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Novelas de Faroeste
Volume I
L P Baçan
Copyright © 2015 L P Baçan
Todos os direitos reservados. Este livro ou
parte dele não pode ser reproduzido ou
usado de qualquer outra forma nem
divulgado sem a expressa autorização do
autor, exceto o uso de partes para referência
ou comentários.
ISBN 978-1-329-81609-1
Lulu Press, Inc. 3101 Hillsborough St, Raleigh, NC 27607
2015
O Velho e Selvagem Oeste
No Velho e Selvagem Oeste, o saloon era
o local mais movimentado e frequentado da
cidade. Ali aconteciam shows, dança, jogo e
muitas brigas. Ali se encontravam mocinhos
e bandidos, pistoleiros e desafiantes,
mulheres bonitas e perigosas. A maior parte
das histórias de faroeste passava por ele.
Dos ambientes mais simples e rudes aos
mais sofisticados, todos, indistintamente
acolhiam moradores e forasteiros, cada um
com sua história, cada um com seu destino.
Famosos pistoleiros criaram fama nesse
local. Outros ali encontraram a morte, na
boca esfumaçada de um Colt. A fumaça da
pólvora negra era o manto lúgubre que
cobria mais um morto. Um punhado de
serragem era jogado sobre a poça de
sangue. Uma rodada gratuita de uísque
barato era servida e minutos depois
ninguém mais se lembrava do ocorrido.
Afinal, o Oeste era mesmo um lugar
selvagem e as Novelas de Faroeste mostram
isso.
As Armas de um
Pistoleiro
Frank Spade já começava a se sentir
incomodado, após alguns dias de
permanência em Frisco, aguardando
noticias.
Steve Grant devia-lhe uma informação
preciosa, talvez a mais importante de toda a
vida de Frank.
Aquele distintivo especial, de agente da
Pinkerton, havia pesado tempo demais em
seu peito. Precisava saber da solução de seu
processo de anistia.
Tão logo fosse considerado um homem
livre, partiria para o sul. Um lugar especial
o esperava no Texas. Lá planejava se
estabelecer e esquecer para sempre aquela
vida de pistoleiro a serviço da lei.
Penduraria suas famosas armas e tentaria
se tornar um homem comum, com desejos e
aspirações comuns, numa comunidade
pacata, sem atropelos, mortes, perseguições
e toda sorte de atribulações de um homem
da lei, especializado em caçar bandidos.
Sua espera era amenizada pela bela e
fogosa corista do Saloon Aces, que agora
repousava, seminua, ao seu lado, na cama
do hotel.
A cabeça perfumada, de longos e
ondulados cabelos, pesava gostosamente no
seu peito másculo, de músculos definidos e
fortes.
— Posso sentir sua impaciência, querido
— ronronou ela, erguendo a cabeça.
Frank aproveitou para girar o corpo,
apanhar um cigarro e acendê-lo. A garota
beijou-lhe o peito, depois sentou-se na
cama. Começou a se vestir
preguiçosamente.
Frank continuou deitado, o trono nu
coberto de pelos reluzindo algumas gotas de
suor.
— Não suporto ficar muito tempo no
mesmo lugar — respondeu ele,
acomodando melhor a cabeça para olhá-la.
— Quando pretende partir?
— Assim que receba a informação que
estou aguardando.
— Estou sedenta. E você?
Frank olhou para a janela. O sol se
refletia nas ondas da baía.
Sorriu preguiçosamente para a garota,
que estava terminando de se vestir.
— Por que não vai até o bar e apanha
uma garrafa pata nós? — propôs ele.
— Oh, não! Está muito abafado aqui.
Quero algo gelado — pediu ela, fazendo
beicinho.
Frank esmagou o cigarro no cinzeiro,
depois espreguiçou-se ruidosamente.
— Vamos, querido, eu o ajudo — disse
ela, apanhando o cinturão dele.
— Está bem, você me convenceu —
concordou ele, finalmente, levantando-se.
Vestiu-se preguiçosamente. A garota
passou-lhe o cinturão. Frank o prendeu à
cintura. Verificou as armas. Depois vestiu o
paletó elegante, ajeitou o chapéu e saíram.
Enquanto caminhavam pelo corredor, Frank
podia ouvir as vozes exaltadas no saloon.
Quando chegaram no final do corredor, no
topo da escadaria que conduzia ao amplo
salão, no entanto, um silencio mortal pairou
no ar.
Conhecia aquela reação e,
instintivamente, desabotoou o paletó e
empurrou-o para trás, liberando o cabo do
Colt.
Desceu a escada com os olhos cinzentos
atentos aos movimentos dos presentes.
Um grupo de homens junto ao balcão o
olhava ostensivamente. Um deles dobrou
vagarosamente um pedaço de papel, pondo-
o no bolso do colete.
O clima pesado que pairava no ar
mantinha os instintos do pistoleiro em
alerta.
— Um uísque e duas cervejas geladas —
ordenou ele, cuidando para que a garota
ficasse a sua esquerda, mantendo livre sua
mão direita.
O barman atendeu-os rapidamente,
afastando-se para um canto mais seguro do
balcão.
O homem que Frank vira dobrando o
papel aproximou-se passo a passo,
medindo-o dos pés à cabeça.
Frank encarou-o, intrigado. O outro parou
junto dele, olhando fixamente.
O pistoleiro conhecia aquele tipo de
olhar. Significava provocação e encrenca.
— O que posso fazer por você? —
indagou, entornando o copo de uísque de
uma só vez.
Apanhou, em seguida, a cerveja e bebeu
um generoso gole, sempre mantendo os
olhos no homem ao seu lado.
— É Frank Spade? — indagou o outro.
— Quem quer saber? — retrucou,
terminando a cerveja e fazendo um gesto
para o barman lhe servir outra.
O homem ao lado dele sorriu
provocadoramente, depois se voltou para
dois outros atrás dele. Os homens estavam
imóveis e portavam espingardas de cano
curto.
— Vejo que ainda conserva sua famosa
dupla de Colts? — observou o outro,
apontando para o cinturão do pistoleiro a
serviço da lei.
— O que quer, afinal? — insistiu Frank,
aborrecido com aquela atitude.
Percebeu que o barman fazia sinais para a
garota se afastar do balcão. Ele entendeu o
que se estava para acontecer e recuou
vagarosamente.
Os dois homens atrás daquele que
interrogava Frank se afastaram para o lado.
Suas espingardas apontavam para os joelhos
do pistoleiro.
Frank conhecia aquele tipo de arma.
Sabia do estrago que poderiam causar.
— Há um monte de gente em Abilene
querendo sua pele, sabia? — comentou o
homem ao lado de Frank.
— Não tenho mais contas a ajustar com a
lei. Já cumpri minha parte no acordo. Sou
um homem livre agora. Trabalho para a lei
— disse ele, retirando cautelosamente o
distintivo do bolso interno de seu paletó.
O homem inclinou-se para olhá-lo. Um
sorriso cínico desenhou-se em seus lábios.
— Deve ter matado alguém para roubá-lo
— comentou, provocando risos nos homens
que portavam as espingardas.
Frank sentiu seus músculos tensos, seus
sentidos aguçados ao máximo.
Seu corpo retesou-se como o de uma fera
prestes a dar o bote. Seus olhos cinzentos
cintilaram. Ele analisou rapidamente sua
situação.
Já estivera em encrencas piores. E já
tivera mais paciência, também.
— Escute, seu idiota — rugiu. — Sei o
que está pretendendo fazer. Muitos já
tentaram antes de você e se arrependera...
— Ouviram isso, rapazes? — indagou
aos demais. — O nosso homem aqui é
valente.
Todos riram no saloon. A mão de Frank
desceu na direção da coronha do Colt
direito.
— É melhor ficar quietinho, Frank
Spade. Você vale muito mais vivo do que
morto, mas não hesitarei em matá-lo, se não
se comportar. Não se mexa. Mantenha suas
armas nos coldres e tudo ficará bem. Solte
seu cinturão. Quero ver de perto essas
armas. Aposto que conseguiu esses
serrilhados nas coronhas matando galinhas
por aí — zombou o desconhecido.
Frank respirou fundo, apoiando-se no
balcão. Ficou imóvel, aguardando o
próximo movimento de seu oponente.
— Não vão colaborar, não é? Não tem
importância. Eu mesmo tiro suas armas —
disse o outro, dando um passo à frente.
Apoiado ao balcão, Frank jogou as pernas
para o alto. O salto de uma das botas atingiu
o nariz do seu adversário, fazendo o sangue
jorrar generosamente.
As espingardas de cano curto soaram ao
mesmo tempo, abrindo um rombo no
balcão.
Frank girou o corpo em pleno ar, caindo
em pé, diante dos dois, que tentavam
remuniciar suas espingardas.
Os Colts deixaram o abrigo de seus
coldres e cuspiram chumbo e morte. Cada
um disparou duas vezes, certeiramente.
Atingidos na testa e no meio do peito, os
dois homens deixaram cair as espingardas e
tombaram para trás, os olhos esbugalhados
refletindo a surpresa.
O pistoleiro se voltou, então, para o outro
provocador, que ajoelhado no assoalho,
tentava estancar com as mãos o sangue que
escorria de seu nariz estraçalhado.
— Tem as respostas para as minhas
perguntas agora? — indagou-lhe Frank,
agarrando-o pelo colarinho e jogando-o
contra o balcão.
— Clemência! — gemeu o homem,
perdendo toda sua pose e sua arrogância.
— O que queriam comigo? — indagou
Frank, erguendo-o e apoiando-o no balcão.
— O cartaz... Ganhamos num jogo de
pôquer de um caçador... Ele disse que nós o
encontraríamos aqui...
Frank retirou o papel dobrado do bolso
do colete do homem que sangrava.
Começou a desdobrá-lo, aparentemente
distraído. Um sorriso de triunfo surgiu no
rosto coberto de sangue de seu desafiador.
Sem olhar para ele, Frank sacou uma das
armas e disparou certeiramente, metendo
uma bala no centro da testa do homem que
estrebuchou, apoiando no balcão.
À medida que a vida se esvaía de seu
corpo, ele foi deslizando para o assoalho,
onde ficou imóvel.
Frank ia terminar de desdobrar o cartaz,
quando a porta do saloon se abriu e o xerife,
juntamente com dois ajudantes, surgiram,
de armas engatilhadas em punho.
— Fique aí mesmo, homem — ordenou o
xerife.
— Está tudo certo, xerife. Sou agente da
lei e estes homens me provocaram. Foi
legítima defesa...
— Ele não é homem da lei coisa
nenhuma — disse o barman. — É um
foragido da justiça. Está naquele cartaz...
— É verdade o que ele está dizendo? —
insistiu o xerife.
— Já fui um homem procurado, xerife,
mas paguei minha divida servindo à justiça.
Sou um agente da Pinkerton, fui anistiado
pelo governador e pelo próprio presidente,
em Washington.
O xerife sondou-o desconfiadamente.
Baixou os olhos para os Colts que Frank
trazia à cintura. As coronhas eram de
madrepérola, com serrilhados marcando
suas vitimas.
— Essas não são armas de um homem da
lei. Costuma marcá-las sempre que mata
alguém?
— Há muito parei de fazer isso, xerife.
Agora, se me deixar provar, posso mostrar-
lhe minhas credenciais...
— Mesmo que seja um homem da lei,
acabou de matar aquele ali a sangue-frio,
xerife — disse o barman, apontando o
homem ao pé ao balcão.
O xerife se aproximou lentamente. Frank
suspirou resignadamente. Aquela era a
historia de sua vida.
— Deixe-me ver esse cartaz aí — pediu o
xerife.
Frank passou-lhe o cartaz, após desdobrá-
lo. Depois retirou suas credenciais e
estendeu-as para o xerife.
— Há junto um documento de anistia
provisória, xerife. O bastante para me livrar
de aborrecimentos como este — explicou,
pacientemente.
— Pode ser — ponderou o xerife. — Mas
o barman o acusa de matar um homem a
sangue-frio.
— Esse homem é um idiota completo,
xerife, que não consegue enxergar um
palmo adiante do nariz — disse Frank, com
rispidez.
— É verdade, xerife, eu vi — insistiu o
barman. — Todos viram. Ele não deu a
menor chance ao outro.
— Vá até o defunto e olhe em sua mão
direita, xerife — disse Frank, com
tranqüilidade.
O xerife fez o que Frank lhe pedira.
Levantou o braço direito do morto. Da
maga do casaco escorregou uma afiada faca.
Frank olhou na direção do barman, que
empalideceu e recuou, assustado.
— Tudo explicado agora, xerife?
— Está tudo certo... Só que não gosto de
encrencas em minha cidade e um homem
como você é encrenca pura, Frank Spade.
— E o que se há de fazer, xerife? —
indagou-lhe Frank, olhando-o
resignadamente.
Os olhos do xerife se fixaram nos olhos
cinzas do pistoleiro. Por trás daquele brilho
mortal havia um homem solitário.
— Limpem esta bagunça — ordenou o
xerife aos seus ajudantes. — Vejam se eles
tem algum valor consigo. Confisquem tudo
para as despesas do funeral.
Um empregado do saloon surgiu com um
balde de água e uma vassoura.
— Quanto lhe devo? — perguntou Frank
ao barman.
— Dez dólares — respondeu o outro,
secamente.
— Dez dólares por estas bebidas? —
surpreendeu-se o pistoleiro.
— Um dólar pela bebida e o resto pelos
estragos — cobrou-o o barman, aborrecido
por ter sido contrariado ao perceber que
acusara Frank injustamente.
— Cobre o prejuízo deles — disse Frank,
jogando uma moeda sobre o balcão.
— Não é o bastante — insistiu o barman.
Frank respirou fundo e debruçou-se sobre
o balcão, olhando a prateleira de garrafas
diante de si.
— Quanto custa aquela garrafa de
bourbon? — indagou.
— Cinco dólares!
— Dê-me — ordenou, retirando um bolo
de notas do bolso do paletó e separando
algumas.
O barman depositou a garrafa diante dele.
— Cinco dólares pela garrafa, um pela
bebida, nove pelos estragos e mais cinco
para os curativos — disse Frank, enquanto
depositava as notas sobre o balcão.
— Curativo, que curativo? — indagou o
barman, com a cara de tolo.
— Estes! — respondeu Frank,
estendendo o braço e agarrando-o pelo
pescoço.
Como se fosse um boneco de trapos,
Frank o trouxe por cima do balcão até
diante de si. O homem tremia como uma
vara verde.
— Piedade! — suplicou, perdendo toda a
pose.
— Eu teria, se não fosse tarde demais
para isso — murmurou Frank, entredentes.
Seus olhos cinzentos cintilaram. Seu
rosto se manteve impassível, como que
talhado na pedra mais fria e dura do deserto.
Seu punho abateu-se pesadamente na
boca do barman, que foi jogado para trás,
contra o balcão.
Ele tossiu, engasgando, antes de cuspir
alguns pedaços de dente e sangue.
— Lembre-se disso da próxima vez que
provocar um homem — intimou-o Frank,
dando-lhe as costas e rumando para a porta.
A corista correu pendurar-se no braço
dele.
— Onde vai? — indagou ela.
— Ao posto do telégrafo.
— Posso esperá-lo?
— Depende das noticias que receber —
respondeu ele, desvencilhando-se dela e
saindo para a rua.
Foi até o posto telegráfico. Assim que
entrou, o encarregado levantou-se com um
papel na mão.
— Acabou de chegar — disse, passando-
o ao pistoleiro.
Frank leu com interesse o conteúdo,
apesar de seu rosto demonstrar um certo
descontentamento.
— Carson City — murmurou em voz
alta. — Aquele bastardo me espera em
Carson City — repetiu, guardando o
telegrama.
Foi até o hotel e arrumou sua bagagem.
— Precisa mesmo partir? — indagou a
garota.
— Sim, preciso — respondeu ele, como
se não mais a conhecesse.
Algum tempo depois deixava o hotel. Seu
cavalo, selado, alimentado e escovado o
esperava na frente. Um garoto sorridente
segurava as rédeas.
Frank prendeu o alforje com as roupas na
garupa da sela. Sorriu para o garoto,
atirando-lhe uma moeda.
Quando montou, levantou os olhos para
as janelas do hotel. Atrás de uma das
vidraças, a corista lutava para disfarçar as
lágrimas.
Frank esporeou seu cavalo e galopou pela
rua principal.
Em alguma parte do sul de Carson City,
ao pé das montanhas, reinava uma grande
agitação num acampamento mineiro, oculto
entre as rochas, num pequeno vale.
Homens armados patrulhavam
ostensivamente o local. Vigias atentos
mantinham-se em alerta, enquanto
cavaleiros iam e vinham a galope.
Alguns tiros soaram ao longe. Algum
tempo depois, um bando a cavalo retornou
ao acampamento, parando diante da
construção principal, abrigada junto à
encosta rochosa.
Um homem envergando um sobretudo do
exercito confederado surgiu à porta.
Era algo de impressionante aquela figura
alta e magra, de espessas barbas brancas e
olhar sem brilho.
Trazia um chicote curto na mão direita e
brincava com ele, girando-o entre os dedos.
— Encontraram aquele maldito amarelo?
— indagou, a voz soando grave e forte.
— Sim, chefe, nós o pegamos e lhe
demos uma lição definitiva — disse o
homem que parecia comandar os outros,
enquanto desmontava de seu cavalo suado.
— O que fizeram com ele?
— Está morto, chefe. Nós o teríamos
trazido para servir de exemplo, mas ele
despencou numa ravina e não nos demos ao
incomodo de resgatar o que sobrou de sua
maldita pele.
— Está certo. Não podia ser de outra
forma. Servirá de lição aos outros.
— Pode deixar que faremos com que
todos saibam o seu destino e o daqueles que
tentam fugir do acampamento.
— Faça-os trabalhar dobrado agora.
Estamos chegando perto daquele veio. Sei
que ele está lá, esperando por mim.
Precisamos de mais gente...
— E de mais suprimentos.
— Vá a Carson City. Fale também com o
xerife. Veja se ele conseguiu mais
trabalhadores para nós.
— Certamente, chefe.
— E traga a dinamite também. Ela vai
ajudar a apressar as coisas — recomendou o
velho.
Os homens se dispersaram. Ele ficou ali,
olhando orgulhosamente ao seu redor,
respirando fundo o ar quente daquela tarde
seca.
Gritos imperativos ecoavam, vindo da
mina. Ele caminhou até uma encosta,
descendo por uma trilha escavada na rocha
solida, até o local de onde vinha todo aquele
movimento.
A entrada da mina parecia uma boca
escancarada na montanha, engolindo os
homens que entravam por ela, empurrando
vagões.
Chicotes estalavam. Gemidos e gritos de
dor se misturavam às ordens ríspidas. O
velho se sentia em casa.
Passou por entre homens molambentos,
com as costas cortadas por chicotadas
impiedosas.
Havia muitos chineses entre eles, alguns
negros e homens brancos também, todos
exibindo em seus corpos as marcas da
crueldade e do sol inclemente.
— Piedade! — gemeu um deles, correndo
atirar-se nos pés no velho.
Um dos guardas se adiantou, brandindo o
chicote. O velho fez um gesto, detendo-o.
— O que há, meu bom homem? —
indagou ao farrapo humano caído a seus
pés.
Sua voz soava com uma falsa brandura.
— Por favor, senhor... Estamos
morrendo...
O velho se abaixou, até que seus olhos
pudessem encarar o outro de frente.
Segurou-o pela garganta, com uma das
mãos, e apertou com força.
A mão inclemente continuou apertando.
Os olhos do preso se injetaram, tintos de
sangue. Sua língua se estendeu, azulando-
se. O velho empurrou o corpo frágil para
trás, na poeira.
— Nunca mais me toque — vociferou,
num fio de voz indignado. — Nunca mais
me toque porque vou arrancar seus dedos e
enfiá-lo goela adentro. Vá trabalhar,
miserável vagabundo. Vá trabalhar ou
mandarei matá-lo de pancadas — prometeu
o velho, erguendo-se, aprumando-se e
caminhando na direção das estrelas, onde
minério era triturado e lavado.
Olhos atentos examinavam o cascalho
que descia, carregado pela força da água,
sobre estrados inclinados de madeira e tela.
— E então, Mark, estamos chegando
perto do veio? — indagou a um jovem de
boa aparência, que fiscalizava todo o
trabalho.
— Tenho absoluta certeza que sim, papai.
Estudei muito estas rochas. Não há mais
dúvida. É o veio mais rico de todo o oeste e
vamos atingi-lo em breve.
— Que acha de usarmos a dinamite?
— É cedo para pensar nisto, pai. Veja
isto. Estamos próximos demais para ter
pressa — disse o rapaz, fechando a mão
sobre um largo recipiente.
Aproximou-se do velho. Estendeu a mão
fechada e, lentamente, foi abrindo os dedos.
Enormes pepitas de ouro surgiram,
fazendo com que os olhos do velhos se
arregalassem.
— Eu sabia... Eu sempre soube...
Teremos tudo de volta, meu filho. Tudo.
Eles voltarão a sentir a força desta mão —
disse o velho, fechando com força o punho
e erguendo-o contra o sol.
— Vamos precisar de mais gente, pai —
disse Mark.
— Você terá todos os homens que
precisar — prometeu o velho, apanhando as
pepitas de ouro da mão do filho.
Retornou à casa principal do
acampamento. Sua sombra alongada
espalhava respeito e temor. O velho general
sulista tinha um coração duro como as
pedras que o rodeavam.
A sorte lhe havia sido adversa. A guerra
tirara-lhe tudo que tinha no sul. A fazenda
fora confiscada para cobrir os impostos.
Seus outros filhos estavam mortos. Sua filha
morrera. Só sobrava ele, Mark, o filho mais
novo, que estudava no Norte, quando a
guerra explodira.
De volta ao seu quartel general, o velho
John Scottsfield olhou a garrafa de uísque
aberta sobre a escrivaninha. Era seu
consolo. Era o que embrutecia seu coração e
o mantinha firme e decidido na busca
daquele veio de ouro, o filão mais rico do
oeste, aquele que resgataria de novo a velha
tradição do nome Scottsfield, outrora
poderoso.
Abriu a garrafa.
— Brindo a você, montanha maldita, que
vai parir de suas entranhas o veio mais rico
de todo o oeste — disse ele, mordendo a
rolha e cuspindo-a para longe.
Bebeu vorazmente. O uísque tinha um
sabor adocicado de sangue e John
Scottsfield adorava isso.
Frank não gostou da maneira como
aquele homem o olhava, no interior do
melhor saloon de Carson City.
Estava na cidade havia uma semana e não
conseguira falar com o maldito Steve Grant,
seu superior para os trabalhos sujos e legais
que fazia para a Agencia Pinkerton de
Detetives.
— Outra cerveja — pediu ele, ao barman,
mantendo sob vigília, através do amplo
espelho a sua frente, o homem que o
encarava ostensivamente.
Conhecia aquele tipo de olhar. Conhecia
aquela tensão que se estampava nos rosto
daqueles que o identificavam.
Carregava consigo a maldição de um erro
da juventude. Tivera sua cabeça a prêmio.
Cartazes haviam sido espalhados pelo Oeste
em todas as direções.
Alguns sabiam de sua anistia. Outros não.
Aquele homem no fundo do saloon parecia
estar longe da civilização por um longo
tempo. Tempo demais.
Frank apanhou a cerveja, tomou um gole
e depositou o copo no balcão. Desabotoou o
paletó. Jogou as abas para trás, descobrindo
as coronhas serrilhadas de seus Colts.
Virou-se. Apanhou o copo de cerveja
com a mão esquerda e caminhou na direção
do homem no fundo do saloon.
Parou diante dele. Tomou um gole. Seus
olhos cinzentos se fixaram nos olhos
escuros e repuxados do homem sentado
diante dele. Pelos traços, parecia um
mestiço índio. Sangue ruim, o pior deles.
Seguramente um caçador de recompensas.
— Sou Frank Spade e estou anistiado. Se
você carrega um daqueles malditos cartazes,
está perdendo seu tempo.
— Quem perguntou? — retrucou o outro,
a voz soando daquela forma que Frank tão
bem conhecia.
Sentiu vontade de dizer ao outro que ele
falava como um homem morto, mas
desistiu. Retornou ao balcão, mas manteve
seus olhos fixos no espelho, observando seu
oponente.
Viu quando ele se levantou, empunhando
um rifle de caçar búfalos.
Sem se voltar para seu oponente, Frank
tomou um gole de cerveja e disse:
— Quer tentar a sorte?
O caçador de recompensa pareceu
analisar a situação. Viu o espelho. Percebeu
que Frank o vigiava.
Pesou suas possibilidades. O rifle estava
engatilhado, mas o cano estava abaixado.
Bastava erguê-lo e disparar. Se a bala
atingisse Frank, sua espinha seria partida ao
meio como um graveto pelo projétil calibre
cinqüenta.
— Tenho um papel que diz que sua pele
vale mil dólares — disse o mestiço.
— Tenho outro que diz que sou um
homem livre — respondeu Frank, sem se
voltar.
— Papéis se sepulturas não discriminam.
Aceitam o que você puser neles.
Frank terminou a cerveja. Depositou o
copo numa mesa a seu lado. Virou-se para
seu oponente.
O mestiço era frio. Frank já vira aquele
tipo de olhar antes. Ficavam muito bem em
cadáveres.
O ambiente do saloon se modificou. As
pessoas se afastaram da linha de tiro dos
dois contendores.
Um silencio de morte pairou no
ambiente. Ninguém respirava. Frank sabia
que teria que matar aquele idiota a sua
frente. Por isso amaldiçoou Steve Grant.
Estava ali havia uma semana e não
conseguira falar com o bastardo.
Não gostava de ficar tempo no mesmo
lugar. Dava-lhe nos nervos. tirava-lhe a
paciência. Punha comichão em seus dedos.
E se não bastasse tudo isso, sempre havia
um idiota com um maldito cartaz no bolso,
querendo ganhar mil dólares que jamais
seriam pagos.
— Eu lhe dou uma chance — disse
Frank, de olho no rifle calibre cinqüenta.
Sabia o estrago que uma arma daquelas
podia fazer. Mas era uma arma pesada.
Jamais dispararia com a rapidez de seus
Colts.
Qualquer homem inteligente, que
conhecesse a fama de Frank, analisaria isso.
Pesaria isso. Mas não se arriscaria. Aquele
rifle era a única opção do caçador de
recompensa. Tinha de ser um único e
certeiro tiro, de uma arma mortal e
devastadora.
Só que Frank confiava mais em seus
Colts.
Tudo parecia ser uma repetição de cenas
anteriores. Olhando nos olhos do mestiço,
Frank antecipava todos os acontecimentos.
Sabia que o rosto do outro ficaria tenso. Um
tique nervoso qualquer demonstraria o
momento do disparo.
— Não desperdice sua chance. Pode ser a
última de sua vida — insistiu Frank.
Suas palavras calaram fundo no mestiço.
Frank percebeu a vacilação. O mestiço tinha
medo.
— Que diabos está acontecendo aqui —
indagou um dos homens que entrava
acompanhado de meia dúzia de outros.
Todos pararam, observando a cena. De
um lado, no meio do saloon, Frank
mantinha as mãos relaxadas, mas ao nível
de suas pistolas mortíferas.
De outro lado, o mestiço apertava a
coronha do rifle, pesando suas
possibilidades.
O olhar cinza e frio de Frank venceu.
— Não terminamos ainda — disse o
mestiço.
— A qualquer momento, em qualquer
lugar, a qualquer hora — respondeu Frank,
virando-lhe as costas e caminhando na
direção do balcão.
O mestiço ergueu o rifle. Frank viu o
movimento no espelho. Moveu o corpo para
o lado.
A bala passou zumbindo ao lado ao lado
de seu corpo e foi espatifar o espelho. O
mestiço soltou o rifle e levou a mão à
cintura.
— Você está morto — disse Frank,
sacando com a esquerda e disparando.
A bala atingiu o centro do pescoço do
mestiço, que ficou indeciso entre sacar o
Colt e estancar o sangue que esguichava de
sua garganta.
Frank viu seu oponente olhá-lo com
surpresa, refletindo nos olhos embaçados a
perplexidade daqueles que sabem que vão
morrer.
Ele já tinha visto aquele olhar antes.
Muitas vezes.
Amaldiçoou Steve Grant por ter de passar
por tudo aquilo de novo.
Um dos homens que havia chegado com
o grupo que os interrompera se adiantou,
encarando Frank.
— Você é rápido com os Colts.
Ninguém se movia no saloon.
— Não conheço outra forma de usá-lo —
disse Frank.
— Procura trabalho?
— Não, estou de passagem.
— É uma pena. Um homem como você
poderia ser útil.
— Útil, com certeza, mas caro demais
para vocês — disse Frank, irritado,
deixando o saloon.
O grupo de homens se aproximou do
balcão. O chefe deles indagou ao barman:
— Quem é a boneca sensível, afinal?
— Frank... Frank Spade, o assassino de
Joshua Tree!
Os homens se entreolharam.
— Ele? — indagou surpreso, o chefe.
— Ele — confirmou o barman, olhando
nos olhos nublados pela morte do mestiço,
que rouquejava, expelindo o resto de sangue
que sobrava em seu corpo.
Frank estava deitado no catre da cela,
sentindo o suor escorrer pelo seu corpo,
molhando suas roupas. O xerife não lhe
dera trégua. Prendera-o na saída do saloon e
não o soltaria até que estivesse satisfeito
com as investigações.
O pistoleiro não cessava de amaldiçoar
Steve Grant por fazê-lo esperar.
Detestava ficar muito tempo em um
mesmo lugar. Já estava em Carson City
havia tempo demais.
Tempo suficiente para ter sido localizado
por mais um daqueles caçadores de
recompensa desatualizados.
Ouviu barulho. Sentou-se
preguiçosamente. O xerife parou diante da
porta da cela.
— Parece que você disse mesmo a
verdade — comentou o homem da lei. —
Além disso, há alguém que fala por você —
emendou.
— Ninguém fala por mim — afirmou
Frank, enraivecido, pondo-se em pé.
— Ora, ora! O mesmo esquentado de
sempre — comentou Steve, surgindo por
detrás do xerife.
— Seu maldito bastardo! — rugiu Frank,
avançando na direção dele.
Não fossem as grades, que o prendiam,
Frank teria agarrado Steve e esmurrado seu
rosto sorridente.
— Se quiser, eu o mantenho aí dentro até
se acalmar — ponderou o xerife.
— Não se preocupe, Connors, Frank me
adora. Pode soltá-lo — pediu Steve.
O xerife o atendeu. Steve estendeu a mão.
A contragosto Frank a apertou.
— Você se fez esperar por uma semana
nesta maldita cidade — vociferou Frank.
— Trabalho, meu amigo. Trabalho!
— Não importa. Agora que está aqui, só
quero que me dê a maldita anistia e pegue
isto de volta — disse Frank, estendendo a
carteira com suas credenciais e o distintivo
da Pinkerton.
— Calma, Frank! Não se precipite. Antes
de finalizarmos isto, há algo que preciso
mostrar-lhe. Aliás, há duas coisas que
preciso lhe mostrar.
Frank olhou-o desconfiadamente.
Conhecia aquele tom de voz. Steve estava
preparando algum coisa.
O xerife apareceu novamente, trazendo as
armas de Frank, entregando-as.
— Estas armas são famosas — comentou.
— Apenas me deram dor de cabeça,
xerife. Por mim eu as penduraria numa
parede e as esquecerei para sempre — disse
Frank, prendendo o cinturão.
— Depois você pensa nisso. Agora venha
comigo — pediu Steve, deixando a cadeia.
Frank o seguiu pela rua principal de
Carson City, até a casa do médico.
Assim que entraram, Steve apontou um
homem estendido num canto da sala, que
funcionava como uma espécie de
ambulatório médico e enfermaria.
— Veja aquilo — disse o detetive.
Frank foi até a cama onde gemia
fracamente um velho chinês. Seu corpo
estava horrivelmente torturado. Havia cortes
por toda parte. Braços e pernas pareciam
fraturados.
— O que houve com ele? — indagou
Frank.
— É o que gostaríamos de saber. Foi
encontrado se arrastando nas proximidades
da cidade. Não pode nos contar nada, mas
há algo que nos chamou a atenção. Observe
isto! — disse Steve, descobrindo o
tornozelo do ferido.
Frank se debruçou. Conhecia aquele tipo
de marca. Era feito por algemas.
— Prisioneiro? — surpreendeu-se.
— Talvez escravo.
— Escravo? Do que está falando?
— De gente que anda sumindo em
Carson City. Este velho passou por aqui,
vindo de San Francisco, há coisa de uns
dois meses. Sumiu de uma hora para outra e
reaparece agora, neste estado. Curioso, não
acha?
— Está bem — disse Frank, tentando se
manter neutro.
Já havia feito sua parte. Queria apenas
finalizar o trato que tivera com Steve e
partir para o Texas o mais depressa
possível.
— Frank, vamos precisar de você
novamente — disse Steve, com ar
suplicante.
Frank o encarou. Sabia que havia alguma
coisa por trás de tudo aquilo.
— Nada feito, Steve. Temos um trato. Eu
cumpri a minha parte. Estou deixando a
Pinkerton. Dê-me o que me prometeu e irei
embora para sempre.
— Frank, o oeste é uma terra difícil,
precisamos de homens como você.
— Há outros.
— Problema de seu patrão. Tenho meus
próprios problemas e quero resolvê-los o
mais depressa possível e ir embora. Se um
china levou uma surra, nada posso fazer.
— Ainda não lhe contei tudo...
— Desista, Steve. Não vou poder ajudá-
lo. Tenho meus planos feitos...
— Está bem! Pedi para mostrar-lhe duas
coisas. Uma é este velho. Vamos ver a
outra. Se não mudar de idéia, eu lhe darei o
que veio buscar e você poderá partir.
— Está certo!
— Só que apenas poderei fazer isto à
noite, durante o jantar.
— O que está tramando, afinal? —
indagou Frank, irritado com Steve.
— À noite você vai saber. Aproveite o
tempo para fazer a barba, tomar um banho e
pôr uma roupa limpa — ordenou Steve.
— Vá para o inferno, homem. Quer parar
de me dizer o que fazer?
Steve riu.
— Vá para o inferno você, Frank Spade.
Faça o que estou mandando ou ponho todos
os xerifes do oeste atrás de você novamente
— prometeu Steve.
— Faça isso e será um homem morto.
— Será? — ironizou Steve, com um
olhar de desafio que irritou definitivamente
o pistoleiro.
— Não me provoque, Steve!
O detetive da Pinkerton sorriu e virou as
costas para o pistoleiro.
Mark Scottsfield recolheu as pepitas de
ouro e depositou-as num saquinho de ouro.
Fechou-o e rumou para a casa principal do
acampamento.
A tarde morria lentamente, com o sol
projetando sombras na muralha de pedra
que se sobressaía sobre o acampamento.
Enquanto caminhava, o jovem sulista
refinada ainda se fazia presente.
Pensou que não precisava ser daquela
forma. Era poderoso agora. Tinha ouro,
muito ouro e, em breve, teria mais, muito
mais.
Comandava um pequeno exército.
Trabalhava bastante, tinha direito de se
divertir e compensar todo o tempo que
perdera estudando no Norte.
Sim, merecia isso. Merecia começar a
gastar um pouco daquele ouro que tanto
sacrifício lhe custava.
— Acho que vou à cidade, pai — disse,
assim que entrou.
John Scottsfield olhava a garrafa vazia
diante de seus olhos, como se buscasse ver
alguma coisa em seu interior.
— Só não vá sozinho — recomendou. —
E traga-me uma caixa deste uísque, se eles
tiverem recebido mais lá no saloon.
— Farei isso, pai.
Foi até o enorme cofre, num canto da
sala. Abriu-o. Lá dentro havia diversos
saquinhos de couro iguais aos que tinha na
mão.
— As pepitas estão ficando cada vez
maiores, pai... Em poucos dias chegaremos
ao veio principal.
— Sim, ele está lá, nos esperando. Não
vejo a hora de topar com ele...
Mark fechou o cofre. Ao se levantar, seu
ombro resvalou no coldre militar pendurado
na parede.
Apanhou-o e prendeu-o à cintura. Abriu-
o, sacando um velho Colt.
— Precisa me ensinar a atirar um dia, pai
— pediu ele.
— Não, filho, você não precisa saber
atirar. Basta ter dinheiro e sempre terá quem
atire por você — ponderou o velho.
Mark brincou rapidamente com o Colt,
depois guardou-o no coldre. Pendurou-o de
volta na parede.
— Mesmo assim, acho que vou comprar
uma nova para mim. Há uns Colts com
coronhas de madrepérola, modelo novo, que
calça balas de Winchester. São muito
práticos porque podem ser remuniciados
com rapidez e...
— Faça como quiser, Mark. Compre
dois, os melhores que encontrar. Afinal, é
para isso que serve o ouro.
Algum tempo mais tarde, Mark chegava à
cidade, acompanhado de mais meia dúzia de
capangas. Foram direto para um dos
saloons.
Assim que entrou, Mark foi saudado pelo
proprietário, que o levou para uma sala, nos
fundos.
— O uísque de seu pai chegou — disse
Robertson, o proprietário do saloon.
— Ótimo, meu pai vai adorar.
— E como estão as coisas lá na mina?
— Estamos próximos do veio. As pepitas
já são do tamanho de ovos de pombas.
— Grandes assim?
— Haverá maiores, tenho certeza. Mas
precisamos de mais gente, Robertson.
— Está difícil, Mark. Ninguém aparece
por aqui. Há apenas um pistoleiro, perigoso
demais para que se mexa com ele. Ainda
ontem ele matou um mestiço aqui dentro do
saloon.
— Não precisamos de mais um
encrenqueiro. E o china, como está?
— Pode considerá-lo morto. Não falará,
pode ficar tranqüilo quanto a isso.
— Viu novamente aquela garota de que
lhe falei? — indagou Mark, demonstrando
todo o seu interesse.
— Sim, ela continua na casa do xerife.
Mas descobri algo que não vai agradá-lo,
Mark.
— E o que foi?
— Lembra-se daquele rapaz louro e forte,
que capturamos há cerca de uns três meses?
— Sim, é um dos melhores escravos que
temos.
— É irmã dele.
— Não!
— E tem mais.
— O quê?
— Ela contratou um homem da Pinkerton
para tentar localizar o irmão. Parece que ele
escreveu uma carta para ela daqui, antes que
o pegássemos e o mandássemos para a
mina.
— Não importa. O acampamento é
inexpugnável e, além disso, muito bem
vigiado. Se o agente da Pinkerton chegar
por perto, vai sumir sem deixar pistas. Tente
arrumar-me mais alguns homens. Meu pai
quer usar a dinamite, mas acho arriscado.
Estamos perto demais para uma ação tão
drástica agora.
— Verei o que posso fazer.
Deixaram a sala e foram para o saloon.
Assim que entraram, a atenção de Mark foi
atraída por aquele homem vestindo um
elegante paletó, encostado no balcão,
bebendo.
As abas do paletó estavam presas para
trás, nas coronhas de dois reluzentes Colts,
com cabos de madrepérola.
Aproximou-se, interessado, vigiando por
seus capangas, espalhados pelo saloon.
— Belas armas — comentou.
Frank desviou seus olhos cinzas para o
rapaz, encarando-o.
— As melhores — respondeu, depois
terminou o copo de uísque, num só gole.
Impacientava-se. Steve ficara de apanhá-
lo no saloon às sete da noite e meia hora já
se passara desde então.
— Posso lhe pagar um drinque? —
ofereceu Mark.
Frank sondou o rapaz. Não parecia
ameaçador e, além de tudo, estava
desarmado. parecia um bom garoto.
— Se faz questão.
Mark fez um sinal para o barman,
pedindo o uísque especial que lhe era
reservado.
— A sua saúde! — brindou Mark.
— A nossa! — respondeu Frank,
entornando.
Saboreou a bebida, melhor que a que lhe
era servida.
— Você deve ser alguém muito especial
— comentou para o rapaz. — Estou aqui há
uma semana e só tenho bebido álcool puro,
da pior qualidade.
— Robertson, sempre que o cavalheiro
aqui pedir, sirva-lhe o melhor — disse
Mark, ao dono do saloon, com certa
arrogância.
— Claro que sim, Sr. Scottsfield.
— Neste caso, permita-me que lhe
retribua o drinque — ofereceu Frank.
— Nada feito. Você é meu convidado
nesta noite — devolveu Mark, envaidecido.
Nova rodada foi servida. Mark fixou seu
olhar no serrilhado da coronha de um dos
Colts.
— Essas marcas representam o que estou
pensando? — indagou ao pistoleiro.
— Sim e não me orgulho disso.
— É um pistoleiro?
— Não gosto de ser chamado assim. Já
fui um. Hoje gostaria de ser esquecido.
— E essas armas, não gostaria de vendê-
las?
— Por que pergunta?
— Adoraria tê-las para mim.
Frank tomou mais um gole. Lembrou-se
de quando era jovem e de como desejara um
par de pistolas como aquela. Só que o preço
que tivera de pagar fora alto demais.
Matara Joshua Tree numa luta limpa.
Joshua Tree era o xerife de uma
cidadezinha. Seus ajudantes caçaram Frank.
Matou três deles numa luta limpa também,
mas espalhou-se que fora numa emboscada.
Afinal, Joshua Tree era considerado o mais
rápido pistoleiro do oeste e jamais fora
batido.
— Esqueça isso, rapaz. Armas só atraem
encrencas e nada mais.
— Quantos homens já matou?
— E o que isso importa? — retrucou,
incomodado com aquele tipo de conversa.
— Não se ofenda, por favor! É apenas
curiosidade. Vamos beber, não está aqui
mais quem perguntou — descartou Mark,
apanhando a garrafa e servindo mais uma
dose para o pistoleiro.
Neste momento Steve chegou. Bateu nas
costas de Frank, que se voltou sem surpresa.
Havia acompanhando sua chegada pelo
espelho a sua frente.
— Você não muda, Frank. Sempre diante
de espelhos, vigiando as costas — observou
o homem da Pinkerton.
— Está atrasado — disse Frank,
aborrecido.
— Vamos lá, então.
Frank agradeceu Mark pela bebida e saiu,
acompanhado de Steve. Quando estava na
rua, Mark lhe gritou da porta do saloon.
— Se mudar de idéia e desejar vender as
pistolas, eu as compro.
— Acho que não tem dinheiro o bastante,
rapaz — respondeu Frank, sem se voltar.
— Não gostaria de descobrir isso? —
devolveu Mark, surpreendendo o pistoleiro.
— Quem é esse? — indagou Steve.
— Um garoto pretensioso — respondeu.
— E agora, qual é a surpresa?
— Vamos a um jantar.
— Jantar? Onde?
— Na casa do xerife.
— E o que há de especial lá?
— Uma pessoa que você precisa
conhecer.
Frank parou.
— Vamos lá, Frank. Você não perde
nada. Depois poderá ir embora.
— Acho bom que seja assim mesmo —
murmurou o pistoleiro, acompanhando
Steve.
Momentos depois chegavam à casa do
xerife, que estava no alpendre. Havia
algumas cadeiras ali e uma pequena mesa,
com uísque e copos.
— Vamos beber alguma coisa, rapazes,
enquanto as senhoras se aprontam.
Frank olhou interrogativamente para
Steve, que não lhe deu atenção e tratou de
servir um uísque.
— Dia quente! — comentou o xerife.
Frank suspirou resignadamente e foi se
servir de uísque. Sentou-se e ficou olhando
a rua deserta e escura.
De longe vinha a música de um dos
saloons ali nas redondezas. Aquela era uma
parte calma da cidade, com casas sem
cercas e jardins floridos.
Jamais se vira morando numa casa como
aquela. Sua vida atribulada sempre fora um
inferno.
Agora, com a anistia, podia começar a
pensar nisso. Acharia o seu lugar no Texas.
Uma boa mulher. Paz, afinal.
Risos femininos vieram do interior da
casa. Frank se voltou. Duas mulheres se
aproximavam, conversando alegres.
Uma era de meia idade, mas ainda
conservando no rosto traços de uma beleza
sem igual.
A outra era jovem e, quando parou na
porta e encarou o pistoleiro, Frank sentiu-se
estremecer.
Aqueles olhos azuis eram a coisa mais
bonita que ele já vira em toda a sua vida.
O jantar transcorreu agradavelmente,
embora Frank se sentisse realmente
incomodado, pois não entendia qual o
objetivo de Steve ao convidá-lo.
Aquele clima acolhedor e familiar
despertaram recordações no pistoleiro, mas
não o bastante para sensibilizá-lo. A vida já
o havia embrutecido demais.
Incomodava-o aquela paz r aquela
tranqüilidade. Não estava mais acostumado
a isso.
Quando o jantar terminou, a esposa do
xerife serviu café, depois se retirou.
A garota, Frank, Steve e o xerife ficaram
na sala.
— Sandy — disse Steve à garota. — Por
que não conta ao Frank o que a trouxe a
Carson City?
— Está bem — disse ela, voltando
aqueles olhos azuis maravilhoso para o
pistoleiro, que ocultou sua perturbação atrás
de longas baforadas em seu cigarro.
— O que é tudo isso, Steve? — indagou
Frank.
— Ouça apenas — pediu o outro.
— Recebi uma carta de meu irmão,
remetida aqui de Carson City. Ele contou
que havia encontrado um emprego num
rancho e que em breve mandaria me
buscar...
— Quando foi isso? — indagou Frank.
— Há uns três meses — respondeu ela.
— Respondi à carta de meu irmão e
aguardei uma noticia, mas,
inexplicavelmente, ele havia desaparecido.
— Não teve mais noticias dele?
— A carta que eu mandei retornou. Pedi
a um amigo que estava indo para San
Francisco que procurasse por Peter, meu
irmão, aqui na cidade. O mais estranho foi
que esse amigo descobriu que Peter havia
levado suas coisas para o rancho onde
trabalharia, mas jamais apareceu por lá. A
última noticia que deram dele foi que
estivera comemorando o novo emprego
num saloon aqui na cidade. Alguém o viu
por lá, bêbado e nunca mais voltou a vê-lo
de novo.
Frank ficou analisando o que a garota
contara, juntando as peças do quebra-cabeça
onde Steve desejava metê-lo.
Primeiro o china todo arrebentado. Agora
a estória da garota. Se conhecia Steve, as
duas coisas estavam relacionadas.
Encarou seu parceiro na Pinkerton.
— E onde eu entro nisso? — indagou?
— Como eu disse antes, precisamos de
você — afirmou Steve.
— Por favor! — suplicou a garota,
encarando Frank com ar ansioso.
— Espere aí, Steve... — tentou descartar
Frank.
— Frank, as duas coisas estão
relacionadas. O xerife tem mais
informações a acrescentar — insistiu Steve.
— Sim, há coisas estranhas acontecendo
em Carson City. Viajantes desaparecem
com muita facilidade. O caso do irmão de
Sandy não é o único. Há outras denúncias.
Além disso, há rumores de um
acampamento mineiro, ao pé das
montanhas, oculto em alguma parte naquele
labirinto de rochas. Falam de um filão de
ouro, o maior já encontrado em todo o
Oeste.
— Esperem aí, amigos — pediu Frank,
um tanto confuso com todas aquelas
informações. — Primeiro o china todo
quebrado...
— O chinês trabalhava nesse
acampamento. A marca da algema em seu
tornozelo indica que trabalhava como
escravo. Acho que tentou fugir e foi
maltratado daquela forma.
— Ele falou alguma coisa?
— Não e duvido que falará. Deve morrer
de uma hora para outra. Por ele jamais
saberemos.
— Está bem! Então há um acampamento
mineiro em algum lugar nas montanhas
usando viajantes como escravos. Peter, o
irmão de Sandy deve estar lá, se não
estiver... — ia dizendo Frank, mas calou-se
ao perceber o olhar de espanto e dor no
rosto de Sandy.
— É isso mesmo, Frank — continuou
Steve. — Precisamos que você investigue.
Frank esmagou o cigarro no cinzeiro,
compreendendo onde Steve quisera levá-lo
todo o tempo.
Encarou Sandy. Como suportar aquele
olhar suplicante e aqueles olhos azuis
marejados?
Diabos! Deveria ter evitado tudo aquilo.
— Diga que vai nos ajudar — pediu
Sandy. — O Sr. Pinkerton me assegurou
pessoalmente que você é um dos melhores
homens de toda a agência.
Frank se voltou e encarou Steve. Havia
aceitado trabalhar na Pinkerton porque teria
sua anistia total.
Até então, recebia algum dinheiro para as
despesas, nada que pudesse juntar para sua
vida futura.
— Você contratou a agência? — indagou
Frank à garota.
— Sim, e por um preço generoso.
— Não entendo — intrigou-se Frank. —
Se dependia de seu irmão...
— Oh, entendo — sorriu ela. — Muita
coisa aconteceu, desde que meu irmão se
separou de mim. Eu me casei com um
homem rico e generoso que, infelizmente,
morreu logo depois em um tiroteio. Tinha
propriedades no Norte, principalmente ao
redor de Washington e foi quem me
apresentou pessoalmente o Sr. Pinkerton.
— Oh, sim — comentou Frank.
Encarou Steve.
— Acho que precisamos falar de
negócios, meu amigo — disse, num tom que
não admitia contestação.
— Está certo, Frank, você pode entrar na
folha de pagamento normal. Não vai se
arrepender. Poderá ter um dinheirinho para
dar de sinal num rancho no Texas — disse
Steve.
— Texas? — surpreendeu-se Sandy. —
Tenho um rancho no Texas, mais
precisamente em Austin. Preciso
desesperadamente de um homem que me
ajude a administrá-lo — disse a garota,
sedutoramente.
Frank se sentiu caindo numa grande e
ardilosa armadilha.
— Não acho que deva ir — recomendou
Robertson.
— Meta-se com sua vida — disse Mark,
rispidamente, entornando mais um copo.
Robertson conhecia bem o garoto. Era
excelente quando sóbrio. Bêbado, se
tornava um transtorno.
Prometera, porém, ao velho Scottsfield
cuidar dele. Mark, no entanto, não
colaborava.
— Mark — insistiu. — Você está bêbado
e a garota está na casa do xerife. Pode
imaginar a encrenca que irá arrumar se
perder o controle?
— Dane-se! Quero vê-la de novo.
Prometo não arrumar encrenca — prometeu
ele, rumando para a porta.
Robertson fez um sinal para os capangas
que estavam no saloon, pedindo que
acompanhassem o rapaz.
Mark caminhou pela rua principal até a
igreja, depois dobrou a direita e rumou para
a parte residencial da cidade.
Viu a casa do xerife, com luz no
alpendre. Animou-se. Talvez a garota
estivesse lá, aproveitando o frescor da noite.
O que viu logo adiante, porém, não o
agradou. O homem que conhecera no bar,
aquele pistoleiro, conversava com a dama
na frente da casa.
Parou, indeciso. Os capangas atrás dele
ocultaram-se nas sombras.
— Diabos! — resmungou o rapaz.
Sabia o tempo todo que seus homens o
seguiam e lhe davam proteção. Não tinha
uma arma, mas lembrou-se do que seu pai
havia dito naquela tarde.
Tinha poder. Podia pagar para que
usassem a arma por ele. E era o que aquela
meia dúzia de homens que o seguia iria
fazer, se preciso fosse.
Aproximou-se, tentando manter-se firme.
Frank conversava com Sandy, envolvido
definitivamente pela armadilha que Steve
lhe havia preparado.
Ao aceitar a missão de tentar localizar o
irmão dela, ganharia não apenas o salário de
agente, mas a possibilidade de administrar
um rancho no Texas, coisa com a qual vinha
sonhando havia muito tempo mesmo.
— Quando me dará noticias? — indagava
ela.
— Eu lhe darei relatórios diários, a
menos que fique impedido de alguma forma
e... — interrompeu-se ele, vendo Mark
surgir das sombras.
Havia algo no rosto do rapaz que não o
agradou. Conhecia aquilo. Seus instintos
ficaram em alerta.
— Ora se não é nosso amigo das belas
pistolas — disse Mark e, apesar de tentar ao
máximo manter a compostura, Frank
percebeu o quanto ele estava alcoolizado.
— Posso fazer alguma coisa por você? —
indagou Frank, os olhos examinando as
sombras da rua.
No saloon, diante do espelho,
conversando com Mark, vira a
movimentação daqueles capangas.
Deveria haver pelo menos uma meia
dúzia deles, sempre atentos aos movimentos
de Mark.
Agora, ali, na rua escura e deserta, não
era diferente. Seus olhos, acostumados ao
perigo, viam mais do que os de um mortal
comum.
Isso o havia mantido vivo até então.
— Por que não me apresenta a bela
dama? — indagou Mark, os olhos
fascinados pela beleza de Sandy.
Frank já havia feito um balanço da
situação, tendo conseguido localizar pelo
menos quatro dos homens que protegiam
aquele rapaz.
Lamentou que Steve e o xerife tivessem
saído. Steve se propusera a acompanhar o
xerife em sua ronda.
Frank ficara ali, envolvido
definitivamente por Sandy.
— Por que não faz isso você mesmo? —
devolveu Frank, os olhos percorrendo a rua,
atentos.
Localizou um quinto homem e, logo em
seguida, o sexto. Memorizou suas posições.
— Como não! — disse o rapaz,
esforçando-se ao máximo para demonstrar
galanteria. — Sou Mark Scottsfield — disse
ele, fazendo uma mesura tipicamente sulista
diante da dama.
— Sandy Tipton — devolveu ela, numa
mesura idêntica.
Mark riu envaidecido, julgando que a
garota correspondia ao seu galanteio.
— Acho que é melhor se retirar, Sra.
Tipton — disse Frank, com formalidade,
lançando um olhar para a jovem, que
pareceu entender o perigo que se anunciava.
— Foi um prazer conhecê-lo, Sr.
Scottsfield — disse ela, fazendo menção de
se voltar.
Mark estendeu a mão e agarrou o braço
da garota, impedindo que ela se afastasse.
— Não vá embora por minha causa —
disse ele.
Frank estendeu a mão e agarrou o punho
dele com firmeza, lançando seu olhar mais
mortal.
Mark levantou os olhos para ele,
surpreso. Não estava acostumado a ser
contrariado.
Percebeu que Frank havia agarrado seu
pulso com a mão esquerda e que, com a
direita, desabotoara o paletó e jogara a aba
para trás, descobrindo a coronha serrilhada
de seu Colt.
— Por favor, não entenda mal — disse o
rapaz, soltando o braço de Sandy.
— Boa noite, Sra. Tipton — disse o
pistoleiro, com um tom de voz intimidou a
garota.
Ela se afastou, entrando na casa. Frank
soltou o braço do garoto.
— Que tal um drinque? — propôs Mark,
mudando de estratégia repentinamente.
Aquele olhar frio e cinzento do pistoleiro
o intimidava e, ao mesmo tempo, o
espicaçava.
O maldito parecia ter tudo aquilo que ele,
com todo o seu ouro, não conseguia obter: o
mais belo par de pistolas do oeste e a
atenção da mulher mais bonita que ele já
vira.
Sabia que seus pistoleiros o protegiam,
mas nada lhe garantia que a primeira bala
de Frank não seria para ele.
— E por que não? — falou o pistoleiro,
aceitando o convite.
Caminharam rumo ao saloon. Nas
sombras, Frank percebia os movimentos
furtivos dos capangas.
— É uma bela dama — comentou Mark.
— Sim, pode-se dizer que sim.
— Eu não quis ser rude e...
— Esqueça — pediu Frank, instintos
atentos, a mente trabalhando nas
informações que tinha sobre o
desaparecimento do irmão de Sandy.
Uma coisa o estava intrigando agora. A
maneira como Mark, quando fizera a oferta
pela compra das armas de Frank, havia dado
a impressão de ter muito dinheiro.
Isso se confirmava pelo fato de ter meia
dúzia de capangas para protegê-lo.
Por que aquele rapaz era tão importante?
E porque tinha aquele tratamento especial
no saloon, com uma marca especial de
uísque dos melhores?
Para ter tudo isso, alguém precisava ter
dinheiro, muito dinheiro mesmo.
— O que faz para viver? — indagou
Frank, o tom de voz sem demonstrar a
menor emoção.
Mark riu.
— Eu sou rico — disse, com desprezo,
mas, ainda assim, um certo respeito.
— Gado? — insistiu Frank.
— Não, algo mais pesado — continuou
Mark, cheio de mistérios.
Frank indagou-se o que poderia ser mais
pesado que o gado.
— E tão valioso? — continuou.
— Mais... Muito mais... O bastante para
mandar fazer milhares de pistolas como a
sua... — disse Mark.
— E por que não faz isso?
— Porque ela jamais teria esses
serrilhados nas coronhas, como as suas. Não
teria captado em cada marca dessas a marca
de um homem morto.
Aproximavam-se do saloon, já na rua
principal. Robertson respirou aliviado, ao
ver o garoto retornado.
Assim que o dois chegaram, Mark pediu
que Frank se adiantasse, enquanto
conversava com Robertson.
— Vamos pegá-lo. É forte e, além disso,
tem duas coisas que desejo mais que tudo
neste mundo — murmurou o rapaz.
— E o que deseja tanto?
— As armas de um pistoleiro e a atenção
de uma bela dama — comentou Mark,
decidido.
— Vamos embebedá-lo primeiro. É um
tipo perigoso, posso lhe assegurar isso —
disse o dono do saloon.
Frank tentou se desviar, mas a coronha da
arma, endereçada a sua cabeça, resvalou em
seu ombro sem maiores danos.
Girou o corpo, no escuro da rua, tentando
atingir seu agressor.
Estiver no saloon, ouvindo as
fanfarronices de Mark, aumentando à
medida em que ele mais se embriagava.
Por fim, percebeu que o rapaz
ultrapassado os limites, despediu-se e
deixou o saloon, não sem antes ouvir Mark
disser:
— Diga quanto quer por elas que eu as
compro — insistiu, referindo-se às pistolas.
Tão logo Mark saiu, Robertson fez um
sinal para os capangas de Mark, que saíram
no encalço do pistoleiro.
Três deles tentavam, agora, imobilizá-lo.
Apesar de bêbado, Frank ainda oferecia
muito perigo.
Sentiu o salto de sua bota bater no corpo
de um dos homens, que gemeu, caindo de
joelhos na poeira da rua deserta e escura.
— Maldito! — ouviu alguém resmungar.
— Pegue-o agora — disse o outro,
tentando segurar Frank pelas costas,
prendendo seus braços.
Frank jogou a cabeça para trás, atingindo
o nariz de seu atacante, que gemeu, sentindo
o sangue escorrer pelo rosto.
Alguém atingiu Frank nos rins, com um
golpe seco e forte. O pistoleiro sentiu seus
joelhos fraquejarem.
Sua única saída agora eram as armas.
Tentou sacá-las, mas a coronha de um rifle
atingiu-o na testa, jogando-o para trás.
— Vamos amaciá-lo um pouco —
comentou um dos homens.
Frank foi erguido e desarmado. Dois
homens seguraram seus braços, enquanto o
outro se pôs a golpear ritmadamente o corpo
do pistoleiro, atingindo seu estômago e o
queixo alternadamente.
Frank sentiu um gosto amargo em sua
boca. Tentou erguer uma das pernas para
interromper aquele ataque, mas sua bota
parecia pesar uma tonelada.
Os punhos continuaram martelando
impiedosamente. Os dois homens soltaram
os braços de Frank, que desabou na poeira.
Os três se juntaram na tarefa cruel de
chutar-lhe o corpo já sem forças.
O sol surgia lentamente, jogando luzes no
acampamento, despertando os homens.
Em pouco tempo, toda a movimentação
recomeçou. Homens alquebrados
reiniciaram sua faina diária, empurrando
vagões, brandindo picaretas.
Frank gemeu dolorosamente, tentando
acomodar melhor o corpo manietado.
Abriu vagarosamente os olhos. Não sabia
onde estava, mas não gostava nada do que
via.
Estava numa jaula, com as mãos
firmemente amarradas, o corpo dobrado
para caber em tão exíguo espaço.
Diante dele desfilavam aqueles homens
maltrapilhos, empurrando vagões de um
lado para outro, indo e vindo daquela mina.
Vigias brandiam chicotes e gritavam
ordens, incentivando os trabalhadores.
Logo adiante, pendurado no galho de
uma árvore seca, um homem balançava
preso pelo pescoço.
Estava sem camisa e todo o seu tronco
estava cortado por chicotadas. A morte
possivelmente lhe fora um consolo, após
tanta tortura.
Um grupo de homens armados se
aproximou. Entre eles sobressaia-se aquele
velho alto, de barbas brancas e postura
militar.
— Ora, temos um novo voluntário —
comentou o velho, quando o grupo parou
diante da jaula.
— O que está havendo por aqui, afinal?
— indagou Frank, sentindo que todos os
seus músculos doíam quando falava.
— Nada especial, meu caro rapaz.
Apenas trabalho...
— Eu já tenho o meu trabalho —
interrompeu-o Frank.
— Acaba de mudar — afirmou o velho,
que parecia de bom humor naquela manhã.
— Você deve estar louco — murmurou
Frank.
— Cale-se! Tenha mais respeito! —
ordenou um dos homens, tentando atingir
Frank com o cabo do chicote.
— Calma, Hollister! — interrompeu-o o
velho. Deixe-o, pelo menos por enquanto.
Acho que já o maltrataram demais.
Precisamos de homens fortes para o
trabalho. Se tiver um gênio ruim, saberemos
como domá-lo, mas não vamos estragá-lo
para a tarefa. Temos perdido homens
demais — ponderou John Scottsfield.
— O que querem de mim, afinal? E
minhas armas? Onde estão minhas pistolas?
Os homens riram com desprezo.
— Queremos apenas que trabalhe direito
e não cause encrencas — disse o velho. —
Vai viver mais se fizer isso.
— E se eu me recusar?
O velho apontou na direção da árvore
seca, onde pendia o corpo de enforcado.
— Não se recusará — afirmou.
Frank percebeu a situação. Sua atenção
foi atraída, porém, na direção de Mark, que
passava por ali.
Preso em sua cintura ia o precioso
cinturão de Frank e as duas pistolas de
coronhas serrilhadas.
— Maldito! — murmurou em voz baixa.
— Como disse? — indagou-lhe o velho.
Frank apenas o olhou com um ódio
profundo.
— Trabalhe direito e será bem tratado e
alimentado. Dê-nos problemas e farei com
que se arrependa — prometeu o velho. —
Preparem uma bola para ele — acrescentou,
afastando-se.
Um dos homens foi até um barracão, de
onde retornou com uma pesada bola de
ferro de onde pendia uma corrente,
finalizando com uma algema.
— Saía daí devagarinho — ordenou um
dos capangas, abrindo a jaula.
Frank moveu com dificuldade o corpo
dolorido. Armas foram apontadas para ele,
desaconselhando qualquer reação.
Obedeceu, resignadamente. A algema se
fechou ao redor de seu tornozelo, assim que
lhe retiraram a bota.
— Tire a outra bota também —
ordenaram.
Frank olhou os homens que caminhavam
descalços sobre os pedregulhos. Havia
sangue em seus pés.
— Temos um trabalho especial para
gente como você: lá dentro, escavando a
mina. Apanhe a bola e siga em frente —
ordenaram novamente e Frank obedeceu.
Apanhou a bola de ferro. Sabia que
qualquer reação era loucura naquele
momento.
Precisava sondar o terreno e se manter
vivo, até descobrir uma forma de sair dali.
As suposições de Steve estavam corretas.
Se aquela era a mina e aqueles eram os
escravos, possivelmente o irmão de Sandy
estivesse ali, a menos que tivesse sido
morto, como aquele pobre coitado
pendurado na árvore.
Foi levado para o fundo da mina. Deram-
lhe uma picareta. Frank se pôs a golpear
ferozmente a muralha de rocha a sua frente.
Assim que seus olhos se acostumaram
totalmente com a escuridão, percebeu
outros homens, cavando como ele.
Afastados e livres da poeira, de armas em
punho, pistoleiros vigiavam o trabalho.
Os vagões chegavam vazios. Eram
carregados de entulho e empurrados para
fora, numa rotina monótona e constante.
— Ei, vocês! — disse Frank, aos outros.
— Há uma forma de escapar daqui?
Os homens esboçaram sorrisos
desconsolados e continuaram brandindo
suas picaretas.
— É morte certa — assegurou um deles.
— Se ficarmos também morreremos —
ponderou Frank.
— Muitos já tentaram e falharam.
— É preciso saber como fazer. Alguém
aqui conhece a região?
— Muito pouco. Somos todos viajantes,
de passagem pela região o que nos torna
inúteis para seguir quem quer que seja.
— Quando poderemos conversar melhor?
— continuou Frank.
— À noite estaremos cansados demais
para isso — comentou um dos homens.
— Força nessas picaretas — berrou um
dos vigias, aproximando-se.
O chicote estalou nas costas de Frank,
que sentiu o gosto de sangue em sua boca.
A ferida ardeu como fogo. Com o canto
dos olhos fitou o homem que o chicoteara.
Seus olhos cinzentos e frios juraram
vingança.
Aquele trabalho estafante durou o dia
todo, com uma pequena pausa para um
almoço.
Quando o dia chegou ao fim, o trabalho
interrompeu-se finalmente. Todos foram
conduzidos a um galpão, onde receberam
um prato de comida.
— Demônios! Isto parece comida de
animais — comentou Frank.
— Cale-se e coma. Não é gostosa mas
manterá suas forças. Vai precisar de todas
elas a cada dia.
Frank apanhou o prato e foi se sentar
num canto. Só quando se sentou, apoiando
as costas contra a parede, foi que percebeu o
quanto estava cansado.
Além disso, os pés doíam terrivelmente,
lanhados pelos pedregulhos. A algema
cortava a pele de seu tornozelo.
Reparou, então, que nem todos os
prisioneiros tinham aquela bola de ferro
presa ao corpo. Devia haver um motivo para
aquilo.
— Acho que formamos um time —
comentou ele, apontando as bolas de ferro
dos outros.
— Isto é só o começo. Depois você fica
tão fraco e tão cansado que nem tem
coragem em pensar em outra coisa a não ser
voltar para este galpão e dormir — explicou
um dos prisioneiros.
— Então preciso fazer algo antes que
chegar a esse estado — concluiu Frank. —
Deve haver uma forma de sair daqui.
— Sim, apressadinho — continuou outro
deles. — Primeiro você se livra da bola de
ferro. Depois pega a única trilha que sai
daqui. Se passar pelos quatro ou cinco
postos de guarda sem se perder no labirinto
de rochas que esconde este lugar, terá de
andar a pé até a cidade. Tudo isso se os
coiotes não o pegarem antes. Ou os
caçadores de fugitivos.
— Não parece muito animador, não? —
concluiu o pistoleiro.
— Bote uma coisa em sua cabeça: não há
como escapar daqui — afirmou um deles.
— Se eu acreditar nisso, aí então estarei
morto. Deve haver uma forma e haverei de
encontrá-la.
— Comece tentando se livrar da bola de
ferro — desafiou alguém e todos riram.
Frank se manteve sério. Retirou o cinto.
Com a fivela ele forçou o orifício da
algema.
Com um sorriso nos lábios o pistoleiro
viu a algema se abrir com facilidade. Todos
começaram a olhá-lo com respeito.
— Você é esperto, homem, muito esperto
— elogiou um dos prisioneiros.
— Aposto como aquelas armas que o
Mark está usando são suas — disse um
outro.
— Sim e vou recuperá-las.
— Ninguém poderia impedi-lo de tentar.
Acho que agora ele conseguirá fazer bonito
para aquela garota da cidade — comentou
alguém.
O assunto interessava Frank. Tinha quase
que certeza que a garota em questão era
Sandy.
— Por que diz isso? — indagou ele.
— Ele está tentando conquistar uma
garota lá na cidade, mas está um tanto
difícil. Ouvi o pessoal da cozinha comentar
que ele vai até à cidade de novo esta noite.
Frank ficou pensativo, imaginando o que
aquele bastardo, com tanto poder, poderia
desejar com Sandy. Ela jamais o receberia e
isso poderia ser o pior.
Mark parecia acostumado a ter tudo que
desejava, mesmo que, para isso, precisasse
usar a força.
E estaria sempre cercado por aqueles
capangas, verdadeiras sombras na
escuridão, protegendo-o o tempo todo.
Eram como sombras.
— Sombras!
Uma idéia surgiu em sua mente, a
principio hesitante, mas ganhando força em
seguida.
— Onde fica o estábulo? — indagou.
— Lá no alto, à direita da casa principal.
Frank terminou de soltar a algema de seu
tornozelo. Esgueirou-se pelo galpão até a
janela.
Sondou lá fora. Homens vigiavam,
portando espingardas de cano duplo.
— Demônios! — praguejou, voltando ao
seu lugar. — Há vigias por toda parte.
— A única maneira de sair daqui é
voando — disse um dos prisioneiros,
apontando para o alto.
Frank levantou os olhos para o telhado.
Era simples, de madeira sobreposta.
Percebeu que não havia janela numa das
paredes.
— O que tem ali atrás? — indagou.
— Um barranco íngreme. Só voando
mesmo você chegaria ao alto, rapaz.
— Talvez — comentou Frank, pondo-se
em pé, analisando suas possibilidades.
— Vai tentar assim mesmo?
— Com um pouco de sorte... Há aqui um
rapaz chamado Peter?
— Peter, o Louro?
— É possível — respondeu Frank. — Foi
capturado há uns três meses. É alto e forte...
— Há alguém assim, mas trabalhava na
dinamite.
— E onde está ele agora?
— Quem pode saber? Andaram
detonando explosivos há algum tempo atrás.
Quem pode dizer o que aconteceu?
Frank não gostou de ter de levar aquela
noticia para Sandy. Mas deixou para se
preocupar com Peter mais tarde. Precisava
agora encontrar uma forma de escapar.
— Pode me ajudar aqui? — pediu,
trazendo uma mesa para o centro do galpão.
Um dos homens segurou a cadeira que
Dank equilibrou sobre a mesa.
Dolorosamente Frank subiu na mesa, depois
na cadeira.
Conseguiu, assim, alcançar uma das
traves do telhado. Todos os músculos de seu
corpo doíam.
Lentamente ele foi se erguendo, até que
seu corpo se enroscasse à trave de madeira
e, finalmente, ele conseguisse se sentar nela.
Ficou algum tempo imóvel, esperando as
dores passarem. Depois ficou em pé e
removeu a madeira do telhado, abrindo uma
abertura.
Reuniu todas as suas forças e saiu para o
frescor da noite.
— Eu voltarei para ajudá-los —
prometeu.
— Boa sorte! — desejaram os
prisioneiros.
Frank recolocou a madeira, fechando a
abertura. Deslizou até o paredão de pedras.
Começou a escalá-lo lentamente.
Podia ouvir os vigias conversando lá
embaixo. Seu corpo parecia querer explodir
de tanta dor, mas sua vontade férrea
prevalecia acima de tudo.
Chegou ao alto e sondou o terreno. Havia
um pátio enorme e aberto. Ao fundo, uma
casa maior. Vislumbrou o estábulo.
Havia uma chance, mínima, mas
possível, de escapar dali, juntando-se àquele
séquito de sombras que seguia Mark.
Esgueirou-se rapidamente, esquecido das
dores, até o estábulo. Procurou um
esconderijo.
Havia selas e animais em quantidade.
Mal havia se ocultado, ouviu vozes. Um
grupo se aproximava.
— É sua vez de selar o cavalo do garoto
— dizia um deles.
— Está bem, deixe comigo. Vamos ver
se, nesta noite, ele consegue finalmente
falar mais de um minuto com aquela garota.
— Aposto como vai conseguir. Ele ficou
muito macho com aquelas duas pistolas...
— Que, por sinal, são boas demais para
ele.
— Está se sentindo o máximo.
Continuaram conversando, enquanto
selavam os cavalos. Frank permaneceu
atento, esperando sua oportunidade.
Steve estava deveras preocupado com
Frank. Conhecia seus métodos. Frank
jamais iniciaria nada sem discutir o melhor
caminho com seu chefe.
Podia ser um tanto esquentado, mas
conhecia seu oficio e trabalhava melhor que
ninguém.
Steve estava tentando, a todo custo,
mantê-lo na agência. Frank era bom demais
para se afastar.
Além disso, era valente e rápido com as
armas. Sabia impor respeito e encontrar
sempre a melhor solução para os casos de
que era encarregado.
E havia sido muitos, enquanto aguardava
a prometida anistia. Sabia que Pinkerton
estava tratando disso, mas iria prolongar ao
máximo o assunto, como firma de manter
Frank no quadro de agentes.
Steve achou melhor procurar o xerife e
discutir o desaparecimento de Frank.
— Não o localizou ainda? — indagou o
xerife, ao vê-lo entrando.
— Ainda não!
O ar pensativo do xerife preocupou
Steve.
— O que acha que houve? — indagou ao
homem da lei.
— Parece que ele sumiu como os outros
— ponderou. — Ou se amigo é muito
esperto ou, neste momento, está onde estão
todos os que andaram sumindo da cidade
nos últimos tempos.
— É muita coincidência. Frank estava
aqui havia uma semana. Por que teria de
sumir logo agora?
— E Sandy, você a viu por aí? —
questionou o xerife.
— Sandy? Por que pergunta? — retrucou
Steve, preocupado.
— Ela saiu ao entardecer para dar uma
volta. Passei pela minha casa há coisa de
uns quinze minutos e ela não retornara
ainda.
— Visitando alguém?
— Acho difícil. Sandy não conhece mais
ninguém na cidade, além de nós. Desde que
chegou não sai de casa.
— Estranho! Que tal darmos uma volta
por aí? — convidou Steve.
— Certo — concordou o xerife, dando
algumas ordens a um de seus ajudantes e,
depois, saindo na companhia de Steve. —
Vamos até minha casa novamente. Talvez
ela tenha voltado.
Steve achou uma boa idéia e rumaram
para lá. Para sua preocupação, no entanto, a
garota, a garota ainda não havia aparecido.
Apanharam seus cavalos e saíram dar
uma olhada pelos arredores, embora não
tivessem a menor idéia de por onde começar
a procurar pela garota.
Steve não estava gostando do rumo que
as coisas estavam tomando.
Sem que ele soubesse, naquele momento,
Sandy era empurrada rudemente para o
interior de um quarto de saloon.
Robertson sorriu satisfeito, olhando a
garota encolher-se assustada na cabeceira da
cama.
— Não sei que diabos aquele garoto viu
em você, dona, mas só sei que posso lutar
muito com isso — comentou ele, fechando
a porta atrás de si.
Olhou a garota assustada. Tinha uma
certa beleza. Além disso, seu corpo era
provocante, roliço e tentador.
O desejo estampou-se em seu rosto.
Poderia entregá-la ao garoto Scottsfield,
mas antes poderia muito bem aproveitar um
pouco de todo aquele prazer oculto no corpo
desejável de Sandy.
Sentou-se na beirada da cama e estendeu
a mão, segurando o queixo da garota, que
tremia.
— O que quer de mim? — indagou ela,
apavorada.
— Ora, ora, dona! Aposto como você
sabe muito bem — respondeu ele, a outra
mão indo pousar sobre um dos seios dela.
— Não, por favor! — pediu ela,
debilmente, mas isso apenas provocava
Robertson.
Sandy tentou manter a frieza e recuperar
o controle da situação. Estava passeando e
escurecera rapidamente.
Não percebera que estava sendo seguida.
Robertson e um outro homem a viram e a
seguiram.
Agarraram-na e a levaram para um beco
e, dali, para o saloon. A mão firme dele
apertava rudemente seu seio agora.
— Por favor — pediu ela, mudando de
estratégia. — Assim não... Dê-me um
tempo... Não gosto das coisas apressadas...
Além disso, gostaria de um banho... Um
pouco de perfume... — disse ela,
sedutoramente.
Robertson pareceu engolir a isca,
convencido de que a garota iria colaborar.
— Está certo, beleza. Vou mandar
alguém para ajudá-la — aceitou ele,
levantando-se e deixando o quarto.
— Nojento! — exclamou a garota,
levantando-se e correndo até a porta.
Girou o trinco, mas a porta havia sido
trancada pelo lado de fora, aprisionando-a.
Foi então, até a janela. Era alta, sem
parapeito, dando para os fundos do saloon.
Tentar sair por ali era arriscar quebrar a
perna, mas Sandy concluiu que isso ainda
era preferível a se submeter a um homem
como Robertson.
Ouviu barulho na porta, que se abriu logo
em seguida. Uma garota entrou. Usava um
vestido decotado e exagerava na
maquilagem do rosto.
— Olá, querida! Meu nome é Mark e
Robertson me mandou para cuidar de você.
Vou lhe preparar um banho quente. Trouxe-
lhe estas roupas também — disse, jogando
sobre a cama um vestido de seda
escandaloso.
Sandy olhava na direção da porta, que
Mark deixara aberta. A outra percebeu isso
e deu de ombros.
— É bobagem tentar sair agora, querida.
Não há como fugir.
— Vou tentar sair pela janela...
— Terei de gritar e avisar Robertson...
— Por quê?
— Porque ele me mataria se eu a
deixasse escapar.
— Como? Não entendo? Você não é
escrava dele e...
— Espere, espere! Acho que você acertou
na mosca. Sou uma espécie de escrava,
como você também o será logo.
— Jamais!
— Escute, querida — disse Sandy e seu
tom de voz era amigo e consolador. — No
começo eu pensava assim, como você.
Depois a gente se acostuma e acaba até
gostando desse bastardo. Ainda prefiro isso
a ser mandada para a mina...
— Mina? Que mina? — interessou-se
Sandy.
— Para onde vão todos os que somem
desta cidade, querida — explicou Mary. —
Agora vá se despindo. Vou lhe preparar um
banho.
— Espere um pouco, Mary. Conte-me
mais a respeito disso.
Ouviram-se vozes lá no saloon, depois
uma agitação que ganhou as ruas.
— Venha comigo, vou lhe mostrar algo
— disse Mary, segurando Sandy pela mão e
levando-a para o corredor e, dali, para um
quarto que dava para a rua.
Aproximaram-se da janela.
— Veja aquilo — apontou.
Um grupo de cavaleiros montava em seus
cavalos, apressados para partirem numa
missão.
— Para onde vão? — quis saber Sandy.
— Caçar escravos. Souberam que um
grupo de colonos acampou norte da cidade.
Pode apostar como todos os homens válidos
sumirão. E se houver mulheres bonitas...
Bem, você poderá cruzar com uma delas
por estes corredores...
— Se sabe tudo isso, por que não vai até
o xerife e conta tudo?
— Não daria um níquel furado pela
minha vida depois disso. Eles sabem ser
duros, querida. Muito duros — disse Mary,
soltando o zíper do seu vestido e
descobrindo as costas.
Sandy horrorizou-se ao ver as marcas
profundas deixadas por um chicote.
— E então, não é preferível ficar longe de
tudo isso? — ponderou Mary.
— Não, não posso me conformar com
isso.
— Pois é melhor ir se acostumando.
Acho que Robertson está lhe preparando
algo especial. Presumo que seja a garota
que encantou o garoto Scottsfield.
Sandy se lembrava desse nome, mas
estava aturdida demais para se lembrar.
Tudo aquilo fedia. Não podia estar
acontecendo.
Steve e o xerife acabavam de retornar à
cadeia, quando um cavaleiro parou junto
deles.
— Frank! — surpreendeu-se Steve. —
Por onde andou?
— É uma longa estória, meu amigo, e
prefiro contá-la diante de um copo de
uísque.
— Tenho o melhor deles lá dentro —
ofereceu o xerife.
Entraram rapidamente. Frank vestia
roupas comuns, sem nenhuma elegância.
Além disso, tinha o rosto marcado por
hematomas e cortes horríveis.
— O que fizeram com sua cara? —
surpreendeu-se o amigo.
— Precisava ver o que fizeram com o
resto do meu corpo também — respondeu o
pistoleiro, aceitando o copo que o xerife lhe
estendia.
Bebeu num só gole e devolveu-o,
pedindo mais. Nova rodada foi servida.
Frank apanhou ele mesmo a garrafa e
somente após ter tomado meia dúzia de
tragos, se dispôs a falar.
— Fui atacado ontem à noite e levado
para a maldita mina. Parece que todos os
que desaparecem da cidade são levados para
lá. Estão escavando ouro e parece ser um
veio promissor.
— Encontrou o irmão de Sandy? — quis
saber Steve.
— Viram-no por lá, mas não o localizei.
Tudo foi muito rápido. Trabalhei o dia todo
no interior da mina e, à noite, consegui
escapar. Tomei o lugar de um dos capangas
que vinham para a cidade. Quando estava
chegando aqui perto, separei-me deles. Na
escuridão não perceberam nada porque vesti
a roupa do capanga.
— Quem são esse homens afinal? —
indagou o xerife.
— O nome Scottsfield lhe é familiar,
xerife? — retrucou Frank.
— Scottsfield... Sim, um velho sulista e
seu filho passaram por aqui alguns meses...
Estavam em busca de terras, mas queriam
algo lá para os lados das montanhas e... Não
me diga que...
— Sim, são os donos da mina.
— Então a lenda estava certa —
comentou o xerife.
— Lenda? Que lenda? — quis saber
Steve.
— Durante a guerra, um grupo de
confederados andou se escondendo no sopé
das montanhas, ao sul de Carson City.
Contas que encontraram pepitas de ouro e
que haveria por lá um filão inimaginável...
Precisamos tomar providencias. Pode nos
levar ao local. Frank?
O pistoleiro sorriu desconsolado,
tomando mais um gole.
— Era noite e eu apenas seguia o grupo.
É um labirinto intricando que, muitas vezes,
julguei que eles próprios estavam perdidos.
— Uma pista, uma forma de sabermos
ainda que vagamente o local — insistiu o
xerife.
— É impossível, xerife! Como disse, era
noite. Não conheço a região. Jamais sairia
de lá sozinho, da mesma forma que jamais
poderia voltar lá de novo.
— Mas espere aí! Você disse que o grupo
veio para a cidade, não? — atentou o xerife.
— Sim, sei até onde encontrá-los. Parece
que o antro deles é o saloon Arrows.
— Robertson! Sim, as coisas começam a
se encaixar. Robertson também é um sulista
e chegou aqui alguns meses antes do velho
Scottsfield. Podem estar juntos nessa sujeira
— deduziu o homem da lei.
— E aquela mulher disse que viu Sandy
nas proximidades do saloon. E foi a última a
vê-la — comentou Steve.
— Sandy? O que houve com ela —
explicou o xerife.
Frank sentiu seu sangue ferver e todas as
dores de seu corpo se aplacarem.
— Malditos! Agora entendo tudo —
murmurou.
— Do que está falando? — insistiu Steve.
— O garoto, Mark Scottsfield, encantou-
se com Sandy, da mesma forma como se
encantou com minhas pistolas. Conseguiu
as pistolas e, acredito, pretendo conseguir
Sandy. Acho que sei onde ela está —
afirmou o pistoleiro.
— Então vamos para lá imediatamente —
decidiu o xerife. — Vou convocar meus
ajudantes e...
— Não, xerife! Por favor, deixe-me
resolver isto a minha maneira — pediu
Frank. — Como homem da lei você terá de
respeitar os livros. Eu posso simplificar as
coisas com isto — disse Frank, sacando a
pistola que tomara do capanga, lá no
acampamento, antes de fugir.
— Essa não faz muito seu estilo —
opinou o xerife. — Acho que se sentirá
melhor com estas — acrescentou, abrindo
um armário e retirando um cinturão duplo.
Nos coldres pendiam duas pistolas com
coronhas de ébano luzidio.
Frank apanhou as armas. Examinou-as.
— São ótimas! — concluiu, prendendo o
cinturão.
Verificou as armas. Examinou-as.
— São ótimas! — concluiu, prendendo o
cinturão.
Verificou as armas e recarregou-as. Steve
fez o mesmo.
— Onde pensa que vai? — indagou-lhe
Frank.
— Vou deixar todo o trabalho sujo para
você e apenas ficar cobrindo sua retaguarda.
Pode ser? — ironizou Steve.
— Não se meta. Este assunto agora é
pessoal. Há alguém naquele saloon usando
as minhas pistolas e eu as quero de volta —
afirmou Frank.
— Se é assim, quanto mais cobertura,
melhor — acrescentou o xerife, apanhando
um espingarda de cano duplo.
Frank resignou-se e se deixou
acompanhar pelos seus amigos. Desceram a
rua principal. Espalhados espaçadamente,
lampiões iluminavam precariamente, o
bastante para permitir a caminhada.
Pouco a pouco o barulho de música e de
risos foi se acentuado, à medida em que se
aproximavam do saloon.
— Qual é o plano, Frank? — quis saber
Steve.
— Conhece o saloon, xerife? — retrucou
Frank.
— Sim, por quê?
— Há uma saída pelos fundos?
— Há uma sim, se não me engano.
— Um de vocês poderia entrar por lá.
— Eu faço isso — ofereceu-se o xerife.
Estavam próximos do saloon. Frank
parou, seguido pelos outros dois. Observou
a fachada do saloon.
— Steve, acha que consegue escalar
aquela lateral e entrar por cima?
— Seguramente, Frank.
— Se pretendem me dar cobertura, nada
melhor que um entrando pelos fundos,
pegando-os pelas costas. Seguramente do
alto você do alto terá uma boa visão do
salão e poderá ficar atento, Steve.
— Tem toda razão. Dê-me alguns
minutos. Tomarei posição. Vou esperar até
Steve escalar a fachada — afirmou o xerife.
— Só agirei quando vocês estiverem
prontos — decidiu Frank.
Frank ficou observando, até que os dois
estivessem prontos. Depois caminhou na
direção da entrada do saloon.
Havia um homem na frente, apoiado a
um pilar, fumando distraidamente. Ao
pressentir a aproximação de Frank, voltou-
se para olhá-lo.
Por momentos ficou surpreso. Depois, fez
menção de recuar, na direção da porta.
Frank já o havia reconhecido. Era o
mesmo que o chicoteara o dia todo, no
fundo escuro daquela mina.
Segurou-o pelo ombro e puxou-o com
força, enquanto lançava seu punho na
direção do rosto dele.
Com um estalido seco, Frank sentiu o
maxilar do outro se partindo com a pancada.
O capanga gemeu, o rosto deformado, a
boca aberta e caída para o lado.
— Vamos consertar isto — murmurou o
pistoleiro, esmurrando do outro lado.
Não parou para ver o estado em que
ficara o rosto daquele bastardo. Suas
pistolas o esperavam lá do saloon.
Quando Frank entrou no saloon, fez-se
um silencio de morte. Robertson, ao fundo,
empurrou Mark rapidamente para o interior
da sala reservada.
— O que houve? — surpreendeu-se o
rapaz.
— Encrenca! — explicou o outro,
apontando pela porta entreaberta.
Frank caminhava até o balcão.
— Posso enfrentá-lo — fanfarronou
Mark, batendo as mãos nas coronhas
serrilhadas das pistolas.
— Não seja louco! Você nem sabe atirar
direito — afirmou Robertson, preocupado.
Mark já havia bebido uns drinques e,
após isso, ficava insuportável e
incontrolável.
— Poupe suas forças — disse, então, ao
rapaz. — Tenho algo especial esperando por
você lá encima. Deixe-me apenas eu me
livrar desse pistoleiro bastardo.
— O que tem para mim?
— Algo que você deseja muito... Mas vai
lhe custar caro, muito caro, meu amigo —
disse Robertson, com malícia.
— Se for o que eu estou pensando, você
será recompensado como um rei —
prometeu Mark.
— Então fique aqui, por favor. Vou
cuidar de tudo lá fora — disse Robertson,
saindo.
Frank se apoiara no balcão e sondava o
ambiente. Reconhecia os capangas
espalhados pelo saloon, mas não via Mark.
Ao mesmo tempo, ficou atento até ver
seus amigos tomando posição.
No alto da escada, Steve fez um sinal
tranqüilizando-o, dando a entender que
encontrara Sandy.
Nos fundos, semi-oculto, o xerife tinha
sua espingarda pronta para abrir fogo se
necessário.
— O que houve com suas pistolas? —
indagou-lhe Robertson, apontando para as
duas que Frank portava.
— Foram roubadas por um bastardo,
filho de uma cadela, que espero encontrar
logo. Ele e mais uns cachorrinhos ensinados
e covardes, que atacam nas sombras e pelas
costas — disse, em voz alta.
Percebeu o movimento dos homens,
demonstrando inquietação. havia cinco
deles. Um era vigiado por Steve; o xerife
cobria um segundo, mas sobravam três
diante de Frank, sem contar Robertson e,
com toda certeza, o grande barman que se
posicionara num ponto determinado do
balcão, possivelmente onde estava
escondida uma arma.
— Por que não toma um drinque e se
acalma? Gostaria de ouvir sua historia —
pediu o dono do saloon, fazendo um sinal
para que o barman os servisse.
Frank se manteve atento aos homens
espalhados pelo saloon. Apanhou o copo
servido e tomou um gole.
— Tome outro e me conte o que houve
— insistiu Robertson, servindo um outro
copo.
Pelo canto dos olhos Frank viu o barman
posicionado atrás do balcão. Já segurava a
coronha de uma arma, possivelmente uma
espingarda de cano serrado.
— Tudo é muito simples — falou Frank.
— Minhas armas foram roubadas e tenho
certeza que o bastardo está aqui, nesta
pocilga — continuou, encarando Robertson
desafiadoramente.
O proprietário do saloon estremeceu
diante daquele olhar mortal e frio.
Frank o viu tremer. Já virá homens
naquela situação antes. Eram, cadáveres
ambulantes à espera da bala que os
transformaria em defuntos definitivos.
O estalido duplo atrás de si avisou que o
barman engatilhara a arma. Tudo foi muito
rápido, pois Robertson também se moveu,
bem como os capangas espalhados pelo
saloon.
As armas voaram para fora dos coldres.
Frank meteu uma bala na testa do barman,
que caiu para trás, disparando para o alto
sua espingarda, fazendo um rombo no forro.
Na mão de Robertson surgiu um
Derringer, mas ele não chegou a usá-lo.
Uma bala traspassou seu peito, jogando-o
para trás, sobre uma mesa.
Dois estampidos haviam soado em
seguida. O xerife abatera um dos capangas e
Steve acertara o outro.
Fumaça e cheiro de pólvora deram ao
saloon um aspecto tétrico. O perfume de
sangue fresco completou a cena macabra.
— Maldito! — berrou um dos capangas,
com a espingarda engatilhada e apontada
para Frank.
— Matem-no — gritou o outro,
posicionando da mesma forma.
Frank atirou-se no assoalho, no exato
momento em que as espingardas
disparavam.
Uma chuva de chumbo quente passou por
cima dele e foi estraçalhar o balcão.
— Pior para vocês! — disse o pistoleiro,
disparando certeiramente.
O primeiro deles foi atingido no peito,
bem no coração. Rodopiou e bateu na
janela, quebrando os vidros e ficando
debruçado para fora, numa posição
macabra.
O segundo teve seu chapéu arrancado.
Junto com o chapéu também foi parte de
seu cérebro.
O terceiro teve mais sorte. Para ele, Frank
reservava algo muito especial.
Uma bala certeira atingiu-lhe o braço.
Outro, o joelho. O capanga gemeu, caindo e
se contorcendo.
Frank foi até ele e o desarmou. O xerife e
Steve se aproximaram rapidamente.
— O que vai fazer com esse? — quis
saber Steve.
— Vou fazer o passarinho cantar — disse
Frank, enigmaticamente. — Há coisas que...
— interrompeu-se, levantando os olhos para
o alto da escada.
Ali, vestindo um escandaloso traje de
seda vermelha, Sandy estava maquilada
como uma garota de saloon.
Longe de ser aquela viuvinha toda
recatada, ela lhe surgia encarnando o tipo de
mulher que o agradava.
— É linda! — balbuciou.
O xerife e Steve se voltaram para olhá-la.
— Está tudo bem com ela? — quis saber
Frank.
— Sim — disse Steve. — foi apenas um
susto.
Frank caminhou até o pé da escada.
Sandy desceu lentamente, olhos fixos nos
do pistoleiro, que jamais havia
experimentado uma emoção tão forte como
aquela.
Seu desejo foi agarrá-la, beijá-la e fazer
amor com ela ali mesmo, naquela escadaria.
Havia algo, também, no olhar daquela
mulher. Vira Frank sacando as armas,
disparando e matando.
Nunca havia presenciado algo tão
violento, tão brutal e inesperado. Estava
trêmula e excitada.
— Venham vamos embora daqui. Vou
levá-la comigo — disse Frank. — Não vai a
parte alguma com ela, maldito! —
interrompeu-o Mark, surgindo no saloon.
Portava desafiadoramente as duas
pistolas roubadas de Frank. Ao vê-las com
ele, Frank empurrou Sandy suavemente na
direção de Steve e do xerife.
Caminhou devagar na direção de Mark.
— É melhor parar aí mesmo — disse
Mark, fazendo menção de sacar as armas.
— Você cale a boca! — cortou-o o
pistoleiro, com a voz fria e tétrica.
Frank conhecia aquele tipo frangote e
fanfarrão.
— Quero as minhas armas de volta —
intimou.
— Venha pegá-las.
— Você não vai sacar contra mim,
frangote covarde. Não vai me dar a chance
de meter-lhe uma bala em cada olho seu.
Antes que possa tocar a coronha de uma
arma, eu já terei disparado meia dúzia de
vezes — continuou Frank, avançando
decididamente.
Viu o tremor nos olhos de Mark. Viu-o
estremecer e recuar, à medida em que Frank
avançava.
— Vamos, saque as armas... Dê-me essa
chance — pediu Frank, cada vez mais
próximo.
Mark recuou até a parede. Encolheu-se.
Frank parou diante dele, ameaçadoramente.
— Quero as minhas armas de volta.
— Sim... Por favor... Perdoe-me... —
acovardou-se Mark.
Desafivelou o cinturão e entregou-o a
Frank. O pistoleiro olhou o rapaz bem
dentro dos olhos.
— Não se aproxime de mim novamente
ou o mato. Temos contas a acertar ainda,
mas não tenho pressa — ameaçou, virando-
se de costas para se afastar.
— Cuidado! — gritou Sandy.
Mark havia apanhado uma garrafa de
cima de uma mesa e brandiu-a na direção da
cabeça de Frank.
— É um covarde que só ataca pelas
costas mesmo — rugiu Frank aparando o
golpe com facilidade.
Desta vez não teve piedade. Seu punho
afundou-se no estômago de Mar, que gemeu
e dobrou-se para a frente.
Frank levantou o joelho violentamente,
atingindo o nariz do rapaz.
O sangue esguichou, enquanto ele caía
para trás. Frank o segurou pelos colarinhos
e o levantou diante de si.
Esbofeteou-o repentinamente, depois o
arremessou sobre uma das mesas.
— Deixe-o, Frank! Pode matá-lo —
alertou o xerife.
— É tudo que ele merecia — respondeu o
pistoleiro. — Vou levar Sandy até sua casa,
xerife. Levem esse bastardo consigo para a
cadeia, Aliás, levem os dois. Aquele rapaz
pode ser a chave que nos levará até aquela
mina.
— O que houve com você? Esta horrível
— comentou Sandy, enquanto ele a
conduzia pela rua.
A suave pressão que a mão dele exercia
em seu braço lhe dava a sensação de
proteção total.
Jamais um homem a fizera se sentir
daquela forma. Seus desejos de mulher
vibravam à flor da pele.
— É uma longa estória. Fui raptado e
levado para uma mina. Acredito que todos
os desaparecidos tenham acabado lá...
— E meu irmão? Você o viu? Teve
noticias dele? — indagou ela, ansiosa.
— Não, infelizmente não. Alguns
homens disseram que o viram por lá, mas
não sabia dele. O que seu irmão sabia fazer?
— Como assim?
— Ele tinha alguma habilidade
específica? Estava na guerra?
— Sim... Era especialista em explosivos.
— Dinamite?
— Também!
— Há uma chance. Um especialista em
explosivo pode estar recebendo um
tratamento especial. Vamos descobrir isso
logo — prometeu ele à jovem.
Haviam chagado na casa do xerife.
Olharam-se. Os olhos cinzas do pistoleiro
brilhavam. Os olhos azuis da garota
cintilavam como as estrelas no céu.
— Conversaremos mais amanhã. Fique
tranqüila quanto ao seu irmão. Prometo-lhe
que vou encontrá-lo — afirmou ele, com
sinceridade.
— Não saberei como lhe agradecer por
isso — respondeu ela, o rosto tenso.
Frank olhou-a fixamente. Já vira aquela
reação nas mulheres. Eram mulheres de
saloon, reconhecia, mas não deixavam de
ser mulheres.
Aquela reação era expontânea, de puro
desejo.
— Beije-me — suplicou ela e, antes que
terminasse, Frank a envolvia fortemente em
seus braços.
Seus lábios esmagaram os dela, sugando
a saliva morna e saborosa. Ela ofegou,
quase desfalecendo em seus braços.
Desejou-a. Ali mesmo.
Mas havia coisas a fazer.
Soltou-a e se afastou, deixando-a
entontecida na porta da entrada.
O acampamento improvisado ardia. As
chamas provocavam uma curiosa e tétrica
dança de sombras nas árvores do bosque ao
redor. Gritos de dor e impropérios cortavam
a noite.
Quatro homens estavam amarrados
fortemente com cordas. Mulheres gritavam.
Crianças choravam.
— Não há aí nenhum que preste — disse
Lawson, que chefiava o grupo de caçadores
de escravos. — Apenas os homens servirão.
Formam um bom grupo e são fortes.
— O que faremos com as mulheres e
crianças? — questionou outro dos
mascarados.
— Deixem-nas. Nada poderão fazer
contra nós.
Os homens amarrados foram postos sobre
cavalos. O grupo partiu, disparando tiros
para o alto.
Rumaram para a cidade, mas, quando
estavam próximos, num entroncamento,
pararam.
— Levem os escravos para a mina. Nós
voltaremos para a cidade para avisar
Robertson.
Lawson e um outro caçador de escravos
retornaram para a cidade. Assim que
chegaram ao saloon, surpreenderam-se com
o que os esperava.
— Maldição! Parece que houve um
furacão por aqui?
— Pior que isso — explicou umas das
garotas.
O papa-defuntos e seus ajudantes
circulavam pelo saloon com grande alegria,
medindo os cadáveres, que haviam sido
alinhados diante do balcão.
— Quem pagará por tudo isso? —
indagou o papa-defuntos.
— Eu me responsabilizo. Pode cuidar de
tudo — disse Lawson, sabedor que, agora, o
saloon lhe pertencia.
Robertson já não mais existia.
— Quem fez isso?
— Aquele pistoleiro — explicou Mary.
— Qual?
— O das pistolas serrilhadas.
— Mas ele estava preso lá na mina... —
comentou Lawson, surpreso.
— Acho que escapou. Fez toso esse
estrago e ainda levou um dos capangas e
Mark Scottsfield para a cadeia.
— Diabos! Isto não pode estar
acontecendo. Na certa vão tentar fazê-lo
falar. Aquele rapaz, o Mark, é um frangote
cobarde e abrirá o bico com facilidade.
Ficou uns instantes pensativos. Sabia que
havia muito dinheiro em jogo naquela
operação.
Robertson estava se saindo muito bem.
Havia um cofre na sala reservada cheio de
pepitas de ouro.
Agora tudo pertenceria a Lawson, mas
não era o bastante. Queria mais, muito mais.
Queria o peso de Mark em ouro. Era o
que o pai dele pagaria para mantê-lo livre
de encrenca.
Só que isso não seria uma tarefa muito
fácil. Bastava olhar aqueles cadáveres
estendidos no assoalho.
— Fred — chamou ele e um dos
caçadores se apresentou. — Vá até a mina e
avise o velho do que aconteceu aqui.
— E por que eu deverei fazê-lo?
— Por que eu estou ordenando.
O outro o encarou desafiadoramente.
— Que fique claro para todos aqui:
Robertson está morto e eu sou o novo
encarregado. Quem não aceitar, sabe o que
fazer — disse, apontando a porta.
— Estou com você — disse Mary, indo
se enroscar nele.
O caçador de escravos hesitou por
instantes. Conhecia Lawson. Sabia que era
rápido no gatilho.
— Está bem! O importante é que o
dinheiro continue caindo — concordou
Fred, afinal, deixando o saloon.
Lawson ficou pensando se haveria
alguma coisa a mais que pudesse fazer.
Frank se sentia outro, usando suas
pistolas. Elas já faziam parte dele e não
podia imaginar-se sem elas.
Mark Scottsfield e seu capanga haviam
sido medicados. Assim que o doutor saiu,
Frank entrou na cela onde eles se
encontravam presos.
— Foi pura perda de tempo todo esse
trabalho do médico — disse ele.
— Vá com calma, Frank! — pediu o
xerife.
— Steve, por que não vai com o xerife
verificar se está tudo bem com Sandy? —
perguntou Frank, dando a entender que
desejava ficar a sós com os dois bastardos.
— Não faça isso, xerife. Meu pai fará
com que se arrependam disso — rosnou
Mark, a face inchada pelos golpes recebidos
de Frank.
— Quem tem medo de seu pai, garoto?
Aliás, tenho contas a ajustar com ele —
cortou-o Frank.
— Não conhece meu pai. Quando souber
que estou aqui, virá com todos os homens e
arrasará a cidade...
— Estou torcendo para que isso aconteça
logo, garoto, pois quando seu pai chegar, a
primeira coisa que verá será seu corpo
dependurado numa árvore, com uma bala
nessa sua boca grande — ameaçou-o Frank.
— Mas não tenciono esperar a visita de seu
pai. Quero visitá-lo primeiro.
— Jamais conseguirá entrar no
acampamento!
— Isso nós veremos. Principalmente se
você nos guiar até lá, garoto — sugeriu
Frank.
— Nunca!
— Ou você ou o bastardo aqui — disse
Frank, apontando para o capanga, que se
encolheu no catre.
O médico havia costurado seu braço e seu
joelho, mas as dores eram terríveis.
— Parece disposto a colaborar —
observou Frank, dirigindo-se ao ferido.
— Não diga nada — ordenou Mark.
— Esqueça-o. Aqui ele não tem nenhum
poder — ironizou Frank, sentando-se ao
lado do prisioneiro.
— Ele não falará! — continuou Mark.
— Cale-se ou quebro-lhe todos os dentes
— vociferou Frank, num tom de voz
intimidador.
Mark recuou, assustado. Frank inclinou-
se sobre o ferido.
— E então, como poderemos entrar no
acampamento? Talvez nesta noite mesmo.
Como são os turnos de guarda? Não creio
que todos fiquem acordados...
— Eles dormem...
— Como?
— Os guardas... Dormem... Quem
conseguiria entrar lá? Se durante o dia já é
difícil, quanto mais à noite? Nem precisaria
de guarda...
— Bom, muito bom! Está disposto a nos
guiar até o interior do acampamento?
— O que eu ganho com isso?
— Sua colaboração poderá livrar sua cara
— prometeu Frank. — Posso testemunhar a
seu favor.
— Não acredite nisso — berrou Mark.
— Mandei-o calar-se — gritou-lhe Frank,
pondo-se de pé num salto.
Mark não teve tempo de recuar. O punho
de Frank abateu-se pesadamente na boca do
rapaz, que foi atirado para trás, batendo
contra a parede.
Cuspiu sangue, aturdido.
— Sua situação está complicada, rapaz!
Só piora as coisas agindo dessa forma.
— Meu pai vai me tirar daqui. Vou fazê-
lo se arrepender de tudo isso — prometeu o
rapaz.
Frank deixou-o de lado e se dirigiu
novamente ao prisioneiro ferido.
— E então? Acha que poderá nos guiar
até o acampamento nesta noite ainda?
— Como vou cavalgar com estes
ferimentos?
Frank deu-lhe razão. Poderiam esperar
até a noite seguinte, mas tinha certeza de
que o pai do garoto logo saberia de sua
prisão e tentaria alguma coisa.
Se não pudessem invadir o acampamento
naquela noite, tinham de tomar outra
providencia.
— Quantos homens trabalham como
capangas lá na mina? — indagou ao
prisioneiro.
— Não responda! — gritou Mark.
Frank o olhou furiosamente. Depois se
voltou novamente para o ferido.
— E então? Quantos?
O prisioneiro pareceu refletir melhor.
Não estava sendo inteligente.
Sabia que mais de trinta homens
trabalhavam para o velho sulista. Todos
pistoleiros, dispostos a tudo.
Colaborar com a lei não era
recomendável, pois cedo ou tarde o velho
invadiria a cidade e libertaria o filho. Se
ficasse contra ele seria um homem morto.
Frank notou a mudança no rosto dele. O
maldito não falaria, a menos que fosse
incentivado.
Pôs a mão sobre o joelho ferido do
capanga. Pressionou ligeiramente. O
homem gemeu.
— Isso dói! — acrescentou.
— Vai doer mais se não me contar —
ameaçou Frank.
O capanga olhou para Mark, indeciso. A
pressão aumentou. A dor ia se tornando
insuportável.
— Uns cinqüenta! — berrou, para
satisfação de Mark.
— Tudo isso? — insistiu Frank,
pressionando ainda mais a perna ferida.
— Sim, um pouco mais, um pouco menos
— confirmou o outro.
Frank se levantou, pensativo.
— Viu agora em que encrenca se meteu?
— ironizou Mark.
— Quebro-lhe todos os dentes se não
calar essa maldita boca — ordenou Frank.
Saiu, trancando a cela. Foi encontrar
Steve e o xerife fumando no lado de fora da
cadeia.
— E então? — quis saber Steve.
— Acho que estamos encrencados. Há
meia centena de pistoleiros naquele
acampamento e virão com tudo para cima
de nós, tão logo o velho saiba da prisão do
filho.
— Tantos assim? — surpreendeu-se o
xerife.
— Creio que sim. Vi muitos homens
armados por lá. Com quantos ajudantes
poderemos contar por aqui?
O xerife ficou pensativo.
— Não acho que seja uma boa idéia
deixar que eles invadam a cadeia —
ponderou o homem da lei. — Muitos
inocentes poderiam sair feridos.
— Que outra saída temos então? —
questionou Steve.
Frank acendeu um cigarro. Sentou-se na
escada. O corpo estava cansado demais para
continuar pensando, mas não podia
desconsiderar a possibilidade mencionada
pelo xerife.
Um grupo de bandidos invadindo uma
cidade poderia causar muito transtorno. Um
outra idéia começou a tomar corpo em sua
mente.
— O que aconteceria se soltássemos o
rapaz? — ponderou.
— Soltá-lo? Acho que ele é nosso maior
trunfo em toda essa história — discordou
Steve.
— A menos que você pretenda seguí-lo
— observou o xerife, notando que Frank
sorria significativamente.
— É essa a idéia, ?Frank? — indagou
Steve.
O pistoleiro concordou com um aceno de
cabeça.
— Façam uma encenação qualquer com
ele, para que se convença de que está livre e
vá direto para o acampamento. Estarei aqui
fora, vigiando-o e seguindo-o.
— Lembre-se, Frank. Não precisa seguí-
lo naqueles labirintos de pedra. Basta que
consiga marcar a direção do acampamento.
Há alguns rastreadores que já caçaram por
aquela região e que podem nos ajudar.
— Farei isso. Não quero ficar preso por
lá novamente. Só espere algum tempo.
Preciso dormir um pouco — pediu o
pistoleiro.
— Vá para o hotel, Frank. Tome um
banho quente e descanse. Eu o acordarei de
madrugada. Será mais fácil seguí-lo no
amanhecer. — disse Steve.
O velho estava possesso. Havia sido
acordado no meio da noite para receber uma
seqüência de péssimas noticias. Robertson,
um importante aliado, estava morto. Meia
dúzia de bons homens também mortos e o
estúpido Mark preso como um bêbado
idiota.
— Como esse homem escapou daqui? —
indagou.
— Acho que ele saiu do galpão, de
alguma forma, e tomou o ligar de Andrew,
entre os homens que seguiam para a cidade
com Mark. Achamos Andrew com o
pescoço partido lá no estábulo — explicou
um dos capangas.
O velho foi até a parede e apanhou o
cinturão. Prendeu-o na cintura. Abriu-o e
sacou o Colt antigo.
Gostava daquela arma. Já o servira
inúmeras vezes.
— O que vamos fazer, patrão? — quis
saber um dos homens.
— Preciso pensar... Uma estratégia... Não
tenciono invadir a cidade para libertar
Mark, mas garanto que ele não ficará lá por
muito tempo.
Lembrou-se rapidamente de sua atuação
na guerra. Liderava um bando de
guerrilheiros, que atacavam fazendas e
povoações, disseminando o terror.
Aquela experiência poderia ser útil agora.
Como fazer com que libertassem seu filho,
através do terror?
Bastaria atacar as pessoas que os
aprisionadores de seu filho adoravam.
Esposa, filhos, esse tipo de coisa.
Poderia tentar isso contra o xerife, mas
como atingir aquele maldito pistoleiro?
Os homens continuavam imóveis,
observando os movimentos nervosos do
velho, aguardando suas ordens.
— Fale-me um pouco mais sobre essa tal
garota — pediu ele ao homem que viera
trazer a noticia da prisão de Mark.
O homem contou-lhe o que sabia.
— Acha que há alguma coisa entre ela e
o pistoleiro?
— Uma das garotas de saloon afirma que
sim.
— Onde mora essa garota?
— Com o xerife. Está a procura do
irmão, Peter, o Louro.
O velho sorriu satisfeito.
— Ela é irmã de Peter?
— Parece-me que sim.
— Muito interessante. Acho que já sei
como nos livrarmos desse pistoleiro. Quero
que meia dúzia de vocês vão à cidade e
capturem a garota. Tragam-na para cá.
Basta dizer que têm noticias do irmão dela
e, seguramente, ela virá com vocês, sem
maiores problemas. Partam assim que o dia
amanhecer.
— E os outros? O que faremos?
— Fiquem preparados. Em breve teremos
Mark de volta e aquele maldito pistoleiro
em nossas mãos — prometeu o velho,
confiante em seus planos.
Sentiu-se até satisfeito que tudo aquilo
estivesse ocorrendo. Tudo estava se
tornando muito monótono por ali.
Um bom desafio era o que precisava para
agitar as coisas. Aquele pistoleiro poderia
ser um bom adversário.
O xerife estava às voltas com aquele
bando de mulheres e crianças que
choramingava ao seu redor.
— Farei o que puder para encontrar seus
maridos — dizia ele, tentando convencê-las.
Tudo estava muito conturbado. Na certa
os homens haviam sido levados para o
acampamento.
— Em breve tudo se resolverá, senhoras.
Voltem ao acampamento e confirme na lei
— insistiu.
Aquela madrugada estava sendo por
demais confusa. Tudo parecia estar
acontecendo de uma só vez.
Assim que conseguiu tranqüilizar as
mulheres e mandá-las de volta para o
acampamento, o xerife foi observar Mark e
o prisioneiro ferido.
Haviam sido postos em selas separadas.
Dormiam profundamente. Steve também
dormia numa das celas. O xerife o acordou.
Apenas um sinal entre eles e Steve soube
que deveria ir acordar Frank. Se seu pai tem
um exército realmente, a ultima coisa que
desejo é que ele invada esta cadeia.
— É um homem inteligente, xerife —
murmurou Mark, satisfeito com aquela
decisão.
— Onde está seu cavalo?
— No saloon.
— Vou acompanhá-lo até lá. Pegue seu
cavalo e suma da cidade. não apareça mais
por aqui. Fiquem com seus problemas por lá
e não os tragam por mim.
— Não se arrependerá, xerife.
— Parta o mais depressa possível. Não
conseguiria deter aquele pistoleiro, se o
visse solto por aí — disse, referindo-se a
Frank.
— Ainda juro como ajustarei contas com
ele, xerife. Custe o que custar.
— Se eu fosse você, esqueceria isso.
Aquele pistoleiro é morte certa.
— Isso nós veremos um dia, xerife.
Mark apanhou seu cavalo e partiu. O dia
ainda demoraria um pouco para nascer.
O xerife olhou ao redor, observando as
sombras da noite. Sabia que, em algum
ponto por ali, Frank se preparava para
seguir o garoto.
Na realidade, Frank já esperava o garoto
fora da cidade. Assim que pôde percebê-lo
rumando para o acampamento, tratou de
seguí-lo a uma distancia prudente, de forma
que não pudesse ser percebido.
Procurou gravar bem a região. Podia
observar as montanhas ao longe, direção
tomada por Mark.
Pouco a pouco o dia amanhecia. Teria de
ser mais cuidadoso para não ser visto.
Algo ocorreu, então. Quando a manhã
surgiu, um grupo de cavaleiros veio ao
encontro de Mark.
Pararam e conversaram durante algum
tempo. Houve um momento de hesitação,
depois Mark e o grupo retornaram, na
direção da cidade.
— Diabos! O que está havendo agora? —
indagou-se.
Não gostava daquela decisão do garoto.
Deveria estar preparando alguma coisa, por
isso tratou de se antecipar e voltar para a
cidade.
Julgou que Mark iria em seu encalço, por
isso rumou para o hotel. Ficou em seu
quarto, esperando.
Suas armas estavam prontas, seus
sentidos atentos. Quando os pistoleiros
chegassem, iriam encontrá-lo preparado.
Sem que ele soubesse, no entanto, Mark
havia tomado outra decisão.
Gostara da idéia de seu pai, de capturar
Sandy. Isso unia o útil ao agradável.
Teria a garota e, ao mesmo tempo, uma
forma de atrair Frank. Iria se vingar dele a
qualquer custo.
Ficou um pouco distante da cidade,
enquanto seus homens iam até a casa do
xerife, falar com Sandy.
Não precisou muito para convencê-lo a
seguí-los. No principio ela hesitou, mas os
homens insistiram que Peter estava ferido e
precisava de ajuda.
Ainda pensou em procurar Mark ou
Steve, mas seu coração de irmã falou mais
alto.
Queria encontrar o irmão a qualquer
custo.
— Deixou um bilhete para alguém? —
indagou um dos homens, quando ela saiu.
— Boa idéia! Vou fazer isso e...
— Não dá tempo. Vamos logo. Seu irmão
pode estar à morte — insistiu o pistoleiro e
Sandy o atendeu imediatamente.
Frank impacientou-se. Tudo estava muito
quieto. Calmo demais. Houvera tempo
suficiente para os capangas de Mark
aparecerem, se esse fosse o interesse.
— Demônios! — resmungou, andando
pelo quarto, com as armas nas mãos. — Por
que teria ele voltado para a cidade? Qual o
seu interesse aqui a não ser...
Interrompeu-se, julgando ter encontrado a
resposta e não gostou do que imaginou.
— Sandy! — murmurou, deixando
rapidamente o quarto.
Seu instinto o salvou no ultimo momento.
— Maldição! — gritou, ao perceber o
vulto no fim do corredor erguer a
espingarda.
Jogou-se no assoalho e a carga dupla de
chumbo passou zumbindo como abelhas
mortíferas por cima de sua cabeça.
Um outro pistoleiro surgiu em seguida,
disparando com uma Winchester repetidas
vezes.
Frank disparou duas vezes certeiramente
e o homem do rifle caiu para trás, rolando
pela escada.
O outro remuniciava a espingarda. Frank
disparou, mirando o ombro direito.
— Maldito bastarda! — gritou o capanga,
caindo para trás.
Frank não lhe deu tréguas. Correu pelo
corredor e saltou sobre o ferido,
imobilizando-o.
Desarmou-o e conduziu-o até a entrada
do hotel.
— Estou sangrando... Você tem que me
levar a um médico — reclamou o ferido.
— Ao diabo seu ferimento! — rosnou
Frank, dando-lhe um tapa na nuca.
— Não pode fazer isso... Estou ferido...
Frank o segurou pelos colarinhos e o
obrigou e encará-lo.
— Se eu quisesse, você estaria morto
agora, como aquele amigo seu lá na escada.
Agora me diga, onde estão os outros?
— Não há mais ninguém.
— Não tente me enganar. Eu os vi vindo
para a cidade, juntamente com o garoto
Scottsfield.
— Não sei do que está falando —
descartou o outro.
O punho de Frank afundou-se no
estômago do capanga, que ofegou,
dobrando-se para frente.
— Não ouvi o que disse — comentou
Frank.
— Leve-se para o xerife... Você é louco
— disse o bandido, em voz alta, tentando
chamar a atenção das pessoas que iam se
ajuntando ao redor deles.
— Essa é uma boa idéia mesmo —
concordou Frank, empurrando-o pela porta.
Cruzaram a rua até a cadeia. Um dos
ajudantes foi avisar o xerife. Steve chegou
logo em seguida, pois dormia no mesmo
hotel de Frank.
— O que foi desta vez? O que está
fazendo aqui? Não ia seguir aquele garoto?
— Ele se encontrou com um bando de
capangas e retornaram à cidade. Julguei que
fariam uma emboscada contra mim. Acertei
em parte...
— Por que m parte?
— É o que este bastardo vai me contar
agora — afirmou Frank, empurrando o
capanga para uma das celas.
— Vocês não podem deixá-lo fazer isso
— reclamou o prisioneiro, mas calou-se
quando o punho de Frank o atingiu no alto
da testa, lançando-o contra a parede.
Frank tirou o paletó e arregaçou as
mangas da camisa. O pistoleiro se encolheu
num canto da cela.
— Onde estão os outros?
— Eu já disse que...
Não chegou a terminar, Frank estendeu a
perna e o salto de sua bota pousou sobre o
ferimento do outro, que gemeu,
empalidecendo de dor.
— Quer pensar melhor? — indagou-lhe
Frank, aliviando a pressão.
— A garota... Foram buscar a garota...
— Malditos! — exclamou Frank.
— O que houve, Frank? — quis saber
Steve.
O xerife também chegava naquele
momento.
— Onde está Sandy? — indagou ao
xerife.
— Não sei... Levantei-me agora e...
— Acho que ela foi raptada por Mark e
seus capangas.
— Pensei que ele tivesse voltado para o
acampamento...
— Era o que fazia, até se encontrar com
um grupo de capangas no caminho. Voltou
para a cidade. Mandou dois homens atrás de
mim e, com os outros, de alguma forma,
conseguiu levar Sandy.
O xerife ordenou que um dos ajudantes
fosse até sua casa verificar se Sandy se
encontrava lá.
O ajudante voltou logo depois, quando o
xerife havia terminado de fazer um café.
— A garota não está lá — disse.
— Eu sabia — comentou Frank,
aceitando a xícara de café.
Bebeu um gole, pensativo. Aquele garoto
era mesmo teimoso. Lastimou não tê-lo
matado quando tivera a chance.
— O que podemos fazer agora? —
questionou Steve.
— Você percebeu que eu nem aceitei a
missão e já estou enterrado nela até o
pescoço? — ironizou Frank, terminando o
café.
Retirou as armas, renunciando-as,
enquanto pensava. O garoto fora, de certa
forma, esperto.
Sabia que Frank iria atrás de Sandy.
Talvez fosse isso o que o jovem queria:
levar Frank até o acampamento de novo.
Agora, porém, havia como entrar lá.
Frank tinha um dos homens em condições
de guiá-los até lá.
Foi até a cela, onde o prisioneiro estava
sendo medicado. Assim quer o médico
terminou o curativo, Frank agarrou o
capanga pelos colarinhos e levantou-se
diante de si.
— Só vou lhe dizer uma vez —
murmurou, entredentes. — Hoje à noite
você vai nos guiar para dentro daquele
acampamento...
— Serei um homem morto —
interrompeu-o o capanga.
Frank sacou uma das armas e enfiou o
cano na boca do outro.
— Será um homem morto se não
concordar. O que escolhe?
O outro sacudiu a cabeça, num gesto
afirmativo.
— É um homem bastante persuasivo,
Frank — brincou Steve, sorrindo.
— Só há uma forma de tratar com esses
animais — rosnou Frank enfurecido.
— Vai mesmo tentar entrar lá? —
indagou o xerife.
— Seguramente, xerife. Posso até apostar
como é isso que eles esperam que eu faça.
Enquanto isso, lá fora, um dos homens de
Mark, que ficara para verificar se tudo
corria bem na emboscada contra Frank,
observava o acontecido.
Um de seus amigos estava morto e o
outro, ferido, fora levado para a cadeia.
Com certeza seria forçado a falar e
denunciar a localização do acampamento.
Nada havia, porém, que pudesse fazer
quanto a isso. Uma pequena multidão se
juntara diante da cadeia e qualquer
iniciativa seria loucura.
O melhor a fazer era voltar a narrar tudo
ao seu patrão. Mais uma vez aquele
pistoleiro tinha levado a melhor contra eles.
O velho ouviu atentamente toda a estória
contada por Mark, mas não conseguia
compreender exatamente o que houvera.
— Eles o soltaram sem mais nem menos?
— insistiu.
— Sim, o xerife ficou com medo de que
você invadisse a cidade, pai.
— Se ele o soltou, não havia necessidade
de capturar a garota, então.
— Pai, aquele pistoleiro não nos dará
tréguas. A única forma de nos vermos livres
dele é matando-o. A garota vai atraí-lo para
nós, se os homens que mandei não fizeram
um bom trabalho.
— E realmente não fizeram — informou
o capanga que acabava de chegar da cidade.
— O que houve, Rick? — indagou Mark,
ansioso.
— O que era de se esperar. Brown está
morto e Jones foi capturado.
— Maldito pistoleiro! — vociferou Mark.
— E a garota? Onde está? — quis saber o
velho.
— Eu a deixei na cabana, junto com o
irmão. Peter já se recuperou bem dos
ferimentos que sofreu naquela explosão e a
companhia da irmã servirá como consolo
para ele.
O velho sondou o rosto do velho.
— E o que acontecerá com ela depois que
matarmos o pistoleiro? — indagou.
— Ela será minha, pai.
— Pode estar se metendo numa encrenca
maior do que imagina, filho. Terá de
conviver com uma mulher que
constantemente desejará vê-lo morto.
— Tratarei disso. Em pouco tempo eu a
domarei, pai. Nisso os Scottsfield não bons
— ironizou o rapaz, apanhando um chicote
e fazendo-o estalar.
Os homens riram, divertidos com a
brincadeira e com a fanfarronice do garoto.
Perto dali, numa cabana, Sandy chorava,
abraçada ao irmão.
— Está tudo bem agora, querida
irmãzinha — tentava ele consolá-la.
Era um rapaz forte e um tanto abatido.
Bandagens envolviam sua testa e o alto da
cabeça. O peito ainda mostrava sinais de
ferimentos profundos.
— O que houve com você, Peter?
— Um pavio curto demais e a dinamite
explodiu antes que eu pudesse sair. As
pedras me atingiram, mas estou bem agora.
Você é que não devia estar aqui. Como a
trouxeram?
— Estou confusa até agora, mas
agradecida àquele jovem, por incrível que
pareça. Primeiro ele me parece um mau
elemento. Depois manda me buscar para vir
ao seu encontro, Peter.
— Maldição! — praguejou Peter. —
Estamos no próprio inferno, irmã. Não sei
qual a intenção deles trazendo-a para cá,
mas precisa saber de uma coisa —
acrescentou, com seriedade.
— E o que é?
— Não sairemos daqui tão fácil. Há
trabalhadores escravos por aqui. Gente
morre a toda hora. Quando precisam de
gente, alguém na cidade providencia isso...
— O homem do saloon...
— Sim com certeza.
— Mas deve haver alguma coisa que
possamos fazer — disse ela, levantando-se e
indo a janela da cabana.
Olhou lá fora. Havia homens armados por
toda parte. O acampamento parecia
escavado no meio da rocha.
Lembrou-se da trilha que usaram para
chegar lá. Um labirinto de pedras e
desolação.
Sandy temeu pelo seu destino ali.
— Por que eles me trariam para cá?
— Para trabalhar na mina não será, com
certeza — descartou Peter.
Sandy pensou em Mark, em como se
mostrara mudado, quando a encontrou, fora
da cidade. Demonstrou muita gentileza, em
nada se parecendo com aquele valentão que
tentara enfrentar Frank no saloon e fora
subjugado.
Lembrou-se de Mark, da maneira como
ele o olhara e daquele beijo furioso na noite
anterior.
Jamais sentira seu corpo vibrar daquela
forma. Jamais experimentara, como mulher,
sensação de calor e umidade como aquela.
Retornou pata junto do irmão.
— Pode se levantar? — indagou.
— Agora sim.
— Não quer se sentar ali na janela, ao
sol?
— Acho que é uma boa idéia. Ajude-me
aqui — pediu ele.
Apoiada nela, Peter foi até a cadeira que
ela pudera junto à janela. sentou-se, o sol
batendo em seu peito.
— Oh, como isto é bom — murmurou,
no momento que a porta da cabana se abria.
Sandy se voltou e encarou Mark. Havia
um outro brilho nos olhos dele agora. Não
parecia tão gentil como o demonstrara
durante toda a viagem.
— O que quer de mim, afinal de contas?
— questionou ela, furiosa.
Mark sorriu. A fúria a deixava mais
bonita e desejável. Saber que ela estava ali,
a sua mercê, dava-lhe uma sensação de
poder muito boa.
— Quero você e vou tê-la, querida —
murmurou ele, com convicção.
— Jamais — respondeu ela, num sopro
de voz enfurecido.
— Pensará melhor nisso, querida, quando
ouvir o que tenho a lhe propor.
— Não quero tratos com você —
descartou ela.
Mark foi até a cadeira onde Peter estava
sentado. Sorriu gentilmente.
— Está melhor? — indagou.
— Sim, logo estarei de pé...
Não chegou a terminar a frase. Com a
bota, Mark empurrou a cadeira para trás e
Peter caiu, batendo a cabeça no assoalho.
— Maldito miserável! — gritou Sandy,
saltando em defesa do irmão.
Mark a afastou com um forte empurrão,
jogando-a sobre a cama. Sua bota pisou o
pescoço de Peter, que jazia atordoado.
— Vai ouvir minha proposta agora? —
indagou.
— Diga o que quer — pediu Sandy,
contendo sua raiva e sua indignação.
— Assim está melhor — disse Mark,
caminhando até ela.
Peter se arrastou, apoiando-se contra a
parede, tonto demais para qualquer reação.
Sandy encarou Mark.
— O que quero é muito simples —
murmurou Mark, o olhar descendo pelo
corpo carnudo de Sandy.
— Como pode ser tão nojento e...
— Cale-se! Se não for boazinha e
educada, você e seu irmão irão morrer.
Primeiro ele, é claro. Depois você.
— É um ser desprezível!
— Chega de elogios e me ouça. Quero
você, garota. Quero você sete noites
seguidas. Depois a levarei e ao seu irmão
para fora daqui. Eu lhes darei um saco de
pepitas de ouro...
— Não preciso de seu ouro maldito...
— Tanto faz. Pense bem em minha
proposta. Tenho um outro assunto para ser
resolvido. Quando terminar com ele,
voltarei para ouvir sua resposta.
Retirou-se, deixando a garota agoniada.
Correu ajudar o irmão e retornar para a
cama.
— Aquele bastardo! — gemeu Peter,
atordoado.
— Fiquei quieto, tudo acabará bem —
prometeu-lhe Sandy, acomodando-o.
Velou-o até que adormecesse. Depois se
levantou e foi até a janela. Ficou olhando
aquelas paredes de pedra, como gigantescas
lapides.
— Oh, Frank! Onde está você? —
lamentou, sem saber que, naquele momento,
na cidade, Frank fazia preparativos para ir
até o acampamento e resgatar Sandy.
— Vou com você — decidiu Steve.
— Vou apreciar sua companhia, Steve,
mas sabia que vamos entrar no próprio
inferno.
— Isso não me assusta. Mas onde está
indo, afinal? — perguntou, seguindo-o pela
rua.
— Ao armazém. Vou fazer compras, não
percebeu? — retrucou Frank, exibindo uma
lista.
— O que há aí? — quis saber Steve,
apanhando-a. — Munição, muita munição
e... Dinamite? — surpreendeu-se.
— Sim, acho que será útil naquele lugar.
— Espera tanta encrenca assim?
— Toda encrenca do mundo.
— É alentador ouvir isso...
— Prepare-se você também, Steve. Não
irá a um piquenique...
— Disso eu estou certo — concordou
Steve, devolvendo-lhe a lista de compras.
Amanhecia tranqüilamente sobre o
acampamento. A calma e o silencio foram
quebrados pelas primeiras ordens ríspidas
soando no galpão onde os escravos
dormiam.
Na casa principal, Mark acordou cedo,
como sempre. Seu pai, no entanto, já estava
em pé, tomando um xícara de café, diante
da janela.
— Vamos começar a agir, filho. Mande
alguém à cidade procurar aquele pistoleiro.
Digam a ele que, caso deseje a garota com
vida, que venha desarmado ao nosso
encontro.
— Certo, pai. Se eu conheço aquele
bastardo, ele virá só cheio de pose e com
aquelas suas pistolas de coronhas
serrilhadas que desejo para mim.
— Ouça bem como desejo que as coisas
aconteçam: no caminho para cá, mande um
grupo aguardá-lo. Assim que ele se
aproximar, deve ser morto e enterrado por
lá mesmo.
— Mas, pai! Eu gostaria de matá-lo com
minhas próprias mãos...
— Então vá com o grupo que irá
emboscá-lo. Quero um serviço rápido e
limpo, sem surpresas.
— Pode deixar comigo, pai — concordou
o rapaz, antegozando o prazer de matar
Frank.
Deixou a casa e foi providenciar o que
seu pai ordenara. Ao sair para o pátio, seu
olhar se voltou para a cabana, onde Sandy
estava prisioneira.
Sorriu deliciado. Logo a teria nos braços
e, então, sua vingança seria completa.
Matara Frank, ficaria com suas pistolas e
com a mulher que ele gostava.
Mal sabia ele que, naquele momento,
seus movimentos eram vigiados por Frank
que, juntamente com Steve, ocultavam-se
no andar superior do estábulo, onde era
guardado o feno para os animais.
— Eu poderia meter-lhe uma bala daqui
mesmo — disse Frank, furioso.
— Calma. Depois de ter circulado por aí
a noite, poderia me explicar o que andou
planejando?
— Vou pôr fogo neste inferno, tão logo
consiga descobrir onde Sandy se escondeu.
— Tem alguma pista?
— Aquela cabana, próxima da casa
principal. Parece-me que o irmão dela está
sendo tratado lá, depois de um acidente com
uma explosão. Com certeza Sandy foi posta
com ele.
— E o que mais preparou você?
— Distribuí algumas armas para os
prisioneiros. No momento certo eles me
ajudarão. Além disso, espalhei algumas
cargas de dinamite por aí. Vê aquele
paredão? — apontou.
— Sim, claro, mas o que há de especial
lá.
— Consegue ver o pedaço de peno
vermelho?
— Está junto com a dinamite?
— Sim, e vou deixar este trabalho para
você. Vai disparar e provocar a confusão.
Vou correr até a cabana e me certificar se
Sandy está lá. As explosões atrairão a
atenção dos guardas. Os prisioneiros
atacarão. Nós invadiremos, então, a casa
principal deste inferno.
— Está certo. E quando começará a
festa?
— Dê-me dois minutos para eu me
posicionar, depois atire no explosivo.
— Deixe comigo — concordou Steve,
mirando cuidadosamente com sua
Winchester.
Frank posicionou-se rapidamente e
esperou. Steve disparou certeiramente. A
explosão ressoou como o ribombar de mil
trovões entre os paredões de rocha.
A confusão formou-se rapidamente.
Frank espantou os cavalos do interior do
estábulo e, oculto na poeira provocada por
eles, correu até a cabana.
Quando entrou, Sandy estava parada em
frente da janela, pálida e assustada com a
explosão.
— Frank! Que bom revê-lo — murmurou
ela, lançando-se nos braços dele.
O pistoleiro a abraçou com força,
apertando-a contra o peito, satisfeito por ver
que tudo estava bem com ela.
— Como chegou aqui?
— Um dos capangas trouxe Steve e a
mim durante a madrugada. preparamos
tudo. Vamos enfrentar esses bastardos.
Tiros soaram do lado de fora. Os
prisioneiros se rebelavam, disparando
contra os guardas. À medida em que os
matavam, iam se armando.
— Que diabos está havendo aqui? —
berrou Mark, entrando na cabana.
Ao ver os olhos cinzas frios e mortíferos
de Frank, o garoto empalideceu e recuou.
— Maldito miserável! — exclamou,
correndo para fora, na direção da casa
principal.
Lá fora, no alpendre da casa, o velho
dava ordens a seus homens, empunhando
seu Colt.
— Pai, ele está aqui! — gritou Mark, se
aproximando.
— De quem está falando?
— O pistoleiro, está lá na cabana —
apontou.
— Fogo nele então — ordenou o velho.
Meia dúzia de armas se voltaram para a
cabana, disparando incessantemente. La
dentro, Frank obrigava Sandy e o irmão a se
deitarem, enquanto as balas assobiavam,
arrancando lascas por todos os lados.
Do alto do estábulo, Steve mirou
cuidadosamente. Apertou o gatilho e um
dos capangas do velho voou para trás,
atingindo em plena testa.
Aquilo surpreendeu os homens, que
trataram de se abrigar. O velho e Mark
correram para o interior da casa.
— Ele não está sozinho — observou o
velho. — Como entrou aqui o maldito?
— Não sei, mas está havendo uma
revolta lá fora, pai.
Neste momento, um grupo de cavaleiros,
chefiados por Lawson, parou diante da casa,
desmontando rapidamente.
Lawson correu para dentro.
— Fiquei sabendo lá na cidade que o
pistoleiro viria para cá. Andou comprando
armas, munição e dinamite, Sr. Scottsfield.
— Foi bom ter vindo para cá, Lawson.
Veja se consegue, com seus homens,
desalojá-los. Há um naquela cabana e outro
no estábulo. Haverá uma enorme
recompensa se conseguir isso.
Os olhos de Lawson brilharam de cobiça.
Se o velho prometia uma recompensa, seria
algo generoso, realmente de valer a pena.
— Vamos, homens! — gritou, deixando a
casa. — Vamos cercar a cabana e o
estábulo. Preciso da ajuda de todos.
Os homens esgueiraram-se, buscando
proteção e tratando de cumprir as ordens
dadas.
Do estábulo, Steve não perdia um tiro. A
cada vez que apertava o gatilho, um homem
se estatelava na poeira.
Por seu turno, Frank fazia o mesmo com
suas famosas pistolas. Cada tiro era um
corpo estendido ao sol que surgia
inclemente.
— Vamos ter que sair daqui — disse
Frank.
— Não há para onde fugir! — exclamou
Sandy.
Atrás deles estava uma encosta rochosa,
por não onde jamais escalariam. Frank
observava o movimento dos capangas lá
fora. Em breve estariam cercados.
Não contava, porém, com a revolta dos
prisioneiros. Guardas jaziam aos montes à
mina e próximos do galpão.
Armados, os escravos subiam a encosta
para o cenário da batalha entre Frank e seus
agressores.
Os pistoleiros do velho Scottsfield pegos
de surpresa, com o ataque dos prisioneiros.
Caíram aos montes, numa nuvem de
fumaça e chumbo.
— Vamos dar o fora daqui — gritou
alguém.
— Eu mato o covarde que fugir —
ameaçou Lawson, mas todo o seu corpo se
abalou repentinamente e o chapéu lhe voou
da cabeça.
Um orifício surgiu no meio de sua testa,
por onde um filete de sangue escorreu.
Seu corpo tombou pesadamente na
poeira.
— Não atirem... Nós nos entregamos...
— ouviu-se.
— Piedade... — começaram a gritar os
capangas da mina.
Os prisioneiros, no entanto, tinham muito
o que vingar. Dias e dias de maus tratos,
chicote e crueldade jamais seriam
esquecidos com facilidade.
Um a um foram dizimando os homens
que se rendiam inutilmente.
Frank não sentiu a menor piedade por
eles, enquanto levava Sandy e o irmão para
fora da cabana.
A fumaça se dissipava. O cheiro de
pólvora e morte pairava no ar. Steve se
aproximou.
— Foi mais fácil do que eu esperava —
comentou.
— Onde está o garoto e o velho?
— Lá dentro — mostrou um dos
escravos.
— Vamos até lá prendê-los, Steve —
convidou Frank.
— Agora que não têm mais a proteção de
seus capangas, são dois pobres infelizes —
afirmou Frank, recarregando suas armas.
Rumaram para a casa. Frank abriu a porta
com um pontapé. Mar se escondia todo
trêmulo, atrás do pai, ereto e imponente no
centro da sala.
— É o homem por trás de toda essa
carnificina — comentou o velho.
— Não fui eu quem começou tudo isso.
— Há muito aqui para todos nós. Ouro,
muito ouro, o filão mais rico de todo o
oeste...
— De nada vai lhe adiantar para o lugar
onde vai — disse Steve.
— Não irei a parte alguma — afirmou o
velho. — Aqui é meu lugar.
— Posso lhe dar duas escolhas — propôs
Frank.
— E quais são as alternativas?
— Saiam conosco e os levaremos para
serem julgados ou fiquem e os
entregaremos aos escravos lá fora.
— Não, pai, jamais! — gritou o garoto,
apavorado, sacando o Colt que o pai tinha
no coldre.
Frank e Steve reagiram da mesma forma.
Suas armas disparam, atingindo o jovem
Scottsfield, que foi jogando para trás.
O sangue escorreu pelo assoalho.
— Malditos! — berrou o velho, correndo
em socorro do filho.
O garoto estava com a boca aberta e os
olhos escancarados, refletindo a surpresa.
Uma bala o atingira na testa. Outra, no
peito. Já estava morto antes de cair no
assoalho.
O velho se voltou para os dois com um
ódio irracional.
— Vocês pagarão por isso — prometeu,
abraçando o corpo inanimado do filho.
— O que fazemos com ele? — indagou
Steve.
— Vamos deixá-lo ser julgado —
afirmou Frank, virando as costas e saindo.
Steve fez o mesmo. Apenas seus passos,
pisando o assoalho de madeira, soaram por
alguns instantes.
Depois, distinto de tudo, o estalido seco
do cão do Colt sendo engatilhado.
Barulho inconfundível.
Alerta!
Ambos se voltaram ao mesmo tempo, as
armas disparando na direção do velho, que
tombou sobre o corpo do filho.
— Foi melhor assim — comentou Steve.
Sandy entrou correndo na casa. Ao ver
que tudo estava bem com Frank, suspirou
aliviada, correndo abraçá-lo.
Frank a apertou contra o peito.
— E agora, o que vai ser? — indagou um
dos escravos, aproximando-se, seguido
pelos outros.
Steve olhou ao seu redor. Havia um cofre
num canto da sala. Foi até lá. Não estava
trancado.
Abriu-o. Havia sacos e sacos de ouro lá
dentro.
— Há muito ouro aqui dentro, o bastante
para que cada um de vocês possa voltar para
suas casas com um bom lucro — disse
Steve.
— E quanto ao resto da mina? Há muito
ouro lá ainda.
— Quem de vocês quer continuar
trabalhando aqui, depois de tantas mortes?
— indagou Steve.
— Sim, com certeza, nas noites escuras,
os fantasmas destes homens virão infernizar
os que se aventurarem a vir aqui — disse
Frank, com voz tétrica.
Os homens se encolheram, assustados.
— Acho que tem toda a razão — disse
um dos escravos. — Vamos dividir esse
ouro e dar o fora daqui. Há o bastante para
todos.
Steve coordenou a divisão. Cada um
recebeu sua parte, apanhou um cavalo e
tratou de dar o fora dali o mais depressa
possível.
Apenas Frank, Steve, Sandy e Peter
ficaram.
— Peter, há algum túnel vazio na mina?
— indagou-lhe Steve.
— Inúmeros.
— Acho que temos um trabalho a fazer
— continuou Steve, olhando para Frank.
— Está pensando o mesmo que eu?
— Acho que sim!
— Então, ao trabalho!
A Mina Double Colt se tornou a mais
famosa do oeste, impulsionando o
desenvolvimento de Carson City e atraindo
para aquela região gente de toda parte,
disposta a trabalhar duro para obter um
pouco de ouro.
Frank e Steve deixaram a Pinkerton e se
dedicaram ao novo negócio com afinco,
auxiliados por Peter, a quem Sandy
transferiu a sua parte, pois preferiu ficar na
cidade.
De quebra, Frank e Steve passaram a
administrar o saloon que fora de Robertson.
Durante algum tempo tiveram de
trabalhar duro. Frank mal via Sandy e isso o
fez sentir falta da garota.
Certa noite, na mina, após um dia duro de
trabalho, Frank comentou com Peter.
— Peter, por que sua irmã não vem mais
à mina como antes?
— Acho que está preocupada com o
enxoval agora — disse Peter, com
displicência.
— Enxoval? De que diabos está falando?
— Enxoval de casamento, homem! Acha
que uma viuvinha tenra e bonita como ela
ficaria a solta por muito tempo?
— Mas... Como? — surpreendeu-se o
pistoleiro.
— Se eu fosse você, iria logo tratar disso,
Frank. Senão ela vai se casar com outro...
— ia dizendo Steve, mas não precisou
terminar.
Frank já havia ido selar seu cavalo e,
pouco depois, partia, sem perceber o quanto
Peter e Steve estavam se divertindo.
— Muito boa essa, Peter — elogiou.
— Mas é verdade. Minha irmã está
fazendo um enxoval.
— Fala sério?
— Sim, mas todo o tempo ela vem
dizendo que é para se casar com Frank.
— E ele não sabia disso?
— Deve adorá-la, mas não decide. Achei
que um empurrãozinho iria ajudar.
— E como ajudou — riu Steve.
Frank cavalgou como um desesperado
pela noite. De repente, percebia o quanto
Sandy era importante em sua vida.
Envolvido com o trabalho na mina, havia
se esquecido de dar mais atenção à jovem.
O medo de perdê-la, agora, o assustava,
enquanto esporeava seu cavalo.
Sandy havia comprado um rancho
próximo da cidade. Vendera suas
propriedades em Washington para ficar
perto de Peter e do homem a quem amava.
Preparava-se para ir dormir, quando
ouviu o galope de cavalo no pátio.
Frank desmontou como um possesso e
invadiu a casa. Quando deu por si, estava no
quarto de Sandy, que vestia uma provocante
e transparente camisola...
— Eu... Você... Casamento... —
balbuciou ele, todo confuso, trocando os pés
pelas mãos.
— Se estou entendendo, você está me
pedindo em casamento? — indagou Sandy
e, antes que ele respondesse, lançou-se nos
braços dele, colando sua boca aos lábios do
pistoleiro.
Frank a apertou com força, sem entender
o que estava acontecendo, mas adorando o
sabor daqueles lábios.
Era algo que ele desconhecia totalmente,
mas que estava tentando a experimentar.
Coiotes da Fronteira
Numa tarde quente de verão, uma
carroça carregada percorria a trilha que ia
de San Antônio a Laredo, na fronteira do
Texas com o México, puxada por três
parelhas de fortes animais.
Era uma carga pesada e Phill Dumbey e
Harry Storm a conduziam. Seus olhos
estavam atentos à trilha e os arredores.
Enquanto Phill manobrava com perícia as
rédeas, Harry apertava com nervosismo a
coronha de sua Overland, uma espingarda
de canos curtos e grosso calibre, muita
usada por cocheiros e guardas.
— Ainda tenho comigo que foi burrice
termos aceitado este trabalho por tão pouco
— reclamava Phill.
— Não seja idiota, Phill. Quem mais nos
pagaria o que receberemos da Sra. Spell?
Quando lhe entregarmos a carroça, teremos
um bom dinheiro nas mãos.
— Não sei se vale a pena tanta tensão,
Harry. Não consigo tirar da cabeça o que
aconteceu com as outras duas carroças.
Você se lembra também?
— Ora, não deixe que aquilo o
impressione. Phill. Vou azar deles, apenas
isso. Os índios que fizeram aquilo já foram
escorraçados de volta para o México. O
Exercito fez um bom trabalho aqui na
região e ainda continua patrulhando a
fronteira. Não teremos problemas, pode
estar certo.
O condutor pensou por algum tempo,
lembrando-se do que vira daquele massacre.
Tinha algumas dúvidas a respeito do
assunto. Dúvidas que apontavam em outra
direção. Estava sendo muito cômodo culpar
os índios por crimes como aqueles.
— Sabe de uma coisa, Harry?
— O quê?
— Eu vi os corpos daqueles homens...
Índios teriam feito pior. E tem outra:
coioteros não atacam homens armados
como eles estavam. Não há coisa que eles
temam mais que uma Overland carregada
com bons cartuchos.
— Ora, cale a boca, Phill. Vai acabar me
deixando mais nervoso ainda...
— Então reconhece que está preocupado,
não?
— Cale-se! — reagiu Harry,
nervosamente.
— Apanhe uma garrafa de uísque aí na
carga e vamos tomar um trago. O Sr. Spell
disse que poderíamos tomar alguns goles,
desde que chegássemos com a carga inteira.
— Boa idéia! Acho que um gole vai me
fazer muito bem agora — falou Harry,
virando-se no assento para levantar a lona
que cobria a carga.
Apanhou uma garrafa de uísque de uma
caixa. Retirou a rolha com os dentes,
cuspindo-a em seguida. Tomou um gole
generoso, depois entendeu a garrafa para o
companheiro de viagem.
Phill o imitou, tomando um gole
demorado, sempre de olho na trilha.
Devolveu a garrafa para o companheiro de
viagem.
Phill o imitou, tomando um gole
demorado, sempre de olho na trilha.
Devolveu a garrafa a Harry, que tomou
novo gole, estalando a língua de satisfação.
— Como se sente agora? — indagou
Harry, sentindo a bebida acamá-lo.
— Melhor, só que ainda não chegamos
ao pior trecho do caminho — lembrou ele.
— Fique tranqüilo! Quando deixarmos a
trilha de Laredo e tomarmos a de San Juan,
nosso destino final, tudo será mais fácil. É
campo aberto e os coioteros jamais
atacariam.
— O diabo vai ser chegar até lá. Não se
esqueça que foi antes da trilha de San Juan
que aqueles homens foram...
— Cale a boca, Phill — cortou-o Harry,
irritado. — Pare de falar naquelas mortes —
acrescentou, tomando mais um gole e
redobrando a atenção.
Ficou segurando a garrafa com a mão
esquerda, enquanto a direita descansava
sobre a coronha da espingarda. Dentro em
pouco deixariam a trilha para Laredo e
tomariam rumo oeste, na direção de San
Juan.
Olhou o céu e calculou a distância que
ainda teriam de percorrer.
— Estamos com sorte, Phill — comentou
Harry, procurando tranqüilizar o amigo. —
Vamos chegar antes do anoitecer, nesta
marcha.
— Estou achando isso muito bom. Eu
não agüentaria passar mais uma noite junto
desta carroça.
Harry não o ouvia. Seus olhos estavam
atentos a alguma coisa à frente.
— Veja, Phill — apontou, enquanto
empunhava a espingarda. — O que é
aquilo?
— Demônios? Parece que há uma árvore
caída no meio da estrada — observou Phill.
— Não estou gostando disso —
comentou Harry, engatilhando a espingarda.
— Para passar teremos de descer e removê-
la.
— Também não estou gostando disso —
acrescentou Phill, procurando sua
espingarda sob o assento da carroça.
Ergueu-a engatilhando-a. Os dois ficaram
atentos, olhando na direção de um grupo de
árvores de um lado ou de algumas rochas,
do outro. Tudo estava calmo.
— Vou dar uma olhada. Cubra-me —
disse Harry, levantando-se cautelosamente.
Um tiro de Winchester ecoou
sinistramente na planície. Harry oscilou
com o impacto e gemeu, abrindo os braços e
caindo para trás, sobre a carga. Uma enorme
marcha de sangue tomava conta de seu
peito.
Phill demorou um segundo para entender
o que se passava. Com a espingarda na mão,
pulos rapidamente da carroça. Novo tiro
ecoou e, antes dele tocar o solo, o cocheiro
sentiu algo quente e dolorido penetrar seu
ombro, desequilibrando-o e fazendo-o rolar
na poeira.
Ficou imóvel e ofegante, sentindo o
sangue escorrer mornamente de seu ombro.
Ouviu cascos de cavalos se aproximando.
Percebeu que não teria chance alguma. A
morte vinha ao seu encontro.
Como um desesperado ele se levantou,
apertando os dois gatinhos da espingarda,
apontada na direção do primeiro alvo que
viu a sua frente.
— Maldição! Ele me acertou! — gritou o
cavaleiro com o rifle na mão, recebendo
uma carga dupla de chumbo em plena
barriga.
— Ele está vivo. Fogo nela! — gritou
outro.
Phill atirou a espingarda para o lado e
tentou sacar seu Colt para reagir. Diversas
balas penetraram seu corpo, fazendo-o
rodopiar, crivado de chumbo.
Seu corpo tombou na poeira,
encharcando-a com seu sangue. No céu um
grupo de abutres parecia saber da presença
da morte lá embaixo.
A tarde findava tranqüilamente na
cidadezinha de San Juan. A calma
permanente que reinava ali só não era
compartilhada por John Spell, que
caminhava nervosamente diante de seu
armazém. Rose, sua linda filha, o observava
preocupada, comentando com Susy, sua
melhor amiga.
— Detesto quando ele fica assim. A
qualquer momento parece que vai explodir.
— O que o preocupa tanto, afinal?
— A nova carroça de suprimentos para o
armazém está a caminho e já deveria ter
chegado.
— O caminho é longo, Rose. Pode ter
acontecido algum imprevisto.
— Sei disso, mas papai se preocupa por
causa do que aconteceu com as outras duas
carroças. Você sabe de toda a história, não
é?
— Sim, sei, mas aquilo foi obra dos
índios. O Exército já os expulsou da região.
— Meu pai parece não acreditar nisso,
Susy. Penso que ele tenha uma outra teoria
a respeito do que aconteceu. Viu ver se
consigo acalmá-lo — disse a garota,
deixando seu posto atrás do balcão e indo
até lá fora.
Tocou o ombro do pai.
— Papai, por que não se senta e se
acalma um pouco? Os rapazes estarão aqui
em breve, acredite nisso.
— Estou com um mal pressentimento,
filha. Eu sei que alguma coisa aconteceu de
novo...
— É só impressão sua, pai. O que pode
haver de errado? O Exército garantiu que
não teríamos mais problemas com aqueles
índios...
— Eu não consigo explicar o que é, Rose,
mas cada vez que olho para o outro lado da
rua e vejo Steve Morgan diante do saloon
olhando para cá, sinto algo aqui dentro me
dizendo para tomar cuidado redobrado.
— Steve Morgan? Ora papai! Steve é um
homem distinto e rico. O que poderia ele ter
a ver com o que aconteceu com aquelas
carroças?
— Pois é isso que fica martelando
constantemente aqui dentro da minha
cabeça.
— É só impressão sua. Verá como tudo
ficará bem, quando a carroça chegar —
tranqüilizou-o ela.
A tarde foi morrendo lentamente. As
horas foram passando. A noite baixou sobre
San Juan mansamente, sem que a carroça
tivesse chegado.
John Spell chegara ao limite de sua
impaciência.
— Rose, feche o armazém e vá me
esperar em casa, querida. Vou falar com o
xerife. Alguma coisa precisa ser feita —
disse ele, saindo nervosamente.
Rose nada pôde fazer para impedí-lo,
principalmente porque ela estava, agora,
igualmente preocupada com a demora e não
conseguia pensar em nada que pudesse
tranqüilizar seu pai e a si mesma. Havia um
cheiro de tragédia no ar e ela podia sentí-lo
naquele começo de noite quente.
Fechou o armazém, depois caminhou ao
longo da rua, na direção de sua casa.
— Olá, beleza! — disse um homem,
aproximando-se e começando a andar junto
dela.
— Laramie, dê o fora, por favor! Você
me aborrece, sabia? — reagiu ela, com
irritação.
Conhecia aquele homem. Era um
pistoleiro que trabalhava no saloon. Havia
algum tempo ele vinha molestando Rose,
que tentava evitá-lo, sem sucesso. Laramie
se julgava um sujeito irresistível para as
mulheres.
— Por que não deixa essa pose de rainha
e me olha de frente? — indagou ele,
segurando-a pelo braço e fazendo-a girar o
corpo na direção dele.
Rose parou, decidida, encarando-o com
um brilho furioso nos olhos.
— E então? O que acha de mim, querida?
— insistiu ele, fazendo pose.
— Quer mesmo saber?
— Sim, vamos lá, doçura! Não me deixe
impaciente!
— Está bem, você pediu. Para mim,
Laramie, você não passa de um rato,
paspalho e covarde. Um indivíduo
desprezível e nojento. Agora faça-me um
favor! Deixe-me em paz! — finalizou ela,
virando-lhe as costas.
Laramie ficou estático por instantes,
depois foi no encalço dela. Segurou-a pelo
ombro, obrigando-a a se voltar.
— Vamos ver se continua pensando o
mesmo do velho Laramie depois disso —
falou ele, beijando-a violentamente.
Rose se debateu, tentando se libertar, mas
os braços dele eram muito fortes e quase a
sufocavam. Em desespero, ela cravou suas
unhas no rosto dele, fazendo-o gemer de
dor.
— Sua maldita! — vociferou ele, cego de
ódio e dor, tentando esbofeteá-la.
Rose foi mais esperta que ele,
desvencilhando-se dos braços dele e
correndo para casa.
— Você ainda vai me pagar por isso —
prometeu ele, furioso, vendo-a se afastar.
— Melhor sorte da próxima vez, Laramie
— ainda gritou ela, de longe.
— Maldita! — disse ele, com um sorriso
cínico nos lábios, esfregando o rosto
arranhado. — Você não perde por esperar
— acrescentou, rumando para o saloon,
tentando imaginar um modo de se vingar
dela.
Quando John Spell entrou no xerifado,
todo o seu nervosismo e sua preocupação
estavam espantadas em seu rosto. Stuart
Ford, o xerife, levantou os olhos para
encará-lo. Percebeu logo que havia alguma
coisa errada com ele.
— O que foi desta vez, John? — indagou
logo.
— A carroça com os novos suprimentos
para o meu armazém deveria ter chegado ao
anoitecer e ainda não apareceu, Stuart.
Estou com um mau pressentimento...
— Acalme-se, homem. Não acha que é
cedo para se preocupar com a carroça?
Muita coisa pode acontecer no caminho.
Uma roda quebrada iria atrasar...
— Era uma carroça nova, xerife,
reforçada, própria para cargas pesadas,
puxada por três parelhas de bons cavalos.
Não acho que esse tenha sido o problema.
— Está bem, pela manhã eu irei pela
trilha verificar se descubro algo. Até lá,
sugiro que espere. Elas podem aparecer a
qualquer momento, no meio da noite...
— Pela manhã? — explodiu John,
incapaz de conter por mais tempo sua
impaciência. — Pode ser tarde demais,
xerife, como o foi nas duas outras vezes.
— O que espera que eu faça, John? Que
saia no meio da noite pela trilha,
procurando uma carroça?
— Pois é o mínimo que poderia fazer,
xerife. Reuna uma patrulha e vá atrás dessa
carroça, demônios! Aqueles homens podem
estar mortos agora.
— Você está exagerando, John. Não há
perigo nessa trilha, depois que o Exército
fez aquela limpeza. E tem mais, John —
falou o xerife, levantando-se da sua cadeira.
— Não preciso que você venha aqui me
dizer o que fazer. Se tem uma queixa,
registre-a e deixe que eu tome as
providências.
— Pois estou registrando a minha queixa,
xerife. Dois cidadãos podem estar mortos
neste momento, já pensou nisso?
— Pois você me dá novos motivos para
não fazer o que me pede. Já pensou
friamente no que pode ter acontecido?
Vamos imaginar que, apesar do trabalho
feito pelo Exército, um novo bando cruzou
novamente a fronteira e veio para cá. Sair
com uma patrulha à noite é o mesmo que
pedir para morrer.
— Não vá me dizer que também
acreditou na história contada pelos
militares?
— E o que havia de errado com elas,
John? — indagou o xerife, olhando com
apreensão seu interlocutor.
— Nós já vimos homens mortos pelos
coioteros antes, xerife. Eles não matam
apenas e roubam. O desprezo deles pela
vida humana é muito maior. Eles mutilam,
marcam, deformam e escalpelam suas
vítimas. Meus cocheiros foram mortos por
homem branco, xerife. Homens brancos que
apenas encheram seus corpos de chumbo
para roubar a carga — devolveu John,
raivosamente.
— Está delirando, John, só pode ser isso.
Que homem branco teria interesse em
roubar uma carga como a sua?
— É o que estou lhe pedindo para
descobrir, xerife.
Stuart percebeu que não tinha mais
argumento para contestar o dono do
armazém. Só que, como responsável pela
lei, tinha de dar a palavra final.
— Ouça bem o que pretendo fazer, John
— disse, entredentes, encarando o outro. —
Amanhã cedo sairei com minha patrulha
para ver o que houve, se a carroça não
chegar até lá. Não pretendo arriscar vidas
por nada, saindo agora à noite.
— É a sua decisão final?
— Sim.
— Então eu mesmo farei seu trabalho,
xerife —decidiu-se Spell.
— Está sendo precipitado, homem...
— Estou desesperado e à beira da
falência. Se perder mais uma carga estarei
perdido. Tenho de zelar pelo que é meu —
falou ele, contendo a indignação.
Deixou o xerifado apressadamente e foi
para casa. Rose percebeu, pela sua
expressão, o quanto ele estava exaltado.
Jamais vira seu pai naquela situação antes.
— O que pretende fazer, papai? —
indagou ela, surpresa por ver o velho abrir
um velho baú e retirar dali um Colt.
Examinou-o rapidamente, depois
carregou-o. Afivelou o cinturão nos quadris.
— Vou ao encontro daquela carroça! —
informou ele.
— É loucura, pai! Por que não espera
amanhecer? Se aconteceu alguma coisa aos
rapazes, não haverá como remediar isso...
— Se você pensa que ficarei aqui parado,
esperando para ver o que acontece, também
está enganada, Rose — disse ele, decidido.
— Por favor, filha, vá para casa de Susy e
fique por lá esta noite, até eu voltar.
— Pelo menos leve alguém com você —
pediu ela.
— E quem se atreveria a sair comigo
agora, no meio da noite, à procura de uma
carroça na trilha? — indagou ele, antes de
abraçá-la rapidamente e deixar a casa.
Rose ficou angustiada, rezando para que
nada de ruim acontecesse a ele.
Enquanto John Spell selava seu cavalo
e saía na escuridão da noite, à procura de
sua carroça, o xerife se dirigia ao saloon,
onde procurou Steve Morgan, o manda
chuva.
Steve era um homem requintado, mas
sinistro em sua aparência geral. A ambição
era seu lema e ganhar dinheiro fácil era uma
de suas principais diversões.
— Precisamos conversar — disse o
xerife, encostando ao balcão.
Steve terminou de examinar o movimento
do amplo saloon, antes de se voltar para o
homem da lei.
— Vamos até os fundos. Não quero que
bisbilhotem nossa conversa — disse,
conduzindo o xerife até os fundos do
saloon, onde havia um espaçoso escritório.
— Qual é o problema?
— Seus homens conseguiram interceptar
o novo carregamento para o armazém do
Spell?
— Sim, acabaram de chegar com a carga.
Por que pergunta?
— Spell esteve no xerifado, informando
me da demora na chegada da carroça. Pediu
que eu agisse, mas eu descartei a idéia, pelo
menos durante a noite. Ele resolveu ir
sozinho. Pedi-lhe que esperasse o
amanhecer, mas ele não concordou. Tive a
nítida impressão de que ele estava
desconfiado de alguma coisa.
— Como assim?
— Desconfiado do modo como os
cocheiros anteriores foram mortos. Segundo
ele, e nisso eu concordo também, os
coioteros não matam apenas. Apenas se dão
por satisfeitos depois de barbarizarem os
cadáveres.
O rosto de Steve demonstrou
contrariedade.
— Isso era fatal acontecer. John Spell é
um homem experiente. Eu sabia que não
conseguiríamos enganá-lo por muito tempo.
Só que, agora, conseguimos nosso objetivo.
Ele deve estar preparando para vender seu
armazém.
— Ouvi dele mesmo que estaria falido,
caso a terceira carroça não chegasse.
— Foi o que pensei.
— Quando vai propor o negócio a ele?
— Amanhã mesmo.
Bateram na porta dos fundos. Quando o
xerife a abriu, um homem ainda coberto de
poeira entrou.
— Está terminado, Sr. Morgan. Já
descarregamos toda a mercadoria e
enterrarmos o pobre Joe. Há uma coisa que
me preocupa e que só vim a perceber depois
que chegamos aqui...
— O que foi, Harry?
— Bem, o problema é que não
encontramos o chapéu do Joe, quando
fomos enterrá-lo, ainda há pouco. Talvez
tenha caído em algum ponto da entrada,
mas talvez tenha caído quando ele levou o
tiro. Na hora nem me preocupei com esse
detalhe. Tratamos de transferir a carga para
as carroças e, depois, acomodar o corpo
dele...
— Não vejo onde isso possa nos trazer
problema — observou o xerife, sem
entender a preocupação.
— Pois é, xerife, o problema é que o
chapéu de Joe é por demais conhecido na
cidade. Se for encontrado junto aos corpos
dos cocheiros, vão ligá-lo ao Joe, que
trabalha para mim, que trabalhamos todos
para o Sr. Morgan.
— Diabos! — comentou Steve Morgan,
contrariado. — John Spell está indo ao
encontro daqueles corpos agora mesmo. Se
encontrar aquele chapéu, vai desconfiar de
tudo e estaremos em apuros para explicar o
que aconteceu...
— Quer que eu dê um jeito nele, patrão?
— sugeriu Hank.
Steve olhou para o xerife, esperando
algum comentário.
— É a única coisa a ser feita agora, Steve
— aconselhou-o o xerife. — Tudo será mais
fácil com o velho fora do caminho,
inclusive negociar com a filha. Não acredito
que Rose vá querer tocar aquele armazém
cheio de dívidas.
— Está bem, vocês me convenceram.
Hank, vá no encalço do velho e mate-o —
ordenou, secamente.
— Será feito, Sr. Morgan — afirmou
Hank Crawford, deixando o xerifado pela
porta que o ligava ao saloon.
Passou pelo balcão, onde conversou
rapidamente com alguns homens que
bebiam. Momentos mais tarde, um grupo de
cavaleiros deixava a cidade, tomando a
mesma direção que John Spell tomara
algum tempo antes.
Cavalgando com uma pequena dianteira
deles, o velho negociante percebeu que seus
ossos já não estavam mais habituados ao
balanço da sela. Diminuiu a marcha,
contendo sua impaciência.
Estava por demais preocupado com seus
homens e sua mercadoria, mas não o
bastante para não perceber o tropel de
cavalos que vinha atrás dele, aproximando-
se rapidamente.
Julgou que fosse o xerife com uma
patrulha, por isso, com alívio, parou e
esperou por eles.
— Olá, rapazes! — cumprimentou-os ele,
efusivamente. — Onde está o xerife? —
acrescentou, assim que o grupo de
cavaleiros o rodeou.
Hank começou a rir, seguido pelos
outros. John Spell não entendeu o que
estava acontecendo.
— De que estão rindo, imbecis? Não
entendem que lá na frente, em algum ponto,
os condutores de minha carroça podem estar
mortos?
— Estão mortos, pode ter certeza disso
— falou, com um sorriso sádico nos lábios.
— Mortos? como assim?
— Os dois estão bem mortos, Sra. Spell.
Eu os matei pessoalmente.
— Você? Mas... Não entendo... Por quê?
— balbuciou o comerciante, todo confuso.
— Talvez o demônio em pessoa possa lhe
responder as perguntas, velho — falou
Hank, sacando sua arma e disparando
friamente diversas vezes.
Seus amigos o auxiliaram naquela
macabra tarefa. O corpo de John Spell foi
arrancado da sela e jogado na poeira,
coberto de sangue. Não satisfeito, pisoteou-
o com seu cavalo.
— Agora você deve estar convencido de
que foram os coioteros que mataram os
condutores, não? — comentou, com ironia.
— O que faremos com ele, Hank? —
Quis saber um dos homens.
— Amarrem uma corda nele e arrastem-
no até junto da carroça. Deixem-no junto
com os outros cadáveres. Os abutres terão
comida para amanhã — ordenou ele, com
desprezo.
Ignorando totalmente o que havia
acontecido com seu pai, Rose conversava
nervosamente com Susy, que tentava
acalmá-la, sem muito sucesso.
— Vai ver os rapazes foram apanhados
pela chegada da noite e resolveram
acampar. A trilha não é muito segura à
noite. Com certeza seu pai vai encontrá-los
e todos estarão aqui amanhã cedo, você vai
ver — dizia Susy.
— Não sei, Susy. Tenho um estranho
pressentimento. Se ao menos o xerife
tivesse tomado uma providência...
— Acalme-se, Rose. Não há nada que
você possa fazer. Não queira ser mais
teimosa que seu pai — repreendeu-a
brandamente a amiga.
Rose caminhou de um lado para outro do
quarto, antes de ir até a janela e ficar
olhando a escuridão lá fora. Sentia-se tensa,
pressionada.
— Talvez haja algo que eu possa fazer,
Susy — disse, de repente, com um brilho
nos olhos. — Você tem papel e um
envelope por aí?
— Sim, claro. O que pretende fazer?
— Vou escrever para o meu irmão, em
Abilene. Ele saberá como resolver tudo
isso.
— Acha que Johnny virá — indagou
Susy, com um suspiro de alento nos lábios.
— Sim, tenho absoluta certeza que ele
virá. É o único que poderá ajudar papai
agora.
— Mas o que Johnny poderá fazer de
concreto, Rose? Ele foi para lá estudar e...
— Ele é um homem, Susy, e os homens
têm habilidade para enfrentar esse tipo de
situação.
— Está bem. Vou apanhar o que você
precisa. A idéia de rever Johnny me agrada
muito, sabia?
— Você não conseguiu esquecê-lo, não?
— sorriu Rose, com cumplicidade.
— Não passávamos de crianças, quando
ele partiu, mas nunca pude esquecê-lo.
Deve estar um homem agora — comentou
ela, com olhos sonhadores.
— Sim, dez anos é um longo tempo,
Susy. Eu também tenho saudades dele.
Johnny raramente responde minhas cartas...
— E o que ele faz agora? Continua
estudando?
— Não sei ao certo. Suas informações a
respeito disso sempre foram muito vagas.
Mas vá logo, pegue papel, envelope e lápis.
Ficarei muito tranqüilo ao saber que esta
carta seguirá na diligência de amanhã.
Na manhã seguinte, o xerife e uma
patrulha foram ao encontro do fato
consumado. Os corpos de John Spell e seus
dois empregados foram encontrados ao lado
da carroça vazia. A trilha tomada pelos
ladrões foi apagada pelos cascos dos
cavalos da patrulha e nada se pode apurar
sobre as mortes.
Durante o funeral de seu pai, Rose se
sentia desolada e revoltada pela forma
estúpida como ele morrera. Se tivesse
esperado o dia seguinte...
Susy, sua melhor amiga, tentava em vão
consolá-la.
— Rose, já aconteceu e nada há que você
possa fazer que mudará isso...
— Eu sei, Susy, mas poderia ter tentado
impedí-lo. Ele era teimoso às vezes, eu sei
disso, mas não estava certo deixá-lo sair no
meio da noite ao encontro de bandoleiros.
Jamais poderei esquecer a maneira estúpida
como ele morreu.
Mais tarde, à saída do cemitério, o xerife
se aproximou dela, estendendo-lhe a mão.
— Sinto muito pelo que houve com seu
pai, Rose. Todos nós gostávamos dele, mas
ele era muito teimoso. Se tivesse me
escutado...
Rose olhou com desprezo para a mão
estendida em sua direção. Seu ódio não
podia ser medido por palavras. Jamais
poderia aceitar tamanha hipocrisia do
homem que deveria fazer cumprir a lei na
cidade.
— Bastardo covarde! — rugiu ela,
entredentes. — Jamais vou esquecer como
você recusou ajuda ao meu pai, quando ele
precisou. Você o deixou ir ao encontro da
morte, xerife e eu não o perdoarei por isso
enquanto viver.
— Rose, seja sensata — pediu ele,
incomodado.
— Você fugiu ao seu dever como um
covarde que é. Deveria ter honrado essa
estrela de lata em seu peito...
— Espere aí, mocinha! — cortou-o ele.
— Não vou admitir que você...
— Ótimo, xerife, vá em frente! Nisso
você é muito bom mesmo. Ameaçar
mocinhas indefesas e prender bêbados
desmaiados é coisa que sabe fazer com
perfeição. Quando se trata, porém, de jogar
sua vida no cumprimento do dever, encontra
sempre uma boa desculpa...
As palavras da garota haviam sido
pronunciadas em voz alta, raivosamente.
Assim, muitas pessoas que se encontravam
por ali passaram a prestar atenção na
conversa.
Ao perceber aquilo, o homem da lei
resolveu se afastar, não sem antes grunhir
um palavrão em voa baixa para a garota.
Rose o humilhara diante de todos, por
isso jurou vingança. Aquela idiotazinha não
perdia por esperar, prometeu-se ele.
— Não devia ter dito aquilo daquela
forma, Rose — repreendeu-a Susy.
— Ele mereceu cada uma das palavras —
afirmou Rose, enxugando os olhos, ainda
trêmula.
— Mesmo assim, você não pode se
esquecer que ele é o xerife da cidade.
— Xerife? para quê? Quando chega a
hora de agir de verdade ele faz corpo mole.
— Está bem, é difícil argumentar com
você, Rose. Vamos para casa, acho que o
melhor a fazer é descansar um pouco.
As duas garotas foram para a casa de
Rose. Ali, cercada de lembranças, ela
conseguiu chorar e desabafar todo o seu
sofrimento.
Susy deixou-a quieta, sozinha com suas
emoções, curtindo sua saudade. Rose
adormeceu. Quando acordou, mais tarde,
Susy levou-lhe um café quente.
— Tome, vai se sentir melhor — disse
ela.
Profundas olheiras marcavam os olhos de
Rose. A tristeza estampava-se em seu rosto.
Ela aceitou o café. Tomou em pequenos
goles, sempre pensativa.
— O que pretende fazer agora, Rose?
— Ainda não sei, Susy. Está tudo tão
confuso em minha cabeça, depois do que
aconteceu.
— Acho que deveria vender o armazém e
ir embora daqui, se é que posso lhe dar esse
conselho. Vou sentir sua falta, mas aqui
sempre terá lembranças que irão magoá-la.
— Ir para onde, Susy? — indagou ela,
pateticamente.
— Não sei... Talvez ao encontro de
Johnny...
Rose pensou por instantes, depois
balançou a cabeça num movimento
negativo.
— Não, eu jamais poderia fazer isso.
Papai não me perdoaria se eu fugisse sem
ter visto a justiça ser feita. Eu preciso ficar,
Susy. Eu vou ficar. Não posso me
conformar com o que aconteceu. Estive
pensando em tudo que houve. Não pode ter
sido apenas coincidência o fato de três
carroças terem sido assaltadas
seguidamente. Deve haver alguma coisa por
trás disso tudo.
— Como assim? — estranhou Susy.
— Lembra-se do que meu pai dizia? Ele
nunca aceitou a hipótese de ter sido roubado
pelos índios.
— E quando pode se certificar disso, não
viveu para contar — observou tragicamente
a amiga.
— Sim, e isso é terrível. Já não sei mais o
que pensar. O melhor talvez seja esperar
pela chegada de Johnny. Ele saberá o que
fazer, tenho certeza disso.
— Enquanto isso, se você quiser, poderá
ficar morando em minha casa. Acho que vai
se sentir melhor lá...
— Não, Susy, querida! Vou ficar aqui.
Agradeço sua oferta, mas esperarei pelo seu
irmão aqui mesmo.
— Então está resolvido. Eu virei morar
com você, pelo menos até a chegada de
Johnny. Está bem assim?
Rose sorriu e abraçou a amiga.
— Mais uma vez eu fico grata a você,
Susy. É a melhor amiga que tenho.
Após haver sido destratado por Rose, o
xerife rumou direto para o saloon, onde
tomou um gole para acalmar-se. Morgan o
viu e percebeu que havia alguma coisa
errada na expressão do rosto do comparsa.
— O que houve, xerife? Nunca o vi
bebendo neste horário —observou ele.
— Aquela maldita garota me humilhou
diante de todo mundo, lá no cemitério...
— Calme-se, isso não importa. O que ela
significa? nada. Nossos planos são mais
importantes...
— Pois isto é o que você vem me dizendo
todo o tempo. Até agora ainda não sei quais
são esses planos. Concordarei em ajudá-lo
porque me prometeu muito dinheiro, mas
até agora não vi nada...
— Tenha paciência. Tudo estará bem,
quando eu comprar o armazém da garota.
— Por que não deixa de mistérios e me
conta logo quais são esses planos tão
misteriosos e lucrativos?
— Está bem, vou satisfazer a sua
curiosidade. Venha comigo até meu
escritório — convidou o dono do saloon.
O xerife o seguiu até lá. Morgan pôs
sobre a mesa uma garrafa de seu melhor
uísque e dois copos. Serviu-os e beberam
juntos.
— Muito bem, Morgan, qual é seu plano?
— A idéia é vender armas aos coioteros,
aos bandoleiros mexicanos ou qualquer
outro bando que nos pague o melhor preço.
Além de armas, vamos vender também
munição e uísque. O que me diz?
— Está maluco! Vamos dar armas para
essa gente nos atacar?
— O que vale é isto aqui, Stuart — disse
Steve Morgan, abrindo uma gaveta e
retirando dali uma pepita de ouro.
Estendeu-a para que o xerife a
examinasse. Seus olhos brilharam
imediatamente de cobiça.
— Onde conseguiu esta?
— De um chefe de um desses bandos.
Veio ao saloon, certa madrugada, propor-
me negócio. Estão cheios de ouro, só que
não conseguem gastá-lo, pois estão sendo
perseguidos aqui e no México.
— Estou começando a entender — falou
o xerife. — Mas por que precisa do
armazém?
— Desde que o Exército interveio nesta
região, tem havido um controle muito
rigoroso do transporte de armas. Eu poderei
trazer quantas desejar, ocultas sob a carga
das carroças de suprimentos. Entendeu
agora?
— Sim, claro! Muito esperto!
— E tem mais. Quando estourar uma
guerra contra os bandoleiros novamente, eu
terei um estoque de mercadorias para
vender por cinco vezes o preço normal, já
que haverá escassez.
— E não será molestado pelos bandos?
— Faz parte de nosso acordo. Nenhuma
de minhas carroças será atacada, enquanto
eu lhes fornecer armas, munição e bebidas.
— Muito engenhoso. Acha que vai
conseguir convencer a garota a vender-lhe o
armazém?
— Estou certo disso.
— E se ela se recusar?
— Mandarei alguns homens assustarem-
na um pouco.
— Mas lembre-se: Nada que me obrigue
a intervir.
— Não se preocupe. Isso será feito com a
maior discrição — garantiu Morgan.
— E quando falará com ela?
— Hoje mesmo. Penso que este é o
melhor momento para convencê-la —
assegurou o dono do saloon.
Steve Morgan passou pelo armazém e,
encontrando-o fechado, foi procurar Rose
na casa dela. Susy o atendeu, intrigada com
a inesperada visita.
— Preciso falar com a Rose — pediu
Steve Morgan.
Susy sentiu calafrios olhando aquele
homem sinistro, vestido tão formalmente.
Convidou-o para entrar, depois foi avisar a
amiga.
— Rose ficou tão intrigada quanto ela a
respeito da visita dele.
— Primeiramente, sinto muito pelo que
houve com seu pai, Rose. Foi uma perda
irreparável. Se houver alguma coisa que eu
possa fazer por você, por favor, não hesite
em me procurar — pediu ele, cheio de
gentileza.
— Está tudo bem, Sra. Morgan. Eu
agradeço a sua oferta. Mas o que o traz
aqui?
— Estive pensando no assunto, Rose.
Acredito que vai ser difícil para você cuidar
sozinha do armazém, agora que seu pai se
foi...
— Talvez tenha razão, mas não vejo
como não possa dar conta de tudo sozinha
— falou ela, corajosamente.
— Admiro sua coragem, Rose, mas
penso que não será tão fácil assim. Sei que
seu pai estava endividado e, com o roubo
das carroças, o prejuízo aumentou...
— Onde quer chegar, Sr. Morgan?
— Vou ser franco com você, Rose. Se
fixar um preço justo, estou disposto a
comprar seu armazém.
— Está me fazendo uma oferta?
— Sim, abra o preço.
Rose ia responder, mas calou-se,
lembrando-se do que seu pai dissera
naquela tarde, antes de morrer, a respeito da
maneira como Steve Morgan olhava para o
armazém.
Era algo que ela não entendera no
momento, mas que começava a ter sentido
naquele instante.
Inegavelmente, Steve Morgan estava
interessado naquele armazém. Rose não
conseguia entender o motivo, já que o ramo
dele era o saloon.
— Sinceramente, Sr. Morgan, eu não
tinha pensado em vender a propriedade...
— Por favor, não se apresse. Terá todo o
tempo necessário para refletir sobre o
assunto, só que rogo-lhe que me dê uma
resposta definitiva o mais depressa possível.
— Está bem, tem a minha promessa. Não
vou lhe garantir que venderei ou não
venderei. Esperarei a chegada de meu irmão
para lhe dar uma resposta definitiva.
— Seu irmão? — estranhou o outro.
— Sim, eu lhe escrevi, pedindo que
viesse. Parte do armazém é dele, não seria
honesto vendê-la sem consultá-lo.
— Está bem, Rose. Eu aguardarei.
Quando se decidir, sabe onde me encontrar.
— Sim, eu sei, Sr. Morgan. Obrigada por
se preocupar comigo! — finalizou ela,
despedindo-se.
Após a saída dele, Susy olhou para a
amiga com uma expressão pensativa.
— Está pensando o mesmo que eu, Rose?
— indagou.
— Estranho este repentino interesse, não?
— Sim, muito estranho. Que interesse
teria ele em comprar o armazém?
— Não faço a menor idéia, Susy. Ele
pode estar sendo muito gentil e sincero de
verdade ou pode estar escondendo algo...
— Apesar de tão distinto, eu sinto
calafrios quando vejo esse homem.
— Confesso que também não me sinto
muito à vontade na presença dele. —
reconheceu Rose.
Após deixar a casa da garota, Steve
retornou ao saloon, onde encontrou o xerife
a sua espera, ansioso para saber as notícias a
respeito da visita.
— E então, o que conseguiu? — indagou
logo.
— Nada feito, por enquanto.
— O que houve?
— Rose está esperando a chegada de seu
irmão, que é dono de metade de tudo. O que
você sabe sobre ele?
— Sobre Johnny Spell? eu me lembro
dele vagamente. Era um rapazola ainda,
quando deixou a cidade e foi para Abilene
estudar, pelo que me lembro. Nunca mais
tive noticias dele.
Steve pensou por instantes.
— Acho que posso usar isso para
convencer a garota a vender logo o
armazém — disse ele.
— O que tem em mente?
— Mandarei um comitê de recepção ao
encontro dele.
— Por que se incomodar tanto? Não seria
mais fácil montar um estabelecimento
concorrente simplesmente?
— Essa é uma alternativa que estou
deixando de reserva. Rose tem um bom
estoque ainda e posso comprá-lo por um
preço baixo. Além disso, não adianta ter
pressa. Preciso de tempo para reunir as
armas junto aos meus fornecedores em San
Antônio.
— Entendo. Se vai agir desta forma,
mande seus homens esperarem no posto de
trocas da Curva do Homem Morto, na trilha
que vem de San Antônio. Qualquer homem
a cavalo ou outro meio de transporte acaba
parando ali.
— Deixarei que Hank cuide disso para
mim. Ele escolherá alguns homens para
fazerem o serviço.
Após cinco horas de mais uma etapa da
estafante viagem, a diligência que vinha de
San Antônio parou no posto de trocas,
envolta numa nuvem de poeira.
Os dois passageiros espanaram as roupas,
ainda no interior do veiculo.
— Como se sente, Johnny? — indagou o
homem diante dele, levantando o chapéu de
sobre os olhos para olhá-lo.
— Estou moído, meus ossos estão todos
fora do lugar. Os solavancos desta maldita
diligência estão me matando — reclamou
ele.
— Eu lhe disse que deveríamos ter vindo
a cavalo — opinou o texano alto, cujo nome
era Sam Harrison.
— Isso destoaria da imagem que
pretendia mostrar ao voltar a minha cidade
— argumentou Johnny. — Eu queria voltar
como um vencedor.
— Está conseguindo, pelo estado de suas
roupas — ironizou Sam. — Por que não
descemos para esticar um pouco as canelas
e tomar um trago? Estou com a garganta
seca e cheia de poeira.
Os dois desceram da diligência,
terminando de espanar as roupas. Sam
entrou no posto à frente de Johnny. Quando
este entrou no recinto, sonoras gargalhadas
partiram de uma das mesas, ocupada por
três elementos mal-encarados, que pareciam
se divertir muito com as roupas que o rapaz
vestia.
— Acho que estão rindo de você —
zombou Sam, encostando ao balcão,
saboreando um uísque.
— Será? — duvidou Johnny. — Não vejo
por que...
Os homens apontavam para ele e riam
ainda mais alto, irritando-o. O rapaz foi ao
encontro deles.
— De que estão rindo, idiotas? —
indagou, sério.
Sam, divertido, tomava seu segundo
uísque, mas seus olhos frios e penetrantes
acompanhavam a cena atentamente. A mão
esquerda segurava o copo. A destra pendia
ao lado do Colt de modo aparentemente
displicente.
— Estamos rindo de suas roupas, seu
janota — respondeu um dos homens,
ironicamente.
— O que há de errado com elas?
— Nada — respondeu o mesmo homem,
levantando-se e alisando as costuras do
elegante terno que Johnny vestia.
Quando, porém, o desconhecido levantou
a mão para tocar o chapéu coco, Johnny
segurou-o pelo pulso e, inesperadamente,
empurrou-o para trás.
Os outros dois homens se levantaram da
mesa imediatamente. O estalido seco de um
gatilho os fez olhar na direção do balcão,
onde um Colt os encarava.
— Por que vocês dois não se sentam,
ficam calminhos e deixam os dois
resolverem sozinhos a questão? — indagou
Sam, levando o copo aos lábios, em mover
um músculo do rosto.
Sem outra alternativa, os dois pistoleiros
obedeceram, sentando-se calmamente.
— Ouça bem o que eu vou lhe dizer,
forasteiro — falou o terceiro pistoleiro. —
Qualquer homem que usa esse tipo de roupa
não merece ser chamado tratado como tal.
Johnny desabotoou seu paletó. Um par de
reluzentes Colts, com cabos de
madrepérola, pendiam de seus quadris.
— Talvez tenha razão, estranho, mas
estou com pouco me danando para o que
você pensa — falou Johnny, calma e
ameaçadoramente. — Só que ainda prefiro
esta minha roupa. Pelo menos não fede
como essa que você está usando. Na
verdade, já vi cavalos mais perfumados que
você.
Uma careta de desprezo desenhou-se no
rosto do pistoleiro.
— Você está me provocando?
— Não, estou apenas elogiando você...
— Está bem, forasteiro. Vou lhe dar uma
chance. Sabe com quem está falando?
— Com um imbecil fedido que tem a
boca grande demais.
O outro empalideceu.
— Sou Billy Prescott e não admito que
alguém me desafie dessa forma — falou ele,
com voz lúgubre.
— Quer um conselho, Billy Prescott? Vá
até aquele bebedouro lá fora e tome um
banho. Vai se sentir mais humano depois
disso — zombou Johnny, virando-lhe as
costas e começando a caminhar para o
balcão.
Tudo se passou numa fração de segundos.
Billy levou a mão ao seu revolver, mas
Johnny parecia esperar aquele movimento.
Girou o corpo com espantosa rapidez. Suas
armas surgiram em suas mãos como num
passe de mágica.
— Não atire! Minha arma ainda está no
coldre — gritou Billy, levantando
covardemente os braços.
Por um triz Johnny não o acertou. Olhou-
o com desprezo. Detestava covardes.
Estendeu, então, uma das mãos e retirou o
revolver do coldre de Billy, jogando-o pela
janela.
Novamente virou-lhe as costas para
caminhar para o balcão. Billy apanhou a
garrafa sobre a mesa e avançou sobre ele. O
rapaz desviou-se e sua bota atingiu o joelho
do seu agressor, derrubando-o no assoalho.
— Só há um modo de tratar covardes
como você, Billy Prescott — falou Johnny,
aproximando-se do homem ajoelhado a sua
frente.
Sua bota atingiu o rosto dele, jogando
para trás. Depois ele se inclinou, agarrando-
o pelos colarinhos e erguendo-o. Seus
punhos martelaram impiedosamente o rosto
de Billy, sem que este esboçasse a menor
reação.
— Agora suma de minha frente ou eu o
matarei como uma cobra nojenta —
ordenou Johnny, chutando-o na direção da
porta.
Billy praticamente se arrastou para fora
do local. Seus dois amigos o seguiram,
sempre de olho na arma que Sam lhes
apontava.
— Você lhe deu uma boa lição, parceiro,
mas aceite o meu conselho. Trate de pôr
outro tipo de roupa. Esse terno vai estar
imprestável ao fim da viagem e você terá de
quebrar cabeças daqui até San Juan.
— Estou começando a pensar que você
tem razão, maldição! Um homem não pode
ser elegante nesta terra esquecida de Deus?
— Pode, mas tem que pensar também na
poeira, nos gozadores e numa porção de
outras coisas.
— Está bem, você me convenceu.
Johnny foi até as bancas que havia num
dos cantos do posto de trocas e escolheu
algumas roupas mais adequadas para a
região, depois tratou de vesti-las.
— E então, como estou agora? —
indagou a Sam.
— Muito melhor. Agora que resolveu
modificar sua imagem, por que não
compremos dois cavalos e seguimos a
viagem montados. Vamos ganhar tempo e a
sela sempre é mais confortável que aquele
banco da diligência.
— Demônios! Desde o principio você
estava certo, Sam. Eu estava errado,
pensando que poderia impressionar as
pessoas de minha cidade, chegando de
diligência e com aquelas roupas elegantes,
mas ridículas para eles.
Sam riu daquela afirmação e os dois
decidiram, então, comprar os cavalos, mas
não havia nenhum a venda.
— Diabos! Vamos enfrentar o resto da
viagem com a diligência mesmo —
conformou-se Sam.
Após tomarem alguns goles, retornaram
para a diligencia, que estava de partida.
Quando saíram do posto de trocas, no
entanto, dois laços inesperados caíram sobre
eles, prendendo-os.
— O que está havendo? — indagou
Johnny, surpreso.
— Acho que Billy Prescott não se
convenceu após a lição que teve —
observou Sam.
— Vou lhe dar uma lição que jamais
esquecerão — falou Billy, brandindo um
chicote.
Johnny e Sam se debateram, procurando
se livrar dos laços, mas os homens nos
cavalos arrancaram, fazendo-os cair na
poeira. Foram arrastados por alguns metros.
— Aí está bom, rapazes — falou Billy a
seus amigos — Fiquem atentos! Vou tomar-
lhes as armas.
Os dois homens nos cavalos afrouxaram
os laços, mas sacaram suas armas,
mantendo Sam e Johnny sob a mira delas.
Billy se aproximou com cuidado, sempre
brandindo o chicote.
— Se vocês fizerem um movimento,
serão mortos por meus amigos — falou
Billy.
— Ouça meu conselho, Billy — falou
Sam, num tom ameaçador. — Já errou
permanecendo aqui. Mesmo assim, estou
disposto a lhe dar uma chance. Se recusar,
será morto, juntamente com seus amigos.
— Você não está em condições de me
ameaçar — falou Billy, começando a
gargalhar.
Seu rosto ferido era uma máscara
grotesca que se tornou pior, quando o riso
morreu-lhe nos lábios. Sam havia sacado
sua arma e disparado contra ele. Sua testa
estalou e seu chapéu voou para o alto,
recheado de ossos, miolos e cabelos.
Ele tombou para trás, enquanto Johnny
girava o corpo no chão, sacando as armas e
disparando contra os homens a cavalo, que
nem chegaram a entender o que estava
acontecendo.
Os pesados projéteis dos quarenta e cinco
os atingiram no peito, jogando-os fora da
sela. Ficaram estrebuchando na poeira,
enquanto os dois se levantavam e
espanavam as roupas.
— Esta foi por pouco — comentou Sam.
— Eles não tinham chance. Morreram
como imbecis que eram.
— Ainda bem. São três idiotas a menos
na face da terra...
Rose estava só no armazém, tendo em
suas mãos um telegrama de Johnny,
comunicando que estava a caminho. Ela
torcia para que ele chegasse na diligência
que passaria por San Juan ao anoitecer. A
todo momento ia até a janela observar se ela
estava chegando. Estava ansiosa para rever
o irmão.
Estava muito preocupada com os
negócios também. Os estoques de provisões
estavam no fim. Além disso, havia algumas
dívidas a serem pagas. Confiava que Johnny
pudesse solucionar tudo aquilo.
Levantou a cabeça ao ouvir passos.
— O que quer aqui? — indagou ela,
rispidamente, a Laramie, que acabara de
entrar.
— É assim que recebe seus fregueses?
— Duvido que você queira comprar
alguma coisa...
— Só saberá se me deixar olhar por aí.
Tenho o direito de fazer isso.
— Não venha me aborrecer, Laramie.
Posso perder a cabeça com você...
— E daí, o que acontecerá?
Rose nada respondeu. Apenas tateou a
mão sob o balcão e trouxe uma Overland de
dois canos engatilhada. Apontou-a na
direção de Laramie, que sorriu
nervosamente.
— Calma, garota! Cuidado com esse
canhão aí! Eu só queria comprar um
chapéu...
— Naquela prateleira encontrará o que
precisa, mas tem apenas um minuto para
fazer isso. Escolha seu chapéu pague e vá
embora ou começarei a atirar.
— Está bem — concordou Laramie, indo
até lá e escolhendo um dos chapéus mais
caros.
— Quer levar esse?
— Sim, quanto é?
— Doze dólares.
— Bom, muito bem. Um pouco caro, mas
vou aceitar assim mesmo — disse ele,
pondo o chapéu na cabeça.
— Que história é essa? — rugiu ela,
furiosa.
— É isso mesmo, querida. Você acaba de
me presentear com este belo chapéu.
— Está ficando maluco, só pode ser isso
— disse ela, fora de si. — Ponha isso de
volta e dê o fora daqui imediatamente —
ordenou em seguida, contornando o balcão
e caminhando direto para ele.
Quando ia retirar o chapéu da cabeça
dele, Laramie a agarrou pelo pulso e a fez
girar, puxando-a para si. Enlaçou-a por trás,
segurando a arma que ela trazia na mão.
— Vamos, confesse — murmurou ele, os
lábios próximos do ouvido dela. — Está
apaixonada por mim, não está? — insinuou
ele, mantendo-a presa.
— Vou matá-lo quando me soltar...
— Só se me der um beijinho primeiro.
— Vai se arrepender quando meu irmão
chegar...
— Seu irmão nunca chegará — afirmou
ele, com ironia.
— Espero que possa repetir isso hoje à
tarde, quando a diligência passar por aqui...
O rosto dele ficou sério.
— Ele está chegando mesmo? Será? —
ironizou, tomando-lhe a arma e
empurrando-a.
Retirou os cartuchos da espingarda,
depois jogou-o para um canto. Tirou o
chapéu e arremessou-o na direção da garota.
— Fique com ele! Não gostei mesmo da
cor — afirmou, passando por ela e
caminhando para a porta.
— Você vai me pagar — murmurou ela,
entredentes.
Laramie foi até o saloon tomar um
drinque, aproveitando para contar a Steve
Morgan o que acabara de ouvir de Rose, a
respeito da vinda do irmão dela.
— Não é nenhuma novidade, mas não o
esperava tão cedo assim — comentou o
dono do saloon.
— Precisa de mim para alguma coisa? Eu
poderia cuidar desse irmãozinho, caso ele
seja algum problema.
— Não, não se preocupe com ele. Hank
selecionou alguns homens. Está mandando
Allan e sua equipe ao encontro do rapaz.
Quanto a você, prefiro que fique por aqui.
Talvez precise de seus serviços para
convencer a garota.
— Quando quiser, patrão — afirmou o
pistoleiro.
— E faça-me outra coisa. Procure Allan,
antes que ele parta, dando-lhe instruções
precisas. Reforce o que Hank deve ter dito.
Não admitirei falhas e não quero
testemunhas em hipótese alguma,
compreendeu?
— Certo, eu transmito o recado. Mas
como eles irão reconhecer o irmão da garota
na diligência?
— Não precisa. Basta que matem todos,
inclusive os cavalos. Não quero mesmo
nenhuma espécie de testemunha.
— Agora tudo está muito claro, patrão.
Vou fazer isso agora mesmo — disse
Laramie, saindo à procura de Allan Corby e
sua equipe de pistoleiros.
Algumas horas mais tarde, quando a
diligencia já havia tomado a trilha para San
Juan, Johnny acordou com um solavanco
maior, aprumando o corpo no assento.
Olhou a paisagem lá fora, tentando se
situar.
— Ainda falta muito? — indagou Sam.
— Não sei ao certo —respondeu Johnny,
pondo a cabeça para fora da janela para
olhar. — Faz muito tempo que fui embora.
Além do mais, estas planícies são todas tão
iguais...
— Pois eu daria tudo isso para estar no
lombo de um cavalo agora, cavalgando lá
fora, ao invés de estar aqui,
desconjuntando-me todo — falou Sam.
Johnny riu, voltando a deitar-se no seu
assento. Eram os únicos passageiros da
diligência.
— Desculpem-me havê-lo forçado a isso,
Sam. É que eu sempre imaginei voltar em
grande estilo, sabe como é? Quando saí de
lá era apenas um rapazola...
— Eu sei como você se sente, mas uma
roupa bonita não vai provar nada. Você é o
que é e pronto.
— Não é bem assim. Um pouco de
charme faz bem à vaidade, não acha? E tem
mais. Quando estivermos chegando, vou
recolocar o meu terno.
— Vão rir de você novamente. Talvez
tenha que brigar de novo para provar sua
elegância — ironizou Sam.
— Pois estarei pronto para tapar a boca
de quem fizer isso — respondeu o rapaz,
erguendo o punho fechado.
— Prepare-se para brigar com a cidade
inteira — riu Sam, cujo olhar estava atento
a alguma coisa que se passava lá fora.
— Algum problema, Sam? — indagou
Johnny.
— Não, nada. Você me disse que na carta
de sua irmã havia referência aos coioteros,
não?
— Sim, e daí?
— Já lutei com os coioteros antes. Este é
o tipo de terreno que não os agrada.
Geralmente preferem locais menos abertos,
onde podem se abrigar e atacar de
emboscada, aos bandos. São como coiotes,
avançando inesperadamente, surgindo do
nada e fugindo rapidamente.
Johnny levantou-se novamente para se
sentar junto da janela e olhar a imensidão da
planície.
— Rose mencionou que meu pai estava
desconfiado desses ataques. Acho mesmo
que ele suspeitava que não eram coioteros.
— É um caso para se pensar, meu amigo.
Ouvi dizer que o Exército esteve na região,
espantando os bandos de saqueadores que
havia por aqui. Precisaria saber mais sobre
o que houve realmente para poder fazer um
julgamento correto.
— isso dá o que pensar.
Naquele momento, a diligência começou
a diminuir a marcha. Sam olhou pela janela
e viu a tosca construção de mais um posto
de mudas, onde os cavalos seriam trocados
por outros, descansados.
— Curva do Homem Morto! —
comentou Johnny, lembrando-se daquele
local.
Inesperadamente, o cocheiro freou a
diligência.
— Algum problema, cocheiro — indagou
Sam, com metade do corpo para fora da
janela.
— Não sei, amigo. Está tudo muito
quieto lá na frente. Não vejo ninguém a
nossa espera.
Os dois amigos trocaram olhares tensos.
— Vejam, há um grupo de homens
saindo do posto — avisou o guarda.
— Acha que poderemos ter problemas?
— perguntou Sam.
— Não sei, mas esta região tem sido
perigosa ultimamente. Não tivemos
problemas, mas carroças com mercadorias
são assaltadas e gente morre por aqui.
— Ok, vá em frente com cautela.
estaremos alertas aqui dentro,
Vagarosamente a diligência se moveu até
parar diante do posto de trocas. O pessoal
que normalmente correria providenciar a
substituição dos cavalos não apareceu.
Apenas aqueles homens mal-encarados,
cobertos de poeira e de olhares sinistros.
— Pode nos ajudar? — indagou um
deles. — Temos um amigo nosso lá dentro.
Ele caiu do cavalo e quebrou a perna. Não
temos como levá-lo para a cidade sem
causar maiores danos.
— Está bem, vamos ver o que se pode
fazer. Onde está ele?
— Lá dentro sobre o balcão.
— E o pessoal do posto?
— Cuidando dele.
O cocheiro começou a descer lentamente,
enquanto o guarda que viajava ao seu ledo
da boléia ficava atento, com a Overland
pronta em sua mão.
— São os únicos passageiros? — indagou
o homem a Sam, que descia, juntamente
com Johnny.
— Sim — respondeu o cocheiro,
avançando na direção da porta.
Quando se aproximava, um rifle ergueu-
se e o cano foi apontado diretamente para
seu rosto. O tiro à queima-roupa o jogou de
costas, sob os cavalos, com o crânio
arrebentado.
O guarda tentou engatilhar sua
espingarda, mas foi derrubado de seu posto
por uma saraivada de balas
Johnny e Sam estavam preparados para a
encrenca. Assim que perceberam a intenção
dos pistoleiros, atiraram-se ao chão, rolando
na poeira, buscando abrigo.
— Acertem aqueles dois! — ordenou
Allan Corby, de arma em punho, disparando
também.
As balas que foram cuspidas pelo
revólver de Johnny, porém calaram
definitivamente a boca de Allan, que foi
atirado para dentro do posto de trocas.
Com seu Colt fumegando e cuspindo
labaredas e fumaça, Sam acertou os outros
pistoleiros, que se amontoaram,
estrebuchando, na poeira.
A reação dos dois havia sido inesperada.
A pontaria infalível e a rapidez no gatilho
surpreenderam mortalmente os pistoleiros.
— Que diabos significou tudo isso? —
indagou Sam, quando tudo se acalmou.
— Sei tanto quanto você, Sam. Pelo que
eu vi, nada havia de valioso na diligência,
nenhum carregamento importante.
— Estranho! Estes homens sabiam
exatamente o que estavam fazendo. Vá dar
uma olhada no cocheiro e no guarda. Verei
se sobrou alguma coisa dos pistoleiros.
Johnny foi ver os dois condutores da
diligência. Estavam ambos mortos.
— Nenhum sobreviveu, Sam —
informou.
— Há um deles com vida ainda — avisou
Sam.
Levaram o ferido e o encostaram a uma
das rodas da diligência. O homem tinha um
enorme buraco no peito, por onde o sangue
minava incessante.
— Que diabos são vocês? Por que
fizeram isso? — indagou-lhe Sam.
— Socorro... Estou morrendo... Preciso
de um médico... — gemeu o pistoleiro,
tentando estancar o sangue com as mãos.
— Não sou conhecido pela minha
paciência, homem, por isso é melhor ir
falando logo o que sabe — ameaçou Sam,
sacando de uma faca de sua boca e
espetando a ponta numa das narinas do
ferido.
— Por favor... Eu não sei de nada... —
balbuciou o outro, cuja vida se esvaía com
rapidez.
— Qual o motivo do assalto? O que
pretendiam com ele? Vamos fale! —
insistiu Sam.
— Matar... Matar Johnny Spell...
Os dois amigos se entreolharam,
surpresos.
— Por que queriam me matar? —
indagou Johnny, agarrando-o pelo colarinho
da camisa.
— Ordens... Recebemos ordens...
— De quem? Vamos, vamos! Fale logo,
seu bastardo! Fale ou o matarei com minhas
próprias mãos — ordenou Johnny,
agitando-o como um possesso.
Sam pôs a mão no ombro do amigo,
detendo-o. Johnny olhou-o sem entender.
— Agora é inútil, Johnny. ele já está
morto.
— Diabos! — praguejou o rapaz,
atirando o corpo inanimado na poeira.
levantou-se pensativo.
— Por quê? — indagou-se ele. — Não
posso entender... Só Rose sabia da minha
vinda. Por que alguém desejaria me matar?
— Estou tão intrigado quanto você,
parceiro, mas posso lhe garantir que
estamos indo na direção de encrencas da
grossa.
— O que faremos com eles? — indagou
o rapaz, apontando os cadáveres.
— O cocheiro e o guarda devem ir para a
cidade. Quanto aos pistoleiros, deveríamos
deixá-los para os abutres, mas tenho um
palpite melhor. Penso que descobriremos
algo se levarmos seus corpos para a cidade.
O que me diz?
— Boa idéia, Sam! Eles devem trabalhar
para alguém. Será muito interessante
descobrir quem era o patrão deles —
concordou Johnny.
Os dois amigos, então, trataram de
carregar a diligência com os cadáveres. As
pessoas que cuidavam do posto de troca
estavam vivas, presas em um aposento e se
mostraram muito agradecidos quando foram
libertadas.
Pela maneira como os pistoleiros agiram,
seriam lógico que nenhum deles escaparia
com vida daquele aposento.
Sam assumiu as rédeas da diligência,
pouco mais tarde e, com sua macabra carga,
tomaram a direção de San Juan, numa
viagem sem mais paradas.
Ao entardecer chegaram à cidade,
parando diante do xerifado. Stuart Ford
estava à porta e olhou intrigado para os dois
ocupantes da boléia.
— Algum problema, rapazes? O que
houve com Simon e Cameron? — indagou.
— É o xerife? — indagou-lhe Sam.
— É o que diz esta estrela — respondeu
Stuart.
— O cocheiro e o guarda está aí dentro,
juntamente com os homens que os mataram.
— O quê? — surpreendeu-se o homem
da lei, indo abrir a porta.
Esperava que ali dentro estivessem os
corpos dos condutores e de Johnny Spell.
Com surpresa, no entanto, percebeu que
Allan Corby e seus amigos acompanhavam
os empregados da diligência.
— Você os conhece? — quis saber Sam.
— Sim, estão sempre por aí. Eram um
bando de imprestáveis e beberrões...
— Sabe para quem trabalhavam?
Stuart pensou, antes de responder à
pergunta.
— Não, não trabalhavam para ninguém
em particular — mentiu ele. — Pelo que
sei, viviam de biscates. Não eram boa gente.
O acontecimento já havia atraído uma
pequena multidão, que observava com
interesse a macabra carga da diligência.
Steve Morgan havia se aproximado
também, atraído pelo ajuntamento.
— O que houve, xerife? — indagou ele,
satisfeito, imaginando que o seu plano fora
bem sucedido e que Johnny estava morto.
— Esses homens foram mortos...
Morgan já havia se debruçado na janela.
— Diabos! É Allan Corby e seus amigos!
— exclamou, empalidecendo e recuando.
Sam e John notaram aquela reação
imediatamente.
— Sabe para quem eles trabalhavam? —
questionou-o Sam.
havia muita gente ao redor que sabia
perfeitamente que Allan e seus homens
trabalhavam para Steve Morgan. O dono do
saloon percebeu que mentir não seria uma
boa política naquele momento, por isso
tratou de pensar rápido e inventar uma boa
história para se justificar.
— Trabalhavam para mim até esta
manhã. Eu os despedi porque não prestavam
— disse.
— É verdade, eu os vi saindo da cidade
— disse Hank.
Johnny e Sam se entreolharam. Ambos
desejariam saber por que aqueles homens
tinham interesse na morte do primeiro. A
resposta teria de esperar um pouco, no
entanto.
— E vocês, quem são? — perguntou-lhes
o xerife.
— Éramos passageiros — respondeu
Sam.
— Sim, não tivemos escolha. Eles
iniciaram o tiroteio, matando o guarda e o
cocheiro. A família que cuida do posto de
troca na Curva do Homem morto
comprovará nossa história.
Um murmúrio percorria a multidão.
Todos conheciam Allan Corby e sua equipe.
Sabiam que eram bons no gatilho e que
dificilmente seriam batidos por apenas dois
homens.
O xerife olhou para Morgan. Havia
incredulidade nos olhares de ambos.
— Está tentando me dizer que vocês dois
sozinhos mataram meia dúzia dos piores
pistoleiros da região? — questionou o
xerife, num tom zombeteiro.
— Eles estão mortos e nós estamos vivos.
Isto prova alguma coisa, não? — devolveu
Sam, com ironia.
— Vou precisar que me contem essa
história com maiores detalhes —
determinou o homem da lei.
— Amanhã cedo, xerife. Eu e meu amigo
estamos muito cansados para falar —
descartou Sam.
— Vão ficar na cidade por muito tempo?
— O bastante para resolvermos nossos
assuntos.
— Está bem, compareçam amanhã cedo
no xerifado. Vou precisar de seus nomes
agora.
— Amanhã, xerife — descartou
novamente Sam, empurrando Johnny para
fora dali.
Apanharam suas bagagens e se afastaram.
— É bom que ninguém tenha certeza a
respeito de quem você é, meu amigo. Se
tentaram matá-lo uma vez, vão tentar de
novo.
— Não gostei da cara daquele homem
para quem os pistoleiros trabalhavam, Sam.
— Nem eu. Não gostei também da
resposta dele. Pensou muito antes de
responder. Há dente de coelho nisso tudo,
pode apostar que sim e nós vamos descobrir
o que é.
— Agora vamos para a minha casa
primeiro. Estou ansioso para rever minha
irmão — falou Johnny, situando-se na
cidade e tomando a direção correta.
Não muito longe dali, Rose estava aflita e
aborrecida. Havia fechado o armazém mais
cedo, porque Laramie estivera lá
incomodando-a mais uma vez.
Foi para casa, esperar a chegada da
diligência, mas Laramie a estivera
rondando. O pistoleiro pretendia se vingar
das marcas de unhas que ela deixara em sua
cara.
Percebendo que chegara a hora de agir, o
pistoleiro foi bater na porta da casa dela.
— A diligência chegou, doçura! — gritou
ele. — Acho que seu irmãozinho não vem
mais...
— Vá para o inferno! — respondeu ela,
lá de dentro, furiosa com ele.
Laramie estava confiante, porque vira o
ajuntamento ao redor da diligência.
Calculou logo que o irmão da garota estava
morto, conforme os planos.
Isso deixava o caminho livre para ele
agir, por isso resolveu assustá-la mais um
pouco.
Bateu de novo na porta, com força. Como
ela não atendia, ele passou a desferir
pontapés, tentando arrombar.
— Aquela é minha casa — apontou
Johnny, dobrando a esquina e reconhecendo
a construção.
— Tem certeza? Há um maluco lá,
chutando a porta.
— Diabos! Não é que você tem razão? —
observou ele, começando a correr naquela
direção.
Após chutar repetidas vezes a madeira,
Laramie conseguiu, finalmente, abrir a
porta. Quando se preparava para entrar, foi
seguro por uma forte mão, que o puxou pelo
colarinho e o jogou para o lado.
— Vai morrer por isso — falou Laramie,
mas não teve tempo de mover um músculo.
O punho do rapaz abateu-se em seu
queixo, atordoando-o e fazendo-o dançar
como um boneco de mola no alpendre da
casa, até cair de joelho.
Sem lhe dar trégua, Johnny meteu-lhe a
ponta da bota no rosto, com força, fazendo-
o rolar pela escada, até o jardim. O rapaz
saltou sobre ele, ergueu-o pelos cabelos e
enterrou o punho em seu estômago,
fazendo-o arfar e amarelar-se.
Empurrou-o, então, na direção de Sam,
que vinha entrando pelo portão. Este não se
fez de rogado. Com um certeiro pontapé
atirou o pobre Laramie no meio da poeira
da rua.
— Johnny! — exclamou Rose, parada na
porta.
— Rose, querida! — exclamou ele em
resposta, indo abraçá-la com força.
Sam ficou parado, observando a cena
com emoção e, ao mesmo tempo,
admirando a beleza daquela garota.
— Meu irmão, que bom que você veio!
— soluçou ela, apertando-se contra ele.
— Acalme-se. Está tudo bem agora.
Quem era aquele sujeito? Não me diga que
minha doce irmã anda despertando amores
violentos nos rapazes da cidade, o que não
seria de se admirar. Você está linda! Já é
uma bela mulher! — elogiou ele.
— Vamos entrar. Tenho muito a lhe dizer
— convidou Rose. — E quanto àquele
traste, a última coisa que posso dizer dele é
que não vale o chão que pisa nem o ar que
respira.
— Sam, venha cá! — chamou Johnny. —
Quero que conheça a minha irmã. Eu dizia
que ela era linda, mas ela é muito mais do
que linda, não acha?
— Tem toda razão, parceiro — falou
Sam, apertando a mão da garota e olhando-a
nos olhos por instantes.
— Ela é ainda mais bonita que tudo que
você disse, Johnny — afirmou ele.
— Chega de paparicá-la, Sam — falou
Johnny, segurando a irmã pelo braço e
entrando na casa. — Onde está papai?
passamos pelo armazém, mas estava tudo
fechado...
Sua irmã o encarou com tristeza.
Lágrimas rolaram dos olhos de Rose.
— Johnny, eu sinto muito... — soluçou
ela.
— Papai? — murmurou ele, incrédulo.
— Como aconteceu?
— Ainda não sei ao certo, por isso
esperava sua vinda com tanta ansiedade...
— Quando ele morreu?
— Na noite em que lhe escrevi a carta.
Pela manhã, após despachá-la na diligência,
é que tomei conhecimento da morte dele.
Fiquei tão desorientada...
— Pobre Rose! Agora eu estou aqui...
— Venham, vou preparar uma refeição
para nós. Contarei tudo que houve em
seguida — decidiu ela, enxugando as
lágrimas.
Os acontecimentos recentes haviam
deixado Steve Morgan apreensivo. Seus
homens não haviam conseguido matar o tal
de Johnny Spell e acabaram mortos, o que
era pior.
Aqueles dois recém-chegados também
despertavam suspeitas. Não quiseram se
identificar. Steve suspeitava que fossem
inimigos e que um deles era o filho de
Johnny Spell.
Estava em seu saloon, numa das mesas,
jogando, quando Laramie apareceu, todo
estropiado.
— Que diabos, homem? Foi atropelado
por uma carroça? — indagou Steve,
surpreso.
Envergonhado, Laramie conservou o
lenço sobre o rosto, enxugando o sangue
que ainda teimava em escorrer. Estava com
o corpo dolorido da surra inesperada que
recebera.
— Não vá me dizer que foi a garota que
fez isso com você — zombou o dono do
saloon.
— Eu estava indo muito bem, até
aparecer aqueles dois homens e me pegaram
à traição.
— Dois homens? Quem são eles? — quis
saber Morgan, já imaginando o que havia
acontecido.
— Eram os dois homens que chegaram
com a diligência — informou o pistoleiro.
— Você os encontrou na casa da garota?
— Sim e isso explica tudo, não? Um
deles era o tal de Johnny Spell, Morgan, o
homem que deveria ter sido morto por Allan
e seus pistoleiros.
— Diabos! — pregueou Morgan, jogando
as cartas sobre a mesa e rumando para seu
escritório.
Laramie o seguiu. Lá dentro, Morgan
serviu-se de uma dose de uísque e entornou-
a de uma só vez, com uma careta.
— Eu sabia! Imaginei logo que os vi. O
mais novo é muito parecido com Rose.
— Sim, é ele mesmo. Foi o que me
agrediu.
— E o outro, sabe quem é?
— Não, não posso imaginar. Talvez um
amigo. Mas o que houve, afinal de contas?
Allan deveria ter liquidado todos naquela
maldita diligência.
— Allan falhou e pagou com a vida.
Aqueles forasteiros o mataram, bem como
ao resto dos homens que mandei.
— Está brincando! Não posso acreditar
que Allan e sua equipe tenham sido mortos
dessa forma.
— Pois trate de acreditar, Laramie. Vi os
corpos de Allan e dos outros. Estavam
muito bem esburacados. Isso me deixou
apreensivo. Aqueles dois podem nos dar
trabalho e dificultar os planos que tracei.
— Quer que eu dê um jeito neles?
— Não, vamos agir de outra forma.
— Como?
— Vamos fazer isso dentro da lei.
— Vai usar o xerife?
— Sim, ele tem que justificar a parte que
receberá dos lucros. Estou pensando em
algo. Farei com que o xerife prenda os dois
bastardos. A história deles é um tanto
fantástica, para quem conhecia Allan e os
outros. Poderemos manobrar os jurados e
induzi-los a condenar os dois.
— Engenhoso! Pode dar certo, patrão.
— Conto com isso, Laramie. Será melhor
ainda se fizermos com que alguns dos
membros do júri sejas nossos rapazes. Vá à
procura do xerife e o mande aqui. Darei as
instruções a ele e espero que possamos nos
livrar logo daqueles intrometidos. Uma boa
corda será a melhor solução para isso.
Johnny e Sam ouviram estarrecidos a
narração de Rose, a respeito da morte de
John Spell, da participação negativa do
xerife e do inesperado interesse de Steve
Morgan em comprar o armazém.
— Não sei entendi direto, Rose, mas
sinto que você quis dizer claramente que
Steve Morgan está envolvido com tudo o
que aconteceu, desde o princípio, não?
— Isso mesmo, Johnny. Primeiro, pela
suspeita de papai e pelo que ele sentia
quando Steve sondava o armazém.
Segundo, pelo interesse dele em comprar
logo, assim que papai morreu.
— Mesmo assim, não vejo nada de
interessante nesse negócio todo, Rose. O
que poderia atrair um homem ambicioso
como Morgan no negócio de secos e
molhados? Acho que o estilo dele é mais
para coisas fáceis, dinheiro rápido, esse tipo
de coisa — opinou Sam.
— Também penso assim, Sam, mas essas
ligações surgiram tão naturalmente que não
há como não desconfiar. Ele deve estar
planejando alguma coisa e, para isso,
precisa do armazém. Não hesitou em roubar
as cargas e em matar papai. Agora quer
completar o trabalho, ficando com tudo.
— Você contou a alguém sobre minha
vinda? — perguntou seu irmão.
— Ao próprio Morgan, quando ele esteve
aqui, fazendo a oferta para a compra.
— Não sei, Sam. Acho que devemos
investigar melhor tudo isso — concluiu o
rapaz. — E aquele tipo que encontramos
aqui, quem é ele?
— Laramie, um dos homens de Steve
Morgan.
— E o que ele queria, afinal de contas?
— Vive me importunando. Já estive
prestes a explodir-lhe a cabeça com a
espingarda de papai...
— Está bem, Rose, fique calma. De agora
em diante, eu e Sam cuidaremos de tudo —
decidiu ele.
— Vamos começar pelo princípio, Rose.
Quem encontrou o corpo de seu pai? —
quis saber Sam.
— O xerife e seus homens.
— Chegou a vê-lo?
— Não. Quando terminaram de preparar
o corpo foi que o trouxeram para cá.
— Quem preparou o funeral?
— O Sr. Alfred, o papa-defuntos da
cidade.
— Acho que poderemos começar por ele.
O que acha, Johnny?
— Acho que é um bom início, Sam.
Antes vamos consertar aquela porta e
reforçá-la. Não quero aquele tipo por aqui
novamente, senão terei de matá-lo.
Após consertarem a porta arrebentada, os
dois amigos deixaram Rose em casa e
saíram para a rua.
— Meu faro não me engana, Johnny.
Tem coisa errada por aqui. Sinto nos ossos.
— Você tem razão, Sam. Sinto o mesmo.
Vamos começar pelo papa-defuntos?
— Sim, acho que ele poderá nos
esclarecer algumas coisas.
— O quê, em especial?
— Precisamos, antes de mais nada, ter
certeza de que seu pai não foi morto por
coiotes. Se estou certo, o roubo das carroças
e a morte dele foram encenadas para jogar a
culpa nos saqueadores. Para mim não
passou de uma farsa.
— Vamos até lá, então.
Momentos mais tarde estavam na
funerária, falando com o velho proprietário,
que reconheceu Johnny, apesar dos dez anos
que o rapaz estivera fora.
Após conversarem amenidades, Johnny
conduziu a conversa para o assunto que o
interessava, a morte de seu pai.
— Sr. Alfred, gostaria que me
respondesse algumas perguntas sobre a
morte de meu pai.
— Sim, foi uma tragédia. Eu era muito
amigo dele. O que quer saber, Johnny?
— Notou alguma coisa estranha no
corpo, quando foi trazido para cá? — quis
saber o rapaz.
— Estranha? como assim? Era o cadáver
de um homem morto a tiros, como tantos
outros que já enterrei...
— Tente se lembrar. Sr. Alfred, por
favor. É importante para mim.
— Eu sinto muito, Johnny, mas não me
lembro de nada que fosse incomum...
— Já enterrou uma pessoa morta pelos
coioteros? — indagou Sam.
— Sim e posso lhe garantir que não é
uma visão agradável, meu rapaz.
— Acredita, então, que meu pai foi morto
por um desses bandos?
O papa-defuntos ficou pensativo por
algum tempo, parecendo refletir sobre a
situação. Seu rosto demonstrou certa
confusão, como se a indagação suscitasse
dúvidas em seu íntimo.
— Eles usam armas de fogo agora, não
mais arcos e flechas... Só que os coioteros
são cruéis... O corpo de seu pai foi
pisoteado por cavalos...
— Foi mutilado de alguma forma? —
insistiu Sam.
— Não, exceto por isso.
— Escalpelado?
— Também não.
— Quando viu alguém morto pelos
coioteros pela última vez, Sr. Alfred? —
continuou Sam.
— Quando o Exército esteve aqui. Um
batedor foi apanhado. Estava horrível.
Mutilado, escalpelado e... Diabos! Não é
que vocês têm razão? Os cocheiros, então,
foram apenas baleados e nada mais. Acho
que, no fundo, vocês têm razão mesmo.
— Meu pai estava armado?
— Sim, o revólver estava no coldre...
— Carregado?
— Sim, todas as balas intactas. Atiraram
nele à queima-roupa... — acrescentou, cada
vez mais se convencendo de que John não
fora morto por bandoleiros.
— Tem certeza desse detalhe, Sr. Alfred?
— insistiu Sam.
— Sim, havia marcas de pólvora em
alguns ferimentos.
— Acho que já nos prestou um enorme
favor, Sr. Alfred. Obrigado — agradeceu
Johnny, retirando-se com Sam.
Na rua, ambos pararam, pensativos,
olhando-se, como se partilhassem das
mesmas conclusões.
— Meu pai não deixaria um bando de
renegados se aproximar dele sem sacar a
arma ou tentar fugir — observou Johnny. —
Aliás homem nenhum o faria.
— Era nisso que eu pensava também,
parceiro. Tudo nos leva a crer que quem
disparou nele era conhecido o bastante para
se aproximar sem despertar suspeitas.
— Homens brancos, não mestiços e
índios. Além disso, gente da cidade, com
certeza.
— Não sei, Johnny, mas compartilho do
mesmo pressentimento de sua irmã. Sempre
que penso no assunto, tudo parece apontar
numa só direção: Steve Morgan.
— Mas eu não entendo! Por que ele se
interessaria pelo armazém e por cargas de
secos e molhados que não conseguiria
vender sem despertar suspeitas? Acho que
aquele saloon deve render muito mais
dinheiro.
— Só há uma forma de descobrir isso.
Podemos fazer uma visita a ele e exercer
um pouco de pressão, só para ver no que dá
— propôs Sam.
— Feito. Vamos nessa, parceiro.
Os dois subiram a rua, entrando no
saloon, bastante movimentado àquela hora
da noite. Aproximaram-se do balcão.
Johnny havia percebido Laramie, encostado
ali, tentando derramar um pouco de uísque
através dos lábios inchados.
Propositadamente esbarrou nele, fazendo
com que o uísque se derramasse sobre o
outro.
— Maldito desastrado! — praguejou
Laramie, virando o corpo, pronto para
esmurrar quem provocara o acidente.
Ao ver de quem se tratava, sua mão parou
no ar e ele empalideceu.
— Não sabia que ratos bebiam nesta
cidade — comentou Johnny, alto o bastante
para ser ouvido por todos ali dentro.
A mão de Laramie pendeu na direção do
Colt.
— Tente, por favor! — desafiou-o
Johnny. — Não está diante de uma garota
indefesa agora. Posso muito bem continuar
o que comecei e mudar definitivamente essa
sua cara na direção de cavalo morto.
Laramie estremeceu. Seu olhar se
desviou na direção da mesa onde estava
Steve Morgan, que lhe fez sinal para que se
acalmasse. O pistoleiro estremeceu. Sentia-
se extremamente humilhado para deixar
passar a ofensa.
— Por que não some daqui? — sugeriu
Sam. — Você fede como um gambá morto
— acrescentou, empurrando-o para ocupar
seu lugar junto ao balcão.
— Calma, Laramie! — recomendou
Steve Morgan, aproximando-se e
percebendo que seu pistoleiro estava prestes
a reagir. — Fique calmo. Parece que nossos
amigos aí estão loucos para encontrar
encrenca.
— As encrencas já existiam aqui antes
nós chegarmos — falou Johnny. —
Encrencas e covardia, como a morte de meu
pai.
Morgan ficou lívido, procurando se
controlar.
— Todos nós lamentamos o que houve
com ele...
— É um bastardo mentiroso, Morgan! —
afirmou Johnny, cara a cara com o outro.
— É bom levar seu amigo para fora daqui
— disse Morgan a Sam. — Ele parece
muito nervoso com a morte do pai e só vai
conseguir se encrencar por aqui.
— Deixe-me lhe dar um aviso, Morgan
— falou Johnny, encostando o indicador no
nariz de seu desafeto. — Tão logo eu possa
provar seu envolvimento na morte de meu
pai, providenciarei para que seja enforcado.
— Está louco! — exclamou Morgan,
pálido e trêmulo de indignação.
— Não pense que não percebemos logo o
que está acontecendo por aqui — continuou
Johnny. — Sei que teve participação nesses
crimes e vou provar isso de qualquer
maneira.
Steve Morgan estava lívido, imóvel,
incapaz de uma reação. Havia muita gente
no saloon, ouvindo as acusações. Para sua
sorte, o xerife entrou naquele momento.
— Estava à procura de vocês — foi
dizendo, enquanto se aproximava dos dois
amigos.
— Já nos encontrou. O que deseja? —
respondeu Sam.
— Vocês estão presos!
Johnny e Sam se entreolharam, surpresos,
depois começaram a rir.
— Só pode ter ficado maluco, xerife.
Qual é a acusação?
— Aquela história sobre as mortes não
me convenceu...
— Pois é a verdade e vai ter que acreditar
nela, xerife — intimou Sam, com
autoridade.
— Não tenho que acreditar nada. Vamos
deixar que um júri decida isso...
— Não iremos para a cadeia nem
seremos submetidos a julgamento, xerife.
Vai ter de acreditar em nossa palavra.
— Sua palavra e estrume têm o mesmo
valor para mim.
— Talvez isso o faça mudar de idéia —
falou Sam, retirando algo de seu bolso e
praticamente esfregando-o na cara do
homem da lei, que empalideceu e
estremeceu.
— E agora, acredita em nós? — indagou
Johnny, fazendo o mesmo.
— Sim, claro — respondeu o outro, num
fio de voz.
— Xerife, esses dois homens entraram
em meu saloon com o intuito de promover
arruaça, provocar meus homens e me acusar
injustamente... — ia dizendo Steve.
— Cale-se, seu idiota! Não viu o que ele
estava exibindo? São emblemas da guarda
Rural do Texas. Ambos são patrulheiros,
com o posto de capitães.
Steve Morgan ficou sem fala.
— E lhe digo mais uma coisa, xerife.
Ainda não aceito o fato de você ter recusado
ajuda ao meu pai na noite em que ele foi
morto. Quando tudo isso terminar, cuidarei
para que seja punido por aquilo — finalizou
Johnny.
Ambos iam se afastar dali, mas Steve
Morgan, em desespero, fez um sinal para
Laramie e alguns pistoleiros que estavam
ali.
— Espere um pouco, seu boca grande! —
ordenou Laramie, confiante no apoio dos
demais pistoleiros.
Johnny e Sam se viraram para olhá-lo.
Outros quatro homens ladearam Laramie,
todos mal-encarados.
— Temos um assunto inacabado —
lembrou Laramie.
— Já está cansado da vida? — zombou
Johnny, aborrecido com a provocação.
— Você se julga muito esperto. Talvez
um pouco de chumbo quente o faça pensar
antes de falara bobagens — continuou
Laramie.
— E você acha que pode fazer isso?
— Vou fazê-lo agora mesmo — decidiu o
pistoleiro, tentando sacar sua arma, no que
foi imitado por seus comparsas.
O inferno se abateu sobre o saloon. Antes
que alguém pudesse piscar, as armas dos
dois patrulheiros já haviam sido sacadas e
cuspiam chumbo e morte, envoltos num véu
de fumaça.
Laramie teve sua cabeça partida e seu
chapéu, recheado de miolos e cabelos, foi
cair na prateleira de bebidas, onde ficou
gotejando sangue.
Os outros quatros pistoleiros tiveram
sorte idêntica. Morreram sem ao menos
conseguir sacar suas armas. Quando a
fumaça se dissipou, os cinco desafiadores
jaziam numa mesma poça de sangue.
— Entenda isso como um sinal, Morgan
— falou-lhe Sam, antes de saírem os dois.
Steve Morgan ficou possesso, olhando os
cadáveres de seus pistoleiros.
— Ficou maluco, Morgan? —
repreendeu-o o xerife. — Vamos conversar
lá dentro.
O xerife empurrou-o até o escritório,
onde lhe serviu uma dose reforçada de
uísque.
— Percebe o que tentou fazer lá fora? —
insistiu o homem da lei.
— Ao diabo você e aqueles dois! O que
os rurais estão fazendo aqui? Como foram
alertados? Eles desconfiam de mim, você os
ouviu...
— Acalme-se, Morgan! Acho que tudo
não passou de coincidência e azar de nossa
parte. O rapaz é irmão da garota e filho de
Johnny Spell, por isso veio para cá. Está
apenas jogando verde. Você não pode entrar
no jogo dele.
— Diabos! — explodiu Morgan,
arremessando o copo contra a parede.
Respirou fundo, procurando se acalmar.
— Está bem, xerife, mas não será nada
fácil afastarmos aqueles dois bisbilhoteiros.
— Vamos por etapas. Eliminá-los não é
uma boa política. Antes de mais nada.
Precisamos descobrir se eles estão aqui
numa missão específica ou se foi mesmo
coincidência.
— E como fará isso?
— Telegrafando ao quartel deles.
— E o que isso irá adiantar?
— Se não estão aqui em missão, farei
com que sejam chamados de volta. Alegarei
que estão obstruindo a justiça e provocando
tumulto. Com a partida dos dois, teremos
apenas que assustar um pouco mais a garota
para que ela vá embora também.
— Está bem, vamos fazer do seu jeito,
então.
Enquanto isso, na rua, voltando para casa,
Johnny e Sam comentavam os últimos
acontecimentos.
— Acha que foi uma boa idéia nos
identificarmos, Sam? — indagou Johnny.
— Não houve outro meio de fazer aquele
xerife perder a pose. Percebeu como ele
queria nos encrencar? Suspeito que ele e o
tal Morgan estão juntos.
— Tive a mesma impressão —
confirmou Johnny.
Em casa, Rose os esperava apreensiva,
pois ouvira o tiroteio. Johnny lhe explicou o
que acontecera, tranqüilizando-a.
— É bom termos verdadeiros
representantes da lei por aqui — disse ela,
com alivio.
— Nunca lhe escrevi contando a respeito
porque não queria deixá-la apreensiva nem
desgostar papai, que esperava que eu
estudasse. Ser um membro da Guarda Rural
do Texas sempre foi meu sonho.
— Sinto orgulhosa de você, Johnny —
disse ela.
Naquele momento, bateram na porta.
Sam foi atender com cautela. Era Susy, à
procura de Rose. Quando a garota entrou e
viu Johnny, ficou petrificada.
O mesmo aconteceu com o rapaz, que se
lembrava muito bem dela. Só que Susy
crescera. Era agora uma linda mulher.
Os quatro amigos conversaram durante
algum tempo, pondo os assuntos em dia.
Susy e Johnny entendiam-se muito bem e
tinham ambos muitas lembranças de quanto
eram crianças.
Rose, no entanto, resolveu por um fim da
conversa amena e tratar de coisas mais
sérias.
— Há algo que precisamos resolver de
imediato, Johnny. Estava apenas esperando
sua chegada — falou ela.
— De que se trata?
— Com o roubo das duas carroças,
estamos com nosso estoques quase a zero.
Temos de decidir se vamos continuar com o
armazém. Se for o caso, precisaremos ir
buscar novas provisões em San Antônio e
novamente correr o risco de um outro
assalto...
— E como estamos de dinheiro?
— Temos muito pouco. As carroças
roubadas esgotaram as reservas de papei.
Tenho um pouco comigo. Acho que dará
para comprar o essencial.
— Eu me pergunto para onde foram as
mercadorias roubadas — falou Sam. — A
menos que fossem destinadas aos bandos de
saqueadores, que utilidade teriam,
escondidas por aí? Que interesse teria Steve
Morgan em conservar essas mercadorias.
— Só tenho uma resposta. Se ele comprar
o armazém, terá onde vendê-las
honestamente.
— Pode ser. Isso justificaria em parte o
interesse dele na compra.
— Vocês desconfiam de Steve Morgan?
— quis saber Susy, atenta à conversa.
— Achamos que ele teve alguma coisa a
ver com tudo isso. Vai ser difícil provar, é
claro, mas tentaremos — respondeu Johnny.
— Vocês já sabiam que ele mandou
buscar pistoleiros em Laredo? — perguntou
Susy.
— Como soube disso? — retrucou Sam.
— Meu pai comentou isso. Estava no
saloon e ouviu essa conversa.
— Parece que ele está se preparando —
comentou Johnny. — Matamos uma porção
de pistoleiros dele. Está repondo o estoque.
— Uma coisa de cada vez — falou Sam.
— Vamos cuidar das mercadorias primeiro.
Afinal, o armazém abastece toda a região,
não é, Rose?
— Sim, por isso vejo urgência nisso —
ajuntou Rose. — Se algum espertalhão
resolver montar um novo armazém,
estaremos em apuros.
— Talvez possamos conseguir crédito
com os próprios fornecedores de papai —
falou Johnny. — Além disso, tenho algum
dinheiro guardado. De qualquer jeito, acho
que poderemos fazer uma boa compra.
— Ótimo, Johnny! quando poderemos
fazer isso? — quis saber Rose.
— Eu e Sam cuidaremos disso. Reuna o
dinheiro que possuiu. Partiremos ao
amanhecer. Temos uma carroça?
— Sim, está no estábulo e é própria para
grandes cargas. Temos também meia dúzia
de bons cavalos.
— Então está decidido. Partiremos ao
amanhecer mesmo e estaremos preparados
para o que der e vier.
Os dois amigos partiram antes do dia
clarear. Inevitavelmente foram vistos por
um dos capangas de Morgan, que tratou de
comunicar o fato ao patrão.
Quando chegou ao saloon pela manhã, foi
a primeira informação que recebeu.
— Partiram com a carroça de carga. Isso
quer dizer que foram buscar mais
mercadorias. É a melhor coisa que poderia
ter acontecido. Vá chamar o xerife! —
ordenou Morgan, satisfeito da vida.
Momentos depois o xerife comparecia no
saloon. Steve lhe contou o que se passava.
— É a chance que esperávamos para nos
livrarmos desses imbecis — falou o homem
da lei, exultante. — Se eles forem mortos
no caminho de volta, como os outros, a
culpa recairá mais uma vez nos coioteros.
— Ótimo! Estou aguardando a chegada
de Bob Heston e seus pistoleiros, que
contratei em Laredo. Assim que chegarem,
sairão no encalço da carroça. Vão preparar
uma boa emboscada, tenho certeza.
— Aqueles dois pagarão por tudo que
fizeram...
— A garota terá que vender o armazém.
Nosso planos estão indo bem de novo,
xerife.
— Excelente! — exultou o homem da lei.
Em San Antônio, Johnny conseguiu
crédito facilmente junto aos fornecedores,
conhecidos de seu pai. Todos ficaram
consternados com o que acontecera ao
velho e se dispuseram a ajudar os filhos a
manter o negócio.
Em razão disso, a carroça voltava
carregada até seu limite máximo, levando as
mercadorias necessárias para suprir o
estoque desfalcado pelos roubos anteriores.
Todo o tempo não enfrentaram nenhum
problema, embora se mantivessem atentos e
tomando todas as precauções. Em breve
deixavam a trilha de San Antônio para
avançar pela trilha que conduzia a San Juan.
Tudo estivera tranqüilo até ali, mas os
dois sabiam que os assaltos anteriores
haviam acontecido naquela trilha. Enquanto
Johnny cuidava das rédeas, Sam ia atento a
tudo que se passava ao redor deles.
— É difícil mesmo que um bando de
renegados se movimente nesta planície sem
ser visto — comentou Johnny.
— Concordo com você. Não é o estilo
deles atacar em campo aberto. O único que
vejo é justamente onde ocorreram os
assaltos anteriores, naquele grupo de rochas.
É o único ponto para uma emboscada.
— O terreno aqui é acidentado.
Poderíamos contornar aquele trecho de
estrada — sugeriu Johnny.
— Mas aí perderíamos a chance de nos
certificarmos a respeito desses ataques.
— Entendo. É o único modo de
descobrirmos quem são os responsáveis, se
brancos ou renegados. Tem algum plano?
— Vamos ter de improvisar. Talvez tirar
um dos cavalos da parelha e ir à frente
verificar.
— Acho que tenho uma idéia melhor. Há
uma fonte algumas milhas antes do local.
Poderemos acampar lá esta noite, deixar a
carroça e irmos a cavalo até as rochas,
investigar.
— É uma idéia bem melhor que a minha.
Se vamos ter alguma surpresa a nossa
espera, já está lá, com certeza.
— Seguramente — concordou Johnny.
Ao anoitecer eles desatrelaram os cavalos
da carroça e seguiram em frente,
aproximando-se daquele grupo de rochas.
Quando estavam mais perto, perceberam o
brilho de uma fogueira e movimentação de
homens e cavalos.
— Há alguém lá — observou Johnny. —
Estou curioso para saber de quem se trata.
Vou lhe dizer o que vamos fazer. Eu vou até
lá, pela trilha. Você contornará as rochas e
ficará atrás deles, para o caso de alguma
surpresa.
— Não acho muito prudente, mas não
temos escolha. Tome muito cuidado. Se
forem os homens que estão a nossa espera,
atirarão primeiro e perguntarão depois.
— Tomarei, fique tranqüilo — disse
Johnny, seguindo em frente, enquanto Sam
contornava o terreno para se aproximar por
trás das rochas.
A fogueira brilhava na noite e havia no ar
um cheiro de comida e café quente.
— Alto lá! — ordenou um homem
armado de rifle, assim que o rapaz se
aproximou do acampamento.
— Calma, amigo — pediu ele. — Só
gostaria de me aquecer um pouco nessa
fogueira e de provar um pouco desse café
— acrescentou ele, contando cinco homens,
todos armados de rifles.
Um deles, que parecia ser o chefe,
aproximou-se cheio de pose e arrogância.
— Quem é você? — perguntou ao recém-
chegado.
— Meu nome é John — respondeu o
rapaz.
— Onde está a sela de seu cavalo?
— Eu a perdi num jogo de pôquer em
San Antônio. Como vê, fiquei sem minha
sela e sem provisões. Estou exausto e um
pouco de café iria bem...
— Nada disso forasteiro. Siga seu
caminho, não queremos estranhos rondando
nosso acampamento. San Juan não está tão
longe assim.
— Amigo, entenda, já está escuro e eu
não...
— Problema seu, amigo — respondeu o
outro, rispidamente, erguendo o rifle que
tinha nas mãos.
Johnny não havia conseguido as respostas
que procurava, embora a intenção daqueles
homens estivessem bem evidentes para
estarem acampados ali.
Resolveu blefar um pouco para se
certificar.
— Hoje não é mesmo meu dia de sorte —
lamentou ele. — Primeiro foram aqueles
dois, na carroça. Agora vocês...
— Espere um pouco! O que foi que
disse? — interessou-se o homem que
chefiava o grupo.
Seu nome era Ted Strong e fazia parte do
grupo que Morgan mandara buscar em
Laredo. Eram todos homens sem
escrúpulos, acostumados a alugar suas
armas pelo melhor preço.
— Eu disse alguma coisa errada? —
devolveu Johnny, percebendo o quanto
aquilo havia interessado os homens ao seu
redor.
— Quem eram esses dois homens? —
insistiu Ted.
— Conduziam uma enorme carroça de
carga...
— É o bastante. São eles. Onde os viu?
— Estão há umas três milhas para trás, na
trilha...
— Muito bom! Agora vá desmontando,
forasteiro — ordenou Ted, apontando-lhe a
arma.
— O que está havendo? O que vai fazer
comigo?
— Você levou azar, meu amigo. Meteu-
se em algo que não deveria e terá de morrer
por isso.
Os outros riram, engatilhando suas armas.
Sob o cavalo, Johnny viu Sam surgir atrás
dos pistoleiros.
— Se pretende me matar, é bom que
olhem para trás primeiro — recomendou
Johnny.
Ted voltou a cabeça. Sobre uma rocha,
Sam lhes apontava dois Colts prontos para
cuspir chumbo e morte.
— O que significa isso? — indagou Ted,
surpreso.
— Significa que não haverá nenhuma
emboscada desta vez — informou Sam,
caminhando na direção deles, após saltar da
rocha.
Johnny desmontou e começou a desarmar
os pistoleiros. Um deles, no entanto, reagiu
inesperadamente, atingindo o rapaz com um
pontapé, derrubando-o, enquanto tentava
sacar o revolver.
Sam não lhe deu trégua. Seu Colt
disparou apenas um tiro, acertando o peito
do pistoleiro, que foi estrebuchar na poeira.
A distração foi o bastante para que os outros
homens se atirassem para o lado, apanhando
suas armas.
— Abrigue-se, Johnny! — gritou Sam,
enquanto balas assobiavam ao seu redor.
Os dois as juntaram atrás de uma pedra,
respondendo ao fogo que se abatia
selvagemente sobre eles.
— Precisamos apanhar pelo menos um
deles com vida — falou Sam.
— Vai ser difícil agora. Eu estava muito
confiante e me distraí — desculpou-se
Johnny.
— Pior para eles. Mantenham-nos sob
fogo. Vou tentar contorná-los.
Os pistoleiros estavam atentos e o local
estava bem iluminado pela fogueira. Mesmo
assim, Sam ainda conseguiu ir até uma
outra rocha.
Sam não esperava, porém, que os outros
homens também tivessem a mesma idéia.
Assim, quando ele correu para a outra
pedra, um dos pistoleiros fez o mesmo.
Nem tiveram tempo de usar as armas,
engalfinhando-se numa luta sem tréguas.
Enquanto isso, Johnny disparava sem
cessar, até o momento em que suas armas
ficaram sem munição.
— É agora, rapazes! — gritou Ted.
Três homens correram na direção do
rapaz, disparando suas armas. Johnny se viu
perdido, pois não havia tempo para
recarregar seus Colts.
Perto dali, Sam conseguia, finalmente,
pôr seu oponente fora de combate,
desarmando-o com um potente murro no
queixo.
— Sam, cadê você? — gritou Johnny,
vendo a morte se aproximando rapidamente.
Um dos pistoleiros saltou para cima da
pedra onde ele se escondia. Apontou sua
arma para a cabeça do rapaz e ia disparar
sem piedade.
A arma de Sam detonou primeiro. O
pistoleiro rodopiou espetacularmente sobre
a rocha, estatelando-se na poeira com a
cabeça aberta pelo disparo.
Johnny precipitou-se sobre a arma que
escapara da mão do seu agressor. Uma bala
raspou-lhe a perna e outra quase o acertou
na cabeça.
Ele disparou sobre o homem mais
próximo, fazendo-o cair para trás com os
braços abertos.
Ted Storm ia atingir Johnny mortalmente,
mas Sam se antecipou, acertando-o com
dois balaços. O pistoleiro caiu de joelhos e
ainda tentou puxar o gatilho de sua arma.
Johnny disparou o tiro de misericórdia,
varando-lhe o coração. O silencio voltou a
reinar na planície.
— Caramba! Esta foi por pouco.
Obrigado, parceiro! — falou Johnny,
ofegante, examinando o buraco que uma
bala fizera na perna de sua calça.
— Esqueça! Acho que temos um deles
com vida — avisou Sam, indo até o local
onde deixara o pistoleiro desacordado.
Sam agarrou o pistoleiro pelo colarinho e
o arrastou para perto da fogueira. Johnny
apanhara um cantil que estava ali.
Derramou água no rosto do pistoleiro.
Este despertou assustado, tentando reagir,
mas Sam plantou sua bota no peito dele,
mantendo-o quieto.
— Fique quieto, amigo! Quem é você?
— indagou-lhe.
— Meu nome é Buck Storm.
— Estavam esperando por nós, não?
— Não sei de nada... Estávamos apenas
acampados para passar a noite e...
— Mentiroso! — exclamou Sam,
apertando o salto de sua bota contra o peito
dele.
— Por favor, tem de acreditar em mim.
Não íamos fazer mal a ninguém...
— É tão comovente — falou Johnny,
apanhando uma acha de lenha em chamas e
se aproximando do pistoleiro subjugado.
— Se quer um conselho, é bom falar
logo. Meu amigo é um tanto impaciente —
recomendou Sam. — Pode querer fazer sua
barba com o tição.
— Não sei de nada — gritou o pistoleiro,
em desespero, segurando o tornozelo de
Sam e girando o corpo, desequilibrando-o.
Ao se ver livre, Buck rolou o corpo e
tentou se levantar após apanhar uma arma
caída ao lado de um cadáver. Johnny não
lhe deu chance.
A acha de lenha em brasa atingiu o rosto
de Buck, fazendo-o gritar de dor.
— Você está bem, Sam? — indagou o
rapaz ao amigo, enquanto pisava a mão com
que Buck empunhava o revólver.
O pistoleiro soltou a arma, gemendo.
Johnny aproximou a acha de lenha do rosto
dele, indagando:
— Está disposto a colaborar ou prefere
morrer de modo horrível?
— Está bem, eu falo — gritou Buck, ao
perceber que um de seus amigos ainda
estava com vida e apontava uma arma para
Johnny.
Este, porém, graças a sua experiência,
percebeu o olhar de Buck e entendeu o
perigo.
— Cuidado, Sam! — gritou ele, jogando-
se para o lado, já com a arma na mão.
O tiro disparado pelo homem ferido
atingiu a boca de Buck, que se levantava
esperançoso. Johnny respondeu ao fogo,
cravando dois balaços na cabeça do
pistoleiro, matando-o instantaneamente.
— Diabos! — praguejou. — Acho que
perdemos a grande chance que estávamos
esperando.
— Sim, nenhum deles falará agora —
ajuntou Sam.
— O que vamos fazer com os cadáveres?
— Vamos deixá-los aqui os abutres.
Levá-los para a cidade será perda de tempo.
Se forem homem de Morgan, ele vai alegar
que os despediu esta manhã, como fez com
aquele que assaltaram a diligência.
— Tem razão, mas não posso aceitar a
idéia de ter perdido a chance de incriminar
Morgan.
— Talvez não! — comentou Sam, com
uma expressão matreira no rosto.
— O que tem em mente?
— Apenas nós sabemos o que se passou
aqui. Poderemos acrescentar um pouco mais
de pressão sobre Morgan. Vamos falar
novamente com ele e dizer-lhe que seus
homens confessaram antes de serem mortos.
— Isso pode abalá-lo...
— Talvez ele comete um erro que não
possa remediar. Aí, então, nós o
apanharemos.
— Bem pensado, Sam. Mal posso esperar
para ver a cara daquele patife.
— Mas teremos de estar alertas porque
ele vai reagir. Minha preocupação principal
é Rose.
— Ela ficará bem. Se for o caso, nós a
esconderemos na casa de Susy.
— Mesmo assim, não podemos nos
arriscar, Johnny. Steve Morgan pode
declarar guerra contra nós todos que
ficarem entre as duas partes.
— Tem razão. Temos de ser cautelosos
em todos os sentidos, mas espero liquidá-lo
o mais depressa possível. Só assim isso
terminará.
— Saiba que compartilho de sua opinião.
Gente como Steve Morgan só fica bem
quando está pendurada por uma corda...
— E não podemos nos esquecer daquele
xerife também. Ele terá de ser punido por
seu envolvimento.
Steve Morgan jogava cartas e conversava
animadamente com os novos pistoleiros
chegados de Laredo. Eram todos homens
perigosos e bons no gatilho.
Para o maioral, tudo estava perfeito
agora. Sentia-se de novo dono da situação e
em breve poderia concretizar o plano que
iria encher seu cofre de ouro.
Repentinamente, o barulho de uma
carroça alertou seus sentidos.
— Silêncio! — ordenou ele.
— Algum problema, Sr. Morgan? —
indagou-lhe um pistoleiro cujo nome era
Stigg Boy.
— Veja quem chegou nessa carroça.
Stigg Boy se levantou. Mal chegou à
porta, porém, Johnny e Sam vinham
entrando, quase esbarrando nele. Steve
Morgan ficou pálido, como se visse
fantasmas a sua frente.
— Desta vez não deu certo, Morgan —
falou-lhe Sam.
— Não sei do que está falando...
— É um covarde mentiroso, Morgan —
acusou-o Johnny, em voz alta.
O silêncio reinou no saloon. Todos
esperavam que Morgan fosse reagir, mas
este já conhecia a rapidez e a determinação
de seus dois adversários.
— Acabamos de matar cinco de seus
capangas a caminho daqui — avisou Sam.
— Vocês estão me acusando sem provas.
Eu não admito que...
— Cale a boca, verme! — ordenou
Johnny. — Saiba que um deles confessou
que trabalhava para você, antes de morrer.
Pena que não pudemos trazê-lo para
testemunhar contra você. Se isso tivesse
acontecido, amanhã cedo você estaria
pendurado numa corda.
Steve Morgan não conseguiu pronunciar
uma só palavra. Tomou um gole de uísque
para recuperar a calma. Se Sam e Johnny
sabiam de alguma coisa, não poderiam
prová-lo. Isso o deixava mais tranqüilo, mas
a pressão estava sendo terrível sobre ele.
— Vocês me aborrecem com essas
histórias — disse ele, voltando a se
concentrar em suas cartas, dominando a
raiva.
Johnny chutou a mesa, derrubando
Morgan. Este, porém, não fez menção de
reagir.
— Um momento, rapaz. Acho que você
já foi longe demais — observou Stigg, com
as mãos à altura das armas.
— Não se meta ou vai sobrar para você,
imbecil — recomendou-lhe Johnny.
— Ninguém faz isso com meu patrão na
minha presença...
— Se está se doendo por ele, por que não
tenta logo sacar suas armas e me dá o
pretexto para matá-lo logo e calar sua boca
fedorenta?
Stigg ficou possesso. Jamais alguém
falara com ele naquele tom. Johnny
demonstrou muita segurança e também
mantinha as mãos à altura dos coldres.
— Vai se arrepender disso, rapaz —
rosnou Stigg.
O pistoleiro ainda hesitou um instante,
depois suas mãos voaram para as coronhas
de seus revólveres.
Os outros pistoleiros no saloon ficaram
alertas, prontos para assistirem à morte de
Johnny.
Ficaram todos surpresos, porém, quando
Stigg foi jogado para trás, após receber dois
balaços. Suas armas mal haviam saído dos
coldres, enquanto as de Johnny já
fumegavam, tendo cuspido chumbo e morte.
— Cuidado, Johnny! — alertou Sam,
pois um outro pistoleiro, rente ao balcão,
sacava sua arma. Os dois patrulheiros
atiraram ao mesmo tempo. O pistoleiro
estrebuchou, depois caiu lentamente,
tentando se firmar no balcão, enquanto suas
forças se esvaíam.
— Mais alguém deseja morrer? —
indagou Johnny.
Steve Morgan, caído no assoalho, olhava
tudo com surpresa. Em fração de segundo,
dois de seus pistoleiros mais recomendados
haviam sido mandados para o inferno.
— Quanto a você, Morgan, esteja
preparado. Sua hora chegará muito mais
depressa do que pode imaginar — avisou-o
Sam.
— Será divertido vê-lo espernear na
ponta de uma corda, Morgan, mas eu me
sentirei mais satisfeito se você me der a
chance de matá-lo pessoalmente, o que farei
com grande prazer, bastardo — finalizou
Johnny.
Ele e Sam iam deixando o saloon, quando
o xerife, atraído pelos tiros, entrou
apressado, com a arma na mão.
— O que houve por aqui? — indagou. —
O que significa esses homens mortos?
— Apenas um pouco de limpeza, xerife
— informou Sam.
— Significa que eles tentaram nos matar
e não tiveram sorte — informou Johnny.
— Vocês dois estão passando das
medidas. Saibam que telegrafei para o
quartel de vocês — avisou o homem da lei.
— E daí? O que conseguiu com isso? —
quis saber Sam.
— Fui informado que vocês estão em
licença e que, por isso, não podem se
intrometer em assuntos de minha jurisdição
— respondeu o xerife, entregando o
telegrama a Sam, que o leu contrariado.
Aquilo não deixava de conter um alerta
de seus superiores.
— Fique tranqüilo, Sam. Isso aí não são
ordens. Mesmo em licença, podemos atuar
em casos de comprovada injustiça ou para
deter crimes em andamentos. Foi o que
fizemos apenas.
— Não pense que vai me enganar com
essas desculpas legais, rapaz...
— Sou Guarda Rural e conheço as leis,
xerife.
— Não vou permitir que virem minha
cidade de pernas para cima. Telegrafei
novamente ao seu quartel, pedindo que
mandem ordens expressas para os dois. Não
admito que se intrometam em meu
trabalho...
— Reconhece, então, que está havendo
alguma coisa por aqui? — argumentou Sam.
— Não tenho satisfação a lhes dar...
— Pois então ouça bem, xerife. Se os
assaltos às carroças e as mortes que
houveram forem obras dos coioteros, então
estamos diante de um problema estadual e a
jurisdição é nossa. Se, por outro lado, você
admitir que foram homens brancos que
atacaram e roubaram as carroças, então eu
aceito que a jurisdição é sua — falou
Johnny.
O xerife ficou estático, pego pela palavra.
— Bem lembrado, Johnny. Sem esquecer
que, se há então um complô de homens
brancos para fazer os ataques, tudo nos leva
a acreditar que você os está acobertando,
xerife. O que nós dá também o direito de
intervir na cidade, para impor novamente a
lei.
— Terão de provar cada acusação que
estão fazendo. Esta cidade ficará quente
demais para vocês, eu prometo isso.
— Está nos ameaçando, xerife? —
questionou-o Sam.
— Estou dando um aviso.
— Que também serve para você.
Os dois patrulheiros deixaram o saloon.
Steve Morgan foi para seu escritório,
seguido pelo xerife.
— Nunca fui tão humilhado em minha
vida — reclamou Steve, servindo-se de uma
dose de seu melhor uísque.
— Eu também. Nada me daria mais
satisfação do que fazer aqueles dois
engolirem a própria língua.
— Enquanto estiverem juntos, são
imbatíveis. Agem como se um lesse o
pensamento do outro. Além disso, são
muito rápidos com as armas.
— Espere um pouco, Steve. Acho que
você me deu uma idéia. Precisamos
encontrar uma forma de dividi-los. Se não
podemos vencer os dois juntos, vamos
cuidar primeiro de um e depois do outro.
— A idéia é interessante, mas como vai
conseguir isso?
— Vou pensar em algo, deixe comigo.
Na manhã seguinte, Johnny e Sam
estavam descarregando a carroça, suprindo
assim os estoques do armazém. Quando já
haviam terminado, Rose foi até eles,
apreensiva.
— Algum problema, Rose? — observou
Johnny.
— Sim. Acabo de receber um bilhete da
Sra. Silver. Lembra-se dela, não?
— Como poderia me esquecer? Ela
praticamente nos criou, após a morte de
mamãe. O que houve com ela?
— Não sei. Ela apenas pede que eu vá ao
rancho dela o mais depressa possível.
Gostaria que você fosse comigo. Não gosto
de sair sozinha por aí, após os últimos
acontecimentos.
— Eu vou com ela, Johnny —
prontificou-se Sam. — Afinal, alguém tem
que ficar no armazém, principalmente hoje,
que as mercadorias chegaram.
— Sam tem razão, Johnny — disse Rose.
— Acha que poderá cuidar das coisas por
aqui?
— Sem problema. Se precisar de ajuda,
mando chamar Susy.
Pouco mais tarde, Sam e Rose
cavalgavam na direção do rancho Silver,
algumas milhas distantes da cidade.
Conversaram durante todo o caminho,
conhecendo-se melhor.
— Lá está o rancho da velha senhora —
apontou Rose, após uma colina.
— Ela vive só?
— Não, ainda é casada. Os dois cuidam
de um pouco de gado. Apenas o bastante
para o sustento.
— Criam cavalos também?
— Não que eu saiba. Por que perguntou?
— Estou vendo alguns cavalos no curral
— observou Sam.
— Não são tantos. Devem pertencer aos
dois. Por que a preocupação?
— Não é preocupação. É apenas um
hábito que adquiri.
— Entendo. Sempre atento a todos os
detalhes, não?
— É uma profissão perigosa, Rose. Estar
alerta é um modo de se manter vivo.
Quando já estavam próximos da casa, um
tiro ecoou sinistramente na planície. O
cavalo de Rose estacou, estremecendo,
ferido mortalmente. Depois tombou,
arremessando a garota na relva.
Imediatamente Sam desmontou e ajudou-
a a se levantar. Correram para trás de um
tronco, enquanto novos disparos eram feitos
contra os dois, arrancando lascas da madeira
seca.
— Entendeu o que eu quis dizer? —
indagou Sam, tentando localizar seus
atacantes. — Tudo não passou de um plano
para nos atrair a uma emboscada, Rose.
— Sendo assim, algo deve ter acontecido
à pobre senhora e seu marido...
— Temo que sim, Rose, mas temos que
nos preocupar com nossas vidas agora. Não
poderemos fugir em apenas um cavalo.
Seríamos facilmente alcançados,
principalmente porque seus cavalos são de
carga, não de montaria.
As balas continuaram zumbindo ao redor
deles. Algumas atingiam o tronco e as
lascas voavam para o alto, enquanto o
chumbo encravava-se profundamente.
Sam se viu numa posição incômoda. Não
podia responder ao fogo pois era arriscado
levantar-se.
Naquele momento, um tropel de cavalos
obrigou-o a se voltar. Dois cavaleiros,
surgidos do nada, galopavam na direção
deles, disparando rifles.
— Abaixe-se, Rose! — ordenou ele,
sacando suas armas e respondendo ao fogo
com precisão mortal.
Os dois cavaleiros foram arrancados de
suas selas. Um rolou na poeira,
estrebuchando. O outro ficou com o pé
preso no estribo, enquanto o cavalo em
disparada o arrastava.
— Não saia daqui, Rose! — ordenou
novamente ele, mais uma vez, à garota.
Foi uma arriscada manobra que poderia
ter-lhe custado a vida, mas ele conseguiu se
firmar. O corpo do cavalo o protegia dos
tiros que vinham do rancho.
Sam pode, então, contar três armas que
disparavam contra ele e Rose. Uma delas
estava na casa principal. Outra se escondia
no celeiro e a terceira estava atrás de uma
cerca, para onde os cavalos se dirigiam.
— Ele está aqui! — gritou o pistoleiro,
quando Sam se soltou do cavalo e se atirou
sobre ele.
Rolaram ambos na poeira, engalfinhados
numa luta mortal.
— Fogo nele! — ordenou o homem na
casa principal.
— Cuidado para não ferir o Jim —
alertou o outro.
— Dane-se o Jim!
Sam percebeu o perigo e se livrou
rapidamente do pistoleiro, pondo-o para
dormir com um potente murro. Correu,
então, para trás de um bebedouro, mas ficou
entre dois fogos.
O homem com quem acabara de lutar
recuperou-se rapidamente voltando a atirar
contra o patrulheiro. Sam girou o corpo com
rapidez. As balas zumbiam, levantando
poeira ao se encravar no chão.
A morte parecia prestes a firmar suas
garras no rural, mas ele não se deu por
vencido. Seu corpo, com incrível agilidade,
continuou girando, até se abrigar atrás de
uma parede.
— Venham para cá, ele está encurralado.
Podemos pegá-lo agora — gritou um dos
homens.
— Cuidem dele. Eu vou atrás da garota
— falou o homem que saía da casa. Assim
que se viu protegido, Sam recarregou suas
armas e aguardou. Um pistoleiro surgiu
correndo diante dele. Sam apertou os
gatilhos de suas armas. O pistoleiro levou as
mãos ao peito e rodopiou, caindo numa
poça de sangue.
— Não vai escapar de mim, maldito rural
— gritou o homem que havia saído do
celeiro, apertando os gatilhos de suas armas
desesperadamente.
As balas cravaram-se na parede, a
milímetros da cabeça de Sam, alertando-o.
Ele respondeu ao fogo e não errou. O
pistoleiro girou o corpo no ar e caiu
estendido, com dois balaços no peito.
— Rose! — exclamou Sam, ao ouvir
gritos da garota.
Precipitou-se, então, na direção do local
onde a deixara escondida. O último dos
pistoleiros que participaram da emboscada
tentava arrastar a garota, que se debatia.
Diante da reação da garota, ele a
esbofeteou com força, derrubando-a. Estava
prestes a matá-la, já que engatilhara a arma
e a apontara para a cabeça da jovem.
Antes que pudesse concretizar seu
intento, Sam saltou sobre ele como um leão
da montanha furioso, disposto a fazer o
bandido pagar por aquela bofetada.
Ambos rolaram na relva. O pistoleiro
conseguiu se livrar de Sam e retomar a
arma, que havia caído.
Sam viu a morte lhe acenar dentro do
cano escuro daquele quarenta e cinco. Um
disparo inesperado soou, no entanto, e o
pistoleiro rodopiou, com as contas crivadas
de chumbo.
Próximo dali, um velho de cabelos
brancos segurava sua Overland ainda
fumegante, após o disparo fatal de seus dois
canos.
— Rose! — gritou a Sra. Silver,
aproximando-se, juntamente com o marido.
A garota se levantou, ainda aturdida. Ao
ver os dois velhinhos ficou muito
emocionada.
— Graças a Deus vocês estão bem —
exclamou ela, abraçando-os.
— O que houve afinal, Rose? Esses
homens chegaram aqui pela manhã e nos
ameaçaram. Forçaram-me a escrever aquele
bilhete...
— Acho que já entendi tudo, Rose —
falou Sam. — Tudo isso foi um ardil para
nós matar. Pensavam que Johnny viria com
você, então eles teriam conseguido o que
sempre desejavam desde o princípio.
— Talvez... Talvez eles tenham feito isso
por outro motivo — ponderou ela,
pensativa.
— Qual?
— Separar vocês dois. Juntos são
imbatíveis...
— Sendo assim Johnny pode estar em
grande perigo agora — concluiu Sam,
preocupado. — Vamos voltar para a cidade
imediatamente. Poderemos usar os cavalos
desses bandidos.
— Depois explicarei tudo o que está
acontecendo — disse Rose ao casal de
velhos.
— E enterrem esses pistoleiros, se
tiverem oportunidade — pediu Sam.
Os dois selecionaram os melhores
cavalos dos pistoleiros e, no momento
seguinte partiam na direção da cidade,
apreensivos pelo que poderia estar
acontecendo a Johnny.
O pai de Susy era o ferreiro da cidade.
Seu nome era Max Mork e, naquele
momento, estava às voltas com o seu
trabalho. Não percebeu a aproximação de
quatro dos pistoleiros de Steve Morgan.
— Tem uma bela oficina aqui, homem —
falou um deles, chamando Stone Granger.
— Oh, obrigado, rapazes! Precisam de
alguma coisa?
— Olá, papai! — disse Susy, chegando
naquele momento. — O almoço está pronto.
— Tem uma bela filha também, ferreiro
— falou Stone, acariciando ousadamente o
rosto de Susy.
Ela se livrou dele com um repelão.
— Espere um pouco, rapaz — ia dizendo
Max, mas calou-se, surpreso, quando uma
arma foi engatilhada diante de seu nariz.
— É melhor ficar quietinha, velho, ou vai
se dar mal — ameaçou um outro pistoleiro.
Susy percebeu que a intenção daqueles
homens não eram das melhores e tentou
correr para longe dali, mas um deles a
segurou pelo braço com firmeza.
Max deixou sua mão pender ao lado da
bigorna. Seus dedos seguraram firme o cabo
de uma pequena marreta.
O pistoleiro que lhe apontava a arma
havia se distraído com Susy. Max vibrou a
marreta com violência, atingindo a mão de
seu oponente, quebrando-a.
O pistoleiro gritou de dor, chamando a
atenção de seus amigos, que tomaram suas
dores.
Não devia ter feito isso, moço —
ameaçou Stone, avançando contra Max.
— Se tocar em minha filha novamente,
eu lhe quebro a cabeça — falou o velho.
O homem que a segurava soltou-a. Susy
percebeu que aqueles homens iriam surrar
seu pai e tratou de correr à procura de ajuda.
Enquanto isso, Max, com a marreta na mão,
ameaçando Stone e seus amigos, que se
divertiam com as ameaças do velho.
Um deles apanhou uma tenaz e, com ela,
retirou um ferro em brasa da forja, atirando-
a contra o ferreiro.
— Maldito! — gritou Max, quando o
ferro em brasa o atingiu no peito,
queimando, fazendo-o soltar a marreta.
Três homens saltaram sobre ele,
agredindo-o selvagemente. Max ainda
conseguiu jogar um deles de encontro à
bigorna, onde bateu a cabeça com força,
cortando-se. Os outros, no entanto, não lhe
deram trégua, agredindo com pontapés e
socos violentos.
A briga atraiu a atenção de alguma
pessoas, mas ninguém se animou em
socorrer o pobre homem.
— Vamos moê-lo de pancadas! — rugiu
Stone, apanhando uma corrente.
Max cobriu o rosto com os braços. Os
golpes impiedosos atingiram seu corpo,
fazendo-o rolar e gemer de dor a cada nova
pancada.
Naquele momento, um vulto se
aproximou na corrida, jogando-se no ar
sobre Stone e derrubando-o.
Ambos rolaram no interior da oficina,
mas, em seguida, desvencilharam-se,
pondo-se rapidamente em pé. Os três
pistoleiros que ainda podiam sacar suas
armas encararam Johnny.
— Caiam fora daqui ou eu os matarei
como animais que são — ameaçou o rapaz
— Não me faça rir, seu idiota. Quem
pensa que é para nos assustar? — indagou
Stone, com ironia.
Seus amigos riram e baixaram suas mãos
em direção das armas.
— Está bem, Sr. Max? — indagou
Johnny ao ferreiro.
— Penso que sim, mas tenho contas
pesadas a ajustar com esses covardes...
— Pois então pegue uma arma, velho, e
venha receber sua conta — desafiou Stone.
— Eu lutarei por ele — antecipou-se
Johnny, resoluto.
Os três pistoleiros se afastaram,
espalhando-se com intenção de dificultar o
trabalho do patrulheiro, que teria de atirar
em três direções diferentes para manter-se
vivo.
As pessoas diante da oficina se
dispersaram, passando a observar os
acontecimentos de lugares mais seguros.
— Estamos prontos, garoto. Saque
quando quiser — desafiou Stone.
— Dê-me uma arma, Johnny, e eu o
ajudarei — falou o ferreiro.
— Não, Sr. Max. Ficarei mais tranqüilo
se afastar, por favor!
— Mas eu sei que posso a...
— Faça como eu disse. Não quero vê-lo
ferido. Vá ao encontro de Susy cuidar
desses ferimentos. Ela está muito
preocupada.
O ferreiro, ainda aturdido pelos golpes
que receberá, deixou o local. Johnny
examinou melhor, então, a situação em que
se encontrava.
Teria de se mover com agilidade incrível
para poder atingir seus três oponentes,
coisas que não seria fácil, já que um estava
a sua frente, outro à direita e outro à
esquerda, sem contar com o pistoleiro com
a mão quebrada, que retirara a arma e a
pusera no cinto, podendo sacar com a
esquerda.
— Muito bem, rapaz. Já teve sua chance.
Prepare-se para morrer.
— Você fala demais! — exclamou
Johnny, sacando sua arma e metendo uma
bala na testa de Stone, que foi jogado para
trás.
Instintivamente Johnny se atirou para trás
da bigorna. As balas dos outros pistoleiros
se achataram contra o metal resistente.
Tratou, então, de responder imediatamente
ao fogo.
O pistoleiro a sua esquerda caiu sobre o
tonel de água ao lado da forja, entornando-
a. O outro rodopiou e bateu o peito contra a
parede, escorregando em seguida, deixando
uma mancha enorme de sangue na madeira.
— Morra, maldito! — berrou o pistoleiro
com a mão quebrada, apontando sua arma
diretamente para a cabeça do patrulheiro.
— Não desta vez — falou o rural,
atirando-se para o lado.
A bala roçou seu corpo, quando o
pistoleiro disparou. Antes mesmo de tocar o
solo, Johnny já havia disparado duas vezes.
O pistoleiro se dobrou sobre os joelhos,
depois tombou pesadamente.
— Johnny! — gritou Susy, correndo ao
encontro dele.
Abraçaram-se com emoção. O corpo da
garota tremia assustado.
— Está tudo bem agora, Susy. Eles não
molestarão seu pai.
Naquele momento apareceu o xerife,
esperando encontrar Johnny morto, mas
estacou surpreso ao ver os cadáveres dos
pistoleiros estendidos em poças de sangue.
— Você é especialista em chegar
atrasado, xerife. Nunca está por perto
quando se precisa de você.
— Eu o adverti. Está cidade ainda vai
ficar mais quente para você.
— Aposto como não conhece nenhum
desses defuntos, não é mesmo?
— Realmente, não os conheço.
— Mas eu os vi ontem à noite no
saloon...
— E daí? Muitos forasteiros entram e
saem daquele saloon diariamente.
— Estes não pareciam de passagem.
— Por que não pergunta a eles, se quer
saber de alguma coisa? — zombou o
homem da lei.
— Deixe-me dizer uma coisa, xerife —
falou Johnny, encarando-o. — Cada vez que
o vejo por perto, sinto um cheiro de
podridão no ar.
O xerife ficou lívido. sua vontade inicial
foi de sacar contra Johnny, mas hesitou,
analisando melhor suas chances.
— Ouça bem, patrulheiro! Minha
paciência tem limites e uma hora eu...
— Você o quê, xerife? — respondeu o
rapaz, afastando Susy do seu lado e pondo-
se em posição.
A mão do xerife tremeu à altura da
coronha de seu Colt, mas não seira desta
vez que ele sacaria. Humilhado, virou as
costas e deixou o local. Momentos depois,
Sam e Rose chegavam a galope.
— Tudo bem com você, Johnny?
— Sim, Sam, mas quase me pegaram de
novo.
— O mesmo aconteceu conosco. Era uma
emboscada.
— Creio que nosso plano de pressionar
Morgan está dando resultado, só que
estamos nos expondo demais — ponderou
Johnny.
— Agora temos que ir até o fim, parceiro.
— Se é assim, então proponho que o
incomodemos ainda mais — sugeriu
Johnny. — Vamos para o armazém. Eu lhe
falarei do meu plano.
O xerife entrou esbaforido no escritório
de Morgan, que havia escutado o tiroteio e
imaginava que seus homens houvessem
matado Johnny.
— Esses pistoleiros que você contratou
não valem nada. O rapaz matou os quatro.
Além disso, acabo de ver o outro chegar
com Rose.
— Diabos! eles não são humanos! —
exclamou Morgan.
— As coisas estão ficando quentes
demais, Morgan. Acho que você deveria
deixar o plano de lado por algum tempo, até
tudo se acalmar.
— Não posso mais fazer isso, xerife.
Tenho de me livrar desses dois. Chegou a
hora de agir sem medir conseqüências.
— Como assim?
Morgan foi até a porta do escritório. O
xerife o acompanhou.
— Vê aquele mexicano no balcão?
— Sim, já o vi por aí algumas vezes.
— É o emissário dos coioteros. Eles estão
ansiosos pelas armas. Além disso, já me
mandaram isto como pagamento adiantado
— falou Morgan, indo até sua mesa e
apanhando dois sacos de ouro numa gaveta.
Espalhou o conteúdo sobre a mesa. Eram
pepitas de ouro.
— Demônios! Há uma pequena fortuna
aí.
— E há muito mais de onde veio isto,
quando entregar as armas que eles precisam.
— Agora entendo sua pressa. Tem
alguma nova idéia?
— Vamos ser drásticos desta vez. Há um
modo de livrarmos deles, sem despertar
suspeitas nem atrair outros rurais.
— Como?
— Queimando-os com o armazém.
— Você perderá a chance de adquirir um
bom estoque e...
— Ao diabo com o estoque deles. É
ninharia, perto do que posso conseguir com
os coioteros.
— A idéia parece bem prática. Se eles
morrerem lá dentro, será fácil justificar a
morte deles aos rurais e evitar novos
aborrecimentos. Farei um relatório bem
detalho para o quartel dos Guardas Rurais e
estaremos livres do problema.
— Além disso, a presença desses rurais
aqui na cidade pode incomodar a população,
que começará a fazer perguntas indiscretas.
Pretendo dar cabo deles esta noite —
sentenciou Morgan, confiante.
Enquanto isso, no armazém, Johnny
acabava de expor sua idéia ao parceiro. —
Pode dar resultado, Johnny. Nós dois nos
revezaremos, mantendo aquele saloon sob
vigia permanente. Pressionado com está, é
certo que Morgan vai tentar algum ato
desesperado.
— Entendi, parceiro.
‘ Na parte da tarde, Sam estava sentado
diante do armazém, sempre observando a
entrada do saloon, no outro lado da rua.
Percebeu enquanto estava ali, que Morgan
viera até a porta para se despedir de um
mexicano de aparência suspeita.
Os dois pareciam muito amigos.
— Rose, conhece aquele homem que está
com Morgan agora? — indagou ele à
garota, sentada ao lado dele.
— Eu o tenho visto freqüentemente por
aqui, sempre entrando ou saindo do saloon.
— Não sabe de onde ele vem?
— Não, mas ele pode trabalhar em algum
rancho por aí, muito embora, depois dos
ataques dos bandoleiros, poucos mexicanos
tenham ficado por aqui.
— Parecem muito amigos, não?
— Está suspeitando de alguma coisa?
— Não sei, mas pode ser algo importante
— disse Sam, levantando-se e indo ao
encontro de Johnny, no interior do prédio.
— Algum problema?
— Acabo de ver um mexicano
despedindo-se de Morgan. Os dois pareciam
muito chegados.
— Mexicano? viu para onde ele está
indo?
— Está deixando a cidade agora.
— Um mexicano... Acho que não custaria
nada seguí-lo. As coisas estão calmas por
aqui hoje. Rose e Susy poderão cuidar do
armazém.
Momentos mais tarde, ambos cavalgavam
em perseguição ao mexicano. Seguiram-no
até que atravessasse o Rio Bravo, passando
para o lado mexicano.
— Gostaria de saber para onde ele está
indo — comentou Johnny, intrigado.
— Não se lembra da região?
— Vagamente. Acho que há um povoado
nesta direção, mas foi abandonado há
muitos e muitos anos atrás, após uma
epidemia que dizimou a maioria da
população.
— O mexicano parece não ter muita
pressa. Por que você não vai na frente,
evitando-o, e dá uma olhada nesse tal
povoado? Eu continuarei mantendo o nosso
amigo ali sob vigilância.
— Pode ser. Vamos ver o que descubro
— disse Johnny, esporeando seu cavalo e
deixando a trilha, para passar à frente do
mexicano, sem que este o percebesse.
Sam continuou a perseguição, evitando
ser percebido, até que, após algum tempo,
Johnny retornou.
— O que descobriu? — quis saber Sam.
— Diabos, homem! Há um bando de
renegados naquele povoado, todos armados
e prontos para infernizar.
— Coioteros?
— Com toda certeza. Se havia um bando
por aqui e foi expulso pelo Exército, bem
que pode ser esse.
— Que ligação poderia ter Morgan com
eles? Consegue entender isso? — indagou
Sam, intrigado.
— Há alguém que talvez possa nos dar
algumas respostas — sugeriu Johnny,
fazendo um sinal de cabeça na direção do
mexicano.
— Acho que tem razão, parceiro —
concordou Sam e ambos esporearam seus
cavalos, alcançando rapidamente o
mexicano.
Este não demonstrou surpresa. Ao
contrário do que os patrulheiros esperavam,
o mexicano olhou-os com arrogância.
— O que desejam? São homens do
Senhor Morgan? — perguntou, num tom de
voz autoritário, de quem não estava
habituado a receber ordens.
— Descobrirá em breve, meu caro amigo
— respondeu Sam, apontando-lhe uma
arma. — Desça logo desse cavalo para
termos uma conversinha.
O mexicano relutou, a principio, em dar
as respostas que os patrulheiros buscavam,
mantendo-se calado. Sam teve de usar de
toda a sua sutileza e, após quebrar alguns
ossos e dentes, fez o mexicano se dispor a
falar.
— Quais suas ligações com Morgan? —
indagou.
— Temos negócios.
— Que tipo de negócios?
— Armas... Morgan iria nos dar armas
em troca de ouro...
— Então era isso. Morgan pretendia
vender armas aos índios — entendeu Sam,
finalmente.
— Por isso precisava do armazém, para
disfarçar suas atividades ilegais. Poderia
trazê-las de San Antônio, junto com a carga
normal, sem despertar suspeitas. Quando
penso que meu pai foi morto por causa de
um plano sórdido desses, sinto vontade de
matar Morgan com minhas próprias mãos.
— Acalme-se, meu amigo. Tudo será
feito ao seu tempo. Agora temos de resolver
um pequeno problema.
— A que se refere?
— Aquele bando de renegados que você
viu ao povoado. Com certeza esperam
apenas uma chance para voltar a atacar. Já
causaram muitos aborrecimentos. Gostaria
de dar um fim neles.
— Eu sei como fazer isso. Há algumas
milhas, na fronteira, há uma guarnição do
Exército mexicano.
— Bem pensado. Na certa eles têm
contas a ajustar com esses bandoleiros.
— E poderão cuidar deste nosso amigo,
caso precisemos de uma testemunha. Estará
bem guardada e longe do conhecimento de
Morgan.
— Ótima idéia!
Havia anoitecido, quando Steve Morgan
convocou Bob Heston ao seu escritório.
Bob era tido como um pistoleiro rápido e
eficiente, que não precisava pensar muito
para matar um homem pelas costas. Aliás,
sua fama fora feita encima dessa habilidade.
— Tenho um trabalhinho especial para
você está noite — foi dizendo Morgan.
— É a respeito daqueles patrulheiros? Eu
estava ansioso pela oportunidade.
— Vai ter sua chance agora, Bob.
Quantos homens nos restam ainda?
— Oito, Sr. Morgan — informou Bob,
após pensar por instantes.
— Apenas oito?
— Sim, conte comigo: quatro foram
mortos durante...
— Está bem, está bem — exasperou-se
Morgan. — Não precisa me lembrar de
todas as ações que fracassaram. Creio que
você e os oito homens serão suficientes para
o trabalho.
— Qual é o plano?
— Primeiro vocês vão incendiar aquele
maldito armazém.
— Incendiar o armazém? Pensei que...
— Deixe-me terminar e já entenderá.
Preciso resolver o assunto rapidamente,
Bob. A idéia é eliminar os patrulheiros a
qualquer preço. Quanto ao armazém, posso
montar outro com as mercadorias que já
roubei.
— Entendo. E onde entramos nós?
— Durante o incêndio, você e os homens
tratarão de matar os rurais. Após terem feito
isso, jogarão os corpos nas chamas,
entendeu?
— E todos pensarão que eles morreram
tentando salvar alguma coisa de seus bens...
— Exatamente. Agora preste atenção:
quando incendiarem o armazém, empilhem
algumas caixas de munição perto do fogo.
Assim, as explosões abafarão os tiros,
quando os matarem.
— Boa sugestão, Sr. Morgan!
— Reuna o pessoal imediatamente e
comece o espetáculo.
Johnny e Sam haviam acabado de chegar,
para tranqüilidade de Rose, que se mostrava
apreensiva. Estava agora na casa dela. Rose
preparava a refeição, enquanto lhe
contavam o que haviam descoberto.
— Por que não prendem Morgan
imediatamente, já que têm uma boa
testemunha? — indagou ela.
— Temos de ser cautelosos com Morgan.
Uma testemunha mexicana, neste momento,
não teria muito peso em San Juan, não
concorda? Além disso, ele ainda está
cercado de pistoleiros, que farão tudo para
livrá-lo — falou Sam.
— Sim — ajuntou Johnny. — Não
sabemos ainda quantos homens Morgan tem
ao seu lado.
— Acho que estou entendendo o ponto de
vista de vocês dois — falou ela. — A
solução, então, não seria pegá-lo de
surpresa?
— Certo, essa é a idéia, mas, antes de
qualquer ação, precisamos medir a
resistência que vamos encontrar. Além
disso, a cidade vai virar um inferno e muitos
inocentes poderão pagar com a vida
qualquer ato impensado. Preocupo-me
também com você, Rose. Gostaria de saber
que está a salvo, antes de qualquer
providencia — falou Johnny.
— Não tenho medo de Morgan e de sua
turma. Se eu pudesse ajudaria vocês, eu...
— Você nos ajudará muito se ficar em
local seguro, Rose — reforçou Sam.
Naquele momento, Susy chegou. Johnny
recomendou que as duas procurassem ficar
juntas num local seguro, quando eles
saíssem. Com relutância elas acabaram
concordando.
Após termina a refeição, a dupla se
preparou para sair, checando e recarregando
as armas.
— Lembrem-se vocês duas: aconteça o
que acontecer lá fora, só saiam quando tudo
estiver acabado. Vocês prometem? —
insistiu Johnny.
— Está certo, faremos como você nos
pediu —a firmou Rose.
Após se despedirem rapidamente, os dois
saíram.
— Johnny, se tudo isto acabar bem, terei
algo muito importante a lhe pedir. — falou
Sam.
— É sobre Rose?
— Sim, acho que nós nos apaixonamos...
— Eu também sinto o mesmo em relação
a Susy. É algo muito antigo Nunca a
esqueci, ao longo desses dez anos. Sempre
pensei em voltar aqui para buscá-la.
— É, talvez tenha chegado a hora de nós
dois deixarmos esta vida de perigos e
pendurarmos as armas. O futuro não parece
muito promissor para quem, como nós, vive
das armas...
— Creio que não, Sam. Sempre haverá
gente como Morgan e seus pistoleiros,
exigindo a presença de policiais como nós...
— Fogo! Fogo! Fogo! — gritou alguém,
na rua.
Os dois se precipitaram naquela direção.
— Demônios! O armazém está pegando
fogo — gritou Johnny.
— Temos de fazer alguma coisa — falou
Sam.
As pessoas corriam para a rua, dispostas
a ajudar. Uma brigada contra o fogo foi
organizada rapidamente, mas todos se
dispersaram quando as caixas de munição
começarão a explodir.
— A munição está pegando fogo —
gritaram. — Corram!
Um pipocar sinistro se misturou ao
barulho das chamas. Sam e Johnny
procuraram abrigo junto à parede do prédio
ao lado.
— Temos de fazer qualquer coisa —
desesperou-se Johnny.
— Não enquanto aquela munição estiver
explodindo.
— Tem razão. Olhe onde uma das balas
acaba de se encravar — apontou Johnny
para um ponto perto de sua cabeça.
— Isso não veio do armazém, Johnny. A
menos que as balas agora façam curva —
alertou Sam, empurrando o amigo para o
chão.
Outras balas arrancaram lascas da parede.
— Estão atirando em nós — gritou Sam.
— Agora entendo. O fogo foi só um
modo de nos atrair para uma nova
armadilha.
— Diabos! Pode ver algum deles?
— Lá naquele telhado — apontou
Johnny, sacando suas armas em seguida e
abrindo fogo.
Com um grito de dor, um pistoleiro
despencou do telhado. Seu corpo bateu
pesadamente na poeira da rua, onde
estrebuchou.
— Há mais ali — alertou Sam, quando
dois homens saltaram por uma porta,
disparando suas armas.
Johnny sentiu o impacto quente e pesado
em sua perna. Sam teve seu chapéu
arrancado por uma bala. Ambos não se
intimidaram. Suas armas vomitaram
chumbo quente.
Os dois pistoleiros estacaram
repentinamente, como se tivessem trombado
com um muro. Suas armas caíram de suas
mãos e eles tombaram para trás,
fulminados.
— Pode ser mais alguém? — indagou
Sam.
— Caramba, como dói — reclamou
Johnny.
— Está ferido?
— Minha perna...
Sam amarrou seu lenço e improvisou um
torniquete. A munição continuava
explodindo no armazém, só que mais
espaçadamente.
— Gostaria de saber quantos ainda
restam — falou Sam, observando
atentamente ao seu redor.
— Parece que se acalmaram...
— Dê-me cobertura. Vou tentar
atravessar a rua.
— isso pode ser fatal.
— É o único modo de descobrirmos onde
estão os outros.
— Está certo, vá em frente. Eu estou
pronto — disse Johnny, engatilhando seus
Colts.
Sam se levantou e correu velozmente
através da rua, saltando para trás de um
bebedouro de água, no outro lado.
Um homem surgiu de um beco com uma
espingarda. Johnny disparou imediatamente.
O pistoleiro foi jogado contra a parede,
antes de cair.
Novos disparos partiram de uma janela.
Johnny e Sam disparam naquela direção,
mas não tiveram certeza de nada. Sam
percebeu então, a espingarda que caíra das
mãos do pistoleiro morto.
— Johnny, fique atento! — gritou para o
amigo.
— Está certo, deixe comigo!
Sam correu na direção do beco e apanhou
a espingarda, rolando para o lado
rapidamente, para fugir aos disparos em sua
direção.
Balas assobiaram no ar e foram se
encravando na madeira atrás dele.
Do outro lado da Rua, Johnny percebeu
que havia alguém no telhado, acima dele,
mas não podia atingí-lo na posição onde
estava.
— Sam, aqui! -0- gritou ele para o
parceiro, apontando para o alto.
— Já vi — respondeu Sam, apertando um
dos gatilhos da espingarda.
O pistoleiro que estava sobre aquele
telhado desabou como um fardo, após ter
recebido uma carga de chumbo grosso em
pleno peito.
Outros disparos partiram do interior de
uma loja. Sam fez um sinal para Johnny,
apontando uma janela. Sam escondeu-se nas
sombras, depois sumiu pelo beco.
Momentos mais tarde, sua espingarda
disparava novamente.
Um corpo foi arremessado através de
uma janela, indo se estatelar na rua, em
meio aos cacos de vidro.
A munição no armazém havia acabado de
explodir. O fogo, porém, consumia
vorazmente tudo que encontrava pela frente.
Quando só restou o barulho das chamas
crepitando, o povo começou a voltar à rua.
Trataram, então, de apagar o incêndio.
Johnny se levantou, preocupado com a
sorte de Sam. Este, porém, surgiu instantes
depois, ileso.
— Adivinhe o que foi que descobri num
barracão nos fundos daquela loja — falou
Sam.
— Diabos, Sam! Não tenho a menor
idéia...
— Há um estoque de mercadorias lá.
Com certeza é tudo o que foi roubado de
meu pai durante aqueles ataques às
carroças.
— E o que há mais na loja?
— A parte da frente está vazia.
Um rapaz passava por eles. Sam o deteve,
indagando a quem pertencia a loja.
— parece que o Sr. Morgan a comprou.
Ninguém sabe o que ele vai montar ali...
— Morgan pensou em tudo — comentou
Sam, agradecendo o rapaz.
— Acho que temos um caso contra ele
agora — falou Johnny. — É hora de lhe
fazermos uma última visita.
Steve Morgan estava no saloon, bebendo
com o xerife, aguardando informações a
respeito da morte dos patrulheiros. Ouviram
os tiros e a correria das pessoas na rua.
Repentinamente, Bob Heston e um outro
pistoleiro entraram apressadamente, pelos
fundos do saloon.
— Conseguiram? — indagou Morgan.
— Não... Aqueles homens são uns
demônios... — falou Heston, apavorado.
— Demônios! O que vamos fazer agora,
Morgan? — indagou-lhe o xerife.
— O que sugere, xerife? Creio que não
há nada que se possa fazer agora. De
qualquer forma, aqueles dois nada podem
provar contra nós. Vou tentar me organizar
novamente e insistir no golpe. Quero aquele
ouro dos coioteros — falou Morgan, indo
até o balcão e pedindo nova garrafa de seu
uísque especial.
Quando ia retornar, uma bala certeira
arrebentou a garrafa, espalhando estilhaços
por toda parte e surpreendendo-o.
— Que diabos está... — ia protestar ele,
mas calou-se quando seus olhos pousaram
em Sam e Johnny, parados na porta.
A arma de Johnny ainda fumegava.
—Você pagará pela morte de meu pai,
Morgan, e por todos os seus outros crimes.
— Não sei do que está falando, rapaz.
Você não pode provar nada. Xerife, como
permite que esses dois entrem em meu
saloon e me acusem?
— Cale a boca, Morgan. Deixe de
hipocrisia. Sabemos de tudo.
— E daí? O que podem provar contra
nós?
— Conhece Pablo Bermudas?
O rosto de Morgan ficou pálido e suas
mãos tremeram ligeiramente.
— Não sei de quem se trata...
— Pois ele o conhece muito bem — falou
Johnny, com ironia. — contou-nos uma bela
história. Uma história que vai custar seu
pescoço, maldito criminoso. Sem falar
numa certa loja aqui na cidade, com um
misterioso estoque nos fundos...
— Do que estão falando, afinal? —
indagou o xerife, tentando se fazer de
inocente.
— Sabemos também sobre você, seu
vendido — acusou-o Sam. — Desde o
principio deu proteção aos crimes desse
bastardo aí.
Morgan e o xerife se entreolharam. Bob
Heston e Hank perceberam que teriam que
lutar por suas vidas.
— Somos quatro contra os dois — falou
Heston.
— Acha que isso é o bastante para nos
derrotar? — ironizou Sam.
— Saiba que eu nunca fui vencido antes
num duelo — disse Heston, com arrogância.
— Então sua hora pode estar chegando,
pistoleiro. Saque quando achar que está
pronto — desafiou-o Johnny, guardando sua
arma no coldre.
Morgan percebeu que,
momentaneamente, as atenções de Sam e
Johnny se voltaram para Bob Heston,
dando-lhe a chance de tentar algo, ainda que
desesperado.
Num salto felino, jogou-se na direção da
porta de seu escritório, tentando procurar
abrigo ali ou escapar pelos fundos do
saloon.
Uma bala disparada pela arma de Johnny,
no entanto, colheu-o em pleno ar, jogando
seu corpo contra o batente da porta. Ele caiu
pesadamente no assoalho, o corpo
estremecendo.
O xerife e os outros sacaram suas armas
com rapidez ao perceberem que não teriam
nenhuma outra oportunidade de tentar lutar
por suas vidas.
Bob ainda conseguiu disparar um tiro.
Sua bala roçou a cabeça de Sam,
desequilibrando-o. Em sua queda, Sam
disparou seus Colts com precisão, apesar de
tudo.
Bob rodopiou espetacularmente, caindo
sobre uma das mesas e tombando-a sobre o
próprio corpo. Johnny disparou
simultaneamente contra o xerife e Hank.
Os dois facínoras mal haviam conseguido
tocar as coronhas de suas armas. Com os
olhos esbugalhados eles recusaram, ante ao
impacto do projétil, atingindo-os no peito.
— Maldito! — gemeu o xerife, caindo de
joelhos, olhando para seu matador.
Hank tombou para trás, imóvel. Johnny
aproximou-se do xerife, que ainda tentou
puxar seu revólver. O rapaz ergueu seu Colt
e disparou novamente, desta vez entre os
olhos do homem da lei.
O corpo dele tombou para trás, numa
poça de sangue, estrebuchando, antes de
imobilizar-se.
— Parece que não teremos um
julgamento em San Juan — falou Sam.
— Sim, teria sido divertido ver esses
vermes balançando na ponta de uma corda.
De qualquer forma, a cidade está livre dessa
escória.
— Vamos ver o que sobrou do armazém.
Ainda bem que encontramos aquele estoque
roubado...
Os dois amigos iam se afastar, voltando
as costas para os cadáveres. Steve Morgan,
que não fora ferido mortalmente, apanhara
uma espingarda no escritório e saía à porta,
apoiando-se à parede.
Os estalidos secos dos gatilhos sendo
armados mal foram percebidos por Johnny e
Sam. Com as mão manchadas de sangue e a
visão turvada pela dor do ferimento,
Morgan apontou a arma para os dois
patrulheiros.
— Sam! — gritou Johnny, percebendo o
perigo pelo reflexo na janela.
— Diabos! — gritou em resposta Sam,
enquanto ambos se atiravam para o lado.
A devastadora carga de chumbo
arrebentou tudo a sua passagem, deixando
um roubo na parede, perto da porta de saída.
As armas de Johnny e Sam dispararam ao
mesmo tempo, repetidas vezes. O corpo de
Morgan foi jogado contra a parede onde
ficou por instantes, sustentado pelos
impactos. Quando a fuzilaria terminou, ele
tombou para frente pesadamente.
Os dois amigos se levantaram.
— Esta foi por pouco — comentou Sam.
— Vamos embora! As garotas devem
estar preocupados conosco — respondeu
Johnny, guardando as armas ainda
fumegantes.
Covil de Facínoras
A cidade de Quemados, a Oeste de San
Antonio, entre Eagle Pass e Del Rio era um
povoado tranqüilo, com ranchos de gado
espalhados ao seu redor.
Próxima de Jiménez, no México, tinha o
Rio Grande separando-as, num ponto onde
sua profundidade facilitava o trânsito de
carroças e animais para o outro lado.
Por esse motivo, bandoleiros e fugitivos
de todo o Estado e dos Estados vizinhos
passavam por Quemados, quando buscavam
exílio e proteção no país vizinho, fugindo a
perseguições ou quando cometiam seus
crimes.
A lei, infelizmente, não dispunha de
homens suficientes para patrulhar toda a
fronteira com o México.
Isso vinha se constituindo num dos
principais problemas para o Estado, que se
tornava presa fácil de renegados e
bandoleiros que atravessavam o Rio Grande
para roubar no lado americano.
Com a criação da Patrulha do Texas, esta
tarefa se tornou mais fácil.
No entanto, principalmente nos anos
posteriores à Guerra da Secessão, que
espalhou desesperados por todo o país, esta
se tornou uma missão inglória.
Se não bastasse todas as facilidades que
os malfeitores tinham para atravessar a
fronteira, homens sem escrúpulos viram
naquilo uma forma de ganhar dinheiro
desonestamente.
Assim, algumas cidades se
transformaram em paraísos para os
malfeitores, transformando-se em autênticos
covis de bandidos da pior espécie,
protegidos à sombra da lei.
Isso exigiu um trabalho insano da
Patrulha do Texas, com seus homens se
empenhando ao máximo para erradicar de
uma vez por todas essa verdadeira praga
que ameaçava assolar o Oeste.
Em Quemados, como em outras cidades
da fronteira, homens ambiciosos se
associaram para fazer da a cidade num covil
desses.
O Xerife Ives Lang entrou no Saloon
Rose Star e examinou os presentes.
Distinguiu Irah Wilkinson numa das mesas
ao fundo, conversando com Duff Allister.
Aproximou-se deles.
— Soube que queria falar comigo, Irah
— disse ele.
— Sim, sente-se.
— É importante?
— Pode acreditar que sim, xerife. Sei que
é um homem ocupado, não o incomodaria
por nada...
O xerife hesitou por instantes, olhando ao
seu redor. Irah insistiu amigavelmente. Ele
se sentou, então, sem maiores cerimônias.
Duff Allister empurrou um copo sobre a
mesa e encheu-o de uísque.
— Beba, é por minha conta — disse.
Duff era dono do saloon e amigo
inseparável de Irah.
— Pois bem, o que desejava? —
perguntou Ives.
— Há muito eu e Duff estamos pensando
num negócio muito rendoso para todos
nos...
— E onde eu entro nisso?
— Calma, Ives, eu chego lá. Para realizar
nosso intento, precisamos de sua
colaboração.
— Que tipo de colaboração?
— Fechar os olhos a determinadas
pessoas que passarão a freqüentar a nossa
cidade.
— E o que ganharei com isso?
— Será nosso sócio... O lucro é ilimitado.
Ives se remexeu na cadeira,
demonstrando interesse.
— Está bem, dê-me os detalhes.
— A todo momento sabemos de homens
que vão se refugiar no México, após algum
golpe rendoso. Resumindo a coisa, esses
homens não precisariam ir para o México.
Poderiam ficar aqui mesmo, em Quemados,
gastando o dinheiro no saloon do Duff e
pagando uma espécie de taxa de
hospedagem à cidade, representada, no
caso, por nós três
— Está sugerindo que tornemos esta uma
cidade aberta?
— Sim, claro. Temos o que oferecer.
Além de estarmos isolados pelo deserto,
temos, em último caso, a fronteira com o
México. Caso os Patrulheiros do Texas
resolvam fazer uma batida, podemos
mandar os homens cruzar o rio e esperar no
México até as coisas se acalmarem.
Teremos lá um local para abrigá-los e onde
continuarão gastando o seu dinheiro, em
nosso benefício.
— É uma idéia interessante, mas
arriscada... — ponderou o xerife.
— Eu não disse que seria fácil. Disse que
seria rendoso para todos nós. E muito
rendoso, diga-se de passagem.
— Está bem, mas precisaríamos de um
disfarce para esses homens, um local onde
hospedá-los, coisas desse tipo — lembrou o
xerife.
— Já pensamos nisso tudo. Eles se
passarão por vaqueiros...
— Vaqueiros? E em que rancho eles
ficariam?
— É aí que temos um pequeno problema
que precisamos resolver logo — contou
Irah.
— Como assim? — quis saber o homem
da lei.
— Duff, mostre-lhe o mapa — ordenou
Irah.
O dono do saloon retirou um papel do
bolso de seu casaco e o estendeu sobre a
mesa.
— Concluímos que o ideal seriam estas
terras — indicou Duff, pondo o dedo
indicador no mapa.
— Sim, parecem boas... Ficam próximas
da fronteira, o que favoreceria a fuga dos
homens para o México, em caso de algum
problema — ponderou o xerife.
— Pois foi por isso que as escolhemos —
falou Irah.
— Só que essas terras pertencem aos
ranchos de Noah Murray e Bob Mathew.
Como esperam conseguir aquelas terras?
Aqueles dois jamais as venderão.
— Talvez pudéssemos convencê-los a
isso — disse Irah.
— Só se for pela força...
— Se esta for a única solução, nós a
usaremos. Aí você entra com sua parte,
dando-nos cobertura.
— Mas esperem aí, as coisas não podem
ser feitas assim. A cidade me pressionaria,
exigindo providências.
— Precisamos apenas pressionar um
pouco aqueles dois, para começar. Talvez
resolvam vender logo os ranchos,
poupando-nos aborrecimentos — falou Irah.
— Não sei... Aqueles dois não são fáceis
assim — comentou Ives, esfregado a mão
no queixo barbado.
— Iremos por etapas. Primeiro falaremos
com eles. Se não concordarem com a venda
pura e simplesmente, decidiremos o que
fazer em seguida — disse Irah. Sei apenas
que não podemos deixar passar a
oportunidade de ganhar um rio de dinheiro
com esta idéia. Dois cabeças-duras não
serão obstáculos — afirmou Duff.
— Além disso, nós temos também outros
planos — adiantou Irah.
— Que tipo de planos?
— O México é um barril de pólvora,
sempre intranqüilo e prestes a explodir.
Soubemos que há uma revolução em
andamento. Poderíamos fazer uma fortuna
contrabandeando armas.
— Fala sério?
— Sim, não pode imaginar o dinheiro
que circula nesse negócio. É muito mais do
que podemos imaginar.
— E então, Ives, o que decide? — quis
saber Irah. — Sem sua ajuda, nada
poderemos fazer.
— Preciso pensar...
— Não há tempo. Cada minuto que
perdemos pensando significa muito dinheiro
que poderia estar entrando em nossos bolsos
— insistiu Irah.
— Eu continuou achando que é muito
arriscado...
— Não temos nada a temer — explicou
Irah. — Depois que tudo estiver em
andamento, estaremos cercados por
pistoleiros de verdade, homens que estarão
prontos para lutar ao nosso lado, caso
alguma coisa ameace nossos planos e a
tranqüilidade deles.
— Isso sem falar nas garotas que
contratarei para o saloon. Afinal, não vai ser
fácil divertir um pessoal como esse que
esperamos trazer para cá. Você poderia ficar
com a melhor — ofereceu Duff, sabendo
que Ives era um mulherengo de primeira e
que apreciaria a idéia.
Os olhos do xerife brilharam de interesse.
— É um plano grandioso... — murmurou.
— Sim, Ives. É a chance de nossas vidas.
Em poucos meses estaremos ricos. Não há
razão para hesitar.
O xerife olhou para os dois homens,
depois para algumas garotas que
conversavam junto ao balcão.
— Promete que poderei escolher a garota
que me interessar? — indagou a Duff.
— Até duas, se quiser — riu o dono do
saloon.
— Está bem, estamos combinados então
— concordou, afinal, estendendo a mão.
Um dos homens do saloon que estivera à
porta o tempo todo se aproximou da mesa.
— Ei, Duff! Noah Murray acaba de
chegar.
— Tem certeza?
— Sim, ele acaba de parar diante do
armazém.
— Está bem, obrigado, Tom — disse
Duff Allister, dispensando-o com um aceno
de mão.
— Vão falar com ele? — quis saber Ives.
— Sim, começaremos a pôr tudo em
prática a partir de agora. Você vem
conosco?
— Por que não?
Os três homens se levantaram e deixaram
o saloon. Cruzaram a rua. Noah Murray, um
texano alto e forte, com seu chapéu de abas
largas, estava descendo de sua carroça.
— Olá, Noah! — cumprimentou-o Duff.
O rancheiro olhou-o com desprezo, pois
não o tolerava.
— Deseja alguma coisa, Duff?
— Sim, tenho uma proposta a lhe fazer...
— Que proposta?
— Quanto quer pelo seu rancho?
— Meu rancho não está a venda.
— Talvez mude de idéia, quando souber
de nossa oferta...
— Não estou interessado — disse Noah,
virando-lhes as costas e caminhando para o
armazém.
— Espere um pouco, Noah — pediu Ives.
— Por que não fica e ouve a proposta?
— Já lhe disse, Mar, meu rancho não está
à venda.
— É sua última palavra?
— Sim, e não se fala mais nisso —
finalizou o rancheiro, entrando no armazém.
Os três homens se entreolharam.
— Eu disse que não seria fácil — falou
Ives.
— É agora que você entra, Ives — disse
Irah.
— Eu? Como assim?
— Eu a Duff já havíamos pensado na
hipótese dele resistir. Há um meio de
pressioná-lo.
— Como?
— O plano é o seguinte... — disse Irah,
dando discretamente os detalhes para o
homem da lei.
Ao final, Ives o olhou espantado.
— Eu não posso fazer isso... Não é
legal...
— E quem disse que as coisas deveriam
ser feitas legalmente? Você representa a
justiça e a lei por aqui. Suas ordens deverão
ser cumpridas.
— Isso mesmo, Ives. Vá lá e faça como
Irah lhe disse. Agindo assim, aparentemente
estará apenas tentando proteger os
interesses da cidade — insistiu Duff.
— Pense na fortuna que vamos fazer —
insinuou Irah, sabendo ser convincente.
Ives esfregou a mão no queixo, depois
verificou se sua arma saía facilmente do
coldre.
Sabia que encontraria barulho ao fazer o
que Irah determinara. Sua ambição, porém,
impulsionava-o.
— Certo, deixem comigo, então.
Entrou decididamente no armazém. Noah
Murray estava sendo atendido pelo velho
Clark, dono do estabelecimento.
— Olá, xerife! — cumprimentou-o
rapidamente o velho. — Já o atendo.
— Espere um pouco, Clark. Ainda vende
a crédito para Noah Murray?
— Sim, sempre fiz isso — respondeu o
velho, surpreso.
— O que há, Ives? Qual é o motivo dessa
pergunta idiota? — indagou Noah, pondo-se
na defensiva.
— Não estou falando com você, Noah —
respondeu-lhe rispidamente o xerife.
— Mas falou de mim num tom de voz
que não me agradou.
— Fique fora disso, homem!
— Quer me explicar o que está havendo,
Ives? — indagou Clark.
— De agora em diante você não venderá
mais a crédito para Noah Murray.
O velho ficou surpreso e indagou:
— E por que não deveria fazê-lo? Noah
sempre me pagou direito...
— Não estamos discutindo isso. Soube
que Noah Murray pretende dar o fora da
cidade. Assim, estou apenas evitando que
você tenha maiores prejuízos...
— Espere aí, Ives. Quem lhe contou essa
história fantástica? — protestou Noah,
pondo a mão no ombro do xerife.
Ives deu-lhe um safanão, fazendo-o
perder o equilíbrio.
— Se tentar me agredir de novo, eu o
mato, Noah — ameaçou.
— Mas eu não estava... — ia se
defendendo o rancheiro.
— Cale-se! — gritou-lhe Ives.
O rancheiro ficou estupefato, sem
entender a razão de tudo aquilo.
— Tem certeza do que está falando, Ives?
— indagou Clark.
— Sim, certeza absoluta. Soube de fonte
segura. Noah lhe deve muito?
— Bem, sim... Deve-me todo o
fornecimento do inverno. Mais ou menos
uns trezentos dólares...
— Então é bom tentar encontrar uma
forma de receber isso, Clark, o mais
depressa possível ou ficará com o prejuízo
— alertou o homem da lei.
— Espere um pouco, Ives! O que está
dizendo é uma infâmia — falou o rancheiro,
avançando para o xerife.
— Nem mais um passo ou atirarei em
você, Noah. Agora apanhe sua carroça e dê
o fora daqui. Ninguém na cidade lhe dará
mais crédito agora.
— Você sabe que isso vai ser meu fim.
Só vou começar a reunir meu gado daqui a
um mês...
— Problema seu. Enquanto não pagar o
que deve, está impedido de entrar na cidade.
— Mas é um absurdo!
— Entenda como quiser, mas faça o que
estou lhe ordenando.
— Com isso não conseguirei ninguém
para trabalhar para mim... Meu gado está
espalhado nos pastos... É só vendê-lo e terei
dinheiro...
— Dê o fora, Noah!
O rancheiro engoliu seco, depois se virou
e saiu. Lá fora, junto à carroça, Irah e Duff
o aguardavam, olhando-o com ar de
zombaria.
— Parece que está tendo problemas,
Noah — observou Irah, sorrindo de modo
sarcástico.
— Talvez agora possa considerar aquela
nossa proposta — acrescentou Duff.
Noah olhou-os com surpresa, depois
começou a rir, começando a entender toda
aquela encenação feita pelo xerife.
— Então é isso! Não sei por que diabos
vocês querem meu rancho, mas não vão
forçar-me a vendê-lo desse modo.
— Use a cabeça, Noah, e poupe
aborrecimentos para todos nós — disse Irah.
— Quanto quer pelo rancho? — indagou
Duff.
— O dinheiro de vocês não me interessa.
Só os aviso que encontrarão muito barulho
se insistirem nessa idéia maluca... — falou
o rancheiro, já aborrecido com tudo aquilo,
fazendo menção de subir na carroça e
afastar-se dali o mais depressa possível.
Percebia claramente que havia alguma
sujeira sendo preparada contra ele, embora
não soubesse definir exatamente o que era e
qual o motivo de tudo aquilo.
Ives os olhava e ouvia, parado à porta do
armazém. Ciente disso, Irah tratou de
provocar Noah, falando ao xerife.
— Viu só, xerife? Noah acaba de nos
ameaçar.
— Não estou ameaçando ninguém —
defendeu-se Noah. — Mas não posso deixar
de reconhecer que me daria muita satisfação
encher as barrigas de dois trapaceiros como
vocês de chumbo.
— Cuidado com o que diz, Noah —
alertou-o Ives.
— Quanto a você, Ives, estou surpreso
que tenha se envolvido com tipos tão
desprezíveis e covardes como esses dois —
falou Noah, corajosamente.
— Ninguém fala assim comigo — disse
Irah, tentando sacar sua arma.
Noah foi mais rápido, apanhando o
chicote da carroça e desarmando.
Duff tentou fazer o mesmo e ganhou um
vergão enorme nas costas de sua mão,
sendo chicoteado da mesma forma que fora
seu parceiro.
Ives, porém, sacou sua arma e disparou,
varando o ombro do rancheiro. O chicote
caiu no chão, aos pés de Noah, manchando-
se
do sangue que escorria do ferimento.
— Maldito seja, Ives! — praguejou
Noah, avançando para ele com um ódio
mortal.
Seu ferimento, porém, tirou-lhe a
mobilidade. Ives se esquivou do primeiro
soco desferido por Noah, retribuindo com
uma violenta coronhada na cabeça do
rancheiro.
— Miseráveis! — vociferou Noah,
aturdido, caindo de joelhos diante do
homem da lei.
Duff, cego pela dor produzida pela
chicotada em sua mão, avançou pelas costas
dele e chutou-lhe a cabeça.
Irah se uniu a ele e ambos golpearam
impiedosamente o corpo do pobre homem.
— Agora chega, rapazes — falou Ives.
— Mais um pouco e todos os nossos
problemas estarão resolvidos — disse Irah,
furioso ainda.
— Já há muita gente olhando, não
convém arriscar — ponderou o xerife.
Irah pareceu retornar à consciência,
olhando ao seu redor. Diversas pessoas
presenciavam a cena, sem saber o que
acontecia realmente.
Ives se encarregou de contar-lhes sua
versão dos fatos, dispersando-os em
seguida.
— Nunca confiei realmente nesse Noah
Murray — falou um cidadão.
— Sempre me pareceu desonesto —
acrescentou outro, com desprezo na voz.
— Talvez a surra o ensine a negociar
honestamente agora — acrescentou um
outro.
Irah e Duff acompanharam isso tudo com
satisfação, pois demonstrava que ninguém
suspeitava que tudo aquilo não passara de
uma armação contra Murray.
Noah Murray estava caído e coberto de
sangue e poeira. Respirava fracamente.
— A cidade já está do nosso lado, Ives.
Entende agora o que eu queria lhe dizer? —
observou Irah, sorrindo de satisfação.
— Sim, mas o que faremos com Noah
Murray agora? — quis saber Ives.
— Vamos deixá-lo aí como exemplo —
sugeriu Irah.
— Ele pode morrer nesse estado —
alertou Ives.
— E daí? Seria o ideal para nós.
— Não, não podemos agir assim. Temos
de ser discretos — disse o xerife. — Como
representante da lei, tenho de agir com
coerência. Levarei Noah ao médico e depois
o prenderei. Assim ninguém nos acusará de
nada posteriormente.
— Está bem, Ives. Faça como quiser.
Depois iremos fazer-lhe uma visitinha na
delegacia. Lá estaremos tranqüilos e à
vontade para convencer Noah Murray a
vender seu rancho.
— E quanto a Bob Mathew?
— Poderemos ir até o rancho dele ou
esperar que ele venha à cidade — sugeriu
Irah.
— Não podemos esperar muito tempo —
lembrou Duff. — Quanto antes terminarmos
esses detalhes, mais cedo poderemos
começar a agir.
— Duff tem razão, Irah — concluiu Ives.
— Talvez devêssemos mandar chamá-lo à
cidade.
— Sim, não deixa de ser uma boa idéia
— concordou Irah.
— Podemos mandar alguém do saloon —
lembrou o xerife.
— Sim, Tom pode fazer isso — propôs
Duff.
— Acha que ele virá ainda hoje? —
indagou Ives.
— Viria se você o intimasse — falou
Irah.
— Sob que pretexto?
— O mesmo que usamos contra Noah
Murray. Bob, assim como todos os outros
rancheiros, também deve dinheiro no
armazém e nas lojas da cidade —
argumentou Irah.
— Está bem, mas primeiro
conversaremos pacificamente com ele,
como tentamos com Noah Murray. Se ele
não aceitar, pensaremos em outras medidas
— decidiu Ives.
Assim que o xerife se afastou, arrastando
o corpo ensangüentado de Noah Murray,
Irah e Duff rumaram para o saloon.
— Ives não me parece muito seguro do
que faz — comentou Irah, assim que se
acomodaram numa das mesas.
— Ele é um dos nossos, fará tudo
conforme lhe ordenarmos, pode estar certo
disso.
— E quanto à idéia de chamar Bob
Mathew à cidade? Não acho que seja
interessante. Poderíamos resolver isso de
um modo mais rápido.
— Sim, mas agindo como Ives
recomendou, teremos a cidade do nosso
lado e não despertaremos suspeitas. Bob
teve problemas com seu gado durante o
inverno, é quase certo que não venderá o
resto da manada por um bom preço. Soube
que ele tem uma hipoteca no banco. Se
todos os seus credores o pressionarem, ele
venderá.
— Sendo assim, vamos mandar Tom à
delegacia para receber instruções — falou
Duff, fazendo um sinal para que Tom se
aproximasse.
Este se apresentou imediatamente.
— Vá até a delegacia e fale com o xerife
Lang. Ele tem algo que precisa ser feito
imediatamente.
— Certo, patrão — respondeu o
pistoleiro, saindo rapidamente.
Duff fez um sinal para o barman e este
levou uma garrafa de uísque e dois copos.
— Quando mandaremos um emissário
avisar os homens que estão refugiados no
México?
— Creio que poderemos fazer isso agora
mesmo — respondeu Irah. — Se tudo correr
bem e do modo como estamos planejando,
logo teremos os ranchos à nossa disposição.
— Sim e esta será a parte mais fácil do
trabalho. Uma vez que a notícia se espalhe,
os fugitivos virão diretamente para cá, no
futuro.
— E quanto às armas?
— Oh, sim, precisava falar-lhe sobre isso.
Recebi notícias de que o arsenal do
Exército, em Houston, foi roubado.
Sumiram duzentos fuzis Enfield e vinte mil
cartuchos.
— Isso quer dizer que nossos rapazes
estão trabalhando direitinho — sorriu Duff.
— Sim, mas o melhor está para vir. Há
um trem que deverá chegar a Houston
amanhã, com um carregamento dez vezes
maior do que isso.
— Mas deverá estar muito vigiado, não?
— Contratei um bom homem para esse
tipo de serviço. Garanto que ele não vai nos
decepcionar. Lembra-se de Texas Charly?
— Sim, você o contratou?
— Como vê, não perdi tempo em minha
última viagem.
Continuaram conversando e bebendo, até
que Tom retornou do rancho de Bob
Mathew, informando que o rancheiro estava
a caminho da cidade.
— Vamos esperá-lo na delegacia? —
propôs Irah.
— Sim, aproveitaremos para ver como
está Noah Murray. Ele não pode morrer
antes de assinar um recibo de venda,
embora isso não faça muita diferença para
nós. De uma forma ou de outra poremos as
mãos na propriedade mesmo.
Rumaram, então, para a delegacia.
Quando entraram, Ives os encarou,
apreensivo.
— Eu ia sair à procura de vocês — disse
ele.
— Algum problema?
— Sim, Noah Murray acaba de morrer.
— Diabos! Isso não podia acontecer —
vociferou Duff, caminhando nervosamente
pelo aposento.
— Como faremos agora? Aposto como a
filha dele nos criará uma porção de
encrencas?
— Deixe-me pensar, Irah. Estaremos em
maus lençóis, quando a cidade tomar
conhecimento disso. Forçosamente seremos
acusados, de alguma forma, e temos de
evitar isso.
— Sim, isso mesmo. Mas como vamos
nos livrar dessa? — indagou Irah.
Ives Lang, então, acomodou-se em sua
escrivaninha, olhando seus amigos. Havia
um sorriso calmo e misterioso em seus
lábios.
— O que há com você, Ives? Não
entende a gravidade da situação? —
indagou Duff, irritado.
— Vocês me decepcionam — falou Ives.
— Em que está pensando? — quis saber
Irah, intrigado com tudo aquilo.
— Ninguém ficará sabendo que a morte
dele se trata na verdade de um homicídio.
Eu cuidarei de tudo.
— E como pretende fazer isso? —
indagou Duff.
— Estive falando com o doutor, enquanto
ele medicava Noah. Ele comentou que Noah
vinha tendo problemas com o coração.
Sabem o que isso quer dizer?
— Sim, estou entendendo agora — falou
Irah, com um sorriso.
— Basta que o médico confirme isso e
tudo ficará resolvido para nós.
— Acha que pode convencer o médico a
fazer isso?
— Não se preocupe, eu e ele somos
velhos amigos. Tudo ficará arranjado.
— Isso resolve um dos problemas, mas
nos deixa na mesma situação de antes. Não
será fácil lidar com a filha de Murray. Eu a
conheço. Ela tem um gênio explosivo —
falou Duff.
— Quando se fizer um levantamento das
dívidas de Noah Murray, a garota vai se
apavorar. Não terá como conseguir dinheiro
de imediato — lembrou Irah.
— Sim, você está certo — concordou
Duff. — Mas se não funcionar, teremos que
usar a força.
— Cuidado com isso. Não podemos fazer
nada errado neste início — alertou Ives. —
Apenas um pouco de pressão e tudo se
resolverá. Posso apressar o processo de
cobrança contra a garota. Se ela não puder
pagar, tomaremos o rancho e o levaremos a
leilão. Com a ajuda do juiz, será fácil
comprá-lo por uma bagatela.
— Sim e o mesmo poderá ser feito com
Bob Mathew — lembrou Irah.
— Mas aí teremos que ter o juiz também
do nosso lado — lembrou Duff.
— O que não é muito difícil. Um bom
barril de uísque é tudo que ele precisa para
aceitar qualquer proposta nossa.
— Se é assim, posso mandar isso hoje
mesmo para a casa dele.
— Sim, faça isso, Duff.
— Ótimo, Ives! Você cuida desses
detalhes e nós vamos tratar dos outros
assuntos — finalizou Irah.
Becky estava sentada no alpendre da
casa, preocupada.
— Maria, tem certeza que meu pai saiu
cedo mesmo para ir à cidade? — indagou
ela à cozinheira.
— Sim, ele ia comprar mantimentos e ver
se selecionava alguns vaqueiros para
começar a recolher o gado.
— Já deveria ter voltado, não?
— Penso que sim, o Señor Murray nunca
se atrasa.
— Está bem, talvez tenha parado para
descansar... — disse a garota, embora
intimamente continuasse preocupada.
Sabia que seu pai havia ido ao médico e
este lhe dissera que ele tinha problemas com
o coração.
Se não estivesse cavalgando quando ele
saiu, teria ido com ele e não precisaria
passar por aquela aflição agora.
Esperou mais um pouco. Como ele não
chegava, ela resolveu ir até à cidade,
verificar o que havia acontecido.
Vestiu roupas de montaria, depois foi
selar seu cavalo. Quando saía do estábulo,
viu a carroça que se aproximava ao longe.
Estranhou que ela rebocasse um cavalo.
Não reconheceu o homem que vinha na
boléia.
— Papai! — murmurou ela. — Oh, não!
— acrescentou, certa agora da tragédia.
Galopou desesperadamente ao encontro
da carroça. Era Loomis, um ajudante do
xerife quem a conduzia.
Quando freou seu animal ao lado, viu o
caixão lá dentro e desesperou-se.
— Oh, Deus, Loomis! O que aconteceu
com meu pai?
— Ele está morto, Becky. Eu sinto
muito...
— Como aconteceu isso, meu Deus! —
murmurou ela, saltando do cavalo para a
carroça e tentando abrir a tampa.
— Eu não faria isso, Becky.
— Por que não? — surpreendeu-se ela.
— O médico fez o possível, mas o rosto
dele está muito machucado...
— Machucado? — espantou-se ela.
— Sim, machucado.
— Como assim? Ele caiu da carroça...
— Não, ele se meteu numa briga lá na
cidade.
— Briga, Loomis? Está falando de meu
pai, Noah Murray, dizendo que ele se meteu
numa briga?
— É isso mesmo. Eu não sei mais o que
lhe dizer. Se for à cidade o xerife lhe
explicará tudo.
Ela pensou por instantes, terrivelmente
confusa. Não sabia exatamente o que fazer,
mas o fato estava ali, diante dela. Seu pai
estava morto. Nada havia que ela pudesse
fazer.
— Faça-me um favor, Loomis! Não
temos nenhum vaqueiro ainda no rancho. Só
estamos eu e Maria, a cozinheira. Pode
cavar uma sepultura e enterrar meu pai?
— Posso, mas o que você pretende fazer?
— Vou descobrir o que houve — falou
ela, decidida.
Estava se esforçando ao máximo para não
se desesperar, embora lágrimas escorressem
pelo seu rosto.
Ela saltou de volta para o seu cavalo e
retornou ao rancho. Foi até um armário e
retirou dali um Colt. Verificou a munição,
prendeu-o no cinto e disparou para a cidade.
Quando chegou, o xerife estava entrando
no saloon.
— Espere, xerife! — deteve-o ela.
O homem da lei viu logo a pistola que ela
trazia presa ao cinto e imaginou que a
garota procurava encrenca.
Talvez isso, longe de ser um problema,
pudesse se transformar na solução definitiva
dos problemas dele e dos sócios em relação
ao rancho.
— O que quer, Becky?
— O que houve com meu pai?
— Eu sinto muito, Becky. Ele se meteu
numa briga...
— Mentira! Meu pai nunca foi de
brigar...
— Pois perdeu a calma desta vez, Becky.
Estava devendo no armazém e foi cobrado...
— Cobrado? Como assim?
— Alguém comentou que ele estava se
preparando para dar o fora da cidade e...
— Espere um pouco, xerife! Do que está
falando, afinal? — indagou ela, totalmente
confusa.
— Acho melhor se acalmar — pediu ele.
Naquele momento, Irah e Duff surgiram
atrás do xerife.
— Algum problema, xerife?
— Não, tudo sob controle.
— Quem surrou meu pai?
— Nós — respondeu Irah. — Veja —
acrescentou, mostrando o vergão causado
pela chicotada.
— Se meu pai lhe fez isso, você deve ter
feito por merecer...
— Becky, aceite o meu conselho: vá
embora, enterre seu pai e acalme-se.
Quando estiver melhor, volte e
conversaremos — finalizou o xerife, dando-
lhe as costas e entrando.
Becky Murray olhava com desconfiança
para o homem sentado a sua frente, na
diligência que se dirigia para Quemados. As
abas largas do chapéu impediam-na de ver o
rosto dele, onde se destacava uma barba
cerrada.
Desde que fora obrigada a deixar o
rancho de seu pai, a garota andava em
sobressaltos.
Tinha, no entanto, coragem o bastante
para retornar à cidade, após haver feito uma
visita ao Quartel General dos Patrulheiros
do Texas, em Houston.
A diligência deu um solavanco. Sua bolsa
caiu do assento. O homem a sua frente se
antecipou, apanhando-a.
— Obrigada! — agradeceu ela, na
defensiva.
— Por nada — respondeu o homem,
levantando a cabeça.
Apesar da barba espessa e escura, o
desconhecido tinha algo de simpático e
bondoso no rosto.
— Parece assustada, dona — observou
ele.
— Eu? Por que diz isso?
— A maneira como olha para os lados e
para as pessoas... Parece um animalzinho
acuado — disse ele, com certa doçura.
— Desculpe-me — pediu ela.
— Tudo bem. Mas deve reconhecer que
está mesmo assustada ou tensa com alguma
coisa.
— Você tem toda razão. Tenho andado
mesmo com os nervos à flor da pele.
— Algum problema sério?
— Sim, muitos. Primeiro mataram meu
pai, depois tomaram o nosso rancho.
Finalmente, os Patrulheiros do Texas dizem
que nada podem fazer porque tudo que
aconteceu foi legal. Pode entender uma
coisa dessas?
— E foi legal?
— Aparentemente.
— Não quer me explicar melhor? Temos
tempo mesmo...
— Não há muito o que contar. Eu só sei
que foi um plano muito bem tramado. Só
não posso entender porque fizeram isso.
Não há uma razão lógica...
— Onde aconteceu tudo isso?
— Em Quemados.
O desconhecido pareceu ficar ainda mais
interessado ao ouvir o nome da cidade.
— Meu nome é Kit Bacley. Se houver
algo que eu possa fazer por você...
— Já não há mais o que fazer, Kit.
— Se é assim, por que está indo para lá?
— Porque desejo descobrir o que há por
trás de tudo isso. Quero saber por que o
rancho de meu pai era tão importante. Sei
que foi a leilão para pagamento das dívida.
Deve ter me sobrado alguma coisa, pois as
dívidas eram mínimas, comparadas ao valor
do rancho.
— Recebeu alguma ameaça depois disso?
— Sim, muitas, não abertamente, mas
veladas.
— De alguém em especial?
— Dos asquerosos que causaram a morte
de meu pai.
— E quem são eles?
— Irah Wilkinson e Duff Allister.
— E como eles causaram a morte de seu
pai?
A garota narrou todo o acontecido.
Depois ficou intrigada com tantas
perguntas. O forasteiro estava
demonstrando um interesse incomum pela
história.
Becky resolveu, então, calar-se, já que
podia estar dizendo coisas à pessoa errada.
— Vamos demorar muito para chegar a
Quemados? — indagou o estranho, algum
tempo depois.
— Não muito agora. Umas duas ou três
horas — informou ela, olhando pela janela.
— Esteve muito tempo fora?
— Um mês apenas.
Kit balançou a cabeça enigmaticamente,
calando-se também até o final da viagem.
Quando chegaram à cidade, ele a ajudou
descer e se despediu com delicadeza e
educação.
Becky dirigiu-se imediatamente à
delegacia. Ao vê-lo, o Xerife Ives Lang
empalideceu.
— O que veio fazer aqui? — indagou ele.
— Buscar o que é meu. Nada consegui
com os Patrulheiros do Texas, mas sei que
meu pai foi covardemente assassinado.
— Foi perda de tempo mesmo, Becky. Eu
mandei um relatório detalhado para lá. Eu
sabia desde o princípio que sua viagem seria
inútil.
— Agora eu sei disso. A quem eu devo
procurar para receber o que tenho direito?
— Receber? Direito? De que está
falando? — surpreendeu-se ele.
— Ora, xerife, entre o que meu pai devia
e o que valia o rancho há uma grande
diferença...
— Está maluca, garota! O dinheiro
arrecadado no leilão mal deu para pagar as
dívidas...
— Louco está você, xerife!
— Tenho todos os documentos para
comprovar...
— Quem comprou o rancho? — indagou
ela, num fio de voz.
— Irah Wilkinson e Duff Allister...
— Aqueles patifes! Agora entendo tudo.
Eles queria o rancho desde o princípio.
Devem ter armado toda essa trama... Vão
me pagar por isso...
— É bom ir com calma, Becky. Não a
quero provocando encrencas na cidade. Está
tudo consumado. Aproveite que a diligência
só parte mais tarde, pegue suas malas e dê o
fora daqui.
— Será que é tão cego que não vê que fui
roubada, xerife?
— Fui uma decisão do juiz. O leilão foi
honesto. Não há o que protestar.
— Não estou gostando disso, xerife. Há
um cheiro de trapaça no ar e estou certa que
você tem alguma coisa a ver com isso tudo,
não?
— Bob Mathew alegou a mesma coisa,
mas acabou se convencendo.
— O que houve com ele?
— Teve o mesmo problema que seu pai.
O rancho foi a leilão.
Becky fechou os punhos com força,
contendo sua cólera. Depois virou-se e saiu,
furiosa.
Ives se dirigiu imediatamente ao saloon,
onde contou aos seus sócios o que ocorrera.
— Então ela teve coragem de voltar —
comentou Irah.
— E está louca para arrumar confusão —
emendou Ives.
— Vamos cuidar dela.
— É apenas uma garota atrevida... —
opinou Duff. — Só tem pose.
— Mandaremos alguns rapazes darem
um susto nela, só isso será o bastante para
expulsá-la daqui — decidiu Irah.
— Façam tudo direito.
— Não se preocupe. Vamos apenas dar
um susto nela. Garanto que ela irá embora
na diligência ainda hoje — prometeu Irah,
chamando dois homens que estavam
encostados no balcão.
Deu-lhes algumas instruções e eles
saíram. Irah convidou Ives para que se
sentasse.
— Como estão indo nossos planos? —
indagou ele, assim que se sentou.
— Chegaram mais dois homens hoje,
procurados por assalto. Cada um nos pagou
duzentos e cinqüenta dólares. Com isso já
lucramos perto de cinco mil dólares em
apenas um mês e estamos só no começo. O
grosso virá do carregamento de armas que
vamos entregar amanhã.
— Ótimo! Logo quero começar a ver a
cor desse dinheiro.
— Não se preocupe, sua parte está bem
guardada.
Enquanto isso, Becky se dirigia ao hotel,
onde pretendia se hospedar. Sentia-se
confusa diante dos acontecimentos e
tremendamente revoltada com o que
acontecera ao seu rancho.
Súbito um homem esbarrou nela,
derrubando sua mala. Sem nada dizer, o
homem chutou com força a mala, abrindo a
tampa e espalhando peças de roupa no chão.
— Eu ajudo! — disse o homem,
abaixando-se para recolher as roupas.
— Pode deixar que eu faço isso, seu
estúpido!
— Deixe que ele faça isso — falou um
segundo homem, segurando-a pelo braço.
— Solte-me, seu brutamontes — ordenou
ela.
— Veja só que beleza — falou o homem
que recolhia as roupas, exibindo um corpete
tirado da mala.
— Dê-me isso — gritou a garota,
debatendo-se, mas o homem que a segurava
pelo braço a mantinha presa com firmeza.
Ela chutava, tentando atingir o homem
que revirava suas roupas e zombava dela.
— Já viu que coisa mais excitante? —
insistiu o homem, exibindo agora um sutiã.
Uma sombra avançou, cobrindo-o. Ele
levantou os olhos e encarou os olhos
cinzentos daquele texano alto e de chapéu
de abas largas.
— É bom fazer o que a garota disse —
falou Kit Bacley, olhando-o furiosamente.
— Dê o fora, homem. Não há nada que
possa interessá-lo aqui — disse o homem
abaixado.
— Eu decido isso. Agora vamos começar
por você — falou ele, apontando para o
outro. — Solte a garota.
— Como quiser, forasteiro — disse o
pistoleiro, empurrando a garota para o lado
e encarando Kit.
O outro pistoleiro se levantou, indo
juntar-se ao amigo. Estavam ambos prontos
para sacar. Kit encarou-os com um sorriso
de desprezo nos lábios.
— Agora vão andando — ordenou ele.
Os dois pistoleiros se entreolharam,
zombando da audácia do forasteiro.
— Vai se arrepender disso — disse um
deles, avançando para Kit.
Seus movimentos, porém, foram lentos
demais. Kit desviou o corpo do golpe que
pretendia atingí-lo na cabeça.
Com agilidade e força, retribuiu
imediatamente com um murro no queixo de
seu atacante.
O homem revirou os olhos e abriu os
braços, enquanto caía para trás, derrubando
seu amigo consigo.
Antes que pudessem se levantar, Kit
completou o trabalho, chutando a cabeça de
cada um e pondo-os para dormir naquele
mesmo instante.
— Obrigada! — disse a garota, após
juntar suas roupas e as recolocar na mala.
— De nada, moça — falou Kit. — Já
resolveu seus negócios em Quemados?
— Não, mas não sei o que fazer.
Simplesmente fui roubada. Imagine que não
receberei nada. O rancho foi vendido pelo
valor das dívidas, o que é um absurdo!
— Entendo. Se é assim, por que não vai
embora da cidade? Aproveite a diligência...
— De forma nenhuma. Quero reunir
provas de que alguma coisa errada está
acontecendo aqui. Vou mandá-las para o
Quartel General dos Patrulheiros. Eles terão
de rever a decisão anterior...
— Pode se dar mal com isso. Já viu que
isto que aconteceu aqui não foi por acaso...
— Obrigada pelo aviso e pela ajuda, mas
sei cuidar de mim. Eles não vão me
intimidar...
— De qualquer forma, cuide-se.
Ela agradeceu, apanhou a mala e
caminhou apressadamente na direção do
hotel.
— Muito bem, espertinho! — disse um
dos pistoleiros caídos, apontando uma arma
para Kit.
— Por que não guarda esse brinquedinho
e continua vivo? — falou ele.
O pistoleiro riu da ameaça, pondo-se em
pé. Seu amigo o imitou. Duas armas foram
apontadas para o recém-chegado.
— Saque sua arma! — ordenou um deles.
As pessoas que haviam parado para
observar a cena imediatamente se
dispersaram. Kit ficou só, encarando a
morte.
— Guardem essas armas, rapazes —
ordenou o Xerife Lang, aproximando-se do
local.
— Ele é nosso, xerife. Fomos
provocados...
— Guarde a arma, Beef — ordenou
novamente o xerife, desta vez asperamente.
— Todos aqui viram o que ele fez
conosco — insistiu Beef, furioso.
— Eu cuido dele agora. Dêem o fora —
ordenou Ives, intrometendo-se entre Kit e os
dois pistoleiros.
— Isso não termina aqui, pistoleiro —
afirmou Beef, guardando sua arma.
Lentamente eles se afastaram, jurando
vingança.
— Muito bem, quem é você? — quis
saber o homem da lei,
— Kit Bacley.
— O que faz por aqui?
— Nada... Estou à procura de trabalho.
— Pelo que vi, acaba de arranjar
encrencas apenas. Se até a tarde não
conseguir um emprego, apanhe a diligência
e dê o fora daqui. A próxima só daqui a
quinze dias.
— Entendi o recado, xerife — falou Kit,
com ironia, afastando-se.
Caminhou diretamente para o saloon.
Encostou-se no balcão e pediu um uísque.
Momentos depois, Beef e seu amigo
entravam, com as caras inchadas e ainda
sujas de sangue e poeira.
Quando viram Kit, fizeram menção de
partir para cima dele. Duff, no entanto,
chamou-os antes.
— O que houve com vocês?
— Estávamos assustando a garota,
quando aquele forasteiro ali se intrometeu.
Quase nos arrebentou as cabeças —
explicou Beef.
— Olhe o que ele fez no meu queixo —
falou o outro pistoleiro, chamado Max.
— Quem é ele?
— Não sei, chegou na diligência de hoje.
— Acha que pode ser um cliente nosso?
— indagou Duff a Irah.
— Não creio. Os homens que nos
procuram viajam cercados de precauções.
Jamais viriam numa diligência.
— Deixe a gente descobrir isso, chefe.
Temos contas a acertar com ele — pediu
Beef.
— Está bem, mas faça parecer que ele os
provocou.
— Entendido — falou Beef, fazendo um
sinal para Max.
Ambos se aproximaram do balcão,
postando-se um de cada lado de Kit. O
forasteiro não moveu um músculo ao vê-los.
— Parece que nos encontramos de novo,
forasteiro — falou Beef.
Kit virou o rosto para olhá-lo com
desprezo e fazer uma careta.
— Você não sente um mau cheiro aqui?
— comentou Kit. — Acho que vem de
vocês dois. Estão fedendo.
Beef empalideceu de raiva e ficou sem
reação. Max deixou sua mão escorregar
lentamente na direção do coldre.
— Você é muito arrogante, forasteiro —
falou Beef.
— Por que vocês dois não caem fora,
enquanto ainda podem usar as pernas? —
indagou Kit, sem pestanejar.
— Está nos desafiando?
— Não, estou lhes dando a chance de
continuarem vivos, só isso.
— Não nos assusta — continuou Beef.
— Sim. E vai nos pedir desculpas
pagando-nos uma bebida — ajuntou Max.
— E se eu me recusar?
— Não estamos pedindo, forasteiro. Será
que não entendeu que estamos ordenando?
Kit se voltou para o barman e fez um
sinal, pedindo que servisse dois uísques.
Enquanto o barman os servia, Kit acendeu
uma cigarrilha.
— Beba! — ordenou ele a Beef, enfiando
a cigarrilha no copo.
Beef recuou um passo. Kit o agarrou pelo
colarinho, levantando-o do assoalho. Max
levou a mão à arma, mas Kit foi mais
rápido, atirando-lhe um copo de uísque nos
olhos.
— Beba! — voltou a ordenar Kit, desta
vez apontando seu Colt engatilhado para o
nariz de Beef.
O pistoleiro, trêmulo e assustado,
apanhou o copo e o levou aos lábios, sob os
olhares atentos de todos no saloon.
Ele hesitou. Kit socou o copo contra a
boca dele, fazendo o sangue molhar a
camisa do pistoleiro.
— Vai morrer por isso — gritou Max,
cego pelo uísque, já de arma em punho.
Os que estavam no saloon se
estarreceram com a rapidez do forasteiro.
Max caiu varado por dois balaços, antes
que pudesse apertar o gatilho de sua arma.
Beef tentou a mesma coisa e teve o
mesmo destino. Texas Charly, o pistoleiro
de confiança de Irah e Duff, levantou-se da
mesa e caminhou na direção de Kit
— Tudo bem, Texas — falou Duff,
seguindo-o e interpondo-se entre ele e Kit.
— Esses idiotas tiveram o que mereciam.
Quanto a você, forasteiro, acho bom deixar
a cidade agora mesmo.
— Não recebo ordens de qualquer um —
disse Kit, calmamente.
— Insolente! — vociferou Texas Charly,
levando a mão à arma.
Antes que ele tocasse a coronha de sua
arma, Kit já lhe apontava seu Colt.
— Não gosto de matar de graça, mas
posso fazer a terceira exceção hoje, se você
insistir em morrer — disse ele a Charly.
— Está arrumando uma porção de
inimigos por aqui, forasteiro. Isso pode não
ser muito bom para a sua saúde — advertiu
Duff.
— Da minha saúde cuido eu — falando
Kit, pagando a bebida e saindo.
Encontrou-se, na porta, com o xerife que
chegava apressado.
— O que houve esta vez? — indagou,
segurando Kit pelo braço.
O forasteiro olhou gelidamente para o
homem da lei. Ives soltou-lhe o braço,
intimidado com aquele olhar mortal.
— Eles me provocaram. Todos são
testemunhas de que eles sacaram antes —
falou Kit, saindo.
Ives foi até a mesa ocupada por Duff e
Irah, que não pareciam satisfeito com o que
haviam presenciado.
— Quem é ele? — indagou Duff.
— Não sei, mas penso que já vi aquele
rosto antes — falou Ives, que estivera
intrigado com isso desde que encontrara Kit
lá fora.
— Lembra-se dele?
— Não, não consigo me lembrar...
— Então trate de se lembrar logo. Ele é
muito bom com uma arma, bom demais
para ser um pistoleiro comum.
Naquele momento, o ajudante do xerife
entrou no saloon, trazendo um cartaz em
suas mãos.
— O que foi, Bob? — indagou-lhe Ives.
O rapaz trazia nas mãos um cartaz de
procurado, que estendeu para o xerife.
— Quando me disse que já havia visto o
rosto daquele forasteiro antes, lembrei-me
de dar uma olhada nos cartazes que
chegaram hoje, pela diligência. Veja!
Ives apanhou o cartaz que o rapaz
estendia, olhou-o, depois passou-o para seus
sócios.
— Kit Bacley, procurado por assalto a
mão armada e assassinato — comentou
Irah.
— Penso que temos aí mais um cliente,
amigos — falou Duff. — Por que não o
convidamos para uma conversa amigável?
— Sim, boa idéia! Charly, vá à procura
dele e traga-o aqui — ordenou Irah.
Os três sócios ficaram conversando e
bebendo animadamente, enquanto Texas
Charly saía à procura de Kit que, naquele
momento, estava no hotel, alugando um
quarto.
Quando caminhava para o aposento que
lhe fora destinado, Becky Murray, que
estava hospedada no quarto diante do dele,
chamou-o.
— Olá! Posso ajudá-la em alguma coisa,
moça? — indagou Kit.
— Antes de mais nada, pode me chamar
pelo nome? É Becky, está bem?
— Como quiser, Becky.
— Entre aqui, precisamos conversar.
Kit estranhou, mas seguiu-a para dentro
do quarto. A garota fechou a porta, depois
encarou-o.
— Foi você quem disparou ainda há
pouco lá no saloon, não foi?
— Sim, matei aqueles dois pistoleiros
que a molestaram.
— É um pistoleiro Kit?
— Por que deseja saber?
— Se for um pistoleiro, quero contratá-
lo.
— Para quê?
— Para me ajudar a recuperar meu
rancho.
— Não acha isso uma causa perdida?
— Não. Eu conversei com o porteiro do
hotel. Ninguém sabia da data do leilão,
apenas aqueles dois, o juiz e o xerife. É
totalmente contra a lei e o leilão pode ser
anulado por isso, desde que eu proteste.
— Então faça isso...
— É o que pretendo fazer, mas preciso
me assegurar de que não serei morta ao
fazer isso.
— Acha mesmo que eles tentarão matá-
la?
— Sim, acho que há muita coisa em jogo
por aqui. Pude ver coisas estranhas desde
que cheguei.
— Como o que, por exemplo?
— Vaqueiros que não estão no pasto
cuidando do gado, mas no saloon, bebendo
e jogando. Gastam mais do que ganham e
parecem, na verdade, estar aqui em férias.
— Como sabe disso?
— Já lhe disse, o porteiro do hotel me
contou algumas coisas. Imagine que aqueles
homens vêm para cá todos os dias, ficam
jogando e se divertindo com as garotas.
Alguns chegam a perder pequenas fortunas
numa noite de jogo e parece não se importar
com isso. Onde vaqueiros que não
trabalham conseguem tanto dinheiro?
Kit esfregou a mão na barba, pensativo.
— Acho tudo isso muito interessante,
mas não me diz respeito...
— Não pensei que fosse um covarde, Kit
— falou ela, com profundo desprezo.
Ele a olhou com seriedade, fazendo-a
estremecer.
— Aceite meu conselho, Becky. Dê o
fora da cidade, pelo menos por algum
tempo.
— Nunca. Vou recuperar aquele rancho,
custe o que custar...
— Então faça como quiser, mas sinto não
poder ajudá-la.
A garota pareceu se sentir decepcionada
com a recusa de Kit.
— Saia! — ordenou ela.
— Como quiser — respondeu ele,
deixando o quarto.
Quando ia abrir a porta de seu quarto, Kit
ouviu passos e esporas soando na escada,
ficando na defensiva. Ao ver que se tratava
de Texas Charly, baixou a mão na direção
da arma.
— Vim em paz, forasteiro — apressou-se
em dizer o pistoleiro.
— Meu nome é Kit, se não se importa.
— Está bem, Kit. Meu patrão quer falar
com você.
— Está bem, mande-os aqui. Eu os
receberei.
— Acho que não entendeu. Você deve ir
lá falar com eles — intimou Texas, com
arrogância.
Kit se aproximou de Texas Charly,
mediu-o dos pés à cabeça, depois agarrou-o
pelo colarinho.
— Pois volte lá e diga a eles que Kit
Bacley não aceita ordens de ninguém, muito
menos de um garoto de recados como você
— finalizou, atirando Texas no assoalho.
Humilhado ao extremo, o pistoleiro se
sentiu tentado a sacar sua arma, mas já
tivera uma amostra da rapidez de Kit.
Desafiá-lo seria morte certa, por isso
levantou-se com a cólera estampada no
rosto e retirou-se rapidamente, rumando
para o saloon.
— Quem ele pensa que é? — berrou
Duff, indignado.
— Acalme-se, Duff — aconselhou Irah.
— Você leu o cartaz. Kit Bacley não é um
ladrãozinho comum. Ele tem estilo.
— Mas eu não gosto de ser desafiado.
Esta cidade é nossa e nós mandamos aqui.
Ninguém que queira permanecer sob a
nossa proteção tem o direito de fazer o que
ele fez. Já pensou se todos começassem a
agir da mesma forma?
— Mesmo assim, vamos com calma —
ainda insistiu Irah.
— Texas, mande quatro dos nossos
homens mais fortes buscar esse insolente —
ordenou Duff. — Não me importo se
tiverem de lhe quebrar alguns ossos para
isso.
— Será um prazer, chefe — falou o
pistoleiro, sorrindo com satisfação.
Esperava apenas por uma chance para
fazer Kit engolir toda a humilhação a que o
submetera.
Pouco depois os quatro homens subiam
as escadas e paravam diante do quarto
ocupado por Kit.
O mais forte deles, chamado Hugh
Brown, arrebentou a porta com um pontapé,
entrando como um furacão.
Kit, porém, havia ouvido o barulho de
botas e esporas parando diante de sua porta,
ficando na defensiva. Imaginou mesmo que
voltariam a sua procura.
Assim, quando aquele brutamontes
entrou no quarto como um touro bravo, já o
esperava com uma cadeira nas mãos.
Lascas de madeira voaram pelo quarto e
Hugh foi se estatelar contra a parede, após
ter sido golpeado na cabeça.
Os outros três homens entraram, mas
foram igualmente surpreendidos. Com o
que restara da cadeira, Kit derrubou mais
um.
Os outros dois foram esmurrados
violentamente. Ao fim da luta, os quatro
atacantes estavam estendidos no assoalho.
— Você aí, levante-se! — ordenou Kit a
Hugh, apontando-lhe a arma.
— Você tem muita sorte, forasteiro —
falou o pistoleiro.
— Quem os mandou aqui?
— Meus chefes... Irah Wilkinson e Duff
Allister...
— Oh, sim. Parece que eles resolveram
ser mais convincentes no convite, não?
— Se quer um conselho, vá logo ver o
que eles querem...
— Caiam fora!
— Se não for por bem, acabará indo
por... — ia dizendo Hugh, mas calou-se
quando Kit enfiou-lhe o cano da arma entre
os dentes.
— Caiam fora! — repetiu ele, gritando
furiosamente.
Os quatro homens se arrastaram para fora
do quarto. Kit apanhou seu chapéu e saiu
atrás deles.
Quando chegou ao saloon, foi direto à
mesa que os pistoleiros lhe apontaram.
— Não gosto desse tipo de convite,
amigos. Da próxima vez que quiserem falar
comigo, venham pessoalmente...
— Sente-se! — ordenou Irah.
— Há um cheiro de ratos por aqui que me
enoja — disse Kit, virando as costas para se
afastar.
— Antes de ir, veja isto — falou Duff.
Kit se voltou para eles. Duff lhe estendia
um cartaz de procurado.
— Por que não se senta e conversamos
como bons amigos? — falou Irah.
— Está bem — cedeu Kit. — O que
desejam? — indagou, apanhando o cartaz
das mãos de Duff e rasgando-o.
— Isso não vai mudar nada — falou
Duff.
— Sei disso.
— O que faz aqui nesta cidade?
— Soube que Quemados é um bom local
para um período de descanso, se é que me
entendem...
— Sim, entendemos perfeitamente e
podemos assegurar-lhe que estará a salvo,
enquanto estiver sob nossa proteção.
— Proteção? Como assim? — indagou
ele, intrigado, mas demonstrando interesse.
— Você terá um local para ficar e todas
as facilidades para fugir para o México, em
caso de alguma complicação. Poderá andar
livremente pela cidade, freqüentar o saloon
e se divertir com as garotas. Se gosta de
jogar, temos todos os tipos de jogos...
— Muito cômodo tudo isso — comentou
Kit.
— Deve reconhecer que para se ter tudo
isso você terá que pagar um preço —
mencionou Duff.
— E onde isso nos leva?
— A uma pequena taxa mensal,
indispensável para assegurar sua
tranqüilidade — falou Irah.
— Traduzindo em miúdos...
— Duzentos e cinqüenta dólares por mês
— informou Duff.
Kit esfregou o queixo barbado, enquanto
refletia sobre a proposta.
— O que acontecerá quando meu
dinheiro acabar?
— Você vai embora e faz um trabalho,
arruma mais dinheiro e volta. Ou então,
poderia considerar uma oferta melhor.
— Que tipo de oferta?
— Vimos como usou sua arma. Um
homem, com a sua habilidade, pode nos ser
muito útil.
— Entendo!
— O que nos diz, então? — quis saber
Duff.
— O que terei a ganhar com isso?
— Não terá que pagar a taxa mensal e
poderemos lhe pagar um salário de
cinqüenta dólares por semana, mais casa,
comida e toda munição que precisar —
especificou Duff.
Kit pensou por instantes, esfregando a
barba, olhando alternadamente para um e
outro.
— É pouco! — afirmou ele.
— Está louco? — indagou Duff. —
Quem pensa que é?
— Alguém que quer participação nos
lucros. Vejo que têm uma operação
montada aqui, senhores. É o tipo de coisa
que me agrada.
— Vá com calma, forasteiro — falou
Irah. — Tivemos muito trabalho para
organizar tudo, não pense que vamos
entregar uma parte do bolo com tanta
facilidade.
— Não sem antes submetê-lo a um teste
para vermos se é tão bom como diz —
ajuntou Duff, observando aquele forasteiro.
— Acho que devemos testá-lo, Irah.
— Não deixa de ser uma boa sugestão.
Eu gosto da idéia — falou Irah.
— Temos o carregamento para entregar.
Com as mortes de Beef e Max, que eram os
encarregados disso, vamos ter que nomear
outros. Penso que seria uma boa chance de
testar nosso amigo aqui.
— Sim, tem razão — concordou Irah,
sorrindo.
— O que deverei entregar?
— Saberá no devido tempo — informou
Duff.
— Só terei que fazer isso e mais nada?
— Acha que é muito fácil?
— Penso que sim. Gostaria de algo mais
desafiador — falou Kit, convencido.
— Pois então surpreenda-nos. Mostre que
é um homem que sabe ver e aproveitar as
oportunidades — desafiou-o Irah.
— Terei autonomia?
— Não sei, isso você terá que descobrir.
Vai entregar mercadorias para nós e receber
o pagamento. Deve cuidar dele e nos trazê-
lo de volta — esclareceu Duff.
— Está bem, senhores. Verei o que posso
fazer. Quando e onde vou ter mais detalhes
sobre o assunto?
— Texas Charly lhe dará os detalhes. Vá
com ele agora. Ficará hospedado no rancho.
— Tenho as minhas coisas no hotel...
— No rancho é mais seguro. Além disso,
o trabalho que vai fazer para nós partirá do
rancho. É bom que esteja familiarizado com
as coisas até então.
— Entendido. Vou pegar minhas coisas
no hotel, então — finalizou Kit, saindo.
Enquanto Texas Charly se encarregava de
conduzir Kit ao rancho, onde ele passaria a
morar, Irah e Duff permaneceram no
saloon, conversando.
— Vamos deixar bem claro uma coisa,
Irah. Não trabalhamos duro para chegar
onde estamos e simplesmente entregar isso
para um espertinho qualquer.
— Claro que não, Duff. Acho que ambos
pensamos da mesma forma. Já percebi que é
do tipo ambicioso, que não vai se contentar
em apenas prestar serviços. Se deixarmos
por conta dele, logo vai querer ser o dono.
— O que faremos a respeito dele, então?
— Vou encarregá-lo de acompanhar a
carga de rifles até o México. Uma vez
concluído o trabalho, ele será morto.
— Ele já mostrou que é perigoso. Quem
fará o trabalho?
— Temos uma porção de homens que
adorariam esse trabalho, mas acho que
Texas Charly vai ter um prazer especial
nisso. Já tem um caso pessoal com esse
sujeito.
— Ótimo, isso resolve a questão. E o que
faremos quanto a Becky Murray?
— Não se preocupe com ela. Temos tudo
em nossas mãos.
— A documentação é mesmo legal?
— Sim, o juiz fez tudo direitinho. Vamos
dar um susto de verdade nela e espantá-la
da cidade. Falarei com Ives a respeito disso.
Como xerife ele encontrará um meio de
expulsá-la daqui facilmente.
Os dois riram, satisfeitos com o
andamento de seus negócios. Um pouco
mais tarde, Kit e Texas Charly chegavam ao
rancho.
— Você ficará aqui. Temos um trabalho
amanhã, mas isso não significa que você
deva desperdiçar sua noite. Há uma porção
de garotas bonitas no saloon, além das
mesas de jogo.
— Irah e Duff têm um bom lucro com
tudo isso, não?
— Isso não é de sua conta...
— Talvez seja. Posso me tornar sócio
deles.
— Se viver para isso.
Kit sorriu zombeteiramente.
— Parece que você não aprovou minha
presença aqui, não?
— Tenho meus motivos.
— Por que não acertamos nossas
diferenças agora mesmo? — indagou Kit,
descendo de seu cavalo.
Texas Charly ficou rubro de cólera, mas
se conteve. Se soubesse que teria uma
chance, por menor que fosse, teria sacado
contra Kit.
— O alojamento é ali — apontou ele,
acovardado.
Kit e ele caminharam até lá.
— Pode escolher uma das camas — falou
Texas. — As que estão sem cobertor estão
livres.
— Ainda bem que não terei de pagar para
dormir numa espelunca dessas — falou Kit,
escolhendo sua cama.
Enquanto fazia isso, Texas deixou o
alojamento, indo ao encontro de alguns
homens que jogavam dados sob uma árvore.
— Quem é o novo hóspede? — indagou
um pistoleiro chamado Billy Bough.
— Um ladrão qualquer — informou o
pistoleiro. — Mas é muito arrogante.
Imagine que matou Beef e Max.
— Então deve ser muito bom com a
arma.
— Sim, não é dos piores. Mesmo assim,
acho que devemos dar-lhe as boas-vindas
— propôs Texas, sorrindo.
— Não contem comigo — falou Billy
Bough. — Nunca me meto com alguém
cujas habilidades desconheço. Isso é
trabalho para El Toro — sugeriu Billy,
apontando na direção de um mexicano.
— Acha que pode vencer aquele
grandalhão? — indagou Texas ao
mexicano.
— Nunca fui vencido, meus punhos
podem ser mais mortais que uma arma,
Texas — falou o mexicano, levantando-se.
Era enorme e musculoso, com a pior das
carrancas no rosto. Texas sorriu,
concordando.
— Então vamos ver do que é capaz, El
Toro.
— Mas esperem aí! O que é que eu ganho
com tudo isso? — quis saber ele.
— Está bem, peça o que quiser.
— Bem, dinheiro não é o meu problema
no momento. Gosto realmente daquela sua
garota lá no saloon.
— Diabos, El Toro! Não tinha outra coisa
para pedir? — indagou Texas, coçando o
alto da cabeça.
— É pegar ou largar — insistiu o
mexicano.
— Está bem. Se der uma lição no
forasteiro, pode ficar com a garota.
— Palavra?
— Sim, você tem a minha palavra.
— Então negócio fechado — concordou
o mexicano.
Rumaram, então, para o alojamento.
Diversos homens seguiram-nos, ansiosos
por um pouco de diversão. Eram bandidos
da pior espécie e a expectativa de uma boa
briga os deixava excitados.
Texas Charly, em particular, era o mais
interessado naquela briga.
Quando El Toro entrou no alojamento,
Kit estava deitado na cama que escolhera. O
mexicano caminhou diretamente para ele,
parando diante da cama.
— Algum problema? — indagou Kit,
levantando a cabeça a cabeça para encarar o
brutamontes.
— Quem o mandou pegar minha cama?
— Esta estava vaga...
— Não interessa. Estou dizendo que é a
minha cama.
— Ora, não me amole. Estou cansado —
falou Kit, virando para o lado.
— Olhe para mim quando eu falar com
você, forasteiro — gritou o mexicano.
— Meu nome é Kit Bacley — falou ele,
sem olhar o outro. — Agora por que não dá
o fora e me deixa em paz?
— Só vou lhe dizer mais uma vez,
forasteiro. Quero esta cama.
Kit levantou a cabeça e olhou
demoradamente para El Toro, depois fez um
aceno de cabeça, recusando-se a fazer o que
o outro determinava.
— Acho que não entendeu bem —
continuou El Toro.
— Você é que não entendeu — falou Kit,
sacando sua arma e apontando-a para a
cabeça do mexicano.
— Estou desarmado, como pode ver —
mostrou o mexicano.
— Entendo — disse Kit, levantando-se e
atirando sua arma sobre a cama.
Havia percebido os outros homens nas
janelas e na porta. Entendeu que teria de
lutar ou seria ridicularizado.
— Aposto cem no forasteiro — falou um
dos pistoleiros.
— Eu aceito — respondeu Texas.
No momento seguinte, diversas apostas
foram feitas. A maioria delas a favor de El
Toro, que tirou a camisa, exibindo a
musculatura exuberante.
Kit fez o mesmo. Não era tão corpulento
quanto o mexicano, mas tinha um bom
físico.
El Toro exibia um sorriso confiante nos
lábios, mas seu rosto se tornou sério ao errar
o primeiro golpe desferido.
Kit, em contrapartida, acertou-o no
estômago, fazendo-o recuar alguns passos.
— É muito esperto, forasteiro, mas acaba
de assinar sua sentença de morte — disse,
com o olhar destilando cólera.
— Por que não cala essa boca e luta de
verdade? — zombou Kit.
El Toro, possesso, avançou para Kit,
tentando novamente atingí-lo. Este, no
entanto, demonstrando agilidade e força
impressionantes, desviou-se e desferiu uma
saraivada de murros no rosto do mexicano,
cobrindo-o de sangue.
Cego pela dor, El Toro golpeou o vazio.
Kit atingiu-lhe um pontapé no estômago e
depois aplicou-lhe um formidável murro na
nuca, derrubando o brutamontes.
— Ele está morto! — exclamou um
pistoleiro que examinou o corpo imóvel do
mexicano.
Todos olharam com respeito para Kit,
que apanhou sua arma sobre a cama,
guardando-a no coldre.
— Eu fico com as coisas de El Toro —
falou Texas Charly, caminhando na direção
do cadáver.
Kit sacou sua arma e disparou uma vez, a
poucos milímetros da bota de Texas Charly,
que parou e o encarou assustado.
— Eu venci o mexicano. As coisas dele
me pertencem.
— Não conhece as regras aqui — falou
Texas, tentando demonstrar confiança,
diante dos olhares dos outros pistoleiros.
— Pois eu digo que esta é a minha regra
e vai valer aqui —argumentou Kit,
disparando mais uma vez, desta vez perto
do pé do pistoleiro. — Se não concordar,
poderemos discutir isso de outra forma —
ameaçou Kit.
Texas já vira o bastante para saber que
não seria páreo para Kit. Assim, não teve
outra alternativa senão recuar, o que
provocou gargalhadas nos presentes.
Humilhado, Texas jurou vingança.
— Estarei a sua disposição para quando
quiser — disse-lhe Kit, abaixando-se para
revistar os bolsos do mexicano.
Depois de retirar tudo que havia de valor,
levantou os olhos para os outros homens,
que o olhavam com curiosidade.
Logo eles se dispersaram, intimidados
pelo olhar daquele homem estranho e
impiedoso.
Na cidade, o Xerife Ives Lang recebia a
visita de um forasteiro que acabava de
chegar à cidade.
— Meu nome é Hewke Lawrence —
falou o recém-chegado, exibindo uma
carteira de couro, onde reluzia um distintivo
dos Patrulheiros do Texas.
Ao ver aquilo, o xerife empalideceu.
— Sou Ives Lang — falou ele.
— Sim, eu sei, xerife. Espero que possa
me ajudar.
— É só dizer, patrulheiro...
— Estou seguindo a pista de um
homem...
— Que homem?
— Este — falou o patrulheiro, exibindo
um cartaz. — Não o viu por aqui, viu?
— Não, creio que não — gaguejou o
xerife, ao reconhecer a figura estampada no
cartaz. — O que ele fez?
— Assaltou um banco e matou um
funcionário. Eu o estou seguindo desde
Abilene.
— Sinto muito, patrulheiro, mas creio
que não posso ajudá-lo...
— Está bem. De qualquer forma,
pretendo ficar alguns dias na cidade, até
reencontrar a pista de Kit Bacley.
— Claro. Conte comigo para o que
precisar.
— Para começar, preciso de um lugar
para ficar...
— No fim da rua vai encontrar o nosso
melhor hotel.
— Está bem. Obrigado por enquanto,
xerife.
Ives esperou que o patrulheiro saísse,
depois correu à janela para observá-lo. Era
alto e forte. Portava duas armas no estilo
dos patrulheiros.
Assim que o viu entrando no hotel,
correu para o saloon, onde encontrou Irah e
Duff.
— O que houve, Ives? Parece que viu um
fantasma? — indagou Irah.
— Pior que isso, rapazes — falou o
xerife, ofegante. — Adivinhem quem acaba
de sair da delegacia.
— Garanto que não foi o governador —
brincou Duff.
— O assunto é sério e você vai perder
todo o senso de humor quando souber.
Temos um Patrulheiro do Texas em nossa
cidade.
— Está brincando! — exclamou Irah.
— Eu jamais brincaria com algo tão
sério.
— O que ele faz aqui? — quis saber
Duff.
— Está à procura de Kit Bacley e vai
permanecer na cidade até encontrar a pista
novamente.
— Diabos! Ele não pode ficar aqui, é um
risco muito grande para nós. Poderá
reconhecer os homens que protegemos.
Sabem o que isso significa?
— Está bem, vamos pensar com calma.
Se ele quer Kit Bacley, vai tê-lo. O que
temos a fazer é evitar que os homens do
rancho venham à cidade, até que o
patrulheiro vá embora. Tudo estará sob
controle, Duff — garantiu Irah.
— Onde está Kit Bacley agora? — quis
saber o xerife.
— Foi para o rancho. Amanhã ele
acompanhará o carregamento de armas.
Assim que tudo estiver terminado, Texas se
encarregará de matá-lo. Trará o corpo para a
cidade e o entregará ao patrulheiro. Tudo
ficará resolvido assim — ponderou Irah.
— Espero que nada dê errado — falou o
xerife, já mais aliviado, porque a situação
parecia estar sob controle.
— Está tudo bem, xerife, não se
preocupe.
— Vi uns homens rondando o hotel ainda
há pouco, quando observava o patrulheiro...
— Ah, sim, eu mandei alguns homens
para lá. Vão dar um susto em Becky Murray
— falou Irah.
— Diabos! Podem dar de cara com o
patrulheiro — lembrou Duff.
— Tem razão! — concordou Irah. — Vai
ser difícil explicar isso, principalmente se a
garota falar com o patrulheiro. Ives, esteja
preparado para responder perguntas. Vamos
tentar deter os homens.
— Farei isso agora mesmo — disse Duff.
Naquele momento, porém, três pistoleiros
avançavam pelo corredor do hotel, parando
diante da porta do quarto de Becky.
— Estão prontos, rapazes? — indagou o
líder, um pistoleiro de nome Hank Trevor,
procurado por roubo de gado.
— Sim, estamos — responderam os
outros.
— Lembrem-se, mandaram-nos assustá-
la apenas... — disse ele, com malícia.
Hank bateu vigorosamente na porta.
Quando esta se abriu, ele empurrou a garota
para dentro, tapando-lhe a boca com a mão.
— Fique quieta, mocinha, ou vai se dar
mal — advertiu ele, esfregando seu corpo
no dela.
— Como vamos fazer para assustar essa
pombinha tão tenra e deliciosa? — indagou
um dos pistoleiros, começando a desabotoar
sua camisa.
Becky tentou desvencilhar-se dos braços
que seguravam, mas foi inútil. Um dos
homens a esbofeteou.
— Ei, Ted! Vamos disputar quem será o
primeiro com ela — falou Hank. — Cadê os
dados? Quem fizer o maior número de
pontos terá o privilégio de ser o primeiro
com esta coisinha gostosa.
— Boa idéia! — concordaram os outros.
Becky, horrorizada ante a idéia de ser
brutalizada por aqueles homens, reuniu
todas as suas forças para golpear fortemente
o baixo-ventre de Hank, fazendo-o soltá-la.
Livre da mão que quase a sufocava, a
garota gritou por socorro. Furioso com
aquilo, Hank a esbofeteou novamente,
fazendo-a cair sobre a mesa e derrubar um
lampião.
— Segurem-na! — ordenou Hank,
colérico. — Essa gata vai ter o que merece
— rugiu ele.
Quando ia desferir outra bofetada na
garota, alguém bateu na porta.
— Quem está aí? — indagou ele.
Ninguém respondeu do lado de fora, mas
voltou a bater.
— O que está acontecendo aí? —
indagou agora uma voz masculina.
— Nada que possa interessá-lo. Caia fora
daqui antes que se machuque — ordenou o
pistoleiro.
— Tem certeza de que está tudo bem? —
insistiu a voz.
Becky, ao ouvir aquilo, viu a sua única
chance de obter ajuda. Cravou os dentes na
palma da mão que cobria sua boca e gritou
novamente.
— Socorro! Preciso de ajuda!
— Abram esta porta! — gritou o homem
do lado de fora.
— Demônios! — praguejou Hank,
empurrando a garota para trás e olhando
para seus parceiros.
— Que sujeito idiota é esse aí fora. Dê
logo um jeito nele, Hank! — falou um
deles.
Hank, aborrecido com aquela
interrupção, escancarou a porta, sacando sua
arma, disposto a dar uma rápida lição
naquele intrometido que vinha atrapalhá-
los.
Hewke precisou menos de um segundo
para perceber a cena. Um homem segurava
firme uma garota, que olhava de modo
suplicante e assustado.
— O que deseja, seu bastardo
intrometido? — falou asperamente Hank,
levantando a arma na direção do rosto do
homem diante dele.
Recebeu um murro sobre o nariz e foi
arremessado do outro lado do aposento,
batendo contra a parede.
— Maldição! — gritaram os outros dois,
em uníssono.
Os dois pistoleiros imediatamente
tentaram sacar suas armas, mas não foram
tão rápidos quanto o estranho.
Hewke percebeu que nenhum daqueles
homens parecia disposto a conversar, por
isso não hesitou de novo.
Cada um deles recebeu um balaço entre
os olhos, estrebuchando no assoalho com o
rosto transformado numa máscara de
sangue.
— Vai se arrepender disso! — gritou
Hank, levando a mão ao coldre de sua arma.
— Não faça isso — ainda avisou Hewke,
mas o bandido não quis ouví-lo.
Antes que pudesse tocar a coronha de seu
Scolfield, uma bala certeira arrebentou-lhe
os miolos.
— Há mais algum? — indagou ele à
garota, que respondeu com um movimento
negativo de cabeça.
Hewke certificou-se de que os homens
estavam mortos, antes de guardar sua arma
e olhar para a garota.
Ela empalideceu e seus sentidos
falharam. Ele correu ampará-la em seus
braços fortes.
Hewke ajudou Becky a se recuperar e se
acomodar numa poltrona. A garota estava
pálida e assustada.
— Obrigada — agradeceu ela, após haver
tomado fôlego. — Por pouco eles não me
apanhavam realmente.
— Quem são eles? O que desejavam com
você?
— É uma longa história e penso que
ninguém se interessa por ela.
— Talvez eu me interesse. Meu nome é
Hewke Lawrence, sou capitão dos
Patrulheiros do Texas.
— Fico contente em conhecê-lo, capitão,
mas nem os Patrulheiros se interessaram
pelo meu problema.
— Você procurou meus superiores?
— Sim, estive no quartel-general, mas foi
tudo inútil.
Hewke puxou uma outra poltrona para
junto de Becky e se sentou, olhando-a
atentamente.
— Porque não me conta tudo, então?
— Quer mesmo saber?
— Sim, claro.
— Bem, tudo começou quando... — ia
começar ela, quando passos apressados
soaram no corredor.
Hewke se levantou rapidamente de sua
poltrona, já com suas armas nas mãos,
prontas para disparar.
— O que está havendo aqui? — indagou
o xerife, entrando naquele momento.
— Tive de matar estes homens, xerife.
Estavam atacando esta mulher...
Ao ver que se tratava dos homens que
haviam sido mandados para intimidar
Becky, Ives sentiu um calafrio percorrer sua
espinha. Havia chegado tarde demais.
— E por que eles faziam isso? —
indagou Ives, gaguejando nervosamente.
— E o que ela iria me contar agora,
xerife.
— O xerife já sabe de todos os detalhes
— alertou Becky.
— Conhece o problema dela, xerife?
— Sim, mas não há nada que se possa
fazer — gaguejou Ives, percebendo que
deveria fazer alguma coisa para evitar que
Becky conversasse com o patrulheiro.—
Becky Murray está lutando por uma causa
perdida. Até a Patrulha do Texas
reconheceu isso.
— Ela já me falou sobre isso, mas não
importa. Gostaria de saber de todos os
detalhes — insistiu Hewke.
— Então por que não vem à delegacia?
Terei o máximo prazer em pô-lo a par dos
acontecimentos — sugeriu Ives.
— Prefiro ouvir a garota primeiro, xerife.
Depois eu o procurarei para saber a sua
versão, xerife. Enquanto isso, seria bom
mandar o papa-defuntos vir limpar o local.
— Eu farei isso — disse Ives, sem outra
alternativa.
Convocou alguns homens que haviam se
aproximado, atraídos pelos tiros, levando os
cadáveres para a funerária.
— Pode me contar tudo aqui, Becky —
pediu Hewke, assim que se viram a sós.
— Obrigado, patrulheiro. Meu nome
completo é Becky Murray — começou ela,
narrando tudo que havia acontecido, até a
perda do rancho.
— Há muita coisa ilegal nisso tudo —
concluiu Hewke, assim que ela terminou.
— O xerife disse que tem cópias dos
documentos. Diz que são perfeitamente
legais, mas não discuto isso. É o modo
como tudo foi feito que torna isso ilegal.
— Sim, e concordo com você. Não sei
por que, mas farejo uma trapaça a milhas de
distância. Se os fatos aconteceram como
você me narrou, sinto que há trapaça em
tudo isso. Só não posso entender o motivo
de tudo isso.
— Há alguma coisa que possa fazer para
me ajudar? — indagou ela, esperançosa.
— Posso bisbilhotar por aí. Se descobrir
provas de alguma coisa errada, posso
intervir.
— Por favor, então. Ajude-me! Garanto
que houve trapaça nisso tudo.
— Está certo, Becky. Esse não é o meu
trabalho no momento, mas vou ver o que
posso fazer — prometeu ele.
— Obrigada! — agradeceu ela, olhando-
o de modo especial.
Hewke despediu-se dela e foi acomodar
suas coisas no quarto que alugara. Após
isso, dirigiu-se à delegacia.
— Quero que me conte sua versão nos
fatos, xerife — pediu ele, sentando-se
diante da escrivaninha de Ives.
— A respeito de quê? - confundiu-se o
xerife, que demonstrava estar muito
nervoso.
— A respeito do que houve com aquela
garota, já se esqueceu? — lembrou-o
Hewke, sondando-o.
— Oh, sim — falou Ives, lembrando-se.
Evidenciando cada vez mais seu
nervosismo, ele contou todo o acontecido a
sua maneira.
— Tem certeza de que tudo foi mesmo
legal, xerife?
— Sim, claro, o juiz esteve presente em
todos os atos. Além disso, os documentos
são públicos, você pode olhá-los à vontade.
— Não posso entender, porém, como o
leilão daqueles ranchos foi feito sem um
edital público.
— Engana-se. Houve um. O juiz mandou
afixá-lo no quadro de editais — mentiu o
xerife, pois era algo que ninguém poderia
provar agora.
— Estranho, porque ninguém viu esse
edital. Acho que tudo está muito confuso,
xerife. Acho que não se importará se eu
fizer algumas investigações, não?
Ives Lang sentiu o suor escorrer pelo seu
rosto. Aquilo era algo que não agradaria
seus sócios.
— Não vejo motivos para fazer isso,
capitão. A Patrulha do Texas recebeu um
relatório completo dos acontecimentos. Eu
mesmo o encaminhei.
— Tudo bem, xerife, mas isso não quer
dizer que não possamos retomar o caso,
xerife.
— Por outro lado, ninguém tem direito de
contestar uma decisão que foi feita na
presença do nosso juiz.
— Não estou contestando nada, xerife.
Só disse que gostaria de investigar um
pouco.
— Se fizer isso, comunicarei o fato a seus
superiores — falou Ives, cada vez mais
nervoso.
Hewke o olhou, demonstrando surpresa.
Depois se levantou e caminhou até a porta.
Antes de abrí-la, virou-se e disse:
— Diga que se trata do Capitão Hewke
Lawrence, xerife.
O xerife estava lívido.
— E tem mais um detalhe: eu acho que
você tem alguma coisa a ver com isso tudo.
— Como assim? — indagou o xerife,
num fio assustado de voz.
— É o que pretendo descobrir — falou
Hewke, saindo.
O patrulheiro apanhou seu cavalo e foi
levá-lo até a estrebaria. Enquanto isso, Ives
corria avisar Irah e Duff.
— Eu sabia que teríamos encrencas com
esse patrulheiro — falou o xerife.
— Não se preocupe, se ele chegar perto
demais, daremos um jeito nele — falou
Duff. — Temos muitos homens que
poderiam acertá-lo. Podemos fazer as coisas
de modo a parecer um acidente.
— É algo que precisa ser bem feito ou
teremos toda a Patrulha por aqui — alertou
Ives.
— Não se preocupe — tranqüilizou-o
Duff. — Tudo será feito com o máximo de
cuidado.
Naquele momento, Hewke deixava a
estrebaria. Parou um pouco à porta,
pensando no que fazer a seguir. Nesse
instante, um cavaleiro entrava na cidade.
Ao vê-lo, Hewke teve certeza de que o
conhecia. Era um homem na casa dos trinta
anos, com uma barba espessa e dois
revólveres pendentes do cinturão.
O cavaleiro notou a presença de Hewke e
pareceu se intimidar por momentos. Depois
seguiu em frente, parando diante do saloon.
Hewke foi naquela direção.
— O que houve, Slim? — indagou Duff,
ao ver o pistoleiro ficar à porta, observando
a aproximação do patrulheiro.
— Conheço aquele homem. É um
patrulheiro — disse Slim.
— Sim, acaba de chegar à cidade.
— Tenho certeza de que ele me
reconheceu...
Hewke olhou significativamente na
direção de seus sócios. Ives foi se esconder
nos fundos do saloon, com a arma
engatilhada.
— Vocês já se encontraram antes? —
indagou Duff.
— Sim, ele fez tudo para pôr as mãos em
mim — informou Slim.
— O xerife está ali nos fundos, com uma
arma pronta para atirar no patrulheiro.
Precisamos apenas de um pretexto.
Provoque-o. Assim que ele for morto, você
retorna ao rancho por algum tempo, até as
coisas esfriarem.
— É uma temeridade enfrentar Hewke
Lawrence — falou o pistoleiro.
— Só terá que distraí-lo. No entanto,
acha que mil dólares ajudariam?
Os olhos do pistoleiro brilharam de
cobiça.
— Posso confiar na habilidade do xerife?
— Absolutamente. Ele lhe dará proteção.
Faça apenas o patrulheiro ficar de costas
para ele. Tudo acabará bem.
Slim concordou e foi se postar numa das
pontas do balcão. Quando Hewke chegou e
pediu uma bebida, Slim ficou preparado
para sacar a arma.
— Olá, Slim! — disse Hewke, sem olhar
na direção do pistoleiro, muito embora seus
sentidos estivessem atentos a tudo que se
passava ao seu redor. — Faz muito tempo,
não?
— Sabia que cedo ou tarde nós nos
encontraríamos, capitão.
— Está disposto?
— Disposto a quê?
— A se entregar.
Slim gargalhou. Os que estavam
presentes no saloon pressentiram barulho e
trataram de sair da linha de tiro.
Hewke franziu a testa, encarando o outro.
— Você não me serve morto, Slim.
— Estou vivo e pretendo continuar assim,
capitão.
— Você está muito confiante para o meu
gosto, Slim. Sempre foi um rato covarde.
Sou capaz de apostar como há algum
cúmplice seu escondido por aí, pronto para
disparar contra mim.
— É um risco que terá de correr.
Hewke havia notado que Slim olhava
muito na direção dos fundos do saloon e
concluiu que ali deveria estar seu cúmplice.
Afastou-se do balcão e caminhou até a
porta do saloon, de onde tinha uma ampla
visão de todo o ambiente.
— Agora posso cuidar dos dois, Slim.
Dou-lhe um minuto para terminar sua
bebida e jogar suas armas fora.
Ao perceber a ação do patrulheiro, o
xerife tratou de fugir dali rapidamente, para
não ser descoberto.
Vendo-se só, Slim acovardou-se.
— Está bem, eu me entrego, mas posso
garantir que não ficarei por muito tempo na
cadeia. Tenho amigos. Se eles não me
ajudarem a sair de lá, poderemos até fazer
um acordo, patrulheiro — falou Slim,
olhando na direção de Irah e Duff.
— Que acordo? — interessou-se Hewke.
— Vamos esperar, por enquanto — disse
Slim, deixando cair se cinturão.
Hewke o levou até a delegacia e o
trancou numa das celas. Quando ia saindo,
encontrou-se com Ives Lang, mais nervoso
do que nunca.
— Há um prisioneiro lá dentro, xerife.
Cuide bem dele. É procurado por
assassinato em Houston.
— Não acha que está se intrometendo em
minha jurisdição, capitão?
— Eu decido isso, lembra-se, xerife? —
finalizou Hewke, afastando-se.
Ives entrou na delegacia. Ao vê-lo, Slim
exclamou, indignado:
— Seu rato covarde! Quase fui morto por
sua culpa.
— Acalme-se, homem! Está tudo bem.
Vamos resolver isso logo.
— Quero sair logo daqui ou aquele
patrulheiro vai ficar sabendo de algumas
coisas que andam acontecendo por aqui —
ameaçou Slim.
— Não se preocupe, já vou dar um jeito
na situação — falou Ives, que havia
conversado com Irah e Duff a respeito de
Slim.
— O que vai fazer?
— Tome esta arma. Vou soltá-lo. Você
dará uns tiros por aqui, apanhará seu cavalo
ali na rua e dará o fora, está bem? Vá direto
para o rancho.
— Gostei de ver. Está fazendo a coisa
certa, xerife, mas como vai explicar minha
fuga ao patrulheiro?
— Direi que você tinha uma arma oculta
na bota — falou Ives, abrindo a porta da
cela.
Slim sorriu satisfeito, caminhando até a
porta.
— Tentarei ser convincente, xerife —
falou o pistoleiro, engatilhando a arma e
apontando-a para o teto.
Um estalido seco indicou que a arma
estava descarregada. Antes que Slim
pudesse entender o que estava acontecendo,
Ives sacou sua arma e fulminou-o com dois
certeiros balaços.
Rapidamente substituiu a arma
descarregada de Slim por outra municiada.
— O que houve? — indagou Hewke,
surgindo apressadamente com suas armas
nas mãos.
— Devia ser mais cuidadoso, capitão —
falou Ives, com ironia. — Ele tinha uma
arma oculta. Quase foi morto por ele.
— Agiu com muita rapidez, xerife —
observou Hewke, sem argumentos para
contestar as palavras de Ives.
Uma pequena multidão se reuniu às
portas da delegacia. Entre as pessoas que ali
estavam, encontrava-se um pistoleiro que
acabava de chegar à cidade, vindo do
rancho, e era amigo de Slim.
Ao tomar conhecimento do que havia
acontecido, correu à procura de Irah e Duff.
— Eu vou matar aquele xerife pelo que
ele fez — disse ele.
— Calma, Bronson! O xerife não teve
nada a ver com a morte de Slim. Foi tudo
culpa daquele guarda rural.
— Então eu o matarei — rugiu Bronson.
— Acalme-se — continuou Irah. — Nós
o vimos em ação. Ele é veloz demais para
você, mas penso que não conseguiria
escapar de uma emboscada. Por que não
reúne alguns amigos e vão esperá-lo no
Passo do Abutre? Eu cuidarei para que ele
apareça por lá.
— Não preciso de ninguém. Não há outro
melhor do que eu com um rifle por aqui.
Posso matá-lo a meia milha de distância.
— Sei disso, Bronson, mas faça a coisa
bem feita. Haverá uma boa recompensa em
dinheiro para vocês.
— Está bem, farei como me pede, mas
desejo acabar logo com ele.
— Vá para o Passo. Terá sua chance.
Após a saída de Bronson, Duff indagou a
Irah:
— Qual é o plano? Como espera levar o
patrulheiro até lá?
— Ele veio aqui à procura de Kit Bacley,
não? Pois ele vai ao encontro de Kit Bacley.
— E como fará isso?
— Não se preocupe, já sei como fazê-lo
— disse Irah, indo até a porta do saloon e
chamando um mexicano que dormitava
apoiado na parede.
— Si, señor! — atendeu ele,
prontamente.
— José, quero que me faça um favor
muito grande. Poderá beber todo o uísque
que puder depois, está entendendo? —
indagou Irah.
— Si, señor! Gracias, señor!
Irah deu-lhe as instruções. O mexicano
saiu em disparada pela rua, indo ao
encontro de Hewke, na delegacia.
— Está à procura de um gringo chamado
Kit Bacley? — indagou o mexicano ao
patrulheiro.
— Sim, como soube disso?
— As notícias aqui se espalham
rapidamente, señor!
— O que sabe sobre Kit Bacley?
— Há um gringo com esse nome no
Passo do Abutre.
— Como sabe que esse é o nome dele?
— Passei por lá. Falei com ele.
— Está bem, vou verificar. Obrigado!
O mexicano se afastou. Hewke indagou a
uma das pessoas ali por perto onde ficava o
Passo, depois foi apanhar seu cavalo na
estrebaria.
Irah e Duff ficaram satisfeitos ao vê-lo
sair da cidade.
— Desse estamos livres, Duff — falou
Irah, com um suspiro de alívio.
— Já não era sem tempo. Acho que agora
poderemos falar com calma sobre o
carregamento de armas, não?
— Sim, o emissário mexicano chega logo
mais com todas as indicações do local onde
deveremos entregar a carga.
— E quanto a Kit Bacley?
— Parece que Texas Charly resolveu
solucionar aquela sua rixa com ele — falou
Irah, sorrindo significativamente.
— Ótimo! Sinto que tudo volta à
normalidade.
Algum tempo depois, dois mexicanos
entraram no saloon e foram direto para a
mesa deles, onde se sentaram sem
cerimônias.
— Sou Alberto, vim falar sobre os fuzis.
— Ótimo, Alberto. Sou Irah e este é meu
sócio, Duff. É só dizer para onde devemos
mandar a carga e amanhã mesmo vocês a
receberão.
— Quanto custará cada fuzil?
— Cinqüenta dólares.
— Estão em boas condições?
— Estão em excelentes condições, sem
contar com toda a munição, conforme
prometemos.
— Ficamos com todos eles. Sabem onde
fica San Juan?
— Sim, um povoado ao norte de Piedras
Negras...
— Exatamente. Estaremos lá esperando.
Pagaremos em ouro.
— Vou mandar o máximo de fuzis que
tiver a nossa disposição — prometeu Irah.
— Gracias, señores! — agradeceu o
mexicano, retirando-se em seguida.
Irah sorriu satisfeito.
— Agora sim eu sinto que está tudo
caminhando conforme planejamos, sócio!
Bronson engatilhou seu rifle e olhou para
seus companheiros, sorrindo de satisfação.
O sol ardente produzia reflexos nos canos
reluzentes das armas prontas para disparar.
— Lembrem-se que o primeiro tiro é meu
— advertiu Bronson.
— Não se preocupe, Bronson. Estamos
aqui apenas para conferir — falou um
pistoleiro chamado Maddock.
— Nunca errei um tiro — disse Bronson,
frisando bem as palavras.
— Sabemos disso, Bronson.
— Se não fosse a exigência de Irah e
Duff, nenhum de vocês estaria aqui. Eu
poderia muito bem cuidar de tudo sozinho.
— Eu não fazia muita questão de vir
tomar sol aqui, quando poderia estar
tomando uma cerveja gelada no saloon —
informou Maddock, aborrecido.
— Parece que há um cavaleiro se
aproximando — avisou um pistoleiro que
estivera, até então, oculto na parte mais alta
da encosta.
— Deve ser ele — falou Bronson,
impaciente.
— Fique pronto, Bronson. O primeiro
tiro é seu. O resto é conosco.
— Combinado. Até vocês precisam
treinar de vez em quando a pontaria — riu
Bronson, olhando na direção da entrada do
passo.
O ruído de cascos de cavalo foi
aumentando. Os pistoleiros, com os dedos
nos gatilhos, esperavam apenas a figura
montada aparecer por trás de umas rochas
para ser fuzilada.
— Que diabos está havendo? — indagou
Bronson, pondo-se em pé e olhando
surpreso para o cavalo sem cavaleiro.
— Estavam à espera de alguém? —
indagou uma voz firme e ameaçadora atrás
deles.
— Como, diabos, foi parar aí? —
indagou, indignado.
— Vi os reflexos do sol nos canos de
suas armas e não gostei do comitê de
recepção que haviam preparado.
— Foi muito esperto, patrulheiro, mas...
— Então sabe que sou um patrulheiro?
Interessante! Como descobriu isso? E por
que estavam a minha espera? — quis saber
Hewke.
— Não temos satisfações a lhe dar. Não
pense que é senhor da situação. Está diante
de cinco homens, acha que pode com todos
nós?
— Terão que descobrir isso sozinhos,
rapazes. Eu os aconselho a soltarem as
armas. Caso contrário, serei obrigado a
matá-los como vermes que são.
— Está sendo muito convencido,
patrulheiro — observou Bronson, fazendo
um sinal para seus companheiros.
Imediatamente eles levantaram as armas
para disparar. Com rapidez impressionante,
porém, o patrulheiro se antecipou a eles.
Suas armas vomitaram chumbo quente e
morte.
Os corpos rodopiaram, atingidos em
cheio, rolando macabramente pela encosta
pedregosa.
— O que tem a dizer agora? — indagou
Hewke a Bronson.
O pistoleiro era o único que não estava
morto ainda. Hewke o havia ferido
propositadamente no ombro.
Os outros quatro estavam espalhados
agora pela encosta, banhados de sangue e
imóveis.
— Por que não termina logo com isso?
— indagou Bronson, em desespero,
tentando sacar seu revólver.
Hewke chutou-lhe o ombro ferido,
fazendo-o gemer de dor. Tomou-lhe a arma
e depois o fez se levantar.
— Antes de terminar com você, quero
que me responda algumas perguntas.
— Não tenho nada a lhe dizer. Exijo que
me leve para a cidade e que me entregue ao
xerife.
— Por que tanta pressa em ir para a
cadeia? — estranhou Hewke.
Bronson calou-se, dando a entender que
nada mais iria dizer ao patrulheiro.
Hewke foi até um dos cavalos dos
pistoleiros e apanhou um laço. Bronson
tentou correr, mas uma bala assobiou junto
ao seu ouvido, fazendo-o parar.
— O que vai fazer comigo? — indagou
ele, trêmulo.
— Vou apenas poupar trabalho à justiça
— falou Hewke, trançando um nó de forca.
— Não pode fazer isso —protestou
Bronson, olhando para o macabro nó na
ponta da corda.
— A menos que me responda algumas
perguntas.
— Está bem, o que deseja saber?
— Para quem trabalha?
— Para ninguém. Sou dono do meu nariz.
— E por que tentou me matar?
— Por vingança.
— Não me lembro de ter feito nada
contra você antes...
— Você foi o responsável pela morte de
Slim. Eu e ele éramos amigos.
— Ah, entendo! — falou Hewke,
fechando o nó ao redor do pescoço de
Bronson.
— Espere aí, eu estou colaborando com
você. Não pode fazer isso — protestou o
pistoleiro, apavorado ao extremo,
percebendo que Hewke iria mesmo enforcá-
lo.
— Quero respostas melhores ou vou
pendurá-lo na primeira árvore que
encontrar.
— Dê-me um tempo, estou sangrando.
Posso morrer. Preciso de um médico.
— A pressa é sua, parceiro.
— Está bem, eu falo tudo que quiser
saber — prontificou-se Bronson,
cambaleando.
A perda de sangue o havia enfraquecido.
Suas pernas cederam e ele tombou
desmaiado.
Hewke lamentou a má sorte, depois o
amarrou sobre um cavalo. Teria de levá-lo
para a cidade e esperar até que se
recuperasse para contar o que ele desejava
saber.
Na manhã seguinte, Kit Bacley, Texas
Charly e um outro pistoleiro de nome Peter
Dave haviam atravessado a fronteira e
penetrado em território mexicano.
Levavam um carregamento de armas que
deveria ser entregue a um grupo de
revolucionários. Kit dirigia a carroça,
enquanto Texas e Peter cavalgavam um
pouco adiante.
— Quando vamos matá-lo? — quis saber
Peter.
— Calma. Podemos precisar dele ainda
— respondeu Texas, sem esconder seu ódio
por Kit.
— Para quê?
— Até entregarmos as armas e
recebermos o ouro, precisamos contar com
ele e suas pistolas. Não quero nenhuma
surpresa. Um homem como Kit saberá se
impor, caso os mexicanos tentem algum
truque.
— Espera alguma surpresa, então?
— Não, não creio que isso aconteça. Eles
precisam de nós para o fornecimento
constante de armas e munição. Em todo
caso, é bom estar sempre preparado.
Uma hora depois chegavam a um
povoado sonolento chamado San Juan, a
algumas milhas da fronteira.
— Muito bem, pessoal. Os mexicanos
estão nos esperando naquela cantina —
apontou Texas. — Vamos para lá terminar
logo com isso.
— Prefiro ficar aqui e esperar junto com
as armas — falou Kit, descendo da carroça.
— Eu lhe dei uma ordem, insolente! —
vociferou Texas.
— Não obedeço ordens de um rato como
você — respondeu Kit, calmamente.
— Você esgotou a minha paciência, Kit.
Acho que é hora de acertarmos nossas
contas — falou Texas, desmontando.
Peter continuou em seu cavalo,
manobrando-o para posicionar-se às costas
de Kit.
Este, porém, percebeu logo a manobra.
Texas estava mesmo muito confiante, por
isso pôs-se na defensiva, aguardando apenas
um movimento de seu oponente.
— Estou pronto, Texas. Aliás, isto é algo
que eu já devia ter feito antes.
— Pare de falar e prepare-se para morrer.
— Você fala demais — disse Kit,
sacando velozmente.
Texas Charly levou um balaço no meio
da testa e foi jogado para trás, de braços
abertos, na poeira.
Peter mal conseguiu tocar na coronha de
sua arma e já era arremessado ao chão por
um certeiro balaço em pleno peito.
Algumas horas mais tarde, Kit Bacley
entrava no saloon e atirava um saco de
couro com moedas de ouro sobre a mesa
ocupada por Irah e Duff.
Estes, quando o viram, ficaram pálidos,
mas o ouro chamou-lhes mais a atenção.
— Contem — disse Kit, sentando-se e se
servindo de uísque.
— É mais do que havíamos combinado
com os mexicanos — exclamou Irah,
surpreso.
— O que fez? — quis saber Duff.
— Achei que cinqüenta dólares por arma
nova era pouco, por isso pedi oitenta. As
usadas foram por cinqüenta mesmo. Como
estão vendo, também sei negociar. E agora,
podemos ser sócios?
— Onde estão Texas e Peter?
— Eu os matei.
— Você o quê?
— Eu os matei — frisou bem Kit. —
Texas nunca me apreciou mesmo. Mal pôde
esperar uma chance para me acertar. E
então, o que dizem da minha proposta?
Passei no teste?
Irah e Duff se entreolharam. Kit havia
provado que não só era bom com suas
armas, mas muito esperto.
Além disso, ainda poderia ser usado para
resolver uma séria ameaça que pairava
sobre eles, já que Bronson e os outros
haviam falhado vergonhosamente.
— Há um patrulheiro na cidade —
informou Irah, observando-o.
— Sim, e daí? — respondeu o pistoleiro,
com tranqüilidade.
— Ele está a sua procura.
— Então deve ser Hewke Lawrence.
— Sim, esse mesmo.
— Esse patrulheiro já está me
aborrecendo, sempre em meus calcanhares.
Acho que chegou o momento de tirá-lo
definitivamente de minha vida — falou Kit,
ameaçadoramente.
— Acha que pode vencê-lo? — indagou
Duff, afoitamente.
— Sim, já o fiz antes.
— Então mate-o.
Kit olhou-o surpreso e intrigado.
— Por que você deseja que ele morra?
— Porque ele é uma ameaça para nosso
ramo de negócio. Anda bisbilhotando pela
cidade e pode pôr a perder toda a nossa
operação, entendeu?
Kit pensou por instantes, observando os
dois homens. Pareciam nervosos.
— Se eu fizer isso, serei aceito como
sócio?
— O que acha, Irah? — indagou Duff.
— Bem, não temos outra escolha.
— O que decidem? — insistiu Kit.
— Está bem. Seja bem-vindo à
sociedade. Agora é preciso cuidar daquele
patrulheiro o mais depressa possível. Ontem
ele prendeu um de nossos amigos e vai
interrogá-lo logo mais. Poderá descobrir
tudo a nosso respeito.
— Está bem, eu topo essa parada, mas
não posso fazer isso abertamente, com
testemunhas.
— E por que não? — indagou Duff. —
Todos na cidade já sabem que ele está atrás
de você. Se os dois se encontrassem e você
o matasse num duelo, tudo estaria resolvido.
— Sim, só que a partir de então eu teria
toda a Patrulha do Texas nos meus
calcanhares. Conheço aquela gente. São
unidos ao extremo.
— Nós lhe daremos toda a proteção
necessária. O xerife poderá inventar uma
boa história para convencê-los de que você
também foi morto e isso encerrará a
questão. Não iriam sair por aí atrás de um
morto e você estaria tranqüilo para ficar e
gozar do resultado de nosso trabalho.
— É uma boa idéia, mas prefiro fazer
isso a meu modo.
— Como?
— Deixem comigo. Eu cuidarei do
patrulheiro. Ele não os aborrecerá mais.
— E quando será isso?
— Esta noite.
— Ótimo, sócio! Enquanto isso, suba e
descanse um pouco. Mandarei uma das
garotas para lá.
— Excelente idéia — concordou Kit,
com um sorriso.
Assim que ficaram a sós, Duff sorriu com
desprezo, olhando para Irah.
— Vamos mesmo cumprir nossa parte no
acordo? — indagou Irah.
— Nem pensar. Vamos esperar que ele
mate o patrulheiro. Depois daremos um
jeito nele. Não gosto desse tipo. É esperto
demais para podermos ficar constantemente
de olho nele.
— Só que vamos precisar sempre de um
homem de confiança, que saiba mesmo usar
as armas.
— Temos uma porção de homens assim
lá no rancho. Basta escolher um deles, o
melhor, se quiser.
— Pensando bem, há um rapazola que
chegou há poucos dias e passa o dia todo
treinando tiro-ao-alvo. Eu já o vi sacar.
— Sim, sei de quem está falando. É tão
rápido quanto Kit Bacley. Como é mesmo o
nome dele?
— Billy Hustin.
— Isso mesmo. Falaremos com ele.
Agora precisamos pensar num modo de
evitar que Bronson fale até à noite, quando
o patrulheiro será morto.
— Ives cuidará disso, não se preocupe.
As palavras de Irah estavam se realizando
naquele momento, na delegacia.
Hewke havia passado a noite vigiando
Bronson, após ele ter sido medicado.
Não queria que nada lhe acontecesse,
porque Bronson poderia esclarecer muita
coisa que acontecia naquela cidade.
— Você tem que manter a boca fechada,
Bronson — falou Ives, fingindo que o
examinava.
Hewke, tomando um café, não percebia o
que estava acontecendo atrás dele.
— Não poderei evitar. Esse patrulheiro
sabe ser violento. Ele me matará se eu não
falar.
— Não se ficar aí deitado e fingir que
ainda está dormindo.
— Acha que isso o convencerá?
— Sim, ele não poderá força-lo a nada,
enquanto julgar que não está em condições
de falar. Eu também estarei aqui para
impedí-lo.
— Está bem, mas eu me sentiria melhor
se você me desse uma arma...
— Está maluco? Quer pôr tudo a perder?
— indagou Ives, mas, em seguida, ao
raciocinar melhor, passou uma faca para as
mãos de Bronson, que a escondeu sob as
cobertas.
— Como está ele? — indagou Hewke,
aproximando-se
— Está mal, não sei se acordará.
— Não entendo. O médico disse que ele
estaria melhor hoje pela manhã...
— Mas você pode olhar e se certificar.
Por mim esse sujeito está às portas da
morte.
— Diabos! Isso é mesmo uma pena.
Poderia me responder algumas questões
realmente interessantes — falou Hewke,
indo até o fogão e apanhando um pouco
mais de café fumegante.
Olhou para o prisioneiro estendido no
catre e teve uma idéia. Aproximou-se dele
e, simulando um acidente, derrubou um
pouco de café quente no peito de Bronson
que, ao se sentir escaldado, pulou do lugar
onde estava.
— Maldito seja, patrulheiro! —
praguejou ele, brandindo a faca.
A lâmina reluziu no espaço, indo cravar-
se no ombro esquerdo de Hewke, fazendo o
sangue escorrer, manchando sua camisa.
Mesmo pego de surpresa, Hewke ainda
pode aplicar um golpe no estômago de
Bronson, que cambaleou.
O xerife se afastou alguns passos, sem
fazer menção de intervir. Hewke tentou
estancar o sangue que corria de seu ombro.
Sua distração deu tempo a Bronson de se
recuperar e atacar novamente.
A faca, desta vez, passou a milímetros da
garganta de Hewke, que se desviou e
atingiu um potente murro no queixo de
Bronson, atirando-o desacordado contra a
parede.
O xerife, então, sacou sua arma e
disparou duas vezes contra o corpo de
Bronson, fulminando-o.
— Você é uma cavalgadura, xerife! —
explodiu Hewke, avançando contra Ives,
tomando-lhe a arma e esbofeteando-o.
— Está indo longe demais, patrulheiro —
protestou o xerife.
Em resposta, Hewke enfiou o revólver no
coldre do xerife, depois deixou sua mão cair
à altura do seu Colt.
— Está com alguma idéia, xerife? —
desafiou.
Ives mordeu os lábios nervosamente.
Seus dedos tremeram, próximos da coronha
da arma.
Já vira aquele patrulheiro sacar e achou
melhor não se arriscar. A morte de Bronson
já solucionava o problema mais imediato.
— Desculpe-me, acho que me excedi —
falou o xerife, relaxando o corpo.
— É a segunda vez que atrapalha meu
trabalho, matando uma testemunha
importante, xerife. E não pense que suas
atitudes me convencem. Eu suspeito de
você e vai se arrepender se eu provar
alguma coisa. Alguma coisa fede por aqui e
acho que é você, Ives Lang — falou Hewke,
ainda furioso.
— Não pode estar falando sério...
— Pois espere e verá — finalizou
Hewke, deixando o local apressadamente.
Passou por entre as pessoas que se
acotovelavam diante da delegacia.
Uma delas comentou.
— Está morrendo muita gente por aqui,
desde que esse patrulheiro chegou.
— Sim, isso mesmo — concordou outra.
— Por que ele não dá o fora e nos deixa
cuidar de nossa cidade em paz? — emendou
um almofadinha.
Hewke parou e se virou para eles. Seus
olhos fuzilavam de raiva.
— Bando de cegos e covardes! Não
percebem o que há de errado por aqui? Eu
devia mesmo deixá-los a mercê dessa
quadrilha, se não fosse minha obrigação
acabar com ela...
As pessoas se calaram diante da fúria do
patrulheiro.
— Quanto a suas opiniões ridículas,
apenas refletem a covardia que há dentro de
vocês — finalizou ele, afastando-se na
direção da casa do médico.
Becky precisou correr para alcançá-lo.
— Você está bem, Hewke?
— Ainda não sei. O ferimento não parece
profundo.
— Vai à procura do médico?
— Sim...
— Não o encontrará em sua casa agora,
pode acreditar. Eu o vi sair da cidade para ir
atender um chamado de emergência num
rancho aqui perto.
— Diabos! Logo agora que eu precisava
dele.
— Deixe-me ver isso — pediu ela,
retirando a mão dele que cobria o ferimento.
Examinou o local. A faca resvalara no
osso ao entrar e isso deveria estar
provocando muita dor.
Ele estava perdendo sangue, mas a
hemorragia não era séria, pois bastava
pressionar a ferida para que o sangue
estancasse imediatamente.
Morando há tanto tempo em um rancho,
Becky já se habituara a ver feridas como
aquelas.
Tinha experiência suficiente para
concluir que aquela não era das piores e
nem das mais feias que já tinha visto.
— Venha comigo ao hotel, eu cuidarei
disso para você tão bem quanto o próprio
médico.
— Você?
— Sim, por que não?
— Acha mesmo que poderá fazê-lo? —
indagou ele, com surpresa e admiração.
— Sim, já remendei cavalos e vaqueiros
feridos em arame farpado e brigas muitas
vezes. Se prometer que ficará quieto, acho
que poderei dar um jeito nisso também.
— Eu ficarei quieto — prometeu ele.
— Então vamos, apoie-se em mim —
pediu ela, rumando na direção do hotel. —
O que houve lá dentro?
— Aquele xerife idiota de novo... Matou
uma preciosa testemunha que estava
disposta a contar o que está havendo nesta
cidade.
— Eu nunca confiei nesse xerife. É um
espertalhão e não duvido que esteja metido
com Irah e Duff, aqueles dois facínoras que
roubaram meu rancho.
— Acho que você tem razão, Becky. Eu
sinto que ele tem alguma coisa a esconder...
— Vamos cuidar disso agora, antes de
mais nada, depois você poderá continuar
suas investigações. Vou pegar uma garrafa
de uísque para desinfetar a ferida...
Becky ajudou Hewke a chegar até a porta
do hotel. Naquele momento, uma charrete
chegava à cidade e passava diante deles. A
garota que a conduzia olhou e gritou:
— Hewke!
— Belle! O que faz aqui? — indagou
Hewke, parando e olhando a garota.
— Quem é ela? — indagou Becky, mal
disfarçando seu ciúme.
— Uma amiga muito querida, mas muito
louca — respondeu ele.
A garota recém-chegada saltou da
charrete e correu na direção de Hewke.
Era morena e muito bonita. Sua presença
chamou a atenção das pessoas que
passagem, que paravam para olhá-la.
— Puxa, o que houve com você? —
indagou ela, ao ver o ombro ferido.
— Nada grave, não se preocupe.
— E onde está Kit Simon? Soube que
estavam juntos numa missão e...
— Cale-se, Belle! — ordenou Hewke,
visivelmente preocupado.
— Eu disse alguma coisa errada?
— Sim, venha para dentro, onde
conversaremos — convidou-a.
Um dos homens que havia parado para
observar a cena com interesse, virou as
costas e foi direto para o saloon, enquanto
Hewke e as garotas entravam no hotel.
— Acho que há alguma coisa errada por
aqui, Duff — comentou ele, assim que
entrou no saloon.
— Por quê, Ted?
— Não sei ainda, mas uma garota acabou
de chegar numa charrete...
— Não vi garota nenhuma.
— Ela entrou no hotel, em companhia do
patrulheiro e da filha de Murray.
— E o que há de errado nisso? —
estranhou Duff.
— Pelo que ela deu a entender, deveria
haver dois patrulheiros na cidade.
— Dois? — surpreendeu-se Duff,
olhando para Irah.
— Explique-se melhor, Ted — ordenou
Irah.
— Bem, ela cumprimentou o patrulheiro,
depois perguntou por um tal de Kit Simon,
porque sabia que os dois estavam juntos
numa mesma missão.
Os dois chefões se entreolharam,
apreensivos.
— Não estou gostando disso — falou
Duff.
— Isso quer dizer que a Patrulha do
Texas anda farejando coisas por aqui. Mas
quem seria o segundo patrulheiro?
— Não tenho a menor idéia, a menos
que... — interrompeu-se Duff,
empalidecendo.
— O que foi, Duff? — quis saber logo
Irah.
— Talvez nosso amigo Kit Bacley tenha
um outro nome.
— E impossível! Você viu o cartaz de
procurado. O próprio patrulheiro disse que
estava caçando Kit Bacley...
— Essa gente é pior do que cobra, Irah.
— Por que diz isso?
— Porque tudo pode ser um plano para
nos apanhar. Não se esqueça de que a garota
esteve no quartel da Patrulha. E se eles
resolveram investigar as denúncias dela
secretamente? Kit Bacley chegou primeiro e
já descobriu muito a nosso respeito. Se for
um patrulheiro, tem bastante para nos
mandar para a prisão pelo resto de nossas
vidas.
— Diabos! Estava tudo indo tão bem e
agora surge esta confusão.
— Vamos ficar calmos. Acho que
podemos nos sair bem de tudo isso ainda.
— Como?
— Esta noite, talvez até possamos matar
dois coelhos com uma só cajadada.
— Não, acho que não devemos nos
arriscar. Se Kit Bacley é um guarda rural,
temos de eliminá-lo o mais depressa
possível. Ele sabe demais sobre nós. Não
quero correr esse risco.
— Quer começar a agir logo, então?
— Sim, acho que é o melhor a fazer.
— Está bem, então. Vamos fazer do seu
modo. No fundo acho que tem toda razão.
Ted, vá ao rancho e traga alguns de nossos
rapazes. Vamos preparar uma surpresa para
nosso sócio Kit Bacley.
No hotel, Hewke acabava de contar todos
os detalhes de sua missão em Quemados.
Becky era a mais surpresa das duas,
comentando:
— Quer dizer, então, que a Patrulha do
Texas acreditou em mim desde o princípio?
— Sim — informou Hewke. — Apenas
mantivemos tudo em segredo para não
precipitar as coisas. Irah, Duff e o xerife
montaram uma grande operação ilegal por
aqui. Já sabemos, inclusive, que estão
também envolvidos no contrabando de
armas para os revolucionários do México.
— Como descobriram isso?
— Através de Kit Simon, ou Kit Bacley,
como é conhecido aqui, nesta missão.
— Todo o tempo eu pensei que ele não
passasse de um pistoleiro barato e covarde.
— Não diga isso de Kit, Becky —
protestou Belle. — Ele é um dos homens
mais valentes que eu conheço.
— Ainda continuo achando que você não
deveria ter vindo, Belle. Alguém pode ter
ouvido você lá na porta do hotel. Se isso
aconteceu, as coisas poderão se complicar
para Kit, acabando com seu disfarce.
— Mas onde está ele?
— Não sei, mas penso que entrará logo
em contato comigo. Já deve ter reunido as
provas sobre o contrabando de armas. Mais
um pouco e acabaremos com toda essa
trama montada aqui na cidade.
— Eu sinto muito. Não sabia que poderia
atrapalhar. Queria apenas me encontrar com
o Kit. Vocês nunca entraram em operações
assim, disfarçados, pelo que eu sei.
— Tem razão, Belle, mas sempre
operamos no norte do Estado, por isso nos
mandaram para cá.
— Agora entendo e vejo o erro que
cometi — lamentou-se Belle.
— Agora vamos torcer para que ninguém
tenha ouvido você. Caso contrário, pode ter
decretado a sentença de morte de Kit.
— Oh, não, tudo menos isso! —
exclamou a garota.
Kit apenas conversava com a garota
mexicana, quando bateram na porta.
— Quem é? — indagou ele.
— O patrão quer falar com você.
— Já vou descer.
— Seja rápido, o assunto é importante —
frisou a pessoa do outro lado da porta.
Kit pôs o cinturão e verificou a munição
das armas.
— Já vai? Nós ainda nem começamos a
nos divertir — lamentou a garota.
— Fica para outra vez, querida — sorriu
ele, depois abriu a porta e desceu ao
encontro de Irah e Duff.
Eles estavam na mesa de sempre,
esperando por ele.
— Qual é o problema, sócios? —
indagou Kit, servindo-se de uma dose de
uísque.
— Queremos saber como fará para se
livrar daquele patrulheiro — indagou Duff.
— Eu já disse que cuidarei dele a minha
maneira. Não se preocupem quanto a isso.
— Mas fazemos questão de saber como
fará isso — insistiu Irah.
Kit sentiu o clima pesado, como se uma
ameaça pairasse no ar, acima de sua cabeça.
— Está bem. Se insistem nisso, eu lhes
direi como farei — decidiu-se ele.
Naquele momento, meia dúzia de homens
que estava no balcão se virou. Um deles se
adiantou.
— Kit Simon! — chamou ele, em voz
alta.
Nenhum músculo se moveu no rosto de
Kit. Ele continuou falando com Irah e Duff.
— Simon! — insistiu o pistoleiro,
chamado Tab Further.
— Acho que aquele homem está
chamando por você — disse Duff, sondando
sua reação.
— A mim? — surpreendeu-se Kit,
fazendo-se de desentendido e se virando
para encarar o pistoleiro.
Percebeu logo os outros junto dele e
sentiu que estava em apuros.
— Lembra-se de mim, Simon? —insistiu
Tab.
— Acho que está cometendo um engano,
parceiro. Nunca nos vimos antes.
Tab riu zombeteiramente.
— Deixe-me refrescar-lhe a memória,
então. Não quer saber notícias de Belle,
aquela vagabunda?
Kit estremeceu de ódio, analisando a
armadilha em que estava metido e como
faria para se safar dela.
— Seu maldito patrulheiro! — gritou
Irah, começando a se levantar furioso.
Com um pontapé Kit fez com que a mesa
virasse sobre os dois sócios, derrubando-os.
— Fogo nele, rapazes! — ordenou Tab.
Kit sacou suas armas, tentando antecipar-
se a todos os pistoleiros, mas eles também
eram rápidos.
Balas assobiaram ao redor dele, quando
correu e se lançou pela janela, arrebentando
a vidraça e caindo do outro lado.
Rapidamente apanhou seu cavalo e
disparou pela rua principal da cidade.
— Atrás dele, rapazes. Quinhentos
dólares para quem trouxer a sua cabeça —
berrou Irah a todos os pistoleiros no saloon.
Tab e os outros saíram imediatamente em
perseguição a Kit. Ives Lang, o xerife,
chegou correndo.
— O que houve? — quis saber.
— Kit Bacley é um maldito patrulheiro
também — informou Duff.
— Maldição! Temos que matá-lo agora.
Sabe do contrabando de armas.
— Sim, Tab e seus amigos saíram no
encalço dele. Vão apanhá-lo, não se
preocupe.
— Se Kit Bacley é um patrulheiro, na
certa já tem elementos para nos mandar para
a cadeia — observou o xerife.
— É bem possível, mas vamos ter de
encontrar uma forma de resolver isso.
Hewke Lawrence chegou naquele
momento. Sentia-se um pouco fraco em
virtude do ferimento, mas Becky havia feito
um bom remendo em seu ombro.
— O que houve, xerife? — indagou.
— Kit Bacley, o homem que procura,
esteve aqui no saloon. Meus homens quase
o pegaram, mas ele fugiu. Eles foram atrás.
Tenho certeza que o pegarão — falou Duff,
com satisfação, observando a reação do
patrulheiro.
— Kit Bacley? Demônios — praguejou
Hewke, sem entender o que se passava. —
Para que lado foram?
— Para o sul.
Hewke correu e apanhou o primeiro
cavalo que viu pela frente.
— Espere, também vou com você —
disse o xerife, sorrindo de modo
significativo para seus sócios.
— Boa idéia, xerife! — disse Duff.
Enquanto isso, Kit cavalgava
furiosamente, fugindo a seus perseguidores,
mas não conhecia bem aquela região.
Apesar de não saber para onde estava se
dirigindo, não se importou. O que contava
eram aqueles homens atrás dele, disparando
sem cessar.
Num dado momento, uma bala atingiu
seu cavalo e Kit foi arremessado ao chão,
rolando aturdido na poeira.
Recuperou-se rapidamente e apanhou o
rifle na sela, correndo para trás de uma
rocha.
Quando seus perseguidores se
aproximavam, ele disparou, derrubando
dois deles certeiramente.
— Protejam-se, rapazes — ordenou Tab.
Os homens desmontaram rapidamente e
cercaram o local onde Kit estava escondido.
— E agora, Tab? —indagou um
pistoleiro de nome Joe Parks.
— Ele está encurralado, não poderá fugir.
Dentro de pouco tempo anoitecerá e
poderemos nos aproximar dele um pouco
mais.
—Mas pode ser que ele consiga escapar
na escuridão —lembrou o outro.
— Vamos dar um jeito para isso não
acontecer.
— O que tem em mente?
— Diga aos rapazes para jogarem toda
lenha que encontrarem na direção daquela
rocha. Depois, preparem tochas. Quando
anoitecer, nós o veremos se ele se mover,
mas ele não nos verá.
— Entendi. Boa idéia, Tab. Tenho
certeza que dará certo.
— Sim, agora vá cuidar disso. Quero uma
fogueira ao redor daquele homem, quando
anoitecer.
Hewke e Ives haviam escutado o tiroteio,
que cessara pouco depois, porém.
— Eles foram para lá — apontou Ives.
— Sim, mas parece que este cavalo
perdeu uma ferradura — informou Hewke,
freando e desmontando.
Ives desmontou também, analisando a
situação. Hewke mal podia mover um
braço, em virtude do ferimento. Além disso,
estava pálido, possivelmente fraco, sem
muitos reflexos.
— Foi como eu disse. Este cavalo perdeu
uma ferradura — falou Hewke, virando-se
para o xerife.
— Então é o fim da linha para você,
patrulheiro.
— Ainda não, xerife. Podemos continuar
no seu cavalo.
— Acho que não entendeu, Hewke —
falou Ives, preparando-se para sacar.
— Acho que agora entendo o que quer
dizer, xerife — observou o rapaz, pondo-se
na defensiva.
— Não devia ter vindo a esta cidade,
patrulheiro. Foi um erro fatal e isso vai lhe
custar a vida.
— Você vai tentar sacar contra mim?
Sabe que não terá chance, xerife.
— Engana-se. Você está fraco e ferido.
Não sei se conseguirá sacar com a mesma
rapidez de sempre.
— Mesmo assim, ainda posso vencê-lo,
xerife.
— É o que veremos.
— Então por que não saca logo, xerife?
Vai constatar seu erro, quando eu lhe meter
uma bala entre os olhos.
— Já falamos demais.
— Talvez ainda não. Pensei que pudesse
me contar algumas coisas, já que está tão
certo de minha morte.
O xerife riu com ar de superioridade.
— Não negarei esse privilégio a um
homem condenado à morte — afirmou ele.
— O que quer saber?
— Conte-me o motivo disso tudo?
Porque se apossaram do rancho do pai de
Becky, para começar?
— Está bem, de nada lhe adiantará saber
isso.
— Só irei para o inferno melhor
informado - riu Hewke.
O xerife riu com ele e contou-lhe todo o
plano, inclusive sobre o contrabando de
armas que estavam sendo roubadas do
Exército.
— Devo reconhecer que foi um bom
plano. Vocês foram muito espertos, mas não
irão aproveitar o que construíram.
— Agora já sabe o que queria saber.
Chega de conversa. Saque sua arma! —
gritou Ives, levando a mão direita na
direção das coronha de seu Colt.
A mão de Hewke foi mais rápida. Seu
Colt cuspiu chumbo. O corpo de Ives se
abalou numa convulsão, depois rodopiou e
caiu de braços abertos na poeira.
Seu chapéu, levando junto miolos e
cabelos, voou longe e ficou girando no chão
como um pião ensangüentado.
— Eu o avisei, xerife — falou Hewke,
montando o cavalo do outro e cavalgando
na direção de onde ouvira o tiroteio.
Enquanto isso, lá no local, Tab indagava
a Joe:
— O que foi esse tiro?
— Não tenho a menor idéia.
— Acho melhor verificarmos. Pegue dois
homens e vá dar uma olhada nisso.
— Sim, já terminamos com toda a lenha
que encontramos por aqui. Penso até que
poderemos assá-lo vivo imediatamente, sem
ter que esperar a noite.
— Você se arriscaria a levantar a cabeça
para atirar uma tocha, sabendo da pontaria
daquele patrulheiro?
— Tem razão, eu não tinha pensado nisso
— ponderou Joe, chamando mais dois
pistoleiros e se afastando do local.
Cavalgaram meia milha, quando viram o
cavaleiro que se aproximava.
— É aquele maldito patrulheiro —
alertou o pistoleiro chamado Dan Ferguson.
— Maldição! — exclamou Joe.
— Vamos ter que matá-lo.
— Não quero nem pensar em enfrentá-lo
cara a cara, rapazes. Vamos armar uma
emboscada para ele. Naquelas rochas ali
teremos um bom local.
Os três homens foram para lá, e
prepararam suas armas. Hewke se
aproximava rapidamente, sem suspeitar da
ameaça que pairava sobre ele.
Quando o teve em sua mira, Joe disparou
a arma, seguido por seus amigos.
Hewke caiu de seu cavalo como se
tivesse sido mortalmente atingido.
— Com trabalho, rapazes! — elogiou os
Joe, enquanto caminhavam na direção do
patrulheiro caído.
— Ele não teve a menor chance...
Quando estavam próximos, no entanto,
Hewke se pôs em pé num salto. O Colt em
sua mão disparou apenas três vezes.
Os corpos de Joe e seus amigos, com os
olhos arregalados de surpresa, tombaram
juntos numa mesma poça de sangue.
Rapidamente o patrulheiro apanhou seu
cavalo e tomou um outro rumo, a fim de
evitar novas emboscadas.
Momentos depois, do alto de uma colina
que dominava toda a região, ele podia
examinar o cenário daquela batalha.
Kit estava cercado, mas seus
perseguidores não podiam atingí-lo. Só
então ele percebeu aquela lenha toda
acumulada ao redor de Kit.
Deduziu logo o que os bandidos iriam
fazer, por isso tratou de pensar logo numa
forma de livrar seu amigo.
— Vocês aí embaixo! Rendam-se! Estão
cercados — gritou ele, tentando um blefe
para amedrontar os pistoleiros.
— Que diabos está acontecendo agora?
— indagou Tab, assustado.
— Não sei, mas acho que nos cercaram.
Mas quem? — falou um dos pistoleiros ao
seu lado.
— Aqueles tiros... Acho que pegaram Joe
e os outros. Não vamos deixar barato,
rapazes. Vamos começar ateando fogo
agora mesmo naquela lenha. Quero
patrulheiro sendo assado vivo — decidiu
Tab.
Hewke começou a disparar seu rifle. Os
pistoleiros buscaram novos esconderijos.
Alguns tentaram atirar tochas, mas foram
derrubados pela pontaria certeira de Kit.
Um deles, porém, conseguiu atirar uma
tocha, antes de cair varado por uma bala.
— Kit, caia fora daí ou será assado vivo
como um frango. Eu lhe dou cobertura —
gritou Hewke.
— Está bem, isso aqui vai começar a
ficar muito quente. Acha mesmo que pode
me dar proteção?
— Vai ter que confiar em mim.
— Está bem, mas não erre nenhum tiro.
Lá embaixo, porém, Tab percebia que
tudo aquilo fora um blefe.
— Há apenas um sujeito lá encima —
observou Tab.
— Diabos, ele quase ia nos enganando...
— Fogo nos dois — ordenou Tab.
Sob intensa fuzilaria, Kit conseguiu
correr por entre as pedras, entre lascas que
voavam e balas que ricocheteavam,
zumbindo macabramente.
Após algum tempo e muitos riscos,
conseguiu chegar até onde estava seu
parceiro.
— Você está bem? — indagou-lhe
Hewke.
— Sim, mas o mesmo não se pode dizer
de você. O que foi aí no ombro?
— Isso não aconteceu agora. Estou bem,
não se preocupe.
— Eles estão se aproximando.
— Tenho um cavalo ali atrás.
— Não conseguiremos escapar assim.
Vamos ter que lutar.
— Como nos velhos tempos?
— Sim, como nos velhos tempos — disse
Kit, engatilhando seu rifle.
Ao final do tiroteio, os cadáveres dos
pistoleiros jaziam ao sol poente, manchados
de sangue, alguns ainda estrebuchando ou
rastejando e tentando chegar aos cavalos,
mas feridos demais para se salvarem.
Kit olhou para Hewke, enquanto
recarregava suas armas.
— Não entendo... Estava tudo indo bem.
De repente, o inferno se abateu sobre mim
— comentou Kit.
— Assim sem mais nem menos?
— É... De repente suspeitaram de mim...
Apareceu um indivíduo que me conhecia...
Falou inclusive de Belle...
Hewke começou a rir.
— Acho que foi ela a causadora de tudo
isso.
— Belle? Mas como?
— Ela está na cidade.
— Diabos! Aquela maluca veio a minha
procura?
— Sim, isso mesmo.
— E quase me mata com isso?
— Você a conhece. Acho que devia
tomar logo uma providência e se casar com
ela. Sabe como Belle é apaixonada por você
há muito tempo.
— Pois eu acho que vou ter que me casar
mesmo com ela. Vai ser o único modo de
fazê-la sossegar.
— Sim e já devia ter feito isso há muito
tempo. Eu não vou fazer como você.
— Olhe só quem fala. Primeiro vá
encontrar a garota de seus sonhos, depois
venha me dar conselhos.
— Pois eu acho que já a encontrei, Kit —
falou Hewke, com os olhos brilhantes.
Kit olhou-o com incredulidade. Ao ver a
expressão no rosto do amigo, no entanto,
não viu motivos para duvidar.
— Quem é ela, afinal? — indagou.
— Você a conhece, é Becky Murray.
— Sim, eu a conheço. É uma garota
corajosa.
— Isso mesmo, muito corajosa mesmo.
— Meus parabéns! Fez uma ótima
escolha. Posso perguntar quando será o
casamento?
— Ainda não sei...
— Mas você disse que...
— Eu sei, mas não me apresse. Antes de
mais nada eu preciso falar com ela para ver
se ela aceita.
Kit riu divertido, balançando a cabeça.
Hewke era um homem corajoso, mas nada
entendia de garotas e de noivados.
— Bem, Hewke, acho que nada mais
temos a fazer aqui. Descobri uma coisa que
esclarece a respeito do que anda
acontecendo nesta cidade, além do
contrabando de armas no México. Estão
tornando isto aqui num covil de facínoras.
— Sim, descobri isso também. O xerife
me deu todos os detalhes dos planos deles
— falou Hewke, contando ao amigo o que o
xerife havia confessado, antes de morrer.
— Muito esperto eles — reconheceu Kit.
— O que vamos fazer agora? Neste
momento devem estar cercados por todos os
pistoleiros e bandidos que abrigavam. Não
será fácil chegar até eles.
— Sei disso. Estive no rancho, onde fica
o covil. Há muitos homens por lá. Teríamos
que ter um batalhão para enfrentá-los
abertamente.
— Só que não há tempo para comunicar a
Patrulha e esperar providências. Se
suspeitarem que estamos vivos, fugirão para
o México, com certeza, onde nós jamais os
apanharemos. Mas já que você falou em um
batalhão...
— Tem alguma idéia?
— Sim, talvez dê certo.
Naquele momento, na cidade, Irah e Duff
acabavam de reunir todos os pistoleiros que
se abrigavam sob sua proteção.
— Muito bem, rapazes — falou Duff. —
Talvez o problema já tenha sido resolvido,
mas devo avisá-los de que há dois
Patrulheiros do Texas na cidade, prontos
para acabar com o nosso negócio e o
sossego de vocês.
— Para resumir — continuou Irah, —
talvez tenhamos que contar com a ajuda de
vocês para dar um sumiço neles.
— Está bem, podem contar conosco,
desde que isso signifique nosso sossego —
falou um dos homens.
— Ótimo! Era isso o que eu queria ouvir.
Somos vinte homens ao todo, o suficiente
para derrotá-los, caso já não tenham sido
mortos.
— Como que fazendo eco às palavras de
Irah, a voz de Hewke soou forte lá fora, na
rua.
— Vocês aí dentro, têm um minuto para
sair e falar conosco.
— É o patrulheiro — reconheceu Duff.
— Diabos! São piores que demônios! —
vociferou Irah, indo até a porta. — O que
desejam?
— Posso matá-los daqui — falou um dos
pistoleiros.
— Calma, vamos ver o que querem. São
cheios de truques e não iriam se expor dessa
forma se não tivessem um trunfo nas mãos
— comentou Irah. — O que vocês querem?
— gritou para os patrulheiros.
— Vocês aí, saibam que há um batalhão
da Patrulha do Texas cercando a cidade e
pronto para invadi-la, caso vocês não se
entreguem — falou Hewke.
— Está brincando!
— Se olhar para a colina na entrada da
cidade verá que falo sério.
Irah, Duff e os outros olharam naquela
direção. Havia um bando de cavaleiros lá,
como que à espera de um sinal para avançar
sobre a cidade.
— Ele falava sério. Onde está a proteção
que compramos? Vocês nos disseram que
estaríamos seguros aqui — protestou um
dos pistoleiros, furioso.
— Calma, deixem-nos pensar. Que
diabos! Como eles conseguiram a vinda
daquele batalhão? — questionou Irah,
irritado com tudo aquilo.
— Isso não interessa agora. O que
importa é que eles estão lá fora. Somos
muitos, mas nunca seríamos páreo para
esses malditos patrulheiros.
Irah olhou para Duff, sem saber que
decisão tomar.
— Peça um pouco de tempo para
pensarmos — aconselhou Duff.
— Sim, boa idéia!
— Tem que haver um meio de
escaparmos daqui...
— Como? Nossos cavalos estão todos aí
na rua. Não conseguiríamos sair.
— A noite está chegando depressa. A
escuridão será nossa aliada.
Irah voltou-se para a porta e gritou:
— Está bem, dê-nos algum tempo para
pensar, patrulheiro.
— Vocês têm cinco minutos — gritou
Hewke.
Kit, ao lado dele, não estava gostando
muito da idéia, mas o plano, apesar de
maluco, podia dar resultado. Tinha de
reconhecer isso.
— O que está achando, Hewke? —
indagou.
— Até aqui, tudo bem. Parece que
conseguimos assustá-los um pouco...
— Mesmo assim, acho melhor ficarmos
preparados. Talvez tenhamos de lutar.
— Se ao menos pudéssemos contar com
alguma ajuda...
— Não conte com o pessoal da cidade,
Kit. A esta hora estão todos debaixo de suas
camas. Não se intrometerão.
Subitamente, sem que os patrulheiros
pudessem impedí-lo, um cavaleiro desceu a
rua a toda, desmontando diante do saloon e
entrando como um raio.
Estava apavorado e correu ao balcão
apanhar um drinque, que bebeu com mãos
trêmulas.
— O que houve, Doug? — indagou Duff,
curioso.
— Não sei... Não posso entender, mas vi
Tab, o xerife e alguns rapazes mortos e
amarrados em suas celas, lá no alto da
colina. Pensei que estivessem vivos e me
aproximei. Parei para falar com eles...
— Espere um pouco! — falou Duff,
olhando para Irah.
Os dois logo perceberam de que se
tratava tudo aquilo.
— Quer dizer que aqueles cavaleiros lá
no alto da colina são nossos rapazes
mortos?
— Sim, isso mesmo...
— Foi um blefe! — exclamou Irah.
— E quase funcionou. Estão vendo,
rapazes? Aqueles patrulheiros estão sós.
Vamos pegá-los.
— Não é tão fácil assim. Eles não nos
deixarão sair por aquela porta e matá-los —
antecipou-se um dos foragidos.
— É claro que não. Vamos sair pelos
fundos. Metade fica aqui, vigiando-os e
distraindo a atenção deles. A outra metade
sairá e tentará cercá-los.
— Parece-me um bom plano — elogiou
Irah.
Assim, em pouco tempo, Hewke e Kit se
transformaram de caçadores em caçados.
— Não estou gostando desse silêncio —
disse Kit.
— Aquele cavaleiro veio da colina. Deve
ter descoberto nosso blefe e estragado tudo.
Duff e Irah devem estar tramando alguma
coisa. Não sabemos quantos homens eles
têm lá dentro...
— De qualquer forma, vamos nos
precaver. Vamos nos esconder ali no
armazém. Assim que começamos a falar
com os homens no saloon, o proprietário o
fechou e deu o fora. Pelo menos teremos
munição ao nosso alcance para enfrentar
todos eles.
Quando tentaram se levantar, balas
zuniram ao redor deles. Eles responderam
ao fogo com extrema pontaria, arrancando
gritos de dor de seus perseguidores, que
trataram de se abrigar melhor.
Os dois aproveitaram a chance para
chegar até o armazém, arrombando a porta e
entrando.
Buscaram proteção atrás do balcão. Kit
encontrou espingardas, carregando-as e
deixando-as ao seu alcance.
— Há rifles naquela estante ali —
apontou Hewke.
Kit foi apanhá-los. Os dois carregaram
essas armas.
— Pelo menos temos armas e munição
para enfrentar um exército — comentou Kit.
— Pois penso que será isso que teremos
de fazer.
Sombras cruzaram a rua com rapidez.
Momentos depois, uma terrível fuzilaria se
abateu contra o armazém, crivando-o de
balas, arrebentando vidraças e tudo que
estava em seu interior.
Os dois patrulheiros continuaram
escondidos atrás sólido balcão, enquanto, lá
fora, Irah e Duff se exasperavam.
— Diabos! Não vamos conseguir tirá-los
de lá com facilidade — disse Irah.
— Vamos ter que entrar lá...
— Certo, vou passar a ordem para os
rapazes. Um grupo dará cobertura.
Lá dentro, Kit percebeu pelo cessar-fogo
momentâneo que alguma coisa aconteceria
em seguida.
— Acho que tentarão entrar — opinou.
— Apanhe as espingardas. Serão
decisivas para contê-los.
Repentinamente, dois homens se atiraram
para dentro do armazém, saltando através da
janela arrebentada.
Kit e Hewke apertaram instintivamente
os gatilhos das espingardas. As cargas
duplas de chumbo atingiram os bandidos
em pleno salto.
Eles tombaram, estrebuchando cobertos
de sangue.
— Ouça! — disse Kit, apontando para a
porta dos fundos.
Dois homens tentaram entrar, após
arrombar a porta, mas foram barrados por
uma muralha de chumbo que os fez em
pedaços.
— Isto aqui está ficando quente demais
— disse Hewke.
— E estamos só no começo. Vai
esquentar ainda mais!
No mesmo momento, mais três homens
tentaram entrar pela porta da frente.
Kit acertou o primeiro deles, mas os
outros dois conseguiram se abrigar atrás de
algumas caixas.
— Fogo neles! — ordenou Duff, lá fora.
Kit e Hewke tiveram que manter as
cabeças abaixadas, enquanto as balas
arrebentavam tudo ao redor deles.
— Estamos num beco sem saída. Aqueles
dois que entraram poderão cair sobre nós a
qualquer momento...
— Então tome isso — falou Kit,
passando outra espingarda carregada para o
amigo.
Como que adivinhando, os dois
pistoleiros pularam para cima do balcão,
assim que cesso o tiroteio que vinha lá de
fora.
Com incrível reflexo, Kit e Hewke
dispararam as espingardas
instantaneamente.
Os dois pistoleiros tiveram suas cabeças
separadas do corpo, sendo jogados para trás
fulminados.
Meia dúzia de homens, vinda pela porta
dos fundos, rolou pelo assoalho do armazém
disparando suas armas.
Kit e Hewke saltaram para os lados,
disparando seus revólveres com incrível
pontaria e sem piedade.
Nenhum dos pistoleiros que rolava pelo
assoalho se levantou mais.
— Não está dando certo. São uns
demônios! — falou Irah, exasperado.
— Não posso entender. Já perdemos mais
da metade dos homens e nem conseguimos
chegar perto deles ainda...
— Só há um maldito jeito — falou Irah,
indo até o saloon e apanhando um lampião.
Acendeu-o. A chama iluminou seu rosto
crispado e furioso.
— Diabos, homem! Isso pode incendiar
toda esta maldita cidade.
— E daí? Quemados já não será um lugar
seguro para nenhum de nós.
— Nisso você tem razão. Ateie fogo no
armazém. Eu vou até o saloon apanhar
nosso dinheiro no cofre. Encontro-o em
seguida. Acho que chegou a hora de dar o
fora daqui.
— Certo, irei em seguida!
Irah atravessou a rua e se aproximou da
janela do armazém, atirando lá dentro o
lampião aceso.
Quando este se espatifou, espalhando o
querosene, tudo começou a pegar fogo.
— Assim que eles saírem, matem-nos,
rapazes! — ordenou Irah, espantado ao
perceber que poucos haviam sobrado vivos.
Deixou-os à espera dos patrulheiros e
correu para o saloon ao encontro de seu
sócio.
Dentro do armazém, Kit e Hewke
perceberam que não tinham outra
alternativa, a não ser sair e enfrentar a
morte.
— Como vai ser agora, parceiro? —
indagou Hewke.
— Do jeito que o capeta gosta, Hewke —
respondeu Kit, recarregando suas armas. —
Vamos ter que abrir caminho a bala.
— Só gostaria de saber quantos mais
ainda há lá fora...
— Não creio que haja muitos. Acertamos
uma porção deles.
— Por onde sairemos?
— Tenho uma idéia — disse Kit, após
olhar ao redor. — Veja aquela janela lateral.
Vamos nos atirar por ela. Na certa eles estão
vigiando a frente e os fundos. É nossa única
chance.
Ambos verificaram bem suas armas,
depois tomaram posição. Kit correu na
frente, arremessando seu corpo contra a
vidraça, que se espatifou.
Hewke veio atrás. Os dois caíram num
beco ao lado do armazém, rolando para a
rua.
Os pistoleiros que vigiavam a frente,
mesmo de armas nas mãos, foram
apanhados de surpresa e mal tiveram tempo
de apertar os gatilhos de suas armas.
Hewke e Kit derrubaram-nos
impiedosamente com uma saraivada de
balas.
Os que vigiavam os fundos correram pelo
beco, ao encontro das armas dos
patrulheiros, que terminaram a limpeza,
fuzilando-os também.
Os dois ficaram abrigados atrás de um
bebedouro, observando.
— Parece que está tudo limpo agora —
falou Hewke.
— Onde estarão aqueles dois covardes,
Irah e Duff? — observou Kit.
— Lá estão eles — apontou Hewke, no
exato momento em que os dois saíam do
saloon e pulavam para as selas de seus
cavalos.
— Estão vindo nesta direção — alertou
Kit.
Os dois patrulheiros foram para o meio
da rua, fazendo sinais para que os dois fora-
da-lei se entregassem. Desesperados, Duff e
Irah atiraram seus cavalos sobre os dois
patrulheiros, enquanto disparavam suas
armas como loucos. Hewke e Kit pularam
para os lados, rolando na poeira, ao mesmo
tempo em que disparavam certeiramente
seus revólveres. Duff e Irah foram jogados
fora de suas montarias, caindo pesadamente
na poeira. Ainda tentaram se levantar e
disparar suas armas, mas nova descarga das
armas dos patrulheiros prostrou-os sem
vida, no meio da rua principal. Quando tudo
silenciou, os habitantes da cidade
começaram a sair à rua.
— Apaguem esse fogo ou esta maldita
cidade será riscada do mapa — gritou Kit.
Imediatamente foram formadas algumas
brigadas com baldes, pás e machados,
dispostas a lutar contra o incêndio.
Hewke e Kit não se importaram com
mais nada. Dois vultos de mulher deixaram
o hotel e correram pela rua na direção deles.
— Você me tirou um peso dos ombros
quando confessou estar apaixonada por Kit
— falou Becky.
— Estou tentando levá-lo ao altar há
cinco anos... Espero que não demore tanto
com Hewke...
— Acha mesmo que ele gosta de mim?
— Claro que sim... Eu posso jurar que ele
a ama — afirmou Becky. — É uma mulher
de sorte, Becky. Hewke é um bom rapaz...
Os dois patrulheiros haviam guardado
suas armas e caminhavam agora, resolutos e
satisfeitos, na direção daqueles braços
abertos.
— Vai se declarar a ela? — indagou Kit.
— Só se você pedir Belle em
casamento...
— Pois então prepare-se, porque é isso
que eu farei — confessou Kit.
Hewke sorriu e seu olhar cravou-se na
figura emocionada que corria em sua
direção.
L P Baçan O Mago das Letras
1975: escreveu e publicou seu primeiro
livro de bolso, a novela Uma Tese
para o Amor, pela Editora Cedibra,
Rio de Janeiro, passando, daí, a
escrever mensalmente novelas por
encomenda para essa e outras
editoras.
1985: teve 11 letras incluídas no LP
Saudação ao Mato Grosso, da dupla
Estudante & Caminhoneiro.
1986: teve 6 letras incluídas no LP
Oração de Um Caminhoneiro, da
mesma dupla.
1991: participou da Coletânea do I
Concurso Nacional de Literatura da
FENAE, com um conto premiado
em 1º. lugar.
1994: participou da Antologia Os Poetas,
do V Concurso Helena Kolody de
Poesia, Governo do Paraná, Curitiba
– PR.
1995: traduziu a obra El Contuberneo
Judeo-Maçónico-Comunista, de José
Antonio Ferrer Benimelli, em 2
volumes intitulados Maçonaria &
Satanismo, para a Editora "A
Trolha".
1996: publicou a novela rural Sassarico,
sobre o fim do ciclo do café, início
da rotação de culturas (soja e trigo)
e surgimento dos bóias-frias e editou
os livros Vida Minha, de Emília
Ramos de Oliveira (biografia) e
Círculo Vicioso, de Arlene Cirino de
Oliveira.
1997: participou da coletânea Poema,
Poesia... Maçom, Maçonaria,
organizada por Mário Cardoso para
a Editora Arte Real.
1998: publicou o livro de poemas
Alchimia.
1999: publicou o livro Redação Passo a
Passo e editou o livro URAÍ - Nossa
Terra, Nossa Gente, 2 volumes, de
Emília Ramos de Oliveira.
2000: teve 2 letras incluídas no CD
Nosso Negócio É Cantar, da dupla
Márcio Rogério & Luciano e 3 letras
no CD Mais, do cantor Cícero de
Souza. Publicou, neste ano de 2000,
Brincando nos Caminhos do Senhor,
revista infantil cristã, Editora e
Gráfica Cotação da Construção,
Londrina – PR.
2001: editou e prefaciou o livro
Templários, de Lori Andrei Perez
Baçan.
2002: foi o autor da letra do hino da Loja
Maçônica Londrina, em parceria
com o músico Wilmar Cirino.
2004: organizou, editou e participou do
livro I Antologia do Portal "Cá
Estamos Nós".
2006: organizou, editou e participou do
livro II Antologia do Portal "Cá
Estamos Nós".
2007: publicou os livros A Sabedoria dos
Salmos, A Sociedade Secreta dos
Templários e O Livro Secreto da
Maçonaria, pela Universo dos
Livros Editora Ltda.
2010: publicou os livros Manual da
Futura Mamãe, Quem Disse Que
Cozinha Não è Lugar de Homem e
Receitas Naturais pela editora
Universo dos Livros. Editou o livro
de contos Solidariedade, do autor
baiano João Justiniano da Fonseca.
Produziu, dirigiu e apresentou uma
série de 7 (sete) programas
radiofônicos Vila das Artes, na
Rádio Boa Nova FM, de Pérola, PR,
sobre literatura atual.
2012: traduziu, editou e publicou o livro
A Origem do Satanismo na
Maçonaria, de Arthur Edward
Waite.
2013: traduziu, editou e publicou em
formato eletrônico os livros Carmila,
de J Sheridan LeFanu, e Teoria da
Esgrima a Cavalo, de Alex Muller,
Anjos, o Caminho de Volta, Os Olhos
do Carrasco, Novelas de Terror
(Volumes I e II) Novelas Policiais
(Volumes I a 7) e Novelas de Faroeste
(Volumes I a IX) pela Lulu Press, Inc.
e Editora Saraiva.
1975 até 2015: hoje escreveu mais de 700
livros, publicados em sua maioria
em formato de bolso, sobre os mais
diferentes assuntos, como:
romances, erotismo, palavras
cruzadas, charadas, passatempos,
literatura infantil, passatempos
infantis, horóscopos, esoterismo,
simpatias populares, rezas, orações,
intenções, anjos, fadas, gnomos,
elementais, amuletos, talismãs,
estresse, manuais práticos, religião e
outros livros de bolso com os mais
diversos temas e letras para músicas.
Já editou em formato eletrônico
mais de 1000 títulos, entre
publicações individuais e antologias,
de autores de Língua Portuguesa e
Espanhola.
Publicou ao longo dos últimos 40 anos
poemas e contos em jornais de
circulação regional. Ultimamente,
Tem traduzido e editado livros
eletrônicos e empenhado em editar
todos seus títulos em formato
eletrônico para serem
disponibilizados a seus leitores.
www.acasadomagodasletras.net