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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ ESPECIALIZAÇÃO EM COMUNICAÇÃO AUDIVISUAL CINEMA DIGITAL E OUTRAS LINGUAGENS CONTEMPORÂNEAS PROF. MS. PAULO ROBERTO CAMARGO O PRISIONEIRO DA GRADE DE FERRO (Auto-Retratos) CLEITON CESAR SCHAEFER

O Prisioneiro Da Grade de Ferro

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O Prisioneiro da Grade de Ferro - Trabalho de Cinema Digital e Outras Linguagens Contemporâneas

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Page 1: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ

ESPECIALIZAÇÃO EM COMUNICAÇÃO AUDIVISUAL

CINEMA DIGITAL E OUTRAS LINGUAGENS CONTEMPORÂNEAS

PROF. MS. PAULO ROBERTO CAMARGO

O PRISIONEIRO DA GRADE DE FERRO (Auto-Retratos)

CLEITON CESAR SCHAEFER

CURITIBA

2010

Page 2: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

O PRISIONEIRO DA GRADE DE FERRO (Auto-Retratos)

FICHA DE INFORMAÇÕES

Título: O Prisioneiro da Grade de Ferro (Auto-retratos)

Título (inglês): The Prisoner of the Iron Bars (self-portraits)

Duração: 123 min e 0 seg.

Ano: 2004

Cidade: São Paulo UF(s): SP País: Brasil

Gênero: Documentário

Subgênero: Político

Cor: Colorido

Número do CPB: 04000502

Sinopse (inglês): The brazilian penitentiary system seen from inside: one year before

the deactivation of Carandiru's Jailhouse, inmates learn how to use videocameras

and document the daylife of America Latina's biggest prison.

Page 3: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

FICHA TÉCNICA

Direção: Paulo Sacramento

Roteiro: Paulo Sacramento

Assistente de Direção: Dennison Ramalho

Depoimentos: detentos da Casa de Detenção de São Paulo

Empresa Produtora: Olhos de Cão Produções Cinematográficas

Produção: Paulo Sacramento

Produção Executiva: Gustavo Steinberg e Paulo Sacramento

Direção de Produção: Gustavo Steinberg

Direção Fotografia: Aloysio Raulino

Operador de Câmera: Aloysio Raulino e detentos da Casa de Detenção

Fotografia de Cena: Não

Fotografia de Cena Autor: Aloysio Raulino

Montagem/Edição: Idê Lacreta e Paulo Sacramento

Estúdio Montagem/Edição: Olhos de Cão

Técnico de Som Direto: Louis Robin e Márcio Jacovani

Microfonista: detentos da Casa de Detenção de São Paulo

Edição Som: Ricardo Reis

Mixagem: Armando Torres Jr.

Estúdio Som: Effects (edição) e Estúdios Mega (mixagem)

Trilha Musical: Não

Trilha Original: Não

DADOS TÉCNICOS

Suporte de Captação: Vídeo (MiniDV)

Suporte de Projeção: 35mm

Janela de projeção de película: 1:1.66

Janela de projeção de vídeo: 16x9 (Letterbox)

Produto Final do Telecine: Vídeo (Betacam Digital)

Ano Telecine: 127

Page 4: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

Disponível nos Suportes: 35mm

Vídeo (Betacam Digital)

Vídeo (MiniDV)

Vídeo (VHS)

Vídeo (DVD)

Vídeo (Betacam SP)

Vídeo (DV-CAM)

Som: Sonoro

Dolby Digital

Idioma: Português

Legendas: Inglês, Espanhol, Francês,

Classificação Indicativa: 16 anos

CURRÍCULO

Website: www.olhosdecao.com.br/prisioneiro

Festivais: 8º Festival Internacional de Documentários -

É Tudo Verdade

31º Festival de Cinema de Gramado

60a. Mostra Internacionale d’Arte

Cinematografica di Venezia (Itália)

27º Festival des Films du Monde de Montreal (Canadá)

Festival de Biarritz (França)

Festival do Rio

Festival International de Documentários

de Amsterdam (Holanda)

Festival Internazionale Filmmaker - Milão (Itália)

Forum Doc BH

Festival Internacional del Nuevo Cine

Latinoamericano - Havana (Cuba)

Festival Internacional de Programmes Audiovisuels -

FIPA (França)

7a. Mostra de Cinema de Tiradentes

Page 5: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

27th Goteborg Film Festival (Suécia)

Human Rihts Watch (Suíça)

Tessaloniki Documentary Festival (Grécia)

Muestra de Cine Mexicano e Iberoamericano

en Guadalajara (México)

Rencontres Cinémas d'Amérique Latine de

Toulouse (França)

The Amnesty Internacional Film Festival in Amsterdam

(Holanda)

International Film Festival of Uruguay

Buenos Aires Festival Internacional de Cine

Independente (BACIFI) (Argentina)

7º Festival de Málaga (Espanha)

Enc Del Outro Cine Quito (Equador)

6º Festival de Cinéma Brésilien de Paris (França)

Tribeca Film Festival (EUA)

Festival de Cinema Brasileiro de Miami

Premiere Brasil – NY (EUA)

Mostra de Cinema Brasileiro na América Latina

(Cidade do México - México)

8º Los Angeles Latino Internacional Film Festival (LA)

4º Festival de Cinema Brasileiro em Israel

Mostra de Cinema Brasileiro na América Latina

(Lima – Perú)

8º Encuentro Latinoamericano de Cine de Lima (Perú)

Mostra de Cinema Brasileiro na América Latina (Buenos

Aires - Argentina)

Festival Internacional de Helsinki

Reel Afirm. Festival (Washington) (EUA)

Festival de Haifa / Israel

20th Warsaw International Film Festival (Inglaterra)

18TH Leeds International Film Festival (Inglaterra)

Puerto Vallarta Film Festival of the Americas – (Mexico)

20º Festival Internacional de Cinema de Santa Bárbara (EUA)

Festival Internacional de Cine Contemporâneo (México)

Page 6: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

1a. Mostra Cine Brasil ( Bogotá - Colômbia)

Festivalíssimo (Montreal - Canadá)

6º Festival Internacional de Lãs Palmas Gran Canarias (Espanha)

Mostra Cinemateca Centro Galego de Arte da Imagem (Espanha)

Festival Internacional de Cine Documental (Quito - Equador)

New Brasil / The UK Brasilian Film Festival (Inglaterra)

Ano do Brasil na França

Prêmios: - Melhor Filme - Golden Owl Awards - Feature Film Competition - 18º

Leeds International Film Festival - Leeds, REINO UNIDO (2004)

- Melhor Documentário - Diretor Estreante - 8º Los Angeles Latino International Film

Festival - EUA (2004)

- Melhor Diretor Estreante de Documentário - Tribeca Film Festival - New York, EUA

(2004)

- Melhor Documentário - 7º Festival de Málaga - Espanha (2004)

- Menção Especial - Future Film Festival / Digital Awards - 60a. Mostra

Internacionale d´Arte Cinematografica di Venezia ¬ Itália (2003)

- Melhor Documentário - Prêmio da Crítica - 31º Festival de Cinema de Gramado -

RS, Brasil (2003)

- Medalha de Prata - Filmmaker Doc Festival - Itália (2003)

- Melhor Filme Internacional, Melhor Filme Brasileiro, Prêmio ABD e Prêmio

Ministério da Cultura - É Tudo Verdade - 8º Festival Internacional de Documentários

- SP/RJ, Brasil (2003)

- Prêmio Especial do Júri - Festival do Rio - RJ, Brasil (2003)

- Melhor Diretor Estreante - APCA - Associação Paulista de Críticos de Arte, São

Paulo (Brasil, 2004)

Data de Lançamento: 16/04/2004

Local Lançamento: SP/RJ

SINOPSE

Um ano antes da desativação da Casa de Detenção do Carandiru, detentos

aprendem a utilizar câmeras de vídeo e documentam o cotidiano do maior presídio

da América Latina.

Page 7: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

O documentário retrata a ineficácia do sistema carcerário brasileiro, sobretudo

sua falha no processo de ressocialização. As lentes de Paulo Sacramento

conseguem captar a desobediência a vários princípios constitucionais,

principalmente em relação à dignidade do apenado.

Apesar de mostrar assassinos, estupradores, ladrões, entre outros, o filme

expõe a maneira - muitas vezes inusitada e criativa - que os presos encontram para

(sobre)viver no cárcere, numa tentativa de diminuir o tempo que sempre insiste em

correr mais vagarosamente quando se está cerrado dentro das gaiolas de ferro. Por

outro lado, o documentário revela as condições sub-humanas a que os apenados

estão submetidos no cárcere, confirmando o descaso Estatal que impera no Sistema

Penal brasileiro.

O diretor entregou a posse das câmeras aos próprios presos, para que eles

filmassem seu dia-a-dia e para dar veracidade à situação em que vivem.

DIRETOR

Formado em Cinema pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade

de São Paulo (ECA/USP). Em 1992, cria a produtora independente Paraísos

Artificiais, que se tornaria em 1996 a produtora Olhos de Cão.

Foi assistente de direção e produtor de finalização do longa-metragem "A

Causa Secreta" (1994, direção de Sérgio Bianchi). Presidiu a Associação Brasileira

de Documentaristas - Seção São Paulo (ABD-SP) ao longo do ano de 1997.

Realizou a montagem dos longas-metragens "Tônica Dominante" (2000,

direção Lina Chamie) e "Cronicamente Inviável" (2000, direção de Sérgio Bianchi).

Produziu e montou o longa "Amarelo Manga" (2002, direção de Cláudio

Assis), vencedor de oito prêmios no Festival de Brasília em 2002, entre eles o de

melhor montagem e os prêmios de melhor filme segundo o júri oficial, a crítica e o

público. Recebeu ainda prêmios de melhor filme no Fórum do Novo Cinema do

Festival de Berlim e no Festival de Cinema Latino-Americano de Toulouse, ambos

em 2003.

Dirigiu os curtas-metragens "Ave" (1992) e Juvenília" (1994) - este último

recebeu o Grande Prêmio de melhor filme nos Rencontres Henri Langlois (França), o

Page 8: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

prêmio de melhor curta no Riminicinema Mostra Internazionale (Itália) e a Medalha

de Prata no Kurtzfilmfestival Goldene Câmera (Alemanha).

Montador laureado, recebeu prêmios de melhor montagem pelos curtas "Nunc

et Semper ou Canal 100" (de José Roberto Torero) no Guarnicê de Cine Vídeo de

São Luís; "Amor!" (de José Roberto Torero) nos festivais de Gramado e de Brasília;

"Geraldo Filme" (de Carlos Cortez) no Festival de Brasília; "5 Filmes Estrangeiros"

(de José Eduardo Belmonte) no Festival de Brasília; e "Tepê" (de José Eduardo

Belmonte) no Festival de Gramado.

Foi também premiado pela edição de som do curta "Onde São Paulo Acaba"

(de Andréa Seligmann) no Festival de Brasília.

CRÍTICA

Documentário captado durante sete meses no presídio do Carandiru, em São

Paulo, "O Prisioneiro da Grade de Ferro (auto-retratos)" foi o grande vencedor da

edição 2003 do É Tudo Verdade - 8º Festival Internacional de Documentários.

O longa-metragem venceu a Competição Internacional e a Competição

Brasileira. Também recebeu o Prêmio da Associação Brasileira de Documentaristas

e um dos três Prêmios Estímulos do Ministério da Cultura. Em maio do mesmo ano,

o filme foi exibido na sessão de encerramento do XIII Cine Ceará - Festival Nacional

de Cinema e Vídeo.

Para o júri internacional do É Tudo Verdade, “O Prisioneiro da Grade de Ferro

(auto-retratos)" se impôs como uma evidência tão forte quanto à necessidade da sua

existência. Segundo os jurados, é "um filme que permite aos próprios prisioneiros

revelar seus corpos abafados; um trabalho onde o ponto de vista do cineasta não é

a sua prioridade exclusiva. Ele é o fruto de um contrato passado entre duas

necessidades. A dos presos de fabricar a sua imagem. A do diretor cineasta de

revelar uma realidade”.

Já para o júri brasileiro do mesmo evento, trata-se “de um filme que soube

criar mecanismos cinematográficos aptos a trazer para o espectador uma dimensão

até então desconhecida de uma questão especialmente dramática. O cineasta

soube criar neste filme, em marcante sintonia com a equipe envolvida, um

dispositivo onde a encenação ou a sinceridade produzem sentidos confluentes,

Page 9: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

revelando aspectos muito especiais (inéditos em alguns casos) sobre a situação

carcerária”.

Poucas coisas são tão clichês quanto dizer que um filme é “um soco no

estômago”. Infelizmente, não se pode imaginar outra sentença para O Prisioneiro da

Grade de Ferro, documentário de Paulo Sacramento (produtor e editor de Amarelo

Manga). Aliás, soco no estômago é pouco.

A película é uma das coisas mais fortes desde Cronicamente Inviável de

Sérgio Bianchi e não traz o alívio de saber-se que há ali uma ficção.

A ideia do documentário é simples: após um curso profissionalizante, os

presos do Carandiru receberam câmeras para filmar o cotidiano da prisão como

quisessem. O diretor Paulo Sacramento ambicionou mostrar o que o filme Carandiru

não conseguiu: a realidade dos presidiários.

Diferente da película de Hector Babenco, O Prisioneiro da Grade de Ferro não

carrega o menor compromisso com uma estética agradável ou em explicar várias

tramas que não traduzem quem os presidiários são. Para retratar o que alguns

presidiários chamam de Portal do Inferno, Sacramento opta por imagens isoladas de

enfermos quase deformados por suas mazelas e sem receber o tratamento

adequado além de retratos isolados de grupos como os evangélicos, os desportistas

e os artistas.

Para se fazer documentário, o grande problema não é com a verossimilhança

das imagens, mas na intenção do diretor que pode manipular seja na edição ou até

mesmo nas perguntas o que filma. Usando os prisioneiros como co-diretores,

Sacramento aumenta em níveis exponenciais o grau de veracidade que o filme

reproduz. Os próprios presos se apresentam como protagonistas e diretores “vocês

desculpem, mas sou apenas um amador”, afirma um dos cinegrafistas.

É esse grau de inexperiência que confere a pureza necessária para mostrar o

descaso da sociedade com os penitenciários. O Prisioneiro da Grade de Ferro é

uma demonstração clara das razões que levam o sistema penal a ficar cada vez

mais superlotado.

No melhor e pior daquele universo, entre traficantes que vendem crack (“isso

aqui é raspa da canela do diabo”), rappers e assassinos, satanistas e artistas é

possível encontrar até aqueles que vão e voltam por vontade própria e para manter

a palavra. Não é difícil entender as mudanças, mas quando elas ocorrem para

melhor. Por que após assistir O Prisioneiro da Grade de Ferro não há a menor

Page 10: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

dúvida de que o Carandiru é, realmente, um portal para o inferno de onde será

quase inevitável sair pior do que entrou.

Em uma cena de O Prisioneiro da Grade de Ferro (Auto-Retratos), Dennison

Ramalho, aqui assistente de direção, empresta uma câmera a um detento pela

estreita escotilha do "Amarelo", uma das cerradíssimas celas de segurança máxima

do complexo carcerário do Carandiru. Fica claro, aqui, que a equipe de filmagem

consegue ir até certo ponto (o mais profundo, aliás, que alguém de fora dali já

conseguiu chegar) e a mini DV é quem segue adiante, sem limites, operada pelos

detentos e tendo um acesso mais íntimo àquele dramático espaço.

À parte essa liberdade suprema da câmera, é seu empréstimo que se faz

emblemático neste documentário. É com ele que o diretor Paulo Sacramento dilui

sua autoridade como diretor e autor do longa, repartindo o controle com os presos

durante as filmagens. Um gesto raro num documentarismo que, de praxe, é feito

para justificar teses previamente concebidas. Sacramento e sua equipe chegam ao

Carandiru sem uma verdade pronta e tampouco pretendendo encontrá-la.

Não há, também, nenhuma intenção de se desenhar um painel que junte as

várias verdades dos presidiários. É mais uma experiência coletiva, sob a

coordenação de Sacramento e sua equipe - tanto que foi ele, mais a montadora, Idê

Lacreta, que editaram o material de 170 horas.

Os workshops que precederam os sete meses de filmagens, em 2001,

também justificam esse trabalho em grupo, e a evidência dessa parceria se dá na

imagem: não há distinção visual entre o material filmado pelo fotógrafo Aloysio

Raulino e aquele filmado pelos presidiários. Mesmo os sons, ruídos e músicas foram

captados ali e editados fora da casa de detenção.

Esse livre trânsito cruzando a muralha do presídio é fruto de uma confiança

mútua que se fez fundamental para que O Prisioneiro da Grade de Ferro desse

conta do seu projeto, que é captar o cotidiano desses homens órfãos de liberdade.

Neste reality show, são os presos que se expressam, libertos do típico

determinismo dos noticiários. Nesse passeio íntimo, o filme de Sacramento descobre

semelhanças entre o mundo do Carandiru e o que está para além de suas muralhas.

As desigualdades entre a "periferia" (as selas do "Amarelo", superlotadas e

mantendo os criminosos em condições animais) e os cárceres enfeitados com

televisão.

As atividades corriqueiras, como lavar o chão, jogar futebol, fazer compras,

passar pelo médico, sonhar pela grade do xilindró com a alegria de fogos de artifício

Page 11: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

que estouram no horizonte. Nada mais verdadeiro sobre os prisioneiros do que

mostrá-los em suas atividades mais corriqueiras, criando vida naquele terreno de

morte da Casa de Detenção.

E ao dar a esses homens imagens que lhes servem mais como espelhos,

"auto-retratos", o filme os recoloca na memória - eles que, removidos do local,

tiveram a desgraça apagada do imaginário coletivo quando o presídio foi desativado

e destruído, em 2002. Por isso a primeira seqüência, a da implosão do Carandiru

mostrada de trás para frente, com os pavilhões levantando-se dos seus escombros.

O Prisioneiro da Grade de Ferro (Auto-Retratos) devolve a existência a esses

homens através da imagem.

O título e a premissa do filme dessa última sessão faz retornar àquela que

deve ser a questão mais recorrente do cinema documental: a representação do

Outro, da experiência do Outro. O filme de Sacramento nasce a partir do resultado

de oficinas de vídeo oferecidas para os presos na (hoje desativada e parcialmente

demolida) casa de detenção de São Paulo – o Carandiru – durante seis meses.

Iniciados nos procedimentos técnicos e narrativos do audiovisual, esses homens se

dispuseram a registrar aspectos de suas vidas (por isso, o subtítulo) lá dentro. O

Prisioneiro é a junção dessas imagens a outras, feitas pela equipe durante todo o

processo.

Objetos da representação viciada do telejornalismo, que os recriam enquanto

resíduo social indesejável, mal a ser combatido, os detentos, por meio de seus auto-

retratos, ganham não somente uma dimensão mais complexa que aquela da mídia

de massa, mas também enquanto criadores de sua própria imagem, vão de objetos

à sujeitos da representação.

Antes de discutir a posição do preso no mundo, O Prisioneiro da Grade de

Ferro quer problematizar o lugar deste (e consequentemente, o do realizador) no

filme: postas as regras, tudo o que veremos deixa de ser realidade imaculada a ser

captada pela câmara, para tornar-se interação entre preso e equipe, entre câmara e

gente. Por esse viés nos chegam as imagens da vivência no Carandiru, estas muitas

vezes captadas nos momentos em que o diretor e a equipe estavam ausentes. 

A atitude de Paulo Sacramento não é experiência isolada. Podemos pensar,

também dentro da tradição do documentário brasileiro, em Jardim Nova Bahia

(1971), de Aloysio Raulino (não por mera coincidência, fotógrafo d’O Prisioneiro da

Grade de Ferro, bem como um dos responsáveis pelas oficinas oferecidas aos

detentos), em que o diretor também entrega a câmara para seu personagem.

Page 12: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

Entretanto, se no filme de Raulino ainda existe a preocupação em preservar

uma certa pureza dos registros, especificando quem filma em cada momento, no de

Sacramento isto não ocorre: na montagem, as imagens dos alunos são misturadas

às imagens da equipe, sem que possamos distinguir claramente quem porta a

câmara, numa dupla contaminação que desautoriza qualquer relativização, tentativa

de perspectiva, em ambas as direções. Só nos chegam os momentos, os

fragmentos da vida na cadeia, sejam eles captados pelo diretor ou não. 

Para onde aponta essa radicalização no sentido de representar a experiência

alheia? Embora sujeitos na captação de imagens, os detentos não participaram da

montagem, instância organizadora determinante. Não esqueçamos de que

Sacramento é autor e não se pretende invisível em seu filme.

Coube ao diretor organizar o material, mas aqui a questão é a de realizar em

conjunto, e o produto desse processo é a consequência do encontro, não um

veredicto anterior à experiência alheia, e muito menos uma intenção totalitária em

relação ao real. 

O sistema carcerário brasileiro visto de dentro: um ano antes da desativação

da Casa de Detenção do Carandiru, em São Paulo, detentos aprendem a usar

câmeras de vídeo e documentam seu cotidiano no maior presídio da América Latina.

O documentário retrata também a ineficácia do sistema carcerário brasileiro,

sua falha no processo de re-socialização, e sua falha no sistema de prevenção.

Mostra a desobediência a vários princípios constitucionais, principalmente em

relação à dignidade das pessoas.

Apesar de mostrar assassinos, estupradores, ladrões, entre outros, o filme

revela que a sua condição de seres humanos não é respeitada e que os prisoneiros

são tratados como animais, vivendo em condições desumanas, fazendo que aqueles

que retornam à sociedade, estejam ainda piores e mais revoltados do que quando

entraram.

Como ensina o escritor português José Saramago: para ver melhor as coisas

há que se lhe dar a volta. Utilizo, nesta oportunidade, um título de filme como mote

para as minhas reflexões. A razão desta escolha, como lembra o professor Rubem

Alves em suas palestras, quem sabe, no futuro, quando alguém se interesse por

meus rabiscos e venha a dizer: "... aquele articulista, policial, educador ou o que

quer que seja quis dizer isso quando escreveu aquilo".

Sabe-se que o mais importante nunca se conta. A história secreta se constrói

com o não-dito, com o subentendido e a vaidosa alusão. Acredita-se que nossas

Page 13: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

escolhas ainda que inconscientes guarda sempre um paralelo com nossos desejos e

inquietações mais imediatos, com as nossas provisórias certezas.

O mote que me atrevo a utilizar, hoje, é do premiado documentário de Paulo

Sacramento, que tem a ver com a possibilidade que temos para repensar o que está

presente e fazemos isso de várias formas.

Um bom filme tem o papel fundamental de muito mais que entreter tentar

reverter. Retratar o homem em sua intimidade, em seu dia-a-dia de preso faz com

que cada um nós reflita sobre algo que não quer se calar, ou seja, vivemos a cada

dia em uma sociedade de controle.

Esse registro cinematográfico me fará um dia lembrar, por exemplo, que a

época assistíamos às mortes anunciadas no Zoológico de São Paulo, quando

alguém usou a metáfora do pai explicando a seu filho que os “bichos” ficavam

presos dentro da jaulas para protegê-los de nós humanos, ou a emblemática cena

do traficante sendo carregado em um carrinho de mão utilizado na construção civil, e

que foi capa de vários jornais.

Por conta da preciosidade do tempo, somos pressionados para irmos direto

ao ponto ou para reduzirmos a uma cena todo um contexto histórico, o que faz com

os textos mais ricos sejam aqueles que conseguem abarcar o todo de forma

sintética.

Ao fazer um esforço de precisão intelectual, a meu ver, o aprendizado que

obtemos do filme é quanto a marca humana por excelência: a lágrima nos olhos.

Sacramento quando registra o olhar desolado e, na seqüência, o vemos

lacrimejando, é como se o preso dissesse ao mundo: errei, devo ser punido ou

reeducado! E em seu, ou nosso oculto pensar surge a questão: mas é esta a forma?

Aquele olhar tem o peso da cena descrita em artigo de Contardo Calligaris, na

Folha de São Paulo, quando ele relembra o gesto de Rosa Parks, a costureira negra

que, num dia de 1955, em Montgomery, Alabama, sentou-se nas fileiras do ônibus

reservadas aos brancos e não quis mais se mexer.

Ela não pedia compensação por danos sofridos nem, a bem dizer, lutava por

um futuro diferente. A repercussão de seu ato (que iniciou o movimento americano

dos direitos civis liderado por Martin Luther King) deve-se, provavelmente, ao fato

seguinte: Rosa Parks não cobrou créditos passados nem futuros, apenas revoltou-

se, ou seja, autorizou-se a viver o presente que queria e que lhe parecia justo. Coma

isso, transformou a sua vida e o mundo.

Page 14: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

O filme de Sacramento pode não transformar o mundo, mas traz novos ares a

milhares de detentos. O inesperado do filme surpreende-nos. O homem é

alimentado por um gênio criativo que sempre nos surpreenderá. Tenta-se ao

interpretar fazer um trabalho similar ao de um historiador ou assim como o do

arqueólogo, que deve procurar desvendar o passado da humanidade, reconstruir os

seus eventos, fazer reviver a vida dos homens de outrora, reconstruir as sociedades

já desaparecidas na voragem dos tempos.

A história, no sentido restrito e tradicional do termo, estuda e faz reviver o

passado da humanidade baseando-se nos documentos escritos, enquanto a

arqueologia se baseia, para alcançar o mesmo fim, em toda a espécie de vestígios

materiais não-escritos, desde edifícios gigantescos aos pólens microscópicos. Em

ambos os casos, pois, se faz história no sentido amplo, completo e verídico do

termo; como fez Paulo Sacramento e equipe, pois deram a volta e viram melhor.

Primeiro longa-metragem dirigido por Paulo Sacramento, O Prisioneiro da

Grade de Ferro pretende retratar e refletir sobre a realidade do sistema carcerário

brasileiro, em um momento em que suas contradições se exacerbam, extrapolando

os limites da aceitabilidade.

Sacramento, há tempos incomodado com o que era veiculado pela mídia

sobre o complexo penitenciário Carandiru – “é sempre rebelião e fuga” – sentiu

vontade de investigar e saber mais sobre a vida daqueles homens. Em 1996,

realizou as primeiras filmagens e partiu para a captação de recursos.

Em 2001, o diretor percebeu que a maneira mais eficiente de dar voz aos

presos e conhecer efetivamente o cotidiano daquelas pessoas seria fazer um filme

em parceria. Buscando um registro documental, optou por ministrar cursos e

workshops a detentos interessados, ensinando-os a manipular câmeras de vídeo.

Um ano antes da desativação da Casa de Detenção do Carandiru, os detentos

registraram, sem intermediários, o cotidiano deste que foi o maior presídio da

América Latina.

Impactantes imagens da implosão de três Pavilhões – 6, 8 e 9 –, ocorrida em

dezembro de 2002, abrem o documentário. Ao longo dos 123 minutos de projeção,

dezenas de detentos, devidamente identificados, falam sobre a rotina na cadeia,

suas histórias, expectativas, injustiças.

Mostram-se perdidos em algumas situações e seguros na convicção de que

sua própria sobrevivência depende da atitude diária perante os colegas. Diversos

Page 15: O Prisioneiro Da Grade de Ferro

aspectos são levantados e um mundo paralelo começa a ser descortinado. O filme

ainda traz depoimentos de ex-diretores da Casa de Detenção.

Sacramento captou R$ 600 mil e levou sete meses para a captação de todo o

material que lhe serviu para a montagem e edição final. Foram 170 horas de material

registrado. O sistema carcerário brasileiro visto de dentro: um ano antes da

desativação da Casa de detenção do Carandiru, detentos aprendem a utilizar

câmeras de vídeo e documentam o cotidiano do maior presídio da América Latina.

REFERÊNCIAS

Sobrecarga. Acesso em 19.06.10. Disponível em:http://www.sobrecarga.com.br/node/view/2561

Cineclube. Acesso em 20.06.10. Disponível em:http://www.cineclube.ufsc.br/cinema-documentario/o-prisioneiro-da-grade-de-ferro/

Folha Renascer. Acesso em 20.06.10. Disponível em:http://folharenascer.webnode.com.br/news/filme-o-prisioneiro-da-grade-de-ferro-documentario-/

Mnemocine. Acesso em 18.06.10. Disponível em:http://www.mnemocine.com.br/promo/promocaoprisioneiro.htm

Wikipédia. Acesso em 20.06.10. Disponível em:http://pt.wikipedia.org/wiki/Prisioneiro_da_Grade_de_Ferro_(Autorretratos)

Programadora Brasil. Acesso em 17.06.10. Disponível em:http://www.programadorabrasil.org.br/programa/17/http://www.programadorabrasil.org.br/filme/184/

Foco Jornalístico. Acesso em 19.06.10. Disponível em:http://www.focojornalistico.com.br/imprensa_detalhes.asp?id=17

Jornal da Mídia. Acesso em 19.06.10. Disponível em:http://www.jornaldamidia.com.br/noticias/2004/07/Opiniao/17-O_prisioneiro_da_grade_de_ferr.shtml