Upload
vuhuong
View
224
Download
1
Embed Size (px)
Citation preview
1
No dia 14 de outubro, o auditório do Montepio foi palco
do primeiro grande debate nacional sobre a
descarbonização profunda da sociedade e da economia
portuguesa.
Estiveram presentes diferentes especialistas internacionais e nacionais, com o objetivo de debater os desafios com que a sociedade moderna se depara no caminho de encontro a uma economia “descarbonizada”.
Durante a sessão de abertura, Dr. António Tomás Correia (Presidente do Conselho de Administração do Montepio), Gonçalo Cavalheiro (Direção do GRACE), Susana Carvalho (CEO da J. Walter Thompson Lisboa) e Pedro Martins Barata (CEO da Get2C) refletiram sobre a importância de alinhar o país, a sua indústria e os seus serviços pelo imperativo da descarbonização.
O Presidente do Montepio Dr. Tomás Correia deu as boas vindas e realçou a importância do combate às alterações climáticas recordando os enormes desafios que já foram ultrapassados. Numa reunião realizada há 40 anos sobre questões ambientais e em que esteve presente, nenhum dos participantes sonhou que seriam precisos 40 anos para se realizar uma
2
conferência sobre descarbonização. Relembrou também que já passaram quase 10 anos desde que Al Gore e o Painel Inter-‐governamental para as Alterações Climáticas ganharam o Prémio Nobel da Paz e que as discussões têm andado muito lentamente.
“É necessária consciencialização e
aprendizagem para ultrapassar obstáculos e para andar mais
rápido e melhor.”
Gonçalo Cavalheiro, da direção do Grace, a maior associação portuguesa de empresas dedicada à responsabilidade social, referiu a importância do Grace se associar a iniciativas e empresas que querem contribuir para a mudança profunda que todos os países vão ter que operar se estiverem a falar a sério quando classificam as alterações climáticas como uma das maiores ameaças com que se depara a humanidade no século XXI. Enfatizou ainda a relevância da parceria entre uma multinacional gigante do mundo da publicidade, com mais de 150 anos de história, milhares de colaboradores e escritórios em dezenas de países e uma pequena empresa de consultoria em alterações climáticas que, apesar de ser pequena vai exercendo a sua influência através da qualidade dos serviços que presta em pelo menos 4 continentes. Concluiu dizendo que a parceria entre a Get2c e a J. Walter Thompson levará a um caminho mais fácil em direção à descarbonização.
Pedro Martins Barata referiu os objetivos da Get2C com a realização desta conferência: dar a conhecer os resultados da Cimeira de Paris, impulsionar o debate nacional sobre a descarbonização profunda, ajudar as empresas mas também os diferentes stakeholders a coletivamente pensarem os cenários para a descarbonização profunda compatíveis com as metas do acordo de Paris e perceber em que medida o país e as empresas portuguesas, nos seus diferentes setores, pode ganhar vantagens comparativas preparando-‐se para uma economia de baixo carbono. Neste contexto, realçou a importância deste primeiro momento de reflexão público sobre o Acordo de Paris, após a sua efetiva ratificação e a apenas duas semanas da entrada em vigor do mesmo. Realçou também que o importante neste momento é começar um debate público sobre os caminhos que Portugal pode traçar para um futuro com zero emissões e referiu o enorme desafio de, juntamente com os parceiros e os diferentes stakeholders começar um processo de reflexão conjunta sobre cenários, porque o tempo chegou em que deveremos começar a planear a longo prazo para uma transição energética e
3
uma mudança de paradigma social que nos afetará a todos, independentemente do nosso grau de preparação.
“Na Get2c acreditamos que esse planeamento e
essa reflexão traz-nos benefícios, seja sociais seja económicos, incluindo no
desenvolvimento de novos modelos e oportunidades de negócio. Passar para um
paradigma energético e social sem emissões de gases com efeito de estufa é certamente difícil,
mas não é impensável, e certamente não é impossível.”
Susana Carvalho, CEO da J. Walter Thompson, focou a sua intervenção no poder da comunicação como sendo player principal na mudança de comportamentos tão crucial neste caminho da descarbonização. Referiu os desafios que palavras como descarbonização, mitigação, adaptação, aquecimento global comportam em termos de comunicação e insistiu que temos de conseguir chegar às pessoas, mudar comportamentos e mudar perceções. “As pessoas têm de ser contagiadas e sentirem que são capazes de fazer a diferença.” Na última década e meia assistimos à erosão de múltiplos negócios e ao surgimento de novas marcas e novas tecnologias que se tornaram gigantes. Estamos a falar da Uber, do OLX, da Amazon... “É preciso redesenhar serviços e produtos, mudar a fonte e o tipo de matérias-‐primas, criar linhas especiais nos portefólios, combater o desperdício, abraçar boas práticas em toda a cadeia de valor, dar o exemplo e dialogar com todos os stakeholders”. Referiu que o que vamos ver daqui para a frente é cada vez mais negócios ligados à mobilidade, à água, à energia, à alimentação, à economia circular, à educação, ao bem-‐estar individual concentrados nas grandes cidades. “A comunicação pode e deve fazer muito mais, pode e deve entrar no princípio da cadeia, ajudar a redesenhar produtos e serviços, a entrar nas matérias-‐primas, no transporte, na distribuição e naturalmente nos pontos de contacto com o consumidor.”
Susana Carvalho deu vários exemplos de parcerias vencedoras incluindo o recente desafio lançado pelo secretário-‐geral da ONU a 6 grandes agências de publicidade e terminou dando destaque ao último dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável “que fala de parcerias colaborativas.
“A colaboração é uma tendência que veio para ficar. Na sociedade, na economia,
todos precisamos de todos.”
4
Ko Barrett, Vice-‐Presidente do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC do inglês United Nations Intergovernamental Panel on Climate Change), relembrou durante sua intervenção que o Acordo de Paris irá entrar em vigor no próximo mês, porém para cumprir com o objetivo de limitar a subida da temperatura média global abaixo dos 2°C, é imperativo o reforço imediato de medidas de mitigação. “The last IPCC report revealed that limiting warming to 2°C involves substantial technological, economic and institutional challenges.” Todos os cenários considerados apresentam um caminho difícil e alguns englobam o uso de tecnologias que apresentam, ainda, alguma controvérsia. Estes cenários ambiciosos exigem reduções de emissões de cerca de 3% por ano a nível mundial, entre 2030 e 2050, como indicam os dados do último relatório do IPCC.
“But even much less ambitious mitigation scenarios require a fundamental deviation from
baseline.”
Apesar de um número crescente de políticas de mitigação para as mudanças climáticas, as emissões cresceram em média 1 GtCO2eq por ano, de 2000 a 2010 comparando com a média de 0,4 GtCO2eq por ano, entre 1970 e 2000. As emissões de CO2, provenientes da queima de combustíveis fósseis e processos industriais são as que mais contribuem para os níveis de GEE verificados e, consequentemente, para o seu crescimento, confirmou Ko Barrett. Estas emissões continuaram a crescer cerca de 3%, entre 2010 e 2011, e cerca de 1-‐2%, entre 2011 e 2012. Ko Barrett alertou que se adiarmos as ações de mitigação até 2030, é certo que os desafios para cumprir a meta dos 2°C irão crescer substancialmente. Sendo que estes cenários são tipicamente caracterizados por níveis de emissão em 2030 de mais de 55 GtCO2e por ano. Por outro lado, se considerarmos o período pós 2030, teríamos de duplicar o corte anual de emissões, para cumprir a meta dos 2°C. Ko Barrett afirma ainda que um caminho de mitigação tardio terá impactos económicos mais elevados de transição e de longo prazo. Caracteriza-‐se também por uma maior dependência em tecnologias de remoção de dióxido de carbono, tais como a captação e armazenagem de carbono e, possivelmente, outras soluções de engenharia do clima.
Ko Barrett deixou bem claro que esta temática sobre as alterações climáticas é um problema global comum e que só será possível alcançar os objetivos definidos em Paris se existir cooperação internacional em conjunto com as políticas locais, nacionais e regionais. Para atingir estes objetivos, diferentes institutos e instituições estão a mobilizar-‐se com o intuito de apoiar os diferentes países para implementar políticas climáticas que permitam a redução das emissões até aos níveis requeridos. Estes planos e estratégias estão nos seus estágios iniciais de desenvolvimento e implementação em muitos países, o que torna difícil avaliar o seu impacto agregado sobre as futuras emissões globais. Ko Barrett acredita que a cooperação internacional poderá resultar na definição e atribuição de direitos e responsabilidades no que
5
diz respeito ao desenvolvimento coordenado e difusão de tecnologias. Como consequência é esperada cooperação em matéria de I&D (investigação e desenvolvimento), bem como, a abertura dos mercados e a criação de incentivos para encorajar as empresas privadas a desenvolver e implementar novas tecnologias. (http://get2c.pt/docs/Ko_Barrett_Decarbonization.pdf)
“Effective mitigation will not be achieved if individual agents advance their own interests
independently.”
No que diz respeito a investimentos em eficiência energética, Ko Barrett adianta que está previsto o aumento anual de cerca de USD 336 mil milhões nos setores do transporte, edifícios e no setor da indústria. É esperado também um aumento cerca de USD 147 mil milhões no que diz respeito ao setor das energias renováveis, produção de energia nuclear e eletricidade com CCS (Captura e Armazenamento de Carbono, do inglês Carbon Capture and Storage), sendo que, o investimento anual global no sistema de energia é atualmente cerca de USD 1.200 mil milhões.
Relativamente aos próximos passos, Ko Barrett comunicou que os trabalhos para o próximo relatório do IPCC estão ainda a decorrer. O encontro de novembro em Marraquexe (Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas de 2016, COP 22) servirá também para relembrar os governos que têm de fornecer informação científica para conclusão do próximo relatório do IPCC. Um esboço do relatório será acordado na próxima reunião do IPCC a decorrer em Banguecoque. É esperada a entrega do relatório em 2018, e em tempo útil para apoiar as discussões na primeira avaliação global em 2023.
Henri Waisman, Coordenador do Deep Decarbonization Pathways Project (DDPP), como segundo orador da manhã veio falar sobre os estudos em diferente países que têm vindo a ser desenvolvidos no âmbito do DDPP. O DDPP tem como intuito construir uma mensagem que permita, por um lado, criar visões de transformação para uma descarbonização profunda da economia de cada país, e que consequentemente possam ajudar na implementação de estratégias, e, por outro lado, criar uma estrutura de diálogo entre as diferentes partes envolvidas em busca das melhores soluções para a problemática das alterações climáticas. Henri Waisman referiu que é feita uma abordagem para a definição de profundas transformações da economia nacional em função dos desafios e oportunidades que cada país apresenta ao nível económico e social. Estas transformações serão definidas a partir de uma visão de longo prazo para mostrar o caminho a seguir e ajudar na tomada de decisões a curto prazo. Desta forma será possível o acesso a toda a informação relevante sempre fomentando a transparência dos dados e das ações a realizar. O foco do projeto é o de reduzir as emissões no setor energético, sendo este o mais representativo dos setores poluentes. Centra-‐se na análise de 16 países entre os países mais poluentes, como EUA, Índia, China e África do Sul.
6
Segundo indica Henri Waisman: “truly
transformative scenarios are feasible in all countries we
have studied”.
Estes cenários de transformações só terão sucesso se se adaptarem ao contexto nacional e às prioridades socioeconómicas. Como exemplo Henri enunciou as desigualdades e a falta de emprego na África do Sul, poluição do ar na Índia ou a dependência energética no Japão.
Mediante uma planificação transparente a longo prazo podem-‐se definir ações concretas que deverão ser realizadas no futuro e assim permitir a priorização dos investimentos sem necessidade de realizar grandes reformas antecipadas. Estes investimentos deverão estar acompanhados em todo as políticas que se adaptem ao contexto nacional, assim como apoiar a sua implementação. Embora o projeto considere abordagens nacionais, o facto de que as alterações climáticas são hoje um desafio global, mostra que é necessária a cooperação global.
O projeto Deep Decarbonization Pathways apoia a implementação de tecnologias de baixos níveis de emissão de carbono através da sugestão de diferentes formas de redução de custos, como por exemplo a transferência de capacidades e tecnologias, a criação de mercados globais e investimentos em I&D, que terão especial importância para países em desenvolvimento.
(http://get2c.pt/docs/DDPP_presentation.pdf)
“We have to move from a world of competition to a
world of cooperation”.
Na segunda parte da manhã, Mário Parra da Silva (Network Representative da United Nations Global Compact em Portugal e Presidente da Aliança ODS Portugal) introduzindo o tema “Descarbonização no contexto alargado dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável”,
7
relembrou a importância e a necessidade de se criar um diálogo e uma parceria entre os integrantes do mundo empresarial para a concretização dos objetivos. Acredita-‐se que é necessária esta união para cumprir com os vários desafios associados à descarbonização da sociedade, e que ainda poderá refletir em externalidades positivas no âmbito dos ODS. Como consumidores de energia devemos ser capazes de tomar decisões inteligentes que não intervenham com o futuro sustentável.
A descarbonização passa por uma mudança no estilo de vida (mais ecológico), desde a forma como vivemos, nos socializamos, o que fazemos e o que queremos fazer. O estilo de vida define a nossa identidade e várias perguntas ficam no ar: O que queremos? Porque nos esforçamos? Que objetivo de vida? Que mede o futuro? O “criar estilos de vida sustentáveis” requer que seja repensado: o nosso modo de vida, o que compramos e adquirimos, o que consumimos, e de que forma organizamos o nosso dia-‐a-‐dia.
(http://get2c.pt/docs/Alianca_ODS.pdf)
“Um mundo onde cada país goze de crescimento
económico e trabalho decente para todos, inclusivo,
sustentado e sustentável.(…) É muito utópico mas
curiosamente está mesmo na nossa mão”.
No início da sessão da tarde, Elena Stecca (Representante do We Mean Business) introduziu o tema “As empresas e o desafio da descarbonização”. Num contexto global, apresentou a plataforma We Mean Business, que congrega empresas nacionais e internacionais com o objetivo da descarbonização. A iniciativa We mean Business é uma coligação constituída por 7 organizações, que trabalha com mais de 460 empresas e 180 investidores com elevada influência a nível mundial, que reconhecem que a transição para uma economia de baixo carbono é a única solução para um crescimento económico sustentável e próspero. Estas entidades comprometeram-‐se com várias ações como aumentar a utilização de fontes de energia renovável, tornar os processos mais eficientes e ecológicos, e assumir a responsabilidade corporativa nas políticas climáticas.
Esta plataforma já conta com a presença de 6 empresas Portuguesas (Caixa Geral de Depósitos, Companhia de Cal e Cimento, CTT – Correios de Portugal, EDP, Jerónimo Martins e Portucel Soporcel) envolvidas em 13 compromissos.
(http://get2c.pt/docs/We_Mean_Business.pdf)
8
“In this case there´s 460 companies, we consider them pioneers, because it´s still a
very short number compared to the many more that we´ve
been eager to see committed to having a strong impact
towards decarbonization level required.”
O Secretário de Estado do Ambiente, Carlos Martins, relembrou que Portugal é um dos países da Europa mais vulneráveis às alterações climáticas, sendo por isso fundamental refletir sobre a descarbonização da economia portuguesa.
Apesar da vulnerabilidade a que o país está exposto, é de relembrar
que “Portugal está de facto profundamente empenhado e
comprometido com aquilo que foi o Acordo de Paris e, nessa medida,
foi um dos primeiros países europeus a ratificar no seu
parlamento a adesão ao acordo”.
Não esquecendo que este ano, entre os dias 7 e 11 de maio, o consumo de eletricidade no país foi assegurado integralmente por fontes renováveis (eólica, solar e hídrica), num total de 107 horas consecutivas. Este marco histórico vem representar o sucesso das políticas que têm vindo a ser implementadas e que, garante, são objetivo de incremento para o futuro. Contudo, Carlos Martins relembrou que é necessário tirar mais partido da situação geográfica e das longas horas de sol a que Portugal está exposto, em relação aos outros países do globo. O setor da energia solar é, precisamente, uma das áreas de maior preocupação no que toca ao seu contributo para mitigação. O setor dos transportes representa também uma das áreas de maior preocupação, sendo “responsável por mais de 25% das emissões nacionais”. Contudo, garante que são esperadas mudanças significativas como resultado das medidas implementadas, quer no sentido de promoção da utilização de transportes públicos bem como do incremento de forma significativa da mobilidade elétrica no país. Ainda sobre o tema, Carlos Martins enunciou que “este verão foi possível instalar redes de carregamento rápido para veículos elétricos que permitem ir de Lisboa ao Algarve, ou de Lisboa ao Porto, com períodos de paragem compatíveis com aquilo que é a nossa vida urbana tradicional.”
9
Relativamente à Diretiva da Economia Circular, é esperado que ao longo de 2017 possa existir um conjunto de iniciativas legislativas que permitam por um lado otimizar o uso dos recursos e por outro ter algum efeito nos consumos de energia, adianta Carlos Martins. Tendo em conta o objetivo de redução de emissões de GEE traçado para 2020 na Estratégia Nacional do país, Carlos Martins relembrou com orgulho que este objetivo já foi alcançado, em 2016, e portanto conseguimos antecipar as metas previstas. Contudo alertou que é necessário continuar o trabalho, não esquecendo que existem já objetivos traçados para 2030, e que em conjunto com os vários atores da sociedade, possamos continuar na linha da frente. Relativamente aos objetivos globais nacionais para 2030, o Secretário de Estado do Ambiente garante que estes estão em linha com os compromissos feitos em Paris. Carlos Martins termina o seu discurso agradecendo aos promotores da conferência por esta iniciativa e pela oportunidade e possibilidade de refletir sobre os compromissos internacionais que foram assumidos pelo país em Paris.
Carla Tomás, do Jornal Expresso, moderou o primeiro debate sobre os desafios políticos. Nuno Lacasta, Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, começou a discussão do primeiro painel ao assinalar que Portugal neste momento está a cumprir em 7 pontos percentuais acima da sua meta para com o protocolo de Quioto. Aponta ainda que as emissões têm decrescido desde 2005, o que comprova a mudança do paradigma energético, motivado por ter uma das mais elevadas penetrações de energias renováveis da Europa. Reforçou o que foi dito por Carlos Martins, no que refere a uma maior aposta em energias renováveis, mais concretamente, energia solar tanto numa forma central como descentralizada. Apontou uma meta ambiciosa que é reduzir as emissões de GEE em 40% para 2030, face ao ano de 2005. Perante a ratificação de Portugal no acordo de Paris, o desafio passa por implementar projetos custo-‐eficientes em setores de importância capital. Acrescenta que o setor residencial e de transportes necessitam de medidas específicas, devido à sua importância e características especiais. “Há ainda muito a fazer, mais concretamente no setor dos transportes tendo em conta a necessidade de transformação das cidades”, adiantou Nuno Lacasta. Francisco Ferreira, Presidente da ZERO, começou a sua intervenção ao afirmar que são necessárias medidas políticas para continuar o trabalho que já foi feito. Deu como exemplo o governo do início do século, que fez uma grande aposta em energia renovável, principalmente eólica, e sem essas medidas, Portugal não teria o peso que tem nesse domínio. Considera que o país está a ser pouco ambicioso, relativamente à redução das emissões em 40% até 2030 argumentando que desde 2005 estas já foram reduzidas em 27% e como tal há margem para ir mais longe.
10
Sugere que, se forem encerradas as centrais de Sines e Pego e reativadas as de gás natural, se os carros novos forem totalmente elétricos e dar outra aplicação aos impostos sobre os combustíveis, pode-‐se chegar muito mais longe do que o proposto. Relativamente ao tema transportes, lembrou que Portugal tem a mesma percentagem de veículos elétricos
que a Alemanha, e que na Holanda, 18% dos veículos novos vendidos são desta tipologia, e como tal, existe tempo para tal mudança, mas para isso é necessário tomar decisões o quanto antes.
António Sá da Costa, Presidente da APREN, começou por lembrar que Portugal será dos países mais fustigados pelas alterações climáticas, especialmente na agricultura e que a população ainda não tem consciência disso. Assim, sugere que o Ministério do Ambiente e a APA deverão investir na educação e sensibilização sobre estes temas, pois é a única forma de mudar hábitos. Continuou referindo e concordando com Carlos Martins ao dizer que as metas existem para serem ultrapassadas, e que muito do esforço neste âmbito foi feito exclusivamente pelo setor de produção de eletricidade renovável. Adiantou ainda que nada foi feito no
aquecimento e arrefecimento e nos transportes. Quando questionado sobre a possibilidade de 100% de produção renovável no setor elétrico em 2030, afirma que os 80% são perfeitamente tangíveis, mas que os últimos 20% são mais difíceis. Enumerou questões técnicas que ainda são de difícil resolução como redes, armazenamento e evolução das baterias, e não acredita que
possa acontecer antes de 2040. Quando interrogado sobre os motivos da fraca contribuição da energia solar apontou duas razões. A primeira deve-‐se à forte falta de confiança que esta fonte de energia ainda tem, pois já devia ter havido investimento em painéis solares nas fachadas dos edifícios para aquecimento de águas sanitárias, que aumentaria a qualidade e as poupanças e poderia fomentar uma indústria nacional. A segunda razão é que durante muitos anos existiu o mito que a energia solar era cara. Ainda sobre este tema, afirmou que o sistema remuneratório não é o mais apropriado e não tem permitido dar mais avanços.
11
Maria João Azancot, Diretora Geral da Associação Técnica da Indústria de Cimento (ATIC), na sua intervenção refere que a indústria cimenteira neste momento não consegue ter emissões zero, pois as tecnologias existentes não o permitem, contudo têm sido feitos esforços significativos para as reduzir. Enumera que como fruto desses esforços tem-‐se verificado menos consumos de
energia, mais utilização de combustíveis alternativos, existência de projetos de desenvolvimento de produtos de baixo carbono e prolongamento do tempo de vida dos produtos existentes. Explicou que a indústria cimenteira tem dois tipos de emissões, combustão e processo, e que atualmente apenas pode ser feito algo nas primeiras. Contudo, acredita que num futuro próximo a captura e armazenamento de carbono poderão ajudar a reduzir as emissões de processo. Alertou ainda que é fundamental que iniciativas deste género não tenham impacto na competitividade das empresas mas deverão ser regulamentadas de forma a facilitar a sua implementação. O investimento em investigação e desenvolvimento em energias renováveis é cem vezes maior do que o feito em tecnologias de captura e armazenagem, disse Maria Azancot.
Por fim, Iva Miranda Pires (DariAcordar – Movimento Zero Desperdício) assinalou que podemos todos contribuir para esta grande causa global através da prática de reciclagem dos resíduos bem como da reutilização de diferentes produtos. A associação DariAcordar, através do movimento Zero Desperdício, tem como objetivo envolver os cidadãos para que possam contribuir para a redução dos impactos que os resíduos apresentam sobre o ambiente, através de caminhos complementares para reduzir o carbono, como o reaproveitamento de recursos (tais como, bens alimentares ou peças de vestuário e calçado). Neste âmbito referiu que uma das razões do nascimento da DariAcordar foi após a constatação de que se desperdiçam toneladas de alimentos ainda adequados ao consumo. Aliado ao facto de haver um elevado número de famílias em situação de insegurança alimentar, afirma que não tem sentido desperdiçar alimentos que estão no estágio final da sua cadeia, ou seja, que têm o máximo de valor acrescentado, e ainda afirma que esse reaproveitamento é aquilo que a economia circular pretende.
12
No último debate do dia, o assunto foi o desafio das empresas face às alterações climáticas. O primeiro interveniente foi Fernando Leite (Lipor) que afirmou que as indústrias vão sempre criar resíduos e que é necessário pensar em como os diminuir, pois reduzir as emissões não será suficiente. Com este princípio em mente, acredita que se deve investir em tecnologias que produzam o mínimo de desperdício e que eventualmente as pessoas utilizarão resíduos para produzir a sua própria energia. A economia circular neste contexto, incentiva as empresas a reinventar-‐se e reutilizar estes subprodutos de forma a criar valor com novos produtos e/ou serviços. Carlos Andrade (GALP) afirmou que a atividade da empresa será para continuar, mas que estão a acompanhar as tendências de mercado, quer seja no investimento em fontes energéticas renováveis, como na aposta na eficiência energética. Este acompanhamento das tendências deve-‐se ao facto de existir planeamento a longo prazo, e dá como exemplo o aumento de produtividade em campos no Brasil, que são resultado de decisões tomadas no final do século passado. Destaca a imprevisibilidade que se tem verificado no mercado energético, dando como exemplo o impacto inesperado que tiveram o shale gas e shale oil, as oscilações dos preços do petróleo e margens de refinação. Perante tais eventos, o planeamento a longo prazo é imperativo, mas considera, ainda mais essencial, manter a competitividade do ponto de vista ambiental, social e económico, e garante que a empresa
está preparada para essas incertezas. Também considera que os resultados da COP21 são positivos mas há que ter maior enfoque na implementação das propostas. Fazendo referência às previsões da Agência Nacional de Energia, referiu que o gás e petróleo vão ser importantes no mix energético, e menciona a forte aposta e promoção de eficiência energética tanto na própria empresa como nos clientes.
Tiago Lopes Farias (Transportes de Lisboa) referiu que a luta contra as alterações climáticas necessita de responsabilização e consciencialização da sociedade. Afirmou ainda que o setor dos transportes é muito sensível e que as frotas necessitam de uma reestruturação inteligente conforme o planeamento das cidades do futuro. Tiago Farias alerta que é imperativo mudar comportamentos e costumes da população de forma a fomentar a aderência aos transportes públicos de forma sustentável e a introdução incremental de veículos elétricos. Ana Quelhas (EDP) mencionou que a descarbonização é base fundamental do negócio da EDP e que a capacidade de produzir energia renovável em Portugal é de 70%, e por isso, está em curso um investimento de 1,4 milhões de euros sendo que 75% será para energia renovável e os
13
restantes 25% serão em redes. Com base nestes pressupostos, afirmou que a EDP pretende em 2030, reduzir as emissões de CO2 em 75% comparando com os valores de 2005. Deixou ainda críticas às tarifas aplicadas na energia fotovoltaica, apesar de afirmar que esta e a eólica já são altamente competitivas, a instabilidade tarifária não permite ir mais longe. Duarte da Ponte (Eletricidade dos Açores) falou do caso particular que caracteriza a região dos Açores. Esta zona devido ao seu reduzido tamanho e isolamento, tem elevadas oscilações de procura de energia, o que exige um planeamento mais controlado e como tal acredita que devem ser utilizados tarifários tri-‐horários. Refere que esta oscilação tem de ser reduzida e como medidas, anunciou que a iluminação pública será substituída por LED´s e está em curso um projeto de energia geotérmica na ilha Terceira. A última intervenção do painel foi feita por José Eduardo Martins (Abreu Advogados) que considerou o tema de extrema importância para o país e sugere que a discussão se propague ao maior número possível de participantes. Como outros intervenientes, também criticou a estruturação das tarifas associadas às energias renováveis e mostrou ambição relativamente ao Acordo de Paris, em que mencionou que Portugal deve ser pioneiro. José Eduardo Martins destacou a importância dos Transportes de Lisboa no contexto da descarbonização da sociedade e reconheceu o desafio que Tiago Farias terá de enfrentar, afirmando que os transportes necessitam de uma revolução profunda, principalmente a nível de alterações de comportamentos pois as pessoas devem ser encorajadas a utilizar transportes públicos.
ENCERRAMENTO
“Começarmos a focar já, não na descarbonização de metas de Quioto, nem
sequer de 2030, mas da descarbonização profunda, acho que é absolutamente essencial, e é agora que se começa a
vislumbrar esse futuro.”
Nuno Lacasta, Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente