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Ministério da Saúde
Fundação Oswaldo Cruz
Escola Nacional de Saúde Pública
“A Supervisão no Programa de Saúde da Família:
Limites e Possibilidades”
Por
Cláudia da Costa Leite Reis
Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre em
Ciências na área de Saúde Pública
Orientadora: Profª. Dra. Virginia Alonso Hortale
Rio de Janeiro, setembro de 2001
DEDICATÓRIA
Às famílias brasileiras, Ainda tão marcadas pela injustiça social, excluídas do processo de trabalho e do acesso à saúde pública. À minha família: Aos meus filhos Ana Rosa e Pedro por terem me proporcionado o real sentimento de "ser" uma família, à Ana pelo exemplo de equilíbrio e cumplicidade ao Pedro pela rebeldia construtiva. Em especial, à minha mãe pela compreensão, exemplo de firmeza, por suas críticas nas horas certas, pela certeza de seu amor. Ao meu pai, pelo exemplo de acadêmico desportista, de um professor que vibra com sua docência. À minha irmã pela sua irreverência equilibrada e pela força que sabe dar nos momentos exatos. Aos meus dois irmãos pela persistência e determinação. Aos Meirelles da Costa Leite pela formação política e exemplos de firmeza e luta por um ideal. Aos Reis pelos ensinamentos de retidão, caráter e espírito científico.
ii
AGRADECIMENTOS
À Virginia Alonso Hortale, pela maneira carinhosa e, ao mesmo tempo, pragmática
com que orientou este trabalho.
À Maria Stella Proença Barata, pela forma sensível e generosa com que tem orientado
“internamente” a minha dissertação. A dissertação da minha vida.
À Edneia Martuchelli Moço, Adriana Nunes Chaves e toda equipe do Programa de
Saúde da Família de Teresópolis pela seriedade com que conduzem o Programa, pela
compreensão e carinho nestes meus dois anos de estudo e pelo incentivo e confiança ao
permitirem a realização deste trabalho no “nosso” PSF que tanto nos empenhamos em levá-lo
à frente.
À Anna Simões e toda a equipe do CENTRA-RIO pelo acolhimento, força e apoio em
momentos difíceis.
Ao amigo José Galvão Alves, pelo incentivo de sempre.
Ao Carlos Roberto da Costa Cordeiro, pela assessoria de informática, me socorrendo
sempre em cima da hora.
À prima Ana Luisa Carneiro da Costa Leite, pela sua disponibilidade e presteza me
orientando no inglês.
Às amigas Margareth Favoreto Fernandes e Cláudia Vargas, pela demonstração de
carinho e preocupação.
Aos "primos" Fernanda Carneiro por sua contribuição ética e Paulo Starling pela força.
Ao pessoal da Secretaria Acadêmica da ENSP, pela presteza e simpatia.
Aos meus alunos que incentivam meu crescimento enquanto “professora-gente”.
iii
“Naturalmente o domínio do inter-humano estende-se muito além do
domínio da simpatia... A única coisa importante é que, para cada um
dos dois homens, o outro aconteça como este outro determinado; que
cada um dos dois se torne consciente do outro de tal forma que
precisamente por isso assuma para com ele um comportamento, que
não o considere e não o trate como seu objeto mas como seu parceiro
num acontecimento da vida, mesmo que seja apenas uma luta de boxe.
É este o fator decisivo: o não-ser-objeto... A esfera do inter-humano é
aquela do face a face, do um-ao-outro; é o seu desdobramento que
chamamos de dialógico”.
Martin Buber
iv
APRESENTAÇÃO
O olhar atento para o sofrimento humano foi meu ponto de partida para a tentativa de
compreensão do processo de adoecimento, sua complexidade suas contradições e implicações.
Os vários anos de trabalho como psicóloga em instituição hospitalar, passando por vários
serviços, me fizeram refletir sobre a imensa capacidade humana de reconstrução, reordenação,
reinvenção de suas situações de vida (algumas vezes das de morte), de saúde e de doença.
Contudo são imensas também a quantidade de oportunidades desperdiçadas - ou nem
percebidas - em função da falta de cuidado, da falta de uma equipe atenta mas que age
displicentemente devido às situações institucionais “adversas” por exemplo. A instituição vai
mal devido ao sistema de saúde ineficiente e perverso, “a bola de neve cresce”, perde-se de
vista um referencial de intervenção, de ajuda, de cuidado. A constatação da impotência
aumenta, e então? O que se faz ?...
A experiência com grupo de hipertensos em unidade básica de saúde fez-me
reacreditar na possibilidade de investimento na pessoa do paciente. Neste momento me
preocupava, além da investigação sobre o adoecer, as formas de manutenção da saúde, das
condições de vida do paciente, seu ambiente de moradia e trabalho, sua vida como cidadão.
Penso: “o paciente sai do hospital e vira gente”. É importante esclarecer que um dos
principais objetivos do psicólogo na instituição hospitalar é tentar preservar o paciente
enquanto pessoa. Mas meu objetivo aqui é ressaltar a mudança de paradigma quando optamos
por conceber o paciente – gente – podendo ser agente de sua vontade, de seu desejo, seu
corpo, sua vida , sua saúde, sua cidadania. Acredito neste referencial, o que vem ao encontro
das propostas do Programa de Saúde da Família (PSF).
A mudança na estratégia de atenção da unidade onde desenvolvia o programa de
hipertensão, para unidade do PSF, fez com que fosse contratada nova equipe de profissionais
para o programa, sendo a equipe anteriormente responsável pelos atendimentos no antigo
modelo, submetida a treinamento, tornando-se a equipe de supervisores.
Desafio? Sim, mas foi com bastante satisfação que passei a integrar uma equipe de
supervisão do PSF.
Vindo de uma família veementemente preocupada com a injustiça e com as
desigualdades sociais, com os direitos do povo à saúde, à educação e ao bem estar, trago, “de
família”, a preocupação com as famílias de meu país. Acrescentando às concepções e ideais
de vida, as possibilidades profissionais, acredito poder contribuir para estruturação e
desenvolvimento de um programa, que verdadeiramente satisfaça as necessidades da saúde
v
pública, da “gente brasileira”, independente de interesses políticos individuais e momentâneos
(eleitorais e/ou eleitoreiros).
vi
RESUMO
O presente estudo, com base numa abordagem qualitativa, utilizando como princípio
metodológico o estudo de caso, discute a supervisão no Programa de Saúde da Família (PSF)
do Município de Teresópolis, no Estado do Rio de Janeiro. Este programa, implantado no
Brasil em 1994, se constitui numa estratégia de reorientação da atenção básica do Sistema
Único de Saúde (SUS).
A supervisão é um importante instrumento no gerenciamento de programas de saúde,
motivo pelo qual objetivou-se analisá-la, descrevendo as suas características, o seu padrão de
funcionamento, identificando os fatores subjetivos que podem interferir na dinâmica deste
processo, delineando o perfil do supervisor do PSF, bem como refletindo sobre a supervisão
como fator essencial de implantação e implementação do programa.
Para tal realizou-se pesquisa bibliográfica e documental, além de entrevistas com os
supervisores do programa e com os membros das equipes que compõem o PSF de
Teresópolis, para identificar percepções, atitudes, valores e tendências destes em relação à
supervisão.
O estudo permitiu reinterpretar a supervisão em saúde, especificamente no PSF,
mostrando que ela é um processo em construção que incentiva a reflexão das práticas de
saúde; possibilita o crescimento profissional, favorecendo-lhes o desenvolvimento da
liberdade e da autonomia, contribuindo para o aprimoramento e sustentação de um programa
que atenda às necessidades de saúde da população e leve à mudança do modelo assistencial
brasileiro.
Palavras-Chave: Programa de Saúde da Família (PSF), Supervisão, Modelo de Atenção.
vii
ABSTRACT
This study discuss the supervision in the Family Health Program (FHP) in
Teresopolis City in Rio de Janeiro State. It was based on a qualitative approach - the case
study. This program, introduced in Brazil in 1994, has become an strategy for health care
reorientation in the Brazilian Health System.
As the supervision is an important tool in the management of health programs, it was
defined five main objectives: analyse the supervision, describe its characteristics and working
patterns, outline the profile of the FHP supervisor, identify subjective factors that could
interfere in the process and reflect on it as an essential way in the program set up and
implementation.
In order to accomplish this, a literature review and interviews were made. The
program supervisors and members of the supervised staff from the FHP in TERESÓPOLIS
were interviewed to identify perceptions, attitudes, values and tendencies concerning
supervision.
Thanks to this study, it was possible to reinterpret the supervision in Health,
specifically inside FHP, showing that it is a building process which stimulates rethinking
health practices; allowing the professional growth, favoring their freedom and autonomy,
contributing to the improvement and support of a program which caters people needs in terms
of health and leading to a change in the Brazilian health care model.
Key words: FHP~Family Health Program, supervision, health care model.
viii
SUMÁRIO
Pag.
Cap.
DEDICATÓRIA -------------------------------------------------------------------------- ii
AGRADECIMENTOS ------------------------------------------------------------------ iii
EPÍGRAFE ------------------------------------------------------------------------------- iv
APRESENTAÇÃO --------------------------------------------------------------------- v
RESUMO --------------------------------------------------------------------------------- vii
ABSTRACT ------------------------------------------------------------------------------ viii
INTRODUÇÃO -------------------------------------------------------------------------- 1
FINALIDADE E OBJETIVOS -------------------------------------------------------- 7
I O PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA ----------------------------------------- 8
1.1 – Um Pouco de Sua História 8
1.2 – O Programa de Saúde da Família Brasileiro: origens e estruturação 11
1.3 – Programa de Saúde da Família no Estado do Rio de Janeiro 15
1.4 – Programa de Saúde da Família de Teresópolis 16
• Organização do PSF Teresópolis 17
• FESO e PSF – caracterização institucional 19
• Processo de educação continuada e permanente 21
1.5 – O Fazer em Saúde – Dia-a-Dia nas Unidades 24
1.5.1 – Tudo em Família 24
1.5.2 – Equipe: Características, atribuições e competências 27
• A equipe de saúde da família - o dia-a-dia de uma unidade 27
• Atribuições da equipe de saúde da família 27
• Abordagem coletiva 30
• Abordagem individual 30
1.6 – Participação Comunitária – Controle Social 33
II A SUPERVISÃO: SUPER-VISÃO OU COM-VISÃO? --------------------------- 38
2.1 – O Conceito: Evolução e Contextualização Histórica 38
2.2 – Organização Sanitária Brasileira e Supervisão 46
2.3 – A Supervisão no PSF 50
2.4 – A Supervisão do PSF de Teresópolis 55
ix
III METODOLOGIA ------------------------------------------------------------------------ 58
3.1 – Método e Estratégia da Pesquisa 58
3.2 – Grupo de Informantes 59
3.3 – Métodos de Coleta de Material 60
3.4 – Análise do Material 62
IV ANÁLISE E DISCUSSÃO DA PESQUISA ----------------------------------------- 63
4.1 – Padrão da Supervisão 63
• Supervisores 63
• Supervisionados 65
4.2 – Processo de Supervisão 67
• Supervisores 68
• Supervisionados 70
4.3 – Perfil do Supervisor 76
• Supervisor, por ele mesmo 76
• Supervisor, pelos supervisionados 78
4. 4 – Fatores Subjetivos 80
• Supervisores 80
• Supervisionados 82
V CONSIDERAÇÕES FINAIS ---------------------------------------------------------- 87
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ----------------------------------------------- 94
ANEXOS ----------------------------------------------------------------------------------- 103
x
INTRODUÇÃO
O século XX é marcado por profundas e rápidas transformações nas esferas da vida
econômica, social, cultural e política. Em um lugar pós-moderno, encontramos algumas
características, que vêm marcando os espaços do cotidiano tanto na vida privada como na vida
pública. A internacionalização da produção, distribuição e consumo, juntamente com o
avanço das tecnologias da informação, têm como resultado a globalização da economia e suas
conseqüências macroeconômicas: transnacionalização empresarial, desterritorialização da
força de trabalho, desemprego. Por outro lado verifica-se um aumento das desigualdades entre
os povos e os grupos sociais, a eclosão de movimentos nacionalistas, a exacerbação dos
conflitos étnicos, a agressão ao meio ambiente, a deterioração do espaço urbano a
intensificação da violência e o desrespeito aos direitos humanos (Paim & Almeida Filho,
2000).
A área da saúde acompanha os acontecimentos mundiais, avançando bastante em
tecnologia, o que faz com que seu custo aumente violentamente e o acesso à mesma seja cada
vez mais restrito. Sua crise não é exclusiva do sistema brasileiro, sendo revelada nas
dimensões da ineficiência, da inefetividade, da ineqüidade e da insatisfação popular, o que
estimula e justifica a “saúde” ocupar permanentemente lugar de destaque nos debates sobre o
desenvolvimento econômico, político e social. É importante examinarmos a trajetória do
Sistema de Saúde Brasileiro. Mendes (1993) enfatiza que os sistemas de saúde são
decorrentes de uma determinação econômica e da concepção de saúde existente na sociedade
num determinado momento. Ele observa que as mudanças políticas e econômicas do início
dos anos 80 são responsáveis pelo esgotamento do modelo médico-assistencial privatista e sua
substituição pelo modelo neoliberal da saúde.
Durante o século referenciado, no Brasil, o sistema de saúde transita do sanitarismo
campanhista para o modelo médico-assistencial privatista1, chegando ao modelo
1 O modelo sanitarista - campanhista originou-se no início do século XX, período de produção cafeeira, que exigia do sistema de saúde uma política de saneamento e controle das endemias que propiciassem condições sanitárias suficientes para que fossem mantidas relações comerciais. Modelo de estrutura centralizada, com visão militarista de combate às doenças de massa, através de campanhas.
A industrialização promoveu o aumento dos centros urbanos, gerando uma massa operária que deveria manter seus corpos saudáveis para o trabalho e para a produção. Houve um esvaziamento do modelo campanhista e crescimento do modelo médico-assistencial privatista, (metade da década de 60), centrado no atendimento de doentes, com ênfase ambulatorial e hospitalar. Ambos os modelos são limitados no que diz respeito ao alcance da atenção à saúde comprometida com a efetividade, eqüidade e necessidade da população (Teixeira, 2000). Para uma discussão mais detalhada, consultar Barbosa, P.R. (2001) Modelos de Atenção à Saúde: conceitos básicos, aspectos históricos e desafios para práticas inovadoras.
2
neoliberal.
Nas décadas de 70 e 80 as discussões se voltam para questões como: extensão de
cobertura dos serviços, reconhecimento do direito à saúde e a responsabilidade da
sociedade em garantir os cuidados básicos de saúde. Começam a surgir políticas
universalizadoras, que atingem seu ápice na Constituição Federal de 1988. Esta estabeleceu
as bases técnicas e jurídicas sobre as quais se implantaria o Sistema Único de Saúde (SUS),
tendo como princípio fundamental a atenção à saúde, enquanto direito de cidadania, com
universalidade de acesso a todos os níveis do sistema (Brasil, 1998).
Por outro lado, Mendes (1993) denuncia que "o modelo médico neoliberal constrói-se
na prática social, reinterpretando um discurso universalizador através de posturas
particularistas e estabelecendo uma oferta de serviços altamente discriminatória, seletiva para
diferentes cidadanias, segundo sua inserção social, conformando, no seu conjunto, um sistema
perverso porque altamente ineqüitativo".
Este mesmo autor, sugere que a implantação do SUS, para que se constitua em uma
reforma sanitária democrática, não deve ser realizada através da aplicação mecânica de seus
princípios e diretrizes - universalidade, integralidade, eqüidade, participação da comunidade,
utilização da epidemiologia no estabelecimento de prioridades, na alocação de recursos e na
orientação programática, descentralização, intersetorialidade e resolutividade. A construção
do SUS deve constituir-se num processo social de mudanças nas práticas sanitárias,
referenciado na concepção ampliada do processo saúde/enfermidade e no paradigma
assistencial da promoção da saúde.
Paim (1994, 1999), chama atenção de que há não só a manutenção, mas também a
expansão do modelo médico-assistencial privatista, no âmbito do SUS (herança do antigo
Inamps), na medida em que institucionalizam-se políticas e práticas sociais, que reproduzem
interesses econômicos e políticos de grupos profissionais, empresas, corporações e elites
políticas, distanciados dos interesses e necessidades da maioria da população.
Os anos 90, são marcados pelo agravamento da crise econômica e fiscal do país, e pela
busca de alternativas que possibilitem a superação dos limites dos modelos de saúde vigentes.
A implementação de programas, ações regulatórias e novas modalidades de alocação de
recursos, com objetivo de aumentar os níveis de eqüidade e eficácia do SUS são medidas
fundamentais.
3
Mudanças no modelo assistencial ocorrem devido à implantação de programas:
Programa de Agente Comunitário de Saúde (PACS), em 1991 e Programa de Saúde da
Família (PSF), em 1994.
O "Saúde da Família", formulado pelo Ministério da Saúde, como proposta de
reorientação da atenção básica,2 conta com mecanismos para impulsionar a sua
implementação como a Norma Operacional Básica de 1996 (NOB/SUS-01/1996), que
valoriza o incremento de cobertura pelo PSF com maior incentivo financeiro aos municípios
para tal, e o “Projeto Reforço à Reorganização do SUS - Reforsus”, uma iniciativa do
Ministério da Saúde com financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento e do
Banco Mundial MS( Ministério da Saúde,1996b).
A proposta "Saúde da Família”, estratégia político-governamental para a mudança do
modelo de assistência à saúde no contexto do SUS, aponta para modificações
importantes na forma de remuneração das ações de saúde (superação da exclusividade do
pagamento por procedimentos), nas formas de organização dos serviços, nas práticas
assistenciais no plano local e no processo de descentralização (Brasil,1998); suscita discussão
uma vez que é marcada por diferentes orientações políticas e ideológicas desencadeando
diferentes compreensões:
A primeira delas é defendida por Mendes (1996), na qual ele se refere à estratégia de
saúde da família como parte das propostas inovadoras com vistas à constituição de novas
práticas de saúde. Uma estratégia que vai além da adstrição da clientela (família) a uma
equipe médica, visto que este fato atenderia a mesma lógica medicalizadora do modelo
médico; mas que sem negar a importância da atenção médica de boa qualidade, a saúde da
família visa a instituição, na prática social, de um outro paradigma da produção social da
saúde. A saúde da família como estratégia de organização da atenção primária visa criar no
primeiro nível do sistema, centros de saúde, nos quais a equipe de saúde da família, em
território de abrangência definido, desenvolve ações focalizadas na saúde; dirigidas às
famílias e a comunidade; de forma contínua personalizada e ativa; enfatizando a promoção e
a prevenção, não se descuidando do aspecto curativo reabilitador; com alta resolutividade;
baixos custos diretos e indiretos, sejam econômicos, sejam sociais e privilegiando a
intersetorialidade. 2 Atenção básica constitui-se num conjunto de ações, de caráter individual ou coletivo, situadas no primeiro nível de atenção dos sistemas de saúde, voltadas para a promoção da saúde, a prevenção de agravos, o tratamento e a reabilitação. A ampliação desse conceito se torna necessária para avançar na direção de um sistema de saúde centrado na qualidade de vida das pessoas e de seu meio ambiente .A organização da atenção básica, com base na lei nº 8.080, tem como fundamento os princípios do SUS referidos anteriormente MS (Ministério da Saúde, 2000b).
4
Segundo Cordeiro (1996), os pressupostos que devem nortear a organização das
práticas de saúde voltadas à família, tais como o reconhecimento da saúde como direito de
cidadania; eleição da família e seu espaço social como núcleo básico de abordagem; prestação
de atenção integral; humanização das práticas de saúde; participação comunitária, são parte de
uma estratégia primordial que induziria a mudanças tanto pela interferência sobre a dinâmica
do mercado de trabalho em saúde, quanto pela reestruturação do processo de trabalho,
buscando introduzir a lógica da efetividade com relação às formas de remuneração, bem como
o manejo racional de tecnologia.
Misoczky (1994) faz considerações críticas acerca do que chama de revival da
medicina comunitária/familiar no Brasil. A autora procura mostrar as limitações de tal
proposta, afirmando que se trata de um modelo de atenção voltado para os pobres, que não
atende às necessidades da população, não valoriza os trabalhadores de saúde e não viabiliza a
descentralização, portanto está muito aquém das formulações que marcaram o processo da
Reforma Sanitária Brasileira e configuraram o SUS. Critica ainda o Ministério da Saúde por
assumir a proposta como modelo de atenção a ser expandido para todo o país. Convida à
reflexão sobre o SUS uma vez que constata que as políticas de saúde adotadas por este, têm
características de continuismo do ideário neoliberal.
Na visão de Vasconcelos (1999a:175), o PSF representa a primeira tentativa
significativa de reformulação, em escala nacional, do modelo de atenção primária à saúde.
Mostra que não é apenas uma nova proposta de atenção seletiva à saúde, que se atém à
abordagem de problemas delimitados, mas uma proposta de grande impacto na diminuição da
mortalidade. E acrescenta: “o futuro de um programa, assim tão recente, será definido no jogo
político entre os atores envolvidos e na sua operacionalização”.
Sintetizamos acima as diferentes posições e percepções de alguns autores a respeito
das diversas dimensões da proposta do PSF. Uns argumentando favoravelmente quanto à
operacionalização da atenção primária em saúde, a partir do PSF, enquanto outros mostram o
risco de, mesmo com o PSF, ocorrer a permanência do modelo tradicional de atenção à saúde.
Na XI Conferência Nacional de Saúde realizada em dezembro de 2000, as discussões
evidenciaram a necessidade de articulação entre concepções, propostas e estratégias que
possibilitem a superação do modelo médico privatista e a construção de um novo modelo que
privilegie a promoção da saúde, a prevenção de riscos e agravos, que reduza as desigualdades
resgatando dimensões éticas e culturais essenciais ao cuidado à saúde das pessoas.
5
O novo ciclo gerencial que começa a se emoldurar na administração pública brasileira,
com a municipalização e a descentralização da saúde, remete a necessidades de
monitoramento das ações e programas de saúde, apontando para indagações sobre um
desenho atualizado da supervisão, que contemple a realidade que ora se apresenta.
A preocupação com a supervisão em saúde presente nos países da América Latina
antes da década de 70, se fortalece a partir da Conferência Internacional sobre Cuidados
Primários de Saúde, realizada em Alma-Ata em 1978, (antiga URSS); momento em que se
discutiu a respeito da formação de recursos humanos para o trabalho em atenção primária,
enfatizando-se a importância da educação continuada e da supervisão.
Em 1980 acontece o Seminário Internacional Sobre Supervisão, no Peru, organizado
pela Organização Panamericana de Saúde (OPAS), tendo como resultado uma proposta de
supervisão que deve ser discutida e operacionalizada a partir de Seminários Nacionais de
Capacitação em Supervisão em cada país participante. Em 1982, estes seminários são
realizados nos respectivos países, e no Brasil é criado o Grupo de Trabalho de Supervisão e
Educação Continuada, com o objetivo de estimular as discussões sobre o assunto e se
operacionalizar a realização destas atividades, à medida em que se ampliavam os serviços de
saúde (Peres, 1986).
Esta autora mostra que nos últimos 30 anos, a supervisão é foco de preocupação na
área da saúde. Inúmeros conceitos e definições tentam explicá-la; na maioria, a supervisão
aparece como entidade autônoma que se auto-define e que se constitui como instrumento
pedagógico.
Frente a essa realidade, tornou-se necessário investigar a supervisão, quanto às suas
origens, fundamentos teóricos, finalidades e dimensões, para melhor subsidiar a compreensão
da mesma, no Programa de Saúde da Família. Foi realizado um estudo no PSF do Município
de Teresópolis, na Região Serrana do Estado do Rio de Janeiro, com a intenção de contribuir
com uma reinterpretação da supervisão em saúde.
O trabalho se estruturou em cinco capítulos:
O primeiro capítulo trata da contextualização histórica do PSF, desde o aparecimento,
no nível internacional, de movimentos de priorização da atenção básica, até a implantação do
programa no Brasil, Rio de Janeiro e Teresópolis. Mostra a organização de uma unidade de
saúde do PSF: características e atribuições da equipe, foco de atendimento na família e
tecendo também considerações sobre a participação comunitária.
6
O segundo capítulo versa sobre a evolução histórica do conceito de supervisão,
tomando como referencial a Teoria Geral da Administração; mostra a articulação entre o
desenvolvimento sanitário brasileiro e a supervisão em saúde; descreve a supervisão no PSF.
No terceiro capítulo é apresentada a pesquisa: metodologia utilizada, instrumento de
coleta de material, categorias de análise.
O quarto capítulo destina-se à análise das categorias segundo as informações
fornecidas pelos supervisores e membros das equipes (supervisionados) que compõe o PSF de
Teresópolis.
O quinto capítulo é reservado às considerações finais.
Acredita-se que o desenvolvimento deste estudo, clarificará aspectos da supervisão,
como suas formas, funções, alcance, limites e possibilidades.
7
FINALIDADE E OBJETIVOS
O presente estudo tem a finalidade de fornecer subsídios para a compreensão da
supervisão em saúde e especificamente no Programa de Saúde da Família.
Para tal, sugere como objetivos:
• Geral:
Analisar as características da Supervisão do Programa de Saúde da Família (PSF) da
Secretaria de Saúde / Fundação Educacional Serra dos Órgãos, de Teresópolis, Rio de Janeiro,
nos seus primeiros dezoito meses de atividades.
• Específicos:
Descrever o padrão de Supervisão do PSF – Teresópolis.
Identificar fatores subjetivos que interferem na dinâmica deste processo: ações de
saúde / equipe / comunidade / supervisão / coordenação.
Refletir sobre o processo de supervisão, como fator essencial de implantação e
manutenção do PSF.
Identificar o perfil do supervisor do PSF.
8
CAPÍTULO I
O PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA
1.1 – Um Pouco de Sua História
O tema medicina de família vem ocupando importante lugar tanto no cenário das
discussões acerca da reforma sanitária como no campo da formação e da prática médica.
Segundo Paim (1986), a medicina de família é o movimento dos cuidados primários à saúde
visto sob a ótica dos países industrializados. Continua mostrando que esta se desenvolve num
momento em que se tenta substituir a formação especializada e tecnificada do médico, por
outra que privilegia a assistência médica integrada e completa aos doentes na coletividade.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) preocupa-se com a questão do atendimento à
família desde 1963, publicando documento sobre a formação do médico de família. Foi nos
Estados Unidos, onde a partir de 1966, a proposta da medicina familiar mais se desenvolveu e
que, em 1969, passou a ser reconhecida como especialidade médica.
Na década de 70, Canadá, México e alguns países europeus aderem ao movimento se
posicionando contra o modelo hospitalocêntrico mundialmente estabelecido, a complexidade
tecnológica, e a fragmentação do trabalho médico em especialidades e sub-especialidades.
Nos mesmos anos 70 são organizados na América Latina, com o apoio da Organização
Mundial de Saúde e empresas estrangeiras, como a Fundação Kellogg, seminários,
consultorias e publicações para que a proposta seja divulgada (Vasconcelos, 1999a).
O Brasil não fica à margem destes acontecimentos, havendo a primeira tentativa de
introdução desse movimento através da OMS e da Associação Brasileira de Escolas Médicas
(ABEM), patrocinando em parceria com a Faculdade de Medicina de Petrópolis, em 1973, o
seminário ”A Formação do Médico de Família”. Seu relatório destaca “a ausência de filosofia
educacional em relação ao tipo de médico que se pretende formar. Parece haver também uma
recusa da expressão “Médico de Família”.
Paim (1986), ao analisar os resultados deste seminário constata que estes
representariam uma aparente derrota, uma vez que, objetivava-se combater desajustes da
prática médica mediante a reorientação da formação profissional do médico, sem se avançar
na discussão da reorganização das instituições de saúde como um todo.
9
Em 1977, a Assembléia Mundial de Saúde lança, como principal meta dos governos e
da OMS, a diretriz da Saúde para Todos no Ano 2000 (SPT 2000). A expressão “saúde para
todos” deveria ser entendida como a necessidade de colocar ao alcance de todo o indivíduo a
atenção primária integrada aos demais níveis de um sistema de saúde OMS (Organização
Mundial de Saúde, 1979).
A Conferência promovida pela Unicef e pela OMS, sobre Atenção Primária à Saúde,
realizada em Alma-Ata, antiga URSS, no ano de 1978, é considerada um marco
histórico/político dessa tendência, pois aponta a necessidade de mudanças radicais em relação
às práticas e ao desenho dos serviços de saúde. Recomenda-se que a atenção primária seja
parte integrante de um sistema de saúde completo e em coordenação com outros setores,
constituindo-se na função central e principal meio para prestação de assistência sanitária, além
de parte do desenvolvimento social e econômico global da comunidade.
A declaração de Alma-Ata determina que a atenção primária compreenda pelo menos
as atividades de educação sanitária, suplementação alimentar, nutrição adequada,
abastecimento adequado de água potável e saneamento básico, assistência materno-infantil
(inclusive planejamento familiar), imunização, prevenção e combate às doenças endêmicas,
tratamento apropriado de doenças e traumatismos comuns e fornecimento de medicamentos
essenciais. Para que se operacionalize a atenção primária é necessário que os governos
formulem estratégias que contemplem as atividades determinadas na Declaração. O próprio
documento da OMS diz que: “é muito importante conseguir que todo o sistema de saúde
conforme a direção e o conteúdo das políticas, estratégias e planos de ação não se convertam
em um sistema paralelo que seja um parente pobre (grifo do autor) do sistema vigente. Para
dar um apoio adequado à atenção primária em todos os níveis, os governos terão que
enfrentar-se com as realidades dos sistemas existentes, nos quais as funções e tendências
principais podem diferir muito das requeridas para aplicar as políticas, as estratégias e os
planos de ação novos” OMS (Organização Mundial de Saúde, 1979).
A OMS passa a ser difusora das determinações da Conferência, e o Banco Mundial o
principal financiador das ações de saúde.
Como decorrência deste movimento internacional, começam a surgir no Brasil uma
série de programas direcionados para a multiplicação da atenção básica à saúde. Os
programas, que no início aparecem de forma desarticulada vão, aos poucos, se integrando,
reformulando-se, possibilitando uma maior articulação entre as ações preventivas e curativas;
10
o que levou à discussão sobre a territorialização e a hierarquização da atenção, fatos que
podem ser considerados como “os primórdios do SUS”.
Nesta época surgem debates políticos sobre que modelo de atenção básica deveria ser
expandido. Um deles é o médico de família, não sendo aceito de imediato. Vasconcelos
(1999a), supõe uma explicação para este fato. Considerando o contexto brasileiro, no
momento em que o país vivia sob ditadura militar, sendo grande a insatisfação política e
crescente a desigualdade social, a origem norte-americana da proposta e sua proximidade com
o modelo neoliberal de prática médica, causam oposição de setores progressistas dos
profissionais de saúde. Uma outra suposição para a inicial rejeição do modelo, é o fato de
parte de seu financiamento estar sob a responsabilidade do Banco Mundial, pois este
caracteriza-se paradoxalmente pela utilização de recursos, objetivos e alcance de suas ações
serem eminentemente públicas, de promoção de políticas de seguridade social, alívio da fome
e redução da pobreza, e no entanto é presidido sempre por um norte-americano e suas
políticas coincidem com os interesses dos governos e das elites do mundo industrializado.
Contudo, essa realidade não é suficiente para que se paralisem as discussões sobre a
reorganização do sistema de saúde brasileiro. No final da década de 80, a consolidação do
modelo “médico de família” em Cuba, trouxe para o setor saúde uma revalorização do tema
família, e ampla reformulação do modelo de atenção primária. No Brasil, isto foi importante
para quebrar a resistência dos profissionais de saúde em relação ao referido modelo.
O sistema de saúde implementado em Cuba após a revolução de 1959, se caracteriza
pela descentralização, sistema único, com financiamento exclusivamente público. Os
indicadores de saúde atingidos em Cuba são comparáveis aos do primeiro mundo.
Instaurado ao final dos anos 80, desenvolvido ao longo de três décadas, o “saúde da
família” cubano, atingiu maior integração das práticas preventivas, promocionais e curativas,
diminuiu a superespecialização médica e estimulou o desenvolvimento de ações dirigidas para
a mudança de estilos e hábitos de vida. Uma das características marcantes deste modelo é o
envolvimento precoce das instituições de formação médica e de outros profissionais de saúde,
no processo de definição e formação dos profissionais que irão integrar o programa. Efetivou-
se uma reforma curricular, e atualmente, todo médico formado nesse país sai preparado para
integrar o programa; sua atuação é reconhecida, oficialmente, como especializada em
medicina geral integral (D´Aguiar,2001). Neste sentido, o médico de família é definido como
um profissional de primeira linha, o que podemos averiguar a partir do que declara
CARCELLER (1995: 41), considerado “um trabalhador da saúde”, cubano:
11
“Uno de los logros fundamentales para desarrollar las ideas de Fidel ha sido la caracterización del Médico de la Família como un clínico competente, como um investigador, como um intérprete de la condición humana, en el proceso salud-enfermedad; um médico sensible al temor de equivocarse y de sorprenderse com las infinitas expresiones de la salud y de la enfermidad; um médico com el enfoque clínico-epidemiológico y social en la solución de los problemas de salud del individuo, de la familia y de la comunidad.”
Documento do Ministério da Saúde Pública de Cuba 1991 (Aguiar, 1998) explicita
que o enfoque do sistema se orienta para o desenvolvimento da atenção primária,
estabelecendo-se a equipe de saúde como o elo fundamental das ações de promoção e
prevenção, sob os princípios da integralidade, setorização, regionalização, continuidade das
ações, com participação ativa das pessoas e das famílias situadas em seu entorno. O modelo
de atenção é baseado nos enfoques clínico, epidemiológico e social dos problemas de saúde
das famílias.
O modelo cubano talvez seja o que mais inspirou as discussões acerca da nova
proposta brasileira de “Saúde da Família”.
A seguir é apresentado como se construiu, no Brasil, durante os anos 90, a partir destes
vários referenciais, a proposta de “Saúde da Família”. E como mantendo aspectos comuns
àqueles aqui relatados, delineou-se enquanto uma política de Estado, para reorientar a atenção
básica no Sistema Único de Saúde: O Programa de Saúde da Família - PSF.
1.2 – O Programa de Saúde da Família Brasileiro: origens e estruturação
Em 1993, o Ministério da Saúde discute um projeto nacional de reorientação dos
serviços básicos de saúde (Chaves,2000). Havia naquele momento, uma grande discussão em
torno do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS)3, implantado em 1991, o
que possibilitou o enfoque da família como unidade de ação programática de saúde, (não
mais o indivíduo), introduzindo também a noção de área de cobertura por família. Alguns
afirmam, como Viana & Dal Poz (1998), que o PACS é um antecessor do PSF. Contudo, o
3 O PACS, foi formulado tendo como objetivo principal a contribuição na redução da mortalidade infantil e mortalidade materna, principalmente nas regiões Norte e Nordeste. A partir da experiência com o programa de agentes comunitários, implantado no Ceará, o Ministério da Saúde constatou que os agentes poderiam também ser peça importante para a organização do serviço básico de saúde no município (Viana & Dal Poz, 1998).
12
PACS já vinha se desenvolvendo de forma isolada; na verdade, o que houve, neste momento,
foi a institucionalização pelo Ministério da Saúde das práticas em saúde com os agentes, uma
vez que havia a necessidade de ampliação da capacidade resolutiva destes.
De acordo com Souza (2001), o evento que marca a concepção oficial do PSF, em
reunião em Dezembro de 1993 em Brasília, aponta para uma dimensão mais ampla de
influências, onde além da participação de Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde,
consultores e especialistas em atenção primária, estão presentes implementadores de
programas de médico de família, através de experiências localizadas, algumas delas sem a
adoção do PACS, como a do Grupo Hospitalar Conceição, em Porto Alegre, a de Niterói e a
de São Paulo.
Além disso, o Relatório do Banco Mundial (1993) sugere que o PSF, no Brasil, deve
ser implantado como estratégia compensatória dos baixos índices dos indicadores de saúde
registrados no país, estabelecendo-se primeiramente atendimento às famílias excluídas.
A implementação do Programa de Saúde da Família acontece oficialmente em março
de 1994 (através da Portaria 692 de 25 de março de 1994) ficando, inicialmente, sob a
responsabilidade da Fundação Nacional de Saúde, sendo criada dentro do Departamento de
Operações, a Coordenação de Saúde da Comunidade – COSAC, agregando ainda a gerência
do PACS e o de interiorização do SUS MS (Ministério da Saúde, 1994b).
Em 1995, o PSF é transferido da Fundação Nacional de Saúde para a Secretaria de
Assistência à Saúde – SAS , rompendo com a idéia de programa vertical, que operava sob a
modalidade de convênio, sinalizando para uma importância maior do programa dentro do
Ministério e por outro tipo de institucionalização do PSF (Viana & Dal Poz,1998).
Em documento do Ministério datado de 1994, consta que, o PSF é um instrumento de
reorganização do SUS e da municipalização, definindo que sua implantação ocorrerá,
prioritariamente, nas áreas de risco (utilizando o Mapa do IPEA, para seleção das áreas) MS
(Ministério da Saúde, 1994a), fato que vem confirmar informações contidas no Relatório do
Banco Mundial.
Neste contexto, Misoczky (1994) adverte que o PSF toma como foco a família de
excluídos, pois é um modelo de atenção direcionado para populações que não podem
contribuir financeiramente para obter ações de saúde.
Vasconcelos (1999a: 174-175) preocupa-se com veemência: “O PSF não deve ser
considerado uma proposta simplificada e barata para áreas rurais e pobres do país, ao
contrário da simplificação, é um alargamento da atenção primária à saúde em direção à
13
incorporação de práticas preventivas, educativas e curativas mais próximas da vida cotidiana
da população e especialmente de seus grupos mais vulneráveis”. O mesmo autor mostra que
um desafio do programa é ter capacidade de integração com serviços locais de saúde bem
estruturados, para possibilitar a formação de uma rede de atendimento (referência e contra-
referência).
O programa é considerado como uma estratégia, privilegiando as ações de promoção,
proteção e recuperação da saúde dos indivíduos e da família, entendida a partir de seu
ambiente físico e social. Esse tipo de abordagem pretende fornecer à equipe do programa uma
compreensão mais abrangente do processo saúde/doença. O objetivo central do mesmo é a
reorganização da prática assistencial em novas bases e critérios, em substituição ao modelo
tradicional centrado na assistência curativa e hospitalar (Viana & Dal Poz, 1998). É uma
estratégia que possibilita a integração e promove a organização de atividades em um território
definido.
Nota-se uma dubiedade entre o caráter de “estratégia” e de “programa”, fato que
possivelmente tem implicações em relação à sua implementação e ao alcance da proposta.
Para Mendes (1998), a idéia de transformar uma proposta de organização da atenção básica
em mais um programa é uma distorção que permanece quando se mantém a coordenação do
PSF separada daquela do PACS. Vasconcelos (1999a), por sua vez, considera que não é
possível haver um único modelo de atenção4 para todo o Brasil, dada a diversidade do país, e,
embora com a definição clara de uma proposta, devem existir parâmetros adequados a esta
adversidade.
Documento do Ministério da Saúde, (1998c) procura esclarecer que, embora
denominado de Programa, o PSF, foge à concepção usual dos demais programas idealizados
por este Ministério, uma vez que não é uma intervenção vertical e paralela às atividades dos
serviços de saúde, operacionalizados a partir de ações programáticas que se constituem de
princípio, meio e fim. Ao contrário, caracteriza-se como uma estratégia que propõe um
modelo de atenção a ser seguido, possibilitando a integração e promovendo a organização das
atividades em um território definido.
O Programa de Saúde da Família vem sendo implantado em todas as regiões do país, a
partir de 1994, quando contavam-se 328 equipes. Em janeiro de 2000, havia 5.139 Equipes de
4 Os modelos de atenção à saúde são formas de organização das relações entre sujeitos (profissionais de saúde e usuários), mediadas por tecnologias (materiais e não materiais), utilizadas no processo de trabalho em saúde, cujo propósito é intervir sobre problemas (danos e riscos) e necessidades sociais de saúde historicamente definidas. Neste sentido um modelo de atenção não é simplesmente uma forma de organização dos serviços de saúde nem tampouco um modo de administrar (gerir ou gerenciar) um sistema de saúde Teixeira(2000).
14
Saúde da Família (ESF) em 1.931 municípios e contavam-se com 113.345 Agentes
Comunitários de Saúde. O Ministério da Saúde pretende expandir as ESF-PSF/PACS, tendo
como objetivo para 2002, a implantação de 20.000 ESF, o que proporcionará uma cobertura
de 50% da população brasileira.
O Ministério da Saúde preconiza que o PSF reafirmando os princípios do SUS, deve
se estruturar através de uma unidade básica de saúde, que sedia a equipe multiprofissional
assumindo a responsabilidade por uma população delimitada, a ela vinculada, e desenvolve
ações de promoção da saúde, prevenção, tratamento e reabilitação, garantindo ainda
referência e contra-referência para os demais níveis do sistema de saúde. A Unidade de Saúde
da Família atua com base nos seguintes princípios:
• Caráter Substitutivo: Não significa a criação de novas estruturas de serviços, exceto em
áreas desprovidas, e sim a substituição das práticas convencionais de assistência por um
novo processo de trabalho centrado na vigilância à saúde.
• Integralidade e Hierarquização: A Unidade de Saúde de Família está inserida no
primeiro nível de ações e serviços do sistema local de saúde – atenção básica. Deve
garantir atenção integral aos indivíduos e famílias e assegurar a referência e contra-
referência para os diversos níveis do sistema.
• Territorialização e Hierarquização: Trabalha com um território de abrangência definido
e é responsável pelo cadastramento e acompanhamento da população adstrita a esta área.
É recomendado que uma equipe seja responsável pelo acompanhamento de, no máximo,
4500 pessoas.
• Equipe Multiprofissional: A Equipe de Saúde da Família é composta minimamente por
um médico generalista, um enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e de quatro a seis
agentes comunitários de saúde.
Outros profissionais podem ser incorporados às Unidades de Saúde da Família ou em
equipe de supervisão, de acordo com as necessidades e possibilidades locais. Uma Unidade de
Saúde da Família pode atuar com uma ou mais equipes dependendo da concentração de
famílias no território de sua abrangência MS (Ministério da Saúde, 1994b).
Dois elementos estruturantes do PSF merecem destaque: o financiamento e o sistema
de informação.
O PSF como estratégia prioritária do Ministério da Saúde para reestruturação da
atenção básica, tem seu financiamento garantido pelo PAB (Piso de Atenção Básica) criado
15
pela Norma Operacional Básica (NOB) 01/96. Esta vem garantindo mecanismos de
financiamento direto do Ministério da Saúde para os municípios, modificando a lógica de
financiamento, baseada anteriormente na produção de serviços (pagamento por
procedimentos) e, atualmente, na cobertura populacional, o que se constitui em um importante
instrumento de consolidação do programa. Uma parte variável de PAB compõe-se de
incentivos adicionados aos recursos de fontes estaduais e municipais. O valor do incentivo
para o PACS é fixado em R$ 2.200,00 ACS/ano. Para o PSF, a portaria 1.329, de 12/11/99,
estabelece que de acordo com a faixa de cobertura, os municípios passam a receber incentivos
diferenciados proporcionais ao número de pessoas cobertas (impacto do programa). Existe
também um incentivo adicional para a implantação de novas equipes, num valor de R$
10.000/equipe, pagos em duas parcelas (Chaves, 2000).
O Sistema de Informação em Atenção Básica (SIAB) é desenvolvido pelo Ministério
da Saúde, através do DATASUS, para o gerenciamento das informações utilizadas pelo PSF
nos municípios. Trata-se de um sistema informatizado que agrega e processa os dados sobre a
população da área de abrangência do PSF. Tais dados são obtidos através das fichas de coletas
e são agregados em relatórios de consolidação dos mesmos. O SIAB é um dos principais
instrumentos de gerência do programa e de cada unidade que o compõem, contém todos os
dados e informações necessárias para avaliação das condições de saúde da população adstrita
a cada unidade e o desempenho das equipes do PSF. É um potente instrumento para
planejamento, acompanhamento e avaliação das ações desenvolvidas pelas Equipes de Saúde
da Família.
Os dados processados pelo SIAB se referem às realidades sócio-sanitárias das
comunidades, à composição das famílias e aos domicílios que habitam, ao resultado das
visitas domiciliares realizadas pelos agentes comunitários, pelo enfermeiro ou pelo médico,
assim como aos relativos à demanda espontânea, à oferta de serviços e aos procedimentos
realizados por cada unidade do PSF (Chaves, 2000).
1.3 – Programa de Saúde da Família no Estado do Rio de Janeiro
O Estado do Rio de Janeiro localiza-se geograficamente na Região Sudeste do Brasil.
Sua organização político-administrativa aponta para a regionalização, dadas as características
sócio-demográficas, próprias e semelhantes em áreas do seu território. Sua divisão político-
administrativa foi determinada segundo as regiões de governo e municípios componentes. A
16
população residente estimada no Estado no ano 2000, foi da ordem de 13.284.447 habitantes,
distribuídos por 91 municípios. A capacidade ambulatorial do Estado apresenta a seguinte
distribuição: total de unidades credenciadas em torno de 4.582, com 20.261 consultórios,
4.433 equipamentos odontológicos instalados, 1.877 salas de pequenas cirurgias e 1.086 salas
de cirurgias ambulatoriais (Chaves, 2000).
Tomando como base a fonte da Secretaria Estadual de Saúde (SES), datada de
11/10/2000, temos a seguinte situação do Estado do Rio de Janeiro em relação ao PSF/PACS:
de um total de 91 municípios, 86 já assinaram convênio com a Secretaria e implantaram o
programa, dois estão em processo de assinatura, dois têm convênio assinado com a SES, mas
não recebem incentivo por não terem sido considerados qualificados para desenvolver o PSF e
01 município não tem convênio. Embora pese o grande número de convênios firmados, a
cobertura do Estado como um todo, é considerada baixa, dada a concentração demográfica
nas regiões metropolitanas.
A Região Serrana, onde o estudo se realizou, tem população total de 766.078
habitantes, com 212.802 famílias estimadas. O somatório de municípios da região é de 15,
representando 14% do total de municípios do Estado. Existem hoje, implantadas nos diversos
municípios da região, 53 ESF e de 471 ACS, que proporcionam cobertura de 23,87%. Para
cobertura de 100%, há a necessidade de implantação de 263 ESF e de 1.460 ACS (FESO,
2001).
O próximo item abordará o Programa de Saúde da Família no Município de
Teresópolis, da sua implantação até o momento da realização do estudo.
1.4 – Programa de Saúde da Família de Teresópolis
O município de Teresópolis está localizado na Região Serrana no Estado do Rio de
Janeiro, a uma distância de 74km da capital, com área de 849km2. A estimativa da população
do município é de 120.079 habitantes (Brasil, 1991), com 83% da população residente em
área urbana e 17% na área rural. Cerca de 15% dos habitantes de Teresópolis vivem em áreas
carentes, com grandes concentrações populacionais e precariedade de serviços públicos. O
processo de pauperização do município tem se intensificado nos últimos anos, podendo ser
caracterizado pelo elevado índice de favelização, já sendo considerado o primeiro do Estado
do Rio de Janeiro (FESO, 2001).
17
O município de Teresópolis conta atualmente com uma rede assistencial à saúde
constituída por nove unidades de saúde da família, cinco unidades de atenção primária à saúde
da rede pública municipal, três unidades secundárias, além de quatro unidades hospitalares.
As unidades do PSF, contam com a presença dos internos da Faculdade de Medicina de
Teresópolis e alunos em estágio final do Curso de Enfermagem.
O PSF Teresópolis foi implantado no município em agosto de 1999, após ter sido
firmado convênio entre a Prefeitura Municipal através da Secretaria Municipal de Saúde e a
Fundação Educacional Serra dos Órgãos (FESO) – Instituição de Ensino Superior. A FESO é
uma instituição responsável pela formação de profissionais em diversas áreas e junto ao PSF,
se incumbe da capacitação de profissionais para atuação no mesmo, através do Pólo de
Capacitação, Formação e Educação Permanente em Saúde da Família do Estado do Rio de
Janeiro – Núcleo FESO, em contrapartida os alunos internos do Curso de Medicina e alunos
do final do Curso de Enfermagem cumprem carga horária de estágio supervisionado nas
unidades de saúde do município. A partir de outubro de 2000, um grupo de alunos do Curso
de Odontologia da FESO são incluídos nesta tarefa.
O programa conta com nove unidades e onze equipes, indicadas a seguir:
• Organização do PSF Teresópolis
Unidade Equipes Famílias Cadastradas População
Acompanhada
Araras 1 1.418 5.077
Beira Linha 2 1.167 4.011
Barra do Imbui 1 1.143 3.848
Fonte Santa 2 1.601 5.778
Granja Florestal 1 967 3.468
Granja Guarani 1 692 2.432
Meudon 1 2.222 5.335
Rosário 1 530 2.088
Vargem Grande 1 968 3.379
Total 11 12.758 35.417 Fonte: SIAB, Novembro de 2000
A população acompanhada representa 29,5% da população do município.
18
Seguindo as recomendações do Ministério da Saúde (MS), as equipes de saúde da
família são compostas por um médico, um enfermeiro, um ou dois auxiliares de enfermagem
e quatro a seis agentes comunitários de saúde, de acordo com a população atendida,
devidamente selecionados e capacitados. Todos os profissionais cumprem jornada de trabalho
com oito horas diárias, de segunda a sexta-feira. O PSF Teresópolis, conta com uma
enfermeira em sua coordenação e também com uma Equipe de Supervisores Técnicos das
diversas áreas (gineco-obstetrícia, pediatria, clínica, nutrição, psicologia, enfermagem e
sociologia) que dão suporte e sustentabilidade ao processo de educação continuada e
permanente destas equipes.
Ações de educação continuada e permanente (serão melhor discutidas posteriormente)
são desenvolvidas com os componentes das equipes, pois nova prática, novos paradigmas se
apresentam, muda-se o eixo de assistência à saúde, tornando-se necessário profissionais que
se adeqüem a esta realidade, como recomenda Costa Neto:
“A necessidade de transformação das praticas de saúde tem demandado o redirecionamento da formação dos profissionais de saúde, de forma que se possa garantir os níveis de resolutividade desejados no exercício das atividades referentes a complexidade de sua atuação. Essa demanda inclui ainda o resgate do exercício da pratica profissional de forma ética vinculada ao exercício da cidadania, baseada na compreensão de que as condições de vida determinam as condições de saúde de uma dada população” MS (Ministério da Saúde, 2000c).
O processo de educação continuada visa a reciclar os profissionais envolvidos com a
equipe de saúde da família (ESF), proporcionando a estes, reflexão e discussão de conteúdos
necessários à sua pratica. A organização das unidades de saúde da família se dá através das
próprias equipes lotadas nas mesmas. Essas devem ser capazes de elaborar seu próprio
processo de trabalho e suas rotinas, com o apoio tanto da coordenação, como da supervisão do
programa. Todos os profissionais lotados no PSF/PACS passam por uma Capacitação
Introdutória para atuação no programa, antes do início de suas atividades.
Com o intuito de melhor esclarecer aspectos sobre o PSF de Teresópolis, é necessário
que se apresente a Fundação Educacional Serra dos Órgãos (FESO).
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• FESO e PSF – caracterização institucional
A Fundação Educacional Serra dos Órgãos (FESO), juridicamente é uma fundação
pública de direito privado e sem fins lucrativos. Foi fundada em janeiro de 1966 pelo Decreto
Municipal nº 02, por iniciativa comunitária.Tem por finalidade instalar e manter
estabelecimento de ensino de todos os graus; criar e manter serviços educativos e
assistenciais; promover, amparar e incentivar a difusão das iniciativas eventos e realizações de
caráter cultural e manter centros de pesquisas nos diversos campos de suas atividades (FESO,
1999b).
Desde 1983, a FESO iniciou suas atividades como parte do programa de assistência
comunitária a partir de uma ação conjunta entre o setor público – Prefeitura Municipal de
Teresópolis (PMT) – Secretaria Municipal de Saúde (SMS) e a FESO. A Unidade Básica de
Saúde (UBS) Beira Linha constitui-se em campo de ação social e de estágio, com vistas à
integração ensino-pesquisa-serviço da Faculdade de Medicina de Teresópolis (FMT) e
Faculdade de Enfermagem de Teresópolis (FET) da FESO. O objetivo foi de servir de base
constitucional ao modelo de saúde que seria levado às outras unidades do município, naquela
época.
Em 1996, diante das reformulações propostas nesta época pelo sistema de saúde e
diante do fato de compreender-se que as ações acima referidas requerem grande dedicação,
foram estabelecidas novas metas para o ano seguinte. O ano de 1997 foi definitivo para que
fossem firmadas ações e metas para o trabalho desenvolvido na UBS Beira Linha. Do ponto
de vista técnico, além de serem incorporados novos profissionais à equipe, teve início uma
proposta de educação continuada.
As mudanças ocorridas no setor saúde no Brasil no ano de 1998, dentre elas o PSF, fez
com que as unidades básicas de saúde da FESO se antecipassem à implantação efetiva do
programa, já que, de certa forma desenvolviam um modelo proposto, seja atendendo dentro
dos princípios da APS, seja introduzindo os alunos do Curso de Medicina e Enfermagem,
proporcionando atendimento à comunidade onde estão inseridas, meta fundamental do
trabalho.
O primeiro semestre do ano de 1999 foi importante para a definição de ações e metas
dos trabalhos desenvolvidos na UBS Beira Linha. Do ponto de vista técnico ocorreram
mudanças essenciais, a partir delas, desenvolvidas ações técnicas e metodológicas da
20
estratégia de saúde da família, acontecendo a implantação do programa – PSF – em agosto
deste mesmo ano.
Após seleção feita pelo Ministério da Saúde, a proposta para Pólo de Capacitação5 e
Formação Permanente em Saúde da Família da FESO foi aceita pelo Comitê de Seleção
daquele Ministério e a partir de maio de 2000, passando a fazer parte do Comitê Gestor do
Pólo de Capacitação do Programa de Saúde da Família do Estado do Rio de Janeiro. Processo
financiado pelo Ministério da Saúde em parceria com a FESO e com a Secretaria Municipal
de Saúde de Teresópolis.
A participação das universidades, com a criação dos Pólos de Capacitação, Formação
e Educação Permanente e Continuada em Saúde da Família, financiados pelo REFORSUS,
tem sido de importância fundamental na capacitação direcionada de centenas de profissionais
que vêm atuando nas Equipes de Saúde da Família.
É importante ressaltar que o Ministério da Saúde recomenda que o treinamento
introdutório deva ser o mais descentralizado possível e preferencialmente realizado no próprio
município ou região. As instâncias das Secretarias Estaduais de Saúde têm como atribuição
assessorar os municípios nessa atividade, quando o município apresenta condições técnicas e
operacionais para tal. O treinamento introdutório é oferecido a partir de demandas oriundas da
Secretaria Estadual de Saúde do Estado do Rio de Janeiro e das Secretarias Municipais de
Saúde da área Geo-Educacional do Pólo de Capacitação em Saúde da Família (PCSF-RJ-
FESO). A clientela é composta por médicos, enfermeiros e auxiliares de enfermagem, agentes
comunitários ou outros elementos que compõem ou venham a compor as Equipes de Saúde da
Família.
Cada treinamento introdutório, apesar de condução metodológica em princípios
pedagógicos básicos, é conduzido de acordo com o perfil municipal ou regional da clientela.
Há a necessidade de basear-se em diagnósticos locais e/ou regionais com base no perfil
epidemiológico. Este perfil é capaz de promover a formação de profissionais para as questões
de maior prevalência na sua área de atuação.
5 Os pólos são definidos como articulação de uma ou mais instituições voltadas para formação e educação permanente de recursos humanos em saúde, vinculados às universidades ou instituições isoladas de educação superior que se consorciam ou formam convênios com Secretarias de Estado e/ou Secretaria Municipal de Saúde para incrementarem programas destinados ao pessoal vinculado à prestação de serviços em Saúde da Família no âmbito de um ou mais municípios. Trata-se de uma rede de instituições comprometidas com integração ensino-serviço voltada para atender a demanda de pessoal preparado para o desenvolvimento da estratégia de Saúde da Família do SUS.
21
O treinamento introdutório se propõe a capacitar os profissionais para analisar junto
com a comunidade a situação de sua área de abrangência referente a aspectos demográficos,
sócio-econômicos, ambientais e sanitários; identificar problemas e potencialidades existentes
na própria localidade; contribuir para que os profissionais compreendam e apreendam os
indicadores do SIAB e criar mecanismos de monitoramento para avaliação das atividades
desenvolvidas.
Espera-se que o profissional, após se submeter à capacitação introdutória, esteja
habilitado para compreender os princípios e diretrizes básicas do Programa de Saúde da
Família do âmbito do SUS; identificar os fundamentos e instrumentos do processo de
organização e prática dos serviços de Saúde da Família: trabalho em equipe, desenvolvimento
das ações programáticas, reorganização do processo de trabalho e intersetorialidade e
compreender as bases para o desenvolvimento do processo de planejamento das ações e
serviços das Unidades de Saúde da Família MS (Ministério da Saúde, 2001).
Alguns aspectos a respeito do processo de educação continuada e permanente devem
ser clarificados.
• Processo de educação continuada e permanente
A educação em saúde é um processo que transcende às práticas educativas restritas a
indivíduos. Esta deve refletir criticamente sobre as práticas de saúde e as relações entre os
sujeitos nelas envolvidos, pensar na reprodução/transformação dessas relações e práticas
sociais e na possibilidade de reestruturar a formas de organização do trabalho, repensando
sobre a relação educação/trabalho (Motta, 1998).
O termo educação continuada aparece na VI Conferência Nacional de Saúde (1997).
Ocasião na qual este movimento foi criticado pelo fato de satisfazer os interesses de grupos de
profissionais específicos, com preocupações acadêmicas, não contribuindo para melhora dos
serviços de saúde. A partir de então, começou-se a fomentar um debate entre educação
continuada e permanente vinculada às políticas de recursos humanos do setor saúde. Foi
durante a VII Conferência Nacional de Saúde em 1980, mediante a implantação do Programa
Nacional de Serviços Básicos de Saúde (Prev-Saúde) que a educação continuada passou a ser
associada a projetos de extensão de cobertura, a fazer parte da reorientação do ensino superior
através da implantação de programas de integração docente-assistencial (IDA) e a ser um
instrumento na supervisão de programas.
22
Os termos continuada e permanente geram discussões. Segundo Ricas (1994) estes
conferem especificidade ao processo ensino/aprendizagem. O termo permanente, o qual foi
bastante difundido pela Organização Panamericana de Saúde (OPAS) se refere a uma
estratégia de reestruturação e desenvolvimento de serviços a partir de uma análise dos
determinantes sociais e econômicos e de transformação de valores e conceitos dos
profissionais. Propõe transformar o profissional em sujeito, colocando-o no centro do
processo ensino/aprendizagem.
Ainda segundo Ricas (1994), o termo continuada abarca as atividades de ensino após o
curso de graduação com o objetivo de atualização, aquisição de informações, através de
metodologia tradicionais. Nunes (1993:46) complementa se referindo à educação continuada
como “alternativas educativas, mais centradas no desenvolvimento de grupos de profissionais
seja através de cursos de caráter complementar e mesmo seriado, seja através de publicação
específicas de um determinado campo”.
A educação permanente se caracteriza por fazer da educação dos trabalhadores de
saúde um processo permanente em que o trabalho é destacado como eixo do processo
educativo, fonte de conhecimento e objeto de transformação. Esta proposta torna o processo
de trabalho em saúde como gerador e configurador de processos educacionais em serviços
locais de saúde, concebendo a educação como sinônimo do reconhecimento de conflitos, e
como a interpretação de vazios não cobertos pelas ações realizadas através do processo de
trabalho (Motta, 1998).
Segundo Almeida (1997) os processos de educação continuada e de educação
permanente são distintos mas não antagônicos e atendem a propósitos e interesses diferentes.
Este autor faz uma síntese entre diferentes aspectos destes processos. A educação
continuada se dá como um processo uniprofissional, é uma prática autônoma, seu enfoque
está na especificidade e seu objetivo principal é a atualização técnico-científica; acontece
esporadicamente, se utiliza da metodologia tradicional (pedagogia da transmissão, através de
aulas, palestras, realizadas em locais diferentes dos ambientes de trabalho) e consegue como
resultado a apropriação passiva do saber científico por parte do aluno e o aperfeiçoamento das
práticas individuais. A educação permanente é um processo multiprofissional com uma
prática institucionalizada, seu enfoque está nos problemas de saúde e objetiva a transformação
das práticas técnicas e sociais; se dá continuamente; o processo de aprendizagem, de natureza
participativa, utiliza a metodologia centrada na resolução de problemas (geralmente através da
supervisão dialogada, oficinas, efetuadas nos mesmos ambientes de trabalho). Tem como
23
resultados a mudança institucional, a apropriação ativa do saber científico por parte dos
autores e o fortalecimento das ações em equipe.
A partir destas indagações, pode-se pensar como os processos educacionais, que
tomam com eixo principal o processo de trabalho em saúde, podem ser um importante
elemento na redefinição de modelos assistenciais, na reorganização de serviços de saúde,
norteando a supervisão para que esta seja um veículo de realização das referidas mudanças.
Como foi visto, não se pode conceber a reorganização das práticas de atenção à saúde
sem que se pense e se invista em uma política de formação e num processo permanente de
capacitação dos recursos humanos. A educação permanente desempenha sua função quando
está envolvida numa prática de transformação, que traduz uma teoria do conhecimento, como
um processo de criação e recriação, desenvolvendo a reflexão crítica sobre sua
prática/trabalho. Podemos dizer então, que a produção de conhecimento em saúde da família
caracteriza-se como processo gerado no trabalho, fundamentalmente participativo, já que
resulta da confrontação de diferentes e complementares experiências entre a equipe e a
comunidade.
O objetivo central da educação permanente é a transformação do processo de trabalho,
orientado para uma constante melhoria da qualidade das ações e serviços de saúde, devendo
se adequar às necessidades loco-regionais dos profissionais e da população atendida.
O processo de educação permanente para o Programa de Saúde da Família objetiva
também, aumentar a resolutividade das ações frente aos problemas prevalentes, a partir do
fortalecimento do processo de trabalho das equipes de Saúde da Família, e do estabelecimento
do compromisso com a saúde da população por parte dos membros da equipe.
Frente aos desafios desse modelo, baseado na família, pretende-se preparar um
profissional para construir seu conhecimento e aprimorar-se com as novas teorias e práticas.
Um profissional que, ao longo de sua carreira, seja capaz de desenvolver um processo
permanente de auto-aprendizagem. Nesse processo, deve haver uma preocupação rotineira
desse profissional e das equipes em identificar problemas críticos de sua realidade de trabalho
e buscar soluções apropriadas. Como enfatiza Souza (Apud Chaves, 2000), educação
permanente das equipes de Saúde da Família constitui importante estratégia para desenvolver
a reflexão crítica sobre as práticas dessas equipes. No entanto, para que haja um processo de
troca entre os profissionais e os saberes da comunidade, é preciso que o projeto de educação
permanente seja orientado para a transformação do processo de trabalho, englobando as
24
necessidades de aprendizagem das equipes com conhecimentos, habilidades, atitudes e
valores da comunidade.
Além dos métodos tradicionais de cursos presenciais, merecem destaque duas formas
de organização do processo educativo permanente, que são a auto-instrução e a educação a
distância, as quais estão atendendo grande contingente de equipes.
A metodologia básica do processo de auto-instrução segue a linha pedagógica baseada
no binômio estudo-trabalho. Podem ser de grande utilidade para os profissionais das equipes o
intercâmbio e as reuniões com outras equipes vizinhas, reuniões com os membros da própria
equipe (para planejamento de ações, avaliação do trabalho da unidade, discussão de caso
clínico-epidemiológico etc), procurando sempre tirar o máximo de aproveitamento do
potencial existente.
O Programa de Educação a Distância busca o processo educacional voltado para a
mudança da prática, não se limitando apenas a uma capilarização de informações ou à
distribuição de rotinas de procedimentos, mas, sim, à mudança da prática no nível básico da
atenção à saúde da população, dando-lhe mais competência e capacidade resolutiva.
Neste sentido, observamos, a importância da Supervisão como veículo redefinidor e
potencializador da operacionalização da educação continuada e permanente e como
importante instrumento gerenciador do programa.
1.5 – O Fazer em Saúde – Dia-a-Dia nas Unidades
1.5.1 – Tudo em Família6
O atual modelo da atenção à saúde -PSF- o qual é centrado na qualidade de vida das
pessoas, e do seu meio ambiente, bem como na relação da equipe de saúde com a
comunidade7, especialmente com seus núcleos sociais primórdios (as famílias); requer
conhecimentos, métodos e procedimentos próprios para atuação dos profissionais. Estes
6 Considerada como unidade de ação programática. Contabilizada a partir do número de pessoas residentes no domicílio. 7 Comunidade: “qualquer agrupamento de indivíduos conscientemente organizados, habitando uma área específica ou uma localidade, dotada de autonomia política limitada, mantendo instituições primárias como escolas e igrejas entre as quais certos graus de interdependência são reconhecidos. Qualquer processo de interação social que gera uma atitude e uma prática mais intensiva e extensiva de interdependência, cooperação e união”( Paim, 1986).
25
devem procurar transformar a relação entre os usuários e os agentes do sistema de saúde
(restabelecimento do vínculo entre quem presta serviço e quem o recebe) e concretizar a
possibilidade da intervenção ambiental para que sejam modificados fatores determinantes
da situação de saúde.
A eleição da família e seu espaço social como núcleo básico de abordagem no
atendimento à saúde, aponta para a necessidade de reflexão e esclarecimento em relação ao
tema: família. Este tem sido objeto de discussão no setor saúde. Salum (1999), ressalta que é
imprescindível não simplificar um objeto tão complexo como a família no momento de definir
e avaliar práticas de saúde. É necessário perguntar de que família se fala, reconhecendo-a
como espaço privilegiado de constituição, desenvolvimento, crise e resolução dos problemas
de saúde individuais e coletivos.
No entanto, observa-se que nem sempre a família é vista como tal; há situações nas
quais “qualquer tipo de intervenção da equipe é considerada como familiar”
(Vasconcelos, 1999a:174). O termo família perde a sua especificidade uma vez que cada
indivíduo ou grupo, conceitua-a de diferentes formas em função da diversidade de
experiências de vida e de acordo com valores culturais adquiridos.
O conceito de família é dinâmico e complexo. A estrutura familiar muda de acordo
com a evolução histórica e cultural e desempenha papel decisivo na educação. É um espaço
onde são absorvidos valores éticos e humanitários e onde se aprofundam laços de cidadania,
solidariedade e direitos humanos. Podemos reforçar esta idéia, através das palavras de
Mendes, (1998:158) “A família de que se fala deve ser compreendida historicamente, na
especificidade de cada época e dependendo dos grupos sociais aos quais pertence. Sabemos
que existem famílias com laços afetivos e estabilidade econômica definidos; famílias sem
recursos assistenciais ou direitos sociais; famílias nucleares ou famílias por conveniência ou
sobrevivência. Em sociedades tão desiguais como a que vivemos, deve-se, primeiramente,
esforçar-se para incorporar, nas análises e propostas de trabalho, como essas relações se
vêm transformando e ganhando novas significações”.
Também podemos conceituar família como sendo um grupo formado por laços
consangüíneos ou não. Seus integrantes estão ligados por laços afetivos (vínculos) positivos e
negativos, que vão garantir o desenvolvimento e proteção desse arranjo familiar, propiciando
aportes de sobrevivência, proteção e bem-estar de seus componentes. E apesar de a família ser
o ponto de confluência das realidades vividas por seus integrantes, ela não deve ser vista
como o somatório de comportamentos individuais, devendo ser considerada como um
26
processo integrado em permanente evolução de cada um de seus membros, sempre em relação
com o outro.
A visão integral e sistêmica da família, parte do princípio de que ela pode ser vista
como parte (sub-sistema) do sistema social , tendo em vista suas permanentes inter-relações
com os demais sub-sistemas sociais (lazer, escola, religião, cultura, política e outros). Além
disso, ao construir-se em um sistema, pode ser vista como um todo, trabalhando,
permanentemente, para manter a homeostase interna (auto-regulação) de seus sub-sistemas
(membros), constituída por regras, fronteiras, hierarquia, poder, papéis, comunicação,
segredos, mitos e uma estrutura inconsciente, que “compõem a dinâmica relacional entre seus
membros” Costa (apud MS, 2000a).
Nas práticas de saúde, observa-se duas formas de enfocar a atenção familiar: na
primeira, a família é vista como fonte de informação contextualizada de um paciente
específico, e na segunda, como o próprio foco da atenção, sendo a partir dela identificados
aspectos coletivos e individuais para serem abordados. A segunda deve ser privilegiada pelas
equipes do PSF, uma vez que a doença é um processo que envolve todo o grupo familiar. É
também dentro deste mesmo grupo que o indivíduo encontra as condições necessárias para a
busca e para a manutenção da saúde. Sendo assim, a visão sistêmica de tratamento dos
problemas de saúde, apontam para a necessidade dos profissionais conhecerem métodos e
técnicas de avaliação de famílias e as encare como “contexto-problema e recurso terapêutico”,
(Duncan & Guigliani, 1998:65).
É importante que o profissional de saúde não perca de vista que fatores externos ou
internos que venham a incidir sobre um dos membros da família atuarão em toda a família,
tanto individualmente, em cada um de seus elementos, como na dinâmica familiar.
Féres-Carneiro (1996) acrescenta dizendo que o conflito nas relações familiares pode
ser positivo ou negativo, na medida em que estimule ou predisponha ao desequilíbrio
emocional das relações familiares e à desadaptação individual. Pode haver na família forças
que predisponham à enfermidade, levando à ruptura da comunicação, à regressão e à
desintegração, como é possível haver no grupo familiar potenciais de promoção de saúde
quando as funções familiares básicas são cumpridas.
27
1.5.2 – Equipe: Características, atribuições e competências
• A equipe de saúde da família - o dia-a-dia de uma unidade
As equipes de saúde da família desenvolvem várias atividades dentro e fora das
unidades, com o objetivo de promover, prevenir e dar assistência à saúde da população a ela
adstrita. A equipe trabalha cadastrando todas as famílias que vivem em sua área de
abrangência, identificando a população e vinculando-a à unidade de saúde. Realiza
diagnóstico dos problemas de saúde das famílias para que a equipe possa planejar suas ações,
dentro das necessidades da população. Acompanham os grupos mais vulneráveis ao
adoecimento e à morte (crianças, mulheres, adolescentes e idosos ), e os portadores de
doenças crônico-degenerativas, por meio das ações programadas, com o objetivo de
minimizar e reduzir possíveis riscos. Presta assistência integral na unidade de saúde ou a
domicílio, através de consulta médica e/ou de enfermagem, e de visitas domiciliares. Cada
equipe atende em média 3.450 pessoas.
As equipes são responsáveis também por registrar os dados e instrumentos próprios do
Sistema de Informação em Atenção Básica (SIAB). Temos como principais indicadores do
sistema: mortalidade infantil, agravos e notificações, vigilância alimentar e nutricional,
imunização e outros. São ainda desenvolvidas atividades de educação em saúde - palestras,
campanhas, reuniões de grupos (hipertensos, diabéticos, gestantes, planejamento familiar, pré-
natal, puericultura, adolescentes), visitas domiciliares, vacinação, busca ativa de casos
relacionados aos grupos de risco, reuniões com a comunidade, mobilização comunitária e
outras situações que interferem nas condições de saúde da população.
Na maioria das vezes as consultas são agendadas, mas atende-se também à demanda
espontânea. Quando um usuário da comunidade é referido para outro serviço, para realização
de algum exame, ou para tratamento especializado, é responsabilidade da equipe da unidade
dar seguimento ao caso mediante seu retorno.
• Atribuições da equipe de saúde da família
A implantação de um novo modelo de assistência à saúde, propõe novo modo de
operar o trabalho , evidenciando-se a necessidade de transformação dos recursos humanos,
28
para que se obtenha profissionais comprometidos com um “Sistema Único de Saúde
qualificado, acessível, sensível e humanizado”. É preciso refletir não só sobre as
transformações no modelo de atenção à saúde, como em relação às transformações no mundo
do trabalho ( Nunes et al. 2000:313).
Em relação ao trabalho, identifica-se uma transformação caracterizada por uma
transição entre o modelo taylorista/fordista, que vigorou entre os anos 50 e 70, quando a
organização do trabalho se caracterizava pela dominância do trabalho prescrito com poucas
possibilidades de intervenção nos processos produtivos, e como decorrência disso havia pouca
autonomia por parte dos trabalhadores. O modelo taylorista (presente ainda na prática dos
serviços), faz com que o trabalhador (sem se dar conta) abra mão do lugar de sujeito do
processo de produção, não reconhecendo a necessidade de sua qualificação, portanto, não
reivindicando-a.
Nas décadas de 80 e 90, com a reestruturação produtiva, baseada na intelectualização
do trabalho, as principais referências passam a ser o conhecimento técnico e a qualificação
profissional. “O novo paradigma do trabalho nas sociedades pós-industriais, recoloca a
centralidade do trabalhador no processo produtivo e amplia a discussão sobre os processos de
qualificação” (Nunes et al.,2000:314)8.
Desta forma, novas competências são exigidas desse trabalhador, valorizando os
sistemas de produção integrados e indicando necessidades de manter os profissionais em suas
respectivas atividades. O trabalhador deve incorporar novas competências que lhe habilitem
como negociador de suas condições de trabalho e as instituições precisam estar preparadas
para realizar negociações que preservem a harmonização dos diferentes vínculos. O modelo
de competência, adquire importância nas discussões sobre a formação e desenvolvimento
de recursos humanos. Para Zarifian (apud Nunes et al., 2000:319) competência é a capacidade
de enfrentar situações e acontecimentos próprios de um campo profissional, “com iniciativa e
responsabilidade, guiadas por uma inteligência prática do que está ocorrendo e com
capacidade para coordenar-se com outros atores para mobilizar suas capacidades”.
Segundo Costa Neto (MS, 2000b), competência profissional é a “operacionalização,
em situação profissional, de capacidades que permitem exercer convenientemente uma função
ou uma atividade, a qual deve estar associada à idéia de adequação e apropriação da mesma
prática a diferentes contextos, mantendo a mesma qualidade esperada. Faz-se necessária,
8 Esta discussão será aprofundada no capítulo referente à supervisão.
29
então, a construção de conhecimentos e o desenvolvimento de habilidades para o logro de tal
objetivo”.
Estas preocupações estão presentes quando se discute a formação dos profissionais
para o programa de saúde da família; neste sentido, os pólos de capacitação em saúde da
família são fundamentais para proporcionar a formação adequada aos profissionais em
questão. A supervisão se faz necessária como suporte para manutenção e aprimoramento
desta formação.
A atenção básica à saúde aponta para uma atenção integral e acessível, devendo contar
com profissionais capazes de trabalhar com a maioria das necessidades de saúde do indivíduo,
desenvolvendo com ele uma relação sustentada e participativa, sempre contextualizando-o na
família e na comunidade. Dessa forma, não é desejável uma atuação restrita aos problemas de
saúde biologicamente estabelecidos, pois, seu compromisso envolve também as ações a serem
realizadas enquanto os indivíduos ainda estiverem saudáveis MS (Ministério da Saúde,
2000b). Assim, a equipe de saúde da unidade básica sob a estratégia de saúde da família deve
conhecer detalhadamente a realidade das famílias que residem em sua área adstrita, incluindo
seus aspectos físicos e mentais, demográficos e sociais. Está sob sua responsabilidade,
também, identificar os problemas de saúde prevalentes na área de sua abrangência, bem
como construir, junto com as famílias, um diagnóstico psicossocial que detecte situações de
vulnerabilidade familiar, tradicionalmente chamadas de fatores de risco, sobre as quais a
população encontra-se exposta.
São ainda atribuições da equipe de saúde da família: prestar assistência integral,
resolutiva, contínua e de boa qualidade às necessidades de saúde da população adstrita, na
unidade de saúde e no domicílio; intervir sobre os fatores de risco aos quais a população está
exposta; eleger a família e seu espaço social como núcleo básico de abordagem no
atendimento à saúde; humanizar as práticas de saúde, estabelecendo o vínculo entre os
profissionais de saúde e a população; proporcionar o estabelecimento de parcerias, através do
desenvolvimento de ações intersetoriais; contribuir para a democratização do conhecimento
do processo saúde/doença, da organização dos serviços e da produção social da saúde;
provocar o reconhecimento da saúde como um direito de cidadania e estimular a organização
da comunidade para o efetivo exercício do controle social MS (Ministério da Saúde,1998a).
Para desenvolver tais atribuições, num contexto de trabalho da equipe de saúde da
família, é necessário que os profissionais desenvolvam competências, que os farão adquirir
um perfil específico para o melhor desempenho de suas funções, tanto numa abordagem
30
coletiva, como numa individual. Estas são determinadas pelo Ministério da Saúde MS
(Ministério da Saúde, 2000a).
• Abordagem coletiva
Os profissionais de saúde devem ser capazes de perceber a multicausalidade dos
processos mórbidos, sejam físicos, mentais ou sociais, tanto individuais, como coletivos,
contextualizando, sempre, o indivíduo em seu meio ambiente. Faz-se necessário que ele esteja
voltado à criação de novos valores, trabalhando mais a saúde do que a doença, cujas ações
estejam permeadas de preocupações integrais, coletivas e sociais e , basicamente, por meio do
trabalho interdisciplinar. O profissional deve estar voltado para atuar nos fatores que alteram
o equilíbrio entre o indivíduo e o ambiente, a compreender a saúde em seu sentido mais
abrangente, realizando práticas integradoras na abordagem da família, e a compreender a
dinâmica setorial, participando, permanentemente, em conjunto com os demais membros da
equipe e com a população, do processo de construção do modelo assistencial.
• Abordagem individual
No que diz respeito à prática da assistência direta à saúde da família, o profissional de
saúde deve atender a todos os seus componentes, independente do sexo ou da idade. Deverá
comprometer-se com a pessoa de forma integral e inserida em seu contexto biológico,
psicológico, social e ambiental, não se limitando a um conjunto de conhecimentos
especializados ou com um grupo de doenças. Deve partir da premissa que as alterações
físicas ou mentais vivenciadas pelos pacientes geram uma desarticulação de sua existência,
abalando e desestruturando a dinâmica de sua família e dos demais sub-sistemas em que se
encontram inseridos.
É necessário valorizar as relações profissional-indivíduo e profissional-família como
parte de um processo dinâmico e terapêutico e de confiança. As unidades básicas de saúde
devem programar as atividades, de acordo com a fase do ciclo de vida em que se encontra a
pessoa, sem perder de vista o seu contexto familiar e social.
São descritas também três competências de caráter geral e organizacional que os
profissionais devem desenvolver :
31
1 – Promoção da Saúde: capacidade de identificar os fatores determinantes da
qualidade de vida, bem como compreender o sentido da responsabilização compartilhada
como base para o desenvolvimento das ações que contribuem para o alcance de uma vida
saudável .
2 – Trabalho em Equipe: capacidade para reconhecer a relevância do trabalho em
equipe de forma interdisciplinar e de desenvolve-lo em uma unidade básica de saúde.
3 – Planejamento das Ações: capacidade para diagnosticar a realidade local,
elaborar e avaliar planos de trabalho capazes de produzir impacto sobre a realidade sanitária
na população, famílias e indivíduos de uma área de abrangência.
As atribuições específicas de cada categoria profissional preconizadas pelo Ministério
da Saúde são:
Médico: o médico da equipe do PSF deve ser, preferencialmente, um generalista
portanto, deve atender a todos os componentes das famílias, independente de sexo e idade.
Suas atribuições básicas são: prestar assistência integral aos indivíduos sob sua
responsabilidade; valorizar a relação médico-paciente e médico-família como parte de um
processo terapêutico e de confiança; oportunizar os contatos com indivíduos sadios ou
doentes, visando abordar os aspectos preventivos e de educação sanitária; executar ações
básicas de vigilância epidemiológica e sanitária; executar as ações de assistência nas áreas de
atenção à criança, ao adolescente, à mulher, ao trabalhador, ao adulto e ao idoso, realizando
também atendimentos de primeiros cuidados nas urgências e pequenas cirurgias
ambulatoriais; discutir de forma permanente junto à equipe de trabalho e comunidade, o
conceito de cidadania, enfatizando os direitos à saúde e as bases legais que os legitimam;
promover a qualidade de vida e contribuir para que o meio ambiente seja mais saudável;
participar do processo de programação e planejamento das ações e da organização do
processo de trabalho das unidades de saúde da família.
Enfermeiro: este profissional desenvolve seu processo de trabalho em dois campos
essenciais: na unidade de saúde, junto à equipe de profissionais, e na comunidade,
acompanhando e supervisionando o trabalho dos agentes comunitários de saúde, bem como
assistindo as pessoas que necessitam de atenção de enfermagem.
Suas atribuições básicas são: executar ações de assistência básica de vigilância
epidemiológica e sanitária nas áreas de atenção à criança, ao adolescente, à mulher, ao
trabalhador e ao idoso; desenvolver ações para capacitação dos ACS e auxiliares de
enfermagem ; oportunizar os contatos com indivíduos sadios ou doentes, visando promover a
32
saúde e elaborar os aspectos de educação sanitária; promover a qualidade de vida e contribuir
para o meio ambiente tornar-se mais saudável; discutir de forma permanente, junto à equipe
de trabalho e a comunidade, o conceito de cidadania, enfatizando os direitos de saúde e as
bases legais que os legitimam e participar do processo de programação e planejamento das
ações e da organização do processo de trabalho das unidades de saúde da família..
Auxiliar de enfermagem: as ações do auxiliar de enfermagem são desenvolvidas nos
espaços da unidade de saúde e no domicílio/ comunidade.
Suas atribuições básicas são: desenvolver, com os agentes comunitários de saúde,
atividades de identificação das famílias de risco; contribuir com o trabalho dos ACS no que se
refere às visitas domiciliares; acompanhar as consultas de enfermagem dos indivíduos
expostos a situações de risco; executar, segundo sua qualificação profissional, os
procedimentos de vigilância sanitária e epidemiológica nas áreas de atenção à criança, à
mulher, ao adolescente, ao trabalhador e ao idoso, bem como no controle da tuberculose,
hanseníase, doenças crônico-degenerativas e infecto-contagiosas e participar da discussão e
organização do processo de trabalho da unidade de saúde.
Agente Comunitário de Saúde: o ACS desenvolverá suas ações nos domicílios de
sua área de responsabilidade e junto à unidade para a programação e supervisão de suas
atividades.
Suas atribuições básicas são: realizar o mapeamento de sua área de atuação; cadastrar
e atualizar as famílias de sua área; identificar indivíduos e famílias expostas a situações de
risco; realizar, através de visita domiciliar, acompanhamento mensal de todas as famílias sob
sua responsabilidade; coletar dados para a análise da situação das famílias acompanhadas;
desenvolver ações básicas de saúde nas áreas de atenção à criança, à mulher, ao adolescente,
ao trabalhador e ao idoso, com ênfase na promoção da saúde e prevenção de doenças;
promover educação em saúde e mobilização comunitária, visando uma melhor qualidade de
vida mediante ações de saneamento e melhorias do meio ambiente; incentivar a formação dos
conselhos locais de saúde; orientar as famílias para a utilização adequada dos serviços de
saúde; informar os demais membros da equipe de saúde acerca da dinâmica social da
comunidade, suas disponibilidades e necessidades e participar do processo de programação e
planejamento local das ações relativas ao território de abrangência da unidade de saúde da
família, com vistas à superação dos problemas identificados.
33
1.6 – Participação Comunitária – Controle Social
Cortes (1995) relaciona cinco correntes de pensamento que analisam o papel do
Estado em sociedades modernas – pluralismo, teoria das elites, nova direita, marxismo,
neopluralismo – focalizando como estas tratam a descentralização e a participação popular,
como nova forma de representação de interesses nas democracias liberais.
O pluralismo considera o poder na sociedade, de forma dispersa entre distintos grupos
de interesses que competem entre si, em um sistema político aberto, descentralizado e
democrático. Defende a participação dos cidadãos e seu controle sobre os políticos. A teoria
das elites nega a democracia e defende a idéia de que as oligarquias sempre dominaram a
vida política. A descentralização não mudaria a estrutura de poder e não facilitaria a
participação dos cidadãos. A nova direita recomenda a democratização das organizações
sociais ao mesmo tempo que ataca a idéia de Estado intervencionista e promotor do bem-estar
social; este estimularia a dependência das pessoas em relação aos governos e atrapalharia o
desenvolvimento econômico. Acreditam na diminuição das dimensões do governo e no
fortalecimento do papel do indivíduo e dos consumidores. O marxismo considera o Estado
um instrumento para o gerenciamento de interesses burgueses, visando à manutenção do
capitalismo. O governo local é visto como uma extensão da rede de dominação para a
submissão política da classe trabalhadora. A participação é concebida sob três pontos de vista:
como estratégia de manipulação para legitimar o sistema capitalista e fortalecer a dominação
clientelista sobre a classe trabalhadora (marxismo convencional); outro grupo defende a idéia
de que a participação popular ao nível local é um meio de organização da classe trabalhadora
para a mudança revolucionária do sistema; e os neomarxistas aceitam a via liberal
democrática de trabalhadores em fóruns institucionalizados (noção de Estado ampliado). Para
o neopluralismo, a questão central não é aumentar o poder das pessoas comuns, mas oferecer
benefícios iguais, de modo a criar um governo popular. Defende a criação de mecanismos
participatórios e a descentralização do poder político.
As diferentes correntes concebem tipos diversos de participantes: comunidade,
cidadão, setores populares, consumidor e usuário. Estes são definidos a partir de como estão
articulados à análise do funcionamento social e do sistema político.
Os pluralistas utilizam o conceito de participação da comunidade em projetos de
desenvolvimento. Embora o conceito seja preciso no que diz respeito às fronteiras espaciais, é
34
impreciso em relação às divisões sociais, tornando difícil a definição dos setores sociais que
estariam aptos a participar; o que faz com que o conceito seja criticado.
O conceito de participação do cidadão, também originado na teoria pluralista, inclui
não só a noção de direitos políticos e civis mas também a idéia de direitos sociais, que supõe a
participação dos cidadãos na riqueza produzida pela sociedade, e a participação destes no
processo político.
O conceito de participação popular designa o envolvimento em processo
participatórios, daqueles que não pertencem à classe dominante, ou seja, daqueles que não
recebem, ou recebem muito pouco, da riqueza gerada pela sociedade. Este conceito tem sido
empregado por representantes do neopluralismo e do marxismo, que incentivam a
participação através de fóruns institucionalizados nos quais os participantes podem expressar
sua voz e tomar parte no processo político.
À nova direita têm-se articulado o conceito de participação do consumidor, vindo do
campo da economia, e que designa aqueles indivíduos que compram bens e serviços,
oferecidos competitivamente por diferentes vencedores e prestadores. É claro que nos países
do terceiro mundo seria irreal sugerir esta forma de participação à totalidade dos
consumidores.
O conceito de usuário combina noções de cidadania e direitos do cidadão e refere-se
aos indivíduos que utilizam serviços prestados em determinada área territorial.
A autora, referenciada anteriormente, sistematizou os tipos de envolvimento de
participantes no processo de decisão política; o trabalho de Paul (apud Cortes, 1995), merece
destaque. Ele considera que um processo participativo pode visar fortalecer para o poder
(empowerment). Ou seja, esses processos objetivam “conduzir a uma partilha eqüitativa de
poder e a um grau elevado de consciência e força política dos setores populares; promover a
capacitação dos beneficiários, para que estes possam compartilhar a administração de tarefas;
aumentar a efetividade, promovendo o envolvimento dos beneficiários para a melhoria de um
programa, ou projeto; repartir os custos do projeto, com as pessoas as quais ele visa
beneficiar; melhorar a eficiência de um projeto ou política para promover a aceitação,
cooperação e interação entre os beneficiários e entre estes e a agência implementadora”,
(Cortes 1995: 77-78).
Cortes (1996) analisa a criação de novas formas de participação popular no processo
político que tiveram sua origem nos anos sessenta, quando aumentavam as desilusões com as
instituições políticas nas democracias liberais ocidentais. E reafirmaram-se durante estes
35
mesmos anos com o crescimento de movimentos sociais como as organizações de moradores,
organizações ecológicas e de consumidores, nos Estados Unidos, Europa e América-Latina.
Governos, orientados por diferentes concepções políticas incentivaram a criação de
distintas propostas de participação. As políticas conservadoras viam os participantes como
consumidores, tinham o objetivo de promover a privatização, portanto, promoviam a
participação do consumidor individual, desconsiderando a importância das lideranças das
entidades que representam os interesses de diversos setores sociais. Os governos social-
democratas enfatizam a necessidade de reforma das organizações públicas a partir de
estratégias não centradas no mercado; propõem aumentar as oportunidades para que cidadãos
ou usuários expressem suas opiniões, ampliando os direitos dos participantes em manifestar
oposição e propor alternativas.
No setor saúde os mecanismos participatórios associam-se à remodelação das
instituições públicas, como a participação da comunidade no processo de desenvolvimento,
estimulado por agências internacionais a exemplo do Banco Mundial, durante a década de 70.
A consolidação de políticas que promovem a participação popular aconteceu a partir
da Declaração dos Cuidados Primários de Saúde da UNICEF/OMS, resultante da Conferência
de Alma-Ata. Esta recomendava que mediante a implementação de políticas de cuidados
primários de saúde, deveriam ser estimulados o autocuidado e a autonomia das comunidades,
no sentido de responsabilizarem-se pela sua própria saúde.
Ao final dos anos 70 e meados dos anos 80, o agravamento da crise econômica e a
ascensão ao poder de políticas conservadoras em países centrais como Estados Unidos,
Alemanha e Grã-Bretanha, determinam mudanças políticas estruturais, que consideram
secundária a questão da participação. Esta torna-se apenas um instrumento para a redução de
custos e para o crescimento das ações autônomas autofinanciadas pelas populações locais. O
interesse das agências internacionais constituía-se no ajustamento estrutural das economias
dos países em desenvolvimento através de políticas que visavam reduzir o tamanho do
aparelho estatal.
A atenção primária à saúde não contradiz a orientação das agências internacionais,
uma vez que valoriza a participação, utilizando-a para priorizar o uso racional de recursos
escassos. A ênfase seria dada à aplicação de tecnologias simplificadas através de um sistema
de saúde hierarquizado que cobriria toda a população. Contrariando de certa forma a proposta
da Conferência, a atenção primária pode tornar-se apenas numa via para racionalizar a
utilização de recursos financeiros, atingindo seletivamente os pobres, denuncia Cortes (1996).
36
Contudo, a autora concorda que a estratégia da atenção básica tenha contribuído para que a
idéia da participação popular fosse inserida na agenda do setor saúde.
Sabendo-se que o que determina a criação de mecanismos participatórios
institucionalizados – como conselhos do SUS – é a própria dinâmica das instituições
políticas e sociais, influenciadas pelas crises institucionais das democracias liberais, podemos
avaliar esses mecanismos no setor saúde brasileiro, na década de 80, como decorrentes da
reforma deste setor, acrescidas pelo processo de reformas do sistema político brasileiro, após
longos anos de ditadura militar. Observa-se então que a participação popular configurou-se
em dever constitucional, a partir da Constituição de 1988, que instituiu o Sistema Único de
Saúde com novas iniciativas institucionais, legais e comunitárias. A lei 8.142 definiu alguns
fóruns para o exercício do controle social, as conferências e os conselhos de saúde, a serem
efetivados nas três esferas do governo. O controle social do sistema de saúde é um princípio e
uma garantia constitucional, regulamentada na Lei Orgânica de Saúde (Dominguez, 1998). É
conveniente ressaltar que a participação comunitária na gestão e controle do sistema de saúde
está prevista na NOB/96.
Cortes (1996) continua salientando que os conselhos de saúde do SUS têm maior
semelhança com os mecanismos participatórios criados pelas democracias liberais durante a
década de 70 (nos Estados Unidos e Grã-Bretanha), do que com experiências participatórias
inspiradas na estratégia de cuidados primários de saúde, propostos pelas Conferência de
Alma-Ata.
Mesmo com a implementação do processo de municipalização, durante os anos
noventa, constata-se que a consolidação formal do controle dos usuários sobre a gestão de
serviços de saúde em nosso país, ainda não se transformou em realidade.
Acreditamos que com a reorganização do setor saúde, através do PSF, a participação
popular venha a se constituir num processo organizador da política de saúde brasileira, uma
vez que características intrínsecas à proposta do PSF facilitam o surgimento de um novo tipo
de aliança na política de saúde. Profissionais de saúde, comunidade e gestores locais devem
criar maneiras de construir juntos, melhorias das condições de saúde do município. Neste
sentido torna-se importante evidenciar a participação comunitária através do controle social.
Este é essencial na construção do SUS, exigindo a participação dos diferentes segmentos
sociais, a partir de representações legítimas e organizadas. As ações desenvolvidas pelo PSF
devem seguir as diretrizes estabelecidas pela legislação, no que se refere à participação
popular.
37
Hoje, os profissionais de saúde têm o dever de facilitar e estimular a população a
exercer o seu direito de participar da definição, execução, acompanhamento e fiscalização das
políticas públicas.
A gestão participativa deve ser estendida às unidades de saúde da família, no sentido
de valorizar o trabalhador de saúde e de garantir o acesso da população a um serviço de
qualidade. Esses elementos são fundamentais ao resgate da cidadania e só através de um
efetivo controle social atingirão seus objetivos.
Daí a importância das equipes de saúde da família incentivarem e apoiarem a criação
dos conselhos gestores de unidades de saúde da família que terão o papel de consolidar e
permitir que as premissas da gestão participativa sejam efetivamente cumpridas.
A supervisão deve assumir um papel catalisador entre as equipes e a comunidade no
sentido de incentivar a gestão participativa e assim permitir o desenvolvimento do controle
social e a construção da cidadania.
38
CAPÍTULO II
A SUPERVISÃO: SUPER-VISÃO OU COM-VISÃO?
2.1 – O Conceito: Evolução e Contextualização Histórica
Num momento de reorientação do SUS, em que a diretriz de descentralização é
privilegiada e a participação comunitária associada ao controle social são estratégias
fundamentais de mudança, impõe-se adequar os procedimentos de supervisão dos serviços de
saúde a essa mudança.
Nunes & Barreto (1999b:6) sugerem que “para operar qualquer modelo de supervisão
em instituição de saúde, deve-se resgatar elementos do contexto, políticas de gestão de
governo para o setor e elementos teóricos que reflitam a proposta gerencial à qual estará
submetida”.
Com o propósito de melhor entender as organizações de saúde e as conseqüentes
características que a supervisão foi assumindo nessas organizações, acreditamos ser
necessário examinar as diferentes escolas da teoria geral da administração, uma vez que as
questões referentes à administração em saúde tendem a ser tratadas com base em princípios de
administração, ainda que adaptadas a situações específicas.
Partindo-se do princípio de que a administração é condicionada por interesses e forças
sociais presentes numa determinada situação histórica, e que a administração em saúde segue
esta mesma lógica, para que a supervisão seja compreendida em seu real significado, a análise
dos elementos relacionados à administração e ao serviço de saúde, deve ser feita em íntima
relação com o exame da maneira como a sociedade está organizada, levando-se em
consideração as forças econômicas, políticas e sociais aí presentes (Peres, 1986).
A teoria clássica da administração teve sua sistematização no início do século XX com
a investigação dos aspectos formais de organização. Suas contribuições podem ser
desdobradas em duas orientações diferentes. A corrente dos atomistas e fisiologistas da
organização, desenvolvida na França (início do século XX até 1930), cujo principal
representante foi Henri Fayol e a Escola de “Administração Científica”, nos Estados Unidos
sendo seu principal expoente Frederick Taylor.
A preocupação básica da corrente dos atomistas e fisiologistas era aumentar a
eficiência da empresa através da forma e disposição dos órgãos componentes da organização e
39
das suas inter-relações estruturais. Tinha como objeto, a organização como um todo,
compreendendo sua estrutura e funcionamento. Para Fayol, citado por Peres (1986),
administrar é: prever (programas de ação), organizar, comandar, coordenar e controlar
(“vigiar para que tudo ocorra conforme as normas estabelecidas e as ordens dadas). E os
princípios gerais da administração: divisão do trabalho (especialização das funções e
separação dos poderes) autoridade (direito de mandar e no poder de fazer-se obedecer),
responsabilidade (sanção – recompensa ou penalidade que acompanha o exercício do poder),
disciplina, unidade de mando (chefe) – para garantir autoridade, disciplina e ordem) unidade
de direção (um só chefe), subordinação do interesse individual ao interesse geral,
remuneração do pessoal, centralização, hierarquia, ordem, eqüidade, estabilidade do pessoal,
iniciativa, união (idéia: a união faz a força). As organizações apresentam-se divididas em
departamentos, seguem a lógica da organização linear (exércitos e igrejas), obedecendo à
unidade única do superior sobre os subordinados (chefe capaz de fazer tudo, de saber tudo e
decidir tudo).
A tarefa da supervisão é inerente aos chefes de todos os níveis de hierarquia. A
supervisão ocorre de forma linear, envolve relação vertical entre supervisor e supervisionados
e consiste em fazer cumprir as ordens recebidas da instância superior, em fazer a “máquina”
funcionar conforme o previsto. Segundo Machado (1978), o controle é o componente
principal da supervisão enquanto os princípios desenvolvidos por Taylor orientarem a divisão
do trabalho nas unidades de produção.
A organização Taylorista reproduz-se com freqüência nas equipes de saúde, onde
existe clara divisão do trabalho, distribuídas pelas diversas categorias profissionais. Na
maioria das vezes o médico assume a função de chefe, sendo hierarquicamente superior aos
demais membros da equipe, exercendo a função de supervisor do serviço.
A tarefa de administrar pessoas, sob esta perspectiva, realiza-se de forma como se elas
fossem instrumento, coisas, ou recursos destituídos de vontade, de projeto próprio, autonomia
e capacidade crítica.
A corrente denominada “Administração Científica” tem como preocupação central
aumentar a produtividade da empresa através do aumento de eficiência no nível operacional;
para isto realizou análise do trabalho operário, propondo a organização funcional, baseada na
especialização das funções para cada tarefa. Taylor fez uma análise completa de cargos e
funções estabelecendo a divisão do trabalho e a especialização do trabalhador.
A supervisão é caracterizada como funcional, descentralizada e de modo a permitir a
máxima especialização dos operários e dos supervisores. Para Chiavenato (1976), “a
40
supervisão funcional nada mais é do que a existência de diversos supervisores, cada qual
especializado em determinada área, e com autoridade funcional (relativa somente à sua
especialidade) sobre os mesmos subordinados, sendo esta autoridade relativa, dividida e
zoneada”. Os supervisores constituem a instância intermediária entre a direção e a execução.
As equipes de saúde , organizadas por especialidades, cumprem a supervisão
funcional. Cada especialista é responsável por supervisionar aqueles profissionais que
exercem sua especialidade (a mesma do especialista). Nestas organizações ocorrem com
freqüência a formação de “mini-equipes”, isoladas umas das outras, realizando trabalho de
forma fragmentada.
Com o crescimento das indústrias e a complexidade do trabalho, a especialização é
cada vez maior, surgindo uma terceira estrutura de organização: estrutura linha-staff, que é o
resultado da fusão dos tipos de organização linear e funcional e se baseia no fato de que entre
a linha – órgãos de execução, e assessoria – e staff - órgãos de apoio e de consultoria -
existem relações de autoridade. Existe autoridade linear de um órgão ou cargo, seja de linha
ou de “staff” sobre os seus subordinados, e existe também, autoridade funcional de um órgão
ou cargo de “staff” em relação a todos os demais órgãos ou cargos da organização, que se
referem à sua especialidade.
Supervisão na organização “linha-staff” integra o órgão ou cargo de “staff”, é
considerada ajuda especializada ao nível da execução, portanto, fora da linha de mando, com
autoridade baseada no conhecimento funcional. Surge a figura do supervisor, o agente que
realiza a supervisão e outra pessoa, que não o chefe, com autoridade técnica por ele delegada.
Atua como extensão de chefia, supervisionando a execução, no que diz respeito à sua área de
especialização. O supervisor é aquele que acompanha a execução de trabalhos previamente
estabelecidos pela direção, através do planejamento – é a assistência especializada e
orientação aos níveis operacionais, no sentido de garantir a execução, respeitados os padrões
definidos. Atua como intermediário entre a direção e a execução.
As equipes de saúde, sobretudo aquelas que exercem suas funções na organização
hospitalar, seguem este modelo e utilizam o termo staff para se nomear. Nos serviços, as
equipes se organizam em torno do chefe e seu staff e como subordinados estão os residentes,
acadêmicos de medicina e outros profissionais.
O exercício de autoridade se dá, como descrito anteriormente, baseado no
conhecimento funcional. As sessões clínicas, coordenadas pelo chefe de serviço (maior
autoridade funcional), são exemplos de supervisão. Entretanto, não é o chefe que acompanha
diariamente todas as atividades das enfermarias, ele delega essa função a um assistente, que
exerce a tarefa de supervisionar os outros membros da equipe; é um intermediário entre o
41
chefe de serviço (direção) e os demais profissionais (execução). Observa-se neste caso a
supervisão nos moldes da organização linha-staff.
A Teoria das Relações Humanas, também conhecida como Escola Humanística da
Administração, desenvolveu-se nos Estados Unidos na década de 20 (século XX), tendo como
percursores Ordway Tead, Mary Follett e Chester Barnard. Seu marco inicial foram os
trabalhos de Elton Mayo, como oposição à Teoria Clássica da Administração. Estabeleceu-se
a partir do desenvolvimento da psicologia do trabalho e da aplicação da sociologia à análise
dos problemas industriais.
Os elementos emocionais passam a ser valorizados e compreendidos como fazendo
parte do processo de administração. Motivação, liderança, dinâmica de grupo, dominam o
repertório administrativo, passa-se a reconhecer não só as necessidades fisiológicas, mas
também as psicológicas e as de auto-realização dos trabalhadores Chiavenato (1976).
A partir da valorização do trabalhador preconizada por esta escola, a supervisão toma
novo contorno, deixando de ser centrada no trabalho para centrar-se no trabalhador, o controle
substituído por resultados. A supervisão passa a ser concebida como sendo um mecanismo de
comunicação, encorajamento, influenciação e persuasão, com objetivo de obter a cooperação
dos trabalhadores para se atingir a eficiência da empresa de forma harmoniosa e humana. O
supervisor é um líder formal que atua com o objetivo de garantir as condições necessárias
para o desenvolvimento do trabalho.
Muitas equipes de saúde se organizam em torno do propósito da humanização, através
do reconhecimento profissional de seus membros, da motivação para ao trabalho, da busca de
resultados satisfatórios para o paciente. Contudo é difícil afirmar que a humanização, seja
característica fundamental das equipes; ela é algo que se almeja no intuito de se realizar os
propósitos acima descritos.
A Teoria das Relações Humanas trouxe valiosas contribuições para o entendimento
das equipes de saúde, uma vez que procurou explicar processos psicológicos existentes nas
relações de trabalho.
A supervisão em saúde se ancora em alguns pressupostos advindos da referida teoria,
como a comunicação, o encorajamento e o objetivo de atingir a eficiência do serviço de forma
humanizada.
Nos anos 50, a Teoria das Relações Humanas passou a ser criticada, entrou em
declínio e deu lugar à discussões que originaram a Teoria Comportamental da Administração.
A motivação foi um dos temas centrais abordados por esta teoria, originando, novas
proposições e novos padrões de administração. Seu maior representante foi Herbert Likert,
autor Behaviorista, que estudou estilos de administração, propondo dois tipos de supervisão:
42
uma orientada para o trabalho, outra para o trabalhador. Tende a subdividir e fragmentar o
trabalho em partes, solucionar, treinar os trabalhadores e pressioná-los para a obtenção dos
níveis de produção estipulados (características da “administração científica” de Taylor); e a
segunda orientada para o empregado, dá mais ênfase aos seres humanos do que ao trabalho,
preocupando-se em manter uma equipe de trabalho atuante e participativa nas decisões. A
supervisão visa mais às metas do que aos métodos (Peres, 1986).
O autor mostra ainda, que os serviços chefiados por supervisores orientados para o
trabalho, em geral são de baixa eficiência e provocam atitudes desfavoráveis tanto com o
trabalho quanto com os supervisores.
Percebe-se a semelhança deste tipo de organização com os sistemas de saúde
verticalizados orientados para o trabalho, que têm como parâmetro de bom funcionamento a
produtividade, onde a atenção à saúde é deixada em plano secundário. Já a outra vertente,
orientada para o trabalhador valorizando sua motivação para o exercício da tarefa, está mais
próxima dos sistemas descentralizados que procuram proporcionar autonomia e criatividade
aos profissionais, possibilitando a auto realização e desenvolvimento prazeroso do trabalho.
A teoria das Relações Humanas e a Comportamentalista foram posteriormente
criticadas porque ao permitirem maior compreensão do trabalhador, aumentaram a
possibilidade de controle sobre ele.
Abordagem Estruturalista da Administração, também conhecida como estruturalismo,
marca o início da concepção de uma sociedade de organizações. Seu principal inspirador foi o
economista e sociólogo já falecido à época, Max Weber. Este se preocupou com as
organizações e sua racionalidade, isto é, com a relação dinâmica entre os meios, os recursos
utilizados e os objetivos alcançados pelas organizações. Essas idéias dão origem à teoria da
Burocracia na Administração, que propõe um modelo de organização, a burocracia. Para
Weber burocracia é um tipo de poder. Burocracia é igual a organização. É um sistema
racional no qual a divisão do trabalho se dá racionalmente com vista a fins. A ação racional
burocrática é a coerência da relação de meios e fins Tragtenberg ( apud Peres, 1986).
Segundo Weber, a Estrutura Burocrática tem características bem definidas: é uma
organização ligada por normas racionais, legais, regras, que definem as relações de mando e
subordinação; se baseia em uma sistemática divisão do trabalho onde os papéis
administrativos são especializados e diferenciados e as atividades distribuídas de acordo com
os objetivos a serem alcançados, de forma impessoal (a obediência prestada pelo subordinado
é também, impessoal); estabelece os cargos segundo princípio hierárquico, cada cargo inferior
está sob o controle e supervisão de um posto superior; fixa regras e normas técnicas para o
43
desempenho de cada cargo; se caracteriza pela profissionalização dos seus participantes Peres
(1986).
A tarefa da supervisão – verificar o cumprimento de normas técnicas e regras
estabelecidas pela organização – é inerente à hierarquia da autoridade. Quem tem “posição
superior” tem obrigação de verificar a realização de quem exerce “posição inferior”. Nas
organizações começa-se a observar tendências à criação de serviços especializados de
controle, que se constituirão, ao longo do tempo, na própria supervisão. Cria-se o cargo de
supervisor, que não é o chefe, mas profissional qualificado, especialista e encarregado de
suprir a tarefa da autoridade hierárquica, é o elemento de ligação entre a autoridade superior e
o nível de execução. Sua função é fazer cumprir as regras e normas técnicas definidas pela
organização.
A teoria estruturalista da administração é um desdobramento da teoria da burocracia e
uma aproximação da teoria das relações humanas. Os autores desta escola, Victor Thompson,
Jean Viet e outros, discutiram o dilema da organização, ou seja, as tensões inevitáveis, que
podem ser reduzidas, mas não eliminadas, entre as necessidades da organização e as
necessidades de seu pessoal, entre a racionalidade e a irracionalidade; entre a disciplina e a
autonomia. Viet (apud Peres, 1986) conceitua estruturalismo como “um método analítico e
comparativo que estuda os elementos ou fenômenos com relação a uma totalidade,
salientando o seu valor de posição”.
O estruturalismo possibilitou a integração de conceitos clássicos e humanísticos, à
visão crítica do modelo burocrático e seu desenvolvimento teórico, avançando em direção à
abordagem de sistemas. Contribuiu também, a partir do exame crítico das teorias descritas
anteriormente, para a elucidação de aspectos da supervisão.
Os princípios nos quais o estruturalismo se baseia – sistemática divisão do trabalho,
sua racionalidade burocrática e hierarquização das tarefas – permeiam as organizações de
saúde e possivelmente tiveram peso no aparecimento das especialidades e subespecialidades
médicas e da supervisão clínica especializada.
A abordagem sistêmica da organização discute a noção de sistema aplicada às
organizações. Sistema “é um conjunto de unidades ou objetos, entre os quais existem
relações” (Bertalanffy, 1977). Os sistemas são classificados em físicos, biológicos e sociais;
podem ser fechados ou abertos; naturais ou artificiais; compõem-se de partes (imput, output,
through-put, feedback), são organizados segundo uma lógica hierárquica (ecossistema,
metassistema, sistema, sub-sistema) e têm mecanismos de controle internos que explicam seu
funcionamento (homeostase, entropia, entropia negativa, comunicação, meio-ambiente). Não
é objetivo do presente trabalho, aprofundar o estudo dos sistemas, desenvolvendo os conceitos
44
acima descritos, mas contar com a contribuição desta teoria para enriquecer a discussão a
respeito da supervisão, buscando a compreensão da mesma.
A organização, na perspectiva sistêmica, é concebida como um todo integrado, onde
cada sistema e subsistema estão associados com a operação total. O sistema se organiza para
cumprir uma determinada tarefa.
A aplicação do conceito de sistema à organização apresenta vantagens, a saber:
descentralização na tomada de decisões, utilização mais eficiente dos recursos alocados a cada
projeto individual e facilidade na contabilização que permite medir a eficiência de cada
sistema operativo individual (Peres, 1986).
Um aspecto evidenciado na administração de sistemas refere-se às relações indivíduo-
organização. A organização é considerada como uma estrutura de papéis, ou ainda como um
conjunto de papéis ou de grupos que se superpõem, cada um formado por pessoas que têm
determinadas expectativas quanto a um determinado indivíduo. Entendendo papel como o
“conjunto de atividades solicitadas de um indivíduo que ocupa uma determinada posição em
uma organização”, Katz (apud Peres, 1986), considera que o conceito de conjunto de papéis é
mais importante do que o de grupo, pois não são consideradas as pessoas no sentido absoluto,
que estão interligadas, mas sim pessoas desempenhando determinados papéis dentro da
organização. Nesta perspectiva o conjunto é encarado como conflitos de papéis e não conflito
de pessoas, e a organização é vista como um conjunto de comportamentos inter-relacionados,
onde os papéis que os indivíduos desempenham têm mais ênfase do que as próprias pessoas.
A organização enquanto sistema aberto traz nova concepção de funcionamento do
sistema que é a ênfase em programas (projetos) que trazem estruturas inovadoras como baixo
nível de formalização, multiplicidade de comando, comunicação horizontal.
Nesta estrutura a supervisão se dá no nível de cada projeto. O controle exercido pela
supervisão, como nos modelos tradicionais, passa a ser substituído pela supervisão por
resultados, mantendo-se entretanto com características de controle, mas agora, direcionado
para o resultado do projeto como um todo.
É importante ressaltar que os participantes, em função de terem visão global do
processo de trabalho e estarem implicados no mesmo, acabam por controlá-lo de tal forma
que o processo passa a ser caracterizado por um auto-controle progressivo, dispensando-se a
necessidade de supervisão próxima, mas demandando esforços interdisciplinares para o
cumprimento dos objetivos do projeto. Nesta perspectiva a supervisão atua como mecanismo
de envio de informações que assegurem aos participantes do projeto, adquirirem
conhecimentos necessários ao funcionamento deste. Impõem-se pontuar a importância que
toma a informática atualmente, como mediadora destas relações e como veículo
45
potencializador das comunicações, propiciando maior eficiência e velocidade na transmissão
de informações.
A atual organização sanitária brasileira assemelha-se à teoria sistêmica. O Sistema
Único de Saúde segue princípios preconizados por esta teoria tais como descentralização na
tomada de decisões, ênfase em projetos, multiplicidade de comandos, comunicação
horizontal, entre outros.
O PSF, constituindo-se num programa implementado pelo SUS, encaixa-se nesta
lógica. As equipes que o compõe se organizam em torno dos papéis9 exercidos por cada
profissional. Na teoria sistêmica, constata-se que a supervisão guarda ainda características de
controle, mas com a diferença que este é direcionado para o projeto como um todo. A
supervisão no PSF, objeto deste estudo, será melhor compreendida no caminhar da presente
investigação.
Após contribuições da teoria sistêmica à administração, os teóricos modernos vêm
formulando estruturas organizacionais mais flexíveis, adaptáveis e ajustáveis a mutações
rápidas. Preocupam-se em obter maior eficiência no alcance dos resultados e têm como meta
a relevância social de seus objetivos.
Peres (1986) mostra que o comportamento organizacional deve ser o reflexo de uma
conjugação de esforços para que os objetivos individuais possam ser continuamente
reconciliados com os objetivos organizacionais através da criação de um ciclo motivacional.
A supervisão necessita se adequar a esta organização no intuito de contribuir para a efetivação
dos resultados que as organizações se propõem a alcançar.
Ao se examinar as estruturas organizacionais, e seus possíveis desdobramentos para a
área da saúde, constata-se que os estilos administrativos variam desde o controle total do
trabalhador através da supervisão permanente e direta, até a estilos participativos que se
assemelham à co-gestão10. Fica claro que o processo de trabalho é determinante do tipo de
supervisão realizada, entretanto, seja nas estruturas mais rígidas ou nas mais flexíveis, insere-
se sempre no âmbito do controle da produção.
Peres (1986) ressalta, ainda, a presença do componente pedagógico educativo da
supervisão nas estruturas organizacionais, uma vez que é tarefa da mesma “ensinar” ao
trabalhador a execução do trabalho conforme regras e normas teóricas definidas pela alta
administração.
9 No sentido proposto por Katz (apud Peres, 1986), descrito na página 44. 10 Quando a formulação, seleção e direção de atividades e tarefas de uma organização, com o fim de execução dos seus planos operatórios, têm a participação efetiva de mais de um de seus membros Cunha (1997).
46
Ao mesmo tempo que a supervisão adquire particularidades de cada tipo de estrutura
organizacional, apresenta-se como uma constante, tanto no seu correspondente de
controle (aspecto gerencial), como no seu aspecto educativo através da educação em serviço
ou educação permanente destacando-se seu componente pedagógico.
Silva (1981) conclui de forma concisa: a função supervisora resolve-se a partir das
relações entre o homem e o trabalho. Originada da dicotomia entre as etapas de concepção e
de execução do trabalho para realizar o controle sobre o processo, a supervisão delineia-se
como uma função técnica que se realiza coerente aos interesses capitalistas. Ainda segundo
Silva, essa seria a própria natureza da gerência, o antagonismo entre os que executam o
processo e os que se beneficiam dele.
Consultar quadro I (anexos).
2.2 – Organização Sanitária Brasileira e Supervisão
Como vimos anteriormente, a supervisão assumiu variadas características ao longo do
tempo, de acordo com o contexto social e político-institucional no qual estivesse inserida.
Nunes & Barreto (1999b) apresentam sinteticamente a evolução da supervisão na organização
sanitária brasileira.
A década de 20 marcou a reorganização dos serviços de saúde pública no país, através
da reforma Carlos Chagas, que criou o Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP).
Baseou-se na centralização normativa e na descentralização executiva, com a introdução de
uma disciplina e um padrão de qualidade, que inseriam o treinamento e a supervisão de
pessoal como uma preocupação permanente, no sentido da racionalização assistencial.
Apesar da descentralização executiva, o estabelecimento das unidades especializadas
torna a supervisão próxima do modelo funcional Taylorista, sendo o especialista, dominante
do ato supervisor.
Ao final deste período e início dos anos 30, o Brasil atravessou um novo passo
descentralizador. Mantendo os princípios básicos do momento anterior, a estrutura
organizacional dos serviços se complexifica, com a criação da rede de centros de saúde (órgão
coordenador dos serviços de higiene) na cidade do Rio de Janeiro.
O controle da execução obriga a prática da supervisão (do serviço) como uma extensão
da capacidade gerencial, acompanhando a atividade finalística em relação ao planejamento e
corrigindo eventuais desvios. Há convivência com a supervisão especializada, que possuía a
“autoridade de linha”. A estrutura organizacional se torna mais complexa,
departamentalizando-se, tanto vertical como horizontalmente.
47
A burocratização avança e pela necessidade de racionalização, obriga o processo
supervisor a realizar-se de maneira funcional, enfatizando métodos, técnicas e processos,
diminuindo a eficácia dos serviços.
A partir da década de 40 o DNSP passa por nova reforma, conduzida por Barros
Barreto, com a introdução da “linha staff” (especialista do Estado Maior) em vários órgãos
periféricos, além do nível central. Destaca-se a questão da coordenação das atividades para
que as unidades descentralizadas se ordenem, visando à unidade de ação que permite atingir a
meta comum.
O supervisor, por delegação da administração, passa a precisar conhecer em detalhes a
estrutura organizacional, utilizando, para a missão de controle, as normas e instruções de
serviços.
Aos poucos a atividade vai incorporando profissionais não médicos e auxiliares de
baixa qualificação, que passam a exigir treinamento e supervisão contínuos. Assim esta vai
ganhando espaço na organização de saúde.
A criação dos Serviços Especializados de Saúde Pública (SESP), dentro do esforço de
guerra (II Guerra Mundial), amplia a burocratização, e a criação do Ministério da Saúde na
década de 50, concorre para reprodução ao nível de estados e de municípios da mesma
estrutura.
A partir dos anos 60, a Reunião de Punta del Este, em 1961, e a adoção do Método
Cendes/Ops, a programação com a eleição de prioridades baseadas na relação custo -
benefício, desdobram-se na III Conferência Nacional de Saúde em fortalecimento da relação
superior - subordinado na supervisão, exercida por pessoal específico, responsável pelo
controle da execução dos aspectos definidos previamente pela linha de mando e pelo preparo
técnico dos recursos humanos.
O aperfeiçoamento burocrático introduz o planejamento em saúde e, a partir do
Decreto Lei 200/67, a década de 70 traz um novo processo descentralizador, em que os
objetivos passam a condicionar as regras, métodos e normas de administração.
A criação do Sistema Nacional de Saúde em 1975 propiciou a formulação de
programas de saúde verticalizados, definidos centralmente e voltados à população assistida.
Introduz, assim, todo o aparato planejador e o conjunto atualizado da racionalidade
administrativa, enfatizando a centralização do poder.
Aos poucos, num contexto de expansão e modernização do Sistema, modelos
alternativos são implementados, como o Programa de Interiorização das Ações de Saúde e
Saneamento (PIASS) e o II Programa Nacional de Alimentação e Nutrição, destacando a
48
participação comunitária. Ao mesmo tempo, a exigência de preparo de recursos humanos
propicia a implantação do Programa de Preparação Estratégica do Pessoal de Saúde
(PPREPS).
A supervisão passa a ser orientada pelos Programas com a definição prévia de
objetivos, em que a visão do conjunto deve servir à identificação da parte desarmônica,
buscando o seu ajustamento. A concepção do processo supervisor passa a ser o de um
subsistema, em interação com a Direção, com os órgãos administrativos e técnico -
normativos, com conhecimento dos Programas e normas, e próximo do nível operacional.
Deve, igualmente, adaptar-se à segmentação do trabalho entre o nível mais qualificado e o
auxiliar, na perspectiva de representar um instrumento de gerência responsável pela educação
do trabalhador e pelo controle do conjunto do trabalho.
O aspecto educativo é ressaltado, atenuando o caráter fiscalizador, de modo a que o
controle como eixo do processo tenha como instrumentos a educação e o apoio, muitas vezes
confundidos com a persuasão e a adesão.
A supervisão passa de especializada à programática; a eficiência da técnica voltada à
eficácia do programa. A multidisciplinaridade é discutida, de modo a assegurar a articulação
das práticas no interior do processo de trabalho.
O fato dos supervisores não integrarem a linha de comando favorece o
desenvolvimento de uma prática mais próxima entre o supervisor e o supervisionado, ficando
o primeiro entre duas expectativas contraditórias, o controle do processo de trabalho pela
gerência e a maior participação no processo de decisão pelo nível de execução.
A expressão desse conflito é a realização de discussões sobre o perfil do supervisor,
focalizada em aspectos comportamentais e a eles atribuindo a responsabilidade pelos
problemas enfrentados no desenvolvimento da atividade.
Os serviços básicos vão ganhando espaço, em julho de 1978, o Ministério da Saúde
cria uma portaria, que estabelece diretrizes para execução desses serviços, definindo normais
operacionais que incluem as atribuições devidas aos níveis elementar e primário. Ainda neste
mesmo ano, a Conferência de Alma-Ata, sobre Cuidados Primários de Saúde, determina que
os representantes dos governos países-membros da OMS assumam o compromisso de adotar
estratégias nacionais que proporcionem “saúde para todos no ano 2000”, mediante
incorporação dos cuidados primários de saúde aos seus planos nacionais, com participação
comunitária. Na Conferência discute-se também que “a supervisão deveria ser dotada de
dupla conotação: controle administrativo e orientação e apoio técnico”. Esse documento
também advertiu que a descentralização do sistema de saúde deveria ser acompanhada de
49
responsabilidade, elegendo o controle como “instrumento de ajuste entre o funcionamento dos
serviços, a política e a estratégia nacional” OMS-UNICEF (Nunes & Barreto, 1999b).
Num contexto de reforma do setor saúde, nos anos 80, a teoria e a prática da
supervisão foram bastante discutidas. Renovou-se o debate em torno da questão da
“supervisão especializada11 ou polivalente”12, enfatizando a dualidade: controle (em suas
várias expressões) e processo pedagógico (com suas múltiplas concepções).
Depois de inúmeras experiências modernizadoras como o PREV-SAÚDE e o
CONASP, nesta mesma década, verifica-se que a prática institucional da supervisão está
vinculada à organização em que opera, incorporando pressupostos e linguagem
administrativa. Nunes & Barreto (1999b:17), acrescentam que “a prática da supervisão tem
em si o caráter contraditório da cobrança, do controle e da colaboração, aliado à dimensão
pedagógica que pode contribuir para o crescimento das equipes supervisionadas”.
Com a implantação do SUS em 1988, acelera-se o processo de descentralização e
novas mudanças percorrem a década de 90. Mudanças no processo condutor do Ministério da
Saúde, reorientação das Secretarias de Saúde e processo de municipalização.
Com a promulgação em 1990, da Lei Orgânica da Saúde, a municipalização torna-se a
nova forma de gerenciamento público. O município transforma-se em espaço privilegiado,
assumindo o papel de prestador de serviços e gestor do sistema local de saúde. É o espaço em
que as pessoas vivem e exercem seus direitos; segundo Mendes (1993:116) é o “microespaço
social do exercício cotidiano de construção da democracia e, portanto, de criação de
cidadania”. Neste cenário se dá a implantação do PSF.
A descentralização visa criar as bases para uma maior autonomia local no uso de
recursos e na implementação de políticas (Hortale,1997). É um processo de transformação
que envolve redistribuição de poder e de recursos, redefinição de papéis das três esferas de
governo, reorganização institucional, reformulação de práticas, estabelecimento de novas
relações entre os níveis de governo e controle social (Brasil, 1993:11).
Discussões realizadas durante o Seminário Internacional de Supervisão no Peru em
1980, mostraram que a descentralização é um processo no qual a distância entre as funções
de mando e as de execução pode ser diminuída, o que contribui para que a supervisão tenha
seus conteúdos e procedimentos estabelecidos e modificados, numa interação constante com o
nível operativo e a partir de anseios expressos pela própria comunidade OPS (1980).
11 Supervisão de natureza restrita, limitada às atividades específicas de um serviço. Ministério da Saúde (1983). 12 Supervisão de natureza ampla, realizada por um supervisor ou uma equipe, na qual são enfocados aspectos gerais da programação, não se atendo a uma área específica. Ministério da Saúde (1983).
50
Assim entende-se que a supervisão precisa ser redefinida de maneira a contemplar a
reorganização do setor saúde, devendo acompanhar as perspectivas atuais de gestão
descentralizada. Estas apontam para a reformulação das relações de trabalho, devido à
valorização das equipes de saúde, sua relação com os usuários dos serviços e a maior
participação destes no sentido de explicitarem suas necessidades não satisfeitas e aprenderem
a se colocar como cidadãos. A descentralização oportuniza a sensibilização da população a
respeito de seus direitos de saúde, cria espaços de autonomia e participação, mudando o papel
do Estado perante a sociedade.
O setor educação pode contribuir para que sejam pensadas as práticas da supervisão
numa perspectiva das características contemporâneas das organizações de saúde.
Abdalla (1999:190) discutindo a supervisão na educação, aponta para a supervisão
como um “poder-fazer” transparente, em direção a uma prática social transformadora. Fala da
dimensão educativa da supervisão reafirmando seu sentido participativo e dinamizador de
momentos emancipatórios. Introduz a questão do perfil do supervisor, afirmando que este é
um agente de produção do conhecimento e “é a partir da realidade concreta que se pode
definir o agente/sujeito/supervisor e seu modo-de-ser, que se constrói no conjunto das práticas
sociais, e não a partir de modelos e idéias de um discurso”, e continua: “é preciso que o
supervisor tome consciência de seu papel de sujeito nesse processo de supervisão”.
A consultoria, “processo baseado na interrelação pessoal criativa, na comunicação
aberta, na relação de confiança e respeito mútuos e na perspectiva de resolução de problemas”
como mostra Luck (2000:47), merece atenção neste estudo, uma vez que constitui-se numa
estratégia de acompanhamento de serviços educacionais e de saúde. Podendo ser considerada
uma forma não diretiva de supervisão, que estimula a reflexão e o desenvolvimento da crítica,
contribuirá para esta análise.
A complexidade da organização do trabalho em saúde, especialmente no PSF,
associadas à multiplicidade de olhares e concepções sobre a supervisão, levam à necessidade
de questionamento e reflexão no sentido de se definir um modelo (de supervisão) que
articule estes aspectos, contextualizando-os aos processos gestores do momento atual.
2.3 – A Supervisão no PSF
Saúde da família é uma concepção de atenção focalizada na promoção da qualidade
de vida, prioriza o enfoque de promoção da saúde em substituição ao enfoque do atendimento
curativo e tem como objetivo trabalhar práticas de saúde que gerem integração entre as ações
individuais e coletivas. O desenvolvimento destas práticas obrigam que os profissionais
51
envolvidos nas mesmas, tenham visão integral do sujeito, da família e da comunidade,
estabelecendo assim novas relações entre estes atores.
As equipes de saúde da família devem estar habilitadas a desenvolverem suas práticas
de maneira eficaz e resolutiva. Para tal, a estratégia da educação permanente, constituí-se num
processo importante de formação e atualização dos profissionais, incentivando a reflexão
crítica sobre as práticas das equipes.
Como explicitado acima, a reorganização de prática de saúde requer capacitação de
recursos humanos. O profissional da equipe de saúde da família, segundo normas do
Ministério da Saúde, precisa ser capaz de atuar com criatividade e senso crítico, mediante
uma prática humanizada, competente que envolve ações de promoção, prevenção,
recuperação e reabilitação. Um profissional capacitado para planejar, organizar, desenvolver e
avaliar ações que respondam às necessidades da comunidade, articulando os diversos setores
envolvidos na Promoção da Saúde.
No entanto têm sido constatadas algumas dificuldades inerentes ao processo de
trabalho das equipes de Saúde da Família, principalmente as ligadas às relações interpessoais
e aquelas relacionadas ao enfrentamento dos problemas vivenciados no cotidiano das
comunidades.
Muito se discute sobre a formação do profissional de Saúde da Família, em algumas
equipes evidencia-se a presença de profissionais que não se adequam às exigências do PSF. A
educação permanente é estratégia evidente de formação destes profissionais porque aponta
para o processo de trabalho como eixo do processo educativo, como fonte de conhecimento e
objeto de transformação; mudança de consciência de uma visão restrita à cura, biologicista e
individual para uma visão integral do processo de trabalho em serviços, ligados à promoção
da saúde; e enfatiza participação coletiva (Motta, 1998).
E a supervisão? Qual seria o papel da supervisão no PSF? Como esta se articularia à
educação permanente? Como se imbricam os aspectos pedagógicos na supervisão?
Quando analisada dentro de um contexto amplo, como parte integrante do sistema de
saúde, a supervisão apresenta-se como elemento viabilizador da política de saúde, na medida
em que repassa conceitos, redefine procedimentos, dá mobilidade entre os vários níveis do
sistema e orienta a execução dos serviços. Embora instrumentalize-se a partir de conteúdos
técnico-administrativos , definidos em consonância com os objetivos da política de saúde, a
supervisão deve rever tais conteúdos a partir das necessidades reais, face ao caráter dinâmico
da realidade de saúde enquanto parte da estrutura social e política. A supervisão assume uma
dimensão política na medida em que interpreta os interesses dos níveis periféricos,
52
procurando reforçar o processo de descentralização. Nesta concepção, a principal função do
supervisor é a de servir à periferia do sistema, através dos instrumentos de educação OPS
(Organização Panamericana de Saúde,1980).
Assim devem estar presentes na supervisão os seguintes elementos: atuação política
em benefício da concretização do processo de descentralização; conhecimento da realidade de
saúde, a partir de seus determinantes sócio-político-econômicos; e da interação contínua com
o pessoal de execução (equipes básicas de saúde, no caso do PSF) e com a comunidade.
Documento do Ministério da Saúde (1980:5) ressalta que o propósito da supervisão é
elevar o padrão de qualidade dos serviços prestados, para proporcionar melhores níveis de
saúde ao indivíduo, à família e à comunidade, visando a eficiência e eficácia dos programas.
Frente a estas posições, é o momento de pensar na supervisão e suas singularidades no
Programa de Saúde da Família. Encontra-se nas idéias que se seguem, um caminho possível
para tal.
Quando denomino este capítulo Supervisão: Super-Visão ou Com-Visão, é com
objetivo de discutir o processo de supervisão de maneira abrangente, global e consistente
explorando o caminho da participação, como alternativa à supervisão enquanto processo
unilateral, superior e onipotente, de uma super-visão,13 visão acima, verdade única. Como
apontam Nunes & Barreto (1999b) supervisionar significa “visão sobre” o objeto do trabalho
realizado por outro. Convisionar (termo cunhado Roberto Nogueira e utilizado por Nunes),
estabelece uma relação entre parceiros, identificando práticas e instrumentos de atuação
conjunta sobre o objeto de trabalho.
Esse debate conta mais de duas décadas, quando já se discutia este tema no nível do
Ministério da Saúde, distinguindo-se a supervisão tradicional da supervisão moderna. A
tradicional tem características de fiscalização, inspeção e controle policial; limita-se a apontar
erros, aplicar sanções ou fazer críticas destrutivas; é eventual e sem planejamento, imposta e
autoritária; a função de supervisor é um posto de prestígio e está a cargo de uma só pessoa;
atua de modo igual para todos, não oportunizando o desenvolvimento individual e nem
profissional dos supervisionados; atua com visitas e entrevistas. Já a supervisão moderna,
associa controle e educação; age com o objetivo de diagnosticar e buscar, junto com o
supervisionado, a solução de problemas; é sistemática, planejada e aceita como necessária
pelos supervisionados; é exercida por uma equipe, tem características de cooperação e é
essencialmente realizada com o trabalho coletivo; adapta-se às diferenças individuais,
13 O termo “supervisão” se origina das palavras latinas super que significa sobre e vídeo que eqüivale a eu vejo. O emprego literal destes termos levou a que sejam interpretados como inspeção, porém de sua evolução resultou uma nova concepção, Ministério da Saúde (1980), a qual será discutida neste capítulo.
53
promovendo o desenvolvimento individual e profissional dos supervisionados; atua a partir de
várias atividades MS (Ministério da Saúde, 1980:4).
Um paralelo pode ser feito entre a supervisão tradicional que se caracteriza como
Super-Visão, que define, comanda, impõem e estabelece uma relação assimétrica entre o
supervisor e o supervisionado; e a supervisão moderna que expressa características da Com-
Visão, se utilizando das contribuições que a dimensão pedagógica pode lhe conferir; reflexão,
análise de “situações-problemas”, troca de experiências, numa perspectiva de cooperação,
parceria e participação. Estabelece-se uma relação simétrica onde supervisor e supervisionado
“co-laboram” para que juntos possam enfrentar as solicitações do serviço, os problemas
existentes, os entraves no trabalho causados pelas dificuldades interpessoais bem como as
limitações individuais de cada membro que participa do processo supervisor. A primeira faz
parte de um modelo de gestão vertical (cobrança/auditoria), enquanto a segunda de gestão
colaborativa (construção conjunta). As ordens e determinações dão lugar a uma solução
compartilhada.
Qual o modelo que se adequa mais ao PSF? A supervisão deve ser técnica ou
administrativa? Controladora ou compartilhada? No lugar de supervisão ter-se-ia uma prática
convisionada na qual se compartilhariam dúvidas, estratégias e soluções para problemas que
envolvem equipes parceirizadas , como sugerem Nunes & Barreto (1999b)?
Referindo-me a estes mesmos autores, que chamam atenção para o conceito de
alienação, “abro um parênteses” para refletir sobre esta e sua contribuição para o
entendimento do processo de supervisão.
Para Dantas (1988) a divisão extrema do trabalho, implantado pelo modo de produção
capitalista, impede que o trabalhador esteja em contato com o produto concreto de sua
atividade. Este processo de quantificação e abstração não se restringindo apenas às fábricas,
tomou a esfera social fazendo com que as pessoas não mantenham “relações concretas com
coisa alguma”.
O trabalho alienado, apresenta uma forma ativa, traduzindo-se no imperativo de
trabalhar e uma vertente passiva, que se caracteriza na educação como convencimento para
aceitação desta necessidade. O trabalho aliena quando produz valor de troca, e na medida que
se complexifica, transforma o próprio homem em uma mercadoria que passa a possuir valor
para o outro, através de mecanismos da sociedade moderna, como salário. O avanço
tecnológico responsável pelo aumento acelerado da mecanização, da rotinização e da
padronização, contribui para a coisificação do homem. A sociedade de consumo cria novas
necessidades impondo a este homem possuir ( mesmo aquilo que não deseja usar). É o que se
54
chama de alienação pelo consumo, que culmina na alienação das forças sociais se
expressando nas ações dos governos exercidos por leis não controladas pelo indivíduo.
Por outro lado, como bem mostram Nunes & Barreto (1999b), existem expressões não
alienantes na sociedade, que acontecem quando o homem busca sua totalidade – relação entre
ele e seu mundo. Os mesmos autores mostram que este processo é possível a partir de uma
reeducação coletiva que se contraponha à massificação capitalista. A prática da participação é
um exemplo do processo de reeducação e aponta para noção de que todos podem exercer
alguma influência política. É nesta perspectiva que se constitui a prática do planejamento
participativo. Este é considerado a partir de três momentos: “a tomada de consciência crítica
sobre a origem da desigualdade social, o auto-enfrentamento dos conflitos e a competente
organização política” (Nunes & Barreto, 1999b:13). O planejamento participativo representa
uma metodologia coletiva e co-responsável de decisões, processo de gestão fundamental
priorizado pelo PSF.
Assim como deve se estruturar a supervisão para que seja coerente com o PSF, com a
nova maneira de planejar e agir em saúde?
Tentando refletir sobre esta questão e outras referenciadas anteriormente, empenhamo-
nos em desenvolver a idéia de supervisão que permita aos atores envolvidos, suplantar a
alienação e atingindo a conscientização, possam se envolver no processo de trabalho, no
processo de supervisão compartilhada, ou melhor, no processo de convisão. Modelo
alternativo de supervisão que privilegia a criatividade, a integração e, “o diálogo, para o
crescimento mútuo, onde a assimetria de conhecimento entre as partes (supervisores e
supervisionados), não deveria inibir a relação de ensino-aprendizagem que se estabelece entre
ambas” (Nunes & Barreto, 1999b:27).
Para tal fomos buscar em Paulo Freire a fundamentação pedagógica necessária para o
entendimento da convisão. Este denuncia o que chamou de “educação bancária, ato de
depositar, de transferir, de transmitir valores e conhecimentos ao educando. A educação se
torna um ato de depositar, em que os educandos são os depositários e o educador é o
depositante” (Freire, 1978:67).
O autor, faz a distinção entre concepção bancária da educação, cuja ênfase está na
permanência do conhecimento e a concepção problematizadora que reforça a mudança, na
qual “educadores e educandos se fazem sujeitos do seu processo, superando o intelectualismo
alienante, superando o autoritarismo do educador ‘bancário’ e superando também a falsa
consciência do mundo” (Freire,1978:86).
55
A prática problematizadora se dá através do diálogo, da comunicação, “a educação
autêntica não se faz de A para B ou de A sobre B, mas de A com B, mediatizadas pelo
mundo” Freire (1978:98), resultando na humanização.
Podemos pensar na convisão a partir do pensamento deste autor, como estratégia de
gerenciamento do PSF, visando à sustentabilidade e ao desenvolvimento do programa.
Numa avaliação entre os planos gerencial e pedagógico, Campos (1998) sugere a
integração de produtividade e compromisso e, ao mesmo tempo, a construção de uma
“máquina organizacional” que seja terapêutica e pedagógica para os atores envolvidos,
permitindo um crescimento pessoal e coletivo de forma contínua e progressiva, produtora de
saúde, o que vem ao encontro da proposta de supervisão, sob o ponto de vista da convisão.
2.4 – A Supervisão do PSF de Teresópolis
Vemos que a complexidade do programa exige a compreensão, por parte do
supervisor, de diversos aspectos: interesses e visões sobre modelos de saúde, especialmente
do PSF; visões da equipe a respeito do processo do adoecer; compreensão da dinâmica:
equipe, comunidade e suas relações interpessoais; inserção do interno de medicina e dos
estagiários de enfermagem, ainda não formados segundo uma perspectiva integral de saúde;
inserção do agente comunitário na equipe; relação entre coordenação do programa /
supervisão / equipe; supervisões técnicas específicas e a relação entre os supervisores.
Tarefa nada fácil a do supervisor no PSF. É necessário que investiguemos esta rede de
ações, reações, conflitos, dificuldades, para ampliar a efetividade da supervisão das ações de
saúde e do programa como um todo.
De acordo com documento oficial do Programa de Saúde da Família de Teresópolis a
supervisão deste tem como objetivo geral, dar suporte técnico às equipes do PSF/PACS com a
finalidade de garantir que a implantação e manutenção do programa se faça integralmente,
através de educação continuada e permanente. Como objetivos específicos, os que se seguem:
possibilitar o aperfeiçoamento profissional e a educação continuada e permanente das
equipes; participar no processo de criação de vínculos de responsabilidade com a população
assistida; possibilitar às equipes garantias de desenvolvimento de um trabalho consistente e
pautado nos princípios, seja da ética profissional, seja da ética pessoal; proporcionar às
equipes meios para utilização dos recursos técnicos disponíveis, de modo a racionalizar essa
utilização; contribuir para a capacitação de recursos humanos, através da integração com as
instituições de ensino; co-responsabilizar-se pela equipe de saúde, estando nela incluídos
56
todos os elementos, inclusive os acadêmicos das instituições de ensino superior; contribuir
para as necessidades mais imediatas, bem como garantir a formação profissional para o
aprimoramento e melhoria da capacidade resolutiva das equipes de saúde; sistematizar as
necessidades de informação e capacitação permanente das equipes; dar apoio à coordenação
do programa a fim de garantir as mudanças propostas do modelo de atenção à saúde.
Para que a supervisão seja operacionalizada, o supervisor deve: proceder a visitas
semanais às unidades do PSF/PACS conforme programação mensal; avaliar assiduidade,
pontualidade, compromisso e co-responsabilidade das equipes em relação ao trabalho
desenvolvido; participar das reuniões de supervisores e das reuniões de equipe quando
solicitado ou houver interesse do supervisor; propor temas de interesse às equipes para
comporem o processo de educação continuada e permanente; propor ações capazes de dar
suporte e apoio às equipes; indicar novos modelos de avaliação às equipes e ao trabalho
proposto; preencher com clareza o documento de supervisão, remetendo-os à coordenação;
criticar e avaliar as ações propostas pela coordenação.
A supervisão do PSF de Teresópolis conta com nove supervisores, e se organizou da
seguinte forma nos primeiros dezoito meses de funcionamento: visitas regulares às 9 unidades
de saúde da família, através de rodízio entre os supervisores, com o objetivo de observar as
atividades e fazer contato com as equipes. As visitas são realizadas também em resposta à
demanda destas unidades, quando a equipe requisita a supervisão dos “supervisores
especialistas”14 – clínica médica, pediatria, gineco-obstetrícia, psicologia, nutrição e
enfermagem. Durante a fase de implantação contou-se com a permanência de um supervisor
durante dois meses em uma só unidade, acompanhando todas as ações de saúde da mesma.
Acontecem supervisões às unidades fora do município de Teresópolis, com o objetivo tanto
de acompanhamento do programa e avaliação das tarefas propostas (rotina da unidade, ações
comunitárias), quanto em resposta à necessidades específicas. São realizadas reuniões
semanais da equipe de supervisão com a coordenação, momento no qual são expostos
problemas, dificuldades, necessidades, resoluções, propostas. Essas situações vividas durante
a semana, pelos supervisores, são levadas ao conhecimento da coordenação do PSF, com o
intuito de refletir sobre, ou buscar possíveis soluções e/ou encaminhamentos.
As principais dificuldades detectadas pelos supervisores a partir dos relatórios que os
mesmos realizam da supervisão, se caracterizam de duas maneiras: administrativas
(organização da unidade – arquivo, horário e atividades que operacionalizam o programa –
grupos, visitas domiciliares, organização dos agentes de saúde) e interpessoais (relação
14 Estes supervisores também realizam supervisões polivalentes.
57
equipe-paciente-família, equipe entre si, equipe-supervisão, agentes de saúde-comunidade-
equipe).
Após 8 meses de implantação do programa constatou-se a necessidade de uma
presença mais constante do supervisor nas unidades para acompanhamento das atividades:
rotina diária, realização de grupos, visitas domiciliares, ações comunitárias. Uma demanda
considerável se deu em relação às interações pessoais entre os membros das equipes
(considerando período de implantação), o que constitui num dos principais entraves à
realização de um trabalho efetivo. Uma equipe que não consegue ultrapassar seus conflitos
enquanto equipe, não atinge seus objetivos, no nosso caso, o atendimento em atenção básica.
Considerando a supervisão um processo amplo, complexo, educativo e contínuo; que
inclui, exame, avaliação, assessoria, informação e intercâmbio dinâmico de conhecimentos e
experiências; tarefa que envolve a intersubjetividade e portanto, diferentes formas de
perceber, sentir, reagir e interpretar situações; acreditamos que a investigação da mesma possa
contribuir para o entendimento dos processos de gestão, levando a um melhor
equacionamento do programa, possibilitando a mudança do modelo de atenção à saúde,
proposto pelo SUS.
A supervisão é uma via de mão dupla, na qual transitam idéias, concepções,
dificuldades, tanto dos supervisores quanto dos supervisionados. “Desbravar” esses caminhos
é poder trilhar com mais segurança e firmeza na estrada da implantação e implementação do
PSF.
Conhecer a prática da supervisão do PSF de Teresópolis, nos seus primeiros dezoito
meses de atividades, é poder refletir, perceber pontos positivos e negativos, fazer mudanças.
É, principalmente para nós, equipe de supervisores, poder nos auto questionar, questionar
nosso fazer e pensar que haverá sempre o que aprimorar, pessoal e profissionalmente.
58
CAPÍTULO III
METODOLOGIA
3.1– Método e Estratégia da Pesquisa
A pesquisa de natureza qualitativa, tomou como princípio metodológico o estudo de
caso, uma vez que analisou uma unidade específica – o PSF de Teresópolis, focalizando a
supervisão.
O estudo de caso analisa detalhadamente o passado e/ou o presente, e as intenções
sociais de uma unidade social: um indivíduo, grupo, instituição ou comunidade.
O estudo de caso foi escolhido como estratégia para esta pesquisa, porque examina um
conjunto de relações nas quais intervêm diversas variáveis. É uma estratégia em que o
pesquisador trabalha uma unidade de análise.
Contandriopoulos et al. (1999) mostram que a observação do caso se faz pelo seu
interior e que o potencial explicativo desta estratégia é resultado da profundidade da análise
do caso, que pretende descrever e explicar de maneira global, a dinâmica de uma organização
ou o funcionamento de um programa.
Triviños (1987) chama atenção para o fato de que nesta estratégia se observa uma
unidade em sua evolução e suas relações estruturais fundamentais sem serem estabelecidas, a
priori, hipóteses ou esquemas de inquisição.
A escolha do PSF-Teresópolis, como estudo de caso, deveu-se não apenas ao fato da
pesquisadora integrar a equipe de supervisão do mesmo, mas também para cumprir o objetivo
de, conhecendo de maneira pormenorizada este processo, contribuir para o seu
aprimoramento.
O estudo pretendeu levantar idéias, reflexões e soluções, no sentido de sugerir
possíveis ações transformadoras de situações vigentes, a partir de um melhor desempenho da
supervisão.
Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas, sob uma orientação etnográfica, com
base em Ludke(1986), centrada na linguagem dos profissionais que atuam no PSF,
supervisores e supervisionados (roteiro em anexo). A orientação etnográfica tenta entender
não só como os indivíduos vêem, descrevem, definem e dão sentido às diferentes situações,
como também que métodos utilizam na realização de ações cotidianas como, comunicar-se,
59
tomar decisões e raciocinar. A etnografia leva-nos a procurar compreender o “vivido” tal
como ele se apresenta na sua “vivência”, permitindo assim, a participação da pesquisadora no
trabalho de campo com a utilização das próprias experiências no estudo.
A investigação sobre a supervisão foi realizada, mediante a análise do discurso dos
informantes. Definiram-se quatro variáveis de estudo, a saber:
1) Padrão da Supervisão. Esta variável foi analisada através das características das
supervisões realizadas, das situações nas quais foram solicitadas, da identificação dos
componentes que os entrevistados consideram prioritários na supervisão, e da descrição das
atividades da mesma, necessárias para alcançar os objetivos do PSF;
2) Processo de Supervisão. Estudado a partir da ótica dos entrevistados, desde a
implantação do programa em agosto de 1999, até o momento da realização das entrevistas em
outubro e novembro de 2000, foram discutidas as questões da evolução do processo neste
período e sua avaliação; o que é uma supervisão de qualidade, aspectos positivos e negativos
desta, o que poderia ser modificado na mesma e ainda se responde à mudança no modelo de
atenção à saúde proposto pelo PSF;
3) Fatores Subjetivos Envolvidos na Supervisão. Para esta análise foram utilizadas
as entrevistas em todo o seu conteúdo, e dados como a disponibilidade dos entrevistados para
concederem-na, seus comportamentos durante a realização das mesmas, observações de
situações surgidas no momento da pesquisa e no dia-a-dia do trabalho nas Unidades;
4) Perfil do Supervisor. Na tentativa de se “traçar” um perfil do supervisor e
especificamente de um supervisor do PSF, foram abordadas questões a respeito da postura
desejável desse, que habilidades e atributos ele deve possuir e que estratégias podem ser
utilizadas para promover estas habilidades e atributos, e ainda como se percebem exercendo
esta função.
3.2 – Grupo de Informantes
A supervisão no PSF não é uma determinação do Ministério da Saúde. Por isso, na
maioria dos municípios brasileiros que aderiram ao mesmo, esta não se constitui como
instrumento de gerência do programa. No Estado do Rio de Janeiro, os municípios do Rio de
Janeiro, Niterói e Teresópolis têm uma equipe de supervisão para acompanhar as atividades
do PSF.
60
A proposta da pesquisa - objetivos, procedimentos e resultados esperados - foi exposta
pela pesquisadora numa reunião, onde estavam presentes a equipe de supervisores, a
coordenação do programa e a maioria dos componentes das equipes, que constituem o quadro
das 9 Unidades do PSF de Teresópolis. Uma delas, com implantação recente, não fez parte do
estudo.
Foram realizadas entrevistas com 5 supervisores técnicos do PSF de Teresópolis: 2
enfermeiras, uma delas acumulando a função de supervisão com a de coordenação do
programa, uma nutricionista, uma pediatra e uma psicóloga. E também com os membros das
equipes de saúde – supervisionados: 6 médicos, 4 enfermeiras, 1 auxiliar de enfermagem e 3
agentes comunitários de saúde, totalizando-se 19 entrevistas.
3.3 – Métodos de Coleta de Material
Os métodos utilizados neste estudo foram de 3 tipos: documental, observação (livre e
participante) e informações fornecidas pelos atores (supervisores e supervisionados) através
de entrevistas dirigidas, semi-estruturadas.
Para o primeiro foram pesquisados documentos escritos que se constituem nos
relatórios oficiais de supervisão e atas das reuniões de supervisores. Além disso, foram
pesquisados registros de arquivo, regulamentos, pareceres, decretos, diretrizes, propostas e
resoluções.
A observação participante, método de coleta de informações considerado essencial
para a operacionalização desta estratégia metodológica - estudo de caso - utiliza como
instrumento registros do diário de campo, permite recorrer aos conhecimentos e experiências
pessoais do pesquisador como auxiliares no processo de compreensão, descrição e análise do
estudo. Este método possibilitou a identificação dos fatores objetivos e subjetivos do processo
da supervisão.
Foram também realizadas observações livres das ações desenvolvidas, afim de se
conhecer com mais detalhes as circunstâncias nas quais estas acontecem, propiciando
identificar componentes objetivos e subjetivos intrínsecos à dinâmica das ações, enriquecendo
a análise do processo de supervisão.
As entrevistas semi-estruturadas (roteiros em anexo) com os supervisores tiveram o
objetivo de compreender como estes se vêem como supervisores, como concebem o processo
61
de supervisão. As entrevistas com os membros das equipes tiveram o intuito de compreender
como vivenciam o papel de supervisionados e como percebem a supervisão. Estas entrevistas
oferecem amplo campo de interrogativas e propiciam novos questionamentos à medida que se
recebe a resposta dos informantes. Permite a interação do entrevistador com o entrevistado,
sendo possível captar atitudes e reações destes.
Segundo Zimmerman (apud Coulon, 1995:90), “para se situar na posição de um
indivíduo da coletividade, o pesquisador necessita levar em conta suas próprias implicações
na estratégia de pesquisa (...), adquirir ‘uma visão íntima de um mundo social particular’(...),
com o intuito de compartilhar com os membros da pesquisa uma linguagem comum, para
evitar os erros na interpretação”. Além disso, ele apresenta o termo “tracking”, que Coulon
(1995:91) propõe que se traduza como “espreita”, um dos traços da observação participante,
utilizado no estudo, em função da familiarização com o grupo de informantes: o que “consiste
em observar o maior número de situações possíveis no decorrer da pesquisa de campo. Pela
“espreita”, o pesquisador tenta ver aquilo que o sujeito vê (...) “espreita” etnográfica é uma
solução para o problema da posição do observador face à diversidade dos comportamentos
sociais(...).”
Foram observados, também, os sinais não-verbais (gestos e expressões) – “atenção
flutuante” (Thiollent, 1988), na tentativa de captar sinalizações de insegurança, de hesitações
ou de quaisquer outras manifestações.
As entrevistas semi-estruturadas, cujo roteiro foi elaborado a partir das contribuições
teóricas referenciadas (bibliografia) e de situações percebidas pela pesquisadora como
merecedoras de maior entendimento, facilitou a interação desta com os entrevistados, fato
relevante, já que o objeto da pesquisa está sendo colocado em discussão com os sujeitos
envolvidos.
Foi utilizada a técnica de triangulação, que permitiu grande amplitude na descrição,
explicação e compreensão do objeto de estudo, e possibilitou o cruzamento de múltiplos
pontos de vista. Essa técnica aborda os processos centrados no sujeito (informantes, suas
percepções, comportamentos e ações), os elementos produzidos pelo meio (resultados da
supervisão observados através dos documentos, e atas de reuniões), e o contexto sócio-
econômico e cultural no qual acontecem estas interações (relações estabelecidas a partir do
modo capitalista de produção).
62
3.4 – Análise do Material
A análise estruturou-se a partir da triangulação das informações: análise dos
documentos, estabelecimento de uma correlação com as falas dos entrevistados, e
contextualização sócio-econômica e cultural.
As entrevistas foram analisadas a partir de várias escutas (fitas) e das leituras das
transcrições destas, com os seguintes objetivos: voltar a atenção ao entrevistado, para
perceber suas reações em relação ao entrevistador e ao tema proposto, para encontrar uma
ordenação entre o discurso dos entrevistados e o tema da pesquisa; e para poder comparar-se
esses discursos buscando-se pontos convergentes e divergentes e uma forma de articulá-los ao
objeto.
A análise das entrevistas permitiu observar as atitudes, valores, crenças e tendências
em relação ao objeto, podendo assim, categorizar os aspectos convergentes e divergentes do
estudo.
A análise do discurso das respostas às perguntas e solicitações da entrevista seguiu um
modelo de interpretação do discurso inspirado na etnometodologia de Coulon (1995), que se
caracteriza por refinar as categorias analíticas na interação com os dados, na impregnação
progressiva do pesquisador pela forma e pelos conteúdos do discurso, retardando de propósito
a interpretação, deixando para um segundo momento o papel da inferência, que muitas vezes
é precipitado.
Buscou-se captar as diversas camadas de sentido, sem deixar de interpretar como os
informantes, compreendem, vêem, descrevem e propõem em conjunto uma determinada
situação. Essas camadas foram captadas e organizadas a partir do levantamento dos diversos
sentidos explicitados, para posterior hierarquização e normalização dos mesmos, ou seja,
buscar a convergência entre eles.
Portanto, em um primeiro momento, a hierarquização e a categorização, foram feitas
de forma horizontal, isto é, para cada pergunta existente na entrevista, foram hierarquizadas as
respostas de todos os informantes. Em um segundo momento, analisou-se separadamente, de
forma vertical, o discurso de cada informante, em relação ao grupo de perguntas
correspondentes à variável a ser analisada, para a partir daí, identificar as divergências e as
convergências existentes, com o objetivo de proporcionar a completude do presente estudo.
63
CAPÍTULO IV
ANÁLISE E DISCUSSÃO DA PESQUISA
A análise foi realizada a partir das quatro variáveis já definidas na metodologia:
padrão da supervisão, processo de supervisão, fatores subjetivos envolvidos na supervisão e
no perfil do supervisor. Essa análise foi feita sob o ponto de vista dos supervisionados e dos
supervisores.
4.1 – Padrão da Supervisão
• Supervisores
Para os supervisores entrevistados, a supervisão técnica-operacional e o trabalho de
integração das equipes são considerados como padrão de supervisão.
“Eu acho importante a gente ter primeiramente a garantia de um técnico-operacional funcionando adequadamente, mas não se limita a isso, devemos também estar observando o funcionamento da Unidade (...) Eu acho que isso tudo são componentes que a gente acaba priorizando e querendo acompanhar (...)” “(...) uma das coisas que eu acho que é fundamental é que o supervisor possa estar dentro do seu trabalho orientando as equipes e também dentro dessas equipes, um cuidado de integrar. Um suporte técnico, um suporte afetivo (...) no sentido que ele possa integrar (...)”
As supervisões técnico-operacionais são entendidas como um conjunto no qual estão
incluídas a supervisão geral (polivalente) e a supervisão específica. Na visão dos informantes,
a supervisão geral deve estar sempre presente, acompanhando as ações de saúde; participando
do planejamento das atividades da Unidade e da avaliação dos resultados das mesmas. Assim,
o supervisor deve orientar todo o funcionamento do Programa de Saúde da Família, como
pode-se constatar nas seguintes falas:
64
“(...) é um trabalho que a gente trabalha com a organização do serviço, com o planejamento das ações e com a avaliação dos resultados. O supervisor é aquele que trabalha em várias questões, que podem ser técnico-operacionais, administrativas, na verdade questões gerais da Unidade.” “Eu acho que a supervisão é essencial em todos os trabalhos. (...) eu acho que ela tem que estar presente em tudo.”
“Quando entro na Unidade do PSF, eu procuro ver todos os problemas existentes ali e tentar solucionar o que puder ser solucionado”.
A supervisão específica (especializada) é vista como aquela que está diretamente
relacionada a uma demanda clínica circunscrita, pontual, ou seja, de pediatria, clínica médica,
nutrição, psicologia, ginecologia, enfermagem. A fala dos informantes abaixo expressa esta
idéia:
“A supervisão da área de enfermagem se volta especificamente para a enfermagem, uma questão técnica-operacional.” “A supervisão na parte de psicologia tem uma característica específica, eu acho que o que sustenta a supervisão em psicologia é você ter o conhecimento técnico-operacional específico da sua área, da proposta do modelo do PSF que é a humanização, o vínculo e as relações interpessoais.”
A integração das equipes é considerada, por todos os supervisores, uma meta
importante da supervisão, uma vez que divergências, competições, conflitos, confusão de
papéis, não coesão. São freqüentemente observados por eles durante o funcionamento do
trabalho das equipes. O que se pode constatar na fala de um dos informantes:
“A grande dificuldade hoje das equipes é conseguir trabalhar de uma forma coesa, integrada, e até pelos diferentes tipos de personalidade (...).”
Percebendo a necessidade de se trabalhar essas dificuldades e tentando promover a
integração das equipes, os supervisores entendem que a supervisão deve ter a função de:
“Trabalhar buscando uma proposta de humanização. O grande entrave do PSF são as relações interpessoais. Temos que trabalhar a questão dos vínculos o tempo todo”.
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“Integrar, gerando espaço para discutir e solucionar possíveis conflitos internos da equipe”.
A supervisão técnico-pedagógica, observada como uma outra característica da variável
padrão, também foi relatada pela maioria dos entrevistados. Ela foi observada em decorrência
da inserção dos internos de medicina nas Unidades do PSF, ou seja, é a supervisão
direcionada a estes internos.
Outra característica ainda inserida na variável padrão da supervisão, citada pelos
entrevistados, é a que cumpre funções relacionadas ao setor administrativo burocrático, no
qual são orientados aspectos da organização de arquivos (pastas das famílias), estatísticas com
notificações dos indicadores de saúde (SIAB).
Para que se alcance os objetivos do PSF, os supervisores apontam como tarefas da
supervisão: o acompanhamento das atividades técnicas e burocráticas, orientação técnico-
pedagógica aos internos, apoio às atividades de grupos, ações de saúde na comunidade,
atividades integradas com o conselho gestor, acompanhamento aos agentes de saúde, atenção
às equipes.
Analisando de forma geral as entrevistas, verifica-se que todos os informantes
consideram que é papel do supervisor, estimular o planejamento das ações nas Unidades, bem
como a avaliação das atividades supracitadas, no sentido de orientação e suporte, nunca com
caráter punitivo e de fiscalização.
Os entrevistados apontam ainda como responsabilidade do supervisor, trabalhar no
sentido de garantir a melhoria da qualidade dos serviços, mediante um processo educativo
continuado e permanente, comprometido com a saúde da população.
• Supervisionados
Os médicos tanto requisitam as supervisões técnicas, como avaliam esta atividade
(supervisão) como decorrente da necessidade técnica.
Supõe-se que o médico que escolheu exercer uma função no PSF, esteja atento à
questões intrínsecas a este modelo, e incluem nos seus pedidos de supervisão: “supervisões
pedagógicas” (palestras), orientações na organização institucional em função à ideologia do
PSF (consultas e atendimentos em grupo), relação do médico com a comunidade, orientações
em situações familiares específicas (gravidez na adolescência, alcoolismo e drogas,
violência), trabalhos de educação e saúde, questões de referência/contra-referência na rede do
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SUS. E como os supervisores relataram, os supervisionados médicos também apontam para
necessidade de uma intervenção da supervisão diretamente nas equipes, no sentido de
trabalhar questões ligadas a condutas profissionais, questões de diferenças interpessoais, “para
harmonizar a equipe”.
“A supervisão deve ter o poder de mudar a forma de funcionamento da equipe. Eu acho que quem está de fora tem uma visão muito privilegiada das coisas, quem está dentro, às vezes está errando ou sendo insuficiente, sem se perceber disso”.
As supervisões são requisitadas também para o acompanhamento dos internos, já que
estes desempenham suas atividades nas Unidades sob a orientação dos médicos.
Sugerem que a supervisão proporcione um monitoramento dos casos através da
discussão de casos clínicos, e que esta possa acompanhar todas as atividades da Unidade.
A equipe de supervisão deve funcionar como elo de ligação entre as equipes de Saúde
da Família, entre estas e a Coordenação do Programa e também com a Secretaria de Saúde.
A questão do controle também está presente:
“Vejo a supervisão como aliada. Eu acho que não deve haver supervisão do tipo controle, eu acho que isso prejudica”.
A enfermagem sentiu maior necessidade das supervisões nas questões administrativas
na fase de implantação do programa. Hoje, esta necessidade se direciona para a relação da
equipe com a comunidade, pois há que ter um tempo para que esta (comunidade) seja
sensibilizada para a proposta do PSF. As supervisões técnicas são mais requisitadas para as
áreas de ginecologia e pediatria. A supervisão é solicitada com freqüência para atender à
demanda de “apoio emocional aos membros das equipes”.
“A gente fica ansiosa para resolver as coisas... a supervisão tira um pouquinho nossa ansiedade”.
Para esse profissional, a atividade de supervisão não deve ser realizada, sob a forma de
controle, mas sim, de acompanhamento, de orientação, de ajuda e de apoio.
“Acredito que praticamente ninguém queira ser vigiado, controlado,... a gente teve que ter um acompanhamento, até para não cometer erros. E para a supervisão que está fora e está vendo toda a
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problemática, e às vezes sabe até mais coisas do que a gente, em relação à reclamação de alguém, tem que orientar mesmo”.
Na ocasião em que foram realizadas as entrevistas, a supervisão atuava pouco
direcionada aos auxiliares de enfermagem. A categoria solicita, no momento da entrevista,
maior atuação da supervisão.
“A supervisão tem que se dar mais aos profissionais de saúde... eles ficam isolados parecem que têm outro status, estão lá em cima, estão longe do alcance, não chegam junto. Eu acho que eles tinham que estar ligados, unidos para isso funcionar”.
A supervisão das atividades diárias dos agentes comunitários de saúde é função da
equipe de enfermagem, contudo a equipe de supervisão é consultada em situações familiares
delicadas (homossexualismo, violência), para acompanhamento de casos junto com a equipe e
dificuldades de relacionamento entre os próprios agentes.
Os agentes requisitam maior participação no dia-a-dia de seu trabalho, nas visitas
domiciliares, para orientação, esclarecimento e apoio.
“A supervisão clareia nossa limitação”.
“Mais do que fiscalização, participação, aliança e união. A supervisão não vem só para ver se nós estamos assinando o ponto, mas para participar. Mas acho também que se não tiver supervisão, nada funciona. A gente tem que ter uma pressãozinha para as coisas funcionarem”.
Nesta última fala percebe-se claramente o caráter contraditório entre a cobrança e o
controle e a colaboração e o suporte que se inserem na supervisão.
4.2 – Processo de Supervisão
O processo de supervisão foi analisado desde a implantação do programa (agosto
1999) até o momento da realização das entrevistas, em outubro e novembro de 2000. Foram
vistas as questões da evolução do processo neste período e sua avaliação; o que é uma
supervisão de qualidade, aspectos positivos e negativos desta, o que poderia ser modificado e
ainda se esta responde à mudança no modelo de atenção à saúde proposto pelo PSF.
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• Supervisores
Na fala dos supervisores, a realização da supervisão, durante a fase de implantação do
programa, foi tarefa pouco clara tanto para a própria equipe de supervisão, quanto para os
supervisionados. A principal confusão se deu entre as supervisões técnicas, gerais e
específicas. Após esse período, as supervisões, embora requisitadas em função de uma
demanda específica, tinham caráter geral, ou seja, uma vez satisfeita a demanda técnica
específica, outras situações da Unidade, poderiam ser trabalhadas com aquele mesmo
supervisor.
As visitas da supervisão às Unidades, podem acontecer com ou sem solicitação das
equipes. A realização de visitas sem solicitação, são freqüentemente sentidas pelos seus
componentes, como de fiscalização. Atualmente, elas ainda ocorrem, com o sentido de
acompanhamento e pelo que parece não têm sido interpretadas assim, provavelmente devido
à maior segurança na realização de sua tarefa, do ponto de vista das equipes, e ainda, pelo
amadurecimento das relações entre as equipes de supervisão e as de supervisionados.
“Muitas equipes vêem o supervisor como um fiscal. No início isso foi motivo de muita controvérsia, as equipes ficam muito com “o pé atrás”, as equipes se sentiam acuadas cada vez que o supervisor vinha(...). Um ponto positivo que teve no período de um ano e pouco do PSF, é que as equipes passaram a ver o supervisor como uma ajuda, como um apoio para elas e não como um fiscal.”
Provavelmente no início, os supervisores podem ter-se sentido inseguros, com
dúvidas, pois, tanto quanto para os membros das equipes, este trabalho era novo para eles.
Quem sabe, sem se darem conta mantiveram uma postura de fiscais como uma forma de
defesa?
Em um período subseqüente, mas ainda de implantação do programa, as supervisões
sofreram modificações. Cada Unidade contava com a presença de um supervisor durante um
mês, pelo menos 3 vezes por semana. Esta experiência foi válida tanto para os supervisores
como para os supervisionados, porque propiciou um acompanhamento mais pormenorizado
das ações de saúde. Contudo, não foi necessário que esta forma de supervisão se alongasse
por muito tempo. As equipes ficaram mais independentes e surgiu a necessidade de se fazer
um rodízio entre os diferentes supervisores pelas Unidades. Foi decidido pela equipe de
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supervisores juntamente com a coordenação do programa, que o supervisor visitasse o número
de Unidades tantas vezes quanto possível, durante a semana.
Percebe-se pelos relatos dos supervisores que o processo de supervisão está em
construção. Eles têm procurado se aprimorar, buscando formas eficazes de gerenciamento do
programa.
“O próprio supervisor está buscando uma maneira de trabalhar a supervisão(...) eu acho que as discussões devem ser sempre assim: eu preciso melhorar o meu processo de trabalho.”
“O processo de supervisão, como é um trabalho novo, teria uma forma ideal e uma forma possível. O ideal é que a supervisão fosse contínua (...) não há tempo, a gente tenta na medida do possível, visar uma qualidade de tempo na qual vamos buscar uma resolução dentro de questões inerentes a cada equipe”.
Os pontos positivos e negativos da supervisão foram referidos da seguinte forma:
Positivos: as equipes ficam mais amparadas e seguras e há um crescimento científico e
pessoal da equipe. A própria existência da supervisão, pois na maioria dos municípios não há
esta modalidade de gerenciamento. O processo de supervisão proporciona a identificação de
problemas, o crescimento da equipe e maior resolutividade do programa.
Negativos: o fato do supervisor ser visto como fiscal e não como um elemento de
ajuda (fase inicial, implantação do programa), permanência em muitos membros das equipes,
da concepção antiga de saúde, ocorrendo um distanciamento entre equipes e paciente, pouco
investimento na qualificação do supervisor e como outro ponto negativo, seria a ausência
deste processo (supervisão) em grande parte dos municípios.
O que poderia ser modificado neste processo ? Os supervisores foram unânimes em
dizer que o processo é dinâmico e está em constante avaliação.
“É um processo muito novo, está em construção, fazemos reavaliações a todo momento”.
Os supervisores consideram a avaliação, um dos componentes da supervisão, uma vez
que, supervisão e avaliação são processos imbricados e interdependentes. Talvez por isso
contenham um aspecto persecutório, não é tarefa fácil avaliar e ser avaliado. Nesse sentido, a
questão da avaliação foi explicitada:
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“A cada visita há uma avaliação da Unidade, da equipe toda, e nós estamos sendo avaliados também, na maneira de nos comportar e na forma de solucionar os problemas, existe uma mútua avaliação”.
A avaliação é vista como processo intrínseco à supervisão, mostram os supervisores. É
necessário auto-avaliação, avaliação da equipe, avaliação do próprio processo de supervisão
quanto à sua eficácia em relação à equipe. A supervisão de qualidade é aquela na qual se
atinge resultados como transformação, mudança, boa resolução e onde há trocas de
experiência entre equipe e supervisores.
Para que a supervisão responda à mudança de modelo de atenção à saúde proposto
pelo PSF é necessário se trabalhar com planejamento, organização, avaliação e resolutividade,
e isto está sendo construído. Esta é a fala dos supervisores entrevistados.
“Acho que a supervisão tem respondido à mudança no modelo sim, pelo menos, incentiva a mudança. Contudo acredito que a supervisão hoje ainda tenha dificuldade de se fazer compreender ou de colocar em prática essa proposta. Ela ainda está buscando o caminho, e este caminho passa pela capacitação, tanto das equipes, quanto do supervisor”.
“A supervisão é um trabalho inovador, tem a proposta de ajudar a mudar o modelo assistencial. Para isso precisa ser uniformizada, ter uma compreensão ampla, abrangente e sistematizada do modelo. Isso de certa forma a gente já tem, mas tem que colocar em prática... tenho um sentimento que a supervisão tem uma teoria e uma outra prática”.
Esta fala é importante porque leva ao questionamento e à reflexão sobre este processo
que na verdade é novo, no PSF, embora tão antigo como estratégia de gestão em saúde. Traz
consigo as seguintes características que podem ser evidenciadas nas falas dos informantes: ser
dinâmico, aberto e inacabado.
• Supervisionados
A divisão da supervisão por fases foi algo que ficou bem marcado para os médicos,
também explicitado na fala dos supervisores. A seguir são descritas falas representando as
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formas como os médicos vivenciaram as fases pelas quais a supervisão passou, na tentativa de
se organizar.
“Primeiro a supervisão vinha para ver se o trabalho estava feito ou não. Chegava de supetão. Me sentia vigiada. Se já fomos selecionados para o PSF, temos o perfil do PSF, não cabe essa vigilância. Acho que a supervisão ficou muito tempo desorganizada, só ficou organizada de um tempo para cá, quando vem com dia e hora marcados”.
“No início não estava muito claro o papel do supervisor, nem para eles nem pra gente. Havia uma confusão entre ajuda e vigilância, sentia-me acuada e automaticamente havia um afastamento. Na fase de supervisão contínua, foi bom, mas acho que não foi a solução ideal porque deveria haver uma escala entre os supervisores e cada um ficar um dia em cada Unidade”.
“Vejo as decisões vindas de fora, as coisas são feitas meio à revelia, temos pouca autonomia em relação ao próprio gerenciamento da Unidade”.
Como no início a supervisão foi entendida como tendo um caráter de fiscalização,
percebe-se uma convergência entre as percepções dos supervisores (embora estes não se
considerem fiscais) e dos supervisionados, neste sentido. Mas nota-se também que quando a
supervisão assume um papel de menos fiscalização, ou pelo menos, de menos freqüência ou
posição mais flexível, surge uma reação dos supervisionados.
“A supervisão não pode ser esporádica, senão o supervisor fica com dificuldade de julgar e avaliar”.
O supervisor é concebido aqui como tendo o poder de julgamento pelo próprio
supervisionado. E ainda vai mais longe...
“a equipe deve ser avaliada de maneira periódica, tem que ser policiada. A supervisão, apesar do termo ser um pouco pesado, é uma questão de policiamento”.
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E continua.
“O supervisor, analogamente falando, tem a mesma função do técnico de futebol, tem que fazer essa orientação. Você tem que jogar mais na frente, você está retendo a bola, você tem que distribuir melhor”.
Esta fala expressa a idéia de que a supervisão deve ter um posicionamento estratégico
devendo estar sempre atenta aos movimentos da equipe.
Os registros das observações participantes das supervisões e as entrevistas
realizadas possibilitaram a constatação de que cada equipe tem uma dinâmica e
consequentemente uma demanda em relação à supervisão. Podemos começar a pensar na
supervisão como um processo geral por um lado, mas bastante individualizado e pessoal por
outro, no qual estão imbricadas características e necessidades específicas do supervisor e do
supervisionado. Essas questões serão melhor desenvolvidas na discussão sobre os fatores
subjetivos envolvidos no processo. Entretanto aspectos contraditórios que denotam as
diferentes concepções e necessidades em relação à supervisão, aparecem quando os médicos
explicitam suas visões a respeito dos pontos positivos e negativos da supervisão.
Os médicos viram como pontos positivos do processo de supervisão: a eficiência
técnica dos supervisores; a troca determinada pela coordenação, de supervisores que faltavam,
marcavam e não compareciam; o supervisor que soluciona, ensina e que ampara; a supervisão
como oportunidade de melhora na execução do trabalho; orientação em relação aos grupos
(hipertensão e puericultura) e em relação à realização de atividades na Comunidade. Os
pontos negativos vêm a seguir: a falta de presença contínua da supervisão; inicialmente, o
distanciamento entre supervisores e equipe, surgindo confronto e enfrentamento entre as
partes; existência do controle, posição de autoridade e não de ajuda, assumida pelo supervisor;
preocupação com questões objetivas (arrumação da Unidade, arquivos, macas); falta de
parceria; distanciamento da supervisão em relação às equipes; este ponto é perceptível pela
fala que se segue:
“Hoje não se policiam, não se gosta de intervir em algumas coisas para não assumir uma conduta antipática, mas em contrapartida, a postura de distanciamento já é antipática em si, quer dizer, a gente não consegue aparar as arestas”.
Complementa: “Não adianta você acionar uma psicóloga duas ou três vezes no mês para tentar discutir questões interpessoais. Eu acho
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que essa discussão tem que ser feita semanalmente com a supervisão”.
Já está se falando do que poderia ser modificado no processo de supervisão, segundo
os médicos entrevistados: a supervisão ficar mais próxima e freqüente, construindo uma
relação estreita com o supervisionado; ampliação da supervisão, mais ligação entre os
supervisores.
“Há muita coisa a ser mudada, incentivo à troca de experiência para sermos uma grande equipe do PSF de Teresópolis”.
Na fala dos médicos, delineia-se como é uma boa supervisão: aquela que fornece
suporte técnico e psicológico para as equipes; que mantém proximidade com as mesmas; que
está na posição de chefia mas se coloca como aliada; que cumpre o compromisso (dia e hora)
dando um retorno para as equipes; e que se auto-avalia constantemente tendo disponibilidade
para receber críticas.
Em relação à questão da supervisão estar respondendo à mudança no modelo de
atenção à saúde proposto pelo PSF, os médicos tiveram posições diferentes. É importante
acompanhar as falas destes profissionais.
“A supervisão não está respondendo à mudança no modelo. Eu acho que a supervisão não é compatível ideologicamente com o PSF. A visão técnica é excelente, as pessoas que compõem a supervisão são de altíssimo gabarito, mas devido ao distanciamento, acabam não se tornando compatíveis com o PSF”.
“Acho que não responde, me dá a sensação que a supervisão é mais chefia do que parceria”.
“A supervisão responde sim, ela é um fator importante nesse processo de mudança, que é um processo de mudança na consciência da população, aos poucos estamos resgatando o que se perdeu ao longo dos anos (médico de família). A supervisão é importante na implantação do PSF, porque este muitas vezes não é entendido pela população e isto causa dificuldades e frustração na equipe. Acho que é um tempo para as equipes de saúde e para a supervisão se adaptarem também ao novo modelo. Estamos engatinhando”.
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As falas apontam, mais uma vez, para o cuidado com que deve ser analisado o
processo de supervisão, uma vez que este é composto de um conjunto complexo de
necessidades, valores, ideologias, personalidades (supervisor e supervisionado) e acontece a
partir de diferentes situações e demandas.
O processo de supervisão é visto pelos enfermeiros como suporte, ou seja, deve ser
solicitada em situações novas, em situações de mudança e em impasses com a comunidade.
São divididas as opiniões no sentido da periodicidade da supervisão, supervisão regular, em
alguns dias específicos da semana, e a supervisão só mediante solicitação. A supervisão tem
como objetivo tirar dúvidas, e muitas delas são resolvidas nas reuniões de equipe, momento
de troca de experiências entre seus membros. Esses profissionais ressaltaram a importância da
avaliação periódica que a supervisão deve fazer em relação ao seu próprio funcionamento e
sistematização.
Sobre os pontos positivos foi dito que a supervisão técnica funciona bem, a equipe de
supervisão promove integração entre as equipes do PSF; valoriza o trabalho das mesmas,
motivando e estimulando a criatividade; investe no treinamento profissional, proporcionando
cursos. Os pontos negativos foram os seguintes: competição entre as equipes, de certa forma
“estimulada” pela supervisão; falta de supervisão mais contínua; em função da dificuldade de
referência / contra referência na rede e nas situações de problemas sanitários (ex.: esgoto a
céu aberto), a supervisão poderia funcionar como elo entre as Unidades e as autoridades
responsáveis, ou seja, ter papel mais ativo nas questões de intersetorialidade.
As opiniões em relação às modificações que poderiam ser feitas no processo de
supervisão, foram: realização de reuniões de equipe nas Unidades com a presença do
supervisor, uma vez que este tem a “tarefa da neutralidade”; mudança de postura profissional
dos supervisores em relação às equipes, estes devem estimular a troca de idéias e
informações, ao invés de reforçarem a competição, e devem saber respeitar a limitação do
profissional.
“A supervisão está em processo de construção, junto com o PSF, então o supervisor tem que cativar o profissional para que ele se sinta parte de uma equipe maior do PSF e não de uma equipe isolada em cada Unidade”.
Uma boa supervisão, para os enfermeiros é aquela que acompanha as atividades da
Unidade, cujo supervisor se coloca no lugar do profissional que está atuando, que promove
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integração pessoal e ajuda as equipes a crescerem. Foi evidenciado um ponto interessante, a
necessidade de “capacidade emocional do supervisor” para que a supervisão se desenvolva
com qualidade.
“Poderia haver a supervisão da supervisão. Uma supervisão mais de cunho psicológico, para conduzir essa parte de relacionamento interpessoal, porque eu acho que é a parte que mais pega”.
Também consideram que a supervisão auxilia na mudança do modelo de atenção à
saúde.
“A supervisão tem que participar deste processo de mudança da atenção básica. Não consigo enxergar o PSF sem a presença da supervisão. É um suporte imprescindível”.
A auxiliar de enfermagem entrevistada, considera que uma boa supervisão tenha que
ser:
“Um trabalho junto, supervisão com todo mundo junto, todos os profissionais do PSF, não só com médicos e enfermeiros”.
Embora ela não tenha respondido a pergunta que lhe foi feita em relação à mudança no
modelo de atenção à saúde, pode-se pensar na seguinte possibilidade: pelo fato desta
profissional não participar da supervisão não distingue situações nas quais há ou não há
interferências da mesma no processo de trabalho. Contudo é significativa sua consideração:
“A supervisão já vem junto com a mudança total, mas a supervisão é no papel e na reunião, ali no batente não está não. Até agora a supervisão não ajudou muito!”.
Os Agentes Comunitários de Saúde consideram que a equipe de supervisão deveria
estar mais próxima deles, dando esclarecimentos e trabalhando as dificuldades encontradas
junto à Comunidade. Este foi apresentado como ponto a ser modificado no processo de
supervisão. Pode-se dizer que em outro momento, contraditoriamente ,que este mesmo
aspecto foi considerado pelos próprios agentes como ponto positivo, portanto sem
necessidade de mudança.
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Consideram que a supervisão e a avaliação estão juntas e que uma boa supervisão
“vê o que está certo e o que está errado, não é aquela coisa maçante de toda hora está em cima cobrando”.
Apenas um ponto ressaltado como positivo, é a integração entre equipe, supervisores
e agentes. Segundo eles, a supervisão tem respondido à mudança no modelo, principalmente
nas relações difíceis vividas em função das reações das Comunidades, ao PSF.
“Primeiro a Comunidade estranhou o modelo, mas a parceria equipe/supervisão fez com que isso mudasse”.
4.3 – Perfil do Supervisor
Na tentativa de se “traçar” um perfil do supervisor e especificamente de um supervisor
do PSF, foram abordadas questões a respeito da postura desejável de um supervisor, que
habilidades15 e atributos16 este deve possuir e que estratégias podem ser utilizadas para
promover estas habilidades e atributos, e ainda como os supervisores se percebem exercendo
essa função.
• Supervisor, por ele mesmo
Segundo os supervisores eles têm a função de ajudar a equipe. É um profissional de
saúde que deve estar inserido ideologicamente no processo do PSF, ser responsável,
ponderado, ter conhecimento geral de questões de saúde e do modelo do PSF e específico de
sua área de atuação.
“É preciso que o supervisor tenha um perfil, que ele tenha uma ideologia, que ele acredite na mudança de paradigma da saúde, que tenha conhecimento em políticas públicas de saúde, tenha uma inserção na saúde coletiva”.
15 Segundo o Dicionário Aurélio,” que tem qualidade ou caráter de hábil, tem aptidão para algo”. 16 Segundo o Dicionário Aurélio, 'aquilo que é próprio de um ser.
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“O supervisor tem que ser responsável, tentar cumprir o horário dele (...) eu acho importantíssimo a responsabilidade e a capacidade da gente poder ajudar as equipes”.
“Eu acho que a primeira habilidade que o supervisor deve ter é o conhecimento, um conhecimento técnico-científico atualizado para que possa contribuir mesmo para essas equipes”.
Para exercer esta função, o supervisor não pode ter uma postura recriminatória e que
penaliza, jamais se colocar acima dos outros, como um Deus, tem que buscar estratégias de
“mostrar sem ofender, de corrigir suavemente as situações”; deve saber dialogar e ter bom
senso. Deve ter um olhar integrador e não fiscalizador. Estas idéias são representadas a partir
destas falas:
“Quanto à postura eu acho que o supervisor não tem que se colocar como um Deus...chegou na Unidade ele é o todo poderoso. Tem que ter uma conduta diferente(...)ele não pode chegar com intuito de punição(...)tem que ver uma estratégia de mostrar para a pessoa sem “ofender”. Essa postura é importante: de não recriminar, não penalizar e não expor o supervisionado”.
“Ele tem que ser integrador e não fiscalizador, tem que ter bom senso, conhecimento técnico da sua área e do modelo do PSF”. “A gente é visto pelo supervisionado, como uma pessoa superior e que está fiscalizando. Eu acho isso errado”.
Profissional responsável, humanizado, aberto às mudanças, sensível, cooperador,
dinâmico, criativo, com poder de improvisação, e que deve acreditar naquilo que faz. São
também características que os supervisores consideram necessárias à sua função
“Acreditar no que fazemos é um passo fundamental. A supervisão é uma tarefa muito nova e não existe uma fórmula, não existe um perfil pronto desse profissional. A gente está tentando construir um profissional com essas características. É importante estarmos abertos para a questão do aprender a aprender, estamos aprendendo a cada dia”.
As estratégias entendidas, por estes informantes, para o desenvolvimento das
características e atributos, necessários ao supervisor são: cursos de capacitação profissional,
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seminários, oficinas, trocas com outras instituições, aprendizagem em serviço e
aprimoramento da pessoa do supervisor.
Os supervisores se vêem como aprendendo a cada dia, tirando prazer de sua função,
contribuindo com as equipes e com a coordenação no sentido de promover a resolutividade
das ações e a continuidade do programa.
• Supervisor, pelos supervisionados
As capacidades esperadas pelos supervisionados - médicos do supervisor são:
capacidade técnica, capacidade de trabalhar em equipe interdisciplinar, deve ter “aptidão”
emocional para relações interpessoais, ser acessível para receber críticas e saber criticar sem
causar ressentimentos aos membros das equipes, estar aberto a receber sugestões dos
supervisionados, poder contribuir sem que haja um entrechoque entre as duas visões:
supervisor e supervisionado. O supervisor deve ser simpático, acreditar no PSF, se posicionar
de maneira “neutra” mas atuante, conhecer todo o funcionamento das Unidades, ser maleável
e dinâmico na resolução de problemas.
O supervisor deve manter uma postura de ajuda, de compreensão e também de
policiamento.
“Eu acho que o supervisor é importante na questão do policiamento, na questão do estar distante, mas ao mesmo tempo estar ciente de tudo aquilo que acontece na Unidade. Falo de policiamento dentro de um contexto positivo, não é cobrar, é policiar, no sentido de certificar de que está indo tudo bem”.
Ainda com relação à postura do supervisor foram explicitadas as opiniões de que este
não deve assumir um papel de chefe, deve colocar-se como um colega e ser transparente ao
mostrar suas posições,
“Muitas vezes o supervisor se coloca como chefe e isso não é legal. Tem que haver coleguismo, uma maneira informal de lidar uns com os outros, deve colocar as cartas na mesa, dar idéias e resolver problemas”.
Percebe-se bem a partir destas falas as imagens polares de policiamento e colaboração,
controle e apoio que a supervisão apresenta. Esta dualidade, inerente do processo de
supervisão, parece que são vistas como complementares pelos entrevistados.
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Na visão das enfermeiras, é conveniente que o supervisor seja uma pessoa flexível, e
aberta a receber opiniões, humana, democrática, sensível à realidade de cada Unidade, deve
ter habilidade técnica e de relacionamento interpessoal, deve ter respeito profissional pelos
membros das equipes, enxergando as limitações de cada profissional. O supervisor deve andar
lado a lado acompanhando o trabalho das equipes, crescendo junto e não só apontando erros.
O supervisor deve também estar sempre disponível para se reunir com a Comunidade.
Consideram que a supervisão funciona como avaliação e orientação. A enfermagem explicita
suas concepções através das falas:
“O supervisor tem que ter jogo de cintura, aliar a experiência de vida à especialidade acadêmica. Tem que ter jogo de cintura para lidar com as equipes, com pessoas de personalidades diferentes. Uns não aceitam a supervisão, outros dizem que aceitam mas não fazem o recomendado, tem os que realmente trabalham e não precisam que a supervisão fique em cima”.
“O supervisor deve ajudar as pessoas a crescerem, ele deve perceber a individualidade de cada um: daqueles que crescem sobre pressão, daqueles que crescem amparados, daqueles que crescem através de estímulos e elogios”.
A auxiliar de enfermagem explicita sua opinião, reivindicando: a supervisão deveria
ter presença mais marcante e o supervisor ser pessoa humana e mais ligada à população.
Exterioriza este pensamento:
“A supervisão (os supervisores) alterou um pouco seu comportamento. A mudança de modelo de atenção, o PSF, mudou a personalidade dos supervisores. Eles eram mais atenciosos antes da mudança. Agora há uma segregação, eles ficam mais lá em cima e a ralé lá embaixo”.
Os Agentes Comunitários de Saúde consideram que os supervisores deveriam ter o
seguinte perfil: saber dirigir, ouvir a equipe para chegarem a um consenso, trabalharem a
união e o vínculo, conhecerem melhor a Comunidade, e ter uma certa firmeza no sentido de
pressionar “um pouquinho” a equipe. Denunciam que falta um ajuste entre supervisão e
agentes.
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“O supervisor não é aquele que simplesmente puxa a orelha, e sim que puxa a orelha sabendo puxar, saber levar a conversa, para não rolar aquilo: Ih, a supervisão vem aí! Lá vem briga! Na verdade não tem que ser assim, tem que ser uma conversa. Tem que ser pressão light”.
4. 4 – Fatores Subjetivos
Este item propõe-se a identificar os fatores subjetivos que interferem não só na
supervisão, mas em todo o processo do PSF: ações de saúde, equipe, comunidade, supervisão
e coordenação. Por se acreditar que a supervisão não existe por si só, não se constitui senão
como uma conseqüência da própria existência do PSF (considera-se aqui o recorte da
supervisão no PSF e não a supervisão em saúde no seu sentido mais abrangente), julga-se
necessário examinar os aspectos subjetivos deste processo. A partir da vivência como
supervisora e da observação e intervenção em Unidades de saúde, percebe-se claramente que
o processo de supervisão, longe de ser um processo puramente objetivo que envolve apenas
questões de cumprimento de regras e normas, direcionamentos e determinações, é um
processo no qual estão incluídos aspectos subjetivos. Formas diferentes de solicitar
supervisões, de avaliar suas necessidades, de enxergar a função e a importância desta, de
conceber o papel dos supervisores e as maneiras como os supervisionados se percebem como
tal. Inúmeras percepções, sentimentos, interpretações, crenças e desejos dos supervisores e
supervisionados, reunidos e articulados fazem parte deste processo.
Não seria possível pensar-se no processo de supervisão no PSF, sem serem incluídos
tais aspectos em sua análise, para isso utilizam-se as entrevistas em todo seu conteúdo, e
dados como a disponibilidade dos entrevistados para concederem-na, seus comportamentos
durante a realização das mesmas, observações tanto de situações surgidas no momento da
pesquisa como no do dia-a-dia do trabalho nas Unidades.
• Supervisores
Na fase da implantação do programa houve uma certa indefinição do papel da
supervisão (percebida mais pelos supervisionados do que pelos supervisores). Ambos
pareciam duvidosos em relação às diferentes situações que demandavam supervisão, à
permanência do supervisor na Unidade, ao material e conteúdo da supervisão, fato explicável
se for considerada a fase de adaptação, e ajustes do programa, em processo de implantação.
Provavelmente, tais situações propiciaram o surgimento de entraves na relação
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supervisores/supervisionados. Estes vêem aqueles como fiscais, não se sentem à vontade em
pedir supervisão e acumulam problemas. Por outro lado, é também provável que os
supervisores, imbuídos desta recente tarefa, tenham se colocado, sem se darem conta, nesta
posição de fiscalização. Inicia-se o primeiro embate, um confronto entre a percepção que os
supervisionados têm dos supervisores e da função da supervisão, e a percepção dos
supervisores em relação à sua tarefa, sua posição e o que esperam dos supervisionados.
“O supervisionado vê o supervisor como um fiscal, ele tem que ver o supervisor enquanto um profissional que está ali para somar, ajudar, para interagir; como alguém que está ali para facilitar o seu trabalho”.
Os supervisores consideram como o maior entrave ao processo de supervisão, as
relações interpessoais, situações de conflito entre as categorias profissionais, a relação das
equipes com os supervisores, a própria concepção do supervisor como fiscal, são situações
provocadoras de conflitos que necessitam ser entendidas e trabalhadas, para que a supervisão
possa se desenvolver. A construção de vínculos e a conseqüente humanização do serviço, são
as principais estratégias apontadas pelos supervisores, para a estimulação deste
desenvolvimento, e se constituem num trabalho desafiador para a supervisão, confirmando
que esta vai muito além de uma atividade eminentemente técnica.
Outro aspecto retirado das falas foi a construção de uma possível relação de
dependência entre a supervisão e as equipes (percebido no período inicial, quando os
supervisores permaneciam durante um mês na mesma Unidade). Contudo, no momento em
que os supervisionados tornaram-se mais confiantes na supervisão e em seu trabalho,
tornaram-se, também, mais independentes.
“Eles esperavam da gente, que ficássemos todo o tempo ali, dando apoio. Seríamos uma bengala mesmo. Com o tempo estão vendo que podem caminhar sozinhos”.
Esta é uma contribuição importante da supervisão, criar condições junto às equipes,
para que estas ganhem autonomia, confiança, e que possam juntos, supervisor/supervisionado,
manter uma relação de troca , de construção conjunta, onde possa existir a “com-visão”,
enquanto processo participativo , interativo e democrático, não unicamente a “super-visão”,
processo fragmentado, unilateral e autoritário. Percebe-se que na supervisão convivem o super
e o com-visionar que reúnem controle e educação numa mesma ação.
82
• Supervisionados
Os médicos trazem a idéia da supervisão tanto como atividade de controle e
fiscalização como de função acolhedora e “cuidadora”. Mostram neste sentido, posições
semelhantes à dos supervisores.
“Uma vez baixou um carro cheio de supervisores, de surpresa, me senti vigiada e não ajudada. Ficamos muito tempo sem uma supervisão organizada”.
“Em outra situação, mudança de um membro da equipe, me senti cuidada pela supervisão e acho que a gente precisa de vez em quando se sentir cuidada, porque a gente está numa linha de fogo meio braba. Neste trabalho, é tudo muito novo e eu acho que é novo para todo mundo, não é só pra gente, para eles também como supervisores”.
Tanto as situações específicas da supervisão como as diferenças individuais dos
supervisores e dos supervisionados, contribuem para que os supervisionados interpretem de
maneiras diferentes a supervisão. O fato dos supervisores “aparecerem de surpresa”, pode ser
persecutório para uns e acolhedor para outros, daí a importância de serem conhecidos estes
aspectos que compõem a dimensão subjetiva do processo.
A auto avaliação está presente na fala dos médicos, que fazem um paralelo entre
onipotência e impotência, reflexão primordial para esta categoria profissional.
“O médico está mais onipotente do que nunca, é a questão da relação humana indo por água abaixo. Hoje em dia se inventa a psiquiatria biológica como se isso por si só, o nome psiquiatria biológica, já não fosse um absurdo. Psiquiatria é a área médica onde se abordam as doenças do psiquismo. O psiquismo que se estabelece a partir da relação com o outro. Então eu acho que o PSF, valoriza a questão do relacionamento humano, é onde você tem um meio propício para investir na relação, investir na relação para o indivíduo poder ter saúde. Eu acho que para um médico, estar dentro do contexto do PSF, não existe coisa melhor, temos que deixar de lado muitas vaidades”.
“A sensação de impotência vem em decorrência da dificuldade de trabalharmos as relações pessoais, de problemas sociais, de questões ligadas a saneamento. Até onde nossa responsabilidade pode ir? Até onde podemos contribuir para uma mudança social”?
83
O PSF com sua proposta de mudança do modelo de assistência à saúde, possibilita a
reflexão das pessoas envolvidas no programa, supervisores e supervisionados, fato que
possivelmente não seria observado se trabalhassem num sistema tradicional de atendimento à
saúde. É interessante a fala de um dos médicos em relação à dinâmica equipe - paciente -
supervisão.
“A equipe passa para o doente a forma de ser e de agir que a supervisão passa para a equipe. Quando a gente trata de prevenção com o doente, a gente repassa também formas de prevenção que a supervisão passará para gente. Por exemplo, a supervisão sinaliza determinados problemas para que estes não se tornem crônicos, porque a gente se depara com problemas interpessoais, a gente reprime isso, deixa para lá... Mas na verdade nunca existe deixa para lá, as coisas vão se acumulando... Este que eu acho que é o lado preventivo da supervisão, trabalhar as questões pessoais. Se a equipe estiver bem vamos passar isso para os pacientes”.
As visões vão se complementando e evidenciam quão importante é a compreensão dos
aspectos subjetivos da supervisão.
Um outro ponto ressaltado foi o de confusão entre a função pedagógica da supervisão
e o supervisor ocupando um lugar de professor.
“A supervisão reproduz a relação professor aluno. Muitas vezes me sinto aluno da supervisão e eu acho que a postura do supervisor não é essa, mas sim de orientação, estreita e próxima”.
Essa confusão de papéis, pode ser compreendida, mas não justificada, pelo fato de
alguns supervisores da equipe exercerem também a função de professores na instituição de
ensino (FESO), na qual o PSF é desenvolvido em parceria com a Prefeitura. Podemos pensar
também na possibilidade do supervisor se considerar um professor, ou ainda, considerar a
supervisão uma atividade de ensino, no sentido tradicional de reprodução social e depósito de
conteúdos no aluno, pelo professor. É visto que tanto a relação professor/aluno como a
supervisor/supervisionado pode ser unilateral ou de troca. As concepções de Paulo Freire nos
ajudam a compreender essas questões. Ele evidencia a importância da relação de troca.
Ele mostra que a aprendizagem é uma troca: quem ensina aprende, quem aprende
ensina. Ensinar não é transmitir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria
produção ou a sua construção. Ensinar não é simplesmente informar, treinar, é formar.
O educador precisa respeitar o saber do educando e ajudá-lo a transformar sua
curiosidade ingênua em curiosidade crítica.
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Ensinar é proporcionar ao educando o senso crítico indispensável para ele tornar-se
agente da sua aprendizagem e não objeto. Educar não para a sua simples adaptação à vida,
mas para sua inserção na vida, no mundo. Proporcionar ao educando uma visão de mundo em
que a História aparece como possibilidade e não como determinismo; em que o futuro não é
inexorável, mas passível de transformação, podendo ele próprio vir a ser agente desta
transformação (Freire, 1996). “O educando deve perceber-se como construtor da cultura
através de sua ação transformadora” (Faria 1987:38). Fazendo uma analogia, o
supervisionando deve perceber-se como construtor dos processos de trabalho em saúde,
através de sua ação transformadora.
A supervisão deve ser solicitada pela equipe ou oferecida pelo supervisor? Esta é uma
questão que perpassa a fala das duas equipes supervisores e supervisionados e que reflete
características muito particulares, mais uma vez, dos supervisionados e dos supervisores. Uma
equipe mais dependente considera sempre que se a supervisão “não aparece”, está
abandonando-a. Ao contrário, uma equipe mais autônoma, se a supervisão “aparece sem
aviso” vive esta situação como um controle. Há também as equipes auto-suficientes que
consideram que está sempre tudo bem, sem problemas e criam a partir desse comportamento,
uma barreira entre ela e a supervisão, muitas vezes difícil de ser transposta. Os membros da
equipe criam uma aliança tal, que um elemento externo (supervisão, no caso), é excluído. Em
contrapartida estão também os supervisores com características pessoais de flexibilidade e
rigidez, fazendo “parcerias” com as equipes. Pensa-se poder contribuir a partir do
esclarecimento destes aspectos, contudo é importante ressaltar que não se desconsideram as
questões objetivas, como responsabilidade e compromisso envolvidos do processo de
supervisão que interferem neste, de forma contínua.
Os médicos finalizam mostrando a supervisão como uma retaguarda necessária:
“A gente é soldado raso, estamos lá na batalha, diretamente com o paciente, então acho que as nossas dificuldades, as nossas angústias, nossos pedidos de socorro, são pouco ouvidos. Eu me sinto assim ainda. Vocês poderiam fazer dinâmica de grupo com as equipes, assim a gente estaria cuidando da nossa saúde mental”.
A enfermagem ressalta a necessidade da supervisão estar acompanhando as equipes,
fazendo avaliação constante, mostram a importância da troca de experiências e da coesão da
equipe. Enquanto supervisionados, consideram que estes devem estar sempre abertos às
mudanças, serem humildes, receptivos e cooperativos, enfatizam a importância da
comunicação.
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“Se não houver comunicação parece fiscalização. Nós temos que procurar ouvir o que está sendo sugerido pela supervisão”.
É importante que a supervisão tenha como objetivo, propiciar o crescimento das
equipes. A supervisão deve contribuir para que as equipes possam vencer barreiras, o
supervisor é visto como um mediador de crises e este deve reconhecer o limites das pessoas,
não fazendo comparações. O supervisor é um elemento facilitador da coesão das equipes.
A questão da coesão entre os membros das equipes deve ser vista com cautela, pois
freqüentemente aparece de forma distorcida. Coesão não é sinônimo de união, solidariedade, e
de equipe madura com possibilidades de realização das tarefas propostas, obtenção de
resultados satisfatórios e alcance de realização e prazer pessoal/profissional para seus
membros. Coesão, muitas vezes, funciona para “uso externo”. Os membros das equipes
demonstram nas suas falas coesão perante a supervisão, mas na realidade o que existem são
alianças perversas formadas entre estes, e que acabam por implodir o grupo, o que acontece
freqüentemente e percebe-se nas entrelinhas das falas dos entrevistados, através das
observações participantes e das situações vivenciadas no momento das supervisões. Os
movimentos, dinâmica, arranjos grupais, devem constituir-se em preocupação constante para
a equipe de supervisão.
Outro ponto evidenciado foi a necessidade do supervisor “cativar” o profissional que
constitui a equipe do PSF pois,
“O profissional tem medo de ser supervisionado, pensa que vai ser vigiado. Se tem supervisão é porque tem algo errado. Mas é porque pensamos na supervisão só com sentido de correção. O supervisor tem que ser o mais objetivo possível e o supervisionado deve estar aberto a todo tipo de crítica, de sugestão, porque isto faz crescer. Supervisão é troca, ninguém quer ser vigiado, quer ser amparado”.
O processo de supervisão é idealizado e investido de poder, sabedoria e possibilidade
de resolução de problemas que não correspondem à realidade. A supervisão é vista como algo
de fora, neutra, com uma visão superior, uma super visão onipotente e onipresente capaz de
solucionar desde questões técnicas, de relacionamento interpessoal até questões sociais e
comunitárias.
“A supervisão tem que estar disposta a resolver todos os problemas”.
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Talvez possa-se compreender a idealização da supervisão pelos supervisionados, a
partir da necessidade destes, de resolver todos os problemas que lhes são apresentados. Diante
desta impossibilidade, projetam na supervisão a possibilidade de resolvê-los como se esta
tivesse este poder. Como se pode observar:
“A supervisão tira um pouquinho de nossa ansiedade, a gente fica ansiosa para resolver as coisas e nem sempre a gente consegue resolver da melhor maneira possível”.
Uma visão menos rígida e idealizada da supervisão aparece também, o que vem
mostrar as diferentes formas de sentir, avaliar, viver o processo:
“Acho que a supervisão não é obrigada a saber e resolver tudo. Da mesma maneira que a gente tem dúvidas, acredito que os supervisores tenham também”.
O auxiliar de enfermagem entrevistado não se encaixa como supervisionado portanto
se sente excluído do processo. É necessário que a equipe de supervisão reflita sobre este dado.
Os agentes comunitários de saúde mostram na sua fala, satisfação em fazer parte da equipe do
PSF, sugerem supervisão mais próxima deles e maior participação nas questões da Unidade.
Estes profissionais se sentem excluídos da supervisão fato que pode ser considerado como um
“vazio”, um “buraco” no processo e que demanda avaliação cuidadosa por parte da equipe de
supervisores.
Os agentes comunitários de saúde merecem atenção especial da supervisão, pois
algumas questões os envolvem. Há uma indefinição em relação à sua identidade profissional:
são e não são profissionais de saúde. Mantêm duplo vínculo com a Comunidade, profissional
e pessoal (moram na Comunidade onde atuam, esta é a proposta). São situações que, se não
forem bem compreendidas, podem trazer complicações tanto para o desempenho no trabalho
como para os próprios agentes, pessoalmente.
“Eu tenho que braçalmente, fisicamente, mentalmente, lançar mão de todos os meus conhecimentos, das minhas forças, ir à luta e dar conta disso tudo”.
Consultar quadros II e III (anexos).
87
CAPÍTULO V
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O modelo sanitário brasileiro incorporou princípios, métodos e técnicas do modelo
administrativo, assumindo a supervisão características das diversas formas de organização. O
modelo taylorista, com a divisão do trabalho, reforçou a divisão social introduzida pelo
capitalismo. Esta situação fez com que o trabalhador sofresse um processo de alienação,
perdendo seu lugar de sujeito. Neste momento a supervisão se caracteriza como instrumento
de controle a serviço da lógica do capital. Acrescenta-se ao taylorismo, a teoria das Relações
Humanas e Comportamentalista que priorizando o entendimento das motivações
psicossociais, acabam por contribuir para que surjam novas formas de controle, mesmo que
em nome da “preocupação com o trabalhador”. A supervisão, com o objetivo de humanização
assume características de controle. A proposta de humanização acabou por fornecer
instrumentos para que o controle e o aumento da produção fossem alcançados. Com a teoria
Estruturalista, a burocracia reforçou a divisão do trabalho e do poder fazendo com que as
relações de mando e subordinação se tornassem mais marcantes; a supervisão tem a função de
fiscalizar o cumprimento de normas. Na teoria Sistêmica, há a descentralização da tomada de
decisões e a ênfase em programas, estimula o aparecimento de estruturas inovadoras que
favorecem a comunicação horizontal. A supervisão tem como alvo o projeto como um todo,
mesmo mantendo características de controle, este é direcionado para o resultado do projeto.
Os participantes, por terem visão global do projeto e estarem implicados no mesmo,
adquirem, progressivamente, a possibilidade do auto-controle, demandando menos da
supervisão. Começa a se delinear o gerenciamento de auto-gestão.
Diante desta análise, percebe-se que a supervisão, em sua essência, permanece a
mesma. Excetuando-se o formato que assume na visão sistêmica, a supervisão desempenha
função de disciplinar o trabalhador. Sua função pedagógica resume-se na reprodução de
padrões de comportamento, e de valores econômicos e sociais. Neste sentido controle e
educação caminham juntos.
Na sociedade pós-industrial dos anos 80 e 90, a reestruturação produtiva, a
intelectualização do trabalho, juntamente com reformulações do sistema de saúde, apontam
para a necessidade de uma re-visão da supervisão. Devem ser considerados os aspectos
ideológicos do sistema de saúde a ser supervisionado e a estrutura da equipe que realiza o
trabalho, tendo que haver participação conjunta supervisor/supervisionado, onde a ação
pedagógica possa ser possibilitadora de crescimento e reflexão.
88
O presente estudo levou-nos a constatar que a supervisão realizada no PSF de
Teresópolis apresenta-se sob diferentes modalidades. Ela não cumpre um padrão previamente
definido, assumindo características diversas, delineando-se, de acordo com a demanda das
equipes. As supervisões técnico-operacionais assumem dois aspectos, o geral, que tem a
característica de acompanhamento de todas as questões das unidades e de monitoramento das
ações de saúde na perspectiva do modelo do PSF; e o específico, que são as supervisões
realizadas em função das especialidades, supervisões de caráter funcional.
O aspecto administrativo é contemplado pelas supervisões administrativas
burocráticas, nos quais os supervisores averiguam desde o cumprimento de horários e
assiduidade dos profissionais, até o preenchimento de fichas de informações sobre os
atendimentos e os indicadores de saúde que compõem o SIAB.
Em relação à supervisão técnico-pedagógica, como foi nomeada pelos
supervisionados, percebe-se uma distorção dos internos de medicina e dos alunos de
enfermagem que realizam suas atividades pedagógicas nas unidades de saúde. A supervisão
técnico-pedagógica é bem mais abrangente e se constitui num instrumento privilegiado da
supervisão, portanto voltaremos a este ponto mais adiante.
Os fatores subjetivos envolvidos tanto no trabalho das equipes como no processo de
supervisão foi uma tônica na fala não só dos supervisores, como dos supervisionados. As
relações interpessoais e a decorrente integração das equipes é um aspecto pregnante e, por
isso mesmo foco prioritário da supervisão. Os conflitos e a não coesão das equipes são fatores
impeditivos da realização humanizada do trabalho. Daí a importância da supervisão como
suporte técnico, afetivo e emocional das equipes supervisionadas, na tentativa de prevenir,
evitar, solucionar ou, pelo menos, minorar-lhes os conflitos e a falta de coesão. O suporte
realmente eficaz dá às equipes a condição delas próprias resolverem esses problemas.
A questão do suporte foi largamente trazida, o que merece discussão mais
aprofundada.
A natureza humana se caracteriza pelo estabelecimento de vínculos com seus
semelhantes, o bebê frágil e imaturo precisa de alguém que lhe dispense cuidados. A família é
formada a partir desta necessidade primeira de cuidar e ser cuidado. Campos (2000), mostra
que não só os bebês prescindem deste cuidado. O adulto precisa do outro para sentir-se
amado, estimado, valorizado, compreendido, cuidado e informado; necessita de um suporte.
Este conceito foi desenvolvido por Caplan e Killelea em 1976, quando analisaram os
vários tipos de suporte que fazem parte da coletividade humana, demonstrando que os
89
sistemas de suporte permitem a construção de vínculos duradouros que são fundamentais para
a manutenção da integridade física e psicológica do indivíduo.
O conceito de suporte social como moderador do estresse, foi discutido por Sidney
Coob também em 1976 e sintetizado por Campos (2000:117), trata-se de uma “forma de
relacionamento grupal na qual prevalecem as trocas afetivas, os cuidados mútuos e a
comunicação franca e precisa entre as pessoas. A rede grupal constituída é solidária, tem
papéis definidos e ocorre de maneira constante, continuada. A resultante é um sentimento de
coesão e de apoio que empresta ao grupo subsídios para o enfrentamento da realidade, agindo
como fator moderador do estresse”.
A supervisão exercida como suporte faz com que as equipes sentindo-se cuidadas e
compreendidas apresentem maior possibilidade de compartilhar afetividade, cuidados mútuos
(entre seus componentes), adquiram meios saudáveis de resolução de conflitos internos e,
uma vez mais estruturadas, possam atender de modo mais adequado seus pacientes. Suporte
gera suporte; quem é bem cuidado, constrói a capacidade de ser um bom cuidador. Uma
equipe que recebe suporte, naturalmente transmite sua capacidade de suporte aos que
necessitam de seus cuidados. Esta idéia fica evidenciada quando vários dos entrevistados
concebem a supervisão como apoio, acompanhamento das atividades, reivindicando uma
relação mais próxima com os supervisores.
Por outro lado, percebe-se que a equipe de supervisores, exercendo função - para eles,
nova - e investida de responsabilidade e poder, prescinde de maiores cuidados. Neste ponto,
as reuniões semanais da equipe de supervisores com a coordenação, funcionam como
oportunidade de troca, apoio, suporte; há uma espécie de troca de suportes entre a supervisão
e a coordenação do programa (PSF). Insistimos na importância do suporte e seu fator
protetor, pois o aspecto de controle e fiscalização da supervisão é uma constante nos relatos
de supervisores e supervisionados. São unânimes as opiniões de que a supervisão não deve ter
este caráter, contudo os supervisionados se sentem fiscalizados em algumas situações e, os
supervisores, mesmo considerando que não devem fiscalizar, assumem esta posição que,
muitas vezes, a própria função lhes impõe. Essas situações, se forem vivenciadas sem a
oportunidade de reflexão e de trocas entre supervisores e supervisionados, possivelmente se
constituirão em fatores geradores de ansiedade, desintegração da equipe e menor eficiência do
trabalho de ambos os lados.
Se as equipes, a partir do entendimento de dificuldades e limitações, tiverem a
possibilidade de elaborar estas questões, este quadro poderá se reverter; mas para que isto
90
aconteça é necessário que a supervisão seja capaz de dar suporte às equipes e que estas sejam
capazes de recebê-lo.
Neste ponto, nos interrogamos sobre que possibilidades tem a equipe de supervisão de
ser “suportiva”. Como construir uma relação supervisor/supervisionado que satisfaça esta
necessidade? Pelos dados analisados foi visto que este objetivo pode ser atingido pela via
pedagógica. Não através da supervisão pedagógica tradicional, reprodutora de conteúdos e
conceitos prontos, de verdades incontestáveis. Mas uma supervisão abrangente que atue como
instrumento de reflexão, mudanças e transformações, e na qual a via pedagógica se constitua
no instrumento mobilizador destas transformações.
Para tal retornamos ao conceito de supervisão encontrado nas referências
bibliográficas consultadas, que tem suas raízes históricas ancoradas numa relação vertical de
poder e autoridade, mas que não é mais suficiente para subsidiar as necessidades que
emergem. A super-visão, poderosa e onipotente, deverá dar lugar à com-visão, processo
conjunto, compartilhado, consciente e convivido. A convisão é o veículo da participação.
Nesta perspectiva, “convisores” e “convisionados” juntos, constróem o conhecimento,
partilham dúvidas e buscam a resolução dos problemas; atingem a conscientização, que na
concepção de Paulo Freire (1978), é diferente da tomada de consciência. Esta tem caráter
limitado, não crítico e se aproxima da idéia de supervisão (conhecimento vindo de fora, que
toma a consciência). Já a conscientização, supõe um desenvolvimento crítico da tomada de
consciência, e permite não só desvelar a realidade, incidindo no nível do conhecimento, como
também criar uma postura de curiosidade epistemológica.
A educação problematizadora que envolve um processo ativo de resolução de
problemas, permite a conscientização e a transformação de situações. Nestes moldes a
convisão pode se desenvolver atingindo objetivos amplos: supervisão técnica, construção de
suporte social, mudanças nas relações de trabalho que permitam suplantar a alienação,
mudanças no modelo assistencial, práticas de participação comunitária, sendo possível o
exercício do controle social.
Dentro desta concepção, o perfil do supervisor (convisor) deve ser o de agente da
produção de conhecimento, um “causador de problemas”, aquele que induz a dúvidas, mas
que junto trilha um caminho para o encontro das soluções. Não é aquele controlador
representante das normas que, com seu “olhar fiscalizador”, regula o cumprimento destas,
sem permitir questionamentos. Estes aspectos contraditórios, representados analogamente
pelo convisor e pelo supervisor, são registrados nos relatos dos entrevistados que vêem o
91
supervisor como integrador e como aquele que compreende, mas também o vê como
fiscalizador e controlador, tendo um dos entrevistados sugerido até, que o supervisor tivesse a
função de policiamento.
Um aspecto que merece ser pontuado é o da neutralidade do supervisor, evidenciado
pelos entrevistados. A concepção sugere um afastamento do supervisor do processo de
supervisão, ou seja, um distanciamento suficiente para que possa perceber, sem envolvimento,
a situação a ser supervisionada. A convisão marca justamente o oposto, a implicação no
processo, por parte do convisor é fundamental para que este se realize.
Uma constatação surpreendente foi o não aparecimento do tema família nos relatos
dos entrevistados. Se o pressuposto básico do PSF é a mudança no foco de atenção para a
família e para a comunidade, esperava-se que este assunto fosse tratado com alguma ênfase.
Isso pode nos fazer pensar se realmente o PSF está respondendo às mudanças propostas pelo
SUS, ou com “nova roupagem” mantém o modelo tradicional? Por outro lado pode-se pensar
que neste aspecto a supervisão esteja deficitária no sentido de estimular o atendimento à
família e a discussão sobre as mudanças de paradigma no atendimento à saúde, pouco
enfatizadas durante a formação dos profissionais que compõem as equipes.
Pelo fato da proposta do PSF ser recente, os profissionais que nele atuam, se
graduaram segundo um paradigma curativo e fragmentado da saúde, onde são valorizadas as
especialidades e não a compreensão global do ser humano e do processo do adoecer. É
exigido do profissional do Programa de Saúde da Família, um conhecimento técnico
abrangente que ele não adquiriu em sua formação, mas que pode desenvolver a partir do
treinamento introdutório, de sua atuação no PSF (treinamento em serviço) e da contribuição
das supervisões. Acredita-se que com a sedimentação do PSF como política de saúde
prioritária do Ministério da Saúde, mudanças significativas nos currículos dos cursos que
abrangem a área de saúde, sejam realizadas, enfatizando a formação do generalista.
É evidente a necessidade de uma concomitância entre a reorganização dos sistemas de
saúde, a reorientação da formação profissional, e o processo de supervisão como um
instrumento destas reorganizações.
O PSF pressupõe que a equipe composta por médico, enfermeiro, auxiliar de
enfermagem e agentes comunitários de saúde, trabalhe integrada para que sejam alcançados
os objetivos deste modelo assistencial. No entanto, a supervisão, segundo o relato dos
informantes, tanto o auxiliar de enfermagem como os agentes não fazem parte das
supervisões. Parece que isto foge à proposta. Esses profissionais são fundamentais para o
trabalho em atenção básica, portanto deveriam participar das supervisões. Uma das funções
92
do agente de saúde, é a realização das visitas domiciliares (VDs), atividade primordial deste
modelo de atenção, na qual se estabelece o vínculo do profissional de saúde com a
comunidade. Situações vivenciadas nas VDs, seriam ricos materiais de discussão das
supervisões. Sugere-se que este aspecto seja revisto.
Pode-se concluir que com as reformulações do sistema de saúde, o novo ciclo
descentralizado, impõe mudanças no processo de gestão, uma vez que o comprometimento
com a coletividade é cada vez mais exigido. Mudam as relações interpessoais, o processo de
trabalho, as estratégias de gestão.
O fortalecimento do poder popular através do controle social, conquista fundamental
incentivada pela reforma sanitária do SUS, vem estabelecer novas relações entre gestores,
profissionais e usuários dos serviços de saúde, estimulando o planejamento participativo.
São apresentadas situações desafiadoras onde a responsabilidade com a saúde está (ou
deveria estar) em primeiro lugar. Há que se superar desde angústias, conflitos, vaidades,
corporativismo de categorias profissionais, interesses políticos e até diferentes concepções em
relação ao próprio modelo do PSF enquanto estratégia de atenção à saúde.
Frente a este cenário, a supervisão apenas enquanto instrumento gerencial e técnico-
pedagógico é insuficiente para contemplar a complexidade que a reestruturação sanitária ora
necessita. O aspecto "suportivo" da supervisão/convisão fornece grande contribuição para que
entraves de diversas naturezas sejam trabalhados, entendidos e elaborados.
A reestruturação do modelo assistencial modifica não só os paradigmas e as
concepções a respeito do ter saúde e do adoecer, os objetivos e os focos das ações, como
também o "fazer" em saúde, transformando atitudes, posturas e comportamentos. Surgem
dificuldades técnicas, administrativo-gerenciais, associadas às dificuldades emocionais. A
angústia gerada pelas transformações e pela necessidade de enfrentamento da nova realidade
deve ser compreendida e "suportada". Os sentimentos de impotência decorrentes do confronto
com situações de extrema pobreza e miséria humanas, com as quais muitos dos profissionais
atuantes no PSF, antes protegido pelas paredes dos hospitais ou mesmo de seus luxuosos
consultórios, não entravam em contato, agora fazem parte de seu cotidiano. Tais vivências,
têm que ser compartilhadas e "suportadas".
Entrave de natureza subjetiva muitas vezes se manifesta pela via dos conflitos
interpessoais prejudicando a realização do trabalho em equipe, ponto primordial do PSF.
Como os relatos dos entrevistados confirmam, é fundamental que a supervisão trabalhe as
relações de equipe, fortaleça os vínculos entre seus membros, para que a tarefa do PSF se
concretize. A supervisão como suporte contempla este propósito.
93
Este estudo vem mostrar a importância de ser considerada e operacionalizada a função
de suporte da supervisão. Assim sugere-se que esta realize-se a partir do tripé –
gerencial/administrativo – técnico/pedagógico – suportivo, utilizando-se da estratégia da
problematização como impulsionadora da reflexão, da criatividade, da possibilidade de
resolução de problemas e do desenvolvimento da pratica da co-laboração.
A supervisão, na perspectiva da convisão, se firmando no tripé sugerido, é um
processo a ser construído. Traz inúmeras possibilidades: de crescimento profissional através
do estabelecimento de vínculos afetivos (e efetivos) entre estes; de reflexão sobre as práticas
estimulando o modelo da ação-reflexão-ação; a compreensão dos aspectos intersubjetivos
envolvidos em todo processo de trabalho; de questionamento dos modelos de atenção à saúde.
Contudo também carrega seus limites, ou seja, a inevitável e permanente ação fiscalizadora, e
a possibilidade de criar dependência dos supervisionados pela supervisão. Neste sentido é
bom ressaltar a importância da supervisão como instrumento de construção de liberdade e
autonomia. É importante enxergar que o limite, não é um impedimento definitivo, mas uma
possibilidade de transformação futura; e a possibilidade não é algo seguro e concluído, mas
que também tem limites e pode ser reinventada.
Este trabalho pretendeu apenas esboçar um caminho em direção a uma reinterpretação
da supervisão em saúde para que esta possa contribuir para o aprimoramento e sustentação de
um programa que atenda às necessidades de saúde da população brasileira; ainda tão marcada
pelas desigualdades sociais.
Espera-se que o PSF possa se firmar para que haja uma real mudança no Sistema de
Saúde Brasileiro, que este consiga fazer valer seus princípios e prioridades. Que a supervisão
possa ser norteadora das mudanças no processo de trabalho, ser “vigilante” contra as práticas
de desumanização, e que a lógica do mercado, que estimula o individualismo e a
competitividade possa abrir, pelo menos, um pequeno espaço para que a lógica da
solidariedade, enquanto compromisso histórico possa se instalar.
94
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103
ANEXOS
104
ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA OS SUPERVISORES
1) Descreva a supervisão realizada por você. Ou, qual a característica da supervisão que você
realiza?
2) Identifique situações nas quais as equipes requisitam supervisão.
3) Identifique os componentes que você considera prioritários na supervisão.
cooperação técnica
controle
avaliação
acompanhamento
desenvolvimento técnico-pedagógico
cooperação financeira
Obs: estes são parâmetros para nortearem a análise, não serão explicitados no momento da
entrevista.
4) Descreva as atividades nas quais a supervisão é importante para que sejam alcançados os
objetivos do PSF.
5)Como você acha que deve se conduzir o profissional responsável pela supervisão? Que
postura é necessária para a realização desta tarefa?
6) E o supervisionado? Qual deve ser o seu comportamento diante da atividade, tendo em
perspectiva a sua realização da melhor forma possível?
7) Que relação você estabelece entre supervisão e avaliação, no processo de gestão do seu
trabalho?
8) Que considerações você faria aos procedimentos adotados pela supervisão?
9) Que pontos positivos e negativos você resgataria do desenvolvimento do PSF, no que se
refere à supervisão?
10) Pensando no desenvolvimento do PSF, haveria algo a ser modificado no processo de
supervisão?
11) Vocês já receberam críticas dos supervisionados quanto à forma e à abordagem da
supervisão realizada? E sugestões?
105
12) Que habilidades e atributos você destacaria como importantes a serem desenvolvidos
pelos técnicos que realizam a supervisão? Quais as estratégias que você destacaria para
promover essas habilidades e atributos?
13) O que é uma boa supervisão para você, e como você pensaria em utilizá-la para
potencializar os resultados na sua área de atividade no PSF?
14) Como você se vê enquanto supervisor?
15)Na sua opinião, a supervisão responde à mudança no modelo de atenção à saúde proposto
pelo PSF?
106
ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA OS MEMBROS
DAS EQUIPES (SUPERVISIONADOS)
1) Identificação do profissional.
2) Identifique situações nas quais as supervisões são necessárias?
3) Identifique os componentes que você considera prioritários na supervisão.
4) Descreva as atividades nas quais a supervisão é importante para que sejam alcançados os
objetivos do PSF.
5) Como você acha que deve se conduzir o profissional responsável pela supervisão? Que
postura é importante para o bom desenvolvimento da atividade?
6) E o supervisionado? Como você acha que deve ser o seu comportamento diante da
atividade, tendo como perspectiva a sua realização da melhor forma possível?
7) Que relação você estabelece entre supervisão e avaliação, no processo de gestão do seu
trabalho?
8) Que considerações você faria aos procedimentos adotados pela equipe de supervisão?
9) Que pontos positivos e negativos você resgataria do desenvolvimento do PSF, no que se
refere à supervisão?
10) Pensando no desenvolvimento do PSF, haveria algo a ser modificado no processo de
supervisão?
11)Vocês já receberam críticas dos supervisores? E sugestões?
12) Que habilidades e atributos você destacaria como importantes a serem desenvolvidos
pelos técnicos que realizam a supervisão ?Quais as estratégias que você destacaria para
promover essas habilidades e atributos?
13) O que é uma boa supervisão para você, e como você pensaria em utilizá-la para
potencializar os resultados na sua área de atividade no PSF?
14) Como você se vê enquanto membro da equipe do PSF e portanto supervisionado?
15) Na sua opinião, a supervisão responde à mudança no modelo de atenção à saúde proposto
pelo PFS?
107
108
109
QUADRO I EVOLUÇÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA SUPERVISÃO
Escolas de Administração Características / Princípios Supervisão Fisiologista da Organização Fayol (França Início Séc. XX)
Aumentar eficiência da organização (prever, organizar, comandar, controlar).
Instrumento de gerência. Relação vertical, sup. (chefe) / supervisionado. Fazer a máquina funcionar
Administração Científica Taylor (USA)
Aumentar a produtividade. Divisão do trabalho. Supervisão funcional. Controle sobre o trabalho.
Industrialização / Complexidade do Trabalho / Especialização Linha – Staff
Linha-staff (organização linear + funcional). Linha (órgão de execução e assessoria) ⇒ staff (órgãos de apoio e consultoria).
Ajuda especializada ao nível de execução (fora da linha de mando). Autoridade baseada no conhecimento funcional. Supervisor diferente de chefe. Acompanha execução do trabalho.
Relações Humanas Tead, Barnard e Mayo Psicologia e Sociologia do Trabalho
Elementos emocionais. Motivação, liderança. Valorização do trabalhador (humanização).
Mecanismo de comunicação e encorajamento. Cooperação do trabalhador. Supervisor é líder formal para garantir o desenvolvimento do trabalho.
Comportamental Likert Estilos de Administração
a) Treinar os trabalhadores e pressioná-los para obter níveis de produções estipulados.
b) Ênfase no trabalhador. Equipe atuante e participativa. Crítica: aumento do conhecimento do trabalhador, aumento do controle sobre ele.
a) Orientada para o trabalho. b) Orientada para o trabalhador.
Estruturalismo Max Weber Sociedade de Organizações Burocracia – Modelo de Organização
Organizações e suas racionalidade (meios, recursos, e objetivos). Normas racionais que definem relações de mando e subordinação. Divisão do trabalho. Cargos hierárquicos. Regras e normas técnicas para desempenho de cada cargo.
Segundo hierarquia. Cumprimento de normas técnicas e regras. Serviços especializados de controle – supervisão. Supervisor – profissional qualificado e especialista, elemento de ligação entre a autoridade superior e o nível de execução.
Sistêmica Sistema Aplicada as Organizações Bertalanffy Mecanismos Internos de Controle
Organização – todo integrado. Sistema – “conjunto de unidades entre as quais existem relações”. Sistema se organiza para cumprir tarefas. Estrutura e conflito de papeis. Ênfase em programas (multiplicidade de comandos), comunicação horizontal.
Supervisão por projetos, visando resultados. Auto-controle progressivo, esforço interdisciplinar, mecanismo de envio de informações.
Atual Estruturas Organizacionais mais Flexíveis, Adaptáveis e Ajustáveis à Mutações Rápidas
Maior eficiência no alcance de resultados, tem como meta a relevância social de seus objetivos. Objetivos organizacionais conciliados aos individuais.
Supervisão descentralizada, participativa. Co-gestão.
Peres, 1986
QUADRO II DISCUSSÃO DAS ENTREVISTAS – SUPERVISORES
Equipe
Supervisores
Elementos de Estudo
Nutrição
Pediatria
Enfermagem (2)
Psicologia
Padrão
Aspectos técnicos Estimulação ação educativa das ações de saúde Aspecto administrativo Apoio às equipes (conflito)
Meta principal – integração e apoio às equipes Educação continuada e permanente Supervisão técnica (geral e específica) Supervisão internato Comunidade – conselho gestor
Técnico operacional Administrativa Relação equipe Planejamento e acompanhamento das ações Avaliação dos resultados Elo equipe / coordenação
Conhecimento técnico Seguir modelo PSF – humanização, vínculos Supervisão como elo de interdisciplinaridade
Processo
Supervisão, processo novo Trabalho integrador Crescimento dos profissionais das equipes Avaliação – relatórios das ações
Orientações da pediatria (internos e família) Consulta conjunta Supervisão – toda a unidade Freqüência dos supervisores Boa supervisão – cumprimento da tarefa / crescimento equipe
Busca da maneira de trabalhar Orientações para grupos Avaliação: própria supervisão e avaliação da equipe Supervisão por demanda Incentivos em campanhas Processo de construção da supervisão Avaliação / resolutividade Reavaliação permanente da supervisão
Necessidade: capacitação para supervisão Supervisão deve: transformar, dar resolução dos problemas Processo inovador – mudança do modelo de atenção à saúde
Fatores Subjetivos
Função integradora Contribuir para o processo de crescimento, aprendizagem Solução de conflitos Dependência
Relação equipe-família Supervisor enquanto fiscal Suscetibilidade à críticas Avaliação mútua entre supervisões e equipe
Relação equipe – supervisão (pouca disponibilidade) Supervisor enquanto fiscal Supervisão dá segurança às equipes
Humanização e criação de vínculo Supervisão ainda tem dificuldade de se fazer compreender Grande entrave: relações interpessoais
Perfil do Supervisor
Dinâmico Conhecimento técnico específico Conhecimento geral em saúde Disponibilidade Reconhecer dificuldades Gostar do que faz Saber dialogar
Capacidade técnica Capacidade de trabalhar em equipe Responsabilidade
Ter conhecimento técnico-científico / comprometido com proposta do PSF Não é fiscal Tem que se sentir membro da equipeEstimulador / facilitador / dinâmico criativo Humanizado, aberto a mudanças / Responsável
Capacitar mais o supervisor Acreditar no trabalho (proposta PSF) Tenha ideologia e conhecimento em políticas públicas de saúde
QUADRO III DISCUSSÃO DAS ENTREVISTAS – SUPERVISIONADOS
EquipeSupervisionado
Elementos de Estudo
Médicos (6)
Enfermeiros (4)
Auxiliar Enfermagem (1)
Agentes Comunitários de
Saúde (3)
Padrão
Questões técnicas (clínicas) Conduta dos profissionais (perfil do PSF) Organização institucional Relação interpessoal (elo entre diversas equipes) Relação equipe / comunidade Questões pedagógicas (discussão casos clínicos)
Prioridade: apoiar o crescimento da equipe (científico e pessoal) Questões técnicas específicas Orientação e planejamento Orientação dos trabalhos de grupo Sensibilização da comunidade
Orientações recebidas da equipe não da supervisão Supervisão como proteção para o PSF Esclarecimento de situações Resolução de problemas
Relação com agentes Divisão das áreas Orientação na relação com pacientes
Processo
Integrado à ideologia do PSF (consultas / grupos). Identidade profissional Avaliação periódica da equipe Supervisão – policiamento (técnico de futebol) Questões técnicas Questões sociais / comunidade Supervisão mais compatível com PSF
Construção do modelo do PSF Orientações administrativas (estatísticas) Organização de toda unidade Manter relação com coordenação Relação supervisão / equipe Orientação de situações com pacientes
Visão pequena do processo de supervisão Avaliação e supervisão caminham juntos
Avaliação constante do trabalho Planos de ação Supervisão + freqüente com agentes
Fatores Subjetivos
Relação supervisão equipe Críticas Distanciamento da supervisão Relação supervisão/segurança Relação humana – vínculos
Reconhecer limites das pessoas Não fazer comparações Mediar crises Não pedir supervisão para não “incomodar” “Invasão” no trabalho das equipes
Proteção, segurança Reconhecer hierarquia Reconhecer seus limites
Relação agente / comunidade Disponibilidade Supervisão / segurança Integração equipe / supervisão / agentes
Perfil do
Supervisor
Competência técnica Boa “aptidão emocional” Capacidade de trabalhar em equipe (técnico de futebol)
Respeito profissional aos membros das equipes Capacidade de relacionamento interpessoal (integrador) Equilíbrio emocional pessoal Capacidade de enfrentamento de adversidades
Alguém que inspeciona a escuta
Saber ouvir a equipe Conhecimento da comunidade