13
Introdução O presente texto, sendo um olhar motivado pelo interesse da investigação-acção, é também um exercício de auto-reflexão que pretende avaliar o que fazemos para que as crianças aprendam e, em simultâneo, perscru- tar como elas o vão fazendo, atentos a alguns processos que ocorrem no seu desenvolvi- mento. O Jardim de Infância (JI) e a sala de activi- dades, em particular – uma vez que é aqui que ocorre a maior quantidade de experiências in- dividuais e colectivas, fora do seio familiar – é um laboratório de aprendizagens por excelên- cia: se considerarmos que neste espaço cada criança tem à disposição a outra criança, o adulto, os instrumentos para interagir. Trata-se aqui de um grupo de vinte e quatro crianças. Crendo com Vigotski 1 , que pela abordagem dialéctica da acção da criança sobre o que a ro- deia e na influência que esse mesmo meio tem sobre ela, impulsionando as suas acções, en- contraremos um manancial de situações dinâ- micas que nos fornecem variadíssimas infor- mações para estudo. Mas, dadas as nossas pró- prias limitações, na impossibilidade de fazer um trabalho mais lato, detivemo-nos numa parcela da prática pedagógica que tem a ver com a planificação, como objecto de estudo. Assim, estruturámos a reflexão que agora apresentamos, cruzando o relato da prática com a fundamentação teórica que com ela se entrelaça, inscrevendo o trabalho no Plano de Actividades (instrumento colectivo de pilota- gem da actividade pedagógica). Desdobramo- -lo na definição do conceito, encontrando-lhe as características do planeamento individual e colectivo e olhamo-lo como impulsionador do trabalho entre pares e, ainda, como indutor do discurso. E, por inerência, porque o Plano de Actividades é um instrumento de mediação, retivemo-nos, também, sobre a questão da in- termediação. As aprendizagens que realizámos através da organização colectiva do trabalho, sinteti- zada num Plano de Actividades, levam-nos sem dúvidas a olhar a nossa acção pedagógica como uma actividade de aprendizagem-ensino. A existência de um momento de planifica- ção colectiva, logo no início do dia, faz parte de uma rotina que as crianças apreendem facil- mente e que se vai transformando, ao longo do ano, num organiser da sua actividade que não dispensam. Em Zabalza (1992, pp. 169-172), encontramos uma interessante definição para a importância das rotinas e da sua caracteriza- ção, que transcrevemos abreviadamente: A rotina baseia-se na repetição de actividades e ritmos na organização espacio-temporal da sala e desempenha importantes funções na configuração do contexto educativo: A) Marco de referência B) Como segurança C) Captação do tempo 5 ESCOLA MODERNA Nº 34•5ª série•2009 O Plano de Actividades como mediador da Aprendizagem-Ensino Manuela Sampaio* * Educação Pré-Escolar. REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 5

O Plano de Actividades como mediador da …centrorecursos.movimentoescolamoderna.pt/dt/1_2_3_trab...guindo-a dos outros animais). O caminho do projecto/actividade/tarefa até à criança

Embed Size (px)

Citation preview

Introdução

Opresente texto, sendo um olhar motivadopelo interesse da investigação-acção, é

também um exercício de auto-reflexão quepretende avaliar o que fazemos para que ascrianças aprendam e, em simultâneo, perscru-tar como elas o vão fazendo, atentos a algunsprocessos que ocorrem no seu desenvolvi-mento.

O Jardim de Infância (JI) e a sala de activi-dades, em particular – uma vez que é aqui queocorre a maior quantidade de experiências in-dividuais e colectivas, fora do seio familiar – éum laboratório de aprendizagens por excelên-cia: se considerarmos que neste espaço cadacriança tem à disposição a outra criança, oadulto, os instrumentos para interagir. Trata-seaqui de um grupo de vinte e quatro crianças.Crendo com Vigotski1, que pela abordagemdialéctica da acção da criança sobre o que a ro-deia e na influência que esse mesmo meio temsobre ela, impulsionando as suas acções, en-contraremos um manancial de situações dinâ-micas que nos fornecem variadíssimas infor-mações para estudo. Mas, dadas as nossas pró-prias limitações, na impossibilidade de fazerum trabalho mais lato, detivemo-nos numaparcela da prática pedagógica que tem a vercom a planificação, como objecto de estudo.

Assim, estruturámos a reflexão que agora

apresentamos, cruzando o relato da práticacom a fundamentação teórica que com ela seentrelaça, inscrevendo o trabalho no Plano deActividades (instrumento colectivo de pilota-gem da actividade pedagógica). Desdobramo--lo na definição do conceito, encontrando-lheas características do planeamento individual ecolectivo e olhamo-lo como impulsionador dotrabalho entre pares e, ainda, como indutor dodiscurso. E, por inerência, porque o Plano deActividades é um instrumento de mediação,retivemo-nos, também, sobre a questão da in-termediação.

As aprendizagens que realizámos atravésda organização colectiva do trabalho, sinteti-zada num Plano de Actividades, levam-nossem dúvidas a olhar a nossa acção pedagógicacomo uma actividade de aprendizagem-ensino.

A existência de um momento de planifica-ção colectiva, logo no início do dia, faz partede uma rotina que as crianças apreendem facil-mente e que se vai transformando, ao longo doano, num organiser da sua actividade que nãodispensam. Em Zabalza (1992, pp. 169-172),encontramos uma interessante definição paraa importância das rotinas e da sua caracteriza-ção, que transcrevemos abreviadamente:

A rotina baseia-se na repetição de actividades eritmos na organização espacio-temporal da sala edesempenha importantes funções na configuraçãodo contexto educativo:

A) Marco de referênciaB) Como segurançaC) Captação do tempo

5

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9

O Plano de Actividades como mediadorda Aprendizagem-Ensino

Manuela Sampaio*

* Educação Pré-Escolar.

REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 5

D) Captação cognitiva: (…) a percepção senso-rial dos momentos completa-se nas rotinas comuma captação cognitiva da estrutura das actividades.E se a isso acrescentarmos actividades de planifica-ção por parte das crianças, do que pensam fazer,esta rotina também possibilita conquistas afectivas(no sentido da implicação pessoal na tarefa, comimportantes repercussões nos resultados finais (…)

E) Virtualidades cognitivas e afectivas.

É claro que Zabalza também nos acautelapara a flexibilidade das sequências, ao invés darigidez do processo com crianças e enuncia-nos, de modo explícito e simples, as vantagensda organização do trabalho com rotinas:

As rotinas são, como os capítulos, o guião davida diária de uma turma que, dia após dia, se vainutrindo de conteúdos e acções. As crianças sabemo nome de cada fase, sabem o que virá depois, sa-bem qual é o procedimento para realizar determi-nadas actividades, etc., e, pouco a pouco, vão-se as-senhoreando da sua vida escolar, vão-se sentindocompetentes e, ao mesmo tempo, vão compro-vando vivencialmente como cada vez lhe saem me-lhor as coisas e sabem melhor o que há para fazer ede que forma resultam, e são divertidas, as tarefas.

No quotidiano da nossa sala com o grupode crianças temos prova disto; espantamo-nosquando verificamos a evolução do grupo queficou do ano passado – pelo domínio dos ins-trumentos de pilotagem, saber-fazer nas áreas,compreensão fácil do que os rodeia, discursoselaborados e críticos, interajuda e orientaçãodos novos, concretização de projectos, avalia-ções em conselho – e também pelo progressodos que entraram de novo.

Um modo possível de testar/verificar o queacabamos de dizer é, como já referimos, de-termo-nos numa parcela da actividade pedagó-gica que acontece, entre nós – o Plano de Acti-vidades.

A reflexão sobre a epistemologia e a didác-tica que o MEM tem vindo a fazer, assente emgrandes nomes da investigação da psicologia eda pedagogia, desde Freinet (e da concepção

empirista da aprendizagem), a Vigotsky e Bru-ner (com a perspectiva socioconstrutivista), évista pela lente da prática – no momento ac-tual e, por força da vida do Movimento e dasociedade em constante reinvenção, onde aeducação retrospectiva deu lugar a uma educa-ção prospectiva e se entende que todas as fun-ções psicológicas têm origem nas relações en-tre seres humanos e deles com o meio numaatitude dialéctica (pressupostos de Vigotsky) –sob um esquema que concebemos: a partir deum ponto, dois segmentos de recta encontram-se na mesma direcção e vão-se deslocando emsentidos opostos:

Actividade pedagógica

Freinet MEM

ComunicaçãoComunicação e através de circuitos expressão livre com envolvimento

dos alunos

Enfoque Visãopedocêntrico sociocêntrica

Técnicas Organizaçãopedagógicas participada

Assembleia Conselho de Coo-cooperativa peração educativa

Jornal de parede

Diário de Turma

É tendo como pano de fundo este contextohistórico, analisado por Niza (1998, pp. 139--140) em que assenta a organização partici-pada de toda a actividade pedagógica, numtreino democrático (daquele modelo políticode sociedade no qual ainda acreditamos)2 queretiramos um objecto para estudo: do conjuntode instrumentos que fazem parte de uma orga-nização participada, elegemos o Plano de Acti-vidades.

6

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9

REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 6

1. O Plano de Actividades

Procurando, não o significado, mas a polis-semia do conceito de planificar, encontrámosdentro da família pedagógica do MEM quemnos tenha facilitado o trabalho de ir às fontes:Pires (2003a e b), através dos seus escritos –«Concepções o modelos de planificação peda-gógica» e «O planeamento no modelo pedagó-gico do Movimento da Escola Moderna»,aborda as perspectivas de vários autores nadesconstrução das relações entre planificação,realização e avaliação, que não podem ser en-tendidas linearmente nem como uma mera su-cessão de etapas. Citando autores muito re-centes (da última década de 2000), associa omodelo de planificação ao modelo curricularutilizado pelo professor, que também lhe con-fere graus de importância diversos.

Ora, chegados a este ponto, é sobre o tipode planificação inerente ao modelo pedagógicoem que navegamos, que queremos deter-nos,para entendermos o que é e para que serve oPlano de Actividades. E, à semelhança do quese passa com o tempo e o espaço educativosque carecem de uma organização cuidada,também o trabalho a desenvolver sob a formade projectos exige uma planificação que é sem-pre feita com as crianças. Assume, aqui,a forma de um mapa, onde se inscrevem pro-jectos e compromissos diários, cuja regulaçãovai sendo feita por cada um e por todos, in-cluindo a educadora.

A importância da planificação na idade pré--escolar é bem clarificada nos estudos de Vi-gotski (1984, pp. 3-20) sobre a «formação so-cial da mente», ao provar a capacidade dacriança em fazer um planeamento mental doque necessita para resolver um problema. Essanecessidade é exteriorizada pela função pla-neadora da fala que permite, à criança, mudarradicalmente o seu campo psicológico (distin-guindo-a dos outros animais). O caminho doprojecto/actividade/tarefa até à criança e destaem sentido inverso passa, no contexto deste

trabalho, pelo Plano de Actividades e pelas in-teracções que ele provoca em cada um e nogrupo (incluindo a educadora).

1.1. Plano de Actividades: instrumento 1.1. de planeamento individual e colectivo 1.1. do currículo.

Trata-se de uma tabela de duas entradas. Nacoluna vertical esquerda estão inscritos os no-mes das crianças. Na linha horizontal superiorordenam-se as actividades que são directa-mente veiculadas pelos instrumentos e mate-riais que integram as áreas educativas – faz-de--conta, matemática, biblioteca, música, oficinade escrita, desenho, pintura, modelagem, re-corte e colagem, construções, tecelagem. Juntoencontra-se a lista semanal de projectos, quedecorrem das intenções de trabalho, indivi-duais ou de grupos. (Figura 1)

A simbologia acordada para preenchimentodo mapa é uma bolinha aberta quando se ins-creve a intenção de fazer, e o seu fechamentodepois de cumprido o que foi planeado.

Colocado em local bem visível e acessível atodos, e servindo-nos de referência para o tra-balho durante um mês, é um instrumento deplanificação colectiva (estão lá todos os no-mes) e individual – as linhas equivalem à pla-nificação de cada um.

O Plano de Actividades (PA) surgiu no pla-card grande da nossa sala, nos primeiros diasde actividade. Do grupo de meninos e meninasdo ano passado, ficaram nove: cinco de 5 anose quatro de 3 anos que, sendo uma mais valiana preparação e organização das actividadesdeste ano, exigem também a continuação dotrabalho iniciado o ano passado.

Uma consequência esperada com esta ati-tude era que todo o grupo se apropriasse,desde cedo, do currículo, dos espaços e mate-riais para o seu desenvolvimento.

É que, como diz Niza (2002):

É no envolvimento e na organização construí-dos paritariamente em comunidade cultural e for-

7

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9

REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 7

mativa, que se reconstituem, se recriam e se produ-zem os instrumentos (intelectuais e materiais), osobjectos de cultura, os saberes e as técnicas atravésde processos de cooperação e interajuda (todos en-sinam e todos aprendem).

Assim se caminha, para a negociação progres-siva, desde o planeamento à partilha das responsa-bilidades e da regulação/avaliação (p. 141).

Transpondo esta linha de pensamento, paraa prática, encontramos no PA – com o seupreenchimento e diálogos que se geram à suavolta, entre crianças e educadora ou entre pa-res – um instrumento de excelência para a or-ganização do trabalho (planificação), reflexãosobre as aprendizagens realizadas, aferição decompromissos, regulação do desenvolvimentodo currículo (diagnóstico do que já se dominae do que falta dominar).

Sobre esta temática há outras reflexões, no-meadamente as que encontram fundamen-tos/alicerces nas Orientações Curriculares paraa Educação Pré-escolar (OCEPE) para a cons-

trução das aprendizagens, como as de Folque(2001):

A participação activa em momentos de planea-mento e avaliação são excelentes oportunidades dereflexão sobre a acção desenvolvida, ou que se pla-nifica desenvolver. Esta reflexão ajuda a criança atomar consciência do processo vivido e a ser pro-gressivamente mais capaz de se apropriar dele.Quando a criança em tempos de planeamento éconvidada a participar na tomada de decisões, elaé levada a pensar, a analisar as condições do am-biente, a analisar os seus próprios desejos e inten-ções, assim como as do grupo. Esta conjugação depontos de vista desafia o seu pensamento, por ve-zes demasiado autocentrado (p. 9).

Quando, ao final da manhã, nas comunica-ções, ou no balanço do final do dia, remetemospara o PA e verificámos o que fizemos e o queficou por fazer, ao procurarmos as justifica-ções, actualizámos pontos de situação do sa-ber que nos servem de rampa de lançamentopara o dia seguinte. Foi para dar mais visibi-

8

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9

Figura 1

REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 8

lidade a este esforço de posicionamento nocurrículo que elaborámos mapas-síntese dasactividades mais e menos escolhidas e dos in-teresses maiores e menores das crianças, nasactividades – para a educadora – e, já maistarde – para as crianças – avaliações individuaisem forma de gráfico (Figuras 2 e 3).

1.2. Plano de Actividades: impulsionador1.1. de projectos

Como passamos, efectivamente, da planifi-cação à acção?

Do exercício reflexivo sobre as práticas3

transcrevemos um breve excerto do nossoDiário:

«Colocada por detrás da Sónia – menina que

evita o discurso –, sentada à sua altura, com a mi-

nha mão esquerda no ombro dela e com a direita

acompanhando o seu olhar pela linha que lhe cor-

responde, no papel da parede, mostrava-lhe as

áreas onde tinha menos presenças. Ela escolheu

“construções”. Disse claramente: quero fazer um

comboio.

Fui logo buscar uma folha de papel para registar

o seu projecto de trabalho. Comecei por perguntar-

-lhe o que precisava. Foi dizendo: rodas, caixas de

ovos. Perguntei como iria segurar as rodas nas cai-

xas. Imediatamente respondeu: cola. Convidei-a a

desenhar o seu comboio e a ir buscar os materiais

para começar a trabalhar, na mesa grande, porque

a outra já estava ocupada; assim que pudesse, iria

ter com ela para ajudar. Ela pegou em tudo o que

precisava, aproveitando umas caixas que já esta-

vam unidas e pintadas e vi, mais tarde, que tinha

dificuldade com a cola – não resultava a aderência.

Aproximei-me e combinei com ela que iria trazer, de

tarde, uma cola melhor. A Sónia suspendeu o pro-

jecto e fomos inscrevê-lo no mapa próprio. A seguir

foi lanchar.

Neste tempo curto de individualização percebi

que: a Sónia domina o instrumento, o inventário da

zona da expressão plástica, consegue fazer um

plano e concretiza-o segundo os padrões culturais

que tem interiorizados – o seu comboio tinha 2 car-

ruagens, 4 rodas, 2 chaminés – manipula e usa os

materiais de modo a conseguir um efeito desejado».

Noutras ocasiões, ainda próximas do iníciodo ano, acontecem situações como a do Leo-nardo, o mais novinho do grupo, que ficoumuito aflito quando descobriu que os outros jáiam trabalhar – «Mas eu ainda não fui ao Plano!»

– e que nos faz perceber como a organização éimportante, desde cedo, na vida destas crian-ças. Então, é a nossa oportunidade de lhes de-dicarmos mais um tempinho e explorar o seupensamento quanto ao encadeamento de algu-mas acções que possam ter o seu pequeno pro-jecto.

Mas o momento da ida ao PA pode ser tam-bém o ponto de partida para o desenvolvi-mento de um projecto de investigação, comoaconteceu quando falávamos da continuidadedo plano semanal – coluna do queremos fazerdo Diário – relativamente a um produto que ti-nha acabado – verniz em spray para envernizaras máscaras. As crianças inscreviam no PA asactividades a que se propunham e, surgindo aquestão «onde colocar a lata de spray vazia»,imediatamente se organizou um grupo paradescobrir mais acerca dos «produtos inflamá-veis». A partir daqui desenharam-se (planea-ram-se) as acções seguintes num outro mapa,que funcionava como «projecto» do trabalhomas também como regulador das actividadesque, para o desenvolverem, inscreviam no PA.

O mesmo se passou com outros projectosde intervenção ou de pesquisa que as criançasquiseram levar por diante.

Depois, os projectos, seguindo os circuitosde comunicação regulares, foram apresentadosà outra turma, a alunos e professores da EB1 eàs famílias.

1.3. Plano de Actividades: mediador 1.3. do trabalho a pares

Iniciar o dia (logo após o acolhimento) coma sua planificação, desde o início do ano lec-tivo, permite que as crianças se tornem res-

9

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9

REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 9

10

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9

Figura 2

Figura 3

REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 10

ponsáveis pelos compromissos assumidos,como verificámos já em 2 de Outubro passado,onde se registou que de manhã, no planea-mento, todos se lembraram do que tinham dei-xado por fazer, no dia anterior. Apesar disso,ainda havia alguma confusão entre marcar apresença, ir ao Plano, voltar ao local de reunião(a mesa grande). É neste momento que a ajudados meninos e meninas, do ano passado, é ne-cessária, para orientar, nos mapas, aqueles quetêm mais dificuldades. Por outro lado, a me-diação da educadora, neste momento de ava-liar para planificar, é exigível para que a activi-dade individual e a actividade colectiva sejamais do que a ocupação do tempo (para issonão era preciso a educadora), seja a realizaçãode uma tarefa a que se propôs com determi-nado fim.

É claro que nesta altura (Março), apesar deexistirem provas de que as crianças já percebe-ram para que servem os instrumentos de pilo-tagem, e de serem autónomas a irem para asáreas, elas precisam muito, ainda, da ajuda doadulto para as explorarem e assim construíremconhecimento.

O cumprimento das rotinas, sobretudo notempo do trabalho autónomo, tem que ser re-gulado, muitas vezes, pela educadora. Isto é,há necessidade de intervir junto daqueles quenos chamam como, por vezes, junto daquelesque correm pela sala, interpelando-os sobre oque se propuseram fazer – remetendo-os parao PA –, sendo necessário acompanhá-los nastarefas, com o fim de lhes proporcionar situa-ções mais elaboradas que lhes devolvam co-nhecimento.

Esta é uma concepção sócioconstrutivistado ensino, onde:

(…) nos movimentamos como uma ajuda aoprocesso de aprendizagem. Ajuda necessária, poissem ela é altamente improvável que os alunos con-sigam aprender, e aprender da forma o mais signifi-cativa possível, os conhecimentos necessários aoseu desenvolvimento pessoal e à sua capacidade decompreender a realidade e de actuar nela, conheci-

mentos por cuja transmissão a escola é socialmenteresponsável (Onrubia, 2001, p. 120).

Para além da educadora, também o traba-lho de pares se tem revelado precioso nas aju-das mútuas; é que não são apenas os mais ve-lhos que se revelam mais competentes – estesaprendem com os outros a diferença de ritmos,a grandeza da ajuda e a rentabilização das ta-refas. Muitas vezes um regula o comporta-mento do outro, porque, responsabilizadospor determinada tarefa a pares, ou porque pla-nificaram e trabalharam juntos, criam empa-tias, ajudam-se, crescem.

Por exemplo, o Mauro, que é o meninomais velho de todos e o mais novo na frequên-cia, esquece-se frequentemente dos seus com-promissos. Acontece que, em parceria com aKora (de 3 anos) que é muito responsável, játem ido verificar a sua planificação, levado porela, para retornar à actividade.

O recurso à planificação, por rotina, per-mite também que, ainda em Novembro, aMarta soubesse fazer sozinha a avaliação doPlano: com os colegas, no final do dia, à voltada mesa grande, o papel da educadora foi o demoderar os temas de conversa enquanto ela in-teragia com cada um dos colegas, para fazerema avaliação das actividades realizadas.

1.4. Plano de actividades: indutor do discurso

Depois de concretizado o plano, a fase se-guinte é a de falar sobre ele; ele pode ter sidoexplicitado no início, mas precisa de ser apre-sentado, de algum modo, para conferirmos asaprendizagens e para que os outros delas seapropriem, também.

Escolhemos, para ilustrar este processo, oexemplo da «leitura» que o António nos fez,depois de concretizar a actividade de desenhoinscrita no Plano, segurando a folha do papel:

«Era um grande sol, muito vermelho e com raios

muito quentes. De manhã, às oito horas, ainda es-

tava muito frio; depois, às cinco horas já estava mais

11

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9

REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 11

quentinho e às seis horas ainda mais; às nove pare-cia um deserto, de tão quente!

Mas as plantas estavam sempre fresquinhasporque moravam à beira do rio. Ao lado das plantashavia um grande monte de algas verdinhas. O rioera muito azul.

O sol era tão quente que a água se evaporou e,enquanto não ia para as nuvens, formou uma flordentro de um grande quadrado! Depois veio umagrande nuvem muito colorida. Era: azul escuro, azulclaro, laranja, verde e rosa.

As violetas pequeninas cresciam dos rebentos dasvioletas grandes.

Quando o sol estava fraquinho dava sombra àsplantas e elas arrebitavam mais! Chamam-se plan-tas do frio.

O mar, nos dias mais frescos e que cai neve,sobe. Quando está muito quente, muito, muito, omar fica muito pequenininho, como se fosse umriacho.

E agora, vitória, vitória, acabou-se o texto! Mete-se um agrafo, um furo e mete-se no porte-

fólio!»

Esta «obra de cultura»4 do António, de cincoanos, que frequenta o JI pela primeira vez eque se apresentou, no início do ano, como queintimidado com tudo e com todos, que pareciater medo de um simples lápis de cor, comove--nos e deixa-nos perplexos com a quantidadede saberes que aqui demonstrou.

Ao conferirmos uma intencionalidade aodiscurso das crianças, mais do que este servirpara a transmissão de informação, a elabora-ção do discurso subentende aspectos sociaismuito importantes:

«a) a construção de formas de participaçãob) a construção do sentido local, contextua-

lizadoc) a construção das regras sociaisd) a construção das identidades individuais»

(Nussbaum, 2002, p. 202).

Tomando por referência o PA, isto é, as acti-vidades que foram desenvolvidas a partir deuma ideia – inscrita no PA – e desenvolvida atra-

vés de um encadeamento de acções, as criançasfalam, comunicam, produzem um discursode explicitação acerca do que fizeram, para par-tilhar com os outros um prazer ou um saber.O momento das comunicações ao grupo é quaseum «prestar contas» social – ali, naquele mapa,está escrito o que cada um se propôs fazer – queajuda a ser-se coerente e a avaliar constante-mente porque é que ainda não se cumpriram to-das as etapas do currículo exposto.

Então, revelam-se críticos e justos, uns comos outros – o que permite a aceitação da crítica,na sequência da interiorização das rotinas; fa-lam das actividades às quais têm de dar conti-nuidade; contam histórias que viram na biblio-teca; descrevem pormenores do que descobri-ram com a lupa, na ciência; empolgam-se adizer como já conseguiram acabar um jogo, namatemática; descrevem como fizeram, quemateriais utilizaram, nas construções; inventa-riam as ferramentas utilizadas para desenha-rem no computador; recontam o papel das per-sonagens que vestiram no faz-de-conta; can-tam mais um verso da canção que ouviram, namúsica; explicam como descobriram uma cornova na pintura; mostram o alfinete que fize-ram para a madrinha, na modelagem.

E, depois, percorrendo a organização da salaestampada no Plano, as crianças podem pôr emevidência, facilmente, as áreas que têm esco-lhido mais e menos, o que as leva a compro-meterem-se, em frente de todos, a repor os dé-fices. É claro que, no decorrer da semana, o pa-pel da educadora passa muito por lhes lembraro que falta. Colocá-las a participar neste pro-cesso, pedindo-lhes que verbalizem o porquêde não estarem a cumprir, porque mudaram deideias, ou simplesmente perguntar-lhes se já fi-zeram tudo o que planearam, leva a um autoquestionamento que, induzido sistematica-mente, revela mudanças de comportamentos.

Se no início era necessário, da parte da edu-cadora, permanecer atenta às falas, apoiar comquestões e intervenções organizadoras do dis-curso, ajudando a relembrar situações, evi-tando respostas em coro, não antecipando res-

12

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9 REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 12

postas, estimulando a participação dos mais tí-midos pela valorização das suas produções, nofinal do segundo período, as intervenções sãomuito mais fluidas e precisam, até, de ser or-ganizadas em mapa próprio (Figura 4), porquenão há tempo para falarem todos – no períododestinado às comunicações.

Criar uma situação de discurso a partir deum instrumento (também) mediador das apren-dizagens – quer para as crianças quer para aeducadora – acaba por ser uma estratégia deaprendizagem-ensino, funcionando, nestecaso, a linguagem cada vez mais enriquecida,como uma das características básicas de ajudana ZDP de Vigotsky, já que ajuda as crianças a«(…) reestruturar e reorganizar as suas expe-riências e conhecimentos, reconstruindo destemodo os significados culturais partilhados pe-los adultos membros do grupo social onde nosinserimos», como somos levados a crer pelaanálise de Onrubia (2001, p. 142) e, também,pela avaliação da Marta (de 5 anos e do anopassado), quando colocávamos ao grupo aquestão «para que serve o Plano?»:

«Para escolherem as coisas que querem fazer.Para não se esquecerem do que têm de fazer; senão,andam pr’ali, pr’ali, pr’ali, desarrumam tudo e osoutros é que têm de arrumar. Quando os meninos fi-zerem uma coisa vão ao Plano ver se têm uma boli-nha aberta e vão lá pintar. Se não houvesse Plano,os meninos andavam p’ra um lado e p’ro outro, nãosabem o que vão fazer, andam e fazem maluquices.Temos Plano que é para os meninos não se esquece-rem do que têm para fazer».

2. Intermediação

Toda a relação do homem com o mundoacontece num determinado contexto, onde a in-teracção social é um motor de aprendizagem,mediada por ferramentas, objectos, signos e re-presentações mentais. A prática pedagógicafundamentada neste referente Vigotskyano pos-sibilita um melhor desempenho tanto dacriança como da educadora. Em educação, paraque ocorram aprendizagens, como é supostoacontecer, é de suma importância o olhar atento

13

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9

Figura 4

REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 13

à acção mediada, quer pelo adulto quer pelospares.

Diversas investigações sobre a cooperaçãoe a aprendizagem demonstram a validade doconversar e trabalhar juntos (Mercer, 1997, pp.100 e 101): para os neopiagetianos os alunosem interacção melhoram, a posteriori, as reali-zações individuais, por meio do conflito socio-cognitivo; para os neovigotskianos, a ênfase nacooperação vem substituir o conflito na ocor-rência de aprendizagens e, para Bruner (2000),a aprendizagem entre pares é possível porqueos mais competentes ajudarão «a pôr andaimes»para os outros. Esta questão levanta algumasdúvidas aos investigadores, nos casos de o parnão ser mais competente, mas que são dissipa-das quando verificamos que, através do dis-curso de explicitação, uma criança verbaliza oque conseguiu aprender na interacção; por ou-tro lado, também com um par mais compe-tente pode ser prejudicial se ele for dominantee sobrepuser as suas próprias estratégias de re-solução dos problemas. Neste caso, a supervi-são do adulto terá de funcionar como me-diadora para que, na relação que as criançasestabelecem uma com a outra, se construa co-nhecimento simbólico e ambas façam aprendi-zagens.

No dia-a-dia surgem situações que nos re-metem, reflexivamente, para os teóricos, comoas que descrevemos a seguir, retiradas do Diá-rio da investigação:

«6 Janeiro. Apercebi-me de dificuldades ao nível

da oralidade de alguns meninos que é preciso traba-

lhar mais. Por comparação, duas meninas da

mesma idade, em situação de leitura de imagens,

revelarem estarem em patamares muito diferentes.

A Ana5 precisa de um “andaime” por perto, de um

controlo maior da sua actividade linguística, para

estimularmos a sua progressão – tal como sustenta

Daniels (2003, p. 143) que, ao estudar a aplicação

das teorias sociocultural e da actividade na educa-

ção, refere: «Day e Gordon (1993) compararam a

instrução “andaimada” e “não andaimada” e desco-

briram que a primeira resultava numa manutenção

mais rápida e melhor da aprendizagem».

É neste espaço da construção do conheci-mento – da passagem daquilo que a criança jáfaz e domina, para o que não conhece, não rea-liza ou não domina suficientemente – que aeducadora vai ajudar adequadamente6 munindo--a com as ferramentas necessárias que ela vaisaber utilizar, em outras situações, para resol-ver problemas idênticos, mas sozinha.

Num outro excerto do mesmo Diário escre-víamos:

«14 Janeiro. O Vitor e a Maria sofrem de uma

insegurança, sem o adulto, que urge ultrapassar.

Ambos continuam a chorar se não me encontro ao al-

cance do seu olhar e precisam de muito estímulo

para iniciarem qualquer actividade.

Hoje, particularmente, senti como a presença

forte de um elemento securizante conseguiu resolver

este problema, em três casos:

– acompanhei sempre a Ana (que chegou ao JI a

chorar e não queria largar a mãe) na saída à biblio-

teca municipal: não chorou, esteve calma na hora do

conto e soube recontá-lo;

– o Vitor, constantemente a perguntar se faltava

pouco para ir almoçar e se eu era a professora dele,

acompanhado pelo seu maior amigo e debaixo da

minha supervisão constante, parou de fazer tais per-

guntas e, surpreendentemente, de tarde, improvisou

danças, em frente a todo o grande grupo, por muito

tempo;

– a Inês, a quem tenho dado mais atenção (nos

seus projectos, no que veste, nos registos, …), fez

uma boa ilustração do conto da manhã, aceitou di-

tar e copiar um texto, lembrou-se da sua tarefa de

registar o tempo (ultimamente parecia não reconhe-

cer o nome e tem usado frequentemente o “não sei”

em qualquer actividade).

Numa outra situação, no recreio, aproveitei para

incentivar à fala, a Ana, que muito precisa de de-

senvolver a oralidade. Nessa altura, o António en-

controu um caracol e imediatamente se envolveram

outros meninos motivados pelo conhecido interesse

do António nos animais. Ele também conhecia a

lenga-lenga do caracol e foi fácil repeti-la, em tom de

brincadeira, em grupo e individualmente – caracolcaracol põe os corninhos ao sol!»

14

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9 REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 14

E, ainda, a 6 de Fevereiro: a Francisca quisajudar a Kora a marcar a presença e a ir aoPlano – mas não sabia muito bem onde era onome dela. Este foi o princípio de um vai-vementre este «instrumento» e «eu» como media-dora: reforcei a minha atitude junto ao Plano,com as crianças, encontrando com elas estra-tégias para descobrirem o nome, verificandoas áreas para onde têm ido mais e menosvezes, valorizando atitudes positivas no Diá-rio, como a da Francisca que tem ajudado aKora e lhe transmite confiança – sempre juntoda Francisca, a Kora tenta fazer o mesmoque ela.

Mas um mês depois, a Kora já se indepen-dentizou da Francisca: vai sozinha ao PA, pla-nifica os seus dias, sem olhar para o que a Fran-cisca escolheu, executa as tarefas sozinha oucom outros pares, conforme as dificuldades ouos prazeres que sente.

Estes relatos do quotidiano são pequenosexemplos da expansão do conhecimento, pelaaprendizagem mediada. Confirmamo-lo naprodução do discurso das crianças, quando,em tempo de comunicações na sala, contam oque fizeram ou o que aprenderam, mas tam-bém pela identificação com a seguinte afirma-ção de Mercer (1997): «Ahora se cree que,compartiendo las ideas, los niños pueden al-canzar tipos de comprensión más generaliza-bles si se les ayuda y anima activamente a ha-cerlo». (p. 104)

A atitude da educadora, ao colocar o enfo-que no papel activo das crianças como sujeitosobreiros das suas aprendizagens e ao posionar--se ao mesmo nível, tem a possibilidade de ex-plorar os momentos de intervir para organizaro ensino; isto é, a partir das reflexões que lheproporcionam as crianças, pode planificar umasérie de acções, adequando a sua prática.

Reflexão final

Durante a passagem para este texto daquiloque foi ficando registado no Diário de Invesi-gação e nos registos da sala, foram desfilandoepisódios da vida da educadora com o grupo,que acabariam, provavelmente, esquecidos,não fossem assim registados. E eles são impor-tantes, não só pela história que contam, massobretudo pelo conhecimento que nos trazemdo estado da pedagogia que praticamos.

A organização do trabalho dentro da sala deactividades sempre nos pareceu de extremaimportância para que o resultado desse traba-lho fosse produtivo – isto é, se traduzisse emdesenvolvimento cognitivo, social e moral dascrianças. Assim, as preocupações com o esta-belecimento de rotinas ao nível do tempo, coma organização do espaço ao nível da sala e coma monitorização de toda a actividade pedagó-gica, são constantes na vida não só profissio-nal, mas como pessoa. E, num olhar reflexivosobre a prática, concretamente neste ano lec-tivo, sobre conversas que se tiveram com cole-gas, sobre as leituras que se vêm fazendo, per-guntamo-nos, muitas vezes, o que precisare-mos de mudar?

Estabelecer o Plano de Actividades comomediador da aprendizagem-ensino foi um de-safio que nos permitiu – se assim se pode dizer– aprender para ensinar. Resumidamente, veri-ficámos:

– o Plano de Actividades desempenha umpapel central no modelo pedagógico;

– o envolvimento de cada criança e de todosna planificação do currículo permite levar acabo projectos de que se gosta mais e aferira falta daqueles em que houve menor envol-vência;

– a planificação colectiva sempre expostapermite regular a actividade da sala;

– o Plano de Actividades expõe o currículo,através de uma barra de ferramentas que são asactividades ilustradas;

– o Plano de actividades mostra o que faltafazer, no currículo, e nos contratos inacabados

15

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9

REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 15

– funciona, portanto e também, como instru-mento de avaliação;

– a planificação em grupo inicia os temposde trabalho autónomo; a avaliação em grupoencerra o ciclo de que as crianças se vão apro-priando e que acabam por não dispensar;

– a planificação colectiva é um exercício departilha do poder, que não pode estar nas mãosde um, apenas (a educadora);

– o Plano de Actividades é um meio privi-legiado de mediação entre a educadora e acriança e entre pares, pelas rampas de lança-mento que induz: no estímulo à fala, à comu-nicação, à produção cada vez mais elaboradado discurso, ao encadeamento mental de ac-ções que se concretizam na realização de pe-quenos projectos, à reflexão sobre as própriasexperiências, à ajuda ao outro na apropriaçãodos instrumentos, ao acompanhamento eatenção do que tem dificuldades na execuçãoda sua tarefa ou projecto;

– o Plano de Actividades é, ainda, um espe-lho do que se faz dentro da sala de actividadese que é facilmente perceptível aos olhos dosleigos, como os pais ou outros convidados, queentram na sala.

Tentando responder à pergunta que nos co-locámos no início desta reflexão, percebemosque há áreas que as crianças escolhem muitomenos, desde o início do ano. Se elas fazemparte das Orientações Curriculares que nos sãofornecidas oficialmente, então teremos de des-cobrir aliciantes para que as crianças tiremdelas o inerente proveito das aprendizagens.Assim, pensamos que a reorganização dos es-paços em questão e a reformulação dos inven-tários, em pequeno grupo, assumido como umprojecto a desenvolver, a inscrever no mapa deprojectos, para depois apresentar ao grandegrupo, poderão ser estratégias necessárias.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Bruner, J. (2000). Cultura da Educação. Lisboa:Edições 70.

Daniels, H. (2001). Vigotski e a Pedagogia. SãoPaulo: Edições Loyola.

Folque, M. A. (2001). Orientações Curriculares:que Alicerces para a Construção das Apren-dizagens?. Escola Moderna, 12 (5) 5-10.

Mauri, T. (2001). O que é que faz com que oaluno e a aluna aprendam os conteúdos esco-lares. In C. Coll et al, O Construtivismo em Salade Aula (pp. 75-119). Porto: Edições ASA.

Mercer, N. (1997). La Construción Guiada delConocimiento: el Habla de Professores y Alum-nos. Barcelona: Paidós.

Niza, S. (1998). O Modelo Curricular de Edu-cação Pré-escolar da Escola Moderna. InJ. O. Formosinho (org.) Modelos Curricularespara a Educação de Infância (pp. 139-159).Porto: Porto Editora.

Nussbaum, L. (2002). El aula como espacio cul-tural y discursivo. In C. Lomas (Org.), Elaprendizaje de la comunicación en las aulas (pp.195-207). Barcelona, Paidós Ibérica.

Onrubia, J. (2001). Ensinar: criar Zonas de De-senvolvimento Próximo e intervir nelas. InColl et al, O Construtivismo em Sala de Aula(pp. 120-149). Porto: Edições ASA.

Perrenoud, P. (2002, 2008). A Prática Reflexiva noOfício de Professor. Profissionalização e RazãoPedagógica. Porto Alegre: Artemd.

Pires, J. (2003a). Concepções e Modelos de Pla-nificação Pedagógica. Escola Moderna, 17 (5),5-22.

Pires, J. (2003b). O Planeamento no ModeloPedagógico do Movimento da Escola Mo-derna. Escola Moderna, 17 (5), 23-68.

Vigotski, L.S. (1984, 2007). A formação Social daMente. São Paulo: Martins Fontes.

Zabalza, M. A. (1992). Didáctica da Educação In-fantil. Porto: ASA.

16

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9 REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 16

17

ESCO

LA

MO

DERN

AN

º 3

4•5ª

série•2

00

9

1 Vigotski em «A formação social da mente» (na 2.ªedição de 2007), ao apresentar-nos a sua teoria, pretendeclarificar diferenças entre a psicologia animal e a psicolo-gia humana, pelo salto qualitativo da internalização dasactividades socialmente enraizadas e historicamente de-senvolvidas (p. 58) que acontecem nas interacções com omeio, e justifica: «A abordagem dialéctica, admitindo ainfluência da natureza sobre o homem, afirma que o ho-mem, por sua vez, age sobre a natureza e cria, através dasmudanças nela provocadas, novas condições naturaispara a sua existência» (ib, id. p. 62).

2 Num outro contexto e lugar, onde indagávamos so-bre as questões da «participação», verificámos que«[h]averá, portanto, uma relação lógica entre a organiza-ção escolar e a democracia como sistema político, queformará cidadãos mais ou menos democráticos, con-forme a cultura democrática dessa mesma organizaçãoescolar. E como se vai medir esse grau de cultura demo-crática? (…) A resposta será dada pelas diversas formasde exercício da democracia, subjacentes aos objectivos(…), (Sampaio, 2005, p. 110).

(…)Se a democracia se aprende, a educação tem umimportante papel nessa tarefa, ao colocar à disposiçãodos indivíduos os princípios orientadores deste modelopolítico de sociedade. Uma sociedade democrática terásubjacente uma escola democrática que preparou os in-divíduos para viver em grupo. Neste princípio está con-tido o factor participação, como orientador do percursoeducativo, onde cada um tem um papel a desempenhar,responsabilidades a assumir, decisões partilhadas. Os há-bitos de participação são fomentados pelo trabalho cola-borativo, de equipa, tanto no que se refere ao processoeducativo, no qual intervêm educadores e educandos,como ao nível das linhas orientadoras da organização es-colar» (ib. Id, p. 112).

3 Perrenoud (2002, p. 198), ao analisar a prática refle-xiva como domínio da complexidade, remete-nos paraShön e diz: (…) uma prática reflexiva metódica insere-seno horário de trabalho como uma rotina. Não uma rotinasoporífera, mas uma rotina paradoxal, um estado dealerta permanente. Por isso ela precisa de disciplina e demétodos: ambos têm por finalidade fazer o professor ob-servar, memorizar, escrever, analisar o que aconteceu,compreender e assumir novas opções».

4 A expressão «obra de cultura» apropriámo-la do dis-curso de Segio Niza, mas também encontramos referên-cia às formas narrativas pessoais como «artefacto cultu-ral» em Daniels (2001, pp. 163 e 164) que por sua vez sefundamenta em Vigotski.

5 Todos os nomes de crianças que mencionarmos,neste texto, serão fictícios.

6 A expressão de ensino como ajuda adequada chega--nos através de Onrubia (2001, pp. 123 e 124) que, ao ex-plorar a concepção sócioconstrutivista do conhecimento,explicita que «(…) o ensino como ajuda adequada pre-tende sempre, a partir da realização compartilhada ouapoiada das tarefas, incrementar a capacidade de com-

preensão e actuação autónoma por parte do aluno. Isto é,tem como objectivo conseguir que os meios e recursosde apoio, utilizados pelo professor para, com a sua ajuda,fazer com que o aluno chegue mais além daquilo que se-ria capaz individualmente, possam em determinado mo-mento ser progressivamente retirados até desaparece-rem por completo, de modo que as modificações nos es-quemas de conhecimento realizadas pelo aluno sejamde tal modo profundas e permanentes que este possa,graças a elas, enfrentar sozinho, adequadamente, situa-ções semelhante. É assim que nos introduz no conceitode Zona de Desenvolvimento Próximo (ZDP), de Vi-gotsky.»

REVISTA N.º 34 A 09/07/09 19:14 Page 17