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ADILSON MARQUES
O reiki segundo o espiritismo
Este livro dedicado a duas almas fraternas e
muito especiais em minha vida: O Srgio Parreli
e a Karina Frner. A vocs, o meu sincero
agradecimento.
SO CARLOS - 2005
Introduo
Para trs, todos vs negadores do
progresso, para trs, com as vossas crenas
de uma outra poca. Por que negais o
progresso e quereis entrav-lo? que,
querendo vencer, vencer ainda e sempre,
condensastes o vosso pensamento em artigo
de f, dizendo Humanidade: sers
sempre criana, e ns, que temos a
iluminao do alto, estamos destinados a te
conduzir. (Mensagem de um esprito
publicada em Obras Pstumas, de Allan
Kardec, p. 307)
Interpreto a mensagem acima como um sinal de que a espiritualidade no
monoplio de nenhuma religio e nem mesmo de caminhos espirituais codificados, como
o prprio Espiritismo. O sentido profundo dos valores espirituais encontra-se sempre em
uma dimenso pessoal e intransfervel. As doutrinas embaam nossa experincia nica com
Deus e, muitas vezes, at a impede. Elas servem para preparar o nefito para o grande
mergulho na realidade suprema e inefvel de um Deus vivo, acolhedor e misericordioso,
mas elas no so ainda a experincia numinosa.
Gradativamente, o que, a princpio, era para ser um caminho cientfico para auxiliar
na renovao moral da humanidade, um caminho para a destruio filosfica do
materialismo atravs da comprovao emprica da vida aps a morte e da comunicabilidade
natural com os mortos, o espiritismo virou, no Brasil, mais uma religio preocupada
com doutrinao (catequese) e proselitismo. Esqueceu-se que o lema de Kardec era fora da
caridade no h salvao e se criou um novo: fora do espiritismo no h salvao.
Porm, se retornarmos, sem pr-conceitos, aos livros de Kardec, ns vamos notar
muitas diferenas entre o que ele denominou como Espiritismo e a prtica medinica
praticada no Brasil, cujo nome, numa anlise mais acurada, deveria ser chamada de
kardecismo.
Muitos adeptos do kardecismo comportam-se como os novos doutores da Lei,
proclamando-se como os legtimos e nicos representantes do Cristo, e com imunidade para
emitir opinies pejorativas e preconceituosas contra as demais doutrinas, sobretudo, a
Umbanda. Muitos apostam no discurso do medo, trocando o inferno dos catlicos pelo
umbral para intimidar quem freqenta terreiros ou se comunica com ndios e pretos-
velhos, os espritos selvagens, primitivos e inferiores, como gostam de falar e de
escrever. Preconceito ou no, quem somos ns para julgar?
Em nossa modesta opinio, o Deus misericordioso de Jesus abenoa todos os
caminhos que desejam a regenerao da Terra e a purificao do esprito eterno. E no me
parece que o desejo de Kardec fosse que se desmanchasse no ar sua racionalidade e o seu
bom senso, para que, em seu nome, se praticasse o preconceito e o fanatismo religioso.
Felizmente, e graas a Deus, o Espiritismo est nas Leis da natureza, e ele muito
mais amplo e complexo que o kardecismo. Talvez este seja o movimento dominante no seio
do Espiritismo brasileiro, o que nos leva a confundir, freqentemente, Espiritismo com
kardecismo e nos faz pensar que os demais movimentos espritas sejam dissidncias. Em
essncia nunca houve dissidncia no movimento esprita. Ocorreu, e continuar ocorrendo,
o desabrochar de agrupamentos no kardecistas.
Em outras palavras, o descontentamento com um certo igrejismo kardecista
originou o racionalismo cristo, movimento que optou em seguir um caminho mais
cientfico, como o fez Kardec; O preconceito s entidades indgenas, aos pretos-velhos e s
crianas, originou a Umbanda, tambm chamada, corretamente, de Espiritismo de
Umbanda, por Zlio de Morais; O desrespeito s demais doutrinas espiritualistas,
sobretudo, s do Oriente, originou o movimento esprita universalista que, atravs do
ecletismo criativo, procurou aproximar o pensamento kardequiano da rica e ancestral
espiritualidade oriental. E assim por diante.
Em suma, todos os movimentos acima so espritas, pelo menos no sentido
proposto nos livros kardequianos, mas no so, necessariamente, kardecistas. O mesmo
pode ser dito das igrejas batistas, nos EUA, que acreditam na reencarnao e daquelas onde
se pratica a psicografia.
Em seu livro Obras Pstumas, livro que muitos kardecistas resolveram classificar
como no-doutrinrio, Allan Kardec afirma que seria uma utopia pretender que o
Espiritismo fosse organizado da mesma maneira no mundo todo. O Espiritismo possui,
obviamente, princpios comuns: a imortalidade da alma, a reencarnao como uma lei
natural, o fenmeno medinico e a lei da causa e efeito regendo nossas vidas. Porm, sua
aplicao poder variar sem que a unidade fundamental seja rompida. Alm disso, afirma
Kardec, que lanar a pedra e o antema, prticas rotinizadas e banalizadas em muitas
casas kardecistas, uma atitude anti-esprita.
Em seus livros Kardec no critica nenhum ritual ou objeto ritualstico, ele apenas
esclarece como eles funcionam. Afirma que sevem para facilitar a concentrao e manter o
pensamento elevado dos participantes. Com exceo de grupos espiritualistas que cobram
pelo trabalho espiritual, que praticam magia negra ou que sacrificam animais, nenhuma
outra prtica espiritualista ou doutrina voltada para a caridade, a s razo kardequiana
censuraria.
Assim, como explicar a crtica que muitos livros kardecistas fazem s outras
doutrinas espiritualistas? Vrios livros, publicados pela FEB ou por editoras espritas, so
recheados de crticas ao Budismo, ao Hinduismo e, principalmente, Umbanda. Seria essa
uma atitude kardequiana? Possivelmente no e, muito menos, crist.
Modestamente, no acredito que Kardec defenderia que se proibisse a manifestao
medinica de espritos indgenas ou de pretos-velhos. O preconceito que existe no meio
kardecista em relao a estas entidades to significativo que muitas livrarias espritas
no deixam expostos os livros dos espritos Ramats e de ngelo Incio, autores espirituais
que ajudam a desconstruir este preconceito secular dos kardecistas em relao ao trabalho
sagrado da Umbanda, mas os deixam escondidos para vender queles que os procuram.
Porm, acredito que vir o momento em que o importante trabalho das entidades
espirituais que assumem essa forma simblica nos trabalhos socorristas ser valorizado e
reconhecido tambm pelos kardecistas. Basta aguardar com resignao e coragem.
Para resgatar a chama sagrada que iluminou o esprito crtico e inquiridor de Kardec
e que est na essncia do Espiritismo, necessrio se voltar para o debate profcuo de
idias e de sentimentos que nos aproximem da divindade, que iluminem a chama eterna que
se esconde no interior de cada criatura. E a internet essencial neste processo,
democratizando o acesso aos textos, pois o livro esprita no foi pensado para enriquecer
autores ou editoras, mas para valorizar a espiritualidade. E esta vive da gratuidade e da
doao desinteressada. Infelizmente, em volta do grande interesse da populao por temas
espirituais, formou-se uma rede de editoras publicando livros e revistas espritas,
unicamente com um objetivo: ganhar muito dinheiro. Uma editora paulista, por exemplo,
chega a escrever na contra-capa de seus livros que a pessoa que reproduzir seus livros ir
adquirir carma.
por causa de tantos barbarismos que est na hora de valorizar o Espiritismo em
seu sentido original, o kardequiano. Em outras palavras, como uma cincia que possui
conseqncias filosficas e morais.
Compreendendo que o Espiritismo kardequiano no religio, conseguimos
diferenci-lo do kardecismo, uma religio medianmica importante que nasceu, no Brasil,
derivada dos textos de Kardec, mas que no o Espiritismo.
Com tal diferenciao, muitos erros de interpretao deixam de existir e quem se
salva o prprio Espiritismo que pode continuar sua marcha evolutiva, abrindo-se para
novos temas e discusses transcendentais.
A leitura atenta e profunda da obra de Kardec nos autoriza a afirmar que, em
nenhum momento, ele afirma que o Espiritismo uma nova religio ou seita e nem h
indcios que nos faam afirmar, como corrente no meio kardecista brasileiro, que o
Espiritismo o futuro da religio ou a religio do futuro. Mais do que novas doutrinas
que enchem a cabea com teorias sobre Deus, ns necessitamos de experincias que
revelem a realidade viva de Deus em nosso corao.
Assim, compreendendo a distino acima, vamos nos aperceber, por exemplo, que
nem todo Centro Esprita, apesar do nome, pratica o Espiritismo e que, muitas prticas
classificadas, rotineiramente, como no-doutrinrias pelo kardecismo, podem e devem
ser objetos de estudo do Espiritismo, pois so, essencialmente, manifestaes espritas.
Como afirmou Kardec no livro Obras Pstumas (p. 250), as crenas, tendncias e o
objetivo do Espiritismo so os seguintes:
- O elemento espiritual e o material so dois princpios, duas foras vivas da
natureza, complementando-se e reagindo, incessantemente, uma sobre a
outra. A misso da cincia o estudo das leis da matria e o espiritismo, o
estudo do elemento espiritual em suas relaes com o elemento
material (grifo meu).
- Sendo o elemento espiritual um estado ativo da natureza, os fenmenos
espritas so to naturais quanto os que tem sua fonte na matria neutra. E o
espiritismo uma doutrina filosfica que tem conseqncias religiosas,
como toda doutrina espiritualista; por isso mesmo toca forosamente s
bases fundamentais de todas as religies, (...) mas no uma religio
constituda. (grifo meu)
Resgatando tais axiomas, possvel compreender que nem todos os movimentos
kardecistas respeitam os princpios kardequianos que originaram o Espiritismo. Como
afirmou Kardec: a tolerncia, conseqncia da caridade, que a base da moral esprita,
lhe faz um dever respeitar todas as crenas. (OP, p. 337) Assim, autores e palestrantes que
fazem crticas, quase sempre, grosseiras, frgeis e sem fundamento ao Budismo, ao
Hindusmo e, principalmente, Umbanda, no podem ser classificados como kardequianos
e muito menos como espritas.
Apesar de muitos kardecistas se colocarem como os legtimos defensores da pureza
doutrinria, ns devemos nos lembrar que Kardec (O.P., p. 341) afirmou, categoricamente:
, pois, do dever de todos os Espritas sinceros frustrar as manobras da intriga,
que se podem urdir nos menores centros, como nos maiores. Devero, antes de tudo,
repudiar, da maneira mais absoluta, quem se colocar, por si mesmo, como um messias,
seja como chefe do Espiritismo, seja como simples apstolo da Doutrina.
Como diz a epgrafe que abre este estudo, por que negais o progresso e quereis
entrav-lo? Que Deus abenoe aqueles que se dedicam ao estudo da Transcomunicao
Instrumental, da Apometria, das novas terapias vibracionais etc., removendo as cinzas de
um kardecismo intolerante e entrpico, para irradiar as luzes da espiritualidade viva desse
momento de regenerao e brandura, onde o mais importante no doutrinar, mas
(co)mover coraes.
As siglas que aparecem neste livro so referentes aos seguintes livros:
LE Livro dos Espritos. Araras/SP: IDE, 138a edio, 2002.
OE O que Espiritismo. Araras/SP: IDE, 33a edio, 1974. LM Livro dos Mdiuns. Araras/SP: IDE, 59a edio, 2001.
OP Obras Pstumas. Araras/SP: IDE, 1a edio, 1993.
EE O Evangelho segundo o Espiritismo. So Paulo: Petit, 1997.
G A Gnese. Araras/SP: IDE, 3a edio, 1992.
Captulo I
Afinal, o que Espiritismo?
O Espiritismo , pois, a doutrina fundada
sobre a existncia, as manifestaes e o
ensinamento dos Espritos.
Kardec (O que Espiritismo, p.186)
Kardec nos afirma que o Espiritismo uma cincia experimental, constituda a
partir das instrues dadas pelos Espritos sobre todos os assuntos que interessam
Humanidade e, tambm, atravs das respostas s perguntas que lhes foram propostas, tendo
sido recolhidas e coordenadas com cuidado (OE, p.186). Tais instrues possibilitaram a
Kardec produzir trs estudos fundamentais, um de ordem filosfica (O Livro dos Espritos),
um de ordem moral (O Evangelho segundo o Espiritismo) e um sobre o processo de
comunicao medinico (O livro dos Mdiuns).
Porm, devemos nos lembrar que Kardec viveu e escreveu imbudo pelos valores
dominantes do homem europeu do sculo XIX: o evolucionismo, o positivismo, o
cientificismo etc. Alm disso, se tais livros abarcaram todos os assuntos que interessavam
naquele momento da histria europia e ocidental, no significa que outros assuntos no
possam ser abordados pelo Espiritismo. Ou ser que eles do conta de todos os assuntos
que interessaram humanidade do sculo XX e dos que interessaro humanidade do
sculo XXI?
Ser que Kardec poderia prever que entre outros assuntos, o homem ocidental se
preocuparia com a preservao do meio ambiente e, relacionado a este tema, com o
vegetarianismo e com o direito dos animais? Ele poderia prever o surgimento de novas
terapias vibracionais como os Florais, o Reiki, a Cromoterapia ou a Musicoterapia? Ou que
o homem dito civilizado demonstraria um interesse gradativo pelas ancestrais filosofias e
prticas corporais do Oriente, tais como o Tai Chi Chuan, o Yoga, a Meditao, o Do-In?
E mesmo no campo do mediunismo, ser que Kardec imaginaria que no sculo XX a
Umbanda seria renovada, abolindo o sacrifcio de animais e a cobrana pelo trabalho de
assistncia espiritual ou que haveria uma crescente manifestao medinica de entidades na
forma de ndios, pretos-velhos, crianas, orientais etc., alm dos famosos mdicos, literatos,
padres e filsofos? Kardec poderia prever o surgimento da Transcomunicao Instrumental,
justamente, no seio da Igreja Catlica, no Vaticano? E a Apometria, com o diagnstico de
outras enfermidades espirituais?
Em suma, so tantos temas e assuntos espritas que, se Kardec tivesse encarnado no
sculo XX, teria produzido, ou orientado, muitos estudos segundo o Espiritismo.
Sendo o Espiritismo uma cincia experimental, tais assuntos apresentados acima,
todos de interesse da humanidade, no podem ser levados aos Espritos? Ser que estes no
podem abord-los em reunies medinicas?
Dentro da lgica e do bom senso kardequiano, tudo leva a crer que sim. Porm,
consolidou-se, no sculo XX, um movimento kardecista para o qual todo e qualquer
assunto que no esteja contido nas chamadas obras da codificao no doutrinrio.
Desse ponto de vista, os Espritos que ousam abord-los so rotulados como
mistificadores e os mdiuns que os escutam de fascinados.
Os seguidores de tal movimento insistem em escrever e propagar que a Umbanda
no Espiritismo, que uma srie de terapias ensinadas por espritos no Espiritismo etc.
Possivelmente tais escritores nunca leram o artigo o espiritismo entre os druidas,
publicado em 1858, na revista Esprita, editada pelo prprio Kardec. Se para o codificador
do Espiritismo at os druidas (que eram tidos como supersticiosos e sanguinrios pelos
cristos) praticavam espiritismo, porque no os umbandistas e os nossos silvcolas? E se
at Scrates, que defendia o aborto para controlar o crescimento populacional,
considerado precursor do espiritismo, porque tanto pavor diante de uma entidade indgena
ou de um peto-velho?
Tais contradies s podero ser resolvidas quando reconduzirmos a questo
esprita para o campo proposto por Kardec: o da Cincia. Compreendendo que o
Espiritismo um campo de pesquisa experimental onde todos os assuntos da humanidade
so objetos de estudo, a doutrinao cai por terra, uma vez que, a cincia tem como meta
compreender e explicar o mundo. A doutrinao pertence a outro departamento: o da
religio. Logo, no deve ser pensado como um kardequiano ou um cientista esprita quem
afirma que um determinado assunto, ainda mais envolvendo a espiritualidade, no seja
doutrinrio.
Kardec parece ter profetizado quando afirmou que ao lado da Doutrina Esprita
podero se formar seitas fundadas ou no sobre os princpios do Espiritismo (O.P., p. 336).
E o kardecismo , com certeza, a mais importante delas. Mas importante salientar que no
foi Kardec quem criou o kardecismo. Alis, no custa realar, sempre afirmou que o campo
de pesquisa do Espiritismo o cientfico e no o religioso. As foras no meio kardecista
que no aceitam que novos temas sejam discutidos (com o argumento de salvaguardar a
pureza doutrinria), demonstram apenas que se renderam ao dogmatismo e ao fanatismo.
Pois sempre mais fcil e cmodo, para se fazer proslitos, manter-se preso s frases feitas,
decoradas e proferidas exaustivamente do que raciocinar de forma independente e crtica, o
objetivo maior de Kardec. O Espiritismo proposto por Kardec no est preocupado em
fazer proslitos e muito menos em doutrinar.
Em suma, o cientista esprita possui conscincia histrica e sabe que a Histria e o
mundo se transformam, assim como as imagens que as pessoas tm desse mesmo mundo.
por isso que h um fosso significativo e quase intransponvel entre a cincia e a religio. A
primeira feita, sobretudo, com conscincia. Ela dinmica, neg-entrpica, e seus
mtodos, suas heursticas e seus objetos so sempre renovados, quando necessrios. E
assim tambm com o Espiritismo, a cincia experimental criada por Kardec, mesmo que
ele ainda no seja reconhecido pelos donos do saber acadmico e no obtenha recursos para
pesquisas. Alis, hoje em dia, mais fcil obter recurso para congelar corpos em
decomposio e esperar o dia em que a cincia poder ressuscit-los, do que para realizar
pesquisas srias sobre reencarnao e imortalidade da alma.
Apesar de dinmica, a cincia esprita, ainda hoje, deve seguir o mesmo axioma
anunciado por Kardec, no Livro dos Espritos:
Ela (a cincia esprita) exige um estudo assduo e, freqentemente,
longo demais; no podendo provocar os fatos, preciso esperar que eles se
apresentem e, no geral, eles so conduzidos por circunstncias das quais
nem ao mesmo se sonha. Para o observador atento e paciente, os fatos se
produzem em quantidade, porque ele descobre milhares de nuanas
caractersticas que so, para ele, rasgos de luz. Assim o nas cincias
vulgares; enquanto que o homem superficial no v numa flor seno uma
forma elegante, o sbio nela descobre tesouros pelo pensamento. (...)
Portanto, no nos enganemos, o estudo do Espiritismo imenso, toca em
todas as questes da metafsica e da ordem social, e todo um mundo que
se abre diante e ns (LE, p. 32. Grifo meu).
Podemos compreender pela passagem acima que Kardec possui uma mentalidade
aberta e cientfica, nada dogmtica ou religiosa. Os fatos espritas se produzem em
quantidade, ele afirma. Se todo um mundo se abre diante de ns, e lembrando que o Livro
dos Espritos necessitou de seis edies para, finalmente, Kardec concluir que aquele
estudo estava encerrado, percebe-se que no fcil fazer a cincia proposta por Kardec.
Diferentemente, porm, o agir doutrinador kardecista. Repetindo, acriticamente, frases e
palavras fora do contexto em que foram criadas e julgando tudo o que possa renovar ou
aprofundar o estudo esprita como no-doutrinrio, o kardecismo no faz cincia, apenas
proselitismo.
Felizmente, porm, acertam quando se consideram membros de uma religio. a
religio que se preocupa com doutrinao e catequizao, no a cincia. Diversos assuntos
no so doutrinrios para o kardecismo, mas interessam ao cientista esprita. Enquanto a
religio se preocupa em fazer proslitos; a cincia produz e difunde conhecimento.
Reconduzindo o Espiritismo ao seu devido lugar, o da Cincia, necessitamos
retomar o papel dos Espritos e o objetivo do Espiritismo, segundo Kardec:
Os Espritos no esto encarregados de nos trazerem a cincia
pronta. Seria, com efeito, muito cmodo se nos bastasse perguntar para
sermos esclarecidos, poupando-nos assim o trabalho de pesquisa. (...) Os
espritos no vm nos livrar dessa necessidade: eles so o que so e o
Espiritismo tem por objeto estud-los, a fim de saber, por analogia, o
que seremos um dia e no de nos fazer conhecer o que nos deve estar
oculto, ou nos revelar as coisas antes do tempo (OE, p. 68, grifo meu).
Kardec deixa claro que o objetivo do Espiritismo fazer cincia, estudando os
Espritos e que tal cincia no se encontra pronta. nesse sentido que temos que entender a
expresso codificao. Codificar tambm um ato ativo, que exige trabalho, criatividade e
criticidade. Quantas pessoas no afirmam que Kardec no teve papel ativo, no criando
nada, apenas codificando os ensinamentos dos espritos, o que d ao termo codificao
um sentido quase metafsico e sobrenatural. Kardec foi importante e ativo, inclusive
manifestando criativamente seu preconceito eurocntrico, fato que foi, inclusive, respeitado
pela espiritualidade, como veremos adiante.
E como todo campo cientfico, o Espiritismo tambm deve se aprimorar, mudar de
paradigmas, de heursticas etc. E, no mbito cientfico, a nica concluso cabal que se pode
tirar do Espiritismo que h influncia do mundo invisvel sobre o mundo visvel. E que j
se pode definir algumas das relaes que existem entre eles. Porm, afirmar que o
Espiritismo j revelou tudo sobre o mundo esprita e que mais nada h para se estudar,
muita preguia mental. Da mesma forma que afirmar que o correto contatar a
espiritualidade somente atravs de mdiuns sentados em volta de uma mesa, e que o
mdium incorporado nunca pode se locomover pelo ambiente de trabalho medinico.
Tais afirmaes so de ordem metodolgica, e no valores doutrinrios.
Como j nos referimos, as pesquisas de Kardec trouxeram conseqncias
importantes, sobretudo para o mbito filosfico e moral. Ou seja: A prova patente da
existncia da alma, da sua individualidade depois da morte, da sua imortalidade e do seu
futuro.(OE, p. 70) Isto o mais importante. Todo resto se constitui em mtodos e
heursticas que constituem as diferentes modalidades de Psiconomias1, em outras palavras,
processos de racionalizao e de metodologias para o intercmbio medinico.
Assim, se os kardecistas s trabalham sentados em volta de uma mesa, no quer
dizer que outras linhas espritas no possam se organizar de outra forma para recepcionar e
trabalhar com os irmos desencarnados. Se os kardecistas necessitam de mesas, outros
agrupamentos necessitam de macas, colchonetes, elementos da natureza etc.
O importante que h todo um vasto mundo aberto para ser conhecido com o
advento da cincia esprita. E por isso que Kardec, preferindo seguir seu estudo pelo
campo da cientificidade, reforou, freqentemente, que h duas coisas no Espiritismo: a
parte experimental das manifestaes e a doutrina filosfica (OE, p. 78). importante
ressaltar que ele fala sempre em doutrina filosfica e no em doutrina religiosa. Alm de
no falar em religio em nenhum momento, Kardec afirma que foi a Igreja Catlica que
transformou o Espiritismo em religio:
Pela natureza e veemncia de seus ataques, ela alargou a
discusso e a conduziu para um terreno novo. O Espiritismo no era
seno uma simples doutrina filosfica e foi ela mesma que o engrandeceu
apresentando-o como um inimigo terrvel; enfim, foi ela que o proclamou
como uma nova religio. Foi uma impercia, mas a paixo no raciocina
(OE, p. 86).
Porm, se foi a Igreja Catlica que tentou transformar o Espiritismo em religio,
fato que o kardecismo assumiu de braos abertos, est na hora de reconduzir a discusso
para a esfera proposta por Kardec para que a impercia no se torne ainda mais grave e o
Espiritismo morra de inanio. Est explicito na obra de Kardec que o Espiritismo no
religio. Assim, todos aqueles que pretendem ser coerentes com o pensamento kardequiano
1 Assim, o kardecismo, a umbanda, a apometria e a prpria transcomunicao instrumental desenvolvem seus prprios mtodos e heursticas, de acordo com o objetivo que cada modalidade medinica necessita. Todas elas so sistemas singulares para o intercmbio medinico, no sendo possvel afirmar, categoricamente, qual o melhor e qual o pior. Qual envolve apenas espritos superiores e qual est nas mos de espritos inferiores.
devem reconduzir o debate sobre o Espiritismo ao seu devido lugar: o domnio da Cincia e
o da Filosofia. No-doutrinrio querer transformar o Espiritismo em religio. O que o
kardecismo tem proposto nestes anos todos o que est manchando a pureza doutrinria
do Espiritismo.
Em outras palavras, j passou da hora de retomar o pensamento kardequiano para
que a cincia esprita, ou seja, o Espiritismo, seja aprimorado. Se algum quiser falar que o
kardecismo a religio do futuro ou o futuro da religio, como se l, rotineiramente, em
livros, em revista e na internet que fale, mas nunca diga que o Espiritismo a religio do
futuro, pois religio ele nunca foi e nem o ser. Respeitar a memria e a obra de Kardec
de fundamental importncia.
Isso no quer dizer que o Espiritismo no acarrete em significativas e importantes
conseqncias morais e ticas, pois toda cincia feita com conscincia deve ter tais
conseqncias. E para que no reste nenhuma dvida, analisemos a passagem abaixo de
Kardec para desfaz qualquer mal-entendido a esse respeito:
O Espiritismo est fundado sobre a existncia de um mundo
invisvel, formado de seres incorpreos que povoam o espao, e que no
so outros seno as almas daqueles que viveram sobre a Terra, ou em
outros globos, onde deixaram seu invlucro material. So a esses seres
que damos o nome de Espritos. Eles nos rodeiam permanentemente,
exercendo sobre os homens, com o seu desconhecimento, uma grande
influncia; eles desempenham um papel muito ativo no mundo moral, e,
at um certo ponto, no mundo fsico. O Espiritismo, pois, est na Natureza
e pode-se dizer que, em uma certa ordem de idias, uma potncia, como
a eletricidade o em outro ponto de vista, como a gravitao o em
outro. Os fenmenos, dos quais o mundo invisvel a fonte, so efeitos
produzidos em todos os tempos; eis porque a histria de todos os povos
deles faz meno. Somente que, em sua ignorncia, como para a
eletricidade, os homens atriburam esses fenmenos a causas mais ou
menos racionais, e deram a esse respeito livre curso imaginao.
O Espiritismo, melhor observado depois que se vulgarizou, veio
lanar luz sobre uma multido de questes at aqui insolveis ou mal
compreendidas. Seu verdadeiro carter, pois, o de uma cincia, e no
de uma religio; e a prova disso que conta entre seus adeptos homens
de todas as crenas, que no renunciaram por isso s suas convices:
catlicos fervorosos que no praticam menos todos os deveres de seus
cultos, quando no so repelidos pela igreja, protestantes de todas as
seitas, israelitas, muulmanos, e at budistas e brmanes. Ele repousa,
pois, sobre princpios independentes de toda questo dogmtica. Suas
conseqncias morais esto no sentido do Cristianismo, porque o
Cristianismo , de todas as doutrinas, a mais esclarecida e a mais pura, e
por essa razo que, de todas as seitas religiosas do mundo, os cristos
esto mais aptos a compreend-lo em sua verdadeira essncia. Pode-se,
por isso, fazer-lhe uma censura? Cada um, sem dvida, pode fazer uma
religio de suas opinies, interpretar vontade as religies conhecidas,
mas da constituio de uma nova igreja, h distncia.
(...) Procedemos em nossos trabalhos com calma e recolhimento,
porque uma condio necessria para as observaes e, em segundo
lugar, porque conhecemos o respeito que se deve queles que no vivem
mais sobre a Terra, qualquer que seja sua condio, feliz ou infeliz, no
mundo dos Espritos. Fazemos um apelo aos bons Espritos porque,
sabendo que h bons e maus, resulta que estes ltimos no vem se
misturar fraudulentamente nas comunicaes que recebemos. O que tudo
isso prova? Que ns no somos ateus, mas isso no implica, de nenhum
modo, que sejamos religiosos.(OE, p. 89 e seguintes. Grifos meus)
Apesar de ser uma longa citao, ela importante para desfazer qualquer dvida.
Alis, se Kardec escrevesse tal passagem no sculo XX, possivelmente teria acrescentado a
Umbanda entre as religies cujos adeptos seriam espritas, pois o umbandista, mais do que
os fiis de outras religies, acredita nas manifestaes dos Espritos, pois trata-se de uma
religio que se utiliza do mediunismo em suas prticas sagradas e em seus rituais. Da no
fazer sentido a averso de muitos kardecistas Umbanda ou sua necessidade sombria de
afirmar que a Umbanda no Espiritismo. Na verdade, a Umbanda uma religio esprita,
pois se fundamenta na manifestao de Espritos. Portanto, o cientista esprita estuda a
Umbanda e qualquer religio sem preconceitos e no as condena porque utilizam ritos e
outras prticas religiosas. O Espiritismo no tem ritos ou rituais porque cincia e a
cincia, por seu carter, deve ter mtodos e heursticas que so sempre colocados em
discusso e no rituais ou dogmas.
A passagem abaixo torna ainda mais evidente tal reflexo:
... Uma vez que, por toda parte que haja homens, h almas ou
Espritos, que as manifestaes so de todos os tempos, e que o relato se
encontra em todas as religies, sem excees. Pode-se, pois, ser catlico,
grego ou romano, protestante, judeu ou muulmano, e crer nas
manifestaes dos Espritos, e por conseqncia, ser Esprita; a prova
que o Espiritismo tem adeptos em todas as seitas. (OE, p. 189, grifos
meus).
Est claro na passagem acima que o Espiritismo no uma nova seita e que
Esprita, na acepo sugerida por Kardec, aquele que acredita na manifestao dos
Espritos. Assim, como afirmar que o umbandista no Esprita? Somente quem no
conhece a obra de Kardec pode fazer tal afirmao pueril.
E um exemplo positivo de como o Espiritismo, como cincia, pode at ajudar na
renovao dos cultos religiosos, encontramos no pioneiro e transgressor trabalho de Zlio
de Morais, no incio do sculo XX, no Rio de Janeiro, no qual, baseando-se nos
ensinamentos dos Espritos, aboliu, na Umbanda, o sacrifcio de animais, a cobrana pelos
servios socorristas, enfatizou que a Umbanda deve praticar a caridade e seguir o preceito
cristo da de graa o que de graa recebestes, valorizou as entidades que se manifestam
como ndios, pretos-velhos e crianas, compreendendo a representao simblica que
possuem etc., e deu um nome adequado para essa modalidade de socorro medinico que
estava ajudando a criar: Espiritismo de Umbanda. Seria um erro se ele a chamasse de
Kardecismo de Umbanda. Porque a Umbanda e o Kardecismo possuem mtodos diferentes
de trabalhar com o plano espiritual. So psiconomias distintas. Mas no resta dvida que
ambas so manifestaes espritas.
Outro exemplo em relao ao Reiki, uma espcie de passe oriental que virou
moda no Ocidente, por volta da dcada de 1980, o assunto principal deste livro. Atravs dos
ensinamentos dos Espritos foi possvel tomar conscincia que esta forma de
fluidoterapia envolve o mundo espiritual atravs de uma equipe de mdicos
desencarnados, preparados para esse trabalho socorrista e que tambm deve ser praticada
atravs da caridade, gratuitamente, e que no qualquer pessoa que pode atender com o
Reiki, mas quem , em suma, mdium de cura, independente de passar por uma, trs, dez
ou cinqenta sintonizaes. Quantos aos smbolos, estes nenhuma serventia metafsica
possuem, mas so ensinamentos morais baseados no Budismo e em outras filosofias
orientais e servem para dar confiana ao passista e aumentar a f pelo emprego do smbolo.
E discutir o Reiki fundamental hoje em dia, pois um fato inslito vem acontecendo
em muitos centros espritas. Muitos kardecistas aplicam, gratuitamente, o passe nos
dias e horrios de trabalho medinico e, em outros, aplicam o reiki cobrando pela sesso.
O argumento que utilizam que o passe e o reiki so terapias diferentes. E que, a
segunda, no envolveria a espiritualidade.
A falta de esclarecimento sobre o funcionamento da tcnica faz com que enxerguem
no reiki uma fonte de renda. Cobram para ensinar meia dzia de smbolos sagrados ou
cobram pela sesso. Mas, a Lei bvia: quanto mais conhecimento, maior a
responsabilidade. E o esprita aquele que ser mais cobrado, porque detm mais
conhecimentos sobre os mecanismos da mediunidade e da vida espiritual. Lembremos,
tambm, que Kardec alertou que a cobrana moral ser ainda maior sobre os mdiuns de
cura.
Assim, o kardecista que finge ver diferenas entre o passe e o reiki, visando
ganhar dinheiro com a imposio das mos, colher, certamente, no futuro, o que semeia no
presente.
Segundo a espiritualidade, o avano do reiki no mundo todo estava previsto para
o sculo XX, mas que chegou a hora de romper com esse vis mercadolgico que o
incentivou, resgatando sua verdadeira dimenso sagrada. Da mesma forma que do lazer
proporcionado pelas mesas girantes, em meados do sculo XIX, Kardec evidenciou a
existncia de conscincias incorpreas, o mesmo deve acontecer com o reiki.
Gradativamente, a revelao espiritual chegar a todos os cantos do planeta e o reiki, que
j at reconhecido pela Organizao Mundial da Sade (OMS), vai se transformar em um
trabalho de cura espiritual importante, generalizado, porm, gratuito.
No Brasil, esse fenmeno j comeou. Por volta de 2001, a Espiritualidade que atua
na ONG Crculo de So Francisco, em So Carlos/SP, esclareceu os mdiuns a esse
respeito. Se o procedimento adotado no reiki diferente do passe (usa-se macas e a
pessoa recebe energia deitada; permite-se uma msica ambiente ao fundo e aromas2, por
exemplo; o paciente no tratado de forma impessoal etc.) a essncia do trabalho a
mesma. Ou seja, o tratamento realizado pela espiritualidade socorrista que utiliza o
ectoplasma fornecido pelos mdiuns de cura. E todo o tratamento envolve a questo do
merecimento.
No caso dos animais, um dos argumentos utilizados pelos que cobram pelo
tratamento e defendem a dimenso miraculosa do reiki, a explicao bvia: o animal
no tem carma. Ele no precisa drenar toxinas do perisprito para o corpo fsico devido aos
erros pregressos. Assim, o tratamento de nossos irmos menores no envolve a questo do
merecimento. E por isso que o reiki tambm cura animais e plantas. Mas com o ser
humano segue a lei numinosa da ao e reao e a cura depende da transformao interior e
do merecimento do paciente.
Alm da ONG, j tivemos noticias de outros ncleos onde a espiritualidade j fez
esse alerta. O esclarecimento j foi feito na cidade de Santa Rita do Passa Quatro, em uma
das mais conhecidas casas de Umbanda do estado de So Paulo. O mesmo j aconteceu em
centros espiritualistas de Pernambuco e do Rio Grande do Sul e, possivelmente, em outros
locais tambm, apesar de no termos conhecimento do fato.
2 Um irmo indgena (esprito) falava quando aplicvamos reiki em outro local: levem os seus palitinhos de cheiro, referindo-se aos incensos e ao papel importante da aromaterapia.
Mas necessrio ressaltar que, quando uma verdade revelada, ela no acontece em
apenas um nico local. Ela acontece de forma ampla e em vrios locais diferentes.
Infelizmente, alguns dirigentes de casas kardecistas se recusam em discutir o
reiki, dizendo tratar-se de assunto no-doutrinrio. Agindo dessa forma apenas impedem
ou dificultam que a verdade venha tona mais rapidamente. Com a omisso, colocam-se ao
lado dos mistificadores e das conscincias desencarnadas que no querem que a verdade
seja revelada, para que o reiki continue sendo pensado como uma terapia miraculosa,
cara e carregada de misticismo.
objetivo da espiritualidade superior desmanchar o charlatanismo e a mistificao
nesta rentvel prtica nova era, como aconteceu, no sculo XIX, com as mesas girantes
estudadas por Kardec.
E tudo isso possvel porque, como afirmou Kardec:
A prpria doutrina que os Espritos ensinam hoje, nada tem de
nova; se a encontra, por fragmentos, na maioria dos filsofos da ndia, do
Egito e da Grcia, e toda inteira no ensinamento do Cristo. Que vem,
pois, fazer o Espiritismo? Ele vem confirmar por novos testemunhos,
demonstrar por fatos, verdades desconhecidas ou mal compreendidas,
restabelecer, em seu verdadeiro sentido, aquelas que foram mal
interpretadas. (OE, p. 188, grifo meu)
Com esses dois exemplos (e poderamos dar muitos outros) pode-se demonstrar
como o Espiritismo uma cincia dinmica e extremamente atual. Se Kardec optou, no
sculo XIX, em estudar a mediunidade, o mundo dos Espritos e o evangelho cristo, nada
implica que outros temas no possam ser estudados pelo Espiritismo. Nada nos impede de
fazer um estudo esprita dos livros sagrados do Oriente, por exemplo, estudar o Bhagavad-
Gita segundo o Espiritismo ou Os Sutras budistas segundo o Espiritismo. Como tambm
possvel estudar o Reiki, a Apometria, a Umbanda segundo o Espiritismo, seguindo,
porm, as recomendaes e cuidados propostos por Kardec, no Livro dos Mdiuns, para se
fazer o intercmbio medinico. Lembrando mais uma vez Kardec, ele afirmou:
Muitas pessoas pensam que o Livro dos Espritos esgotou a srie
de perguntas de moral e de filosofia; um erro; por isso, talvez til
indicar a fonte de onde se pode tirar assuntos de estudo por assim dizer,
ilimitados.
(...) O valor da instruo que se recebe sobre um assunto
qualquer, moral, histrico, filosfico ou cientifico, depende inteiramente
do estado do Esprito que se interroga; cabe a ns julgar. (LM, p. 402)
Est explcito acima que Kardec gostaria que novas pesquisas fossem feitas. Que
outros assuntos fossem tratados pelo Espiritismo. Alm disso, podemos rever alguns dos
assuntos discutidos por Kardec, como o caso da civilizao e da evoluo das raas.
Qualquer estudante de histria ou antropologia sabe que as expresses civilizado e
primitivo, criadas no sculo XIX, por pensadores europeus, so expresses ideolgicas e
preconceituosas. No foram os Espritos que as criaram, mas responderam as perguntas de
Kardec sobre a evoluo das raas de uma forma que fosse possvel ao homem do sculo
XIX compreender seus ensinamentos. Porm, atualmente, quando a mentalidade dominante
a da defesa da pluralidade cultural e racial, ou que a diviso dos povos em primitivos e
civilizados caiu por terra, no s possvel, mas necessrio, retomar esse assunto junto aos
Espritos, pois, com certeza, nosso estgio evolutivo j nos permite compreender tais
fenmenos de um ponto de vista diferente, mais complexo e sem os preconceitos
eurocntricos que se encontram nas entrelinhas da obra de Kardec. Hoje em dia, quem
ousaria escrever, como o fez Kardec, a frase abaixo:
O negro pode ser belo para o negro, como um gato belo para um
gato; mas no belo no sentido absoluto, porque os seus traos
grosseiros, seus lbios espessos acusam a materialidade dos instintos;
podem bem exprimir as paixes violentas, mas no saberiam se prestar s
nuanas delicadas dos sentimentos e s modulaes de um esprito fino
(OP, p. 165).
Para a cincia do sculo XIX, ideolgica e eurocntrica, tal afirmao poderia at
ser cientfica, mas hoje demonstra puro preconceito. Mas tal passagem infeliz deve
desmerecer todo o resto de sua pesquisa? claro que no. Alm disso, os prprios Espritos
deram a pista para Kardec, que vale para os no-espritas (para tirar o argueiro de seus
olhos), mas, sobretudo, aos espritas (para tirar a trave que carregam nos olhos):
Alis, no bom contrariar muito bruscamente os preconceitos;
esse seria um meio de no ser mais ouvido; eis porque os Espritos falam,
com freqncia, no sentido da opinio daqueles que os escutam, a fim de
conduzi-los pouco a pouco a verdade. Apropriam sua linguagem s
pessoas, como tu mesmo o faria, se s um orador um pouco hbil; por isso
no falaro a um chins ou a um maometano, como falaro a um francs
ou a um cristo, porque estariam bem seguros de serem repelido (LM,
367).
Um bom interprete sabe que esta frase tambm estava sendo endereada a Kardec,
um europeu positivista que acreditava que o mundo era dividido entre primitivos e
civilizados, entre inferiores e superiores, que o mundo seguiria um caminho
inexorvel onde a Europa seria o modelo a ser seguido pelas demais civilizaes, etc. Logo,
os prprios Espritos no poderiam atacar de frente o preconceito europeu, pois poderiam
no ser escutados. Imaginem se ao invs de padres, filsofos ilustres, polticos consagrados
etc., os Espritos que se manifestassem para a codificao fossem ndios, pretos-velhos
ou orientais usando turbantes? Seriam, como ocorre ainda hoje, taxados de inferiores e de
mistificadores, e expulsos das reunies medinicas.
Para no dar voz s entidades inferiores, na dcada de 1920, a Federao Esprita
Brasileira publicou em sua revista que os ndios e os pretos-velhos, apesar de virem do
mundo astral, no se pautam pelo kardecismo. Nesse aspecto, ela tem razo, porque j
apontamos a diferena entre Espiritismo e kardecismo. O que no se pode afirmar que tais
manifestaes no so Espritas. Caso contrrio, estaramos dando uma nova conotao ao
termo criado por Kardec.
E o fato de Kardec escrever que ilgico admitir que o esprito de um selvagem
se torne, de repente, sbio e virtuoso, ao desencarnar (OE, p. 117), no significa,
necessariamente, que o ndio um ser intermedirio entre o animal e o homem ou que o
atual responsvel pela violncia urbana, como dizem alguns kardecistas3 em suas palestras
ou escrevem em seus livros.
Nem todo ndio selvagem e nem todo aquele que vive nos grandes centros
urbanos civilizado. Alm disso, sabendo da existncia da reencarnao, quem pode
afirmar que muitos civilizados no necessitaro encarnar em aldeias indgenas ou que
muitos ndios, hoje encarnados na Terra, j no foram ilustres civilizados, vivendo a
personalidade de filsofos, cientistas ou reis na Europa? E, no Livro dos Mdiuns, quando
Kardec afirma que apenas os espritos superiores so capazes de realizar reunies no
desdobramento e manter a conscincia do que foi discutido, ser que ele tinha
conhecimento que vrios antroplogos descrevem que tal fato ocorre tambm em vrias
comunidades indgenas, isoladas territorialmente? Se soubesse, talvez no faria tal
afirmao ou no daria margem para se pensar que os povos indgenas so,
necessariamente, inferiores ou selvagens.
Curiosamente, o kardecismo resgatou o valor do povo celta ou dos druidas,
classificados pelos antigos cristos como povos sanguinrios e selvagens. Tudo isso
porque a espiritualidade revelou que Allan Kardec4 teria sido o nome que Denizard
Hipollyte Leon Rivail teve em uma de suas encarnaes. Ser que teremos que esperar a
3 Um livro kardecista muito famoso traz a seguinte informao doutrinria: a de que os ndios so os brbaros que invadem, atravs da reencarnao, o mundo civilizado, sendo, assim, os responsveis pela violncia urbana. 4 Um livro famoso e facilmente encontrado nas livrarias e bancas espritas chama-se Allan Kardec: o druida reencarnado, de Eduardo Carvalho Monteiro. O livro revaloriza o conhecimento desse antigo povo que habitou a Glia, mas que foi estigmatizado pelos romanos e pelos cristos.
espiritualidade revelar alguma encarnao indgena ou africana de algum apstolo do
kardecismo para a ancestralidade indgena e a dos africanos tambm no ser resgatada e
valorizada?
Sabendo que o meio scio-cultural apenas mais um cenrio onde o Esprito eterno
encontra as condies mais ou menos favorveis para o seu aprimoramento moral,
emocional e intelectual, ou seja, onde representa mais uma personalidade nesse jogo
fascinante que a reencarnao, no faz sentido acreditar no evolucionismo linear que
condicionou a cincia no sculo XIX. Curiosamente, se a prpria cincia materialista j
abandonou esta forma de pensar, porque ela deve permanecer na cincia esprita?
Assim, fazer tais questionamentos aos Espritos, mesmo sabendo que eles no
sabem tudo, pois so apenas as almas das pessoas que deixaram seu envoltrio terrestre,
no desmerecer Kardec ou manchar a pureza doutrinria, como pensam alguns
kardecistas, mas compreender que a histria dinmica, que os temas se atualizam e que o
Espiritismo deve acompanhar tal processo.
Kardec, ao contrrio de Conte (o criador do Positivismo ou Doutrina Positivista e,
posteriormente, o criador da religio Positivista, um culto novo ou um sistema de f sem
Deus), no se preocupou em fundar uma nova igreja. A religio kardecista foi criada por
alguns seguidores de Kardec, que retiraram a dimenso experimental de sua obra e a
transformaram em um sistema de f, infalvel e inabalvel.
Na obra de Kardec h uma dimenso moral subseqente que, hoje em dia, seria
mais adequado tratar como dimenso tica. Podemos dizer, tambm, que existe uma
religiosidade, ou, em uma linguagem moderna, uma espiritualidade em sua obra, mas no,
necessariamente, uma religio.
E mesmo no texto publicado na Revista Esprita, de dezembro de 1868, no qual
Kardec defende que o Espiritismo religio, devemos procurar interpretar com mais
cuidado tal texto e contextualiz-lo para no deturp-lo. Kardec, com seu rigor lgico-
positivista, enfatizou que h duas concepes para o vocbulo religio. Um no sentido
clssico de religare, ou seja, enquanto uma comunidade de sentimentos, princpios e
crenas, na qual h laos morais que unem mentes e coraes. nesse sentido tambm que
antroplogos contemporneos estudam o marxismo, por exemplo, e o classificam como
uma religio poltica, pois uma doutrina que agregou e ainda agrega mentes e coraes,
constituindo-se em um sistema de F dos mais fanatizados e intolerantes.
Nesse sentido mais amplo, o Espiritismo seria uma religio. Mas Kardec enfatiza
que h o sentido mais restrito e usual, em que o vocbulo religio significa uma espcie de
culto, onde h a necessidade de uma casta sacerdotal, hierarquias, rituais etc. Por no ter
esse segundo sentido, Kardec enfatiza que melhor denominar o Espiritismo como uma
doutrina cientfica.
Hoje em dia com a distino entre as expresses religio e religiosidade esta
polmica parece estar resolvida. Assim como no se confunde mais autoritarismo com
autoridade, poucas pessoas confundem religio com religiosidade. E talvez nem mesmo a
palavra religiosidade se sustente por muito tempo. O frei Leonardo Boff em seu livro
espiritualidade: um caminho de transformao faz uma distino entre religio e
espiritualidade, demonstrando como esta se relaciona s qualidades do esprito humano
para alm das crenas, dogmas e rituais. Apesar de distintas, religio e espiritualidade
podem se relacionar e conviver. E uma pessoa, mesmo sem ter religio, pode alcanar um
alto grau de espiritualidade se procura pautar sua vida por valores como o amor, a
pacincia, a tolerncia, o perdo etc.
Hoje em dia, no meio kardecista, existe o rito de apenas ler os chamados livros
recomendados. Seus fiis procuram sempre consultar as autoridades kardecistas para
saber quais os livros que podem ou no ser lidos. E, curiosamente, j h grupos que no
recomendam nem os livros de Kardec. Dizem que Obras Pstumas, O que espiritismo
e A Gnese no fazem parte dos livros da codificao esprita e que no devem ser lidos.
Outros dizem que mesmo os livros da codificao so difceis e que o nefito deve se
instruir a partir das apostilas escritas por algum kardecista experiente. Ou seja, agem
como se estivssemos na Idade Mdia.
Analisando algumas dessas apostilas, produzidas por centros espritas de So
Carlos, encontrei passagens curiosas. Por exemplo, em uma delas afirma-se que entidades
que se manifestam como orientais e passam orientaes pautadas pela cincia ou filosofia
do Oriente so mistificadoras. Ser? Onde Kardec escreveu isso? Com certeza, o alvo dos
autores da apostila era o esprito Ramats, uma espcie de Leonardo Boff ou de Herbert
Marcuse do espiritismo. Uma pedra no sapato daqueles que defendem a pureza
doutrinria.
A prtica descrita acima no me parece ser importante para se defender a pureza
doutrinria. Ao contrrio, parece servir para se evitar a insurgncia da criatividade e da
verdadeira f racionalizada. Parece uma defesa da obedincia cega, da mediocridade e da
acomodao.
No toa que muitos livros cujos autores afirmam se devotar cincia esprita no
passam, em uma leitura mais profunda, de textos para o proselitismo religioso kardecista. E
se lembrarmos que Jesus h dois mil anos em nenhum momento anunciou uma igreja, mas
o Reino de Deus e a necessria transformao interior, no faz sentido acreditar que ele
defendeu o Kardecismo como o nico consolador. Mesmo aps toda a mudana scio-
econmica, poltica, educativa e espiritual, sua mensagem continua a mesma: a
transformao interior que importa e no a embalagem externa. E como afirmou o Buda, as
doutrinas so meios e no fins. E o Kardecismo ao invs de se ver como mais um possvel
caminho para a salvao, se coloca como a prpria salvao, condenando todas as demais
alternativas como irracionais, supersticiosas, fascinadas, obsedadas etc.
O discurso kardecista carece de cientificidade. um discurso eminentemente
voltado para doutrinao e para fazer proslitos. Mas se queremos redirecionar o
Espiritismo para o campo cientfico necessrio, antes de tudo, discuti-lo
epistemologicamente. a discusso que procuraremos apresentar no prximo captulo.
Captulo II
A cincia esprita e sua cientificidade
Do ponto de vista epistemolgico, h
uma dicotomia entre fato e valor, quer dizer,
no h uma ponte de dedutibilidade entre
ambos: de um fato no se segue um valor;
tampouco de um valor se segue um fato. (...)
No obstante, na vida real, fato e valor no
se dissociam.
Hilton Japiassu. O mito da neutralidade
cientfica. P. 41.
Apesar de todas as evidncias, no temos ainda como afirmar, categoricamente, a
sobrevivncia e a eternidade da alma, ou afirmar que o fenmeno medinico , de fato, a
comunicao entre o plano material e o espiritual, e no uma psicopatologia. Para ns,
espritas, a reencarnao no uma teoria, um fato. Alis, ns no cremos em espritos.
Nos temos certeza que eles existem. Mas como (com)provar tudo isso cientificamente?
No basta dizer que a cincia esprita diferente da cincia materialista, pois ela
seria fruto da revelao dos espritos. S esse argumento no basta para se fazer cincia.
Por outro lado, os espritas precisam seguir o caminho contrrio ao dos marxistas. Se estes
ltimos queriam chegar ctedra para transform-la em plpito de pregao doutrinria, o
que, realmente, conseguiram fazer durante boa parte do sculo XX, o cientista esprita
necessita buscar a neutralidade cientifica como valor, no sentido weberiano, para que
consiga se ater a uma certa objetividade e se distinguir de suas derivaes empricas
(psiconomias) que so tambm seus objetos de estudo. O Espiritismo deve sempre se dirigir
razo. Seus derivados empricos (kardecismo, umbandismo e outros ismos) podem e
devem se dirigir ao corao.
Como afirma Hilton Japiassu, um dos significativos estudiosos da cincia
contempornea, mais fcil conceituar a cincia do que defini-la. Mas uma coisa parece
consenso, hoje em dia: no existe uma definio objetiva e, muito menos, neutra do que
cincia. Os conhecimentos ditos objetivos e racionalizados esto sempre engendrados pela
ambincia scio-cultural e histrica. por isso que a razo cientfica mutvel, histrica e
varivel. E mesmo as revelaes espirituais no so imunes ao tempo e s injunes do
contexto em que so transmitidas pela espiritualidade.
Vimos, no captulo anterior, que o preconceito eurocntrico de Kardec foi
respeitado pela espiritualidade. Sua obra est to impregnada pela mentalidade e pelo
imaginrio do homem europeu do sculo XIX, como todas as revelaes anteriores, seja na
poca de Buda, de Scrates, de Moiss, de Jesus ou qualquer outra. As revelaes so
sempre contextualizadas pela conscincia histrica de cada poca.
Em suma, em matria de cincia ou de revelao espiritual, no h objetividade
absoluta. A linguagem, os temas, os modelos de um conhecimento tcnico ou valorativo
so sempre o reflexo da imagem do mundo no qual se originaram. Em outras palavras, ela
uma interpretao sempre passvel de mudanas, pois sempre marcada pela cultura em
que se insere. E Kardec soube disso, pois sempre afirmou que o Espiritismo s surgiu no
momento em que a civilizao ocidental estava pronta para compreend-lo. Isso no quer
dizer, porm, que o Espiritismo deve se manter preso racionalidade do sculo XIX.
essa crena, arraigada no meio kardecista, que conduz facilmente mistificao e no o
contato medinico com espritos que desejam discutir outros assuntos diferentes daqueles
que integram os livros da codificao.
E se o Espiritismo no obra de um nico indivduo, nem a revelao miraculosa
feita pelos espritos, ele necessita do trabalho constante de vrios experimentos medinicos,
de onde surgem inovaes conceituais e teorias. Caber ao cientista esprita fazer escolhas,
correr riscos e adotar atitudes crticas. Mas isto deve ser feito com estudo srio e no com
pr-conceitos.
O cientista esprita aquele que consegue transitar por todas as disciplinas
espritas, ou seja, pela Umbanda, pelo Kardecismo, pelo Universalismo, pela Apometria
etc, estudando, pacientemente, seus mtodos e prticas medinicas, anotando os
conhecimentos que produzem para que, finalmente, possa apresentar, de forma reflexiva, os
resultados de sua pesquisa. Em suma, estudando e comparando as diferentes psiconomias,
poder produzir um saber inteligvel, porm, sempre falvel. Isto o Espiritismo.
Assim, cada uma das disciplinas espritas pode cooperar para a elaborao de uma
sabedoria espiritual (Psicosofia) que ajude o homem moderno a suprir sua alienao
anmica, sem desrespeitar a autonomia de cada disciplina. O conhecimento e as certezas
do Kardecismo bastam para o kardecista, assim como o conhecimento e as certezas da
Umbanda bastam para o umbandista. Mas, para o Homo spiritualis, sero tais
conhecimentos e certezas suficientes? aqui que o Espiritismo deve promover o discurso
do esprito sobre ele mesmo, e construir uma animagogia5 (educao espiritual) dialgica e
processual para o homem encarnado. O valor supremo da alma no pode surgir de um nico
ponto de vista. Deve sempre estar aberto s novas possibilidades de conhecimentos
objetivos e ticos.
Os pressupostos axiolgicos da cincia esprita foram apresentados por Kardec e
ainda permanecem vlidos. E, se do ponto de vista epistemolgico, o mais adequado, hoje
em dia, falar na existncia de prticas cientficas, no faz sentido as pessoas que orientam
a poltica cientfica no Brasil no aceitar o Espiritismo, pois este possui critrios que o
validam como uma prtica cientfica sobre a realidade espiritual. E tambm capaz de
formular tcnicas para a coleta de dados, para no ficar apenas no domnio da pura
especulao, como tambm constituir um corpo terico de contextualizao e construir seus
objetos cientficos.
O valor cientfico dos produtos intelectuais do Espiritismo evidente. E, se na
ordem do saber contemporneo, a atividade cientfica deve ser diversa do senso comum, da
percepo imediata, das atividades ideolgicas e isentas de achismos, o Espiritismo,
como campo de pesquisa, muito mais cientfico do que a Pedagogia e muitas das Cincias
Humanas hoje existentes.
Talvez o maior erro do Espiritismo foi crescer misturado ao kardecismo, um de seus
derivados empricos. Da mesma forma que o cientista da educao no deve se confundir 5 Alternamos, freqentemente, os prefixos anima e psique de propsito. Com o prefixo anima pretendemos realar a dimenso da alma encarnada, enquanto, com o prefixo psique, ressaltamos o esprito, ou seja, o ser desencarnado.
com o professor ou legitimar, ideologicamente, um ou outro sistema pedaggico, o cientista
esprita precisa colocar entre parnteses sua convico e participao em uma das diferentes
psiconomias existentes, caso contrrio, corre o risco de perder sua processualidade
cientfica e ficar o tempo todo fazendo pregao doutrinria, como fazem os marxistas.
Se, por definio, toda atividade cientifica encontra-se em estado de constante
inacabamento, ou seja, a produo cientifica acabada um absurdo epistemolgico, a
confuso kardecismo/Espiritismo dificulta o avano da cincia esprita.
No mbito cientifico, tudo objeto de discusso. Nem todo conhecimento
perenemente vlido. Todo critrio absoluto de verdade um absurdo do ponto de vista
cientfico. E por isso que a atividade cientifica baseia-se no campo frtil do pluralismo
conceitual. Um parmetro universal de objetividade mais adequado para proselitismo
religioso e no para se fazer cincia. por isso que quando alguns pesquisadores espritas
se questionam sobre a diviso clssica proposta por Kardec em pensar o ser humano como
tendo um corpo fsico, um perisprito e um esprito, os kardecistas entram em campo
fechando a discusso, afirmando que qualquer outra proposta seria no-doutrinria. Para
eles, se Kardec escreveu que so trs, so trs e ponto final. No importa se atravs da
clarividncia ou de outras tcnicas se descobriu outras dimenses. Tal dogmatismo no
pode ser chamado de cincia esprita.
E por que o Espiritismo ainda no obteve cidadania acadmica, se ele constri o seu
objeto cientfico seguindo, pari passu, o que defende a epistemologia contempornea?
Vejamos o que diz Japiassu no livro O mito da neutralidade cientfica:
O objeto real existe independentemente de nosso conhecimento,
quer pensemos nele quer no. Contudo, a cincia no se interessa pelo
objeto real em seu estado bruto. O objeto real s se torna objeto cientfico
quando for retirado de seu estado natural, vale dizer, quando for
construdo, elaborado, pensado por uma teoria, ou seja, enquadrado
por um ponto de vista terico. Em outras palavras, o simples acontecer
s atinge o nvel do conhecimento cientfico quando for reconstrudo
teoricamente. (p. 28)
No isso o que o Espiritismo faz em relao reencarnao ou mediunidade?
Aqueles que no acreditam nos argumentos espritas que devem provar, ou melhor, negar
a existncia da reencarnao ou provar que a mediunidade uma farsa.
Nesse sentido, quando um rgo de fomento pesquisa ou uma Faculdade impede
que uma pesquisa acadmica sobre tais assuntos seja realizada, est agindo com m-f e
impedindo o avano da cincia. Como justificar pesquisas sobre congelamento de corpos,
sobre marxismo, sobre contos de fadas e proibir uma pesquisa sobre reencarnao?
O Espiritismo universal como toda cincia e estuda as manifestaes espirituais
objetivas. Mas importante diferenci-lo do kardecismo para que possa adquirir sua real
cientificidade. O kardecismo objeto de estudo do Espiritismo e este no deve ser usado
para legitimar aquele.
O kardecismo pode anunciar profecias, dizer que o nico caminho para
favorecer a paz entre os homens, ser o consolador prometido pelo Cristo etc. O kardecismo
pode emitir juzos de valor que no so enunciados cientficos, o Espiritismo no.
Com tal diferenciao, as manifestaes espritas (ou causadas pelos Espritos)
podem se tornar, realmente, objetos cientficos. Mas quando o objetivo fazer proslitos,
ento o campo de atuao passa a ser o religioso, seja pelas vias do kardecismo, da
umbanda ou um outro qualquer, mas deixar de ser cientfico e, portanto, da esfera do
Espiritismo.
Foi por isso que, antes de afirmar que existem Leis que regem o intercmbio entre o
mundo visvel e o invisvel, Kardec procurou reunir um nmero significativo de evidncias
sobre a existncia de tal mundo invisvel. E hoje em dia elas so ainda em maior
quantidade. Porm, no foi o Espiritismo que as produziu. O Espiritismo as estuda.
Porm, hoje em dia, nenhum cientista acredita que a partir da experincia possvel
deduzir teorias e leis, como fez Kardec e toda a cincia newtoniana-positivista do sculo
XIX. As reflexes epistemolgicas contemporneas, sobretudo, a partir da teoria da
relatividade de Einstein, afirmam que a cincia uma construo. Ou seja, sem a ajuda
de um quadro terico formado por princpios e conceitos escolhidos subjetivamente, no
possvel fazer a observao. Em suma, a teoria define, anteriormente, o que pode ser
observado.
O que ocorreu tambm na obra de Kardec, mesmo que este no tenha percebido.
Kardec anunciou que um fato novo necessitava de conceitos novos, mas foram os seus
novos conceitos que lhe permitiram enxergar de outro ngulo um fenmeno arcaico e
rotineiro em todo o mundo. Foi a sua teoria que o ajudou a concluir que o intercmbio com
o mundo espiritual no possui nada de sobrenatural ou maravilhoso, sendo um processo
natural e regido por Leis tambm naturais.
Tal constatao, ao contrrio, no desmerece a obra de Kardec, mas a humaniza. O
que importante para podermos transcender o positivismo impregnado no Espiritismo de
Kardec, tornando-o ainda mais cientfico, ou seja, compreendendo que a cincia
processual e necessita da criao de categorias e conceitos explicativos, e que estes no so
estanques, mas histricos, pois um significado pode se esgotar ou se esvaziar com o tempo.
Esta conscincia histrica ajuda a desconstruir o racionalismo ingnuo, do tipo
positivista. fcil constatar que Kardec foi um Esprito criativo e anticonformista. Porm,
se o seu Espiritismo eminentemente lgico, ele carece de psicologia, sociologia e
antropologia cultural para ser, realmente, cientfico, abrindo-se, sem medo,
provisoriedade terica, to em evidncia na cincia contempornea.
A observao direta, fato considerado cientfico no sculo XIX, no to direta
assim. Como nos lembra o epistemlogo Japiassu, a expresso este copo dgua s na
aparncia uma observao direta e particularizada. Em sua essncia encontramos
implicados dois conceitos: copo (matria extensa) e gua (elemento lquido). Em suma,
toda observao decorre de um conhecimento terico anterior, que o prprio contexto
possibilitador da observao.
E qual foi o contexto onde Kardec fez suas observaes? Quais foram os conceitos
que ele tomou emprestado para observar os fatos espritas? Ser que a diviso trina
(esprito, perisprito e corpo fsico) proposta por Kardec d conta da interpretao de novos
fatos espritas surgidos no sculo XX? Todos esses pontos so temas para o cientista
esprita discutir, mas, por enquanto, podemos nos ater s leis descobertas por Kardec e
que continuam atuais. A primeira que:
Os Espritos no podendo responder seno sobre o que sabem,
segundo seu adiantamento, e, alm disso, sobre o que lhes permitido
dizer, porque h coisas que no devem revelar, visto que no dado,
ainda, ao homem tudo conhecer. (...) Sobre muitas coisas, ele no pode
dar seno sua opinio pessoal, que pode ser justa ou falsa. (...) Haveria,
pois, imprudncia e leviandade em aceitar sem controle tudo o que vem
dos Espritos (O.E., p. 122).
Tal constatao demonstra toda dificuldade que se impe na comunicao
medinica. No possvel confiar, cegamente, no que os Espritos falam. Muitos
kardecistas acreditam piamente que s os Espritos superiores se comunicaram com
Kardec e que, hoje em dia, qualquer novidade transmitida por Espritos mistificadores.
Curiosamente, o prprio Kardec no to ingnuo e afirma que no possvel
comprovar a identidade dos Espritos da codificao. No h como provar se foram
realmente Scrates, Fenlon, Napoleo etc. os Espritos que usaram tais nomes famosos em
suas comunicaes. Kardec no se cansou de dizer que os Espritos inferiores gostam de
tomar emprestado nomes conhecidos e reverenciados. Assim, mais importante o contedo
da mensagem e no o nome que o Esprito utiliza para se comunicar (L.E., p. 30).
Outra lei importante, anunciada por Kardec, foi a seguinte:
As comunicaes com os Espritos devem sempre ser feitas com
calma e recolhimento; no se deve jamais perder de vista que os Espritos
so as almas dos homens e que seria inconveniente deles fazer um jogo e
um objeto de divertimento. (...) Um outro ponto igualmente essencial a
considerar que os Espritos so livres; eles se comunicam quando
querem, com quem lhes convm e tambm quando podem, porque tem
suas ocupaes. Eles no esto s ordens e ao capricho de quem quer que
seja, e no dado a ningum faze-los vir contra a sua vontade. (...) do que
procede, resulta que toda a reunio esprita, para ser proveitosa, deve,
como primeira condio, ser sria e reservada, que tudo deve a se passar
respeitosamente, religiosamente, e com dignidade, se se quer obter o
concurso habitual dos bons Espritos. (...) Os bons Espritos vm nos
instruir para nossa melhoria e nosso progresso, e no para nos revelar o
que no devemos ainda saber, ou aquilo que no devemos aprender seno
pelo nosso trabalho. Se bastasse interrogar os Espritos para obter a
soluo de todas as dificuldades cientificas, ou para fazer descobertas ou
invenes lucrativas, todo ignorante poderia tornar-se sbio
gratuitamente, e todo preguioso poderia se enriquecer sem trabalhar.
(...) fora do que pode ajudar ao progresso moral, no h seno incerteza
nas revelaes que se podem obter dos espritos. (O.E., p. 124)
Se os Espritos revelam novas informaes apenas no tempo certo, quando o ser
humano, em tese, encontra-se preparado para compreender tais revelaes, significa que,
com o passar do tempo, novas revelaes podero ser feitas. Por que acreditar que o mundo
parou no sculo XIX? Quem conhece um pouco da histria do kardecismo no Brasil sabe
da polmica gerada pela obra Nosso Lar, do Esprito Andr Luiz, psicografado por Chico
Xavier. Durante muito tempo gerou celeuma por apresentar a erraticidade dos Espritos
de uma forma nada errante, atravs de colnias planejadas e gerenciadas, onde se estuda,
trabalha, h alimentao, transporte, hospitais etc. At hoje se encontra na internet artigos
kardecistas afirmando que tudo no passou de animismo de Chico Xavier, pois nada
disso se encontra nas obras bsicas da codificao. A impresso que se tem que alguns
kardecistas se agarram obra de Kardec como algumas seitas se agarram ao Antigo
Testamento, difundindo uma mentalidade neofbica, assustadora e intolerante.
Porm, em suma, se no podemos acreditar cegamente em tudo o que os Espritos
dizem, tambm no devemos ser to paranicos e negar tudo, aceitando apenas o que se
encontra nos livros de Kardec, como se eles fossem o registro da Verdade absoluta. Alis,
at os livros de Kardec j sofrem censura, como tivemos oportunidade de salientar.
por isso que no podemos perder de vista, como afirmou Kardec:
O Espiritismo est fundado sobre a existncia dos Espritos, mas
os Espritos, no sendo outros que as almas dos homens, desde que h
homens, h Espritos; o Espiritismo no o descobriu, nem os inventou. Se
as almas ou Espritos podem se manifestar aos vivos, por que isso est
na natureza, e desde ento deveram faz-lo de todos os tempos. (O.E., p.
187)
Em suma, toda manifestao de Espritos, seja qual for o meio escolhido, esprita,
independente de concordarmos com o seu contedo ou no. O mximo que podemos fazer
interpretar tal contedo. E, no campo da moral, o que o Espiritismo impe pela
constatao, o seguinte:
A necessidade da prtica do bem e de no fazer o mal. uma
cincia de observao que, repito-o, tem conseqncias morais, e essas
conseqncias so a confirmao e a prova dos grandes princpios da
religio; quanto s questes secundrias, ele as deixa conscincia de
cada um. (O.E., p. 94)
Ou seja, a pessoa que descobre que a vida no se extingue com a morte fsica passa
a ser mais cuidadosa em seu cotidiano, passa a se relacionar com outras pessoas de uma
forma mais solidria e compreensiva. O Espiritismo realiza, atravs do estudo, o que
muitas vezes a Experincia de Quase Morte (EQM) realiza atravs da dor. Quantas pessoas
que retornam de tais experincias vivenciam uma verdadeira metania, transformando-se
completamente e dando muito mais valor vida e aos relacionamentos solidrios. No
podemos nos esquecer tambm da prtica chinesa que relatamos em nosso livro Dharma-
Reiki chamada Hsuan Hsueh em que o discpulo preparado para uma viagem astral
consciente. Aps o seu retorno ao mundo fsico, transforma, normalmente, sua forma de
encarar a vida e passa a tomar mais cuidado com os seus atos para no prejudicar as
pessoas.
No toa que a mxima moral de Kardec fora da caridade no h salvao
(O.E., p. 106). Em nenhum momento ele fala que fora do Espiritismo no h salvao. E
nem fala como deve ser a prtica do bem. Assim, porque seria no-doutrinrio praticar o
bem atravs do Reiki, da Cromoterapia, da Apometria ou de qualquer outra tcnica
espiritual, anmica ou medinica? Se elas so prticas que envolvem a espiritualidade,
sobretudo o Reiki e a Apometria, elas so, necessariamente, espritas. Se elas s acontecem
devido presena da equipe socorrista formada por mdicos desencarnados, so formas de
caridade eminentemente espritas. Talvez no sejam kardecistas, mas a um outro assunto.
Devemos nos lembrar que o Espiritismo, como afirmou Kardec:
No descobriu nem inventou os Espritos, nem descobriu o mundo
espiritual, no qual se acreditou em todos os tempos; somente ele o prova
por fatos materiais e o mostra sob sua verdadeira luz, livrando-o dos
preconceitos e das idias supersticiosas que engendram a dvida e a
incredulidade. (O.E., p. 149)
Assim, quem somos ns para julgar quais so as formas, tcnicas ou a aparncia
perispiritual que os Espritos podem utilizar para praticar a caridade. Por exemplo, muitas
casas espritas no permitem a manifestao de entidades indgenas nuas ou vestidas, de
orientais com turbantes na cabea etc. Este fato, puro preconceito kardecista, no um
axioma da cincia esprita. Ao contrrio, o verdadeiro cientista esprita ir estudar tais
manifestaes singulares, pois sabe que o mundo espiritual no formado apenas por
filsofos, padres e mdicos.
E, ao que se refere a alguns fatos espirituais polmicos, ou que tendem ao
fantasioso, mas que no podem ainda ser explicados pelo Espiritismo, Kardec mais uma
vez mostra seu bom-senso e coerncia:
No nos apressemos, entretanto, em rejeitar a priori tudo o que
no compreendemos, porque estamos longe de conhecer todas essas leis, e
que a Natureza no nos disse ainda todos os seus segredos. O mundo
invisvel um campo de observao ainda novo, do qual seria presuno
pretender haver sondado todas as profundezas, ento que novas
maravilhas se revelam sem cessar aos nossos olhos. (O.P., p. 76)
Com base nessa afirmativa, ser que Kardec agiria como os kardecistas em relao
s entidades indgenas, Transcomunicao Instrumental ou Apometria, taxando tudo a
priori de impureza doutrinria? Ou no mediria esforos para estudar tais fatos espritas?
O cientista esprita sabe que a questo da identidade (do Esprito comunicante) ,
por todos os ttulos, secundria, e haveria puerilidade a isso ligar importncia, como
afirmou Kardec. Porm, no mediunismo kardecista, nem sempre tal recomendao levada
a srio. Quantos no so os dirigentes que impedem que uma entidade que se manifesta
como ndio ou como um ex-escravo possa dar sua mensagem? H locais que apenas
aceitam receber mensagens de espritos que se identificam como mdicos, literatos,
filsofos, padres etc. Tal prtica no encontra justificativa na obra de Kardec. Alm disso,
como o Espiritismo cincia, deve ser objeto de estudo a comunicao de tais entidades. E
como afirmou Kardec, os espritos falam sobre todos os assuntos que interessam
humanidade. E este um outro ponto importante que diferencia o Espiritismo do
kardecismo. Neste ltimo, na maioria dos casos, os Espritos s podem confirmar o que
todos j sabem para no ferir a pureza doutrinria.
E a bacia semntica do Espiritismo? Ela deve ser confinada ao sculo XIX para ser
doutrinria? claro que no. Kardec no afirma que para os espritos superiores a idia
tudo, e a forma no nada? E que dentro de uma mesma cincia pode haver vrios
sistemas? (O.P., p. 33 e 34). A lngua se atualiza, assim como os conceitos e os sistemas.
Em suma, enquanto o kardecista v tudo o que no conhece como no-
doutrinrio, o cientista esprita v em todas as manifestaes medinicas novas luzes e as
estuda sem pr-conceitos. Possivelmente, Kardec ao afirmar que h pessoas que
encontram perigo por toda a parte e em tudo que no conhecem, estava profetizando o
que aconteceria no seio do kardecismo, a religio derivada de sua profunda obra cientfica e
filosfica.
Em resumo, o objetivo da cincia esprita estudar a realidade espiritual e a
mediunidade naquilo que elas so e no naquilo que gostaramos que elas fossem,
deturpando os fatos em favor de certos interesses doutrinrios.
Captulo III
O reiki sem mistificao
Ningum pode destruir esta verdade: Deus est
dentro de voc. Saiba descobri-Lo e ter
conquistado a felicidade.
Pastorino
Pedi e se vos dar; buscai e achareis; batei
porta e se vos abrir; pois todo aquele que pede,
recebe, e quem procura acha e se abrir quele
que bater porta.
So Matheus (7:7 a 11)
Mas pedi sinceramente, com f, fervor e
confiana; apresentai-vos com humildade e no
com arrogncia, sem o que sereis abandonados s
vossas prprias foras, e as quedas que sofrereis
sero a punio de vosso orgulho. este o
sentido destas palavras do Cristo: buscai e
acharei, batei e se vos abrir.
Evangelho segundo o espiritismo
Por isso vos digo: das riquezas de origem
inqua fazei amigos, para que, quando estas vos
faltarem, os amigos vos recebam nos
tabernculos eternos.
Jesus
Este captulo foi organizado a partir das respostas obtidas com a espiritualidade que
atua na ONG Crculo de So Francisco, entre os anos de 2002 e 2005. At onde sabemos,
atuam na casa as seguintes correntes espirituais: as indgenas, os pretos-velhos, as crianas,
as entidades mdicas (muitas so mentores da chamada Associao Mdico-Esprita), e trs
linhas de espritos orientais (uma do extremo oriente, uma da ndia e outra representando,
simbolicamente, os antigos povos Persas6). Atualmente, o trabalho teraputico da ONG
tem se pautado na oferta de quatro servios complementares: o ensinamento e aplicao de
Reiki, as aulas de Yoga, a difuso do Kefir, um cogumelo de origem tibetana importante
para regularizar o funcionamento dos intestinos, e cursos para o cultivo de plantas
medicinais.
Fomos orientados para procurar organizar as informaes abaixo na forma de
perguntas e respostas, o que facilita a compreenso do leitor. o mtodo adotado nos livros
de Ramats e de muitos outros autores espirituais, alm do prprio Livro dos Espritos,
escrito por Kardec.
A ordem estabelecida para a apresentao das questes no representa,
necessariamente, a ordem em que as perguntas foram feitas espiritualidade.
Devemos lembrar que tais respostas, obtidas na ONG, foram tambm confirmadas
pela espiritualidade que atua em outras casas, aumentando, assim, nossa confiana de que
atravs da gratuidade e da preocupao com o aprimoramento espiritual que o Reiki deve
ser difundido, sem mistrios, mistificaes e charlatanismos.
Pergunta 01 necessrio ser sintonizado no Reiki para se enviar boas energias e auxiliar
na recuperao de enfermos?
Resposta - Para se enviar energia so necessrias trs coisas: o pensamento elevado, a
vontade de ajudar o prximo e o amor desinteressado. Todo o resto instrumento ou
muletas criadas pelos homens, em todos os tempos, para auxiliar neste processo. Poucos
6 Segundo alguns videntes, estes espritos so negros, altos e usam um pequeno chapu de forma ovalar e um manto colorido que desce dos ombros at os ps. Segundo uma entidade indgena, so espritos que no encarnam mais na terra e trazem os remdios e os instrumentos que necessitam diretamente do mundo espiritual, sem precisar manipular as formas etricas dos elementos da terra, como fazem nossos irmos indgenas.
esto preparados para acreditar no poder mental que possuem. Poucos sabem que a mente
uma poderosa usina. Poucos sabem que possvel direcionar nossa energia para diferentes
fins, inclusive ajudar na cura de um irmo enfermo, desde que este tenha o merecimento
para ser curado atravs da imposio das mos, pois nenhuma tcnica, incluindo o Reiki,
capaz de transcender a Lei do carma e o livre-arbtrio.
Todos, cristos ou no, sabem que a plantao livre, mas a colheita ser sempre
obrigatria. O que no significa que Deus seja punitivo, apenas que existe uma verdadeira
justia csmica regendo o universo.
A energia utilizada no Reiki a mesma que o ser humano, nas mais diferentes e
distantes culturas e civilizaes, aprendeu a manipular, dando nomes diferentes e utilizando
formas distintas para tanto. Assim, o que menos importa o nome da tcnica. Porm, todas
sempre funcionaro quando apresentar as trs condies bsicas: pensamento, vontade e
amor.
Pergunta 02 A cada dia aparecem novas pessoas dizendo que canalizaram smbolos.
Muitos so patenteados, inclusive. Mas pelo exposto, eles no seriam, ento, necessrios?
Resposta Esse processo que voc descreve fruto do orgulho e do egosmo humano.
Deus no pra de criar um s segundo e nunca repete uma s criao. E, apesar disso, ele
nunca assinou nenhuma de suas criaes. S o homem orgulhoso e egosta pensaria em
patentear um smbolo que canalizou. Esse smbolo pode, de fato, ter existido no passado
e a pessoa, em um estado ampliado de conscincia, obtido atravs da meditao, pode
acessar este smbolo criado em algum tempo remoto. A prpria pessoa pode ter utilizado tal
smbolo em alguma encarnao, em algum ritual da comunidade em que viveu. Voc
mesmo no via o crucifixo de So Damio7, mesmo sem o conhecer na atual encarnao?
Como j dissemos, no passado, o homem criava instrumentos que o auxiliavam a
manter seu pensamento concentrado e canalizar sua vontade. Mas hoje, com a evoluo
7 O esprito comunicante se refere ao crucifixo bizantino que ornava a capela de Assis, onde So Francisco teve suas primeiras revelaes espirituais. Durante muito tempo vi tal crucifixo em minha mente, sem saber o que o mesmo significava. Quando soube que eu j havia sido um franciscano, por volta do sculo XVI, e ao descobrir que a imagem mental que eu via representava um cone franciscano, nunca mais a vi.
mental e moral j alcanada, pode prescindir de tais elementos grficos, principalmente,
quando utilizados para charlatanismo e mistificao.
Pergunta 03 E os canalizadores que afirmam que foram seres de outros planetas, que
foram extraterrestres que lhe transmitiram os smbolos e que os mesmos lhes falaram para
no divulg-los para qualquer pessoa, pois seria muito perigoso, transformando, assim, o
smbolo em uma mercadoria cara e disputada, avidamente, pelos adeptos das seitas Nova
Era?
Resposta Para aquele que paga, h sempre aquele que vende. O charlatanismo s existe
porque ainda h pessoas que gostam de ser enganadas. Se o canalizador tem essa vontade
de canalizar um smbolo que o possa tornar famoso, que d para ele criar um novo
sistema de Reiki e, alm disso, ganhar dinheiro comercializando o smbolo, tudo isso far
com que ele atraia para o seu lado conscincias desencarnadas zombeteiras ou
mistificadoras. No ao acaso que vo aparecer seres de altssima evoluo espiritual,
afirmando serem de outros planetas, com formas bizarras como lagartos e outros bichos, e
vo transmitir ao canalizador smbolos com nomes apropriados para filmes de fico
cientfica e vo dizer, obviamente, para ele guardar o smbolo com muito cuidado.
Vo dizer, para estimular a vaidade do mdium, que so smbolos valiosos e que
servem para curar cncer ou outras doenas que, se no podemos afirmar que so
incurveis, podemos garantir que, dependem, sobretudo, do merecimento do paciente. Sem
a reforma ntima, tais enfermidades, que so as colheitas dos erros do passado, no so
curadas.
As toxinas astrais que as originam s podem ser drenadas a partir do Amor ou da
Dor, quando so, ento, drenadas para o corpo fsico na forma de graves enfermidades. Por
isso no importa se o smbolo foi transmitido por Buda, dr. Lagarto, Saint-Germain,
Jesus ou outro esprito que diz ter vindo de Srius ou de Jpiter... A toxina ser drenada
pelo suor do trabalho amoroso ou pela dor da expiao.
E por que dizem que so smbolos valiosos? Porque servem para a mistificao,
para estimular o orgulho e o egosmo do mdium invigilante que o canalizou. Jesus e So
Francisco usaram algum smbolo para curar? No. Eles usavam apenas o grande poder
mental que possuam e contavam com o amparo da espiritualidade superior.
Pergunta 04 - Mas por que ao mentalizarmos um dos smbolos do Reiki, automaticamente,
sentimos a energia fluindo e se dirigindo para o paciente? Esse fenmeno sensorial no
seria um indcio de que os smbolos funcionam?
Resposta Em nenhum momento falamos que os smbolos no funcionam. O que estamos
comentando que no h necessidade de sintonizao como vocs fazem nos cursos de
Reiki, com tantos apetrechos esotricos e rituais. No fundo, ser sempre a vontade, o
pensamento e o amor que esto agindo na movimentao da energia. A vontade, o
pensamento e o amor antecedem o desenho do smbolo.
Vamos esclarecer como funciona a comunicao entre o esprito (mente) e o
crebro. Em primeiro lugar, vocs devem saber que o ser humano no pensa atravs de
palavras. E, para se transmitir uma idia, o ser humano necessita converter o seu
pensamento em um sistema de cdigos. Este sistema pode ser na forma de sinais ou
imagens simblicas, como no caso do Reiki e de tantas outras prticas orientais, ou na
forma de palavras, que tambm so smbolos8.
Em qualquer um dos casos, para funcionar, necessria a decodificao, ou seja, a
interpretao da mensagem. por isso que a pessoa que no conhea o smbolo e no saiba
para que o mesmo funciona, no vai sentir nada, no vai enviar energia. Ele no tem ainda a
chave para decodificar a mensagem. Seu crebro e seu subconsciente no sabem
decodificar o smbolo. Ao contrrio, o iniciado vai movimentar sua energia vital, sua
bioenergia, porque associou ao smbolo, imagem grfica, uma funo. Ou seja, ele sabe
que ao desenhar um determinado smbolo ele deve dar um comando inconsciente para o seu
duplo-etreo liberar a energia. Ele est substituindo a palavra por um outro smbolo, por
uma imagem.
8 No texto tcnica de comunicao esprita, de Herminio C. Miranda, este pesquisador nos informa que: Se o pensamento deve ser expresso em palavras h que fazer a escolha da lngua; se for em imagens, preciso decidir quanto forma, cor, ao tamanho e ao processo de divulgao. E dessa mesma forma que os smbolos do Reiki funcionam.
Pode acontecer tambm da pessoa j ter entrado em contato com aquele smbolo em
outra encarnao. Da, apesar de no se lembrar, ele est gravado em seu perisprito. Assim,
mesmo sem ter passado por um ritual inicitico, a energia ser liberada quando desenhar o
smbolo, pois sua mente inconsciente ou seu subconsciente aprendeu, no passado, como
decodificar a mensagem.
Agora, mesmo o iniciado no Reiki, que passou pelo ritual inicitico, que aprendeu
os infinitos sistemas de Reiki, mas que desenha os smbolos sem se concentrar e sem
vontade, no ir manipular nenhuma energia. Nada ir acontecer.
A criao de smbolos uma forma de codificao. E como o ser humano ainda no
capaz de viver sem smbolos para se comunicar, eles so muito teis. E qualquer um pode
criar um smbolo e, se for do tipo malandro, correr para patentear e inventar uma histria
bem mistificadora para ganhar um bom dinheiro com o seu smbolo sagrado.
Como j salientamos, no Oriente, esta sabedoria de como a comunicao funciona
milenar. E o homem ocidental descobriu isso, recentemente. No se diz que uma imagem
vale mais do que mil palavras? A decodificao de