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O PAPEL DAS CONSTRUTORAS E INCORPORADORAS IMOBILIÁRIAS NA
CIDADE DE TRÊS LAGOAS-MS
OBAL, Karoline Kolosinski
Bolsista PET Geografia UFMS/CPTL - [email protected]
GOMES, Thayná Nogueira
Mestranda em Geografia PPGGEO/UFMS/CPTL - [email protected]
ARANHA-SILVA, Edima
Tutora PET Geografia e Coordenadora do PPGGEO/UFMS/CPTL -
O município de Três Lagoas localizado na mesorregião Leste de Mato Grosso do
Sul, experimentou no último decênio (2010) uma intensificação em seu processo de
industrialização; com isso alteram-se suas formas, conteúdos e processos, dando novas
roupagens à urbe, visto que a demanda por moradia, saúde, educação e serviços básicos
aumentou consideravelmente com a instalação de indústrias de papel e celulose.
O propósito desta pesquisa pauta-se na análise da territorialização da rede
estabelecida pelas empresas construtoras e incorporadoras na cidade de Três Lagoas-
MS, visando compreender o papel dessas construtoras e incorporadoras imobiliárias
enquanto agentes na produção do espaço urbano .
O construto teórico metodológico da pesquisa se pautou na revisão bibliográfica
de Santos (2012a; 2012b) que em suas obras discorre sobre o papel do cidadão na
contemporaneidade, assim como sobre os “sistemas de objetos e sistemas de ações”;
Corrêa (1989; 1993) corrobora com a análise das estruturas reticulares, bem como a
caracterização dos agentes produtores do espaço; Haesbaert & Limonad (2007) no que
se refere à questão do território e rede. Foram realizadas saídas de campo, a fim de
melhor compreender os processos experimentados pela cidade, realizou-se também
pesquisa nos sites das empresas com atuação em Três Lagoas. Para elaboração da parte
cartográfica foram utilizados os programas Excel, Corel Draw X5 e Philcarto.
CONTEXTUALIZANDO TRÊS LAGOAS-MS
A cidade de Três Lagoas-MS exerce poder de atração sobre empresas
construtoras e incorporadoras imobiliárias em decorrência das mudanças pelas quais a
cidade passa, haja vista, a intensificação da dinâmica industrial desde o ano de 2006, em
que teve início a construção da unidade fabril da empresa Fibria Celulose S/A, resultado
da fusão da International Paper-IP com a Votorantin Celulose e Papel-VCP em 2006 e
pela incorporação da Aracruz pela VCP em 2009.
A instalação de indústrias transnacionais em território três-lagoense teve
implicações na dinâmica intraurbana da cidade. Com a indústria, no período de sua
construção fabril vários trabalhadores migraram à cidade, em busca de emprego e
melhores condições da qualidade de vida, sendo em sua maioria trabalhadores braçais
advindos de regiões como o Nordeste. Essa migração acarretou um processo de inchaço
populacional, que além de evidenciar a falta de infraestrutura urbana, intensificou o
processo de especulação imobiliária, decorrente da intensa demanda por moradias.
O processo de especulação imobiliária se acentuou nos anos seguintes, pois a
cidade continuou recebendo indústrias como a Eldorado Brasil S/A, também de celulose
e papel, que iniciou suas atividades em 2012; SITREL – Siderúrgica Três Lagoas com
atividades iniciadas no mesmo ano e mais recentemente e em fase de construção a
Unidade de Fertilizantes de Três Lagoas-UFN3/PETROBRAS (Petróleo Brasileiro
S/A), que também atraíram grande quantidade de trabalhadores tanto na fase de
construção quanto de mão de obra qualificada para trabalhar internamente nas empresas.
A mudança do perfil do trabalhador migrante se deu principalmente após a fase
de construção das unidades de produção, pois as empresas precisavam de trabalhadores
que suprissem a demanda por mão de obra qualificada, para ocuparem os cargos mais
altos dentro da empresa. O que não significa que a migração de trabalhadores braçais ou
mão de obra pouco qualificada tenha cessado.
Com o apoio governamental, como o desenvolvimento de políticas públicas
voltadas para a economia e a oferta de incentivos fiscais, foram atraídos para a cidade
investimentos do setor privado. A indústria ganhou peso na economia estadual, e Três
Lagoas-MS se destacou com a produção de celulose e papel, tornando-se um polo
industrial do Estado de Mato Grosso do Sul (LAMOSO, 2011).
Esse retrospecto faz-se necessário na medida em que o processo de atração das
empresas construtoras e incorporadoras imobiliárias foi resultante da intensificação
industrial na cidade, que estimulou a migração de trabalhadores aumentando o
contingente populacional da urbe e sendo substrato do processo de especulação
imobiliária, incentivando e atraindo outras empresas deste e de outros estados para
realizar empreendimentos na cidade.
REDES, CONSTRUTORAS E INCORPORADORAS
Segundo Sposito (2008) a cidade é uma totalidade em constantes
transformações, produzida historicamente por diferentes atores com objetivos e poder
de atuação diferenciados, deste modo torna-se fácil compreender a dinâmica vivenciada
por Três Lagoas na última década dos anos 2000, onde o processo de industrialização e
crescimento tem efetivado rearranjos territoriais à medida que novas formas de morar
são implantadas na urbe.
Para Haesbaert & Limonad (2007) o território pode ser entendido como a
apropriação e domínio de um espaço, uma construção histórica e social, a partir das
relações de poder que envolvem a sociedade e o espaço geográfico. Neste contexto a
rede é um elemento ou uma das formas do território se apresentar e se organizar.
A rede urbana para Corrêa (1989) “reflete e reforça as características sociais e
econômicas do território” e “pode ser considerada uma forma espacial através da qual as
funções urbanas se realizam”.
Em síntese as construtoras e incorporadoras tendem a se materializar em
territórios redes e passam a atuar nas cidades onde a produção e o consumo de moradias
se efetivam. Em pesquisa realizada na cidade de Três Lagoas o número de empresas de
construção e incorporação imobiliária chega a 17, a rede estabelecida está evidenciada
na figura 1, onde pode-se constatar que suas matrizes estão em cidades localizadas nas
Regiões Sul e Sudeste, em estados como São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio de
Janeiro e Goiás, e somente três delas se localizam no estado de Mato Grosso do Sul, nas
cidades de Dourados e Campo Grande.
Existem construtoras e incorporadoras imobiliárias locais dedicadas a
empreendimentos menores, como construção de casas e reformas em geral, visto que os
empreendimentos maiores como os condomínios horizontais e verticais, além dos
loteamentos urbanos, são realizados em sua maioria por empresas construtoras e
incorporadoras imobiliárias externas, como se apresenta na Figura 1.
A materialidade desses empreendimentos imobiliários contribui com a
efetivação de descontinuidades territoriais, que se estabelecem na medida em que há o
distanciamento físico entre os polos e matrizes, contudo, há relação imaterial por meio
de tecnologias da informação, entre as ações e o comando.
Figura 1: Mapa do território-rede estabelecido pelas empresas construtoras e incorporadoras imobiliárias em Três Lagoas-MS
O PAPEL DAS CONSTRUTORAS E INCORPORADORAS NA PRODUÇÃO
DO ESPAÇO URBANO
Com o delinear da nova dinâmica industrial em Três Lagoas-MS, a cidade
ganhou visibilidade e investimentos que possibilitaram, não somente uma interelação
direta e/ou indireta com o mercado externo, mas também alterou-se sua própria
dinâmica intraurbana.
A especulação imobiliária fortemente aquecida tornou-se grande possibilidade
de lucratividade para as empresas incorporadoras e construtoras, devido à demanda por
moradia, aumentando a dinâmica do mercado imobiliário e consequentemente a
apropriação da renda da terra urbana pelos proprietários fundiários.
As empresas construtoras e incorporadoras advindas de outras localidades do
país mantêm seus escritórios na cidade, alguns inclusive temporários e se territorializam
amplamente na urbe; como podemos observar na Figura 2, que mostra a espacialização
dos empreendimentos nos quais as empresas pesquisadas atuam.
Os empreendimentos realizados por essas empresas são materializados em 6
(seis) condomínios residenciais horizontais de alto padrão, 17 condomínios residenciais
verticais de padrões variados e 7 loteamentos urbanos. Esses padrões de moradia,
outrora, não existiam de forma densa na urbe, mas agora se tornaram alternativas para
atender as novas demandas oriundas do processo de intensificação da industrialização.
Totalizando 30 empreendimentos, assevera o peso da atuação dessas empresas na
produção do espaço urbano, revelando a implementação de novas formas de morar em
Três Lagoas.
Os condomínios residenciais horizontais são dotados de infraestrutura de boa
qualidade e amenidades internas como área de lazer, área de festas, academia de
ginástica, área verde, entre outros, que fazem com que seus moradores não necessitem
se deslocar a outros lugares da cidade para satisfazer algumas de suas necessidades;
além de propiciar um ambiente agradável, confortável e longe de “caos” e da violência
da cidade, sendo um ambiente criado que nos remete à topofilia (TUAN, 2005). Um dos
fatores que levam as pessoas de maior poder aquisitivo a irem morar nesses
condomínios, é a segurança particular existente dentro dos mesmos, que transmite a
sensação de segurança e bem estar aos moradores.
Os condomínios residenciais verticais muitas vezes são dotados também dessas
amenidades que atraem um público interessado em residir um em ambiente confortável
e seguro, que forneça qualidade de vida aos seus moradores, porém esses atrativos ou
amenidades são encontrados principalmente nos edifícios destinados às pessoas de alta
renda, as quais têm a possibilidade de consumir esses espaços, como é o caso do
edifício Don El Chall.
Existem alguns condomínios verticais voltados para atender a uma demanda
crescente de pessoas interessados em adquirir a “casa própria”, geralmente pessoas com
que detêm renda que os colocam como sendo da classe média, sendo que os
apartamentos são financiados por bancos como Caixa Econômica Federal e Banco do
Brasil S/A. Esses empreendimentos não possuem tantos requisitos estruturais a oferecer
a seus moradores, sendo, portanto um dos motivos que faz com que tenham um preço
mais baixo em relação aos anteriores. Mas para as empresas construtoras e
incorporadoras podem ser muito lucrativos.
No caso da moradia para a população de baixa renda, Três Lagoas-MS iniciou o
processo de verticalização de moradias populares inaugurando em dezembro de 2013 o
Residencial Novo Oeste; e está dando continuidade com a construção de outros
Conjuntos Habitacionais do mesmo padrão. Para esse empreendimento a Prefeitura
Municipal de Três Lagoas-MS contou com a empresa Brookfield Incorporações,
realizando o maior Conjunto Habitacional do Mato Grosso do Sul em quantidades de
apartamentos, com 1.224 famílias residentes (TRÊS LAGOAS, 2013).
O adensamento de grande quantidade de moradores e o pouco espaço dos
apartamentos (42 m² cada) influenciam negativamente na qualidade de vida dessa
população, fato este agravado pelo distanciamento do centro da cidade, dificultando o
acesso dos moradores a equipamentos urbanos básicos.
Desse modo, a produção do espaço urbano em Três Lagoas-MS vem ocorrendo
de forma a introduzir novas formas de morar, importadas de grandes centros urbanos
brasileiros, que por sua vez importaram modelos de moradias de grandes centros
urbanos da Europa e dos Estados Unidos (SOMEKH, 1997).
Destarte, a introdução dessas novas formas de morar ocorre de forma indiferente
às especificidades do lugar, o que pode ser comprovado pela adoção do modelo vertical
de habitação sem sua real necessidade, haja vista que a introdução de habitações
verticalizadas se justifica quando há escassez de espaços não edificados, o que não é o
caso de Três Lagoas(SOMEKH, 1997; TÖWS et al. 2009).
Em Três Lagoas observa-se a atuação dos agentes produtores do espaço
(CORRÊA, 1993) de forma a privilegias empreendimentos lucrativos, mas que muitas
vezes não estão relacionados com a melhoria da qualidade de vida da população local.
Ademais, muitas dessas ações são pensadas tanto em lugares diferentes, quanto por
pessoas que não conhecem as especificidades da realidade local.
Os eventos, as ações não se geografizam indiferentemente. Há em cada momento, uma relação entre valor da ação e o valor do lugar onde ela se realiza. Sem isso todos os lugares teriam o mesmo valor de uso e o mesmo valor de troca, valores que não seriam afetados pelo movimento da história (SANTOS, 2012a, p. 86)
Para Santos (2012a) os objetos não agem, mas podem nascer predestinados a um
determinado tipo de ação. Nesse sentido, o papel das empresas construtoras e
incorporadoras imobiliárias é de realizar a materialização de objetos (condomínios e
loteamentos) em Três Lagoas, sendo que estes foram pensados em sua gênese para
atender a determinadas classes sociais, o que corrobora para a acentuação da
desigualdade social.
[...] a possibilidade de ser mais, ou menos, cidadão depende, em larga proporção, do ponto do território onde se está. Enquanto, um lugar
vem a ser condição de uma pobreza, um outro lugar poderia, no mesmo momento histórico, facilitar o acesso aqueles bens e serviços que lhe são teoricamente devidos, mas que, de fato, lhe faltam (SANTOS, 2012b, p. 107, grifo do autor).
Dessa forma, o cidadão acaba por se tornar um cidadão-consumidor (SANTOS,
2012b) desses espaços, sendo que o espaço a ser consumido dependerá de seu poder
aquisitivo, o que resultará nas possibilidades de maior ou menor acesso à cidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A atual dinâmica vivenciada por Três Lagoas-MS exerce poder de atração sobre
as diversas construtoras e incorporadoras imobiliárias de outros Estados, visto que a
cidade tem recebido famílias formadas por trabalhadores que exercem distintas funções
nas indústrias. Somando um total de 16 empreendimentos realizados por 8 empresas do
estado de São Paulo, pode-se concluir que o mesmo se sobressai frente aos demais,
evidenciando o território rede estabelecido entre os dois estados.
A produção do espaço urbano tem o seu incremento por meio destas empresas a
partir da construção de condomínios horizontais e verticais e de loteamentos urbanos,
que evidenciam que novas formas de morar estão sendo criadas, bem como há a
diferenciação entre classes ou grupos sociais na destinação e consumo desses espaços.
Desta forma, acentuam-se as desigualdades sociais existentes, pois condomínios
horizontais tanto de luxo quando conjuntos habitacionais verticais estão sendo
construídos por essas empresas construtoras e incorporadoras imobiliárias conduzidas
pelas ações dos agentes produtores do espaço.
BIBLIOGRAFIA CORRÊA, R. L. A rede urbana. São Paulo: Editora Ática, 1989 ______. O espaço urbano. São Paulo: Ática, 1993. HAESBAERT, R.; LIMONAD, E. O território em tempos de globalização. Etc, espaço, tempo e crítica. v. 1, n. 2(4), p. 39-52, ago/2007 LAMOSO, L. P. Dinâmicas produtivas da economia de exportação no Mato Grosso do Sul – Brasil. Mercator, Fortaleza, v. 10, n. 21, p.33-47, jan./abr. 2011. SANTOS, M. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. 4 ed. 7 reimp. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2012a. ______. O espaço do cidadão. 7 ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2012b. SOMEKH, N. A cidade vertical e o urbanismo modernizador. São Paulo: Studio Nobel: Editora da Universidade de São Paulo: FAPESP, 1997. SPOSITO, E. S. Redes e cidades. São Paulo: Editora UNESP, 2008. TÖWS, R. L.; MENDES, C. M.; GIMENEZ, H. M. M.; DRUCIAKI, V. P. O processo de verticalização no norte central paranaense: o caso de Apucarana. In: MENDES, C.
M. & TÖWS, R. L. (Org.). A geografia da verticalização urbana em algumas cidades médias do Brasil. Maringá: Eduem, 2009, capítulo V, p. 95-117. TRÊS LAGOAS (Prefeitura Municipal), 2013. Disponível em: < http://www.treslagoas.ms.gov.br/noticia/maior-conjunto-habitacional-da-historia-de-ms-foi-entregue-em-2013/8702/> Acesso em: 27 jun. 2014. TUAN, Y. Paisagens do medo. São Paulo: Editora da UNESP, 2005.