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Representações sobre “casamentos de contrato” no sertão baiano
Vânia Nara Pereira Vasconcelos*
Este texto analisa práticas e representações em torno dos “casamentos de contratos”1
realizados por Dona Farailda na década de 1980 em Serrolândia.2 Esta senhora, que se tornou
lendária por ter-se casado sete vezes ao longo da sua vida, também ficou bastante conhecida
como “casamenteira” por realizar essa prática. Em entrevista, contou detalhadamente como
iniciou sua experiência como “juíza” desses casamentos:
Eu comecei porque eu conheci...[...] Tinha um cartório em Gavião (cidade
vizinha a Serrolândia) e a Dona Júlia e seu Pantaleão era quem fazia o
casamento lá. Então teve uma pessoa, [...] que eu fui testemunha dessa
pessoa, eu levei no Gavião, [...] todo mundo sabia que eu acompanhava e
fizemos linha, quando é um dia nós foi pro casamento... [...] Quando é um
dia o guarda nos pegou na estrada [...]. Ai nós chegamos atrasados no
cartório. Depois que terminou o casamento, a Dona Júlia falou: “Dona
Farailda a senhora é representante do povo lá de Serrolândia, que vem pra
aqui sempre trazer, porque a senhora não põe um cartório lá?” Eu disse
assim: “Eu não posso mulher, como é que eu ponho lá?” Ela disse pra mim:
“Você não tem suas amizades lá com o cartório civil?” Eu digo: “Tenho”.
[...] Ai ela disse: “Você vai lá no cartório e você conversa com alguém no
cartório e você explica, que esse casamento aqui só pra gente de maior, aqui
não se casa moça, nem rapazinho, se casa porque é viúvo, é largado”. [...]
Disse oh: “Ninguém vai lhe bulir, a senhora sendo acertada pelo juiz de paz,
pela mulher do cartório e pelo sargento ai, você vai abrir seu cartório em
sua casa”. (Dona Farailda, 13.04.2006)
Na versão de Dona Farailda ela teria estabelecido um acordo com o Juiz de Paz e a
Escrivã do Cartório de Serrolândia para realizar os “casamentos de contrato”. Segundo ela,
eles eram uma alternativa para as pessoas “largadas” (separadas não oficialmente), que não
podiam se casar oficialmente, pois ainda não haviam conseguido o divórcio:
Agora ai eu fui em Nini. Nini disse: “Cuide de tu mulher, aqui é o seguinte,
na hora que chegar uma moça em tua casa procurando casar, você manda
pro meu cartório. Na hora que chegar uma aqui largada, que não seja
divorciada eu mando pra você...” Que a pessoa tendo o divórcio pra casar
no civil casava, não tendo o divórcio, voltava pra minha casa. Eu tendo
minha filha eu não queria ver ela amigada. [...] Que era pra não ter aquele
nome de ficar amigado. (Idem).
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A escrivã do Cartório citada nesse trecho da entrevista contrariou esta versão e
afirmou nunca ter concordado com a realização desse tipo de casamento. De acordo com ela,
os juízes condenavam esse tipo de prática, no entanto os casamentos continuavam sendo
feitos.
Em entrevista, Dona Nilda (15.11.2011) contou que um homem que havia se casado
com o contrato foi surpreendido ao descobrir que o ritual não possuía validade jurídica, o que
levou o juiz a interrogá-la a respeito do assunto, levando-a a contatar as filhas de Dona
Farailda para alertá-las do risco de sua mãe ser presa.
Não é possível saber ao certo qual o grau de tolerância da justiça frente a uma prática
que contrariava suas regras. No entanto, o que me interessa aqui é problematizar a disputa de
representações, ou a “luta de representações” (CHARTIER, 2002, p. 61-79), acerca do
casamento. No discurso de Dona Farailda está muito presente a idéia de que os “casamentos
de contrato” tinham uma função social, ajudando as pessoas a fugirem do estigma de serem
“amigadas”. Esse termo, usado por várias depoentes, refere-se à União Consensual, estado
conjugal no qual a pessoa vive em companhia de cônjuge com quem não contraiu casamento
civil ou religioso. De acordo com elas as pessoas nessa condição eram discriminadas
socialmente.
É provável que os “casamentos de contrato” representassem uma alternativa para
pessoas de baixa renda que não tinham condições de arcar com as despesas do cartório e com
as roupas. De acordo com Dona Farailda:
[...] Eu era a juíza, porque eu era a juíza, porque eu sabia assinar e também
era de idade. Mas as meninas como tinha leitura, Neli cansou de preencher e
Lena batia na máquina. Saia tudo bonitinho, certinho [...] Eu já tinha o
vestido de noiva, até hoje ainda tenho a grinalda (risos) Alguém chegava lá
pra casar e eu alugava tudo. Entendeu? Tirava retrato. Tudo na minha casa.
Era uma festa. Apois, ali na pracinha enchia de carro, fazia até gosto! No
dia que era coisa de casamento, as meninas arrumava a casa. E nós fazia o
casamento ali. (Dona Farailda, 13.04.2006)
Apesar de produzirem uma descrição do ritual associando-o à festa, os entrevistados
não confirmaram esse elemento em sua experiência; todos disseram que o ritual era presidido
por Dona Farailda, que lhes fazia perguntas (eles não recordam quais), que havia
testemunhas para assinar o contrato, o que para eles garantia a validade do casamento, apesar
de nenhum ter afirmado haver comemoração após a cerimônia.
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É interessante a forma como ela explica ser a “juíza”, fazendo uma associação à sua
idade; essa justificativa parece estar pautada em valores de uma sociedade onde as pessoas
mais velhas são consideradas mais confiáveis, podendo exercer funções que provavelmente
não seriam atribuídas aos mais jovens. No contrato a que tive acesso, o qual analisarei mais
adiante, de fato ela assina como “juíza”. Quanto à informação de que suas filhas “batiam na
máquina” não pôde ser confirmada, pois encontrei um contrato manuscrito; entretanto, como
tive acesso apenas a um deles, é possível que houvesse uma variação na forma de escrita do
contrato.
Além de demonstrar a importância dada ao casamento, em sua entrevista Dona
Farailda deixou claro também que os “casamentos de contrato” constituíam uma forma de
sobrevivência para ela: “Tinha dia lá em casa, tinha semana de eu fazer cinco, seis
casamentos. Agora foi um ganha pão pra mim” (Idem).3 Sua filha apresenta outra versão,
afirmando que ela fazia os casamentos apenas para “ajudar as pessoas”, mas que estes não
constituíam uma fonte de renda (Elenita, 28.05.2010).
Levando em conta que a memória é seletiva e que geralmente relatamos aquilo que
nos interessa narrar, visto que a narrativa se faz no presente a respeito do passado (POLLAK,
1992, p. 200-215), é provável que sua filha prefira referir-se aos casamentos realizados por
sua mãe (condenados pela justiça de acordo com Dona Nilda) como um ato de bondade, ao
invés de lembrá-lo como uma espécie de trabalho remunerado.
Duas entrevistadas, sendo uma delas a escrivã citada acima, afirmaram que apesar dos
“casamentos de contrato” não terem nenhuma validade jurídica, eles eram realizados com
certa frequência. De acordo com Suzana:
O povo era muito bobo. O povo pagava e achava que aquilo tinha validade.
Além disso, ela não podia ver ninguém sozinho que ela queria fazer um
casamento. [...] O casamento era de gente solteira. Tinha validade assim pra
eles. [...] No dia do casamento era na casa dela, ela era a anfitriã da festa, aí
tinha ki-suco, bolo, o que tiver. Ela fazia tudo, tudo, ela era a juíza (Suzana,
28.02.2006)
A visão de que o povo era enganado por Dona Farailda pode ser facilmente
contrariada quando ouvimos os próprios sujeitos que vivenciaram essa experiência.
Entrevistei algumas pessoas que se casaram no “casamento de contrato” realizado por ela. As
memórias e representações acerca dessa experiência são diversas: Célia e Severino, que se
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casaram em 1983, ao serem questionados sobre a validade daquele casamento me olharam
surpresos, visto que para eles a minha pergunta não fazia nenhum sentido:
Severino: Nunca vi. Nós não sabe se... (...) Nós não procurou saber sobre
isso aí, na época. (28.05.2010)
Célia: Nós queria mermo...ter assim...(...) Um papel...pra mode
dizer...casemo. Pra não ficar em vão de tudo...(...) Tem que casar... Ficar
sem casar... A maioria hoje não quer casar não, né? Ai... meu sonho era
casar. Mas casemo, graças a Deus! (28.05.2010)
Nesse trecho da entrevista eles reforçam a idéia defendida por Dona Farailda de que
as pessoas atribuíam muita importância ao casamento e provavelmente não gostavam de ser
apontados como “amigados”, uma vez que estão juntos há 33 anos e nunca procuraram outra
forma de oficializar a união. Quando lhes perguntei se gostariam de casar-se na Igreja, ele
respondeu: “Nunca casemo. É pra casar e nunca tivemos tempo de casar. Tem que
frequentar...” (Idem). Guardam até hoje o contrato, que tem para eles o mesmo valor da
certidão de casamento civil para a maioria das pessoas.
O motivo que os levou a procurar Dona Farailda não foi nenhum tipo de limitação
jurídica relacionada com casamentos anteriores, mas o fato de ele não possuir documentos de
identidade, necessários para uma cerimônia oficial (civil ou religiosa). De acordo com ele,
seus documentos foram perdidos em uma viagem e ao retornar queria muito casar-se com
Célia, pois não gostaria de “amigar-se” com ela; entretanto não era possível conseguir a
autorização para o casamento civil sem os devidos documentos. Isso nos faz refletir que
provavelmente as razões que levavam casais pobres a se casarem com Dona Farailda eram
diversas, não se limitando apenas aos argumentos por ela apresentados.
Dona Odália (03.08.2010), que era viúva quando se casou no “casamento de contrato”
em 1984, ficou viúva novamente e agora vive em companhia de seu Raimundo, apresenta um
discurso ambíguo. Ao mesmo tempo em que considera a experiência importante em sua vida,
fala desconfiada da validade do “casamento de contrato” realizado por Dona Farailda. Para
compreender a desconfiança que aparece em sua fala temos que levar em conta que esta traz
a visão do presente sobre uma experiência do passado. Provavelmente para ela essa não era
uma questão relevante no momento em que se casou.
De acordo com Dona Farailda, o “contrato” possuía a vantagem de poder ser desfeito
ou renovado, sem precisar de divórcio: “Comercial mesmo. [...] Quem quer passar um
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contrato, faça de dez anos, faça de cinco anos, faça de um ano. [...] Renovava se quisesse, se
vivesse bem, se não, não tinha divórcio” (13.04.2006). Essa informação não foi comprovada
quando tive acesso a um dos contratos; nele não consta nenhuma referência ao prazo em que
os casais deveriam ficar casados. Eis a única referência à duração do casamento: “O presente
contrato terá duração vitalícia começando a vigorar da presente data em diante”.4
Apresentarei a seguir o contrato de casamento de Maria Célia Nascimento Santos e
Severino Daniel Amorim Costa, citado acima, para uma análise mais aprofundada dessa
fonte:
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É possível perceber que o contrato que Dona Farailda utilizava para realizar os
casamentos não foi elaborado por ela, sendo um “contrato de mútua assistência”, com termos
oficiais e que se refere “as penas da lei”; evidentemente isso parece muito irônico, se
pensarmos que o casamento realizado por ela não tinha nenhuma ligação com a Justiça
oficial. O trecho que primeiro chama atenção está no segundo parágrafo e se refere ao local
onde o contrato teria sido realizado: “República dos Estados Unidos do Brasil”. Apesar de o
contrato ter sido assinado em 1983, o texto é muito anterior, visto que esse termo só foi
utilizado até 1967, quando o Brasil passou a se chamar “República Federativa do Brasil”.5
A segunda questão de que eu gostaria de tratar aqui diz respeito à definição de papéis
de gênero presentes no contrato. Está muito claro que as funções das mulheres no casamento
são distintas das dos homens; enquanto estes são idealizados como mantenedores, elas
deveriam “viver honestamente (...) prestando obediência, acatamento e respeito”. Embora o
contrato subverta as regras jurídicas, visto não ter “validade legal”, ele reafirma papéis
“tradicionais” de gênero mais claramente que a certidão de casamento civil.
A definição de papéis de gênero está ligada a uma concepção de separação das esferas
pública e privada, tradicionalmente definidas como pertencentes ao campo do masculino e do
feminino, respectivamente. Historicamente as feministas vêm desconstruindo essa
perspectiva, mostrando que a dicotomia das esferas não passa de uma criação da sociedade
androcêntrica, visto que não é mais possível refletir sobre as sociedades sem compreender a
relação existente entre elas. Michelle Perrot, em Mulheres Públicas, discute a relação
existente entre homem público/poder político e mulher pública/prostituta (PERROT, 1998).
Amparo Sardà analisa como o discurso acadêmico supervaloriza o espaço público em
detrimento do privado, criando uma hierarquia para as relações de gênero e justificando a
inferioridade da mulher por esta se encontrar historicamente mais próxima do espaço
privado. Esta autora questiona a dicotomia público / privado, e considera que estas esferas
estão extremamente relacionadas, não sendo possível analisá-las de forma tão separada.
Critica, ainda, esse discurso por empobrecer a análise sobre o público, pois ao excluir o
privado do processo não consegue perceber as relações entre as duas esferas, perdendo de
vista as transformações históricas (SARDÀ, 1991, p. 87-99).
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Casamentos de contrato – um costume em comum
O historiador Edward Thompson apresenta em Costumes em Comum a “venda de
esposas” como um costume das camadas populares inglesas dos séculos XVIII e XIX
(THOMPSON, 1998, p. 305-352). O autor se refere ao ritual, visto por muitos como
leviandade dos pobres em relação ao casamento, como “divórcio popular”. Segundo
Thompson, no rito “a esposa podia ser levada ao mercado puxada por uma corda, ou a corda
podia aparecer no momento da venda” (Idem, ibidem, p. 317) e era entregue assim ao
comprador. Havia a aparência de um leilão e a troca de algum dinheiro.
Essa prática pode parecer aos nossos olhos contemporâneos algo absolutamente
condenável; o próprio autor vai mostrar que havia uma literatura na Inglaterra que criticava
tal costume, reduzindo-o à “compra direta de um bem”, mas, para Thompson, “uma vez
estabelecido o estereótipo, é demasiado fácil interpretar a evidência por meio do clichê”
(Idem, ibidem, p. 306).
Assim, o historiador inglês nos convida a atentar para outros aspectos daquele ritual:
em primeiro lugar mostra que, ao invés de descaso, esse ritual pode ser interpretado como
uma forma de valorização do casamento e, além disso, o fato de ser necessário o
consentimento da comunidade para a realização do mesmo demonstra certa autonomia da
cultura plebeia em relação às camadas mais abastadas. Pode ainda ser considerada uma
possibilidade de formalização do divórcio, visto que a maioria da população não tinha acesso
a ele naquela sociedade. De acordo com Thompson: “Fica claro (...) que temos de retirar a
‘venda de esposas’ da categoria de uma brutal venda de gado e colocá-la na do divórcio
seguido de novo casamento” (Idem, ibidem, p. 323).
Sem querer cometer nenhum anacronismo, pois é necessário considerar as diferenças
entre a sociedade inglesa dos séculos XVIII e XIX e o sertão baiano da segunda metade do
século passado, sugiro que os “casamentos de contrato”, realizados por Dona Farailda, são
uma espécie de “costume em comum”. Considero que essa prática foi “inventada” por
sujeitos que não tinham acesso às instituições do casamento e do divórcio, mas
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compartilhavam da importância desses valores, de forma que essa população excluída passou
a utilizar um ritual considerado “sem validade” para as autoridades jurídicas, mas aceito por
eles.
Na introdução do livro citado acima, Thompson discute o conceito de costume em
comum, levantando problemáticas que me interessam muito para pensar sobre o ritual
realizado pela “casamenteira” do sertão da Bahia. Ao analisar os costumes da sociedade rural
inglesa, argumenta que esta possuía normas próprias, contrariando a ideia de que seguia
regras impostas pelas camadas mais abastadas e urbanas. Thompson também chama atenção
para o fato de essa população reforçar costumes conservadores, ligados a uma “cultura
tradicional”, ao mesmo tempo em que tinha práticas rebeldes; nesse sentido, ela se
apropriava de regras “oficiais” para criar as suas próprias. O autor defende ainda que os
trabalhadores ingleses do século XVIII tinham regras invisíveis e que a cultura “do povo” é
imbuída de interesses próprios, rompendo com a imagem de vitimização e resignação desta.
Muitos desses argumentos me interessam para pensar sobre como uma sociedade,
também predominantemente rural, “inventou” ou “recriou” um ritual de “casamento
popular”, procurando compreender quais as razões que levaram a população pobre de
Serrolândia a procurar os serviços de casamento de Dona Farailda. Pretendo fazer essa
análise rompendo com a ideia (muito presente no imaginário dos entrevistados) de que essa
população era ingênua, sendo enganada pela “casamenteira” citada, tentando compreender
como esse ritual lhe interessava por motivos diversos, pautados em interesses próprios. Outra
contribuição de Thompson será a de fazer pensar como essa população reafirma valores
“conservadores/tradicionais”, como o casamento, criando uma prática rebelde, que afrontava
a Justiça e era desconsiderada e criticada por parte da sociedade serrolandense.
Mesmo sem “validade jurídica”, os “casamentos de contrato” feitos por Dona
Farailda, sobreviveram em Serrolândia provavelmente até o final da década de 1980. De
acordo com seu depoimento, ela parou de realizar o ritual quando, em 1988, casou-se (pela
sexta vez) com um senhor evangélico que lhe sugeriu não continuar com a prática:
(...) Eu digo, não minha filha, meu marido era presbítero e ele não deixou eu
nem terminar. Não fazer mais depois que eu casei com ele. (...) porque ele
dizia: “Nós dois somos crente, nós não pode vacilar, porque isso ai é um
comércio, Deus não quer isso não”. Parei, vim pra cá, não fiz mais. Me
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telefonaram pra saber se eu ainda tava fazendo casamento... (Dona Farailda,
13.04.2006)
A existência dos “casamentos de contrato” leva-nos a refletir sobre a importância que
o casamento tinha para as camadas populares nessa sociedade; ela sugere, igualmente, que a
realização de um ritual de união entre os casais ainda era imprescindível para aquela
comunidade, independentemente de seu aspecto legal. Também o temor de ser apontado
como “amigado”6 pode ser uma das razões para sua existência, como discutido acima. Ao
realizar essa prática Dona Farailda reinventa, recria novas formas de exercício do poder,
atuando no espaço “do outro”: da Justiça e do Estado.
* Professora Adjunta do Campus V – UNEB e Doutora em História pela UFF. 1 Esses “casamentos de contrato” realizados por Dona Farailda não eram registrados em cartório, portanto não
tinham nenhuma validade jurídica; eram assim chamados pois ela elaborava um “contrato” que era assinado
pelos noivos. Ele não deve ser confundido com o contrato nupcial previsto pela lei para casamentos civis. O
antigo Código Civil (lei nº 3.071 de janeiro de 1916) já regulava as disposições sobre a liberdade dos nubentes
de estipular sobre os seus bens. Todos os casais, quando no enlace matrimonial no Civil, opinam (mesmo que
tacitamente) sobre o regime de bens, isso é um contrato nupcial. Assim como o anterior, o Novo Código Civil
brasileiro regula dando os critérios para o pacto antenupcial. Nada impede aos nubentes de determinar os
parâmetros que vigorarão em sua união civil, desde que esse acordo respeite o que rege a lei. 2 Serrolândia é um pequeno município do interior da Bahia, localizado no Piemonte da Chapada Diamantina, a
319,9 Km de Salvador, na região Norte. De acordo com o IBGE sua população estimada em 2016 era de 13.774
habitantes. 3 Apesar das informações desencontradas é possível afirmar que era cobrada uma taxa pelo serviço. 4 Trecho do contrato de casamento de Maria Célia Nascimento Santos e Severino Daniel Amorim Costa, 1983. 5 Em 1967, com a primeira Constituição da ditadura militar, o Brasil passou a chamar-se República Federativa
do Brasil, nome que a Constituição de 1988 conserva até hoje. Antes, na época do império, era Império do
Brasil e depois, com a proclamação da República, Estados Unidos do Brasil.
http://www.pt.wikipedia.org/wiki/Brasil 6 Em pesquisa realizada em Serrolândia foi possível perceber a discriminação sofrida por casais “amigados”, ou
seja, que viviam em União Consensual. (VASCONCELOS, 2007).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
CHARTIER, Roger. “Introdução: por uma sociologia histórica das práticas culturais”. In: A
História Cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1998.
_______________. “O mundo como representação”. In: À beira da falésia: a história entre
certezas e inquietudes. Porto Alegre: UFRGS, 2002. pp. 61-79.
PERROT, Michele. Minha História das Mulheres. São Paulo: Contexto, 2007.
_______________. Mulheres Públicas. São Paulo: UNESP, 1998.
12
POLLAK, Michael. “Memória e Identidade Social” In Estudos Históricos. Rio de janeiro.
Vol. 5, n. 10, 1992, 200-215.
_______________. “Memória, esquecimento, silêncio” In Estudos Históricos, vol. 2, nº 3.
1989.
SARDÀ, Amparo Moreno. “Em torno al androcentrismo en la história” In El arquétipo viril
protagonista de la história. Exercícios de lecturas no androcentrica. Cuadernos inacabados.
Barcelona: Universidad de Barcelona, 1991.
THOMPSON, E. P. Costumes em comum. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
VASCONCELOS, Vânia. Evas e Marias em Serrolândia: práticas e representações acerca
das mulheres em uma cidade do interior (1960-1990). Salvador: EGBA, Fundação Pedro
Calmon, 2007.