Upload
others
View
18
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
Kant e HegelOrigem do positivismo e marxismo
Aula 28
por Olavo de Carvalho
coleção
HistóriaEssencial da
Filosofia
(, [,iinL lllr rlr llfturnLLdn lr lM'llir
^Lor lt rl 0srr ptrLilnn(rl,,r trr l)vt)
qrc 'i,,'
pot0 sc v!ndnLo N.rtr!druc Ío
lorl}c$o x' l].uslL iulh. dc2003q,Dytigil (1 2008lrv Olrvo dd CrNrLho
Edson Múoel de Olnreira Fllho
Motrique S.henlrêh e Dagmar Rizzôlo
Esludi. E Ândré calalcanre cimên.v
Os direitor aut.rah dessaêdiqào pertcn.ôm à
É Realjzações Editora. Livraria e Dislribuidora Ltdâ
CliP 0,1010-970- Sáo Pànlo SP
[rnail e@]ereâliza.ôcs .om br
R6eNâd.s todos os direnos d$1. obr Púihida loda c qualqucr rupioduqÀo desta ediqao porqualquer meio Õú 1ófr4 seja cláclcüônicaou me.âniu, lntlrl{tia, graraçáo ou rtuâlquer meió
e2008
Kant e HegelOrigem do positivismo e marxismo
Aula 28
por Olavo de Carvalho
coleçâo
HistóriaEssencial da
Filosofia
(i)lccÃo História Esscnciâl da Fil(»ofia
l(ant e FlegelOrigem do positiüsmo e malxismo - Aula 28por Olavo de Carvalho
Schelling iâl conro eu erpus nà úliima âula é nlgo que qLrase não. i1",- . '.únrrJ('lri.r..:,rr r(n... rirú r(\c lpur(us,u nJ Lpu(,,,,,r ) cnlrâ na colrenre das idéias.
^quela idéia é lançada c cla rica ali
r! rrdada csperando para só no século ).X ter umâ continuidâde O
( Lr re lmenie teve eleiio. o que veio a enlr$ e ergrossar a corrente
L s idóiês no século xlx lbi justamcnle o que veio ntcs que é Hcsel(. l(ânt. Entáo. platicârncntc todo o dcscnvolvirncnto da históriâ da
lios{rli e de modo geral da hislória das idéias. talveT até da histúria
,Lr cultltrâ e gcrâI. no século XIX vâi pâriir desses dois pontos, Kanr
r llcgcl. Dc câda urn \,âo de var coúcntcs quc prosscgucm ató hojc
, (luc dê âlgum oro.lo Írodelâm náo só âs idéiâs dominanies nii socie
,Lrdc, mas se inpregnan lao pro[rndamenic ra cL tura qlre chcgâm â
,l(tcrmírar c dar lblma à percepçào nrdividual das coisas. ou scjâ, as
t)cssoâs cn)icrganl as coisas rcalmcnte dcniro dc ulnâ cstrururâ kântia-
r)ir ()u hegeliaia olr üma rrisiura clas duas colsas.
Sc nós pergunrârmos âssim: então, nesse sentido, o que sohra real
,rcntc dc l(ânt c Hcgcl nessa herança'1 É claro quc Dào ó o sistcmâ in-
Iriro. nem.r suâ obra inteira. aem o conjuntL, daquilo que eles deram.
,,.r",te 'j'\.,,"'eflii I .líu (ê\' Ii..(,i\ê.rfr(àrnnJru.r'u\ \rur rLs gcraqõcs scguinics c é transrnitido ató nós. Erúão, cssc núclco náo
Irccisâ neccssariamenre coincidir con1 o núclco da intençào quc esses
lila)solos liverarn T:rlvez eles mesrros exanriralldo as conseqüências
lrslanicas que eies próprios desencâdcârarnr 1ilessem qu€ rrtiiicâr âl-
!rLnrâ coisa. olr sc corrigir cDr algun ponto, ou chaüar a atcnçáo dos
i I 1r r).OlrvoL[ r\uLa27 s]olins. L n{liz4aoi 2008
T
seus continuaclores por os ter intcrprclado não müito eratanrcnte. eic .
ctc. nrdo isso não veín aLr caso par<r nós. qucr clizcr o quc nos interessa
nâo ó â pârtir dcssc moDrenlo o q!e l(ant e llegel realmcntc clisscrâm,
-,,. rulL,"ll]u' L\Íu Jnr in.,rnrerirlô.pelr.É( r.,ir.,.;uin.\ qu.dizcr', Dão aquilo que eles quiseram l'âzcr. mas aquilo qüe loi leito oorias idóiâs dcles. Eu acredilo que existe uma boa rclaçâo cntrc uma coisâ
e ouirâ, não acrcclito que cles tenhanr sido lr.idos ou dclonnados. mas
iârnbérir náo acredilo qlrc a hcmnça dclcs coincidâ exata.renle coür L)
quc elcs prct€ndianr lazer Ninguém conscguc conrrolâr d€ tal modo â
\u: or"pri. : írrn."ir rra.re rt,t.,r:uinrç..Nlfls olhando l(ant c Hcg€l enrâo sob êsse âspecto rcsunlido c cn-
lie.tândo os dols dertro de Lrma corrcntc cvolLrtivâ que já vinha arltes.
nós vânros ier que sil!á los em relaqâo à situação ânterio( â unrâ lorga
tradiçào lilosófica qrlc \,ai dos gregos alé eles e em scguida situá-los cm
rclação êos seus sucessorcs
Com relâção aos aDtecessorcs. a dilcrcnça básica qlr€ separa l(art e
Hcgcl do que v€ ânies. a maüeiran1âjs snnplcs dcvcr cssa diferençâ é
coniparar por Lxn lado com Plaião, por o!tro lado corn os escolásticos.
ou São'tornás cle Aquino. Írb uln ccno ponio de visiô que é o mais
importartc. e esse nlais inlportântc ó justamcntc o das rclaçóes entre
o conhccimcnto hrmano e a estrlrtura obiciivâ cla rcalidadc. Plâtáo
linhâ.1 idéia de quc o homcm é unra espécie de inlemrcdiário cntrc
os âninrais e os deuses. qucr dizcr, cssa idéia que ele tem cla Detaxi(rrctaxi) mosirâ que o homem é un1 ser quc não eÍá n€m totalnrenie
be instalado no nnrndo tcrlcstre. no mundo dos sentidos. c quc ncnr
chega a ascer der cLrnr plciamcntc ao mundo dos deüses. l)1tao, ele vive
ncssc erircrncio. porran to a es truturâ do conhccinrenio hn ranoéuma
estruium probicnláiica e ten$ional. por assim diTcr nós nc chegârnos
n lomar possc plenâncntc clo mundo dos sertidos e Dem do nundc)
dos deüses Isso quer dizer quc nós cstamos o tempo iírdo traclulindo
('
oi r()§ lcnn()s do ouiro e o L,ulru IIos icrr os do um. O que Íaz cont
,tLr. r({la a cÍrutura do conhecinrcnto hulnano tenha u a naiureza
.rirrlxilicr. Qucr dizer, o.tue ó ncstc sentido é urn símbolo? Unl sinl
h'11, a nâ vcrdade um signo corl significado inesgotável, quer.ljTet,
,),,(lc ,) signilicantc nâo corresponde pcrttitancnle ao seu significantc.
r LLo !liz€r, o signo iem un.t naturcza alusiva. ele aponla nulna direçiio.
riirs rro cnunciado de significado cle não chega a cobrir pcúcitamenle
t, srrL objeto, quct dizcr. o objelo transccndc de nmitlr o significâdoi
t, {,hiclo, rão: â cssênci.r do objct., cotlsidcrâdo transcendc dc nltlito
't,ri,,t ,ô.pr i l i ( , d u L \ r r l l r H r n J i c Iou. L.,rJ i..,caIr.tr-.ui.'r,tur dizcr quc não e\isLe para Plaiio um conhccimcnto litcrâlmenie
v(rhdciro, todo conhccimenlo só é sinrbolicamente verdadeiro, qucr
(lizcl o conhecinrcnto é verdadeiro quândo elc o inLlicâ nr dücçâo cle
L !rrr rralidadc que depois vocô por scu eslbrço próprio podc chegar a
( r,irhcccr por experiência pcssoal. ou seia, não câbc à lilosolla pmpriâ-
rrcftc dizer a realidâdc, erprinir verbalrrcnrc a realidade. rtras cabc à
lll,)§oli indicá-lâ pârâ quc o ser humâno concreto quc cstá ouvir.k)
a( ú ilo sâiba em que dircÇáo cslá âquilo clo qual vocô cstá falarrclo e elc
tanrbónr dhe parâ lá.
iirl.ro isto é umâ coisa asslm absolutanerlie tlrüdamelriâl nào só
rfr Plalão, rras en1 toda â iradição ocidcntâl e oriental. Sc você olhar
llirciiinho, você cornpârâ. por cxcnlplo, esla idéia com os seus sinrila-
rcs que âparecem no taoismo, no budisnro, nos vcdâs, etc , etc , você
!ai ver que nrncâ ninguár na humânidadc. nenhun dos grandcs sá-
bi(,s ou filósofLrs ieve â prctcnsáo cle que o s€u discurso iosse urnâ
iÍaduçtlo exala da rcalidadc. porque se o discurso losse ulna lradüçáo
c alâ dà realidâde, cLc scria por assim dizcr vcrdadciru em si mcsmo
indcpendentencntc de quem está ouvirdo. Ora. Iós sâbenros qtrc toclo
'1..,.r.,.u., runrr rr"o"J.:r,dr r., rJu,.,rr r.i'trprurr'JU\uí i
,,Lrvinte tcm dele. Qucr dizet: se eu aprendi uma vcrdade e a digo para
vocês. eu digor a verdade llo quc eu aprccndi podc estâr no mcu dis-
ctlrso porque cu ielltei cok)cá lâ lá. rnits lsso só yai se perlazer só vai
sc complctar na hora crn quc você enten.lor acluilo Quer.lizert lodn
discursL, ncccssita dc unr scr hLrmâno quc cÍctivc os ronheci renios
quc ele está trans ilifid{r I,(n islo se a eleiivilçãl, da verdade depende
dc uln atír hrmarro daquelc a quêm â verdâde €slá send{] trarsmitida,
cntáo, isso qucr dizcr quc ncnhum discurso cor si urcsrro pode ser li.ll)cr)rr) verdâ.leiro llle vai dependcr seüpre de uma eietivâçào. Ou seja,
trÍla ciônciâ ncsse scntido olr tod:i lift)solia é urr processo e.luuaii
vo, qucr dizcr ao insrrrtor cabc lnenos elc .li7cr a verdade do que ele
criâr as condica)cs quc pcnnitâm quc o aluno pcrccba csia vcrdadc E
nest! senlido lodo discurso hLrrrnno é evidenienente sin1bólico. quer
dizer, eu náo posso pegar â verdade que en irprcendi e traduzi là tão
cficazmcntc para vocôs dc modo qüe ela est€ja preserie, porque o dis-
cur'so versa soble Lr uDiverso, sobre a realidâde, sobre llcus, ctc., ctc..
nenhu r ser hLrmano tem a capacidade de presenlilicar lisicanente es
sas coisas atravós do seu discuÍso: nâ hora ern qLle você diz a palavra
clel'ântc. o elefantc úo sc matcrializa ali. E o conhccimcnto cfctivo sc
dar,r nao somente na conpree.sào do cliscurso pelo seu ouvintc, lnas
a horâ em que esse ouvinte é capaz dc rcconhecer aqlrilo na própriâ
rcalkladc da suâ ejiperiênciâ [ntão. o hiâlo erlre.liscuÍso e realidade
senprc lbi considerado ulna coisa quasc banal. Qucr dizcr', o conhc-
cimcrlo nâo se perhz no discurso. lnâs se perlãz no ser humano quc
Lr ouve lirlao. você tem qlralrlr elenerlos aí na verdadc. você tetn o
cmissor o rcccptor.odiscursoconrurdo;co mundoéachav€qüevai
lechar tudo isso aí. E cLrnnr ninguanl podc tcr a prctcnsão dc abarcar
o mundo clrm o seu clisclrrso. entaro, você usa o discurso como um
indica.lor, conro u r snrbolo. de nrodo que o seu ouvinle olvirdo o
discffso clc vcja o rrt"ndo.
1l
l)rrrrrlc inilônios os seres lrumanos lurrrr capazcs de viv€r rrcssa
t,rlL iL r uadrângular icrrando scnrprc se apÍrxil1âr da reillidadc. da
\,. (lc, .r1râvós clo discurso, sâbcn(lo quê o discurso rtro êm sülicicrr
i( l)rrr isso. c sabendo quc sonpre parâ âlóm do discurso vocô ia ler
IC irbrir parà ulna pc$pectivà dc cxperiênciâ iLimitacla I'l clrri{)sâ-
i, r rlr ilso não incomodava a ninglrénr. as pessoas âchava '
quc as-
.iLrr cia rrrrito naxlral. âcontccc quc rl pâI.rir dc Lrm cerltr nromcnto
,tIe c nrarcado justaffcntc pela épocâ dc Dcscârles, Galilcu, ctc . clc .
,r )xrcc. â piclensão dc prcndcr a rcaliclâde dentro dc unl §islenrà quc
,1rü r(ic 1:r) b€m a cslruiura írtima clcsla iealidadc q[c §eja Possivcl
t,rrvcr a condria dr iealidadc coDr e\ati.láo ,:laí p.Lra di.rnre. QrLcr di
/(!: (t .11cntâtiva de olhar a realidade como sc eh los'te uma máqllifa
tlr qüâl você con|ecerrdo a esrrulum e o funcio)ranrenio, vocô pude§se
,,t).rLr rL nrirquin:i dc ntodo pcrleiio. Náo precisa dizcr que a idéia ertr
:.i ncsrrla é imbccil. mas iârnbam náo precisa dizcr que selnprc havcrá
l)iriLrs.lâ rcâlida.le que luncionâm real cntc assim, i colncçar pclas
lrtr1priâs n1áquinas Qrcr dizcr que se vocô lcndo, vendo o diagranâ e
o mânual de instruçôes de unr equipalnrinlo quaklucr. vLrcê náo consc-
jrüc tazê lo funcionar exâlánrcntc cono esiá no nrartral de instruÇócs é
|(,11uê alBo dcu crlado. NIas a idéja de lazer dâ ciêrcia u,nâ cspócic de
rallual dc inslrlrçó€s tlo conjunlo dâ rcâlidtLdc e de chcilar a eripressar
i, ,câlidâdc err lórnulas matenráticâs perteit.s c dciil]itivâs qLr€ ]rcr-
iritissem ao h.nncm adquirir um poder sohre o i:onitrnlo da reali.lâdc,
rsir é unu idéií que apârccc justanrertc nâ Renascença cl,m Calilclr.
cifir Bacon. cotn Descartcs, clc.. elc Então, você vê quc ncstc nlollLcrr
1r), quando apar€ce cssa proposra. c\isie urnil rlptrrâ do cquilíbrn)
r icrior. Aniiilamcntc vlrcê linha uma espécie de cquilibrrc iensionâI,
qucr.liTer nós sabenos quc nós rin podenús saber lu.lo, nars sâbe
Lnr)s quc nós náo pollclnos lazer o coniunto da realldâdc câbcr denlro
do nosso discurso como se iosse o inllnito em âto. mâs nós sabemos
que através dc sÍnbolos benr adiculados nós conseguimos remeter o
nosso ouvinte e nós mcsmos â uma realidade de modo que nós sempre
sabemos do qlre estamos fâlando. embora náo consigamos dominâr
aquilo completâmente.
Entáo. varnos dizer que aié essa época châmada Renâscimento o
objetivo do conhecimento era situar o homem denirc da eslrutura da
rcalidade. A partir do Renascimento surge a âmbiçào dc quc a rcalida-
de dcve ser contida dentro do disclrrso de lal modo que conhecendo o
discursLr você donine a realidade.
(Allmo) - Isso tatnbém WLo dp.seio de h'atlslotmat a reêlidatle. nâo é?
Él Inicialmentc ó â idóiâ de dominar rnas você donina un1â coisâ
para que ela façâ o que você qucl e nâo o que elâ quer.
(ALuna) PtoÍessot, o elemetlto de inprccisào úai acompanh(üPnpt.'Porq t tlao t untn tnprcci\àn lonfota40
Veja, â idéiâ nresma cle imprecisáo só apârccc ncsta ópoca. ninguém
imaginava antes que o hiato entre discurso e realidâde lbsse uma im-precisâo ou um dcfcito do discurso.
(Aluna) - É ufia cataclerístic.t tlo discütso...
Este hiaio entre discurso e reâlidâde rellete a nossa situação den-
tro dâ rcâlidâde, portanio, ele é tlrn elemento dâ própria realidade. A
incapacidadc humanâ de abarcar a realidade con1o um todo faz parte
dâ cstrutura da própria realidade e é ela que rcllcte â nossa posiÇão.
Entáo. por exeffplo, como dizia Sáo Tonás de,{qlrino, vocô náo pode
ter un conhccimcnto preciso sobÍe uma coisa imprecisa, qucr dizcr-, o
conhecin1enlo nâo tcm que abarcaÍ a realidade. ele teln quc simbolizar
l0
(lc inodo suliciente para que você sêjba do qu€ está faiando, enião,
qLrcr dizer que certas i.dicaçóes bâstânl; o conhecimento não é ürra
rcdc, ulna lrama quc terúa que âbarcar e conler o coniunto da reali'
.lâdc. nâo é isto, ele é um simples indicador, você náo vaivivcr denttu
LLo univcrso do discurso, depois de ouvir o discurso você vai continuar
llentro da reâlidade. e aqnele discuÍso é só mais unl elemento quc entra
na própria rcalidade. Isto todo mundo soubc, todo mundo em todas as
civilizaçõcs senpre soubc disto.
Entâo. náo cabe ao lilósolo dizer tudo nem muito menos dizer tudo
cxatamente. É dizcr o su[iciente para que L] seu ouvinte saibà do que
cle está faiando. Você veja, por quc Platáo senrp|e no final de seus diá-
logos apela ao miio? Porqu€ ele perccbe que aquele discurso dialéiico
que ele csiá empreendcndo. es§e mesnro disculso chega ao sen limile,
cle se âbre pâra uma Íealidade que tÍansccnde inlinilamenic aquele
enloque, eniâo, ele precisa até de ün outro tipo de simbolismo pêra
â1udir àqullo, cntâo. ele apelâ ao mito. E não há nisso uma inrprccisáo;
náo. isto é a traduçáo da própriâ estrutura da realidâdc, a realidad€ é
assin. ÀgoÍa, a pâftir do mom€nto e1n que você acrcditê qlre a rcâli_
dadc é construída conlo se losse urüâ máquina, estruturada por leis
üatemáiicas rigorosas, enião, você tem que conheceÍ essâs lcis perfei
tameni€, c conhecêlas dc tal modo que o conhccin1enio delâs lhe dé o
poder sobrc a máquina. É ai que ertra o ncgócio da imprecisáo. Qucr
dizer q|ando você náo consegue tàzer isso, vocô fala: "Não, âí tcnr
uma inlprecisão". E esta idéiâ esiá táo prolllndarnente na cabeÇa dâs
pcssoas, ela se aüaigou lão proiundamente na mentalidade modema,
quc a idéiâ da i prccisão leva as pcssoas âo desespero. Quer dizer, de
onde surge o tipo de ccticismo moderno? Ven dissolVocêtcnta conhe
cer prccisanenie Llrnâ coisa qüe en si mcslna é imprecisa; daivocê não
consegue c você acha quc tem algo eÍrado coln o seu conhecimento.
ll
\reja você, quando Kânt diz para as pessoas: .,Nós só conhecemos
os fenômcnos e náo conhccelllos as coisas-em-si",, ele está cxpondo
isso como se l'osse umalimitaçâo do conh€cimcnto humâno; e cle nâo
percebe r u< (urrc\oôrde1 u n.1., .an á. .r.i.r. qrje \ô.urr(gucn \e
mostrar para nós sob a fonra de lênômcnos, elas náo conseguem se
mostrar para nós só na suâ cssência pura. Ou seja, não é uma Iimita
çáo do conhccimento humano, é a estrutura da reatidade qLre ó assim.
E elc coloca isso como se Iosse urna limitaçáír do conhecinrento hu-
mano. Por exenrplo. o iàto de que você quando vê um animâl você só
consegue vü pelo lado enl que ele está. e, no êntanto você sabe que
clc rem outros lados. IGnt coloca isso cl,mo sc l'osse uma linitaçâodo conhecimento, quer dizer, a nossa estrlturâ dc pcrcepçáo é iáolalha quc ela só permitc ver o anirnal por rlnr dos lados. entáo. nós
sâbenos que o ânnnàl em sl mesmo náo e assim, que elc tenl Druitas
outras caracteristicas que pâra nós são inacessívcis. Eu digo: ah, sim,
e o pobre clo arinal, €le por sua vcz reria a câpacidade de se mostrarpara rnifl pff iodos os seus lados âo mesmo tempo? Só que Ifurtnão laz essa pe€unla. Entáo, algo que antcs era acejto como umacondiçáo normal da estrutura da r€alidade. de rcpente colneça a scr
visto corno uma anonralia ou urna limiiaçáo do conhecinenio huma-
no. Mas só parece assirn porque houvc uma ambiçáo dcsrnedida. é só
a partir da horâ en1 que você pretendeu levar o conhecinenro hu rano para alénl da própria estruiura da realidadc, dilo dc ourro modo,
a hora em qlre vocô não âceita mais a esrrutura da rcalidade, e você
quer iransfoÍmá la eln outra coisa, qucr dizer. você qucr transtbrniála en urna máquina perititânrente dominável e manipulávci. É ctaroque é unl dclirio de onipotôncial
riduAulx 24 Kant. C.rexlho, olavo d. Ed E ltcutt7aq.cs,2003
IZ
A idéiâ de Bâcon de quc "o saber se destina ao poder", essâ idéia
nâo tinha ocorÍido a ninguórn antes. Não é isto? A própria vida de Só-
cl?tcs denonstrâ que sabcr náo é poder, ele eslá sabendo de tudo c, no
cntanto. os cêms podcm mais do que ele. Entáo, ninguém antcs destâ
ópoca acreditou que o conhecinenio humano dcvcsse adquirir unl po
der sobÍe o conjunto dâ realidade. Um poder sobre nada na verdacle,
quer dize( Sócratcs com tlrdo o que ele sâbc náo consegue se salãr da
cncrcnca em que ele eslá. E isto é normâI, o ser hunano é rcal ente
assin. Por quê? Nós vilemos na conringência. nós nêo vjvemos dentro
dc um universo perleitamente lógico onde só existem as essências c
suas propdedades, náo. eristem os acidentes, em núm€ro infinito. A
acidenialidade ia7 pade da cstrutura dâ realidêde, ela náo ó un crro
ná estr!turâ da reâlidâde. E isto. nais ou nlenos iodo mundo sabiâ De
repcnte. eu creio qlre em râzáo da decadência do eosino, qucr dizcr o
ensino universitário. por exemplo- a que um DescaÍcs teve acesso, ou
que nrals iarde a que o próPrio l(ant teve acesso, cra rcalmente nuito
ruim, transmiiiâ a cssas pessoas uma idéia errada dâ ciência êrtigâ e
lnedievâl, eúáo, era natural que de certo modo os caras se revoltassem
contra âquilo c tentasse achar uma coisa melhor O que eles nao
sabiam é q c a coisa melhorque eles estavam procurando já exis iia an'
tigamentc, ncm precisâva ser inveniâda, era só recuperar âquilo que no
ensino tinha sido pedido. Quando o Dcscaries se rebelacontÍâos seus
mesircs do Colégio de La Flàche, clc acredita que eles repíesentâm
todo o pensanenlo antigo; quando clcs náo o representarl de mâneira
alguma. eles representâvan apenas Lrm resíduo que sobrou no fundo
de muitos séc!los de decadôncia. Entáo. você veja, prâticamcnte o que
sobruu de tocla â ciôncia aristotélicâ, na época e atê hoje na mentali'
dade de gÍande pafic dos universitários, é a idéiâ da silogistica, quan
dLr se lala "lógica dc Aristóie]es", você está entcndendo a silogística,
quer dizer aquela ciôncia demonstÍativa pela qual de duâs premissas
1u
você obté 0ma conclusão necessariamente. E ilrdo que saisse disso
os câras achavâm que não estava em Aristóieles, qlrando está; quer di-
zer. Aristóieles ad ite várias ordens de conhecirnento râcionâl muitogmduadâs, rnuiio mediadas enire si. Quândo, p(, exemplo, na décâda
de 30. urn slrjcito chamâdo Jcân-\,Iarie Leblon descobre que o étodo
de Aristóteles náo é a lógicâ. mas é a dialética, e ele diz isslr a primei
ra vez, elc causa um cscândalo, ninguérr âdffitlu isso. quer dizer. a
idéiâ de que Àristóteles consistia de basicamcntc duas coisâs: Iógica
anâlíticâ e â teologia do prineiro Dlotor imóvcl. O rrundo aristotólico
lal colno eles inâginavan era un1 rnundo ern quc aqui esiá dado o
primeiro motor iDúvei e a realidade s€ segue depois do pritneiro motor
imóvel conio âs conseqüências se seguen da premissa, quer dize! sc
ria rm mundo inieirânienle lógico, csrrutlrradinho que se apresentava
diante de nós como se losse unl edilício dedutivo. Quando Ariíótelesnuncâ dissc issoi isso é um ânti'âristoiêlismo. nras o que havja sobrado
clclc, nós podcmos dizer que as suc€ssilas geraçóes lbÉm anloldando
Aristótclcs ao scu próprio gosio. selecionârâm dele aquilo que lhes
parecia lnais hârmônico com â sua própria visão do mundo. entáo loiun1 Aristóteles iotalnente invcntadol E, notc.bcm. mcsrno aquelcs quc
descobrem que â coisa nâo ó assim, como cssc Lcblon, depois Eric
Weil, Enrico Berti, todos eles, o quc clcs fazcrn ó dizcr: "olha, Inas
em Arislóleles exi$te ulna vâriedade muito maior de enlbques, nâo ó
isto. o verdêdciro Àristóteles nâo é essc". Nlesmo ssin elcs âinda náo
pegam à unidâde orgânica do pensânento aristotólico En acho que cu
pcgüei com o negócio dâ ieoriâ dos quairc discursosr, porque você teln
âs quâtro fairas de discurso, quauo laixas de racionalidade, que cor
rcspondcm rigorosârrente à esirutura do conhecimenio, do lenômeno
do conhccimenb humano tai corú elc sc €leva desde as p€rcepçoes
sensíveis rlrôvés dâ sint€se imaginativa aié â lbm1açáo dos conceilos
c da possibilidâde dâ prova ânalítica. Mas isto é o Àristóieies que a
gente sabe hoje. essâ coisa de Aristótelcs começa a se lalar a partir dos
ânos 60, e isso é um ncgócio táo novo na história que até um idiota
coÍro eu pôde contribuir com âlguma coisa paú o progresso dessa
. ô\á \ sao dc Ari5rol.les \ílu\r(jrurf-(ui'-r)u'Lolnr.pr.ur"ote â nada pâra dizcr ali Mas isto é o qlle se sabe hoje, nâ Renascença
o que tinha sobrado de Àrislóleies era exâtâmente isso: a tcoiogia do
primeiro notor imóvet e a lógica dedutivâ. Tanio quc Bacon quando
cle lança o seu Novo Órganon que trocâ â ênfase no conhccnnento
dcdutivo pelo valor da induçáo. ele acreditâ que elc cstá Iazendo uma
trenenda novidade. ele âcredira que nada disso cxiste em Àristóteles
quando explicitamenle Aristóteles diz quc cm muitas coisâs a induçáo
é o írnico jeito de você chegâr lá.
Enião, qucr dizer que vocé tirha nesnro uma decadência do cnsi-
no E aquel€ a stotelisiro que eÍa transmiiido àquelâs gcraçôcs €ra
evidentenente insalislatório, mâs ao se rcbelâr contra cle as pessoas
nao percebenr quc cstão se rebelando apenas conlra una determinâ.la
etapâ da história da educaqão. mas acreditam que estão se rcbclando
contrâ todâ a Anlígiiidade Descafes acr€dita qL'c junto corn os jesuí'
tâs que loram professores delc csiá dcrrubando toda â Àntigüidâde, e
náo estái cstá derrubando só aqueles jesuí1as. Quer dizer, umâ cerra
coisa dcsnedida. un1a lallà de senso das pÍoporço€s. é caractcrÍstico
desta époc.t. Junlo co esta idéiâ ingônua. boboca, de cstar destruindo
toda a filosolia antiga quandovocê está âpenas discutlrdo com os seus
profcssores, mais ou menos clrmo um jove adolescente que acha quc
quando se rebela conLrâ os pais €le €stá se rcbclando contra toda a
hislóda anreriori porque ó assnn, só tcm na cabeça do âdolescenie. a
históriâ humana só te três eiapas, aqueia en que ele está, a imediaia-
nente anterior que é a dos pajs e anies iá com€çou a Idadc Médiê e ar.CrÍ!.lhoOlavódeAristótrlescmn.\nftApúclnxlntoduqao:,tcoriadosqualr.discu,s)s
1'+ t5