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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
O IDOSO E O ENVELHECIMENTO SAUDÁVEL
Por Arlette Gomes dos Santos
Orientadora
Profª. Mary Sue
Rio de Janeiro
2003
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
O IDOSO E O ENVELHECIMENTO SAUDÁVEL
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como condição prévia para a
conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato
Sensu” em Terapia Familiar Sistêmica.
Por: Arlette Gomes dos Santos
AGRADECIMENTOS
A todos os longevos com quem tenho a honra
de conviver e conhecer no Grupo da 3ª Idade
no IASERJ.
A todos os longevos idosos que, com
entusiasmo, me concederam as entrevistas
compartilhando um pouco de suas vidas. E me
deram as dicas de como caminhar por esta
terra desconhecida: “A velhice”.
A Mary Sue, minha orientadora a quem eu
escolhi por amor à primeira vista.
A Tereza Maria Ramos de Oliveira, minha
irmã por escolha, que não me deixou desistir.
E por seu espírito de desprendimento.
A minha filha Alyxandra e ao meu filho
Jefferson, os meus amores.
DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho ao meu companheiro
Antonio Emir por seu incentivo ao meu
crescimento intelectual e pessoal e a Vytória
Odara, minha neta, Fabiano, meu afilhado,
jóias que chegaram a minha vida para dar
luminosidade.
RESUMO
Este trabalho versa sobre o envelhecimento saudável, e quer mostrar que é
possível envelhecer com saúde, e para isso lança mão da Antropologia da História e
da Psicologia, pios só assim se tam uma dimensão desse envelhecer, através dos
vários olhares, dessa forma quebra-se o paradigma medico que vê o velho não como
sujeito, mas como objeto, o que coloca o velho como um ser à margem da sociedade.
E o corpo passa a não ser visto só como orgânico, mas também como um
corpo pulsional.
O envelhecimento com saúde é possível desde que o ser humano tome
consciência de si, o mais cedo possível e se envolva em ações sociais de qualquer
gênero, e sempre reinvestindo na vida em busca da realização e seus desejos. As
pesquisas comprovam que os idosos que souberam reorganizar suas vidas
mantiveram-se produtivos e motivados, deixaram seu legado na História da
humanidade.Dessa forma, esse trabalho busca recolocar o idoso em seu devido lugar
ou seja, o lugar de sujeito, sujeito esse na História não um mero observador.
Nossa meta foi mostrar que essa possibilidade é possível, e que além da
conscientização por parte dos idosos, se faz necessário que ele dialogue com o
mundo, assuma a posição de ator, preencha esse lugar e colha os frutos de seu desejo.
Acreditamos, que a completude não existe, a falta está presente desde sempre.
METODOLOGIA
Este trabalho será baseado numa pesquisa teórica e numa pesquisa empírica,
de cunho implorativa. No que diz respeito a pesquisa teórica será baseada em livros,
revistas e outros documentos, de forma a proporcionar maior familiaridade com o
problema a ser pesquisado. No campo empírico, serão realizadas entrevistas com
idosos maiores de 70 anos, sendo que 3 homens e 3 mulheres. A coleta de dados será
feita atravez de uma pesquisa aleatória, esse universo de pessoas com mais de 70
anos, foi escolhido por se tratar de longevos e a Organização Mundial de Saúde
classifica como idoso os indivíduos entre 60 e 74 anos.
A técnica utilizada para a análise dos dados , será análise de contudo das falas
dos entrevistados.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 9
CAPITULO I –A Velhice 13
CAPITULO II –A Velhice como Construção Social 32
CAPITULO III – O Velho e seu corpo: Uma Encarnação 42
CAPITULO IV – Análise dos Dados 51
CONCLUSÃO 54
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 58
ANEXOS 61
FOLHA DE AVALIAÇÃO 68
INTRODUÇÃO
O fantasma da velhice amedronta o mundo neste fim de século, e os ruídos
assustadores desafiam o saber e o poder, levando o ser humano a novas
encruzilhadas. Com o avanço de novas tecnologias e praticas médicas e da
urbanização, o prolongamento da vida transforma-se em realidade. No Brasil, os
velhos vem crescendo a partir da década de 70. Somos agora sacudidos por novos
dados fornecidos pelas estatísticas do IBGE que projetam para o ano 2005, que a
população idosa atinja a 35 milhões de habitantes, fato que ultrapassa o crescimento
da população jovem. O Brasil é um país que envelhece, a passos largos. Ao
identificar que o crescimento da população velha cresce, torna-se um problema
social, uma vez que muda toda a geografia econômica e o Estado ao despreza quem
não trabalha, são “ um bando de vagabundos”nas palavras do ex Presidente da
Republica, Fernando Henrique Cardoso. É importante que se volte a olhar para o
velho, trazendo-o para a ordem do dia.
Sabemos que é difícil para o velho fazer essa travessia, passando
se lugar de sujeito de ação para objeto, com nenhum reconhecimento social, alem de
existir no imaginário da sociedade a representação de que a velhice é a proximidade
da morte.
A velhice é uma graça se você à alcança com criatividade e
curiosidade. Estas qualidades requerem viver em plenitude o momento presente, já
que hoje é a juventude da sua longevidade,(a alternativa quântica para o
envelhecimento Deepak Chopra,pp 233 )
Há um enigma vinculado a questão da longevidade, pois a ciência
ainda não pode prever quem viverá até uma idade extremamente avançada.
Para todas as gerações anterior aos 50 anos, era uma idade para
iniciar restrições graduais das atividades.Mas nascer aos 50 anos! Pouca coisa na
vida nos prepara para isto. Estudos realizados pelo Departamento de Saúde do estado
da Califórnia se a ciência médica conseguisse vencer um único grande risco que
ameaça a nossa saúde, a arteriosclerose ,a expectativa média de vida para as
mulheres na Califórnia se elevaria para 100 anos.
A idéia não questionada do velho paradigma era que, a medida
que o corpo ia se desgastando com o passar do tempo, a vida se tornava cada vez
menos gratificante. O estoque de possibilidade se esgota após uma certa idade, a qual
é arbitrariamente definida por cada sociedade e indivíduo.
O novo paradigma nos diz que a vida é um processo de
transformação constante, não de declínio, e sim, é cheia de potencial para um
crescimento sem limites. Para conservar a chance de novas possibilidades década pós
década tem-se que saber o que são essas possibilidades. Estudos sociológicos
efetuados com longevos, impressionam e demonstram a forte ligação desses
indivíduos com a liberdade e a independência.
Por todas as suas vidas eles tenderam a evitar serem contido por
forças repressoras. Tradicionalmente, a maioria trabalhou por conta própria, eles
prezaram e muito a sua autonomia. Ser adaptável às perdas e os reverses da vida foi
superado, após perdas significativas, chorada, mas depois a pessoa seguiu sua vida
em frente. Dessa forma pensando na velhice podemos dizer são esses os novos atores
sociais, que temos que aprofundar nossos estudos e abrindo caminhos para novas
investigações, para que esse grande contingente populacional não fiquem silenciado.
Ao trazermos, a questão do envelhecimento saudável, é porque essa temática nos
leva a pensar que preciso desmistificar o lugar que esse idoso ocupa na atualidade em
nossa sociedade.
Tendo se tornado uma questão relevante no cenário nacional, o
olhar dos contemporâneo ainda que de forma tímida tem-se voltado para os velhos,
principalmente a Antropologia que está numa linha de frente e acompanha o próprio
movimento de descoberta da velhice por parte da sociedade. Alem desta Ciência
Social, temos a Psicologia, Psiquiatria, Saúde Coletiva e a Sociológica, etc...Ao
ocupar um lugar importante na sociedade, e começar a ser objeto de preocupações
acadêmicas não só por parte das Ciências Sociais, da Psicologia (muito timidamente)
e da Medicina principalmente nos ramos da Gerontologia e da Geriatria, é o já
começar ser visto, e conseqüentemente a ocupação de um novo lugar, lugar esse dado
principalmente pela medicina através das pesquisas realizada visando a prevenção de
doenças degenerativas, tais como arteriosclerose, reumatismo, doenças articulares
entre outras.
O novo paradigma está se instalando, é possível envelhecer
saudável de corpo e mente, pode-se vislumbrar um lugar para esse novo velho.É o
encarnar esse momento existencial como uma etapa de vida, como ser criança,
adolescente, adulto e velho, e que cada uma dessas fazes tem seus lutos, seus
conflitos e seus sintomas. Ser velho é ser privilegiado, é preciso que se dê conta
disto,que o centro de seu interesse foi deslocado de uma realização no mundo que até
então fez parte de seu cotidiano, para a realização da vida interior. Sensibilidade,
ternura, paciência, sabedoria e clarividência estão relacionados ao processo de
envelhecer.
Os ganhos e as perdas estão presentes em todas etapas da vida,
porem, ela é percebida com maior força na velhice, como não há um modo universal
de vivenciar a velhice, podemos dizes que as pessoas envelhecem de vários modos,
mas o “bom envelhecimento” ou seja, o envelhecimento saudável é um privilegio
para as pessoas que são reorganizadoras que lutam contra o encolhimento de seu
mundo, mantendo uma vida ativa, criando novas perspectiva de vida com novos
projetos, novos relacionamentos. Para alguns, também envelhecer saudável é
dedicar-se a novos rumos, como cuidar do jardim, arte ou até mesmo cuidar dos
netos, o que importa é a ocupação do tempo com coisas gratificantes, que possam
manter em lugar seus valores e a moral.
Os velhos são testemunhas de um passado, é necessário que se
envolvam com a construção do futuro, têm o que dizer pela experiência e sabedoria,
só dessa forma ajudando as gerações na construção do presente, nos projetos
geracionais e culturais poderão interferir no processo da civilização.
“Os velhos representam a memória, e um povo desmemorizado é facilmente subjugado.” (PIÑON,
1987)
Ao contrário do que se pensa, o número de idosos longevos é
bastante grande, e os grandes vultos da humanidade ultrapassaram a casa dos setenta
anos.
Não temos aqui a pretensão de dar conta desta problemática, mas
realizaremos o que for possível, no sentido de dar um ponta pé inicial nesta temática
tão pouco abordada na psicologia. A nossa consciência é que esta não é uma tarefa
fácil, tendo em vista a limitação bibliográfica para um maior aprofundamento do que
está sendo proposto.
“ É preciso viver cada idade a seu modo, sem precisar
provar alguma coisa nem para si, nem para as os outros
e, sobre tudo, não pedindo desculpas por existir.
( Maria Helena Novaes)
“ Os velhos representam a memória e um povo
desmemorizado é facilmente subjugado”
( Nelido Piñon)
CAPÍTULO I
A VELHICE
Existem duas formas de envelhecer,
aquela onde o idoso se retira do mundo,
vivendo a velhice como a sociedade quer e
aquela onde o idoso desafia a sociedade,
colocando-se como ator social.
HIPÓTESE
A longevidade é uma demonstração que a pessoa viveu a vida de uma
maneira sábia e dotada de virtudes singulares para resistir às provações da sociedade
em que vive, o que é uma forma de louvar a velhice. Como muito bem diz Simone de
Beauvoir, o homem que esquece que está ficando velho, por isso não se importa em
não ser mais jovem.Nessa perspectiva, a representação social da velhice está
associada a não passagem para a inatividade, mas sim, a uma nova reestruturação e
para uma nova história de vida.
Tendo por base esse pressuposto, a hipótese desse trabalho nos faz acreditar
que o idoso deve exercitar seu memória e inteligência, aumentando as probabilidades
de envelhecer saudavelmente.Povoando sua vida de objetivos e metas a serem
alcançadas.
Na medida em que ele (sujeito), compreende o que significa essa passagem,
terá uma perspectiva de como será o seu envelhecimento, e se tornará assim
motivado e interessado em enfrentar as novas condições que lhe impõe a sociedade.
Ser motivado para a vida, continuar na posição de sujeito e não de objeto como quer
a sociedade capitalista colocá-lo. Para manter-se dessa forma, ou seja, na boca da
cena o idoso reorganiza-se e com isso se expande objetivando a criatividade. Dessa
forma, a recomposição nos idosos dos universais da subjetivação trará de volta a
interação entre a criatividade e coletividade permitindo maior dinamização nas
praticas sociais.
É dessa prática que surge a possibilidade dos longevos interferirem no
processo civilizatório expandindo seu legado.
As grandes criações são heranças dos humanos que ultrapassaram dos limites
dados pela sociedade no que tange a idade, em sua época romperam com estereótipos
e preconceitos.
“O tecido social, constitui um elemento primordial na conservação da saúde, tanto física como
psíquica, sendo que para evitar a influência do avançar da idade, nossa ação deve se voltar para o
ambiente, para a diminuição de todas as causas de agressão e para torná-la mais apta para enfrentar
situações estressantes”. (Tessin1994,61).
1.1 - Justificativa do tema:
A escolha do tema desta monografia se deu após reflexão e observação das
mais variadas situações, onde o individuo de meia idade queixava-se do medo de
envelhecer, e ao mesmo tempo, o desejo de manter-se saudável.
Todo história do envelhecimento humano tem sido caracterizado pela desesperança,
as imagens que se tam da velhice são terríveis e associada a doenças, esclerose e
melancolia. Sendo a velhice um dos maiores desafios do século XXI, por força do
aumento populacional e da expectativa de vida, se impõe que seja repensada a
questão da velhice.
O fato do individuo envelhecer mete medo, porque culturalmente na
sociedade ocidental ela é associada a idéia de morte e solidão, portanto é uma crença
, emcucada na consciência, e como tal é silenciosa e oculta gerando medos e
sintomas. Uma crença é algo que se presume verdadeiro, enquanto ela for mantida
conservará certos parâmetros, onde se perceberá algo como estranho ou não, aflitivo
ou prazeroso, de acordo com o ajuste da expectativa
. Quando a interpretação do individuo muda, tem lugar também uma mudança
em sua realidade. Somando-se a tudo isso, é preciso levar em conta que a cultura no
nosso contexto é voltada ideologicamente para a juventude e a beleza, culto ao corpo,
ficando o velho relegado à segundo plano, isto pode ser observado na própria
produção acadêmica onde quase não se encontra uma bibliografia vasta sobre a
temática, embora esse olhar esteja começando ficar presente. Essa produção
acadêmica no que diz respeito a psicologia, versa mais sobre a criança o adolescente,
e questões clinicas, relegando a velhice um lugar menor.
Dessa forma pensando na temática do idoso é que temos que aprofundar
nossos estudos, e propomos mudanças no paradigma.” O envelhecimento é fatal para
todos, pois todos morreremos, mais a vasta maioria dos casos talvez 99% a causa da
morte não é a idade avançada e sim câncer, ataque cardíaco, derrame, pneumonia e
outras enfermidades.( Choopra: 80)
Ao trazemos a possibilidade do envelhecer saudável como tema do presente
trabalho, se justifica na medida em que propomos descobrir um novo paradigma, em
direção de desmistificar a crença que envelhecer pode ser sinônimo de doença.
Qualquer que seja a causa específica , é a doença e não a velhice em si que pode
provocar o declínio nas funções mentais a muito tempo associada a senilidade.
Dessa forma pensando no idoso, podemos repensar em novos caminhos, ou
novas possibilidades de atravessarmos essa faze da vida, com equilíbrio e não
necessariamente carregando um corpo doente, arrasado pelo tempo. O que
pretendemos é aprofundar nossas pesquisas ou seja, nossos estudos, para que novos
caminhos investigativos sejam abertos para essa grande massa populacional, sendo
beneficiada com novas possibilidades. Ao trazermos a questão do envelhecimento
saudável, é porque acreditamos que o ser humano não nasceu para morrer de doença,
e sim de velhice.
Desmistificar essa crença, sabemos, é uma tarefa difícil de ser realizada, mas ,
o mínimo que fizermos, será um grande passo dado como contribuição.Pensamos que
a razão pela qual os idosos sentem-se marginais em nossa sociedade se dá pelo fato
de serem afastados do fluxo principal de suas atividades, a aposentadoria, não tendo
um ideal positivo para o estágio da vida em que se encontram.
A família nesta fase tão importante da vida é de fundamental importância,
tendo em vista que os idosos necessitam do convívio familiar, e os asilados sentem-
se abandonados pelas suas famílias, e que em realidade é o que acontece.
“A discriminação à velhice é uma herança da sociedade industrial, que substituiu a sociedade família,
onde o velho tinha uma posição definida acompanhada de privilégios e respeitabilidade”
( I.P.U.B. pp,137)
Manter-se atualizado, exercitando as capacidades cognitivas, é uma boa
forma de minimizar e controlar os efeitos alienantes que processo do
desenvolvimento pode gerar em alguns velhos, velhice não significa déficit
intelectual.
Simone de Beauvoir (1970) sabiamente afirma que a consciência da velhice
emerge no sujeito a partir da atitude que seu semelhante tem para com ele. Por tento
é a sociedade que enquadra o individuo, por meio de suas atitudes e preconceitos,
denunciando o envelhecimento de cada um. As pessoas crescem assimilando esses
preconceitos e estereótipos pejorativos criando auto-imagem negativa ao chegar a
velhice.
Assim a velhice se é construída cognitivamente no decorrer da vida. O ser
humano não se dá conta dessa construção, que opera das mais variadas formas, como
por exemplo:O idoso não tem condições de trabalhar, o idoso não tem vida sexual, o
idoso é um dependente de outros portanto um peso, a velhice é a faze da regressão.
Há uma tendência a generalização onde os idosos saudáveis sofrem pressão e são
taxados de terem comportamentos inadequados. É assim que a velhice é aprendida
socialmente, a apologia da falta , falta saúde, falta de companhia, falta de atividade,
falta de desejo e até mesmo falta de senso critico.
Como já foi dito anteriormente, uma crença encucada na consciência
silenciosa e oculta gerando medos, è algo que se presume verdadeiro. O idoso
saudável é aquele que rompeu com todas essas encucações, sendo um ser
biopsicossocial, sua saúde está ligada a dinâmica pela qual ele particularmente
melhor vivenciou os acontecimentos. O importante è aprender a envelhecer, algo que
se deve estar atento bem antes do envelhecimento propriamente dito, pois é a falta de
exercícios e treinamentos adequados juntos com alimentação empobrecida e o
estresse que leva ao decréscimo intelectual.
“É preciso que a sociedade saia dos seus encalacros e o veja de uma outra forma, com mais dignidade.
É evidenciar esse ator na sua própria identidade neste seu momento de vida.” ( Oliveira, 2000: 23)
1.2. Problematização Talentos Idosos:
Envelhecer bem implica em aceitar a condição de mortal. A cultura moderna
leva à negação desse enfrentamento e à repressão do medo que assalta o ser humano
ao simples pensamento de que não estará aqui para sempre.
Chaplin, longevo e criativo, talento inquestionável, Albert Einstein deixou
sua contribuição no campo do pensamento científico, Freud, deixou um legado
inovador e transformador, a psicanálise, Gandi, com sua lucidez e generosidade nos
deixou a idéia da democracia disciplinada. Sem contarmos com os talentos nacionais,
nos campos das artes, da ciência e da cultura, que em seu tempo deram sua
contribuição no processo civilizatório do nosso país e grande contribuição á
humanidade como foi ocaso de Osvaldo Cruz no campo da ciência, e Nise da Silveira
medica psiquiatra. Di Cavalcante e Tarcila do Amaral nas artes plásticas e os artistas
do povo todos longevos:Pixinguinha, Cartola, Vinícius de Morais entre tantos outros,
que se mantiveram produtivos e criativos até o fim de suas vida,sem contar os que
ainda estão entre nós em atividade.
O importante é a motivação o interesse em viver, o idoso deve expandir-se e
reorganizar-se para se manter produtivo e criativo. A recomposição nos idosos dos
universais da subjetivação trará de volta a interação entre a criatividade e
coletividade permitindo maior dinamização nas praticas sociais. É dessa pratica que
surge a possibilidade dos longevos interferirem no processo civilizatório, expandindo
seu legado. “O tecido social, constitui um elemento primordial na conservação da
saúde tanto física como psíquica” (Tessin e Mouty 1994 pp.61) Psicopatologia do
Envelhecimento: Assistência ao Idoso.Rio de Janeiro ed Vozes.
O Brasil como outros países com a mesma idade de existência, já não pode
ser considerado um país jovem.A população idosa é volumosa e num progressivo
crescimento. Isso se deve a alguns fatores, dentre os quais dois são relevantes: a
diminuição da natalidade, que por sí reduz a população jovem, e o aumento da
longevidade, propiciado pelos avanços dos conhecimentos e recursos da moderna
tecnologia medica.
Como já foi citado anteriormente, expandir-se para se manter criativo é o
grande segredo para a manutenção da saúde física, mental e psicológica do
idoso.Envelhecer com criatividade é a verdadeira arte para quem deseja morrer de
velhice, e não de doença, para isso é necessário que o individuo desenvolva uma
nova filosofia de vida que possibilite a manutenção de uma nova identidade
psicológica, e assim autonomia funcional, e saúde.”O cidadão, não importando sua
idade, deve poder decidir livremente seu estio de vida, estabelecendo seus padrões de
autonomia”1(Carta de Ottawa, 1986)
Tal qual a aposentadoria, o velho tem que se ligar na corrente da vida ou só
lhe restará o “aposento”,para passar o tempo . “Goeth dizia que a idade nos toma de
surpresa e que não existe outra alternativa senão morrer prematuramente ou
envelhecer antes de morrer. A velhice é, portanto, o destino de todos os que não
morrem antes dela”2
É como se houvesse um mundo paralelo reservado ao idoso, e esse mundo
nasce com a maturidade, mas é na velhice que ele é apontado e colocado a
disposição, é como uma viagem onde o idoso lentamente vai se desligando de um
mundo anterior onde havia um lugar para ele e já não há, desavisadamente penetra
em um mundo totalmente estranho que é sinalizado pelas primeiras perturbações do
estress, o inconformismo causado pelas mudanças.Entretanto, nem todos os idosos
desligam do mundo anterior, procurando se adaptar a essa nova forma de viver,
fazendo mesmo o que foi desejado grande parte da vida, como por exemplo: retorno
aos bancos escolares, pratica de esporte, trabalhos sociais.
É exatamente nesse momento que a informação é importante, pois se não
souber conduzir-se diante das inevitáveis transformações, o idoso corre risco de
1 Revista de gerontologia, pp. 198, volume: 6, nº 4 dezembro de 1998 2 Envelhecer e Ser Feliz, pp. Saldanha Coelho,2 edição.Ed .Espaço e Tempo
terminar seus dias melancolicamente no abandono neste mundo paralelo que começa
a se abrir diante dos seus passos.
Mas, é preciso atribuir valores as suas vidas, e essa atribuição de valores se dá
na medida em que forem atribuída também aos demais, atravez do amor, da amizade,
da indignação pelas injustiças e pela compaixão, viver uma vida humana engajada,
mesmo depois de perdida algumas ilusões, o idoso não deve permitir o esmaecimento
do ardor vital.
Mesmo estando a sociedade os empurrando para o mundo paralelo, cabe
resistir e não entrar no jogo, fugir do tédio, dá sentido a sua existência. Há na
atualidade grandes possibilidades de prolongar a vida e a saúde, quer seja, via
esportes e atuando das mais variadas formas e também com uma alimentação
saudável. O idoso necessita do movimento assim como da convivência social para
prolongar a saúde física, mental e espiritual, essas metas são formas de estabelecer a
autonomia e liberdade de escolha para sua própria vida. A longevidade não será lá
essas coisas, se o idoso estiver vegetando em cima de uma cama em clínica de
repouso. O desequilíbrio bioquímico no cérebro pode ser a raiz de muitas desordens
mentais como a depressão compulsiva e obsessiva, o que não se deve é
generalizarmos que isto faz parte do envelhecimento.
Manter a saúde mental com toda performance, a retenção da memória em seu
pico máximo também é condição para reter o envelhecimento o cuidado que
tomamos com nós mesmos é que vai nos garantir até certo ponto o nível de saúde
que desejamos ter. “Não se torne uma estatística triste de si mesmo e para seus
filhos. A hora é agora, “carpe diem”, ou “ aproveite o dia de hoje”. Isso pode
significar muito, anos mais tarde.” 3.
Como se pode observar, existem duas formas de envelhecer , ou seja, aquela
onde o idoso se retira do mundo, vivendo a velhice como a sociedade a constrói e
aquela onde o idoso desafia a sociedade colocando-se como um ator social.
3 Dra Marie Miczak,pp 79. Os segredos de Permanecer Jovem, Ed Madras
É dentro dessa segunda perspectiva que o trabalho monográfico vai se
direcionar na medida em que envelhecer saudavelmente é um desafio para o idoso,
que vai confrontar-se com o modelo existente do modo de produção capitalista, onde
a máquina ideológica o coloca num segundo plano , na contra mão da história , pois
não é mais um agente de produção,não servindo portanto para produzir riqueza. Está
na saída do sistema, não sendo mais interessante a ele, por isso a discussão hoje na
ordem do dia sobre a “Reforma da Previdência”. Contraditoriamente, a igreja diz
“ironicamente “ que este ano é internacional do idoso.
Assim sendo,os velhos constroem suas vivências de acordo com diferentes
modos de subjetivação, virando “cálculo atuarial”, o que é uma forma de discriminar
os velhos, levando-o ao isolamento social e afetivo, segundo essa ótica
envelhecimento é igual a déficit.
1.3. - História da Velhice
A medicina do século XV, por ser prerentino propunha-se como O
INVERNO AS VIDA, metáfora que se transformou, através dos tempos, em lugar
comum para designar a senectude, tendo sido empregado pela primeira vez, por
Hipócrates médico e filósofo da Grécia Antiga
Na Idade Média, o velho é destronado. Este é um marco importante, uma vez
que as Cruzadas tinham ideais de que a virilidade e a juventude com que contavam
os cavaleiros jovens, podiam desbravar os novos mares em busca da conquista
marítima que visava o descobrimento de riquezas para a ampliação do comércio
marítimo. O jovem teria o vigor para atingir esse objetivo econômico. O velho então
passou a ser visto de forma pejorativa, ou seja, aquele que é decrépito, ridículo,
objeto provocador de riso, repugnante. Entretanto não eram excluídos do convívio
dos jovens. Assim, a ideologia da igreja católica relega o velho a um plano de ser o
escárnio da sociedade para assegurar aos jovens um estatuto privilegiado. Se de um
lado, tem o jovem viril, de outro, o velho como aquele que não tem valor social.
O Renascimento traz com sigo os ideais de beleza e perfeição bastante
presentes nas sociedades greco-romanas. O velho passa a ser mais rejeitado ainda,
mas não é discriminado nos espaços sociais. Com a Revolução industrial do fim do
século XIX, momento que o capitalismo traz a sua marca como modo de produção
dominante, e com essa marca grandes transformações econômica, sociais e política.
Estabelecem-se novas formas de relações sociais de produção, que tem como base o
capital de um lado e o trabalho de outro. O que está em cena é a acumulação de
capital e uma nova classe aponta no poder, a burguesia, proprietária dos meios de
produção e de trabalho. A burguesia imprime sua ideologia e as famílias se
estruturam segundo valores burgueses.
No século XVIII, com o advento do processo de industrialização na
Inglaterra, o organismo do velho possa a ser associado a uma maquina que se
desgasta. Acreditava-se, na época, que cada indivíduo trazia em si um princípio vital
cujo enfraquecimento acometeria a velhice e, em seguida, a morte
Só a partir do século XIX, a geriatria ainda não designado assim começo a
existir. Surge uma preocupação terapêutica em relação á velhice, considerando,
então, como uma patologia. Velho doente torna-se sinônimo. Entretanto com poucos
os que chegaram nesses tempos a senescência. Só com a higienização do Ocidente
começa a se ampliar à expectativa de vida. O aumento da população idosa é um
produto da modernidade, embora esta, paradoxalmente, marginalizando os velhos.
Já no século XX surge o aparecimento da geriátra como ciência; a
arteriosclerose e a osteoporose são descritas como sinais de envelhecimento. Só
recentemente, ao lado da medicina geriátrica, surge a gerontologia que procura
estudar a velhice não mais como doença, mas como uma etapa natural do processo
vital. Essa ciência, no entanto, em seu início, manteve-se fiel a um ponto de vista
positiva, da mesma forma que a geriatria, pois se limitaria a descrever apenas
sintomas de senectude: rugas, embranquecimento e queda dos cabelos, impotência
sexual, perda dos dentes.
Os avanços trazidos pela psicanálise e pela filosofia proporcionaram a velhice
ser compreendido por dimensões subjetivas e existências.A memória com Bérgson e
Freud, entendido como elo intersubjuntivo com o passado como o tempo do lembrar,
momento em que o idoso pode, através do ritmo interno, reconstruir e reviver
passagens significativas de sua mocidade.
A importância dada ao inconsciente amplia o significado do ser velho, inclusive
colocando-o em xeque, pois segundo a psicanalista Marten Grothon, citado por
Simone de Beauvoir, “nosso inconsciente ignora velhice. Alimenta a ilusão da eterna
juventude” (Apend. Beauvoir, 1970, VII:17).
O velho não sente as transformações físicas acarretados pelos anos. E pela rejeição
da sociedade em relação a ele que começa a conceber-se como velho. Por isso, Sartre
afirma ser a velhice um “irrealizável”:
(...) é uma situação composta e, como tais, retificadas (um êtrepour - autrui) que transcendem nossa
consciência. Nunca poderei assumi-la, tal como ela é para o outro, fora de mim. (Apend.Bosi,
1979.37)
O termo geriatria foi introduzido no início do século XX, após grande
discurssão sobre a Senescência, foi o médico Ignaz Leo Nascher, o primeiro a usar o
termo Geriatria na comunidade médica através de um artigo escrito em 1909, para o
New York Medical Journal.Nascher se dedicava a fazer com a velhice o que já se
fazia com as crianças, Abraham Jacob que é considerado o pai da pediatria,
desenvolveu uma base clínica que identificasse os problemas infantis.
Para Nasser o envelhecimento era um processo de degeneração celular, no
seu livro Geriatrics de 1914 ele detalha com precisão a maneira como os velhos
deveriam ser diferenciado a partir de seus corpos. Nascher propunha que a
combinação da degeneração celular interna com o declínio físico afetaria as
características mentais, cita a avareza do idoso, que para ele, seria o resultado da
proximidade com a morte.
A medicina captura a velhice, a partir desse momento o velho passa ser
diferenciado das outras faixas etárias. Assim como a Pediatria, a Geriatria e
posteriormente a Gerontologia nomearia a velhice como alvo de cuidados
específicos.A descoberta da velhice não se resumiu apenas ao corpo envelhecido, o
velho seria também singularizado, em relação ao seu comportamento e suas
condições sociais.
A moderna Gerontologia também estar voltada para estudo das várias
experiências de velhice e envelhecimento normal e patológico, abrangendo aspectos
em diferentes contextos sócio-culturais e histórico.Dessa forma a Gerontologia
define-se como o campo multi e interdisciplinar voltado para seus determinantes
genético-biologico, psicológico e sócio- culturais. Como profissional da área de
saúde o gerontologo empenha-se em alcançar um objetivo máximo que é a finalidade
de sua vida em duas vertentes: a autonomia e a independência dos idosos.
No século XX há um medo da velhice pelo fato de que houve um grande
avanço da medicina e com isso um aumento de expectativa de vida, o que faz o velho
ser ignorado, ou seja, ele é cada vez mais rejeitado. Entretanto, como o capitalismo
traz em seu bojo a sociedade de classe, não se pode pensar sobre o velho de forma
homogênea, mas dentro de uma perspectiva de classes sociais. Seco mostra que na
classe baixa, onde os pobres velhos perderam a capacidade produtiva, tornaram-se
um peso para a família e são abandonados à própria sorte, enquanto nas famílias de
classe média, os avós bonachões tornam-se cúmplices dos netos, mas não decide seu
destino.Já os velhos que mantém um poder aquisitivo alto, continua a exercer seu
poder, mas pelo que possui.
1.4- A velhice no Brasil.
Passaremos agora a designar como a velhice é vista no Brasil. Começaremos
com a definição encontrada no dicionário do Aurélio onde a velhice é uma rabugice
ou disparate próprio do velho. Aqui já se nota um tom de preconceito em relação ao
velho, ou seja, é um rabugento, e, pejorativamente, um disparatado. Essa é uma
representação sobre a velhice que é tratada como coisa, descaracterizada e olhada
negativamente. A associação entre velhice e decadência atinge todos os domínios da
sociedade brasileira. O marco no Brasil que faz o indivíduo ingressar no mundo dos
velhos, é a legislação social brasileira da previdência social Peixoto procura mostrar
que com a criação da aposentadoria em nosso país, o ciclo de vida é reestruturado.
Dessa forma, tem-se aí três grandes etapas, quais sejam a infância e a
adolescência que constituem o tempo de formação, a idade adulta, o tempo de
produção e a velhice o tempo de repouso, do não trabalho (1999:81). Aqui , cabe
considerar, que a construção social da velhice imbui-se da ideologia do trabalho, que
nada mais faz que sinalizar para o velho o que eles representam, comparecendo para
atribuir seu afastamento e sua indesejabilidade a envelhecimento biológico, que é
tido como uma degradação. Assim, a ideologia marca o envelhecimento por ritual de
afastamento. Sendo uma categoria socialmente produzida, o idoso só pode ser visto
dentro de uma perspectiva de classe social, como dito anteriormente, pois é a partir
daí que se tem uma compreensão do lugar que ele ocupa na sociedade.
A velhice é um elemento fundamental à reprodução das relações capitalistas
de produção, uma vez que isso implica representações de idéias, valores sobre a
etapa final da vida humana que organizada segundo as determinações do modo
capitalista de produção. Ao transformar o trabalhador em mercadoria e na
concomitante degradação de sua trajetória de vida, o velho é o elo final da
exploração que vai ser marcada quando de sua saída do mercado de trabalho, e com
sua entrada na aposentadoria.
Nesse momento, no auge de sua exploração transfigura-se nos baixos
rendimentos que recebe. Com isso, a sua inscrição na sociedade o coloca num outro
lugar, qual seja, o da desvalorização, uma vez que “ trabalhar é, pois o eixo que se
plasma e exercita com exclusividade a possibilidade de autoconsciência e auto-
afirmação perante a sociedade[...]a improdutividade[...] é a causa mortis, trabalho é
vida”. (Haddad:1986,49).
Pela ótica da classe social, ideologicamente o idoso e o velho são
diferenciados, uma vez que normas e valores passam pela ideologia dominante da
sociedade. Dessa forma, as pessoas de idade elevada na classe favorecida são
chamadas de idosas, enquanto que na classe desfavorecida, ou seja, a dominada,
estas pessoas são tidas como velhas fato que assume um caráter negativo em relação
ao idoso.Como se pode observar, o peso dado a um e a outro é atribuído de qualidade
e valor.
Assim sendo, a representação social da velhice está associada à passagem
para a inatividade. Muitos adiam-na para não se enquadrarem entre os “velhos”. A
aposentadoria significa a saída de um trabalho regular, o que normalmente está
associado à idade, ou seja, ela é confundida com envelhecimento como já foi dito. Na
medida em que a aposentadoria traz consigo o selo da velhice, da inutilidade social,
esse período vai ser caracterizado como decadente. No dizer de Veras, e com muita
propriedade, a própria denominação traz em seu bojo, a retirada do velho de cena, ou
seja, ”é aquele que fica no aposento”(1999,43), o que o coloca em confronto com os
trabalhadores economicamente ativos, na medida em que há uma mudança no seu
padrão de vida. Na realidade, a aposentadoria é o peso da responsabilidade dos
problemas que a pessoa vai enfrentar como velha.
O licenciamento de indivíduos com mais de 60 anos, através do estatuto legal
da aposentadoria, faz com que percam o direito de continuar trabalhando legalmente,
mesmo que tenham vontade. Dessa forma, o velho transforma-se numa mão de obra
barata, na medida em que muitas vezes tem que trabalhar para completar seus parcos
rendimentos que recebem da previdência social.
De modo geral, com a inatividade, o velho é empurrado para o espaço público
onde se expõe para a sociedade. Esse movimento é também imprimido pela família,
na medida em que há um manejamento de velhos por parte dos adultos no sentido de
imobilizá-los em cuidados para “seu próprio bem”. O velho, dessa forma, vai ficando
mesmo no aposento, uma vez que se vê privado de liberdade de escolha, o que lhe
confere um lugar de dependente no seio da família, não administrado nem mesmo
sua aposentadoria. Muitas vezes, é obrigado a sair de seu aposento indo para um
outro mais degradante, qual seja o da submissão a uma internação hospitalar.
Economicamente inativos, são considerados “socialmente mortos”, pois o lugar que
o sujeito ocupa no sistema produtivo, é o lugar que ele ocupa na sociedade, e isso
reflete na construção do sujeito enquanto pessoa. Assim, quando não se tem o
primado do homem mercadoria, há um engendramento de sua desvalorização.
Na sociedade brasileira, portanto, ao se aposentar, o velho é condenado a
inanição, à inatividade e ao tédio, na medida em que é afastado do trabalho,
convertendo-o num parasita dos cofres públicos, no que diz respeito à economia
previdenciária. Esse fato retrata bem o valor que o velho tem em nossa sociedade,
qual seja, a infância e a adolescência representam a promessa de “garantia” de
conquista, enquanto que o idoso é incapaz, improdutivo, portanto, nenhum olhar
deve ser dirigido a ele que já está gasto pela idade.
O velho só é lembrado no Brasil quando se anuncia o déficit da previdência.
Esquece que trabalhou, produziu riquezas, já contribuiu com a sua mais-valia para
acumulação capitalista. Na medida em que o jovem é priorizado em nossa sociedade,
a velhice é os apoios de memória e substitui a lembrança pela história oficial
oprimida, despojada e banida.
Nesse contexto, uma sociedade como a nossa, “desarma o velho mobilizando
os mecanismos pelos quais oprime a velhice, destrói os apoios de memória e
substitui a lembrança pela história oficial celebrativa”(Chauí: 1987, XVIII). Essa é a
passagem de um período ativo de reconhecimento social, para um período inativo,
com diminuição do padrão de vida, alem das exteriorizações físicas que inscrevem a
pessoa no envelhecimento, leva também a perdas do status social.
Tendo se tornado um problema social na medida em que o reconhecimento
dos velhos implica em tornar visível a situação em que se encontram em nosso país,
e colocá-los no centro das preocupações sociais do momento para que se possa agir
sobre ele e poder ser elaborado um programa em função desses novos atores
traduzem-se em novas definições da velhice e do envelhecimento, que ganham
dimensão com a expressão “Terceira Idade”.
A noção de “Terceira Idade” é um decalque do vocábulo francês dotado logo
após a implantação de políticas sociais para velhice na França, e traz consigo a
transformação da imagem do velho. A rubrica da “Terceira Idade” inscreve-se na
criação de atividades sociais, culturais e esportivas. Designa os “jovens velhos”
aposentados dinâmicos. Surge uma gama de produtos de beleza, alimentares e de
turismo, bem como novas especialidades profissionais como a Geriatria e a
Gerontologia, cujos discursos são assentados na ciência.
A rubrica da “Terceira Idade” vem para contrapor a “teoria do
desengajamento”, que como diz França preconizava o “afastamento progressivo do
individuo no seio da sociedade, usado como instrumento a aposentadoria, e na
aceitação dessa perda como providencial para que o individuo dispusesse um tempo
maior para suas realizações, uma vez que estava próximo à morte” (1999:19) a
“teoria do desengajamento”, que contém em essência a idéia contraria a passividade,
mas na realidade se esperava que a própria sociedade descobrisse alternativas para os
idosos excluídos da produção.
Dessa forma, ideologicamente, essa idéia se encera em uma mesma saída para
a questão da velhice, possibilitando aos velhos condições de viverem através do
processo de ressocialização, ou seja, ter uma existência diferente daquela que é
socialmente produzida. Saber envelhecer repousa em parâmetros e, como diz
Haddad,...”a superação dos obstáculos a uma velhice feliz vai buscar no social suas
razões de ser”(1986:37).
CAPÍTULO II
A VELHICE COMO CONSTRUÇÃO SOCIAL:
CAMINHOS E DESCAMINHOS
Conceituar a pessoa de “velha”, só porque
atingiu um numero razoável de anos, é
apenas um conceito cronológico
2.1- Visões Críticas.
Caracterizar a pessoa velha é um desafio, uma vez que sua complexidade
reside na utopia de traçar um perfil da pessoa humana em face de suas peculiaridade.
O que pode se chamar velhice, implica em varias dimensões: a biológica,
cronológica, psicológica, existencial, cultural, econômica e política dentre outras. O
ser humano é visto de forma multifacetada.
Assim conceituar a pessoa como velha, só porque atingiu um número
razoável de anos, é apenas um conceito cronológico, que nada mais é que uma
função linear de expectativa de via. Essa forma de voltar o olhar para o velho não
leva em conta a dimensão temporal da subjetividade, uma vez que o tempo vivido é
um reservatório de experiências acumuladas. O calendário externo pode não
corresponder a jovialidade que mantém ativo o indivíduo em idade avançada,
podendo mesmo não equivaler à cronologia das artérias.
Importante se faz ressaltar que as idades cronológicas baseadas num sistema
de datação estão ausente nas sociedades orientais, uma vez que há uma incorporação
dos estágios da maturidade na estrutura social, onde se considera não só o
desenvolvimento biológico, mas também os níveis de maturidade, com o
reconhecimento da capacidade de realizar certas tarefas, assim como é autorizado
para a realização de práticas como caçar, casar e participar do conselho dos mais
velhos, que muitas vezes decidem a passagem de um estágio para outro não havendo
uma orientação baseada na idade cronológica.
Já nas sociedades ocidentais a cronologia é um mecanismo básico de
atribuição de status como a maioridade legal, a definição de papéis ocupacionais
entrada e saída do mercado de trabalho, o direito a aposentadoria, etc...Ao contrário
das sociedades orientais, nas sociedades ocidentais, a idade cronológica é
estabelecida por um aparato cultural do sistema de datação independente e neutro em
relação à estrutura biológica e a incorporação dos estágios de maturidade.
Os critérios e normas da idade cronológica são impostos nas sociedades
ocidentais por exigências das leis que determinam os direitos e deveres do cidadão.
Assim, a “idade cronológica só tem relevância quando o quadro político jurídico
ganha precedência sobre as relações familiares e de parentesco para determinar a
cidadania”(Debert): 1999,58).Nessas sociedades, a idade cronológica é uma
dimensão fundamental da organização social e econômica. Dessa forma temos então
a padronização da infância, adolescência, da idade adulta e da velhice.
A própria Organização Mundial de Saúde(OMS), classifica o envelhecimento
em 4 estágios, que são baseados no sistema de datação. Temos assim: a)- meia idade
de 45a 59anos; b)-idoso que se situa na faixa de idade que vai dos 60aos 74anos.c)-
ancião que fica na faixa etária que vai dos 75aos 90anos e finalmente as pessoas de
extrema velhice, que são aquelas que tem 90anos e mais.
O que acontece quando se vê o indivíduo cronologicamente é “estereotipá-lo
segundo a faixa etária, desprezando o conceito que cada pessoa é um ser individual
único, indivisível e que dentro de sua totalidade tem características especiais
(Simões: 1994,20), assim como deve ser vista em relação a um contexto cultural
dado.
A Biologia considera a velhice como a idade do declínio mental e corporal,
com o aumento da involução dos sentidos e das funções vitais. É um mundo de
perdas, onde o rendimento não está em escala aceitável. Assim sendo, o
envelhecimento é um processo manifestado em todos os níveis de integração do
organismo, desde de células, órgãos e seu funcionamento, no nível corporal e no
declínio mental com alterações de memória, inteligência, etc.
Essa forma de olhar o velho é uma visão muito restrita e linear do processo
de envelhecimento. É coisificar o velho. É não ultrapassar a uma concepção
positivista e naturalista da existência humana, ou seja, os seres humanos estão
fadados a uma evolução contínua, que podemos dizer o indivíduo nasce, reproduz,
envelhece e morre. Os fundamentos teóricos desta visão baseiam-se ns teoria do
desgaste dos órgãos.
Diante do que foi colocado acima, é preciso não perder de vista que os
conceitos acima relacionados estão associados a marcos observáveis, como o
parâmetro objetivo da idade acima de 60 anos, marca visíveis no corpo biológico,
bem como as marcas sociais do envelhecimento. As marcas psíquicas não são
observáveis, e são suas formas de manifestação amplamente variáveis que vão
conferir diferenças individuais diante da velhice, para além das determinações
biológicas.
Esse ponto de vista traz consigo a idéia de que o envelhecimento, uma vez
que é a fase final do organismo humano em sua evolução, associação de sua chegada
com idéia da morte, passando a ser o cancelamento dos desejos. Não podemos ver a
impotência sexual dos velhos como a extinção da libido, entendida como uma pulsão
de vida que só se extingue com a morte.
A Psicologia Evolutiva contemporânea trabalha sob o ponto de vista de que
envelhecer abrange não apenas aspectos biológicos, mas também psicológicos e
refere-se à velhice como ciclo total de vida e “falar de velhice é falar forçosamente
de um momento do tempo existencial”(Machado: 1992:47). A psicologia Evolutiva
preocupou-se, até recentemente, apenas em estudar o desenvolvimento emocional do
nascimento até a vida adulta, e só há pouco tempo, o conceito de desenvolvimento
começou a ganhar amplitude no sentido de tratar não apenas o assim chamado o
período de ascensão, mas também o período de involução.
A amplitude da Psicologia Evolutiva de forma como está sendo tratada aqui
pode ser vista em Merval Rosa (1998;102). Nesta área da Psicologia, pode ser vista
que vários aspectos da atividade intelectual do velho são afetados pelo processo de
envelhecimento e que um destes é o que se refere à memória, que pode ser causada
pela deterioração das artérias, ou seja, seu endurecimento, assim como a falta
adequada de circulação sanguínea no cérebro, o que afeta o cognitivo do ser humano.
Um outro aspecto que é considerado é a perda do interesse pelos eventos
atuais por parte das pessoas idosas. Ela conserva os aspectos da vida em que foi bem
sucedida podendo dessa forma o velho desligar-se do presente. A perda da memória
na pessoa que é velha é mais freqüente . Além disso, a inteligência sofre um leve
declínio com o processo de envelhecimento, mas tem mais acuidade e concentração
que a pessoa mais jovem, mais por uma tentativa de evitar erros.A precisão
perceptiva na pessoa velha é prejudicada por causa do declínio dos órgãos sensoriais
periféricos, o mesmo acontecendo com as habilidades motoras. Rosa coloca que
“apesar de não funcionar bem intelectualmente, a pessoa idosa já não possui a
mesma capacidade intelectual de épocas anteriores da vida(1998:102).
As mudanças biológicas quer sejam funcionais, quer estruturais, causam uma
mudança na auto imagem do velho, momento em que ele perde sua identidade
psicológica. Esta identidade é que vai determinar o ajustamento do individuo a essa
fase final do processo evolutivo. Assim, ao sofrer mudanças de ordem física e
intelectual, as estruturas de sua personalidade tendem também a se modificar. Ocorre
um reduzido contato do idoso com o mundo exterior.
Essa visão da Psicologia quer generalizar e universalizar o processo de
envelhecimento por que passa a pessoa. Esquece-se ela que as sociedades são
diferenciadas, não se podendo ficar no aspecto somente descritivo. É como se essa
descrição fosse acontecer com todas as pessoas velhas. Essa abordagem deixa de fora
aspectos importantes, quais sejam a sua inserção no contexto social.
A visão bipolar da questão do envelhecimento ganha força com a moderna
gerontologia. Assim, Wolterck coloca: (...)processo de envelhecimento das células
em todo organismo vivo, existe no inicio mesmo do desenvolvimento, de modo que
desde os primeiros aos últimos anos de vida, viver e envelhecer são uma mesma
coisa”( Apud: Secco:1999,10). Para esse autor a senescência não apresenta
necessariamente o declínio, a regressão física, mas também “ser velho” compreende
um processo dialético que engloba amadurecimento e sabedoria. Este pensamento
está contido na citação de Afonso Romano Sant`Anna na crônica “Quando os
Cabelos Embranquecem”: “É estranho que a gente comece ver esmaecidamente o
rosto das coisas que estão perto, exatamente quando a experiência começa nos
ensinar a ver melhor as coisas de longe”(Apud: Secco:1999,10).
Segundo este ponto de vista, a velhice deixa de ser encarada como uma
patologia, acabando com o estereótipo de que velhos e doentes eram sinônimos. A
moderna gerontologia ultrapassa a idéia do envelhecimento como uma decadência de
forças e para isso, tem como suportes a psicanálise e a filosofia. Com isso, a velhice
passa a ser compreendida em suas dimensões subjetivas e existenciais. Com a
psicanálise, por exemplo, a senescência é encarada como o tempo de lembrar,
momento em que o velho pode, através do íntimo interior, reconstruir e reviver
passagem significativas da sua mocidade. A importância dada ao inconsciente amplia
o significativo do ser velho, na medida em que ele ignora a velhice e alimenta a
ilusão da eterna juventude.
O velho embora marcado por transformações físicas acarretadas pelos anos, é
cercado por determinantes sociais, como a rejeição da sociedade em relação a ele,
que começa a conceber-se como velho, o que torna a concepção da velhice variável
de cultura para cultura e de época para época, ficando difícil pensarmos o que
significa ser velho fora de um contexto histórico determinado.
2.2. - A velhice como construção social.
Como vimos anteriormente, o ser humano quando avança em idade, a
sociedade passa a discriminar os velhos, que são conduzidos a um isolamento físico,
afetivo e social. A senectude passa a ser uma faze terminal e vegetativa do processo
vital.Será que é mesmo assim?
Os estudos antropológicos recentes mostram que a velhice é uma categoria
socialmente produzida e como diz Debet “os recortes de idade e a definição de
práticas legítimas associadas a cada etapa de vida não são, portanto conseqüências de
uma evolução cientifica marcada por formas cada vez mais preciosas de estabelecer
parâmetros no desenvolvimento biológico humano. (1998:53).
Ao se lançar o olhar para a perspectiva antropológica, podemos dizer que as
representações sobre a velhice e a posição social do velho, ganham contornos
particulares de acordo com cada sociedade. Assim sendo, com essa consideração
pode-se delinear que mudanças ocorreram nesta faixa etária e não podem ser vistas
de forma isolada, onde as perdas biológicas regem o conjunto de outros declínios.
Bourdieu faz uma colocação muito interessante a respeito, dizendo que as
“classificações por idade(também por sexo e classe), acabam impondo limites e
produzindo uma ordem em que cada um deve se manter ...em seu lugar”(1998,112).
Isso pode ser dito em relação à sociedade capitalista, onde as manipulações
são produzidas levando-se em conta a idade. Idade para sair e entrar no mercado de
trabalho, votar e ser votado, para casar e para morrer. Quando se chega a uma idade
determinada pela aposentadoria há um afastamento total da cadeia das relações, com
perdas de laços. O tempo é o tempo capitalista, é o tempo da acumulação. Assim, no
sistema capitalista demarca “o envelhecimento por rituais de afastamento, se não de
degradação, o contexto social e do trabalho nada mais fazem do que sinalizar para
seus membros o que eles representam”( Novaes:1995,15).
A velhice nessa forma de ver não é uma etapa naturalizada do curso de vida,
como querem os psicólogos que trabalham com a Psicologia Evolutiva e biólogos,
mas sim vivências permanentemente construídas de acordo com diferentes modos de
subjetivação.Entretanto a velhice não deve ser entendida como uma entidade isolada,
mas sim, como uma pluralidade de descrições sócio-culturais, o que faz com que a
representação social do idoso seja diferente segundo o contexto em que está inserido.
Esta representação está sujeita à interferência de preconceitos e estereótipos sociais
como, por exemplo, de que a “velhice é triste” e é “uma doença em alta”. O
biológico ganha um redimensionamento se visto num contexto social dado.
O processo biológico é universal, mas seus contornos dependem de cada
sociedade em particular, fato que dá sentido a existência do velho. S e tomarmos
como base a cronologia ligada aos dados biológicos, teremos uma padronização que
vai coisificar o velho numa determinada idade, com isso perdendo a plasticidade que
essa faixa etária pode adquirir se vista de um outro ponto de vista social.
Essa visão segundo Debert demonstra que a idade não é um dado da natureza,
nem um princípio constitutivo de grupos sociais, nem um fator explicativo do
comportamento humano (1999). Essa forma de olhar o velho rompe com a Psicologia
Evolutiva em seus pressupostos, que estuda sistematicamente o desenvolvimento da
personalidade humana no processo formativo do indivíduo desde a fecundação até a
velhice, e concebe uma seqüência linear de etapas evolutivas, apesar das
particularidades culturais de um determinado contexto.
Portanto, os recortes de idade não devem ser conseqüência de uma evolução
científica. Por isso Simone de Beauvoir afirma que:
“(...) o que define o sentido e o valor da velhice, é o sentido atribuído pelos homens a
existência, é o seu sistema global de valores (...). Segundo a maneira pela qual se comporta para com
seus velhos, a sociedade desvenda sem equívocos a verdade- tantas vezes, cuidadosamente mascarada-
de seus princípios e seus fins”45
4 BEAUVOIR, S. - A Velhice . Relações com o Mundo- Difusão Européia do Livro- São Paulo 1970,
p. 123.
5
Segundo a ótica que estamos tratando aqui, as representações da velhice e a
idade a partir da qual os indivíduos são considerados velhos, e o tratamento que é
dado pelos mais jovens, tem significado particulares segundo os mais variados
contextos.
Na sociedade atual, a questão da velhice traz em seu bojo grande carga de
negatividade, pois a velhice é vista como decadência não como sabedoria e
experiência, reconhecer-se velho é difícil, pois o envelhecer distancia o homem do
ideal concebido. Não há de estranhar, portanto, a recorrência generalizada na classe
mais favorecida de resistência a expressão do envelhecimento, transfigurada em
cirurgia plástica, pintura de cabelo, etc. Fato que desnaturaliza o processo de
envelhecimento onde a expressão do velho com suas marcas deixam de existir, pelo
menos a expressão física que fica bem evidente, o que reforça a imortalização do
ideal de juventude tão presente em nossa sociedade, onde a velhice deve ser
escondida a todo custo.
Isto vem mostrar que nas sociedades capitalistas, há uma tendência à
homogeneização, homogeneização essa em que a criança é enviada ao mundo dos
adultos. Ela se adultiza desde a mais tenra idade e com isso há o desaparecimento da
infância e os jovens mantêm-se via academias física e socialmente. O corpo, as belas
figuras estão em primeiro plano. O físico é o que importa. Eles, os jovens, trazem
lucro para o capital. O idoso por seu lado “deve”rejuvenescer. Aí está embutido um
preconceito, onde a palavra “velhice” significa perda deterioração, fracasso,
inutilidade, fragilidade, decadência, gasto pelo uso, ou seja, o gasto pelo trabalho que
precisa ser restaurado capitalísticamente.
É uma forma também de esconder o envelhecimento da sociedade. É
improdutivo, mas tem uma aparência jovem, pois só assim serve aos meios de
consumo. Assim, no sentido de “ homogeneizar”, a classe dominante busca[...] se
constituir no que visa um alvo privilegiado, a atualização do comportamento dos
homens na e com relação à “terceira idade”(Haddad:1996,18).
A sociedade ao recusar-se se ver na velhice, impede que a mesma viva em sua
plenitude. Pergunto: será que a sociedade constrói a juventude para ocultar a velhice?
Normalmente, a palavra velho é usada como sinônimo de jovem, sendo que este
último é a referência primordial onde se reconhece a “negatividade” do velho,
mostrando que há uma distância entre os excluídos e os não excluídos.
Dessa forma, em nossa cultura, os velhos foram desarmados, o que segundo
Chauí comentando a tese de Ecléa, escreve que “os velhos foram
desarmados(...)deixa uma ferida aberta em nossa cultura: a velhice oprimida
despojada e banida”(1987,18).Ao oprimir a velhice, o velho sobrevive apenas. Há
exclusão dos espaços de participação não só na sociedade mais ampla, como também
na família.
CAPÍTULO III.
O VELHO E O SEU CORPO:
UMA ENCARNAÇÃO
É importante para o velho tornar-se um
ser mais pleno neste mundo, ir
ultrapassando o EU PRECISO para poder
conectar-se com o EU TENHO, EU
REALIZO, EU OBTENHO, vivendo o seu
momento de encarnação existencial,
recriando seu lugar na sociedade, ao se
tornar sujeito aos olhos de si mesmo e do
outro.
Sendo o processo de envelhecimento um processo social que assume uma
significação particular de acordo com a história de cada um, e que ser velho é
marcado por rituais de afastamento do contexto social e do trabalho, podemos dizer
que ao longo de sua vida, a libido é deslocada para o trabalho, a sexualidade, etc... e
neste momento há uma ruptura com o ideal de vida e os relacionamentos perdem-se.
O seu lugar na família, que antes era o de provedor, agora quem assume são os
filhos, trazendo um sentimento de impotência, o sujeito, passa a uma posição de
objeto.
Entretanto, existem pessoas que fazem uma travessia para o envelhecimento
de forma sadia, não indo parar no aposento, mas há outros que esta travessia se faz
de forma em que a adaptação é frágil e, se faz normalmente naqueles setores onde
há um certo grau de subdesenvolvimento da personalidade, onde a vivência da
SOMBRA (medo do envelhecimento biológico, medo da diminuição da potência
sexual, etc...), costuma ser bastante dolorosa. Assim, as emoções ficam mais
descontroladas e elas não tendo seu escoamento natural, se transformam em
sintomas. Perde-se o contato com a energia primária, fonte de realização do desejo,
que fica muito difícil para ele, na medida em que a ruptura traz um desinvestimento
na vida.
Podemos dizer que a energia primária que é uma “fonte fundamental de
energia que se orienta para um determinado objetivo” (Besson; 1) e que existe uma
impulsão primária que a anima. Se o velho está num momento de desinvestimento
no sentido de estar vivendo uma situação que ele não consegue expressar, mas não
quer dizer que ele deixou de existir, mas deixou de se conectar com a energia vital,
o que o obriga a optar pelo que é convencional, isto é, o que a sociedade espera
dele, reprimindo o sentimento, fazendo a concessão de nela permanecer, perdendo
dessa forma a capacidade de criar coisas novas e recebe uma visita indesejável, que
se dá pela porta dos fundos, por intermédio dos sintomas físicos, que resiste a
impulsão da energia.
Temos então o mundo dizendo NÃO para o velho e ele sem capacidade
de expressar-se fica numa reação secundária parada na ruptura que acompanha o
caráter trágico da experiência vivida pelo velho quando é confrontada sua
encarnação/desencarnação, pois ele traz consigo devido às perdas da própria idade a
idéia de finitude. Perdendo o velho, como já foi dito, a noção de uma outra
possibilidade de ser de forma mais criativa, ele fica no padrão secundário, vivendo-
o como normal sem qualquer questionamento.
Como fica então a questão que foi colocada em relação ao velho no que
diz respeito ao Círculo Psico-Orgânico? Escolhemos o Círculo como recorte para
este trabalho, porque para nós ele enfoca um símbolo universal de enorme força e
indica sempre o mais importante aspecto da vida – sua extrema e integral
totalização. Pensamos que o Círculo ao poder ser utilizado em suas várias
dimensões, aqui será feita uma ponte com o toque, dada sua importância devido ao
momento existencial em que vive o velho, no sentido uma ruptura no curso de sua
vida onde aparece uma patologia, qual seja a dor física, pois na Psicologia
Biodinâmica, como diz Sacharny, “pensamos que é possível e mesmo essencial
reatar, reconectar com o ‘paraíso perdido’...Não se trata de negar o sofrimento,
mas de dar sentido a nossa experiência no mundo”(Oliveira; apud: 2001) . Assim,
o que a Análise Psico-Orgânica traz para o idoso é um redimensionamento da sua
experiência no mundo no sentido de recontar a energia primária e com ela o EU
EXISTO.
É aí que vem a importância do tocar, pois seu sentido é o de dar a
possibilidade do velho reencontrar a sensações primordiais, como, por exemplo,
aquela de EXISTIR, que colocamos com letras maiúsculas, pois o EXISTIR é o
sentido da própria vida. O toque é transformacional, portanto, “Ferramenta de
exploração, para ‘ir em direção a situação’(ou para deixá-la”(Bochet:17) . O velho
quer ser tocado, quer ser acolhido, quer ser ouvido, enfim, quer ser valorizado em
suas várias dimensões.
O que falta ao velho? É fazer a integração com a sua SOMBRA, ou seja,
uma conexão do consciente com o inconsciente, vital para o equilíbrio daí a
importância do toque para que o velho se conecte com o seu registro mais original,
mais arcaico, de forma a entrar numa maior sintonia com seu corpo, ou seja, isto
fala, de um registro profundo.
Assim, como diz Sacharny, “o toque é um instrumento de conexão e aí
poder trazer para a situação, poder encontrar situações que fazem referência a
essa intensidade que vem a partir do toque e reverbera no corpo” (Oliveira; apud:
2001) O toque é importante vai poder buscar a imagem, a situação e a expressão do
que o velho está vivendo no aqui e agora.
O direcionamento é a encarnação do que o velho está vivendo no
momento, mas de forma criativa, e isso só é possível na medida em que ele se
conecta com a energia primária, fonte de enraizamento e de vida, pois passa a ter
possibilidade de se expressar, e isto vem tanto da ordem do prazer quanto das
sensações prazerosas. Isto só é possível através da integração.
Se o toque é uma ferramenta terapêutica para ir a direção a uma
situação, o velho pode fazer uma conexão com as experiências do passado, ele vai
para uma situação vertical ou no aqui e agora para uma situação horizontal, no curso
da qual pode encontrar o que havia esquecido e brotar de novo a energia de viver
com um imenso desejo de dar um sentido a vida e isso só pode se dar se o velho se
apropriar de uma situação vertical que ele viveu, podendo fazer novas escolhas,
produtos de sua vontade. Aí ele vai poder optar se quer sair ou não do convencional,
mas de forma consciente.
O toque, no caso do velho, como elemento de integração, leva a uma
acumulação, é quando o velho pode sair de uma atitude passiva diante do mundo e,
aos poucos poder transformar esse lugar em que se colocou, para ter uma atitude
ativa diante do mundo, e “ao buscarmos soluções para atender nossas necessidades
e realizar nossos desejos, estaremos formando o ego e ampliando nossa
consciência”. (Grinberg;1997:470) e dessa forma o EU EXISTO!
A função do ego é função de adaptação à vida tanto interior quanto
exterior, ou seja, falamos de micro e macro regulação. A vida começa a se tornar
mais fácil na medida em que o ego se estrutura e pode responder as solicitações que
a vida lhe impõe, pois adquire a capacidade de simbolizar, o que sem isso seria
difícil lidar com as várias solicitações, perdas, frustrações e carências do dia a dia e
essa “identidade do ego consigo mesmo é baseada na consciência das percepções
do próprio corpo”. (Grinberg;1997:47)
Como diz Boyesen (1992), a circulação faz parte da problemática da
pessoa e no caso do velho, em seu momento existencial a energia se dá no sentido
descendente, no sentido do defluxo, não se completando o círculo energético, o
velho fica nas saídas.
Se a energia do velho fica somente no defluxo, mas no sentido de um
esvaziamento, não completando o seu ciclo energético, acreditamos serem mais
problemáticos os pontos: 1(necessidade); 2(acumulação); 3(identidade); 4(força);
5(capacidade); 6(conceito).
Assim, esse ponto1, no processo em que se encontra o velho, é o retorno
ao estado de “dependência da mãe”, ou seja, aqui pode-se fazer uma leitura de como
sendo uma “dependência dos filhos”ou de qualquer outra pessoa próxima a ele.
Neste sentido, podemos dizer que esse retorno ao ponto1, não significa
abrir uma via de maior impulso a energia vital, mas o retorna a uma posição
infantilizada, no sentido de não experienciar, ou melhor, ir a busca do prazer, e,
dessa forma, o fluxo vital fica comprometido. É o momento em que ele está
mergulhado no vazio e precisa ser tocado, para poder se nutrir. Aqui, o velho se
encontra num registro muito unário de sua existência, que é muito próximo à
sensação de morte, que é extremamente potente. O importante aqui, é que ele se
reconecte com a energia primária, no sentido de uma nutrição, indo ao encontro da
situação mais original relacionada à figura materna, que é a de proteção.
Ao se conectar com as suas necessidades, o velho aos poucos começa a
ter uma atitude ativa diante do mundo. Ao buscar soluções para atender as
necessidades, está começando a fortalecer o ego e ampliando a consciência de estar
no mundo.
O que traz a acumulação? Pela acumulação, o ego já está mais
fortalecido, velho ao buscar soluções para a tender suas necessidades, como foi dito
anteriormente, o caminho do crescimento está aberto, foi feito um movimento
FLUXO
CARGA
DEFLUXO
DESCARGA
centrípeto. Nesse ponto podemos falar de continente, de apropriação... “sentir o
outro é sentir seus próprios limites, é ser capaz de se definir corporalmente; é ser
capaz mais tarde de fazer a imagem de seu corpo, de sua identidade”. (Besson: 6)
O toque é importante no sentido de deixar que o velho explore o seu espaço próprio
pelo contato, o que vai dando um sentido maior de enraizamento no mundo. Assim,
o velho já se sente capaz de escolher uns conteúdos e abrir mão de outros e poder
começar a se conectar com a SOMBRA e poder transformar a energia residual em
conseqüêncial, pois, a partir de uma sensação mais próxima ao corpo, o sentimento
vai poder ter um continente e ter um sentido.
É importante para o velho tornar-se um ser mais pleno neste mundo, ir
ultrapassando o EU PRECISO, para poder conectar-se com o EU TENHO, EU
REALIZO, EU OBTENHO, vivendo seu momento de encarnação existencial,
recriando seu lugar na sociedade, ao se tornar sujeito aos olhos de si mesmo e do
outro. Aí, os valores da sociedade em relação ao velho serão vistos com um outro
olhar por ele. Como dizia Yung “quanto mais a pessoa se torna si mesma, mais ela
se torna um indivíduo”. (Fraisse: apud: Yung; 1998:48).
Assim o velho torna-se mais inteiro, íntegro de forma que ele possa
enfrentar a vicissitudes da vida. Ele sai do unário e entra na ligação, reunificando de
uma forma horizontal na sociedade, e também se liga num nível vertical que
também podemos chamar de SELF, o SI-MESMO, que funciona como um
verdadeiro maestro, mantendo a orquestra unida para executar uma melodia única
ao longo da existência. Dessa forma, o velho conecta-se com a energia vital, a
energia psíquica, que nada mais é do ponto de vista Yunguiano, a libido.
Acumulação (ponto2) e identidade (ponto3), estão intimamente ligados,
mas são diferentes entre si. A acumulação é a materialização do limite, da
contenção, de um potencial energético, enquanto que a identidade é o princípio
substancial, ou melhor, dizendo, ela se inscreve nos limites da contenção. É poder
dizer EU! EU sou capaz sozinho, e ao mesmo tempo Eu preciso do outro. É quando
o velho já começa a assumir o seu processo, implicar-se na sua vida e viver seus
próprios temas. A vontade já começa a se manifestar.
Para isso, o velho precisa da força, (ponto4), para se colocar em
movimento, que anda também muito junta com a capacidade (ponto5). Diz respeito
ao investimento do velho no mundo, por isso é tão importante o esporte ou qualquer
outra atividade física para que ele possa sentir o tônus muscular e sair do lugar do
esgotamento das forças, assim como o da velhice como o limiar da morte, ou seja, a
senectude como etapa terminal e negativa do processo vital.
É importante que essa força seja uma afirmação da identidade, e para
isso é importante que esteja muito próxima ao ponto3, pois desta forma o velho vai
ter uma sustentação maior na sua relação com o mundo e suas confrontações,
encontrando uma direção. O reconhecimento da virilidade e da autonomia aumenta
no velho a confiança de estar no mundo. É sentir-se forte, é a força da energia que
sobe.
O ponto 5, a capacidade, fala de investimento no mundo. A energia
precisa estar acumulada. Há uma projeção para o futuro. O idoso neste ponto já está
saindo para uma relação ternária que no ponto 6, podemos dizer que é a resolução
do Édipo.
Essa projeção para o futuro se dá em conseqüência de uma focalização
de energia, pois o velho já entra em contato com a imagem simbólica que só pode
ser consciente, se associada ao ego, como diz Yung. Essa imagem simbólica,
portadora do sentido da experiência, é quando o velho é confrontado com o objeto
do seu desejo e a capacidade de realizá-lo. Temos aí uma confrontação com o real,
que é o ponto de partida no sentido de transformação da vida. Essa capacidade de
transformação traz ao velho o lugar de sonhador, sonhador dos seus desejos. que
bloqueados ele entra em contato e vai retomando as suas funções sociais e o seu
lugar na sociedade.
O importante para que ocorra essa mudança é que a imagem seja muito
próxima do real para evitar frustrações. É o momento em que o velho vai conectar
com as suas possibilidades.
Agora, o velho vai para o nível do desejo, e se colocar numa relação
ternária. Aqui, ele vai entrar no campo da realização, EU REALIZO! Já existe um
projeto de vida e este projeto tem um sentido. Estamos falando do ponto 6
(capacidade), já começando o defluxo, só que agora de uma forma mais criativa e
não de um esvaziamento, como foi falado antes.
O desejo vai ser confrontado com os critérios de realidade do mundo, aí
vem à indagação:- será que ele pode ser realizado? Este ponto é o “momento de
escolha consciente, da encarnação, que é a realização no mundo da escolha feita a
partir da confrontação entre a imagem simbólica e imagem real”.(Besson:12) É a
passagem que se dá entre o mundo interno do velho, uma vez que este é o nosso
objeto de estudo, e o mudo externo. Existe uma “independência, mas também
confrontação com o mundo externo”.( Fraisse;1998:21)
É o tempo do velho reinvestir de forma encarnada numa velhice feliz
sabendo conviver com as marcas do tempo e com isso reduzindo este momento de
perdas seja ela cognitiva, de poder ou de beleza.
Esse reinvestimento faz parte de suas escolhas, do lugar que deseja, o
reinvestimento que fará em sua vida, dando um outro sentido a sua existência, caso
contrário, o velho ficará ossificado nas experiências passadas, não se permitindo
assumir o lugar de sujeito das suas escolhas. Pensamos que o ponto 6 ao referir-se
as escolhas, é dizer um SIM a vida, pois nós diríamos que essa confrontação com o
mundo externo se dá pela integração da SOMBRA, as experiências mais arcaicas.
Reconhecê-la é lidar com as deficiências, o que é uma negociação longa e difícil. É
importante, entretanto que tudo isto seja visto de forma contextualizada, nos valores
inerentes a cada sociedade.
Para ir ao encontro de é o fazer-se expressar para o outro-Tu, assim
como para outros-Eles. Isso só acontece se os 6 primeiros estágios foram bem
vividos, pois a moral do trabalho exclui o velho do convívio com os familiares que,
no afã de consumirem e de enriquecerem cada vez mais, não tem tempo para o
diálogo com os pais e avós. Conforme assinala Simone de Beauvoir “com a
modernidade intensifica-se uma ‘conspiração de silêncio’contra a
velhice”.(Secco:apud;1999:24)
O lugar reconquistado é feito de escolhas, de inclusive a de não aceitar
esta conspiração do silêncio a que a sociedade quer submetê-lo. Para isso, o velho
tem que estar cônscio de sua força para aceitar uma eventual recusa a sua expressão.
O importante que o Ele não é mais ameaçador. O contrato de vida agora pode ser
mudado, uma vez que o ponto 7 é o ponto da expressão. Assim, o velho sai do lugar
onde o contrato era “eu correspondo às expectativas do mundo”, para “agora, vou
saber se o mundo vai corresponder as minhas expectativas, pois estou consciente do
lugar que ocupo”.
É o tempo de dizer, olhar e fazer. O velho é um sujeito que agora
dialoga com o mundo. Está na posição de ator. Coloca-se na ação, ou seja, escolhe
conscientemente, realiza.
Para nós os pontos 7 e 8 caminham bem juntos é o lugar da expressão
dos sentimentos, é o velho estar em contato com suas emoções. É agora colher os
frutos do desejo expresso, da ação realizada e é importante que a satisfação
aconteça. Aqui, o velho está num estado de plenitude, onde ele se unifica com a sua
ação. Ele tem o sentimento da OBTENÇÃO. Isto pressupõe uma grande força.
O velho agora chega ao ponto 9 num estado de bem estar independente,
onde no corpo são espalhadas ondas de prazer, de vibração, de respiração cósmica.
Entretanto pensamos que este bem estar não pode ser nirvânico, o importante é
viver a orgonomia num certo bem estar, para que possa retornar ao ponto 1.
Acreditamos que a completude não existe, a falta está presente desde sempre.
Para nós foi extremamente prazeroso fazer esta viagem com o velho no
Círculo Psico-Orgânico através do toque. Foi acompanhar passo a passo sua
trajetória no Círculo, a construção do seu ego no sentido do EU EXISTO. Isto quer
dizer a manutenção do SIM a vida, pulsando de novo num re-encontro com ela. Ir
para a autonomia é no contato com o outro e,
“supõe encontrar uma flexibilidade no contato com o outro entre: ter
uma certa independência(identidade) e saber ser dependente (fusão).
Isto implica não ficar fixado nas dolorosas dependências do passado,
a fim de ocupar um lugar, na experiência da dependência, para a
confiança e o prazer”.(Bochet;1993:18)
CAPÍTULO IV
ANÁLISE DOS DADOS
“Só me sinto feliz, viajo, faço as coisas não
dou trabalho a quem viajo, não me
percebo velha... eu canto nas serestas... é
por alegria que não me sinto velha...”
(90 anos)
4.1. – Análise das entrevistas
Foram realizadas três entrevistas com homens idosos. No que se refere ao
discurso referente ao envelhecimento, está presente o seguinte:
“Eu me sinto surpreso, um jovem se levantou para me dar lugar no ônibus, daí passei a me cuidar
mais, trabalho, não levo as coisas com rigidez, sinto-me muito bem em todos os aspectos, inclusive
sexual. Posso dizer que sou uma pessoa feliz (70 anos)”
“Hoje estou um pouco assustado em não chegar viver. Agora, me sinto muito vaidoso, jogo bola, e
lá... quero viver mais, sou uma pessoa presente, resolvi guardo as alegrias do momento, o passado
passou. Sou feliz, deixei de beber para dar exemplo.” (77 anos)
“Não penso nisso, sou um privilegiado, sou aposentado, fiquei sem fazer nada, ai comecei a adoecer,
tive nostalgia, voltei a trabalhar, nunca mais tive nada. Gosto de festa tenho espírito desportivo, ajudo
muito os outros.”(70 anos)
Nos depoimentos, a velhice está presente, se contrapondo a ela a idéia de
mobilidade(trabalhar, jogar bola, festa) e também a questão de estar vivendo com
felicidade esse momento.
Tal qual as idosas, nos homens idosos fica evidenciado a dificuldade em
reconhecer-se na velhice, uma vez que a velhice é um território desconhecido.
Da mesma forma esses idosos, também utilizam os subterfúgios para dar continuidade
e não viver as rupturas, que no social significa degenerescência. Evidencia o quanto é
falso a consciência que o sujeito pode ter si mesmo.
Entretanto, as rupturas dos construtos são necessárias para que os velhos
possam reescrever um novo histórico de suas vidas.Os subterfúgios que ficaram:
“Sinto-me muito bem, sou muito feliz, não penso nisso, jogo bola, gosto de festas, sou muito
desportista”.
Pelo que foi dito podemos dizer que o homem (ser humano) vivencia a
passagem do tempo com espanto, surpresa e desconserto.Não reconhecem em si as
metamorfoses oriundas, passo a passo, com a senescência.
Dessa forma, o velho se angustia devido a não ter mais a vivencia de
permanência que se rompe com as modificações advindas com a idade, modificações
que não são sentidas pelo velho, a não ser pelo olhar do “outro”.
No primeiro depoimento, o sentimento da velhice comparece num momento de
ruptura, quando o “outro”aponta um lugar, e esse fato o leva a reflexão, a parti dessa
percepção “passei a dar maior atenção a mim”.
As rupturas são necessárias para que o os construtos sociais sejam
racionalizados, podendo os idosos reescrever sua história, e permanecer conectado
com a vida.
Foram realizadas três entrevistas com mulheres idosas. No que se refere ao
discurso referente ao envelhecimento, está presente o seguinte:
“Eu faço de tudo, acho que foi só quando a idade chegou, tenho bom humor, acho que esse é o
segredo...” (80 anos).
“Não me considero muito velha, faço tudo viajo de avião, escrevo, sou presidente dos ex-
combatentes” (90 anos).
“Depois que perdi meu marido, quando fiquei viúva...” (82 anos).
Nos primeiros depoimentos, a velhice está presente, se contrapondo a ela, a
idéia da mobilidade(viajar de avião, escrever...) e de bom humor. Evidencia-se aí a
dificuldade de reconhecer-se utilizando subterfúgios, uma vez que a velhice é um
território desconhecido e ameaçador. Esses subterfúgios nos dão a visão de que o
velho os utiliza para colocar em evidência a continuidade e não viver ruptura que no
social significa degenerescência. Desde aí se pode ver o quanto é falsa, ou falseada, a
consciência que o sujeito pode ter de si mesmo.
Entretanto, as rupturas dos construtos são necessárias para que o velho possa
escrever um novo texto de sua vida e permanecer conectado com a sua existência.
No decorrer das entrevistas, esses subterfúgios ficam bem marcados como podemos
observar:
“Só me sinto feliz, viajo, foco as coisas não dou trabalho a quem viajo, não me percebo velha... eu
canto nas serestas... é por alegria que não me sinto velha...” (90 anos).
“Eu nunca deixei de ter vaidades, brinco e batom...”.
Pelo que foi dito anteriormente podemos dizer também que o homem
vivencia a passagem do tempo com espanto, surpresa, desconserto. Ele não
reconhece em si as metamorfoses advindas, passo a passo, com a senescência. Dessa
forma, o velho se angustia devido a não ter mais a vivência de permanência que se
rompe com as modificações advindas com a idade, modificações que não são
percebidas pelo velho a não ser pelo “olhar do outro”.
No ultimo depoimento, percebemos que o sentimento da velhice compareceu
num momento de ruptura, de luto, fato que levou a uma depressão, uma vez que se
tratou de uma perda significativa. O narcisismo não foi suficientemente forte para
evitar a depressão. Esse sentir o envelhecer num momento de ruptura é um sinal que
a angustia do ficar velho já estava em estado latente e se manifestando por ocasião da
viuvez. Como ela diz:
“De lá para cá não tenho muito a pensar, as coisas ficam sem importância, sempre sozinha. Apesar
disso não atrapalha, solidão é á noite”.
O que aí aparece é a situação de desamparo que comparece em todo sujeito.
Há uma dor diante desse desamparo. Com o rompimento, instaura-se o vazio e é aí
que ela fala da solidão.
Há um sentimento de estranheza da entrevistada nas suas relações sociais,
pois fala das pessoas não darem atenção aos velhos, sentindo-se discriminada, “...
acho errado não dar atenção às pessoas, sinto a mudança. Não dão atenção aos
idosos...”.
Por esse depoimento, percebemos que a entrevistada, sabe que houve uma
mudança na entrada da velhice, mas vivencia de forma bastante negativa. Percebe-se
através do discurso o desejo de ausentar-se do mundo.
CONCLUSÃO
O Envelhecer saudável implica em viver cada etapa da vida, assim como ser
criança, velho ou adulto.
As condições da longevidade dependem de como estar o funcionamento
mental e do desenvolvimento da personalidade, por que a velhice na vida é um fato, a
vida na velhice pode ser uma qualidade. É difícil assumir essa nova imagem de si, e
pouco a pouco repetir reiteradamente, eu tenho 60 anos, eu tenho 70 anos ou mais,
essa é uma forma de interiorizar essa realidade, e permanecer ligado a corrente da
vida.
As palavras de ordem observadas nos relatos foram, lutar, trabalhar, cantar,
dançar, essas palavras demonstram como o ser humano tem capacidade de reverter
vários problemas da vida, e lutar com o espírito para atingir a saúde e o bem estar
possível. Para o homem que se sente bem, estar bem com vida, ter boas relações com
seu entorno, a idade não é tão pesada. Trata-se de assumir a realidade, é preciso
aderir à nova imagem de si, reconstruir sua identidade.
Na realidade o contato com os idosos entrevistados, foram marcado de grande
expectativa, afinal não sabíamos o que nos esperava, mas, após alguns fazerem o
relato de suas vidas, e dizer o que podia ser dito, observamos um estranho prazer por
parte deles, em poder falar de si. Tanto as idosas como os idosos, relataram fatos de
suas vidas com bastante lucidez, os momentos tristes foram abreviados, mas a alegria
de estar vivos ficou bem marcado na fala de cada um.
Finalmente concluímos, que o segredo do envelhecimento saudável está
condicionado ao estilo de vida e aos relacionamentos efetuados durante essa
trajetória, e mais, o importante foi ouvir dos velhos: O que importa é hoje! E o
orgulho de estarem vivos e lúcidos confirmando a citação da carta de Otawa “O
cidadão não importando sua idade deve poder decidir livremente seu estilo de vida,
estabelecendo seus padrões de autonomia” ( Carta de Otawa, 1996.).
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