Upload
others
View
6
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC - SP
Nayana Franklin Odorico
TV aberta e mídias sociais:
o engajamento da audiência interativa na construção de conteúdos televisivos
Mestrado em Comunicação e Semiótica
São Paulo
2016
Nayana Franklin Odorico
TV aberta e mídias sociais:
o engajamento da audiência interativa na construção de conteúdos televisivos
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial para obtenção do
título de MESTRE em Comunicação e
Semiótica pelo Programa de Estudos Pós-
Graduados em Comunicação e Semiótica, sob
orientação do Prof. Dr. Eugênio Trivinho
São Paulo
2016
Nayana Franklin Odorico
TV aberta e mídias sociais:
o engajamento da audiência interativa na construção de conteúdos televisivos
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial para obtenção do
título de MESTRE em Comunicação e
Semiótica pelo Programa de Estudos Pós-
Graduados em Comunicação e Semiótica, sob
orientação do Prof. Dr. Eugênio Trivinho.
Aprovada em: ____/____/____
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________
_____________________________________
_____________________________________
DEDICATÓRIA
Para José Wilson, Luiza Helena, Júnior e Diêgo.
Pelo apoio constante e amor incondicional.
AGRADECIMENTOS
Obrigada aos familiares, ao meu namorado, Henry César, à minha prima Paula, às
amigas de infância (MC), aos amigos Piauienses em São Paulo, em especial, aos acadêmicos
Thiago Magalhães e Helene Rebelo, aos queridos amigos de vários lugares do Brasil que me
apoiaram de alguma forma durante esta intensa jornada, aos amigos da Sunset em nome de
Elias Suzuki, à amiga Juliana Hercowitz, a Thiago Nascimento, aos amigos conquistados
durante o Mestrado, em especial, ao Igor Maximiliano, aos Professores que auxiliaram durante
os últimos anos de aprendizado, na pessoa do Coordenador do Programa, Rogério da Costa, e
à Cida Bueno, pelo apoio prestado a todos nós alunos durante essa jornada.
Agradeço ao Prof. Dr. Eugênio Trivinho pela orientação esmera deste trabalho.
Agradeço, por fim, ao CNPQ, à FUNDASP e à PUC-SP pela bolsa concedida de que
esta pesquisa é parte.
Só sabemos com exatidão quando sabemos
pouco; à medida que vamos adquirindo
conhecimento, instala-se a dúvida.
Goethe
RESUMO
A presente pesquisa objetiva compreender a atuação do principal protagonista da cibercultura
no Brasil, o usuário, bem como sua relevância na construção de conteúdos televisivos. O
interesse por este cenário nasce da multiplicação do uso de dispositivos móveis e das mídias
sociais, que possibilitaram aos sujeitos interativos maior acesso e compartilhamento de
informação a qualquer momento, gerando uma série de transformações em seus
comportamentos e hábitos. Esse fato acabou por influenciar mudança de postura de alguns
programas televisivos, que passaram a trazer para a sua programação conteúdos e pautas
provenientes da internet. O problema principal dessa pesquisa liga-se ao questionamento sobre
qual público responde aos convites de participação realizados pela TV aberta e o modo como
ela utiliza esse feedback para gerar conteúdo. Percebe-se um território construído e tateado
pelos jovens em um panorama de engajamento, criando um espaço colaborativo que impulsiona
a capacidade de articulação e ação dos usuários. A programação da TV aberta estimula o uso
das mídias sociais não só como forma de interação, mas também como possibilidade para novos
braços de conteúdos transmídia. Os interesses financeiros das grandes emissoras e empresas
continuam em primeiro plano, porém, os conteúdos produzidos necessitam constantemente de
reformulações e frescor de novos formatos. Este estudo se baseia em importantes autores
brasileiros e estrangeiros da área da Comunicação, que contribuíram para a reflexão e
construção das bases teóricas de análise, a saber: Cannito e os desafios da TV na era digital;
Clay Shirky e o comportamento de um novo espectador e sua cultura de participação; Eugênio
Trivinho e os estudos relevantes sobre glocal e dromocracia cibercultural; Henry Jenkins e a
convergência das mídias e a narrativa transmídia; e Thompson e seus estudos sobre o
desenvolvimento das mídias. A análise do corpus enfoca a grade noturna da Rede Globo de
Televisão (telenovela Verdades Secretas e BBB16) durante o segundo semestre de 2015 e o
primeiro semestre de 2016. A observação sistemática recaiu tanto nos programas de TV quanto
no comportamento dos indivíduos no Facebook e Twitter. Para auxiliar a análise empírica do
corpus, foram utilizadas fontes de estudo do mercado e sobre o consumidor, além de pesquisa
quantitativa com usuários, que incrementaram o resultado final do trabalho.
Palavras-chave: cibercultura; mídias digitais; convergência; TV aberta brasileira; transmídia;
usuário.
ABSTRACT
This academic work has the objective to understand the acting of the protagonist of cyberculture
in Brazil, the user, as well as his relevance for the construction of television content. The interest
in the scenario comes from the multiplication of mobile devices usage and social media, that
allowed interactive subjects to have more access to information and share it at any time,
generating a series of changes in their behavior and habits. That influenced the change of
attitude of some TV programs which have begun to introduce content and themes to their
programming influenced by the internet. The main problem of this research is connected to the
questioning about which audience responds to the participation invitations performed by the
open TV network and how it uses this feedback to generate content. It is noticed a territory
constructed and groped by young people in a scenario of engagement, creating a new
collaborative public space that boosts the capacity of articulation and action of users. The open
TV network programming stimulates the usage of social media not only as a form of interaction,
but also as a possibility to new branches of transmidia content. The financial interests of big
TV broadcasters and companies stand in first plan, however the produced content constantly
needs reformulation and freshness of new formats. The study is based on the work of important
brazilian and international authors of communication area that contributed to reflection and
construction of the theoretical basis of analysis, such as: Cannito and the challenges of TV in
the digital age; Clay Shirky and the behavior of a new spectator and culture of participation;
Eugenio Trivinho and relevant studies about glocal and cyberculture dromocracy; Henry
Jenkins and convergences of current media and transmedia narrative; besides Thompson and
the studies on the development of media. The corpus analysis focuses on the night programming
of Rede Globo de Televisão (the soap opera Verdades Secretas and the reality show BBB16)
during the second half of 2015 and the first half of 2016. The sistematic observation fell on both
TV programs and individual behavior on Facebook and Twitter. To assist the empiric analysis
of the corpus, sources of market and consumer research were used, as well as qualitative
research carried out with users, which enhanced the final results of this work.
Keywords: cyberculture; digital media; convergence; brazilian open network TV.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Apresentador Pedro Bial na chamada ao vivo para participação na final ................. 31
Figura 2: Conteúdo explicativo sobre como participar da final via app ................................... 32
Figura 3: Passo -a -passo via site para participação via site – envio do vídeo – etapa 1 .......... 33
Figura 4: Print da página/ convite para baixar o app – via site ................................................ 34
Figura 5: Momento do programa na TV, utilizando visual e linguagem interativa ................. 37
Figura 6: Print da final do programa sobre os emojis do BBB16 ............................................ 38
Figura 7: Tuíte do perfil do programa sobre os emojis na semana da grande final.................. 38
Figura 8: Tuíte sobre o aplicativo do BB16 ............................................................................. 39
Figura 9: Tuítes dos usuários com a #VerdadesSecretas .......................................................... 41
Figura 10: Tuítes dos usuários captados do Twitter ................................................................. 42
Figura 11: Facebook do HugoGloss com o #ResumoGloss ..................................................... 43
Figura 12: Tuítes sobre a atuação de HugoGloss ao final de Verdades Secretas ..................... 45
Figura 13: Tuítes sobre a atuação de HugoGloss ao final de Verdades Secretas ..................... 46
Figura 14: Tuítes de HugoGloss durante a final de Verdades Secretas ................................... 47
Figura 15: Tuítes de HugoGloss durante a final de Verdades Secretas ................................... 47
Figura 16: Trecho da entrevista de Bruno para blog da Veja SP ............................................. 48
Figura 17: Resultado da Pergunta 1 do questionário ................................................................ 56
Figura 18: Resultado da Pergunta 2 do questionário ................................................................ 56
Figura 19: Resultado da Pergunta 3 do questionário ................................................................ 57
Figura 20: Resultado da Pergunta 4 do questionário ................................................................ 57
Figura 21: Resultado da Pergunta 5 do questionário ................................................................ 58
Figura 22: Resultado da Pergunta 6 do questionário ................................................................ 58
Figura 23: Resultado da Pergunta 7 do questionário ................................................................ 58
Figura 24: Resultado da Pergunta 8 do questionário ................................................................ 59
Figura 25: Resultado da Pergunta 9 do questionário ................................................................ 59
Figura 26: Resultado da Pergunta 10 do questionário .............................................................. 59
Figura 27: Resultado da Pergunta 11 do questionário .............................................................. 60
Figura 28: Resultado da Pergunta 12 do questionário .............................................................. 61
Figura 29: Resultado da Pergunta 13 do questionário .............................................................. 62
Figura 30: Resultado da Pergunta 14 do questionário .............................................................. 62
Figura 31: Resultado da Pergunta 15 do questionário .............................................................. 62
Figura 32: Tuítes com presença do Usuário Participante sobre Verdades Secretas ................. 65
Figura 33: Tuítes com presença do Usuário Participante sobre Verdades Secretas ................. 65
Figura 34: Tuítes com presença do Usuário Engajador sobre BBB16 ..................................... 66
Figura 35: Tuíte com presença do Usuário Engajador sobre BBB16....................................... 67
Figura 36: Tuítes com presença do Usuário Engajador sobre Verdades Secretas ................... 67
Figura 37: Tuítes do Usuário de reputação após término de Verdades Secretas ..................... 69
Figura 38: Tuítes com presença do Usuário de reputação após término da novela.................. 69
Figura 39: Tuítes com presença do Usuário de reputação durante BBB16 .............................. 70
Figura 40: DVDs Verdades Secretas ........................................................................................ 73
Figura 41: Tuíte do Hugo Gloss sobre o DVDs – com link para Facebook ............................. 74
Figura 42: Post do Hugo Gloss sobre o DVDs Verdades Secretas .......................................... 75
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 12
Estado da Arte ...................................................................................................................... 15
1 USUÁRIO: SUJEITO CIBERCULTURAL NO CENÁRIO DE CONVERGÊNCIA DOS
MEIOS DE COMUNICAÇÃO ................................................................................................ 18
1.1 Cultura da convergência ............................................................................................ 22
2 A NARRATIVA TRANSMÍDIA, FÃS E A IMPORTÂNCIA DOS USUÁRIOS COM
REPUTAÇÃO NAS REDES ................................................................................................... 27
2.1 Big Brother Brasil 2016 (BBB16) ............................................................................. 30
2.2 Verdades Secretas (2015) .......................................................................................... 40
2.3 A importância dos usuários com reputação nas redes ............................................... 49
3 RAIO-X DOS USUÁRIOS BRASILEIROS EM 2016 .................................................... 53
3.1 Análise dos resultados de Pesquisa ............................................................................ 55
3.2 Delimitação dos perfis da audiência interativa .......................................................... 63
3.3 Diretrizes de conteúdo: próximos passos ................................................................... 70
CONCLUSÃO .......................................................................................................................... 77
REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 79
APÊNDICES ............................................................................................................................ 82
Apêndice A ........................................................................................................................... 82
Apêndice B ........................................................................................................................... 87
12
INTRODUÇÃO
Enquanto teóricos discutem se o público prefere
internet ou televisão, o espectador assiste à televisão
e ao mesmo tempo obtém informações extras sobre
sua série preferida na internet.
Newton Cannito
O avanço tecnológico permanente e a consolidação da internet como espaço de
consumo midiático no decorrer das últimas décadas possibilitaram uma condição promissora
para o desdobramento de práticas colaborativas. Progressivamente, o usuário possui cada vez
mais à sua disposição formas de se colocar ativamente como agente de ações interativas,
desempenhando sua tendência natural de socialização.
A crescente utilização das mídias sociais pelos indivíduos corrobora esse espírito e
demonstra um comportamento de maior engajamento, por meio do qual esse usuário
desempenha papel cada vez mais ativo na produção, filtragem e seleção de conteúdo.
Paralelamente a esse cenário, a TV, em tempos de convergências, traz alternativas de
experimentação para o telespectador, tanto em sua programação quanto no ambiente online. O
interesse pela presente pesquisa nasce deste ponto de observação, qual seja, o modo como os
espectadores interativos brasileiros têm mudado a forma de consumir os conteúdos televisivos,
principalmente pela presença da tecnologia móvel e das mídias sociais. Nos dias de hoje, eles
interagem com a programação das TVs diretamente do sofá de casa, respondendo aos chamados
de participação por meio de devices variados – principalmente o celular.
Esse fato leva a uma série de questionamentos, que se resumem no problema principal
desta pesquisa: “qual perfil de usuário responde aos convites de participação da TV aberta, e
como a TV utiliza esse feedback para gerar conteúdo?”. É nesse território repleto de análises de
caráter técnico, social e cultural que serão direcionados os estudos desta Dissertação. Aqui, será
possível acompanhar o debate sobre essas especificidades, provocando uma importante
construção de repertório a fim de compreender como se configurarão as diretrizes de conteúdo
da televisão no futuro, além de descobrir características do perfil daqueles que compõem esta
audiência interativa.
Percebe-se que o fio condutor do processo que amarra arestas e ativa o cenário é o
usuário, protagonista da cibercultura – objeto desta pesquisa. Para começar, é necessário
abordar um ponto sobre o uso do termo utilizado para tal. A palavra comum que denomina este
espectador interativo é usuário. Porém, a pesquisa pretende ressignificar esta palavra utilizando
termos/ conceitos que complexizam a argumentação, tais como sujeito cibercultural, indivíduo
13
ciberespacial, sujeito interativo e indivíduo teleinteragente; no entanto, sem fixar nenhum
termo propriamente – pois tudo vai depender dos contextos nos quais serão aplicados. Mesmo
quando for utilizado o vocábulo usuário, entenda-se qualquer destes termos supracitados em
itálico. Outro ponto a ser observado é acerca do uso da expressão audiência interativa, que
será empregada também no sentido de conjunto dos usuários, receptores das mensagens,
aqueles que interagem entre televisão e mídias sociais.
O cenário analisado possui uma força pulsante no que tange à alteração da relação
entre tecnologias, indústrias e públicos. A chegada de novas formas de entretenimento no
mercado brasileiro – tal como o Netflix (misto de internet e TV) – trouxe uma pressão peculiar
às emissoras de TV, com a necessidade de atualização e de novos conteúdos de qualidade para
um público cada vez mais interativo. É preciso um link constante com o território digital quando
o assunto é entretenimento, proporcionando ainda mais extensões de conteúdos e narrativas
para os sujeitos interativos.
A Rede Globo de Televisão, por exemplo, tem se destacado por ser uma das emissoras
pioneiras da TV aberta quando se trata de produção de conteúdo de massa diferenciado para o
público, tanto em programação quanto em mídias secundárias. A emissora compreendeu a
mudança no cenário e no comportamento dos indivíduos, de modo que tem se fortalecido para
essa nova realidade. Basta focar nos movimentos realizados pela empresa nos últimos anos,
como por exemplo, a contratação de novos nomes para a cúpula da emissora e o alto
investimento em tecnologia no universo digital. É possível citar exemplos relevantes como a
contratação do publicitário Sérgio Valente para direção da Central Globo de Comunicação1,
cujo intuito é proporcionar um diálogo mais empático entre a TV e o público "na era digital";
além do fortalecimento e crescimento interno da área de Comercialização de Mídias Digitais,
responsável por projetos em multiplataformas e inteligência de mercado.
O digital tem deixado a televisão muito mais narrativa, haja vista as histórias estarem
cada vez mais interessantes, o que faz crescer a importância dos contadores dessas narrativas e
sua capacidade de abranger e criar novos territórios. Nota-se que uma das mais famosas
especulações sobre este cenário, baseada na ideia de que a TV possa “perder” para a internet, é
teórica; tudo convergirá e provocará mudanças práticas no entretenimento para o público. Como
cita Cannito (2010, p. 17): “quem vai ganhar a batalha não é uma mídia em si, mas sim o
produtor de conteúdo que souber criar obras que atuem simultaneamente em todas as mídias”.
1 Sérgio Valente… (2013, não paginado).
14
O objetivo da presente Dissertação é a realização de uma pesquisa teórica exploratória
sobre qual perfil de sujeitos ciberculturais realizam atualmente interação com a TV aberta. Será
apresentada a delimitação de aspectos bem estruturados a partir das análises realizadas,
exibindo as descobertas de novos modelos de interação, bem como de conteúdos propostos
pelos programas. A relevância dessa pesquisa está em promover um melhor entendimento sobre
o cenário convergente entre TV e internet no Brasil, por meio de uma reflexão teórica que
auxiliará na construção dos pilares na área acadêmica sobre a cultura de participação e conteúdo
transmídia.
De acordo com os perfis gerados, observa-se que a análise é valorosa para futuras
pesquisas, com um território norteado por jovens. Atualmente, essa juventude é detentora de
experiências contextualizadas e, cada vez mais, participativas em um cenário que tende a
crescer nos próximos anos, tornando-se relevante para a produção de novos conteúdos. Deste
modo, faz-se mais importante entender a relação entre o conteúdo e os hábitos dos usuários do
que possibilidades técnicas em si.
Durante a jornada de elaboração da pesquisa, foi construída uma linha de pensamento
ampla e apurada, com conceitos e observações essenciais para a concepção do material. A
organização foi disposta conforme segue:
O Capítulo 1, sob o título Usuário: sujeito cibercultural no cenário de convergência
dos meios de comunicação, propõe abordar a configuração de época e o universo teórico no
qual o objeto está inserido, além de demarcar a cultura da convergência;
O Capítulo 2, intitulado A narrativa transmídia, fãs e a importância dos usuários com
reputação nas redes, traz a narrativa transmídia como forma de ligação convergente e relevante
entre a televisão e as mídias sociais, além de versar sobre a importância dos fãs nessa dinâmica.
Nesse capítulo, também se apresenta a observação acerca do corpus constituído por Verdades
Secretas e BBB16, além das interações dos indivíduos ciberculturais nas mídias sociais. No que
concerne ao usuário com reputação, também serão descritas sua natureza e importância para
resultados positivos nos conteúdos multiplataformas;
O Capítulo 3, denominado Raio-X dos usuários brasileiros em 2016, tem como foco a
delimitação dos perfis dos sujeitos interativos que respondem aos convites de participação da
TV aberta. Ademais, trata dos insights gerados por esses sujeitos para os próximos passos em
relação ao conteúdo para as emissoras de TV.
Antes de adentrar nos capítulos, faz-se necessário relatar o Estado da arte, que
debaterá sobre algumas indagações do tema, além de reportar a importância da Banca de
Qualificação para a determinação das diretrizes do trabalho.
15
Estado da Arte
A estrutura da presente Dissertação foi elaborada por meio da ajuda de alguns teóricos
brasileiros e estrangeiros que apresentam argumentos e diálogos interdisciplinares entre si. A
presença destes pesquisadores tornou-se um auxílio necessário para a compreensão do tema e
da delimitação do território a ser estudado.
O livro de Henrry Jenkins, Cultura da Convergência (2009), é um dos mais
importantes apoios à pesquisa; talvez seja o mais citado neste trabalho, bem como também por
outros pesquisadores da área. Nele, o autor relata acerca do novo tipo de cultura nascida das
transformações midiáticas, trazendo exemplos atuais e relevantes. Jenkins realiza um mergulho
nas transformações que as novas tecnologias estão operando no comportamento humano
contemporâneo. Já em Cultura da Conexão (2014), Jenkins, Ford e Green mapeiam mudanças
fundamentais na criação e propagação de conteúdos de mídias; a obra traz exemplos
contextualizados, além de críticas aos modelos de negócio quando o assunto é cultura
participativa.
Eugênio Trivinho e seus estudos relevantes em Glocal (2012) e em A dromocracia
cibercultural (2007) constituem um vetor necessário em todo o processo deste estudo. O autor
aborda pontos interessantes, tais como a lógica exponencial da cibercultura e o processo
civilizatório longitudinal articulado na velocidade digital e em todos os setores das experiências
humanas.
No que tange à cultura da participação e ao comportamento do novo espectador, o
destaque é para o especialista norte-americano em internet, Clay Shirky. Em A cultura da
participação – criatividade e generosidade no mundo conectado (2011), o autor cita diversos
exemplos de ferramentas criadas de forma compartilhada, como a enciclopédia colaborativa
Wikipédia, além de explicar o modo como é possível explorar as oportunidades criadas pela
tecnologia. O resultado é uma visão abrangente e empática sobre as novas formas de consumo
e produção de informação, perspectiva esta explicitada de forma criativa e relevante.
Newton Cannito, em A televisão na era digital: interatividade, convergência e novos
modelos de negócio (2010), discute os desafios da TV na era digital. Este livro é de extrema
importância para a pesquisa, pois apresenta reflexões sobre os desafios do meio e aventa para
os próximos passos da TV. Nesta obra, o foco se dá no espectador do futuro e nos conteúdos
de narrativas transmídias, mas atenta também para a possibilidade de novos modelos de
negócio.
16
Já John Thompson (2014) afirma que o desenvolvimento da mídia transformou a
construção da sociedade atual; analisa também a emergência da indústria da comunicação de
massa e suas tendências, focalizando o desenho de um caminho mais tátil e menos saturado
para as mídias no mundo contemporâneo.
Publicações organizadas, bem como seus autores, também auxiliaram na edificação do
presente estudo. Dentre elas, duas obras merecem destaque: A condição glocal: configurações
tecnoculturais, sociopolíticas e econômico-financeiras na civilização mediática avançada e A
onipresença dos jovens nas redes, organizadas por Eugênio Trivinho (2014), e por Lúcia
Santaella e Cleomar Rocha (2015), respectivamente. A primeira é resultado da pesquisa coletiva
interdisciplinar desenvolvida pelo CENCIB – PUC/SP (Centro Interdisciplinar de Pesquisas em
Comunicação e Cibercultura da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), e a segunda,
desenvolvida pelo Sociotramas, grupo de pesquisa no qual os temas de estudo são voltados às
redes digitais de informação, acesso, comunicação e interação.
Outras referências bibliográficas igualmente tiveram relevância durante toda a
produção de conteúdo. No processo exploratório, fontes como centro de pesquisa e estudos de
mercado e do consumidor (BRASIL, 2014) trouxeram informações essenciais, principalmente
sobre o perfil e o comportamento dos brasileiros.
E, para finalizar, uma pesquisa quantitativa auxiliou na concepção e delimitação dos
perfis de sujeitos ciberculturais que respondem aos convites de interação entre internet e
televisão. No total, foram 45 participações em 20 dias de pesquisa no universo online; esta
indicação faz-se necessária, pois, como cita Cannito (2010, p. 135), “apenas a observação de
casos reais, aliada a uma análise conceitual, será capaz de apontar as tendências, desconstruindo
mitos e apontando para o real potencial de mudança”.
Vistos os apoios utilizados para tal, outro ponto determinante para os direcionamentos
assertivos foram as questões levantadas pela Banca de Qualificação. Antes deste momento, a
pesquisadora trilhava um caminho baseado na “influência” dos usuários na construção de
conteúdos de massa para a programação televisiva. Deste modo, a pesquisa prosseguia em um
sentido mais “romântico” sobre o assunto, focando as relações entre os meios, assumindo um
papel perigoso perante os questionamentos mais aprofundados que estariam por vir ao final da
Dissertação.
Com os debates propostos e fomentados durante a Banca, horizontes se abriram e foi
criada uma nova forma de observar a pesquisa. Antes, a perspectiva era dicotômica: o usuário
influencia ou não influencia a programação televisiva? Visto a complexidade deste cenário, não
se embarcou nesta diretriz, mas sim, trilhou-se um caminho focado na questão acerca da
17
natureza que permeia este fenômeno. A importância sobre a composição do perfil dos sujeitos
cresceu e, por conseguinte, a forma de observação do panorama tornou-se mais crítica, de modo
que foi possível observar que existem outros interesses que dão o tom, principalmente, o
econômico. A analogia com um iceberg, citada pelos integrantes da Banca, ponderou todo o
processo da pesquisa: consegue-se observar parte do problema, logo adiante, porém, é mais
profundo e denso do que realmente parece.
Compreende-se que a Rede Globo de Televisão, com programas analisados que
compõem o corpus da pesquisa, intima os sujeitos interativos à participação, recebe os
feedbacks desses convites e resolve o que deve ser tomado como decisão, com base em suas
diretrizes internas. Assim, tem-se um logro: a televisão capitaliza para si o discurso da
democracia em teoria, mas na prática possui a parte maior do iceberg (imerso) como foco,
englobando os interesses da emissora e de seus parceiros associados.
Deste modo, preferiu-se construir a pesquisa com análises mais criteriosas. Ao invés
de se embarcar na força do usuário e no discurso televisivo, foi contemplada a atuação opinativa
dos usuários, além de especificar sobre a liberdade de uma emissora fazer o que bem entende
com as informações recebidas; foi neste terreno de observação que se construiu as bases da
pesquisa.
18
1 USUÁRIO: SUJEITO CIBERCULTURAL NO CENÁRIO DE CONVERGÊNCIA
DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO
Bem-vindos à cultura da convergência,
onde as velhas e as novas mídias colidem,
onde mídia corporativa e mídia alternativa
se cruzam, onde o poder do produtor de
mídia e o poder do consumidor
interagem de maneiras imprevisíveis.
Henry Jenkins
No contexto atual da civilização, o campo da comunicação vem passando por
mudanças em função do avanço tecnológico e da convergência multimídia. Paralelamente, a
habilidade do usuário2 em se conectar – consumir, produzir e compartilhar – está se
modificando e transformando os conteúdos gerados em diversas plataformas, principalmente
em veículos de comunicação de massa, como a TV.
O cidadão da sociedade moderna tem se tornado ator principal desse movimento de
mudanças estruturais. Inserido nesse cenário dinâmico, esse indivíduo tem se apropriado de
mensagens e incorporando-as em sua vida, construindo uma percepção e consciência de si
mesmo, daquilo que ele é e de onde está situado no tempo e espaço desde cedo.
Os primeiros processos de socialização na família e na escola são, de muitas
maneiras, decisivos para o subsequente desenvolvimento do indivíduo e da
sua autoconsciência. Mas não devemos perder de vista o fato de que, num
mundo cada vez mais bombardeado por produtos das indústrias da mídia, uma
nova e maior arena foi criada para o processo de autoformação. É uma arena
livre das limitações espaçotemporais da interação face a face e, dado o alcance
da televisão em sua expansão global, torna-se cada vez mais acessível aos
indivíduos em todo o mundo. (THOMPSON, 2014, p. 72).
Nota-se que, progressivamente, esse sujeito tem mudado seu posicionamento e tem
tentado colocar-se como um agente ativo das ações interativas, desempenhando sua tendência
natural de socialização – extensão do que é como criatura social, mutável e adaptável a
realidades recebidas. Haja vista que a natureza humana busca desenvolver o senso de
comunidade, a internet se configura como o fio que aproximará as pessoas conectadas em rede.
A internet modifica as formas de sociabilidade, é verdade, mas também é essa
possibilidade de comunicação de todos para todos, essa inversão do polo
tradicional de emissão que potencializa a memória como arquivo binário e
desfaz barreiras do tempo e espaço, reconfigurando práticas sociais, de cultura
e de consumo. (FARIA, 2015, p. 210).
2 Conforme esclarecimento feito na Introdução.
19
A internet abre territórios e possibilidades de atuação frente a diversos canais e
posicionamentos. Mas até que ponto, de fato, esse protagonismo realmente consegue ir?
Antes de imergir e compreender mais a fundo esse território do usuário, é necessário
tatear o macro deste tópico, com observações e fomento de alguns questionamentos. O primeiro
deles é: onde esse sujeito está inserido atualmente? A resposta ancora na Cibercultura. O termo
– significado original do prefixo ciber (controle) em língua inglesa – é o adequado para
organizar esse complexo de ideias e realizações sobre o qual se pretende falar. Será
compreendida a cibercultura, nesta pesquisa, como uma configuração de época.
A cibercultura está implicada em tudo o que de mais socialmente importante
vem à luz do mundo contemporâneo, na medida em que todos os objetos,
procedimento e processos doravante predominantes dependem, em alguma
medida, da matriz informática da tecnologia. (TRIVINHO, 2001, p. 60).
Após a II Guerra Mundial, a cultura pós-moderna tem fincado e enraizado esse novo
cenário com fronteiras pulverizadas, no qual o crescimento da cibernética e da comunicação
criaram pilares para a cibercultura. Foram os avanços tecnológicos, telecomunicacionais e da
informática, promovidos a partir desse período histórico, que formataram e delinearam os
contornos da atual sociedade.
Nesse território da cibercultura, faz-se necessário também – visando a um melhor
entendimento do cenário – ressaltar que esta é perpassada inteiramente pela dromocracia,
regime de vida baseado na velocidade, de par com a potência de sua violência peculiar. Essa
mudança acontece no real, no agora, e tem suas consequências.
É através do processo de satelização em tempo real do planeta e da incessante
realimentação e circulação dos signos e práticas ciberculturais que se
desenvolve a reprodução social-histórica do que Trivinho denomina de
sistema dromocrático cibercultural. (BARBOSA, 2014, p. 201).
Atualmente, indivíduos e instituições – tal como a TV, são obrigados a fazer parte da
cibercultura, sem se esquivar de um caráter imperativo da lógica dromocrática cibercultural. É
a atual fase mundial do capitalismo tardio, da civilização mediática em tempo real, integrando
comunicação em rede e cultura digital.
Dessa forma, pretende-se explanar ainda melhor por meio de metáfora: a cibercultura
– em sua natureza dinâmica – é o epicentro desse período. Em outras palavras, ela seria igual
ao olho de um furacão que começa centralizado e, posteriormente, irradia-se (aumenta) a partir
do momento em que entra em contato com o território social-histórico em que estão inseridos,
ganhando força com a velocidade das redes. É um furacão que deixa marcas na atual sociedade,
20
no sistema, em sua ordem da lógica dromocrática. Segundo Trivinho, “A dromocracia se
tornou, mais que tudo, a lógica exponencial da cibercultura”. (2007, p. 23, grifo do autor).
Compreendidos a configuração de época e o universo teórico e epistemológico no qual
o objeto está inserido, é possível focar mais objetivamente na natureza do sujeito interativo.
Quando se trata do território brasileiro, é possível citar que a comunicação de massa funcionou
ativamente como difusora e uniformizadora de novas formas e estilos culturais. Ribeiro (2015,
p. 19) já asseverava que, apesar das diferentes matrizes raciais e culturais, “os brasileiros se
sabem, se sentem e se comportam como uma só gente, pertencente a uma mesma etnia”. Em
todas as sociedades, os seres humanos trazem aspectos centrais da vida social e se ocupam da
produção e intercâmbio de informações de conteúdos simbólicos.
Desde as mais antigas formas de comunicação gestual e de uso da linguagem
até os mais recentes desenvolvimentos na tecnologia computacional, a
produção, o armazenamento e a circulação de informação e conteúdo
simbólico têm sido aspectos centrais da vida social. (THOMPSON, 2014, p.
35).
Com o desenvolvimento da mídia, essa transformação sobre a natureza de produção e
intercâmbio simbólicos modificou, de forma profunda e irreversível, o mundo moderno.
Se “o homem é um animal suspenso em teias de significados que ele mesmo
teceu”, como Geertz observou, então os meios de comunicação são rodas de
fiar no mundo moderno e, ao usar estes meios, os seres humanos fabricam
teias de significação para si mesmos. (THOMPSON, 2014, p. 36).
Nas mensagens produzidas pelos meios de comunicação, ainda que os indivíduos
tenham quase nenhum controle sobre os conteúdos das matérias simbólicas que lhe são
oferecidas, eles podem usar, formatar e reelaborar os materiais recebidos. O usuário utiliza sua
habilidade de ser social, de se conectar, de modo a crescer cada vez mais sua potência:
transforma o que é recebido de cultura de massa em cultura popular – é o que acontece quando
a cultura de massa é colocada de volta na rede ou se mescla à cultura tradicional. Os memes3
gerados nas redes sociais após acontecimentos pontuais em programas de TV ou novelas são
prova dessa força: cenas ou frases marcantes tomam proporções gigantescas e engajam milhares
de indivíduos teleinteragentes. O linguajar popular também é influenciado, seja com bordões,
seja com brincadeiras relacionadas ao acontecimento; tudo isto proporcionado pelo ser ativo e
social que se constitui como objeto de estudo na presente pesquisa.
3 Memes: termo bastante conhecido e utilizado no "mundo da internet". Refere-se ao fenômeno de "viralização"
de uma informação, ou seja, qualquer vídeo, imagem, frase, ideia, música etc., que se espalhe rapidamente entre
vários usuários, alcançando muita popularidade.
21
Um exemplo do que se acabou de citar é o crescimento gigantesco do número de
youtubers – como são chamados os donos de canais na mídia social Youtube –, atualmente
considerados exímios formadores de opinião. Alguns dos principais nomes ganham fama e
repercussão a partir de temas pautados pela sociedade e pelo noticiário, tais como cultura pop
e cidadania.
Nos últimos anos, observou-se essa transição na forma como o usuário consome e gera
informação. Não só pela mudança nos meios, mas principalmente graças à internet, veículo
capaz de impulsionar a posição de espectador para colaborador. Cannito (2010) descreve
nitidamente o período atual de transformação, no qual a tecnologia digital é a maior revolução
que já ocorreu na história das mídias.
A mudança é simultânea em todas as mídias e tem uma nova e fundamental
característica: a convertibilidade. “Bits são bits”, dizia Negroponte em A vida
digital. Essa simples definição muda tudo. No digital tudo pode ser reduzido
a código binário, a zero e um, então é fácil converter de uma mídia para a
outra. Surge assim uma nova possibilidade: a convergência das mídias, uma
revolução sem precedentes que é a verdadeira chave para entender o que
acontecerá com a televisão do futuro. (CANNITO, 2010, p. 15).
As novas plataformas criaram caminhos de oportunidades que fazem ascender práticas
sociais, constituindo uma cultura ligada em rede. Sinalizam com precisão este fator Jenkins,
Ford e Green, ao mostrarem um movimento na direção de um modelo mais participativo:
O público não é mais visto como simplesmente um grupo de consumidores de
mensagens pré-construídas, mas como pessoas que estão moldando,
compartilhando e reconfigurando conteúdo de mídia de maneiras que não
poderiam ter sido imaginadas antes. E estão fazendo isso não como indivíduos
isolados, mas como integrantes de comunidades mais amplas e em redes que
lhes permitem propagar conteúdos muito além de sua vizinhança geográfica.
(JENKINS; FORD; GREEN, 2014, p. 24).
Um processo social que, por meio de práticas locais ciberculturais, identifica o
indivíduo no mundo e torna-o parte da civilização mediática – em tempo real. A tecnologia não
se posiciona como um condicionante desta transformação, mas sim, parte atuante no processo.
É certo que o brasileiro é um indivíduo bastante ativo, que acredita muito em sua
presença online e em sua capacidade de modificação. Atualmente, os sujeitos, os receptores,
não querem apenas receber informações por intermédio das diversas mídias, querem também
ver-se, ouvir-se, participar, contar o próprio cotidiano para si e para aqueles com quem
convivem. Fazer parte das mídias sociais se tornou nos dias de hoje um imperativo para quem
quer se integrar à sociedade em rede. Basta uma rápida imersão nas mídias sociais, como
22
Twitter e Facebook, para se notar a necessidade de comunicação das pessoas, a premência em
estarem juntas – ainda que no ciberespaço, a vontade de falar e o desejo de serem ouvidas.
Shirky relata um ponto interessante sobre a mudança no ambiente de mídia nos últimos
anos, principalmente em relação à forma de produção de conteúdo público e privado:
Num histórico piscar de olhos, passamos de um mundo com dois modelos
diferentes de mídias – transmissões públicas por profissionais e conversas
privadas entre pessoas – para um mundo no qual se mesclam a comunicação
social pública e a privada, em que a produção profissional e a amadora se
confundem e em que a participação pública voluntária passou de inexistente
para fundamental. (SHIRKY, 2011, p. 186).
Essa mudança é entendida também no que tange à programação televisiva, na qual
cada vez mais programas da grade da TV aberta brasileira afirmam realizar interações e edições
de acordo com o intercâmbio realizado com o público. A dúvida que surge a partir desta
observação é: será que o usuário se percebe realmente interagindo com essa programação,
acreditando influenciar e pautar programas? Ou acredita ser algo pré-organizado junto a
interesses orientados em favor da audiência? Eis aqui uma provocação que perpassará a
pesquisa nos diversos níveis de discussão.
Compreendida a mudança do comportamento do indivíduo ciberespacial perante as
modificações das mídias tradicionais (como a TV) e da cibercultura, é hora de olhar adiante.
Ocorre, assim, uma nova perspectiva na área dos meios de comunicação frente ao novo viés
comportamental do usuário; a convergência é a palavra-mestra neste contexto.
1.1 Cultura da convergência
Percebe-se uma construção de cultura ascendente no âmbito do universo cibercultural
atual estudado: a cultura da convergência. O assunto foi abordado pelo pesquisador do MIT
(Massachusetts Institute of Technology) Henry Jenkins (2009), o qual trouxe uma quebra do
paradigma de que haveria a substituição das velhas mídias de massa pelas novas mídias digitais.
O autor defende que, ao invés de substituição, há uma convergência.
Na cultura da convergência, há uma correlação entre os meios de comunicação,
emergindo um fluxo de conteúdo proporcionado por diferentes mídias e provocando um
comportamento específico no público de diferentes experiências de entretenimento. O autor
afirma que essa convergência ocorre nos cérebros das pessoas e em suas interações sociais, não
se tornando um ponto final, mas sim, um processo:
A convergência das mídias é mais do que apenas uma mudança tecnológica.
A convergência altera a relação entre tecnologias existentes, indústrias,
mercados, gêneros e públicos. A convergência altera a lógica pela qual a
23
indústria midiática opera e pela qual os consumidores processam a notícia e o
entretenimento. [...] Prontos ou não, já estamos vivendo numa cultura da
convergência. (JENKINS, 2009, p. 43).
Com foco no território de estudo (TV e mídias sociais), procura-se compreender como
essa cultura convergente ocorre entre os meios e como o usuário participa das novas formas de
narrativas. Utilizar-se-á mais uma vez o auxílio de Jenkins e de sua narrativa transmídia – ou
transmedia storytelling – a fim de explicitar melhor o assunto, que será abordado no segundo
capítulo dessa Dissertação.
Atualmente, observa-se o modo como a TV intima a convergência para sua realidade
e traz o estímulo de uma “segunda tela”, materializada por meio de smartphone ou tablet –
instrumentos que proporcionam uma nova opção para assistir a um programa de TV, como
também alteram a maneira de experimentá-la.
Na história dos meios de comunicação, observa-se uma preocupação sempre que uma
novidade comunicacional é desenvolvida. No século passado, quando a TV foi criada, muito se
falou sobre a morte do rádio. Bullshit. Paralelamente, ambos continuaram em seus caminhos e
desenvolveram-se ainda mais. Após a concepção da internet, bem como de seu uso e
importância para a vida cotidiana do atual século, é natural observar a grandiosidade e
velocidade com que este meio se tem apresentado, além de se notar especulações e dúvidas
sobre o futuro da TV no país. Bullshit. Ambos se completam e se desenvolvem, abrindo novas
frentes e negócios com tal mistura e, quem sai ganhando, é o próprio usuário.
Isto posto, percebe-se que todas as mídias permanecem e, ao final, acabam se
completando. Cannito (2010, p. 17) defende essa linha de pensamento e afirma que a crença de
que a TV vai “perder” espaço para a internet é especulativa. Em suas palavras: “Na prática,
tudo vai confluir. Quem vai ganhar a batalha não é uma das mídias em si, mas sim o produtor
de conteúdo que souber criar obras que atuem simultaneamente em todas as mídias”. O poder
concentrar-se-á nas mãos de quem melhor conseguir compreender o cenário: criar e/ou produzir
bom conteúdo para atuar simultaneamente em diversas mídias. Jenkins afirma que
A expressão cultura participativa contrasta com noções mais antigas sobre
passividade dos espectadores dos meios de comunicação. Em vez de falar
sobre produtores e consumidores de mídia como ocupantes de papéis
separados, podemos agora considerá-los como participantes interagindo de
acordo com um novo conjunto de regras, que nenhum de nós entende por
completo. Nem todos os participantes são criados iguais. Corporações – e
mesmo indivíduos dentro das corporações de mídia – ainda exercem maior
poder do que qualquer consumidor individual, ou mesmo um conjunto de
consumidores. E alguns consumidores têm mais habilidades para participar
dessa cultura emergente do que outros. (JENKINS, 2009, p. 30).
24
As empresas de mídia – produtoras de conteúdos de massa – já percebem a atual forma
como o público vem consumindo mídia nos dias de hoje. Os consumidores se tornaram mais
ativos, migratórios e com pouca lealdade perante as redes ou a meios de comunicação. “Se os
antigos consumidores eram indivíduos isolados, os novos consumidores são mais conectados
socialmente. Se o trabalho de consumidores de mídia já foi silencioso e invisível, os novos
consumidores agora são barulhentos e públicos” – assevera Jenkins (2009, p. 47). É necessário
que as grandes corporações observem o movimento e se aperfeiçoem à tendência, respeitando
as diferentes plataformas e públicos. Cannito aborda os direcionamentos da convergência para
as empresas:
A convergência remodela tudo: da linguagem à organização das empresas, que
estão revendo seu plano de negócios e reorganizando seu modelo de produção.
Uma tendência crescente no mundo da convergência é o desenvolvimento de
produtos e serviços cruzados entre empresas de diferentes setores da indústria
de comunicação e entretenimento. Uma imagem produzida originalmente para
cinema pode, com a tecnologia digital, ser exibida também no celular. Isso faz
que as obras sejam, desde o início, concebidas com uma linguagem adequada
a várias saídas, ou com conteúdos extras que possibilitem ações cross media
(mídias cruzadas) ou transmídia. (CANNITO, 2010, p. 84).
Um exemplo nato de observação de cenário e excelente uso dos aprendizados
adquiridos é a criação norte-americana do Netflix. Partindo da premissa de que os
telespectadores querem assistir ao que desejam, quando e onde lhes apetece – e de forma barata
–, surgiu um produto inédito da revolução digital vivida nos tempos atuais. O Netflix é um
serviço que não está tirando o lugar de outra mídia, mas certamente, está mudando
definitivamente a forma e a experiência de se assistir à TV. “Pense no aparelho de TV de um
futuro não muito distante como um grande iPad pendurado na parede” – afirma Reed Hastings,
fundador e presidente da empresa.
Agora empresas de internet, como Netflix e YouTube, estão mudando a
própria ideia do que se entende por programação de TV. O comportamento de
cada indivíduo é armazenado e destrinchado: softwares de análise de dados
são cada vez mais importantes nas decisões de quais roteiros filmar, quais
descartar. (TEIXEIRA JR., 2015, p. 34).
Com uma mensalidade fixa de R$ 19,90 (dezenove reais e noventa centavos), os
assinantes do Netflix podem assistir à vontade ao conteúdo disponibilizado na plataforma: a
cada mês, são mais de 2 bilhões de horas de filmes e séries de TV, sem nenhuma interrupção
comercial; uma real revolução na área de conteúdo por demanda no atual cenário de
convergência.
25
É perceptível o uso da inteligência, de modo que os números da empresa acerca dos
sujeitos teleinteragentes avaliam o perfil de uso dos assinantes e produzem conteúdo voltado
exclusivamente para seus interesses. Uma “produção” orientada por big data com influência
dos usuários. Os computadores da empresa registram exatamente o que cada usuário assistiu,
além da ordem e quantidade de episódios.
Em uma entrevista recente, Ted Sarandos, o responsável pelo conteúdo do
Netflix, disse que as decisões sobre os investimentos artísticos da empresa
seguem uma proporção de mais ou menos 70-30 – ou seja, 70% dependeriam
dos dados; e 30% da intuição. (TEIXEIRA JR., 2015, p. 34).
Com tanta ajuda de informações sobre o perfil do target, fica mais assertiva a produção
de novos conteúdos e direcionamentos internos da empresa. O usuário produz –
inconscientemente – números que auxiliam a empresa de entretenimento a oferecer ainda mais
conteúdos interessantes; uma teia retórica e bem-aventurada para ambas as partes.
Visto o cenário aflorado de referências, percebe-se que esse sujeito cibercultural tem
se mostrado atuante não só na área do entretenimento, mas também em relação aos interesses
públicos em geral, cobrando das mídias tradicionais, das marcas e de pessoas do ciberespaço,
posturas mais reais e transparentes. Esta performance, citada por Jenkins como inteligência
coletiva, é utilizada hoje em dia primordialmente para o lazer, mas já vem ganhando proporções
maiores, tal como supracitado.
O consumo tornou-se um processo coletivo [...] Nenhum de nós pode saber de
tudo; cada um de nós sabe alguma coisa; e podemos juntar as peças, se
associarmos nossos recursos e unirmos nossas habilidades. A inteligência
coletiva pode ser vista como uma fonte alternativa de poder midiático.
Estamos aprendendo a usar esse poder em nossas interações diárias dentro da
cultura da convergência. Neste momento, estamos usando esse poder coletivo
mais principalmente para fins recreativos, mas em breve estaremos aplicando
essas habilidades a propósitos mais “sérios”. (JENKINS, 2009, p. 30).
Ainda utilizando as palavras de Jenkins (2014, p. 366) e sua citação sobre o tio Bem e
Peter Parker, no filme Homem-Aranha [Spider-Man]: “com o grande poder vem a grande
responsabilidade”. Assim como as empresas (principalmente de mídia) e os governos devem
enfrentar o aumento da pressão para serem transparentes em uma era em que as informações
estão mais do que nunca propensas a virem à tona, cada um tem de pensar sobre a cumplicidade
em relação aos materiais que são retransmitidos; sobre a responsabilidade dos cidadãos de
examinarem o que compartilham; e sobre a reputação como curadores das informações que
escolhem para fazer circular.
Com isso, percebe-se que, na verdade, aquilo que se mostrava como um canal
concorrente da mídia tradicional, vem se mostrando um canal complementar; e o que parecia
26
ameaçar a uniformidade cultural, está agora efetivamente criando diversidade. O que importa
agora é a transformação das capacidades atuais em oportunidades. De sorte que quem ganha
em todo esse processo é o usuário.
Portanto, torna-se necessário compreender melhor este território, conhecer e delimitar
o perfil destes sujeitos ciberculturais que atuam no ambiente de mídia propagável. Mas para tal,
é necessário observar o cenário e aprofundar a análise das formas de construção destes
conteúdos. O próximo capítulo aborda ainda a convergência dos meios.
27
2 A NARRATIVA TRANSMÍDIA, FÃS E A IMPORTÂNCIA DOS USUÁRIOS COM
REPUTAÇÃO NAS REDES
A maior mudança talvez seja a
substituição do consumo individualizado
e personalizado pelo consumo
como prática interligada em rede.
Henry Jenkins
Observou-se, no capítulo anterior, o território no qual o usuário, cidadão cibercultural,
está inserido, em meio a veículos convergentes e delimitação de espaço. No presente capítulo,
será analisado mais a fundo um recorte sobre os conteúdos que são criados pelos meios e o
público que os consome. Para tal, a narrativa transmídia será uma das pontas de abordagem.
O termo em língua inglesa transmedia storytelling – traduzido para o português como
narrativa transmídia – foi batizado por Henry Jenkins no livro Cultura da convergência; nele,
o autor argumenta que a narrativa transmídia é um desdobramento da cultura da convergência.
Será usada na presente pesquisa a linha geral proposta pelo autor (2009, p. 49) na qual ele se
refere a esta narrativa como “uma nova estética que surgiu em resposta à convergência das
mídias – uma estética que faz novas exigências aos consumidores e depende da participação
ativa de comunidades de conhecimento”.
Adentrando na narrativa, Mittermayer (2016, p. 19) auxilia na observação de que
nunca foi problema para o ser humano contar histórias – há milênios ele interpreta signos,
manifesta pensamentos e cria histórias. O que mudou atualmente para o indivíduo
contemporâneo é “que o homem deixou de contar mitos ao redor da fogueira e começou a contar
narrativas ficcionais primeiramente por meio da literatura, hoje também pelos meios de
comunicação”. Essas histórias são criadas principalmente para esquecer os problemas passados
no dia-a-dia, para fins de entretenimento da população.
Mittermayer ainda cita que as mídias admitiram a função de contar essas histórias por
meio de “quadrinhos, livros, filmes, séries e novelas, jogos digitais, pela web em séries online
e até mesmo pelas redes sociais digitais” (2016, p. 19). O autor conclui que o mais interessante
é notar a constante evolução deste processo: “a evolução dos meios e das tecnologias
acompanham a forma de contar e criar narrativas”. E é com a ajuda dessas novas formas de
contar histórias, com nome de narrativa transmídia, que é possível observar a dinâmica de
consumo de conteúdo dos usuários.
Uma história transmídia desenrola-se através de múltiplas plataformas de
mídias, com cada novo texto contribuindo de maneira distinta e valiosa para o
28
todo. Na forma ideal de narrativa transmídia, cada meio faz o que faz de
melhor – a fim de que uma história possa ser introduzida num filme, ser
expandida pela televisão, romances e quadrinhos; seu universo possa ser
explorado em games ou experimentado como atração de um parque de
diversões. (JENKINS, 2009, p. 138).
Os meios digitais ganham destaque no cenário por tornarem rapidamente as narrativas
ainda mais tangíveis e exponenciais. A narrativa transmídia se concentra nos dias de hoje
principalmente no entretenimento, um mercado que sempre busca inovação a curto prazo,
focado em rentabilidade e sucesso instantâneo. Daí tanta concentração nas mídias sociais e o
impacto gerado aos usuários: de uma maneira rápida e mensurável, estes conteúdos se espalham
e ganham território. Assim como cita Gosciola, nota-se que:
As novas tecnologias de comunicação e de informação, ou as novas mídias,
abriram-se também para as possibilidades de contar histórias. Assim como no
caso do cinema, no período inicial do contar histórias através das novas
mídias, as histórias eram mais simples. Porém, agora, elas são contadas de
maneira complexa, isto é, graças aos recursos das novas mídias, podem ser
apresentadas por diversos pontos de vista, com histórias paralelas, com
possibilidades de interferência na narrativa, com opções de continuidade ou
descontinuidade da narrativa e muito mais. (GOSCIOLA, 2003, p. 19).
Os principais meios de comunicação, como a TV, já perceberam a importância sobre
a forma de atuar nos diversos “braços” que compõem seu negócio, com um conteúdo integrado
em diversas plataformas. Porém, a qualidade da história precisa ser a grande estrela: o
transmídia só acontece após uma excelente ideia.
Um exemplo recente e interessante a ser citado no contexto da vertente de conteúdo
multiplataforma é a novela que obteve sucesso de audiência no horário das 19 horas, no ano de
2016, na Rede Globo, intitulada Totalmente Demais. Para a emissora, a novela foi um grande
laboratório de experiências de conteúdo, interatividade e ações comerciais. A trama teve seu
capítulo zero exibido antes no Globo Play, plataforma de streaming da emissora, rompendo
barreiras nunca anteriormente vistas na teledramaturgia. Após altos índices de audiência e
conquista de um público cativo e engajado nas mídias sociais, a emissora resolveu construir um
conteúdo digital depois do encerramento da novela, o qual foi intitulado de “Totalmente Sem
Noção Demais”. Tal conteúdo dispunha de dez capítulos que contavam um pouco mais sobre a
história dos principais personagens da trama – tudo isso exibido somente no ambiente digital.
O resultado foi tanto o alto engajamento dos telespectadores para assistir online aos capítulos
extras, bem como uma narrativa de sucesso para a empresa.
29
Nota-se não só a ligação de um bom conteúdo focal a diversos pontos de contato da
própria emissora, mas também a produção de conteúdo diferenciado para cada canal: a narrativa
transmídia ascende e aflora suas vertentes. Jenkis cita que:
A narrativa transmídia é a arte da criação de um universo. Para viver uma
experiência plena num universo ficcional, os consumidores devem assumir o
papel de caçadores e coletores, perseguindo pedaços da história pelos
diferentes canais, comparando suas observações com as de outros fãs, em
grupos de discussão on-line, e colaborando para assegurar que todos os que
investiram tempo e energia tenham uma experiência de entretenimento mais
rica. (JENKINS, 2009, p. 49).
Nesse cenário, compreende-se que os fãs são o elo principal de todo esse processo.
São eles que unirão as pontas e justificarão todos os esforços realizados em prol do conteúdo.
Afinal, tal como citado por Jenkins (2009), o que seria Matrix sem seus milhares de fãs
consumindo seus diversos produtos diferentes? Mittermayer complementa:
[...] o fã não quer apenas tuitar, curtir, comentar ou compartilhar sobre a
narrativa. No contexto atual, o fã também deseja entrar na narrativa ficcional.
A paixão do fã pela narrativa é tão grande que, para eles não basta ser apenas
um espectador comum. Alguns fãs almejam ser os criadores, os produtores, os
autores, os colaboradores e, lá no fundo obscuro, eles sentem-se donos da
narrativa armada. (MITTERMAYER, 2016, p. 83).
Hoje em dia, as novas tecnologias apenas expandem o processo de participação desses
indivíduos interativos socialmente ligados em torno de um objetivo comum. Anteriormente,
eles possuíam o contato direto por intermédio de conversas pessoais, cartas escritas,
organização de fã-clubes, fóruns de discussões online, blogs, etc.; atualmente, eles produzem
conteúdos (fanfics) e expandem o universo ficcional em uma verdadeira cultura participativa.
As ações de fã-clubes desse nível chegam à produção de fan fictions (fanfic),
roteiros e postagens de suas realizações na web, num movimento mundial de
divulgação de milhares de novos audiovisuais invisíveis à grande imprensa e
ao conhecimento do público em geral. É um movimento de grande interesse
para a TV interativa e, de acordo com Dan Harries, já recebeu o nome de
“audiência interativa”. (CANNITO, 2010, p. 177).
Essa cultura participativa provocada pelos fãs é um novo modo de pensar em cidadania
e colaboração. E tudo isso interconectado: um campo fértil para divulgação de novos conteúdos.
A cultura do fã é um embrião para as narrativas transmídias. Jenkins explicita de modo mais
preciso:
Os fãs sempre foram os primeiros a se adaptar às novas tecnologias de mídia;
a fascinação pelos universos ficcionais muitas vezes inspira novas formas de
produção cultural, de figurinos a fanzines e, hoje, de cinema digital. Os fãs
são o segmento mais ativo do público das mídias, aquele que se recusa a
30
simplesmente aceitar o que recebe, insistindo no direito de se tornar um
participante pleno. (JENKINS, 2009, p. 188).
Visto a importância destes na narrativa transmídia, a presente pesquisa traz como
cenário observado do universo envolvendo fãs versus conteúdo transmídia, a análise de dois
programas brasileiros da grade noturna da Rede Globo de televisão, quais sejam: BBB16 e a
telenovela Verdades Secretas. Além da observação de conteúdo televisivo durante os períodos
de exibição, também foi realizada uma imersão nas mídias sociais (Twitter e Facebook) durante
os programas, sendo possível depurar pontos importantes e relevantes para a presente pesquisa.
A seguir, serão citados os acontecimentos e aprendizados durante os meses de cada
programa.
2.1 Big Brother Brasil 2016 (BBB16)
O programa Big Brother é um reality show de formato mundial, cuja proprietária é a
produtora holandesa Endemol. A versão brasileira está na grade anual da TV Globo há dezesseis
anos. A ideia do programa é escalar alguns participantes – após seleção com entrevistas e fotos
– para confinamento em uma casa vigiada por câmeras e, principalmente, pelo grande público.
Ao final, apenas um ganhador leva o prêmio máximo, após 3 meses de confinamento.
A cada ano, novos ídolos e celebridades saem do BBB (como é popularmente
conhecido) e ganham repercussão junto ao público. Muitos já se tornaram atores e atrizes, além
de apresentadores e formadores de opinião; outros, possuem apenas sucesso instantâneo e, logo
após o programa, caem no esquecimento.
Indiscutivelmente Big Brother é um exemplo de programa que “colou”. E
minha hipótese é que ele colou por ter abordado os mesmos temas da novela
brasileira, mas criando uma forma inovadora de representar a sociedade, uma
forma muito adequada à experiência contemporânea e à cultura digital.
(CANNITO, 2010, p. 202).
A edição de 2016 teve uma atenção especial por parte desta pesquisa por se configurar
um ponto fora da curva em relação às edições dos outros anos: o compromisso de que o último
programa, o da grande final, seria feito com o auxílio do público de casa – o usuário. Com um
primeiro convite via chamada no programa, feita pelo apresentador Pedro Bial, o sujeito
teleinteragente foi convidado a participar, mas apenas por intermédio da internet.
31
Figura 1: Apresentador Pedro Bial na chamada ao vivo para participação na final
Fonte: Conteúdo online da final do programa no GloboPlay 4
Além da chamada ao vivo do apresentador, houve outros meios de convite ao público,
a saber: nas mídias sociais da Rede Globo, online na plataforma Gshow e em sites parceiros,
como o Uol. Intitulado de “VOCÊ NA FINAL!”, os usuários participavam através do site e
pelo aplicativo do programa (app). Para tal, bastava participar de um desafio e enviar um vídeo
relatando a opinião acerca de alguns momentos que mais chamaram atenção do sujeito
interativo na edição 2016, como por exemplo: “qual momento mais mexeu com você”; “qual
foi o momento mais engraçado”; “por qual romance você torceu”; e “para quem vai sua
torcida!”, dentre outros.
4 Disponível em: <https://globoplay.globo.com/v/4936745/>. Acesso em: 20 set. 2016.
32
Figura 2: Conteúdo explicativo sobre como participar da final via app
Fonte: Site da Globo5
5 Disponível em: <http://gshow.globo.com/participe/noticia/2016/03/participe-dos-desafios-no-aplicativo-do-
bbb16-e-apareca-na-final-do-reality.html>. Acesso em: 20 set. 2016.
33
Figura 3: Passo -a -passo via site para participação via site – envio do vídeo – etapa 1
Figura 3.1: passo a passo para participação via site – envio do vídeo – etapa 2
Figura 3.2: passo a passo para participação via site – envio do vídeo – etapa 3
Fonte: Site da Globo6
6 Disponível em: <http://colaboracoes.globo.com/campanha/340/colaboracoes/nova?assunto=1249>. Acesso em:
20 set. 2016.
34
O aplicativo do Big Brother Brasil é um exemplo nato de teor transmídia. Além de
conteúdos inéditos, o app colocou em contato os fãs por meio de chats, trouxe desafios e vídeos
inéditos, além de brincadeiras em um só território. O aplicativo poderia ser instalado tanto em
aparelhos Android quanto IOS, abrangendo grande parte dos smartphones brasileiros. E para
fechar esse período de narrativas transmídia, o programa resolveu contar com a ajuda dos
“BBBmaníacos” – como são chamados os usuários mais fervorosos – para ajudar na construção
do último programa da edição 2016.
Figura 4: Print da página/ convite para baixar o app – via site
35
Figura 4.1: continuação do print da página/ convite para baixar o app – via site
Figura 4.2: continuação do print da página/ convite para baixar o app – via site
Figura 4.3: continuação do print da página/ convite para baixar o app – via site
36
Figura 4.4: continuação do print da página/ convite para baixar o app – via site
Figura 4.5: continuação do print da página/ convite para baixar o app – via site
Fonte: Site da Globo7
A final do BBB16 prometeu ser disruptiva e construída com a interação dos usuários,
conforme reiterou o apresentador Pedro Bial durante a final do programa: “o BBB16 é o BBB
de vocês”. Porém, o que se observou durante a apresentação do programa no dia cinco de abril
de 2016 foi o seguinte: realmente houve interações do público, entretanto, foram editadas e
escolhidas pelo crivo do programa. As pautas foram liberadas aos usuários para que cada um
pudesse falar de momentos e de pessoas que mais gostaram durante o período de duração do
programa, porém, a verdadeira voz enviada pelo usuário foi editada, mixada por terceiros e
levada ao ar de acordo um roteiro “pré-estabelecido” do programa. Na realidade, apenas alguns
trechos dos vídeos recebidos foram selecionados e editados para a final; o time interno realizou
7 Disponível em: <http://especiais.gshow.globo.com/bbb/bbb16/especial-app/>. Acesso em: 20 set. 2016.
37
uma peneira e apenas algumas participações foram contabilizadas durante o programa de 1 hora
e 4 minutos de duração.
Figura 5: Momento do programa na TV, utilizando visual e linguagem interativa
Fonte: conteúdo online da final do programa no GloboPlay 8
Além da supracitada participação dos usuários durante a final, o programa também
realizou ações diferenciadas e inéditas em relação aos anos anteriores. Devido ao grande
sucesso da edição 2016 e de números exponenciais observados pelo Twitter e pela Rede Globo,
as empresas se uniram para criar novidades na telinha e na rede online, e ainda dar uma ajudinha
às torcidas dos participantes: uso de emojis divertidos. Quem utilizasse a hashtag #BBB16 –
ou a hashtag com o nome de candidato eliminado mais a sigla BBB (#AnaPaulaBBB, por
exemplo) – veria em seus tuítes um emoji com o robozinho do programa.
O apresentador alertou os usuários, também durante o programa na TV, que quem
tuitasse com as hashtags #BBB16, #VaiGeralda, #VaiRonan, #VaiMariaClaudia e/ou
#VaiMunik, na semana da grande final, seriam agraciados com emojis criados especialmente
para cada finalista. Pela primeira vez na história da televisão brasileira, cada finalista do reality
show teve seu próprio emoji personalizado no universo online.
Os Brothers da casa mais vigiada do país já criaram muitas polêmicas na
telinha e fizeram barulho no Twitter. A repercussão foi tanta que, até o
momento, já foram enviados mais de 13 milhões de Tweets, gerando mais de
385 milhões visualizações na plataforma, 63% mais impacto do que na edição
anterior. Foram diversos bate-papos com a Ana Paula (@anapaularenault) e
outros participantes, memes, GIFs e Moments especiais fazendo a cobertura
de tudo o que acontece para os fãs não perderem nenhum detalhe. (FLORIS,
2016, não paginado).
8 Disponível em: <https://globoplay.globo.com/v/4936745/> Acesso em: 20 set. 2016.
38
Figura 6: Print da final do programa sobre os emojis do BBB16
Fonte: Conteúdo online da final do programa no GloboPlay 9
Figura 7: Tuíte do perfil do programa sobre os emojis na semana da grande final
Fonte: Twitter BBB 10
Percebe-se que os fãs também gostaram e aprovaram o aplicativo em torno do reality
e, inclusive, interagiram online (via Twitter) mencionando a relevância do app. O tuíte não era
sobre as funcionalidades do aplicativo, mas como essa ferramenta se tornou necessária para a
audiência do programa.
9 Disponível em: <https://globoplay.globo.com/v/4936745/> Acesso em: 20 set. 2016.
10 Disponível em: <https://twitter.com/bbb>. Acesso em: 20 set. 2016.
39
Figura 8: Tuíte sobre o aplicativo do BB16
Fonte: Twitter
A observação sobre a final do BB16 levantou alguns pontos para esta pesquisa, no que
se refere à interação existente entre Programa de TV versus Usuário nas redes. Esta é percebida
pelos indivíduos ciberculturais e exaltada pelo programa de TV, porém, existe um
aprofundamento maior sobre essa interação. Os fãs do BBB tornam-se – na medida que o
programa está no ar – fãs de participantes do programa; nota-se uma verdadeira empatia criada
entre os fãs-usuários e os participantes que viram ídolos, causando uma verdadeira paixão pelo
programa de entretenimento. A grande mídia televisiva já percebeu esse movimento nas mídias
sociais não só neste segmento, mas como uma dinâmica corriqueira entre online e televisivo. A
cada ano, a cada temporada, é necessário uma renovação e um novo olhar em torno do que pode
tornar-se novidade para este engajamento. A narrativa transmídia tem despontado como uma
das soluções neste momento. Porém, a inovação vem a ser a palavra da vez neste contexto. Não
é qualquer postura inovadora que permeará este relacionamento: interesses maiores e mais
rentáveis dão o tom neste sentido. Aplicativo online com conteúdo inédito sobre o programa,
parcerias entre veículos e até participação orquestrada do público – tudo isso é realizado como
forma de “promover” engajamento entre o usuário e a TV. O público responde ao chamado e
interage com conteúdo e com novas propostas de engajamento.
É aqui que se compreende um território mais denso e afunilado para o emissor e
receptor. A mensagem passada de volta ao emissor é compreendida da maneira que convém a
quem produziu o conteúdo; o feedback do receptor é mais perceptível quando se entra em
extremos como total negação ou desaprovação – casos raramente observados na mídia atual.
Então a interpretação e reverberação desses números pelo emissor terá, em grande escala, dados
40
positivos e boas avaliações em um contexto geral – principalmente para os parceiros e
patrocinadores do programa. Porém, uma dúvida aflora: será que realmente isto pode ser
considerado um engajamento real, participativo, dos usuários?
Aberto este parêntese, notou-se a necessidade de uma pesquisa mais aprofundada para
melhor compreensão sobre estes questionamentos e sobre o perfil de quem está online para o
engajamento proposto entre TV e internet. Contudo, apenas no terceiro capítulo será realizado
um aprofundamento quantitativo.
Ainda no território de observação, traz-se um segundo caso, o da telenovela Verdades
Secretas, exibida no segundo semestre de 2015, na Rede Globo. Um sucesso de audiência com
destaque em narrativa transmídia; desta vez, com um “braço” inovador engrenhado entre os
usuários no território analisado.
2.2 Verdades Secretas (2015)
A Rede Globo de Televisão tem voltado sua atenção nos últimos anos ao público de
telenovela no horário das 23 horas. Tal fato não surpreende haja vista a grande aceitação do
público não só pelo conteúdo, mas também pelo horário de atuação. O brasileiro assiste mais
TV no horário noturno11, principalmente em relação às pautas de entretenimento. Nesse
território, a possibilidade de abordar temas mais polêmicos e formatos mais diversificados –
com chamadas na TV em estilo série e imagens com qualidade de cinema – tem sido uma aposta
visível da emissora quando se trata de inovação na grade de programação. Verdades Secretas12
estreou com alta aceitação do público já desde o primeiro capítulo. Um movimento inicial da
emissora, em relação aos excelentes pontos de audiência já na primeira semana, foi modificar
o horário até então proposto de veiculação do programa: devido ao bom desempenho, passou a
ser a novela das dez, após a novela das nove – uma estratégia a fim de aumentar os índices de
audiência da novela Babilônia, então veterana das 21 horas.
No ano de 2015, a telenovela citada neste tópico foi considerada como o título de maior
sucesso da emissora. Em audiência, chegou a marcar 29 pontos no Ibope nas últimas semanas,
número raro para a faixa horária. Do mesmo modo, a parte publicitária também obteve sucesso
e, após um período com apenas um intervalo comercial por capítulo, Verdades Secretas passou
11
Brasil (2014). 12
Telenovela produzida e exibida pela Rede Globo no horário das 23 horas entre 8 de junho a 25 de setembro de
2015, em 64 capítulos. Foi a 5ª "novela das onze" exibida pela emissora. Escrita por Walcyr Carrasco e Maria
Elisa Berredo.
41
a ter dois nos últimos dias de exibição, ou seja, rentabilidade para a TV e também
reconhecimento do público em um produto que se reinventou nos últimos tempos.
Visto todo este cenário de números positivos na TV, a presente pesquisa interessou-se
em entender melhor este universo devido ao enorme sucesso observado também nas mídias
sociais. Não foi só a trilha sonora e enredo excelentes – além do formato cinematográfico – que
fizeram a telenovela cair nas graças do público, houve também um grande aliado: as mídias
sociais, mais especificamente, o Twitter. O sucesso pode ser medido quando se afirma que o
folhetim foi a única atração brasileira entre os dez programas mais citados nas redes sociais em
todo território mundial no mês de junho de 2015.
Figura 9: Tuítes dos usuários com a #VerdadesSecretas
Fonte: Twitter
42
Figura 10: Tuítes dos usuários captados do Twitter
Fonte: Twitter
Após as análises nas mídias sociais, foi possível observar a grande repercussão da
novela entre os usuários. Foram 3 meses de fervor na internet, com milhares de tuítes e posts
no Facebook. Notou-se nas plataformas digitais um movimento em torno da telenovela,
independentemente do horário: a interação ocorria não só durante o programa, mas também em
vários momentos do dia, utilizando-se sempre a hashtag #VerdadesSecretas.
À época, alguns sites especializados em televisão trouxeram para a pauta o “porquê”
do sucesso da telenovela junto aos brasileiros. Alguns sugerem a forte narrativa da trama do
autor Walcyr Carrasco, outros, indicam o excesso de sexualidade e coragem vindo da emissora
– e até fatos reais bem próximos da dura realidade vivida por muitos. Porém, a presente pesquisa
observou um movimento pulsante nas mídias sociais que poderia ser citado, indubitavelmente,
como um grande engajador de público para a telenovela.
Um fenômeno relevante ocorreu no meio digital, uma diferente proposta de
convergência no Brasil – narrativa transmídia –, observado de uma maneira peculiar neste
contexto da telenovela, e que foi intitulado nesta pesquisa como “usuário com reputação nas
43
redes”. No caso observado, o usuário com reputação em questão chama-se Hugo Gloss: uma
web-celebridade que comentava diariamente, de uma forma irreverente, a novela e seus
personagens, além de promover resumos do dia (antes de o capítulo ir ao ar, HugoGloss já
realizava, inusitadamente, no início do dia, comentários sobre os acontecimentos da trama), e
o fazia por meio de suas páginas no Twitter, blog e Facebook.
Figura 11: Facebook do HugoGloss com o #ResumoGloss
Figura 11.1: Facebook do HugoGloss com o #ResumoGloss
44
Figura 11.2: Facebook do HugoGloss com o #ResumoGloss
Fonte: página da web-celebridade HugoGloss no Facebook13
Gloss, como costuma ser chamado, é um fenômeno peculiar da internet brasileira.
Baseada no interesse de entendimento sobre a força deste personagem na rede, a presente
pesquisa buscou compreender mais a fundo este usuário com reputação – no capítulo seguinte
desta Dissertação, delimitar-se-á melhor o seu perfil.
O jornalista Bruno Rocha14 é o nome por trás deste personagem ressaltado. Tudo
começou no Twitter há alguns anos, quando ele ainda escrevia como um fake de um humorista
chamado “Christian Pior”. Após complicações com o perfil fake, o jornalista teve de se desfazer
de seu nome antigo e criar uma nova identidade, intitulada Hugo Gloss. E foi a partir daí que
as coisas começaram a acontecer para o brasiliense: em 2013, foi convidado por Luciano Huck
para se tornar redator do “Caldeirão do Huck”, atração de sábado da Rede Globo. De lá para
cá, Bruno construiu um poderio online de fazer inveja: ampliou seu poder nas mídias, seja com
blog, página no Facebook, Twitter, Periscope, Snapchat, virou apresentador de TV, entre outras
atividades.
Esta informação acima é proeminente para os estudos em questão. Pois, o fato de que
um dos principais influenciadores das mídias sociais durante o sucesso de Verdades Secretas,
em 2015, na TV Globo, é funcionário da emissora, torna-se algo bastante peculiar. Todo
13
Disponível em: <https://www.facebook.com/HugoGloss>. Acesso em: 21 set. 2016. 14
Bruno Rocha ganhou notabilidade em 2010 quando criou um Twitter fake chamado "Christian Pior", sempre
interagindo com famosos, ganhou muita visibilidade porém, teve que trocar de nome, então passou a se chamar
Hugo Gloss e um dia foi contatado por Luciano Huck e chamado para ser redator do Caldeirão do Huck. Em
2013, criou o blog Hugo Gloss, que é um dos maiores sites de famosos do Brasil, estando entre os 900 mais
acessados.
45
movimento de observação recai no fato de que ele era um dos “braços” da TV na hora de
construir conteúdo sobre a telenovela no ambiente online. O jornalista não só atuou como um
comentador de conteúdo – tal como já é conhecido nas redes –, mas também produziu conteúdos
diferenciados para os usuários. Com o uso da hashtag #ResumoGloss, ele conseguiu realizar
uma antecipação do que seria veiculado pela telenovela no mesmo dia, mas o fez de maneira
leve e divertida, entretendo o usuário e causando um verdadeiro alvoroço nas mídias sociais.
Com o apoio da emissora, Gloss tinha acesso não só ao resumo da telenovela, mas
também às imagens das cenas que seriam veiculadas no capítulo do dia. O seu conteúdo virava
um teaser próprio sobre a novela, alinhado ao universo digital e dialogando diretamente com
os usuários/fãs do programa. Percebe-se a forma como a emissora o conduziu a fim de ser um
produtor de conteúdo, mesclando a pessoa física (e jurídica), promovendo-o perante os usuários
como um fanfics – mais do que apenas um veículo transmídia –, sendo portanto, uma forma de
gerar empatia entre os outros fãs.
Figura 12: Tuítes sobre a atuação de HugoGloss ao final de Verdades Secretas
Fonte: Twitter
46
Figura 13: Tuítes sobre a atuação de HugoGloss ao final de Verdades Secretas
Fonte: Twitter
A pesquisa traz em pauta a observação de uma nova forma de produção de conteúdo
da narrativa transmídia, na qual um fã (“Gloss foi convidado para virar produtor do Caldeirão
não só por ter se tornado uma promessa ao mundo digital naquela época, mas também por ser
exímio conhecedor da história e programação televisiva”15), após ascensão nas redes, é
incorporado ao universo da produção televisiva e é contratado para realizar a disseminação de
conteúdo online, engajando os usuários e ascendendo ainda mais o produto em foco; além disso,
tinha acesso a um conteúdo inédito, em primeira mão, antes mesmo de outros veículos de
imprensa que comentam sobre o assunto. Aqui, não se classifica-o como uma forma de fanfics
devido a essa ligação direta com a fonte. Gloss é intitulado na presente pesquisa como usuário
de reputação nas redes por conseguir se igualar aos fãs devido às suas atuações, por ter
credibilidade entre os usuários e também por ser considerado parte do universo online – não
ligado ao universo televisivo.
15
Comentário retirado da entrevista de Hugo Gloss à blogueira Camila Coutinho, no quadro #DeCarona – no
Youtube. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=bzPja6kIlC0>. Acesso em: 15 set. 2016.
47
Figura 14: Tuítes de HugoGloss durante a final de Verdades Secretas
Fonte: Twitter
Figura 15: Tuítes de HugoGloss durante a final de Verdades Secretas
Fonte: Twitter
Apesar de Bruno já ter citado em entrevista16 que é funcionário da emissora, poucos
usuários sabem de sua ligação com a TV Globo neste período, e veem seus posts como
descobertas (furos) devido à grande influência do jornalista em relação a celebridades e veículos
importantes. Atualmente, em 2016, Bruno Rocha virou apresentador de TV (MTV) e toca seu
blog, mídias sociais e projetos publicitários como prioridade – oficialmente, o jornalista saiu da
Rede Globo no final de 2015. Para tal feito, Bruno conta com uma equipe profissional para
auxiliá-lo nos posts, pesquisas e projetos.
Sempre gostei de fazer comentários das novelas, mas com Verdades eu
misturei nomes de personagens antigos e criei nomes novos (Larissa, vivida
por Grazi Massafera, virou Grazi Winehouse e, depois de convertida, Grazi
16
Batista Jr. (2015, não paginado).
48
Urach). Eu postava o resumo da novela todos os dias, sempre com o meu olhar.
Todos os resumos tinham mais de 100 000 curtidas no Facebook, sendo que o
do último capítulo teve mais de 200 000. O engraçado é que eu recebia
mensagens às 7 da manhã de gente já pedindo os comentários, eu nem tinha
acordado direito. (BATISTA JR., 2015, não paginado).
A pesquisadora tentou entrevistá-lo em diversos momentos para melhor entendimento
do processo e da ascensão como um usuário de reputação, e também sobre até que ponto o
vínculo com a TV Globo influenciava seu modus operandi online. Porém, a assessoria de
imprensa do jornalista recusou todos os contatos desta pesquisadora.
Durante as análises online, encontrou-se um relato, em uma entrevista no blog Terraço
Paulistano, sobre a relação dos posts do brasiliense com a Rede Globo, como pode ser visto na
imagem a seguir:
Figura 16: Trecho da entrevista de Bruno para blog da Veja SP
Fonte: Blog Terraço Paulistano17
17
Batista Jr. (2015, não paginado).
49
O que se pode compreender destas observações é que Bruno foi uma importante
ferramenta utilizada para a ascensão do programa, atraindo o público e fazendo com que a
novela fosse o assunto da internet ao longo dos três meses. Como o próprio jornalista citou em
entrevista, o perfil é um “antecipador de tendências”; e, com isso, conseguiu engajar, de forma
engraçada e empática, o público, exatamente por não ser algo forçado ou interligado
diretamente à emissora. Atualmente, o jornalista colhe os louros do sucesso e promove novos
voos em territórios internacionais: um usuário com reputação que agora interliga não só a TV,
mas também cinema, games, celebridades e muito mais do universo entretenimento para a
internet.
2.3 A importância dos usuários com reputação nas redes
A partir das notas realizadas nas últimas páginas, a atenção volta-se inteiramente ao
usuário com reputação nas redes. É hora de compreendê-lo mais profundamente,
esmiuçando-o, para, no próximo capítulo, integrá-lo ao cenário geral de análise.
Para começar, é necessário recapitular que este influenciador surge das narrativas
ficcionais que atravessam diferentes mídias. Mittermayer ajuda a entender melhor a forma de
atuação neste panorama, explicando, em sua Dissertação, que cada projeto transmidiático
possui suas vertentes particulares:
A primeira tarefa a aprender é que não há uma única fórmula, poção mágica
ou receita para o planejamento de tais projetos. O que existe, na verdade, são
diversas maneiras e se contar narrativas fictícias de forma complementar.
Defendo que a complexidade do tema é tão grande que cada projeto
transmidiático comporta-se à sua maneira, e isto vem a ser, ao mesmo tempo,
a melhor qualidade e a pior adversidade. (MITTERMAYER, 2016, p. 111).
Esta citação leva a refletir sobre os interesses e planejamentos dos produtos televisivos
nos dias atuais. Um passo anterior é necessário antes de se produzir um conteúdo para TV, haja
vista a grandiosidade de reverberação nos diversos canais auxiliares, como a internet. Porém,
esse passo não é uma receita ou algo pré-moldado a vários conteúdos. É uma transformação
constante – para cada emissora, a cada projeto, em cada área –, reinventar-se e criar
oportunidades acerca de seus produtos. Maurício Mota (JENKINS; GREEN; FORD, 2104, p.
9) assevera que “as receitas de sucesso na área de conteúdo, mídia e jornalismo mudaram
bastante. Aliás, mudaram, não. Elas não existem mais”.
Entende-se a importância de renovação a cada temporada quando a maior emissora de
TV aberta do Brasil resolve ampliar e diversificar uma de suas áreas mais relevantes, tal como
50
é a de Comercialização de Mídias Digitais. Em 2014, a Rede Globo celebrou18 o fortalecimento
e crescimento dessa área com o desenvolvimento e criação de uma equipe exclusiva para
branded content19. Trata-se de inteligência aliada ao negócio na primeira instância da emissora.
Um verdadeiro universo é construído em torno dos conteúdos televisivos, e a
inteligência de mercado ajuda a orientar e pautar os roteiristas e diretores, sem se esquecer do
poder de barganha que cresce em relação aos parceiros e ao mercado publicitário. O usuário
com reputação nas redes surge deste olhar atento ao mercado, principalmente em torno de
nomes da internet (web-celebridades: bloguers e youtubers) que possuem influência direta
sobre diversos tipos de usuários.
Um exemplo interessante deste mix de possibilidades supracitado é o caso do
youtuber20 Christian Figueiredo, convidado a protagonizar um quadro no programa Fantástico,
todos os domingos, chamado “Me Conta Lá no Quarto”. Nesse quadro, o youtuber conversa
com adolescentes sobre a primeira transa, o primeiro beijo, bullying, liberdade, sexualidade e
vários outros temas da vida deste target. O objetivo da série é aproximar pais e filhos. De uma
forma diferente, o programa conseguiu a atenção deste público que assiste menos televisão do
que os mais velhos, e trouxe para a telinha um dos grandes nomes atrelados atualmente ao
universo adolescente. E não, a Rede Globo não perguntou aos usuários se estes queriam ou não
a presença de Christian Figueiredo21 aos domingos na TV aberta. A partir do momento em que
se gerou a pauta para esse target na emissora, é possível que tenha havido uma junção de
números e a observação do movimento das mídias online em torno deste perfil de público,
juntamente com o entendimento do que poderia se tornar uma espinha dorsal a fim de atrair a
atenção dos usuários. Em números, é possível entender o porquê da escolha deste youtuber:
quase três milhões de seguidores no Instagram, dois milhões no Twitter e cinco milhões e meio
de inscritos em seu canal no Youtube – um fenômeno com vídeos que abordam dilemas da vida.
É preciso compreender e agregar plataformas para gerar engajamento atualmente. O
pesquisador Henry Jenkins discute a importância da unificação e construção de universos em
projetos transmidiáticos:
Cada vez mais, as narrativas estão se tornando a arte da construção de universo
[...] O universo é maior do que o filme, maior, até do que a franquia – já que
as especulações e elaborações dos fãs também expandem o universo em várias
18
Globo celebra... (2014, não paginado). 19
Branded content: conteúdo de entretenimento produzido por marcas com o objetivo de aproximar-se do
público, fortalecer e associar valores à marca e trabalhar o engajamento. 20
Youtuber é a forma como são chamados os produtores de conteúdo do Youtube. São a nova "turma de amigos",
ídolos, de crianças e adolescentes de todo o Brasil. 21
Escolhido "webstar do ano" de 2015 pelo público da emissora de TV Nickelodeon.
51
direções. Como me disse um experiente roteirista: “Quando comecei, era
preciso elaborar uma história, porque, sem uma boa história, não havia filme
de verdade. Depois quando as sequências começaram a decolar, era preciso
elaborar um personagem, porque um bom personagem poderia sustentar
múltiplas histórias. Hoje, é preciso elaborar um universo, porque um universo
pode sustentar múltiplos personagens e múltiplas histórias, em múltiplas
mídias”. (JENKINS, 2009, p. 161-162).
O perfil deste usuário com reputação pode ser entendido como uma espinha dorsal
para o conteúdo online da TV para as mídias. É possível unificar, em uma só pessoa, tanto
novas narrativas como também possibilidades de pautas publicitárias entre os fãs. De forma
sutil, pode-se construir um universo em torno de vários assuntos, como se fosse a opinião
particular do usuário com reputação, provocando empatia e simpatia em relação aos demais
usuários. Constitui uma forma orquestrada de interação e opinião, mas bem difícil de se
perceber perante os tantos caminhos e braços possíveis de contato.
Até aqui, pode-se questionar os direcionamentos da pesquisa e se afirmar que esse
usuário com reputação seria figura conhecida no meio das áreas de publicidade e Relações
Públicas, já recebendo cachês e participando de eventos e propagandas há um bom tempo.
Porém, é visível e imutável que esse usuário não só orienta os outros fãs ao consumo de
conteúdo, mas também produz novos conteúdos em uma linguagem crível e empática com o
restante do público, sem ser colocada em xeque a fonte ou a forma de origem. Um usuário que
gera engajamento ativo online e produz números rentáveis para TV: aqui sim o fio limiar que
cai o questionamento. É o mesclar de territórios que dá o tom a este sujeito. No caso de Hugo
Gloss, sua figura pública e ligada aos diversos meios de comunicação levou-o a se tornar um
porta-voz dos fãs, principalmente quando mesclava conteúdo novo com antigos aprendizados
de novelas. Um exemplo é a forma como o jornalista se referia a alguns personagens da novela
Verdades Secretas – citado aqui, como exemplo, o protagonista Rodrigo Lombardi, chamando-
o em seus resumos pelo nome do personagem mais famoso já vivido anos atrás pelo ator (Raj),
juntamente com o personagem de cinema sobre o qual mais se falou naquele ano (Cristian
Grey).
Esse mix de conhecimentos, a forma de narrar os fatos e a empatia com o público foi
o segredo de sucesso dos posts nas mídias sociais, afastando um possível fracasso de algo
considerado forçado. Visto os principais pontos, nota-se que o usuário com reputação teve
uma relevância fundamental como produtor de conteúdo transmidiático para a novela das 23
horas da Rede Globo. Com isto, criam-se insights sobre o futuro e novos desenhos sobre o
background transmidiático em relação ao universo da TV e mídias sociais. A afirmação que se
pode deixar para que seja realizada uma reflexão é a seguinte: os youtubers são fortes
52
candidatos a se tornarem uma ponte para espirais transmídia, principalmente em relação a TV
e cinema.
53
3 RAIO-X DOS USUÁRIOS BRASILEIROS EM 2016
A curadoria colaborativa de dados se
tornou uma atividade central desta década.
Tudo aquilo que fazemos na internet tem
influência na memória coletiva.
Todos têm este poder,
que vem junto com a responsabilidade.
Pierre Levy
A presente pesquisa especificará neste capítulo o retrato atual do usuário brasileiro.
Para tal, utilizar-se-á alguns pilares que auxiliarão na identificação do perfil em foco:
observação do comportamento do usuário, números colhidos sobre o ambiente de mídia e
pesquisa quantitativa com os sujeitos interativos. O resultado será captado tanto por meio de
um cross que direcionará, da forma mais assertiva, as conclusões desta descrição, como por
uma imersão em pesquisas e dados para delimitar um território de aprendizados.
O brasileiro é um ser digital bastante ativo. Isso ocorre não só pelas características do
povo – via observação empírica –, mas também pelo cenário no qual encontra-se inserido, no
qual as mídias estão em constante mudança e evolução. Cannito relata que:
Parto do pressuposto de que, por trás das mudanças tecnológicas, continua
existindo o “espectador”, um animal da espécie humana que continua
procurando as diversas mídias para suprir suas necessidades culturais. Tenho
consciência de que uma nova tecnologia ajuda a transformar a percepção de
mundo da espécie humana, mas também sei que, desde a Idade da Pedra, os
homens ouvem histórias reunidos em torno de um foco de luz (seja a fogueira
ou um aparelho televisivo). É, portanto, num constante balançar entre as
inovações de hoje e o tradicionalismo de sempre que teço minhas hipóteses.
(CANNITO, 2010, p. 30).
A participação destes indivíduos ciberculturais se dá de diversas formas e em
diferentes canais, tais como Twitter e Facebook. Essas mídias sociais não retiram a audiência
ou o foco da tela principal. Neste caso, a programação da TV estimula o uso e justifica a
necessidade de uma segunda tela, materializada por meio de smartphone, tablet e notebook que
não só proporcionam uma nova opção para assistir a um programa de TV, como também
alteram a maneira como estes indivíduos a experimentam com conteúdo transmídia.
É possível observar esse fenômeno em números. Atualmente, no Brasil, a televisão
segue como meio de comunicação predominante. De acordo com a pesquisa Brasileira de Mídia
201522, 95% dos entrevistados afirmaram ver TV – sendo que 73% deles têm o hábito de assistir
22
Brasil (2014).
54
diariamente. Em média, os brasileiros passam 4 horas e 31 minutos por dia expostos ao
televisor, de segunda a sexta-feira, e 4 horas e 14 minutos nos finais de semana. Já no território
digital, metade dos brasileiros (48%) usa internet. O percentual de pessoas que a utilizam todos
dos dias cresceu: os usuários das novas mídias ficam conectados, em média, 4 horas e 59
minutos por dia durante a semana e 4 horas 24 minutos nos finais de semana – valores superiores
aos obtidos em relação à televisão.
Mais do que as diferenças regionais, são a escolaridade e a idade dos entrevistados os
fatores que impulsionam a frequência e a intensidade do uso da internet no Brasil. Entre os
usuários com ensino superior, 72% acessam a internet todos os dias, com uma intensidade
média diária de 5 horas e 41 minutos. Entre as pessoas com até a 4ª série, os números caem para
5%, com a média de 3 horas e 22 minutos. Em relação à idade, 65% dos jovens na faixa de 16
a 25 anos se conectam todos os dias, em média, 5 horas e 51 minutos durante a semana, contra
4% e 2 horas e 53 minutos dos usuários com 65 anos ou mais.
Quando misturam os cenários, internet e TV, entende-se que um a cada seis brasileiros
navega na internet enquanto assiste à televisão, conforme o estudo23 Social TV, do IBOPE
Nielsen Online, realizado em 13 regiões metropolitanas, com pessoas de 10 anos de idade ou
mais. Enquanto os que mais assistem à TV juntamente com a internet são os jovens,
principalmente entre 20 a 24 anos, são os adolescentes de 15 a 19 anos os que mais comentam
sobre a televisão na internet. Entre os adultos, esse hábito é maior entre as mulheres e entre
pessoas de classe econômica AB.
Ainda segundo a pesquisa, mais de 70% desses consumidores simultâneos afirmam
que procuram na internet informações sobre o que está sendo mostrado na TV; e 80% admitem
ter ligado a TV ou trocado de canal motivados por alguma mensagem recebida pela internet.
Quando o assunto é tempo consumido nas diversas telas, os consumidores brasileiros estão no
topo do ranking, com quase oito horas por dia em frente a alguma tela. O smartphone é o líder
nessa estatística, atraindo a atenção dos brasileiros diariamente24.
Paralelamente, mitos e pensamentos sobre o fim da TV caem por terra não só
teoricamente – como já comentado alhures pelos autores estudados para a pesquisa em questão
–, mas comprovadamente, por meio dos números. Os brasileiros gostam e englobam a TV em
seu cotidiano há anos; ela é um componente social e aglutinador forte, já que serve como pano
de fundo para conversas entre as pessoas nos diversos níveis sociais. Na realidade, como se
observa no cenário exposto acima, a TV brasileira não está morrendo, tampouco perdendo sua
23 IBOPE (2012, não paginado). 24 Deluca (2014, não paginado).
55
força: está passando por uma transição. E é essa transição que fomenta esta pesquisa: como é
realizada essa extensão de conteúdos em outros canais e quem responde aos convites
interativos. Shirky (2011) cita que a indústria televisiva está se surpreendendo ao ver usos
alternativos do tempo livre, sobretudo entre os jovens.
Os dados esboçam nitidamente um território sendo construído e tateado pelos jovens.
Ao mesmo tempo que eles têm passado menos tempo em frente à TV, estão comentando,
interagindo e compartilhando muito mais nas redes do que os mais velhos. Mittermayer (2015,
p. 248) afirma que são os jovens os que ocupam a posição de mais assíduos protagonistas nas
redes digitais:
O jovem vive seu tempo, com toda a pujança sociocultural que caracteriza a
sociedade contemporânea. Ele vive um contexto em constante ressonância e
reverberação, que de tempos pra cá preenche o ambiente tecnológico, uma
mídia que atende a uma demanda social que não é nova: os espaços individuais
articulados com os espaços sociais. (ROCHA; AMARAL-SILVA, 2015, p.
27).
Tratada a tal reflexão sobre os números esboçados, a presente Dissertação resolveu
utilizar-se de números particulares para auxiliar na observação desse atual cenário, além da
possibilidade de insights para o trabalho. Foi realizada uma pesquisa com 45 participantes
durante vinte dias do mês de setembro e outubro de 2016, com quinze perguntas no total,
enviadas online para pessoas de idades variadas – via mídias sociais.
O questionário (vide os Apêndices desta Dissertação) basicamente era composto por
perguntas divididas em 3 categorias, quais sejam: perfil do usuário, interação TV-mídias
digitais e corpus – acerca dos programas (BBB16 e Verdades Secretas). A ideia de o
questionário ser enviado online foi para impactar diretamente o target procurado. A premissa
da entrevista era: “Se você interage nas mídias sociais enquanto assiste TV, e assistiu BBB16
e/ou Verdades Secretas, responda essa pesquisa”. O questionário também foi enviado
diretamente pela pesquisadora desta Dissertação para perfis observados atuantes durante a
análise tanto no Twitter quanto no Facebook – o envio foi realizado pelos próprios canais.
3.1 Análise dos resultados de Pesquisa
Todas as respostas obtidas por meio desta pesquisa encontram-se nos Apêndices, ao
final desta Dissertação. Serão apresentadas aqui as análises das observações em torno dos
resultados, apresentados por meios gráficos. As tabulações foram realizadas pelo próprio
Google Docs, ferramenta utilizada para entrevista, de modo a se organizar as informações
captadas. As primeiras perguntas foram baseadas no perfil dos usuários, como por exemplo,
56
idade e escolaridade. O objetivo foi confirmar se o perfil do sujeito interativo dos programas
do corpus de entretenimento estava de acordo com as considerações das pesquisas utilizadas
neste projeto; ademais, outro objetivo era saber como essa delimitação pode trazer premissas
relevantes ao resultado final.
Figura 17: Resultado da Pergunta 1 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
Figura 18: Resultado da Pergunta 2 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
57
Figura 19: Resultado da Pergunta 3 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
Figura 20: Resultado da Pergunta 4 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
Quase 70% dos participantes da pesquisa possuem entre 25-34 anos. E outra fatia
significativa encontra-se na faixa etária entre 18-24. A Figura 17 apresenta, inicialmente, os
resultados. Aqui, já se consegue assegurar a primeira conclusão de análise: sim, os sujeitos
interativos são jovens, e boa parcela é do gênero feminino. Nesse caso, a grande maioria é
composta de jovens adultos que não vem de uma idade mais baixa como observado nas
pesquisas e, sim, de uma média mais acima da classificação. Outro fator interessante diz
respeito à escolaridade destes usuários: a maioria já finalizou o curso superior e está em um
nível mais alto da escolaridade. Esta informação condiz outra já citada anteriormente nas
pesquisas, isto é, as pessoas que mais acessam à internet possuem um maior nível de
escolaridade. E, para finalizar, a média de renda da maioria da pesquisa: entre 2 a 6 salários
mínimos.
58
Figura 21: Resultado da Pergunta 5 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
Figura 22: Resultado da Pergunta 6 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
Figura 23: Resultado da Pergunta 7 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
59
Figura 24: Resultado da Pergunta 8 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
Figura 25: Resultado da Pergunta 9 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
Figura 26: Resultado da Pergunta 10 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
60
Figura 27: Resultado da Pergunta 11 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
Baseado na premissa de que responderiam ao questionário as pessoas que interagem
nas mídias sociais enquanto assistem à programação televisiva, foi observada uma pequena
parcela de números sobre a não participação desse cenário, mesmo sendo solicitado que apenas
o perfil detalhado participasse. Foi algo pequeno, tal como mostram as Figuras 21 e 22, porém,
um elemento relevante para a delimitação de um perfil de sujeito interativo desta pesquisa:
aquele que acredita não participar por estar apenas observando os acontecimentos. No próximo
tópico, será possível entender mais sobre esse sujeito.
Uma relevante curiosidade da pesquisa foi a compreensão sobre a forma utilizada para
interação entre os dois veículos. Na pergunta proposta no questionário, foram dadas opções de
interações mais habituais na atualidade (Figura 23); e a confirmação veio com uma margem
bem grande entre o primeiro e o segundo colocado: sim, o celular é o meio mais utilizado para
a relação entre TV e internet nas diversas plataformas como Facebook e Whatsapp, sendo o
Twitter o principal canal para a interação – vide Figura 24.
Os sujeitos ciberculturais também foram indagados sobre o que os estimulava a
comentar sobre esses programas online; foi solicitado que marcassem a opção que mais se
aproximasse de suas opiniões. O resultado visto na Figura 25 configura um sujeito interativo
que gosta, em grande parte, de fazer parte das discussões que estão acontecendo nas mídias.
Uma pequena parcela acha interessante ser considerado um formador de opinião entre os seus
amigos, ressaltando o lado de novas motivações para os relacionamentos interpessoais nas
mídias. Outro ponto interessante deste tópico (Figura 25) foi a resposta dos usuários na opção
“outros”: “fazer parte da zuera”, “compartilhar minha opinião/emoção com meus amigos” ou
apenas “quero expor o que penso sobre o programa” também foram citados, o que mostra que
os usuários não têm interesse em modificar o conteúdo proposto pela TV, mas sim realizar uma
61
interação sobre o assunto na sua “comunidade”, entre os amigos, relatando fatos e opiniões a
respeito do programa.
Esses resultados mostram pontos relatados no começo deste capítulo não só pela
presente pesquisadora, mas também por Cannito, que cita o brasileiro como possuidor de perfil
bastante ativo nas redes, além de ser detentor de qualidades sociais extremamente afloradas. Na
Figura 26, percebe-se que os usuários não só interagem com amigos e celebridades, mas
também com desconhecidos, trazendo um insight interessante à pesquisa: relacionamento com
quem tem o mesmo interesse no assunto é maior e mais eficiente do que com quem é do convívio
do dia-a-dia. Isso acontece devido à necessidade de os fãs discutirem e compartilharem ideias
e novidades a respeito daquilo que eles adoram.
Já os principais programas de melhor atuação nas mídias sociais são na área de
entretenimento como filmes, séries, minisséries e novelas. A Figura 27 mostra que, na
percepção dos participantes da entrevista, esses segmentos se destacam mais quando o assunto
é interatividade. Naturalmente, são perfis de programas que possuem narrativas predispostas à
extensão e intercâmbio, com possibilidades de atuar em diversos territórios com diferentes
conteúdos.
Figura 28: Resultado da Pergunta 12 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
62
Figura 29: Resultado da Pergunta 13 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
Figura 30: Resultado da Pergunta 14 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
Figura 31: Resultado da Pergunta 15 do questionário
Fonte: Elaboração Própria
63
As últimas perguntas giram em torno do corpus desta Dissertação. Uma observação
relevante que deve ser ressaltada é sobre uma resposta deixada na opção “other” da Figura 28,
sobre o que o entrevistado assistia. A resposta de um usuário foi: “não assistia diariamente mas
acompanhava flash e as repercussões pelas redes sociais”. Tal afirmação mostra que a
percepção do assistir é totalmente do veículo TV. A movimentação em torno do programa no
digital fica como uma configuração secundária – como forma de flash e repercussões –, mas
que não deixa de orientar a narrativa do programa na televisão. Outro aspecto importante deste
levantamento é acerca da utilização da palavra “acompanhar”: em nenhum momento o sujeito
cibercultural se coloca como participativo, mas sim como observador. Um olhar que
complementa ainda mais as análises dos perfis, que serão delimitados mais adiante. Nas últimas
figuras, é possível perceber que eles não acreditam que as interações realizadas modificam o
andamento dos programas. O “não sei opinar” ganha força principalmente quando se é
questionado sobre a natureza das interações: 35,6% não sabem opinar acerca deste fato. Em
segundo lugar estão as interações consideradas reais; e com 31,1% as manipuladas. Números
bem equilibrados, pelos quais se consegue captar as incertezas que pairam sobre estes
questionamentos: é realmente difícil delimitar um território tão denso e pouco transparente para
os indivíduos.
3.2 Delimitação dos perfis da audiência interativa
Aqui, a pesquisa possui a oportunidade de estipular os tipos de sujeitos interativos que
respondem aos convites de participação da TV aberta. Após a coleta de dados, os aprendizados
anteriores e a análise dos comentários nas mídias, foi possível observar que os entrevistados
possuíam algumas características em comum e comportamentos direcionados para um mesmo
intuito. Por isso, propor-se-á a delimitação de perfis de usuários brasileiros para melhor
compreensão do segmento no que se refere ao ano de 2016.
De acordo com os pontos levantados, eis aqui a demarcação dos quatro perfis dispostos
por esta Dissertação, bem como os seus modos de atuação:
1. Usuário Observador: este perfil se sente participante das interações entre televisão
e mídias sociais, porém apenas observa os comentários de terceiros sobre o assunto
no digital. Gosta de se sentir parte da discussão sobre o programa e estar a par dos
detalhes, mas apenas é um ouvinte, tornando-se engajador do assunto em outros
momentos, como por exemplo, a roda de amigos ou no café da tarde no trabalho – fora
das mídias. A interação online desse perfil é zero. É um primeiro nível de consumidor
64
de conteúdo nas plataformas, que é difícil de ser tateado, mas está presente no cenário
como observador – com sua relevância própria para os números gerais: vai além da
dicotomia, existe este limbo em que o sujeito interativo sente-se parte do contexto,
mas não atua e não se deixa ver por estatísticas gerais de consumo e interação.
2. Usuário Participante: aqui concentra-se o maior número de pessoas em relação às
presentes classificações. São usuários que gostam de comentar e interagir sobre os
programas não só em suas páginas, mas também com a participação de amigos e
familiares. O interesse é participar ativamente da discussão: os sujeitos interativos
postam sobre suas impressões e posicionamentos a respeito da trama. É um perfil
delimitado pela vontade de ter uma voz ativa, ouvida, cuja proposta é fomentar e
compreender melhor o assunto em destaque. As mídias sociais são entendidas não só
como um território de absorção de conteúdo para esses indivíduos teleinteragentes,
mas também como um campo para discussão e novidades com a participação de
amigos e conhecidos, principalmente na hora do programa. Percebe-se também a
utilização da hashtag como forma de pertencimento ao assunto, à comunidade em
questão, abrindo-se caminhos para intercâmbios entre outros usuários. Outro formato
de atuação relevante é o modo de assistir aos conteúdos: o sujeito interativo pode ter
perdido o teor televisivo alguns dias da semana, mas se sente acompanhando
ativamente a partir do momento em que se percebe inteirado do programa via mídias
sociais.
65
Figura 32: Tuítes com presença do Usuário Participante sobre Verdades Secretas
Fonte: Twitter
Figura 33: Tuítes com presença do Usuário Participante sobre Verdades Secretas
Fonte: Twitter
3. Usuário Engajador: atuante e engajado, este perfil é bastante intenso. Aqui os
usuários conversam, discutem, provocam, postam fotos (memes, gifs, etc.), trechos do
programa, interagem com amigos, desconhecidos, veículos de mídia e chamam as
celebridades para a pauta em questão. O perfil é composto em boa parte por fãs das
tramas e concentra um maior número de usuários jovens. A interação acontece não só
na hora do programa, mas também em diversos momentos do dia. Esse usuário
engajador é bem relevante aos conteúdos transmídia, pois são os sujeitos interativos
que mais se engajam e interagem com as novidades, além de disseminarem
66
informações sobre o assunto. Pode-se citar sobre esse perfil um envolvimento
emocional forte com os programas e com os ídolos: desde consumir informações e
criar posts nas mídias, até movimentos financeiros como vaquinhas online
(arrecadação de dinheiro) para presentear aquela pessoa de quem eles gostam. Um
exemplo interessante a ser relatado é o caso da ganhadora do BBB16, Munik Nunes,
que, mesmo saindo milionária do programa, alguns de seus fãs das mídias sociais
realizaram um movimento para dar um carro de presente à ganhadora25.
Figura 34: Tuítes com presença do Usuário Engajador sobre BBB16
Fonte: Twitter
25
Guidorizzi (2016, não paginado).
67
Figura 35: Tuíte com presença do Usuário Engajador sobre BBB16
Fonte: Twitter
Figura 36: Tuítes com presença do Usuário Engajador sobre Verdades Secretas
68
Figura 36.1: Tuítes com presença do Usuário Engajador sobre Verdades Secretas
Fonte: Twitter
4. Usuário com reputação nas redes: conforme já citado no capítulo 2 desta
Dissertação, a quarta representação fecha a delimitação dos perfis interativos e seus
modos de atuação nas mídias sociais. Aqui, delimita-se melhor o segmento citando
novos exemplos além do Hugo Gloss. O usuário com reputação consegue não só
engajar outras dezenas, centenas, ou milhares de usuários, mas também motiva a
interação e produz conteúdos próprios para a rede. Esse conteúdo é produzido não só
com interesses de ganhar reconhecimento e mais seguidores, mas também com o
intuito de participar dos assuntos “quentes” do momento. Com isso, reúne pessoas que
se interessam por um assunto ou pessoa (por exemplo, uma novela ou programa) e
estende o conteúdo não só para o Twitter ou Facebook, mas também para outras
plataformas, como por exemplo, Blog, Snapchat, Instagram, etc. É difícil um sujeito
interativo compreender até que ponto vai a delimitação do pessoal e do profissional
nos comentários feitos por esse perfil, já que o usuário com reputação é um fã
igualmente aos demais nas redes – porém, com credibilidade e tido como um exímio
formador de opinião. No meio digital, os destaques mais famosos são chamados de
69
digital influencer26, termo que surgiu em língua inglesa e, em tradução livre, significa
influenciador digital. É necessário ressaltar que esse perfil, abordado na presente
pesquisa, traz a fusão do digital com a TV, não apenas abrangendo a classificação livre
do termo supracitado – muitas vezes, orientado ao grande mercado publicitário. O
usuário com reputação gera engajamento ativo online e produz números rentáveis para
televisão, além de gerar conteúdo transmídia: um braço importante da TV para as
mídias sociais nos dias atuais.
Figura 37: Tuítes do Usuário de reputação após término de Verdades Secretas
Fonte: Twitter
Figura 38: Tuítes com presença do Usuário de reputação após término da novela
Fonte: Twitter
26
Dino (2016, não paginado).
70
Figura 39: Tuítes com presença do Usuário de reputação durante BBB16
Fonte: Twitter
3.3 Diretrizes de conteúdo: próximos passos
Para começar a esboçar algumas diretrizes sobre conteúdo, vale ressaltar uma frase de
reflexão do publicitário José Porto, citada no Tab da Uol27, sobre o momento digital no Brasil:
“Já tínhamos mídias de massa e agora passamos também a ter massas de mídia”. São essas
massas, audiências interativas, que sancionarão e direcionarão o melhor trajeto para os
conteúdos que virão, além de inspirar a produção de novos caminhos a serem explorados.
De acordo com Rocha e Amaral-Silva (2015, p. 26), “embora o jovem seja o hóspede
mais notável e agitado do ciberespaço, ele ainda não tem as chaves e os códigos que organizam
27
TAB #48. Disponível em: <http://tab.uol.com.br/ativismo-digital/>. Acesso em: 22 nov. 2015.
71
a cena”. O protagonista atua neste cenário de interação e é foco para os novos passos, porém,
há interesses maiores que dão o tom e organizam o trilhar do futuro – principalmente na
plataforma televisiva.
As emissoras de TV têm procurado chegar da melhor forma a insights captados dos
usuários para fomentação de novos conteúdos, de modo que estão se preparando para tal feito.
As próprias mídias sociais como Facebook e Twitter são fortes fontes de números e apontadores
às emissoras. Os relatórios conseguem, em cada horário, delimitar o público e sublinhar
comportamentos acerca daquilo que mais engaja, entre outros. Isso também é uma fonte
proeminente para as TVs no Brasil, no sentido de parcerias e insumos para investimentos em
futuros projetos de sucesso.
A TV Globo é destaque quando o assunto é o olhar estratégico (como visto no capítulo
2) e o investimento em torno do digital. Ponto curioso é o convite desta mesma emissora aos
parceiros – principalmente do mercado de publicidade – para a participação em discussões e
cocriações de oportunidades em todas as plataformas da Globo28. O objetivo primordial é
promover o conteúdo da emissora para demandas de um mercado cada vez mais digital,
oferecendo deste modo as melhores soluções para aproximar marcas e pessoas,
independentemente do device em que elas estejam. Assim, surge um novo contorno de
relacionamento entre ambos, caindo a antiga forma de contato, como cita Cannito abaixo –
entre veículo e anunciante – e surgindo uma nova, entre veículo e parcerias.
No Brasil, as emissoras produzem o próprio conteúdo com total autonomia e
o distribuem de forma gratuita. O que elas vendem não é o programa em si,
para o espectador, e sim o espaço na grade de programação para que o
anunciante transmita sua mensagem. Vendem, portanto, a possibilidade de
contato entre o anunciante e um espectador. (CANNITO, 2010, p. 12).
A estratégia da TV Globo configura-se legítima partindo do pressuposto de que o
mercado publicitário tem forte olhar e atuação no universo digital. Em geral, isso provoca um
panorama mais “fora da caixa”, porém, sem esquecer os pilares de interesses econômicos da
emissora. Mais do que nunca, surgirão parcerias entre veículos e empresas para produção e
criação de conteúdo inéditos; não apenas na relação TV e mídias digitais, mas também
envolvendo cinema, livros, quadrinhos e games.
Os usuários com reputação continuarão atuando como ponte forte na configuração de
conteúdo transmídia. O movimento começa a ser delimitado a partir do momento em que esses
perfis são chamados para protagonizarem filmes e quadros na TV ligados aos assuntos
28
Globais convocam... (2015, não paginado).
72
debatidos nas redes, principalmente em relação ao universo jovem – em especial, os
adolescentes. A presente pesquisa já citou Hugo Gloss como um forte braço da Rede Globo
para a novela Verdades Secretas, com seu notável desempenho como braço de conteúdo
transmídia. Um novo exemplo a ser citado é Kéfera, a nova sensação no ambiente de narrativas
transmídia: ela já possui livros lançados, canais em diversas mídias sociais, além de marca de
roupas, comidas e acessórios. Porém, o passo mais disruptivo da jovem de 23 anos foi o cinema,
com participação em diversos longas no Brasil. O convite para a grande tela ocorreu devido à
grande mobilização que seu perfil provoca nas mídias, principalmente em relação ao público
teen. O mercado cinematográfico captou essa oportunidade e convidou a influenciadora, mesmo
sem possuir conhecimentos de dramaturgia, a encarar esse desafio. A resposta tem se verificado
em números: o filme “É Fada”, protagonizado por Kéfera e a jovem atriz Klara Castanho, já é
considerado um sucesso, tendo sido visto por cerca de 371 mil pessoas, só no primeiro final de
semana de exibição. Kéfera também cantou na trilha sonora deste longa: as músicas –
disponíveis nas principais plataformas como iTunes e Spotify – chegaram a ultrapassar cantores
profissionais como Manu Gavassi e Ludmilla.
A interatividade começa a ser significativa como fonte de retorno. E os
produtos já não são mais planejados para ser exibidos uma só vez, como
acontecia com novelas e programas de auditório. Muitos programas hoje são
criados para um público mundial, que não só pode assisti-los na TV no
momento da transmissão, como também gravá-los, reproduzi-los, ou ainda
colecioná-los em DVD. São formas de remunerar o negócio da televisão que
ainda não foram adotadas pelos negociadores brasileiros. (CANNITO, 2010,
p. 110).
Os algoritmos alertam e, por conseguinte, o mercado produz: assim é – e tende a
continuar sendo. Tornar-se empático com os usuários e oferecer entretenimento relevante
constitui a pauta da vez. Repensar os formatos também entra nesse tom, não sendo necessário
algo tão fora da curva para tal; compreender que os fãs são o foco principal e que assuntos
complementares podem solucionar esses gaps também é uma forma de inteligência concernente
ao assunto.
A novela Verdades Secretas também pode ser citada como exemplo de produto que
sofreu adaptações. Após meses do grande sucesso na TV, lançou um box – com 13 DVDs – de
edição especial, com seu conteúdo ajustado para 25 capítulos, além de cenas estendidas com
aproximadamente 1 hora de duração cada. Complementando o material, a série ganhou reforço
com conteúdo extra: making off com cenas de bastidores e webdocs de temas polêmicos
abordados na trama, ambos produzidos pelo Gshow.
73
Figura 40: DVDs Verdades Secretas
Fonte: Loja Globo29
29
Disponível em: <http://www.loja.globo/dvd-verdades-secretas-13-discos.html> Acesso em: 8 ago. 2016.
74
Figura 41: Tuíte do Hugo Gloss sobre o DVDs – com link para Facebook
Fonte: Twitter
75
Figura 42: Post do Hugo Gloss sobre o DVDs Verdades Secretas
Fonte: Facebook
As opções atuais são tão variadas que, atualmente, sentar-se em frente a tela na sala e
esperar o programa favorito começar no horário definido não é mais o que os consumidores
esperam. As oportunidades para os usuários consumirem o que querem, quando querem e pelo
dispositivo que querem, estarão cada vez mais em pauta na TV aberta. Novamente citando a
emissora carioca, quando o assunto é esse, a Globo já tem despontado na frente das
concorrentes: o GloboPlay, aplicativo para acesso a conteúdos exclusivos da programação, a
qualquer hora. Além de benefícios para os assinantes, há a possibilidade de acesso a capítulos
de novelas e minisséries antes mesmo de irem ao ar. E é com essa tática que a emissora tem
tentado atrair os usuários para sua plataforma: foco em mobilidade, alto impacto e materiais
inéditos aos assinantes.
Cannito (2010, p. 29) já exaltou que o conteúdo da televisão é resultado de três fatores:
“a) a criatividade de seus realizadores, organizada para que surja uma criatividade coletiva; b)
possibilidades e limites da tecnologia; c) formas de financiamento do produto”. É perceptível
que a qualidade dos autores, bem como a produção brasileira, é uma das melhores do mundo;
sem se mencionar as novas portas abertas pela tecnologia. Porém, a forma de financiamento
tem ganhado novas perspectivas nas formas de se rentabilizar tais projetos. É preciso parceria
e números positivos sobre as concepções, e só a convergência transmídia de conteúdo pode
realizar tal feito.
76
Ao final, percebe-se que o conteúdo precisa ter qualidade e consistência para que tudo
se interligue de uma maneira muito mais inteligente. A televisão promete tornar-se muito mais
televisão, com narrativas mais abrangentes e conectadas, e o digital, configura-se como uma
mola propulsora de interação e entendimento do usuário.
77
CONCLUSÃO
As oportunidades diante de nós,
individual ou coletivamente, são gigantescas;
o que fazemos com elas será determinado em grande parte
pela forma como somos capazes de imaginar
e recompensar a criatividade pública,
a participação e o compartilhamento.
Clay Shirky
É chegado o momento de olhar para a Dissertação como um todo e verificar os
caminhos trilhados. Do começo até o final da produção do material, foram muitos desapegos
sobre trajetórias escolhidas, leituras e posicionamentos.
Relembrando a analogia da introdução, pode-se afirmar que o território em que o
objeto e problemática desta pesquisa estão inseridos é como um imenso iceberg: olha-se a ponta
visível, mas não se compreende até que ponto a parte imersa, do fundo, vai. A pesquisa
focalizou mais profundamente a parte aparente e tátil do iceberg, não adentrando a parte
submersa – apesar da tentativa de se observar, a uma maior distância, os fatos ali condensados.
Nota-se na superfície adiante do iceberg a tendência de que a televisão continuará com
bastante força nos próximos anos, gerando produtos que tenham sinergia com outras mídias.
Afinal de contas, atrás de tudo isso há um sujeito interativo – um animal da espécie humana –
que procura suprir suas necessidades culturais com uma dinâmica de pertencimento nas
discussões nas redes.
Para o indivíduo cibercultural, o simples fato de existir e estar sendo percebido pela
comunidade digital é o mais relevante. O sentimento de pertencimento ao grupo de interesse é
mais forte do que a promessa de modificação via mídias sociais em algum programa, por
exemplo. Claro que o discurso sobre o real time, a participação ativa e a construção de conteúdo
em via de mão dupla é bem recebido por esses indivíduos ciberculturais. Os estímulos fazem
parte do cenário interativo e dão o tom de engajamento há décadas, desde a época do programa
Você Decide, da Rede Globo. Porém, a real cultura da participação atualmente acontece entre
os intérpretes principais nas mídias, entre os usuários, no contexto de estar imerso nas
discussões entre seus contatos, entre os interessados no mesmo assunto.
Visto esse movimento, as emissoras já compreenderam a direção mais voltada à
qualidade dos conteúdos e à importância do engajamento em torno de comunidades sobre os
programas. O fluxo da televisão não se perderá, surgindo novas oportunidades de parcerias na
concepção de produtos e na compreensão do sujeito interativo. Os usuários com reputação nas
78
redes são a prova de que esse caminho ainda renderá muitos frutos entre as grandes corporações
e esses propagadores de conteúdos.
Percebe-se que os jovens são os grandes protagonistas no que se refere aos próximos
passos no meio da convergência: mentes e corações conectados, multiplicidade de aspectos
próprios, verdadeiros guardiões de um território em que ainda há muito a ser explorado. A
perspectiva sobre o contorno desses usuários seria a de indivíduos que estão modificando tudo
ao seu redor, com a força e velocidade do digital. Ora, é fato que a convergência entre os meios
está transformando, cada vez mais, a atuação dos sujeitos interativos. E é sobre o olhar atento
que cresce aqui a delimitação de um consumo em comunidade que ganhou um destaque
inesperado na pesquisa: sai o perfil individual do usuário que responde aos convites de interação
com programas, e entra a compreensão de um perfil em comunidade, interligado em rede, que
participa em prol de um contexto coletivo ao final.
Os usuários com reputação aportam no âmbito do universo digital e prometem
delimitar novos caminhos transmidiáticos em relação ao universo da TV e mídias sociais. Os
youtubers (ou influenciadores) mostram-se como peças alternativas e diferenciadas para
conteúdo de diversos canais, não só para a televisão, como também para o cinema, rádio e
impresso. A empatia com o público, os usuários, é a ordem da vez.
Em suma, a televisão brasileira tende a se tornar cada vez mais televisão. Com o auxílio
de boas narrativas e abordagens inéditas, o conteúdo ganha peso e torna-se cada vez mais
contextualizado e com respostas mais atuantes por parte dos usuários. A TV utilizará a
interatividade dentro da especificidade de sua linguagem, devolvendo ao sujeito cibercultural
produtos catalisados pelas mais diversas mídias, delineados sempre por seus interesses
econômicos/rentáveis.
79
REFERÊNCIAS
#Decarona Hugo Gloss / como começou, quase BBB, dicas de internet, momento climão e mais.
Canal Garotas Estúpidas. Youtube. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=bzPja6kIlC0>. Acesso em: 15 set. 2016.
BARBOSA, B. Dependência do glocal na cibercultura: acoplamento estrutural do ente humano
e meios interativos como habitus glocalizado. In: TRIVINHO, Eugênio (Org.) A condição
Glocal: configurações tecnoculturais, sociopolíticas e econômico-financeiras na civilização
mediática avançada. São Paulo: Annablume; FAPESP, 2014. p. 197-216.
BATISTA JR., J. “Bruno Rocha, o criador do Hugo Gloss: potência das redes sociais”.
VEJA (SP), 2015. Disponível em: <http://vejasp.abril.com.br/blogs/terraco-
paulistano/2015/09/entrevista-bruno-rocha-criador-hugo-gloss/>. Acesso em: 15 nov. 2015.
BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Comunicação Social. Pesquisa brasileira
de mídia 2015: hábitos de consumo de mídia pela população brasileira. Brasília: Secom, 2014.
Disponível em: <http://www.secom.gov.br/atuacao/pesquisa/lista-de-pesquisas-quantitativas-
e-qualitativas-de-contratos-atuais/pesquisa-brasileira-de-midia-pbm-2015.pdf>. Acesso em: 10
set. 2016.
CANNITO, N. A televisão na era digital: interatividade, convergência e novos modelos de
negócio. São Paulo: Summus, 2010.
DELUCA, C. Brasileiros passam oito horas por dia usando várias telas. Estudo comportamental
AdReaction LatAm, da Millward Brown. Corp TV, set. 2014. Disponível em:
<http://corptvbrasil.blogspot.com.br/2014/09/brasileiros-passam-oito-horas-por-
dia.html?m=1>. Acesso em: 02 out. 2015.
DINO. A era dos Digital Influencers: o marketing ganha um novo aliado para promover
negócios "clique a clique". Notícias. Terra, jul. 2016. Disponível em:
<https://noticias.terra.com.br/dino/a-era-dos-digital-influencers-o-marketing-ganha-um-novo-
aliado-para-promover-negocios-clique-a-
clique,1e412fc885f8ff6b3bdd2a13f9a3e8f3cz7ohpk5.html>. Acesso em: 20 set. 2016.
FARIA, E. Redes sociais de fanfics entre os jovens. In: ROCHA, C.; SANTAELLA, L. (Org.).
A onipresença dos jovens nas redes. Goiânia: FUNAPE/Media LAB/UFG, 2015. p. 209-227.
FECHINE, Y; CARLÓN, M. O fim da televisão. Rio de Janeiro: Confraria dos Ventos, 2014.
FLORIS, S. Final do #BBB16 terá Twitter emojis e Moments especiais. Abr. 2016.
Disponível em: <https://blog.twitter.com/pt/2016/final-do-bbb16-ter-twitter-emojis-e-
moments-especiais>. Acesso em: 19 set. 2016.
F/RADAR. Ativismo digital. 15ª ed. 2015. Disponível em: <http://tab.uol.com.br/ativismo-
digital/>. Acesso em: 22 nov. 2015.
GOSCIOLA, V. Roteiro para novas mídias: do game à TV interativa. São Paulo: Editora
Senac São Paulo, 2003.
80
GLOBAIS CONVOCAM publicitários para cocriar projetos de conteúdo. Portal Adnews,
Redação, out. 2015. Disponível em: <http://adnews.com.br/midia/globais-convocam-
publicitarios-para-cocriar-projetos-de-conteudo.html>. Acesso em: 02 jul. 2016.
GLOBAL MOBILE CONSUMER SURVEY: The UK cut. Produced by Deloitte, 2012.
Disponível em: <http://www.deloitte.com/view/en_GB/uk/industries/tmt>. Acesso em: 02
maio 2015.
GLOBO CELEBRA fortalecimento de sua área de mídias digitais. Portal Adnews, Redação,
set. 2014. Disponível em: <http://www.adnews.com.br/televisao-e-radio/globo-celebra-
fortalecimento-de-sua-area-de-midias-digitais>. Acesso em: 02 out. 2015.
GLOBO.COM. “Big Brother Brasil 16: Programa de 05 abr. 2016, na íntegra”. Globo play.
Disponível em: <https://globoplay.globo.com/v/4936745>. Acesso em: 20 set. 2016.
_______. “Participe dos desafios do 'BBB16' e apareça na Final do reality”. GShow, 30 mar.
2016. Disponível em: <http://gshow.globo.com/participe/noticia/2016/03/participe-dos-
desafios-no-aplicativo-do-bbb16-e-apareca-na-final-do-reality.html>. Acesso em: 20 set. 2016.
_______. Big Brother Brasil. GShow. Disponível em:
<http://especiais.gshow.globo.com/bbb/bbb16/especial-app/>. Acesso em: 20 set. 2016.
GUIDORIZZI, G. Fãs de Munik, do 'BBB16', querem lhe dar de aniversário carro de R$ 200
mil. Pure People, maio 2016. Disponível em: <http://www.purepeople.com.br/noticia/fas-de-
munik-do-bbb16-querem-lhe-dar-de-aniversario-carro-de-r-200-mil_a114353/1>. Acesso em:
20 set. 2016.
IBOPE. No Brasil, 43% dos internautas assistem à TV enquanto navegam. IBOPE -
Notícias, jul. 2012. Disponível em: <http://www.ibope.com.br/pt-
br/relacionamento/imprensa/releases/paginas/no-brasil-43-dos-internautas-assistem-a-tv-
enquanto-navegam.aspx>. Acesso em: 25 ago. 2015.
JENKINS, H. Cultura da convergência. 2. ed. São Paulo: Aleph, 2009.
JENKINS, H.; FORD, S.; GREEN, J. Cultura da conexão: criando valor e significado por
meio da mídia propagável. São Paulo: Aleph, 2014.
JENSEN, K. B. Media convergence: the three degrees of network, massa and interpersonal
communication. Routledge: New York, 2010.
LÉVY, P. O ciberespaço e a economia de atenção. In: PARENTE, A. (Org.). Tramas da rede:
novas dimensões filosóficas, estéticas e políticas da comunicação. Porto Alegre: Sulina, 2014.
MITTERMAYER, T. O jovem leitor ubíquo e a narrativa transmídia. In: ROCHA, C.;
SANTAELLA, L. (Org). A onipresença dos jovens nas redes. Goiânia: FUNAPE/Media
LAB/UFG , 2015. p. 247-262.
81
MITTERMAYER, T. Narrativas transmídia: uma releitura conceitual e prática. 2016. 150 f.
Dissertação (Mestrado em Mídias Digitais) – Curso de Tecnologia da Inteligência e Design
Digital, Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2016.
MONTEIRO, M. Promiscuidade humano-máquina: Protetizações interativas e glocalização da
experiência humana na cibercultura. In: TRIVINHO, Eugênio (Org.). A condição glocal:
configurações tecnoculturais, sociopolíticas e econômico-financeiras na civilização mediática
avançada. São Paulo: Annablume; FAPESP, 2014. p. 217-236.
OS PRINCÍPIOS DE UX PARA APLICATIVOS DE DISPOSITIVOS MÓVEIS. Produced by
Google Brasil, 2015. Disponível em: <https://www.thinkwithgoogle.com/intl/pt-
br/articles/mobile-app-ux-principles.html>. Acesso em: 05 jul. 2015.
RIBEIRO, D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. 3ª ed. São Paulo: Global,
2015.
ROCHA, C.; AMARAL-SILVA, M. Experiência social e ressonância cibernética: juventude e
a onipresença na rede. ROCHA, C.; SANTAELLA, L. (Org.). A onipresença dos jovens nas
redes. Goiânia: FUNAPE/Media LAB/UFG, 2015. p. 13-29.
SÉRGIO VALENTE é o novo diretor da Globo Comunicação. Exame, Negócios, fev. 2013.
Disponível em: <http://exame.abril.com.br/negocios/noticias/sergio-valente-e-o-novo-diretor-
da-globo-comunicacao>. Acesso em: 01 out. 2016
SHIRKY, C. A cultura da participação: criatividade e generosidade no mundo conectado. Rio
de Janeiro: Zahar, 2011.
STYCER, M. Globo sacrifica seriados para ajudar “Verdades Secretas”. Disponível em:
<http://mauriciostycer.blogosfera.uol.com.br/2015/06/11/globo-sacrifica-seriados-para-
ajudar-verdades-secretas-e-sacrifica-seriados/>. Acesso em: 20 nov. 2015.
TEIXEIRA JR., S. Quem tem medo do Netflix? Exame, São Paulo, ed. 1.085, a. 49, n. 5, p.
32-43, mar. 2015.
THOMPSON, J. B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. Petrópolis: Vozes,
2014.
TRIVINHO, E. Comunicação e cultura no pós-guerra. In: ______. O Mal-estar da teoria: a
condição da crítica na sociedade tecnológica atual. Rio de Janeiro: Quartet, 2001. p. 41-62.
______. A dromocracia cibercultural: lógica da vida humana na civilização midiática
avançada. Coleção Comunicação. São Paulo: Paulus, 2007.
______. Glocal: visibilidade mediática, imaginário bunker e existência em tempo real. São
Paulo: Annablume, 2012.
82
APÊNDICES
Apêndice A
83
84
85
86
87
Apêndice B
88
89
90