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Politicas publicas pos em gestao escolar
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Curso de Pós-Graduação Lato Sensu a Distância
Gestão Escolar
Políticas Públicas na
Educação
Autor: Wercy Rodrigues Costa Júnior
EAD – Educação a Distância
Parceria Universidade Católica Dom Bosco e Portal Educação
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www.eunapos.com.br
SUMÁRIO
UNIDADE 1 - EDUCAÇÃO E TRABALHO ............................................................. 03
1.1 A centralidade do trabalho no processo de emancipação humana ................... 04
1.2 Trabalho, educação e determinação histórica ................................................... 08
1.3 A educação como práxis humana ..................................................................... 13
UNIDADE 2 - O ESTADO E AS POLÍTICAS DA EDUCAÇÃO BÁSICA ............... 20
2.1 Políticas educacionais para educação básica no governo Fernando Henrique
Cardoso: subordinação consentida ao capital ......................................................... 27
2.2 A educação básica, a LDB e o Conselho Nacional de Educação no governo
FHC ........................................................................................................................ 30
2.3 Políticas educacionais para educação básica no primeiro governo Luiz Inácio
Lula da Silva: rupturas e permanências .................................................................. 34
UNIDADE 3 - POLÍTICA EDUCACIONAL NO CONTEXTO DO
NEOLIBERALISMO ............................................................................................... 38
3.1 Política educacional no contexto do capitalismo e do neoliberalismo ............... 39
3.2 As Políticas Educacionais como mediadoras do processo de reprodução do
modelo neoliberal .................................................................................................... 50
UNIDADE 4 - ESTADO, EDUCAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS
EDUCACIONAIS ..................................................................................................... 54
4.1 Definição de política e política educacional ....................................................... 56
4.2 Política educacional, legitimação e construção da sociedade ........................... 59
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 69
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UNIDADE 1- EDUCAÇÃO E TRABALHO
A natureza em si mesma não pode garantir a existência humana. A existência
humana não se apresenta como uma dádiva natural. Os próprios homens devem
produzi-la por meio do trabalho. Isso quer dizer que o homem se faz homem; ele não
nasce homem. Ele forma-se homem. Ele deve aprender a se produzir como homem.
Assim como ele deve aprender a ser homem, ele deve aprender a produzir sua
própria existência. Portanto, “a produção do homem é, ao mesmo tempo, a formação
do homem, isto é, um processo educativo”. (SAVIANI, 2007, p. 154). Nesse sentido,
a origem da educação corresponde à origem do homem.
Existe, nesse caso, uma relação de identidade entre trabalho e educação. No
próprio ato de produzir a sua existência os homens aprendiam a produzi-la. No
trabalho eles aprendiam a trabalhar. Atuando sobre a natureza, os homens se
autoeducavam e educavam as novas gerações, relacionando-se uns com os outros.
Assim, como indica Saviani (2007, p. 154), a produção da existência implica o
desenvolvimento de formas e conteúdos que são validados pela experiência,
configurando-se como um singelo processo de aprendizagem. Nesse processo,
aqueles elementos validados pela experiência e confirmados pela eficácia são
preservados e transmitidos às novas gerações, como forma de manutenção e
continuidade da espécie. Os que não são confirmados são afastados.
A análise do trabalho docente, produto histórico da atividade produtiva,
também precisa ser pensada com base nas determinações fundamentais que são as
relações de trabalho e as relações sociais de produção. Problematizar o sentido do
trabalho docente é problematizar, igualmente, o sentido desse ser humano concreto.
Por isso, problematizar o trabalho do professor equivale a problematizar o sentido da
existência do trabalhador docente.
Como o trabalho se revela como um processo que permeia e confere o ser
homem do próprio ser humano, constituindo, assim, sua especificidade, ele não
pode ser entendido apenas, e de forma restritiva, “como uma ocupação, um mero
fazer, um emprego, uma questão de sobrevivência ou de ascensão.” (SILVA, 2008,
p. 88). Nesse sentido, torna-se importante investigar e situar o trabalho dos
professores nesse processo.
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1.1 A centralidade do trabalho no processo de emancipação
humana
O trabalho é um conceito/categoria fundamental para descrever a essência
necessária do ser humano que se expressa na sua capacidade de viver em
comunidade, na totalidade de sua vida social. O trabalho é a base de uma
comunidade humana, porque permite que os seres humanos estabeleçam as mais
variadas relações: sociais, linguísticas, axiológicas, etc. Ele é a origem e o
fundamento do desenvolvimento da humanidade, precisamente porque a história é
história dos meios de produção1 e das relações de produção2, como propõe a
concepção materialista da história. Nesse sentido, o trabalho pode ser considerado
como a forma originária do mundo dos seres humanos; ser considerado, pois, como
fenômeno originário, como modelo do ser social. (LUKÁCS, 1979, p. 26). Ou seja,
como a protoforma na qual se assenta o mundo dos homens e das mulheres.
O mundo dos seres humanos, por sua vez, se apresenta como um conjunto
articulado de partes diferentes. Na medida em que a sociedade evolui, estas partes
diferentes tendem a crescer em número, e a ser cada vez mais diferenciadas entre
si. Por isso, se pode dizer que o ser social é um complexo de complexos. O mundo
humano e, por isso, social diz respeito a um ser que se autoproduz no sentido
preciso que tanto as suas determinações mais essenciais, quanto as mais
fenomênicas, são resultantes dos atos humanos concretos singulares, em
tendências históricas concretas, universais.
É intrínseca ao ser humano a sua predisposição à vida em sociedade, sendo
o trabalho o fundamento do ser social. Para Engels (1876), o trabalho é a
possibilidade concreta que permitiu a passagem de um animal, predisposto
geneticamente, à humanidade. Somente por meio do trabalho “o homem pode
passar da generalidade do seu ser em si para a generalidade do ser para si, por se
1 Conjunto formado pelos meios de produção de trabalho e pelo objeto de trabalho. Os meios de
produção incluem os instrumentos de produção (ferramentas, máquinas), as instalações (edifícios, silos, armazéns), as diversas formas de energia e combustível e os meios de transporte. O objeto de trabalho é o elemento sobre o qual ocorre o trabalho humano: a terra e as matérias-primas, as jazidas minerais e outros recursos naturais. (SANDRONI, 1999, p. 378). 2 Conceito da economia marxista que designa o conjunto de relações econômicas que se
estabelecem entre os homens, independentemente de sua consciência e da sua vontade individual, no processo de produção e reprodução de sua vida social. (Idem, p. 518).
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configurar o trabalho como meio de expressão e de realização da essência
necessária do homem, sua humanidade”3. (INFRANCA, 2005, p. 12).
Tratando do trabalho na sua totalidade, é necessário entender que só há
trabalho quando este faz parte do processo de reprodução social, ou seja, somente
no ser social existe trabalho. Portanto, “isolado da totalidade social, enquanto
absoluta singularidade que não participa da sociedade, o trabalho sequer existe
enquanto tal.” (LUKÁCS, 1972, p. 76). É a função social dos atos que o faz ou não
ser trabalho, ainda que a singularidade de cada trabalho não seja impugnada em
detrimento da necessária participação do trabalho na totalidade social.
O trabalho, portanto, é um ato singular que tem implicações na totalidade
social. O trabalho é sempre e necessariamente um ato humano irrepetível, ainda que
marcado pela singularidade. E assim como é impossível anular a conexão do
trabalho com a totalidade social, também é impossível ocultar a sua singularidade,
mesmo que parta de uma decisão de repetir o já realizado.
Destarte, diferentemente do que ocorre na esfera biológica, esta
transformação da natureza é teleologicamente posta. O trabalho, na sua forma
exclusivamente humana, caracteriza-se, também, por sua dimensão teleológica. Isto
é, diferente dos outros animais, o trabalho humano caracteriza-se pela antecipação
mental do resultado. Seu resultado final é previamente construído na subjetividade
sob a forma de uma finalidade que orientará todas as ações que virão a seguir
(MARX, 1965, p. 202).
O ser consciente constitui historicamente a natureza humana. E a satisfação
das necessidades do indivíduo é o fim, o resultado e o objetivo do trabalho humano.
Essa transformação teleologicamente posta da natureza é que se denomina de
trabalho. E como as necessidades mudam historicamente, as formas históricas de
trabalho humano, para satisfazer essas necessidades, também mudam.
Portanto, o trabalho é a marca humana mais decisiva por ser a condição de
possibilidade de o ser humano construir um futuro respondendo conscientemente às
necessidades percebidas e identificadas em sua cotidianidade. A originalidade da
natureza humana se funda na sua capacidade de constituir-se consciente na relação
com a natureza.
3 O texto original se encontra em espanhol. A tradução é nossa.
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A consciência, nesse sentido, estrutura o agir humano revelando o ser
humano como um ser autocriativo que constrói a realidade humana e social pela
práxis. Para Kosik (1989, p. 222), por práxis entende-se a determinação da
existência humana como elaboração da realidade “e a possibilidade de
transformação” (SILVA, 2008, 178). A práxis se articula essencialmente ao homem,
em todas as suas manifestações, pois ela é maneira específica de ser do indivíduo.
A práxis se articula como todo o homem e o determina na sua totalidade, uma vez
que ela o determina interiormente.
A universalidade da práxis, marcada pela capacidade de o ser humano criar a
realidade, que é humana e social, e de compreendê-la, revela que o indivíduo é um
ser ontocriativo. Ainda segundo Kosik (1989, p. 222), no conceito de práxis
encontram-se o movimento laborativo e o existencial como dois momentos de um
único movimento.
No movimento existencial, a singularidade humana se produz e se expressa
nas relações. Para se autorrealizar as pessoas exteriorizam a sua interioridade
colocando-se em sua obra. Isto é, a objetividade revela o caráter intersubjetivo da
expressão do homem. Já o movimento laborativo, manifesta a inserção do indivíduo
no mundo por meio da sua produção ativa. A natureza humana aqui se expressa
como trabalho, pois o homem vê-se a si mesmo no mundo por ele construído.
Toda objetivação resulta em novos conhecimentos e novas habilidades, em
novas possibilidades, e por isso ao transformar a natureza, o indivíduo também se
transforma. Nesta exata medida, a produção do objeto não é apenas o processo de
objetivação; não é apenas uma transformação da realidade, mas é também a
exteriorização de um sujeito. Cada uma das transformações do real ocorrerá no nível
de desenvolvimento já alcançado pela individualidade em questão.
O trabalho é o meio de exteriorização da essência necessária do ser humano,
enquanto realiza a universalidade do gênero humano: a humanidade. O ser humano
se revela e transpassa no objeto produzido. O produto do seu trabalho já não é um
em si, mas um para si. É possível que o ser humano reconheça-se nos produtos que
criou (VÁZQUEZ, 1997, p. 75). Assim, a obra mesma do ser humano, o trabalho e
seu produto mais autêntico, o ser social, marca a dimensão originária do indivíduo.
Por isso, o trabalho é um dos elementos constitutivos do ser humano e a sua
realização se transforma em fonte de prazer.
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O trabalho representa o ponto de partida histórico e dialético do processo de
humanização do homem. Assim, como princípio do ser humano individual e social, “é
ainda mais princípio do homem como ser histórico: o ser humano com o trabalho
colocou em movimento uma série causal que teve como primeira consequência a
passagem do animal ao humano.” (INFRANCA, 2005, p. 32). Nessa perspectiva,
podemos ousar e afirmar que o indivíduo foi criado pelo trabalho, “enquanto este se
manifesta como a primeira condição fundamental de toda vida humana”. (ENGELS,
1876). Homens e mulheres são, em certa medida, criados pelo trabalho, pois é
justamente o trabalho, isto
é, a possibilidade de
mudar as coisas, de
transformar o mundo e de
fazer objetos, que vai
diferenciá-los,
fundamentalmente, do
animal.
Fonte: http://migre.me/8bG8n
Por isso, o trabalho é uma categoria essencial para se compreender a história
do ser humano. Por meio do trabalho cada homem constrói a sua história enquanto
produz a sua própria existência, ainda que o desenvolvimento das forças produtivas4
num determinado momento histórico a condicione. E como “o desenvolvimento
histórico das forças produtivas – a própria história dos homens – se dá pelo tipo de
relações de produção, ainda é a categoria trabalho o referencial básico de análise.”
(PESSANHA, 1995, p. 15).
4 Forças naturais (inclusive o próprio homem) apropriadas pelo homem para a produção e reprodução
de sua vida social. A parte material das forças produtivas, isto é, os instrumentos e os objetos de trabalho, constituem a base material e técnica da sociedade. A principal força produtiva, no entanto, é o próprio homem, que cria instrumentos de trabalho cada vez mais poderosos, aperfeiçoa seus objetos de trabalho e combina ambos no sentido de ampliar constantemente a produção. Isso significa que as forças produtivas tendem a crescer constantemente. Essa expansão opera modificações nas relações de produção e no modo de produção. Assim, determinado nível de desenvolvimento das forças produtivas correspondem determinadas relações de produção. [...] Em determinada fase de seu desenvolvimento, as forças produtivas entram em contradição com as relações de produção existentes. Nos modos de produção escravista, feudal e capitalista, se, no princípio, as relações de produção significaram um estímulo, para o desenvolvimento das forças produtivas, posteriormente, com o desenvolvimento destas últimas, transformaram-se em freios a sua ulterior expansão. A revolução social seria a forma pela qual essa contradição se resolveria. (SANDRONI, 1999, p. 249).
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O trabalho se apresenta como uma relação social, determinado
historicamente e caracterizado por um processo em que participam o ser humano e
a natureza. Nesse processo, o indivíduo, com sua própria ação, impulsiona, regula e
controla seu intercâmbio material com a natureza (PESSANHA, 1995, p. 17). No
entanto, ao atuar sobre a natureza externa, o ser humano modifica-a, ao mesmo
tempo em que modifica, igualmente, a sua natureza mesma (MARX, 1995, p. 204).
Assim, o caráter transformador do trabalho se realiza tanto na sua relação
com objeto como na sua relação com o sujeito, originado da sua função mediadora
entre a pessoa e a natureza. Nessa relação, mediada pelo trabalho, as potências
humanas ocultas são desenvolvidas, ao mesmo tempo em que as forças da
natureza são subordinadas ao poder do homem (LUKÁCS, 1979, p. 16).
Ao se exteriorizar por meio da objetivação da sua prévia ideação, o indivíduo
adquire novos conhecimentos (tanto da realidade exterior como da sua própria
individualidade) e novas habilidades vão sendo descobertas e desenvolvidas. Ao
transformar o real, o sujeito também se transforma. Esse complexo,
objetivação/exteriorização, é o solo genético do ser social como esfera ontológica
distinta da natureza. Todo processo de objetivação-exteriorização é
necessariamente único e genérico. Único, pela simples razão de a história jamais se
repetir e genérico, porque ele incorpora, tanto no plano objetivo quanto no subjetivo,
determinações genéricas que correspondem ao desenvolvimento efetivamente
alcançado pela humanidade a cada momento histórico.
O processo de produção e reprodução da realidade/humanidade/sociedade
deve ser considerado desde a realização histórica do trabalho, pois é nela que os
homens fazem a sua própria história, não em condições por eles escolhidas e,
tampouco, de maneira arbitrária, mas em circunstâncias que encontram
imediatamente diante de si, determinadas pelos fatos e pela tradição,
historicamente. (LUKÁCS, 1972. p. 83). Na história o homem realiza-se a si mesmo.
1.2 Trabalho, educação e determinação histórica
Antes da história e independente dela, o ser humano não sabe quem é, não
possui uma identidade. Ainda para Kosik (1989, p. 217), somente na história o
homem existe. O explicitamento do indivíduo a si mesmo na história, que equivale à
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criação do homem e da humanidade/sociedade, é o sentido da própria história. A
história, nesse sentido, apresenta-se como a substância da sociedade. E a
substância contém em si a permanência da heterogeneidade de toda estrutura
social, por isso a substância da sociedade só pode ser a própria história. (HELLER,
1970, pp. 2-3).
O explicitamento do ser humano a si mesmo na história permite-nos tocar na
relação existente entre trabalho e liberdade, uma vez que o homem busca uma vida
dotada de sentido na história. Sobre o assunto, Lukács afirma:
O quão fundamental é o trabalho para a humanização do homem está também presente no fato de que sua constituição ontológica forma o ponto de partida genético para uma outra questão vital que afeta profundamente os homens no curso de toda a história: a questão da liberdade. (LUKÁCS apud ANTUNES, 2002, p. 144).
Num primeiro momento, podemos afirmar que a liberdade consiste em decidir
objetivamente, não abstratamente, diversas possibilidades concretas. A liberdade,
em última análise, se manifesta como um desejo de alterar, ou manter, a realidade
existente.
Quanto maiores são os conhecimentos das cadeias causais presentes e operantes, mais adequadamente eles (os conhecimentos) poderão ser transformados em cadeias causais postas, e maior será o domínio dos sujeitos sobre elas, o que significa dizer que maior será a esfera da liberdade. (ANTUNES, 2002, p. 145).
A liberdade, nesse sentido, se expressa na teleologia, na colocação de
finalidades concebidas no interior do ato de trabalho. Portanto, como assegura
Antunes (2002, p. 145), citando Lukács, o complexo que fornece fundamento ao ser
social encontra seu momento originário, sua protoforma, na esfera do trabalho.
Contudo, a liberdade pode ser comprometida quando o ritmo de trabalho tem que
atender a necessidades extrínsecas ao homem, fazendo com que ele deixe de ser
protagonista na sua atividade laboral, transformando-se.
Por fim, é importante destacar que o trabalho é o solo genético do novo que é
incessantemente produzido na reprodução social. A cada objetivação-exteriorização
é produzida uma nova situação tanto objetiva (uma realidade que agora incorpora
um objeto antes inexistente) como subjetiva (a consciência é portadora de
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conhecimentos e habilidades que não possuía anteriormente), à qual o indivíduo se
vê obrigado, para não desaparecer, a responder com novas prévias ideações e
novos atos de objetivação-exteriorização, efetivando assim um novo passo em
direção ao futuro.
O que nos interessa é que, ao se transformar em uma particularidade que
participa de uma totalidade já existente, a história desse ente adquire uma indelével
dimensão genérica: sua história absorve determinações da totalidade do existente
que, por sua vez, retroage sobre o desenvolvimento da totalidade do real como um
seu ente particular. A produção de uma nova situação corresponde à geração de um
novo momento histórico, fazendo com que todos os que vivem naquele ambiente
estejam expostos às consequências e, portanto, tenham que responder às novas
situações geradas pelas objetivações singulares dos outros indivíduos. Isto,
obviamente, altera não apenas a relação dos indivíduos com a natureza, mas
também a relação dos indivíduos entre si.
A história dos homens revela precisamente o fim, teleologicamente falando,
da ação dos homens em sociedade. A humanidade é a única responsável por seu
destino. Os homens não cumprem um dado destino imposto por forças ou
determinações que não podem controlar. Por isso, a relação dos indivíduos em
sociedade com a história está determinada pelo desenvolvimento da sua capacidade
de fazer história. Esta, por sua vez, está intimamente vinculada à capacidade de os
homens em sociedade extraírem da natureza os meios necessários à sua
reprodução social, garantindo a reprodução biológica dos indivíduos que a
compõem. A história está, desse modo, intrinsecamente vinculada ao
desenvolvimento das forças produtivas. À medida que as forças produtivas se
desenvolvem, alarga-se o horizonte de possibilidades para os homens fazerem sua
história.
No entanto, o processo histórico no qual estamos inseridos nesse período de
transição do século XX para o XXI apresenta uma característica paradoxal. Por um
lado, a história parece querer nos apontar para a efemeridade e a fugacidade de
todas as coisas. O que ontem era referência segura para pautar nossos
comportamentos, hoje se manifesta inconsistente. Todas as dimensões da vida
humana se encontram afetadas pela pressão esmagadora da efemeridade.
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Todavia, esta percepção de que nada permanece por muito tempo, convive
com outra percepção que nos leva a crer no “extremo oposto: que tudo permanece o
mesmo. Como se esse mesmo período histórico, com sua permanente fluidez,
tivesse uma única função: convencer-nos da insuperabilidade do mercado” (LESSA,
2005, p.70). Todas as transformações ocorrem justamente para obedecer às
necessidades do mercado5, ainda que superfluamente estejam revestidas da
intenção de se voltar contra ele. As mudanças revelam a permanência e a
insuperabilidade do mercado. A mercadoria6, assim, nesse mundo em constante
mudança, é a única realidade que permanece.
O mercado é a realidade última que confere identidade às coisas, uma vez
que é nele e por ele que elas adquirem existência, passando do âmbito do nada ao
âmbito da realidade. Parece existir um estatuto ontológico de transcendentalidade
assumido pela mercadoria, que lhe coloca como realidade última de toda construção
histórica. É a mercadoria e o mercado o que permanecem na mudança radical de
tudo e de todos. Nesse sentido, a mercadoria, por revelar-se como a nossa
essência, marca a nossa imutabilidade ainda que em tudo e constantemente
sejamos sempre diferentes.
De um mundo em constante transformação como o nosso o que se deveria
esperar era que todos os indivíduos chegassem à conclusão acerca da eterna
5 Em sentido geral, o temo designa um grupo de compradores e vendedores que estão em contato
suficientemente próximo para que as trocas entre eles afetem as condições de compra e venda dos demais. Um mercado existe quando compradores que pretendem trocar dinheiro por bens e serviços estão em contato com vendedores desses mesmos bens e serviços. Desse modo, o mercado pode ser entendido como o local, teórico, ou não, do encontro regular entre compradores e vendedores de uma determinada economia. (SANDRONI, 1999, p.378). 6 “Todas as sociedades humanas têm de produzir suas próprias condições materiais de existência. A
mercadoria é a forma que os produtos tomam quando essa produção é organizada por meio de troca. Nesse sistema, uma vez criados, os produtos são propriedades de agentes particulares que têm o poder deles transferindo-os a outros agentes. Os agentes que são donos de produtos diferentes confrontam-se num processo de barganha pelo qual trocam seus produtos. Nesse processo, uma quantidade definida de um produto troca de lugar com uma quantidade definida de outro. A mercadoria tem, portanto, duas características: pode satisfazer a uma necessidade humana (valor de uso); e pode obter outras mercadorias em troca, poder de permutabilidade (valor de troca) [...] As complexas relações reais que um produtor de mercadorias tem com outros seres humanos através divisão social do trabalho promovida pela produção de mercadorias são reduzidas a forças de mercado impessoais e incontroláveis. Os produtores, cujo mundo é, na verdade, criado por outras pessoas, veem-se a si mesmos existindo num mundo de coisas, as mercadorias. A forma de produção de mercadorias simultaneamente torna o trabalho privado trabalho social quando os produtos são trocados e fragmenta o trabalho social em trabalhos privados. Essa confusão de relações entre pessoas com relações entre coisas é a contradição fundamental da produção de mercadorias. Marx dá a isso o nome de Fetichismo da Mercadoria, ou seja, o processo pelo qual os produtos do trabalho humano passam a aparecer como uma realidade independente e incontrolável, alheia e estranha àqueles que os criaram”. (BOTTOMORE, 2001, p. 266).
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efemeridade de todas as coisas, uma vez que tudo está se transformando. No
entanto, “o exato oposto tem lugar: nada a se fazer senão aceitar as transformações
que vivemos como a evidência cabal de que, seja qual for o futuro, será sempre
regido pela mercadoria, pelo mercado.” (LESSA, 2005, p. 71).
A mundivisão burguesa é capaz de rebaixar a nossa existência a uma
dimensão de imediaticidade e presentificação, sem levar em consideração o
passado, presente e o futuro como determinações reais e materiais da nossa
existência.
Perdida a conexão com a sua historicidade o indivíduo, portador de uma
racionalidade afetada, acaba perdendo-se e esvaziando-se na sua relação consigo
mesmo e com a sociedade, uma vez que a sua individualidade foi dissolvida em uma
totalidade carente de mediações. A história construída socialmente torna-se
estranha, “não nos reconhecemos nas consequências dos nossos atos, não nos
reconhecemos nas consequências do que nós próprios provocamos a nós mesmos.”
(LESSA, 2005, p. 73). Torna-se impossível elaborar uma síntese pessoal por
ficarmos perdidos nas dimensões globais da nossa interioridade.
Ao fazer do trabalho e da força de trabalho uma mercadoria igual às demais,
separando-o do seu produto, o modo de produção capitalista, regido pela lógica de
mercado, acaba produzindo novas formas de relações sociais, escondendo que se
trata de relações entre pessoas. A produção destrutiva de mercadorias é,
necessariamente, a reprodução destrutiva de nossa humanidade (LESSA, 2005, p.
74). A mercadoria materializa as relações sociais, aparecendo nelas como dotada de
poder próprio. Como observa Pessanha (1995, pp. 20-21), esse processo de
reificação, ao produzir o fetiche da mercadoria é o fundamento da alienação do
mundo moderno. O trabalhador não se reconhece na mercadoria que produz,
tornando-se mero mediador entre o instrumento que usa e o produto que gera
tornando-se ele mesmo em mercadoria.
A dificuldade teórica para apreender o mundo que transita entre o efêmero e a
permanência do mercado é potencializada pela alienação em que nos encontramos.
Como num círculo vicioso, a nossa desconexão com a história acentua os processos
alienantes. Por isso, não há nenhuma surpresa em ficarmos desorientados quando
tratamos de algo tão fundamental, tão humano e tão constante na história como o
trabalho. Por causa dos processos alienantes que caracterizam a nossa vida
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perdemos o contato e a compreensão com aquilo que nos “diferencia da natureza e
que tem sido, por toda a história, a nossa marca mais decisiva: nossa capacidade de
construir o futuro como resposta consciente às necessidades que identificamos em
nossas vidas cotidianas.” (LESSA, 2005 p. 74). Perdemos o contato com a nossa
essência porque perdemos o contato com o mundo, resultado imediato das nossas
ações, capaz de revelar o que é essencial no homem.
Sentimo-nos como um brinquedo nas mãos da história como se ela tivesse
vida própria e não se constituísse como um empreendimento humano,
demasiadamente humano. Por isso, a tendência hoje de tratar o trabalho tão-
somente a partir das suas manifestações mais imediatas, sem situá-lo
historicamente, perdendo, assim, a conexão com a totalidade. Não obstante, o
trabalho apenas pode ser a categoria “eterna do mundo dos homens porque
assume, a cada instante da história, configurações distintas que são irrepetíveis
(portanto, únicas), pois portadoras de todo desenvolvimento do passado.” (LESSA,
p. 75).
1.3 A educação como práxis humana
A educação é um fenômeno inerente aos seres humanos. Assim,
compreendendo-se a natureza humana compreende-se, ao mesmo tempo, a
natureza da educação e vice-versa. É o trabalho que diferencia os homens dos
outros animais. Os animais adaptam-se à realidade natural tendo a garantia de sua
existência naturalmente. Mas o homem precisa construir ininterruptamente sua
própria existência.
Dessa forma, diferentemente dos outros animais, que se adaptam às
condições naturais, o homem adapta a natureza a si transformando-a e
humanizando-a. Esse processo se realiza por meio do trabalho. E o trabalho se
inicia no momento em que o agente antecipa mentalmente a finalidade da ação,
pois, diferente das outras ações, o trabalho se manifesta como uma ação adequada
a finalidades, isto é, constituída de finalidades.
Para garantir sua sobrevivência, o homem extrai, ativa e intencionalmente, os
meios de sua existência, da natureza. Nesse processo o homem vai transformando a
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natureza em um mundo significado, constituído de sentido: o mundo cultural. Por
isso, ressalta Saviani (1991, p. 20):
[...] dizer, pois, que a educação é um fenômeno próprio dos seres humanos significa afirmar que ela é, ao mesmo tempo, uma exigência do e para o processo de trabalho, bem como é, ela própria, um processo de trabalho.
Doravante, o processo de produção da existência implica, antes de tudo, que
o trabalho material seja capaz de garantir a produção de bens materiais em escalas
cada vez mais complexas. Porém, como foi dito acima, para produzir materialmente
sua existência os seres humanos precisam antecipar idealmente os objetivos da
ação, isto é, representar em forma de ideias os objetivos reais.
Segundo Saviani (1991, p. 20), essa representação inclui o aspecto de
conhecimento das propriedades do mundo real (ciência), de valorização (ética) e de
simbolização (arte). Neste processo de representar mentalmente os objetivos reais
abre-se, para o homem, o horizonte para o aparecimento do trabalho imaterial, outra
categoria fundamental da produção da existência humana. Por trabalho imaterial
compreende-se a produção de ideias, valores, hábitos, símbolos, conceitos, etc. Ou
seja, trata-se da produção do saber, que pode ser o saber sobre o fenômeno ou um
dado específico, ou sobre a universalidade da produção humana, chamada de
cultura.
A educação se encontra na categoria de trabalho imaterial, pois está
vinculada à produção de ideias, conceitos, habilidades, símbolos e valores que não
lhe interessam como elementos em si mesmos e exteriores ao homem. Tais
elementos considerados em si mesmos, como realidades exteriores ao homem, se
constituem como objetos das ciências do espírito em oposição às chamadas
ciências da natureza.
Na perspectiva da educação, porém, esses elementos interessam quando se
tornam necessários à sua assimilação por parte dos homens, na produção de um
mundo significado, da cultura. Portanto, “o que não é garantido pela natureza tem
que ser produzido historicamente pelos homens; e aí se incluem os próprios
homens”. (SAVIANI, 2001, p. 21).
Podemos afirmar, nesse sentido, que o homem produz a si mesmo ao
produzir o mundo, uma vez que a sua natureza não é ontologicamente dada, mas
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produzida sobre a base da natureza biofísica. Consequentemente, “o trabalho
educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular,
a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens.”
(SEVERINO, 2001, p. 21). Dessa forma, a educação, inicialmente, diz respeito à
identificação dos elementos culturais indispensáveis que precisam ser internalizados
pelos indivíduos humanos no seu processo de humanização e, depois, diz respeito à
descoberta das maneiras mais adequadas para atingir os objetivos.
Nessa perspectiva, a educação é, ao mesmo tempo, mediada e mediadora,
por se apresentar como o esforço de constituição de significado, possibilitando a
revelação ontológica da prática humana. No entanto, a educação é sempre
mediação fundamental para as outras mediações que constituem a existência
histórica. A educação é “um investimento intergeracional com o objetivo de inserir os
educandos nas forças construtivas do trabalho, da sociabilidade e da cultura.”
(SEVERINO, 2001, p. 67).
Diferentemente de uma concepção espiritualizada da educação, que permeou
grande período histórico, a prática educacional real tem absoluta prioridade em
nossa existência histórica, ainda que a educação se instrumentalize teoricamente. A
educação se realiza nas mesmas condições das outras atividades que marcam as
demais esferas da existência humana, profundamente marcada pelas mesmas
características gerais desenvolvidas em sociedades históricas pela espécie humana.
Por isso, além de se assumir como um processo fundamentalmente histórico, a
educação também se realiza como um projeto antropológico.
É por meio da atividade prática que a existência se realiza. É pelo agir como
sujeito social que o ser humano se instaura. Nesse sentido, o homem se apresenta
como aquilo que ele fez de si mesmo. Nas palavras de Severino (2001, p. 68), seu
ser é seu devir histórico, cuja consistência se dá pelo conjunto de seu agir ao longo
do tempo e no espaço social. Portanto, aquilo que o homem é e aquilo no qual ele
vai se tornando é delimitado pelo seu agir histórico.
Porém, não se nega a absoluta relevância da teoria quando se circunscreve a
primazia ontológica da prática. Pois, não se trata de uma cisão irredutível, uma vez
que a teoria se expressa como prática no exercício da subjetividade lógica. A teoria
é a manifestação do exercício da subjetividade que se revela em prática
simbolizadora. Assim, mais do que apontar para uma dicotomização do ser humano,
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torna-se necessário problematizar as dimensões teórica, técnica e política da prática
humana, sem antagonizar prática e teoria.
Doravante, é por meio da cultura, da sociabilidade e do trabalho que a nossa
existência histórica se efetiva e se objetiva. Assim, “na medida em que se especifica
a partir da unidade dessas três dimensões, a prática torna-se práxis e só será
humana se for intencionalizada através de sua capacidade simbolizadora.”
(SEVERINO, 2001, pp. 68-69). Por conseguinte, somente pela intervenção
simultânea dos processos de objetivação e subjetivação inerentes às relações do
homem com a natureza, a cultura e a sociabilidade que essa materialidade se realiza
e se efetiva. O caráter humano dessas relações se manifesta se sua realização
subjetiva estiver significada pela realidade objetiva, e vice-versa. Como ressalta
Severino (2001, p. 69)
Tal significação se expressa também pela afirmação do papel do conhecimento quanto ao agir humano. A subjetivação do mundo objetivado, como solo das práticas, se realiza pelo conhecimento, única ferramenta da espécie para intencionalizar sua prática. “Conhecimento” é aqui entendido com maior abrangência, designando toda a extensão do exercício da subjetividade em sua prática simbolizadora.
A articulação marcada pela intencionalidade humana entre práticas históricas
e conhecimento é mediada pela educação. Nesse sentido, a educação é uma práxis
cujo sentido é significar intencionalmente “as práticas reais pelas quais os homens
buscam implementar sua existência.” (SEVERINO, 2001, p. 69). A educação se
dirige aos educandos questionando sua subjetividade e, ao mesmo tempo,
potencializando seu desenvolvimento. O conhecimento possibilita a apropriação das
articulações reais do mundo social, criticamente, pela subjetividade. Daí o papel
conscientizador – por isso, interpretativo, reflexivo, compreensivo e desmascarador
das ideologias na sociedade – e não descritivo da educação.
Como se observa, por mais significativo que seja a especificidade simbólica
não pode esgotar o processo educacional. As demais modalidades práticas são
integradas pela prática educativa, na existência histórica. De um lado, afirma
Severino (2001, p. 70), o processo educacional é substantivamente prática técnica
(trabalho) e também prática política (sociabilidade). De outro lado, sua função é
mediar e intencionalizar essas práticas. No entanto, a prática educacional, além de
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ser a manifestação concreta das práticas políticas e técnicas, ela também é uma
propedêutica para a sociabilidade e a inserção no mundo do trabalho.
Como se observa, há uma relação intrínseca entre sociedade e educação. As
ciências humanas revelaram durante a história que todas as práticas educacionais,
sejam formais ou informais, expressam uma concepção de sociedade e a qual
modelo se vinculam. Por isso, a educação elabora reflexões que justificam a
sociedade quando mantém um vínculo com a sociedade ao se formalizarem como
políticas educacionais. No entanto, a educação só pode objetivar e compreender o
seu papel e apreender sua identidade, quando toma certa distância da sociedade.
Assim como em cada momento histórico surgem profissionais e especialistas
teóricos que organizam e justificam a institucionalização da prática educacional,
devem surgir, igualmente, profissionais que a compreendam e revelem as
contradições que existem entre as forças sociais e a educação. Há uma relação
íntima entre sociedade e processo educacional, de tal maneira que a organização
educacional reproduz integral e estruturalmente a sociedade.
Mas, a educação pode, igualmente, se manifestar como fator de
transformação social, quando se orienta para uma função desestruturadora. As
ações do sujeito tornam dependente todo processo histórico, cabendo à educação a
função de mediadora e transformadora da História. Ressignificada, a educação
passa a ser compreendida como prática social e histórica. Dessa maneira:
[...] esse processo envolve comportamentos, costumes, instituições, atividades culturais e organizações burocrático-administrativas. A educação é um evento social que se desdobra no tempo histórico. É também mediação da sociabilidade, sendo sua finalidade inserir as novas gerações no universo social, fora do qual não sobrevivem. (SEVERINO, 2001).
As formas institucionalizadas de práticas sociais reproduzem a sociedade da
maneira que existem, ao incluir as gerações mais novas no universo social. A
sociedade se estrutura segundo as relações políticas marcadas pelas relações de
poder decorrentes dos fatores econômicos e ideológicos.
A educação atua sobre e mediante as relações intersubjetivas expressas
como conceitos, valores e representações. Ela é uma prática política e social que se
instrumentaliza de elementos simbólicos, produzidos pela subjetividade manejada
pela cultura. Ao lidar com conteúdos simbólicos subjetivos dos alunos, a educação
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só pode ser realizada como conscientização. No entanto, a dimensão da
representação é o locus da ideologia. Atuando nesse âmbito, a educação pode
reproduzir os conteúdos ideológicos da sociedade, conservando-a, ao conservar as
relações sociais que sustentam, ideologicamente, a própria sociedade.
Alguns autores, entre eles Althusser, em sua obra clássica Ideologia e
aparelhos ideológicos do Estado, analisa de forma contundente a função
reprodutivista da educação institucionalizada. Segundo o Severino (2001, pp. 73-74),
para garantir a reprodução dos meios de produção, o capitalismo precisa assegurar
a reprodução da força de trabalho. Esse processo precisa ser retroalimentado pela
qualificação da força de trabalho submetido sempre aos interesses da classe
dominante, por meio da ação do sistema escolar e por outras instituições que se
situem fora do sistema.
Desse modo, os valores e os conhecimentos, ideologicamente embutidos na
escola, são transmitidos pela sociedade capitalista. Assim, a educação atuando
como aparelho ideológico do Estado, marcado pelas relações capitalistas de
produção, conserva a hegemonia burguesa, reproduzindo as relações de dominação
inerentes à sociedade capitalista.
O processo educacional pode, por um lado, reforçar a relação de dominação
na sociedade ao reproduzir mecanismos ideológicos sem nenhuma reelaboração,
mas, pode, contraditoriamente superar, por meio da crítica, os conteúdos ideológicos
e impor resistências à dominação social, contribuindo, desse modo, para relações
político-sociais menos opressoras. Ao assumir tal postura, a educação torna-se uma
práxis transformadora.
Por ser mediada por conteúdos simbólicos, a educação não atua como
grande meio para a transformação da sociedade. No entanto, é impossível pensar
em transformação social sem pensar, ao mesmo tempo, em mudança nas
representações, valores, conceitos, habilidades, ideias, símbolos, etc., isto é, no
universo simbólico humano. Nesse sentido, a educação ocupa lugar indispensável
no processo de transformação social. Pois,
[...] as mudanças econômicas e políticas pressupõem mudanças profundas e simultâneas na esfera ideológica. É que as práticas reais (produtiva, política e simbolizadora) também são mediadoras da existência histórica dos homens e interfaces de um único processo geral. (SEVERINO, 2001, p. 76).
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Se a educação pode se colocar a serviço da reprodução de um modelo de
sociedade, por meio da reprodução, sistematização e divulgação de uma ideologia,
pode, igualmente, se colocar a serviço, reproduzindo, sistematizando e divulgando
uma contra ideologia, assumindo assim, um projeto transformador de sociedade.
Pode produzir uma nova consciência entre os indivíduos e cidadãos, abrindo, desse
modo, a possibilidade de se elaborar uma crítica à ideologia vigente,
desmascarando-a em seus compromissos e interesses dominantes.
Ao produzir e potencializar discursos contra ideológicos, a educação pode
revelar aos oprimidos, o modo como se estrutura a sociedade, abrindo-lhes a
possibilidade de se apropriarem do saber sistematizado e, assim, denunciar as
relações de poder. Trabalhado de forma adequada pela educação, “o conhecimento
leva à conscientização do significado contraditório das relações sociais.”
(SEVERINO, pp. 76-77). Nesse processo, a educação pode atuar na formação e
produzir entre os grupos dominados e explorados, uma nova consciência de classe
instrumentalizando-os para uma práxis política mais apropriada.
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UNIDADE 2 – O ESTADO E AS POLÍTICAS DA EDUCAÇÃO BÁSICA
O Brasil tem experimentado mudanças significativas em diversos âmbitos da
vida nacional nos últimos anos. Os debates que ocorreram revelam a necessidade
de serem repensadas alternativas para as questões estruturais da educação no
Brasil, passando, inclusive, pela reforma da educação. A necessidade de dar
respostas e soluções para os problemas da ineficiência no atendimento público
educacional, da universalização da educação básica e das novas exigências
advindas da reestruturação capitalista de produção, justificam as mudanças.
Essas profundas mudanças vêm ocorrendo desde as últimas décadas do
século XX e início do século XXI em todos os planos da sociedade, também o
teórico, o ideológico, econômico, sociocultural e ético-político, revelando uma crise
radical do sistema capitalista, teórico e ético-político.
Dessa forma, as mudanças devem ser interpretadas muito mais pelo
movimento do processo de reestruturação do capitalismo, também como nova
organização social, do que pela crise do papel do Estado assistencialista,
conduzindo a mudanças nos centros de poder. As transformações ocorridas nos
sistemas de ensino, na década de 1990, deixaram a marca da flexibilidade. A
autonomia administrativa e financeira das unidades escolares foi ampliada com a
combinação entre a centralização das decisões e a descentralização das ações.
Para Oliveira (2001, p. 107):
Embora a descentralização já estivesse prevista como norma desde o Decreto n. 200 de 1967 e a divisão de responsabilidades pelo financiamento e administração da educação entre as esferas administrativas também já estivesse contemplada legalmente, medidas mais eficazes que garantissem a distribuição de competências e recursos na gestão educacional só encontraram lugar nos anos 1990, a exemplo do Fundef.
Nos anos de 1990, principalmente, o debate sobre educação e
desenvolvimento esteve vinculado à necessidade de dar uma resposta ao padrão de
qualificação emergente no contexto da reestruturação da produção capitalista e da
globalização da economia, ocupando lugar central nas políticas educacionais. Como
parte de um contexto mais amplo, a organização e a estrutura do sistema
educacional, expressam muitas das peculiaridades e características dessas
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mudanças, “sendo também palco de inúmeras transformações”. (VIEIRA, 1999, p.
9).
Por isso, a década de 1990 pode ser considerada como um período fértil em
termos de formulação de propostas no âmbito da educação brasileira
fundamentalmente nos aspectos que dizem respeito à sua gestão. Segundo Oliveira
(2001, p. 105), “ao longo desses anos foram sendo introduzidas mudanças na
administração dos sistemas de ensino em âmbito municipal, estadual e federal, que
resultaram numa grande diversidade de experiências na gestão da educação”.
Autores como Chomsky (1996) e Bernardo (1991) demonstram que o Estado
começa a apresentar sinais de cansaço e crise diante do surgimento de novas
instituições políticas, de dimensões globais e vinculadas a vários centros. Essas
instituições passam “a negociar parâmetros e normas gerais para o mercado
mundial e as políticas delas advindas (as leis de royalties, as normas de qualidade,
as regras de intercâmbio mundial, etc.) também passam a interferir nas políticas
internas dos Estados Nações”. (OLIVEIRA, 2001, p. 106).
O interesse do Brasil com as reformas educacionais na década de 1990 era
com a ampliação da oferta do ensino fundamental, “interpretado como educação
básica, apesar da amplitude adquirida por esse termo na Constituição Federal de
1998.” (OLIVEIRA, 2001, p. 107). A necessidade de conferir um mínimo de
conhecimento à população para que pudesse ser inserida e integrada à nova
organização social, justificava o empreendimento. Assim, a educação básica passou
a estar diretamente vinculada com a tarefa de conferir as condições necessárias
para que os indivíduos acessassem o mercado de trabalho.
Nesse sentido, os anos de 1990 foram assinalados por iniciativas que
visavam reformas do sistema público de ensino em todos os estados brasileiros. O
objetivo desta reforma era ajustar a oferta de mão de obra qualificada e a procura do
mercado de trabalho. Contudo, Oliveira (2001, p. 107) observa que:
[...] essas mudanças não se limitaram às questões de conteúdo (do que e como deveria ser ensinado), mas, primordialmente, à política que deveria nortear a educação, suas formas de financiamento, controle e gestão. Tais reformas seriam então justificadas pela relativa importância atribuída aos processos escolares formais neste momento de reestruturação capitalista, de emergência de novos
padrões de produção.
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Ao mesmo tempo em que se percebe a prioridade dada à educação básica,
observa-se igualmente maior atenção às exigências de níveis de escolaridade e
formação dos trabalhadores para acessarem e permanecerem no emprego formal.
Assim, as muitas iniciativas de governos, empresários e trabalhadores, na
formulação de propostas no horizonte das políticas educacionais, podem ser
explicadas por essa exigência.
A partir da Constituição Federal de 1998, o conceito de educação básica foi
ampliado, passando a ser compreendida como um processo que abrange a
educação infantil, o ensino fundamental e o médio. Nesse contexto,
[...] a partir da Conferência Mundial Sobre Educação para Todos, realizada em Jontiem, em 1990, a preocupação com uma educação dirigida à equidade social passou a orientar as recomendações dos organismos internacionais ligados à ONU para as políticas educacionais dos países pobres mais populosos do mundo. As reformas educacionais dos anos 1990, no Brasil, trouxeram esta finalidade. (OLIVEIRA, 2001, p. 108).
Como se observa, a década de 1990 foi marcada pela tentativa de reformar a
educação, ampliando o acesso e criando possibilidades de permanência dos
indivíduos nas escolas formais, procurando acabar com o analfabetismo, mas ainda
envolto em uma compreensão restritiva do termo educação básica. A proposta de
universalização do acesso à educação encontrava-se atrelada e combinada com
medidas “de racionalidade técnica para a gestão dos recursos públicos aplicados no
setor.” (OLIVEIRA, 2001, p. 109).
Essa combinação colocou em perigo a almejada qualidade, uma vez que a
relação entre o aumento de serviços educacionais pelo Poder Público e a diminuição
dos gastos empregados, tornaram o processo mais frágil. A ampliação do conceito
de educação básica deveria significar um maior compromisso do Estado com a
educação geral, possibilitando um maior acesso da população à escolarização
formal. Porém, não foi isso que aconteceu.
Apesar da ampliação do conceito de Educação Básica, como revela o texto
da Constituição Federal de 1988, na prática a sua efetivação tem apresentado
algumas dificuldades, uma vez que o direito à educação infantil, fundamental e
média não vem ocorrendo. Ao contrário, “na última década se percebeu uma
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tentativa à priorização do Ensino Fundamental como Educação Básica; portanto,
necessária e obrigatória.” (OLIVEIRA, 2000, p. 145).
Na Carta Magna brasileira de 1988, no seu título VIII, cap. III, seção 1, art.
205, a educação se revelou como um direito social. A educação figurara como
“direito de todos e dever do Estado e da família” e a seu respeito se afirma que:
“será promovida e incentivada com a elaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho”.
No entanto, o país conviveu, desde 1996, com novos dispositivos legais, cuja
origem se reporta a mudanças feitas na Constituição Federal de 1998 no capítulo
que trata da educação, por meio da Emenda Constitucional n. 14, de 12 de setembro
de 1996, à qual se seguiram a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB), Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e a regulamentação do Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério (Fundef), instituído pela Emenda Federal n. 14/1996 e regulamentado por
meio da Lei n. 9.424, de 24 de dezembro de 1996.
Já em 1998 iniciaram as primeiras reflexões sobre a nova LDB, que se
traduziram em vários projetos que tramitaram no Congresso, dado a intensidade dos
debates e dos diversos interesses, tornando o processo contraditório. O texto
aprovado foi:
[...] aquele de autoria do senador Darcy Ribeiro, o qual incorpora aspectos dos outros projetos e acrescenta outros. Assim, a nova LDB nem é aquela vislumbrada pelo primeiro projeto aprovado na Câmara dos Deputados, em junho de 1990, relatada pelo deputado Jorge Hage, nem, contudo, a prevista pela primeira versão do projeto do senador Darcy Ribeiro. (VIEIRA, 1999, pp. 9-10).
Para Vieira (1999, p. 9), a nova LDB conserva o espírito da Carta Magna de
1998, ao detalhar seus princípios e direção no sentido de propor orientações gerais
para o sistema educacional. Faz isso ao definir uma nova função para o Governo
Federal e para os demais âmbitos do Poder Público, ao refletir também a política
educacional desenvolvida a partir de 1995.
A Legislação em si mesma não tem e jamais teve o poder de transformar a
configuração da realidade, mas pode apontar, para uma direção desejável, o
sistema educacional, numa dada conjuntura histórica. A Constituição, ao estabelecer
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a universalização do direito à educação e constituí-la como um dever do Estado,
família e sociedade, introduz a concepção de que a Educação é um dever que deve
ser compartilhado entre Estado e sociedade.
Esse dever, na esfera do Poder Público, deve ser imputado a todas as
esferas governamentais. No âmbito familiar, a responsabilidade com a educação
“também se concretiza através de deveres, cabendo aos pais ou responsáveis
matricular seus filhos “menores, a partir dos sete anos de idade, no ensino
fundamental” (LDB, Art. 6.)”. (VIEIRA, 1999, pp. 9-10).
Segundo a Constituição Federal, artigo 205 e a atual LDB, artigo 2, o fim da
educação é o “pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Ou seja, para a Constituição Federal,
a educação tem uma finalidade ética, política e econômica. Ao estabelecer que esta
abrange os processos formativos que se “desenvolvem na vida familiar, na
convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos
movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações
culturais”, a nova LDB define a educação em sentido amplo.
A nova LDB tem o poder de disciplinar a educação escolar. Ela avança na
compreensão da educação ao vinculá-la com a prática social e o mundo do trabalho.
Para Vieira (1999, p. 10), “os princípios orientadores da educação nacional
estabelecidos na Constituição (CF, Art. 206, I a VII), são retomados e ampliados pela
LDB (Art. 3, I a XI)”.
Uma vez que definem as bases sob as quais estão estabelecidas a
organização e a estrutura do modelo educacional brasileiro, cremos ser importante
citar esses princípios orientadores. São eles:
I. Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II. Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, a
arte e o saber; III. Pluralismo de ideias e concepções pedagógicas; IV. Respeito à liberdade e apreço à tolerância; V. Coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
VI. Gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; VII. Valorização do profissional da educação escolar;
VIII. Gestão democrática do ensino público, na forma desta lei e da legislação dos sistemas de ensino;
IX. Garantia de padrão de qualidade; X. Valorização da experiência extraescolar;
XI. Vinculação entre a educação escolar, trabalho e as práticas sociais. (VIEIRA, 1999, p. 9).
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A Constituição Federal no artigo 208 e a LDB, no artigo 4 regulamentam o
dever do Estado para com a educação, fazendo com que o ensino fundamental seja
obrigatório e gratuito, contemplando, inclusive, gratuitamente aqueles que não
tiveram acesso a ele na idade oportuna. Essa regulamentação revela que o Poder
Público tem um compromisso efetivo com o ensino fundamental para todos os
cidadãos brasileiros. O Estado tem ainda o dever de contemplar as demais
modalidades e níveis de ensino além de garantir que o ensino médio seja
paulatinamente universalizado gratuitamente.
Como observa Vieira (1999, p. 10):
São também deveres do Estado: o atendimento às crianças de 0 a 6 anos e aos portadores de deficiência, assim como o acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; a oferta de ensino noturno regular e, de programas suplementares para o ensino fundamental, visando ao atendimento do educando.
Apoiado em análises de pesquisadores e intelectuais que, apesar do cenário
de crise continuam a se esforçar para produzir um pensamento crítico a todas as
formas de dominação, como Frigotto e Ciavatta (2003, p. 5), pretendemos refletir
sobre a educação básica brasileira nos anos de 1990, “à luz do movimento mais
amplo internacional que, com o apoio de assessorias, documentos formadores de
opinião e de recursos, foi se impondo às políticas públicas de educação com a
participação ativa, anuência e colaboração das autoridades locais”.
Depois das mudanças políticas e econômicas ocorridas na segunda metade
do século passado revelou-se um modelo de sociedade mundial que se distanciava
do “pensamento único”. Sob a perspectiva da educação, percebe-se uma
concorrência entre o ajuste dos sistemas educacionais às exigências da nova
organização do capital e as demandas por uma:
[...] efetiva democratização do acesso ao conhecimento em todos os seus níveis. Os anos de 1990 registram a presença dos organismos internacionais, que entram em cena em termos organizacionais e pedagógicos, marcados por grandes eventos, assessorias técnicas e farta produção documental. (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 5).
A Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura.
(UNESCO), os Fundos das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNDU) e Banco Mundial financiaram, no
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início do ano de 1990, em Jontiem, Tailândia, com a Conferência Mundial sobre
Educação para Todos, o primeiro grande evento, que propunha uma proposta global
de educação para a década que se iniciava. Como revela o documento da
Conferência, em Jontiem, foi apresentada uma proposta que tinha como tema
central a satisfação das necessidades básicas de aprendizagem, que englobava a
década de 1990. Segundo o documento:
Cada pessoa – criança, jovem ou adulto – deverá estar em condições de aproveitar as oportunidades educacionais oferecidas para satisfazer suas necessidades básicas de aprendizagem. Estas necessidades abarcam tanto as ferramentas essenciais para a aprendizagem (como a leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo, a solução de problemas) como os conteúdos básicos da aprendizagem (conhecimentos teóricos e práticos, valores e atitudes) necessários para que os seres humanos possam sobreviver, desenvolver plenamente suas capacidades, viver e trabalhar com dignidade, participar plenamente do desenvolvimento, melhorar a qualidade de sua vida, tomar decisões fundamentais e continuar aprendendo. A amplitude das necessidades básicas de aprendizagem varia de país a país em sua cultura e muda inevitavelmente com o transcurso do tempo. (WCEA, 1990, p. 157)7.
A Declaração foi subscrita por representantes de 155 governos e por
agências internacionais, personalidades da área de educação em nível mundial,
ONGs e associações de profissionais, que se comprometeram a garantir uma
educação de qualidade a todos.
Ao Brasil, como um dos países que subscreveram a Declaração, foi pedido
com insistência que desenvolvesse ações efetivas capazes de emular as políticas
educacionais durante a década. Como observa Shiroma et al. (2002, pp. 58-59):
As estratégias acordadas na Conferência previam: para necessidades diferentes, conteúdos, meios e modalidades de ensino e de aprendizagem diversas; prioridade a grupos em situação de privação: meninas, mulheres, portadores de necessidades especiais; sistemas de avaliação de resultados; condições materiais, físicas e emocionais para aprender, incluindo saúde, nutrição, etc.; obrigação de o Estado fornecer educação básica com o concurso de organismos governamentais e não governamentais, setor privado, comunidades locais, grupos religiosos, famílias; reconhecimento dos saberes tradicionais e do patrimônio cultural de cada grupo, por meio de modalidades educativas formais e não formais.
7 O original se encontra em espanhol. A tradução é nossa.
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No Brasil tinha início o breve governo de Fernando Collor de Mello, deposto
do cargo por denúncias que lhe conduziram ao impeachment. Entretanto, as
orientações da Conferência de Jontiem influenciaram o Plano Decenal da Educação
para Todos, já no governo de Itamar Franco, em 1993. O conjunto da situação
política no Brasil, marcada por uma intensa correlação de forças influenciará no
rumo e na elaboração da nova Lei de Diretrizes Bases da Educação Nacional (LDB).
Por outro lado, as reformas educacionais implementadas no governo FHC,
como corolário de um amplo movimento internacional, continuou a ganhar fisionomia
por meio de outras agências e documentos para a área de educação. Frigotto e
Ciavatta (2003, p.7), ressaltam que:
Ainda em 1990, a CEPAL publicou Transformación productiva con equidad, que enfatizava a urgência da implementação de mudanças educacionais em termos de conhecimentos e habilidades específicas, demandadas pela reestruturação produtiva. Em 1992, a CEPAL volta a publicar outro documento sobre o tema, Educación y conocimiento: eje de la transformación productiva con equidad, vinculando educação, conhecimento e desenvolvimento nos países da América Latina e do Caribe.
Percebe-se uma pressa para se realizar uma grande reforma dos sistemas
educacionais que proporcionasse uma adequada capacitação profissional que
atendesse às demandas de conhecimento científico-tecnológico, assim como
recomendações que proporcionassem o enfrentamento das mudanças e tensões da
mundialização. Nesse sentido, a educação, principalmente a básica, seria o
instrumento essencial para desenvolver nos indivíduos a capacidade de responder
aos desafios de um mundo em transição.
2.1 Políticas educacionais para educação básica no governo
Fernando Henrique Cardoso: subordinação consentida ao capital
A nova LDB é aprovada, no Governo Fernando Henrique Cardoso (FHC),
cabendo à educação básica, no contexto em que foi redigida, a finalidade de
“desenvolver o educando, assegurando-lhe a formação comum indispensável para o
exercício da cidadania, e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos
posteriores” (Lei nº 9.394/96, art. 22); e organiza-se nos níveis fundamental e médio
(Art. 24). (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 8).
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No Governo FHC a política educacional para educação apresentou-se como
um projeto neoconservador. Por isso, foram e são intensas e abundantes as críticas
a esse período, tanto no âmbito da educação, como no político, cultural e,
principalmente, econômico. As críticas que se direcionavam ao governo revelavam
que este orientou as diferentes políticas, nos vários âmbitos, vislumbradas e
subordinadas “aos organismos
internacionais, gestores da
mundialização do capital e dentro da
ortodoxia da cartilha do credo neoliberal,
cujo núcleo central é a ideia do livre
mercado e da irreversibilidade de suas
leis. Tudo isso, por meio de uma relação
intencional e consentida”. (FRIGOTTO;
CIAVATTA, 2003, p. 11).
Fonte: http://migre.me/8bGp6
Perry Anderson (2002, p. 2) avalia o governo FHC, observando que:
A característica que define o governo FHC tem sido o neoliberalismo “light” do tipo que predominou nos anos 90 (...). A dinâmica fundamental do neoliberalismo se ergue sobre dois princípios: a desregulamentação dos mercados e a privatização dos serviços. (...) Fernando Henrique Cardoso leiloou a maior parte do setor estatal e abriu a economia completamente, apostando na entrada de um fluxo maciço de capital externo para modernizar o país. Após oito anos, os resultados estão aí, evidentes: estagnação crescente, salários reais em queda, desemprego em nível nunca antes visto e uma dívida estrondosa. O regime foi condenado aos seus próprios termos.
Portanto, a conclusão a que se chega é que o Governo FHC se mostrou um
período de retrocesso e mediocridade do ponto de vista social e econômico. Como
observamos, a elite burguesa nacional encontrou em FHC o líder com capacidades
de arquitetar e construir seu projeto hegemônico de longo prazo, associado,
vinculado e submetido à nova ordem da mundialização do capital. Nesse contexto,
FHC constrói um governo de centro-direita e, “sob a ortodoxia monetarista e do
ajuste fiscal, agora no contexto da férrea doutrina dos organismos internacionais e
sua cartilha do Consenso de Washington, efetiva as reformas que alteram
profundamente a estrutura do Estado brasileiro para ‘tornar o Brasil seguro para o
capital’.” (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 13).
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No conjunto de correntes internalizadas e partilhadas pelo projeto econômico-
social do governo FHC está a descentralização, retirada da cartilha neoliberal do
Consenso de Washington. A descentralização, assim com a autonomia, estabelece
uma estrutura que transfere aos agentes econômicos, sociais e educacionais o
dever de competir no mercado a venda de seus serviços e produtos. Observa
Frigotto e Ciavatta (2003, p.14) que:
A privatização fecha o circuito do ajuste. O máximo de mercado e o mínimo de Estado. O ponto crucial da privatização não é a venda de algumas empresas apenas, mas o processo do Estado de desfazer-se do patrimônio público, privatizar serviços que são direitos (saúde, educação, aposentadoria, lazer, transporte, etc.) e, sobretudo, diluir, esterilizar a possibilidade de o Estado fazer política econômica e social. O mercado passa a ser o regulador, inclusive dos direitos.
Por conseguinte, articulado à sociedade brasileira que se ajusta às exigências
do capital financeiro é que o projeto para a educação desse governo pode ser
compreendido e encontra sua coerência lógica. Para que o ajuste e articulação se
tornassem mais efetivos, os especialistas – tecnocratas e técnicos – que produziram
as medidas, na sua maioria eram:
Intelectuais altamente preparados em universidades do exterior e com passagem, alguns, muito longa, outros mais breve, nos organismos internacionais que estão na base das reformas educativas: Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento, Organização Internacional do Comércio (OIT), etc. Esta lista é encabeçada com aquele que seria o ministro de Educação de FHC por oito anos, Paulo Renato Souza, e completada, entre outros, por João Batista de Araújo, Cláudio de Moura Castro, Guiomar Namo de Melo e Maria Helena Guimarães Castro. (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 15).
Portanto, é sobre a lógica unidimensional do mercado que foi se construindo o
projeto de educação básica do governo FHC, expressando-se tanto na forma de
organização do sistema escolar como no universo simbólico dos educadores e
pedagogos. Ao se desprezar e sujeitar o projeto de desenvolvimento de uma
educação nacional popular e autônoma, também o foi a “perspectiva de uma
educação básica omnilateral, politécnica ou tecnológica”, como propunha, por
exemplo, Saviani (2003).
Como se observa, a dimensão mais grave e com consequências significativas
para a educação foi o fato de o governo FHC, por meio do MEC, ter adotado e
disseminado um pensamento pedagógico empresarial sustentado pelas orientações
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de agências nacionais, internacionais e regionais, fazendo dele diretriz e concepção
educacional do Estado. Tratou-se:
[...] de uma perspectiva pedagógica individualista, dualista e fragmentária coerente com o ideário da desregulamentação, flexibilização e privatização e com o desmonte dos direitos sociais ordenados por uma perspectiva de compromisso social coletivo. (SAVIANI, 2003, p. 16).
A antiga secretária da Secretaria de Ensino Superior (SESU) e diretora do
Instituto Nacional de Estudos de Pesquisas Educacionais (INEP), Maria H.
Guimarães Castro, responsável pelo Exame Nacional de Ensino Superior (Provão) e
pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), que geria a
educação vinculada aos interesses do Banco Mundial, que tinha a necessidade de
avaliar o impacto do Projeto Nordeste, segmento Educação, revela objetivamente as
competências que deviam ser avaliadas para atender as demandas dos
empresários. Em uma recente pesquisa realizada pelo MEC, Castro (2001), assim
se expressou:
[...] sobre o que o mercado de trabalho esperava dos alunos ao final do Ensino Médio de cursos profissionalizantes, revelou-se que as empresas querem que esses estudantes tenham domínio de Língua Portuguesa, saibam desenvolver bem a redação e se comunicarem verbalmente. Esta é uma das competências gerais que o ENEM procura avaliar e que a Reforma do Ensino Médio procura destacar. Em segundo lugar, os empresários querem que os futuros trabalhadores detenham os conceitos básicos de matemática e, em terceiro lugar, que tenham capacidade de trabalhar em grupo e de se adaptarem a novas situações. Portanto o que os empresários estão esperando dos futuros funcionários são as competências gerais que só onze anos de escolaridade geral podem assegurar. (CASTRO, 2001).
Objetivou-se, então, no governo FHC a competição dos empresários pelo
domínio exclusivo do pensamento pedagógico que ultrapassava a formação
profissional e específica.
2.2 A educação básica, a LDB e o Conselho Nacional de Educação
no governo FHC
A recusa do governo FHC à proposta da LDB, elaborada a partir da sociedade
organizada, congregadas no Fórum Nacional de Defesa da Escola Pública,
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evidencia o Plano deste governo para sujeitar as reformas na área da educação ao
projeto de ajuste econômico-fiscal, tanto no plano organizativo como pedagógico. O
caráter e a formação do Conselho Nacional de Educação (CNE) confirmam o
planejamento.
Para ganhar tempo e estabelecer a reforma educacional foram enviadas ao
Parlamento – pelos parlamentares da base do governo -, Decretos e outras medidas,
fazendo com que a tramitação da LDB fosse postergada ao máximo. Como a
ideologia e as políticas de ajustes eram incompatíveis com o pensamento dos
educadores sobre a LDB, ela foi intensamente combatida e rejeitada. Foi, por isso,
conforme revelam Frigotto e Ciavatta (2003, p. 18), que:
[...] o projeto de LDB oriundo das organizações dos educadores, mesmo sendo coordenado, negociado e desfigurado pelos relatores do bloco de sustentação governamental, foi rejeitado pelo governo. Todas as decisões fundamentais foram sendo tomadas pelo alto, pelo Poder Executivo, por meio de medidas provisórias, decretos ou por leis conquistadas no Parlamento mediante o expediente da troca de favores.
A nova LDB (Lei 9394/6) que finalmente foi aprovada pelo Congresso
Nacional, além de se revelar como o resultado da ação personalista do senador
Darcy Ribeiro representou, igualmente, como observa Florestan Fernandes, uma
dupla traição: “fez uma síntese deturpada do longo processo de negociação do
projeto negociado com a sociedade organizada e deu ao governo, que não tinha
projeto de LDB, o que este necessitava”. (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 18).
A LDB aprovada revelou uma profunda coerência com os interesses que se
encontravam sub-reptícios à sua elaboração, por ser minimalista e, em “consonância
com a proposta de desregulamentação, de descentralização e de privatização e
compatível com o Estado Mínimo.” (SAVIANI, 1997, p. 200).
O Plano Nacional de Educação também deve ser compreendido como o
corolário de projetos em disputas, em competição. Eles têm a função de
regulamentar a Lei Nacional de Educação, elaborando estratégias para fazerem com
que a política de educação em vigor fosse cumprida com força legal. Todavia, “esse
procedimento supõe uma ampla negociação com a sociedade e com o legislativo de
modo que se garanta a orientação política da lei por meio da destinação efetiva de
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recursos e da elaboração de instrumentos legais complementares.” (FRIGOTTO;
CIAVATTA, 2003, p. 17).
No caso do Brasil, onde os procedimentos democráticos são constantemente
vencidos por um costume histórico autoritário, os planos educacionais assumem
uma compleição mais vaga ao aproximar-se da política, “ficando a salvo do
cumprimento de metas definidas em função dos problemas a resolver.” (FRIGOTTO;
CIAVATTA, 2003, p. 18).
Como no Brasil não se tem uma tradição democrática de incorporar os mais
variados interesses de setores da sociedade para construir um projeto superior para
o país, os planos educacionais acompanham e expressam as inconstâncias deste
Estado. Por isso, a partir de 1964 os planos saem gradativamente do âmbito dos
pedagogos, para os tecnocratas, economistas e engenheiros da “nova” economia
nacional dos anos 1970 que se prolongou até a década atual (HORTA, 1982 e
1997).
O Governo FHC (1994-2002) respondeu, exercendo de forma absoluta o
poder, por meio do atual Plano Nacional da Educação (PNE), na forma da Lei n.
10.172 de 09/01/2001, a criação do “Plano Nacional da Educação da Sociedade
Brasileira, elaborado sob a liderança do Fórum Nacional em Defesa da Escola
Pública” (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 18), que em conjunto com a Constituinte
de 1998, também participou efetivamente da elaboração do projeto da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação.
A sociedade brasileira ainda continua a exigir que o investimento em
educação chegue a 10% do PIB, ao final do PNE. Esse percentual ajudaria a
fortalecer outra exigência da sociedade brasileira que é a de ter uma escola pública
estatal e a democratização da gestão educacional como ideia central em direção à
universalização da educação básica e, paulatinamente, o ensino superior. No
entanto, observa Davies (1999, pp. 11-12 e 35) que:
A resposta governamental, quando trata da competência da União, contorna “a necessidade de indicar prazos e de apontar o setor competente pela execução da meta, contrariamente ao sentido, muitas vezes invasivo, com que normatiza condutas e procedimentos aos estados e municípios” e procede “à transferência de responsabilidades da União aos entes subnacionais, como tentativa de remediar os males decorrentes de ações anteriores do governo
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federal”, como é o caso do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF).
Os vetos que impossibilitaram que o PNE fosse um Plano Nacional, segundo
o movimento organizado, foram elaborados no governo FHC, pela área econômica,
que seguia a cartilha do FMI. Os benefícios que seriam oriundos, segundo discurso
oficial, da minimização do Estado e da consequente privatização do sistema
educacional, não mostraram os resultados anunciados. Segundo Frigotto e Ciavatta
(2003, p.21), aconteceu o contrário.
A retração do Estado e a privatização dos serviços, ao contrário do discurso oficial e publicitário, não trouxeram benefícios à população. Ao contrário, privatizaram e elitizaram os serviços, transferiram o clientelismo populista para o clientelismo junto às organizações da sociedade civil e introduziram o voluntariado como uma questão de “cidadania”. São políticas que visam a minorar os efeitos da expropriação econômica e cultural que atingem as classes assalariadas (subempregados e desempregados), marginalizados, em diversos níveis, dos benefícios sociais propiciados pelo desenvolvimento das forças produtivas. São políticas pobres para os pobres.
Nos oito anos do governo FHC a política de ensino fundamental foi escolhida
como prioridade central, tanto no horizonte da organização como no pedagógico.
Porém, como argumenta Davies (2003 Apud FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 22),
os indicadores fundamentais não apresentaram melhoras. O autor aponta
discrepâncias nas análises estatísticas do Ministério da Educação e questiona a
campanha de 1997/1998, “Toda criança na escola”, que teria sido viabilizada pelo
FUNDEF.
O descompromisso real com a qualificação da educação fundamental se
revela pela descentralização autoritária da incumbência de manutenção da
educação infantil e fundamental pelos municípios, mas sem nenhuma garantia
mínima que atendimento fosse mais qualitativo. O FUNDEF foi criado para permitir
que houvesse um gasto mínimo aluno/ano no ensino fundamental, usados pelos
municípios, para aumentar sua renda compulsória, por meio da intensificação do
processo de associação de matrículas. Ressalta Frigotto e Ciavatta (2003, p.20) que
“em certos casos houve matrículas fantasmas”.
A respeito da relação entre transferência de recursos do Governo Federal aos
municípios, por meio do FUNDEF, e centralização e distribuição dos recursos por
aluno, confirma Pinto (2002, p. 117 e 128) que:
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O governo federal divulga relatórios róseos sobre os efeitos do Fundo (MEC, 1999), curiosamente, divulgando apenas os ganhos de receitas dos municípios, sem mostrar que estes recursos “ganhos” correspondem exatamente às quantias perdidas pelas redes estaduais, mesmo porque os recursos adicionais federais são ínfimos (menos de 3% dos recursos do Fundo). (...) Portanto, nos anos FHC, apesar de o país ter vivido um progressivo aumento da carga tributária, esta melhoria de arrecadação não repercutiu no sentido de ampliar efetivamente os gastos com ensino no Brasil.
Ao contrário do que expressa a sigla FUNDEF, percebeu-se um inexpressivo
investimento na educação fundamental e, concomitantemente, no magistério. A
elaboração de políticas públicas efetivas para a educação básica foi substituída por
slogans que a apresentavam muito mais como beneficiária de filantropia, do que
como “dever do Estado e espaço para profissionais especializados e qualificados.”
(FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 21).
Nesse contexto, em que as ações educacionais apresentavam-se como
eventuais, tópicas e assumidas por quem delas tinha pena, os professores foram
submetidos a intensas obrigações, desprezados e humilhados nas suas condições
efetivas de vida e de trabalho, ao mesmo tempo em que seu saber e profissão foram
desvalorizados e desrespeitados.
O governo FHC, marcado pela estabilidade econômica atingida por meio do
Plano Real, quando era ministro da fazenda do governo Itamar Franco, promoveu
importante reforma do Estado brasileiro modernizando-o sim, mas racionalizando-o
também. A reforma, como procuramos mostrar acima, marcada por privatizações de
empresas públicas, trouxe como importante elemento iniciativas de
desregulamentação da Administração Federal e pública, ao implementar um novo
modelo de gestão de políticas sociais marcadas pela descentralização. A educação
sofreu consequências significativas por causa desse modelo de reforma.
2.3 Políticas educacionais para educação básica no primeiro
governo Luiz Inácio Lula da Silva: rupturas e permanências
A crítica a respeito da lógica do recurso à racionalidade técnica como meio
diretivo das políticas sociais, foi um fator importante na eleição de Luiz Inácio Lula da
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Silva. Como a assunção de Lula à presidência do país, representava o rompimento
com essa lógica, o início do seu governo acabou gerando certa insatisfação, uma
vez que esse governo apresentou, nesse sentido, menos ruptura e mais
permanências do que o esperado e anunciado. Oliveira (2009, p. 203) ressalta que
“até mesmo a retórica observada nessas políticas foi sendo assumida pelo novo
governo que passou a professar a inclusão social no lugar do direito universal à
educação”.
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que agora começa a ser
intensamente objetivado e analisado, vem sendo apontado como executor de
políticas sociais, orientadas aos setores mais vulneráveis da sociedade. De fato, a
sua eleição gerou um conjunto de expectativas de transformações no interior da
sociedade brasileira, de maneira especial na
área da educação. A crença em “alterações
importantes nesse setor decorria, de um lado,
de um histórico de experiências educacionais
inovadoras de gestões petistas, em particular
nos municípios, e, de outro, do triste legado
que recebeu de seu antecessor”. (PINTO,
2009, p. 324).
Fonte: http://migre.me/8bGx3
O governo Lula, na área de educação, desenvolveu programas, estabeleceu
parcerias com os municípios e diretamente com as escolas, algumas vezes sem
interferência dos estados, estabelecendo um novo modelo de gestão de políticas
públicas e sociais. Esse novo modelo de administração ocasionou o envolvimento de
outras instituições na realização de programas sociais no âmbito social, tais como:
Organização Não Governamental (ONG), Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), sindicatos. Esse modelo de gestão de políticas públicas e sociais teve início no governo anterior, ou seja, na reforma do Estado promovida pelo presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC). (OLIVEIRA, 2009, 198).
Ainda segundo Oliveira (2009, p. 198), na área educacional, o primeiro
governo Lula foi marcado, apesar das expectativas de mudanças radicais, muito
mais por continuações que rompimentos em relação ao governo FHC. Tendo
recebido uma ampla e complexa reforma educacional, nos dois mandatos de seu
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predecessor, “restava a esse governo re-reformar a educação ou conservar e manter
as iniciativas anteriores. A opção parece ter sido pelo segundo caminho”.
(OLIVEIRA, 2009, p. 198).
No que se refere à educação básica, os quatro primeiros anos de governo
Lula podem ser caracterizados pela falta de políticas constantes e normativas e de
ação efetiva no sentido de confrontar-se ao processo de reformas iniciadas no
governo FHC. Observamos, já com certa distância, que naqueles quatro anos iniciais
foram implementadas ações pulverizadas e uma variedade de programas sociais
direcionadas, em grande parte, a um público específico. Para Oliveira (2009, p. 198):
Foi somente no último ano do primeiro mandato que, por meio da Emenda Constitucional n. 53, de 19/12/2006, atribuindo nova redação ao parágrafo 5º do art. 212 da Constituição Federal e ao art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, o governo criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB). O Fundo foi então regulamentado pela Medida Provisória n. 339, de 28/12/2006, que foi convertida na Lei n. 11.494, de 20/06/2007, estabelecendo finalmente o FUNDEB e ampliando, em relação ao Fundo anterior – o Fundo de Financiamento e Manutenção do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, o FUNDEF1 –, o principal mecanismo de financiamento da educação básica, compreendendo agora suas três etapas: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, com duração prevista para 14 anos.
Pode-se, por conseguinte, considerar que durante os mandatos do governo
Lula houve iniciativas importantes e significativas no que se refere à implementação
de políticas regulares de educação, visando a recuperação da função de
protagonista do Estado Federal como promotor de políticas para a área. O
protagonismo do Estado nesse setor se materializou, principalmente, na diminuição
das diferenças regionais e na tentativa de recentralizar, não como uma
contrarreforma, a sua função com respeito à educação, dirimindo os desequilíbrios
ocorridos na década passada, como revelou alhures esse texto, que trouxe ganhos e
perdas.
Para exemplificar isso acreditamos que o FUNFEB, ao ser instituído, pode ser
considerado um avanço para a área, por corrigir as arestas deixadas pelo FUNDEF,
como um fundo que cobre a educação básica. Além disso, ressalta Oliveira (2009, p.
208), que:
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A firme defesa do MEC em relação à regulamentação do piso nacional salarial dos professores de educação básica no Brasil pode ser apontada como uma tentativa política de recuperação do mencionado protagonismo. Na mesma direção, podemos considerar o esforço para a organização da Conferência Nacional de Educação – CONAE, tendo como tema a construção de um sistema nacional de educação articulado.
Destarte, como se pôde observar, no governo Lula a educação e,
fundamentalmente, as políticas educacionais foram marcadas por valores contrários
e, portanto, com características de rupturas em relação ao governo FHC e por
políticas que revelaram continuações da linha adotada pelo mesmo governo.
Entretanto, observa Oliveira (2009, p. 208), que a realização do CONAE no ano de
2010, estabeleceria prioridades e compromissos que ultrapassariam o governo Lula,
por envolver segmentos e setores significativos da sociedade no debate que
discutiriam a respeito dos rumos da educação brasileira nos governos que o
sucederiam.
UNIDADE 3 – POLÍTICA EDUCACIONAL NO CONTEXTO DO
NEOLIBERALISMO
Como já revelado no corpo deste trabalho, vivenciamos um amplo processo
de redefinição global das esferas política, pessoal e social, no qual complexos e
eficientes mecanismos de representação e significação são utilizados para criar e
recriar um ambiente favorável à perspectiva social e à política neoliberal. Mais do
que a reestruturação das esferas econômica, política e social, o que está em jogo é
a redefinição e a reelaboração das próprias formas de significação e representação
social.
A estratégia neoliberal de conquista hegemônica extrapola o campo
educacional, embora ocupe sempre destaque, pois a educação e as políticas
educacionais dependem das características e do poder dos grupos hegemônicos e
não só das condições políticas de uma conjuntura histórica.
Esse processo de reestruturação, citado acima, deve ser entendido como
uma nova fase do capitalismo. A partir da década de 1970, o mundo passou a
presenciar uma crise do modo de produção capitalista, que levou a transformações
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na produção da vida material objetiva e subjetiva. Tais mudanças “ocorrem na esfera
do Estado, da produção, do mercado e também no âmbito ideológico-político-
cultural, em consequência dos processos de Reestruturação Produtiva, da
Globalização e do Neoliberalismo” (PERONI, 2006, p. 11).
A crise estrutural do capital – que no auge do fordismo8 e do keysianismo9
manifestou um período próspero de acumulação de capital impulsiona, entre os anos
de 1970 a 1990, uma gama de mudanças sócio-históricas capazes de afetar
substancialmente a estrutura social. Assim, a implementação de um vasto processo
de reestruturação do capital afeta de forma contundente o mundo do trabalho, ao
alterar profundamente a maneira com que se encontra organizada a classe dos
trabalhadores assalariados.
Antunes (2000, p. 23) ressalta que essas modificações foram tão intensas,
que a “classe que vive do trabalho” viveu a mais intensa crise do século, uma vez
que tanto a materialidade como a subjetividade foram afetadas, transformando o
modo de ser dessa classe. Nesse contexto, o mundo do trabalho nas suas formas de
inserção na estrutura produtiva, assim como nas formas de representação política e
sindical, também sofreu transformações profundas.
Nessa perspectiva, a educação se apresenta como um veículo eficaz de
efetivação das exigências do modelo neoliberal, pois como ressaltam Gentili e Silva
(1995), há estratégias específicas para a educação institucionalizada. E é essa
relação entre política educacional e modelo neoliberal, no contexto do modo de
produção capitalista no processo da globalização, que pretendemos analisar neste
texto.
8Conjunto de métodos de racionalização de produção elaborado pelo industrial norte-americano
Henry Ford, baseado no princípio de que a empresa deveria adotar a verticalização, chegando a dominar não apenas as fontes das matérias-primas, mas até o transporte dos seus produtos. Para reduzir os custos a produção deveria ser em massa, e dotada de tecnologia capaz de desenvolver ao máximo a produtividade de cada trabalhador. O trabalho deveria ser também altamente especializado, cada operário realizando apenas um tipo de tarefa. E para garantir a elevada produtividade, os trabalhadores deveriam ser bem remunerados e as jornadas de trabalho não deveriam ser muito longas. SANDRONI. Paulo. Novíssimo Dicionário de Economia. São Paulo: Editora Best Seller, 2002, p. 250. 9 Modalidade de intervenção do Estado na vida econômica, com a qual não atinge a totalmente a
autonomia da empresa privada, e que prega a adoção, no todo ou em parte, das políticas sugeridas na principal obra de Keynes, Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda. Tais políticas propunham solucionar o problema do desemprego pela intervenção estatal, desencorajando o entesouramento em proveito das despesas produtivas, por meio da redução das taxas de juros e do incremento dos investimentos públicos. As propostas da chamada “revolução keynesiana” foram feitas no momento em que a economia mundial sofria o impacto da Grande Depressão, que se estendeu por toda a década de 30 até o início da II Guerra Mundial. (SANDRONI, 2002, p. 324).
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3.1 Política educacional no contexto do capitalismo e do
neoliberalismo
O liberalismo – ainda que seja uma palavra ambígua no vocabulário
econômico e político – designa uma filosofia política, fundada no valor da liberdade
individual, mas descreve igualmente um conjunto de princípios ideológicos, que
identifica uma perspectiva de análise diante dos processos e mecanismos que
orientam o funcionamento da economia ocidental.
Esses princípios têm a sua origem e seu fundamento no liberalismo clássico,
que se caracteriza por uma perspectiva de mundo que remonta, pelo menos, até
Adam Smith.10 Contudo, pode-se afirmar que os princípios basilares do liberalismo
foram formulados ao longo do século XVIII com [...] “os teóricos do Direito Natural
como os pensadores que representam os antecedentes do pensamento político
liberal, preocupados com a problemática da natureza e organização do poder em um
momento em que se produziam transformações sociais.” (BIANCHETTI, 1996, p.
47).
Tais princípios podem ser assim sintetizados:
O indivíduo é a fonte de seus próprios valores morais. Portanto, com
um compromisso irrestrito com a liberdade pessoal, que supõe a não
intervenção na busca de suas metas privadas;
[...] “uma política de estrita liberdade econômica, que habitualmente se
denomina laissez faire”11;
10
Provavelmente Kircaldy, Fife, 5 de junho de 1723 – Edimburgo, 17 de julho de 1790. Economista escocês, um dos mais eminentes teóricos da economia clássica. Entre 1764-1766 morou na França, convivendo com Quesnay, Turgot e outros. Ao retornar a seu país, a preocupação com os fatores que produziriam o aumento da riqueza da comunidade, o levaria a escrever, em 1776, sua obra célebre, A Riqueza das Nações: investigação sobre sua Natureza e suas Causas. A publicação do livro coincidiu com a Revolução Industrial e satisfazia aos interesses econômicos da burguesia inglesa. Nele, Smith exalta o individualismo, considerando que os interesses individuais livremente desenvolvidos seriam harmonizados por uma “mão invisível” e resultariam no bem-estar coletivo (SENDRONI, 2002, p. 565). 11
Laissez-faire. Um termo francês que em tradução aproximada significa “permissão para fazer”, conta com duas principais definições sociológicas. É associado à descrição de Adam Smith sobre o papel ideal do Estado em relação ao capitalismo, que implica nada fazer e deixar que os capitalistas e os mercados regulem a si mesmos. Segundo o capitalismo do laissez-faire, a competição (concorrência) assegura que os bens que indivíduos querem comprar serão produzidos em
40
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Uma doutrina do governo limitado e restringido a garantir as funções
básicas de organização e funcionamento da sociedade, de maneira
especial, a liberdade, a segurança e a justiça.
Todavia, o Liberalismo Clássico entrou em crise já nos fins do século XIX e,
particularmente nos EUA e no Reino Unido, o termo liberal começou a ser
empregado com frequência para descrever um liberalismo intervencionista ou social.
Ainda que liberal no sentido político, chegou a identificar-se com aquele que
assumiu propensão pela intervenção do Estado para corrigir, de maneira particular,
as injustiças sociais, uma vez que o Estado de Bem-Estar incorporava [...] “critérios
outros que aqueles de mercado, isto é, critérios sobre a utilidade social de certos
bens, a necessidade de padrões mínimos de saúde e educação, em suas decisões
relativas à produção, à locação e consumo de bens.” (BIANCHETTI, 1996, p. 32).
O Estado de Bem-Estar, porém, deve ser compreendido como um conjunto de
medidas e ações públicas que procuravam garantir a todos os cidadãos de uma
nação o acesso a um mínimo de serviços públicos capazes de melhorar ou
potencializar suas condições de vida. Tal conjunto de ações, referentes à
intervenção direta das estruturas públicas na melhoria do nível da população e ao
fato de que tais ações são reivindicadas pelos cidadãos como direito, devem ser
situadas nos 20 e 30 do século XX.
A Primeira Guerra Mundial, como mais tarde a Segunda, permite
experimentar a maciça intervenção do Estado, tanto na produção (indústria bélica)
como na distribuição (gêneros alimentícios e sanitários). Mas, a grande crise de
1929 - o pior e o mais extenso período de recessão econômica do século XX,
caracterizada por uma crise de superprodução, onde a oferta (mercadorias) era
maior que a demanda (consumidores) -, com as tensões sociais criadas pela inflação
e pelo desemprego provocam, em todo o mundo ocidental, um intenso aumento dos
gastos públicos para a sustentação do emprego e das condições de vida dos
trabalhadores. Para Bobbio (2000, p. 417):
O aumento do déficit público provoca instabilidade econômica,
inflação, instabilidade social, reduzindo consideravelmente as
possibilidades da utilização do Welfare em função do assentimento ao
abundância e vendidos aos preços que estão dispostos a pagar. In. JOHNSON. Allan G. Dicionário de Sociologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997, p. 134.
41
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sistema público. Alguns Estados são obrigados a limitar a intervenção
assistencial, quando o aumento da carga fiscal gera em amplos
estratos da opinião pública uma atitude favorável à volta à
contribuição baseada no princípio contratualista.
O Estado de Bem-Estar, ou Estado assistencial, pode ser definido, à primeira
análise, como Estado que garante tipos mínimos de renda, alimentação, saúde,
habitação, educação, assegurados a todo o cidadão, não como caridade, mas como
direito político. Essa orientação política predominou até meados dos anos sessenta
(1960), quando se constata uma considerável quebra da separação entre sociedade
(ou mercado, ou esfera privada) e o Estado (ou política, ou esfera pública), tal como
era constituída na sociedade liberal. E nova relação que se estabelece entre “o
Estado e a sociedade é entendida em termos de equilíbrio, de compromisso e de
coexistência pacífica, se bem que com o rompimento da separação” (Bobbio, p.
418).
A crise fiscal do Estado é tida como um vestígio do antagonismo natural entre
as duas funções do Estado assistencial: “o fortalecimento do consenso social, da
lealdade para com o sistema das grandes organizações de massa, e o apoio à
acumulação capitalista com o emprego anticonjuntural da despesa pública” (Bobbio,
p. 418). Por isso, a singular relação estabelecida entre Estado e sociedade pelo
Welfare State deixa de ser entendida em termos de equilíbrio, mas como elemento
que levará à natural eliminação de um dos dois polos.
As causas dessa crise não devem, porém, ser interpretadas de maneira
uníssona. Há um grupo de pensadores, entre os quais Habermas (1973), que
sustentam a posição de que o Estado assistencial traz como resultado a estatização
da sociedade. Assim, “trabalho, rendimento, chances de vida não são mais
determinados pelo mercado, mas por mecanismos políticos que objetivam a
prevenção dos conflitos, a estabilidade do sistema, o fortalecimento da legitimação
do Estado.” (BOBBIO, 2000, p. 418).
A vontade política não se forma mais pelo livre jogo das associações na
sociedade civil, mas se solidifica através de mecanismos institucionais que atuam
como filtro na seleção das solicitações funcionais ao sistema. Partidos, sindicatos e
Parlamento operam como organismos dispensadores de serviços, trocando-os pelo
apoio politicamente disponível (Bobbio, 2000, p. 419).
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Por outro lado, a crise do Estado de bem-estar pode ser compreendida como
um processo de socialização do Estado. Nessa perspectiva, o Estado assistencial
difundiu, segundo Bobbio (2000, p. 419), uma ideologia igualitária que:
Tende a deslegitimar a autoridade política; a disposição do Estado a
intervir nas relações sociais provoca um enorme aumento nas
solicitações dirigidas às instituições políticas, determinando a sua
paralisia pela sobrecarga da procura; a competição entre as
organizações públicas leva à impossibilidade de selecionar e
aglutinar os interesses, causando a total permeabilidade das
instituições às demandas mais fragmentadas.
Nesse contexto, a saída da crise fica entregue à capacidade de resistência
das instituições, à sua autonomia em face das pressões de grupos sociais numa
perpétua atitude reivindicativa. Esse panorama afeta o Estado benfeitor na sua
natureza e no seu fundamento, por causa da crise econômica e política que se
instala nessa década, mudando de maneira radical a perspectiva da necessidade da
intervenção do Estado.
Nessa conjuntura é que se insere a implementação de um novo e amplo
processo de reestruturação do capital, com vistas a recuperar o seu ciclo produtivo,
afetando intensamente o mundo do trabalho ao promover mudanças significativas na
forma de organização da classe dos trabalhadores assalariados. Juntamente com o
Estado Benfeitor entra em decadência o modelo de produção taylorista/fordista que
vigorou na grande indústria ao longo do século XX. Assim, após um período bem
sucedido de acumulação de capitais, entre os anos de 1950 e 1960 que
correspondem, igualmente, à crise do fordismo e do keysianismo, o capital passa a
dar mostras de um quadro crítico, que pode ser observado por alguns elementos
como:
A tendência decrescente da taxa de lucro decorrente do excesso de
produção; o esgotamento do padrão de acumulação
taylorista/fordista de produção; a desvalorização do dólar, indicando
a falência do acordo de Breeton Woods; a crise do Welfare State ou
do “Estado de Bem-Estar Social”; a intensificação das lutas sociais
(com greves, manifestações de rua) e a crise do petróleo que foi um
fator que deu forte impulso a esta crise. (PEDROSO, 2004, p. 1).
O método de produção desse modelo pautava-se na separação entre
gerência, concepção, controle e execução. O que havia em especial em Henry Ford
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e que torna possível a distinção do fordismo (marcado pela categoria tempo) do
taylorismo (marcado pela concepção de série) era o seu reconhecimento explícito de
que a produção em massa significava consumo em massa, um novo sistema de
reprodução da força de trabalho, uma nova política de controle e gerência do
trabalho, em suma, um novo tipo de sociedade democrática e racionalizada (Idem,
2004). Ford lança, assim, os fundamentos de um sistema em que os próprios
trabalhadores deveriam ser considerados também em consumidores e não apenas
como mão de obra empregada no limite de suas possibilidades. Assim, em síntese,
salienta Pedroso (2004) que:
Podemos afirmar que o sistema taylorista/fordista caracteriza-se pelo: padrão de acumulação em massa, objetivando reduzir custos de produção bem como ampliar o mercado consumidor; produção homogeneizada e enormemente verticalizada obedecendo à uniformidade e padronização, onde o trabalho é robotizado, disciplinado e repetitivo; parcelando as tarefas, o que conduzirá o trabalho operário à desqualificação.
Repetir a mesma operação mecânica várias vezes por dia, não conduzia e,
tampouco, incentivava qualquer crescimento intelectual, provocando inclusive a
insatisfação com o trabalho, uma vez que não havia um processo de identificação
com ele. O fordismo, então, estimulava o estranhamento entre trabalhador e
trabalho.
Nesse ambiente, muitas insatisfações emergem dos indivíduos devido à
rigidez deste modo de produção, uma vez que esse comportamento implicava a
intensificação de trabalho extenuante e a eliminação do saber do indivíduo como
elemento constitutivo do processo de trabalho. Constata-se, a partir de então, “um
movimento generalizado de lutas e resistências nos locais de trabalho, que havia se
desqualificado e mesmo destruído o saber daqueles trabalhadores de ofício, que
tinham um determinado controle e autonomia no seu trabalho” (PEDROSO, 2004, p.
2). A emergência da contradição entre autonomia e heteronomia, própria do
processo de trabalho fordista, adicionada pela contradição entre produção e
consumo, intensificava os pontos de saturação deste modelo.
Por conseguinte, os movimentos sociais, as mobilizações nas ruas e nas
fábricas, tornam o fordismo improdutivo. Por isso, à medida que crescia o
acirramento das lutas de classes e a recusa dos trabalhadores a submeterem-se à
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gestão fordista, implicava, igualmente, numa crise do regime de acumulação
intensiva, possibilitando a visualização de uma crise de caráter estrutural.
Da crise do modelo fordista, nasce um novo modelo, fundamentado em
fórmulas inovadoras no objetivo de superar as falhas do taylorismo/fordismo. Esse
modelo, chamado de toyotismo, estrutura-se a partir de um número mínimo de
trabalhadores, ampliando-os, através de horas extras, trabalhadores temporários ou
subcontratação, dependendo das condições de mercado. O toyotismo é uma
resposta à crise do fordismo nos anos 1970. Ao invés do trabalho desqualificado, o
operário torna-se polivalente. Ao invés da linha individualizada, ele se integra em
uma equipe. Ao invés de produzir veículos em massa para pessoas que não
conhece, ele fabrica um elemento para a satisfação da equipe que está na
sequência da sua linha. (ANTUNES, 2000, p.36).
O modelo toyotista elabora um discurso voltado para a valorização do
trabalho em equipe, da qualidade no e do trabalho, da multifuncionalidade, da
flexibilização e da qualificação do trabalhador. Oculta, porém, retomando a posição
de Mézáros (1995), a exploração, a intensificação e a precarização do trabalho,
inerentes à busca desenfreada do lucro pelo sistema de metabolismo social do
capital, que, por não ter limites, configura-se como ontologicamente incontrolável.
Nessa nova etapa do modo de produção capitalista, o Estado deixa de ser a
solução e passa a ser o problema, porque segundo seus críticos, esta instituição
para legitimar-se, atendendo as necessidades da população via políticas sociais,
gastou mais do que devia provocando uma crise fiscal. Também, porque, “ao
regulamentar a economia, atrapalhou o livre andamento do mercado.” (PERONI,
2006, p. 13).
Desse modo, a ideologia do neoliberalismo emerge como uma reação política
e teórica enfática contra o Estado de Bem-Estar ou intervencionista e à necessidade
de se implementar um amplo processo de reestruturação do capital, com vistas a
recuperar o seu ciclo de produção nascidos também da crise do modelo
fordista/taylorista, que promoveram mudanças importantes na forma de organização
do trabalho. Foi de Frederich Hayek o texto – O Caminho da Servidão - escrito em
1944, que forneceu as bases teóricas do neoliberalismo. Do ponto de vista político-
ideológico, neoliberalismo é uma “superestrutura ideológica e política que
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acompanha uma transformação histórica do capitalismo moderno” (THERBORN,
1995, p. 39).
O neoliberalismo é um corpo de doutrina coerente, “autoconsciente, militante,
lucidamente decidido a transformar todo o mundo à sua imagem, em sua ambição
estrutural e sua extensão internacional” (ANDERSON, 1995, p. 22). Ou seja, um
programa de reformas e ajustes estruturais de efeito ampliado pelo monopólio da
ciência e das novas tecnologias, o que possibilitou uma expansão do capital até
atingir a atual etapa de globalização. (CORRÊA, 2000, p. 39).
O texto Hayek trata-se “de um ataque apaixonado contra qualquer limitação
dos mecanismos de mercado por parte do Estado, denunciando como uma ameaça
letal à liberdade, não somente econômica, mas também política” (ANDERSON,
1995, p. 9). Dessa forma, torna-se evidente que a pretensão de Hayek, e dos
participantes da Sociedade Mont Pèlerin12, era combater o keynesianismo e o
solidarismo que imperavam, a fim de preparar os fundamentos de um capitalismo
diferente, totalmente livre de regras para o futuro. Para esse teórico, o igualitarismo
promovido pelo Estado de Bem-Estar “destruía a liberdade dos cidadãos e a
vitalidade da concorrência, da qual dependia a prosperidade de todos.”
(ANDERSON, 1995, p. 10).
Durante um período considerável essas ideias ficaram em latência, mas a
partir da década de 1970 chega a crise do modelo econômico pós-guerra, fazendo o
mundo capitalista avançado cair numa profunda e longa recessão. Para o
neoliberalismo, as políticas sociais implementadas no Estado de Bem-Estar Social,
12
A sociedade do Mont Pélerin foi fundada em 1947 pelo economista austríaco August Friedrich von Hayek. Ensinou na universidade de Chicago. Recebeu o Prêmio Nobel de Economia em 1974, depois cinco dos seus alunos sucessivamente foram honrados igualmente pelo júri Nobel. A sociedade do Mont Pélerin tira o seu nome da estância suíça próxima de Montreux. Reúne-se em sessão uma semana por ano, de cada vez numa cidade diferente. Em 1994, em Cannes, participaram cerca de quatrocentas e cinquenta personalidades. Este clube muito fechado felicita-se de contar com Margaret Thatcher e Alain Madelin entre os seus membros. O seu presidente actual é um francês, o professor Pascal Salin (Paris-Dauphine), sucedeu a Edwin J. Feulner (presidente de The Heritage Foundation). As teorias ditas «libertarianas» de Hayek, estigmatizam as políticas de reactivação do consumo que, segundo ele, distorceriam os preços e provocariam a prazo um desemprego em massa. Compreendem também uma espécie de antropologia. Hayek denuncia o imobilismo da ordem natural assim como utopias que pretendem «do passado fazer tábua rasa». Opõe-lhes o mercado como único modo de melhoria da ordem natural, logo como única fonte de progresso. Em matéria constitucional, Hayek desenvolve um esquema original. As instituições seriam compostas de duas assembleias: a primeira, de vocação legislativa, votaria as receitas do orçamento; enquanto a segunda, de vocação executiva, votaria as despesas. (http://www.infoalternativa.org/mundo/mundo176.htm. Acesso em 06/09/2008 às 16h15).
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baseadas numa maior distribuição de renda, se constituem num saque à
propriedade privada, “além de serem um obstáculo ao livre andamento do mercado,
visto que os impostos oneram a produção.” (PERONI, 2006, p. 13).
Assim, o surgimento do neoliberalismo, nesse período, principalmente nos
países capitalistas desenvolvidos, deve ser compreendido com base em algumas
condições históricas, tais como: as figuras políticas de Margareth Thatcher na Grã-
Bretanha e Ronald Reagan nos EUA, a crise pela qual passava a economia mundial
no contexto da gênese do neoliberalismo e a crise do petróleo, que corroborou para
a recessão econômica.
Os governos Tatcher contraíram a emissão monetária, elevaram as taxas de
juros, baixaram drasticamente os impostos sobre os rendimentos altos, aboliram
controles sobre os fluxos financeiros, criaram níveis de desemprego massivos,
impuseram uma nova legislação antissindical e cortaram os gastos sociais. E,
finalmente, esta foi uma medida surpreendentemente tardia, “se lançaram num
amplo programa de privatização, começando por habitação pública e passando em
seguida a indústrias básicas como o aço, a eletricidade, o petróleo, o gás e a água.”
(ANDERSON, 1995, p. 12).
Por sua vez, Ronald Reagan, na sua política interna, também reduziu os
impostos em favor dos ricos, elevou as taxas de juros e reprimiu greves. Mas,
decididamente, “não respeitou a disciplina orçamentária; ao contrário, lançou-se
numa corrida armamentista sem precedentes, envolvendo gastos militares enormes,
que criaram déficit público muito maior do que qualquer outro presidente da história
norte-americana.” (ANDERSON, 1995, p. 12).
Nesse caso específico, a prioridade liberal se referia mais a competição militar
com a União Soviética, concebida como uma estratégia para destruir a economia
soviética, ao mesmo tempo em que buscava derrubar o regime comunista na
Rússia.
Por fim, é atribuído à intervenção do Estado o desemprego em massa e a
debilidade do crescimento, uma vez que se começa, então, a [...] “manifestar-se um
estancamento econômico, acompanhado de um processo de estagflação13, que
13
Situação na economia de um país na qual a estagnação ou o declínio do nível de produção e emprego se combinam com uma inflação acelerada. O fenômeno contraria a teoria clássica segundo a qual a inflação tenderia a declinar com o aumento do desemprego. Fenômeno típico do pós-guerra,
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reflete a existência de problemas estruturais no padrão de acumulação do
crescimento.” (BIANCHETTI, 1996, p. 29).
Esse cenário corrobora com a posição de Milton Friedman, para quem [...] “a
intervenção governamental é maléfica em si, afinal os grandes avanços da
civilização (...) nunca vieram de governos centralizados.” (FRIEDMAN, 1985, p. 13).
Assim, fica exposta, à crítica, o fracasso das políticas estatais, colocando em
questão a eficiência do setor público na produção de serviços sociais.
No entanto, a crítica mais severa ao Estado keynesiano se referia aos gastos
públicos, resultado imediato da política estatal, que interferia no processo de
crescimento e no funcionamento do mercado, uma vez que incentivava as ações
sociais e, portanto, coletivas, capazes de inverter o centro do funcionamento do
mercado, que tende a potencializar e incentivar a ação de agentes individuais,
considerados centrais no sistema econômico.
Tal crítica evidencia sub-repticiamente o objetivo fundamental da política
econômica neoliberal, que é a de criar as condições de possibilidade para o
funcionamento flexível do mercado, eliminando os obstáculos que se impõem à livre
concorrência.
Historicamente, a regulação das relações de trabalho esteve fortemente
ancorada ao Estado. Por essa razão, sua retirada do mercado de trabalho suscitou
uma situação de turbulência moral. (BEYNON, 1998, p. 36). As reformas neoliberais
adquiriram várias formas e matizes, mas alguns elementos estiveram presentes em
todas elas: assim como a “remercantilização da força de trabalho, a contenção ou
desmontagem dos sindicatos, a desregulação dos mercados de trabalho e a
privatização de muitos serviços sociais que estiveram previamente em mãos do
Estado.” (FIORI, s/d, p. 13). Dessa maneira, pode-se dizer que “governos neoliberais
propõem noções de mercados abertos e tratados de livre comércio, redução do setor
público e diminuição do intervencionismo estatal na economia e na regulação do
mercado.” (GENTILI, 2001, p. 114).
Ao fazer sua a teoria do livre câmbio e apoiando-se em ideologias várias, para
justificar sua visão de mundo como um grande mercado, o neoliberalismo imprime
uma percepção de que todas as pessoas e países podem competir nas mesmas
a estagflação tem se acentuado em quase todas as economias capitalistas desenvolvidas depois da chamada crise do petróleo (1973-1975). (SANDRONI, 2002, p. 221).
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condições de igualdade, segundo suas próprias possibilidades. Como se depreende,
o que caracteriza fundamentalmente o neoliberalismo é o alargamento do raio de
ação da lógica do mercado.
Portanto, a ideia do Estado Mínimo é uma consequência da utilização da
lógica do mercado em todas as relações sociais, que não podem ser reduzidas, ou
diminuídas ao aspecto econômico somente. A ideia de Estado Mínimo pressupõe um
deslocamento das atribuições do Estado perante a economia e a sociedade.
Preconiza-se a não intervenção, e este afastamento em prol da liberdade individual
e da competição entre os agentes econômicos, segundo o neoliberalismo, é o
pressuposto da prosperidade econômica. A única forma de regulação econômica,
portanto, deve ser feita pelas forças do mercado, as mais racionais e eficientes
possíveis.
Ao Estado Mínimo cabe garantir a ordem, a legalidade e concentrar seu papel
executivo naqueles serviços mínimos necessários para tanto: policiamento, forças
armadas, poderes executivo, legislativo e judiciário, etc., abrindo mão, portanto, de
toda e qualquer forma de atuação econômica direta, como é o caso das empresas
estatais. A concepção de Estado mínimo surge como reação ao padrão de
acumulação vigente durante grande parte do século XX, em que o Estado financiava
não só a acumulação do capital, mas também a reprodução da força de trabalho, via
políticas sociais.
Na medida em que este Estado deixa de financiar esta última, torna-se, ele
próprio, “máximo” para o capital. O suporte do fundo público (estatal) ao capital não
só não deixa de ser aporte necessário ao processo de acumulação, como também
ele se maximiza diante das necessidades cada vez mais exigentes do capital
financeiro internacional. O Estado Mínimo, nesse sentido, deve ser entendido como
uma concepção fundada nos pressupostos da reação conservadora que deu origem
ao neoliberalismo.
Esse cenário nos permite dizer que o Estado capitalista foi criado pela
burguesia para reproduzir na sua estrutura e funcionamento as características das
relações sociais e econômicas que constituem este modo de produção. O Estado se
constitui como um complexo de práticas e teorias que justificam e mantêm o
domínio, ao mesmo tempo em que conquista o consentimento daqueles sobre os
quais exerce o domínio.
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Nessa perspectiva, as políticas sociais se apresentam como estratégias
promovidas pela classe hegemônica para implantar e desenvolver determinado
modelo social. “Estas estratégias se compõem de planos, projetos e diretrizes
específicas em cada área de ação social.” (BIANCHETTI, 1996, p. 88). Portanto,
podem estar em estreita relação com as necessidades e os interesses de
concentração de capital.
Por conseguinte, o projeto neoliberal, que se apresenta fundamentalmente
conservador, supõe a elaboração de um espaço que torne possível pensar o
econômico, o social e o político dentro, unicamente, das categorias que justificam o
arranjo social capitalista. Tal ofensiva necessita ser vista, sobretudo, como uma luta
para criar categorias próprias, noções e terminologias por meio dos quais se podem
nomear a sociedade e o mundo.
E mais, a assimilação de tais terminologias e noções, tais como: qualidade
total, adequação do ensino à competitividade do mercado internacional,
modernização da escola, “nova vocacionalização, incorporação das técnicas e
linguagens da informática e da comunicação, abertura das universidades aos
financiamentos empresariais, pesquisas práticas, utilitárias e produtividade.” (SILVA
JÚNIOR, 1996, p. 42), são capazes de imprimir uma performatividade, ou seja, um
jeito de ser, agir e ver o mundo naqueles que incorporam tais terminologias e
noções. Essa lógica, perceptivelmente excludente, precisa, para sua perpetuação e
funcionamento, ser internalizada e assumida como perspectiva única das pessoas.
Para tanto, necessita de veículos que disseminem esta representação de mundo.
3.2 As Políticas Educacionais como mediadoras do processo de
reprodução do modelo neoliberal
É inegável que os processos sociais mais abrangentes de reprodução do
modo de produção capitalista e os processos educacionais encontram-se
intrinsecamente unidos. À educação sempre coube a função histórica de mediar os
projetos políticos que tanto podem ser “democráticos como autoritários, includentes
ou de exclusão das maiorias e, portanto, local onde se articulam interesses diversos
50
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e antagônicos, local de disputa ideológica e de hegemonias.” (CORRÊA, 2000, p.
50).
A educação, por meio das políticas públicas, marcadas pelos interesses dos
grupos hegemônicos, e, portanto, marcada pela lógica do mercado, tem assumido o
papel de preparar cidadãos acríticos capazes, unicamente, de desempenhar funções
de perpetuação e acirramento de tal lógica.
Os indivíduos, na medida em que internalizam o valor mercantil e as relações
mercantis como padrão dominante de interpretação de mundo possíveis, “aceitam –
e confiam – no mercado como o âmbito em que, “naturalmente”, podem – e devem –
desenvolver-se como pessoas humanas.” (GENTILLI, 1995, p. 228).
A “mercantilização de tudo” nessa fase do capitalismo implica atingir os
homens, suas relações e práticas sociais – suas vidas, sua educação, suas
consciências, por meio de um processo de doutrinação neoliberal utilizando,
inclusive, as novas tecnologias de comunicação. Daí a importância, segundo Corrêa
(2000, p. 51), de compreender esse processo identificando os limites e
possibilidades de uma reelaboração das consciências no interior mesmo do
movimento hegemônico. O discurso neoliberal redesenha o cenário da vida social e
política a partir dos valores e princípios neoliberais a nível mundial, mas dentro das
particularidades locais e regionais.
O neoliberalismo é mais do que uma alternativa teórica, econômica, ético-
política, educacional porque constitui uma ideologia que ao ser introjetada pelo
senso comum “pode tornar-se hegemônica como se fosse a única leitura possível e
viável para os problemas criados pelo próprio capitalismo.” (CORRÊA, 2000, p. 41)
Ao invadir as consciências constrói um senso comum presidido pelos valores
neoliberais, desenvolvendo, assim, um processo de naturalização da exclusão e das
formas de violência contra grupos e populações deixadas à sua própria sorte.
Tal processo é implementado, inclusive, por escolas e movimentos de
tendência neoliberal que com unanimidade propagam a centralidade do econômico
como o “elemento estruturador das relações sociais, ou seja, a utilização das
categorias econômicas para analisar as relações sociais, o papel do Estado e da
política.” (CORRÊA, 2000, p. 41). Nesse contexto, a educação é transferida do
âmbito dos direitos para o âmbito privilegiado do mercado, transformando-a de um
direito social para um serviço, uma mercadoria que deve ser adquirida no livre
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mercado, uma vez que a educação é redefinida segundo a lógica do mercado pelas
reformas neoliberais.
Ainda para Corrêa (2000, p. 46), as políticas neoliberais de educação são
impostas por organismos nacionais e internacionais como o Banco Mundial e o FMI
(Fundo Monetário Internacional), dentre outros, que definem como o conjunto das
nações devem se ajustar à globalização do capital e ao neoliberalismo. A
interferência do Banco Mundial no âmbito educacional está se ampliando desde a
década de 1970, tanto pelo poder de suas orientações no sentido de produzir as
reformas educativas, como pelo volume dos recursos financeiros aplicados. Esse
ordenamento objetiva:
1. Adequar as políticas educacionais ao movimento de esvaziamento das
políticas de bem-estar social;
2. Estabelecer prioridades, cortar custos, racionalizar o sistema, enfim,
embeber o campo educativo da lógica do campo econômico;
3. Subjugar os estudos, diagnósticos e projetos educacionais a essa
lógica. (WARDE, 1998, p. 11). Essas reformas na educação ditadas pelo
Banco Mundial para o Brasil e vários países da América Latina:
[...] representam uma proposta articulada organicamente, um pacote de medidas a partir de uma ideologia neoconservadora e neoliberal, com um viés economicista no enfoque da educação, isto é, tratando a educação, a cultura e a política com a mesma teoria e metodologia de uma economia de mercado. A reforma educativa passou a ser entendida como restrita a uma reforma do sistema escolar, que precisa ser urgentemente mudado. (CORRÊA, 2000, p.47).
Essa orientação, porém, mascara a realidade, uma vez que a educação é
somente uma das expressões objetivas do modo como a sociedade produz e
reproduz a sua própria existência. E a ideologia liberal desconsidera as dimensões
estruturais das questões educacionais como a econômica, a ética, a política,
reduzindo-as somente a problemas administrativos. Essa realidade vale igualmente
para as esferas teóricas e epistemológicas, pois a educação e o conhecimento
também foram subordinados à lógica da produção e do mercado.
Na realidade, o papel da educação, neste contexto, é o de “produzir cidadãos
que não lutem por seus direitos e pela desalienação do e no trabalho, mas cidadãos
‘participativos’, não mais trabalhadores, mas colaboradores e adeptos do consenso
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passivo”. (FRIGOTTO, 1998, p. 48). O padrão mercantil promove o individualismo,
desmobiliza ações de solidariedade e de participação social, mas tranquiliza a
consciência uma vez que a lógica do modelo é considerada a lógica da natureza:
vence o mais capaz. (CORRÊA, 2000, p.41).
Dito de outra forma, a educação tornou-se uma peça no mecanismo de
acumulação do capital ao estabelecer consensualmente a reprodução do injusto
sistema de classes. Tornou-se mecanismo de perpetuação do sistema, ao invés de
instrumento da emancipação do homem. A necessidade de buscar a adesão, o
consentimento e a legitimação para as reformas neoliberais fizeram com que a
consciência adquirisse importância fundamental nesse vasto processo de
elaboração e consolidação da tendência hegemônica do neoliberalismo nestas
últimas décadas.
No entanto, apesar de usar várias formas para dificultar a luta para a
transformação dos homens e dessas perversas estruturas sociais vigentes, não
consegue impedir que surjam iniciativas contrárias à hegemonia do capitalismo
mundializado, como sistema político, econômico e social e da superestrutura
ideológica e política que o acompanha nesta fase de seu desenvolvimento histórico,
o neoliberalismo. Esse processo histórico e contraditório possibilita o surgimento de
formas contrárias de resistência a essa lógica.
O papel da educação é, assim, único, tanto para o planejamento de meios
adequados e apropriados para transformar as condições objetivas de reprodução,
como para a efetivação de uma mudança metabólica radical nos indivíduos, por
meio de uma automudança consciente. Portanto, não é surpreendente que na
concepção marxista a “efetiva transcendência da autoalienação do trabalho seja
caracterizada como uma tarefa inevitavelmente educacional.” (MÉSZÁROS, 2005, p.
15).
É por isso que hoje o sentido da mudança educacional radical não pode ser
outro senão o de perseguir de modo planejado e consistente uma estratégia de
rompimento do controle exercido pelo capital, com todos os meios disponíveis, bem
como com todos os meios ainda a serem inventados, e que tenham o mesmo
espírito, como salienta Mészáros (2005).
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UNIDADE 4 - ESTADO, EDUCAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS
A concepção de política e Estado em Marx pode ser contextualizada no
debate sobre a relação que se estabeleceu entre Estado e a nova sociedade
burguesa nascida na modernidade, depois que os
indivíduos se sentiram desobrigados em relação ao
antigo regime feudal e à implementação da dinâmica
produtivista do capital. Marx, desde o início, sustenta
que o Estado se constituiu originariamente calcado na
desigualdade e no conflito de classes gerado pelo
surgimento da propriedade privada, que tinha como
função precípua assegurar e conservar a dominação
e a exploração de classe.
Fonte: http://migre.me/8bILw
Para ele, o surgimento do Estado, com o seu caráter de classe e as
representações sobre as quais ele estava fundado, somente poderia ser
compreendido como uma fundação da sociedade civil e marcado pelo conjunto das
relações econômicas e interesses privados. Desse modo, o Estado foi criado pela
sociedade civil para ser seu instrumento, visando garantir as próprias bases sobre as
quais se assentava.
O Estado burguês, nesse sentido, estava disposto, de tal modo, a proteger as
relações capitalistas de produção, assegurando o domínio do capital sobre o
trabalho, “a reprodução ampliada do capital, a acumulação privada do produto
social, a redistribuição do fundo público em benefício do capital, a exploração da
renda fundiária, etc.” (BARBOSA, 2004, p. 10).
O Estado seria, portanto, ao mesmo tempo, parte integrante das relações
capitalistas de produção e instrumento de defesa das mesmas. Com a publicação
das obras Ideologia Alemã e o Manifesto do Partido Comunista, em 1846-1847, Marx
avança em sua concepção de Estado, afirmando, no início do Manifesto, que a
história das sociedades que existiram é a manifestação da história das lutas de
classe.
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Marx passa a reconhecer no Estado uma entidade marcada pela competição
entre as classes em conflito que buscam, por meio da disputa, fazer valer seus
interesses, apresentando uma característica de classe necessária em decorrência
de a sociedade encontrar-se socialmente antagonizada pelo advento da propriedade
privada e das classes sociais, concluindo que:
Homens, livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, mestre de corporação e companheiro, numa palavra, opressores e oprimidos, em constante oposição, têm vivido numa guerra ininterrupta, ora franca, ora disfarçada; uma guerra que terminou sempre, ou por uma transformação revolucionária da sociedade inteira, ou pela destruição das suas classes em luta. (MARX; ENGELS, 1983, vol. I, p. 22).
Cabe, assim, ao Estado administrar as contradições que são constitutivas da
sociedade e dele próprio, uma vez que se apresenta impossibilitado de superá-las.
Se as pode suprimir do plano formal, não pode do plano real, mantendo-as sob
controle, como um poder que, emanado da sociedade, põe-se acima dela, mas
estranhando-se cada vez mais em relação a ela.
Ao acentuar suas análises acerca da gênese do Estado, que emerge sob
relações capitalistas de produção e em situações históricas, Marx remete para seu
caráter de classe e para sua determinação material e histórica, reconhecendo nele,
porém, uma instituição acima de todas as outras, capaz de assumir uma margem de
relativa independência em relação às classes em conflito, com vista a salvaguardar
as relações de produção capitalista.
O Estado se expressa como violência concentrada e organizada da
sociedade, revelando a relação tensa entre sociedade civil (conjunto das relações
econômicas) e sociedade política (Estado). Nessa perspectiva, o Estado se institui
como a expressão das formas contraditórias das relações de produção que se
arraigam na sociedade civil, tornando-se delas parte necessária, tendo nelas sua
origem, determinando, em última instância, as ações do Estado.
O Estado exerce uma violência, mas no nível da aparência do modo de
produção capitalista funciona como contraviolência, uma vez que ele somente pode
preservar a aparência fazendo recurso da violência ao impor, de forma dissimulada,
a igualdade na desigualdade. Não obstante, a violência se manifesta no interior
dessa sociedade, ainda que sua aparência se realize como contraviolência,
ocultada.
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4.1 Definição de política e política educacional
A sociedade se constitui pelas relações sociais que são marcadas pela fase
de desenvolvimento das forças de produção que sintetizam a totalidade de
conhecimentos, tecnologias e correlações de forças de cada momento histórico. É
das lutas travadas entre indivíduos, grupos e classes sociais que decorrem o Estado
e a educação, assim como sua forma, conteúdo e qualidade.
Isso significa dizer que se “a sociedade é dinâmica, o Estado e a educação
também o são e, em função disso, configuram-se de forma diferente em cada
contexto histórico. Portanto, para compreendê-los, precisamos situá-los como
expressão do movimento da sociedade, fugindo das concepções abstratas e a-
históricas.” (ZANARDINI; ORSO, 2008, p. 102).
O Estado é o reino da força; não é o reino do bem-comum, mas do interesse
de uma parte. Daí a possibilidade de usar a palavra política para referir-se a toda
modalidade de direção de grupos sociais que envolva poder, administração e
organização. Quando falamos em política, no entanto, as pessoas comumente
imaginam um espaço que diz respeito apenas ao Estado e a pessoas qualificadas
que estariam investidas da capacidade de decidir em relação à administração da
cidade. Portanto, imaginam um espaço extrínseco e externo à sua vida cotidiana.
Esta imagem de política, porém, não corresponde às sociedades
democráticas, mas a sociedades autoritárias onde as pessoas estão acostumadas a
ser amparadas sem poder interferir efetivamente nos destinos da coletividade. Tanto
isso é verdade “que muitos consideram que apenas certas pessoas estão investidas
de poder (têm capacidade de agir, de produzir efeitos) e, por isso, decidem,
mandam, restando à maioria apenas a obediência.” (ZILLE, 2008, p. 19). O poder se
manifesta nas relações ou num conjunto de relações através das quais indivíduos ou
grupos sociais afetam as atividades de outros indivíduos ou de outros grupos.
Embora o termo política, por derivar de polis, signifique tudo o que se refere à
cidade e, por isso, a tudo o que é civil, urbano, público, recebeu outra conotação
depois da obra Política de Aristóteles.
Bobbio (1998, p. 954) observa que o conceito empregado em sua gênese,
para referir-se ao estudo das “coisas do Estado”, foi sendo mudado com o tempo,
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referindo-se sempre à práxis humana, mas vinculada agora a uma relação de poder
de um ou mais seres humanos sobre outros, realizada por algum tipo de interesse.
Bobbio (Idem, p. 955) avalia que:
Há várias formas de poder do homem sobre o homem; o poder político é apenas uma delas. Na tradição clássica, que remonta especificamente a Aristóteles, eram consideradas três formas principais de poder: o poder paterno, o poder despótico e o poder político. Os critérios de distinção têm sido vários [...] Em Aristóteles se entrevê a distinção baseada no interesse daquele em benefício de quem exerce o poder: o paterno se exerce pelo interesse dos filhos; o despótico, pelo interesse do senhor; o político, pelo interesse de quem governa e de quem é governado, o que ocorre apenas nas formas corretas de Governo.
Bobbio, neste fragmento, revela o caráter teleológico da política, uma vez
que, ao defender algum tipo de interesse, antevendo os resultados ideais, a
atividade política está voltada para um determinado fim. Por isso, o termo política
também é empregado para designar o conjunto de ações direcionadas para se
alcançar objetivos, que necessitam da participação efetiva do Estado para planejar e
executar ações coletivas, como as políticas sociais, políticas, econômicas, ligadas à
saúde, habitação, previdência social etc.
As políticas sociais, nesse sentido, são estratégias promovidas a partir do
nível político com a finalidade de imprimir um modelo social, compostas por planos,
projetos e diretrizes próprias para cada âmbito de ação social. No entanto, estas
políticas sociais assumem as características dos conflitos de interesses e das
correlações de forças, presentes ou não, em uma determinada sociedade. Em outras
palavras “ao constituir uma unidade, tanto a política econômica como a social podem
expressar mudanças nas relações entre as classes sociais ou nas relações entre
distintos grupos sociais existentes no interior de uma só classe.” (BIANCHETTI,
1999, p. 89).
As estruturas políticas são sempre usadas para a promoção de uma
determinada política social que possa atender os interesses estratégicos de um
grupo que, em uma determinada formação social, exerce a hegemonia. Essas
estratégias podem ser encontradas em sociedades capitalistas que promovem
políticas sociais com o objetivo de manter uma estreita relação com as necessidades
de acumulação do capital. Esta afirmação, segundo Bianchetti (1999, p. 89), “Não
pretende colocar essa razão como única, mas pretende mostrar a aceitação que
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essas políticas conseguiram em determinados momentos históricos e que contrasta
com as críticas inspiradas no modelo neoliberal”.
Em uma sociedade capitalista o Estado desempenha importante papel na
reprodução do modo ao agenciar suas políticas sociais na direção da acumulação
do capital. Isto é realizado quando as políticas sociais são implementadas com o
objetivo de dirimir os efeitos negativos da exploração e acumulação, próprias do
sistema capitalista.
Desta maneira, o desenvolvimento econômico é constantemente perseguido
pelo Estado que promove o avanço “das forças produtivas, promovendo também o
ciclo do consumo necessário à manutenção da sociedade capitalista,
individualizando o acesso aos bens produzidos pela sociedade.” (ZANARDINI;
ORSO, 2008, pp. 95-96). Neste contexto, as políticas sociais cumprem uma função
estratégica.
Ao cumprir tal função, as políticas sociais têm sido cada vez mais destacadas
e a educação, como uma das dimensões das políticas sociais, é utilizada pelo
Estado para disseminar a ideologia da justiça social e da diminuição da pobreza, de
maneira especial em países periféricos em relação à hegemonia central do
capitalismo.
A política educacional não pode receber uma definição acabada, pois, como
processo, ela se manifesta em cada momento histórico a partir de um determinado
contexto e das relações e ações que os seres humanos estabelecem com as várias
esferas sociais. Segundo Martins (1994, p. 8):
Essa relação da política educacional com as demais esferas do mundo social ocorre justamente porque ela trata de algo básico para a existência de qualquer grupo humano: a educação. O verbo educar vem do latim educare, derivado de educere, que quer dizer eduzir, conduzir, revelar valores e capacitar o espírito humano a criá-los.
Porém, a política educacional não pode ser compreendida apenas como um
processo direcionado para a produção de valores e para a emancipação humana,
dada sua estreita relação com um modelo de sociedade e de Estado.
Quando a educação assume uma forma organizada e definida de acordo com
fins e interesses que se tem em relação aos educandos implicados no processo, a
política educacional passa a existir. Esta afirmação nos possibilita a elaboração de
uma distinção entre educação e política educacional. Enquanto educação se
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manifesta como uma das maneiras de as pessoas comunicarem o saber,
exteriorizando de forma livre, e entre todos, as suas crenças, a política educacional,
por sua vez, pressupõem a organização e a seleção criteriosa daquilo que será ou
não transmitido.
Como se observa, há uma íntima implicação entre educação e política
educacional. No entanto, ainda que a política educacional atue sobre a educação,
não se pode afirmar que ela exerça um domínio sobre ela, pois é a “educação como
prática social que ultrapassa a escola e que pode alterar e interferir na política
educacional.” (MARTINS, 1994, p. 9).
4.2 Política educacional, legitimação e construção da sociedade
Enquanto a educação nos permite pensar os modelos de homens e mulheres
de que necessita a sociedade, a política educacional auxilia na construção desses
modelos, ao definir as formas e os conteúdos do saber que serão apresentados aos
aprendizes com a intenção de construir, legitimar e assegurar um tipo de construção
de mundo e de sociedade. Nesse sentido, a política educacional é usada como um
instrumento que projeta e forma os modelos de pessoas de que uma sociedade tem
necessidade.
Assim, se a política educacional pode ser instrumentalizada se supõe que ela
esteja envolvida por intencionalidades que precisam ser lidas, interpretadas e
compreendidas. Quando se apreende as intenções que se encontram implicadas
nas políticas educacionais, se compreende, igualmente, que tipo de sociedade e
projeto humano está propondo essa política educacional. Dessa maneira, “a política
educacional não retira a força criadora da educação, apenas a canaliza para fins
específicos, embora possa também fragilizar o processo pedagógico,
impossibilitando uma ação criadora e reflexiva.” (MARTINS, 1994, p. 10).
A política educacional nasce a partir da evolução da sociedade onde a
educação, num primeiro momento, se realizava sem seriação escolar, sem classes
de alunos e, tampouco, com professores especializados passando, em seguida, a se
processar envolvendo escolas, professores, alunos e métodos pedagógicos. Assim,
tornava-se fundamental, políticas que imprimissem objetivos e orientação ao
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processo educacional, assim como a definição de caminhos e etapas para se atingir
as metas.
Contudo, quando se fala em definição de caminhos, etapas e metas, voltamos
a nos perceber diante do tema da intenção. As intenções surgem condicionadas às
conjunturas e momentos históricos do que a lugares determinados e fixos. Podem
surgir em sociedades mais primitivas, como nas sociedades maduras; no âmbito de
uma instituição escolar como na tradição ensinada por meio da observação. Por
isso, podemos encontrar várias formulações de políticas educacionais e, portanto,
diversas intencionalidades ao se vasculhar o passado, o presente e mesmo projetar
o futuro, por meio de documentos antigos e discursos atuais.
Mas, nem sempre a intenção de uma política educacional pode ser
claramente percebida. Às vezes ela pode se encontrar escondida. Martins (1994, pp.
17-18), revela que:
Uma política educacional pode ser clara e visível, ou então obscura e camuflada. Por exemplo: orientar a manutenção e a transformação do menino e da menina em homem e mulher, em sociedades como a nossa, nem sempre implica que a intenção seja transformá-los em sujeitos históricos e sociais, em seres humanos emancipados.
Por conseguinte, conhecendo-se a intencionalidade implicada em uma política
educacional, pode-se compreender outro aspecto que a envolve: o poder. Pois, é
por meio do exercício prático do poder que todas as políticas educacionais são
estabelecidas. Nasce assim a figura do Estado compreendido como uma estrutura
de poder que reúne, sintetiza e põe em movimento a força política da classe que
domina as relações sociais e de produção.
O Estado é uma estrutura de poder capaz de organizar a sociedade de
classes antagônicas, traduzindo o pensamento da classe dominante, construindo as
condições fundamentais para o seu máximo desenvolvimento. Dentre todos os
teóricos que tematizaram a origem e função do Estado, Gramsci (1980), com o seu
conceito de Estado ampliado foi, em nossa concepção, aquele que melhor pode nos
ajudar a compreendermos o que vem a ser políticas educacionais, situando-as no
interior das políticas públicas.
Para Gramsci, somente por meio de alianças e da obtenção do consenso
passivo das classes dirigidas é que uma classe pode se assegurar como dirigente.
Para isso, a classe dominante em alguns momentos supera o horizonte corporativo,
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sacrificando parte dos seus interesses imediatos, na procura por articulação de
alianças para a construção da hegemonia política e ética, isto é, da dominação
ideológica da classe burguesa sobre a classe dos trabalhadores.
Nessa perspectiva, o Estado moderno para manter-se deveria se revestir de
coerção e hegemonia, uma vez que ele não poderia manter-se unicamente por meio
da coerção, ou seja, como instrumento a serviço da classe dominante. Assim, o
conceito de Estado ampliado nasce da sua análise sobre os mecanismos de
construção e produção desta hegemonia. Na concepção de Estado ampliado
considera-se importante entender que o Estado, além de ser o aparelho
governamental, também se apresenta como aparelho privado de hegemonia ou
sociedade civil. Nesse sentido, segundo Oliveira (1997, p. 21):
“Estado = sociedade política + sociedade civil, isto é, hegemonia revestida de coerção.” (GRAMSCI, 1984, p. 147-149). Assim, a noção geral de Estado abrange a sociedade política, correspondendo basicamente ao núcleo governamental que exerce o domínio legal através dos mecanismos de coerção sobre toda a sociedade, bem como a sociedade civil compreendendo os aparelhos privados de hegemonia.
Nesse contexto, a sociedade política, constituída pelo conjunto dos
organismos públicos, tem por função o exercício da coerção, da manutenção, pela
força, da ordem estabelecida. Mas, tanto a sociedade política como a sociedade
civil atua com a finalidade de manter e reproduzir a força hegemônica.
Por conseguinte, a hegemonia – de maneira especial nas sociedades
ocidentais, e nesse caso também a sociedade brasileira - não pode ser descartada
pelos grupos que têm a pretensão de assumir o controle e o comando do conjunto
da sociedade, rompendo com sua condição de grupos sociais dominados. Para isso,
é importante para as classes dominadas articularem-se para intervirem em todas as
instituições que têm o poder de construir a hegemonia ética e política, tais como:
escolas, partidos políticos, meios de comunicação, sindicatos, etc. É necessária a
construção de uma contra-hegemonia.
As políticas educacionais situam-se no âmbito das políticas públicas de
caráter social. Ou seja:
[...] são políticas de responsabilidade do Estado quanto à sua formulação, implementação e manutenção, estabelecidas com base num processo de tomada de decisões que envolvem organismos da
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sociedade política (Estado) e entidades da sociedade civil. As políticas públicas, via de regra, são formuladas em um processo contraditório e complexo, pois envolvem interesses de vários segmentos que desejam garantir direitos, especialmente aqueles vinculados às necessidades básicas dos cidadãos, como educação, saúde, assistência e previdência social. Dependendo da correlação de forças dos representantes desses segmentos essas políticas podem intensificar seu caráter “público”, isto é, atender as necessidades de quase todos, da coletividade, acima dos interesses privados, de determinados grupos de poder. É o estado em ação”. (MOROSINI, M. C.; BITTAR, M., 2006, p. 165).
Portanto, as políticas públicas estão em constante transformação, como a
sociedade. Por isso, é necessário compreender o projeto político do Estado em sua
totalidade, com as contradições de cada momento histórico. Ainda que toda política
devesse ser considerada como pública e social, uma vez que a política se define
como a arte de administrar o bem público, em sociedades em que existe a
apropriação, por parte de determinada classe social, dos meios de produção, o
Estado também é apropriado por essa classe, para que possa administrar seus
interesses econômicos particulares.
Desse modo, nas sociedades capitalistas, a fim de consolidar a expansão do
capital, o Estado assume a função de impulsionar a política econômica. Essa política
econômica, compreendida como antissocial, favorece aos interesses privados com
prejuízo aos interesses da coletividade. Contraditoriamente, a própria continuidade
do sistema capitalista é ameaçada, pela grande concentração de riqueza gerada por
sua própria política econômica. Assim, o Estado necessita promover políticas
públicas ou sociais em todos os âmbitos, para equilibrar os efeitos do próprio
modelo.
Por conseguinte, o Estado desenvolve certo número de políticas públicas ou
sociais para intervir no controle das contradições, acalmando as tensões sociais que
a relação capital e trabalho engendram no âmbito da reprodução. As políticas sociais
têm, consequentemente, como finalidade a distribuição da riqueza social, pelo
menos em certos patamares, para equalizar as diferenças produzidas pelo sistema
capitalista.
Nas sociedades capitalistas o Estado, “mesmo submetido aos interesses
gerais do capital na organização e administração do público, as políticas públicas,
especialmente, as de cunho social, são produto das lutas, pressões e conflitos entre
os grupos e classes que constituem a sociedade.” (ARAÚJO, s/d, p. 6). As políticas
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públicas, em síntese, se revelam como o produto final das trocas, consensos,
conflitos e disputas entre os distintos grupos ou classes que formam uma sociedade
determinada.
Dessa maneira, situar a educação como uma política social pública,
pressupõe a compreensão das estruturas de poder e de dominação, dos conflitos
infiltrados por todo o corpo social e que tem no Estado o locus da sua síntese.
As políticas educacionais originadas do Estado implicam em escolhas e
decisões que envolvem instituições, grupos e indivíduos, como qualquer outra
política pública. Elas não são o resultado de iniciativas abstratas. Elas são
construídas na correlação de forças sociais distintas, que se organizam para
defender seus interesses particulares. Por isso, é preciso examinar seu valor
histórico para se compreender como são produzidas e implementadas as políticas
públicas.
Assim, é nos programas governamentais, nos seus planos e projetos que as
políticas públicas têm sua expressão, estabelecendo determinadas relações entre
Estado e sociedade. Sendo “as políticas sociais uma fração das políticas públicas,
elas têm sua origem nas mudanças qualitativas, na organização da produção e nas
relações de poder.” (SILVA, 2000, p. 80). Elas representam, desse modo, no
capitalismo contemporâneo, ao mesmo tempo, a mediação política de interesses
distintos e as necessidades de valorização do capital.
Nessa perspectiva, as políticas sociais assumem a função de regulamentar o
processo de proletarização, ao inserir a força de trabalho no mercado de trabalho
marcado pelas relações capitalistas de produção. É, portanto, por meio da política
social que “o Estado resolve o problema da transformação de trabalho não
assalariado em trabalho assalariado.” (SILVA, 2000, p. 80).
Os estudos sobre as políticas sociais começaram a ganhar centralidade no
Brasil nos inícios da década de 1980, quando o país saía de um período marcado
pelo autoritarismo. Assim, à medida que a democracia era reinstaurada no Brasil
percebia-se o impulso a essas pesquisas e revelava-se, por meio delas, o quanto o
regime militar contribuía para aprofundar a negação, à maioria da população, dos
direitos sociais.
A história da educação brasileira está repleta de exemplos de políticas
educacionais que foram elaboradas imaginando servirem ao saber de todos os
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implicados no processo educacional. Tal processo revela a íntima relação entre
políticas educacionais, construção de subjetividades e disseminação de ideologias
dos grupos sociais dominantes. Pois, “ao mesmo tempo em que interfere na
constituição do imaginário e na reprodução da ideologia, ela também se constitui e é
consequência desse processo.” (SILVA, 2000, p. 10).
Essa mútua interdependência entre política educacional, construção do
imaginário e intencionalidade de grupos sociais podem, ainda que num primeiro
instante tenha teoricamente o objetivo de transformar, pela educação, a sociedade
em algo mais emancipado, podem, na prática, desencadear um processo de
alienação. Ao invés de educar ocorre um processo de deseducação, onde a ação
criadora e reflexiva são deixadas de lado, formando-se pessoas que simplesmente
façam aquilo que o grupo social dominante quer, sem jamais contrariá-lo ou
questioná-lo. Nas sociedades industrializadas essas pessoas podem facilmente ser
encontradas.
Por isso, em sociedades como a brasileira a política educacional se revela
como um complexo processo que atua na subjetividade dos seres humanos
extrapolando os programas de governo que se articula por meio de planos e metas
para a educação. Como observa Martins (1994, pp. 11-12):
[...] ao tratar da educação que, deve ser transmitida de geração a geração, a política educacional está interferindo no corpo de regras sociais constituintes da moralidade de um grupo, podendo incluir ou excluir valores, e acaba delimitando, assim, o próprio processo de formação subjetiva do ser humano, que envolve os sentimentos e as disposições que vão regular sua conduta.
As implicações das políticas educacionais no imaginário das pessoas não se
encontram explícitas, uma vez que a sua interferência sobre o processo de
organização do trabalho, que consiste em direcionar a maneira como o aprendiz vai
receber e assimilar o saber necessário para a execução de uma profissão, é sempre
mais explícita. Por isso, refletir sobre a política educacional supõe pensar sobre a
construção dos seres humanos atuais e do futuro, enfocando todas as dimensões da
sua existência. Conforme Araújo (s/d, p.6):
Ao longo da História do Brasil, a educação redefiniu seu perfil, ao mesmo tempo reprodutor e inovador da estrutura social, ou seja, ela consiste em uma das maneiras que a sociedade estabelece para produzir e reproduzir suas formas de organização do trabalho e da
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vida. A educação modela aptidões, comportamentos, atitudes, valores, conceitos, preconceitos, que são necessários a cada forma de organização social e a escola é um dos locais privilegiados para sua realização.
Nesse sentido, o Estado brasileiro, à medida que se organizava, assumiu
para si o trabalho de lançar os fundamentos da sua educação escolar própria.
No caso específico do Estado brasileiro, principalmente a partir da década de
1990, priorizou-se a política econômica em prejuízo da política social. Com a
abertura política, foi transferida para a sociedade civil a responsabilidade por
melhorar as condições de vida da sociedade brasileira, fazendo-a acreditar que
participa das decisões. O corolário desse processo foram políticas sociais
compensatórias e excludentes, que não contemplaram a mudança nas relações
entre trabalho e capital, limitando-se somente ao estímulo do crescimento
econômico. Como observa Silva (2000, p. 82):
Um destaque na área da educação nos anos de 1980 foi a organização de diversos setores da sociedade civil e política brasileira, para a construção de um projeto de educação para o país no Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública – FNDEP. As demandas educativas cresceram e, entre elas, a de maior destaque foi a do exercício da cidadania em seu espaço de atuação.
Pensar a cidadania em termos coletivos, institucionais e grupais foi a maior
novidade nesse período. Não se tratava somente da possibilidade de reivindicação,
mas de proposição, de participação efetiva, uma vez o lugar da participação estava
assegurado juridicamente.
Contudo, mesmo que tenha havido muitos embates quanto à necessidade da
aprendizagem profissional,
[...] o exercício da cidadania, a descentralização do ensino básico, tanto por objetivos democratizantes quanto pela intenção de reduzir gastos, os problemas na área dos direitos sociais (padrões mínimos de educação, saúde, renda, trabalho, entre outros) nos anos de 1990, reafirmam a difícil relação entre governabilidade e ajustamento estrutural com democratização. (SILVA, 2000, p. 82).
No momento em que era fundamental a formação de técnicos que fossem
capazes de acompanhar o processo de mudanças qualitativas do processo de
racionalização da produção pela inserção de novas tecnologias, o capital novamente
mostrou-se interessado pelo sistema educacional.
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A educação, como política social do Estado capitalista contemporâneo, mais
uma vez, atendeu de modo específico às necessidades de valorização do capital. É
necessário admitir com Neves (1994, p. 16), que “o ritmo e o desenvolvimento das
políticas educacionais na atualidade estão relacionados tanto com a consolidação
dos níveis de participação popular, como com o nível de desenvolvimento das forças
produtivas e com as relações de produção.”
Como se observa, o Estado se utiliza das políticas sociais como estratégia
para regular e regulamentar a vida das pessoas e incorporar a força de trabalho dos
que não possuem, em trabalho assalariado. Nas últimas décadas, principalmente na
década de 1990, tornou-se evidente o enfraquecimento do padrão de
desenvolvimento implementado pelo Estado, deixando-se entrever a distância
significativa entre Estado e sociedade, que só começou a dar sinais de mudança na
década de 2000.
A educação não está imune às transformações da base material da
sociedade. Por isso, tanto as políticas sociais como as políticas educacionais estão
sendo, hoje, orientadas pelas proposições capitalistas que consideram o mercado o
eixo das relações sociais. As políticas sociais foram jogadas às leis do mercado,
como bem assinala Sanfelice (2001, p. 10).
A educação, desta forma, se apresenta como uma peça indispensável para
legitimar o mecanismo de acumulação do capital ao estabelecer por meio de
consensos, terminologias e categorias próprias, a reprodução do injusto sistema de
classes. Ao invés de se manifestar como um instrumento eficaz para a mudança
fornece os meios e o pessoal necessários à maquinaria produtiva em expansão no
sistema capitalista.
Doravante, a educação, que poderia ser um instrumento eficaz e essencial
para a mudança, tornou-se meio daqueles estigmas da sociedade capitalista ao
“fornecer os conhecimentos e o pessoal necessário à maquinaria produtiva em
expansão do sistema capitalista, mas também gerar e transmitir um quadro de
valores que legitimem os interesses dominantes.” (MESZÁROS, 2005, p. 15).
Porém, a emancipação humana, possível pela educação, é o objetivo central dos
que lutam contra a intolerância e a alienação da sociedade mercantil.
Para que tal realidade seja possível, dois conceitos devem ser tomados como
prioritários: a universalização do trabalho como atividade humana autorrealizadora e
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a universalização da educação. É por isso que é necessário, como observa
Mészáros (2005), romper com a lógica do capital se quisermos contemplar a criação
de uma alternativa educacional significativamente diferente. Mas, não podemos nos
esquecer o que disse Mészáros, em outra obra (2002, p. 16), que é impossível
superar o capital sem a eliminação do conjunto dos elementos que compreende
esse sistema.
Para tanto, a educação não pode estar desvinculada do destino do trabalho
humano. Haja vista que, “um sistema que se apoia na separação entre trabalho e
capital, que quer a disponibilidade de uma enorme massa de força de trabalho sem
acesso a meios para sua realização, necessita, ao mesmo tempo, socializar os
valores, que permitem a sua reprodução.” (MÉSZÁROS, 2005, p. 15).
Há a necessidade de se recuperar a verdadeira lógica da educação que é a
de potencializar a capacidade humana de interagir com o mundo de forma
consciente e ativa. Consciência supõe a capacidade de fazer uma leitura crítica da
estrutura em que se vai atuar, por meio de uma práxis transformadora, no exercício
responsável da cidadania. Todavia, esta realidade só será possível se o profissional
da educação for, igualmente, capaz de perceber primeiro a complexa estrutura –
excludente e reificadora - por meio de uma leitura criteriosa e crítica do mundo,
podendo, assim, apresentar-se como mediador da ação consciente do aluno ao
contexto histórico no qual se encontra inserido.
Utopia? Talvez! Mas ser um utópico, segundo Löwi (1998, p.29), é possibilitar
uma alternativa crítica e subversiva à ideologia neoliberal que se propõe a veicular
formas de representação e de valores que visam manter ou fortalecer a ordem
estabelecida, instituindo uma visão de mundo conservadora e legitimadora da
realidade e da história. Toda utopia traz em si mesma uma crítica ao topos.
É certo que o cotidiano de cada indivíduo e das instituições sofre as
determinações das ações e orientações do Estado. Assim, é fundamental para o
professor compreender essas determinações e como elas foram construídas
historicamente para que possa se posicionar criticamente diante delas e participar de
forma efetiva na elaboração de políticas educacionais que possibilite a superação da
exploração, dominação e exclusão em que se encontra grande parte da população
brasileira.
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