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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO E HUMANIDADES Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social AMANDA LUIZA DOS SANTOS PEREIRA MEIOS DE COMUNICAÇÃO COMO QUESTÃO TEÓRICA: mapeamento e análise de possibilidades conceituais SÃO BERNARDO DO CAMPO 2017

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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO E HUMANIDADES

Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social

AMANDA LUIZA DOS SANTOS PEREIRA

MEIOS DE COMUNICAÇÃO COMO QUESTÃO TEÓRICA:

mapeamento e análise de possibilidades conceituais

SÃO BERNARDO DO CAMPO

2017

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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO E HUMANIDADES

Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social

AMANDA LUIZA DOS SANTOS PEREIRA

MEIOS DE COMUNICAÇÃO COMO QUESTÃO TEÓRICA:

mapeamento e análise de possibilidades conceituais

Tese apresentada em cumprimento parcial às

exigências do Programa de Pós-Graduação em

Comunicação Social, Universidade Metodista de São

Paulo (UMESP), para obtenção do grau de Doutor.

Orientador: Prof. Dr. Fábio Botelho Josgrilberg

SÃO BERNARDO DO CAMPO

2017

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FICHA CATALOGRÁFICA

P414m Pereira, Amanda Luiza dos Santos

Meios de comunicação como questão teórica: mapeamento e

análise de possibilidades conceituais / Amanda Luiza dos Santos

Pereira. 2017.

189 p.

Tese (Doutorado em Comunicação Social) --Escola de

Comunicação, Educação e Humanidades da Universidade

Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2017.

Orientação: Fábio Botelho Josgrilberg.

1. Comunicação - Teoria 2. Meios de comunicação 3.

Conceitos I. Título.

CDD 302.2

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A tese de doutorado sob o título “Meios de Comunicação como questão teórica:

mapeamento e análise de possibilidades conceituais”, elaborada por Amanda

Luiza dos Santos Pereira, foi defendida e aprovada em 10 de maio de 2017,

perante banca examinadora composta por Prof. Dr. Fábio Botelho Josgrilberg

(Presidente/UMESP), Profa. Dra. Marli dos Santos (Titular/UMESP), Prof. Dr.

Sebastião Carlos de Morais Squirra (Titular/UMESP), Prof. Dr. Anderson

Vinícius Romanini (Titular/USP), Prof. Dr. Walter Teixeira Lima Junior

(Titular/UNIFAP).

_________________________________________

Prof. Dr. Fábio Botelho Josgrilberg

Orientador e Presidente da Banca Examinadora

_________________________________________

Profa. Dra. Marli dos Santos

Coordenadora do Programa de Pós-Graduação

Programa: Pós-Graduação em Comunicação Social

Área de concentração: Processos Comunicacionais

Linha de pesquisa: Inovações Tecnológicas na Comunicação Contemporânea

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AGRADECIMENTOS

Aos professores da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), em especial, o prof.

Dr. Fábio Botelho Josgrilberg, pelo acolhimento na orientação final da pesquisa, mas também

nas atividades e encontros interdisciplinares. Prof. Dr. Sebastião Carlos de Morais Squirra pelas

contribuições, indicações e incentivo. Profa. Dra. Marli dos Santos e Prof. Dr. Luciano Sathler

Rosa Guimarães, pela disposição e apoio. Profa. Dra. Cicília Maria Krohling Peruzzo pelas

críticas e sugestões direcionadas ao trabalho.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoas de Nível Superior (CAPES) e à Pró-

Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa da UMESP, pelo apoio e concessão de benefício através

do Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Superior (PROSUP).

Aos funcionários da UMESP, em especial, Priscila Teodoro Errerias pela paciência e

gentileza constantes.

Ao prof. Dr. Anderson Vinícius Romanini pelas contribuições com a pesquisa desde a

banca de qualificação e ao prof. Dr. Osvaldo Frota Pessoa Junior pelas conversas e importantes

indicações.

Aos melhores amigos de pós-graduação que alguém pode ter: Fábio Palamedi, parceiro

intelectual e de um quase podcast, André Rosa pelas trocas de ideias durante todos os trabalhos

desenvolvidos desde o mestrado e pela leveza do seu bom humor. Liliane Monteiro, por toda

ajuda na obtenção de referências raras. Krishma Carreira e Ana Graciela Voltolini, por todos

os encontros, palavras de apoio e risadas. Rafael Vergili, por todas as conversas honestas e

divertidas, mantidas apesar da distância.

Ao prof. Dr. Walter Teixeira Lima Junior, por todos os desafios e oportunidades que me

ofereceu junto ao Grupo de Pesquisa Tecnologia, Comunicação e Ciência Cognitiva (Tecccog),

pelo exemplo de seriedade e cientificidade, por toda dedicação na orientação direta desta

investigação até o período de qualificação e pelas contribuições posteriores.

Aos amigos-irmãos que estiveram ao meu lado, apesar da minha insociabilidade, em

especial Daniel Costa Paiva e Weider Weise.

Ao meu pai, Nagibe Moreno dos Santos, pelo interesse e imprescindível ajuda nas

dúvidas direta e indiretamente relacionadas aos problemas lógicos, bem como pelo apoio

incondicional.

Ao meu doce Fábio Luís Pereira, por todo afeto e todas as ações que só alguém tão

admirável e com tanto amor poderia oferecer.

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RESUMO

Esta pesquisa é motivada pela pergunta Que é Meio de Comunicação nas abordagens

circunscritas pela produção nacional? Em razão disso, os levantamentos realizados

especificamente sobre o domínio da Comunicação foram integralmente vinculados às

referências utilizadas nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu e em periódicos e anais de

abrangência nacional dos últimos sete anos. Com o objetivo de mapear proposituras conceituais

acerca de Meio de Comunicação e baseada na proposta metodológica de Lopes (2005), foi

realizada uma análise subdivida em procedimentos de cunho metódico-técnico e teórico-

epistemológico das publicações recentes e de textos que podem ser designados como clássicos

da área, visando identificar e avaliar argumentos sobre a questão. Mediante os resultados

obtidos as principais conclusões são: em textos recentes Meio de Comunicação é uma lacuna

conceitual, visto que a problematização direcionada ao conceito em si é representativa em

menos de 1% dos textos analisados. Em relação aos textos clássicos, embora se tenha algumas

pistas de espaços para a formulação de construções hipotéticas que colaborem para a

conceituação, confirmam-se as intuições do debate epistemológico que apontam para a

proeminência do uso não especializado do termo.

Palavras-chave: Teorias da Comunicação. Realismo científico. Conceito.

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ABSTRACT

This research is motivated by the question What is Media in the approaches circumscribed by

the national production? Because of this, the surveys are specifically related to the field of

Communication have been integrally linked to the references were used in Stricto Sensu courses

and in periodicals and annals of national scope of the last seven years. With the objective of

mapping conceptual proposals about Media and based on Lope’s methodology (2005), an

analysis of recent publications and texts that can be designated as Communication Classics was

carried out, which was subdivided into methodical-technical and theoretical-epistemological

procedures of in order to identify and evaluate arguments on Media issue. Through the results

obtained the main conclusions are: in recent texts media is a conceptual gap, since the

problematization directed to the concept itself is representative in less than 1% of the texts

analyzed. In relation to the classical texts, although there are some clues of space for the f

hypothetical constructions that collaborate for the conceptualization, the intuition of the

epistemological debate, on the prominence of the non-specialized use of the term are confirmed.

Keywords: Theories of Communication. Scientific realism. Concept.

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RESUMEN

Esta investigación está motivada por la pregunta ¿Cuál es el medio de comunicación en los

enfoques circunscrito por la producción nacional? Como resultado, las encuestas realizadas

específicamente en el campo de la comunicación fueron totalmente vinculados a referencias

utilizadas en los cursos de posgrado Stricto Sensu y en revistas y actas en cobertura nacional de

los últimos siete años. Con el fin de cartografiar proposiciones conceptuales sobre medio de

comunicación y con base en el enfoque metodológico de Lopes (2005), se realizó un análisis

de publicaciones recientes y textos que pueden ser designados como clásicos de Comunicación,

que se subdividió en procedimientos metódico-técnicos y teórico-epistemológicos para

identificar y evaluar los argumentos sobre el tema. A través de los resultados obtenidos las

principales conclusiones son: En textos recientes el medio de comunicación es una brecha

conceptual, ya que la problematización dirigida al concepto mismo es representativa en menos

del 1% de los textos analizados. En cuanto a los textos clásicos, aunque existen algunas pistas

de espacio para la formulación de construcciones hipotéticas que colaboran para la

conceptualización, se confirman las intuiciones del debate epistemológico sobre la prominencia

del uso no especializado del término.

Palabras-clave: Teorías de la Comunicación. Realismo científico. Concepto.

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LISTA DE TABELAS

TABELA 1 – Tabela verdade: Conjunção ......................................................................... p. 63

TABELA 2 – Tabela verdade: Disjunção .......................................................................... p. 63

TABELA 3 – Tabela verdade: Negação ............................................................................. p. 64

TABELA 4 – Tabela verdade: Condicional ....................................................................... p. 64

TABELA 5 – Tabela verdade: Bicondicional .................................................................... p. 64

TABELA 6 – Disciplinas gerais nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu .................... p. 67

TABELA 7 – Lista das referências bibliográficas mais frequentes nos cursos de pós-graduação

Stricto Sensu ......................................................................................................................... p. 69

TABELA 8 – Lista de periódicos selecionados ................................................................. p. 79

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 – Modelo Metodológico de Pesquisa ................................................................. p.14

FIGURA 2 – Componentes sintagmáticos do modelo metodológico ................................... p.17

FIGURA 3 – Modelo metódico-técnico de identificação e análise de conceito ................. p. 59

FIGURA 4 – Distinção de Premissa(s) ............................................................................... p. 62

FIGURA 5 – Modelo técnico básico de tratamento de argumentos .................................... p. 63

FIGURA 6 – Estrutura teórico-conceitual em Lasswell ..................................................... p. 145

FIGURA 7 – Objeto-modelo de caixa negra ....................................................................... p.146

FIGURA 8 – Primeira estrutura teórico-conceitual em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet .... p. 153

FIGURA 9 – Segunda estrutura teórico-conceitual em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet .... p. 154

FIGURA 10 – Oposição Teoria Hipodérmica – Two-step flow ......................................... p. 155

FIGURA 11 – Estrutura teórico-conceitual em Adorno e Horkheimer .............................. p. 161

FIGURA 12 – Estrutura teórico-conceitual em McLuhan ................................................. p. 163

FIGURA 13 – Estrutura teórico-conceitual em Martín-Barbero ........................................ p. 168

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LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1 – Distribuição de referências por disciplina ................................................... p. 68

GRÁFICO 2 – Frequência de referências bibliográficas nos cursos de pós-graduação Stricto

Sensu .................................................................................................................................... p. 70

GRÁFICO 3 – Frequência de citações nas três principais referências sobre Teorias da

Comunicação ....................................................................................................................... p. 71

GRÁFICO 4 – Termos com maior frequência em Lasswell ............................................... p. 84

GRÁFICO 5 – Meio em Lasswell ....................................................................................... p. 85

GRÁFICO 6 – Conjuntos de termos mediante funções em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet

.............................................................................................................................................. p. 87

GRÁFICO 7 – Termos com maior relevância qualitativa em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet

.............................................................................................................................................. p. 88

GRÁFICO 8 – Meio e uso de extensões em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet ...................... p. 89

GRÁFICO 9 – Efeitos em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet .................................................. p. 90

GRÁFICO 10 – Termos com maior frequência em Adorno e Horkheimer ........................ p. 91

GRÁFICO 11 – Termos com maior frequência em McLuhan ............................................ p. 93

GRÁFICO 12 – Termos com maior frequência em McLuhan, concatenando extensões de Meio

.............................................................................................................................................. p. 94

GRÁFICO 13 – Meio/Veículo e uso de extensões em McLuhan ....................................... p. 95

GRÁFICO 14 – Termos com maior frequência em Martín-Barbero .................................. p. 97

GRÁFICO 15 – Desdobramentos de Cultura em Martín-Barbero ...................................... p. 98

GRÁFICO 16 – Meio em Martín-Barbero .......................................................................... p. 99

GRÁFICO 17 – Desdobramentos de Comunicação em Martín-Barbero ........................... p. 100

GRÁFICO 18 – Distribuição dos textos nos periódicos .................................................... p. 102

GRÁFICO 19 – Distribuição dos textos entre 2010 e 2016 .............................................. p. 103

GRÁFICO 20 – Distribuição de textos no periódico Animus ............................................ p. 104

GRÁFICO 21 – Distribuição de textos no periódico Brazilian Journalism Research ...... p. 105

GRÁFICO 22 – Distribuição de textos no periódico Communicare ................................. p. 106

GRÁFICO 23 – Distribuição de textos no periódico Estudos em Jornalismo e Mídia ..... p. 106

GRÁFICO 24 – Distribuição de textos no periódico Extraprensa .................................... p. 107

GRÁFICO 25 – Distribuição de textos no periódico Ciberlegenda .................................. p. 108

GRÁFICO 26 – Distribuição de textos no periódico Galáxia .......................................... p. 109

GRÁFICO 27 – Distribuição de textos no periódico Signos do consumo ......................... p. 110

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GRÁFICO 28 – Distribuição de textos no periódico Comunicação & Sociedade ............ p. 111

GRÁFICO 29 – Distribuição de textos no periódico Comunicação, mídia e consumo ..... p. 112

GRÁFICO 30 – Distribuição de textos no periódico Eptic ................................................ p. 113

GRÁFICO 31 – Distribuição de textos no periódico Estudos em Comunicação ............... p. 114

GRÁFICO 32 – Distribuição de textos no periódico Fronteiras ....................................... p. 115

GRÁFICO 33 – Distribuição de textos no periódico Compolítica .................................... p. 116

GRÁFICO 34 – Distribuição de textos no periódico Comunicação e Educação .............. p. 116

GRÁFICO 35 – Distribuição de textos no periódico Contemporânea .............................. p. 117

GRÁFICO 36 – Distribuição de textos no periódico Culturas midiáticas ........................ p. 117

GRÁFICO 37 – Distribuição de textos no periódico ECOM ............................................. p. 118

GRÁFICO 38 – Distribuição de textos no periódico Esferas ............................................ p. 118

GRÁFICO 39 – Distribuição de textos no periódico Liinc ................................................ p. 119

GRÁFICO 40 – Distribuição de textos no periódico Opinião Pública .............................. p. 119

GRÁFICO 41 – Distribuição de textos no periódico Comunicação & Informação .......... p. 121

GRÁFICO 42 – Distribuição de textos no periódico Conexão .......................................... p. 121

GRÁFICO 43 – Distribuição de textos no periódico Contracampo .................................. p. 122

GRÁFICO 44 – Distribuição de textos no periódico ECO-Pós ......................................... p. 122

GRÁFICO 45 – Distribuição de textos no periódico Líbero ............................................. p. 123

GRÁFICO 46 – Distribuição de textos no periódico Logos .............................................. p. 123

GRÁFICO 47 – Distribuição de textos no periódico Novos Olhares ................................ p. 124

GRÁFICO 48 – Distribuição de textos no periódico Intexto ............................................. p. 125

GRÁFICO 49 – Distribuição de textos no periódico Organicom ...................................... p. 126

GRÁFICO 50 – Distribuição de textos no periódico Comunicação e Inovação ............... p. 127

GRÁFICO 51 – Distribuição de textos no periódico Geminis ........................................... p. 128

GRÁFICO 52 – Distribuição de textos no periódico Intercom .......................................... p. 128

GRÁFICO 53 – Distribuição de textos no periódico Lumina ............................................ p. 129

GRÁFICO 54 – Distribuição de textos no periódico Rizoma ............................................ p. 129

GRÁFICO 55 – Distribuição de textos no periódico Rumores .......................................... p. 130

GRÁFICO 56 – Distribuição de textos no periódico Rev. Bras. Hist. da Mídia ............... p. 131

GRÁFICO 57 – Distribuição de textos no periódico E-compós ........................................ p. 132

GRÁFICO 58 – Distribuição de textos no periódico Famecos .......................................... p. 132

GRÁFICO 59 – Distribuição de textos no periódico Matrizes .......................................... p. 133

GRÁFICO 60 – Distribuição de textos no periódico Sessões do imaginário .................... p. 133

GRÁFICO 61 – Distribuição de textos no periódico Verso e Reverso .............................. p. 134

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GRÁFICO 62 – Usos especializado e não especializado de meio em textos recentes ...... p. 137

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ------------------------------------------------------------------------------------------ 13

Capítulo I – POSSIBILIDADE DE DEMARCAÇÃO CIENTÍFICA E PERTINÊNCIA DA

COMUNICAÇÃO --------------------------------------------------------------------------------------- 21

1. Centralidade da demarcação e da lógica científica na discussão epistemológica ------------ 28

2. A questão da (inter)disciplinaridade a partir do deslocamento da caixa negra para a caixa

translúcida ------------------------------------------------------------------------------------------------- 39

3. Pertinência epistemológica do Problema de Pesquisa ------------------------------------------- 45

Capítulo II – INSTÂNCIAS METÓDICA E TÉCNICA DA ESTRATÉGIA DE

INVESTIGAÇÃO PARA O MAPEAMENTO DO CONCEITO DE MEIO DE

COMUNICAÇÃO --------------------------------------------------------------------------------------- 51

1. Procedimentos metódicos e técnicos de identificação e análise de conceito-argumento --- 58

2. Seleção da unidade de pesquisa de textos originais ---------------------------------------------- 65

3. Seleção da unidade de pesquisa de textos recentes----------------------------------------------- 76

Capítulo III – DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS EM NÍVEL METÓDICO-

TÉCNICO ------------------------------------------------------------------------------------------------- 81

1. Textos originais --------------------------------------------------------------------------------------- 82

1.1 A estrutura e a função da comunicação na sociedade ----------------------------------------- 83

1.2 The people’s choice: how the voter makes up his mind in a presidential campaign ------ 87

1.3 Dialética do esclarecimento ----------------------------------------------------------------------- 90

1.4 Os meios de comunicação como extensões do homem ----------------------------------------- 93

1.5 Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia ------------------------------- 96

2. Textos recentes -------------------------------------------------------------------------------------- 101

Capítulo IV – INTERPRETAÇÃO EM NÍVEL TEÓRICO-EPISTEMOLÓGICO DOS

RESULTADOS DA ANÁLISE METÓDICO-TÉCNICA --------------------------------------- 139

1. A estrutura e a função da comunicação na sociedade ------------------------------------------ 144

2. The people’s choice: how the voter makes up his mind in a presidential campaign ------ 152

3. Dialética do esclarecimento ----------------------------------------------------------------------- 159

4. Os meios de comunicação como extensões do homem ---------------------------------------- 163

5. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia -------------------------------- 167

6. Textos recentes -------------------------------------------------------------------------------------- 171

CONSIDERAÇÕES FINAIS ------------------------------------------------------------------------ 177

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS -------------------------------------------------------------- 184

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13

INTRODUÇÃO

O modo científico de pensar é ao mesmo tempo imaginativo e disciplinado. Isso é

fundamental para o seu sucesso. A ciência nos convida a acolher os fatos, mesmo

quando eles não se ajustam às nossas preconcepções. Aconselha-nos a guardar

hipóteses alternativas em nossas mentes, para ver qual se adapta melhor à realidade.

Impõe-nos um equilíbrio delicado entre uma abertura sem barreiras para ideias

novas, por mais heréticas que sejam, e o exame cético mais rigoroso de tudo - das

novas ideias e do conhecimento estabelecido. Esse tipo de pensamento é também

uma ferramenta essencial para a democracia numa era de mudanças (SAGAN, 1996,

p. 32).

De acordo com a perspectiva do realismo científico, o fazer científico estável e desejável

é concebido como um equilíbrio entre os dados empíricos e a reflexão teórica, considerando as

limitações do conhecimento científico originadas na falibilidade humana.

A partir de tal posição (também denominada racionalismo crítico e falsicacionismo), em

observação às limitações humanas e, por conseguinte, da proposta aqui produzida, tem-se como

ponto de partida a seguinte premissa: nenhuma investigação que se pretenda científica pode ser

completa e definitiva e, para ser exequível, demanda recortes.

O recorte proposto é propulsionado pela noção de que a origem/início da pesquisa

científica é o Problema, que por sua vez só pode ser identificado a partir de uma perspectiva

teórica porque, contrariando o indutivismo (positivismo), a Ciência não começa com a

observação.

O início do recorte deixa explícita a primazia das reflexões epistemológica e teórica

nesta investigação, o que conduziu à observação do modelo metodológico estruturado em

instâncias e fases por Lopes (2005).

Em tal modelo, as instâncias são inter-relacionadas, de forma que em cada fase prática

da pesquisa, exige-se coerência entre os diferentes níveis, de modo que, invariavelmente, a

orientação epistemológica acaba por ser retomada, visto que a instância epistemológica:

[...] é a instância que exerce uma função de vigilância crítica na pesquisa. Ao longo

de toda a pesquisa essa instância se traduz em movimentos ou operações destinadas

à explicitação dos obstáculos epistemológicas da pesquisa e sua autocorreção e à

construção do objeto científico (LOPES, 2005, p. 121).

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14

FIGURA 1 – Modelo Metodológico de Pesquisa

Fonte: Lopes (2005, p. 156).

Ainda na perspectiva da instância epistemológica e em concordância com o

posicionamento adotado, tomou-se como noção de Teoria a proposta de Mario Bunge (2012, p.

380), na qual se trata de “sistema hipotético-dedutivo: isto é, um sistema composto de um

conjunto de assunções e de suas consequências lógicas [...] é um conjunto de proposições

fechadas sob dedução (isto é, incluindo todas as consequências lógicas dos axiomas) [...]”.

Esse conjunto de proposições inter-relacionadas forma um quadro que indica os limites

das explicações oferecidas e, portanto, a pertinência dessas e das questões que as originam. É

nesse contexto que se compreende a construção de um determinado Objeto de pesquisa

delimitado por um viés disciplinar, na medida em que a observação do Objeto empírico será

orientada e terá sentido a partir da estrutura hipotético-dedutiva.

Seguindo tal raciocínio, além de ser passível de verificação empírica e/ou de suas

explicações, o reconhecimento de uma proposta como científica demanda compatibilidade de

diálogo com o conhecimento teórico estabelecido, sem que isso seja equivalente a um consenso

em relação às escolhas ou refutações de hipóteses e abordagens, por exemplo (BUNGE, 1980).

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15

Dessa forma, o primeiro movimento de construção do Problema de pesquisa deste

trabalho foi realizar um levantamento de investigações acerca da delimitação do conhecimento

teórico estabelecido no domínio da Comunicação, dentro das quais se destacou o entendimento

que identifica sete tradições1 para a conformação da área (CRAIG, 1999).

Em âmbito nacional, distinguiram-se os trabalhos de Luís Mauro Sá Martino, em

especial o artigo publicado em 2008, A ilusão teórica no campo da comunicação, que realiza

uma comparação entre livros nacionais publicados entre 1997 e 2007, e de Luiz Claudio

Martino, com ênfase no texto O campo da comunicação e suas teorias (2008), no qual se

discutem, entre outras questões, as condições para esse tipo de delimitação.

Sem ignorar os estudos mais recentes que são impulsionados pelas mesmas dificuldades,

se faz necessário destacar a maior variação quantitativa: trata-se da identificação de 604

diferentes teorias/vertentes em 25% do conteúdo dos periódicos Journalism & Mass

Communication Quarterly, Journal of Communication e Journal of Broadcasting & Electronic

Media (BRYANT; MIRON, 2004).

Evidenciada ou não na superfície dos textos, a questão primária Quais são os

conhecimentos teóricos da Comunicação? desdobra-se em outras perguntas que, em razão da

variedade e de suas inter-relações, influenciaram a insistência inicial de localizar o eixo

condutor da reflexão.

Neste estudo, o eixo foi organizado a partir dos debates mais recentes de caráter teórico-

epistemológico em âmbito nacional, dentro dos quais, além do consenso a respeito da

diversidade nas investigações em Comunicação, observa-se por exemplo, como apontam Braga

(2011) e Rüdiger (2014), alheamento em relação ao conceito de Meio de Comunicação.

A partir disso, sem que se pretenda conceber tal recorte como absoluto, ficou

estabelecida como pergunta chave Que é Meio de Comunicação?, circunscrita pela produção

científica em âmbito nacional e, por isso, abarcando para o entendimento do Estado da Arte

informações relativas aos cursos de Pós-Graduação em Comunicação, periódicos e eventos da

área.

Demarca-se aqui um empenho fundamentalmente conceitual e que, cônscio da

importância da evidência empírica, delimita-se na análise e verificação das explicações teóricas

para que seja exequível do ponto de vista metódico e técnico, e justificável, nos níveis

1 Retórica, semiótica, fenomenológica, cibernética, sociocultural, teoria crítica e sóciopsicológica.

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epistemológico e teórico, em observância ao modelo de Lopes (2005) e às recomendações de

Bunge (1980) em relação às estratégias de investigação científica.

Dentre as referências bibliográficas mais presentes nos cursos de pós-graduação Stricto

Sensu e nos artigos publicados em âmbito nacional, centrados em debates teórico-

epistemológicos, está o livro organizado por Hohlfeldt, Martino e França (2007), dentro do qual

Martino (2007), especificamente, expõe as principais dificuldades à propósito da definição do

Objeto. Sobre isso, destaca que:

Primeiramente seria preciso rever mais atentamente o que realmente as grandes

escolas chamam de meios de comunicação e de cultura de massa. O funcionalismo

americano – ao qual se atribui inadvertidamente a análise dos meios de comunicação

– está na verdade longe de ter um conceito na matéria. A fragmentação analítica do

processo comunicativo (esquema de Lasswell) e sua busca dos efeitos da

comunicação de massa estabelecem um quadro de análise que acaba por condicionar

o desenvolvimento das pesquisas de modo a não privilegiar o estudo dos meios de

comunicação. Representado por diferentes tradições de pesquisa, os objetos

historicamente privilegiados pelo funcionalismo são: a persuasão, o controle social,

os usos e gratificações, os processos de produção de notícia... Não se encontrará aí

nenhuma pesquisa conceptual ou teórica sobre o que é um meio de comunicação. O

que representaria um erro primário e capital para uma empreitada que se pretende

científica, caso perseverássemos em atribuir a esta escola um objeto que não é

exatamente o seu. Restrito à observação da eficácia dos processos comunicativos, o

funcionalismo americano negligencia a análise dos instrumentos tecnológicos

envolvidos nesses processos, como negligencia também a análise da dimensão

histórica da pertinência desses instrumentos, quer dizer, a análise do processo através

do qual os meios de comunicação adquirem sua eficácia ao emergirem como

elemento estruturante de uma sociedade historicamente dada.

De outra parte, à orientação sintética adotada pela Escola de Frankfurt – fortemente

influenciada pelos conceitos marxistas (alienação, ideologia...), e talvez

demasiadamente voltada a uma abordagem político-econômica dos processos de

comunicação de massa – seria preciso integrar uma análise dos meios de

comunicação no que toca sua eficácia enquanto tecnologias da inteligência, como

faz Jack Goody, por exemplo – que, identificando a cultura com os processos

comunicativos, vê nos meios de comunicação (e em outras tecnologias da

inteligência) a possibilidade de fundamentar a problemática da cultura em uma base

positiva -, pois é preciso que os estudos de Comunicação não se percam os laços com

os dispositivos tecnológicos na base do processo (MARTINO, 2007, p. 29-30).

Para o trabalho aqui proposto, entende-se que há ainda duas dificuldades: em primeiro

lugar, considerar Meios de Comunicação e Cultura de Massa com a mesma ênfase demandaria

o amplo escrutínio de perspectivas teóricas, especialmente filosóficas e sociológicas, que

descentralizariam a pergunta chave, já fundamentada em nível epistemológico. Em segundo

lugar, outros trabalhos (BRYANT; MIRON, 2004; MARTINO, L.C., 2008; MARTINO, L.M.,

2008) já citados nesta Introdução, incluindo do próprio autor, revelam a dificuldade de se

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estabelecerem, por exemplo, quais seriam as grandes escolas e os autores/obras relevantes,

dentre outras questões.

Excluindo-se o tratamento da Cultura de Massa como central, buscou-se a delimitação

da questão teórica como resolução da segunda dificuldade. Dessa forma, a investigação dirige-

se à Que é Meio de Comunicação nas abordagens teóricas circunscritas pela produção

nacional e, portanto, refere-se ao mapeamento de explicações acerca do conceito de Meio de

Comunicação e ao retorno à díade epistemologia-teoria a partir do resultado originado por tal

mapeamento. Para isso, consideram-se como base de orientação da produção nacional as

referências bibliográficas das disciplinas sobre Teorias da Comunicação dos cursos de pós-

graduação Stricto Sensu e artigos recentes publicados em periódicos, sendo os critérios de

seleção melhor explicitados em momento oportuno deste trabalho.

Retomando Lopes (2005), tem-se a indicação dos componentes sintagmáticos do

modelo metodológico proposto pela autora (2005) na Figura 2:

FIGURA 2 – Componentes sintagmáticos do modelo metodológico

Fonte: Lopes (2005, p. 137).

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Já tendo pormenorizado o problema de pesquisa, cabe mencionar brevemente o núcleo

principal do Quadro Teórico de Referência (QTR) utilizado, que a partir da constituição da

pesquisa por instâncias está distribuído da seguinte maneira:

Epistemológica: Bunge (1980; 2013), Lakatos (1979), Popper (1973; 1979; 2013),

Sokal e Bricmont (2010), na perspectiva do realismo científico;

Teórica: Martino, L. C. (2007; 2008) e Rüdiger (2014), fundamentalmente em

relação à pertinência da questão central do trabalho;

Metódica: Hohlfeldt, Martino e França (2007), Mattelart e Mattelart (2005) e Wolf

(2008), do ponto de vista da relação com a execução técnica. Puntel (2008) e Weitz

(1988), a propósito do vínculo entre o metódico-técnico e o epistemológico-teórico;

Técnica: Baronett (2009), Bispo, Castanheira e Souza Filho (2014); Carnielli e

Epstein (2011) para as análises pertinentes à díade metódica-técnica e sua

operacionalização.

As referências foram selecionadas a partir de dois critérios básicos: (1) da pertinência -

muitas vezes somada à raridade - da abordagem central de seus autores, e (2) seu auxílio na

solução de dificuldades relativas às instâncias em que estão inseridas. Independente do

parâmetro utilizado na escolha, os esclarecimentos sobre eles e sobre as próprias referências

foram feitos mediante sua inserção no desenvolvimento do trabalho e, portanto, não serão

repetidos aqui.

Com base na maior parte dos referenciais mencionados e o projeto inicial desta pesquisa,

foram realizados estudos exploratórios2 que colaboraram para a realização de ajustes,

fundamentalmente técnicos, de coleta, descrição e análise, além de serem objeto de reflexão

epistemológica e teórica para a manutenção de centralização do problema delimitado.

Tecnicamente, os estudos exploratórios incluíram o levantamento de artigos publicados

em âmbito nacional, de 2010 a 2015, orientados pelo termo “Meio de Comunicação”. Além de

2 No artigo Comunicação e Ciência: definição de Meio como elemento para distinção do domínio, apresentado do

II Encontro Internacional de Tecnologia, Comunicação e Ciência Cognitiva em dezembro de 2015 e publicado na

segunda edição especial (dezembro de 2016) do Brazilian Journal of Technology, Communication, and Cognitive

Science pela autora em coautoria com André Rosa de Oliveira, há um exemplo da dificuldade técnica ressaltada.

Outra pesquisa exploratória com a mesma base de textos foi apresentada em coautoria com Daniel Costa de Paiva

no XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, no GP Teorias da Comunicação (setembro de

2016), no artigo Lacuna teórica do Meio de Comunicação: análise da relação termo-conceito-argumento em

periódicos nacionais.

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um grande número de textos (à época dos estudos exploratórios, 560 artigos), foi identificada

uma grande variedade de termos utilizados como sinônimo de “Meio”.

Tendo em vista a questão chave desta investigação e os estudos exploratórios

realizados3, percebeu-se a possibilidade de a divergência e a pluralidade terminológica relativa

ao Meio de Comunicação não produzirem incomensurabilidade de caráter conceitual e, por

conseguinte, a refutação (ou respaldo) da incomensurabilidade poderia ser mantida no nível

estritamente teórico-epistemológico (BRAGA, 2011; LAKATOS, 1979; MARTINO, 2014;

POPPER, 1973 e 2013).

Dito de outra forma, supõe-se que a incomensurabilidade não se justifica no âmbito

epistemológico4, mas também não no teórico no que tange a ideia de Meio de Comunicação,

especialmente se constatado que seu esclarecimento conceitual não é central no

desenvolvimento das abordagens que são consideradas pertinentes às Teorias da Comunicação.

Ainda assim, pressupõe-se também que é possível produzir, a partir da análise dos

textos mais estudados, um delineamento básico acerca do que se pensa como Meio de

Comunicação.

Dessa maneira, o mapeamento das explicações relativas ao conceito de Meio de

Comunicação como Objetivo geral deste trabalho desdobra-se em questões acerca das inter-

relações conceituais que estruturam as perspectivas/obras selecionadas para análise, bem como

as aproximações e divergências das chaves-conceituais e a consistência argumentativa (relações

formais) entre elas5.

Para a exposição desta pesquisa, o trabalho foi organizado de forma que no Capítulo I

– Possibilidade de demarcação científica e pertinência da Comunicação, destaca-se a

justificação da posição do realismo científico (BUNGE, 2013; LAKATOS, 1979; POPPER,

2013; SOKAL; BRICMONT, 2010), argumentando-se que responde de modo mais adequado

ao ceticismo do que o antirrealismo. A proposta da Interdisciplinaridade, particularmente no

domínio da Comunicação, é entendida como uma aproximação do ceticismo/relativismo,

especialmente se fundamentada pela noção de incomensurabilidade presente em Kuhn (2001).

Tudo isso foi colocado em questão nesse primeiro capítulo para demonstrar a partir de quais

3 A ampliação/complementação das pesquisas mencionadas está incluída neste trabalho. 4 O que se fundamenta a partir do posicionamento do realismo científico em relação à defesa da

interdisciplinaridade. 5 As opções metódicas e técnicas também são pormenorizadas em momento posterior neste trabalho.

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fundamentos prefere-se uma visão que refute a Interdisciplinaridade e tome o Princípio da

Interdisciplinaridade como ponto de partida.

Sequencialmente, no Capítulo II – Instâncias metódica e técnica da estratégia de

investigação para o mapeamento do conceito de Meio de Comunicação, apresenta-se o

percurso de seleção que levou à distinção de duas unidades de pesquisa: textos originais da

Comunicação e textos recentes. Além disso, são apresentadas as opções procedimentais de

coleta, tratamento de dados e de análise técnica dos argumentos e a justificação a respeito de

tais escolhas.

No Capítulo III – Descrição e análise dos resultados em nível metódico-técnico, são

apresentados os resultados da análise metódica-técnica das duas unidades de pesquisa, além da

justificação, frente a tais resultados, da não aplicação dos procedimentos em nível teórico-

epistemológico para toda a unidade de pesquisa relativa aos textos recentes.

Já no Capítulo IV – Interpretação em nível teórico-epistemológico dos resultados da

análise metódico-técnica, realiza-se um retorno aos fundamentos que foram expostos no

primeiro capítulo e que conduziram à pergunta Que é Meio de Comunicação nas abordagens

circunscritas pela produção nacional?, buscando-se articular uma interpretação dos resultados

da análise exposta no capítulo III a partir do nível teórico-epistemológico para a manutenção

da vigilância epistemológica, tal como proposta por Lopes (2005), bem como para a

conservação da coerência metodológica entre as instâncias da investigação.

Finalmente, o trabalho é encerrado com a apresentação das Considerações Finais e das

Referências bibliográficas.

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Capítulo I – POSSIBILIDADE DE DEMARCAÇÃO

CIENTÍFICA E PERTINÊNCIA DA COMUNICAÇÃO

Se a estrutura estabelecida pela ciência está plausivelmente errada (por ser arbitrária,

irrelevante, impatriótica, ímpia ou por servir sobretudo aos interesses dos

poderosos), então podemos nos poupar o trabalho de compreender o que tantas

pessoas consideram um corpo de conhecimento complexo, difícil, altamente

matemático e contrário à intuição. Então todos os cientistas teriam o castigo

merecido. A inveja da ciência poderia ser superada. Aqueles que têm percorrido

outros caminhos em busca de conhecimento, aqueles que secretamente têm acolhido

convicções que a ciência desprezou, poderiam ter então o seu lugar ao sol (SAGAN,

1996, p. 214).

Tendo em vista observações da Filosofia da Ciência da linha falsicacionista, neste

capítulo são abordadas características de pesquisa, isto é, da lógica dos desenvolvimentos das

atividades científicas e, por conseguinte, perpassa por aspectos da metafísica e da

epistemologia.

Buscando não deslocar o centro deste trabalho da Ciência para a Filosofia, interessa aqui

estabelecer claramente os parâmetros que fundamentam a investigação e, consequentemente,

não dificultar quaisquer análises das argumentações expostas.

Como primeiro esclarecimento, tem-se que todo trabalho científico é uma argumentação

e, sendo assim, implica o escrutínio conceitual, em nível lógico-dedutivo e em sua relação com

aspectos empíricos. Portanto, ainda que sua interface com a Filosofia seja evidente, o que o

caracteriza como produtivo, justamente por diferenciar-se da Filosofia, é o passo que dá ao

encontro da teoria e dos índices.

Aqui já está intrínseco o posicionamento do realismo científico que faz parte deste

estudo, ou seja, entende-se que o papel da Ciência é versar sobre a realidade, o conjunto das

coisas existentes, incluindo os elementos que não podem ser totalmente abrangidos pela

percepção (POPPER, 2013).

Referindo-se ao que está subjacente à realidade que pode ser detectada, as questões que

alcançam as entidades inobserváveis são fundamentais nas reflexões científicas porque as

delimitam, afastando-as, sobretudo, do senso comum e das pseudociências, além de viabilizar

predições acerca do observável. Tal preocupação se justifica porque a realidade (observável e

inobservável) não é construída, não é subjetiva, ela existe, tendo o pesquisador a percebido ou

não. Esse é o motivo pelo qual:

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Há muita coisa que a ciência não compreende, muitos mistérios que ainda devem ser

resolvidos. Num Universo com dezenas de bilhões de anos-luz de extensão e uns 10

ou 15 bilhões de anos de idade, talvez seja assim para sempre. Tropeçamos

constantemente em surpresas. Entretanto, para alguns escritores religiosos e da Nova

Era, os cientistas acreditam que “só existe aquilo que descobrem”. Os cientistas

podem rejeitar revelações místicas para as quais não há outra evidência senão o

testemunho de alguém, mas dificilmente acreditam que seu conhecimento da

natureza seja completo (SAGAN, 1996, p. 32).

A implicação do posicionamento realista assumido que é colocada em questão refere-se

ao fato de que “[...] os dados observacionais constituem indícios últimos para as afirmações

sobre as entidades inobserváveis” (OKASHA, 2002, p. 71-72, tradução nossa)6. É a

consequência do argumento realista sobre tal ponto que justifica sua prevalência sobre o

antirrealismo e, no caso específico deste trabalho, a preferência da delimitação de Ciência a

partir de Karl Popper e Mario Bunge (e as críticas de Sokal e Bricmont), devendo-se considerar

que a delimitação/demarcação científica se relaciona diretamente com o que Hilton Japiassú e

Danilo Marcondes apontam no Dicionário básico de Filosofia como cientificidade:

[...] evoca os critérios que nos permitem definir o que constitui um conhecimento

científico de fato e distingui-lo claramente das outras formas de saber não-

científicas. Dois são os critérios mais correntes: o recurso à dedução racional e o

recurso à verificação experimental. Só há conhecimento científico a partir do

momento em que podemos repetir determinado fenômeno ou prever com certeza o

aparecimento desse fenômeno, sob determinadas condições. Insatisfeito com o

critério da verificabilidade, defendido pelos empiristas lógicos — segundo o qual

uma teoria só é científica quando suscetível de uma verificação experimental real ou

possível —, Karl Popper propõe um critério demarcatório entre o científico e o não-

científico [...] (JAPIASSÚ; MARCONDES, 2001, p. 36).

O antirrealismo sugere que os dados manifestos subdeterminam a Ciência, isto é, os

fenômenos podem ser esclarecidos por reflexões conflitantes e, por conseguinte, não há como

precisar, abarcando-se entidades inobserváveis7 ou não, se determinada teoria é verdadeira e se

deve prevalecer sobre outras.

Já para o realismo, tal como explica Okasha (2002), há diversos outros critérios (como,

por exemplo, o da plausibilidade) que permitem escolher entre teorias incompatíveis. Isso

ocorre porque os critérios permitem classificar a qualidade das explicações fornecidas pelas

6 No original: [...] observational data constitute the ultimate evidence for claims about unobservable entities

(OKASHA, 2002, p. 71-72). 7 Okasha (2002) explica por exemplo que, embora os organismos vivos que existem no planeta sejam observáveis,

nunca foram efetivamente observados em sua totalidade pelo homem. E essa é uma das razões pela qual o critério

da falsificação é ainda o mais adequado.

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teorias e, portanto, ainda que mais de uma forneça esclarecimentos sobre os mesmos dados, é

possível oferecer uma justificação suficiente sobre a escolha de uma explanação em detrimento

de outras.

Isso significa que a escolha de uma explicação específica não é, em Ciência, arbitrária.

Os critérios de demarcação fornecem a possibilidade de que a prevalência de determinada teoria

seja explicitada e contestada abertamente.

Admitir a contestação e a refutação de explicações não permite que se conclua que a

Ciência é relativista, subjetivista. Ao contrário, a difere da indesejável pseudociência:

A pseudociência difere da ciência errônea. A ciência prospera com seus erros,

eliminando-os um a um. Conclusões falsas são tiradas todo o tempo, mas elas

constituem tentativas. As hipóteses são formuladas de modo a poderem ser refutadas.

Uma sequência de hipóteses alternativas é confrontada com os experimentos e a

observação. A ciência tateia e cambaleia em busca de melhor compreensão. Alguns

sentimentos de propriedade individual são certamente ofendidos quando uma

hipótese científica não é aprovada, mas essas refutações são reconhecidas como

centrais para o empreendimento científico.

A pseudociência é exatamente o oposto. As hipóteses são formuladas de modo a se

tornar invulneráveis a qualquer experimento que ofereça uma perspectiva de

refutação, para que em princípio não possam ser invalidadas. Os profissionais são

defensivos e cautelosos. Faz-se oposição ao escrutínio cético. Quando a hipótese

pseudocientífica não consegue entusiasmar os cientistas, deduz-se que há

conspirações para eliminá-la (SAGAN, 1996, p. 28).

Este aspecto da prevalência de uma teoria sobre as outras está diretamente relacionado

às noções de Paradigma, de Thomas Kuhn, e Programa de investigação, de Imre Lakatos, as

quais estão circunscritas pelo problema da demarcação.

Nesse sentido, todas as propostas dizem respeito às justificações do conhecimento

científico, ou seja, perpassam questões como: quais teorias são aceitáveis? Quais são as

questões abrangidas pelo conhecimento científico? Quais são os parâmetros de avaliação das

teorias científicas? Então, a Epistemologia e a Lógica que se dirigem à Ciência assumem, em

última instância, caráter normativo, oferecendo argumentos sobre o que os cientistas devem ou

não levar à frente como atividade científica:

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Uma vez que o debate realismo/antirrealismo diz respeito ao objetivo da ciência,

poder-se-ia pensar que seria resolvido simplesmente perguntando aos próprios

cientistas. Por que não fazer uma enquete aos cientistas perguntando-lhes sobre os

seus objetivos? Mas essa sugestão ignora o problema — toma a expressão “o

objetivo da ciência” muito literalmente. Quando perguntamos qual é o objetivo da

ciência, não estamos perguntando sobre os objetivos individuais de cada cientista.

Ao invés disso, estamos perguntando como melhor dar sentido ao que os cientistas

dizem e fazem — como interpretar o empreendimento científico. Os realistas pensam

que deveríamos interpretar todas as teorias científicas como tentativas de descrições

da realidade; os antirrealistas pensam que essa interpretação é inapropriada para as

teorias que falam de entidades e processos inobserváveis. Embora seja interessante

descobrir as próprias opiniões dos cientistas sobre o debate realismo/antirrealismo,

a questão é, em última análise, filosófica (OKASHA, 2002, p. 60-61, tradução

nossa)8.

A Filosofia da Ciência sobre a qual fala Okasha (2002) não é a única existente. Este é o

motivo pelo qual Imre Lakatos, por exemplo, se ocupou em seus estudos das Filosofias da

Ciência nos últimos anos da sua vida, questionando quais histórias da Ciência surgem a partir

de uma ou outra concepção da dinâmica das atividades científicas e, finalmente, formulou a

proposta de Programa de investigação.

Reiterando que não se pretende produzir deslocamento da Ciência para a Filosofia, cabe

resgatar as principais propostas, tendo em vista não só os diálogos que propulsionam na

Filosofia, mas sua frequência no arcabouço dos debates no domínio da Comunicação.

Entretanto, o resgate dessas propostas não é feito individualmente e/ou realizando o

escrutínio de todos os aspectos porque assim se perderia a ênfase na cientificidade. Ao

contrário, a remissão a tais propostas é executada à luz da sua produtividade e adequação ao

exercício científico. E por isso, cabe questionar, qual é o lugar da discussão epistemológica na

Ciência e, sequencialmente, no domínio da Comunicação?

8 No original: “Since the realism/anti-realism debate concerns the aim of science, one might think it could be

resolved by simply asking the scientists themselves. Why not do a straw poll of scientists asking them about their

aims? But this suggestion misses the point - it takes the expression 'the aim of science' too literally. When we ask

what the aim of science is, we are not asking about the aims of individual scientists. Rather, we are asking how

best to make sense of what scientists say and do - how to interpret the scientific enterprise. Realists think we should

interpret all scientific theories as attempted descriptions of reality; anti-realists think this interpretation is

inappropriate for theories that talk about unobservable entities and processes. While it would certainly be

interesting to discover scientists' own views on the realism/antirealism debate, the issue is ultimately a

philosophical one” (OKASHA, 2002, p. 60-61).

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1. Centralidade da demarcação e da lógica científica na discussão

epistemológica

Recorrendo-se ao Dicionário Oxford de filosofia tem-se que:

Epistemologia (do gr., epistemê: conhecimento) Teoria do conhecimento. Algumas

de suas questões centrais são: a origem do conhecimento; o lugar da experiência e

da razão na gênese do conhecimento; a relação entre o conhecimento e a certeza, e

entre o conhecimento e a impossibilidade do erro; a possibilidade do ceticismo

universal; e as formas de conhecimento que emergem das novas conceitualizações

do mundo. Todos esses tópicos se relacionam com outros temas centrais da filosofia,

tais como a natureza da verdade e a natureza da experiência e do significado [...]

(BLACKBURN, 1997, p. 118-119).

Observando-se as questões epistemológicas indicadas por Blackburn (1997) é possível

distinguir algumas preocupações principais: (1) a questão do ceticismo (2) o problema da

demarcação (3) aspectos de métodos.

No início deste capítulo apontou-se claramente para o posicionamento do realismo, cujo

confronto habitual é com o antirrealismo/idealismo. Entretanto, em ambos os casos o

conhecimento é possível, o que significa que as duas posições se opõem ao ceticismo, à negação

de que o conhecimento, racional e diferente de mera opinião ou crença, possa ser alcançado.

A adoção do ceticismo teria como consequência o esvaziamento do exercício científico

e, também por este motivo, não poderia configurar como central neste trabalho. Isso não

significa que sejam ignoradas as importantes objeções que apresenta sobre o posicionamento

realista, mas apenas que o lugar de escrutínio das dificuldades que coloca está (interessa à) na

Filosofia de caráter geral.

O principal motivo pelo qual não é possível ignorar as objeções do ceticismo está

calcado no entendimento de que nenhuma das questões epistemológicas (problemas) é

independente. Dessa maneira, dependendo da resposta que se adota frente a uma delas, há

diferentes consequências lógicas às outras.

Apesar disso, é justificado que no âmbito desta pesquisa o ceticismo seja ao menos

parcialmente isolado porque a investigação não se dirige a todo e qualquer conhecimento sobre

o qual os problemas epistemológicos podem versar, mas apenas em torno do conhecimento dito

científico. E, neste caso, a ênfase no problema da demarcação e dos métodos se coloca como

mais adequada. Sobre isso, a importância da proposta de Karl Raimund Popper é colocada da

seguinte maneira:

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Ficou famoso com seu primeiro livro Logik der Forschung (1935), no qual destrói

as tentativas tradicionais de fundamentar o método científico no apoio que a

experiência proporciona às generalizações e às teorias adequadamente construídas.

Acentuando as dificuldades que o problema da indução põe a qualquer método desse

gênero, Popper propõe como alternativa uma epistemologia que parte da formação

arrojada e imaginativa de hipóteses. Estas enfrentam o tribunal da experiência, que

tem o poder de falsificá-las mas não de confirmá-las (ver falsificabilidade;

falsificação). Uma hipótese que sobreviva à tentativas de refutação pode ser

provisoriamente aceita como “corroborada”, mas jamais se pode atribuir-lhe uma

probabilidade (BLACKBURN, 1997, p. 302).

Seguindo ainda Blackburn (1997, p. 302) no que tange a proposta de Popper sobre a

demarcação no domínio da Ciência, ela aparece como fundamentação do fazer científico e,

apesar de críticas no âmbito filosófico, “[...] muitos pensadores aceitam, no essencial, a solução

popperiana para o problema da demarcação entre a verdadeira ciência e as suas imitações – isto

é, que a primeira apresenta teorias genuinamente falsificáveis, ao passo que as segundas não

[...]”.

A qualidade da propositura popperiana é que, sugerindo que o exercício científico se

desenvolva equilibrando Teoria (formulação de conjecturas) e a refutação metódica (também

fundamentada em evidências empíricas), o afasta do dogmatismo e da irracionalidade, porque

estipula uma maneira/método pela qual os pesquisadores podem avaliar seus posicionamentos

e esclarecer sob que circunstâncias devem abdicar dos mesmos.

É neste ponto que a proposta de Popper pode ser comparada a de Kuhn (2001)9, uma

vez que o último explica o abandono e a aceitação dos posicionamentos científicos a partir das

revoluções científicas, ou seja, da ruptura de Paradigma, que para o autor (2001, p. 31) é anterior

aos constructos propriamente científicos e sobre isso seria necessário perguntar “[...] Por que a

realização científica concreta, como local de compromisso profissional, é anterior aos vários

conceitos, leis, teorias e pontos de vista que podem ser abstraídos dela? [...]”.

[...] O ponto de vista de Kuhn sublinha a situação histórica concreta de uma ciência

no espaço dos problemas e das perspectivas herdadas de avanços anteriores. Um

paradigma é estabelecido apenas em períodos de ciência revolucionária, surgindo

tipicamente em resposta a uma acumulação de anomalias e dificuldades que não

podem ser resolvidas no paradigma vigente (BLACKBURN,1997, p. 279).

Percebe-se então que o sentido do Paradigma de Kuhn (2001) é constituído pelo

contraste entre a Ciência Normal e a Ciência Extraordinária. Portanto, embora as abordagens

9 Publicado originalmente em 1962.

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do autor (2001) sobre Paradigma sejam díspares, é possível uma percepção ampliada de que se

refere às bases de determinado domínio quando estabilizado (Ciência Normal). Considerando-

se que tais fundamentos são constituídos por universo conceitual, resultados de pesquisas e

processos de desenvolvimento similares, “‘ciência normal’ significa pesquisa firmemente

baseada em uma ou mais realizações científicas passadas. Essas realizações são reconhecidas

durante algum tempo por uma comunidade científica específica como proporcionando os

fundamentos para sua prática posterior [...]” (KUHN, 2001, p. 29).

As anomalias do Paradigma em vigência só serão relevantes em períodos iniciais ou de

crise, embora possam ser identificadas por pesquisas no período normal (KUHN, 2001). Assim,

à luz da visão kuhniana, a refutação (nos termos de Popper) indica em última instância imperícia

individual, pois os obstáculos do Paradigma são definidos pelo grupo de pesquisadores,

observando determinações e métricas não endógenas, mas sim externas (localizadas

particularmente nas dimensões sociológica e psicológica) e, por isso, a atividade científica é,

em última análise, dogmática.

Enquanto em Kuhn (2001) a refutação é um processo arbitrário, em Popper (2013) os

parâmetros dela precisam ser compartilhados e esclarecidos, de modo que ela também seja

passível de falseamento.

Ainda assim, a proposta de Popper (2013) é avaliada com o auxílio da perspectiva

kuhniana: algumas críticas dirigidas a Popper apontam que os exemplos escolhidos por ele para

colocar em relevo a refutação de teorias por evidências empíricas consideradas cruciais são

escolhidos e interpretados à luz do desenvolvimento já realizado (LAKATOS, 1979; PELUSO,

1995). Nesse sentido, com resultados opostos, os mesmos exemplos seriam percebidos como

simples anomalias nos critérios de Kuhn (2001), o que não obscurece a seguinte consideração:

[...] (1) um teste é – ou deve-se fazer que seja – uma luta, de dois adversários, entre

a teoria e a experiência de modo que, na confrontação final, só as duas se defrontem;

e (B) o único resultado interessante dessa confrontação é o falseamento

(conclusivo): “[as únicas genuínas] descobertas são refutações de hipóteses

científicas”. Entretanto, a história da ciência sugere que (1’) os testes são – pelo

menos – lutas, de três adversários, entre as teorias rivais e a experiência e (2’)

algumas das experiências mais interessantes resultam, prima facie, antes em

confirmação do que em falseamento (LAKATOS, 1979, p. 140).

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Conservando o desenvolvimento da cisão com a comprovação e com a justificação

externa à Ciência oferecido por Popper (2013)10, Lakatos (1979)11 explica a origem da noção

de Programa de investigação. Em tal enquadramento, o falseacionismo metodológico é uma

progressão que considera arriscada porque “[...] os riscos são tão ousados que atingem as raias

da temeridade e a gente pergunta a si mesmo se não haverá um meio de atenuá-los”

(LAKATOS, 1979, p. 137).

Ampliando tal consideração, o autor (1979) explica que o motivo pelo qual o

falseacionismo metodológico é priorizado frente às propostas fundamentadas no nível externo

é que, cônscio da falibilidade humana e, por conseguinte, da Ciência, responde de modo mais

congruente às críticas do ceticismo:

Cumpre apreciar a atitude diabolicamente atrevida do nosso falseacionista

metodológico. Ele se tem na conta de um herói que, defrontando-se com duas

alternativas catastróficas, teve a coragem de refletir friamente sobre os méritos

relativos de cada uma e escolher o menor dos males. Uma das alternativas era o

falibilismo cético, com sua atitude de “vale tudo”, o abandono desesperado de todos

os padrões intelectuais, e com estes a ideia do progresso científico. Nada pode ser

restabelecido, nada pode ser rejeitado, nada sequer pode ser comunicado: o

crescimento da ciência é um crescimento do caos, uma verdadeira Babel [...]

(LAKATOS, 1979, p. 137).

Tendo em vista os problemas e os méritos da proposta de Popper (2013), e a

insuficiência do Paradigma de Kuhn (2001), Lakatos (1979) oferece a seguinte alternativa:

[...] uma teoria científica T só será falseada se outra teoria T’ tiver sido proposta com

as seguintes características: (1) T’ tem um excesso de conteúdo empírico em relação

a T; isto é, prediz fatos novos, a saber, fatos improváveis à luz de T, ou mesmo

proibidos por ela; (2) T’ explica o êxito anterior de T, isto é, todo o conteúdo não-

refutado de T está incluído (dentro dos limites do erro observacional) no conteúdo

de T’; e (3) parte do conteúdo excessivo de T’ é corroborado (LAKATOS, 1979, p.

142).

Em continuidade, Lakatos (1979) compartilha com Popper (2013) o entendimento de

que uma teoria pode ser mantida em função de hipóteses auxiliares, as quais são admitidas se

não forem ad hoc, isto é, se não constituírem reinterpretação linguística que ao invés de ampliar

o conteúdo e explicar um fato novo, o diminua. A colaboração de Lakatos (1979) está em

10 Resumidas pelas condições de abandono de determinado posicionamento, como indicadas anteriormente neste

mesmo item. 11 Texto incluído no quarto volume do Colóquio Internacional sobre Filosofia da Ciência, realizado em Londres,

em 1965.

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ponderar que a avaliação da teoria inclui a análise não apenas de sua conformação geral

(condições inicias, hipóteses secundárias, evidências empíricas etc), mas também de sua

progressão em relação a outras: “[...] Só de uma série de teorias se pode dizer que é científica

ou não-científica, nunca de uma teoria isolada; aplicar o termo “científico” a uma única teoria

é incorrer num erro de categoria” (LAKATOS, 1979, p. 145, grifo do autor)

Por isso o realce está no Programa de investigação, a saber, naquilo que “[...] consiste

em regras metodológicas; algumas nos dizem quais são os caminhos de pesquisa que devem ser

evitados (heurística negativa), outras nos dizem quais são os caminhos que devem ser

palmilhados (heurística positiva)” (LAKATOS, 1979, p. 162).

O aprofundamento sobre a complementaridade entre as propostas de Lakatos (1979) e

de Popper (2013) não é o foco deste trabalho, mas cabe asseverar que, em relação à posição

kuhniana, tais propostas ajudam a argumentar que a incomensurabilidade é, em última análise,

uma questão de divergência terminológica, no sentido de que possíveis diferenças conceituais

não são indissolúveis a ponto de não existirem subsídios para avaliação12. Paralelamente,

reforçam a recusa de hipóteses ad hoc para responder a falsificações.

Nesse raciocínio a perspectiva kuhniana é enfraquecida em razão das flexibilizações

necessárias: além da incomensurabilidade se tornar superficial, a distinção entre Ciência

Normal e Extraordinária se dá arbitrariamente e, por conseguinte, o Paradigma -

especificamente concernente às revoluções científicas - perde em capacidade explicativa.

Além da posição popperiana complementada por Lakatos já exposta neste texto, há uma

refutação justificada da incomensurabilidade em Albedah (2006) 13, que defende como solução

adequada a proposta de Gadamer. Nesse sentido, ele argumenta que:

Resolver o paradoxo da incomensurabilidade deve, portanto, explicar a

ruptura comunicativa evitando as objeções levantadas contra Kuhn. Para

conseguir isso, uma explicação precisa satisfazer pelo menos três requisitos

de adequação: deve ser auto referencialmente consistente; deve ser aberta; E,

finalmente, deve ser historicamente reflexiva (ALBEDAH, 2006, p. 333,

tradução nossa)14.

12 Cabe salientar que sobre isso, o próprio Kuhn também concorda em sua fala durante o mesmo Colóquio do qual

foi extraído o texto de Lakatos (1979). Fazem parte do mesmo volume os textos de Kuhn (1979) intitulados Lógica

da Descoberta ou Psicologia da Pesquisa? e Reflexões sobre os meus Críticos. 13 A inclusão de Albedah (2006) foi realizada em função de críticas realizadas na ocasião da qualificação do

trabalho. Embora a opção proposta pelo autor (2006) tenha sido desconsiderada pelas razões apresentadas neste

capítulo, as objeções foram produtivas para o esclarecimento do delineamento da pesquisa. 14 No original: Resolving the paradox of incommensurability must, therefore, account for communicative

breakdown while avoiding the objections raised against Kuhn. To achieve this, an account needs to satisfy at least

three adequacy requirements: it must be self-referentially consistent; it must be open-ended; and finally, it must

be historically reflexive (ALBEDAH, 2006, p. 333).

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Segundo Albedah (2006), a explicação que soluciona o problema da

incomensurabilidade é a hermenêutica gadameriana, segundo a qual um determinado

entendimento não pode ser final porque ele é sempre histórico-conceitual, influenciado por um

determinado domínio referencial e passível de expansão, ou seja, um entendimento não pode

ser último porque ele é sempre relativo, embora argumente que tal posição se afasta do

relativismo radical.

Através da hermenêutica gadameriana, a incomensurabilidade seria afastada não apenas

porque se admite a possibilidade de inúmeras reinterpretações, mas também por razões

histórico-contextuais. Assim, deve-se manter uma abertura dialógica, isto é, uma abertura para

a expansão da linguagem (inclusive a científica) e do domínio referencial que a conduz.

A posição epistemológica assumida neste trabalho concorda, em especial, com a

demanda da não contradição (consistência) da explicação nos termos apresentados pelo autor

(2006), mas não recorre ao relativismo epistêmico para isso.

A partir de tal perspectiva, trata-se, fundamentalmente, da limitação humana em relação

à produção do conhecimento em sentido amplo, ao refletir sobre Ciência como um todo, e

específico, dado que toda pesquisa possui, necessariamente, inúmeras delimitações para que

seja exequível.

Entende-se aqui que não se trata de relativismo radical porque isso resultaria em

ceticismo e Albedah (2006) não propõe que o conhecimento é impossível, mas também admite

ao menos um critério de avaliação explicativa: o da consistência. Contudo é compreendido

como relativismo epistêmico na medida em que não aponta limite para as (re)interpretações e

também não propõe qualquer estrutura explicativa.

Embora seja possível articular de modo mais ou menos rígido as explicações e possíveis

interpretações de determinado entendimento teórico, não estabelecer parâmetros sobre os

limites de (re) interpretações, especialmente quando não se coloca em questão evidências

empíricas, destituem do exercício científico aspectos básicos de sua demarcação como, por

exemplo, desenvolvimento de técnicas de controle de testes empíricos e a demanda pela

repetição dos mesmos.

Dentre as demandas apontadas pelo autor (2006), a exigência da não

contradição/consistência é particularmente importante para a proposta deste trabalho, uma vez

que as operacionalizações conceituais para as quais se dedica maior atenção estão no nível de

exposição e correlações combinadas pelas propostas teóricas que compõem as unidades de

pesquisa (LOPES, 2005). Sobre isso, Albedah (2006) afirma ainda que “para que uma

explicação seja auto referencialmente consistente, deve descrever a ruptura comunicativa por

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premissas aceitáveis que não contradigam as próprias conclusões que são legitimamente

extraídas delas [...]” (ALBEDAH, 2006, p. 333, tradução nossa)15.

Esclarecendo o que seria a explicação gadameriana de entendimento/compreensão tem-

se que:

Gadamer pensa que a experiência estética é a experiência hermenêutica exemplar,

onde a interação entre o objeto da experiência, o contexto de compreensão e o

entendimento como um evento histórico e linguístico demonstram um tipo peculiar

de unidade através da qual a verdade da obra de arte, o contexto de compreensão e a

questão da compreensão em si não podem ser consideradas isoladamente uns dos

outros (ALBEDAH, 2006, p. 334, tradução nossa)16.

Albedah (2006) assevera que se trata de compreender que um determinado

entendimento é sempre influenciado por um domínio referencial (traditional horizon) que

delimita a compreensão sobre a qual é preciso ter consciência (historically effect

consciousness).

Faz parte de tal consciência a admissão de que um determinado entendimento não pode

ser final em razão da centralidade do efeito histórico, isto é, de que o que é compreendido sobre

dado objeto é passível de alteração por causa de condições contextuais e alterações no domínio

referencial. Além disso, uma determinada compreensão também não poderia ser tomada como

final porque:

[...] da universalidade da interpretação resulta que a compreensão é necessariamente

aberta e plural. É aberta porque o que um nativo de uma língua compreende de um

determinado texto é sempre parcial, prejudicial e finito. É a experiência dessa

finitude que motiva a abertura a outras interpretações. Do mesmo modo, o

entendimento é plural porque os horizontes tradicionais são diferenciados em virtude

do que é transmitido em suas respectivas linguagens, e estes promovem leituras

diferenciadas do texto [...] (ALBEDAH, 2006, p. 335-336, tradução nossa)17.

15 No original: For an account to be self-referentially consistent, it must describe communicative breakdown by

acceptable premises that do not contradict the very conclusions that are legitimately drawn from them […]

(ALBEDAH, 2006, p. 333). 16 No original: Gadamer thinks that aesthetic experience is the exemplary hermeneutic experience where the

interplay between the object of experience, the context of understanding, and understanding as a historical and

linguistic event display a peculiar sort of unity whereby the truth of the work of art, the context of understanding,

and the understanding subject itself cannot be considered in isolation from one another […] (ALBEDAH, 2006,

p. 334). 17 No original: [..] from the universality of interpretation that understanding is necessarily open-ended and plural.

It is openended because what a native of one language understands of a certain text is always partial, prejudicial,

and finite. It is the experience of this finitude that motivates openness to other interpretations. By the same token,

understanding is plural because traditional horizons are differentiated by virtue of what is handed down in their

respective languages, and these promote differentiated readings of the text […] (ALBEDAH, 2006, p. 335-336).

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Nesse sentido, o autor (2006) explica que se faz necessária uma ruptura comunicativa

para que determinado entendimento seja compartilhado, ou seja, para que seja possível a

familiarização com determinada compreensão e não o inverso (alienação). E o que viabilizaria

a familiarização/não alienação sobre dada compreensão seria a abertura dialógica:

Um aspecto central da abertura dialógica, da compreensão em geral, é a antecipação

da conclusão. Visto como um todo, o texto deve ser assumido para desfrutar de

unidade interna. Essa unidade não anula a possibilidade de contradições internas,

descontinuidades ou abertura, pois elas só podem ser vistas à luz de uma suposição

de unidade. À medida que a interpretação prossegue, a compreensão do todo, por sua

vez, traria as partes sob nova luz revisando seu significado inicial [...] (ALBEDAH,

2006, p. 337, tradução nossa)18.

Para o autor (2006, p. 337, tradução nossa)19, a partir da hermenêutica de Gadamer

admite-se as inúmeras reinterpretações que, ao expandirem os limites da linguagem e dos

domínios referenciais, resultam na fusão de horizontes e, por essa razão, só é possível produzir

“[...] um entendimento infinitamente revisável e um horizonte em constante expansão [...]”.

A proposta apresentada por Albedah (2006) embora tenha diversos pontos convergentes

com a perspectiva epistemológica aqui adotada, não cabe neste trabalho. Porém, se faz

necessário responder a ela porque, acompanhando Sokal e Bricmont (2010), entende-se que é

possível compreendê-la como uma resposta às limitações da proposta de Popper (2013)20 como,

por exemplo, o falsicacionismo radical.

Em primeiro lugar, embora se concorde com a afirmação de que o referencial e os

conceitos aos quais se referem possam ser expandidos, a partir do realismo científico isso se dá

em função da relação entre as abstrações e as evidências empíricas, ou a partir da pertinência

conceitual da modificação.

Um argumento que sustente tal pertinência, ainda que tenha seus sentidos ampliados, se

estiver estruturado de modo inválido não pode ser aceito (BUNGE, 2012) e isso não depende

de contextualização.

18 No original: A central aspect of dialogical openness, of understanding in general, is the anticipation of

completion. Viewed as a whole, the text must be assumed to enjoy internal unity. Such unity does not negate the

possibility of internal contradictions, discontinuities, or open-endedness, for these could only be seen in light of

an assumption of unity. Partial experience of a text always takes place in light of a pre-understanding which is

projected onto the whole/unit. As interpretation proceeds, the understanding of the whole would in turn bring the

parts under new light revising their initial meaning [...] (ALBEDAH, 2006, p. 337). 19 No original: […] endlessly revisable understanding, and an ever expanding horizon […] (ALBEDAH, 2006, p.

337). 20 O que explica a complementação a partir de Lakatos e Bunge nesta investigação.

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Ao menos no que tange o domínio da Comunicação, a inserção, ampliação ou

modificação de conceitos é, com certa frequência, realizada a partir de metáforas e analogias.

A questão é saber até que ponto tais recursos são realmente necessários e colaboram para a

compreensão e desenvolvimento do exercício científico (SOKAL; BRICMONT, 2010),

especialmente se somados ao relativismo epistêmico.

Sem rejeitar definitivamente outras opções, essas são as razões pelos quais se optou por

um modelo metódico-técnico condizente com o realismo científico: considera-se aqui o

exequível, observando reflexões epistemológicas, mas também técnicas21.

Posto isso, fica a constatação de que a demarcação de Ciência mantida prossegue com

uma série de demandas para um pensamento que se pretenda científico: os problemas precisam

ser circunscritos com clareza, as hipóteses devem ser passíveis de criteriosa avaliação e são

necessários dados empíricos, dentre outras coisas.

O conhecimento científico sempre diz respeito a determinado objeto empírico, um dado

fenômeno:

[...] O termo "fenômeno" passou a ser utilizado nas ciências experimentais e nas

ciências humanas para designar não uma coisa, mas um processo, uma ação que se

desenrola. Assim, a física e a química denominam "fenômeno" toda modificação que

ocorre no estado de um corpo: o movimento é um fenômeno (o corpo em movimento

se desloca); a dilatação dos gases é um fenômeno, mas os gases são corpos: a

digestão (em biologia) é um fenômeno, mas o aparelho digestivo é um conjunto de

órgãos (JAPIASSÚ; MARCONDES, 2001, p. 75).

Avaliada superficialmente a afirmação pode parecer absurda em um trabalho de base

realista e que prevê a pesquisa empírica como característica fundamental, mas o conhecimento

científico inicia-se em idealizações/reflexões (e não experiências) sobre os fenômenos. Dito de

outra forma, a Ciência é iniciada a partir de um problema:

[...] o conhecimento não começa com percepções ou observações ou com a

recopilação de dados ou de fatos, senão com problemas. Não há conhecimento sem

problemas – mas tampouco há problema sem conhecimento. Quer dizer que este

começa com a tensão entre saber e não saber, entre conhecimento e ignorância:

nenhum problema sem conhecimento –nenhum problema sem ignorância. Porque

todo problema surge do descobrimento de que algo não está na ordem do nosso saber

atual, ou logicamente considerado na descoberta de uma contradição interna entre o

nosso suposto conhecimento e os supostos fatos (POPPER, 1973, p. 102, grifo do

autor, tradução nossa)22.

21 Essas opções metodológicas são explicadas no Capítulo II deste trabalho. 22 No original: […] el conocimiento no comienza con percepciones u observación o con la recopilación de datos o

de hechos, sino con problemas. No hay conocimiento sin problemas — pero tampoco hay ningún problema sin

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Sendo a contradição identificada derivada ou não de conhecimento científico, em se

reconhecendo um Problema de pesquisa, a teorização passa a ser primordial. E o que parece ser

essencial é a incidência da reflexão sobre o aspecto disciplinar da Ciência, não apenas no que

tange seu caráter sistemático, mas também na medida em que materializa um domínio científico

e, por conseguinte, um determinado quadro de pertinência de indagações, já que “[…] uma

especialidade científica – como é chamada – é apenas um conglomerado delimitado e

construído de problemas e ensaios de solução. O que realmente existe, no entanto, são os

problemas e as tradições científicas” (POPPER, 1973, p. 106, tradução nossa)23.

Tal como explica Bunge (2013), as teorizações dependem do estabelecimento de pelo

menos um objeto-modelo que sempre começa por simplificações, as quais posteriormente são

complexificadas. Entretanto, não significa que tais complexificações resolvem as limitações

típicas da Ciência como, por exemplo, de ser falível, de produzir apenas hipóteses provisórias

ou de não dar conta de todas as questões do Universo. Assim, por mais complexa que seja

sempre implicará alguma redução.

A distinção entre objeto empírico e Objeto de pesquisa está diretamente relacionada às

limitações indicadas, porque a partir da admissão de que dificilmente a realidade completa será

conhecida cientificamente e que há sempre o inobservável, eles jamais serão idênticos. O

Objeto de pesquisa, bem como os esquemas e modelos conceituais nos quais se apoia, são

ferramentas que o pesquisador utiliza para se aproximar da realidade, e não a realidade em si.

A compreensão segundo a qual as tentativas de estabelecimento de um Objeto de

pesquisa são reducionistas rejeita as características básicas da atividade científica, normalmente

exigindo de tal atividade o que não é possível ofertar, isto é, verdades absolutas e equivalência

entre Objetos de pesquisa (derivados de teorização) e objetos empíricos, como uma espécie de

domesticação da realidade:

conocimiento. Es decir, que éste comienza con la tensión entre saber y no saber, entre conocimiento e ignorancia:

ningún problema sin conocimiento— ningún problema sin ignorancia. Porque todo problema surge del

descubrimiento de que algo no está en orden en nuestro presunto saber; o, lógicamente considerado, en el

descubrimiento de una contradicción interna entre nuestro supuesto conocimiento y los hechos; o expresado quizá

más adecuadamente, en el descubrimiento de una posible contradicción entre nuestro supuesto conocimiento y los

supuestos hechos (POPPER, 1973, p. 102, grifo do autor). 23 No original: [...] Una especialidad científica —tal y como se la llama— no es sino un conglomerado delimitado

y construido de problemas y ensayos de solución. Lo realmente existente, no obstante, son los problemas y las

tradiciones científicas (POPPER, 1973, p. 106).

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Talvez a distinção mais clara entre a ciência e a pseudociência seja o fato de que a

primeira sabe avaliar com mais perspicácia as imperfeições e a falibilidade humanas

do que a segunda (ou a revelação “infalível”). Se nos recusamos radicalmente a

reconhecer em que ponto somos propensos a cair em erro, podemos ter quase certeza

de que o erro - mesmo o engano sério, os erros profundos - nos acompanhará para

sempre. Mas, se somos capazes de uma pequena auto avaliação corajosa, quaisquer

que sejam as reflexões tristes que possa provocar, as nossas chances melhoram muito

(SAGAN, 1996, p. 28-29).

Tais ponderações não conduzem a Ciência ao subjetivismo, justamente porque não

sustentam a conclusão de que a realidade se reduz às representações que ela fornece.

Tendo em conta que a noção de realidade não é um consenso nem mesmo na Filosofia,

e sendo este um trabalho circunscrito pela Ciência, resta tomar de empréstimo os argumentos

filosóficos que refutam a ideia de uma realidade convencionada, determinada pela interpretação

e, enfim, subjetiva.

Isso implica o argumento de que à Ciência é necessário realizar constantes ajustes

(oriundos dos questionamentos de suas propostas), que correspondem a adequações dos

sistemas teóricos à realidade que se dirigem. Isso ocorre porque, em algum momento percebe-

se que o conhecimento que se pensa ter sobre a realidade se mostra no mínimo incompleto, ou

seja, não condiz “verdadeiramente” a realidade (POPPER, 1973).

Ainda que se admita que o Objeto de pesquisa é uma interpretação, deve não apenas

estar relacionada aos índices empíricos, como também deve poder ser criticada em termos da

qualidade dessa relação.

Então, a interpretação não é a realidade em si, mas integrante do método de aproximação

com a realidade, e isso explica porque os cuidados com o universo conceitual que sustenta

determinado domínio científico são tão importantes quanto as consequências, os reflexos da

explicação teórica.

Uma vez que os conceitos são exprimidos por termos, assevera-se que a ambiguidade

terminológica que tem como resultado a pluralidade conceitual é típica do uso ordinário das

palavras e, por isso, não cabe como recurso de teorização: invariavelmente, propulsionará a

irrefutabilidade das proposições, aproximando a explanação formulada da pseudociência

(BUNGE, 2013). Além de, como apontado anteriormente, produzir a falsa sensação de

incomensurabilidade.

A importância do aspecto conceitual é retomada posteriormente neste trabalho, porque

há outro fator que também colabora para a sensação de incomensurabilidade, mas que

permanece no cunho epistemológico: o posicionamento da interdisciplinaridade, que é

abordado nesta investigação à luz da noção de caixa negra.

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2. A questão da (inter)disciplinaridade a partir do deslocamento da caixa

negra para a caixa translúcida

Resumidamente, qualquer objeto-modelo denominado caixa negra ajusta-se a uma

limitação básica do domínio ao qual pertence: a impossibilidade metodológica de abranger as

dinâmicas endógenas dos fenômenos aos quais se dirige. Isso se dá porque as variáveis

mensuráveis (direta ou indiretamente) não se localizam nos processos internos e, por

conseguinte, restringem a teorização sobre todos os aspectos inobserváveis envolvidos. Esse

entendimento, baseado em Bunge (2013), difere-se da noção de “caixa preta” de Bruno Latour

(2000).

Em Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora, Latour

(2000, p. 17) trabalha com a ideia de que a Ciência24, tal como praticada por cientistas, tende a

ser uma caixa preta. Então, é preciso decidir se “[...] nossa entrada será pela porta de trás, a da

ciência em construção, e não pela entrada mais grandiosa da ciência acabada”.

A proposta de Latour (2000) é realizada a partir do que se denomina Science Studies25,

enfatizando a noção do sujeito, neste caso produtor do conhecimento científico, para dar conta

da relação entre ciência, tecnologia e sociedade, sobre a qual:

Eu afirmo que esse campo existe, que há um núcleo de problemas e métodos comuns,

que ele é importante e que todas as disciplinas e objetos dos estudos de "ciência,

tecnologia e sociedade" podem ser empregados também como material especializado

para estudá-lo. Para definir o que está em jogo nesse campo de estudo, a única coisa

de que precisamos são alguns conjuntos de conceitos suficientemente resistentes

para aguentar a viagem por todas essas disciplinas, esses períodos e objetos

(LATOUR, 2000, p. 35-36).

A caixa preta de Latour (2000) somada ao nexo que faz a partir da figura mitológica de

Jano não é um conceito, método ou qualquer outro elemento científico elaborado pelo autor

(2000), mas um recurso explicativo do qual se utiliza para justificar sua opção pela abordagem

de Science Studies e contextualizar sua ideia de ciência e técnica, a tecnociência.

As diversas implicações filosóficas e científicas da consideração da proposta de Latour

(2000) nesta investigação e as inúmeras objeções que podem ser feitas, não suprimem o

esclarecimento em questão: diferentemente, para Bunge (2013), o objeto-modelo do tipo caixa

negra é parte do ferramental utilizado para a construção de conhecimento científico, é uma

24 A rigor, não há muita diferença para o pensamento do autor (2000) entre Ciência/cientistas e Técnica/técnicos. 25 Uma Antropologia da Ciência que se opõe à Sociologia tradicional, cujo ícone seria Durkheim.

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abordagem, uma opção ou possibilidade metódica e não um recurso explicativo, como em

Latour (2000).

Já Blackburn (1997) abrange a expressão “teoria da caixa preta” em um sentido bem

próximo ao de Bunge (2013):

A compreensão de algo inteiramente através de sua função. Essa concepção deixa-

nos o problema de saber qual é o mecanismo que permite o desempenho dessa

função, já que esse algo é considerado como uma caixa preta, onde tudo aquilo que

o faz funcionar é invisível. Numa teoria da caixa preta aplicada à ciência, por

exemplo, considera-se uma teoria científica unicamente como um formalismo, ou

como um simples dispositivo para produzir previsões a partir de dados empíricos.

Numa teoria da caixa preta aplicada à mente, diríamos que compreendemos a mente

de uma forma exaustiva quando sabemos quais são os dados de entrada (inputs) que

nela produzem os seus dados de saída (outputs) (BLACKBURN, 1997, p. 380).

As explicações teóricas fundamentadas em objeto-modelo caixa negra tendem à

diversidade porque cada objeto empírico abarcado implica um diferente modelo teórico que,

em geral, não é compatível com outros. Portanto, a característica em comum não é de ordem

teórica, mas sim a maneira de empreender a investigação, uma vez que “[...] ‘caixa negra’ se

refere a uma espécie de abordagem mais do que a um tema; sugere que a gente está lidando

mais com o comportamento global do que com a estrutura interna - sem implicações relativas

à não-existência de uma estrutura [...]” (BUNGE, 2013, p. 70, grifo do autor).

Não sendo relativas à não-existência da estrutura, as implicações da caixa negra

consistem na ênfase dos aspectos externos (como, por exemplo, efeitos) em detrimento de

pressupostos relativos às dinâmicas internas, ou seja, é em princípio incompleta frente aos

requisitos científicos, porque se caracteriza por (1) alto grau de generalidade (2) caráter total

(3) simplicidade (4) precisão26 (5) segurança27:

[...] De fato, um alto grau de generalidade, ou falta de especificidade, revela que a

espécie do sistema não é levada em conta; o caráter não-local prova que a provável

estrutura complexa do sistema foi relanceada, ou no mínimo, integrada; a

simplicidade é a marca da superficialidade; finalmente, a excelência na adequação

desacompanhada de profundidade, de segurança e de certeza, aproximam

perigosamente as teorias fenomenológicas da irrefutabilidade - que, segundo Popper,

é o selo da não-ciência (BUNGE, 2013, p. 83).

26 “Podemos construir teorias fenomenológicas para satisfazer qualquer conjunto de dados por um aumento

adequado ou pela manipulação de um certo número de parâmetros” (BUNGE, 2013, p. 82). 27 “As teorias da caixa negra são as mais firmemente ancoradas na experiência, portanto, as melhores protegidas

contra refutação [...]” (BUNGE, 2013, p. 82).

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Por outro lado, segundo Bunge (2013), há pelo menos três razões que sustentam a

pertinência da caixa negra: (1) o início de modelos teóricos que satisfazem requisitos científicos

são, em geral, realizados a partir deste tipo de abordagem; (2) são suficientes para certos fins,

especialmente porque são descrições gerais e (3) realizam a interlocução entre teorias mais

profundas e evidências empíricas.

Ao ser iniciada por um modelo do tipo caixa negra, uma disciplina progride quando

passa a satisfazer os requisitos científicos, ou seja, a estruturar modelos teóricos que além de

operacionalizar índices externos (especialmente de saída, efeito), se ocupam da hipotetização

de mecanismos internos. É neste ponto que a interdisciplinaridade aparece da seguinte maneira:

PRINCÍPIO DA INTERDISCIPLINARIDADE – Dada qualquer disciplina

científica, existe uma interdisciplinaridade que a liga a outra disciplina científica.

Esta máxima metodológica convida a ultrapassar fronteiras disciplinares. É fértil,

muito embora irrefutável. Ao mesmo tempo, ajuda a discriminar a ciência da

pseudociência, a qual, tipicamente, fica isolada (BUNGE, 2012, p. 296).

Paviani (2008), buscando estipular os possíveis sentidos de interdisciplinaridade, aponta

para algumas limitações:

Imaginar que a interdisciplinaridade consiste na criação de novas ciências ou

disciplinas é uma ambição desmesurada e uma simplificação utópica. Relacionar a

interdisciplinaridade ao conceito de revolução científica, no sentido de Kuhn, é uma

hipótese muito pretensiosa. Afirmar, finalmente, que as relações interdisciplinares

não possuem relevância epistemológica, pois desde sempre as disciplinas estão numa

relação mútua, é desconhecer o estado atual do conhecimento científico e das

questões pedagógicas (PAVIANI, 2008, p. 15).

Entende-se que as limitações/proibições apontadas pelo autor (2008) acerca da

interdisciplinaridade sugerem que há contextos diferentes, mas inter-relacionados, a exemplo

do que acontece com a Filosofia da Ciência. Mas novamente, seguindo o posicionamento

(inclusive de caráter epistemológico) assumido até aqui, interessa a dimensão em que ela afeta

aspectos lógicos do desenvolvimento científico.

Isso porque, ainda que se admita que no âmbito da realidade da prática científica os

níveis lógicos e extralógicos mantêm relação direta, a análise demanda um afastamento em que,

como campos de reflexão, tais dimensões não podem ser equivalentes ou redutoras da outra

inadvertidamente.

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De modo geral, o argumento de maior fôlego28 e mais frequentemente identificado na

Comunicação29 diz respeito à complexidade do objeto a ser investigado, sendo um dos

referenciais mais influentes o sociólogo francês Edgar Morin. Quando propõe a epistemologia

da complexidade (2006) e quando denuncia a falta de consciência – no sentido de ignorância

sobre os fundamentos, assim como do não comprometimento ético (2005) – do fazer científico,

Edgar Morin está, prioritariamente, questionando a pertinência da disciplina e dos fundamentos

científicos básicos oriundos da Filosofia da Ciência.

Sua crítica do cerceamento reflexivo produzido pelo âmbito disciplinar (MORIN, 2006)

se estabelece na medida em que se admite inobservância do Princípio da interdisciplinaridade

(BUNGE, 2012). Mas as ideias simplificadoras da realidade, às quais a complexidade explicada

por Morin (2005) se opõe parecem formar não a Ciência como um todo, mas uma má ou

pseudociência.

Crítica semelhante foi realizada por Kuhn (1979) no Colóquio Internacional sobre

Filosofia da Ciência de 1965, na sua readequação de Ciência Normal. Sobre isso, Popper (1979)

respondeu que:

A meu ver, o cientista “normal”, tal como Kuhn o descreve, é uma pessoa da qual

devemos ter pena [...] O cientista “normal”, a meu juízo, foi mal ensinado. Acredito,

e muita gente acredita como eu, que todo o ensino de nível universitário (e se possível

de nível inferior) devia consistir em educar e estimular o aluno a utilizar o

pensamento crítico. O cientista “normal”, descrito por Kuhn, foi mal ensinado. Foi

ensinado com espírito dogmático: é uma vítima da doutrinação (POPPER, 1979, p.

65).

É por isso que é difícil não perceber a proposta da complexidade como insuficiente para

eliminar as demandas do conhecimento científico. Além de se tratar de uma crítica da má

ciência, foi no bojo do desenvolvimento científico que se tornou evidente (MORIN, 2006;

BUNGE, 2013). Assim, a complexidade acaba por reforçar as demandas da demarcação e da

lógica científica, sobretudo no que toca a delicada relação entre a reflexão e o objeto empírico,

equilibrada necessariamente pelo Objeto de pesquisa.

Alguma redução será sempre necessária, fundamentalmente porque a falibilidade

humana é perene em todo o constructo científico. Entretanto, isso não é negado pela Ciência,

28 Porque se distancia em alguma medida da justificativa de subversão do exercício de poder

disciplinador/mutilador da Ciência e aproxima-se de possibilidades na dimensão da lógica do desenvolvimento

científico. 29 Considerando aqui, fundamentalmente, o contexto brasileiro.

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ao contrário é admitido como premissa e limitação de seu exercício e, por conseguinte, se trata

de algo de que se tem (cons)ciência.

Considerando as imbricações endógenas, não se refuta a ideia de que a

interdisciplinaridade30, no que tange sua influência no debate epistemológico, possa não ter sido

apreciada pelos diversos domínios e em diferentes momentos da construção científica. Mas já

em Bunge (2013)31 é tomada como consequência do requisito epistemológico da coerência

externa, dentro do qual:

A teoria deve ser coerente com a massa de conhecimento aceito, se é que deve

encontrar apoio em algo mais do que apenas seus exemplos, se é que deve ser

considerada como um acréscimo ao conhecimento e não como um corpo estranho.

As teorias revolucionárias – em contraposição às teorias divergentes ou doidas – são

incoerentes com apenas parte do conhecimento científico, pois a própria crítica das

velhas teorias e a construção de outras novas se realiza com base em conhecimento

definido e à luz de normas mais ou menos explicitamente estabelecidas. As

heterodoxias isoladas não põem em perigo a massa do conhecimento estabelecido

(no entanto provisório); muito ao contrário, questionamos as teorias isoladas à luz

de conhecimento aceito e regras de procedimento (BUNGE, 2013, p. 135).

Este requisito epistemológico está diretamente vinculado a outros também de ordem

epistemológica e metodológica e, indiretamente, às exigências filosóficas da teoria que, de

modo geral, afetam o poder explanatório e preditivo, sua profundidade, sua justeza

metacientífica etc (BUNGE, 2013).

Dessas relações, a mais interessante para o centro deste item do trabalho é a que diz

respeito ao critério também epistemológico do poder explanatório, como sendo o equilíbrio

entre alcance e precisão:

[...] Mas o alcance de uma teoria científica não pode pretender solucionar todo e

qualquer problema, sob pena de tornar-se irrefutável. Em particular, uma teoria

científica tem de ser unilateral, i. e., não deve ser capaz de amparar hipóteses ou

propostas contrárias (e.g., contraditórias), nem deve ser coerente com elementos de

evidência contraditórios [...] (BUNGE, 2013, p. 136-137).

30 Também é preciso destacar que é na questão da interdisciplinaridade que os aspectos educacionais, de

transmissão do conhecimento científico no âmbito escolar se destacam, em comparação aos outros elementos

discutidos até aqui. O que não suplanta, entretanto, a limitação de execução desta investigação: optando-se pela

dimensão lógica, não há possibilidade de abranger a Ciência ou a disciplina com tão largo alcance, a ponto de

alcançar o político, institucional, econômico, educacional etc. 31 Cuja primeira edição em espanhol é de 1972.

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A crítica de Martino e Boaventura (2013) a respeito da interdisciplinaridade alcança,

dentre outras coisas, justamente essa implicação epistemológica do desequilíbrio entre alcance

e precisão que caracteriza algumas percepções de interdisciplinaridade, colocando-a em

oposição à Ciência:

Disciplinas menos consolidadas teoricamente, como a Comunicação e a Educação,

ficam expostas a estas propostas radicais, de modo que alguns julgam encontrar na

interdisciplinaridade uma maneira de resolver seus problemas de fundamentação,

objeto e método. Contudo a própria falta de clareza sobre o sentido de

interdisciplinaridade traz uma importante implicação epistemológica: dependendo

da maneira como se compreenda a interdisciplinaridade, a consequência lógica é

negar a possibilidade de que a Comunicação possa ser trabalhada como uma

disciplina científica, além de criar embaraços para as atividades de ensino e pesquisa

(MARTINO; BOAVENTURA, 2013, p. 2).

Deslocar a interdisciplinaridade do Princípio/Requisito de Interdisciplinaridade

(BUNGE, 2012 e 2013) corresponde a compreendê-la como uma ruptura paradigmática em

relação à disciplina no sentido proposto por Kuhn (2001).

Por consequência, a proposta carrega o esvaziamento da noção de Paradigma

identificado no primeiro item deste capítulo. Mas, além disso, origina-se da equivocada redução

de disciplina como mera articulação burocrática (MARTINO; BOAVENTURA, 2013). Ao

contrário, a disciplina é uma característica da Ciência:

[...] a repartição em disciplinas e a especialização do conhecimento são

características do conhecimento científico, o que fica mais nítido com o

desenvolvimento deste. A ciência difere, portanto, da filosofia, que é intrinsecamente

um saber inter/trans disciplinar. Daí o mal-estar da crítica interdisciplinar mais

radical, pois o ataque e a desclassificação do pensamento científico podem soar como

uma volta a um estado pré-científico (erudição naturalista, sabedoria de vida, ética

humanista...) ou como um descabido exercício de apregoar a superioridade da

especulação filosófica sobre o trabalho científico, quando na verdade são

conhecimentos de ordens diferentes (MARTINO; BOAVENTURA, 2013, p. 6).

Não se pretende com isso afirmar que essa é a única questão de consequência

epistemológica a ser objeto de atenção no domínio da Comunicação, mas sim que a partir desta

crítica é possível iniciar o questionamento sobre o lugar e as condições da discussão

epistemológica, especificamente em Comunicação, o que é objeto da próxima seção.

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3. Pertinência epistemológica do Problema de Pesquisa

Levando em consideração principalmente o argumento da incomensurabilidade e da

interdisciplinaridade, volta-se para o texto Trilhas da investigação epistemológica: o GT

Epistemologia da Comunicação da Compós, de Luis Mauro Sá Martino (2014), no qual se

identifica como central o problema da diversidade de objetos e, por conseguinte, de referenciais

teórico-conceituais.

Em uma linha de abordagem próxima ao texto de Martino (2014), para discutir o lugar

do debate epistemológico na Comunicação tanto quanto se faz pertinente neste item do

trabalho32, foram buscados textos nos anais de Intercom e Compós, sobretudo e respectivamente

nos grupos Teorias da Comunicação e Epistemologia da Comunicação. Além disso, no caso de

periódicos, as preferências pelos textos foram orientadas por dois critérios: a avaliação Qualis

dos periódicos (de A1 a B3)33 e a centralidade da questão epistemológica34.

Um exemplo de tal centralidade está em Marcondes Filho (2011), para o qual a

consequência negativa da demasiada amplitude das abordagens (tomadas como um conjunto) é

também provocada pelo descompromisso epistemológico e ontológico com a comunicação:

[...] Todos falavam de comunicação e ninguém se debruçava sobre a comunicação.

Adorno e Horkheimer demonizavam a cultura pop porque esta elevava o kitsch à

estatura da grande arte; McLuhan intrigava-se com os equipamentos técnicos

prolongando nossos próprios órgãos e membros; Eco empobrecia a discussão

reduzindo-a a um embate de extremos: ou cedemos aos apocalípticos ou nos

integramos. Nem os mais recentes críticos da cultura técnica – Flusser, Deleuze,

Baudrillard, Kamper –, nem os comentadores cautelosos da era digital, em suma,

ninguém se pergunta o que é, em última análise, comunicação (MARCONDES

FILHO, 2011, p. 170).

Identificando preocupações da mesma ordem, Ciro Marcondes Filho e José Luiz Braga

discutem seus posicionamentos em diversos textos especialmente a partir de 2011, ampliando

o debate para os níveis metodológicos e teóricos, de forma que não cabem neste item do

trabalho.

32 Em outros capítulos posicionamentos teóricos adotados em pesquisas comunicacionais brasileiras serão objeto

de análise conceitual. Dessa maneira, os textos aqui citados esboçam o panorama da possibilidade de cientificidade

da Comunicação, sem maiores detalhes, para privilegiar a manutenção da ênfase em questões epistemológicas (ou

de implicações epistemológicas) diretas. 33 Lista recente do Qualis Periódicos referentes aos anos 2013 e 2014 e acessada com base em documento que

informa sobre a atualização, disponível em: <http://uploads.capes.gov.br/files/OficioCircular22_DAV-

DivulgacaoQualis.pdf>. Acesso em: 16 fev. 2016. 34 Todos os textos correspondem ao período de 2010 a 2016, excetuando textos em livros. Assim, ainda que os

debates de interesse deste item sejam abordados em livros, a preferência pelos congressos e periódicos se dá pela

dinâmica mais ágil e pela abrangência ampliada destes textos em relação aos livros.

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Mas no ponto inicial de ambos, insiste-se na recusa da interdisciplinaridade nos

parâmetros criticados por Martino e Boaventura (2013) e na demanda por orientações

epistemológicas e ontológicas mínimas, visto que “esta postura, talvez válida em um ângulo

filosófico, não deixa, entretanto, margem para uma pesquisa que se pretenda identificável. A

comunicação, espalhando-se como objeto por todas as áreas, estando em todas as pautas, não

está em nenhum lugar” (BRAGA, 2011, p. 65).

O motivo pelo qual tal escolha, que é em última análise epistemológica, não se justifica

é:

Além do absurdo lógico de que o espaço de encontro é o vácuo, o que não fica

explicado nessa perspectiva é por que, de repente, há um tema que se torna de

interesse tão generalizado e com tal acuidade que não consegue mais efetivamente

caber nos espaços de cada campo particular ou de algumas interfaces bem

construídas. Note-se que outros temas ocupam igualmente o interesse de várias

disciplinas – por exemplo – a violência, o trabalho, o sexo, o discurso, a tomada de

decisões. Em várias disciplinas, esses temas surgem e simplesmente se encaixam na

ordem de preocupações dominantes de cada campo, aí bem integradas. Ou seja, ainda

que transversais a vários campos, estes diversos temas são facilmente subsumidos

ao ângulo de interesse de cada disciplina. No diálogo entre uma disciplina e outra,

são essas angulações específicas que são cotejadas para ampliar o enfoque (BRAGA,

2011, p. 63-64).

Para o autor (2011), uma saída possível é viabilizada pela posição segundo a qual:

[...] o objeto da Comunicação é toda e qualquer “conversação” do espaço social. Ou

melhor: o que há de propriamente “conversacional” e de troca (simbólica e de

práticas interativas) nas diversas instâncias e situações da vida social. Em

contraposição a esta visão da comunicação generalizada (mas ainda com ênfase nos

processos comunicacionais – de trocas simbólicas e práticas, portanto) uma

preferência mais circunscrita, enfocando apenas o que ocorre nos “meios de

comunicação social” (MCS ou mídia) (BRAGA, 2011, p. 65).

No artigo A disciplinarização da Epistemologia no ensino da(s) Teoria(s) da

Comunicação, Luis Mauro de Sá Martino (2013) aponta para duas possibilidades mais

relevantes: a Comunicação a partir de meios ou de processos. O que ambas possuem em comum

é que, invariavelmente, dependem de esclarecimentos sobre os meios de comunicação, ainda

que seja para refutar sua centralidade.

A centralidade dos meios de comunicação é a posição evidente nos diversos textos de

Luiz Cláudio Martino, somada aos diferentes argumentos de caráter epistemológico que utiliza

para justificá-la. A crítica direta à posição de Martino está no texto de Francisco Rüdiger (2014),

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Epistemologia “da” Comunicação: elementos para a crítica de uma fantasia acadêmica, no

qual explica que:

O presente artigo agencia estas interrogações e se origina do ceticismo em relação

aos movimentos acadêmicos que, reivindicando uma causa sem examinar seus

pressupostos, desejam fundar uma autoridade intelectual propagando uma crença e

recrutando seguidores, seja para conquistar vantagens materiais e administrativas,

seja para satisfazer fantasias de poder em um mundo dominado pela vontade de

possuí-lo. A legitimação acadêmica e reconhecimento institucional não bastam para

conferir autonomia epistemológica a um saber e, por isso, relativamente à matéria,

só mantém o espírito livre quem evita confundir prática política institucional e

voluntarismo epistemológico com justificativa intelectual e filosófica (RÜDIGER,

2014, p. 398).

Ainda que a primeira justificativa para sua refutação da Epistemologia da Comunicação

seja baseada na questão da “luta pelo poder”, Rüdiger (2014) propõe-se a restringir sua crítica,

dentre outras coisas, pelo estabelecimento de parâmetros conceituais.

É em função disso que Rüdiger (2014) não rejeita a ênfase nos meios de comunicação,

ao mesmo tempo em que refuta as justificativas de Martino:

Martino deseja, em resumo, algo simples e razoável, que a pesquisa em

comunicação, entre os que fazem parte administrativamente dos setores acadêmicos

agrupados com o rótulo, se reduza a estudos de mídia (Martino, 2001a). Acreditamos

estar de acordo com ele, quando subscrevemos a tese de que, em vez de

comunicação, o tema mais central de nossos estudos são os fenômenos de mídia [...].

Sua ingenuidade ou ilusão consiste em pensar que isto, entretanto, baste para

justificar uma epistemologia e, assim, fundar uma nova ciência. A origem do pecado

é o culto fetichista da palavra “comunicação”, lançada onde deveriam aparecer os

termos mídia e estudos de mídia (RÜDIGER, 2014, p. 402).

Para o autor (2014), a localização disciplinar dos meios de comunicação não pode se

dar a partir de um debate epistemológico, uma vez que tal reflexão “[...] só tem necessidade

desde o ponto de vista de quem analisa filosoficamente a atividade científica. O pesquisador

mesmo pode desconhecê-la, sem que isso importe necessariamente em prejuízo. A falta pode

ou não acarretá-lo, porque, como tal, aquele primeiro está, em essência, engajado noutro tipo

de tarefa” (RÜDIGER, 2014, p. 403).

O mérito da objeção de Rüdiger (2014) é a distinção entre os trabalhos teórico e

epistemológico, na medida em que é da alçada do primeiro a elaboração conceitual que deveria

separar toda e qualquer comunicação (vista sob inúmeras angulações, de diferentes domínios),

daquela relativa aos meios de comunicação. Sua contrapartida é de que:

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As teorias da comunicação que dispomos não procedem à sistematização da área, no

sentido de fazer convergir suas teses e proposições. A pergunta que se deve fazer,

porém, é: por que deveriam? O raciocínio precede como se a sistematização, no

sentido da confecção de uma “teoria geral” ou da explicitação de um “princípio

unitário” fosse não apenas desejável e possível, mas indispensável à sobrevivência

acadêmica e intelectual dos estudos de mídia. O fato, no entanto, é que não é assim:

o campo acadêmico da comunicação surgiu e vem prosperando à revelia dessa

exigência, que pode interessar e ser esperada pela filosofia da ciência, mas não é

necessária para ajuizar os resultados de suas pesquisas e, mesmo, manter uma

comunidade acadêmica [...] (RÜDIGER, 2014, p. 405).

Assim, a proposta do autor (2014) retoma ao menos parcialmente o ceticismo, visto que

inviabiliza que a crítica de posicionamentos diferentes seja realizada a partir de parâmetros

epistemológicos e metodológicos, atribuindo a Martino um segundo equívoco: o de sucumbir

“acriticamente à crença no conhecimento científico como única forma legítima de saber [...]”

(RÜDIGER, 2014, p. 405).

Rüdiger (2014) também tem razão em sua objeção de que a distinção temática não é um

critério diretamente epistemológico, cabendo a contrapartida de que não significa que não tenha

importantes implicações em tal instância. Somado a tal pontuação, também apresenta o

argumento de que:

Epistemologia da comunicação, na medida em que pode carregar rigor e propriedade

filosófica como expressão, só pode significar estudo analítico, eventualmente

histórico dos fundamentos teóricos e metodológicos que estruturam a pesquisa e a

produção do conhecimento por parte dos investigadores dos chamados fenômenos

de comunicação (mídia, mais frequentemente). Isto é, refere-se à análise das

perspectivas teóricas e métodos de estudo dos quais lançam mão os estudiosos dos

fenômenos ligados à imprensa, ao rádio, à televisão e a outros meios de

comunicação. Confunde-a com a teoria aquele que lhe atribui à tarefa de definir o

que é a comunicação enquanto objeto de pesquisa, visto que só aquela pode,

legitimamente, construir seu conhecimento (RÜDIGER, 2014, p. 411).

Além disso, também tem razão em sua objeção de que:

Quem quer que se proponha a analisar e debater os feitos e realizações, mas também

os problemas e desafios da pesquisa em comunicação (mídia, de fato) fará bem em

se dedicar à epistemologia, porque é nesse plano que essas tarefas se colocam.

Porém, só o fará bem se não perder contato com o trabalho de investigação

efetivamente desenvolvido na área e puser de lado a convicção provinciana de que

esta tarefa possui o objetivo doutrinário de provar o caráter de ciência desse campo

do conhecimento, através da determinação abstrata e impositiva do que pretende que

seja seu objeto (RÜDIGER, 2014, p. 410).

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Entretanto, a solução de Rüdiger (2014) também aponta para a preponderância da

dimensão extralógica na discussão epistemológica, porque para o autor (2014), do contrário,

recai-se na defesa da Ciência como único conhecimento legítimo.

Então, em tal solução o trabalho epistemológico está restrito ao levantamento das

produções científicas, tendo os parâmetros pautados exclusivamente pelas práticas dos

estudiosos. Porém, como colocado por Okasha (2002), no que tange a questão epistemológica,

trata-se do melhor sentido que se pode dar ao empreendimento científico e não do sentido

construído pelos objetivos individuais dos pesquisadores.

É possível observar que a discordância sobre o que é ou deve ser Ciência vincula-se ao

debate sobre a importância de aspectos endógenos e externos. Nesse sentido, a pontuação da

insuficiência da primazia de fatores externos, não implica na defesa de suficiência da

perspectiva lógica, pois nenhuma nem outra podem encerrar isoladamente a questão do

estabelecimento das disciplinas.

A questão é que, mesmo na defesa de superioridade da visão sociológica (KUHN, 2001;

MORIN, 2005 e 2006; PAVIANI, 2008; RÜDIGER, 2014) procura-se alicerces que remetam

a algum tipo de demarcação que é, em última instância, lógica. Tomadas dessa forma, as

proposições são incoerentes: não há parâmetros para que suas posições se justifiquem, estando

tais posições certas ou erradas, sendo verdadeiras ou falsas.

A Ciência, subsumida como hábito intelectual, comportamental, linguístico e

tecnológico, anterior a qualquer reflexão teórico-metodológica, conduz à ideia de que

equívocos e limitações científicas equivalem à pseudociência.

Além disso, se não há instrumentos para que as explicações sejam avaliadas, o

pesquisador não pode distinguir e perceber se está sendo levado a concepções dogmáticas, de

senso comum ou de pseudociência o que, em última análise, produz convergência com o

ceticismo.

Supondo-se que os parâmetros sejam reduzidos à consideração ou não da

interdisciplinaridade, é preciso que se esclareça quanto ao entendimento: é uma posição válida

(também) porque não é hermética – Princípio/Requisito da Interdisciplinaridade (BUNGE,

2012 e 2013) ou porque, extrapolando as demandas científicas básicas e focalizando a

subversão de algum tipo de dominação, produz um saber ainda mais “verdadeiro”.

Além disso, como asseverado anteriormente, frequentemente as propostas extralógicas,

buscando a crítica dos aspectos lógicos, os suprimem de forma a aproximá-las do ceticismo.

Perde-se capacidade explicativa, pois não permitem a identificação de mecanismos que

viabilizem avaliação das justificações que oferecem.

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Sem critérios para avaliar sua aproximação com a “verdade”, abre-se espaço para duas

perguntas básicas: em primeiro lugar, por quais razões são essas as melhores respostas a

respeito do sentido atribuído ao empreendimento científico? Em segundo lugar, quais são as

supostas condições para o abandono dessas respostas?

Não é preciso retornar a outras justificações da Filosofia da Ciência sobre a fragilidade

de teorizações cujos sentidos e consistência só podem ser avaliados em si mesmos, mas é

pertinente apontar que a interlocução entre domínios circunscrita pelo Princípio da

interdisciplinaridade não deve ser confundida com o sentido de interdisciplinaridade

coerentemente criticado por Martino e Boaventura (2013).

A objeção realizada em relação à proposta da Interdisciplinaridade se aplica a qualquer

concepção que esteja contextualizada pela Ciência, isto é, se faz necessário oferecer critérios

de avaliação e justificação das opções realizadas, além de não ser hermética, manter auto

coerência e relação equilibrada com as evidências empíricas.

Tendo em vista os delineamentos desta pesquisa e com o objetivo de garantir sua

exequibilidade, a ênfase da análise está na auto coerência das propostas entendidas como

pertinentes às Teorias da Comunicação, orientada pela questão Que é Meio de Comunicação?

Dessa maneira, segue-se para os esclarecimentos sobre a estrutura metódica e técnica

articulada para a viabilização dessa análise e as justificações das escolhas realizadas.

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Capítulo II – INSTÂNCIAS METÓDICA E TÉCNICA DA

ESTRATÉGIA DE INVESTIGAÇÃO PARA O MAPEAMENTO

DO CONCEITO DE MEIO DE COMUNICAÇÃO

Ao modo de proceder característico da ciência convencionou-se chamar de método

científico. O nome é ambíguo. De uma parte é merecido porque o método existe e é

eficaz. Por outro lado a expressão ‘método científico’ é enganosa, pois pode induzir

a crer que consiste num conjunto de receitas exaustivas e infalíveis que qualquer um

pode manejar para inventar ideias e pô-las à prova. Em verdade, não existem tais

receitas populares para investigar. O que existe é uma estratégia da investigação

científica [...] (BUNGE, 1980, p. 34).

Na proposta de Lopes (2005), os conceitos abrangidos pela pesquisa perpassam as

diferentes instâncias de modo que em cada uma delas a preocupação com os construtos é

orientada para as tarefas adequadas a cada nível e fase da investigação.

A partir da instância epistemológica a pesquisa passa a estar comprometida com a

ruptura epistemológica, isto é, com a distinção entre Objeto de pesquisa e Objeto empírico,

entre exercício científico e senso comum e pseudociência.

Enfatizando a instância teórica, tem-se como tarefa a formulação sistemática dos

conceitos de maneira que se cumpra adequadamente com o compromisso destacado no nível

epistemológico, ou dito de outra forma, deve viabilizar a “[...] ruptura epistemológica em face

das pre-noções do senso comum, através de um corpo sistemático de enunciados e de sua

formulação conceitual visando captar e explicar os fatos” (LOPES, 2005, p. 124).

No âmbito da instância metódica estão as operações de exposição, que estão sujeitas à

verificação de coerência interna, e de causação/correlação, cuja finalidade “consiste em traçar

conexões entre teses, fatos, variáveis, proposições [...]” (LOPES, 2005, p. 127).

Finalmente, é da alçada da instância técnica a operacionalização do conceito em si, ou

seja, a opção e a realização de parâmetros de medição, representação, categorização,

indicadores e redefinição de conceitos.

Utilizar-se de tais distinções de relevo do conceito a partir de cada instância realça dois

pontos: em primeiro lugar, o reconhecimento de que o conceito é um elemento preponderante

em todos os níveis da pesquisa, que os inter-relaciona diretamente, já que a elucidação dos

mesmos depende de sua operacionalização metódica e técnica, que é orientada pelos níveis

teórico e epistemológico. Em segundo lugar, a identificação da importância do conceito não é

suficiente para o delinear e estabelecer explicitamente como ele se afasta da linguagem comum

e quais são suas características.

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Para este estudo em particular as perguntas relativas ao conceito são especialmente

decisivas na medida em que as operacionalizações não são realizadas mediante um objeto

empírico que seja relacionado a Meio de Comunicação, mas sim frente às operações de

exposição e correlação articuladas pelas propostas teóricas que compõem as unidades de

pesquisa desta investigação.

Nesse sentido, busca-se adaptar a proposta metodológica de Lopes (2005) para o

contexto da estratégia de investigação científica particular deste trabalho, em face a ênfase do

aspecto conceitual.

Para o debate acerca de Conceito e buscando manter a conformidade com as escolhas

epistemológicas e teóricas já realizadas no capítulo anterior, foram excluídas as perspectivas

que tomam o Conceito ou o Conhecimento a partir das seguintes posições:

Ceticismo e relativismo, pois implicaria no esvaziamento da instância

epistemológica norteadora do trabalho e, como já argumentado, embora tenham

produzido importantes objeções, não se justificam frente a possibilidade colocada

pelos debates em Filosofia da Ciência, em especial a proposta de Popper (1979;

2013) e as complementações em Lakatos (1979), Bunge (1980; 2013) e Sokal e

Bricmont (2010);

Formação do conceito ou do conhecimento no Homem, porque descentralizaria a

perspectiva adotada, visto que a origem da formulação é ignorada, na medida em

que o esforço reflexivo deve incidir sobre a formulação em si (POPPER, 1979;

2013).

Sob o enfoque da relação entre propósitos epistemológicos e metódicos particulares

desta pesquisa, bem como recorrendo aos dicionários de Filosofia, tem-se que:

O que é compreendido por um termo, em particular um predicado. Possuir um

conceito é ter a capacidade de usar um termo que o exprima ao fazer juízos; essa

capacidade está relacionada com as coisas como saber reconhecer quando o termo

se aplica, assim como poder compreender as consequências de sua aplicação. O

termo “ideia” foi inicialmente usado da mesma maneira, mas é hoje evitado devido

a suas associações com as imagens mentais subjetivas, que podem ser irrelevantes

para a posse de um conceito [...] (BLACKBURN, 1997, p. 66).

E também que:

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Ideia simples, unidade de significado, tijolo de uma proposição. Exemplos:

“indivíduo”, “espécie”, “duro”, “duríssimo”, “entre”. Todo conceito pode ser

simbolizado por um termo, mas o inverso é falso. De fato, alguns símbolos tais como

“ele” e “de”, são sincategoremáticos, e outros denotam coisas concretas ou

propriedade a seu respeito. Os conceitos podem ser agrupados em dois grandes

gêneros: conjuntos e predicados de diferentes graus (unários, binários etc.). Tais

conceitos encontram-se definidos implicitamente na teoria dos conjuntos e na lógica

dos predicados, respectivamente. Como os nomes não são nem predicados nem

conjuntos, eles não são conceitos, muito embora alguns deles designem conceitos

[...] (BUNGE, 2012, p. 65, grifo do autor).

Similarmente em Japiassú e Marcondes (2001) há a indicação da face lógica do

Conceito, enfatizando-se sua importância na formulação de juízos. Já Abbagnano (2007), que

dentre os dicionários oferece a maior explicação, inicia sua exposição argumentando que se

refere:

Em geral, todo processo que torne possível a descrição, a classificação e a previsão

dos objetos cognoscíveis. Assim entendido, esse termo tem significado

generalíssimo e pode incluir qualquer espécie de sinal ou procedimento semântico,

seja qual for o objeto a que se refere, abstrato ou concreto, próximo ou distante,

universal ou individual, etc [...] (ABBAGNANO, 2007, p. 164).

Sequencialmente, o autor (2007) esclarece que a noção de Conceito pode ser vista a

partir de duas perspectivas: da sua natureza e da sua função, ambas explicadas a partir de

inúmeras abordagens filosóficas, porém sem explicitar os fundamentos que convergem ou

divergem sobre os dois prismas e sem elaborar um recorte das perspectivas descoincidentes a

partir da questão do conceito.

Depreendeu-se que a dificuldade de elaborar um recorte segundo o problema do

conceito é uma consequência do tratamento intrínseco da questão Que é Conceito? nas diversas

abordagens filosóficas apresentadas por Abbagnano (2007).

Theories of Concepts: a History of the major philosophical tradition, de Morrin Weitz35

(1988), é uma obra oriunda da dificuldade em compreender a questão da natureza do conceito

que, segundo seu autor (1988) tem como causa a falta de uma história da Teoria sobre o mesmo.

Perpassando uma longa lista de filósofos36, Weitz (1988), aponta para uma preponderância de

35 A preocupação mais ampla de Weitz nesse texto se dá em complemento aos seus trabalhos direcionados às

condições teóricas e, portanto, conceituais da Arte. Embora exista tal especificidade na obra do autor, a

peculiaridade do texto aqui utilizado se dá pela sua pertinência. 36 Platão, Aristóteles, Agostinho, Tomás de Aquino, Descartes, Spinoza, Leibniz, Hobbes, Locke, Berkeley, Hume,

Kant, Frege, Russell, Moore, Ryle e Geach.

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preocupações inicialmente vistas em Platão e Aristóteles sobre a viabilidade do conhecimento

e as características de um conceito.

Coincidindo com a inferência realizada a partir da leitura de Abbagnano (2007), para

Weitz (1988) a maior dificuldade reside no fato de, na maior parte dos casos, a noção de

conceito não estar na superfície das discussões que cada filósofo analisado propõe diretamente.

No caso de Platão, por exemplo, o autor (1988) busca extrair dos argumentos sobre Justiça e

sobre Linguagem os critérios aplicados aos conceitos de modo amplo.

Uma face da preocupação com os conceitos está vinculada à Ontologia:

A palavra “ontologia” foi criada por R. Goclenius para o seu Lexicon Philosophicum,

publicado em 1613. Ela é resultado da junção de dois termos gregos, onta (entes) e

logos (teoria, discurso, palavra). Ao pé da letra, ontologia significa, portanto, teoria

dos entes. “Ente” está aí representando todas as coisas sobre as quais se pode dizer

que são – ou que a ontologia é a teoria do ser enquanto tal. A partir da obra de

Christian Wolff, Ontologia (1730), esta passou a ser considerada parte da metafísica

[...] A ontologia passou a ser sinônimo de metaphysica generalis, tratando de analisar

as características do ser em geral [...] (CASTRO, 2008, p. 7, grifo do autor).

As diferenças centrais dos filósofos estudados por Weitz (1988) são ontológicas, isto é,

são determinadas pelas visões particulares sobre o caráter mais amplo da realidade, ou dito de

outra maneira, sobre as características singulares e necessárias do ser/existência/verdade dos

objetos do conhecimento para cada proposta.

A consequência da diversidade ontológica, que para Weitz (1988) constitui em certa

medida a fragilidade da Teoria dos Conceitos, se evidencia nas diferentes acepções e no caráter

secundário da problematização sobre as peculiaridades da explicação (conceituação) dos

objetos existentes.

Em conformidade com tal asserção, em Estrutura e ser: um quadro referencial teórico

para uma filosofia sistemática, Lorenz B. Puntel37 aponta que:

37 A escolha de Puntel (2008) também se deu em razão da pertinência, visto que para a elaboração de sua proposta

o autor se dedicou amplamente e desde os anos 1960 ao estudo dos problemas relativos à explicação e ao conceito,

também concernente ao desenvolvimento científico tal como percebido nesta pesquisa. Ainda que a proposta dele

não possa ser analisada, evitando-se o deslocamento inadequado do trabalho, suas argumentações no âmbito

filosófico colaboram para o esclarecimento do problema conceitual.

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A expressão ‘conceito’ inquestionavelmente está entre as expressões empregadas

com mais frequência na filosofia de todas as épocas. À pergunta o que se quer dizer

com essa expressão ou o que exatamente se entende ou se deve entender por ela,

dificilmente haverá um filósofo em condições de dar uma resposta clara, adequada e

convincente a isso. Basta examinar a história das explicações da expressão ‘conceito’

para convencer-se de que não é possível nem cogitar que exista uma concordância,

por mínima que seja, entre os filósofos. Por exemplo, o que Hegel pensa por

‘conceito’ dificilmente terá algo a ver com o que filósofos como Kant, Frege, Carnap

e outros associam com essa expressão. Não obstante, essa expressão foi e é

empregada a todo momento da literatura filosófica (PUNTEL, 2008, p. 209).

Assim como Weitz (1988), Puntel (2008) identifica a multiplicidade ontológica, porém

optando por refletir sobre ela:

Só na nossa época foi identificada e empreendida a tarefa de desenvolver uma teoria

do conceito (na literatura filosófica de fala inglesa, habitualmente se emprega a

formulação ‘Theory of Concepts [Teoria de conceitos]’). Nesse tocante, não se leva

em conta só a filosofia no sentido mais estrito, mas também são consideradas de

modo decisivo outras disciplinas, em especial a(s) ciência(s) cognitiva(s) e a

psicologia [...] (PUNTEL, 2008, p. 210).

Enquanto para Puntel (2008) as respostas acerca da natureza do conceito não são

satisfatórias, para Weitz (1988) elas estão relacionadas aos problemas do conhecimento de

forma que sua avaliação global (todas as noções de conceito, em todas as aplicações conceituais

de todos os filósofos a partir dos entendimentos individuais sobre a possibilidade do

conhecimento) se torna inviável.

O elemento estável é para Weitz (1988) o ponto de concordância na Teoria dos

Conceitos (os “princípios lógicos”), o que Abbagnano (2007) denominou “função”38 do

conceito e que Puntel (2008) estabelece como um problema de “referência”39:

[...] Uma compreensão puramente extensional de conceitos reduz o teor conceitual à

abrangência conceitual. Nesse caso, um conceito é equiparado ao (à menção do)

conjunto de objetos, aos quais ele é aplicado. De acordo com uma compreensão não

exclusivamente extensional, um conceito “designa” uma entidade que pode ter

diversas designações, mais exatamente, correspondendo à expressão linguística com

que o conceito é associado: desse modo, há atributos (propriedades e relações),

funções etc. (PUNTEL, 2008, p. 211).

O que aparece explícita ou implicitamente em todos os casos (ABBAGNANO, 2007;

BLACKBURN, 1997; BUNGE, 2012; JAPIASSÚ; MARCONDES, 2001; PUNTEL, 2008;

38 Apesar de tornar inseparável qualquer posição sobre função das perspectivas sobre a natureza. 39 Para Puntel (2008), no sentido de possuir conteúdo designado.

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WEITZ; 1988) é que Conceitos implicam explicações que reduzam a ambiguidade, que não se

detenham a inventariar fenômenos e que apresentem critérios explicativos de coerência.

Dito de outra forma, aponta-se para a demanda de parâmetros a respeito dos conceitos

designados, especialmente porque a redução da ambiguidade (uso do termo para significar

diferentes conceitos ou diferentes conceitos aplicados a um mesmo termo) só se viabiliza

através de especificações sobre a aceitação do seu uso “correto” mediante ao universo em que

se aplicam.

Embora epistemologicamente o estabelecimento dos critérios seja variável em função

do conceito que é especificamente colocado em questão e do posicionamento sobre a

viabilidade do conhecimento (WEITZ, 1988), metodicamente, a definição de tais parâmetros

aparece constantemente relacionada às delimitações lógicas de exposição de argumentos, tal

como se observa nas coincidências apontadas por Weitz (1988) e nas explicações oferecidas

por Blackburn (1997), Bunge (2012) e Japiassú e Marcondes (2001).

A Lógica aparece sempre vinculada ao desenvolvimento das outras inúmeras questões

do pensamento filosófico, essencialmente a partir da sua aproximação com a matemática,

especificamente a álgebra. Destaca-se como um domínio razoavelmente independente já a partir

do século XIX e, posteriormente no século XX:

[...] o programa de Russell, centrado na noção de linguagem ideal, foi alvo de severas

críticas, principalmente — mas não apenas — por parte dos "analistas do uso", de

Oxford. Por outro lado, em outros setores (p. ex., na escola alemã proveniente de

Hilbert e de Scholze, e na escola polonesa de Lukasiewicz e Tarski) prevaleceram

os interesses matemáticos e o interesse pela própria L. como disciplina estritamente

matemática. Essa é a origem da cisão (por ora parcial) da L. numa série de disciplinas

cada vez mais formalizadas e matematizadas, com todos os complexos problemas

inerentes à formalização de uma disciplina matemática fundamental (a

metamatemática) [...] (ABBAGNANO, 2007, p. 629).

Tal explicação, concorda com a que é oferecida por Bunge (2012):

a. Geral – O órganon de raciocínio válido (correto): a teoria da dedução. A lógica é

formal, ou seja, é independente de conteúdo e, portanto, da verdade. Por isso perdoa

formalmente argumentos válidos sem considerar a verdade das premissas, assim

como acusa raciocínios inválidos a partir de premissas verdadeiras. A concordância

pela lógica é por conseguinte necessária embora insuficiente para o discurso

racional. Sin. lógica matemática. b. Lógica clássica – O campo da matemática,

oriundo da filosofia, cuja base é a lógica predicativa de primeira ordem com

identidade e que sustenta os princípios do meio excluído e da dupla negação. É a

teoria lógica que está subjacente à maior parte da matemática e à totalidade da ciência

factual e da tecnologia [...] (BUNGE, 2012, p. 224).

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A Lógica40 de que se fala aqui está prioritariamente ocupada com a justeza dos

argumentos (BARONETT, 2009; BISPO; CASTANHEIRA; SOUZA FILHO, 2014; COPI,

1978;), enfatizando a qualidade das relações entre premissas e conclusões das inferências

dedutivas, isto é, a validade dos argumentos a partir de princípios lógicos claramente

estipulados em Lógica tal como indicados por Bunge (2012) na citação imediatamente anterior.

Isso significa que, tecnicamente, se viabiliza especificamente a avaliação do argumento

em uma angulação endógena, sem considerar sua relação com as evidências empíricas. E é

nesse sentido que, na perspectiva dos níveis metódico e técnico, a Lógica colabora para a

execução deste trabalho.

Os princípios lógicos apontados por Bunge (2012), podem ser explicados de maneira

resumida a partir das explanações de Bispo, Castanheira e Souza Filho (2014, p. 4-5) como: (1)

Princípio da identidade, para o qual “toda proposição é idêntica em si mesma” (P é P); (2)

Princípio da não contradição, porque “uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao

mesmo tempo” (não [P e não P]); (3) Princípio do terceiro excluído, isto é, “toda proposição

ou é verdadeira ou é falsa, não existindo um terceiro valor que ela possa assumir” (P ou não P

[ou exclusivo]). Considerando que sobre este último princípio, Bunge (2012) o denomina “meio

excluído” e argumenta que:

[...] o princípio foi mal interpretado por muitos como se impusesse dicotomias ou

partições binárias, do tipo “preto ou branco”, “bom ou mau”, e “capitalista ou

socialista”. Trata-se de um erro porque o princípio se refere a proposições, e não a

coisas concretas: ele apenas divide cada conjunto de proposições em asserções e suas

negações. Portanto, ele não evita a partição de uma coleção em tantas classes (de

equivalência) quanto se necessita [...] (BUNGE, 2012, p. 241).

Então, a propósito dos textos que foram selecionados para comporem as unidades de

pesquisa, tecnicamente se trata de identificar os argumentos relativos a Meio de Comunicação

e verificar, a partir da perspectiva lógica, a justeza de tais argumentos para a formação de um

conceito. Para tanto, elaborou-se um modelo metódico de identificação e análise de conceito e

um modelo técnico de tratamento dos argumentos, apresentados no item subsequente.

Em seguida, são abarcados os passos sobre a composição da unidade de pesquisa

composta pelos textos originais, a saber, (1) Harold Lasswell, A estrutura e a função da

comunicação na sociedade, (2) Paul Lazarsfeld, Bernard Berelson e Hazel Gaudet, The

40 Em seu sentido formal, sem ignorar que há estudos lógicos voltados à indução, além das chamadas Lógicas Não

Clássicas associadas principalmente à Computação (ex: Lógica Fuzzy).

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people’s choice (3) Theodor Adorno e Max Horkheimer, Dialética do esclarecimento, (4)

Marshall McLuhan, Os meios de comunicação como extensões do homem e (5) Jesús Martín-

Barbero, Dos meios às mediações.

Por fim, no terceiro item deste capítulo, são abordados os procedimentos e as razões que

resultaram na seleção da segunda unidade de pesquisa, relativa aos textos recentes.

1. Procedimentos metódicos e técnicos de identificação e análise de conceito-

argumento

Considerando as reflexões até agora realizadas, concorda-se com Bunge (2012) em sua

proposta de que o significado é uma característica dos conceitos:

[...] O significado é uma peculiaridade dos construtos, ou dos símbolos que os

designam. Ele pode ser equiparado à referência (denotação), ao sentido (conotação)

ou aos dois tomados em conjunto. A referência é insuficiente para determinar o

significado porque toda coisa concreta apresenta diferentes propriedades,

conceituadas como o são muitos predicados. Por exemplo, tanto o “metabolismo”

como a “divisibilidade” aplicam-se às células, mas são obviamente diferentes.

Tampouco o sentido é suficiente, cumpre sempre saber a respeito de que objetos

estamos falando e não apenas sobre o que sabemos deles [...] (BUNGE, 2012, p. 352,

grifo do autor).

Nessa perspectiva, a referência (ou classe de referência) distingue sobre o que se está

falando como, por exemplo, “[...] de fato, enquanto ‘mais duro’ refere-se a corpos, sua extensão

é a coleção de pares ordenados de corpos para os quais a relação vale efetivamente [...]”

(BUNGE, 2012, p. 334).

Nesse sentido, uma classe de referência estabelece acerca de que se está falando e a

extensão, também chamada “cobertura de um construto é a coleção de itens para os quais ela é

válida [...]” (BUNGE, 2012, p. 60). Complementarmente, o sentido (ou intensão) é constituído

por definições e descrições das quais é possível depreender critérios de aceitabilidade do uso

do conceito (BUNGE, 2012; WEITZ, 1988).

Dessa forma, o esquema metódico para a identificação e análise técnica do conceito de

Meio de Comunicação nos textos selecionados nas unidades de pesquisa pode ser demonstrado

da seguinte maneira:

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FIGURA 3 – Modelo metódico-técnico de identificação e análise de conceito

Fonte: o próprio autor

A representação do conceito é tecnicamente selecionada pelo uso da expressão “meio

de comunicação” e suas variações básicas como, por exemplo, “meios”, “media” e “mídia”.

Com o desenvolvimento da pesquisa outros termos designadores foram sendo incluídos como

representação do conceito ou, de modo mais específico, como extensões dele.

Dos trechos relacionados ao uso de termos e expressões extensionais ou que

representam o conceito buscou-se depreender descrições e definições, isto é, indicação de

características contidas por Meio de Comunicação, de elementos contextuais que apontem para

a compreensão do sentido de uso e de relações do conceito de Meio com outros

designadores/conceitos. Em nível técnico, a viabilização de reconhecimentos de descrições e

definições foi orientada por procedimentos de tratamento dos argumentos que são incluídos

neste capítulo.

Como será retomado e melhor explicado posteriormente, foram utilizadas duas

unidades de pesquisa neste trabalho. A primeira delas é composta por textos originais, ou seja,

por autores que elaboraram propostas específicas e que são tomados, nos cursos de pós-

graduação, como relevantes. E a segunda é formada por trabalhos publicados recentemente que,

em função de sua constituição frente às estruturas técnicas de disponibilização dos artigos,

centralizam a designação “meio de comunicação”.

Em especial sobre a primeira unidade, compreende-se que a verificação de argumentos

relativos ao conceito de Meio de Comunicação também precisa considerar que podem estar

inseridos em estruturas explanatórias que o relacionam a outros conceitos.

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Dada a abordagem adotada e o caráter teórico do estudo, se fez necessário retomar, a

partir dos resultados obtidos, o viés da pertinência epistemológica e teórica. Entretanto, por se

tratar de retorno às outras instâncias, isso só é realizado no capítulo IV deste trabalho41.

O que cabe explicar aqui são os critérios de identificação e análise das explanações, cuja

realização se dá mediante também a leitura global dos textos considerando:

A justeza lógica dos argumentos, ou seja, observando as circunstâncias iniciais das

propostas e seus aspectos dedutivos;

A indicação de dinâmicas e correlações que constituem a explicação;

As relações entre o conceito de Meio de Comunicação e seus designadores com

outros, observando a composição conceitual geral proposta pelo texto analisado.

Para manejar e gerenciar as análises das unidades de pesquisa optou-se pela utilização

do software Atlas/Ti para garantir a organização dos documentos e da análise que foi

desenvolvida.

Para assegurar a integridade dos textos, uma vez que alguns não foram encontrados

disponíveis em formato digital e os outros apresentavam resultados discrepantes no Atlas/Ti em

função da qualidade, além da digitalização dos textos, utilizou-se ferramentas de Optical

Character Recognition (OCR) para que o procedimento a partir do software não fosse

prejudicado. Dessa forma, os passos de análise no Atlas/Ti foram:

Gerar uma planilha com todos os termos dos textos;

Realizar a leitura pormenorizada de todos os textos de modo que os termos mais

frequentes42 que, a partir de uma primeira leitura, estivessem vinculados a uma

descrição ou definição fossem marcados e o trecho em que estavam inseridos fosse

extraído/marcado. O mesmo procedimento foi aplicado a Meio de Comunicação,

suas variações e extensões como, por exemplo, meios, veículo, televisão e cinema;

Os trechos extraídos foram analisados a partir dos princípios e regras lógicas,

expostos a seguir neste capítulo.

41 A explicação introdutória se fez necessária porque constitui uma das principais relações entre as instâncias

epistemológica-teórica e metódica-técnica, sendo a última díade o interesse prioritário deste capítulo. 42 A frequência foi também analisada proporcionalmente em cada texto, em função do número total de palavras.

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Em razão da grande variedade terminológica em relação a Meio de Comunicação, foi

necessário utilizar procedimentos de formalização dos argumentos analisados para viabilizar a

parcial automatização do procedimento, orientados a partir de três referências básicas:

Introdução à lógica matemática (2014), de Carlos Alberto F. Bispo, Luiz B. Castanheira e

Oswaldo Melo Souza Filho; Lógica: uma introdução voltada para as ciências (2009), de Stan

Baronett; e Pensamento crítico: o poder da lógica e da argumentação (2011), de Walter A.

Carnielli e Richard L. Epstein.

As exposições de Bispo, Castanheira e Souza Filho (2014) e Carnielli e Epstein (2011)

foram utilizadas como base para a formalização simbólica dos argumentos avaliados e são

citadas aqui para a explicação da aplicação das regras lógicas que fundamentaram a análise,

bem como acontece com algumas das exposições de Bunge (2012).

Baronett (2009) apresenta alguns modelos de aplicação lógica, especialmente em

relação ao mapeamento de premissas e conclusões, demonstração de análise de inferências e

processos de formalização, que foram observados no planejamento dessa fase da análise.

A primeira tarefa prática consistiu em agrupar todos os termos designadores que foram

tratados nos textos como sinônimos de Meio de Comunicação e, por conseguinte, os trechos

que os continham.

Sequencialmente, foram distinguidos os trechos que se direcionavam ao tratamento

direto de Meio de Comunicação dos que não continham qualquer termo considerado e agrupado

como “meio” no centro da argumentação. Nos exemplos a seguir, enquanto em McLuhan

(2005) “meio” é o centro argumentativo, em Laswell (1989) não o é. Portanto, o trecho extraído

do segundo autor (1989) foi descartado como explicação de meio porque não se propõe a isso,

bem como não se enquadra como argumento passível da análise aplicada:

Exemplo 1 - “[...] Este fato apenas serve para destacar o ponto de que ‘o meio é a

mensagem’, porque é o meio que configura e controla a proporção e a forma das

ações e associações humanas. O conteúdo ou usos desses meios são tão diversos

quão ineficazes na estruturação da forma das associações humanas [...]”

(MCLUHAN, 2005, p. 23).

Exemplo 2 - “[...] Quando o principal problema diz respeito às pessoas atingidas

pelos meios de comunicação, falamos de análise de audiência [...]” (LASSWELL,

1989, p. 105).

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Em seguida, os trechos foram discriminados segundo a identificação de um argumento,

isto é, trechos que apresentavam “[...] um conjunto de n proposições, e uma delas é

consequência e depende das demais [...]” considerando que “[...] a proposição consequência é

chamada de conclusão, e as demais, de premissas. As premissas devem servir para provar, ou

no mínimo, formar alguma evidência para a conclusão de argumento” (BISPO;

CASTANHEIRA; SOUZA FILHO, 2014, p. 32, grifo do autor):

FIGURA 4 – Distinção de Premissa(s)

Fonte: o próprio autor

Para facilitar esse procedimento da análise, os trechos foram divididos entre premissa(s)

e conclusão(ões), destacando-se os conectivos proposicionais utilizados no argumento,

classificados em Conjunção, Disjunção, Condicional, Bicondicional ou Negação43:

43 Os trechos selecionados incluíam prioritariamente mais de duas premissas, além de conclusões correlacionadas

e utilização de mais de um conectivo para a construção do argumento completo. Então, as demonstrações aqui

realizadas são da estrutura do procedimento técnico que foi adaptado/complementado mediante as demandas da

análise.

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FIGURA 5 – Modelo técnico básico de tratamento de argumentos

Fonte: o próprio autor

Conjunção foi demarcada quando as proposições estavam ligadas pela palavra “e” ou

sinônimos, implicando na seguinte demanda: para a conclusão ser considerada verdadeira e o

argumento válido, todas as premissas relacionadas precisariam ser também verdadeiras

(BISPO; CASTANHEIRA; SOUZA FILHO, 2014):

TABELA 1 – Tabela verdade: Conjunção

Fonte: Adaptado de Carnielli e Epstein (2011, p. 315)

Disjunção foi identificada em proposições que estavam relacionadas pela palavra “ou”

ou sinônimos. Neste caso, para a conclusão ser considerada verdadeira e o argumento válido,

apenas uma premissa precisaria ser verdadeira (BISPO; CASTANHEIRA; SOUZA FILHO,

2014):

TABELA 2 – Tabela verdade: Disjunção

Fonte: Adaptado de Carnielli e Epstein (2011, p. 316)

P1 P2 P1 E P2

V V V

V F F

F V F

F F F

P1 P2 P1 OU P2

V V V

V F V

F V V

F F F

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Foram indicados como Negação conectivos que, ao invés do relacionamento das

proposições apontavam para a negação da precedente. Neste caso, “[...] se o valor-verdade de

uma proposição é (V), quando acompanhado do conectivo de negação, passará a ser (F) e vice-

versa”[...] (BISPO; CASTANHEIRA; SOUZA FILHO, 2014, p. 11):

TABELA 3 – Tabela verdade: Negação

Fonte: Adaptado de Carnielli e Epstein (2011, p. 315)

Categorizaram-se como Condicional proposições relacionadas pela regra/expressão

“se..., então...”, caso em que a afirmação [...] é falsa (F) se e somente se o antecedente é V e o

consequente é F” (CARNIELLI; EPSTEIN, 2011, p. 317). E como Bicondicional proposições

relacionadas pela regra/expressão “...se, e somente se ....”, casos em que a validade do

argumento é determinada pela relação direta entre as proposições e o valor-verdade das

proposições simples. Dito de outra forma, o argumento “[...] é válido quando for impossível

todas as premissas serem verdadeiras e a conclusão ser falsa” (BISPO; CASTANHEIRA;

SOUZA FILHO, 2014, p. 36):

TABELA 4 – Tabela verdade: Condicional

Fonte: Adaptado de Carnielli e Epstein (2011, p. 317)

TABELA 5 – Tabela verdade: Bicondicional

Fonte: o próprio autor

P NÃO P

V F

F V

P1 P2 SE P1 ENTÃO P2

V V V

V F F

F V V

F F V

P1 P2 P1 SE E SOMENTE SE P2

V V V

V F F

F V F

F F V

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É importante destacar que para os fins dessa análise a correspondência com o objeto

empírico ou a “verdade” das proposições não é primordial, porque os objetivos desse

procedimento são (1) distinguir argumentos de não argumentos, e (2) identificar os argumentos

passíveis da análise aqui proposta como válidos ou inválidos. Isso porque, embora exista

relação entre valor-verdade e validade/invalidade a última díade, de modo prioritário, é

concernente à forma do argumento (BISPO; CASTANHEIRA; SOUZA FILHO, 2014).

Finalizados os esclarecimentos sobre os procedimentos metódicos e técnicos de

identificação e análise de conceito, bem como de tratamento dos argumentos, segue-se para os

detalhamentos da seleção das unidades de pesquisa.

2. Seleção da unidade de pesquisa de textos originais

Buscando um panorama das referências bibliográficas acerca das Teorias de

Comunicação utilizadas nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu em território nacional, foi

realizado levantamento através da plataforma Sucupira da Comissão de Aperfeiçoamento de

Pessoal de Nível Superior (CAPES)44.

Foram identificados 51 Programas de pós-graduação, sendo 22 com curso de Mestrado,

5 com Mestrado Profissional e 24 com Mestrado e Doutorado, resultando-se em um total de 75

cursos de pós-graduação em Comunicação.

Dentre as Instituições de Ensino (IEs) destacadas, 10 não possuem disciplinas de teorias

em caráter geral:

FIAM-FAAM Centro Universitário, que possui mestrado profissional em

Jornalismo, subdividido nas linhas Linguagens Jornalísticas e Tecnologias, e

Jornalismo e Mercado de Trabalho.

Universidade Anhembi Morumbi, com cursos de mestrado e doutorado na área de

concentração Comunicação Audiovisual.

Universidade Estadual de Campinas, na qual os cursos de mestrado e doutorado são

concentrados na área de Multimeios.

Universidade Estadual de Londrina, cujas linhas de pesquisa são Cultura Visual e

Processos Sociais, e Imagem e Linguagens.

44 https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/index.jsf

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Universidade Estadual de Ponta Grossa, cuja área de concentração do mestrado é

Processos Jornalísticos.

Universidade Federal de Juiz de Fora, que possui curso de mestrado na área de

concentração Comunicação e Sociedade.

Universidade Federal de Ouro Preto, cuja área de concentração do mestrado é

Comunicação e Temporalidades.

Universidade Federal da Paraíba/João Pessoa, nos cursos de mestrado, acadêmico

(Comunicação e Culturas Midiáticas) e profissional (Jornalismo).

Universidade Federal de Santa Catarina, com cursos de mestrado e doutorado, cuja

área de concentração é Jornalismo.

Universidade Federal de São Carlos, com mestrado na área de concentração Imagem

e Som.

Para se chegar às disciplinas selecionadas, determinou-se como necessária a relação

entre os termos Teoria(s) e Comunicação. Evitando-se a restrição demasiada dos resultados,

foram considerados também Campo, Pensamento e Pesquisa em relação à Teoria(s), e Mídia,

Meios e Comunicacional, concernente à Comunicação.

Com isso, chegou-se ao total de 42 disciplinas distribuídas em 61 cursos de pós-

graduação Stricto Sensu, de 36 instituições, conforme a Tabela 6.

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TABELA 6 – Disciplinas gerais nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu

Fonte: Adaptado da plataforma Sucupira

Disciplina IE

As Teorias de Comunicação no surgimento do rádio UNIP

Campo comunicacional e suas interfaces PUC/MG

Correntes teóricas da Comunicação Social UMESP

Estudos avançados em Teoria da Comunicação UERJ

Fundamentos da Teoria da Mídia UNIP

Fundamentos do pensamento comunicacional UFAM

Fundamentos teóricos da Comunicação UFC

Metodologia da Pesquisa em Comunicação USP

Novas Teorias da Mídia UERJ

Pensamento comunicacional contemporâneo PUC/MG

Problemas teóricos da Comunicação UFRJ

Problemas teóricos da Comunicação UFF

Questões teóricas em Comunicação UFES

Seminários das Teorias da Comunicação UMESP

Temas em Teorias Contemporâneas da Comunicação e da Cultura UFBA

Tendências teóricas em Comunicação e Cultura UFT

Teoria da Comunicação UCB

Teoria da Comunicação UFG

Teoria da materialidade e diacronia dos meios UNIP

Teoria social e da Comunicação UFPR

Teoria(s) da comunicação midiática UFRN

Teorias Críticas na Comunicação PUC/SP

Teorias Culturalistas na Comunicação PUC/SP

Teorias da Comunicação PUC/SP

Teorias da Comunicação FCL

Teorias da Comunicação UFMS

Teorias da Comunicação FUFPI

Teorias da Comunicação PUC/RS

Teorias da Comunicação UNB

Teorias da Comunicação UNISINOS

Teorias da Comunicação UNESP/BAU

Teorias da Comunicação UFMG

Teorias da Comunicação UFPA

Teorias da Comunicação UTP

Teorias da Comunicação UNISO

Teorias da Comunicação e da Informação UFRGS

Teorias da Comunicação e da Mídia ESPM

Teorias da Comunicação e Inovação USCS

Teorias da Comunicação I PUC/RIO

Teorias e Metodologias no campo da Comunicação FUFSE

Teorias e Métodos de pesquisa em Comunicação UFPE

Teorias sistêmicas da comunicação PUC/SP

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Embora o caráter específico, ao invés de geral, já estivesse sugerido no nome de algumas

disciplinas a exemplo de Teorias Culturalistas na Comunicação, optou-se por manter todas as

42 no passo seguinte do levantamento, em que se tratou de identificar as referências

bibliográficas, também através das informações disponíveis na plataforma Sucupira.

GRÁFICO 1 – Distribuição de referências por disciplina

Fonte: o próprio autor

É possível observar que, considerando a média de cerca de 17 referências bibliográficas

por disciplina, 23 possuem 18 ou mais referências, dentre as quais destacam-se Teorias da

Comunicação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Pontifícia Universidade

Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS) que listaram, respectivamente, 135 e 100 referências

bibliográficas.

A disciplina com menor quantidade de referências (4 indicações bibliográficas) foi

Teorias da Comunicação I, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ).

Para facilitar a demonstração da frequência das referências bibliográficas nas

disciplinas, apresenta-se a tabela que as lista e, sequencialmente, o gráfico relativo à frequência

em si:

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TABELA 7 – Lista das referências bibliográficas mais frequentes nos cursos de pós-graduação Stricto

Sensu

Fonte: o próprio autor

HOFELDT, Antonio; MARTINO, Luiz C. e FRANÇA, Vera Veiga (Orgs.) Teorias da comunicação: conceitos, escolas e tendências.

MATTELARD, Armand; MATTELARD, Michèle. História das teorias da comunicação.

WOLF, Mauro. Teorias das comunicações de massa.

MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos Meios às Mediações: comunicação, cultura e hegemonia.

MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem.

HALL, Stuart. Da diáspora: identidades e mediações culturais.

SODRE, Muniz. Antropológica do Espelho: uma teoria da comunicação.

DE FLEUR, Melvin L.; BALL-ROKEACH, Sandra. Teorias da comunicação de massa.

LIMA, Luiz Costa (org.). Teoria da cultura de massa.

THOMPSON, John B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia.

KELLNER, Douglas. A cultura da mídia.

COHN, Gabriel (Org.). Comunicação e indústria cultural.

ECO, Humberto. Apocalípticos e Integrados.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade.

SILVERSTONE, Roger. Por que estudar a mídia?

HARVEY, David. Condição pós-moderna.

BOUGNOUX, Daniel. Introdução às ciências da informação e da comunicação.

BRAGA, José Luiz. Constituição do Campo da Comunicação.

CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede: a era da informação: economia, sociedade e cultura, vol. 1.

LOPES, Maria Immacolata Vassallo (Org.). Epistemologia da comunicação.

LOPES, Maria Immacolata Vassallo. Pesquisa em comunicação.

MARTINO, Luiz C. (Org.). Teorias da comunicação: muitas ou poucas?

SFEZ, Lucien. Crítica da comunicação.

ADORNO, Theodor W.; HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento.

BENJAMIM, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica - Magia e Técnica, Arte e Política. Obras Escolhidas I.

BRIGGS, Asa; BURKE, Peter. Uma história social da mídia: de Gutenberg à Internet.

MARCONDES FILHO, Ciro. O espelho e a máscara: o enigma da comunicação no caminho do meio.

MARTÍN-BARBERO, Jesús. Ofício de cartógrafo: travessias latino-americanas da comunicação na cultura.

MATTELART, Armand. A comunicação-mundo: história das ideias e das estratégias.

MIÈGE, Bernard. O Pensamento comunicacional na contemporaneidade.

MORIN, Edgar. Cultura de massa no século XX.

ZIELINSKI, Siegfried. Arqueologia da mídia: em busca do tempo remoto das técnicas do ver e do ouvir.

HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa: complementos y estudios previos.

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GRÁFICO 2 – Frequência de referências bibliográficas nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu

Fonte: o próprio autor

Dentro das 42 disciplinas, foram identificadas 746 referências bibliográficas distintas,

das quais cerca de 76% (569) foram incluídas em apenas uma disciplina.

Distinguindo as referências que tratam as Teorias da Comunicação amplamente, ou seja,

que não se tratam de uma proposição ou perspectiva teórica específica, as mais utilizadas (em

cerca de 42% das disciplinas)45 são: Teorias da Comunicação: conceitos, escolas e tendências,

livro organizado por Antonio Hohlfeldt, Luiz C. Martino e Vera Veiga França, História das

Teorias da Comunicação, de Armand e Michèle Mattelart, e Teorias das Comunicações de

Massa, de Mauro Wolf.

Em uma análise das três referências é possível observar que embora as abordagens para

o recorte que produzem sejam diferentes46, há autores (em especial Lazarsfeld e Adorno) que

coincidem nos três livros gerais e, nos três casos, são os mais mencionados.

45 As outras referências mais utilizadas não tratam de Teorias da Comunicação de modo geral, destacando-se Dos

meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia (Martín-Barbero), Os meios de comunicação como

extensões do homem (McLuhan) e Diáspora: identidades e mediações culturais (Hall). 46 Resumidamente, no caso do livro organizado pelos pesquisadores brasileiros há um debate epistemológico

colocado antes da abordagem das perspectivas teóricas, enquanto no caso de Michèle e Armand Mattelart há uma

preocupação com inúmeras interligações entre as vertentes, além de relações com aspectos de possíveis objetos

empíricos. Finalmente, Mauro Wolf optou por uma abordagem baseada em aspectos de fundamentação teórica dos

efeitos limitados, estando prioritariamente restrito em Mass Communication Research e Teoria Crítica.

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GRÁFICO 3 – Frequência de citações nas três principais referências sobre Teorias da Comunicação

Fonte: o próprio autor

Os dois textos específicos dos dois autores mais citados foram publicados nos anos

1940: Lazarsfeld em coautoria com Bernard Berelson e Hazel Gaudet, The People’s Choice:

how the voter makes up his mind in a presidencial campaign47, e Adorno em coautoria com

Max Horkheimer, Dialética do Esclarecimento48.

Sequencialmente, tem-se Harold Dwight Lasswell e Herbert Marshall McLuhan,

respectivamente o artigo A estrutura e a função da comunicação na sociedade (1989),

publicado originalmente em 1948, e Os meios de comunicação como extensões (2005),

divulgado em 1964.

Segundo Mattelart e Mattelart (2005, p. 36), “a primeira peça do dispositivo conceitual

da corrente da Mass Communication Research data de 1927. É o livro de Harold D. Lasswell

(1902-1978) Propaganda Techniques in the World War, que extrai as lições da guerra de 1914-

1918 [...]”. Já o denominado modelo de Lasswell “[...] dota a sociologia funcionalista da mídia

de um quadro conceitual que, até então, alinhava apenas uma série de estudos de caráter

monográfico [...]”.

Wolf (2008, p. 16), no item O modelo de Lasswell e a superação da teoria

hipodérmica49, aponta que “[...] quando a teoria hipodérmica deixou de ser sobretudo um

presságio e uma descrição de efeitos temidos para se transformar num paradigma concreto de

pesquisa, seus próprios pressupostos deram lugar a resultados que contradiziam sua elaboração

47 Em 1944 foram publicados os resultados parciais. O estudo completo é de 1948. 48 A questão da coautoria explica especialmente as menções relativas a Horkheimer e a Merton. 49 O denominado modelo de Lasswell, que para Wolf (2008) impulsionou a superação da teoria hipodérmica,

embora tenha sido parte do trabalho do autor em anos anteriores é explicitado e divulgado amplamente no artigo

incluído na unidade de pesquisa.

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fundamental”. Entretanto, a superação apontada não teria implicado na modificação

significativa do modelo behaviorista Estímulo-Resposta oriundo do período hipodérmico.

No capítulo A pesquisa norte-americana, escrito por Carlos Alberto Araújo e inserido

em Teorias da Comunicação: conceitos, escolas e tendências, afirma-se que:

[...] entre os anos 20 e 60, os estudos norte-americanos foram marcados pela

hegemonia de um campo de estudos denominado Mass Communication Research.

Essa tradição de estudos é composta por abordagens e autores tão variados que vão

desde a engenharia das comunicações, passando pela psicologia e sociologia, com

pressupostos teóricos e mesmo resultados distintos e, em muitos casos, quase

inconciliáveis (ARAÚJO, 2007, p. 120).

De acordo com Araújo (2007, p. 120), apesar da diversidade há uma unidade entre eles

composta por uma “[...] orientação empiricista dos estudos, tendendo, na maioria das vezes,

para enfoques que privilegiam a dimensão quantitativa [...]”, por uma “[...] orientação

pragmática, mais política do que científica [...]” e pelo objeto de estudo, que estaria focalizado

em “comunicação mediática”.

O autor (2007) divide a Mass Communication Research em três grandes grupos: Teoria

Matemática da Comunicação (cujo principal texto seria A teoria matemática da comunicação,

de Weaver e Shannon), Corrente Funcionalista (com ênfase em Estrutura e função da

comunicação na sociedade, de Lasswell, além de Comunicação de massa, gosto popular e ação

social organizada, de Lazarsfeld e Merton) e a Teoria Hipodérmica.

Uma vez que o próprio Araújo (2007) indica as outras duas referências gerais, sobre a

Teoria Hipodérmica, volta-se aqui também para esses autores. Em Mattelart e Mattelart (2005,

p. 37), além de apontarem, sem uma referência específica, que Lasswell teria criado o termo

“agulha hipodérmica” 50 como hipótese central de que há “[...] efeito ou impacto direto e

indiferenciado sobre os indivíduos atomizados”, indicam que tal noção estaria de acordo com

abordagens psicológicas da época, dentre as quais destacam “[...] a psicologia das massas de

Le Bon; o behaviorismo inaugurado desde 1914 por John B. Watson; as teorias do russo Ivan

P. Pavlov sobre o condicionamento; os estudos de um dos pioneiros da psicologia social, o

britânico William McDougall [...]” (MATTELART; MATTELART, 2005, p. 37-38).

Em uma perspectiva diferente e mais abrangente, Wolf (2008) coloca que:

50 Araújo (2007) concorda com a afirmação de Mattelart e Mattelart (2005). Em contrapartida, na tese Harold

Lasswell e o Campo da Comunicação, defendida em 2012 por Rafiza Luziani Varão Ribeiro Carvalho,

argumentou-se que o termo foi utilizado pela primeira vez em 1944, em Voting, de Berelson, Lazarsfeld e McPhee.

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Na realidade, mais do que um modelo sobre o processo de comunicação, seria

necessário falar de uma teoria da ação: a elaborada pela psicologia behaviorista. Seu

objetivo é estudar o comportamento humano com os mesmos métodos da experiência

e da observação, típicos das ciências naturais e biológicas. O sistema de ação que

distingue o comportamento humano deve ser composto pela ciência psicológica em

unidades compreensíveis, distinguíveis e observáveis. Na relação complexa entre

organismo e ambiente, o elemento crucial é presentado pelo estímulo: este

compreende os objetos e as condições externas ao sujeito, que a partir dele produzem

uma resposta [...] A unidade estímulo/resposta exprime, portanto, os elementos de

toda forma de comportamento (WOLF, 2008, p. 9-10).

O termo “behaviorismo” teria sido utilizado/delimitado pela primeira vez por John B.

Watson, no texto Psychology as the behaviorist views it, publicado em 1913. Neste artigo,

evidentemente voltado para a Psicologia, Watson (2008) demonstra uma preocupação comum

aos mais diversos textos elaborados em momentos em que as áreas nas quais estão inseridos

são consideradas incipientes51, que é a de sistematizar, delimitar e atribuir aspectos de

cientificidade às pesquisas. Assim, inicia explicando que:

A psicologia como o behaviorista a vê é um ramo experimental puramente objetivo

das ciências naturais. Seu objetivo teórico é a previsão e o controle do

comportamento. A introspecção não constitui parte essencial de seus métodos, nem

o valor científico de seus dados depende da facilidade com que eles podem ser

interpretados em termos de consciência. O behaviorista, em seus esforços para

conseguir um esquema unitário da resposta animal, não reconhece linha divisória

entre homens e animais. O comportamento do homem, com todo o seu refinamento

e complexidade, constitui apenas uma parte do esquema total de investigação do

behaviorista (WATSON, 2008, p. 289).

Tal questão é ainda reforçada explicitamente em outro trecho:

Não desejo criticar a psicologia injustificadamente. Ela tem evidentemente falhado,

eu acredito, durante os cinquenta singulares anos de sua existência como uma

disciplina experimental, em abrir seu espaço no mundo como uma ciência natural

inconteste. Psicologia, como ela é geralmente pensada, tem algo de esotérico em seus

métodos. Se você falha em reproduzir meus achados, não se deve a alguma falha no

seu instrumento ou no controle de seu estímulo, mas sim ao fato de que sua

introspecção é destreinada. O ataque é feito sobre o observador e não sobre o arranjo

experimental. Em física e em química, o ataque é feito sobre as condições

experimentais. O aparato não era sensível o suficiente, substâncias químicas impuras

foram usadas etc. Nessas ciências, uma técnica melhor permitirá resultados

reproduzíveis. Em psicologia é diferente. Se você não pode observar de 3-9 estados

de clareza em sua atenção, sua introspecção é pobre. Se, por outro lado, um

sentimento parece razoavelmente claro para você, sua introspecção é novamente

defeituosa. Você está vendo demais. Sentimentos nunca são claros (WATSON,

2008, p. 292).

51 Se não por uma questão de tempo, do ponto de vista metodológico e epistemológico.

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As comparações entre Homem e outros animais, ou ainda, deslocamentos e analogias

(identificadas especialmente pelo termo “organismo”) aparecem não apenas na Psicologia

behaviorista, mas também na Sociologia da época (MATTELART; MATTELART, 2005).

Também se aplica ao que Araújo (2007) apontou como Corrente Funcionalista (inclusive no

texto de Lasswel, Estrutura e função da comunicação na sociedade, como será demonstrado

no item que o descreve e analisa especificamente, no próximo capítulo).

Considerando a relação com o domínio da Comunicação nas três referências

bibliográficas (ARAÚJO, 2007; MATTELART; MATTELART, 2005; WOLF, 2008), o

behaviorismo não corresponde propriamente à teorização da área, mas apresenta coincidência

do objeto-modelo inicial (BUNGE, 2013) e, portanto, conciliável e incorporado pelas diferentes

propostas.

A respeito da Teoria Matemática da Comunicação, Araújo (2007) coloca que, também

denominada Teoria da Informação, “[...] não está preocupada com a inserção social da

comunicação [...]” e, além disso:

[...] Elaborada por dois engenheiros matemáticos, Shannon e Weaver, em 1949, essa

teoria é menos um conjunto acabado de conceitos e pressupostos teóricos, mas sim

uma sistematização do processo comunicativo a partir de uma perspectiva puramente

técnica, com ênfase nos aspectos quantitativos (ARAÚJO, 2007, p. 121).

Mattelart e Mattelart (2005) explicam que no mesmo ano em que Lasswell publicou A

estrutura e a função da comunicação na sociedade, Claude Elwood Shannon publicou a

monografia The Mathematical Theory of Communication. Mas separa o que chama de Teoria

da Informação, relacionando-a diretamente com a Cibernética e com o Colégio Invisível/Escola

de Palo Alto.

Há aqui a exclusão da “Teoria Matemática da Comunicação”, independentemente do

texto ou autor entendido como original52, em função de: em primeiro lugar, considerando que

o debate conceitual a respeito de Comunicação é uma questão teórica-epistemológica profunda,

não parece razoável, também tendo em vista estudos anteriores53, desconsiderar a possibilidade

52 Há uma publicação de Shannon no Bell System Technical Journal em 1948 e uma de Weaver (fundamentada

em larga medida em Shannon) em 1949 na Scientific American, publicada no Brasil na obra organizada por Gabriel

Cohn, Comunicação e Indústria Cultural. E há, ainda, os textos de ambos os autores ampliados em um livro,

também denominado The mathematical theory of communication, publicado em 1949. 53 No capítulo Apontamentos sobre o imprescindível debate da tecnologia para a comunicação social, no livro

Tecnologia, comunicação e ciência cognitiva, publicado em 2014, apresenta-se o argumento de Floridi (2010)

sobre a insuficiência dos pressupostos de Shannon como informação, mais adequados à comunicação de dados.

Essa é uma reflexão que não cabe no escopo deste trabalho em função da sua complexidade, além de não se ter

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de a mesma condição se aplicar à Informação. Em segundo lugar, das três principais referências

gerais sobre Teorias da Comunicação, apenas em Araújo (2007) há essa relação direta com a

“Teoria Matemática”54.

Além dos textos originais já citados, há a inclusão de Dos meios às mediações:

comunicação, cultura e hegemonia, de Martín-Barbero, em função da sua relevância,

constatada em um primeiro momento pela sua inclusão entre as referências mais citadas nas

disciplinas de Teorias da Comunicação dos cursos de pós-graduação Stricto Sensu.

Retornando às referências sobre Teorias da Comunicação que orientam a seleção,

Berger (2007) explica que na América Latina, tanto quanto em outros lugares, não apenas a

inquietação científica impulsionou a produção de pesquisas, mas também exigências políticas

e sociais dentro do seguinte contexto:

[...] Na América Latina, as marcas da dependência estrutural, que evoca uma cultura

do silêncio e da submissão, mas também, de resistência e de luta, são pano de fundo

da busca por compreender o que acontecia com a comunicação e demarca as

fronteiras do emergente campo de estudo (BERGER, 2007, p. 241).

Enfatizando os centros de estudo, as publicações e os autores, Berger (2007) aponta

como pais fundadores e/ou principais influências teóricas Armand Mattelart, Antonio Pasquali,

Luis Ramiro Beltrán, Eliseo Verón e Paulo Freire.

Exceto por Mattelart, cujo livro sobre Teorias da Comunicação é expressivo no conjunto

das disciplinas listadas, os demais autores não aparecem significativamente nos cursos de pós-

graduação.

Em Wolf (2008), que originalmente foi publicado em 1985, a única referência é a Verón,

especificamente no item O modelo de comunicação semiótico-informativo. Também em

Mattelart e Mattelart (2005), Verón aparece vinculado à semiótica e à escola francesa. Beltrán,

Freire, os próprios Mattelart e Mattelart e Pasquali são mencionados por Mattelart e Mattelart

(2005) como parte de um grupo de pesquisadores críticos relacionado à ruptura com a

Sociologia funcionalista.

Os mesmos autores (2005, p. 171) também mencionam Martín-Barbero, além de

Appadurai, García Canclini e Ortiz, no grupo de estudos em que os estudiosos “[...] se

encontrado argumentos consistentes, fundamentalmente de caráter epistemológico, de inclusão das reflexões da

denominada Teoria Matemática para os fins desta pesquisa. 54 Também não há justificativa epistemológica para tal opção na obra em que o texto do autor (2007) está inserido.

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interrogam sobre os complexos processos de apropriação e reapropriação, de resistências e

mimetismo [...]”.

Berger (2007, p. 267), por seu turno, entende que Martín-Barbero seria o proponente

das três linhas de estudo que passariam a identificar as pesquisas da América Latina, “[...]

quando a pesquisa se independentiza do estudo dos meios para compreender a vida cotidiana,

onde os meios ingressam detendo um lugar”. E então, “Barbero é considerado o ‘formulador

das questões’ e o impulsionador do campo no sentido de sua renovação, pois, junto com as

revisões, ele formulou um projeto transdisciplinar para pensar desde a comunicação [...]”.

Pelas razões expostas até aqui é que Dos meios às mediações, passou a ser incluído na

unidade de pesquisa.

O caso de Os meios de comunicação como extensões do homem, de Marshall McLuhan,

é parecido com Dos meios às mediações, com a diferença de que a expressividade do autor e

do livro nas referências básicas sobre Teorias da Comunicação é ainda maior.

Para além dos textos originais já justificados, a coincidência que resta entre as três

referências sobre teorias de modo amplo (HOHLFELDT; MARTINO; FRANÇA, 2007;

MATTELART; MATTELART, 2005; WOLF, 2008) diz respeito à semiótica. Entretanto,

observando-se as referências totais das disciplinas é possível perceber que a inclusão do assunto

nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu é extremamente pontual, diferentemente dos casos

dos livros de Martín-Barbero e McLuhan, que extrapolam disciplinas dirigidas a determinado

conjunto de propostas teóricas e também são quantitativamente relevantes.

Dessa forma, os textos originais que compõem a unidade de pesquisa são: (1) Harold

Lasswell, A estrutura e a função da comunicação na sociedade, (2) Paul Lazarsfeld, Bernard

Berelson e Hazel Gaudet, The people’s choice (3) Theodor Adorno e Max Horkheimer,

Dialética do esclarecimento, (4) Marshall McLuhan, Os meios de comunicação como extensões

do homem e (5) Jesús Martín-Barbero, Dos meios às mediações.

3. Seleção da unidade de pesquisa de textos recentes

O primeiro estudo exploratório realizado consta no artigo Comunicação e Ciência:

definição de Meio como elemento para distinção do domínio, apresentado do II Encontro

Internacional de Tecnologia, Comunicação e Ciência Cognitiva em dezembro de 2015 e

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publicado na segunda edição especial (dezembro de 2016) do Brazilian Journal of Technology,

Communication, and Cognitive Science55.

Para assegurar a exequibilidade da análise e de sua verificação, optou-se por selecionar

periódicos incluídos em sistema de gerenciamento de acesso aberto, de abrangência nacional,

com classificação Qualis entre A1 e B2, no período de Janeiro de 2010 a Abril de 2015.

Em uma primeira tentativa, o retorno inicial foi de cerca de 3.200 artigos, o que conduziu

à opção de excluir resultados cujos termos não fossem exclusivamente “Meio” ou “Meios”

relacionados à “Comunicação” em Título, Resumo e Palavra-chave, chegando-se por fim a 560

artigos.

A análise de uma pequena parcela desses textos colocou em evidência alguns problemas

técnicos como, por exemplo, dificuldade em identificar vertentes teóricas utilizadas, amplo uso

extensionalista e diversas abordagens temáticas que não incluíam “Meio de Comunicação”,

embora os artigos tenham sido indexados com a priorização de tal designação.

Buscando-se solucionar as dificuldades percebidas, o mesmo conjunto de textos foi

analisado no artigo Lacuna teórica do Meio de Comunicação: análise da relação termo-

conceito-argumento em periódicos nacionais56, apresentado no XXXIX Congresso Brasileiro

de Ciências da Comunicação (GP Teorias da Comunicação), em setembro de 2016.

Analisando todos os 560 artigos, constatou-se que em menos de 2% havia coincidência

de relevância de “Meio de Comunicação” para a indexação e identificação de vertente teórica.

Como complemento, foram selecionados trechos que incluíam “Meio” ou sinônimos ou

extensões (que foram sendo agrupados a partir da leitura dos textos), buscando-se por

associações com expressões que descrevessem os critérios de aplicação do termo e/ou as

consequências reflexivas da aplicação.

Em função da não identificação de tais associações, ampliou-se o escopo para relações

com sinônimos ou categorização. Ainda assim, não foi possível deduzir qualquer critério

relativo aos sinônimos e categorizações além das extensões admitidas como “Meio de

Comunicação de Massa” e das relações com “Internet” e termos com aplicação semelhante.

Por conseguinte, “Meio” se aproxima do uso comum do termo similar a “através” ou

“contexto”, sem nenhuma redução de ambiguidade ou parâmetro justificado, admitindo-se

inclusive a “cidade” como “meio de comunicação”, sem que tal indicação tivesse implicado em

explicação e problematização de “meio”.

55 Tendo como coautor André Rosa de Oliveira. 56 Cujo coautor é Daniel Costa de Paiva.

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Em função do volume de textos e do evidente aumento do número de artigos a serem

avaliados para coleta, no caso da unidade de pesquisa constituída pelas publicações recentes,

diferentemente da unidade relativa aos textos originais, foi desconsiderada a relevância

quantitativa de outros termos associados a noções secundárias para os fins desta pesquisa.

Então, supondo-se que o termo “Indústria Cultural” fosse quantitativamente preponderante,

essa característica não necessariamente seria identificada.

Com o agrupamento de sinônimos realizado para o segundo estudo exploratório, foram

criadas as regras de admissão e exclusão de sinônimos de modo que fossem diminuídos os casos

como o exemplificado a respeito de “cidade” e “meio”. Sendo assim, do ponto de vista técnico,

somente o procedimento em relação à análise de argumento é exatamente o mesmo para as duas

unidades de pesquisa essencialmente porque os textos recentes são considerados como um todo,

sem as distinções detalhadas para a unidade de textos originais.

Considerando a mesma delimitação dos estudos exploratórios mencionados, isto é,

periódicos incluídos em sistema de gerenciamento de acesso aberto, de abrangência nacional,

com classificação Qualis entre A1 e B2, chegou-se a 46 deles:

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TABELA 8 – Lista de periódicos selecionados

Fonte: Adaptado da plataforma Sucupira

Alceu

Alterjor

Animus

Brazilian Journalism Research

Ciberlegenda

Communicare

Compolítica

Comunicação & Informação

Comunicação & Inovação

Comunicação & Sociedade

Comunicação e Educação

Comunicação, Mídia e Consumo

Conexão

Contemporânea: Comunicação e Cultura

Contracampo

Culturas midiáticas

Devires

ECCOM: Educação, Cultura e Comunicação

E-COMPÓS

ECO-Pós

Eptic

Esferas

Estudos em Comunicação

Estudos em Jornalismo e Mídia

Estudos semióticos

Extraprensa

Famecos

Fronteiras

Galáxia

Geminis

Intercom: Revista Brasileira de Ciências da Comunicação

Intexto

Líbero

Liinc

Logos

Lumina

Matrizes

Novos Olhares

Opinião Pública

Organicom

Revista Brasileira de História da Mídia

Rizoma

Rumores

Sessões do Imaginário

Signos do Consumo

Verso e Reverso

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A ampliação do número de periódicos se deu em função de modificação no

procedimento de busca que, ao invés de ser realizado a partir dos indexadores, foi executado

individualmente na página de cada periódico que até o período de entrega deste trabalho estava

disponível57.

Aplicando as regras de inclusão e exclusão de designadores e sinônimos, elaboradas a

partir do segundo estudo exploratório, chegou-se a um total de 705 textos, compreendendo o

período de Janeiro de 2010 a Dezembro de 2016, considerando-se ainda os seguintes parâmetros

adicionais de designadores aceitos:

Meio(s) desde que diferente de “através” e “contexto”, bem como não relacionado

a “ambiente”;

Mídia(s) e termos derivados como, por exemplo, “midiática” desde que relacionado

à “comunicação” e/ou “massa” ou extensões, tais como televisão e rádio;

Aparato(s), Artefato(s), Canal(is), Dispositivo(s), Plataforma(s), Suporte(s),

Tecnologia(s) e Veículo(s), desde que relacionados a “comunicação” e/ou “massa”

ou extensões, como no caso de Mídia(s).

Esclarecidas as opções metódicas e técnicas da estratégia de investigação para o

mapeamento do conceito de Meio de Comunicação, segue-se para a descrição e análise dos

resultados obtidos.

57 Alguns periódicos, embora listados na plataforma Sucupira, apresentaram problemas de disponibilização da

informação: Comunicação Midiática, Comunicação & Política, Comunicação Pública. O periódico Estudos em

Comunicação não disponibilizou até o fim deste estudo as seguintes edições: 2014, volume 15, número 36 e 2015,

volume 16, número 41.

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Capítulo III – DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

EM NÍVEL METÓDICO-TÉCNICO ARGUMENTO – a. Linguagem comum – Dispita. b. Lógica – Raciocinar

(de maneira válida ou inválida) a partir das premissas até a conclusão. Os

únicos argumentos válidos são dedutíveis. A validade depende

exclusivamente da forma [...] Independentemente de sua validade, os

argumentos podem ser frutíferos ou estéreis. Se inválidos porém frutíferos,

podem ser chamados de sedutores [...] Os argumentos não dedutivos

dependem de seu conteúdo [...] O estudo de argumentos não dedutivos

compete à psicologia cognitiva e à epistemologia, não à lógica [...] (BUNGE,

2012, p. 34).

A partir dos procedimentos explicitados e justificados no capítulo anterior como parte

da estratégia de investigação especificamente relacionada às instâncias metódica e técnica, são

apresentados os resultados das unidades de pesquisa.

Como esclarecido anteriormente, foram aplicados procedimentos metódico-técnicos de

identificação e análise a partir dos termos que designam o conceito, buscando depreender

indicações de qualidades pertinentes a Meio de Comunicação, bem como os sentidos de uso e

de relações do conceito de Meio com outros designadores/conceitos, delimitados pela produção

científica em âmbito nacional.

No caso da unidade de pesquisa relativa aos textos originais, entende-se que além disso,

há demanda de compreender as estruturas explanatórias gerais, a fim de verificar a relações

entre Meio de Comunicação e outros conceitos.

Tendo em vista o tipo/formato de trabalho que compõe a unidade de textos recentes e a

variedade de abordagens diferentes, considerou-se que a compreensão das estruturas

explanatórias de cada um dos 705 textos não seria produtiva.

Portanto, o escrutínio de artigos da unidade de pesquisa de textos recentes também em

caráter teórico-epistemológico ficou restrito aos que apresentaram proposições específicas a

“Meio”, sem aplicação tangencial, isto é, funcional ou extensional.

Tais aprofundamentos de níveis epistemológico e teórico são realizados no capítulo IV

e, nesse sentido, este capítulo foi organizado de forma que fosse mantida a ênfase da análise

metódica-técnica, sendo o primeiro item relativo a unidade de pesquisa de textos originais e, o

segundo, a unidade de pesquisa de textos recentes.

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1. Textos originais

Como apontado anteriormente, os textos originais que compõem a unidade de pesquisa

são: (1) Harold Lasswell, A estrutura e a função da comunicação na sociedade, (2) Paul

Lazarsfeld, Bernard Berelson e Hazel Gaudet, The people’s choice (3) Theodor Adorno e Max

Horkheimer, Dialética do esclarecimento, (4) Marshall McLuhan, Os meios de comunicação

como extensões do homem e (5) Jesús Martín-Barbero, Dos meios às mediações.

Além da identificação dos textos nas referências da disciplina, tais como os casos dos

livros de Os meios de comunicação como extensões do homem e Dos meios às mediações,

também foram observados os esclarecimentos de base sobre Teorias da Comunicação.

Dessa maneira, chegou-se a esse conjunto de textos considerando as referências

bibliográficas das disciplinas voltadas às Teorias nos cursos brasileiros de pós-graduação

stricto-sensu em Comunicação, bem como ao que é indicado pelas três referências mais

frequentes nos cursos sobre Teorias da Comunicação: (1) Teorias da Comunicação: conceitos,

escolas e tendências, (2) História das Teorias da Comunicação, e (3) Teorias das

Comunicações de Massa.

Após a obtenção ou melhoramento dos textos através de ferramentas OCR, foi gerada,

para cada um, uma planilha com todos os termos por intermédio do Atlas/Ti. Os designadores

com qualidade conceitual ainda que em caráter de extensão, e incluindo os relativos ao “Meio”,

foram destacados e os trechos em que estavam inseridos foram extraídos.

Tais trechos foram analisados segundo a proposta técnica de enfatizar a identificação de

argumentos, a distinção entre premissa(s) e conclusão(ões), a identificação de conectivos

proposicionais e aplicação das tabelas-verdade de acordo com o trecho em questão.

Depois disso, retornou-se à estrutura metódica geral de apreciação dos argumentos,

quando para além da justeza lógica, buscou-se depreender dos trechos extraídos extensões e

referências; descrições, definições e sentidos dos conceitos, além de critérios de aceitabilidade

do uso dos designadores.

Tendo sido realizada essa retomada, segue-se para a descrição e análise dos textos que

compõem a primeira unidade de pesquisa.

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1.1 A estrutura e a função da comunicação na sociedade

Os termos que compõem o título do artigo, originalmente publicado em 194858, são parte

do conjunto de termos/expressões mais utilizados pelo autor (1989) no decorrer do texto, tal

como pode ser observado no Gráfico 4:

GRÁFICO 4 – Termos com maior frequência em Lasswell

Fonte: o próprio autor

O termo mais utilizado é “Sociedade”, para o qual não foi identificado esforço

explicativo de teor conceitual, sendo seu uso geral de caráter contextual, vinculado a “Política”

e concernente às extensões (“sociedade humana”, “sociedade democrática” etc.). Também foi

utilizado para indicações acerca das três funções atribuídas à “Comunicação” (vigilância sobre

o meio ambiente, correlação das partes da sociedade em resposta ao meio e transmissão da

herança social entre gerações), da estrutura (que também não possui teor explicativo-conceitual)

e da comunicação no enquadramento da analogia proposta, como ilustrado na citação abaixo:

58 A versão utilizada para análise está disponível em língua portuguesa no livro organizado por Gabriel Cohn

(1989), Comunicação e Indústria Cultural.

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Embora tenhamos notado um certo número de equivalências estruturais e funcionais

entre a comunicação das sociedades humanas e outras entidades vivas, não se

pretende afirmar que possamos estudar com êxito o processo de comunicação na

América ou no mundo pelos métodos mais apropriados para a pesquisa dos animais

inferiores ou de organismos físicos isolados [...] Quando o nosso objeto de estudo

são seres humanos, podemos entrevistar o grande “animal falante”. (Isso não

significa que aceitemos tudo, sem mais. Às vezes, prognosticamos o contrário

daquilo que o indivíduo diz pretender fazer. Neste caso, dependemos de outras

indicações, tanto verbais quanto não-verbais) (LASWELL, 1989, p. 110).

Considerando que uma explicação funcional se dá “[...] em termos de funções ou papéis

mais do que de mecanismos subjacentes. Descreve o que as coisas fazem, não como as fazem

[...]” (BUNGE, 2012, p. 139), também não há, sobre “Comunicação” teor explicativo-

conceitual.

O que pode ser identificado restringe-se, nas palavras de Lasswell (1989), às áreas de

“estudo científico do processo de comunicação”, bem como à ocorrência/extensão do processo

de comunicação: “característica da vida em qualquer nível”, “das sociedades humanas e outras

entidades vivas”, “na América ou no mundo”, “em qualquer Estado” etc.

Dessa maneira tanto “Sociedade” quanto “Comunicação” apresentam amplitude de

extensões de forma que não é possível estabelecer com precisão os critérios de aceitabilidade

de aplicação porque não se vinculam a definições ou explanações.

A referência passa a ser melhor compreendida quando o autor (1989) a vincula com

aspectos políticos e, portanto, no mesmo contexto de “Política”, além da explanação funcional

de “Comunicação”.

Somando-se as duas constatações, reforça-se a identificação da tendência do tratamento

temático ao invés de teor conceitual.

O termo de maior relevância quantitativa é “Meio”, entretanto na maior parte dos casos

é operacionalizado como “meio ambiente” e como sinônimo de “através” ou contexto, tal como

demonstrado no gráfico abaixo.

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GRÁFICO 5 – Meio em Lasswell

Fonte: o próprio autor

Em caráter especializado, isto é, como designador/sinônimo, o autor (1989) utiliza, entre

outros, “meio de comunicação de massa”, “canais de comunicação” e “modernos instrumentos

de comunicação”.

Na maior parte dos casos não se trata de argumento sobre “Meio”, ou seja, o tratamento

é temático. Além disso, é significativo o uso extensionalista tal como “rádio”, “imprensa” e

“cinema”.

Embora proponha a divisão do “estudo científico do processo de comunicação” com

uma certa independência entre “análise de conteúdo” e “análise de meios (media)”, não

esclarece sobre o ponto de origem da causa dos efeitos.

Ao tornar admissível como origem dos efeitos os conteúdos ou os meios ou ambos,

identifica-se o resultado do não esclarecimento conceitual de Meio de Comunicação e a

restrição da reflexão em Lasswell (1989) no caráter extensionalista do uso do termo.

Como no caso de todos os termos distinguidos, “controle” possui diversos sinônimos,

tratando-se em geral de uso relativo à extensão. A distinção que o autor (1989) claramente faz

é entre manipuladores (quem de fato interfere na elaboração do conteúdo) e manejadores

(indivíduos ou empresas ou setores que lidam com a aplicação/ajuste à determinada plataforma

tecnológica). Dentre as ocorrências apresentadas tem-se, por exemplo, “editores de jornais”

para manipuladores e “impressores e distribuidores de livros” para manejadores. Para além

disso, a questão do “controle” é contextual para as funções da comunicação, fundamentalmente

a eficiente:

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A análise desenvolvida até aqui implica certos critérios de eficiência ou ineficiência

na comunicação. Nas sociedades humanas, o processo é eficiente na medida em que

julgamentos racionais são facilitados. Um julgamento racional implementa objetivos

vinculados a valores. Em sociedades animais, a comunicação é eficiente quando

ajuda a sobrevivência, ou alguma outra necessidade específica do agregado [...]

(LASSWELL, 1989, p. 113).

Não há acuracidade na analogia elaborada, uma vez que o autor (1989) não especifica

“sobrevivência”, embora exponha sua priorização de determinados “valores”, os quais

funcionalmente vinculam-se a “Comunicação” e “Meio” sem, contudo, esclarecê-los ou afastar

a centralidade das questões políticas.

No que tange a “audiência”, Lasswell (1989) não oferece uma conceituação geral, mas

uma distinção entre o “agregado de atenção” e “público”59. E, abordando a extensão, tem-se

que:

Convém assinalar que nem todas as pessoas são membros do público mundial, ainda

que pertençam em certa medida, ao agregado de atenção mundial. Para pertencer a

um agregado de atenção basta ter símbolos de referência para Nova York, América

do Norte, Hemisfério Ocidental ou para o globo é um membro do agregado de

atenção de cada um desse locais respectivamente. Para ser um membro do público

de Nova York, contudo, é essencial formular exigências para a ação pública em Nova

York, ou que afetem diretamente essa cidade (LASSWELL, 1989, p. 115).

O argumento para a distinção de “público” é de que:

O público dos EUA, por exemplo, não se restringe aos seus habitantes ou cidadãos,

dado que não-cidadãos americanos do exterior poderão tentar influenciar a política

norte-americana. De forma correspondente, nem todos os habitantes dos Estados

Unidos são membros do público americano, de vez que algo mais do que atenção

passiva é necessário para isso. Um indivíduo passa de um agregado de atenção para

um público quando ele desenvolve a expectativa de que aquilo que ele quer pode

afetar a condução da vida pública (LASSWELL, 1989, p. 115).

Finalmente, sobre “esclarecimento”, os argumentos apresentados ou não estão

relacionados entre si ou não têm as proposições relacionadas de forma que seja possível

asseverar mais do que a relação de esclarecimento com “opinião racional pública” e com a

“sociedade democrática”.

59 Ele também menciona que há “grupos de sentimento” que se comportam como “multidões”, mas não oferece

um argumento de teor conceitual.

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1.2 The people’s choice: how the voter makes up his mind in a presidential campaign

Publicado originalmente em 1948, o objeto do estudo é delimitado pela campanha

presidencial norte-americana de 1940 (Roosevelt e Willkie), cuja coleta de dados se deu entre

os meses de maio e novembro, no Condado de Erie (Ohio).

Diferentemente dos outros textos analisados, há a exposição de um amplo conjunto de

evidências empíricas, o que resultou em uma primeira apreensão dos termos pouco produtiva.

Não ficando clara a relevância quantitativa e qualitativa dos termos, optou-se por

categorizar todos, em um primeiro momento associando sinônimos e, em um segundo

momento, considerando a função dos termos dentro do texto e sua importância quantitativa.

Dentre os termos quantitativamente mais relevantes, a maior parte diz respeito à

descrição dos elementos que delimitam o objeto (Exemplos: “campanha”, “candidato”,

“democrata” etc.) ou ao estudo em si (Exemplos: “respondentes”, “painel”, “perguntas” etc.).

Ainda no mesmo conjunto, dentre os termos que estavam associados a um argumento,

a maioria teve o processo de formalização limitado, uma vez que na maior parte dos casos há

associação com as evidências empíricas que são apresentadas pelos autores (1948)60.

GRÁFICO 6 – Conjuntos de termos mediante funções em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet

Fonte: o próprio autor

60 Em especial nesses casos, não foram identificados problemas de justeza do argumento.

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Sequencialmente, foram selecionados termos a partir da relevância qualitativa, ou seja,

relacionados a esforço conceitual e/ou a “Meio”.

GRÁFICO 7 – Termos com maior relevância qualitativa em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet

Fonte: o próprio autor

Embora o termo “Comunicação” seja identificado em trechos extraídos mediante a

relevância qualitativa, não há argumento com teor conceitual e na maior parte dos casos está

associado a “Meio”.

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GRÁFICO 8 – Meio e uso de extensões em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet

Fonte: o próprio autor

O termo “Meio” aparece vinculado a argumentos, mas não como seu centro, isto é, os

trechos não constituem explicação de teor conceitual do termo, nem definição de critérios da

aplicação: se trata de distinguir a “comunicação” que se dá através deles da interpessoal ou de

exemplificações que evidenciam extensões como, por exemplo, “jornal”, “rádio” e “revista”.

“Meio de Comunicação” não apresenta variações terminológicas como no caso de

Lasswell (1989), mas é aplicado em caráter extensionalista como mencionado acima e indicado

no gráfico 8. Não implica em distinções de uso, exceto no que tange a não aplicação a

“comunicação interpessoal”.

A propósito dos termos “Efeito” e “Influência” não foram identificados argumentos de

teor conceitual, mas tendo em vista a análise do conjunto dos trechos em que são aplicados e as

operacionalizações demonstradas pelos autores (1948) é possível apreender que há duas

importantes opções de uso: (1) “Efeito” como concretização da opinião do respondente (sua

escolha final a respeito de determinado candidato), (2) “Efeito” e “Influência” como sinônimos,

relativos ao que pode ser realizado por “Meio”, “Líder de Opinião”, “Pressões Inter-

relacionadas”, “Condição socioeconômica” etc.

Dentro da segunda opção de uso, há a delimitação de que está vinculada quanti e

qualitativamente de modo mais significativo ao grupo de respondentes que apresentou variação

em sua posição, de modo que os possíveis efeitos estudados aparecem como “Conversão”,

“Reforço” e “Ativação”, bem como estão relacionados a “Pressões Inter-relacionadas”:

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GRÁFICO 9 – Efeitos em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet

Fonte: o próprio autor

Finalmente, sobre o “Fluxo em duas etapas” há duas considerações: em primeiro lugar

aparece relativo aos termos “Informação” e “Comunicação” igualmente, sugerindo-se que os

autores (1948) não os distinguem conceitualmente. Em segundo lugar, está sempre relacionado

a “Líder de Opinião”, que é o termo de maior atenção reflexiva no decorrer de todo o texto.

Dado o esforço explicativo dos autores (1948) em relação ao termo, tem-se alguns

delineamentos sobre a aceitação da aplicação do termo. Entretanto, não se trata de algo que

possa ser plenamente avaliado nesta pesquisa, dentre outras razões, porque os argumentos estão

sempre vinculados/justificados pelas evidências empíricas demonstradas.

1.3 Dialética do esclarecimento

Dentre os termos que compõem o título, “Esclarecimento” aparece de forma

quantitativamente mais relevante na totalidade do texto:

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GRÁFICO 10 – Termos com maior frequência em Adorno e Horkheimer

Fonte: o próprio autor

Enquanto “Esclarecimento” está entre os termos quantitativamente mais relevantes,

“Dialética” representa apenas cerca de 1,5% dos designadores especializados do texto,

considerando que um dos primeiros trechos que incluem “Dialética” é o seguinte:

[...] Quando uma árvore é considerada não mais simplesmente como árvore, mas

como testemunho de uma outra coisa, como sede do mana, a linguagem exprime a

contradição de que uma coisa seria ao mesmo tempo ela mesma e outra coisa

diferente dela, idêntica e não idêntica. Através da divindade, a linguagem passa da

tautologia à linguagem. O conceito, que se costuma definir como a unidade

característica do que está nele subsumido, já era desde o início o produto do

pensamento dialético, no qual cada coisa só é o que ela é tornando-se aquilo que ela

não é (ADORNO; HORKHEIMER, 1969, p. 29).

Adorno e Horkheimer (1969) estão se referindo à “Dialética” como algo que admite o

descumprimento do terceiro excluído, o que não seria preponderante se fosse possível

determinar o fundamento da “dialética” proposta, uma vez que em nenhum dos trechos não

extensionalistas (três no total) a distinguem como ontologia ou metodologia61.

61 Em caráter extensionalista, a “Dialética” está sempre vinculada a oposições que, na leitura ora exposta, parecem

afirmação e negação, a contradição em si, cujo debate de cunho filosófico não cabe nesta pesquisa.

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“Esclarecimento” aparece vinculado de modo quantitativamente mais relevante à

“Dominação”, “Razão/Racionalidade” e “Mito”, e quantitativamente menos relevante à

“Ciência” e “Técnica”.

Embora os argumentos não possam ser avaliados na perspectiva da relação entre

premissas e conclusões dado que os próprios autores (1969) a evitam, as condições de aplicação

são colocadas de forma que é possível apreender que “Esclarecimento” se opõe ao “Mito”,

alinhando-se à “Dominação”, “Razão/Racionalidade”, “Técnica” e, principalmente, “Ciência”

ou, filosoficamente, ao “Positivismo”. Ainda assim, não foi possível identificar teor conceitual

diretamente relacionado ao termo “Esclarecimento”.

O termo quantitativamente mais relevante, “Natureza”, é aplicado de duas formas: (1)

natureza de algo e (2) como objeto empírico e, portanto, é operacional. “Sociedade” e “Massa”

também não são termos colocados em evidência conceitual, sendo utilizados operacional e

secundariamente vinculados à “Indústria Cultural”.

No conjunto de trechos relativos a “Indústria Cultural” não foi identificado um

argumento com teor conceitual. Entretanto, a regularidade dos termos (em geral, utilizados

operacionalmente) e a explicitação contextual fornecem alguns subsídios dos critérios de

relação, aplicação e características. As relações mais explícitas se referem aos “Meios”, a

“publicidade”, “Arte” e “Crítica” (desaparecimento ou supressão das qualidades de ambas) e a

característica mais evidente é sua atuação como sistema.

Finalmente, “Comunicação” é um termo quantitativamente raro no texto e está

geralmente relacionado a outro na mesma condição: “Meio”. Observou-se que juntos

correspondem a menos de 1% dos termos especializados, além de sua aplicação não indicar

critérios explícitos de uso e apresentar caráter extensionalista amplo como, por exemplo, no

trecho denominado Isolamento pelos meios de comunicação:

A afirmação que o meio de comunicação isola não vale apenas no domínio cultural.

Não apenas linguagem mentirosa do locutor de rádio sedimenta no cérebro das

pessoas como a imagem da linguagem e impede-as de falar umas com as outras, não

apenas o louvor da Pepsi-Cola abafa o ruído do desmoronamento dos continentes,

não apenas o modelo espectral dos heróis do cinema se projeta sobre o abraço dos

adolescentes e mesmo sobre o adultério. O progresso separa literalmente as pessoas.

O pequeno guichê da estação ou do banco possibilitava ao caixa cochichar com o

colega e partilhar com ele seus pequenos segredos. As janelas de vidro dos

escritórios modernos, os salões gigantescos onde inúmeros empregados trabalham

em comum, podendo ser facilmente vigiados pelo público e pelos chefes, não

permitem mais nem conversas particulares, nem idílios. Mesmo nas repartições, o

contribuinte está protegido do desperdício de tempo dos servidores. Mas os meios

de comunicação separam as pessoas também fisicamente. A ferrovia foi substituída

pelos automóveis. O carro próprio reduz os contatos de viagem a hitchhikers algo

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inquietantes. As pessoas viajam sobre pneus de borracha, rigorosamente isoladas

umas das outras. Em compensação, só se conversa num carro o que se discute em

outro; a conversa da família isolada está regulada pelos interesses práticos. Assim

como toda família com uma renda determinada gasta a mesma percentagem com

alojamento, cinema, cigarros, exatamente como a estatística prescreve, assim

também os temas são esquematizados segundo as classes de automóveis. Quando se

encontram, aos domingos ou viajando, em hotéis onde as acomodações e os

cardápios são idênticos em cada faixa de preços, os hóspedes descobrem que se

tornaram, com o isolamento, cada vez mais semelhantes. A comunicação cuida da

assimilação dos homes isolando-os (ADORNO; HORKHEIMER, 1969, p. 206-207).

1.4 Os meios de comunicação como extensões do homem

Tanto proporcionalmente, quanto em comparação direta com os outros textos incluídos

nessa unidade de pesquisa, em McLuhan (2005), o termo “Meio” é quantitativamente o de

maior relevância:

GRÁFICO 11 – Termos com maior frequência em McLuhan

Fonte: o próprio autor

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Não há distinção de sentido ou em caráter extensionalista de “Meio”, “Veículo” e

“Tecnologia”. Nesse sentido, as extensões explícitas “imprensa/jornal”, “televisão”, “rádio” e

“cinema” têm em conjunto e quantitativamente preponderância no texto.

Agrupando-se as extensões explícitas a designação geral “Meio/Meio de Comunicação

de Massa/Veículo”, bem como “telefone” e “eletricidade” para os quais o autor (2005) se dirige

também como “Meio”, tem-se uma visão mais clara da relevância quantitativa de “meio” em

sua acepção de “veículo” como um todo no texto.

GRÁFICO 12 – Termos com maior frequência em McLuhan, concatenando extensões de Meio

Fonte: o próprio autor

A despeito de cerca de 53% do uso de termos especializados se referirem a “meio”,

trata-se prioritariamente de menção às extensões e não aos argumentos de teor conceitual

completo.

Ao se referir especificamente a “Meio de Comunicação” há poucas variações, enquanto

há seis extensões explícitas utilizadas (em ordem de relevância quantitativa: “imprensa/jornal”,

“televisão”, “rádio”, “eletricidade”, “cinema” e “telefone”), como demonstrado no gráfico

abaixo:

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GRÁFICO 13 – Meio/Veículo e uso de extensões em McLuhan

Fonte: o próprio autor

“Meio” se relaciona com outros termos quantitativamente relevantes como, por

exemplo, “Extensão”, “Homem”, “Mensagem” e “Conteúdo”:

[...] o exemplo da luz elétrica pode mostrar-se esclarecedor. A luz elétrica é

informação pura. É algo assim como um meio sem mensagem, a menos que seja

usada para explicitar algum anúncio verbal ou algum nome. Este fato, característico

de todos os veículos, significa que o “conteúdo” de qualquer meio ou veículo é

sempre um outro meio ou veículo. O conteúdo da escrita é a fala, assim como a

palavra escrita é o conteúdo da imprensa e a palavra impressa é o conteúdo do

telégrafo [...] Uma pintura abstrata representa uma manifestação direta dos processos

do pensamento criativo, tais como poderiam comparecer nos desenhos de um

computador. Estamos aqui nos referindo, contudo, às consequências psicológicas e

sociais dos desenhos e padrões, na medida em que ampliam ou aceleram os processos

já existentes. Pois a “mensagem” de qualquer meio ou tecnologia é a mudança de

escala, cadência ou padrão que esse meio ou tecnologia introduz nas coisas humanas

[...] (MCLUHAN, 2005, p. 22, grifo nosso).

A formalização dos trechos relativos ao “Meio” viabilizou a identificação dos

argumentos da preponderância do “Meio” sobre a “Mensagem” e do “Meio como extensão”

porque, embora sua forma de apresentação não seja formal (por exemplo, “O meio é a

mensagem”), não implica em descumprimento dos princípios lógicos básicos.

Do ponto de vista das extensões utilizadas, o critério que é possível extrair é que se trata

de técnica/tecnologia e as consequências da “Extensão” são individuais e compartilhadas.

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Porém, tendo vista a indistinção de teor conceitual entre “Tecnologia” e “Meio”, a maior

dificuldade diz respeito à delimitação que, como em outros casos, é ampla e ambígua.

Quanto aos outros termos quantitativamente mais relevantes, em especial “Homem”,

“Sociedade” e “Cultura”, não são objeto de preocupação conceitual do autor (2005), o que

resultou na não identificação de argumentos descritivos, definidores ou de explanação,

apresentando aplicações das quais, mesmo enquanto conjunto, não foi possível extrair critérios.

E, finalmente, no que tange “Aldeia”, além de corresponder quantitativamente a menos

de 1% dos termos de maior frequência, não foi identificado argumento de teor conceitual

completo através do qual fosse possível estabelecer manifestadamente classe de referência e

sentido.

1.5 Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia

Repetindo-se o padrão, os termos que compõem o título do livro, originalmente

publicado em 198762, são parte do conjunto de termos/expressões mais utilizados pelo autor

(1997) no decorrer do texto, tal como pode ser observado no Gráfico 14:

62 Para esta análise foi utilizada a versão em língua portuguesa, de 1997.

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GRÁFICO 14 – Termos com maior frequência em Martín-Barbero

Fonte: o próprio autor

“Cultura” é o termo que se relaciona diretamente com todos os outros termos

quantitativamente relevantes como, por exemplo, “Arte” que, na maior parte dos casos, é

utilizado operacionalmente nos argumentos a respeito do conceito de “Cultura” na “corrente

culturalista” (termo/expressão que relaciona a Escola de Frankfurt).

Tratada isoladamente, “Cultura” corresponde a cerca de 36% dos termos com expressão

de teor conceitual ou extensionalista.

“Cultura” é, portanto, o designador que centraliza o debate do autor (1997) e, por

conseguinte, mais relevante para a classe de referência e sentidos de outros termos-conceitos,

em especial “Mediação”.

Além do uso como grande conceito (a Cultura) ou de nível extensionalista mais amplo

(cultura nacional, camponesa, indígena etc.), há designadores particulares como demonstrado

abaixo:

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GRÁFICO 15 – Desdobramentos de Cultura em Martín-Barbero

Fonte: o próprio autor

Sobre “Sociedade”, apesar de ser um termo quantitativamente relevante, não há esforço

explicativo-conceitual próprio do autor (1997). E embora relacione autores a termos

especializados (Exemplo: Le Bon – Sociedade de Massa), o interesse conceitual reside na

relação entre “Massa” e “Popular”, considerando “Hegemonia” e “Mediação”/ “Recepção”.

O problema operacional, que perpassa todo o texto de Martín-Barbero (1997), é que o

teor conceitual é explícito quando relacionado a termos-expressões de outros autores como, por

exemplo, “Indústria Cultural” (Adorno e Horkheimer) e “Hegemonia” (Gramsci). Nesses casos,

o autor (1997) demonstra argumentos que relacionam diretamente premissas e conclusões

passíveis de verificação, operacionalização essa que ele utiliza como subsídio para abarcar ou

refutar posições teóricas.

Entretanto, quando se trata de termos especializados propostos diretamente

(principalmente “Mediação”), a análise do conjunto de trechos relativos ao designador

evidencia três tendências: (1) ou não atende ao princípio da não contradição, isto é, estão

estruturados de modo que uma proposta sobre mediação é tomada como verdadeira e falsa; (2)

ou as premissas e conclusões não estão vinculadas (3) e/ou o esclarecimento do teor conceitual

e da relação entre premissas e conclusões depende do esclarecimento de um segundo termo

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especializado que não foi realizado (Exemplo: compreender “Mediação” depende do

entendimento de “Meio”). O trecho central da constatação é:

O campo daquilo que denominamos mediações é constituído pelos dispositivos

através dos quais a hegemonia transforma por dentro o sentido do trabalho e da vida

da comunidade. Já que é o próprio sentido do artesanato ou das festas o que é

modificado por aquele deslocamento "do étnico ou do típico", que não só para o

turista, mas também na comunidade, provoca o esmaecimento da memória que

convoca [...] (MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 262).

A identificação da contradição está diretamente relacionada com o caráter

extensionalista de “Mediação” e de “Cultura”, que no texto do autor (1997) aparecem aplicados

em inúmeras situações.

A priorização do caráter extensionalista de termo especializado se repete em relação a

“Meio”.

GRÁFICO 16 – Meio em Martín-Barbero

Fonte: o próprio autor

Se por um lado a identificação e compreensão geral dos trechos tenha sido facilitada em

função de as variações terminológicas para “meio” e as extensões utilizadas serem

quantitativamente irrelevantes, não foram identificados argumentos com teor conceitual

completo ou que delimitassem as condições das extensões aceitas. O trecho que mais se

aproxima de qualquer uma das demandas está exposto abaixo:

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As denominações são também um bom ponto de acesso. Pliego indica o "meio": uma

simples folha de papel dobrada duas vezes, ou várias folhas dobradas formando um

caderninho, impresso em duas ou três colunas. Cordel assinala o modo de difusão,

pois os pliegos eram exibidos e vendidos pendurados em um cordel na praça [...]

(MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 145, grifo do autor).

Finalmente, a propósito de “Comunicação”, há três contextos básicos de aplicação do

termo:

GRÁFICO 17 – Desdobramentos de Comunicação em Martín-Barbero

Fonte: o próprio autor

Quando utilizado de modo isolado, trata-se especialmente de trechos em que o autor

(1997) se refere aos limites do domínio, entretanto, sem argumentos que esclareçam o teor

conceitual de “Comunicação” como, por exemplo, quando afirma que “[...] a comunicação está

se convertendo num espaço estratégico a partir do qual se pode pensar os bloqueios e as

contradições que dinamizam essas sociedades-encruzilhada, a meio caminho entre um

subdesenvolvimento acelerado e uma modernização compulsiva [...]” (MARTÍN-BARBERO,

1997, p. 258, grifo do autor).

Em uma pequena parcela de aplicação do termo, o autor (1997) aponta para extensões

da “Comunicação”, também sem explicitar os critérios que validariam o uso.

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Por fim, há o uso de “Comunicação” relacionado a “Meio” e, nesse sentido, a

identificação colaborou para o agrupamento do termo “Meio”, mas não implicou

esclarecimento do teor conceitual de ambos os termos especializados.

2. Textos recentes

Tal como esclarecido anteriormente, a unidade de pesquisa foi composta por 46

periódicos, excluindo-se da lista extraída da plataforma Sucupira os que não são da área da

Comunicação (na maior parte vinculados a programas de pós-graduação stricto sensu em

História e Psicologia), bem como Comunicação Midiática, Comunicação & Política e

Comunicação Pública, uma vez que até a data de finalização deste trabalho apresentaram

problemas de disponibilização.

Isso se deu porque essa dificuldade não pode ser solucionada a partir da coleta nos

indexadores visto que, em última instância, a coleta dos artigos publicados tem de ser realizada

diretamente nas páginas dos periódicos.

Além disso, foram identificados problemas de disponibilização no periódico Estudos

em Comunicação nas edições de 2014, volume 15, número 36 e de 2015, volume 16, número

41.

Focalizando título, resumo e palavras-chave foram coletados somente os textos que

apresentaram os seguintes parâmetros para os termos: (1) “Meio(s)” se diferente de “através” e

“contexto” ou relacionado a “meio ambiente”; (2) “Aparato(s)”, “Artefato(s)”, “Canal(is)”,

“Dispositivo(s)”, “Mídia(s)”, “Plataforma(s)”, “Suporte(s)”, “Tecnologia(s)” e “Veículo(s)”,

admitindo-se termos variados como, por exemplo, “midiáticos” se relacionados a

“comunicação” e/ou “massa”, ou ainda termos tomados como extensão, tais como “televisão”.

A partir disso a unidade de pesquisa foi constituída por 705 textos distribuídos nos 46

periódicos consultados da seguinte maneira:

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GRÁFICO 18 – Distribuição dos textos nos periódicos

Fonte: o próprio autor

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No que se refere à preponderância das publicações em relação aos anos, tem-se:

GRÁFICO 19 – Distribuição dos textos entre 2010 e 2016

Fonte: o próprio autor

Quase 10% dos textos que compuseram a unidade foi extraído da revista Rumores,

vinculada a Escola de Comunicações e Arte da Universidade de São Paulo (ECA-USP).

Dentre os periódicos verificados, Devires e Estudos semióticos não tiveram artigos que

se enquadrassem nos critérios estabelecidos para esta pesquisa. Em contrapartida, 17 revistas

tiveram textos extraídos acima da média.

Alceu e Aterjor tiveram apenas um artigo extraído, respectivamente publicados em 2013

e 2016. Em ambos os casos há apreensão funcional dos meios sem exploração do teor conceitual

completo. O maior esforço é de caráter extensionalista, sem a exposição dos critérios que

admitem as diferentes extensões, nem no trecho em questão e abaixo demonstrado, nem em

trechos subsequentes no artigo:

Em termos conceituais, inicialmente, observa-se que Pereira (1981) divide os meios

de comunicação social em três categorias: 1. meios de comunicação de massa como

rádio, televisão e imprensa; 2. literatura e 3. artes performáticas como música, teatro,

cinema, entre outras. Analogamente, Lima (1995) considera os meios de

comunicação social como sendo compostos por: 1. mídia impressa; 2. rádio; 3.

televisão; 4. propaganda e 5. Artes [...] (TRINDADE, CAMPANARIO, 2013, p. 48).

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No periódico Animus, tal como é possível verificar no gráfico 20, foram identificados

três artigos (2011, 2014 e 2015) que atendiam os parâmetros de extração.

GRÁFICO 20 – Distribuição de textos no periódico Animus

Fonte: o próprio autor

Nos três artigos o tratamento de “Meio” é funcional e como recorte do objeto empírico,

isto é, apontam para que servem/seu papel e para restrição do levantamento de dados do

trabalho, sem que isso resulte no esclarecimento de teor conceitual.

Em relação ao periódico Brazilian Journalism Research a maior quantidade de artigos

extraídos foi publicada entre os anos de 2012 e 2015.

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GRÁFICO 21 – Distribuição de textos no periódico Brazilian Journalism Research

Fonte: o próprio autor

Dentre os termos designadores mais frequentes no conjunto de textos do Brazilian

Journalism Research destacam-se:

“meio(s) de comunicação”, “meios de comunicação em multiplataforma”, “meios

de comunicação online”, “meio digital”, “meio jornalístico”, “meio tradicional”,

“novos meios de comunicação”

“meios sociais de comunicação”, “social media”

“veículos de comunicação”

A aplicação não é prioritariamente funcional, mas sim de “Meio” como delimitador do

recorte empírico como, por exemplo, a análise de determinado jornal. Nesse sentido, o uso do

termo é proeminentemente extensional e secundário em discussões sobre a qualidade do

jornalismo, mudanças econômicas e profissionais oriundas da introdução de tecnologias,

critérios de noticibialidade, aspectos éticos, categorias de narrativas jornalísticas, formação

profissional e a presença de determinados assuntos em jornais específicos (exemplo: questões

de meio ambiente e divulgação científica).

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Nos periódicos Communicare, Estudos em Jornalismo e Mídia, e Extraprensa, cujas

distribuições de textos estão expostas nos gráficos abaixo, também há preponderância de

interesse pelo jornalismo.

GRÁFICO 22 – Distribuição de textos no periódico Communicare

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 23 – Distribuição de textos no periódico Estudos em Jornalismo e Mídia

Fonte: o próprio autor

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GRÁFICO 24 – Distribuição de textos no periódico Extraprensa

Fonte: o próprio autor

Além da abordagem de aspectos do jornalismo, em especial da prática profissional, a

respeito da credibilidade e cobertura jornalística, identificou-se também a preponderância de

questões políticas gerais (debates sobre democracia e cidadania, por exemplo) e específicas

(sobre determinada eleição).

O uso de “Meio” é funcional e extensional, para sua aplicação como delimitador do

objeto empírico (como, por exemplo, análise da cobertura jornalística sobre eleições em jornais

específicos).

Os periódicos Ciberlegenda, Galáxia e Signos do Consumo concentram a maior parte

dos textos publicados com os parâmetros de extração para esta unidade nos primeiros anos do

período estabelecido, entre 2010 e 2012, considerando que no último ano (2016), foi

identificado em cada periódico apenas um texto.

No caso de Ciberlegenda, os designadores identificados são próximos ou similares aos

que foram reconhecidos no Brazilian Journalism Research, sendo “meios de comunicação de

massa”, “veículos de comunicação de massa”, “velhos meios de comunicação”, “media”,

“meios eletrônicos”, “meios impressos”, “novas mídias” e “mídia pública”, dentre outros.

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108

GRÁFICO 25 – Distribuição de textos no periódico Ciberlegenda

Fonte: o próprio autor

A maior parte dos textos faz uso extensionalista dos termos, isto é, explica-os através

de exemplos, tais como “Tv” e “Facebook”. Excetuando-se o artigo de 2012, As singularidades

do espaço audiovisual brasileiro nos anos 2000: Reflexões sobre convergência, cinema e

televisão.

Esse trabalho em especial, além do cunho extensionalista e de delineamento do objeto

empírico, teve o seguinte trecho extraído, o que não resultou em esclarecimentos acerca de teor

conceitual: “As transformações são conceituais e atingem todos os meios, uma vez que as

fronteiras previamente demarcadas no campo audiovisual são frequentemente apagadas,

desafiando os paradigmas teóricos estabelecidos” (CESÁRIO, 2012, p. 87).

Como é possível observar, tanto quanto nos outros artigos do mesmo periódico, não há

redução de ambiguidade a partir de outros termos-conceitos como, por exemplo, “paradigmas

teóricos”, que também é aplicado funcionalmente.

Enquanto Ciberlegenda teve 20 artigos extraídos no total, a revista Galáxia teve apenas

8, como apontado no gráfico abaixo.

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GRÁFICO 26 – Distribuição de textos no periódico Galáxia

Fonte: o próprio autor

Não foram identificadas nos textos do periódico Galáxia aplicações do

termo/designador diferentes dos das revistas analisadas até aqui. Repete-se, portanto, a

tendência do uso de “Meio” como recorte do objeto empírico e, por consequência, o caráter

extensionalista.

Já na revista Signos do Consumo, cujo total de textos extraídos foi 16, as temáticas gerais

são Consumo e Publicidade, Linguagem, Representações e Uso dos meios em especial de cunho

político e mercadológico.

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GRÁFICO 27 – Distribuição de textos no periódico Signos do Consumo

Fonte: o próprio autor

Nesse sentido, não há nenhuma novidade em comparação com os periódicos analisados

até o presente momento, ou seja, repete-se a tendência de uso do “Meio” como recorte do objeto

empírico e do caráter extensionalista amplo, incluindo, por exemplo, games.

Dentre as revistas que apresentaram aumento de quantidade de textos extraídos nos

últimos anos do período estabelecido estão Comunicação & Sociedade; Comunicação, mídia e

consumo; Eptic; Estudos em Comunicação e Fronteiras.

No caso da primeira, apenas 6 artigos foram extraídos, como demonstrado no gráfico

abaixo.

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GRÁFICO 28 – Distribuição de textos no periódico Comunicação & Sociedade

Fonte: o próprio autor

Exceto pelo designador “meios dominantes”, não foram encontrados termos diferentes

dos já mencionados até aqui. A tendência extensionalista e de aplicação de “Meio” como recorte

do objeto empírico também permanece.

O que chama atenção é a definição apresentada sobre “mídias sociais digitais”, que

seriam diferentes, segundo argumento anterior dos autores (2015), de outros meios:

Entendemos as mídias sociais digitais, neste trabalho, como ambiência resultante de

associações/ interações entre atores humanos (indivíduos, grupos e organizações) e

algumas tecnologias de comunicação com potencialidade para usos e apropriações

mais participativos e conversacionais [...] (CARVALHO; RUBLESCKI;

BARRICHELLO, 2015, p.112).

E ainda:

Propusemos os meios como resultados das associações entre suas gramáticas – que

já são resultado de combinações do mesmo tipo – e seus usos e apropriações sociais,

constituindo ambiências. Apresentamos as mídias sociais digitais como meios que

resultam de associações entre suas potencialidades materiais e seus usos. Ao trazer

alguns exemplos das associações sociotécnicas entre essas mídias e as organizações

jornalísticas, mostramos que os meios e os atores sociais afetam-se mutuamente em

um processo que, desde a perspectiva ecológica, está sempre em desenvolvimento

(CARVALHO; RUBLESCKI; BARRICHELLO, 2015, p.126).

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112

Embora o referencial teórico (Ator-rede) seja bem definido e sejam apresentadas

definições, os usos diversos de termos-conceitos correlacionados e também de “mídias sociais

digitais” não reduzem a ambiguidade de modo que seja possível extrair critérios explícitos para

a aplicação do designador e suas consequências: são resultado de associações ou interações

entre atores e tecnologias e/ou são um objeto que se relaciona com os atores e as tecnologias

e/ou são as tecnologias em si? As potencialidades materiais são os usos mais participativos e

conversacionais? De que forma se distanciam ou se aproximam dos outros meios?

No que tange o periódico Comunicação, mídia e consumo, o número de artigos extraídos

foi menor, como exposto no gráfico abaixo.

GRÁFICO 29 – Distribuição de textos no periódico Comunicação, mídia e consumo

Fonte: o próprio autor

Apenas o artigo Entre mídia e comunicação: origens e modalidades de uma dicotomia

nos estudos da área, publicado em 2016, não faz uso de “Meio” como delimitador do objeto

empírico. Para que fique mais explícito, esse é o caso, por exemplo, do texto O The Daily como

uma mistura de mídias e uma nova significação do meio jornal, de 2013, cujo conceito-chave

é, na verdade, “convergência”.

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113

Apesar de tratar diretamente da questão do “Meio”, não se trata de uma proposta

conceitual sobre o mesmo, mas de um debate epistemológico. Então, o autor (2016) apresenta

apreensões que, embora tenham características descritivas e de definição, estão incluídas em

um argumento sobre o que se propõe como “Meio”, não constituindo asserção imediata sobre

o conceito. Isso é elucidado quando explica que:

O termo “mídia”, neste caso, parece se referir, com pouca problematização, a um

conjunto de “meios de comunicação”, de “massa” ou “digitais”, destacados

sobretudo por se tratarem de dispositivos tecnológicos englobados, por vezes, em

um âmbito institucional no qual “mídia” ganha também o significado de “empresa

de comunicação”. Nas duas concepções, como aparato e como instituição, é possível

observar a acentuação unilateral de uma dimensão que parece por vezes prescindir

do humano e/ou do social como princípio, contexto e fim (MARTINO, 2016, p. 14).

O mesmo ocorre quando aponta que:

O campo semântico coberto por “estudos de mídia”, portanto, equivale apenas

parcialmente à “teoria da comunicação”; ao mesmo tempo, como indicado, mesmo

a perspectiva de “estudos de mídia”, por conta da polissemia conceitual de “mídia”

nos estudos de comunicação, não parece necessariamente contribuir para a definição

do objeto, mas apenas para o que aparenta ser uma resolução imediata de uma

problemática epistemológica que, no entanto, não subsiste a um escrutínio mais

amplo (MARTINO, 2016, p. 23-24).

Seguindo-se para o periódico Eptic, tem-se a seguinte demonstração dos artigos

extraídos:

GRÁFICO 30 – Distribuição de textos no periódico Eptic

Fonte: o próprio autor

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114

Repete-se a tendência extensionalista e de “Meio” como elemento de delineamento do

objeto empírico, com a peculiaridade de que a propensão temática em todos os casos é voltada

para o debate de aspectos macrossociais, fundamentalmente econômicos e políticos,

relacionados à regulação da comunicação.

Tal regularidade de inserção temática não se repete no caso da revista Estudos em

Comunicação.

GRÁFICO 31 – Distribuição de textos no periódico Estudos em Comunicação

Fonte: o próprio autor

No periódico Estudos em Comunicação, a tendência temática que se utiliza de “Meio”

como delimitador do objeto empírico e de caráter extensionalista é ampla, perpassando por

tratamentos de determinados assuntos (exemplo: poluição, ração, gênero, movimentos sociais

etc) até a descrição de ações empresariais (exemplo: como determinado jornal passou a

disponibilizar notícias etc).

A diversidade temática também foi observada no caso da revista Fronteiras, cuja

distribuição de textos coletados é demonstrada no gráfico abaixo.

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GRÁFICO 32 – Distribuição de textos no periódico Fronteiras

Fonte: o próprio autor

A diversidade temática não obscurece a unidade de utilização funcional de “Meio”, que

é aplicado às explanações de teor conceitual relacionadas a aspectos políticos, bem como para

o recorte de objeto empírico, prioritariamente relativo a jornalismo (cobertura jornalística de

determinado assunto, narrativa jornalística etc).

Dentre os periódicos com menor número de textos extraídos, mas que não apresentaram

redução de artigos que se enquadram nos parâmetros desta pesquisa em 2016 estão

ComPolítica, Comunicação e Educação, Contemporânea: Comunicação e Cultura, Culturas

midiáticas, ECOM – Educação, Cultura e Comunicação, Esferas, Liinc e Opinião Pública,

cujas distribuições por ano estão demonstradas nos gráficos abaixo.

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116

GRÁFICO 33 – Distribuição de textos no periódico Compolítica

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 34 – Distribuição de textos no periódico Comunicação e Educação

Fonte: o próprio autor

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117

GRÁFICO 35 – Distribuição de textos no periódico Contemporânea: Comunicação e Cultura

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 36 – Distribuição de textos no periódico Culturas midiáticas

Fonte: o próprio autor

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118

GRÁFICO 37 – Distribuição de textos no periódico ECOM

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 38 – Distribuição de textos no periódico Esferas

Fonte: o próprio autor

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119

GRÁFICO 39 – Distribuição de textos no periódico Liinc

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 40 – Distribuição de textos no periódico Opinião Pública

Fonte: o próprio autor

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120

No caso dos periódicos Compolítica, Contemporânea, Esferas, Liinc e Opinião Pública

repetem-se as tendências observadas até aqui no que se refere a aplicação de “Meio”, em

especial no uso do termo como subsídio de recorte do objeto empírico, que exceto por cinco

textos (dentre dezesseis), dizem respeito ao tratamento de questões políticas pelos “Meios”,

sem esclarecimentos conceituais sobre os mesmos.

Nas revistas Comunicação e Educação, Culturas midiáticas e ECOM, além de “Meio”

como delimitador do objeto empírico, há o uso funcional e de caráter extensionalista e, ainda,

diversos trechos com indicações triviais ou que não correspondem a um argumento passível

dessa análise como, por exemplo:

A televisão é um meio de comunicação social de suma importância na vida do

brasileiro, tendo como finalidade informar e também proporcionar entretenimento à

grande massa. No dia 02 de dezembro de 2007, começaram as transmissões no Brasil

da TV digital, nas cidades da Grande São Paulo, que gerou e ainda provoca uma série

de questionamentos e dúvidas a respeito desta nova TV (BARRETO, 2011, p. 17).

Na mesma revista, há a exceção no texto Novas tecnologias na sala de aula, no seguinte

trecho:

Descrevendo as mídias, nós nos referimos hoje, tanto a instituições, como meios

impressos, radiofônicos, televisivos, a gêneros (jornais, revistas etc.) ou a técnicas

(fax, rádio). Todavia, as definições, para além de sua diversidade, insistem

geralmente sobre a finalidade das mídias que implica uma comunicação. Assim,

Francis Balle (1995 apud GONNET, 2004, p. 16) define mídia “como o equipamento

técnico que permite aos homens comunicar a expressão de seu pensamento quaisquer

que sejam a forma e a finalidade desta expressão” (OLIVEIRA JÚNIOR; SILVA,

2010, p. 87).

Exceto a relação com a comunicação e com a técnica/tecnologia não há outro critério

explícito de aplicação. Tais requisitos, entretanto, são considerados insuficientes porque

demandariam o esclarecimento conceitual dos designadores “comunicação” e

“técnica/tecnologia”, além de tal relação não ser evidente, do ponto de vista epistemológico e

teórico (MARTINO, L. M., 2016).

Seguindo-se para os periódicos ainda não mencionados, alguns apresentaram pequena

queda em 2016 no número de artigos publicados dentro dos parâmetros de coleta desta unidade

de pesquisa: Comunicação & Informação, Conexão, Contracampo, ECO-Pós, Líbero, Logos,

Novos Olhares, cujas distribuições por ano estão demonstradas nos gráficos abaixo.

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121

GRÁFICO 41 – Distribuição de textos no periódico Comunicação & Informação

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 42 – Distribuição de textos no periódico Conexão

Fonte: o próprio autor

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GRÁFICO 43 – Distribuição de textos no periódico Contracampo

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 44 – Distribuição de textos no periódico ECO-Pós

Fonte: o próprio autor

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GRÁFICO 45 – Distribuição de textos no periódico Líbero

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 46 – Distribuição de textos no periódico Logos

Fonte: o próprio autor

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124

GRÁFICO 47 – Distribuição de textos no periódico Novos Olhares

Fonte: o próprio autor

Neste conjunto de periódicos, a tendência temática prioritária diz respeito à

representação de questões políticas por “meios” específicos e, portanto, também ao uso de

“Meio” como delimitador do objeto empírico. Além disso, há textos que tratam da perspectiva

funcional de “Meio”, focalizando o papel do mesmo em determinada questão normalmente para

além da comunicação e no âmbito político ou relacionada à hipótese do agendamento,

considerando que tal especificação não resultou em esforços de teor conceitual relativos a

“Meio”.

Além disso, uma menor parcela dos textos desses sete periódicos se referiu à perspectiva

de autores específicos (que mesmo nesses casos não resultou na explanação sobre “Meio”) e à

reconfiguração de atuação profissional relacionada à comunicação, em especial nos ramos do

jornalismo e da publicidade.

Ainda sobre esses sete periódicos, um texto intitulado Medium-Remedium: o problema

ontológico dos meios e seu entrelaçamento comunicativo (ECO-Pós, 2013) foi destacado para

reflexão posterior, realizada no próximo capítulo, sobre os esclarecimentos que podem ser

objeto de inferência em relação a “Meio”, partindo-se de uma perspectiva de análise em níveis

epistemológico e teórico.

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Considerando ainda os periódicos que apresentaram diminuição de textos nos

parâmetros de extração considerados para esta unidade de pesquisa, dois especificamente

apresentaram reduções mais drásticas, tais como demonstradas nos gráficos abaixo.

GRÁFICO 48 – Distribuição de textos no periódico Intexto

Fonte: o próprio autor

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GRÁFICO 49 – Distribuição de textos no periódico Organicom

Fonte: o próprio autor

No caso do periódico Intexto há uma ampla variação temática na qual a questão do

“Meio” está inserida, bem como repetição das tendências de uso já percebidas até aqui. No que

se refere à revista Organicom, a temática geral é bem definida em relação a problemas

específicos de Relações Públicas e está presente em todos os artigos extraídos.

Seguindo-se para o periódico Comunicação & Inovação apresenta-se abaixo o gráfico

de distribuição dos textos no período estipulado para esta investigação.

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GRÁFICO 50 – Distribuição de textos no periódico Comunicação e Inovação

Fonte: o próprio autor

Das tendências já apontadas, observou-se a priorização de “Meio” como elemento

delimitador dos objetos empíricos. Nesses casos, a exemplificação e, portanto, indicação de

extensões como, por exemplo Twitter, é o máximo de esclarecimento a respeito do designador.

As distribuições das revistas Geminis, Intercom, Lumina, Rizoma e Rumores são

demonstradas abaixo nos gráficos 51, 52, 53, 54 e 55.

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GRÁFICO 51 – Distribuição de textos no periódico Geminis

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 52 – Distribuição de textos no periódico Intercom

Fonte: o próprio autor

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GRÁFICO 53 – Distribuição de textos no periódico Lumina

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 54 – Distribuição de textos no periódico Rizoma

Fonte: o próprio autor

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130

GRÁFICO 55 – Distribuição de textos no periódico Rumores

Fonte: o próprio autor

Os cinco periódicos apresentam textos coletados que privilegiam, em ordem de

relevância, o uso do “Meio” como delimitador do objeto empírico e indicações extensionalista,

e aplicação funcional do designador, em especial para tratamento de questões políticas.

Chama atenção que não apenas o conjunto, mas o caso específico da revista Rumores:

as cinco revistas concentram 178 artigos de um total de 705, considerando ainda que o periódico

que sozinho possui cerca de 10% do total de textos extraídos (Rumores) não tem um artigo que

se dirija centralmente ao esclarecimento do teor conceitual completo de “Meio”, restringindo-

se aos usos funcionais, de recorte de objeto empírico e extensionalistas.

Outro periódico com características parecidas, inclusive no que tange a distribuição dos

textos no período de coleta, é a Revista Brasileira de História da Mídia.

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131

GRÁFICO 56 – Distribuição de textos no periódico Revista Brasileira de História da Mídia

Fonte: o próprio autor

Entretanto, a proeminência do uso de “Meio” como delimitador de objeto empírico está

relacionada com o caráter histórico como é possível perceber em títulos como A máquina do

tempo: a publicidade de lava-louças em cinco décadas de permanências, publicado em 2016.

Dos últimos cinco periódicos restantes, apenas E-compós apresentou diminuição no

número de textos enquadrados nos requisitos de coleta elaborados para esta unidade de

pesquisa, como é possível verificar nos gráficos de distribuição de textos abaixo colocados.

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132

GRÁFICO 57 – Distribuição de textos no periódico E-compós

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 58 – Distribuição de textos no periódico Famecos

Fonte: o próprio autor

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133

GRÁFICO 59 – Distribuição de textos no periódico Matrizes

Fonte: o próprio autor

GRÁFICO 60 – Distribuição de textos no periódico Sessões do imaginário

Fonte: o próprio autor

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134

GRÁFICO 61 – Distribuição de textos no periódico Verso e Reverso

Fonte: o próprio autor

Além das tendências verificadas em todos os periódicos avaliados até aqui, quanto ao

uso funcional e extensional de “Meio”, esses últimos guardam em comum o fato de terem pelo

menos um artigo que discute, a partir de uma perspectiva teórico-epistemológica, a questão do

“Meio”, em alguns casos resultando em texto a ser melhor detalhado no próximo capítulo.

Destaca-se da E-Compós o artigo Meio, mediação, agência: a descoberta dos objetos

em Walter Benjamin e Bruno Latour, publicado em 2013. Da Famecos, Semiótica da

comunicação: da semiose da natureza à cultura, de 2010; Epistemologia “da” Comunicação:

elementos para a crítica de uma fantasia acadêmica, de 2014, e A virada comunicacional. Ou

porque os estudos de “midiatização”, de hábito e da Teoria dos Media passam ao largo da

comunicação, de 2015.

Do periódico Matrizes, os textos Tertium datur: introdução a uma teoria negativa dos

media e Mídias sociais digitais a partir da ideia mcluhaniana de médium-ambiência, ambos

publicados em 2013.

Finalmente, de Sessões do imaginário, tem-se o artigo Mídia fluida: por uma renovação

conceitual, de 2010, e de Verso e Reverso, Constituição do campo da comunicação, de 2011.

O artigo publicado em 2015 na Famecos, os dois textos da Matrizes e o publicado na

Sessões do imaginário tiveram a análise realizada no próximo capítulo, em função do viés

teórico-epistemológico implicado e que não pode ser verificado exclusivamente a partir da

preocupação com os argumentos.

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135

Os outros textos não foram incluídos na próxima fase da análise porque, ainda que

apresentem argumentos de cunho epistemológico sobre “Meio”, isso não implicou em

esclarecimento de teor conceitual completo.

No artigo Meio, mediação, agência: a descoberta dos objetos em Walter Benjamin e

Bruno Latour, publicado em 2013 no periódico E-compós, há esforço para localizar os

designadores na obra dos autores incluídos no texto e um debate sobre os esforços dos mesmos,

mas não a centralização de qualquer um dos termos inseridos no título.

Resumidamente, em Epistemologia “da” Comunicação: elementos para a crítica de

uma fantasia acadêmica, publicado em 2014 na Famecos, a proposta é de que as decisões

relativas ao Objeto da Comunicação ou ao esclarecimento de “Meio” não devem ser iniciadas

sob a angulação epistemológica, mas sim teórica.

O artigo do periódico Verso e Reverso, já citado anteriormente neste trabalho, coloca a

questão de indecisão e não conceituação de “Meio” como obstáculo epistemológico.

Finalmente, em Semiótica da comunicação: da semiose da natureza à cultura, dois

trechos extraídos elucidam a descrição:

Em vez de rever suas assunções básicas e procurar os fundamentos que sustentam

todo e qualquer tipo de comunicação, para então pesquisar o que define e diferencia

a comunicação simbólica humana, as teorias da comunicação entregaram-se a uma

corrida infrutífera e insustentável para tentar explicar os efeitos sociais do

aparecimento das novas mídias (MACHADO; ROMANINI, 2010, p. 95).

E ainda:

Os meios de comunicação ocuparam a cena da cultura não porque são veículos de

transmissão de informação, mas porque elaboram linguagem com códigos culturais

diferenciados: do alfabeto à tipografia; da fotografia à cinematografia; da discografia

à videografia e aos códigos digitais e informáticos (MACHADO; ROMANINI,

2010, p. 90).

Ressaltando a unidade de pesquisa de textos recentes como um todo, “Meio de

Comunicação” e suas extensões “Jornal”, “Televisão”, “Rádio” e “Cinema” são os

designadores mais significativos do ponto de vista quantitativo.

“Internet”, “Convergência”, “Redes Sociais” e “Web” foram agrupadas porque,

mediante o conjunto de trechos que as incluíam, não foi possível identificar critérios de

divergência ou similaridade. Além disso, aqueles que tratavam de algum dos termos como

extensão de outro são quantitativamente irrelevantes, estando inseridos em menos de 1% dos

textos que compõem esta unidade.

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136

Os designadores/sinônimos de “Meio” são diversos, mas ainda assim é possível destacar

como principais:

“Meio(s) de Comunicação”

“Meio(s) de Comunicação de Massa”

“Meio(s) Sociais de Comunicação ”

“Meio(s) de Comunicação Online”

“Meio(s) de Comunicação em Multiplataforma”

“Meio(s) digital(s)”

“Meio(s) dominante(s)”

“Meio(s) eletrônico(s)”

“Meio(s) jornalístico(s)”

“Meio(s) impresso(s)”

“Meio(s) tradicional(is)”

“Medium”

“Media”

“Mídia pública”

“Novos Meio(s) de Comunicação”

“Novas Mídias”

“Tecnologia(s) de Comunicação”

“Tecnologia(s) de Informação e Comunicação (TICs)”

“Velhos Meio(s) de Comunicação”

“Veículo(s) de Comunicação (de massa)”

Em cerca de 2% dos textos foram identificadas associações proibitivas em relação a

“Meio”, considerando que a maior parte se tratava de esclarecer que o trabalho não se restringia

ao “meio” tal como utilizado em caráter extensão (Exemplo – “a análise não está restrita aos

produtos da televisão”).

A propósito do tipo de uso do termo, foi possível realizar uma distinção similar à que

foi feita no caso do texto A estrutura e a função da comunicação na sociedade, em relação aos

usos especializado e não especializado.

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137

GRÁFICO 62 – Usos especializado e não especializado de meio em textos recentes

Fonte: o próprio autor

Apesar de o uso especializado ter relação com importância quanti (Exemplo –

quantidade de vezes que aparece no texto) e qualitativa (Exemplo – configurar como termo

relevante na indexação), o uso de “Meio” como sinônimo de “através” é quase o dobro do uso

como “Meio de Comunicação”.

Além disso, há o uso como “ambiente” ou “contexto” que em larga medida colaborou

para a compreensão do quadro geral do texto como, por exemplo, “meio político” e “meio

sociocultural”.

Sobre isso, o resultado do último estudo exploratório se repete: o viés da questão política

é prioritário, ou no mínimo mencionado, em cerca de 64% dos textos.

Apesar dessa constatação, a tentativa de relacionar o uso em caráter de extensão com

um aporte teórico específico não foi possível, visto que essa relação precisaria ser demonstrada

na superfície do texto.

O que conduz a mais um resultado pertinente: os poucos textos que oferecem uma

relação clara com uma vertente teórica ou similar, ou ainda que apresentam algum esforço de

teor conceitual acerca de meio, não representam nem 3% do total de artigos analisados.

Desses, estão sendo excluídos os textos que apresentaram maior relevância sobre os

designadores “Mediação” e “Midiatização” isoladamente, visto que, de modo geral, são

atrelados a asserções proibitivas em relação a “Meio”.

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138

Considere-se também que dentro deste pequeno conjunto que indica o enquadramento

teórico, quando se relacionam a um meio especificamente como, por exemplo, “televisão”, os

esclarecimentos são estritamente voltados ao meio em questão.

Sobre esse pequeno, mas heterogêneo conjunto de textos que apontam explicitamente

para aportes teóricos, não foi possível realizar inferências sobre os critérios de aceitação de uso

do termo.

Foi possível perceber que esse grupo de textos possui três características distintas: (1)

se relaciona a Teoria do Meio ou menciona especificamente McLuhan; (2) Efetua relações com

tecnologia; (3) Tem como ênfase aspectos do jornalismo (essa última característica é acentuada

no total de artigos desta unidade de pesquisa).

Uma última consideração a ser feita é a característica que esse conjunto de artigos possui

em comum: a maior parte deles oferece um breve resgate teórico e/ou um debate em nível

epistemológico. Nesses casos, trata-se dos textos com maior esforço explicativo, além de

relacionarem algumas constatações realizadas neste trabalho tanto no que tange às

preocupações teórico-metodológicas, quanto em relação aos resultados apresentados. Como

mencionado, alguns deles foram destacados para o próximo nível da análise.

Considerando o que foi apresentado sobre as duas unidades de pesquisa, segue-se para

a reflexão sobre tais resultados, orientada pela perspectiva da pertinência epistemológica e

teórica que contextualiza a questão Que é Meio de Comunicação nas abordagens teóricas

circunscritas pela produção nacional.

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139

Capítulo IV – INTERPRETAÇÃO EM NÍVEL TEÓRICO-

EPISTEMOLÓGICO DOS RESULTADOS DA ANÁLISE

METÓDICO-TÉCNICA

[...] é a instância que exerce uma função de vigilância crítica na pesquisa. Ao longo

de toda a pesquisa essa instância se traduz em movimentos ou operações destinadas

à explicitação dos obstáculos epistemológicas da pesquisa e sua autocorreção e à

construção do objeto científico (LOPES, 2005, p. 121).

O debate em nível epistemológico e teórico no domínio da Comunicação aponta para

uma dispersão de caráter teórico e metodológico que se reflete tanto em pesquisas recentes,

como apontado por Martino, L.M (2014), quanto em livros que versam sobre as Teorias da

Comunicação, na medida em que eles demonstram que “[...] ninguém concorda sobre quais são,

de fato, as teorias da comunicação. Ou, mais precisamente, que temos em mente conjuntos e

ideias muito diferentes quando empregamos a expressão ‘teorias da comunicação’”

(MARTINO, L. C., 2008, p. 25).

O que aparece de forma consensual é que a dispersão é originada pelo tratamento

temático dispensado à comunicação (BRAGA, 2011; MARCONDES FILHO, 2011), de modo

que “[...] ninguém se pergunta o que é, em última análise, comunicação” (MARCONDES

FILHO, 2011, p. 170).

As perguntas Que é Comunicação? e Quais são as Teorias da Comunicação? são as

propulsoras das discussões e propostas de cunho epistemológico e teórico, dentro das quais há

sempre a inserção da questão do meio: em geral, se trata especificamente de defender ou refutar

Meio de Comunicação como vetor de delineamento da área (BRAGA, 2011; MARTINO, L.

M., 2013; RÜDIGER, 2014), além da centralização do conceito de comunicação (BRAGA,

2011; MARCONDES FILHO, 2011; MARTINO, L. C., 2007 e 2008).

Nesse sentido, concordou-se com Rüdiger (2014) sobre o argumento de que é no nível

do trabalho teórico que estaria a distinção de uma angulação comunicacional. Entretanto,

considerando as consequências de tal afirmação, se faz necessário questionar “[...] a tese de

que, em vez de comunicação, o tema mais central de nossos estudos são os fenômenos de mídia

[...]” (RÜDIGER, 2014, p. 402).

Coerente com o argumento de Rüdiger (2014), Luis Mauro Sá Martino (2016), no texto

Entre mídia e comunicação: origens e modalidades de uma dicotomia nos estudos da área,

afirma que “Meio” e “Comunicação” são percebidos como intercambiáveis ou sinônimos de

modo que:

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140

Se, no limite do óbvio, as “teorias da comunicação” estariam evidentemente ligadas

ao estudo da “comunicação”, o problema aparece quando se lança um olhar mais

atento à especificidade de cada teoria. E, nesse momento, vemos um conjunto díspar

de teorias e conceitos endereçados a problemas e objetos dos mais variados,

reverberando posições de inúmeras outras áreas do conhecimento, definidos ora

como “comunicação”, ora como “mídia” (MARTINO, L. M., 2016, p. 11).

O autor (2016) esboça que a dicotomia da área seria formada por uma escolha,

fundamentalmente epistemológica, entre “comunicação” e “mídia”, uma vez que a correlação

entre os termos não é, de fato, óbvia:

Se, como notado no início, a noção de ‘comunicação” está diretamente ligada ao

conceito de “meios”, sobretudo por conta de décadas de estudos sobre os “meios de

comunicação”, por outro lado as perguntas subjacentes a esse tipo de estudo – quais

“meios”? Qual “comunicação”? Como relacioná-los? -, se observadas mais de perto,

mostram que a aparente obviedade da relação não resiste a uma investigação mais

elaborada sem exibir algumas de suas profundas contradições e assimetrias,

presentes como tensão original nos fundamentos da área (MARTINO, L. M., 2016,

p. 25).

Entre as perguntas sobre “Meios” e “Comunicação” ou ainda sobre a relação entre

ambos, supõe-se aqui que a questão primordial nessa dicotomia seria se a Comunicação só se

realiza como Objeto de pesquisa pelos Meios.

Cabe retomar que o Objeto de pesquisa não equivale ao Objeto empírico: a construção

do Objeto de pesquisa e, portanto, das Teorias é uma relação entre as reflexões conceituais e as

evidências empíricas.

Decorre-se daí que, como observa Martino, L. M. (2016), identificar a primazia temática

dos fenômenos de mídia (RÜDIGER, 2014) não implica relação epistemológica-conceitual

entre Meio e Comunicação. Mas, por conseguinte, uma vez que o tratamento temático da

comunicação não culminou na sua centralização teórica ou em um enfoque propriamente

comunicacional, é preciso questionar se a preponderância do designador “meio” como recorte

temático e delineamento empírico resultou ou se encontra com alguma elaboração teórica-

conceitual.

Supondo que tal elaboração reflexiva exista, é preciso também questionar sobre sua

importância no que seriam as Teorias da Comunicação.

No capítulo anterior, foi realizada a descrição e análise em nível metódico-técnico dos

resultados encontrados em duas unidades de pesquisa distintas: os textos originais que,

inseridos direta (referência explícita) ou indiretamente (referência a partir de indicações em

obras sobre Teorias da Comunicação) nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu em nível

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nacional, seriam a expressão mínima de propostas teóricas a partir das quais as reflexões podem

se dar, e os artigos publicados entre 2010 e 2016 que incluiriam de modo significativo nas suas

proposituras o designador “Meio” ou sinônimos e extensões, em parâmetros explicados

anteriormente.

Sobre a unidade de pesquisa de textos recentes observou-se o relevo do uso de “Meio”

como elemento central de objetos empíricos dos estudos publicados.

Em muitos casos, “Meio” não se tratava da temática central e, também por isso, nem

toda aplicação do designador à restrição das evidências empíricas foi identificada

concomitantemente com o uso funcional, com a exposição do(s) papel(is) dos “meios”.

O caráter extensionalista é prioritário e, nesse sentido, o que é possível depreender está

restrito às principais tendências de sinônimos do designador “Meio” e de extensões.

Algumas reflexões epistemológicas, mais frequentes no último conjunto de periódicos

descritos no capítulo anterior, resultaram em debates pertinentes ao nível teórico da pesquisa.

E, em razão disso, foram trazidos para este capítulo do trabalho.

Na unidade de textos originais, constatou-se que o uso de “meio” é essencialmente

extensionalista, não sendo possível pontuar os critérios de admissão da utilização da noção ou

mesmo de uma categorização de objetos empíricos. O que é possível distinguir formalmente

sobre os meios é que:

Constituem uma via de investigação razoavelmente independente dos estudos

científicos de comunicação e estão relacionados às funções da comunicação na

sociedade, fundamentalmente em nível político (LASWELL, 1989);

A propósito da Opinião Pública e de sua realização como voto no contexto de

eleições, podem produzir efeitos/influência, mas de forma reduzida

(LAZARSFELD; BERELSON; GAUDET, 1955);

São parte da Indústria Cultural, operando efeitos negativos na cultura, em especial

na arte e na crítica (ADORNO; HORKHEIMER, 1969);

Em sendo extensões do homem, produzem alterações na percepção individual e

compartilhada em âmbito sociocultural, bem como delimitam as mensagens

constituídas pela absorção de um meio pelo outro (MCLUHAN, 2005);

Estão pouco associados à Comunicação, uma vez que o conceito-chave é o de

Mediação, subsidiado pelo de Cultura (MARTÍN-BARBERO, 1997).

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Também a partir da análise estritamente metódica-técnica dos textos originais, é

possível perceber que ainda que se afirme que o meio é um elemento central das argumentações

(MARTINO, L. M., 2016; RÜDIGER, 2014), é preciso considerar que é uma centralidade

operacional seja para sua refutação como elemento que demarca a Comunicação (MARTÍN-

BARBERO, 1997) ou para sua utilização como delimitação empírica, especialmente relativa a

efeitos/influência/consequências (ADORNO; HORKHEIMER, 1969; LASWELL, 1989;

LAZARSFELD; BERELSON; GAUDET, 1955; MCLUHAN, 2005).

Neste capítulo, realiza-se um retorno aos fundamentos que foram expostos no início do

trabalho e que conduziram à pergunta Que é Meio de Comunicação nas abordagens

circunscritas pela produção nacional?, buscando-se articular uma interpretação dos resultados

da análise metódico-técnica a partir do nível teórico-epistemológico para a manutenção da

vigilância epistemológica (LOPES, 2005), isto é, da coerência metodológica entre as instâncias

da investigação.

Em relação a unidade de pesquisa de textos originais, aqui são adicionados argumentos

secundários sobre a estruturação das noções que apresentam, sem a intenção de desenvolver

uma história da biografia ou da bibliografia dos autores, mas de inserir informações que ajudem

a esclarecer a composição teórica e a verificar a pertinência do Meio nessas propostas.

Tendo em vista as obras sobre Teorias da Comunicação utilizadas para a seleção desta

unidade de pesquisa (HOHLFELDT; MARTINO; FRANÇA, 2007; MATTELART;

MATELLART, 2005; WOLF, 2008), bem como os textos que a compõem, em especial Martín-

Barbero (1997) que realiza críticas a outros posicionamentos se auto localizando em viés

diferente, principalmente da Escola Americana e da Escola de Frankfurt, pode-se dizer que as

vertentes distinguidas são:

Escola Americana/Mass Communication Research/Escola Funcionalista/Pesquisa

administrativa, que incluiria os textos de Lasswell (1989) e Lazarsfeld, Berelson e

Gaudet (1955);

Escola de Frankfurt/Teoria Crítica, representada na unidade por Adorno e

Horkheimer (1969);

Escola de Toronto/Teoria do Meio, não obstante sobre McLuhan (2005) exista

diferentes entendimentos, visto que é percebido como trabalho subsequente ao de

Innis e integrante da visão de sociedade distinguida em “[...] termos de

comunicação, que é definida em termos de redes [...]” (MATTELART;

MATTELART, 2005, p. 159); obra marginal nas Teorias da Comunicação (WOLF,

2008); “[...] uma primeira abordagem do fenômeno comunicacional em sua relação

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com o desenvolvimento das tecnologias, dos avanços culturais e dos fenômenos

sociais [...]” (HOHLFELDT, 2007, p. 63) e integrante do ponto de vista semiótico

(MACHADO, 2007)63;

Estudos Culturais/Mediação/Recepção/Pesquisa na América Latina, identificada na

unidade de pesquisa em Martín-Barbero (1997).

Nos primeiros cinco itens desse capítulo são apresentadas representações gráficas da

estrutura teórico-conceitual extraídas dos textos na análise metódico-técnica, portanto

atribuindo um sentido epistemológico e teórico aos resultados já demonstrados.

No caso de Lasswell (1989) e Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948), o recorte temático

de “meio” e a variedade do uso em caráter de extensão provocaram repetições das constatações

dos resultados do capítulo anterior.

Em relação a Adorno e Horkheimer (1969), McLuhan (2005) e Martín-Barbero (1997)

foi possível e demandada uma exposição mais independente em função das características de

tais textos. Os primeiros (1969) vinculados a ideias filosóficas de fundo que são utilizadas para

a constituição da noção principal (Indústria Cultural), McLuhan (2005) com aforismos que

invocam origens e sobreposições teóricas diversas e Martín-Barbero (1997) que transita entre

explicitação coerente e contradição.

Além disso, por serem as primeiras, as análises relativas a Lasswell (1989) e Lazarsfeld,

Berelson e Gaudet (1948), incluem as inserções do viés proposto, tornando-as mais extensas

e/ou complexas.

O último item do capítulo se refere à reflexão em níveis teórico e epistemológico dos

artigos destacados da unidade de pesquisa de textos recentes: (1) Mídia fluida: por uma

renovação conceitual (2010); (2) Tertium datur: introdução a uma teoria negativa dos media;

(3) Medium-Remedium: o problema ontológico dos meios e seu entrelaçamento comunicativo

(2013); (4) Mídias sociais digitais a partir da ideia mcluhaniana de medium-ambiência (2013);

e (5) A virada comunicacional. Ou porque os estudos de “midiatização”, de hábito e da Teoria

dos Media passam ao largo da comunicação (2015).

63 Observe-se que as duas últimas posições dizem respeito a capítulos de um mesmo livro.

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1. A estrutura e a função da comunicação na sociedade

De acordo com Mattelart e Mattelart (2005, p. 36) “a primeira peça do dispositivo

conceitual da corrente da Mass Communication Research data de 1927. É o livro de Harold D.

Lasswell (1902-1978) Propaganda Techniques in the World War, que extrai as lições da guerra

de 1914-1918 [...]”.

O que se sabe sobre esse texto de Lasswell especificamente, é que o conteúdo se refere

ao seu doutorado defendido dois anos antes (1925) e que, voltado para Ciências Políticas

(CARVALHO, 2012), estava circunscrito pela preocupação sobre os efeitos dos Meios na

sociedade.

As Ciências Políticas configuram, como observa Carvalho (2012), o aporte de Lasswell

na maior parte dos trabalhos entre os anos 1930 e 1940 e foi mantido em paralelo com os seus

trabalhos direcionados ao governo norte-americano, em especial como chefe da Divisão

Experimental para o Estudo das Comunicações em Tempo de Guerra, a partir 1940. Sobre

Propaganda Techniques in the World War especificamente:

O livro não é, portanto, uma obra maquiavélica, ensinando a se praticar uma

propaganda desleal, mas uma análise das técnicas empregadas pelas nações

envolvidas na Primeira Grande Guerra que, por acaso, eram desleais e procuravam

com o auxílio da propaganda, atingir o público e produzir como reação o

comportamento esperado. Para alcançar seus desígnios, o propagandista tem como

guia, exatamente como aponta a maior parte da bibliografia de teorias da

comunicação, a sinalização do esquema estímulo-resposta behaviorista (o

behaviorismo social de Mead) [...] (CARVALHO, 2012, p. 199).

No trabalho da mesma autora (2012), há também a indicação de que, embora a maior

parte das investigações de Lasswell tenha sido centralizada pela propaganda, ele realizou a

transição de “propaganda” para “comunicação”:

Ao optar pelo uso da palavra comunicação, Lasswell primeiro amplia o escopo de

atuação da Divisão Experimental de Comunicação em Tempos de Guerra e acaba,

ainda que de forma não muito intencional, congregando as diversas vertentes de

pesquisas que se avolumavam desde o início do século XX tendo como objeto os

processos de comunicação de massa. Em segundo lugar, ao agrupar essas diferentes

pesquisas sob uma única insígnia, força-se a reflexão sobre o próprio termo. E, se

Lasswell havia tentado desenvolver uma teoria da propaganda, a designação agora

concebida pela Divisão Experimental para Comunicação em Tempos de Guerra traz

a necessidade de uma teoria da comunicação também. O que antes se encontrava

disperso, começa a ser agrupado (CARVALHO, 2012, p. 212).

O chamado modelo lasswelliano da comunicação, apesar de utilizado pelo pesquisador

em seus trabalhos para o governo norte-americano, só passou a configurar como circunscrito

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no campo científico a partir do artigo A estrutura e a função da sociedade, publicado em 1948

(CARVALHO, 2012).

Cabe dizer que nesse período, as pesquisas de outros estudiosos como, por exemplo,

Paul Lazarsfeld, já estavam sendo desenvolvidas e, portanto, neste artigo já se percebe alguns

refinamentos que justificam a noção de superação da agulha hipodérmica pelo modelo,

afirmada por Wolf (2008).

Neste ponto cabe já inserir a estrutura teórico-conceitual extraída a partir dos resultados

apresentados no capítulo anterior.

FIGURA 6 – Estrutura teórico-conceitual em Lasswell

Fonte: o próprio autor

Como observado na descrição e análise em nível metódico-técnico, dos termos

especializados e que enfatizam as questões sobre as quais as análises podem se subdividir,

“efeito” é o que menos aparece no texto, estando restrito basicamente à apresentação do modelo,

quando se esclarece que “[...] Se for o caso do impacto sobre as audiências, o problema será de

análise de efeitos” (LASSWELL, 1989, p. 105). Assim, não há qualquer argumento no texto

que autorize a aproximação do modelo lasswelliano apresentado no artigo (1989) com efeitos

em nível conceitual, seja para defendê-lo ou para refutá-lo.

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Dessa maneira, a superação percebida por Wolf (2008), tem a ver com o afastamento da

crença de que as configurações das mensagens e dos meios são suficientes para determinar

ações da audiência, mas não necessariamente implica no abandono das noções funcionais e da

abordagem behaviorista, o que resulta na manutenção do Objeto-modelo “Entrada → Saída”.

O que cabe novamente ressaltar, é que esse Objeto-modelo costuma caracterizar os períodos

incipientes das teorizações, quando ainda não se tem disponíveis as teorias com maior

capacidade explicativa (BUNGE, 2013).

FIGURA 7 – Objeto-modelo de caixa negra

Fonte: o próprio autor

O não esclarecimento do teor conceitual também se aplica aos outros elementos, isto é,

“controle”, “audiência”, “conteúdo” e “meios”, considerando-se que meio é o termo

especializado que mais é utilizado pelo autor (1989).

Embora exista uma relação entre “meio”, “comunicação” e “mensagem” (conteúdo), as

funções da comunicação na sociedade, que são a ênfase do artigo (1989), nem sempre estão

fundamentadas nos “meios”. Isso porque a partir do uso extensional que Lasswell (1989) faz

do termo (como “rádio” e “imprensa”, por exemplo) eles podem ser entendidos como atrelados

a algum tipo de tecnologia ou controle determinado (canais centrais de comunicação), visto que

uma de suas afirmações é de que:

[...] a maior parte das mensagens inerentes a qualquer Estado não envolve os canais

centrais de comunicação. Ocorrem dentro das famílias, vizinhanças, lojas, grupos de

campo e outros contextos locais. A maior parte do processo educacional é conduzido

da mesma forma (LASSWELL, 1989, p. 109).

Outra utilização do termo “meio” o relaciona a meio ambiente, tendo o uso indicado

especialmente através da analogia com outros animais. Meio ambiente interno é composto pela

sociedade e os indivíduos que a integram e o meio externo é composto pelas condições que

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constituem algum tipo de obstáculo ou que oferecem riscos a manutenção da sociedade

democrática64 (LASSWELL, 1989).

Apesar de Lasswell (1989) não apresentar associações relacionais constitutivas de teor

conceitual ou descritivas dos critérios de aceitação para os elementos que sustentam os estudos

científicos da Comunicação65, ele aponta para alguns componentes que estão localizados em

interseções das áreas de estudo.

Ele diferencia, por exemplo, “manipuladores” e “manejadores” como indivíduos ou

instituições que fazem parte de “controle” de formas diferentes: os primeiros têm participação

nos meios, mas também na elaboração do conteúdo e na atribuição de sentido (extensionalmente

trata-se, por exemplo, de editores de jornais e propagandistas), enquanto os últimos não têm

participação na elaboração do conteúdo, de modo que transmitem “[...] aos seus destinatários

mensagens que não entram com outras modificações além daquelas de caráter puramente

acidental [...]” (LASSWELL, 1989, p. 110), a exemplo de impressores e distribuidores de

livros66.

De outra parte, entre “audiência” e “conteúdo”, o autor (1989) destaca o “público”,

distinguindo-o de outros grupos que podem ser entendidos como parte da “audiência”,

especificamente dos que compõem os “agregados de atenção” e “os grupos de sentimento”.

Para o autor (1989, p. 115) “[...] para pertencer a um agregado de atenção basta ter

símbolos de referência comuns [...]” a uma determinada comunicação. A diferença com o

público é que este “[...] desenvolve a expectativa de que aquilo que ele quer pode afetar a

condição da vida pública”. Já no caso dos “grupos de sentimento”67:

[...] Durante uma guerra ou crise bélica, por exemplo, os habitantes de uma região

são inexoravelmente levados a impor certas orientações da vida pública a outros.

Dado que o resultado do conflito depende da violência, e não do debate, não há um

público sob tais condições. O que há é uma rede de grupos de sentimento, que atuam

como multidões e, portanto, não toleram dissenção (LASSWELL, 1989, p. 116).

64 Não se entra aqui no mérito da suficiência do que Lasswell (1989) considera sociedade democrática, mas apenas

da exposição das relações propostas no texto. 65 Nas palavras do autor (1989). 66 Note-se aí que ainda que o autor (1989) não realize esforço conceitual relativo a “Meio”, a aplicação do

designador às instituições/empresas de comunicação não cabe, pois elas estariam na interseção que o implica, mas

não corresponde a “Meio” em si. 67 Não se trata exatamente de “agendamento”, que é formalizado como hipótese a partir de 1972, com os estudos

de McCombs e Shaw.

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Nesse sentido, o “público” é a parte da audiência que é relevante no estudo do processo

comunicacional considerando-se a função da comunicação na sociedade, posto que se trata

também de informar, sem ocultações ou distorções, isto é, de “esclarecer”68.

O último componente intersecional é o único que diz respeito a todos os elementos do

estudo científico da comunicação, as “estruturas de atenção”:

Se concebermos o processo de atenção mundial como uma série de estruturas de

atenção (attention frames), é possível descrever-se a proporção em que um conteúdo

comparável atinge indivíduos e grupos. Podemos procurar o ponto em que a

“condutibilidade” deixa de ocorrer, e podemos verificar a margem entre a

“condutibilidade total” e a “condutibilidade mínima” [...] (LASSWELL, 1989, p.

108).

Lasswell (1989) não aponta elementos de interseção que relacionem exclusivamente

Controle-Conteúdo-Audiência ou Controle-Meio-Audiência. Decorre-se daí que, embora o

termo “meio” seja quantitativamente mais significativo, se trata de atribuir a ele mais de um

significado especializado em associação a outros termos: “meio ambiente” e “meios de

comunicação”.

Estruturalmente, para a conformação da proposta, Meio-Conteúdo são os elementos que

fundamentam os componentes intersecionais relevantes, isto é, aqueles que o autor (1989)

identifica. A diferença é que sobre Conteúdo, Lasswell (1989, p. 106) propõe que para sua

análise “[...] subdividimos o campo no estudo do significado e no do estilo, o primeiro

referindo-se à mensagem e o segundo à disposição dos elementos que compõem a mensagem”.

Já o Meio de Comunicação é tratado como um recorte do Objeto empírico, ou melhor,

como elemento no qual é possível identificar, pelo menos, o conteúdo da comunicação.

Entretanto, não é possível asseverar que para o autor (1989) se trata, necessariamente, do que

se designa geralmente como “Meios de Comunicação de Massa”, porque ele dá exemplos de

circulação dos conteúdos através da oralidade. Não há qualquer critério mínimo, exceto de

viabilização da “comunicação” (independentemente do que isso possa significar) entre

indivíduos e grupos.

Considere-se também que toda a formulação de Lasswell (1989) se dá a partir da função

da comunicação na sociedade, sendo tal função relacionada prioritariamente às questões

políticas, em geral contextualizadas pelos conflitos de guerra.

68 Novamente, Lasswell (1989) vincula o esclarecimento à opinião pública dentro de uma teoria democrática, sobre

a qual não há mais detalhes.

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Sintetizada a estrutura teórico-conceitual, passa-se para análise dessa estrutura em

relação ao Objeto-modelo utilizado para abordagem em Lasswell (1989).

Retoma-se Wolf (2008), segundo o qual a Agulha Hipodérmica elaborada pela

psicologia behaviorista é entendida da seguinte maneira:

Seu objetivo é estudar o comportamento humano com os mesmos métodos da

experiência e da observação, típicos das ciências naturais e biológicas. O sistema de

ação que distingue o comportamento humano deve ser decomposto pela ciência

psicológica em unidades compreensíveis, distinguíveis e observáveis. Na relação

complexa entre organismo e ambiente, o elemento crucial é representado pelo

estímulo: este compreende os objetos e as condições externas ao sujeito, que a partir

dele produzem uma resposta [...] (WOLF, 2008, p. 9-10).

Assim, tem-se que a perspectiva “Estímulo → Resposta” é coerente com o Objeto-

modelo de caixa negra, que por sua vez é:

[...] O procedimento natural – que não é, entretanto, o curso histórico – é o de

começar pelo objeto-modelo mais simples, desprovido de estrutura, depois

acrescentar-lhe uma estrutura simples (por exemplo, dividindo a caixa original em

duas) e prosseguir neste processo de complicação até conseguir explicar tudo o que

se quer [...] (BUNGE, 2013, p. 18).

Infere-se então que a Agulha Hipodérmica, comprometida com o Objeto-modelo de

caixa negra, atenta-se para as variáveis externas e globais do processo de comunicação, que

sejam direta ou indiretamente mensuráveis. Isso porque o Objeto-modelo não é um constructo

científico isolado, especialmente no que tange a passagem da caixa negra para a caixa

translúcida:

Um objeto-modelo, mesmo engenhoso, servirá para pouca coisa, a menos que seja

encaixado em um corpo de ideias no seio do qual se possam estabelecer relações

dedutivas. É preciso pois, como já dissemos, tecer uma rede de fórmulas em torno

de cada objeto-modelo. Se este corpo de ideias for coerente, constituirá um modelo

teórico de indivíduos concretos r do tipo R. Em outros termos, um modelo teórico de

um objeto r suposto real é uma teoria específica Ts com respeito a r, e esta teoria é

constituída por uma teoria, geral Tg enriquecida de um objeto-modelo m ^ r

(BUNGE, 2013, p. 24).

Isso significa que não é o objeto-modelo, mas sim o modelo teórico específico que

produz os esclarecimentos acerca dos mecanismos internos. A Teoria geral pode acolher as

diversas Teorias específicas porque, fundamentada pelo Princípio da Interdisciplinaridade, quer

dizer que as elaborações derivadas do objeto-modelo e do modelo teórico particular não podem

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ser herméticas e/ou contradizer o conhecimento científico estabilizado, sem apontar

diretamente a refutação desse conhecimento (BUNGE, 2012 e 2013; POPPER, 2013).

O que o modelo teórico da psicologia behaviorista faz é evitar referências aos estados

mentais e aos mecanismos fisiológicos de modo que, não apenas restringe o nível metódico-

técnico analítico aos efeitos mensuráveis através do comportamento, como suas proposições

contradizem (ao menos indiretamente) o conhecimento científico estabilizado a respeito dos

mecanismos ignorados.

É nessa perspectiva que se compreende e concorda com o entendimento de que:

[...] se para a teoria behaviorista o indivíduo submetido aos estímulos da propaganda

podia apenas responder sem resistência, os desenvolvimentos subsequentes da

communication research convergem na explicitação de que a influência das

comunicações de massa é mediada pelas resistências que os destinatários ativam de

várias formas. E, no entanto, o esquema lasswelliano da comunicação conseguiu

oferecer-se como paradigma para essas duas tendências de pesquisa opostas. Ou

melhor, apresentou-se aproximadamente ao final do período de maior êxito da teoria

hipodérmica, quando já se manifestavam os motivos que deviam conduzir à sua

superação (WOLF, 2008, p. 14-15).

A discordância aqui se refere ao entendimento de que o modelo lasswelliano é um

Paradigma para as outras propostas em comunicação, sejam as subsequentes ou a antecessora

Agulha Hipodérmica.

O modelo lasswelliano seria um modelo teórico específico que se refere diretamente e

acaba por organizar um objeto-modelo também de caixa negra que, oferecendo algumas

explicações ainda ambíguas em função da não expressão do teor conceitual, se dirige ao

aprofundamento (não oferecido pela Agulha Hipodérmica) dos elementos que centralizam

variáveis intervenientes:

[...] podemos afirmar que as teorias das caixas negras não podem deixar de conter

variáveis intervenientes, i. é, variáveis que medeiam entre a entrada e a saída; teorias

da caixa translúcida, por outro lado, contêm a mais constructos hipotéticos, i. é,

variáveis que se referem a entidades não-observadas, eventos e propriedades

(BUNGE, 2013, p. 71).

Concorda-se também, com exceção da aplicação do termo paradigma, com a

compreensão de que “[...] no entanto, quando a teoria hipodérmica deixou de ser sobretudo um

presságio e uma descrição de efeitos temidos para se transformar num paradigma concreto de

pesquisa seus próprios pressupostos deram lugar a resultados que contradiziam sua elaboração

fundamental” (WOLF, 2008, p. 16).

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As refutações oferecidas a partir do objeto-modelo e do modelo teórico lasswelliano

mencionadas por Wolf (2008) dizem respeito à conexão direta entre circulação da mensagem e

comportamento da audiência, bem como exclusividade dos efeitos sobre a audiência, não

resultando no deslocamento da caixa negra para a caixa translúcida.

Mas é preciso também considerar que sendo o Estímulo e a Resposta concebidos como

variáveis exógenas, então o Estímulo – no objeto-modelo intrínseco ao modelo lasswelliano –

diz respeito às condições do meio ambiente político-social, em uma perspectiva externa ou

interna desse ambiente. A Resposta é, por conseguinte, o cumprimento das funções da

comunicação na Sociedade.

Enquanto objeto-modelo de caixa preta, é coerente que não sejam apresentadas

associações de teor conceitual ou de critérios de aplicação terminológica, na medida em que a

comunicação e seus elementos são, em si, recortes do objeto empírico, sendo operacionalizados

como variáveis intervenientes e não como objeto de constructos hipotéticos (BUNGE, 2013): é

um modelo que tem como interesse a Sociedade, particularmente em sua dimensão sócio-

política, indiretamente mensurável pela comunicação.

Acentua-se que essa análise estritamente teórico-epistemológica em observação a

aspectos especificamente endógenos não propõe que não há esclarecimentos pertinentes ao

domínio da Comunicação. Diz respeito, particularmente, ao que se pretende como significação

teórica dos resultados da análise metódico-técnica, com o objetivo de viabilizar a identificação

de delineamentos de “Meio de Comunicação”.

Reforçando o recorte de execução do trabalho, se faz necessário reconhecer que o debate

a respeito do esclarecimento de variáveis intervenientes ou de construções hipotéticas pode ser

estendido aos outros trabalhos que compõem a Escola Americana e outras vertentes. Entretanto,

em observação a exequibilidade do trabalho, mantém-se a ênfase nos textos originais

selecionados, com a adição de considerações que se mostraram diretamente relevantes à

elaboração da análise teórico-epistemológica.

Tendo isso esclarecido, segue-se para o texto de Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1955),

realizando algumas observações a respeito de Lazarsfeld especificamente.

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2. The people’s choice: how the voter makes up his mind in a presidential

campaign

Paul Lazarsfeld é o autor mais frequentemente mencionado nas três obras sobre Teorias

da Comunicação que orientaram a seleção da unidade de pesquisa de textos originais, o que

motivou questionamentos sobre qual seria a razão disso.

Sociólogo austríaco que emigrou para os Estados Unidos nos anos 1930, incluído no

grupo dos “pais fundadores da comunicação” (MATTELART; MATTELART, 2005, p. 47)69,

bem como indicado como um dos responsáveis pelo fato70 de “nos anos 40 e 50, a história da

sociologia funcionalista da mídia situa, como inovação, a descoberta de um elemento

intermediário entre o ponto inicial e o ponto final do processo de comunicação [...]”.

Estando não apenas inserido na Escola Americana, como também tendo desenvolvido

trabalhos para o governo norte-americano próximo à Lasswell (CARVALHO, 2012),

Lazarsfeld é uma figura que articula ainda o diálogo com outro autor incluído nesta unidade de

pesquisa, Adorno:

Musicólogo e filósofo, Adorno responde ao convite de Paul Lazarsfeld, que lhe

oferece colaboração em um programa de pesquisas sobre os efeitos culturais dos

programas musicais no rádio, no âmbito do Princeton Office of Radio Research, uma

das primeiras instituições permanentes de análise dos meios de comunicação. Esse

primeiro projeto de pesquisa em solo americano é financiado pela Fundação

Rockefeller. Lazarsfeld, por meio dessa colaboração, espera “desenvolver uma

convergência entre a teoria europeia e o empirismo americano”. Espera que a

“pesquisa crítica” “revitalize” a “pesquisa administrativa”.

Essa esperança será frustrada. A colaboração termina em 1939. A oposição entre as

duas mentalidades revela-se insuperável. Adorno recusa dobrar-se à lista de questões

proposta pelo financiador, que, em sua opinião, encerra o objeto de pesquisa nos

limites do sistema de rádio comercial em vigor nos Estados Unidos e impede a

“análise desse sistema, suas consequências culturais e sociológicas e seus

pressupostos sociais e econômicos”. Em suma, uma lista que deixa em segundo

plano o “quem”, o “como” e o “porquê”. “Quando fui confrontado”, dirá Adorno

mais tarde, “à exigência de ‘medir a cultura’ vi que a cultura deveria precisamente

ser essa condição que exclui uma mentalidade capaz de medi-la” [...]

(MATTELART; MATTELART, 2005, p. 75-76).

Em relação à estrutura teórico-conceitual exposta no texto analisado, demonstra-se um

primeiro entendimento que busca colocá-la em relação ao que foi identificado em Lasswell

(1989).

69 Convém indicar que as críticas a visão orientada pelos “pais fundadores” extrapola o recorte deste trabalho, na

medida em que dois deles (Kurt Lewin e Carl Hovland), além do próprio Wilbur Schramm, propositor dessa

clivagem, não foram incluídos na unidade de pesquisa. 70 Em função do texto aqui incluído, mas também do escrito em coautoria com Elihu Katz, Personal Influence: the

part played by people in the flow of mass communications (1965).

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153

Isso porque, como explicado no capítulo anterior, esse texto tem uma característica

peculiar em relação aos outros originais: a relevância quantitativa de inúmeros termos é oriunda

do seu uso como descritor da delimitação empírica do trabalho dos autores (1948), vinculada à

campanha presidencial norte-americana de 1940 (Roosevelt e Willkie), que teve seu período de

coleta entre os meses de maio e novembro, centralizada na região do Condado de Erie (Ohio).

FIGURA 8 – Primeira estrutura teórico-conceitual em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet

Fonte: o próprio autor

Embora os autores (1948) não indiquem formalmente “controle”, “conteúdo” e

“audiência” como Lasswell (1989), entende-se que em uma primeira apreensão é possível

apontar que “controle” e “conteúdo” estão presentes, conquanto aglutinados como “meio”.

A análise metódica-técnica evidenciou que o termo “meio” é utilizado por Lazarsfeld,

Berelson e Gaudet (1948) para distinguir a “comunicação” que se dá em nível interpessoal e

que se relaciona com “líder de opinião” daquela dos “meios”, cujas extensões são “rádio”,

“jornal” e “revista”, e estão vinculadas às mensagens dos candidatos.

A “audiência” corresponderia aos indivíduos que constituem os grupos que também

delimitam o objeto empírico, o eleitorado. Nesse sentido, dentro de uma ideia ampla de

sociedade (“audiência”), os autores (1948) trabalham na verdade com a ideia de “grupos” dos

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154

quais os eleitores fazem parte e através deles são observados fatores socioeconômicos71 que os

enquadram.

Uma parte específica do eleitorado, a saber, indivíduos interessados na eleição

presidencial e nas comunicações através dos “meios”, bem como com opinião razoavelmente

formada são denominados “líderes de opinião”. Eles exerceriam uma “influência” diferente dos

“meios” sobre as outras pessoas do grupo que adotariam uma determinada opinião,

materializada pelo voto a partir da inter-relação entre: fatores socioeconômicos, influência do

grupo e do líder e, de maneira mais reduzida, influência dos meios.

Esse entendimento resultou na formulação de uma outra estrutura relativa ao texto dos

autores (1948), colocada abaixo.

FIGURA 9 – Segunda estrutura teórico-conceitual em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet

Fonte: o próprio autor

Em uma compreensão similar, Wolf (2008) sintetiza o estudo e o relaciona não apenas

com o “Líder de Opinião”, mas também com a mudança em relação ao fluxo comunicacional:

71 Que na verdade são somados a outros indícios de posicionamento social geral do indivíduo, dos quais os autores

(1948) destacam ainda a região de residência e religião.

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155

A pesquisa se articula com base em problemas como o papel do status

socioeconômico, da religião a que se pertence, faixa etária e de outros fatores

sociológicos na predisposição das orientações de voto, ou na correlação entre o grau

de interesse, de motivação, de participação na campanha eleitoral e o grau de

exposição a ela reservada. Os mesmos resultados pelos quais este trabalho

permaneceu na história da communication research — ou seja, a "descoberta" dos

líderes de opinião e o fluxo de comunicação em dois níveis — são elementos parciais

dentro de fenômenos mais vastos: mais precisamente, ao se articular (juntamente

com todas as variáveis socioeconômico-culturais precedentes) o grau de participação

e de envolvimento na campanha, observa-se que o grau máximo de interesse e de

conhecimento a respeito do tema é apresentado por alguns indivíduos [...] Estes

representam a parte da opinião pública que tenta influenciar o resto do eleitorado e

que mostra uma reação e uma resposta mais atentas aos eventos da campanha

presidencial (WOLF, 2008, p. 37-38).

Tal compreensão em Wolf (2008) é somada à sua distinção gráfica entre a Teoria

Hipodérmica e a alteração relativa ao fluxo comunicacional:

FIGURA 10 – Oposição Teoria Hipodérmica – Two-step flow

Fonte: Wolf (2008, p. 39)

Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948) explicam que a Liderança de opinião é um dos

mecanismos pelos quais as atitudes de grupos e, por conseguinte, as individuais (em suma, a

Opinião Pública) são formadas. Nas palavras dos próprios autores incluídas no prefácio da

segunda edição:

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[...] Somos levados, em primeiro lugar, a estudar os líderes de opinião. Em cada

grupo social há alguns indivíduos que são particularmente ativos e articulados. Eles

são mais sensíveis do que outros aos interesses de seu grupo, e mais ansiosos para se

expressar sobre questões importantes. É relativamente fácil localizar esses

indivíduos e, portanto, estudar como eles diferem da maioria de seu grupo.

No presente estudo, descobrimos que uma das funções dos líderes de opinião é fazer

a mediação entre os meios de comunicação de massa e outras pessoas em seus

grupos. Supõe-se comumente que os indivíduos obtenham suas informações

diretamente de jornais, rádio e outros meios de comunicação. Nossas descobertas,

entretanto, não confirmaram isso. A maioria das pessoas adquiriu muita da sua

informação e muitas das suas ideias através de contatos pessoais com os líderes de

opinião em seus grupos. Esses últimos indivíduos, por sua vez, se expunham

relativamente mais do que outros aos meios de comunicação de massa. O fluxo de

informações em duas etapas é de óbvia importância prática para qualquer estudo de

propaganda.

Aliás, o conceito de liderança de opinião não é novo. Nos muitos estudos de "poder",

"influência" e "liderança", somos lembrados de que cada comunidade pode apontar

para homens e mulheres importantes que definem as modas e são imitados por

outros. Mas nossa investigação sugere que esse conceito familiar deve ser

modificado. Pois descobrimos que a liderança de opinião não opera apenas

verticalmente, de cima para baixo, mas também horizontalmente: há líderes de

opinião em cada caminhada de vida (LAZARSFELD; BERELSON; GAUDET,

1948, p. p. xxii-xxiii, tradução nossa)72.

Comparando-se a estrutura teórico-conceitual em Lasswell (1989) e em Lazarsfeld,

Berelson e Gaudet (1948), há uma alteração no elemento intersecional de maior relevância que

em Lasswell (1989) incluía as Estruturas de Atenção:

Se concebermos o processo de atenção mundial como uma série de estruturas de

atenção (attention frames), é possível descrever-se a proporção em que um conteúdo

comparável atinge indivíduos e grupos. Podemos procurar o ponto em que a

“condutibilidade” deixa de ocorrer, e podemos verificar a margem entre a

“condutibilidade total” e a “condutibilidade mínima” [...] (LASSWELL, 1989, p.

108).

72 No original: […] We are led, first of all, to study opinion leaders. In every social group there are some individuals

who are particularly active and articulate. They are more sensitive than others to the interests of their group, and

more anxious to express themselves on important issues. It is relatively easy to locate these individuals, and thus

to study how they differ from the majority of their group.

In the present study we found that one of the functions of the opinion leaders is to mediate between the mass media

and other people in their groups. It is commonly assumed that individuals obtain their information directly from

newspapers, radio, and other media. Our findings, however, did not bear this out. The majority of people acquired

much of their information and many of their ideas through personal contacts with the opinion leaders in their

groups. These latter individuals, in turn, exposed themselves relatively more than others to the mass media. The

two-step flow of information is of obvious practical importance for any study of propaganda.

The concept of opinion leadership is, incidentally, not a new one. In the many studies of "power," "influence," and

"leadership," we are reminded that every community can point to important men and women who set the fashions

and are imitated by others. But our investigation suggests that this familiar concept must be modified. For we

found that opinion leadership does not operate only vertically, from top to bottom, but also horizontally: there are

opinion leaders in every walk of life (LAZARSFELD; BERELSON; GAUDET, 1948, p. p. xxii-xxiii).

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Observa-se que tanto quanto na explicação fornecida por Lasswell (1989) a respeito do

processo de atenção mundial, a explanação sobre o Líder de Opinião é funcional, pois uma vez

que diz respeito a sua função no fluxo comunicacional. Ambos têm relação com o fluxo, de

modo que em nenhum dos textos ficam estabelecidos limites de interferência. Em resumo,

admitem inúmeras possibilidades, podendo se tratar de expansão, interrupção, inflexão etc. do

fluxo comunicacional, bem como não excluem a chance de interferência da composição do

conteúdo em si.

A diferença é que, os Líderes de opinião são parte da audiência, isto é, não correspondem

a estruturas institucionais, e sua influência acontece prioritariamente no domínio da

comunicação interpessoal.

Não se trata neste caso de duas faces de um mesmo processo ou de uma mesma

dimensão comunicacional. Refere-se a inter-relação entre dois sistemas comunicacionais

diferentes, de natureza (ainda que não explicitadas exaustivamente) distintas.

Também é preciso salientar que:

De modo geral, portanto, a teoria da mídia ligada à abordagem sociológica e empírica

sustenta que a eficácia da comunicação de massa é largamente vinculada a e

dependente de processos de comunicação internos à estrutura social em que vive o

indivíduo e que não são efetuados pela mídia (WOLF, 2008, p. 43, grifo do autor).

Concorda-se com Wolf (2008) no sentido de que em comparação com o modelo teórico

lasswelliano, desloca-se o interesse da sociedade como um todo para os grupos, em uma

abordagem ainda com prevalência sociológica, apesar de implicar também opções metódico-

técnicas tipicamente psicológicas.

Então, o objeto-modelo que se pode deduzir da estrutura teórico-conceitual reformulada

a respeito de Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948) e também da distinção gráfica de Wolf

(2008) desloca e/ou refina algumas questões presentes no objeto-modelo lasswelliano.

O Estímulo e a Resposta continuam sendo variáveis exógenas ao processo de

comunicação, dizendo respeito a um processo mais amplo: o de formação da Opinião Pública.

Especificamente no âmbito da Resposta, se trata da formação dessa opinião

considerando-se de modo primordial a inter-relação entre sistemas comunicacionais distintos,

asseverando-se que há proeminência de um deles: o da comunicação interpessoal, onde se

localiza o Líder de opinião.

A resposta é mensurável pela declaração da opinião sobre determinado tema (por

exemplo, campanhas eleitorais) ou pela ação propriamente (voto).

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Ainda tendo em vista a noção de objeto-modelo de caixa negra (BUNGE, 2013), há

outros aspectos que precisam ser considerados: em primeiro lugar, uma interpretação que

focaliza a “diminuição” da influência dos meios na estrutura teórico-conceitual em Lazarsfeld,

Berelson e Gaudet (1948) não é pertinente porque se trataria neste caso de adicionar uma etapa

ao objeto-modelo lasswelliano.

Acima de tudo, não colaboraria para a centralização teórica da principal questão trazida

pelos autores (1948), que é a inter-relação entre comunicação dos meios e comunicação

interpessoal.

Em segundo lugar, embora o modelo lasswelliano seja um ponto de partida, é preciso

avaliar a possível interpretação de que seja um outro objeto-modelo, porém passível de

fundamentar inferências que coloquem ambos em articulação e avaliação. Ou seja, apesar das

diferenças em contornos e particularidades das teorias específicas, não há impossibilidade de

diálogo entre elas.

Uma outra possibilidade é considerar que o objeto-modelo continua o mesmo

(resumidamente, Emissor → Mensagem → Receptor), adicionando-se apenas que é aceitável a

inter-relação entre diferentes processos comunicacionais, sendo admissível seu recorte por

diferentes objetos empíricos.

Essa última opção interpretativa apresenta-se aqui como mais factível na medida em que

se identifica articulação possível entre os dois modelos. Nesse raciocínio, os modelos se

diferenciam no plano do desenvolvimento teórico, no caso de Lazarsfeld, Berelson e Gaudet

(1948) possibilitado parcialmente pelas evidências empíricas.

Em ambos os modelos teóricos, coincidem o tratamento temático de “meio”

(evidenciado pelo uso de caráter extensionalista) e a clivagem sociológica (não obstante no

primeiro texto seja Sociedade e no segundo sejam grupos específicos compreendidos a partir

de índices socioeconômicos).

Além disso, o que poderia ser questionado é a capacidade que o modelo teórico-

conceitual fundamentalmente intrínseco em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948) teria de

começar a deslocar o objeto-modelo da caixa negra para caixa translúcida.

Afirma-se aqui que, tendo em vista particularmente o texto adicionado na unidade de

pesquisa, embora se possa aferir que há possibilidade de diminuição da opacidade, não há

razões para asseverar que ela se realiza já nesta obra. Entretanto, cabe acentuar que em relação

a tal esclarecimento específico, a pesquisa aqui realizada possui uma limitação oriunda da

delimitação, do Problema estipulado e do Objetivo. Portanto, perseguir tal elucidação

demandaria o desvio da ênfase proposta e riscos à exequibilidade da investigação.

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3. Dialética do esclarecimento

No levantamento baseado nas principais referências sobre Teorias da Comunicação,

assim como Lazarsfeld, Adorno é frequentemente mencionado, especialmente relacionado ao

texto que foi selecionado para compor a unidade de pesquisa e escrito em coautoria com

Horkheimer.

A nomeação de Horkheimer em 1930, para o cargo de diretor do Instituto para Pesquisa

Social da Universidade de Frankfurt, teria sido determinante para a conformação da identidade

teórica-epistemológica do grupo como “[...] uma tentativa de consolidar a atitude crítica em

relação à ciência e à cultura, com a proposta política de uma reorganização racional da

sociedade, em condição de superar a crise da razão” (WOLF, 2008, p. 73).

Dialética do esclarecimento começou a ser escrito em 1942, sendo publicado em 1947,

antes de Dialética negativa, que data de 1966 e que, resumidamente73, retomando questões da

Dialética do esclarecimento, enfatiza um posicionamento epistemológico de proeminência da

filosofia, do modelo ensaístico e outras características que o aproximam, no entendimento aqui

proposto, do ceticismo.

Considerando as delimitações desta investigação, entre as duas obras chama a atenção

um debate do qual Adorno participou e que foi designado, equivocadamente, como “sobre o

positivismo” para apontar que se tratava das ideias/participação de Popper74. Ao criticar a

proposta de Popper, Adorno (1973) insistentemente não se dirigiu aos aspectos centrais da

propositura criticada, o que resultou em uma digressão de Popper (1973) às questões mais

fundamentais da sua abordagem epistemológica75. Dessa forma, a leitura realizada não

contribui nesta pesquisa para asseverar se o ceticismo presente em Dialética do esclarecimento

já é uma posição epistemológica bem demarcada em relação ao método hipotético-dedutivo ou

se está mais centrada na dialética, em termos ontológicos:

73 Resumidamente, porque o escrutínio dessa obra especificamente não foi incluído nesta investigação e, portanto,

não pode ser colocado em questão. 74 O equívoco que vincula Popper ao positivismo aparece nas exposições de Adorno em A disputa do positivismo

na sociologia alemã e nas caracterizações de Ciência que, no domínio da Comunicação, estão prioritariamente

vinculadas à ideia de Interdisciplinaridade como superação da disciplinaridade ou da Ciência. 75 Na compreensão aqui proposta a recusa de Adorno em debater alguns aspectos básicos da natureza dos métodos

não materializou a proposta da incomensurabilidade, em primeiro lugar porque mesmo as críticas que faz para

além do que foi proposto por Popper indicam sua compreensão (ainda que se suponha ter sido parcial) dos

problemas metodológicos apontados pelo seu par. Em segundo lugar, asseverar que são posições incomensuráveis

demandaria uma recolocação do arranjo de Popper na análise, posto que as suas propostas, embora constantemente

criticadas pela posição da Interdisciplinaridade são também frequentemente ignoradas/desconhecidas.

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DIALÉTICA – a. Na filosofia antiga e medieval é um sinônimo da lógica ou da arte

da argumentação. A dialética, no hegelianismo e no marxismo, é algumas vezes

encarada como um método e em outras, como uma filosofia. A primeira

interpretação é equivocada, porque nem Hegel nem Marx nem seus seguidores

propuseram qualquer método propriamente dito (ou procedimento padronizado) com

gosto de dialética. A dialética é uma filosofia e, mais precisamente, uma ontologia.

A ética e a epistemologia dialéticas não existem [...] c. Ontologia dialética – Esta

concentra as assim chamadas três leis da dialética, estabelecidas por Hegel e

reformuladas por Engels e Lênin. Elas são: (1) cada coisa seria a união de opostos;

(2) cada mudança origina-se em uma oposição (ou “contradição”); (3) qualidade e

quantidade mudam uma na outra [...] (BUNGE, 2012, p. 101-102).

Retomando o que foi demonstrado no capítulo anterior, o termo “dialética” representa

apenas cerca de 1,5% dos termos especializados do texto, tendo em vista que o trecho que mais

se aproxima do teor conceitual foi compreendido como descumprimento do princípio do

terceiro excluído e, por isso, é aqui retomado:

[...] Quando uma árvore é considerada não mais simplesmente como árvore, mas

como testemunho de uma outra coisa, como sede do mana, a linguagem exprime a

contradição de que uma coisa seria ao mesmo tempo ela mesma e outra coisa

diferente dela, idêntica e não idêntica. Através da divindade, a linguagem passa da

tautologia à linguagem. O conceito, que se costuma definir como a unidade

característica do que está nele subsumido, já era desde o início o produto do

pensamento dialético, no qual cada coisa só é o que ela é tornando-se aquilo que ela

não é (ADORNO; HORKHEIMER, 1969, p. 29).

Considerando a proposta interpretativa de Bunge (2012), sugere-se a leitura de que

Dialética diz respeito à contradição do conjunto de elementos que podem ser agrupados sob o

termo “esclarecimento” no sentido de: (1) intercambiar características de objetos distintos,

homogeneizando-os; (2) se auto localizar como oposição ao “mito” e a “dominação” e ser

localizado, pelos autores (1969) como a realização de ambos e refutação da “crítica”; (3) cada

extensão do “esclarecimento” (por exemplo, a técnica, a ciência, a publicidade etc.) provoca

uma mudança que, ao se realizar, propulsiona novos modos de declínio da cultura.

Como explica Rüdiger (2004), os estudiosos da Escola de Frankfurt:

[...] costumam ser designados pura e simplesmente como teóricos da comunicação

pelos especialistas deste campo de conhecimento, coisa que, entretanto, não somente

não foram, como contestariam com vigor, na medida em que, nas poucas vezes que

empregaram o termo, os chamados frankfurtianos rejeitaram a pertinência analítica

da categoria (RÜDIGER, 2004, p. 89).

O termo fundamental é, então, Indústria Cultural, sobre o qual Adorno (1989) esclarece

que:

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Tudo indica que o termo indústria cultural foi empregado pela primeira vez no livro

Dialektik der Aufkärung, que Horkheimer e eu publicamos em 1947, em Amsterdã.

Em nossos esboços tratava-se do problema de cultura de massa. Abandonamos essa

última expressão para substituí-la por “indústria cultural”, a fim de excluir de

antemão a interpretação que agrada aos advogados da coisa; estes pretendem, com

efeito, que se trata de algo como uma cultura surgindo espontaneamente das próprias

massas, em suma, da forma contemporânea de arte popular [...] (ADORNO, 1989,

p. 287).

Dessa maneira, observando os resultados apresentados no capítulo anterior, a opção

interpretativa de Bunge (2012) e os esclarecimentos em Adorno (1989) e Rüdiger (2004), tem-

se a seguinte estrutura:

FIGURA 11 – Estrutura teórico-conceitual em Adorno e Horkheimer

Fonte: O próprio autor

Como elemento intersecional de todo o argumento dos autores (1969), compreende-se

por “Indústria Cultural” um conjunto/sistema de práticas sociais típicas do “esclarecimento”

que, demarcadas por contradições (como, por exemplo, distanciar fisicamente, mas unir/

homogeneizar intelectualmente), realizam o inverso do projeto do “esclarecimento” como

demonstrado na arguição em que “[...] os mitos que caem vítimas do esclarecimento já eram o

produto do próprio esclarecimento. No cálculo científico dos acontecimentos anula-se a conta

que outrora o pensamento dera, nos mitos, dos acontecimentos [...]” (ADORNO;

HORKHEIMER, 1969, p. 7).

Além de realizar o inverso de seu projeto, a forma aplicada do Esclarecimento, a

Indústria Cultural, produz resultados essencialmente negativos sobre ou em razão de: (1) isolar

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os indivíduos da natureza e a pretexto de dominá-la, de fato destruí-la76; (2) degradação da arte,

cuja erosão também reflete na supressão da crítica e (3) aviltamento da individualidade, através

da integração77 vertical das pessoas e das práticas sociais reflexivas/críticas/de resistência pela

lógica de produção.

A árida noção de “Meio” na propositura dos autores (1969) por um lado ajuda no

entendimento de que certamente a Indústria Cultural não pode ser subsumida pelas suas

extensões (técnica, ciência, cinema, jazz etc.) porque é uma dinâmica sociocultural ampla e não,

por exemplo, o conjunto de técnicas ou de empresas ligadas a produção de bens culturais.

Em contrapartida, reforça o que foi exposto por Braga (2011), Marcondes Filho (2011)

e Rüdiger (2004; 2014), sobre o perpassar meramente temático de “comunicação” e “meio”.

Sobre eles é, a partir dos usos em caráter de extensão, sabido que estão submetidos à dinâmica

da Indústria Cultural.

Dessa forma, o interesse dos autores (1969) repousa sobre a identificação dos efeitos

negativos, em especial a degradação da cultura (particularmente da arte e da possibilidade de

crítica) do processo de Esclarecimento, que é materializado pela Indústria Cultural.

A partir dos parâmetros expostos por Bunge (2013), enquanto objeto-modelo, não

obstante seja possível também considerar a complexidade da opção de interpretação teórica

e/ou a justeza ou não da proposta de dialética78 (BUNGE, 2012), ainda não se trata de

Comunicação e/ou Meio.

Por conseguinte, não se trata da transição para a caixa translúcida. Mantendo coerência

com o objeto-modelo, tanto Estímulo quanto Resposta estão localizados em elementos

exógenos de caráter sociocultural.

No modelo teórico, a proposta de visada dialética das dinâmicas da Indústria Cultural é

notadamente a diferença em relação a Lasswell (1989) e Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948),

considerada por alguns estudiosos, a exemplo de Rüdiger (2004 e 2007) e Wolf (2008), como

marca da originalidade dos autores (1969).

Mas como consequência da mesma opção ontológica que propulsiona o aprofundamento

teórico, tem-se o método expositivo que não autoriza a afirmação de que há indireta ou

diretamente uma construção hipotética que reflita no deslocamento da caixa negra para a caixa

76 Questão para a qual os autores (1969) se voltam inúmeras vezes, como evidencia a relevância quantitativa do

termo “natureza”. 77 No sentido de Integrados em oposição aos Apocalípticos. 78 Que se evita aqui colocar em causa, exceto no que produz resultados diretos na dimensão metódica-técnica na

análise empregada nesta investigação.

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translúcida, a despeito das inúmeras exemplificações da dinâmica de operação da Indústria

Cultural.

4. Os meios de comunicação como extensões do homem

Como explicado no início deste capítulo, nas principais referências sobre Teorias da

Comunicação não há concordância sobre a localização da proposta de McLuhan (2005), o que

em uma primeira leitura significa que de alguma forma ela perpassa ou é minimamente

articulável com as outras diversas posições teóricas.

Além da relevância quantitativa do termo “meio”, a diferença aqui observada é o

reconhecimento da importância também qualitativa, isto é, não obstante a noção seja ampla e o

uso em caráter de extensão acentuado, não se caracteriza como tratamento temático:

FIGURA 12 – Estrutura teórico-conceitual em McLuhan

Fonte: O próprio autor

Os termos especializados que foram acentuados para além de “Meio” não possuem

teor conceitual propriamente, eles estão na estrutura teórico-conceitual para dar sentido às duas

proposições principais expostas pelo autor (2005): (1) o meio é a mensagem, e (2) os meios são

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extensões do homem/da percepção. Como início da análise proposta, retoma-se a citação já

mencionada no capítulo anterior:

[...] o exemplo da luz elétrica pode mostrar-se esclarecedor. A luz elétrica é

informação pura. É algo assim como um meio sem mensagem, a menos que seja

usada para explicitar algum anúncio verbal ou algum nome. Este fato, característico

de todos os veículos, significa que o “conteúdo” de qualquer meio ou veículo é

sempre um outro meio ou veículo. O conteúdo da escrita é a fala, assim como a

palavra escrita é o conteúdo da imprensa e a palavra impressa é o conteúdo do

telégrafo [...] Uma pintura abstrata representa uma manifestação direta dos processos

do pensamento criativo, tais como poderiam comparecer nos desenhos de um

computador. Estamos aqui nos referindo, contudo, às consequências psicológicas e

sociais dos desenhos e padrões, na medida em que ampliam ou aceleram os processos

já existentes. Pois a “mensagem” de qualquer meio ou tecnologia é a mudança de

escala, cadência ou padrão que esse meio ou tecnologia introduz nas coisas humanas

[...] (MCLUHAN, 2005, p. 22).

Daí depreende-se que os “Meios” em McLuhan (2005) não têm um critério de

aplicação específico que os diferenciem ou demarquem a equivalência com “Tecnologia”. O

que é possível apreender é que eles produzem efeitos na organização cultural que podem

implicar em alterações tecnológicas, de sociabilidade etc.

É preciso abrir um espaço para a seguinte explicação: secundariamente às proposições

primárias de extensão e prevalência da invisibilidade dos meios, McLuhan (2005) preocupa-se

também em dividi-los entre quentes e frios, o que implica em uma relação entre a quantidade

de sentidos estendidos e o nível de participação no meio. Porém, na fase de análise metódico-

técnica tal distinção não se mostrou relevante, assim como “Aldeia Global”.

Do ponto de vista epistemológico-teórico a inclusão não é entendida como produtiva

por duas razões: em primeiro lugar, não é essencial para o desenvolvimento central das

principais propostas do autor (2005), e em segundo lugar sua abordagem demandaria o

apontamento de tantas objeções a respeito do não esclarecimento e/ou o retorno a aspectos

epistemológicos que colocam em pauta, por exemplo, a questão das percepção e participação

a partir de uma angulação das Ciências Cognitivas, que afetariam a manutenção da

exequibilidade da pesquisa.

Voltando-se para o que é central na citação, está exposta a noção de que “meio é a

mensagem”. Contudo, a opção interpretativa oferecida é oposta: o meio não é a mensagem.

Além de ser distinto da mensagem, o meio (ou suas implicações) é prioritário porque sua

invisibilidade produz como resultado ignorá-lo como objeto que demanda apuração. Isso se dá,

sobretudo, porque ele é propulsionador de modificações individuais e socioculturais:

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[...] “o meio é a mensagem”, porque é o meio que configura e controla a proporção

e a forma das ações e associações humanas. O conteúdo ou usos desses meios são

tão diversos quão ineficazes na estruturação da forma das associações humanas. Na

verdade não deixa de ser bastante típico que o “conteúdo” de qualquer meio nos

cegue para a natureza desse mesmo meio [...] (MCLUHAN, 2005, p. 23).

Em McLuhan (2005), a demanda de investigação do Meio é justificada pelas

consequências negativas da recusa dessa constatação:

[...] Enquanto adotarmos a atitude de Narciso, encarando as extensões de nossos

corpos como se estivessem de fato lá fora, independentes de nós, enfrentaremos os

desafios tecnológicos com a mesma sorte, a mesma pirueta e queda de quem

escorrega numa casca de banana (MCLUHAN, 2005, p. 89).

Também está apoiada na ideia de que ocorrem inflexões a partir da inter-relação de

diferentes meios, cujo fruto é a absorção de um meio por outro, tornando-se o seu conteúdo:

Não percebemos a luz elétrica como meio de comunicação simplesmente porque ela

não possui “conteúdo”. É o quanto basta para exemplificar como se falha no estudo

dos meios e veículos. Somente compreendemos que a luz elétrica é um meio de

comunicação quando utilizada no registro do nome de um produto. O que aqui

notamos, porém, não é a luz, mas o “conteúdo” (ou seja, aquilo que na verdade é um

outro meio [...] (MCLUHAN, 2005, p. 23).

A alteração da organização cultural seria oriunda da modificação nos sentidos dos

indivíduos que, ao terem seu aparato perceptivo estendido pelos meios, passam a perceber

objetos e construções socioculturais (como, por exemplo, as noções de tempo e espaço)79 de

modo diferente no nível da experiência, criando com eles uma específica relação simbólica.

Um exemplo das alterações perceptiva e simbólica produzidas em relação à noção de

espaço está colocado quando o autor (2005, p. 286-287) afirma que “[...] os meios elétricos, no

entanto, antes abolem do que aumentam a dimensão espacial. Graças à eletricidade, em toda a

parte retomamos os contatos pessoa a pessoa como se atuássemos na escala da menor das

aldeias [...]”. Em relação ao tempo, tem-se o seguinte trecho:

79 Não se ignora aqui que a interpretação mais acurada acerca das consequências dos meios sobre as noções de

tempo e espaço implicaria na inclusão da obra de Harold Innis, o que afetaria a viabilidade da investigação como

foi delimitada.

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[...] não há qualquer princípio de causalidade, numa mera sequência. O fato de uma

coisa seguir-se a outra não significa nada. A simples sucessão não conduz a nada, a

não ser à mudança. Assim a eletricidade viria a causar a maior das revoluções, ao

liquidar a sequência e tornar as coisas simultâneas. Com a “velocidade instantânea”,

as causas das coisas vieram novamente à tona da consciência, o que não ocorria com

as coisas em sequência e em consequente concatenação [...] (MCLUHAN, 2005, p.

26).

Retomando a noção de objeto-modelo (BUNGE, 2012 e 2013), tem-se que, apesar da

centralização de McLuhan (2005) no Meio, o esquema lasswelliano é ainda admissível como

objeto-modelo das formulações teóricas de McLuhan (2005). E isto independente do critério

adotado em sua aplicação do termo “meio” nas proposições centrais.

Uma opção interpretativa possível é que as dinâmicas especulativas entre “o meio é a

mensagem” e o “meio é uma extensão do homem” obscurecem e configuram maior opacidade

ao objeto-modelo lasswelliano, ou são uma recuperação do objeto-modelo de Lasswell e de

modelos teóricos de outros autores como propõe, por exemplo, Martín-Barbero (1997, p. 60-

61) ao afirmar que “[...] certamente poder-se-ia afirmar que McLuhan não fez mais que

expressar numa linguagem explicitamente antiteórica a intuição-obsessão que atravessa de

ponta a ponta a reflexão norte-americana dos anos 40-50 sobre a relação cultura/sociedade [...]”.

Essa apreensão é aqui refutada em função de duas questões: em primeiro lugar a raridade

do exame do Meio abstendo-se do tratamento estritamente temático é o primeiro passo de

viabilização do debate epistemológico a respeito de “Meio” e da própria Comunicação.

Sem colocar em pauta a qualidade reflexiva ou a originalidade das premissas

consideradas por McLuhan (2005), importa acentuar que Meio e Comunicação não são logo de

início subsumidos por aspectos macrossociais, sendo naturalizados. Ao contrário, dentre os

poucos aspectos que ficam claros em McLuhan (2005) está, novamente independente do debate

sobre a capacidade explicativa, a problematização do Meio.

Ao produzir interrogações sobre o Meio, a leitura de McLuhan (2005) suscita questões

sobre a relação dele e da Comunicação com a Tecnologia. Tal relação, ao menos nos autores

cuja análise já foi demonstrada (ADORNO; HORKHEIMER, 1969; LASSWELL, 1989;

LAZARSFELD, BERELSON; GAUDET, 1948), está necessariamente suprimida nos próprios

meios (em uma visão que os naturaliza) ou nos aspectos macrossociais.

Assim, mesmo frente às inúmeras críticas que possam ser tecidas a respeito da proposta

isoladamente ou do seu não resultado de destituição do objeto-modelo lasswelliano, é preciso

reconhecer que se constata no mínimo a viabilização de construções hipotéticas incipientes a

respeito dos mecanismos e não mais das implicações exógenas.

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167

Uma outra opção a ser considerada é, a exemplo do que foi exposto também sobre

Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948), a alternativa de se tratar de um mesmo objeto-modelo,

porém com reflexões que exijam a distinção entre, no mínimo, recortes de objetos empíricos

que distingam processos comunicacionais baseados em tecnologia dos não baseados em

tecnologia.

Evidentemente, avançar daí para a reflexão sobre a interseção entre Meio,

Comunicação e Tecnologia, enquanto Objetos de modelos teóricos exigiria a expansão para o

escrutínio teórico também da Tecnologia já que a partir dos autores (ADORNO;

HORKHEIMER, 1969; LASSWELL, 1989; LAZARSFELD, BERELSON; GAUDET, 1948)

tal detalhamento não é viável, bem como não está incluído na delimitação desta pesquisa.

5. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia

Como observado no capítulo anterior, Cultura é quantitativamente, a questão mais

relevante em Martín-Barbero (1997). Isso acontece porque funciona operacionalmente, para

indicar/esclarecer inúmeras noções que não são originalmente formuladas por ele: Cultura

como um processo amplo, culturas particulares (indígenas, por exemplo), Cultura Popular, de

Massa e Hegemônica, Indústria Cultural, Identidade Cultural etc.

Não obstante os usos operacionais sejam importantes ao esforço do autor (1997) de

localizar sua proposta em relação aos outros posicionamentos, em especial a Escola Americana

e a Escola de Frankfurt, a preponderância está na tentativa de intercambiar Comunicação e

Cultura. Conforme argumenta Martín-Barbero (1997):

Assim a comunicação se tornou para nós questão de mediações mais que de meios,

questão de cultura e, portanto, não só de conhecimentos mas de reconhecimento.

Um reconhecimento que foi, de início, operação de deslocamento metodológico para

rever o processo inteiro da comunicação a partir de seu outro lado, o da recepção, o

das resistências que aí têm seu lugar, o da apropriação a partir de seus usos [...]

(MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 16, grifo do autor).

Frente à indicação dos Usos, o autor (1997) também se esforça para se opor não apenas

às duas escolas, mas a noções específicas como, por exemplo, de “Usos e Gratificações”. Esses

aspectos não são analisados aqui, porque desconfigurariam os propósitos da pesquisa.

Respeitando-se os delineamentos desta investigação, aponta-se a auto localização de

Martín-Barbero (1997) em oposição ao frankfurtianos:

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168

Esta é a aposta e o objetivo deste livro: mudar o lugar das perguntas, para tornar

investigáveis os processos de constituição do massivo para além da chantagem

culturalista que os converte inevitavelmente em processos de degradação cultural. E

para isso, investigá-los a partir das mediações e dos sujeitos, isto é, a partir das

articulações entre práticas de comunicação e movimentos sociais [...] (MARTÍN-

BARBERO, 1997, p. 17).

E também a Escola Americana como um todo:

[...] Devemos começar situando o verdadeiro alcance do que procuramos, sua

diferença frente às teorias funcionalistas da recepção: "Não se trata apenas de medir

a distância entre as mensagens e seus efeitos, e sim de construir uma análise integral

do consumo, entendido como o conjunto dos processos sociais de apropriação dos

produtos [...]”(MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 290, grifo do autor).

Esse entendimento, de valorização da inter-relação entre Cultura e Comunicação,

somado à oposição com as duas escolas mencionadas, resultou na compreensão de que o quadro

teórico-conceitual do autor (1997) se articula através de Cultura, Mediação, Recepção e Meio.

FIGURA 13 – Estrutura teórico-conceitual em Martín-Barbero

Fonte: O próprio autor

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A começar por Recepção, tem-se que:

[...] Abre-se assim ao debate um novo horizonte de problemas, no qual estão

redefinidos os sentidos tanto da cultura quanto da política, e do qual a problemática

da comunicação não participa apenas a título temático e quantitativo - os enormes

interesses econômicos que movem as empresas de comunicação - mas também

qualitativo: na redefinição da cultura, é fundamental a compreensão de sua natureza

comunicativa. Isto é, seu caráter de processo produtor de significações e não de mera

circulação de informações, no qual o receptor, portanto, não é um simples

decodificador daquilo que o emissor depositou na mensagem, mas também um

produtor (MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 287, grifo do autor).

Considerando a distinção entre Objeto-modelo e modelo teórico, cabe aqui ressaltar que

a abordagem que fundamenta a arguição do autor (1997) é essencialmente a mesma que orienta

o objeto-modelo lasswelliano.

Não apenas neste trecho, mas também quando atribui à Mediação um sentido de

“entremeio”, de um elemento intermediário, Martín-Barbero (1997) acaba por retroceder com

o conceito de Mediação à abordagem behaviorista.

O posicionamento epistemológico que Martín-Barbero (1997) se esforça para evitar

acaba por também incluir sua proposta e, do ponto de vista estritamente teórico, o autor (1997)

possui algumas características que dificultam a realização do reposicionamento que pretende.

Também como mencionado na análise de cunho metódico-técnico, o conjunto de

trechos nos quais o autor (1997) oferece explanações sobre Mediação tem como característica

algumas tendências.

Em primeiro lugar, não existem critérios bem estabelecidos de aplicação da noção de

Mediação. E embora Martín-Barbero (1997) se utilize do termo com frequência no texto, cada

acepção inclui mais algum fator que não foi anteriormente mencionado, de maneira que

algumas proibições supostas (exemplo – mediação não é) são falseadas. Dessa forma, o autor

(1997) acaba por transitar entre o descumprimento do princípio lógico da não contradição e as

reformulações ad hoc (LAKATOS, 1979).

Uma outra questão que chama atenção em relação a capacidade explicativa da proposta

da Mediação é o fato de que, ao menos inicialmente, ela é localizada pelo autor (1997) de modo

exógeno para posteriormente (mas também a partir do título da obra) colocá-la como principal

elemento intersecional e, portanto, em articulação com os meios.

Mas a adversidade que se apresenta é ainda anterior: como é possível deslocar um

modelo teórico de um conceito para o outro se nenhum dos dois atende aos critérios de

formulação/exposição conceitual?

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Sem qualquer atribuição negativa ou subestimada de outras pesquisas cujo tema é

Recepção ou Mediação, constata-se que nessa obra específica (1997) há reflexões insuficientes

não apenas no nível teórico, mas também no nível metódico.

No entanto, é interessante notar que tais insuficiências não são evidentes quando Martín-

Barbero (1997) analisa os pressupostos de outros, especialmente os de base da Escola de

Frankfurt.

Mesmo recusando equiparações com as escolas Americana e de Frankfurt, dada a

indefinição das três ideias (Mediação, Recepção e Meio) acaba por ser absorvido em razão de

algumas imprecisões teóricas e da consequente adesão ao Objeto-modelo behaviorista. É por

isso que se discorda aqui da proposição do autor (1997) de que é um projeto metodológico.

As formulações teóricas não podem ser isoladas das outras instâncias da pesquisa

(LOPES, 2005; BUNGE, 2013); mas isso não significa que não seja possível identificar e

distinguir diferentes recursos científicos, dos diferentes níveis da investigação.

Não se pode asseverar que Martín-Barbero (1997) não possui recursos teóricos, mas em

contrapartida também não se fundamenta a partir deste texto específico a existência de um

amplo recurso metodológico como esperado. Neste caso, a absorção da explicação teórica pelo

Objeto-modelo não poderia acontecer e/ou o modelo teórico teria que dar conta de construções

hipotéticas que as colocassem na direção da diminuição da opacidade (BUNGE, 2012 e 2013).

O trecho mais pontual a respeito de Meio é o seguinte, retomado do capítulo anterior:

As denominações são também um bom ponto de acesso. Pliego indica o "meio": uma

simples folha de papel dobrada duas vezes, ou várias folhas dobradas formando um

caderninho, impresso em duas ou três colunas. Cordel assinala o modo de difusão,

pois os pliegos eram exibidos e vendidos pendurados em um cordel na praça [...]

(MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 145, grifo do autor).

O Meio aparece absorvido pelos instrumentos e pela técnica que impulsionariam a

difusão de seus conteúdos. Mas, novamente, são noções e conceitos que, mesmo que possam

ser evitados no vocabulário da Mediação/Recepção, a cada esclarecimento se estabelecem cada

vez mais firmemente no Objeto-modelo que se pretendeu criticar.

Nesse sentido, algo a ser enfatizado diz respeito à afirmação de que há, antes da

Mediação e da Recepção típicas da pesquisa na América Latina, um midiacentrismo.

No que tange os autores até agora analisados, assevera-se que justamente o que não há

é o enfoque no “Meio”, à exceção de McLuhan (2005). Ou, de outra forma, só é possível admitir

a existência de um midiacentrismo se for suficiente para sua configuração a abordagem

temática.

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6. Textos recentes

.

Como mencionado no início deste capítulo, os textos selecionados são: (1) Mídia fluida:

por uma renovação conceitual (2010); (2) Tertium datur: introdução a uma teoria negativa dos

media (2013); (3) Medium-Remedium: o problema ontológico dos meios e seu entrelaçamento

comunicativo (2013); (4) Mídias sociais digitais a partir da ideia mcluhaniana de medium-

ambiência (2013); e (5) A virada comunicacional. Ou porque os estudos de “midiatização”, de

hábito e da Teoria dos Media passam ao largo da comunicação (2015).

O que esses textos possuem em comum é a abordagem direta da noção de “Meio”, seja

para criticá-la ou preservá-la, considerando abertamente questões conceituais e a teorização da

Comunicação, não restrita a pontuações epistemológicas ou históricas da institucionalização

dos estudos do domínio da Comunicação.

Iniciando-se por A virada comunicacional. Ou porque os estudos de “midiatização”, de

hábito e da Teoria dos Media passam ao largo da comunicação, Marcondes Filho (2015) critica

a proposta semiótica e os estudos centralizados em Media a partir de uma visada que considera

sociológica e sobre os quais ele é mais preciso:

A Teoria dos Media, como é denominada hoje na Alemanha, trabalha com isso. Seu

objeto teórico é o estudo político da dominação exercida pelos meios de

comunicação, hoje, também, pelos meios eletrônicos, como a internet e suas diversas

plataformas de veiculação de matérias jornalísticas, vídeos, música e entretenimento.

Não se trata de um estudo de comunicação, mas de tecnologias aplicadas à sociedade,

um tipo de ramo da sociologia (MARCONDES FILHO, 2015, p. 139-140).

Entretanto, tais críticas não estão aqui colocadas em questão porque a contraposição

adequada exigiria confrontá-las com o que Marcondes Filho (2015) aponta sobre tais posições.

Interessa é o que o autor (2015) entende por comunicação:

Quando um livro me transforma, quando um filme mexe com as minhas concepções,

quando uma instalação me faz rever meus padrões estéticos, estou falando de um

choque, um salto qualitativo, um reposicionamento mental que passa a ordenar

diferentemente o meu mundo (MARCONDES FILHO, 2015, p. 137).

Segundo Marcondes Filho (2015, p. 138) para pensar comunicação e, portanto, o

deslocamento qualitativo que produz “um reposicionamento mental”, “[...]seria necessário

distinguir duas coisas: objeto da comunicação e a própria comunicação [...]”.

Para realizar tal distinção, o autor (2015) considera importantes diferenciações em

relação aos meios no seguinte contexto:

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No Brasil, foi criada a curiosa expressão “mídia”, que, em princípio não diz nada e

serve para múltiplos objetos. “Mídia”, que é como o brasileiro importou a pronuncio

do termo inglês media, é, por vezes, inclusive, contraposto ao termo media (de massa

media), o que faz com que os estudos brasileiros dessa questão tecnológica sejam

totalmente ilegíveis para o leitor estrangeiro, visto que, para esses, é tudo “media” e

quando nós fazemos essa separação, parece, aos olhos do leitor do exterior, que nossa

ciência comunicacional não é séria (MARCONDES FILHO, 2015, p. 140).

O que cabe avaliar é a distinção de “mídia” apontada pelo autor (2015) que, dentre os

textos selecionados para a reflexão deste item aparece em Mídia fluida: por uma renovação

conceitual. Neste artigo (2010), explica-se que “foneticamente, mídia é a representação do

termo inglês media, que tem origem no latim médium, cujo plural é media. Como significado,

mídia, desde suas primeiras definições, remete a meio, espaço intermediário ou local onde tudo

converge” (MALLMANN, 2010, p. 18).

A autora (2010) aponta em diversos momentos McLuhan (2005), mas isso não é

suficiente para estabelecer se as propostas deste autor (2005) se enquadram em sua visão nas

primeiras definições mencionadas, inclusive porque os pontos de escrutínio são fragmentados.

O que é possível aqui afirmar é que, tendo em vista as análises realizadas neste trabalho,

ao menos a partir de vista teórico-conceitual, os pontos em que “tudo converge” são diferentes

em todos as obras apreciadas e nenhuma corresponde integralmente aos meios (Exemplo:

“Estrutura de atenção” em Lasswell). Se tal apreensão se der frente ao objeto-modelo, então tal

ponto de convergência é indeterminado, porque os modelos teóricos em questão não o

deslocaram definitivamente. Finalmente, se o argumento leva em consideração o objeto

empírico, então Mallmann (2010) corrobora a demanda pela distinção apontada por Marcondes

Filho (2015).

Outro ponto que reforça o argumento de existência da indistinção está colocado no

seguinte trecho:

[...] o período em que vivemos hoje não é mais compatível com o entendimento

segmentado por meios de comunicação. Em outras palavras, há tempos

denominamos telejornalismo o conteúdo veiculado pela TV, como será chamado o

mesmo conteúdo ao ingressar na Internet e ser acessado em um celular? Seria

contraditório chamarmos de telejornal um programa assistido via celular. Assim,

chamamos o programa apenas por vídeo, decaindo o prefixo tele, que se referia pura

e simplesmente ao aparato (e seu modo de transmissão) (MALLMANN, 2010, p. 20-

21).

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Essa não é uma apreensão relativa ao Objeto de pesquisa e, portanto, ao conceito. É

antes uma descrição do objeto empírico a partir de algo (conteúdo e aparato) que para a autora

(2010) equivale a “Meio”.

Em primeiro lugar, embora as categorizações sejam necessárias à formulação de um

conceito expresso por um designador especializado, elas não são suficientes. Em segundo lugar,

seria necessário reduzir a ambiguidade e explicar a diferença entre “conteúdo” e “aparato” e

estabelecer a localização de “meio”.

A mesma indistinção aparece em Medium-Remedium: o problema ontológico dos meios

e seu entrelaçamento comunicativo, no qual medium seria aquilo que é incomunicável, em

alguma instância a realidade em si, visto que é percebido como “experiência pura”. A

dificuldade é que o meio/mídia seria uma outra parte da realidade, aquela que é não

necessariamente corpórea, mas obrigatoriamente material:

[...] o médium não pode ser uma coisa. Elevá-lo à condição de coisa ou ferramenta,

reificá-lo, é abrir a porta para o fetiche. Quando os media são confundidos com os

objetos que os incorporam, a magia cede lugar à fixidez mórbida das imagens

vidradas [...] a vida corporal, experimentada no sensível, para a ser vida abstrata,

projetada em imagem. O corpóreo, muitas vezes confundido com matéria, é cada vez

menos presente na comunicação. E o que deveria ser médium para a experiência,

acaba substituído por um meio qualquer, por mídia banal (OLIVEIRA; LIESEN,

2013, p. 15-16).

Já em Mídias sociais digitais a partir da ideia mcluhaniana de medium-ambiência,

desde a proposta macluhaniana:

Se a partir dos meios, a teoria de McLuhan permite analisar a sociedade, o meio não

é apenas o suporte técnico, o canal neutro, invisível, pelo qual fluem as mensagens

da mídia. O meio mcluhaniano, como fica claro nas obras mais tardias de McLuhan,

é o ambiente que afeta, tensiona, sugere significados e sentidos. Ao dizer que o meio

é a mensagem, o autor nos lembra que o meio, com suas características técnicas,

simbólicas, organizacionais, produz efeitos tão ou mais importantes que aqueles que

possam ser produzidos pelo conteúdo das mensagens que veiculam. Sob essa

perspectiva, a noção de meio carrega em si um caráter cultural que contesta qualquer

tentativa de filiar McLuhan a uma linha teórica determinista (BARICHELLO;

CARVALHO, 2013, p. 236-237).

Diferente do que exposto por Oliveira e Liesen (2013), para Barichello e Carvalho

(2010), por “meio” entende-se tudo “que afeta, tensiona, sugere significado e sentidos”, provido

de “características técnicas, simbólicas e organizacionais”. Exceto por especificar os tipos de

características que constituem os meios, coloca-se aí uma apreensão funcional, isto é, do que

os “meios” fazem.

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174

Para Mallmann (2010) há diferença entre “mídia” e “meio”, e a primeira se relaciona

com “fluxos”, mas não com a questão técnica e institucional (que estaria restrita ao “meio”), ou

dito de outra forma “[...] o que entendemos por mídia nos tempos atuais são os próprios fluxos

informativos, que se dão entre aparatos (sejam eles quais forem). Acreditamos que justamente

o fluxo é o que melhor traduz mídia na Modernidade Líquida descrita por Baumann [...]”. E

ainda:

[...] Como se pode perceber, a mídia enquanto fluxo em um metassistema vai à

contramão do entendimento clássico da comunicação, em que nas pontas se

encontravam emissor e receptor, sendo o canal o objeto que mediava a informação

entre ambos. A comunicação massiva está presente nesse metassistema, mas,

diferentemente de sua fórmula original, ela reaparece por intermédio da participação,

manipulação, compartilhamento entre interagentes (emissores/receptores). Na mídia

contemporânea não há pontas, pois não estamos tratando de um modelo linear de

comunicação, tampouco de um sistema isolado dos demais existentes

(MALLMANN, 2010, p. 23).

Já para Barichello e Carvalho (2013) os aspectos técnicos e institucionais estariam

também presentes na “mídia” (que é o conjunto de “meios”), como é possível depreender do

trecho que também indica extensões:

Mídia é a forma aportuguesada da palavra latina media, plural de médium, que é

meio, em seu sentido de meio de comunicação, para além da ideia de mero canal.

Portanto, o termo mídia englobaria o conjunto de meios de comunicação,

representando uma instituição social – com seus conjuntos de valores, normas, regras

– o ambiente, o fundo, a cultura. Mídia, nesse sentido, não é apenas um meio técnico

– televisão, rádio, computador -, por ela envolve fluxos de comunicação, interações

tecnossociais, apropriações simbólicas, questões organizacionais e culturais

(BARICHELLO; CARVALHO, 2013, p. 238).

Outros designadores, em especial, “mediação”, “midiatização” e “mediatização”

apareceram com frequência em outros artigos da unidade de pesquisa de textos recentes. Porém,

para avaliar de que forma eles colaboram (ou não) para o conceito de “meio” e “mídia”, bem

como para determinação de diferenciação ou equivalência entre ambos, seria necessário ampliar

o escopo deste trabalho de forma improdutiva.

Em razão disso, tal questão é avaliada no argumento de Marcondes Filho (2013) tendo

em vista a impossibilidade de nesta pesquisa investigar também tais designadores. A questão

aqui é, portanto, o estabelecimento funcional de meio/media/tecnologias da comunicação:

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[...] O aumento da democracia e o desmoronamento dos impérios comunicacionais

não justifica a construção linguística “midiatização” como oposta à mediatização,

supostamente atribuída a tempos idos.

Isso porque o termo mediatização dá conta disso. Ele se refere pura e

simplesmente ao uso dos media para certos fins. Mediatizar é realizar (o que quer

que seja) com o apoio das tecnologias comunicacionais, não importa para que lado

ou defendendo que interesse. É como o fármaco, que é tanto um remédio quanto um

veneno, dependendo dos seus modos de uso. “Midiatização”, ao contrário, veio para

confundir, pois pretende positivar uma ação mediática invertendo seu polo, mas

caindo numa tautologia inócua (MARCONDES FILHO, 2015, p. 140-141).

O aspecto com o qual se concorda, independente de se tratar das colocações de

Barichello e Carvalho (2013), Mallmann (2010) ou Oliveira e Liesen (2013) é que:

Não está claro que meios são esses. Supõe-se que a pintura seja um meio, a escrita,

outro meio, a oralidade, mais outros, não se podendo caracterizá-las necessariamente

como de “massa”, apenas como meios. Comunicação realiza-se através de meios,

esse é seu modo de acontecer; isso diz como ela se dá, mas ainda não a caracteriza.

Por outro lado, falar que a comunicação ocorre através dos meios quer dizer que seja

medial, não mediática, visto que mediática, como dito acima, está subordinada à

lógica dos mass media (MARCONDES FILHO, 2015, p. 140-141).

Em razão de tal colocação, a proposta do autor (2015, p. 143) é que “comunicação,

assim, deveria ser estudada – talvez não ‘a partir de’, mas subsidiada pelo estudo de – processos

mediais. E a tecnologia digital a colocaria em outro nível de medialidade, no nível – agora sim

– do mediático [...]”.

Avaliar a proposta de Objeto da Comunicação em si não é da alçada deste trabalho, mas

cabe concordar com o entendimento de que, do ponto de vista epistemológico e teórico,

conceitos são explicados por relações de e com outros conceitos em uma estrutura hipotético-

dedutiva mais ampla, devendo ser coerente com tal estrutura.

Ainda que não se possa avaliar, os textos aqui incluídos corroboram com a asserção de

que há indefinição e insuficiência em relação a “meio” e, dada sua implicação em qualquer que

seja a proposta mais ampla relativa ao domínio da Comunicação, constitui-se obstáculo

epistemológico e teórico.

No artigo Tertium datur: introdução a uma teoria negativa dos media, propõe-se a

seguinte apreensão do designador “medium":

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176

[...] O que exatamente este termo designa permanece incerto: um objeto, um aparato,

uma técnica, um dispositivo, uma instituição ou qualquer coisa parecida. Até o

presente, sequer alguma vez pareceu claro definir se algo é ou não é um medium,

porque um pedaço de vidro, um instrumento, um sistema de transportes ou mesmo

um veículo, uma imagem, uma estrutura técnica ou uma função matemática não são

media per se, mas só podem se tornar um medium sob condições e práticas

específicas. Por esse motivo, a teoria dos media não pode partir sobretudo, de objetos

ou propriedade classificáveis [...] Por isso, ao invés de media no sentido de objetos,

seria mais adequado falar de medialidade, no sentido de estrutura genérica do medial

– aquela estrutura que se mostra naquilo que os media produzem, transportam,

representam ou comunicam, de tal forma que o medium em si não seria um objeto

adequado de pesquisa, mas apenas as materialidades, os dispositivos e as

performatividades que lhe são subjacentes e que acompanham ou entram nos

processos mediais sem, contudo, se comediarem [...] (MERSCH, 2013, p. 208).

Um entendimento possível é de que medium, em razão de sua materialidade, evidencia

aspectos do medial, sem com isso regular a medialidade. Ao contrário é a medialidade

(condições e práticas específicas) que deslocam um determinado objeto para a categoria

medium que não é exclusivamente comunicacional, visto que eles “produzem, transportam,

representam ou comunicam”.

A questão que se coloca em seguida é se a Teoria dos Media não é necessariamente

comunicacional, embora possa servir de subsídio para uma Teoria da Comunicação como

propõe Marcondes Filho (2015). Em seguida, também resta perguntar se nessa proposta

“meio/medium” deve ser um conceito estritamente funcional e de recorte empírico ou se deve

ser objeto de teorização e, talvez, ser subsidiado por abstrações específicas do domínio da

Tecnologia.

Há aqui certa ambiguidade em relação ao medium na medida em que não há argumentos

suficientes para saber se o medium é propriedade dos processos mediais ou se a medialidade é

uma propriedade do medium ou ainda se o medium é um conceito cuja face empírica são suas

materialidades e que explica a medialidade de processos que, talvez, não se limitem à

Comunicação.

Ainda assim, identifica-se que há o esforço reflexivo acerca da questão do “meio”

considerando sua colocação teórico-epistemológica no domínio da Comunicação e

considerações acerca dos reflexos de entendimento de “meio” (a partir deste ou de designadores

tomados como semelhantes) em uma apreensão maior do Objeto da Comunicação, apesar de

em algumas propostas tal Objeto ser confundido com o objeto empírico.

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177

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É importante distinguir criteriosamente dois tipos de crítica das ciências: aquelas que

se opõem a uma teoria particular e são fundamentadas em argumentos específicos, e

aquelas que repetem de uma forma ou outra os argumentos tradicionais do ceticismo

radical [...] é crucial não misturar esses dois tipos de argumentos: se alguém quiser

contribuir com a ciência, seja natural ou social, deve abandonar as dúvidas radicais

e concernentes à viabilidade da lógica ou à possibilidade de conhecer o mundo

através de observação e/ou experiência. Evidentemente, podemos sempre ter dúvidas

sobre uma teoria específica. Porém, argumentos céticos gerais apresentados para

sustentar essas dúvidas são irrelevantes, exatamente em virtude de sua generalidade

(SOKAL; BRICMONT, 1996, p. 207-208).

Que é Comunicação? é uma pergunta que é da alçada do domínio científico, na medida

em que as reflexões desenvolvidas a respeito de tal indagação influenciam diretamente na

identificação de Problemas, na elaboração de Objetos de pesquisa e na avaliação da pertinência

e da capacidade explicativa das propostas investigativas.

A partir da posição do realismo crítico e, portanto, da admissão da falibilidade humana

e do conhecimento científico, refuta-se a possibilidade de uma resposta definitiva à questão.

Isso não implica na desconsideração de que os posicionamentos sobre o assunto precisam ser

realizados e justificados para que, finalmente, possam ser avaliados, melhor desenvolvidos,

abandonados etc., ou na proximidade com o ceticismo e com o relativismo.

Quando aplicada ao desenvolvimento da pesquisa, a perspectiva sobre Que é

Comunicação? resulta em outra pergunta: Quais são as Teorias da Comunicação?. O embaraço

é que, atualmente, qualquer posicionamento rigoroso (o que não quer dizer final) sobre isso se

mostra tecnicamente inviável. Considerando, por exemplo, a diversidade identificada por

Bryant e Miron (2004), constituída por cerca de 604 abordagens teóricas distintas, uma tentativa

de resolução profunda e de avaliação das diferentes propostas teóricas seria infindável.

Reconhecendo consensualmente a multiplicidade teórica, os debates de caráter teórico-

epistemológico subdividem-se geralmente em duas perspectivas: uma em que a

Interdisciplinaridade é uma característica peculiar da Comunicação que, propulsionando

tamanha variação teórica-metodológica, resulta (ou resultará) positivamente na superação da

Ciência (em uma compreensão caricata).

Na outra visão, a redução da multiplicidade é desejável e possível, desde que estejam

compartilhados os critérios analíticos que devem ser aplicados (evitando o dogmatismo e

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afastando-se da pseudociência) e exista a intenção de superar obstáculos teóricos e

epistemológicos.

É na segunda posição que esta pesquisa está localizada, posto que não obstante este ser

um trabalho que não lida com evidências empíricas de quaisquer processos comunicacionais, a

observação da relação entre abstrações e objeto empírico formam o ponto de partida para a

justificação da posição do realismo científico frente ao irrealismo como mais adequada resposta

ao ceticismo (OKASHA, 2002).

Deduz-se daí que, um desenvolvimento intrínseco posterior a esta investigação é a

avaliação mais ampla (considerando o conjunto da obra dos autores) das posições teóricas aqui

analisadas, tendo como ênfase a contraposição delas com evidências empíricas e dos resultados

desse desenvolvimento com os que são aqui demonstrados.

Isso porque, apesar de no primeiro capítulo estar incluída a reflexão sobre a

impossibilidade da incomensurabilidade, nesta pesquisa não seria exequível a verificação

completa, em total atendimento ao método hipotético-dedutivo (POPPER, 2013).

A propósito da centralização do conceito aqui buscado tem-se que, ainda que este estudo

se coloque a favor da pertinência do Meio como principal elemento norteador da pesquisa em

Comunicação, tal colocação não requer consenso e, evidentemente, não se pretende absoluta.

Porém, isso não suprime o fato de que, se como justificado no início deste texto o Meio

constitui um obstáculo teórico com implicações epistemológicas no domínio da Comunicação

ele é, no mínimo, parte de seu Objeto.

Enquanto componente do Objeto de pesquisa, é preciso que viabilize a interlocução

entre as diferentes reflexões. Se não há o enfrentamento e a crítica das proposituras, não há

como o domínio se desvencilhar da repetição dos argumentos, reconhecer seus limites e

interfaces ou desenvolver parâmetros de avaliação e aceitação das propostas que não sejam, em

função da tendência exógena (KUHN, 2001), dogmáticos (BUNGE, 1980; POPPER, 2013).

É nesse contexto que se coloca a opção da disciplinaridade, sem que isso signifique a

proibição de interlocução entre diferentes saberes, inclusive porque a rigor, o exercício

científico deve supor o Princípio da Interdisciplinaridade (BUNGE, 2012 e 2013), inclusive

como ferramenta de manutenção do rigor epistemológico (LOPES, 2005).

Sendo assim, sem qualquer ilusão de esgotamento da problemática estabelecida, foram

determinadas as estratégias de investigação particulares deste estudo, com base, especialmente,

no modelo metodológico amplo de Lopes (2005).

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Buscando-se viabilizar o Objetivo da pesquisa, mediante as dificuldades encontradas no

decurso dos estudos exploratórios, ficou estabelecido que os procedimentos analíticos seriam

divididos em níveis metódico-técnico e teórico-epistemológico.

Para o cumprimento de tais procedimentos foram realizadas diferentes opções técnicas

para a seleção, coleta, descrição e análise das unidades de pesquisa.

A começar pela unidade composta pelos textos “clássicos”, realizou-se o levantamento

dos cursos de pós-graduação Stricto Sensu em território nacional, através da plataforma

Sucupira da Capes.

O primeiro dado pertinente é que, entre os 75 cursos de pós-graduação,

aproximadamente 20% não oferecem nenhuma disciplina voltada a ampla discussão das Teorias

da Comunicação.

O levantamento das disciplinas na plataforma Sucupira considerou os seguintes

conjuntos de termos: [Teoria(s) – Campo – Pensamento – Pesquisa] e [Meio(s) – Mídia –

Comunicação – Comunicacional].

Chegou-se a um total de 42 disciplinas que, frente à média de 17 referências por

disciplina, apresentaram discrepâncias: a disciplina que continha maior número de referências

apontava 135 indicações, e a que continha menor número destacava 4 referências.

Outro aspecto relevante é que, entre as 746 referências distintas, a maior parte, cerca de

76%, era indicada em apenas uma disciplina/instituição.

Desse amplo conjunto de referências, foram destacadas as que tratavam das Teorias da

Comunicação de modo geral e não em uma proposta específica. As três mais citadas eram

indicadas em cerca de 42% das disciplinas (HOLHFELDT; MARTINO; FRANÇA, 2007;

MATTELART; MATTELART, 2005; WOLF, 2008).

Confrontando a análise dos três livros com as referências das disciplinas, destacaram-se

os textos mais mencionados/comentados para a composição da unidade de pesquisa de textos

originais: (1) Harold Lasswell, A estrutura e a função da comunicação na sociedade, (2) Paul

Lazarsfeld, Bernard Berelson e Hazel Gaudet, The people’s choice (3) Theodor Adorno e Max

Horkheimer, Dialética do esclarecimento, (4) Marshall McLuhan, Os meios de comunicação

como extensões do homem e (5) Jesús Martín-Barbero, Dos meios às mediações.

Já a unidade de pesquisa que abrangia textos recentes foi delimitada considerando-se

periódicos incluídos em sistema de gerenciamento de acesso aberto, de abrangência nacional,

com classificação Qualis entre A1 e B2, publicados entre 2010 e 2016. Após a aplicação dos

critérios de seleção desenvolvidos a partir dos estudos exploratórios, chegou-se a um total de

705 textos que se referiam e eram indexados a partir do designador “Meio” ou similares.

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Na análise de nível metódico-técnico, isto é, especificamente relativa à identificação de

argumentos e a avaliação dedutiva, a unidade de textos recentes apresentou resultados similares

aos estudos exploratórios, dentre os quais são destacados:

Um dos tipos de associação mais próxima de argumento com teor conceitual foi

identificada em cerca de 2% dos textos. Tratava-se de associações proibitivas em

relação aos meios que, na grande maioria, explicitavam que os trabalhos abrangiam

preocupações para além do Meio de Comunicação;

Os textos que ofereceram esclarecimentos diretos a respeito de associação teórica

não representam nem 3% do total de artigos analisados. Nesse grupo de texto, foram

identificadas relações com o enquadramento de “Teoria do Meio” e/ou McLuhan,

com a noção de Tecnologia e/ou com aspectos do Jornalismo;

A maior parte dos textos, 64% apresentava como preocupação central questões

políticas.

Houve a tentativa de categorizar os 705 artigos a partir de cinco critérios que

demarcaram possibilidades distintivas mais frequentes, mas a demasiada ambiguidade e a

ausência de teor conceitual inviabilizaram a apreensão de tais conjuntos. Dito de outra forma,

em pesquisas publicadas nos últimos sete anos em gerenciamento aberto e de abrangência

nacional os indícios apontam para o entendimento de que o Meio de Comunicação é uma lacuna

conceitual.

Voltando-se para a unidade de pesquisa de textos originais, a análise em nível metódico-

técnico apresentou os seguintes resultados: embora quantitativamente relevante, o termo

“meio” é prioritariamente operacional, no sentido de refutá-lo como elemento de demarcação

da Comunicação (caso explícito de Martín-Barbero) ou de usá-lo como recorte do objeto

empírico relacionado aos efeitos o que, direta ou indiretamente, se aplica a todos os textos

analisados.

Na análise em níveis teórico e epistemológico, buscou-se deduzir das obras, com apoio

moderado de textos secundários, as estruturas teórico-conceituais individuais. Portanto, em um

primeiro momento as estruturas foram extraídas, mediante as justificações que foram sendo

desenvolvidas no decorrer da análise, para sequencialmente serem avaliadas pelos parâmetros

relativos à noção de Objeto-modelo de caixa negra e a possibilidade de deslocamento para a

caixa translúcida, em relação aos modelos teóricos.

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A conclusão mais ampla a partir dessa análise é de que a opção da incomensurabilidade

teórica relativa ao Meio não pode ser sustentada, porque não há uma interlocução teórica que o

coloque em pauta diretamente e há proximidade do tratamento dispensado ao designador-

conceito.

Entretanto, há alguns aspectos a serem considerados. Em primeiro lugar, o argumento

segundo o qual há centralização de Meio (nos textos originais e nos recentes) deve observar o

caráter funcional e extensional do tratamento teórico que demarca abordagem temática.

Portanto, a aplicação de Meio, mas também de Comunicação, é operacional.

Além disso, não obstante a aproximação com os designadores-conceitos seja

funcional/operacional e extensional/temática, não há indicações que autorizem a apreensão de

que são, ao invés de relacionados, intercambiáveis.

Em segundo lugar, considerando as atribuições de valor frequentes em relação ao que

se denominou Escola Americana, tanto no caso do texto de Lasswell (1989) quanto no de

Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948), não há proposições que fundamentem a equivalência

entre “Meio” e “Emissor” e, por conseguinte, a aplicação extensional a empresas de

comunicação. A partir de Adorno e Horkheimer (1969), o máximo do uso da extensão teria o

sentido parcialmente baseado em Indústria Cultural, enquanto em McLuhan (2005) e Martín-

Barbero (1997) não há nada de significativo sobre isso.

Apenas McLuhan (2005) oferece uma apreensão notadamente não temática e não

restrita ao caráter de extensão do Meio que, na avaliação mais positiva possível, abre

possibilidade de desenvolvimento de construções hipotéticas que diminuam a opacidade do

Objeto-modelo que admite articulação com os diferentes modelos teóricos.

Mediante a naturalização e não problematização do Meio como mecanismo científico

conceitual seria pertinente em caráter de aprofundamento desta pesquisa, aplicar novos critérios

de seleção tendo em vista a seguinte questão: Se em existindo a centralização do Meio em mais

de uma proposta, se configuraria a incomensurabilidade e se seria produzido o deslocamento

de Objeto-modelo?

Além disso, é preciso considerar que estudos recentes retomam as propostas teóricas

originais abrangidas por esta investigação de modo que há inúmeras possibilidades como, por

exemplo: a questão do Meio pode ter sido incorporada ao desenvolvimento recente e/ou

construções hipotéticas desvinculadas ao conceito podem ter viabilizado mudanças em objeto-

modelo e modelos teóricos.

O que também pareceu interessante nos resultados da análise em nível teórico-

epistemológico foi a identificação da resiliência de um mesmo objeto-modelo, apesar das

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divergências relativas aos modelos teóricos. As alegações de superação de tal objeto-modelo

ignoram o fato de que ele é, frente aos resultados aqui expostos, o vetor de diálogo, certamente

não necessariamente consensual ou dogmático, das propostas teóricas.

Como os textos selecionados não compunham somente uma escola ou autor, não foi

possível verificar as possibilidades interpretativas que alguns modelos teóricos, especialmente

Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948) e McLuhan (2005) teriam. Apesar disso, buscou-se

explicitar as possibilidades interpretativas, tanto quanto foi possível identificá-las a partir dos

fundamentos e justificações desta investigação.

Principalmente na Escola Americana e na Escola de Toronto, entende-se que há maior

possibilidade de articulação teórica não apenas pela resiliência do modelo lasswelliano, mas

pela proximidade das propostas teóricas e a interlocução direta.

No que tange a Escola de Frankfurt, não é possível, a partir dos resultados aqui

demonstrados, inferir sobre as possíveis amarrações. O que foi possível perceber é que,

enquanto estrutura teórica de análise conceitual de Meio, há apenas o uso extensionalista e

operacional que privilegia o entendimento do conceito principal: Indústria Cultural, bem como

é absorvido em uma categoria mais ampla: o Esclarecimento.

A propósito da Mediação/Recepção proposta por Martín-Barbero (1997), ignorando

aqui a volumosa pesquisa em âmbito nacional e outros teóricos proeminentes da vertente, a

maior preocupação é circunscrita pela possibilidade de que os argumentos indiquem

modificações ad hoc (LAKATOS, 1979).

No entanto, na compreensão aqui proposta essa verificação só seria possível

considerando mais amplamente tal perspectiva e, preferencialmente, em oposição à Escola de

Toronto.

Centralizando especificamente o Meio, considerando-se o que é possível depreender dos

textos analisados, tem-se que, a partir deles isoladamente, não há rigorosamente esforço

conceitual. Mas é possível apontar para as extensões já conhecidas como, por exemplo,

televisão, rádio, cinema.

Tal constatação pode ser utilizada para levantar questionamentos sobre posições que, a

partir única e exclusivamente dos textos aqui incluídos, se vejam autorizadas a escolher sobre

a preponderância ou não do Meio de Comunicação como demarcação do domínio científico.

A partir de McLuhan (2005) sugere-se que a interface com a Tecnologia, em uma

perspectiva também conceitual e não em caráter de extensão como nos textos recentes,

possivelmente é obrigatória para a viabilização, em especial, de critérios de aplicação e

admissibilidade do conceito.

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Com isso não se pretende asseverar que não há nenhuma pesquisa em andamento que

seja relevante para a problemática desta pesquisa, mas se afirmando que se há, não é

significativa e está, frente a comunidade de pesquisadores em Comunicação, isolada.

Quantitativamente esse isolamento está demonstrado pelo número de textos que, em

período de sete anos de publicações, abarcam a questão na direção das condições de

cientificidade: cinco artigos.

Em tais textos foram identificados pontos de coincidência, sendo o primeiro e mais

importante a abordagem direta de “Meio”, observando-se manifestadamente aspectos

conceituais e a teorização da Comunicação. Dito de outra forma: tentando também refletir sobre

as consequências do que se entende por Meio para a compreensão do domínio da Comunicação

e de seu(s) Objeto(s) de pesquisa, apenas de pontos de indistinção entre esse último e objeto

empírico.

O segundo é a utilização de designadores específicos além de “Meio” e “Mídia”:

Medium e Media são termos frequentes nos textos, tanto do ponto de vista individual, quanto

vistos como conjunto. Também é comum a digressão à definição de caráter etimológico,

funcional e extensional para iniciar os argumentos de cunho teórico.

O último elemento coincidente é a articulação com os designadores “Mediação”,

“Mediatização” e “Midiatização” que estão vinculados a propostas não incluídas nas unidades

de pesquisa. Nesse sentido, seria adequado aplicar a eles análises próximas a deste estudo para

melhor avaliar fatores de concordância e discordância apontados por esses textos recentes.

Além do que foi mencionado, também se depreendeu que seria necessário discutir até

que ponto a interface entre Meio/Medium/Media com Tecnologia deveria ser considerada, no

sentido do Princípio da Interdisciplinaridade (BUNGE, 2012), a fim de se evitar a repetição dos

usos como recorte empírico, funcionais e extensionais que, até o presente momento, se mostram

improdutivos para o desenvolvimento científico do domínio da Comunicação em relação ao

obstáculo teórico circunscrito pelo Meio de Comunicação.

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