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Escola Secundária c/ 3.º Ciclo EB Joaquim de Araújo, Penafiel Ano Lectivo 2009/2010 NOME ____________________________________________ ______ Turma _____ PESSOA ORTÓNIMO Paulismo e Interseccionismo Em Fernando Pessoa coexistem duas vertentes: a tradicional e a modernista. Algumas das suas composições seguem na continuidade do lirismo português, outras iniciam o processo de ruptura, que se concretiza nos heterónimos ou nas experiências modernistas, como o paulismo e o interseccionismo, no Pessoa ortónimo. O paulismo define-se pela confusão do subjectivo e do objectivo, pela associação de ideias desconexas, pelo vocabulário expressivo do tédio, do vazio da alma e pelas aberrações da sintaxe. Com o poema “Impressões do Crepúsculo” (paúlico) abriu caminho ao Modernismo. Nele põe em destaque o vago, a subtileza e a complexidade. O interseccionismo é a subjectividade excessiva, a síntese levada ao máximo, o exagero da atitude estática. No poema “Chuva Oblíqua” (interseccionista), percebe-se já o processo de criação poética, segundo Fernando Pessoa, e a tensão sinceridade/ fingimento, como tentativa de encontrar a unidade entre a experiência sensível e a inteligência. Análise do poema “Chuva Oblíqua” O poema apresenta seis fragmentos e uma multiplicidade muito rica de imagens (paisagem/porto, missa/chuva, Egipto/papel, quarto/lá fora, carrossel/árvores, maestro/infância), que se sobrepõem como

Pessoa Ortónimo

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Resumo de poemas de Pessoa ortónimo

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Page 1: Pessoa Ortónimo

Escola Secundária c/ 3.º Ciclo EB Joaquim de Araújo, Penafiel

Ano Lectivo 2009/2010

NOME ____________________________________________ Nº ______ Turma _____

PESSOA ORTÓNIMO

Paulismo e Interseccionismo

Em Fernando Pessoa coexistem duas vertentes: a tradicional e a modernista. Algumas

das suas composições seguem na continuidade do lirismo português, outras iniciam o processo

de ruptura, que se concretiza nos heterónimos ou nas experiências modernistas, como o

paulismo e o interseccionismo, no Pessoa ortónimo.

O paulismo define-se pela confusão do subjectivo e do objectivo, pela associação de

ideias desconexas, pelo vocabulário expressivo do tédio, do vazio da alma e pelas aberrações

da sintaxe. Com o poema “Impressões do Crepúsculo” (paúlico) abriu caminho ao Modernismo.

Nele põe em destaque o vago, a subtileza e a complexidade.

O interseccionismo é a subjectividade excessiva, a síntese levada ao máximo, o

exagero da atitude estática. No poema “Chuva Oblíqua” (interseccionista), percebe-se já o

processo de criação poética, segundo Fernando Pessoa, e a tensão sinceridade/ fingimento,

como tentativa de encontrar a unidade entre a experiência sensível e a inteligência.

Análise do poema “Chuva Oblíqua”

O poema apresenta seis fragmentos e uma multiplicidade muito rica de imagens

(paisagem/porto, missa/chuva, Egipto/papel, quarto/lá fora, carrossel/árvores,

maestro/infância), que se sobrepõem como ponto de acesso ao seu contrário e onde o teor de

transparência favorece no seu desempenho como instrumento de sobreposição, criando,

através de todas estas sobreposições uma “lógica ofuscada”.

No fragmento I, percebemos que a luminosidade - claro/ escuro - caminha paralela à

noção de mundo real e mundo pensado. Este fragmento denuncia também a forma como o

poeta utilizará a linguagem, “com uma horizontalidade vertical”. Este verso remete-nos à

construção de um terceiro eixo, o da linguagem, que se vai interseccionando ao longo do

poema, até formar um cubo.

De entre os seis fragmentos que compõem a série “Chuva Oblíqua”, o terceiro

metaforiza o próprio acto de escrever ao representar, por meio de imagens, o processo criador

do poeta. Uma nova dimensão surge no espaço desse fragmento: a realidade do escrever

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enquanto camada semântica básica para a significação do poema, camada sobre a qual é

sobreposta a idealidade do sonhar.

“A grande Esfinge do Egipto sonha por este papel dentro...”

Conforme destacado no verso acima, ocorre a sobreposição entre duas paisagens:

papel e Egipto. A intersecção entre esses planos revela que, ao acto de escrever, está

associado a simulação de um mundo enigmático: a projecção múltipla sonho x realidade. O

monumento guardião de mistérios seculares e inacessíveis na sua imobilidade domina a folha

em branco.

O encaminhamento gradativo dos dois planos interseccionados provoca efeitos no eu

poético e na própria poesia:

“Escrevo – e ela aparece-me através da minha mão transparente”

“E ao conto do papel erguem-se as pirâmides...”

“Escrevo – perturbo-me de ver o bico da minha pena”

O eu poético e o leitor são colocados no ponto de intersecção, para onde confluem os

elementos perturbadores do poema: Egipto, papel, escrevo, Esfinge, canto do papel. A

representação da perturbação é evidente nos versos abaixo:

“Escureceu tudo... Caio por um abismo feito de tempo...

Estou soterrado sob as pirâmides a escrever versos à luz clara deste candeeiro

E todo o Egipto me esmaga de alto através dos traços que faço com a pena...”

Finalmente, ocorre uma última intersecção, entre o presente e o passado, dando-se a

visão idealista do funeral do rei Cheops, que ocorre simultaneamente no presente do Eu

poético.