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O SANEAMENTO E AS PROVAS DA INCAPACIDADE LABORAL
Prof. José Roberto Sodero Victório
Advogado
Pesquisador Internacional da Universidade de Salerno –
Itália e da Universidade UMSA de Buenos Aires
Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais
Mestre em Ciências Ambientais
Pós-Graduado em Direito Empresarial
Professor de Doutorado e Mestrado da UMSA de Buenos
Aires
Coordenador de Pós-Graduação
Professor de Graduação e Pós-Graduação
Especialista em: Direito do Trabalho, Processo do
Trabalho, Direito Previdenciário, Direito Administrativo
Membro do “Obsservatório sui Diritti Umani: Bioetica,
Salute” – Itália e da Sociedade Brasileira de Acústica
IntroduçãoA incapacidade laboral do trabalhador econseqüentemente do segurado da Previdência Social étema necessário de qualquer debate em torno do Direitodo Trabalho e do Direito Previdenciário, mormentequando se ensaia um modelo de reforma previdenciáriaque privilegiará uma aposentadoria por idade, distantedo alcance do trabalhador brasileiro. Este trabalhobusca trazer um ponto de vista sobre a prova dobenefício por incapacidade e seu saneamento pelo juiz,estabelecendo com clareza sempre o objeto da perícia.
Os benefícios por incapacidadeOs benefícios por incapacidade passarão a sermais freqüentes porque a possibilidade de maistempo dedicado ao trabalho em um País cujareforma trabalhista diminui condições detrabalho e privilegia o capital, será propulsorpara que o trabalhador acabe se tornando umdoente em potencial.As doenças de natureza física agregadas àquelasda natureza psíquica ou psiquiátrica serão a meuver o grande desafio epidemiológico laboral daspróximas décadas.
As notícias mais freqüentes veiculadas na mídia e pelospróprios relatos dos segurados é que o INSS tem seposicionado no sentido de conceder altasindiscriminadas ou pouco avaliadas tecnicamente,assim como a não concessão de benefícios porincapacidade, sob um falso fundamento de fraudesprevidenciárias, tudo isso com um vistoso intuitoeconômico-financeiro de redução de pagamento debenefícios previdenciários.
Certamente não defendemos que os benefíciospor incapacidade sejam concedidosindiscriminadamente, mas é óbvio que não sepode defender a concessão de altas ou nãoconcessões de benefícios por incapacidade porsimples critério econômico-financeiro.
Soma-se a isso a pouca ou quase nenhumaespecialidade dos peritos do INSS ou na suadesignação para a avaliação das mais diversaspatologias e da própria avaliação do meioambiente do trabalho.
A perícia previdenciária administrativaA realização da perícia previdenciária administrativa,portanto, esbarra nos limites da competência técnica dospróprios peritos do INSS e também na conduta da autarquiaprevidenciária de, sob o falso fundamento da fraude, deliberarpor altas e não concessões de benefícios por incapacidade deforma ilegal e abusiva.Se do ponto vista administrativo esbarramos nas dificuldadescriadas pelo INSS nos resta à busca do processo judicialprevidenciário. E lógica e necessariamente ocorrerá arealização da prova ou provas da incapacidade laboral.
A perícia judicial por incapacidade. Provas esaneamento.Normalmente quando nos deparamos com a necessidadeda prova da incapacidade sabemos da necessidade daperícia judicial médica e por muitas das vezes (euentendo que deveria ocorrer na totalidade das vezes)da vistoria no local de trabalho.Portanto, necessário além da constatação da incapacidade– aqui entendo incapacidade de um modo geral – averificação de que a aludida incapacidade impeça osegurado do exercício de sua atividade laboral, ou seja, éabsolutamente necessária a vistoria do local de trabalho,obrigação essa quase nunca observada tanto pelo INSS,quanto pelos advogados dos segurados, juízes e peritos.
É verdade que podemos lançar mão, no caso das
chamadas doenças ocupacionais, do Nexo Técnico
Epidemiológico Previdenciário, o NTEP, previsto na
legislação previdenciária. Vejo este aspecto
importantíssimo da prova, às vezes deixado de lado pelo
advogado do segurado.
A lista C do Anexo II do Regulamento traz uma relação
causal presumida entre a Classificação Internacional de
Doenças – CID 10 e a Classificação Nacional de
Atividades Econômicas – CNAE do empregador do
segurado, sendo certo que na intersecção dos dados da
doença e da CNAE se chega à conclusão primária de
existência ou não do nexo causal.
F40-F48
0710 0990 1311 1321 1351 1411 1412 1421 1532 2945 3600 4711 4753 4756
4759 4762 4911 4912 4921 4922 4923 4924 4929 5111 5120 5221 5222 522
3 5229 5310 6110 6120 6130 6141 6142 6143 6190 6311 6422 6423 8011
8012 8020 8030 8121 8122 8129 8411 8423 8424 8610
Assim, por exemplo, no caso de um segurado portador dereações aos stress graves ou transtornos de adaptaçãoclassificados na CID10 como F43, os segurados que sãoempregados de empresas classificadas na CNAE teriam oNTEP configurado, conforme a lista C, abaixo apontada:Vejamos alguns exemplos de CNAE para o caso da CID10F43:CNAE 8012 – Serviços de transportes de valoresCNAE 6190 - Serviços de instalação e manutenção de linhasde telefones públicosCNAE 5111 - Serviços de transporte aéreo de passageiros
Que prova deve-se fazer nestecaso? A prova do registro dosegurado na empresa e acaracterização da empresa naCNAE. A prova da relaçãoempregatícia se faz com a Carteirade Trabalho e Previdência Social –CTPS e a prova da CNAE daempresa, através do seu CNPJ.Vejamos um exemplo:
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
CADASTRO NACIONAL DA PESSOA JURÍDICA NÚMERO DE INSCRIÇÃO
02.012.862/0001-60
MATRIZ
COMPROVANTE DE INSCRIÇÃO E DE SITUAÇÃO
CADASTRAL
DATA DE ABERTURA
09/07/1986
NOME EMPRESARIAL
TAM LINHAS AEREAS S/A.
TÍTULO DO ESTABELECIMENTO (NOME DE FANTASIA)
LATAM AIRLINES BRASIL
CÓDIGO E DESCRIÇÃO DA ATIVIDADE ECONÔMICA PRINCIPAL
51.11-1-00 - Transporte aéreo de passageiros regular
E a prova da doença? A doença se provaatravés de várias formas, dentre elas oatestado médico:
Ou a apresentação de um relatóriomédico, que se trata de umdocumento mais completo. Veja oexemplo:
Não se pode esquecer, da prova da medicaçãoofertada ao segurado, eis que em algumasvezes o próprio medicamento propicia aincapacidade do segurado. Neste caso,importante observar na bula domedicamento os efeitos colaterais que podemser impeditivos para o exercício da atividadelaboral.Vejamos o exemplo:
Referência
RivotrilApresentação de Rivotril (clonazepam)Formas farmacêuticas, vias de administração e apresentações Comprimidos de 0,5 mg ou 2 mg. Uso oral. Caixa com 20 ou 30 comprimidos. Comprimidos sublinguais de 0,25 mg. Uso oral. Caixa com 30 comprimidos. Gotas de 2,5 mg/mL (1 gota = 0,1 mg). Uso oral. Frasco com 20 mL.
Advertências
Considerando que Rivotril® causa depressão do SNC, os pacientes que estão
recebendo esta droga devem ser advertidos quanto a realizar ocupações perigosas que
requerem agilidade mental, como operar máquinas ou dirigir veículos. Também
devem ser advertidos sobre o uso concomitante de álcool ou outras drogas
depressoras do SNC durante a terapia com Rivotril® (vide item Interações
medicamentosas).
Em alguns estudos, até 30% dos pacientes apresentaram perda da atividade
anticonvulsivante, freqüentemente dentro de três meses iniciais da administração.
Em alguns casos, o ajuste de dose pode restabelecer a eficácia.
Quando usado em pacientes nos quais coexistem vários tipos de distúrbios
epilépticos, Rivotril® pode aumentar a incidência ou precipitar o aparecimento
de crises tônico-clônicas generalizadas (grande mal). Isso pode requerer a adição
de anticonvulsivantes adequados ou um aumento de suas dosagens. O uso
concomitante de ácido valpróico e Rivotril® pode causar estado de mal de
ausência.
Recomenda-se realizar exames de sangue periódicos e testes da função hepática
durante a terapia a longo prazo com Rivotril®. (....)
A outra questão relacionada à prova da incapacidade está associada
às provas técnicas, ou seja, à constatação da própria doença, sua
etiologia, sua evolução, sua relação de causalidade. Neste caso,
observo que a maioria dos segurados está impossibilitada de ter
acesso a um assistente técnico – o que seria imensamente
importante, senão necessário, neste caso, médico e/ou engenheiro de
segurança, ante a inviabilidade do pagamento dos honorários destes
profissionais. Fato é que o advogado, nestes casos, ficará
responsável pela quesitagem inicial, suplementar e complementar,
acompanhamento de perícias e impugnação do laudo pericial. O que
se questiona aqui é com que suporte o advogado fará estas
intervenções, já que as especialidades periciais estariam, em tese,
fora da sua zona de competência?
O Novo Código de Processo Civil nasceu com uma importânciaimensurável quando trata da perícia judicial: privilegiou atecnicidade!! Não há mais espaços para os achismos, as ausênciasde respostas conclusivas, a nomeação de peritos não experts noobjeto da perícia!!Se esta é uma verdade, obriga-se o advogado – ainda mais quandonão conta com a assessoria do assistente técnico – a operar deforma a conhecer tecnicamente sobre a incapacidade dosegurado e toda a gama de origens, evoluções, diagnósticos eprognósticos de diversas patologias. E esse apoio somente se dáatravés de documentação científica que confirme a tese jurídicadefendida sobre a incapacidade laboral.
Vejamos, pois um exemplo de um caso fictício em que se estaria envolvendo distúrbios do ombro e a atividade laboral. Veja que neste caso poder-se-ia utilizar material técnico, extraído do site Scielo,de uma Publicação da Revista Brasileira de Epidemiologia[1]:
[1] http://www.scielosp.org/scielo.php?script=sci_abstract&pid=S1415-790X2005000200009&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
Revista Brasileira de Epidemiologia
versão impressa ISSN 1415-790X
Resumo
MENDONCA JR., Hélio Pires de e ASSUNCAO, Ada Ávila. Associação entre distúrbios do
ombro e trabalho: breve revisão da literatura. Rev. bras. epidemiol. [online]. 2005, vol.8, n.2,
pp.167-176. ISSN 1415-790X. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-790X2005000200009.
Este artigo apresenta os resultados de uma breve revisão da literatura focalizada nos distúrbios do ombro. As
publicações foram pesquisadas nos sites do Medline, Ovid, Lilacs e periódicos Capes, no período de janeiro de
1993 a julho de 2004, com as seguintes palavras-chave: shoulder pain, rotator cuff, job, dor no ombro, manguito
rotador, trabalho. Foram selecionados os artigos de acordo com os seguintes critérios: estudo epidemiológico
publicado em inglês, português ou espanhol, com informações sobre a carga física ou sobre os fatores psicossociais
do trabalho, explicitação do método de avaliação da exposição, presença de dor no ombro ou tendinopatia do
manguito rotador. Vinte artigos preencheram todos os critérios de inclusão. Encontrou-se associação positiva entre
os distúrbios do ombro e o trabalho praticado pelos sujeitos dos estudos revisados.
Palavras-chave : Dor no Ombro; Manguito Rotador; Trabalho.
Esse apoio técnico é importante para fazer
uma análise da patologia, elaboração de
quesitos, obrigando o perito judicial a se
manifestar sobre os artigos científicos
utilizados, até mesmo por conta da alta
especialização de seus autores. Com a
juntada de material técnico-científico de
apoio, já não se trata mais um leigo –
leia-se advogado – articulando nos autos
sobre uma ciência que não é da sua
especialidade, mas fundamentando sua
tese em materiais científicos capazes de
auxiliar e até de confrontar o perito
judicial.
Aliás, ante a tecnicidade impressa pelo novo CPC no âmbito da perícia judicial é absolutamente necessário que o Juiz saneie corretamente o processo, quanto à prova pericial, antes de encaminhá-lo ao perito. Urge observar que o artigo 465 do CPC determina que o juiz nomeará perito especializado no objeto da perícia. Assim, há a necessidade do saneamento estabelecendo os limites do objeto da perícia antes de nomear o perito especializado naquele objeto.
Apenas como exemplo, seria o caso do juiz em um processo que se busca a concessão de um auxílio-doença previdenciário e não acidentário, deixar claro ao perito que não há necessidade de realizar nexo de causalidade entre a doença e a atividade laboral, limitando-se à constatação da patologia e a verificação se ela é incapacitante ou não para a atividade habitual do segurado. Com isso evitam-se digressões desnecessárias e garante a objetividade da prova pericial, até mesmo porque como explicita o CPC, évedado ao perito ultrapassar os limites de sua designação, bem como emitir opiniões pessoais que excedam o exame técnico ou científico do objeto da perícia.
Novos e inúmeros são os desafios aos que
labutam no Direito Previdenciário, os
benefícios por incapacidade também o são,
mas.....