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Quebrando PARADlliMA!i

Ed René Kivitz

8 Ahnã

Rua Manuel Alonso Medina, 298- São Paulo - SP - CEP 04650-031 Tels./Fax (11) 5686-5058 • 5686-7046 • 5523-9441

Site: www.abbapress.com.br E-mail: [email protected]

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Quebrando Paradigma Ed René Kivitz © Abba Press Editora Ltda

Categoria: Liderança Cód.: 01.106.0995.6

7ª Edição no Brasil Dezembro de 2008

Revisão de texto por Lourenço Stélio Rega

Coordenação Editorial Oswaldo Paião Jr.

Impressão e Acabamento Imprensa da Fé

ISBN 978 - 85-85931-01-9

Arte da Capa Durante anos, os suíços dominaram, absolutos, o conceito de narcar a hora. O relógio suíço tinha a máquina e a mais avançada tecnologia. Até que um novo paradigma revolucionou o mercado. Surgiu o relógio digital, à bateria de quartzo, produzido com alta tecnofogía pelos asiáticos, principalmente japoneses em parceria com os americanos. A ironia é que foram os suíços que inventaram os relógios a quartzo, mas ficaram presos no seu paradigma de relógios mecânicos. A concepção artística da capa deste livro, procura inovar e ilustrar a quebra dos paradigmas. Por isso, causa certa estranheza em alguns observadores. Essa experiência demonstra o quanto é difícil para nós, especialmente evangélicos, aceitarmos novas maneiras de fazer as coisas e ver o mundo.

É permitida a reprodução de partes desse livro, desde que citada a fonte e com a devida autorização dos editores.

" Ahnã Rua Manuel Alonso Medina, 298 - São Paulo - SP - CEP 04650-031 Tels./Fax (11) 5686-5058" 5686-7046 "5523-9441 Site: www.abbapress.com.br E-mail: [email protected]

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Conteúdo

Prefácio .......................................................................................................... 05

Introdução ..................................................................................................... 07

1. O Conceito de Paradigmas ................................................................ 11

II. Bases Bíblicas e Teológicas Para a Igreja ................................. 15 1. A Razão de Ser da Igreja 2. A Missão da Igreja 3. A Filosofia da Igreja

III. A Igreja e Seus Paradigmas .......................................................... 37 1. A Igreja e o Templo 2. A Igreja e o Domingo 3. A Igreja e o Clero 4. A Igreja e o Culto Síntese e Quadro Sinóptico dos Paradigmas

IV. A Igreja e Seus Novos Paradigmas ............................................ 57 1. Pequenos Grupos e Discipulado 2. Pequenos Grupos e Cuidado do Rebanho 3. Pequenos Grupos e Ministérios Pessoais 4. Pequenos Grupos e Liderança na Igreja Quadro Sinóptico a Respeito dos Pequenos Grupos

V. Radicalizando na Visão ..................................................................... 7 5

VI. Conclusão .............................................................................................. 97

Bibliografia Sugerida .............................................................................. 100

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Dedicatória

Ao Douglas Spurlock, meu inesquecível discipulador

À Igreja Batista de Água Branca, minha grande família

À minha esposa Silvia Regina, e meus filhos Fernanda e Vitor, pedacinho de céu na minha vida

Agradecimentos

Almir Cordeiro Jr., que me iniciou nas ciências do Planejamento Estratégico

Lourenço Stélio Rega, que revisou e lapidou o texto

Comissão de Planejamento Estratégico da Igreja Batista de Água Branca: Nelson Beck Machado, Eliseu Jorge, Marcos Flávio de Cabral Moraes Jr.,

João Alexandre Fabossi, Alberto Sanches Borgufío, Walter Gomes Jr., Claudio Lemos Pinheiro,

Roberto Nobuyuki Handa, Jaime Augusto Cisterna, que discutiu teologia com piedade e amor ao corpo de Cristo

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Prefácio

O Pastor Ed René Kivitz é um dos mais proeminentes pensadores da nossa geração de pastores que o Espírito Santo tem levantado na Igreja Evangélica do Brasil.

O presente trabalho revela o modo objetivo, claro e profundo de seu pensamento. Isto porque o Ed é sobre­tudo, pastor. Ele pensa com acuidade intelectual, mas dirige o fluxo de seu trabalho para o estímulo pastoral que a igreja precisa receber.

Neste livro você vai encontrar um dos temas mais desafiantes que está posto para a Igreja nessa virada de milênio: a quebra de paradigmas que foram sacralizados, mas nada tem a ver com a revelação de Deus em Sua palavra.

Identificar que paradigmas são esses, como e por­que eles devem ser quebrados é a tarefa a que o pastor Ed se propõe neste livro. E consegue.

O que você vai sentir enquanto ler, é que o texto é provocativo, porém sério e reverente. Não há nele ne­nhum desejo de "mudança por mudança". Ao contrário, as razões para mudar são teológicas estrategicamente justificadas e elas fazem total sentido.

Eu, pessoalmente, me sinto extremamente compro­metido com o tema deste livro. Afinal, faz alguns anos que venho insistindo na necessidade da quebra de al­guns paradigmas que atrapalham a realização plena da missão da igreja. Por esta razão, o livro do pastor Ed René Kivitz me dá um profundo senso de gratificação ministerial, pois não apenas visa minhas convicções aqui apresentadas, mas feitas de maneira muito melhor do que eu jamais fiz.

Rev. Caio Fábio D'Araújo Filho

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Introdução

Saio em busca de um jeito de ser Igreja capaz de equilibrar fidelidade às Escrituras e relevância mi­nisterial na sociedade urbana contemporânea. Arrisco­me nesta aventura com o coração apoiado em três pilares. Primeiro, o temor de quem sabe que a Igreja não é uma instituição humana nem o resultado do esforço de alguns poucos amigos em desenvolverem um projeto de convivência. Sei que a Igreja é o povo de Deus, um povo que o Senhor Jesus comprou com seu próprio sangue (At 20.28). Sei que por trás das formas institucionais e por trás de estatutos, regimentos, cons­tituições, costumes e culturas, há um povo que é pro­priedade peculiar de Deus (1 Pe 2.9). Sei que devo medir minhas palavras, tomar cuidado quando o ardor dos meus poucos anos me impulsionar a criticar, apontar novos caminhos ou sugerir mudanças, e falar muito cautelosamente, com um olho no leitor e outro no semblante do Senhbr da Igreja.

Em segundo lugar, move-me um fortíssimo senso de respeito e gratidão aos irmãos que de boa vontade se gastaram e deixaram-se gastar por este empreen­dimento eterno chamqdo Igreja (2 Co 12.15). Olho para a Igreja hoje sabendo que a estrutura eclesiástica que temos é fruto de "sangue, suor e lágrimas" de tantos que, assim como nós, amaram a Igreja e se deram por ela.

Finalmente, há no meu coração um senso de obrigação. A fidelidade a Deus e ao seu povo não nos deixa outra alternativa do que não encararmos de frente, tendo em vista uma reflexão séria e piedosa, os diversos jeitos de ser igreja hoje. A ambição do meu

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coração é repetir a caminhada de Davi, que "serviu a sua própria geração segundo a vontade de Deus" (At 13.36).

Lembro-me do dia quando um irmão mais idoso, diácono da Igreja onde eu servia como pastor, bateu no meu ombro e me disse em tom solene: "Não se fazem mais pastores como antigamente". Numa fração de segundos os grandes expoentes de minha denominação passaram pela minha mente. Pensamentos como "a dignidade do púlpito" ou "a postura de um ministro de Deus" ecoaram em minha consciência trombando-se com meu auto-retrato.

A observação sobre "pastores como antigamente" me atormentou por muito tempo e ocupou muito de minhas reflexões e orações, até que um dia Deus me respondeu trazendo-me um desafio ainda maior do que a reprodução dos modelos do passado. Compreendi que é certo que não se fazem mais pastores como anti­gamente, justamente pelo jato de que já não se fazem mais pastores para antigamente.

Dewey Mulholland disse que "a reforma Protes­tante do Século XVI foi essencialmente teológica, mas ainda precisamos urgentemente de uma reforma eclesiológica". Estas palavras deram o tom do meu pre­paro acadêmico para o exercício do ministério pastoral. Desde então, sou movido pela convicção de que a Igreja está o que não é, e que o mote presbiteriano é um desafio renovado para cada geração de cristãos: "uma Igreja reformada, sempre se reformando". Eclesiologia é meu tema predileto ejá nem me lembro mais quanto tempo faz que por ele me apaixonei.

Assim pois, ainda que respeitosa e cautelosa­mente, caminho pelos bastidores de estruturas e men­talidades vigentes na eclesiologia evangélica brasileira,

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Introdução 9

em busca de coerência entre a fidelidade às Escrituras e a relevância ministerial na sociedade urbana contemporânea.

Este texto que você tem em mãos é resultado de mais de 10 anos de pesquisa e experimentos concomi­tantes ao serviço pastoral. Sigo à risca o ditado que ensina que "copiar de um é plágio; copiar de mil é pesquisa". Talvez, e muito provavelmente, as idéias, opiniões e conclusões que você mesmo nutre acerca da Igreja estejam esboçadas nestas páginas. Não du­vido. Muitas delas cresceram em mim após conversas com pastores, participações em congressos, escuta de preletores diversos, trânsito entre o rebanho, conselhos de homens fiéis, muita leitura e, principalmente, periodos longos e intensos de recolhimento na presença de Deus. Tudo isso, experiência muito próxima da sua.

Aqui está o norte provisório de meu serviço como pastor de uma igreja local num grande centro urbano como São Paulo, que espero servir de referencial para sua busca não menos intensa de servir a Deus, servin­do à igreja de forma atual, relevante, bíblica e cheia da imprescindível unção do Espírito Santo.

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1 O Conceito de

Paradigmas

~que é um paradigma? O dicionário indica ser uma palavra de origem grega (gr. paradeigma) que significa "modelo" ou "padrão". A melhor fonte para nossa conceituação é Joel Arthur Barker, que desde 197 4 vem trabalhando com pesquisas e consultoria para grandes empresas, principalmente nas áreas de inovação e antecipação ao futuro. Barker (1992, p.32), após citar vários autores e pesquisadores, tais como Thomas Khun, autor de A estrutura das revoluções científicas, amplamente usado no mundo das ciências, Wills Harmon, homem chave do Standford Research Institute, e Marilyn Ferguson, editora e produtora do New Sense Bulletin, apresenta sua definição de "para­digma":

Conjunto de regras e regulamentos (explícitos e não explícitos) que fazem duas coisas: (1) estabelecem li­mites ou fronteiras; (2) nos dizem como devemos nos comportar dentro destes limites de forma a sermos bem sucedidos.

Além desta definição, Barker (1992, p.35) nos apresenta uma lista de palavras que se associam ao conceito de paradigma. São elas:

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Teorias Medidas Modelos Hábitos Métodos Princípios Padrões Estruturas Rotinas Costumes Convenções Dogmas

Senso comum Janelas convencionais Valores Preconceitos Tradições Doutrinas Ideologias Regras

Paradigmas são, portanto, as fronteiras dentro das quais o sucesso deve ser construído e as soluções para os problemas devem ser encontradas. Paradigmas são limites de possibilidades. Paradigmas são "verda­des" que se fixaram na mente e que indicam um jeito de ser, viver ou fazer as coisas. Novos paradigmas sur­gem quando alguém descobre um jeito diferente de encarar ou fazer alguma coisa. Após repetidas expe­riências bem sucedidas à luz dos novos paradigmas, eles acabam por se instalar como regras que possuem um ar de definitivas, até que alguém as quebre, gerando outros e novos paradigmas. Veja uma breve lista de situações resultantes da quebra de paradigmas nos últimos anos:

@! O desrespeito à autoridade, na família e na sociedade em geral.

@! A valorização da informação como maior ri­queza.

!@Abordagem pública da sexualidade; linguagem obscena no rádio e 1V.

!@ Aceitação gradativa do homossexualismo. !@ Descoberta de que nem sempre o maior é o

melhor: "small is beautiful".

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O Conceito de Paradigmas 13

[@ O "mundo digital". l@ A participação da mulher na política e nos

negócios. l@ O Japão como paradigma de qualidade.

Agora, observe algumas coisas que tempos atrás foram tidas como improváveis, ou mesmo impossíveis. Veja o que disseram alguns dos mais ilustres homens do passado (Barker, 1992, p. 89).

l@ "Voar através de máquinas mais pesadas que o ar é impraticável e insignificante, senão completa­mente impossível" (Simon Newcomb, astrônomo, em 1902)

[@ Mulheres sensíveis e responsáveis não querem votar" ( Grover Cleveland, em 1905)

[@ "Quem será o louco que vai querer ouvir atores falando?" (Harry Warner, Warner Brothres Pictures, em 1927)

[@ Eu penso que existe um mercado mundial para apenas cinco computadores" (Thomas Watson, chair­man da IBM, em 1943)

[@ "Não existe qualquer razão para que uma pes­soa tenha um computador em casa" (Ken Olsen, Pre­sidente da Digital Equipment Corporation, em 1977)

Os paradigmas, portanto, ao mesmo tempo em que estabelecem os limites e referenciais de segurança pessoal e institucional, podem se transformar em blo­queios para projetos que beneficiariam milhares de

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pessoas. Quebrar urna regra de trânsito, pode custar a vida de alguém, e nesse caso, o paradigma é um instrumento para a segurança e a ordem nos grandes centros urbanos. Por outro lado, deixar de repensar os paradigmas ou obstacular seus aprimoramentos ou mutações pode causar grandes prejuízos.

A esta altura de nossa argumentação duas res­salvas são necessárias. A primeira diz respeito ao fato de que ninguém vive sem paradigmas. É impossível viver sem regras e padrões de raciocínio. Nesse caso, devemos verificar constantemente se nossos paradig­mas estão compatíveis com a realidade.

A segunda ressalva brota do ditado popular que adverte para o fato de que ao jogarmos fora a água da bacia, devemos cuidar para não jogarmos também o bebê que foi banhado. Evidentemente, há critérios que devem ser observados quando falamos em "quebrar paradigmas". O equilíbrio nessa questão talvez se enquadre nas mais dificeis artes.

Nesse caso, a quebra de paradigmas deve ser norteada pelos mais elevados valores morais de urna sociedade, e em nosso caso, enquanto cristãos, pelas Sagradas Escrituras que apresentam princípios imu­táveis e universais. Em outras palavras, há paradig­mas irrevogáveis. Encontrá-los é urna das mais subli­mes tarefa dos que pretendem mudar o mundo.

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II Bases Bíblicas

e Teológicas Para a Igreja

:Í-ormulação Estratégica, Planejamento Es­tratégico, Downsizing, Qualidade Total, Reengenharia, dentre outros, são termos identificados com a exce­lência em produtos e serviços na administração mo­derna. São termos técnicos, não raras vezes entrelaça­dos e controvertidos, capazes de afirmar o óbvio com tamanha precisão que as organizações que negligen­ciam estes processos estão fadadas ao fracasso. São ferramentas tão válidas para as organizações, quanto as fórmulas da física são válidas para a construção de aviões e as leis espirituais para a saúde existencial.

Karl Lachler, meu professor na Faculdade Teo­lógica Batista de São Paulo, sempre dizia em suas aulas que "tudo que está na Bíblia é verdade, mas nem tudo que é verdade está na Bíblia". Certamente a área de estruturas e processos organizacionais enquadra-se nesta afirmação. Isto é, quando focalizamos a comu­nidade cristã local como grupo de cristãos unidos em função de objetivos comuns, obviamente a sabedoria chamada secular tem muito a nos ensinar, sem que isso desmereça quaisquer conteúdos bíblicos e teoló­gicos.

Nesse caso, o uso das mais modernas e eficazes concepções gerenciais e administrativas é perfeita-

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mente plausível no contexto da comunidade cristã. Assim como um pastor se vale dos ensinamentos da psicologia para sua prática de conselheiro, dos insights da sociologia e antropologia para a interpretação de sua cultura, e dos recursos da medicina para cuidar do filho com febre, também deve valer-se dos princípios para gerenciamento de pessoas ou grupos, tendo em vista não somente viabilizar que cada cristão cumpra seu ministério pessoal, como também mobilizar a Igreja como um todo para que cumpra sua missão no mundo.

Com isto em mente, com a mesma seriedade com que dou ouvidos aos teólogos mais credenciados, tam­bém presto atenção àquilo que os administradores e consultores têm a dizer, mesmo porque muitos deles são cristãos apaixonados pelo Rei e pelo reino. Foi com homens assim que aprendi a distinguir alguns concei­tos interessantes, capazes de nos conceder uma melhor visualização de nossas instituições.

CONCEITO DEFINIÇÃO

Razão Necessidade do mercado que justifica a de Ser existência de uma instituição

Resposta de uma instituição à uma neces-

Missão sidade específica do mercado; o que a insti-tuição pretende fazer para suprir a neces-sidade do mercado

Fator de distinção entre instituições afins; o que caracteriza e cria a singularidade de uma

Filosofia instituição (os manuais usam ainda outros termos tais como crenças, valores, cultura ou filosofia)

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1. A Razão de Ser da Igreja

Que razões teria Deus para estabelecer a Igreja no mundo e trabalhar para sua manutenção e expan­são? Qual é a razão de ser da Igreja? Qual é o propósito principal da Igreja?

Escolhi a carta do apóstolo Paulo aos Efésios para basear minhas respostas. Ali, estão expostos os propósitos eternos de Deus, coisas que Deus planejou e fez antes da fundação do mundo e que foram se concretizando na história. Efésios é uma síntese de toda a Bíblia, e um texto tão abrangente que pode tratar com profundidade tanto dos conflitos do Oriente Médio quanto das brigas de um casal na segunda-feira.

Sendo fato que, como diz Efésios, as coisas come­çam a acontecer desde antes da fundação do mundo, então o melhor que podemos fazer é "começar do início por uma questão de princípios": Génesis é nosso ponto de partida.

O texto de Génesis narra a criação do ser huma­no, nas pessoas de Adão e Eva. A narrativa nos dá conta de que Deus delegou a Adão e Eva poder e autori­dade sobre a criação, e eles tornaram-se responsáveis pela administração do universo (Gn 1.26-28). Valeres­saltar que Deus não .deu autonomia ao ser humano, apenas compartilhou com ele a administração da cria­ção. Nada no universo pode ser autônomo em relação a Deus, senão teríamos dois deuses.

Houve, porém, um momento em que o ser huma­no resolveu assumir o controle do universo para gover­ná-lo por si mesmo, deixando Deus de lado. Deus era o paradigma através do qual o ser humano derivava sua concepção de certo e errado, bem e mal. Mas, o ser humano acreditou que, tendo acesso à árvore do

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conhecimento do bem e do mal, poderia assumir o papel de normatizador do universo, poderia chamar para si o direito de ser a fonte de autoridade acerca do bem e do mal, do certo e do errado. Deus, que era o centro de todas as coisas, foi posto de lado.

Evidentemente, Deus fez valer o contrato. Dizia a cláusula de segurança que no dia em que o ser humano partisse para "carreira solo", morreria (Gn 2.1 7). De fato, o advento do pecado trouxe a morte, em pelo menos cinco dimensões:

(1) Morte fISica, porque agora o homem, criado para viver eternamente, experimenta a fragilização do seu corpo até às últimas conseqüências (Gn 3.22).

(2) Morte social, porque o homem, criado para uma vida de comunhão e companheirismo com seus semelhantes, agora experimenta uma sucessão inter­minável de guerras e conflitos, transferindo sempre, à semelhança de Adão e Eva (Gn 3.12, 13), suas culpas interiores para terceiros.

(3) Morte existencial, porque o homem, criado com completo autodomínio, experimenta a realidade do medo, da culpa e a fragmentação de si mesmo, chegando a ponto de afirmar ser capaz apenas de fazer o mal que aborrece e incapaz de concretizar o bem que deseja (Gn 3. 10; Rm 7.15).

(4) Morte cósmica, porque o homem, criado para dominar a criação, tornou-se hóspede e prisioneiro do universo, sofrendo o flagelo de maremotos e terremo­tos, padecendo o câncer e a AIDS, e vivendo menos. Tudo isso resultado de um universo administrado pela

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criatura, que é incapaz de administrar a si mesma.

(5) Morte espiritual, a mais básica e determinante de todas as outras. Separação de Deus, quebra do rela­cionamento básico e expulsão do paraíso, ou expul­são da presença de Deus (Gn 3.23,24).

Cedendo à tentação da serpente, o ser humano criado para dominar sob a ação e bênção de Deus, tornou-se um hóspede prisioneiro do universo, sob a ira e o juízo de Deus. O universo se desconjuntou e tudo ficou fora do lugar. A terra, que Deus dera aos filhos dos homens (Sl 115.16), os filhos dos homens a entregaram ao inimigo, e por isso a Bíblia chama o Diabo de "deus deste século (presente ordem)" (2 Co 4.4), e diz o que "o mundo (universo criado) jaz no maligno" (1 Jo 5.19). Diz também que o ser humano não está mais sob a influência de Deus, mas sim sob a tirania do "príncipe das potestades do ar, o espírito que opera nos filhos da desobediência", e agora não faz mais a vontade de Deus, mas "a vontade da carne e dos pensamentos", vive seguindo seus instintos des­controlados e seus desejos desenfreados (Ef2. l-3). Não é de admirar que o mundo esteja todo desarranjado.

Efésios, entretanto, vai mais além. Descreve que Deus jamais desistiu de sua criação e projetou um plano de resgate. Estabeleceu um propósito bem defi­nido e tomou todas providências para que ele se consu­masse. Diz o apóstolo Paulo que o propósito eterno de Deus é "fazer convergir em Cristo todas as coisas, tanto as que estão nos céus como as que estão na terra" (Ef 1.1 O). Isto é, Deus pretende trazer de volta para debaixo do seu controle o universo usurpado pelo diabo.

As providências foram tomadas: o Senhor Jesus

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veio como enviado do Pai para "buscar e salvar o que se havia perdido" {Lc 19.10). Na cruz, o Senhor Jesus "arrancou as armas dos principados e potestades e triunfou sobre eles" (Cl 2.15). Em outras palavras, com sua morte, o Senhor Jesus estava reconciliando o mun­do com Deus, isto é, satisfazendo a justiça ultrajada de Deus (2 Co 5.19-21), e readquirindo os direitos sobre todo o universo. Por isso a teologia diz que o universo pertence a Deus duas vezes: por direito de criação e por direito de redenção.

Deus Pai honrou o sacrifício do Senhor Jesus, e deixou isso bem claro ressuscitando-o de entre os mor­tos e "fazendo-o sentar-se à sua direita nos céus, muito acima de todo principado, e autoridade, e poder, e do­mínio, e de todo nome que se nomeia, não somente neste século mas também no vindouro" (Ef 1.20,21).

Foi por isso que o Senhor Jesus, ressurreto, reu­niu seus discípulos e declarou solenemente que "toda a autoridade me foi dada no céu e na terra" (Mt 28.19). Em síntese, a boa notícia do evangelho é que o universo tem um novo chefe: Jesus Cristo, o Senhor.

Podemos concordar com Ariovaldo Ramos quando diz que o status do Senhor Jesus é tríplice:

(1) O Senhor Jesus é o centro de todo o imiverso: "fazer convergir em Cristo todas as coisas" (Ef 1.10). Isto quer dizer que tudo no universo deve acontecer segundo os interesses e de acordo com o jeito do Senhor Jesus.

(2) O Senhor Jesus é o cabeça de todo o universo: "sujeitou todas as coisas debaixo dos seus pés( ... ) para ser cabeça sobre todas as coisas" (Ef 1.22). Isto implica

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dizer que o Senhor Jesus é a única autoridade sobre tudo e todos, e que todas as realidades devem se curvar à sua vontade.

(3) O Senhor Jesus é a plenitude do universo: "cumpre tudo em todas as coisas" (Ef 1.23). O que significa que todas as realidades devem expressar o Senhor Jesus, uma vez que somente em coerência com ele o universo faz sentido, adquire seu potencial má­ximo e realiza em si mesmo o propósito para o qual foi criado.

A comparação entre esta percepção teológica e a realidade do mundo nos conduzem à constatação de que todo o universo pertence ao Senhor Jesus de direito de criação e redenção, mas ainda está em rebeldia, o que nos introduz na seqüência de Efésios, quando o apóstolo Paulo nos ensina que "para que o Senhor Jesus exerça domínio, seja o cabeça, sobre todo o uni­verso, Deus o constituiu cabeça da Igreja" (Ef 1.22,23). Isto é, o projeto inicial de Deus ainda está valendo: os céus ainda são os céus do Senhor e a terra continua entregue aos filhos dos homens. Deus ainda pretende agir no mundo e dominar sua criação através daqueles que se submetem a Ele.

Conclui-se, portanto, que a Igreja ocupa lugar central no processo de retomada do reino de Deus. A estratégia de Deus para redimir o universo inclui a criação de uma nova humanidade em Cristo Jesus. Paulo, apóstolo, ensina que:

"... a criação aguarda com ardente expectativa a revelação dos filhos de Deus. Porquanto a criação ficou sujeita à vaidade, não por sua vontade, mas por causa

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daquele que a sujeitou, na esperança de que também a própria criação há de ser liberta do cativeiro da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus. Porque sabemos que toda a criação, conjunta­mente, geme e está com dores de parto até agora; e não só ela, mas até nós, que temos as primícias do Espírito, também gememos em nós mesmos, aguar­dando a nossa adoção, a saber, a redenção do nosso corpo" (Rm 8.18-23).

"Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo, não imputando aos homens as suas transgressões; e nos encarregou da palavra da reconciliação" (2Co 5.19).

Em outras palavras, a plena redenção do uni­verso se consumará quando a nova humanidade em Cristo estiver construída. O ato redentor de Deus reco­locando o homem em seu status original trás impli­cações para a harmonia plena do universo. O raciocínio teológico segue a lógica de que assim como todo o universo foi afeta do pelo pecado do homem, assim também todo o universo será resgatado com a redenção do homem.

Falando em termos de causa e efeito, podemos afirmar que o pecado do homem é a causa, e a desar­monia cósmica é a conseqüência. Logo, a redenção do homem teria como conseqüência o resgate de todo o universo. Este é o sentido do pensamento do apóstolo Paulo: (1) a criação geme e aguarda a redenção dos filhos de Deus, que a libertará do cativeiro; (2) Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo, dei­xando de levar em conta as transgressões dos homens.

Isto nos leva a crer que a razão de ser da Igreja

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é a reconciliação da criação com o Criador. Isto é, "a necessidade do mercado que justifica a existência da Igreja" é que Cristo quer ser Senhor de fato sobre todo o universo criado, devolvendo-o à harmonia original, através da reconciliação do homem com Deus.

O diagrama elaborado por Karl Bosma resume bem toda esta argumentação de Efésios e a razão de ser da Igreja:

2. A Missão da Igreja

Como, então, a Igreja responde à sua razão de ser? Isto é, o que a Igreja deve fazer no mundo para que todas as coisas sejam submetidas, de direito e de fato, ao controle do Senhor Jesus? A resposta a estas perguntas define a missão da Igreja.

A chamada Grande Comissão, em suas múltiplas formas deve ser o nosso referencial:

"Foi me dada toda autoridade no céu e na terra. Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a observar todas as coisas que eu vos tenho mandado, e eis que estou convosco todos os dias

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até a consumação dos séculos" (Mateus 28.18-20).

"Ide por todo mundo e pregai o evangelho a toda criatura" (Marcos 16.15).

"Assim está escrito que o Cristo padecesse, e ao terceiro dia ressurgisse dentre os mortos; e que em seu nome se pregasse o arrependimento para remissão dos pecados, a todas as nações, começando por Jerusalém" (Lucas 24.46,47)

"Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e ser-me-eis testemunhas, tanto em Jerusalém, como em toda a Judéia e Samaria, e até os confins da terra" (Atos 1.8).

Estes textos propõem, como afirmou o Rev. John Stott (1975, p. 27), uma "ênfase cumulativa" que pode conduzir à falsa interpretação de que a missão da Igreja se resume em pregar; converter e ensinar. Entretanto, há alguns pilares básicos no comissionamento da Igreja que, sendo negligenciados, reduzem em muito o con­ceito de missão:

(1) A abrangência da missão da Igreja é quase ilimitada. O texto de Mateus fala a respeito de toda autoridade, toda a divindade, todas as nações, todas as ordens do novo Rei, todos os dias. A abrangência deste comissionamento indica que a missão da Igreja extrapola a conversão do indivíduo, sendo, na verdade, um projeto global de redenção.

{2) O conteúdo da proclamação da Igreja envolve "todas as coisas que Jesus mandou", e isto abrange

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muito mais do que o plano da salvação. O evangelho todo, ou "todo o conselho de Deus", como disse o após­tolo Paulo (At 20.27), inclui a totalidade do propósito de Deus para a sua criação.

(3) O comissionamento está alicerçado no fato de que toda a autoridade está de volta nas mãos do Senhor Jesus. A Igreja é responsável por proclamar que o uni­verso tem um novo soberano, que o tempo da rebeldia cessou e que o reino de Deus foi inaugurado. Esta, na verdade, é a boa nova: haverá uma "consumação dos séculos", um fim bom para a criação e a instalação do reino eterno de Deus, e dele farão parte todos aqueles que a partir de agora se submeterem ao novo Rei, todos aqueles que se "arrependerem, e forem redimidos de seus pecados" (Me 1.14).

O fim último da missão da Igreja não é a conver­são em massa de pecadores, mas a instalação definitiva do reino de Deus: "Santificado seja o teu nome, venha o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu" (Mt 6.9, 10). Como bem disse John Stott (1989, p. 43):

"não devemos separar a salvação do reino de Deus. Na Bíblia, estes dois são virtualmente sinônimos, modelos alternativos que descrevem a mesma obra de Deus. Quando Jesus disse aos seus discípulos: 'quão difícil é entrar no reino de Deus', parece ter sido natural que eles respondessem com a pergunta: 'Então, quem pode ser salvo?' (Me 10.24-26). É evidente que, para eles, entrar no reino de Deus era o mesmo que ser salvo".

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Em síntese, Deus não está resgatando apenas pessoas, está resgatando o universo e restaurando a plena ordem e harmonia cósmica sob os pés do Senhor Jesus. À luz desta compreensão, devemos concordar com Lausanne quando afirma que a missão da Igreja é levar o evangelho todo para o homem todo, promo­vendo a manifestação histórica do reino de Deus como um sinal do que será a terra nova. Fazer discípulos é apenas uma dimensão desta ação integral de estar no mundo como o Senhor Jesus no mundo esteve: "Assim como o Pai me enviou, também eu vos envio a vós" (Jo 20.21).

Mais uma vez lanço mão de argumentos de Ariovaldo Ramos (1995, p. 43):

''..4s vezes penso que a Igreja se comporta como um bizarro grupo guerrilheiro: imagine um grupo guerri­lheiro cujo objetivo seja o de agregar às suas fileiras o maior número de cidadãos do país; imagine que o grupo, depois de muito esforço, consiga isto, ou seja, mais de 50% da população do país tomou-se membro do tal grupo; entretanto, como esse era todo o objetivo do grupo, este, mesmo constituindo a maioria da nação, não está no poder, isto é, tem a maioria das pessoas mas não afetou em nada a realidade à sua volta. A Igreja, muitas vezes, parece comportar-se assim também. Todo o seu objetivo é arrebanhar a maioria das pessoas da cidade para si, sem, contudo, ter um projeto para a cidade. É por isso que, muitas vezes, a Igreja, apesar de crescer muito numa cidade, não muda nada a vida da mesma. Não queremos apenas aumentar o número de convertidos numa cidade, queremos nos apossar dela. Queremos que mesmo os que não se converterem sejam afetados pela

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presença de Deus na cidade, e que, por causa da palpabilidade desta presença, pensem muito bem antes de levantarem-se contra a vontade de Deus. Nosso modus operandi, nessa conquista, não é a busca pelo poder político ou econômico; é o interceder, o salgar, o profetizar e o servir até que, pelo efeito do fermento, a cidade toda fique levedada (Lc 20.21 )".

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Na década de 80, o movimento que no Brasil foi batizado de Evangelical, enfatizou a "missão integral, ou holística, da Igreja". A proposta para as dimensões da ação da Igreja no mundo era dupla: resgatar o in­divíduo e atacar os centros nervosos da sociedade. O conceito de pecado era abrangente: "individual" e "estrutural", devendo a igreja enfrentar tanto as hostes espirituais que oprimem indivíduos, quanto as hostes espirituais que geram estruturas sociais que conspiram contra os interesses do reino de Deus, e igualmente aprisionam indivíduos. A máxima "corpo sem alma é defunto, e alma sem corpo é fantasma", trouxe extraor­dinária implicação missiológica: resgatar pessoas inteiras, propiciando-lhes o acesso ao pão de trigo e dando-lhes, pela graça, o pão da vida.

O possível conflito entre evangelizar e servir gerou intensa discussão. O relatório final da Consulta sobre a relação entre a Evangelização e a Responsa­bilidade Social, realizada em Grand Rapids em junho de 1982 (Série Lausanne - Vol 2, 1983, p. 20), apazi­guou os ânimos ao concluir que:

(1) A ação social é conseqüência da evangeli­zação, pois através da pregação do evangelho Deus produz nas pessoas o novo nascimento, e esta nova vida se manifesta no serviço prestado aos outros. A

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solidariedade, enquanto marca do caráter cristão à luz do modelo de Jesus que "veio para servir" (Me 10.45) e "andou por toda parte fazendo o bem" (At 10.38), é caracteristica da Igreja em missão. A Bíblia ensina que o Senhor Jesus deu-se a si mesmo por nós, não apenas para "remir-nos de toda iniqüidade", mas também com o fim de "purificar para si mesmo um povo exclusiva­mente seu, zeloso de boas obras" (Tt 2.14), de modo que "somos criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus de antemão preparou, a fim de que andássemos nelas"(Ef 2.10).

(2) A ação social é ponte para a evangelização, pois abre portas para a proclamação do evangelho. O próprio Jesus algumas vezes manifestou obras de mise­ricórdia antes de proclamar o reino de Deus.

(3) A ação social é parceira da evangelização, uma vez que até mesmo no ministério de Jesus a proclama­ção e o serviço andavam de mãos dadas. Ele alimentou os famintos, curou os enfermos, instruiu os ignorantes e proclamou as boas novas do reino de Deus.

Muito se falou também acerca dos níveis de tratamento que a Igreja deveria dar à questão social. A maioria acreditava que a Igreja deveria "dar o peixe e ensinar a pescar". Mas um grupo considerável estava convencido que, além destas duas dimensões, a Igreja deveria somar forças para a transformação das estru­turas sociais, à luz do conceito de co-beligerância, desenvolvido por Francis Schaeffer. Isto é, unir-se à sociedade civil organizada em razão de valores comuns na promoção da justiça e da paz. A Consulta sobre a relação entre a Evangelização e a Responsabilidade

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Social também se pronunciou dizendo que a responsa­bilidade social dos cristãos deveria contemplar a (1) filantropia, (2) os projetos comunitários de desenvol­vimento, e (3) a ação política (1983, p.38).

Evidentemente, toda esta discussão gerou exces­sos, e alguns polarizaram na carona da teologia da Libertação que absolutizou o social e estrutural. Ou­tros, escaparam pela via da ingênua convicção de que "mudando o indivíduo, muda-se a estrutura", e foca­lizaram apenas a evangelização.

Vale ressaltar que não devemos confundir o reino de Deus com a sociedade cristianizada, como fizeram os teólogos do "evangelho social", que acreditavam que poderiam estabelecer o reino de Deus na terra. Con­fesso que, por vezes acredito que alguns discursos ufa­nistas de lideranças evangélicas no Brasil caminham nesta direção, ou do anseio constantiniano de casar Estado e Igreja, numa união que a história jâ provou infrutífera e danosa para ambos. Todos sabemos que o reino de Deus está inaugurado, mas não está con­sumado; será consumado quando o Senhor Jesus tiver posto todos os inimigos debaixo dos seus pés e, tendo destruído todo poder, e domínio, e autoridade, inclusive a morte, entregar o reino a Deus, o Pai (1Co15.24-26).

Por outro lado, é indiscutível que, como disse Charles Finney (Stott, 1989, p. 20), "o evangelho libera um poderoso impulso rumo a reforma social", e que esse impulso já se manifestou historicamente, como no caso do avivamento wesleyano na Inglaterra do sé­culo XIX, resultando por exemplo na reforma do sis­tema penitenciário, na abolição do tráfico de escravos, no surgimento dos primeiros sindicatos e na melhoria das condições de trabalho nas minas e fábricas. Assim, pois, quando falamos acerca da missão da Igreja,

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devemos encarar a ação integral da Igreja no mundo, e não apenas a dimensão do resgate ao indivíduo.

Este é o embasamento bíblico-teológico para a ação da Igreja tanto em sua dimensão universal, como corpo de Cristo, quanto para sua dimensão local, en­quanto comunidade cristã. Evidentemente, uma comu­nidade cristã local jamais conseguirá conquistar o mundo para Cristo. Mas no sentido teológico, que orienta a igreja a agir "tanto em Jerusalém, como em toda a Judéia e Samaria, e até os confins da terra" (At 1.8), devemos crer que o âmbito de atuação de uma igreja não pode se restringir a um bairro, uma cidade ou um país. A ação de uma igreja deve ser simultânea no distante e no imediato a partir de seu próprio con­texto.

c. s. Lewis, resume bem tudo isso quando diz que o mundo é um território ocupado pelo inimigo e "o Cristianismo é a história de como o rei justo desem­barcou (poderíamos dizer, desembarcou disfarçado) e nos chama para uma grande campanha de sabotagem".

3. A Filosofia da Igreja

Até agora vimos que a missão da Igreja é levar o evangelho todo para o homem todo. Mas, cada igreja desenvolverá sua própria maneira de cumprir esta mis­são, que chamamos defilosofiade ministério. Afilosofia diz respeito às ênfases e valores peculiares de cada igreja local. Diz respeito a um jeito de ser, ao como cumprir sua missão deixada pelo Senhor da Igreja. Mais ainda do que os conceitos de razão de ser e mis­são, a filosofia tem tudo a ver com paradigmas, uma vez que é na filosofia que as comunidades deixam transparecer seu jeito de pensar, seus limites de pos-

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sibilidades e seus padrões de comportamento. Nesse caso, não podemos encontrar uma decla­

ração de.filosofia que seja comum a todas as comu­nidades locais. Podemos e devemos crer que os con­ceitos de negócio, missão e estratégia possuem defi­nições bíblicas que não podemos alterar. O conceito de filosofia, entretanto, varia de igreja para igreja, de contexto para contexto. Cada comunidade cristã, por­tanto, é responsável por elaborar sua declaração de filosofia à luz de bases bíblicas e teológicas, mas deve­mos compreender que a Bíblia oferece razoável margem de liberdade que favorece visões diferentes entre si.

Há uns 12 anos atrás tive meu primeiro contato com estes conceitos através de Peter Wagner, quando insistiu: "Escreva Sua Filosofia de Ministério" ( 1984, pg 1 75). O texto contava a experiência de quatro dife­rentes igrejas na área de Los Angeles. A primeira, a Catedral de Cristal, liderada por Robert Schuller, foi chamada por Wagner de "igreja da vida real", uma vez que o ministério era direcionado para pessoas avessas à religião. Schuller dizia que não gostava de pregar, pois o povo de sua região não dava crédito às Escri­turas. O púlpito era usado para testemunhar o que Jesus podia fazer "na vida real das pessoas". Seus ser­mões eram, e ainda são, discursos filosóficos recheados de teologia.

O segundo modelo foi a Grace Community Chur­ch, chamada de "igreja-escola", e pastoreada por John MacArthur, que dedicava-se quase que exclusivamente a expor as Escrituras para um povo que levava cader­nos para anotações dos sermões.

O terceiro exemplo foi a Vineyard Christian Fellowship, chamada de "igreja da geração jovem", cujos cultos aconteciam num ginásio e onde as pessoas

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entre 18 e 30 anos iam como se estivessem vestidas para um show de rock. John Wimber era o pastor à época. Vineyard hoje está bem diferente. A filosofia mudou.

Finalmente, Wagner apresentou a Paradise Bap­tist Church, que denominou de "igreja do empurrão espiritual", que pela ênfase no poder do Espírito Santo tornara-se uma das mais destacadas igrejas dos negros de Los Angeles.

Alex Periscinoto, em sua coluna CRIAÇÃO & CONSUMO, no jornal "Folha de São Paulo", apresentou e elogiou a filosofia de ministério da Metro Baptist Church, de Nova York. Sua fonte foi um anúncio da Igreja com o seguinte título: "Desabrigados no fim do quarteirão. Prostitutas na esquina. Traficantes de crack no outro lado da rua. Que ótimo lugar para uma Igreja".

Abaixo, seguia o texto que singulariza a "Metro Baptist Church":

"Jesus não freqüentava clubes de campo, teatros ou restaurantes caros, ele sempre ia onde havia carências. As mesmas que correm soltas na cidade de Nova York hoje em dia. Carências como seres humanos famintos e com frio dormindo nas grades dos exaustores do metrô por causa do ar quente. Carências como pessoas capturadas na teia do abuso e do uso de drogas. Ou carências como homens, mulheres e crianças vendendo seus preciosos corpos por uma migalha de comida, um abrigo ou simplesmente um lugar qualquer para passar a noite. Conhecemos estas carências tão bem porque as vemos todos os dias. Nossa Igreja fica bem no meio da Clin.ton South, lugar mais conhecido como A Cozinha do Inferno. Bem, agora Deus está na Cozinha do Inferno. Nossos ministros oferecem comida e roupas, enquanto nossa congregação oferece

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amor e apoio. Gostamos de pensar que isso é o que Jesus faria. Visualizamos o dia em que nossa vizinhança mudará de estar cheia de luta para estar cheia de amor. Só nesse dia nós nos mudaremos".

Outro exemplo bastante salutar é a Lake Avenue Community Church, em Pasadena, Califórnia, com sua estrutura montada em três pilares: célula, que reúne 12 a 15 pessoas; congregação, cada uma com seu pas­tor, reunindo aproximadamente 150 pessoas; e cele­bração, que reúne a igreja toda. Ray Ortlund, em seu livro Senhor, faça da minha um milagre, narra como em 1968, deu o pontapé inicial nesta filosofia, colo­cando a Igreja diante de três compromissos básicos: (1) onde quer que você esteja espiritualmente, entregue de novo seu coração a Jesus; (2) comprometa-se com o corpo de Cristo; e (3) comprometa-se com o mundo -com seu trabalho neste mundo e seu testemunho a ele.

A Willow Creek Community Church, em Chicago, EUA, é outro exemplo inovador e inspirador baseado em quatro princípios básicos, que englobam: (1) ares­ponsabilidade pessoal do cristão em testemunhar; (2) a diferença entre as necessidades dos cristãos e não cristãos; (3) o processo distinto da jornada espiritual de cada pessoa; e (4) o fato de cada cristão é capacita­do por Deus para ministrar no corpo de Cristo.

Bill Hybels, 45, principal pastor da Willow Creek, em entrevista concedida ao jornal Folha de S. Paulo, em 25 de dezembro de 1991, salienta que a intenção da Igreja é proporcionar a oportunidade de que as pessoas se relacionem com Deus à distância dos rituais chatos da religião. Com uma abordagem atual, sem a velha distinção entre social e espiritual, Bill Hybels

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pretende fugir da coação e manipulação, enfatizando a instrução e o esclarecimento do povo a respeito de temas relevantes. A Willow Creek, em função de sua filosofia, é um dos mais discutidos modelos eclesiás­ticos atualmente nos Estados Unidos.

Também no Brasil, esta diversidade de filosofias de ministérios tem segmentado o povo evangélico a partir de diferentes propostas de vivência da fé. Consi­derando que a filosofia de ministério indica claramente o que cada pessoa pode esperar ou até mesmo procurar em uma comunidade cristã, cada comunidade traz para si um certo tipo de pessoas.

Usando a linguagem do marketing, ainda que ressaltando-se o perigo das generalizações, podemos afirmar que cada segmento cristão possui um apelo distinto para o mercado. A Igreja Universal do Reino de Deus, por exemplo, concentra sua ênfase na solução para problemas. Todo o apelo da Igreja do Bispo Edir Macedo está voltado para a tríade cura-exorcismo-pros­peridade como veículo para satisfação de necessidades imediatas.

As igrejas pentecostais históricas enfatizam o poder do Espírito Santo, notadamente na manifestação de dons espirituais de êxtase verbal - daí a ênfase no dom de línguas estranhas, revelações e profecias, e do confronto com os poderes das trevas. As igrejas chama­das neo-pentecostais enfatizamfenômenos espirituais, o que explica os dentes de ouro, sopros e quedas, arre­batamentos, visões, bem como uma boa dose de pros­peridade financeira como resultado da intervenção milagrosa de Deus.

As igrejas reformadas enfatizam o saber teológico, o que nos leva considerar que os pentecostais vão ao templo para falar com Deus e os reformados vão ao

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templo para falar a respeito de Deus. Em síntese, está claro que as igrejas, enquanto

comunidades cristãs locais, são diferentes entre si. Vale ressaltar, entretanto, que, respeitados os limites bíbli­cos, não há qualquer razão para que se busque a uni­formidade entre as filosofias de ministério, ou que se afirme um modelo eclesiástico como único e universal. Na verdade, a diversidade de visões ministeriais é um reflexo da multiforme sabedoria de Deus expressa em sua Igreja, como também um resultado concreto da diversidade do corpo de Cristo. Devemos, portanto, va­lorizar e respeitar as formas que as igrejas vão assu­mindo cultural e historicamente.

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III A Igreja e Seus

Paradigmas

9'eter Wagner, no artigo já citado, comenta que todas as filosofias de ministério são válidas e alcançam pessoas diferentes. Veja o que ele diz: "Nenhuma igreja pode fazer todo o trabalho; nenhuma igreja consegue ministrar a todas as necessidades humanas. Portanto, a excelência no ministério envolve fazer algumas esco­lhas. Ninguém pode dizer: Temos alguma coisa para cada tipo de pessoa'. Cada Igreja deve decidir sua iden­tidade peculiar e potencializar sua personalidade úni­ca". É esta "personalidade única" que chamamos de filosofia.

George Barna (1991, p. 52) caminha na mesma direção, quando afirma que "igrejas podem atrair mais pessoas para si mesmas empreendendo um pequeno número de ministérios chave com excelência, do que realizando muitas coisas apenas adequadamente". Em outras palavras, é mais eficaz fazer poucas coisas real­mente bem feitas, do que muitas coisas com quali­dade apenas razoável.

Este conceito de filosofia ministerial traz consigo duas questões básicas que merecem considerações. Em primeiro lugar, é evidente que há distâncias diferen­tes entre as filosofias ministeriais e os princípios da palavra de Deus. É perfeitamente possível que uma

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comunidade cristã esteja assentada em areia movediça, uma vez que não é raro encontrarmos igrejas funcio­nando à luz de princípios nitidamente conflitantes com os modelos bíblicos. É fato que alguns modelos ecle­siásticos são mais compatíveis com os modelos bíblicos do que outros, e cabe a cada liderança cristã o exercício do discernimento tendo o Espírito Santo como fonte de luz e a Bíblia como bússola para a jornada.

Em segundo lugar, é importante registrar que todas as comunidades cristãs, sem exceção, funcionam a partir de uma filosofia. Nem sempre seus membros ou líderes têm consciência dos valores e princípios que norteiam sua vivência religiosa, mas certamente res­pondem a um tipo de raciocínio lógico, e nem sempre verdadeiro. Isto é, cada líder possui seu "jeito próprio de pensar a Igreja", sua natureza e missão, que acaba por influenciar a prática ministerial, a estrutura ecle­siástica, as ênfases e ações cotidianas do ministério pastoral e comunitário.

Em se tratando de diversidade na filosofia, o pro­blema é que parece haver cada vez menos diversidade. A maioria dos líderes tem a tendência de reproduzir os modelos e responder aos paradigmas de seu tempo. Enxergam a Igreja sob lentes herdadas e nem sempre param para avaliar a compatibilidade do modelo ado­tado com os referenciais das Escrituras. São guiados por paradigmas definidos de antemão, e na maioria das vezes, não se dão conta de que respondem a uma "inteligência" raras vezes tão inteligente assim.

Nesse caso, considerando que a igreja pode ser também avaliada como uma organização sujeita aos limites impostos pelos paradigmas, temos a obrigação de avaliar como as igrejas funcionam hoje, verificar se sempre funcionaram assim ou se há outro jeito de ser

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igreja, mais eficaz e mais compatível com a palavra de Deus.

Conquanto não seja possível enquadrar todas as comunidades cristãs num único jeito de ser, acredito que hã uma mentalidade vigente, uma certa maneira de pensar a igreja, que se torna representativa da gran­de maioria das comunidades cristãs. Creio que pode­mos identificar esta mentalidade eclesiástica à luz de quatro grandes conceitos, ou paradigmas, a saber: cul­to, clero, domingo e templo.

Certo semanário denominacional publicou re­portagem onde o articulista elogiava o vigor de uma comunidade cristã. Dizia o artigo que a Igreja batizava mais de 300 novos cristãos por ano e que atendia mais de 400 crianças a cada domingo em sua escola domi­nical. Comentava acerca do culto jovem no sábado à noite, que reunia mais de 1000 jovens semanalmente, e dos quatro cultos dominicais, todos com casa cheia. Arrematava dizendo que o grande desafio para aquela igreja, como também para todas as demais igrejas, era ampliar aquele imenso santuário, abrindo-o em forma de leque, construindo dezenas e dezenas de galerias (tal qual aquela mega-igreja de Seul) e enchê-lo de almas salvas por Cristo Jesus.

Obviamente, uma Igreja com estes números exer­ce influência significativa na sociedade, principalmente em se tratando do contexto do nordeste brasileiro, mas o articulista foi incapaz de vê-la. Por que? Por causa dos paradigmas "culto, clero, domingo e templo". Que fatores impediram o articulista de valorizar a influência dos profissionais cristãos na sociedade, a extensão das obras sociais desenvolvidas pela Igreja, ou quem sabe o arrojo missionário daqueles irmãos? Os paradigmas viciaram a mente do cristão a compreender a Igreja como

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um acontecimento semanal. Daí o conceito de que uma igreja viva é aquela que possui um imenso santuário que por sua vez está sempre cheio de "almas salvas por Cristo".

Lembro-me também de um grande painel que encontrei na entrada de uma instituição cristã. Mostra­va um sujeito seguido por sua casinha à caminho do templo, com os seguintes dizeres: "Eu e minha casa serviremos ao Senhor". Novamente um flagrante dos paradigmas "culto, clero, templo e domingo". Eles são responsáveis pela representação de serviço a Deus co­mo freqüência ao templo. Creio que o painel seria mais fiel ao espírito da Escritura se mostrasse o cristão sain­do do templo e afirmando seu compromisso de serviço.

Um outro, e último exemplo, é a propaganda de um seminário teológico cuja campanha dizia: "Invista em você e prepare-se para ser um servo que reflita neste mundo a vida de Jesus Cristo". Na capa, havia um desenho estilizado de um pastor no púlpito. Erro: associar o "refletir a vida de Jesus Cristo no mundo" com algo que é desenvolvido pelo clero, o pregador, no templo, no domingo e no culto. A filosofia está correta, mas os paradigmas impedem-na de concretizar-se.

Nas próximas páginas tentaremos avaliar estes paradigmas à luz da Bíblia, buscando compreender não apenas como limitam o potencial da igreja, mas principalmente quais são algumas alternativas possí­veis para que a igreja redescubra a liberdade estrutural característica do cristianismo primitivo. O ensinamento bíblico é que a Igreja do Senhor Jesus está desafiada a viver além dos limites do culto-clero-domingo­templo.

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1. A Igreja e o Templo

A Bíblia possui várias avenidas principais. Marti­nho Lutero dizia que a Bíblia é cristocêntrica; os teó­logos da libertação já preferem transitar pela teologia do reino de Deus; outros irmãos seguem adiante pelas tortuosas e sinuantes estradas escatológicas; e tantas outras possibilidades podem ser alistadas. Creio que uma das avenidas principais da Bíblia é a narrativa do processo de Deus em busca de compartilhar sua vida e presença com as pessoas, criadas à sua imagem e semelhança. Se estou bem certo, encontro seis fases deste processo de Deus.

( 1 J Face à Face no Paraíso

No início, o ser humano e Deus conversavam face à face na virada do dia (Gn 2. 7). Até que o pecado tomou lugar e o ser humano foi expulso da presença de Deus. A partir de então, Deus não estava mais pre­sente entre os homens, devendo ser buscado através de ofertas e sacrifícios. A decadência humana foi acelerada: os exemplos de Abel (Gn 4.4) e Enoque (Gn 5.24) são isolados e o quadro mais próximo de um mun­do administrado pela criatura, sem que o Criador tenha vez e voz, é a geração que precede o dilúvio (Gn 6.1-12). Mas Deus iniciou um longo projeto de redenção e entrou numa nova fase do processo de repartir sua vida com as pessoas.

(2) No Meio do Povo, no Tabernáculo

Deus chamou um homem de nome Abrão e lhe fez a promessa de abençoar todas as famílias da terra,

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fazendo dele, Abrão, o pai desta nação abençoada (Gn 12.1-3). Seguem-se narrativas de cultos com os Patriar­cas edificando altares onde Deus a eles se manifestava, e isso pode ser interpretado na perspectiva de Deus em busca do homem, e não do homem em busca de Deus, visto que o culto era sempre um ato segundo: Deus se manifestava e o homem respondia com sacrifi­cios e ofertas.

Enquanto isso, Deus esperou quatrocentos anos para que a nação prometida começasse a aparecer: a semente de Abraão se multiplica e torna-se numerosa sob o domínio tirânico do Egito e, somente então, Deus dá continuidade ao seu plano redentor.

A proposta de Deus é a libertação de Israel, para guiá-lo pelo deserto através de Moisés (SI 77.20). Este povo que percorreria o deserto seria identificado como povo de Deus, um reino sacerdotal, uma ponte entre Deus e as nações (Êx 19.1-6). Deus providenciou, en­tão, uma forma de sinalizar sua bênção e repartir sua presença com o povo no deserto. E exatamente aí come­çou a segunda fase do processo de Deus em repartir sua vida e presença com as pessoas: o Tabernáculo, o templo móvel que estava sempre no meio do povo, acompanhando-o em suas andanças pelo deserto ime­diatamente após a libertação da escravidão no Egito (Êx 25.8; 29.45,46; 33. 7).

O Tabernáculo foi uma experiência que perdurou por mais de quatrocentos anos, até o início do periodo do reino unido, quando o rei Davi desejou "construir uma casa para Deus" (2 Sm 7).

(3) Com Endereço, no Templo

A terceira fase do processo de Deus em repartir

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sua vida e presença com as pessoas interrompeu o projeto original que ganhava corpo com a figura do Tabernáculo. Deus queria sinalizar sua presença no meio do povo, mas não queria um endereço fixo. Davi, entretanto, projeta o Templo argumentando que a casa de Deus não poderia ser uma tenda que alguém monta e desmonta enquanto que a casa do rei era feita de cedro e cheia de todas as riquezas.

A reação de Deus à proposta de Davi foi seme­lhante ao incidente do estabelecimento da monarquia: a princípio desaconselha, mas acaba abençoando. Deus deixou claro que não desejava um endereço, e aproveitou a ocasião para fazer a Davi a promessa de que um dos seus descendentes construiria uma casa eterna onde, ali sim, Deus habitaria (1 Sm 8.4-22; 2 Sm 7; 1Cr17.4-15; 2 Cr7.12-18). Em termos imedia­tos, este descendente era Salomão, mas ficou muito claro que na verdade era uma referência ao Senhor Jesus, pois a promessa apontava para "um reino esta­belecido para sempre" (2 Sm 7.13, 16).

(4) Em toda a sua glória, em Jesus de Nazaré

Jesus de Nazaré é a expressão máxima da pre­sença de Deus no mundo. É Deus encarnado. Aspa­lavras do próprio Senhor Jesus deixam claro sua cons­ciência a este respeito: "Eu e o Pai somos um, de modo que quem me vê a mim, vê o Pai" (Jo 10.30; 14.9).

(5) Nas Pessoas, na Igreja

Quase mil anos depois de Salomão, o Senhor Jesus está diante do templo de Jerusalém, que já não era mais aquele construído por Salomão, mas o re-

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constrnído por Zorobabel, fazendo a seguinte decla­ração: "Derribai este santuário, e em três dias o levanta­rei". João, o evangelista, explica que Jesus se referia ao seu corpo, numa alusão claríssima à ressurreição (Jo 2.19-21).

É neste contexto que devemos entender a pro­messa de Jesus: "Na casa do meu Pai há muitas mora­das; se não fosse assim, eu vo-lo teria dito; vou prepa­rar-vos lugar. E, se eu for e vos preparar lugar, virei outra vez, e vos tomarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também" (Jo 14.2,3). Jesus cumpre sua promessa: morre, e após três dias ressus­cita com a casa do Pai pronta e com lugar suficiente para todos os que pela fé se unissem a Ele. A glória de Deus, antigamente localizada no Tabernáculo e depois no Templo, agora estava em Cristo e seria comparti­lhada com todos os que, pela fé, têm comunhão com Ele.

As palavras de Jesus "eu vou e volto" devem ser entendidas como referentes à sua morte e ressurreição, e não como indicativas de sua segunda vinda, pelo menos por 4 razões:

1. A preocupação dos apóstolos dizia respeito ao presente, e não ao feturo: o que aconteceria com eles após a morte de Jesus e não após a sua própria morte;

2. Qualquer judeu em Jerusalém que ouvisse a expres­são "casa do Pai" enxergaria o Templo, e não o céu;

3. O contexto da afirmação de Jesus é Jo 2.19-21, quando a casa do Pai é identificada com o Templo de Jerusalém e o corpo de Cristo, e não com o céu;

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A Igreja e Seus Paradigmas 45

4. A promessa de "estar onde Jesus estiver" tem pre­visão de três dias para o seu cumprimento; não se trata de "morrer e ir para o céu", mas de experimentar his­toricamente a presença de Jesus.

A casa do Pai é, portanto, a Igreja, o corpo de Cristo, onde temos perfeita comunhão com o Senhor Jesus. Nosso reencontro com o Senhor Jesus não é uma promessa escatológica, mas uma realidade vigente através do Espírito Santo. Afinal, o Senhor Jesus prometeu que estaria conosco todos os dias até a consumação dos séculos {Mt 28.20), e que, juntamente com seu Pai viveria e faria morada naqueles que guardassem sua palavra {Jo 14.23).

Os apóstolos compreenderam nitidamente a mensagem, pois que chamaram a igreja de "templo santo para morada de Deus em Espírito" (Ef 2.21,22), "pedras vivas, edificadas como casa espiritual" ( 1 Pe 2.5) e ensinaram que o Espírito Santo habita na igreja, o corpo de Cristo (1Co3.19; 6.19).

Estevão afirmou que "o Altíssimo não habita em templos feitos por mãos de homens" (At 7.48), de modo que quem tem um lugar sagrado para a adoração é o povo pagão, que procura templos e colinas. O Templo exerceu sua função tipológica no Antigo Testamento, mas agora os cristãos sabem que Deus é Espírito, e é necessário que os que o adoram o adorem em Espírito e em verdade" (Jo 4.24). Este é o ensinamento à mulher que desejava saber "onde adorar a Deus": "No coração", disse Jesus.

A glória de Deus está nas pessoas e, nesse caso, o Novo Testamento derruba o primeiro paradigma. Cris­tãos podem sobreviver sem templos. Aliás, já demons­traram isso nos primeiros três séculos da era cristã,

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pois o primeiro templo surgiu após a conversão de Constantino e o conseqüente estabelecimento do cris­tianismo como religião oficial do Império. A chamada Santa Helena, mãe de Constantino, fez esse "favor" para os cristãos. Igreja é sinônimo de pessoas, e não de templos.

Evidentemente, as Igrejas continuarão tendo seus templos. O desafio é no sentido de que consigam enxergá-los como instrumentos facilitadores da execu­ção de sua agenda ministerial. Os templos não são um fim, são um meio, uma ferramenta. E, nesse caso, toda vez que a agenda ministerial da igreja colidir com o templo, enquanto espaço físico, a igreja deve encon­trar outro ambiente onde responder à sua vocação peregrina.

(6) Face à Face, no Céu

A sexta e última fase do processo de Deus em compartilhar sua vida e presença com o homem será a plenitude da experiência espiritual, quando, no céu, nós conheceremos a Deus como também somos conhe­cidos e o veremos tal qual ele é (1 Co 13.12; 1 Jo 3.2}. Até lá, quem deseja encontrar-se com Deus não precisa procurar um templo, basta embrenhar-se no meio do povo de Deus.

2. A Igreja e o Domingo

Paulo, apóstolo, evidentemente conhecia o arcabouço da Lei de Moisés, que prescrevia dias e horas para o culto a Deus. A Lei indicava sacrifícios diários, mensais, anuais, e estabelecia o sábado como dia san­to, dedicado ao Senhor (Êx 20.8}.

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Muitas interpretações são possíveis a respeito das razões para a guarda do sábado. Pessoalmente, creio que o sábado, enquanto interrupção de trabalho, presta-se como instrumento disciplinador e facilitador para que nos lembremos sempre de que a realidade última da vida não está restrita ao espaço fisico, natural e visível. O sábado é a obrigação de parar de trabalhar, parar de produzir, parar de pensar em coisas, riquezas e conquistas. O sábado é um dia especial para a refle­xão sobre o significado dos outros seis dias. Uma opor­tunidade para colocar a alma no compasso de Deus, como que desintoxicando-a da tirania do fazer e produ­zir como fonte de valorização do ser diante de Deus.

Esse é o entendimento de Paul Stevens, em seu livro Disciplinas para um coração faminto. Diz ele que "em um sentido mais profundo, não guardamos o sá­bado; o sábado é quem nos guarda. A finalidade do sábado era ser o período de lazer intencional em que refletíssemos sobre a origem e os alvos de nossa vida na terra. Logo, o sábado nos mantém voltados para Deus, como quem está viajando com destino ao céu" (1993, p. 205). Isso está em perfeito acordo com a compreensão de Jesus, que ensinava que a guarda do sábado não era uma obrigação a ser cumprida com fins meritórios, mas sim um instrumento facilitador da espiritualidade humana: "O sábadofoifeito por cau­sa do homem, e não o homem por causa do sábado" (Me 2.27).

O sábado judaico, portanto, era um instrumento para ensinar o povo a buscar a Deus e entrar no gozo de sua presença. Justamente por isso é que o autor de Hebreus compara o descanso sabático com o céu: estar plena, eterna e conscientemente na presença de Deus (Hb 4.9-11).

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Paulo, apóstolo, interpreta este ensinamento dizendo aos cristãos que ninguém poderia julgá-los "por causa de dias de festa, ou de lua nova ou de sába­dos" (Cl 2.16) e que aqueles que 'julgam iguais todos os dias" devem ser respeitados porque o fazem igual­mente para o Senhor (Rm 14.5). Paulo está dizendo que não precisamos encarar o sábado como um dia específico da semana a ser reservado para Deus, mesmo porque os cristãos do primeiro século, em função da ressurreição do Senhor Jesus, optaram pelo domingo como dia de suas reuniões (Lc 24.1; At 20. 7; 1 Co 16.2; Ap 1. 1 O). O que precisamos guardar é o propósito do mandamento da guarda do sábado, independentemente de dia e hora. O princípio bíblico a respeito do sábado, portanto, tem mais a ver com práticas devocionais do que com um dia da semana a ser dedicado às atividades eclesiásticas. Diz respeito ao processo de cultivar a intimidade com Deus independentemente do kronos.

E, nesse caso, o segundo paradigma também já foi quebrado.

3. A Igreja e o Clero

A estrutura religiosa do Antigo Testamento esta­va baseada numa hierarquia que incluía o sumo sacer­dote, os demais sacerdotes e os levitas. Eles eram res­ponsáveis por representar o povo diante de Deus e oficiar todo o processo de ofertas e sacrificios, tanto no Tabernáculo como no Templo.

O apóstolo Paulo ensinou que a estrutura religio­sa do Velho Testamento era como "sombras do que haveria de vir" (Cl 2.17), e o autor de Hebreus, seguindo o mesmo raciocínio, apontou para Jesus como o mais perfeito sacerdote, que apresentou o mais perfeito

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sacrificio, no mais perfeito Tabernáculo (Hb 9.1-15), abrindo um "novo e vivo caminho" que permite a cada cristão entrar com ousadia no Santo Lugar, prerro­gativa que outrora era somente do Sumo-Sacerdote (Hb 10.19-21). A obra de Cristo acabou de vez com a es­trutura vetero-testamentária e fez da igreja um reino de sacerdotes (1 Pe 2.5,9).

Assim como o acesso a Deus está aberto a todas as pessoas por meio de Jesus Cristo (1 Tm 2.5), a responsabilidade de fazer a ponte entre Deus e os homens repousa sobre todos os cristãos (1 Pe 2.9, 10). A Bíblia ensina que "a cada um é dada a manifestação do Espírito Santo para proveito comum" (1Co12.7, 11), de modo que nenhum cristão está excluído do processo de abençoar pessoas e exercer a autoridade do Senhor Jesus no mundo.

A distinção entre evangelistas, profetas, apósto­los e pastores-mestres (Ef 4.11) é apenas e tão somente funcional, uma vez que o corpo de Cristo é edificado e cresce mediante o "~uxílio de todas as juntas, segundo ajusta operação de cada parte" (4.16). Isso, na verdade, sempre ocorreu com o povo de Deus, que era um reino sacerdotal onde todos tinham a responsabilidade de intermediar o propósito de Deus de abençoar todas as famílias da terra (Gn ·12.1-3; Êx 19.1-6).

A esta altura, julgo necessário um esclarecimento dobre a distinção entre o ministério dos pastores da igreja e o ministério pastoral da igreja. Não há como negar que "Deus concedeu uns para apóstolos, evan­gelistas, profetas e pastores-mestres" (Ef 4.11). O Novo Testamento apresenta claramente o conceito de equipe: um grupo de anciãos responsável pelo cuidado do rebanho, o ensino da palavra e a presidência geral dos ministérios (At 20.28; 1 Ts 5.12, 13; 1 Tm 5.17, 18).

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Entretanto, está claro também que os pastores foram entregues à igreja "para o aperfeiçoamento dos santos para a obra do ministério" (Ef 4.12), em outras pala­vras: pastores existem para colocar os santos em circu­lação. E quando os santos estão em circulação, há mutualidade e o ministério pastoral da igreja é viabi­lizado.

Veja que Paulo esclarece que na igreja há "os presidem sobre vós", e este é o ministério dos pastores da igreja. Mas em seguida ele ensina que admoestar os insubordinados, consolar os desanimados e ampa­rar os fracos é tarefa de todos os cristãos, e este é o ministério pastoral da igreja (1 Ts 5.12-14).

A idéia de que pastores existem para realizar a obra do ministério, quer porque "têm mais tempo", ou "são pagos para isso", ou porque "detém o saber reli­gioso", não encontra respaldo no Novo Testamento, de modo que o terceiro paradigma também deve ser que­brado.

4. A Igreja e o Culto

Se levarmos a sério as implicações das mudan­ças dos três primeiros paradigmas, então deveremos redimensionar nosso conceito de culto. Cristãos não têm mais templo, nem sacerdotes que oferecem sacrifi­cios a um Deus ultrajado em sua justiça, e muito me­nos precisam guardar o sábado ou qualquer outro ri­tual. Em Cristo, todas estas coisas foram abolidas, pois que apontavam para Ele e, sendo assim, já cum­priram seu papel (Cl 2.16, 1 7).

A morte de Cristo decretou o fim dos sacrifícios de animais, por duas razões. Os sacrifícios prestavam­se a um papel duplo: aplacar a ira de Deus e conquistar

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sua boa vontade abençoadora. A cruz fez as duas coisas: satisfez plenrunente a justiça de Deus e aplacou sua ira (2 Co 5.19-21), e nos abriu a porta para todas as bênção espirituais (Ef 1.4), pois o Deus que não poupou nem mesmo seu próprio Filho não deixará de nos dar, com Ele, todas as coisas (Rm 8.32).

O apóstolo Pedro é porta voz da doutrina neo­testrunentário do culto ao ensinar que aqueles que estão em Cristo são semelhantes a pedras vivas, edifi­cados como casa espiritual, para sacerdócio santo, a fim de que ofereçrun sacrificios espirituais agradáveis a Deus por Jesus Cristo (1 Pe 2.5). O único sacrificio espiritual agradável a Deus que um cristão pode ofe­recer é a sua própria vida: "Rogo-vos pois irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos como um sacrificio vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional" (gr. logiken, genuíno, legítimo). Em outras palavras, se a igreja é ao mesmo tempo tem­plo, sacerdote e sacrificio, o culto ganha outra dimen­são.

Este novo conceito de culto traz duas implica­ções. A primeira é que "a vida é um culto" e, nesse caso, "quer comais, quer bebais, ou façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus" (1 Co 10.31). O que costumrunos chamar de louvor, com pes­soas reunidas para cãnticos, é um momento no todo da adoração, e não a totalidade de nossa devoção a Deus.

A segunda implicação é que apresentar a vida como um sacrificio vivo a Deus, necessarirunente de­semboca no serviço. Russell Shedd, comentando Romanos 12, diz que "o corpo e a mente não são sacri­ficados num altar, segundo o modo da Antiga Aliança, mas incorporados no serviço ativo dentro do corpo de

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Cristo, a Igreja. Os dons distribuídos pelo Espírito são um sinal claro da aprovação de Deus em relação aos sacrificios vivos que lhe foram oferecidos".

Isso nos faz entender o uso da palavra liturgia no Novo Testamento. Willian Barclay (1985, p. 126) esclarece os três sentidos diferentes da palavra:

1. O serviço de uma pessoa para com outra, como por exemplo, a oferta para os cristãos de Jerusalém que estão em necessidade (Rrn 15.27; 2 Co 9.12), assim como a ajuda que os filipenses e Epafrodito prestaram a Paulo (Fp 2.17,30);

2. O serviço chamado religioso, como por exemplo a ação dos líderes de Antioquia (At 13.2), o ministério de Paulo aos gentios (Rrn 15.16) e o próprio ministério do Senhor Jesus (Hb 8.2,6);

3. O serviço público de um homem, como por exemplo o ato de governar e julgar (Rrn 13.6).

À luz do exposto, liturgia não era apenas algo realizado dentro do templo, como um culto a Deus, mas sim a totalidade dos serviços de uns para com os outros, inclusive as coisas realizadas nas reuniões cris­tãs, o que na verdade era serviço a Deus.

A liturgia enquanto ordem de atividades de uma reunião cristã, devem ser avaliadas à luz das reuniões dos cristãos. As reuniões cristãs nos primeiros séculos são um exemplo de culto redimensionado. Em primeiro lugar porque a Igreja sobreviveu e se expandiu sem templo até meados do século IV, após a conversão de Constantino, conforme já consideramos.

Em segundo lugar, porque as reuniões eram

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voltadas para a edificação da Igreja. O pouco que se pode conhecer das ordens de culto dos primeiros cris­tãos denuncia este fato. Veja por exemplo que Paulo diz que quando os cristãos se reúnem, um tem salmo, outro doutrina, outro línguas e outro interpretação (1 Co 12.26). Mas acontece que todas as coisas deveriam ser feitas para que a igreja fosse edificada, todos apren­dessem e fossem encorajados (12.26,31). O alvo da reunião não era "prestar culto", pois a vida é um culto. O alvo da reunião era a maturidade do corpo que serve na trama do dia-a-dia.

Note também que os cânticos indicam uma ati­tude interiorizada - "no vosso coração" - fazendo com que a adoração seja muito mais um estilo de vida do que um momento de culto (At 2.47). Eram também instrumentos para o ensino e a admoestação o que explica o "falai entre vós com salmos e hinos e cânticos espirituais" (Ef 5.19; Cl 3.16).

Os cânticos, nas celebrações cristãs, servem para duas coisas. Primeiro como expressão do coração diante de Deus, como por exemplo nos casos de Moisés e Miriã (Êx 15), Ana (1 Sm 2.1-11), Maria (Lc 1.46-55) e Za­carias (Lc 1.67-69). Também, e fundamentalmente para a edificação da igreja, uma vez que são instrumento didático para a comunidade reunida. Daí a importância da profundidade teológica dos hinos cristãos primitivos (como por exemplo: Rm 11.33-36; Fp 2.6-11; 1 Tm 3.16).

Reuniões para louvor e cânticos, muito embora justificadas pelo Novo Testamento, eram, entretanto, um parêntesis na vida de serviço sacerdotal da igreja no mundo, e não a totalidade de sua dedicação a Deus. Veja que o texto que nos encoraja a "oferecer a Deus sacrifício de louvor, como fruto dos lábios'', aparece no

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repartir com os necessitados, sendo estes sacrifícios dos quais Deus igualmente se agrada (Hb 13.13-16). Como bem disse o Pastor Caio Fábio, "se não há culto na vida, não há vida no culto" (1995, p.17).

Os cristãos não prescindem dos grandes ajunta­mentos para louvor e edificação. Muito ao contrário, um povo que não celebra não adquire compreensão e ou percepção de suas vitórias, e ao fim das contas começará duvidar se Deus de fato intervém na história. O que se diz, é que a celebração não encerra a totali­dade da vivência da fé, é apenas uma de suas partes.

Assim pois, o quarto paradigma também não en­contra bases sólidas na Escritura, visto que o conceito atual de culto (reunir pessoas para louvar a Deus atra­vés de uma liturgia} não encontra eco nas páginas do Novo Testamento, uma vez que é demasiadamente reducionista do amplo sentido de "servir a Deus".

SÍNTESE E QUADRO SINÓPTICO DOS PARADIGMAS

A igreja de Jesus é, portanto, desafiada pelo Novo Testamento a viver além dos limites do templo, do domingo, do culto e do clero. Muito provavelmente nada disso seja novidade. O problema é que nossa prática eclesiástica não acompanha nossa lucidez teológica. Os cristãos continuam chamando o templo de "casa do Senhor", o culto de "trabalho do Senhor", o domingo éle "dia do Senhor", e o pastor de "anjo do Senhor". A maioria dos cristãos compreende que dons espirituais são capacidades que são exercitadas nas reuniões cristãs, e servir a Deus acontece, geralmente, no domin-

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go, no templo e, principalmente no culto. Os cristãos inventaram até um "assistir ao culto", como se houves­se alguém - o clero - que prestasse o culto em seu lugar. Por vezes, penso que os cristãos substituíram o sacrifício de animais pelo louvor: assim como o judeu ofertava um novilho, o cristão contemporâneo oferta um-hine-,m-flag1ante desvnrâó ensino do Novo Testamento.

A igreja contemporânea, ao invés de fixar-se no modelo do Tabernáculo e de Cristo (mobilidade), fixou­se no modelo do Templo (fixidez). E pior do que a perspectiva do Templo estabelecida pelo Antigo Testa­mento, foi a noção imprimida pelo Catolicismo Romano. Aquele era instrumento litúrgico, este um aparelho político. Os sacerdotes em Israel eram responsáveis pela questão religiosa, deixando a administração do Estado nas mãos do Rei. O clero romano, por sua vez, era necessário para a manutenção do poder da Igreja Institucional e portanto concentrava o saber em suas mãos. Com o agravante de monopolizar a representa­tividade divina, o clero oprimia ainda mais os que, de­sejosos de chegar a Deus, deviam passar por ele. Assim nasceu a distinção entre clero e laicato, e a depen­dência de uma casta religiosa que atuava enquanto outros assistiam.

O resultado desta distorção é que a igreja não se vê mais como um instrumento nas mãos de Deus para "fazer convergir em Cristo todas as coisas, tanto as que estão nos céus como as que estão na terra" (Ef 1.10). Isto é, a igreja perde o sentido de missão, pois se o Senhor Jesus quer exercer sua autoridade no uni­verso criado através da igreja, ela, igreja, não pode permanecer intra-muros.

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Talvez pior do que perder o sentido de missão, é perder o sentido de identidade. Igreja não é o lugar onde os cristãos vão, Igreja é o que os cristãos são, e isso já não está tão claro para muitos. Richard Halver­son (Shelley & Marshall, 1992, p. 109), capelão do senado norte americano, observou que "no início, a igre-ja era uma comunhão de homens_emu.Jh~re~_ çgntrgdos _ no Cristo vivo. Então a igreja chegou à Grécia e tornou­se umafilosofia. Depois, chegou a té Roma e tornou-se uma instituição. Em seguida, àEuropa, e tornou-se uma cultura. E, finalmente, chegou à América e tornou-se um empreendimento (business)". Podemos também afirmar que, ao chegar no Brasil, a igreja tornou-se um evento. A maioria dos modelos eclesiásticos contem­porâneos tende a resumir a ekklesia a uma sucessão de eventos religiosos nos finais de semana, negli­genciando a dinâmica comunitária do povo de Deus.

ESTRUTURA VELHO HOJE NOVO TESTAMENTO TESTAMENTO

Atividade Culto (Dt 12. 11, 12) Culto Todas (1 Co 10.31)

Dia Sábado (Ex 20.8) Domingo Todos (CI 2.16, 17)

Local Templo (2Cr 7.12) Templo Todos (At 7.47-50)

Pessoas Sacerdotes (Dt 18. 1-8) Pastores Todas (1 Pe 2.9, 10)

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'

IV A Igreja e Seus

Novos Paradigmas

a luz de tudo quanto já consideramos, acredito que o maior desafio pastoral contemporâneo é pegar os cristãos reunidos no templo, no domingo, para o culto onde o clero desempenha sua performance, e despejá-los na segunda-feira para a vivência da fé onde quer que se encontrem. Deixar que a igreja se compre­enda como "comunidade reunida para culto" é uma distorção completa dos propósitos de Deus.

Tudo isso me faz crer que uma boa declaração de filosofia para a igreja é a seguinte: levar o evangelho todo para o homem todo, priorizando relaciona­mentos, envolvendo todos os seus membros, além dos limites do culto-clero-domingo-templo. O alvo ministerial da igreja deve ser o de pegar todos os cris­tãos reunidos no domingo, no templo ao redor do clero para assistir o culto, e despejá-los na segunda-feira, tendo em vista a ação cristã responsável no mundo.

A dificuldade está em mobilizar todo um rebanho para que seja eficaz não apenas no espaço da religio­sidade tradicional, mas principalmente na trama da vida. Uma das maiores responsabilidades de um pastor local diz respeito aos mecanismos que uma comuni­dade cristã possui para que funcione fora dos paradig­mas da religiosidade tradicional. Isto é, como uma co­munidade cristã pode "acontecer" independentemente

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do templo, do domingo, do clero e do culto. São estas as questões para as quais alisto algumas sugestões.

Esta é a hora de falarmos a respeito dos Peque­nos Grupos, Células, Koinonias, Grupos Familiares, ou seja lá como você queira se referir ao rebanho fracio­nado na comunhão da mesa, nas casas, e no serviço de todos os dias. Pequenos Grupos não nasceram ontem, existem desde a eternidade, passaram por Jetro e Moisés, perduraram durante todo o período apostólico e chegaram à atualidade sem perder seu vigor. Elmer Towns escreveu Ten Innovative churches, um guia so­bre o crescimento de dez igrejas inovadoras nos Es­tados Unidos. Surpreendentemente, oito, das dez igre­jas, apresentam os Pequenos Grupos como carro-chefe de sua experiência de comunidade. É largamente difundida a noção de que um dos maiores segredos das mega-igrejas na Coréia é a estrutura de células. E em muitos outros lugares, é esta a explicação para igrejas cujo crescimento é extraordinário.

As razões para que os Pequenos Grupos atraves­sem as culturas e o tempo e se firmem como instrumen­tos necessários à saúde da comunidade cristã são inú­meras, mas chamo sua atenção para apenas uma: O Novo Testamento mostra que a vida cristã é uma vida de relacionamentos e os Pequenos Grupos são a única estrutura eclesiástica capaz de possibilitar mutualidade e mobilização. Veja que as principais instâncias de atuação do corpo de Cristo devem funcionar à base de relacionamentos pessoais: discipulado, cuidado do rebanho, ministérios pessoais e liderança.

1. Pequenos Grupos e Discipulado

O discipulado se faz através de relacionamentos,

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pois discipular é "ensinar a guardar todas as coisas que o Senhor Jesus mandou" (Mt 28.19), e não apenas ensinar o que o Senhor Jesus mandou.

Para ensinar o que Jesus mandou, precisamos de bons mestres, bons métodos didáticos, bons currí­culos e instalações adequadas. Talvez, um bom curso no Seminário ou um ciclo de estudos através de vídeo cassete. Mas, "ensinar a guardar" carece de relaciona­mentos, de exemplos concretos, de pessoas que possam ser observadas de perto.

O Senhor Jesus, obviamente, é o melhor exemplo deste conceito. Diz a Escritura que o processo de disci­pulado dos apóstolos foi a dinâmica dos relacionamen­tos pessoais: "Então designou doze para que estivessem com ele" (Me 3.14). Sublinhe este "estivessem com ele".

Paulo, apóstolo, seguiu a mesma trilha e escan­carou os bastidores de sua vida para Timóteo, seu dis­cípulo mais notável: ensinou doutrina, mostrou com­portamento, compartilhou fraquezas e lutas e levou o discípulo junto para algumas santas aventuras missio­nárias (2 Tm 3.10-12). Por esta razão o apóstolo podia exortar os filipenses a que observassem tudo quanto, não apenas ouviram de sua boca, mas também viram em seu estilo de vida (Fp 4. 9), e despedir-se dos presbíteros de Éfeso salientando que seu ensino acon­teceu na praça pública - púlpito, e de casa em casa -pequeno grupo (At 20.20).

Mas, devemos nos curvar às evidências e aos fatos. Qualquer observador despido de preconceitos será capaz de enxergar que boa parte das comunidades cristãs contemporâneas substituiu os relacionamentos de discipulado por séries de conferências evangelís­ticas, aulas dominicais, fitas cassete, apostilas e insti­tuições teológicas. Evidentemente, todas estas coisas

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têm sua função no processo educativo, mas nada subs­titui o relacionamento pessoal onde o conteúdo do evangelho pode ser visualizado, e não apenas ouvido.

O discipulado, portanto, é um processo, e não um programa. Discipular não consiste em fazer com que alguém se envolva com atividades religiosas, como cul­tos, classes para estudos bíblicos, e eventos diversos. Discipular é compartilhar a vida, é envolver-se num relacionamento pessoal, à luz da palavra de Deus, para que o Espírito Santo encontre espaço e recursos para transformar o estilo de vida completo dos discípulos.

Cristãos maduros, satisfeitos na alma em função de seu relacionamento com Jesus é a proposta do Novo Testamento a respeito da vida cristã. Veja que o apósto­lo Paulo salienta que "todas as coisas contribuem para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito". Mas qual é este propósito? A resposta está no versículo seguinte: "se­rem conformes a imagem de seu Filho" (Rm 8.28,29).

Há pelo menos mais quatro textos da lavra de Paulo que apontam nesta mesma direção. O primeiro texto (Gl 4.19) registra o sofrimento do pastor para ver Cristo formado em seu rebanho; isto é, a ação pastoral no sentido de que os cristãos sejam de fato um reflexo histórico do Cristo vivo. O segundo, (Ef 4.11-13) salien­ta que os dons espirituais são um meio para que os cristãos ministrem uns aos outros, na intenção de que todos cheguem à plena maturidade, ou "estatura de varão perfeito".

O terceiro texto (Cl 1.21-28) compara o ministério pastoral ao ministério de Cristo. Paulo argumenta que o Senhor Jesus morreu a fim apresentar todo cristão santo, sem defeito e irrepreensível diante de Deus. Mas também relata que ele mesmo, Paulo, também sofre

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para que possa "apresentar todo homem perfeito em Cristo". A palavra "perfeito" é uma tradução da palavra grega "teleiós", que significa completo, sem faltar em coisa alguma, ou adulto, plenamente desenvolvido e na plena posse de capacidades e potencialidades.

Finalmente, podemos encontrar Paulo recomen­dando a Timóteo que permaneça firme na observância e ensino das Escrituras que são inspiradas por Deus e têm como fim a plena maturidade do cristão: "perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra" (2 Tm 3.17).

O cristão deve, portanto, buscar aquela qualida­de de vida que somente Deus pode dar. Uma qualidade de vida integral, que o Senhor Jesus chamou de abundante ou completa (Jo 10.10). Experiências com o poder do Espírito Santo de Deus, interação com a palavra de Deus e eventuais fenômenos carismáticos não são um fim em si mesmo. O alvo é "ser como Cris­to", é aquela satisfação da alma que, sendo encontra­da por Deus, encontrou sua identidade mais profun­da e foi harmonizada consigo mesma, com o próximo, com o universo criado. O processo de discipulado na teia dos relacionamentos de mutualidade no corpo de Cristo é o caminho bíblico para este encontro e esta plena satisfação.

2. Pequenos Grupos e Cuidado do Rebanho

Devemos considerar que não somente o discipu­lado, mas também o cuidado do rebanho se faz através de relacionamentos. A expressão "uns aos outros" apa­rece 59 vezes no Novo Testamento. Os chamados "man­damentos recíprocos" envolvem exortação, aconselha­mento, advertência, instrução, apoio na fraqueza, enco-

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rajamento, aceitação, intercessão, dentre outros. O Novo Testamento, portanto, é claro quando aponta para o fato de que é na dinâmica dos relacionamentos pes­soais que as carências completas dos irmãos é supri­da e onde os cristãos são aliviados de qualquer sorte de cargas pesadas demais para um ombro só.

Em tempo, podemos fazer duas ressalvas. A pri­meira é que há momentos na vida cristã em que o cuidado pastoral necessário extrapola os limites da mutualidade, e justamente por isso Deus concedeu pessoas cujos dons espirituais são direcionados para o apoio interpessoal imediato (Ef 4.11: pastores). Este cuidado pastoral específico é uma questão de dom espiritual, e não apenas de proximidade relacional.

A segunda ressalva diz respeito à possibilidade de um acompanhamento profissional efetuado por um terapeuta, psicólogo ou psiquiatra. Há ocasiões em que a mutualidade no corpo de Cristo fornece a atmosfera de amor, aceitação e sustentação espiritual para que o socorro profissional seja instrumento para o soergui­mento do cristão. Procurar ajuda profissional não é pecado nem falta de fé, mas sim prudência de quem recebe como benção os recursos da ciência.

A advertência em favor da mutualidade cristã e dos frutíferos relacionamentos interpessoais é uma reação à infantilidade de muitos cristãos. É impressio­nante a mentalidade evangélica mais comum de que a mutualidade cristã somente é aceita quando o pastor está envolvido no processo. Mais uma vez, lembramos que o cuidado do rebanho é desenvolvido por todos os membros da igreja. Inclusive pelo pastor, mas não somente por ele. O mais comum, entretanto é que um irmão enfermo, sendo visitado por um grupo da igreja, ao final ainda pergunte: "E o pastor, quando vem?".

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Parece que a ministração do corpo de Cristo é incomple­ta ou insuficiente quando não acompanhada pelo "representante do clero". Podemos até considerar que psicologicamente se explique esta dependência, mas isto não reverte a necessidade de que se aceite o cui­dado pastoral dos irmãos.

Somente os Pequenos Grupos, que se reúnem regularmente para desenvolver a mutualidade, geram o espaço onde os relacionamentos profundos podem acontecer. A Igreja não conseguirá outro meio de ser Igreja a menos que fracione seu rebanho em pequenas células (que chamamos de Pequenos Grupos) reprodu­toras de relacionamentos.

A salvação em Cristo é individual, mas a vida cristã é comunitária. A Bíblia diz que a cada cristão foi dado o privilégio de comungar com o Espírito Santo, mas que esta comunhão necessariamente vincula o cristão com o corpo de Cristo (1 Co 12.31), de modo que cristãos são partes uns dos outros (Rm 12.5), o que explica o fato de que as coisas boas e ruins que acontecem com um cristão repercutem na vida de todos os cristãos (1 Co 12.26). A saúde espiritual de um cristão está na proporção direta da profundidade e qualidade de seus relacionamentos interpessoais no corpo de Cristo.

No meu tempo de criança, além de muito futebol na rua e pipas ao vento, uma das brincadeiras predi­letas da meninada era com bolas de gude. Nossa bola de gude mais valiosa era o "bolão", que usávamos para acertar as outras bolinhas, geralmente apostadas num triângulo ou num círculo desenhados no chão.

Mas a brincadeira mais gostosa era o "mata­mata", quando cada garoto tentava acertar o bolão do outro, cada um à sua vez. O máximo do jogo era quando

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conseguíamos quebrar o bolão do adversário com um teco bem forte. Era a evidência de uma grande vitória. Brincadeira perversa, aquela.

Lembro-me que minha maior fornecedora de bolões era uma fábrica de latas próxima de casa. Nos fundos da fábrica havia uns bandejões cheios de bolas de gude que serviam para lixar as chapas de alumínio onde as estampas das latas seriam impressas antes do corte. O movimento das bandejas provocava o atrito entre as bolas de gude, umas nas outras, e de todas, na superficie inferior da chapa colocada sobre elas. O resultado era que, além de deixarem a chapa bem lisinha, algumas bolinhas ficavam bem cascudas e quase que perfeitamente redondas. Isto é, ótimas para a mira e dificílimas de se quebrar. Eram os balões mais preciosos.

Imagino que esta é uma boa alegoria para a vida na comunidade cristã: é no roçar de vidas que surgem a consistência e a perfeição. É na troca de inputs e no intercâmbio de experiências que pessoas crescem rumo à maturidade. Quando cada pessoa tem a oportunidade de compartilhar suas riquezas todos saem ganhando, sejam elas riquezas emocionais, intelectuais, espiri­tuais e até mesmo materiais. A saúde de uma comu­nidade cristã está na proporção direta da qualidade de seus relacionamentos interpessoais.

Nesse sentido, as comunidades restritas aos eventos centrados nos paradigmas "culto-clero-domin­go-templo" perdem a riqueza da diversidade dos mem­bros do corpo de Cristo, pois que giram ao redor de alguns poucos, que muitas vezes nem são tão ricos assim. Estas são razões suficientes para que os líderes cristãos esvaziem o palco e encham as salas das casas, e motivo pelo qual a filosofia da igreja deve enfatizar a

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mobilização e engajamento de todos os seus membros na obra do ministério.

3. Pequenos Grupos e Ministérios Pessoais

As duas primeiras justificativas para a necessi­dade de Pequenos Grupos apontavam para o cuidado do rebanho e o discipulado, o que responde ao anseio de uma "igreja viva". As próximas duas, respondem ao anseio de uma "igreja ativa", e se preocupam com a estrutura de organização das igrejas do Novo Testa­mento. Primeiro, olharemos a dinâmica dos ministérios pessoais.

Paulo, apóstolo, esclarece que há diversidade de dons, ministérios e operações (1 Co 12.4-6). Veja as definições no quadro:

DONS MINISTÉRIOS OPERAÇÕES

ESPIRITUAIS

Habilidades, Contexto Resultados do exercício

capacidades ou âmbito dos dons

e poderes onde os espirituais

concedidos dons espirituais em cada contexto

por Deus são exercidos (trabalho pronto)

Os dons espirituais são dados aos cristãos em função da igreja. Os dons são distribuídos no contexto dos ministérios e não para atuações tipo "free lancer". Cada ministério precisa de pessoas com as mais

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vartadas.habilidades e que estejam comprometidas com o todo da ação e da filosofia da igreja. Os cristãos, portanto, devem buscar seu lugar nos vartados minis­térios da igreja e não apenas descobrir seus dons pessoais.

Um dos modelos mais apropriados desta filosofia é a Igreja Batista em Bear Valley, cujo testemunho está registrado em Unleashing the church, escrito por Frank Tillapaugh, seu pastor à época.

A Igreja de Bear Valley dividia a cidade em gru­pos, observando as pessoas e montando ministérios tendo seus estilos de vida em mente. Os ministérios eram os mais diversos: grupos étnicos, mendigos, estu­dantes, idosos, solteiros, casados, crianças, atletas, artistas e tantos outros. Cada membro da Igreja era encorajado a pensar: "Deus pode me usar para dirigir uma nova área de ministério".

Todos estão atentos às necessidades e quando identificadas e verificados os recursos disponíveis, surge a pergunta: "Deus está levantando alguém para este ministério?". Se a resposta é sim, então todos os membros são avisados que se abriu uma nova frente de trabalho. A medida que as pessoas vão se envolven­do, nascem as equipes de ministérios. A Igreja fornece a supervisão para a liderança daquele novo ministério e mobiliza recursos para que ele aconteça. O restante é responsabilidade dos irmãos envolvidos, pois que receberam de Deus não somente o ministério, como também a capacitação para executá-lo.

Nisso tudo há uma nota importantíssima. Bear Valley não possuía ministérios para os quais não encontrava líderes que por eles se reponsabilizassem. Se a necessidade aparece e ninguém se manifesta, então, não há como supri-la. Das duas uma: ou Deus

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quer a comunidade envolvida em outras áreas de atuação, ou alguém está "enterrando talentos".

Não sei se Bear Valley continua agindo desta ma­neira, mas o testemunho de Frank Tillapaugh é vibran­te e apontou bons caminhos para que as comunidades cristãs viabilizem hoje o que o Novo Testamento vem dizendo há dois mil anos.

A Igreja Batista de Água Branca, onde exerço a função pastoral desde 1989, caminha nesta direção de ministérios criativos e alternativos. Um dos pastores da Equipe Ministerial, Roberto Nobuyuki Handa, Nobú, tem uma vocação especial de Deus em encaixar, asses­sorar e encorajar pessoas em novas frentes ministe­riais. Assim nasceram, dentre outros, o ministério de Thriatlon, o grupo teatral, alfabetização de adultos, e o Telecurso funcionando todas as noites na sede da igreja. Uma escolinha de esportes com reforço escolar está a caminho e certamente muitas outras frentes criativas de serviço serão colocadas à disposição do rebanho para que as pessoas sirvam a Deus e ao próxi­mo à luz de seus dons, interesses e vocações.

No Encontro de Pastores e Líderes organizado pela SEPAL em 1992, Paul Landrey contou sobre a época de Oliver Cromwell, na Grã-Bretanha, quando o estoque de prata para cunhar moedas caiu. Em busca de mais prata, chegou a noticia de que a maior concen­tração do metal estava nas Catedrais, nos ídolos e santos. Cromwell não teve dúvidas e decretou: "Derre­tam os santos e coloquem-nos em circulação".

Colocar os santos em circulação é o grande desa­fio ministerial. E, se de fato a igreja deve funcionar fora dos paradigmas "culto-clero-domingo-templo", os santos devem circular na sociedade e no mundo, e não apenas à serviço da estrutura eclesiástica.

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Estes conceitos sobre a dinâmica ministerial da Igreja de Cristo nos levam a considerar que trabalhar para, ou na igreja local, não é o único caminho para se trabalhar para Deus ou pelo reino de Deus. Conside­rando esta diversidade dons e ministérios pessoais e que o alvo da comunidade é agir no mundo para que todas as coisas voltem ao controle do Senhor Jesus, as igrejas deveriam atentar muito mais para o que os seus membros fazem fora do "culto-clero-domingo-tem­plo" do que na estrutura formal da comunidade cristã.

Dois médicos da Igreja Batista de Água Branca me ensinaram isso. Um deles, sendo transferido de sua função de diretor num posto de saúde, foi recon­duzido mediante veemente apelo da população local. O outro, trabalhou duro para a prefeitura, montando e dirigindo dois postos de saúde em regiões da periferia da cidade de São Paulo. Surpreendi-me certa vez, chamando-lhes a atenção pelo fato de que eu quase não podia contar com eles na estrutura formal da Igreja. Flagrante incoerência na "filosofia de ministério". O serviço daqueles irmãos à população carente era também um serviço a Deus e um ministério cristão. Aqueles homens de Deus não estavam tão envolvidos na estrutura formal da instituição que presido, mas isso não significava que não estivessem trabalhando pelo reino de Deus. Fui fisgado pelo paradigma "culto­clero-domingo-templo". Quase imperdoável.

A igreja local deve viabilizar que seus membros sirvam a Deus no mundo, e, sempre que possível, gerar estruturas móveis e flexíveis para que trabalhem jun­tos. Mas isso não eqüivale dizer que somente os ser­viços prestados através das estruturas eclesiásticas formais devam ser considerados ministérios.

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4. Pequenos Grupos e Liderança na Igreja

As igrejas neo-testamentárias possuíam uma liderança plural, isto é, funcionavam e eram presididas por um conselho de anciãos (At 11.30; 13.1; 14.23; 15.2,4,6,22; 16.4; 20.17; 21.18; Tt 1.5 e, principal­mente, 1 Ts 5.12, 13; 1 Tm 5.17).

Watchman Nee (1964, ps. 50,54), comenta que:

"Não é necessário que os presbíteros renunciem a suas profzssões comuns e se devotem exclusivamente aos seus deveres relacionados com a igreja. São sim­plesmente homens locais que desempenham suas funções costumeiras e ao mesmo tempo são revestidos de responsabilidades especiais na igreja. No caso de aumentarem os negócios locais, eles podem dedicar-se inteiramente à obra espiritual".

"Os presbíteros são também chamados bispos", continua Nee. "O termo bispo significa supervisor, e um supervisor não é aquele que trabalha em lugar de outros, mas aquele que supervisiona outros enquanto traba­lham. Deus tencionava que cada cristão fosse um obreiro cristão, e Ele designou alguns para a supervisão da obra de sorte que ela pudesse ser levada avante eficien­temente. Jamais estava na mente de Deus que a maioria dos cristãos se dedicasse exclusivamente aos negócios seculares e deixasse os negócios da igreja a um grupo de especialistas. Não há como exagerar isso. Presbíteros não constituem um grupo de homens contratados para fazer o trabalho da igrrja em lugar de seus membros".

O grande entrave para que este modelo neo­testamentário se concretize é a mentalidade clerical que estamos discutindo desde a apresentação dos

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paradigmas. Todos os cristãos, sem exceção, além de uma ocupação, têm também uma vocação. Paulo, após­tolo, por exemplo, era fazedor de tendas, e esta era sua ocupação. Entretanto, era também apóstolo aos gentios, e esta era sua vocação. Ocupação, portanto, diz respeito à profissão, enquanto que vocação, fala sobre dons espirituais e ministérios pessoais de cada cristão.

O que Watchman Nee estava dizendo é que nada impede que um cristão chegue à conclusão de que seus dons espirituais, seu temperamento ou personalidade, sua capacitação ou experiência ministerial, e o estimulo da parte do Espírito Santo seja para o exercíêlo da função pastoral na comunidade cristã. Esta descoberta da vocação não implica necessariamente na anulação ou abandono da ocupação, como ilustrado no caso do apóstolo Paulo. Não significa necessariamente que o irmão com esta vocação deva se matricular num Semi­nário e abandonar seu "trabalho secular". Significa sim que deve buscar o máximo de aperfeiçoamento para que exerça sua função pastoral no corpo de Cristo, notadamente em sua comunidade cristã local. Veja também o exemplo de Áquila e Priscila, que pastorea­vam igrejas em sua casa e seguiam, à semelhança de Paulo, no oficio de fazedores de tendas (At 18.1-3; Rrn 16.3-5; 1 Co 16.19).

Observe também que o fato de que o Novo Testa­mento trata os presbíteros sempre no plural (At 20. 17; Fp 1.1; 1 Ts 5.12,13; 1 Tm 5.17,18) justifica-se pelo menos pelos seguintes fatores. Primeiro porque "na multidão dos conselheiros há sabedoria" (Pv 11.14), de modo que uma equipe pastoral previne heresias e diminui a possibilidade de erros que poderiam conduzir o rebanho a caminhos tortuosos.

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Em segundo lugar, a equipe ministerial se justi­fica porque impede a atrofia da igreja em função dos personalismos. Há quem diga que uma igreja não cresce mais do que a visão do seu pastor, e todos sabe­mos que um pastor pode ter a visão correta, mas jamais terá a visão completa.

Em terceiro e último lugar, a equipe ministerial gera a multiplicidade de ministérios, pois que vários ministros, com dons e ministérios diferentes imprimem este ritmo na comunidade inteira. A comunidade por sua vez, deixa de girar ao redor da visão e força de trabalho de um homem só.

Acredito que este retorno ao padrão bíblico é a solução para a qualidade do ministério em muitas igre­jas evangélicas no contexto brasileiro. Creio também que as comunidades pequenas que não podem susten­tar o "pastor de tempo integral", deveriam atentar para a possibilidade de equipes ministeriais formadas por irmãos que reúnam em si mesmos as capacitações do Espírito Santo, a integridade no caráter, a experiência e maturidade na vida cristã, e o respaldo do rebanho. Estes irmãos poderiam e deveriam continuar "fazendo tendas" tendo em vista o sustento da família, sem que isso os impedisse de exercer a função pastoral na co­munidade. Na verdade, este é um dos grandes segre­dos do crescimento das igrejas pentecostais: o comis­sionamento dos chamados pastores leigos.

Mas infelizmente, a mentalidade de muitas igre­jas, principalmente as de tradição reformada, implica na outorga da função pastoral a "um homem vocacio­nado formado no seminário denominacional". E não somente as igrejas, mas principalmente os seminários e os próprios vocacionados para a função pastoral têm a mentalidade de "pastor titular, ou único, de tempo

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integral". Este modelo tem trazido alguns males à Igreja de Cristo. Primeiro, alimenta a mentalidade clericalista dos rebanhos, que atribuem aos tais vocacionados e estudados, a responsabilidade do ministério que deve­ria ser de todos.

Em segundo lugar, gera um grande efetivo de pastores incompetentes e ineficazes, justamente porque na idade em que deveriam se empenhar para uma formação profissional, deixaram tudo, e em nome de uma possível vocação, foram para o seminário para que "se formassem pastores". Mais tarde, mesmo com um ministério infrutífero, estes tais permanecem liderando igrejas, justamente porque só "estudaram para ser pastor". O resultado é que, ou carregam du­rante anos a fio igrejas debilitadas e sem qualquer pos­sibilidade de expansão, ou mudam de igreja num curto espaço de tempo, o suficiente para que se desincompa­tibilizem com o rebanho e seus líderes locais.

Finalmente, esta estrutura clerical que privilegia um homem só como vocacionado para o ministério, tem gerado igrejas fracas, à mingua, consumindo recursos, tempo, reuniões e outras coisas mais em suas respectivas denominações.

Não há qualquer dúvida, portanto, de que a proposta do Novo testamento é que as igrejas funcio­nem à base do ministério de todos os seus membros, mobilizados por um grupo de cristãos fiéis e idôneos, que por sua vez dedicam, preferencialmente tempo integral, mas podem e devem dedicar tempo parcial, quando a situação exigir.

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QUADRO SINÓPTICO A RESPEITO DOS PEQUENOS GRUPOS

PEQUENO GRUPO PEQUENO GRUPO DE DISCIPULADO DE SERVIÇO

Manter a igreja viva Manter a igreja ativa

Ênfase no SER Ênfase no FAZER

Maturidade Ministério

Oportunidade para com- Oportunidade para instru-partilhar, orar, estudar a Bí- ção, treinamento, planeja-biia, buscar suporte para menta e engajamento para que cada pessoa possa que cada pessoas possa seguir em frente em sua exercer seus dons espiri-jornada espiritual e apro- tuais em ministérios que fundar seu relacionamento expressem a ação do Se-com o Senhor Jesus. nhor Jesus no mundo.

Líderes capacitados para Líderes capacitados para a o cuidado do rebanho supervisão e viabilização

dos ministérios

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V Radicalizando

na Visão

e hegamos agora ao coração de toda esta dis­cussão. Este é o momento para imaginarmos o dia-a­dia e a dinâmica de funcionamento de uma igreja li­berta dos paradigmas culto-clero-domingo-templo. Alisto, portanto, algumas sugestões que refletem um exemplo de como estes princípios podem ser concre­tizados.

1. A igreja liberta dos paradigmas culto-clero­domingo-templo utiliza espaços físicos sem se deixar enclausurar por eles.

O conceito "sede própria" é também um para­digma que deve ser quebrado. Implica num complexo que envolve, no mínimo: auditório, salas de apoio, esta­cionamento e estrutura administrativa. Na verdade, se é que uma igreja deve ter sua sede, por que deve necessariamente ser "sede própria"?

Há alguns anos atrás fui procurado por um gru­po de irmãos que estava iniciando uma comunidade cristã. A intenção do grupo era ouvir alguns insights acerca de filosofia de ministério, tendo em vista a necessidade de encontrar um norte para a igreja que nascia. Lá pelas tantas, em nossa conversa, chegamos

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ao item "sede", quando todos falaram a respeito dos custos não apenas de terrenos, mas também de cons­trução.Perguntei-lhes a respeito do que os levavam a considerar que a Igreja deveria ter a tal "sede própria". Na época não me responderam, mas os passos que decidiram seguir indicaram que não julgaram impor­tante tal questionamento.

Evidentemente, muitas igrejas já estão instala­das em sedes próprias que lhes servem adequada­mente. Têm uma preocupação a menos. Mas há tam­bém um sem número de comunidades cujas sedes já se tornaram pequenas e-ou envelhecidas. Quando a igreja chega nesta esquina, na maioria das vezes decide partir para a famosa "construção do templo". Estas comunidades, via de regra, repetem a seguinte história:

(1) Investem anos de sua história na construção de um, dois ou mais prédios;

(2) Destinam quase a totalidade de seus recursos financeiros para a compra de ferro, tijolo, cimento e cal, e quando chega a hora do acabamento, é um literal "Deus nos acuda";

(3) "Queimam" seus melhores líderes, utilizando-os em atividades burocráticas e administrativas;

(4) Desviam o foco de seus pastores, que deveriam de­dicar-se à palavra e oração, mas acabam adquirindo uma úlcera em função de notas promissórias por ven­cer;

(5) Dilapidam o patrimônio pessoal de seu rebanho em inúmeras "ofertas de amor";

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(6) Abrem as portas de um templo que já está pequeno no dia da inauguração; e

(7) Descobrem atônitas (as que descobrem) que todo o investimento feito (esforço, tempo, dinheiro) não am­pliou em nada a influência ministerial da igreja em seu contexto social.

Uma igreja que ainda não possui sua sede própria, ou cuja sede já não lhe é adequada, tem pelo menos quatro alternativas, que já são amplamente uti­lizadas, como segue:

(1) Alugar uma propriedade estratégica para utilizá-la como sede permanente (um supermercado, uma fábrica desativada, um cinema ou anfiteatro);

(2) Alugar uma casa que servirá para a estrutura administrativa e utilizar outros espaços da cidade para as demais atividades, como por exemplo: auditório, para as celebrações coletivas semanais; clubes por um dia, para lazer e convivência; propriedades menores para projetos sociais;

(3) Trocar suas propriedades particulares por prédios prontos que necessitem apenas de adaptação;

(4) Deflagrar um processo de construção com projetos de baixo custo, rápidos e funcionais. A estruturas pré­fabricadas parecem ser uma boa sugestão para projetos a serem iniciados.

As igrejas não devem se preocupar tanto em construir templos, como em encontrar espaços onde

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possam viabilizar sua agenda ministerial. Os casos de exceção devem ser tratados cuidadosamente, visando uma reflexão consciente capaz de verificar se a cons­trução de um templo dentro dos parâmetros usuais é a única e mais viável das alternativas, ou apenas reflete o enquadramento aos paradigmas.

2. Uma igreja liberta dos paradigmas culto­clero-domingo-templo não acontece eventualmen­te, acontece permanentemente.

Cresci numa estrutura eclesiástica assentada nos paradigmas culto-clero-domingo-templo. O domin­go de alguém que desejasse estar perfeitamente inte­grado na Igreja era extremamente cansativo. Começava às 9 hs, com a Escola Bíblica Dominical. Em seguida vinha o culto da manhã, geralmente às 10.30hs. À tarde, três atividades se sucediam: distribuição de folhetos pelo bairro e culto na Congregação, às 15 hs; ensaio do coro às 16.30hs; e, reuniões para treina­mento de líderes às 18hs. Durante alguns anos, me lembro bem, participei em todas estas atividades, além de pregar no culto ao ar livre, na Praça, convidando pessoas para o culto da noite que começava às 20hs. Não me admiro de que muitas vezes ouvi meus pastores reclalllando que os comprometidos eram bem poucos. Somente mais tarde compreendi que a expressão "comprometidos" dizia respeito à estrutura eclesiástica, e não à vida cristã em si.

Evidentemente, os frutos desta estrutura de funcionamento estão vigentes: cristãos sérios com Deus e muitas novas igrejas. Acredito, inclusive, que muitos cristãos foram e são felizes servindo a Deus desta maneira. Mas também é certo que esta forma de ser

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igreja gerou patologias incalculáveis nos cristãos e suas comunidades. A maior delas, foi o estabelecimento de uma dicotomia entre o serviço a Deus e a luta pela sobrevivência, a vida religiosa e a vida particular, o mundo sagrado e o mundo secular. Lembro-me do testemunho do Dr. Paulo Oliveira (texto não publicado), um irmão lúcido, quando questiona consigo mesmo:

"Qualquer pessoa que entre em uma igreja evan­gélica e se assente para ouvir o sermão dominical, cer­tamente irá ouvir um apelo a que se empenhe em executar a "obra do Senhor", a ser fiel e zeloso de tal sorte que esta obra maravilhosa não seja prejudicada pela sua negligência ou omissão. Também, com certeza, o ministro deixará bem claro o que quer dizer por "obra do Senhor", de modo que lhe recordará a sua obrigação de pregar, de contribuir, de orar, de ser assíduo aos cultos e demais serviços da igreja, de se engajar nas atividades dos diversos departamentos da igrejci. ·

Mas, nestes momentos uma pergunta me toma de assalto, furiosa e constrangedora: Será esta .. realmente a "obra do Senhor"? Para isto fomos criados e colocados neste mundo pleno de possibilidades e. pre­nhe de dificuldades? Será que é realmente para rea­lizarmos este tipo de obra que devemos com o suor do nosso rosto comer o nosso pão, para depois de vencer espinhos e cardos retornar ao pó de onde fomos tirados?

Deve haver também uma outra "obra do Senhor", sim por certo. E nela não faltarão os filhos, a mulher, o comer e beber bem, a alegria da vida e a paz do lar, os deleites e prazeres da alma, ou o desabrochar seguro, gradual e incessante dos.fluxos de amor, de criatividade, de energia realizadora que nascem dentro de nós, e que como feras enjauladas lutam por abrir caminhos em meio aos desânimos, às decepções, à indiferença,

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aos ódios e ciúmes, e que apesar de tudo e contra tudo isso, se concretizam nas "boas obras que Deus já antes tinha preparado para que nelas andássemos".

Estas inquietações deveriam ser suficientes para que as igrejas enxugassem sua agenda eclesiástica for­mal e super-valorizassem informal. Isto é, menos ativi­dades comuns e "obrigatórias", e grande incentivo aos ministérios (diaconias) e relacionamentos pessoais des­centralizados do "culto, clero, domingo e templo".

Por exemplo, imagino a agenda de uma comuni­dade cristã com as seguintes atividades:

(1) Celebração coletiva, no domingo, pela manhã ou à tarde, tendo em vista o louvor e adoração comunitária, a unidade doutrinária, e a coesão ministerial (objetivos ministeriais comuns);

(2) Grupos de Discipulado em dias, locais e horários diversos, tendo em vista o cuidado do rebanho, o disci­pulado, inclusive de novos cristãos. Os grupos de disci­pulado devem funcionar também como o ambiente da devoção, onde a participação de todos, com salmo, dou­trina, profecia, revelação (1Co14.26-33) é muito mais própria do que nas celebrações coletivas;

(3) Grupos de Ministérios, com a agenda de execução flexível, aglutinando cristãos ao redor de projetos co­muns, como projetos sociais, teatro, música, evange­lização de grupos específicos, engajamento missionário, intercessão, e outros. Neste aspecto podemos enqua­drar a utilização da sede da Igreja para múltiplas ativi­dades, de modo a não cometer o pecado de abrir as portas somente aos domingos, deixando o ambiente ocioso durante a semana.

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(4) Eventos especiais para evangelização, integração e comunhão, instrução e treinamento, à luz da compre­ensão de que "obra do Senhor" envolve o vôlei da "mo­çada", o estudo bíblico, a pizza com os amigos, a vigília de oração, o bate-bola entre casados e solteiros, o pro­jeto social, a educação infantil e tudo quanto for feito "por palavras e por obras", sabendo-se que a prior, todo ajuntamento cristão é expressão simultãnea de koínonía, kerígma e dídaché (comunhão, proclamação e instrução);

(5) Estrutura de educação, competindo com o mercado. Isto é, assim como pessoas priorizam seu tempo para estudar inglês, piano ou pára-quedismo, devem ter a oportunidade de buscar em sua comunidade cristã os subsídios para aprofundamento na fé e qualificação para o serviço cristão no mundo. Estudar e buscar profundidade teológica é compulsório, e não obriga­tório, muito embora seja dificil imaginar um cristão displicente quanto à palavra de Deus.

As igrejas devem possuir uma agenda solta, com forte ênfase nos relacionamentos pessoais, no disci­pulado e no serviço solidário. A agenda da igreja local deve ser flexível e variada e os Pequenos Grupos, tanto de Díscipulado quanto de Serviço podem suprir esta necessidade. As variáveis de aglutinação de pessoas, quer por afinidades pessoais, quer projetos comuns, são infindáveis quando a igreja se propõe a funcionar todos os dias em todos os lugares através de todos os seus membros, e não apenas no culto-clero-domingo­templo.

Esta estrutura responde à realidade urbana con­temporãnea. Hoje em dia as pessoas querem opções variadas, produtos e serviços personalizados. Bill

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Hybels (Folha de S. Paulo, 1991) disse que "é cada vez mais difícil manter uma igreja pequena, 'presevar o armazém de secos e molhados'. O espaço é ocupado por supermercados que oferecem muitos produtos. O mesmo ocorre na religião". O problema, portanto, não é ser grande, mas conseguir fracionar o rebanho em Pequenos Grupos afins, de modo que a vivência da fé seja incorporada no estilo de vida de cada pessoa, e não se restrinja ao ativismo dominical.

A igreja há que acontecer sempre, e para isso deve raciocinar a partir do pequeno, ágil, flexível, capaz de respeitar as peculiaridades de cada segmento do seu rebanho, ao invés de enterrar-se no ativismo de num único dia da semana, para um único programa massificado. A Igreja grande deve ser fracionada. A pequena, deve crescer a partir da multiplicação de célu­las afins.

3. Uma igreja liberta dos paradigmas culto­clero-domingo-templo mobiliza todos os seus mem­bros a partir dos dons espirituais e ministérios pessoais

Um fenômeno característico do evangelicalismo no Brasil é a figura dos "grandes homens de Deus". homens, ou mulheres que representam a "versão gospel do guru". Alguns, por opção própria, outros, pela pres­são popular. Os primeiros, adoecidos na alma, colocam­se a si mesmos no pedestal do egocentrismo e não têm grandes dificuldades para encontrar admiradores. Estes, não possuem ovelhas ou discípulos, possuem fãs. Há também aqueles que lutam para fugir desta condição, mas acabam vitimados pela cultura da Amé­rica Católica que "sempre precisará de seus ridículos

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tiranos": o povo os eleva à dimensão da trindade. Vale ressaltar que a palavra de Deus apresenta

biografias extraordinárias e aponta na direção de homens e mulheres usados por Deus para ministérios específicos, mas que a ênfase do Novo Testamento está no funcionamento do corpo de Cristo através do "auxílio de todas as juntas, segundo ajusta operação de cada parte" (Ef 4.16). Não se discute que a palavra de Deus faz distinção entre os "uns" e os "santos" (Ef 4.11, 12), de modo que o exercício da liderança é insti­tuição divina. O grande segredo operacional da Igreja é o equilíbrio entre a ação de uma liderança visionária e carismática e o engajamento de todos os cristãos. Nesse sentido, o ministério em equipes deve prevalecer como instrumento de mobilização do rebanho e fator atenuante dos personalismos, o que nos leva à seguinte estrutura eclesiástica:

3.1. Uma Equipe Ministerial capaz de "utilizar" seus integrantes em ministérios compatíveis com seus dons espirituais.

O objetivo seria o de repartir atribuições de acordo com as potencialidades, personalidade, experiência e formação específica dos chamados Pastores. A comunidade deveria visualizar claramente seu pastores, que poderiam dedicar tempo integral ou parcial, inclusive oficializando a participação dos chamados leigos cujos dons e ministérios fossem compatíveis com as funções ministeriais.

3.2. Conselhos Ministeriais responsáveis pela coordenação das áreas de atuação da igreja, agluti­nando ministérios afins e engajando cristãos com inte­resses, dons, experiências e vocações especificas.

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Esta estruturação da Igreja está alicerçada em três princípios básicos, a saber:

(1) Os dons espirituais e as vocações específicas impli­cam em que nenhum membro da igreja estará envol­vido em todos os ministérios;

(2) A equipe ministerial, além de suas responsabilida­des inerentes de dedicar-se à oração e à palavra de Deus, passa a ter as seguintes atribuições:

* Encaixar as pessoas em áreas ministeriais com­patíveis com seus dons, personalidades, interesses e capacitações.

*Aperfeiçoar as pessoas para que executem bem seus ministérios, isto é, providenciar para que tenham treinamento adequado.

* Subsidiar as pessoas em seus respectivos mi­nistérios, isto é, providenciar que tenham recursos ne­cessários para o bom desempenho de suas funções.

* Administrar os ministérios da comunidade co­mo um todo, o que eqüivale não somente a manter todos eles debaixo do mesmo guarda-chuva (a filosofia da igreja), como também planejar, delegar e supervi­sionar cada área ministerial juntamente com suas res­pectivas equipes de trabalho.

(3) Os Conselhos Ministertais, subdivididos em múltiplos ministérios são a igreja em suas respectivas áreas de atuação. Isto é, quando um grupo de ministérto age, a igreja age através dele. Sendo assim, quando um membro da igreja

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alcança o mundo, a igreja alcança o mundo.

MINISTROS Cristãos com a vocação e a preparação DE TEMPO suficientes para a dedicação exclusiva INTEGRAL aos ministérios da comunidades cristã

Os chamados leigos cujos dons espiri-

MINISTROS tuais, ministérios e competência profis-

FAZEDORES sional são compatíveis com as funções

DETENDAS pastorais e façam parte da equipe mi-nisterial reconhecida pela comunidade cristã

MINISTROS Ministros convidados para a execução de projetos de médio prazo na comuni-

TEMPORÁRIOS dade cristã

Cristãos cujos dons e ministérios apon-tam para futuro aproveitamento no mi-

ESTAGIÁRIOS nistério pastoral e ou missionário e já estejam envolvidos em programas para formação teológica

4. Uma igreja liberta dos paradigmas culto­clero-domingo-templo articula sua estrutura ope­racional de modo a valorizar e priorizar relacio­namentos pessoais

O acelerado processo de desenvolvimento tecno­lógico e de urbanização da sociedade vem cozinhando as igrejas em fogo brando. As cidades vão se tornando locais de trabalho e a tecnologia vai isolando pessoas

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que passam a interagir com máquinas que dão acesso a produtos e serviços necessários à sobrevivência. Com­putadores conectados em rede, caixas eletrônicos, dri­ve-thru, delivery e telemarketing, são instrumentos ca­da vez mais utilizados e as pessoas já podem traba­lhar, fazer compras e encontrar diversão sem deixar os poucos metros quadrados de seus apartamentos. A violência das ruas e o trãnsito insuportável das grandes cidades serão cada vez mais capazes de persuadir o cidadão a fazer de sua casa o lugar mais agradável de se estar.

Haverá, entretanto, urna brecha em todo este mecanismo social que se instala com ares de definitivo. O fato de que Deus criou pessoas para viverem em profunda comunhão é irrevogável. Não é sem razão que o Senhor Jesus determinou o amor como marca característica e distintiva da comunidade cristã. Pes­soas precisam de Deus, e pessoas precisam de pessoas. Nada supera a relação pessoa-pessoa. A experiência de amar e ser amado é insubstituível. O ser humano é, decididamente, gregário. A vida humana é pontilhada de momentos quando nada preenche a necessidade que somente pode ser suprida por um abraço caloroso e acolhedor.

Sabemos que a satisfação humana não depende apenas da posse do objeto desejado. É necessáiio que o processo de conquista do objeto seja pleno e coerente de modo a gerar o "sentimento de posse" e a "sensação de suprido". Pois é fato que se a realidade virtual poderá gerar a sensação de estar abraçado, jamais poderá ge­rar a sensação de ser amado. Talvez até possa abraçar, mas a sensação de que o abraço nunca aconteceu acompanhará o carente noite à dentro.

As comunidades cristãs locais que farão dife-

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rença no futuro serão aquelas cuja ênfase maior estiver nos relacionamentos interpessoais. Estruturas, progra­mas e métodos serão, como sempre foram, secundá­rios, em uma comunidade de amor. A comunidade que não estiver fracionada e não possuir mecanismos capa­zes de aproximar pessoas umas das outras será apenas mais um item na agenda de tantos que preenchem seus vazios com atividades e programas.

Carl George ( 1992, p. 15) comenta uma lista de clamores ou necessidades das pessoas neste final de século. Dentre outras coisas, as pessoas estão dizendo mais ou menos o seguinte:

(1) Eu preciso de calor humano

John Naisbitt, em seu best-seller Megatrends, afirma que em resposta ao fenômeno "high-tech" as pessoas estão carentes de "high-touch". O acelerado processo de avanço tecnológico e a crescente convivên­cia com a máquina tem gerado a necessidade de relacio­namentos humanos significativos.

(2) Capacite-me a conviver com a instabilidade

Hoje em dia as pessoas somente estão dispostas a participar das atividades eclesiásticas se suas neces­sidades são satisfeitas. As pessoas que se envolvem com uma comunidade cristã estão em busca de algo que possa funcionar em seus relacionamentos, desem­penho profissional e saúde familiar.

(3) Eu preciso de motivação

Todos os líderes devem se perguntar acerca de

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quais as necessidades de seus membros, de modo a supri-los e liberá-los para o trabalho voluntário.

{4) Mostre-me uma organização onde as pessoas realmente são importantes

As estruturas organizacionais devem ser huma­nizadas. Afinal, estamos trabalhando para transformar pessoas ou para perpetuar instituições e programas?

(5) Mostre-me pessoas que realmente se impor­tam comigo

Em outras palavras: "Esta igreja está interessada em mim, ou na minha mão de obra e meu dinheiro?".

A comunidade cristã é por excelência ambiente de encontro: pessoas com Deus, umas com as outras e consigo mesmas, num processo cujas riquezas são insondáveis e imensuráveis. O ativismo religioso, a multiplicação de líderes tipo "show man" e atividades "xerocadas" dos mega-eventos hollywoodianos são e serão sempre insuficientes para preencher os anseios mais profundos da pessoa humana, principalmente num contexto social e cultural cheio de competitivi­dade, que leva ao extremo a sugestão de "cada um por si e o diabo que leve o último".

A Igreja há que voltar às origens e reafirmar-se como ambiente de encontros, relacionamentos, acon­chego, ambiente família, vida comunitária, sob pena de tornar-se mais um item a disputar a agenda do cidadão urbano ou distração barata para o pobre da periferia. Para que se estabeleça como igreja em sentido pleno, a comunidade cristã deverá resgatar a realidade profunda da comunhão bíblica: a unidade espiritual

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que faz com que todos sejam um, um em Cristo. Menos atividades, reuniões, programas, eventos, e mais comu­nhão, trocas interpessoais, conversas francas, peito aberto, mãos dadas e abraços fraternos. O lugar central da Igreja na virada do século, não deve ser nem o palco nem o púlpito, mas sim a mesa.

5. A igreja liberta dos paradigmas culto-clero­domingo-templo considera o discipulado uma rea­lidade imprescindível

A relação pessoa-pessoa inclui prioritariamente processos de discipulado, uma vez que a dinâmica dos relacionamentos não se esgotam na mera convivência social. Cristãos se multiplicam através do "contato­contágio", repartindo a vida que recebem de Cristo com outras pessoas.

Em termos práticos, e observando a preocupação didática, podemos considerar os processos de disci­pulado na igreja lo~al a partir de quatro fases distin­tas, como segue:

Esta visão das "fases do discipulado" merece algu­mas considerações. Em primeiro lugar, o quadro é apenas uma forma de facilitar a compreensão, uma vez que relacionamentos pessoais não podem ser emoldurados. Discipulado não é programa (horas aula, textos didáticos, projetos, eventos, etc}, é processo, e por isso mesmo varia de pessoa para pessoa, de relacio­namento para relacionamento.

Em segundo lugar, vale ressaltar a centralidade dos pequenos grupos como facilitador do discipulado. Muito embora tenhamos as dimensões do relaciona­mento pessoal, dos eventos selecionados, das celebra­ções coletivas, engajamento ministerial, é no pequeno

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grupo que o processo de enriquecimento mútuo ganha sua maior densidade.

Uma igreja preocupada em ser mais do que uma "agência de promoção de eventos gospel" deve priorizar recursos e ambientes para que seus membros possam crescer na maturidade cristã, servir através de seus dons espirituais em ministérios a partir do corpo de Cristo multiplicar-se através do "contato-contágio" com não cristãos. Este processo todo: testemunho, inte­gração, maturidade e reprodução é o discipulado.

O PROCESSO DE DISCIPULADO

FASE ESTRATÉGIA OBJETIVO

1. Amizade

Testemunho 2. Exemplo A Conversão 3. Serviço do Discípulo 4. Testemunho Verbal

1. Eventos especiais O Batismo Integração 2. Pequenos Grupos

de Discipulado do Discípulo

1 . Eventos especiais A Qualidade Maturidade 2. Pequenos Grupos de Vida

de Discipulado do Discípulo 3. Celebrações coletivas

1. Programa de

Reprodução Treinamento O Ministério

2. Pequenos Grupos do Discípulo de Serviço

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6. A igreja liberta dos paradigmas culto-clero­domingo-templo é uma agência de serviço profé­tico

Praticamente todos os segmentos evangélicos em nosso país estão sensibilizados para a questão social. Raríssimas são as lideranças evangélicas que ainda não se conscientizaram que uma igreja que não é solidária está destituída de sua voz profética, quer por seu descrédito ante a sociedade, sua insensibilidade intrínseca ou pelo fato de estar traindo sua vocação histórica, uma vez que negligencia a mais elevada ex­pressão prática de sua essência de amor: a solidarie­dade. As lideranças evangélicas, portanto, são moti­vadas pelo sonho de impactar o Brasil e contribuir significativamente para o surgimento de uma nova e mais justa ordem social.

Diferem, entretanto, estas lideranças, nas ques­tões estratégicas. Concordam no "o que fazer", mas divergem no "como fazer". Há quem acredite que o caminho da relevância histórica passa pela conquista das instâncias de poder político e assentam sua estra­tégia em três pilares: cetro, coroa e trono, que sinte­tizam e simbolizam o poder temporal. A máxima anar­quista que ensina que "nenhum homem conquista o poder, o poder é que conquista o homem" tem sido comprovada na experiência de muitos evangélicos que se aventuraram por este caminho. Para os tais, o processo de chegar lá no topo tem sido permeado por acordos e maracutaias que deixariam Maquiavél orgu­lhoso de seus "discípulos cristãos".

Evidentemente, a escalada de cristãos às instân­cias do poder público será sempre uma bem aventu­rança, na medida em que o poder for instrumento de

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serviço e não de domínio. É nessa perspectiva que o apóstolo Paulo chama as autoridades constituídas de ministros de Deus para a promoção da justiça e bem comum (Rm 13.1-7). Nesse caso, o poder e a autoridade constituem-se em "meio" e não em "fim".

O caminho proposto pelo Senhor Jesus ainda permanece: a toalha no lugar do cetro, os espinhos no lugar da coroa, e a cruz no lugar do trono. A Igreja exerce o seu impacto na sociedade e concretiza seu ideal de relevância histórica pela via do serviço, e não do poder. É através da expressão da solidariedade que a Igreja deve estender as fronteiras do reino de amor eterno do Senhor que venceu como Cordeiro e não como Leão.

Mesmo porque, se é fato que o processo de urba­nidade e tecnologia há de gerar um status de conforto para alguns setores da população, certamente também há de multiplicar as carências nos centros de maior densidade populacional. O serviço será a resposta cris­tã capaz de justificar a existência e permanência da igreja na sociedade. Chegará o tempo em que a ocio­sidade dos templos evangélicos será imperdoável. O pecado que as comunidades cristãs cometem hoje, ao mobilizarem seus recursos para servir apenas seu pú­blico interno, será o algoz de amanhã.

A previsão de que os grandes centros urbanos serão bolsões de pobreza e delinqüência, a exemplo do que já acontece em outras partes do mundo, indica que as comunidades cristãs devem se aparelhar para a prestação de serviços, abrindo suas portas e dispo­nibilizando suas riquezas, de tal maneira que sejam de fato comunidades alternativas, proclamadoras e promotoras da justiça integral que sinaliza o reino eterno e atrai o coração do homem ao Deus que, em

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Cristo, redime, liberta e transforma. Nesse sentido, o serviço cristão é profético: aponta necessariamente para a eternidade e para a dimensão da espiritualidade do reino de Deus, para o Cristo e sua tão grande salva­ção. A Igreja não está no mundo para benemerência, mas para submetê-lo ao Senhor Jesus. A ação solidária deve se fazer acompanhar da palavra profética, e toda palavra profética despida da solidariedade é barulho de lata.

A velha tensão entre evangelização e responsabi­lidade social há que ficar na poeira da história. Cristãos devem redescobrir que o serviço a Deus é necessaria­mente um serviço ao próximo. Quem quer ofertar a Jesus não deve se apressar na direção do templo para o serviço religioso, deve passar antes pelo leito do hospital, a cadeia e a esquina, deve vestir o nu, visitar o enfermo e dar de comer e beber ao moribundo, pois quem serve a um dos pequeninos, na verdade serve a Jesus (Mt 25.31-46).

7. Uma igreja liberta dos paradigmas culto­clero-domingo-templo amplia seus horizontes ministeriais através de múltiplas parcerias com igrejas e instituições cristãs

Toda comunidade cristã carece de um fórum cristão de fraternidade. Definitivamente, a visão do reino de Deus deve levar a visão da comunidade para além de suas fronteiras locais e denominacionais. O corpo de Cristo é maior do que suas formas históricas e culturais de expressão. As fronteiras denomina­cionais e diferenciações teológicas devem distinguir, mas nunca separar. Esse é um tempo de parcerias, onde comunidades afins devem se aglutinar ao redor

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de projetos comuns capazes de impactar seu contexto. Há pelo menos três benefícios de um fórum

cristão de fraternidade:

(1) Balizamento teológico

A Bíblia, ao ensinar que "na multidão de conse­lheiros há sabedoria", indica que o labor teológico é uma tarefa comunitária. O Rev. John Stott, ensina que a negligência ao consenso teológico da Igreja é uma blasfêmia contra o Espírito Santo de Deus que há dois mil anos ilumina cristãos para que entendam as Escri­turas.

As chamadas igrejas independentes, isoladas da comunhão com outras comunidades são um solo fértil para heresias, uma vez que passam a girar em torno de alguns poucos homens e mulheres que negligen­ciam uma dimensão imprescindível do exercício da liderança cristã: a prestação de contas.

(2) Intercâmbio ministerial

O Pastor Lourenço Stelio Rega foi o primeiro de quem ouvi a expressão "comunidade cristã virtual", onde os recursos mais diversos são intercambiados e multiplicados entre igrejas. Num mundo em que a maior riqueza é a informação, a maior contribuição entre comunidades cristãs é a transferência de know how. E viva a Internet. E o BBS (Bulletin Board Service).

(3) Soma de riquezas

Comunidades cristãs isoladas não têm poder de fogo para impactar a cidade e o mundo. As redes mis-

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sionárias denominacionais, os aglomerados eclesiás­ticos com caixa único, a contribuição interdenomi­nacional que sustenta as chamadas paraeclesiásticas e os movimentos esporádicos internacionais são teste­munhos de que "uma igreja só não faz verão". A pre­sença cristã institucional na mídia, por exemplo, so­mente é possível mediante a conjugação de esforços, como bem demonstram as experiências atuais.

8. A igreja liberta dos paradigmas culto-clero­domingo-templo está mais preocupada em salgar a terra e iluminar o mundo do que em preservar seu pequeno rebanho

Charles Swindoll afirmou que "a tradição é a fé viva dos que já morreram, enquanto que o tradicio­nalismo é a fé morta dos que ainda vivem". Infelizmente, os defensores e mantenedores do status quo ainda são em grande número dentro das comunidades evangé­licas, notadamente nas reformadas históricas, geral­mente alicerçadas nos feudos das famílias fundadoras. Não são poucos os pastores que gastam seus dias ten­tando permanecer de pé face às exigências de l1de- . ranças tradicionalistas, ao invés de investirem suas · potencialidades na criação e desenvolvimento de meca­nismos de testemunho cristão na sociedade.

Definitivamente, sob pena de obsolescência, as igrejas estão desafiadas a romper os paradigmas culto­clero-domingo-templo. Este é um tempo quando os líde­res covardes e as comunidades reacionárias serão atro­pelados pelas mudanças que a cada dia se multiplicam e ocorrem mais rapidamente. Manter a tradição, e não o tradicionalismo. Eis o desafio para quem deseja "servir a sua própria geração, segundo a vontade de Deus".

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Conclusão

1. Síntese

A Igreja, o corpo vivo de Cristo, deve existir fora dos paradigmas "culto-clero-domingo-templo". Isto, evi­dentemente, não significa que estas dimensões da re­ligiosidade são prescindíveis; significa sim que não são suficientes nem prioritárias.

Não há dúvidas quanto ao fato de que milhares de cristãos são semanalmente abençoados por Deus mediante sua freqüência nas celebrações coletivas, quando no templo são tocados por Deus, seja por oca­sião do louvor, de um testemunho ou oração, e mesmo na proclamação da palavra de Deus. Se é verdade que cristãos sobrevivem sem templos, também é verdade que aqueles que negligenciam a freqüência às cele­brações coletivas de sua comunidade cristã deixam de lado uma dimensão significativa e até mesmo impres­cindível da experiência religiosa.

Entretanto, somente a igreja fracionada em Pe­quenos Grupos pode experimentar a plenitude do que o Novo Testamento chama de ekklesia. Enquanto não há mutualidade entre os cristãos, não há igreja, há evento. Enquanto não há multiplicidade de ministéri­os e serviços a partir da comunidade cristã, não há igreja em missão, há igreja em reunião.

Os Pequenos Grupos, portanto, devem ser a teia de sustentação do dia-a-dia da comunidade cristã, bem como os instrumentos viabilizadores do serviço pres-

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tado pelos cristãos no mundo. Dons espirituais devem ser vistos na perspectiva de ministérios coletivos (diaconias) e não na dimensão individualizada (experi­ências com Deus à portas fechadas). Cristãos devem ser encorajados a se envolver em ministérios e não apenas a descobrir seus dons. Mais do que isso, cris­tãos devem ser encorajados e subsidiados para que exerçam em plenitude sua vocação de sal da terra e luz do mundo, e a vivência comunitária não é apenas o ambiente onde cristãos qualificam sua vida a fim de servir a Cristo nos respectivos contextos onde se en­contram, como também o fórum para a ministração comum ao mundo.

As grandes reuniões da comunidade são reu­niões de celebração, gratidão, profecia e encorajamento ao corpo que está ministrando no cotidiano e expan­dindo as fronteiras do domínio de fato do Senhor Je­sus. As pequenas reuniões da comunidade, são espa­ço para a expressão de todos diante de Deus e para o exercício da mutualidade, construindo os relaciona­mentos que solidificarão o corpo em missão.

2. Uma Visão Para a Igreja Local

RAZÃO A reconciliação da criação com o Criador DE SER

MISSÃO Levar o evangelho todo para o homem todo

Priorizar relacionamentos envolvendo FILOSOFIA todos os membros além dos límites

do "culto-clero-domingo-templo"

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Conclusão 99

3. Um Segredo de Domínio Público

Nada substitui o mover do Espírito Santo na Igre­ja. O Espírito Santo é como o vento que sopra onde, quando e como quer. O Espírito Santo é livre e misterio­so, não sabemos de onde vem nem para onde vai, só sabemos que Ele está presente, porque é impossível deixar de perceber o vento.

Registre-se, portanto, que não há filosofia de mi­nistério, planejamento, organizações, métodos, cam­panhas de marketing ou quaisquer outras realidades que substituam a ação do Espírito Santo. Sabemos que todas estas coisas podem ajudar e até mesmo se encaixam na nossa parte tipo remover a pedra, mas ressuscitar o morto é obra absoluta do Senhor Jesus, e não há nada que lhe roube a glória ou simule sua intervenção. O Espírito Santo de Deus não é manipu­lável: Ele é como o vento, e não como um ventilador.

Uma igreja, portanto, que quer fazer diferença no mundo, deve ser uma igreja carismática. Deve se entregar à prática das disciplinas espirituais: oração, jejum, devoção pessoal e coletiva à luz da palavra viva de Deus, adoração livre que exalta a Deus Pai, Filho e Espírito Santo. Deve estar aberta aos carismas, na perspectiva de "buscar com zelo os melhores dons" (ICo 12.31). de tal maneira que seu ministério seja explica­do apenas à luz do transcendente, da intervenção di­reta do Espírito Santo, e não pelo seus recursos diver­sos e potenciais humanos.

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Ed René Kivltz, é casado com SIMa Re­gina e possuem dois filhos, Fernanda e

..__ __ , Vitor. Atualmente é pastor da Igreja Ba­tista de Água Branca, em São Paulo, on-

c~- de desenvolve um ministério, dinâmico e criativo, de evangelização urbana. É um dos diretores da Sociedade Bíblica Internacional, professor na Faculdade Teológica Batista em São Paulo, confe­rencista e autor de verve bíblica e moder­na. Suas obras, Nasce Uma Igreja e Koinonia - Manual Para Líderes de Pe­quenos Grupos, são bons exemplos des­te talento.

aradigmas são modelos, padrões .comportamentais, hábi­tos, costumes e idéias cristalizadas que vão se sedi­mentando em nossas mentes e definem nosso jeito de ser e

ver o mundo. A igreja é o povo de Deus, evangelizando e melhorando a

sociedade, enquanto canúnha para o céu. A mensagem do Senhor é eterna, mas os paradigmas ecle­

siásticos estão sujeitos à ação corrosiva do tempo. Novos e criativos conceitos eclesiológicos precisam flores­

cer. A Igreja tem o dever de ser relevante no seu tempo e para sua gente. Essa é a proposta ousada e amorosa deste livro.

ISBN 978-85-85931-01-9

9 788585 931018

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Boa Leitura! Oswaldo Paião Jr.