Upload
vanthien
View
216
Download
1
Embed Size (px)
Citation preview
IV CONGRESSO NACIONAL DA FEPODI
ACESSO À JUSTIÇA
LIVIA GAIGHER BOSIO CAMPELLO
MARIANA RIBEIRO SANTIAGO
Copyright © 2016 Federação Nacional Dos Pós-Graduandos Em Direito
Todos os direitos reservados e protegidos. Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados sem prévia autorização dos editores.
Diretoria – FEPODI Presidente - Yuri Nathan da Costa Lannes (UNINOVE) 1º vice-presidente: Eudes Vitor Bezerra (PUC-SP) 2º vice-presidente: Marcelo de Mello Vieira (PUC-MG) Secretário Executivo: Leonardo Raphael de Matos (UNINOVE) Tesoureiro: Sérgio Braga (PUCSP) Diretora de Comunicação: Vivian Gregori (USP) 1º Diretora de Políticas Institucionais: Cyntia Farias (PUC-SP) Diretor de Relações Internacionais: Valter Moura do Carmo (UFSC) Diretor de Instituições Particulares: Pedro Gomes Andrade (Dom Helder Câmara) Diretor de Instituições Públicas: Nevitton Souza (UFES) Diretor de Eventos Acadêmicos: Abimael Ortiz Barros (UNICURITIBA) Diretora de Pós-Graduação Lato Sensu: Thais Estevão Saconato (UNIVEM) Vice-Presidente Regional Sul: Glauce Cazassa de Arruda (UNICURITIBA) Vice-Presidente Regional Sudeste: Jackson Passos (PUCSP) Vice-Presidente Regional Norte: Almério Augusto Cabral dos Anjos de Castro e Costa (UEA) Vice-Presidente Regional Nordeste: Osvaldo Resende Neto (UFS) COLABORADORES: Ana Claudia Rui Cardia Ana Cristina Lemos Roque Daniele de Andrade Rodrigues Stephanie Detmer di Martin Vienna Tiago Antunes Rezende
ET84
Ética, ciência e cultura jurídica: IV Congresso Nacional da FEPODI: [Recurso eletrônico on-line]
organização FEPODI/ CONPEDI/ANPG/PUC-SP/UNINOVE;
coordenadores: Livia Gaigher Bosio Campello, Mariana Ribeiro Santiago – São Paulo:
FEPODI, 2015.
Inclui bibliografia
ISBN: 978-85-5505-143-2
Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações
Tema: Ética, ciência e cultura jurídica
1. Direito – Estudo e ensino (Pós-graduação) – Brasil – Congressos. 2. Ética. 3. Ciência. 4.
Cultura jurídica. I. Congresso Nacional da FEPODI. (4. : 2015 : São Paulo, SP).
CDU: 34
www.fepodi.org
IV CONGRESSO NACIONAL DA FEPODI
ACESSO À JUSTIÇA
Apresentação
Apresentamos à toda a comunidade acadêmica, com grande satisfação, os anais do IV
Congresso Nacional da Federação de Pós-Graduandos em Direito – FEPODI, sediado na
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo –PUC/SP, entre os dias 01 e 02 de outubro de
2015, com o tema “Ética, Ciência e Cultura Jurídica”.
Na quarta edição destes anais, como resultado de um trabalho desenvolvido por toda a equipe
FEPODI em torno desta quarta edição do Congresso, se tem aproximadamente 300 trabalhos
aprovados e apresentados no evento, divididos em 17 Grupos de Trabalhos, nas mais
variadas áreas do direito, reunindo alunos das cinco regiões do Brasil e de diversas
universidades.
A participação desses alunos mostra à comunidade acadêmica que é preciso criar mais
espaços para o diálogo, para a reflexão e para a trota e propagação de experiências,
reafirmando o papel de responsabilidade científica e acadêmica que a FEPODI tem com o
direito e com o Brasil.
O Formato para a apresentação dos trabalhos (resumos expandidos) auxilia sobremaneira este
desenvolvimento acadêmico, ao passo que se apresenta ideias iniciais sobre uma determinada
temática, permite com considerável flexibilidade a absorção de sugestões e nortes, tornando
proveitoso aqueles momentos utilizados nos Grupos de Trabalho.
Esses anais trazem uma parcela do que representa este grande evento científico, como se
fosse um retrato de um momento histórico, com a capacidade de transmitir uma parcela de
conhecimento, com objetivo de propiciar a consulta e auxiliar no desenvolvimento de novos
trabalhos.
Assim, é com esse grande propósito, que nos orgulhamos de trazer ao público estes anais
que, há alguns anos, têm contribuindo para a pesquisa no direito, nas suas várias
especialidades, trazendo ao público cada vez melhores e mais qualificados debates,
corroborando o nosso apostolado com a defesa da pós-graduação no Brasil. Desejamos a
você uma proveitosa leitura!
São Paulo, outubro de 2015.
Yuri Nathan da Costa Lannes
O DIREITO PROCESSUAL CIVIL E O NOVO CÓDIGO SOB A ÓTICA DO ACESSO À JUSTIÇA
THE PROCEDURE AND THE NEW CIVIL CODE UNDER THE ACCESS TO JUSTICE OPTICAL
Adriano BonamettiAndré Luís Mattos Silva
Resumo
Antes de se tratar de um novo Código de Processo Civil, como uma inovação de
procedimentos dentro da esfera civil, o novo estatuto traz em si muito mais uma reforma
substancial e significativa para a ampliação do acesso e melhoria da distribuição da Justiça.
Essa renovação e adequação do novo processo aos tempos atuais se fizeram necessárias
porquanto a legislação a substituir, embora tenha sofrido inúmeras alterações, já completara
quarenta anos de vigência. Restaram, contudo, mantidas as linhas principais do processo,
bem como estão ratificadas práticas e alterações legislativas antes realizadas e que tiveram a
mesma finalidade, de maior acesso e melhor exercício da jurisdição. As diferentes visões e
objetivos do processo, que são utilizados para conferir maior efetividade e celeridade a ele,
passam pela necessidade de ampliação do acesso do povo à Justiça. No que se refere
especificamente ao direito processual civil, são significativas as mudanças do novo código
que auxiliarão na consecução desse intento, de buscar menos morosidade e maior efetividade
ao processo.
Palavras-chave: Direito processual civil, Novo código, Acesso à justiça
Abstract/Resumen/Résumé
Before it is a new Civil Procedure Code, as an innovative procedures within the civil area,
the new status brings with it more substantial and meaningful reform to expand access and
improve the distribution of the justice. This renewal and adaptation of the new process to
current times were necessary because the legislation was replaced, although it has undergone
many changes since completed forty years of validity. There remained, however, kept the
main lines of the process, and are ratified practices and legislative changes made before and
who had the same purpose, greater access and better exercise of jurisdiction. The different
views and goals of the process, which are used to ensure greater effectiveness and speed to it,
pass by the need to increase access of the people to justice. With specific reference to civil
procedural law, the changes are significant new code that will assist in achieving that
purpose, to seek less delays and more effectively to the process.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Civil litigation, New code, Access to justice
116
INTRODUÇÃO
A busca por um processo mais célere, efetivo e justo, seja ele civil, penal ou
trabalhista, é uma constante de todos os países democráticos com razoável nível de
desenvolvimento do Direito. Princípios e regras basilares do processo, inerentes a um Estado
Democrático de Direito, em regra estão erigidos ao status constitucional.
Entre nós, o primeiro Código de Processo Civil surgiu em 1939, sem levar em
consideração as legislações que anteriormente regravam o processo civil brasileiro. O estatuto
em vigor, de 1973, já se constituiu uma significativa mudança de paradigmas, sobretudo em
razão das sucessivas mudanças pelas quais passou através desses mais de quarenta anos de
vigência.
Para além dessas transformações verificadas – extremamente necessárias e
modernizadoras das regras do processo – a promulgação de um novo codex traz elementos
contemporâneos e mais adequados aos anseios da sociedade atual, especialmente aqueles que
tendem a diminuir a lentidão da máquina judiciária e conferir maior segurança jurídica aos
jurisdicionados.
É certo, contudo, que as linhas principais do atual estatuto processual serão mantidas,
como não poderia deixar de ser, até por imperativo constitucional. Ficando então inalterados
os mais importantes aspectos do atual Código de Processo Civil, mormente aqueles
relacionados ao devido processo legal, ao juiz natural, ao direito de defesa, ao contraditório,
ao processo justo enfim.
Também serão mantidas as principais espécies de tutela jurisdicional (urgentes ou
não); a necessidade da existência dos pressupostos de constituição e desenvolvimento
processuais; bem como a garantia de todos os princípios constitucionais aplicáveis ao
processo, aqui mencionados de forma exemplificativa e que não serão pormenorizadamente
tratados neste artigo, por não se constituir tema principal.
A par da manutenção da essência do processo como instrumento de aplicação do
direito material ao caso concreto que é submetido ao Poder Judiciário, prioritária a análise dos
pontos contidos nas principais reformas, anteriores e do novo código, que se destinam a
ampliar o acesso ao Poder Judiciário, seja através das ações afirmativas, legislações conexas e
criação de instrumentos de universalização do acesso.
Também de mesmo objetivo é a criação de mecanismos processuais, sobretudo no
novo Código de Processo Civil, aptos a proporcionar uma melhor distribuição da justiça, seja
pela simplificação de procedimentos e recursos, seja pelo julgamento conjunto de ações
117
2
idênticas reunidas, seja através de meios usados para a diminuição dos desníveis
eventualmente verificados entre os litigantes.
E ainda há, no âmbito da nova disciplina processual e acompanhando diversas outras
legislações esparsas, previsões acerca da solução alternativa de conflitos de interesses, sem
que haja a necessidade da prestação jurisdicional tradicional, concedida através dos
provimentos jurisdicionais emanados da atividade processual, ou seja, do próprio ofício
judicante.
Do cotejo das principais disposições inovadoras de nossa nova lei processual e de
outros diplomas legais com a realidade do acesso à justiça é que se extrai a questão
relacionada ao grau de sucesso que se pode atingir com o novo estatuto processual e suas
disposições, inovadoras ou confirmadoras de tendências e legislações anteriores, no sentido de
se conferir maior efetividade ao processo, para um sempre maior número de pessoas.
O resultado dessa análise não é simples tampouco estanque no tempo, devendo-se
fazer continuamente, pois certamente é dinâmico e necessário o aperfeiçoamento dos
dispositivos legais, eminentemente processuais ou não, que alcancem o objetivo maior, de
uma justiça mais acessível, célere e efetiva.
ASPECTOS INTRODUTÓRIOS DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL
O direito processual, enquanto ramo do direito e ciência autônoma, estudado a partir
de princípios e regramentos próprios, é relativamente recente enquanto comparado com outros
ramos do direito.
É certo que no Direito praticado em Roma, o processo como meio de solução aos
conflitos de interesses teve destaque ímpar, sendo que os doutrinadores dividem o processo
civil romano em três fases: o período das legis actiones, com predominância da oralidade; o
período formulário, no qual havia uma base escrita, conquanto ainda prevalente a forma
verbalizada; e período da extraordinaria cognitio, com a predominância do direito escrito
(GONÇALVES, 2010).
No terceiro período, surgiram as primeiras regras e princípios que cuidavam do
exercício da jurisdição e da própria formação e desenvolvimento do processo, ou seja, de seu
início, com o pedido inicial até o momento da solução final da controvérsia, a sentença
(THEODORO JÚNIOR, 2006).
Todavia, somente após a publicação do alemão Oskar Von Bulow, na obra intitulada
“teoria dos pressupostos processuais e das exceções dilatórias” surgiu o regramento da relação
118
3
jurídica processual, mediante a previsão de um conjunto de ônus, poderes e deveres entre as
partes do litígio.
A partir da obra de Von Bulow, o direito processual adquiriu autonomia enquanto
ciência e teve considerável desenvolvimento a partir dos estudos de grandes juristas italianos
e alemães (GONÇALVES, 2010).
Entre nós, o atual Código de Processo Civil sofreu diversas alterações e reformas,
sempre no sentido de se obter maior celeridade e efetividade do processo enquanto
instrumento de aplicação do direito material ao caso concreto, de atuação do Estado através
do exercício, monopolista, da jurisdição.
Funciona o direito processual civil, então, como principal instrumento
do Estado para o exercício do Poder Jurisdicional. Nele se encontram as
normas e princípios básicos que subsidiam os diversos ramos do direito
processual, como um todo, e sua aplicação faz-se por exclusão, a todo e
qualquer conflito não abrangido pelos demais processos, que podem ser
considerados especiais, enquanto o civil seria o geral. (THEODORO
JÚNIOR, 2006, p.7)
Dentre as significativas mudanças não só no próprio texto codificado, mas também por
meio da promulgação de diversas novas legislações complementares ou extravagantes,
merecem ênfase aquelas cujo objetivo fora a superação dos obstáculos não só para maior
distribuição da Justiça entre aqueles que a procuram, mas especialmente uma ampliação de
acesso e informação àqueles dela mais distantes.
A grande reforma que se fez, nos últimos anos, nos textos do código e na legislação
esparsa, portanto, apontam para o mesmo e confessado propósito de desburocratizar os
procedimentos adotados nos processos judiciais e acelerar o resultado pretendido nessas
demandas, a própria prestação jurisdicional.
A limitação, voluntária ou provocada, do acesso à justiça, além de produzir
insatisfação e desconfiança da população nas instituições jurídicas, tende a reforçar a
litigiosidade entre os membros de uma sociedade. São exemplos as comunidades nas quais
pouco ou nada atua o Estado para solucionar conflitos de interesses, o que gera o
recrudescimento da violência e, em alguns casos não raros, o surgimento de “justiceiros”
populares.
119
4
Disso decorre, portanto, a constante preocupação em encontrar-se soluções técnicas
que possam realmente propiciar um maior e mais efetivo acesso à justiça. No particular, são
notáveis e inegáveis as inovações trazidas pelos Juizados Especiais, inicialmente no âmbito da
justiça estadual e posteriormente na justiça federal.
“ Instrumentalismo e efetividade são idéias que se complementam na formação do
ideário do processualismo moderno. Para ser efetivo no alcance das metas de direito
substancial, o processo tem de assumir plenamente sua função de instrumento.”
(THEODORO JÚNIOR, 2006, p.20)
Assim, os Juizados Especiais no Brasil são pautados pelo procedimento simples, ágil e
menos custoso. Sua função, portanto, é atender ao justo anseio de todo cidadão de ser ouvidos
no que concerne aos seus problemas jurídicos, sejam eles de natureza privada, em regra a ser
solucionado junto aos juizados estaduais, seja de conflitos de interesses entre as pessoas e os
entes da administração pública, como o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que se dá
por meio dos Juizados Federais (MARINONI, 1996).
As causas de menor valor e complexidade dispensam o patrocínio da causa por
advogado, o que gera menor burocracia e mais fácil acesso à jurisdição. Qualquer cidadão, em
determinadas hipóteses, pode, pessoal e diretamente, dirigir-se a um desses órgãos do Poder
Judiciário, pleitear e obter a resposta para seu anseio, de forma gratuita.
As sucessivas reformas do processo transcendem do sentido de mero
ingresso e buscam nova face ao desenvolvimento dessa atuação no processo,
que gravita sob a efetividade, princípio alçado a nível constitucional e que
ganhou nova ênfase, ainda que antes apenas implícito em nosso
ordenamento. (CIANCI, 2009, p. 23)
Malgrado a gratuidade profissional do advogado também se constitua garantia de
nossa Constituição Federal, a gratuidade das taxas, despesas e custas judiciais, verificada nos
juizados especiais, a também caracterizá-los, facilitam o acesso independente.
A mais dramática reforma da assistência judiciária teve lugar nos
últimos 12 anos. A consciência social que redespertou, especialmente no
curso da década de 60, colocou a assistência judiciária no topo das reformas
judiciárias. A contradição entre o ideal teórico do acesso efetivo e os
sistemas totalmente inadequados de assistência judiciária tornou-se cada vez
mais intolerável. (CAPPELLETTI, 1988, p.33)
120
5
A promoção da conciliação, figura central nos juizados estaduais, constitui-se ainda
requisito essencial para a passagem para a fase de instrução e julgamento, garantida a
participação popular nessa primeira fase do processo, uma vez que os juízes leigos e os
conciliadores serão recrutados entre os membros da sociedade, preferencialmente entre
bacharéis em Direito e advogados.
Além desses aspectos, importante a chamada deformalização do processo nos juizados
(MARINONI, 1996), pois o pedido inicial e a contestação podem ser apresentadas oralmente,
por exemplo.
Mas não é só, outras medidas e legislações foram adotadas e promulgadas ao escopo
da busca pela superação dos obstáculos normalmente verificados em relação ao processo
judicial em geral, como a criação dos juízos universitários; o aperfeiçoamento e ampliação da
assistência judiciária gratuita; a informação acerca de direitos e a própria otimização da
atividade jurisdicional, especialmente através da implantação, recente, dos processos
eletrônicos em quase todos os tribunais do país.
Considerando todos esses avanços, mencionados apenas a título de exemplo nesse
artigo, trazidos pelo legislador em suas inúmeras alterações, reformas e elaboração de novos
diplomas legais, surgiu, há muito, a corrente de entendimento segundo a qual se faz(ia)
necessária a elaboração de um novo Código de Processo Civil, o que se deu por meio da
formação de uma comissão de notáveis juristas com esse mister, por iniciativa do Senado
Federal.
Promulgada está, por conseguinte, a Lei nº 13.105, de 16.03.2015, cuja vacatio legis é
de um ano a contar de sua publicação, em 16.03.2015, instituindo o Novo Código de Processo
Civil Brasileiro (NCPC), que trouxe muito mais uma significativa reforma, adequação e
adaptação aos novos tempos do que propriamente uma inovação total do processo civil.
Isso se dá até por imperativo constitucional, uma vez que as garantias e os princípios
constitucionais aplicáveis ao processo permanecem. E assim realmente deve ser, porquanto
vivemos em um Estado Democrático de Direito, cujos valores são inegociáveis, sobretudo
quando se trata de um processo judicial, como, por exemplo, o direito à ampla defesa; ao
contraditório; ao devido processo legal; ao duplo grau de jurisdição etc.
A questão que se coloca, contudo, está relacionada até que ponto os elementos e
institutos trazidos pelo novo estatuto processual estarão aptos a efetivamente melhorar a
atuação do Poder Judiciário e responder aos jurisdicionados aquilo que se constitui sua maior
queixa: a lentidão dos processos e a falta de segurança jurídica (WAMBIER, 2015).
121
6
Antes, porém, de se adentrar aos novos dispositivos capazes de atingir o objetivo
colimado no processo, necessária uma breve análise da forma de se observar o processo, suas
características e fins.
VISÕES SOBRE O PROCESSO
Como visto alhures, o surgimento da teoria e da ciência do processo passa pela própria
evolução histórica da sociedade. Sendo assim, a teoria do processo reflete a ideia de uma
época, da noção de Estado de um determinado momento histórico.
E é por isso que a Constituição Federal usualmente traça as linhas principais do
processo judicial, estabelecendo uma tutela constitucional do processo, de modo a garantir o
funcionamento do processo e da própria atuação jurisdicional do Estado conforme as regras e
os princípios que se encontram vincados em valores maiores, constitucionais.
Não parece equivocado concluir que o processo autêntico – enquanto ciência, teoria e
prática – teve lugar com o surgimento da proibição estatal de se fazer justiça com as próprias
mãos. Em outras palavras, ao proibir a auto-tutela, o Estado trouxe para si a aplicação do
direito como interesse público em si mesmo, estruturando o sistema de direitos e garantias
individuais.
O Poder Judiciário é, portanto, um poder político imprescindível ao equilíbrio social e
democrático, pois o Estado, decidindo os conflitos e impondo suas decisões, fazendo lei entre
as partes, afirma seu próprio poder de autoridade, personificado no magistrado.
Na mesma visão política do processo estão as garantias constitucionais protegidas
processualmente em face de eventuais arbítrios dos agentes estatais. São os chamados
remédios constitucionais, que se constituem instrumentos processuais para a garantia das
liberdades públicas. Por isso também denominada jurisdição constitucional das liberdades.
No tocante ao processo civil e ao próprio direito material não penal, há a previsão
constitucional no sentido de constituir o mandado de segurança garantidor dos direitos em
geral, excetuados aqueles relacionados à liberdade de locomoção, dos indivíduos.
Trata-se de importante meio político-processual para limitar, de forma adequada, o
exercício do Poder Público nas suas mais variadas vertentes, não só para permitir a
impugnação de quaisquer desses atos, como também, e principalmente, para corrigir os atos
ilegais ou abusivos praticados pelos agentes do Estado ou assemelhados.
122
7
As ações coletivas e até mesmo a ação civil pública são mecanismos de atuação
política através do processo, com uma participação mais intensa do cidadão no poder político
do Estado, vez que o cidadão comum, isoladamente, encontra dificuldades para fazê-lo.
No caminho da realização da democracia social e participativa, parece correto que o
processo se apresenta apto para tanto, na medida em que a finalidade da jurisdição pode ser
concebida como algo destinado à realização do bem comum, que é a essência dos valores de
um povo, em determinado momento histórico.
Por isso, a finalidade social do processo encontra apoio na sociedade contemporânea,
pois, conquanto a democracia seja considerada meio para se atingir os anseios da coletividade,
o exercício da jurisdição, em determinados casos, se destina a realizar os objetivos da
democracia social e participativa. Aliás, uma das funções mais importantes do processo, como
sabido, é servir de instrumento para a pacificação social.
Dentre as visões segundo os diferentes escopos do processo e da própria jurisdição
estão ainda os jurídicos, que são aqueles decorrentes da atuação da vontade concreta do
direito, da lei. Para tal fim é que existe o processo. É meio, é instrumento, para a obtenção do
bem da vida a que cada um tem direito.
Parece correto o pensamento de Aristóteles, para quem a justiça é a distribuição dos
bens, das vantagens sociais, das benesses advindas do fato de se viver em sociedade. E essa
distribuição tem a ver com uma proporção, por isso refere-se a um meio termo, a chamada
“justa medida social”.
Metaforicamente é o ponto equidistante numa linha entre dois extremos. O justo,
portanto, é o igual. É uma espécie de ponto de igualdade encontrado a partir da utilização de
critérios de proporção.
A maior contribuição de Aristóteles foi desenvolver as noções de
justiça distributiva e de igualdade geométrica: na distribuição dos bens entre
os sujeitos deve-se considerar que, não sendo iguais, não receberão as
mesmas concessões – a noção de justiça determina que sejam dadas coisas
iguais aos iguais e coisas desiguais aos desiguais. (TARTUCE, 2012, p. 31)
Dos princípios sociais da democracia – a vida, a liberdade, e propriedade, a igualdade
e a segurança – destacam-se aqueles que são próprios da natureza humana: a igualdade; a
liberdade e a propriedade.
123
8
O garantia da observância e respeito a esses princípios, a segurança, é buscada através
do processo, como situação e relação jurídica e até mesmo como instituição. Sendo assim, o
processo, em regra, deriva da dinâmica das atividades das partes sob o comando do juiz.
A atividade jurisdicional e todas aquelas à ela inerentes, postas em prática pelo próprio
Estado, devem assegurar os direitos fundamentais de quaisquer categorias, sendo que dentre
elas estão inclusas as minorias, os menos favorecidos.
Por isso o processo não pode ignorar os diferentes níveis dos litigantes, devendo
existir uma isonomia dinâmica do processo que transcende a igualdade formal, erigido a
princípio, segundo o qual todos se submetem igualmente ao Poder Jurisdicional do Estado e
todo tem igual acesso a ele (BARBOSA e MAIA, 2015).
Pensado dessa forma, o processo não pode ser concebido apenas como atividade
estatal que se encontra à disposição da sociedade. É necessário que haja mecanismo e
políticas que viabilizem ao menos favorecidos ultrapassar os obstáculos sociais e econômicos
que dificultam o acesso a ela.
Já em Platão, a igualdade entre os indivíduos despontava como elemento da justiça e
esta, entendida como uma virtude humana, de modo que a justiça não devia ser concebida
apenas em relação aos sujeitos do processo, a configurar mera justiça comutativa, mas como
estrutura e atuação do Estado, incumbido da distribuição da justiça.
Nessa visão, a distribuição da justiça significava dar a cada um aquilo que teria direito
por pertencimento e adequação, dividindo-se em planos conforme a aptidão de cada uma dos
integrantes da sociedade.
Já Aristóteles, mesmo corroborando a visão de Platão, trabalhou mais profundamente
a identidade entre a justiça e a igualdade, sendo que esta não aparecia unicamente como
elemento daquela, mas como sua própria essência, ao definir o ponto médio, o medium da
virtude, sendo que o equilíbrio perfeito era considerado por ele a forma adequada e única para
a obtenção da felicidade e da realização plena (TARTUCE, 2012).
Tendo em vista o direito constitucional de ação e o acesso à justiça como elementos
fundamentais do Estado Democrático de Direito, certamente há um vínculo indissociável
entre a Constituição e a justiça constitucional.
Por isso, cabe ao Estado a função primária de codificar a relação entre a iniciativa do
indivíduo, membro da sociedade, e a possibilidade de, provocando a atuação jurisdicional do
Estado, dele obter a tutela jurisdicional adequada. O que ocorre, segundo a visão processual
constitucional, ou ainda visão constitucional do processo, com a constitucionalização do
124
9
direito ao processo e à jurisdição, com a garantia de acesso a todos, inclusive aos menos
favorecidos, especialmente através de política públicas garantidoras desse escopo.
O PROCESSO E O ACESSO À JUSTIÇA
A tutela jurisdicional e o próprio acesso à justiça, como se sabe, é direito fundamental
para a efetivação e eficácia dos direitos, igualmente para todos. Ocorre que as pessoas de uma
sociedade certamente estão, muitas vezes, em situações díspares, denotando desigualdades
significativas, que geram desigualdade para o acesso à justiça e ao processo.
É em razão disso que nossa Constituição Federal aponta como um de seus principais
objetivos a redução das desigualdades sociais, mediante a construção, permanente, de uma
sociedade livre, justa e solidária. Impõe ainda o dever de se conferir o tratamento igual a
todos perante a lei.
Considerando esse necessário viés constitucional do processo, cabe a análise de como
o processo civil contemporâneo, materializado na promulgação de um novo código, conferirá
tratamento igualitário sem permitir discriminações de qualquer natureza, não só para a
facilitação do acesso à justiça, como também para que todos obtenham a tutela jurisdicional
adequada.
No sentido da igualdade, desde logo se tem o conceito da igualdade formal, que é
aquela segundo a qual o tratamento dispensado às partes deve ser exatamente igual, cuja
paridade de tratamento, por conseguinte, não leva em consideração as desigualdades fáticas
havidas entre os sujeitos do processo.
Cabe lembrar que por disposição legal do estatuto processual civil, o magistrado deve
conferir tratamento igualitário entre as partes em caráter formal, desvelando atuação
indiferente ao eventual desnível entre as partes, o que já não ocorre em relação ao princípio do
livre convencimento do magistrado, que possibilita ao julgador, atribuir tratamento desigual
entre os litigantes em nome da igualdade real, desde que o faça devidamente fundamentado,
nos termos da Constituição Federal e legislações especiais.
Antes, porém, de se verificar em qual nível encontram-se as desigualdades sociais,
convém breve comentário sobre as características e diferenças entre a vulnerabilidade do
jurisdicionado e sua hipossuficiência.
Pelo sentido léxico do vocábulo, hipossuficiente é aquele que não é auto-suficiente,
aquele que é economicamente muito humilde, já a vulnerabilidade está relacionada ao critério
de suscetibilidade, isto é, o vulnerável é aquele que é ou está suscetível a determinadas
125
10
situações que outros não estão, enquanto a hipossuficiência caracteriza aquele indivíduo
desprovido de condições econômicas e financeiras para fazer ou deixar de fazer algo.
Portanto, para que o juiz afira a condição de hipossuficiência se faz imprescindível
uma análise do preenchimento de requisitos legais, mormente em face das disposições da lei
de assistência judiciária, bem como por meio da valoração de com base nas regras ordinárias
de experiência, para descobrir-se se a natureza socioeconômica do indivíduo apresentado
como hipossuficiente realmente corresponde ao que dessa situação se espera.
Tome-se como exemplo o Direito do Consumidor. O critério apropriado para a
definição e a própria natureza da hipossuficiência revela-se na necessidade de facilitação da
defesa do consumidor em juízo, o que não deixa de ser uma vulnerabilidade, do ponto de vista
econômico.
De qualquer modo, vulnerabilidade e hipossuficiência não são conceitos idênticos
tampouco antagônicos ou muito distantes. O fato é que para se garantir maior acesso à justiça,
o legislador de 1950 promulgou a legislação específica para sua facilitação (Lei de
Assistência Judiciária – Lei nº 1060/50) e outros diversos diplomas legais buscam corrigir os
desníveis havidos entre as partes no litígio e na própria relação jurídica de direito material,
como no caso da Consolidação das Leis do Trabalho, do Código de Defesa do Consumidor,
do Estatuto da Criança e do Adolescente, do Estatuto do Idoso, da Lei Maria da Penha etc.
Considerando a abordagem no que tange ao acesso dos hipossuficientes à justiça, ao
processo e até mesmo ao patrocínio profissional e assistência jurídica, pertinente o estudo
relacionado à vulnerabilidade processual e sua consideração para que se obtenha a isonomia
processual.
Vulnerabilidade processual é a suscetibilidade do litigante que o
impede de praticar os atos processuais em razão de uma limitação pessoal
involuntária ensejada por fatores de saúde e/ou de ordem econômica,
informacional, técnica ou organizacional de caráter permanente ou
provisório . (TARTUCE, 2012, p.184)
Assim, o acesso à justiça deve dar-se de forma completa e eficiente, sobretudo
considerando a imprescindível universalidade, ou seja, a possibilidade de todas as pessoas,
independentemente de óbices financeiros ou de qualquer outra ordem, serem capazes de
efetivar seus direitos através da busca por uma tutela jurisdicional, tempestiva e adequada.
126
11
O reconhecimento das diferenças entre as partes litigantes é medida que pressupõe
concreta análise comparativa segundo critérios bem definidos a fim de descobrir-se se um
deles possui alguma fraqueza que o impeça de litigar no mesmo grau que seu opositor,
devendo o magistrado conduzir o processo da forma mais isonômica possível, segundo o que
dispõe a legislação codificada e a esparsa.
Seguindo esse objetivo e como exemplo claríssimo dessa distinção, as ações
afirmativas apresentam-se como uma discriminação positiva e plenamente admissível,
sobretudo juridicamente, pois afasta a ideia de igualdade formal, já vista alhures, para que seja
proporcionada uma “igualação jurídica efetiva”, assegurado no sistema constitucional
democrático, segundo o entendimento da Ministra Carmem Lúcia, do Supremo Tribunal
Federal (apud TARTUCE, 2012, p.71)
Na verdade é a busca sempre presente para o estabelecimento de uma lei efetivamente
justa, recta ratio, uma vez que os critérios para a aferição do igual, do meio termo, segundo
Aristóteles, se personificam através das ações afirmativas.
A ação afirmativa costuma ser concebida como um remédio
temporário que visa superar discriminação histórica e efetivar a igualdade
material; a proposta é que ela desapareça quando atingido seu objetivo, sob
pena de transmudar-se em uma diferenciação indevida que viola o princípio
da igualdade. (TARTUCE, 2012, p.71)
No direito material brasileiro há diversas manifestações nesse mesmo sentido, sempre
ao escopo de estancar, ou ao menos minimizar, as diferenças e desníveis verificados entre as
pessoas e suas diversas relações jurídicas, de direito material e até mesmo de direito
processual.
Merecem destaque, ainda que mencionados sucintamente por não se constituírem
objeto específico deste trabalho e seguindo uma aproximada ordem cronológica, as leis
trabalhistas, em especial as inovações trazidas em 1943 com a edição da Consolidação das
Leis do Trabalho e suas consideráveis ampliações no texto constitucional. Do mesmo modo as
disposições relacionadas à saúde, com a criação de um sistema único de saúde e os
dispositivos legais pertinentes às pessoas portadoras de deficiências.
Mais proximamente, as leis relativas ao Direito do Consumidor, especialmente o
Código de Defesa do Consumidor, como derivação de normas constitucionais. Do mesmo
modo, a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente.
127
12
O Estatuto do Idoso, a Lei Maria da Penha e o Estatuto da Igualdade Social também
são exemplos de ações que visam a corrigir disparidades entre as pessoas, reconhecendo as
diferenças entre elas, suas consequências práticas e os mecanismos efetivos para a correção
desses desníveis.
Em um sentido mais abrangente, porquanto de caráter indiscriminado, encontram-se as
reformas processuais havidas nos últimos anos, especialmente com o advento do Novo
Código de Processo Civil, como instrumento de facilitação e ampliação do acesso à justiça.
DISPOSIÇÕES PROCESSUAIS INOVADORAS E O ACESSO À JUSTIÇA
Não apenas o novo código a entrar brevemente em vigor, como também todas as
alterações processuais pretéritas, derivam da atividade humana, cuja característica
fundamental é a falibilidade, de modo que porventura há erros dentre muitos acertos
verificados no espírito do legislador processual.
Exatamente em prestígio desses muitos acertos de antemão observados, sem prejuízo
de outros futuros possíveis questionamentos acerca dos desacertos desta e de outras reformas
processuais, se fará aqui uma breve análise dos principais e mais significativos pontos do
novo estatuto processual e das reformas recentes do processo, e suas evidentes virtudes, no
tocante ao acesso ao Poder Judiciário e ao próprio exercício da jurisdição.
Para demonstrar a evolução do processo e da distribuição da justiça, ainda que sob a
ótica do desenvolvimento, parece certo asseverar que a tutela jurisdicional do Estado
acompanhou os direitos fundamentais do cidadão, em uma espiral ascendente contínua.
A evolução da tutela jurisdicional se deu juntamente com a evolução
dos direitos fundamentais. Ao analisar o direito ao desenvolvimento
percebe-se que ele é alcançado dentre outras formas, justamente com a
atuação positiva estatal. O reconhecimento dos novos paradigmas da tutela
jurisdicional é importante como meio de dar efetividade ao direito ao
desenvolvimento. (LINO, 2013, p.127)
E o magistrado, enquanto aplicador do direito ao caso concreto que lhe é submetido,
deve sempre observar a ciência do Direito em suas mais variadas fontes e vertentes, de sorte a
encontrar, da forma mais adequada, a solução para a controvérsia. Nesse contexto é que se
apresenta o artigo 8º, do Novo Código de Processo Civil.
128
13
Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e
às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da
pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a
legalidade, a publicidade e a eficiência.
Notável a previsão legal, embora tecnicamente assim não seja a maneira mais
adequada, no sentido de, inicialmente, mencionar a necessidade de atendimento aos fins
sociais e ao bem comum, a promoção da dignidade da pessoa humana, para só então fazer
menção aos princípios da legalidade e da razoabilidade, entre outros.
Independente dessa constatação, mesmo entre os princípios a legalidade viria apenas
depois da proporcionalidade e da razoabilidade.
É que as referências à dignidade da pessoa humana, à
proporcionalidade e à razoabilidade são feitas como se o legislador estivesse
a valorar, escalonando, os princípios enumerados neste preceito, de forma
que à legalidade estaria reservada apenas a quarta prioridade na escala à ser
considerada pelo juiz no momento de aplicar a lei. (PUOLI, 2015, p.133)
Entretanto, mesmo se considerando a existência de uma hermenêutica moderna que
reduza a autoridade e até mesmo a estrita observância da lei, a segurança jurídica deriva da
necessidade de entendimentos cada vez mais uníssonos e consentâneos com o ordenamento
jurídico positivado, mormente quando levamos em conta a primazia do processo legislativo,
inerente ao Direito Romano, do qual emanou o nosso sistema jurídico.
Daí as previsões processuais mais modernas no sentido de que a interpretação e o
entendimento das cortes superiores, autoridades judiciárias máximas sobre determinados
temas, deve ser observado por todos os demais órgãos que exercem a função jurisdicional do
Estado. Essa previsão, de caráter obrigacional, teve início com a instituição das súmulas
vinculantes.
No novo código, há especial destaque quanto aos precedentes judiciários, no qual se
incluem as súmulas vinculantes. Os entendimentos jurisprudenciais ganham especial destaque
quando se observa o disposto no artigo 489, do novo Código de Processo Civil, que
estabelece ser ausente de fundamento e, portanto, nula, a decisão judicial que não enfrentar
129
14
devidamente a questão dos precedentes e da própria jurisprudência, seja para aplicá-los, seja
para afastá-los.
Art. 489. (...): I – (...); II – (...); III – (...). § 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I – (...); II – (...); III – (...); IV – (...); V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. (...)
Ter-se-á então não só a aplicação obrigatória do entendimento de algumas súmulas,
por isso denominadas vinculantes, como também a necessidade de se enfrentar quaisquer
entendimentos jurisprudenciais apresentados pelas partes, ou mesmo invocados ex officio pelo
magistrado para a solução da controvérsia.
Há ainda a disposição constitucional inserta pela emenda constitucional número 45,
que alçou ao nível constitucional a garantia de todo cidadão a uma razoável duração do
processo, muito embora a essa disposição legal caiba interpretação subjetiva, uma vez que a
razoabilidade temporal pode variar de uma pessoa para outra.
Na mesma categoria de alterações legislativas processuais pretéritas ao novo estatuto
tem-se a reunião simbólica de feitos com recursos repetitivos, incidente através do qual
determinado recurso servirá de leading case, de molde que o entendimento manifestado pelo
tribunal superior em seu julgamento seja estendido a todos os outros similares recursos, os
quais ficarão sobrestados até solução definidora.
No código atual também há previsão no sentido de que seja possível, já no primeiro
grau de jurisdição e antes mesmo da formação da relação jurídica processual, através da
citação do réu, que se prolate sentença extintiva com resolução de mérito, quando a matéria
130
15
controvertida for unicamente de direito e no juízo já tiver sido proferida sentença de
improcedência.
Essa, aliás, uma tendência processual contemporânea, vincada na otimização dos
procedimentos em processos similares, sendo que há também no novo estatuto processual a
previsão acerca das demandas repetitivas e da necessidade de seu julgamento conjunto e
único, tornado mais racional, célere e juridicamente segura a tutela jurisdicional nessas
hipóteses.
As tutelas específicas para a obtenção do resultado prático equivalente, sempre que se
tratar de obrigação de fazer ou não fazer e de entregar, também se apresenta como mecanismo
posto à disposição do magistrado, em favor da parte credora, ao desiderato de que haja maior
efetividade na tutela jurisdicional executiva.
Além da criação dos Juizados Especiais, tema já abordado alhures, há ainda o
estabelecimento de meios alternativos para a solução de litígios – dentro e fora do processo
civil – seja por meio de uma audiência inicial, imprescindível pela previsão do novo código,
para a busca da conciliação e da mediação, seja através de legislação extravagante, como, por
exemplo, a Lei de Arbitragem.
Além disso, o novo estatuto de processo estabelece um procedimento único,
simplificando o trâmite dos processos e conferindo menor complexidade para o andamento
dos feitos, sempre em prestígio de uma atuação estatal que busque descarregar o Poder
Judiciário através de ações mais lógicas e simples.
Do mesmo modo prevê a redução de meios formais de defesa, para concentrar todos
os pontos em uma única peça processual. Desse modo, alegações que antes formaram autos
suplementares em virtude de possíveis incidentes processuais, no código a vigorar serão
concentrados na contestação, a ser apresentada pelo réu no processo civil.
No que diz respeito ao sistema recursal previsto no novo estatuto, há a previsão acerca
de algumas limitações com diferimento da oportunidade para a impugnação das decisões
judiciais, como no caso do agravo, sem que se possa, contudo, retirar da parte litigante a
possibilidade de questionar as decisões judiciais em geral, pugnando por seu reexame, sob
pena de aviltamento do princípio do duplo grau de jurisdição.
Inovação considerável advém da previsão do novo diploma legal sobre a necessidade
de uma ordem cronológica, de caráter público, para que seja proferida decisão final nos
litígios, de sorte que a lista será pautada pela situação processual apta a julgamento, ou seja,
serão inscritos na lista de ordem cronológica os processos prontos para sentença e não
131
16
conforme seu início, até porque a duração de um processo certamente não é idêntica à de
outro.
Diante disso, são sensíveis e necessárias as alterações legislativas em relação ao
processo civil, para torná-lo mais justo, acessível e célere. Essa é uma busca constante, seja do
legislador que promoveu reformas nas últimas décadas, seja como agora, quando se promulga
um novo diploma legal a regulamentar, da maneira mais moderna e útil possível, o processo
civil brasileiro.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Direito Processual Civil é considerado ramo do Direito Público, dentre outros
motivos, porque todos devem ter acesso a um processo justo, célere e efetivo. Parece
equivocado e inadmissível o adágio popular no sentido de que a justiça tarda, mas não falha.
Ao contrário. Delonga na prestação jurisdicional é vertente de sua negação. E a
prestação jurisdicional através do processo deve ser justa, o que só se conquista por meio de
um Poder Judiciário organizado, no qual se investe, material e financeiramente, aquilo que se
faz necessário.
A par dessas óbvias necessidades e constituindo-se o processo como fundamental
meio de distribuição da justiça, deve também ser ampliado seu acesso, de modo efetivo.
Não basta a previsão constitucional acerca da inafastabilidade de qualquer questão, é
preciso que haja ações concretas que tenham o condão de permitir essa ampliação, seja
através da facilitação econômica, a isenção de pagamentos de taxas, custas e outras despesas
processuais, seja através de tratamento diferenciado àqueles que são diferentes, ao escopo da
correção das desigualdades e desníveis, a tornar iguais as parte em litígio.
Por isso essas correções de diferenças são admitidas em nossa legislação processual e
material, sendo necessária a realização de uma discriminação positiva. As ações afirmativas,
por exemplo, sabidamente demonstram a busca permanente de igualdade, do meio termo de
Aristóteles, necessidade tão presente nos dias atuais e em nossa sociedade de extratos tão
díspares.
E assim são as reformas do processo civil brasileiro, não só aquelas implementadas
pontualmente desde a promulgação do atual código, em 1973, como também, e
principalmente, a tendência contemporânea e acertada, verificada com a aprovação e
promulgação de um Novo Código de Processo Civil
132
17
É certo que a evolução do direito processual é permanente, especialmente porque seu
estudo e concepção, enquanto ciência jurídica, são relativamente novos. A evolução do
processo deve acompanhar a evolução do próprio direito, sobretudo no que se relaciona aos
direitos fundamentais do cidadão, que devem estar acompanhados das garantias para a
observância e obediência desses mesmos direitos.
O processo é, portanto, instrumento para a aplicação do direito material de maneira
equânime e justa, motivo pelo qual é visto com fins políticos, sociais e jurídicos. A atuação do
Estado através do processo é forma de realização plena do direito, uma vez que aos
jurisdicionados é vedada a auto-tutela.
Porém é impossível atingir-se a plenitude do exercício da jurisdição, com a concessão
a cada um exatamente aquilo que tiver direito, se não pensar-se o processo como algo
facilmente acessível a qualquer pessoa, desde a mais privilegiada até a mais humilde, de uma
sociedade.
É nesse sentido que as atuais e pretéritas mudanças processuais tratadas neste artigo se
unem, na busca constante e contínua por uma processo mais justo, mais célere e mais efetivo.
E, além disso, a todos acessível.
O novo diploma legal processual traz em seu bojo inúmeras alterações e disposições.
Algumas repetindo disposições reformadoras anteriores, outras estabelecendo novos
paradigmas para o processo civil brasileiro.
Antes de se debruçar sobre o resultado prático conquistado, o que advirá da prática de
foro, cabe ao cientista do direito analisar o intuito do legislador pátrio e sua busca contínua
para o aperfeiçoamento de nosso sistema legal processual, de modo a conferir justiça a todos
os cidadãos, dependentes do exercício da atividade jurisdicional do Estado, diretamente ou
não.
De se concluir, portanto, que a comissão de notáveis que elaboraram as primeiras
versões do texto em comento, como todas as demais discussões e alterações, inclusive com a
realização de diversas audiências públicas, constituem-se importante avanço no campo do
direito processual.
133
18
REFERÊNCIAS
ALVIM, José Eduardo Carreira. Teoria Geral do Processo. Rio de Janeiro: Forense, 2003. BARBOSA, Rafael Vinheiro Monteiro. MAIA, Maurilio Casas. Isonomia Dinâmica e Vulnerabilidade no Direito Processual Civil. Revista de Processo. Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 39, n. 230, p. 349-365, abr. 2014. BUENO, Cassio Scarpinella. Visão geral do(s) projeto(s) de novo Código de Processo Civil . Revista de Processo. Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 39, n. 235, p. 353-377, set. 2014. ___________. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2105. CAPPELLETTI, Mauro. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988. CASTRO JÚNIOR, Osvaldo Agripino de. Introdução ao direito e desenvolvimento. Brasília: OAB Editora, 2004. CIANCI, Mirna. O acesso à Justiça e as reformas do CPC (Coleção direito e Processo / Coordenador Cassio Scarpinella Bueno). São Paulo: Saraiva, 2009. DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. São Paulo: Malheiros, 2002. GONÇALVES, Marcos Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil: execução e processo cautelar. São Paulo: Saraiva, 2010. Vol. 1. GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. 18ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007. Vol. 1. LINO, Estefânia Naiara da Silva. A tutela jurisdicional efetiva como garantia da concretização do direito ao desenvolvimento. São Paulo: Letras Jurídicas, 2012. MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. São Paulo: Malheiros, 1996. MENDES, Gilmar Ferreira. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014. MONTORO, André Franco. Estudos de filosofia do direito. São Paulo: Saraiva, 1999. 3ª ed. MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. Vol. V. MORRIS, Clarence (org.). Os grandes filósofos do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2002. NETO, José Wellington Bezerra da Costa. O esforço do projeto de Código de Processo Civil contra a jurisprudência defensiva. Revista de Processo. Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 39, n. 233, p. 123-148, jul. 2014.
134
19
NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na constituição federal. 8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. _________. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. PUOLI, José Carlos Baptista. O juiz, a aplicação do Direito e o Novo CPC. Revista do Advogado. Ed. AASP, São Paulo, ano XXXV, n. 126, p. 131-136, mai. 2015. SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de processo civil. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. Vol. I. SOUZA, Miguel Teixeira de. Apontamento sobre a Ciência Processual Civil. Revista de Processo. Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 39, n. 235, p. 69-83, set. 2014. TARTUCE, Fernanda. Igualdade e vulnerabilidade no processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 2012 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2006. v.1. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. O que se espera do Novo CPC?. Revista do Advogado. Ed. AASP, São Paulo, ano XXXV, n. 126, p. 198-203, mai. 2015.
135