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Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias Departamento de Arquitectura, Urbanismo e Geografia
Memória, museologia e virtualidade: um estudo sobre o Museu da Pessoa
Rosali Maria Nunes Henriques
Dissertação apresentada na ULHT para a obtenção do grau de mestre em Museologia
Orientador: Prof. Doutor Mário Canova Magalhães Moutinho Co-orientadora: Profa. Mestre Judite Santos Primo
2004
Resumo Esta pesquisa incide sobre o uso da Internet pelos museus, a partir do estudo de caso do
Museu da Pessoa. O Museu da Pessoa é um museu virtual, criado em 1991, na cidade de São
Paulo que se expandiu, primeiramente para Portugal, em seguida para os Estados Unidos e
que se encontra em processo de implantação no Canadá. Baseado na premissa da
democratização da informação e de valorização da história de vida das pessoas, o trabalho do
Museu da Pessoa está centrado em três eixos: registo, preservação e divulgação de histórias de
vida. Seu trabalho está baseado em três conceitos que se entrelaçam: memória, museologia e
virtualidade. A memória é a base de seu acervo, é a fonte e documento do seu trabalho. A
museologia é seu campo de actuação e a virtualidade, a sua essência. Os museus virtuais e
sua configuração na óptica da museologia contemporânea, a memória enquanto instrumento
de mudança social e a museologia enquanto disciplina social são os elementos essenciais para
o entendimento da trajectória do Museu da Pessoa e o foco deste estudo.
Palavras-chaves: memória, Internet, museologia, museu virtual, cibermuseu. Abstract This research project assesses the use of Internet by museums, using the case study of the
Museum of the Person. The Museum of the Person is a virtual museum, founded in São Paulo
City, Brazil, in the year 1991. Since that time it has expanded, first into Portugal, then into the
United States and is now being introduced into Canada. Based on the premise of
democratization of information and of enhancing the value of people’s life stories, the work of
the Museum of the Person is centered on three main objectives: recording, preserving and
disseminating life stories. Its work is based on three closely intertwined concepts: memory,
museology and virtuality. Memory is the basis of its collection; it is the source and
documentary proof of its work. Museology is its field of activity and virtuality, its essence.
Virtual museums and their configuration from the standpoint of contemporary museology,
memory as a tool for social change, and museology as a social discipline are the essential
elements for understanding the course of the Museum of the Person’s history and the focus of
this study.
Keywords: memory, Internet, museology, virtual museum, cybermuseum
Dedicatória
Para Paulo, que com paciência e amor me ajudou a trilhar os caminhos lusitanos
Para meus pais, que me ensinaram a lutar pelos meus próprios sonhos
Agradecimentos
Aos meus orientadores, professores Mário Moutinho e Judite Primo, pela orientação paciente,
ajudando-me a entender os novos caminhos da museologia.
Aos directores do Museu da Pessoa, Karen Worcman e José Santos Matos, pelo incentivo à
continuidade dos meus estudos, prescindindo da minha colaboração no dia-a-dia do trabalho
do Museu da Pessoa durante minha estadia em Portugal. Mas principalmente à Karen, pela
leitura cuidadosa da dissertação e pelas modificações sugeridas.
Aos profissionais da museologia brasileira, Cristina Bruno, Maria Célia Santos, Vera Siqueira
e Mário Chagas pela disposição em colaborar com o meu trabalho, respondendo ao inquérito
sobre os museus virtuais. Mas principalmente ao professor Mário Chagas, pela leitura e
sugestões enviadas.
Ao Jorge Gustavo Rocha, pelas modificações sugeridas, principalmente sobre a museologia
no espaço virtual.
À Joana Monteiro, ao José Cláudio Oliveira e ao Marcelo Sabbatini, pela troca de
experiências e inquietações na área da museologia virtual.
Às colegas de Museu da Pessoa, Cláudia Leonor e Zilda Kessel, pelas referências e dicas
sobre memória e Sheila Garcia Milanez, Immaculada Lopez, Carla Nieto Vidal, Sônia London
e Carolina Misorelli, pela ajuda na pesquisa sobre o Museu da Pessoa.
Aos colaboradores dos núcleos português, canadiano e americano do Museu da Pessoa,
Susana Correia, Marc-André Delorme e Phil Stafford, pelas informações enviadas sobre o
trabalho efectuado pelos núcleos.
À minha irmã Rosália Maria Nunes Henriques Huaira, pelo apoio na elaboração do inquérito
e na análise dos dados da pesquisa sobre o público do Museu da Pessoa.
Sumário Índice das figuras, tabelas e gráficos ......................................................................................2 Introdução .................................................................................................................................4
1. Objectivos e justificativa ....................................................................................................5 2. Metodologia........................................................................................................................6
I. Memória, museologia e virtualidade ...................................................................................9
I.1. Memória social...............................................................................................................12
I.1.1. Sobre o conceito de memória ..................................................................................12 I.1.2. Entre memória e história .........................................................................................14 I.1.3. Memória colectiva e memória social ......................................................................16 I.1.4. Memória, esquecimento e identidade social ...........................................................17 I.1.5. Memória e oralidade ...............................................................................................19 I.1.6. Considerações finais................................................................................................23
I.2. Museologia, museus e património..................................................................................24
I.2.1. Museus: memória e poder .......................................................................................24 I.2.2. Museologia e património.........................................................................................27 I.2.3. Uma nova museologia: um novo museu .................................................................32 I.2.4. Acção cultural dos museus......................................................................................37 I.2.5. Considerações finais................................................................................................41
I.3. O mundo da Internet.......................................................................................................43
I.3.1. Configuração da Internet.........................................................................................43 I.3.2. Origens da Internet ..................................................................................................45 I.3.3. Uma revolução silenciosa .......................................................................................48 I.3.4. A revolução do hipertexto .......................................................................................51 I.3.5. Espacialidade e temporalidade na Internet: o ciberespaço......................................53 I.3.6. Considerações finais................................................................................................55
I.4. A museologia no virtual .................................................................................................56
I.4.1. O virtual e o digital .................................................................................................56 I.4.2. Os museus e a Internet ............................................................................................58 I.4.3. Tipos de sites de museus .........................................................................................61 I.4.4. Em torno do conceito do museu virtual ..................................................................64 I.4.5. As acções museológicas nos museus virtuais .........................................................71 I.4.6. Considerações finais................................................................................................74
II. Museu da Pessoa: um museu virtual ...............................................................................76
II. 1. As especificidades do Museu da Pessoa ......................................................................77
II.1.1. Um museu de pessoas ............................................................................................77 II.1.2. Conceitos norteadores............................................................................................78 II.1.3. Missão e Visão.......................................................................................................80 II.1.4. Configuração do trabalho.......................................................................................81 II.1.5. O impacto social ....................................................................................................83 II.1.6. A virtualidade.........................................................................................................87 II.1.7. Considerações finais ..............................................................................................89
II.2. Histórico........................................................................................................................90
II.2.1. Primórdios (1991) ..................................................................................................90 II.2.2. Consolidação (1992 - 1996)...................................................................................93 II.2.3. Crescimento (1997 - 1999) ....................................................................................95 II.2.4. Expansão (2000 - 2002) .........................................................................................96 II.2.5. Rede (2003 - actual)...............................................................................................98 II.2.6. Considerações finais ..............................................................................................99
II.3. Análise do site.............................................................................................................100
II.3.1. Primeira versão (1996).........................................................................................100 II.3.2. Segunda versão (1997 - 2000) .............................................................................103 II.3.3. Terceira versão (2001- 2002)...............................................................................106 II.3.4. Quarta versão – Portal Museu da Pessoa.net (2003 - actual)...............................108 II.3.5. Considerações finais ............................................................................................111
II.4. O público do Museu da Pessoa ...................................................................................113
II.4.1. Caracterização dos utilizadores............................................................................113 II.4.2. Uso da Internet.....................................................................................................119 II.4.3. A relação dos utilizadores com o Museu da Pessoa ............................................122 II.4.4. Considerações finais ............................................................................................137
II.5. Análise das acções museológicas................................................................................138
II.5.1. Pesquisa ...............................................................................................................138 II.5.2. Preservação ..........................................................................................................139 II.5.3. Comunicação .......................................................................................................142 II.5.4. Considerações finais ............................................................................................145
Conclusões .............................................................................................................................146 Índices remissivos .................................................................................................................150 Bibliografia citada ................................................................................................................154 Bibliografia de referência ....................................................................................................168 Anexos....................................................................................................................................176
2
Índice das figuras, tabelas e gráficos Figuras Figura 1 – Página de entrada da exposição virtual ‘Musées et Millénaire’..............................61 Figura 2– Site do Museu Nacional de Arqueologia .................................................................63 Figura 3 – Página de entrada do museu virtual Sagres.............................................................64 Figura 4 - Página de entrada para o site do Projeto Portinari..................................................69 Figura 5 - Recepção do MUVA................................................................................................70 Figura 6 - Página principal da primeira versão do site do Museu da Pessoa .........................101 Figura 7– Segunda parte da página principal do Museu da Pessoa (primeira versão) ...........102 Figura 8 - Página principal da segunda versão do site do Museu da Pessoa..........................104 Figura 9 - Página principal da terceira versão do site do Museu da Pessoa ...........................107 Figura 10 - Página principal do Portal Museu da Pessoa.net .................................................110 Figura 11– Página de entrada da exposição virtual ‘Um balcão na Capital’..........................143 Figura 12- Entrada para a exposição virtual ‘Almanak da Idade do Pensar’ .........................144
Tabelas Tabela 1 - Definições de museu virtual ....................................................................................65 Tabela 2 - Uso da Internet pelos museus..................................................................................71
Gráficos Gráfico 1 – Gráfico sobre a consulta a sites governamentais...................................................47 Gráfico 2 – Utilizadores do Portal por sexo ...........................................................................114 Gráfico 3 – Faixa etária dos utilizadores do Portal ................................................................114 Gráfico 4 – Ocupação principal dos utilizadores do Portal ....................................................115 Gráfico 5 – Habilitações literárias dos utilizadores do Portal ................................................116 Gráfico 6 – Profissões dos utilizadores do Portal...................................................................117 Gráfico 7 – Utilizadores por unidade da Federação (estados)................................................118 Gráfico 8 – Utilizadores do Portal, por cidades onde moram ................................................118 Gráfico 9 - Conexão à Internet ...............................................................................................119 Gráfico 10 – Tempo de uso da Internet ..................................................................................120 Gráfico 11 – Frequência de uso da Internet............................................................................120 Gráfico 12 - Tipos de sites e portais mais consultados...........................................................121 Gráfico 13 – Finalidade de uso da Internet.............................................................................122 Gráfico 14 – Como conheceu o trabalho do Museu da Pessoa ..............................................123 Gráfico 15 – Conhecimento da Missão do Museu da Pessoa.................................................124 Gráfico 16 – Identificação com a Missão do Museu da Pessoa .............................................124 Gráfico 17 – Período de primeiro contacto com o Museu da Pessoa .....................................125 Gráfico 18 – Regularidade da visita ao Portal........................................................................125 Gráfico 19 - O que atraiu a atenção para a visita....................................................................126 Gráfico 20 – Navegação no Portal..........................................................................................127 Gráfico 21 – Aprovação do layout .........................................................................................127 Gráfico 24 – Grau de satisfação em relação ao conteúdo do Portal .......................................129 Gráfico 25 – Sensações da visita ............................................................................................129 Gráfico 26 - O que atraiu a atenção na página principal ........................................................130 Gráfico 27 – Uso do acervo....................................................................................................131 Gráfico 28 – Para quê foi usado o acervo...............................................................................131 Gráfico 29 – Grau de satisfação com o material utilizado .....................................................132 Gráfico 30 – Grau de satisfação com o Portal ........................................................................132
3
Gráfico 31 - Sugestões para incrementar o Portal ..................................................................133 Gráfico 32 – Recomendação do Portal ...................................................................................133 Gráfico 33 – Possibilidade de retorno ao Portal .....................................................................134 Gráfico 34 – Envio de material ao Portal ...............................................................................134 Gráfico 35 – Que tipo de material foi enviado .......................................................................135 Gráfico 36 – Período de envio do material.............................................................................135 Gráfico 37 – Grau de satisfação com o material enviado.......................................................136
4
Introdução
“O ato de sonhar é um ato político, ético e estético. Não é possível sonhar sem boniteza, sem moralidade e sem opção política.”
Paulo Freire, em entrevista ao Museu da Pessoa, 1992
Este trabalho é fruto das inquietações que surgiram durante a minha trajectória no
Museu da Pessoa. O primeiro contacto que tive com o trabalho do Museu da Pessoa foi em
fins de 1993, quando vi uma matéria sobre suas actividades no programa ‘Vitrine’1, da TV
Cultura de São Paulo. O trabalho desenvolvido pelo Museu da Pessoa despertou minha
atenção, não só pela originalidade, mas também pelo seu carácter social. Naquela ocasião eu
fazia um curso de especialização em museologia pela Fundação Escola de Sociologia e
Política e as ideias defendidas pelo Museu da Pessoa soaram aos meus ouvidos como música.
As minhas inquietações em relação à museologia e o meu ideal em trabalhar com uma
museologia mais dinâmica e mais participativa ganharam eco no trabalho desenvolvido pelo
Museu da Pessoa. Essa convergência de interesses levou-me a entrar em contacto com a
equipa gestora do projecto e começou aí uma trajectória que se iniciou de forma mais
sistemática em 1994 e levou-me a fazer parte do grupo gestor do Museu da Pessoa em 1997.
Em 2002, por questões pessoais vim para Portugal. Surgiu então a oportunidade de cursar o
mestrado em Museologia Social da Universidade Lusófona. No momento da escolha do
objecto de estudo a ser desenvolvido para a tese não tive dúvidas, escolhi o Museu da Pessoa
como estudo de caso.
Estudar um museu virtual como o Museu da Pessoa tornou-se um grande desafio
pessoal, não somente por ser uma experiência inovadora na Internet, mas também pelo
carácter do trabalho desenvolvido. Além disso, através do estudo teórico sobre os museus
virtuais e um olhar mais apurado sobre a trajectória do Museu da Pessoa pude obter uma visão
mais ampla da museologia e possibilitou-me um novo olhar sobre o trabalho que temos
desenvolvido ao longo dos anos no Museu da Pessoa.
O meu primeiro contacto com a Internet foi em 1996, justamente quando o Museu da
Pessoa teve a sua primeira experiência na rede mundial de computadores. Na ocasião, ainda
não tínhamos a noção completa de como a Internet poderia ser tão útil ao nosso trabalho,
embora soubéssemos da importância desse veículo de comunicação para o desenvolvimento
do trabalho quotidiano do Museu da Pessoa. O desafio de ajudar a construir um site de um
1 - O programa Vitrine existe desde 1990 e inicialmente era um programa sobre os meios de comunicação de massa. Hoje continua com esta vertente mas trabalha principalmente com as novas médias e as novas tecnologias, principalmente a Internet. O programa é apresentado em directo aos sábados às 22 horas da noite pela TV Cultura (http://www.tvcultura.com.br/vitrine/).
5
museu, que já havia nascido com a ideia de ser virtual, foi sempre estimulante na medida em
que nos colocava num mundo completamente novo.
1. Objectivos e justificativa O Museu da Pessoa é um museu virtual criado na cidade de São Paulo, no Brasil, em
1991, por um grupo de historiadores e jornalistas. A ideia que deu origem ao Museu da
Pessoa e a sua própria trajectória ressaltam a importância das histórias pessoais para a
preservação da memória colectiva e social2. O foco do trabalho do Museu da Pessoa é o
registo, preservação e divulgação das histórias de vida das pessoas, e os seus objectivos
apontam para a socialização da memória através da Internet.
O desafio deste estudo é entender como a Internet foi fundamental para o
desenvolvimento do trabalho do Museu da Pessoa e como a Internet pode ajudar os museus a
tornarem-se mais próximos do seu público utilizador. Com este trabalho pretende-se
contribuir para o entendimento do conceito de museus virtuais, a partir do estudo de caso do
Museu da Pessoa. Por ser um museu com características tão peculiares, seu estudo torna-se
interessante, não somente por discutir a museologia no virtual, mas também para entender os
usos da memória em projectos de pesquisa. Além disso, as questões pertinentes ao trabalho
dos museus, discutidas e debatidas pelos museólogos tornam-se necessárias para o
entendimento de um museu com o perfil do Museu da Pessoa.
Para levar ao cabo este estudo foram traçados três objectivos principais. O primeiro
deles é analisar a bibliografia específica sobre os temas memória, museologia e
virtualidade. Não é intenção esgotar estes assuntos, mas lançar um olhar para a compreensão
da trajectória de um museu virtual com as características do Museu da Pessoa.
O segundo objectivo definido para este estudo é discutir o uso da Internet pelos
museus e a configuração dos museus virtuais, à luz dos autores que já trabalharam estes
temas. O conceito de museu virtual ainda não é um consenso entre os especialistas, pois só
recentemente passaram a ser alvo de estudo na museologia. Nesse sentido, as discussões
teóricas sobre o conceito de museu virtual e o uso da Internet pelos museus estão apenas
começando no âmbito da museologia. A discussão sobre o conceito de museu virtual poderia
ser efectuada apenas sobre o ponto de vista teórico, a partir de autores que já trabalharam o
tema. No entanto, uma opção que se mostrou mais eficaz foi utilizar um estudo de caso para
ilustrar os conceitos discutidos ao longo do trabalho, tornando, assim, o estudo mais
abrangente, uma vez que é preciso confrontar a teoria e a prática. Por isso, o terceiro objectivo
2 - Entende-se por memória colectiva o conjunto de narrativas individuais, que agrupadas formam um painel multifacetado de um determinado grupo social.
6
desse estudo é analisar a trajectória do Museu da Pessoa, à luz das discussões teóricas
realizadas na primeira parte desse trabalho, e entender o processo de criação e a
configuração de um museu virtual.
A escolha deste tema para a dissertação de mestrado levou em conta dois factores: a
ausência de estudos anteriores sobre o Museu da Pessoa e a necessidade de aprofundar
algumas questões no âmbito da museologia no espaço virtual. O primeiro dos factores aponta
para um estudo sobre a experiência do Museu da Pessoa. Com uma trajectória de mais de 10
anos de actividades, no Brasil, o Museu da Pessoa não foi, ainda, objecto de estudo de uma
forma mais aprofundada3. Nesse sentido, o Museu da Pessoa é uma experiência de museu
virtual que merece uma reflexão sobre as suas actividades e sua trajectória.
O segundo factor de escolha do tema deve-se ao interesse em discutir o uso da Internet
pelos museus. A Internet é uma ferramenta de comunicação que surgiu, de forma mais
abrangente, na década de 90, do século XX e o seu uso pelos museus proliferou-se a partir de
1994. Por se tratar de uma nova ferramenta de comunicação, a Internet ainda configura uma
experiência nova para a museologia, assim como para outras áreas de conhecimento.
2. Metodologia Organização do trabalho
O trabalho, desenvolvido durante um ano de pesquisa, foi organizado em dois grandes
blocos de informação: na primeira parte será apresentada a dinâmica das discussões teóricas
ligadas aos três eixos do trabalho: memória, museologia e virtualidade. Na segunda parte será
estudado o caso específico de um museu virtual: o Museu da Pessoa. Essas duas partes foram
divididas em capítulos e sub-captítulos para facilitar a leitura. Por fim, apresenta-se a
bibliografia referenciada nos capítulos, a bibliografia consultada mas não referenciada, os
índices remissivos e os anexos.
Na primeira parte desse estudo foram delineados três grandes temas de discussão
teórica, divididos em quatro capítulos. Quando foi decidido estudar o caso do Museu da
Pessoa nesta dissertação de Mestrado definiu-se o escopo do trabalho com base em três
conceitos norteadores: memória, museologia e virtualidade. O primeiro eixo da pesquisa é a
memória, pois o trabalho do Museu da Pessoa está centrado no registo, preservação e
divulgação das histórias de vida. Assim, no primeiro capítulo verifica-se como determinados
3 - Recentemente uma das formadoras do Museu da Pessoa, Zilda Kessel, defendeu uma dissertação de mestrado sobre um dos projectos desenvolvidos pelo Museu da Pessoa, no Mestrado em Ciência da Informação, na Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. No entanto, o objecto de análise da dissertação foi somente o uso da memória na aprendizagem escolar, através do projecto Memória Local, e não teve como objectivo estudar o Museu da Pessoa.
7
autores trabalharam o conceito de memória, diferenciando-a da história, entende-se os
conceitos de memória colectiva e memória social e discute-se também o uso da história oral
como ferramenta de trabalho para os historiadores e museólogos.
Como o Museu da Pessoa é um museu virtual, com uma trajectória voltada para a
valorização do património, o seu estudo de caso deve ser analisado sob a óptica da
museologia. Por isso, no segundo capítulo serão trabalhadas questões ligadas à museologia
contemporânea: museologia e memória, nova museologia e novos enfoques da acção cultural
nos museus. Entendeu-se que a museologia é o suporte das discussões que serão foco na
segunda parte desse estudo.
E por fim, a virtualidade. Embora possua actividades fora do seu espaço virtual, o
Museu da Pessoa é essencialmente um museu cujo veículo de comunicação, interacção e
exposição é a Internet. A virtualidade, em sua essência, não surgiu com a Internet, mas é
através da Internet que tem a sua face mais visível. Por isso, no terceiro capítulo serão
trabalhadas as questões da origem da Internet e sua configuração. Este entendimento é
importante para que, no quarto capítulo, possa ser discutido o uso da Internet pelos museus e
o conceito de museu virtual e suas implicações na museologia. Faz-se necessário entender
como este veículo surgiu e como revolucionou os conceitos de espaço e tempo, assim como a
sua utilização tornou-se um desafio para os museus.
Como o Museu da Pessoa foi concebido e como desenvolve o seu trabalho é o foco da
segunda parte do estudo. No primeiro capítulo estudou-se as especificidades do Museu da
Pessoa, para em seguida, apresentar o histórico do trabalho desenvolvido. A análise do Portal
Museu da Pessoa.net, bem como a evolução dos sites do Museu da Pessoa é o assunto do
terceiro capítulo. Em seguida, foi feito um estudo sobre o público do Museu da Pessoa,
baseado em inquérito realizado junto aos utilizadores do Portal. Por último, analisa-se as
acções museológicas desenvolvidas pelo Museu da Pessoa em sua vertente física e virtual.
Não é o objectivo desse estudo esgotar o assunto, visto tratar-se de nova dinâmica de enfoque
na museologia, mas tentar entender o desenvolvimento de um projecto com estas
especificidades e qual o seu contributo para a museologia.
Fontes consultadas Para a primeira parte da dissertação, efectuou-se pesquisa bibliográfica nas bibliotecas
da Universidade de São Paulo e em bibliotecas públicas e universitárias de Lisboa e de Braga.
A ideia era buscar autores que trabalhassem cada eixo temático de forma mais abrangente.
Boa parte da bibliografia encontra-se em língua portuguesa, seja de autores portugueses e
8
brasileiros ou obras de autores estrangeiros, algumas publicadas em outras línguas, e outras
traduzidas no Brasil e em Portugal. Como em qualquer trabalho académico, torna-se muito
difícil abranger todos os autores que trabalham com os temas, por isso, optou-se por trabalhar
com os autores considerados clássicos nos estudos da memória, museologia e virtualidade.
A pesquisa sobre o Museu da Pessoa foi efectuada com base em nossa própria
experiência pessoal, em duas entrevistas com a fundadora do Museu da Pessoa, textos sobre o
Museu da Pessoa, na sua maioria disponíveis na Internet; além de material fotográfico, artigos
de jornal, matérias de televisão e rádio e também nos documentos oficiais de criação do
Museu da Pessoa e do Instituto Museu da Pessoa.net.
Normas e procedimentos Optou-se por desenvolver a redacção final na ortografia portuguesa, respeitando a língua
original dos autores ao fazer citações ipsis verbis. Assim sendo, nas citações de autores
brasileiros ou de livros traduzidos e publicados no Brasil é mantida a ortografia brasileira.
Além disso, por este mesmo critério, as citações em língua estrangeira encontram-se no corpo
do texto, na língua original. Para maior entendimento e facilitar a leitura, foram feitas
traduções livres dos trechos em língua estrangeira, inserindo-as nas notas de rodapé.
Nas citações dos autores optou-se por utilizar o sistema de autor/ano e nas notas de
rodapé foram disponibilizadas as informações complementares, traduções dos trechos em
outras línguas e comentários paralelos ao texto principal. As citações dos autores e as
indicações bibliográficas estão em conformidade com as normas portuguesas, elaboradas pelo
Instituto Português da Qualidade4.
Inquérito ao público do Museu da Pessoa Para realizar a pesquisa sobre o público do Museu da Pessoa optou-se por trabalhar com
a pesquisa quantitativa, utilizando para isso de um questionário (anexo II) para obter as
informações necessárias. O inquérito foi aplicado nos meses de Março, Abril e Maio de 2004.
A metodologia de abordagem aos utilizadores foi feita em duas formas: colocação de um link
para o questionário na página principal do Portal Museu da Pessoa.net e envio de e-mails
convidando os utilizadores registados no Portal a participarem do inquérito. A amostragem do
inquérito tem um universo de 102 pessoas, correspondendo a 11% do total de pessoas
inscritas no Portal Museu da Pessoa.net.
4 - ISO - NP 405-1 de 1994, publicada na edição de Janeiro de 1995. Instituto Português da Qualidade. No entanto, optamos por não apresentar nas indicações bibliográficas os códigos da ISBN e ISSN por muitos livros estrangeiros não terem estes códigos em suas fichas catalográficas.
9
I. Memória, museologia e virtualidade
“ [o museu] um lugar de tudo; é um lugar para colorir o pensamento”. Diodato Aiambo, índio ticuna,
citado por José R. Bessa Freire (2003) A descoberta do museu pelos índios. p. 251
A memória está intrinsecamente ligada à museologia, não somente pela origem
etimológica da palavra, onde Mnemosine, a deusa da memória é a mãe de todas as musas, que
habitavam no mouseión (museu), mas também porque os museus são instituições da memória.
A memória está na génese dos museus, por isso não podemos dissociar os museus da memória
colectiva.
A acção do Museu da Pessoa está baseada na preservação da memória dos grupos
sociais. Nesse sentido, faz-se necessário discutir os conceitos de memória social e colectiva na
dinâmica do processo museólogico. Nossa memória é o conjunto das lembranças que
queremos preservar para a posterioridade. Mas é também a forma como vemos o mundo, pois
também funciona como um ferramenta para a melhoria da auto-estima de grupos sociais.
Nesse sentido, a memória não diz respeito somente ao passado, mas também ao presente, pois
“Exilar a memória no passado e deixar de entendê-la como força viva do presente. Sem
memória, não há presente humano, nem tampouco futuro. Em outras palavras: a memória
gira em torno de um dado básico do fenômeno humano, a mudança.” (MENEZES, 1987:
184).
As discussões sobre memória, desenvolvidas durante a pesquisa estão baseadas nos
conceitos de memória colectiva e memória social, preconizados por Maurice Halbwachs e
trabalhados por Michael Pollak e Gérard Namer. Além disso, serão discutidos autores que
trabalharam a distinção entre memória e história, tais como Pierre Nora e Jacques Le Goff5; e
autores que discutiram a preservação das narrativas orais, como Walter Benjamin e Paul
Thompson.
Por ser um museu virtual, o Museu da Pessoa tem características próprias, mas não
deixa de ser um museu. Por isso, para entender a dinâmica do seu trabalho é preciso estudá-lo
sob a óptica da museologia. O museu também tem sofrido ao longo de sua existência
mudanças no seu papel. De uma instituição com um papel meramente preservacionista na sua
génese, o museu tem adquirido novas facetas e mudado a forma como o património é
trabalhado através de suas acções. No entanto, não é objectivo deste estudo discutir a relação 5 - Nesse sentido, basearemos a discussão sobre a memória a partir do enunciado de Jacques Le Goff (1984: 46) que define a memória como “um elemento essencial que se costuma chamar identidade, individual e colectiva, cuja busca é uma das actividades fundamentais dos indivíduos e das sociedades de hoje, na febre e na angústia”.
10
entre os museus e a museologia, mas lançar alguns pressupostos para o entendimento do
trabalho desenvolvido pelo Museu da Pessoa. Para isso, durante este trabalho, será utilizada a
concepção de museu defendida por Marc Alain Maure, onde:
“Un musée est un moyen, un instrument dont une societé donnée dispose pour trover,
concretiser, marquer, signaliser son identité, c’est-à-dire son territoire et ses frontiers
dans le temps et dans l’espace, par rapport à d’autres societés et groupes socio-
culturels”6 (MAURE, 1994: 86)
A museologia também sofreu e ainda sofre mudanças constantes na forma como é
entendida e trabalhada pelos museólogos ao longo da história. Por isso, durante este estudo
será utilizada a definição traçada por Anna Gregorová7 e trabalhada por Waldisa Rússio8 que
define a museologia como o estudo da relação das pessoas com a sua realidade. Além disso,
iremos trabalhar com a sintetização de Cristina Bruno que propõe a museologia como uma
área de conhecimento9.
O terceiro aspecto do Museu da Pessoa é a sua virtualidade. Actualmente quando
dizemos que determinada coisa é virtual, podemos ser levados a pensar em algo ligado à
Internet. No entanto, o conceito de virtualidade não nasceu com a Internet, ele já existia nos
postulados Aristotélicos de potência, pois a origem etimológica da palavra virtual está ligada
à potência. É uma palavra de origem latina virtualis, que deriva da palavra latina virtus, que
significa força e potência. Por isso, quando trabalhamos com o conceito de virtualidade, é
preciso distingui-lo da Internet. O virtual é o que pode vir a ser mas que não existe
necessariamente fisicamente. Ao passo que a Internet é uma das ferramentas para o que existe
de forma virtual possa ter uma forma física, mesmo que só acessível remotamente10. Este
6 - Tradução livre: “O museu é meio e um instrumento que uma determinada sociedade dispõe para concretizar, marcar, sinalizar sua identidade, seu território e suas fronteiras no tempo e no espaço e o seu relacionamento com outras sociedades e grupos sócio-culturais” 7 - Segundo Anna Gregorová, “La muséologie est une science qui examine le rapport spécifique de l´homme avec la realité, et consiste dans la collection et la conservation consciente et systématique et dans l´utilisation scientifique, culturelle et educative d´objets inanimés, matériels, mobiles (surtout tridimensionnels) qui documentent le développement de la nature de la societé”. In: Desvallees, André (1989). Le Défi muséologique.p. 359. Tradução livre: “A museologia é uma ciência que examina a relação específica do Homem com a realidade, e consiste na colecção e conservação consciente e sistemática e na utilização científica, cultural e educativa dos objectos inanimados, materiais, móveis (sobretudo tridimensionais) que documentam o desenvolvimento da natureza da sociedade.” 8 - Segundo Waldisa Rússio, “O fato museológico é a relação profunda entre o Homem, sujeito que conhece, e o Objeto, parte da Realidade à qual o Homem também pertence e sobre a qual tem o poder de agir, relação que se processa em um cenário institucionalizado, o museu”. Rússio, Waldisa. Conceito de cultura e sua inter-relação com o patrimônio cultural e a preservação. 1991. p. 1 9 - Segundo Cristina Bruno a museologia é uma área de conhecimento, “(…) para equacionar os aspectos técnicos, teóricos e metodológicos, relativos à constituição, implementação e avaliação dos processos que as sociedades estabelecem para a seleção, tratamento e extroversão dos indicadores da memória”. Bruno, Cristina. A museologia como uma pedagogia para o patrimônio. s.d., p. 2. 10 - E aqui por físico entende-se não somente o que pode ser palpável mas aquilo que existe de forma física, ou seja, um site de Internet, embora seja virtual não deixa de ter componentes físicos de interacção tais como softwares, servidores de conexão, computadores, etc..
11
estudo está baseado no conceito de virtualidade defendido por Pierre Lévy, Philippe Quéau e
Bernard Deloche. Em relação à discussão sobre o conceito de museu virtual, este trabalho
baseia-se nos estudos sobre os museus virtuais efectuado por Bernard Deloche, em sua obra
‘Le musée virtuel’, publicada em 2001.
A ideia básica desta primeira parte deste estudo é, portanto, trabalhar estes temas e
autores, e o seu relacionamento, para que se possa lançar uma luz para o entendimento da
trajectória do Museu da Pessoa.
12
I.1. Memória social
“Nossa memória é um elemento básico para o estabelecimento de nossa identidade. É nossa história de vida que nos dá a possibilidade de nos reconhecer como indivíduos a cada dia”
Karen Worcman (2001) A história na empresa p.11.
A palavra memória vem do latim memoria e significa a faculdade de reter, a capacidade
de lembrar. No entanto, a memória pode ter uma série de significados em várias áreas do
conhecimento: história, psicologia, informática, arquitectura, etc. Neste estudo interessa-nos
debruçar sobre a memória sob o ponto de vista social, ou seja, a memória enquanto
património de uma comunidade.
O objectivo deste capítulo é introduzir as questões da memória social. Para isso, será
feito um estudo sobre a evolução do conceito da memória e suas implicações. A seguir,
iremos distinguir a memória da história. Isto é importante, na medida em que, um museu que
trabalha com a memória social trabalha também com a história. É preciso, também, distinguir
a memória social da memória colectiva, além de estudar quais seriam os mecanismos da
memória para o reforço da identidade social. Por último, será estudada a relação entre a
memória e as narrativas orais. Entender como as histórias são narradas é importante para a
compreensão dos usos sociais da memória. Não é objectivo desse estudo esmiuçar a
metodologia de história oral, mas entender o processo de recolha dos depoimentos orais,
principalmente nos processos museológicos.
I.1.1. Sobre o conceito de memória O conceito de memória tem se modificado ao longo dos tempos. Na mitologia grega, a
memória era representada por uma deusa, Mnemosine, filha de Urano (Céu) e Gaia (Terra)
que, unida a Zeus gerou as nove musas, divindades responsáveis pela inspiração poética. Para
os gregos a memória era a ‘mãe’ da poesia mas também a musa da épica. Os gregos
acreditavam que a memória e a imaginação vinham da mesma origem. A memória seria um
dom a ser exercitado e, para isso, utilizavam técnicas para relembrar e para guardar o que lhes
interessava.
Para Henri Bergson (1999) há dois tipos de memória: a memória hábito, aprendizado
obtido à custa da repetição e necessário para a vida em sociedade, e a memória pura, feita de
lembranças de carácter não-mecânico. Para ele, o passado permanece inteiramente dentro da
nossa memória. Em seus estudos, Bergson faz uma abordagem psicológica da memória. Em
contraponto a esta posição, Maurice Halbwachs (1990) defende uma memória colectiva e
social. Baseado nos estudos de Durkheim sobre os factos sociais, Halbwachs debruça-se sobre
13
os aspectos sociais da memória. Em sua obra ‘Les Cadres sociaux de la mémoire’ e
posteriormente em ‘Mémoire collective’, Halbwachs defende que a memória reforça a coesão
social do grupo. Os postulados defendidos por Halbwachs serão retomados na terceira parte
deste capítulo, onde serão discutidos os conceitos de memória social e memória colectiva.
Paul Connerton (1993) retoma o conceito de Bergson, mas distinguindo três tipos de
memória: a pessoal, a cognitiva e memória-hábito (aprendizado). A memória pessoal é
aquela em que fazemos descrições de nós próprios com base na nossa própria experiência, a
memória cognitiva é aquela que diz respeito ao que ouvimos falar, uma vivência de outros e
por fim, a memória-hábito que é o aprendizado e a capacidade de reproduzirmos
determinada acção que aprendemos. Também baseando-se no conceito de Bergson sobre
memória hábito, Gilles Deleuze (2000: 155) afirma que o fundamento do tempo é a memória,
pois “(...) a Memória é a síntese fundamental do tempo que constitui o ser do passado (o que
faz passar o presente).” Nesse sentido, a memória é sempre uma síntese activa derivada dos
acontecimentos.
Em complemento ao trabalho de Halbwachs, Michael Pollak (1989) afirma que os
elementos constitutivos da memória são: os acontecimentos vividos ou sabidos, as
personagens (as pessoas) e os lugares. Os lugares da memória são os monumentos, paisagens,
datas, etc., isto é, lugares ligados a uma lembrança. O conceito de lugar da memória foi
definido por Pierre Nora em sua obra ‘Lieux de la mémoire’. Para Nora (1984), os museus,
institutos históricos, casas de cultura, monumentos, entre outros são lugares de memória, pois
permitem criar laços de identificação com as pessoas. Nesse mesmo sentido, os lugares da
memória, acrescenta Pollak (1992: 202) seriam “(…) lugares particularmente ligados a uma
lembrança, que pode ser uma lembrança pessoal, mas também pode não ter apoio no tempo
cronológico”. Os lugares da memória, tal como defendido por Pierre Nora, nos transportam
para as memórias de outros tempos, de outros acontecimentos. Nesse sentido, os museus são
lugares de memória porque preservam a memória contida nas referências patrimoniais,
musealizadas por um determinado grupo social.
As mudanças no conceito de memória foram fundamentais para a evolução das ciências
humanas, que no século XX começou a delinear seus contornos de forma clara, mas também
permitiu criar distinções entre o que é memória e o que é história, conceitos interligados nos
primeiros tempos da humanidade.
14
I.1.2. Entre memória e história Quando se discute o conceito de memória social, é preciso distingui-lo da história.
Alguns autores trabalham esta distinção de forma clara. Entre eles destacamos Pierre Nora,
Jacques Le Goff e Maurice Halbwachs. Pierre Nora (1984) distingue o relato histórico, os
discursos da memória e as recordações. A história é uma produção racional dos
acontecimentos do passado. Já a memória é sempre uma construção do passado, baseada nas
experiências vividas e sempre a partir do presente. Portanto, a memória é permeada pela
subjectividade, pois está enriquecida com as emoções de quem a conta. Para ele, memória e
história não são sinónimos mas quase opostos, pois:
“(...)l´histoire, [est] une représentation du passé. (...) La mémoire s´enracine dans le
concret, dans l´espace, le geste, l´image et l´objet. L´histoire ne s´attache qu´aux
continuités temporelles, aux évolutions et aux rapports des choses. La mémoire est
absolu et l´histoire ne connaît que le relatif11. ” (NORA, 1984: XIX)
Já Jacques Le Goff trabalha o conceito defendido por Paul Veyne (1983: 14) de que a
história “(…) é narrativa de acontecimentos: tudo o resto daí decorre”, ou seja, a história é
sempre uma narração. E complementando o raciocínio de Veyne, Le Goff (2000) afirma que a
história pode ter três sentidos: o primeiro deles seria a pesquisa das acções realizadas pelas
pessoas, ou seja, a ciência histórica; o segundo sentido seria o objecto da pesquisa em si, ou
seja, aquilo que as pessoas realizaram, e por fim, a história seria uma narração. Nesse último
sentido ela está intrinsecamente ligada à memória. Mas história não é memória. “Tal como o
passado não é a história mas o seu objecto, também a memória não é a história, mas é, ao
mesmo tempo, um de seus objectos e um nível elementar de elaboração histórica”(LE GOFF,
2000: 48). Jacques Le Goff defende que há duas histórias: a da memória colectiva e a dos
historiadores. Para Le Goff, o distanciamento entre estas duas deve ser diminuído pelos
historiadores de ofício e divulgada pela escola, pois “a história deve esclarecer a memória e
ajudá-la a rectificar os seus erros” (LE GOFF, 2000: 30).
Para Maurice Halbwachs é na história vivida que se apoia a nossa memória. Para
Halbwachs, a história não é só uma sucessão cronológica de acontecimentos e datas, “mas
tudo aquilo que faz com que um período se distinga dos outros (…)”(1990: 60). Ao lado de
uma história escrita, acrescenta ele, há uma história viva que se perpetua através da memória
dos grupos. Para Halbwachs (1990: 80), a história seria uma “(…) compilação dos fatos que
ocuparam o maior espaço na memória dos homens”. Nesse caso, a história não é todo o
11 - Tradução livre: “A história [é] uma representação do passado. (...) A memória se enraíza no concreto, no espaço, no gesto e no objecto. A história está ligada às questões temporais, às evoluções com as coisas. A memória é absoluta e a história só conhece o relativo. ”
15
passado mas basicamente o que resta do passado. A história escrita, como aparece nos
manuais, é dividida em períodos e em sequências como actos de uma peça. Já a memória é
selectiva, ou seja, nem tudo o que aconteceu é lembrado, mas somente aquilo que ficou
marcado nas lembranças de cada um. No entanto, a memória colectiva de um determinado
grupo é que torna a história mais verosímil, pois “l´histoire n´est accessible que par la
mémoire. Mémoire collective et symboliques sous forme d´écrits, de signes, de traces qu´il
s´agit de conserver, de traduire, d´interpréter12.” (GAULEJAC, 1988: 7)
Neste sentido, Lucília Neves (2000) afirma que a memória e a história são processos
sociais, inseridos nas experiências individuais e colectivas das pessoas. Para Lucília, é
possível estabelecer duas formas de relação entre memória e história: a memória como fonte
do saber histórico e numa segunda forma, a história pode assumir uma dimensão erudita,
alijando a memória de seu papel fundamental no processo de construção de um determinado
saber histórico. No entanto, Peter Burke (1992) nos alerta para a simplificação da relação
entre memória e a história quando dizemos que a memória reflecte o que realmente aconteceu.
Para Burke, a simplificação dessa relação está sujeita a ser encarada como algo simples,
quando não o é.
Para Walter Benjamin (1994), a história é uma narração e o cronista é o narrador dessa
história. Ele diferencia o cronista do historiador, pois o historiador é obrigado a explicar os
acontecimentos, não podendo simplesmente narrá-los. Para Benjamin, a reminiscência está na
origem das narrações. É a reminiscência que cria a rede que todas as histórias constroem entre
si. Para Benjamin, a reminiscência é como Xehrazade, onde cada história encadeia uma nova
história.
Em relação ao papel do historiador nesse processo, Marc Bloch (1974) em sua obra
‘Apologie pour l´histoire ou métier d´historien’ já alertava para o facto de que o historiador é,
antes de tudo, um observador dos factos históricos, mas com um papel fundamental nesse
processo: o de relatar as memórias das pessoas. O papel do historiador é o de ser um ‘escriba’,
registando os factos ocorridos em seu entorno. Nesse sentido, a forma como a história foi
sendo narrada ao longo dos tempos, ganhou uma nova dimensão com o surgimento do
conceito de memória colectiva e memória social. A memória deixa de ser entendida apenas
como uma capacidade de lembrança e passa a ser factor de coesão social.
12 - Tradução livre: “A história só é acessível pela memória. Memória colectiva e simbólica sobre a forma de escrita, signos, traços que ela conserva, traduz e interpreta.”
16
I.1.3. Memória colectiva e memória social Os estudos sobre a memória social ganharam fôlego nas obras de Maurice Halbwachs,
sociólogo francês e discípulo de Durkheim. Criador do conceito de memória colectiva,
Halbwachs via o homem como um ser social. Ele defende o carácter eminentemente social da
memória, ou seja, a memória é sempre construída pelo grupo, mesmo sendo uma construção
individual, pois “(…) cada memória individual é um ponto de vista sobre a memória coletiva,
que este ponto de vista muda conforme o lugar que ali eu ocupo, e que este lugar mesmo
muda segundo as relações que mantenho com outros meios.” (HALBWACHS, 1990: 51)
Segundo Halbwachs (1994), a memória individual é social porque ela é intelectual e
porque os instrumentos que ela utiliza são os da inteligência. A nossa memória é também de
origem social porque todas as lembranças estão em relação com o conjunto de noções que o
grupo tem. Além disso, a memória nos faz compreender as circunstâncias das lembranças e
ela traz junto de si, parte da memória colectiva, pois “notre mémoire sociale est un virtualité
de mémoire collective car elle est ce qui reste d´une ou plusieurs mémoires collectives
passées quand la cohésion et la contrainte du groupe on disparu13.” (NAMER, 1987: 24)
Para Halbwachs (1994), a rememoração é uma reflexão e é essa medida que dá o
carácter social à nossa memória. A memória colectiva é o trabalho de um grupo social que
articula suas lembranças em quadros sociais comuns, compartilhadas por todo o grupo. Para
Halbwachs, a memória colectiva passa por um constante processo de reconstrução e de busca
de significados, e por isso, ele separa o social (que pertence à sociedade), do colectivo (que
pertence a um grupo) (NAMER, 1987). Nesse aspecto também Halbwachs se opõe a Bergson,
pois para Bergson (1999), a memória social, prática e racional é uma memória de imagens,
isoladas da nossa consciência individual.
Halbwachs (1990) distingue a memória autobiográfica da memória histórica, a primeira
seria a memória pessoal e a segunda a memória colectiva. A primeira seria interior e a
segunda exterior. Todos os indivíduos participariam dessas duas espécies de memórias. “A
primeira se apoiaria na segunda, pois toda história de nossa vida faz parte da história em
geral. Mas a segunda seria, naturalmente, bem mais ampla do que a primeira.”
(HALBWACHS, 1990: 55)
Para entendimento do conceito de memória colectiva, Halbwachs (1994) propõe os
quadros sociais, que são mecanismos para o enquadramento da memória. Em seus estudos ele
defende que a memória se baseia em três quadros, três pontos de referência para o seu
entendimento: a linguagem, o tempo e o espaço. Halbwachs trabalha com a memória dos
13 - Tradução livre: “Nossa memória social é uma virtualidade da memória colectiva porque ela é aquilo que resta de uma ou mais memórias colectivas passadas quando a coesão do grupo já desapareceu.”
17
músicos para a compreensão do quadro da linguagem, pois a música é parte da linguagem. O
tempo e o espaço são meios utilizados pela memória para as lembranças do que está mais
próximo (tempo) e do que está mais longe (espaço).
“Mas a memória colectiva não é somente uma conquista, é também um instrumento e
um objectivo de poder. São as sociedades cuja memória social é sobretudo oral ou que
estão em vias de constituir uma memória colectiva escrita que melhor permitem
compreender esta luta pela dominação da recordação e da tradição, esta manifestação
da memória.” (LE GOFF, 1984: 46)
A questão da memória colectiva é importante quando se trabalha com a museologia,
porque a memória nos museus deve ser entendida não somente como a memória dos objectos,
mas sobretudo das pessoas que participaram de determinado processo social, pois:
“(…) as histórias não são narrativas que acumulam, sem sentido, tudo o que vivemos. É
no que elege como sendo importante e como transmite que o grupo caracteriza-se a si
próprio. É no tipo de narrativa construída que os grupos se definem e se forjam. É a
partir de como constroem e contam sua própria história que os grupos criam sua
identidade” (WORCMAN, 2001: 13).
A memória colectiva é construída a partir das narrativas de várias pessoas de um
determinado grupo social, e é fonte básica para a construção de uma identidade social e
valorização da auto-estima deste grupo. Por isso, quando trabalha-se com determinado acervo
de um museu é preciso não dissociar a memória dos objectos, da memória colectiva daquele
grupo pois memória e identidade social são facetas de um mesmo processo de construção
social.
I.1.4. Memória, esquecimento e identidade social A palavra memória evoca ao mesmo tempo lembrança e esquecimento. As sociedades
necessitam do esquecimento tanto quanto da memória. Para Marc Auge (2001: 27), “É
preciso saber esquecer para saborear o gosto do presente, do instante e da espera, mas a
própria memória tem necessidade do esquecimento: é preciso esquecer o passado recente
para reencontrar o passado antigo.” Para Augé, a relação entre memória e esquecimento é a
mesma relação que existe entre a vida e a morte, pois uma precisa da outra para a sua própria
sobrevivência. “O esquecimento, em suma, é a força viva da memória e a recordação o seu
produto”. (AUGÉ, 2001: 27)
Michael Pollak também alerta para a necessidade de lembrar e esquecer. Sem o
esquecimento não há memória. Se, como Funes, lembrássemos de todos os detalhes de todos
18
os dias em que vivemos, estaríamos fadados a viver apenas para lembrar e não para viver14.
Lembrar é importante, mas é importante também o esquecimento. E nesse sentido, a memória
necessita de enquadramento constante, ou seja, necessita de manter a coesão interna. Mas
“todo trabalho de enquadramento de uma memória de grupo tem limites, pois ela não pode
ser construída arbitrariamente” (POLLAK, 1989: 7).
Quando se trabalha com a questão da memória social, não se pode deixar de estudá-la
sob o enfoque da identidade social, pois a memória colectiva, resgatada nos processos de
recolha, é base para o fortalecimento do sentimento de identidade do grupo social. Michael
Pollak (1992) defende que a memória é, ao mesmo tempo, selectiva e um fenómeno
construído, ou seja, não lembramos de tudo mas daquilo que nos marcou e que este é um
processo constante de reforço da identidade. Para ele, “(…) a memória é um elemento
constituinte do sentimento de identidade, tanto individual como coletiva, na medida em que
ela é também um fator extremamente importante do sentimento de continuidade e de
coerência de uma pessoa ou de um grupo em sua reconstrução de si.” (POLLAK, 1992: 204)
Nesse sentido, Ulpiano Bezerra de Menezes (1987) afirma que o suporte da identidade é a
memória, pois é ela que dá inteligibilidade à realidade. “O conceito de identidade implica
semelhança a si próprio, formulada como condição de vida psíquica e social. Nessa linha,
está muito mais próximo dos processos de re-conhecimento do que de conhecimento.”
(MENEZES, 1987: 182)
Um depoimento de história de vida é um registo individual, da experiência vivida por
aquela pessoa. No entanto, diz respeito ao grupo social em que esta pessoa está inserida.
Segundo Pierre Nora, a memória do grupo é motor da identidade social, pois “le passage de la
mémoire à l´histoire a fait à chaque groupe l´obligation de redéfinir son identité par la
revitalisation de sa propre histoire. Le devoir de mémoire fait de chacun l´historien de soi. ”
(NORA, 1984: XXIX). Também Jacques Le Goff defende que a memória é um elemento
essencial para a identidade individual ou colectiva “(…) cuja busca é uma das actividades
fundamentais dos indivíduos e das sociedades de hoje, na febre e na angústia.” (LE GOFF,
1984: 46).
As sociedades estão em crescimento acelerado, os grupos modificam-se de forma
assustadora, é preciso fazer da memória colectiva um instrumento de reforço da identidade do
grupo, pois:
“O discurso da História é fundamental para a formação da identidade de um grupo e
tem papel fundamental para a manutenção e transformação dos padrões e valores 14 - No conto ‘Funes, o memorioso’, Jorge Luís Borges conta a história de um homem, que após uma queda de um cavalo passa a lembrar de todos os detalhes da sua vida, sem esquecer nenhum pormenor. Esta situação leva a um esgotamento de Funes, pois ele não consegue descansar a memória.
19
sociais. O caminho para a conquista da cidadania é o da compreensão da importância
dos próprios valores, da própria história. Reunir histórias de vida é também uma forma
de produzir conhecimento. Não um conhecimento gerado por narrativas estanques, mas
advindo das diversas experiências e visões das pessoas que constituem nossa sociedade.
Ouvir é a melhor maneira de entender o outro e se quebrar preconceitos
sociais”(HENRIQUES &WORCMAN, 2003: 725)
O reforço da identidade do grupo e a construção de uma memória colectiva são alguns
dos fins quando da realização de um projecto de memória. E para a realização de um projecto
com essa envergadura é preciso compreender o processo de construção da memória e de que
forma a oralidade se transforma em memória construída por um grupo social. Para isso se faz
necessário a utilização da metodologia da história oral. É o que veremos a seguir.
I.1.5. Memória e oralidade A memória se serve da oralidade para a preservação da história de um determinado
grupo social15. Segundo André Leroi-Gourhan, a história da memória colectiva pode ser
dividida em cinco períodos: “(…) o da transmissão oral, o da transmissão escrita por meio
de tábuas ou índices, o das fichas simples, o da mecanografia e o da seriação electrónica.”
(LEROI-GOURHAN, 1987: 59). E a oralidade é uma característica das comunidades
primitivas. Antes do surgimento da escrita, os mais velhos passavam seus costumes e suas
tradições através dos relatos orais, ensinando aos mais jovens o conhecimento que foi
preservado ao longo da história daquele grupo social. Por isso, Paul Thompson (1992:45)
afirma que a história oral é tão antiga quanto a história, pois “Ela foi a primeira espécie de
história.” 16
Na Antiguidade Clássica as narrativas orais eram consideradas fontes históricas e,
muitos dos escritos que restaram este período são relatos das batalhas e narrativas heróicas.
No entanto, as sucessivas mudanças no mundo e a criação de novos instrumentos de registos
mudaram a forma como as sociedades encaram a oralidade. De grande uso nas comunidades
primitivas, ela foi perdendo a sua força à medida que a história foi tornando-se uma ciência, a
partir do século XVII.
15 - Entende-se por oralidade a capacidade de preservação da história social do grupo através de relatos da história da comunidade. 16 - Danièle Voldman (1998) questiona o uso da expressão ‘história oral’, afirmando que ela tornou-se inadequada e que só deveria ser empregada para qualificar o período dos anos 50 aos anos 80, mais como carácter historiográfico. Neste trabalho, no entanto, utilizamos esta expressão pois entendemos que não há uma outra expressão para melhor definir esta metodologia de trabalho.
20
A história da memória colectiva foi cada vez mais sendo detida pelos historiadores, em
detrimento do grupo social. E a tradição oral viu questionada parte de sua veracidade
histórica. No entanto, muitas comunidades (africanas e indígenas) ainda continuaram com a
tradição oral, pois em suas sociedades não havia a escrita. Para Jacques Le Goff (2000) é
importante não esquecermos de que a oralidade e a escrita coexistem nas sociedades e que
isso é importante para a história e que a história não nasceu com a escrita, “(…) pois não há
sociedades sem história” (LE GOFF, 2000: 52). Nesse aspecto, Pierre Lévy (1994) defende
dois tipos de oralidade, a primária que é aquela existente nas comunidades onde não há uma
língua escrita e a oralidade secundária, onde os relatos orais são complementares às fontes
escritas (fontes documentais).
Foi a partir dos anos 50 do século XX que a oralidade voltou a ser valorizada como
fonte de informação para os historiadores. A criação de uma metodologia de recolha de
depoimentos orais, mais conhecida como história oral, e o seu uso como fonte pelos
historiadores é ainda muito recente. Ela começou a ser utilizada como fonte de informação
para o estudo da história a partir da 2ª Guerra Mundial, precisamente em 1948, por Alan
Nevin da Columbia University (JOUTARD, 1983).
A partir dos anos 50, na Grã-Bretanha, através de Paul Thompson, da Essex University,
a história oral passou a ser difundida na Europa. Este trabalho de Paul Thompson teve início
com o projecto ‘The Edwardians’, onde os depoimentos orais recolhidos durante a pesquisa
deram origem a uma publicação e um arquivo de depoimentos orais ligados à Essex
University17. Nos anos 60, influenciado pela Escola dos Annales e encabeçado por Philipe
Joutard, surgiu também na França um movimento para uso da história oral como fonte de
pesquisa18. E a história oral expandiu-se primeiro pelo resto da Europa, depois pela América.
O uso da história oral como metodologia de pesquisa tomou força nos estudos de
história contemporânea, na década de 80, com enfoque nos estudos económicos e sociais. Foi
a partir desta época que a metodologia da história oral ganhou novos contornos19. Os
primeiros estudos utilizando a metodologia de história oral como fonte de pesquisa foram
efectuados pelo antropólogo Oscar Lewis, em ‘Filhos de Sanchez’ (1961) e ‘Pedro Martinez’
17 - Os resumos dos 444 depoimentos recolhidos pelo projecto, bem com a transcrição integral de alguns depoimentos podem ser consultados pela Internet através do endereço: http://www.qualidata.essex.ac.uk/edwardians/about/introduction.asp (consultado em 26/06/2004 às 15:00h) 18 - A Escola dos Annales é um movimento criado por historiadores franceses, utilizando novos procedimentos de pesquisa e novos objectos sociais. A sua origem está ligada à revista Annales d'histoire economique sociale, fundada em 1929 por Lucien Febvre e Marc Bloch. Esse movimento tinha como objectivo mudar a historiografia, traçando para isso um diálogo com as outras ciências humanas. 19 - Entende-se por metodologia de história oral o conjunto de ferramentas (guiões, perfis, fichas, etc) usadas por historiadores e antropólogos para a recolha dos depoimentos de história de vida.
21
(1964). Em seus estudos, Lewis faz uma interessante demonstração do poder das entrevistas e
das histórias de vida para o uso nas pesquisas antropológicas (THOMPSON, 1984).
A memória é, por excelência, selectiva. A história de determinado grupo é o conjunto de
narrativas que este mesmo grupo filtrou e registou. A forma como cada grupo narra a sua
história também é importante, pois pode-se estudar como este grupo social se vê. As
narrativas orais são, por isso, fontes inesgotáveis de informações. Alguns autores trabalharam
este tema de forma a entender como as narrativas são construídas. Entre eles destacamos
Walter Benjamin (1994), que trabalhando sobre as formas das narrativas, alerta para o facto
de que elas se baseiam muito na experiência que é passada de pessoa a pessoa. Benjamin
alerta para a crise da memória e da narração, pois “a arte de narrar está definhando porque a
sabedoria — o lado épico da verdade — está em extinção.” (BENJAMIN, 1994: 201) Para
ele, é preciso resgatar as narrativas orais, pois:
“Contar histórias sempre foi a arte de contá-las de novo, e ela se perde quando as
histórias não são mais conservadas. Ela se perde porque ninguém mais fia ou tece
enquanto ouve a história. Quanto mais o ouvinte se esquece de si mesmo, mais
profundamente se grava nele o que é ouvido.” (BENJAMIN, 1994: 198).
As pessoas narram suas histórias de forma a montar um mosaico da sua própria vida. E a
tendência é para o uso da linearidade nas lembranças dos factos ocorridos, pois a narrativa
sempre é feita do presente para o passado. Nesse caso, é a visão actual do mundo que é
passada na narrativa. Por isso, a actividade de contar história é sempre temporal. Além disso,
a narrativa também é uma forma de comunicação. Por isso, para Ecléa Bosi que trabalhou
com a narrativa de idosos moradores da cidade de São Paulo, “A narração é uma forma
artesanal de comunicação. Ela não visa a transmitir o “em si” do acontecido, ela o tece até
atingir uma forma boa.” (BOSI, 1994: 88)
Ainda sobre a forma como as pessoas narram suas histórias, é importante lembrar que as
narrativas não são apenas através da fala, mas dos gestos, do nosso corpo. Além disso, nossa
história não é somente o que narramos mas os objectos que nos acompanham durante a nossa
vida.
“Existem muitas maneiras de percebermos e registrarmos nossa história. A primeira
delas é em nosso próprio corpo, nosso cérebro, nossa linguagem... Em seguida vamos
juntando outros elementos... Objetos, fotos, álbuns... Elementos que, juntos, constituem
nossas lembranças. Nossa história é formada então por aquilo que selecionamos como
importante ao longo de nossa vida. Não é um puro reflexo do que vivemos, mas sim uma
construção do que consideramos significativo para nossa vida. É, com certeza, uma
narrativa construída.” (WORCMAN, 2001: 12)
22
Por isso, o uso da história oral em projectos de resgate da memória dos grupos sociais
possibilita dar voz aos próprios protagonistas da história, trazendo não uma única história,
mas múltiplas histórias. Nesse sentido, Paul Thompson (1992) alerta sobre a possibilidade do
uso social da memória nas comunidades. Para Thompson, a forma de abordagem da história
oral possibilita uma maior interacção com a comunidade. A história oral permite às
comunidades terem a sua história preservada, pois “A história oral é uma história construída
em torno de pessoas. Ela lança a vida para dentro da própria história e isso alarga seu
campo de ação. (...) E oferece os meios para uma transformação radical do sentido social da
história.” (THOMPSON, 1992:44).
Nas últimas décadas tem surgido várias experiências de projectos de memória em
comunidades tendo como enfoque principal o uso social dessa memória20. A possibilidade da
própria comunidade ‘escrever’ a sua própria história valoriza as experiências individuais e
ajuda a trabalhar a auto-estima do grupo.
Sobre a questão do uso das fontes orais nas pesquisas históricas, é importante lembrar
que toda fonte histórica é subjectiva, pois “Toda fonte histórica derivada da percepção
humana é subjetiva, mas apenas a fonte oral permite-nos desafiar essa subjetividade:
descolar as camadas de memória, cavar fundo em suas sombras, na expectativa de atingir a
verdade oculta.” (THOMPSON, 1992: 197) Michael Pollak (1992) defende que da mesma
forma que a memória é socialmente construída, a documentação produzida também o é. Por
isso, afirma que a crítica que todo historiador deve fazer às fontes orais é a mesma no uso de
fontes escritas porque da mesma forma que a memória é socialmente construída, as
documentações (oficiais ou não), também o são. O papel do historiador ou do antropólogo no
processo de selecção e recolha de depoimentos num projecto de registo de memória de uma
comunidade é extremamente fundamental. O especialista poderá instrumentalizar a
comunidade na metodologia de história oral, possibilitando que a própria comunidade possa
usufruir das ferramentas para o registo de sua memória.
20 - Um exemplo de projecto que tem trabalhado a memória da comunidade como instrumento de mobilização está sendo desenvolvido por moradores da comunidade da Maré, no Rio de Janeiro. Através do CEASM, uma organização não-governamental, a comunidade trabalha com projectos de recolha de depoimentos dos moradores e usa esses depoimentos para ilustrar a sua própria história. Mais informações no site: www.ceasm.org.br.
23
I.1.6. Considerações finais A memória é, antes de mais, recordação, lembrança. E lembrar é seleccionar, escolher. E
isso funciona tanto individualmente como colectivamente. Por isso, construção da memória de
um grupo é a memória colectiva desse grupo, ou seja, é aquilo que ele selecciona e regista
como importante é o que passa ser definido como importante. E é através desse registo que
este grupo reforça a sua identidade social e marca a sua trajectória no tempo e no espaço.
É importante reafirmar que os grupos sociais são portadores de memória e que esta
memória é património intangível da sua comunidade. Nesse sentido, o papel dos museus
enquanto lugares de memória é dar espaço para que os grupos possam ter suas histórias
preservadas. Nesse sentido, a preservação é necessária mas não apenas da memória dos
objectos, das referências patrimoniais, mas a memória das pessoas.
Este processo de mudança na concepção do museu, desencadeado a partir dos anos 50
do século XX, foi fundamental para a compreensão do museu enquanto instituição ligada à
memória colectiva. Como é a relação com dos museus com a memória e como estas
mudanças foram fundamentais para a compreensão de uma nova perspectiva museológica é o
assunto do próximo capítulo.
24
I.2. Museologia, museus e património
“O museu é por excelência o espaço da representação do mundo, dos seres, das coisas, das relações”. Ulpiano Bezerra de Menezes (2002) O museu e o problema do conhecimento p. 23
O nome museu vem da palavra grega Mouséion. Na Grécia, o Mouséion era o templo
onde moravam as nove musas, filhas de Zeus e de Mnemosine (deusa da memória). Embora a
palavra tenha origem na antiguidade clássica, o museu enquanto instituição é um fenómeno
relativamente recente na história da humanidade, pois data do século XVIII. No século XIX
os museus já eram instituições de prestígio e de poder, pois adquirem status de instituição
cultural privilegiada. O alargamento da noção de património, a redefinição do objecto
museológico, a participação da comunidade no processo museológico e a mudança na
concepção de museu são os grandes marcos da museologia no século XX.
O objectivo desse capítulo é entender como estas transformações foram importantes
para a criação de novas formas de relacionamento entre a comunidade e seu património,
mediadas pelo museu. Para isso, seleccionamos algumas questões que consideramos
pertinentes para este entendimento. A primeira questão diz respeito ao papel exercido pelo
museu enquanto instituição de memória e de poder. A segunda questão trata-se do
alargamento da noção de património e como estas mudanças reflectiram no processo
museológico, pois elas são também fruto das transformações no conceito de património. E foi
a partir das mudanças do conceito de património, que surgiu uma nova visão de uma
museologia mais participativa, através do movimento da Nova Museologia. A partir dos anos
60, muda-se a concepção de museu, mas também do público, que deixa de ser um mero
observador e passa a participar activamente do processo museológico.
I.2.1. Museus: memória e poder21 Os museus foram durante séculos repositório de objectos e colecções. E, estes objectos
estavam muitas vezes associados à cultura das elites e da burguesia. Os museus nasceram já
com este papel, de valorização da cultura das elites, pois as primeiras colecções estavam
ligadas às Casas Reais, e os gabinetes de curiosidades eram, na sua maioria, amontoados de
objectos considerados de valor artístico e cultural pela classe social dominante no período.
Não é por acaso que o primeiro museu público, a Galeria do Louvre, foi inaugurado no
período pós revolucionário, pois segundo Ulpiano Menezes (1993), as jovens nações utilizam-
se dos museus para reafirmar a sua identidade enquanto nação. 21 - O título deste sub-capítulo - museus: memória e poder - foi retirado do texto Memória e Poder: dois movimentos, de Mário Chagas (2002), publicado em Museus e políticas de memória.
25
O coleccionismo valoriza o que é raro e valioso em termos de unicidade e riqueza. Um
coleccionador de selos não selecciona o que coleccionar ao acaso, mas escolhe aqueles que
são raros e que aos olhos de outros coleccionadores os tornam valiosos. Os critérios de
recolha das colecções nos museus tradicionais não são diferentes desta visão. Segundo Marc-
Alain Maure (1978: 29), “Les objets traditionnellement collectionnés par les musées n´ont
jamais été selectionnés dans le but de créer des collections representatives de l´état général
d´une societé a un moment donné22”. E na maioria das vezes, as colecções dos museus não
retratavam a realidade do País onde eles estavam localizados. É por isto que John Kinard,
director do Anacostia Museum, museu de bairro nos Estados Unidos, afirmou que “You
would never kwnon from visiting the average American museum that the black man exists in
América.23” (MAURE, 1978: 30). Durante muitos anos, o património preservado nos museus
era seleccionado segundo uma óptica eurocentrista. O museu não era o reflexo da realidade
mas sim um templo para a contemplação de objectos raros e preciosos.
Os museus são, por sua própria origem, lugares de memória (preservação) e de poder
(relacção com o poder constituído). Os museus são lugares de memória porque trabalham com
o património e com a memória das pessoas. Segundo Mário Chagas (1996: 90), é a memória
que sustenta a transmissão dos testemunhos da cultura, pois “a memória não é o passado, mas
apenas a sua representação, e como tal é dinâmica e cambiante, é espacial e temporal, é
individual e coletiva”. No entanto, este autor alerta para o facto de que preservar objectos não
significa necessariamente preservar a memória. O que interessa é a preservação da relação
que os objectos mantêm entre si e como representação da memória.
Os museus são lugares de poder porque todo o processo de selecção e de musealização
pressupõe escolha e toda escolha deriva de um processo de domínio de poder. São lugares de
poder também porque toda relação pressupõe uma relação de poder, seja ela dentro ou fora do
museu. Segundo Mário Chagas (1996), a luta pela preservação é também uma luta política.
No entanto, é preciso que os profissionais que trabalham com a museologia tenham claro que
o poder faz parte do processo museológico. Nesse sentido, “o poder em exercício empurra a
memória para o passado, subordinando-a a uma concepção de mundo, mas como o passado é
um não-lugar e o seu esquecimento é necessário, as possibilidades de insubordinação não
são destruídas” (CHAGAS, 2000: 4). Para Mário Chagas (2003), há também uma política de
memória nos museus, porque o que é seleccionado para preservar obedece a critérios políticos
da instituição. 22 - Tradução livre: “Os objectos tradicionalmentes coleccionados pelos museus não foram, na sua maioria, seleccionados com o objectivo de criar colecções representativas de uma sociedade num determinado momento.” 23 - Tradução livre: “Você jamais saberá sobre a existência de negros na América ao visitar os museus médios americanos.”
26
Para Mário Chagas (1996:92), o processo de musealização “é uma forma voluntária de
preservação e de construção da memória” pois no momento em que determinado
património24 é musealizado ele estabelece uma relação com a memória construída daquela
comunidade25. No entanto, este autor adverte que toda musealização é também um recorte da
realidade pois,
“A musealização consiste, em última análise, no estabelecimento de um recorte da
realidade e no entendimento de que este recorte historicamente determinado deve ser
preservado. Fica claro, portanto, que a musealização implica seleção, arbítrio e
atribuição de valores. O mesmo acontece com a memória (ou o processo de
memorização); não se pode memorizar tudo, posto que isto significa impedir a
mudança, a transformação, o novo” (CHAGAS, 1996:92).
O museu é uma instituição de memória, e, segundo Gerard Namer (1987: 178), o museu
é uma memória selectiva do mundo pois, “Le musée assure la mémoire de chaque objet,
c´est-à-dire l´explication de sa nature, de sa forme, de son origine26”. Namer acrescenta que
o museu é a memória dos valores porque cada sociedade escolhe o que preservar de sua
história. Neste sentido, Henri-Pierre Jeudy (1990: 15) alerta para a tendência de criação de
museus pelos poderes políticos “(…) para consagrar sua imagem a grupos sociais que são
motivados, ao que parece, pelo papel que tem o museu no reconhecimento de uma
identidade.” O museu não é somente um lugar de memória, mas também um lugar de
identidade. Para este autor, “A diferença entre ir ao museu e «fazer» um museu é minimizada
em vista do desejo de reavivar os espaços da memória.” (JEUDY, 1990:14)
A preservação das referências patrimoniais faz sentido dentro do contexto a que elas
pertencem, é o que elas guardam de memória e o que representam junto aquela comunidade é
que as tornam importantes27. E nesse sentido, é importante lembrar que não só os objectos
carregam em si as memórias de uma determinada comunidade, mas também as experiências e
as visões de mundo de seus actores sociais. Nesse sentido, tão mais importante que preservar
objectos é preservar as referências da memória colectiva.
24 - O património aqui entendido como o resultado da capacidade de criar e reflectir, é o processo de criação de cultura e transformação da realidade. É toda produção social do homem, inclusive a relação do homem com o meio ambiente e envolve diversidade cultural. 25 - Iremos trabalhar com o conceito de comunidade sendo “(...) um grupo de indivíduos que, apoiado em um patrimônio, realiza ações museológicas, com o objetivos e metas definidas a partir das suas necessidades, dos seus anseios, definindo, em conjunto, os problemas e as soluções para os mesmos, situando-o no contexto mais amplo da sociedade”. (SANTOS, 2000: 220) 26 - Tradução livre: "O museu assegura a memória de cada objecto, ou seja, a explicação de sua natureza, de sua forma, de sua origem." 27 - Estamos utilizando o termo referência patrimonial para significar não só os objectos, mas os elementos a serem patrimonializados e musealizados.
27
Segundo Mário Chagas (2002), os museus, bem como as bibliotecas, arquivos, centros
culturais e galerias de arte, são portadores de um determinado discurso da realidade, ou seja,
eles têm um papel na política cultural da sociedade e uma ideologia preservacionista de
determinado cunho social. No entanto, esta noção do papel social do museu é ainda muito
recente, assim como o museu enquanto espaço de memória, somente a partir da década de 60,
com as mudanças no conceito de património e o entendimento do papel social do museu, é
que se abre uma nova perspectiva de uma instituição voltada para a memória da comunidade.
I.2.2. Museologia e património A palavra património vem da palavra latina patrimonium e significava no interior da
sociedade romana a transmissão de bens e heranças (HARTOG, 1998). Segundo Mário
Chagas (1996), o termo património está vinculado a uma herança paterna, passada de pai para
filho no seio da sociedade. O conceito de património evoluiu muito, pois inicialmente a ideia
de património estava associada à arte e à cultura, hoje sabemos que o património de uma
comunidade pode ser sua culinária, suas tradições, além do ambiente natural: fauna e flora.
Ou seja, o património engloba também o meio ambiente, o saber e o artefacto. Segundo
Hugues de Varine (1974), o património compõe-se de três elementos: o meio ambiente, o
conjunto de bens acumulados pelas pessoas e o conjunto de bens culturais.
O património cultural é o resultado da capacidade de criar e reflectir, é o processo de
criação de cultura e transformação da realidade. É toda produção social das pessoas, inclusive
a relação delas com o meio ambiente e envolve diversidade cultural. Neste trabalho, a
definição que usaremos é a de que “(…) patrimônio é o conjunto dos bens identificados pelo
Homem, a partir de suas relações com o meio-ambiente e com outros Homens, e a própria
interpretação que ele faz dessas relações” (BRUNO, 1996: 19)
O conceito de património nacional, concebido como património público acessível a todo
cidadão, surgiu no contexto da Revolução Francesa. Segundo Françoise Choay (2000), foi a
partir de medidas tomadas pelos revolucionários para a salvaguarda do património que a
questão patrimonial começa a ser entendida como uma questão crucial na Europa. Nesse
período, definiu-se que os monumentos (bens móveis nacionalizados) ficariam sob a tutela do
Estado, salvaguardando-os da destruição. Choay afirma que a conservação do património
histórico durante a Revolução Francesa não foi “(…) nem uma ficção, nem uma aparência.
Essa experiência durou seis anos e determinou, a longo prazo, a evolução da conservação
monumental em França” (2000: 100).
28
O histórico da questão patrimonial pode ser delineado a partir de três encontros
promovidos pela Unesco (GAMEIRO, 1998). O primeiro deles foi a Convenção de Haia
realizada em 1954 pela ONU e UNESCO e que definiu o que é bem cultural. Nessa
Convenção definiu-se património como bens móveis ou imóveis que representam grande
importância para o património cultural dos povos; edifícios que guardam os bens culturais,
museus, bibliotecas, arquivos, etc; e centros monumentais.
Em 1964, durante o Congresso Internacional de Arquitectos e Técnicos dos
Monumentos Históricos promovido pela ONU, em Veneza, produziu-se um novo documento
que passou a ser chamada Carta Internacional para a Conservação e Restauração dos
Monumentos, mais conhecida como Carta de Veneza. A Carta de Veneza caracterizou o
património comum como obra dos povos e que deveria, portanto ser preservado e acrescentou
o património paisagístico à questão patrimonial. As principais resoluções deste encontro
foram: o monumento histórico é portador de testemunho da civilização; a conservação e o
restauro contribuem para a salvaguarda e as obras de arte são testemunhos históricos.
Por fim, em 1972 a Unesco promoveu uma convenção onde definiu em 38 artigos o que
é património. O documento da Convenção para a Protecção de Património Industrial Mundial
Cultural e Natural realizada em Paris é o principal documento que aborda a questão
patrimonial como valor supra-nacional. Na Convenção foi definido como património cultural:
monumentos – obras arquitectónicas, de escultura ou pintura monumentais que tenham valor
do ponto de vista histórico, artístico ou científico; conjuntos de construções isoladas ou
reunidas, valor universal e sítios – obras da natureza, valor histórico, estético, etnológico ou
antropológico. Na Convenção de 1972 ficou estabelecido que os países membros da
UNESCO deveriam ser responsáveis pela salvaguarda do seu património cultural, artístico e
natural (AUDRERIE, 1998).
Mas, antes destes três eventos é preciso mencionar também a Carta de Atenas, de 1931.
Na verdade, este documento produzido pela Conferência dos Especialistas para a Protecção e
conservação de Monumentos de Arte e História é considerado o primeiro documento
internacional a tratar da questão patrimonial (HERNANDEZ, 2002). Os princípios expostos
em 10 princípios, neste documento, podem ser resumidos em cinco grandes linhas: a
necessidade de cooperação internacional para a protecção do património; a importância da
conservação, manutenção e restauração dos monumentos históricos; proclamação dos
princípios e técnicas para restauração; recomendação para o respeito ao ambiente em torno
dos monumentos e a necessidade de criação de sistemas de documentação, difusão e acção
educativa.
29
Segundo Carlos Lemos (1987), o património cultural de uma sociedade, de uma região
ou de uma nação é bastante diversificado e sofre permanentemente alterações. Para Lemos,
nunca houve ao longo de toda a história da humanidade critérios e interesses permanentes e
abrangentes voltados à preservação de artefactos, seleccionados sob qualquer óptica que
fosse. Portanto, o património preservado pelos museus pode sofrer mudanças ao longo de sua
existência, pois é testemunho de determinada época.
Nesta via, segundo Jean Davallon (1995), é preciso distinguir a patrimonialização, que
é reconhecer num determinado objecto seu valor patrimonial, da musealização, que é a
institucionalização das referências patrimoniais como acervo de museu. Para este autor a
musealização, trata-se da mudança de status de determinada referência, transformando-a em
um acervo de museu. No entanto, não é preciso que determinada referência patrimonial seja
musealizada para ser reconhecida como um património de determinada comunidade. No caso
da patrimonialização, a referência é reconhecida como património, mas não é necessário que
passe a integrar o acervo do museu.
A patrimonialização dos objectos tem duas perspectivas. A primeira delas encara o
património como algo herdado e transmitido, imposto pelo passado; esta perspectiva acaba
criando um fosso entre as gerações. A segunda perspectiva funda-se em razões de
conveniência, ou seja, cada geração selecciona as referências patrimoniais que mais se
identificam com a sua visão de património, pois as referências patrimoniais têm significados
específicos para cada geração.
Normalmente, o processo de selecção de determinada referência patrimonial para sua
musealização é feito pelos museus através da mediação do Estado ou organismos do Estado,
ou pela comunidade envolvida no processo. Essa intermediação leva em conta os seguintes
critérios: a comunicação, ou seja, como a referência patrimonial ‘fala’ à comunidade; a
unicidade e o seu valor económico (potencial de mercado). Segundo Jean Davallon (1992) é a
selecção que faz com que um determinado objecto seja considerado objecto de museu,
enquanto outros não ganham esse status.
O alargamento da noção de património, segundo Davallon (1997), foi acompanhado de
uma dupla diversificação. Para ele, acaba co-existindo duas formas de património: o
património reconhecido como tal pelos poderes constituídos (património nacional) e o
património comunitário, que demanda um maior envolvimento da comunidade no processo de
conservação e valorização do mesmo.
Nestor Garcia Canclini (1998), ao estudar as realidades museológicas latino-americanas,
aponta duas estratégias usadas pelos Estados e por particulares para a patrimonialização: a
espiritualização esteticista do património e a ritualização histórica e antropológica. Na
30
primeira estratégia, as referências patrimoniais são separadas das relações sociais para as
quais foram produzidas, desvinculando-as de suas referências. Elas são desalojadas do seu
quotidiano e perdem o sentido. A segunda estratégia utiliza a expografia para criar ambientes
com objectos grandiosos, de forma a valorizá-los. Para Garcia Canclini (1998), nesse caso,
“(…) o museu parece um testemunho fiel da realidade”, utilizando para isso a teatralização e
ritualização. A patrimonialização de determinada referência patrimonial, acrescenta Garcia
Canclini, é sempre uma escolha que reproduz as diferenças entre grupos sociais.
“Toda operação científica ou pedagógica sobre o patrimônio é uma metalinguagem,
não faz com que as coisas falem, mas fala delas e sobre elas. O museu e qualquer
política patrimonial tratam os objetos, os edifícios e os costumes de tal modo que, mais
que exibi-los, tornam inteligíveis as relações entre eles, propõem hipóteses sobre o que
significam para nós que hoje os vemos ou evocamos.” (GARCIA CANCLINI, 1998:
202)
Com o alargamento da noção de património a partir da década de 60, o museu deixou de
lado o seu papel passivo de mero acumulador de património e cultura, e passou a ser um
articulador do processo de mobilização cultural da comunidade. O papel do museu neste
processo de patrimonialização da cultura é o de ser o agente impulsionador e mediador do
processo. É o responsável pela musealização do património da comunidade envolvida. E
nesse sentido, é preciso deixar claro que não somente do património material, mas também do
património imaterial, ou intangível28.
“O museu é a sede cerimonial do patrimônio, o lugar em que é guardado e celebrado,
onde se reproduz o regime semiótico com que os grupos hegemônicos o organizaram.
Entrar em um museu não é simplesmente adentrar um edifício e olhar obras, mas
também penetrar em um sistema ritualizado de ação social”. (GARCIA CANCLINI,
1998: 169)
A acção museológica como produção de conhecimento desenvolve-se nas etapas da
pesquisa, preservação e comunicação. A pesquisa é uma acção interactiva que faz a reflexão,
observação e análise da realidade, qualificada como património cultural. O conhecimento
28 - Para a Unesco o património imaterial ou intangível é “O conjunto das manifestações culturais, tradicionais e populares, ou seja, as criações coletivas, emanadas de uma comunidade, fundadas sobre a tradição. Elas são transmitidas oral e gestualmente, e modificadas através do tempo por um processo de recriação coletiva. Integram esta modalidade de patrimônio as línguas, tradições orais, os costumes, a música, a dança, os ritos, os festivais, a medicina tradicional, as artes da mesa e o «saber-fazer» dos artesanatos e das arquiteturas tradicionais.”Citado por ABREU, Regina. “Tesouros Humanos vivos” ou quando as pessoas transformam-se em patrimônio cultural – notas sobre a experiência francesa de distinção do “Mestres da Arte”. In: ABREU, Regina ; CHAGAS, Mário [eds.] - Memória e património: ensaios contemporâneos. Rio de Janeiro: DPA, 2003. p. 81-94.
31
produzido na acção museal e para a acção museal na pesquisa museológica objectiva uma
nova prática social.
A preservação, uma das etapas da acção museológica, pode ser dividida em selecção,
conservação e documentação. A selecção é responsável pela recolha das referências
patrimoniais para a construção do conhecimento da comunidade. Estas referências,
testemunhos do património de uma comunidade, são eleitas segundo os critérios elencados
anteriormente e obedecem à lógica do processo museológico29. É importante salientar que
toda selecção leva em conta factores políticos e ideológicos e que a selecção museológica
também é condicionada por estes factores. Segundo Waldisa Rússio (1991: 8), quando
musealizamos objectos e artefactos estamos passando informações à comunidade e “(...)
informação pressupõe conhecimento (emoção/razão), registro (sensação, imagem, ideia) e
memória (sistematização de idéias e estabelecimento de ligações)”. No entanto, é preciso
deixar claro que a preservação não se basta por si mesma. Segundo Mário Chagas (1996:46),
“A preservação não justifica a si mesma, ela é um meio e não um fim. É necessário que ao
lado da preservação se instaure o processo de comunicação.”
A comunicação alimenta todo o processo museológico e não está restrita à exposição.
Ela está presente em todo processo museológico. Entende-se o processo museológico como
uma acção interactiva, onde pressupõe a produção do conhecimento, a qualificação da cultura
social e a musealização do património de determinada comunidade. Segundo Cristina Bruno
(s.d.: 5), “(…) os procedimentos da comunicação explicitam as opções interpretativas no que
tange às referências culturais/indicadores da memória/coleções/acervos”. A acção de
comunicação é que dá maior visibilidade ao acervo, e que possibilita uma interacção maior
entre o museu e o seu público, pois “(…) o processo de comunicação é base necessária para
a produção de conhecimento original a partir do bem cultural preservado” (CHAGAS,
1996:46).
Os processos de musealização contribuem para transformar em novos valores e novos
significados as referências do património cultural da comunidade. Segundo Waldisa Rússio
(s.d.:4), a musealização acarreta uma valorização, uma ênfase em certas referências nos
processos museológicos: “(…) a musealização repousa em pesquisas prévias na seleção dos
objetos, na documentação, na direção, na administração, conservação, e eventualmente na
restauração”. Podemos dizer que o facto museal é a qualificação da cultura em um processo
interactivo de acções de pesquisa, preservação e comunicação, objectivando a construção de
29 - Cristina Bruno dá o nome de património comunitário a este “(…) conjunto de bens partilhado por um grupo de pessoas em um espaço delimitado e ao longo do tempo, cuja preservação é importante para a identidade cultural do grupo”. In: A Museologia como pedagogia para o patrimônio. s.d. p. 13
32
uma prática social. A dimensão social e educativa da museologia está ligada ao património
cultural mas também ao processo e à prática social.
Estas mudanças na forma como os museus trabalham o processo museológico foram
possíveis, não só pelo alargamento do conceito de património mas também pelo surgimento
de um movimento na década de 60 que colocou novos desafios aos profissionais dos museus.
Este movimento, chamado de Nova Museologia, teve papel fundamental na mudança de
concepção dos museus. É o que veremos a seguir.
I.2.3. Uma nova museologia: um novo museu Para entendermos as mudanças que ocorreram na concepção do museu é preciso recuar
ao ano de 1958, quando se realiza no Rio de Janeiro o Seminário Regional da UNESCO sobre
a Função Educativa dos Museus. O Seminário serviu para uma ampla revisão das questões
pertinentes aos museus e teve como maior contribuição a afirmação da função educativa do
museu.
O surgimento de acções relacionadas com o movimento posteriormente chamado de
Nova Museologia teve início a partir das discussões realizadas na mesa redonda sobre a
função do Museu na América Latina, em Santiago do Chile em 1972. Foi no contexto das
transformações sociais da década de 70 que os museus latino-americanos sentiram
necessidade de discutir o seu papel frente à sociedade. Santiago do Chile não foi uma escolha
ao acaso neste período, o Chile estava sob um governo de cunho socialista inversamente ao
que ocorria nos outros países da América Latina. Infelizmente, as discussões que resultaram
em um documento tão importante para a museologia, não tiveram na América Latina uma
expressão maior naquele período, visto que alguns países como Bolívia, Peru e Brasil viviam
sob o regime de ditadura militar. O que aconteceria logo a seguir com Chile, Argentina e
Uruguai. No entanto, as ideias defendidas nesta mesa redonda tiveram rapidamente eco na
Europa.
As decisões da mesa redonda, fundamentais para o desenvolvimento da Nova
Museologia, foram quatro: os museus latino-americanos não estavam adaptados à sua
realidade e deveriam cumprir a sua função social, considerando todos os seus aspectos, ou
seja, o museu não só como um guardião do património, mas o desenvolvimento deste
património em prol da comunidade. Em segundo lugar, o museu deveria inverter o seu vector
temporal, ou seja, situar-se num momento do passado mas tendo como ponto de vista o
presente e com ele, atender o futuro. Como terceira decisão da mesa os participantes
adoptaram um novo tipo de museu: o museu integral, inspirado no conceito de ecomuseu
33
europeu, ou seja, um museu voltado para a comunidade. Por fim, decide-se criar uma
associação dos museus latino-americanos, filiada ao ICOM. (A.A.V.V.:1989)
“O conceito de museu integral questionou noções consagradas do universo
museológico como o colecionismo, o museu entre quatro paredes, e o patrimônio
oficial, identificado apenas com o histórico e o artístico. Despertou a atenção dos
profissionais para todo o patrimônio à espera de musealização, para a importância da
participação comunitária em todas as instâncias museológicas, e impôs novos métodos
de trabalho”. (ARAÚJO & BRUNO, 1995:6)
As novas concepções de museu comunitário, integral e ecomuseu encontraram
resistências em alguns sectores da museologia. Durante o encontro do ICOFOM no México
em 1980 e em Paris em 1982 as posições dos museólogos defensores de uma nova postura
frente às transformações sociais entraram em choque com o grupo que defendia uma
museologia mais tradicional. Em 1983, durante o encontro em Londres, O ICOM e o
ICOFOM irão rejeitar a “(...) existência de práticas museológicas não conformes ao quadro
estrito da museologia instituída(...)” (MOUTINHO, 1995: 26). O grupo ligado às novas
tendências museológicas resolveu, então, fazer um encontro no Canadá para organizar um
evento sobre a Nova Museologia. Durante este encontro de 1983, no ecomuseu de Haute
Beauce, no Canadá, Pierre Mayrand propôs a formação de um grupo de trabalho sobre
museologia comunitária (MENSCH, 1995).
Com o objectivo de aprofundar os estudos e reafirmar o papel do museu, enquanto
instituição voltada para o serviço da comunidade, teve lugar em Quebec, em 1984, o 1º
Atelier Internacional da Nova Museologia, sob a iniciativa de Pierre Mayrand e René Rivard.
Os objectivos deste atelier foram: “Criar as condições de intercâmbio sobre a ecomuseologia
e nova museologia no mundo. Definir as suas relações com a museologia em geral.
Aprofundar os conceitos e encorajar as práticas.” (MOUTINHO, 1989: 55-6)
As conclusões do 1º Atelier reafirmaram o papel social da museologia e a valorização
das identidades e culturas, além alertar para a necessidade de mudança do papel e da função
do museólogo. Com a Declaração de Quebec proclamou-se os princípios básicos da Nova
Museologia, reafirmando o papel social do museu.
“A museologia deve procurar, num mundo contemporâneo que tenta integrar todos os
meios de desenvolvimento, estender suas atribuições e funções tradicionais de
identificação, de conservação e de educação, a práticas mais vastas que estes
34
objectivos, para melhor inserir sua acção naquelas ligadas ao meio humano e físico.”
(Declaração de Quebec – 1984)30
Durante o encontro em Quebec ficou estabelecido que o próximo atelier seria realizado
em Lisboa, no ano seguinte. O atelier teria como objectivo dar continuidade à discussão sobre
a Nova Museologia e estudar o desenvolvimento dos museus locais na defesa do património.
(MOUTINHO, 1989). Assim, em 1985, durante o II Encontro Internacional Nova
Museologia/Museus Locais, realizado em Lisboa, reafirmou-se a declaração de Quebec e
criou-se o MINOM, cuja sigla significa Movimento Internacional para uma Nova Museologia.
Nos preceitos da Nova Museologia, o foco do museu deixa de ser a colecção e passa a
ser a comunidade, com seu património e sua especificidade. Os aspectos específicos da Nova
Museologia, definidos em Quebec, em 1984, podem ser explicados através de 10 princípios
(MOUTINHO, 1989: 57-61). O primeiro deles é a memória colectiva como a base do
património e referencial para o entendimento e transformação da realidade. Todos os saberes
e percepções históricas e sociais, e todos os testemunhos são sujeitos e objectos de
conservação nos museus. Além disso, os bens materiais são considerados património, na
medida em que são reflexos da memória colectiva de uma determinada comunidade.
O facto social substitui o objecto da colecção na prioridade do museu. No nível da
pesquisa e da interpretação, os sujeitos sociais são as principais preocupações da Nova
Museologia. Aqui entendendo facto social como o património, os saberes e a vivência da
comunidade do entorno.
O processo de criação é constante. Duas forças actuam no museu, uma no sentido da
institucionalização e outra no sentido da centrifugação, criando um movimento de inovações.
Os profissionais, que trabalham sob a óptica da Nova Museologia, têm consciência de que
todo movimento gera uma institucionalização e que a institucionalização tende a destruir
qualquer movimento. A Nova Museologia é o equilíbrio entre estas duas forças. A criação de
um museu comunitário é um processo contínuo de construção e reconstrução.
Os objectivos museais orientam-se para o desenvolvimento comunitário. A Nova
Museologia propõe que o centro da atenção do museu não seja somente os seus objectivos de
conservação e preservação do património, mas o desenvolvimento das comunidades do ponto
de vista cultural, mas também através da via social e económica.
O espaço do museu é o seu território de intervenção. O museu deixa de ser um espaço
com quatro paredes e passa a abranger um território de uma comunidade. A
interdisciplinaridade é essencial. Na Nova Museologia, o especialista, museólogo ou
30 - In: PRIMO, Judite - Pensar contemporaneamente a Museologia. In: Museologia, teoria e prática. 1999. p. 11
35
conservador, não actua sozinho, ele tem o apoio de outras áreas das ciências sociais. E tem,
principalmente, o apoio da comunidade do território.
A interpretação transforma os métodos museográficos, pois cabe ao museu estar em
constante busca por novas formas de interpretação do seu património. A Nova Museologia
utiliza interpretações diferentes a diferentes saberes, de forma a tornar a comunicação mais
próxima do utilizador, pois “(...) le musée a un rôle à la fois démonstratif et pédagogique, qui
se prolongue tout au long des programmes de développment. Il peut également servir de
média pour l´expression des avis et propositions de la population en direction des autorités:
c´est un lieu d´échange31” (VARINE, 2000 : 52)
Os métodos museográficos são baseados na participação popular. Em todos os níveis
de concepção, programação, realização e animação das exposições e manifestações museais, é
importante a participação popular. É no museu que os actores do desenvolvimento, a
população, articulam seus saberes e seu património.
O visitante passivo é cada vez mais desnecessário. Memória colectiva, sujeitos sociais e
movimento criador mudam completamente a noção do visitante do museu. Ele não é mais um
usuário contemplativo mas participante activo no trabalho do museu. Ele torna-se um actor do
processo museológico.
As atitudes, as relações e os hábitos de trabalho devem ser novos. É preciso uma
mudança de atitude dos profissionais e nas relações patronais. Os profissionais devem unir-se
e fazerem do museu um centro de discussão e de trabalho em conjunto.
Na Nova Museologia, o museu é visto como uma instituição social, adaptado às
necessidades da sociedade, e o seu objecto de estudo é a sociedade, o seu entorno e seu
património. E o património entendido como um bem cultural produzido pela sociedade e para
a sociedade. Foi a partir das discussões da Nova Museologia que os museus começaram a ter
um papel activo na comunidade. O museu deixou de ser mero depósito de obras raras de
carácter cultural e passou a ser uma instituição voltada para o desenvolvimento. Este processo
de mudança envolveu questões importantes como desenvolvimento comunitário,
envolvimento da comunidade, foco de actuação do museu, processo museológico e educação
permanente. Segundo Mário Moutinho “Não foi a museologia tradicional que evoluiu para
uma Nova Museologia mas sim a transformação da sociedade que levou à mudança dos
parâmetros da museologia”. (MOUTINHO, 1989: 102)
No novo museu o património, a população e o território interagem de forma a fazer do
museu uma instituição dinâmica voltada para o desenvolvimento da comunidade. A 31 - Tradução livre: “O museu tem um papel ao mesmo tempo demonstrativo e pedagógico que se prolonga nos programas de desenvolvimento. Ele pode também ser um meio de expressão dos desejos da população: é um lugar de trocas.”
36
comunidade tem papel fundamental no processo museológico do novo museu, aqui entendida
como uma população que vive em um território. E é papel deste novo museu articular a
comunidade e trabalhar para a recuperação da identidade local, dos saberes e da cultura
comunitária. Em 1979, Hugues de Varine criou um modelo comparativo entre esta nova
concepção de museu que se apoia no território + património + população, em oposição a uma
visão tradicional de museu, que reforça a ideia de que um museu é edifício, contendo uma
colecção, para atendimento ao público. O museu deixa ser uma instituição voltada para dentro
e passa a ser voltada para fora, para seu público utilizador.
Segundo Maria Célia Santos (2002), as principais contribuições do movimento da Nova
Museologia ao processo museológico podem ser evidenciadas nas acções de pesquisa,
preservação e comunicação. Estas acções sofreram alterações, pois o conhecimento é
construído na acção museal e para a acção museal. As acções museológicas não se esgotam
no espaço do museu, mas ampliam as possibilidades de novos processos de musealização na
comunidade. Maria Célia Santos (1996: 276) afirma que num processo museológico
enriquecido na dinâmica do processo social, “(…) o fato museal é a qualificação da cultura
em um processo interativo de acções de pesquisa, preservação e comunicação, objetivando a
construção de uma nova prática social”. A prática social leva à apropriação do património
pela comunidade e através desta apropriação, a comunidade pode construir uma nova prática
social.
Neste novo museu já não existe a ideia de público e sim de utilizador/beneficiário, pois
não possui uma função estática, de mero observador, mas participa activamente no processo
museológico. E a comunidade envolvida deverá agir de forma a absorver o processo e dele
fazer parte. “Par action communautaire, j’entends l’action qui est le fruit de l’initiative et de
l’effort synergique des membres d’une communauté, en vue d’ obectifs correspondant aux
intérêts du developpement de celle-ci32 .” (VARINE, 1991: 99)
O museólogo tem também um papel fundamental no novo museu. Não mais como um
grande expert de seu acervo, mas como sujeito do desenvolvimento social e articulador do
processo museal. O museólogo terá por função articular a comunidade para que ela possa
interagir no processo museológico. Cabe a ele prover aos membros da comunidade os
instrumentos conceituais e materiais que lhes permitem participar do processo de colecta,
preservação e difusão do património que é objecto do museu.
Os membros da comunidade não são sujeitos passivos deste museu, mas actuantes em
todas as fases da acção museológica. A Nova Museologia trouxe para o processo museológico 32 - Tradução livre:“Por acção comunitária, eu entendo a acção que é fruto da iniciativa e do esforço sinérgico dos membros de uma comunidade, em vista dos objectivos correspondentes aos interesses do desenvolvimento deles mesmos.”
37
uma reflexão de que o museu é uma instituição dinâmica e baseada na memória colectiva e
não nos objectos. As referências patrimoniais são portadoras desta memória e não o foco
principal do museu.
O objecto no novo museu não é mais entendido como o centro das atenções, mas sim
como meio de levar à comunidade a uma prática social. O objecto é um vector de
comunicação. Na actualidade, a função social dos museus é uma questão indiscutível. Uma
das questões que se coloca é como fazer com que o museu possa preservar e comunicar sem
perder esta função social. Para Waldisa Rússio,
“A grande tarefa do museu contemporâneo é, pois, a de permitir esta clara leitura de
modo a aguçar e possibilitar a emergência (onde ela não existir) de uma consciência
critica, de tal sorte que a informação passada pelo museu facilite a ação
transformadora do Homem” (RUSSIO, 1991:8)
Estas mudanças no papel dos museus foram fundamentais para o processo de
aproximação do museu com o seu público beneficiário, não só através de acções de
comunicação mas também envolvendo-o em todo o processo museológico.
I.2.4. Acção cultural dos museus O museu é uma instituição responsável por seleccionar, preservar e divulgar a memória
e a cultura na nossa sociedade e fazer destas acções mola transformadora da realidade. Entre
as acções museológicas encontra-se a divulgação. Ela não compreende só a exposição –
extroversão do acervo – mas também o atendimento ao público, seja ele da comunidade
envolvida no projecto, ou não. E este atendimento pressupõe a criação de um programa de
acção educativa direccionada para os diversos segmentos de público.
Segundo Teixeira Coelho (1988: 33), “A ação cultural tem sua fonte, seu campo, seus
instrumentos na produção simbólica de um grupo”. Para Teixeira Coelho, esta acção cultural
se dá em três momentos distintos: o primeiro deles diz respeito ao surgimento dos museus
para preservarem os bens culturais da humanidade, é a etapa da valorização dos produtos
culturais; o segundo momento é no pós 2ª Guerra Mundial onde há o desvio da obra para o
indivíduo, há uma valorização da pedagogia de transformação de indivíduos em grupos; e por
fim, o momento histórico vivido no pós Maio de 68 onde o foco da acção cultural passa a ser
centrado no indivíduo33.
33 - O movimento conhecido por Maio de 68 teve início na França por estudantes da Universidade de Nanterre em Março de 68. Apoiados por intelectuais e operários, os estudantes barricaram Paris e lutaram contra a polícia. A maior reivindicação dos estudantes era a mudança nos currículos e na organização académica, além da contestação à política imperialista francesa na Guerra da Argélia.
38
Para Teixeira Coelho (1988), a educação pode ser uma modalidade de cultura mas a
cultura será sempre mais ampla do que a educação. Por isso, é preciso que a acção educativa
dos museus não seja simplesmente um acto educativo, mas que ela seja uma acção cultural
com vistas a um determinado aprendizado. Segundo Mário Chagas (1994:65), “(…) a ação
educativa é processo de transformação do bem cultural em bem social”, ou seja, o museu
pode transformar esta sua acção em algo transformador da realidade. E aí ele estará
cumprindo a sua função social.
“A ação educativa de caráter museológico se desenvolve precisamente no âmbito do
fato museal. Essa afirmação, correta do ponto de vista teórico, diz pouco a respeito da
orientação vetorial da ação educativa, que tanto poderá estar voltada para o diálogo,
para a reflexão, para a transformação da realidade social, quanto para o monólogo,
para a domesticação e para a conformação social” (CHAGAS, 1994: 65)
Nos dias de hoje é muito raro a criação de um museu onde não esteja presente em seu
organograma um sector de acção educativa. No entanto, muitas vezes é apenas um sector de
atendimento ao público, comum em quase todos os museus, do que propriamente um
programa de acção educativa.
Os museus, na sua maioria, demoraram para despertar para as questões educativas. A
criação de serviços educativos nos museus é uma realidade do século XX. Antes disso, os
museus não se preocupavam em observar e muito menos propor actividades específicas para
tipos de públicos diferentes. E só a partir de 1952 que começaram a surgir publicações do
ICOM sobre o assunto (HENRIQUES, 1996). Com estas preocupações, foi criada em 1965 o
CECA – Comité Internacional para Educação e Cultura, que é organismo do ICOM
responsável pelas discussões sobre o uso educacional dos museus.
Os museólogos e especialistas começaram, na década de 50, a despertar para a
problemática da acção educativa nos museus. George Henri Rivière, em seu curso no Louvre
ministrava um seminário chamado ‘O museu como instrumento de educação e cultura’,
mostrando sua preocupação em relação ao papel educativo do museu. Para ele, o museu
poderia ser um instrumento de massa, trazendo a formação para o prazer, com actividades e
acções dirigidas. (DESVALLEES, 1989). Esta preocupação de Rivière já estava presente,
quando ele coordenou o Seminário Regional sobre a Função Educativa dos Museus
promovido pelo ICOM e UNESCO e realizado em 1958, no Museu de Arte Moderna do Rio
de Janeiro. Neste seminário, a preocupação com as relações entre museu e educação sofreu
um redimensionamento e um novo enfoque. O documento final do seminário “(…) dá ênfase
39
à função educativa dos museus, entendendo que a educação exercida é a formal; reconhece o
museu como se fosse uma extensão da escola.” (PRIMO, 1999: 8)
Além dos debates no Seminário, os museólogos ligados à Nova Museologia também
sofreram influência das ideias do educador brasileiro Paulo Freire. Em seus trabalhos, Paulo
Freire defendia uma pedagogia para a libertação do indivíduo, diferenciando-a da educação
bancária tradicional (PRIMO, 1999). A metodologia de Paulo Freire incitava a uma
participação activa dos agente sociais no processo educativo, pois para ele: “Ninguém educa
ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo
mundo” (FREIRE, 1992: 68). Os preceitos de Paulo Freire influenciaram os pensadores da
Nova Museologia no sentido da participação popular no desenvolvimento dos projectos
comunitários.
Mesmo antes do seminário do Rio de Janeiro, a Unesco realizou uma reunião na cidade
de Nova York, em 1952, entre educadores e técnicos de museus. Nessa reunião, com o nome
de ‘Seminário sobre o Papel dos Museus na Educação’, decidiu-se que os países deveriam
optar pelos seus próprios programas museológicos-educativos, a partir de sua realidade; que
seria fundamental a interacção entre o museu e a escola através de programação comum e que
os professores devem ser preparados para a actuação junto aos museus. (BRUNO & MELLO,
1989)
Segundo Tomislav Solá, citado por Rosana Nascimento (1998), o conceito de papel
educativo dos museus deve ser repensado para atingir a sua verdadeira dimensão. Mas o
sector educativo deve ser integrado à proposta do museu na sua totalidade, senão não atingirá
seus objectivos.
“(...) a ação educativa desenvolve-se com base no próprio fato museal e é processo de
transformação da relação do individuo com os testemunhos tangíveis e não-tangíveis da
cultura. E processo de redescoberta, de germinação de sentimentos, pensamentos,
sensações e intuições. E processo de apropriação do bem cultural em bem social”.
(CHAGAS, 1989: 47)
A dimensão pedagógica do museu abrange diversos sectores. Mas tem que se evitar
transformar o museu em uma sala de aula. Segundo Mário Chagas (s.d.: 3)“(...) é necessário
o abandono da postura sacralizada de repositário do patrimônio cultural, para que elas
passem a ser o veículo do patrimônio social.” A relação do museu com a escola é uma
relação necessária e primordial mas deverá ser diferenciada. É preciso que os museus dêem
formação aos professores de como utilizar o seu acervo, só assim, o museu dará à escola os
meios de utilizar mais e melhor suas exposições. (PRAET & POUCET, 1992)
40
Segundo Maria Célia Santos (1994), nos museus, assim como nas escolas, há um
reforço do papel de sacralização do saber. Para ela, as duas instituições podem ser
comparadas nestas posturas através de algumas premissas. Entre elas destacamos: a
valorização do herói, a recolha de objectos de determinados segmentos da sociedade, a
abordagem factual, o discurso da erudição e a descontextualização do conteúdo.
O museu deve exercer uma missão pedagógica, cultural e patrimonial porque ele
concorre com outras formas de lazer na preferência do público. As mudanças no papel do
museu e sua definição serviram também para modificar a forma como o público vê os
museus. Segundo René Teboul e Luc Champarnaud (1999), as mudanças nos museus
ocasionaram mudanças nas práticas culturais, de um lado por aumentar o público visitante, e
por outro lado pela mudança de uso dos museus pelo público. O museu passa a ser um espaço
de convivência da comunidade.
O museu esteve durante muito tempo voltado para si mesmo. Quando o museu se voltou
para o público foi preciso definir melhor a sua forma de actuação. Mudou-se a relação do
museu com o visitante, agora não mais público estático mas público participativo. Neste
aspecto Hugues de Varine (1989: 314), ressalta que George Henri Rivière concebia este
público participativo como sujeito activo no museu: “En réalité, pour lui, le public devait
trouver au musée une jouissance personnelle, non seulement dans la contemplation des
collections exposées, mais aussi dans le confort de la visite34.”
Nestor Garcia Canclini (1988), em pesquisa realizada sobre o público nos museus de
arte do México, detectou nas respostas dos utilizadores uma clara distinção dos espaços:
museu e casa, o uso simbólico e o utilitário, entre o estético e o quotidiano. Na verdade, os
estudos sobre o público dos museus têm demonstrado que ele está cada vez mais heterogéneo
e que não podemos trabalhar esta noção como algo dado. Para Garcia Canclini (1998: 150), o
público é “(…) uma soma de setores que pertencem a estratos econômicos e educativos
diversos, com hábitos de consumo cultural e disponibilidade diferentes para relacionar-se
com os bens oferecidos no mercado”.
Se o museu passa a ser entendido, pós anos 60, como uma instituição voltada para a
comunidade, faz-se necessária uma maior convivência com outras instituições ligadas ao
processo identitário da comunidade. Entre todas as instituições talvez seja a escola a mais
privilegiada, pois ela tem um papel fundamental no quotidiano da comunidade: ela prepara as
novas gerações. É neste aspecto que o museu pode ter um papel fundamental, o de formar
novas gerações preocupadas com a preservação patrimonial da comunidade. As novas
34 - Tradução livre: “Na realidade, para ele (Rivière), o público deveria descobrir no museu um prazer pessoal, não somente na contemplação das colecções expostas mas também pelo conforto da visita.”
41
gerações poderão ser educadas em uma concepção de património mais alargada. E este é um
dos papéis do museu e da escola. Os desafios da acção educativa nos museus é fazer com as
novas gerações tenham o museu como uma instituição pertencente ao seu mundo, e não como
algo distante da sua realidade, pois “Os museus, como meios de comunicação de massa,
podem desempenhar um papel significativo na democratização da cultura e na mudança do
conceito de cultura.” (GARCIA CANCLINI, 1998: 169).
Conforme vimos anteriormente, o público, nessa nova concepção de museologia, é um
sujeito activo e participativo no processo museológico, interagindo e fazendo deste processo
uma ferramenta de mudança social. O público não é somente o visitante, aquele que entra no
museu para ver alguma exposição ou participar de alguma actividade. A concepção de público
também muda pois agora é ele também beneficiário do processo museológico e não mais um
sujeito passivo do processo. Segundo Fernando João Moreira (s.d.: 3), na concepção mais
alargada de público, “(…) passa a incorporar aqueles que utilizam o museu ou, sobretudo no
caso dos novos museus, que se utilizam do museu, independentemente da forma que essa
utilização assuma. Ou seja, o conceito de público passa a repousar na ideia central de
utilizador”. Segundo este autor, nessa concepção de utilizador, a visita deixa de ser o
elemento central da actividade museológica. Nesse sentido, as acções extra-muros dos museus
realizadas pela Internet ou utilizando outras formas de comunicação e interacção com o
público, são de grande valia para desmistificar a própria concepção de público.
I.2.5. Considerações finais Pode-se dizer que as funções dos museus podem ser definidas em duas grandes linhas: a
primeira delas é trabalhar a memória colectiva, através de referências patrimoniais, tornando-
se uma instituição activa socialmente. A outra função é mediar o processo museológico,
potenciando a relação entre os utilizadores e o seu património.
O museu, ao longo de sua trajectória, sofreu mudanças em sua concepção, pois é uma
instituição que procura traduzir e reflectir o seu tempo. Nesse sentido, as mudanças
preconizadas pela Nova Museologia inseriram os museus na realidade das comunidades,
evidenciando o seu papel social. O museu, como toda instituição, necessita estar sempre se
renovando, criando condições de levar seu trabalho de forma eficiente a um número maior de
pessoas, pois cabe, também, às instituições museológicas um papel activo no processo de
desenvolvimento da sociedade. Para isso, é preciso que os museus trabalhem para que suas
actividades possam estar mais perto do quotidiano das pessoas. Nesse sentido, uma das
ferramentas que pode ajudar o museu a sair de seus muros e abranger um maior número de
42
pessoas é a Internet. A Internet não só possibilita uma divulgação mais eficiente do trabalho
dos museus, mas também abre a possibilidade de novas interacções no espaço virtual,
complementando as actividades realizadas no espaço físico ou criando novas perspectivas de
acções museológicas.
43
I.3. O mundo da Internet
“A informática já não tem a ver com computadores. Tem a ver com a vida” Nicholas Negroponte (1996) Ser Digital. p. 14
A Internet é algo ainda muito novo, pois a proliferação de seu uso começou
efectivamente na década de 90 do século XX. Mesmo uma das funcionalidades mais antigas,
como o correio electrónico, é relativamente nova, pois em 2004 comemorou 30 anos de
existência. Em termos históricos é um tempo muito curto. No entanto, já é possível verificar
algumas transformações ocorridas em várias áreas do conhecimento por causa do advento da
Internet. Hoje, é quase impossível pensar num mundo sem a sua presença, mesmo que boa
parte de seus usuários viveram sua infância, adolescência e juventude sem utilizá-la.
O objectivo deste capítulo é entender qual é a configuração da Internet, como ela surgiu
e como acarretou uma revolução no mundo. Mais do que um capítulo introdutório à questão
da virtualidade que será trabalhada a seguir, este capítulo tem como objectivo entender os
processos de comunicação deste novo veículo. Não há uma intenção de aprofundar este
estudo, visto não ser este o objecto da dissertação, mas compreender alguns aspectos
fundamentais para o entendimento da questão. Para isso, serão discutidas a criação do
hipertexto e o surgimento do ciberespaço, que foram de fundamental importância para o
desenvolvimento da Internet.
I.3.1. Configuração da Internet A Internet é uma rede que liga computadores do mundo inteiro. Para ter acesso a esta
rede, basta conectar-se a um computador equipado com modem ou uma placa de rede ligada a
um provedor de acesso35. Esse computador local será ligado a um outro computador e assim
por diante. A conexão entre estes computadores pode ser feita por telefone, por satélite ou por
cabo. A Internet não é só uma rede, mas uma conexão de várias redes, interligando-se entre si.
Os nós da Internet estão espalhados pelo mundo inteiro, possibilitando um acesso rápido a
qualquer conteúdo.
A Internet é, também, uma grande biblioteca com médias variadas (textos, livros,
músicas, fotos, vídeos, jogos, etc.) cujo conteúdo está descentralizado e armazenado em
computadores servidores (servers) ao redor do mundo. Os servidores são máquinas de alta
capacidade, com grande poder de processamento e conexões velozes controladas por
35 - Modem são as iniciais das palavras MODulator-DEMolutador, é um dispositivo físico (hardware) que permite ao computador ligação à linha telefónica ou ao cabo.
44
universidades, empresas e órgãos do governo, utilizando os protocolos de comunicação
TCP/IP36.
Para que todos os computadores possam estar em rede, permitindo que seus utilizadores
conversem, foram criados protocolos de comunicação. Os protocolos são regras que permitem
a troca de informações entre computadores e sistemas operacionais diferentes. Para cada tipo
de função na Internet foi criado um protocolo específico. Para ter acesso ao correio
electrónico foi criado um sistema universal que lê o endereço que contém o símbolo arroba no
meio37. Para a transferência de ficheiros foi criado o FTP, que permite que um utilizador tenha
acesso a um directório de um servidor remoto38. E por fim, foi criado o protocolo HTTP que
permite o acesso às páginas estáticas (em formato HTML) ou páginas dinâmicas extraídas de
base de dados39. O protocolo HTTP é utilizado nos browers que são programas que lêem as
páginas web40. Foi a criação dos browsers que permitiu a popularização da Internet fora dos
meios académicos.
A Internet está descentralizada e não tem dono. E nisso, reside todo o seu sucesso. Não
existe um órgão central de controlo, pois cada nó da rede interliga-se de forma autónoma com
os outros nós. Foi criada uma organização de utilizadores chamada ISOC – Internet Society -
que promove a troca de informações sobre o seu uso (SILVA & REMOALDO, 1997) e cada
país optou por uma determinada instituição para o controlo da Internet e dos nomes de
domínio da Internet naquele país41. Em Portugal a entidade responsável pelos nomes de
domínio é a FCCN – Fundação para Computação Científica Nacional. No Brasil, o organismo
responsável é o Comité Gestor da Internet, criado em 1995, que através do Registro.br
controla o registo dos nomes de domínio42.
A Internet é mantida pelas pessoas e empresas que pagam as suas conexões. Os custos
de manutenção das páginas são suportados pelas pessoas, empresas e instituições que são
responsáveis pelo seu conteúdo, utilizando-se para isso de venda de publicidade e outros
36 - Transfer Control Protocol/Internet Protocol: Protocolo de controlo de transferência. 37 - E-mail: endereço electrónico de correspondência. O e-mail é sempre composto pelo nome escolhido pelo usuário, seguido do símbolo @ e logo após o nome do provedor de acesso. É um dos sistemas mais utilizados actualmente no mundo inteiro. 38 - File Transfer Protocol: protocolo utilizado para transferência de ficheiros. Esse sistema permite que o utilizador envie determinado ficheiro (texto, imagem, etc.) através de um programa de janelas, onde o remetente lê o directório do destinatário. 39 - A sigla Hyper Text Markup Language significa em inglês Linguagem de Marcação de Hipertexto. É a linguagem padrão usada para criar páginas web com programação de hipertexto. E a sigla Hyper Text Transfer Protocol é um protocolo de transferência de hipertextos que permitem a leitura das páginas web pelos browsers. 40 - O browser é o software ou programa, usado para visualizar páginas web. Actualmente os mais usados são o Internet Explorer e o Netscape Navigator (ou Mozilla). 41 - Os nomes de domínio também são chamados de URL – Universal Resources Locators. 42 - Portaria Interministerial Número 147 de 31 de Maio de 1995.
45
mecanismos de captação de recursos. Um dos maiores usos da Internet é a consulta às páginas
de conteúdo. Este sistema só foi possível usando a tecnologia dos hipertextos43.
I.3.2. Origens da Internet A ideia de uma rede que ligasse todos os computadores surgiu no contexto da Guerra
Fria. Na ocasião, estudiosos do Pentágono, com medo da eminência de uma terceira guerra
mundial, começaram a pesquisar formas de armazenar dados que pudessem estar disponíveis
em vários servidores e não em um único servidor. Assim, se um servidor fosse destruído, as
informações vitais para a segurança dos Estados Unidos estariam à salvo nesta rede virtual. É
essa a ideia que deu origem à uma rede descentralizada. A Internet nasceu, portanto, por
questões políticas e de segurança militar (ROSA, 2003).
Em 1962 Joseph Licklider, investigador do MIT – Massachusetts Institute of
Technology, escreveu uma série de artigos em que propunha o conceito de ‘Galactic
Network’. A ‘Galactic Network’ seria um conjunto de computadores, ligados entre si, a partir
dos quais qualquer pessoa poderia ter acesso a informações muito diversas,
independentemente do local onde elas se encontrassem (MARCELO, 2001).
O início das primeiras redes de computadores aconteceu no final dos anos 60 e início
dos anos 70, sendo conhecidas como tecnologias de Redes Locais (LANs - Local Area
Networks). Para resolver os problemas de incompatibilidade das redes, surgiu no final de
1970 o projecto ARPA (Advanced Research Projects Agency), do Departamento de Defesa
dos Estados Unidos, usando tecnologias variadas. O Pentágono viu que a rede podia ser
utilizada como troca de informações entre as universidades americanas e cedeu-a, que no seu
início era ligada somente a quatro computadores, para uso académico. O primeiro nó da rede
da ARPA, mais conhecida como ARPANET, foi efectuado pela Universidade da Califórnia,
em Los Angeles (UCLA), em 1969.
Na década de 70 com o surgimento do computador pessoal (PC), a ARPANET começou
a ter um sentido muito mais amplo. Não só a proliferação do uso dos PC´s estimulou o
crescimento da rede, mas também o surgimento do Unix, sistema operativo criado pela Bell
Laboratories, foi responsável pela propagação da comunicação.
Em 1983, a ARPANET dividiu-se em duas: a ARPANET para investigação e a
MILNET, para uso militar (RHEINGOLD, 1996). Surgiram os protocolos de comunicação, o
correio electrónico e o sistema de FTP. Em 1986, a NSF - National Science Foundation
43 - O hipertexto permite cruzar informações dentro do próprio site ou com informações de outros sites através de links (marcações) no texto ou imagens da página.
46
tornou-se o principal sustentáculo da rede das redes, agora com o nome de Internet. Nasce
então a Internet (Interconnected Networks) ou World-Wide Web (WWW), usando o sistema
de TCP/IP. No entanto, o conceito de Internet foi criado por Vint Cerf e Bob Jahn em 1973.
Era a ideia de ligar redes isoladas com uma linguagem comum.
No entanto, a banalização da Internet só foi possível a partir de 1989, quando da criação
de um sistema de informação baseado em hipertextos. Concebido por Tim Berners-Lee e
Robert Cailliau do CERN (Centre Européen de Recherches Nucléaires), localizado em
Genebra, este sistema está baseado em três ideias principais: a navegação por hipertextos, a
integração dos sistemas existentes (e-mail, FTP, etc.) e apoio multimédia. E em 1990 a
ARPANET foi desactivada. Em 1991 surgiu a mais importante ferramenta da Internet: o
HTTP. Em 1993, surgiu o Mosaic, primeiro browser, sistema capaz de codificar e
descodificar os hipertextos, e em 1993, a NSF, que é um organismo do Governo americano,
transferiu suas funções à iniciativa privada.
Em Portugal as primeiras ligações à rede foram feitas em 1991 através do PUUG –
Portuguese Unix Users Groups. Neste mesmo ano a FCCN iniciou o registo de nomes de
domínios.pt. Em 1992 o primeiro servidor web foi colocado em funcionamento. Em 1994 é
considerado o ano Zero da Internet em Portugal por ser o ano de inauguração do serviço de
acesso à Internet pela Telepac (SILVA, 1999).
Em Maio de 1989 já existiam no Brasil três ligações à Internet: entre o Laboratório
Nacional de Computação Científica (LNCC) do CNPq, no Rio de Janeiro e a Universidade de
Maryland, em Washington, entre a Fundação de Amparo à Pesquisa do estado de São Paulo
(Fapesp) e o Fermi National Laboratory (Fermilab) em Chicago e entre a Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Universidade de Califórnia em Los Angeles (UCLA)
(STANTON, 1998). Em 1991 através da linha da Fapesp foi liberado o acesso às
universidades, instituições de pesquisa e órgãos governamentais. Em Maio de 1995 através de
uma portaria conjunta do Ministério das Comunicações e do Ministério da Ciência e
Tecnologia a Internet foi liberada aos provedores comerciais.
Surgida como um meio de comunicação e de troca de informações entre as
universidades americanas, a Internet começou a expandir-se realmente pelo mundo e criar
uma nova realidade a partir de 1993. A popularização do uso dos microcomputadores (os
PC´s ) foi o grande responsável pelo crescimento da Internet. A criação de sistemas
operacionais mais acessíveis permitiu também o crescimento de números de utilizadores da
Internet. Os números da Internet crescem a cada ano de forma cada vez mais acelerada.
Segundo o Instituto Ipsos-Insight, que realizou pesquisa em 12 países, o número de pessoas
conectadas à Internet aumentou 7% em 2002, totalizando no conjunto desses 12 países, 335
47
milhões de utilizadores44. Em Julho de 2003, 38, 3% dos portugueses possuía computadores
em suas residências e 21,7% teria acesso à Internet em casa45.
Em pesquisa realizada em Dezembro de 2003, o número de utilizadores no Brasil
conectados em suas residências estava na ordem dos 12,3 milhões de pessoas, ou seja 7,23%
da população46. Embora aparentemente a proporção de utilizadores residenciais não é tão
grande no Brasil, o uso da Internet está cada vez mais difundido. Em pesquisa realizada em
Maio de 2004, o Brasil era segundo país com maior tempo de consulta à Internet,
dispendendo cada pessoa 13 horas e 51 minutos por mês47. Este número só é maior no Japão.
Além disso, o Brasil é o país onde os sites governamentais são mais consultados pela
população.
Gráfico 1 – Gráfico sobre a consulta a sites governamentais
Fonte: www.ibope.com.br (consultado em 20/05/2004 às 12h30)
O crescimento da Internet em todo o mundo tem superado as expectativas e previsões do
mercado. No entanto, é preciso alertar que a Internet, mesmo com toda popularização, ainda é
uma forma de comunicação pouco utilizada se trabalharmos com os números globais da
população do mundo. Ainda são muitos os excluídos digitais. Em 2001, numa pesquisa 44 - Informação retirada endereço da World Wide Web: http://www.ipsos-insight.com/tech/publications/fow.cfm, em 2 de Março de 2004, às 16h00. 45 - Pesquisa efectuada pelo Instituto Nacional de Estatísticas – INE. http://www.ine.pt, consultada em 2 de Março de 2004, às 15h45. 46 - Dados levantados pela pesquisa IBOPE//NetRatings. http://www.ibope.com.br, consultada em 20 de Março de 2004, às 15h30. Este número é relativo aos utilizadores conectados em suas residências e não leva em conta o número de pessoas que têm acesso à Internet no trabalho ou em outras instituições. A população do Brasil conta actualmente com 170 milhões de pessoas segundo dados do censo demográfico de 2000, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (http://www.ibge.gov.br). 47 - Pesquisa IBOPE//NetRatings. Disponível no endereço www.ibope.com.br e retirada em 26 de Junho de 2004, às 11h20.
48
realizada pela Internet Business demonstrou que 41% de todo acesso mundial concentrava-se
nos EUA e Canadá e que a América Latina respondia por apenas 4% (SILVEIRA, 2001). Os
países mais pobres são justamente aqueles onde os números da Internet são menores, pois a
exclusão digital é, também, uma face da exclusão social.
I.3.3. Uma revolução silenciosa Hoje quando falamos em novas tecnologias de comunicação não poderemos deixar de
falar da Internet. E como afirma Negroponte, hoje em dia, a informática diz mais respeito à
vida do que aos computadores. O surgimento de novas tecnologias de informação está
modificando a forma como as pessoas vêem o mundo. É uma autêntica revolução da
tecnologia da informação. E “A tecnologia da informação é para esta revolução o que as
novas fontes de energia foram para as revoluções industriais sucessivas.” (CASTELLS,
2002:68). Segundo Castells essa revolução permitiu a criação de um novo paradigma: o da
tecnologia da informação. Manuel Castells (2002) aponta cinco características deste novo
paradigma48. A primeira característica deste paradigma é a sua matéria-prima que é a
informação, ou seja, são tecnologias para agir sobre a informação e não apenas informação
para agir sobre a tecnologia. Um segundo aspecto diz respeito à penetrabilidade dos efeitos
das novas tecnologias. Todas as actividades humanas são moldadas pelo novo meio
tecnológico, acrescenta Castells. Como terceira característica ele aponta a lógica de redes
como um elemento essencial neste novo paradigma. Em quarto lugar surge a flexibilidade, ou
a possibilidade de reconfiguração das redes e organizações. E por fim, a quinta característica
do paradigma tecnológico é a possibilidade de integração entre os sistemas, ou seja, a
convergência tecnológica entre equipamentos electrónicos. Neste sentido, Nicholas
Negroponte (1996) defende que a convergência tecnológica será o grande passo para o futuro.
Ela possibilitará ao homem cada vez mais usufruir das novas tecnologias que fazem parte de
seu quotidiano.
No entanto, é lícito afirmar que a relação entre as pessoas e as novas tecnologias traz
algumas questões polémicas. Alguns autores como Jean Baudrillard e Paul Virilio vêem esta
relação com certa temeridade. Baudrillard (1997) admite que a digitalização do saber e da
informação trará cada vez mais benefícios à humanidade mas não percebe as implicações que
esta revolução trará ao quotidiano das pessoas. Já Paul Virilio (2000) considera que é absurda
a ideia de que o ciberespaço possa servir à democracia, pois a Internet reproduz as mazelas da
48 - Para a definição do paradigma da informação, Castells baseou-se na concepção de paradigma tecnológico enunciado por Carlota Perez, Christopher Freeman e Giovanni Dosi.
49
sociedade. Vírilio possui uma visão de que a Internet, por ter sua origem no Pentágono, é um
veículo de comunicação essencialmente militar.
Entre os autores considerados ciberotimistas, destacam-se Manuel Castells, Pierre Lévy
e Nicholas Negroponte que vêem na Internet uma nova forma inovadora de comunicação e
interacção. Mesmo autores mais cépticos como Dominique Wolton defendem a capacidade da
Internet em modificar o quotidiano das pessoas, pois “Com a Net, estamos do lado da
emissão, da capacidade de transmissão sem reflexão a priori sobre o receptor (que poderá
ser qualquer internauta, em qualquer parte do mundo).” (WOLTON, 2000: 91)
A massificação da comunicação que se efectivou de forma irreversível pela Internet,
trouxe uma nova perspectiva: a de que as novas tecnologias servirão para auxiliar as pessoas
no seu dia-a-dia. Nessa concepção, a Internet não é só um meio de comunicação de massa
mas também uma forma de ver o mundo. Nicholas Negroponte (1996) chega mesmo a
defender que vivemos a era da pós-informação, ou seja, a Internet não só um meio de
comunicação de massas, mas também a personalização da informação do eu digital49. Para
este autor, a Internet possibilita essa convergência entre o eu personalizado e o mundo, uma
vez que é acessível a qualquer pessoa não só a sua consulta, mas também a possibilidade de
interacção neste novo universo.
Segundo Michael Benedikt (1991), os egos e seus múltiplos papéis têm uma nova
existência no ciberespaço, pois a Internet possibilita aos actores sociais uma maior
comunicabilidade com o mundo, seja na produção de diários (blogs) ou na criação de páginas
pessoais50. O surgimento de ferramentas para a construção dos weblogs possibilitou a
proliferação da criação de páginas pessoais, permitindo a troca de experiências pelos seus
utilizadores. Os weblogs “(…) propiciam um outro tipo de vivência: desmaterializada,
desterritorializada, constituída a partir da relação com o mundo virtual, no não-lugar”
(KESSEL, 2003: 68) e permitem também a construção colectiva de um determinado
conteúdo, tornando-se num “(…) um objecto comum, dinâmico, construído (ou, pelo menos
alimentado) por todos aqueles que o usam.” (LÉVY, 2001: 122). A proliferação dos blogs
deu à Internet uma nova face: a de um grande mural de troca de experiências. Utilizadas, na
sua maioria, por adolescentes, as ferramentas de criação e manutenção dos blogs, permitem
uma maior interacção das pessoas com a Internet. Nesse sentido, há uma grande tendência
49 - Um autor que estuda mais profundamente a questão da identidade na era da Internet é Sherry Turkle em suas obras: O segundo eu: os computadores e o espírito humano e A vida no ecrã: a identidade na era da Internet. 50 - O blog ou weblog é uma espécie de diário na Internet. Permite ao utilizador acrescentar informações, imagens, links sem possuir conhecimento específico para a construção de páginas web. O boom do uso dos blogs foi a partir de 1999. Segundo pesquisa realizada pelo Ibope/NetRatings, o número de visitantes aos blogos cresceu 14,6% no Brasil entre Janeiro e Maio de 2004. Informação retirada do site: http://www.ibope.com.br, em 26 de Junho de 2004, às 11h10.
50
pela substituição das páginas pessoais pelos blogs, por tratar-se de ferramentas de fácil uso
por qualquer pessoa, sem necessidade de maiores conhecimentos informáticos para a sua
manipulação.
Pierre Lévy (1994) chega mesmo a definir a Internet como uma nova mutação cultural
da humanidade, fenómeno este a que ele dá o nome de tecnologias da inteligência51. Para
este autor, diferentes tecnologias da inteligência tem se sucedido ao longo da história da
humanidade: a primeira fase seria das sociedades orais, o segundo marco é o surgimento da
escrita, o terceiro a criação da imprensa e por último o surgimento da Internet52. Para Lévy
(1994), o surgimento da Internet é tão importante quanto a passagem das culturas orais para a
cultura escrita, pois conjuga características das sociedades orais, quando as mensagens eram
recebidas no momento exacto da emissão, com elementos dos meios de comunicação actuais
(escrita, televisão, rádio), permitindo a comunicação mesmo sem o contacto directo com o
receptor da mensagem. A Internet, no entanto, permite uma interacção maior entre emissor,
receptor e mensagem. Lévy chama isso de universalidade sem totalidade.
“Com efeito, o maior evento cultural anunciado pela emergência do ciberespaço é o
desatrelamento entre esses dois operadores sociais ou máquinas abstratas (muito mais
do que conceitos!) que a universalidade e a totalização são. A causa é simples: o
ciberespaço dissolve a pragmática de comunicação que, desde a invenção da escrita,
havia conjuntado o universal e a totalidade. Com efeito, leva-nos de volta a essa
situação anterior a escrita — porém, numa outra escala e em outra órbita — na medida
em que a interconexão e o dinamismo em tempo real das memórias online faz os
parceiros da comunicação partilharem novamente o mesmo contexto, o mesmo imenso
hipertexto vivo.” (LÉVY, 1998)
A Internet será a revolução do século XXI, pois permitirá uma nova forma de interacção
do sujeito social com o seu mundo. É uma revolução porque as novas tecnologias possibilitam
não só um maior acesso às informações, de modo globalizado e instantâneo, mas também uma
interacção maior pelos utilizadores. Além disso, a Internet, como veremos a seguir, não ocupa
espaços tradicionais, pois no dizer de Jean-François Lyotard (1989: 71) tem uma “(…)
capacidade global de memorização que devemos estimar à escala cósmica.” Por fim, é
51 - Lévy chega mesmo a propor um quadro dos três pólos do espírito: pólo da oralidade primária, pólo da escrita e pólo informático-mediático. No pólo informático-mediático “os actores da comunicação partilham cada vez mais o mesmo hipertexto”. (LÉVY, 1999:160). 52 - Nesse sentido, Lévy apoia-se nas ideias de Marshall Mcluhan, que em sua obra A Galáxia de Gutenberg aponta a criação de uma nova era nas comunicações a partir da invenção da imprensa por Gutenberg. Mcluhan defende o surgimento de uma nova era com o surgimento da televisão e a globalização do mundo, ao cunhar o termo ‘aldeia global’.
51
importante ressaltar, parafraseando Melvin Kranzberg, que a Internet não é nem boa, nem
ruim, mas necessária53.
A Internet é um veículo e uma forma de comunicação em constante evolução e
necessária, nos dias de hoje, a qualquer instituição. É praticamente impossível prescindirmos
da Internet para a realização de uma pesquisa nos dias de hoje. Cada vez mais temos mais
acesso às informações através da Internet, e cada vez mais temos mais necessidades de mais
informações. Mas a revolução da Internet também é a revolução do hipertexto, uma forma de
acesso à informação criada anteriormente, mas que teve o seu boom com a Internet. Isso é o
que veremos a seguir.
I.3.4. A revolução do hipertexto O hipertexto pode ser definido como uma forma de acesso às informações através de
links entre vários textos54. Pierre Lévy define o hipertexto com “Um conjunto de nós
conectados pelas ligações. Os nós podem ser palavras, páginas, imagens, gráficos ou partes
de gráficos, sequências sonoras, documentos complexos que podem ser, eles próprios,
hipertextos” (LÉVY, 1994: 43).
A ideia de hipertexto foi enunciada pela primeira vez por Vannevar Busch, em 1945,
num artigo publicado na revista ‘Atlantic Monthly’ cujo título era ‘As we may think’
(BUSCH, 1945). Baseado num sistema de microfichas chamadas Memex, Busch afirmava
que a mente humana opera por associação de redes e caminhos criados pelas células do
cérebro. Para Busch, a criação do sistema Memex era justificada pela necessidade do
processamento das informações colectadas pelos pesquisadores, em número cada vez maior,
transformando-se numa explosão de informações (LANDOW, 1995). O Memex utilizava o
sistema de hipertexto para compilar e organizar estas informações.
No entanto, o termo hipertexto só foi utilizado, com a ideia de exprimir uma
escrita/leitura não linear no sistema informático, na década de 70 por Theodore Nelson
(LÉVY, 1994). Nesse sentido, Theodore Nelson utilizou o termo hipertexto para criticar a
linearidade da escrita, pois o hipertexto possibilita o cruzamento de informações, distribuídas
em ficheiros diferentes. O conceito de hipertexto defendido por Nelson é de “(...) una
53 - Melvin Kranzberg em seu artigo ‘The information age: evolution or revolution?’ publicado no livro de Bruce Guile Information Technologies and Social Transformation, em 1985 e citado por Manuel Castells em A Sociedade em rede. Vol. 1. p. 113., afirma que “a tecnologia não é nem boa, nem ruim e também não é neutra”. 54 - No hipertexto, a ideia de cruzamento não só em relação aos textos propriamente ditos, mas aos ficheiros armazenados em diferentes servidores.
52
escritura no secuencial a un texto que bifurca, que permite que el lector elija y que se lea
mejor en una pantalla interactiva55.” (citado por LANDOW, 1995: 15)
George Landow (1995) trabalha o conceito de hipertexto, utilizando-se da concepção de
texto preconizados pelos estruturalistas e pós-estruturalistas, nomeadamente Roland Barthes e
Michel Foucault56. Nesse sentido, o conceito de hipertexto é a de um texto electrónico
composto de fragmentos de textos e os nexos electrónicos que conectam entre si. Para
Landow, a versatilidade do hipertexto está justamente em estabelecer essas ligações entre
vários textos, tornando o leitor, um sujeito activo no processo da leitura. O hipertexto, na
visão de Landow, permite uma leitura descontínua e aleatória. Ele chega a afirmar que o
hipertexto seria uma forma de metatexto, pois “Una de las características fundamentais del
hipertexto es estar compuesto de cuerpos de textos conectados57.” (LANDOW, 1995: 24)
O hipertexto, que já era utilizado em bases de dados multimédia e em CD-ROM’s como
uma forma de cruzar informações entre vários ficheiros, ganhou uma nova dimensão com a
Internet. Com o hipertexto, a Internet tornou-se um meio de comunicação mais ágil e mais
permeável, porque permitiu o cruzamento de informações alojadas em servidores distantes e
não somente entre ficheiros de uma origem. O hipertexto possibilitou a criação de uma grande
biblioteca desterritorializada. Ela é desterritorializada, pois permite armazenar e cruzar
informações locadas em espaços completamente diversos. Para alguns autores, nomeadamente
Pierre Lévy, o surgimento do hipertexto é a grande ferramenta da revolução da Internet.
Segundo Pierre Lévy (1994) o hipertexto possui seis características: metamorfose,
heterogeneidade, multiplicidade e encaixamento de escalas, exterioridade, topologia, e por
fim, mobilidade dos centros. Todas estas características fazem do hipertexto a base para a
interligação dos nós da rede. É como uma grande enciclopédia ligando verbetes a conteúdos
mais diversos e variáveis. O hipertexto é uma ferramenta que possibilita ao utilizador uma
interacção maior com o conteúdo apresentado nos sites, pois ele é apenas “(…) uma matriz de
textos potenciais, e apenas alguns vão realizar-se através da interacção com um utilizador”
(LÉVY, 2001: 37)
“Hipertextualidade significa acesso interactivo de alguma coisa para algum lado. Tal
como a digitalização é a forma de produção de conceito, a hipertextualidade é a forma
de armazenamento e distribuição de conteúdo.” (KERCKHOVE, 1999: 32)
Nesse sentido, o hipertexto tornou possível o cruzamento de informações variadas,
permitindo ao utilizador uma maior navegação pelo conhecimento apresentado. Não que 55 - Tradução: “(…) uma escritura não sequencial a um texto que bifurca, que permite que o leitor e que se possa ler melhor num monitor interactivo”. 56 - Landow basea-se nas obras de Michel Foucault Arqueologia do Saber e de Roland Barthes S/Z. 57 - Tradução livre: “Uma da características fundamentais do hipertexto é estar composto de corpos de textos conectados”.
53
hipertextualidade é garantia total de interactividade, pois a interactividade demanda outras
características que o hipertexto não abarca, mas é uma forma de acesso às informações.
I.3.5. Espacialidade e temporalidade na Internet: o ciberespaço A Internet trouxe novos enfoques aos conceitos de tempo e de espaço. O processo de
comunicação já não é mais unilateral mas permite interacção intemporal e espacial. O espaço
na Internet (o ciberespaço) define as relações entre os indivíduos e o espaço virtual.
A palavra ciberespaço foi utilizada pela primeira vez no romance ‘Neuromante’ ou
‘Neuromancer’ (no original em inglês), de William Gibson. Publicado em 1984, o romance de
Gibson apresenta o ciberespaço como um conjunto de redes de computadores onde as
informações circulam. É no ciberespaço que acontecem as batalhas entre as empresas
multinacionais pelo domínio do mundo. É a nova fronteira. O ciberespaço gibsoniano seria
“(…) uma «alucinação consensual» onde podemos nos conectar através de «chips»
implantados no cérebro” (LEMOS, s.d.).
O ciberespaço é definido por Pierre Lévy (2000: 95) como “(…) o espaço de
comunicação aberta pela interligação mundial dos computadores e das memórias
informáticas”. O ciberespaço é um espaço criado pela comunicação mediada por
computadores, mais conhecida como CMC. Através da CMC é possível interagir neste novo
espaço. Mas o espaço físico do ciberespaço, no sentido mais conhecido, é entendido como os
computadores que armazenam as informações.
“O ciberespaço não compreende somente materiais, informações e seres humanos, ele é
também povoado por seres estranhos, semi-textos, semi-máquinas, semi-atores, semi-
cenários: os programas. Um programa ou software, é uma lista bem organizada de
instruções codificadas que visam fazer cumprir uma tarefa determinada a um ou mais
processadores. Por intermédio dos circuitos que eles comandam, os programas
interpretam dados, agem sobre informações, transformam outros programas, fazem
funcionar computadores e redes, accionam máquinas físicas, viajam, reproduzem-se,
etc.” (LÉVY, 2000: 44)
As novas tecnologias de informação, mas principalmente a Internet, transformaram a
relação das pessoas com o seu espaço. O ciberespaço é o não-lugar, é a ausência do espaço
físico. Segundo Marc Augé (1998: 83), o termo não-lugar antropológico designa “(…) duas
realidades complementares mas distintas. Espaços constituídos em relação a certos fins
(transporte, trânsito, comércio, lazer), e a relação que os indivíduos estabelecem com esses
espaços.” Para Augé, o lugar antropológico possui três características comuns: ele é
54
identitário, relacional e histórico. Para ele, o ciberespaço é um não-lugar, pois a relação que os
indivíduos estabelecem com a Internet é um espaço transitório, tal como conduzir um carro
em uma rodovia ou comprar uma roupa em determinada loja. Nesse sentido, as comunidades
virtuais também seriam não-lugares, uma vez que permitem a interacção entre os seus
membros mas de forma transitória58. No entanto, a Internet pode também ser entendida como
um lugar, na medida que cria relações entre as pessoas através de redes e conexões, etc. Nesse
sentido, as instituições de memória quando criam laços na rede podem transformar-se em
lugares de memória virtuais. A transformação do não-lugar em lugar de memória é possível e
cria novas relações de uso da tecnologia.
“As novas tecnologias comunicacionais transformam a relação com o espaço, dando-
nos uma percepção de mundo que altera nossa percepção e nossa memória, ao mesmo
tempo em que colocam em xeque o conceito de lugar e criam um outro, o não-lugar,
que é produto das tecnologias comunicacionais. Embora seja um conceito esvaziado de
afetividade, o não-lugar dá sentido ao lugar – investido de memória/lembrança – e cria
um lugar antropologicamente eletrônico, possibilitando a uma nova sociabilidade.”
(MARCONDES, 1996:146)
Na concepção de Negroponte (1996: 175), a era da pós-informação afastará as
limitações da geografia, possibilitando a interacção com outros ambientes, pois “(…) a vida
digital trará consigo uma dependência cada vez menor de um lugar específico num momento
específico”. Nesse sentido, é importante entendermos o que podemos designar como lugar.
Usaremos o conceito preconizado por Manuel Castells (2002: 512) em sua obra ‘A Sociedade
em rede’, que define o lugar como “(…) um local cuja forma, função e significado são
independentes dentro das fronteiras da contigüidade física”. Castells distingue os espaços de
fluxo (lugares de poder) dos espaços de lugares (lugares onde moramos). Nesse sentido, ele
defende a construção de pontes culturais, políticas e físicas entre as duas formas de espaço
(2002: 518), possivelmente a Internet. Segundo Pierre Lévy (2003) “O espaço cibernético é
um novo espaço de interação humana”.
“Os mundos virtuais caracterizam-se não propriamente pela representação, mas pela
simulação. Esta simulação é, na verdade, apenas uma das possibilidades de exercício
do real. Os objetos e o espaço no qual eles se inserem são os agentes desta simulação59.
(…) eles não têm realidade substancial, posto que são imagens virtuais. Mas os mundos
virtuais apresentam, através da matriz numérica, uma configuração espacial onde os 58 - Não vamos aqui nos deter sobre o fenômeno das comunidades virtuais. Vários autores já se debruçaram sobre este tema, entre eles destacamos Howard Rheingold em sua obra A Comunidade Virtual. 59 - Jean Baudrillard em sua obra Simulacros e Simulações defende que “(…) na perspectiva clássica (mesmo cibernética), a tecnologia é um prolongamento do corpo. É a sofisticação funcional de um organismo humano, que lhes permite igualar-se à natureza e investir contra ela triunfalmente” (1991:139)
55
objetos concretos inserem-se de maneira inteiramente nova.” (MARCONDES, 1996:
163)
O tempo é um dos conceitos que a Internet revolucionou. Segundo G.W. Leibniz (citado
por CASTELLS, 2002: 555) “(…) o tempo é a ordem de sucessão das «coisas», de forma que
sem as «coisas» não existiria tempo”. Em relação ao tempo, Giles Deleuze (2000) afirma que
a sua primeira síntese é intratemporal, pois o tempo não sai do presente, ou seja, é sempre
preciso um outro tempo para sintetizar o próprio tempo. Nesse sentido, a Internet é
intemporal60. É intemporal, pois permite interacção sem os limites do tempo. O tempo virtual
é um tempo real, ou seja, o acompanhamento das informações e dos acontecimentos mundiais
já não estão mais dependentes dos horários dos telejornais ou da impressão dos jornais, mas
ele é online e constantemente actualizado. Por isso, Castells (2002) afirma que esta
intemporalidade reafirma uma cultura do eterno e do efémero, pois a produção de informação
apesar de intensa depende do “contexto e do objetivo da construção solicitada”. Nesse
sentido, Jean- François Lyotard (1989: 71) afirmava que “(…) os computadores não param de
sintetizar cada vez mais o tempo”. Nesse sentido, tempo já não é mais entendido como dantes,
pois a Internet criou formas de sintetizá-lo.
I.3.6. Considerações finais A revolução que a Internet está proporcionando, e que ainda pode proporcionar ao
mundo é algo que nem mesmo os especialistas conseguem prever com rigor. Como já foi dito
anteriormente, a Internet é um veículo em constante mutação, cada dia novas ferramentas
surgem para facilitar o processo de comunicação. O caminho apontado por quase todos os
especialistas é o da convergência entre várias médias de comunicação: Internet, televisão
digital, telefonia móvel, etc. As facilidades que esta convergência trará a todas as áreas de
conhecimento, inclusive as ciências humanas, só o tempo dirá. Ao dizer que o hipertexto é
uma outra revolução, dentro da própria revolução da Internet, reforça-se o poder de
cruzamento de informações que ele permite. Nas ciências humanas, e obviamente na
museologia, o hipertexto possibilita entrelaçar conteúdos que em suportes físicos seriam
impossíveis. Esta possibilidade, bem como outras ferramentas disponíveis na Internet, abriu
caminho para novas interacções entre um património e seus utilizadores. Sob esse enfoque, a
desterritorialização e desespacialização da Internet permitem um novo olhar sobre o
património e consequentemente sobre a museologia. Os museus passam a ter uma ferramenta
que os podem levar além de suas próprias fronteiras. 60 - Segundo Manuel Castells, o “(…) tempo intemporal é apenas a forma dominante emergente do tempo social na sociedade em rede porque o espaço de fluxos não anula a existência de lugares.” (2002: 527)
56
I.4. A museologia no virtual
“Lo virtual no es una moda anódina y pasajera. Es una verdadera piedra de toque de lo real o, mejor dicho, de nuestro sentido de la realidad61.“ Philippe Quéau (1995) Lo virtual p. 12.
Conforme já foi demonstrado, a Internet está revolucionando a forma como as pessoas
se comunicam. E isso não se passa de forma diferente na sua relação com a museologia. Os
museus, como qualquer instituição, estão presentes na rede mundial de computadores. A
criação de sites de museus proliferou a partir da década de 90, mas muitos museus ainda nem
possuem sites institucionais. E muito deles possuem sites cujo único objectivo é apenas
disponibilizar os endereços de contacto da instituição.
Por isso, o objectivo deste capítulo é justamente entender a contribuição da Internet para
a museologia. Ou seja, como a museologia se apropria da Internet e quais são os usos que os
museus fazem deste novo veículo de comunicação. Para isso, em primeiro lugar serão
discutidos os conceitos de virtual e digital. Em seguida, será analisado o uso da Internet pelos
museus e a evolução da discussão em congressos especializados, para analisarmos uma
tipologia sobre os sites de museus, que divide em três categorias os sites actualmente
existentes. Como o estudo de caso é sobre um museu virtual, o eixo central deste capítulo será
a discussão sobre o conceito de museu virtual e suas implicações para a museologia. Por se
tratar de algo muito novo na museologia, o conceito de museu virtual ainda é controverso.
Esperamos poder dar uma contribuição para a discussão. E, no fim do capítulo serão
analisadas as acções museológicas que podem ser exercidas no âmbito virtual.
I.4.1. O virtual e o digital Antes de uma análise mais profunda sobre a definição dos museus virtuais é preciso
diferenciar os conceitos de virtual e digital. Alguns autores debruçaram sobre o conceito do
virtual sob um ponto de vista filosófico. Pierre Lévy (2001), baseando-se em Giles Deleuze
(2000) e na filosofia escolástica, afirma que o virtual é o que existe em potência e não em
acto, pois “(…) o virtual não se opõe ao real, mas ao actual: virtualidade e actualidade são
apenas duas maneiras de ser diferentes.” (LÉVY, 2001: 15) Para Lévy, a virtualização não é
necessariamente a mutação de algo real em não-real, pois a virtualização desloca o centro de
gravidade do objecto considerado. Lévy não vê a virtualização como uma ameaça e sim como
um complemento. Nesse sentido, a virtualização altera as concepções de espaço,
desterritorializando-o, e de tempo, causando um desprendimento do aqui e agora.
61 - Tradução livre: “O virtual não é uma moda anódina e passageira. É uma verdadeira pedra de toque do real, ou melhor dizendo, do nosso sentido de realidade.”
57
Em relação à discussão do conceito de virtual, Javier Echeverría (2000) questiona as
ideias de Lévy, onde a virtualização é a oposição da actualização. Para Echeverría, as
reflexões de Lévy sobre as tecnologias virtuais mostram-se inadequadas para uma análise
filosófica, pois partem de um conceito apenas etimológico, pois “(…) los artefactos
tecnológicos non son entidade virtuales, sino reales62” (ECHEVERRÍA, 2000: 131).
Já Bernard Deloche (2001) trabalha o conceito de virtual sob um ponto de vista estético.
Para o autor, a ideia de virtualidade engloba a ideia de síntese (simulação do real) e de
imagem numérica. Para ele, o virtual renova profundamente o status da imagem, modificando
a sua relação com a arte. Nesse caso, o museu é um mediador da relação do público com a
arte. Para Deloche, é preciso distinguir o virtual do digital, pois a digitalização de uma
determinada imagem não é necessariamente a criação de uma imagem virtual. O virtual não se
confunde com o irreal ou o imaterial, pois “C´est donc ailleurs qu´il faut chercher la virtualité
de l´art, non pas dans l´irréalité ou l´immatérialité mais dans la positive même du sensible:
montrer le sensible par un artefact. Et l´art n´est rien d´autre que la virtualisation du
sensible63” (DELOCHE, 2001: 150).
Deloche (2001) afirma que a arte é um artefacto, um produto artificial que a pessoa
interpõe entre ele mesmo e o mundo. Nesse caso, a virtualização consiste em passar de um
artefacto a outro artefacto, como uma espécie de substituição. Assim como Lévy, Deloche
trabalha com os conceitos de Gilles Deleuze, onde “o virtual possui uma plena realidade
enquanto virtual” (DELEUZE, 2000: 342). Para Deleuze, deve-se evitar, contudo, confundir o
virtual com o possível, pois “(...) o possível opõe-se ao real; o processo do possível é, pois,
uma «realização».” (DELEUZE, 2000: 345).
Philippe Quéau (1995) questiona a noção de realidade e considera que o virtual deve ser
entendido como uma outra experiência do real, como um novo sistema de representação.
Repensando o conceito aristotélico de potência, Queáu faz uma analogia entre o esboço de
desenho que antecede a obra de arte para explicar o virtual. Segundo Quéau no entanto, é
preciso distinguir a potência do virtual: “Lo potencial es aquello que puede convertirse en
actual. Lo virtual es la presencia real y discreta de la causa64.” (QUÉAU, 1995: 28) Para
Quéau, o virtual está mais próximo do conceito de potencial das teorias físicas
contemporâneas, do que do conceito preconizado por Aristóteles, que via na potência uma
atitude para receber uma forma. Para Quéau (1995), o virtual também pode propor novas
62 - Tradução livre: “(…) os artefactos tecnológicos não são entidades virtuais, senão reais”. 63 - Tradução livre: “E por isso é necessário procurar a virtualidade da arte, não na irrealidade ou na imaterialidade, mas no sensível: mostrar o sensível através de um artefacto. E a arte não é outra coisa senão a virtualização do sensível.” 64 - Tradução livre: “O potencial é aquilo que pode converter-se em actual. O virtual é a presença real e discreta da causa.”
58
faces de interacção e de comunicação entre as pessoas. Nesse sentido, também Mário Perniola
distingue o virtual como o não potencial da tradição, pois “(…) a oposição aristotélica entre
paciência e acto privilegia o acto que constitui a forma plena e final do ser, a própria
existência do objecto, em relação à qual a potência é mera pré-formação, pré-determinação,
pré-existência.” (PERNIOLA, 1994:107).
É preciso distinguir o virtual do digital. O digital só é possível a partir de um processo
de digitalização, e o virtual já é uma realidade em si. Para Román Gubern (1996), a imagem
digital é uma matriz de números, contida na memória de um computador, ou seja, a imagem
digital é a representação de uma imagem real, em formato informático. Gubern utiliza os
postulados de Aristóteles sobre a potência e faz uma distinção entre a produção da imagem e
o seu resultado: “(…) podemos llamar al modelo lógico-matemático de la producción
infográfica «la obra en potencia» y a la imagem resultante «la obra en acto»,
correspondientes a las dos etapas de su modelización y de su visualización65.” (GUBERN,
1996: 143)
Ainda em relação à questão da digitalização nas discussões de arte e de estética, Régis
Debray (1992) aponta a digitalização como uma ruptura na história da imagem no Ocidente.
Para este autor, a passagem do analógico ao digital é uma ruptura tão grande quanto a arma
atómica o foi para as guerras.
I.4.2. Os museus e a Internet Assim como uso da Internet pelos museus ainda é algo recente, as discussões sobre este
uso também o são. Em 1991, realizou-se em Pittsburgh, na Pensilvânia a primeira conferência
sobre o uso da hipermedia e da interactividade nos museus. Mais conhecida pela sigla ICHIM
- International Conference on Hypermedia and Interactivity in Museums - esta conferência
tem se realizado bianualmente nos Estados Unidos e em alguns países da Europa para discutir
as questões sobre o uso das novas tecnologias nos museus66. O objectivo dessas conferências
é promover o potencial da multimédia interactiva nos programas dos museus. Nesse sentido
também, em 1993, o MDA - Museum Documentation Association - organizou em Cambrigde
65 - Tradução livre: “(…) podemos chamar o modelo lógico-matemático da produção infográfica «a obra na potencia» e a imagem resultante «a obra no acto», correspondendo às duas etapas de sua modelização e sua visualização.” 66 - As informações sobre todas as conferências já realizadas encontram-se no site da instituição Archives & Museums Informatics, no endereço http://www.archimuse.com/conferences/ichim.html. O site foi consultado em 20 de Maio de 2004.
59
um congresso sobre Museus e Interactividade. Este congresso deu ênfase ao uso da
multimédia nos museus67.
Em relação ao uso da Internet pelos museus, os primeiros debates surgiram em 1997
quando se realizou em Los Angeles, na Califórnia, a primeira conferência sobre museus e
Internet. Chamadas de ‘Museums and Web’, estas conferências são realizadas anualmente nos
Estados Unidos ou Canadá e têm como objectivo reunir os profissionais dos museus,
principalmente aqueles ligados às áreas de novas tecnologias, para discutir as questões
pertinentes ao uso da Internet pelos museus68.
Até o verão de 2004, o ICOM não possuía um comité específico sobre Internet e
interactividade nos museus, por isso, as discussões sobre as novas tecnologias nos museus
eram efectuadas pelo seu comité de documentação, o CIDOC – International Committee for
Documentation, através de um grupo de trabalho específico sobre o uso da Internet. Criado
em 1992 durante o encontro do ICOM em Québec, este grupo de trabalho começou a produzir
durante o encontro na Noruega, em 1995, um documento sobre o uso de multimédia nos
museus69. Em 1996 o documento foi finalizado e traçou algumas directrizes sobre este novo
desafio para os museus. O objectivo é esclarecer questões fundamentais sobre multimédia e a
preservação do património através do uso das novas tecnologias nos museus. No entanto, diz
muito pouco sobre o uso da Internet nos museus.
A Internet possibilitou transformar átomos em bits. Ou seja, matéria palpável (objectos)
em código binário. E segundo Nicholas Negroponte (1996: 21) o bit “(…)não tem cor,
tamanho nem peso e pode viajar à velocidade da luz”. Nesse sentido, os museus passam a
trabalhar com referências patrimoniais digitais na Internet. E, portanto, passíveis de serem
trabalhadas de várias formas. Nesse sentido, a Internet possibilitou aos museus interagir de
forma globalizada, alterando a noção de tempo e de espaço. Ou seja, o museu na Internet
nunca fecha, pois “L´accessibilité des musées sur les réseaux informatiques permet
d´atteindre le grand public et de toucher la nouvelle génération de visiteurs de musées «en
ligne»70.” (BALIGAND, 1998: 195)
Na Internet é possível abrir mão da exposição tridimensional, tradicionalmente usada
pelos museus como forma de divulgação de seu acervo, criando novas perspectivas de
67 - O MDA é uma organização, criada na Inglaterra em 1977. Tem como objectivo desenvolver actividades de discussão, publicação e formação na área de documentação museológica. Mais informações sobre suas actividades podem ser obtidas no site do MDA: http://www.mda.org.uk. O site foi consultado em 20 de Maio de 2004, às 11h20. 68 - Os programas das discussões, bem como a publicação dos papers das conferências podem ser consultados no site http://www.archimuse.com/conferences/mw.html. O site foi consultado em 20 de Maio de 2004, às 12h30. 69 - O documento final produzido pelo grupo de trabalho pode ser encontrado no site do CIDOC, pelo endereço http://www.willpowerinfo.myby.co.uk/cidoc/multi1.htm. O site foi consultado em 20 de Maio de 2004. 70 - Tradução livre: “A acessibilidade dos museus nas redes informáticas permite atender ao grande público e tocar a nova geração de visitantes dos museus online.”
60
apresentação do acervo. Além disso, a Internet possibilita visitas virtuais, podendo atrair mais
público para a visita ‘real’ (GARCIA, 1999: 515). Ou seja, além de ser um cartão de visitas
do museu, a Internet possibilita o acesso ao património de uma forma mais ampla.
Actualmente, um grande número de museus possui sites institucionais. Como qualquer
instituição do século XXI, os museus também buscam levar ao grande público informações
sobre o conteúdo do seu acervo e sobre as actividades culturais desenvolvidas em seu espaço.
Assim, o uso da Internet como meio de divulgação e comunicação possibilitou aos museus
uma interacção maior com os utilizadores. Além da criação de sites com informações sobre o
conteúdo de seu acervo, os museus utilizam também dos meios de comunicação próprios da
Internet: e-mails, boletins, etc., para divulgar o trabalho desenvolvido. Segundo Maria Luísa
Bellido Gant (2001), os museus transformaram a Internet num espaço para a apresentação de
seus boletins, folhetos e catálogos, facilitando a divulgação de suas actividades.
Uma questão que se coloca é como a Internet é usada pelos museus. Mais do que um
veículo de comunicação, a Internet permite uma maior interacção com o público, mas também
com os especialistas. Além do uso como uma ferramenta de marketing, que estudaremos a
seguir, a Internet possibilita a montagem de redes de conexão entre várias instituições afins e
com objectivos convergentes. Este uso pode ser feito através de listas de discussões, fóruns,
rede de comunicação, etc., pois a Internet possibilita uma troca de experiências entre os
profissionais dos museus de forma mais rápida e consistente. Em 1994, Fátima Cofan Feijóo,
da Universidade Complutense de Madrid, já fazia um alerta na revista de Museologia aos
profissionais dos museus:
“Internet afectará las relaciones entre los profesionales del museo, por lo que debería
existir una estrecha colaboración entre los museos con funciones similares,
manteniendo lazos comunes mediante las discusiones on-line de los miembros y
colaboradores para mejorar el producto de su trabajo71”. (COFAN FEIJOO, 1994: 35)
A troca de informações e discussões sobre temas no âmbito da museologia, através da
criação de redes de informação é uma ferramenta que pode ser usada na Internet.
Outras formas de uso da Internet pelos museus são as colaborações multi-institucionais.
Nesse caso, a instituição responsável pelo projecto convida outras instituições a participarem
com conteúdos específicos, criando exposições permanentes na Internet. Um exemplo disso é
a exposição ‘Museus e Milénio’, promovida pelo Museu da Civilização de Québec em 2000.
O Museu da Civilização convidou várias instituições museológicas de todo o mundo para
criar conteúdos ou expor conteúdos dos seus acervos relativos ao século XX. O resultado é 71 - Tradução livre: “A Internet afectará as relações entre os profissionais do museu, pelo que deveria existir uma estreita colaboração entre os museus com funções similares, mantendo laços comuns mediante as discussões online dos membros e colaboradores para melhorar o produto do seu trabalho.”
61
uma exposição de conteúdos culturais e patrimoniais de vários museus no mundo. Nesta
exposição colaboraram doze museus de várias partes do mundo: França, Estados Unidos,
Suíça, Suécia, Eslovénia, Brasil, Canadá, Madagáscar, Itália e Alemanha. Este tipo de
colaboração, embora mais raro, é de fundamental importância, pois permite que os museus
usem a Internet no seu melhor: criando laços virtuais com outras instituições. Infelizmente, a
maioria dos museus ainda não viram a potencialidade de utilizar a Internet para este tipo de
colaboração inter-institucional. Para estas instituições, a Internet serve apenas como um
grande painel para afixar suas informações institucionais, e não como uma ferramenta de
troca e entrelaçamento de referências patrimoniais.
Figura 1 – Página de entrada da exposição virtual “Musées et Millénaire”
Fonte: http://www.mumi.org (consultado em 23/05/2004)
I.4.3. Tipos de sites de museus Os museus estão acessíveis na Internet em variadas formas, mas existem três tipos
básicos de sites. Neste trabalho iremos utilizar a tipologia criada em 1996 por Maria Piacente,
citada por Lynne Teather (1998)72. Em sua tese de Masters of Arts nos Estados Unidos,
Piacente enumera três categorias de websites de museus. A primeira categoria de sites é o
folheto electrónico, cujo objectivo é a apresentação do museu. Este tipo de site funciona
como uma ferramenta de comunicação e de marketing. O utilizador tem acesso à história do
72 - PIACENTE, Maria. Surfs Up_: Museums and the world Wide Web, MA Research Paper, Museum Studies Program, University of Toronto, 1996. Infelizmente não tivemos acesso às informações originais.
62
museu, aos horários de funcionamentos e às vezes ao corpo técnico do museu. É o tipo mais
comum em quase todos os museus. Alguns são mais bem elaborados, dependendo dos
recursos existentes no museu, mas todos têm como objectivo principal ser uma apresentação
visual, tal como um folheto, do museu. Nesse caso, a Internet funciona como uma forma de
tornar o museu mais conhecido e também possibilitar um acesso mais fácil pelos utilizadores
da rede mundial de computadores.
Sabemos que a escolha de sites mais elaborados, tanto do ponto de vista do design
quanto da navegação, depende dos recursos humanos e financeiros disponíveis da instituição.
Os custos de manutenção de um site mais simples, que não necessita de uma base de dados,
podem ser suportados por qualquer instituição, mesmo porque existem muitos servidores que
oferecem hospedagem gratuita para este tipo de site. Por isso, queremos crer que a escolha de
um tipo de site mais simples dependa mais do tipo de recursos que o museu tenha, do que por
uma decisão da instituição.
Para Maria Piacente, a segunda categoria de site seria museu no mundo virtual, ou
seja, neste tipo de site a instituição apresenta informações mais detalhadas sobre o seu acervo
e, muitas vezes, através de visitas virtuais. O site acaba por projectar o museu físico na
virtualidade e muitas vezes apresenta exposições temporárias que já não se encontram mais no
seu espaço físico, fazendo da Internet uma espécie de reserva técnica de exposições. Além
disso, muitos deles disponibilizam bases de dados do seu acervo, mostrando objectos que não
se encontram em exposição naquele momento ou mesmo disponibilizam informações sobre
determinado assunto.
Nesta categoria podemos encontrar alguns sites de museus brasileiros e portugueses.
Entre eles destacamos o site do Museu Nacional de Arqueologia, tutelado pelo Instituto
Português de Museus de Portugal. Além de todas as informações pertinentes a um site de
museu, o MNA possui uma visita virtual ao seu acervo, onde é possível conhecer todas as
secções expositivas do museu. Além disso, algumas peças do acervo foram seleccionadas e
podem ser visualizadas em três dimensões. É possível comprar online os produtos da loja do
museu, ou seja, o site também presta serviço de e-commerce para o museu73.
O site do MNA não se restringe às actividades do Museu mas é também um site de
informações e referências sobre arqueologia em Portugal. Premiado pela Unesco em 2002
com ‘Web Art d'Or’ de melhor site de museus do mundo, o Museu Nacional de Arqueologia é
um bom exemplo de um site de museu no mundo virtual.
73 - A palavra e-commerce designa o comércio electrónico realizado através da Internet. Para ser um e-commerce não basta apresentar os produtos, mas que o utilizador possa comprar sem a necessidade de se deslocar a um ambiente físico.
63
Figura 2– Site do Museu Nacional de Arqueologia
Fonte: http://www.mnarqueologia-ipmuseus.pt/ (consultado em 20/05/2004)
A terceira categoria é a de museus realmente interactivos. Neste tipo de site, pode até
existir uma relação entre o museu virtual e o museu físico mas são acrescentados elementos
de interactividade que envolvem o visitante. Às vezes, o museu reproduz os conteúdos
expositivos do museu físico e em outros casos, o museu virtual é bem diferente do museu
físico. O que torna estes museus interactivos é a forma como eles trabalham com o público. A
interactividade é a alma desse tipo de site de museu, pois permite que o público possa
interagir com e no museu. Neste caso, é importante salientar que o museu na Internet não
perde as suas características essenciais e que pode adquirir novas facetas. Ou seja, os
objectivos do site não são necessariamente diferentes do museu físico, mas é um
complemento dele. Conforme veremos depois, esta categoria de site é na verdade um museu
virtual e não um site.
Um bom exemplo de um website de um museu que trabalha com interactividade é o
caso do Museu de Ciência e Tecnologia de Porto Alegre, Brasil, cujo formato virtual tem o
nome de Sagres. Ligado à Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, o Sagres
possui conteúdos e formatos diferentes do museu físico. A ideia não foi reproduzir o museu
físico, mas trabalhar os conteúdos do museu de forma lúdica, criando outras actividades de
interacção que o museu físico não possibilita. No projecto do Sagres, a ideia básica é a
interacção do utilizador. Os utilizadores podem fazer pesquisas sobre ciência e tecnologia e
brincar com os seus conhecimentos dessas disciplinas. Segundo Ana Bertoletti e Antônio
64
Costa (1999), o sistema é um ambiente de educação e procura adaptar os seus conteúdos às
características dos utilizadores.
Utilizamos esta tipologia apenas para distinguir a forma como os museus trabalham a
Internet. No entanto, é preciso deixar claro que um site de museu não é, necessariamente, um
museu virtual. Ele é apenas um site de museu. Para entendermos o que seria um museu
virtual, iremos trabalhar em seguida com os conceitos de virtual e digital.
Figura 3 – Página de entrada do museu virtual Sagres
Fonte: http://sagres.mct.pucrs.br (consultado em 20/05/2004)
I.4.4. Em torno do conceito do museu virtual O conceito de museu virtual ainda é algo muito novo na museologia. Conforme já foi
visto anteriormente, a Internet é uma realidade dos anos 90 do século XX. Antes disso, o uso
da Internet estava restrito ao ambiente académico. Foi somente com a proliferação da Internet
comercial, a partir de 1993, que os museus começam a apresentar-se de forma virtual.
Para Anna Lisa Tota (2000), os museus virtuais online são na sua maioria, aproximações
imperfeitas dos museus físicos. Nesse sentido, Pierre Lévy afirma que o que é comummente
chamado de museu virtual nada mais é do que um catálogo na Internet.
“Os «museus virtuais», por exemplo, não são muitas vezes senão maus catálogos na
Internet, enquanto que o se «conserva» é a própria noção de museu enquanto «valor»
que é posta em causa pelo desenvolvimento de um ciberespaço onde tudo circula com
65
fluidez crescente e onde as distinções entre original e cópia já não têm evidentemente
razão de ser.” (LÉVY, 2000: 202)
A questão levantada por Lévy é importante, na medida em que a discussão sobre os
museus virtuais ainda é incipiente. Lévy nesta afirmação dá uma pista de como os
especialistas poderiam trabalhar a questão dos museus virtuais, discutindo a própria noção de
valor e de conservação de património. Nesse sentido, a maioria dos museus virtuais, está mais
preocupada em apresentar e justificar sua faceta virtual através de representações, do que
utilizar as potencialidades que a Internet oferece para a interacção com o utilizador.
Mas ainda há pouca discussão teórica sobre os museus virtuais. Segundo Weiner
Schweibenz (1998), o conceito de museu virtual está em constante construção e é fácil
confundirmo-nos com as outras denominações, tais como: museu electrónico, museu digital,
museu online, museu hipermedia, meta-museu, museu cibernético, cibermuseu e museu no
ciberespaço. Por se tratar de uma temática ainda muito nova na museologia, não há um
consenso em relação ao que é considerado museu virtual e o que seria apenas um site de
museu. A maioria dos autores que trabalha com a questão aponta para uma definição ligada à
virtualização dos objectos e sua apresentação online, sem uma discussão mais profunda sobre
os aspectos teóricos deste tipo de abordagem.
Para melhor o entendimento da discussão sobre o conceito dos museus virtuais,
elaboramos um quadro com conceitos propostos por diversos autores:
Tabela 1 - Definições de museu virtual
Autor Ano Concepções de museu virtual
Glen Hoptman74 1992 Conexão entre várias médias, múltiplas perspectivas. Sergio Talens e José Hernandez75
1997 Uma réplica do museu físico.
Jamieson Mckenzie 1997 Uma colecção electronicamente organizada de artefactos (pinturas, fotografias, etc.).
Artur Colorado76 1997 É um meio que oferece ao utilizador um fácil acesso aos objectos do museu.
Werner Schweibenz
1998 Meios para estabelecer o acesso, o contexto, usando a tecnologia de informação.
Antonio Battro 1999 Se trata de um ‘outro museu’, de um museu virtual em paralelo com o real, seu complemento no ciberespaço, com vida própria.
Bernard Deloche 2001 Indica o campo da problemática do museal, isto é processo de descontextualizção/recontextualização do museu. Fonte: Rosali Henriques.
74 - Retirada do artigo de Werner Schweibenz (1998). The virtual museum. 75 - Retirada do livro de Maria Luísa Bellido Gant (2001). Arte, museos y nuevas tecnologias, p. 248. 76 - Ibidem, p. 249.
66
Entre estes autores que trabalharam sobre a questão dos museus virtuais, destaca-se
Bernard Deloche, que discute a questão sob um prisma filosófico, que em sua obra ‘Le musée
virtuel’, publicada em 2001, estuda a questão da virtualidade no processo museológico.
Debruçando-se basicamente sobre os museus de arte, Deloche estuda o que ele chama de
tripla reciprocidade da arte. Para ele, a arte está ligada a três termos fundamentais: o estético,
o museal e o virtual. O estético teria como processo o sentir, o museal expor e o virtual
substituir. Para Deloche, o virtual é omnipresente e possibilita a emergência de uma outra
cultura, pois “Le virtuel a, d´un seul coup, élargi sans restriction le champ de
l´expographie77” (2001: 17). Em sua definição de arte “(...) la présentation du sensible par un
artefact78” (2001: 47).
O museu virtual permite a dessacralização da arte, do objecto sensível. Mas não deve-
se, afirma Deloche (2001), fazer do museu um depósito de arte mas também temer a
fetichização da arte pelos museus. Para este autor, o museu tem uma dupla função estética:
comunicar e analisar, pois o museu é um lugar privilegiado de experiências sensoriais.
Em relação à questão do museu virtual, Deloche afirma que o museu é um templo da
imagem, utilizando o conceito de museu paralelo, ou seja, o museu virtual é aquele que existe
na virtualidade, quase que como um substituto, um museu sem lugar e sem paredes. No
entanto, para ele, não há incompatibilidade entre o museu paralelo e o físico, a que ele dá o
nome de institucional.
“(...)l´histoire montre qu´un deuxième musée a sans cesse doublé le musée officiel, il
s´agit du musée de substitus, d´un musée virtuel si l´on veut, géneralement sans lieu et
sans murs, et cependant tout aussi réel et certainement plus efficace que ne l´est le
musée institutionnel79”. (DELOCHE, 2001: 162)
Em relação à posição de Deloche sobre os museus virtuais, discordamos quando ele diz
que o museu virtual é um museu substituto. No nosso entendimento, o museu virtual, sendo
uma vertente virtual de um museu físico, não é um museu substituto. Ele pode sim, ser um
museu complementar, pois pode existir fisicamente e ter uma vertente virtual. Nesse sentido,
o museu virtual pode ser tão ou mais eficaz do que o museu físico. Pode ser também uma
nova perspectiva de um museu físico, mas não o substituirá totalmente.
77 - Tradução livre: “O virtual alargou, de um só golpe e sem restrições, o campo da expografia.” 78 - Tradução livre: “(…) a apresentação do sensível através de um artefacto.” 79 - Tradução livre: “(…) a história mostra que um segundo museu duplica o museu oficial, sem dúvida, trata-se do museu dos substitutos, de um museu virtual se quisermos, geralmente sem espaço e sem paredes, mas entretanto tão real e certamente tão eficaz quanto o museu institucional. ” Observação: não concordamos com o termo institucional pois pode gerar confusão, dando a entender que o museu virtual não é uma instituição. No entanto, ele também pode ser uma instituição. Preferimos utilizar o termo museu físico.
67
Tanto Antonio Battro (1999) quanto Bernard Deloche (2001) trabalham com a
concepção de museu virtual, baseados no conceito de museu imaginário defendida por André
Malraux. Malraux (2000) propunha a criação de um museu imaginário que serviria para
abrigar todas as obras de arte do mundo, devidamente fotografadas. Esse museu, segundo
Malraux, seria um espaço da memória viva. Assim, cada pessoa poderia ter o seu próprio
museu imaginário. O museu virtual é uma espécie de um museu imaginário porque ao mesmo
tempo que trabalha com a reprodução, prioriza o uso da imagem como referência patrimonial.
Nesse sentido, “El museo virtual es mucho más que poner fotos en Internet de las reservas,
colecciones permanentes y muestras temporarias. Se trata de concebir un museo totalmente
nuevo80” (BATTRO, 1999). O museu virtual não é a reprodução de um museu físico mas um
museu completamente novo, criado para traduzir as acções museológicas no espaço virtual. O
museu imaginário proposto por Malraux também é um museu novo, criado por cada um de
nós, com as imagens que seleccionamos e reproduzimos dos museus físicos. Nesse sentido, o
museu imaginário de Malraux também é um museu virtual, pois cada pessoa pode ter o seu
próprio museu de reproduções.
Bernard Deloche diferencia o museu virtual do cibermuseu. Para ele, o museu virtual é
um museu paralelo, aberto às novas sensações. Os sites ou os CD-ROM´s dos museus são,
para ele, cibermuseus, pois modificam ou complementam o museu físico. Já o museu virtual é
uma nova concepção do mesmo património, apresentada de forma virtual.
Partindo do conceito proposto por Bernard Deloche, iremos trabalhar com o conceito de
museu virtual, distinguindo-o dos sites de museus: os cibermuseus. Os cibermuseus são
reproduções online do acervo ou parte do acervo de um determinado museu. O museu virtual
é um espaço virtual de mediação e de relação do património com os utilizadores. É um museu
paralelo e complementar que privilegia a comunicação como forma de envolver e dar a
conhecer determinado património. No nosso entendimento, só pode ser considerado museu
virtual, aquele que tem suas acções museológicas, ou parte delas trabalhadas num espaço
virtual. Nesse caso, chamaremos de cibermuseus aqueles sites de museus que não se
enquadram nessa concepção de museu virtual.
Entendemos que a virtualidade não é necessariamente ligada à Internet, pois os museus
virtuais podem sê-lo, mesmo sem estarem online, através de CD-ROM’s, quiosques,
exposições físicas, performances, etc. Os museus virtuais são aqueles que trabalham o
património, através de acções museológicas, mas que não necessariamente têm suas portas
abertas aos utilizadores em seu espaço físico. O Museu da Pessoa, nosso objecto de estudo, é
80 - Tradução livre: “O museu virtual é muito mais do que por fotos na Internet das reservas, colecções permanentes e exposições temporárias. Trata-se de conceber um museu novo”.
68
um museu que nasceu com a concepção de virtualidade antes mesmo do crescimento e
proliferação da Internet.
Em relação ao conceito do museu virtual é preciso esclarecer que o museu virtual pode
ter duas configurações: vertentes virtuais de determinado museu físico, ou seja, pode ser uma
outra dimensão do museu físico (como o Sagres, por exemplo) ou museus essencialmente
virtuais. Nesse caso, a existência de um museu virtual não pressupõe a existência de um
museu físico81. No primeiro caso, os museus virtuais são complementos do museu físico, pois
podem trabalhar suas acções museológicas de forma diferente em suas duas vertentes. Nesse
sentido, o processo museológico émuito enriquecedor, pois o público terá duas abordagens
diferentes de um mesmo património: uma abordagem presencial e uma abordagem remota.
No segundo caso, as acções museológicas são efectuadas, na sua maioria, no seu espaço
virtual, ou seja, não é um museu a ser visitado pelo público em seu espaço físico. Isso, no
entanto, não invalida algumas acções museológicas fora do seu espaço virtual e do espaço
físico (tais como as efectuadas pelo Projeto Portinari e pelo Museu da Pessoa), mas a
essência das suas actividades museológicas concentra-se no seu espaço virtual.
Para explicitar um pouco mais o conceito de museu virtual, temos como exemplo um
projecto de musealização de um património, que embora não se auto-denomine museu virtual
cumpre as funções do que seria um museu virtual nessa concepção. Trata-se do Projeto
Portinari. O Projeto Portinari foi criado em 1979, na Pontifícia Universidade Católica do Rio
de Janeiro e tem como objectivo catalogar, preservar e divulgar as obras do pintor brasileiro
Cândido Portinari. O trabalho efectuado pela equipa do projecto não se restringe ao site, mas
abrange uma série de actividades ligadas ao espólio do pintor, tais como exposições,
pesquisas e inventário das obras localizadas, pesquisa sobre a autenticidade das obras, recolha
de depoimentos, criação de conteúdos para escolas, etc.
A existência da Internet deu ao projecto um novo fôlego, pois permitiu que um maior
número de pessoas tivesse acesso às informações recolhidas pela equipa. O site, criado em
1998, é a face mais visível do projecto. Nele, é possível consultar as réplicas digitais das
obras já localizadas e catalogadas e poder conhecer um pouco mais sobre a vida e a obra de
Portinari82. O site tem uma secção específica para o trabalho com as crianças. Nela pode-se
encontrar sugestões de actividades para os professores desenvolverem com seus alunos em
sala de aula. A ideia é trabalhar o conteúdo do site de forma lúdica e atraente para o público
infanto-juvenil. 81 - Aqui devemos deixar claro que a não existência do museu físico não pressupõe a existência somente do site, pois o museu pode ter um endereço físico, mas o que o torna virtual é a forma como são desenvolvidas suas acções museológicas, ou seja, elas são efectuadas no espaço virtual e não no espaço físico. O museu virtual, essencialmente virtual, não abre suas portas para o atendimento ao público em seu espaço físico. 82 - Boa parte das obras de Cândido Portinari encontra-se nas mãos de coleccionadores particulares.
69
O que torna o site do projecto um museu virtual não é o facto de dizer ou não que é um
museu virtual, mas a forma como ele trabalha o património virtualmente. As acções
museológicas efectuadas pelo projecto Portinari, algumas delas virtuais, fazem com ele possa
ser considerado um museu virtual. Para ser um museu virtual não basta ter as reproduções das
obras de arte, devidamente catalogadas, e apresentá-las ao público, mas fazer actividades
onde o utilizador possa interagir com estas referências patrimoniais.
Figura 4 - Página de entrada para o site do Projeto Portinari
Fonte: http://www.portinari.org.br/ (consultado em 20/05/2004)
Uma outra questão que é pertinente quando discutimos o conceito de museu virtual é
entender a concepção utilizada por alguns sites de museus, inclusive alguns museus virtuais,
de que um museu é um edifício que comporta uma colecção, para deleite de seu público.
Conforme vimos anteriormente, esta é uma concepção de museu enraizada no século XIX e
que o movimento da Nova Museologia questionou, contrapondo-a com uma nova concepção
de museu que se baseia no património, de uma comunidade, estabelecida num determinado
território. Ao reproduzir a configuração de um edifício, com todas as suas características, o
museu virtual está reforçando o conceito de museu existente na mentalidade da maioria das
pessoas. E mesmo projectos de museus essencialmente virtuais, como o MUVA, por
exemplo, continuam a reforçar essa ideia83. O design do MUVA, construído provavelmente
83 - O MUVA – Museu de Artes Virtuais, mantido pelo jornal El País, é um museu virtual com reproduções de obras de arte uruguaia.
70
em VRML, reproduz as divisões físicas de um museu tradicional84. Ao entrar no site, o
utilizador tem a sensação de visitar um edifício de um museu com os espaços físicos
necessários: recepção, escadas, corredores, salas para exposições individuais, exposições
colectivas, etc. Maria Luísa Bellido Gant (2001: 252) chega mesmo a afirmar que o MUVA,
enquadra-se na tipologia mais avançada dos museus virtual, pois “(…) se estructura como un
auténtico[sic] museo, con seis plantas, todas ellas navegables, vestíbulo, passilos, escaleras,
ascensores…85”. Discordamos dessa autora nesse aspecto, primeiro porque um museu virtual
já é um autêntico museu, ou seja, ele não precisa reproduzir fisicamente um museu para ser
considerado um autêntico museu virtual. E em segundo lugar, uma visita virtual não faz dele
um museu virtual, pode ser apenas um bom site de museu. Não se pretende aqui questionar a
utilização de uma metáfora plo MUVA, recorrendo ao edifício para mostrar que é um museu
virtual, mas sim a ideia de que para ser um museu virtual autêntico é necessário reproduzir
um museu físico.
Figura 5 - Recepção do MUVA
Fonte: http://www.elpais.com.uy/muva/ (consultado em 20/05/2005)
No nosso entender, um dos méritos dos museus virtuais, além de poderem interagir de
forma mais dinâmica com os utilizadores, é questionar o conceito de que para ser museu é
necessário ter um edifício. Nesse sentido, os museus virtuais ou os sites de museus que têm
esse tipo de apresentação continuam a reforçar esta ideia, podendo tornar-se simulacros de
museus. O que podemos definir como museu virtual é aquele que faz da Internet espaço de
interacção através de acções museológicas com o seu público utilizador. Os museus virtuais
são livres, no entanto, para utilizar metáforas que lhes apetecer para a navegação, utilizando
84 - VRML - Virtual Reality Modeling Language - é uma linguagem vectorial utilizada em desenhos 3D e multimédia. 85 - Tradução livre: “(…) se estrutura como um autêntico museu, com seis andares, todos eles navegáveis, recepção, corredores, escadas, elevadores…”
71
de plantas baixas ou desenhos simulando edifícios de museus. No entanto, é preciso deixar
claro que a existência de um museu não pressupõe necessariamente um espaço físico, mesmo
que simulado virtualmente.
Finalizando esta questão, e para entender a visão de pessoas que trabalham no dia a dia
com os museus sobre o conceito de museu virtual, foram enviadas três perguntas para alguns
museólogos brasileiros. As questões abordadas eram sobre o entendimento do conceito de
museu virtual, sobre o uso da Internet pelos museus e como os museus podem potenciar suas
acções através da Internet. Dos emails recebidos, destacamos três especialistas cujas respostas
estão em comum acordo com o conceito de museu virtual proposto neste estudo, ou seja, de
que o museu virtual reproduz online as acções museológicas. Tabela 2 - Uso da Internet pelos museus
Especialista Conceito de museu virtual Potenciar o uso da Internet Cristina Bruno “Entendo por museu virtual a
instituição que se relaciona com seu público a partir da utilização de tecnologias eletrônicas e, mediante estas possibilidades, realiza as ações de salvaguarda e comunicação”.
“A melhor utilização da Internet prende-se ao seu uso curatorial e museográfico, no que se refere ao universo dos museus”.
Maria Célia Santos “Um museu que pesquisa, preserva e comunica informações sobre o patrimônio cultural, criando redes de interação com usuários de diferentes contextos, democratizando o conhecimento e contribuindo para o desenvolvimento humano”.
“Considero que a Internet é hoje um instrumento indispensável para o enriquecimento da pesquisa, para as ações de preservação e comunicação. Um aspecto que quero ressaltar é a necessidade de ampliação do intercâmbio entre as instituições, por meio da NET. Criar e alimentar a rede entre instituições museológicas não só é necessário como urgente”.
Mário Chagas “Talvez a gênese do Museu Virtual, no entendimento que abraço, deva ser buscada no Museu Imaginário de André Malraux. Em certa medida o Museu Imaginário coincide com o próprio mundo da arte. Assim, pensar um Museu Virtual é admitir a hipótese de que é possível conceber um museu que rompe com a idéia tradicional de lugar e opera com um "não-lugar", ainda que para acessá-lo precisemos estar em algum lugar.”
“O uso da Internet em muitos museus está restrito à divulgação de informações e ao "marquetim" museal. (…) Seria possível imaginar práticas interativas, práticas de visitas virtuais, práticas de construção de museus pessoais. Seria possível imaginar os museus contribuindo para a maior disseminação da tecnologia museu e também da própria tecnologia da Internet. A idéia de um Museu Imaginário pode ser dinamizada através da Internet de um modo não previsto pelo seu idealizador.”
Fonte: Rosali Henriques
I.4.5. As acções museológicas nos museus virtuais As acções dos museus estendem-se nos âmbitos da pesquisa, preservação e
comunicação. A questão é entender como essas acções museológicas podem ser efectuadas
através dos museus virtuais. As acções museológicas dos museus virtuais não são muito
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diferentes das acções do museu físico. No entanto, requerem abordagens diferenciadas, pois o
veículo de comunicação é diferenciado.
Segundo Bernard Deloche (2001), a informática e a multimédia trouxeram para o museu
uma nova dinâmica que pode ser demonstrada através de três funções básicas: agrupar,
analisar, mostrar. As novas tecnologias possibilitaram aos museus trabalhar o seu património,
o seu acervo, de forma estruturada através de bases de dados, utilizando técnicas mais
modernas de comunicação com o público.
Deloche alerta para o facto de que a tecnologia não é uma panaceia para resolver todos
os problemas dos museus. Como exemplo ele cita a holografia, que se utiliza da tecnologia
mas que incentiva a fetichização dos objectos: “La simulation des effets par des substitus
analogiques tels que l´hologramme ou l´image en 3D n´est bien souvent qu´un prolongement
audacieux de la muséographie traditionnelle et sert parfoi à renforcer le phénomène de
fétichisation86” (DELOCHE, 2001: 204)
As referências patrimoniais nos museus virtuais, embora desprovidos de sua
materialidade, podem ter a mesma identidade do que na exposição física. Por isso, Deloche
alerta para fetichização quando fala da holografia. Nesse caso, mesmo tratando-se de uma
reprodução, a referência patrimonial é tratada como fetiche. O risco da fetichização existe
sempre, seja no museu físico, seja no museu virtual. No entanto, se o museu virtual tiver uma
postura mais pró-activa em relação às actividades interactivas que o espaço virtual permite,
ele terá oportunidade de evitar a fetichização das referências patrimoniais. Ou seja, se ele dá
prioridade às actividades de interacção com o seu público utilizador em detrimento à
valorização desta ou aquela referência patrimonial, fica mais difícil acontecer a fetichização.
Outro aspecto apontado por Deloche é o facto de que muitos museólogos crêem que a
tecnologia é algo ainda ligado ao futuro dos museus e não algo presente no quotidiano da
actuação museológica, pois “L´erreur était de croire que la rencontre du musée avec les
nouveaux médias n´était qu´un phénomène de circonstance, une simple péripétie dans le
techniques muséographiques87.” (DELOCHE, 2001: 251)
As referências patrimoniais são, ao mesmo tempo, documento e mensagem. Nesse
sentido, Cristina Bruno e Marcelo Araújo (1989) afirmam que o processo de comunicação,
através da recuperação da identidade dessas referências, permite também uma concretização
do público em três níveis: o objecto na sua materialidade (signo), o objecto na sua inserção
sócio-cultural (símbolo) e a relação desse indivíduo com a realidade que o circunda. 86 - Tradução livre: “A simulação dos efeitos pelos substitutos analógicos tal como o holograma ou a imagem 3D, não é mais que um prolongamento audacioso da museografia tradicional e serve para reforçar o fenómeno da fetichização.” 87 - Tradução livre: “O erro está em crer que o encontro do museu com as novas médias não é mais do que um fenómeno de circunstâncias, uma simples peripécia das técnicas museográficas”.
73
Em relação à questão da comunicação, é interessante verificar que nesse caso, ao mesmo
tempo que o museu virtual possui algumas restrições em relação às suas exposições, pode, por
outro lado, trabalhar o seu acervo de forma mais acessível. Nesse sentido, Maria Luísa Bellido
Gant (2001) aponta uma série de vantagens dos museus virtuais em relação aos museus
físicos: melhor acesso às informações; interpretações das colecções sob diversos pontos de
vista; melhor organização da informação; o acesso é mais cómodo e mais atractivo e o custo
para a visita é mínimo.
A exposição no museu virtual, assim como no museu físico, é uma mediação entre o
património e o público. Segundo Alexandra Vol (1998), nos museus de arte e de história esta
mediação é mais contemplativa e estética e nos museus de ciência e tecnologia a mediação é
mais didáctica. Além disso, uma exposição de um museu virtual seja ela reprodução de uma
determinada exposição física ou não, pode ter um carácter diferenciado e não ser mera
reprodução virtual de uma exposição física. A Internet disponibiliza a uma série de
ferramentas que podem ser utilizadas para incrementar a comunicação nos museus virtuais,
mas também serve como mediadora da acção de visitar um museu.
“(…) trata-se de imaginar novas poéticas do planeamento museológico, pensadas para
um museu virtual em sentido próprio, isto é, para um museu que se configure como
destituído tout court de uma geografia territorial. Não reprodução-imitação, mais ou
menos cuidadosa, de conjuntos de espaços geridos no mundo off line, mas colecção
virtual de objectos, artefactos que, como tal, existe exclusivamente on line.” (TOTA,
2000: 212)
Para Kim Veltman (2001) a Internet trouxe para o processo museológico,
principalmente à extroversão do acervo, algumas vantagens. Entre elas a de poder expor um
maior número de objectos do que numa exposição convencional, pois através de base de
dados é possível exibir todo o acervo. Outros aspectos apontados seriam o acesso aos objectos
mesmo à distância, bem como possibilitar um acesso a estes objectos por outros níveis de
interacção. A Internet possibilita também apresentar as referências patrimoniais dentro do
contexto de sua produção e seu contexto histórico, fazendo com que o público possa ter uma
visão mais abrangente do que a apresentada no museu físico.
Além das vantagens apontados por Veltman, não podemos esquecer que a Internet
possibilita trabalhar a acção educativa do museu de forma mais dinâmica. E esta acção não se
limita aos espaços do museu, mas pode ser feita online. Os museus virtuais que têm
trabalhado melhor com a questão da acção educativa são, na sua maioria, museus de ciência e
tecnologia. No entanto, o uso do material de acervo para actividades educativas,
principalmente com crianças e jovens, é possível com todos os tipos de museus e não somente
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nos museus de ciência. Em museus de arte, por exemplo, é possível criar jogos interactivos e
brincadeiras utilizando as obras digitalizadas. Os museus virtuais podem trabalhar
determinado quadro ou objecto, ajudando o público/utilizador a construí-lo ou desconstruí-lo,
colocando-o na condição do produtor ou autor da peça exposta.
No âmbito da preservação do património, as actividades de conservação e documentação
do património nos museus virtuais são realizadas através de base de dados. Além disso, é
importante esclarecer que a preservação do conteúdo na Internet é questão fundamental, por
se tratar de um veículo que possibilita constantes alterações é necessário que todo o conteúdo
já adicionado, seja em termos de exposições virtuais ou acções educativas, seja passível de ser
consultado pela Internet. Nesse sentido, Marcelo Sabbatini (2003) alerta para que as colecções
online sejam sempre suportadas por bases de dados, pois estas permitem aceder de forma
diferenciadas tanto aos objectos em si, como à colecção como um todo.
O museu virtual não é um centro de referência, por isso não basta preservar as
colecções, mas é importante que estas colecções e/ou exposições sejam interactivas. Aqui
entendendo interactividade como interacção com o utilizador. A preservação das referências
patrimoniais num museu virtual passa também pela actualização constante da tecnologia
utilizada. As novas tecnologias, pela própria definição da palavra, estão constantemente em
mutação. É preciso pois estar atento às mudanças e renovar sempre o suporte digital das
informações.
I.4.6. Considerações finais A Internet trouxe para a museologia uma nova perspectiva. Não só porque permitiu
potenciar o acesso aos museus de forma mais ampla, mas também por dar oportunidade aos
museus de saírem de seus muros. As acções museológicas dos museus, exercidas através da
Internet podem ter um alcance muito maior do que aquelas que são exercidas em seu espaço
físico, pois podem abranger um público muito maior. Os museus que sabem tirar proveito de
todas as possibilidades que a Internet oferece, criando seus próprios museus virtuais,
conseguem ir além de suas fronteiras. Além disso, a possibilidade de uma interacção maior
com o público utilizador é a grande vantagem da criação de museus virtuais, sejam eles
representações virtuais de museus já existentes ou criados especialmente para a rede mundial
de computadores.
Em nosso entendimento, boa parte dos museólogos e especialistas de museus ainda não
está ciente da revolução que a Internet pode fazer pelos museus. Talvez isso explique a falta
de interesse em utilizar todas as possibilidades que a Internet oferece, criando sites apenas
informativos, trabalhando a Internet apenas como um folheto electrónico do museu. Não
75
estamos aqui fazendo juízo de valor sobre aqueles sites que são apenas informativos, pois
sabemos que uma série de factores é responsável pela escolha de determinado tipo de site,
entre elas, a económica, mas alertamos para o facto de que a maioria dos profissionais dos
museus ainda não vêem a Internet como uma ferramenta que pode fazer do museu uma
instituição mais dinâmica e mais interactiva.
Além disso, como vimos, muitos autores ainda vêem o museu virtual como um
simulacro de um museu físico, ou seja, estão arraigados no conceito de museu como um
espaço de exposição de determinada colecção. E isso, infelizmente, restringe o uso da Internet
pelos museus, tornando seus sites, mesmo aqueles mais interessantes e atractivos, apenas sites
de museus e não museus virtuais.
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II. Museu da Pessoa: um museu virtual
“As memórias de mim mesmo me ajudaram a entender as tramas das quais fiz parte” Paulo Freire, educador, entrevistado pelo Museu da Pessoa em 1992.
Quando Paulo Freire disse a frase citada acima, durante a gravação do seu depoimento
de história de vida para o projecto ‘Memória Oral do Idoso’, realizado pelo Museu da Pessoa,
ele soube resumir de maneira sucinta a importância da memória para o entendimento da nossa
própria trajectória de vida. Essa frase dita pelo educador e pensador brasileiro resume a
importância do processo de contar e registar as histórias de vida para a compreensão do nosso
quotidiano. No entanto, esta não é uma análise pouco comum, feita por um intelectual
reconhecido internacionalmente, mas uma constatação que muitos entrevistados fazem após a
realização de um depoimento de história de vida, a de que toda história de vida é importante.
Nesse sentido, o Museu da Pessoa teve, desde o seu início, um slogan que era: ‘onde você faz
parte da história’, no qual era transmitida a ideia de que todo ser humano tem o direito a ter
sua história de vida preservada e que essas histórias individuais fazem parte da história
colectiva. Foi com essa ideia de preservação da memória de cada um, que o Museu da Pessoa
surgiu em 1991, na cidade de São Paulo, no Brasil. Sua trajectória, que em 2004 comemora
14 anos de trabalho, foi sempre pontuada pelo trabalho com a preservação da memória social.
Na segunda parte deste trabalho, que virá a seguir, será dedicada ao estudo da trajectória
do Museu da Pessoa. Para isso, será analisada e apresentada a sua configuração, o histórico de
suas actividades, a evolução do site, a caracterização de seu público e suas acções
museológicas. Mais do que um olhar sobre a trajectória do Museu da Pessoa, este estudo tem
como objectivo entender a dinâmica da museologia no espaço virtual, a partir do estudo
concreto de um caso de um museu virtual.
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II. 1. As especificidades do Museu da Pessoa
“Todas as histórias de família são banais, mas há quem não tenha a sua? Neuza Guerreiro de Carvalho, história de família enviada ao Museu da Pessoa em 1997.
O Museu da Pessoa é uma experiência nova na museologia. Não só por seu carácter
virtual, o que não deixa de ser uma novidade, mas pela especificidade de sua configuração.
Conforme será explicitado neste capítulo o surgimento de um museu voltado para as histórias
de vida das pessoas, embora não seja uma ideia completamente nova, trouxe um novo
enfoque, uma vez que sua proposta é valorização das histórias das pessoas comuns.
Para entender o trabalho desenvolvido pelo Museu da Pessoa é importante compreender
quais são os conceitos que norteiam a sua trajectória. É preciso, além disso, estudar sua
missão e sua visão e compreender a dinâmica do processo de trabalho. Outra questão
fundamental para o entendimento do projecto do Museu da Pessoa é entender como o trabalho
desenvolvido pode causar impacto na sociedade. E por fim o foco será a questão da
virtualidade no Museu da Pessoa. Nesse sentido, é preciso estudar o Museu da Pessoa à luz
das discussões teóricas sobre os museus virtuais, levantadas anteriormente.
II.1.1. Um museu de pessoas Um museu com um acervo de depoimentos orais não é uma novidade, pelo menos no
Brasil. Entre as décadas de 60 e 80 do século XX proliferou a criação de museus da imagem e
do som em todo o Brasil88. Estes museus, na sua maioria ligados à autarquia local (prefeitura
ou mesmo governo estadual), foram criados com objectivo de preservar as histórias de
grandes figuras da cultura local. A maioria desses museus trabalha com depoimentos orais de
personalidades ligadas à música, literatura, cinema e fotografia. O objectivo básico dos MIS é
preservar a cultura local, identificando e recolhendo depoimentos orais e documentos sobre os
produtores culturais.
A ideia de criação de um museu virtual com as histórias das pessoas nasceu da
necessidade de um espaço para o registo das histórias das pessoas89. A criação de um museu
com as histórias das pessoas, baseada na premissa da democratização da informação, tornou-
se possível não somente devido ao alargamento da noção de história e de património, mas 88 - Existem cerca de 17 museus da imagem e do som no Brasil. Os mais conhecidos estão no Rio de Janeiro e em São Paulo (informação retirada do site http://www.mis.rj.gov.br/, no dia 26 de Junho de 2004, às 15:54h). O MIS do Rio de Janeiro (http://www.mis.rj.gov.br/) criado em 1965 e transformado em 1990 em Fundação Museu da Imagem do Som está vinculado ao governo do estado do Rio de Janeiro. O MIS de São Paulo (http://www.mis.sp.gov.br/) foi criado em 1970 e está vinculado ao governo do estado de São Paulo. Os outros 17 MIS são ligados aos governos estaduais e a órgãos municipais (prefeituras, secretarias de cultura, etc.). 89 - Aqui, entendendo espaço não como um museu físico mas como um lugar de memória, na concepção de Pierre Nora.
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também deve-se à própria redefinição do papel dos museus na sociedade. Conforme vimos
anteriormente, as mudanças no papel social do museu foram produto das discussões realizadas
pelos museólogos a partir da década de 1950. Além disso, o alargamento do conceito de
património, abrangendo também o património imaterial alargou o campo da museologia.
Em entrevista a Thom Gillespie em 1999, a idealizadora do Museu da Pessoa, Karen
Worcman, explica a necessidade da criação de um museu aberto às histórias de vida das
pessoas:
“History seems to be made of what the dominant culture elects to be important. But how
about people, regular people? Regular people make history while they are here. Each
person has a unique life story and a different experience that is valuable. To be able to
understand life through a housewife's point of view or through a doorman's point of
view or through the view of a child on the street, this can be really important and
revolutionary. There are museums for everything: art objects, civilizations, kings,
queens, cities, etc. But, why not have a museum for regular people? A museum that
could give everybody the possibility of having his or her life story preserved for
eternity? Why not have a Museum of the Person? I think that was how the idea was
born90”. (GILLESPIE, 1999)
O Museu da Pessoa não é o único museu a recolher e preservar histórias das pessoas,
mas sua concepção é interessante, na medida em que trabalha o conceito de um museu aberto
a todas as histórias de vida. O que é mais comum nos museus é a utilização de depoimentos
de histórias de vida como uma documentação complementar aos objectos do acervo. No
Museu da Pessoa as histórias de vida são o seu próprio acervo. Mais do que musealizar
pessoas, o seu foco é musealizar suas histórias, seus gestos e suas visões de mundo.
II.1.2. Conceitos norteadores O trabalho do Museu da Pessoa está baseado em três eixos: registo, preservação e
divulgação de histórias de vida. Partindo desses três eixos, o trabalho do Museu da Pessoa
está centrado nos seguintes conceitos norteadores:
90 - Tradução livre: “A história parece ser feita do que foi demarcado como significativo pela cultura dominante. Mas como proceder quando falamos de todo e qualquer indivíduo, de pessoas comuns? Pessoas comuns constróem a sua história aqui e agora. A história de cada pessoa é única, e a experiência vivida é valiosa. Conseguir entender a vida do ponto de vista de uma dona de casa ou através da visão de um porteiro ou pelos olhos de uma criança de rua, pode-se constituir em algo importante e revolucionário. Podem-se encontrar museus a respeito de tudo: objectos de arte, civilizações, reis, rainhas, cidades, etc. Mas, por que não dispor de museus para pessoas comuns? Um museu que oferecesse a possibilidade de preservar a história de vida de todas as pessoas por toda a eternidade? Por que não ter um Museu da Pessoa? Acho que foi assim que tudo começou.”
79
• “A história de cada pessoa é valiosa para a construção de uma memória social.
• A memória oral abre espaço para a transmissão de experiências que se perdem com o
passar das gerações.
• Coletar e organizar histórias de vida são formas importantes de produzir
conhecimento.
• A história dá senso de identidade e pertencimento e pode estabelecer novos valores
sociais.
• Cidadania inclui o respeito à história e aos valores de cada um91”.
Analisando os conceitos norteadores do Museu da Pessoa é possível dividi-los em dois
grupos: o primeiro grupo diz respeito ao uso da memória e o segundo grupo a forma de
produção dessa memória. Nesse primeiro grupo enquadram-se os conceitos para a construção
de uma memória social, para a percepção da identidade de um grupo social e para a
valorização da cidadania. No segundo grupo encontram-se os conceitos de transmissão da
memória para o futuro e como produção de conhecimento.
É o primeiro conceito norteador que resume a essência do trabalho desenvolvido pelo
Museu da Pessoa, ou seja, a história de cada pessoa é valiosa para a percepção da memória
social, entendendo a memória social como a memória colectiva de um determinado grupo
social. Conforme vimos anteriormente, um dos princípios defendidos pela Nova Museologia é
a noção da memória colectiva como base do património e referencial para o entendimento e
transformação da realidade. A história de vida de uma pessoa é, portanto, património imaterial
do grupo social ao qual ela pertence. E esse património deve ser preservado, assim como os
bens materiais que são reflexo dessa memória colectiva. Ou seja, tão importante quanto
preservar objectos é preservar os costumes, histórias e tradições ligadas àquele grupo social.
Em sintonia com o primeiro conceito norteador, o Museu da Pessoa defende também o
uso da memória social para a transformação da sociedade. Ou seja, é através do conhecimento
da sua própria história que um grupo social se vê, se reconhece e pode estabelecer novos
parâmetros e novos valores sociais. Nesse sentido, a memória é também ferramenta para a
melhoria da auto-estima de grupos sociais e para transformação em uma colectividade mais
consciente e mais transformadora. A memória, além de factor de coesão de um determinado
grupo social, também ajuda no resgate a auto-estima, na medida em que conhecendo a história
do outro passamos a valoriza-lo enquanto ser humano portador de valores.
O Museu da Pessoa acredita também que é importante a preservação do conhecimento e
a divulgação dessas experiências para as novas gerações. Isso faz-se necessário para evitar a
91 - Informação retirada do Portal do Museu da Pessoa.net http://www.museudapessoa.net, no dia 26 de Junho de 2004 às 15:57h.
80
perda de identidade do grupo social. Nesse sentido, recolher histórias de vida é produzir
conhecimento para as gerações futuras, mas também para o presente, pois, além de produzir
conhecimento através da recolha da memória oral, transformando-a em fonte de pesquisa, o
Museu da Pessoa defende o uso desse conhecimento para a transformação da realidade no
tempo actual.
II.1.3. Missão e Visão À medida em que a experiência com os projectos foi crescendo, houve a necessidade de
expressar na missão os conceitos norteadores defendidos pelo Museu da Pessoa. Por isso, no
ano de 2001 a partir de discussão com a equipa chegou-se à missão actual que é: “Registrar,
preservar e transformar em informação histórias de vida de toda e qualquer pessoa da
sociedade, promovendo mudanças sociais por meio da reflexão sobre a identidade e
valorização de indivíduos e comunidades”92. Na missão está expresso a característica
essencial do trabalho do Museu da Pessoa que é o uso da memória social para a valorização e
para transformação da sociedade. Nesse sentido, os conceitos norteadores complementam a
missão.
“Eu acredito profundamente no poder do Museu tanto para um ser humano quanto
para um grupo. O que eu acho? Qual é a missão do Museu? (...) eu acho que a história
não é sobre o passado, é sobre o seu presente. É ela que realmente faz que você perceba
o que você está sendo no momento, ou o que você vai ser. Isso para uma pessoa ou até
para um grupo. Então, eu acho que você, toda pessoa tem a sua própria história, e criar
uma grande rede de histórias de vida é uma forma de você realmente criar um impacto
social grande, de mudanças. Só ouvindo o mundo do outro você entende o outro, senão
é tudo preconceito, pré-concebidos: pobre é assim, preso é assim, gringo é assim. Os
mundos podem ser tantos, e cada mundo tem sua lógica93”.
A partir da discussão de uma missão mais abrangente, o grupo gestor do Museu da
Pessoa chegou a uma visão que seria: “Ser referência mundial em memória oral, como um
espaço virtual de expressão, comunicação, geração e troca de conhecimento entre as pessoas
de todo o mundo94”. Uma vez que o Museu da Pessoa defende a preservação do conhecimento
das pessoas, independentemente de onde estejam, e que a abrangência de seu trabalho não
92 - Informação retirada do Portal do Museu da Pessoa.net http://www.museudapessoa.net, em 26 de Junho de 2004, às 15:57h. 93 - Entrevista de história de vida de Karen Worcman realizada pela jornalista Solange Mayumi Lemos, s.d.. 94 - Informação retirada do Portal do Museu da Pessoa.net http://www.museudapessoa.net, no dia 26 de Junho de 2004 às 15:57h.
81
está restrita ao Brasil, a visão foi concebida no sentido de vir a ser um projecto de carácter
mundial. Nesse sentido, a visão do Museu da Pessoa diz respeito às intenções de crescimento
e expansão do seu trabalho e de sua metodologia. O Museu da Pessoa quer ser um espaço
virtual, mas não somente de carácter e abrangência locais, mas a nível mundial.
Para realizar sua missão e sua visão, o Museu da Pessoa definiu alguns objectivos de
trabalho. São eles:
• “Valorizar e preservar a história de vida de todas as pessoas, incentivando o
protagonismo de pessoas e grupos;
• Constituir um painel multifacetado de pessoas no mundo, estimulando o respeito à
diversidade cultural, social, sexual, política, étnico-racial e religiosa dos vários
grupos e comunidades;
• Colaborar com a aproximação e o entendimento entre diferentes gerações, grupos e
comunidades;
• Socializar a produção de conteúdo na Internet95”.
Os objectivos do Museu da Pessoa são os seus princípios de trabalho. Além da
valorização das histórias de vida para a transformação social, o Museu da Pessoa trabalha para
a aproximação de gerações e para a socialização dos conteúdos na Internet96. Pois, a
socialização do conteúdo é uma das características que faz com que o Museu da Pessoa seja
um museu virtual e não somente um site. Além disso, é parte dos objectivos do Museu da
Pessoa criar um grande painel de histórias de vida, incentivando o protagonismo dos grupos
sociais abrangidos pelos projectos desenvolvidos.
II.1.4. Configuração do trabalho O Museu da Pessoa foi oficialmente criado em 1992. Como o Museu da Pessoa é uma
instituição que não tem financiamento público todo trabalho é desenvolvido através da
dinâmica de projectos97. Os tipos de projectos desenvolvidos pelo Museu da Pessoa têm duas
configurações: projectos sociais e projectos institucionais. Os projectos sociais são ligados à
95 - Idem. 96 - Um projecto interessante sobre a aproximação de gerações foi desenvolvido pelo Projecto Aprendiz, em parceria com o Museu da Pessoa em 2001. Um dos objectivos do projecto Oldnet era a formação de jovens estudantes do secundário na metodologia de história oral para que eles pudessem recolher depoimentos de idosos moradores do asilo Golda Meir, da cidade de São Paulo. Além de recolher as histórias, os jovens ensinavam aos idosos como utilizar a Internet. As histórias recolhidas pelos jovens foram disponibilizadas no site do Museu da Pessoa (http://www.museudapessoa.net/hotsites/oldnet/index.htm). 97 - Durante toda a sua trajectória o Museu da Pessoa já realizou 90 projectos, recolhendo mais de 4 mil depoimentos. Actualmente está trabalhando em oito projectos de resgate de memória.
82
educação, terceira idade, Internet e depoimentos abertos ao público98. Os projectos
institucionais são aqueles ligados aos programas de memórias das empresas, instituições e
produtos culturais99. Para a execução desses projectos o Museu da Pessoa busca parceiros e
patrocinadores para o seu financiamento. Muitos dos projectos desenvolvidos pelo Museu da
Pessoa são para empresas que desejam registar a sua história, através das histórias de vida de
seus colaboradores. Nesses projectos, o Museu da Pessoa é um prestador de serviços na área
de desenvolvimento de projectos de memória. E os resultados finais dos projectos são sempre
produtos culturais tais como exposições, publicações e documentários em vídeo.
Este tipo de projecto ajudou o Museu da Pessoa a ampliar seu acervo de depoimentos,
uma vez que a base de toda pesquisa são os depoimentos. Nesses casos, o acordo assinado
entre o Museu e a empresa permite que os depoimentos recolhidos no projecto possam fazer
parte do acervo do Museu da Pessoa. Foi dessa forma que o Museu da Pessoa conseguiu
aumentar o seu acervo de depoimentos e também garantir a sua sustentabilidade ao longo dos
anos.
“Todos os projetos geram depoimentos que integram o acervo geral do Museu da
Pessoa. O crescimento do acervo é viabilizado pelo direito de propriedade intelectual
sobre os conteúdos, sempre firmado pelo Museu da Pessoa em seus contratos com os
clientes e depoentes em geral. O acervo é também ampliado por histórias que chegam
via Internet”. (WORCMAN, 2002b: 2)
Pela sua própria dinâmica de trabalho, o Museu da Pessoa tem um corpo de
colaboradores variável, ou seja, se há muitos projectos o número de profissionais envolvidos é
maior e se o número de projectos diminui, diminuem também os profissionais envolvidos. A
dinâmica de projecto é interessante pois torna a instituição mais flexível mas também é factor
de insegurança pois, as equipas são estruturadas somente com a existência de verba disponível
para determinado projecto. Nesse sentido, o Museu da Pessoa tem buscado criar novos
projectos e novas fontes de financiamento.
Em 2002, com a criação do Instituto Museu da Pessoa.net, procurou-se criar uma
entidade jurídica que fosse responsável pelos projectos sociais, separando-os dos projectos
institucionais. Além disso, o objectivo da criação do Instituto era disseminar, multiplicar e
democratizar seu acervo e metodologia, além de tentar expandir o trabalho do Museu da
98 - Todos os sábados o Museu da Pessoa abre suas portas para gravar depoimentos das pessoas. São pessoas que se registaram previamente e que são convidadas a darem o seu depoimento naquele dia. Estes depoimentos não estão ligados a nenhum projecto específico. O objectivo do Museu Aberto é abranger pessoas que não têm oportunidade de serem entrevistadas pelos projectos em curso. 99 - Várias empresas brasileiras e multinacionais instaladas no Brasil fizeram projectos de memória empresariais em parceria com o Museu da Pessoa. A valorização das histórias dos funcionários é o traço comum em todos esses projectos.
83
Pessoa a outros países, criando novos núcleos. Conforme vimos anteriormente, a visão do
Museu da Pessoa é ser referência mundial em histórias de vida. Com o objectivo de expandir
sua metodologia e ampliar seus horizontes decidiu-se que era importante canalizar as energias
para a criação de uma rede mundial de memórias. Esse processo que ainda está em curso
deverá culminar com uma rede abrangendo não somente os núcleos do Museu da Pessoa mas
também outros projectos de memórias espalhadas pelo mundo.
A criação de um núcleo do Museu da Pessoa em Portugal, em 1999, foi o primeiro
passo para a expansão do trabalho do Museu da Pessoa. Os núcleos do Museu da Pessoa, a
actuar em Portugal, Estados Unidos e Canadá, são independentes do Museu da Pessoa do
Brasil. A ideia que os une é a missão do Museu da Pessoa e o seu compromisso social.
Conforme veremos posteriormente, a escolha dos locais para a criação de núcleos não foi
propositadal mas aconteceu em virtude dos contactos que o Museu da Pessoa foi efectuando
ao longo de sua trajectória. O papel do Museu da Pessoa, do Brasil, é treinar os novos núcleos
no uso da metodologia de história oral e ser o gestor da rede de memórias. Como a actuação
dos núcleos é independente, actualmente está em estudo a criação de um sistema integrador
que possa ‘ler’ todos os depoimentos. Este sistema possibilitará o acesso a todos os
depoimentos do acervo do Museu da Pessoa, independentemente do núcleo a que pertence. A
ideia de criação desse sistema integrador, que será um dos braços da rede Museu da
Pessoa.net, é fazer com que os projectos de memória possam fazer parte de um mesmo
acervo.
II.1.5. O impacto social O impacto social do trabalho do Museu da Pessoa pode ser medido através de três
factores: pelo registo dos depoimentos, pela possibilidade de pesquisa e pela inclusão digital
realizada em seus projectos educativos. A primeira dimensão é a possibilidade do registo de
depoimentos, pois dá oportunidade às pessoas comuns de terem suas histórias de vida
preservadas, contribuindo para elevação de sua auto-estima. A gravação de um depoimento de
história de vida é uma arma fundamental para a melhoria de qualidade de vida, principalmente
dos idosos, conforme podemos notar pelo depoimento do Sr. Marius Vieira Gonçalves,
participante do Programa ‘Agentes da História’ que afirma100: “Eu nunca me imaginei
100 - O programa Agentes da História foi um projecto desenvolvido pelo Museu da Pessoa entre os anos 2000 e de 2001 e previa a formação e capacitação de idosos na metodologia de história oral. Após a formação, os idosos participavam da recolha de depoimentos aos sábados e em eventos onde havia recolhas de depoimentos. http://www.museudapessoa.net/hotsites/agentes/index.htm
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participar de um museu. Este trabalho é uma vacina contra o complexo de inferioridade101”.
Além disso, por se tratar de depoimentos de pessoas comuns, o trabalho do Museu da Pessoa
ajuda na recuperação da auto-estima.
“Para a pessoa que narra é um elemento transformador, também. Ela começa a
recolher essa história, vai repensando... Narrar é retornar ao registro, partir de alguma
coisa, recriar. (…) não é como fazer uma terapia: posso pagar um analista e contar
minha vida. Mas não, é contar como um legado, de preservação, de reconstrução
mesmo da própria identidade.102”
Conforme vimos anteriormente, para o Museu da Pessoa a memória é também uma
ferramenta de valorização da auto-estima dos grupos sociais. Entre vários projectos do Museu
da Pessoa com essa perspectiva ressaltamos o projecto ‘Identidade e Memória’, desenvolvido
em parceria com a Secretaria Municipal de Educação da Cidade do Rio de Janeiro, entre
Dezembro de 2001 e Setembro de 2002. O projecto previa a capacitação de membros da
comunidade do Morro dos Prazeres na metodologia de história oral. Os próprios moradores,
orientados por profissionais do Museu da Pessoa, recolheram as histórias de vida dos
moradores da comunidade, seleccionaram e editaram o material para a elaboração de uma
exposição e um documentário em vídeo103. O resultado do projecto foi apresentado no dia 4
de Outubro de 2002, nas dependências do Centro de Desenvolvimento de Educação Integrada
Amália Fernandez Conde, mais conhecido como Casarão dos Prazeres. Mais do que recolher
depoimentos da comunidade, o objectivo era a mobilização da comunidade para um trabalho
com a memória. Embora este projecto tenha tido êxito em suas proposições, ficou claro que
um projecto para ser realizado por uma comunidade, deve ser algo desejado pela comunidade
e gerido pela própria comunidade.
As narrativas orais são ricas em informações e conhecimentos que muitas vezes se
perdem de uma geração a outra. A possibilidade de preservar estas narrativas orais para o
conhecimento das novas gerações é factor fundamental para o auto-conhecimento dos grupos
sociais.
“(…)democratizing the production and diffusion of information should be the most
important goal. Inasmuch as the members of communities acquire digital technology,
they themselves can also become producers and keepers of their own history,
101 - Trecho do depoimento do Sr. Marius Vieira Gonçalves, nascido em Araguari, Minas Gerais, em 1916. Militar reformado, escritor e escultor, Marius foi entrevistado em 1999 e posteriormente convidado a participar do programa Agentes da História. 102 - Entrevista de história de vida de Karen Worcman realizada pela jornalista Solange Mayumi Lemos, s.d.. 103 - A equipa de trabalho formada por sete pessoas da comunidade recolheu 26 histórias de vida (em áudio) de antigos moradores do Morro dos Prazeres, 34 curtos depoimentos em vídeo durante um evento no Casarão dos Prazeres, três depoimentos temáticos, além de cerca de 230 fotos e documentos.
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integrating it or not with the social history of other communities. It is in this sense that
socially excluded communities (indigenous and others) can use digital technology and
the Internet as forms of social and cultural inclusion104”. (WORCMAN, 2002a)
A segunda dimensão do impacto social do trabalho do Museu da Pessoa é a
possibilidade de dar às pessoas acesso, através da pesquisa, a um acervo de histórias de vida.
Para o Museu da Pessoa, tão importante quanto registar a memória, é preciso divulgá-la. Por
isso, o esforço do Museu da Pessoa foi sempre no sentido de transformar os depoimentos,
recolhidos nos projectos, em produtos culturais, tais como exposições, livros, sites na Internet
e CD-ROM´s. Além de possibilitar uma visão mais democrática da história, a divulgação do
acervo permite a compreensão de valores e expectativas de pessoas e comunidades que
normalmente não têm espaço nas médias tradicionais. Nesse sentido, a existência da Internet é
fundamental pois permite uma maior divulgação do material, uma vez que é acessível por
qualquer computador conectado à rede mundial de computadores.
O uso do acervo de depoimentos do Museu da Pessoa por professores e jornalistas
sempre foi constante, embora poucas vezes mensurado devido a inexistência de controlo sobre
o material retirado da Internet. Em relação ao uso do acervo, o Museu da Pessoa é muito
consultado (via telefone) por jornalistas e pesquisadores que querem ter contacto de pessoas
que já deram seu depoimento para o Museu da Pessoa105. Em 2000, o site foi citado como
fonte de pesquisa em alguns livros escolares. Isso fez com que vários alunos entrassem em
contacto com o site e utilizassem os depoimentos em trabalhos escolares. Entre eles
destacamos um comentário enviado por e-mail pela estudante Raíssa Pelicer Sugimoto,
recebido em 21/03/2001: “Fiquei sabendo do Museu da Pessoa pela aula de Historia. Estou
na 4ª série e achei o Museu da Pessoa muito criativo, porque podemos deixar depoimentos e
conhecer outras pessoas, outras épocas... Vi muitas coisas legais!”
A terceira dimensão do impacto social do Museu da Pessoa é a inclusão digital. O
Museu da Pessoa defende o uso dos computadores em projectos de memória, pois é preciso
dar ‘sentido’ ao uso dos computadores. O Museu da Pessoa acredita que a verdadeira inclusão
social não é colocar as comunidades em contacto com os computadores, mas dar um uso
dinâmico ao trabalho com os computadores. Segundo Karen Worcman, o uso de
104 - Tradução livre: “(…) democratizar a produção e a difusão da informação deve ser o objectivo mais importante. Visto que os membros das comunidades adquirem a tecnologia digital, eles mesmos podem também transformar-se produtores e preservadores de sua própria história, integrando a ou não com a história social de outras comunidades. É neste sentido que as comunidades socialmente excluídas (indígenas e outras) podem usar a tecnologia digital e a Internet como forma de inclusão social e cultural”. 105 - Por questões de segurança, no site do Museu da Pessoa não são divulgados os contactos dos depoentes.
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computadores não significa necessariamente inclusão digital, muito menos a digitalização de
suas histórias.
“ (...) digitize the artifacts and historical narratives of communities does not guarantee
social inclusion. On the other hand, to simply distribute computers among communities
(indigenous and others) does not guarantee digital inclusion. It is necessary to first
make computers and their use meaningful to the people who will be using the
computers. Communities need to be engaged in the digitization of their own stories as a
means of social affirmation. It is also critical that communities feel the «need» and/or
have the will to publicize and integrate their cultures106.” (WORCMAN, 2002a)
A ideia de aliar memória, educação e novas tecnologias tomou corpo a partir de 2001
com o início do desenvolvimento do projecto ‘Memória Local’107. O projecto ‘Memória
Local’ é uma iniciativa do Museu da Pessoa e do Instituto Avisa Lá que alinha uso da
memória e aprendizagem oral e escrita na escola108. O objectivo dessa iniciativa é o
desenvolvimento de projectos de memória local nas escolas públicas, com ênfase nas práticas
de leitura e escrita por meio da capacitação de professores e técnicos. A ideia básica que move
os projectos é a capacitação de professores na metodologia de história oral e o uso da
memória no processo de ensino-aprendizagem de alunos do ciclo básico. É um projecto que já
abrangeu escolas das cidades de Ituiutaba, Uberaba, Uberlândia, Rio de Janeiro e Santos109.
O projecto, desenvolvido ao longo de 10 meses promove encontros de três em três
semanas entre as formadoras do Museu da Pessoa, do Instituto Avisa Lá, os professores, os
coordenadores. Prevê também encontros com os alunos das salas de aula atendidas e o uso de
computadores para a inserção das histórias recolhidas. Os computadores nesse projecto são
usados pelos alunos para inserirem no site do Museu da Pessoa as histórias recolhidas pelo
projecto. Na maioria dos casos, é através do projecto que os alunos e também os professores
têm um primeiro contacto com a informática, pois um dos requisitos para a escola participar 106 - Tradução livre: “(…) a digitalização de artefactos e narrativas históricas de comunidades não é garantia de inclusão social. Por outro lado, a distribuição pura e simples de computadores entre comunidades (indígenas e outras) não é garantia de inclusão digital. Antes de tudo é preciso colocar os computadores e fazer com que a sua utilização realmente tenha sentido para as pessoas que os usam. As comunidades precisam ser envolvidas no processo de digitalização de suas histórias como forma de afirmação social. Também é essencial que as comunidades sintam a «necessidade» e/ou tenham a vontade de divulgar e integrar suas culturas.” 107 - Sobre o projecto Memória Local há uma dissertação de mestrado defendida pela formadora do Museu da Pessoa, Zilda Kessel. Nela, a autora estuda o uso das novas tecnologias e da memória na aprendizagem escolar, tendo por base o estudo de caso do projecto Memória Local desenvolvido pelo Museu da Pessoa e pelo Instituto Avisa Lá, no bairro de Vila Isabel, no Rio de Janeiro. Referências: KESSEL, Zilda. A construção da memória na escola: um estudo sobre as relações entre memória, história e informação na contemporaneidade. São Paulo: Escola de Comunicação e Artes, 2003. Tese de Mestrado em Ciência da Informação. p. 144. 108 - O Instituto Avisa Lá é uma organização não governamental voltada para o desenvolvimento de projectos na área de formação de professores. Mais informações no site http://www.avisala.org.br/ 109 - De 2001 a 2003 o projecto formou 55 coordenadores, 99 professores e 3.679 alunos.
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do projecto, é ser uma escola pública e sem acesso à Internet110. Dessa forma, o projecto
contribui também para a inserção digital pois os computadores permanecem na escola após o
fim do projecto. Os resultados finais do projecto são uma exposição, com as histórias
recolhidas pelas crianças na comunidade e desenhos efectuados, e um site com as histórias. A
elaboração de produtos finais é importante pois torna visível às próprias crianças, o resultado
do trabalho.
A apresentação das histórias no espaço virtual possibilita não só uma divulgação maior
dos resultados do projecto ‘Memória Local’, mas também uma inclusão digital dos
utilizadores através dos conteúdos inseridos. Dessa forma, os professores aprendem a utilizar
a Internet como uma ferramenta de interacção, para o uso no dia-a-dia na escola.
II.1.6. A virtualidade O Museu da Pessoa foi, desde o seu início, concebido para ser um museu virtual de
histórias de vida. É um museu que tem na sua concepção original a ideia de virtualidade pois,
ele já nasceu com o propósito de ‘reconsiderar’ o espaço museal111. Conforme vimos
anteriormente, a virtualidade não está necessariamente ligada à Internet, pois a virtualidade
poder ser aquilo que existe em potência, e não simplesmente em acto. Um museu virtual é
portanto, aquele que possibilita a interacção das pessoas com o seu património de forma
virtual, ou seja, sem o deslocamento a um determinado espaço físico.
A criação de um museu de histórias de vida quase que pressupõe a criação de um museu
virtual, uma vez que é impossível musealizar pessoas, no sentido tradicional do termo, tal
como musealizamos objectos. A musealização das pessoas é a musealização de suas histórias
de vida, de sua trajectória pessoal. No entanto, é preciso deixar claro que nem todos os
museus que contém depoimentos são virtuais, uma vez que muitos deles não trabalham com a
ideia da virtualidade, tornando-se somente espaços de recolha e preservação das histórias de
vida, sem divulgá-las. Nesse sentido, a concepção destes museus está mais próxima dos
centros de investigação do que de museus propriamente ditos.
“There are many people, and their discourses are impalpable. Therefore, the «place» to
gather that material had to be a virtual «place». Today, with the progress of Internet,
speaking about «virtual» space may even seem as a trivial thing, but at the beginning it
sounded more like an ideal, the one of creating information networks that could be
110 - Os computadores e o acesso à Internet são financiados pelos patrocinadores do projecto que são actualmente o Instituto Pão de Açúcar e a CTBC Telecom. Além disso, o projecto conta com uma parceria com a IBM. 111 - Aqui entendendo o espaço museal como um espaço físico, de visita física e não como um espaço museológico.
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connected, constituting a «virtual Museum». Therein, the only possible way to carry our
purposes through was the creation of the multimedia data bank that could eventually be
available in networks, thus creating a virtual network of life stories112” (WORCMAN et
al., 1999).
Sobre a questão do espaço museal, em entrevista a Thom Gillespie, Karen Worcman,
afirma que para a criação de um museu de histórias de vida é necessário repensar a noção de
espaço museal.
"The idea of establishing a «museum» that preserves «people's life stories» forced us to
reconsider our standard idea of «place»," Worcman says. ´There are many people, and
their voices are non-material. Therefore, the «place» to gather their stories had to be a
«virtual» place´113." (GILLESPIE, 1999).
A ideia de virtualidade está presente na criação do Museu da Pessoa e essa certeza já
estava presente na página de entrada do site, lançado em 1996, onde vinha o alerta: “Museu
da Pessoa não é um museu nos moldes tradicionais. É um museu virtual. O que fica
registrado são as narrativas, as fotografias, os documentos, formando um banco de dados
com centenas de depoimentos114”. A ideia inicial era a de que as histórias seriam divulgadas
através de CD-ROM´s, livros, exposições e em espécie de jukeboxes com as histórias, espécie
de quiosques multimédia. “O museu sempre foi virtual. Não tinha Internet nem nada. A gente
achava que ia ter uma porção de jukebox.115”
Não havia a ideia de criar um museu físico com as histórias de vida, pois o objectivo do
Museu da Pessoa não era ter um espaço para a visitação, mas tentar abranger um maior
número de pessoas com a divulgação das histórias recolhidas. A virtualidade era entendida no
sentido de divulgar as histórias das pessoas de forma mais abrangente possível. Nesse sentido,
o surgimento da Internet deu ao Museu da Pessoa as ferramentas necessárias para a
divulgação de suas histórias de maneira mais eficaz. A popularização da Internet veio
consolidar esta ideia, pois possibilitou uma maior divulgação do trabalho desenvolvido. Além
disso, a Internet possibilitou também que os utilizadores da Internet, público do Museu da
Pessoa, interagissem com as histórias, não só consultando-as, mas enviando suas próprias
112 - Tradução livre: “Existem muitos povos, e seus discursos são imperceptíveis. Por consequência, o «lugar» de coligir esse material tinha de ser um «lugar» virtual. Actualmente, com o desenvolvimento da Internet, falar sobre espaço «virtual» pode até mesmo parecer banal, mas no início isso soou mais como algo ideal, capaz de criar redes de informação que podiam ser conectadas, constituindo um «Museu virtual». Nesse particular, a única forma possível de alcançar nossos objectivos era a criação de uma base de dados multimédia porque podia depois ser disponibilizada em redes, criando, assim, uma rede virtual de histórias de vida.” 113 - Tradução livre: “A ideia de criar um «museu» que preserve as «histórias de vida de todas as pessoas» nos fez reavaliar a ideia padrão de «lugar». Worcman afirmou que ´existem muitas pessoas, e suas vozes são imateriais. Assim, o melhor «lugar» para reunir essas histórias tinha de ser um «espaço» virtual´” 114 - Informação retirada do primeiro site do Museu da Pessoa (actualmente desactivado) 115 - Entrevista da história de vida de Karen Worcman realizada pela jornalista Solange Mayumi Lemos, s.d..
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histórias e fotos de família. Assim, qualquer pessoa pode enviar sua história de vida ou a
história de sua família para ser inserida no acervo do Museu da Pessoa.
O Museu da Pessoa é um museu virtual, na medida em que trabalha o património
imaterial, através de acções museológicas, num espaço virtual. A musealização das histórias
de vida em um museu virtual permite não somente a divulgação dessas histórias mas também
a interacção do público com este património.
II.1.7. Considerações finais A ideia de democratização da memória, defendida pelo Museu da Pessoa, não é somente
dar oportunidade às pessoas de terem sua história de vida preservada, mas também fazer com
que essas histórias sejam utilizadas para promover mudanças sociais. Nesse sentido, baseia-se
nos conceitos defendidos pelo movimento da Nova Museologia, onde o papel dos museus não
é somente o de preservação de conhecimento, no caso das histórias de vida, mas também de
mediador no processo de transformação social de determinada comunidade.
Conforme pudemos ver, o surgimento de um museu com histórias das pessoas não é
algo assim totalmente inédito, mas as especificidades do Museu da Pessoa o torna único em
relação a outros museus do género. A maior contribuição do Museu da Pessoa está na sua
própria concepção, onde o uso social da memória é a base do seu trabalho.
“Acho que o Museu da Pessoa é uma grande ferramenta de transformação, de
compreensão, integração social. A minha ideia é ter um portal, agregar grupos,
crianças, todo mundo fazer parte da mesma grande comunidade. É como se criasse um
grande depósito de histórias de uma grande comunidade. E as pessoas se perceberiam
dessa maneira. Acho que o mundo é construído pela narrativa que você tem, e a
sociedade vai transformar ele a partir dessas narrativas, de refazer essas narrativas.
Acho que o poder do Museu é esse. (...) E sei que o Museu muda valores, muda padrões
culturais, educacionais. Muda sua noção de espaço – por que não um museu? Muda
sua noção de história116”.
A própria virtualidade é também uma característica essencial do Museu da Pessoa, uma
vez que a comunicação com o público é feita essencialmente através da Internet. É através da
Internet que o Museu da Pessoa consegue abranger um público muito maior do que aquele
que tem acesso ao seu acervo fisicamente. Ou seja, é através da Internet que o Museu da
Pessoa consegue cumprir seu papel de museu virtual voltado às memórias das pessoas.
116 - Entrevista de história de vida de Karen Worcman realizada pela jornalista Solange Mayumi Lemos, s.d..
90
II.2. Histórico “Vocês já gravaram tudo? Minhas palavras, minhas mãos, meus olhos?
Então fotografaram a minha alma”. Olga Cordoni, dona de casa, entrevistada pelo Museu da Pessoa em 1992.
A história de uma instituição é feita, não somente por suas mudanças organizacionais
e estruturais, mas sobretudo pelas pessoas que dela fazem parte. Assim também é a história do
Museu da Pessoa. Ela confunde-se com a história de um grupo de pessoas que acreditaram ser
possível criar um museu aberto às histórias das pessoas. É também, a história de sua
idealizadora, Karen Worcman, que sonhou ser possível criar um espaço virtual para a
preservação da memória social.
Como um estudo sobre o Museu da Pessoa é algo inédito, foi preciso criar critérios na
tentativa de sistematizar sua história. Para facilitar o estudo, a sua história foi dividida em
cinco fases: primórdios, consolidação, crescimento, expansão e rede. Para efectuar esta
separação por fases foram utilizados três tipos de critérios: crescimento e amadurecimento do
projecto, mudanças na configuração do site e também mudanças em seu espaço físico.
Durante toda sua trajectória, o Museu da Pessoa esteve instalado em três espaços físicos
diferentes e teve quatro versões diferentes do site. Estas mudanças, mais do que adequação às
novas necessidades, foram efectuadas com vistas à melhoria no desenvolvimento do seu
trabalho.
II.2.1. Primórdios (1991) A ideia que deu origem ao Museu da Pessoa surgiu através de um grupo de trabalho
encabeçado pela historiadora Karen Worcman. Licenciada em História pela Universidade
Federal Fluminense e mestre em Linguística pela Universidade Federal do Rio de Janeiro,
Karen começou seu envolvimento com a metodologia de história oral durante o projecto ‘José
de Medeiros: 50 anos de fotografia’, realizado pela Funarte117. O projecto previa a recolha de
depoimentos orais do próprio fotógrafo, de amigos e familiares do mesmo e elaboração de
uma publicação.
117 - José Araújo de Medeiros nasceu em Teresina, no estado do Piauí, em 1921. Em 1939 migrou para o Rio de Janeiro onde trabalhou como fotógrafo da revista O Cruzeiro e também como director de fotografia em mais de 30 filmes. Faleceu em 1990, em Áquila, na Itália. É um dos mais conhecidos fotógrafos brasileiros do fotojornalismo. A Funarte – Fundação Nacional de Arte é um órgão vinculado ao Ministério da Cultura do Brasil. Tem como objectivo promover actividades artísticas e culturais nas áreas do teatro, dança, ópera, circo, artes plásticas e gráficas, fotografia, música popular e erudita, folclore e cultura popular, cinema e vídeo, documentação e informação. Também se ocupa com a preservação da memória cultural do Brasil. Foi criada em 1975, extinta em Março de 1990 para ser transformada e recriada em Setembro de 1994. Mais informações através do site: http://www.funarte.gov.br/
91
Logo em seguida, Karen envolveu-se num projecto sobre imigração judaica no Rio de
Janeiro chamado ‘Heranças e Lembranças: imigrantes judeus no Rio de Janeiro’. Este
projecto foi realizado pela Associação Israelita do Rio de Janeiro no período compreendido
entre 1988 e 1991 e tinha como objectivo gravar depoimentos de imigrantes judeus que
moravam na cidade do Rio de Janeiro. Os produtos finais desse trabalho foram a edição de um
livro de depoimentos e uma exposição com objectos, fotos e depoimentos. Nesse projecto,
Karen Worcman era coordenadora da pesquisa oral e era responsável pela recolha dos
depoimentos. Foi durante este projecto que Karen despertou para a questão do uso da
memória enquanto ferramenta de mudança social.
“The basic idea came from my research experiences working on an oral history project
from 1988 to 1991 about Jewish immigrants to Brazil. A basic question I was dealing
with was how historical concepts changed in didactic books and how this change
changes how societies build their histories. The project was divided into two parts: one
group collected and studied the objects the immigrants had brought, and the other
group worked with oral history life stories. I coordinated this group. I collected 90
interviews and 200 hours of tape recording. The project results were an exhibition, a
book, and organized material for an archive118”. (GILLESPIE, 1999)
Em 1991, Karen levou a exposição sobre a imigração judaica para São Paulo. Com o
nome de ‘Memória e Migração’ a exposição foi montada no MIS – Museu da Imagem e do
Som. A exposição já foi assinada pelo Museu da Pessoa, embora ele ainda não existisse
oficialmente. Sobre a repercussão dessa exposição, temos o depoimento da Karen:
“E logo no início pensei em fazer uma exposição. Esse projeto tinha um livro e uma
exposição, uma grande exposição. Trouxe a exposição prá cá, acabei conseguindo
marcar a exposição no MIS. Já não estava mais interessada em ser só judeus, já estava
interessada num museu. Prá essa exposição, que chamava “Memória e Migração” – eu
tinha acabado de chegar –, tinha que conseguir espaço, conseguir dinheiro, tudo. (...)
Saiu na Folha, na Cultura. Tinha grupos de migrantes. E dentro da exposição eu criei o
núcleo do Museu da Pessoa. Tinha uma fila! Era 1991. Foi muito interessante.
118 - Tradução livre: “A ideia básica surgiu quando realizei, de 1988 a 1991, um projecto de pesquisa em história oral sobre a vinda de imigrantes judeus para o Brasil. Uma das questões básicas abordadas foi a transformação de conceitos históricos em livros didácticos e como essa mudança teve uma influência decisiva sobre a forma como as sociedades passaram a elaborar suas respectivas histórias. O projecto foi dividido em duas partes: um grupo recolheu e estudou os objectos trazidos pelos imigrantes, e um segundo grupo dedicou-se à história oral e, consequentemente, ao registo de histórias de vida dessas pessoas. Eu fui a coordenadora deste grupo. Recolhi 90 depoimentos e realizei 200 horas de gravação. O projecto gerou uma exposição, um livro e um arquivo de material organizado”
92
Chegaram a visitar a exposição 150.000 pessoas. Foi muito rico, tinha seminário de
música, de dança, foi um negócio!119”
Durante a exposição no MIS uma estrutura com uma câmara de vídeo foi montada para
a recolha de depoimentos. Durante 15 dias foram gravados 150 depoimentos de migrantes,
imigrantes e seus descendentes. Com o sucesso da exposição, a ideia de criação de um museu
onde as pessoas pudessem deixar registadas as suas histórias ganhou força. Através de suas
ideias, Karen conseguiu agregar um grupo de pessoas em torno do projecto. Esse grupo era
formado pelas historiadoras Karen Worcman, Márcia Ruiz e Cláudia Leonor e pelos
jornalistas José Santos Matos e Mauro Malin120.
“Eu sou historiadora. O Zé é jornalista. A gente se juntou porque ele era videomaker e
fazia na época o que se chamava “videocartas”, em cima de depoimentos de pessoas,
que tinha uma linguagem (…). Desse grupo tinha o Mauro Malin, que era um primo
meu; na época ele estava no Governo, ele era muito interessante, jornalista e
historiador. A Márcia, que está no Museu, encontrei nessa oficina que eu dei na Oficina
Cultural Oswald de Andrade. Ela é historiadora, mas ela tinha uma coisa de marketing,
era muito viva, muito prática. E a Cláudia, que estava lá, trabalhou com o MIS, era
uma estagiária do MIS. Acabou virando uma espécie de auxiliar, foi absorvendo a
tecnologia, a metodologia.121”
O grupo reunia-se periodicamente para discutir as ideias que iam surgindo e como
viabilizá-las. Karen alugou uma sala na Rua Itapetininga, no centro de São Paulo. É nesta sala
que o Museu da Pessoa começou a funcionar. Começou-se, então, a discutir formas de
actuação do Museu da Pessoa e também a buscar possíveis patrocinadores. A equipa criou um
protótipo para uma base de dados de dados de histórias de vida e começou a fazer contactos
com instituições para buscar patrocínio para a ideia.
Em entrevista a Thom Gillespie, Karen Worcman fala sobre este primeiro ensaio do que
seria o Museu da Pessoa:
“Our first step was to make a prototype of the database idea. At this time, the Internet
was not popular (at least in Brazil). So, the idea was to create a publicly accessible
multimedia database, possibly a CD-ROM or a kiosk. The idea was always to keep the
life stories, including video, photographs, etc., to allow any person the opportunity to
119 - Entrevista da história de vida de Karen Worcman realizada pela jornalista Solange Mayumi Lemos em 2001. 120 - Do grupo inicial apenas o jornalista Mauro Malin não está mais no dia-a-dia do Museu da Pessoa. Actualmente é editor da revista Update, da Câmara Americana de Comércio, em São Paulo. 121 - Entrevista de história de vida de Karen Worcman realizada pela jornalista Solange Mayumi Lemos, s.d..
93
make a selection, a choice to say something important about his or her life. What we
wanted to keep was always essentially virtual122.” (GILLESPIE, 1999)
Este protótipo, onde eram apresentados alguns depoimentos, fotos, áudios e trechos de
vídeo, foi o primeiro ensaio do que seria o Museu da Pessoa, ainda não como um site mas
como uma base de dados multimédia. Além da busca por patrocinadores para o Museu da
Pessoa, o grupo gestor discutiu a criação de uma figura jurídica para suportar os projectos que
iam surgindo.
II.2.2. Consolidação (1992 - 1996) Em Maio de 1992 foi oficialmente criado o Museu da Pessoa, com uma instituição
privada. Nestes primeiros anos o trabalho do Museu da Pessoa começou a ser conhecido
através de seus projectos, que geravam notícias nos jornais e nos canais de televisão. O
primeiro projecto realizado com a marca Museu da Pessoa, já configurado como uma pessoa
colectiva foi realizado em parceria com a Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo. Este
projecto, que recebeu o nome de ‘Memória Oral do Idoso’ previa um curso de formação em
história oral aberto aos interessados, recolha de depoimentos em vídeo e a edição de um livro.
Ao todo foram recolhidos 62 depoimentos, inclusive o do educador Paulo Freire. O projecto
teve como produto final a publicação de um livro, chamado de ‘Almanak da Idade do Pensar’
configurado como uma espécie de agenda para o ano de 1993.
Conforme vimos anteriormente, o caminho escolhido para a viabilização financeira do
Museu da Pessoa foi a realização de projectos de memória para outras instituições. Nesse
sentido, em 1993, o Museu da Pessoa conseguiu viabilizar o seu primeiro projecto de
memória de uma instituição, quando foi convidado pelo São Paulo Futebol Clube para criar
uma base de dados multimédia com depoimentos dos antigos jogadores, adeptos e dirigentes.
O projecto ainda previa a criação de um espaço com a memória da equipa de futebol,
chamado ‘Memorial do São Paulo Futebol Clube’, que foi inaugurado em Março de 1994.
Este seria o primeiro de uma série de projectos realizados para os clubes de futebol
brasileiros, tornando o acervo do Museu da Pessoa rico em memórias do futebol brasileiro.
Em 1993, o Museu da Pessoa mudou-se para um escritório na Rua Cardeal Arcoverde,
no bairro de Pinheiros. Inicialmente foi dividir o escritório com uma empresa de informática,
122 - Tradução livre: “Nosso primeiro passo foi criar o modelo de uma base de dados. Naquela época a Internet ainda não havia se popularizado (pelo menos no Brasil). Assim, a ideia era criar um banco de dados multimédia aberto a qualquer pessoa, possivelmente um CD-ROM ou quiosque. Sempre existiu a ideia de registar e preservar histórias de vida, inclusive através de vídeo, fotografias, etc., a fim de permitir que a pessoa tivesse a possibilidade de realizar uma selecção, uma escolha, e então falar sobre o que considerava realmente significativo em sua vida. Nossa ideia de registrar e preservar sempre foi essencialmente virtual”.
94
chamada M2A. Em 1994 esta empresa mudou-se para outro endereço, ficando o Museu da
Pessoa nesse endereço até 2000.
No ano de 1994 o Museu da Pessoa iniciou uma parceria com o SESC de São Paulo,
para a realização de um projecto sobre a memória do comércio na cidade de São Paulo123.
Desde então, o Museu da Pessoa tem realizado projectos sobre a memória do comércio em
várias regiões do Estado de São Paulo124. O objectivo do projecto ‘Memórias do Comércio’ é
gravar depoimentos de comerciantes e comerciários da área de actuação do SESC de São
Paulo. Os produtos finais dos projectos são livros com as histórias, exposições itinerantes e
sites na Internet125. Com estes projectos, o Museu da Pessoa conseguiu um grande número de
depoimentos de imigrantes e migrantes, ligados ao comércio dessas cidades.
O ano de 1996 marcou a primeira experiência do Museu da Pessoa com a Internet. O
site criado pelo Museu da Pessoa, nessa época, foi uma proposta ainda tímida de uso da
Internet. Foi como um balão de ensaio, para uma compreensão de como utilizar este novo
veículo de comunicação. Nesse ano, o Museu da Pessoa participou da conferência
internacional de História Oral, realizada na Suécia, apresentando o trabalho desenvolvido no
Brasil. Foi também no ano de 1996 que o Museu da Pessoa, em parceria com a Confederação
Nacional dos Metalúrgicos e com o patrocínio da Companhia Brasileira de Mineração e
Metalurgia, iniciou uma pesquisa sobre as profissões em extinção126. Este projecto, inserido
num projecto maior chamado ‘Memórias do Trabalho’, teve como objectivo mapear as
profissões que foram extintas ou que estavam em processo de extinção no Brasil. A partir do
levantamento das profissões, foram entrevistados 32 pessoas cujas profissões se enquadravam
neste perfil. Como resultado do projecto criou-se uma base de dados com as informações
recolhidas. Posteriormente, em 1999, o material foi editado e publicado em livro com o nome
de ‘Memórias do trabalho: depoimentos sobre as profissões em Extinção’. Esta publicação foi
utilizada nos cursos do ‘Programa Integrar’ da CNM e gerou mais três outros livros,
produzidos pelos próprios alunos do curso de formação127.
123 - O SESC – Serviço Social do Comércio é uma instituição de carácter privado, sem fins lucrativos, de âmbito nacional, criado em 1946, por iniciativa dos empresários do sector de comércio e serviços, que o mantêm e administram. É uma entidade nacional, embora cada estado tenha autonomia financeira e administrativa para suas actividades. Mais informações no site: http://www.sescsp.com.br/sesc/ 124 - Os projectos foram realizados na cidade de São Paulo, Araraquara e São Carlos, das cidades da Baixada Santista e actualmente está a desenvolver um projecto sobre o comércio nas cidades do Vale do Paraíba. 125 - Endereço do projecto: http://www.sescsp.com.br/sesc/hotsites/memoriasdocomercio/comercio/index.cfm 126 - A CNM – Confederação Nacional dos Metalúrgicos é um órgão ligado à CUT – Central Única dos Trabalhadores, a maior central sindical brasileira. Informações pelo site: http://www.cnmcut.org.br/ 127 - O Programa Integrar é um programa de requalificação profissional destinado à reinserção de metalúrgicos desempregados no mercado de trabalho. Recentemente o programa se desdobrou em outras ações, ampliando seu conceito de qualificação profissional para educação e trabalho. Desde o início de 2003, o Programa Integrar continuou a ser desenvolvido em parcerias com as prefeituras, que assumiram a sua proposta educacional, nas redes municipais de ensino, para trabalhadores em geral. No seu início, o programa possuía financiamento do FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador, do Ministério do Trabalho.
95
II.2.3. Crescimento (1997 - 1999) Os anos de 1997 e 1999 marcaram o crescimento do Museu da Pessoa. Em 1997, o
Museu da Pessoa relançou seu site, não mais em um provedor desconhecido, mas hospedado
no Universo Online128. Esta nova versão do site, que será analisada posteriormente, trouxe
algumas novidades que possibilitaram uma maior interacção com os utilizadores. Nesse
mesmo ano, o Museu da Pessoa participou em Paris no congresso sobre o uso das médias
interactivas nos museus, mais conhecido como ICHIM.
Em 1999, o site do Museu da Pessoa foi premiado como o melhor site de São Paulo pela
Aberje129 e a fundadora do Museu da Pessoa, Karen Worcman, tornou-se fellow da Ashoka
Empreendedores Sociais130. A inclusão da Karen Worcman no grupo de fellows da Ashoka
trouxe o reconhecimento ao Museu da Pessoa como um empreendimento criativo, inovador e
de grande impacto social.
Em 1999, durante a participação do Museu da Pessoa na conferência ‘Museums and
Web’, em Nova Orleans, o Museu da Pessoa foi considerado pelo ‘New York Times’ o site
mais interessante da conferência internacional de museus, por sua experiência criativa no
trabalho com a memória social131. Sobre a apresentação do trabalho do Museu da Pessoa
nessa conferência, os organizadores do evento David Bearman & Jennifer Trant (1999)
disseram: “Their social experiences become its subjects as they take part with others in the
development of an archive of experience. The radical simplicity of the Brazilian concept, built
128 - O Universo Online, mais conhecido como UOL é o maior portal de conteúdo e de acesso do Brasil. Lançado em Abril de 1996 possui actualmente 1,2 milhões de assinantes pagos e seu conteúdo está distribuído em 42 estações temáticas. É considerado o maior portal de informação em língua portuguesa. Informações retirados do site http://www.uol.com.br, no dia 26 de Junho de 2004, às 16:40h. 129 - A Aberje – Associação Brasileira de Comunicação Empresarial é uma associação que tem por objectivo discutir e promover a comunicação empresarial. Desde 1995 a Aberje entrega anualmente prémios nas categorias de comunicação empresarial e institucional para as empresas e instituições. Os prémios são regionais e há também um prémio nacional. Uma das categorias é a de Memória Empresarial que premia projectos de valorização da memória das empresas e instituições. Mais informações no site: http://www.aberje.com.br. 130- A Ashoka é uma organização não-governamental internacional, criada nos Estados Unidos em 1980 e que tem como objectivo o investimento nos empreendedores sociais. Com actuação em 48 países em desenvolvimento, a Ashoka selecciona anualmente empreendedores sociais para estimular e apoiar. A ideia essencial é apoiar o trabalho do empreendedor social, neste caso chamado de fellow, e não a instituição a que ele pertence. Os fellows recebem durante dois anos uma bolsa mensal para o desenvolvimento do seu trabalho social. Mais informações no site: http://www.ashoka.org.br 131 - O artigo sobre a conferência realizada em New Orleans, Matthew Mirapaul afirma: “If one site could be said to have commanded the most interest during the conference, it would be Museu da Pessoa (Museum of the Person), a virtual museum that presents 500 life stories of ordinary Brazilian citizens and continues to add more every week. By definition, the site has no difficulty attracting the attention of its target audience”. Tradução livre: “Se houve um site que atraiu atenção especial durante o seminário, este foi certamente o Museu da Pessoa (Museum of the Person), um museu virtual que conta em seu acervo com 500 histórias de vida de cidadãos brasileiros comuns e que continua a aumentar sua colecção toda semana. Por definição, o site não tem nenhuma dificuldade para atrair a atenção de seu público-alvo”. Artigo publicado em 16 de Março de 1999. http://www.nytimes.com/library/tech/99/03/cyber/articles/16museums.html, consultado em 20 de Maio de 2004 às 15:30h.
96
entirely without technological bells and whistles, caught everyone at the meeting by
surprise132”.
Durante essa conferência, a equipa do Museu efectuou dois contactos que foram úteis
posteriormente para o crescimento do Museu da Pessoa, um deles com o professor Jorge
Gustavo Rocha do Departamento de Informática da Universidade do Minho e o outro com o
professor de médias interactivas da Universidade de Indiana, Thom Gillespie. Ambos estavam
no congresso para a realização de workshops. Thom Gillespie tornou-ser colaborador do
Museu da Pessoa, inclusive, incentivando posteriormente a criação de um núcleo do Museu da
Pessoa na Universidade de Indiana133.
Assim, como resultado desse encontro, foi, nesse ano, criado o Núcleo do Museu da
Pessoa em Portugal, ligado ao Departamento de Informática da Universidade do Minho134.
Em outubro de 1999, a equipa gestora do Museu da Pessoa, do Brasil, participou no Porto de
uma conferência sobre o uso da interactividade e multimédia nos museus. Durante a
conferência acentuaram-se os laços entre a equipa brasileira e portuguesa do Museu da
Pessoa. Como resultado surgiu o primeiro projecto do núcleo português de recolha de
depoimentos de moradores da cidade do Porto para a Sociedade Porto 2001. O papel do
Museu da Pessoa, do Brasil, foi o de dar formação em metodologia de história oral para a
equipa que trabalhou na recolha dos depoimentos. O resultado do projecto foi a
disponibilização do material no site da Sociedade Porto 2001 e no site do Núcleo Português
do Museu da Pessoa. Embora o núcleo português tenha sido criado em 1999, foi
efectivamente em 2000 que começou a expansão do Museu da Pessoa para além das fronteiras
brasileiras.
II.2.4. Expansão (2000 - 2002) Os anos de 2000 a 2002 marcaram a expansão do Museu da Pessoa. No ano de 2000,
por iniciativa de uma professora do Colégio Rio Branco de São Paulo, o Museu da Pessoa
recebeu através de seu site 45 histórias de alunos. A esta iniciativa seguiu-se outras e logo
várias professoras de outros colégios passaram a enviar histórias de seus alunos para o site do
Museu da Pessoa. O site do Museu da Pessoa, que já era usado por professores do ensino
132 - Tradução livre: “Suas experiências sociais passam a ser os seus temas à medida que participam com outros do desenvolvimento de um arquivo de experiências vividas. A extrema simplicidade do conceito brasileiro, elaborado inteiramente sem nenhum acessório adicional para torná-lo mais atraente, apanhou todo mundo de surpresa na reunião.” 133 - Thom Gillespie é professor de medias interactivas e director Masters in Immersive Mediated Environments (MIME) no departamento de Telecomunicações da Universidade Indiana e um dos membros do conselho consultivo do Instituto Museu da Pessoa.net. 134 - O núcleo português do Museu da Pessoa já realizou 6 projectos de memória, recolhendo ao todo 254 depoimentos. Endereço do site do núcleo português: http://www.museu-da-pessoa.net
97
fundamental em sala de aula, passou a ser utilizado também pelos alunos para inserirem suas
próprias histórias.
O ano de 2000 marcou também a mudança de espaço físico, das dependências na Rua
Cardeal Arcoverde, em Pinheiros, o Museu da Pessoa mudou-se para uma casa na Rua
Delfina, na Vila Madalena. A mudança foi necessária devido ao crescimento dos projectos e
consequentemente, o crescimento da equipa.
Em 2001, o Museu da Pessoa foi o objecto de um workshop durante a conferência
‘Museums and Web ´2001’ em Seattle. O workshop cujo nome era “The Museum-Of-The-
Person 'dot' World135” tinha como objectivo desenvolver etapas para a expansão do trabalho
do Museu da Pessoa, incentivando a criação de novos núcleos. Durante o workshop diversos
profissionais ligados a museus debateram a criação de núcleos do Museu da Pessoa. Entre
eles, o Núcleo de Portugal, representado pelo professor Jorge Gustavo Rocha. Nesse
workshop surgiu a ideia da criação de um núcleo nos Estados Unidos, ligado à Universidade
de Indiana, com a participação activa da professora Inta Carpenter136. Nesse mesmo ano, o
Museu da Pessoa recebeu o Prémio Aberje de Memória Empresarial, pelo projecto Vale
Memória, desenvolvido para a Companhia do Vale do Rio Doce.
Foi durante o ano de 2001 que surgiu a ideia de transformar o site do Museu da Pessoa
em um portal de memória. O estímulo final para esta transformação deu-se com a participação
do Museu da Pessoa no Prémio Empreendedor Social, realizado pela Ashoka e pela Mckinsey
durante este mesmo ano137. O plano de negócios escolhido pelo Museu da Pessoa para ser
desenvolvido durante o processo do Prémio Empreendedor Social, foi criação de um Portal de
histórias de vida, chamado Museu da Pessoa.net. A ideia era criar um portal que congregasse
vários sites ligados a quatro grandes áreas: educação, instituições, comunidades e pessoas.
Cada site teria conteúdos direccionados a um determinado público-alvo. A configuração do
Portal Museu da Pessoa.net será objecto de análise no próximo capítulo.
Em Julho de 2002 foi oficialmente criado o Instituto Museu da Pessoa.Net, constituído
como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), pela nova lei em vigor
no Brasil138. A ideia de criação de uma organização não-governamental que gerisse os
projectos do Museu da Pessoa remonta a 1997, quando a primeira versão recebeu o nome de
135 - Tradução: Museu da Pessoa.mundo. 136 - O endereço do site do Núcleo americano do Museu da Pessoa é http://www.bloomington.in.us/~mop-i/index 137 - O Prémio Empreendedor Socialé um concurso realizado pela Ashoka em parceria com a Mckinsey. É um concurso-treinamento de âmbito nacional e tem como objectivo capacitar organizações da sociedade civil para desenvolver projectos para captação de recursos. Cada organização social sugere um plano de negócios no qual deve trabalhar durante os meses do processo, passando por três etapas eliminatórias. Os três melhores projectos entre os 10 finalistas ganham prémios em dinheiro. E há também um prémio para a ideia mais inovadora em captação de recursos. Em 2002, o Museu da Pessoa foi um dos 10 finalistas deste prémio com o plano de negócio sobre o Portal Museu da Pessoa.net. 138 - Lei federal Nº 9.790, de 23 de Março de 1999.
98
Instituto de Histórias Digitais. Posteriormente, evolui-se a discussão, transformando o nome
para Instituto Museu da Pessoa.net e utilizando as ideias discutidas durante o processo do
Prémio Empreendedor Social. No entanto, desde 2001 os projectos sociais do Museu da
Pessoa já eram assinados pelo Instituto. A criação do Instituto Museu da Pessoa.net foi a
concretização de disseminar o trabalho desenvolvido pelo Museu da Pessoa, multiplicando o
alcance de seus projectos.
No fim do ano de 2002, o Museu da Pessoa voltou a receber o Prémio Aberje de
Memória Empresarial, desta vez pelo projecto educativo Memória Local - Histórias de Nossa
Terra, desenvolvido em parceria com o Instituto Avisa Lá e a CTBC Telecom.
II.2.5. Rede (2003 - actual) Em Agosto de 2003, foi lançado o Portal Museu da Pessoa.Net. Conforme vimos
anteriormente, a criação de um Portal de histórias de vida é um desejo antigo do Museu da
Pessoa. O Portal é a continuidade natural do trabalho desenvolvido ao longo da trajectória do
Museu da Pessoa e tem como objectivo “(…) constituir uma rede mundial de histórias de
vida e contribuir com a formação de uma nova memória social139”.
O lançamento do Portal e a apresentação oficial do Instituto Museu da Pessoa.net
aconteceram durante seminário promovido pelo Museu da Pessoa e pelo SESC-SP durante
entre os dias 12 a 14 de Agosto de 2003, em São Paulo. O Seminário ‘Memória, rede e
mudança social’, que se realizou no auditório do SESC-SP, na Vila Marina contou com a
participação de 550 pessoas, do Brasil e de convidados internacionais. Os objectivos deste
seminário eram congregar pessoas para discutir o uso da memória por grupos sociais e
envolvê-los nos debates para a criação de uma rede de memórias.
O seminário envolveu questões como uso da memória, análise do papel da Internet na
democratização da memória e discussão de estratégias para a constituição de uma rede de
memórias. Os três eixos temáticos do seminário foram definidos de tal forma a abranger as
várias possibilidades que o tema proporcionava, sendo: Memória: das tradições orais ao
mundo digital, Ação Memória: histórias de vida e mudança social e Memória Virtual:
tecnologias e a construção de redes virtuais de histórias de vida.
O seminário contou com a participação de pessoas ligadas aos núcleos português e
americano do Museu da Pessoa, além de dois canadianos do Centro de Histórias de Montreal.
Os primeiros contactos com o Centre d´Histoires de Montreal aconteceram em Novembro de
139 - Informação retirada do Portal do Museu da Pessoa.net http://www.museudapessoa.net, no dia 26 de Junho de 2004, às 16:47h.
99
2002, através de seu director, Jean-François Leclerc140. Na ocasião a ideia era trocar
experiências entre o trabalho desenvolvido no Canadá e no Brasil. Convidados pela equipa do
Museu da Pessoa a participarem do Seminário, resolveram criar um núcleo do Museu da
Pessoa em Montreal, vinculado ao Centro de Histórias de Montreal. Actualmente, o núcleo
canadiano está em negociação para a criação de uma entidade jurídica ligada ao CHM, para
suportar os projectos ligados à memória das pessoas que vivem em Montreal.
No final do ano de 2003, o Museu da Pessoa ganhou novamente o Prémio Aberje de
Memória Empresarial, desta vez pelo projecto sobre a memória do BNDES – Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social, realizado por ocasião do aniversário de 50 anos da
instituição.
O ano de 2004 é um ano dedicado à elaboração de estratégias para o crescimento da
rede. Os grupos de discussão criados durante a realização do Seminário têm continuado a
trabalhar as questões pertinentes para o crescimento do trabalho. Dois grupos de discussão,
um de metodologia e outra de tecnologia, têm discutido a normalização da metodologia e
integração dos sistemas de informação: sites e bases de dados.
II.2.6. Considerações finais O Museu da Pessoa é uma instituição que se mantém em construção. Sua trajectória
demonstra que muitas ideias que surgiram no início de sua existência só conseguiram ser
viabilizadas após 10 anos de actividade. E mesmo assim, muitas delas, como a criação de uma
rede de histórias de vida, não foram ainda concretizadas. No entanto, outras ideias, como o
crescimento para outros países, que embora não tenha sido planeado a princípio, tornou-se
possível devido à divulgação do trabalho do Museu da Pessoa através da participação em
congressos no exterior.
Por ser uma ideia nova e pela configuração da sua sustentabilidade, que depende de
financiamento para seus projectos, o Museu da Pessoa ainda busca uma auto-suficiência
financeira para crescer e poder cumprir a sua missão. Sendo assim, está sujeito aos revezes da
situação económica, como aconteceu em 1998, cuja situação económica do País se reflectiu
na retracção dos projectos de memórias das empresas e instituições.
140 - O Centro de Histórias de Montreal é um museu ligado à autarquia da cidade de Montreal. Criado em 1983 é voltado para a cultura local. É um museu que já trabalha com a recolha de depoimentos de moradores da cidade de Montreal, tendo já recolhidos 150 depoimentos. Mais informações no site: www.ville.montreal.qc.ca/chm/chm.htm
100
II.3. Análise do site
“Enfim, em resumo, isso foi um pouco da minha vida. Espero que quem consiga ter a paciência de ler goste. Eu gostei, e muito, de ter passado por tudo isso, o fato de ter escrito
isso me fez recordar muitas coisas e isso é maravilhoso...” Leandro Francisco Ferreira, que enviou sua história em 06 de Junho de 1998.
A Internet é um veículo dinâmico, por isso, é necessário que hajam mudanças periódicas
tanto no design quanto na navegação dos sites. Mesmo tendo tão pouco tempo de existência já
é possível fazer estudos sobre a evolução dos sites desde os mais remotos, que possuíam um
carácter mais informativo e eram um amontoado de links, até os sites mais sofisticados
produzidos actualmente com animações em flash. No entanto, não é objectivo desse capítulo
estudar a evolução do design dos sites, e sim compreender como o site do Museu da Pessoa
evoluiu durante esses oito anos de convivência com a Internet. Conforme vimos
anteriormente, embora tenha nascido com uma essência de museu virtual, foi somente com a
Internet que o Museu da Pessoa conseguiu divulgar de forma mais homogénea o seu trabalho.
Embora o site do Museu da Pessoa tenha sofrido alterações ao longo dos anos, pode-se
considerar que houve quatro grandes mudanças do design e de navegação de sua página na
Internet. Essas mudanças reflectiram não só o amadurecimento das ideias do Museu da
Pessoa, mas também seguiram as tendências do design, da organização da informação e de
navegação na Internet. As mudanças do site do Museu da Pessoa, conforme pode-se verificar
a seguir, ocorreram por transferência de hospedagem e por mudanças na concepção do
próprio site. A análise desse capítulo restringe-se às funcionalidades dos sites e do Portal do
Museu da Pessoa. A análise das funções museológicas, realizadas através do Portal do Museu
da Pessoa deverá ser objecto de estudo no capítulo posterior.
II.3.1. Primeira versão (1996) A primeira experiência do Museu da Pessoa na Internet aconteceu em 1996. A Internet
estava praticamente começando no Brasil e era algo ainda muito novo. As empresas e
instituições ainda estavam aprendendo a trabalhar com este novo veículo de comunicação. Por
isso, a tendência desse período era a criação de sites mais simples do ponto de vista do design,
mas também do ponto de vista da navegação. Os sites criados nesse período são, na sua
maioria, páginas institucionais, tal como um folheto electrónico, onde a instituição é
apresentada, normalmente através de uma secção o que é ou quem somos, onde aparecem os
contactos da empresa: endereço, telefones, e-mails, etc; normalmente o produto ou serviços
são apresentados e muito pouca coisa além disso.
101
O site do Museu da Pessoa, lançado em Abril de 1996 não diferia da política dos
primeiros sites da Internet. Desenvolvido pela empresa Miklos Design, servia como uma
página institucional para a divulgação do trabalho desenvolvido pelo Museu da Pessoa. A
página inicial era uma espécie de texto com links para outras páginas e, como norma do
período, possuía muita informação escrita, o que seria hoje considerado excessivo. A cor de
fundo da página era cinza e como era moda no período havia uma espécie de papel de parede
com o nome do Museu da Pessoa. Uma barra no canto superior esquerdo continha uma
animação onde fotos e rostos de pessoas surgiram de tempos em tempos. O site possuía um
contador do número de pessoas que visitaram o site e um livro de visitas para as pessoas
assinarem.
Além das informações sobre o que era o Museu da Pessoa e o trabalho desenvolvido, a
página inicial destacava sempre algum depoimento do acervo. A cada 15 dias o site era
actualizado e o depoimento que estava em destaque saía e dava lugar a um novo depoimento.
Não havia ainda a ideia de acrescentar novos depoimentos, e sim apenas de apresentá-los.
Para isso, os utilizadores tinham a possibilidade de aceder a uma pequena biografia do
depoente, uma foto actual (às vezes extraída do próprio depoimento em vídeo) e o texto
integral do depoimento em formato de texto (acessível via download).
Figura 6 - Página principal da primeira versão do site do Museu da Pessoa
Fonte: primeiro site do Museu da Pessoa
Era um site estático, com poucas secções e algumas animações141. Além da página
principal, o site estava dividido em seis secções: Acervo, Produtos, Métodos, Aplicações,
141 - Diz-se estático ao site que não é construído dinamicamente, ou seja, as páginas são ficheiros HTMLs. Quando as páginas são formadas dinamicamente diz-se que o site é dinâmico. Normalmente os sites dinâmicos têm uma base de dados como suporte.
102
Fórum e Realizações. Conforme o padrão da época, o menu estava situado na lateral direita do
site e apresentava capitulares de cores diferentes. Na secção Acervo havia um texto com a
explicação de como era desenvolvido o trabalho do Museu da Pessoa e abria espaço para que
as pessoas pudessem se registar para gravar o seu depoimento. Além disso, nessa secção eram
disponibilizadas quinzenalmente pequenas biografias das pessoas já entrevistadas pelo Museu
da Pessoa. A secção Produtos apresentava os possíveis produtos que poderiam ser realizados
com base nos depoimentos orais. A página Métodos apresentava uma lista de características
do trabalho do Museu da Pessoa. A página Aplicações era uma lista de possíveis usos da
memória para produtos culturais. Na secção Fórum, embora tivesse esse nome, era uma seção
de notícias sobre o Museu da Pessoa e não uma secção para troca de experiências entre os
utilizadores. Por fim, a seçcão Realizações apresentava uma lista dos projectos já realizados
pelo Museu da Pessoa.
Figura 7– segunda parte da página principal do Museu da Pessoa (primeira versão)
Fonte: primeiro site do Museu da Pessoa
Assim, o primeiro site do Museu da Pessoa era característico de sua época. Ele possuía
um carácter institucional e funcionava como uma espécie de folheto electrónico. Só com a
reformulação do site, que aconteceu logo a seguir, que o Museu da Pessoa passou a utilizar a
Internet como uma ferramenta de interacção com o público. No nosso entender, o maior
problema do site nesse período era o excesso de textos em todas as secções. Além disso, o
visitante não era atraído a retornar ao site, pois as alterações eram pequenas e pouco
significativas. Baseado no conceito de museu virtual defendido na primeira parte deste estudo,
pode-se dizer que o primeiro site do Museu da Pessoa não se configurava como sendo um
103
museu virtual. No entanto, o seu objectivo principal estava cumprido, que era divulgar o
trabalho do Museu da Pessoa.
II.3.2. Segunda versão (1997 - 2000) No final do ano de 1996, o portal de informação Universo On-line (UOL) convidou o
Museu da Pessoa para ser um parceiro de conteúdo. As negociações entre a direcção do
Museu da Pessoa e o UOL foram efectuadas e em Março de 1997 o site do Museu da Pessoa
passou a ser hospedado nos servidores do UOL. O acordo entre o Museu da Pessoa e o UOL
não envolvia custos financeiros. Para o UOL, o Museu da Pessoa representava volume de
conteúdo e de histórias interessantes a que os utilizadores do Portal teriam acesso. Para o
Museu da Pessoa a hospedagem nos servidores do UOL garantia mais audiência e mais
visibilidade, pois o UOL, além de ser um provedor muito conhecido pela comunidade de
utilizadores da Internet no Brasil, ainda daria destaque na sua página principal às novidades
do site do Museu da Pessoa. Com a hospedagem, o Museu poderia usufruir de duas
ferramentas disponibilizadas pelo UOL: uma sala de bate-papo, que acabou sendo usada
somente no dia da inauguração do site, e uma ferramenta de fórum.
A inauguração oficial do site aconteceu num cibercafé de uma livraria de São Paulo,
onde foi programado um bate papo nas salas de chats do UOL com o fundador da biblioteca
da comunidade de Paraisópolis, Claudemir Cabral142. Para marcar a inauguração do novo site,
o Museu da Pessoa entrevistou o jornalista Barbosa Lima Sobrinho e deu destaque ao seu
depoimento na página de entrada do site143.
O design do site, proposto pela própria equipa do UOL foi adaptado pela empresa
Miklos Design para as necessidades do Museu da Pessoa. Além do menu que era apresentado
na horizontal dentro de uma imagem de várias pessoas, o site possuía uma barra de navegação
do UOL, que era obrigatória em todos os sites hospedados nos servidores desse provedor. O
fundo das páginas era branco, com design simples e nas páginas das secções internas do site
havia uma animação com frases de alguns depoentes que apareciam num gif animado144.
142 - Claudemir Cabral foi o idealizador de uma biblioteca na Favela de Paraisópolis, na cidade de São Paulo. Mais conhecida como Becei – Biblioteca Escola Crescimento Educação Infantil atende a comunidade e foi aberta por Claudemir através de recebimento de doações de livros e revistas. Hoje a biblioteca tem espaço próprio e atende não só a comunidade de Paraisópolis, mas também os bairros vizinhos. 143 - Alexandre José Barbosa Lima Sobrinho nasceu em Recife no dia 22 de Janeiro de 1897 e faleceu no Rio de Janeiro em 16 de Julho de 2000. Advogado, jornalista, professor político e escritor, esteve em várias lutas pela democratização no Brasil. Durante 78 anos assinou uma coluna diária no Jornal do Brasil, tornando-se o jornalista mais activo do Brasil. 144 - GIF é a sigla para Graphics Interchange Format. É um formato de ficheiro que pode ser lido por qualquer browser gráfico. Pode ser usado como uma imagem estática ou como uma imagem animada, usando uma sequência de imagens. A este segundo tipo dá-se o nome de gif animado. Após o surgimento da linguagem Flash, criada pela Macromedia, o uso de gifs animados perdeu a sua força.
104
O site estava dividido em algumas secções: O que é, Almanaque, Fotografias, Acervo,
Escreva sua História e Visitantes. A secção O que é apresentava o Museu da Pessoa,
explicando o trabalho desenvolvido, a equipe e os projectos já realizados. A secção
Almanaque apresentava histórias temáticas (histórias dos comerciantes em São Paulo,
homenagens aos pais, etc) e histórias de famílias. Essa secção foi usada também para
disponibilizar pequenas histórias temáticas enviadas por outras pessoas em ocasiões especiais:
Dia da Mãe, Dia do Pai, Natal, etc.
Na secção Fotografias o utilizador tinha acesso às fotografias do acervo através de
assuntos pré-seleccionados pela equipa do Museu da Pessoa (futebol, casamento, fotos de
família, etc). A secção Acervo era dividida em duas partes: histórias recebidas pela Internet e
depoimentos do acervo do Museu da Pessoa. Os depoimentos ainda eram disponibilizados em
páginas HTML, na ausência de uma base de dados.
Figura 8 - Página principal da segunda versão do site do Museu da Pessoa
Fonte: segunda versão do site do Museu da Pessoa
Na secção Escreva sua História o utilizador tinha a possibilidade de inserir sua história
no site, através de um formulário onde ele preenchia alguns dados pessoais e escrevia a
história num campo apropriado. O utilizador tinha a opção de enviar uma história sua ou de
alguém que queria homenagear (pai, mãe, avós, etc). A secção Visitantes era um espaço para
o utilizador enviar seus comentários para o Museu da Pessoa. Nessa mesma secção
inicialmente havia um fórum onde os participantes propunham temas para discutir. O fórum
105
foi pouco tempo depois desactivado, pois não havia um controlo sobre o seu conteúdo e
alguns utilizadores escreviam assuntos fora do contexto.
Além das secções fixas, na página principal eram apresentadas semanalmente novidades
e destaques do acervo. Além disso, pela primeira vez era possível fazer buscas ao material do
acervo. Estas pesquisas, de carácter livre, permitiam aos utilizadores procurar por palavras
nos textos dos depoimentos e nas legendas das fotos145. Embora este sistema de busca não
tivesse um grau de eficiência muito alto, pois acabavam por extrair informações
desnecessárias, foi um primeiro passo para a uma procura mais organizada de informações no
site.
Além de estar hospedado num provedor mais conhecido e portanto ter mais visibilidade,
a maior novidade do site em relação à primeira versão foi a possibilidade das pessoas
poderem inserirem suas histórias146. O site deixou de ter um papel somente de apresentar o
acervo do Museu da Pessoa, mas também abriu a possibilidade de uma interacção maior com
o seu público. O acervo do Museu da Pessoa deixou de ser somente dos depoimentos
recolhidos nos projectos, mas ampliou-se, na medida em que abriu espaço para que outras
pessoas pudessem divulgar suas histórias. Sobre essa possibilidade, em entrevista a Thom
Gillespie, Karen Worcman fala sobre as mudanças que aconteceram nesta nova versão:
“The Internet made it possible to let people write their stories without being interviewed
by us. This was a big change. We began to think of other changes, such as ways to be
more present in people's daily lives: net diaries and calendars for scheduling special
dates such as birthdays, anniversaries and Mother's Day; places for people to tell
special stories on special days. We changed a lot with the Internet, and we expect to
change even more.147” (GILLESPIE, 1999)
O maior problema do site do Museu da Pessoa, nesse período, foi a ausência de uma
base de dados que desse suporte ao acervo. Uma base de dados possibilitaria, por um lado, a
organização do material e por outro permitiria uma busca mais sofisticada ao acervo. Além
disso, o site foi crescendo de forma vertiginosa e as poucas secções, cristalizadas na barra do
menu, impossibilitavam uma navegação mais fácil. As novas secções que eram criadas
tornavam o site numa ‘colcha de retalhos’. Este problema reflectiu na navegação do site, que
145 - Pesquisa livre é um tipo de pesquisa por palavras, ou seja, não é busca a campos fechados. Mais conhecida como “busca burra” pois recupera palavras com a mesma raiz sem filtrá-las. Por exemplo: se escrevermos “amor”, pode aparecer a palavra “namorado” pois a primeira está contida na segunda. 146 - O site do Museu da Pessoa recebeu durante este período 380 histórias recebidas pela Internet. 147 - Tradução livre: “A Internet deu às pessoas a possibilidade de escrever suas histórias sem serem antes entrevistadas por nós. Isso representou uma grande mudança. Começamos a pensar em outras mudanças, por exemplo, poderíamos os fazer presentes no dia-a-dia das pessoas: diários na rede, calendários para planeamento de data especiais como aniversários, comemorações, dia das mães; espaços reservados para pessoas contarem histórias especiais em dias especiais. Mudamos muito com a Internet, e esperamos mudar ainda mais.”
106
se tornou confusa e mesmo o design já não suportava a quantidade de secções e subsecções
que foram sendo criadas ao longo do tempo.
II.3.3. Terceira versão (2001- 2002) O site do Museu da Pessoa esteve hospedado nos servidores do UOL durante cinco
anos. Em 2001, com a nova política de parcerias do UOL, que exigia que parte do conteúdo
do site fosse exclusivo aos assinantes do UOL, o Museu da Pessoa resolveu em comum
acordo rescindir o contrato e retirar o seu site do servidor do UOL. Sendo assim, o Museu da
Pessoa resolveu hospedar sua página num provedor pago e divulgar mais o seu próprio nome
de domínio.
As mudanças em termos de design foram poucas após a saída do UOL. E foram feitas
internamente, pela própria equipa de webdesign do Museu da Pessoa. A grande mudança foi a
criação de um menu lateral em substituição ao menu horizontal, concebida com o objectivo de
organizar melhor a navegação. Além disso, nova secções foram criadas para abrigar o
material já existente no site. Uma novidade foi a apresentação de uma foto por dia na página
de entrada. Nela, o utilizador podia ter acesso às fotos do acervo do Museu da Pessoa. Na
página principal continuava a ter um parágrafo de abertura explicando o Museu da Pessoa.
Era:
“Todo ser humano, anônimo ou célebre, tem o desejo de eternizar sua história. Esta
idéia deu origem ao Museu da Pessoa, que tem como objetivo possibilitar a todo e
qualquer indivíduo ter a sua história de vida registrada e preservada. Este é um museu
virtual do qual você pode fazer parte, escrevendo e incluindo em nosso acervo a sua
história de vida. Além disso, você pode consultar fotos, documentos, áudios e outras
biografias148”.
Entre as novas secções, que se juntaram às do antigo site, surgiram as seguintes:
Instituições, Projetos, Educação, Áudios, Vídeos, Eventos, Núcleos, Frase do dia, Calendário
Interativo e Fale conosco. A secção Instituições era uma página com links para alguns
projectos apoiados pelo Museu da Pessoa e também parceiros e patrocinadores dos projectos.
A lista de projectos desenvolvidos pelo Museu da Pessoa, que se encontrava dentro da antiga
secção O que é, passou para a secção Projetos.
Uma novidade do novo site foi a organização dos conteúdos de educação. A criação da
secção Educação teve como objectivo apresentar as histórias recolhidas pelas crianças nos
148 - Texto de abertura do site do Museu da Pessoa, já desactivado.
107
projectos de educação desenvolvidos pelo Museu da Pessoa em Ituiutaba e no Rio de Janeiro.
Além disso, era utilizada para apresentar as histórias de crianças enviadas por escolas de São
Paulo.
Figura 9 - Página principal da terceira versão do site do Museu da Pessoa
Fonte: terceira versão do site do Museu da Pessoa
Nas secções Áudio e Vídeo, os utilizadores tinham acesso a trechos de áudio e vídeo de
alguns depoimentos do acervo. A inclusão dessas secções só foi possível com o avanço da
Internet, que com o surgimento da banda larga, permitiu colocar vídeos e áudios sem perda de
qualidade. A secção Eventos foi criada para abrigar as informações e histórias recolhidas em
eventos públicos de captação de depoimentos, promovidos pelo Museu da Pessoa. Estes
eventos, normalmente em parceria com outras instituições visavam recolher depoimentos em
lugares públicos. Após o evento, os trechos dos depoimentos eram inseridos no site. Em
Núcleos o utilizador tinha acesso ao site do Núcleo Português do Museu da Pessoa e as
informações sobre o núcleo de São João del Rei149. Por fim, haviam ainda as secções Frase
do dia e Calendário Interativo que não possuíam ligação a outros conteúdos. A frase do dia
era um trecho seleccionado dos depoimentos, sendo que cada dia uma nova frase era
apresentada. O calendário interactivo era apenas um calendário com datas festivas do Brasil.
Entre as mudanças na página principal destaca-se a retirada da busca, que se mostrava
ineficiente e a apresentação de um banner com novidades ou com projectos apoiados pelo
149 - Em 1999, durante a realização de uma formação em metodologia de história oral no 12º Inverno Cultural, na universidade Funrei, na cidade de São João del Rei, a equipa do Museu da Pessoa teve oportunidade de formar um grupo de pessoas que começou a recolher histórias das pessoas e tencionava criar um núcleo do Museu da Pessoa naquela cidade. Este núcleo esteve activo durante alguns anos, recolhendo depoimentos mas actualmente suas actividades estão paradas.
108
Museu da Pessoa150 . A página principal continuava a ter dois destaques, onde haviam sempre
duas chamadas para o conteúdo do acervo.
Em termos de funcionalidades, o site não apresentou nenhuma novidade. A grande
mudança foi a organização do conteúdo de modo a permitir uma melhor navegação, incluindo
novas secções. Mas o principal problema do site anterior ainda continuava pois a ausência de
uma base de dados impossibilitava uma busca eficiente, além de não permitir que as páginas
fossem geradas automaticamente, aumentando o trabalho da equipa. Este foi o maior
problema enfrentado pelo site do Museu da Pessoa durante todos esses anos.
II.3.4. Quarta versão – Portal Museu da Pessoa.net (2003 - actual) Conforme vimos anteriormente, a ideia inicial da criação de um portal de histórias de
vida estava baseado na criação de quatro sites: educação, comunidades, instituições e pessoas.
Desses quatro, dois já estão em funcionamento: escolas e pessoas. A ideia da criação de um
portal estava baseada na organização dos conteúdos, direccionando o uso dos conteúdos aos
públicos específicos.
O Portal Museu da Pessoa.net foi inaugurado no dia 12 de Agosto de 2003, durante o
seminário ‘Memória, rede e mudança social’. Para a divulgação do lançamento do Portal, foi
criada uma exposição física itinerante e uma exposição virtual com 10 personagens cujas
histórias se encontram no acervo do Museu da Pessoa. Esta exposição chamada ‘História
Ambulante’ foi uma ideia simples, mas eficaz para a divulgação do trabalho do Museu da
Pessoa151. Durante o período do seminário alguns actores e actrizes amadores, do curso de
teatro da Fundação Gol de Letra participaram da exposição, carregando placas com as 10
histórias de vida seleccionadas do acervo do Museu da Pessoa152. Cada história escolhida
dizia respeito a uma pessoa mas também a um bairro da cidade de São Paulo, que comemorou
durante o ano de 2004, 450 anos de sua fundação. Os actores, carregando as placas, com duas
faces, andavam a cada dia, durante a semana do Seminário, por pontos estratégicos da cidade
de São Paulo (Av. Paulista, Parque Ibirapuera, etc). Eles foram treinados a dar informações
150 - É a abreviação de 'banner advertisement' (banner de anúncio). O banner é uma imagem de carácter publicitário inserido dentro de um site. Normalmente é animado pois sua finalidade é chamar a atenção do utilizador para outro site ou para algum conteúdo dentro do próprio site. 151 - O nome da exposição foi escolhido para referenciar os ambulantes que trabalham na região central e na Av. Paulista, na cidade de São Paulo, carregando placas com publicidade diversas. Veja fotos da exposição ‘História Ambulante’ no Anexo I. 152 - A Fundação Gol de Letra é uma organização não governamental de apoio a comunidades carentes, criada em 1998 pelos jogadores de futebol Leonardo e Raí. O Museu da Pessoa desenvolveu um projecto em parceria com a Fundação Gol de Letra, cujo objectivo era formar os moradores do bairro de Vila Albertina na metodologia de história oral. Mais informações no site: http://www.goldeletra.org.br/
109
sobre a história de vida que carregavam e a incentivar as pessoas a participarem do acervo do
Museu da Pessoa. A ideia da exposição era não só divulgar o lançamento do Portal e o
Instituto mas também apresentar uma outra forma de exposição física: uma exposição que
fosse itinerante, veiculada através de pessoas e que pudesse ‘ passear’ pela cidade.
Durante o evento de lançamento, os depoentes (os que ainda estão vivos) cujas histórias
e fotos foram reproduzidas na exposição ambulante estiveram presentes e falaram sobre a
experiência de contar sua história para o Museu da Pessoa. O evento de lançamento contou
também com uma apresentação de um grupo de rappers e de repentistas, que contaram suas
histórias de vida em forma de versos e fizeram um desafio entre estes dois estilos musicais153.
A ideia de criação de um portal de memórias foi a evolução natural do trabalho do
Museu da Pessoa, mas respeitando a ideia inicial de que a participação e a consulta possam
ser feitas por qualquer pessoa:
“O portal é aberto à consulta e participação de toda pessoa que tenha o desejo de
preservar e partilhar sua trajetória. Busca assim garantir o direito de todo ser humano
de participar da História. Ao preservar, integrar e divulgar experiências de vida pela
internet, o portal visa transformá-las em fonte de conhecimento e contribuir com a
formação de uma nova memória social154”.
O design do Portal, desenvolvido pela empresa JExperts e com a direcção artística do
programador gráfico e fotógrafo Cafi, segue algumas características comuns aos sites actuais.
Entre elas o uso de uma animação em flash na página de abertura, onde dentro de um desenho
de uma mão aparecem várias fotos de pessoas. Além disso, utiliza imagens nas páginas
principais, para chamar a atenção do utilizador. Por se tratar de um portal, há várias chamadas
na página principal para os conteúdos dos sites internos. Na página principal também há
espaço para banners de carácter institucional, seja para defender alguma causa ou para apoiar
projectos correlatos. O Portal trabalha principalmente com a cor vermelha, deixando outras
cores para as páginas secundárias e para os sites internos.
Actualmente o Portal Museu da Pessoa.net está organizado nos seguintes sites: Pessoas
e Escolas. Estes sites, cujos acessos se encontram na barra superior do Portal, têm estrutura e
navegação autónomas. No site Escolas o utilizador tem acesso aos projectos educativos
153- Repentistas são cantores populares que cantam versos em forma de desafio. É uma tradição moura que os portugueses levaram para o Brasil. No Brasil, existem vários tipos de repentes: a trova gaúcha (Rio Grande do Sul), o calango (Minas Gerais), o cururu (São Paulo), o samba de roda (Rio de Janeiro) e o repente nordestino. No nordeste brasileiro, onde é mais comum, existem três tipos de repentes: a embolada (onde o cantador toca pandeiro ou ganzá), o aboio (o cantador não recorre a nenhum instrumento, usa apenas a voz) e a cantoria de viola (mais comum entre os repentistas que foram para o sul do Brasil). Fonte: Folha de São Paulo, 27/01/1997. Artigo: Repentistas movem indústria cultural "subterrânea", de Armando Antenore. 154 - Informação retirada do Portal do Museu da Pessoa.net. http://www.museudapessoa.net
110
realizados pelo Museu da Pessoa. Este site tem as seguintes secções: Memória Local,
Biblioteca e Antenas. Na secção Memória Local estão disponíveis a metodologia do projecto
Memória local, bem como as histórias e todo o material recolhido pelos projectos já
realizados. Na secção Biblioteca, o utilizador tem acesso a textos sobre o trabalho com a
memória. E por fim, a secção Antenas apresenta links para projectos que também utilizam a
memória na escola.
Figura 10 - Página principal do Portal Museu da Pessoa.net
Fonte: http://www.museudapessoa.net
Além disso, na barra do menu superior há ligações para as secções Nossos sites, Quem
somos e Rede. A secção Nossos Sites é uma entrada para os projectos desenvolvidos pelo
Museu da Pessoa. A secção Quem Somos na verdade é a ampliação da antiga secção O que é
e apresenta as seguintes subsecções: Missão, História, Equipe, Conselho, Projetos, Parceiros e
Rede. O objectivo dessa secção é apresentar o trabalho do Museu da Pessoa. Na entrada
Projetos o utilizador tem acesso a uma busca aos projectos, organizados por projectos
culturais, projectos comunitários, projectos educativos e projectos institucionais. A secção
Rede apresenta informações do Seminário e também como participar da rede de memórias do
Museu da Pessoa.
Na barra do menu inferior o utilizador tem acesso a secções fixas do Portal: Busca,
Links, Postal, Meu Museu, Código de Conduta, Mapa e Fale Conosco. O projecto de
navegação do site prevê que estas secções sejam comuns a todos os outros sites, por isto são
fixas. Na secção Busca o utilizador pode fazer buscas por palavra, por nome, por perfil, por
111
origem, em foto, documento e em desenho. Na secção Links, são apresentados os projectos
que trabalham com memória e história de vida, organizados pelos países. Na secção Postal, o
utilizador pode enviar postais com algumas fotos do acervo. A secção Meu Museu o
utilizador poderá criar uma colecção dos seus itens favoritos do Portal. Para isso, é preciso
antes registar-se no Portal. Na secção Código de Conduta o utilizador tem acesso às normas
para consulta e inserção das histórias e fotografias. A secção Mapa apresenta o mapa do portal
e a secção Fale conosco possui um formulário para que o utilizador possa enviar uma
mensagem e possui também os contactos da equipa do Museu da Pessoa.
Além da navegação na horizontal, o portal apresenta uma navegação na lateral onde
possui as seguintes secções: Conte sua História, Monte sua exposição, Você no Museu,
Acervo, Exposição e Dúvidas. Na secção Conte sua História o utilizador encontrará as
ferramentas necessárias para a inserção da sua história. Diferentemente dos sites anteriores,
no Portal é preciso antes estar registado como utilizador para poder utilizar as ferramentas de
interacção. Na secção Monte sua exposição o utilizador, previamente registado poderá
montar uma exposição com fotos e textos sobre a sua vida. É um processo automático em que
o próprio utilizador poderá escolher o estilo de site que gostaria de apresentar. Após o
preenchimento o utilizador envia para aprovação pela equipa do Portal. A secção Você no
Museu é onde os utilizadores poderão fazer seus registos e assim poderem interagir com o
Portal. A secção Acervo é a entrada para as histórias das pessoas. Ela tem uma página de
entrada com alguns destaques para algumas histórias e permite também aceder à lista dos
depoentes, organizada alfabeticamente. Na secção Exposições, o utilizador tem acesso às
exposições virtuais criadas pela própria equipa do Museu da Pessoa e também pelos
utilizadores do Portal. E por fim, a secção Dúvidas que são as perguntas mais frequentes e
que deverão auxiliar o utilizador no processo de inserção de sua história.
II.3.5. Considerações finais Ao estudar a evolução do site do Museu da Pessoa é possível entender como a
instituição evoluiu o seu conceito de virtualidade desde o primeiro site, que era pouco
dinâmico e nada interactivo, até a criação de um portal de memórias. O maior problema dos
sites anteriores que era a falta de uma busca mais eficiente e de uma navegação mais
organizada foi suprimido pela existência de uma base de dados. O Portal do Museu da Pessoa,
ao contrário dos sites anteriores, utiliza uma base de dados para organização do seu conteúdo.
O Portal do Museu da Pessoa, tal como foi pensado em 2002, durante o prémio
Empreendedor Social, sofreu algumas modificações, mas a sua essência é a mesma, ou seja, a
112
divisão de conteúdos em sites para facilitar a navegação. Algumas implementações, com o
crescimento da rede Museu da Pessoa.net ainda não estão totalmente prontas, mas a base que
foi construída é uma ferramenta potente para o desenvolvimento dessa rede de memórias.
Conforme dissemos anteriormente, o próximo passo é a construção de um sistema integrador
para ligar os sites dos núcleos português, americano e posteriormente o canadiano. Assim, o
utilizador poderá ter acesso através do Portal, não somente às histórias recolhidas nos
projectos realizados no Brasil, mas também as histórias recolhidas por estes núcleos.
Uma outra ideia que ainda não foi totalmente implementada e que será fundamental para
a divulgação das histórias é a produção de conteúdo com o material do acervo. Assim, os
professores poderiam utilizar os conteúdos do acervo para uso com seus alunos em sala de
aula. Este uso, que agora já existe, mas que seria mais incentivado e estimulado, daria ao
Portal um uso maior do que ele possui actualmente.
113
II.4. O público do Museu da Pessoa
“Faz dois dias que conheci o Museu e não consigo parar de me emocionar ao ler histórias de vidas, estas vidas felizes com algum passado de lágrimas, algumas de alegrias outras porém de tristezas.
Assim são minhas lágrimas, sem qualquer controle, elas manifestam-se. Obrigado pelos sorrisos e pelas lágrimas...”
Cintia Mendes, email recebido pelo Museu da Pessoa em 25/02/1999.
Estudar o público de um museu não é uma tarefa fácil. É preciso produzir inquéritos
específicos e aplicá-los aos seus visitantes. Da mesma forma, para estudar o público de um
museu virtual é preciso aplicar questionários, pois a quantificação realizada pela Internet
ainda não é totalmente confiável. Além disso, o que existe, geralmente, são estatísticas de
visitas ao site. No entanto, estes números são frios e não possibilitam uma análise mais
apurada dos resultados. Nesse sentido, para uma análise mais profunda sobre o público na
Internet é necessário um inquérito voltado aos utilizadores do site, com perguntas específicas
e demandas bem definidas.
O Museu da Pessoa nunca fez nenhum tipo de estudo sobre seu público. Como o público
do Museu da Pessoa é, preferencialmente, um utilizador da Internet, torna-se complicado
qualquer tipo de pesquisa, seja ela qualitativa ou quantitativa, pois o inquérito pode ser
respondido por qualquer pessoa que aceda o site. Por se tratar de um museu virtual, o público
é aqui entendido como um utilizador da Internet. Mas como não é qualquer utilizador, foi
preciso direccionar a pesquisa para as pessoas que realmente consultam e utilizam o Portal.
Por isso, foi elaborado e aplicado um questionário aos utilizadores registados no Portal Museu
da Pessoa.net.
Com o intuito de conhecer o público utilizador do Portal Museu da Pessoa.net foi
disponibilizado um inquérito na página principal do Portal. A pesquisa foi efectuada nos
meses de Março, Abril e parte do mês de Maio de 2004, e teve como amostragem 102
questionários respondidos, abrangendo um universo de 11% das pessoas inscritas no Portal155.
O resultado deste inquérito será analisado a seguir.
II.4.1. Caracterização dos utilizadores Para entender qual é o perfil do público que consulta e envia suas histórias para o
Portal do Museu da Pessoa foram seleccionadas algumas perguntas específicas na primeira
parte do questionário. A ideia era conhecer o público utilizador, bem como seus interesses e
suas opiniões. De todas as perguntas disponibilizadas, duas não serão utilizadas para a análise,
155 - O modelo do questionário encontra-se no Anexo II deste estudo. O questionário foi elaborado, levando-se em conta apenas o público do Museu da Pessoa, do Brasil, por isso suas questões e respostas são direccionadas à realidade brasileira, inclusive no que diz respeito à ortografia. O Portal possui actualmente 915 pessoas inscritas.
114
pois os resultados foram considerados irrelevantes. São elas: estado civil e renda. Justamente
por não abranger o público mais jovem (crianças e jovens estudantes), estas respostas não
serão analisadas neste estudo.
A primeira questão que os utilizadores deveriam responder era qual era o seu sexo.
Pelo resultado apresetando no gráfico nº 2, verifica-se que do total de 100% de respostas
válidas, 69% dos utilizadores que responderam ao inquérito são do sexo feminino e 31% do
sexo masculino. Esse resultado ficou dentro da expectativa porque já se imaginava que boa
parte do público fosse do sexo feminino, até pelo contacto efectuado através de emails e
telefonemas. Gráfico 2 – Utilizadores do Portal por sexo
Sexo
Masculino31%
Feminino69%
Masculino Feminino
A segunda questão da identificação era a faixa etária. Nela, o utilizador deveria marcar
a qual faixa etária pertencia. Conforme se pode verificar através do gráfico nº 3, a maior
percentagem foi registada na faixa etária de 36 a 50 anos, com 43% das respostas válidas. As
outras faixas etárias tiveram uma marcação menor, ficando em segundo lugar a faixa etária de
26 a 35, com resultado de 19%, seguida da faixa de 18 a 25, com 18% das respostas válidas.
Em quarto lugar aparece o público utilizador com mais de 51 anos, totalizando 15% das
respostas válidas. Os menores índices de resposta foram para as faixas de idade menores,
sendo que a primeira faixa, dos 7 aos 11 anos registou uma percentagem de 3% e a faixa dos
12 aos 17, obteve 2% das respostas válidas. No nosso entendimento, o Portal poderia atrair o
público mais jovem, trabalhando conteúdos específicos para pesquisas escolares, no site
Escolas, e formulando um design mais atractivo para este tipo de público.
Gráfico 3 – Faixa etária dos utilizadores do Portal
115
Faixa etária
15%
3%
2%
18%
19%
43%
7 a 11 anos 12 a 17 anos 18 a 25 anos 26 a 35 anos 36 a 50 anos Mais de 51 anos
Uma outra questão para configurar o público utilizador do Museu da Pessoa era saber
qual é a sua principal ocupação, ou seja, se estudam, trabalham ou se estão fora do mercado
de trabalho (aposentados e donas de casa). Para isso, colocou-se as seguintes opções: se só
estuda, só trabalha, trabalha e estuda, se é aposentado e se é dona de casa. Conforme pode-se
perceber pelo resultado das respostas, no gráfico nº 4, boa parte do público utilizador do
Museu da Pessoa é formada por pessoas que trabalham e estudam paralelamente, totalizando
um percentual de 48% das respostas válidas. O público que tem como ocupação principal
apenas o trabalho está em torno de 29% e o público que só estuda em torno de 12% do total.
O número de pessoas que são aposentados e donas de casas são de 8% e 3%. É interessante
notar que 77% dos utilizadores do Portal estão no mercado de trabalho e que 48% destes
possui as duas ocupações.
Gráfico 4 – Ocupação principal dos utilizadores do Portal
Ocupação
29%
3%8%
48%
12%
Só estuda Só trabalha Trabalha e estuda É aposentado É dona de casa
116
Outra informação interessante que foi possível detectar através deste inquérito é que
grande parte dos utilizadores têm curso superior, que cursaram ou estão cursando uma pós-
graduação. Através do gráfico nº 5 é possível verificar que 43% dos utilizadores têm ou
cursam uma pós-graduação, e 21% tem curso superior, totalizando 64% de pessoas com curso
superior. Daqueles que ainda estão cursando ou têm o curso superior incompleto, o percentual
é de 21%, corroborando com o gráfico 3 e com o número elevado de pessoas que estão
estudando.
Gráfico 5 – Habilitações literárias dos utilizadores do Portal
Escolaridade
4% 4%4%
3%
21%
21%
43%
1º grau incompleto
1º grau completo
2º grau incompleto
2º grau completo
Superior incompleto
Superior completo
Pós-graduação
Em relação à profissão da maioria do público utilizador, ficou patente o grande
número de professores que utilizam o Portal. Conforme podemos verificar pelo gráfico nº 6,
22% do público é formado por professores, seguido por estudantes (12%), historiadores (7%),
jornalistas (7%) e museólogos (5%). Como está era uma questão aberta, foi feita uma
codificação para agrupar as profissões de forma a analisá-las de forma mais coerente. No
entanto, como muitas profissões só apareceram uma única vez, estas respostas foram
consideradas como outras, e por isso o número elevado de pessoas na categoria Outras (20%).
Entre estas profissões surgiram algumas interessantes tais como militar, escritor, artista
plástico, secretária, operador de telemarketing e comerciante.
117
Gráfico 6 – Profissões dos utilizadores do Portal
Profissão
22%
15%
7%7%5%3%
3%3%
2%2%
2%2%2%2%
3%
2%
20%
Professor Estudante Historiador Jornalista Museólogo Aposentado Arte-educador Psicológo Advogado Analista de sistemas Pesquisador Designer Pedagoga Assistente social Funcionário público Auxiliar administrativo Outros
Para localizar espacialmente os utilizadores do Portal, foi disponibilizado um espaço
para que pudessem escrever em qual cidade e estado moram. As respostas foram tabuladas e o
resultado delas está demonstrado nos gráficos 7 e 8 desse estudo.
Em relação à localização geográfica do público utilizador do Portal, ficou claro que a
maioria do público está localizada no estado de São Paulo, conforme podemos verificar no
gráfico nº 7, com 65% das respostas válidas. Sendo que 43% das pessoas que responderam ao
inquérito moram na cidade de São Paulo, 15% em cidades do interior do estado e 6% em
cidades da Grande São Paulo (São Bernardo do Campo, Santo André, etc.). O segundo estado
com maior número de pessoas a utilizar o Portal é o Rio de Janeiro com um percentual de
14%, sendo todos moradores da cidade do Rio de Janeiro. Em seguida, vem o estado de
Minas Gerais, com 8% das respostas ao inquérito, sendo 5% moradores na capital, Belo
Horizonte e restante em Uberlândia e Uberaba. Com 1% do percentual das respostas válidas
temos o estado do Espírito Santo.
Sendo assim, a maioria dos utilizadores concentra-se na região Sudeste, com um total
de 88% das respostas válidas. A região Nordeste foi a segunda em maior número de
utilizadores, com 6%, sendo 4% da Bahia e o restante na Paraíba e em Rio Grande do Norte.
Em seguida aparece a região Sul com 4% de utilizadores, distribuídos pelos estados de Santa
Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná. Não apareceu nenhum utilizador da região Norte e
somente 1% da Região Centro-Oeste.
118
Gráfico 7 – Utilizadores por unidade da Federação (estados)
Unidades da Federação
65%1%
8%
14%
2%4%2%1%1%1%1%
SP SC MG RJ DF BA PR PB ES RS RN
Gráfico 8 – Utilizadores do Portal, por cidades onde moram
Cidades
43%
15%
14%
8%
6%
6%4%
2%
2%
São Paulo Interior de São Paulo Rio de Janeiro Cidades mineiras Grande São Paulo Outras Salvador João Pessoa Brasília
O resultado desse inquérito, no que diz respeito à localização geográfica não foi
surpreendente. Devido à sua localização geográfica e pela própria divulgação realizada pelas
médias locais e regionais, o trabalho do Museu da Pessoa acaba sendo mais conhecido na
cidade e consequentemente, no estado de São Paulo156. Um facto que ajudou a divulgação do
Portal em outros estados foi o lançamento de seu novo layout durante o Seminário ‘Memória,
Rede e Mudança social’, pois nele participaram pessoas de vários estados brasileiros.
156 - A maioria dos canais de televisão no Brasil possuem programas jornalísticos regionais, sendo as matérias jornalísticas produzidas pelas emissoras locais. Além disso, os jornais também são direccionados ao público de determinada cidade.
119
Finalizando a análise do perfil do público utilizador do Portal do Museu da Pessoa,
vimos que a maioria é do sexo feminino (69%), com idade entre 36 e 50 anos (43%), que
trabalha e estuda (48%), tem curso de pós-graduação (44%), é professora (22%) e moradora
na cidade de São Paulo (44%).
II.4.2. Uso da Internet Para a análise de como o público do Portal usa a Internet, foram elaboradas cinco
perguntas para entendimento dessa questão. A ideia era conhecer como o público se conecta,
há quanto tempo utiliza a Internet, com que frequência, quais são os usos da Internet e quais
outros sites têm o hábito de utilizar na rede mundial de computadores.
A primeira questão foi sobre o local de acesso à Internet, ou seja, onde o utilizador se
conecta. Como a questão possibilitava uma resposta múltipla, o utilizador poderia marcar
mais de uma resposta, ou seja, poderia ter acesso em sua residência como no trabalho, ou na
escola. Conforme podemos verificar no gráfico nº 9, 76% das pessoas disseram que possuem
conexão em suas residências e 55% no trabalho. Parte deste público acede a Internet na escola
ou universidade, totalizando 29% das respostas válidas. Somente 4% acede em cibercafés e
3% acede de outros locais tais como casa de parentes e amigos. Gráfico 9 - Conexão à Internet
Em casa No Trabalho Na escola / universidade Em cibercafés Outros lugares
Em relação ao tempo e a frequência de uso da Internet, grande parte dos utilizadores têm
muito tempo de uso da Internet, ou seja 39% das respostas válidas apontam para mais de 6
anos de uso da Internet, conforme podemos verificar no gráfico nº 10. Em segundo lugar, vem
o índice de 3 a 4 anos que registou um percentual de 24% de respostas válidas e o de 5 a 6
anos, que registou 22% das respostas válidas. Somente 5% dos utilizadores têm menos de um
ano de uso da Internet.
3
4
29
55
76
120
Gráfico 10 – Tempo de uso da Internet
Tempo de uso da Internet
5%10%
24%
22%
39%Menos de 1 ano
De 1 a 2 anos
De 3 a 4 anos
De 5 a 6 anos
Mais de 6 anos
Em relação ao tempo destinado à conexão, conforme pode-se verificar no gráfico nº 11,
os resultados obtidos nas respostas apontam para pessoas que estão sempre conectadas pois,
51% dos utilizadores se conectam todos os dias, e 24% estão permanentemente conectados.
Aqueles que se conectam alguns dias da semana foram 13% da amostragem e aqueles que
conectam uma vez por semana 10%. O número daqueles que se conectam esporadicamente é
de 2%. Pelo resultado do inquérito, podemos afirmar que o público utilizador do Portal é um
público familiarizado com a Internet, pois utiliza o veículo há bastante tempo e que possui
uma conexão diária à rede mundial de computadores.
Gráfico 11 – Frequência de uso da Internet
Frequência de acesso
24%
51%
10%
13%2%
O dia inteiro Todos os dias Dia sim, dia não Uma vez por semana De 15 em 15 dias
121
Além de tentar conhecer onde e durante quanto tempo o público do Portal despendia na
Internet, também era preciso saber para que tipo de sites e portais o público se sente mais
atraído. Para isso, foram elaboradas uma série de alternativas, possibilitando respostas
múltiplas. Conforme podemos verificar no gráfico nº 12, a alternativa mais escolhida entre as
respostas válidas foram os portais de informação, ou seja, 84% das pessoas que responderam
ao inquérito utilizam os portais de informação. Os sites de entretenimento (música, cinema,
etc.) ficaram em segundo lugar na preferência do público, com 52% das respostas. Os blogs e
salas de chats tiveram respectivamente 19% e 17% das respostas válidas. Conforme vimos na
primeira parte desse trabalho, o uso dos blogs está impulsionando o crescimento da audiência
na Internet, principalmente no Brasil. A Internet também é usada para conhecer melhor as
pessoas famosas, pois 11% das respostas apontam para a consulta a sites de personalidades.
Os sites de busca, embora não existem como alternativa para resposta, obteve 7% de respostas
válidas.
Gráfico 12 - Tipos de sites e portais mais consultados
%
Em relação ao uso da Internet, foram colocadas algumas alternativas para que o público
pudesse escolher várias delas. Conforme podemos verificar no gráfico nº 13 a alternativa que
obteve maior número de respostas foi a da Pesquisa, pois 86% das pessoas marcaram como
sendo a principal finalidade de uso da Internet. Em seguida, com 79% das respostas aparece a
alternativa mandar emails.
Em conformidade com a resposta ao quadro anterior, 65% das pessoas utilizam a
Internet como um veículo de informação, pois lêem notícias e reportagens publicadas nos
portais de informação da Internet brasileira (UOL, Terra, Globo, etc.). O uso da Internet como
Portais de informação
Sites de entretenimento
Blogs
Bate-papo e salas de chats
Sites de personalidades
Sites de busca
Outros
Universidades e académicos
Sites governamentais
Museus e universidades
2
45
67
11
1719
52
84
122
divertimento (sites de humor, anedotas, etc.) foi assinalado por 28% das pessoas que
responderam ao inquérito. A Internet é usada também como um veículo de comunicação,
sendo que 25% das pessoas utilizam programas de instant messaging, tais como Messenger,
ICQ, Yahoo Pager e 10% usam salas de chats. Das respostas válidas, 8% das pessoas que
responderam ao inquérito possuem um blog na Internet. Gráfico 13 – Finalidade de uso da Internet
%
O que se pode perceber pelo resultado do inquérito é que a maior parte do público do
Portal possui conexão em sua residência, tem já algum tempo de convívio com a Internet e
que usa a Internet como veículo de pesquisa e de informação. É interessante verificar que a
Internet é utilizada como um veículo de comunicação entre as pessoas, não só através do
envio de emails, mas também através de salas de chats e programa de instant messaging, tais
como Messenger, ICQ e Yahoo Pager.
II.4.3. A relação dos utilizadores com o Museu da Pessoa Após o estudo do perfil básico de quem utiliza o Portal do Museu da Pessoa.net,
inclusive detectando a forma como ele usa a Internet, era preciso entender como o Museu da
Pessoa é visto pelo seu público utilizador. Para isso, o inquérito foi dividido em duas partes.
A primeira, contendo 20 perguntas, diz respeito ao conhecimento sobre o trabalho
desenvolvido pelo Museu da Pessoa e sobre a forma como o Museu da Pessoa trabalha. Na
segunda parte, foram seleccionadas quatro perguntas para as pessoas que já enviaram suas
histórias para o acervo do Museu da Pessoa.
Pesquisar
Mandar e-mails
Notícias/reportagens
Divertir-me
Conversar com amigos
Salas de chats
Actualizar meu blog
Outros
Participar de fóruns
1
6
8
10
25
28
65
79
86
123
As primeiras cinco perguntas são sobre como o utilizador vê e desde quando conhece o
trabalho do Museu da Pessoa. A primeira pergunta, que deixava ao utilizador a possibilidade
de marcar respostas múltiplas, é sobre como conheceu o trabalho do Museu da Pessoa.
Conforme podemos verificar no gráfico nº 14, as respostas foram muito pulverizadas, ou seja,
não há uma diferença muito grande entre os números das respostas. As respostas mais
assinaladas foram a Internet, com 34% respostas válidas, por indicação de alguém, com 26%
respostas válidas e por publicações, com 21% das respostas válidas. Entre as respostas abertas
(Outros, com 16%), destaque para os 10% que responderam que conheceram o trabalho do
Museu da Pessoa através do Seminário ‘Memória, Rede e Mudança Social’, realizado em
Agosto de 2003. Embora não tenha tido uma maioria expressiva, a Internet aparece como o
principal espaço de divulgação do Museu da Pessoa.
Gráfico 14 – Como conheceu o trabalho do Museu da Pessoa
A segunda questão que foi abordada nessa parte do inquérito era sobre o conhecimento
da missão do Museu da Pessoa. O objectivo era verificar se o público que utiliza o Portal tem
conhecimento sobre o conteúdo da missão do Museu da Pessoa e se identifica com ela. Pelos
resultados apresentados nos gráficos 15 e 16, podemos verificar que o percentual de pessoas
que conhecem a missão do Museu da Pessoa ficou em 76%, sendo que 97% dos que
responderam afirmativamente à primeira pergunta se identifica com a missão. Analisando as
respostas pode-se dizer que é preciso que a missão esteja mais clara aos utilizadores pois o
número de pessoas que desconhecem a missão é ainda considerável (24%). Um dos esforços
do Portal seria o de divulgar mais a missão, de forma que os utilizadores tivessem a clara
noção do objectivo do trabalho do Museu da Pessoa.
Pela Internet
Por indicação de alguém
Por publicações (jornais, revistas, etc)
Outros
Seminário sobre memória
Pela televisão
Não respondeu
Pelo rádio
%
1
3
5
10
16
21
26
34
124
Gráfico 15 – Conhecimento da Missão do Museu da Pessoa
Missão do Museu
Sim76%
Não24%
Sim
Não
Gráfico 16 – Identificação com a Missão do Museu da Pessoa
Você se identica com a missão?
Sim97%
Não3%
Sim
Não
Um dos objectivos do inquérito era verificar quando o Portal (e anteriormente o site) se
tornou conhecido pelas pessoas. Para isso, foram apresentados cinco períodos, abrangendo
desde o primeiro site, lançado em 1996, até 2004. Pelas respostas demonstradas através do
gráfico nº 17, pode-se verificar que metade das pessoas (50%) teve conhecimento do trabalho
desenvolvido pelo Museu da Pessoa entre os anos de 2002-2003. Provavelmente, boa parte
dessas pessoas participaram do Seminário ‘Memória, Rede e Mudança Social’, realizado em
2003, e que foi factor de grande divulgação do trabalho do Museu da Pessoa. Em seguida,
com 16% das respostas válidas aparece o período de 2000-2001. Alguns utilizadores só
recentemente tiveram contacto com o Portal, sendo nesse caso, 12% das respostas válidas.
125
Dos utilizadores que conhecem o trabalho do Museu da Pessoa há mais tempo, 11%
conheceram entre 1998-1999 e 10% conhecem do período 1996-1997. Gráfico 17 – Período de primeiro contacto com o Museu da Pessoa
Primeiro contacto
10%
11%
16%
50%
12%1%
1996 - 1997 1998 - 1999 2000 - 2001 2002 – 2003 2004 Não respondeu
Em relação à regularidade das visitas ao Portal, conforme pode-se verificar pelo gráfico
nº 18, o maior índice de resposta foi para a opção 4 a 5 vezes, com 32% das respostas, tendo
logo a seguir a resposta de 2 a 3 vezes, com 31% das respostas válidas. O público que
podemos considerar como utilizador cativo do Portal, que consulta regularmente, tem um
índice baixo, com 23% das pessoas que responderam ao inquérito. E o número de pessoas que
tiveram o seu primeiro contacto com o Portal foi de 13%, ou seja, são pessoas que
responderam ao inquérito na primeira vez que acederem o Portal.
Gráfico 18 – Regularidade da visita ao Portal
Regularidade na visita
13%
31%
32%
23%
1%
1 vez 2 a 3 vezes 4 a 5 vezes Entro regularmente Não respondeu
126
O inquérito demonstra que o Museu da Pessoa tem ainda muito trabalho para cativar o
público e fazê-lo retornar mais vezes ao Portal. Uma sugestão seria procurar actualizar o
conteúdo da primeira página semanalmente e enviar boletins convidando as pessoas a
entrarem, registarem-se e participarem das actividades do Portal.
A última pergunta sobre o conhecimento do Portal é sobre o que atraiu a atenção do
público para conhecer o trabalho do Museu da Pessoa. Esta pergunta, que permitia respostas
múltiplas teve resultados próximos, mas o que mais atraiu as pessoas foi o nome do Museu da
Pessoa, com 49% das respostas válidas, conforme podemos verificar pelo gráfico nº 19. O
conteúdo do Portal, ou seja, as histórias e as fotografias disponibilizadas foram responsáveis
por 46% das respostas. O facto de ser um museu e de ser virtual também atraiu a atenção das
pessoas, o primeiro com 36% das respostas e o segundo com 39% das respostas. O percentual
daqueles que se sentiram atraídos pela possibilidade de enviar sua história para ser
acrescentada ao acervo foi de 28%. É interessante notar que o nome do Museu da Pessoa é
ainda o maior factor de atracção para o público. No nosso entendimento, o Portal deveria
explorar mais o facto de ser um museu virtual, evidenciando as acções museológicas na
página principal. Gráfico 19 - O que atraiu a atenção para a visita
%
Um segundo bloco de perguntas foi utilizado para descobrir qual é a reacção do público
em relação aos aspectos técnicos do Portal, tais como design e navegação. Em relação à
navegação, o utilizador deveria responder qual o grau de dificuldade em navegar no Portal.
Através do gráfico nº 20 é possível verificar que a maioria respondeu que a navegação está
fácil, com 57% das respostas válidas. Uma grande parcela, 35%, respondeu que a navegação
está mais ou menos fácil e 7% respondeu que a navegação está difícil.
O nome (Museu da Pessoa)
As histórias que pude ler
A ideia de ser virtual
O facto de ser um museu
Envio da minha história
Outros
O design
A proposta
Fonte de pesquisa (uso)
Não respondeu 4
33
57
28
3639
46
49
127
Gráfico 20 – Navegação no Portal
Navegação do Portal
57%
35%
7% 1%
Fácil
Mais ou menos
Difícil
Não respondeu
Em relação ao layout, a maioria aprova o layout do Portal, totalizando 71% das
respostas válidas. Conforme pode-se verificar no gráfico 22, entre a maioria dos que aprovam
o layout, 68% respondeu que a informação está mais organizada, 21% que a navegação está
mais fácil e 7% gostou das cores do novo Portal. O percentual de pessoas que desaprovaram o
novo layout foi de 25%. E maior grau de insatisfação com o novo layout está relacionado com
a escolha das cores, com 43% das respostas válidas. Uma parte dos utilizadores (38%)
afirmou que o site está confuso e 19% reclamou da navegação do Portal (vide gráfico 23). Gráfico 21 – Aprovação do layout
Aprovação do layout
71%
25%
4%
Sim Não Não respondeu
128
Gráfico 22 – Motivos de aprovação do layout do Portal
Porque gostou do layout
68%
7%
21%
4%
A informação está bemorganizada Gostei das cores
A navegação está fácil
Não respondeu
Gráfico 23 – Motivos pela insatisfação com o layout do Portal
Porque não gostou do layout
43%
19%
38%Não gostei das cores Não gostei da navegação Está confuso
Além da questão do lyaout, foi disponibilizada também uma pergunta, onde o utilizador
deveria opinar sobre o conteúdo do Portal. Para isso, o utilizador poderia marcar as opções
Excelente, Bom, Muito Bom, Regular e Péssimo. Conforme pode-se verificar no gráfico nº
24, o maior número de respostas foi para a resposta Bom, que recebeu 41% da totalidade das
respostas. Em segundo lugar aparece, com 33% das respostas válidas, a resposta Muito Bom e
em terceiro lugar, com 18%, a categoria Excelente. O índice de insatisfação em relação ao
conteúdo é muito baixo, somando 5% para a resposta Regular e 1% para a resposta Péssimo.
Para finalizar, 2% das pessoas não responderam à questão perguntada.
129
Gráfico 22 – Grau de satisfação em relação ao conteúdo do Portal
Opinião sobre o conteúdo
18%
33%
41%
5%
1%
2%
Excelente
Muito bom
Bom
Regular
Péssimo
Não respondeu
Para avaliar a visita foi disponibilizada uma pergunta a qual o utilizador deveria
responder que tipo de sensações obteve durante a visita, marcando se sua visita foi curiosa,
divertida, surpreendente, interessante, etc., possibilitando que o utilizador assinalasse mais de
uma resposta. Conforme pode-se verificar no gráfico nº 25, com 64% das respostas válidas, a
curiosidade foi o adjectivo utilizado pela maioria das pessoas para classificar sua visita ao
Portal. Com um percentual de 33%, a visita teve um carácter divertido e 22% surpreendente.
Gráfico 23 – Sensações da visita
%
Com estes resultados é possível afirmar que o conteúdo do Portal desperta curiosidade
nas pessoas, inclusive, incentivando-as a retornar. O trabalho que deveria ser desenvolvido era
o de cativar estas pessoas, criando novas secções e novos conteúdos, para que elas possam
estar sempre retornando ao Portal em busca de mais informações.
Curiosa
Divertida
Surpreendente
Outros
Não respondeu
Interessante
4
5
6
22
33
64
130
Em seguida, à avaliação do layout, da navegação e da visita, foi disponibilizado um
bloco de perguntas onde o público avaliava o conteúdo específico do Portal. Para isso, foram
efectuadas três perguntas para avaliação do utilizador. A primeira deles diz respeito ao que
chamou a atenção na primeira página do Portal. Com a possibilidade de marcar respostas
múltiplas foi disponibilizado ao utilizador as seguintes opções: uma história, a foto do dia,
exposições virtuais e outras, com possibilidade de escrever algum comentário. No gráfico nº
26 podemos verificar que com um percentual de 52%, a maioria das pessoas respondeu que o
que mais chamou a atenção do acervo do Museu da Pessoa foi a história de uma determinada
pessoa disponível na primeira página do Portal. As exposições virtuais foram o segundo
tópico que mais chamou a atenção dos utilizadores, com 44% das respostas válidas e a foto do
dia foi o terceiro tópico, com 21% das respostas válidas. Esta pergunta também possibilitava
acrescentar alguma resposta no item Outras e com isso, viu-se que 2% das pessoas que
responderam ao questionário foram atraídas pelos projectos de educação realizados pelo
Museu da Pessoa e que possuem links na primeira página do Portal. Gráfico 24 - O que atraiu a atenção na página principal %
Ao continuar a avaliação do conteúdo, era preciso saber se as pessoas usavam o
conteúdo do Portal e de que forma ele era utilizado. Para isso foram elaboradas três perguntas:
uma directa sobre o uso do acervo, outra sobre como era utilizado e a última sobre o grau de
satisfação em relação ao seu uso. Conforme podemos verificar pelo gráfico nº 27, o índice de
pessoas que nunca utilizaram o acervo é maior do que aqueles que já utilizaram, sendo o
percentual de respostas NÃO com 67% e 31% de respostas SIM. Do percentual de 31%, que
respondeu SIM ao inquérito, 31% utilizou o material para outros fins que não os disponíveis
no inquérito. O número das pessoas que utilizou o acervo para uma pesquisa da faculdade foi
de 28% e para uma pesquisa na escola, 13%. O percentual de professores que responderam ao
Uma história
As exposições virtuais
A foto do dia
Outras
Propostas de educação
Não respondeu
6
2
8
21
44
52
131
inquérito afirmando ter usado o conteúdo do Portal com seus alunos foi também de 28% (vide
gráfico nº 28). Gráfico 25 – Uso do acervo
Já usou o acervo?
31%
67%
2%
Sim
Não
Não respondeu
Gráfico 26 – Para quê foi usado o acervo
Uso do acervo
13%
28%
28%
31% Para uma pesquisa da escola
Para um trabalho da minhafaculdade Para usar com meus alunos
Outros
Em seguida, foi avaliado o grau de satisfação com o material utilizado, sendo que
somente aqueles que utilizaram o acervo poderiam responder esta questão. Conforme pode-se
verificar no gráfico nº 29, 67% das pessoas que utilizaram o material do Portal está satisfeito,
15% muito satisfeito e 9% insatisfeito com o material encontrado. Em relação a uma
avaliação do Portal como um todo, 71% dos utilizadores estão satisfeitos, 15% muito
satisfeitos e 6% insatisfeitos (vide gráfico 30).
132
Gráfico 27 – Grau de satisfação com o material utilizado
Grau de satisfação com o material
15%
67%
9%
3%6%
Muito satisfeito
Satisfeito
Pouco satisfeito
Nem satisfeito neminsatisfeito Não respondeu
Gráfico 28 – Grau de satisfação com o Portal
Grau de satisfação com o Portal
15%
71%
6%5%
1%
2%
Muito satisfeito
Satisfeito
Pouco satisfeito
Nem satisfeito nem insatisfeito
Insatisfeito
Não respondeu
Em relação à avaliação final do Portal, foram colocadas três perguntas para que o
público avaliasse o Portal na sua totalidade. A primeira delas dizia respeito ao que eles
gostariam que fosse criado ou implementado no Portal. Conforme podemos verificar no
gráfico nº 31, com possibilidade de respostas múltiplas, a preferência das pessoas recaiu em
quatro opções: a troca de informações com as pessoas que enviaram suas histórias, com 55%
das respostas válidas, mais textos contextuais, também com 55%, a apresentação de árvores
genealógicas, com 54% das respostas e a criação de um fórum para troca de experiências, com
133
47%. Por um lado, as respostas mostram um interesse das pessoas em conhecerem melhor as
pessoas que enviaram suas histórias, mas também demonstra um interesse em troca de
experiências no uso da metodologia de história oral. Gráfico 29 - Sugestões para incrementar o Portal
Gráfico 30 – Recomendação do Portal
Recomendaria o Portal?
95%
3% 2%
Sim Não Não respondeu
A última parte desse bloco de perguntas sobre o Portal e na continuidade de sua
avaliação, o utilizador foi convocado a responder duas perguntas sobre o Portal que resumisse
a sua avaliação. A primeira delas que era sobre a recomendação do Portal a outra pessoa, que
obteve um percentual de 95% de aprovação, conforme podemos verificar no gráfico nº 32. A
segunda pergunta, que consultava o utilizador sobre a possibilidade de retornar novamente ao
Troca informação c/ as pessoas Mais textos contextuais
Árvores genealógicasUm fórum para troca de experiênciasTextos e bibliografia sobre o assunto
Instrumentos de buscas mais fáceisUm blog dos participantes
Instrumentos de buscas mais refinados
Conteúdos em outros idiomasOutros
Exposições temáticasDiário online
%
113
611
1922
2540
475455
55
134
Portal, teve um percentual de 89% de respostas positivas (vide gráfico nº 33). Nesse sentido, o
podemos afirmar que o Portal teve um alto índice de aprovação e que o trabalho do Museu da
Pessoa obteve reconhecimento entre aqueles que utilizam o seu conteúdo. Gráfico 31 – Possibilidade de retorno ao Portal
Retornaria novamente?
89%
9%2%
Sim
Não
Não respondeu
Finalizando as questões sobre o trabalho do Museu da Pessoa, foram disponibilizadas na
quarta parte do inquérito (segunda sobre o Portal) quatro perguntas para que o utilizador
pudesse avaliar também o envio das histórias. Na primeira delas, o utilizador deveria
responder se havia enviado algum material, sendo que 19% das pessoas responderam que
SIM, conforme pode ser verificado pelo gráfico nº 34. Gráfico 32 – Envio de material ao Portal
Enviou material para o Portal?
19%
75%
6%
Sim Não Não respondeu
135
Para o grupo de pessoas que enviou material para o Portal, ou seja, 19% do total da
amostragem, foram disponibilizadas as perguntas seguintes. Na primeira delas o utilizador
deveria responder qual tipo de material havia encaminhado ao acervo do Museu da Pessoa.
Conforme pode ser verificado no gráfico nº 35, do total de respostas afirmativas, 43% das
pessoas enviou sua própria história de vida, 25% enviou uma história de uma terceira pessoa e
25% enviou alguma fotografia. Gráfico 33 – Que tipo de material foi enviado
Material enviado
43%
25%
25%
7%
Minha história A história de outra pessoa Fotos Outros
Gráfico 34 – Período de envio do material
Período de envio do material
26%
32%
16%
21%
5%
1997 1998 - 1999 2000 - 2001 2002 - 2003 2004
Para entender o período de envio do material, foi disponibilizada uma pergunta sobre o
período abrangido, sendo que 32% enviou o material entre os anos de 1998-1999, 26% em
136
1997, 21% no período de 2002-2003, 16% no período 2000-2001 e somente 5% no ano de
2004. Pelas respostas ficou claro que os períodos em que o Portal mais recebeu histórias
foram os anos de mudança do site, que permitiram a interacção com o utilizador, ou seja,
entre 1998 e 1999 (vide gráfico nº 36). Gráfico 35 – grau de satisfação com o material enviado
Grau de satisfação - material
11%
42%
21%
21%
5%
Muito satisfeito
Satisfeito
Pouco satisfeito
Insatisfeito
Não respondeu
Em relação ao grau de satisfação com o material enviado, pode ser verificado pelo
gráfico nº 37, que 42% está satisfeito, 21% pouco satisfeito e 21% insatisfeito. Somente 11%
dos utilizadores estão muito satisfeitos com o material enviado, somando-se os índices de
pouca satisfação e de insatisfação, 42% dos utilizadores não está contente com o material
enviado. Isso fica demonstrado também através dos comentários disponibilizados ao fim do
inquérito, onde alguns utilizadores se queixam de não saberem onde encontrar suas histórias
no novo Portal. Essa mudança deve-se ao facto das histórias terem sido migradas para a base
de dados e que muitos dos utilizadores divulgaram o endereço das páginas HTML para seus
amigos e familiares. Com a inserção dessas histórias em base de dados, o endereço que estas
pessoas possuíam não é mais válido e é necessário ‘descobrir’ novamente os caminhos das
histórias.
Ao fim do inquérito foi disponibilizado um espaço para críticas e sugestões dos
utilizadores. Estes comentários podem ser divididos em quatro categorias básicas: sugestões
de dinâmica para o site, sugestões de projectos e conteúdos, críticas sobre algum problema de
acervo (não encontrar a história, etc.) e agradecimentos. Boa parte das sugestões encaminha
para a questão da actualização do Portal, pois algumas pessoas sugeriram que o Portal fosse
actualizado mais periodicamente (diariamente ou semanalmente) e que houvessem mais
exposições virtuais. Nas sugestões de projectos e conteúdos, alguns utilizadores sugeriram
137
temas específicos tais como episódios da história do Brasil, histórias de bairros, etc. As
críticas recebidas são na sua maioria, por utilizadores que enviaram sua história e que não
conseguem encontrá-la no Portal, conforme já dissemos anteriormente. E por fim, alguns
utilizadores elogiam o trabalho do Museu da Pessoa e agradecem a oportunidade de ter sua
história preservada naquele espaço.
II.4.4. Considerações finais Ao concluirmos esta análise do público é preciso reforçar mais uma vez que o resultado
do inquérito está condicionado ao público que respondeu ao inquérito. Como qualquer
pesquisa de campo, as respostas estão condicionadas à visão das pessoas que responderam ao
inquérito. Por isso, tentamos abranger uma amostragem significativa do público. No entanto,
devido a exiguidade do tempo, foi necessário fecharmos a pesquisa com um número de 102
questionários válidos. Não é uma amostragem muito grande mas que serve para o nosso
intuito que é avaliar e dimensionar o trabalho desenvolvido pelo Portal Museu da Pessoa.net.
Em relação à questão da pesquisa do público de um determinado museu, é preciso estudá-los,
pois “(…) los estúdios de público plantean la necesidad de conocer el público para orientar
su ética y lícita manipulación táctica y estratégica157” (ASENSIO, 2000: 77).
Em relação aos dados recolhidos, ficou claro que a maioria do público do Museu da
Pessoa possui alta escolaridade, na sua maioria são do sexo feminino, são pessoas na fase
adulta e com profissões ligadas ao ensino ou à pesquisa. A maior parte possui conexão com a
Internet em sua própria residência, mas também no trabalho. São pessoas que vêm na Internet
um uso como veículo de informação, mais do que um veículo de comunicação, embora utilize
a Internet em toda a sua potencialidade.
Em relação ao trabalho desenvolvido pelo Museu da Pessoa, a maioria está satisfeito
com o trabalho desenvolvido, embora tenha críticas em relação ao novo layout do Portal e a
organização do acervo. Pelas críticas e sugestões encaminhadas ficou claro que algumas
mudanças deverão ser efectuadas para adequar o Portal ao seu público, muitas delas em
relação à organização do material, mas também a produção de conteúdos específicos tais
como exposições virtuais, textos contextuais e criação de espaços de convívio (fóruns, listas
de discussão, blogs, etc.) entre os utilizadores.
157 - Tradução livre: “(…) os estudos de público delineam a necessidade de conhecer o público para orientar sua ética e lícita manipulação táctica e estratégica.”
138
II.5. Análise das acções museológicas
“Este caderno que tem muitas histórias Poemas, poesias e até algumas piadas que se tornaram verdadeiras
É uma criativa de um homem aposentado Que apesar de ter pouco estudo
Sempre foi esforçado na luta pela vida Considera o caderno como o livro de uma parte de sua própria história”
trecho da história de Salvador Martin Pintor, recebida pelo Museu da Pessoa, em 1998.
Conforme vimos anteriormente os museus distinguem-se de outras instituições que
lidam com o património por suas acções museológicas. Nesse sentido, um museu virtual não
difere do museu tradicional, pois pressupõe-se que as acções museológicas devam existir
também na virtualidade. No entanto, conforme vimos no capítulo sobre a museologia no
virtual, as acções museológicas no espaço virtual possuem características diferenciadas. Uma
exposição virtual pode ser diferente de uma exposição física, não somente na forma, mas
também no conteúdo, pois a exposição virtual permite um maior número de informações,
utilizando as ferramentas disponíveis na Internet. Entre as acções museológicas, as ligadas à
preservação são essencialmente físicas, embora possam existir também na vertente virtual.
Conforme vimos anteriormente, o trabalho do Museu da Pessoa não se restringe ao site
na Internet. Embora possua um carácter essencialmente virtual, o Museu da Pessoa também
interage com o público através de seus produtos culturais (exposições, livros e
documentários). Por isso, a análise que faremos a seguir leva em conta não somente as acções
museológicas efectuadas pela Internet, mas também aquelas realizadas no contexto físico.
II.5.1. Pesquisa As acções de pesquisa realizadas pelos museus são acções interactivas e que dão
qualificação ao património cultural. Segundo os princípios da Nova Museologia, o
conhecimento produzido na pesquisa museológica objectiva uma nova prática social. Nesse
sentido, é preciso que a pesquisa não seja mero levantamento de informações, mas elemento
de integração do património à comunidade. É a partir dessa visão que será feita uma análise
das acções de pesquisa realizadas pelo Museu da Pessoa.
As acções de pesquisa realizadas pelo Museu da Pessoa são efectuadas visando dar
subsídios ao trabalho de recolha dos depoimentos, ou seja, é uma pesquisa contextual. E essa
pesquisa contextual serve para localizar determinada época ou facto histórico. Por exemplo:
durante a pesquisa sobre o comércio na cidade de São Paulo foram efectuadas pesquisas sobre
139
as actividades de comércio de determinadas ruas da cidade e um levantamento fotográfico das
casas comerciais para complementar o trabalho da recolha dos depoimentos.
As pesquisas são actividades de suporte ao trabalho dos museólogos, para subsidiar o
trabalho de preservação e comunicação do museu. No caso do Museu da Pessoa também o é.
As actividades de pesquisa são o suporte para os projectos realizados pelo Museu da Pessoa,
pois as histórias de vida não são elementos soltos, elas pertencem a determinado contexto
histórico-social que deve ser resgatado no processo de pesquisa. Além disso, os depoimentos
são um rico acervo de histórias que pode ser utilizado para subsidiar pesquisas históricas
realizadas pela própria instituição e por grupos externos.
A pesquisa é uma acção voltada para produção de conhecimento, e tem com o objectivo
reflectir sobre o acervo. Nesse sentido, os produtos culturais produzidos pelos museus:
exposições, catálogos e livros, têm como objectivo estudar os objectos da sua colecção mas
também divulgar o acervo externamente.
II.5.2. Preservação A preservação engloba as acções de recolha, conservação e documentação, pois ela
abriga as acções internas para a preservação de determinado acervo. O conceito de
preservação pressupõe não somente o trabalho de conservar e documentar um património,
mas também as acções que fazem com que este património seja musealizado, ou seja, as
acções de recolha de material.
Por se tratar de um museu cujo acervo são as histórias de vida, o trabalho de recolha do
Museu da Pessoa é efectuado utilizando a metodologia de história oral. Conforme vimos no
capítulo sobre a memória, a metodologia de história oral foi sistematizada a partir da década
de 50, do século XX. E essa metodologia engloba diversas actividades, desde a gravação do
depoimento em vídeo ou em áudio, ao preenchimento de fichas com informações
complementares sobre os entrevistados. O processo de trabalho com os depoimentos envolve
ainda o tratamento do acervo: transcrição, revisão e edição e também a digitalização das
fotografias e documentos dos entrevistados. Após o tratamento, os depoimentos são inseridos
na base de dados, permitindo assim o cruzamento de informações entre os vários projectos do
Museu da Pessoa.
Conforme vimos anteriormente, um dos objectivos do Museu da Pessoa é disseminar a
sua metodologia de trabalho. Nesse sentido, a metodologia para a recolha dos depoimentos
está sendo sistematizada para permitir que grupos sociais e movimentos comunitários possam
utilizá-la para o trabalho de recolha de sua própria memória. O aperfeiçoamento da
140
metodologia visa não somente ajustá-la à dinâmica dos projectos comunitários mas também
torná-la mais acessível a estes grupos sociais.
No Museu da Pessoa, a recolha das histórias também pode ser feita pela Internet.
Através de formulários disponibilizados no Portal do Museu da Pessoa, qualquer pessoa pode
enviar sua história ou de alguém conhecido. As histórias recebidas pela Internet são
incorporadas ao acervo do Museu da Pessoa, assim como os depoimentos recolhidos nos
projectos. No entanto, como o procedimento de recolha é diferenciado, estas histórias também
têm um tratamento diferenciado pela equipa do Museu da Pessoa. As informações enviadas
pelos utilizadores da Internet não são direccionadas, ou seja, as histórias recebidas através do
Portal não possuem um guião para a sua recolha. Por isso, obtém-se uma variedade maior de
histórias, tais como, história em forma de versos, na primeira pessoa, com ou sem fotografias.
“A Internet, além de garantir acesso ao acervo, é o instrumento que permite que as
pessoas não sejam apenas receptoras da informação – mas tornem-se agentes de sua
própria história e/ou da comunidade em que vivem. Por meio da Internet, as próprias
pessoas escrevem suas histórias. Por meio da Internet, os indivíduos, os grupos, as
instituições e as empresas passam a fazer parte de uma comunidade maior. Suas
histórias deixam de ser suas e passam a ser de todos. Isto é, de fato, integração”
(WORCMAN, 2002b: 4)
O uso da Internet para receber histórias possibilitou ao Museu da Pessoa não só
aumentar o seu acervo de histórias de vida, mas também ampliar a área abrangida pois pôde
recolher histórias de outros estados brasileiros. Por questões físicas e económicas, os
projectos do Museu da Pessoa acabam por se concentrar no eixo Rio-São Paulo. Isso traz
pouca diversidade ao acervo. O uso da Internet para recolher histórias alargou essa fronteira.
Quando se trabalha com a conservação de objectos, é preciso distinguir o tipo de objecto
dos museus tradicionais daqueles que possuem acervo de histórias de vida. Os objectos
museológicos nesse tipo de museus são as histórias de vida, ou seja, os depoimentos. Mas não
só os depoimentos, mas uma variedade de informações complementares que enriquecem a
trajectória daquela pessoa: fotos, objectos, árvore genealógica, dados pessoais, etc. Nesse
sentido, a conservação do acervo requerer um tratamento diferenciado em relação aos outros
objectos museológicos. Não basta conservar as informações recolhidas, transcrevendo os
depoimentos e mantendo-os em formato digital para ser lido por qualquer computador, mas
também é preciso preservá-los do ponto de vista físico, ou seja, preservar o suporte material
daquele depoimento158. Depoimentos gravados em áudio ou em vídeo demandam técnicas
158 - Aqui estamos usando de digital no sentido de formato digital, ou seja, ficheiros informáticos. Isso vale para os depoimentos que são arquivos em formato Word, mas também às fotografias que são digitalizadas em formato
141
diferenciadas de conservação. Além do controle de humidade e temperatura, requisitos
essenciais para um acervo de vídeo, é preciso que estes suportes sejam constantemente
actualizados para não correrem o risco de se tornarem uma tecnologia obsoleta. Nesse sentido,
o Museu da Pessoa tem trabalhado sempre com tecnologias mais actualizadas nas gravações
dos depoimentos, seja em vídeo ou em áudio, para obter uma maior qualidade e garantir uma
sobrevivência maior do suporte159. A transposição de suportes mais antigos em vídeo (VHS e
Hi-8) e áudio (cassetes) para suportes mais modernos é sempre necessária, na medida em que
a tecnologia muda constantemente e é preciso estar atento, também, para evitar desgaste do
suporte material.
Em relação à questão da documentação museológica, os museus com acervo de histórias
de vida também possuem algumas diferenciações. A documentação nesse tipo de museu vai
além da descrição do acervo, pois ela é fundamental para o processo de recuperação da
informação. Essas informações não dizem respeito só ao depoimento em si, que pode ser
indexado por temas e/ou editado, mas também às informações complementares sobre aquela
pessoa: dados pessoais, fotografias, documentos, etc.
As fotografias são elementos fundamentais para o entendimento de uma trajectória de
vida, mas também servem para ilustrar a passagem do tempo. Nesse sentido, elas são fonte
fundamental para o estudo da moda e dos costumes, por exemplo. Por isso, um museu com
histórias de vida necessita de uma base de dados para organizar as inúmeras informações que
podem ser recuperadas nos depoimentos e também para recuperar os temas abrangidos nas
fotos digitalizadas. Ou seja, um museu de histórias de vida também é um arquivo com estas
histórias, ou seja, a sua reserva técnica é uma reserva de histórias e não de objectos. E uma
das questões que se coloca é como organizar esse arquivo de modo a recuperar todas as
informações que ele contém. Nesse sentido, a escolha do Museu da Pessoa foi por uma base
de dados multimédia pois ela tem capacidade para:
“1. a better preservation of the material, because it is a digital preservation and not an
analogical one. The magnetic medium avoids the ageing and/or quality loss f the
material with the copies (which is the case of audio and video tapes or Xerox copies);
2. a wider possibility of registering testimonies - once voice, image, and text are
recorded;
3. large possibilities of consultation, because, unlike books and videos, in which the
information ordering is imposed upon reader, the multimedia information bank is non-
JPG ou GIF. É importante esclarecer que o acervo do Museu da Pessoa não possui as fotos originais, mas cópias digitais das imagens cedidas pelos depoentes. 159 - Actualmente os depoimentos em vídeo e os áudios são gravados em suporte digital, utilizando-se para isso de câmaras de vídeo DVCAM e mini-disc.
142
linear, enabling the user to «navigate» through the system, cross-referring information
and investigating more profoundly those sections he is interested in160”. (WORCMAN
et al., 1999)
No entanto, por questões financeiras e de carácter organizacional, o Museu da Pessoa
demorou 10 anos para conseguir uma base de dados que pudesse abranger todas as suas
necessidades. Somente com a criação do Portal Museu da Pessoa.net foi possível criar um
sistema que pudesse buscar de forma eficiente as informações, seja pelo público interno ou
pelos utilizadores da Internet. As tentativas anteriores de construção de uma base de dados
multimédia esbarraram em problemas técnicos, mas também devido à complexidade
necessária para este tipo de trabalho.
Actualmente parte do acervo do Museu da Pessoa já encontra-se na nova base de dados
e outra parte encontra-se em processo de migração para que todo o acervo possa ser
consultado através da Internet. Conforme vimos anteriormente, o próximo passo é a
construção de um sistema integrador que possa incluir os acervos de outros núcleos,
possibilitando uma consulta cruzada às informações dos outros países.
II.5.3. Comunicação Entende-se a comunicação como a acção museológica mais visível ao público, pois é
através dela que os museus divulgam o seu acervo. A comunicação é a forma como os museus
apresentam o seu património e interagem com o público. E a exposição é a face mais visível
da comunicação. É através das exposições – permanentes ou temporárias – que os museus se
comunicam com o público. Segundo Jean Davallon (1997), numa definição mais alargada, a
exposição é uma disposição de apresentação de objectos aos visitantes. Para ele, a diferença
entre a exposição em si e o museu propriamente dito, reside no fato de que o museu não é
somente um dispositivo de comunicação, mas uma instituição cultural. Ou seja, ele deve
também exercer outras funções além de comunicar: pesquisar e conservar o seu acervo. É
através dessa concepção que iremos trabalhar as acções de comunicação do Museu da Pessoa.
Como toda acção de comunicação, as exposições, virtuais ou não, necessitam de um
conceito gerador. Não basta simplesmente apresentar os depoimentos, tal como objectos 160 - Tradução livre: “1. melhor preservação do material, já que se trata de preservação digital e não de analógica. O meio magnético evita o envelhecimento e a perda de qualidade do material com as cópias (que é o caso de fitas de áudio e vídeo ou fotocópias); 2. maiores possibilidades de registar depoimentos – uma vez gravadas a voz, a imagem e o texto; 3.diversas possibilidades de consulta porque, diferentemente de livros e vídeos, nos quais o sistema de informação é imposto ao leitor, o banco de informações multimédia é não linear, dando ao usuário a possibilidade de «navegar» através do sistema, fazer remissão recíproca da informação e investigar de forma mais profunda as secções de interesse específico”.
143
museológicos, mas traduzir uma ideia a partir dessas histórias. As exposições, realizadas pelos
museus que têm como objectivo a recolha de histórias de vida, podem até apresentar objectos
mas o fio condutor da exposição serão sempre as histórias contadas na primeira pessoa.
A Internet é a grande ferramenta de comunicação do Museu da Pessoa, mas é preciso
relembrar que não é somente através da Internet que o museu realiza suas acções de
comunicação. As exposições do Museu da Pessoa podem ser físicas, de carácter temporário, e
exposições virtuais, de carácter permanente. As exposições físicas são, na maioria das vezes,
resultado de algum projecto realizado em parceria com outra instituição. Ou seja, são produtos
finais de determinado projecto de memória, mas ela pode ter também uma vertente virtual.
Nesse caso, embora possuam o mesmo conteúdo, o design e a forma da exposição são
diferentes concernentes ao veículo de comunicação em que estão. Ou seja, numa exposição
física o conteúdo que pode ser apresentado em painéis ganha uma nova configuração na
Internet, justamente porque a exposição virtual possibilita um cruzamento de informações que
a exposição física não permite. Além disso, a exposição virtual não sofre com problemas de
espaço, uma vez que as informações são digitalizadas e ocupam pouco espaço físico161.
Figura 11– Página de entrada da exposição virtual ‘Um balcão na Capital’
Fonte: http://www.museudapessoa.net
As exposições virtuais, tal como nas exposições físicas, não devem prescindir de vários
elementos para sua apresentação. Numa exposição física esses elementos são a iluminação, a
configuração do espaço, a humidade, o número de pessoas que tenciona receber, os objectos,
161 - Um exemplo de uma exposição que teve uma versão física e virtual é a exposição Balcão na Capital: memórias do comércio na cidade no Rio de Janeiro, realizada pelo SESC Rio e pelo Museu da Pessoa e que cuja vertente virtual pode ser acedida no endereço http://www.museudapessoa.net/hotsites/sescrio/index.htm. O projecto também resultou numa publicação com o mesmo nome. Cada produto: livro, exposição física e exposição virtual teve uma apresentação diferente, obedecendo aos formatos de cada média.
144
etc. Numa exposição virtual é preciso estar atento ao design e a navegação da exposição para
não desviar a atenção do utilizador para o que é importante.
Figura 12- Entrada para a exposição virtual ‘Almanak da Idade do Pensar’
Fonte: http://www.museudapessoa.net
A ideia de exposições virtuais já existia desde o segundo site do Museu da Pessoa na
Internet, embora não possuísse o nome de exposição. Inicialmente as exposições ficavam na
secção chamada Almanaque. O próprio nome almanaque dava a ideia de uma variedade de
histórias e fotografias, seleccionadas por assunto ou tema. O conceito de almanaque foi
baseado na ideia de extrair trechos de depoimentos, fotografias e informações contextuais
para atrair o visitante. Além disso, na secção Fotografia o utilizador poderia consultar parte
das fotografias do acervo, organizadas por temas. Agrupando estas duas secções surgiu a ideia
de criar exposições virtuais, não mais só com depoimentos e fotos, mas com linha do tempo e
textos históricos. O que distinguem as exposições do acervo propriamente dito, é que elas são
um recorte do acervo e não a sua totalidade. Além disso, os depoimentos agrupados, sejam em
pequenos trechos ou integrais, são seleccionados segundo uma óptica de curadoria, para
contar uma determinada história colectiva.
Uma das grandes novidades do Portal Museu da Pessoa.net foi a criação da
possibilidade dos próprios utilizadores da Internet poderem montar suas próprias exposições
virtuais. Eles podem fazer isso, utilizando-se de textos e fotos que podem estar no seu próprio
computador ou usar as fotos existentes no acervo do Museu da Pessoa. Nesse caso, os
utilizadores também interagem no processo de comunicação do Museu da Pessoa, na medida
em que seleccionam o que querem mostrar e como mostrar. Ainda pouco utilizada pelos
utilizadores, essa ferramenta é imprescindível para fazer do Museu da Pessoa um museu
aberto à colaboração do seu público, não só na acção de preservação da memória, mas
145
também na comunicação dessa memória colectiva. Nesse sentido, o Museu da Pessoa criou
uma biblioteca digital de histórias de vida mas aberta à participação dos seus utilizadores
pois:
“A Internet passou a permitir, ainda, que os «visitantes» tornassem-se também
«produtores de informação» (em uma biblioteca tradicional, existe claramente a divisão
entre quem produziu o conhecimento - os autores, os editores etc. – e quem os utiliza).”
(HENRIQUES & WORCMAN, 2003: 725)
A nova forma de participação dos utilizadores, através da inserção de uma exposição
virtual, faz com que o Museu da Pessoa possa se tornar um museu realmente aberto à
participação das pessoas, preservando e comunicando suas histórias .
II.5.4. Considerações finais Ao concluir as questões levantadas neste capítulo, vimos que as acções museológicas do
Museu da Pessoa são desenvolvidas na Internet, mas também em seu espaço físico. E que as
exposições, físicas e virtuais, mesmo possuindo o mesmo conteúdo podem trazer
configurações diferentes, respeitando a média em que se encontra.
Um museu de histórias de vida, de carácter virtual, não deve simplesmente preservar os
depoimentos e abrir para a consulta do público em seu espaço virtual, mas tornar-se uma fonte
de divulgação desse património imaterial. A forma como o Museu da Pessoa usa as suas
acções museológicas na Internet demonstra a sua vocação virtual. E este carácter virtual é
ainda mais presente quando existe possibilidade da interacção com o público através da
Internet, não somente incluindo suas histórias, mas também interagindo no processo de
comunicação.
146
Conclusões “Marco Polo descreve uma ponte, pedra a pedra.
- Mas qual é a pedra que sustém a ponte? – pergunta Kublai Kan. - A ponte não é sustida por esta ou por aquela pedra – responde Marco,
- mas sim pela linha do arco que elas formam. Kublai Kan permanece silencioso, reflectindo.
Depois acrescenta: - Porque me falas das pedras? É só o arco que me importa.
Polo responde: - sem pedras não há arco.” Ítalo Calvino (2002) Cidades Invisíveis. p. 85
A escolha do Museu da Pessoa, como um estudo de caso para o entendimento da
questão dos museus virtuais, levou em conta não somente a necessidade de aprofundar
questões sobre o uso da Internet pelos museus, mas a possibilidade de entender a trajectória
dessa instituição à luz da experiência adquirida em 10 de anos de actividade. À medida em
que nos debruçamos sobre a configuração, a história, o site e acções museológicas
desenvolvidas pelo Museu da Pessoa pudemos perceber novas dinâmicas possíveis a serem
aplicadas ao trabalho do dia a dia. Esse novo olhar permitiu-nos verificar problemas e buscar
novas soluções. Além disso, possibilitou-nos uma releitura do trabalho e lançou novos
desafios para tornar o projecto mais aberto às interacções das pessoas.
O primeiro objectivo que foi definido neste estudo diz respeito à discussão teórica sobre
os três conceitos que definem o trabalho do Museu da Pessoa: memória, museologia e
virtualidade. A proposta inicial de analisar a literatura, a partir de uma leitura pormenorizada
da bibliografia, procurou debater as visões dos autores que trabalharam estes temas, de forma
a subsidiar o estudo de caso, realizado na segunda parte deste trabalho.
A discussão sobre os três pilares levou-nos a entender novas perspectivas no âmbito da
memória e da museologia. A memória foi, desde os anos 50, utilizada como fonte de pesquisa
em projectos académicos. No entanto, mais do que criar novas fontes documentais, a memória
é hoje utilizada como ferramenta para repensar as narrativas históricas. O trabalho
desenvolvido pelo Museu da Pessoa, bem como por outras instituições de preservação da
memória social, eleva o uso da memória a uma nova categoria, a de alavanca para o
desenvolvimento de novas interacções entre os grupos sociais. Essas interacções permitem um
novo olhar desses grupos para a sua própria história, na medida em que possibilitam uma
participação activa nos processos sociais.
A museologia sofreu ao longo do século XX mudanças estruturais na forma de ver e
pensar o museu. Estas mudanças foram, principalmente, na forma como as pessoas passaram
a lidar com o seu próprio património, tornando-o um elemento activo no processo de
147
desenvolvimento social, pois a museologia passa a ser entendida como uma ciência
interdisciplinar e voltada para o desenvolvimento e o museu deixa de ser uma instituição
encastelada no seu saber e a participação da comunidade torna-se imprescindível no processo
museológico. Nesse sentido, a musealização do património deixa de ser um privilégio dos
museus, mas uma prática social executada pelos grupos sociais envolvidos no processo de
uma acção museológica, pois:
“A musealização é, então, processada na prática social – no interior do museu ou fora
dele –, em sua dinâmica real, no tempo e no espaço, abordando a cultura de forma
integrada ao cotidiano, ampliando as suas dimensões de valor, de consciência e de
sentido” (SANTOS, 2003:15)
Nesse sentido, a museologia contemporânea aponta para um caminho que é a realização
de acções museológicas que possam servir de instrumento para mudanças sociais. E essas
acções estão ligadas à memória, não só por ser o museu um lugar de memórias, memórias dos
objectos e memórias das pessoas mas também porque os museus são lugares de interacções
das pessoas com o seu património. Nesse sentido, o surgimento de novos museus, como o
Museu da Pessoa, serviram para repensar o próprio papel dos museus enquanto instituições
mediadoras do património, na medida em que abre novas perspectivas de interacções entre o
utilizador e o património.
No fim do século XX e o início de um novo século a Internet surgiu com um novo
desafio aos museus. O uso da Internet pelos museus pode revolucionar a forma como
interagem com o património de uma comunidade, seja transformando-se em um elo de ligação
patrimonial com a comunidade, divulgando seu património ou interagindo com seus
utilizadores. Nesse sentido, ela pode permitir que os museus possam ser instrumentos de
inclusão social, tornando-os efectivamente ferramentas de uso social. Os desafios que a
Internet trouxe aos museus, e também ao Museu da Pessoa apontam para uma participação
muito maior dos utilizadores nos processos museológicos. No entanto, o uso da Internet
enquanto espaço de interacção ainda é subestimado pelos museólogos e pouco explorado
pelos museus. Um dos desafios actuais da museologia é aproveitar todos os recursos que a
Internet permite, para que ela possa deixar de ser um não-lugar, tornando-se num lugar de
memórias, um lugar de convívio do público com o património.
O segundo objectivo deste estudo apontava para uma discussão sobre o uso da Internet
pelos museus e para o entendimento do conceito de museu virtual, a partir de discussões dos
autores que se debruçaram sobre o tema. Nesse sentido, mais do que levantar um histórico da
questão, o trabalho efectuado teve como objectivo definir um conceito de museu virtual que
pudesse ser utilizado no estudo de caso pretendido. E um dos contributos deste estudo foi o
148
lançar um novo olhar à discussão do conceito dos museus virtuais, baseando-se na concepção
de um museu imaginário proposto por André Malraux. Nesse sentido, chegamos a uma
definição onde o museu virtual é um espaço virtual de mediação e de relação do
património com os utilizadores. É um museu paralelo e complementar que privilegia a
comunicação como forma de envolver e dar a conhecer determinado património. É um espaço
de rompimento com o não-lugar da Internet, com a ideia tradicional de lugar, tornando-se um
lugar de memórias.
A própria virtualidade também é uma forma de revolução do próprio papel do museu,
pois além de desterritorializar o património faz com que a Internet seja palco de novas
interacções museológicas. A Internet trouxe para os museus uma nova perspectiva, na medida
em que fez repensar o próprio conceito de museu e sua actuação nessa nova média. Nesse
sentido, os museus virtuais surgiram como novas perspectivas de interacção museológica, não
somente no sentido de abrir outras formas de participação dos utilizadores, mas também por
discutir o próprio conceito de museu, libertando-o do espaço físico. A possibilidade de utilizar
novos espaços para a interacção com o património é o grande contributo dos museus virtuais à
museologia.
O terceiro objectivo definido dizia respeito ao estudo de caso escolhido para este
trabalho. Nesse sentido, ao analisar a trajectória do Museu da Pessoa, pudemos apreender
novas perspectivas para a discussão do próprio conceito de museu virtual, mas também sobre
os enfoques do trabalho com a memória e o entendimento de novas abordagens da
museologia. Este estudo possibilitou sistematizar o material já produzido sobre o Museu da
Pessoa e produzir um histórico sobre a instituição. Mas o principal contributo foi o de lançar
um olhar sobre a trajectória do Museu da Pessoa, nas perspectivas da memória, da museologia
e da virtualidade.
A Internet é o espaço privilegiado de interacção do Museu da Pessoa com seu público. É
na Internet que são realizadas parte das acções museológicas do Museu da Pessoa. No
entanto, mais do que revolucionar a questão do espaço museológico, a Internet possibilitou ao
Museu da Pessoa uma interacção maior com seus utilizadores, pois permitiu ao utilizador uma
participação activa na produção de conteúdo. O utilizador deixa de ser apenas um
‘observador’, para ser um produtor de conteúdo e um curador, na medida em que pode enviar
suas histórias e produzir exposições virtuais com seu acervo ou com material de outras
pessoas disponíveis no acervo do Museu da Pessoa.
O Museu da Pessoa é um museu virtual, não somente por ter sua existência baseada na
Internet, mas porque trabalha com o património imaterial, que são as histórias de vida das
pessoas. A concepção de virtualidade, fora da Internet, é aquela ligada ao que pode vir a ser, à
149
potência da existência. Nesse sentido, um museu com histórias de pessoas é um museu para o
futuro, para guardar as histórias para as novas gerações, para ser referência de um tempo
passado e de um tempo presente.
Afinal, qual é a pedra que sustenta a ponte? As narrativas orais são as pedras que
sustentam o arco, que sustenta a ponte. As pontes, nesse caso, são as múltiplas e variadas
histórias que formam um conjunto de histórias de determinado grupo social. E as histórias das
pessoas são ricas em informações, acontecimentos, versões e visões. E um conjunto de
histórias deixa de ser apenas um conjunto de histórias, passando a ser um pedaço de uma
história muito maior e assim sucessivamente. As histórias de vida são como pequenos retalhos
de uma colcha, como uma teia de histórias que se entrelaçam, formando uma história maior. E
assim, as pedras vão sustendo o arco, que sustenta a ponte, que sustenta o mundo.
150
Índices remissivos Termos acção educativa.................................................................................................28, 37, 38, 41, 73 ARPANET..........................................................................................................................45, 46 blogs .........................................................................................................................49, 121, 137 comunidade......12, 19, 22, 23, 24, 26, 27, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 40, 69, 84, 87, 89,
103, 138, 140, 147 ecomuseu ............................................................................................................................32, 33 esquecimento ......................................................................................................................17, 25 fetichização.........................................................................................................................66, 72 hipertexto..............................................................................................43, 44, 45, 50, 51, 52, 55 história oral .............................12, 19, 20, 22, 81, 83, 84, 86, 90, 91, 93, 96, 107, 108, 133, 139 identidade social .....................................................................................................12, 17, 18, 23 interactividade ............................................................................................53, 58, 59, 63, 74, 96 Internet.....4, 5, 6, 7, 8, 10, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 52, 53, 55, 56, 58, 59, 60, 61,
62, 63, 64, 67, 68, 71, 73, 74, 75, 81, 82, 85, 87, 88, 89, 92, 93, 94, 98, 100, 101, 102, 103, 104, 105, 107, 113, 119, 121, 122, 123, 137, 138, 140, 142, 143, 144, 145, 147, 148, 165
lugar da memória ................................................................................................................13, 23 lugar de memórias ..................................................................................................................147 memória ...5, 6, 7, 8, 9, 10, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 31, 34,
37, 41, 54, 58, 67, 77, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 86, 89, 90, 91, 93, 94, 95, 96, 97, 98, 99, 102, 109, 110, 111, 139, 143, 144, 147, 160, 165
memória colectiva.......................................6, 12, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 22, 23, 26, 34, 79, 145 memória social..........................................................................................6, 9, 12, 15, 16, 17, 79 musealização...............................................................25, 26, 29, 30, 31, 33, 36, 68, 87, 89, 147 museologia.....4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 17, 24, 25, 27, 32, 33, 41, 55, 56, 60, 64, 65, 74, 77, 78, 138,
146, 147, 168 Museu da Pessoa....4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 67, 68, 76, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 86, 87, 88,
89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 102, 103, 104, 105, 106, 107, 108, 109, 110, 111, 113, 115, 118, 119, 122, 123, 124, 126, 130, 134, 135, 137, 138, 139, 140, 141, 142, 143, 144, 145, 148
museu integral ....................................................................................................................32, 33 museu virtual .4, 5, 6, 7, 9, 56, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 69, 70, 71, 72, 73, 74, 75, 76, 77, 81, 87,
88, 89, 95, 100, 102, 106, 113, 126, 138, 148 museus virtuais ...................................4, 5, 56, 64, 65, 66, 67, 68, 69, 70, 71, 72, 73, 74, 75, 77 não-lugar.........................................................................................................25, 49, 53, 54, 147 narrativas orais................................................................................................12, 19, 21, 84, 149 Nova Museologia........................................................24, 32, 33, 34, 35, 36, 39, 69, 79, 89, 138 objecto museológico.................................................................................................................24 patrimonialização ...............................................................................................................29, 30 património7, 9, 12, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 34, 35, 36, 41, 55, 59, 60, 65, 67, 68,
69, 72, 73, 74, 77, 78, 79, 87, 89, 138, 139, 142, 145, 146, 147, 148 património cultural .......................................................................................................27, 28, 32 virtual...5, 6, 7, 10, 45, 49, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 69, 71, 72, 73,
74, 77, 80, 87, 88, 89, 90, 93, 95, 103, 108, 126, 138, 143, 144, 145, 158 virtualidade .....................6, 7, 8, 9, 10, 16, 43, 56, 57, 62, 66, 67, 77, 87, 88, 89, 111, 138, 148
151
Autores
Abreu, Regina...........................................................................................................................30 Araújo, Marcelo..................................................................................................................33, 72 Asensio, Mikel........................................................................................................................137 Audrerie, Dominique ................................................................................................................28 Baligand, Françoise ..................................................................................................................59 Barthes, Roland ........................................................................................................................52 Battro, Antonio ...................................................................................................................65, 67 Baudrillard, Jean.................................................................................................................48, 54 Bearman, David ........................................................................................................................95 Bellido Gant, Maria Luisa ......................................................................................60, 65, 70, 73 Benedikt,, Michael....................................................................................................................49 Benjamin, Walter............................................................................................................9, 15, 21 Bergson, Henri..............................................................................................................12, 13, 16 Bertoletti, Ana Carolina............................................................................................................63 Bloch, Marc ........................................................................................................................15, 20 Borges, Jorge ............................................................................................................................18 Bosi, Ecléa ................................................................................................................................21 Bruno, Cristina .....................................................................................10, 27, 31, 33, 39, 71, 72 Burke, Peter ..............................................................................................................................15 Busch, Vannevar.......................................................................................................................51 Calvino, Ítalo ..........................................................................................................................146 Castells, Manuel ...............................................................................................48, 49, 51, 54, 55 Chagas, Mário...........................................................................24, 25, 26, 27, 30, 31, 38, 39, 71 Champarnaud, Luc ...................................................................................................................40 Choay, Françoise ......................................................................................................................27 Cofan Feijóo, Fátima ................................................................................................................60 Colorado, Artur.........................................................................................................................65 Connerton, Paul ........................................................................................................................13 Costa, Antônio Carlos ..............................................................................................................64 Davallon, Jean ..................................................................................................................29, 142 Debray, Régis ...........................................................................................................................58 Deleuze, Gilles .......................................................................................................13, 55, 56, 57 Deloche, Bernard ........................................................................................11, 57, 65, 66, 67, 72 Desvallees, André...............................................................................................................10, 38 Durkheim, Émile ................................................................................................................12, 16 Echeverría, Javier .....................................................................................................................57 Febvre, Lucien..........................................................................................................................20 Foucault, Michel.......................................................................................................................52 Freire, José Bessa ......................................................................................................................9 Freire, Paulo .............................................................................................................4, 39, 76, 93 Gameiro, José ...........................................................................................................................28 Garcia, Juan .............................................................................................................................60 Garcia Canclini, Nestor ..........................................................................................29, 30, 40, 41 Gaulejac, Vincent de ................................................................................................................15 Gibson, William .......................................................................................................................53 Gillespie, Thom ..................................................................................78, 88, 91, 92, 93, 96, 105 Gregorová, Anna ......................................................................................................................10 Gubern, Román.........................................................................................................................58 Halbwachs, Maurice ...........................................................................................9, 12, 13, 14, 16 Hartog, François .......................................................................................................................27 Henriques, Luís Oliveira ..........................................................................................................38
152
Henriques, Rosali ...................................................................................................................145 Hernandez Hernandez, Francisca .............................................................................................28 Hernandez, José ........................................................................................................................65 Hoptman, Glen .........................................................................................................................65 Jeudy, Henri..............................................................................................................................26 Joutard, Philipe .........................................................................................................................20 Kerckhove, Derrick de..............................................................................................................52 Kessel, Zilda .................................................................................................................. 6, 49, 86 Kranzberg, Karl ........................................................................................................................51 Landow, George .................................................................................................................51, 52 Le Goff, Jacques .................................................................................................9, 14, 17, 18, 20 Leibniz, G.W. ...........................................................................................................................55 Lemos, André ...........................................................................................................................53 Lemos, Carlos...........................................................................................................................29 Leroi-Gourhan, André ..............................................................................................................19 Lévy, Pierre ............................................................11, 20, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 56, 57, 64, 65 Lewis, Oscar .............................................................................................................................20 Lyotard, Jean-François .......................................................................................................50, 55 Malraux, André...................................................................................................................67, 71 Marcondes Filho, Ciro........................................................................................................54, 55 Maure, Marc-Alain .............................................................................................................10, 25 Mayrand, Pierre ........................................................................................................................33 Mckenzie, Jamieson..................................................................................................................65 Mcluhan, Marshall....................................................................................................................50 Mello Vasconcelos, Camilo de.................................................................................................39 Menezes, Ulpiano Bezerra de.........................................................................................9, 18, 24 Mensch, Peter ...........................................................................................................................33 Mirapaul, Matthew ...................................................................................................................95 Moreira, Fernando João............................................................................................................41 Moutinho, Mário...........................................................................................................33, 34, 35 Namer, Gérard ................................................................................................................9, 16, 26 Nascimento, Rosana ................................................................................................................39 Negroponte, Nicholas .......................................................................................43, 48, 49, 54, 59 Nelson, Theodore .....................................................................................................................51 Neves, Lucília...........................................................................................................................15 Nora, Pierre.........................................................................................................9, 13, 14, 18, 77 Perniola, Mário .........................................................................................................................58 Piacente, Maria ...................................................................................................................61, 62 Pollak, Michael...................................................................................................9, 13, 17, 18, 22 Poucet, Bruno ...........................................................................................................................39 Praet, Michel van......................................................................................................................39 Primo, Judite.............................................................................................................................40 Quéau, Philippe ............................................................................................................11, 56, 57 Remoaldo, Pedro ......................................................................................................................44 Rheingold, Howard.............................................................................................................45, 54 Rivard, René .............................................................................................................................33 Rivière, George Henri ........................................................................................................38, 40 Rússio, Waldisa ............................................................................................................10, 31, 37 Santos, Maria Célia ........................................................................................26, 36, 40, 71, 147 Schweibenz, Werner.................................................................................................................65 Silva, Carlos Alberto ................................................................................................................46 Silva, Libório ............................................................................................................................44
153
Silveira, Sérgio .........................................................................................................................48 Solá, Tomislav ..........................................................................................................................39 Stanton, Michael.......................................................................................................................46 Talens, Sérgio ...........................................................................................................................65 Teather, Lynne..........................................................................................................................61 Teboul, René.............................................................................................................................40 Teixeira Coelho ..................................................................................................................37, 38 Thompson, Paul ..................................................................................................9, 19, 20, 21, 22 Tota, Anna Lisa ..................................................................................................................64, 73 Trant, Jennifer...........................................................................................................................95 Turkle, Sherry...........................................................................................................................49 Varine, Hugues de ..................................................................................................27, 35, 36, 40 Veltman, Kim ...........................................................................................................................73 Veyne, Paul...............................................................................................................................14 Virilio, Paul ..............................................................................................................................48 Vol, Alexandra .........................................................................................................................73 Voldman, Daniele.....................................................................................................................19 Wolton, Dominique ..................................................................................................................49 Worcman, Karen...............12, 17, 19, 21, 78, 82, 85, 86, 88, 90, 91, 92, 95, 105, 140, 142, 145
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Anexos Anexo I
Exposição ‘História Ambulante’ (Agosto de 2003 – fotos Márcia Zoet)
A exposição sobre uma passadeira da Av. Paulista
A exposição no separador central da Av. Paulista
A exposição em frente ao MASP – Museu de Arte de São Paulo
177
Anexo II Questionário
Identificação Q1. Sexo
1. ( ) Masculino 2. ( ) Feminino
Q2. Idade
1. ( ) 7 a 11 anos 2. ( ) 12 a 17 anos 3. ( ) 18 a 25 anos 4. ( ) 26 a 35 anos 5. ( ) 36 a 50 anos 6. ( ) mais de 51 anos
Q3. Ocupação
1. ( ) só estuda 2. ( ) só trabalha 3. ( ) trabalha e estuda 4. ( ) é aposentado 5. ( ) é dona de casa (quando não trabalhar fora)
Q4. Escolaridade
1. ( ) 1º grau incompleto 2. ( ) 1º grau completo 3. ( ) 2º grau incompleto 4. ( ) 2º grau completo 5. ( ) Superior incompleto 6. ( ) Superior completo 7. ( ) Pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado)
Q5. Estado civil
1. ( ) solteiro (a) 2. ( ) casado (a) 3. ( ) divorciado (a) 4. ( ) viúvo (a) 5. ( ) outros
Q6. Renda
1. ( ) menos de 5 salários mínimos 2. ( ) de 5 a 10 salários mínimos 3. ( ) de 11 a 20 salários mínimos 4. ( ) de 21 a 40 salários mínimos 5. ( ) mais de 40 salários mínimos
Q7. Profissão: ____________________ Q8. Cidade onde mora: ______________ Q9. Estado: __________
178
Uso da Internet Q10. Como você tem acesso à Internet? (resposta múltipla)
1. ( ) em casa 2. ( ) no trabalho 3. ( ) na escola/universidade 4. ( ) em cibercafés 5. ( ) nos telecentros 6. ( ) outros_________
Q11. Há quanto tempo usa a Internet? 1. ( ) menos de 1 ano 2. ( ) de 1 a 2 anos 3. ( ) de 3 a 4 anos 4. ( ) de 5 a 6 anos 5. ( ) mais de 6 anos
Q12. Com que frequência acessa a Internet?
1. ( ) estou conectado o dia inteiro 2. ( ) todos os dias 3. ( ) dia sim, dia não 4. ( ) Uma vez por semana 5. ( ) de 15 em 15 dias 6. ( ) 1 vez por mês 7. ( ) raramente
Q13. Que outros sites e portais frequenta na Internet? (resposta múltipla)
1. ( ) Portais de informação tais como UOL, Terra, Globo, IG, etc 2. ( ) sites de entretenimento: cinemas, músicas, etc 3. ( ) blogs 4. ( ) sites de personalidades 5. ( ) bate-papo e salas de chats 6. ( ) outros __________________
Q14. Para o que você mais usa a Internet? (resposta múltipla)
1. ( ) mandar e-mails 2. ( ) pesquisar 3. ( ) divertir-me 4. ( ) entrar em salas de chats 5. ( ) conversar com meus amigos pelo ICQ, Messenger ou Yahoo Pager 6. ( ) escrever meu diário (blog) 7. ( ) ler notícias/reportagens 8. ( ) outros _________________
179
Sobre o Museu da Pessoa Q15. Como você ficou sabendo do Museu da Pessoa? (resposta múltipla)
1. ( ) pela Internet 2. ( ) pelo rádio 3. ( ) pela televisão 4. ( ) por publicações (jornais, revistas, etc) 5. ( ) por indicação de alguém ______________ 6. ( ) outros ______________
Q16. Você sabe qual é a missão do Museu da Pessoa?
1. ( ) sim 2. ( ) não
Q17. Se respondeu sim à pergunta anterior. Você se identifica com a missão do Museu da Pessoa?
1. ( ) sim 2. ( ) não
Q18. Quantas vezes já entrou no Portal do Museu da Pessoa.Net?
1. ( ) 1 vez 2. ( ) 2 a 3 vezes 3. ( ) 4 a 5 vezes 4. ( ) entro regularmente
Q19. Quando teve o seu primeiro contato com o site do Museu da Pessoa?
1. ( ) 1996 - 1997 2. ( ) 1998 - 1999 3. ( ) 2000 - 2001 4. ( ) 2002 – 2003 5. ( ) 2004
Q20. O que mais despertou a sua atenção? (resposta múltipla)
1. ( ) o nome (Museu da Pessoa) 2. ( ) a ideia de ser virtual 3. ( ) a possibilidade de enviar minha história para o acervo 4. ( ) as histórias que pude ler 5. ( ) o design 6. ( ) o fato de ser um museu 7. ( ) outros _____________________
Q21. A navegação do site está:
1. ( ) fácil 2. ( ) mais ou menos 3. ( ) difícil
Q22. A sua visita ao portal foi: (resposta múltipla)
1. ( ) divertida 2. ( ) surpreendente 3. ( ) curiosa 4. ( ) chata 5. ( ) outros _____________
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Q23. Que tipo de informação atraiu sua atenção na página principal? (resposta múltipla)
1. ( ) uma história 2. ( ) a foto do dia 3. ( ) as exposições virtuais 4. ( ) outras ________________
Q24. O que acha do conteúdo (acervo de depoimentos, histórias e fotos) do Museu da Pessoa?
1. ( ) excelente 2. ( ) muito bom 3. ( ) bom 4. ( ) regular 5. ( ) péssimo
Q25.Você gostou do layout do Museu da Pessoa?
1. ( ) sim 2. ( ) não
Q26. Se respondeu não – diga o porquê
1. ( ) não gostei das cores 2. ( ) não gostei da navegação 3. ( ) está confuso
Q27. Se respondeu sim – diga o porquê
1. ( ) a informação está bem organizada 2. ( ) gostei das cores 3. ( ) a navegação está fácil
Q28. Você usa ou já usou o acervo do Museu da Pessoa?
1. ( ) sim 2. ( ) não
Q29. Se respondeu sim à pergunta 26, responda para quê usou o acervo:
1. ( ) para uma pesquisa da escola 2. ( ) para um trabalho da minha faculdade 3. ( ) para usar com meus alunos (sou professor (a)) 4. ( ) outros ________________________
Q30. Se respondeu sim à pergunta 26. Qual foi o seu grau de satisfação em relação ao material encontrado?
1. ( ) muito satisfeito 2. ( ) satisfeito 3. ( ) pouco satisfeito 4. ( ) nem satisfeito nem insatisfeito 5. ( ) insatisfeito
Q31. No geral, qual é o seu grau de satisfação com o Museu da Pessoa?
1. ( ) muito satisfeito 2. ( ) satisfeito 3. ( ) pouco satisfeito 4. ( ) nem satisfeito nem insatisfeito 5. ( ) insatisfeito
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Q32. O que você gostaria de ver no Portal do Museu da Pessoa? (resposta múltipla)
1. ( ) árvores genealógicas 2. ( ) possibilidade de trocar informação com as pessoas que enviaram as histórias 3. ( ) um blog dos participantes 4. ( ) um fórum para troca de experiências 5. ( ) instrumentos de buscas mais fáceis 6. ( ) instrumentos de buscas mais refinados 7. ( ) mais textos e bibliografia sobre o assunto 8. ( ) mais textos contextuais (sobre temas, histórias das cidades, etc) 9. ( ) conteúdos em outros idiomas 10. ( ) outros __________________________
Q33. Você recomendaria o Portal do Museu da Pessoa a um amigo?
1. ( ) sim 2. ( ) não
Q34. Você tem interesse em visitar o Portal do Museu da Pessoa novamente?
1. ( ) sim 2. ( ) não
Envio de histórias Q35.Você já enviou algum material para o Museu da Pessoa?
1. ( ) sim 2. ( ) não
Se respondeu sim à pergunta 31, responda as seguintes perguntas Q36. O que você enviou?
1. ( ) minha história 2. ( ) a história de outra pessoa (pai, mãe, avós, etc) 3. ( ) fotos 4. ( ) Outros __________________
Q37. Quando enviou a sua contribuição? 1. ( ) 1997 2. ( ) 1998 - 1999 3. ( ) 2000 - 2001 4. ( ) 2002 - 2003 5. ( ) 2004
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Q38. Qual é o seu grau de satisfação em relação ao material encaminhado? 1. ( ) muito satisfeito 2. ( ) satisfeito 3. ( ) pouco satisfeito 4. ( ) nem satisfeito nem insatisfeito 5. ( ) insatisfeito
Q39. Dê uma sugestão ou faça um comentário: