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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
INSTITUTO DE QUÍMICA
MURILO PASTORELLO PEREIRA
DESENVOLVIMENTO DE SUBSTRATOS SERS PARA DETECÇÃO DE
POLUENTES AMBIENTAIS EMERGENTES
CAMPINAS
2016
MURILO PASTORELLO PEREIRA
DESENVOLVIMENTO DE SUBSTRATOS SERS PARA DETECÇÃO DE
POLUENTES AMBIENTAIS EMERGENTES
Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto de
Química da Universidade Estadual de Campinas
como parte dos requisitos exigidos para a obtenção
do título de Mestre em Química na área de Química
Inorgânica.
Orientador: Prof. Dr. Italo Odone Mazali
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA
PELO ALUNO MURILO PASTORELLO PEREIRA, E ORIENTADA PELO PROF. DR.
ITALO ODONE MAZALI.
CAMPINAS
2016
DEDICATÓRIA
Dedico esta dissertação aos meus pais,
Mauro e Magaly, e a todos os professores
que, de alguma forma, contribuíram para
a minha vida escolar e acadêmica.
AGRADECIMENTOS
À minha família, pelo apoio em todos os momentos e sentidos, e
especialmente aos meus pais Mauro e Magaly, pelo incentivo, apoio emocional e
financeiro, compreensão e paciência. Eu amo vocês!
Ao meu orientador, Prof. Italo Odone Mazali, por todo o conhecimento
compartilhado, pelos conselhos e todas as conversas (sobre química ou não), e pela
oportunidade de participar de um grupo de pesquisa que me trouxe tantos
momentos e resultados positivos, desde a iniciação científica até o final do mestrado.
Ao Prof. Fernando Sigoli, e a todos os colegas do Laboratório de Materiais
Funcionais: Anerise, Alice, Carla, Charlão, Cris, Dagbau, Emille, Filipe, Gabi, Gilmar,
João (presente na maior parte do meu mestrado), Josi, Lanousse, Larissa, Laura,
Lidiane, Carol, William, e em especial ao Isaías, Naiara, Bia e Adriana, que, além de
colegas, se tornaram amigos próximos e queridos! Vou sentir saudades.
― Agradeço ainda aos que estiveram presentes no laboratório durante a
minha iniciação científica, especialmente Juliana, Mathias e Ernesto.
Às amigas Thalita, Denise, Fernanda e Vanessa, por todos os bons
momentos desde a graduação.
Aos amigos Guilherme, Hugo, Thiago, João, João Flora, Lucas, Fábio,
Gustavo e Bruno, por todos os anos de amizade, viagens, festas, conversas e bons
momentos!
À Emille e ao Douglas, pelas imagens de TEM, e ao técnico Hugo Loureiro,
pelas imagens de SEM, realizadas no IQ-UNICAMP; à Cristine, pelas imagens de
HRTEM e medidas de EDS realizadas no LNNano.
Aos funcionários do IQ-UNICAMP: Milene, Claudinha, Sônia e Renata pela
ajuda na realização das medidas, e pelas boas conversas.
Aos professores Diego Pereira dos Santos e Daniela Zanchet, pelas
contribuições no Exame de Qualificação.
Á CAPES pela bolsa concedida, e à FAEPEX pelo auxílio-ponte fornecido.
RESUMO
O Espalhamento Raman Intensificado por Superfície (SERS – Surface-Enhanced
Raman Scattering) é um fenômeno observado quando uma molécula é adsorvida na
superfície de um substrato metálico, fazendo com que a intensidade do seu
espalhamento Raman seja amplificada em diversas ordens de grandeza. O presente
trabalho teve como objetivo a síntese de nanoestruturas de ouro e prata com
morfologias e tamanhos controlados, e sua aplicação como substrato SERS para a
detecção de moléculas que vêm sendo classificadas como poluentes ambientais
emergentes em ambientes aquáticos. Foram sintetizados nanobastões
monometálicos de ouro, e bimetálicos de ouro e prata em uma estrutura caroço-
casca, controlando suas dimensões e espessura da casca. Os materiais foram
caracterizados pelas técnicas de espectroscopia de absorção (UV-Vis-NIR),
microscopia eletrônica de transmissão (TEM), microscopia eletrônica de
transmissão de alta resolução (HRTEM), e espectroscopia de raios X por energia
dispersiva (EDS), e os resultados indicaram a obtenção das nanopartículas com
tamanho e morfologia controlados. Os substratos SERS foram preparados através
da deposição das suspensões de nanopartículas em placas de vidro
funcionalizadas com alcoxissilanos, seguida da deposição da molécula de
interesse. Sua caracterização foi feita por espectroscopia de absorção (UV-Vis-
NIR) e microscopia eletrônica de varredura (SEM), que mostraram as propriedades
óticas e a organização das nanopartículas depositadas, respectivamente. A
eficiência dos substratos foi avaliada através de mapeamentos SERS utilizando a
molécula sonda 4-aminobenzotiol (4-ABT) a partir de soluções diluídas
consecutivamente, até o limite em que as bandas características da molécula
pudessem ser observadas nos espectros. As análises foram realizadas utilizando
fonte de excitação em 633 nm. O substrato contendo nanopartículas caroço-casca
mostrou maior eficiência para a molécula sonda, atingindo o limite de detecção de
1.10-15 mol L-1, e foi então testado na análise das moléculas de poluentes
ambientais, o fármaco sulfatiazol, e os pesticidas tiram e paration.
ABSTRACT
Surface-Enhanced Raman Scattering (SERS) is a phenomenon observed when a
molecule is adsorbed on the surface of a metallic substrate, leading to an increase in
the intensity of the Raman scattering in several orders of magnitude. The present
work describes the synthesis of gold and silver nanostructures with controlled
morphology and size, and their application as SERS substrates for the detection of
molecules that have been classified as contaminants of emerging concern in water
resources. Monometallic gold nanorods and core-shell gold-silver nanorods have
been synthesized under specific conditions, with control of their dimensions and shell
thickness. The particles were characterized by absorption spectroscopy in the UV-
Vis-NIR region, transmission electron microscopy (TEM), high-resolution
transmission electron microscopy (HRTEM), and energy-dispersive X-ray
spectroscopy (EDS), and the results confirmed the production of nanoparticles with
well-defined size and morphology. SERS Substrates were prepared by deposition of
the nanoparticles onto functionalized glass slides, followed by the deposition of the
molecules of interest. The slides were characterized by absorption spectroscopy in
the UV-Vis-NIR region, which showed the optical properties of the deposited
nanoparticles, and scanning electron microscopy (SEM), that elucidated their
dispersion over the surface. The efficiency of the SERS substrates was evaluated by
mapping analyses using the probe molecule 4-aminobenzothiol (4-ABT) from
consecutively diluted solutions and excitation source at 633 nm, until the
characteristic bands of the molecule could no longer be detected in the spectra. The
substrates containing core-shell nanoparticles showed higher sensitivity for probe
molecule detection, reaching a detection limit of 1.10-15 mol L-1, and were thus
employed in the detection of the drug Sulfathiazole, and the pesticides Thiram and
Parathion.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
4-ABT 4-aminobenzotiol
APTMS (3-aminopropil)-trimetoxissilano
Au@AgNRs nanobastões caroço-casca de ouro e prata
AuNRs nanobastões de ouro
CCD dispositivo de carga acoplada (charge-coupled device)
CNPEM Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais
CTAB brometo de cetiltrimetilamônio (cetyltrimethylammonium bromide)
cts contagens
EDS espectroscopia de raios X por energia dispersiva (energy dispersive
X-ray spectroscopy)
EM mecanismo eletromagnético
EPA Agência de Proteção Ambiental (Environmental Protection Agency)
fcc cúbico de faces centradas (face-centered cubic)
FDTD diferenças finitas no domínio do tempo (fnite-difference time-domain)
He-Ne hélio-neônio
HOMO orbital molecular ocupado de mais alta energia (highest occupied
molecular orbital)
HRTEM microscopia eletrônica de transmissão de alta resolução (high-
resolution transmission electron microscopy)
JCPDS Comitê de Padrões de Difração de Pó (Joint Committee on Powder
Diffraction Standards)
LMEOA Laboratório Multiusuário de Espectroscopia Óptica Avançada
LNNano Laboratório Nacional de Nanotecnologia
LSPR ressonância de plasmon de superfície localizado (localized surface
plasmon resonance)
LUMO orbital molecular não ocupado de mais baixa energia (lowest
unoccupied molecular orbital)
MPTMS (3-mercaptopropil)-trimetoxissilano
OMS Organização Mundial da Saúde
PDT propanoditiol
ppm parte por milhão
PVP polivinilpirrolidona
Ref. referência
rpm rotação por minuto
SEM microscopia eletrônica de varredura (scanning electron microscopy)
SERS espalhamento/espectroscopia Raman intensificado(a) por superfície
(surface-enhanced Raman scattering/spectroscopy)
SM-SERS SERS de única molécula (single molecule-SERS)
TC mecanismo de transferência de carga
TEM microscopia eletrônica de transmissão (transmission electron
mcroscopy)
TEM-FEG microscopia eletrônica de transmissão com emissão de campo
(transmission electron mcroscopy - field emission gun)
u.a. unidade arbitrária
UNICAMP Universidade Estadual de Campinas
UV-Vis-NIR ultravioleta-visível-infravermelho próximo
LISTA DE SÍMBOLOS
tempo
campo elétrico oscilante
amplitude de oscilação do campo elétrico
frequência de oscilação do campo elétrico
momento de dipolo elétrico induzido
tensor de polarizabilidade
deslocamento em relação à posição de equilíbrio
amplitude de vibração de uma molécula
frequência de vibração de uma molécula
polarizabilidade na posição de equilíbrio
nível vibracional molecular
Intensidade da luz espalhada por uma molécula
fluxo de fótons incidentes em uma molécula
seção de choque do espalhamento Raman
( ) função dielétrica
( ) componente real da função dielétrica
( ) componente imaginário da função dielétrica
campo elétrico na região externa de uma nanopartícula
campo elétrico incidente orientado na direção
direção radial em relação a uma esfera
, , coordenadas cartesianas
, , vetores unitários
raio de uma esfera
constante dielétrica do meio
( ) função dielétrica de uma nanopartícula metálica
pH potencial hidrogeniônico
Ka constante de acidez
pKa logaritmo negativo da constante de acidez
fator de intensificação
intensidade da banda no espectro SERS
intensidade da banda no espectro Raman
concentração da solução depositada em placa de vidro
concentração da solução depositada em substrato SERS
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Lista de reagentes utilizados no trabalho.................................................. 43
Tabela 2. Potenciais-padrão de redução dos íons e complexos de ouro em água...50
Tabela 3. Atribuições das bandas nos espectros Raman e SERS do 4-ABT............70
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Representação dos processos de espalhamento (A) Rayleigh, e Raman
(B) Stokes e (C) anti-Stokes. ..................................................................................... 23
Figura 2. Exemplo de um espectro Raman mostrando a linha do laser ao centro, e
as bandas Stokes e anti-Stokes. Adaptado da Ref. . ................................................ 24
Figura 3. Representação da oscilação da nuvem eletrônica em uma nanopartícula
metálica esférica na presença de um campo elétrico incidente. Adaptado da Ref. 36.
.................................................................................................................................. 29
Figura 4. Componentes real (Re[ ]) e imaginária (Im[ ]) da função dielétrica do
ouro e da prata em função do comprimento de onda. Adaptado da Ref. 38. ............ 30
Figura 5. Representação dos processos fotoinduzidos de transição eletrônica entre
os estados eletrônicos do metal e da molécula adsorvida quimicamente. ................ 34
Figura 6. Intensificação do campo eletromagnético ao redor de um dímero de
nanopartículas de Au de 100 nm de diâmetro, com espaçamento de 0,5 nm,
calculada pelo método FDTD. A incidência da radiação é perpendicular ao eixo entre
as nanopartículas. Adaptado da Ref. 64. .................................................................. 36
Figura 7. Estrutura molecular genérica das sulfonamidas. ....................................... 38
Figura 8. Estrutura molecular do fármaco sulfatiazol. ............................................... 39
Figura 9. Estrutura molecular do fungicida tiram. ..................................................... 40
Figura 10. Estrutura molecular do inseticida paration ............................................... 41
Figura 11. Esquema reacional da preparação das sementes de ouro. .................... 44
Figura 12. Esquema reacional do crescimento dos nanobastões de ouro. .............. 45
Figura 13. Esquema reacional da síntese da casca de prata sobre os AuNRs. ....... 45
Figura 14. (A) Estrutura molecular do CTAB e (B) bicamada de CTAB na superfície
do nanobastão de ouro (adaptado da Ref. ). ............................................................. 49
Figura 15. Ilustração da estrutura cuboctaédrica das sementes de ouro estabilizadas
por CTAB. Adaptado da Ref. 107. ............................................................................. 51
Figura 16. Ilustrações e imagens de TEM do surgimento de planos de truncamento
durante o crescimento das sementes de ouro. Adaptado da Ref. 107. ..................... 52
Figura 17. Estrutura cristalina dos AuNRs e dos ângulos entre as faces para os
modelos propostos por (A) Wang e (B) Carbó-Argibay. Adaptado da Ref. 109. ....... 54
Figura 18. Espectro de extinção da suspensão de AuNRs. ..................................... 54
Figura 19. Imagens de TEM dos AuNRs .................................................................. 55
Figura 20. Histograma tridimensional da distribuição dimensional dos AuNRs. ....... 56
Figura 21. (A-B) Imagens de HRTEM dos nanobastões de ouro. A região ampliada
da Figura 21A mostra a medida da distância interplanar. ......................................... 57
Figura 22. Espectros de extinção na região do UV-Vis-NIR dos AuNRs, e das
partículas caroço-casca Au@Ag sintetizadas pela adição de diferentes volumes da
solução de AgNO3 1 mmol L-1. .................................................................................. 59
Figura 23. Fotos das suspensões obtidas nas sínteses de AuNRs e Au@AgNRs. . 60
Figura 24. (A-D) Imagens de HRTEM dos Au@AgNRs. A região ampliada da Figura
24B mostra a medida da distância interplanar. ......................................................... 61
Figura 25. (A-B) Imagens de mapeamento de composição química dos nanobastões
caroço-casca de ouro e prata, e gráficos da distribuição de composição ao longo da
(C) Linha 1 e (D) Linha 2 na Figura 25B. .................................................................. 62
Figura 26. Estruturas moleculares do (A) MPTMS e (B) APTMS. ............................ 63
Figura 27. Ilustração da funcionalização do substrato de vidro com alcoxissilanos,
com a representação da hidrólise, seguida da condensação. Na última imagem à
direita, é mostrado exemplo do vidro funcionalizado com MPTMS. .......................... 63
Figura 28. Ilustrações da (A) deposição de AuNRs sobre vidro funcionalizado com
MPTMS e (B) intercalação das deposições com PDT. .............................................. 64
Figura 29. Espectros de extinção dos substratos contendo AuNRs e Au@AgNRs. A
linha vermelha indica o comprimento de onda de excitação do laser utilizado no
Raman (632,8 nm). ................................................................................................... 65
Figura 30. Imagens de SEM de um único substrato contendo AuNRs, em diferentes
magnificações. .......................................................................................................... 66
Figura 31. Imagens de SEM de um único substrato contendo Au@AgNRs, em
diferentes magnificações. .......................................................................................... 67
Figura 32. Imagem de SEM dos Au@AgNRs agregados na superfície do substrato.
.................................................................................................................................. 68
Figura 33. (A) Estrutura molecular do 4-ABT, e (B) ilustração da interação das
moléculas de 4-ABT com a superfície dos AuNRs depositados sobre o substrato de
vidro funcionalizado. .................................................................................................. 69
Figura 34. Espectro Raman do 4-ABT sólido (preto), e espectro SERS do 4-ABT
depositado em substrato de AuNRs a partir de solução 10-3 mol L-1 (vermelho). ...... 69
Figura 35. Espectros obtidos a partir das médias dos mapeamentos realizados nos
substratos (A) AuNRs e (B) Au@AgNRs, preparados a partir de soluções de 4-ABT
em concentrações decrescentes. No detalhe da Figura 35B, é mostrada a ampliação
do espectro para a concentração 1.10-15 mol L-1. ...................................................... 72
Figura 36. Mapas de 50 espectros SERS para os substratos contendo Au@AgNRs
e soluções de 4-ABT (A) 1.10-4 e (B) 1.10-12 mol L-1. Os gráficos estão na mesma
escala. ....................................................................................................................... 73
Figura 37. Espectro Raman do sulfatiazol sólido (linha vermelha) e espectros SERS
obtidos a partir de mapeamentos dos substratos contendo solução de sulfatiazol
1.10-3 mol L-1 (linhas pretas). ..................................................................................... 74
Figura 38. Espectro Raman do tiram sólido, e espectros SERS obtidos a partir das
médias dos mapeamentos realizados nos substratos preparados a partir de soluções
aquosas de tiram em concentrações decrescentes. ................................................. 75
Figura 39. (A) Estrutura molécular do tiram e (B) fragmento do tiram coordenado à
superfície metálica de forma bidentada após clivagem da ligação S–S. ................... 76
Figura 40. Determinação da intensidade da banda em 560 cm-1 para o espectro da
solução de tiram 1.10-3 mol L-1 depositada em placa de vidro, e para a solução
1.10-7 mol L-1 depositada em substrato contendo Au@AgNRs. ................................ 77
Figura 41. Espectro Raman do paration sólido (linha vermelha) e espectros SERS
obtidos a partir de mapeamentos nos substratos contendo solução de paration
1.10-4 mol L-1 (linhas pretas). ..................................................................................... 78
Figura 42. Espectros obtidos a partir de mapeamento na superfície dos substratos
contendo Au@AgNRs, sem a deposição de moléculas. ........................................... 79
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 19
2. FUNDAMENTOS TEÓRICOS ............................................................................... 20
2.1 Espectroscopia Raman ....................................................................................... 20
2.2 Espectroscopia Raman Intensificada por Superfície (SERS) .............................. 26
2.2.1 Mecanismo Eletromagnético ......................................................................... 28
2.2.2 Mecanismo Químico ..................................................................................... 33
2.3 Substratos SERS ................................................................................................ 35
2.4 Poluentes Ambientais Emergentes ..................................................................... 37
2.4.1 Fármacos ...................................................................................................... 38
2.4.2 Pesticidas ..................................................................................................... 39
3. OBJETIVOS .......................................................................................................... 42
4. MATERIAIS E MÉTODOS .................................................................................... 43
4.1 Síntese de nanobastões de ouro (AuNRs) .......................................................... 44
4.1.1 Preparação da suspensão de sementes de ouro ......................................... 44
4.1.2 Preparação da solução de crescimento dos AuNRs ..................................... 44
4.2 Síntese de nanobastões caroço-casca de ouro e prata (Au@AgNRs)................ 45
4.3 Preparação dos substratos SERS ....................................................................... 46
4.4 Caracterização .................................................................................................... 46
4.4.1 Caracterização das suspensões de nanopartículas ..................................... 46
4.4.2 Caracterização dos substratos SERS ........................................................... 47
4.5 Avaliação da atividade SERS dos substratos ..................................................... 47
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................ 49
5.1 Nanobastões de ouro .......................................................................................... 49
5.2 Nanobastões caroço-casca de ouro e prata ........................................................ 57
5.3 Preparação e caracterização dos substratos SERS............................................ 62
5.4 Análise de Poluentes Ambientais Emergentes .................................................... 73
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS E PERSPECTIVAS .................................................. 80
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 82
19
1. INTRODUÇÃO
Milhares de produtos químicos artificiais são usados diariamente, sendo
que todos apresentam potencial para atingir e contaminar os recursos hídricos por
diversas vias. A contaminação ocorre a partir dos resíduos gerados tanto pela sua
produção industrial quanto pelo seu consumo na sociedade. Fármacos e outros
contaminantes de águas residuais são compostos que têm recebido muita atenção
pública e do meio científico em vários países. Apesar de alguns serem encontrados
em baixas concentrações, o monitoramento dos recursos hídricos é de extrema
importância para garantir a qualidade da água distribuída para a população, evitando
riscos à saúde humana 1,2.
Muitas técnicas são usadas para a detecção de moléculas contaminantes
ambientais, como a eletroforese capilar e a cromatografia líquida acoplada a
espectrometria de massas 3,4. Ambas são técnicas muito eficientes e com alto poder
de detecção, mas apresentam limitações, como a necessidade de pré-concentração
quando a concentração dos analitos é baixa, e purificação quando a matriz é
complexa. Além disso, são relativamente demoradas, pois requerem a coleta,
transporte, armazenamento e preparo da amostra. A busca por uma ferramenta
analítica altamente sensível, portátil, de baixo custo e que permita a detecção de
compostos ao nível de traços, torna-se uma necessidade.
Dentro deste contexto, o presente trabalho propõe o desenvolvimento de
um substrato que seja eficiente na detecção de moléculas poluentes em baixas
concentrações, utilizando a espectroscopia Raman como ferramenta analítica.
Através do uso de nanopartículas metálicas depositadas em vidro, pretende-se
desenvolver um substrato a partir do qual a influência do tamanho e composição
dessas partículas será avaliada na eficiência de detecção de moléculas
selecionadas, visando a obtenção de um sistema que possa ser utilizado em
análises de rotina, principalmente na área de controle ambiental.
20
2. FUNDAMENTOS TEÓRICOS
2.1 Espectroscopia Raman
A espectroscopia Raman é uma técnica de espectroscopia vibracional,
que tem como princípio físico fundamental o espalhamento inelástico da radiação
eletromagnética após a interação da sua componente do campo elétrico com a
matéria. É uma técnica baseada em uma fonte de radiação monocromática, que
tipicamente emprega comprimentos de onda na região do infravermelho próximo até
o ultravioleta, passando pela região do visível 5,6. O efeito Raman foi inicialmente
observado pelo físico indiano Sir Chandrasekhara Venkata Raman (1888 – 1970) na
década de 1920, ao estudar os efeitos de espalhamento da luz em materiais
transparentes a ela. Inspirado pelo desejo em explicar fenômenos óticos naturais
como a cor azul do mar, Raman e seus colaboradores realizaram diversos
experimentos utilizando a luz do sol como fonte de radiação, em equipamentos
bastante rudimentares, como telescópios e filtros de cor. O efeito descoberto por
eles foi oficialmente publicado em 1928, junto com o primeiro registro espectral
realizado para o benzeno. Contudo, previsões teóricas deste fenômeno já haviam
sido feitas em 1923 pelo físico austríaco Adolf Smekal, e observações experimentais
foram realizadas quase simultaneamente pelos físicos russos Grigorii Landsberg e
Leonid Mandelstam 7,8.
Dentre os processos óticos decorrentes da interação da radiação
eletromagnética com a matéria, destacam-se a absorção e o espalhamento, sendo o
último responsável pelo efeito Raman. O espalhamento da radiação pode ser
entendido a partir da interação do campo eletromagnético da radiação incidente com
o material, o que promove uma perturbação no sistema. A matéria, apesar de ser
essencialmente contínua e, em geral, eletricamente neutra, é formada por
distribuições discretas de carga elétrica. Ao incidir no material, o campo elétrico da
radiação induz um momento de dipolo que faz com que as cargas oscilem na
mesma frequência, e essa movimentação de cargas leva à emissão de ondas
secundárias, que se sobrepõem formando a radiação espalhada. A radiação é
espalhada em todas as direções, e a sua polarização geralmente é diferente em
relação à onda incidente, podendo haver ou não variação na energia 9,10,11.
21
No espalhamento elástico, o fóton espalhado possui a mesma energia do
fóton incidente, processo chamado de espalhamento Rayleigh. Já no espalhamento
inelástico, a sua energia pode ser maior ou menor em relação ao fóton incidente, o
que está associado à transição entre dois estados. Uma das principais formas de
espalhamento inelástico em moléculas é o espalhamento Raman, em que a variação
de energia corresponde à diferença entre níveis vibracionais/rotacionais 12.
Considerando uma radiação eletromagnética monocromática, o campo
elétrico oscilante que varia com o tempo ( ) é dado pela Equação 1:
( ) (1)
na qual é a amplitude de oscilação do campo, e é a sua frequência. Quando
essa radiação incide em uma molécula, ela altera a distribuição da densidade
eletrônica, gerando um momento de dipolo elétrico induzido (P), representado pela
Equação 2:
(2)
A constante de proporcionalidade, , é o tensor de polarizabilidade, que representa
a facilidade com que a nuvem eletrônica da molécula é distorcida na presença do
campo elétrico em relação à configuração de equilíbrio, gerando o momento de
dipolo.
Se esta molécula vibra a uma frequência , então o deslocamento em
relação à posição de equilíbrio ( ) para um determinado modo vibracional é dado
pela Equação 3:
( ) (3)
em que é a amplitude da vibração. Já a polarizabilidade pode ser descrita em
termos da contribuição do modo vibracional por uma expansão em série, como
mostrado na Equação 4:
22
(
) (
) (4)
Nesta equação, é a polarizabilidade na posição de equilíbrio, e (∂ /∂ )0 é a taxa
da variação da polarizabilidade com relação à variação de , avaliada na posição de
equilíbrio. Para o caso das vibrações moleculares, em que o deslocamento dos
átomos em relação à posição de equilíbrio é pequeno, podem-se desconsiderar os
termos de maior ordem, aproximando a dependência da polarizabilidade a uma
expansão de primeira ordem. Assim, combinando as Equações de 1 a 4, obtém-se:
( )
( ) (
)
( )
( ) (
)
( ) ( )
( )
(
) ( ) ( ) (5)
O primeiro termo da Equação 5 se refere ao momento de dipolo oscilante
que gera radiação com frequência , ou seja, o espalhamento Rayleigh. Já no
segundo termo, correspondente ao espalhamento Raman, a frequência emitida pode
ser menor que a frequência incidente ( ), ou maior ( ), chamados de
espalhamento Stokes e anti-Stokes, respectivamente 13,14.
A Figura 1 mostra diagramas de níveis de energia que ilustram esses três
processos. Na parte inferior da figura, é representado o nível eletrônico fundamental
da molécula, com os respectivos níveis vibracionais, enquanto na parte superior,
está o primeiro nível eletrônico excitado, também contendo os níveis vibracionais. Na
técnica de espectroscopia Raman convencional, a energia da radiação de excitação
não é suficiente para levar a molécula para o primeiro estado eletrônico excitado; em
vez disso, ela é levada ao chamado estado virtual, representado pela linha
23
tracejada. Este estado não é solução de uma equação de Schrödinger independente
do tempo, não correspondendo a um valor bem definido de energia, e portanto, não
representa um estado estacionário do sistema 15.
Figura 1. Representação dos processos de espalhamento (A) Rayleigh, e Raman
(B) Stokes e (C) anti-Stokes.
No espalhamento Rayleigh (Fig. 1A), a radiação incidente leva a molécula
a um estado virtual, e é espalhada sem sofrer variação na energia, com a molécula
retornando ao estado fundamental. No espalhamento Raman do tipo Stokes (Fig.
1B), a molécula é excitada do estado vibracional fundamental = 0 para um estado
virtual, e retorna para o estado vibracional = 1, sendo que a radiação é espalhada
com energia menor em relação à incidente. Essa diferença de energia corresponde à
transição = 0 = 1 de um determinado modo vibracional. De acordo com a lei
da distribuição de Maxwell-Boltzmann, à temperatura ambiente, uma pequena fração
das moléculas se encontra em estados vibracionais excitados, como = 1. A
radiação incidente leva essas moléculas a um estado virtual que, ao retornarem para
o estado fundamental = 0, provocam o espalhamento da radiação com energia
maior do que a incidente, dando origem ao efeito Raman anti-Stokes (Fig. 1C). Para
este caso, a diferença de energia também corresponde à frequência do modo
vibracional em questão 12.
24
O espectro Raman de uma molécula apresenta a intensidade do
espalhamento em função do deslocamento Raman, expresso tipicamente em
número de onda (cm-1), como mostrado na representação da Figura 2. Os valores de
deslocamento Raman vistos no espectro são a diferença de frequência entre a
radiação incidente e a radiação espalhada, e portanto, correspondem à frequência
dos modos vibracionais da molécula. A banda atribuída ao espalhamento Rayleigh,
coincidente com a frequência da fonte de excitação, é observada com alta
intensidade no centro do espectro. Em valores positivos de deslocamento, são
observadas as bandas atribuídas ao espalhamento Raman Stokes, e nos valores
negativos correspondentes, ao espalhamento anti-Stokes. Os dois lados diferem
somente nas intensidades de espalhamento, sendo as bandas anti-Stokes menos
intensas, uma vez que a população de moléculas que se encontram nos estados
vibracionais excitados é menor. Para que um modo vibracional de uma molécula
seja ativo e observado no espectro Raman, deve ser obedecida a seguinte regra de
seleção: a vibração de determinada ligação deve provocar variação na sua
polarizabilidade, ou seja, o termo (∂α/∂q)0 da Equação 5 deve ser diferente de
zero 13,14.
Figura 2. Exemplo de um espectro Raman mostrando a linha do laser ao centro, e
as bandas Stokes e anti-Stokes. Adaptado da Ref. 16.
25
Os processos de espalhamento são intrinsecamente fracos em condições
típicas, quando comparados à absorção e fluorescência, por exemplo. No fenômeno
de espalhamento Raman, a quantidade de luz espalhada por uma molécula
considerando todas as direções, (dada em fótons por segundo), se relaciona
com o fluxo de fótons que incide nessa molécula, (dado em fótons cm-2 s-1)
através da Equação 6:
(6)
A constante de proporcionalidade, , é a seção de choque para o
espalhamento Raman, que é expressa em cm2 e depende da frequência de
excitação. A definição geral da seção de choque de uma molécula, para um
determinado fenômeno ótico linear, é a área de um feixe homogêneo incidente em
que todos os fótons serão efetivamente envolvidos no processo. Quanto maior for o
seu valor, maior a interação entre a radiação e a molécula, e portanto, maior a
magnitude do processo. Dessa forma, a seção de choque permite comparar a
eficiência de fenômenos óticos como a absorção e o espalhamento, uma vez que
fornece a relação entre a quantidade de fótons que estarão envolvidos em cada
processo. A seção de choque do espalhamento Raman é da ordem de magnitude de
10-29 cm2, enquanto para a absorção, por exemplo, valores típicos variam entre
10-18 e 10-21 cm2 12,17.
Na situação em que a energia do laser está em ressonância com uma
transição eletrônica permitida da molécula, ou seja, em que essa energia é suficiente
para levar a molécula para um estado eletrônico excitado, o processo é chamado de
Raman ressonante 10. Neste caso, a condição de ressonância provoca alterações no
tensor polarizabilidade da molécula, o que afeta diretamente a seção de choque do
espalhamento. Consequentemente, a intensidade do espalhamento Raman é
aumentada em várias ordens de grandeza com relação à técnica Raman
convencional. Os modos vibracionais associados aos grupos da molécula
responsáveis pela transição eletrônica (como grupos cromóforos) são
preferencialmente intensificados no espectro, o que pode reduzir a complexidade
espectral para esta molécula 10. Neste contexto, a espectroscopia Raman
ressonante é considerada uma técnica de espectroscopia vibrônica, uma vez que
26
fornece informações das estruturas vibracional e eletrônica da amostra analisada. A
seção de choque do espalhamento Raman ressonante é da ordem de 10-24 cm2.
Os espectros Raman são de simples aquisição, e requerem mínima ou
nenhuma preparação da amostra. O espectro de uma molécula é bastante
característico e funciona como a sua impressão digital, o que permite a identificação
de compostos até mesmo em misturas 18. A aplicação convencional da técnica,
entretanto, é limitada devido à baixa intensidade do espalhamento Raman, e/ou
observação de fluorescência nos espectros para determinados analitos. Além disso,
a técnica não apresenta sensibilidade suficiente para a investigação de compostos
em baixa concentração, dificultando, por exemplo, sua aplicação para
monitoramento ambiental 19. Estes problemas têm sido contornados com o
desenvolvimento de metodologias que permitam a intensificação do espalhamento
Raman, possibilitando sua aplicação como método analítico 5,19.
2.2 Espectroscopia Raman Intensificada por Superfície (SERS)
O efeito de espalhamento Raman intensificado por superfície (Surface-
Enhanced Raman Scattering – SERS) consiste na intensificação do espalhamento
Raman de uma molécula em várias ordens de grandeza quando ela está adsorvida
na superfície de um metal, ou pelo menos nas suas proximidades (no máximo a
10 nm de distância). Esse efeito decorre, dentre outros fatores, da interação
eletromagnética da luz incidente com a chamada ressonância de plasmon do
metal 12.
A primeira observação do efeito SERS foi feita em 1974 por Fleischmann
et al. 20 ao reportar o espectro Raman intensificado de uma monocamada de piridina
adsorvida na superfície de um eletrodo rugoso de prata, cuja rugosidade foi gerada
eletroquimicamente por ciclos de oxidação e redução. Os autores observaram uma
intensificação na ordem de 106 em relação à molécula não adsorvida, e a atribuíram
à grande área superficial do eletrodo rugoso, o que permitiria a adsorção de um
maior número de moléculas. Entretanto, em 1977, Jeanmarie e Van Duyne 21 e
Albrecht e Creighton 22 constataram que o aumento na intensidade de espalhamento
era inconsistente com um simples aumento de área superficial do eletrodo, que, no
caso da piridina, levaria a um aumento na concentração de moléculas na ordem de
apenas 10 vezes. Eles assumiram, então, que se tratava de um novo fenômeno. Em
27
1978, Moskovits 23 sugeriu que a grande intensificação no espalhamento Raman
observado era resultado da oscilação coletiva dos elétrons em nanoestruturas
metálicas, a chamada ressonância de plasmon, essencialmente em cobre, prata e
ouro. Ele previu ainda que o mesmo fenômeno seria observado em suspensões
coloidais desses metais, recobertas com a molécula do analito em questão.
A partir de então, sucessivos estudos surgiram com o objetivo de
comprovar as previsões realizadas anteriormente, e elucidar os mecanismos
responsáveis pelo efeito de intensificação observado, buscando o desenvolvimento
de novos substratos metálicos 24. Hoje, a técnica é apontada como uma sonda
espectroscópica poderosa na detecção de várias moléculas, e sua aplicação é
descrita na literatura na detecção de fármacos 25, poluentes ambientais 26, moléculas
de interesse biológico 27, como DNA, enzimas e proteínas em geral, entre outras.
A explicação da origem do efeito SERS é dada de forma geral na
literatura através de dois mecanismos distintos, porém complementares: o
eletromagnético (EM) e o químico, ou de transferência de carga (TC). De maneira
geral, o mecanismo eletromagnético está relacionado com a intensificação do campo
eletromagnético próximo à superfície do metal, devido a efeitos óticos que surgem
da sua interação com a radiação eletromagnética incidente. Este mecanismo é
considerado como sendo o de maior contribuição para o efeito de intensificação do
espalhamento. Já o mecanismo de transferência de carga sugere a interação
química efetiva entre a molécula espalhadora e a superfície metálica, com a
formação de complexos de transferência de carga, que causam modificação na
polarizabilidade da molécula, levando então à intensificação do espalhamento 17,28.
Esses efeitos têm sido amplamente estudados em nanopartículas metálicas, não
somente por serem bons espalhadores de radiação, mas também por suas
propriedades óticas serem facilmente moduladas 29.
Pesquisas envolvendo nanomateriais têm apresentado grande avanço
devido à possibilidade de alterar as propriedades dos materiais conforme seu
tamanho é reduzido para a escala nanométrica. Além de apresentarem maior razão
área/volume, diferentes propriedades óticas, eletrônicas e magnéticas surgem
nestes sistemas em relação aos materiais estendidos, o que permite aplicá-los em
diversas áreas, como plasmônica, catálise e sensores óticos 30,31,32. Neste contexto,
as nanopartículas metálicas vêm sendo muito exploradas para a aplicação em
28
SERS, por exibirem o chamado efeito de Ressonância de Plasmon de Superfície
Localizado (LSPR).
2.2.1 Mecanismo Eletromagnético
A interação da radiação eletromagnética com nanopartículas metálicas foi
descrita por Gustav Mie em 1908 33. A teoria de Mie apresenta uma solução para as
equações de Maxwell, que descreve o espectro de extinção de partículas esféricas
de tamanho arbitrário, sendo a extinção, a combinação dos fenômenos de
espalhamento e absorção 34. A origem do mecanismo eletromagnético para a
intensificação do espalhamento em SERS se dá pela interação da radiação incidente
com a ressonância do plasmon de superfície da nanopartícula metálica, o que leva à
intensificação do campo elétrico local. O termo plasmon foi introduzido na literatura
científica em 1956 por David Pines, em um artigo de revisão no qual a seguinte
definição foi dada 35:
“As oscilações coletivas dos elétrons de valência se
assemelham muito às oscilações eletrônicas de plasma
observadas em descargas gasosas. Nós introduzimos o termo
‘plasmon’ para descrever o quantum de excitação elementar
associado a essa movimentação coletiva de alta frequência.”
Assim, o plasmon é definido como um quantum que representa os modos de
excitação das oscilações da densidade de cargas em um plasma. O plasma, por
definição, se refere à movimentação dos elétrons livres em um metal, em relação
aos íons positivos fixos, podendo ser chamado, neste caso, de plasma de elétrons
livres, ou plasma do estado sólido 12.
Quando a radiação incide sobre as nanopartículas metálicas muito
menores que o comprimento de onda desta radiação, o campo elétrico oscilante
interage com os elétrons livres de condução do metal e perturba a nuvem eletrônica,
de modo que esta é deslocada dos núcleos positivos da rede metálica. A atração
coulômbica entre elétrons e núcleos gera uma força restauradora, que promove a
oscilação coerente da nuvem eletrônica 12,34. A Figura 3 ilustra a oscilação da nuvem
eletrônica na partícula pela atuação do campo elétrico incidente. Essa oscilação
29
produz um momento de dipolo induzido, que promove a intensificação do campo
elétrico na vizinhança da nanopartícula. O campo elétrico acentuado é
experimentado por moléculas que eventualmente estejam próximas à sua superfície,
e isso leva ao aumento da magnitude dos processos de espalhamento. Esse efeito
confere às nanopartículas propriedades que são dependentes do material do qual
elas são constituídas, seu tamanho, e geometria. Por ser um fenômeno de
superfície, ou seja, que ocorre na interface entre o metal e o meio no qual a
nanopartícula está inserida, ele depende ainda da constante dielétrica do meio 36,37.
Figura 3. Representação da oscilação da nuvem eletrônica em uma nanopartícula
metálica esférica na presença de um campo elétrico incidente. Adaptado da Ref. 36.
As propriedades óticas dos materiais são caracterizadas pela sua função
dielétrica ( ), que são números complexos dependentes do comprimento de onda
da radiação incidente, possuindo uma componente real , e uma imaginária ,
como mostrado na Equação 7.
( ) ( ) ( ) (7)
A componente imaginária está associada à perda de energia devida à
absorção pelo material, em parte relacionada com as transições eletrônicas na
estrutura de bandas do metal. Já a parte real é relacionada com o armazenamento
de energia pelo material, e consequente espalhamento de radiação, determinando
assim a frequência de ressonância do plasmon para nanopartículas metálicas 14,38. A
Figura 4 mostra os gráficos das componentes real e imaginária da função dielétrica
30
da prata e do ouro em função do comprimento de onda. Esses metais apresentam
valores negativos para a componente real, e valores baixos e positivos para a
componente imaginária na região do visível ao infravermelho próximo, o que permite
seu uso para aplicações em plasmônica nessa faixa de comprimentos de onda.
Figura 4. Componentes real (Re[ ( )]) e imaginária (Im[ ( )]) da função dielétrica
do ouro e da prata em função do comprimento de onda. Adaptado da Ref. 38.
A magnitude de intensificação do espalhamento Raman em sistemas
contendo nanopartículas metálicas depende do campo elétrico local produzido pela
ressonância do plasmon. Para determinar esse campo elétrico na parte externa da
nanopartícula ( ), utilizam-se as equações de Maxwell aproximadas por equações
de Laplace sob determinadas condições. Considera-se uma nanopartícula
monometálica esférica, cujo tamanho seja bem menor que o comprimento da
radiação incidente, definindo uma aproximação quase estática em que o campo
elétrico incidente é considerado constante ao redor da partícula. O campo elétrico
total na parte externa da esfera é dado pela Equação 8:
[
( )] (8)
31
em que é o vetor do campo elétrico incidente orientado na direção é a
polarizabilidade do metal, é a distância radial em relação à esfera, , e são as
coordenadas cartesianas, e , e são os vetores unitários. O primeiro termo da
equação é o campo elétrico incidente na nanopartícula, enquanto o segundo é
referente ao campo induzido pelo momento de dipolo (Equação 2) na posição
resultante do efeito de plasmon no metal. Considerando ainda que a partícula, de
função dielétrica , está dispersa em um meio cuja constante dielétrica é , a
solução da equação de Laplace mostra que a polarizabilidade é dada por:
(9)
em que é o raio da esfera, e é dado por:
( )
( ) (10)
Combinando as Equações de 7 a 10, obtém-se:
(
) [
( )] (11)
A partir da Equação 11, pode-se avaliar a dependência do campo elétrico
produzido ao redor da nanopartícula com as propriedades do metal e do meio
externo. Quando a parte real da função dielétrica do metal se aproxima do valor
( ) = - , e o valor da componente imaginária é pequeno, a polarizabilidade,
associada ao segundo termo da Equação 11, adquire valores altos, o que maximiza
o valor do campo elétrico produzido pelo plasmon. Essa condição de ressonância é
possível quando a parte real da função dielétrica assume valores negativos na
região do visível e infravermelho próximo, e a parte imaginária apresenta valores
pequenos, o que é de fato observado para os metais mostrados na Figura 4. Uma
vez que a função dielétrica de determinado metal é dependente do comprimento de
onda, sua componente real, em conjunto com a constante dielétrica do meio, é
32
responsável pela determinação do comprimento de onda em que o plasmon será
observado 14,34,39,40.
Os metais Au 41, Ag 42, e menos frequentemente Cu 43, são os mais
amplamente usados em experimentos SERS, uma vez que suas bandas de
absorção do plasmon de superfície se encontram na região do visível e
infravermelho próximo, onde geralmente se encontram os comprimentos de onda
das linhas de laser mais utilizadas em equipamentos Raman. Como visto na Figura
4, a parte imaginária da função dielétrica do ouro, relativa às transições eletrônicas
interbandas, ainda apresenta altos valores abaixo de aproximadamente 600 nm,
região em que a prata apresenta grande vantagem em aplicações plasmônicas.
Acima dessa região de comprimento de onda, contudo, a absorção do ouro se
assemelha à da prata, o que favorece o seu uso devido à maior estabilidade química
deste metal.
Na região próxima a 633 nm, comprimento de onda do laser de He-Ne,
amplamente utilizado em espectroscopia Raman, a prata ainda apresenta certa
vantagem em relação à eficiência na intensificação do campo elétrico comparada ao
ouro. Contudo, nanopartículas de prata com morfologia controlada,
monodispersidade e boa estabilidade são de difícil obtenção por metodologias de
síntese química 44. Este problema pode ser contornado através da preparação de
sistemas hierárquicos de nanopartículas, como as estruturas bimetálicas caroço-
casca, em que uma nanopartícula de ouro com morfologia bem definida é recoberta
com uma camada de prata. As nanopartículas caroço-casca exibem propriedades
eletrônicas, óticas e catalíticas que podem ser diferentes das observadas para os
componentes individuais, exibindo diversas aplicações 45. No caso de sistemas
caroço-casca utilizando prata e ouro, as partículas obtidas podem incorporar a
monodispersidade do ouro com as propriedades óticas da prata, fornecendo
materiais promissores para a preparação de substratos SERS.
A avaliação das propriedades óticas das nanopartículas metálicas através
da aproximação eletrostática descrita acima considera somente que a partícula é
muito menor que a radiação incidente. Entretanto, para dimensões típicas até
aproximadamente 100 nm, é observada a influência de efeitos de tamanho nas
características das bandas de extinção atribuídas ao plasmon. O aumento no
tamanho da nanopartícula faz com que as cargas fiquem mais afastadas durante a
oscilação do dipolo, e com isso, a força restauradora que atua nessas cargas é
33
menor. Como consequência, a oscilação ocorre com uma frequência menor, e a
banda atribuída ao plasmon dessa partícula será observada em maiores
comprimentos de onda no espectro de extinção 46.
Outro fator que exerce influência na posição da banda plasmon e na
intensidade do campo elétrico produzido na superfície da nanopartícula é a sua
geometria. A geometria tem efeito no padrão de polarização da superfície e,
portanto, define o comportamento da ressonância de plasmon. Em partículas
anisotrópicas, surgem diferentes simetrias de polarização, e assim, um maior
número de bandas pode ser observado no espectro de extinção em relação às
partículas esféricas 47.
No caso de nanobastões, a ressonância de plasmon depende da
orientação do campo elétrico incidente em relação à partícula, e dessa forma, as
oscilações dipolares podem acontecer tanto no sentido transversal quanto no
longitudinal em relação ao eixo do bastão 48. Isso faz com que, utilizando uma fonte
de radiação não polarizada, duas bandas sejam observadas no seu espectro, uma
atribuída à ressonância dipolar do plasmon na direção transversal, e outra, ao
plasmon dipolar na direção longitudinal. A posição da banda longitudinal é
dependente do comprimento do bastão, pois, novamente, surge o efeito da maior
separação de cargas nessa direção em relação à direção transversal, o que faz com
que a força restauradora seja menor, e consequentemente, a oscilação tenha menor
frequência, sendo observada em maiores comprimentos de onda do que a
ressonância de dipolo transversal 49,50.
Em geometrias que possuem extremidades pontiagudas, como as placas
triangulares, pentágonos e cubos, quanto menor for a angulação dessas
extremidades, maior será o acúmulo e a separação de cargas, e portanto, mais
deslocadas estarão as bandas para menores valores de frequência. Além disso,
cálculos mostram que, nessas pontas, o maior acúmulo de carga irá produzir a maior
intensificação do campo elétrico local 47, consequentemente intensificando o
espalhamento.
2.2.2 Mecanismo Químico
A contribuição do mecanismo químico para o efeito SERS pode ser
entendida como uma modificação na polarizabilidade da molécula analisada,
resultante da formação de um complexo entre essa molécula e a superfície metálica,
34
ou seja, admite-se que haja ligação química entre os dois componentes. Com isso,
essa contribuição não se dá diretamente na intensificação do sinal Raman, mas sim
na alteração da identidade e natureza da molécula 51.
A formação do complexo entre a molécula e o metal modifica a estrutura
eletrônica das espécies envolvidas. Considera-se, como uma aproximação, que o
nível de Fermi do metal esteja localizado entre os níveis ocupados de maior energia
(HOMO), e os níveis não ocupados de menor energia (LUMO) da molécula, como
representado no diagrama da Figura 5. Quando a radiação incidente está em
ressonância com a transição eletrônica entre os níveis da molécula, ocorre o
fenômeno de Raman ressonante, discutido anteriormente. Podem ocorrer ainda dois
fenômenos de transferência de carga: a transição eletrônica entre o estado
fundamental da molécula e o nível de Fermi do metal, ou então entre o nível de
Fermi do metal e o estado excitado da molécula. Caso a radiação incidente seja
ressonante com a energia necessária para que esses processos de transferência de
carga ocorram, isso pode levar ao aumento substancial no tensor de polarizabilidade
do complexo, intensificando o sinal SERS 10,14,52.
Figura 5. Representação dos processos fotoinduzidos de transição eletrônica entre
os estados eletrônicos do metal e da molécula adsorvida quimicamente.
35
Com a adsorção química da molécula na superfície do metal, o espectro
SERS pode mostrar características distintas em comparação à molécula livre, tanto
com relação à posição, quanto à intensidade. Modos vibracionais que antes não
eram ativos, ou eram pouco intensos, podem ser vistos intensificados e/ou
deslocados.
2.3 Substratos SERS
Nanoestruturas metálicas empregadas na obtenção de espectros SERS
podem ser utilizadas na forma de suspensões coloidais de nanopartículas; estruturas
metálicas planares, tais como nanopartículas metálicas depositadas sobre uma
superfície plana (como vidros, silício, metais, entre outros) na forma de filmes; e
também em eletrodos metálicos.
Uma das formas de sintetizar nanopartículas é através dos processos top-
down, em que estruturas grandes são sistematicamente reduzidas a componentes
menores utilizando padrões ou moldes. As estruturas são obtidas de forma
controlada por técnicas como litografia e fotolitografia, dando origem a substratos
que têm sido apontados como promissores em SERS, em termos de resposta
uniforme, reprodutibilidade e quantificação 53,54. Tais técnicas permitem a preparação
de substratos metálicos com padrão pré-definido, com superfície uniforme e
modulação do valor da banda plasmon de superfície, porém exigem o uso de
equipamentos e técnicas sofisticadas de microfabricação, fazendo com que seu
custo seja bastante elevado 55.
Outra forma de preparação envolve os processos conhecidos como
bottom-up, que são definidos como sendo a preparação de sistemas maiores a partir
de unidades menores, como átomos, moléculas, polímeros, ou até mesmo
nanopartículas. A preparação das nanopartículas geralmente envolve processos de
redução química ou biológica, com a formação de núcleos e sucessivo crescimento,
o que permite bom controle de tamanho e morfologia sob condições específicas 56.
O uso das nanopartículas na preparação dos substratos é bastante
explorado na literatura, sendo que diversas abordagens são utilizadas na sua
imobilização em superfícies planas. No nosso grupo de pesquisa, placas de vidro
funcionalizadas com APTMS, um alcoxissilano que contém um grupo amino terminal,
foram utilizadas para realizar a deposição de nanopartículas de prata na obtenção
36
de substratos SERS 57,58,59. Para a imobilização de nanopartículas de ouro, trabalhos
relataram o uso do MPTMS, alcoxissilano que contem o grupo tiol terminal 60,61,62.
O desenvolvimento de dispositivos para aplicação SERS requer como
característica importante a geração de hot spots, regiões em que a curta distância
(tipicamente 1 a 2 nm) entre duas ou mais nanoestruturas com banda plasmon
promove o acoplamento dessa ressonância, o que leva a uma grande intensificação
do campo elétrico local 55. Uma única molécula localizada na região do hot spot
produz um sinal SERS de mesma intensidade de centenas a milhares de moléculas
adsorvidas em regiões onde não há hot spot 63, o que permite alcançar o regime de
detecção de uma molécula (SM-SERS – single molecule-surface enhanced Raman
spectroscopy). A Figura 6 mostra a intensificação do campo eletromagnético em
relação ao campo incidente (que incide na direção perpendicular ao eixo entre as
duas partículas), calculado pelo método das diferenças finitas no domínio do tempo
(FDTD – finite-difference time-domain), ao redor de duas nanopartículas de ouro
com 100 nm de diâmetro e espaçamento de 0,5 nm. O hot spot é representado nas
regiões amarelas, onde a intensificação do campo é máxima 64.
Figura 6. Intensificação do campo eletromagnético ao redor de um dímero de
nanopartículas de Au de 100 nm de diâmetro, com espaçamento de 0,5 nm,
calculada pelo método FDTD. A incidência da radiação é perpendicular ao eixo
entre as nanopartículas. Adaptado da Ref. 64.
37
Diversas estratégias são utilizadas para a geração de hot spots. Em
suspensões coloidais, a agregação das nanopartículas pode ser feita por interações
eletrostáticas, através da mudança na força iônica pela adição de sais; em
substratos preparados por deposição, podem ser usados métodos físicos de auto-
organização, em que um fluxo convectivo é aplicado durante a evaporação do
solvente; métodos de preparação por litografia, ou então se pode induzir a
agregação pela funcionalização da superfície de deposição ou pelo uso de agentes
que se ligam à superfície das nanopartículas 64. Neste contexto, Brolo e
colaboradores reportaram o uso da molécula propanoditiol (PDT) na imobilização e
intercalação de camadas de nanopartículas de ouro depositadas 65,66, o que leva à
sua agregação e consequente geração de hot spots.
Há um grande interesse no desenvolvimento de substratos com alta
eficiência para aplicação em SERS, buscando maior aplicabilidade da técnica em
diversas áreas, e a sua consolidação como uma ferramenta analítica. Do ponto de
vista prático, um bom substrato SERS é aquele que apresenta uma intensificação
uniforme e elevada do espalhamento Raman, com reprodutibilidade das medidas e
baixo custo de preparação. Com relação à versatilidade de aplicação, diversos
trabalhos têm relatado o uso de nanopartículas depositadas em papel, criando
sistemas flexíveis com potencial de aplicação comercial em análises de rotina para
sistemas químicos e biológicos 67,68. Dentre as vantagens desse tipo de substrato,
está o baixo custo, a biodegradabilidade, a possibilidade de produção em larga
escala, e a facilidade de transporte em grandes quantidades.
2.4 Poluentes Ambientais Emergentes
Poluentes ambientais emergentes são compostos químicos encontrados
em matrizes ambientais e biológicas, que não são comumente monitorados no
ambiente e ainda não são contemplados por legislações regulatórias de controle
ambiental, mas que são ameaças potenciais à saúde humana e aos ecossistemas,
mesmo em baixas concentrações. Esses compostos estão presentes em diversos
produtos comerciais que são produzidos em larga escala, principalmente fármacos
(antibióticos, anti-inflamatórios, antidepressivos, hormônios), pesticidas, produtos de
higiene pessoal, aditivos industriais, além de drogas ilícitas 69,70.
38
Muitos desses compostos atingem os recursos hídricos através de rejeitos
urbanos, quando a sua remoção nas estações de tratamento de esgoto não é
eficiente, e também a partir dos efluentes industriais e da agricultura. Com o número
crescente de poluentes encontrados em sistemas hídricos, surge a necessidade de
se estudar a sua ocorrência, destino e impacto ecológico, além de criar programas
de monitoramento para evitar danos ambientais e à saúde 71,72. Com isso, faz-se
necessária a utilização de uma técnica analítica sensível, eficiente e versátil para
sua detecção e monitoramento. Neste contexto, o desenvolvimento de substratos
eficientes à base de nanopartículas metálicas pode permitir a utilização de SERS
como técnica analítica de rotina. Além disso, a possibilidade do uso de
equipamentos Raman portáteis permite que as análises sejam realizadas em campo.
2.4.1 Fármacos
As sulfonamidas são uma classe de agentes antibacterianos de amplo
espectro de atuação que, em doses usuais, apresentam efeito bacteriostático, ou
seja, impedem a multiplicação das células bacterianas, retardando o avanço da
infecção. Embora a bactéria permaneça viva, a queda na taxa de divisão celular
permite que o sistema imunológico do paciente seja capaz de combater a infecção.
Em alguns casos, contudo, o tratamento é realizado utilizando altas doses desses
fármacos, levando ao efeito bactericida, ou seja, à morte da bactéria. O efeito é
baseado na inativação de enzimas envolvidas no processo de produção de ácido
fólico das bactérias, o que interrompe a biossíntese de ácidos nucleicos, e
consequentemente impede a divisão celular 73.
A Figura 7 mostra a estrutura molecular geral para as sulfonamidas
empregadas como agentes antibacterianos. Variando o grupo funcional R ligado ao
nitrogênio sulfonamídico, são obtidos compostos com diferentes propriedades físico-
químicas e farmacológicas.
Figura 7. Estrutura molecular genérica das sulfonamidas.
39
O sulfatiazol (4-amino-N-(2-tiazolil)benzenossulfonamida) é um agente
antibacteriano comumente utilizado no tratamento de infecções respiratórias e
urinárias, e vem sendo apontado como contaminante de ambientes aquáticos ao ser
encontrado em resíduos hospitalares e de estações de tratamento de esgoto. A
estrutura molecular do sulfatiazol está apresentada na Figura 8.
Figura 8. Estrutura molecular do fármaco sulfatiazol.
A detecção do sulfatiazol pela técnica de SERS foi relatada por Ratkaj e
Miljanić 74. Os autores utilizaram nanopartículas de Au, Ag e Cu em suspensão
coloidal, obtendo espectros SERS para uma solução de concentração 9.10-6 mol L-1
(energia de excitação em 785 nm), e também em uma placa de Au, para uma
solução 1.10-4 mol L-1 (excitação em 1064 nm).
2.4.2 Pesticidas
O Brasil é um dos maiores produtores e exportadores de produtos
agrícolas do mundo. Entretanto, o uso indiscriminado de agroquímicos, tanto em
relação à quantidade, quanto ao tipo de pesticida, pode oferecer risco aos
trabalhadores rurais, à população em geral e ao meio ambiente 75. Um pesticida é
uma substância, ou mistura de substâncias, cujas aplicações são prevenir, destruir,
repelir ou reduzir efeitos de pestes que atingem culturas agrícolas. Essas pestes
podem ser insetos, roedores, fungos, bactérias, ervas daninhas, ou quaisquer outros
organismos nocivos 76.
Amplamente utilizados em todo o mundo como fungicidas, os
ditiocarbamatos são agroquímicos organossulfurados utilizados em diversas culturas
agrícolas. A ação fungicida destes compostos está relacionada à reação do grupo
ditiocarbamato com enzimas das células dos fungos, ou então à sua complexação
com metais presentes nessas enzimas, inibindo sua atividade 77.
40
O tiram (dissulfeto de tetrametilthiuram ou dissulfeto de
bis-(dimetiltiocarbamoila)), cuja estrutura molecular está representada na Figura 9, é
um fungicida do grupo dos ditiocarbamatos, extensivamente utilizado como agente
protetor de folhas e frutas contra uma grande variedade de doenças causadas por
fungos. É também aplicado no tratamento de sementes, principalmente para culturas
de milho, algodão, cereais, e vegetais ornamentais 78. Além disso, o tiram é utilizado
na indústria de borracha como agente acelerador de vulcanização, e já foi
empregado no tratamento de infecções em humanos, como a escabiose, e também
como agente antibacteriano, aplicado direto à pele ou incorporado a sabões 79.
Figura 9. Estrutura molecular do fungicida tiram.
A toxicidade causada pela exposição ao tiram pode levar a danos aos
olhos e pele, como dermatites de contato, além de problemas no fígado devidos à
liberação de dissulfeto de carbono 80,81. Estudos mostraram que ele pode ainda
apresentar efeitos mutagênicos 82 e induzir a formação de tumores 83. De acordo
com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o tiram é classificado como
moderadamente nocivo à saúde humana 84.
Diversos trabalhos reportaram a detecção do tiram utilizando substratos
SERS. Lv et al. 85, Zhang et al. 86, e Zhang et al. 87 detectaram o espectro do
fungicida até a concentração de 1.10-7 mol L-1 empregando, respectivamente, asas
de cigarra decoradas com nanopartículas de ouro, nanofios de prata depositados em
substratos de vidro, e nanopartículas caroço-casca de Au e Ag intercaladas por uma
folha de óxido de grafeno. Wang e colaboradores 88 atingiram o limite de detecção
de 1.10-9 mol L-1, utilizando microesferas poliméricas recobertas com nanopartículas
de prata como substrato.
Na classe dos inseticidas, os compostos em geral são neurotóxicos,
atuando no sistema nervoso central dos organismos alvo e causando o
envenenamento pela inibição de enzimas específicas. Devido a isso, a toxicidade
41
da maioria desses compostos não é seletiva, sendo uma ameaça a outras
espécies, inclusive a humanos, e por serem lipossolúveis, são facilmente
absorvidos pela pele 76. Dentre os inseticidas mais conhecidos, o paration
(fosfotioato de O,O-dietil-O-(4-nitrofenila)) é um composto organofosforado utilizado
principalmente em culturas de cereais, frutas, legumes, algodão e plantas
ornamentais 89. Sua estrutura molecular está representada na Figura 10. Devido à
sua alta toxicidade, ele já foi banido ou considerado de uso restrito em diversos
países, tendo sido responsável por um grande número de casos de intoxicação em
seres humanos 90. Além dos efeitos neurológicos associados ao contato com o
paration, a exposição prolongada a este inseticida pode causar genotoxicidade e
carcinogenicidade 91,92. Na classificação da OMS, o paration aparece como
extremamente nocivo à saúde 84.
Figura 10. Estrutura molecular do inseticida paration
Espectros SERS do paration foram reportados por Han et al. 93 utilizando
nanoesferas de sílica encapadas com prata, para as quais o limite de detecção de
1.10-7 mol L-1 foi atingido. Jiang et al. 94 reportaram espectros para a concentração
de 1.10-9 mol L-1, empregando como substrato nanobastões de MnO2 decorados
com ouro.
42
3. OBJETIVOS
O objetivo principal do projeto foi desenvolver um substrato SERS
eficiente na detecção de moléculas classificadas como poluentes ambientais, e que
possam futuramente ser adaptados para o uso em análises de rotina. A base para a
preparação dos substratos foi o uso de nanopartículas com propriedades
plasmônicas, visando obter a máxima intensificação do espectro Raman de
determinadas moléculas através do efeito SERS. Com isso, busca-se a detecção
destas moléculas em soluções bastante diluídas, com a finalidade de, futuramente,
empregar os substratos na análise de matrizes ambientais, como água de rios e
lagos.
Para isso, foram estabelecidos como objetivos específicos do trabalho:
Sintetizar e caracterizar dois tipos de nanopartículas metálicas com
morfologia e tamanho controlados: os nanobastões de ouro, e os
nanobastões caroço-casca de ouro e prata;
Empregar as suspensões obtidas na preparação dos substratos através da
sua deposição em placas de vidro funcionalizadas com alcoxissilanos.
Avaliar e comparar a eficiência dos substratos através da detecção da
molécula sonda 4-aminobenzotiol (4-ABT) pela técnica de SERS.
Empregar o substrato de melhor desempenho, caracterizado pela eficiência
em termos do limite de detecção, na análise das moléculas contaminantes
selecionadas: o fármaco sulfatiazol, e os pesticidas tiram e paration.
43
4. MATERIAIS E MÉTODOS
Na Tabela 1, estão listados os reagentes utilizados no projeto, as
respectivas marcas e purezas. Todos os reagentes foram utilizados como recebidos
dos fornecedores, sem purificação adicional. Em todas as etapas, foi utilizada água
deionizada (resistividade 18,2 MΩ cm a 25 ºC), e as vidrarias foram previamente
lavadas com água régia (HCl:HNO3 na proporção 3:1).
Tabela 1. Lista de reagentes utilizados no trabalho.
Reagente Marca Pureza (%)
Nome
Fórmula química
Ácido clorídrico HCl Synth ≥ 37a
Ácido nítrico HNO3 Synth 65
Brometo de cetiltrimetilamônio C19H42BrN Aldrich ≥ 99
Ácido tetracloroáurico HAuCl4 Aldrich ≥ 49b
Boroidreto de sódio NaBH4 Aldrich 99,99
Nitrato de prata AgNO3 Aldrich ≥ 99
Hidróxido de sódio NaOH Synth 97
Peróxido de hidrogênio H2O2 Synth 29c
Polivinilpirrolidona (PVP - 55000) (C6H9NO)n Aldrich ―
Ácido ascórbico C6H8O6 Aldrich ≥ 99,7
Ácido sulfúrico H2SO4 Synth 98
(3-aminopropil)-trimetoxissilano C6H17NO3Si Acros 95
(3-mercaptopropil)-trimetoxissilano C6H16O3SiS ABCR 97
1,3-Propanoditiol C3H8S2 Aldrich 99
Etanol C2H5OH Synth 99,5
4-aminobenzotiol C6H7SN Aldrich 97
Sulfatiazol C9H9N3O2S2 Fluka 99,9
Tiram C6H12N2S4 Fluka 99,9
Paration C10H14NO5PS Fluka 99,7
a Teor dissolvido em água;
b Baseado em Au;
c (v/v) em água.
44
4.1 Síntese de nanobastões de ouro (AuNRs)
Os nanobastões de ouro foram preparados em meio aquoso de acordo
com metodologia reportada na literatura 95, utilizando peróxido de hidrogênio em
meio básico como agente redutor e crescimento através do uso de sementes de
ouro.
4.1.1 Preparação da suspensão de sementes de ouro
Em um balão de fundo redondo de 50 mL, mantido a 28 ºC em banho de
água, foram adicionados 4 mL de uma solução de brometo de cetiltrimetilamônio
(CTAB) 0,1 mol L-1 e 40,5 µL de uma solução 1 % de HAuCl4. Em seguida, 24 µL de
solução de NaBH4 0,1 mol L-1 foram adicionados rapidamente ao balão, sob
agitação. A solução de NaBH4 foi preparada com água gelada, imediatamente antes
do uso. Após agitação por 2 min, a solução foi deixada em banho de água a 28 ºC
por cerca de 1 h antes do uso na próxima etapa. A Figura 11 ilustra a síntese da
suspensão de sementes de ouro.
Figura 11. Esquema reacional da preparação das sementes de ouro.
4.1.2 Preparação da solução de crescimento dos AuNRs
O crescimento dos AuNRs foi feito conforme o esquema mostrado na
Figura 12. A 50 mL de uma solução de CTAB 0,1 mol L-1, foram adicionados 20 µL
de AgNO3 0,1 mol L-1, e 1,03 mL de uma solução de HAuCl4 24,28 mol L-1. Em
seguida, foram adicionados 162,5 µL de solução de NaOH 1 mol L-1, e 27,5 µL de
H2O2 30 %. A solução foi agitada por 1 min, e então foram adicionados rapidamente
150 µL da suspensão de sementes, cuja preparação foi descrita acima. A suspensão
resultante permaneceu sob agitação por 30 s, e então foi mantida em banho de água
45
a 28 ºC por pelo menos 1,5 h. Foi obtida uma suspensão de cor roxa escura, que foi
centrifugada a 14000 rpm por 10 min e redispersa em água deionizada.
Figura 12. Esquema reacional do crescimento dos nanobastões de ouro.
4.2 Síntese de nanobastões caroço-casca de ouro e prata (Au@AgNRs)
A síntese dos sistemas caroço-casca foi feita em meio aquoso seguindo
procedimento descrito na literatura 96 com algumas modificações, através da
redução de solução precursora de prata por ácido ascórbico em meio básico.
Inicialmente, 8 mL da suspensão de nanobastões de ouro foram dispersos em 20 mL
de solução de polivinilpirrolidona (PVP; massa molar média 55000 g mol-1) 2 %. Em
seguida, foram adicionados diferentes volumes de solução de AgNO3 1 mmol L-1
(0,75; 1,0; 1,5 e 2,5 mL), e 0,5 mL de solução aquosa de ácido ascórbico 0,1 mol L-1.
A suspensão foi agitada por 2 min, e em seguida, 1 mL de solução de hidróxido de
sódio 0,1 mol L-1 foi rapidamente adicionado. A reação se completou em
aproximadamente 2 min obtendo-se suspensões com diferentes tonalidades da cor
verde. Na Figura 13, está mostrado o esquema de síntese dos Au@AgNRs.
Figura 13. Esquema reacional da síntese da casca de prata sobre os AuNRs.
46
4.3 Preparação dos substratos SERS
Inicialmente, lâminas de vidro com 1,2 cm x 1,2 cm foram imersas em
solução piranha (H2SO4:H2O2 na proporção 4:1) por 2 h, lavadas abundantemente
com água deionizada e secas em estufa a 105 ºC por 10 min. Para a deposição das
nanopartículas de ouro, a funcionalização dos substratos foi realizada utilizando uma
solução de (3-mercaptopropil)-trimetoxissilano (MPTMS) na proporção
10 % MPTMS/4,5 % água/85,5 % etanol (em volume), enquanto que para as
nanopartículas caroço-casca, foi utilizada solução de (3-aminopropil)-trimetoxissilano
(APTMS) na mesma concentração. As placas secas foram imersas na solução
correspondente por um período de 16 h, e em seguida, lavadas com etanol e
mantidas em estufa a 110 ºC por 1 h.
Para fazer a deposição das nanopartículas de ouro sobre o vidro
silanizado com MPTMS, 100 µL da suspensão de nanobastões foram gotejados
sobre as placas, que foram então colocadas em estufa a 40 ºC por 20 min, lavadas
com água deionizada e secas sob fluxo de N2. Em seguida, foi feita a intercalação
utilizando uma solução de propanoditiol (PDT) 5 mmol L-1 em etanol. As placas
foram imersas nesta solução por 1 h, lavadas com etanol e secas sob fluxo de N2,
completando uma deposição. O processo foi então repetido mais quatro vezes,
totalizando cinco deposições de AuNRs. A deposição da suspenção de
nanopartículas caroço-casca foi realizada da mesma forma sobre as placas
funcionalizadas com APTMS, porém, não foi feita intercalação com PDT.
4.4 Caracterização
4.4.1 Caracterização das suspensões de nanopartículas
A caracterização dos nanobastões obtidos foi feita por espectroscopia de
absorção no UV-Vis-NIR utilizando espectrofotômetro Agilent HP8354, na faixa de
300 a 1000 nm; microscopia eletrônica de transmissão (TEM) em equipamento Zeiss
Libra 120, com potencial de aceleração de 120 kV; microscopia eletrônica de
transmissão de alta resolução (HRTEM) e espectroscopia de raios X por energia
dispersiva (EDS) em equipamento TEM-FEG JEOL JEM 2100F, com potencial de
aceleração de 200 kV e resolução de 1,9 Å (imagens e medidas realizadas no
Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano) do Centro Nacional de Pesquisa
47
em Energia e Materiais (CNPEM)). Para as análises de microscopia, as suspensões
aquosas foram gotejadas em grades de cobre recobertas com carbono, e secas à
temperatura ambiente.
4.4.2 Caracterização dos substratos SERS
As placas de vidro foram analisadas por espectroscopia de absorção no
UV-Vis-NIR em espectrofotômetro Varian Cary 50 na faixa de 300 a 1000 nm. A
distribuição das nanopartículas nos substratos foi avaliada por microscopia
eletrônica de varredura com emissão de campo (SEM-FEG), a partir da deposição
em placas de silício funcionalizadas com os silanos correspondentes. As imagens
foram feitas em equipamento Quanta FEG 250 (FEI), utilizando potencial de
aceleração de 10 kV e detector de elétrons secundários.
4.5 Avaliação da atividade SERS dos substratos
A eficiência dos substratos quanto à atividade SERS foi avaliada
utilizando a molécula sonda 4-aminobenzotiol (4-ABT). Foi preparada uma solução
1.10-3 mol L-1 em etanol, a partir da qual foram feitas diluições em água para
concentrações entre 1.10-4 e 1.10-15 mol L-1. Sobre cada placa de vidro contendo
nanopartículas, foram depositados 150 µL de cada solução de 4-ABT, o suficiente
para cobrir toda a superfície do vidro, que foi então mantido em dessecador para a
evaporação do solvente à temperatura ambiente.
As medidas de espectroscopia Raman foram realizadas no Laboratório
Multiusuário de Espectroscopia Óptica Avançada (LMEOA) do Instituto de Química
da UNICAMP. Os espectros Raman foram obtidos no equipamento HORIBA Jobin
Yvon T64000, com detector CCD resfriado com nitrogênio líquido, e acoplado a um
microscópio ótico com resolução espacial de 1,0 μm e resolução espectral de 1 cm-1,
utilizando o laser de He-Ne (632,8 nm). O laser foi focado na amostra com objetiva
de 100x, e a coleta dos espectros foi feita com tempo de exposição de 30 s e sem
acumulação. Os spikes foram removidos dos espectros com a utilização da
ferramenta de filtro despike.
A partir dos resultados de intensificação obtidos para os substratos
utilizando a molécula sonda, o sistema selecionado foi utilizado para analisar o
fármaco e os pesticidas. Para o sulfatiazol, foi preparada uma solução de
48
concentração 1.10-3 mol L-1 em etanol, a partir da qual foram feitas diluições
sucessivas em água. Já para os pesticidas tiram e paration, as soluções 1.10-3 mol L-1
foram preparadas em acetona, prosseguindo com as diluições em água. A
deposição nos substratos a partir das soluções diluídas foi realizada da mesma
forma que para o 4-ABT.
49
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO
5.1 Nanobastões de ouro
AuNRs foram sintetizados pelo método de crescimento a partir de
sementes com o uso de H2O2, que atua como agente redutor em meio básico. Tal
metodologia permite obter partículas com morfologia e tamanho bem definidos, e
com controle da posição da banda de ressonância do plasmon de superfície. A
síntese de nanobastões requer um controle rigoroso tanto dos efeitos
termodinâmicos, relacionados com a estabilização de faces cristalográficas
específicas, quanto cinéticos, relativos ao crescimento anisotrópico, e assim,
diversos parâmetros estão envolvidos.
O uso de um surfactante catiônico de cadeia longa, como o CTAB (Figura
14A), é crucial para o direcionamento de morfologia durante o crescimento da
nanopartícula, formando uma estrutura de bicamada ao seu redor 97, como mostrado
na Figura 14B. A cadeia do surfactante deve ser longa o suficiente para promover a
estabilização da nanopartícula, mas curta suficiente para permanecer solúvel nas
condições da síntese e armazenamento da suspensão. Estudos mostraram que os
íons brometo presentes nesta molécula são fortemente adsorvidos a faces
específicas do ouro 98, principalmente às faces laterais de maior índice, que
possuem estrutura de empacotamento mais espaçada.
(A)
(B)
Figura 14. (A) Estrutura molecular do CTAB e (B) bicamada de CTAB na superfície
do nanobastão de ouro (adaptado da Ref. 99).
O precursor de ouro é adicionado na forma de íons [AuCl4]‾, um complexo
de metal d8, cuja solução apresenta cor amarela clara devida a transições
ligante–metal. Na presença de CTAB, os cloretos do complexo são substituídos por
50
brometos, uma vez que a energia de complexação com o ouro é maior para este
último, e isso é evidenciado pela alteração na cor da solução para laranja escura.
Subsequentemente, o íon precursor forma um complexo com micelas do surfactante
na forma AuBr4―CTA, o que altera o seu potencial de redução, e assim interfere na
cinética de crescimento das partículas 100. A Tabela 2 apresenta os potenciais-
padrão de redução em solução aquosa dos íons e complexos de ouro 101.
Tabela 2. Potenciais-padrão de redução dos íons e complexos de ouro em água 101.
Semi-reação Potencial-padrão (V)
Au3+/Au+
Au3+ + 2e‾ → Au+ +1,40
[AuCl4]‾ + 2e‾ → [AuCl2]‾ + 2Cl‾ +0,93
[AuBr4]‾ + 2e‾ → [AuBr2]‾ + 2Br‾ +0,80
Au+/Au
Au+ + e‾ → Au +1,71
[AuCl2]‾ + e‾ → Au + 2Cl‾ +1,15
[AuBr2]‾ + e‾ → Au + 2Br‾ +0,96
Os complexos mostrados na Tabela 2 são mais estáveis do que os íons
de ouro livres e, portanto, são mais dificilmente reduzidos, o que é evidenciado pelos
menores valores de potencial de redução. O complexo [AuBr4]‾ apresenta potencial
ainda menor do que o [AuCl4]‾ , de modo que um agente redutor fraco é capaz de
reduzi-lo apenas a [AuBr2]‾, mas não a ouro metálico, o que só ocorre quando as
sementes são adicionadas. Isso evita a nucleação secundária na solução de
crescimento dos bastões. A formação do complexo [AuBr4]―CTA diminui ainda mais
esse potencial, sendo então reduzido a [AuBr2]―CTA pelo H2O2 em meio básico
(potencial de redução +0,15 V 102), e garantindo que a deposição ocorra de forma
controlada. Essa primeira redução é evidenciada pelo desaparecimento da cor
alaranjada da solução, que se torna incolor, uma vez que o centro metálico do
complexo agora possui configuração d10, e a transferência de carga ligante–metal
não é mais observada. A micela contendo complexo reduzido direciona os íons
precursores até as sementes, que agem como catalisadores da redução controlada
do Au+ a ouro metálico na sua superfície 100.
51
Durante o crescimento do cristal, a bicamada formada pelas moléculas do
surfactante faz com que as extremidades fiquem mais susceptíveis ao contato com
as micelas que contêm os íons Au+, devido à interação preferencial do CTAB com as
faces específicas do ouro e à curvatura da estrutura da bicamada nas extremidades
50,103,104. Esse mecanismo de crescimento faz com que a síntese seja extremamente
sensível a impurezas, principalmente em relação a íons haleto. Quando o CTAB não
é de alta pureza, pode haver traços de iodeto, o que impossibilita a obtenção de
nanobastões. Os íons iodeto possuem energia de adsorção maior do que o brometo
em determinadas faces do ouro, se ligando preferencialmente à face {111}. Dessa
forma, a presença de iodeto, mesmo na ordem de ppm, impede a formação de
bastões e favorece a obtenção de outras morfologias, como esferas e placas
triangulares 98,105,106.
Ainda não há um consenso quanto ao papel da prata na formação dos
bastões de ouro, mas os estudos têm mostrado que o Ag+ está envolvido na quebra
de simetria durante o crescimento das sementes, e que, na sua ausência, não é
obtida uma quantidade significativa de nanobastões. Um estudo sistemático sobre
esse mecanismo foi realizado por Walsh et al. 107. Os pesquisadores mostraram que
as sementes de ouro preparadas por esta metodologia possuem em torno de 2 nm,
e são monocristais cuboctaédricos que contêm 8 faces {111} e 6 faces {100}
arranjadas simetricamente (Figura 15), cujo crescimento não implicaria, a princípio,
em uma quebra de simetria. A presença do CTAB modifica a energia superficial da
partícula, uma vez que ele adsorve preferencialmente às faces {100},
estabilizando-as em relação às {111}.
Figura 15. Ilustração da estrutura cuboctaédrica das sementes de ouro estabilizadas
por CTAB. Adaptado da Ref. 107.
52
As sementes iniciam então o crescimento isotrópico. Os autores
observaram que, quando as partículas possuem em torno de 4 a 6 nm, surgem
planos de truncamento assimétrico de maior índice, nas regiões de encontro entre os
planos {111}. Eles sugerem que esses truncamentos são incorporados à estrutura
da partícula para reduzir efeitos de borda onde planos de menor índice se
encontram, diminuindo significativamente a energia livre de superfície da estrutura.
Na Figura 16, são mostradas ilustrações e imagens de microscopia, nas quais é
evidenciada a formação do plano de truncamento durante o crescimento da
semente. A faixa de tamanho em que os truncamentos são observados corresponde
exatamente à faixa em que se relata a quebra de simetria das partículas.
Figura 16. Ilustrações e imagens de TEM do surgimento de planos de truncamento
durante o crescimento das sementes de ouro. Adaptado da Ref. 107.
53
Os autores do trabalho propõem que as faces assimétricas de
truncamento são estabilizadas preferencialmente pelas espécies Ag+ presentes na
solução de crescimento, uma vez que seu empacotamento atômico é mais espaçado
em relação às outras faces mais compactas. Essas faces estabilizadas por uma
camada de prata, e que são distribuídas de maneira não simétrica, possuem
estabilidade intensificada em relação às outras, fazendo com que a subsequente
deposição de átomos de ouro ocorra mais rapidamente nas outras direções. O
crescimento então prossegue de forma assimétrica, gerando partículas
monocristalinas anisotrópicas.
Existe controvérsia na literatura quanto à atribuição das faces cristalinas
expostas nos AuNRs. O primeiro estudo foi feito por Wang et al. 108 em 1999. Os
autores descreveram os nanobastões como sendo monocristais com retículo
cristalino fcc (cúbico de faces centradas), seção transversal octogonal, apresentando
as faces {100} e {110} intercaladas, paralelas ao eixo longitudinal, e na extremidade,
uma face {001}, quatro {110} e quatro {111}. Mais recentemente, outras publicações
apresentaram atribuições alternativas, como a de Carbó-Argibay et al. 109, que vem
sendo mais aceita. Este trabalho mostrou que, na verdade, a lateral dos
nanobastões é composta por oito faces equivalentes de alto índice, {520}, com as
extremidades ainda compostas pelas faces {110} e {111}, como na atribuição
anterior. Os autores relacionaram a estrutura proposta com o mecanismo de
crescimento dos bastões, em que a adsorção seletiva do CTAB em faces
equivalentes nas laterais favoreceria o crescimento unidimensional da partícula.
A Figura 17 mostra representações da estrutura cristalina de nanobastões
de ouro, comparando os modelos propostos por Wang (Figura 17A) e por Carbó-
Argibay (Figura 17B). O segundo autor suporta ainda sua proposta mostrando a
correspondência entre os ângulos medidos entre as faces nas micrografias e os
valores esperados para esses ângulos.
54
Figura 17. Estrutura cristalina dos AuNRs e dos ângulos entre as faces para os
modelos propostos por (A) Wang e (B) Carbó-Argibay. Adaptado da Ref. 109.
A caracterização dos AuNRs obtidos foi feita por espectroscopia na região
do UV-Vis-NIR em suspensão aquosa, cujo espectro de extinção está mostrado na
Figura 18.
400 500 600 700 800 900 1000
520
Exti
nção
Comprimento de onda (nm)
730
Figura 18. Espectro de extinção da suspensão de AuNRs.
A síntese permite o controle do comprimento dos bastões de tal forma que
a banda plasmon longitudinal varie entre aproximadamente 700 e 980 nm. Os
55
parâmetros reacionais foram selecionados, a fim de se obter bastões com a banda
longitudinal mais próxima possível à linha do laser utilizado nos experimentos SERS,
ou seja, 632,8 nm, sem comprometer a qualidade dos nanobastões. Foram
observadas as duas bandas características de nanopartículas metálicas no formato
de bastões, a primeira na região de 520 nm, atribuída ao plasmon transversal de
nanobastões de ouro, e a segunda, em 730 nm, atribuída ao plasmon longitudinal.
Na Figura 19, estão apresentadas as imagens de TEM dos AuNRs, que
confirmaram a obtenção de partículas com morfologia controlada. São observadas
também, em menor quantidade, partículas cúbicas, esféricas e de morfologia não
definida, que são impurezas típicas da síntese de nanobastões de ouro 110.
Figura 19. Imagens de TEM dos AuNRs
56
A fim de obter dados estatísticos sobre a distribuição de tamanho dos
nanobastões obtidos na síntese, foi feita a contagem de 650 partículas a partir das
imagens de TEM, medindo tanto o comprimento dos bastões quanto a sua
espessura. A Figura 20 mostra o histograma tridimensional que representa a
distribuição das dimensões dos bastões medidos.
Figura 20. Histograma tridimensional da distribuição dimensional dos AuNRs.
A partir do histograma da Figura 20, observa-se um bom controle de
crescimento das nanopartículas pelo método de síntese, com intervalos estreitos de
distribuição. Em relação ao comprimento, a maioria dos bastões se encontrou na
faixa entre 40 e 70 nm, sendo o valor médio (com o respectivo desvio padrão
amostral) de 49 ± 9 nm, enquanto para a espessura, os bastões ficaram limitados
entre 10 e 21 nm, com valor médio e desvio padrão de 16 ± 2 nm. A razão de
aspecto, que é a razão entre o comprimento e a espessura dos bastões, apresentou
valor médio de 3,1.
Foram feitas imagens de HRTEM, mostradas na Figura 21, para avaliar a
estrutura cristalina das partículas de ouro. Na região ampliada da Figura 21A, a
distância interplanar foi medida como sendo 0,24 nm, atribuída aos planos (111) do
ouro de acordo com a ficha cristalográfica JCPDS #4-784. Na imagem da
57
Figura 21B, foram também observadas distâncias interplanares de 0,20 nm
atribuídas aos planos (200). As franjas observadas nas partículas sobrepostas da
Figura 21B são franjas de interferência conhecidas como padrão de Moiré 111. De
modo geral, esse fenômeno ocorre quando duas grades de espaçamento próximo
ou idêntico são superpostas, sendo associado, no caso de nanoestruturas
cristalinas, a distâncias interplanares semelhantes.
Figura 21. (A-B) Imagens de HRTEM dos nanobastões de ouro. A região ampliada
da Figura 21A mostra a medida da distância interplanar.
5.2 Nanobastões caroço-casca de ouro e prata
O recobrimento dos AuNRs com Ag foi realizado através da redução
utilizando ácido ascórbico em meio básico, e PVP como agente estabilizante. A
espécie capaz de reduzir o precursor Ag+ é o ascorbato monoaniônico, que está
majoritariamente presente em valores de pH elevados. Em pH ácido, o ácido
ascórbico está presente na forma não dissociada (pKa1 = 4,1) e não é capaz de
reduzir os íons Ag+ 112. O uso de um agente redutor fraco faz com que o processo de
deposição sobre os nanobastões de ouro seja lento e controlado, evitando a
homonucleação, e consequente crescimento de partículas monometálicas de prata.
Estudos do mecanismo de recobrimento 113,114 mostraram que ocorre a formação de
um complexo entre o Ag+ e o CTAB presente na superfície dos AuNRs. Esse
(A) (B)
58
processo também garante que a redução seja lenta, mantendo a quantidade de
átomos de prata metálica abaixo de uma concentração crítica de homonucleação.
Além disso, a complexação com os íons brometo do CTAB favorece o contato dos
precursores de prata com as faces expostas dos AuNRs. As cadeias de PVP, além
de promoverem a estabilização das nanopartículas por efeitos estéricos, podem
também coordenar aos íons de prata antes da sua redução, contribuindo para a
deposição mais controlada 45.
O crescimento da camada de prata sobre os planos cristalinos do ouro
ocorre de forma epitaxial, uma vez que os parâmetros de rede da estrutura fcc de
ambos os metais são bastante próximos (Au: 0,4078 nm; Ag: 0,4086 nm). Quando a
deposição é controlada, o crescimento ocorre nas direções [110], que apontam para
as laterais dos AuNRs, e na direção [001], e isso leva à formação de 4 faces {100}
nas laterais, e 2 nas extremidades. Com isso, a estrutura com seção octogonal dos
nanobastões de ouro é recoberta pela prata formando um prisma quadrado. A
deposição ocorre uniformemente em todas essas direções, o que reduz a razão de
aspecto das partículas 114.
A Figura 22 mostra os espectros de extinção para AuNRs e para
Au@AgNRs sintetizados com volumes crescentes de solução de AgNO3, que
fornecem evidências da formação da estrutura caroço-casca. As bandas que eram
atribuídas ao plasmon longitudinal e transversal dos nanobastões puros ainda são
observadas, agora sendo atribuídas às ressonâncias na interface Au-Ag. A banda do
plasmon longitudinal sofre deslocamento para menores comprimentos de onda
devido à redução da razão de aspecto dos bastões, uma vez que o aumento da
concentração de íons Ag+ leva à formação de cascas mais espessas. Esse
deslocamento também é atribuído à incorporação das propriedades óticas da prata,
que geralmente apresenta comprimentos de onda de extinção menores para
partículas de mesmo tamanho e morfologia 115. A banda do plasmon transversal, que
é menos sensível à razão de aspecto, sofre um deslocamento discreto.
59
Figura 22. Espectros de extinção na região do UV-Vis-NIR dos AuNRs, e das
partículas caroço-casca Au@Ag sintetizadas pela adição de diferentes volumes da
solução de AgNO3 1 mmol L-1.
Estudos sugeriram que, com a formação das partículas caroço-casca,
observa-se outra banda em menor comprimento de onda, atribuída à oscilação
dipolar transversal na superfície da casca de prata 116. Contudo, nos espectros da
Figura 22, foram observadas duas outras bandas, nas regiões de 340 e 400 nm.
Esse desdobramento se origina quando o crescimento da prata ocorre de forma
assimétrica, ou seja, a deposição é maior em um dos lados do nanobastão. A banda
em 400 nm é então atribuída à oscilação no lado mais espesso, enquanto aquela em
340 nm, ao lado mais fino 114,117.
Na Figura 23, são mostradas fotos das suspensões de nanobastões
obtidas nas sínteses. A primeira foto à direita é a suspensão de AuNRs, e nas
demais, as partículas Au@Ag NRs, em que o volume de AgNO3 utilizado na síntese
aumenta da direita para a esquerda. Para a sequência dos estudos com as
nanopartículas caroço-casca, foi selecionada a suspensão cuja banda referente ao
plasmon longitudinal mais se aproximou da linha do laser utilizado como excitação
na espectroscopia Raman, condição de ressonância para a qual se espera a maior
60
intensificação na banda SERS. Com isso, a caracterização seguiu com a suspensão
preparada a partir da adição de 1,5 mL de solução de AgNO3 1 mmol L-1.
Figura 23. Fotos das suspensões obtidas nas sínteses de AuNRs e Au@AgNRs.
A obtenção de estruturas do tipo caroço-casca foi confirmada pelas
imagens de HRTEM, mostradas na Figura 24. Os componentes dos nanobastões
são facilmente distinguidos pela diferença de contraste entre a prata e o ouro nas
imagens, que é devida ao maior número atômico do ouro. As imagens das Figura
24A e B mostram o recobrimento homogêneo da prata ao redor do bastão de ouro.
Entretanto, nas Figura 24C e D, foram identificadas partículas cujo recobrimento não
foi uniforme, com maior acúmulo de prata em uma das laterais. O crescimento
assimétrico da casca de prata é atribuído na literatura a uma deposição rápida e
menos controlada na superfície dos AuNRs, e contribui para o aparecimento das
duas bandas de extinção em baixos comprimentos de onda vistas no espectro da
Figura 22 114. O valor da distância interplanar medido na região ampliada da
Figura 24B é de 0,208 nm, atribuído aos planos (200) da prata, de acordo com a
ficha cristalográfica JCPDS #4-783.
61
Figura 24. (A-D) Imagens de HRTEM dos Au@AgNRs. A região ampliada da Figura
24B mostra a medida da distância interplanar.
Análises de espectroscopia de raios X por energia dispersiva (EDS) foram
realizadas para comprovar a estruturação hierárquica entre o bastão de ouro no
caroço e a prata na casca. As Figuras 25A e B apresentam o mapeamento de
composição química realizado em alguns nanobastões observados por TEM, em que
as cores amarela e laranja representam, respectivamente, a presença de ouro e de
prata na região analisada. Na Figura 25A, pode ser observado ainda um bastão de
ouro que não foi recoberto por prata. Foi feito mapeamento por perfil de linha nos
dois bastões indicados pelas linhas azuis na Figura 25B, com os respectivos gráficos
apresentados nas Figuras 25C e D. Os resultados mostraram que, de fato, o ouro
(A) (B)
(C) (D)
62
está no interior da nanopartícula, e que foi recoberto por uma camada de prata,
formando a estrutura caroço-casca.
Figura 25. (A-B) Imagens de mapeamento de composição química dos nanobastões
caroço-casca de ouro e prata, e gráficos da distribuição de composição ao longo da
(C) Linha 1 e (D) Linha 2 na Figura 25B.
5.3 Preparação e caracterização dos substratos SERS
Uma vez sintetizadas e caracterizadas, as suspensões contendo AuNRs e
Au@AgNRs foram utilizadas na preparação dos substratos SERS, através da
63
deposição sobre lâminas de vidro funcionalizadas com MPTMS e APTMS,
respectivamente. As suas respectivas estruturas moleculares estão representadas
nas Figura 26A e B. Os organossilanos funcionais são muito utilizados para
promover a adesão entre uma superfície mineral, em geral composta de sílica, e
outro material, como polímeros, superfícies metálicas e nanopartículas 118. Entre os
mais utilizados, estão os trimetoxissilanos, tendo sido utilizadas neste trabalho as
moléculas com terminações tiol e amino.
(A)
(B)
Figura 26. Estruturas moleculares do (A) MPTMS e (B) APTMS.
Em solução aquosa, os grupos metóxi dessas moléculas são hidrolisados
e formam silanóis, que podem então sofrer condensação entre si e/ou com grupos
silanol presentes na superfície da sílica 118,119, como representado na Figura 27. A
funcionalização do substrato de vidro com tais moléculas faz com que o grupo
funcional correspondente fique disponível para interagir com as nanopartículas, que
ficarão desta forma, quimicamente ligadas ao substrato, evitando a lixiviação.
Figura 27. Ilustração da funcionalização do substrato de vidro com alcoxissilanos,
com a representação da hidrólise, seguida da condensação. Na última imagem à
direita, é mostrado exemplo do vidro funcionalizado com MPTMS.
64
Para os substratos contendo nanobastões de ouro, cada deposição foi
intercalada pela funcionalização com moléculas de propanoditiol, que possuem um
átomo de enxofre em cada extremidade, e dessa forma interagem com as camadas
promovendo melhor fixação das nanopartículas. A Figura 28 mostra ilustrações do
substrato funcionalizado com MPTMS e deposição de AuNRs, e também da
intercalação de camadas com o PDT. A intercalação foi feita com o objetivo de
promover maior fixação e agregação entre as nanopartículas, favorecendo a
geração de hot spots na superfície do substrato.
(A)
(B)
Figura 28. Ilustrações da (A) deposição de AuNRs sobre vidro funcionalizado com
MPTMS e (B) intercalação das deposições com PDT.
A deposição das nanopartículas caroço-casca ocorre de forma análoga à
mostrada na Figura 28A, porém utilizando o APTMS, que possui o grupo amina
terminal. Os espectros de extinção na região do UV-Vis-NIR dos substratos
contendo AuNRs e Au@AgNRs estão mostrados na Figura 29. As bandas atribuídas
ao plasmon longitudinal encontram-se deslocadas para menores comprimentos de
onda em relação aos nanobastões em suspensão, o que é consequência da
mudança na constante dielétrica do meio em que elas se encontram. A
nanopartícula, que antes estava suspensa em água, agora se encontra cercada
predominantemente por ar, portanto, a posição da banda plasmon será influenciada
por essa contribuição, de acordo com a condição de ressonância descrita
anteriormente. A linha vermelha no espectro indica a posição do laser utilizado como
fonte de excitação no Raman (632,8 nm).
65
400 500 600 700 800 900 1000
670 AuNRs
Au@AgNRs
Ex
tin
ção
Comprimento de onda (nm)
638
Figura 29. Espectros de extinção dos substratos contendo AuNRs e Au@AgNRs. A
linha vermelha indica o comprimento de onda de excitação do laser utilizado no
Raman (632,8 nm).
Pode-se observar que a linha do laser está contida nas bandas do
plasmon longitudinal, estando praticamente sobreposta ao seu máximo no caso das
partículas caroço-casca. Para o caso dos AuNRs, essa banda foi observada mais
alargada, o que pode ser efeito da maior agregação das partículas na superfície do
vidro, resultado da utilização do PDT.
Para avaliar a organização das nanopartículas na superfície dos
substratos, foram realizadas análises por microscopia eletrônica de varredura. As
micrografias do substrato contendo AuNRs estão mostradas na Figura 30, enquanto
na Figura 31, estão as imagens do substrato contendo Au@AgNRs.
66
Figura 30. Imagens de SEM de um único substrato contendo AuNRs, em diferentes
magnificações.
(A)
(B)
(C)
)
67
Figura 31. Imagens de SEM de um único substrato contendo Au@AgNRs, em
diferentes magnificações.
(A)
(B)
(C)
)
68
As tentativas de obter imagens a partir das placas de vidro não foram bem
sucedidas devido ao carregamento da amostra, mesmo com a metalização da sua
superfície. Com isso, os nanobastões foram depositados em placas de silício
funcionalizadas com os silanos correspondentes, de forma análoga à deposição no
vidro. As imagens mostram que a deposição das nanopartículas foi uniforme, com
regiões de agregação, principalmente para os nanobastões de ouro, o que pode
favorecer a geração de hot spots.
Na Figura 32, é apresentada uma imagem de maior ampliação, em que as
nanopartículas caroço-casca estão agregadas na superfície do substrato. Em
algumas regiões, pode-se observar ainda o envolvimento com uma camada de PVP.
Figura 32. Imagem de SEM dos Au@AgNRs agregados na superfície do substrato.
Após a caracterização dos substratos, foi realizada a deposição da
molécula de 4-ABT a partir das soluções diluídas, a fim de verificar a eficiência das
nanopartículas na análise por SERS. A Figura 33A mostra a estrutura molecular do
4-ABT, e a ilustração da Figura 33B mostra uma possível forma de interação entre a
molécula do 4-ABT e a superfície das nanopartículas de ouro. Para as
69
nanopartículas recobertas com prata, a interação pode ser feita preferencialmente
pelo grupo amina.
(A)
(B)
Figura 33. (A) Estrutura molecular do 4-ABT, e (B) ilustração da interação das
moléculas de 4-ABT com a superfície dos AuNRs depositados sobre o substrato de
vidro funcionalizado.
A partir disso, foi feita a análise por espectroscopia Raman para avaliar o
efeito SERS dos substratos. A Figura 34 mostra o espectro Raman para o 4-ABT
sólido, e o espectro SERS para o substrato contendo AuNRs, preparado com
solução de 4-ABT de concentração 1.10-3 mol L-1.
Figura 34. Espectro Raman do 4-ABT sólido (preto), e espectro SERS do 4-ABT
depositado em substrato de AuNRs a partir de solução 10-3 mol L-1 (vermelho).
70
Na Tabela 3, são feitas as atribuições das bandas presentes em ambos
os espectros. No espectro da molécula sem contato com as nanopartículas, são
observadas as bandas atribuídas aos modos vibracionais A1, que são modos
simétricos de vibração no plano (considerando a molécula de 4-ABT com simetria
C2v) 120. As bandas pouco intensas em 1006, 1178 e 1492 cm-1 são atribuídas,
respectivamente, às deformações angulares de C-C e C-C-C, deformação angular
de C-H, e uma combinação do estiramento de C-C e a deformação angular de C-H.
Já a banda bastante intensa, vista em 1086 cm-1, é atribuída ao estiramento da
ligação C-S 121,122.
Tabela 3. Atribuições das bandas nos espectros Raman e SERS do 4-ABT 121,122,123.
Número de onda (cm-1) Atribuições (a)
Raman do 4-ABT sólido
SERS em AuNRs
1006 1006 γ(C-C) + γ(C-C-C) (A1)
1086 1073 ν(C-S) (A1)
― 1139 δ(C-H) (B2)
1178 1188 δ(C-H) (A1)
― 1389 ν(C-C) + δ(C-H) (B2)
― 1434 ν(C-C) + δ(C-H) (B2)
1492 1470 ν(C-C) + δ(C-H) (A1)
(a) As notações γ e δ indicam os modos de deformação angular, e ν indica o modo de estiramento.
Quando a molécula é adsorvida no substrato, o espectro SERS mostra
alguns desses modos vibracionais deslocados e intensificados, além de outros
modos. As vibrações de simetria A1 ainda são vistas, mas surgem também modos
B2, atribuídos às vibrações assimétricas no plano.
Estudos mostram que esses modos são intensificados pelo mecanismo
químico, sendo atribuídos à transferência de carga entre a superfície metálica e a
molécula ao formar a ligação Au-S e, além disso, sugerem a orientação
perpendicular da molécula em relação ao arranjo de nanobastões. A intensificação
71
depende do grau de combinação entre o nível de Fermi do metal e a energia dos
orbitais da molécula adsorvida na sua superfície, e também da energia do laser
utilizado 123,124. A afinidade da molécula pela superfície metálica faz com que a
contribuição do mecanismo de transferência de carga seja significativo, levando à
intensificação das bandas observadas no espectro 125. No espectro SERS da Figura
34, pode-se observar a banda em 1006 cm-1 na mesma posição, e as bandas em
1086, 1178 e 1492 cm-1 encontram-se deslocadas para 1073, 1188 e 1470 cm-1,
respectivamente. Aparecem ainda bandas dos modos vibracionais B2, bastante
intensificadas, em 1139 cm-1, atribuída à deformação angular da ligação C-H, e em
1389 e 1434 cm-1, que são combinações da deformação da ligação C-H com o
estiramento da ligação C-C 121,122.
Na próxima etapa, foram feitos mapeamentos SERS dos substratos
preparados com AuNRs e Au@AgNRs e as soluções de 4-ABT em concentrações
decrescentes, com o objetivo de verificar a mínima concentração detectável para
cada sistema. Os mapeamentos foram realizados em regiões distintas das placas de
vidro, obtendo-se em média 150 espectros para cada substrato. Cada espectro
mostrado na Figura 35 representa uma média dos espectros obtidos nos
mapeamentos para as diferentes concentrações depositadas nos substratos.
Nos substratos contendo AuNRs (Figura 35A), a mínima concentração
para a qual as bandas características do 4-ABT foram observadas no espectro foi
1.10-8 mol L-1. Para a concentração 1.10-9 mol L-1, já não foi possível identificá-las.
Para os substratos contendo Au@AgNRs (Figura 35B), a molécula foi detectada até
a concentração de 1.10-15 mol L-1, cujo espectro ampliado está mostrado no detalhe
da figura, devido à intensidade significativamente baixa das bandas. A presença de
moléculas em hot spots faz com que o seu sinal seja intensificado em diversas
ordens de grandeza, superando a magnitude da variação da concentração. Devido a
isso, neste conjunto de espectros, foi observada uma variação de intensidade na
ordem de 103 na escala de contagens, correspondente à variação 1011 mols L-1 na
faixa de concentração estudada.
Os resultados indicam que os nanobastões de ouro recobertos com prata,
quando depositados no substrato de vidro, possuem maior eficiência na
intensificação das bandas da molécula de 4-ABT, atingindo um limite de detecção
inferior ao do substrato contendo nanobastões de ouro não recobertos.
72
(A)
(B)
Figura 35. Espectros obtidos a partir das médias dos mapeamentos realizados nos
substratos (A) AuNRs e (B) Au@AgNRs, preparados a partir de soluções de 4-ABT em
concentrações decrescentes. No detalhe da Figura 35B, é mostrada a ampliação do
espectro para a concentração 1.10-15 mol L-1.
73
Na Figura 36, são mostrados, a título de exemplo, espectros obtidos em
mapeamentos realizados em diferentes regiões dos substratos contendo
Au@AgNRs e soluções de 4-ABT 1.10-4 e 1.10-12 mol L-1. Os gráficos estão na
mesma escala, e mostram 50 espectros para cada concentração, em uma faixa
específica de deslocamento Raman. No mapa da amostra preparada a partir da
solução mais concentrada, mostrado na Figura 36A, é possível perceber a grande
incidência de espectros com bandas de alta intensidade, que estão distribuídos pela
superfície do substrato de maneira uniforme. Na Figura 36B, cuja amostra foi
preparada com a solução mais diluída, as bandas que permitem a identificação do
analito estão presentes em menor quantidade, além de apresentarem intensidade
mais baixa. Quanto menor a concentração do analito, menor a quantidade de
espectros cujas bandas são intensificadas, o que reflete o número decrescente de
moléculas adsorvidas no substrato, principalmente em regiões de hot spots.
(A)
(B)
Figura 36. Mapas de 50 espectros SERS para os substratos contendo Au@AgNRs e
soluções de 4-ABT (A) 1.10-4 e (B) 1.10-12 mol L-1. Os gráficos estão na mesma
escala.
5.4 Análise de Poluentes Ambientais Emergentes
A partir dos resultados obtidos, o substrato contendo as partículas
caroço-casca de ouro e prata foi selecionado para avaliar o efeito SERS das
moléculas de poluentes ambientais.
Inicialmente, o substrato foi testado na detecção do fármaco sulfatiazol, a
partir de soluções de concentração 1.10-3 mol L-1 em etanol. A Figura 37 mostra o
74
espectro Raman do composto sólido (linha vermelha), e diversos espectros SERS
obtidos a partir de mapeamentos realizados nos substratos.
1000 1100 1200 1300 1400 1500
sulfatiazol 10-3 mol L
-1
11
34
10
73
sulfatiazol sólido
1000 cts
In
ten
sid
ad
e
Deslocamento Raman (cm-1)
Figura 37. Espectro Raman do sulfatiazol sólido (linha vermelha) e espectros SERS
obtidos a partir de mapeamentos dos substratos contendo solução de sulfatiazol
1.10-3 mol L-1 (linhas pretas).
As bandas observadas em 1073 e 1134 cm-1 no espectro Raman são
atribuídas, respectivamente, à deformação do anel fenil e ao estiramento simétrico
do grupo SO2 da molécula 74. Contudo, nos espectros SERS, a atribuição dessas
bandas à presença da molécula foi dificultada, uma vez que foram pouco
intensificadas, e também prejudicadas pelo background do substrato, que foi
observado principalmente na região de maiores números de onda. Os espectros
mostrados são resultantes de mapeamentos realizados em diversos substratos, que
foram preparados a partir de soluções distintas de mesma concentração do fármaco.
Além da deposição da molécula por gotejamento e secagem, foi também testada a
metodologia de imersão, em que o substrato foi deixado em contato com a solução
75
do fármaco por 16 h. Contudo, todas as abordagens levaram a substratos que não
promoveram a intensificação significativa das bandas da molécula, mesmo nesta
concentração relativamente alta, e portanto, indicam que o sistema pode não ser
eficiente na detecção do sulfatiazol.
A análise do pesticida tiram foi realizada utilizando soluções aquosas
diluídas consecutivamente a partir de uma solução de concentração 1.10-3 mol L-1
em acetona. Foram preparados dois substratos para cada concentração utilizando
soluções distintas, com a subsequente realização de mapeamentos em diversas
regiões de cada placa. Cada espectro mostrado na Figura 38 representa uma média
dos espectros SERS obtidos para as respectivas concentrações, juntamente com o
espectro Raman do composto sólido.
400 600 800 1000 1200 1400
Tiram 10-7 mol L
-1
Tiram 10-6 mol L
-1
Tiram 10-5 mol L
-1
Tiram 10-4 mol L
-1
Tiram sólido
Inte
ns
idad
e
Deslocamento Raman (cm-1)
500 cts
Figura 38. Espectro Raman do tiram sólido, e espectros SERS obtidos a partir das
médias dos mapeamentos realizados nos substratos preparados a partir de soluções
aquosas de tiram em concentrações decrescentes.
76
A banda mais intensa observada em 560 cm-1 no espectro do pesticida
sólido é atribuída ao estiramento da ligação S–S da molécula, enquanto a banda em
1373 cm-1, bem menos intensa, se refere à combinação do estiramento da ligação
C–N com a deformação angular do grupo CH3 126. Nos espectros SERS, contudo, a
diferença de intensidade entre essas duas bandas diminui consideravelmente,
chegando a situações em que a intensidade da segunda supera a da primeira. Na
literatura, isso é atribuído à clivagem da ligação S–S quando moléculas de
ditiocarbamato entram em contato com superfícies metálicas, gerando dois resíduos
moleculares que possuem forte interação com o metal. Trabalhos publicados
mostraram evidências da quebra dessa ligação, como a redução da intensidade da
banda em 560 cm-1, e também da coordenação dos fragmentos moleculares ao
metal de forma bidentada, como mostrado na Figura 39. Os autores evidenciaram a
formação da ligação C═N, como consequência da atração do par de elétrons do
nitrogênio, favorecendo essa coordenação em relação à forma
monodentada 126,127,128.
(A)
(B)
Figura 39. (A) Estrutura molécular do tiram e (B) fragmento do tiram coordenado à
superfície metálica de forma bidentada após clivagem da ligação S–S.
As bandas atribuídas ao tiram foram identificadas nos espectros até
concentração de 1.10-7 mol L-1, equivalente a 0,02 ppm, o que indica que o substrato
é eficiente na detecção da molécula até esse limite de concentração. Esse valor está
duas ordens de grandeza abaixo do limite máximo de resíduo do pesticida em frutas
estipulado pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA), que é de
7 ppm 87. A intensificação das bandas nos espectros provavelmente está relacionada
com a coordenação dos fragmentos moleculares à superfície metálica, o que
possibilita a manifestação do mecanismo químico de intensificação.
77
Para obter um valor numérico da eficiência do substrato na detecção do
tiram, foi estimado o fator de intensificação através da Equação 12 58:
(12)
em que e são as intensidades de uma mesma banda medidas para os
espectros SERS e Raman da molécula, respectivamente, e e são as
concentrações das soluções depositadas sobre uma placa de vidro, e sobre os
substratos contendo nanopartículas, respectivamente. Para realizar essa estimativa,
uma solução de tiram de concentração 1.10-3 mol L-1 em acetona foi depositada
sobre uma placa de vidro limpa, e seca à temperatura ambiente, a fim de se obter o
espectro Raman da molécula não adsorvida em nanopartículas. Para o substrato
contendo Au@AgNRs, foram avaliados os espectros referentes à concentração de
1.10-7 mol L-1. Os espectros mostrados na Figura 40 são as médias dos espectros
obtidos nos mapeamentos de cada placa, para a determinação da intensidade das
bandas em 560 cm-1. Para os valores medidos, foi calculado o fator de intensificação
de 3.104 para detecção do tiram utilizando o substrato contendo Au@AgNRs.
Figura 40. Determinação da intensidade da banda em 560 cm-1 para o espectro da
solução de tiram 1.10-3 mol L-1 depositada em placa de vidro, e para a solução
1.10-7 mol L-1 depositada em substrato contendo Au@AgNRs.
78
O substrato contendo Au@AgNRs também foi avaliado na detecção do
pesticida paration. A Figura 41 mostra o espectro Raman da molécula não
depositada (linha vermelha), e alguns dos espectros SERS que foram obtidos nos
diversos mapeamentos realizados nos substratos preparados a partir de soluções
1.10-4 mol L-1. Da mesma forma que para o sulfatiazol, foi testada uma série de
substratos preparados por gotejamento e secagem, utilizando soluções distintas de
mesma concentração, além dos testes de imersão. Entretanto, para esta molécula,
também não foram identificadas as bandas características em nenhuma das
análises. Alguns dos espectros mostrados apresentaram intensidade nas regiões
próximas a 1350 e 1600 cm-1, que são coincidentes com bandas do paration (1346 e
1591 cm-1). Contudo, esse perfil espectral também é observado em alguns espectros
quando mapeamentos são realizados nos substratos contendo somente a deposição
das nanopartículas, ou seja, sem a adição das moléculas, como observado na
Figura 42, e portanto, refere-se ao background do substrato.
Figura 41. Espectro Raman do paration sólido (linha vermelha) e espectros SERS
obtidos a partir de mapeamentos nos substratos contendo solução de paration
1.10-4 mol L-1 (linhas pretas).
79
Figura 42. Espectros obtidos a partir de mapeamento na superfície dos substratos
contendo Au@AgNRs, sem a deposição de moléculas.
Esses resultados indicam que o substrato contendo Au@AgNRs não
intensificou as bandas do paration de forma eficiente, o que pode estar relacionado
ao fato de a molécula não possuir grupos capazes de ligar quimicamente à
superfície metálica, ou não sofrer uma clivagem que gere fragmentos passíveis de
coordenar ao metal, como ocorre com o tiram.
Com isso, o trabalho mostrou que os substratos SERS baseados em
determinadas nanopartículas metálicas não são universais, podendo ser eficientes
na intensificação do sinal para uma classe de compostos, e não eficientes para
outras. Esta observação é positiva, no sentido de que moléculas cujos espectros não
foram intensificados, como o paration, não atuariam como interferentes na
determinação de outros analitos em uma matriz complexa, o que é uma vantagem
em termos analíticos.
80
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS E PERSPECTIVAS
O trabalho consistiu em comparar a eficiência de substratos SERS
baseados em nanobastões monometálicos de ouro, e bimetálicos de ouro e prata
com estrutura caroço-casca, e aplicá-los na detecção de moléculas classificadas
como poluentes ambientais emergentes.
Os AuNRs foram sintetizados através de metodologia que permitiu obter
suspensões estáveis de partículas com tamanho e morfologia controlados. Os
nanobastões apresentaram valores médios de comprimento de 49 nm, e 16 nm de
espessura, com a banda do plasmon longitudinal centrada em 730 nm. A suspensão
foi utilizada na síntese dos Au@AgNRs. Nesta etapa, a variação no volume da
solução precursora de prata permitiu controlar a espessura da casca de prata, sendo
que os parâmetros reacionais foram ajustados para a obtenção de uma partícula
cuja banda do plasmon longitudinal mais se aproximasse da energia do laser
utilizado nas medidas Raman (633 nm). A caracterização das suspensões por
HRTEM e EDS confirmou a estruturação hierárquica das nanopartículas
caroço-casca, com crescimento epitaxial da prata sobre a estrutura cristalina do
ouro.
As suspensões foram depositadas em placas de vidro funcionalizadas
com organossilanos, que promoveram a adesão das nanopartículas à superfície do
vidro. A caracterização dos substratos por espectroscopia de absorção mostrou o
deslocamento da banda plasmon para menores valores de comprimento de onda ao
passar da suspensão aquosa para a superfície do vidro, localizada em 670 nm para
os AuNRs, e em 638 nm para Au@AgNRs.
A eficiência dos substratos foi avaliada pela análise SERS utilizando a
molécula sonda 4-ABT, que foi depositada nas placas através do gotejamento de
100 µL das soluções da molécula em concentrações decrescentes, a fim de avaliar a
menor concentração possível de ser detectada em cada sistema. Foram realizados
mapeamentos em diversas regiões na superfície dos substratos, obtendo-se em
média 150 espectros para cada concentração, sendo que a média dos espectros
obtidos nos mapeamentos para cada sistema permitiu comparar a eficiência dos
substratos. Para as placas contendo AuNRs, as bandas atribuídas ao 4-ABT foram
observadas nos espectros até o limite de 1.10-7 mol L-1, enquanto para os substratos
com Au@AgNRs, na concentração de 1.10-15 mol L-1, a presença dessas bandas
81
ainda foi verificada, o que indicou a maior eficiência na detecção da molécula sonda
para este sistema.
Os substratos contendo as partículas caroço-casca foram testados na
detecção das moléculas de contaminantes ambientais selecionadas. O pesticida
tiram foi identificado nos espectros SERS através das bandas em 560 e 1373 cm-1,
em comparação com o espectro Raman do composto sólido. A intensificação desses
modos vibracionais, em conjunto com avaliação espectral realizada em estudos
presentes na literatura, mostra que a molécula do tiram sofre uma clivagem na
ligação S–S, gerando dois fragmentos moleculares que se ligam à superfície
metálica de forma bidentada, através dos átomos de enxofre. Essa interação
possibilita a atuação do mecanismo químico, que contribui para a intensificação das
bandas nos espectros SERS. As bandas do tiram foram identificadas até a
concentração de 1.10-7 mol L-1, equivalente a 0,02 ppm, (fator de intensificação na
ordem de 104), valor superior ao mínimo reportado na literatura, mas que está abaixo
do limite máximo de resíduo do pesticida em frutas estabelecido pela Agência de
Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA), que é de 7 ppm. Ainda não existe
controle dos limites de concentração do tiram em sistemas hídricos, porém, o
substrato desenvolvido apresenta potencial para aplicações futuras em sua
detecção.
Para os testes com o fármaco sulfatiazol e o pesticida paration, o
substrato não apresentou a mesma eficiência de detecção, uma vez que as bandas
atribuídas às moléculas não foram observadas nos espectros. Isso pode estar
relacionado ao fato de essas moléculas não se ligarem quimicamente ao substrato
da forma como acontece com o tiram, o que reduz a eficiência dos mecanismos de
intensificação. Como alternativa, a detecção dessas moléculas poderia ser testada
em substratos contendo somente os AuNRs, ou então outro tipo de nanopartícula
metálica que eventualmente interaja com elas de forma mais eficiente.
Como perspectiva para o substrato contendo Au@AgNRs na detecção do
tiram, é importante buscar melhorias na deposição das nanopartículas e da
molécula, assim como testar outras matrizes de deposição, como silício e papel. A
incorporação dessas nanopartículas em papel, principalmente através da sua
impressão a partir de uma “tinta de nanopartículas”, pode levar a um sistema com
potencial para ser utilizado como substrato comercial de baixo custo, eficiente na
detecção de moléculas como o tiram em matrizes ambientais.
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