Upload
others
View
1
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
RECONHECIMENTO GEOLoGICO DA SERRA DORONCADOR, ESTADO DE MATO GROSSO
Por
F . F'. M. DE ALMEIDA e W. T. HE NNIES
ABSTRACT
Geological investigation in th e Roncador plateauand adjacent areas have shown that typical g eological deposits of the Paraguaian miogeosinclinereach the Araguaia basin. The Roncador plateauindicates the aproximate contact of the Gu aporeplatform with one marginal basin of this geonaincline. Presence of rocks from th e Chapada Groupin the detritical coverture of the plateau wasconfirmed, as well as younger beds, possibly 01P al eozoic age, where oolitic iron ore was discoveredNew data a bout the Cenozoic coverture in theAraguaia and Sete de Setembro river basins aropresented.
RESUMO
Reconhecim ento geol6gico re alizado na serra doRoncador e areas adjacentes mostrou que forma<;oes e es t rutu ras tipicas da faixa de dobramentosdo geossinclineo Paraguaio se estendem it bacia dorio Araguaia. A serra do Roncador assinala a posi<;iio aproximada da borda da plataforma do Guapore em contacto com uma bacia marginal dessegeo ssinclineo. Confirmou-se a presenca de rochasdo Grupo Chapada na cob ertura detritica da serrado Roncador, assim como a de camadas mals modernas, provav etrnente tambern pal eoz6icas, entreas quais se encontrou minerto de ferro ooliticoNovos conhecimentos saO apresentados sabre as coberturas cenoz6icas dos rios Araguaia e Sete deE'etembro.
INTR ODUQA O
o vale do rio das Mortes e a serra do Roncador, na area nordeste do Estado de MatoGrosso, permaneciam geologicamente desconhecidos ate 1947, quando a Divisao de Geologiae Mineralogia organizou uma expedicao aregiao, da qual participaram K. E . Caster, 0Barbosa, S. Petri e F . F. M. de Almeida.Servindo-se de aviao, unico meio de acessoentao disponivel, a expedicao visitou Xavanti-
na, localid ade que vinha de ser criada pelaFundaeao Brasil Central, sobrevoou a serra doRoncador e alcan cou uma aldeia de indios Kalapalos situada no rio Xingu. Verificou a expedicao que 0 Grupo Cuiaba, com muitas dascaracteristicas com que se apresenta na areatipo dos arredores da capi tal mato-grossense,se estendia a. bacia do rio Araguaia (K. E.Caster, 1947; F. F. M. de Almeida, 1948 ). Verificou , tarnbern, que a chamada serra do Roncador era uma extensa chapada dividindo aguasdas bacias dos rios Araguaia e Xingu, Suacobertura sedimentar foi entao atribuida aoCretaceo (F . F. M. de Almeida, 1948 ). Aarea da ser ra do Roncador, nessa ocas iao inacessivel por terra, era povoada por selvicolashostis, da tribu Xavante.
Em 1957 0 geologo K. Beurlen, da Divisaode Geologia e Mineralogia, realizou novo reconhecimento da regiao situada entre os rios dasGarcas, Araguaia e Mortes . Percorreu a estrada que en tao havia sido aberta ligandoAragareas a Xavantina e realizou Investigacoesern varias diregoes, nos arredores deste povoado. Confirmou a presence do Grupo Cuiaba naalta bacia do rio Araguaia e no rio das Mortes.
Para a preparacao do Mapa Geologico doBrasil, edigao de 1960, a Cia. Prospec foi encarregada pela Dlvisao de Geologia e Mineralogia de elaborar uma interpretacao fotogeologica de fotografias aereas trimetrogon, da altabacia do rio Xingii e da do rio das Mortes.Essa lnterpretacao, executada POl' O. Barbosae E. H. G. Braun, foi apresentada em mapa
em escala ao milioneslmo mas publicada emescal a aproximada de 1 :2 .360 .000, no Relaterio Anual do Diretor da Divisao de Geologia
24 BOL. DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE GEOLOGIA - V. 18, NQ 1. 1969
e Mineralogia referente ao ana de 1959. Em
bora feita sem contr61e de campo. e referindose a uma regiao geologicamente quase desconhecida, representa corretamente a exten sao doGrupo Chapada a serra do Roncador, ondeantes se supunha existirem camadas cretaceas,ass irn como as extensas coberturas cenozoicasdos vales dos rios Araguaia e das Mertes, cujaimportancia havia escapado aos investigadoresanterlores, Outros elementos representadosnesse mapa serao oportunamente comentados.
"Oltimamente foi pacificada a tribo Xavanteo que ocupa as faldas e os campos do altoda Serra do Roncador, tendo uma companhiade colonizacao se estabelecido em terras dobaixo vale do rio Sete de Setembro, proximoa sua foz no rio Culuene. Em 1965 a Fundacao Brasil Central deu in icio a chamada Expedicao Xavantina-Cachimbo, encarregada deabri r uma estrada entre essas duas localidades.Apresentava-se, com isso, oportunidade de seinvestigar a desconhecida regiao da serra doRoncador e verificar-se a suposta extensao,ao vale do rio A raguaia, das estruturas do geossinclineo Paraguaio. Urn convenio foi estabelecido entre a Fundacao Brasil Central e aUniversidade de Sao Paulo pel o qual aquelafornece aos pesquisadores desta, facilidades deacesso as invias regioes penetradas pela expedicao. Valendo-se de tats facilidades. umaprimeira viagem foi realizada POl' Almeida aserra do Roncador em abril de 1966. Em julhodaquele ano, os autores penetraram por terrana regtao, partindo de Xavantina, e sobrevoaram extensas areas do triangulo compreendidoentre Santa Isabel do Morro na ilha do Bananal, Garapu e Xavantina. 0 rio das Mortesfoi navegado ate a foz do rio A reoes e levantada uma reg iao geologica entre as localidadesde Xavantina e Garapu. 0 espigao da serra doRoncador foi percorrido ao longo de cerca de
200 quilometros, ate as nascentes do rio Suia
Missu, nesse trajeto tendo sido atravessado 0
vale do rio Mangarura, afluente da margem
esquerda do rio das Mortes.
Os autores agradecem as seguintes institui
c;oes as facilidades de varias naturezas que lhes
tornaram possivel penetrar ne ssa despovoada
regiao do solo mato-grossense: Conselh o Na
cional de Pesquisas, Divisao de Geologia e Mi
neralogia do D .N . P . M .. Fundaeao Brasil Cen
tral. Fundaeao de Amparo a Pesquisa do Es
tado de Sao Paulo e Universidade de Sao
Paulo.
o ALTO VALE DO RIO DAS MORTES
o rio das Mortes procede dos chapadoesdevonianos do planalto mato-grossense, dosquais se precipita na cachoeira da F'umaca,para percorrer trecho de rochas metamorficasantes de se Iancar nas extensas planicies de
seu baixo curso. Entre a referida cachoeira ea foz do rio Pindaiba seu curso encaixado eatormentado pol' numerosos rapidos e apertadoentre morros quartziticos. A regiao que nessetrecho atravessa e de relevo colinoso baixo, entalhado sobretudo em filitos com algumas intercalacces de quartzitos que se destacam napaisagem como morros de discreta elevacao,Afastadas das proximidades dos principais rios,as elevacoes sao recobertas de depositos modernos, de natureza areno-argilosa, que emprestam a paisagem seu aspecto uniforme esuavizado.
A estrada de Xavantina a serra do Roncador apresenta somente uns poucos cortes,sendo raras as exposicoes das rochas xistosas.Nela. e nas barrancas dos rios das Mortes eAreoes, pode-se verificar serem os filitos sericiticos as rochas mais abundantes do GrupoCulaba na regiao. Posto que sem pre muitoalterados pelo intemperismo, observa-se queIltologicamente sao comparaveis aos filitos daBalxada Cuiabana. identidade que se manifestatambern na grande abundancia de veios dequartzo leitoso, localmente auriteros. comoacontece na lendaria reglao do morro dosAraes, a oeste de Xavantina.
Aqui as maiores massas de quartzlto, quesustentam as saliencias do relevo, pod em tel'mais de duas leguas de extensao, Podem serexaminadas nos morros proximos ao campo deavlacao de Xavantina, os situados nas irnedia (;oes da foz do rio Areoes e os que a estradapara a serra do Roncador atravessa a uns 20
quilometros apos Xavantina. Sempre se apresentam tais rochas como quartzitos muito puros, de granulacao media a fina, localmentemicaceos, com estratiricacao pouco aparente.Nao vimos grauvacas ou subgrauvacas, nemassociacoes com carater de turbiditos comoexistem nos arredores da cidade de Cuiaba, Osquartzitos da regiao do rio das Mortes lernbram, contudo, os de Santo Antonio do Leverger, Barao de Melgaco e os da borda sul daSerra de Sao Vicente, na bacia do rio Cuiaba.
K. Beurlen (1959 ) referiu a extstencla de
menores Intercalacoes de calcarios nos filitos
da regiao de Xavantina e das proximidades de
F. F', M. DE ALMEIDA e W. T. HENNIES - Reconhecimento geologico.. . 25
l
53°
LEGENDA
EJ QUATERNARIO- -
0 TERCIARIO. .
~~~~;·il~~~l CARBONiFERO
[TI DEVONIANOo " GRUpa GHAPAOA
[l]] CAMBRIANO0 GRUpa ALro PARAGUAI
f?Zl PROTEROZ01COGRUPO GUIASA
E SCALA
0 km so! !
14°
II
II
I
30
100i
60 16, .
MAPA GEOLOGICO DA SERRA DO RONCADORModi/lea.do de O. Ba.rbosa. e £: H. G. Bra u r2 ,1960
53 ° 30 ' 52 ° 30 '
26 BOL. DA 80CIEDADE BRA8ILEIRA DE GEOLOGIA - V. 18, N9 1, 1969
Aragarcas. Posto que as procurassemos, naologramos identifica-Ias, 0 que atribuimos aofato de haverem sido abandonados os caminhospercorridos POl' Beurlen.
A 22 quilometros de Xavantina, num dosraros cortes da estrada para a serra do Roncador, observamos a presenca de filitos sericiticos muito alterados, mas claramente possuidores de seixos mal rolados e deformados, dequartzito, podendo alcancar cerca de 20 centimetros de diametro, Embora a ocorrencia tenha-nos sugerido a preesnca, no local, de res tos dos drifts do Grupo J angada, podem igualmente constituir urn metaconglomerado do proprio Grupo Cuiaba,
o metamorfismo denunciado pelas rochasexaminadas do Grupo Cuiaba, tanto no vale dorio das Mortes como no do alto rio Araguaia,nao ultrapassa a facies xisto verde. Na baci aAraguaia, em Mato Grosso, desconhecemos apresenca de granitos intrusivos no Grupo Cuiaba, Os que existem em Araguaiana, a margem esquerda do rio Araguaia (K. Beurlen,1959), parece-nos serem associados a rochas doComplexo Basal Goiano . Os granitos da SerraNegra, a sui de Aragarcas, e os do vale do rioPiranhas, em Coias, devern contudo, ser correlativos dos da Serra de Sao Vicente, em MatoGrosso, como parece comprovarem-no datacoesgeocronologteas em execucao em Sao Paulo.
As camadas do Grupo Cuiaba na regiaosituada entre 0 rio das Mortes e a serra doRoncador acham-se holomorflcamente dobradas, e aparentemente falhadas, segundo direcoesgerais predominantemente orientadas entre 459e 609 NE, exibindo mergulhos moderados a fortes para urn e outro lados. Essa tect6nica provoca a repeticao de camadas e responde pelasvariadas cristas subparalelas de quartzito quese observam no relevo da alta bacia do rio. Anorte do paralelo 14930'8 as direcoes estruturais infletem-se para cerca de 30oNE, que passatarnbem a ser a direcao geral de t6da a drenagem que busca a area da ilha do Bananal,assim como de algumas cristas quartziticas,presumivelmente pertencentes ao Grupo Cuiaba,que se destacam das planicies existentes entreos rios Araguaia e das Mortes a sui daquelailha.
Dep 6sitos aluviais cenozolcos cobrem amajor parte da bacia do rio das Mortes, estando presentes mesmo onde ele entalha rochasdo Grupo Cuiaba, Incluem-se em dupla categoria: as aluvi5es modernas, de natureza arenoargilosa, existentes somente nas planicies alu-
viais e leitos maiores e baixos terraces dos rios,e os depositos elevados que recobrem os interfluvtos, podendo se apresentar a mais de meiacentena de metros acima dos rios. Os primeiros t ern distribuiqao restrita na area que percorremos, mas ganham extrema importancia naque sobrevoamos, do baixo curso do rio, a jusante da confluencia do rio Pindaiba. Distrrbuibuicao inversa se observa quanto aos dep6sitos aluviais antigos, que cobrem a major parte da area da bacia do rio Pindaiba e da doMortes a montante da foz daquele. Em Xavantina medimos espessura de 52 metros dasaluvioes antigas, que repousam sobre embasamento algo movimentado dos xistos do GrupoCuiaba. Nas barrancas do rio, a jusante davila, e em escavacoes nesta, pode-se observarserem tais camadas de constituicao arenosa ouareno-argilosa, localmente podendo conter seixos centimetricos de quartzo e quartzito. Saopouco consistentes, sen do geralmente indistintasua estratiftcacao, pois que se mostram sempremuito alteradas pelo intemperismo. A este fenorneno atribuimos as cores vivas e variegadascom que se apresentarn, em contraste com astonalidades palidas ou cinzentas dos dep6sitosmodernos. Freqiientemente nelas se desenvolvern crostas lateriticas de estrutura granular,fato que favorece 0 desenvolvimento de relevotabular, que nos arredores de Xavantina seeleva a meia centena de metros acima do rio.A vila, edificada num terrace entalhado nessaformacao aluvial antiga, acha-se a 15 metrosacima do nivel do rio, mas 0 aero porto, a 329metros de altitude, situa-se em plena chapadasedimentar, a 52 metros acima do leito do riodas Mortes.
Aparentemente grandes volumes da cobertura aluvial antiga foram retirados pela erosaomoderna, da bacia do rio das Mortes e da doAraguaia a montante da ilha do Bananal, paracederem lugar as extensas planicies aluviais
que ali se observam e que, juntamente com aarea daquela ilha, multo lembram 0 Pantanalde Mato Grosso. Como este, tambern devemocupar area de subsidencia moderna.
Na Carta Geol6gica da America do Sui,edic;ao de 1964, atribui-se a formacao aluvialantlga ao Terciario, e nao mais ao Quaternariopluvial, como no Mapa Geologico do Brasil(1960 ). Embora a idade dessa formacao sejarealmente desconhecida, nao deixa de chamara atencao do observador a semelhanca queapresenta com rochas do chamado Grupo Barreiras, da regiao Amazonica.
F. F. M. DE ALMEIDA e W. T. HENNIES - Reconhecimento geologico ... 27
Serra do Roncador
A serra do Roncador, a norte de Xavantina, e a borda escarpada e festonada de umacuesta em cujo fronte, voltado para 0 rio dasMortes, se apresentam camadas do Grupo AltoParaguai, sendo 0 reverse sustentado pelos arenitos e folhelhos devonianos do Grupe Chapada.
o Grupo Alto Paraguai, na serra do Roncador, acha-se representado por duas de suasforrnacoes da regiao tipo: Sepotuba e Diamantino. Faltam quaisquer- cam adas que possamser atribuidas ao Arenito Raizama, como deresto, tambem representantes das sequenciascarbonatadas da regiao centro-oeste do Estado.
No mapa geologico da regiao do Alto Xingue rio das Mortes, reproduzido no Relat6rioAnual do Diretor da Divisao de Geologia eMineralogia para 1959, pertence realmente aoGrupo Alto Paraguai toda a area atribuida a«Serle Tocantins ou Culaba», na alta bacia dorio Sete de Setembro, enquanto que a area representada como pertencente a «Serie Araxa»na alta bacia dos rios das Mortes e Pindaibaconstitui-se de rochas do Grupo Cuiaba.
Formacao Sepotuba - A Formacao Sepotuba, na estrada de Xavantina a serra do Roncador, aflora numa faixa com cerca de 5 quilometros de largura. Sua base acha-se ocultasob os sedimentos antigos do Cenoz6ico. Osmais baixos horizontes expostos da formacaoconstituem-se de folhelhos ardosianos de corcinza escuro, chocolate ou esverdeada, rochasque quase sempre se mostram muito alteradas,adquirindo aspecto de folhelho argiloso algo micaceo, Intercalam-se-Ihes laminas mllimetrioase camadas centimetricas de siltito e arenitofeldspatico micaceo, em associacao com perfeita estratincacao plano-paralela. As vezes constituem alternancias ritmicas em que camadasde siltito com poucos decimetros ou alguns centimetros de espessura se separam por outrasbern mais delgadas, de natureza argilosa.
Os arenitos, mals ou menos micaceos efeldspaticos, que se intercalam aos termos peliticos da formacao, sao geralmente de granula<;ao fina e uniforme e estrutura macica,
Observamos claramente que no alto da formacae passam a se intercalar nos folhelhos esiltltos, camadas pouco espessas de arcosio fino,tal como as conhecemos na regiao situada entreas cidades de Alto Paraguai e Diamantino (F.F . M. de Almeida, 1964). Assim se caracterizacomo de transieao a passagem entre as Formacoes Sepotuba e Diamantino, pelo que ado-
tamos, na falta de melhor crtterlo, 0 aparecimento da primeira camada de arcosio comocaracterizando a base da rormacao superior.
As intensas deforrnacoes com que se apresentam as rochas do Grupo Alto Paraguainessa area dificultam a estimativa da espessura de suas camadas, mas cremos que Sepotuba tern, na estrada percorrida, varias centenas de metros de espessura.
Furmacao Diamantino - A FormacaoDiamantino apresenta-se as faldas da serra doRoncador, onde se mostra intensamente dobrada , ou nos altos dela, onde suas camadas saosub-horizontals. Sao numerosas suas exposi~6es nos cortes da estrada, nas gargantas doscorregos que descem a serra ou em afloramentos esparsos, nos campos de seus altos ou leitos dos rios que os drenam. Sua rocha maiscaracteristica e urn arcosio arenoso macico, degranulaeao fina e uniforme, cor vermelha nasexposicoes de rocha alterada e muito caracteristica esfoliacao esferoidal. Dificilmente deixaperceber qualquer estratificacao, a menos queinclua leitos de litologia diferente. Marcas deonda sao localmente observaveis. A cor original da rocha parece cinza escuro ou cinza avermelhado escuro, e quando assim se mostra ede extrema resistencia ao choque do martelo.o aspecto macico da rocha predomina nas exposicoes das escarpas da serra, em horizontesdo alto da formacao. Os horizontes inferioresapresentam litologia variada, em que se alternam, as vezes ritmicamente, arenitos, arcosios,siltitos e folhelhos.
Entre as poucas estruturas notaveis observadas na formacao chama atencao a freqiientepresenea de aparas de folhelho (clay galls) nosarcosios, Suas dimens6es variam de milimetrosa pouco mais de urn palmo, sendo subangularesa bern arredondadas, mas sempre de baixa esfericidade. Disp6em-se em posicoes subparalelasao acamamento, lembrando as vezes fragmentos pouco deslocados de mud cracks; outrasvezes, foram claramente transportados, com 0
que adquiriram formas arredondas. Localmenteconstituem delgados leitos de conglomerado intraformacional.
Grupo Chapada - As camadas do GrupoChapada, que tao grande desenvolvimentoapresentam na alta bacia do rio das Mortesacima da cachoeira da Fumaca, estendem-sedali para norte, para constituirem estreita elonga cobertura tabular na serra do Roncador,como representada no mapa da PROSPEC. Tivemos oportunidade de examinar, nao longe dasnascentes do rio Suia-Missu, pared6es de are-
28 BOL. DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE GEOLOGIA - V. 18, N'-' 1, 1969
nitos argilosos brancos, com estratiftcacao cruzada e atitude sub-horizontal, que em nada sedistinguem dos que se mostram nos blocos defalha da alta bacia do rio Pindaiba e na serrada Fogaca proximo a Aragarcas,
Ao atingir 0 alto da serra do Roncador, aestrada que se dirige de Xavantina para Garapu atravessa pequena espessura desses mesmos arenitos, que com atitude proxlmamentehorizontal recobrem, discordantemente, os arcosios da Formacao Diamantino. Desse local emdlrecao as nascentes do rio Suia-Missu acumieira da serra acha-se revestida de are6esorlginarios dos arenitos devonianos, que somuito localmente se exp5em em rochedos isolados, Nesse mesmo trajeto atravessamos trechos constituidos de folhelhos da parte superior do Grupo Chapada, correlativos do Folhelho Ponta Grossa. Sua area de ocorrenciacaracteriza-se pela presenca de extrema abundancia de chapinhas de canga no solo, produtode generalizada lateritizacao, f'enomeno tipicodas areas de ocorrencia dos folhelhos devonianos na regiao Centro-Oeste. Sobrevoando-se aserra, percebe-se claramente a topografia tipicados folhelhos, destacando-se discretamente noplanalto arenitico.
Estrutura - Na serra do Roncador as camadas da Formacao Diamantino apresentamse simplesmente onduladas, quando nao subhorizontais em grandes extens6es, como as vimos na alta bacia do rio Mangarura. Uns poucos quilometros a suI da testa da serra, todavia, as mesmas camadas, e bern asim as daFormacao Sepotuba, acham-se intensamentedobradas, nao raro em atitude vertical. Os folhelhos adquirern, entao, aspecto de ardosias,se bern que tipica clivagem ardosiana nao hajasido observada. Veios de quartzo Ieitoso, podendo ter alguns centimetros de espessura, tornam-se freqiientes nas areas de mais intensadef'ormacao, dispondo-se em atitude subvertical,preenchendo fraturas que predominantementese orientam em posicoes quase normais a dire<;ao das camadas. Tais veios tambern existemna area dos filitos do Grupo Cuiaba, onde sao,
porem, incomparavelmente mais abundantes eespessos, resultando do metamorfismo que suasrochas manifestam.
As direc;6es dos dobramentos do GrupeAlto Paraguai a norte de Xavantina sao vizinhas de ENE, aparentemente em discordanciacom as do Grupo Cuiaba, rna is proximas dadirecao NE. As condicoes precarlas de observacao na area de contato dos dois grupos nao
nos permitiram comprovar no campo tal discordancia angular.
Embora os dobramentos do Grupo Alto Pa,raguai exercam decidida influencia no tracadodos menores coletores da drenagem da regiao,por falta de camadas suficientemente competentes nao suportam qualquer relevo estrutural.Importa notar, porem, que 0 fronte escarpadoda serra do Roncador aproximadamente coincide com a posicao em que os intensos dobramentos cedem lugar a camadas da FormacaoDiamantino em atitude sub-horizontal. A serra.de tal modo, nao e sornente urn divisor deaguas das bacias dos rios Xingu e das Mortes, mas aproximadamente assinala urn limiteestrutural e geotectonico, qual seja a borda domiogeossinclineo Paraguai-Araguaia em contatocom a cobertura nao holomorficamente dobradado craton do Guapore, numa perfeita replica doque temos observado na bacia do alto rio Paraguai a oeste da Provincia Serrana (F. F. M.de Almeida, 1964) e a borda suI do PlanaltoDaniel (W. T. Hennies, 1967), em Mato Grosso, e a Serra Geral de Golas, a leste do vale dorio Parana (F. F. M. de Almeida, 1967). A Fig.9 do Relatorio Anual do Diretor da Divisao deGeologia e Mineralogia do D. N. P. M. para1959, e reproducao de uma fotografia aereaobliqua em que claramente se podern observaras vertentes festonadas da serra do Roncadorcoroadas pelas camadas sub-horizontais do arenito devoniano. 0 que na respectiva legendase aponta como sendo «xistos quartziticos defraca inclinacao» corresponde a Formacao Diamantino. Tal paisagern, sobrevoada por nos,apresenta atraves da rala vegetacao campes
tre, a coloraeao avermelhada tipica da area de
ocorrencia dessa formacao.
Vale do rio Sete de Setembro
o rio Sete de Setembro, 0 principal afluente da margem direita do rio Culuene, tern seusmananciais na serra do Roncador, a cerca de450 metros de altitude. Seu alto curso drenaarea de rochas da Formacao Diamantino pertencentes a cobertura da plataforma do Guapore. A cerca de 30 qullornetros a noroeste daborda da serra, nas proximidades da fazendaSete de Setembro, 0 rio penetra na area doGrupo Chapada, estreitando-se seu vale entreos rebordos festonados do planalto arenoso, elevado de uma centena de metros, que a rio atravessa em angusta passagem conseqiiente. A jusante desse local, passa a percorrer regiao derelevo colinoso baixo, em que a superficie do
F. F'. M. DE ALMEIDA e W. T. HENNIES - Reconhecimento geologico ... 29
solo se acha coberta de chapinhas de cangaindicando a presenca dos folhelhos devonianos,que nao afloram na estrada. Penetra entao 0
rio, ja a uns 30 quilometros a montante deGarapu, numa area de geologia dlversa, em queos morros sao constituidos de camadas aparentemente concordantes com as devonianas, dearenitos e siltitos ferruginosos, com coloracoesviolacea de intemperismo. Sua espessura totaldeve exceder 100 metros. No alto dos morrosmais proxlmos da estrada, incluem-se nessessedimentos, camadas de minerio de ferro oolitico muito parecido com 0 que em 1961 examinamos nas Iorrnacoes paleozoicas da bacia dorio Jatapu, no Amazonas. Constituem-se deoolites esterrcos, ou elipsoidais mais ou menosalongados, uns aos outros unidos POI' cimentoIerrugtnoso, sem que m atriz os sepa re. Sao notaveis essas rochas pela uniformidade granulemetrica, pois os oolitos, no material que examinamos, tern diametro compreendido entre 0,2e 0,5 milimetros. Ao microscopic os granulesdenunciam estrutura interna concentrica e deIicado zoneamento. Parece consistirem constituiGao de hematita e goetita, sem que se mostremagnetita, mineral componente de parte apreclavel do rmnerio do Jatapu. A goetita formacristais vermelhos, com clivagens e gemlnacaotipicas, podendo urn so cristal constituir todoa oolito. Nao notamos sulf etos nem carbonatos,no material examinado, todo constituido de oxidos e hidroxidos de ferro, com granules dequartzo em porcentagens variaveis,
Na interpretacao fotogeologica da regiaodo Alto Xingu e rio das Mortes, de autoria deO. Barbosa e E. H . G. Braun, e indicada apresenea do Grupo Aquidauana nas proximidades do local onde encontramos 0 minerio deferro oolitico. Embora nos pareca improvavelque tal grupo se estenda a norte do paralelo15"S, e possivel a presenca de camadas carboniferas no media vale do rio Sete de Setcmbro.
assim como assinalado no referido mapa em
relacao as nascentes do rio Suia-Missu, e a elas
pertenceria 0 minerio de ferro descrito. So es
tudos futuros permltirao fazer-se ldeia de pos
sivels reservas desse minerio nessa remota re
giao, POI' ora despovoada e de dificil acesso.
A baixa bacia do rio Sete de Setembrocornpreende-se na vasta depressao sedimentarcenozoica do Alto Xingu. As margens do rioapresentam-se camadas areno-argilosos poucoconsistentes, em tudo comparaveis as que acirna descrevemos do vale do rio das Mortes. Suportam relevo tabular erodido pel a drenagem
moderna, nele se expondo ate cerca de 30 metros de espessura de tais sedimentos. Pouco ajusante de Garapu 0 rio passa a percorrer planicie aluvial moderna, ainda em vias de as
soreamento, atraves da qual alcanca 0 rioCuluene.
Conclusdes
1 - Com a presente Investigacao ficoucomprovada a extensao das estruturas Para
guaides a bacia do rio das Mertes, onde estao
presentes dois de seus grupos tiplcos, Cuiaba
e Alto Paraguai, representando respectivamente
os estagios estruturais inferior e superior do
miogeossinclineo.
2 - Faltam. na reg lao, as sequencias car
bonatadas do Grupo Araras e a Formacao Rai
zama. Metaconglomerados localmente identifi
cados poderao representar 0 Grupo Jangada.
3 - A serra do Roncador, alern de ser
uma divisa geomorrologica, e tambem urn limite
estrutural e geotect6nico, assinalando aproxi
madamente a borda do geossinclineo Paraguai
Araguaia em contato com a plataforma do
Ouapore.
4 - Confirma-se a extensao das forma
C;6es devonianas do Grupo Chapada a da serra
do Roncador.
5 - Comprova-se a vasta extensao de 1.600
quilornetros da faixa de ocorrencia do Grupo
Alto Paraguai, que assinala grande foredeep
desenvolvido a borda da plataforma do Guapore
no estagio tardio da tecto-orogenese Brasiliana
na regiao Centro-Oeste.
6 - Com a presente investigacao mais se
destaca a semelhanca geotect6nica entre os mio
geossinclineos Paraguai-Araguaia e Brasilia,
mostrando-se que as serras do Roncador e Ge
ral de Golas assinalam a posicao das bordas
dos respectivos forelands, onde as faixas de
clobramentos orogenicos cedem lugar a defer
macoes menos intensas, tipicas de plataforma.
7 -- Abre-se a possibilidade de ocorrerem
na alta bacia do rio Xingu, mlnerios de ferro
ooliticos de idade paleozoica, semelhantcs aos
do Estado do Amazonas.
30 BOL. DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE GEOLOGIA - V. 18, NQ 1, 1969
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA, F. F. M. de (1948) - Contribui~ao flgeologia dos Estados de Goias e Mato Grosso.Dlv. Gool. Mlnetalogla, D. N. P . M., Notas PrelEstudos nQ 46, 16 p. Rio de .Janeiro.- (1964) - Geologia do Centro-Oeste MatoGrossense. Div . Geol. Mineralogia, D. N. P. M.,Bol. nv 215, 137 p. Rio de .Janeiro.- (1967) - Evolu~ao tectOnlca do Centro-Oestebrasileiro no Proteroz6ieo Superior. Simp6siosObre 0 Manto Superior. Anals Acad . Bras. CI~n
clas (no prelo) ,BARBOSA, O. e E . H. G. BRAUN (1960) - Mapa
geol6gico da regiiio do Alto Xlngu e rio das
Mortes. Dlv. Geol. Mineralogia, D. N. P. M.,ReI. Anual do Dlretor para 1959, Fig. 20. Riode .Janeiro.
BEURLEN, K. (1959) - Geologia da zona de Barrado Gar~as a Chavantina. Div . Geol. Mlneralogla,D. N. P. M.. Bo!. nQ 193, 56 P. Rio de .Janeiro.
CASTER, K. E . (1947) - Expedi~ll.o geol6gica emGoias e Mato Grosso. Min . Metalurgia, v, XII,nv 69, p, 126-127. Sao Paulo.
HENNIES, W. T. (1967) - Geologia do CentroNorte Mato-Grossense. Esoola Pulitecnlca Unlv.Sao Paulo, Dep. Eng. Minas. 65 p., mapa. (teseInedita), Sll.o Paulo.