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7/26/2019 O olho e a nvoa: consideraes sobre a teoria do teatro
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o Olho e a Nvoa
Consideraes
obre a teoria do teatro
Angela Materno
Isso, primeira vista, parece claro. Mas, me- A teoria como inquietao do olhar
dida em que os olhos se detm, vai ficando obscu-
ro. Na verdade, uanto mais osolhossedetm, e no h como negar que "todo olho traz
maisobscuroica. At que osolhosseecham e, consigo sua nvo' (Didi- Huberman, 1998:
livre da observao tenta, a mente indaga. 77), tornando assim o ato de ver uma luta-
Que significa isso?Que, afinal, significa isso, com o que parcialmente vemos, com o que
queparecia claro primeira vista?At que a no vemos ainda, ou jamais, e com o que
mente tambm dd a impressode se echar. nos olha no que vemos - e se tambm no
Comoseecharia a anela de um quarto escuro possvel ignorar o j to citado verbo grego the-
e vazio.A nica anela que ddpara a escurido orein (ver), raiz comum das palavras teatro e teo-
exterio1:Depois, nada mais. No. Infelizmen- ria, associadas,ento, por modalidades do vis-
te, no.Restam inda os nuesampejos e uz, vel, talvez se possa pensar inicialmente a no
e a agitao. busca ega ndefinida da men- de teoria do teatro como esse ugar ou momen-
te. Incessante. to agonstico em que as vises o espetculo, do
Samuel Beckett - Companhia texto dramatrgico ou das concepes teatrais
so expostas s suas prprias nvoas - aos seus
pressupostos, limites e expectativas. E confron-
Temos ue nos exercitarpara um ato visual tadas no apenas com outras perspectivas (e
complexo. embaamentos), mas tambm com a luta pela
Bertolt Brecht
- "Notas sobre a 6pera de trs formulao e construo do que visto, con-
vintns" fronto este que desnaturaliza o olhar e desfaz a
evidncia do objeto.
Angela Materno professorado Departamento de Teoria do Teatro, da Escola de Teatro da UNI-Rio.
1 Refiro-me aqui idia central do livro O que vemos,o que nosolha, de GeorgesDidi-Huberman, ou
seja,a de que todo ver marcado por uma ciso entre o que vemos e o que a nos olha, sendo que isto
que nos olha
-
"e que retoma constantemente no que acreditamos apenas ver" - conceme ao trabalho
da perda, ao jogo do esvaziamento.Na primeira frase do primeiro captulo, diz Huberman: " O que
vemos s vale
-
s vive
-
em nossos olhos pelo que nos olh' (p. 29). E nmais adiante: " [...] cada coisa
a ver, por mais exposta,por mais neutra de aparnciaque seja orna-se nelutdvel quando uma perda a
suporta - ainda que pelo vis de uma simples associao e idias, mas constrangedora,ou de um jogo
de linguagem
-,
e desse ponto nos olha, nos conceme, nos persegue." (p. 33).
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Neste sentido, talvez se possa entender a que este ltimo "recebe" o sentido do texto ao
teorizao como o gesto de tensionar os pontos constitu-lo (Iser, 1996; 51), pois o que emerge
de vista, assim como as categorias e critrios que da experincia ficcional e literria, e dos atos de
os constituem, no para conduzir tal conflito a apreenso do texto, "o no-idntico ao de an-
um bom termo, ou a uma sntese apaziguadora, temo existente no mundo" (Iser, 1996: 53),
mas para repor em jogo constantemente, e cri- o que resulta da assimetria e hiatos existentes
ticamente, os prprios termos e as idias em entre o leitor e a obra, e dos vazios e indetermi-
questo. Teorizar seria, ento, dinamizar as naes a ela inerentes. Tarefa da teoria , ento,
contradies, no para resolv-Ias, mas para dar a meu ver, construir uma atuao reflexiva que,
a ver as "cises em obr'2 (expresso de Didi- sempre atenta relao do pensamento consigo
Huberman, novamente; CL 1998: 75). mesmo, procure articular a formulao de con-
Sejam feitas, entretanto, duas ressalvas. ceitos e perspectivas de abordagem com a per-
Em primeiro lugar, dar a ver no significa, aqui, manente sinalizao crtica do momento e do
evidenciar o que j estaria previamente - e su- lugar a partir dos quais o que se v visado. la-
postamente - dado (na obra ou no objeto em refa que inclui construo e problematizao
foco), mas sim constituir, a partir dos embates incessantes destes dois horizontes: o que se es-
e da dialtica visual que vigoram em todo pro- tende diante de nossos olhos e o que forja o
cesso perceptivo, tanto o olhar quanto aquilo nosso olhar.
que olhado. Dar a ver produzir disjunes e Em segundo lugar - esta a segunda das
espaamentos na aparente inteireza e orga- duas ressalvas mencionadas anteriormente - a
nicidade do objeto, abrir lacunas em sua espes- dinamizao das contradies a que me refiro
sura, estabelecer suas diferenas e antinomias como outro dos gestos ericos implica tambm
internas, flagrar o espedaamento e obscureci- uma espcie de dinamizao s avessas, ue, por
mento do visvel implicados em tudo o que se um lado, partilha com Baudelaire a concepo
mostra. Dar a ver abismar. de que o movimento no se d apenas no des-
Como destaca Wolfgang Iser, "No h locamento - "Odeio o movimento que desloca
percepo imediata, como tampouco conheci- as linhas", diz o poeta - (Baudelaire, 1972: 32;
mento imediato. Ao contrrio, sempre preci- poema "La Beaut"), e por outro, entende,
so captar um trao do no-dado no dado para como Walter Benjamin, que "pensar no inclui
que este - qualquer que seja o ponto de vista
-
apenas o movimento das idias, mas tambm
possa ser apreendido" (Iser, 1996: 119). Ao pos- sua imobilizao" (Benjamin, 1987: 231). As- ,
tular sua teoria do efeito esttico, centrada no sim sendo, dinamizar as contradies no sig-
estudo da obra literria e dos modos de nifica apenasou necessariamentearticul-Ias por
interao entre o texto e o leitor, Iser observa meio de relaes emporalmente extensivas, mas
2 Tendo como um dos ncleos centrais de sua reflexo a anlisede obras minimalistas, como os cubos
negrosde Tony Smith, por exemplo, GeorgesDidi-Huberman, em O que vemos, que nosolha, recusa-
sea pensara imagem a partir do dilema entre tautologiae crena termos do autor) - que seriam modos
de tentar evitar a inelutvel ciso do ver, refugiando-seaqum ou alm desta ciso, e afirmando, por-
tanto, no primeiro caso, que o que se v s6 o que se v, ou buscando, no segundo caso, superar
imaginariamente o que visto pela afirmao da existnciade algo para alm das evidncias.Conside-
rando que os pensamentosbinrios, ou os pensamentos o dilema, so ncapazes e dar conta da ciso
do ver, Didi-Huberman prope a dialetizaodo que vemos e do que nos olha a partir de seuponto de
inquietude, de suspenso.
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tambm acion-Ias, e portanto constitu-Ias (dar que escapa dos esquemas duais que balizam a
a ver), a partir do enfoque das diferentes tem- percepo e o conhecimento com alternativas
poralidades que muitas vezes disputam, interna excludentes e redutoras.
e intensivamente, uma mesma obra, ou um E se o pensamento terico, tal como o
mesmo perodo histrico, ou um mesmo pen- compreendo, lida justamente com os lampejos
samento. Dinamizar as contradies significa, e as nvoas que possibilitam e dificultam todo
neste caso, nterromper o fluxo do prprio pen- exerccio do ver, o trabalho terico sempre,
samento, para surpreender, imobilizando, uma ento, tateante - no apenas por no se pautar
"configurao saturada de tenses".3 (Benja- pela clareza definidora, mas tambm porque
min, 1987: 231). sabe que precisa constituir, a cada momento, as
Se recorro mais de uma vez interlocuo condies de possibilidade do prprio pensa-
com Georges Didi-Huberman porque consi- mento. tateante como o era, na descrio de
dero que ao desenvolver, em O que vemos,o que Trotsky (citada por Benjamin em um de seus
nosolha, uma teoria da imagem, o autor elabo- fragmentos) o trabalho de seu pai na seara: "
ra, tambm e simultaneamente, uma reflexo Olho-o comovido. Meu pai faz movimentos
sobre a prxis terica, fazendo com que sua con- simples e completamente usuais, no se pode-
cepo de imagem retome em uma concei- ria pensar que estivesse rabalhando; seus pas-
tuao da prpria teoria e de seusmodos de pro- sos so guais, so passos ateantes como se pro-
duzir imagens do pensamento. Ao afirmar que curasse o lugar onde enfim pudesse comear
a imagem s pode ser pensada ("s h imagem corretamente. " (Benjamin, s/d: 272). O labor
a pensar radicalmente", repete-se em vrios mo- do conceito - tarefa da teoria - pressupe esta
mentos do livro) para alm das oposies ca- contnua e cuidadosa procura pelo lugar de
nnicas entre o visvel e o invisvel, entre o pr- onde olhar, de onde indagar, de onde comear.
ximo e o distante (oposio pertinente noo Pressupe, portanto, constantes recomeos: ne-
extensiva de espao), entre o visvel e o legvel, cessrios para que o pensamento no se dete-
e para alm do princpio usual de historicida- nha no j pensado, no j realizado.
de, Didi-Huberman reivindica para o prprio Mas se o pensar terico, no esforo de
pensamento da imagem - ou seja, para sua visualizao de seus objetos (sejam eles o teatro,
teorizao - uma espacial dade e uma tempora- a literatura, o conceito de imagem etc), cami-
lidade tambm ambguas e no fixveis em no- nha de modo tateante entre interrupes e
es ou dicotomias habituais e simplificadoras. recomeos porque ao mesmo tempo em que
Alm disto, atribui teoria - e ao pensamento no deve se deter no j alcanado (no j estabe-
que ela projeta - uma dimenso, por assim di- lecido), mas sim refundar sua perspectiva a cada
zer, quase cnica, j que seus procedimentos re- confronto com novas paisagens e outros olha-
flexivos demandam, segundo o autor, uma de- res, ele tambm precisa deter o movimento das
terminada disposio espao-temporal: aquela coisas e das idias para que elas possam se tor-
3 desta mobilizao do pensamento em uma configurao marcada por tensese ambigidades que
surge, segundo Benjamin, a imagem dialtica (em que a imagem a prpria dialtica em estado de
suspenso),uma das principais categorias ericas de seusmtodos crtico e filosfico, analisadospor
Susan Buck-Morss, em seu estudo sobre o Projeto das Passagens,omo uma dialtica do olhar (Buck-
Morss, Susan. Dialtica do olhar. Walter Benjamin e o Projeto das Passagens.raduo de Ana Luiza
Andrade; reviso cnica de David Lopes de Silva. Belo Horizonte, Editora UFMG; Chapec, Editora
Universitria Argos, 2002)
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sala preta ~~""
nar visveis.Em um dos trechos do fragmento histria universal,Benjamin a acusa,ustamen-
"Vestirio de mscaras",Walter Benjamin alu- te, de no ter "qualquer armao erica" e pro-
de imbricada relaoentre imobilizao, visi- . cederde forma meramenteaditiva. Derivada do
bilidade e teatro. Diz ele: " Semprede novo, em historicismo e da concepo inear de tempo
Shakespeare,m Caldern, combatentespreen- que he subjacente, histria universal,segun-
chem o ltimo ato e reis, prncipes, pagense do Benjamin, "utiliza a massados fatos para
squitos entram em cena fugindo'. O instante com elespreenchero tempo homogneoe va-
em que se tornam visveis aos espectadores s zio" (Benjamin, 1987: 231).
faz deter-se.A fuga daspersonagens ramticas, Configura-se,assim,na obra benjaminia-
a cenad voz de alto. " (Benjamin, s/d: 65). na, uma indissocivel elaoentre eoria, crtica
Ao movimento contnuo e fugidio das e histria que me parece elevanteapontar, pois
personagens, cena - como numa brincadeira emborasejapossvel iferenciar,em pane, a pr-
de criana - diz '~to ". E, ento, o congela,o tica terica das prticas crtica e historiogrfica
imobiliza. E por meio desta interrupo, propriamente ditas, a teoria impensvelsem
quando o olhar dos espectadores s detm, que uma dimensohistrico-crtica. Dimenso his-
aspersonagensornam-sevisveis.Apropriando- trica que seconstitui na medida em que a his-
me desta imagem, arrisco dizer que a teoria toricidade entendida como uma dupla marca,
(cujas afinidades etimolgicas com o teatro j ou seja, ndica tanto o momento em que algo
foram mencionadas) encena torna visvel a aconteceu quanto o momento em que este
panir de determinado enquadramentoespao- acontecimento torna-se visvel, legvel, (re)co-
temporal- uma luta. No a que os "combaten- nhecvel e, ento, histrico. Como observa
tes" ravavamantesde entrarem no palco, no a Walter Benjamin em O livro das Passagens,~
luta dos reis e dos prncipes. Mas outra: a luta marca histrica das magensno indica apenas
do olho com o que foge ao seualcanceem tudo que elaspenencem a uma poca determinada,
o que ele v; a luta do pensamentopara dar for- ela indica sobretudo que elas s chegam
ma e consistncia o que "semprede novo" atra- legibilidade em uma pocadeterminada (. . . )
.J
vessar, m fuga, o seu campo de viso. O pen- cada Agora o Agora de uma recognoscibi-J
sar e~i~o,o gnoraq~e ida to-som~nt,eom lidaded~term~nad~"~enjamin,1993:4 9). ~
a possIbIlIdade desses Instantes espacIahzados DImensao hIStrIcaque se COnStItuI, am- 1
(pelos pontos de observao linhas de pensa- bm, na medida em que a historicidade, como;
mento)em quea captura a significaoealgo prope Giorgio Agambenno ensaio n Play- J
sempre ovamente rovisria. /and' rejlectionsn historyandp/ay, sejaconce-
As referncias Walter Benjamin, que se- bida n~o como o~iza~o ~ronolgica,mas, im 1
ro constantes neste texto, devem-se ao fato de como margem dIferencIal entre tempos dIver-
que, tanto em seu trabalho como crtico liter- sos: entre o "era uma vez" e o "no mais", e en-
rio (inclusive quando trata de temas teatrais), tre diacronia e sincronia. "Todo acontecimento
quanto em suas reflexes sobre a histria, so histrico representa uma margem diferencial
de fundamental imponncia as construes te- entre diacronia e sincronia, estabelecendo uma
ricas de seu pensamento, decisivas para sua pro- relao significativa entre elas" (Agamben,
duo ensastica.A visada crtica de Benjamin, 1993: 75). Se o histricoemerge,ponanto, da .
como assinalaHenri Meschonnic, no somen- diferenae colisoentre temporalidadesdistin- :
te sobre tal ou qual tema, mas sobre o modo tas entre o outrorae o agora o agoraem queo
mesmo de significar (Wismann, 1986: 709), ou outrora trazido cena, pensado)
-
a reflexo
seja,sobre o modo de armar o pensamento,de terica nevitavelmenteo inclui, pois seumodo
formular conceitos e significaes. Por outro de pensar amais anula as diferenas,ou elimi-
lado, quando critica, por exemplo, a noo de na os intervalos. Pelo contrrio, pane do prin-
I. :-i'i j ~~~l4l ~,
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cpio de que sem eles no h viso nem conhe- sentido, como destaca Irene Cardoso em "His-
cimento possveis. tria, memria e crtica do presente", "a atua-
A partir da, pode-se dizer tambm que a lidade constitui-se, ento, como uma alteridade
problematizao do visvel empreendida pelo em relao ao passado e ao prprio presente.
pensar terico faz do estabelecimento da dife- Caracteriza-se como um movimento de disjun-
rena histrica a prpria condio de possibili- o desse presente, de uma no-contempo-
dade das formulaes que ele engendra. Pois o raneidade dele em relao a si prprio" (Cardo-
prprio momento (a atualidade) da ao refle- so, 2001: 16).
xiva - o agora do pensamento e da escrita - j J a dimenso crtica da teoria advm no
supe e requer a configurao de uma margem s das problematizaes que ela instaura - e in-
temporalmente diferencial, constituda a partir quietam o ver
-,
e da crise que ela abre na per-
de uma "desatualizao do presente". Dialogo cepo, mas tambm de seu confronto com ob-
aqui com a anlise realizada por Irene Cardoso jetos e realidades particulares, pois o pensamen-
das concepes de atualidade e de presente de- to terico no o que se interessa apenas pelas
senvolvidaspor Foucault em suas ltimas obras. categorias gerais, ou lida somente com abstra-
Destacando a distino que ele estabeleceentre es. Pelo contrrio, a teoria organiza seu pen-
essasduas noes tendo em vista "sua escolha samento no contato e no embate com a con-
filosfica de um pensamento crtico que toma cretude das obras e das experincias artsticas. E
a forma de uma ontologia da atualidade" e que, s assim poderia faz-Io, pois a separao entre
portanto, interroga: "O que a nossa atual i- pensamento e criao (variante da separao
dade? Qual o campo atual das experincias entre teoria e prtica) j indica a ausncia de um
possveis?" (Cardoso, 2001: 215). Irene Car- olhar terico e faz parte do equvoco de imagi-
doso, em "Foucault e a noo de acontecimen- nar que haja reflexo sem corpos (corpus) e cria-
to", argumenta: o artstica sem pensamento.
H uma distino, portanto, entre o presente
e o atual, entre o hoje e o agora. O atual A teoria do teatro como provocao
construdo a partir de um "certo elemento
do presente ue se rata de reconhecer", omo Se minhas tentativas de conceituar a teoria (vi-
"diferena histrica". Este reconhecimento, sando O campo teatral) privilegiaram, at agora,
que o da crtica, da problematizao,desa- as formas e as foras de seu empenho em cons-
tualiza o presente,desatualiza hoje, no mo- tituir uma prxis reflexiva, e no a focalizaram
vimento de uma interpelao. Nessesentido em sua pluralidade, em suasdiversas orientaes
o presente o dado, nem enquadradonuma possveis- semiolgica,ociolgica,ntropol-
linearidade entre o passadoe o futuro (Car- gica etc. -, isto no significa que haja aqui a in-
doso, 2001: 219). teno de estabelecer uma suposta natureza
terica que unifique todas as suas modalidades,
Nesta perspectiva, a prpria reflexo te- ultrapasse suas variaes histricas, metodol-
rica opera uma temporalizao, pois ao atentar gicas, ideolgicas, culturais e supere a multipli-
para o momento e condies em que interroga cidade de objetos dos quais ela pode se ocupar.
seu objeto ela tambm problematiza a atualida- Muito longe de qualquer concepo essencialis-
de e viabilidade de sua interrogao, criando, ta, o que pretendi, na verdade, foi enfatizar que
assim, margens, diferenas, espaamentos tem- toda percepo ou compreenso de algo sem-
porais no prprio presente em que atua, e fa- pre um esforo, uma luta, um trabalho de cons-
zendo deste presente no s o lugar mas tam- truo e demolio de perspectivas, e que este
bm o objeto de uma problematizao. Nesse esforo e trabalho concernem reflexo terica
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so por ela realizados e explicitados. O que sig- ria costuma ser olhada como algo que paira aci-
nifica dizer que a teoria sempre uma provoca- ma da experincia. Mas no acima do bem e do
o s diversas formas de defesa e de afirmao mal, pois ela , muitas vezes, de modo velado
da espontaneidade e da imediaticidade. ou explcito, considerada malfica para o bom
Por contrariar as convices mais arraiga- andamento da criatividade dos artistas.
das e interromper a torrente de idias que se Em O demnio da teoria, sugestivo ttulo
avolumam desde h muito, por atuar inneras do livro de Antoine Compagnon (O demnio
vezes, portanto, como a pedra no caminho, ou da teoria: literatura e senso omum, esse o ttu-
como o rochedo que, no meio do ri04, obriga 10 completo), o autor discute, principalmente
as guas a refluirem e os pensamentos a salta- nos captulos introdutrio e conclusivo, quais
rem de seus eitos e pensarem sobre seu prprio seriam, no mbito da teoria literria (ou da teo-
curso, a teoria provoca, no raramente, descon- ria da literatura), as possveis tarefas e especi-
forto, suspeitas, ou mesmo um desprezo irrita- ficidades do primeiro desses ois termos. E mes-
do que mal disfara a tola arrogncia que se sa- mo ressaltando que o "impulso terico" sempre
tisfaz com seu estoque de certezas teis e opi- corre o risco de acomodar-se em disciplinas
nies de bolso. (acadmicas) compartimentadas e inofensivas,
O contracurso da teoria em relao aos ou deformar-se em manuais explicativos,
conceitos j estabelecidos e j asseguradosgera Compagnon considera que a teoria eminen-
resistncias. Ao tematizar a teoria do teatro, e a temente crtica e opositiva (Compagnon, 1999: -
teoria e o teatro, considero importante assina- 16). E como o objeto de anlise do autor so os
lar essas esistncias, at porque elas ainda se estudos literrios, ele afirma: "H teoria quan-
verificam, e de forma algumas vezes acentuada, do as premissas do discurso corrente sobre a li-
tanto na esfera da criao e da realizao tea- teratura no so mais aceitas como evidentes,
trais, quanto no mbito da formao dos artis- quando so questionadas, expostas como cons-
tas de teatro, como, por exemplo, nos cursos trues histricas, como convenes." (Com-
universitrios de artes cnicas, onde essas esis- pagnori, 1999: 18).
tncias manifestam-se no s em alguns alunos, A substituio da palavra literatura pela
mas tambm em alguns professores. palavra teatro no altera o teor provocativo da
Resistncias, desconfianas e preconceito teoria em relao s concepes e valores mais
que se materializam em determinados usos difundidos Do mesmo modo como esta outra
vocabulares. Se o adjetivo terico poucas vezes observao de Antoine Compagnon poderia
vem isento de um certo tom acusativo (ou pe- tambm se referir importncia da teoria na
jorativo) quando escolhido para qualificar formao teatral: '~teoria da literatura', diz ele,
projetos ou pontos de vista, o advrbio quase " uma aprendizagem da no-ingenuidade"
sempre indica algo que no nem ser concre- (Compagnon, 1999: 24). E neste sentido con-
tizvel, praticvel ("Teoricamente. . . "). A teo- sidero que a teoria pode ser, sim, demonaca.
4 Remeto-me aqui, explicitamente, imagem que finaliza a primeira verso 1931) do ensaio de Walter
Benjamin sobre Brecht intitulado O que o teatro pico?Um estudosobreBrecht. Para conceituar a
noo de assombro (estranhamento) no teatro brechtiano, Benjamin o compara ao refluxo produzido
pela interrupo ou retesamento do fluxo real da vid'
-
"o assombro este refluxo". Mas tambm
compara o assombroao rochedo "do qual contemplamosa torrente das coisas" Benjamin, 1987: 90) e
onde ela - a torrente - vem se quebrar. Ainda segundo Benjamin, "o objeto mais autntico desseas-
sombro a dialtica em estadode repouso" (p. 90-1).
~
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Fragilizandonossas renashabituais e nos fa- e semapriori o espetculoaracompreend-
zendo perder a inocncia, ela nos expulsa do 10e usufrui-lo.Esta eoriadano-teoria ma-
parasoe nos condenaao trabalho: isto , luta joritria na medidaem que ela se apiaem
do ver e ao esforo da reflexo. No chamado um consenso parente o pblico, freqen-
meio eatral a palavra eoria adquire, quasesem- tementemantidopeloscrticos,e segundo
pre, um sentido bem amplo e passaa abranger qual o espetculo um bem mediatamente
o conjunto de estudos, anlisese reflexesso- consumvel empreparao rvia,sem c-
bre O eatro. E a parecepersistir, em muitos ca- nica de anlise onstruda, emutilizao e
sos,a velha e injustificada desconfianade que uma metalinguagemxplcita:ela sed ares
a viso erica sobrea obra teatral, por parte do de bom senso de nocncia noseprivade
artista ou do espectador,possa prejudicar ou ridicularizar jargodos ericos bstratos
macular seja o processode sua criao, seja a prolixos Pavis, 990: 112).
pretensa spontaneidade e sua apreciao.
Em um texto de 1940, intitulado Notas Considerando-se este comentrio de
sobre escrita ealista,Bertolt Brecht comenta a Pavis,a questoque se coloca no , portanto,
freqente superstiodos artistas"em relao "com ou sem teoria?", mas qual teoria?A que
cincia,ao conhecimentoe auto-reflexo. fir- no se percebea si mesmae reproduz automa-
mando que esta superstio", omo ele mesmo ticamente diase critrios adotadospela maio-
denomina,vincula-seao medo que os artistas e- ria como se eles brotassemespontaneamente
riam de perder sua originalidade, Brecht critica s tivessemcomo suporte a intuio e aquilo
"o pudor religioso om que o escritor se nega a que se chama de indiscutvelgosto essoal, u a
contemplar a origem das suas dias e dos seus teoria que, autoconscientede seusprocedimen-
sentimentos"e o "receio de que ele no sejaca- tos reflexivos, e limites, redesenha,constante-
pazde continuar a ser poeta depois de saberde- mente, seu horizonte crtico no contato e no
masiado". Brecht, 1978: 117). Mais adiante, confronto com aquilo que contempla?A teoria
com a ironia que sempre he foi peculiar, arre- da no-teoria, que se torna, por isso mesmo,
mata: "Os nossospoetas perderam a voz, no unvoca, homogneae rgida na certezade sua
tanto em facedo livro O Capital como do pr- intuio do que " bom" e da validade nape-
prio capital" (Brecht, 1978: 118). lvel do consenso?Ou a teoria que, plural em
Quanto recepo eatral, insiste-seain- suas diversas perspectivascrticas possveis,e
da, muitas vezes,na mesma e insustentvel e- sempre recolocadasem xeque, no se cr, em
cla: a apregoada ruio espontnea.S que, a nenhuma de suas ormas, totalizante ?
rigor, no existe este olhar absolutamente es- Seh atorese encenadores ue ainda pro-
pontneo, sento de premissas expectativas, fessama dicotomia entre teorizao e prtica
relacionando-se ireta e imediatamente com a teatral porque no conseguem, ensoeu, per-
obra. Este suposto olhar , na verdade,molda- ceber na teoria esseapelo por uma constante
do pelasconvenes abituais e pelasperspecti- problem4tizaodo olhar, das escolhasartsti-
vasdominantes to habituais e dominantesque cas realizadas, os meios expressivos tlizados,
parecemnaturais, no construdas). do pensamentoproduzido, e das ormas e rela-
Da mesma orma que, como bem obser- esde criaoe de produo experimentadas.
va Patrice Pavis, Problematizao staque seconstitui a partir do
confronto de leituras, do tensionamento de
A teoriamajoritria a teoriada no-teoria, pontos de vista, da reflexo sobre as experin-
querdizer,a convico e que noh neces- cias artsticas,e da cumplicidade crtica com o
sidade e reflexo lobalparapensar prti- processode criao da obra. Esses torese en-
ca eatrale quebasta preciarntuitivamente cenadores arecementender a teoria como um
.
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sala preta
conjunto fechadode idiase avaliaessobrea como destacaE. H. Gombrichno final de seu
obra, o autor, seucontexto) completamenteex- livro Arte e iluso (Gombrich, 1986: 342), en-
terior ao trabalho artstico propriamente dito. to duas das tarefasda teoria so: ensionar os
E a partir destaequvocaconcepo ue seale- limites de nossa iso nossoolho e nossas -
ga, muitas vezes,que a teoria pode prejudicar voas
-
problematizando o que sabemos, pro-
ou contaminar a relao supostamente)direta vocar conhecimentos inquietando o nosso
do artista com a obra emsi mesma.Como seele olhar. Desta dupla via terica resultam novos
e ela pudessem se relacionar para alm (ou horizontes e novas experinciasde visibilidade
aqum) de qualquer mediao e de quaisquer e de inteligibilidade da arte e do mundo.
outros conhecimentose interpelaes. No casoespecfico o Brasil, o desconfor-
Mas h tambm aquelesatorese encena- to em relao teoria pareceassociar-seor um
dores que, como JosCelso Martinez Corra, lado, ao culto da personalidade,do talento, do
fazem de suasexperincias omo artistase pen- gnio nato, e, por outro, conseqente esvalo-
sadores do teatro o palco de mltiplas inquieta- rizao do trabalho, que se manifesta, no pas,
es,a partir dasquais procuram olhar e pensar sob as mais variadas formas, inclusive nessa
a teoria. Em entrevistaa Edelcio Mostao e F- auto-suficincia da intuio e da genialidade
ti ma Saadi,publicadana revistaFolhetim,Z tantas ezes reconizada.
Celso afirma que o teatro o lugar de relembrar Explico melhor: a rejeioao pensamen-
o poder - da inteligncia, da imaginao que to terico e ao que ele em de aborioso, ateante
o ser humano tem. E acrescenta: e precrio parece corresponder ao que Srgio
Buarquede Holanda diagnosticava, m Razes
O teatro em que tocar nesse oderio mas, do Brasil, como "o horror ao vago, ao hesitante,
para ocarnesse oderio,eleprecisa er ido, ao fluido, que obrigam colaborao, o esfor-
interpretadoe, para sto, ele precisa emais o e, por conseguinte, a certa dependnciae
da teoria do teatro
[...]
Durante muito tem- mesmo abdicao da personalidade"
- trao
po,houveum desprestgio uito grande essa que, segundo o autor, tem determinado fre-
coisade pensaro teatro [...] a maioria dos qentemente nossa ormao espiritual". Nes-
atores,principalmente uem vai muito pra ta mesma inha de argumentao,Srgio Buar-
televiso,em uma rejeio ela eoria, pela que ressalta: Tudo quanto dispensequalquer
reflexo. parao teatropoderser ecebido, trabalho mental aturado e fatigante, as idias
necessriamaatividade rtica... crticaoga claras, cidas, definitivas que favorecemuma
luz no quevoc az (Folhetim, 002: 138). espciede atonia da inteligncia parecem-nos
constituir a verdadeira essnciada sabedori'
Mais adiante, explicitando a estreita ela- (Holanda, 1982: 117).
o entre produo artstica e produo terica, A extrema valorizaodo talento e a sua
e apontando para a necessidade e novaspers- contraface a desconfiana m relao neces-
pectivas crticas para que novas propostas ea- sidadede muito trabalho , no dizem respeito
trais possam e ornar efetivamentevisveise le- estritamentea uma determinada concepode
Z Celso delara:"Eu sinto que, pra mui- artista, mas tambm ecoam, como mostra Sr-
ta gente, meu trabalho no tem leitura: a pessoa gio Buarque, o rano de certos pontos de vista
pode estar de corpo presenteali mas est com conservadores:
os preconceitosdela e aquelespreconceitosno
foram trabalhadose ela no v, no estaqui e Mash raos or ondenossantelectualidade
agora. " (Folhetim,2002: 139). ainda evela uamisso itidamente onser-
E se, portanto, "nunca podemos separar vadorae senhorial.Um deles a presuno,
com nitidez o que vemos do que sabemos", aindaem nossos ias o generalizadantre
I.
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o Olho e a Nvoa:Consideraesobrea teoria do teatro
seus xpoentes, e que o verdadeiroalento no nem explicativa, nem generalizante.No
h de ser espontneo, e nascena,omo a elaboramodelosde anliseque possam erapli-
verdadeira obreza, ois os rabalhos o es- cados obra (cnico-dramatrgica) para dela
tudo acurado odemconduzirao saber,mas extrair sua gica de funcionamento e seusigni-
assemelham-se,or suamonotoniae reitera- ficado supostamente culto. Tambm no esta-
o,aosofciosvis que degradam homem" beleceos princpios geraisdo chamado enme-
(Holanda,1982: 123). no teatral.
A teoria do teatro no coincide com a
O exerccioda teoria nos mbitos da cria- apresentao os conceitos undamentaisdo te-
oe da formao eatraisadquire, assim,a meu atro (at porque a arte teatral permanente...
ver,uma irrecusvel mportncia, pois ao requi- mente refundada). Tambm no responde,
sitar um contnuo trabalho de reflexo, um es- como muitas vezesse esperaou se imagina,
foro de argumentaoe uma rotina de estudos pergunta "O que o teatro?" Em primeiro lu-
e interlocues,ele (o exerccio da teoria) pro- gar, porque o enfoque terico, a meu ver, no
pe um modo diferenciado de entender e rea- se coaduna com concepes ssencialistas. m
lizar a prtica teatral. Um modo que, na con- segundo, porque no campo atual da criao e
tramo de certos parmetrosartsticos e cultu- da reflexo artsticase teatrais, no campoatual
rais ortemente enraizados e embre-seque no de nossas xperinciasosslveis retomando s
Brasil a relaoentre ator e talento, por exem- formulaesde Foucault citadase analisadas or
pIo, quasesempre foi dada como evidente
-,
Irene Cardoso , a questodos territrios niti-
.
acaba razendo para as salasde ensaioe para as damentedemarcados u dasespecificidadesn-
salas e aula no apenas confronto entre pers- teiramente determinadas alvez no seja aquilo
pectivas iversas inerente, nclusive, prpria que devaserpensado.A teoria do teatro solicita,
multiplicidade de abordagensem que a teoria hoje - mais do que nunca, talvez -, a configu-
se configura -, mas tambm o dissensopoliti- raode um espao eflexivo hbrido, compos-
camentenecessrio toda atividade artstica e to de relaes intersees rticas com outras
intelectual. formas de expresso rtsticae com outros carn-
E se a teoria tambm a aprendizagem pos de conhecimento.
da mprecisodos olhos e da &agilidadedasevi- Vale lembrar, por fim, que as obras, pro-
dncias "Isso, primeira vista, parece claro. postase experinciaseatrais ambm produzem
Mas, medida em que os olhossedetm,vai fi- a seu modo, e de modo diferenciado, teorias-
candoobscuro.", e se , ainda, a aprendizagem pensamentosobre a arte e o teatro, inquieta-
da irredutvel agitao da mente e do carter esdo olhar. Na obra de Brecht, por exemplo,
nuncadefinitivo de suasespeculaes "Depois, a intrnseca elaoentre reflexoartsticae ati-
nadamais.No. Infelizmente,no.Restam inda vidade terica foi determinante para seu proje-
os nuesampejos e luz, e a agitao", ento a to teatral, e certamente muito contribuiu para
teoria nos exercita no s para a complexidade que a prpria idia de teatro fosse, para o
do ato visual, mas ambm para a historicidade dramaturgo e encenadoralemo, algo constan-
de nossas isese indagaes. temente problematizvel e nunca definitiva-
Toda tentativa de definir a teoria do tea- mente resolvido
tro , de certo modo, uma contradio, pois faz Em "Notas sobrea perade trsvintns",
parte da reflexo terica problematizar e rela- Brecht faz uma curiosa e instigante sugesto
tivizar asdefinies,mostrando seucarterpre- que, at onde sei, nunca foi por ele efetivamen-
cirio, provisrio. Talvez se possapensar,entre- te realizada,mas que revela seu propsito de
tanto, o que ela no , principalmente em rela- tensionar a idia e a estrutura convencionaisdo
o prtica de seu ensino. A teoria do teatro teatro com uma
-
digamos assim - provocao
.
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sala preta
terica.Diz ele: " Tambm na arte dramticah corpos parcialmente expostosesto racamente
que introduzir as notas de rodap e a consulta iluminados, mas esto , ainda l, e sempre
de confronto" (Brecht, 1978: 26). Visando - pois raramente bandonam cena , tam-
tensionar o palco e o livro - problematizando bm nesses alcosem que o visvel e o intelig-
seussuportese inquietando o visvel e o legvel vel so ensionadosao extremo, at o limite do
- Brecht prope que se introduza no teatro o possvel,do dizvel, at o limite do teatralizvel,
agon da formulao de idias e o embate dos tambm nesses palcos est em jogo uma
desdobramentos eflexivos. teorizaodo teatro - figurada, por exemplo,
Tambm na quase completa escurido no retorno infindvel da indagao: Que, afi-
dos palcosde Beckett, em que cabeas, ocase nal significa sso?
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