ou para outros, na medida em que elas
seguem padres reconhecveis e cujos principais elementos de tais prticas
so as aes que as constituem, a maneira pelas quais estas aes so
executadas, os atores sociais que participam das aes, os recursos
necessrios para a exequibilidade das aes etc.
A priori, pode se esperar que qualquer gnero possa combinar com
qualquer discurso, porque os gneros so, no mais das vezes, modelos de
aes e mecanismos comunicativos. Todavia, na prtica, nem todas as
combinaes de gnero e discurso so socialmente aceitveis, justamente
pelas regulaes que os discursos sofrem e refratam.
J por outro recurso de anlise social semitica, Theo Van Leeuwen
aborda a questo do estilo. Para desenvolv-la sob a gide semitica social,
o autor parte dos trabalhos de outro terico, Norman Fairclough, que
executa trs conceitos, em parte semelhantes, aos da teoria de Van
Leeuwen: discurso, gnero e estilo. Entretanto, o objeto de pesquisa de
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Fairclough foi o de uma anlise da linguagem do Novo Trabalhismo, mas ligado ao
campo poltico:
Estilos (por exemplo, o estilo de Tony Blair) tm a ver com identidades polticas e
valores; discursos (por exemplo, o discurso da "terceira via" [frente poltica da qual
Tony Blair faz parte]) tm a ver com representaes polticas, e gneros tm a ver
com figuras como a linguagem, como meios de Governo (O Green paper constitui
um gnero particular, uma maneira particular de usar a lngua no governo) (...)
Apenas estes [gneros] so analiticamente separveis em casos reais, eles esto sempre simultaneamente em funcionamento. Assim, qualquer discurso de Tony
Blair, por exemplo, pode ser analisado em termos de como ele contribui para o
processo de governo (como ele alcana o consentimento, por exemplo), como se
representa o mundo social e os processos poltico e governamental em si, e como ele
projeta uma identidade particular, ligada a valores especficos isto , em termos de gnero, discurso e estilo. (FAIRCLOUGH, 2000, p.14 apud VAN LEEUWEN,
2004, p. 139)8
A semitica social, principalmente, tem se concentrado mais nos recursos
semiticos empregados no discurso e no gnero do que estilo. Entretanto,
Van Leeweun observa que, como em seu entendimento, a expresso estilo de vida comea a substituir classe social, como o principal tipo de agrupamento social e fonte de identidade social, as questes de estilo tm-se
se tornando cada vez mais importantes no mundo social dos dias de hoje.
O autor ainda apresenta trs abordagens para questes ligadas ao
tema estilo. Aponta em uma direo de mudana quanto a esta questo: a
dominncia de expresses tais como estilo de vida em vez de estilo social. Na prtica e em teoria, as trs abordagens, como o autor tenta demonstrar, se envolvem de muitas maneiras. Isso se d porque h um ponto
comum entre todas os recursos de estilo, que a articulao que preside a
relao entre a liberdade individual um certo estilo prprio de cada indivduo e a determinao social, que, de muitas maneiras, coage os vrios estilos existentes a centrar-se em formas estilisticamente dominantes.
No entendimento de Van Leuuwen, em primeiro lugar, deve ser considerada
a ideia de estilo individual como diferena individual, embora as formas de
falar, escrever e agir estejam sempre em alguma medida socialmente
reguladas. H, ainda assim, geralmente, espaos para diferenas individuais,
para, como diz o prprio autor, fazer as coisas do nosso jeito. A caligrafia um bom exemplo do estilo individual. Ela
socialmente regulada, uma vez que h um modo como tem sido ensinada no
sistema escolar, mas todo mundo tem sua prpria caligrafia, que
reconhecvel e ligada a um estilo prprio. O estilo individual tem se
expressado fortemente em manifestaes como msica, literatura e artes, em
que interessante e exaltado ter seu prprio estilo. De acordo com Van
Leeuwen, alguns autores, por um lado, tratam o estilo individual como
marca de identidade, uma espcie de impresso digital. O estilo individual
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de voz permite reconhecer que certo orador, que o estilo individual de
escrita de dado escritor etc. A capacidade de reconhecer estilo individual
torna-se um campo de conhecimento especial, um campo de trabalho,
certamente. A experincia do historiador de arte, a determinar se uma
pintura um verdadeiro Monet, Portinari, Tarsila do Amaral, entre outros
artistas. Alm desse campo, a base de estilo individual pode contribuir na
percia de um linguista forense, que chamado a (com)provar, com base em
caractersticas estilsticas, que documentos aparentemente distintos e
assinados diferentemente, eram, na verdade, escritos pela mesma pessoa.
Para outros tericos, por outro lado, o recurso estilstico significa ser
algo expressivo. Estilo expressa sentimento, atitudes diante do que dito,
escrito, pintado ou engendrado. Ou seja, sustenta certa autoria de um
discurso a que se veicula o dizvel. Segundo o autor, isto pode resultar de
decises deliberadas, como no caso da literatura, artes, teatro, etc., em que
estilos podem ser deliberadamente cultivados (ou imitados), ou no, como
no caso de algo considerado vulgar, vozes das pessoas, estilos de escrita,
estilos de andar, e assim por diante.
Tericos franceses, como Guiraud, Barthes, Rifaterre, cada qual
sua maneira, se detiveram na questo do estudo dos estilos. Da expresso
estilstica a um estudo do valor estilstico, passando inclusive por tpicos
tais como origem social do sujeito falante, efeitos de estilo na semitica
estruturalista, abordagens psicolgicas ao estilo individual, como o estudo
de preferncias de cor, em determinadas abordagens linguagem corporal, ou
em grafologia, ou em relao literatura, como Barthes o fez, ao criticar a
ideia valores expressivos.
J pela ideia de estilo social, Van Leeweun trata de arguir que
recurso de estilo nesta situao exprime no nossa personalidade individual
e atitudes, mas a nossa posio social. Dito de outro modo, h um Quem somos? em termos de categorias estveis, tais como classe, gnero e idade, relaes sociais e O que fazer? em termos de atividades socialmente reguladas, as quais nos envolvemos em certos papis que desempenhamos
dentro do ambiente social. Assim, estilo social no seria psicologicamente
motivado nem seguiria nossos humores de ocasio. Ainda que nessa ideia o
individual no desaparea, em certa medida, o valor altamente centrado em
um ego diminui de importncia.
O estilo social passou a desempenhar papel cada vez mais
importante, por exemplo, nas teorias sociolingustica e estilstica dos anos
1960 e 1970. Juntamente com o interesse nas variantes lingusticas em si,
como determinada realizao fontica ou encaixes morfossintticos em
certos grupos de indivduos, muitas vezes falantes do mesmo idioma,
passou-se a se estudar outras variantes a atuar nestas diferenas de
linguagem, por exemplo, classe social, poder, status de determinada variante
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diante do meio social etc. So de muito flego, dentro do campo da
lingustica, trabalhos de pesquisadores como Bernstein, Labov, Brown,
Gilman ou mesmo para os recursos de estilo em meios de comunicao,
campo de judicirio. Portanto, a idia de estilo, que tinha sido to
fortemente associada ao estilo individual, passava ento idia de
variedade da lngua, dialeto, idioleto, marcadores de variedade; competncia das regras sociais para seguir os estilos, entre outras coisas. A semitica social por tratar de recursos semiticos, em contextos
sociais, se alinha a esses estilos sociais. Desse modo, estilo compreende
tanto a organizao de caractersticas lingusticas no texto quanto os efeitos
produzidos nas complexas inter-relaes do produtor do texto, texto e
consumidor do texto, em sua, especficos posicionamentos sociais.
Por essa via de pensamento terico, estilo de vida, como quer Van
Leeuwen, o ponto de encontro entre estilo individual e estilo social. Por
um lado, social, porque um grupo que mantm certo estilo, mesmo se os
grupos que sustentam esto geograficamente dispersos, espalhados por
outras cidades, estados e/ou lugares do mundo, o que os caracteriza no por
uma estabilidade posicionamentos sociais como classe, sexo e idade ou
mesmo atividades relativamente estveis, como ocupaes. Porm,
compartilham comportamentos de consumo (gosto compartilhado) padres
comuns de atividades de lazer (por exemplo, um interesse em esportes
similares, ou destinos tursticos) e atitudes compartilhados para questes
sociais, como atitudes semelhantes para os problemas ambientais, questes
sexistas de gnero etc. Por intermdio de sua aparncia, as pessoas podem
anunciar suas interpretaes de mundo, a sua filiao com certos valores e atitudes. Na mesma base, que pode tambm reconhecer outros, em todo o
mundo, como membros que interpretam o mundo da mesma forma.
No entanto, estilo de vida tambm pode ser analisado como algo da
ordem do individual. Ao contrrio do tradicional estilo social, o discurso
inscrito em estilo de vida, segundo Van Leeuwen, diversificado. Tem-se
uma diminuio da homogeneidade, aumenta-se a escolha e acaba-se, assim,
com a exigncia de se vestir de acordo com a sua idade, gnero, classe,
profisso e at mesmo nacionalidade. H certamente estilos distintos para
homens e mulheres, para jovens e velhos e para diferentes nveis sociais,
como classes e ocupaes; entretanto, se essas nuanas no desaparecem,
certamente se tornam gradativamente menos importantes. Embora os
indivduos possam estar cientes do fato de que as suas escolhas so tambm
as escolhas de milhes de pessoas como eles, em todo o mundo, seus estilos
so essencialmente individuais e pessoais, e isso demonstra, em alguma
medida, que eles esto fazendo uso criativo da ampla gama de recursos
semiticos, que lhes so disponibilizados pelas indstrias culturais (que
fator gerado e existente pelo lado social do consumo de bens culturais). Este
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discurso se refora pelo fato de que estilo de vida um tipo de identidade
instvel, que pode mudar e ser descartada, refeita, transformada a qualquer
momento. Como um resultado, existe uma necessidade de monitorar
constantemente os meios de vida e do meio ambiente. Os significados
expressos pelo estilo de vida j no derivam do inconsciente, tais como os
de escritores, artistas e atores no passado. As pessoas atualmente criam suas
identidades de forma deliberada talvez isso explique o estado exaltado de escritores, artistas, atores etc. na sociedade de consumo contempornea, isto
, com essa permissividade de criao, mudana e transformao de estilo, a
canonizao de um estilo literrio pode ser questionada ou, na melhor das
hipteses, ter de dividir espao com outros estilos menos prestigiados, ao dizer de Dominique Maingueneau (2003).
Van Leeuwen explicita est tenso individual vs. social com o
exemplo da caligrafia, novamente. Vejamos:
Se caligrafia estilo individual de escrever, revelando uma personalidade nica e consistente do escritor, seja em qualquer contexto, e se os estilos sociais so homogneos, mas variam de acordo com o contexto por exemplo, a caligrafia livre de uma carta pessoal, escrita com as caligrafias apropriadas para cartas comerciais ento estilo de vida do escrito caracterizado pelo computador, que, como a mquina de escrever, fornece padronizaes sociais e produes em massa de
formas de letras[fontes], mas, ao contrrio da mquina de escrever, d aos usurios
uma grande variedade de fontes que lhes permitam personalizar sua comunicao
por escrito, independentemente se estas so pblicas ou privadas.(VAN LEEUWEN,
2005, p. 146)9
Com efeito, estilo, na visada terica da semitica social de Van Leeuwen,
trata-se de um recurso semitica inscrito na maneira pela qual um artefato
semitico produzido ou, ainda, um evento semioticamente realizado,
quando em contraste com o discurso e o gnero em que se realiza. Os efeitos
de sentidos transmitidos pelo estilo so, no mais das vezes, diferentes. No
caso de individual, estilo marca a identidade e o carter de uma pessoa,
individualmente dizendo. No caso do modelo de estilo social, trata-se de
ndices sociais, categorias como provenincia, classe, profisso etc. No caso
de estilo de vida, possvel pensar na indicao de identidades individuais e
sociais interagindo. Assim, os valores que so socialmente produzidos e
partilhados com outros formam um novo tipo de identidade social.
Em ltima instncia, entre as maneiras de anlise da semitica social
de Van Leeuwen, temos questes atinadas modalizao elaborada a partir
dos recursos semiticos empregados nos discursos. Modalidade a abordagem social semitica para a questo da representao de verdade,
ainda que, sem trocadilhos, a verdade no seja verdadeiramente verdade. Ela
diz respeito tanto a questes de representao fato vs. fico, realidade vs. fantasia, vs. real vs. artificial, autntico vs. falso quanto a questes de
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interao social, porque as reflexes que concernem verdade so tambm
um vis para questes sociais, haja vista que o que considerado como
verdadeiro em um contexto social e histrico por no ser, necessariamente,
assim considerado em outros, com todas as consequncias que isso traz.
De acordo com Van Leeuwem, em princpio linguistas e
semioticistas no esto preocupados com a verdade absoluta, mas com a
verdade que falantes, escritores e outras produes significantes interpretam
com base em certos recursos semiticos que utilizam para se expressarem.
Os dois no coincidem necessariamente, mas perfeitamente possvel
representar ou se fazer representar sobre o que no existe. uma fico
realista que prospera sobre isso. Surgida de um embate de posicionamentos,
da, portanto, a necessidade de modalizar a algum objetivo qualquer que seja
o discurso, a modalidade se baseia na imposio de argumentos, ditos
representantes de uma verdade absoluta, por uma autoridade, ou por um
texto oficial, ou por um consenso alcanado no dilogo; dito de outro modo,
modalidade requer sempre duas partes, o falante ou escritor e o ouvinte ou
leitor que, voluntariamente, ou a contragosto, esto em consonncia com a
verso de verdade acordada. H, dessa forma, um controle social que
decanta sobre o controle de representao da realidade, que ser aceita ou
no como a base, para um dado julgamento e/ou ao a ser realizada. Quem
busca controlar a modalidade pode controlar que verso de realidade ser
selecionada como a verso vlida no processo semitico utilizado ou a que
ser marginalizada.
Os recursos lingusticos da modalidade tm claramente papel muito
importante a desempenhar na sociedade. Eles permitem que as pessoas
criem as verdades compartilhadas de que precisam, a fim de serem capazes
de formar grupos que acreditam nas mesmas coisas e que podem, portanto,
agir de forma coesa e eficaz no e sobre o mundo, atuando inclusive na
marginalizao de certas verdades que eventualmente um determinado
grupo, ideolgica ou politicamente dominante, por exemplo, possa no
querer expor ou no ter interesse em expor.
Dessa perspectiva, Van Leuween classifica o interesse dos lingistas
na modalidade tradicionalmente centrada em uma abordagem gramatical sistmica especfica, que se vale de modais auxiliares, por exemplo, tais
como may, will, must. Estes trs ordenadamente expressam modalidades
(possibilidades de assentos de sentido): baixa, mdia e alta. Para este
domnio de estudos lingusticos, a verdade no simplesmente alguma coisa
do tipo uma coisa ou outra (ou...ou), algo vlido para um verdadeiro ou falso, saturado de sentidos, mas uma questo de grau. Como ilustra Van
Leeuwen:
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She may use another name (low modality)
She will use another name (median modality)
She must use another name (high modality) 10
Esses trs graus de modalidade podem, naturalmente, ser tambm expressos
por substantivos relacionados, por exemplo, segurana, probabilidade,
possibilidade; por adjetivos, por exemplo, certo, provvel, possvel;
advrbios, por exemplo, com certeza, provavelmente, talvez,
indubitavelmente etc.
O terico Van Leeuwen, para chegar a essa concluso, se fiou em
boa medida no trabalho de Halliday, linguista que acrescentou uma
dimenso importante sobre a questo das enunciaes modalizadas. Ele
percebeu que a modalidade no s nos permite escolher graus de verdade,
mas tambm tipos de verdades. Os exemplos citados por Van Leeuwen nas
linhas anteriores so baseados na idia de probabilidade. Eles representam
os valores em uma escala que vai de um Sim, verdade at No, falso. Portanto, o critrio para este tipo de verdade : quanto maior a probabilidade de que o que se est afirmado realmente existiu, ou realmente
ocorreu, ou ser que realmente ocorreu, maior a modalidade da afirmao. Outro tipo a frequncia de verdade modalizada. Isto baseado em uma
escala que vai de "Sim, sempre" at "No, nunca", ou de "Sim, todos at
No, ningum. Nestes casos, o critrio de verdade : quanto mais o que se afirmou acontece, ou quanto mais as pessoas pensam o que se afirma, ou
mais o dizem ou mais o fazem, maior da modalidade dessa afirmao. Os recursos lingusticos utilizados para realizar este tipo de modalizao, no
entanto, podem ainda se expressar em diferentes graus de frequncia, como,
por exemplo, em forma adverbial. Ele algumas vezes usa camiseta branca; Ele frequentemente usa camiseta branca; Ele sempre usa camiseta branca, entre outros. Ainda argumentando com base no mirante das reflexes de Halliday, h tambm a distino entre modalidade objetiva e
modalidade subjetiva. Nesta, o critrio de verdade algo como: quanto mais forte for minha convico interior sobre a verdade de uma afirmao,
maior ser a modalidade dessa afirmao. J naquela a ideia deixar claramente a verdade expressa. Novamente, isto no significa que a
afirmao seja necessariamente verdade, apenas que representada como
tal.
Todavia, de acordo com semitica social, modalidade no se
restringe ao estudo da linguagem verbal, mas tambm um conceito
multissemitico. Todos os meios de expresso tm recurso de modalidade.
A questo da verdade emerge em todos eles, em todas materialidades
significantes inscritas na histria.
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Em consonncia com Van Leeuwen (1996), tomando por base outros
estudos seus especialmente Kress e Van Leeuwen (1996) muitos so os meios de expresso que esto envolvidos em julgamentos de modalidade,
entre elas a visual. Por exemplo: os graus de articulao dos detalhes das
formas, escalonados entre simples desenhos tracejados at fotografias mais
ntidas e de textura fina; os graus de articulao do plano de fundo, numa
escola que vai do zero, onde as formas e/ou os objetos so mostrados em
contraste com um fundo branco e/ou preto, esboado fora de foco, at o
mximo em nitidez e detalhamento dos preenchimentos de plano de fundo; a
existncia de graus de saturao de cor, num gama de possibilidade que vai
da ausncia de saturao preto e branco at cores em mxima saturao, entre as quais esto os tons misturados a vrios outros tons de cinza; a
modulao de cor por graus a partir da utilizao de cor plana, no
modulada para a representao de todas as nuanas, desde as mais sutis at
as mais aparentes, em modulaes de certas cores, por exemplo, a cor da
pele, ou a cor da grama; diferentes tonalidades de cor, em graus que vo do
monocromtico a uma utilizao completa das cores; outros recursos como
uso maior ou menor das profundidades, jogos de luz e sombra, uso
proposital da gradao preto e branca em fotografias, filmes, desenhos,
enfim, uma srie de elementos que compem a modalidade visual, utilizadas
por meio de recursos semiticos e que so estudados no escopo da semitica
social.
Todos esses meios de expresso visual so gradativos. Eles
permitem dizer que dimenso ser destacada, colocada em relevo, e quais
outras ficaro margem. O valor de certas modalidades, suas configuraes
e recursos semiticos utilizados dependem do tipo de verdade visual que
posta ou no em relevo, em determinados contextos. E o terico Van
Leeuwen ainda vai trabalhar quatro formas de modalizao distintas para o
aspecto visual dos objetos semiticos, sendo elas a modalizao naturalista,
abstrata, tecnolgica e sensorial.
Em muitos contextos, h dominncia de modalidades naturalistas.
Elas mantm uma viso de verdade que tange assero: quanto mais uma imagem for semelhante maneira como, na realidade, se veria algo que se
viu, a partir de um ponto de vista especfico e sob certas condies
especficas de iluminao, maior ser a sua modalidade. Ainda de acordo com Van Leeuwen, esta, pelo menos, a teoria, porque, na realidade, a
modalidade naturalista fornece indcios de julgamentos de maneira muito
dependente da forma como que a tecnologia de imagem representa o visual.
Quando a preto e branco era a norma, a cor foi considerada como mais do que real. J as modalidades visuais abstratas so comuns nos visuais
cientficos e de arte moderna. A verdade visual como uma verdade abstrata.
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Assim, quanto mais uma imagem representar as essncias profundas e
subjetivas daquilo que ela est representando, ou mais ela representar o
padro geral, subjacente superficialmente, maior ser a sua modalidade. Ou
seja, ela se expressa pela articulao reduzida. Especificidades de
iluminao, matizes de cor, detalhes que criam diferenas individuais so
irrelevantes do ponto de vista da verdade essencial ou geral. Isto visto, por
exemplo, quando as modalidades naturalistas e abstratas so combinadas.
A modalidade tecnolgica tem a verdade visual baseada na utilidade
prtica da imagem. Quanto mais uma imagem pode ser usada como um
modelo, ou uma ajuda, ou uma trilha de sentido para a ao, maior ser sua
modalidade. Muitos mapas so deste tipo, e por isso so padres para fazer
o vestido, a arquitetura de desenhos e as instrues de montagem de kits
faa voc mesmo. Ou mesmo o Diagrama de Veen que contextualiza icnicamente o discurso do desenvolvimento sustentvel. As configuraes
correspondentes desta modalidade tendero para articulao fortemente
diminuda.
A ltima modalidade arrolada pelo terico a sensorial, em que o
visual baseia-se no efeito de prazer ou descontentamento criado pelas
sensaes visuais. Alm disso, realizado por um grau de articulao que
aplicado para alm do ponto de naturalismo, de modo que a nitidez,
profundidade, cor, luz o jogo de sombra tornam-se, a partir do ponto de
vista da modalidade naturalista, mais do que real. Cor, por exemplo,
utilizado na sensorial no para denotar significados gerais, tais como
pastagens ou gua em mapas, ou ainda expressar a essncia de algo em uma
imagem artstica (modalidade abstrata) nem por sua semelhana com a
realidade (como na modalidade naturalista), mas para ser uma espcie de
calmante ou efeito perturbador. A modalidade sensorial usada em
contextos onde h assuntos de prazer: em anncios de alimentos de
fotografia e perfume, por exemplo, e tambm em contextos que tentam criar
uma intensidade de experincia semelhante do sonho ou da alucinao,
tal qual em certos tipos de arte surrealista ou em filmes de terror.
Em suma, modalidade um termo-conceito que se refere a recursos
semiticos utilizados para expressar a forma em que as verdades so
representadas e tambm com elas devem ser tomadas. Recursos de
modalidade permitem que uma gama de distintos graus e tipos de
modalidades possam ser expressos como verdades. A linguagem tem
recursos de modalidade para expressar a verdade dos enunciados em termos
de probabilidade, frequncia, de saber, cuja valorao de verdade no
enunciado pode e/ou deve ser subjetivo ou objetivo. Alm disso, a semitica
social de Van Leeuwen trata de outras modalidades, utilizadas na
comunicao, entre as quais podemos ter a naturalista, a abstrata, a
tecnolgica e a sensorial, conforme expomos.
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As eleies presidenciais brasileiras: uma breve anlise...
O primeiro texto que mobilizamos para a nossa anlise foi publicado
inicialmente no jornal Folha de S. Paulo e republicado no site do UOL em
12/05/2010 s 11h 54.
Aborto questo de poltica de sade pblica, diz Dilma
(11)
Dilma participou de programa de TV no Rio Grande do Sul nesta segunda-feira.
Para a presidencivel Dilma Rousseff, o aborto uma "violncia contra a mulher" e
no uma "questo de foro ntimo", mas sim uma de "poltica de sade pblica". A
ex-ministra da Casa Civil foi questionada sobre o tema na manh desta quarta-feira
(12), durante participao no programa Painel RBS, da emissora TVCOM, no Rio
de Grande do Sul. "Nesses casos que incluem gravidez risco de vida ou violncia
no possvel que as mulheres das classes populares usem mtodos medievais [para
abortar]", disse a pr-candidata petista Presidncia da Repblica. "Um governo no
tem de ser contra ou a favor do aborto; ele tem de ser a favor de uma poltica
pblica".
No fragmento de texto acima possvel observar que o enunciado aborto questo de poltica de sade pblica destacado do contexto situacional e do cotexto original e colocado como ttulo da matria. A opo por esse
destaque da fala da locutora em detrimento de outras possveis tais como
violncia contra a mulher e questo de foro ntimo inicialmente parece estar relacionada ao fato de que essa pequena frase possui um carter de
frmula. Todavia, um exame um pouco mais minucioso das outras falas
evidencia que todas poderiam ser enquadradas na categoria de frmula.
Acreditamos que tal destaque se d em razo de o jornalista transformar a
fala de Dilma numa enunciao aforizante, pois como diz Maingueneau
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(2010a, p.14), o enunciador da aforizao assume o ethos do locutor que est no alto, do indivduo autorizado, em contato com uma Fonte
Transcendente. Ele considerado como aquele que enuncia sua verdade,
que prescinde da negociao. O jornalista, ao realizar o destaque, no est dialogando nem com o locutor da fala destacada e nem com o destinatrio
(leitor). Sua fala monologalmente construda se inscreve como a fala
autorizada de um Sujeito Pleno de direito.
Se a aforizao implica um locutor que se situa como Sujeito de pleno direito,
reciprocamente um Sujeito se manifesta como tal por sua capacidade de aforizar.
Trata-se fundamentalmente de fazer coincidir sujeito da enunciao e Sujeito no
sentido jurdico e moral: algum se coloca como responsvel, afirma valores e os
princpios perante o mundo, dirige-se a uma comunidade que est alm dos
alocutrios empricos que so seus destinatrios. Na tradio filosfica, o Sujeito, o
sub-jectum, colocado abaixo, ele o que no varia, o que escapa relatividade dos
contextos; Sujeito pleno, o aforizador pode responder por aquilo que diz atravs da
pluralidade das situaes de comunicao. Disso vem sua ligao estreita com a
juridicidade: quando se quer condenar por suas afirmaes, em geral o que se
condena no um texto sempre relativo a um contexto , mas uma aforizao ou um conjunto de aforizaes. (MAINGUENEAU, 2010a, p.15).
No momento em que o site do UOL insere monologalmente a aforizao"
aborto questo de poltica de sade pblica", atribuda candidata Dilma
Rousseff, o leitor interpelado a atribuir a esse enunciado formulaico um
sentido que extrapola o seu sentido primeiro. A interpretao assume a
equao: Dizendo X, o locutor implica Y, onde Y se constitui num enunciado genrico de valor dentico: O Estado no deve deixar que o indivduo decida sobre realizar um aborto ou no; O aborto deve ser tratado pelo Estado; O Estado deve planejar aes para resolver o problema do aborto; No se deve apoiar o aborto, O aborto no deve ser tratado como um problema religioso, etc. As possveis interpretaes produzidas pelos leitores no so da mesma ordem e profundidade das que
acompanham os textos literrios, filosficos, ou religiosos, por exemplo. No
entanto, trata-se de uma verdadeira atitude hermenutica que faz com os leitores mobilizem um conjunto de estratgias interpretativas. Ou seja, os
leitores so mobilizados a interpretar o destaque, procurando (re)construir o
percurso interpretativo desenhado pela enunciao aforizante. Desse modo,
no entendimento de Maingueneau (2010a, p. 15),
[...] partindo do postulado de que a aforizao resulta de uma operao de
destacamento que pertinente, o leitor deve construir interpretaes que permitam
justificar esta pertinncia. Pouco importa qual seja a interpretao que ele construa,
o essencial que ele postule um alm do sentidoimediato e aja de acordo. Fazendo
isso, o destinatrio chamado a justificar, pela busca hermenutica, a prpria
operao de destacamento: o fato de esse enunciado ["aborto questo de poltica de
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sade pblica"] ser apresentado em um regime aforizante leva o destinatrio a
legitimar a totalidade do quadro situacional.
No fragmento em anlise, possvel observar junto da enunciao
aforizante a presena de uma fotografia do rosto da locutora Dilma
Rousseff. Sobre a relao entre fotografia e aforizao, Maingueneau
(2010a, p.16) nos diz o seguinte:
A presena muito frequente de fotos do rosto dos locutores ao lado das aforizaes
pessoais aparece como a manifestao de algo constitutivo. O rosto tem duas
propriedades notveis: 1) a nica parte do corpo considerada capaz de identificar o
indivduo como distinto de qualquer outro; 2) , no imaginrio profundo, a sede do
pensamento e dos valores transcendentes. A foto autentica a aforizao do locutor
como sendo sua fala, aquela que faz dele um Sujeito plenamente responsvel. Ela
acompanha naturalmente, portanto, a aforizao.
No caso em anlise, a fotografia mostra que a locutora Dilma Rousseff est
dentro de um carro acompanhada por Marco Aurlio Garcia, assessor
especial da Presidncia da Repblica para assuntos internacionais. A
matria do jornalista faz, contudo, aluso ao fato de que a candidata deu
entrevista a uma TV do Rio Grande do Sul, Dilma participou de programa de TV no Rio Grande do Sul nesta segunda-feira; era de se esperar, portanto, que a fotografia retratasse a entrevista. No entanto, como afirma
Maingueneau (2010a, p. 16) A foto do rosto tambm , alm disso, o produto de um destacamento, que elimina a exigncia de todocontexto
situacional (roupa, lugar, momento...). A fotografia do rosto da locutora Dilma Rousseff apaga a necessidade de uma referencialidade, corporal,
temporal e espacial. No preciso mostrar a locutora em um estdio de
televiso para evidenciar que efetivamente ela tenha dito o que est no
destaque e no cotexto original. Tanto a aforizao quanto o destacamento do
rosto, ao se apoiarem mutuamente, identificam o locutor com a pessoa do
rosto, dando corpo enunciao e produzindo um efeito de veracidade do
que dito. Ademais, a fotografia mostra que a locutora Dilma traz a
fisionomia leve: sorriso nos lbios; olhos bem abertos e sobrancelhas
levemente arqueadas, olhando alegremente para os seus
espectadores/interlocutores. Tais recursos semiticos (Van Leeuwen, 2005) buscam mostrar, por um lado, um tom de ameno do locutor e, por
outro, colocam esses espectadores/interlocutores numa relao de interao
com o locutor. Essa trajetria do olhar, mesmo que em um plano imaginrio,
exige dos espectadores/interlocutores que estes ltimos estabeleam um
contato afetuoso com o primeiro. Acrescente-se a isso o fato de que a
fotografia ao mostrar uma pessoa sorrindo francamente para os seus
espectadores/interlocutores, evidencia que se trata do locutor em sua
essncia, dirigindo-se de maneira amena, mas sincera, franca aos seus
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espectadores/interlocutores. Com efeito, ao defender ento que o aborto questo de poltica de sade pblica, na conjuno com os recursos semiticos mobilizados, constri-se uma representao da verdade que a
locutora o est fazendo de maneira sincera.
Tomemos mais um excerto de matria publicada no site do UOL em
13 de setembro de 2010 s 14h57, de autoria de Camila Campanerut.
Serra satiriza argumento de Dilma "de que no era
candidata em 2009"
(12)
O candidato Presidncia da Repblica, Jos Serra (PSDB), disse segunda-feira
(13) que o argumento de sua principal concorrente na disputa eleitoral, a ex-
ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT) de que o vazamento de dados
sigilosos da Receita Federal de aliados dele no tem ligao com as eleies
hilariante. muito importante saber que est ligado a uma questo poltico-eleitoral. A idia de que ela no era candidata hilariante. A Dilma j, desde meados
de 2008 comeou a campanha ao lado do presidente da Repblica, inclusive quem
tocava a Casa Civil na prtica era a atual ministra da Casa Civil. Isso at as paredes,
o gramado da Esplanada, as lmpadas da OAB, todo mundo sabe disso, afirmou aps participao de debate na sede do Conselho Federal da Ordem dos Advogados
do Brasil (OAB). Logo aps receber a notcia do vazamento de dados da filha de
Serra, a empresria Vernica Serra e de seu genro Alexandre Bourgeois, Dilma
alegou que no era candidata e, que por isso os vazamentos de dados fiscais de
pessoas ligadas a Serra no tinha vis eleitoral. "Em abril de 2009 no existia
eleio, nem para mim, nem para o meu adversrio, nem para a outra concorrente, a
Marina. Nenhum de ns era candidato, era algo bastante longe. Ento tem de apurar
direitinho o que est acontecendo dentro da Receita. Em setembro, eu no era
candidata, no era pr-candidata, no tinha pr-candidatura nem candidatura",
afirmou a petista, no ltimo dia 5 em entrevista coletiva.
No fragmento acima o locutor Jos Serra diz: muito importante saber que est ligado a uma questo poltico-eleitoral. A ideia de que ela no era
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candidata hilariante. A Dilma j, desde meados de 2008 comeou a
campanha ao lado do presidente da Repblica, inclusive quem tocava a Casa
Civil na prtica era a atual ministra da Casa Civil. Isso at as paredes, o
gramado da Esplanada, as lmpadas da OAB, todo mundo sabe disso. Todavia, o jornalista constri o ttulo da matria introduzindo o enunciado
Serra satiriza o argumento de Dilma e destacando do cotexto original a pequena frase de que no era candidata, todo o restante da fala do locutor totalmente opacificada. Alm disso, no cotexto original, embora tenha
qualificado de hilariante a idia de que no era candidata, no fica to evidente que o locutor Jos Serra tenha satirizado o argumento de Dilma
Rousseff. Com efeito, quando o site do UOL reconstri a fala atribuda ao
candidato Jos Serra, o leitor interpelado a atribuir a esse enunciado um
sentido que extrapola o seu sentido primeiro. A interpretao assume a
equao: Dizendo X, o locutor implica Y, onde Y se constitui num enunciado genrico de valor dentico: O argumento de Dilma no deve ser entendido como verdadeiro; Dilma deve falar a verdade sobre a quebra de sigilo na Receita Federal; No se deve apoiar quem falta com verdade, etc. Trata-se, tal qual no exemplo anterior, de uma verdadeira atitude hermenutica que faz co