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Análise das mudanças na área de tratamento de doenças mentais na cidade de Salvador, Bahia, Brasil.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAFACULDADE DE COMUNICAÇÃO
COMUNICAÇÃO E ATUALIDADE IIDOCENTE: SIMONE BORTOLIERO
O TRATAMENTO DA SAÚDE MENTAL EM SALVADOR:Uma análise da realidade local a partir da experiência dos CAPS
ADRIANA SANTANA
CAIO AMARAL
GILDÁSIO JÚNIOR
KARINA RIBEIRO
MARÍLIA DE MOURA
SALVADOR
2010
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1. INTRODUÇÃO
Tendo em vista a pouca divulgação de informações sobre saúde mental e tratamento
de tais doenças em Salvador, o grupo da disciplina Comunicação e Atualidade II, da
Faculdade de Comunicação da UFBA, decidiu se aprofundar nesse tema como trabalho final
do semestre 2010.1 e refletir sobre a situação atual da saúde pública, especificamente na área
de saúde mental em Salvador.
Primeiro, tentou-se entender o conceito de saúde mental, e o que seriam os transtornos
que a afetam e por que. Percebendo as diferenças entre o que seriam as doenças clínicas e o
que seria a “loucura”, no sentido de diferenças na sociedade.
Entendendo esses conceitos, pode-se avaliar a história dos tratamentos dessas doenças
mentais no Brasil, desde o seu início tardio em relação aos outros países, como quanto às
formas desumanas como eram realizadas. Chegando a uma situação atual onde o principal
objetivo dos tratamentos é a reinserção social dos pacientes, pois se considera que eles não
são inválidos para a sociedade como foi acreditado por tanto tempo.
Tomando Salvador como exemplo dessa nova política adotada oficialmente desde
2001, com a promulgação da Lei Paulo Delgado 10.216 pelo governo federal, e executado
pelos governos municipais e estaduais, pode perceber pontos positivos e negativos do sistema,
assim como os desafios que precisarão ser resolvidos para que esses pacientes possam ser
tratados de forma mais humana e para que sejam reinseridos em seus ambientes familiares,
profissionais e sociais.
O trabalho, através de entrevistas realizadas pelo grupo com a coordenadora do
programa de saúde mental da secretaria municipal de saúde de Salvador, Célia Rocha, com a
psicóloga Irene Demouliere, da CAPS Prof. Luis Meira Lessa, e se baseando em documentos
oficiais do Ministério da Saúde, faz uma análise da rede de serviços de tratamento de doenças
mentais oferecidas em Salvador pelo poder público.
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1. SAÚDE MENTAL
Para tratar das questões relacionadas à Saúde Mental, como pretendemos neste
trabalho, se faz necessário traçar inicialmente definições e conceitos pertinentes ao tema e que
por vezes podem trazer alguma confusão.
Antes, porém, vale ressaltar a própria definição de saúde admitida pela OMS
(Organização Mundial de Saúde) que serve como princípio básico das discussões acerca deste
campo social. Assim, de acordo com A publicação datada de 1997 da Revista de Saúde
Pública da Universidade de São Paulo (USP), “a Organização Mundial de Saúde define saúde
não apenas como a ausência de doença, mas como a situação de perfeito bem-estar físico,
mental e social.”
Partindo dos preceitos referidos, pode-se perceber que, quando se trata de transtornos
mentais, deve-se considerar o caráter subjetivo para além dos sintomas e quadros clínicos. De
acordo com Michel de Foucault:
A loucura, porém, não está somente ligada às assombrações e os mistérios do mundo,
mas ao próprio homem, às suas fraquezas, às suas ilusões e a seus sonhos,
representando um sutil relacionamento que o homem mantém consigo mesmo. Aqui,
portanto, a loucura não diz respeito à verdade do mundo, mas ao homem e à verdade
que ele distingue de si mesmo. (FOUCAULT, 1997)
Atentemo-nos aqui, que Foucault chama em causa não apenas a questão da
subjetividade inerente aos problemas mentais, como também á relação que a sociedade tem
para com a loucura.
Outras questões importantes, relacionadas às noções de saúde mental, tangem a
classificação dos problemas. Fortalecidos por algumas imprecisões no uso dos conceitos, há
uma notada dificuldade em diferenciar algumas doenças. Assim, traremos algumas diferenças
básicas nas concepções de Loucura e de Deficiência mental.
A Loucura, em sua concepção atual, é entendida pela visão de mundo considerada fora
dos padrões, ou seja, aquelas formas de entendimento que destoam do crivo social. No
entanto, essa noção de loucura e, sobretudo a sua visão de ojeriza social, pode ser admitida
como um efeito da sociedade moderna do pós-guerra, no que diz respeito à subjetividade e à
produção de sentido. “A desrazão é entendida como tudo aquilo que uma sociedade enxerga
como sendo seu ‘outro’: a estranheza, a ameaça, a alteridade radical. Essa dimensão pode ser
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identificada em diversas épocas e, inclusive, pode ser percebida como essencial nas mais
variadas formações histórico-sociais.” (SILVEIRA & BRAGA, 2007, p.592)
Silveira & Braga (2005) ainda nesse texto, intitulado “Acerca do Conceito de Loucura
e Seus Reflexos na Assistência de Saúde Mental” fazem uma análise interessante sobre as
variações da concepção de loucura ao longo do tempo, retratando também a variação na visão
que a sociedade tinha da doença, que passou de “divindade” na Grécia Clássica à
“representação do castigo divino” na Idade Média.
No entanto, foi somente a partir do Séc. XVIII que os distúrbios mentais passam a ser
tratados como um “objeto do saber médico”, e considerada a sua possibilidade de cura. Esse
processo culminou na reforma da psiquiatria, em meados do ultimo século, quando o conceito
de loucura então passa a ser percebido “enquanto existência-sofrimento do sujeito em relação
com o corpo social” (SILVEIRA & BRAGA, 2005).
Dessa forma, pode-se notar que a chamada “loucura” está hoje enquadrada no que se
entende por doença mental e este é o que “refere-se à formulação técnico-científica de um
estado de perturbação gerador de variados níveis de inabilidades sociais”. Em outras palavras,
as doenças mentais correspondem tanto a distúrbios psíquicos como inaptidões ocorridas por
transtornos não-subjetivos, externos, como as deficiências mentais.
Assim, entramos em outro segmento de classificação das doenças mentais. As
deficiências mentais, que são atribuídas “às pessoas que tem impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras,
podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições.”
(ONU/2007 Decreto Legislativo n.186/2008 apud MUSSE, 2009). Desta forma, podemos
compreendê-la como transtornos relacionados às rupturas ou retardamentos no processo de
desenvolvimento de aptidões, inteligências do ser humano.
A ICIDH17 (The conceptual framework of the World Health Organisation
International Classification of Impairment, Disability, and Handicap) propõe uma
classificação da conceituação de deficiência que pode ser aplicada a vários aspectos da saúde
e da doença, sendo um referencial unificado para a área. Estabelece, com objetividade,
abrangência e hierarquia de intensidades, uma escala de deficiências com níveis de
dependência, limitação e seus respectivos códigos, propondo que sejam utilizados dentro do
CID (Código Internacional de Doenças) pelos serviços de medicina, reabilitação e segurança
social.
Por esta classificação, a deficiência mental é conceituada como: “perda ou
anormalidade de estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica, temporária ou
5
permanente. Incluem-se nessas a ocorrência de uma anomalia, defeito ou perda de um
membro, órgão, tecido ou qualquer outra estrutura do corpo, inclusive das funções mentais.
Representa a exteriorização de um estado patológico, refletindo um distúrbio orgânico, uma
perturbação no órgão.
Ao transitar por conceitos e terminologias a respeito de temas relacionados à saúde
mental, torna-se notória a gama de variáveis sociais, individuais e científicas que devem ser
considerados para se definir e/ou classificar um fenômeno da loucura ou da deficiência
mental. O desafio se torna ainda mais evidente se considerarmos as diversas alterações
sofridas nestas concepções ao longo do tempo, bem como nas suas atribuições sociais. Por
isso, é importante não apenas distinguir cada termo, mas também considerar todo o processo
histórico de mudança dessas visões.
2. A PSIQUIATRIA NO BRASIL
No Brasil, a preocupação com o tratamento especializado para os acometidos de
doenças mentais, é datada do início do século XIX, momento em que a corte portuguesa se
instala no país. No período, diversos estudiosos tentaram mudar os métodos de tratamento
psíquicos, baseando-se em autores majoritariamente europeus. Isso não significa dizer que o
tratamento foi aperfeiçoado de forma positiva, mas apenas que surgiu certa preocupação
acerca do assunto. Neste contexto, é criada a Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro, que
publicava atas, escritos e reclamava a necessidade de espaços destinados ao tratamento de
pessoas com transtornos mentais.
Até então, não existia nenhum hospital psiquiátrico no Brasil. A Santa Casa da
Misericórdia do Rio de Janeiro abrigava alguns pacientes com sintomas de doenças mentais.
Entretanto, funcionava apenas como um asilo, como abrigo para pessoas pobres, moradoras
de rua e, portanto, não existia pessoal capacitado em psiquiatria. Além disso, o espaço era
inadequado, insalubre, e o tratamento dado aos pacientes, era de reclusão e de maus tratos.
Assim, por reivindicação da Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro, em 1852 é
inaugurado o suntuoso Hospício de Pedro II. Infelizmente, o hospital não dispôs das
condições necessárias para melhor atender os doentes e continuava subordinado e anexado à
Santa Casa de Misericórdia.
No final do século XIX, com a influência dos franceses Phillipe Pinel e Jean-Étienne
Dominique Esquirol, algumas mudanças começaram a acontecer no Brasil. Foi regulamentado
6
o ensino da medicina psiquiátrica em 1882. Com isso, as faculdades de medicina da Bahia e
do Rio de Janeiro passaram a estudar as doenças mentais com mais profundidade e a analisá-
las como distintas das outras enfermidades. Mais profissionais se especializaram, foram
construídos novos espaços, e desenvolvidas novas formas de tratamento psiquiátrico.
Os estudos especializados na área psiquiátrica revelavam uma maior preocupação com
àqueles que sofriam com transtornos mentais. Entretanto, as formas de tratamento
continuavam violentas e excludentes: Os hospícios mantinham os pacientes passivos e
reclusos. Eles eram privados de um convívio social, eram indivíduos indesejáveis, tidos como
pessoas geradoras de uma desordem social.
No século XX, o número de hospitais psiquiátricos aumenta significativamente. Neste
momento, a previdência social garantia um auxílio psiquiátrico àqueles que estivessem
doentes e internados, o que era rentável e lucrativo para os empresários donos dos hospícios,
sanatórios, etc. Cada doente representava um lucro a mais, o que acabou enchendo o
manicômio de pessoas que, muitas vezes, não estavam com problemas sérios.
Os tratamentos eram, muitas vezes, violentos: camisa de força, eletrochoque,
lobotomia, convulsoterapia. Tais procedimentos costumavam agravar os distúrbios e também
conseguiam deixar os pacientes inertes, anestesiados. Quando internados, eles geralmente
ficavam confinados, sem qualquer convívio social, privados de atividades interativas e de
cuidados emocionais.
Neste contexto, dificilmente um paciente internado conseguia se recuperar e sair do
hospital manicomial, pois o objetivo maior dos médios e empresários era alimentar a doença,
ao invés de tratá-la. Isso criou um número enorme de casos crônicos. Diante de um
agravamento em sua saúde mental, eles dificilmente conseguiam ser ouvidos, e ter seus
direitos respeitados.
Existiram tentativas de mudar esse o quadro, mas o Estado brasileiro não facilitava o
processo, que piorou durantes a ditadura. Juliano Moreira e Ulisses Pernambucano tentaram
implantar uma reforma nos hospícios, com tratamento em regime livre, e um sistema de
educação especial. Infelizmente, suas ideias não foram conquistadas e a assistência
psiquiátrica entrava em degradação.
Com o fim da ditadura, a reação contra o mau tratamento psiquiátrico ganhou espaço
no país. Havia, entretanto, uma forte oposição exercida pelo setor privado, que, àquela altura,
já havia se expandido e controlava as decisões do Estado. A busca pelas mudanças foi
espelhada nas experiências e reflexões do italiano Franco Basaglia, que idealizava uma
sociedade sem manicômios, capaz de abrigar os portadores de sofrimento mental.
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Neste contexto, dá-se o início da luta da Reforma Psiquiátrica e, em 1989, a entrada no
congresso do Projeto de Lei Paulo Delgado. A proposta era a extinção de manicômios e o
direito à cidadania das pessoas que sofriam com doenças mentais. O projeto ficou em
tramitação por 12 anos e apenas em 2001 a lei foi sancionada no país: Lei Federal 10.216.
Apesar da conquista, a lei promulgada não foi igual ao seu projeto. Ela deu ênfase aos
tratamentos humanitários, sem exclusão e com inserção social. Também protegeu os doentes
mentais contra qualquer tipo de preconceito e restringiu as possibilidades de internação,
entretanto não deixa clara a obrigação do fim dos manicômios.
3. O TRATAMENTO DA SAÚDE MENTAL NA REDE PÚBLICA DA
CIDADE DE SALVADOR
Após a aprovação da Lei 10.216 no ano de 2001, a assistência oferecida a portadores
de doenças mentais, que durante muito tempo esteve associada principalmente a internação
em hospitais psiquiátricos, passou por mudanças significativas. O Ministério da Saúde
estruturou uma política de saúde mental que redirecionou os recursos desses hospitais para um
modelo substitutivo de base comunitária. Esse cenário de mudanças constitui a reforma
psiquiátrica, caracterizada principalmente pela proposta de oferecer um atendimento público
em saúde mental que garanta o acesso da população aos serviços e o respeito a seus direitos e
liberdade; mudança de paradigma no tratamento da saúde mental, ao invés de isolar o paciente
da sociedade, o tratamento incentiva a inserção social, o convívio na família e na comunidade.
A assistência passa a ser oferecida em Centros de Atenção Psicossocial (CAPS),
Residências Terapêuticas e ambulatórios. O redirecionamento do modelo assistencial originou
a Política Nacional de Saúde Mental, cujo objetivo é reduzir progressivamente a quantidade
de leitos psiquiátricos, qualificar, expandir e consolidar a rede extra-hospitalar. Tais
mudanças são de grande relevância para o Brasil uma vez que 3% da população geral sofre
com transtornos mentais severos e persistentes; 12% da população necessita de algum
atendimento em saúde mental, seja ele contínuo ou eventual, o que resulta em um
investimento de 2,3% do orçamento anual do SUS para a área da Saúde Mental. (SIS.SAÚDE
- Sistema Integrado de Saúde do Rio Grande do Sul)
A Política de Saúde Mental da cidade de Salvador está baseada na Política Nacional de
Saúde Mental, por isso, suas ações devem estar em consonância com os objetivos da Política
Nacional na busca pela consolidação de um modelo de atenção à saúde mental aberto e de
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base comunitária, que possibilite a livre circulação das pessoas portadoras de transtornos
mentais pelos serviços, comunidade e cidade. (Ministério da Saúde) Em 2005, a Secretaria
Municipal de Saúde assinou um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) assumindo o
compromisso de ampliar e fortalecer a rede de assistência, implantar mais CAPS e
Residências Terapêuticas e de aderir ao Programa de Volta para Casa. Neste mesmo ano, a
Secretaria Municipal de Saúde da Bahia solicitou o descredenciamento de 520 leitos dos
hospitais psiquiátricos Sanatório Bahia e Casa de Saúde Ana Nery. O Ministério da Saúde
orienta os gestores de saúde dos municípios a construírem uma rede de saúde mental que
possa ser constituída por vários dispositivos assistenciais que possibilitem a atenção
psicossocial aos pacientes com transtornos mentais.
Embora alguns hospitais psiquiátricos tenham sido fechados, ainda existem três
unidades que oferecem leitos em Salvador, os hospitais Juliano Moreira e Mário Leal e o
Sanatório São Paulo. Vale ressaltar que estes hospitais estão sob a responsabilidade do estado.
Segundo o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde, em dezembro de 2009, a Bahia
ocupava a 20ª posição no ranking dos estados que oferecem leitos psiquiátricos. Segundo a
pesquisa, a Bahia teria sete hospitais psiquiátricos com um total de 888 leitos. (Anexo1) Paulo
Gabrielli, coordenador Estadual de Saúde Mental, afirma que: “O Hospital Psiquiátrico ainda
constitui o centro da assistência, o lugar do tratamento no imaginário social, instituição que
absorve a maior parte dos recursos humanos e financeiros investidos pelo Sistema Único de
Saúde no país.” Para ele “É preciso estimular a reestruturação e expansão do atendimento,
promovendo ações de atenção primária no âmbito dos municípios, com a finalidade de
garantir o acesso da população a uma ampla rede pública de atenção psicossocial extra-
hospitalar.”
Já em âmbito municipal, as opções de tratamento que estão disponíveis na rede pública
de saúde são as seguintes: Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) que constituem a
principal estrutura da rede municipal de saúde para tratar os portadores de transtornos mentais
severos. Trata-se de um serviço territorial de base comunitária que visa promover a inserção
social do portador de transtorno mental através de um tratamento integrado. O objetivo destas
unidades de tratamento é oferecer atendimento à população de sua área de abrangência,
realizando o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários pelo acesso ao
trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e
comunitários. (Ministério da Saúde) Atualmente existem dezoito CAPS em Salvador e ao
todo, na Bahia, existem 163. (Área Técnica de Saúde Mental / IBGE – Anexo 2)
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Existem ambulatórios que podem ser definidos como unidades de saúde com equipe
multiprofissional especializada em saúde mental. A equipe é formada por profissionais tais
como, psiquiatras, enfermeiros, farmacêuticos, entre outros. Em Salvador existem os
seguintes ambulatórios: o Centro Terapêutico Municipal Álvaro Rubim de Pinho, o Centro de
Saúde Mental Aristides Novis e o Centro de Saúde Mental Oswaldo Camargo. Já os Serviços
Residenciais Terapêuticos (SRT’s) são casas ou unidades habitacionais inseridas na
comunidade, com capacidade para até oito pacientes. Criadas no ano 2000, as unidades são
destinadas aos egressos de hospitais psiquiátricos que levaram dois anos ou mais em
tratamento e que perderam os vínculos familiares. Em Salvador existem apenas seis unidades
dos SRT’s, os moradores dessas residências terapêuticas recebem tratamento nos CAPS. No
total, existem vinte SRT’s em funcionamento na Bahia e uma unidade em processo de
implantação, ao todo as residências abrigam 114 pessoas. (Área Técnica de Saúde Mental –
Anexo 3)
Existem também os consultórios de rua da Equipe de Saúde Mental Capitães da Areia,
cuja sede fica no Centro Histórico de Salvador. A equipe formada por sete profissionais
(enfermeiras, psicólogos, assistentes sociais, psicopedagoga e educador físico) presta pronto-
atendimento a crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. Nos consultórios
de rua são realizadas abordagens diretas e a partir disso são feitas visitas domiciliares,
monitoramento e acompanhamento dessas crianças e adolescentes. O trabalho da Equipe
abrange as áreas do Pelourinho, Terreiro de Jesus e Comércio e segundo Célia Rocha (Anexo
6), coordenadora do Programa de Saúde Mental da rede municipal de saúde, é um dos
serviços que a Secretaria Municipal de Saúde pretende ampliar para que suas ações tenham
um maior alcance. Como estava previsto no Termo de Ajuste de Conduta (TAC) a Secretaria
Municipal de Saúde aderiu ao Programa de Volta para Casa, desenvolvido pelo Ministério da
Saúde e que visa promover a reintegração de pessoas egressas de longos períodos de
internação através da concessão de uma bolsa-auxílio de 240 reais como parte integrante do
processo de reabilitação psicossocial. Na Bahia, existem 115 beneficiários cadastrados em 5
municípios, mas em Salvador existem apenas 8 beneficiários. (Secretaria de Saúde do Estado
da Bahia, 2010)
As opções de atendimento de emergência na rede pública de saúde de Salvador, em
casos psiquiátricos, ainda são poucas. Em 2009, foi inaugurado o 1º Pronto-atendimento
psiquiátrico da cidade. Este atendia pacientes com transtornos mentais agudos que eram
encaminhados pelo SAMU ou por alguma unidade de saúde do município. Os pacientes
permaneciam durante 48h no pronto-atendimento e os casos mais graves eram encaminhados
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para os hospitais psiquiátricos Juliano Moreira e Mário Leal (Secretaria Municipal de
Comunicação). No entanto, o único pronto-atendimento psiquiátrico da cidade fechou oito
meses após sua inauguração e até hoje não foi reativado. Segundo Célia Rocha, a reabertura
do pronto-atendimento psiquiátrico está entre as metas da Secretaria Municipal de Saúde, mas
ainda não há data prevista para isso. A alternativa existente para emergências é a equipe de
psiquiatria na Regulação do SAMU, que foi criada devido à demanda de atendimentos de
casos psiquiátricos. Em 2009, 5,89% dos casos atendidos pelo SAMU foram psiquiátricos.
(Secretaria Municipal de Saúde) Essa equipe é formada por sete psiquiatras que além de
orientar as pessoas que ligam para o SAMU, também orientam os técnicos do Serviço de
Saúde Mental a realizar encaminhamento de pacientes.
Observando os serviços da rede pública de saúde de Salvador, é possível compreender
que as mudanças estruturais no tratamento do portador de transtorno mental são importantes
não apenas para oferecer outro modelo de assistência, baseado na ressocialização e não mais
no isolamento do paciente. Mas também contribuem para que a saúde mental tenha nova
abordagem. Percebe-se que os serviços públicos voltados para a saúde mental tratam essa
questão de modo integrado, oferecendo uma assistência que está associada à educação, ao
lazer, à cultura, que valoriza a participação da família no tratamento do paciente e que
incentiva sua integração em uma comunidade. Entretanto, a quantidade de CAPS ainda é
insuficiente para atender a demanda da população. Então se hospitais psiquiátricos são
fechados ou têm seus leitos reduzidos, alguns pacientes ficarão sem tratamento. Isto porque as
alternativas criadas ou ampliadas para substituir o antigo modelo de tratamento ainda não
chegam a todos os portadores de transtorno mental, pois, ainda existem comunidades nas
quais a Secretaria Municipal de Saúde estabeleceu que fossem criados CAPS, mas que até
hoje não receberam a unidade do serviço.
Outro problema é a contradição existente entre o incentivo à livre circulação das
pessoas portadoras de transtornos mentais e o que acontece na realidade. Essas pessoas ainda
não têm acesso ao benefício da gratuidade no transporte público, o que dificulta o
deslocamento de pacientes de baixo poder aquisitivo, que não residem próximos aos CAPS
onde fazem tratamento. Diante de tais problemas, depreende-se que os avanços em relação ao
tratamento da saúde mental foram significativos, principalmente no que diz respeito à
inserção social e à garantia de direitos, mas ainda existem aspectos que precisam receber mais
atenção na rede pública de saúde a fim de que sejam encontradas possíveis soluções para estes
problemas.
11
4. CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL - CAPS
Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) foram oficializados através portaria GM
224/92 e atualmente são regulamentados pela Portaria nº 336/GM, de 19 de fevereiro de 2002,
integrando a rede do Sistema Único de Saúde – SUS (Secretaria Municipal de Saúde). Os
CAPS “são serviços de saúde mental abertos, destinados a prestar atenção diária a pessoas
com transtornos mentais severos e persistentes” (Ministério da Saúde). De maneira mais
complexa, podemos dizer que os CAPS são “serviços territoriais de base comunitária,
destinados a acolher e tratar os pacientes com transtornos mentais, estimular sua integração
social e familiar, apoiá-los em suas iniciativas de busca da autonomia, oferecer-lhes
assistência de forma integral” (Secretaria Municipal de Saúde).
A Lei Paulo Delgado (Lei nº 10.216) não criou os CAPS, apenas os legitimizou, uma
vez que existem unidades que funcionam há mais de 20 anos. O primeiro CAPS do Brasil foi
o Centro de Atenção Psicossocial Professor Luiz da Rocha Cerqueira, conhecido como CAPS
Itapeva, inaugurado em março de 1986 em São Paulo.
Existem cinco tipos de CAPS (CAPS I, CAPS II, CAPS III, CAPSi e CAPS ad), cada
um com uma clientela diferente, a depender do contingente populacional a ser coberto e do
período de funcionamento. CAPS I atendem a municípios de pequeno porte, que possuem de
20.000 a 70.000 habitantes; CAPS II são serviços para cidades de médio porte, com
população de 70.000 a 200.000 habitantes; CAPS III são os únicos que atendem 24 horas por
dia e estão disponíveis nas grandes cidades, com população acima de 200.000 habitantes. Os
CAPSi e CAPS ad são unidades de tratamento segmentado, alocadas em cidades de médio
porte. Os primeiros atendem a crianças e adolescentes com até 17 anos de idade, enquanto os
CAPS ad são serviços destinados a dependentes de álcool e outras drogas, cuja dependência é
secundária ao transtorno mental.
Salvador conta com um total de 18 Centros de Atenção Psicossocial. Entre eles,
funciona no bairro de Pernambués um CAPS ad e, nos bairros da Liberdade e Rio Vermelho,
funcionam os dois CAPSi do município. Recentemente foi inaugurado um CAPS III no bairro
de Pirajá, com a especificidade de prestar atendimento a crianças e adolescentes usuários de
álcool e drogas. Antonio Nery Filho, criador do Centro de Estudos e Terapia do Abuso de
Drogas (Cetad), vinculado à Universidade Federal da Bahia, e consultor da Prefeitura, diz que
“a ideia é implantar mais quatro CAPS ad até 2011” (MUITO, 4 de outubro de 2010).
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Os CAPS se propõem a auxiliar na reinserção social dos indivíduos e, nesse sentido,
atuam com a presença de diversos profissionais que, juntos, ajudam no desenvolvimento de
diversas habilidades. Em entrevista com Irene Demouliere, psicóloga do CAPSi Professor
Luis Meira Lessa, localizado no bairro do Rio Vermelho, pode se certificar que essa equipe
multiprofissional de fato age dentro das unidades. O CAPS em que trabalha conta com
psicólogos, psiquiatras, educador físico, enfermeiros, técnicos de enfermagem e terapeuta
ocupacional, mostrando que a preocupação dos centros vai além de um tratamento médico.
São oferecidas também diversas atividades terapêuticas, como psicoterapia individual ou
grupal, oficinas terapêuticas, acompanhamento psiquiátrico, visitas domiciliares, atividades de
orientação e inclusão das famílias e atividades comunitárias.
O tratamento feito nos CAPS consiste em um projeto terapêutico individual, assim,
cada paciente recebe um tratamento específico de acordo com suas necessidades e é
acompanhado por um técnico de referência. Existe um procedimento para que um indivíduo
possa ser inserido como paciente em um desses centros. O acolhimento é a primeira etapa:
assim que o indivíduo procura uma unidade, ele recebido pelo técnico de plantão do CAPS,
que ouve atentamente o seu caso. O profissional pode indicar imediatamente o tratamento
adequado para o paciente, quando o mesmo possui perfil para ser atendido no CAPS. Quando
a pessoa não possui perfil, ela é encaminhada para o serviço adequado. O profissional pode,
ainda, não se sentir seguro para construir o PTI – Plano Terapêutico Individual – do paciente e
preferir consultar a equipe de profissionais da unidade. Nesse caso, o técnico de plantão leva o
caso à reunião técnica, para discuti-lo com outros profissionais e construir um diagnóstico em
conjunto.
De acordo com o projeto terapêutico de cada usuário, estes podem passar o
dia todo na Unidade, parte do dia ou vir apenas para alguma consulta.
Comparecendo todos os dias estarão em regime intensivo, alguns dias da
semana em regime semi-intensivo e alguns dias no mês em não-intensivo. As
necessidades de cada usuário e os projetos terapêuticos, compreendendo as
modalidades de atendimento citadas e os tempos de permanência no serviço,
são decididas pela equipe, em contato com as famílias também, e igualmente
as mudanças neste projeto segundo as evoluções de cada usuário.
(MALAZAVI)
Segundo as normas do Ministério da Saúde, que estabelece uma unidade de tratamento
para cada 100 mil habitantes, deveriam existir, em Salvador, 30 unidades de CAPS para que
as demandas da população fossem atendidas. Recentemente, o Ministério da Saúde repassou
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recursos para a implementação de 54 novos CAPS no Brasil. Três destes serão implementados
na Bahia, mas nenhum em Salvador. As cidades a receberem as unidades serão Barra,
Governador Mangabeira e Utinga. A criação de novos centros em Salvador se faz necessária,
uma vez que hoje a rede consegue prestar atendimento apenas a cerca de 60% da população
que necessita de seus serviços.
14
5. CONCLUSÃO
O tratamento psiquiátrico no Brasil tem mudado ao longo do tempo de forma a
melhorar, gradativamente, os cuidados destinados à população acometida de tais doenças. Os
maus tratos marcaram a realidade dos que foram internados em manicômios e sanatórios.
Àquela altura, essa parcela da população era tratada com ojeriza e, consequentemente,
excluída do convívio social. O movimento anti-manicomial e a Reforma Psiquiátrica que
surgiram por volta da década de 90, chamaram atenção para a necessidade de mudanças, que
já haviam ocorrido em outras partes do mundo.
Por conseqüência, a lei Paulo Delgado acabou sendo aprovada e conseguiu propor
uma modificação no tratamento psiquiátrico, que parece ter se tornado mais humano,
cuidadoso e, principalmente, preocupados com a reinserção social. Diante disso, foi impedido
que novas internações fossem feitas sem maiores motivos e que os pacientes fossem reclusos
e afastados de sua família.
Após observar os serviços oferecidos na cidade de Salvador, e da nova forma de
enxergar os pacientes com doenças mentais, podemos perceber algumas falhas e melhoras
deste novo sistema. As mudanças foram, sem dúvida, extremamente significantes e positivas.
A lei 10.216 garante uma melhora gradativa no sistema de tratamento, a reinserção social dos
pacientes, a defesa de seus direitos e o fim do preconceito. Entretanto, ficou claro que a atual
situação na cidade não esta completamente de acordo com a nova lei, e que não garante o
pleno cuidado com os doentes mentais. Portanto ainda existem problemas a se enfrentar.
A primeira situação observada é que ainda falta um número suficiente para atender a
toda população, de serviços oferecidos tanto pela prefeitura quanto pelo estado. O Ministério
da Saúde, por exemplo, recomenda que exista uma CAPS para cada 100.000 habitantes, ou
seja, em uma cidade como Salvador, com a população aproximadamente de três milhões de
pessoas, o ideal seria ter 30 Centros de Atenção Psicossocial, enquanto existem somente 18.
Apenas seis residências terapêuticas oferecem moradia para aqueles que não têm família ou
não podem viver em outro lugar. O único Pronto Atendimento Psiquiátrico inaugurado na
cidade, foi fechado apenas oito meses após sua abertura.
Em conversa com Célia Rocha, ela afirma que uma das dificuldades em ampliar as
opções de tratamento em Salvador, reside no fato de que grande parte dos imóveis da cidade
não possui documentos necessários para que o governo possa alugá-los ou comprá-los. O que
termina sendo um dos grandes empecilhos para que novos CAPS, Residências Terapêuticas
15
etc. sejam inaugurado. Entretanto, esse discurso parece não condizer com a realidade, pois
mesmo que existam imóveis irregulares, com mais comprometimento do poder público, mais
serviços poderiam ser oferecidos a população.
Outro problema relatado é a falta de políticas de informação da sociedade sobre o
assunto, tanto sobre saúde mental quanto as opções de tratamento que existem. A secretaria
não tem ação nesse sentido, fazendo com que a população fique desinformada, podendo
causar o abandono de doentes pela família ou maior número de casos de preconceito.
Uma questão relatada na entrevista com a psicóloga da CAPS é a falta de integração
entre o sistema de saúde com outros serviços públicos, como transporte. Deficientes mentais
não têm o direito de utilizar transporte público gratuitamente. Isso faz com que muitos desses
abandonem o tratamento por não terem condições financeiras de se locomover para as
unidades de saúde. Ainda que não existam dados para quantificar essa situação, a psicóloga
informou que existem muitos casos como este e que seria interessante se governo tomasse
medidas a fim de garantir um tratamento adequado.
A política que a própria secretaria informa em documentos oficiais, que ainda não foi
implantada é a de atendimento periódico a população, em relação à prevenção de doenças
mentais. O serviço público de saúde não fornece atendimento terapêutico e psicológico para a
população. Ou seja, em uma sociedade onde a violência, crises sociais e outros problemas
atingem as pessoas diariamente, e que algumas tem força para continuar vivendo de forma
normal e outras têm a sua saúde mental abalada, não existe um serviço público de
atendimento psicoterapêutico para essa população.
Além do preconceito existente na sociedade com as pessoas “loucas”, “malucas” e
outros adjetivos pejorativos que são usados contra indivíduos doentes e que precisam de um
tratamento clínico. Também não existe um trabalho de conscientização social contrário a
esses tipos de atitude.
Muitos pacientes, quando acabaram os antigos hospícios, não tiveram para onde ir e
não foram absorvidos pelo novo sistema, fazendo com que o número de moradores de rua
aumentasse em 30% em Salvador, segundo estudos da Escola Baiana de Medicina.
Percebe-se que com a mudança que aconteceu com a Lei Paulo Delgado, o modo de
olhar os doentes mentais foi alterado, e que a nova relação entre médicos e pacientes não é
mais de exclusão, e sim de reinserção social. Mas, isso não tem acontecido de forma plena.
Os dados nos mostram que o novo sistema precisa corrigir essas falhas e problemas
para que toda a população de Salvador possa ter acesso a um serviço de qualidade e que as
16
mudanças continuem para que a saúde mental seja um assunto levado a sério em todas as
instâncias, tanto governamental quanto social.
17
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- AMARANTE, Paulo & TORRE, Eduardo Henrique Guimarães. Protagonismo e
Subjetividade: a construção coletiva no campo da saúde mental. Ciência e Saúde Coletiva
2001, Vol. 6 .
- Dicionário Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil. Rio de Janeiro, 1930. Disponível em: http://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/iah/P/verbetes/stcasarj.htm#historico. Acesso em: 24 nov. 2010.
- FERNANDES, Flora. História da Psiquiatria no Brasil: histórico. Psicologado Artigos Jan 2009.
- GABRIELE, Paulo. Política de Saúde Mental da Bahia, Salvador.
Disponível em: http://bit.ly/igL4s4. Acesso em: 27 nov. 2010.
- MALAVAZI, Gabriela. SER MELHOR. Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) como
dispositivos da reforma psiquiátrica. Disponível em: <http://www.sermelhor.com/artigo.php?
artigo=28&secao=espaco>. Acesso em: 22 nov. 2010.
- Manicômio judiciário: arbitrariedade e violência. Rev. Viver. Jul 2007, nº83.
- Memória da Loucura. Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.ccs.saude.gov.br/memoria%20da%20loucura/Mostra/apresenta.html . Acesso em: 24 nov. 2010
- MENDONÇA, Tatiana. “Usar crack significa saltar de paraquedas sem paraquedas”. Jornal
A Tarde, Salvador, 03 out. 2010. Revista Muito. Disponível em:
<http://revistamuito.atarde.com.br/?p=5647>. Acesso em: 21 nov. 2010.
- Ministério da Saúde. Saúde Mental – Apresentação, Brasília, 2010.
Disponível em: < http://portal.saude.gov.br/portal/saude/area.cfm?id_area=925>. Acesso em:
27 nov. 2010.
18
- Ministério da Saúde. Saúde Mental – Centros de Atenção Psicossocial, Brasília, 2010.
Disponível em: http://bit.ly/eQpWBB. Acesso em: 27 nov. 2010.
- MINISTÉRIO DA SAÚDE. Saúde Mental. Disponível em:
<http://portal.saude.gov.br/portal/saude/area.cfm?id_area=925>. Acesso em: 27 nov. 2010.
- MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações
Programáticas Estratégicas. Saúde Mental no SUS: os Centros de Atenção Psicossocial /
Ministério da Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
- MIRANDA-SÁ JR., Luiz Salvador de. Breve histórico da psiquiatria no Brasil: do período colonial à atualidade. Rev. psiquiatr. Rio Gd. Sul, Ago 2007, vol.29, no.2, p.156-158.
- MUSSE, Luciana Barbosa, O Papel das Ouvidorias no fortalecimento da cidadania das
pessoas com transtornos mentais. SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE OUVIDORIA-
OMBUDSMAN BRASIL-CANADÁ, 2009.
- O que é Doença Mental? Disponível em: http://www.artigonal.com/saude-artigos/o-que-e-
uma-doenca-mental-730354.html. Acesso em: 22 nov.2010.
- PESSOTI, Isaias. O século dos Manicômios. São Paulo: 34, 1996.
- PICCININI. Walmor, J. História da Psiquiatria: Voando sobre a História da Psiquiatria. 2000. Disponível em: http://priory.com/psych/wal0800.htm . Acesso em: 24 nov. 2010.
- Presidência da República Casa Civil/; Lei nº10.216. Brasília 2001. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm. Acesso em: 24 nov. 2010.
- Secretaria Municipal de Comunicação (SECOM). Salvador recebe o 1º Pronto Atendimento
Psiquiátrico, Salvador, ago. 2009.
Disponível em: < http://bit.ly/hFPzXE>. Acesso em: 15 out. 2010.
- Secretaria Municipal de Saúde. Saúde Mental no Município de Salvador, Salvador, 2009.
Disponível em: http://bit.ly/ifs7oF. Acesso em: 20 nov. 2010.
19
- Secretaria de Saúde do Estado da Bahia. Conferência de Saúde Mental, Bahia, abr. 2010.
Disponível em: http://bit.ly/dHYT0D. Acesso em: 28 nov. 2010.
- SEGRE, Marco & FERRAZ, Flávio Carvalho. REVISTA DE SAÚDE PÚBLICA. O
conceito de Saúde. Universidade de São Paulo, São Paulo, 1997, Vol. 31, Número 5.
- SILVEIRA, Lia Carneiro & BRAGA, Violante Augusta Batista. Acerca do conceito de
loucura e seus reflexos na assistência de saúde mental. São Paulo, 2005.
- SIS.SAÚDE - Sistema Integrado de Saúde do Rio Grande do Sul. Política Nacional de
Saúde Mental, Porto Alegre, jun. 2009.
Disponível em: <http://www.sissaude.com.br/sissaude/inicial.php?case=2&idnot=1562>.
Acesso em: 27 nov. 2010.
20
7. ANEXOS
ANEXO 8.1
Hospitais e leitos psiquiátricos
ANEXO 8.2
CAPS
21
ANEXO 8.3
Serviços Residenciais Terapêuticos
ANEXO 8.4
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI N o 10.216, DE 6 DE ABRIL DE 2001.
Dispõe sobre a proteção e os direitos das
pessoas portadoras de transtornos mentais e
redireciona o modelo assistencial em saúde
mental.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu
sanciono a seguinte Lei:
22
Art. 1o Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que
trata esta Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo,
orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos
e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu transtorno, ou qualquer outra.
Art. 2o Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus
familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no
parágrafo único deste artigo.
Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental:
I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas
necessidades;
II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua
saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na
comunidade;
III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração;
IV - ter garantia de sigilo nas informações prestadas;
V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou
não de sua hospitalização involuntária;
VI - ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis;
VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu
tratamento;
VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis;
IX - ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.
Art. 3o É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde mental, a
assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos mentais, com a
devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada em estabelecimento de
saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades que ofereçam assistência em saúde
aos portadores de transtornos mentais.
Art. 4o A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os
recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.
§ 1o O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do paciente
em seu meio.
§ 2o O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a oferecer
assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo serviços médicos, de
assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e outros.
23
§ 3o É vedada a internação de pacientes portadores de transtornos mentais em
instituições com características asilares, ou seja, aquelas desprovidas dos recursos
mencionados no § 2o e que não assegurem aos pacientes os direitos enumerados no parágrafo
único do art. 2o.
Art. 5o O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize situação
de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de ausência de
suporte social, será objeto de política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial
assistida, sob responsabilidade da autoridade sanitária competente e supervisão de instância a
ser definida pelo Poder Executivo, assegurada a continuidade do tratamento, quando
necessário.
Art. 6o A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico
circunstanciado que caracterize os seus motivos.
Parágrafo único. São considerados os seguintes tipos de internação psiquiátrica:
I - internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário;
II - internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a
pedido de terceiro; e
III - internação compulsória: aquela determinada pela Justiça.
Art. 7o A pessoa que solicita voluntariamente sua internação, ou que a consente, deve
assinar, no momento da admissão, uma declaração de que optou por esse regime de
tratamento.
Parágrafo único. O término da internação voluntária dar-se-á por solicitação escrita do
paciente ou por determinação do médico assistente.
Art. 8o A internação voluntária ou involuntária somente será autorizada por médico
devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina - CRM do Estado onde se localize
o estabelecimento.
§ 1o A internação psiquiátrica involuntária deverá, no prazo de setenta e duas horas,
ser comunicada ao Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do estabelecimento
no qual tenha ocorrido, devendo esse mesmo procedimento ser adotado quando da respectiva
alta.
§ 2o O término da internação involuntária dar-se-á por solicitação escrita do familiar,
ou responsável legal, ou quando estabelecido pelo especialista responsável pelo tratamento.
Art. 9o A internação compulsória é determinada, de acordo com a legislação vigente,
pelo juiz competente, que levará em conta as condições de segurança do estabelecimento,
quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e funcionários.
24
Art. 10. Evasão, transferência, acidente, intercorrência clínica grave e falecimento
serão comunicados pela direção do estabelecimento de saúde mental aos familiares, ou ao
representante legal do paciente, bem como à autoridade sanitária responsável, no prazo
máximo de vinte e quatro horas da data da ocorrência.
Art. 11. Pesquisas científicas para fins diagnósticos ou terapêuticos não poderão ser
realizadas sem o consentimento expresso do paciente, ou de seu representante legal, e sem a
devida comunicação aos conselhos profissionais competentes e ao Conselho Nacional de
Saúde.
Art. 12. O Conselho Nacional de Saúde, no âmbito de sua atuação, criará comissão
nacional para acompanhar a implementação desta Lei.
Art. 13. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 6 de abril de 2001; 180o da Independência e 113o da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Jose Gregori
José Serra
Roberto Brant
ANEXO 8.5
Entrevista com Irene Guillien Demouliere, Psicóloga da unidade CAPS I Prof. Luis
Meira Lessa (Rio Vermelho, Salvador-Ba), realizado no dia 19 de Novembro de 2010 pelo
grupo.
Quando o CAPS I Prof. Luis Meira Lessa surgiu?
Em 2006.
Há quanto tempo você trabalha no CAPS?
Há dois anos.
Ele é o único que atende ao público infantil na cidade?
Não. Existe outro CAPS I na Liberdade e, recentemente, foi inaugurado um CAPS III
(Álcool e Drogas) para crianças e adolescentes no bairro de Pirajá.
Esse CAPS atende a pacientes de outros municípios?
Não. Inclusive, o atendimento se dá a partir da apresentação de comprovante de
residência que comprove que o paciente mora em Salvador. Esse é um problema, pois às
vezes chegam pacientes de outras cidades e temos que encaminhá-los para o CAPS de sua
cidade. Essa é uma exigência da Prefeitura Municipal de Salvador.
25
Como é o funcionamento do CAPS?
Funcionamos de segunda a sexta-feira de 8h às 17h. Sexta-feira não fazemos
acolhimento de novos pacientes. Sexta pela manhã, a equipe realiza reunião técnica para
dialogar sobre a situação dos pacientes e à tarde os profissionais atendem a outros pacientes.
A equipe é formada por aproximadamente 25 profissionais de diversas áreas. Temos
psicólogos, psiquiatras, educador físico, enfermeiros, técnicos de enfermagem e terapeuta
ocupacional. Mas acredito que a quantidade de profissionais existentes não é suficiente, pois
muitas vezes não podemos agendar visitas individuais dos pacientes com um psicólogo.
Após a Lei 10.216 (Lei Paulo Delgado), houve mudanças no modo de tratamento
de doenças mentais. Na prática, o que mudou?
Agora o paciente tem acesso a um tratamento mais humano, sem enclausuramento. O
CAPS procura valorizar essa reintegração do paciente na comunidade, dando a possibilidade
dele se sentir útil, não excluído.
E qual é a função dos hospitais psiquiátricos nesse processo?
Os hospitais psiquiátricos ainda devem existir, pois servem para atender às
emergências. Os CAPS não tem a função de atender crises emergenciais, até porque a
presença de psiquiatras aqui não é diária. Também não contamos com leitos e não possuímos
autorização para aplicar medicamentos, uma vez que não temos estrutura apropriada.
Enquanto profissional, quais dificuldades são encontradas no serviço público de
atendimento à saúde mental?
As dificuldades financeiras para custeio de transporte de pacientes são verificadas com
frequência aqui na unidade. Não existe uma lei que reconheça o portador de transtorno mental
como deficiente. Muitas vezes eles tem que retornar algumas vezes na semana e a família não
tem como pagar seu transporte. A Prefeitura Municipal não conta com nenhuma iniciativa de
auxílio nesse sentido.
Considerando outras experiências profissionais, como você compara o
atendimento oferecido pelo CAPS com serviços particulares e de outros hospitais
psiquiátricos?
Eu também trabalho em uma clínica particular e eu sinto que aqui o acompanhamento
dos pacientes é mais próximo, existe um verdadeiro acolhimento. Manejamos nosso tempo de
acordo com a necessidade dos pacientes. A clínica particular não oferece isso porque temos
uma grade fixa de atendimento aos pacientes, o que não permite que o profissional se
disponha a auxiliar um paciente fora de seu horário. Além disso, lá a equipe não dialoga tanto.
Aqui nós temos um turno semanal para trocar ideias sobre os casos, enquanto, na outra
26
clínica, temos apenas uma reunião mensal. O diálogo sobre as experiências dos profissionais
enriquece nosso trabalho. Em relação aos instrumentos de trabalho, não há diferença, apenas
as salas de atendimento no CAPS são menores e não oferecem tanto conforto.
A proposta dos CAPS é auxiliar na reintegração social dos pacientes. Como é
realizado esse processo?
Nós estabelecemos contatos com várias instituições. Além de realizarmos passeios
com as crianças e assembleias com a participação das mães, existe uma iniciativa de parceria
com as escolas, que consiste na visita de profissionais às escolas que apresentam queixas dos
pais, a fim de esclarecer aos educandos sobre doenças mentais. Para incluir os adolescentes no
mercado de trabalho, estabelecemos parceria com o “Projeto Incluir” e a “Fundação Cidade
Mãe”, que auxiliam na profissionalização destes jovens.
Baseado na recomendação do Ministério da Saúde, Salvador conta com
quantidade insuficiente de CAPS. Isso influencia na qualidade do serviço?
Sem dúvida, o número de CAPS deveria ser ampliado, o ideal é que tivéssemos um
CAPS por bairro. O agrupamento de muitos pacientes em uma unidade influi na queda da
qualidade do serviço oferecido.
ANEXO 8.6
Entrevista com Célia Rocha, coordenadora do Programa de Saúde Mental da rede
municipal de saúde (Ed. Caramuru, Comércio, Salvador-Ba), realizado no dia 17 de
Novembro de 2010 pelo grupo.
Inicialmente Célia Rocha falou sobre as opções existentes no sistema de saúde pública
do município para o tratamento da Saúde Mental. Tais como, os Centros de Atenção
Psicossocial (CAPS), os ambulatórios, os Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT) e o
Programa de Volta para Minha Casa. Segundo a coordenadora, os CAPS constituem a
principal estrutura da rede municipal de saúde, para tratar os indivíduos que apresentem
transtornos mentais severos. Os CAPS visam proporcionar a inserção social da pessoa
portadora do transtorno, oferecendo a esse indivíduo assistência de forma integral. Os CAPS
constituem um serviço territorial de base comunitária.
O tratamento feito nos CAPS consiste em um projeto terapêutico individual, assim,
cada paciente recebe um tratamento específico de acordo com suas necessidades e é
acompanhado por um técnico de referência. A equipe que trabalha nas unidades é
multidisciplinar, formada por psicólogos, psiquiatras, oficineiros, arte-educadores, entre
27
outros. Embora todo esse trabalho tenha gerado um produtivo movimento de inserção dos
portadores de transtorno mental na sociedade, os 18 CAPS existentes em Salvador, ainda não
são suficientes para atender a demanda da população que precisa desse serviço. O Ministério
da Saúde recomenda que exista 1 unidade de tratamento para cada 100 mil habitantes,
portanto, deveriam existir em Salvador, 30 unidades do CAPS para que a recomendação do
Ministério fosse devidamente cumprida. Por enquanto, as 18 unidades existentes atendem a
cerca de 60% da população. Dessas unidades, que têm como prioridade realizar o tratamento
de pessoas com transtorno mental severo, existem CAPS específicos que cuidam de crianças
(CAPSi) e o CAPSad – especializado no tratamento de álcool e drogas.
Célia Rocha também informou que as ações desenvolvidas no Programa de Saúde
Mental baseiam-se na integração da temática da saúde, com a educação e com outros direitos
dos indivíduos, ou seja, visam oferecer condições para que a pessoa que está em tratamento,
possa exercer sua cidadania com dignidade. A entrevistada comentou que antes da aprovação
da Lei Paulo Delgado (Lei nº 10.216) o tratamento destinado aos portadores de transtornos
mentais, não respeitava a individualidade dos pacientes e ao invés de socializá-los acabava
por segregá-los ainda mais. Nesse sentido, a Lei Paulo Delgado reforça o compromisso de
proteção dos portadores de transtornos mentais. A lei que prevê a extinção dos manicômios
legitimou o funcionamento dos CAPS (alguns funcionam a mais de 20 anos) e trouxe maior
visibilidade a essas iniciativas que já eram desenvolvidas antes da aprovação da lei.
Algumas das dificuldades existentes no Programa de Saúde Mental são a falta de uma
assessoria de comunicação específica para o setor, para dar maior visibilidade ao que é
desenvolvido no programa; fatores externos também dificultam a ampliação do número de
serviços, por exemplo, a dificuldade para encontrar um imóvel, com a documentação
regularizada, para alugar e instalar mais CAPS. Por enquanto, a Secretaria Municipal de
Saúde, pretende ampliar a rede dos CAPS e consolidá-la e ampliar o alcance dos consultórios
de rua itinerantes, cuja sede fica no Centro Histórico.