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6º Congresso SOPCOM 2773
O discurso jornalístico no enredo de "Os Simpsons"
Lívio Galeno
Tamiris Lima
Paulo Fernando de Carvalho Lopes
Universidade Federal do Piauí – UFPI
Resumo
A série americana Os Simpsons está prestes a iniciar a 19ª temporada e com isso, fazer
aniversário de 19 anos no ar. Desde os primeiros episódios, suscitam discussões que
refletem a e na sociedade. Não distante disso, o jornalismo se configura através da
importância que este apresenta na realidade e na série.
Entretanto, conta com a vantagem e o respaldo de ser uma animação a fim de expressar
opiniões. Posto isso, os pesquisadores realizarão um trabalho científico com a intenção
de verificar a importância do jornalismo nos episódios. Para isso, analisarão as marcas
enunciativas, baseados nas teorias de Análise de Discurso propostas por Emile
Benveniste, Paulo Fernando Lopes de Carvalho e Milton José Pinto.
Como ponto de análise específico, a configuração do diálogo entre os jornalísticos e seu
público tendo como corpus de análise os episódios da primeira temporada do seriado.
Introdução
Os Simpsons completam 19 anos no ar em 2009. Ao longo desse tempo
consolidou-se como uma série de grande repercussão uma vez que a história da família
percorre diversos campos e momentos da sociedade fazendo deles uma análise, muitas
vezes críticas e ridicularizadora, dos padrões de vida da classe média americana. A
série se passa na cidade de Springfield sempre no mesmo ano: 1990.
Homer Jay Simpson trabalha na usina nuclear local. Casado com a dona de casa
Marge (Margareth) são os pais de Bart (Bartolomeu), garoto de dez anos que aterroriza
a vizinhança e a escola além de envolver a família em diversos conflitos que causa, Lisa
(Elisabeth), uma intelectual preocupada com causas sociais, e Maggie, um bebê que
diversas vezes demonstra ser a mais esperta da casa. Os cinco têm um interesse em
comum: Televisão. Já na abertura da série, os perfis são dispostos e a TV aparece como
ponto de união dos personagens que se colocam, seja como e onde for, para assisti-la.
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Springfield, apesar de ser uma pequena cidade, possui um sistema de
comunicação desenvolvido: Rádio, diversas emissoras de TV e impressos. Afinal, para
uma cidade onde o inusitado sempre acontece, notícia é o que não falta.
O telejornalismo está presente em vários episódios da primeira temporada como
ponto fundamental para o desenvolvimento da história. Uma vez que os repórteres são
pessoas que estão sempre por perto e não perdem um furo de reportagem. Como os
Simpsons se envolvem facilmente em situações inusitadas, as notícias os englobam de
alguma forma.
Dentre os personagens de mídia destacam-se na primeira temporada o palhaço
Krusty (protagonista do show de humor preferido das crianças Simpsons e dono dos
Estúdios Krustylu), Kent Brockman (âncora dos principais programas jornalísticos da
cidade), Arnie Pie (Repórter e apresentador eventual de programas jornalísticos).
A popularidade da televisão dentro da classe média a tornou personagem tão
importante na série quanto os próprios integrantes da família. A notícia televisiva
passou a ser a mais percebida, deixando marcas do discurso midiático que atravessa os
meios de massa e perpassa por diversos outros campos integrando-os ao enunciado e
fazendo circular na sociedade. A pequena cidade da série faz voltar nossos olhos para as
formas de caracterização e circulação das produções telejornalísticas. Já que a série
reflete valores da sociedade real em uma cidade fictícia, inspira suas críticas e
personagens em fatos atuais.
Metodologia e Referencial Teórico
A metodologia aplicada à pesquisa baseia na Análise de Discurso. Como a
primeira temporada de “Os Simpsons” é composta por treze episódios, os autores
tomaram por corpus quatro episódios escolhidos aleatoriamente. O material analisado
encontra-se dublado para a língua portuguesa, seguindo normas oficiais do Brasil. As
falas dos personagens foram recortadas literalmente, para depois serem aplicadas as
teorias escolhidas como norte da pesquisa.
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A motivação do projeto focou-se na tentativa de desvendar como é construído o
conceito de jornalismo para esta temporada do seriado, e como este conceito influencia
no desenvolver das situações de conflito criadas no decorrer de cada episódio analisado.
O trabalho de Émile Benveniste, visitado por Valdir Flores e Marlene Teixeira
no texto “A lingüística comporta a enunciação: Émile Benveniste”, foi o reporte
utilizado quando houve a necessidade de se utilizar a Teoria da Enunciação. Benveniste
foi um dos lingüistas que propôs um modelo de análise da língua, especialmente em
uma época em que se vivia o apogeu do estruturalismo. Neste artigo será usado o
primeiro eixo de análise proposto por Benveniste que trata da “(inter)subjetividade na
linguagem” que “corresponde ao nível „intralinguístico‟ em que cada signo é distinto,
significativo em relação aos demais, dotado de valores opositivos e genéricos e
dispositivos em uma organização paradigmática” (Flores; Teixeira, 2005).
Ainda sobre a teoria de Benveniste, lançamos mão da concepção de que a
imagem do outro (tu), e de si mesmo (eu), se faz presente no ato de modificar a língua
imposto pela fala de um agente (eu) e como esta imagem presente no discurso molda e
adequa a enunciação de um indivíduo.
No ato de enunciar, de por a língua em funcionamento, o sujeito instaura a
presença do outro. Este segundo sujeito social é inevitável uma vez que ao falar, sempre
se fala para alguém. A partir daí o sujeito utiliza a língua para estabelecer uma relação
com o mundo através do outro e com isso, o homem insere-se no mundo,
transformando-o.
Essa transformação se dá de maneira subjetiva. Ao fazer uso da língua, da
cultura, a subjetividade do sujeito é posta em funcionamento, pois é a subjetividade que
determina as formas de falar ao outro.
Outro autor adota para compor a análise foi Milton José Pinto e sua obra
“Comunicação e Discurso”, de onde utilizamos o fragmento “Uma Agenda para a
Análise de Discurso”. Deste trecho recortamos a necessidade, baseado em uma
tendência estruturalista moderna, de se destacar o contexto social impregnado na
enunciação utilizada como base da análise.
Milton Pinto destaca a necessidade de os pesquisadores, que adotam a Análise
de Discurso como meio para se produzir conhecimento, se deterem a “textura” de cada
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texto, já que é nesses locais que são passíveis de determinação das marcas sociais e
pessoais impregnadas na enunciação.
É na superfície dos textos que podem ser encontradas as pistas ou marcas deixadas
pelos processos sociais de produção de sentidos que o analista vai interpretar. O analista
de discurso é uma espécie de detetive sociocultural. Sua prática é primordialmente a de
procurar e interpretar os vestígios que permitem a contextualização (PINTO, 1999)
Por fim, a tese de doutoramento de Paulo Fernando intitulada “Negociando
Sentidos, Articulando Lugares: o modelo semiológico-discursivo nas teorias da
comunicação e do jornalismo” contribui com a idéia de que vê a notícia, a matéria-
prima do jornalismo, como “prática discursiva” que deve ser entendida “a partir dos
processos de produção, circulação e consumo de sentidos como sendo um texto redigido
para alguém ler” e como tal são “o lugar por excelência do ideológico”.
Jornalismo em “Os Simpsons”
O primeiro episódio analisado é o terceiro da primeira temporada e é intitulado
“A odisséia de Homer”. Resumidamente, neste capítulo, o pai da típica família norte
americana é demitido de seu trabalho em uma usina de energia termo nuclear. Sem
ocupação, Homer passar a defender a segurança do trânsito em sua cidade e encontra no
jornalismo um aliado para se fazer visível na sociedade de Springfield.
Uma tomada que apresenta o personagem em diversas capas do jornal da cidade
confirma a idéia de que o fato de Homer estar em uma série de capas do periódico lhe
dá destaque perante os outros. Lembremos aqui da importância da primeira página, ou
capa, de um periódico. Geralmente, para defender a pertinência de um assunto ou
pessoa na primeira página de um jornal, por exemplo, o mesmo deve ser tocado por
algum dos critérios de noticiabilidade citados por tantos teóricos do jornalismo.
A manchete da capa deve ser alguém, ou algo, de importância para a vida em
sociedade, e através de sua luta pela segurança em Springfield, Homer se tornou
destacável na multidão.
Prova disso pode ser notado na primeira manchete que o jornal da cidade traz:
“Simpson afirma: é seguro!”. Nesta seqüência discursiva podemos perceber que de
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simples trabalhador, Homer passar a ser uma autoridade em segurança a ponto de
garantir a população de sua cidade um estado de proteção a partir de sua afirmação.
Neste período podemos perceber a idéia primeira de que agora, após a atuação de
Simpsons, o trecho passa a oferecer segurança à população já que quem afirma,
confirma. Se agora o local passa a ser seguro, é por que antes não o era. O ponto de
exclamação apresenta o fim da proposição com uma certeza, contrastando com a dúvida
de segurança do local (conclui-se isso pela opção de não usar o ponto final que
encerraria de vez qualquer discussão posterior).
Outra constatação é evidenciada pela preferência de uma pausa antes da citação
da fala de Homer. O narrador mantém distanciamento da ideologia de segurança
expressa na afirmação de Simpson, daquilo que acredita o jornal através dos dois
pontos. Essa pausa deixa claro que o jornal esta apenas reproduzindo a idéia de um
outro, e não assumindo como sua. Percebe uma desconfiança do veículo de
comunicação jogado a responsabilidade da enunciação de segurança para o enunciador.
Na segunda seqüência discursiva relevante encontramos a frase “Dezenas
aplaudem Homer Simpson”. Percebemos mais uma vez que o jornal de Springfield,
mesmo dando destaque às ações do personagem, mantém um distanciamento do ator ao
noticiar seu feitos. A expressão “dezenas” transmite a idéia de que a população passa a
apoiar as atitudes de Homer paulatinamente. Sua causa não é da maioria, mas já
conquista adeptos. O verbo “aplaudem” completa a idéia de adesão, entretanto, a
restringe aos adeptos, não significando uma posição do jornal. Desta vez, nenhum ponto
foi usado, o que deixa a margem da interpretação pessoal de cada leitor para a validade
da causa explicitada mais uma vez na capa do jornal.
Após diversas aparições em jornais, Homer ainda não se sente satisfeito e
pretende atacar seus antigos patrões, donos de uma usina de energia nuclear na cidade.
Uma multidão acompanha Simpson à porta da fábrica. Lá, um simpatizante do novo
cidadão expoente anuncia: “O homem cujo próprio nome é sinônimo de segurança”.
Este posicionamento mostra o poder do jornalismo na criação e promoção de uma
personalidade perante uma sociedade, mesmo não havendo a adesão às idéias de Homer.
O segundo episódio analisado recebe o título de “A Lisa esta tristonha”. O título
já evidencia um possível tema de discussão: o humor de Lisa. Este é o 6º capítulo da
primeira temporada.
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Homer assiste uma notícia de um telejornal. A TV aparece na cena mostrada por
trás, pouco valorizando e criando uma imagem generalista de que a situação, a ser
descrita na cena, poderia ser noticiada por qualquer canal de TV de Springfield que os
resultados seriam o mesmo. Percebemos que para investir nesta concepção de que a
audiência é massificada, o jornalismo da primeira temporada do seriado tem uma
imagem de telespectador ideal: sem cultura e que apenas se preocupa com aspectos
imediatos de sua rotina cotidiana, podendo ser destacado o critério de noticiabilidade da
proximidade do fato noticiado com a vida do receptor.
A notícia fala sobre um incêndio que se alastrou pelo centro de Springfield.
Foram destruídos o “Teatro Municipal, o Museu de História Natural de Springfield, o
Centro de Arte de Springfield e o bar na esquina do boliche”. Homer assiste o jornal
sem esboçar reação, a não ser quando, no final do texto televisivo surge a informação de
que o bar fora atingido. Simpson desperta e aparenta desespero quando vai comentar a
notícia com Marge. Sua esposa está na cozinha, visivelmente perturbada. Simpson
pergunta se ela está bem. Marge responde que está aborrecida. Então, Homer fala: “Meu
Deus! O que vamos fazer?”. A partir de desta enunciação conclui-se que o personagem
subtende que estado de humor de sua esposa se deve ao fato de o bar ter sido destruído.
A seqüência discursiva mostra a falta de interesse do enunciador pelo ocorrido com a
história e arte de sua sociedade. O fato de nem citarem o nome do bar deixando a livre
interpretação de que foi “(apenas mais um) bar da esquina” confirma as “preocupações”
e as impressões do canal de TV do telespectador ideal, representado por Homer. Assim,
seu discurso é moldado propositalmente para que se possa perceber que Homer é o tipo
de pessoa que se preocupa com um incêndio em um bar, mas não com a cultura e lazer,
quanto mais com a tristeza de sua filha.
Percebe-se na análise um comportamento egoísta do telespectador que apenas se
manifesta quando se sente intimamente prejudicado. O episódio é marcado por crítica a
um receptor ideal que nem mesmo se sensibiliza por problemas ocorridos em seus lares,
desde que esses fatos não interfiram em sua rotina.
O sétimo episódio da temporada é intitulado “Chamando os Simpsons”: A
família adquire um novo veículo e saem a um passeio na floresta ao redor de
Springfield. No entanto, saem da rota, o carro com todos os pertences cai em um abismo
e os Simpsons ficam perdidos na mata. Então, Homer e Bart tentam retornar à cidade
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para pedir ajuda enquanto as mulheres ficam em um determinado local. No desenrolar
da história, Homer envolve-se em um grande engano, pois ao tentar fugir de um
enxame, cai em uma poça de lama e é confundido com um personagem folclórico, Pé
Grande, por um naturalista que fazia filmagens da natureza. O vídeo é divulgado pela
imprensa.
A primeira seqüência discursiva encontrada no telejornal local é marcada pela
fala do âncora, Arnie Pie, que não deixa esconder espanto com a notícia: “O legendário
meio homem meio macaco não é mais só lenda, ele é muito, muito real”. O uso da
palavra “só” traz ao enunciado duas concepções: a primeira parte do pressuposto que
seja de conhecimento geral a existência da lenda do Pé Grande; e a segunda diz que o
Pé Grande deixa de ser um mito e passa a ser realidade. A expressão “não é mais”
intensifica e garante a realidade do fato. A repetição do advérbio “muito” insere uma
possível desconfiança da realidade e do terror causado pelo mito. A postura do jornalista
é de extremo desconforto e medo, olhando sempre ao redor. Isso exprime o critério de
noticiabilidade adotado para a reportagem: alerta de perigo.
Ao encerrar, o jornalista Arnie Pie propõe um acompanhamento dos
espectadores: “naturalmente teremos mais detalhes dessa história”. O advérbio instiga
o conhecimento de que a imprensa investigará o fato, isso é retomado ao usar a palavra
“detalhes”, sugerindo a divulgação completa, não superficial.
A cena seguinte mostra a imprensa com várias equipes de reportagem de
diversas emissoras na floresta. O ambiente está modificado pela divulgação do fato que
atraiu muitas pessoas, inclusive vendedores ambulantes, como uma espécie de ponto
turístico.
O alvoroço faz com que Lisa e Marge sejam encontradas na mata e é neste
momento que tomam conhecimento do fato. Marge recebe um jornal com a seguinte
manchete: “Elo Perdido ainda à solta”. A palavra “ainda” contribui dando a idéia de
motivos para ter medo, assim podendo ser percebido o postura de cobrança de atitudes
das autoridades locais para proteção dos habitantes, sugerindo a ineficácia delas.
Assustada, Marge diz que é Homer, seu marido, e torna-se alvo da mídia, dando
entrevista e gerando manchetes sem investigações jornalísticas que garanta a veracidade
dos fatos, prendem-se apenas a uma fonte.
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No momento da entrevista a Marge, um repórter pede a produção para tirar os
ursos de perto, pois estão atrapalhando. Isso traz a imagem de que para o repórter o
importante é a produção, não os obstáculos, por mais absurdos que sejam. Então um
integrante da produção diz aos ursos: “estamos gravando, todos os ursos para fora do
cenário, já!”. O local da notícia é visto como algo que foi montado, um cenário “real”.
O “já” como palavra de ordem instaura o trabalho jornalístico como algo superior,
intocável.
Na seqüência da entrevista com Marge, o repórter faz perguntas com duplicidade
de sentido causando constrangimento na entrevistada ao ponto dela perguntar se vai sair
na TV. No entanto, ele não recua e passa a induzir respostas mais constrangedoras
causando fúria em Marge.
Quando encontram Homer, a comunidade científica o prendem sendo seguidos
passo-a-passo pela imprensa. Na última cena, Homer, já em casa, vê uma entrevista
coletiva de imprensa dos cientistas, que estavam estudando o caso, ao lado de Marge e
demonstra preocupação ao dizer que os rapazes do trabalho vão divertir-se às suas
custas, desliga a TV dizendo palavrões. Simpson só se preocupa com a repercussão no
seu dia-a-dia não dando importância para a repercussão midiática do caso.
O décimo segundo episódio da temporada é intitulado “Krusty se machuca”.
Nele o palhaço Krusty é acusado de assalto a mão armada a um mercadinho local
enquanto Homer fazia compras, tornando-se uma das principais testemunhas. Por ser o
palhaço uma figura midiática importante na cidade, o caso ganha espaço na imprensa.
Não acreditando que seu ídolo seja um bandido, Bart pede ajuda a Lisa para
averiguarem o caso e acabam por constatar que o ajudante de palco do Show do Krusty,
Selvagem Cor-de-rosa, cometeu um crime tentando culpar Krusty.
Ao chegar em casa após os procedimentos posteriores ao assalto, Homer tenta
explicar a Marge o porquê do atraso quando se dá conta que o Noticiário está
veiculando o fato. A primeira imagem é a vinheta do Springfield News. No entanto, esta
não aparece como de costume, pois a palavra “ação” está piscando. Isso chama atenção
ao caráter de alerta. Simultaneamente a sonora da chamada do noticiário aponta: “A
equipe de repórteres número um de Springfield com nosso apresentador premiado Kent
Brockman”. Em seguida um outro jornalista apresenta-se como substituto, pois Kent
está de folga no dia o que caracteriza prestação de contas com o telespectador. Então faz
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a chamada para a matéria: “Por que um palhaço cruza a fronteira?O assalto ao
mercadinho. Os bastidores desta enigmática brincadeira logo depois dos comerciais” –
neste momento, Homer tentar desviar a atenção de Bart da matéria. As características
do palhaço de fazer piadas, charadas e brincadeiras são tomadas na chamada da
reportagem fazendo referência sutil ao crime. Ao utilizar o pronome demonstrativo
“desta” antes de referir-se ao fato como brincadeira, mas ao mesmo tempo o trata como
grave ao especificar o crime.
Porém, a seqüência da cena dá a notícia diretamente: “Krusty, o palhaço, está na
cadeia esta noite depois de um ousado assalto a um mercadinho local”. Por referir-se a
membro de outra emissora, identificam o personagem com um aposto. O crime é
caracterizado como ousado, sendo que o adjetivo posto antes do substantivo remete a
uma intensificação do crime.
O jornalista continua: “Esta noite a equipe Swat de Springfield prendeu o
palhaço televisivo que aparece em nossa concorrente no horário de nosso premiado
robô Hank”. Além de caracterizar o palhaço, aproveitou-se da fala em uma espécie de
contrapropaganda, já que se utiliza da má fama do personagem para divulgar um
produto seu. Ademias, dizer que tem um jornalista e um programa de TV premiado
contribui para a promoção da emissora.
A fala seguinte diz que “acaba de chegar as imagens da câmera de segurança
do mercadinho”. A expressão inicial exprime o ineditismo e eficiência da emissora o
que reforça a contrapropaganda. As imagens mostram o momento do assalto
exatamente quando Homer relata ao Abu, funcionário do supermercado, o motivo de
estar triste é porque suas cunhadas estão em sua casa. Então, uma das irmãs de Marge
diz “Então, a verdade aparece”, o “então” designa o momento certo para a verdade
aparecer e define verdade como o que é visto na TV, desviando o foco do palhaço para
Homer.
No dia seguinte, o noticiário apresentado por Kent Brockman inicia com a
imagem do rosto palhaço entre grades e um letreiro “Krusty vai em cana – o dia em que
o riso morreu”. Na primeira frase, há o uso de gíria. Na segunda o artigo definido
determina o dia da prisão seguido por uma expressão que remete a deterioração da
carreira de Krusty com o uso da palavra “morreu”, dando idéia de extinção,
impossibilidade de volta da carreira do personagem.
6º Congresso SOPCOM 2782
A imagem, então, abre para o jornalista o qual saúda Springfield. A
personificação da cidade traz a generalidade de audiência para o telejornal. Kent
Brockman diz: “ Krusty, o palhaço e o bem amado dos adoráveis pirralhos, agora nada
mais é que um suspeito de um crime comum”. O aposto de identificação de Krusty
retoma sua popularidade e refere-se as crianças como “pirralhos”, apesar de empregar
um adjetivo anteriormente a fim de amenizar a ofensiva. Em seguida, a nova imagem do
palhaço é disposta por “nada mais é”, sugerindo a desconstrução da figura de mídia que
era.
As falas seguintes do jornalista exprime o modo sensacionalista de ação da
imprensa ao mencionar que o julgamento de Krusty “assumiu um picadeiro de um circo
armado pela imprensa”. Isso retoma a idéia mencionada a cerca do sétimo episódio de
cenário. O jornalista prossegue afirmando que as crianças de todas as idades aguardam
novidades sobre o caso. Assim, insere a importância da imprensa na vida dos
espectadores. A continuidade faz um resumo da vida de Kurst na TV. Vale ressaltar a
postura do âncora após mostrar um vídeo do momento em que o palhaço teve um
enfarte cardíaco no ar: o jornalista ri, mostrando subjetividade, e retoma o texto
naturalmente.
Para finalizar a edição, relata que o acontecimento causou balbúrdia na cidade e
movimentos sociais-religioso para a eliminação dos produtos mercadológicos referentes
ao personagem. E encerra: “Será Krusty, o palhaço, prestes a trocar suas calças largas
pelo uniforme relativamente justo da penitenciária de Springfield? Saberemos amanhã
quando o julgamento começar”. A interrogação abre espaço para a dúvida da inocência
do réu; o emprego do verbo saberemos demonstra que o caso é público e a espera por
uma ação da Justiça; a palavra “amanhã” denota a espera pelo julgamento e o
acompanhamento do caso pela imprensa.
Quando Bart e Lisa investigam e descobrem o verdadeiro criminoso, o Selvagem
Cor-de-rosa, os policiais tomam conhecimento através da TV. Só então, os policiais e a
imprensa direcionam para o estúdio, onde prendem o criminoso. No entanto, os jornais
não mais veiculam detalhadamente.
Considerações Finais
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O jornalismo é um meio capaz de manipular massas, mas sem se envolver a
ponto de aderir a qualquer idéia, tentando mostrar-se neutro. Age como um conselheiro
que aponta os caminhos a seguir, instaura seu poder e relevância na sociedade. Seu
ponto de vista e ações são moldados de acordo com o desenrolar dos acontecimentos.
Não mostra, portanto uma identidade fixa podendo ser moldado conforme gostos e
tendências populares. Tal manifestação não acontece apenas com o conteúdo, mas com
a linguagem, esta carregada de gírias e informalidade.
Em diversos pontos, a produção jornalística é sensacionalista. Os critérios de
noticiabilidade, a produção e circulação das informações se dão pelo caráter de ser
inusitado e ou conter um alerta a população.
Também se percebeu a construção de imagem de um receptor massificado na
sociedade, representado por Homer Simpson, preso a uma rotina individualizada que
não se insere num contexto familiar, mas num espaço social regido pela conveniência e
o bem estar pessoal. Mesmo os conflitos envolvendo os personagens, a repercussão
social não lhes atinge de forma direta. Suas preocupações são imediatas, o que pode
mudar em seu círculo social ou seu modo de vida.
Referência Bibliográfica
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