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Paulo uma Ficção - O Prisioneiro do Senhor

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Uma nova ameaça faz com que os amigos Paulo e Barnabé se separem, seguindo cada qual o seu caminho. As igrejas que os dois ex-companheiros fundaram estão sendo ameaçadas pelo poder do legalismo religioso e por falsos pregadores enviados pelo Dr. Marcos Tavares, o novo líder da Igreja Nova Vida. Conseguirá Paulo resolver estas questões e trazer o povo de volta ao verdadeiro evangelho? Novos perigos e ameaças aguardam nossos heróis, enquanto persistem na missão que lhes foi confiada. Novos amigos e inimigos surgirão na vida deste que se auto-intitulava o prisioneiro do Senhor.

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Renato Alexandre

São Paulo / 2011

PauloUma ficção

O prisioneiro do Senhor

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Prefácio

Trazer o apóstolo Paulo para os dias hodiernos é um grande desafio. Quando comecei este trabalho, jamais imaginei que fosse ser tão complicada esta obra, porém, estou adorando a aventura!

Nesta eletrizante continuação da obra Paulo – uma ficção, você vai acompanhar nosso herói, o pastor Paulo, enquanto percorre por inúmeros lugares no intuito de levar o evangelho de Jesus Cristo a todas as pessoas. Maiores perigos serão enfrentados nesta continuação da história, que está ainda mais empolgante do que a primeira. Novos personagens surgirão, novos desafios ao avanço do evangelho, enquanto se nota como o evangelho de Jesus Cristo pode mudar a vida de qualquer pessoa. Paulo encontrará sua maior ameaça e dificuldade, na qual terá que contar com uma ajuda inesperada, além de confiar no Senhor. Em meio a isso tudo, o peso das igrejas continuará lhe causando preocupações, e ele terá que confrontar novas heresias, ameaça de falsos pregadores, o poder religioso da Igreja Nova Vida, na pessoa de seu ex-sogro, o Dr. Tavares. Como será que Paulo, o prisioneiro do Senhor, enfrentará todos esses problemas? Acompanhe-o nesta aventura, enquanto ele parte em mais viagens para proclamar o evangelho de Jesus Cristo, na companhia de seus amigos. Você jamais verá a vida de Paulo da mesma maneira.

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Esta é uma obra indispensável para qualquer um que aspire ao episcopado, ou mesmo para aquele que deseja um encontro verdadeiro com o Cristo que Paulo, o apóstolo dos gentios, pre-gava. Tenho para mim que, depois de Cristo, o apóstolo Paulo foi o maior homem que já andou por esta terra. Muitos homens viveram e contribuíram de forma magnífica para a cultura, liberdade social, arte, política etc. Porém, apenas um cidadão de Tarso pôde, na força do Senhor Jesus, virar este mundo de cabeça para baixo, enfrentando oposições dos religiosos de sua época e mesmo daqueles que se diziam irmãos, mas não eram. Verdade seja dita: O evangelho que se conhece hoje, a Bíblia que hoje é possível ler e estudar, só chegou até nós por que um dia este homem de Tarso abandonou tudo, considerando tudo como perda1, para levar o evangelho ao povo gentio, isto é, a cada um de nós que não somos judeus.

Este livro que você tem em suas mãos não poderia ser escrito se não fosse à coragem e determinação deste antigo perseguidor da igreja e agora um de seus maiores representantes. Paulo era um apóstolo diferente dos demais, sendo ele – como costumava dizer – o menor dos apóstolos2, porém foi o que mais trabalhou em prol do evangelho3.

Eu só tenho a agradecer a Deus pelo dom da salvação e por ter usado a vida do apóstolo dos gentios para proclamar o evangelho levando-o até os confins da terra4.

Renato Alexandre

1 Filipenses 3.8 NVI2 1Corintios 15.9 NVI3 1Coríntios 15.10; 2Coríntios 11.23 NVI4 Atos dos apóstolos 13.47 NVI

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Introdução

Pois decidi nada saber entre vocês, a não ser Jesus Cristo, e este, cruci-ficado – assim disse o apóstolo Paulo. Esta era a convicção que o apóstolo tinha. Quem dera fosse essa a convicção de cada cristão também. Toda a crítica que esta história faz é justamente contra esses cristãos – principalmente líderes e pregadores inescrupulosos – que maculam o evangelho genuíno com suas ganâncias, busca por fama, prosperidade e tudo o mais que não tem a ver com o evangelho de Cristo. O mais intrigante é ver como o povo cristão, em si, pode ser tão cego! Pois qualquer nova doutrina, mesmo que contrarie as Escrituras, é bem aceita pelo povo. O povo perdeu o temor de Deus!

A igreja prefere crer mais no que disse o “profeta” do que crer na Palavra de Deus. A situação é tão grave que há muitos cristãos – bem, pelo menos se dizem cristãos – que simples-mente idolatram seus líderes, que colocam sua fé na fé, que usam todo tipo de amuleto mágico – lenços ungidos, gravatas ungidas, métodos para adquirir prosperidades etc. É simples-mente caótico! Para os cristãos de hoje em dia, não basta crer em Jesus, pois há obsessão por campanhas, propósitos, atos proféticos que não levam nada a lugar algum, profecias etc. Enfim, só não confiam na Bíblia. O evangelho de hoje tem se tornado ensinamentos simplistas os quais não se necessita mais de Cristo Jesus, nem se quer reconhecê-lo como Senhor. Os

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pregadores modernos têm buscado, cada vez mais, mostrar-se como “os usados por Deus”, tudo para inflarem seus orgulhos. Isso não é o evangelho que foi pregado pelo apóstolo Paulo. O evangelho genuíno não se preocupa com a autoexaltação, antes, porém, em promover o nome de Jesus5. Em vez disso, mensa-gens desses tais superpregadores têm sido motivacionais, de autoajuda, que valorizam mais as bênçãos do que o abençoador. Esqueceu-se de Jesus e do que Ele fez por nós! A mensagem da cruz tem sido descartada dos púlpitos, mal se ouve falar de santidade, perdão dos pecados, salvação pela graça, conversão e novo nascimento, apenas prosperidade e mais prosperidade, bênçãos e mais bênçãos! Pregadores mentirosos e irresponsáveis que distorcem as Escrituras a seu bel-prazer para conseguirem lucro e benefício próprio6. Mesmo os louvores têm transmitido mensagens triunfalistas e sem compromisso com a salvação das almas perdidas, sendo que isso em nada glorifica o nome de Jesus. Os líderes de hoje em dia preocupam-se mais com seu próprio bem-estar – não todos, ainda há um remanescente! –, são orgulhosos e gananciosos, os chamados “mercadores da fé”7.

Em meio a um cenário como este é que imagino a vida do apóstolo Paulo na atualidade, sob a pele do pastor Paulo – o herói de nossa aventura. Como disse – ou melhor, escrevi – em meu primeiro trabalho, desde muito tempo sempre me perguntei como o apóstolo Paulo se comportaria nas igrejas de hoje. Bem, não sei a resposta a esta inquietante pergunta, porém com base em minhas dúvidas, criei o pastor Paulo e tento expressar nele meus sentimentos quanto ao que eu penso sobre tudo isso.

5 João 16.14 NVI 6 Miqueias 2.11 NVI7 2Corintios 2.17 NVI

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Espero que esta leitura seja edificante para cada leitor e que Deus use esta obra simples para mostrar que a verdadeira essência do evangelho é proclamar Jesus Cristo, nosso Senhor e Salvador.

Que Deus abençoe a todos! Agora, acompanhe Paulo em suas aventuras e boa leitura!

“Esta é uma história fictícia baseada em fatos reais daquele que foi, depois de Jesus Cristo – a meu ver – o maior homem que já andou nesta terra, o apóstolo Paulo. Qualquer semelhança entre esta história de ficção com a realidade é mera coincidência.”

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Capítulo 1

Uma visão muda o rumo da viagem

Meu querido amigo Teófilo, estou eu aqui lhe escrevendo esta história, dando testemunho a mim e a minha consciência sobre o que Deus realizou por intermédio de meu antigo amigo Paulo. E não somente por Paulo, mas eu também trabalhei ativamente na obra de nosso bom Deus, eu o Dr. Lucas, este mesmo que vos escreve. Em minha primeira carta que escrevi, lembro-me que mencionei a obra que Deus realizou quando transformou a vida do pastor Paulo de um terrível perseguidor a pregador do evangelho. Mencionei também como Paulo, após um tempo de reclusão para que pudesse meditar em tudo o que havia lhe acontecido, iniciou uma incrível jornada missionária em com-panhia de Barnabé e João Marcos, mas este último, temendo por sua vida, voltou para casa em Antioquia. Quando estavam prestes a terminar a obra e tendo sido apedrejados na cidade de Listra, encontrei-me com Paulo e Barnabé e tratei de suas feridas em minha clínica. Tendo terminado a missão para o qual os missionários foram enviados, retornamos para Antioquia e depois viajamos para Damasco a fim de que pudéssemos expor o relatório da viagem aos demais irmãos em Cristo.

Percebendo a aproximação de uma nova ameaça, mais mortal que a perseguição do Dr. Carlos Andrada, Paulo responde um e-mail, um pedido de socorro vindo dos líderes da região da

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Galácia, e isso causou grande repercussão entre a cristandade toda. Decidimos, então, partir em uma nova viagem missionária para a região da Galácia, depois de termos trabalhado arduamente na igreja de Antioquia, por pouco mais de um ano, a fim de que confrontar ensinos errôneos de pregadores desautorizados, enviados da parte do novo presidente da Igreja Nova Vida, o Dr. Marcos Tavares.

A operação falso profeta foi uma ameaça terrível e que nos pegou totalmente desprevenidos.

Chegado o dia da viagem, por causa de um desentendimento entre Paulo e Barnabé, os amigos que pareciam inseparáveis, dois homens de Deus que tanto trabalharam em prol do Reino de Deus, separaram-se. Tão grande foi a desavença entre os dois, e tudo por causa de João Marcos, pois Barnabé, querendo dar-lhe mais uma chance, convidou-o para a viagem. Paulo por outro lado, não esquecera que João Marcos os abandonara em um momento crítico da viagem e, por isso, não aceitou que ele os acompanhasse. Nenhum dos dois queria ceder, Paulo era duro em seu modo de lidar com a situação, enquanto Barnabé tentava argumentar que Paulo era irredutível. Sendo assim, eles se separaram indo cada qual por seu caminho. Barnabé e João Marcos seguiram para as ilhas de Chipre enquanto Paulo, Silas e eu, Lucas, seguimos viagem pelas terras da Síria e pela Cilícia, tendo nós, apenas um propósito: confirmar a fé dos irmãos e fortalecer as igrejas.

Aqui, retomo esta história...Passados alguns dias, Paulo e seus amigos chegaram às cidades

de Derbe, onde foram muito bem recebidos pelos irmãos e de lá descemos à Listra a fim de terem com os cristãos de lá.

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– Não vejo uma recepção tão calorosa como a que tivemos em Derbe, desde que fui ordenado a diácono em Damasco! – disse Silas.

– É verdade Silas – respondeu Paulo. – O povo realmente estava feliz pela nossa vinda.

O dia estava nublado, poucas pessoas circulavam pelas ruas da cidade, nuvens de chuva começavam a se formar no céu e isso era o prenúncio de muita chuva. Fazia cerca de quinze dias que Paulo saíra de Antioquia e até a presente data as coisas não pareciam estar de acordo com o planejado por eles.

Haviam andado muito, estavam cansados pela longa viagem, não se lembravam de a viagem ser tão dura assim, ainda não haviam tido oportunidade de testemunhar a Cristo com quase ninguém, apenas na igreja em Derbe, embora isso pareceu pouco comparado com a primeira vez em que saíram de viagem. Isso incomodava muito Paulo, pois se sentia frustrado e aborrecido. Porém, Paulo não deixaria que esse aborrecimento viesse tirá-lo de seu foco, que era fortalecer e confirmar a fé dos irmãos livrando-os dos enganos e ensinos errôneos dos pregadores enviados pela Igreja Nova Vida.

A Igreja Nova Vida, sob o comando do novo presidente, Dr. Tavares, enviara pregadores e mestres que difundiram ensinos con-trários à Palavra de Deus no intuito de confundir o povo e colocar em descrédito Tiago, o líder da revolta, e Paulo seu antigo genro.

Lucas parou seu carro no acostamento para poderem descansar um pouco, pois a viagem fora custosa para ele que dirigira durante seis horas seguidas. Enquanto Lucas tirava um cochilo em seu carro, Paulo e Silas foram ao mercado da cidade para comprarem algo para comer.

– Pobre Lucas – murmurou Silas. – Ele vem dirigindo desde que saímos de Antioquia e é o que menos dorme nesta viagem! Deve estar muito cansado.

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Paulo aquiesceu, percebendo os infortúnios que os cercavam nesta viagem que parecia estar fadada ao fracasso. Por um ins-tante desejou que seu amigo Barnabé estivesse ali para orientá-lo sobre o que fazer, porém ambos haviam se desentendido por causa do orgulho ferido de Paulo o que causou a separação dos dois.

Depois de fazer as compras, Paulo e Silas já iam saindo do mer-cado, quando uma mulher, vindo atrás deles, começa a falar-lhes:

– Com licença, senhores, mas, por acaso você – disse apontando para Paulo – não é o pastor Paulo, o mesmo que esteve em nossa cidade certa vez, sendo apedrejado pelos cidadãos de nossa cidade?

Paulo franziu o cenho, forçando a mente tentando se lembrar da fisionomia da mulher. O fato de ela mencionar o apedreja-mento para Paulo deixou-o meio desconfortável.

– Isso mesmo, minha senhora. – Paulo hesitou por um instante e então prosseguiu. – Chegamos hoje cedo de viagem para visitar alguns irmãos desta cidade, mas...

O semblante da senhora se iluminou quando soube tratar-se de Paulo e largando suas compras pôs-se a falar.

– Sim, sim! Eu vi mesmo que era você, pastor, pois de cara o reconheci – disse a senhora – está mais velho, um pouco é claro, e com cavanhaque, porém logo que bati os olhos em você sabia que era o pastor Paulo.

– Diga-me, senhora – inquiriu Paulo, sentindo-se inco-modado – como me conhece e quem é a senhora?

A senhora enrubesceu-se, pois percebera que fora indelicada fazendo uma abordagem tão inesperada sem, nem ao menos, se apresentar.

– Oh, perdoem minha indelicadeza, senhores! Fui tão descuidada. Chamo-me Eunice e sou membro da Igreja Nova

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Vida também. Mudei-me há pouco tempo para esta cidade. Quando você e outro senhor estiveram por aqui anteriormente, eu havia chegado há poucos dias.

Parecia que uma luz começava a surgir no fim do túnel. Final-mente encontraram uma oportunidade de serem ouvidos pelos demais habitantes da cidade. Chegariam à pequena congregação que se formara de sua última viagem e de lá proclamariam o evangelho de Jesus Cristo, ensinando-os corretamente e exor-tando mais pessoas a conhecer Cristo Jesus.

– A senhora poderia nos conduzir até os líderes da igreja para que eu pudesse conversar com eles? – perguntou Paulo.

– Mas claro! – exclamou a senhora. – Teremos uma reunião esta tarde, pois alguns problemas têm surgido em nossas igrejas.

– Problemas, que tipo de problemas? – perguntou Silas, com um ar de desconfiança.

– Ora, perdoem-me, senhores – disse a senhora. – Os irmãos devem estar se sentindo cansados pela viagem e eu aqui, falando demais! Perdoem-me.

Paulo e Silas se entreolharam preocupados e Silas fazendo sinal com a cabeça disse a Paulo que insistisse com a mulher.

– Não se preocupe minha senhora, hã, Eunice, não é? Conte-nos o que está ocorrendo. Viemos de Antioquia justamente para confirmar a fé de nossos irmãos e para auxiliar a igreja.

A dona Eunice muito se alegrou com essas palavras de Paulo e ali mesmo, na saída do mercado, começou a glorificar a Deus, para constrangimento de Paulo e Silas.

– Louvado seja o nome do Senhor! Minhas orações foram ouvidas e respondidas!

Paulo tentava sem muito sucesso conter a senhora, pois todos os transeuntes ali presentes estavam perplexos olhando para o espetáculo que a mulher estava dando.

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– Por favor, senhora, acalme-se! Por favor, diga-nos o que realmente está acontecendo por aqui.

– Claro, perdoem-me senhores – disse uma Eunice ruborizada – perdoem meu entusiasmo, mas quando eu lhes disser o que temos passado em nossa igreja, vocês saberão por que estou tão contente com a vinda de vocês aqui. Bem, não fiquemos aqui parados, venham, vamos até minha casa! Lá poderei lhes explicar melhor a história enquanto lhes preparo algo para almoçarem. Devem estar famintos! Meu filho Timóteo poderá lhes fazer companhia enquanto preparo o almoço.

Chegando à casa de Eunice, Paulo, Silas e Lucas – ainda com sono! – acomodaram-se na sala enquanto o almoço era prepara-do para os convidados. A chuva começou a cair do lado de fora, uma chuva forte acompanhada por fortes ventos que açoitavam as casas dos habitantes de Listra. Loide, mãe de Eunice fazia companhia para os missionários enquanto esperavam para saber das notícias sobre a igreja de Listra. Lucas recostava-se no sofá mantendo os olhos semiabertos, com uma expressão horrível, como se não dormisse há dias. Não podendo mais se conter, Paulo levantou-se e, olhando firme nos olhos de dona Loide, uma senhora beirando os oitenta anos, com expressões bem fortes no rosto de uma pessoa bem sofrida na vida, e perguntou-lhe:

– Com licença, hã..., dona Loide – prosseguiu Paulo, escolhendo muito bem as palavras. – Por acaso a senhora sabe alguma coisa sobre os problemas que vêm acontecendo em nossa igreja por aqui?

Loide, que até agora permanecera em um silêncio sepulcral, tricotando, olhou-os fixamente, largando o que estava fazendo e, sorrindo, começou a dizer:

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– Você ainda é bem jovem rapaz! – disse a senhora com um tom carinhoso na voz. – O caminho que escolheu é muito espinhoso! Se continuar neste caminho, é provável que não viva por muito tempo.

Essas palavras fizeram Paulo estremecer. Silas sentiu-se desconfortável por Paulo, seu amigo e companheiro, e Lucas desistiu de tentar dormir. Essas palavras caíram em cheio no coração dos três missionários. No fundo, cada um deles sabia que tais palavras eram verdadeiras. Eles estavam indo contra o poder da maior e mais poderosa instituição religiosa que se conhecia na atualidade.

– Temos total consciência dos perigos que nos esprei-tam – disse Paulo demonstrando nervosismo. – Ainda assim, não podemos deixar de pregar o evangelho de Jesus Cristo a todos que necessitam.

– Eu já sabia que você diria isso meu jovem – disse a senhora em tom enfático. – Realmente deseja continuar seguindo em frente com isso, mesmo sabendo quais serão as possíveis consequências?

Os três aquiesceram. Paulo estava determinado a proclamar o evangelho, não importando o que acontecesse com sua própria vida.

– Para mim o viver é Cristo, morrer é lucro! – disse-lhe Paulo.

Relâmpagos riscavam o céu e trovões ribombavam do lado de fora da casa. Loide, então, chamou seu neto Timóteo.

– Meu neto, Timóteo, poderá lhes explicar melhor o que vem acontecendo em nossa igreja, rapazes.

Timóteo era um jovem de dezessete anos de idade e um cristão dedicado que recebia bom testemunho de toda a congre-gação pelo seu empenho na obra de Deus. Ele era um moço de

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pele clara, estatura média, olhos escuros, como um céu nublado e cabelos loiros ondulados, sendo o filho único de Eunice. Estava vestido com uma camiseta branca, bermuda jeans e tênis nos pés. Quando o jovem entrou na sala, cumprimentou todos os convidados, sendo apresentado a cada um deles por sua avó, Loide. Tão logo estavam todos apresentados, Timóteo passou a lhes expor as dificuldades que enfrentavam na igreja de Listra, no que diz respeito a pregadores enviados de Damasco que traziam uma mensagem um tanto estranha. Paulo ouvia o menino discursar prestando-lhe muita atenção.

– Diga-me Timóteo – interrompeu-o Paulo – que tipo de mensagem estes pregadores de Damasco lhes trouxeram?

Paulo sentou-se deixando Timóteo em pé no meio da sala explicando-lhes tudo desde o começo. Paulo não sabia o porquê, mas algo naquele jovem rapaz lhe chamava a atenção. Talvez a forma eloquente como se expressava e falava do evangelho, talvez seu carisma com o qual captava a atenção de todos na sala. Paulo não sabia, porém sabia que este rapaz era uma possível promessa no futuro, desde que bem orientado nos caminhos do Reino.

– Homens vindos de Damasco, dizendo-se da parte de Tiago e recomendados por você, Paulo, chegaram aqui e começa-ram a ensinar que “a menos que guardássemos as tradições da Igreja Nova Vida, seus usos e costumes, não poderíamos ser salvos. A fé, apenas, não era suficiente!”

Paulo lançou um olhar de soslaio para seus companheiros de viagem e pediu que Timóteo continuasse.

– Nosso povo está bastante confuso, Paulo – prosseguiu Timóteo. – As palavras desses homens confundiu todos com promessas falsas, um evangelho barato e com regras e mais regras. Esse não é o verdadeiro evangelho, não o evangelho de Cristo. Não pode ser! O evangelho que conheci pela minha avó e minha mãe é um evangelho de vida e paz e não de jugo religioso.

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Paulo estava maravilhado com a defesa do evangelho feita pelo rapaz. Nunca antes vira um jovem, assim tão novo, falar de uma forma tão ousada sobre o evangelho.

– Timóteo – chamou sua mãe, Eunice. –O almoço está pronto! Chame nossos convidados.

Todos se sentaram à mesa para almoçar. A chuva dera uma trégua, cessara, dando lugar a um mara-

vilhoso raiar do sol. O dia estava já quase terminando, e Paulo e seus companheiros sabiam que, depois da reunião na congre-gação de Listra, precisavam retomar sua viagem, seguindo seu caminho levando o evangelho adiante.

– dona Eunice – disse Paulo – a senhora deve saber que nossa estada em Listra é passageira, pois estamos em uma viagem missionária e, portanto, precisamos prosseguir nossa caminhada.

Todos ao redor da mesa fizeram silêncio, fitando Paulo, enquanto este lhes falava. Lucas já imaginava o que Paulo estava tramando e, sabendo disso, deu-lhe um sorriso do tipo: “Vá em frente, peça à mãe do rapaz!”

– Sim, senhores – respondeu a mãe do rapaz. – Sei muito bem disto. Mas, por que está me dizendo isso?

Paulo olhou para Timóteo, que desviou o olhar sentindo-se acanhado, e então, olhando para Lucas e Silas, que o encora-javam com um sorriso nos lábios, fitou dona Eunice nos olhos e prosseguiu.

– dona Eunice – disse Paulo – eu estou muito interessado em levar comigo, nesta viagem, seu filho Timóteo.

Timóteo e sua mãe pareciam espantados, pois a notícia pegou-lhes de surpresa. dona Loide limitou-se a olhar para sua filha com um olhar decidido como que se já soubesse que este dia, cedo ou tarde, chegaria.

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– Mas, Paulo – gaguejava a senhora. – Eu posso saber o motivo de tal interesse pelo meu filho?

Paulo recostou-se na cadeira, endireitando a coluna a fim de ficar em uma postura mais cômoda. Lucas e Silas olharam-se de soslaio prevendo o que Paulo iria dizer.

– dona Eunice, seu filho tem um ótimo conhecimento das Escrituras Sagradas, um pouco superficial ainda, mas já demonstra bom discernimento. Sem contar que a maneira como ele defende o evangelho de Jesus Cristo é impressionante. Senti-me atraído pela maneira como ele falava sobre o evangelho. Com um pouco de instrução e prática no ministério, seu filho se tornará um excelente pastor!

Paulo olhou para Timóteo e sorriu. Eunice, instintivamente, abraçou o filho, deixando escorrer uma lágrima pela face. Ela olhou fundo nos olhos de seu filho que brilhavam de emoção e então, beijando-o, o entregou aos cuidados de Paulo.

– Sim, claro – disse dona Eunice com a voz embargada. – Eu já imaginava que isso aconteceria cedo ou tarde. Desde cedo que Timóteo demonstra vocação para ser um pregador do evangelho. Ele sempre procurou estudar muito as Escrituras, fazendo sempre muitas perguntas e tudo mais. Tudo bem, eu o autorizo a acompanhá-los senhores.

O rosto de Paulo e seus companheiros se iluminaram demonstrando contentamento com a decisão da senhora. Os três deram-se as mãos prometendo que cuidariam muito bem de Timóteo.

– Não precisa se preocupar, dona Eunice – disse-lhe Silas. – Cuidaremos de seu filho. Esta viagem não demorará muito, e logo estaremos de volta trazendo novamente seu filho aos seus cuidados.

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A reunião na nova congregação, na cidade de Listra, fora muito boa. Paulo leu a carta de Tiago perante os irmãos de Listra e lhes instruiu para que permanecessem fiéis a Jesus Cristo e seu evangelho. O povo recebeu os missionários com bastante alegria, e saber que eram lembrados pela igreja de Damasco fez com que recobrassem ânimos para continuar resistindo às falsas doutrinas dos homens de Tavares da Igreja Nova Vida.

Os dias iam correndo, e em todo lugar por onde passavam, Paulo, Lucas, Silas e agora também Timóteo proclamavam o evangelho da graça de Deus levando a mensagem da salvação mediante a fé em Jesus Cristo.

Timóteo estava fascinado com tudo o que presenciava, pois não somente via Paulo e seus companheiros pregarem de forma poderosa como também sinais e maravilhas, em nome de Jesus, os acompanhavam, testificando que sua mensagem era verdadeira. Multidões afluíam para ouvir o evangelho, e muitos desses se convertiam ao Senhor Jesus.

Chegando o dia de partir, Paulo reuniu os líderes da igreja e impondo as mãos sobre Timóteo o recomendou à graça de Deus, separando-o para segui-los nesta viagem. A mãe de Timóteo abraçou-o e o beijou desejando-lhe que Deus o acompanhasse em todo caminho. E assim, partiram da cidade de Listra levando consigo o mais novo integrante de sua equipe, o jovem Timóteo. “Por onde andaria Barnabé?” Assim pensava Paulo. Olhando ao seu redor ele via a providência de Deus em separá-los para que pudesse ter mais pessoas nesta obra que prometia não ser nada fácil. Do contrário, seriam apenas Paulo, Barnabé e Lucas, mas agora, o trabalho contava com mais obreiros, mais pessoas envolvidas e trabalhando para o Reino

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de Deus. A viagem estava apenas começando e Paulo sentia-se muito animado agora. Assim as igrejas eram fortalecidas na fé e cresciam em número a cada dia.

A viagem pela estrada era muito dura. E Lucas era o único motorista dentre o grupo todo, por isso esta viagem exigia de-mais dele. Era-lhes necessário fazer várias paradas para abastecer o carro e para que Lucas pudesse descansar um pouco. Isso apenas os atrasava mais. O grupo já começava a ficar irrequieto, porém não havia escolha, uma vez que Paulo era poupado de dirigir para não se cansar e estar bem disposto sempre que necessitasse pregar o evangelho. Paulo e seus companheiros seguiram caminho, viajando por toda a região da Frígia, se-guindo pela região da Galácia. Porém, algo incomodava muito o pastor Paulo, pois, depois que saiu da cidade de Listra, não conseguia pregar em mais nenhum lugar. Todas as portas para ele se fechavam, não encontrava nenhuma pessoa disposta a lhe dar ouvidos. Mesmo nas igrejas da região ele não conseguia ouvintes. Alguns irmãos, dissimulando, não os recebiam em casa, outros ainda, lhes diziam na cara que não queriam ouvir quem era contrário às tradições de suas igrejas, isto é, as tra-dições impostas pela Igreja Nova Vida. Por mais estranho que parecesse, pois Paulo não encontrava receptividade da parte de ninguém, ele podia perceber a mão do Espírito Santo lhe impe-dindo de pregar em todas estas regiões por onde eles passaram e isso o deixava mais confuso ainda. Não conseguia entender qual seriam os desígnios de Deus nesta viagem, pois ele viajara desde Antioquia para corrigir certos abusos e ensinos errôneos em todas as igrejas da Galácia, porém nessas mesmas igrejas o Espírito de Deus o impedia de entrar.

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– Para onde iremos agora, chefe? – perguntou Lucas.Paulo estava cansado de tanto viajar, pois esta viagem estava

sendo muito frustrante para ele e isso o deixava realmente nervoso.

Olhando no mapa pôde se localizar, estando agora próximo a fronteira da Mísia, um distrito situado a noroeste da região da Galácia.

– Lucas – bradou Paulo – vamos, agora, contornar pela esquerda no próximo retorno e entraremos na Bitínia!

– Bitínia, Paulo? – resmungou Silas. – Isso é muito ao Norte de onde estamos! Tem certeza de que não estamos dando voltas em círculos?

– Façam como eu disse... – resmungava Paulo – Eu sei perfeitamente...

– Já sei, já sei – interrompeu-o Lucas, demonstrando nervosismo e preocupação. – Você sabe perfeitamente para onde estamos indo! Tudo o que eu percebo é que ficamos dando voltas e mais voltas sem chegar a lugar algum!

Timóteo apenas observava a discussão dos três missioná-rios. Ele achava muito engraçado quando os três se punham a discutir, pois Lucas era sempre muito irreverente e sempre acabava por tranquilizar os ânimos do pessoal, porém desta vez a situação era realmente séria. Eles não estavam encontrando lugar certo para realizar a missão. Voltar para casa era um pensamento tentador e constante na mente dos homens de Deus. Há limites até mesmo para um servo de Deus, e Paulo e seus companheiros estavam quase alcançando o seu limite.

Após duas horas de viagem e com os nervos à flor da pele, quando estavam se aproximando dos portões da cidade da Bitínia, Paulo ouviu novamente a voz do Senhor soar-lhe ao coração.

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– Não entre na região da Bitínia! – Oh não, Senhor! Outra vez não! – orava Paulo em seu

coração. – Diga que o Senhor não está me dizendo isso.Mas a voz novamente lhe bradava ao coração, tão clara como

se estivesse ouvindo qualquer um dentro do carro de Lucas. Tão alta e clara como se tivesse alguém ao seu lado lhe dizendo aquelas palavras.

– Não entre na região da Bitínia!Paulo já sabia o que esperar, ainda assim arriscou. – Parem o carro! – exclamou Paulo. – Não podemos

continuar! Temos que voltar, nossa missão não é aqui nesta cidade.

– Oquêeeeee!!!! – disseram Lucas, Silas e Timóteo em uníssono. – O que você quer dizer com voltar?

– Paulo, é bom que você tenha uma boa explicação para isso que acaba de dizer – reclamou Lucas.

Paulo baixou a cabeça, desconcertado. Os olhos de todos no carro convergiram para ele, todos estavam cansados, irritados, com fome, sede e agora Paulo dizia que não podiam entrar na cidade em que eles perderam quase duas horas para chegar! Isso só podia ser brincadeira.

– O Espírito de Jesus está nos impedindo de prosseguir – murmurou Paulo, quase que inaudível. – Eu não sei o motivo, mas o Senhor não quer que entremos nesta cidade. Eu estou tão confuso quanto qualquer um de vocês, pessoal. Não sei por que Deus está nos jogando de um lado para outro numa espécie de jogo de nervos.

Lucas encostou sua testa contra o volante do carro segurando o volante com tanta força que os nós de seus dedos ficavam brancos. Silas disfarçava a tensão folheando um jornal velho,