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2017
DIREITOS
HUMANOS,
GÊNERO E
DIVERSIDADE
Encontro
USP
Escola
07/2017
(CON)vivências, experiências e
interseccionalidades
“Nenhum de nós é tão bom quanto todos nós juntos”
AGRADECIMENTOS
A gratidão é o único tesouro dos humildes.
William Shakespeare
Sempre é tempo de agradecer... E quando vidas se encontram
com o propósito de celebrar uma convivência respeitosa em meio
a diversidade, este desejo transborda.
Somos gratos à Universidade de São Paulo, à Comissão de
Cultura e Extensão do Laboratório de Física da USP e ao 14º
Encontro USP Escola (julho/ 2017) pelo espaço de reflexões
organizado e concedido.
Agradecemos ao curso Direitos Humanos, Gênero e
Diversidade na Escola e à Professora Andrea Paula dos Santos
Oliveira Kamensky, que proporcionou uma perspectiva de
formação humana integral voltada para o aprendizado, a
compreensão e o convívio com as diferenças; promovendo uma
cultura de paz, o reconhecimento das diversidades culturais com
garantia de direitos humanos.
Nossa gratidão a cada empenho para que esta semana de cursos
de atualização acontecesse, os temas e as abordagens
diversificadas, o ambiente acolhedor que resultou no aprendizado
intensificado pela troca de vivências e práticas.
Sumário
APRESENTAÇÃO .......................................................................... 06
INTRODUÇÃO ............................................................................... 08
PARTE I – DIVERSIDADES ........................................................ 13
CAP 1 BIANCA ALENCAR .......................................................... 14
CAP 2 AMÉLIA SANTOS .............................................................. 19
CAP 3 CAMILA SOUZA ................................................................ 23
CAP 4 EMELY FAGUNDES .......................................................... 38
CAP 5 FELIPE DOS SANTOS ........................................................ 42
CAP 6 FLAVIELLE JOLLENBECK ............................................... 45
CAP 7 RIVKA ................................................................................. 49
CAP 8 LUCIENE ALVES ............................................................... 57
CAP 9 MARIANA OLIVEIRA........................................................ 58
CAP 10 EUGÊNIA KATO .............................................................. 63
CAP 11 LUCILENE FREITAS ........................................................ 68
CAP 12 ANA GISELE ..................................................................... 73
CAP 13 PROJETO‘ARTE E INCLUSÃO: UMA POSSIBILIDADE’
74
CAP 14 RELATO DE AUTOMUTILAÇÃO ................................... 78
CAP 15 PROJETO ‘UM OLHAR SOBRE A COMUNIDADE’ ...... 80
CAP 16 PROJETO ‘PRÉ CONCEITOS’.......................................... 91
PARTE II - GÊNERO ................................................................ 100
CAP 1 HERBE DISCÓRDIA ........................................................ 101
CAP 2 GIOVANNA LIMA ........................................................... 109
CAP 3 MICHELLE........................................................................ 112
CAP 4 PRISCILA ARANTES ....................................................... 122
CAP 5 SUZETE ............................................................................. 127
CAP 6 RELATO: EU, A HIPOCRISIA E O MOVIMENTO
LGBT ................................................................................... 131
CAP 7 PROJETO ‘UM COLETIVO FEMINISTA DENTRO DA
ESCOLA’ ............................................................................. 135
CAP 8 PROJETO ‘SIM, NÓS PODEMOS’ ................................... 138
CAP 9 PROJETO ‘GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOLA:
ROMPENDO COM O SILÊNCIO ........................................ 142
PARTE III – SEXUALIDADES ........................................ 153
CAP 1 BÁRBARA CRISTINA ............................................... 154
CAP 2 IZABEL LUSTOSA .................................................... 159
CAP 3 POESIAS
AS CEM LINGUAGENS DA AUTONOMIA ............................. 164
NÃO ESTOU EM CIMA DO MURO ..................................... 165
CAP 4 RELATO: MEU NOME É PATTY .................................... 166
CAP 5 RELATO DE HOMOSSEXUALIDADE E BULLYING
FAMILIAR ........................................................................... 168
CAP 6 PROJETO ‘DIVERSIDADE SEXUAL NO CONTEXTO
ESCOLAR’ ......................................................................... 171
CAP 7 PROJETO ‘POR UM FIO DE MEMÓRIA’ ........................ 174
CAP 8 PROJETO ‘AUTORES DA DIVERSIDADE’ .................... 178
PARTE IV RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS .................... 182
CAP 1 ANA PAULA .............................................................. 183
CAP 2 BRUNA SILVA .......................................................... 188
CAP 3 PROJETO ‘ A INTOLERÂNCIA NA ESCOLA NO ENSINO
DA EJA ............................................................................... 191
CAP 4 PROJETO ‘IDENTIDADE SE CONSTRÓI A PARTIR DA
VISIBILIDADE’ .................................................................. 195
CAP 5 PROJETO ‘DIVERSIDADE CULTURAL BRASILEIRA’ 201
APRESENTAÇÃO
O projeto Gênero e Diversidade na Escola, idealizado em
uma parceria entre o Ministério da Educação, a Universidade
Federal do ABC e as Secretarias de Direitos Humanos e
Cidadania da Prefeitura de São Paulo, desenvolveu um curso de
aperfeiçoamento voltado para educadoras/es e pessoas da
comunidade escolar dispostos a construir novos conhecimentos e
autoconhecimento por meio de quatro eixos temáticos:
1. Diversidades
2. Gênero
3. Sexualidades
4. Relações Étnico-Raciais
A metodologia foi aplicada a partir da elaboração de escritos
autobiográficos em diários, constituindo um memorial em que
cada cursista pode relacionar sua própria história de vida e
experiências pessoais com essas temáticas, reunindo elementos
de suas vivências e aprendizados para a construção de
um projeto de intervenção. O presente livro, resultado desse
curso, está organizado em seções entituladas pelas temáticas,
contém os referidos diários pessoais, relatos de histórias
presenciadas em escolas e projetos relacionados às temáticas
elencadas.
Nosso objetivo é sensibilizar a comunidade escolar para esses
saberes, interseccionalizando categorias de análise da realidade
social para produção de novos conhecimentos em práticas
educativas e culturais, transformadoras do cotidiano escolar.
INTRODUÇÃO
Gênero e diversidade na Escola: educadores valorizados e
produtores de conhecimento
Suzana Lopes Salgado Ribeiro
Este não é mais um livro sobre a discussão da
diversidade. Este é um livro que exibe caminhos e reflexões – de
professores – sobre seu trabalho no cotidiano da escola. Desta
ligação com a prática advém seus principais valores.
Um primeiro valor pode ser salientado diz respeito
aos sujeitos que compõe a autoria desta publicação. São
profissionais da educação participantes do programa de extensão
USP Escola, que oferece diversas formações de cunho continuado
– cursos, palestras e oficinas – para melhor preparar os
profissionais da educação. Destaca-se que tais profissionais
reconhecem suas limitações e buscam ampliar o repertório de sua
atuação pedagógica por meio de formações. Assim,
diferentemente do que por vezes ouve-se, os professores buscam
formação, investem seu tempo e dinheiro para melhorar seu
ofício, não sendo, portanto, acomodados e passivos. Além disso,
aponto que podem ser – como se mostra aqui – produtores de
saberes relevantes para a docência, que modificam seu meio e que
devem ser levadas em conta em estudos acadêmicos e da política
pública.
Um segundo valor, portanto, que decorre deste
protagonismo dos professores, é o de defender que o
conhecimento sobre a educação ou sobre a escola seja construído
em diálogo com esses sujeitos, imersos na prática do cotidiano.
Isso, pois entende-se que os professores são sujeitos fundamentais
para entender o universo escolar de forma profissional e profunda.
Sem escalas de valor, não cabe dizer que são mais importantes
que outros sujeitos, e, evidentemente, tem-se que ter em mente
que a escola existe para que os alunos possam aprender. Mas na
escola, os alunos são transitórios, já os docentes são mais estáveis
e podem mostrar aspectos mais perenes das relações estabelecidas
no contato com o cotidiano e a realidade escolar.
Um terceiro valor que pode ser notado em relação a
esta obra, é que para tratar de preconceitos e discriminações, é
preciso ouvir quem media esses conflitos cotidianamente. Os
professores são protagonistas neste quesito, e a partir desta
vivência podem formular apontar caminhos. Caminhos que
delineiam projetos e ações para combater os conflitos e as
desigualdades consolidados ao longo de séculos na sociedade
brasileira e ainda presentes em nosso mundo contemporâneo.
Dito isso, cabe falar da relevância da existência de
políticas públicas como o GDE, que permitem professores se
formarem para o trabalho com as temáticas das diferenças de
gênero, de etnicidade, de sexualidade. Retomando o conteúdo do
texto de introdução, vale contar o caminho percorrido para esta
oficina que é consequência de experiências anteriores. A Profa.
Dra. Andrea Paula dos Santos Oliveira Kamensky, da
Universidade Federal do ABC - UFABC, coordenou cursos em
modalidade de Aperfeiçoamento na Universidade Estadual de
Ponta Grossa – UEPG (2009) e na UFABC (2015), e realizou a
oficina – curso de atualização – Gênero e Diversidade na Escola,
no USP-Escola (2017). A partir desta oficina, alguns participantes
organizaram um grupo de estudos, desenvolvendo atividades
educativas e culturais, que, hoje, tomam concretude neste livro.
As diferenças são tratadas com atenção nas quatro
partes que estruturam o presente texto. Em cada parte, trabalha-
se uma das temáticas – diversidades, gênero, sexualidades e
relações étnico-raciais - apresentando-se uma reunião de diários
com registros de experiências de vida permitem uma
compreensão das questões relacionadas à intolerância e ao
convívio com as diferenças. Estes textos, de maneira subjetiva
revelam relatos pessoais e profissionais. Falam sobre as
dificuldades enfrentadas nas manifestações de diferenças, como
ter tatuagens e/ou piercings, ser nordestino, ser migrante, ser
negro, ser gay...
A partir dessas colocações, importa dizer que as
narrativas sobre o viver devem ser registradas e publicadas para
que se possa compreender a pluralidade de experiências
concomitantemente individuais/específicas e humanas/gerais. As
narrativas – curtas ou longas – presentes neste livro, constituem-
se como enunciados de si, expressões de subjetividade que
mostram enredos contraditórios e complexos forjados a partir de
vivencias particulares, experiências compartilhadas por muitos.
Com isso quero encerrar este texto com a reflexão da
urgência de buscar novas perspectivas – teóricas, metodológicas,
reflexivas – que reconheçam a importância das subjetividades na
construção do conhecimento, que reconheçam a coragem de se
contar e que reconheçam as possibilidades de transformação que
apresentam. Vejo os textos presentes neste livro como universos
subjetivos e identitários complexos, diversos e que não podem ser
reduzidos a esquemas de análises de ação coletiva tradicionais. A
leitura de cada texto oferece caminhos de se entender o diverso,
na diversidade e o complexo na complexidade.
Por isso mesmo, volto a repetir: este não é mais um
livro sobre a discussão da diversidade.
I. DIVERSIDADES
Capítulo 1
Bianca de Jesus Alencar
NINGUÉM TEM O DIREITO DE ME JULGAR POR EU SER
QUEM SOU E COMO SOU!
Vivências e história de vida na Educação Básica
Meu nome é Bianca de Jesus Alencar, tenho 29 anos, sou
pedagoga e atualmente trabalho com o Ensino Fundamental l, no
Governo do Estado de São Paulo.
Poderia parafrasear sobre diversas histórias que se
construíram ao longo da minha vida, num emaranhado de dor,
muita luta e resistência: a opressão de um pai extremamente
machista que sempre quis - sem sucesso - ditar o que era
permitido ou não à mulher. Sobre minha mãe, que é o meu maior
exemplo de sabedoria, força e perseverança; sobre o que vivenciei
e aprendi com alunos carentes da periferia e suas famílias no
período em que lecionei...
Mas falarei sobre um tema que ainda me atinge diretamente
e certamente ainda fará parte do meu cotidiano: a intolerância
com a diversidade e o pré-conceito.
Iniciei meu trabalho como professora em uma Associação
vinculada a Igreja Católica, gerida por religiosas (freiras) muito
comprometidas. O Projeto era mantido por doações vindas de
“bem feitores” italianos e atendia alunos das regiões periféricas
dos entornos do bairro.
Trabalhávamos com o reforço escolar e os alunos
frequentavam o local no contra-turno das aulas regulares. O
construtivismo norteava todos os planos de aula, fazíamos visitas
nas casas dos alunos, oficinas, projetos e a liberdade para criar
fazia tudo valer a pena. Por me encantar pelo trabalho foi que
decidi cursar Pedagogia.
Sempre fugi dos padrões estabelecidos pela sociedade e
desde muito jovem tinha piercings, tatuagens e o cabelo colorido
ou com algum corte “estiloso”. Durante esse trabalho na
Associação, o vermelho “Rita Lee” é que se sobressaía em minhas
madeixas.
Havia um encontro importante em Verona, com as Irmãs,
para a prestação de contas sobre o andamento dos Projetos que a
Associação realizava aqui no Brasil. Ficou acertado que iriam
duas representantes do Projeto de São Paulo, a coordenadora
pedagógica e eu. Então teríamos que nos organizar para
providenciar o passaporte, comprar as passagens aéreas, calcular
os custos e planejar tudo.
Fiquei muito animada com a possibilidade de fazer minha
primeira viagem internacional, decidi investir na viagem e não
fazer a formatura da graduação (que seria no mesmo tempo).
Neste período aprendemos a língua italiana e chegou o tempo de
tirarmos o passaporte. Ao nos avisar sobre tais procedimentos,
uma das representantes da Associação me chamou e falou sobre
todo o processo, e para aminha surpresa, reforçou:
- Bianca, você sabe que terá que pintar o cabelo de preto se
quiser nos representar no encontro em Verona não é?
- Oi?
Fiquei em choque. Foi ali, naquele momento que percebi
que mesmo depois de alguns anos lecionando e principalmente
convivendo com pessoas que me conheciam, como também ao
meu trabalho, que independente do valor que isso tivesse, os
julgamentos ainda prevaleciam.
Respondi imediatamente que se fosse para mudar quem eu
era, seguramente não iria. A coordenadora posicionou-se dizendo
que se eu não fosse, ela também não iria. Dessa forma aconteceu:
não fomos.
Algum tempo depois aconteceram algumas mudanças na
gestão e a primeira norma estabelecida foi que a partir daquele
dia, quem tivesse tatuagem (mesmo que de chiclete no caso das
crianças), piercing ou brinco, ao frequentar as aulas, deveria tirá-
los. Essa fala também foi dita durante uma reunião com os pais.
Na frente de todos eles, eu ouvi de uma das gestoras:
- Pode não parecer, mas uma tatuagem, um piercing dizem
muito sobre o caráter de uma pessoa.
Minha decepção só aumentou. A essa altura, eu estava indo
trabalhar sem os piercings e escondendo muito bem as tatuagens,
conforme as orientações. Sofri, chorei muito, muito mesmo.
Pensava que o problema fosse comigo e não o fato de não me
aceitarem como eu era. Questionei se deveria continuar na
educação (estava no último ano da graduação) e pensei até em
desistir do curso. Foram dias difíceis, passou um tempo e fui
trabalhar em outra Instituição.
Mas como nada nesta vida é por acaso e as voltas que a vida
dá não me deixam mentir... Com o tempo a crise atingiu a Itália e
as irmãs não puderam continuar mantendo o Projeto em São
Paulo. A Comunidade (algumas lideranças das pastorais
paroquiais) se sensibilizou, assumiu o Projeto e, como eles
desconheciam a rotina do lugar e precisavam de alguém que
tivesse vivências, fui convidada a coordenar o espaço.
Aceitei. Voltei! Agora era gestora do espaço que fui tão
hostilizada.
E é essa lição que levo para a minha vida quando me deparo
com os pré-conceitos que as pessoas tem quando me veem, essa
foi a primeira vez que senti na pele e depois dessa já tiveram
inúmeras situações... Mas hoje me respaldo na legislação e exijo
respeito. Vai ter professora dos anos iniciais “fora dos padrões”
SIM. Prontíssima para fazer a diferença, inclusive.
Capítulo 2
Amélia Santos
AS PESSOAS SÃO MUITO MAIS QUE NACIONALIDADE,
COR, ETNIA.
História de vida
Presenciei muitas atitudes de discriminação entre os
membros da minha família durante a minha infância,
principalmente por questões de origem. Sempre ouvi história
sobre os antepassados e seus relacionamentos conjugais. Minha
mãe teve as relações cortadas com o pai dela, aos dezenove anos,
pois ela ousou casar se com um nordestino, o qual meu avô
abominava pela sua origem. Meu avô, que era argentino filho de
espanhóis, casou-se com uma mulher (minha avó Maria) que era
conhecida pela família dele como a “negrinha”. Minha avó Maria,
filha de um italiano com uma mineira: nesse caso, a família do
italiano não aceitou o relacionamento de seu filho. Minha bisavó
faleceu durante o parto de minha avó, que foi criada por esses
avós italianos.
Eu e meus irmãos por convivermos mais com a família da
minha mãe, tínhamos algum sentimento de inferioridade em
relação aos demais membros dessa família: tios, tias, primos etc.,
pois nosso pai era nordestino e, pelo visto, isso não era algo bom
perante a opinião da família.
Quando visitávamos meu avô, lembro-me o quanto ele
enaltecia a raça espanhola, o quanto meu avô tentava mostrar a
superioridade em relação às demais. Só fiquei sabendo que ele era
argentino quando veio a falecer, visto que ele se considerava
espanhol, por conta seus pais que eram da Espanha. Não me
lembro dele ter falando alguma coisa sobre o meu pai com a gente
– os netos, ele nos aceitava e gostava muito de nós, brincava,
comprava presentes e levava-nos para passear de carro. Meus
irmãos e eu nos divertíamos muito com ele, mas ele não queria
ver minha mãe e meu pai. Fomos privados da sua companhia por
volta dos meus seis anos de idade, não sei o motivo. Minha avó
continuava a nos visitar sem que meu avô soubesse. Ele faleceu
aos sessenta e dois anos de idade e não houve tempo para um
reencontro, entre a filha, os netos e, quem sabe, com o próprio
genro. Mais tarde soube por alguns tios que meu avô também
sentiu muito o afastamento desses netos.
Minha mãe sofria violência doméstica por parte do meu pai,
isso fazia com que a gente tivesse a impressão de que o meu avô
tinha razão em relação à opinião dele sobre o meu pai.
Minha tia, irmã da minha mãe, casou-se com um português.
Ouvíamos falar que ela sim estava se casando com um homem
bom que poderia dar um futuro melhor para ela, não era como a
minha mãe que não soube escolher, casando-se com um “baiano”.
Diante de tantos absurdos que presenciei nessa etapa da
minha vida, me aproximei da família do meu pai. Na
adolescência, fiz questão de ir até a Bahia. Conheci pessoas
maravilhosas, e só confirmei aquilo que eu sempre achei e sentia:
as pessoas são muito mais que nacionalidade, cor, etnia.
Capítulo 3
Camila Souza
PERSIGO MEU SONHO DE, COMO EDUCADORA, REDUZIR
AS VIOLÊNCIAS TODAS
O QUE ME TROUXE AQUI?
Minha família nasceu e se desenvolveu na Vila Madalena,
hoje um bairro de classe média de São Paulo, tendo-se mudado
em 1976 para a região do Butantã,
Meus bisavós maternos, chegaram dos mais diferentes
lugares - Ceará, Portugal, Rio Grande do Sul e Itália – todos entre
1884 e 1911. Somente a Bisa Brasilina ( única de sua família a
nascer no Brasil e por tal razão rejeitada por acharem que seria
“mais escurinha”) era letrada; uma indígena, um cangaceiro e um
militar todos analfabetos.
Da geração seguinte, toda nascida em São Paulo, todos
foram à escola, mas somente 2 gerações depois, teríamos os
primeiros parentes com diploma superior.
Sou filha de vó, ela ocupou no meu imaginário aquele
lugar da mãe socialmente ideal: uma guerreira mãe de 7 filhos, 1
deles com uma deficiência mental. Ficou viúva aos 36 anos e além
de seus filhos ainda criou meu primo e eu, nascidos 1 mês após a
morte do meu avô.
Minha vó foi 5ª filha de 7 irmãos casou-se aos 18 anos
(grávida) e fez somente o “primário”, como chamado na época.
Todos os seus irmãos foram matriculados na escola; para sua mãe,
analfabeta com o sonho de ser poeta, o letramento era essencial.
Conseguiu uma vaga na enfermagem do Hospital das Clínicas,
em 1956, onde trabalhava sua irmã mais velha.
Minha mãe, que foi mãe solo aos 17 anos, era meio hippie,
muito livre, gostava de música, bicho, de gente. Ela nunca gostou
muito da escola, simplesmente fugia desde sempre, tanto minha
vó quanto minhas tias falam do quanto minha mãe não cabia na
escola, e assim como pulava a janela de casa pra viver, saía da
Fernão Dias e “ia pro Pão de Açúcar da Teodoro ouvir música
no corredor de eletrodomésticos”.
Ela achava “careta” a educação que minha vó me dava,
escolhia a melhor escola pelo tamanho do quintal. Se tivesse chão
de terra e árvores pra subir, seria a escolhida. Perfeita se não
tivesse muros e as crianças tomassem banho de mangueira e
chuva vez ou outra. Ela me chamava de chatinha e buscava me
mostrar que o mundo era muito maior do que aquilo que eu
conhecia.
Toda minha educação básica foi em escola pública, ‘fiz o
“prézinho” do bairro, era uma Escola Parque onde a gente
brincava na terra, podia correr, meninos e meninas brincavam
juntos e os coleguinhas eram os mesmos das brincadeiras nas ruas
do bairro. As professoras eram “tias” e o que movia o ano pra
mim eram os ensaios das apresentações artísticas que aconteciam
sempre no segundo semestre. As lembranças mais fortes que trago
deste período são do percurso de casa a escola (que fazia
brincando com minha mãe) e do parque.
Fui para o primário. Minha alfabetização foi bastante
natural, consolidando-se ainda no primeiro semestre da primeira
série, já na escola ‘dos maiores’. Nessa época toda a rotina de casa
estava em torno do ir e vir da escola. Tanto o uniforme como o
material precisavam ser comprados, para tanto, a opção
encontrada para complementar a aposentadoria de minha avó era
vender salgadinhos para festas e todos nós colaborávamos nas
encomendas.
Sendo o dinheiro da aposentadoria e dos salgadinhos
insuficientes para custear a gente na escola, para evitar que
fossemos para a ‘caixa escolar’ (atendia as crianças cujas famílias
não podiam comprar uniforme e material, motivo que causava
discriminação na escola), minha avó passou a vender doces na
porta da escola que estudávamos, quando fomos para o grupo
escolar (atual fundamental II).
Da terceira série em diante, minha relação de amor com a
escola mudou muito, eu era “a sem pai nem mãe”, só não era pior
do que minha amiga que morava no orfanato, que todos olhavam
com cara de pena. E o calendário comemorativo reforçava isso.
Pior dia do ano pra mim era o “dia dos pais”: todo ano eu tinha
que explicar que não tinha pai e ouvir que não dá pra nascer sem
pai, que todo mundo tem pai. De início minha avó representava
meu pai, até o ano que minha mãe já alcóolatra e agora com
problemas de drogadição, fora colocada pra fora de casa, então
não teve mãe no dia das mães. A partir dali, ninguém ia ao dia de
ninguém. Questão resolvida. E foi libertador, pra todas nós.
Fui percebendo que nem todas as famílias eram iguais, as
mães de algumas meninas não as deixavam ir brincar na minha
casa e minha presença na casa delas durava até saberem que eu
era “criada pela vó” viúva. Fui construindo minhas relações de
amizade na rua e buscava me aproximar das crianças que tinham
uma realidade mais parecida com a minha e diferente das do
bairro de classe média em que eu cresci.
Tinha 4 professoras: português, matemática, ciências e
educação física. Lembro de algumas delas que marcaram:
Profª Marialice Coelho Dourado, de Português: letra
linda, lousa colorida, trazia a música, o teatro, o lúdico, a
literatura e o que eu mais amei desde sempre redação; tudo
acontecia nas aulas dela
Profª Joselita que tornava a Matemática a coisa mais legal
que eu já tinha conhecido, ela trazia jogos e amava os
números, tinha uma doçura diferente de outros
professores de matemática, ela nos respeitava e ao tempo
de cada um, aceitava as diferentes formas de resolver
questões e sempre trazia problemas que envolviam a
turma toda.
Não lembro o nome da professora de ciências, mas para
mim ela era mágica, afastava as carteiras e nos colocava
como protagonistas nas experiências, éramos o Sol, a
Terra e todos os planetas, entendendo as órbitas e seus
movimentos, girando por toda a sala de aula. Passei a
estudar astrologia inspirada pelos planetas que ela me
apresentou de forma tão mágica.
Já na Educação Física, os meninos faziam separados das
meninas, somente era junto quando faltava um monte de gente.
Aí brincávamos de corda, mãe da rua, esconde-esconde,
ocupávamos a escola toda, com menos supervisão.
Eu era a menina falante, inteligente, loirinha de cabelão
liso até a cintura. Boazinha, voz de gralha, mas educadinha,
sempre querendo agradar. Era comum as professoras quererem
“me adotar”, me convidavam às suas casas, faziam penteados no
meu cabelo, nunca vi uma de minhas professoras pentear o cabelo
crespo de outras meninas ou tecer elogios a elas. Na época não
entendia bem se elas sentiam pena de mim, ou se não gostavam
de todas as outras meninas.
Da 3ª pra 4ª série, também começavam os movimentos de
formação de grupinhos, muito relacionado com a pré-
adolescência e toda a coisa de meninos de um lado e meninas do
outro ficou cada vez mais forte, o que nos unia ainda eram os
assuntos das aulas que forçadamente compunha grupos mistos,
que promovia um convívio fora da escola. Foi de um destes
grupos que eu e outros 4 alunos decidimos ‘ajudar’ no reforço das
crianças de 1º e 2º ano. Na 4ª série tivemos um surto de hepatite
na escola, a contaminação se deu pelos bebedouros. Passei 4
meses sem poder frequentar a escola, voltando soube que nosso
projeto tinha sido encerrado.
O projeto de monitoria, interrompido pela diretoria, teve
tão bom desempenho com as crianças, que, quando chegamos ao
5º ano e mudamos de período, retomamos a monitoria e passamos
a brincar com as crianças menores no intervalo delas,
colocávamos em prática com apoio da coordenadora pedagógica
Foi daí que a coordenadora conversou com a gente sobre Grêmio
Escolar. Dona Petita, uma profissional que abria a secretaria pra
gente, também abriu a possibilidade de uma forma mais efetiva
de participarmos da gestão escolar. Compusemos então o
primeiro grêmio da EMPG Des Amorim Lima em 1988, e com
atividades que abria as portas da escola oficialmente no final de
semana e dali pra frente, até hoje, nunca foi diferente.
Era um tempo de muita discussão política, Período de
redemocratização, minha família ia às ruas nas carreatas desde as
Diretas, Mas descobrir esta coisa dos debates foi grandioso, além
das artes, tinham outros meios de comunicar.
Enquanto ia para a escola na 6º série, sozinha, um homem
que sempre estava na padaria quando eu ia comprar pão, estava
ali parado me esperando. Ele me cumprimentou, eu retribui como
sempre fazia e me chamou para “me dizer uma coisa”. Esta coisa
era uma arma e me puxando ali mesmo no mato alto do fundo do
posto me estuprou. Fiquei chorando até perto do horário de saída
da escola que estava há somente 1 quarteirão e quando deu o
horário fui para minha casa, assim, sem contar pra ninguém,
envergonhada. Desta forma, achei que se ninguém soubesse, era
como se não tivesse acontecido.
Meu comportamento mudou, a escola me encaminhou
para psicóloga do posto. Como confiaria naquela mulher que só
me mandava desenhar e nunca tinha sequer olhado pra mim? Eu
ainda não podia falar.
No segundo semestre deste ano, minha mãe que já estava
vivendo com um companheiro, engravidou e me convidou a ir
morar com ela. Fui para Embu das Artes, onde me transferiram
pra uma escola estadual a partir do ano seguinte.
Aos 12/13 anos, na 7ª série, eu era uma rebelde
transgressora, que se colocava em todo tipo de risco. Arrumava
briga, cabulava aula, até chegar ao limite de levar a arma do meu
padrasto para a escola e brincar de roleta russa com minha turma.
Nessa escola, a profª de Educação Física costumava promover
rodas de conversas. Numa destas rodas, falando sobre
sexualidade, fui a única a dizer que não era virgem e pela primeira
vez vi a possibilidade de contar o que havia acontecido comigo
no ano anterior, mas fui cortada por ela dizendo: “Não é mais
virgem? E o que você pretende fazer da sua vida? Nunca haverá
um homem que queira casar com você!” Nunca, jamais, me
esquecerei destas palavras, das caras de repulsa dos meus amigos
e do chão se abrindo embaixo de mim. Abandonei a escola.
Definitivamente aquele não era o meu lugar.
Sair da escola me obrigou a retornar para a casa da minha
vó, arrumei um emprego na vídeo-locadora que tinha acabado de
abrir no bairro.
Num período de quase 3 anos, flores chegaram a minha
casa algumas vezes, mesmo no tempo em que eu não morava ali.
Até que, em uma tarde, num destes dias, as flores chegaram perto
das 15h (o mesmo horário de entrada da escola há anos atrás). Eu
as recebi, não tinha cartão, somente meu nome, como das outras
vezes. Nesta tarde, estava sentada na calçada, quando um homem
subindo a rua, me cumprimentou pelo nome; percebo que era ele
que me enviava flores. Por fim contei que aquele homem havia
me estuprado. Foi um choque para todos, mas a cada frase e a
cada minuto eu me arrependia mais da revelação. Minhas roupas
curtas foram as primeiras a serem responsabilizadas, na sequencia
minha educação e excessiva simpatia. Estava ali tudo explicado,
a culpa era minha.
Aos 15 anos engravidei do rapaz de 19, que eu namorava
desde o fim dos 13 e achava que tinha vencido na vida. Agora eu
tinha um filho nos braços, não havia terminado o ensino básico,
não tinha liberdade para ter uma amiga ou ir à padaria; mas estava
construindo uma família, socialmente adequada, custasse o que
custasse. Acreditando nisso, me mantive em um relacionamento
abusivo por 20 anos.
O fim da adolescência me rendeu duas tentativas de
suicídio e auto-mutilação; eu precisava muito que aquilo tudo
acabasse, que parasse de doer. Apesar de dolorosas as acusações,
a confusão da culpa, a nenhuma estima, falar foi libertador, foi o
princípio da superação e cura.
Conclui meus estudos entre idas e vindas de uma
adolescência complicada. Em 1994, me matriculei no supletivo e
conclui a 7ª e 8ª séries. Eu me envergonhava muito de não ter
estudado. Durante o supletivo eu já sabia me defender das piadas
maldosas de professores. Trabalhava, cuidava do meu filho, com
a ajuda da minha avó, eu conseguia estudar
Em 1995, veio o diagnóstico HIV+ da minha mãe. Na
década de 80/90 um diagnóstico de AIDS era uma sentença de
morte. Minha mãe tinha 34 anos e ainda nem sabíamos se meus
irmãos com 6 e 5 anos na época, teriam sorologia negativa. Neste
mesmo ano meu padrasto faleceu e minha mãe que havia se
convertido a uma religião protestante e estava sóbria há quase 5
anos, voltou a beber.
Foram quase três anos de cura da nossa relação durante o
tratamento, acordando a cada dia e vendo ela morrer um
pouquinho. Foram anos de total dedicação, até que no final de
1997, quando por fim conseguíamos dizer eu te amo, ela se foi.
Minha mãe me ensinou sobre generosidade, sobre amor, sobre ser
quem você é. Ela viveu os 37 anos mais intensos que alguém
poderia ter vivido e demorei outros tantos anos depois da morte
dela, até entender que ela havia me ensinado a lição mais valiosa
que eu poderia aprender: a viver. Foi neste período entre idas e
vindas ao Hospital Emílio Ribas, em São Paulo, que observei o
grande número de senhoras, casadas, em relacionamentos
tradicionais, que se descobriam soropositivas depois da morte do
companheiro de muitos anos. Em sua maioria eram resignadas.
Entre as mais jovens, a revolta era maior, com um número que
chamava atenção de tentativa de suicídio.
Concluí o ensino médio só em 2009, novamente na EJA.
Busquei colaborar na formação de todas aquelas pessoas que não
tinham tido nenhuma oportunidade, e aproveitei a oportunidade
de todo o conhecimento trazido por todas elas; “nenhum a menos”
foi nosso lema até o fim e vi muitas vidas serem transformadas
pela oportunidade da educação. Não foram os professores, muito
menos a gestão que nos motivou, éramos nós que nos
fortalecíamos, era o vínculo que criamos em nossas dificuldades
que nos aproximava. Eram muitas as opressões que nos uniam.
Hoje estou no 3º semestre de Pedagogia, EAD-UNICEU;
é a minha grande chance e farei dela o melhor que eu puder,
agarrada a esta oportunidade com unhas e dentes. Minha vó, hoje
aos 82 anos, ainda banha meu tio de 53 e sonha em me ver
formada
Sofri bulling na minha turma nos primeiros semestres:
pergunto demais, contesto demais, quero aprender demais.
Minhas colegas sentem-se atrapalhadas por mim. Dividida entre
me calar e não atrapalhar, ou tirar deste curso tudo que ele puder
me oferecer, persigo meu sonho de como educadora reduzir as
violências todas que vi e vivi nas escolas por onde passei, na
busca por ser uma formadora de formadores que olhe a criança
como o universo particular que ela é, mas parte do todo, com
direitos, considerando de onde ela vem, suas experiências e
fazendo de suas limitações potencialidades a serem estimuladas e
desenvolvidas. .
Desde 2012, dedico integralmente minha vida a
coordenar, orientar, facilitar e promover a execução de projetos
de jovens artistas periféricos, na busca pela redução das
desigualdades sociais, do machismo e do racismo; por ver na
prática nossos Direitos Humanos e Sociais garantidos em sua
integralidade, numa perspectiva intercultural de Cultura de Paz.
O diploma que busco hoje, já não é importante só pra mim;
mulher periférica, feminista, educadora social, documentarista,
produtora cultural e mãe sem romantização; o diploma é também
para outras mulheres que se viram entre os retalhos que formam
a colcha da minha existência, para que se motivem a não desistir
delas mesmas.
Camila Souza
Coordenadora de Projetos do Instituto Haphirma pelo Desenvolvimento
Humano Integral e Idealizadora do ErêTantã_Bloco do Brincar.
Como foi passar pelo GDE-2017?
Primeira manhã no 14º Encontro USP Escola: cheguei a sala do
GDE-2017, a música cheia de energia nos recebeu, logo percebi que
seria deslocada do meu lugar. Feminista, cheia de certezas, mas
transbordando de dúvidas; cheguei ali naquele primeiro momento,
emocionalmente impactada por estar na USP, como aluna em um curso
de extensão. Para quem brincou naquele quintal por toda a infância, sem
jamais ser encorajada a tentar estar ali.
Segundo dia eu tentava assimilar a tal metodologia de
autobiografia e começava a ver pequenos pedaços meus em cada
história que se contava ali, cada fragmento de memória; tanta superação
naquelas vozes que também eram minha, uma força que a gente não
entende de onde vem. Eu ainda não havia começado nem biografia,
menos ainda diário ou projeto. Estava atida a plataforma que fora
apresentada, com tantos conteúdos de referência, e encantada com a
Prof Andrea Paula, tanto conhecimento e uma luz que trazia a tona
possibilidades que eu jamais tinha imaginado.
Metade da jornada eu me dei conta que me sentava para tentar ler,
mas na verdade aquela hora na grama servia para assimilar todo aquele
conhecimento fervilhando na cabeça. Não rolou grana nem pro
bandejão nesta semana, mas a alma estava tão alimentada de tantas
outras coisas, que a matéria pouco importou. Nós dançávamos. Todos
os dias, pelo menos uma hora. No começo, bem mais tímidas, mas ali,
já no meio daquela jornada tão íntima, nos divertíamos com os passos
trocados e a exaustão, mas era libertador e nós já éramos um grupo.
Já no penúltimo dia juntos, precisava começar minha biografia,
desde o primeiro dia buscando como construir. Criei um grupo em uma
rede social, com as tias de mais idade da família e comecei a provocar
memórias de tempos antigos, gerações atrás; aquele curso estava
refletindo na construção da identidade da minha família, o que para
mim era muito importante ( minha mãe faleceu com apenas 34 anos e
não tive presença paterna, nem carrego seu nome), pois minha história
nunca foi contada. Não tenho álbuns de fotos de aniversário ou de
apresentações de escola, a família já fazia um rodízio para garantir que
pelo menos uma pessoa comparecesse a escola. Estava eu ali, tomando
consciência das dores e violências provocadas por duas das instituições
sociais mais sólidas: a família e a escola.
Último dia, precisava lidar com o rompimento. Havia uma
promessa de que o grupo não se dissolveria ali, mas tantos outros bons
grupos, quando concluem suas formações, se dissolvem. Período da
manhã, eu me inscrevi no último momento para falar. Tremia. Nunca
contei aquela história, estava ali tão despida quanto nunca tinha
experimentado, mas estava entre pares e não tinha dúvidas do carinho
de todas as pessoas presentes. Levei o hino da Marcha Mundial de
Mulheres Contra o Racismo e pelo Bem Viver e contei da minha
experiência na formação de formadores, com atores culturais
periféricos. Fui muito bem acolhida e eu pensava: ‘Porque será que
ensinam tantos conceitos? Olha esta metodologia, sou outra pessoa, foi
transformador!’
Depois do GDE o grupo não só não se dissolveu, como se uniu
ainda mais. Temos construído e dançado, dançado muito. E aprendido
e nos encantado.
Até o próximo GDE, onde estaremos presentes de corpo e alma,
ampliando esta rede multiplicadora da Cultura de Paz.
Camila Souza
Capítulo 4
Emely Fagundes
OUVINDO O PRÓXIMO, PODEMOS ENTENDER E
COMPREENDER MELHOR OS PONTOS DE VISTA DE
CADA UM E COM ISSO CONSTRUIR A PRÓPRIA OPINIÃO
O Despertar
Meu nome é Emely, minha família me chama de Jacqueline,
meu segundo nome. Tenho 30 anos, sou Pedagoga, formada em
História e tenho 4 pós-graduações em arte e terapia,
psicopedagogia institucional, alfabetização e letramento e
psicopedagogia clinica e hospitalar. Estou começando minhas
pesquisas para o Mestrado, pesquisando quais universidades
serão possíveis para o estudo, após eu ter conseguido a
oportunidade de ser coordenadora no meu trabalho, onde pude
perceber a importância da formação do professor para a sua
prática.
Desde pequena sonhava em ter uma profissão, brincava de
escolinha com minhas primas, escrevia na lousa, lia livros,
imitava meus professores, acredito que tive boas influencias para
seguir esse caminho. Convivi com algumas dificuldades,
trabalhei muito mesmo estudando no Ensino Médio, sonhava em
entrar na faculdade Uninove. Lutei, fui atrás do Movimento dos
Sem Terra e consegui meia bolsa; assim concluí o curso de
Pedagogia. Durante esse processo fiquei 5 anos estudando, pois
fiz 2 pós-juntas. Esse período não comprava nada, usei as mesmas
roupas e sapatos por anos. Tinha uma visão fechada, pois pertenço
a uma religião que por muitas vezes o homem dita sua lei, mas eu
penso que Deus está em nossos corações e quem julga é somente
Ele. Portanto, aos 22 anos de idade, quando encerrei meu primeiro
ciclo de formação, mudei meus pensamentos, modo de agir, falar
e andar; tive forças para separar as questões da igreja e da
profissão, pois eu seguia conforme os costumes e regras que são
colocadas por cada religião: mulher usar somente saia, cabelo
grande, não ouvir ou dançar músicas que não sejam da nossa
igreja, não ter TV. Não deixei de freqüentar, no meu modo de paz,
ouço músicas que sinto vontade e danço quando quero.
Muitas pessoas na época criticaram (meus pais ficaram do
meu lado), essa mudança dizendo: ´´Você cortou o cabelo´´, ´´
você pintou o cabelo´, você está usando calça´´, vamos orar
por você.
No começo eu senti dúvidas, pois esses comentários me
deixavam achar que errei e que pequei diante de Deus, mas
consegui compreender que pessoas têm opiniões diferentes,
idéias, ações e interpretações à sua maneira, aprendi a respeitar e
aceitar.
Algumas vezes debatia, fiquei um bom tempo sentindo uma
revolta por ter feito essa mudança. Acredito que todas as pessoas
têm o direito de escolha e mudança, e não importa quando isso
acontecer, temos que respeitar e compreender.
Quando iniciei o curso GDE, que fui escolhida, fiquei muito
feliz, pois só em falar USP, foi um orgulho. Durante o curso tive
muitas idéias do que escrever que daria um livro, pois sou uma
pessoa que gosta de ouvir muito. Acredito que ouvindo o
próximo, podemos entender e compreender melhor os pontos de
vista de cada um e com isso construir a minha opinião após
analisar cada situação.
Capítulo 5
Felipe Eduardo dos Santos
TODOS NÓS TEMOS DIREITOS E DEVERES
As Descobertas
Sou o professor Felipe, tenho 29 anos, sou de São Paulo,
recém formado em Educação Física. Atuei como estagiário na
prefeitura de Caieiras, onde aprendi e descobri coisas novas
dentro da minha área, com as experiências dos professores já
formados.
Vou relatar aqui dois fatos em breve palavras:
A minha vida, desde pequeno, foi de desafíos. Cresci
querendo ter as coisas, como qualquer outro rapaz: carro, trabalho
e habilitação.
Consegui trabalhar em uma empresa, sem pensar em
faculdade; mas não via a hora de me formar e ter meu dinheiro.
Trabalhei com serviço de metalúrgico muito pesado e comecei a
perceber que os estudos eram importantes, pois quem tinha
recebia mais e tinha melhores cargos.
Minha irmã já estava formada, e nunca deixou de estudar
até hoje. Ela é pedagoga e está como coordenadora. Pensei que eu
poderia ser professor, pois gosto muito de jogar bola e de assistir
esportes na TV.
Então decidi pedir a conta no trabalho, me arrisquei.
Comprei um carro, já tinha uma moto do meu outro emprego.
Cheguei a pensar que não iria conseguir terminar o curso: muitas
lutas, peguei algumas DPs, mas estou firme; ainda desempregado.
No meu estágio aprendi muitas coisas, mas destaco algumas
situações relacionadas à nossa cultura. Alguns pais, por serem
evangélicos, não aceitavam que seus filhos participassem de
atividades como: dança, uso de roupas de acordo com a dança,
comemoração de alguma data que para eles remetem a idolatria.
Considerei que estavam privando seus filhos dos seus direitos.
Isso me marcou muito, pois acredito que todos nós temos direitos
e deveres, mas muitos pais precisam ter conhecimento e entender
muitas questões culturais.
Capítulo 6
Flavielle Jollenbeck
Diversidade religiosa – três (ou mais) em uma
pessoa.
Talvez minha história seja parecida com muitas outras,
visto que o que vou falar é sobre minha trajetória religiosa.
Fui batizada nos conformes do Catolicismo, como
acredito que a maioria da população. Mas nasci e minha infância
foi dentro da Umbanda, minha mãe era “mãe de santo” do bairro
onde vivo, meu quintal tinha um centro: ouvir e bater tambor eram
normal. Uma religião como qualquer outra, em que alguém que
precisa de ajuda encontra o conforto, mas demonizada para a
maioria dos que não conhecem ou não convivem, ou ainda que a
use como forma de querer fazer o mal ao outro e atribua essa
maldade a religião e não a suas atitudes.
Quando criança, tive pneumonia, e por estar num estado
em que minha mãe julgava muito ruim, ela fez uma oferenda a
Oxum, pedindo minha melhora, me deixando assim em cuidados
desse orixá. Se foram os medicamentos ou a intervenção divina
que me fez melhorar, já não sei, mas até hoje é muito difícil eu
ficar gripada, com força que, segundo minha irmã, “é maior que
de muito homem por aí”.
Após o falecimento da minha mãe, minha irmã me levou
para a religião evangélica; não de forma autoritária e nem
agressiva. Nunca fui obrigada a seguir nenhuma religião, mas era
o que ela acreditava e queria meu melhor. Ela já estava indo em
igrejas e conhecendo antes, tanto que minha mãe se converteu
pouco antes de sua morte.
Acredito que foi essa religião e seus engessamentos que
causaram tantos entraves que carrego até hoje: coisas pequenas
como ter medo da religião onde nasci, jogar brinquedos do
pokémon que era visto como demoníaco, ter medo de ser
constantemente castigada por Deus e negar minha orientação
sexual. Estudei o Fundamental II em uma escola religiosa, onde
havia cultos toda sexta depois do intervalo.
Talvez tenha começado aí tantas inseguranças e medos,
ou não. Minha vida até os dez anos (quando minha mãe morreu)
é contada pelos meus irmãos e depois disso, parece que as
histórias se bagunçam. Atualmente, adulta, me reconheço como
do Espiritismo Kardecista, assim talvez como meus irmãos.
Mas a questão de tudo isso não é só sobre uma pessoa
que passou por algumas religiões e carrega a diversidade disso,
mas como em sala de aula isso é totalmente anulado. Claro, a
escola é laica... mas para os alunos. O professor e o Estado
parecem imunes a isso e coloca a vertente do Evangélico como o
padrão correto a ser seguido. Isso, diretamente interfere naquela
aluna que não se reconhece nele, ou que talvez apenas não tenha
interesse nisso. Então, como romper um molde de educação que
parece tão inquebrável?
Capítulo 7
Rivka
O QUE É SER TRANSPARENTE?
Eu: um eixo de diversidade
Sobre mim: Rivka, quase uma década de magistério,
mestre, doutora em Literatura, dois livros de ficção publicados...
Sentiste falta de algo? Sim, eu também sinto a falta do meu lado
pessoal Rivka, trinta e dois anos, homossexual, judia, sobre-peso-
devoradora-de-livros-e-de-tudo-que-cause-bom-paladar,
comediante enrustida, sagitariana com ascendente em gêmeos e
lua em peixes, amante de um bom uísque com porcentagem
alcoólica baixa e de um cigarro de baixa nicotina apenas para criar
o clima biográfico nebuloso de Saussure nos meus textos sobre
meu azar no amor, mas sem se descuidar da saúde. Piscadela
fotógrafa. Nostálgica que prefere Canal Viva a Netflix (não
rigorosamente), nostálgica a discos de 1989 para antes...
Esse meu lado retraído, especialmente tímido, parte da
minha existência fingido, outra parte sofrido preconceito. Esse
meu lado pessoal endurecido com postura docente frente ao
aluno, por orientação de possível repressão misógina. Retraio
minha orientação aos alunos. Tenho colegas, homens gays,
assumidos à classe e que têm todo apoio. Isso não se aplica às
mulheres, pois ainda há o “preceito esperançoso” de que a mulher,
ainda mais se for professora, há que defender as retro-normas
adotadas ao “bom costume”.
Quando me uni a um colega e amigo gay nos movimentos
LGBT, o corpo docente, composto mais de 90% por professoras,
teve a sua maioria evitando me dirigir a palavra. Não entendi. Mas
não sofri! Apenas sinto em não poder compartilhar
amistosamente sobre minhas inspirações líricas e amorosas no
que me faz comum e feliz sem me importar com que julguem.
Meu lado fingido – que não faço mais – é um feixe da
parte retraída: fui noiva “heterossexualmente” duas vezes.
Daqueles namoros chatos e blasé de domingo cuja única atração
que me causava um pouquinho de frenesi era admirar as bailarias
do programa Silvio Santos. Até aí, sem comentários, passemos à
parte terceira.
Meu lado sofrido preconceito foi na escola onde cursei a
primeira série, ainda do antigo segundo grau. Escola católica onde
tive minha entrada proibida na capela por ser judia... Colegas de
turma evitavam se aproximar de mim. Na dita “hora da oração”
ia, lá, eu para a biblioteca. Namorava a Literatura nesta época...
Hoje já me encontro casada com ela através de mestrado e
doutorado em papel passado e lecionando-a com amor.
Voltando para o meu lado ativo na sala de aula, meus
alunos conhecem o lado de defesa: a titulada, a elaboradora de
projetos, a postura ereta não-emotiva, objetiva. Pergunta-me tu se
isso me torna o dia cinza. Respondo-te que, de tudo isso, a cinza
das horas – amálgama de Manuel Bandeira – cede espaço a cinza
daquela que tem de esquecer-se subjetivamente para não exibir a
consequência do seu leque de diversidade.
Bom, por isso, escrevendo sobre o eixo diversidade, é
plausível considerar que a diversidade não seja um assunto
tratado de professores para alunos, mas que seja também
tratado/trabalhado entre os professores, os funcionários, os
responsáveis. Toda comunidade escolar é diversa por sua
natureza! Logo, o que é diverso é transparente.
E o que é transparente? Segundo o dicionário, adjetivo
comum de dois gêneros; 1. que deixa passar a luz e ver
nitidamente o que está por trás; 2. p. ext. que deixa passar a luz
mas não permite distinguir o que fica atrás; translúcido.
Permitamo-nos, pois, observar: quando a palavra no
dicionário é poesia pronta, resta-nos vesti-la com veracidade e nos
sentirmos poema... Então, a contar sobre mim, possuo uma lista
de transparente diversidade assim como Fernando Pessoa possui
dentro de si todos os sonhos do mundo. Portanto, qual deles eu
colocarei primeiro em realidade (perante meus alunos)?
Capítulo 8
Luciene Alves
AGORA POSSO AJUDAR OUTRAS PESSOAS A
ENCONTRAR AS SUAS DORES, AMENIZAR ASSIM
ESSE SOFRIMENTO INCALCULÁVEL.
Narrativa – Diário Pessoal
Eu me chamo Luciene Alves de Souza, tenho 50 anos, sou
natural de São Paulo e resido na Zona Leste.
Trabalho há onze anos em uma escola da Rede Estadual
(Escola Estadual Professor Gabriel Ortiz) e há três anos
exercendo a função de Professora Mediadora de Conflitos.
Também sou Psicóloga Clínica com consultório no bairro
do Tatuapé, atendendo aos sábados.
Aos três dias de nascida fui adotada por um casal que não
podia ter filhos (Alice e Luiz), meus queridos pais.
Criada no seio da família do meu pai, pois a família de
minha mãe era de Santa Catarina e não tínhamos contato.
Fui muito amada por meus pais, mas não por sua família,
que não me consideravam da família por ser adotada e negra.
Durante toda minha infância e até a adolescência sofri
Bullying familiar. Minha mãe biológica era prima distante de
minha avó paterna e esporadicamente quando aparecia, eu era
trancada em um banheiro junto com ela e minha avó dizia que ela
poderia me levar quando quisesse, pois Alice e Luiz não eram
meus pais e sim ela era minha mãe. Eu chorava muito todas as
vezes que esta mulher aparecia.
Era sempre preterida em relação aos meus primos que
tudo podiam e eu não.
Minha avó um dia pegou um brinquedo que eu achei (uma
bolinha de borracha colorida), tomou da minha mão e disse que
daria para meu primo porque achei no quintal, então não era dona.
Acabei ficando com o brinquedo, pois chorei muito e ela me
devolveu.
Quando estava com oito anos, meu pai, que trabalhava em
obras, me deu uma cachorra branca que dei o nome de Boneca.
Um dia voltando da escola chamei por ela e não obtive resposta.
Apareceu minha avó e disse que chamou a carrocinha e deu a
minha cachorra. Ela me disse:
- Porque só você pode ter cachorro e seus primos não? -
Chorei por dias e meus pais não puderam fazer nada.
Minha mãe era uma pessoa muito pacata, sendo assim
nunca me defendia. Apenas tentava controlar as situações
escondendo muitas coisas de meu pai para não haver brigas. Foi
muito humilhada para poder conseguir algum dinheiro para meus
estudos básicos.
Eu sofria calada por respeito aos mais velhos, pois era essa
a educação de minha mãe até chegar à adolescência, onde me
rebelei como a maioria nesta idade e não permitia que mais
ninguém me ofendesse.
Mas no fundo sempre tinha a necessidade de saber o
porquê de tudo que acontecia.
Sendo assim quando adulta depois de muita luta e já com
vinte e seis anos, passei no vestibular para Psicologia e foi quando
consegui as respostas que procurava para mim. Agora poderia
ajudar outras pessoas a encontrar as suas, amenizar assim esse
sofrimento incalculável.
Minha profissão como Psicóloga, contribui muito para
meu cargo como Mediadora, pois trabalhando com adolescentes,
deparamos com muitos conflitos interpessoais, mas na maioria
das situações o que ressalta são os conflitos intrapessoais.
Trabalho com dois projetos muito importantes para a
Mediação de Conflitos que são: Roda de Conversas e Tutores da
Mediação e com o conteúdo do curso Direitos Humanos, Gênero
e Diversidade na Escola em que pude crescer como pessoa e
profissional. Vou poder aprimorá-los acrescentando novas
técnicas aqui aprendidas auxiliando a todos a ter um olhar
diferenciado diante das reações das pessoas que fazem jul-
gamentos discriminatórios, preconceituosos e de estereótipo.
Capitulo 9
“PERMANEÇA NAQUILO QUE VOCÊ ACREDITA!”
Luciene Alves
Cresci numa família pobre, pais nordestinos, muitos
irmãos – dos quais sou a mais nova.
Dos filhos que moravam na casa, o mais velho era o único
homem. As falas relativas ao comportamento esperado de acordo
com o sexo eram frequentes. Em determinada ocasião, este foi
severamente repreendido por estar ‘mostrando os dentes’ para
outro homem que estava à porta conversando com a mãe.
As filhas mulheres lidavam com inúmeras proibições, não
podiam nem ter amigos homens. Sem citar as recomendações de
portar-se como recatadas. Nesse contexto, a sexualidade era um
tabu, associada ao pecado e não ao prazer
A violência doméstica era freqüente. Lembro de episódios
em que o patriarca (alcoólatra, autoritário, agressivo e possessivo)
chegava alcoolizado e agredia a matriarca (submissa, mas
também inflexível). As crianças sempre assustadas, poucas vezes
tinham reação. Uma ocasião ele batia a cabeça dela repetidas
vezes na parede, ouvia-se gritos. Em outra noite de briga, ela
dirigiu-se a delegacia acompanhada de sua filha menor para
prestar queixa. Mostrou sua roupa rasgada por seu parceiro.
- Senhora, tá vendo isso aqui, é sangue. Não é brincadeira!
– Foi a resposta que obteve do atendente, que apontou marcas
vermelhas no chão. A violência persistiu, em maior ou menor
grau, por longos anos, até que marcas de sangue puderam ser
vistas também na casa desse casal. Exatamente o que ocorreu só
eles souberam, mas após isso finalmente houve intervenção da
justiça, determinando o afastamento do agressor.
Criação extremamente rigorosa, o erro não era aceito.
Tentei me enquadrar nesse padrão exigido durante grande parte
de minha existência. Era uma criança tímida que convivia com
carência afetiva e inúmeros complexos. A tentativa de agradar a
outrem também me acompanhou, e em meio a todos esses
conflitos internos vivi em depressões constantes; ora não desejava
viver, ora buscava a superação.
“SIM, SOU EU MESMO
TAL QUAL RESULTEI DE TUDO...
QUANTO FUI, QUANTO NÃO FUI,
TUDO ISSO SOU...
QUANTO QUIS, QUANTO NÃO QUIS,
TUDO ISSO ME FORMA...”
O curso fez grande sentido pela fase de vida que estou.
Sempre gostei de desafios, me motivam; atualmente desligar-me
de inúmeros paliativos e aprofundar-me em questões internas
considero ser o maior de todos eles.
Iniciei o Encontro USP- Escola pensando que a área com
a qual mais me identificaria seria diversidade cultural, uma
abordagem comum que levo a todos os ambientes por onde passo:
nossas diferenças podem ser vistas de forma positiva se focar na
contribuição individual com o todo.
Porém, no decorrer do mesmo, me emocionei muito ao
relembrar minha história de vida, desde a infância, e perceber o
quanto sou fruto de uma criação racista, machista, sexista e
movida por inúmeros outros preconceitos.
Por fim, perceber o valor inestimável da pluralidade
humana e oferecer resistência a qualquer ação externa que
objetive o enquadramento em um padrão de vida estabelecido foi
o que obtive com o Curso. É impossível alcançar a felicidade
negando nossa própria essência, tentando ser aquilo que os outros
esperam que sejamos. E já que estamos vivos, precisamos
usufruir da vida!
Capítulo 10
Eugênia Kato
TUDO QUE TENHO VONTADE E QUE NÃO VAI
ATRAPALHAR NINGUÉM EU FAÇO, NÃO ME
PREOCUPO SE VOU AGRADAR OU NÃO; RESPEITO
AS PESSOAS, MAS RESPEITO A MIM MESMA EM
PRIMEIRO LUGAR
De onde eu vim e para onde estou indo...
Para descrever um pouco sobre mim, preciso contar primeiro
sobre meus pais. Minha mãe nasceu em 1944 em Teófilo Otoni, Minas
Gerais, filha de descendentes alemães (Laure e Paschke); meu pai
nasceu em 1949 em Promissão, São Paulo, filho de imigrantes
japoneses (Nakamura e Kato).
Muitos acontecimentos e histórias complexas aconteceram com
ambos, infâncias rigorosas e repletas de sanções financeiras. Em certo
dia na Cidade de São Paulo, minha mãe estava lavando a calçada, no
bairro de Moema, onde trabalhava como doméstica em casa de família;
meu pai aparece todo sujo de graxa e pede água para lavar as mãos e
minha mãe nega com receio da patroa brigar e indicou o barzinho na
esquina. No final de semana seguinte ele voltou e a convidou para sair,
para assistir uma luta de boxe. Daí segue-se anos de namoro e eles
acabaram casando em 1972, na Igreja Católica, sem a presença do meu
avô materno, separado da minha avó, ambos de religião Lutera (hoje,
aos 94 anos, minha avó materna é católica). Meu pai, sem a permissão
do meu avô paterno, que era NichirenShu (ordem Budista), contou
apenas com a presença da minha avó paterna, nem seus irmãos estavam
presentes.
Em 02 de maio de 1974, no bairro de Santo Amaro, Zona Sul da
cidade de São Paulo, de parto natural eu nasci às 21 horas, vivi os
primeiro três anos da minha existência na casa da minha avó materna e
depois por quase toda minha vida na casa da minha mãe, na mesma rua,
em Interlagos. Apesar de ser um bairro no extremo Sul da capital
Paulistana, é considerado relativamente nobre. Apesar da grande
dificuldade financeira dos meus pais, ambos muito trabalhadores e com
costumes e gostos muito ímpares, fizeram muito para que eu pudesse
ser quem sou: acredito que sou uma pessoa muito abençoada porque
acredito em Jesus Cristo e em Nossa Senhora, sem influência dos meus
pais; eles acham que sou “Beata” e Deus me ajude que um dia eu possa
ser mesmo, sem perder minha paixão pela vida (dança e música,
Carnaval, plantas, animais, perfumes, brinquedos, cor-de-rosa, natação,
viajar, pessoas, em especial crianças e adolescentes).
Fui uma criança muito doente até os 10anos, e tive muitas doenças
incomuns durante a vida toda, mas quanto mais o tempo passa,
aparentemente mais saudável tenho me tornado.
Com 43 anos, já vivi e sobrevivi muitas relações, histórias,
acontecimentos, ações e reações. Acredito que não tenho grandes
dúvidas sobre a minha existência, nem grandes dores ou traumas
psicológicos, filosóficos, social, tão pouco espiritual; só biológico, que
ainda estou no caminho da cura usando a homeopatia, porque a alopatia
não tem mais eficácia no meu corpo. Mas não deixo de fazer nada na
minha vida por conta das dores que sinto, talvez faça mais lentamente.
Tudo que tenho vontade e que não vai atrapalhar ninguém eu faço, não
me preocupo se vou agradar ou não; respeito as pessoas, mas respeito a
mim mesma em primeiro lugar.
Sou farmacêutica, mas essa é uma longa história e hoje pouco
presente no meu dia a dia, e não representa em nada o meu ganha-pão,
faz parte só de parte dos meus projetos de voluntariado.
Em 2010, por conta de perdas salariais e dificuldades por conta
do Serra (enquanto ministro) e do Ex-Presidente do PT, resolvi buscar
uma nova forma de sobrevivência financeira. Como sempre gostei de
todas as áreas, não consegui visualizar o que eu poderia fazer para
mudar, mas precisava recomeçar aos 36 anos, por uma série de questões
familiares e socais. Minha melhor amiga de infância me recordou que,
mesmo eu estudando em escola pública, dava aula particular para os
vizinhos de escola particular. Então decidi fazer Licenciatura em
Química; mas como não existia um curso próximo, com valores
financeiros possíveis e horários cabíveis, desisti do curso. Foi quando
apareceu no quintal de casa a propaganda do Curso de Licenciatura em
Pedagogia, em turmas da madrugada, das 5h45 às 8h30, a 9 km de casa
e a 8 km do meu emprego onde meu turno era das 9h às 19h de segunda
a sexta e sábados e domingo alternados das 9h às 14h, foi perfeito.
Cursando Pedagogia no Centro Universitário Ítalo Brasileiro
(UniÍtalo) tudo deu certo. Amei o curso, os estágios, os trabalhos
voluntários, as atividades complementares, as amizades conquistadas,
os trabalhos que vivenciei de 2012 quando comecei a lecionar no Estado
como Professor PEB II (ciências, biologia, química entre outras
disciplinas), em 2014 após ser Professora substituta no semestre
anterior fui contratada pela UniÍtalo. Hoje sou professora efetiva da
Prefeitura de São Paulo na EMEI Barão do Rio Branco com 620
crianças lindas, estou como módulo acabo conhecendo ou sendo
conhecida por quase todas as crianças. Atuo também com o
Voluntariado com as Irmãs Carmelitas Mensageiras do Espírito Santo
(freiras) nos Lares Abrigos e CCA (Centro de Criança e Adolescente).
A partir de 2010 cada dia, semana ou mês podem vir a ser um
belo e grande relato. Minha vida é muito agitada e sempre com
acontecimentos diversos, mas são histórias para outros diários. Um
grande abraço para quem leu até aqui e minha gratidão.
Capítulo 11
Lucilene Freitas
“SILENCIAR A VIOLÊNCIA SIGNIFICA PROMOVER A
MORTE EM VIDA DE SUAS VÍTIMAS.”
Vivências e lutas...
Meu nome é Lucilene, sou professora atualmente, e me
interessei por Direitos Humanos a partir da minha graduação em
Licenciatura em Geografia iniciada em 2010 com o auxílio do
meu professor orientador. Realizei pesquisas sobre relações
étnico-raciais e desenvolvi atividades sobre essa temática,
anterior a esse momento. Minhas atitudes não eram refletidas e eu
não tinha o aporte conceitual para entender o quanto a nossa
sociedade é inspiradora para nos manter dentro de ideias que
visam o combate ao preconceito, racismo e outras formas de
inferiorizar as pessoas. No decorrer da graduação conheci grupos
de estudos sobre gênero e as condições da mulher e sua
visibilidade na sociedade, e foi nesse momento que surgiu na
minha vida uma situação que será exposta a seguir.
Muitas vezes achamos que algumas situações que
aparecem nas grandes mídias e meios de comunicação não podem
acontecer com pessoas muito próximas ou mesmo em nossas
vidas, assim, nos enganamos. O que ocorre é uma sucessão de
episódios de medo em que as vítimas perdem suas forças e
adoecem ou ficam em condições de sub sobrevivência, como, por
exemplo: medo de sair de casa, atender telefone, freqüentar o
trabalho, escola ou universidade, entre outros que impedem que a
pessoa que sofre tais pressões e desafios tenha força para lutar
contra as situações de opressão.
A introdução acima é para revelar o momento em que
reconheci e fortifiquei a minha identidade por meio de uma
vivência com uma pessoa da minha família que passou cinco anos
em uma relação abusiva, sofrendo violência física e psicológica,
quadro que resultou em uma depressão e, posteriormente, com o
surgimento de um câncer que avançou e deu fim a sua vida com
apenas 39 anos, deixando um filho de três anos que hoje é uma
das motivações para minhas ações diárias. O intuito aqui não é
detalhar as cenas vividas ou toda a violência sofrida, pois a
própria vítima não terminou o relacionamento com a pessoa que
a agredia, não realizou denúncias ou tomou qualquer providência
por receio que o filho pudesse sofrer mais com a situação ou
mesmo que acontecesse algo grave com a criança por conta das
ameaças recebidas.
A partir do falecimento da vítima se iniciam as minhas
lutas com relação à pessoa que cometera as ameaças e agressões,
pois essa circunstância ganhou grande proporção a ponto de toda
família enfrentar os mesmos problemas com relação à violência
praticada anteriormente apenas com uma pessoa.
Esse relato é um alerta para que o silêncio praticado por
mulheres, jovens e adultas, seja rompido diante de qualquer forma
de desrespeito e intervenção negativa quanto a sua integridade
física e psicológica. Esse enfrentamento é um processo que
precisa ser vivenciado diariamente com a ajuda da família,
amigos e serviços complementares de apoio a vítima, tanto em
âmbito jurídico como em associações que prestam serviços
auxiliando mulheres.
A partir do momento em que descobrimos uma vítima em
potencial, nossas ações devem ser voltadas para auxiliar essa
pessoa a sair da relação abusiva a qual esta submetida, não é uma
tarefa fácil, afinal, o medo e pânico imperam. Reforçando que, no
meu caso, a pessoa mencionada faleceu e, os casos de ameaças
persistiram, sendo assim: como será conviver com uma pessoa
que diariamente não lhe faz bem? Que tira toda a sua liberdade?
Afasta-te da sua família e amigos? E, sobretudo, esmaga toda a
tua identidade praticando diversas maneiras de violência?
Essa mensagem que narra apenas um pequeno momento
da minha vida é também um convite, ou mesmo um apelo, para
que nós, como defensoras e defensores dos direitos humanos
comecemos com as ações em nosso cotidiano, intervenções por
meio do diálogo e afetividade, pois as feridas só podem ser
curadas com muito carinho e amor, e mesmo assim, há marcas
que não se apagam com o passar do tempo na vida e história das
mulheres.
Em meio às vivências reveladas, participei do curso
Gênero e Diversidade na Escola pela Universidade Federal Do
ABC em 2015 que foi essencial para que eu despertasse meu
entendimento sobre como a sociedade trata as questões
relacionadas aos Direitos Humanos, e como as ações relacionadas
ao preconceito, racismo, xenofobia, entre outras ideologias, estão
ligadas ao pensamento eurocêntrico e ganham vigor por meios de
normas e padrões impostos socialmente que servem para
categorizar pessoas, e dividí-las segundo sua etnia, gênero ou
orientação sexual, de modo que haja a estreita visão de
inferioridade de alguns grupos sobre outros, ou mesmo
individualmente.
A dúvida que eu deixei para este momento: quem é a
vítima que faleceu? - Minha irmã. As vítimas que restaram: eu,
meu sobrinho e toda minha família. Hoje, tenho medidas
protetivas de afastamento com relação à pessoa que praticou as
ações agressivas e apoio jurídico e de órgãos competentes.
Capitulo 12
Ana Gisele
A IMPORTÂNCIA DE DISSIPARMOS
ALGUNS CONCEITOS E
PRECONCEITOS
PROJETO: ARTE E INCLUSÃO: UMA
POSSIBILIDADE
Ana Gisele
O projeto de intervenção proposto no curso teve como
objetivo central realizar uma releitura de uma obra de arte para
trabalhar o tema da inclusão, com estudantes que frequentam a
escola no período vespertino e que estão cursando a 5ª ano do
Ensino Fundamental I, com idade aproximada de 10 anos.
Para o trabalho de intervenção com os alunos, selecionei as
obras da artista Rosa Maria da Paz sobre brincadeiras infantis.
Nascida em São Paulo, mas moradora da cidade de Mauá desde
os primeiros dias de vida, a artista plástica trabalha tendo como
linha mestra, as obras de Picasso, sem, contudo ater-se
exclusivamente ao estilo desse famoso pintor. Trabalha com cores
vibrantes e intensas, muitas figuras geométricas e temas do
cotidiano. De suas obras selecionei aquelas que tinham como
tema, as brincadeiras infantis, e ative-me especialmente sobre
uma obra: Pipas.
Justificativa:
Somos seres expressivos e as linguagens artísticas
deveriam ser vistas como uma oportunidade de conhecimentos e
de demonstrar sentimentos e pensamentos. A Arte pode auxiliar o
indivíduo a descobrir, compreender, desenvolver habilidades
contidas em si mesmo, mas que precisam de auxílio para
desabrochar.
Objetivos:
- Propor e realizar um projeto de intervenção tendo como
pano de fundo a releitura de uma obra de arte para trabalhar o
tema da inclusão.
- Discutir nas rodas de conversa a inclusão como direito
adquirido e necessidade social.
- Apresentar uma forma lúdica para trabalhar com o tema
da inclusão.
Metodologia:
Com os alunos, realizou-se a atividade proposta através da
apresentação da obra de arte Pipas, de Rosa Maria da Paz; uma
conversa dirigida sobre a artista ressaltando seu contexto de vida,
seu trabalho e buscando que os alunos posicionassem suas
opiniões a respeito da questão da inclusão e seu papel na
sociedade. Logo em seguida, pediu-se que eles fizessem uma
releitura da obra apresentada, com vistas à inclusão.
Recursos materiais:
Figura impressa contendo a obra Pipas; folhas de papel
sulfite, materiais de pintura como lápis de cor, giz de cera, canetas
hidrocor, réguas, lápis, borrachas.
Durante o processo de construção da releitura, algumas
discussões muito interessantes surgiram, acompanhando o tema
central, que era a inclusão, como a relacionada a gênero, já que
na figura apresentada, há uma menina empinando pipa, e isso
suscitou, a princípio, bastante questionamento por parte dos
meninos e também das meninas. Diante dessa atitude, realizamos
uma roda de conversas e pudemos discutir sobre o porquê aquela
figura elevou tanto os ânimos de todos os alunos. A reflexão
mostrou-se extremamente eficaz para dissiparmos alguns
conceitos e preconceitos das crianças.
Quanto ao foco principal, pudemos notar que os alunos não
souberam retratar com precisão a necessidade da inclusão.
Parece-nos que a questão de gênero ficou mais latente que o foco
principal da intervenção. Diante dessa constatação será preciso
certamente repensar novas estratégias.
FIGURA 1: PIPAS
Capítulo 13
Relato de Automutilação (Cutting)
Luciene Alves
Ao abordar uma aluna que estava chorando, peguei no seu
braço e percebi que estavam com vários cortes na região próxima
ao pulso (Cutting).
Conversando com ela, soube que isso acontecia desde os
13 anos. Começou enfiando agulhas no braço para sentir dor,
depois a socar a parede e só a partir deste ano (2016) que começou
a se cortar nos braços com a lâmina do apontador e também ficar
trancada em seu quarto não participando em nada com a família.
Orientei a aluna quanto ao seu comportamento e solicitei
o comparecimento de seus pais.
Esta aluna, sentia-se muito inferior à sua mãe ( referindo-
se à beleza) e as suas amigas de escola. Sentia-se rejeitada por
todos, mas a sua mágoa era maior em relação a sua mãe.
Criada praticamente pelos avós, sem a presença da mãe,
que engravidou muito jovem e assumiu a filha sozinha, seguindo
sua vida normalmente como solteira. Após alguns anos, casou-se
e o padrasto não assume o papel do “ausente” pai e a mãe não
notava que sua atenção era exclusiva para seu marido, deixando
sua filha em segundo plano.
Sua saída foi automutilar-se na tentativa de chamar a
atenção da mãe e com isso passar a existir como pessoa.
A mãe compareceu e quando relatei o que estava se
passando com a sua filha, a mesma afirmou que não sabia das
agressões. Ficou abismada e disse que jamais passou por sua
cabeça que a filha fizesse isso com ela própria. Disse que a filha
fica trancada em seu quarto e que no seu entendimento isso seria
normal da adolescência.
Fiz algumas orientações à mãe e dentre elas, levar sua
filha a um psicólogo para uma avaliação.
Após semanas, chamei a aluna para saber como estava, e
a mesma apresentou–se sorridente e confiante. Relatou que seu
relacionamento com a mãe melhorou e que não sente mais
vontade de se agredir.
Capítulo 14
PROJETO UM OLHAR SOBRE A COMUNIDADE
EMEF PADRE NILDO DO AMARAL JÚNIOR – 2016
Mariana Oliveira
JUSTIFICATIVA:
A escola é o local onde se encontra a diversidade cultural. É, portanto,
um espaço privilegiado para construção de caminhos que vise à
eliminação de preconceitos e de práticas discriminatórias.
No entanto, o que se percebe muitas vezes, são as dificuldades de
diálogo entre gerações diferentes. Um exemplo disso são as inúmeras
divergências resultantes das expectativas em relação ao outro (profº/
aluno/ funcionários). Os professores, cansados da indisciplina, tentam
autoritariamente controlar o comportamento dos alunos; estes, por sua
vez, reagem às atitudes dos professores, desafiando-os constantemente.
Educação em direitos humanos significa educar para uma sociedade
mais igualitária, mais justa, mais democrática, o que significa relações
dialógicas e horizontais. Para que isso pudesse acontecer, iniciou-se um
estudo mais aprofundado nessa perspectiva: quem são os atores que
atuam na EMEF Padre Nildo?
O INÍCIO
No horário de formação dos professores, à partir do estudo da referência
bibliográfica DESIGN THINKING PARA EDUCADORES, fez-se o
levantamento das características que eles percebiam na U.E.:
• Não cumprem combinados;
• O desrespeito é contínuo;
• A influência é seguida;
• As reações são constantes;
• Criou-se um clima de ameaças;
• Não há diálogo nem aprendizagem;
• Rótulos;
• Tem consciência do que é errado;
• Demonstram prazer em transgredir;
• Poucas opções de ações disciplinares, que mostram-se sem efeito;
• Muito discurso, pouca ação;
• Salas lotadas;
• Sistema educacional que não lhes desperta interesse – longos períodos
na escola, aulas chatas;
• Rotatividade de profissionais;
• Espaço físico restrito;
• Comunidade distante da escola e inserida num contexto de violência;
• Poucas opções de lazer.
Em seguida, o questionamento foi: Qual U.E. queremos?
• Alunos protagonistas;
• Escola respeitada como espaço deles;
• Ambiente humano;
• Cumprir a função social que é a aprendizagem.
À partir disso, surgiu o desafio que nortearia nossa ação ao longo do
ano:
• COMO TORNAR UM AMBIENTE PRAZEROSO E QUE
PROMOVA A APRENDIZAGEM?
Todas as sugestões citadas foram elencadas:
• Parceria com a família, inclusive formação para a família: formação
para a família, atender as necessidades da comunidade, momentos para
os pais circularem na escola.
• Parceria com redes de proteção: contatos e encaminhamentos ao
NAAPA, CEFAI, Postos De Saúde, Assistência Social etc.
• Unidade nas ações entre os profissionais da U.E.: formações,
combinados, reuniões, estreitar vínculos através de confraternizações,
valorização das ações do profissional.
• Ampliação do repertório cultural e de perspectivas: projetos, passeios
pedagógicos, parcerias com instituições como CIEE, SENAC,
Fundação Dom Bosco, CMTC, ETEC.
• Envolver o aluno (protagonismo): projetos, colegiados, grêmio
estudantil.
• Olhar humano e valorização das potencialidades: Como a criança
aprende? Cada aluno aprende de um jeito, descobrir qual a maneira de
atingir o aluno, diversificar aula, criar outras estratégias.
• Intervenção nos horários de intervalos e saídas: otimizar o espaço.
• Iniciar com grupos pequenos – o foco: convênios com universidades,
colaboração dos professores em módulo, ações e projetos específicos,
direcionados.
O próximo material de estudo “PROGRAMA ÉTICA E CIDADANIA
– CONSTRUINDO VALORES NA ESCOLA E NA SOCIEDADE”,
sugeria um estudo da comunidade e posterior apresentação em
Seminário. Iniciou-se, então, o Projeto propriamente dito.
DESENVOLVIMENTO:
TEMA GERADOR: ÉTICA E CIDADANIA
FOCO: TRABALHAR VALORES
“ OS AGENTES ENVOLVIDOS NÃO SÃO
EXCLUSIVAMENTE AS PROFESSORAS E OS
PROFESSORES, MAS TODA A
COMUNIDADE. CADA VEZ MAIS, A
EDUCAÇÃO E AS APRENDIZAGENS
DEPENDEM DE UMA REALIDADE
CONTEXTUAL MAIS AMPLA.” IMBERNÓN,
F. A EDUCAÇÃO NO SÉCULO XXI
• Inicialmente, os professores, em horário de formação, foram até a
comunidade;
• DISPARADOR DE AÇÕES: PASSEIO PEDAGÓGICO A
EXPOSIÇÃO SESC VILA MARIANA, a abordagem dos monitores foi
com intuito de evidenciar os aspectos positivos e negativos da cidade;
fazendo um paralelo com a comunidade dos alunos: O que há de
positivo? O que há de negativo? O que pode ser feito para melhorias?
• Em sala, os alunos realizaram atividade sobre a exposição, e de acordo
com suas respostas, foram organizados em temas;
6º ANO: LAZER E CULTURA;
7º ANO: DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E COMUNITÁRIO;
9º ANO: EDUCAÇÃO.
Os próximos passos:
• Visita do vereador Presidente da Comissão de Educação, Cultura e
Esportes da Câmara, que respondeu as perguntas dos alunos;
• Receberam a visita de um morador antigo da comunidade explanando
a história do bairro e esclarecendo dúvidas;
• Grupos de representantes de alunos foram aos espaços próximos ao
bairro para conhecer e entrevistar as autoridades do local: Subprefeitura
(conversa com subprefeito), Diretoria Regional de educação (conversa
com diretor regional), CEU (conversa com gestora), EE Lívio Xavier
(conversa com Vice Diretora responsável pelo Programa Escola da
Família), Casa de Cultura (conversa com monitor), Parque do Itaim;
• Entrevistas com moradores e pais de alunos, que culminaram em um
gráfico que foi exposto pelos alunos no Dia da Família.
• A próxima atividade desenvolvida foi a Gincana Olímpíca, na mesma
época que acontecia as Olimpíadas; fazendo-se um paralelo à realidade
local: os alunos apresentaram um pouco de sua cultura e tiveram
desafios envolvendo pessoas e estudo da comunidade.
• Criação de Projeto de Lei com idéias sugestivas para as necessidades
percebidas na comunidade, um dos projetos criados foram
encaminhados à Câmara e o aluno foi selecionado para ser vereador por
um dia no Parlamento Jovem.
• Culminância no Trabalho Colaborativo Autoral (TCA), onde os
alunos escolheram um tema que gostariam de pesquisar e realizaram
uma intervenção social.
Em Busca Da Felicidade: Atividade no Dia da Família com
reflexão sobre o que significa felicidade. Intervenção social - abraço
grátis na Estação Itaim, apresentação com jogral, dança e vídeo;
Violência: Entrevista na Delegacia. Intervenção social-
confecção de folhetos com telefones de emergências e possíveis ações
em casos de violência. Apresentação: telejornal com debate e
entrevistas com pessoas que foram vítimas de violência.
Violência na Escola: Intervenção Social e apresentação: Relato
de vida de aluna que sofreu bullying, desistiu da escola por alguns anos
e tentou suicídio, estava num momento de superação.
“Então eu acho isso completamente errado pois você tem que ser o
que é, não o que as pessoas querem que você seja , até por que o que
adianta ter um lindo rotúlo e dentro não ter nenhum conteúdo ...”
“Eu acredito que se nós nos reunirmos podemos fazer um mundo
bem melhor para todos, inclusive os jovens, e sem o bullying. Se
você é criança ou adolescente e sofre por isso, você tem que
comunicar os seus responsáveis , e sem precisar ter vergonha disso
, pois existe pessoas que ate tiram a própria vida por sofrerem
muito escondido de todos e vocês senhores responsáveis procurar
sempre orientar seus filhos”
“Agora me explica o que adianta não ligar pro bullying pois
estamos todos estamos vendo que ele existe e é praticado com
frequência. É fácil virar as costas para o problema, o difícil é
encará– lo cara a cara e evitar ao máximo que ele aconteça . Eu e
você, todos nos somos maior que o bullying.”
“Muitos sofrem com o bullying por causa do seu porte fisico ou pela
aparência diferente da maioria; até mesmo pelo cabelo , cor da pele
(normalmente por ser magro ou gordo). Isso eu acho meio que
desnecessário, pois todos somos iguais por dentro e é o que mais
importa. Isso é gerado quase que sempre pela sociedade hipócrita
que vivemos, pois essa sociedade exige um padrão para que todos
sigam e normalmente quem não se enquadra a esse padrão acaba
sofrendo!”
Racismo: Apresentação – Encenação.
Gravidez na Adolescência: Entrevista na UBS. Intervenção
social: distribuição de preservativos. Apresentação: encenação.
Corrupção na Política: Contato com assessoria de políticos para
entrevista. Intervenção social: conscientização sobre eleição na escola
e nas ruas.
Reciclagem e reutilização de materiais: Intervenção – oficina
com materiais recicláveis.
Drogas:
CONCLUSÃO
Capítulo 15
PROJETO “PRÉ – CONCEITOS”
Herbe de Souza e Juliana Felix
Justificativa
Este projeto tem como base a erradicação de toda e qualquer
forma de discriminação latentente dentro do espaço escolar, visto que a
escola pode e deve ser tratada como uma sociedade, e bem como
disseminadora de preconceitos, tanto por parte de alunos, professores,
gestores e a comunidade que os cerca.
A grande preocupação de como esse formandos estão lidando
com a questão de gênero, sexualidade, raça, deficiencias e niveis
sociais, fez com que esse projeto fosse elaborado e pensado para um
público de crianças que recebem informações a todo momento, e que às
vezes são erroneas.
A palavra preconceito refere-se a uma ideia que se faz a
respeito de algo ou alguém, antes mesmo de conhecer do que (ou de
quem) se fala. Forma-se um conceito por antecipação, geralmente por
precipitação, sem uma análise mais profunda ou conhecimento de
determinado assunto.
Normalmente é causado por ignorância, isto é, pelo não
conhecimento do outro que é “diferente”. Conduzindo à discriminação,
marginalização, ao sofrimento e até violência. Essas atitudes vêm
acompanhadas por explicações, que se caracteriza pela sua insistência,
sem nada de coerente que as justifique.
Nesse contexto, a escola destaca-se como importante meio na
formação de conhecimentos, comportamentos e valores, pois é dentro
dela que tem sido muito debatido nos últimos anos, iniciativas que
visam facilitar a inserção e a permanência dos discriminados no
ambiente escolar.
Sendo assim e visando a uma aprendizagem significativa e
com base nas novas concepções pedagógicas que norteiam as reflexões
dos estudiosos de Ciências Humanas nas últimas décadas, sentiu-se a
necessidade em desenvolver um projeto que vise combater o
preconceito e a discriminação não só no ambiente escolar, mas em todas
as instâncias possíveis.
Este documento foi definido a partir de critérios de equidade,
ou seja, critérios relacionados aos direitos de cidadania, iniciado a partir
de exemplos corriqueiros, situações do dia-a-dia que possam ser
facilmente identificadas ou compreendidas pelo aluno.
Uma vez que a Constituição Federativa do Brasil, garante em
alguns artigos comuns para todo brasileiro que:
Art 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do
Brasil:
I –construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II–garantir o desenvolvimento nacional;
III–erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades
sociais e regionais;
IV–promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo- -se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (EC no 45/2004)
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos
desta Constituição;
II –ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão
em virtude de lei;
III–ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou
degradante;
IV–é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
V–é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da
indenização por dano material, moral ou à imagem;
VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma
da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VIII–ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa
ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-
se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação
alternativa, fixada em lei;
XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e
liberdades fundamentais;
XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e
imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família,
será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando
ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
(EC no 19/98 e EC no 53/2006)
I –igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II –liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento,
a arte e o saber; III – pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas,
e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
Diretrizes Nacionais para a educação em direitos Humanos
Segundo o parecer das “Diretrizes Curriculares
Nacionais da Educação Básica”, no parecer homologado,
com Despacho do Ministro, publicado no D.O.U. de
30/05/2012, Seção 1, Pág 33.
Processo 23001.000158/2010-55
Parecer CNE/CP nº 8/2012
Aprovado 06/03/2012.
Este relatório diz que:
“ Os estudos em Direitos Humanos são frutos da luta pelo
reconhecimento, realização e universalização da dignidade
humana.”
...“ Assim sendo, a educação é reconhecida como um dos
Direitos Humanos e a Educação Em Direitos Humanos é a parte
fundamental do conjunto desses direitos, inclusive do próprio
direito a educação” (D.C.N.E.B. pág 515)
... “As profundas contradições que marcam a sociedade
brasileira indicam a existência de graves violações destes
direitos em conseqüência da exclusão social, econômica,
política e cultural que promovem a pobreza, as desigualdades,
as discriminações, os autoritarismos, enfim, as múltiplas formas
de violência contra pessoa humana.”... (D.C.N.E.B. pág 515).
“Para a sua consolidação, a Educação em Direitos
Humanos precisa da cooperação de uma ampla variedade de
sujeitos e instituições que atuem na proposição de ações que
sustentam. Para isso todos os atores do ambiente
educacional devem fazer parte do processo de
implementação da Educação em Direitos Humanos. Isso
significa que todas as pessoas , independente do seu sexo;
origem nacional, étnico-racial, de suas condições
econômicas, sociais ou culturais; de suas escolhas de credo;
orientação sexual; identidade de gênero, faixa etária,
pessoas com deficiência, altas habilidades/superdotação,
transtornos globais e do desenvolvimento, têm a
possibilidade de usufruírem de uma educação não
discriminatória e democrática.” (D.C.N.E.B. pág 516).
Objetivo Geral
Estimular intervenções individuais e coletivas contra atitudes
preconceituosas, etnocêntricas e discriminatórias dentro do espaço
escolar.
Objetivo Especifico
Conscientização das diferenças entre pessoas,
mostrando que a diversidade não implica inferioridade;
Ensinar o que é preconceito e discriminação;
Reconhecer a importância da liberdade de expressão;
Trabalhar noção de cidadania, igualdade de direitos e
deveres;
Desenvolver o respeito ao outro, respeito a si mesmo e
solidariedade humana;
Conscientizar o aluno de que vivemos em uma sociedade
multicultural e pluriétnica;
Estimular no aluno atitudes de tolerância e respeito em
relação ao outro;
Questionar o etnocentrismo;
Tomar posição diante de questões sociais e relativas à
cidadania;
Respeitar e valorizar a diversidade cultural;
Assumir atitudes éticas e compromissos;
Trocar ideias e informações, colaborando na criação coletiva;
Público alvo:
4º e 5º ano do ensino fundamental – ciclo I
Temas trabalhados pelos grupos
Tipos de Preconceito;
Gênero;
Definição de identidade de gênero;
Intolerância;
Homofobia;
Transfobia;
Preconceito na música;
O preconceito nas imagens;
Entrevistas com pessoas vítimas de preconceito;
A diversidade religiosa;
O preconceito na sexualidade;
Pessoas com necessidades especiais;
Bullying;
O preconceito registrado em jornais e revistas.
AVALIAÇÃO
Como já se sabe o processo de avaliação deve ser feito de forma
contínua. Então, neste projeto, os alunos serão avaliados em todos os
momentos, desde a apresentação do tema em sala de aula até a execução
das atividades.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/escola_protege/caderno5.pdf
www.acaoeducativa.org.br/fdh/wp-
content/uploads/2012/09/Kimberle-Crenshaw.pdf
www.scielo.br/pdf/ref/v10n1/11636.pdf
disciplinas.stoa.usp.br/pluginfile.php/185058/mod_resource/content/2/
G%C3%AAnero-Joan%20Scott.pdf
drive.google.com/file/d/0B6PYVwec4vbrZFc0ak96R01HZDRoeGdY
a1VqZEtqTUVscExN/view?pli=1
speedy.sh/zCp4q/Nota-Publica-do-CNE-Identidade-de-Genero-9-
2015-1.pdf
Constituição Federativa do Brasil
PARTE II: GÊNERO
Capítulo 1
Herbe Discórdia
SOU UM SER ÚNICO E MULTIFACETADO. SER
SINGULAR E PLURAL AO MESMO TEMPO... E QUEM
NÃO É?
Meu nome é Herbe de Souza Silva. Nasci em 11 de julho de 1980,
São Paulo, na Freguesia do Ó. Meus pais são João dos Reis da Silva e
Rita Aparecida de Souza Silva.
Eu moro ainda no mesmo lugar onde eu nasci. Quando comecei a
crescer, no bairro não tinha nada, era a minha casa, a casa de um vizinho
e pouquíssimas casas. Foi crescendo aos poucos. Franco da Rocha era
uma cidade-dormitório, eles (meus pais) compraram a casa lá em 1980,
e foram construindo.
Na minha infância eu brincava de tudo: pega-pega, esconde-
esconde, passa anel, corda, brincava na terra, brincava de fazer bolinho
de lama. Eu brincava mais com as meninas, mas eu tinha outro lado
com os meninos, que já ia pra outros lados, mais sexualmente falando.
Porque a gente vai descobrindo a sexualidade. E meu primeiro
namorado, eu tinha cinco anos. Comecei cedo. Meu primeiro
namoradinho, mas sem a malícia que a gente tem hoje. Foi à descoberta
do corpo. Descobrindo que ele tinha a mesma coisa que eu e que dava
prazer, de certa forma, que a gente gostava de tocar o corpo um do
outro. Depois quando foi crescendo, os outros meninos descobriram que
alguma coisa em mim era diferente, eles foram querendo ter os prazeres
que eles não conseguiam, porque só tinha moleque na rua.
Os conflitos começaram com os meninos me chamando de
bichinha. Porque até então nunca soube o que eu era, se era menino ou
menina, porque eu brincava com todo mundo. Meu maior pânico foi
quando pensei ter engravidado afinal naquela época, segundo minha
avó, “se uma menina beijar na boca poderia engravidar”, e eu fui além
do beijo: “Meu Deus, se eu ficar grávida, eu vou contar pra quem? O
que eu faço com essa criança? Por onde essa criança vai nascer?”.
Então, na biblioteca da escola, acabei achando um livro que falava sobre
o assunto. Tranquilizei-me.
Eu falei: “Ah, eu não vou ficar grávido, não vai dar certo. Posso
continuar brincando”. Mas foi bem assim. Eles descobriram esse meu
lado mais meigo, mais afeminado, virou festa. Eu nunca contei para a
família. Porque eu nunca precisei contar. Porque querendo ou não, a
minha mãe tinha pouco estudo, tinha estudo suficiente pra trabalhar,
meu pai tinha parado de estudar, e eu que continuava estudando. Então
não era uma coisa muito fácil, em 1989, pra saber o que era. Eu fui
depois com muito tempo estudando pra saber o que realmente era isso,
e convivendo, porque tudo foi acontecendo. Eu nunca cheguei pra
minha mãe e falei: “Mãe, eu sou gay”. Não precisou contar. Mas quando
ela suspeitou que eu talvez pudesse ser ela fez chantagem, ela falou que
se eu fosse gay, ela se mataria. Eu falei: “Então tá, se você vai se matar,
eu não sou”. Depois que eu fui morar sozinha, eu falei: “Ahã, te
enganei.”
Lembro-me que pegava as roupas da minha mãe e da minha irmã.
Como ela ia trabalhar sempre bonita, aqueles saltos lindos, toda aquela
roupa linda. E os vestidos da minha irmã serviam, então usava os
vestidos da irmã. Eu achava lindo salto alto. Eu corria pela casa de salto
alto. Ela tinha um salto agulha lindo, e até então servia no meu pé.
Nossa, eu ficava me acabando com aquele sapato em pé. Depois cresceu
o pé, não serviu mais.
O problema pra mim começou na escola que eu estudei, Elvira
Parada Manga. A Educação Física era diferente, era de manhã, quando
eu fazia, tinha que frequentar o horário dos meninos, uma vez e tinha o
time de camisa e o time sem camisa, só que eu tinha seios, lógico que
naquele dia não fiz, fiquei com ponto negativo. Eu parei de fazer as
aulas, no primeiro ano, fiz compensação de ausências, depois consegui
com minha mãe, um atestado médico que eu não podia fazer as aulas,
isso foi até fácil, ela trabalhava com vários médicos, porém, todo ano
tinha uma desculpa diferente, e no ultimo consegui um atestado de
trabalho, e não fiz Educação Física durante três anos.
Com 16 anos eu entrei no CEFAM, em 1997, no ensino normal.
Eu queria estudar no Gandra, em Jundiaí, que era uma escola de
nutricionismo. Mas quis o destino que fosse pra essa escola. Minha mãe
fez minha matrícula faltando uma semana pra começar as aulas. Eu
entrei no ensino normal, e nessa escola tinha o curso profissionalizante,
o magistério, e algumas salas extras de ensino normal de ensino médio,
na qual estava. Todo mundo fazendo, estudando, um monte de
candidato a professor, passavam dez horas por dia. Eu comecei a me
interessar. Tinha bolsa, tinha um salário, um salário mínimo na época.
Eu fiz a prova no mesmo ano pra entrar em 1998. Eu passei na prova,
fiquei na lista de espera, desisti da vaga, passei minha vaga pra outra
pessoa. No mês de abril, a menina que eu tinha dado a vaga desistiu, eu
perguntei para o diretor se eu podia voltar, ele me deu a vaga. Porque
como eu sempre estava muito ali, eu tinha contato com toda a parte de
administrativo, eu comecei a trabalhar na secretaria da escola. Então eu
tinha acesso a tudo na escola.
Quando cheguei à escola eu era diferente, cabelo verde, alta, bem
andrógena, então virou uns bochichinhos. Até o dia que esse diretor
chegou, entrou, conversou com todos os alunos em cima do púlpito,
que naquela escola não seria permitido preconceito de forma alguma, e
quem tivesse preconceito racial, sexual, seria expulso da escola, eu
falei: “Pronto, é aqui que eu quero ficar”. Depois que ele entrou, minha
vida ficou tranquila. Tanto é que até hoje a gente tem contato, agora ele
é supervisor de ensino. Fiquei com a vaga de magistério das sete da
manhã até às 18 horas, e de noite eu continuava o ensino médio, porque
eu não desisti da minha vaga do ensino médio. Então eu ficava na escola
das 7h às 22 horas da noite. Eu só chegava em casa pra dormir. Nos
primeiros anos, eu não gostava do magistério, eu ia mesmo por ir.
Quando eu comecei a fazer estágio, que eu tive contato direto com as
crianças, com os professores em outras escolas, eu me encantei e falei:
“É isso que eu quero pra mim”.
Comecei a ministrar aulas como eventual em uma escola estadual
de tradição onde moro, confesso que os primeiros dias foram tensos,
pois, apesar de ter feito estagio nessa escola, ser estagiária é uma coisa,
e ser a professora era outra, e além de tudo, a substituta.
Confesso que sei dos problemas que as minhas diretoras sofreram
no inicio, afinal, uma travesti dando aula pra crianças! Mas, elas nunca
deixaram que eu soubesse disso, talvez se elas me contassem eu me
desmotivaria e desistisse da carreira.
Passaram-se os anos e precisava fazer faculdade, essa também foi
no susto. Eu fiz o Enem, fiz a inscrição do ProUni e esqueci. Eu
precisava ter faculdade, só o ensino técnico o magistério não me
garantia muita coisa. Pela lei, dependendo de algum tempo, você tinha
que ter o nível superior pra poder continuar dando aula. Um dia ligaram-
me da faculdade que eu tinha feito inscrição, eu tinha conseguido uma
bolsa do ProUni e se eu estava afim da vaga. Eu falei: “Opa! Agora”. E
corri pra faculdade e fiz a inscrição.
Nos primeiros meses de faculdade não foi fácil, trabalhava o dia
todo com aulas de reforço, e de noite corria pra faculdade, no inicio o
dinheiro só dava pra pagar a condução e a mensalidade (minha bolsa
era de 50%), não sobrava quase nada, me alimentava na escola, e
quando chegava da faculdade de madrugada descia até a casa da minha
avó pra jantar. Ela só dormia quando eu chegava.
Em todo esse trajeto escolar, a minha sexualidade, sempre esteve
em questão, ou pros amigos, depois para os alunos, pais e a
comunidade. Nunca escondi nada, sempre tratei tudo com muita
naturalidade, sempre falei do assunto abertamente, lógico que pra quem
perguntasse, não saio por ai falando.
Como disse, o começo foi árduo, cheio de histórias mal contadas,
porem com o tempo, as pessoas foram me conhecendo e vendo meu
trabalho, e o que me facilita, é o fato de não ficar trocando de escolas,
de forma que meu profissionalismo é visto. E como os pais já me
conhecem há muito tempo, então eles não veem tanto problema. Quem
não me conhece, chega de fora, tem um impacto. Porque adora
conversar no portão da escola. Eles vão perguntando muito, então acaba
rápido com esse estigma. O que eu tento fazer com eles é quebrar
realmente o estigma do que é apresentado na mídia. Porque o meu
grande problema é o que a mídia mostra.
E que todo homossexual não fica 24 horas por dia atrás de
homem, como a mídia mostra. A gente trabalha, a gente estuda, a gente
não vive de sexo. E eu também tento quebrar o paradigma de que toda
travesti faz programa. Não faz. Toda travesti estuda se quiser, faz
programa se quiser. Também eu tento o contraponto. Às vezes nem
todas tiveram a oportunidade que eu tive de estudar, porque aí você tem
que enfrentar de peito aberto, saber que você vai entrar num lugar que
as pessoas não vão te querer e vão tentar te tirar de qualquer jeito. Você
vai falar: “Não. Estou pagando, vou estudar e vou ficar aqui”. Porque
eu falei: “Eu não vou pra rua, porque se eu for pra rua, eu não vou
ganhar dinheiro, eu vou passar fome”.
Nesse tempo tenho alguns alunos que se transformaram, ou se
aceitaram como travestis e mulheres trans, e infelizmente não
obtiveram o apoio familiar, acabaram indo pra fora de casa. Preocupo-
me, pois a rua abraça, as mais velhas abraçam, e as mesmas começaram
a prostituir-se.
Minha aceitação como uma travesti é política, eu gosto do que
sou, não sou uma mulher trans, porém não vejo problemas em ser, gosto
de causar o tumulto cerebral e visual. Gosto de confundir, sou um ser
único e multifacetado. Ser singular e plural ao mesmo tempo... E quem
não é?
Capítulo 2
Giovanna Lima
Ao final do meu primeiro ano de mestrado, participei de
um processo seletivo para dar aulas em uma escola particular de
idiomas, uma das melhores em São Paulo. O processo todo foi
bastante longo e exaustivo. Após a realização de uma prova,
dinâmica de grupo e entrevista, em dezembro, começamos o
treinamento que duraria o mês todo. Éramos 20 pessoas com
formações diferentes. Muitos fizeram faculdade fora, outros eram
mestres, alguns tinham certificados internacionais ligados ao
ensino de língua e outros já lecionavam há 20 anos.
O treinamento foi ministrado pelas seis supervisoras da
escola, mas a maior parte dele foi administrado por uma delas,
que era bastante rigorosa. Eu, como mais nova e inexperiente do
grupo, estava levando o processo muito a sério como parte do meu
aprendizado e cheguei até a perder peso por conta do meu
nervosismo. Eu dividia meu tempo em planejar aulas para o
treinamento, ministrá-las, ler os textos indicados e participar das
discussões, e em escrever artigos e trabalhos para o mestrado.
Na metade do treinamento, todos nós deveríamos passar
por mais uma entrevista com essa supervisora e todos estávamos
apreensivos com a situação. O comentário mais comum após a
entrevista era que havia sido uma experiência terrível e que a
supervisora tinha sido hostil. Um professor até mesmo comentou
que ela se negou a recebê-lo porque ele havia se atrasado. Na
minha vez, porém, não percebi nenhum comportamento rude da
parte dela. Consegui tirar minhas dúvidas e ela foi bastante
esclarecedora em suas respostas. Ao comentar isso com o colega
que chegou atrasado, ouvi a seguinte resposta:
- Claro que ela foi legal com você. Você é mulher.
Eu não entendi o comentário e pedi que ele o esclarecesse.
Ele me disse, então, que eu, na posição de mulher e sendo jovem,
chamava a atenção da supervisora porque ela é homossexual e,
sendo assim, ela com certeza me contrataria.
Ao final do treinamento apenas quatro pessoas foram
contratadas, eu entre elas, e novamente ouvi esse comentário do
colega. Creio que o fato de eu não ter tanta experiência em sala
de aula e ainda assim ser contratada e ele não, o ofendeu. O olhar
masculino e machista do meu colega diminuiu todo o meu esforço
ao longo do processo ao meu gênero.
Capítulo 3
Michelle
NÃO SEI DE ONDE SURGIU FORÇA, MAS ELA VEIO; HOJE
ME SINTO MAIS FORTE E VITORIOSA.
MIL VIDAS EM UMA
Falar a respeito da minha vida é uma tarefa difícil. Tenho
várias questões não resolvidas e muitas que sequer consigo
lembrar, já que por um motivo misterioso bloqueei muitas
lembranças. Mas, acima de tudo, falar sobre minha vida é falar
sobre várias Michelles.
É falar de uma criança contestadora e livre, que foi podada ao
longo do tempo por várias questões, como: o machismo, a
violência e a religiosidade (não que a religiosidade seja ruim, mas
pelo dano que causa quando utilizada como ferramenta para acuar
as pessoas).
É falar de uma criança que teve armas apontadas na cabeça,
que viu a família entrar em falência e sofreu bulling.
É falar de uma adolescente que trabalhou e estudou, se viciou
em drogas ao mesmo tempo em que aprendia a lidar com a
orientação sexual e a família se desfazendo. Que viu o irmão
passar por situações de bulling e não pôde fazer nada; que entrou
em depressão, sofreu muito assédio, mas encontrou forças para
abandonar as drogas.
Falar da minha vida é falar da jovem adulta que casou cedo
demais para conquistar seu espaço, que sofreu com um
relacionamento abusivo, que sofreu privações por falta de
dinheiro, que foi humilhada e traída, mas conseguiu se libertar.
É falar que em meio a tanta inconsistência, levantava de
madrugada para trabalhar e fazia curso técnico. Que sofreu
perseguição por não querer se relacionar com um homem, pediu
socorro e viu as portas se fecharem.
É falar de uma mulher que foi salva por professoras, que entrou
na faculdade mesmo não podendo pagar. Que escolhia entre
comprar comida e pagar a faculdade e mesmo assim, se formou.
Falar da Michelle é falar que ainda há tantas outras histórias
para contar e outras tantas que nem se lembra. É falar de força,
resistência, vontade de viver e, ao mesmo tempo, falar de muita
sensibilidade. É falar de força e coragem para acreditar no amor.
Por fim, falar da minha vida é uma vitória e um agradecimento.
Quando eu era pequena, meu pai acreditava piamente que
tarefas domésticas cabiam apenas às mulheres. Tenho três irmãos
e minha mãe trabalhava fora o dia todo.
Certo dia havia um irmão da igreja em casa e meu pai queria
que eu fizesse almoço para ele, mas eu não sabia porque minha
mãe, apesar das longas jornadas de trabalho, sempre deixava tudo
pronto. Após muitos gritos, meu pai me colocou em frente ao
fogão e me bateu com a cinta pra eu fazer alguma coisa,
afirmando que eu era mulher e tinha que saber. O irmão da igreja
ficou sem jeito e foi almoçar em casa e eu fiquei de castigo o
restante do dia. Meu pai foi almoçar na casa da minha tia e não
levou nenhum dos meus irmãos. Não lembro se chegamos a
almoçar naquele dia.
Sempre vi minha mãe lutando muito para conseguir algo
melhor na vida, apesar do machismo iminente do meu pai.
Quando criança teve que parar de estudar para ajudar em casa e
não havia conseguido voltar desde então. Depois de casada, junto
com meu pai, tiveram um comércio que nos rendeu uma vida
muito confortável. Entretanto, este comércio faliu e eles tiveram
de voltar ao mercado de trabalho e como minha mãe ainda não
tinha qualificação, começou trabalhar como empregada
doméstica, sem carteira assinada. Fazia longas jornadas por dia,
cuidava dos filhos e da casa. Cansada, resolveu concluir o ensino
através do Supletivo. Como isso exigia que ela ficasse ainda mais
tempo fora de casa, meu pai se incomodou, as brigas começaram
a ser ainda mais intensas e frequentes a ponto da minha mãe
desistir de terminar os estudos através de aulas presenciais.
Inconformada, estudou em casa e prestou a prova do SISU e
concluiu o Ensino Médio. Alguns anos depois, foi a primeira
mulher motorista de ambulância de Barueri.
Fui uma criança muito ansiosa e descontava todas minhas
inquietações na comida, o que resultou num grande aumento de
peso. Na escola, já sofria muito com bulling por causa das roupas
que usava, que seguiam as regras da igreja que minha família
frequentava, além de não poder fazer muitas coisas que meus
colegas faziam. Às vezes eu tentava explicar, mas não fazia
sentido para eles e piorava minha situação: eles zombavam muito,
principalmente no intervalo, onde outras pessoas se juntavam e
isso me deixava arrasada.
Certo dia, na hora da saída, alguns alunos se organizaram e
começaram a jogar ovo em mim, enquanto gritavam:
- Acertem a galinha gorda!
- Suja a saia dela, aí vai ser obrigada a usar uma roupa de
verdade.
Eu não falava o que acontecia para minha mãe nem para os
profesores.
Lembro-me que quando era pequena e meus pais tinha um
comércio, íamos para a loja no contra turno da escola. Presenciei
vários assaltos, a ponto de ter arma apontada para minha cabeça
ou até mesmo me esconder porque os assaltantes tinham o
costume de trancar meus pais e os funcionários num banheiro e,
se eu não me escondesse, não tinha quem os tirasse de lá quando
os assaltantes fossem embora.
Durante boa parte da minha vida, ouvi histórias terríveis
acerca dos “pecadores” e de “como eles queimariam no inferno”.
Sempre tive muito medo de ir para esse lugar de punição tão
terrível, entretanto, com o passar do tempo, essa passou a ser uma
verdade que não mais me cabia. Eu lia a bíblia e não entendia
como Jesus, que ajudava as pessoas sem nem questionar o que
elas havia feito para estar nas situações apresentadas seria capaz
de tamanhas atrocidades. Logo, tudo o que se pregava deixou de
fazer sentido e parei de frequentar a igreja.
Com a chegada da adolescência, comecei a namorar e
conheci o rock. Foi libertador por um bom tempo, achar que podia
ser eu mesma. Ou pelo menos aquela versão de mim. Conheci
um garoto e comecei a namorar; mas como ele era roqueiro e meu
pai muito conservador, fui proibida de namorar e passei um bom
tempo de castigo, sem sair de casa sozinha. Continuei namorando
escondida, com ele conheci o cigarro, a bebida alcoólica e as
drogas. Vi meu namorado apanhar de um grupo com, no mínimo
dez homens; pedi dinheiro na rua, cantei numa banda, vi amigos
apanhando da polícia, os mesmos que me apalpavam com o
pretexto de estarem me revistando, vi pessoas tendo overdose,
tive amigos que se suicidaram, dormi na rua, entre tantas outras
coisas que a vida de um usuário proporciona.
O rapaz que eu namorava se afundou cada vez mais e
começou a ser violento comigo, a ponto de me bater... Daquele
dia em diante, comecei questionar se era aquela vida que eu
queria, já que me sentia sozinha e vazia. É uma tristeza tamanha
quando se tem tantas expectativas, quando saímos em busca de
amor e compreensão e damos de cara, repetidamente, com um
mundo frio, ameaçador e solitário.
Resolvi que sairia do vício, que sairia do buraco em que
estava. Na mesma época em que tomei essa decisão, havia
concluído o Ensino Médio, aos trancos e barrancos, e vi um
concurso aberto para o cargo de auxiliar de serviços gerais.Fiz
uma barganha com Deus: Se passasse no concurso, pararia com
as drogas. Passei. Trabalhei dois anos neste cargo e consegui me
desintoxicar. Esse período foi um dos que me senti mais sozinha
na vida, pois todas as pessoas que conhecia de afastaram porque
eu estava ficando careta. Não sei de onde surgiu força, mas ela
veio e hoje me sinto mais forte e vitoriosa.
Capítulo 4
Priscila Arantes
SOU UM UNICÓRNIO DO AMOR. UNICÓRNIO NÃO
TEM GÊNERO. SÓ QUER DANÇAR, FESTAR E SER
FELIZ!
Quem me vê nem consegue imaginar a criação rígida que
tive. Não condizem com as tatuagens e piercings que colorem e
abrilhantam meu corpo. Nada era permitido, o que na infância
nem foi tão ruim assim, se bem que me lembro de todos os meus
amigos indo a excursões da escola e eu sem poder… Casa dos
outros, reuniões para brincadeira… Minha mãe era a que não
deixava. Nada. Nunca. Situação acentuadíssima por uma avó
espanhola que sempre morou conosco, e também nos criou com
todo o rigor de alguém que nasceu em meados dos anos 20...
Na adolescência tudo piorou e o sentimento de estranha
no ninho veio com força total. Não podia viver a juventude como
via meus colegas, combinando várias coisas legais que a leveza
da idade permite. Era de casa para a escola e vice-versa. Notas
altíssimas, as maiores da sala sempre, que minha mãe dizia não
serem mais nada do que minha obrigação.
Com 16 anos arrumei um namoradinho de sofá. Segundo
a mãe e a vó, nunca que deveria beijá-lo. Elas demoraram um ano
para beijar seus respectivos noivos/ maridos e eu deveria fazer
igual, sempre pelo mesmo motivo: não ficar mal falada. Tadinho
do menino, nem aguentou o peso da relação!
Com 18 entrei na faculdade. Letras, minha paixão. E
também o início do meu empoderamento, quando comecei a bater
o pé e transgredir: chegava quinta-feira, meu grupo e eu, diverso,
homo, bi, queer, íamos à balada GLS (era essa a sigla no
momento) e dançávamos a noite inteira. Eu só dançava. E era
paquerada por homens e mulheres, me sentia uma “dancing
queen”, rainha da dança, me esbaldando em meu momento.
Quanto à família, eu já era uma perdida... Assim sendo, ficavam
meses sem me dirigir a palavra. Meus planos eram sair dali na
primeira oportunidade.
Arrumei outro namoradinho com 20 anos. Negro. Família
espanhola odiou, quase entrou em colapso. Ao mesmo tempo,
uma professora, que parecia afim de mim, aceitou dividir o
apartamento dela comigo. Oportunidade única.
No que cheguei com as malas, minha família chegou com
a contraproposta: filha dos “Barbosa” não sai de casa sem ser
casada. Case com esse namoradinho (ele mesmo, o negro odiado),
que mobiliamos sua nova casa e pagamos sua faculdade até o fim.
Negócio da China. Aceitei.
Primeira consulta no ginecologista porque ia casar. Levei
minha mãe junto e fiz questão de mostrar que ainda era virgem,
aos 21 anos. Ela ficou pálida, pois acreditava que eu já estava
“desenganada”. Quis mudar a proposta, perguntou se eu queria
desistir. Ah, mas nunca! Vou até o fim!
O casamento? Um fiasco! Durou um ano. Mas abriu-me
as portas e pude dizer: eu não volto mais. Padeci muito com a
falta de dinheiro, mas sempre consegui me manter. Aos 24 já era
efetiva em duas redes, municipal e estadual, porque dentre as
poucas certezas da vida, ser professora sempre me foi claro como
água.
Agora tinha que dar rumo à vida. Casei novamente. Com
um homem, porque foi o que a vida trouxe. De verdade, não ligo
muito para o campo amoroso. Nesse aspecto bem deixo a vida me
levar. Já no campo dos estudos e profissão, esses sim são minha
prioridade de vida.
Homem mais velho e acomodado... Mas a lavagem
cerebral que minha família havia feito em mim era tão boa, que
me fizeram acreditar que eu merecia quem me quisesse, já que já
tinha me separado tão jovem. Se alguém se interessasse por mim,
eu já deveria dar graças aos céus. Foi um casamento até que feliz,
durou onze anos e se desgastou.
Aí eu apertei o botão: com 36 anos comecei a fazer tudo o
que queria fazer. Muitas pessoas, baladas e bebidas. Experiências
que só não me deixam saudade, porque hoje vivo como sempre
quis.
Num site de relacionamentos, conheci meu atual marido.
A opção, deixei em aberto. O interesse que tenho é pelo ser
humano, não importa ser homem, mulher, cis, trans... Mas surgiu
um homem de novo. Que me aceita como sou: toda desenhada,
fazendo pole dance, ensaio fotográfico de pin-up, mestrado,
cursos de espiritualidade e umbanda, tomando meus bons drinks
e me acompanhando e aplaudindo cada vitória. Hoje, a autoestima
que era inexistente, é viva. Convivo com as pessoas e vou
colorindo o mundo por aí. Como disseram no GDE, sou um
unicórnio do amor. Unicórnio não tem gênero. Só quer dançar,
festar e ser feliz!
Capítulo 5
Suzete
O SER HUMANO É MUITO MAIS DO QUE
MÁQUINA BIOLÓGICA, É MAIS DO QUE GENÉTICA,
ELE INTEGRA CULTURA, VALORES.
Procurei na minha memória histórias que pudessem
exemplificar a complexidade da abordagem da diversidade sexual
nas escolas. Sou Orientadora Educacional de uma escola pública,
localizada num bairro de classe média alta e definida pela
comunidade como uma escola pública, mas com perfil de escola
particular. Existe uma resistência muito grande ao novo e ao
diferente por parte dessa comunidade escolar.
Há dois anos uma “menina” de doze anos assumiu-se
como “menino” e passou a enfrentar problemas com os colegas,
mas, principalmente, com os pais dos colegas. Alguns pais vieram
à escola e solicitaram-nos para que cuidássemos e não
permitíssemos que as “filhas”andassem e conversassem com ele,
pois temiam que o mesmo pudesse influenciá-las quanto à
orientação sexual.
Ora, diante deste relato, fica claro o preconceito e à
dificuldade da sociedade na aceitação do que é diverso. Muitas
famílias, por insegurança em relação à sexualidade, optam pela
omissão e por atitudes repressoras na tentativa de conter as
dúvidas e ansiedades dos filhos. É claro que abordar esse tema é
um desafio, já que se trata de um assunto complexo e a maioria
dos pais sentem-se inseguros, desconfortáveis e cercados de
dúvidas quanto ao que tratar com os filhos, pois os genitores, em
sua grande maioria, pertenceram a uma geração repressora e cuja
moralidade era inquestionável. No entanto, não falar sobre é dar
margem a consequências como a discriminação e o preconceito.
Especificamente quanto à diversidade sexual, é importante
dialogarmos para esclarecermos que há inúmeras possibilidades
de ser menino ou menina; de ser homem ou mulher. Existem
diferentes maneiras de como os indivíduos se sentem e se
apresentam aos outros, e isso vai além do simples conceito de
“sexo biológico”, definido de forma até simplista pela biologia,
pois o que entra em jogo aqui são comportamentos sociais,
socialização, jeito de ser e singularidades. Nasce-se com um sexo
biológico, porém o ser humano é muito mais do que máquina
biológica, é mais do que genética, ele integra cultura, valores.
Nesse contexto, o caminho seria trabalhar o tema como
ampliação da cidadania, isto é, desenvolvermos com os alunos e
os pais discussões e atividades seguindo os princípios da
dignidade humana, da igualdade, respeito e liberdade. É
necessário que sejam passadas informações científicas e
históricas para que se quebrem as amarras do preconceito. O
Respeito às diferenças deve ser ensinado pela família e pela
escola, numa ótica contemporânea. Por tudo isso, é inegável a
necessidade da inclusão das problemáticas de gênero e
sexualidade nas escolas, mas com o cuidado para não se repetir
os modelos preconceituosos, moralistas e o ocultando-se a
diversidade sexual.
Capítulo 6
Relato: Eu, a hipocrisia e o movimento LGBT
Flavielle Jollenbeck
Há dois anos, tive um aluno negro de três anos de idade,
que amava brincar com bonecas, panelas e coisas que dizem ser
do universo feminino. Quando sua mãe chegava, sua reação é
aquela que esperamos ver de uma criança com saudade: ia
sorrindo e abraçando-a. No entanto, quando era seu pai, ele
jogava os brinquedos de lado e relutava para ir, quando saía da
sala era sempre de cabeça baixa.
A professora da sala na época veio conversar comigo
sobre isso e dizer como estava preocupada com a atitude dele, não
pela possibilidade de ter uma relação instável com o pai, mas por
brincar e gostar tanto dos brinquedos que ela considerava ‘coisa
de mulher’.
Minha reação foi de raiva. Uma pedagoga atuando na
Educação Infantil, período em que as crianças não têm todos esses
preconceitos, reproduzir tal pensamento machista, misógino, de
um pequeno ser em formação que estava apenas brincando.
Tentei conversar com ela: explicar que ele talvez só
tivesse a mãe como a maior referencia e modelo, ou que a
brincadeira de boneca talvez o tornasse realmente um pai e não
um doador de esperma. Mas, mesmo que a orientação e identidade
de gênero dele fossem diferentes da que ela julgava certa, não
cabia a nós fazer especulação a ese respeito.
A cada momento que eu tentava explicar, ela retrucava
dizendo que a sociedade só viveu até hoje pelo motivo dos
homens serem homens e as mulheres realmente mulheres. Ou
seja, como se alguém do LGBT só tivesse surgido por algum tipo
de erro divino. Afirmava que eu, enquanto assistente, por passar
mais tempo com eles, deveria fazer algo a respeito: oferecer
carros e bonecos para ele e não deixá-lo pegar as bonecas, pois
ele precisava saber que era homem.
A essa altura, eu já estava extremamente furiosa.
Respondi que não iria impedir ninguém de brincar com alguma
coisa porque eles já sofriam muito por ficar doze horas no
maternal e eu não seria mais um motivo de frustração. Mais do
que isso, esclareci que não tomaria essa atitude por não julgar que
brinquedos ou brincadeiras tivessem que ser separados em
próprios para meninos ou meninas.
Ela insistiu:
- Flavielle, ele é uma criança! O que a gente ensinar, ele
vai aprender. Se você colocar uma criança pra ser criada com
macacos, macaquinho ele será.
Sinceramente, naquele momento meu mundo caiu. Tudo
que o movimento LGBT luta, tudo que eu sou foi reduzido a uma
“má criação” como se orientação, identidade de gênero fosse uma
opção.
Com isso, nasceu uma vontade de mostrar que o LGBT
existe sim, mas como?
Tenho vinte e cinco anos de idade, me reconheço como
lésbica desde os dez. Somente minha irmã sabe, disse isso para há
apenas um ano em meio a uma discussão.
Eu e minha namorada trabalhamos na mesma escola,
mas nunca saímos de mãos dadas ou sequer andamos de mãos
dadas na cidade onde moramos. Nós nos sentimos à vontade pra
fazer isso em São Paulo, bem longe de onde vivemos e
convivemos.
Então, como eu, alguém que nem verbaliza para os que
amo minha orientação, posso ter voz para o movimento LGBT?
Como posso querer proteger uma criança, se não me mostrar e
dizer para ela que existo e que ela pode se apoiar em mim?
Por mais que eu acredite na sincronicidade da vida e veja
que desde que me propus a fazer a monografia da minha pós-
graduação voltada a esse tema, muitas coisas apareceram para eu
estudar e me empoderar, como esse curso do GDE, o primeiro
congresso LGBT da UFABC, palestras, filmes, enfim, não me
sinto honesta para falar do movimento sem me assumir, como se
por isso não fosse digna o suficiente e por isso trago no titulo a
palavra hipocrisia, pois é assim que me sinto quando penso de
seguir em frente no projeto da monografia.
Capítulo 7
PROJETO: UM COLETIVO FEMINISTA DENTRO DA
ESCOLA
José Milton Pereira
E.E. Maria Guilhermina Lopes Fagundes
Santa Bárbara d’Oeste/SP
Objetivos
- Promover um debate teórico sobre certos conceitos interligados ao
universo do gênero, basicamente no que diz respeito ao patriarcalismo
como questão estruturante de promoção das desigualdades entre os
sexos masculino e feminino.
- Promover/estimular debates sobre a violência contra as mulheres nos
diferentes espaços da escola, desde as salas de aulas, bem como sala
dos professores, pátio, grêmio, etc.
- Promover intervenções performáticas como forma de despertar uma
desconstrução do patriarcalismo – Quem disse que mulheres não podem
fazer isso ou aquilo?
-Promover roda de conversa com palestrantes (mulheres) como forma
de contribuir para uma melhor formação.
Como foram ou serão realizadas as atividades dessa ação?
1º momento: Sondagem na comunidade da escola sobre os reais
problemas que afetam as alunas em seu cotidiano escolar.
2º momento: Fazer uma sondagem entre as alunas e professoras sobre
a necessidade de montar um grupo (coletivo) para discutir bem como
intervir na comunidade da escolar para pelo menos diminuiro
desrespeito e a desigualdade entre os sexos masculino e feminino.
3º momento: dirigir-se a coordenação/direção com o propósito de
criação do coletivo.
4º momento: Convidaruma professora que possa abraçar a causa de
maneira laica e, se possível, militante.
5º momento: Escrever o projeto e enviar para a coordenação.
6º momento: Em ATPC, divulgar/estimular as professoras a indicar
alunas que gostariam de fazer parte do coletivo. Duas por turma.
7º momento: Marcar o dia do 1º Encontro. Todos os professores foram
convidados, principalmente professoras.
8º momento: roda de conversa sobre o porquê, para quê, objetivos em
criar um Coletivo Feminista. Nesse primeiro dia foi feito uma dinâmica
onde cada aluna escreverá num pequeno papel sobre “O que mais a
atinge como mulher no contexto da escola”? Em seguida ouve a
divulgação dos relatos de cada uma.
Nesse dia ainda foi demonstrado (%) o número de mulheres que são
mortas todo dia no Brasil; Comparativo com outros países; Conceito de
feminicídio, etc.
9º momento: Intervenção performática do Coletivo no pátio da escola.
Horário de almoço. Foram feitos vários cartazes com palavras de ordem
e colados nas pilastras, paredes, murais, etc.
Grande parte deles foram rasgados na mesma hora pelos meninos.
Nesse mesmo dia foi criado o nome do Coletivo: Coletivo GDA-
Coletivo Garotas de Atitudes
Em que local foi ou poderá ser realizada a ação?
Escola, pátio, sala de aula.
Quais os recursos (materiais, equipamentos, profissionais
convidados etc.) serão necessários/
Sala de aula, Data Show, cartolinas, canetão.
Qual o prazo estimado para seu planejamento e execução?
A cada 15 dias as alunas se reúnem para formação e intervenções.
Qual o número ideal de participantes?
Duas por salas- totalizando 24 alunas. (Número específico de nossa
escola. Cada escola tem sua especificidade/dinâmica e, portanto, esse
número pode variar).
Quem são as (os) participantes?
Alunas dos 6ºs ao ensino médio. Dois professores.
Como essa ação foi ou será avaliada?
É bom ressaltar que o Coletivo em questão tem também, além de
ressaltar a extrema desigualdade entre homens e mulheres, estimular o
protagonismo das alunas. O Coletivo foi criado para ser um espaço de
discussão/reflexão e, sobretudo, de confronto/prática. Seu viés tem
como uma das premissas se colocar de maneira laica, interseccional e,
portanto, respeitando o lugar de fala.
Diferentes palestrantes contribuíram e contribuem para (na)
formação das alunas; desde professoras que fazem um trabalho de
militância, representantes da saúde das mulheres etc. Essas diferentes
palestrantes que contribuíram e contribuem com o coletivo, além de
dinâmicas, trabalham textos de autoras-militantes como Chimamanda,
Angela Davis etc.
Capítulo 8
PROJETO “SIM NÓS PODEMOS!”
Bianca de Jesus Alencar
Justificativa
Separação nas filas entre meninos e meninas; nas brincadeiras que
limitam as meninas ás bonecas; quando os meninos são muito mais
incentivados a desenvolver atividades físicas e até mesmo na entrega de
folha colorida, para uma simples atividade, em que a cor rosa é sempre
direcionada ás meninas... entre tantas outras situações vivenciadas
diariamente, é assim que a escola costuma reforçar práticas desiguais
que acontecem na sociedade. Partindo desta problemática, fez se
necessário criar um projeto para discutir a igualdade de gênero e
empoderar as alunas que, desde muito cedo sofrem com o sexismo.
Objetivo
Promover a discussão sobre igualdade de gênero na escola.
Debater a questão com os alunos dos anos iniciais e intervir em
situações de sexismo, refletindo criticamente sobre comportamentos, a
fim de estabelecer relações interpessoais pautadas pela igualdade de
gênero.
Duração
Uma semana
Recursos
Livro “MENINA NÃO ENTRA” Telma Guimarães Castro Andrade,
outros títulos referentes a história das mulheres (para crianças); Papéis
diversos, lápis de cor, canetas hidrocor entre outros materiais para
confeccionar painel.
Desenvolvimento
1ª etapa
Problematização
Leitura do Livro “MENINA NÃO ENTRA”
Telma Guimarães Castro Andrade
A partir da problemática do livro promover uma discussão com os
alunos sobre brincadeiras e gênero.
2ª etapa Conversa com os alunos
Contextualizar o tema, numa conversa sobre o papel das mulheres na
sociedade e suas conquistas ao longo do tempo, até chegar nos dias
atuais. Nesta etapa, incluir histórias de mulheres que fizeram história e
quebraram paradigmas: Malala, Frida Kahlo, Dandara...
.
3ª etapa
Confeccionar Painel
A partir da afirmação “Mulheres podem...” escrever frases e ilustração
para compor painel (atividade com os alunos realizada em duplas)
4ª etapa
Implantação das ações
Junto com os alunos repensar práticas sexistas e elaborar novas
estratégias para introduzir no cotidiano escolar, como organizar filas
mistas, oferecer osmesmos brinquedos e jogos a ambos os sexos, não
fazer comparações que menosprezem as meninas...
Avaliação
A avalição será contínua através da observação do envolvimento das
crianças e mudanças de atitude.
Capítulo 9
PROJETO GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOLA:
ROMPENDO COM O SILÊNCIO.
Lucilene Freitas
Desconstruindo relações de poder na escola.
Tema do Projeto
Este projeto aborda a questão de gênero e o ensino de filosofia.
A intenção de levar essa temática para a sala de aula ocorreu devido à
observação no ambiente escolar da falta de diálogo e práticas que
possam suscitar atitudes de respeito e solidariedade com relação a todas
as pessoas que estão inseridas na comunidade escolar. Nesse sentido, é
abordada a questão das relações de dominação e poder que permeiam o
ambiente escolar e a forma com que são constituídas nas instituições
determinando uma sobreposição de alguns indivíduos sobre outros, ou
seja, a dominação existente simbolicamente entre homens em relação
às mulheres.
Justificativa
A escolha deste objeto de estudo aconteceu devido às condições
que comunidades escolares vêem enfrentando problemáticas
relacionadas à gênero e como o ensino de filosofia e seu aporte teórico
pode auxiliar em tal discussão.
No âmbito do conhecimento filosófico, se almeja a construção
de discussões que revelem junto aos estudantes como se edificaram as
relações de poder e cominação ao longo do processo histórico e como
essas relações são naturalizadas no cotidiano das instituições, e,
sobretudo, como isso acontece nas unidades escolares.
Objetivos
Dentre os objetivos que se espera alcançar com a temática podem ser
considerados:
- apresentar os conceitos de dominação e poder que permeiam as
relações humanas;
- discutir o conceito de gênero e como aconteceu sua construção na
sociedade moderna;
- promover diálogos com pessoas atuantes em questões de gênero da
comunidade escolar;
- identificar situações problemáticas juntos aos estudantes em relação
à questão de gênero;
- desenvolver ações junto aos estudantes de conscientização no
ambiente escolar;
- estimular a produção de “estudos de caso” como exemplos de
situações que devem ser combatidas na convivência diária entre
estudantes;
- Organizar exposição em que estudantes possam contribuir de diversas
formas sobre seu entendimento em relação à questão de gênero
(desenhos, sarau, cartazes, produção de maquetes com materiais
recicláveis, vídeos, fotos, dentre outros).
Apresentação dos planos de aula.
Planejamento Aula 1.
1. Título da aula
Moça vai conversar?
2. Identificação complementar
Aplicação na modalidade: Ensino Médio
Disciplina: Filosofia
Tema: Gênero e filosofia.
3. Objetivos da aula
- discutir a importância de conversar sobre gênero no ambiente escolar;
- apresentar conceitos relevantes à temática: gênero, sexualidade,
orientação sexual, identidade, diversidade;
- observar como os estudantes agem quando dialogam sobre o tema, e
quais suas curiosidades e dúvidas;
- entender como é a construção conceitual de gênero junto ao
pensamento de jovens do Ensino Médio.
4. Duração das atividades
A atividade terá duração de uma hora aula.
5. Pré requisitos.
Conhecimentos prévios dos estudantes:
- entendimento dos significados de: masculino e feminino; direitos
humanos; respeito; violência e não- violência; auto-estima.
6. Estratégias e recursos da aula
Ao iniciar a aula são realizadas as perguntas: “Vocês sabem se há
diferenças entre homens e mulheres?”; “Como vocês identificam essas
diferenças?”; “Vocês sabem o que é igualdade de gênero?”; “Percebe
atitudes no seu dia a dia sobre igualdade de gênero?” “Conte
experiências que você entende que tem relação com esse tema”. Após
as perguntas e levantamento de respostas, os estudantes se reúnem em
grupos e elaboram um ”mapa mental” (metodologia conhecida para
estudantes que estão nesta aula) mostrando seu entendimento sobre a
discussão e expõe por meio de diálogo suas idéias.
7. Avaliação
A avaliação da aula será por meio da produção de um diário, em que
cada estudante escreve sobre seu entendimento de conceitos abordados
e complementa com vivências, observações percepções em relação à
situação contemplada na aula.
Planejamento Aula 2.
1. Título da aula
E se fosse você?
2. Identificação complementar
Aplicação na modalidade: Ensino Médio
Disciplina: Filosofia
Tema: Gênero e filosofia.
3. Objetivos da aula
- dialogar sobre as formas de violência existentes que são praticadas
com homens, e, sobretudo com mulheres;
- discutir sobre a situação da mulher no mercado de trabalho;
- refletir se o Estado intervém positivamente em situações de
vulnerabilidade ou de violência contra a mulher;
- questionar porque a violência é “omitida” na sociedade, sendo que há
mecanismos, mesmo que precários, para a defesa das vítimas.
4. Duração das atividades
A atividade terá duração de uma hora aula.
5. Pré requisitos
Conhecimentos prévios dos estudantes:
- entendimento dos significados de: trabalho; direitos humanos;
violência física e psicológica; estudo de caso.
6. Estratégias e recursos da aula
Ao iniciar a aula são realizadas as perguntas: “As mulheres têm direitos
iguais aos homens no mercado de trabalho?”, “Como você identifica
essa situação?”, “A mulher trabalha mais que o homem?” “Você sabe o
que é direitos humanos?”, “Todos têm os mesmos direitos?”, “A mulher
assume funções na vida em igualdade com os homens?”, “O que você
pensa em relação a estes temas?”
Após as perguntas e levantamento de respostas, os estudantes se reúnem
em grupos e começam a escrever situações que já presenciaram em
relação à violência de gênero por meio da metodologia “estudo de caso”
(método que já é conhecido e praticado por estudantes do Ensino Médio
em questão).
7. Avaliação
A avaliação da aula será por meio da criação de um “estudo de caso”
produzido em grupos e que será discutido na próxima aula sobre o tema.
Planejamento da Aula 3.
1. Título da aula
Diga não às relações de poder e dominação!
2. Identificação complementar
Aplicação na modalidade: Ensino Médio
Disciplina: Filosofia
Tema: Gênero e filosofia.
3. Objetivos da aula
- Discutir sobre as relações de poder existentes nas relações de gênero.
- Incentivar os estudantes a exercitar a desconstrução de saberes pré-
concebidos pela sociedade historicamente.
- Dialogar sobre a naturalização das relações de dominação que podem
ser praticadas em questão de vulnerabilidade étnico-racial, gênero e
sexual.
4. Duração das atividades
A atividade terá duração de uma hora aula.
5. Pré-requisitos
Conhecimentos prévios dos estudantes:
- entendimento dos significados de: poder, dominação, relações
humanas,
6. Estratégias e recursos da aula
Apresentação do “estudo de caso” produzido por estudantes em forma
dialogada e em PowerPoint e discussão sobre o tema, e organização
para a produção de vídeos discutindo os temas “Gênero na escola;
“violência psicológica e emocional”; “Rompimento com relações de
poder e dominação no ambiente escolar”, que serão expostos na escola
no evento “Feira Cultural”.
7. Avaliação
A avaliação desta aula acontece no momento que os estudantes expõem
o estudo de caso a todas e todos, e apresentam os conceitos apreendidos
nas aulas anteriores com as discussões propostas.
Bibliografia.
SCOTT, Joan Wallach. Gênero: uma categoria útil de análise
histórica. Revista Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 20, n. 2, p.
71-99, 1995.
THOMPSON, John B. Ideologia e cultura moderna: teoria social
crítica na era dos meios de comunicação de massa. Petrópolis, RJ:
Vozes, 1995.
Síntese bibliográfica.
AUAD, Daniela. Educar meninas e meninos: relações de gênero na
escola. São Paulo: Ed. Contexto, 2006.
ALTMAN, Helena. Orientação sexual nos parâmetros curriculares
nacionais. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v.9, n. 2, p.575-
585, 2001.
BOURDIEU, Pierre. A DominaçãoMasculina. Rio de Janeiro: Ed.
Bertrand. Brasil, 2003.
*as obras não foram referenciadas porque foram somente parâmetro
paras a construção das abordagens temáticas.
PARTE III: SEXUALIDADES
Capítulo 1
Bárbara Cristina
EU QUERO, EU POSSO, EU CONSIGO, E EU VOU FAZER A
DIFERENÇA.
Meu nome é Bárbara Cristina, e vou contar um pouquinho
da minha hístoria. Nasci dia cinco de julho de mil novessentos e
noventa e sete nacidade de Suzano-SP, prematura pesando apenas
quatrocentas e pouquinhas gramas. Filha de um pai caiçara
nascido em Santos-SP e com 19 anos na época, e uma mãe
maranhense de Bacabal-MA em seus belos 17 anos.
Até os meus cinco anos de idade morei com meus pais e
meus avós paternos, por ser prematura no inicio foi dificil cuidar
de mim, mas meu avô sempre esteve junto com a minha mãe no
que podia. Minha família é bem simples, no inicio eu até usava
fralda de pano por falta de dinheiro para comprar as descartaveís.
Muitas vezes meu avô saia para vender coisas no ferro-velho com
minha mãe para comprar leite e comida; nisso meu pai sempre
muito largado.
Na época eu não tinha noção de que minha mãe não ficava
comigo porque ela tinha que trabalhar para não me faltar as
coisas. Como eu passava o tempo todo com o meu pai, na minha
cabeça ele era mais legal que ela. Meus país se separaram quando
eu tinha cerca de cinco anos de idade e eu quis ficar com o meu
pai.
Nessa época minha mãe abriu mão da minha guarda, pois
não queria que eu ficasse com ela contra minha vontade. Fiquei
dois anos sem ver minha mãe, nos comunicamos apenas por
ligação. As dificuldades eram inúmeras: teve periodos que
tinhamos apenas um ovo para quatro pessoas, mas não tinhamos
nem o gás para fazer, passei meses comendo somente arroz.
Quando eu ia à casa da minha mãe eu ganhava roupas, e comia
bem e via todo mundo feliz, e não sabia por que na minha casa
não podia ser assim. Até tentei morar algumas vezes com a minha
mãe, mas sempre fui muito apegada ao meu avô e por isso voltei.
Quando eu tinha nove anos, em meio a tantas dificuldades
financeiras, havia um rapaz dono de um lava rápido na nossa rua
que emprestava dinheiro ao meu pai e avós. Meu pai pediu que eu
fosse pegar o dinheiro com ele, ele então passou a mão em mim.
Eu fiquei apavorada, porém ele me disse que se eu falasse para
alguém iria parar de emprestar dinheiro para minha familia e
meus avós iriam morrer de fome. Os abusos se estenderam por
um ano mais ou menos, até meu pai arrumar uma mulher e nós
mudarmos de cidade.
Essa mulher me salvou de diversos modos:
Antes de se envolver com meu pai, ela namorava uma moça.
Então, com um mês que eu conheci ela, já consegui contar-
lhe que era homosexual. Nessa época, meu pai dizia que se eu
fosse ‘lesbica’ iria me matar. Então ela me prometeu que iria
tentar ir moldando a mente dele. Como não tinha muito
contato com minha mãe, apeguei-me a ela como mãe.
Certo dia, estávamos de carro com meu pai. Em meio a uma
discussão, ela abriu o cinzeiro do carro e pegou dois pinos de
cocaína, atirando-os para fora do carro e reclamando com meu
pai por fazer uso disso. Ele instintivamente começou a agredi-
la. Chegando à casa, as agressões se agravaram, ele em cima
dela tentando enforcá-la com o fio do ventilador. Nessa
ocasião peguei uma faca na intenção de matá-lo. Meus avós
brigaram comigo e interviram para acalmar a situação.
Nesse dia, pela primeira vez, pude ver quem realmente era meu pai.
Ele conversou comigo e assumiu ser usuário de drogas. Seguiram-
se diversas crises de abstinencia.
A mulher dele disse que não iria me deixar sozinha com
ele, e que quando eu fosse embora, ela também iria.
Com onze anos de idade, consegui me assumir para os meus
pais e para o mundo. Meu pai aceitou e minha mãe disse que já
sabia, porém ainda tentei relacionar-me com garotos por um
tempo, mas não consegui.
Devido a crises de abstinencia de meu pai, que pressionava
meus avós, voltei a ir buscar dinheiro com o rapaz do lava rápido,
o que me trouxe de volta os fantasmas do passado. Prometi nunca
mais fazer aquilo. Contei para minha mãe, que questionou ele e
meus avós. Então meu pai me bateu, esmurrou minhas costas
enquanto dizia:
- Sapatão desgraçada, você tem que morrer!
Após esse episodio, deixei meus avós e fui em busca de algo
melhor. Morei com minha mãe, iniciei um relacionamento
homoafetivo, iniciei um curso profissionalizante e depois
consegui ingressar na Faculdade de Pedagogia pelo Prouni.
E eu sigo com o mesmo pensamento: estou atrás do melhor,
para poder oferecerpelo menos um pouco de descanso para meus
avós que já sofreram tanto. Infelizmente minha avó veio a falecer,
mas eu vou lutar pelo meu avô; eu quero ajudar também em
projetos sociais.
Capítulo 2
Izabel Lustosa
MEU DESEJO É QUE O SENTIMENTO DE SOFRER
PRECONCEITO SEJA EXTINTO, FINALMENTE!
A diversidade cultural bate de impacto a minha vida
primeiramente, e dolorosamente em minha própria casa, uma vez
que sou uma jovem de 19 anos, pansexual, com uma mente
disposta a compreender e aceitar as diversidades. Já minha mãe,
extremamente religiosa, tem seuspróprios conceitos de certo e
errado fixados como verdade única.
De minha família, somente minha irmã do meio sabe que
sou homossexual. Ela também teve a confiança em me contar que
era homossexual há quatro anos, mas devido a nossa criação tem
muita dificuldade em se aceitar; acredita que nunca irá ser feliz
com uma mulher, porque segundo a nossa mãe e a educação
religiosa, isso não é possível. Entretanto, eu, mesmo sendo nove
anos mais nova, sempre me fiz de apoio e a revesti de incentivos
para ela ser realmente aquilo que ela é.
Minha família é natural da Paraíba o que culturalmente os
tornaram com uma extrema dificuldade em aceitar as
diversidades, o que para mim é totalmente compreensível. Eu
consigo entender que minha mãe, mais especificamente, não teve
a oportunidade de ter uma boa educação escolar, e com a criação
tradicional foi impedida de ver a imensidão entre as relações
humanas.
Eu não ligo para o que pensam de mim em relação a minha
orientação sexual, e ao modo como deixo transparecer meu amor
pelas pessoas, e como me julgam pelas pessoas com que ando e
que se tornaram meus amigos. Mas tudo muda quando eu tenho
que me relacionar com minha mãe. Por ter tanta importância em
minha vida, qualquer comentário feito por ela me destrói em
pedaços, mesmo que eu sempre esteja debatendo esses assuntos
dentro de casa. Eu me sinto paralisada ao saber que por mais que
eu entenda a visão que ela tem do mundo, ela nunca vai entender
que eu, filha dela, que já nasci com toda minha vida projetada
com base nos conceitos dela, poderei ir contra isso. Ela não vai
me amar completamente e plenamente pelo simples fato de eu
conseguir amar uma pessoa, simplesmente por amar.
Eu escrevi esse diário por saber que há pessoas que passam
pela mesma situação que eu, partilham dessa mesma angustia, e
pelo meu desejo de que esse sentimento seja extinto, finalmente!
Capítulo 3
Poesia: As cem linguagens da autonomia
(Texto inspirado na poesia ‘as 100 linguagens da criança’, de Lóris
Malaguzzi)
Brubs.
A sexualidade é feita de cem,
A sexualidade tem cem gêneros, cem pensamentos, cem modos de
agir, falar e abordar.
Cem sempre cem modos de escutar as maravilhas de amar.
Cem gêneros e orientações sexuais para compreender.
Cem amores para descobrir. Cem empoderamentospara nos atentar.
A sexualidade tem cem linguagens (e depois cem, cem, cem), mas
proibiram-lhe 99.
A sociedade e a religião impõem disciplina e heterossexualidade
compulsória.
Dizem- lhe para casar e depois ter filhos, de obedecer sem questionar,
de se viver com tabus e sem conhecer seu corpo.
De aceitar preconceitos e violência da família e almoçar com eles na
pascoa e no natal.
Dizem-nos: não te toques nem mesmo para conhecer seu próprio
corpo, mas te culpam se o invadem sem sua permissão, e de cem
roubaram-nos noventa e nove.
Dizem-nos: o gênero define quem devemos amar, ser desde o
nascimento e como cuidar do próprio corpo.
O gênero e a orientação sexual, o aborto e a autonomia de nossas
vidas, são coisas não debatidas.
Dizem-nos: a “ideologia de gênero” não será debatida, nos gritamos:
DEBATEREMOS!”
Poeisa: Não estou em cima do muro
Brubs
Eu quero respeito
Não tente dar este tiro no escuro
Eu tenho a bandeira roxa, rosa e azul no meu peito.
Não se atreva a me chamar de vetor de DST
Quando você se recusa a me ver
Quando você se recusa a ver
Que bissexuais existem independente de você!
Como já diziam as palavras de ordem,
“eu beijo homem, beijo mulher, tenho o direito de beijar quem eu
quiser!”
Você não tem o direito de apontar o dedo na minha cara e dizer que
minha vida amorosa e sexual não existe quando eu estou bem
aqui na sua frente.
Nos respeite, e olhe para a realidade de uma perspectiva diferente.
Bissexuais existem independente de você!
Capítulo 4
Relato: “Meu nome é Patty”
Amélia
Primeiro dia de aula numa escola nova e um grande desafio
a enfrentar: uma distância de quase quarenta quilômetros de
distância de minha residenciae tinha que lecionar no período
noturno.
Subi para a sala de aula, me apresentei e falei sobre a
disciplina. Ao iniciar a chamada, uma aluna interrompeu-me e
disse:
-O número três, por favor, é Patty.
Olhei para ela e não entendí. Olhei novamente com intuito
de questionar, quando percebi que se tratava de uma transexual.
Era a primeira vez em quase trinta anos de profissão que eu me
deparava com uma transexual na sala de aula.
Sorri para ela e disse:
-Ok, Patty!
E assim, todas as vezes que fazia a chamada, ela se
apressava e falava:
-Patty!- e eu repetia:
-Patty. - e ela sorria.
Na outra sala de aula de outra etapa, também havia outra transexual de
nome Laila. Convivendo com elas, refleti e aprendi muito em
relação ao direito de sermos e fazermos nossas escolhas de acordo
com as nossas convicções e sentimentos.
Capítulo 5
Relato de Homossexualidade e Bullying familiar
Luciene
Enquanto professora mediadora do Ensino Médio em
escola do estado, presencio diversas situações envolvendo a
sexualidade.
Uma delas que chamou minha atenção de forma especial
e de todos os gestores, foi o caso de um dos alunos que tinha um
comportamento introvertido e que não interagia com seus
colegas. A professora da sala de leitura observando esse
comportamento veio falar comigo.
Chamei-o, e conversando com ele pude constatar que seu
problema era por ser homossexual, mas não com seus colegas, e
sim com sua família. Filho único de pais não tão jovens,
enfrentava situações constrangedoras na sua casa com seus pais e
também com seus avós.
Não tinha abertura para falar sobre este assunto e isto
estava sufocando- o.
Como sou psicóloga, facilita meu trabalho como
mediadora fazendo com que os alunos consigam se abrir e
desabafar suas angústias amenizando seu sofrimento.
Tivemos alguns encontros, convoquei seus pais para
informar sobre tais comportamentos e aconselhei que o levassem
a um psicólogo.
O aluno começou a interagir mais com seus colegas e
melhorar seu comportamento no geral, mas passados alguns
meses, seus pais foram até a escola desesperados querendo saber
sobre o filho. Se estava tudo bem, se ele estava com bom
comportamento, se o comportamento dele era diferente e etc.
Percebemos que queriam saber sobre a homossexualidade
do filho, mas deixamos que eles mesmo comentassem a respeito
questionando se eles perceberam algo de diferente no
comportamento do filho, pois na escola estava tudo normal.
Foi então que relataram ter visto uma conversa dele com
outro menino na rede social marcando encontro. Estavam
desesperados e chorando muito afirmando a todo tempo que seu
filho não era Gay. Que isso não seria possível, pois eles faziam
de tudo pelo filho, que os avós estavam decepcionados e que
falaram com ele da decepção.
Enfim, este aluno além de estar se descobrindo o que já
não é fácil para um adolescente, sofria bullying familiar
dificultando ainda mais sua socialização e levando-o a rebeldia
para com os seus.
Aconselhamos novamente que a família procurasse a
ajuda de um profissional para ajuda-los e ao seu filho, pois na
primeira recomendação, os pais ignoraram para não falar sobre o
assunto.
Nesta situação o preconceito estava dentro da própria família
e não no ambiente escolar, mas atingindo o aluno no seu
convívio social.
Capítulo 6
PROJETO: DIVERSIDADE SEXUAL NO CONTEXTO
ESCOLAR
Suzete Mary BalbinotCambruzzi
EEEF MatteoGianella
Quais os objetivos desta ação?
1. Oportunizar reflexões a respeito da diversidade sexual.
2. Criar um espaço que promova a discussão e estimule a
compreensão entre educação e diversidade sexual.
3. Sensibilizar a comunidade escolar para que as pessoas
consideradas “diferentes” não sofram preconceitos.
4. Ressaltar que o ser “diferente” não reflete empecilhos à
realização desonhoseconquistas.
Como foram ou serão realizadas as atividades dessa ação?
1. Levantar dados sobre o preconceito sexual na escola.
2. Conversa informal com ex-alunos da escola com orientação
sexual “diferente”.
3. Buscar na mídia exemplos de superação quanto à diversidade
sexual.
Em que local foi ou poderá ser realizada?
As atividades ocorrerão nos diferentes espaços da escola, ou seja, sala
de aula, pátio da escola, sala de informática, ginásio de esportes e
biblioteca.
Quais os recursos (materiais, equipamentos, profissionais
convidados, etc.) serão necessários?
1. Projetor multimídia, livros, computadores, cartolinas, papel
pardo.
2. Sala organizada com cadeiras em círculo para os debates e
reflexões.
Qual o prazo estimado para o seu planejamento?
a) Planejamento: três semanas
b) Execução: 12 semanas
Qual o número ideal de participantes?
240
Quem são os participantes?
Estudantes, professores, coordenadores pedagógicos,
pais, funcionários da escola, gestores e comunidade em geral que se
interesse pelo tema.
Como essa ação foi ou será avaliada?
A avaliação será realizada a partir da construção coletiva
de painéis, textos e vídeos com depoimentosa cerca do assunto.
Capítulo 7
PROJETO : POR UM FIO DE MEMÓRIA
Larissa Pujol
Instituto Estadual de Educação Olavo Bilac
Santa Maria – RS
Conceito: atividade aplicada ao projeto Um Dedo de Prosa e Poesia, já
desenvolvido na referida escola.
Sobre Um Dedo de Prosa e Poesia: a partir da expressão popular “um
dedo de prosa”, o projeto busca interagir uma rede de leitura entre
alunos e seus familiares/amigos sobre as obras estudadas em classe,
abordando diversas temáticas, dentre eles, o assunto da diversidade.
A atividade proposta “Por um fio de memória”, incluída no projeto, está
relacionada ao diálogo com o idoso presente no local familiar do aluno,
resgatando a “prosa” de suas histórias, por ora quiçá esquecida, sem
apego as questões identitárias ou genealógicas. O que se pretende
resgatar é o registro sobre as conversas sobre diversidade, incluindo a
disposição sobre sexualidade e gênero, presente (ou ocultas) na época.
Quais os objetivos dessa ação?
1. Retratar como era o parecer social da época sobre o assunto
gênero e sexualidade.
2. Através do idoso, traçar o seu perfil jovem e como ele lidava
com os assuntos.
3. Retratar a educação familiar e o ensino escolar que sua
juventude viveu.
4. Verificar a maneira como a escola abordava as questões de
gênero e sexualidade.
Como foram ou serão realizadas as atividades dessa ação?
É considerável observar a evolução dos Direitos Humanos para
enfrentar as desigualdades que marcam o desafio da educação e do
costume social. O papel, a função, a divisão retratados na percepção
comum do social torna-se, de tempos em tempos, tópicos para refletir e
argumentar mudanças através da mediação que oriente sobre o
preconceito e a discriminação. O gerador de conflitos, adquiridos com
o debate, intervém para abordar a falta de diálogo e demasiado
julgamento. Logo, resgatando a conversa com o idoso é possível
construir a diferença entre a opinião e o julgamento buscando anotar o
perfil reflexivo época a época. A proposta partida por “um dedo de
prosa” antes trabalhará obras em que sejam pertinentes as questões
sobre gênero, incluindo São Bernardo, de Graciliano Ramos, A Hora da
Estrela e A Paixão Segundo G.H, de Clarice Lispector, e outras obras
Modernas do século XX, que poderão auxiliar os alunos a criarem seus
questionários. Assim, após a leitura e a roda de prosa, os alunos
considerarão os exemplos de personagens estudados para começar a
aproveitar o questionário em casa, aplicando-o de maneira informal.
Caso o aluno não conviva com um idoso, ele poderá trabalhar a proposta
em um asilo, desde que construa com o idoso um vínculo confiável e
amistoso para a conversa que o deixe à vontade para relatar sobre o
assunto.
Após os dados coletados, será elaborado um livro de memórias
comparando as obras estudadas com a entrevista com os idosos.
Em que local foi ou poderá ser realizada?
A atividade poderá ser realizada em casa ou em asilos.
Qual o prazo para seu planejamento e execução?
a) Duas semanas para a leitura e abordagem das obras.
b) Duas aulas para a exposição da tarefa.
c) Uma semana para a pesquisa.
d) Duas semanas para a finalização em livro de memórias.
Qual o número ideal de participantes?
Todas as turmas de 3º ano do Ensino Médio, com total de 65 alunos e
os idosos entrevistados (máximo dois por aluno).
Quem são os participantes?
Alunos com idades entre dezesseis e 18 anos, os idosos e a professora.
Como essa ação será avaliada?
Observação contínua tratando de avaliar o procedimento utilizado para
a realização da pesquisa: adequação do espaço, elaboração do
questionário, pertinência com as obras, reconhecimento do idoso,
anotação dos dados.
Capítulo 8
PROJETO: AUTORES DA DIVERSIDADE
Larissa Pujol
Instituto Estadual de Educação Olavo Bilac
Santa Maria - RS
Conceito: atividade aplicada ao projeto Um Dedo de Prosa e Poesia, já
desenvolvido na referida escola.
A atividade estabelece um estudo sobre a Diversidade abrangida na
Literatura Infantil. Aplicada no Curso Normal, a proposta procura
desenvolver com os alunos normalistas a pesquisa sobre autores que
abordam a Diversidade nas seguintes questões: gênero, étnico-racial,
sexualidade e pessoas especiais, nos enredos dedicados às crianças da
Educação Infantil – Pré-escola ao 5º ano, e, logo, culminando na
produção de painéis sobre a atividade e realizando a discussão com
colegas sobre métodos de como planejar/aplicar uma aula sobre
Diversidade em sala de aula.
Quais os objetivos dessa ação?
1. Desenvolver a pesquisa no âmbito da Literatura Infantil,
procurando ressaltar o tema da Diversidade nas histórias infantis.
2. Através do conhecimento sobre a história, os grupos de pesquisa
desenvolverão um diálogo sobre as estratégias de como abordar o autor,
o livro e o tema Diversidade.
3. Traçar o perfil dos alunos para os quais os normalistas realizarão
sua aula e como as crianças interagem com o enredo e, logo, a
discussão.
4. Verificar a maneira que as crianças lidam com os eixos gênero,
racismo, sexualidade e pessoas especiais, bem como tratar de dialogar
o processo de desconstrução do estereótipo e do respeito à
autoafirmação do querer ser e do poder ser.
Como foram ou serão realizadas as atividades dessa ação?
É considerável observar a evolução dos Direitos Humanos para
enfrentar as desigualdades que marcam o desafio da educação e do
costume social. O papel, a função, a divisão retratados na percepção
comum do social torna-se, de tempos em tempos, tópicos para refletir e
argumentar mudanças através da mediação que oriente sobre o
preconceito e a discriminação. O gerador de conflitos, adquiridos com
o debate, intervém para abordar a falta de diálogo e demasiado
julgamento. Logo, ressaltando a conversa com a criança, é possível
construir a diferença entre opinião e julgamento buscando anotar o
perfil reflexivo durante a aula aplicada pelo normalista. A proposta
partida por “um dedo de prosa” antes trabalhará obras da Literatura
Infantil em que sejam pertinentes as questões sobre Diversidade que
poderão auxiliar os normalistas a criarem seus planos de aula para a
Educação Infantil. Assim, após a pesquisa e a discussão das estratégias,
os alunos considerarão os exemplos dos métodos dos colegas para
aproveitar na sua aula. Após o estudo e a explanação dos painéis, os
normalistas confeccionarão o Kit Diversidade (pequeno folheto com a
historinha, o autor e a reflexão abordada) para entregar às crianças.
Em que local foi ou poderá ser realizada?
A atividade será realizada nas dependências do Instituto.
Qual o prazo para seu planejamento e execução?
a) As aulas da disciplina Literatura Infantil no Curso Normal, 2º e
3º anos, realizam-se uma vez por semana e, no 1º ano, que não possui
essa disciplina em sua grade, será utilizada uma parte da aula de
Literatura.
b) Uma aula para a explanação da atividade e divisão dos grupos,
mais a escolha dos eixos que cada grupo abordará dentro do tema
Diversidade.
c) Uma aula para reunião entre as turmas e seus grupos para
explanação dos autores e eixos escolhidos, bem como a discussão sobre
métodos de aplicação das histórias infantis às crianças.
d) Uma semana para a confecção, em aula, dos painéis e do Kit
Diversidade para entregar aos alunos da Educação Infantil.
e) Um período para a apresentação dos painéis e dos planos de aula
dos normalistas.
f) Finalização em estágio de regência.
Qual o número de participantes?
40 (quarenta) alunos normalistas entre 1º, 2º e 3º anos. As crianças da
Educação Infantil para as quais os alunos farão estágio.
Quem são os participantes?
Alunos normalistas com idades entre quinze e 18 anos, as crianças e a
professora.
Como essa ação será avaliada?
Observação contínua tratando de avaliar o procedimento utilizado para
a realização da pesquisa e da aplicação da atividade: adequação do
estudo, elaboração dos métodos e das estratégias, domínio do tema e
das obras aplicadas às crianças, reconhecimento da fragilidade em
classe sobre o assunto, apresentação dos painéis e das aulas.
PARTE IV: RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS
Capítulo 1
Ana Paula
“EVITAR O PERIGO DE UMA HISTÓRIA ÚNICA”
Em busca do meu verdadeiro Eu.
Sou a quarta filha de uma família de cinco filhas mulheres,
pais separados, há exatamente 25 anos. Meu pai é branco e
racista; minha mãe é negra, com cabelo liso. Via meus pais
brigando e minha mãe acionar a delegacia por causa da agressão;
ela voltava para casa e no mesmo dia ele também voltava, como
se nada tivesse acontecido.
Quando minha mãe se relacionou com meu pai ela já tinha
três filhas, fruto do seu primeiro casamento com um descendente
de italianos. Esse casamento foi marcado por atos de agressão
física - por parte dele - e de racismo, por parte de uma irmã dele.
Teve seu fim num episódio de tentativa de homicídio (com faca),
após 17 anos, mesmo sem o apoio do meu avô (NEGRO), que
acreditava que o casamento era para sempre.
Todas as minhas irmãs têm cabelo liso. O engraçado é que
nasci careca, mas aos poucos meus cabelos foram crescendo e eu
os cortava estilo “Joãozinho” (porque meu cabelo é crespo) e me
vestia como um menino, não conseguindo me ver diferente.
Com o tempo e alguns procesos químicos, meus cabelos
estavam um pouco melhor, os anos de cabelos curtos e roupas
masculinas tinham chegado ao fim.
No Ensino Médio consegui realizar o que achava ser meu
sonho: fazer permanente afro, para assim ter lindos cachos.
Porém, ainda escondia meus cabelos através de coques, presos
sobre grampos, pois recebia os apelidosde Maria Bethânia ou Gal
Gosta sempre que os deixava solto.
No ano de 2013, ouvi um aluno do sétimo ano referir-se à
mim de forma ofensiva. Dentre outras coisas, falou:
-Aquela pessoa de óculos, se usar chapinha vai queimar
ela!
Este episódio me entristeceu intensamente. Eu me senti
feia, chorei muito e não retornei para essa escola após o final do
ano letivo.
Em outra escola, sendo bem tratada por todos, comecei a
estudar sobre o continente africano na USP. Depois realizei uma
formação em Diadema, onde tive contato com o movimento negro
de lá e ao fim desta formação me reconheci como uma mulher
negra; mas faltava algo para completar minha transformação.
A escola, então, solicitou uma palestra para compartilhar
o que havia aprendido e assim o fiz. No ano de 2016, uma
professora de Português (praticante da Filosofia Unbuntu) trouxe
para escola uma peça de teatro baseada no livro ‘O mundo no
Black Power de Tayó’ (autora Kiusam de Oliveira), realizado por
suas três alunas. Foi assistindo esta peça que me reafirmei como
uma mulher negra e o desejo de alterarmeu visual só aumentou,
pois não aguentava mais ver meus cabelos presos.
No início do ano seguinte (2017), resolvi assumir meus
cabelos do jeito que eles são: crespos, volumosos e lindos! Para
isso ocorrer, pesquisei muito sobre cabeleireiros especialistas em
cabelos afro, e enfrentei mais um desafio: ir ao salão com os
cabelos soltos. No caminho me senti insegura, imaginava que
todos estavam me olhando e dizendo algo sobre meu cabelo, mas
ao entrar no salão, me reconheci, vi pessoas como eu no espaço.
Hoje posso dizer que estou feliz com meus cabelos, com
minha aparência, sou uma mulher negra completa, que não tem
medo de ouvir “hoje seu cabelo está muito afro – um eufemismo
para: ”hoje seu cabelo está muito armado”.
Continuo divulgando meus conhecimentos sobre o
continente africano e a cultura afro brasileira, em sua diversidade,
na minha escola em outros períodos e em outras escolas quando
convidada.
Estou desenvolvendo dois temas com minha turma de
terceiro ano do médio, formações e discussões sobre a diversidade
sexual e as relações étnicos- raciais, este ano, devido um projeto
implantado na minha escola, para com isso eles possam ter mais
respeito com a comunidade LGBTT e desconstruir alguns
conceitos sobre o continente africano, a cultura africana e afro
brasileira.
É também uma forma de retribuir aos meus alunos e
alunas, pois muitos me deram força neste processo, incentivando
com suas atitudes de empoderamento, sendo verdadeiros
exemplos para minha pessoa, sempre podemos aprender com
nossos alunos, mesmo que as situações da nossa profissão sejam
difíceis.
Capítulo 2
Bruna Silva
A EDUCAÇÃO É A FORMA MAIS EFICAZ DE
PROVOCARMOS UMA MUDANÇA POSITIVA EM NOSSA
VIDA E NA VIDA DE OUTROS SERES HUMANOS
Quem é Brubs?
Chamo-me Bruna, prefiro Brubs (apelido carinhoso de
infância). Tenho 22 anos de idade. Somos de uma família de
retirantes, avós maternos paraibanos e avós paternos
pernambucanos. Sou a primeira da minha família a nascer no
estado de São Paulo e ter acesso a universidade e estudos
acadêmicos mesmo fora da faculdade.
Morei ate os dois anos de idade com minha mãe, meus avós
maternos e meus tios. Durante meus dois primeiros anos nesta
casa, minha avó me criou enquanto minha mãe saía para trabalhar.
A partir dos quatro anos, meu pai biológico quis me assumir e
passou a pagar minha pensão, o que futuramente iria me ajudar a
pagar meus estudos. Minha mãe casou-se com meu padrasto, a
quem chamo de pai até hoje.
Meu pai e sua família é testemunha de Jeová e por parte de
mãe, são católicos fervorosos. Quando estava com 10 anos, eu
estudei a bíblia com minha avó paterna, que me fazia ler um livro
bíblico por semana.
Foi apenas com 11 anos que tive noção de que não poderia
continuar calada sobre o que discordo da religião, saí do coral da
igreja e parei de estudar a bíblia, pois descobri que sinto atração
por garotas (e por garotos). Sofro ate hoje com a bifobia causada
pelos familiares e amigos.
A partir dos 11 anos, conheci Kitty, uma garota com quem
me dei muito bem e passei a gostar com o tempo. Somos amigas
até hoje, foi meu primeiro grande amor, apesar de viver em outro
estado.
No fundamental II, estudando em uma escola particular
tradicional, as pessoas falavam que meu cabelo era feio, meu
nariz era de batata, meu cabelo era de Bombril. Nesta época eu
comecei a prender meu cabelo, fazer chapinha. E então quando
achei que as chacotas iriam acabar, aumentaram mais:
-E aí? Arrumou o Bombril?
-Olha, conseguiu dinheiro pra arrumar o cabelo, so falta
consertar esse nariz.
Essas gozações me faziam muito mal! Quando completei
quatorze anos, alisei meu cabelo. Mas somente aos dezessete anos
que conheci Jully,uma amiga que iria me ajudar a amar meu
cabelo e iniciar minha transição capilar. Hoje, amo meu cabelo e
agradeço a minha amiga e ex-companheira de Marcha das Vadias
por ter fortalecido minha pessoa. Hoje eu levanto minha voz e
grito “NÃO, MEU CABELO É BOM, E MEU NARIZ É
LINDO!”.
Capítulo 3
PROJETO: A INTOLERÂNCIA NA ESCOLA NO ENSINO DO
EJA (EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS)
Clarissa de Oliveira
E.E. Alexandre Bassora
Nova Odessa/SP
Apresentação
A escola pública passou a difundir e expandir o acesso a todas as
pessoas à educação reunindo assim uma vasta e rica diversidade
cultural. Ao mesmo tempo, estereótipos e preconceitos difundidos e
reproduzidos socialmente, seja pela mídia, internet, políticas públicas,
passaram a fazer parte da comunidade escolar. Como a escola deve
servir de instrumento para minimizar conflitos e formar cidadãos,
apontar as diferenças e buscar a identidade do aluno desconstruindo
paradigmas e levando-os a refletir sobre suas origens é necessário para
a compreensão da diversidade na formação da cultura brasileira.
Objetivos
- Buscar a identidade do aluno como um ser social e sua contribuição
enquanto um organismo coletivo;
- Promover o debate sobre a diversidade cultural na escola para
desmistificar estereótipos e preconceitos que são difundidos;
- Levar a reflexão sobre origens étnicas;
- Perceber que todas as etnias contribuem para a formação da cultura do
país.
Como foram ou serão realizadas as atividades dessa ação?
- Conversa com os alunos do EJA falando sobre as origens de cada
aluno para identificar a diversidade local;
- Fazer um levantamento de dados locais sobre a diversidade da
escola/comunidade;
- Solicitar autorizações de uso de imagem e começar as entrevistas;
- Fazer a reunião do material produzido e montar o documentário.
Em que local foi ou poderá ser realizada a ação?
Poderá ser realizado nas salas de aulas e espaços da escola, como pátio,
sala de informática, quadras.
Quais os recursos (materiais, equipamentos, profissionais
convidados etc.) serão necessários?
Espaços da escola, câmera para registros e projetor para exibição.
Qual o prazo estimado para seu planejamento e execução?
O prazo estimado é de 3 meses, ficando o documentário pronto para
exibição na feira cultural da escola.
Qual o número ideal de participantes?
O maior número de alunos possível, mas devido a necessidade de
exposição de imagem, espera-se que tenham entre 10 e 20 alunos
participantes.
Quem são as (os) participantes?
Alunos do EJA do 1º termo ao 3º ano (5 salas de aula).
Como essa ação foi ou será avaliada?
Será avaliada em conjunto com as atividades da feira cultural.
Capítulo 4
Projeto: IDENTIDADE SE CONSTRÓI A PARTIR DA
VISIBILIDADE
MICHELLE SILVA
FLAVIELLE JOLLENBECK
PROPOSTA
Um povo que não conhece a própria história não tem condições de
construir uma identidade sólida e, para isso, é necessário que tenha
firmamento, embasadas em nossa cultura, que é tão plural. Mais que
conhecer, faz-se necessário compreender os processos pelos quais
passamos para que tenhamos a atual configuração de sociedade.
O Dia do índio não deve ficar de fora desta construção, uma vez que
compõe parte de extrema importância de nosso meio social. Entretanto,
não se pode encerrar este assunto apenas num único dia de
representações de estereótipos. Os educandos precisam compreender
para além de meras ilustrações, mas se emaranhar com sua história,
navegando nos costumes, visões de mundo, a forma que levavam a vida
e que, mesmo sendo todos índios, também havia entre eles a
diversidade, a diferença, assim como nos dias de hoje. É necessário que
aprendam que os costumes que temos hoje são fundamentados nos deles
e, que sem essa fundamentação, não seríamos este povo permeado de
história e cultura tão ricas.
Para embasar tal necessidade, a lei 11.645/08, que complementa a Lei
10.639/03, traz a obrigatoriedade do ensino da história afro-brasileira e
africana no currículo nacional, e também das questões indígenas.
Portanto, o presente projeto, por meio das disciplinas de História,
Geografia, Língua Portuguesa e Artes, torna-se meio de construção de
identidade, não só do indivíduo, mas do ser social, inserido num
contexto que deve ser valorizado desde sua origem.
O presente projeto tem foco nos alunos de quarto ano e trará à tona o
modo de viver indígena e os costumes que carregamos até os dias de
hoje. Com auxílio de gravuras, maquete móvel e objetos, além da
realização dos sinais referentes com toda a turma, o intuito é alcançar
todos os educandos por igual, além de inserir a Língua Brasileira de
Sinais nas atividades.
Intencionando a construção de saberes acerca do Brasil pré-colonial e
seus habitantes, as mudanças em seu modo de vida e os costumes que
carregamos até hoje em nosso dia a dia e não nos damos conta da
origem, aumentando assim, o campo de saber dos educandos, trazendo
a diversidade para a sala de aula, diminuindo preconceitos e ainda
cumprindo a lei 11.645/08 e as diretrizes dos Parâmetros Curriculares
Nacionais.
OBJETIVOS
• Compreender a diversidade e cultura presente em nossa cidade;
• Associar os costumes indígenas com costumes cotidianos;
• Entender a importância da cultura indígena para nossa
sociedade;
• Perceber as mudanças no estilo de vida indígena no decorrer do
tempo
• Respeitar as diferentes culturas
• Elaborar objetos a partir de recursos da natureza e recicláveis
ESTRATÉGIAS/ IMPLEMENTAÇÃO
• Exposição das imagens de crianças com diferentes etnias,
mostrando como somos todos diferentes. Pegar a imagem de uma
criança indígena e iniciar debate;
• Roda de conversa com exposição de mais imagens indígenas e
fazer perguntas norteadoras “O que é índio?”, “Vocês já viram algum?”,
“Como acham que eles vivem?”, “Onde vivem?” “Será que sempre
viveram da mesma forma?”; (30min)
• Com o auxílio de gravuras dos povos indígenas, identificar
como se vestiam, o lugar onde moravam, como se organizavam,
construindouma linha do tempo a partir de como imaginam como era
antes e o caminho que percorreram até chegar no modo de vida atual;
• Questionar os apontamentos em debate aberto;
• Maquete móvel, disponibilizada pelo Museu de Arqueologia e
Etnologia da USP para ilustrar o modo de vida que levavam e as
mudanças graduais no decorrer do tempo;
• Pesquisa: Entrevistar familiares e conhecidos acerca do que
sabem sobre índios e registrar com desenho e construções de frases
explicativas tanto
• Exposição e socialização dos resultados;
• Vídeo Pajerama;
• Reflexão acerca do vídeo, sobre como se sentiram ao serem
forçados a mudança e como ela começou, com utilização de recursos
visuais para ilustração;
• Pesquisa em grupo e execução de brincadeiras indígenas que
permanecem até hoje;
• Reconstrução da linha do tempo com gravuras, considerando o
conhecimento que obtiveram;
• Sistematização da aula anterior;
• Objetos indígenas para apreciação também fornecidos pelo
Museu de Arqueologia e Etnologia da USP e associação com o que
utilizamos atualmente;
• Construção de objetos utilizando materiais recicláveis e
recursos da natureza (chocalhos, colares, arco e flecha, cocares, e os
sugeridos pelos alunos) no jardim da escola (1 hora)
• Exposição dos objetos na escola
RECURSOS
• Gravuras com rostos de crianças diferentes etnias;
• Gravuras com costumes indígenas;
• Maquete Tátil do MAE - USP;
• Objetos indígenas do MAE - USP;
• Retro projetor;
• Pátio / Jardim da escola
• Garrafas pets;
• Grãos diversos;
• Folhas, galhos, frutos;
• Jornais;
• Cartolinas;
• Fio de nylon;
• Macarrão;
• Penas;
• Tintas para rosto;
• Tinta guache.
AVALIAÇÃO
A avaliação se dará a partir do cumprimento e evolução nas atividades
realizadas, que apontarão o desenvolvimento de cada aluno no decorrer
do projeto, além da observação do sentido de responsabilidade,
participação e empenho, resolução de conflitos e capacidade de
autonomia e sua evolução baseada na tragetória da implementação da
proposta.
Capítulo 5
PROJETO – DIVERSIDADE CULTURAL BRASILEIRA
EmelyJac. Dos Santos Fagundes (Pedagoga)
Felipe Eduardo dos Santos (Ed. Física)
Justificativa
Este projeto tem por finalidade mostrar aos alunos do Ensino
fundamental I que a cultura popular brasileira é plural, que o povo
brasileiro é resultado de uma diversidade de sons, de cores, de normas,
de valores que, ao se misturarem, nos deram este Brasil ritmo, este
Brasil sensibilidade e ação; um Brasil, acima de tudo, sincrético,
miscigenado, com seu tempo e sua história. Com este objetivo, deseja-
se que os alunos internalizem que povo desenvolvido é aquele que
busca e divulga a sua cultura, como forma de identidade, nacionalidade
e cidadania e que acima de tudo respeite as diferenças.
Objetivos
Despertar o interesse na cultura brasileira
Propiciar momentos reflexivos
Reconhecer e valorizar a diversidade humana
Produto final
Diário com fotos e relatos
Faixa etária
2° e3° anos fundamental I – 7 á 8 anos
Tempo estimado
4 meses 1 aula por semana
ETAPA 1
Apresentar aos alunos o projeto.
Começar com a dinâmica do aquário;
Entregar um pedaço de papel pequeno para cada aluno
Deixar Lápis das diversas cores exposto na mesa
Pedir que desenhem um peixe do jeito deles
Colocar na lousa desenhado em uma cartolina um aquário
enorme
Pedir que colem os peixes
Abrir para discussão com os alunos:
Os peixes são iguais?
Quais as diferenças estamos vendo?
Eles vivem onde?
Com o objetivo e iniciar a proposta do projeto.
Explicar que os alunos ganharão um caderno pequeno e poderão
decorar como quiserem, com o objetivo e dever de que em todas as aulas
e em qualquer momento que estiverem inspirados poderão escrever em
seus diários.
Explicar quais os objetivos a serem alcançados e esperados pela turma.
Levantar os conhecimentos prévios dos alunos sobre o que sabem do
assunto e anotar em um cartaz para complementar as etapas durante as
aulas.
Pedir que os alunos desenhem na folha como eles se acham, olhando
em um espelho e expor. Sendo que essa será a primeira visão e no final
terá outra proposta parecida para comparar.
Solicitar que os alunos registrem no diário, podendo ter desenhos.
ETAPA 2
Pedir que os alunos tragam fotos para montarmos um painel da
diversidade.
Explicar aos alunos o que é a diversidade na escola.
Pedir que os alunos façam uma pesquisa com a família sobre a formação
da família e as misturas das raças e assim trazer para a próxima aula.
Expor os desenhos em um mural da diversidade.
Solicitar que os alunos registrem no diário, podendo ter desenhos.
ETAPA 3
Iniciar a aula retomando as questões da aula anterior.
Organizar os alunos em uma roda e pedir que peguem a pesquisa.
Montar com os alunos um mapa com os estados do Brasil e colocar por
nomes ou números com uma legenda, para que fiquem em destaque aos
alunos as questões da diversidade que existem.
Conversar com os alunos sobre as fotos?
Quais diferenças nas fotos?
Quais semelhanças?
Quantas pessoas brancas têm?
Quantas negras?
Quantas de outra etnia?
Montar um gráfico com os dados e expor junto como mapa.
Solicitar que os alunos registrem no diário, podendo ter desenhos.
ETAPA 4
Iniciar a aula retomando a aula anterior.
Dizer aos alunos que hoje a aula será uma roda de leitura do livro: Jeito
de ser.
Esse livro pode complementar as questões da miscigenação,
esclarecendo.
Antes da leitura
Perguntar aos alunos o que esperam ouvir com essa leitura?
O que quer dizer cada um do seu jeito?
Ouvir os alunos e anotar na lousa.
Durante a leitura
Mostrar algumas imagens e indagar os alunos.
Depois da leitura
Perguntar o que os alunos acharam da leitura?
Deixar que eles coloquem a sua opinião diante da leitura
trazendo para a reflexão do estudo em sala de aula.
Solicitar que os alunos façam um relato sobre o que descobriram
do assunto e depois ilustrar.
Solicitar que os alunos registrem no diário, podendo ter desenhos.
ETAPA 5
Iniciar a aula com a leitura do livro O filho querido, resgatando com os
alunos as questões das diferentes famílias, crianças adotadas.
Antes da leitura
Perguntar aos alunos o que será que esse livro irá abordar
quando ouvimos o título?
Olhando a imagem do livro o que ela representa?
O que estão vendo na imagem?
Solicitar que os alunos registrem no diário, podendo ter
desenhos.
ETAPA 6
Iniciar a roda de conversa, falando aos alunos sobre as diferentes danças
que existem, deixar algumas (escolhida pelo professor) para
exemplificar ligando a cada estado e podendo complementar com o
mapa realizado em sala.
Após realizar com os alunos uma das danças circulares (professor
escolhe), com isso sair em um espaço maior que a sala de aula para fazer
a dinâmica.
Após, solicitar que os alunos façam desenhos com uma legenda
reflexiva sobre as suas impressões, fechando com uma discussão em
roda de fruição.
Solicitar que os alunos registrem no diário, podendo ter desenhos.
ETAPA 7
Iniciar a aula com uma dança circular, sendo que esse objetivo será de
acolhimento e interação dos alunos.
Após voltar para a sala de aula, sentar os alunos em roda, propor a
leitura do livro As famílias do mundinho (escolher um funcionário da
escola para ler).
Os alunos nessa aula terão a surpresa de que outra pessoa irá ler para
eles, o objetivo dessa aula será de interagir os funcionários e alunos para
que assim percebam que todos têm direitos, podemos fazer as mesmas
coisas e por isso temos que respeitar a todos.
Após a leitura registrar a roda de leitura para expor em painel.
Solicitar que os alunos registrem no diário, podendo ter desenhos.
Após os alunos irão desenhar novamente o seu auto retrato e expor ao
lado do outro no painel ou em uma pasta, esse objetivo é analisar as
mudanças dos desenhos do começo ao fim, partindo das informações
inseridas durante o estudo.
ETAPA 8
Retomar com os alunos sobre o estudo para situar a aula.
Solicitar que os alunos registrem no diário, podendo ter desenhos.
Essa aula os alunos irão confeccionar bonecos de meia, solicitar com
antecedência os materiais, lembrando que os alunos devem trazer meias
de diversas cores, não definir a cor, o mesmo para a lã que será o cabelo.
Materiais
1 meia qualquer cor
Lã para cabelo ou outro material que o aluno queira
Canetinhas para tecido ou de cd para traços do rosto com cores
diversas
Fitas e laços
Tecidos em pedaços
Cola quente
Tesoura
Cola
Jornal ou revistas para enchimento
Deixar os alunos a vontade para criar os bonecos, explicar aos alunos
que os bonecos poderão ter as características parecidas com a deles.
Depois de pronto os alunos darão um nome aos bonecos e apresentarão
para os demais colegas da sala em uma roda.
ETAPA 9
Essa aula será para retomar a aula dos bonecos e terminar.
Solicitar que os alunos registrem no diário, podendo ter desenhos.
Retomar a questão com os alunos sobre as diferenças.
Os bonecos são iguais?
Todos têm o mesmo estilo de cabelo?
Roupa, laço oufita?
Foram criados de matérias diferentes?
Fazendo com que o aluno reflita sobre essa questão, que
todos somos diferentes, porém iguais por sermos seres humanos.
Após solicitar que os alunos em grupos de 5 alunos, decidam uma
história criada ou recontada, para criar com esses bonecos e apresentar
para os colegas da sala de aula.
Essa proposta pode ser apresentada para outras salas.
A confecção dos bonecos pode ser ministrada (com ajuda do professor)
pelos alunos maiores em uma sala de alunos menores, interagindo os
grupos e idades.
ETAPA 10
Como fechamento do projeto, solicitar que os alunos pela 3° vez
desenhem seu auto-retrato e cole ao lado dos outros dois, com isso
conversarem com os alunos para que respondam as questões abaixo.
Solicitar que os alunos registrem no diário, podendo ter desenhos.
Os desenhos são iguais?
O que tem de diferentes do 1° para o 2°?
Do 3° para o 1°?
Os desenhos estão diferentes? Em que? Justifique.
Somos todos iguais? Em que? Porque?
Temos os mesmos direitos? Cite os que você lembra,
Após essa discussão em roda de conversa com os alunos e analise dos
desenhos expostos, convidarem outras salas para apreciar o painel e
pedir que esses alunos de dividam na sala de aula para receber os alunos
e eles contarem sobre, sendo dividido em:
1° grupo explica o painel do mapa e gráfico
2° grupo explica sobre os bonecos expostos e faz uma breve
apresentação
3° grupo apresenta uma leitura de um dos livros lido em sala
4° grupo apresenta e explica o mural do auto-retrato
Com isso montar o produto final com as fotos, legendas, registros dos
alunos, conforme foi solicitado em toda a aula, para compor nosso
documentoque ficará na biblioteca da escola após percorrer as casas dos
alunos.
POSFÁCIO