Upload
others
View
4
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO E HUMANIDADES
Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social
AMANDA LUIZA DOS SANTOS PEREIRA
MEIOS DE COMUNICAÇÃO COMO QUESTÃO TEÓRICA:
mapeamento e análise de possibilidades conceituais
SÃO BERNARDO DO CAMPO
2017
UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO E HUMANIDADES
Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social
AMANDA LUIZA DOS SANTOS PEREIRA
MEIOS DE COMUNICAÇÃO COMO QUESTÃO TEÓRICA:
mapeamento e análise de possibilidades conceituais
Tese apresentada em cumprimento parcial às
exigências do Programa de Pós-Graduação em
Comunicação Social, Universidade Metodista de São
Paulo (UMESP), para obtenção do grau de Doutor.
Orientador: Prof. Dr. Fábio Botelho Josgrilberg
SÃO BERNARDO DO CAMPO
2017
FICHA CATALOGRÁFICA
P414m Pereira, Amanda Luiza dos Santos
Meios de comunicação como questão teórica: mapeamento e
análise de possibilidades conceituais / Amanda Luiza dos Santos
Pereira. 2017.
189 p.
Tese (Doutorado em Comunicação Social) --Escola de
Comunicação, Educação e Humanidades da Universidade
Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2017.
Orientação: Fábio Botelho Josgrilberg.
1. Comunicação - Teoria 2. Meios de comunicação 3.
Conceitos I. Título.
CDD 302.2
A tese de doutorado sob o título “Meios de Comunicação como questão teórica:
mapeamento e análise de possibilidades conceituais”, elaborada por Amanda
Luiza dos Santos Pereira, foi defendida e aprovada em 10 de maio de 2017,
perante banca examinadora composta por Prof. Dr. Fábio Botelho Josgrilberg
(Presidente/UMESP), Profa. Dra. Marli dos Santos (Titular/UMESP), Prof. Dr.
Sebastião Carlos de Morais Squirra (Titular/UMESP), Prof. Dr. Anderson
Vinícius Romanini (Titular/USP), Prof. Dr. Walter Teixeira Lima Junior
(Titular/UNIFAP).
_________________________________________
Prof. Dr. Fábio Botelho Josgrilberg
Orientador e Presidente da Banca Examinadora
_________________________________________
Profa. Dra. Marli dos Santos
Coordenadora do Programa de Pós-Graduação
Programa: Pós-Graduação em Comunicação Social
Área de concentração: Processos Comunicacionais
Linha de pesquisa: Inovações Tecnológicas na Comunicação Contemporânea
AGRADECIMENTOS
Aos professores da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), em especial, o prof.
Dr. Fábio Botelho Josgrilberg, pelo acolhimento na orientação final da pesquisa, mas também
nas atividades e encontros interdisciplinares. Prof. Dr. Sebastião Carlos de Morais Squirra pelas
contribuições, indicações e incentivo. Profa. Dra. Marli dos Santos e Prof. Dr. Luciano Sathler
Rosa Guimarães, pela disposição e apoio. Profa. Dra. Cicília Maria Krohling Peruzzo pelas
críticas e sugestões direcionadas ao trabalho.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoas de Nível Superior (CAPES) e à Pró-
Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa da UMESP, pelo apoio e concessão de benefício através
do Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Superior (PROSUP).
Aos funcionários da UMESP, em especial, Priscila Teodoro Errerias pela paciência e
gentileza constantes.
Ao prof. Dr. Anderson Vinícius Romanini pelas contribuições com a pesquisa desde a
banca de qualificação e ao prof. Dr. Osvaldo Frota Pessoa Junior pelas conversas e importantes
indicações.
Aos melhores amigos de pós-graduação que alguém pode ter: Fábio Palamedi, parceiro
intelectual e de um quase podcast, André Rosa pelas trocas de ideias durante todos os trabalhos
desenvolvidos desde o mestrado e pela leveza do seu bom humor. Liliane Monteiro, por toda
ajuda na obtenção de referências raras. Krishma Carreira e Ana Graciela Voltolini, por todos
os encontros, palavras de apoio e risadas. Rafael Vergili, por todas as conversas honestas e
divertidas, mantidas apesar da distância.
Ao prof. Dr. Walter Teixeira Lima Junior, por todos os desafios e oportunidades que me
ofereceu junto ao Grupo de Pesquisa Tecnologia, Comunicação e Ciência Cognitiva (Tecccog),
pelo exemplo de seriedade e cientificidade, por toda dedicação na orientação direta desta
investigação até o período de qualificação e pelas contribuições posteriores.
Aos amigos-irmãos que estiveram ao meu lado, apesar da minha insociabilidade, em
especial Daniel Costa Paiva e Weider Weise.
Ao meu pai, Nagibe Moreno dos Santos, pelo interesse e imprescindível ajuda nas
dúvidas direta e indiretamente relacionadas aos problemas lógicos, bem como pelo apoio
incondicional.
Ao meu doce Fábio Luís Pereira, por todo afeto e todas as ações que só alguém tão
admirável e com tanto amor poderia oferecer.
RESUMO
Esta pesquisa é motivada pela pergunta Que é Meio de Comunicação nas abordagens
circunscritas pela produção nacional? Em razão disso, os levantamentos realizados
especificamente sobre o domínio da Comunicação foram integralmente vinculados às
referências utilizadas nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu e em periódicos e anais de
abrangência nacional dos últimos sete anos. Com o objetivo de mapear proposituras conceituais
acerca de Meio de Comunicação e baseada na proposta metodológica de Lopes (2005), foi
realizada uma análise subdivida em procedimentos de cunho metódico-técnico e teórico-
epistemológico das publicações recentes e de textos que podem ser designados como clássicos
da área, visando identificar e avaliar argumentos sobre a questão. Mediante os resultados
obtidos as principais conclusões são: em textos recentes Meio de Comunicação é uma lacuna
conceitual, visto que a problematização direcionada ao conceito em si é representativa em
menos de 1% dos textos analisados. Em relação aos textos clássicos, embora se tenha algumas
pistas de espaços para a formulação de construções hipotéticas que colaborem para a
conceituação, confirmam-se as intuições do debate epistemológico que apontam para a
proeminência do uso não especializado do termo.
Palavras-chave: Teorias da Comunicação. Realismo científico. Conceito.
ABSTRACT
This research is motivated by the question What is Media in the approaches circumscribed by
the national production? Because of this, the surveys are specifically related to the field of
Communication have been integrally linked to the references were used in Stricto Sensu courses
and in periodicals and annals of national scope of the last seven years. With the objective of
mapping conceptual proposals about Media and based on Lope’s methodology (2005), an
analysis of recent publications and texts that can be designated as Communication Classics was
carried out, which was subdivided into methodical-technical and theoretical-epistemological
procedures of in order to identify and evaluate arguments on Media issue. Through the results
obtained the main conclusions are: in recent texts media is a conceptual gap, since the
problematization directed to the concept itself is representative in less than 1% of the texts
analyzed. In relation to the classical texts, although there are some clues of space for the f
hypothetical constructions that collaborate for the conceptualization, the intuition of the
epistemological debate, on the prominence of the non-specialized use of the term are confirmed.
Keywords: Theories of Communication. Scientific realism. Concept.
RESUMEN
Esta investigación está motivada por la pregunta ¿Cuál es el medio de comunicación en los
enfoques circunscrito por la producción nacional? Como resultado, las encuestas realizadas
específicamente en el campo de la comunicación fueron totalmente vinculados a referencias
utilizadas en los cursos de posgrado Stricto Sensu y en revistas y actas en cobertura nacional de
los últimos siete años. Con el fin de cartografiar proposiciones conceptuales sobre medio de
comunicación y con base en el enfoque metodológico de Lopes (2005), se realizó un análisis
de publicaciones recientes y textos que pueden ser designados como clásicos de Comunicación,
que se subdividió en procedimientos metódico-técnicos y teórico-epistemológicos para
identificar y evaluar los argumentos sobre el tema. A través de los resultados obtenidos las
principales conclusiones son: En textos recientes el medio de comunicación es una brecha
conceptual, ya que la problematización dirigida al concepto mismo es representativa en menos
del 1% de los textos analizados. En cuanto a los textos clásicos, aunque existen algunas pistas
de espacio para la formulación de construcciones hipotéticas que colaboran para la
conceptualización, se confirman las intuiciones del debate epistemológico sobre la prominencia
del uso no especializado del término.
Palabras-clave: Teorías de la Comunicación. Realismo científico. Concepto.
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – Tabela verdade: Conjunção ......................................................................... p. 63
TABELA 2 – Tabela verdade: Disjunção .......................................................................... p. 63
TABELA 3 – Tabela verdade: Negação ............................................................................. p. 64
TABELA 4 – Tabela verdade: Condicional ....................................................................... p. 64
TABELA 5 – Tabela verdade: Bicondicional .................................................................... p. 64
TABELA 6 – Disciplinas gerais nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu .................... p. 67
TABELA 7 – Lista das referências bibliográficas mais frequentes nos cursos de pós-graduação
Stricto Sensu ......................................................................................................................... p. 69
TABELA 8 – Lista de periódicos selecionados ................................................................. p. 79
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 – Modelo Metodológico de Pesquisa ................................................................. p.14
FIGURA 2 – Componentes sintagmáticos do modelo metodológico ................................... p.17
FIGURA 3 – Modelo metódico-técnico de identificação e análise de conceito ................. p. 59
FIGURA 4 – Distinção de Premissa(s) ............................................................................... p. 62
FIGURA 5 – Modelo técnico básico de tratamento de argumentos .................................... p. 63
FIGURA 6 – Estrutura teórico-conceitual em Lasswell ..................................................... p. 145
FIGURA 7 – Objeto-modelo de caixa negra ....................................................................... p.146
FIGURA 8 – Primeira estrutura teórico-conceitual em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet .... p. 153
FIGURA 9 – Segunda estrutura teórico-conceitual em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet .... p. 154
FIGURA 10 – Oposição Teoria Hipodérmica – Two-step flow ......................................... p. 155
FIGURA 11 – Estrutura teórico-conceitual em Adorno e Horkheimer .............................. p. 161
FIGURA 12 – Estrutura teórico-conceitual em McLuhan ................................................. p. 163
FIGURA 13 – Estrutura teórico-conceitual em Martín-Barbero ........................................ p. 168
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1 – Distribuição de referências por disciplina ................................................... p. 68
GRÁFICO 2 – Frequência de referências bibliográficas nos cursos de pós-graduação Stricto
Sensu .................................................................................................................................... p. 70
GRÁFICO 3 – Frequência de citações nas três principais referências sobre Teorias da
Comunicação ....................................................................................................................... p. 71
GRÁFICO 4 – Termos com maior frequência em Lasswell ............................................... p. 84
GRÁFICO 5 – Meio em Lasswell ....................................................................................... p. 85
GRÁFICO 6 – Conjuntos de termos mediante funções em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet
.............................................................................................................................................. p. 87
GRÁFICO 7 – Termos com maior relevância qualitativa em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet
.............................................................................................................................................. p. 88
GRÁFICO 8 – Meio e uso de extensões em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet ...................... p. 89
GRÁFICO 9 – Efeitos em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet .................................................. p. 90
GRÁFICO 10 – Termos com maior frequência em Adorno e Horkheimer ........................ p. 91
GRÁFICO 11 – Termos com maior frequência em McLuhan ............................................ p. 93
GRÁFICO 12 – Termos com maior frequência em McLuhan, concatenando extensões de Meio
.............................................................................................................................................. p. 94
GRÁFICO 13 – Meio/Veículo e uso de extensões em McLuhan ....................................... p. 95
GRÁFICO 14 – Termos com maior frequência em Martín-Barbero .................................. p. 97
GRÁFICO 15 – Desdobramentos de Cultura em Martín-Barbero ...................................... p. 98
GRÁFICO 16 – Meio em Martín-Barbero .......................................................................... p. 99
GRÁFICO 17 – Desdobramentos de Comunicação em Martín-Barbero ........................... p. 100
GRÁFICO 18 – Distribuição dos textos nos periódicos .................................................... p. 102
GRÁFICO 19 – Distribuição dos textos entre 2010 e 2016 .............................................. p. 103
GRÁFICO 20 – Distribuição de textos no periódico Animus ............................................ p. 104
GRÁFICO 21 – Distribuição de textos no periódico Brazilian Journalism Research ...... p. 105
GRÁFICO 22 – Distribuição de textos no periódico Communicare ................................. p. 106
GRÁFICO 23 – Distribuição de textos no periódico Estudos em Jornalismo e Mídia ..... p. 106
GRÁFICO 24 – Distribuição de textos no periódico Extraprensa .................................... p. 107
GRÁFICO 25 – Distribuição de textos no periódico Ciberlegenda .................................. p. 108
GRÁFICO 26 – Distribuição de textos no periódico Galáxia .......................................... p. 109
GRÁFICO 27 – Distribuição de textos no periódico Signos do consumo ......................... p. 110
GRÁFICO 28 – Distribuição de textos no periódico Comunicação & Sociedade ............ p. 111
GRÁFICO 29 – Distribuição de textos no periódico Comunicação, mídia e consumo ..... p. 112
GRÁFICO 30 – Distribuição de textos no periódico Eptic ................................................ p. 113
GRÁFICO 31 – Distribuição de textos no periódico Estudos em Comunicação ............... p. 114
GRÁFICO 32 – Distribuição de textos no periódico Fronteiras ....................................... p. 115
GRÁFICO 33 – Distribuição de textos no periódico Compolítica .................................... p. 116
GRÁFICO 34 – Distribuição de textos no periódico Comunicação e Educação .............. p. 116
GRÁFICO 35 – Distribuição de textos no periódico Contemporânea .............................. p. 117
GRÁFICO 36 – Distribuição de textos no periódico Culturas midiáticas ........................ p. 117
GRÁFICO 37 – Distribuição de textos no periódico ECOM ............................................. p. 118
GRÁFICO 38 – Distribuição de textos no periódico Esferas ............................................ p. 118
GRÁFICO 39 – Distribuição de textos no periódico Liinc ................................................ p. 119
GRÁFICO 40 – Distribuição de textos no periódico Opinião Pública .............................. p. 119
GRÁFICO 41 – Distribuição de textos no periódico Comunicação & Informação .......... p. 121
GRÁFICO 42 – Distribuição de textos no periódico Conexão .......................................... p. 121
GRÁFICO 43 – Distribuição de textos no periódico Contracampo .................................. p. 122
GRÁFICO 44 – Distribuição de textos no periódico ECO-Pós ......................................... p. 122
GRÁFICO 45 – Distribuição de textos no periódico Líbero ............................................. p. 123
GRÁFICO 46 – Distribuição de textos no periódico Logos .............................................. p. 123
GRÁFICO 47 – Distribuição de textos no periódico Novos Olhares ................................ p. 124
GRÁFICO 48 – Distribuição de textos no periódico Intexto ............................................. p. 125
GRÁFICO 49 – Distribuição de textos no periódico Organicom ...................................... p. 126
GRÁFICO 50 – Distribuição de textos no periódico Comunicação e Inovação ............... p. 127
GRÁFICO 51 – Distribuição de textos no periódico Geminis ........................................... p. 128
GRÁFICO 52 – Distribuição de textos no periódico Intercom .......................................... p. 128
GRÁFICO 53 – Distribuição de textos no periódico Lumina ............................................ p. 129
GRÁFICO 54 – Distribuição de textos no periódico Rizoma ............................................ p. 129
GRÁFICO 55 – Distribuição de textos no periódico Rumores .......................................... p. 130
GRÁFICO 56 – Distribuição de textos no periódico Rev. Bras. Hist. da Mídia ............... p. 131
GRÁFICO 57 – Distribuição de textos no periódico E-compós ........................................ p. 132
GRÁFICO 58 – Distribuição de textos no periódico Famecos .......................................... p. 132
GRÁFICO 59 – Distribuição de textos no periódico Matrizes .......................................... p. 133
GRÁFICO 60 – Distribuição de textos no periódico Sessões do imaginário .................... p. 133
GRÁFICO 61 – Distribuição de textos no periódico Verso e Reverso .............................. p. 134
GRÁFICO 62 – Usos especializado e não especializado de meio em textos recentes ...... p. 137
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ------------------------------------------------------------------------------------------ 13
Capítulo I – POSSIBILIDADE DE DEMARCAÇÃO CIENTÍFICA E PERTINÊNCIA DA
COMUNICAÇÃO --------------------------------------------------------------------------------------- 21
1. Centralidade da demarcação e da lógica científica na discussão epistemológica ------------ 28
2. A questão da (inter)disciplinaridade a partir do deslocamento da caixa negra para a caixa
translúcida ------------------------------------------------------------------------------------------------- 39
3. Pertinência epistemológica do Problema de Pesquisa ------------------------------------------- 45
Capítulo II – INSTÂNCIAS METÓDICA E TÉCNICA DA ESTRATÉGIA DE
INVESTIGAÇÃO PARA O MAPEAMENTO DO CONCEITO DE MEIO DE
COMUNICAÇÃO --------------------------------------------------------------------------------------- 51
1. Procedimentos metódicos e técnicos de identificação e análise de conceito-argumento --- 58
2. Seleção da unidade de pesquisa de textos originais ---------------------------------------------- 65
3. Seleção da unidade de pesquisa de textos recentes----------------------------------------------- 76
Capítulo III – DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS EM NÍVEL METÓDICO-
TÉCNICO ------------------------------------------------------------------------------------------------- 81
1. Textos originais --------------------------------------------------------------------------------------- 82
1.1 A estrutura e a função da comunicação na sociedade ----------------------------------------- 83
1.2 The people’s choice: how the voter makes up his mind in a presidential campaign ------ 87
1.3 Dialética do esclarecimento ----------------------------------------------------------------------- 90
1.4 Os meios de comunicação como extensões do homem ----------------------------------------- 93
1.5 Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia ------------------------------- 96
2. Textos recentes -------------------------------------------------------------------------------------- 101
Capítulo IV – INTERPRETAÇÃO EM NÍVEL TEÓRICO-EPISTEMOLÓGICO DOS
RESULTADOS DA ANÁLISE METÓDICO-TÉCNICA --------------------------------------- 139
1. A estrutura e a função da comunicação na sociedade ------------------------------------------ 144
2. The people’s choice: how the voter makes up his mind in a presidential campaign ------ 152
3. Dialética do esclarecimento ----------------------------------------------------------------------- 159
4. Os meios de comunicação como extensões do homem ---------------------------------------- 163
5. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia -------------------------------- 167
6. Textos recentes -------------------------------------------------------------------------------------- 171
CONSIDERAÇÕES FINAIS ------------------------------------------------------------------------ 177
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS -------------------------------------------------------------- 184
13
INTRODUÇÃO
O modo científico de pensar é ao mesmo tempo imaginativo e disciplinado. Isso é
fundamental para o seu sucesso. A ciência nos convida a acolher os fatos, mesmo
quando eles não se ajustam às nossas preconcepções. Aconselha-nos a guardar
hipóteses alternativas em nossas mentes, para ver qual se adapta melhor à realidade.
Impõe-nos um equilíbrio delicado entre uma abertura sem barreiras para ideias
novas, por mais heréticas que sejam, e o exame cético mais rigoroso de tudo - das
novas ideias e do conhecimento estabelecido. Esse tipo de pensamento é também
uma ferramenta essencial para a democracia numa era de mudanças (SAGAN, 1996,
p. 32).
De acordo com a perspectiva do realismo científico, o fazer científico estável e desejável
é concebido como um equilíbrio entre os dados empíricos e a reflexão teórica, considerando as
limitações do conhecimento científico originadas na falibilidade humana.
A partir de tal posição (também denominada racionalismo crítico e falsicacionismo), em
observação às limitações humanas e, por conseguinte, da proposta aqui produzida, tem-se como
ponto de partida a seguinte premissa: nenhuma investigação que se pretenda científica pode ser
completa e definitiva e, para ser exequível, demanda recortes.
O recorte proposto é propulsionado pela noção de que a origem/início da pesquisa
científica é o Problema, que por sua vez só pode ser identificado a partir de uma perspectiva
teórica porque, contrariando o indutivismo (positivismo), a Ciência não começa com a
observação.
O início do recorte deixa explícita a primazia das reflexões epistemológica e teórica
nesta investigação, o que conduziu à observação do modelo metodológico estruturado em
instâncias e fases por Lopes (2005).
Em tal modelo, as instâncias são inter-relacionadas, de forma que em cada fase prática
da pesquisa, exige-se coerência entre os diferentes níveis, de modo que, invariavelmente, a
orientação epistemológica acaba por ser retomada, visto que a instância epistemológica:
[...] é a instância que exerce uma função de vigilância crítica na pesquisa. Ao longo
de toda a pesquisa essa instância se traduz em movimentos ou operações destinadas
à explicitação dos obstáculos epistemológicas da pesquisa e sua autocorreção e à
construção do objeto científico (LOPES, 2005, p. 121).
14
FIGURA 1 – Modelo Metodológico de Pesquisa
Fonte: Lopes (2005, p. 156).
Ainda na perspectiva da instância epistemológica e em concordância com o
posicionamento adotado, tomou-se como noção de Teoria a proposta de Mario Bunge (2012, p.
380), na qual se trata de “sistema hipotético-dedutivo: isto é, um sistema composto de um
conjunto de assunções e de suas consequências lógicas [...] é um conjunto de proposições
fechadas sob dedução (isto é, incluindo todas as consequências lógicas dos axiomas) [...]”.
Esse conjunto de proposições inter-relacionadas forma um quadro que indica os limites
das explicações oferecidas e, portanto, a pertinência dessas e das questões que as originam. É
nesse contexto que se compreende a construção de um determinado Objeto de pesquisa
delimitado por um viés disciplinar, na medida em que a observação do Objeto empírico será
orientada e terá sentido a partir da estrutura hipotético-dedutiva.
Seguindo tal raciocínio, além de ser passível de verificação empírica e/ou de suas
explicações, o reconhecimento de uma proposta como científica demanda compatibilidade de
diálogo com o conhecimento teórico estabelecido, sem que isso seja equivalente a um consenso
em relação às escolhas ou refutações de hipóteses e abordagens, por exemplo (BUNGE, 1980).
15
Dessa forma, o primeiro movimento de construção do Problema de pesquisa deste
trabalho foi realizar um levantamento de investigações acerca da delimitação do conhecimento
teórico estabelecido no domínio da Comunicação, dentro das quais se destacou o entendimento
que identifica sete tradições1 para a conformação da área (CRAIG, 1999).
Em âmbito nacional, distinguiram-se os trabalhos de Luís Mauro Sá Martino, em
especial o artigo publicado em 2008, A ilusão teórica no campo da comunicação, que realiza
uma comparação entre livros nacionais publicados entre 1997 e 2007, e de Luiz Claudio
Martino, com ênfase no texto O campo da comunicação e suas teorias (2008), no qual se
discutem, entre outras questões, as condições para esse tipo de delimitação.
Sem ignorar os estudos mais recentes que são impulsionados pelas mesmas dificuldades,
se faz necessário destacar a maior variação quantitativa: trata-se da identificação de 604
diferentes teorias/vertentes em 25% do conteúdo dos periódicos Journalism & Mass
Communication Quarterly, Journal of Communication e Journal of Broadcasting & Electronic
Media (BRYANT; MIRON, 2004).
Evidenciada ou não na superfície dos textos, a questão primária Quais são os
conhecimentos teóricos da Comunicação? desdobra-se em outras perguntas que, em razão da
variedade e de suas inter-relações, influenciaram a insistência inicial de localizar o eixo
condutor da reflexão.
Neste estudo, o eixo foi organizado a partir dos debates mais recentes de caráter teórico-
epistemológico em âmbito nacional, dentro dos quais, além do consenso a respeito da
diversidade nas investigações em Comunicação, observa-se por exemplo, como apontam Braga
(2011) e Rüdiger (2014), alheamento em relação ao conceito de Meio de Comunicação.
A partir disso, sem que se pretenda conceber tal recorte como absoluto, ficou
estabelecida como pergunta chave Que é Meio de Comunicação?, circunscrita pela produção
científica em âmbito nacional e, por isso, abarcando para o entendimento do Estado da Arte
informações relativas aos cursos de Pós-Graduação em Comunicação, periódicos e eventos da
área.
Demarca-se aqui um empenho fundamentalmente conceitual e que, cônscio da
importância da evidência empírica, delimita-se na análise e verificação das explicações teóricas
para que seja exequível do ponto de vista metódico e técnico, e justificável, nos níveis
1 Retórica, semiótica, fenomenológica, cibernética, sociocultural, teoria crítica e sóciopsicológica.
16
epistemológico e teórico, em observância ao modelo de Lopes (2005) e às recomendações de
Bunge (1980) em relação às estratégias de investigação científica.
Dentre as referências bibliográficas mais presentes nos cursos de pós-graduação Stricto
Sensu e nos artigos publicados em âmbito nacional, centrados em debates teórico-
epistemológicos, está o livro organizado por Hohlfeldt, Martino e França (2007), dentro do qual
Martino (2007), especificamente, expõe as principais dificuldades à propósito da definição do
Objeto. Sobre isso, destaca que:
Primeiramente seria preciso rever mais atentamente o que realmente as grandes
escolas chamam de meios de comunicação e de cultura de massa. O funcionalismo
americano – ao qual se atribui inadvertidamente a análise dos meios de comunicação
– está na verdade longe de ter um conceito na matéria. A fragmentação analítica do
processo comunicativo (esquema de Lasswell) e sua busca dos efeitos da
comunicação de massa estabelecem um quadro de análise que acaba por condicionar
o desenvolvimento das pesquisas de modo a não privilegiar o estudo dos meios de
comunicação. Representado por diferentes tradições de pesquisa, os objetos
historicamente privilegiados pelo funcionalismo são: a persuasão, o controle social,
os usos e gratificações, os processos de produção de notícia... Não se encontrará aí
nenhuma pesquisa conceptual ou teórica sobre o que é um meio de comunicação. O
que representaria um erro primário e capital para uma empreitada que se pretende
científica, caso perseverássemos em atribuir a esta escola um objeto que não é
exatamente o seu. Restrito à observação da eficácia dos processos comunicativos, o
funcionalismo americano negligencia a análise dos instrumentos tecnológicos
envolvidos nesses processos, como negligencia também a análise da dimensão
histórica da pertinência desses instrumentos, quer dizer, a análise do processo através
do qual os meios de comunicação adquirem sua eficácia ao emergirem como
elemento estruturante de uma sociedade historicamente dada.
De outra parte, à orientação sintética adotada pela Escola de Frankfurt – fortemente
influenciada pelos conceitos marxistas (alienação, ideologia...), e talvez
demasiadamente voltada a uma abordagem político-econômica dos processos de
comunicação de massa – seria preciso integrar uma análise dos meios de
comunicação no que toca sua eficácia enquanto tecnologias da inteligência, como
faz Jack Goody, por exemplo – que, identificando a cultura com os processos
comunicativos, vê nos meios de comunicação (e em outras tecnologias da
inteligência) a possibilidade de fundamentar a problemática da cultura em uma base
positiva -, pois é preciso que os estudos de Comunicação não se percam os laços com
os dispositivos tecnológicos na base do processo (MARTINO, 2007, p. 29-30).
Para o trabalho aqui proposto, entende-se que há ainda duas dificuldades: em primeiro
lugar, considerar Meios de Comunicação e Cultura de Massa com a mesma ênfase demandaria
o amplo escrutínio de perspectivas teóricas, especialmente filosóficas e sociológicas, que
descentralizariam a pergunta chave, já fundamentada em nível epistemológico. Em segundo
lugar, outros trabalhos (BRYANT; MIRON, 2004; MARTINO, L.C., 2008; MARTINO, L.M.,
2008) já citados nesta Introdução, incluindo do próprio autor, revelam a dificuldade de se
17
estabelecerem, por exemplo, quais seriam as grandes escolas e os autores/obras relevantes,
dentre outras questões.
Excluindo-se o tratamento da Cultura de Massa como central, buscou-se a delimitação
da questão teórica como resolução da segunda dificuldade. Dessa forma, a investigação dirige-
se à Que é Meio de Comunicação nas abordagens teóricas circunscritas pela produção
nacional e, portanto, refere-se ao mapeamento de explicações acerca do conceito de Meio de
Comunicação e ao retorno à díade epistemologia-teoria a partir do resultado originado por tal
mapeamento. Para isso, consideram-se como base de orientação da produção nacional as
referências bibliográficas das disciplinas sobre Teorias da Comunicação dos cursos de pós-
graduação Stricto Sensu e artigos recentes publicados em periódicos, sendo os critérios de
seleção melhor explicitados em momento oportuno deste trabalho.
Retomando Lopes (2005), tem-se a indicação dos componentes sintagmáticos do
modelo metodológico proposto pela autora (2005) na Figura 2:
FIGURA 2 – Componentes sintagmáticos do modelo metodológico
Fonte: Lopes (2005, p. 137).
18
Já tendo pormenorizado o problema de pesquisa, cabe mencionar brevemente o núcleo
principal do Quadro Teórico de Referência (QTR) utilizado, que a partir da constituição da
pesquisa por instâncias está distribuído da seguinte maneira:
Epistemológica: Bunge (1980; 2013), Lakatos (1979), Popper (1973; 1979; 2013),
Sokal e Bricmont (2010), na perspectiva do realismo científico;
Teórica: Martino, L. C. (2007; 2008) e Rüdiger (2014), fundamentalmente em
relação à pertinência da questão central do trabalho;
Metódica: Hohlfeldt, Martino e França (2007), Mattelart e Mattelart (2005) e Wolf
(2008), do ponto de vista da relação com a execução técnica. Puntel (2008) e Weitz
(1988), a propósito do vínculo entre o metódico-técnico e o epistemológico-teórico;
Técnica: Baronett (2009), Bispo, Castanheira e Souza Filho (2014); Carnielli e
Epstein (2011) para as análises pertinentes à díade metódica-técnica e sua
operacionalização.
As referências foram selecionadas a partir de dois critérios básicos: (1) da pertinência -
muitas vezes somada à raridade - da abordagem central de seus autores, e (2) seu auxílio na
solução de dificuldades relativas às instâncias em que estão inseridas. Independente do
parâmetro utilizado na escolha, os esclarecimentos sobre eles e sobre as próprias referências
foram feitos mediante sua inserção no desenvolvimento do trabalho e, portanto, não serão
repetidos aqui.
Com base na maior parte dos referenciais mencionados e o projeto inicial desta pesquisa,
foram realizados estudos exploratórios2 que colaboraram para a realização de ajustes,
fundamentalmente técnicos, de coleta, descrição e análise, além de serem objeto de reflexão
epistemológica e teórica para a manutenção de centralização do problema delimitado.
Tecnicamente, os estudos exploratórios incluíram o levantamento de artigos publicados
em âmbito nacional, de 2010 a 2015, orientados pelo termo “Meio de Comunicação”. Além de
2 No artigo Comunicação e Ciência: definição de Meio como elemento para distinção do domínio, apresentado do
II Encontro Internacional de Tecnologia, Comunicação e Ciência Cognitiva em dezembro de 2015 e publicado na
segunda edição especial (dezembro de 2016) do Brazilian Journal of Technology, Communication, and Cognitive
Science pela autora em coautoria com André Rosa de Oliveira, há um exemplo da dificuldade técnica ressaltada.
Outra pesquisa exploratória com a mesma base de textos foi apresentada em coautoria com Daniel Costa de Paiva
no XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, no GP Teorias da Comunicação (setembro de
2016), no artigo Lacuna teórica do Meio de Comunicação: análise da relação termo-conceito-argumento em
periódicos nacionais.
19
um grande número de textos (à época dos estudos exploratórios, 560 artigos), foi identificada
uma grande variedade de termos utilizados como sinônimo de “Meio”.
Tendo em vista a questão chave desta investigação e os estudos exploratórios
realizados3, percebeu-se a possibilidade de a divergência e a pluralidade terminológica relativa
ao Meio de Comunicação não produzirem incomensurabilidade de caráter conceitual e, por
conseguinte, a refutação (ou respaldo) da incomensurabilidade poderia ser mantida no nível
estritamente teórico-epistemológico (BRAGA, 2011; LAKATOS, 1979; MARTINO, 2014;
POPPER, 1973 e 2013).
Dito de outra forma, supõe-se que a incomensurabilidade não se justifica no âmbito
epistemológico4, mas também não no teórico no que tange a ideia de Meio de Comunicação,
especialmente se constatado que seu esclarecimento conceitual não é central no
desenvolvimento das abordagens que são consideradas pertinentes às Teorias da Comunicação.
Ainda assim, pressupõe-se também que é possível produzir, a partir da análise dos
textos mais estudados, um delineamento básico acerca do que se pensa como Meio de
Comunicação.
Dessa maneira, o mapeamento das explicações relativas ao conceito de Meio de
Comunicação como Objetivo geral deste trabalho desdobra-se em questões acerca das inter-
relações conceituais que estruturam as perspectivas/obras selecionadas para análise, bem como
as aproximações e divergências das chaves-conceituais e a consistência argumentativa (relações
formais) entre elas5.
Para a exposição desta pesquisa, o trabalho foi organizado de forma que no Capítulo I
– Possibilidade de demarcação científica e pertinência da Comunicação, destaca-se a
justificação da posição do realismo científico (BUNGE, 2013; LAKATOS, 1979; POPPER,
2013; SOKAL; BRICMONT, 2010), argumentando-se que responde de modo mais adequado
ao ceticismo do que o antirrealismo. A proposta da Interdisciplinaridade, particularmente no
domínio da Comunicação, é entendida como uma aproximação do ceticismo/relativismo,
especialmente se fundamentada pela noção de incomensurabilidade presente em Kuhn (2001).
Tudo isso foi colocado em questão nesse primeiro capítulo para demonstrar a partir de quais
3 A ampliação/complementação das pesquisas mencionadas está incluída neste trabalho. 4 O que se fundamenta a partir do posicionamento do realismo científico em relação à defesa da
interdisciplinaridade. 5 As opções metódicas e técnicas também são pormenorizadas em momento posterior neste trabalho.
20
fundamentos prefere-se uma visão que refute a Interdisciplinaridade e tome o Princípio da
Interdisciplinaridade como ponto de partida.
Sequencialmente, no Capítulo II – Instâncias metódica e técnica da estratégia de
investigação para o mapeamento do conceito de Meio de Comunicação, apresenta-se o
percurso de seleção que levou à distinção de duas unidades de pesquisa: textos originais da
Comunicação e textos recentes. Além disso, são apresentadas as opções procedimentais de
coleta, tratamento de dados e de análise técnica dos argumentos e a justificação a respeito de
tais escolhas.
No Capítulo III – Descrição e análise dos resultados em nível metódico-técnico, são
apresentados os resultados da análise metódica-técnica das duas unidades de pesquisa, além da
justificação, frente a tais resultados, da não aplicação dos procedimentos em nível teórico-
epistemológico para toda a unidade de pesquisa relativa aos textos recentes.
Já no Capítulo IV – Interpretação em nível teórico-epistemológico dos resultados da
análise metódico-técnica, realiza-se um retorno aos fundamentos que foram expostos no
primeiro capítulo e que conduziram à pergunta Que é Meio de Comunicação nas abordagens
circunscritas pela produção nacional?, buscando-se articular uma interpretação dos resultados
da análise exposta no capítulo III a partir do nível teórico-epistemológico para a manutenção
da vigilância epistemológica, tal como proposta por Lopes (2005), bem como para a
conservação da coerência metodológica entre as instâncias da investigação.
Finalmente, o trabalho é encerrado com a apresentação das Considerações Finais e das
Referências bibliográficas.
21
Capítulo I – POSSIBILIDADE DE DEMARCAÇÃO
CIENTÍFICA E PERTINÊNCIA DA COMUNICAÇÃO
Se a estrutura estabelecida pela ciência está plausivelmente errada (por ser arbitrária,
irrelevante, impatriótica, ímpia ou por servir sobretudo aos interesses dos
poderosos), então podemos nos poupar o trabalho de compreender o que tantas
pessoas consideram um corpo de conhecimento complexo, difícil, altamente
matemático e contrário à intuição. Então todos os cientistas teriam o castigo
merecido. A inveja da ciência poderia ser superada. Aqueles que têm percorrido
outros caminhos em busca de conhecimento, aqueles que secretamente têm acolhido
convicções que a ciência desprezou, poderiam ter então o seu lugar ao sol (SAGAN,
1996, p. 214).
Tendo em vista observações da Filosofia da Ciência da linha falsicacionista, neste
capítulo são abordadas características de pesquisa, isto é, da lógica dos desenvolvimentos das
atividades científicas e, por conseguinte, perpassa por aspectos da metafísica e da
epistemologia.
Buscando não deslocar o centro deste trabalho da Ciência para a Filosofia, interessa aqui
estabelecer claramente os parâmetros que fundamentam a investigação e, consequentemente,
não dificultar quaisquer análises das argumentações expostas.
Como primeiro esclarecimento, tem-se que todo trabalho científico é uma argumentação
e, sendo assim, implica o escrutínio conceitual, em nível lógico-dedutivo e em sua relação com
aspectos empíricos. Portanto, ainda que sua interface com a Filosofia seja evidente, o que o
caracteriza como produtivo, justamente por diferenciar-se da Filosofia, é o passo que dá ao
encontro da teoria e dos índices.
Aqui já está intrínseco o posicionamento do realismo científico que faz parte deste
estudo, ou seja, entende-se que o papel da Ciência é versar sobre a realidade, o conjunto das
coisas existentes, incluindo os elementos que não podem ser totalmente abrangidos pela
percepção (POPPER, 2013).
Referindo-se ao que está subjacente à realidade que pode ser detectada, as questões que
alcançam as entidades inobserváveis são fundamentais nas reflexões científicas porque as
delimitam, afastando-as, sobretudo, do senso comum e das pseudociências, além de viabilizar
predições acerca do observável. Tal preocupação se justifica porque a realidade (observável e
inobservável) não é construída, não é subjetiva, ela existe, tendo o pesquisador a percebido ou
não. Esse é o motivo pelo qual:
25
Há muita coisa que a ciência não compreende, muitos mistérios que ainda devem ser
resolvidos. Num Universo com dezenas de bilhões de anos-luz de extensão e uns 10
ou 15 bilhões de anos de idade, talvez seja assim para sempre. Tropeçamos
constantemente em surpresas. Entretanto, para alguns escritores religiosos e da Nova
Era, os cientistas acreditam que “só existe aquilo que descobrem”. Os cientistas
podem rejeitar revelações místicas para as quais não há outra evidência senão o
testemunho de alguém, mas dificilmente acreditam que seu conhecimento da
natureza seja completo (SAGAN, 1996, p. 32).
A implicação do posicionamento realista assumido que é colocada em questão refere-se
ao fato de que “[...] os dados observacionais constituem indícios últimos para as afirmações
sobre as entidades inobserváveis” (OKASHA, 2002, p. 71-72, tradução nossa)6. É a
consequência do argumento realista sobre tal ponto que justifica sua prevalência sobre o
antirrealismo e, no caso específico deste trabalho, a preferência da delimitação de Ciência a
partir de Karl Popper e Mario Bunge (e as críticas de Sokal e Bricmont), devendo-se considerar
que a delimitação/demarcação científica se relaciona diretamente com o que Hilton Japiassú e
Danilo Marcondes apontam no Dicionário básico de Filosofia como cientificidade:
[...] evoca os critérios que nos permitem definir o que constitui um conhecimento
científico de fato e distingui-lo claramente das outras formas de saber não-
científicas. Dois são os critérios mais correntes: o recurso à dedução racional e o
recurso à verificação experimental. Só há conhecimento científico a partir do
momento em que podemos repetir determinado fenômeno ou prever com certeza o
aparecimento desse fenômeno, sob determinadas condições. Insatisfeito com o
critério da verificabilidade, defendido pelos empiristas lógicos — segundo o qual
uma teoria só é científica quando suscetível de uma verificação experimental real ou
possível —, Karl Popper propõe um critério demarcatório entre o científico e o não-
científico [...] (JAPIASSÚ; MARCONDES, 2001, p. 36).
O antirrealismo sugere que os dados manifestos subdeterminam a Ciência, isto é, os
fenômenos podem ser esclarecidos por reflexões conflitantes e, por conseguinte, não há como
precisar, abarcando-se entidades inobserváveis7 ou não, se determinada teoria é verdadeira e se
deve prevalecer sobre outras.
Já para o realismo, tal como explica Okasha (2002), há diversos outros critérios (como,
por exemplo, o da plausibilidade) que permitem escolher entre teorias incompatíveis. Isso
ocorre porque os critérios permitem classificar a qualidade das explicações fornecidas pelas
6 No original: [...] observational data constitute the ultimate evidence for claims about unobservable entities
(OKASHA, 2002, p. 71-72). 7 Okasha (2002) explica por exemplo que, embora os organismos vivos que existem no planeta sejam observáveis,
nunca foram efetivamente observados em sua totalidade pelo homem. E essa é uma das razões pela qual o critério
da falsificação é ainda o mais adequado.
26
teorias e, portanto, ainda que mais de uma forneça esclarecimentos sobre os mesmos dados, é
possível oferecer uma justificação suficiente sobre a escolha de uma explanação em detrimento
de outras.
Isso significa que a escolha de uma explicação específica não é, em Ciência, arbitrária.
Os critérios de demarcação fornecem a possibilidade de que a prevalência de determinada teoria
seja explicitada e contestada abertamente.
Admitir a contestação e a refutação de explicações não permite que se conclua que a
Ciência é relativista, subjetivista. Ao contrário, a difere da indesejável pseudociência:
A pseudociência difere da ciência errônea. A ciência prospera com seus erros,
eliminando-os um a um. Conclusões falsas são tiradas todo o tempo, mas elas
constituem tentativas. As hipóteses são formuladas de modo a poderem ser refutadas.
Uma sequência de hipóteses alternativas é confrontada com os experimentos e a
observação. A ciência tateia e cambaleia em busca de melhor compreensão. Alguns
sentimentos de propriedade individual são certamente ofendidos quando uma
hipótese científica não é aprovada, mas essas refutações são reconhecidas como
centrais para o empreendimento científico.
A pseudociência é exatamente o oposto. As hipóteses são formuladas de modo a se
tornar invulneráveis a qualquer experimento que ofereça uma perspectiva de
refutação, para que em princípio não possam ser invalidadas. Os profissionais são
defensivos e cautelosos. Faz-se oposição ao escrutínio cético. Quando a hipótese
pseudocientífica não consegue entusiasmar os cientistas, deduz-se que há
conspirações para eliminá-la (SAGAN, 1996, p. 28).
Este aspecto da prevalência de uma teoria sobre as outras está diretamente relacionado
às noções de Paradigma, de Thomas Kuhn, e Programa de investigação, de Imre Lakatos, as
quais estão circunscritas pelo problema da demarcação.
Nesse sentido, todas as propostas dizem respeito às justificações do conhecimento
científico, ou seja, perpassam questões como: quais teorias são aceitáveis? Quais são as
questões abrangidas pelo conhecimento científico? Quais são os parâmetros de avaliação das
teorias científicas? Então, a Epistemologia e a Lógica que se dirigem à Ciência assumem, em
última instância, caráter normativo, oferecendo argumentos sobre o que os cientistas devem ou
não levar à frente como atividade científica:
27
Uma vez que o debate realismo/antirrealismo diz respeito ao objetivo da ciência,
poder-se-ia pensar que seria resolvido simplesmente perguntando aos próprios
cientistas. Por que não fazer uma enquete aos cientistas perguntando-lhes sobre os
seus objetivos? Mas essa sugestão ignora o problema — toma a expressão “o
objetivo da ciência” muito literalmente. Quando perguntamos qual é o objetivo da
ciência, não estamos perguntando sobre os objetivos individuais de cada cientista.
Ao invés disso, estamos perguntando como melhor dar sentido ao que os cientistas
dizem e fazem — como interpretar o empreendimento científico. Os realistas pensam
que deveríamos interpretar todas as teorias científicas como tentativas de descrições
da realidade; os antirrealistas pensam que essa interpretação é inapropriada para as
teorias que falam de entidades e processos inobserváveis. Embora seja interessante
descobrir as próprias opiniões dos cientistas sobre o debate realismo/antirrealismo,
a questão é, em última análise, filosófica (OKASHA, 2002, p. 60-61, tradução
nossa)8.
A Filosofia da Ciência sobre a qual fala Okasha (2002) não é a única existente. Este é o
motivo pelo qual Imre Lakatos, por exemplo, se ocupou em seus estudos das Filosofias da
Ciência nos últimos anos da sua vida, questionando quais histórias da Ciência surgem a partir
de uma ou outra concepção da dinâmica das atividades científicas e, finalmente, formulou a
proposta de Programa de investigação.
Reiterando que não se pretende produzir deslocamento da Ciência para a Filosofia, cabe
resgatar as principais propostas, tendo em vista não só os diálogos que propulsionam na
Filosofia, mas sua frequência no arcabouço dos debates no domínio da Comunicação.
Entretanto, o resgate dessas propostas não é feito individualmente e/ou realizando o
escrutínio de todos os aspectos porque assim se perderia a ênfase na cientificidade. Ao
contrário, a remissão a tais propostas é executada à luz da sua produtividade e adequação ao
exercício científico. E por isso, cabe questionar, qual é o lugar da discussão epistemológica na
Ciência e, sequencialmente, no domínio da Comunicação?
8 No original: “Since the realism/anti-realism debate concerns the aim of science, one might think it could be
resolved by simply asking the scientists themselves. Why not do a straw poll of scientists asking them about their
aims? But this suggestion misses the point - it takes the expression 'the aim of science' too literally. When we ask
what the aim of science is, we are not asking about the aims of individual scientists. Rather, we are asking how
best to make sense of what scientists say and do - how to interpret the scientific enterprise. Realists think we should
interpret all scientific theories as attempted descriptions of reality; anti-realists think this interpretation is
inappropriate for theories that talk about unobservable entities and processes. While it would certainly be
interesting to discover scientists' own views on the realism/antirealism debate, the issue is ultimately a
philosophical one” (OKASHA, 2002, p. 60-61).
28
1. Centralidade da demarcação e da lógica científica na discussão
epistemológica
Recorrendo-se ao Dicionário Oxford de filosofia tem-se que:
Epistemologia (do gr., epistemê: conhecimento) Teoria do conhecimento. Algumas
de suas questões centrais são: a origem do conhecimento; o lugar da experiência e
da razão na gênese do conhecimento; a relação entre o conhecimento e a certeza, e
entre o conhecimento e a impossibilidade do erro; a possibilidade do ceticismo
universal; e as formas de conhecimento que emergem das novas conceitualizações
do mundo. Todos esses tópicos se relacionam com outros temas centrais da filosofia,
tais como a natureza da verdade e a natureza da experiência e do significado [...]
(BLACKBURN, 1997, p. 118-119).
Observando-se as questões epistemológicas indicadas por Blackburn (1997) é possível
distinguir algumas preocupações principais: (1) a questão do ceticismo (2) o problema da
demarcação (3) aspectos de métodos.
No início deste capítulo apontou-se claramente para o posicionamento do realismo, cujo
confronto habitual é com o antirrealismo/idealismo. Entretanto, em ambos os casos o
conhecimento é possível, o que significa que as duas posições se opõem ao ceticismo, à negação
de que o conhecimento, racional e diferente de mera opinião ou crença, possa ser alcançado.
A adoção do ceticismo teria como consequência o esvaziamento do exercício científico
e, também por este motivo, não poderia configurar como central neste trabalho. Isso não
significa que sejam ignoradas as importantes objeções que apresenta sobre o posicionamento
realista, mas apenas que o lugar de escrutínio das dificuldades que coloca está (interessa à) na
Filosofia de caráter geral.
O principal motivo pelo qual não é possível ignorar as objeções do ceticismo está
calcado no entendimento de que nenhuma das questões epistemológicas (problemas) é
independente. Dessa maneira, dependendo da resposta que se adota frente a uma delas, há
diferentes consequências lógicas às outras.
Apesar disso, é justificado que no âmbito desta pesquisa o ceticismo seja ao menos
parcialmente isolado porque a investigação não se dirige a todo e qualquer conhecimento sobre
o qual os problemas epistemológicos podem versar, mas apenas em torno do conhecimento dito
científico. E, neste caso, a ênfase no problema da demarcação e dos métodos se coloca como
mais adequada. Sobre isso, a importância da proposta de Karl Raimund Popper é colocada da
seguinte maneira:
29
Ficou famoso com seu primeiro livro Logik der Forschung (1935), no qual destrói
as tentativas tradicionais de fundamentar o método científico no apoio que a
experiência proporciona às generalizações e às teorias adequadamente construídas.
Acentuando as dificuldades que o problema da indução põe a qualquer método desse
gênero, Popper propõe como alternativa uma epistemologia que parte da formação
arrojada e imaginativa de hipóteses. Estas enfrentam o tribunal da experiência, que
tem o poder de falsificá-las mas não de confirmá-las (ver falsificabilidade;
falsificação). Uma hipótese que sobreviva à tentativas de refutação pode ser
provisoriamente aceita como “corroborada”, mas jamais se pode atribuir-lhe uma
probabilidade (BLACKBURN, 1997, p. 302).
Seguindo ainda Blackburn (1997, p. 302) no que tange a proposta de Popper sobre a
demarcação no domínio da Ciência, ela aparece como fundamentação do fazer científico e,
apesar de críticas no âmbito filosófico, “[...] muitos pensadores aceitam, no essencial, a solução
popperiana para o problema da demarcação entre a verdadeira ciência e as suas imitações – isto
é, que a primeira apresenta teorias genuinamente falsificáveis, ao passo que as segundas não
[...]”.
A qualidade da propositura popperiana é que, sugerindo que o exercício científico se
desenvolva equilibrando Teoria (formulação de conjecturas) e a refutação metódica (também
fundamentada em evidências empíricas), o afasta do dogmatismo e da irracionalidade, porque
estipula uma maneira/método pela qual os pesquisadores podem avaliar seus posicionamentos
e esclarecer sob que circunstâncias devem abdicar dos mesmos.
É neste ponto que a proposta de Popper pode ser comparada a de Kuhn (2001)9, uma
vez que o último explica o abandono e a aceitação dos posicionamentos científicos a partir das
revoluções científicas, ou seja, da ruptura de Paradigma, que para o autor (2001, p. 31) é anterior
aos constructos propriamente científicos e sobre isso seria necessário perguntar “[...] Por que a
realização científica concreta, como local de compromisso profissional, é anterior aos vários
conceitos, leis, teorias e pontos de vista que podem ser abstraídos dela? [...]”.
[...] O ponto de vista de Kuhn sublinha a situação histórica concreta de uma ciência
no espaço dos problemas e das perspectivas herdadas de avanços anteriores. Um
paradigma é estabelecido apenas em períodos de ciência revolucionária, surgindo
tipicamente em resposta a uma acumulação de anomalias e dificuldades que não
podem ser resolvidas no paradigma vigente (BLACKBURN,1997, p. 279).
Percebe-se então que o sentido do Paradigma de Kuhn (2001) é constituído pelo
contraste entre a Ciência Normal e a Ciência Extraordinária. Portanto, embora as abordagens
9 Publicado originalmente em 1962.
30
do autor (2001) sobre Paradigma sejam díspares, é possível uma percepção ampliada de que se
refere às bases de determinado domínio quando estabilizado (Ciência Normal). Considerando-
se que tais fundamentos são constituídos por universo conceitual, resultados de pesquisas e
processos de desenvolvimento similares, “‘ciência normal’ significa pesquisa firmemente
baseada em uma ou mais realizações científicas passadas. Essas realizações são reconhecidas
durante algum tempo por uma comunidade científica específica como proporcionando os
fundamentos para sua prática posterior [...]” (KUHN, 2001, p. 29).
As anomalias do Paradigma em vigência só serão relevantes em períodos iniciais ou de
crise, embora possam ser identificadas por pesquisas no período normal (KUHN, 2001). Assim,
à luz da visão kuhniana, a refutação (nos termos de Popper) indica em última instância imperícia
individual, pois os obstáculos do Paradigma são definidos pelo grupo de pesquisadores,
observando determinações e métricas não endógenas, mas sim externas (localizadas
particularmente nas dimensões sociológica e psicológica) e, por isso, a atividade científica é,
em última análise, dogmática.
Enquanto em Kuhn (2001) a refutação é um processo arbitrário, em Popper (2013) os
parâmetros dela precisam ser compartilhados e esclarecidos, de modo que ela também seja
passível de falseamento.
Ainda assim, a proposta de Popper (2013) é avaliada com o auxílio da perspectiva
kuhniana: algumas críticas dirigidas a Popper apontam que os exemplos escolhidos por ele para
colocar em relevo a refutação de teorias por evidências empíricas consideradas cruciais são
escolhidos e interpretados à luz do desenvolvimento já realizado (LAKATOS, 1979; PELUSO,
1995). Nesse sentido, com resultados opostos, os mesmos exemplos seriam percebidos como
simples anomalias nos critérios de Kuhn (2001), o que não obscurece a seguinte consideração:
[...] (1) um teste é – ou deve-se fazer que seja – uma luta, de dois adversários, entre
a teoria e a experiência de modo que, na confrontação final, só as duas se defrontem;
e (B) o único resultado interessante dessa confrontação é o falseamento
(conclusivo): “[as únicas genuínas] descobertas são refutações de hipóteses
científicas”. Entretanto, a história da ciência sugere que (1’) os testes são – pelo
menos – lutas, de três adversários, entre as teorias rivais e a experiência e (2’)
algumas das experiências mais interessantes resultam, prima facie, antes em
confirmação do que em falseamento (LAKATOS, 1979, p. 140).
31
Conservando o desenvolvimento da cisão com a comprovação e com a justificação
externa à Ciência oferecido por Popper (2013)10, Lakatos (1979)11 explica a origem da noção
de Programa de investigação. Em tal enquadramento, o falseacionismo metodológico é uma
progressão que considera arriscada porque “[...] os riscos são tão ousados que atingem as raias
da temeridade e a gente pergunta a si mesmo se não haverá um meio de atenuá-los”
(LAKATOS, 1979, p. 137).
Ampliando tal consideração, o autor (1979) explica que o motivo pelo qual o
falseacionismo metodológico é priorizado frente às propostas fundamentadas no nível externo
é que, cônscio da falibilidade humana e, por conseguinte, da Ciência, responde de modo mais
congruente às críticas do ceticismo:
Cumpre apreciar a atitude diabolicamente atrevida do nosso falseacionista
metodológico. Ele se tem na conta de um herói que, defrontando-se com duas
alternativas catastróficas, teve a coragem de refletir friamente sobre os méritos
relativos de cada uma e escolher o menor dos males. Uma das alternativas era o
falibilismo cético, com sua atitude de “vale tudo”, o abandono desesperado de todos
os padrões intelectuais, e com estes a ideia do progresso científico. Nada pode ser
restabelecido, nada pode ser rejeitado, nada sequer pode ser comunicado: o
crescimento da ciência é um crescimento do caos, uma verdadeira Babel [...]
(LAKATOS, 1979, p. 137).
Tendo em vista os problemas e os méritos da proposta de Popper (2013), e a
insuficiência do Paradigma de Kuhn (2001), Lakatos (1979) oferece a seguinte alternativa:
[...] uma teoria científica T só será falseada se outra teoria T’ tiver sido proposta com
as seguintes características: (1) T’ tem um excesso de conteúdo empírico em relação
a T; isto é, prediz fatos novos, a saber, fatos improváveis à luz de T, ou mesmo
proibidos por ela; (2) T’ explica o êxito anterior de T, isto é, todo o conteúdo não-
refutado de T está incluído (dentro dos limites do erro observacional) no conteúdo
de T’; e (3) parte do conteúdo excessivo de T’ é corroborado (LAKATOS, 1979, p.
142).
Em continuidade, Lakatos (1979) compartilha com Popper (2013) o entendimento de
que uma teoria pode ser mantida em função de hipóteses auxiliares, as quais são admitidas se
não forem ad hoc, isto é, se não constituírem reinterpretação linguística que ao invés de ampliar
o conteúdo e explicar um fato novo, o diminua. A colaboração de Lakatos (1979) está em
10 Resumidas pelas condições de abandono de determinado posicionamento, como indicadas anteriormente neste
mesmo item. 11 Texto incluído no quarto volume do Colóquio Internacional sobre Filosofia da Ciência, realizado em Londres,
em 1965.
32
ponderar que a avaliação da teoria inclui a análise não apenas de sua conformação geral
(condições inicias, hipóteses secundárias, evidências empíricas etc), mas também de sua
progressão em relação a outras: “[...] Só de uma série de teorias se pode dizer que é científica
ou não-científica, nunca de uma teoria isolada; aplicar o termo “científico” a uma única teoria
é incorrer num erro de categoria” (LAKATOS, 1979, p. 145, grifo do autor)
Por isso o realce está no Programa de investigação, a saber, naquilo que “[...] consiste
em regras metodológicas; algumas nos dizem quais são os caminhos de pesquisa que devem ser
evitados (heurística negativa), outras nos dizem quais são os caminhos que devem ser
palmilhados (heurística positiva)” (LAKATOS, 1979, p. 162).
O aprofundamento sobre a complementaridade entre as propostas de Lakatos (1979) e
de Popper (2013) não é o foco deste trabalho, mas cabe asseverar que, em relação à posição
kuhniana, tais propostas ajudam a argumentar que a incomensurabilidade é, em última análise,
uma questão de divergência terminológica, no sentido de que possíveis diferenças conceituais
não são indissolúveis a ponto de não existirem subsídios para avaliação12. Paralelamente,
reforçam a recusa de hipóteses ad hoc para responder a falsificações.
Nesse raciocínio a perspectiva kuhniana é enfraquecida em razão das flexibilizações
necessárias: além da incomensurabilidade se tornar superficial, a distinção entre Ciência
Normal e Extraordinária se dá arbitrariamente e, por conseguinte, o Paradigma -
especificamente concernente às revoluções científicas - perde em capacidade explicativa.
Além da posição popperiana complementada por Lakatos já exposta neste texto, há uma
refutação justificada da incomensurabilidade em Albedah (2006) 13, que defende como solução
adequada a proposta de Gadamer. Nesse sentido, ele argumenta que:
Resolver o paradoxo da incomensurabilidade deve, portanto, explicar a
ruptura comunicativa evitando as objeções levantadas contra Kuhn. Para
conseguir isso, uma explicação precisa satisfazer pelo menos três requisitos
de adequação: deve ser auto referencialmente consistente; deve ser aberta; E,
finalmente, deve ser historicamente reflexiva (ALBEDAH, 2006, p. 333,
tradução nossa)14.
12 Cabe salientar que sobre isso, o próprio Kuhn também concorda em sua fala durante o mesmo Colóquio do qual
foi extraído o texto de Lakatos (1979). Fazem parte do mesmo volume os textos de Kuhn (1979) intitulados Lógica
da Descoberta ou Psicologia da Pesquisa? e Reflexões sobre os meus Críticos. 13 A inclusão de Albedah (2006) foi realizada em função de críticas realizadas na ocasião da qualificação do
trabalho. Embora a opção proposta pelo autor (2006) tenha sido desconsiderada pelas razões apresentadas neste
capítulo, as objeções foram produtivas para o esclarecimento do delineamento da pesquisa. 14 No original: Resolving the paradox of incommensurability must, therefore, account for communicative
breakdown while avoiding the objections raised against Kuhn. To achieve this, an account needs to satisfy at least
three adequacy requirements: it must be self-referentially consistent; it must be open-ended; and finally, it must
be historically reflexive (ALBEDAH, 2006, p. 333).
33
Segundo Albedah (2006), a explicação que soluciona o problema da
incomensurabilidade é a hermenêutica gadameriana, segundo a qual um determinado
entendimento não pode ser final porque ele é sempre histórico-conceitual, influenciado por um
determinado domínio referencial e passível de expansão, ou seja, um entendimento não pode
ser último porque ele é sempre relativo, embora argumente que tal posição se afasta do
relativismo radical.
Através da hermenêutica gadameriana, a incomensurabilidade seria afastada não apenas
porque se admite a possibilidade de inúmeras reinterpretações, mas também por razões
histórico-contextuais. Assim, deve-se manter uma abertura dialógica, isto é, uma abertura para
a expansão da linguagem (inclusive a científica) e do domínio referencial que a conduz.
A posição epistemológica assumida neste trabalho concorda, em especial, com a
demanda da não contradição (consistência) da explicação nos termos apresentados pelo autor
(2006), mas não recorre ao relativismo epistêmico para isso.
A partir de tal perspectiva, trata-se, fundamentalmente, da limitação humana em relação
à produção do conhecimento em sentido amplo, ao refletir sobre Ciência como um todo, e
específico, dado que toda pesquisa possui, necessariamente, inúmeras delimitações para que
seja exequível.
Entende-se aqui que não se trata de relativismo radical porque isso resultaria em
ceticismo e Albedah (2006) não propõe que o conhecimento é impossível, mas também admite
ao menos um critério de avaliação explicativa: o da consistência. Contudo é compreendido
como relativismo epistêmico na medida em que não aponta limite para as (re)interpretações e
também não propõe qualquer estrutura explicativa.
Embora seja possível articular de modo mais ou menos rígido as explicações e possíveis
interpretações de determinado entendimento teórico, não estabelecer parâmetros sobre os
limites de (re) interpretações, especialmente quando não se coloca em questão evidências
empíricas, destituem do exercício científico aspectos básicos de sua demarcação como, por
exemplo, desenvolvimento de técnicas de controle de testes empíricos e a demanda pela
repetição dos mesmos.
Dentre as demandas apontadas pelo autor (2006), a exigência da não
contradição/consistência é particularmente importante para a proposta deste trabalho, uma vez
que as operacionalizações conceituais para as quais se dedica maior atenção estão no nível de
exposição e correlações combinadas pelas propostas teóricas que compõem as unidades de
pesquisa (LOPES, 2005). Sobre isso, Albedah (2006) afirma ainda que “para que uma
explicação seja auto referencialmente consistente, deve descrever a ruptura comunicativa por
34
premissas aceitáveis que não contradigam as próprias conclusões que são legitimamente
extraídas delas [...]” (ALBEDAH, 2006, p. 333, tradução nossa)15.
Esclarecendo o que seria a explicação gadameriana de entendimento/compreensão tem-
se que:
Gadamer pensa que a experiência estética é a experiência hermenêutica exemplar,
onde a interação entre o objeto da experiência, o contexto de compreensão e o
entendimento como um evento histórico e linguístico demonstram um tipo peculiar
de unidade através da qual a verdade da obra de arte, o contexto de compreensão e a
questão da compreensão em si não podem ser consideradas isoladamente uns dos
outros (ALBEDAH, 2006, p. 334, tradução nossa)16.
Albedah (2006) assevera que se trata de compreender que um determinado
entendimento é sempre influenciado por um domínio referencial (traditional horizon) que
delimita a compreensão sobre a qual é preciso ter consciência (historically effect
consciousness).
Faz parte de tal consciência a admissão de que um determinado entendimento não pode
ser final em razão da centralidade do efeito histórico, isto é, de que o que é compreendido sobre
dado objeto é passível de alteração por causa de condições contextuais e alterações no domínio
referencial. Além disso, uma determinada compreensão também não poderia ser tomada como
final porque:
[...] da universalidade da interpretação resulta que a compreensão é necessariamente
aberta e plural. É aberta porque o que um nativo de uma língua compreende de um
determinado texto é sempre parcial, prejudicial e finito. É a experiência dessa
finitude que motiva a abertura a outras interpretações. Do mesmo modo, o
entendimento é plural porque os horizontes tradicionais são diferenciados em virtude
do que é transmitido em suas respectivas linguagens, e estes promovem leituras
diferenciadas do texto [...] (ALBEDAH, 2006, p. 335-336, tradução nossa)17.
15 No original: For an account to be self-referentially consistent, it must describe communicative breakdown by
acceptable premises that do not contradict the very conclusions that are legitimately drawn from them […]
(ALBEDAH, 2006, p. 333). 16 No original: Gadamer thinks that aesthetic experience is the exemplary hermeneutic experience where the
interplay between the object of experience, the context of understanding, and understanding as a historical and
linguistic event display a peculiar sort of unity whereby the truth of the work of art, the context of understanding,
and the understanding subject itself cannot be considered in isolation from one another […] (ALBEDAH, 2006,
p. 334). 17 No original: [..] from the universality of interpretation that understanding is necessarily open-ended and plural.
It is openended because what a native of one language understands of a certain text is always partial, prejudicial,
and finite. It is the experience of this finitude that motivates openness to other interpretations. By the same token,
understanding is plural because traditional horizons are differentiated by virtue of what is handed down in their
respective languages, and these promote differentiated readings of the text […] (ALBEDAH, 2006, p. 335-336).
35
Nesse sentido, o autor (2006) explica que se faz necessária uma ruptura comunicativa
para que determinado entendimento seja compartilhado, ou seja, para que seja possível a
familiarização com determinada compreensão e não o inverso (alienação). E o que viabilizaria
a familiarização/não alienação sobre dada compreensão seria a abertura dialógica:
Um aspecto central da abertura dialógica, da compreensão em geral, é a antecipação
da conclusão. Visto como um todo, o texto deve ser assumido para desfrutar de
unidade interna. Essa unidade não anula a possibilidade de contradições internas,
descontinuidades ou abertura, pois elas só podem ser vistas à luz de uma suposição
de unidade. À medida que a interpretação prossegue, a compreensão do todo, por sua
vez, traria as partes sob nova luz revisando seu significado inicial [...] (ALBEDAH,
2006, p. 337, tradução nossa)18.
Para o autor (2006, p. 337, tradução nossa)19, a partir da hermenêutica de Gadamer
admite-se as inúmeras reinterpretações que, ao expandirem os limites da linguagem e dos
domínios referenciais, resultam na fusão de horizontes e, por essa razão, só é possível produzir
“[...] um entendimento infinitamente revisável e um horizonte em constante expansão [...]”.
A proposta apresentada por Albedah (2006) embora tenha diversos pontos convergentes
com a perspectiva epistemológica aqui adotada, não cabe neste trabalho. Porém, se faz
necessário responder a ela porque, acompanhando Sokal e Bricmont (2010), entende-se que é
possível compreendê-la como uma resposta às limitações da proposta de Popper (2013)20 como,
por exemplo, o falsicacionismo radical.
Em primeiro lugar, embora se concorde com a afirmação de que o referencial e os
conceitos aos quais se referem possam ser expandidos, a partir do realismo científico isso se dá
em função da relação entre as abstrações e as evidências empíricas, ou a partir da pertinência
conceitual da modificação.
Um argumento que sustente tal pertinência, ainda que tenha seus sentidos ampliados, se
estiver estruturado de modo inválido não pode ser aceito (BUNGE, 2012) e isso não depende
de contextualização.
18 No original: A central aspect of dialogical openness, of understanding in general, is the anticipation of
completion. Viewed as a whole, the text must be assumed to enjoy internal unity. Such unity does not negate the
possibility of internal contradictions, discontinuities, or open-endedness, for these could only be seen in light of
an assumption of unity. Partial experience of a text always takes place in light of a pre-understanding which is
projected onto the whole/unit. As interpretation proceeds, the understanding of the whole would in turn bring the
parts under new light revising their initial meaning [...] (ALBEDAH, 2006, p. 337). 19 No original: […] endlessly revisable understanding, and an ever expanding horizon […] (ALBEDAH, 2006, p.
337). 20 O que explica a complementação a partir de Lakatos e Bunge nesta investigação.
36
Ao menos no que tange o domínio da Comunicação, a inserção, ampliação ou
modificação de conceitos é, com certa frequência, realizada a partir de metáforas e analogias.
A questão é saber até que ponto tais recursos são realmente necessários e colaboram para a
compreensão e desenvolvimento do exercício científico (SOKAL; BRICMONT, 2010),
especialmente se somados ao relativismo epistêmico.
Sem rejeitar definitivamente outras opções, essas são as razões pelos quais se optou por
um modelo metódico-técnico condizente com o realismo científico: considera-se aqui o
exequível, observando reflexões epistemológicas, mas também técnicas21.
Posto isso, fica a constatação de que a demarcação de Ciência mantida prossegue com
uma série de demandas para um pensamento que se pretenda científico: os problemas precisam
ser circunscritos com clareza, as hipóteses devem ser passíveis de criteriosa avaliação e são
necessários dados empíricos, dentre outras coisas.
O conhecimento científico sempre diz respeito a determinado objeto empírico, um dado
fenômeno:
[...] O termo "fenômeno" passou a ser utilizado nas ciências experimentais e nas
ciências humanas para designar não uma coisa, mas um processo, uma ação que se
desenrola. Assim, a física e a química denominam "fenômeno" toda modificação que
ocorre no estado de um corpo: o movimento é um fenômeno (o corpo em movimento
se desloca); a dilatação dos gases é um fenômeno, mas os gases são corpos: a
digestão (em biologia) é um fenômeno, mas o aparelho digestivo é um conjunto de
órgãos (JAPIASSÚ; MARCONDES, 2001, p. 75).
Avaliada superficialmente a afirmação pode parecer absurda em um trabalho de base
realista e que prevê a pesquisa empírica como característica fundamental, mas o conhecimento
científico inicia-se em idealizações/reflexões (e não experiências) sobre os fenômenos. Dito de
outra forma, a Ciência é iniciada a partir de um problema:
[...] o conhecimento não começa com percepções ou observações ou com a
recopilação de dados ou de fatos, senão com problemas. Não há conhecimento sem
problemas – mas tampouco há problema sem conhecimento. Quer dizer que este
começa com a tensão entre saber e não saber, entre conhecimento e ignorância:
nenhum problema sem conhecimento –nenhum problema sem ignorância. Porque
todo problema surge do descobrimento de que algo não está na ordem do nosso saber
atual, ou logicamente considerado na descoberta de uma contradição interna entre o
nosso suposto conhecimento e os supostos fatos (POPPER, 1973, p. 102, grifo do
autor, tradução nossa)22.
21 Essas opções metodológicas são explicadas no Capítulo II deste trabalho. 22 No original: […] el conocimiento no comienza con percepciones u observación o con la recopilación de datos o
de hechos, sino con problemas. No hay conocimiento sin problemas — pero tampoco hay ningún problema sin
37
Sendo a contradição identificada derivada ou não de conhecimento científico, em se
reconhecendo um Problema de pesquisa, a teorização passa a ser primordial. E o que parece ser
essencial é a incidência da reflexão sobre o aspecto disciplinar da Ciência, não apenas no que
tange seu caráter sistemático, mas também na medida em que materializa um domínio científico
e, por conseguinte, um determinado quadro de pertinência de indagações, já que “[…] uma
especialidade científica – como é chamada – é apenas um conglomerado delimitado e
construído de problemas e ensaios de solução. O que realmente existe, no entanto, são os
problemas e as tradições científicas” (POPPER, 1973, p. 106, tradução nossa)23.
Tal como explica Bunge (2013), as teorizações dependem do estabelecimento de pelo
menos um objeto-modelo que sempre começa por simplificações, as quais posteriormente são
complexificadas. Entretanto, não significa que tais complexificações resolvem as limitações
típicas da Ciência como, por exemplo, de ser falível, de produzir apenas hipóteses provisórias
ou de não dar conta de todas as questões do Universo. Assim, por mais complexa que seja
sempre implicará alguma redução.
A distinção entre objeto empírico e Objeto de pesquisa está diretamente relacionada às
limitações indicadas, porque a partir da admissão de que dificilmente a realidade completa será
conhecida cientificamente e que há sempre o inobservável, eles jamais serão idênticos. O
Objeto de pesquisa, bem como os esquemas e modelos conceituais nos quais se apoia, são
ferramentas que o pesquisador utiliza para se aproximar da realidade, e não a realidade em si.
A compreensão segundo a qual as tentativas de estabelecimento de um Objeto de
pesquisa são reducionistas rejeita as características básicas da atividade científica, normalmente
exigindo de tal atividade o que não é possível ofertar, isto é, verdades absolutas e equivalência
entre Objetos de pesquisa (derivados de teorização) e objetos empíricos, como uma espécie de
domesticação da realidade:
conocimiento. Es decir, que éste comienza con la tensión entre saber y no saber, entre conocimiento e ignorancia:
ningún problema sin conocimiento— ningún problema sin ignorancia. Porque todo problema surge del
descubrimiento de que algo no está en orden en nuestro presunto saber; o, lógicamente considerado, en el
descubrimiento de una contradicción interna entre nuestro supuesto conocimiento y los hechos; o expresado quizá
más adecuadamente, en el descubrimiento de una posible contradicción entre nuestro supuesto conocimiento y los
supuestos hechos (POPPER, 1973, p. 102, grifo do autor). 23 No original: [...] Una especialidad científica —tal y como se la llama— no es sino un conglomerado delimitado
y construido de problemas y ensayos de solución. Lo realmente existente, no obstante, son los problemas y las
tradiciones científicas (POPPER, 1973, p. 106).
38
Talvez a distinção mais clara entre a ciência e a pseudociência seja o fato de que a
primeira sabe avaliar com mais perspicácia as imperfeições e a falibilidade humanas
do que a segunda (ou a revelação “infalível”). Se nos recusamos radicalmente a
reconhecer em que ponto somos propensos a cair em erro, podemos ter quase certeza
de que o erro - mesmo o engano sério, os erros profundos - nos acompanhará para
sempre. Mas, se somos capazes de uma pequena auto avaliação corajosa, quaisquer
que sejam as reflexões tristes que possa provocar, as nossas chances melhoram muito
(SAGAN, 1996, p. 28-29).
Tais ponderações não conduzem a Ciência ao subjetivismo, justamente porque não
sustentam a conclusão de que a realidade se reduz às representações que ela fornece.
Tendo em conta que a noção de realidade não é um consenso nem mesmo na Filosofia,
e sendo este um trabalho circunscrito pela Ciência, resta tomar de empréstimo os argumentos
filosóficos que refutam a ideia de uma realidade convencionada, determinada pela interpretação
e, enfim, subjetiva.
Isso implica o argumento de que à Ciência é necessário realizar constantes ajustes
(oriundos dos questionamentos de suas propostas), que correspondem a adequações dos
sistemas teóricos à realidade que se dirigem. Isso ocorre porque, em algum momento percebe-
se que o conhecimento que se pensa ter sobre a realidade se mostra no mínimo incompleto, ou
seja, não condiz “verdadeiramente” a realidade (POPPER, 1973).
Ainda que se admita que o Objeto de pesquisa é uma interpretação, deve não apenas
estar relacionada aos índices empíricos, como também deve poder ser criticada em termos da
qualidade dessa relação.
Então, a interpretação não é a realidade em si, mas integrante do método de aproximação
com a realidade, e isso explica porque os cuidados com o universo conceitual que sustenta
determinado domínio científico são tão importantes quanto as consequências, os reflexos da
explicação teórica.
Uma vez que os conceitos são exprimidos por termos, assevera-se que a ambiguidade
terminológica que tem como resultado a pluralidade conceitual é típica do uso ordinário das
palavras e, por isso, não cabe como recurso de teorização: invariavelmente, propulsionará a
irrefutabilidade das proposições, aproximando a explanação formulada da pseudociência
(BUNGE, 2013). Além de, como apontado anteriormente, produzir a falsa sensação de
incomensurabilidade.
A importância do aspecto conceitual é retomada posteriormente neste trabalho, porque
há outro fator que também colabora para a sensação de incomensurabilidade, mas que
permanece no cunho epistemológico: o posicionamento da interdisciplinaridade, que é
abordado nesta investigação à luz da noção de caixa negra.
39
2. A questão da (inter)disciplinaridade a partir do deslocamento da caixa
negra para a caixa translúcida
Resumidamente, qualquer objeto-modelo denominado caixa negra ajusta-se a uma
limitação básica do domínio ao qual pertence: a impossibilidade metodológica de abranger as
dinâmicas endógenas dos fenômenos aos quais se dirige. Isso se dá porque as variáveis
mensuráveis (direta ou indiretamente) não se localizam nos processos internos e, por
conseguinte, restringem a teorização sobre todos os aspectos inobserváveis envolvidos. Esse
entendimento, baseado em Bunge (2013), difere-se da noção de “caixa preta” de Bruno Latour
(2000).
Em Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora, Latour
(2000, p. 17) trabalha com a ideia de que a Ciência24, tal como praticada por cientistas, tende a
ser uma caixa preta. Então, é preciso decidir se “[...] nossa entrada será pela porta de trás, a da
ciência em construção, e não pela entrada mais grandiosa da ciência acabada”.
A proposta de Latour (2000) é realizada a partir do que se denomina Science Studies25,
enfatizando a noção do sujeito, neste caso produtor do conhecimento científico, para dar conta
da relação entre ciência, tecnologia e sociedade, sobre a qual:
Eu afirmo que esse campo existe, que há um núcleo de problemas e métodos comuns,
que ele é importante e que todas as disciplinas e objetos dos estudos de "ciência,
tecnologia e sociedade" podem ser empregados também como material especializado
para estudá-lo. Para definir o que está em jogo nesse campo de estudo, a única coisa
de que precisamos são alguns conjuntos de conceitos suficientemente resistentes
para aguentar a viagem por todas essas disciplinas, esses períodos e objetos
(LATOUR, 2000, p. 35-36).
A caixa preta de Latour (2000) somada ao nexo que faz a partir da figura mitológica de
Jano não é um conceito, método ou qualquer outro elemento científico elaborado pelo autor
(2000), mas um recurso explicativo do qual se utiliza para justificar sua opção pela abordagem
de Science Studies e contextualizar sua ideia de ciência e técnica, a tecnociência.
As diversas implicações filosóficas e científicas da consideração da proposta de Latour
(2000) nesta investigação e as inúmeras objeções que podem ser feitas, não suprimem o
esclarecimento em questão: diferentemente, para Bunge (2013), o objeto-modelo do tipo caixa
negra é parte do ferramental utilizado para a construção de conhecimento científico, é uma
24 A rigor, não há muita diferença para o pensamento do autor (2000) entre Ciência/cientistas e Técnica/técnicos. 25 Uma Antropologia da Ciência que se opõe à Sociologia tradicional, cujo ícone seria Durkheim.
40
abordagem, uma opção ou possibilidade metódica e não um recurso explicativo, como em
Latour (2000).
Já Blackburn (1997) abrange a expressão “teoria da caixa preta” em um sentido bem
próximo ao de Bunge (2013):
A compreensão de algo inteiramente através de sua função. Essa concepção deixa-
nos o problema de saber qual é o mecanismo que permite o desempenho dessa
função, já que esse algo é considerado como uma caixa preta, onde tudo aquilo que
o faz funcionar é invisível. Numa teoria da caixa preta aplicada à ciência, por
exemplo, considera-se uma teoria científica unicamente como um formalismo, ou
como um simples dispositivo para produzir previsões a partir de dados empíricos.
Numa teoria da caixa preta aplicada à mente, diríamos que compreendemos a mente
de uma forma exaustiva quando sabemos quais são os dados de entrada (inputs) que
nela produzem os seus dados de saída (outputs) (BLACKBURN, 1997, p. 380).
As explicações teóricas fundamentadas em objeto-modelo caixa negra tendem à
diversidade porque cada objeto empírico abarcado implica um diferente modelo teórico que,
em geral, não é compatível com outros. Portanto, a característica em comum não é de ordem
teórica, mas sim a maneira de empreender a investigação, uma vez que “[...] ‘caixa negra’ se
refere a uma espécie de abordagem mais do que a um tema; sugere que a gente está lidando
mais com o comportamento global do que com a estrutura interna - sem implicações relativas
à não-existência de uma estrutura [...]” (BUNGE, 2013, p. 70, grifo do autor).
Não sendo relativas à não-existência da estrutura, as implicações da caixa negra
consistem na ênfase dos aspectos externos (como, por exemplo, efeitos) em detrimento de
pressupostos relativos às dinâmicas internas, ou seja, é em princípio incompleta frente aos
requisitos científicos, porque se caracteriza por (1) alto grau de generalidade (2) caráter total
(3) simplicidade (4) precisão26 (5) segurança27:
[...] De fato, um alto grau de generalidade, ou falta de especificidade, revela que a
espécie do sistema não é levada em conta; o caráter não-local prova que a provável
estrutura complexa do sistema foi relanceada, ou no mínimo, integrada; a
simplicidade é a marca da superficialidade; finalmente, a excelência na adequação
desacompanhada de profundidade, de segurança e de certeza, aproximam
perigosamente as teorias fenomenológicas da irrefutabilidade - que, segundo Popper,
é o selo da não-ciência (BUNGE, 2013, p. 83).
26 “Podemos construir teorias fenomenológicas para satisfazer qualquer conjunto de dados por um aumento
adequado ou pela manipulação de um certo número de parâmetros” (BUNGE, 2013, p. 82). 27 “As teorias da caixa negra são as mais firmemente ancoradas na experiência, portanto, as melhores protegidas
contra refutação [...]” (BUNGE, 2013, p. 82).
41
Por outro lado, segundo Bunge (2013), há pelo menos três razões que sustentam a
pertinência da caixa negra: (1) o início de modelos teóricos que satisfazem requisitos científicos
são, em geral, realizados a partir deste tipo de abordagem; (2) são suficientes para certos fins,
especialmente porque são descrições gerais e (3) realizam a interlocução entre teorias mais
profundas e evidências empíricas.
Ao ser iniciada por um modelo do tipo caixa negra, uma disciplina progride quando
passa a satisfazer os requisitos científicos, ou seja, a estruturar modelos teóricos que além de
operacionalizar índices externos (especialmente de saída, efeito), se ocupam da hipotetização
de mecanismos internos. É neste ponto que a interdisciplinaridade aparece da seguinte maneira:
PRINCÍPIO DA INTERDISCIPLINARIDADE – Dada qualquer disciplina
científica, existe uma interdisciplinaridade que a liga a outra disciplina científica.
Esta máxima metodológica convida a ultrapassar fronteiras disciplinares. É fértil,
muito embora irrefutável. Ao mesmo tempo, ajuda a discriminar a ciência da
pseudociência, a qual, tipicamente, fica isolada (BUNGE, 2012, p. 296).
Paviani (2008), buscando estipular os possíveis sentidos de interdisciplinaridade, aponta
para algumas limitações:
Imaginar que a interdisciplinaridade consiste na criação de novas ciências ou
disciplinas é uma ambição desmesurada e uma simplificação utópica. Relacionar a
interdisciplinaridade ao conceito de revolução científica, no sentido de Kuhn, é uma
hipótese muito pretensiosa. Afirmar, finalmente, que as relações interdisciplinares
não possuem relevância epistemológica, pois desde sempre as disciplinas estão numa
relação mútua, é desconhecer o estado atual do conhecimento científico e das
questões pedagógicas (PAVIANI, 2008, p. 15).
Entende-se que as limitações/proibições apontadas pelo autor (2008) acerca da
interdisciplinaridade sugerem que há contextos diferentes, mas inter-relacionados, a exemplo
do que acontece com a Filosofia da Ciência. Mas novamente, seguindo o posicionamento
(inclusive de caráter epistemológico) assumido até aqui, interessa a dimensão em que ela afeta
aspectos lógicos do desenvolvimento científico.
Isso porque, ainda que se admita que no âmbito da realidade da prática científica os
níveis lógicos e extralógicos mantêm relação direta, a análise demanda um afastamento em que,
como campos de reflexão, tais dimensões não podem ser equivalentes ou redutoras da outra
inadvertidamente.
42
De modo geral, o argumento de maior fôlego28 e mais frequentemente identificado na
Comunicação29 diz respeito à complexidade do objeto a ser investigado, sendo um dos
referenciais mais influentes o sociólogo francês Edgar Morin. Quando propõe a epistemologia
da complexidade (2006) e quando denuncia a falta de consciência – no sentido de ignorância
sobre os fundamentos, assim como do não comprometimento ético (2005) – do fazer científico,
Edgar Morin está, prioritariamente, questionando a pertinência da disciplina e dos fundamentos
científicos básicos oriundos da Filosofia da Ciência.
Sua crítica do cerceamento reflexivo produzido pelo âmbito disciplinar (MORIN, 2006)
se estabelece na medida em que se admite inobservância do Princípio da interdisciplinaridade
(BUNGE, 2012). Mas as ideias simplificadoras da realidade, às quais a complexidade explicada
por Morin (2005) se opõe parecem formar não a Ciência como um todo, mas uma má ou
pseudociência.
Crítica semelhante foi realizada por Kuhn (1979) no Colóquio Internacional sobre
Filosofia da Ciência de 1965, na sua readequação de Ciência Normal. Sobre isso, Popper (1979)
respondeu que:
A meu ver, o cientista “normal”, tal como Kuhn o descreve, é uma pessoa da qual
devemos ter pena [...] O cientista “normal”, a meu juízo, foi mal ensinado. Acredito,
e muita gente acredita como eu, que todo o ensino de nível universitário (e se possível
de nível inferior) devia consistir em educar e estimular o aluno a utilizar o
pensamento crítico. O cientista “normal”, descrito por Kuhn, foi mal ensinado. Foi
ensinado com espírito dogmático: é uma vítima da doutrinação (POPPER, 1979, p.
65).
É por isso que é difícil não perceber a proposta da complexidade como insuficiente para
eliminar as demandas do conhecimento científico. Além de se tratar de uma crítica da má
ciência, foi no bojo do desenvolvimento científico que se tornou evidente (MORIN, 2006;
BUNGE, 2013). Assim, a complexidade acaba por reforçar as demandas da demarcação e da
lógica científica, sobretudo no que toca a delicada relação entre a reflexão e o objeto empírico,
equilibrada necessariamente pelo Objeto de pesquisa.
Alguma redução será sempre necessária, fundamentalmente porque a falibilidade
humana é perene em todo o constructo científico. Entretanto, isso não é negado pela Ciência,
28 Porque se distancia em alguma medida da justificativa de subversão do exercício de poder
disciplinador/mutilador da Ciência e aproxima-se de possibilidades na dimensão da lógica do desenvolvimento
científico. 29 Considerando aqui, fundamentalmente, o contexto brasileiro.
43
ao contrário é admitido como premissa e limitação de seu exercício e, por conseguinte, se trata
de algo de que se tem (cons)ciência.
Considerando as imbricações endógenas, não se refuta a ideia de que a
interdisciplinaridade30, no que tange sua influência no debate epistemológico, possa não ter sido
apreciada pelos diversos domínios e em diferentes momentos da construção científica. Mas já
em Bunge (2013)31 é tomada como consequência do requisito epistemológico da coerência
externa, dentro do qual:
A teoria deve ser coerente com a massa de conhecimento aceito, se é que deve
encontrar apoio em algo mais do que apenas seus exemplos, se é que deve ser
considerada como um acréscimo ao conhecimento e não como um corpo estranho.
As teorias revolucionárias – em contraposição às teorias divergentes ou doidas – são
incoerentes com apenas parte do conhecimento científico, pois a própria crítica das
velhas teorias e a construção de outras novas se realiza com base em conhecimento
definido e à luz de normas mais ou menos explicitamente estabelecidas. As
heterodoxias isoladas não põem em perigo a massa do conhecimento estabelecido
(no entanto provisório); muito ao contrário, questionamos as teorias isoladas à luz
de conhecimento aceito e regras de procedimento (BUNGE, 2013, p. 135).
Este requisito epistemológico está diretamente vinculado a outros também de ordem
epistemológica e metodológica e, indiretamente, às exigências filosóficas da teoria que, de
modo geral, afetam o poder explanatório e preditivo, sua profundidade, sua justeza
metacientífica etc (BUNGE, 2013).
Dessas relações, a mais interessante para o centro deste item do trabalho é a que diz
respeito ao critério também epistemológico do poder explanatório, como sendo o equilíbrio
entre alcance e precisão:
[...] Mas o alcance de uma teoria científica não pode pretender solucionar todo e
qualquer problema, sob pena de tornar-se irrefutável. Em particular, uma teoria
científica tem de ser unilateral, i. e., não deve ser capaz de amparar hipóteses ou
propostas contrárias (e.g., contraditórias), nem deve ser coerente com elementos de
evidência contraditórios [...] (BUNGE, 2013, p. 136-137).
30 Também é preciso destacar que é na questão da interdisciplinaridade que os aspectos educacionais, de
transmissão do conhecimento científico no âmbito escolar se destacam, em comparação aos outros elementos
discutidos até aqui. O que não suplanta, entretanto, a limitação de execução desta investigação: optando-se pela
dimensão lógica, não há possibilidade de abranger a Ciência ou a disciplina com tão largo alcance, a ponto de
alcançar o político, institucional, econômico, educacional etc. 31 Cuja primeira edição em espanhol é de 1972.
44
A crítica de Martino e Boaventura (2013) a respeito da interdisciplinaridade alcança,
dentre outras coisas, justamente essa implicação epistemológica do desequilíbrio entre alcance
e precisão que caracteriza algumas percepções de interdisciplinaridade, colocando-a em
oposição à Ciência:
Disciplinas menos consolidadas teoricamente, como a Comunicação e a Educação,
ficam expostas a estas propostas radicais, de modo que alguns julgam encontrar na
interdisciplinaridade uma maneira de resolver seus problemas de fundamentação,
objeto e método. Contudo a própria falta de clareza sobre o sentido de
interdisciplinaridade traz uma importante implicação epistemológica: dependendo
da maneira como se compreenda a interdisciplinaridade, a consequência lógica é
negar a possibilidade de que a Comunicação possa ser trabalhada como uma
disciplina científica, além de criar embaraços para as atividades de ensino e pesquisa
(MARTINO; BOAVENTURA, 2013, p. 2).
Deslocar a interdisciplinaridade do Princípio/Requisito de Interdisciplinaridade
(BUNGE, 2012 e 2013) corresponde a compreendê-la como uma ruptura paradigmática em
relação à disciplina no sentido proposto por Kuhn (2001).
Por consequência, a proposta carrega o esvaziamento da noção de Paradigma
identificado no primeiro item deste capítulo. Mas, além disso, origina-se da equivocada redução
de disciplina como mera articulação burocrática (MARTINO; BOAVENTURA, 2013). Ao
contrário, a disciplina é uma característica da Ciência:
[...] a repartição em disciplinas e a especialização do conhecimento são
características do conhecimento científico, o que fica mais nítido com o
desenvolvimento deste. A ciência difere, portanto, da filosofia, que é intrinsecamente
um saber inter/trans disciplinar. Daí o mal-estar da crítica interdisciplinar mais
radical, pois o ataque e a desclassificação do pensamento científico podem soar como
uma volta a um estado pré-científico (erudição naturalista, sabedoria de vida, ética
humanista...) ou como um descabido exercício de apregoar a superioridade da
especulação filosófica sobre o trabalho científico, quando na verdade são
conhecimentos de ordens diferentes (MARTINO; BOAVENTURA, 2013, p. 6).
Não se pretende com isso afirmar que essa é a única questão de consequência
epistemológica a ser objeto de atenção no domínio da Comunicação, mas sim que a partir desta
crítica é possível iniciar o questionamento sobre o lugar e as condições da discussão
epistemológica, especificamente em Comunicação, o que é objeto da próxima seção.
45
3. Pertinência epistemológica do Problema de Pesquisa
Levando em consideração principalmente o argumento da incomensurabilidade e da
interdisciplinaridade, volta-se para o texto Trilhas da investigação epistemológica: o GT
Epistemologia da Comunicação da Compós, de Luis Mauro Sá Martino (2014), no qual se
identifica como central o problema da diversidade de objetos e, por conseguinte, de referenciais
teórico-conceituais.
Em uma linha de abordagem próxima ao texto de Martino (2014), para discutir o lugar
do debate epistemológico na Comunicação tanto quanto se faz pertinente neste item do
trabalho32, foram buscados textos nos anais de Intercom e Compós, sobretudo e respectivamente
nos grupos Teorias da Comunicação e Epistemologia da Comunicação. Além disso, no caso de
periódicos, as preferências pelos textos foram orientadas por dois critérios: a avaliação Qualis
dos periódicos (de A1 a B3)33 e a centralidade da questão epistemológica34.
Um exemplo de tal centralidade está em Marcondes Filho (2011), para o qual a
consequência negativa da demasiada amplitude das abordagens (tomadas como um conjunto) é
também provocada pelo descompromisso epistemológico e ontológico com a comunicação:
[...] Todos falavam de comunicação e ninguém se debruçava sobre a comunicação.
Adorno e Horkheimer demonizavam a cultura pop porque esta elevava o kitsch à
estatura da grande arte; McLuhan intrigava-se com os equipamentos técnicos
prolongando nossos próprios órgãos e membros; Eco empobrecia a discussão
reduzindo-a a um embate de extremos: ou cedemos aos apocalípticos ou nos
integramos. Nem os mais recentes críticos da cultura técnica – Flusser, Deleuze,
Baudrillard, Kamper –, nem os comentadores cautelosos da era digital, em suma,
ninguém se pergunta o que é, em última análise, comunicação (MARCONDES
FILHO, 2011, p. 170).
Identificando preocupações da mesma ordem, Ciro Marcondes Filho e José Luiz Braga
discutem seus posicionamentos em diversos textos especialmente a partir de 2011, ampliando
o debate para os níveis metodológicos e teóricos, de forma que não cabem neste item do
trabalho.
32 Em outros capítulos posicionamentos teóricos adotados em pesquisas comunicacionais brasileiras serão objeto
de análise conceitual. Dessa maneira, os textos aqui citados esboçam o panorama da possibilidade de cientificidade
da Comunicação, sem maiores detalhes, para privilegiar a manutenção da ênfase em questões epistemológicas (ou
de implicações epistemológicas) diretas. 33 Lista recente do Qualis Periódicos referentes aos anos 2013 e 2014 e acessada com base em documento que
informa sobre a atualização, disponível em: <http://uploads.capes.gov.br/files/OficioCircular22_DAV-
DivulgacaoQualis.pdf>. Acesso em: 16 fev. 2016. 34 Todos os textos correspondem ao período de 2010 a 2016, excetuando textos em livros. Assim, ainda que os
debates de interesse deste item sejam abordados em livros, a preferência pelos congressos e periódicos se dá pela
dinâmica mais ágil e pela abrangência ampliada destes textos em relação aos livros.
46
Mas no ponto inicial de ambos, insiste-se na recusa da interdisciplinaridade nos
parâmetros criticados por Martino e Boaventura (2013) e na demanda por orientações
epistemológicas e ontológicas mínimas, visto que “esta postura, talvez válida em um ângulo
filosófico, não deixa, entretanto, margem para uma pesquisa que se pretenda identificável. A
comunicação, espalhando-se como objeto por todas as áreas, estando em todas as pautas, não
está em nenhum lugar” (BRAGA, 2011, p. 65).
O motivo pelo qual tal escolha, que é em última análise epistemológica, não se justifica
é:
Além do absurdo lógico de que o espaço de encontro é o vácuo, o que não fica
explicado nessa perspectiva é por que, de repente, há um tema que se torna de
interesse tão generalizado e com tal acuidade que não consegue mais efetivamente
caber nos espaços de cada campo particular ou de algumas interfaces bem
construídas. Note-se que outros temas ocupam igualmente o interesse de várias
disciplinas – por exemplo – a violência, o trabalho, o sexo, o discurso, a tomada de
decisões. Em várias disciplinas, esses temas surgem e simplesmente se encaixam na
ordem de preocupações dominantes de cada campo, aí bem integradas. Ou seja, ainda
que transversais a vários campos, estes diversos temas são facilmente subsumidos
ao ângulo de interesse de cada disciplina. No diálogo entre uma disciplina e outra,
são essas angulações específicas que são cotejadas para ampliar o enfoque (BRAGA,
2011, p. 63-64).
Para o autor (2011), uma saída possível é viabilizada pela posição segundo a qual:
[...] o objeto da Comunicação é toda e qualquer “conversação” do espaço social. Ou
melhor: o que há de propriamente “conversacional” e de troca (simbólica e de
práticas interativas) nas diversas instâncias e situações da vida social. Em
contraposição a esta visão da comunicação generalizada (mas ainda com ênfase nos
processos comunicacionais – de trocas simbólicas e práticas, portanto) uma
preferência mais circunscrita, enfocando apenas o que ocorre nos “meios de
comunicação social” (MCS ou mídia) (BRAGA, 2011, p. 65).
No artigo A disciplinarização da Epistemologia no ensino da(s) Teoria(s) da
Comunicação, Luis Mauro de Sá Martino (2013) aponta para duas possibilidades mais
relevantes: a Comunicação a partir de meios ou de processos. O que ambas possuem em comum
é que, invariavelmente, dependem de esclarecimentos sobre os meios de comunicação, ainda
que seja para refutar sua centralidade.
A centralidade dos meios de comunicação é a posição evidente nos diversos textos de
Luiz Cláudio Martino, somada aos diferentes argumentos de caráter epistemológico que utiliza
para justificá-la. A crítica direta à posição de Martino está no texto de Francisco Rüdiger (2014),
47
Epistemologia “da” Comunicação: elementos para a crítica de uma fantasia acadêmica, no
qual explica que:
O presente artigo agencia estas interrogações e se origina do ceticismo em relação
aos movimentos acadêmicos que, reivindicando uma causa sem examinar seus
pressupostos, desejam fundar uma autoridade intelectual propagando uma crença e
recrutando seguidores, seja para conquistar vantagens materiais e administrativas,
seja para satisfazer fantasias de poder em um mundo dominado pela vontade de
possuí-lo. A legitimação acadêmica e reconhecimento institucional não bastam para
conferir autonomia epistemológica a um saber e, por isso, relativamente à matéria,
só mantém o espírito livre quem evita confundir prática política institucional e
voluntarismo epistemológico com justificativa intelectual e filosófica (RÜDIGER,
2014, p. 398).
Ainda que a primeira justificativa para sua refutação da Epistemologia da Comunicação
seja baseada na questão da “luta pelo poder”, Rüdiger (2014) propõe-se a restringir sua crítica,
dentre outras coisas, pelo estabelecimento de parâmetros conceituais.
É em função disso que Rüdiger (2014) não rejeita a ênfase nos meios de comunicação,
ao mesmo tempo em que refuta as justificativas de Martino:
Martino deseja, em resumo, algo simples e razoável, que a pesquisa em
comunicação, entre os que fazem parte administrativamente dos setores acadêmicos
agrupados com o rótulo, se reduza a estudos de mídia (Martino, 2001a). Acreditamos
estar de acordo com ele, quando subscrevemos a tese de que, em vez de
comunicação, o tema mais central de nossos estudos são os fenômenos de mídia [...].
Sua ingenuidade ou ilusão consiste em pensar que isto, entretanto, baste para
justificar uma epistemologia e, assim, fundar uma nova ciência. A origem do pecado
é o culto fetichista da palavra “comunicação”, lançada onde deveriam aparecer os
termos mídia e estudos de mídia (RÜDIGER, 2014, p. 402).
Para o autor (2014), a localização disciplinar dos meios de comunicação não pode se
dar a partir de um debate epistemológico, uma vez que tal reflexão “[...] só tem necessidade
desde o ponto de vista de quem analisa filosoficamente a atividade científica. O pesquisador
mesmo pode desconhecê-la, sem que isso importe necessariamente em prejuízo. A falta pode
ou não acarretá-lo, porque, como tal, aquele primeiro está, em essência, engajado noutro tipo
de tarefa” (RÜDIGER, 2014, p. 403).
O mérito da objeção de Rüdiger (2014) é a distinção entre os trabalhos teórico e
epistemológico, na medida em que é da alçada do primeiro a elaboração conceitual que deveria
separar toda e qualquer comunicação (vista sob inúmeras angulações, de diferentes domínios),
daquela relativa aos meios de comunicação. Sua contrapartida é de que:
48
As teorias da comunicação que dispomos não procedem à sistematização da área, no
sentido de fazer convergir suas teses e proposições. A pergunta que se deve fazer,
porém, é: por que deveriam? O raciocínio precede como se a sistematização, no
sentido da confecção de uma “teoria geral” ou da explicitação de um “princípio
unitário” fosse não apenas desejável e possível, mas indispensável à sobrevivência
acadêmica e intelectual dos estudos de mídia. O fato, no entanto, é que não é assim:
o campo acadêmico da comunicação surgiu e vem prosperando à revelia dessa
exigência, que pode interessar e ser esperada pela filosofia da ciência, mas não é
necessária para ajuizar os resultados de suas pesquisas e, mesmo, manter uma
comunidade acadêmica [...] (RÜDIGER, 2014, p. 405).
Assim, a proposta do autor (2014) retoma ao menos parcialmente o ceticismo, visto que
inviabiliza que a crítica de posicionamentos diferentes seja realizada a partir de parâmetros
epistemológicos e metodológicos, atribuindo a Martino um segundo equívoco: o de sucumbir
“acriticamente à crença no conhecimento científico como única forma legítima de saber [...]”
(RÜDIGER, 2014, p. 405).
Rüdiger (2014) também tem razão em sua objeção de que a distinção temática não é um
critério diretamente epistemológico, cabendo a contrapartida de que não significa que não tenha
importantes implicações em tal instância. Somado a tal pontuação, também apresenta o
argumento de que:
Epistemologia da comunicação, na medida em que pode carregar rigor e propriedade
filosófica como expressão, só pode significar estudo analítico, eventualmente
histórico dos fundamentos teóricos e metodológicos que estruturam a pesquisa e a
produção do conhecimento por parte dos investigadores dos chamados fenômenos
de comunicação (mídia, mais frequentemente). Isto é, refere-se à análise das
perspectivas teóricas e métodos de estudo dos quais lançam mão os estudiosos dos
fenômenos ligados à imprensa, ao rádio, à televisão e a outros meios de
comunicação. Confunde-a com a teoria aquele que lhe atribui à tarefa de definir o
que é a comunicação enquanto objeto de pesquisa, visto que só aquela pode,
legitimamente, construir seu conhecimento (RÜDIGER, 2014, p. 411).
Além disso, também tem razão em sua objeção de que:
Quem quer que se proponha a analisar e debater os feitos e realizações, mas também
os problemas e desafios da pesquisa em comunicação (mídia, de fato) fará bem em
se dedicar à epistemologia, porque é nesse plano que essas tarefas se colocam.
Porém, só o fará bem se não perder contato com o trabalho de investigação
efetivamente desenvolvido na área e puser de lado a convicção provinciana de que
esta tarefa possui o objetivo doutrinário de provar o caráter de ciência desse campo
do conhecimento, através da determinação abstrata e impositiva do que pretende que
seja seu objeto (RÜDIGER, 2014, p. 410).
49
Entretanto, a solução de Rüdiger (2014) também aponta para a preponderância da
dimensão extralógica na discussão epistemológica, porque para o autor (2014), do contrário,
recai-se na defesa da Ciência como único conhecimento legítimo.
Então, em tal solução o trabalho epistemológico está restrito ao levantamento das
produções científicas, tendo os parâmetros pautados exclusivamente pelas práticas dos
estudiosos. Porém, como colocado por Okasha (2002), no que tange a questão epistemológica,
trata-se do melhor sentido que se pode dar ao empreendimento científico e não do sentido
construído pelos objetivos individuais dos pesquisadores.
É possível observar que a discordância sobre o que é ou deve ser Ciência vincula-se ao
debate sobre a importância de aspectos endógenos e externos. Nesse sentido, a pontuação da
insuficiência da primazia de fatores externos, não implica na defesa de suficiência da
perspectiva lógica, pois nenhuma nem outra podem encerrar isoladamente a questão do
estabelecimento das disciplinas.
A questão é que, mesmo na defesa de superioridade da visão sociológica (KUHN, 2001;
MORIN, 2005 e 2006; PAVIANI, 2008; RÜDIGER, 2014) procura-se alicerces que remetam
a algum tipo de demarcação que é, em última instância, lógica. Tomadas dessa forma, as
proposições são incoerentes: não há parâmetros para que suas posições se justifiquem, estando
tais posições certas ou erradas, sendo verdadeiras ou falsas.
A Ciência, subsumida como hábito intelectual, comportamental, linguístico e
tecnológico, anterior a qualquer reflexão teórico-metodológica, conduz à ideia de que
equívocos e limitações científicas equivalem à pseudociência.
Além disso, se não há instrumentos para que as explicações sejam avaliadas, o
pesquisador não pode distinguir e perceber se está sendo levado a concepções dogmáticas, de
senso comum ou de pseudociência o que, em última análise, produz convergência com o
ceticismo.
Supondo-se que os parâmetros sejam reduzidos à consideração ou não da
interdisciplinaridade, é preciso que se esclareça quanto ao entendimento: é uma posição válida
(também) porque não é hermética – Princípio/Requisito da Interdisciplinaridade (BUNGE,
2012 e 2013) ou porque, extrapolando as demandas científicas básicas e focalizando a
subversão de algum tipo de dominação, produz um saber ainda mais “verdadeiro”.
Além disso, como asseverado anteriormente, frequentemente as propostas extralógicas,
buscando a crítica dos aspectos lógicos, os suprimem de forma a aproximá-las do ceticismo.
Perde-se capacidade explicativa, pois não permitem a identificação de mecanismos que
viabilizem avaliação das justificações que oferecem.
50
Sem critérios para avaliar sua aproximação com a “verdade”, abre-se espaço para duas
perguntas básicas: em primeiro lugar, por quais razões são essas as melhores respostas a
respeito do sentido atribuído ao empreendimento científico? Em segundo lugar, quais são as
supostas condições para o abandono dessas respostas?
Não é preciso retornar a outras justificações da Filosofia da Ciência sobre a fragilidade
de teorizações cujos sentidos e consistência só podem ser avaliados em si mesmos, mas é
pertinente apontar que a interlocução entre domínios circunscrita pelo Princípio da
interdisciplinaridade não deve ser confundida com o sentido de interdisciplinaridade
coerentemente criticado por Martino e Boaventura (2013).
A objeção realizada em relação à proposta da Interdisciplinaridade se aplica a qualquer
concepção que esteja contextualizada pela Ciência, isto é, se faz necessário oferecer critérios
de avaliação e justificação das opções realizadas, além de não ser hermética, manter auto
coerência e relação equilibrada com as evidências empíricas.
Tendo em vista os delineamentos desta pesquisa e com o objetivo de garantir sua
exequibilidade, a ênfase da análise está na auto coerência das propostas entendidas como
pertinentes às Teorias da Comunicação, orientada pela questão Que é Meio de Comunicação?
Dessa maneira, segue-se para os esclarecimentos sobre a estrutura metódica e técnica
articulada para a viabilização dessa análise e as justificações das escolhas realizadas.
51
Capítulo II – INSTÂNCIAS METÓDICA E TÉCNICA DA
ESTRATÉGIA DE INVESTIGAÇÃO PARA O MAPEAMENTO
DO CONCEITO DE MEIO DE COMUNICAÇÃO
Ao modo de proceder característico da ciência convencionou-se chamar de método
científico. O nome é ambíguo. De uma parte é merecido porque o método existe e é
eficaz. Por outro lado a expressão ‘método científico’ é enganosa, pois pode induzir
a crer que consiste num conjunto de receitas exaustivas e infalíveis que qualquer um
pode manejar para inventar ideias e pô-las à prova. Em verdade, não existem tais
receitas populares para investigar. O que existe é uma estratégia da investigação
científica [...] (BUNGE, 1980, p. 34).
Na proposta de Lopes (2005), os conceitos abrangidos pela pesquisa perpassam as
diferentes instâncias de modo que em cada uma delas a preocupação com os construtos é
orientada para as tarefas adequadas a cada nível e fase da investigação.
A partir da instância epistemológica a pesquisa passa a estar comprometida com a
ruptura epistemológica, isto é, com a distinção entre Objeto de pesquisa e Objeto empírico,
entre exercício científico e senso comum e pseudociência.
Enfatizando a instância teórica, tem-se como tarefa a formulação sistemática dos
conceitos de maneira que se cumpra adequadamente com o compromisso destacado no nível
epistemológico, ou dito de outra forma, deve viabilizar a “[...] ruptura epistemológica em face
das pre-noções do senso comum, através de um corpo sistemático de enunciados e de sua
formulação conceitual visando captar e explicar os fatos” (LOPES, 2005, p. 124).
No âmbito da instância metódica estão as operações de exposição, que estão sujeitas à
verificação de coerência interna, e de causação/correlação, cuja finalidade “consiste em traçar
conexões entre teses, fatos, variáveis, proposições [...]” (LOPES, 2005, p. 127).
Finalmente, é da alçada da instância técnica a operacionalização do conceito em si, ou
seja, a opção e a realização de parâmetros de medição, representação, categorização,
indicadores e redefinição de conceitos.
Utilizar-se de tais distinções de relevo do conceito a partir de cada instância realça dois
pontos: em primeiro lugar, o reconhecimento de que o conceito é um elemento preponderante
em todos os níveis da pesquisa, que os inter-relaciona diretamente, já que a elucidação dos
mesmos depende de sua operacionalização metódica e técnica, que é orientada pelos níveis
teórico e epistemológico. Em segundo lugar, a identificação da importância do conceito não é
suficiente para o delinear e estabelecer explicitamente como ele se afasta da linguagem comum
e quais são suas características.
52
Para este estudo em particular as perguntas relativas ao conceito são especialmente
decisivas na medida em que as operacionalizações não são realizadas mediante um objeto
empírico que seja relacionado a Meio de Comunicação, mas sim frente às operações de
exposição e correlação articuladas pelas propostas teóricas que compõem as unidades de
pesquisa desta investigação.
Nesse sentido, busca-se adaptar a proposta metodológica de Lopes (2005) para o
contexto da estratégia de investigação científica particular deste trabalho, em face a ênfase do
aspecto conceitual.
Para o debate acerca de Conceito e buscando manter a conformidade com as escolhas
epistemológicas e teóricas já realizadas no capítulo anterior, foram excluídas as perspectivas
que tomam o Conceito ou o Conhecimento a partir das seguintes posições:
Ceticismo e relativismo, pois implicaria no esvaziamento da instância
epistemológica norteadora do trabalho e, como já argumentado, embora tenham
produzido importantes objeções, não se justificam frente a possibilidade colocada
pelos debates em Filosofia da Ciência, em especial a proposta de Popper (1979;
2013) e as complementações em Lakatos (1979), Bunge (1980; 2013) e Sokal e
Bricmont (2010);
Formação do conceito ou do conhecimento no Homem, porque descentralizaria a
perspectiva adotada, visto que a origem da formulação é ignorada, na medida em
que o esforço reflexivo deve incidir sobre a formulação em si (POPPER, 1979;
2013).
Sob o enfoque da relação entre propósitos epistemológicos e metódicos particulares
desta pesquisa, bem como recorrendo aos dicionários de Filosofia, tem-se que:
O que é compreendido por um termo, em particular um predicado. Possuir um
conceito é ter a capacidade de usar um termo que o exprima ao fazer juízos; essa
capacidade está relacionada com as coisas como saber reconhecer quando o termo
se aplica, assim como poder compreender as consequências de sua aplicação. O
termo “ideia” foi inicialmente usado da mesma maneira, mas é hoje evitado devido
a suas associações com as imagens mentais subjetivas, que podem ser irrelevantes
para a posse de um conceito [...] (BLACKBURN, 1997, p. 66).
E também que:
53
Ideia simples, unidade de significado, tijolo de uma proposição. Exemplos:
“indivíduo”, “espécie”, “duro”, “duríssimo”, “entre”. Todo conceito pode ser
simbolizado por um termo, mas o inverso é falso. De fato, alguns símbolos tais como
“ele” e “de”, são sincategoremáticos, e outros denotam coisas concretas ou
propriedade a seu respeito. Os conceitos podem ser agrupados em dois grandes
gêneros: conjuntos e predicados de diferentes graus (unários, binários etc.). Tais
conceitos encontram-se definidos implicitamente na teoria dos conjuntos e na lógica
dos predicados, respectivamente. Como os nomes não são nem predicados nem
conjuntos, eles não são conceitos, muito embora alguns deles designem conceitos
[...] (BUNGE, 2012, p. 65, grifo do autor).
Similarmente em Japiassú e Marcondes (2001) há a indicação da face lógica do
Conceito, enfatizando-se sua importância na formulação de juízos. Já Abbagnano (2007), que
dentre os dicionários oferece a maior explicação, inicia sua exposição argumentando que se
refere:
Em geral, todo processo que torne possível a descrição, a classificação e a previsão
dos objetos cognoscíveis. Assim entendido, esse termo tem significado
generalíssimo e pode incluir qualquer espécie de sinal ou procedimento semântico,
seja qual for o objeto a que se refere, abstrato ou concreto, próximo ou distante,
universal ou individual, etc [...] (ABBAGNANO, 2007, p. 164).
Sequencialmente, o autor (2007) esclarece que a noção de Conceito pode ser vista a
partir de duas perspectivas: da sua natureza e da sua função, ambas explicadas a partir de
inúmeras abordagens filosóficas, porém sem explicitar os fundamentos que convergem ou
divergem sobre os dois prismas e sem elaborar um recorte das perspectivas descoincidentes a
partir da questão do conceito.
Depreendeu-se que a dificuldade de elaborar um recorte segundo o problema do
conceito é uma consequência do tratamento intrínseco da questão Que é Conceito? nas diversas
abordagens filosóficas apresentadas por Abbagnano (2007).
Theories of Concepts: a History of the major philosophical tradition, de Morrin Weitz35
(1988), é uma obra oriunda da dificuldade em compreender a questão da natureza do conceito
que, segundo seu autor (1988) tem como causa a falta de uma história da Teoria sobre o mesmo.
Perpassando uma longa lista de filósofos36, Weitz (1988), aponta para uma preponderância de
35 A preocupação mais ampla de Weitz nesse texto se dá em complemento aos seus trabalhos direcionados às
condições teóricas e, portanto, conceituais da Arte. Embora exista tal especificidade na obra do autor, a
peculiaridade do texto aqui utilizado se dá pela sua pertinência. 36 Platão, Aristóteles, Agostinho, Tomás de Aquino, Descartes, Spinoza, Leibniz, Hobbes, Locke, Berkeley, Hume,
Kant, Frege, Russell, Moore, Ryle e Geach.
54
preocupações inicialmente vistas em Platão e Aristóteles sobre a viabilidade do conhecimento
e as características de um conceito.
Coincidindo com a inferência realizada a partir da leitura de Abbagnano (2007), para
Weitz (1988) a maior dificuldade reside no fato de, na maior parte dos casos, a noção de
conceito não estar na superfície das discussões que cada filósofo analisado propõe diretamente.
No caso de Platão, por exemplo, o autor (1988) busca extrair dos argumentos sobre Justiça e
sobre Linguagem os critérios aplicados aos conceitos de modo amplo.
Uma face da preocupação com os conceitos está vinculada à Ontologia:
A palavra “ontologia” foi criada por R. Goclenius para o seu Lexicon Philosophicum,
publicado em 1613. Ela é resultado da junção de dois termos gregos, onta (entes) e
logos (teoria, discurso, palavra). Ao pé da letra, ontologia significa, portanto, teoria
dos entes. “Ente” está aí representando todas as coisas sobre as quais se pode dizer
que são – ou que a ontologia é a teoria do ser enquanto tal. A partir da obra de
Christian Wolff, Ontologia (1730), esta passou a ser considerada parte da metafísica
[...] A ontologia passou a ser sinônimo de metaphysica generalis, tratando de analisar
as características do ser em geral [...] (CASTRO, 2008, p. 7, grifo do autor).
As diferenças centrais dos filósofos estudados por Weitz (1988) são ontológicas, isto é,
são determinadas pelas visões particulares sobre o caráter mais amplo da realidade, ou dito de
outra maneira, sobre as características singulares e necessárias do ser/existência/verdade dos
objetos do conhecimento para cada proposta.
A consequência da diversidade ontológica, que para Weitz (1988) constitui em certa
medida a fragilidade da Teoria dos Conceitos, se evidencia nas diferentes acepções e no caráter
secundário da problematização sobre as peculiaridades da explicação (conceituação) dos
objetos existentes.
Em conformidade com tal asserção, em Estrutura e ser: um quadro referencial teórico
para uma filosofia sistemática, Lorenz B. Puntel37 aponta que:
37 A escolha de Puntel (2008) também se deu em razão da pertinência, visto que para a elaboração de sua proposta
o autor se dedicou amplamente e desde os anos 1960 ao estudo dos problemas relativos à explicação e ao conceito,
também concernente ao desenvolvimento científico tal como percebido nesta pesquisa. Ainda que a proposta dele
não possa ser analisada, evitando-se o deslocamento inadequado do trabalho, suas argumentações no âmbito
filosófico colaboram para o esclarecimento do problema conceitual.
55
A expressão ‘conceito’ inquestionavelmente está entre as expressões empregadas
com mais frequência na filosofia de todas as épocas. À pergunta o que se quer dizer
com essa expressão ou o que exatamente se entende ou se deve entender por ela,
dificilmente haverá um filósofo em condições de dar uma resposta clara, adequada e
convincente a isso. Basta examinar a história das explicações da expressão ‘conceito’
para convencer-se de que não é possível nem cogitar que exista uma concordância,
por mínima que seja, entre os filósofos. Por exemplo, o que Hegel pensa por
‘conceito’ dificilmente terá algo a ver com o que filósofos como Kant, Frege, Carnap
e outros associam com essa expressão. Não obstante, essa expressão foi e é
empregada a todo momento da literatura filosófica (PUNTEL, 2008, p. 209).
Assim como Weitz (1988), Puntel (2008) identifica a multiplicidade ontológica, porém
optando por refletir sobre ela:
Só na nossa época foi identificada e empreendida a tarefa de desenvolver uma teoria
do conceito (na literatura filosófica de fala inglesa, habitualmente se emprega a
formulação ‘Theory of Concepts [Teoria de conceitos]’). Nesse tocante, não se leva
em conta só a filosofia no sentido mais estrito, mas também são consideradas de
modo decisivo outras disciplinas, em especial a(s) ciência(s) cognitiva(s) e a
psicologia [...] (PUNTEL, 2008, p. 210).
Enquanto para Puntel (2008) as respostas acerca da natureza do conceito não são
satisfatórias, para Weitz (1988) elas estão relacionadas aos problemas do conhecimento de
forma que sua avaliação global (todas as noções de conceito, em todas as aplicações conceituais
de todos os filósofos a partir dos entendimentos individuais sobre a possibilidade do
conhecimento) se torna inviável.
O elemento estável é para Weitz (1988) o ponto de concordância na Teoria dos
Conceitos (os “princípios lógicos”), o que Abbagnano (2007) denominou “função”38 do
conceito e que Puntel (2008) estabelece como um problema de “referência”39:
[...] Uma compreensão puramente extensional de conceitos reduz o teor conceitual à
abrangência conceitual. Nesse caso, um conceito é equiparado ao (à menção do)
conjunto de objetos, aos quais ele é aplicado. De acordo com uma compreensão não
exclusivamente extensional, um conceito “designa” uma entidade que pode ter
diversas designações, mais exatamente, correspondendo à expressão linguística com
que o conceito é associado: desse modo, há atributos (propriedades e relações),
funções etc. (PUNTEL, 2008, p. 211).
O que aparece explícita ou implicitamente em todos os casos (ABBAGNANO, 2007;
BLACKBURN, 1997; BUNGE, 2012; JAPIASSÚ; MARCONDES, 2001; PUNTEL, 2008;
38 Apesar de tornar inseparável qualquer posição sobre função das perspectivas sobre a natureza. 39 Para Puntel (2008), no sentido de possuir conteúdo designado.
56
WEITZ; 1988) é que Conceitos implicam explicações que reduzam a ambiguidade, que não se
detenham a inventariar fenômenos e que apresentem critérios explicativos de coerência.
Dito de outra forma, aponta-se para a demanda de parâmetros a respeito dos conceitos
designados, especialmente porque a redução da ambiguidade (uso do termo para significar
diferentes conceitos ou diferentes conceitos aplicados a um mesmo termo) só se viabiliza
através de especificações sobre a aceitação do seu uso “correto” mediante ao universo em que
se aplicam.
Embora epistemologicamente o estabelecimento dos critérios seja variável em função
do conceito que é especificamente colocado em questão e do posicionamento sobre a
viabilidade do conhecimento (WEITZ, 1988), metodicamente, a definição de tais parâmetros
aparece constantemente relacionada às delimitações lógicas de exposição de argumentos, tal
como se observa nas coincidências apontadas por Weitz (1988) e nas explicações oferecidas
por Blackburn (1997), Bunge (2012) e Japiassú e Marcondes (2001).
A Lógica aparece sempre vinculada ao desenvolvimento das outras inúmeras questões
do pensamento filosófico, essencialmente a partir da sua aproximação com a matemática,
especificamente a álgebra. Destaca-se como um domínio razoavelmente independente já a partir
do século XIX e, posteriormente no século XX:
[...] o programa de Russell, centrado na noção de linguagem ideal, foi alvo de severas
críticas, principalmente — mas não apenas — por parte dos "analistas do uso", de
Oxford. Por outro lado, em outros setores (p. ex., na escola alemã proveniente de
Hilbert e de Scholze, e na escola polonesa de Lukasiewicz e Tarski) prevaleceram
os interesses matemáticos e o interesse pela própria L. como disciplina estritamente
matemática. Essa é a origem da cisão (por ora parcial) da L. numa série de disciplinas
cada vez mais formalizadas e matematizadas, com todos os complexos problemas
inerentes à formalização de uma disciplina matemática fundamental (a
metamatemática) [...] (ABBAGNANO, 2007, p. 629).
Tal explicação, concorda com a que é oferecida por Bunge (2012):
a. Geral – O órganon de raciocínio válido (correto): a teoria da dedução. A lógica é
formal, ou seja, é independente de conteúdo e, portanto, da verdade. Por isso perdoa
formalmente argumentos válidos sem considerar a verdade das premissas, assim
como acusa raciocínios inválidos a partir de premissas verdadeiras. A concordância
pela lógica é por conseguinte necessária embora insuficiente para o discurso
racional. Sin. lógica matemática. b. Lógica clássica – O campo da matemática,
oriundo da filosofia, cuja base é a lógica predicativa de primeira ordem com
identidade e que sustenta os princípios do meio excluído e da dupla negação. É a
teoria lógica que está subjacente à maior parte da matemática e à totalidade da ciência
factual e da tecnologia [...] (BUNGE, 2012, p. 224).
57
A Lógica40 de que se fala aqui está prioritariamente ocupada com a justeza dos
argumentos (BARONETT, 2009; BISPO; CASTANHEIRA; SOUZA FILHO, 2014; COPI,
1978;), enfatizando a qualidade das relações entre premissas e conclusões das inferências
dedutivas, isto é, a validade dos argumentos a partir de princípios lógicos claramente
estipulados em Lógica tal como indicados por Bunge (2012) na citação imediatamente anterior.
Isso significa que, tecnicamente, se viabiliza especificamente a avaliação do argumento
em uma angulação endógena, sem considerar sua relação com as evidências empíricas. E é
nesse sentido que, na perspectiva dos níveis metódico e técnico, a Lógica colabora para a
execução deste trabalho.
Os princípios lógicos apontados por Bunge (2012), podem ser explicados de maneira
resumida a partir das explanações de Bispo, Castanheira e Souza Filho (2014, p. 4-5) como: (1)
Princípio da identidade, para o qual “toda proposição é idêntica em si mesma” (P é P); (2)
Princípio da não contradição, porque “uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao
mesmo tempo” (não [P e não P]); (3) Princípio do terceiro excluído, isto é, “toda proposição
ou é verdadeira ou é falsa, não existindo um terceiro valor que ela possa assumir” (P ou não P
[ou exclusivo]). Considerando que sobre este último princípio, Bunge (2012) o denomina “meio
excluído” e argumenta que:
[...] o princípio foi mal interpretado por muitos como se impusesse dicotomias ou
partições binárias, do tipo “preto ou branco”, “bom ou mau”, e “capitalista ou
socialista”. Trata-se de um erro porque o princípio se refere a proposições, e não a
coisas concretas: ele apenas divide cada conjunto de proposições em asserções e suas
negações. Portanto, ele não evita a partição de uma coleção em tantas classes (de
equivalência) quanto se necessita [...] (BUNGE, 2012, p. 241).
Então, a propósito dos textos que foram selecionados para comporem as unidades de
pesquisa, tecnicamente se trata de identificar os argumentos relativos a Meio de Comunicação
e verificar, a partir da perspectiva lógica, a justeza de tais argumentos para a formação de um
conceito. Para tanto, elaborou-se um modelo metódico de identificação e análise de conceito e
um modelo técnico de tratamento dos argumentos, apresentados no item subsequente.
Em seguida, são abarcados os passos sobre a composição da unidade de pesquisa
composta pelos textos originais, a saber, (1) Harold Lasswell, A estrutura e a função da
comunicação na sociedade, (2) Paul Lazarsfeld, Bernard Berelson e Hazel Gaudet, The
40 Em seu sentido formal, sem ignorar que há estudos lógicos voltados à indução, além das chamadas Lógicas Não
Clássicas associadas principalmente à Computação (ex: Lógica Fuzzy).
58
people’s choice (3) Theodor Adorno e Max Horkheimer, Dialética do esclarecimento, (4)
Marshall McLuhan, Os meios de comunicação como extensões do homem e (5) Jesús Martín-
Barbero, Dos meios às mediações.
Por fim, no terceiro item deste capítulo, são abordados os procedimentos e as razões que
resultaram na seleção da segunda unidade de pesquisa, relativa aos textos recentes.
1. Procedimentos metódicos e técnicos de identificação e análise de conceito-
argumento
Considerando as reflexões até agora realizadas, concorda-se com Bunge (2012) em sua
proposta de que o significado é uma característica dos conceitos:
[...] O significado é uma peculiaridade dos construtos, ou dos símbolos que os
designam. Ele pode ser equiparado à referência (denotação), ao sentido (conotação)
ou aos dois tomados em conjunto. A referência é insuficiente para determinar o
significado porque toda coisa concreta apresenta diferentes propriedades,
conceituadas como o são muitos predicados. Por exemplo, tanto o “metabolismo”
como a “divisibilidade” aplicam-se às células, mas são obviamente diferentes.
Tampouco o sentido é suficiente, cumpre sempre saber a respeito de que objetos
estamos falando e não apenas sobre o que sabemos deles [...] (BUNGE, 2012, p. 352,
grifo do autor).
Nessa perspectiva, a referência (ou classe de referência) distingue sobre o que se está
falando como, por exemplo, “[...] de fato, enquanto ‘mais duro’ refere-se a corpos, sua extensão
é a coleção de pares ordenados de corpos para os quais a relação vale efetivamente [...]”
(BUNGE, 2012, p. 334).
Nesse sentido, uma classe de referência estabelece acerca de que se está falando e a
extensão, também chamada “cobertura de um construto é a coleção de itens para os quais ela é
válida [...]” (BUNGE, 2012, p. 60). Complementarmente, o sentido (ou intensão) é constituído
por definições e descrições das quais é possível depreender critérios de aceitabilidade do uso
do conceito (BUNGE, 2012; WEITZ, 1988).
Dessa forma, o esquema metódico para a identificação e análise técnica do conceito de
Meio de Comunicação nos textos selecionados nas unidades de pesquisa pode ser demonstrado
da seguinte maneira:
59
FIGURA 3 – Modelo metódico-técnico de identificação e análise de conceito
Fonte: o próprio autor
A representação do conceito é tecnicamente selecionada pelo uso da expressão “meio
de comunicação” e suas variações básicas como, por exemplo, “meios”, “media” e “mídia”.
Com o desenvolvimento da pesquisa outros termos designadores foram sendo incluídos como
representação do conceito ou, de modo mais específico, como extensões dele.
Dos trechos relacionados ao uso de termos e expressões extensionais ou que
representam o conceito buscou-se depreender descrições e definições, isto é, indicação de
características contidas por Meio de Comunicação, de elementos contextuais que apontem para
a compreensão do sentido de uso e de relações do conceito de Meio com outros
designadores/conceitos. Em nível técnico, a viabilização de reconhecimentos de descrições e
definições foi orientada por procedimentos de tratamento dos argumentos que são incluídos
neste capítulo.
Como será retomado e melhor explicado posteriormente, foram utilizadas duas
unidades de pesquisa neste trabalho. A primeira delas é composta por textos originais, ou seja,
por autores que elaboraram propostas específicas e que são tomados, nos cursos de pós-
graduação, como relevantes. E a segunda é formada por trabalhos publicados recentemente que,
em função de sua constituição frente às estruturas técnicas de disponibilização dos artigos,
centralizam a designação “meio de comunicação”.
Em especial sobre a primeira unidade, compreende-se que a verificação de argumentos
relativos ao conceito de Meio de Comunicação também precisa considerar que podem estar
inseridos em estruturas explanatórias que o relacionam a outros conceitos.
60
Dada a abordagem adotada e o caráter teórico do estudo, se fez necessário retomar, a
partir dos resultados obtidos, o viés da pertinência epistemológica e teórica. Entretanto, por se
tratar de retorno às outras instâncias, isso só é realizado no capítulo IV deste trabalho41.
O que cabe explicar aqui são os critérios de identificação e análise das explanações, cuja
realização se dá mediante também a leitura global dos textos considerando:
A justeza lógica dos argumentos, ou seja, observando as circunstâncias iniciais das
propostas e seus aspectos dedutivos;
A indicação de dinâmicas e correlações que constituem a explicação;
As relações entre o conceito de Meio de Comunicação e seus designadores com
outros, observando a composição conceitual geral proposta pelo texto analisado.
Para manejar e gerenciar as análises das unidades de pesquisa optou-se pela utilização
do software Atlas/Ti para garantir a organização dos documentos e da análise que foi
desenvolvida.
Para assegurar a integridade dos textos, uma vez que alguns não foram encontrados
disponíveis em formato digital e os outros apresentavam resultados discrepantes no Atlas/Ti em
função da qualidade, além da digitalização dos textos, utilizou-se ferramentas de Optical
Character Recognition (OCR) para que o procedimento a partir do software não fosse
prejudicado. Dessa forma, os passos de análise no Atlas/Ti foram:
Gerar uma planilha com todos os termos dos textos;
Realizar a leitura pormenorizada de todos os textos de modo que os termos mais
frequentes42 que, a partir de uma primeira leitura, estivessem vinculados a uma
descrição ou definição fossem marcados e o trecho em que estavam inseridos fosse
extraído/marcado. O mesmo procedimento foi aplicado a Meio de Comunicação,
suas variações e extensões como, por exemplo, meios, veículo, televisão e cinema;
Os trechos extraídos foram analisados a partir dos princípios e regras lógicas,
expostos a seguir neste capítulo.
41 A explicação introdutória se fez necessária porque constitui uma das principais relações entre as instâncias
epistemológica-teórica e metódica-técnica, sendo a última díade o interesse prioritário deste capítulo. 42 A frequência foi também analisada proporcionalmente em cada texto, em função do número total de palavras.
61
Em razão da grande variedade terminológica em relação a Meio de Comunicação, foi
necessário utilizar procedimentos de formalização dos argumentos analisados para viabilizar a
parcial automatização do procedimento, orientados a partir de três referências básicas:
Introdução à lógica matemática (2014), de Carlos Alberto F. Bispo, Luiz B. Castanheira e
Oswaldo Melo Souza Filho; Lógica: uma introdução voltada para as ciências (2009), de Stan
Baronett; e Pensamento crítico: o poder da lógica e da argumentação (2011), de Walter A.
Carnielli e Richard L. Epstein.
As exposições de Bispo, Castanheira e Souza Filho (2014) e Carnielli e Epstein (2011)
foram utilizadas como base para a formalização simbólica dos argumentos avaliados e são
citadas aqui para a explicação da aplicação das regras lógicas que fundamentaram a análise,
bem como acontece com algumas das exposições de Bunge (2012).
Baronett (2009) apresenta alguns modelos de aplicação lógica, especialmente em
relação ao mapeamento de premissas e conclusões, demonstração de análise de inferências e
processos de formalização, que foram observados no planejamento dessa fase da análise.
A primeira tarefa prática consistiu em agrupar todos os termos designadores que foram
tratados nos textos como sinônimos de Meio de Comunicação e, por conseguinte, os trechos
que os continham.
Sequencialmente, foram distinguidos os trechos que se direcionavam ao tratamento
direto de Meio de Comunicação dos que não continham qualquer termo considerado e agrupado
como “meio” no centro da argumentação. Nos exemplos a seguir, enquanto em McLuhan
(2005) “meio” é o centro argumentativo, em Laswell (1989) não o é. Portanto, o trecho extraído
do segundo autor (1989) foi descartado como explicação de meio porque não se propõe a isso,
bem como não se enquadra como argumento passível da análise aplicada:
Exemplo 1 - “[...] Este fato apenas serve para destacar o ponto de que ‘o meio é a
mensagem’, porque é o meio que configura e controla a proporção e a forma das
ações e associações humanas. O conteúdo ou usos desses meios são tão diversos
quão ineficazes na estruturação da forma das associações humanas [...]”
(MCLUHAN, 2005, p. 23).
Exemplo 2 - “[...] Quando o principal problema diz respeito às pessoas atingidas
pelos meios de comunicação, falamos de análise de audiência [...]” (LASSWELL,
1989, p. 105).
62
Em seguida, os trechos foram discriminados segundo a identificação de um argumento,
isto é, trechos que apresentavam “[...] um conjunto de n proposições, e uma delas é
consequência e depende das demais [...]” considerando que “[...] a proposição consequência é
chamada de conclusão, e as demais, de premissas. As premissas devem servir para provar, ou
no mínimo, formar alguma evidência para a conclusão de argumento” (BISPO;
CASTANHEIRA; SOUZA FILHO, 2014, p. 32, grifo do autor):
FIGURA 4 – Distinção de Premissa(s)
Fonte: o próprio autor
Para facilitar esse procedimento da análise, os trechos foram divididos entre premissa(s)
e conclusão(ões), destacando-se os conectivos proposicionais utilizados no argumento,
classificados em Conjunção, Disjunção, Condicional, Bicondicional ou Negação43:
43 Os trechos selecionados incluíam prioritariamente mais de duas premissas, além de conclusões correlacionadas
e utilização de mais de um conectivo para a construção do argumento completo. Então, as demonstrações aqui
realizadas são da estrutura do procedimento técnico que foi adaptado/complementado mediante as demandas da
análise.
63
FIGURA 5 – Modelo técnico básico de tratamento de argumentos
Fonte: o próprio autor
Conjunção foi demarcada quando as proposições estavam ligadas pela palavra “e” ou
sinônimos, implicando na seguinte demanda: para a conclusão ser considerada verdadeira e o
argumento válido, todas as premissas relacionadas precisariam ser também verdadeiras
(BISPO; CASTANHEIRA; SOUZA FILHO, 2014):
TABELA 1 – Tabela verdade: Conjunção
Fonte: Adaptado de Carnielli e Epstein (2011, p. 315)
Disjunção foi identificada em proposições que estavam relacionadas pela palavra “ou”
ou sinônimos. Neste caso, para a conclusão ser considerada verdadeira e o argumento válido,
apenas uma premissa precisaria ser verdadeira (BISPO; CASTANHEIRA; SOUZA FILHO,
2014):
TABELA 2 – Tabela verdade: Disjunção
Fonte: Adaptado de Carnielli e Epstein (2011, p. 316)
P1 P2 P1 E P2
V V V
V F F
F V F
F F F
P1 P2 P1 OU P2
V V V
V F V
F V V
F F F
64
Foram indicados como Negação conectivos que, ao invés do relacionamento das
proposições apontavam para a negação da precedente. Neste caso, “[...] se o valor-verdade de
uma proposição é (V), quando acompanhado do conectivo de negação, passará a ser (F) e vice-
versa”[...] (BISPO; CASTANHEIRA; SOUZA FILHO, 2014, p. 11):
TABELA 3 – Tabela verdade: Negação
Fonte: Adaptado de Carnielli e Epstein (2011, p. 315)
Categorizaram-se como Condicional proposições relacionadas pela regra/expressão
“se..., então...”, caso em que a afirmação [...] é falsa (F) se e somente se o antecedente é V e o
consequente é F” (CARNIELLI; EPSTEIN, 2011, p. 317). E como Bicondicional proposições
relacionadas pela regra/expressão “...se, e somente se ....”, casos em que a validade do
argumento é determinada pela relação direta entre as proposições e o valor-verdade das
proposições simples. Dito de outra forma, o argumento “[...] é válido quando for impossível
todas as premissas serem verdadeiras e a conclusão ser falsa” (BISPO; CASTANHEIRA;
SOUZA FILHO, 2014, p. 36):
TABELA 4 – Tabela verdade: Condicional
Fonte: Adaptado de Carnielli e Epstein (2011, p. 317)
TABELA 5 – Tabela verdade: Bicondicional
Fonte: o próprio autor
P NÃO P
V F
F V
P1 P2 SE P1 ENTÃO P2
V V V
V F F
F V V
F F V
P1 P2 P1 SE E SOMENTE SE P2
V V V
V F F
F V F
F F V
65
É importante destacar que para os fins dessa análise a correspondência com o objeto
empírico ou a “verdade” das proposições não é primordial, porque os objetivos desse
procedimento são (1) distinguir argumentos de não argumentos, e (2) identificar os argumentos
passíveis da análise aqui proposta como válidos ou inválidos. Isso porque, embora exista
relação entre valor-verdade e validade/invalidade a última díade, de modo prioritário, é
concernente à forma do argumento (BISPO; CASTANHEIRA; SOUZA FILHO, 2014).
Finalizados os esclarecimentos sobre os procedimentos metódicos e técnicos de
identificação e análise de conceito, bem como de tratamento dos argumentos, segue-se para os
detalhamentos da seleção das unidades de pesquisa.
2. Seleção da unidade de pesquisa de textos originais
Buscando um panorama das referências bibliográficas acerca das Teorias de
Comunicação utilizadas nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu em território nacional, foi
realizado levantamento através da plataforma Sucupira da Comissão de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (CAPES)44.
Foram identificados 51 Programas de pós-graduação, sendo 22 com curso de Mestrado,
5 com Mestrado Profissional e 24 com Mestrado e Doutorado, resultando-se em um total de 75
cursos de pós-graduação em Comunicação.
Dentre as Instituições de Ensino (IEs) destacadas, 10 não possuem disciplinas de teorias
em caráter geral:
FIAM-FAAM Centro Universitário, que possui mestrado profissional em
Jornalismo, subdividido nas linhas Linguagens Jornalísticas e Tecnologias, e
Jornalismo e Mercado de Trabalho.
Universidade Anhembi Morumbi, com cursos de mestrado e doutorado na área de
concentração Comunicação Audiovisual.
Universidade Estadual de Campinas, na qual os cursos de mestrado e doutorado são
concentrados na área de Multimeios.
Universidade Estadual de Londrina, cujas linhas de pesquisa são Cultura Visual e
Processos Sociais, e Imagem e Linguagens.
44 https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/index.jsf
66
Universidade Estadual de Ponta Grossa, cuja área de concentração do mestrado é
Processos Jornalísticos.
Universidade Federal de Juiz de Fora, que possui curso de mestrado na área de
concentração Comunicação e Sociedade.
Universidade Federal de Ouro Preto, cuja área de concentração do mestrado é
Comunicação e Temporalidades.
Universidade Federal da Paraíba/João Pessoa, nos cursos de mestrado, acadêmico
(Comunicação e Culturas Midiáticas) e profissional (Jornalismo).
Universidade Federal de Santa Catarina, com cursos de mestrado e doutorado, cuja
área de concentração é Jornalismo.
Universidade Federal de São Carlos, com mestrado na área de concentração Imagem
e Som.
Para se chegar às disciplinas selecionadas, determinou-se como necessária a relação
entre os termos Teoria(s) e Comunicação. Evitando-se a restrição demasiada dos resultados,
foram considerados também Campo, Pensamento e Pesquisa em relação à Teoria(s), e Mídia,
Meios e Comunicacional, concernente à Comunicação.
Com isso, chegou-se ao total de 42 disciplinas distribuídas em 61 cursos de pós-
graduação Stricto Sensu, de 36 instituições, conforme a Tabela 6.
67
TABELA 6 – Disciplinas gerais nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu
Fonte: Adaptado da plataforma Sucupira
Disciplina IE
As Teorias de Comunicação no surgimento do rádio UNIP
Campo comunicacional e suas interfaces PUC/MG
Correntes teóricas da Comunicação Social UMESP
Estudos avançados em Teoria da Comunicação UERJ
Fundamentos da Teoria da Mídia UNIP
Fundamentos do pensamento comunicacional UFAM
Fundamentos teóricos da Comunicação UFC
Metodologia da Pesquisa em Comunicação USP
Novas Teorias da Mídia UERJ
Pensamento comunicacional contemporâneo PUC/MG
Problemas teóricos da Comunicação UFRJ
Problemas teóricos da Comunicação UFF
Questões teóricas em Comunicação UFES
Seminários das Teorias da Comunicação UMESP
Temas em Teorias Contemporâneas da Comunicação e da Cultura UFBA
Tendências teóricas em Comunicação e Cultura UFT
Teoria da Comunicação UCB
Teoria da Comunicação UFG
Teoria da materialidade e diacronia dos meios UNIP
Teoria social e da Comunicação UFPR
Teoria(s) da comunicação midiática UFRN
Teorias Críticas na Comunicação PUC/SP
Teorias Culturalistas na Comunicação PUC/SP
Teorias da Comunicação PUC/SP
Teorias da Comunicação FCL
Teorias da Comunicação UFMS
Teorias da Comunicação FUFPI
Teorias da Comunicação PUC/RS
Teorias da Comunicação UNB
Teorias da Comunicação UNISINOS
Teorias da Comunicação UNESP/BAU
Teorias da Comunicação UFMG
Teorias da Comunicação UFPA
Teorias da Comunicação UTP
Teorias da Comunicação UNISO
Teorias da Comunicação e da Informação UFRGS
Teorias da Comunicação e da Mídia ESPM
Teorias da Comunicação e Inovação USCS
Teorias da Comunicação I PUC/RIO
Teorias e Metodologias no campo da Comunicação FUFSE
Teorias e Métodos de pesquisa em Comunicação UFPE
Teorias sistêmicas da comunicação PUC/SP
68
Embora o caráter específico, ao invés de geral, já estivesse sugerido no nome de algumas
disciplinas a exemplo de Teorias Culturalistas na Comunicação, optou-se por manter todas as
42 no passo seguinte do levantamento, em que se tratou de identificar as referências
bibliográficas, também através das informações disponíveis na plataforma Sucupira.
GRÁFICO 1 – Distribuição de referências por disciplina
Fonte: o próprio autor
É possível observar que, considerando a média de cerca de 17 referências bibliográficas
por disciplina, 23 possuem 18 ou mais referências, dentre as quais destacam-se Teorias da
Comunicação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS) que listaram, respectivamente, 135 e 100 referências
bibliográficas.
A disciplina com menor quantidade de referências (4 indicações bibliográficas) foi
Teorias da Comunicação I, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ).
Para facilitar a demonstração da frequência das referências bibliográficas nas
disciplinas, apresenta-se a tabela que as lista e, sequencialmente, o gráfico relativo à frequência
em si:
69
TABELA 7 – Lista das referências bibliográficas mais frequentes nos cursos de pós-graduação Stricto
Sensu
Fonte: o próprio autor
HOFELDT, Antonio; MARTINO, Luiz C. e FRANÇA, Vera Veiga (Orgs.) Teorias da comunicação: conceitos, escolas e tendências.
MATTELARD, Armand; MATTELARD, Michèle. História das teorias da comunicação.
WOLF, Mauro. Teorias das comunicações de massa.
MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos Meios às Mediações: comunicação, cultura e hegemonia.
MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem.
HALL, Stuart. Da diáspora: identidades e mediações culturais.
SODRE, Muniz. Antropológica do Espelho: uma teoria da comunicação.
DE FLEUR, Melvin L.; BALL-ROKEACH, Sandra. Teorias da comunicação de massa.
LIMA, Luiz Costa (org.). Teoria da cultura de massa.
THOMPSON, John B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia.
KELLNER, Douglas. A cultura da mídia.
COHN, Gabriel (Org.). Comunicação e indústria cultural.
ECO, Humberto. Apocalípticos e Integrados.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade.
SILVERSTONE, Roger. Por que estudar a mídia?
HARVEY, David. Condição pós-moderna.
BOUGNOUX, Daniel. Introdução às ciências da informação e da comunicação.
BRAGA, José Luiz. Constituição do Campo da Comunicação.
CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede: a era da informação: economia, sociedade e cultura, vol. 1.
LOPES, Maria Immacolata Vassallo (Org.). Epistemologia da comunicação.
LOPES, Maria Immacolata Vassallo. Pesquisa em comunicação.
MARTINO, Luiz C. (Org.). Teorias da comunicação: muitas ou poucas?
SFEZ, Lucien. Crítica da comunicação.
ADORNO, Theodor W.; HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento.
BENJAMIM, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica - Magia e Técnica, Arte e Política. Obras Escolhidas I.
BRIGGS, Asa; BURKE, Peter. Uma história social da mídia: de Gutenberg à Internet.
MARCONDES FILHO, Ciro. O espelho e a máscara: o enigma da comunicação no caminho do meio.
MARTÍN-BARBERO, Jesús. Ofício de cartógrafo: travessias latino-americanas da comunicação na cultura.
MATTELART, Armand. A comunicação-mundo: história das ideias e das estratégias.
MIÈGE, Bernard. O Pensamento comunicacional na contemporaneidade.
MORIN, Edgar. Cultura de massa no século XX.
ZIELINSKI, Siegfried. Arqueologia da mídia: em busca do tempo remoto das técnicas do ver e do ouvir.
HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa: complementos y estudios previos.
70
GRÁFICO 2 – Frequência de referências bibliográficas nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu
Fonte: o próprio autor
Dentro das 42 disciplinas, foram identificadas 746 referências bibliográficas distintas,
das quais cerca de 76% (569) foram incluídas em apenas uma disciplina.
Distinguindo as referências que tratam as Teorias da Comunicação amplamente, ou seja,
que não se tratam de uma proposição ou perspectiva teórica específica, as mais utilizadas (em
cerca de 42% das disciplinas)45 são: Teorias da Comunicação: conceitos, escolas e tendências,
livro organizado por Antonio Hohlfeldt, Luiz C. Martino e Vera Veiga França, História das
Teorias da Comunicação, de Armand e Michèle Mattelart, e Teorias das Comunicações de
Massa, de Mauro Wolf.
Em uma análise das três referências é possível observar que embora as abordagens para
o recorte que produzem sejam diferentes46, há autores (em especial Lazarsfeld e Adorno) que
coincidem nos três livros gerais e, nos três casos, são os mais mencionados.
45 As outras referências mais utilizadas não tratam de Teorias da Comunicação de modo geral, destacando-se Dos
meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia (Martín-Barbero), Os meios de comunicação como
extensões do homem (McLuhan) e Diáspora: identidades e mediações culturais (Hall). 46 Resumidamente, no caso do livro organizado pelos pesquisadores brasileiros há um debate epistemológico
colocado antes da abordagem das perspectivas teóricas, enquanto no caso de Michèle e Armand Mattelart há uma
preocupação com inúmeras interligações entre as vertentes, além de relações com aspectos de possíveis objetos
empíricos. Finalmente, Mauro Wolf optou por uma abordagem baseada em aspectos de fundamentação teórica dos
efeitos limitados, estando prioritariamente restrito em Mass Communication Research e Teoria Crítica.
71
GRÁFICO 3 – Frequência de citações nas três principais referências sobre Teorias da Comunicação
Fonte: o próprio autor
Os dois textos específicos dos dois autores mais citados foram publicados nos anos
1940: Lazarsfeld em coautoria com Bernard Berelson e Hazel Gaudet, The People’s Choice:
how the voter makes up his mind in a presidencial campaign47, e Adorno em coautoria com
Max Horkheimer, Dialética do Esclarecimento48.
Sequencialmente, tem-se Harold Dwight Lasswell e Herbert Marshall McLuhan,
respectivamente o artigo A estrutura e a função da comunicação na sociedade (1989),
publicado originalmente em 1948, e Os meios de comunicação como extensões (2005),
divulgado em 1964.
Segundo Mattelart e Mattelart (2005, p. 36), “a primeira peça do dispositivo conceitual
da corrente da Mass Communication Research data de 1927. É o livro de Harold D. Lasswell
(1902-1978) Propaganda Techniques in the World War, que extrai as lições da guerra de 1914-
1918 [...]”. Já o denominado modelo de Lasswell “[...] dota a sociologia funcionalista da mídia
de um quadro conceitual que, até então, alinhava apenas uma série de estudos de caráter
monográfico [...]”.
Wolf (2008, p. 16), no item O modelo de Lasswell e a superação da teoria
hipodérmica49, aponta que “[...] quando a teoria hipodérmica deixou de ser sobretudo um
presságio e uma descrição de efeitos temidos para se transformar num paradigma concreto de
pesquisa, seus próprios pressupostos deram lugar a resultados que contradiziam sua elaboração
47 Em 1944 foram publicados os resultados parciais. O estudo completo é de 1948. 48 A questão da coautoria explica especialmente as menções relativas a Horkheimer e a Merton. 49 O denominado modelo de Lasswell, que para Wolf (2008) impulsionou a superação da teoria hipodérmica,
embora tenha sido parte do trabalho do autor em anos anteriores é explicitado e divulgado amplamente no artigo
incluído na unidade de pesquisa.
72
fundamental”. Entretanto, a superação apontada não teria implicado na modificação
significativa do modelo behaviorista Estímulo-Resposta oriundo do período hipodérmico.
No capítulo A pesquisa norte-americana, escrito por Carlos Alberto Araújo e inserido
em Teorias da Comunicação: conceitos, escolas e tendências, afirma-se que:
[...] entre os anos 20 e 60, os estudos norte-americanos foram marcados pela
hegemonia de um campo de estudos denominado Mass Communication Research.
Essa tradição de estudos é composta por abordagens e autores tão variados que vão
desde a engenharia das comunicações, passando pela psicologia e sociologia, com
pressupostos teóricos e mesmo resultados distintos e, em muitos casos, quase
inconciliáveis (ARAÚJO, 2007, p. 120).
De acordo com Araújo (2007, p. 120), apesar da diversidade há uma unidade entre eles
composta por uma “[...] orientação empiricista dos estudos, tendendo, na maioria das vezes,
para enfoques que privilegiam a dimensão quantitativa [...]”, por uma “[...] orientação
pragmática, mais política do que científica [...]” e pelo objeto de estudo, que estaria focalizado
em “comunicação mediática”.
O autor (2007) divide a Mass Communication Research em três grandes grupos: Teoria
Matemática da Comunicação (cujo principal texto seria A teoria matemática da comunicação,
de Weaver e Shannon), Corrente Funcionalista (com ênfase em Estrutura e função da
comunicação na sociedade, de Lasswell, além de Comunicação de massa, gosto popular e ação
social organizada, de Lazarsfeld e Merton) e a Teoria Hipodérmica.
Uma vez que o próprio Araújo (2007) indica as outras duas referências gerais, sobre a
Teoria Hipodérmica, volta-se aqui também para esses autores. Em Mattelart e Mattelart (2005,
p. 37), além de apontarem, sem uma referência específica, que Lasswell teria criado o termo
“agulha hipodérmica” 50 como hipótese central de que há “[...] efeito ou impacto direto e
indiferenciado sobre os indivíduos atomizados”, indicam que tal noção estaria de acordo com
abordagens psicológicas da época, dentre as quais destacam “[...] a psicologia das massas de
Le Bon; o behaviorismo inaugurado desde 1914 por John B. Watson; as teorias do russo Ivan
P. Pavlov sobre o condicionamento; os estudos de um dos pioneiros da psicologia social, o
britânico William McDougall [...]” (MATTELART; MATTELART, 2005, p. 37-38).
Em uma perspectiva diferente e mais abrangente, Wolf (2008) coloca que:
50 Araújo (2007) concorda com a afirmação de Mattelart e Mattelart (2005). Em contrapartida, na tese Harold
Lasswell e o Campo da Comunicação, defendida em 2012 por Rafiza Luziani Varão Ribeiro Carvalho,
argumentou-se que o termo foi utilizado pela primeira vez em 1944, em Voting, de Berelson, Lazarsfeld e McPhee.
73
Na realidade, mais do que um modelo sobre o processo de comunicação, seria
necessário falar de uma teoria da ação: a elaborada pela psicologia behaviorista. Seu
objetivo é estudar o comportamento humano com os mesmos métodos da experiência
e da observação, típicos das ciências naturais e biológicas. O sistema de ação que
distingue o comportamento humano deve ser composto pela ciência psicológica em
unidades compreensíveis, distinguíveis e observáveis. Na relação complexa entre
organismo e ambiente, o elemento crucial é presentado pelo estímulo: este
compreende os objetos e as condições externas ao sujeito, que a partir dele produzem
uma resposta [...] A unidade estímulo/resposta exprime, portanto, os elementos de
toda forma de comportamento (WOLF, 2008, p. 9-10).
O termo “behaviorismo” teria sido utilizado/delimitado pela primeira vez por John B.
Watson, no texto Psychology as the behaviorist views it, publicado em 1913. Neste artigo,
evidentemente voltado para a Psicologia, Watson (2008) demonstra uma preocupação comum
aos mais diversos textos elaborados em momentos em que as áreas nas quais estão inseridos
são consideradas incipientes51, que é a de sistematizar, delimitar e atribuir aspectos de
cientificidade às pesquisas. Assim, inicia explicando que:
A psicologia como o behaviorista a vê é um ramo experimental puramente objetivo
das ciências naturais. Seu objetivo teórico é a previsão e o controle do
comportamento. A introspecção não constitui parte essencial de seus métodos, nem
o valor científico de seus dados depende da facilidade com que eles podem ser
interpretados em termos de consciência. O behaviorista, em seus esforços para
conseguir um esquema unitário da resposta animal, não reconhece linha divisória
entre homens e animais. O comportamento do homem, com todo o seu refinamento
e complexidade, constitui apenas uma parte do esquema total de investigação do
behaviorista (WATSON, 2008, p. 289).
Tal questão é ainda reforçada explicitamente em outro trecho:
Não desejo criticar a psicologia injustificadamente. Ela tem evidentemente falhado,
eu acredito, durante os cinquenta singulares anos de sua existência como uma
disciplina experimental, em abrir seu espaço no mundo como uma ciência natural
inconteste. Psicologia, como ela é geralmente pensada, tem algo de esotérico em seus
métodos. Se você falha em reproduzir meus achados, não se deve a alguma falha no
seu instrumento ou no controle de seu estímulo, mas sim ao fato de que sua
introspecção é destreinada. O ataque é feito sobre o observador e não sobre o arranjo
experimental. Em física e em química, o ataque é feito sobre as condições
experimentais. O aparato não era sensível o suficiente, substâncias químicas impuras
foram usadas etc. Nessas ciências, uma técnica melhor permitirá resultados
reproduzíveis. Em psicologia é diferente. Se você não pode observar de 3-9 estados
de clareza em sua atenção, sua introspecção é pobre. Se, por outro lado, um
sentimento parece razoavelmente claro para você, sua introspecção é novamente
defeituosa. Você está vendo demais. Sentimentos nunca são claros (WATSON,
2008, p. 292).
51 Se não por uma questão de tempo, do ponto de vista metodológico e epistemológico.
74
As comparações entre Homem e outros animais, ou ainda, deslocamentos e analogias
(identificadas especialmente pelo termo “organismo”) aparecem não apenas na Psicologia
behaviorista, mas também na Sociologia da época (MATTELART; MATTELART, 2005).
Também se aplica ao que Araújo (2007) apontou como Corrente Funcionalista (inclusive no
texto de Lasswel, Estrutura e função da comunicação na sociedade, como será demonstrado
no item que o descreve e analisa especificamente, no próximo capítulo).
Considerando a relação com o domínio da Comunicação nas três referências
bibliográficas (ARAÚJO, 2007; MATTELART; MATTELART, 2005; WOLF, 2008), o
behaviorismo não corresponde propriamente à teorização da área, mas apresenta coincidência
do objeto-modelo inicial (BUNGE, 2013) e, portanto, conciliável e incorporado pelas diferentes
propostas.
A respeito da Teoria Matemática da Comunicação, Araújo (2007) coloca que, também
denominada Teoria da Informação, “[...] não está preocupada com a inserção social da
comunicação [...]” e, além disso:
[...] Elaborada por dois engenheiros matemáticos, Shannon e Weaver, em 1949, essa
teoria é menos um conjunto acabado de conceitos e pressupostos teóricos, mas sim
uma sistematização do processo comunicativo a partir de uma perspectiva puramente
técnica, com ênfase nos aspectos quantitativos (ARAÚJO, 2007, p. 121).
Mattelart e Mattelart (2005) explicam que no mesmo ano em que Lasswell publicou A
estrutura e a função da comunicação na sociedade, Claude Elwood Shannon publicou a
monografia The Mathematical Theory of Communication. Mas separa o que chama de Teoria
da Informação, relacionando-a diretamente com a Cibernética e com o Colégio Invisível/Escola
de Palo Alto.
Há aqui a exclusão da “Teoria Matemática da Comunicação”, independentemente do
texto ou autor entendido como original52, em função de: em primeiro lugar, considerando que
o debate conceitual a respeito de Comunicação é uma questão teórica-epistemológica profunda,
não parece razoável, também tendo em vista estudos anteriores53, desconsiderar a possibilidade
52 Há uma publicação de Shannon no Bell System Technical Journal em 1948 e uma de Weaver (fundamentada
em larga medida em Shannon) em 1949 na Scientific American, publicada no Brasil na obra organizada por Gabriel
Cohn, Comunicação e Indústria Cultural. E há, ainda, os textos de ambos os autores ampliados em um livro,
também denominado The mathematical theory of communication, publicado em 1949. 53 No capítulo Apontamentos sobre o imprescindível debate da tecnologia para a comunicação social, no livro
Tecnologia, comunicação e ciência cognitiva, publicado em 2014, apresenta-se o argumento de Floridi (2010)
sobre a insuficiência dos pressupostos de Shannon como informação, mais adequados à comunicação de dados.
Essa é uma reflexão que não cabe no escopo deste trabalho em função da sua complexidade, além de não se ter
75
de a mesma condição se aplicar à Informação. Em segundo lugar, das três principais referências
gerais sobre Teorias da Comunicação, apenas em Araújo (2007) há essa relação direta com a
“Teoria Matemática”54.
Além dos textos originais já citados, há a inclusão de Dos meios às mediações:
comunicação, cultura e hegemonia, de Martín-Barbero, em função da sua relevância,
constatada em um primeiro momento pela sua inclusão entre as referências mais citadas nas
disciplinas de Teorias da Comunicação dos cursos de pós-graduação Stricto Sensu.
Retornando às referências sobre Teorias da Comunicação que orientam a seleção,
Berger (2007) explica que na América Latina, tanto quanto em outros lugares, não apenas a
inquietação científica impulsionou a produção de pesquisas, mas também exigências políticas
e sociais dentro do seguinte contexto:
[...] Na América Latina, as marcas da dependência estrutural, que evoca uma cultura
do silêncio e da submissão, mas também, de resistência e de luta, são pano de fundo
da busca por compreender o que acontecia com a comunicação e demarca as
fronteiras do emergente campo de estudo (BERGER, 2007, p. 241).
Enfatizando os centros de estudo, as publicações e os autores, Berger (2007) aponta
como pais fundadores e/ou principais influências teóricas Armand Mattelart, Antonio Pasquali,
Luis Ramiro Beltrán, Eliseo Verón e Paulo Freire.
Exceto por Mattelart, cujo livro sobre Teorias da Comunicação é expressivo no conjunto
das disciplinas listadas, os demais autores não aparecem significativamente nos cursos de pós-
graduação.
Em Wolf (2008), que originalmente foi publicado em 1985, a única referência é a Verón,
especificamente no item O modelo de comunicação semiótico-informativo. Também em
Mattelart e Mattelart (2005), Verón aparece vinculado à semiótica e à escola francesa. Beltrán,
Freire, os próprios Mattelart e Mattelart e Pasquali são mencionados por Mattelart e Mattelart
(2005) como parte de um grupo de pesquisadores críticos relacionado à ruptura com a
Sociologia funcionalista.
Os mesmos autores (2005, p. 171) também mencionam Martín-Barbero, além de
Appadurai, García Canclini e Ortiz, no grupo de estudos em que os estudiosos “[...] se
encontrado argumentos consistentes, fundamentalmente de caráter epistemológico, de inclusão das reflexões da
denominada Teoria Matemática para os fins desta pesquisa. 54 Também não há justificativa epistemológica para tal opção na obra em que o texto do autor (2007) está inserido.
76
interrogam sobre os complexos processos de apropriação e reapropriação, de resistências e
mimetismo [...]”.
Berger (2007, p. 267), por seu turno, entende que Martín-Barbero seria o proponente
das três linhas de estudo que passariam a identificar as pesquisas da América Latina, “[...]
quando a pesquisa se independentiza do estudo dos meios para compreender a vida cotidiana,
onde os meios ingressam detendo um lugar”. E então, “Barbero é considerado o ‘formulador
das questões’ e o impulsionador do campo no sentido de sua renovação, pois, junto com as
revisões, ele formulou um projeto transdisciplinar para pensar desde a comunicação [...]”.
Pelas razões expostas até aqui é que Dos meios às mediações, passou a ser incluído na
unidade de pesquisa.
O caso de Os meios de comunicação como extensões do homem, de Marshall McLuhan,
é parecido com Dos meios às mediações, com a diferença de que a expressividade do autor e
do livro nas referências básicas sobre Teorias da Comunicação é ainda maior.
Para além dos textos originais já justificados, a coincidência que resta entre as três
referências sobre teorias de modo amplo (HOHLFELDT; MARTINO; FRANÇA, 2007;
MATTELART; MATTELART, 2005; WOLF, 2008) diz respeito à semiótica. Entretanto,
observando-se as referências totais das disciplinas é possível perceber que a inclusão do assunto
nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu é extremamente pontual, diferentemente dos casos
dos livros de Martín-Barbero e McLuhan, que extrapolam disciplinas dirigidas a determinado
conjunto de propostas teóricas e também são quantitativamente relevantes.
Dessa forma, os textos originais que compõem a unidade de pesquisa são: (1) Harold
Lasswell, A estrutura e a função da comunicação na sociedade, (2) Paul Lazarsfeld, Bernard
Berelson e Hazel Gaudet, The people’s choice (3) Theodor Adorno e Max Horkheimer,
Dialética do esclarecimento, (4) Marshall McLuhan, Os meios de comunicação como extensões
do homem e (5) Jesús Martín-Barbero, Dos meios às mediações.
3. Seleção da unidade de pesquisa de textos recentes
O primeiro estudo exploratório realizado consta no artigo Comunicação e Ciência:
definição de Meio como elemento para distinção do domínio, apresentado do II Encontro
Internacional de Tecnologia, Comunicação e Ciência Cognitiva em dezembro de 2015 e
77
publicado na segunda edição especial (dezembro de 2016) do Brazilian Journal of Technology,
Communication, and Cognitive Science55.
Para assegurar a exequibilidade da análise e de sua verificação, optou-se por selecionar
periódicos incluídos em sistema de gerenciamento de acesso aberto, de abrangência nacional,
com classificação Qualis entre A1 e B2, no período de Janeiro de 2010 a Abril de 2015.
Em uma primeira tentativa, o retorno inicial foi de cerca de 3.200 artigos, o que conduziu
à opção de excluir resultados cujos termos não fossem exclusivamente “Meio” ou “Meios”
relacionados à “Comunicação” em Título, Resumo e Palavra-chave, chegando-se por fim a 560
artigos.
A análise de uma pequena parcela desses textos colocou em evidência alguns problemas
técnicos como, por exemplo, dificuldade em identificar vertentes teóricas utilizadas, amplo uso
extensionalista e diversas abordagens temáticas que não incluíam “Meio de Comunicação”,
embora os artigos tenham sido indexados com a priorização de tal designação.
Buscando-se solucionar as dificuldades percebidas, o mesmo conjunto de textos foi
analisado no artigo Lacuna teórica do Meio de Comunicação: análise da relação termo-
conceito-argumento em periódicos nacionais56, apresentado no XXXIX Congresso Brasileiro
de Ciências da Comunicação (GP Teorias da Comunicação), em setembro de 2016.
Analisando todos os 560 artigos, constatou-se que em menos de 2% havia coincidência
de relevância de “Meio de Comunicação” para a indexação e identificação de vertente teórica.
Como complemento, foram selecionados trechos que incluíam “Meio” ou sinônimos ou
extensões (que foram sendo agrupados a partir da leitura dos textos), buscando-se por
associações com expressões que descrevessem os critérios de aplicação do termo e/ou as
consequências reflexivas da aplicação.
Em função da não identificação de tais associações, ampliou-se o escopo para relações
com sinônimos ou categorização. Ainda assim, não foi possível deduzir qualquer critério
relativo aos sinônimos e categorizações além das extensões admitidas como “Meio de
Comunicação de Massa” e das relações com “Internet” e termos com aplicação semelhante.
Por conseguinte, “Meio” se aproxima do uso comum do termo similar a “através” ou
“contexto”, sem nenhuma redução de ambiguidade ou parâmetro justificado, admitindo-se
inclusive a “cidade” como “meio de comunicação”, sem que tal indicação tivesse implicado em
explicação e problematização de “meio”.
55 Tendo como coautor André Rosa de Oliveira. 56 Cujo coautor é Daniel Costa de Paiva.
78
Em função do volume de textos e do evidente aumento do número de artigos a serem
avaliados para coleta, no caso da unidade de pesquisa constituída pelas publicações recentes,
diferentemente da unidade relativa aos textos originais, foi desconsiderada a relevância
quantitativa de outros termos associados a noções secundárias para os fins desta pesquisa.
Então, supondo-se que o termo “Indústria Cultural” fosse quantitativamente preponderante,
essa característica não necessariamente seria identificada.
Com o agrupamento de sinônimos realizado para o segundo estudo exploratório, foram
criadas as regras de admissão e exclusão de sinônimos de modo que fossem diminuídos os casos
como o exemplificado a respeito de “cidade” e “meio”. Sendo assim, do ponto de vista técnico,
somente o procedimento em relação à análise de argumento é exatamente o mesmo para as duas
unidades de pesquisa essencialmente porque os textos recentes são considerados como um todo,
sem as distinções detalhadas para a unidade de textos originais.
Considerando a mesma delimitação dos estudos exploratórios mencionados, isto é,
periódicos incluídos em sistema de gerenciamento de acesso aberto, de abrangência nacional,
com classificação Qualis entre A1 e B2, chegou-se a 46 deles:
79
TABELA 8 – Lista de periódicos selecionados
Fonte: Adaptado da plataforma Sucupira
Alceu
Alterjor
Animus
Brazilian Journalism Research
Ciberlegenda
Communicare
Compolítica
Comunicação & Informação
Comunicação & Inovação
Comunicação & Sociedade
Comunicação e Educação
Comunicação, Mídia e Consumo
Conexão
Contemporânea: Comunicação e Cultura
Contracampo
Culturas midiáticas
Devires
ECCOM: Educação, Cultura e Comunicação
E-COMPÓS
ECO-Pós
Eptic
Esferas
Estudos em Comunicação
Estudos em Jornalismo e Mídia
Estudos semióticos
Extraprensa
Famecos
Fronteiras
Galáxia
Geminis
Intercom: Revista Brasileira de Ciências da Comunicação
Intexto
Líbero
Liinc
Logos
Lumina
Matrizes
Novos Olhares
Opinião Pública
Organicom
Revista Brasileira de História da Mídia
Rizoma
Rumores
Sessões do Imaginário
Signos do Consumo
Verso e Reverso
80
A ampliação do número de periódicos se deu em função de modificação no
procedimento de busca que, ao invés de ser realizado a partir dos indexadores, foi executado
individualmente na página de cada periódico que até o período de entrega deste trabalho estava
disponível57.
Aplicando as regras de inclusão e exclusão de designadores e sinônimos, elaboradas a
partir do segundo estudo exploratório, chegou-se a um total de 705 textos, compreendendo o
período de Janeiro de 2010 a Dezembro de 2016, considerando-se ainda os seguintes parâmetros
adicionais de designadores aceitos:
Meio(s) desde que diferente de “através” e “contexto”, bem como não relacionado
a “ambiente”;
Mídia(s) e termos derivados como, por exemplo, “midiática” desde que relacionado
à “comunicação” e/ou “massa” ou extensões, tais como televisão e rádio;
Aparato(s), Artefato(s), Canal(is), Dispositivo(s), Plataforma(s), Suporte(s),
Tecnologia(s) e Veículo(s), desde que relacionados a “comunicação” e/ou “massa”
ou extensões, como no caso de Mídia(s).
Esclarecidas as opções metódicas e técnicas da estratégia de investigação para o
mapeamento do conceito de Meio de Comunicação, segue-se para a descrição e análise dos
resultados obtidos.
57 Alguns periódicos, embora listados na plataforma Sucupira, apresentaram problemas de disponibilização da
informação: Comunicação Midiática, Comunicação & Política, Comunicação Pública. O periódico Estudos em
Comunicação não disponibilizou até o fim deste estudo as seguintes edições: 2014, volume 15, número 36 e 2015,
volume 16, número 41.
81
Capítulo III – DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
EM NÍVEL METÓDICO-TÉCNICO ARGUMENTO – a. Linguagem comum – Dispita. b. Lógica – Raciocinar
(de maneira válida ou inválida) a partir das premissas até a conclusão. Os
únicos argumentos válidos são dedutíveis. A validade depende
exclusivamente da forma [...] Independentemente de sua validade, os
argumentos podem ser frutíferos ou estéreis. Se inválidos porém frutíferos,
podem ser chamados de sedutores [...] Os argumentos não dedutivos
dependem de seu conteúdo [...] O estudo de argumentos não dedutivos
compete à psicologia cognitiva e à epistemologia, não à lógica [...] (BUNGE,
2012, p. 34).
A partir dos procedimentos explicitados e justificados no capítulo anterior como parte
da estratégia de investigação especificamente relacionada às instâncias metódica e técnica, são
apresentados os resultados das unidades de pesquisa.
Como esclarecido anteriormente, foram aplicados procedimentos metódico-técnicos de
identificação e análise a partir dos termos que designam o conceito, buscando depreender
indicações de qualidades pertinentes a Meio de Comunicação, bem como os sentidos de uso e
de relações do conceito de Meio com outros designadores/conceitos, delimitados pela produção
científica em âmbito nacional.
No caso da unidade de pesquisa relativa aos textos originais, entende-se que além disso,
há demanda de compreender as estruturas explanatórias gerais, a fim de verificar a relações
entre Meio de Comunicação e outros conceitos.
Tendo em vista o tipo/formato de trabalho que compõe a unidade de textos recentes e a
variedade de abordagens diferentes, considerou-se que a compreensão das estruturas
explanatórias de cada um dos 705 textos não seria produtiva.
Portanto, o escrutínio de artigos da unidade de pesquisa de textos recentes também em
caráter teórico-epistemológico ficou restrito aos que apresentaram proposições específicas a
“Meio”, sem aplicação tangencial, isto é, funcional ou extensional.
Tais aprofundamentos de níveis epistemológico e teórico são realizados no capítulo IV
e, nesse sentido, este capítulo foi organizado de forma que fosse mantida a ênfase da análise
metódica-técnica, sendo o primeiro item relativo a unidade de pesquisa de textos originais e, o
segundo, a unidade de pesquisa de textos recentes.
82
1. Textos originais
Como apontado anteriormente, os textos originais que compõem a unidade de pesquisa
são: (1) Harold Lasswell, A estrutura e a função da comunicação na sociedade, (2) Paul
Lazarsfeld, Bernard Berelson e Hazel Gaudet, The people’s choice (3) Theodor Adorno e Max
Horkheimer, Dialética do esclarecimento, (4) Marshall McLuhan, Os meios de comunicação
como extensões do homem e (5) Jesús Martín-Barbero, Dos meios às mediações.
Além da identificação dos textos nas referências da disciplina, tais como os casos dos
livros de Os meios de comunicação como extensões do homem e Dos meios às mediações,
também foram observados os esclarecimentos de base sobre Teorias da Comunicação.
Dessa maneira, chegou-se a esse conjunto de textos considerando as referências
bibliográficas das disciplinas voltadas às Teorias nos cursos brasileiros de pós-graduação
stricto-sensu em Comunicação, bem como ao que é indicado pelas três referências mais
frequentes nos cursos sobre Teorias da Comunicação: (1) Teorias da Comunicação: conceitos,
escolas e tendências, (2) História das Teorias da Comunicação, e (3) Teorias das
Comunicações de Massa.
Após a obtenção ou melhoramento dos textos através de ferramentas OCR, foi gerada,
para cada um, uma planilha com todos os termos por intermédio do Atlas/Ti. Os designadores
com qualidade conceitual ainda que em caráter de extensão, e incluindo os relativos ao “Meio”,
foram destacados e os trechos em que estavam inseridos foram extraídos.
Tais trechos foram analisados segundo a proposta técnica de enfatizar a identificação de
argumentos, a distinção entre premissa(s) e conclusão(ões), a identificação de conectivos
proposicionais e aplicação das tabelas-verdade de acordo com o trecho em questão.
Depois disso, retornou-se à estrutura metódica geral de apreciação dos argumentos,
quando para além da justeza lógica, buscou-se depreender dos trechos extraídos extensões e
referências; descrições, definições e sentidos dos conceitos, além de critérios de aceitabilidade
do uso dos designadores.
Tendo sido realizada essa retomada, segue-se para a descrição e análise dos textos que
compõem a primeira unidade de pesquisa.
83
1.1 A estrutura e a função da comunicação na sociedade
Os termos que compõem o título do artigo, originalmente publicado em 194858, são parte
do conjunto de termos/expressões mais utilizados pelo autor (1989) no decorrer do texto, tal
como pode ser observado no Gráfico 4:
GRÁFICO 4 – Termos com maior frequência em Lasswell
Fonte: o próprio autor
O termo mais utilizado é “Sociedade”, para o qual não foi identificado esforço
explicativo de teor conceitual, sendo seu uso geral de caráter contextual, vinculado a “Política”
e concernente às extensões (“sociedade humana”, “sociedade democrática” etc.). Também foi
utilizado para indicações acerca das três funções atribuídas à “Comunicação” (vigilância sobre
o meio ambiente, correlação das partes da sociedade em resposta ao meio e transmissão da
herança social entre gerações), da estrutura (que também não possui teor explicativo-conceitual)
e da comunicação no enquadramento da analogia proposta, como ilustrado na citação abaixo:
58 A versão utilizada para análise está disponível em língua portuguesa no livro organizado por Gabriel Cohn
(1989), Comunicação e Indústria Cultural.
84
Embora tenhamos notado um certo número de equivalências estruturais e funcionais
entre a comunicação das sociedades humanas e outras entidades vivas, não se
pretende afirmar que possamos estudar com êxito o processo de comunicação na
América ou no mundo pelos métodos mais apropriados para a pesquisa dos animais
inferiores ou de organismos físicos isolados [...] Quando o nosso objeto de estudo
são seres humanos, podemos entrevistar o grande “animal falante”. (Isso não
significa que aceitemos tudo, sem mais. Às vezes, prognosticamos o contrário
daquilo que o indivíduo diz pretender fazer. Neste caso, dependemos de outras
indicações, tanto verbais quanto não-verbais) (LASWELL, 1989, p. 110).
Considerando que uma explicação funcional se dá “[...] em termos de funções ou papéis
mais do que de mecanismos subjacentes. Descreve o que as coisas fazem, não como as fazem
[...]” (BUNGE, 2012, p. 139), também não há, sobre “Comunicação” teor explicativo-
conceitual.
O que pode ser identificado restringe-se, nas palavras de Lasswell (1989), às áreas de
“estudo científico do processo de comunicação”, bem como à ocorrência/extensão do processo
de comunicação: “característica da vida em qualquer nível”, “das sociedades humanas e outras
entidades vivas”, “na América ou no mundo”, “em qualquer Estado” etc.
Dessa maneira tanto “Sociedade” quanto “Comunicação” apresentam amplitude de
extensões de forma que não é possível estabelecer com precisão os critérios de aceitabilidade
de aplicação porque não se vinculam a definições ou explanações.
A referência passa a ser melhor compreendida quando o autor (1989) a vincula com
aspectos políticos e, portanto, no mesmo contexto de “Política”, além da explanação funcional
de “Comunicação”.
Somando-se as duas constatações, reforça-se a identificação da tendência do tratamento
temático ao invés de teor conceitual.
O termo de maior relevância quantitativa é “Meio”, entretanto na maior parte dos casos
é operacionalizado como “meio ambiente” e como sinônimo de “através” ou contexto, tal como
demonstrado no gráfico abaixo.
85
GRÁFICO 5 – Meio em Lasswell
Fonte: o próprio autor
Em caráter especializado, isto é, como designador/sinônimo, o autor (1989) utiliza, entre
outros, “meio de comunicação de massa”, “canais de comunicação” e “modernos instrumentos
de comunicação”.
Na maior parte dos casos não se trata de argumento sobre “Meio”, ou seja, o tratamento
é temático. Além disso, é significativo o uso extensionalista tal como “rádio”, “imprensa” e
“cinema”.
Embora proponha a divisão do “estudo científico do processo de comunicação” com
uma certa independência entre “análise de conteúdo” e “análise de meios (media)”, não
esclarece sobre o ponto de origem da causa dos efeitos.
Ao tornar admissível como origem dos efeitos os conteúdos ou os meios ou ambos,
identifica-se o resultado do não esclarecimento conceitual de Meio de Comunicação e a
restrição da reflexão em Lasswell (1989) no caráter extensionalista do uso do termo.
Como no caso de todos os termos distinguidos, “controle” possui diversos sinônimos,
tratando-se em geral de uso relativo à extensão. A distinção que o autor (1989) claramente faz
é entre manipuladores (quem de fato interfere na elaboração do conteúdo) e manejadores
(indivíduos ou empresas ou setores que lidam com a aplicação/ajuste à determinada plataforma
tecnológica). Dentre as ocorrências apresentadas tem-se, por exemplo, “editores de jornais”
para manipuladores e “impressores e distribuidores de livros” para manejadores. Para além
disso, a questão do “controle” é contextual para as funções da comunicação, fundamentalmente
a eficiente:
86
A análise desenvolvida até aqui implica certos critérios de eficiência ou ineficiência
na comunicação. Nas sociedades humanas, o processo é eficiente na medida em que
julgamentos racionais são facilitados. Um julgamento racional implementa objetivos
vinculados a valores. Em sociedades animais, a comunicação é eficiente quando
ajuda a sobrevivência, ou alguma outra necessidade específica do agregado [...]
(LASSWELL, 1989, p. 113).
Não há acuracidade na analogia elaborada, uma vez que o autor (1989) não especifica
“sobrevivência”, embora exponha sua priorização de determinados “valores”, os quais
funcionalmente vinculam-se a “Comunicação” e “Meio” sem, contudo, esclarecê-los ou afastar
a centralidade das questões políticas.
No que tange a “audiência”, Lasswell (1989) não oferece uma conceituação geral, mas
uma distinção entre o “agregado de atenção” e “público”59. E, abordando a extensão, tem-se
que:
Convém assinalar que nem todas as pessoas são membros do público mundial, ainda
que pertençam em certa medida, ao agregado de atenção mundial. Para pertencer a
um agregado de atenção basta ter símbolos de referência para Nova York, América
do Norte, Hemisfério Ocidental ou para o globo é um membro do agregado de
atenção de cada um desse locais respectivamente. Para ser um membro do público
de Nova York, contudo, é essencial formular exigências para a ação pública em Nova
York, ou que afetem diretamente essa cidade (LASSWELL, 1989, p. 115).
O argumento para a distinção de “público” é de que:
O público dos EUA, por exemplo, não se restringe aos seus habitantes ou cidadãos,
dado que não-cidadãos americanos do exterior poderão tentar influenciar a política
norte-americana. De forma correspondente, nem todos os habitantes dos Estados
Unidos são membros do público americano, de vez que algo mais do que atenção
passiva é necessário para isso. Um indivíduo passa de um agregado de atenção para
um público quando ele desenvolve a expectativa de que aquilo que ele quer pode
afetar a condução da vida pública (LASSWELL, 1989, p. 115).
Finalmente, sobre “esclarecimento”, os argumentos apresentados ou não estão
relacionados entre si ou não têm as proposições relacionadas de forma que seja possível
asseverar mais do que a relação de esclarecimento com “opinião racional pública” e com a
“sociedade democrática”.
59 Ele também menciona que há “grupos de sentimento” que se comportam como “multidões”, mas não oferece
um argumento de teor conceitual.
87
1.2 The people’s choice: how the voter makes up his mind in a presidential campaign
Publicado originalmente em 1948, o objeto do estudo é delimitado pela campanha
presidencial norte-americana de 1940 (Roosevelt e Willkie), cuja coleta de dados se deu entre
os meses de maio e novembro, no Condado de Erie (Ohio).
Diferentemente dos outros textos analisados, há a exposição de um amplo conjunto de
evidências empíricas, o que resultou em uma primeira apreensão dos termos pouco produtiva.
Não ficando clara a relevância quantitativa e qualitativa dos termos, optou-se por
categorizar todos, em um primeiro momento associando sinônimos e, em um segundo
momento, considerando a função dos termos dentro do texto e sua importância quantitativa.
Dentre os termos quantitativamente mais relevantes, a maior parte diz respeito à
descrição dos elementos que delimitam o objeto (Exemplos: “campanha”, “candidato”,
“democrata” etc.) ou ao estudo em si (Exemplos: “respondentes”, “painel”, “perguntas” etc.).
Ainda no mesmo conjunto, dentre os termos que estavam associados a um argumento,
a maioria teve o processo de formalização limitado, uma vez que na maior parte dos casos há
associação com as evidências empíricas que são apresentadas pelos autores (1948)60.
GRÁFICO 6 – Conjuntos de termos mediante funções em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet
Fonte: o próprio autor
60 Em especial nesses casos, não foram identificados problemas de justeza do argumento.
88
Sequencialmente, foram selecionados termos a partir da relevância qualitativa, ou seja,
relacionados a esforço conceitual e/ou a “Meio”.
GRÁFICO 7 – Termos com maior relevância qualitativa em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet
Fonte: o próprio autor
Embora o termo “Comunicação” seja identificado em trechos extraídos mediante a
relevância qualitativa, não há argumento com teor conceitual e na maior parte dos casos está
associado a “Meio”.
89
GRÁFICO 8 – Meio e uso de extensões em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet
Fonte: o próprio autor
O termo “Meio” aparece vinculado a argumentos, mas não como seu centro, isto é, os
trechos não constituem explicação de teor conceitual do termo, nem definição de critérios da
aplicação: se trata de distinguir a “comunicação” que se dá através deles da interpessoal ou de
exemplificações que evidenciam extensões como, por exemplo, “jornal”, “rádio” e “revista”.
“Meio de Comunicação” não apresenta variações terminológicas como no caso de
Lasswell (1989), mas é aplicado em caráter extensionalista como mencionado acima e indicado
no gráfico 8. Não implica em distinções de uso, exceto no que tange a não aplicação a
“comunicação interpessoal”.
A propósito dos termos “Efeito” e “Influência” não foram identificados argumentos de
teor conceitual, mas tendo em vista a análise do conjunto dos trechos em que são aplicados e as
operacionalizações demonstradas pelos autores (1948) é possível apreender que há duas
importantes opções de uso: (1) “Efeito” como concretização da opinião do respondente (sua
escolha final a respeito de determinado candidato), (2) “Efeito” e “Influência” como sinônimos,
relativos ao que pode ser realizado por “Meio”, “Líder de Opinião”, “Pressões Inter-
relacionadas”, “Condição socioeconômica” etc.
Dentro da segunda opção de uso, há a delimitação de que está vinculada quanti e
qualitativamente de modo mais significativo ao grupo de respondentes que apresentou variação
em sua posição, de modo que os possíveis efeitos estudados aparecem como “Conversão”,
“Reforço” e “Ativação”, bem como estão relacionados a “Pressões Inter-relacionadas”:
90
GRÁFICO 9 – Efeitos em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet
Fonte: o próprio autor
Finalmente, sobre o “Fluxo em duas etapas” há duas considerações: em primeiro lugar
aparece relativo aos termos “Informação” e “Comunicação” igualmente, sugerindo-se que os
autores (1948) não os distinguem conceitualmente. Em segundo lugar, está sempre relacionado
a “Líder de Opinião”, que é o termo de maior atenção reflexiva no decorrer de todo o texto.
Dado o esforço explicativo dos autores (1948) em relação ao termo, tem-se alguns
delineamentos sobre a aceitação da aplicação do termo. Entretanto, não se trata de algo que
possa ser plenamente avaliado nesta pesquisa, dentre outras razões, porque os argumentos estão
sempre vinculados/justificados pelas evidências empíricas demonstradas.
1.3 Dialética do esclarecimento
Dentre os termos que compõem o título, “Esclarecimento” aparece de forma
quantitativamente mais relevante na totalidade do texto:
91
GRÁFICO 10 – Termos com maior frequência em Adorno e Horkheimer
Fonte: o próprio autor
Enquanto “Esclarecimento” está entre os termos quantitativamente mais relevantes,
“Dialética” representa apenas cerca de 1,5% dos designadores especializados do texto,
considerando que um dos primeiros trechos que incluem “Dialética” é o seguinte:
[...] Quando uma árvore é considerada não mais simplesmente como árvore, mas
como testemunho de uma outra coisa, como sede do mana, a linguagem exprime a
contradição de que uma coisa seria ao mesmo tempo ela mesma e outra coisa
diferente dela, idêntica e não idêntica. Através da divindade, a linguagem passa da
tautologia à linguagem. O conceito, que se costuma definir como a unidade
característica do que está nele subsumido, já era desde o início o produto do
pensamento dialético, no qual cada coisa só é o que ela é tornando-se aquilo que ela
não é (ADORNO; HORKHEIMER, 1969, p. 29).
Adorno e Horkheimer (1969) estão se referindo à “Dialética” como algo que admite o
descumprimento do terceiro excluído, o que não seria preponderante se fosse possível
determinar o fundamento da “dialética” proposta, uma vez que em nenhum dos trechos não
extensionalistas (três no total) a distinguem como ontologia ou metodologia61.
61 Em caráter extensionalista, a “Dialética” está sempre vinculada a oposições que, na leitura ora exposta, parecem
afirmação e negação, a contradição em si, cujo debate de cunho filosófico não cabe nesta pesquisa.
92
“Esclarecimento” aparece vinculado de modo quantitativamente mais relevante à
“Dominação”, “Razão/Racionalidade” e “Mito”, e quantitativamente menos relevante à
“Ciência” e “Técnica”.
Embora os argumentos não possam ser avaliados na perspectiva da relação entre
premissas e conclusões dado que os próprios autores (1969) a evitam, as condições de aplicação
são colocadas de forma que é possível apreender que “Esclarecimento” se opõe ao “Mito”,
alinhando-se à “Dominação”, “Razão/Racionalidade”, “Técnica” e, principalmente, “Ciência”
ou, filosoficamente, ao “Positivismo”. Ainda assim, não foi possível identificar teor conceitual
diretamente relacionado ao termo “Esclarecimento”.
O termo quantitativamente mais relevante, “Natureza”, é aplicado de duas formas: (1)
natureza de algo e (2) como objeto empírico e, portanto, é operacional. “Sociedade” e “Massa”
também não são termos colocados em evidência conceitual, sendo utilizados operacional e
secundariamente vinculados à “Indústria Cultural”.
No conjunto de trechos relativos a “Indústria Cultural” não foi identificado um
argumento com teor conceitual. Entretanto, a regularidade dos termos (em geral, utilizados
operacionalmente) e a explicitação contextual fornecem alguns subsídios dos critérios de
relação, aplicação e características. As relações mais explícitas se referem aos “Meios”, a
“publicidade”, “Arte” e “Crítica” (desaparecimento ou supressão das qualidades de ambas) e a
característica mais evidente é sua atuação como sistema.
Finalmente, “Comunicação” é um termo quantitativamente raro no texto e está
geralmente relacionado a outro na mesma condição: “Meio”. Observou-se que juntos
correspondem a menos de 1% dos termos especializados, além de sua aplicação não indicar
critérios explícitos de uso e apresentar caráter extensionalista amplo como, por exemplo, no
trecho denominado Isolamento pelos meios de comunicação:
A afirmação que o meio de comunicação isola não vale apenas no domínio cultural.
Não apenas linguagem mentirosa do locutor de rádio sedimenta no cérebro das
pessoas como a imagem da linguagem e impede-as de falar umas com as outras, não
apenas o louvor da Pepsi-Cola abafa o ruído do desmoronamento dos continentes,
não apenas o modelo espectral dos heróis do cinema se projeta sobre o abraço dos
adolescentes e mesmo sobre o adultério. O progresso separa literalmente as pessoas.
O pequeno guichê da estação ou do banco possibilitava ao caixa cochichar com o
colega e partilhar com ele seus pequenos segredos. As janelas de vidro dos
escritórios modernos, os salões gigantescos onde inúmeros empregados trabalham
em comum, podendo ser facilmente vigiados pelo público e pelos chefes, não
permitem mais nem conversas particulares, nem idílios. Mesmo nas repartições, o
contribuinte está protegido do desperdício de tempo dos servidores. Mas os meios
de comunicação separam as pessoas também fisicamente. A ferrovia foi substituída
pelos automóveis. O carro próprio reduz os contatos de viagem a hitchhikers algo
93
inquietantes. As pessoas viajam sobre pneus de borracha, rigorosamente isoladas
umas das outras. Em compensação, só se conversa num carro o que se discute em
outro; a conversa da família isolada está regulada pelos interesses práticos. Assim
como toda família com uma renda determinada gasta a mesma percentagem com
alojamento, cinema, cigarros, exatamente como a estatística prescreve, assim
também os temas são esquematizados segundo as classes de automóveis. Quando se
encontram, aos domingos ou viajando, em hotéis onde as acomodações e os
cardápios são idênticos em cada faixa de preços, os hóspedes descobrem que se
tornaram, com o isolamento, cada vez mais semelhantes. A comunicação cuida da
assimilação dos homes isolando-os (ADORNO; HORKHEIMER, 1969, p. 206-207).
1.4 Os meios de comunicação como extensões do homem
Tanto proporcionalmente, quanto em comparação direta com os outros textos incluídos
nessa unidade de pesquisa, em McLuhan (2005), o termo “Meio” é quantitativamente o de
maior relevância:
GRÁFICO 11 – Termos com maior frequência em McLuhan
Fonte: o próprio autor
94
Não há distinção de sentido ou em caráter extensionalista de “Meio”, “Veículo” e
“Tecnologia”. Nesse sentido, as extensões explícitas “imprensa/jornal”, “televisão”, “rádio” e
“cinema” têm em conjunto e quantitativamente preponderância no texto.
Agrupando-se as extensões explícitas a designação geral “Meio/Meio de Comunicação
de Massa/Veículo”, bem como “telefone” e “eletricidade” para os quais o autor (2005) se dirige
também como “Meio”, tem-se uma visão mais clara da relevância quantitativa de “meio” em
sua acepção de “veículo” como um todo no texto.
GRÁFICO 12 – Termos com maior frequência em McLuhan, concatenando extensões de Meio
Fonte: o próprio autor
A despeito de cerca de 53% do uso de termos especializados se referirem a “meio”,
trata-se prioritariamente de menção às extensões e não aos argumentos de teor conceitual
completo.
Ao se referir especificamente a “Meio de Comunicação” há poucas variações, enquanto
há seis extensões explícitas utilizadas (em ordem de relevância quantitativa: “imprensa/jornal”,
“televisão”, “rádio”, “eletricidade”, “cinema” e “telefone”), como demonstrado no gráfico
abaixo:
95
GRÁFICO 13 – Meio/Veículo e uso de extensões em McLuhan
Fonte: o próprio autor
“Meio” se relaciona com outros termos quantitativamente relevantes como, por
exemplo, “Extensão”, “Homem”, “Mensagem” e “Conteúdo”:
[...] o exemplo da luz elétrica pode mostrar-se esclarecedor. A luz elétrica é
informação pura. É algo assim como um meio sem mensagem, a menos que seja
usada para explicitar algum anúncio verbal ou algum nome. Este fato, característico
de todos os veículos, significa que o “conteúdo” de qualquer meio ou veículo é
sempre um outro meio ou veículo. O conteúdo da escrita é a fala, assim como a
palavra escrita é o conteúdo da imprensa e a palavra impressa é o conteúdo do
telégrafo [...] Uma pintura abstrata representa uma manifestação direta dos processos
do pensamento criativo, tais como poderiam comparecer nos desenhos de um
computador. Estamos aqui nos referindo, contudo, às consequências psicológicas e
sociais dos desenhos e padrões, na medida em que ampliam ou aceleram os processos
já existentes. Pois a “mensagem” de qualquer meio ou tecnologia é a mudança de
escala, cadência ou padrão que esse meio ou tecnologia introduz nas coisas humanas
[...] (MCLUHAN, 2005, p. 22, grifo nosso).
A formalização dos trechos relativos ao “Meio” viabilizou a identificação dos
argumentos da preponderância do “Meio” sobre a “Mensagem” e do “Meio como extensão”
porque, embora sua forma de apresentação não seja formal (por exemplo, “O meio é a
mensagem”), não implica em descumprimento dos princípios lógicos básicos.
Do ponto de vista das extensões utilizadas, o critério que é possível extrair é que se trata
de técnica/tecnologia e as consequências da “Extensão” são individuais e compartilhadas.
96
Porém, tendo vista a indistinção de teor conceitual entre “Tecnologia” e “Meio”, a maior
dificuldade diz respeito à delimitação que, como em outros casos, é ampla e ambígua.
Quanto aos outros termos quantitativamente mais relevantes, em especial “Homem”,
“Sociedade” e “Cultura”, não são objeto de preocupação conceitual do autor (2005), o que
resultou na não identificação de argumentos descritivos, definidores ou de explanação,
apresentando aplicações das quais, mesmo enquanto conjunto, não foi possível extrair critérios.
E, finalmente, no que tange “Aldeia”, além de corresponder quantitativamente a menos
de 1% dos termos de maior frequência, não foi identificado argumento de teor conceitual
completo através do qual fosse possível estabelecer manifestadamente classe de referência e
sentido.
1.5 Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia
Repetindo-se o padrão, os termos que compõem o título do livro, originalmente
publicado em 198762, são parte do conjunto de termos/expressões mais utilizados pelo autor
(1997) no decorrer do texto, tal como pode ser observado no Gráfico 14:
62 Para esta análise foi utilizada a versão em língua portuguesa, de 1997.
97
GRÁFICO 14 – Termos com maior frequência em Martín-Barbero
Fonte: o próprio autor
“Cultura” é o termo que se relaciona diretamente com todos os outros termos
quantitativamente relevantes como, por exemplo, “Arte” que, na maior parte dos casos, é
utilizado operacionalmente nos argumentos a respeito do conceito de “Cultura” na “corrente
culturalista” (termo/expressão que relaciona a Escola de Frankfurt).
Tratada isoladamente, “Cultura” corresponde a cerca de 36% dos termos com expressão
de teor conceitual ou extensionalista.
“Cultura” é, portanto, o designador que centraliza o debate do autor (1997) e, por
conseguinte, mais relevante para a classe de referência e sentidos de outros termos-conceitos,
em especial “Mediação”.
Além do uso como grande conceito (a Cultura) ou de nível extensionalista mais amplo
(cultura nacional, camponesa, indígena etc.), há designadores particulares como demonstrado
abaixo:
98
GRÁFICO 15 – Desdobramentos de Cultura em Martín-Barbero
Fonte: o próprio autor
Sobre “Sociedade”, apesar de ser um termo quantitativamente relevante, não há esforço
explicativo-conceitual próprio do autor (1997). E embora relacione autores a termos
especializados (Exemplo: Le Bon – Sociedade de Massa), o interesse conceitual reside na
relação entre “Massa” e “Popular”, considerando “Hegemonia” e “Mediação”/ “Recepção”.
O problema operacional, que perpassa todo o texto de Martín-Barbero (1997), é que o
teor conceitual é explícito quando relacionado a termos-expressões de outros autores como, por
exemplo, “Indústria Cultural” (Adorno e Horkheimer) e “Hegemonia” (Gramsci). Nesses casos,
o autor (1997) demonstra argumentos que relacionam diretamente premissas e conclusões
passíveis de verificação, operacionalização essa que ele utiliza como subsídio para abarcar ou
refutar posições teóricas.
Entretanto, quando se trata de termos especializados propostos diretamente
(principalmente “Mediação”), a análise do conjunto de trechos relativos ao designador
evidencia três tendências: (1) ou não atende ao princípio da não contradição, isto é, estão
estruturados de modo que uma proposta sobre mediação é tomada como verdadeira e falsa; (2)
ou as premissas e conclusões não estão vinculadas (3) e/ou o esclarecimento do teor conceitual
e da relação entre premissas e conclusões depende do esclarecimento de um segundo termo
99
especializado que não foi realizado (Exemplo: compreender “Mediação” depende do
entendimento de “Meio”). O trecho central da constatação é:
O campo daquilo que denominamos mediações é constituído pelos dispositivos
através dos quais a hegemonia transforma por dentro o sentido do trabalho e da vida
da comunidade. Já que é o próprio sentido do artesanato ou das festas o que é
modificado por aquele deslocamento "do étnico ou do típico", que não só para o
turista, mas também na comunidade, provoca o esmaecimento da memória que
convoca [...] (MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 262).
A identificação da contradição está diretamente relacionada com o caráter
extensionalista de “Mediação” e de “Cultura”, que no texto do autor (1997) aparecem aplicados
em inúmeras situações.
A priorização do caráter extensionalista de termo especializado se repete em relação a
“Meio”.
GRÁFICO 16 – Meio em Martín-Barbero
Fonte: o próprio autor
Se por um lado a identificação e compreensão geral dos trechos tenha sido facilitada em
função de as variações terminológicas para “meio” e as extensões utilizadas serem
quantitativamente irrelevantes, não foram identificados argumentos com teor conceitual
completo ou que delimitassem as condições das extensões aceitas. O trecho que mais se
aproxima de qualquer uma das demandas está exposto abaixo:
100
As denominações são também um bom ponto de acesso. Pliego indica o "meio": uma
simples folha de papel dobrada duas vezes, ou várias folhas dobradas formando um
caderninho, impresso em duas ou três colunas. Cordel assinala o modo de difusão,
pois os pliegos eram exibidos e vendidos pendurados em um cordel na praça [...]
(MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 145, grifo do autor).
Finalmente, a propósito de “Comunicação”, há três contextos básicos de aplicação do
termo:
GRÁFICO 17 – Desdobramentos de Comunicação em Martín-Barbero
Fonte: o próprio autor
Quando utilizado de modo isolado, trata-se especialmente de trechos em que o autor
(1997) se refere aos limites do domínio, entretanto, sem argumentos que esclareçam o teor
conceitual de “Comunicação” como, por exemplo, quando afirma que “[...] a comunicação está
se convertendo num espaço estratégico a partir do qual se pode pensar os bloqueios e as
contradições que dinamizam essas sociedades-encruzilhada, a meio caminho entre um
subdesenvolvimento acelerado e uma modernização compulsiva [...]” (MARTÍN-BARBERO,
1997, p. 258, grifo do autor).
Em uma pequena parcela de aplicação do termo, o autor (1997) aponta para extensões
da “Comunicação”, também sem explicitar os critérios que validariam o uso.
101
Por fim, há o uso de “Comunicação” relacionado a “Meio” e, nesse sentido, a
identificação colaborou para o agrupamento do termo “Meio”, mas não implicou
esclarecimento do teor conceitual de ambos os termos especializados.
2. Textos recentes
Tal como esclarecido anteriormente, a unidade de pesquisa foi composta por 46
periódicos, excluindo-se da lista extraída da plataforma Sucupira os que não são da área da
Comunicação (na maior parte vinculados a programas de pós-graduação stricto sensu em
História e Psicologia), bem como Comunicação Midiática, Comunicação & Política e
Comunicação Pública, uma vez que até a data de finalização deste trabalho apresentaram
problemas de disponibilização.
Isso se deu porque essa dificuldade não pode ser solucionada a partir da coleta nos
indexadores visto que, em última instância, a coleta dos artigos publicados tem de ser realizada
diretamente nas páginas dos periódicos.
Além disso, foram identificados problemas de disponibilização no periódico Estudos
em Comunicação nas edições de 2014, volume 15, número 36 e de 2015, volume 16, número
41.
Focalizando título, resumo e palavras-chave foram coletados somente os textos que
apresentaram os seguintes parâmetros para os termos: (1) “Meio(s)” se diferente de “através” e
“contexto” ou relacionado a “meio ambiente”; (2) “Aparato(s)”, “Artefato(s)”, “Canal(is)”,
“Dispositivo(s)”, “Mídia(s)”, “Plataforma(s)”, “Suporte(s)”, “Tecnologia(s)” e “Veículo(s)”,
admitindo-se termos variados como, por exemplo, “midiáticos” se relacionados a
“comunicação” e/ou “massa”, ou ainda termos tomados como extensão, tais como “televisão”.
A partir disso a unidade de pesquisa foi constituída por 705 textos distribuídos nos 46
periódicos consultados da seguinte maneira:
102
GRÁFICO 18 – Distribuição dos textos nos periódicos
Fonte: o próprio autor
103
No que se refere à preponderância das publicações em relação aos anos, tem-se:
GRÁFICO 19 – Distribuição dos textos entre 2010 e 2016
Fonte: o próprio autor
Quase 10% dos textos que compuseram a unidade foi extraído da revista Rumores,
vinculada a Escola de Comunicações e Arte da Universidade de São Paulo (ECA-USP).
Dentre os periódicos verificados, Devires e Estudos semióticos não tiveram artigos que
se enquadrassem nos critérios estabelecidos para esta pesquisa. Em contrapartida, 17 revistas
tiveram textos extraídos acima da média.
Alceu e Aterjor tiveram apenas um artigo extraído, respectivamente publicados em 2013
e 2016. Em ambos os casos há apreensão funcional dos meios sem exploração do teor conceitual
completo. O maior esforço é de caráter extensionalista, sem a exposição dos critérios que
admitem as diferentes extensões, nem no trecho em questão e abaixo demonstrado, nem em
trechos subsequentes no artigo:
Em termos conceituais, inicialmente, observa-se que Pereira (1981) divide os meios
de comunicação social em três categorias: 1. meios de comunicação de massa como
rádio, televisão e imprensa; 2. literatura e 3. artes performáticas como música, teatro,
cinema, entre outras. Analogamente, Lima (1995) considera os meios de
comunicação social como sendo compostos por: 1. mídia impressa; 2. rádio; 3.
televisão; 4. propaganda e 5. Artes [...] (TRINDADE, CAMPANARIO, 2013, p. 48).
104
No periódico Animus, tal como é possível verificar no gráfico 20, foram identificados
três artigos (2011, 2014 e 2015) que atendiam os parâmetros de extração.
GRÁFICO 20 – Distribuição de textos no periódico Animus
Fonte: o próprio autor
Nos três artigos o tratamento de “Meio” é funcional e como recorte do objeto empírico,
isto é, apontam para que servem/seu papel e para restrição do levantamento de dados do
trabalho, sem que isso resulte no esclarecimento de teor conceitual.
Em relação ao periódico Brazilian Journalism Research a maior quantidade de artigos
extraídos foi publicada entre os anos de 2012 e 2015.
105
GRÁFICO 21 – Distribuição de textos no periódico Brazilian Journalism Research
Fonte: o próprio autor
Dentre os termos designadores mais frequentes no conjunto de textos do Brazilian
Journalism Research destacam-se:
“meio(s) de comunicação”, “meios de comunicação em multiplataforma”, “meios
de comunicação online”, “meio digital”, “meio jornalístico”, “meio tradicional”,
“novos meios de comunicação”
“meios sociais de comunicação”, “social media”
“veículos de comunicação”
A aplicação não é prioritariamente funcional, mas sim de “Meio” como delimitador do
recorte empírico como, por exemplo, a análise de determinado jornal. Nesse sentido, o uso do
termo é proeminentemente extensional e secundário em discussões sobre a qualidade do
jornalismo, mudanças econômicas e profissionais oriundas da introdução de tecnologias,
critérios de noticibialidade, aspectos éticos, categorias de narrativas jornalísticas, formação
profissional e a presença de determinados assuntos em jornais específicos (exemplo: questões
de meio ambiente e divulgação científica).
106
Nos periódicos Communicare, Estudos em Jornalismo e Mídia, e Extraprensa, cujas
distribuições de textos estão expostas nos gráficos abaixo, também há preponderância de
interesse pelo jornalismo.
GRÁFICO 22 – Distribuição de textos no periódico Communicare
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 23 – Distribuição de textos no periódico Estudos em Jornalismo e Mídia
Fonte: o próprio autor
107
GRÁFICO 24 – Distribuição de textos no periódico Extraprensa
Fonte: o próprio autor
Além da abordagem de aspectos do jornalismo, em especial da prática profissional, a
respeito da credibilidade e cobertura jornalística, identificou-se também a preponderância de
questões políticas gerais (debates sobre democracia e cidadania, por exemplo) e específicas
(sobre determinada eleição).
O uso de “Meio” é funcional e extensional, para sua aplicação como delimitador do
objeto empírico (como, por exemplo, análise da cobertura jornalística sobre eleições em jornais
específicos).
Os periódicos Ciberlegenda, Galáxia e Signos do Consumo concentram a maior parte
dos textos publicados com os parâmetros de extração para esta unidade nos primeiros anos do
período estabelecido, entre 2010 e 2012, considerando que no último ano (2016), foi
identificado em cada periódico apenas um texto.
No caso de Ciberlegenda, os designadores identificados são próximos ou similares aos
que foram reconhecidos no Brazilian Journalism Research, sendo “meios de comunicação de
massa”, “veículos de comunicação de massa”, “velhos meios de comunicação”, “media”,
“meios eletrônicos”, “meios impressos”, “novas mídias” e “mídia pública”, dentre outros.
108
GRÁFICO 25 – Distribuição de textos no periódico Ciberlegenda
Fonte: o próprio autor
A maior parte dos textos faz uso extensionalista dos termos, isto é, explica-os através
de exemplos, tais como “Tv” e “Facebook”. Excetuando-se o artigo de 2012, As singularidades
do espaço audiovisual brasileiro nos anos 2000: Reflexões sobre convergência, cinema e
televisão.
Esse trabalho em especial, além do cunho extensionalista e de delineamento do objeto
empírico, teve o seguinte trecho extraído, o que não resultou em esclarecimentos acerca de teor
conceitual: “As transformações são conceituais e atingem todos os meios, uma vez que as
fronteiras previamente demarcadas no campo audiovisual são frequentemente apagadas,
desafiando os paradigmas teóricos estabelecidos” (CESÁRIO, 2012, p. 87).
Como é possível observar, tanto quanto nos outros artigos do mesmo periódico, não há
redução de ambiguidade a partir de outros termos-conceitos como, por exemplo, “paradigmas
teóricos”, que também é aplicado funcionalmente.
Enquanto Ciberlegenda teve 20 artigos extraídos no total, a revista Galáxia teve apenas
8, como apontado no gráfico abaixo.
109
GRÁFICO 26 – Distribuição de textos no periódico Galáxia
Fonte: o próprio autor
Não foram identificadas nos textos do periódico Galáxia aplicações do
termo/designador diferentes dos das revistas analisadas até aqui. Repete-se, portanto, a
tendência do uso de “Meio” como recorte do objeto empírico e, por consequência, o caráter
extensionalista.
Já na revista Signos do Consumo, cujo total de textos extraídos foi 16, as temáticas gerais
são Consumo e Publicidade, Linguagem, Representações e Uso dos meios em especial de cunho
político e mercadológico.
110
GRÁFICO 27 – Distribuição de textos no periódico Signos do Consumo
Fonte: o próprio autor
Nesse sentido, não há nenhuma novidade em comparação com os periódicos analisados
até o presente momento, ou seja, repete-se a tendência de uso do “Meio” como recorte do objeto
empírico e do caráter extensionalista amplo, incluindo, por exemplo, games.
Dentre as revistas que apresentaram aumento de quantidade de textos extraídos nos
últimos anos do período estabelecido estão Comunicação & Sociedade; Comunicação, mídia e
consumo; Eptic; Estudos em Comunicação e Fronteiras.
No caso da primeira, apenas 6 artigos foram extraídos, como demonstrado no gráfico
abaixo.
111
GRÁFICO 28 – Distribuição de textos no periódico Comunicação & Sociedade
Fonte: o próprio autor
Exceto pelo designador “meios dominantes”, não foram encontrados termos diferentes
dos já mencionados até aqui. A tendência extensionalista e de aplicação de “Meio” como recorte
do objeto empírico também permanece.
O que chama atenção é a definição apresentada sobre “mídias sociais digitais”, que
seriam diferentes, segundo argumento anterior dos autores (2015), de outros meios:
Entendemos as mídias sociais digitais, neste trabalho, como ambiência resultante de
associações/ interações entre atores humanos (indivíduos, grupos e organizações) e
algumas tecnologias de comunicação com potencialidade para usos e apropriações
mais participativos e conversacionais [...] (CARVALHO; RUBLESCKI;
BARRICHELLO, 2015, p.112).
E ainda:
Propusemos os meios como resultados das associações entre suas gramáticas – que
já são resultado de combinações do mesmo tipo – e seus usos e apropriações sociais,
constituindo ambiências. Apresentamos as mídias sociais digitais como meios que
resultam de associações entre suas potencialidades materiais e seus usos. Ao trazer
alguns exemplos das associações sociotécnicas entre essas mídias e as organizações
jornalísticas, mostramos que os meios e os atores sociais afetam-se mutuamente em
um processo que, desde a perspectiva ecológica, está sempre em desenvolvimento
(CARVALHO; RUBLESCKI; BARRICHELLO, 2015, p.126).
112
Embora o referencial teórico (Ator-rede) seja bem definido e sejam apresentadas
definições, os usos diversos de termos-conceitos correlacionados e também de “mídias sociais
digitais” não reduzem a ambiguidade de modo que seja possível extrair critérios explícitos para
a aplicação do designador e suas consequências: são resultado de associações ou interações
entre atores e tecnologias e/ou são um objeto que se relaciona com os atores e as tecnologias
e/ou são as tecnologias em si? As potencialidades materiais são os usos mais participativos e
conversacionais? De que forma se distanciam ou se aproximam dos outros meios?
No que tange o periódico Comunicação, mídia e consumo, o número de artigos extraídos
foi menor, como exposto no gráfico abaixo.
GRÁFICO 29 – Distribuição de textos no periódico Comunicação, mídia e consumo
Fonte: o próprio autor
Apenas o artigo Entre mídia e comunicação: origens e modalidades de uma dicotomia
nos estudos da área, publicado em 2016, não faz uso de “Meio” como delimitador do objeto
empírico. Para que fique mais explícito, esse é o caso, por exemplo, do texto O The Daily como
uma mistura de mídias e uma nova significação do meio jornal, de 2013, cujo conceito-chave
é, na verdade, “convergência”.
113
Apesar de tratar diretamente da questão do “Meio”, não se trata de uma proposta
conceitual sobre o mesmo, mas de um debate epistemológico. Então, o autor (2016) apresenta
apreensões que, embora tenham características descritivas e de definição, estão incluídas em
um argumento sobre o que se propõe como “Meio”, não constituindo asserção imediata sobre
o conceito. Isso é elucidado quando explica que:
O termo “mídia”, neste caso, parece se referir, com pouca problematização, a um
conjunto de “meios de comunicação”, de “massa” ou “digitais”, destacados
sobretudo por se tratarem de dispositivos tecnológicos englobados, por vezes, em
um âmbito institucional no qual “mídia” ganha também o significado de “empresa
de comunicação”. Nas duas concepções, como aparato e como instituição, é possível
observar a acentuação unilateral de uma dimensão que parece por vezes prescindir
do humano e/ou do social como princípio, contexto e fim (MARTINO, 2016, p. 14).
O mesmo ocorre quando aponta que:
O campo semântico coberto por “estudos de mídia”, portanto, equivale apenas
parcialmente à “teoria da comunicação”; ao mesmo tempo, como indicado, mesmo
a perspectiva de “estudos de mídia”, por conta da polissemia conceitual de “mídia”
nos estudos de comunicação, não parece necessariamente contribuir para a definição
do objeto, mas apenas para o que aparenta ser uma resolução imediata de uma
problemática epistemológica que, no entanto, não subsiste a um escrutínio mais
amplo (MARTINO, 2016, p. 23-24).
Seguindo-se para o periódico Eptic, tem-se a seguinte demonstração dos artigos
extraídos:
GRÁFICO 30 – Distribuição de textos no periódico Eptic
Fonte: o próprio autor
114
Repete-se a tendência extensionalista e de “Meio” como elemento de delineamento do
objeto empírico, com a peculiaridade de que a propensão temática em todos os casos é voltada
para o debate de aspectos macrossociais, fundamentalmente econômicos e políticos,
relacionados à regulação da comunicação.
Tal regularidade de inserção temática não se repete no caso da revista Estudos em
Comunicação.
GRÁFICO 31 – Distribuição de textos no periódico Estudos em Comunicação
Fonte: o próprio autor
No periódico Estudos em Comunicação, a tendência temática que se utiliza de “Meio”
como delimitador do objeto empírico e de caráter extensionalista é ampla, perpassando por
tratamentos de determinados assuntos (exemplo: poluição, ração, gênero, movimentos sociais
etc) até a descrição de ações empresariais (exemplo: como determinado jornal passou a
disponibilizar notícias etc).
A diversidade temática também foi observada no caso da revista Fronteiras, cuja
distribuição de textos coletados é demonstrada no gráfico abaixo.
115
GRÁFICO 32 – Distribuição de textos no periódico Fronteiras
Fonte: o próprio autor
A diversidade temática não obscurece a unidade de utilização funcional de “Meio”, que
é aplicado às explanações de teor conceitual relacionadas a aspectos políticos, bem como para
o recorte de objeto empírico, prioritariamente relativo a jornalismo (cobertura jornalística de
determinado assunto, narrativa jornalística etc).
Dentre os periódicos com menor número de textos extraídos, mas que não apresentaram
redução de artigos que se enquadram nos parâmetros desta pesquisa em 2016 estão
ComPolítica, Comunicação e Educação, Contemporânea: Comunicação e Cultura, Culturas
midiáticas, ECOM – Educação, Cultura e Comunicação, Esferas, Liinc e Opinião Pública,
cujas distribuições por ano estão demonstradas nos gráficos abaixo.
116
GRÁFICO 33 – Distribuição de textos no periódico Compolítica
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 34 – Distribuição de textos no periódico Comunicação e Educação
Fonte: o próprio autor
117
GRÁFICO 35 – Distribuição de textos no periódico Contemporânea: Comunicação e Cultura
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 36 – Distribuição de textos no periódico Culturas midiáticas
Fonte: o próprio autor
118
GRÁFICO 37 – Distribuição de textos no periódico ECOM
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 38 – Distribuição de textos no periódico Esferas
Fonte: o próprio autor
119
GRÁFICO 39 – Distribuição de textos no periódico Liinc
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 40 – Distribuição de textos no periódico Opinião Pública
Fonte: o próprio autor
120
No caso dos periódicos Compolítica, Contemporânea, Esferas, Liinc e Opinião Pública
repetem-se as tendências observadas até aqui no que se refere a aplicação de “Meio”, em
especial no uso do termo como subsídio de recorte do objeto empírico, que exceto por cinco
textos (dentre dezesseis), dizem respeito ao tratamento de questões políticas pelos “Meios”,
sem esclarecimentos conceituais sobre os mesmos.
Nas revistas Comunicação e Educação, Culturas midiáticas e ECOM, além de “Meio”
como delimitador do objeto empírico, há o uso funcional e de caráter extensionalista e, ainda,
diversos trechos com indicações triviais ou que não correspondem a um argumento passível
dessa análise como, por exemplo:
A televisão é um meio de comunicação social de suma importância na vida do
brasileiro, tendo como finalidade informar e também proporcionar entretenimento à
grande massa. No dia 02 de dezembro de 2007, começaram as transmissões no Brasil
da TV digital, nas cidades da Grande São Paulo, que gerou e ainda provoca uma série
de questionamentos e dúvidas a respeito desta nova TV (BARRETO, 2011, p. 17).
Na mesma revista, há a exceção no texto Novas tecnologias na sala de aula, no seguinte
trecho:
Descrevendo as mídias, nós nos referimos hoje, tanto a instituições, como meios
impressos, radiofônicos, televisivos, a gêneros (jornais, revistas etc.) ou a técnicas
(fax, rádio). Todavia, as definições, para além de sua diversidade, insistem
geralmente sobre a finalidade das mídias que implica uma comunicação. Assim,
Francis Balle (1995 apud GONNET, 2004, p. 16) define mídia “como o equipamento
técnico que permite aos homens comunicar a expressão de seu pensamento quaisquer
que sejam a forma e a finalidade desta expressão” (OLIVEIRA JÚNIOR; SILVA,
2010, p. 87).
Exceto a relação com a comunicação e com a técnica/tecnologia não há outro critério
explícito de aplicação. Tais requisitos, entretanto, são considerados insuficientes porque
demandariam o esclarecimento conceitual dos designadores “comunicação” e
“técnica/tecnologia”, além de tal relação não ser evidente, do ponto de vista epistemológico e
teórico (MARTINO, L. M., 2016).
Seguindo-se para os periódicos ainda não mencionados, alguns apresentaram pequena
queda em 2016 no número de artigos publicados dentro dos parâmetros de coleta desta unidade
de pesquisa: Comunicação & Informação, Conexão, Contracampo, ECO-Pós, Líbero, Logos,
Novos Olhares, cujas distribuições por ano estão demonstradas nos gráficos abaixo.
121
GRÁFICO 41 – Distribuição de textos no periódico Comunicação & Informação
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 42 – Distribuição de textos no periódico Conexão
Fonte: o próprio autor
122
GRÁFICO 43 – Distribuição de textos no periódico Contracampo
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 44 – Distribuição de textos no periódico ECO-Pós
Fonte: o próprio autor
123
GRÁFICO 45 – Distribuição de textos no periódico Líbero
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 46 – Distribuição de textos no periódico Logos
Fonte: o próprio autor
124
GRÁFICO 47 – Distribuição de textos no periódico Novos Olhares
Fonte: o próprio autor
Neste conjunto de periódicos, a tendência temática prioritária diz respeito à
representação de questões políticas por “meios” específicos e, portanto, também ao uso de
“Meio” como delimitador do objeto empírico. Além disso, há textos que tratam da perspectiva
funcional de “Meio”, focalizando o papel do mesmo em determinada questão normalmente para
além da comunicação e no âmbito político ou relacionada à hipótese do agendamento,
considerando que tal especificação não resultou em esforços de teor conceitual relativos a
“Meio”.
Além disso, uma menor parcela dos textos desses sete periódicos se referiu à perspectiva
de autores específicos (que mesmo nesses casos não resultou na explanação sobre “Meio”) e à
reconfiguração de atuação profissional relacionada à comunicação, em especial nos ramos do
jornalismo e da publicidade.
Ainda sobre esses sete periódicos, um texto intitulado Medium-Remedium: o problema
ontológico dos meios e seu entrelaçamento comunicativo (ECO-Pós, 2013) foi destacado para
reflexão posterior, realizada no próximo capítulo, sobre os esclarecimentos que podem ser
objeto de inferência em relação a “Meio”, partindo-se de uma perspectiva de análise em níveis
epistemológico e teórico.
125
Considerando ainda os periódicos que apresentaram diminuição de textos nos
parâmetros de extração considerados para esta unidade de pesquisa, dois especificamente
apresentaram reduções mais drásticas, tais como demonstradas nos gráficos abaixo.
GRÁFICO 48 – Distribuição de textos no periódico Intexto
Fonte: o próprio autor
126
GRÁFICO 49 – Distribuição de textos no periódico Organicom
Fonte: o próprio autor
No caso do periódico Intexto há uma ampla variação temática na qual a questão do
“Meio” está inserida, bem como repetição das tendências de uso já percebidas até aqui. No que
se refere à revista Organicom, a temática geral é bem definida em relação a problemas
específicos de Relações Públicas e está presente em todos os artigos extraídos.
Seguindo-se para o periódico Comunicação & Inovação apresenta-se abaixo o gráfico
de distribuição dos textos no período estipulado para esta investigação.
127
GRÁFICO 50 – Distribuição de textos no periódico Comunicação e Inovação
Fonte: o próprio autor
Das tendências já apontadas, observou-se a priorização de “Meio” como elemento
delimitador dos objetos empíricos. Nesses casos, a exemplificação e, portanto, indicação de
extensões como, por exemplo Twitter, é o máximo de esclarecimento a respeito do designador.
As distribuições das revistas Geminis, Intercom, Lumina, Rizoma e Rumores são
demonstradas abaixo nos gráficos 51, 52, 53, 54 e 55.
128
GRÁFICO 51 – Distribuição de textos no periódico Geminis
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 52 – Distribuição de textos no periódico Intercom
Fonte: o próprio autor
129
GRÁFICO 53 – Distribuição de textos no periódico Lumina
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 54 – Distribuição de textos no periódico Rizoma
Fonte: o próprio autor
130
GRÁFICO 55 – Distribuição de textos no periódico Rumores
Fonte: o próprio autor
Os cinco periódicos apresentam textos coletados que privilegiam, em ordem de
relevância, o uso do “Meio” como delimitador do objeto empírico e indicações extensionalista,
e aplicação funcional do designador, em especial para tratamento de questões políticas.
Chama atenção que não apenas o conjunto, mas o caso específico da revista Rumores:
as cinco revistas concentram 178 artigos de um total de 705, considerando ainda que o periódico
que sozinho possui cerca de 10% do total de textos extraídos (Rumores) não tem um artigo que
se dirija centralmente ao esclarecimento do teor conceitual completo de “Meio”, restringindo-
se aos usos funcionais, de recorte de objeto empírico e extensionalistas.
Outro periódico com características parecidas, inclusive no que tange a distribuição dos
textos no período de coleta, é a Revista Brasileira de História da Mídia.
131
GRÁFICO 56 – Distribuição de textos no periódico Revista Brasileira de História da Mídia
Fonte: o próprio autor
Entretanto, a proeminência do uso de “Meio” como delimitador de objeto empírico está
relacionada com o caráter histórico como é possível perceber em títulos como A máquina do
tempo: a publicidade de lava-louças em cinco décadas de permanências, publicado em 2016.
Dos últimos cinco periódicos restantes, apenas E-compós apresentou diminuição no
número de textos enquadrados nos requisitos de coleta elaborados para esta unidade de
pesquisa, como é possível verificar nos gráficos de distribuição de textos abaixo colocados.
132
GRÁFICO 57 – Distribuição de textos no periódico E-compós
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 58 – Distribuição de textos no periódico Famecos
Fonte: o próprio autor
133
GRÁFICO 59 – Distribuição de textos no periódico Matrizes
Fonte: o próprio autor
GRÁFICO 60 – Distribuição de textos no periódico Sessões do imaginário
Fonte: o próprio autor
134
GRÁFICO 61 – Distribuição de textos no periódico Verso e Reverso
Fonte: o próprio autor
Além das tendências verificadas em todos os periódicos avaliados até aqui, quanto ao
uso funcional e extensional de “Meio”, esses últimos guardam em comum o fato de terem pelo
menos um artigo que discute, a partir de uma perspectiva teórico-epistemológica, a questão do
“Meio”, em alguns casos resultando em texto a ser melhor detalhado no próximo capítulo.
Destaca-se da E-Compós o artigo Meio, mediação, agência: a descoberta dos objetos
em Walter Benjamin e Bruno Latour, publicado em 2013. Da Famecos, Semiótica da
comunicação: da semiose da natureza à cultura, de 2010; Epistemologia “da” Comunicação:
elementos para a crítica de uma fantasia acadêmica, de 2014, e A virada comunicacional. Ou
porque os estudos de “midiatização”, de hábito e da Teoria dos Media passam ao largo da
comunicação, de 2015.
Do periódico Matrizes, os textos Tertium datur: introdução a uma teoria negativa dos
media e Mídias sociais digitais a partir da ideia mcluhaniana de médium-ambiência, ambos
publicados em 2013.
Finalmente, de Sessões do imaginário, tem-se o artigo Mídia fluida: por uma renovação
conceitual, de 2010, e de Verso e Reverso, Constituição do campo da comunicação, de 2011.
O artigo publicado em 2015 na Famecos, os dois textos da Matrizes e o publicado na
Sessões do imaginário tiveram a análise realizada no próximo capítulo, em função do viés
teórico-epistemológico implicado e que não pode ser verificado exclusivamente a partir da
preocupação com os argumentos.
135
Os outros textos não foram incluídos na próxima fase da análise porque, ainda que
apresentem argumentos de cunho epistemológico sobre “Meio”, isso não implicou em
esclarecimento de teor conceitual completo.
No artigo Meio, mediação, agência: a descoberta dos objetos em Walter Benjamin e
Bruno Latour, publicado em 2013 no periódico E-compós, há esforço para localizar os
designadores na obra dos autores incluídos no texto e um debate sobre os esforços dos mesmos,
mas não a centralização de qualquer um dos termos inseridos no título.
Resumidamente, em Epistemologia “da” Comunicação: elementos para a crítica de
uma fantasia acadêmica, publicado em 2014 na Famecos, a proposta é de que as decisões
relativas ao Objeto da Comunicação ou ao esclarecimento de “Meio” não devem ser iniciadas
sob a angulação epistemológica, mas sim teórica.
O artigo do periódico Verso e Reverso, já citado anteriormente neste trabalho, coloca a
questão de indecisão e não conceituação de “Meio” como obstáculo epistemológico.
Finalmente, em Semiótica da comunicação: da semiose da natureza à cultura, dois
trechos extraídos elucidam a descrição:
Em vez de rever suas assunções básicas e procurar os fundamentos que sustentam
todo e qualquer tipo de comunicação, para então pesquisar o que define e diferencia
a comunicação simbólica humana, as teorias da comunicação entregaram-se a uma
corrida infrutífera e insustentável para tentar explicar os efeitos sociais do
aparecimento das novas mídias (MACHADO; ROMANINI, 2010, p. 95).
E ainda:
Os meios de comunicação ocuparam a cena da cultura não porque são veículos de
transmissão de informação, mas porque elaboram linguagem com códigos culturais
diferenciados: do alfabeto à tipografia; da fotografia à cinematografia; da discografia
à videografia e aos códigos digitais e informáticos (MACHADO; ROMANINI,
2010, p. 90).
Ressaltando a unidade de pesquisa de textos recentes como um todo, “Meio de
Comunicação” e suas extensões “Jornal”, “Televisão”, “Rádio” e “Cinema” são os
designadores mais significativos do ponto de vista quantitativo.
“Internet”, “Convergência”, “Redes Sociais” e “Web” foram agrupadas porque,
mediante o conjunto de trechos que as incluíam, não foi possível identificar critérios de
divergência ou similaridade. Além disso, aqueles que tratavam de algum dos termos como
extensão de outro são quantitativamente irrelevantes, estando inseridos em menos de 1% dos
textos que compõem esta unidade.
136
Os designadores/sinônimos de “Meio” são diversos, mas ainda assim é possível destacar
como principais:
“Meio(s) de Comunicação”
“Meio(s) de Comunicação de Massa”
“Meio(s) Sociais de Comunicação ”
“Meio(s) de Comunicação Online”
“Meio(s) de Comunicação em Multiplataforma”
“Meio(s) digital(s)”
“Meio(s) dominante(s)”
“Meio(s) eletrônico(s)”
“Meio(s) jornalístico(s)”
“Meio(s) impresso(s)”
“Meio(s) tradicional(is)”
“Medium”
“Media”
“Mídia pública”
“Novos Meio(s) de Comunicação”
“Novas Mídias”
“Tecnologia(s) de Comunicação”
“Tecnologia(s) de Informação e Comunicação (TICs)”
“Velhos Meio(s) de Comunicação”
“Veículo(s) de Comunicação (de massa)”
Em cerca de 2% dos textos foram identificadas associações proibitivas em relação a
“Meio”, considerando que a maior parte se tratava de esclarecer que o trabalho não se restringia
ao “meio” tal como utilizado em caráter extensão (Exemplo – “a análise não está restrita aos
produtos da televisão”).
A propósito do tipo de uso do termo, foi possível realizar uma distinção similar à que
foi feita no caso do texto A estrutura e a função da comunicação na sociedade, em relação aos
usos especializado e não especializado.
137
GRÁFICO 62 – Usos especializado e não especializado de meio em textos recentes
Fonte: o próprio autor
Apesar de o uso especializado ter relação com importância quanti (Exemplo –
quantidade de vezes que aparece no texto) e qualitativa (Exemplo – configurar como termo
relevante na indexação), o uso de “Meio” como sinônimo de “através” é quase o dobro do uso
como “Meio de Comunicação”.
Além disso, há o uso como “ambiente” ou “contexto” que em larga medida colaborou
para a compreensão do quadro geral do texto como, por exemplo, “meio político” e “meio
sociocultural”.
Sobre isso, o resultado do último estudo exploratório se repete: o viés da questão política
é prioritário, ou no mínimo mencionado, em cerca de 64% dos textos.
Apesar dessa constatação, a tentativa de relacionar o uso em caráter de extensão com
um aporte teórico específico não foi possível, visto que essa relação precisaria ser demonstrada
na superfície do texto.
O que conduz a mais um resultado pertinente: os poucos textos que oferecem uma
relação clara com uma vertente teórica ou similar, ou ainda que apresentam algum esforço de
teor conceitual acerca de meio, não representam nem 3% do total de artigos analisados.
Desses, estão sendo excluídos os textos que apresentaram maior relevância sobre os
designadores “Mediação” e “Midiatização” isoladamente, visto que, de modo geral, são
atrelados a asserções proibitivas em relação a “Meio”.
138
Considere-se também que dentro deste pequeno conjunto que indica o enquadramento
teórico, quando se relacionam a um meio especificamente como, por exemplo, “televisão”, os
esclarecimentos são estritamente voltados ao meio em questão.
Sobre esse pequeno, mas heterogêneo conjunto de textos que apontam explicitamente
para aportes teóricos, não foi possível realizar inferências sobre os critérios de aceitação de uso
do termo.
Foi possível perceber que esse grupo de textos possui três características distintas: (1)
se relaciona a Teoria do Meio ou menciona especificamente McLuhan; (2) Efetua relações com
tecnologia; (3) Tem como ênfase aspectos do jornalismo (essa última característica é acentuada
no total de artigos desta unidade de pesquisa).
Uma última consideração a ser feita é a característica que esse conjunto de artigos possui
em comum: a maior parte deles oferece um breve resgate teórico e/ou um debate em nível
epistemológico. Nesses casos, trata-se dos textos com maior esforço explicativo, além de
relacionarem algumas constatações realizadas neste trabalho tanto no que tange às
preocupações teórico-metodológicas, quanto em relação aos resultados apresentados. Como
mencionado, alguns deles foram destacados para o próximo nível da análise.
Considerando o que foi apresentado sobre as duas unidades de pesquisa, segue-se para
a reflexão sobre tais resultados, orientada pela perspectiva da pertinência epistemológica e
teórica que contextualiza a questão Que é Meio de Comunicação nas abordagens teóricas
circunscritas pela produção nacional.
139
Capítulo IV – INTERPRETAÇÃO EM NÍVEL TEÓRICO-
EPISTEMOLÓGICO DOS RESULTADOS DA ANÁLISE
METÓDICO-TÉCNICA
[...] é a instância que exerce uma função de vigilância crítica na pesquisa. Ao longo
de toda a pesquisa essa instância se traduz em movimentos ou operações destinadas
à explicitação dos obstáculos epistemológicas da pesquisa e sua autocorreção e à
construção do objeto científico (LOPES, 2005, p. 121).
O debate em nível epistemológico e teórico no domínio da Comunicação aponta para
uma dispersão de caráter teórico e metodológico que se reflete tanto em pesquisas recentes,
como apontado por Martino, L.M (2014), quanto em livros que versam sobre as Teorias da
Comunicação, na medida em que eles demonstram que “[...] ninguém concorda sobre quais são,
de fato, as teorias da comunicação. Ou, mais precisamente, que temos em mente conjuntos e
ideias muito diferentes quando empregamos a expressão ‘teorias da comunicação’”
(MARTINO, L. C., 2008, p. 25).
O que aparece de forma consensual é que a dispersão é originada pelo tratamento
temático dispensado à comunicação (BRAGA, 2011; MARCONDES FILHO, 2011), de modo
que “[...] ninguém se pergunta o que é, em última análise, comunicação” (MARCONDES
FILHO, 2011, p. 170).
As perguntas Que é Comunicação? e Quais são as Teorias da Comunicação? são as
propulsoras das discussões e propostas de cunho epistemológico e teórico, dentro das quais há
sempre a inserção da questão do meio: em geral, se trata especificamente de defender ou refutar
Meio de Comunicação como vetor de delineamento da área (BRAGA, 2011; MARTINO, L.
M., 2013; RÜDIGER, 2014), além da centralização do conceito de comunicação (BRAGA,
2011; MARCONDES FILHO, 2011; MARTINO, L. C., 2007 e 2008).
Nesse sentido, concordou-se com Rüdiger (2014) sobre o argumento de que é no nível
do trabalho teórico que estaria a distinção de uma angulação comunicacional. Entretanto,
considerando as consequências de tal afirmação, se faz necessário questionar “[...] a tese de
que, em vez de comunicação, o tema mais central de nossos estudos são os fenômenos de mídia
[...]” (RÜDIGER, 2014, p. 402).
Coerente com o argumento de Rüdiger (2014), Luis Mauro Sá Martino (2016), no texto
Entre mídia e comunicação: origens e modalidades de uma dicotomia nos estudos da área,
afirma que “Meio” e “Comunicação” são percebidos como intercambiáveis ou sinônimos de
modo que:
140
Se, no limite do óbvio, as “teorias da comunicação” estariam evidentemente ligadas
ao estudo da “comunicação”, o problema aparece quando se lança um olhar mais
atento à especificidade de cada teoria. E, nesse momento, vemos um conjunto díspar
de teorias e conceitos endereçados a problemas e objetos dos mais variados,
reverberando posições de inúmeras outras áreas do conhecimento, definidos ora
como “comunicação”, ora como “mídia” (MARTINO, L. M., 2016, p. 11).
O autor (2016) esboça que a dicotomia da área seria formada por uma escolha,
fundamentalmente epistemológica, entre “comunicação” e “mídia”, uma vez que a correlação
entre os termos não é, de fato, óbvia:
Se, como notado no início, a noção de ‘comunicação” está diretamente ligada ao
conceito de “meios”, sobretudo por conta de décadas de estudos sobre os “meios de
comunicação”, por outro lado as perguntas subjacentes a esse tipo de estudo – quais
“meios”? Qual “comunicação”? Como relacioná-los? -, se observadas mais de perto,
mostram que a aparente obviedade da relação não resiste a uma investigação mais
elaborada sem exibir algumas de suas profundas contradições e assimetrias,
presentes como tensão original nos fundamentos da área (MARTINO, L. M., 2016,
p. 25).
Entre as perguntas sobre “Meios” e “Comunicação” ou ainda sobre a relação entre
ambos, supõe-se aqui que a questão primordial nessa dicotomia seria se a Comunicação só se
realiza como Objeto de pesquisa pelos Meios.
Cabe retomar que o Objeto de pesquisa não equivale ao Objeto empírico: a construção
do Objeto de pesquisa e, portanto, das Teorias é uma relação entre as reflexões conceituais e as
evidências empíricas.
Decorre-se daí que, como observa Martino, L. M. (2016), identificar a primazia temática
dos fenômenos de mídia (RÜDIGER, 2014) não implica relação epistemológica-conceitual
entre Meio e Comunicação. Mas, por conseguinte, uma vez que o tratamento temático da
comunicação não culminou na sua centralização teórica ou em um enfoque propriamente
comunicacional, é preciso questionar se a preponderância do designador “meio” como recorte
temático e delineamento empírico resultou ou se encontra com alguma elaboração teórica-
conceitual.
Supondo que tal elaboração reflexiva exista, é preciso também questionar sobre sua
importância no que seriam as Teorias da Comunicação.
No capítulo anterior, foi realizada a descrição e análise em nível metódico-técnico dos
resultados encontrados em duas unidades de pesquisa distintas: os textos originais que,
inseridos direta (referência explícita) ou indiretamente (referência a partir de indicações em
obras sobre Teorias da Comunicação) nos cursos de pós-graduação Stricto Sensu em nível
141
nacional, seriam a expressão mínima de propostas teóricas a partir das quais as reflexões podem
se dar, e os artigos publicados entre 2010 e 2016 que incluiriam de modo significativo nas suas
proposituras o designador “Meio” ou sinônimos e extensões, em parâmetros explicados
anteriormente.
Sobre a unidade de pesquisa de textos recentes observou-se o relevo do uso de “Meio”
como elemento central de objetos empíricos dos estudos publicados.
Em muitos casos, “Meio” não se tratava da temática central e, também por isso, nem
toda aplicação do designador à restrição das evidências empíricas foi identificada
concomitantemente com o uso funcional, com a exposição do(s) papel(is) dos “meios”.
O caráter extensionalista é prioritário e, nesse sentido, o que é possível depreender está
restrito às principais tendências de sinônimos do designador “Meio” e de extensões.
Algumas reflexões epistemológicas, mais frequentes no último conjunto de periódicos
descritos no capítulo anterior, resultaram em debates pertinentes ao nível teórico da pesquisa.
E, em razão disso, foram trazidos para este capítulo do trabalho.
Na unidade de textos originais, constatou-se que o uso de “meio” é essencialmente
extensionalista, não sendo possível pontuar os critérios de admissão da utilização da noção ou
mesmo de uma categorização de objetos empíricos. O que é possível distinguir formalmente
sobre os meios é que:
Constituem uma via de investigação razoavelmente independente dos estudos
científicos de comunicação e estão relacionados às funções da comunicação na
sociedade, fundamentalmente em nível político (LASWELL, 1989);
A propósito da Opinião Pública e de sua realização como voto no contexto de
eleições, podem produzir efeitos/influência, mas de forma reduzida
(LAZARSFELD; BERELSON; GAUDET, 1955);
São parte da Indústria Cultural, operando efeitos negativos na cultura, em especial
na arte e na crítica (ADORNO; HORKHEIMER, 1969);
Em sendo extensões do homem, produzem alterações na percepção individual e
compartilhada em âmbito sociocultural, bem como delimitam as mensagens
constituídas pela absorção de um meio pelo outro (MCLUHAN, 2005);
Estão pouco associados à Comunicação, uma vez que o conceito-chave é o de
Mediação, subsidiado pelo de Cultura (MARTÍN-BARBERO, 1997).
142
Também a partir da análise estritamente metódica-técnica dos textos originais, é
possível perceber que ainda que se afirme que o meio é um elemento central das argumentações
(MARTINO, L. M., 2016; RÜDIGER, 2014), é preciso considerar que é uma centralidade
operacional seja para sua refutação como elemento que demarca a Comunicação (MARTÍN-
BARBERO, 1997) ou para sua utilização como delimitação empírica, especialmente relativa a
efeitos/influência/consequências (ADORNO; HORKHEIMER, 1969; LASWELL, 1989;
LAZARSFELD; BERELSON; GAUDET, 1955; MCLUHAN, 2005).
Neste capítulo, realiza-se um retorno aos fundamentos que foram expostos no início do
trabalho e que conduziram à pergunta Que é Meio de Comunicação nas abordagens
circunscritas pela produção nacional?, buscando-se articular uma interpretação dos resultados
da análise metódico-técnica a partir do nível teórico-epistemológico para a manutenção da
vigilância epistemológica (LOPES, 2005), isto é, da coerência metodológica entre as instâncias
da investigação.
Em relação a unidade de pesquisa de textos originais, aqui são adicionados argumentos
secundários sobre a estruturação das noções que apresentam, sem a intenção de desenvolver
uma história da biografia ou da bibliografia dos autores, mas de inserir informações que ajudem
a esclarecer a composição teórica e a verificar a pertinência do Meio nessas propostas.
Tendo em vista as obras sobre Teorias da Comunicação utilizadas para a seleção desta
unidade de pesquisa (HOHLFELDT; MARTINO; FRANÇA, 2007; MATTELART;
MATELLART, 2005; WOLF, 2008), bem como os textos que a compõem, em especial Martín-
Barbero (1997) que realiza críticas a outros posicionamentos se auto localizando em viés
diferente, principalmente da Escola Americana e da Escola de Frankfurt, pode-se dizer que as
vertentes distinguidas são:
Escola Americana/Mass Communication Research/Escola Funcionalista/Pesquisa
administrativa, que incluiria os textos de Lasswell (1989) e Lazarsfeld, Berelson e
Gaudet (1955);
Escola de Frankfurt/Teoria Crítica, representada na unidade por Adorno e
Horkheimer (1969);
Escola de Toronto/Teoria do Meio, não obstante sobre McLuhan (2005) exista
diferentes entendimentos, visto que é percebido como trabalho subsequente ao de
Innis e integrante da visão de sociedade distinguida em “[...] termos de
comunicação, que é definida em termos de redes [...]” (MATTELART;
MATTELART, 2005, p. 159); obra marginal nas Teorias da Comunicação (WOLF,
2008); “[...] uma primeira abordagem do fenômeno comunicacional em sua relação
143
com o desenvolvimento das tecnologias, dos avanços culturais e dos fenômenos
sociais [...]” (HOHLFELDT, 2007, p. 63) e integrante do ponto de vista semiótico
(MACHADO, 2007)63;
Estudos Culturais/Mediação/Recepção/Pesquisa na América Latina, identificada na
unidade de pesquisa em Martín-Barbero (1997).
Nos primeiros cinco itens desse capítulo são apresentadas representações gráficas da
estrutura teórico-conceitual extraídas dos textos na análise metódico-técnica, portanto
atribuindo um sentido epistemológico e teórico aos resultados já demonstrados.
No caso de Lasswell (1989) e Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948), o recorte temático
de “meio” e a variedade do uso em caráter de extensão provocaram repetições das constatações
dos resultados do capítulo anterior.
Em relação a Adorno e Horkheimer (1969), McLuhan (2005) e Martín-Barbero (1997)
foi possível e demandada uma exposição mais independente em função das características de
tais textos. Os primeiros (1969) vinculados a ideias filosóficas de fundo que são utilizadas para
a constituição da noção principal (Indústria Cultural), McLuhan (2005) com aforismos que
invocam origens e sobreposições teóricas diversas e Martín-Barbero (1997) que transita entre
explicitação coerente e contradição.
Além disso, por serem as primeiras, as análises relativas a Lasswell (1989) e Lazarsfeld,
Berelson e Gaudet (1948), incluem as inserções do viés proposto, tornando-as mais extensas
e/ou complexas.
O último item do capítulo se refere à reflexão em níveis teórico e epistemológico dos
artigos destacados da unidade de pesquisa de textos recentes: (1) Mídia fluida: por uma
renovação conceitual (2010); (2) Tertium datur: introdução a uma teoria negativa dos media;
(3) Medium-Remedium: o problema ontológico dos meios e seu entrelaçamento comunicativo
(2013); (4) Mídias sociais digitais a partir da ideia mcluhaniana de medium-ambiência (2013);
e (5) A virada comunicacional. Ou porque os estudos de “midiatização”, de hábito e da Teoria
dos Media passam ao largo da comunicação (2015).
63 Observe-se que as duas últimas posições dizem respeito a capítulos de um mesmo livro.
144
1. A estrutura e a função da comunicação na sociedade
De acordo com Mattelart e Mattelart (2005, p. 36) “a primeira peça do dispositivo
conceitual da corrente da Mass Communication Research data de 1927. É o livro de Harold D.
Lasswell (1902-1978) Propaganda Techniques in the World War, que extrai as lições da guerra
de 1914-1918 [...]”.
O que se sabe sobre esse texto de Lasswell especificamente, é que o conteúdo se refere
ao seu doutorado defendido dois anos antes (1925) e que, voltado para Ciências Políticas
(CARVALHO, 2012), estava circunscrito pela preocupação sobre os efeitos dos Meios na
sociedade.
As Ciências Políticas configuram, como observa Carvalho (2012), o aporte de Lasswell
na maior parte dos trabalhos entre os anos 1930 e 1940 e foi mantido em paralelo com os seus
trabalhos direcionados ao governo norte-americano, em especial como chefe da Divisão
Experimental para o Estudo das Comunicações em Tempo de Guerra, a partir 1940. Sobre
Propaganda Techniques in the World War especificamente:
O livro não é, portanto, uma obra maquiavélica, ensinando a se praticar uma
propaganda desleal, mas uma análise das técnicas empregadas pelas nações
envolvidas na Primeira Grande Guerra que, por acaso, eram desleais e procuravam
com o auxílio da propaganda, atingir o público e produzir como reação o
comportamento esperado. Para alcançar seus desígnios, o propagandista tem como
guia, exatamente como aponta a maior parte da bibliografia de teorias da
comunicação, a sinalização do esquema estímulo-resposta behaviorista (o
behaviorismo social de Mead) [...] (CARVALHO, 2012, p. 199).
No trabalho da mesma autora (2012), há também a indicação de que, embora a maior
parte das investigações de Lasswell tenha sido centralizada pela propaganda, ele realizou a
transição de “propaganda” para “comunicação”:
Ao optar pelo uso da palavra comunicação, Lasswell primeiro amplia o escopo de
atuação da Divisão Experimental de Comunicação em Tempos de Guerra e acaba,
ainda que de forma não muito intencional, congregando as diversas vertentes de
pesquisas que se avolumavam desde o início do século XX tendo como objeto os
processos de comunicação de massa. Em segundo lugar, ao agrupar essas diferentes
pesquisas sob uma única insígnia, força-se a reflexão sobre o próprio termo. E, se
Lasswell havia tentado desenvolver uma teoria da propaganda, a designação agora
concebida pela Divisão Experimental para Comunicação em Tempos de Guerra traz
a necessidade de uma teoria da comunicação também. O que antes se encontrava
disperso, começa a ser agrupado (CARVALHO, 2012, p. 212).
O chamado modelo lasswelliano da comunicação, apesar de utilizado pelo pesquisador
em seus trabalhos para o governo norte-americano, só passou a configurar como circunscrito
145
no campo científico a partir do artigo A estrutura e a função da sociedade, publicado em 1948
(CARVALHO, 2012).
Cabe dizer que nesse período, as pesquisas de outros estudiosos como, por exemplo,
Paul Lazarsfeld, já estavam sendo desenvolvidas e, portanto, neste artigo já se percebe alguns
refinamentos que justificam a noção de superação da agulha hipodérmica pelo modelo,
afirmada por Wolf (2008).
Neste ponto cabe já inserir a estrutura teórico-conceitual extraída a partir dos resultados
apresentados no capítulo anterior.
FIGURA 6 – Estrutura teórico-conceitual em Lasswell
Fonte: o próprio autor
Como observado na descrição e análise em nível metódico-técnico, dos termos
especializados e que enfatizam as questões sobre as quais as análises podem se subdividir,
“efeito” é o que menos aparece no texto, estando restrito basicamente à apresentação do modelo,
quando se esclarece que “[...] Se for o caso do impacto sobre as audiências, o problema será de
análise de efeitos” (LASSWELL, 1989, p. 105). Assim, não há qualquer argumento no texto
que autorize a aproximação do modelo lasswelliano apresentado no artigo (1989) com efeitos
em nível conceitual, seja para defendê-lo ou para refutá-lo.
146
Dessa maneira, a superação percebida por Wolf (2008), tem a ver com o afastamento da
crença de que as configurações das mensagens e dos meios são suficientes para determinar
ações da audiência, mas não necessariamente implica no abandono das noções funcionais e da
abordagem behaviorista, o que resulta na manutenção do Objeto-modelo “Entrada → Saída”.
O que cabe novamente ressaltar, é que esse Objeto-modelo costuma caracterizar os períodos
incipientes das teorizações, quando ainda não se tem disponíveis as teorias com maior
capacidade explicativa (BUNGE, 2013).
FIGURA 7 – Objeto-modelo de caixa negra
Fonte: o próprio autor
O não esclarecimento do teor conceitual também se aplica aos outros elementos, isto é,
“controle”, “audiência”, “conteúdo” e “meios”, considerando-se que meio é o termo
especializado que mais é utilizado pelo autor (1989).
Embora exista uma relação entre “meio”, “comunicação” e “mensagem” (conteúdo), as
funções da comunicação na sociedade, que são a ênfase do artigo (1989), nem sempre estão
fundamentadas nos “meios”. Isso porque a partir do uso extensional que Lasswell (1989) faz
do termo (como “rádio” e “imprensa”, por exemplo) eles podem ser entendidos como atrelados
a algum tipo de tecnologia ou controle determinado (canais centrais de comunicação), visto que
uma de suas afirmações é de que:
[...] a maior parte das mensagens inerentes a qualquer Estado não envolve os canais
centrais de comunicação. Ocorrem dentro das famílias, vizinhanças, lojas, grupos de
campo e outros contextos locais. A maior parte do processo educacional é conduzido
da mesma forma (LASSWELL, 1989, p. 109).
Outra utilização do termo “meio” o relaciona a meio ambiente, tendo o uso indicado
especialmente através da analogia com outros animais. Meio ambiente interno é composto pela
sociedade e os indivíduos que a integram e o meio externo é composto pelas condições que
147
constituem algum tipo de obstáculo ou que oferecem riscos a manutenção da sociedade
democrática64 (LASSWELL, 1989).
Apesar de Lasswell (1989) não apresentar associações relacionais constitutivas de teor
conceitual ou descritivas dos critérios de aceitação para os elementos que sustentam os estudos
científicos da Comunicação65, ele aponta para alguns componentes que estão localizados em
interseções das áreas de estudo.
Ele diferencia, por exemplo, “manipuladores” e “manejadores” como indivíduos ou
instituições que fazem parte de “controle” de formas diferentes: os primeiros têm participação
nos meios, mas também na elaboração do conteúdo e na atribuição de sentido (extensionalmente
trata-se, por exemplo, de editores de jornais e propagandistas), enquanto os últimos não têm
participação na elaboração do conteúdo, de modo que transmitem “[...] aos seus destinatários
mensagens que não entram com outras modificações além daquelas de caráter puramente
acidental [...]” (LASSWELL, 1989, p. 110), a exemplo de impressores e distribuidores de
livros66.
De outra parte, entre “audiência” e “conteúdo”, o autor (1989) destaca o “público”,
distinguindo-o de outros grupos que podem ser entendidos como parte da “audiência”,
especificamente dos que compõem os “agregados de atenção” e “os grupos de sentimento”.
Para o autor (1989, p. 115) “[...] para pertencer a um agregado de atenção basta ter
símbolos de referência comuns [...]” a uma determinada comunicação. A diferença com o
público é que este “[...] desenvolve a expectativa de que aquilo que ele quer pode afetar a
condição da vida pública”. Já no caso dos “grupos de sentimento”67:
[...] Durante uma guerra ou crise bélica, por exemplo, os habitantes de uma região
são inexoravelmente levados a impor certas orientações da vida pública a outros.
Dado que o resultado do conflito depende da violência, e não do debate, não há um
público sob tais condições. O que há é uma rede de grupos de sentimento, que atuam
como multidões e, portanto, não toleram dissenção (LASSWELL, 1989, p. 116).
64 Não se entra aqui no mérito da suficiência do que Lasswell (1989) considera sociedade democrática, mas apenas
da exposição das relações propostas no texto. 65 Nas palavras do autor (1989). 66 Note-se aí que ainda que o autor (1989) não realize esforço conceitual relativo a “Meio”, a aplicação do
designador às instituições/empresas de comunicação não cabe, pois elas estariam na interseção que o implica, mas
não corresponde a “Meio” em si. 67 Não se trata exatamente de “agendamento”, que é formalizado como hipótese a partir de 1972, com os estudos
de McCombs e Shaw.
148
Nesse sentido, o “público” é a parte da audiência que é relevante no estudo do processo
comunicacional considerando-se a função da comunicação na sociedade, posto que se trata
também de informar, sem ocultações ou distorções, isto é, de “esclarecer”68.
O último componente intersecional é o único que diz respeito a todos os elementos do
estudo científico da comunicação, as “estruturas de atenção”:
Se concebermos o processo de atenção mundial como uma série de estruturas de
atenção (attention frames), é possível descrever-se a proporção em que um conteúdo
comparável atinge indivíduos e grupos. Podemos procurar o ponto em que a
“condutibilidade” deixa de ocorrer, e podemos verificar a margem entre a
“condutibilidade total” e a “condutibilidade mínima” [...] (LASSWELL, 1989, p.
108).
Lasswell (1989) não aponta elementos de interseção que relacionem exclusivamente
Controle-Conteúdo-Audiência ou Controle-Meio-Audiência. Decorre-se daí que, embora o
termo “meio” seja quantitativamente mais significativo, se trata de atribuir a ele mais de um
significado especializado em associação a outros termos: “meio ambiente” e “meios de
comunicação”.
Estruturalmente, para a conformação da proposta, Meio-Conteúdo são os elementos que
fundamentam os componentes intersecionais relevantes, isto é, aqueles que o autor (1989)
identifica. A diferença é que sobre Conteúdo, Lasswell (1989, p. 106) propõe que para sua
análise “[...] subdividimos o campo no estudo do significado e no do estilo, o primeiro
referindo-se à mensagem e o segundo à disposição dos elementos que compõem a mensagem”.
Já o Meio de Comunicação é tratado como um recorte do Objeto empírico, ou melhor,
como elemento no qual é possível identificar, pelo menos, o conteúdo da comunicação.
Entretanto, não é possível asseverar que para o autor (1989) se trata, necessariamente, do que
se designa geralmente como “Meios de Comunicação de Massa”, porque ele dá exemplos de
circulação dos conteúdos através da oralidade. Não há qualquer critério mínimo, exceto de
viabilização da “comunicação” (independentemente do que isso possa significar) entre
indivíduos e grupos.
Considere-se também que toda a formulação de Lasswell (1989) se dá a partir da função
da comunicação na sociedade, sendo tal função relacionada prioritariamente às questões
políticas, em geral contextualizadas pelos conflitos de guerra.
68 Novamente, Lasswell (1989) vincula o esclarecimento à opinião pública dentro de uma teoria democrática, sobre
a qual não há mais detalhes.
149
Sintetizada a estrutura teórico-conceitual, passa-se para análise dessa estrutura em
relação ao Objeto-modelo utilizado para abordagem em Lasswell (1989).
Retoma-se Wolf (2008), segundo o qual a Agulha Hipodérmica elaborada pela
psicologia behaviorista é entendida da seguinte maneira:
Seu objetivo é estudar o comportamento humano com os mesmos métodos da
experiência e da observação, típicos das ciências naturais e biológicas. O sistema de
ação que distingue o comportamento humano deve ser decomposto pela ciência
psicológica em unidades compreensíveis, distinguíveis e observáveis. Na relação
complexa entre organismo e ambiente, o elemento crucial é representado pelo
estímulo: este compreende os objetos e as condições externas ao sujeito, que a partir
dele produzem uma resposta [...] (WOLF, 2008, p. 9-10).
Assim, tem-se que a perspectiva “Estímulo → Resposta” é coerente com o Objeto-
modelo de caixa negra, que por sua vez é:
[...] O procedimento natural – que não é, entretanto, o curso histórico – é o de
começar pelo objeto-modelo mais simples, desprovido de estrutura, depois
acrescentar-lhe uma estrutura simples (por exemplo, dividindo a caixa original em
duas) e prosseguir neste processo de complicação até conseguir explicar tudo o que
se quer [...] (BUNGE, 2013, p. 18).
Infere-se então que a Agulha Hipodérmica, comprometida com o Objeto-modelo de
caixa negra, atenta-se para as variáveis externas e globais do processo de comunicação, que
sejam direta ou indiretamente mensuráveis. Isso porque o Objeto-modelo não é um constructo
científico isolado, especialmente no que tange a passagem da caixa negra para a caixa
translúcida:
Um objeto-modelo, mesmo engenhoso, servirá para pouca coisa, a menos que seja
encaixado em um corpo de ideias no seio do qual se possam estabelecer relações
dedutivas. É preciso pois, como já dissemos, tecer uma rede de fórmulas em torno
de cada objeto-modelo. Se este corpo de ideias for coerente, constituirá um modelo
teórico de indivíduos concretos r do tipo R. Em outros termos, um modelo teórico de
um objeto r suposto real é uma teoria específica Ts com respeito a r, e esta teoria é
constituída por uma teoria, geral Tg enriquecida de um objeto-modelo m ^ r
(BUNGE, 2013, p. 24).
Isso significa que não é o objeto-modelo, mas sim o modelo teórico específico que
produz os esclarecimentos acerca dos mecanismos internos. A Teoria geral pode acolher as
diversas Teorias específicas porque, fundamentada pelo Princípio da Interdisciplinaridade, quer
dizer que as elaborações derivadas do objeto-modelo e do modelo teórico particular não podem
150
ser herméticas e/ou contradizer o conhecimento científico estabilizado, sem apontar
diretamente a refutação desse conhecimento (BUNGE, 2012 e 2013; POPPER, 2013).
O que o modelo teórico da psicologia behaviorista faz é evitar referências aos estados
mentais e aos mecanismos fisiológicos de modo que, não apenas restringe o nível metódico-
técnico analítico aos efeitos mensuráveis através do comportamento, como suas proposições
contradizem (ao menos indiretamente) o conhecimento científico estabilizado a respeito dos
mecanismos ignorados.
É nessa perspectiva que se compreende e concorda com o entendimento de que:
[...] se para a teoria behaviorista o indivíduo submetido aos estímulos da propaganda
podia apenas responder sem resistência, os desenvolvimentos subsequentes da
communication research convergem na explicitação de que a influência das
comunicações de massa é mediada pelas resistências que os destinatários ativam de
várias formas. E, no entanto, o esquema lasswelliano da comunicação conseguiu
oferecer-se como paradigma para essas duas tendências de pesquisa opostas. Ou
melhor, apresentou-se aproximadamente ao final do período de maior êxito da teoria
hipodérmica, quando já se manifestavam os motivos que deviam conduzir à sua
superação (WOLF, 2008, p. 14-15).
A discordância aqui se refere ao entendimento de que o modelo lasswelliano é um
Paradigma para as outras propostas em comunicação, sejam as subsequentes ou a antecessora
Agulha Hipodérmica.
O modelo lasswelliano seria um modelo teórico específico que se refere diretamente e
acaba por organizar um objeto-modelo também de caixa negra que, oferecendo algumas
explicações ainda ambíguas em função da não expressão do teor conceitual, se dirige ao
aprofundamento (não oferecido pela Agulha Hipodérmica) dos elementos que centralizam
variáveis intervenientes:
[...] podemos afirmar que as teorias das caixas negras não podem deixar de conter
variáveis intervenientes, i. é, variáveis que medeiam entre a entrada e a saída; teorias
da caixa translúcida, por outro lado, contêm a mais constructos hipotéticos, i. é,
variáveis que se referem a entidades não-observadas, eventos e propriedades
(BUNGE, 2013, p. 71).
Concorda-se também, com exceção da aplicação do termo paradigma, com a
compreensão de que “[...] no entanto, quando a teoria hipodérmica deixou de ser sobretudo um
presságio e uma descrição de efeitos temidos para se transformar num paradigma concreto de
pesquisa seus próprios pressupostos deram lugar a resultados que contradiziam sua elaboração
fundamental” (WOLF, 2008, p. 16).
151
As refutações oferecidas a partir do objeto-modelo e do modelo teórico lasswelliano
mencionadas por Wolf (2008) dizem respeito à conexão direta entre circulação da mensagem e
comportamento da audiência, bem como exclusividade dos efeitos sobre a audiência, não
resultando no deslocamento da caixa negra para a caixa translúcida.
Mas é preciso também considerar que sendo o Estímulo e a Resposta concebidos como
variáveis exógenas, então o Estímulo – no objeto-modelo intrínseco ao modelo lasswelliano –
diz respeito às condições do meio ambiente político-social, em uma perspectiva externa ou
interna desse ambiente. A Resposta é, por conseguinte, o cumprimento das funções da
comunicação na Sociedade.
Enquanto objeto-modelo de caixa preta, é coerente que não sejam apresentadas
associações de teor conceitual ou de critérios de aplicação terminológica, na medida em que a
comunicação e seus elementos são, em si, recortes do objeto empírico, sendo operacionalizados
como variáveis intervenientes e não como objeto de constructos hipotéticos (BUNGE, 2013): é
um modelo que tem como interesse a Sociedade, particularmente em sua dimensão sócio-
política, indiretamente mensurável pela comunicação.
Acentua-se que essa análise estritamente teórico-epistemológica em observação a
aspectos especificamente endógenos não propõe que não há esclarecimentos pertinentes ao
domínio da Comunicação. Diz respeito, particularmente, ao que se pretende como significação
teórica dos resultados da análise metódico-técnica, com o objetivo de viabilizar a identificação
de delineamentos de “Meio de Comunicação”.
Reforçando o recorte de execução do trabalho, se faz necessário reconhecer que o debate
a respeito do esclarecimento de variáveis intervenientes ou de construções hipotéticas pode ser
estendido aos outros trabalhos que compõem a Escola Americana e outras vertentes. Entretanto,
em observação a exequibilidade do trabalho, mantém-se a ênfase nos textos originais
selecionados, com a adição de considerações que se mostraram diretamente relevantes à
elaboração da análise teórico-epistemológica.
Tendo isso esclarecido, segue-se para o texto de Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1955),
realizando algumas observações a respeito de Lazarsfeld especificamente.
152
2. The people’s choice: how the voter makes up his mind in a presidential
campaign
Paul Lazarsfeld é o autor mais frequentemente mencionado nas três obras sobre Teorias
da Comunicação que orientaram a seleção da unidade de pesquisa de textos originais, o que
motivou questionamentos sobre qual seria a razão disso.
Sociólogo austríaco que emigrou para os Estados Unidos nos anos 1930, incluído no
grupo dos “pais fundadores da comunicação” (MATTELART; MATTELART, 2005, p. 47)69,
bem como indicado como um dos responsáveis pelo fato70 de “nos anos 40 e 50, a história da
sociologia funcionalista da mídia situa, como inovação, a descoberta de um elemento
intermediário entre o ponto inicial e o ponto final do processo de comunicação [...]”.
Estando não apenas inserido na Escola Americana, como também tendo desenvolvido
trabalhos para o governo norte-americano próximo à Lasswell (CARVALHO, 2012),
Lazarsfeld é uma figura que articula ainda o diálogo com outro autor incluído nesta unidade de
pesquisa, Adorno:
Musicólogo e filósofo, Adorno responde ao convite de Paul Lazarsfeld, que lhe
oferece colaboração em um programa de pesquisas sobre os efeitos culturais dos
programas musicais no rádio, no âmbito do Princeton Office of Radio Research, uma
das primeiras instituições permanentes de análise dos meios de comunicação. Esse
primeiro projeto de pesquisa em solo americano é financiado pela Fundação
Rockefeller. Lazarsfeld, por meio dessa colaboração, espera “desenvolver uma
convergência entre a teoria europeia e o empirismo americano”. Espera que a
“pesquisa crítica” “revitalize” a “pesquisa administrativa”.
Essa esperança será frustrada. A colaboração termina em 1939. A oposição entre as
duas mentalidades revela-se insuperável. Adorno recusa dobrar-se à lista de questões
proposta pelo financiador, que, em sua opinião, encerra o objeto de pesquisa nos
limites do sistema de rádio comercial em vigor nos Estados Unidos e impede a
“análise desse sistema, suas consequências culturais e sociológicas e seus
pressupostos sociais e econômicos”. Em suma, uma lista que deixa em segundo
plano o “quem”, o “como” e o “porquê”. “Quando fui confrontado”, dirá Adorno
mais tarde, “à exigência de ‘medir a cultura’ vi que a cultura deveria precisamente
ser essa condição que exclui uma mentalidade capaz de medi-la” [...]
(MATTELART; MATTELART, 2005, p. 75-76).
Em relação à estrutura teórico-conceitual exposta no texto analisado, demonstra-se um
primeiro entendimento que busca colocá-la em relação ao que foi identificado em Lasswell
(1989).
69 Convém indicar que as críticas a visão orientada pelos “pais fundadores” extrapola o recorte deste trabalho, na
medida em que dois deles (Kurt Lewin e Carl Hovland), além do próprio Wilbur Schramm, propositor dessa
clivagem, não foram incluídos na unidade de pesquisa. 70 Em função do texto aqui incluído, mas também do escrito em coautoria com Elihu Katz, Personal Influence: the
part played by people in the flow of mass communications (1965).
153
Isso porque, como explicado no capítulo anterior, esse texto tem uma característica
peculiar em relação aos outros originais: a relevância quantitativa de inúmeros termos é oriunda
do seu uso como descritor da delimitação empírica do trabalho dos autores (1948), vinculada à
campanha presidencial norte-americana de 1940 (Roosevelt e Willkie), que teve seu período de
coleta entre os meses de maio e novembro, centralizada na região do Condado de Erie (Ohio).
FIGURA 8 – Primeira estrutura teórico-conceitual em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet
Fonte: o próprio autor
Embora os autores (1948) não indiquem formalmente “controle”, “conteúdo” e
“audiência” como Lasswell (1989), entende-se que em uma primeira apreensão é possível
apontar que “controle” e “conteúdo” estão presentes, conquanto aglutinados como “meio”.
A análise metódica-técnica evidenciou que o termo “meio” é utilizado por Lazarsfeld,
Berelson e Gaudet (1948) para distinguir a “comunicação” que se dá em nível interpessoal e
que se relaciona com “líder de opinião” daquela dos “meios”, cujas extensões são “rádio”,
“jornal” e “revista”, e estão vinculadas às mensagens dos candidatos.
A “audiência” corresponderia aos indivíduos que constituem os grupos que também
delimitam o objeto empírico, o eleitorado. Nesse sentido, dentro de uma ideia ampla de
sociedade (“audiência”), os autores (1948) trabalham na verdade com a ideia de “grupos” dos
154
quais os eleitores fazem parte e através deles são observados fatores socioeconômicos71 que os
enquadram.
Uma parte específica do eleitorado, a saber, indivíduos interessados na eleição
presidencial e nas comunicações através dos “meios”, bem como com opinião razoavelmente
formada são denominados “líderes de opinião”. Eles exerceriam uma “influência” diferente dos
“meios” sobre as outras pessoas do grupo que adotariam uma determinada opinião,
materializada pelo voto a partir da inter-relação entre: fatores socioeconômicos, influência do
grupo e do líder e, de maneira mais reduzida, influência dos meios.
Esse entendimento resultou na formulação de uma outra estrutura relativa ao texto dos
autores (1948), colocada abaixo.
FIGURA 9 – Segunda estrutura teórico-conceitual em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet
Fonte: o próprio autor
Em uma compreensão similar, Wolf (2008) sintetiza o estudo e o relaciona não apenas
com o “Líder de Opinião”, mas também com a mudança em relação ao fluxo comunicacional:
71 Que na verdade são somados a outros indícios de posicionamento social geral do indivíduo, dos quais os autores
(1948) destacam ainda a região de residência e religião.
155
A pesquisa se articula com base em problemas como o papel do status
socioeconômico, da religião a que se pertence, faixa etária e de outros fatores
sociológicos na predisposição das orientações de voto, ou na correlação entre o grau
de interesse, de motivação, de participação na campanha eleitoral e o grau de
exposição a ela reservada. Os mesmos resultados pelos quais este trabalho
permaneceu na história da communication research — ou seja, a "descoberta" dos
líderes de opinião e o fluxo de comunicação em dois níveis — são elementos parciais
dentro de fenômenos mais vastos: mais precisamente, ao se articular (juntamente
com todas as variáveis socioeconômico-culturais precedentes) o grau de participação
e de envolvimento na campanha, observa-se que o grau máximo de interesse e de
conhecimento a respeito do tema é apresentado por alguns indivíduos [...] Estes
representam a parte da opinião pública que tenta influenciar o resto do eleitorado e
que mostra uma reação e uma resposta mais atentas aos eventos da campanha
presidencial (WOLF, 2008, p. 37-38).
Tal compreensão em Wolf (2008) é somada à sua distinção gráfica entre a Teoria
Hipodérmica e a alteração relativa ao fluxo comunicacional:
FIGURA 10 – Oposição Teoria Hipodérmica – Two-step flow
Fonte: Wolf (2008, p. 39)
Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948) explicam que a Liderança de opinião é um dos
mecanismos pelos quais as atitudes de grupos e, por conseguinte, as individuais (em suma, a
Opinião Pública) são formadas. Nas palavras dos próprios autores incluídas no prefácio da
segunda edição:
156
[...] Somos levados, em primeiro lugar, a estudar os líderes de opinião. Em cada
grupo social há alguns indivíduos que são particularmente ativos e articulados. Eles
são mais sensíveis do que outros aos interesses de seu grupo, e mais ansiosos para se
expressar sobre questões importantes. É relativamente fácil localizar esses
indivíduos e, portanto, estudar como eles diferem da maioria de seu grupo.
No presente estudo, descobrimos que uma das funções dos líderes de opinião é fazer
a mediação entre os meios de comunicação de massa e outras pessoas em seus
grupos. Supõe-se comumente que os indivíduos obtenham suas informações
diretamente de jornais, rádio e outros meios de comunicação. Nossas descobertas,
entretanto, não confirmaram isso. A maioria das pessoas adquiriu muita da sua
informação e muitas das suas ideias através de contatos pessoais com os líderes de
opinião em seus grupos. Esses últimos indivíduos, por sua vez, se expunham
relativamente mais do que outros aos meios de comunicação de massa. O fluxo de
informações em duas etapas é de óbvia importância prática para qualquer estudo de
propaganda.
Aliás, o conceito de liderança de opinião não é novo. Nos muitos estudos de "poder",
"influência" e "liderança", somos lembrados de que cada comunidade pode apontar
para homens e mulheres importantes que definem as modas e são imitados por
outros. Mas nossa investigação sugere que esse conceito familiar deve ser
modificado. Pois descobrimos que a liderança de opinião não opera apenas
verticalmente, de cima para baixo, mas também horizontalmente: há líderes de
opinião em cada caminhada de vida (LAZARSFELD; BERELSON; GAUDET,
1948, p. p. xxii-xxiii, tradução nossa)72.
Comparando-se a estrutura teórico-conceitual em Lasswell (1989) e em Lazarsfeld,
Berelson e Gaudet (1948), há uma alteração no elemento intersecional de maior relevância que
em Lasswell (1989) incluía as Estruturas de Atenção:
Se concebermos o processo de atenção mundial como uma série de estruturas de
atenção (attention frames), é possível descrever-se a proporção em que um conteúdo
comparável atinge indivíduos e grupos. Podemos procurar o ponto em que a
“condutibilidade” deixa de ocorrer, e podemos verificar a margem entre a
“condutibilidade total” e a “condutibilidade mínima” [...] (LASSWELL, 1989, p.
108).
72 No original: […] We are led, first of all, to study opinion leaders. In every social group there are some individuals
who are particularly active and articulate. They are more sensitive than others to the interests of their group, and
more anxious to express themselves on important issues. It is relatively easy to locate these individuals, and thus
to study how they differ from the majority of their group.
In the present study we found that one of the functions of the opinion leaders is to mediate between the mass media
and other people in their groups. It is commonly assumed that individuals obtain their information directly from
newspapers, radio, and other media. Our findings, however, did not bear this out. The majority of people acquired
much of their information and many of their ideas through personal contacts with the opinion leaders in their
groups. These latter individuals, in turn, exposed themselves relatively more than others to the mass media. The
two-step flow of information is of obvious practical importance for any study of propaganda.
The concept of opinion leadership is, incidentally, not a new one. In the many studies of "power," "influence," and
"leadership," we are reminded that every community can point to important men and women who set the fashions
and are imitated by others. But our investigation suggests that this familiar concept must be modified. For we
found that opinion leadership does not operate only vertically, from top to bottom, but also horizontally: there are
opinion leaders in every walk of life (LAZARSFELD; BERELSON; GAUDET, 1948, p. p. xxii-xxiii).
157
Observa-se que tanto quanto na explicação fornecida por Lasswell (1989) a respeito do
processo de atenção mundial, a explanação sobre o Líder de Opinião é funcional, pois uma vez
que diz respeito a sua função no fluxo comunicacional. Ambos têm relação com o fluxo, de
modo que em nenhum dos textos ficam estabelecidos limites de interferência. Em resumo,
admitem inúmeras possibilidades, podendo se tratar de expansão, interrupção, inflexão etc. do
fluxo comunicacional, bem como não excluem a chance de interferência da composição do
conteúdo em si.
A diferença é que, os Líderes de opinião são parte da audiência, isto é, não correspondem
a estruturas institucionais, e sua influência acontece prioritariamente no domínio da
comunicação interpessoal.
Não se trata neste caso de duas faces de um mesmo processo ou de uma mesma
dimensão comunicacional. Refere-se a inter-relação entre dois sistemas comunicacionais
diferentes, de natureza (ainda que não explicitadas exaustivamente) distintas.
Também é preciso salientar que:
De modo geral, portanto, a teoria da mídia ligada à abordagem sociológica e empírica
sustenta que a eficácia da comunicação de massa é largamente vinculada a e
dependente de processos de comunicação internos à estrutura social em que vive o
indivíduo e que não são efetuados pela mídia (WOLF, 2008, p. 43, grifo do autor).
Concorda-se com Wolf (2008) no sentido de que em comparação com o modelo teórico
lasswelliano, desloca-se o interesse da sociedade como um todo para os grupos, em uma
abordagem ainda com prevalência sociológica, apesar de implicar também opções metódico-
técnicas tipicamente psicológicas.
Então, o objeto-modelo que se pode deduzir da estrutura teórico-conceitual reformulada
a respeito de Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948) e também da distinção gráfica de Wolf
(2008) desloca e/ou refina algumas questões presentes no objeto-modelo lasswelliano.
O Estímulo e a Resposta continuam sendo variáveis exógenas ao processo de
comunicação, dizendo respeito a um processo mais amplo: o de formação da Opinião Pública.
Especificamente no âmbito da Resposta, se trata da formação dessa opinião
considerando-se de modo primordial a inter-relação entre sistemas comunicacionais distintos,
asseverando-se que há proeminência de um deles: o da comunicação interpessoal, onde se
localiza o Líder de opinião.
A resposta é mensurável pela declaração da opinião sobre determinado tema (por
exemplo, campanhas eleitorais) ou pela ação propriamente (voto).
158
Ainda tendo em vista a noção de objeto-modelo de caixa negra (BUNGE, 2013), há
outros aspectos que precisam ser considerados: em primeiro lugar, uma interpretação que
focaliza a “diminuição” da influência dos meios na estrutura teórico-conceitual em Lazarsfeld,
Berelson e Gaudet (1948) não é pertinente porque se trataria neste caso de adicionar uma etapa
ao objeto-modelo lasswelliano.
Acima de tudo, não colaboraria para a centralização teórica da principal questão trazida
pelos autores (1948), que é a inter-relação entre comunicação dos meios e comunicação
interpessoal.
Em segundo lugar, embora o modelo lasswelliano seja um ponto de partida, é preciso
avaliar a possível interpretação de que seja um outro objeto-modelo, porém passível de
fundamentar inferências que coloquem ambos em articulação e avaliação. Ou seja, apesar das
diferenças em contornos e particularidades das teorias específicas, não há impossibilidade de
diálogo entre elas.
Uma outra possibilidade é considerar que o objeto-modelo continua o mesmo
(resumidamente, Emissor → Mensagem → Receptor), adicionando-se apenas que é aceitável a
inter-relação entre diferentes processos comunicacionais, sendo admissível seu recorte por
diferentes objetos empíricos.
Essa última opção interpretativa apresenta-se aqui como mais factível na medida em que
se identifica articulação possível entre os dois modelos. Nesse raciocínio, os modelos se
diferenciam no plano do desenvolvimento teórico, no caso de Lazarsfeld, Berelson e Gaudet
(1948) possibilitado parcialmente pelas evidências empíricas.
Em ambos os modelos teóricos, coincidem o tratamento temático de “meio”
(evidenciado pelo uso de caráter extensionalista) e a clivagem sociológica (não obstante no
primeiro texto seja Sociedade e no segundo sejam grupos específicos compreendidos a partir
de índices socioeconômicos).
Além disso, o que poderia ser questionado é a capacidade que o modelo teórico-
conceitual fundamentalmente intrínseco em Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948) teria de
começar a deslocar o objeto-modelo da caixa negra para caixa translúcida.
Afirma-se aqui que, tendo em vista particularmente o texto adicionado na unidade de
pesquisa, embora se possa aferir que há possibilidade de diminuição da opacidade, não há
razões para asseverar que ela se realiza já nesta obra. Entretanto, cabe acentuar que em relação
a tal esclarecimento específico, a pesquisa aqui realizada possui uma limitação oriunda da
delimitação, do Problema estipulado e do Objetivo. Portanto, perseguir tal elucidação
demandaria o desvio da ênfase proposta e riscos à exequibilidade da investigação.
159
3. Dialética do esclarecimento
No levantamento baseado nas principais referências sobre Teorias da Comunicação,
assim como Lazarsfeld, Adorno é frequentemente mencionado, especialmente relacionado ao
texto que foi selecionado para compor a unidade de pesquisa e escrito em coautoria com
Horkheimer.
A nomeação de Horkheimer em 1930, para o cargo de diretor do Instituto para Pesquisa
Social da Universidade de Frankfurt, teria sido determinante para a conformação da identidade
teórica-epistemológica do grupo como “[...] uma tentativa de consolidar a atitude crítica em
relação à ciência e à cultura, com a proposta política de uma reorganização racional da
sociedade, em condição de superar a crise da razão” (WOLF, 2008, p. 73).
Dialética do esclarecimento começou a ser escrito em 1942, sendo publicado em 1947,
antes de Dialética negativa, que data de 1966 e que, resumidamente73, retomando questões da
Dialética do esclarecimento, enfatiza um posicionamento epistemológico de proeminência da
filosofia, do modelo ensaístico e outras características que o aproximam, no entendimento aqui
proposto, do ceticismo.
Considerando as delimitações desta investigação, entre as duas obras chama a atenção
um debate do qual Adorno participou e que foi designado, equivocadamente, como “sobre o
positivismo” para apontar que se tratava das ideias/participação de Popper74. Ao criticar a
proposta de Popper, Adorno (1973) insistentemente não se dirigiu aos aspectos centrais da
propositura criticada, o que resultou em uma digressão de Popper (1973) às questões mais
fundamentais da sua abordagem epistemológica75. Dessa forma, a leitura realizada não
contribui nesta pesquisa para asseverar se o ceticismo presente em Dialética do esclarecimento
já é uma posição epistemológica bem demarcada em relação ao método hipotético-dedutivo ou
se está mais centrada na dialética, em termos ontológicos:
73 Resumidamente, porque o escrutínio dessa obra especificamente não foi incluído nesta investigação e, portanto,
não pode ser colocado em questão. 74 O equívoco que vincula Popper ao positivismo aparece nas exposições de Adorno em A disputa do positivismo
na sociologia alemã e nas caracterizações de Ciência que, no domínio da Comunicação, estão prioritariamente
vinculadas à ideia de Interdisciplinaridade como superação da disciplinaridade ou da Ciência. 75 Na compreensão aqui proposta a recusa de Adorno em debater alguns aspectos básicos da natureza dos métodos
não materializou a proposta da incomensurabilidade, em primeiro lugar porque mesmo as críticas que faz para
além do que foi proposto por Popper indicam sua compreensão (ainda que se suponha ter sido parcial) dos
problemas metodológicos apontados pelo seu par. Em segundo lugar, asseverar que são posições incomensuráveis
demandaria uma recolocação do arranjo de Popper na análise, posto que as suas propostas, embora constantemente
criticadas pela posição da Interdisciplinaridade são também frequentemente ignoradas/desconhecidas.
160
DIALÉTICA – a. Na filosofia antiga e medieval é um sinônimo da lógica ou da arte
da argumentação. A dialética, no hegelianismo e no marxismo, é algumas vezes
encarada como um método e em outras, como uma filosofia. A primeira
interpretação é equivocada, porque nem Hegel nem Marx nem seus seguidores
propuseram qualquer método propriamente dito (ou procedimento padronizado) com
gosto de dialética. A dialética é uma filosofia e, mais precisamente, uma ontologia.
A ética e a epistemologia dialéticas não existem [...] c. Ontologia dialética – Esta
concentra as assim chamadas três leis da dialética, estabelecidas por Hegel e
reformuladas por Engels e Lênin. Elas são: (1) cada coisa seria a união de opostos;
(2) cada mudança origina-se em uma oposição (ou “contradição”); (3) qualidade e
quantidade mudam uma na outra [...] (BUNGE, 2012, p. 101-102).
Retomando o que foi demonstrado no capítulo anterior, o termo “dialética” representa
apenas cerca de 1,5% dos termos especializados do texto, tendo em vista que o trecho que mais
se aproxima do teor conceitual foi compreendido como descumprimento do princípio do
terceiro excluído e, por isso, é aqui retomado:
[...] Quando uma árvore é considerada não mais simplesmente como árvore, mas
como testemunho de uma outra coisa, como sede do mana, a linguagem exprime a
contradição de que uma coisa seria ao mesmo tempo ela mesma e outra coisa
diferente dela, idêntica e não idêntica. Através da divindade, a linguagem passa da
tautologia à linguagem. O conceito, que se costuma definir como a unidade
característica do que está nele subsumido, já era desde o início o produto do
pensamento dialético, no qual cada coisa só é o que ela é tornando-se aquilo que ela
não é (ADORNO; HORKHEIMER, 1969, p. 29).
Considerando a proposta interpretativa de Bunge (2012), sugere-se a leitura de que
Dialética diz respeito à contradição do conjunto de elementos que podem ser agrupados sob o
termo “esclarecimento” no sentido de: (1) intercambiar características de objetos distintos,
homogeneizando-os; (2) se auto localizar como oposição ao “mito” e a “dominação” e ser
localizado, pelos autores (1969) como a realização de ambos e refutação da “crítica”; (3) cada
extensão do “esclarecimento” (por exemplo, a técnica, a ciência, a publicidade etc.) provoca
uma mudança que, ao se realizar, propulsiona novos modos de declínio da cultura.
Como explica Rüdiger (2004), os estudiosos da Escola de Frankfurt:
[...] costumam ser designados pura e simplesmente como teóricos da comunicação
pelos especialistas deste campo de conhecimento, coisa que, entretanto, não somente
não foram, como contestariam com vigor, na medida em que, nas poucas vezes que
empregaram o termo, os chamados frankfurtianos rejeitaram a pertinência analítica
da categoria (RÜDIGER, 2004, p. 89).
O termo fundamental é, então, Indústria Cultural, sobre o qual Adorno (1989) esclarece
que:
161
Tudo indica que o termo indústria cultural foi empregado pela primeira vez no livro
Dialektik der Aufkärung, que Horkheimer e eu publicamos em 1947, em Amsterdã.
Em nossos esboços tratava-se do problema de cultura de massa. Abandonamos essa
última expressão para substituí-la por “indústria cultural”, a fim de excluir de
antemão a interpretação que agrada aos advogados da coisa; estes pretendem, com
efeito, que se trata de algo como uma cultura surgindo espontaneamente das próprias
massas, em suma, da forma contemporânea de arte popular [...] (ADORNO, 1989,
p. 287).
Dessa maneira, observando os resultados apresentados no capítulo anterior, a opção
interpretativa de Bunge (2012) e os esclarecimentos em Adorno (1989) e Rüdiger (2004), tem-
se a seguinte estrutura:
FIGURA 11 – Estrutura teórico-conceitual em Adorno e Horkheimer
Fonte: O próprio autor
Como elemento intersecional de todo o argumento dos autores (1969), compreende-se
por “Indústria Cultural” um conjunto/sistema de práticas sociais típicas do “esclarecimento”
que, demarcadas por contradições (como, por exemplo, distanciar fisicamente, mas unir/
homogeneizar intelectualmente), realizam o inverso do projeto do “esclarecimento” como
demonstrado na arguição em que “[...] os mitos que caem vítimas do esclarecimento já eram o
produto do próprio esclarecimento. No cálculo científico dos acontecimentos anula-se a conta
que outrora o pensamento dera, nos mitos, dos acontecimentos [...]” (ADORNO;
HORKHEIMER, 1969, p. 7).
Além de realizar o inverso de seu projeto, a forma aplicada do Esclarecimento, a
Indústria Cultural, produz resultados essencialmente negativos sobre ou em razão de: (1) isolar
162
os indivíduos da natureza e a pretexto de dominá-la, de fato destruí-la76; (2) degradação da arte,
cuja erosão também reflete na supressão da crítica e (3) aviltamento da individualidade, através
da integração77 vertical das pessoas e das práticas sociais reflexivas/críticas/de resistência pela
lógica de produção.
A árida noção de “Meio” na propositura dos autores (1969) por um lado ajuda no
entendimento de que certamente a Indústria Cultural não pode ser subsumida pelas suas
extensões (técnica, ciência, cinema, jazz etc.) porque é uma dinâmica sociocultural ampla e não,
por exemplo, o conjunto de técnicas ou de empresas ligadas a produção de bens culturais.
Em contrapartida, reforça o que foi exposto por Braga (2011), Marcondes Filho (2011)
e Rüdiger (2004; 2014), sobre o perpassar meramente temático de “comunicação” e “meio”.
Sobre eles é, a partir dos usos em caráter de extensão, sabido que estão submetidos à dinâmica
da Indústria Cultural.
Dessa forma, o interesse dos autores (1969) repousa sobre a identificação dos efeitos
negativos, em especial a degradação da cultura (particularmente da arte e da possibilidade de
crítica) do processo de Esclarecimento, que é materializado pela Indústria Cultural.
A partir dos parâmetros expostos por Bunge (2013), enquanto objeto-modelo, não
obstante seja possível também considerar a complexidade da opção de interpretação teórica
e/ou a justeza ou não da proposta de dialética78 (BUNGE, 2012), ainda não se trata de
Comunicação e/ou Meio.
Por conseguinte, não se trata da transição para a caixa translúcida. Mantendo coerência
com o objeto-modelo, tanto Estímulo quanto Resposta estão localizados em elementos
exógenos de caráter sociocultural.
No modelo teórico, a proposta de visada dialética das dinâmicas da Indústria Cultural é
notadamente a diferença em relação a Lasswell (1989) e Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948),
considerada por alguns estudiosos, a exemplo de Rüdiger (2004 e 2007) e Wolf (2008), como
marca da originalidade dos autores (1969).
Mas como consequência da mesma opção ontológica que propulsiona o aprofundamento
teórico, tem-se o método expositivo que não autoriza a afirmação de que há indireta ou
diretamente uma construção hipotética que reflita no deslocamento da caixa negra para a caixa
76 Questão para a qual os autores (1969) se voltam inúmeras vezes, como evidencia a relevância quantitativa do
termo “natureza”. 77 No sentido de Integrados em oposição aos Apocalípticos. 78 Que se evita aqui colocar em causa, exceto no que produz resultados diretos na dimensão metódica-técnica na
análise empregada nesta investigação.
163
translúcida, a despeito das inúmeras exemplificações da dinâmica de operação da Indústria
Cultural.
4. Os meios de comunicação como extensões do homem
Como explicado no início deste capítulo, nas principais referências sobre Teorias da
Comunicação não há concordância sobre a localização da proposta de McLuhan (2005), o que
em uma primeira leitura significa que de alguma forma ela perpassa ou é minimamente
articulável com as outras diversas posições teóricas.
Além da relevância quantitativa do termo “meio”, a diferença aqui observada é o
reconhecimento da importância também qualitativa, isto é, não obstante a noção seja ampla e o
uso em caráter de extensão acentuado, não se caracteriza como tratamento temático:
FIGURA 12 – Estrutura teórico-conceitual em McLuhan
Fonte: O próprio autor
Os termos especializados que foram acentuados para além de “Meio” não possuem
teor conceitual propriamente, eles estão na estrutura teórico-conceitual para dar sentido às duas
proposições principais expostas pelo autor (2005): (1) o meio é a mensagem, e (2) os meios são
164
extensões do homem/da percepção. Como início da análise proposta, retoma-se a citação já
mencionada no capítulo anterior:
[...] o exemplo da luz elétrica pode mostrar-se esclarecedor. A luz elétrica é
informação pura. É algo assim como um meio sem mensagem, a menos que seja
usada para explicitar algum anúncio verbal ou algum nome. Este fato, característico
de todos os veículos, significa que o “conteúdo” de qualquer meio ou veículo é
sempre um outro meio ou veículo. O conteúdo da escrita é a fala, assim como a
palavra escrita é o conteúdo da imprensa e a palavra impressa é o conteúdo do
telégrafo [...] Uma pintura abstrata representa uma manifestação direta dos processos
do pensamento criativo, tais como poderiam comparecer nos desenhos de um
computador. Estamos aqui nos referindo, contudo, às consequências psicológicas e
sociais dos desenhos e padrões, na medida em que ampliam ou aceleram os processos
já existentes. Pois a “mensagem” de qualquer meio ou tecnologia é a mudança de
escala, cadência ou padrão que esse meio ou tecnologia introduz nas coisas humanas
[...] (MCLUHAN, 2005, p. 22).
Daí depreende-se que os “Meios” em McLuhan (2005) não têm um critério de
aplicação específico que os diferenciem ou demarquem a equivalência com “Tecnologia”. O
que é possível apreender é que eles produzem efeitos na organização cultural que podem
implicar em alterações tecnológicas, de sociabilidade etc.
É preciso abrir um espaço para a seguinte explicação: secundariamente às proposições
primárias de extensão e prevalência da invisibilidade dos meios, McLuhan (2005) preocupa-se
também em dividi-los entre quentes e frios, o que implica em uma relação entre a quantidade
de sentidos estendidos e o nível de participação no meio. Porém, na fase de análise metódico-
técnica tal distinção não se mostrou relevante, assim como “Aldeia Global”.
Do ponto de vista epistemológico-teórico a inclusão não é entendida como produtiva
por duas razões: em primeiro lugar, não é essencial para o desenvolvimento central das
principais propostas do autor (2005), e em segundo lugar sua abordagem demandaria o
apontamento de tantas objeções a respeito do não esclarecimento e/ou o retorno a aspectos
epistemológicos que colocam em pauta, por exemplo, a questão das percepção e participação
a partir de uma angulação das Ciências Cognitivas, que afetariam a manutenção da
exequibilidade da pesquisa.
Voltando-se para o que é central na citação, está exposta a noção de que “meio é a
mensagem”. Contudo, a opção interpretativa oferecida é oposta: o meio não é a mensagem.
Além de ser distinto da mensagem, o meio (ou suas implicações) é prioritário porque sua
invisibilidade produz como resultado ignorá-lo como objeto que demanda apuração. Isso se dá,
sobretudo, porque ele é propulsionador de modificações individuais e socioculturais:
165
[...] “o meio é a mensagem”, porque é o meio que configura e controla a proporção
e a forma das ações e associações humanas. O conteúdo ou usos desses meios são
tão diversos quão ineficazes na estruturação da forma das associações humanas. Na
verdade não deixa de ser bastante típico que o “conteúdo” de qualquer meio nos
cegue para a natureza desse mesmo meio [...] (MCLUHAN, 2005, p. 23).
Em McLuhan (2005), a demanda de investigação do Meio é justificada pelas
consequências negativas da recusa dessa constatação:
[...] Enquanto adotarmos a atitude de Narciso, encarando as extensões de nossos
corpos como se estivessem de fato lá fora, independentes de nós, enfrentaremos os
desafios tecnológicos com a mesma sorte, a mesma pirueta e queda de quem
escorrega numa casca de banana (MCLUHAN, 2005, p. 89).
Também está apoiada na ideia de que ocorrem inflexões a partir da inter-relação de
diferentes meios, cujo fruto é a absorção de um meio por outro, tornando-se o seu conteúdo:
Não percebemos a luz elétrica como meio de comunicação simplesmente porque ela
não possui “conteúdo”. É o quanto basta para exemplificar como se falha no estudo
dos meios e veículos. Somente compreendemos que a luz elétrica é um meio de
comunicação quando utilizada no registro do nome de um produto. O que aqui
notamos, porém, não é a luz, mas o “conteúdo” (ou seja, aquilo que na verdade é um
outro meio [...] (MCLUHAN, 2005, p. 23).
A alteração da organização cultural seria oriunda da modificação nos sentidos dos
indivíduos que, ao terem seu aparato perceptivo estendido pelos meios, passam a perceber
objetos e construções socioculturais (como, por exemplo, as noções de tempo e espaço)79 de
modo diferente no nível da experiência, criando com eles uma específica relação simbólica.
Um exemplo das alterações perceptiva e simbólica produzidas em relação à noção de
espaço está colocado quando o autor (2005, p. 286-287) afirma que “[...] os meios elétricos, no
entanto, antes abolem do que aumentam a dimensão espacial. Graças à eletricidade, em toda a
parte retomamos os contatos pessoa a pessoa como se atuássemos na escala da menor das
aldeias [...]”. Em relação ao tempo, tem-se o seguinte trecho:
79 Não se ignora aqui que a interpretação mais acurada acerca das consequências dos meios sobre as noções de
tempo e espaço implicaria na inclusão da obra de Harold Innis, o que afetaria a viabilidade da investigação como
foi delimitada.
166
[...] não há qualquer princípio de causalidade, numa mera sequência. O fato de uma
coisa seguir-se a outra não significa nada. A simples sucessão não conduz a nada, a
não ser à mudança. Assim a eletricidade viria a causar a maior das revoluções, ao
liquidar a sequência e tornar as coisas simultâneas. Com a “velocidade instantânea”,
as causas das coisas vieram novamente à tona da consciência, o que não ocorria com
as coisas em sequência e em consequente concatenação [...] (MCLUHAN, 2005, p.
26).
Retomando a noção de objeto-modelo (BUNGE, 2012 e 2013), tem-se que, apesar da
centralização de McLuhan (2005) no Meio, o esquema lasswelliano é ainda admissível como
objeto-modelo das formulações teóricas de McLuhan (2005). E isto independente do critério
adotado em sua aplicação do termo “meio” nas proposições centrais.
Uma opção interpretativa possível é que as dinâmicas especulativas entre “o meio é a
mensagem” e o “meio é uma extensão do homem” obscurecem e configuram maior opacidade
ao objeto-modelo lasswelliano, ou são uma recuperação do objeto-modelo de Lasswell e de
modelos teóricos de outros autores como propõe, por exemplo, Martín-Barbero (1997, p. 60-
61) ao afirmar que “[...] certamente poder-se-ia afirmar que McLuhan não fez mais que
expressar numa linguagem explicitamente antiteórica a intuição-obsessão que atravessa de
ponta a ponta a reflexão norte-americana dos anos 40-50 sobre a relação cultura/sociedade [...]”.
Essa apreensão é aqui refutada em função de duas questões: em primeiro lugar a raridade
do exame do Meio abstendo-se do tratamento estritamente temático é o primeiro passo de
viabilização do debate epistemológico a respeito de “Meio” e da própria Comunicação.
Sem colocar em pauta a qualidade reflexiva ou a originalidade das premissas
consideradas por McLuhan (2005), importa acentuar que Meio e Comunicação não são logo de
início subsumidos por aspectos macrossociais, sendo naturalizados. Ao contrário, dentre os
poucos aspectos que ficam claros em McLuhan (2005) está, novamente independente do debate
sobre a capacidade explicativa, a problematização do Meio.
Ao produzir interrogações sobre o Meio, a leitura de McLuhan (2005) suscita questões
sobre a relação dele e da Comunicação com a Tecnologia. Tal relação, ao menos nos autores
cuja análise já foi demonstrada (ADORNO; HORKHEIMER, 1969; LASSWELL, 1989;
LAZARSFELD, BERELSON; GAUDET, 1948), está necessariamente suprimida nos próprios
meios (em uma visão que os naturaliza) ou nos aspectos macrossociais.
Assim, mesmo frente às inúmeras críticas que possam ser tecidas a respeito da proposta
isoladamente ou do seu não resultado de destituição do objeto-modelo lasswelliano, é preciso
reconhecer que se constata no mínimo a viabilização de construções hipotéticas incipientes a
respeito dos mecanismos e não mais das implicações exógenas.
167
Uma outra opção a ser considerada é, a exemplo do que foi exposto também sobre
Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948), a alternativa de se tratar de um mesmo objeto-modelo,
porém com reflexões que exijam a distinção entre, no mínimo, recortes de objetos empíricos
que distingam processos comunicacionais baseados em tecnologia dos não baseados em
tecnologia.
Evidentemente, avançar daí para a reflexão sobre a interseção entre Meio,
Comunicação e Tecnologia, enquanto Objetos de modelos teóricos exigiria a expansão para o
escrutínio teórico também da Tecnologia já que a partir dos autores (ADORNO;
HORKHEIMER, 1969; LASSWELL, 1989; LAZARSFELD, BERELSON; GAUDET, 1948)
tal detalhamento não é viável, bem como não está incluído na delimitação desta pesquisa.
5. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia
Como observado no capítulo anterior, Cultura é quantitativamente, a questão mais
relevante em Martín-Barbero (1997). Isso acontece porque funciona operacionalmente, para
indicar/esclarecer inúmeras noções que não são originalmente formuladas por ele: Cultura
como um processo amplo, culturas particulares (indígenas, por exemplo), Cultura Popular, de
Massa e Hegemônica, Indústria Cultural, Identidade Cultural etc.
Não obstante os usos operacionais sejam importantes ao esforço do autor (1997) de
localizar sua proposta em relação aos outros posicionamentos, em especial a Escola Americana
e a Escola de Frankfurt, a preponderância está na tentativa de intercambiar Comunicação e
Cultura. Conforme argumenta Martín-Barbero (1997):
Assim a comunicação se tornou para nós questão de mediações mais que de meios,
questão de cultura e, portanto, não só de conhecimentos mas de reconhecimento.
Um reconhecimento que foi, de início, operação de deslocamento metodológico para
rever o processo inteiro da comunicação a partir de seu outro lado, o da recepção, o
das resistências que aí têm seu lugar, o da apropriação a partir de seus usos [...]
(MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 16, grifo do autor).
Frente à indicação dos Usos, o autor (1997) também se esforça para se opor não apenas
às duas escolas, mas a noções específicas como, por exemplo, de “Usos e Gratificações”. Esses
aspectos não são analisados aqui, porque desconfigurariam os propósitos da pesquisa.
Respeitando-se os delineamentos desta investigação, aponta-se a auto localização de
Martín-Barbero (1997) em oposição ao frankfurtianos:
168
Esta é a aposta e o objetivo deste livro: mudar o lugar das perguntas, para tornar
investigáveis os processos de constituição do massivo para além da chantagem
culturalista que os converte inevitavelmente em processos de degradação cultural. E
para isso, investigá-los a partir das mediações e dos sujeitos, isto é, a partir das
articulações entre práticas de comunicação e movimentos sociais [...] (MARTÍN-
BARBERO, 1997, p. 17).
E também a Escola Americana como um todo:
[...] Devemos começar situando o verdadeiro alcance do que procuramos, sua
diferença frente às teorias funcionalistas da recepção: "Não se trata apenas de medir
a distância entre as mensagens e seus efeitos, e sim de construir uma análise integral
do consumo, entendido como o conjunto dos processos sociais de apropriação dos
produtos [...]”(MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 290, grifo do autor).
Esse entendimento, de valorização da inter-relação entre Cultura e Comunicação,
somado à oposição com as duas escolas mencionadas, resultou na compreensão de que o quadro
teórico-conceitual do autor (1997) se articula através de Cultura, Mediação, Recepção e Meio.
FIGURA 13 – Estrutura teórico-conceitual em Martín-Barbero
Fonte: O próprio autor
169
A começar por Recepção, tem-se que:
[...] Abre-se assim ao debate um novo horizonte de problemas, no qual estão
redefinidos os sentidos tanto da cultura quanto da política, e do qual a problemática
da comunicação não participa apenas a título temático e quantitativo - os enormes
interesses econômicos que movem as empresas de comunicação - mas também
qualitativo: na redefinição da cultura, é fundamental a compreensão de sua natureza
comunicativa. Isto é, seu caráter de processo produtor de significações e não de mera
circulação de informações, no qual o receptor, portanto, não é um simples
decodificador daquilo que o emissor depositou na mensagem, mas também um
produtor (MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 287, grifo do autor).
Considerando a distinção entre Objeto-modelo e modelo teórico, cabe aqui ressaltar que
a abordagem que fundamenta a arguição do autor (1997) é essencialmente a mesma que orienta
o objeto-modelo lasswelliano.
Não apenas neste trecho, mas também quando atribui à Mediação um sentido de
“entremeio”, de um elemento intermediário, Martín-Barbero (1997) acaba por retroceder com
o conceito de Mediação à abordagem behaviorista.
O posicionamento epistemológico que Martín-Barbero (1997) se esforça para evitar
acaba por também incluir sua proposta e, do ponto de vista estritamente teórico, o autor (1997)
possui algumas características que dificultam a realização do reposicionamento que pretende.
Também como mencionado na análise de cunho metódico-técnico, o conjunto de
trechos nos quais o autor (1997) oferece explanações sobre Mediação tem como característica
algumas tendências.
Em primeiro lugar, não existem critérios bem estabelecidos de aplicação da noção de
Mediação. E embora Martín-Barbero (1997) se utilize do termo com frequência no texto, cada
acepção inclui mais algum fator que não foi anteriormente mencionado, de maneira que
algumas proibições supostas (exemplo – mediação não é) são falseadas. Dessa forma, o autor
(1997) acaba por transitar entre o descumprimento do princípio lógico da não contradição e as
reformulações ad hoc (LAKATOS, 1979).
Uma outra questão que chama atenção em relação a capacidade explicativa da proposta
da Mediação é o fato de que, ao menos inicialmente, ela é localizada pelo autor (1997) de modo
exógeno para posteriormente (mas também a partir do título da obra) colocá-la como principal
elemento intersecional e, portanto, em articulação com os meios.
Mas a adversidade que se apresenta é ainda anterior: como é possível deslocar um
modelo teórico de um conceito para o outro se nenhum dos dois atende aos critérios de
formulação/exposição conceitual?
170
Sem qualquer atribuição negativa ou subestimada de outras pesquisas cujo tema é
Recepção ou Mediação, constata-se que nessa obra específica (1997) há reflexões insuficientes
não apenas no nível teórico, mas também no nível metódico.
No entanto, é interessante notar que tais insuficiências não são evidentes quando Martín-
Barbero (1997) analisa os pressupostos de outros, especialmente os de base da Escola de
Frankfurt.
Mesmo recusando equiparações com as escolas Americana e de Frankfurt, dada a
indefinição das três ideias (Mediação, Recepção e Meio) acaba por ser absorvido em razão de
algumas imprecisões teóricas e da consequente adesão ao Objeto-modelo behaviorista. É por
isso que se discorda aqui da proposição do autor (1997) de que é um projeto metodológico.
As formulações teóricas não podem ser isoladas das outras instâncias da pesquisa
(LOPES, 2005; BUNGE, 2013); mas isso não significa que não seja possível identificar e
distinguir diferentes recursos científicos, dos diferentes níveis da investigação.
Não se pode asseverar que Martín-Barbero (1997) não possui recursos teóricos, mas em
contrapartida também não se fundamenta a partir deste texto específico a existência de um
amplo recurso metodológico como esperado. Neste caso, a absorção da explicação teórica pelo
Objeto-modelo não poderia acontecer e/ou o modelo teórico teria que dar conta de construções
hipotéticas que as colocassem na direção da diminuição da opacidade (BUNGE, 2012 e 2013).
O trecho mais pontual a respeito de Meio é o seguinte, retomado do capítulo anterior:
As denominações são também um bom ponto de acesso. Pliego indica o "meio": uma
simples folha de papel dobrada duas vezes, ou várias folhas dobradas formando um
caderninho, impresso em duas ou três colunas. Cordel assinala o modo de difusão,
pois os pliegos eram exibidos e vendidos pendurados em um cordel na praça [...]
(MARTÍN-BARBERO, 1997, p. 145, grifo do autor).
O Meio aparece absorvido pelos instrumentos e pela técnica que impulsionariam a
difusão de seus conteúdos. Mas, novamente, são noções e conceitos que, mesmo que possam
ser evitados no vocabulário da Mediação/Recepção, a cada esclarecimento se estabelecem cada
vez mais firmemente no Objeto-modelo que se pretendeu criticar.
Nesse sentido, algo a ser enfatizado diz respeito à afirmação de que há, antes da
Mediação e da Recepção típicas da pesquisa na América Latina, um midiacentrismo.
No que tange os autores até agora analisados, assevera-se que justamente o que não há
é o enfoque no “Meio”, à exceção de McLuhan (2005). Ou, de outra forma, só é possível admitir
a existência de um midiacentrismo se for suficiente para sua configuração a abordagem
temática.
171
6. Textos recentes
.
Como mencionado no início deste capítulo, os textos selecionados são: (1) Mídia fluida:
por uma renovação conceitual (2010); (2) Tertium datur: introdução a uma teoria negativa dos
media (2013); (3) Medium-Remedium: o problema ontológico dos meios e seu entrelaçamento
comunicativo (2013); (4) Mídias sociais digitais a partir da ideia mcluhaniana de medium-
ambiência (2013); e (5) A virada comunicacional. Ou porque os estudos de “midiatização”, de
hábito e da Teoria dos Media passam ao largo da comunicação (2015).
O que esses textos possuem em comum é a abordagem direta da noção de “Meio”, seja
para criticá-la ou preservá-la, considerando abertamente questões conceituais e a teorização da
Comunicação, não restrita a pontuações epistemológicas ou históricas da institucionalização
dos estudos do domínio da Comunicação.
Iniciando-se por A virada comunicacional. Ou porque os estudos de “midiatização”, de
hábito e da Teoria dos Media passam ao largo da comunicação, Marcondes Filho (2015) critica
a proposta semiótica e os estudos centralizados em Media a partir de uma visada que considera
sociológica e sobre os quais ele é mais preciso:
A Teoria dos Media, como é denominada hoje na Alemanha, trabalha com isso. Seu
objeto teórico é o estudo político da dominação exercida pelos meios de
comunicação, hoje, também, pelos meios eletrônicos, como a internet e suas diversas
plataformas de veiculação de matérias jornalísticas, vídeos, música e entretenimento.
Não se trata de um estudo de comunicação, mas de tecnologias aplicadas à sociedade,
um tipo de ramo da sociologia (MARCONDES FILHO, 2015, p. 139-140).
Entretanto, tais críticas não estão aqui colocadas em questão porque a contraposição
adequada exigiria confrontá-las com o que Marcondes Filho (2015) aponta sobre tais posições.
Interessa é o que o autor (2015) entende por comunicação:
Quando um livro me transforma, quando um filme mexe com as minhas concepções,
quando uma instalação me faz rever meus padrões estéticos, estou falando de um
choque, um salto qualitativo, um reposicionamento mental que passa a ordenar
diferentemente o meu mundo (MARCONDES FILHO, 2015, p. 137).
Segundo Marcondes Filho (2015, p. 138) para pensar comunicação e, portanto, o
deslocamento qualitativo que produz “um reposicionamento mental”, “[...]seria necessário
distinguir duas coisas: objeto da comunicação e a própria comunicação [...]”.
Para realizar tal distinção, o autor (2015) considera importantes diferenciações em
relação aos meios no seguinte contexto:
172
No Brasil, foi criada a curiosa expressão “mídia”, que, em princípio não diz nada e
serve para múltiplos objetos. “Mídia”, que é como o brasileiro importou a pronuncio
do termo inglês media, é, por vezes, inclusive, contraposto ao termo media (de massa
media), o que faz com que os estudos brasileiros dessa questão tecnológica sejam
totalmente ilegíveis para o leitor estrangeiro, visto que, para esses, é tudo “media” e
quando nós fazemos essa separação, parece, aos olhos do leitor do exterior, que nossa
ciência comunicacional não é séria (MARCONDES FILHO, 2015, p. 140).
O que cabe avaliar é a distinção de “mídia” apontada pelo autor (2015) que, dentre os
textos selecionados para a reflexão deste item aparece em Mídia fluida: por uma renovação
conceitual. Neste artigo (2010), explica-se que “foneticamente, mídia é a representação do
termo inglês media, que tem origem no latim médium, cujo plural é media. Como significado,
mídia, desde suas primeiras definições, remete a meio, espaço intermediário ou local onde tudo
converge” (MALLMANN, 2010, p. 18).
A autora (2010) aponta em diversos momentos McLuhan (2005), mas isso não é
suficiente para estabelecer se as propostas deste autor (2005) se enquadram em sua visão nas
primeiras definições mencionadas, inclusive porque os pontos de escrutínio são fragmentados.
O que é possível aqui afirmar é que, tendo em vista as análises realizadas neste trabalho,
ao menos a partir de vista teórico-conceitual, os pontos em que “tudo converge” são diferentes
em todos as obras apreciadas e nenhuma corresponde integralmente aos meios (Exemplo:
“Estrutura de atenção” em Lasswell). Se tal apreensão se der frente ao objeto-modelo, então tal
ponto de convergência é indeterminado, porque os modelos teóricos em questão não o
deslocaram definitivamente. Finalmente, se o argumento leva em consideração o objeto
empírico, então Mallmann (2010) corrobora a demanda pela distinção apontada por Marcondes
Filho (2015).
Outro ponto que reforça o argumento de existência da indistinção está colocado no
seguinte trecho:
[...] o período em que vivemos hoje não é mais compatível com o entendimento
segmentado por meios de comunicação. Em outras palavras, há tempos
denominamos telejornalismo o conteúdo veiculado pela TV, como será chamado o
mesmo conteúdo ao ingressar na Internet e ser acessado em um celular? Seria
contraditório chamarmos de telejornal um programa assistido via celular. Assim,
chamamos o programa apenas por vídeo, decaindo o prefixo tele, que se referia pura
e simplesmente ao aparato (e seu modo de transmissão) (MALLMANN, 2010, p. 20-
21).
173
Essa não é uma apreensão relativa ao Objeto de pesquisa e, portanto, ao conceito. É
antes uma descrição do objeto empírico a partir de algo (conteúdo e aparato) que para a autora
(2010) equivale a “Meio”.
Em primeiro lugar, embora as categorizações sejam necessárias à formulação de um
conceito expresso por um designador especializado, elas não são suficientes. Em segundo lugar,
seria necessário reduzir a ambiguidade e explicar a diferença entre “conteúdo” e “aparato” e
estabelecer a localização de “meio”.
A mesma indistinção aparece em Medium-Remedium: o problema ontológico dos meios
e seu entrelaçamento comunicativo, no qual medium seria aquilo que é incomunicável, em
alguma instância a realidade em si, visto que é percebido como “experiência pura”. A
dificuldade é que o meio/mídia seria uma outra parte da realidade, aquela que é não
necessariamente corpórea, mas obrigatoriamente material:
[...] o médium não pode ser uma coisa. Elevá-lo à condição de coisa ou ferramenta,
reificá-lo, é abrir a porta para o fetiche. Quando os media são confundidos com os
objetos que os incorporam, a magia cede lugar à fixidez mórbida das imagens
vidradas [...] a vida corporal, experimentada no sensível, para a ser vida abstrata,
projetada em imagem. O corpóreo, muitas vezes confundido com matéria, é cada vez
menos presente na comunicação. E o que deveria ser médium para a experiência,
acaba substituído por um meio qualquer, por mídia banal (OLIVEIRA; LIESEN,
2013, p. 15-16).
Já em Mídias sociais digitais a partir da ideia mcluhaniana de medium-ambiência,
desde a proposta macluhaniana:
Se a partir dos meios, a teoria de McLuhan permite analisar a sociedade, o meio não
é apenas o suporte técnico, o canal neutro, invisível, pelo qual fluem as mensagens
da mídia. O meio mcluhaniano, como fica claro nas obras mais tardias de McLuhan,
é o ambiente que afeta, tensiona, sugere significados e sentidos. Ao dizer que o meio
é a mensagem, o autor nos lembra que o meio, com suas características técnicas,
simbólicas, organizacionais, produz efeitos tão ou mais importantes que aqueles que
possam ser produzidos pelo conteúdo das mensagens que veiculam. Sob essa
perspectiva, a noção de meio carrega em si um caráter cultural que contesta qualquer
tentativa de filiar McLuhan a uma linha teórica determinista (BARICHELLO;
CARVALHO, 2013, p. 236-237).
Diferente do que exposto por Oliveira e Liesen (2013), para Barichello e Carvalho
(2010), por “meio” entende-se tudo “que afeta, tensiona, sugere significado e sentidos”, provido
de “características técnicas, simbólicas e organizacionais”. Exceto por especificar os tipos de
características que constituem os meios, coloca-se aí uma apreensão funcional, isto é, do que
os “meios” fazem.
174
Para Mallmann (2010) há diferença entre “mídia” e “meio”, e a primeira se relaciona
com “fluxos”, mas não com a questão técnica e institucional (que estaria restrita ao “meio”), ou
dito de outra forma “[...] o que entendemos por mídia nos tempos atuais são os próprios fluxos
informativos, que se dão entre aparatos (sejam eles quais forem). Acreditamos que justamente
o fluxo é o que melhor traduz mídia na Modernidade Líquida descrita por Baumann [...]”. E
ainda:
[...] Como se pode perceber, a mídia enquanto fluxo em um metassistema vai à
contramão do entendimento clássico da comunicação, em que nas pontas se
encontravam emissor e receptor, sendo o canal o objeto que mediava a informação
entre ambos. A comunicação massiva está presente nesse metassistema, mas,
diferentemente de sua fórmula original, ela reaparece por intermédio da participação,
manipulação, compartilhamento entre interagentes (emissores/receptores). Na mídia
contemporânea não há pontas, pois não estamos tratando de um modelo linear de
comunicação, tampouco de um sistema isolado dos demais existentes
(MALLMANN, 2010, p. 23).
Já para Barichello e Carvalho (2013) os aspectos técnicos e institucionais estariam
também presentes na “mídia” (que é o conjunto de “meios”), como é possível depreender do
trecho que também indica extensões:
Mídia é a forma aportuguesada da palavra latina media, plural de médium, que é
meio, em seu sentido de meio de comunicação, para além da ideia de mero canal.
Portanto, o termo mídia englobaria o conjunto de meios de comunicação,
representando uma instituição social – com seus conjuntos de valores, normas, regras
– o ambiente, o fundo, a cultura. Mídia, nesse sentido, não é apenas um meio técnico
– televisão, rádio, computador -, por ela envolve fluxos de comunicação, interações
tecnossociais, apropriações simbólicas, questões organizacionais e culturais
(BARICHELLO; CARVALHO, 2013, p. 238).
Outros designadores, em especial, “mediação”, “midiatização” e “mediatização”
apareceram com frequência em outros artigos da unidade de pesquisa de textos recentes. Porém,
para avaliar de que forma eles colaboram (ou não) para o conceito de “meio” e “mídia”, bem
como para determinação de diferenciação ou equivalência entre ambos, seria necessário ampliar
o escopo deste trabalho de forma improdutiva.
Em razão disso, tal questão é avaliada no argumento de Marcondes Filho (2013) tendo
em vista a impossibilidade de nesta pesquisa investigar também tais designadores. A questão
aqui é, portanto, o estabelecimento funcional de meio/media/tecnologias da comunicação:
175
[...] O aumento da democracia e o desmoronamento dos impérios comunicacionais
não justifica a construção linguística “midiatização” como oposta à mediatização,
supostamente atribuída a tempos idos.
Isso porque o termo mediatização dá conta disso. Ele se refere pura e
simplesmente ao uso dos media para certos fins. Mediatizar é realizar (o que quer
que seja) com o apoio das tecnologias comunicacionais, não importa para que lado
ou defendendo que interesse. É como o fármaco, que é tanto um remédio quanto um
veneno, dependendo dos seus modos de uso. “Midiatização”, ao contrário, veio para
confundir, pois pretende positivar uma ação mediática invertendo seu polo, mas
caindo numa tautologia inócua (MARCONDES FILHO, 2015, p. 140-141).
O aspecto com o qual se concorda, independente de se tratar das colocações de
Barichello e Carvalho (2013), Mallmann (2010) ou Oliveira e Liesen (2013) é que:
Não está claro que meios são esses. Supõe-se que a pintura seja um meio, a escrita,
outro meio, a oralidade, mais outros, não se podendo caracterizá-las necessariamente
como de “massa”, apenas como meios. Comunicação realiza-se através de meios,
esse é seu modo de acontecer; isso diz como ela se dá, mas ainda não a caracteriza.
Por outro lado, falar que a comunicação ocorre através dos meios quer dizer que seja
medial, não mediática, visto que mediática, como dito acima, está subordinada à
lógica dos mass media (MARCONDES FILHO, 2015, p. 140-141).
Em razão de tal colocação, a proposta do autor (2015, p. 143) é que “comunicação,
assim, deveria ser estudada – talvez não ‘a partir de’, mas subsidiada pelo estudo de – processos
mediais. E a tecnologia digital a colocaria em outro nível de medialidade, no nível – agora sim
– do mediático [...]”.
Avaliar a proposta de Objeto da Comunicação em si não é da alçada deste trabalho, mas
cabe concordar com o entendimento de que, do ponto de vista epistemológico e teórico,
conceitos são explicados por relações de e com outros conceitos em uma estrutura hipotético-
dedutiva mais ampla, devendo ser coerente com tal estrutura.
Ainda que não se possa avaliar, os textos aqui incluídos corroboram com a asserção de
que há indefinição e insuficiência em relação a “meio” e, dada sua implicação em qualquer que
seja a proposta mais ampla relativa ao domínio da Comunicação, constitui-se obstáculo
epistemológico e teórico.
No artigo Tertium datur: introdução a uma teoria negativa dos media, propõe-se a
seguinte apreensão do designador “medium":
176
[...] O que exatamente este termo designa permanece incerto: um objeto, um aparato,
uma técnica, um dispositivo, uma instituição ou qualquer coisa parecida. Até o
presente, sequer alguma vez pareceu claro definir se algo é ou não é um medium,
porque um pedaço de vidro, um instrumento, um sistema de transportes ou mesmo
um veículo, uma imagem, uma estrutura técnica ou uma função matemática não são
media per se, mas só podem se tornar um medium sob condições e práticas
específicas. Por esse motivo, a teoria dos media não pode partir sobretudo, de objetos
ou propriedade classificáveis [...] Por isso, ao invés de media no sentido de objetos,
seria mais adequado falar de medialidade, no sentido de estrutura genérica do medial
– aquela estrutura que se mostra naquilo que os media produzem, transportam,
representam ou comunicam, de tal forma que o medium em si não seria um objeto
adequado de pesquisa, mas apenas as materialidades, os dispositivos e as
performatividades que lhe são subjacentes e que acompanham ou entram nos
processos mediais sem, contudo, se comediarem [...] (MERSCH, 2013, p. 208).
Um entendimento possível é de que medium, em razão de sua materialidade, evidencia
aspectos do medial, sem com isso regular a medialidade. Ao contrário é a medialidade
(condições e práticas específicas) que deslocam um determinado objeto para a categoria
medium que não é exclusivamente comunicacional, visto que eles “produzem, transportam,
representam ou comunicam”.
A questão que se coloca em seguida é se a Teoria dos Media não é necessariamente
comunicacional, embora possa servir de subsídio para uma Teoria da Comunicação como
propõe Marcondes Filho (2015). Em seguida, também resta perguntar se nessa proposta
“meio/medium” deve ser um conceito estritamente funcional e de recorte empírico ou se deve
ser objeto de teorização e, talvez, ser subsidiado por abstrações específicas do domínio da
Tecnologia.
Há aqui certa ambiguidade em relação ao medium na medida em que não há argumentos
suficientes para saber se o medium é propriedade dos processos mediais ou se a medialidade é
uma propriedade do medium ou ainda se o medium é um conceito cuja face empírica são suas
materialidades e que explica a medialidade de processos que, talvez, não se limitem à
Comunicação.
Ainda assim, identifica-se que há o esforço reflexivo acerca da questão do “meio”
considerando sua colocação teórico-epistemológica no domínio da Comunicação e
considerações acerca dos reflexos de entendimento de “meio” (a partir deste ou de designadores
tomados como semelhantes) em uma apreensão maior do Objeto da Comunicação, apesar de
em algumas propostas tal Objeto ser confundido com o objeto empírico.
177
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É importante distinguir criteriosamente dois tipos de crítica das ciências: aquelas que
se opõem a uma teoria particular e são fundamentadas em argumentos específicos, e
aquelas que repetem de uma forma ou outra os argumentos tradicionais do ceticismo
radical [...] é crucial não misturar esses dois tipos de argumentos: se alguém quiser
contribuir com a ciência, seja natural ou social, deve abandonar as dúvidas radicais
e concernentes à viabilidade da lógica ou à possibilidade de conhecer o mundo
através de observação e/ou experiência. Evidentemente, podemos sempre ter dúvidas
sobre uma teoria específica. Porém, argumentos céticos gerais apresentados para
sustentar essas dúvidas são irrelevantes, exatamente em virtude de sua generalidade
(SOKAL; BRICMONT, 1996, p. 207-208).
Que é Comunicação? é uma pergunta que é da alçada do domínio científico, na medida
em que as reflexões desenvolvidas a respeito de tal indagação influenciam diretamente na
identificação de Problemas, na elaboração de Objetos de pesquisa e na avaliação da pertinência
e da capacidade explicativa das propostas investigativas.
A partir da posição do realismo crítico e, portanto, da admissão da falibilidade humana
e do conhecimento científico, refuta-se a possibilidade de uma resposta definitiva à questão.
Isso não implica na desconsideração de que os posicionamentos sobre o assunto precisam ser
realizados e justificados para que, finalmente, possam ser avaliados, melhor desenvolvidos,
abandonados etc., ou na proximidade com o ceticismo e com o relativismo.
Quando aplicada ao desenvolvimento da pesquisa, a perspectiva sobre Que é
Comunicação? resulta em outra pergunta: Quais são as Teorias da Comunicação?. O embaraço
é que, atualmente, qualquer posicionamento rigoroso (o que não quer dizer final) sobre isso se
mostra tecnicamente inviável. Considerando, por exemplo, a diversidade identificada por
Bryant e Miron (2004), constituída por cerca de 604 abordagens teóricas distintas, uma tentativa
de resolução profunda e de avaliação das diferentes propostas teóricas seria infindável.
Reconhecendo consensualmente a multiplicidade teórica, os debates de caráter teórico-
epistemológico subdividem-se geralmente em duas perspectivas: uma em que a
Interdisciplinaridade é uma característica peculiar da Comunicação que, propulsionando
tamanha variação teórica-metodológica, resulta (ou resultará) positivamente na superação da
Ciência (em uma compreensão caricata).
Na outra visão, a redução da multiplicidade é desejável e possível, desde que estejam
compartilhados os critérios analíticos que devem ser aplicados (evitando o dogmatismo e
178
afastando-se da pseudociência) e exista a intenção de superar obstáculos teóricos e
epistemológicos.
É na segunda posição que esta pesquisa está localizada, posto que não obstante este ser
um trabalho que não lida com evidências empíricas de quaisquer processos comunicacionais, a
observação da relação entre abstrações e objeto empírico formam o ponto de partida para a
justificação da posição do realismo científico frente ao irrealismo como mais adequada resposta
ao ceticismo (OKASHA, 2002).
Deduz-se daí que, um desenvolvimento intrínseco posterior a esta investigação é a
avaliação mais ampla (considerando o conjunto da obra dos autores) das posições teóricas aqui
analisadas, tendo como ênfase a contraposição delas com evidências empíricas e dos resultados
desse desenvolvimento com os que são aqui demonstrados.
Isso porque, apesar de no primeiro capítulo estar incluída a reflexão sobre a
impossibilidade da incomensurabilidade, nesta pesquisa não seria exequível a verificação
completa, em total atendimento ao método hipotético-dedutivo (POPPER, 2013).
A propósito da centralização do conceito aqui buscado tem-se que, ainda que este estudo
se coloque a favor da pertinência do Meio como principal elemento norteador da pesquisa em
Comunicação, tal colocação não requer consenso e, evidentemente, não se pretende absoluta.
Porém, isso não suprime o fato de que, se como justificado no início deste texto o Meio
constitui um obstáculo teórico com implicações epistemológicas no domínio da Comunicação
ele é, no mínimo, parte de seu Objeto.
Enquanto componente do Objeto de pesquisa, é preciso que viabilize a interlocução
entre as diferentes reflexões. Se não há o enfrentamento e a crítica das proposituras, não há
como o domínio se desvencilhar da repetição dos argumentos, reconhecer seus limites e
interfaces ou desenvolver parâmetros de avaliação e aceitação das propostas que não sejam, em
função da tendência exógena (KUHN, 2001), dogmáticos (BUNGE, 1980; POPPER, 2013).
É nesse contexto que se coloca a opção da disciplinaridade, sem que isso signifique a
proibição de interlocução entre diferentes saberes, inclusive porque a rigor, o exercício
científico deve supor o Princípio da Interdisciplinaridade (BUNGE, 2012 e 2013), inclusive
como ferramenta de manutenção do rigor epistemológico (LOPES, 2005).
Sendo assim, sem qualquer ilusão de esgotamento da problemática estabelecida, foram
determinadas as estratégias de investigação particulares deste estudo, com base, especialmente,
no modelo metodológico amplo de Lopes (2005).
179
Buscando-se viabilizar o Objetivo da pesquisa, mediante as dificuldades encontradas no
decurso dos estudos exploratórios, ficou estabelecido que os procedimentos analíticos seriam
divididos em níveis metódico-técnico e teórico-epistemológico.
Para o cumprimento de tais procedimentos foram realizadas diferentes opções técnicas
para a seleção, coleta, descrição e análise das unidades de pesquisa.
A começar pela unidade composta pelos textos “clássicos”, realizou-se o levantamento
dos cursos de pós-graduação Stricto Sensu em território nacional, através da plataforma
Sucupira da Capes.
O primeiro dado pertinente é que, entre os 75 cursos de pós-graduação,
aproximadamente 20% não oferecem nenhuma disciplina voltada a ampla discussão das Teorias
da Comunicação.
O levantamento das disciplinas na plataforma Sucupira considerou os seguintes
conjuntos de termos: [Teoria(s) – Campo – Pensamento – Pesquisa] e [Meio(s) – Mídia –
Comunicação – Comunicacional].
Chegou-se a um total de 42 disciplinas que, frente à média de 17 referências por
disciplina, apresentaram discrepâncias: a disciplina que continha maior número de referências
apontava 135 indicações, e a que continha menor número destacava 4 referências.
Outro aspecto relevante é que, entre as 746 referências distintas, a maior parte, cerca de
76%, era indicada em apenas uma disciplina/instituição.
Desse amplo conjunto de referências, foram destacadas as que tratavam das Teorias da
Comunicação de modo geral e não em uma proposta específica. As três mais citadas eram
indicadas em cerca de 42% das disciplinas (HOLHFELDT; MARTINO; FRANÇA, 2007;
MATTELART; MATTELART, 2005; WOLF, 2008).
Confrontando a análise dos três livros com as referências das disciplinas, destacaram-se
os textos mais mencionados/comentados para a composição da unidade de pesquisa de textos
originais: (1) Harold Lasswell, A estrutura e a função da comunicação na sociedade, (2) Paul
Lazarsfeld, Bernard Berelson e Hazel Gaudet, The people’s choice (3) Theodor Adorno e Max
Horkheimer, Dialética do esclarecimento, (4) Marshall McLuhan, Os meios de comunicação
como extensões do homem e (5) Jesús Martín-Barbero, Dos meios às mediações.
Já a unidade de pesquisa que abrangia textos recentes foi delimitada considerando-se
periódicos incluídos em sistema de gerenciamento de acesso aberto, de abrangência nacional,
com classificação Qualis entre A1 e B2, publicados entre 2010 e 2016. Após a aplicação dos
critérios de seleção desenvolvidos a partir dos estudos exploratórios, chegou-se a um total de
705 textos que se referiam e eram indexados a partir do designador “Meio” ou similares.
180
Na análise de nível metódico-técnico, isto é, especificamente relativa à identificação de
argumentos e a avaliação dedutiva, a unidade de textos recentes apresentou resultados similares
aos estudos exploratórios, dentre os quais são destacados:
Um dos tipos de associação mais próxima de argumento com teor conceitual foi
identificada em cerca de 2% dos textos. Tratava-se de associações proibitivas em
relação aos meios que, na grande maioria, explicitavam que os trabalhos abrangiam
preocupações para além do Meio de Comunicação;
Os textos que ofereceram esclarecimentos diretos a respeito de associação teórica
não representam nem 3% do total de artigos analisados. Nesse grupo de texto, foram
identificadas relações com o enquadramento de “Teoria do Meio” e/ou McLuhan,
com a noção de Tecnologia e/ou com aspectos do Jornalismo;
A maior parte dos textos, 64% apresentava como preocupação central questões
políticas.
Houve a tentativa de categorizar os 705 artigos a partir de cinco critérios que
demarcaram possibilidades distintivas mais frequentes, mas a demasiada ambiguidade e a
ausência de teor conceitual inviabilizaram a apreensão de tais conjuntos. Dito de outra forma,
em pesquisas publicadas nos últimos sete anos em gerenciamento aberto e de abrangência
nacional os indícios apontam para o entendimento de que o Meio de Comunicação é uma lacuna
conceitual.
Voltando-se para a unidade de pesquisa de textos originais, a análise em nível metódico-
técnico apresentou os seguintes resultados: embora quantitativamente relevante, o termo
“meio” é prioritariamente operacional, no sentido de refutá-lo como elemento de demarcação
da Comunicação (caso explícito de Martín-Barbero) ou de usá-lo como recorte do objeto
empírico relacionado aos efeitos o que, direta ou indiretamente, se aplica a todos os textos
analisados.
Na análise em níveis teórico e epistemológico, buscou-se deduzir das obras, com apoio
moderado de textos secundários, as estruturas teórico-conceituais individuais. Portanto, em um
primeiro momento as estruturas foram extraídas, mediante as justificações que foram sendo
desenvolvidas no decorrer da análise, para sequencialmente serem avaliadas pelos parâmetros
relativos à noção de Objeto-modelo de caixa negra e a possibilidade de deslocamento para a
caixa translúcida, em relação aos modelos teóricos.
181
A conclusão mais ampla a partir dessa análise é de que a opção da incomensurabilidade
teórica relativa ao Meio não pode ser sustentada, porque não há uma interlocução teórica que o
coloque em pauta diretamente e há proximidade do tratamento dispensado ao designador-
conceito.
Entretanto, há alguns aspectos a serem considerados. Em primeiro lugar, o argumento
segundo o qual há centralização de Meio (nos textos originais e nos recentes) deve observar o
caráter funcional e extensional do tratamento teórico que demarca abordagem temática.
Portanto, a aplicação de Meio, mas também de Comunicação, é operacional.
Além disso, não obstante a aproximação com os designadores-conceitos seja
funcional/operacional e extensional/temática, não há indicações que autorizem a apreensão de
que são, ao invés de relacionados, intercambiáveis.
Em segundo lugar, considerando as atribuições de valor frequentes em relação ao que
se denominou Escola Americana, tanto no caso do texto de Lasswell (1989) quanto no de
Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948), não há proposições que fundamentem a equivalência
entre “Meio” e “Emissor” e, por conseguinte, a aplicação extensional a empresas de
comunicação. A partir de Adorno e Horkheimer (1969), o máximo do uso da extensão teria o
sentido parcialmente baseado em Indústria Cultural, enquanto em McLuhan (2005) e Martín-
Barbero (1997) não há nada de significativo sobre isso.
Apenas McLuhan (2005) oferece uma apreensão notadamente não temática e não
restrita ao caráter de extensão do Meio que, na avaliação mais positiva possível, abre
possibilidade de desenvolvimento de construções hipotéticas que diminuam a opacidade do
Objeto-modelo que admite articulação com os diferentes modelos teóricos.
Mediante a naturalização e não problematização do Meio como mecanismo científico
conceitual seria pertinente em caráter de aprofundamento desta pesquisa, aplicar novos critérios
de seleção tendo em vista a seguinte questão: Se em existindo a centralização do Meio em mais
de uma proposta, se configuraria a incomensurabilidade e se seria produzido o deslocamento
de Objeto-modelo?
Além disso, é preciso considerar que estudos recentes retomam as propostas teóricas
originais abrangidas por esta investigação de modo que há inúmeras possibilidades como, por
exemplo: a questão do Meio pode ter sido incorporada ao desenvolvimento recente e/ou
construções hipotéticas desvinculadas ao conceito podem ter viabilizado mudanças em objeto-
modelo e modelos teóricos.
O que também pareceu interessante nos resultados da análise em nível teórico-
epistemológico foi a identificação da resiliência de um mesmo objeto-modelo, apesar das
182
divergências relativas aos modelos teóricos. As alegações de superação de tal objeto-modelo
ignoram o fato de que ele é, frente aos resultados aqui expostos, o vetor de diálogo, certamente
não necessariamente consensual ou dogmático, das propostas teóricas.
Como os textos selecionados não compunham somente uma escola ou autor, não foi
possível verificar as possibilidades interpretativas que alguns modelos teóricos, especialmente
Lazarsfeld, Berelson e Gaudet (1948) e McLuhan (2005) teriam. Apesar disso, buscou-se
explicitar as possibilidades interpretativas, tanto quanto foi possível identificá-las a partir dos
fundamentos e justificações desta investigação.
Principalmente na Escola Americana e na Escola de Toronto, entende-se que há maior
possibilidade de articulação teórica não apenas pela resiliência do modelo lasswelliano, mas
pela proximidade das propostas teóricas e a interlocução direta.
No que tange a Escola de Frankfurt, não é possível, a partir dos resultados aqui
demonstrados, inferir sobre as possíveis amarrações. O que foi possível perceber é que,
enquanto estrutura teórica de análise conceitual de Meio, há apenas o uso extensionalista e
operacional que privilegia o entendimento do conceito principal: Indústria Cultural, bem como
é absorvido em uma categoria mais ampla: o Esclarecimento.
A propósito da Mediação/Recepção proposta por Martín-Barbero (1997), ignorando
aqui a volumosa pesquisa em âmbito nacional e outros teóricos proeminentes da vertente, a
maior preocupação é circunscrita pela possibilidade de que os argumentos indiquem
modificações ad hoc (LAKATOS, 1979).
No entanto, na compreensão aqui proposta essa verificação só seria possível
considerando mais amplamente tal perspectiva e, preferencialmente, em oposição à Escola de
Toronto.
Centralizando especificamente o Meio, considerando-se o que é possível depreender dos
textos analisados, tem-se que, a partir deles isoladamente, não há rigorosamente esforço
conceitual. Mas é possível apontar para as extensões já conhecidas como, por exemplo,
televisão, rádio, cinema.
Tal constatação pode ser utilizada para levantar questionamentos sobre posições que, a
partir única e exclusivamente dos textos aqui incluídos, se vejam autorizadas a escolher sobre
a preponderância ou não do Meio de Comunicação como demarcação do domínio científico.
A partir de McLuhan (2005) sugere-se que a interface com a Tecnologia, em uma
perspectiva também conceitual e não em caráter de extensão como nos textos recentes,
possivelmente é obrigatória para a viabilização, em especial, de critérios de aplicação e
admissibilidade do conceito.
183
Com isso não se pretende asseverar que não há nenhuma pesquisa em andamento que
seja relevante para a problemática desta pesquisa, mas se afirmando que se há, não é
significativa e está, frente a comunidade de pesquisadores em Comunicação, isolada.
Quantitativamente esse isolamento está demonstrado pelo número de textos que, em
período de sete anos de publicações, abarcam a questão na direção das condições de
cientificidade: cinco artigos.
Em tais textos foram identificados pontos de coincidência, sendo o primeiro e mais
importante a abordagem direta de “Meio”, observando-se manifestadamente aspectos
conceituais e a teorização da Comunicação. Dito de outra forma: tentando também refletir sobre
as consequências do que se entende por Meio para a compreensão do domínio da Comunicação
e de seu(s) Objeto(s) de pesquisa, apenas de pontos de indistinção entre esse último e objeto
empírico.
O segundo é a utilização de designadores específicos além de “Meio” e “Mídia”:
Medium e Media são termos frequentes nos textos, tanto do ponto de vista individual, quanto
vistos como conjunto. Também é comum a digressão à definição de caráter etimológico,
funcional e extensional para iniciar os argumentos de cunho teórico.
O último elemento coincidente é a articulação com os designadores “Mediação”,
“Mediatização” e “Midiatização” que estão vinculados a propostas não incluídas nas unidades
de pesquisa. Nesse sentido, seria adequado aplicar a eles análises próximas a deste estudo para
melhor avaliar fatores de concordância e discordância apontados por esses textos recentes.
Além do que foi mencionado, também se depreendeu que seria necessário discutir até
que ponto a interface entre Meio/Medium/Media com Tecnologia deveria ser considerada, no
sentido do Princípio da Interdisciplinaridade (BUNGE, 2012), a fim de se evitar a repetição dos
usos como recorte empírico, funcionais e extensionais que, até o presente momento, se mostram
improdutivos para o desenvolvimento científico do domínio da Comunicação em relação ao
obstáculo teórico circunscrito pelo Meio de Comunicação.
184
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
ADORNO, Theodor W. Sobre la lógica de las ciencias sociales. In: ______ et. al. La disputa
del positivismo en la Sociologia Alemana. Barcelona: Grijalbo, 1973, p. 121-138.
______. A indústria cultural. In: COHN, Gabriel (Org.). Comunicação e Indústria Cultural.
São Paulo: TA Queiroz, 1989, p. 287-295.
ADORNO, Theodor W.; HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento: fragmentos
filosóficos:1969.
ALBEDAH, Amani. A Gadamerian critique of Kuhn's linguistic turn: incommensurability
revisited. International Studies in the Philosophy of Science, v. 20, n. 3, out. 2006, p. 323-
345. Disponível em: <http://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/02698590600961000>.
Acesso em: 24 jun. 2015.
ARAÚJO, Carlos Alberto. A pesquisa norte-americana. In: HOHLFELDT, Antonio;
MARTINO, Luiz C.; FRANÇA, Vera Veiga (Orgs.).Teorias da comunicação: conceitos,
escolas e tendências. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007, p. 119-130.
BARICHELLO, Eugenia Mariano da Rocha; CARVALHO; Luciana Menezes. Mídias sociais
digitais a partir da ideia mcluhaniana de medium-ambiência. Matrizes, São Paulo, n. 1, p.
235-246, jan./jun. 2013.
BARONETT, Stan. Lógica: uma introdução voltada para as ciências. Porto Alegre:
Bookman, 2009.
BARRETO, Diego de Magalhães. TV digital interativa: uma nova forma de assistir à TV.
ECOM, Lorena, v. 2, n. 3, p. 16-23, jan/jun., 2011.
BERALDO, Beatriz. A máquina do tempo: a publicidade de lava-louças em cinco décadas de
permanências. Revista Brasileira de História da Mídia, v. 5, n. 2, p. 54-67, jul./dez. 2016.
BERGER, Christa. A pesquisa em comunicação na América Latina. In: HOHLFELDT,
Antonio; MARTINO, Luiz C.; FRANÇA, Vera Veiga (Orgs.).Teorias da comunicação:
conceitos, escolas e tendências. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007, p. 241-277.
BISPO, Carlos Alberto Ferreira; CASTANHEIRA, Luiz Batista; SOUZA FILHO, Oswaldo
Melo. Introdução à lógica matemática. São Paulo: Cengage Learning, 2014.
BLACKBURN, Simon. Dicionário Oxford de filosofia. Rio de Janeiro: Zahar, 1997.
BRAGA, José Luiz. Constituição do campo da comunicação. Verso e Reverso, Unisinos, São
Leopoldo, v. 25, p. 62-77, 2011.
185
BRYANT, Jennings; MIRON, Dorina. Theory and research in mass communication. Journal
of Communication, v. 54, dez. 2004, p. 662-704.
BUNGE, Mario. Epistemologia: curso de atualização. São Paulo: TA Queiroz, 1980.
______. Dicionário de filosofia. São Paulo: Perspectiva, 2012.
______. Teoria e realidade. São Paulo: Perspectiva, 2013.
CARNIELLI, Walter A.; EPSTEIN, Richard L. Pensamento crítico: o poder da lógica e da
argumentação. 3. ed. São Paulo: Rideel, 2011.
CASTRO, Susana. Ontologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.
CARVALHO, Luciana Menezes; RUBLESCKI, Anelise; BARICHELLO, Eugenia Maria
Mariano da Rocha. Associações sociotécnicas entre organizações jornalísticas e mídias sociais
digitais. Comunica & Sociedade, São Bernardo do Campo, v. 37, n. 2, p. 109-129, 2015.
CARVALHO, Rafiza Luziani Varão Ribeiro. Harold Lasswell e o Campo da
Comunicação. 2012. 244 f. Tese (Doutorado em Comunicação) - Universidade de Brasília,
Brasília.
CESÁRIO, Lia Bahia. As singularidades do espaço audiovisual brasileiro nos anos 2000:
Reflexões sobre convergência, cinema e televisão. Ciberlegenda, n. 27, p. 84-93, 2012.
CRAIG, Robert T. Communication Theory as a Field. Communication Theory, v. 9, n. 2, p.
119–161, 1999.
FELINTO, Erick. Meio, mediação, agência: a descoberta dos objetos em Walter Benjamin e
Bruno Latour. E-compós, Brasília, v.16, n.1, p. 1-15, jan./abr. 2013.
FLORIDI, Luciano. Information: a very short introduction. New York: Oxford University
Press, 2010.
HOHLFELDT, Antonio. As origens antigas: a comunicação e as civilizações. In: ______;
MARTINO, Luiz C.; FRANÇA, Vera Veiga (Orgs.).Teorias da comunicação: conceitos,
escolas e tendências. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007, p. 61-98.
JAPIASSÚ, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário básico de Filosofia. 3. ed. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 2001.
KATZ, Elihu; LAZARSFELD, Paul F. Personal influence: the part played by people in the
flow of mass communications. New York: Free Press Paperback, 1965.
KUHN, Thomas Samuel. Respondendo a meus críticos. In: LAKATOS, Imre; MUSGRAVE,
Alan (Org.). A Crítica e o desenvolvimento do conhecimento. São Paulo: Cultrix/Edusp,
1979, p. 285-343.
______. A estrutura das revoluções científicas. 6. ed. São Paulo: Perspectivas, 2001.
186
LAKATOS, Imre. O Falseamento e a Metodologia dos Programas de Pesquisa Científica. In:
______; MUSGRAVE, Alan (Org.). A Crítica e o desenvolvimento do conhecimento. São
Paulo: Cultrix/Edusp, 1979, p. 109-243.
LASSWELL, Harold. A estrutura e a função da comunicação na sociedade. In: COHN,
Gabriel (Org.). Comunicação e Indústria Cultural. São Paulo: TA Queiroz, 1989, p.105-
117 .
LATOUR, Bruno. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora.
São Paulo: UNESP, 2000.
LAZARSFELD, Paul; BERELSON, Bernard; GAUDET, Hazel. The People's Choice: how
the voter makes up his mind in a presidencial campaign. 2. ed. New York: Columbia
University Press, 1948.
LOPES, Maria Immacola Vassallo. Pesquisa em comunicação. 8. ed. São Paulo: Loyola,
2005.
MACHADO, Irene. O ponto de vista semiótico. In: HOHLFELDT, Antonio; MARTINO,
Luiz C.; FRANÇA, Vera Veiga (Orgs.).Teorias da comunicação: conceitos, escolas e
tendências. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007, p. 279-309.
MACHADO, Irene; ROMANINI, Vinicius. Semiótica da comunicação: da semiose da
natureza à cultura. Famecos, Porto Alegre, v. 17, n. 2, p. 89 – 97, mai./ago. 2010.
MALLMAN, Andréia Denise. Mídia fluida: por uma renovação conceitual. Sessões do
imaginário, Porto Alegre, v. 15, n. 24, p. 18-27, 2010.
MARCONDES FILHO, Ciro J. R. Duas doenças infantis da comunicação: a insuficiência
ontológica e submissão política. Uma discussão com José Luiz Braga. Matrizes, São Paulo,
Universidade de São Paulo, v. 5, p. 169-178, 2011.
______. A virada comunicacional. Ou porque os estudos de “midiatização”, de hábito e da
Teoria dos Media passam ao largo da comunicação. Famecos, Porto alegre, v. 22, n. 2, p.
134-145, abr./jun. 2015.
MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia.
Rio de Janeiro: UFRJ, 1997.
MARTINO, Luís Mauro Sá. A ilusão teórica no campo da comunicação. Famecos, v. 15, n.
36, ago. 2008, p. 111-117.
______. A disciplinarização da Epistemologia no ensino da(s)Teoria(s) da Comunicação.
Intexto, Porto Alegre, UFRGS, n. 29, p. 1-17, dez. 2013.
______. Trilhas da investigação epistemológica: o GT de Epistemologia da Comunicação da
Compós. XXIII Encontro Anual da Compós, Pará, p. 1-16, 27 a 30 de maio de 2014.
______. Entre mídia e comunicação: origens e modalidades de uma dicotomia nos estudos da
área. Comunicação, Mídia & Consumo, v. 13, n. 38, set./dez. 2016, p. 10-28.
187
MARTINO, Luiz Claudio. Interdisciplinaridade e o objeto de estudo da comunicação. In:
HOHLFELDT, Antonio; ______; FRANÇA, Vera Veiga (Orgs.).Teorias da comunicação:
conceitos, escolas e tendências. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007, p. 27-38.
MARTINO, Luiz Claudio. O campo da comunicação e suas teorias. In: KÜNSCH, Dimas A.;
BARROS, Laan Mendes (Orgs.). Comunicação: saber, arte ou ciência? São Paulo: Plêiade,
2008, p. 13-33.
MARTINO, Luiz Cláudio; BOAVENTURA, Katrine Tokarski. O Mito da
Interdisciplinaridade: história e institucionalização de uma ideologia. E-compós, Brasília,
v.16, n.1, p. 1-16, jan./abr. 2013.
MATTELART, Armand; MATTELART, Michèle. História das teorias da comunicação. 8.
ed. São Paulo: Loyola, 2005.
MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. 14 ed. São
Paulo: Cultrix, 2005.
MERSCH, Dieter. Tertium datur: introdução a uma teoria negativa dos media. Matrizes, São
Paulo, n. 1, p. 207-222, jan./jun. 2013.
MORIN, Edgar. Ciência com consciência. 8. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.
______. Introdução ao pensamento complexo. Porto Alegre: Sulina, 2006.
PAVIANI, Jayme. Interdisciplinaridade: conceitos e distinções. 2. ed. Caxias do Sul:
EDUCS, 2008
OKASHA, Samir. Philosophy of Science: a very short introduction. New York: Oxford
University Press, 2002.
PAVIANI, Jayme. Interdisciplinaridade: conceitos e distinções. 2. ed. Caxias do Sul:
EDUCS, 2008.
PELLANDA, Eduardo Campos; NUNES, Ana Cecília B. O The Daily como uma mistura de
mídias e uma nova significação do meio jornal. Comunicação, mídia e consumo, v. 10, n 28,
p. 189-207, 2013.
PELUSO, Luis Alberto. A filosofia de Karl Popper: Epistemologia e racionalismo crítico.
Campinas: Papirus, 1995.
PEREIRA, Amanda Luiza S. Apontamentos sobre o imprescindível debate da tecnologia para
a comunicação social. In: LIMA JUNIOR, Walter Teixeira; MACHADO, Murilo Bansi
(Orgs.). Tecnologia, Comunicação e Ciência Cognitiva. São Paulo: Momento, 2014, p. 7-
26.
PEREIRA, Amanda Luiza S.; OLIVEIRA, André Rosa. Comunicação e Ciência: definição de
Meio como elemento para distinção do domínio. Brazilian Journal of Technology,
Communication, and Cognitive Science, São Paulo, v. 4, n. 2, p. 1-15, dez. 2016.
188
Disponível em
:<http://www.revista.tecccog.net/index.php/revista_tecccog/article/view/71/79>. Acesso em:
3 fev. 2017.
PEREIRA, Amanda Luiza S.; PAIVA, Daniel Costa. Lacuna teórica do Meio de
Comunicação: análise da relação termo-conceito-argumento em periódicos nacionais. XXXIX
Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, São Paulo, p. 1-12, 05 a 09 de
setembro de 2016. Disponível em:
<http://portalintercom.org.br/anais/nacional2016/resumos/R11-3060-1.pdf>. Acesso em: 6
out. 2016.
POPPER, Karl Raimund. La lógica de las ciências sociales. In: ADORNO, Theodor
Wiesengrund et. al. La disputa del positivismo en la Sociologia Alemana. Barcelona:
Grijalbo, 1973, p. 101-120.
______. A Ciência Normal e seu perigos. In: LAKATOS, Imre; MUSGRAVE, Alan (Org.). A
Crítica e o desenvolvimento do conhecimento. São Paulo: Cultrix/Edusp, 1979, p. 63-71.
______. A lógica da pesquisa científica. 2. ed. São Paulo: Cultrix, 2013.
PUNTEL, Lorenz B. Estrutura e ser: um quadro referencial teórico para uma filosofia
sistemática. São Leopoldo: UNISINOS, 2008.
RÜDIGER, Francisco. Introdução à teoria da comunicação: problemas, correntes e autores.
2. ed. São Paulo: Edicon, 2004.
______. A Escola de Frankfurt. In: HOHLFELDT, Antonio; MARTINO, Luiz C.; FRANÇA,
Vera Veiga (Orgs.).Teorias da comunicação: conceitos, escolas e tendências. 7. ed.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2007, p. 131-150.
______. Epistemologia “da” Comunicação: elementos para a crítica de uma fantasia
acadêmica. Famecos, Porto Alegre, v. 21, n. 2, p. 395-417, mai./ago. 2014.
SAGAN, Carl. O mundo assombrado pelos demônios: a ciência vista como uma vela no
escuro. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
SOKAL, Alan; BRICMONT, Jean. Imposturas intelectuais: o abuso da Ciência pelos
filósofos pós-modernos. 4. ed. Rio de Janeiro: Record, 2010.
TRINDADE, Luiz Valério de Paula; CAMPANARIO, Claudia Rosa Acevedo. Mapeamento
bibliográfico de pesquisas sobre o fenômeno de presença e representação social de indivíduos
afrodescendentes em meios de comunicação social no Brasil: 1965-2011. Alceu, v. 14,n. 27,
p. 48-65, jul./dez. 2013.
WATSON, John B. Clássico traduzido: a psicologia como o behaviorista a vê. Temas psicol.,
Ribeirão Preto , v. 16, n. 2, p. 289-301, 2008 . Disponível em:
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
389X2008000200011&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 29 abr. 2016.
189
WEITZ, Morris. Theories of concept: a history of the major philosophical tradition.
London/New York: Routledge, 1988.
WOLF, Mauro. Teorias das comunicações de massa. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes,
2008.