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Hanseniase
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Papel das instituies de pesquisa e ensinoem hansenase no controle e preveno de
incapacidades e reabilitao
M. Virmond1
INTRODUO
evido complexidade da
hansenase enquanto doena,
sua infectividade, seu potencia l
incapacitante e sua longa
presena na histria da medicina, a
hansenase tem sido historicamente uma
doena confinada a hospita is ou
inst i tuies fechadas dedicadas ao cuidado
de patolog ias complexas. Particularmente,
isto se verificou de forma muito evidente no
fim do sculo 19 quando o isolamento dos
pacientes nestas instituies era visto comouma medida muito avanada do ponto de vista
de sade pblica. Entretanto, modif icaes
importantes no controle da hansenase
comearam a ocorrer num curto espao de
tempo. Lembremos que no mais que quarenta
anos se passaram desde a introduo das
sulfonas como o primeiro tratamento
realmente efetivo para a doena at os
esquemas de poliquimioterapia (PQT)
recomendados pela Organizao Mundial da
Sade (OMS), para no mencionar os decisivos
a v a n o s n a s r e a s d e m i c r o b i o l o g i a e
imunologia trata-se realmente de um perodo
m u i t o c u r t o , t o m a n d o - s e e m c o n t a a
hansenase como doena milenar.
Com a implementao dos esquemasde pol iqu imioterap ia recomendados pe laOMS, a prevalncia da hansenase diminuiudrasticamente, o conceito de eliminao comoproblema de sade pblica at o ano 2000obteve expressiva aceitao e, mais impor -
' Diretor Tcnico e pesquisador cientfico doInstituto Lauro de Souza Lima
tan te , a percepo da hansen ase comodoena curvel teve um efe i to pos i t ivo e
tremendo sobre as questes do controle da
doena tanto do lado dos pacientes como dasequipes de sade. Entretanto, dois pontos
ainda permanecem no resolvidos, de certaforma:
- o estigma- o potencial incapacitante da hansenase
PQT, ESTIGMA & DANO NEURAL
As pessoas sempre tiveram receio dahansenase por ser ela uma doena contagiosae incurvel, seu tratamento durava a vida todae resultava quase sempre em deformidades.
A PQT teve um papel muito importantena mudana deste perfil. A curabilidade dahansenase pela PQT e o impacto que istoprovocou na modificao desta imagem foienorme e no apenas a curabilidade, mas amelhoria na qualidade dos servios e cuidadoscom os pacientes, que parte da estratgia daPQT. Assim, a melhoria no diagnstico precocediminuiu sensivelmente o nmero daquelesclssicos casos lepromatosos avanados e comfades l eon ina. Ex is tem tambm algumasevidncias de que, atualmente, o nmero decasos novos com baciloscopia maior que 2+ muito pequeno. As provveis razes para abusca mais precoce de diagnstico e tratamentoresidem num conhecimento mais amplamented i vu lg ado de que a doena cu rve l , o
D
Hansenologia Internationalis PERSPECTIVAS
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VIRMOND, M. Papel das instituies de pesquisa e ensino emhansenase no controle e preveno deincapacidades e reabilitao
tratamento leva menos tempos e que oisolamento no mais necessrio. Emresumo, a PQT, enquanto uma filosof ia decontrole da doena, contribuiu enormementepara a diminuio do estigma.
O potencial incapacitante da hansenase
est intimamente ligado questo do dano
neural. Este, por sua vez, est relacionado com aimunidade dos pacientes em relao ao M.
leprae. Neste sentido, as reaes so os maioresresponsveis pelo dano neural.
A PQT tem contr ibu do tambm napreveno das incapacidades. Alguns trabalhosreferem que o nmero de reaes diminuiaps a introduo da PQT recomendada pelaOMS. Ademais, parece claro que o diagnsticop r e c o c e , o t r a t a m e n t o a d e q u a d o e a smelhor ias nos cu idados com os pac ientes(pr inc ipa lmente pe la deteco precoce etratamento correto das reaes) contriburamefetivamente para uma diminuio global daincidncia de incapacidades. A OMS estimaentre um e dois milhes o nmero de casos
onde se preveniram as incapacidades desde aintroduo dos esquemas de PQT.
DANO NEURAL O DESAFIO CONTINUA
Mesmo que a PQT tenha efetivamentecont r ibu do de vr i a s fo rmas para umasignificativa melhora no controle da hanse-nase, o dano neural ainda uma ameaapresente aos gerentes de programas decontrole e uma desafio aos pesquisadores.Sabemos que a melhor abordagem para apreveno do dano neural, e preveno deincapacidades, ainda o diagnstico precoce etratamento adequado. Entretanto, sabemosque um grupo de pacientes ainda vai neces-s i tar aes para preveni r incapac idades ,prevenir a piora de incapacidades j instaladasou mesmo necessitar de medidas reabilitativas.Este grupo poder ser constitudo dos seguintestipos de casos:
- casos novos j detectados com algumaincapacidade;
casos que desenvolvero algum tipode incapacidade durante o tratamento oudepois do tratamento terminado;
casos antigos diagnosticados tardia-mente j com incapacidades instaladas.
As informaes no so muitos claras
em re lao magn i t ude des tes g rupos .En t re tan to , a lguns dados permi tem uma
estimativa sobre o assunto (Virmond, 1995)2
Estima-se que, em mdia, 12,5% doscasos novos apresentem grau 2 de incapa-
cidade no momento do diagnstico. Este valorvar ia muito de acordo com a qual idade do
servio num mesmo pas.
Supem-se que exista uma baixa taxade desenvolvimento de incapacidades duranteo tratamento com PQT/OMS ou aps o terminodo tratamento. Rao (1994)1 relata 0,2% deincapacidades em um grupo de 2.054 casos.Resultados ainda no publicados de umestudo no Brasil com seguimento de 155 casosnovos revela que nenhum destes casosdesenvolveu incapacidades ou que as jinstaladas tenham se deteriorado durante operodo do estudo.
Os casos diagnosticados mais tardia-mente ainda necessitam ser melhor estudadosdo ponto de vista epidemiolgico quanto squestes de preveno de incapacidades emesmo das necessidades reabil itativas. Dequalquer modo, a OMS (WHO, 1996)3 estima
que, atualmente, existam 1.878.600 indiv-duos que apresentam incapacidades devido hansenase.
Os dados apresentados at este
pargrafo tem a finalidade de chamar aateno ao fato de que as incapacidades em
hansenase so ainda um problema real, que
a prevalncia das incapacidades relevante eque este o momento para dar-se s
atividades de preveno de incapacidades e reabilitao a devida importncia e merecida
prioridade.
Hansen. Int., 24(1): 32-37, 1999 33
Hansenologia Internationalis
O PAPEL FUTURO DAS INSTITUIES DEPESQUISA & ENSINO
Existe um medo generalizado de que asinstituies de Pesquisa & Ensino(P&E)envolvidas com hansenase iro reduzir suasatividades ou mesmo fechar quando foratingida a meta de eliminao da hansenasecomo problema de sade pblica. Este receiono justificvel porque, mais do que nunca,as instituio de P&E tero que continuar aexercer um papel fundamental nos anosvindouros. Com a crescente horizontalizaodos servios de sade, estas instituiesatuaro como ilhas de excelncia, comoreservatrios de conhecimentos sobre ahansenase. Neste sentido, os papeis seguintesdevero ser prioritrios para estas instituies :
Manter vivo o conhecimento sobrehansenase produzido at o momento
Atuar como centros de referncia paracasos complexos
Desenvolver pesquisas em busca desoluo a problemas ainda existentes nahans en as e e out r os a i nda po r s er emidentificados.
Pode-se compreender facilmente queunidades de sade de pequeno e mdio porte,ou mesmo hospitais que tratem hansenaseambulatorialmente de forma integrada no tenhampessoal qualificado nem tempo disponvel para sededicarem a atividades especficas como otreinamento de pessoal e produo de saberem hansenase. Devemos reconhecer que estasunidades tem a seu cargo o tratamento econtrole de outras patologias alm dahansenase. Isto mais verdadeiro ainda coma crescente reduo da prevalncia dahansenase devido ao uso dos esquemasPQT/OMS de curta durao ou, no futuro, aouso de novos esquemas teraputicos quepermitiram curar a hansenase em menortempo ainda.
Em resumo, a hansenase ser vistapelos servios de sade como uma doenacomum e igual s demais no como umapatologia que necessite cuidados especiais. Em
algumas regies a hansenase, inclusive,poder tornar-se uma patologia rara.
Estas so as razes porque as institui-
es de P&E devem, cada vez mais, assumir ereforar seu papel de reservatrio de conhe-
cimento sobre hansenase.
Estes so os locais para fornecer aopessoal dos servios gerais de sade treina-
mento continuado para que possam atenderuma demanda reduzida de casos de hanse-
nase, mas certamente ainda presente aps o
ano 2000.Estes so os locais onde conhecimento
especializado em clnica de hansenase deverestar disponvel para dirimir dvidas emanadas
das unidades sanitrias e para internar, diag-
nosticar e tratar casos complexos da doena.Devemos recordar que o M. leprae um
microrganismo ainda no cultivvel, mesmotendo sido a primeira bactria a ser
identificada como agente causador de uma
patologia humana. Em resumo, maisprovvel que a hansenase venha a ser elimi-
nada antes que muitas questes importantessejam respondidas. Certamente muitas destas
questes no sero teis ao propsito da
eliminao se obtivermos respostas aps aeliminao mas sero de enorme impor-
tncia para uma nova e controvertida meta: ade erradicao da hansenase.
Neste sentido, as instituies de P&E
devem receber todo o apoio para que cum-pram seu papel vital como centros de pesquisa
em busca de solues para problemas aindaexistentes. Entre as prioridades de pesquisa,
podemos citar trs de mxima importncia:- dano neural, com prioridade mxima;- mtodos confiveis e eficazes para a
deteco subclnica da infeco;- novos esquemas teraputicos.
AS INSTITUIES DE P&E E A PREVENODE INCAPACIDADES
Este no o local adequado paradiscutir questes bsicas de preveno ereabilitao, as quais tm sido amplamentediscutidas em congressos, reunies e artigos
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VIRMOND, M. Papel das instituies de pesquisa e ensino em hansenase nocontrole e preveno de incapacidades e reabilitao
em peridicos. Entretanto, alguns pontos
devem ser salientados referentes s relaes
entre instituies de P&E, preveno de
incapacidades e reabilitao.
- Preveno de incapacidades so aes
integradas ao atendimento do paciente e,
portanto, devem ser executadas no nvel ondeest o paciente, isto , nos postos e centros de
sade ou na comunidade.
Considera-se adequada e suficiente a
tecnologia disponvel para preencher as
necessidades de aes de preveno de
incapacidades.
O desafio da preveno de inca-
pacidade no exatamente o que fazer e simcomo tornar efetiva a tecnologia disponvel.
As instituies de P&E tem um papel
fundamental nestas questes:
1 - treinamento de pessoal de sade
deve ser feito por estas instituies. Se a
integrao da hansenase nos servios de sade
uma estratgia importante para atingir-se ameta de eliminao, para que seja efetiva esta
integrao passa pelo treinamento das equipes
de sade nas instituies ou pelas instituies
de P&E em hansenase. Isto particularmenteimportante nas aes de PI. Alm do treina-
mento das tcnicas bsicas em PI, a deteco
precoce e o monitoramento de neurites um
tema importantssimo a ser considerado
durante estes treinamentos. Ademais, os
treinamentos no necessitam ser feitos na
instituio de P&E. Reconhece-se que
treinamentos em servio sobre PI so mais
efetivos que cursos convencionais. Neste caso,
os profissionais qualificados das instituies de
P&E devem estar disponveis para deslocarem-
se at as unidades para promoverem trei-
namento no local;
2 como instituies de Pesquisa &
Ensino, elas devem implementar cursos de
treinamento em Pesquisa em Sistemas de Sade
conforme proposto pela OMS (Health System
Research HSR) e, particularmente, atuar comocentros de superviso para projetos de pesquisa
em sistema de sade na rea de PI.
3 Projetos de pesquisa clnica e epide-
miolgica devem ser desenvolvidos e imple-
mentados por estas instituies. Algumas
prioridades seriam:
modificaes aos testes atuais de
deteco de leso neural de forma a torna-los
mais consistentes e simples para uso no
campo;
- desenvolvimento de novos testes para
uma avaliao mais consistente do dano
neural, incluindo avaliao quantitativa;
desenvolvimento e avaliao de
calados mais efetivos e aceitveis para
preveno de lceras plantares;
- desenvolvimento de novas modifi-
caes de utenslios para uso domiciliar e no
trabalho, modificaes mais ergonmicas e
atrativas;
desenvolvimento de novas aborda-
gens para tornar as atividades de PI mais
efetivas, isto , fazer com que os pacientesaceitem, entendam e efetivamente incorporem
as atividades de PI em sua vida diria. Neste
sentido, a transferncia de conhecimento
essencial, assim como o modo de fazer esta
transferncia;
- desenvolvimento de estudos epide-
miolgicos para melhor quantificar o tamanho
do problema das incapacidades de forma a
permitir uma tomada de deciso mais coerente
e real por parte dos gerentes de programas;
desenvolvimento de estudos sobre as
relaes entre reaes e incapacidades;
- desenvolvimento de estudos clnicos
sobre novas abordagens teraputicas das
reaes em hansenase.
AS INSTITUIES DE P&E E AREABILITAO
Ao contrrio das atividades de PI, que
foram incorporadas ateno bsica ao
pacientes de hansenase, a reabilitao
permaneceu uma atividade essencialmente
institucional. Neste sentido, basta mencionar
apenas alguns dos principais centros no mundo
onde a reabilitao atividade tipicamente
institucional: Carville, Karigiri, Manaus,
Hansen.Int., 24(1):32-37, 1999 35
Hansenologia International is
Kumbakonam, Chingelput, Bombay, Bauru,
ALERT, Dakar, Ching Mai, etc. Por esta razo,
seria bvio afirmar que as atividades de
reabilitao esto intimamente ligadas s
instituies de P&E. Isto bastante razovel,
uma vez que, historicamente, as atividades de
reabilitao em hansenase foram iniciadas e se
desenvolveram nestes tipos de instituies
numa poca em que a internao de um
paciente de hansenase em um hospital geral
seria impensvel. Entretanto, e curiosamente,
o conceito de que a reabilitao, enquanto
ao complexa, deva ser integrado ao servio
geral de sade precede o conceito atual de
que o controle da hansenase deve ser
integrado aos servios gerais de sade. Mesmo
com um contnuo esforo de algumas
instituies para incentivar esta integrao (por
meio de treinamento de esquipes de hospitais
gerais e divulgao deste conceito em
jornadas e congressos mdicos no relacionados
com a hansenase), o resultado deste esforo
ainda no compensador. Devido
principalmente ao estigma, ao receio do
aumento da carga de trabalho e s poucas
condies de trabalho do sistema geral de sade
na maioria dos pases endmicos, os pacientes
de hansenase tem pouca aceitao nestes
servios.
Neste sentido, alguns papis impor-
tantes a serem desenvolvidos pelas instituies
de P&E no futuro incluem:
1 semelhana do conhecimento
clnico, as instituies de P&E devem atuar
como reservatrios de conhecimento em
reabilitao em hansenase.
2 As instituies devem reforar suas
atividades de treinamento em reabilitao
fsica e cincias afins, com apoio gover-
namental e de ONGs. Semelhante PI, as
equipes destas instituies devem estar
disponveis para realizar treinamentos de
cirurgies em seus prprios hospitais gerais,
alm de desenvolver cursos regulares nas
prpria instituio de P&E.
3 Estas instituies devem ser centros
ativos para a divulgao dos aspectos de
reabilitao em hansenase.
4 Pesquisa nos diversos aspectos da
reabilitao devem ser estimuladas, incluindo:
novas estratgias para diminuir o
estigma na comunidade;
- o papel da descompresso neural no
tratamento da neurite, preveno de deformi-
dades e preveno da piora de deformidades
j instaladas;
- novas tcnicas para a reconstruo do
nariz em hansenase;
novas tcnicas para a melhora da
aparncia esttica da face e mtodos inova-
tivos de transferncia de tendes em membros
superiores e inferiores;
melhor definir o papel dos retalhos
microcirrgicos no tratamento de lceras
plantares complicadas;
- tratamento efetivo da artropatia de
Charcot e outros acometimentos steo-articu-
lares em hansenase;
patognese e novas abordagens
teraputicas lcera de perna.
Se a PI atividade tipicamente de pos-
tos e centros de sade, as aes de reabilitao
podem estar centradas em instituies de P&E,
caso tenham infra-estrutura para tal. A maior
razo para esta afirmativa que, aps mais de
50 anos de um contnuo esforo nesta rea, o
melhor conhecimento e capacidade resolutiva
em reabilitao em hansenase continua
restrito a instituies de P&E em hansenase. A
transferncia desta tecnologia, ainda que
desejvel e estimulada intensamente, ainda
no foi conseguida na sua quantidade, a
despeito do grande nmero de casos que
necessitam aes de reabilitao.
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CONCLUSO
Nas reas de PI e reabilitao, as
instituies de P&E devem ser vistas como
unidades especializadas responsveis pela ma-
nuteno e desenvolvimento do conheci-
mento hansenolgico. Entretanto, indepen-
dente da complexidade das aes que
desenvolva, estas instituies no podem
esquecer que seu principal papel o de estar
aptas a responder s necessidades dos
programas de controle no campo de forma a
obter-se um adequado e efetivo controle da
hansenase como um problema de sade
pblica antes e depois do ano 2000.
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
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3. W HO. Wor ld Heal th Organizat ion. Ac t ionProgramme for the Elimination of Leprosy.Status Report 1996. WHO/LEP/96.5
Hansen. Int., 24(1): 32-37, 1999 37