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TEMA 3. TRIBUTAÇÃO, ORÇAMENTOS E
SISTEMAS DE INFORMAÇÕES SOBRE
A ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA PÚBLICA.
SUBTEMA 3.4 – ELABORAÇÃO E EXECUÇÃO
ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA.
TÍTULO – A Realização Orçamentária e Financeira de
Emendas Orçamentárias e o seu Controle pelo Executivo
por Meio da (IN)Fidelidade Parlamentar.
2
RESUMO
Várias são as questões relacionadas às finanças públicas que afetam a
sociedade. Uma delas refere-se à necessidade de o Governo Federal,
periodicamente, ter que avaliar diferentes alternativas com a finalidade de atender a
demandas da sociedade. Os atendimentos a essas demandas são, em certos casos,
realizados por meio da execução orçamentária e financeira de emendas
orçamentárias individuais de parlamentares, configuradas como transferências
intergovernamentais voluntárias.
Essas transferências são freqüentemente utilizadas como “moeda” em um
mercado específico. Esse mercado é a arena política do Congresso Nacional e os
seus agentes são, de um lado, o “Núcleo” do Poder Executivo Federal, representado
pelos Ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Casa-Civil e, de outro, os
membros de partidos políticos que compõem a coalizão com o Governo Federal,
ocupando cargos nos ministérios ou cadeiras nas casas legislativas. O processo de
“alienação” entre os agentes tem como “moeda” a governança administrativa e a
governabilidade política.
O “Núcleo” do Executivo Federal oferta parte de sua governança
administrava ao possibilitar a realização orçamentária e financeira dessas emendas
pelos aliados que ocupam pastas ministeriais ou ao autorizar a execução delas
diretamente a seu favor. Por outro lado, os membros aliados são ofertantes de parte
da governabilidade política e, por meio de seus votos, esperam receber governança
administrativa concretizada na execução orçamentária de suas emendas em
benefício a seus redutos eleitorais.
O estudo se volta para a configuração dos fatores que dão sustentação à
hipótese do trabalho de que é possível o controle pelo Executivo da realização
3
orçamentária e financeira de emendas orçamentárias individuais de parlamentares.
Nesse sentido, busca-se estabelecer uma correlação entre esses fatores, por meio
de um indicador, denominado de Índice de (In)Fidelidade, e comprovar que o
“Núcleo” do Executivo Federal realmente dispõe de mecanismo institucional efetivo.
Uma série de variáveis é instituída para a construção de um modelo, objetivando
não só ratificar a hipótese, mas dar mais consistência. A pesquisa teve como
universo das informações a 51ª Legislatura (anos de 1999, 2000, 2001 e 2002),
referentes às observações das proposições de emendas orçamentárias individuais
às Leis Orçamentárias Anuais (LOA).
Diante dos resultados, pode-se afirmar que a realização orçamentária e
financeira dessas emendas atende às prioridades do “Núcleo” em detrimento a
critérios objetivos de alocação e distribuição de recursos públicos, evidenciando
distanciamentos de um hipotético ponto eficiente de Pareto. O direcionamento da
execução orçamentária e financeira para certas localidades não condiz com as
principais razões para sua existência e realização. Em outras palavras, significa
dizer que a realização orçamentária e financeira dessas emendas, controlada pelo
“Núcleo”, é uma espécie de “moeda” utilizada estrategicamente para a obtenção de
(maior) governabilidade ou outros benefícios particulares, em que o atendimento das
necessidades sociais é submetido a uma escala diferenciada de prioridades.
SUMÁRIO
I - INTRODUÇÃO........................................................................................................2
II – O CONTROLE DA EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA. .................6 2.1 - A LDO E A EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA.........................15 2.2 - A LOA E A EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA. ........................18 2.3 - CONTROLE DA EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA. ...............20 2.4 - O “NÚCLEO” COMO MONOPOLISTA...........................................................26
III – ANÁLISE EMPÍRICA .........................................................................................30 3.1 - PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS EM RELAÇÃO À HIPÓTESE........30
3.1.1 - Universo e Amostra.................................................................................30 3.1.2 – Coleta de Dados......................................................................................31 3.1.3 – Tratamento dos Dados e Critérios de Seleção........................................31
3.2. - BASE DE DADOS PARA O MODELO FINAL..............................................41 3.3 – RESULTADOS DA REGRESSÃO ................................................................49
IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................55
V - BIBLIOGRAFIA...................................................................................................58
2
I - INTRODUÇÃO
O panorama institucional sob o qual se desenvolve a execução
orçamentária e financeira no Brasil é complexo, no sentido de que se refere a um
jogo político de interesses. Na ótica disciplinar, a questão envolve fatos relacionados
às Finanças Públicas, ao Direito Financeiro, à Ciência Política e à Economia,
refletindo a amplitude do tema. No caso específico da realização orçamentária e
financeira de transferências intergovernamentais, as Voluntárias configuram-se
como uma de suas principais modalidades, estando contida nessas parte das
emendas orçamentárias individuais dos parlamentares. As demais transferências
intergovernamentais podem ser classificadas por determinação constitucional ou
legal, por repartição de receita tributária, ou para provisão de bens e serviços
públicos.
Este estudo trata de evidenciar a realização da execução orçamentária e
financeira de emendas individuais de parlamentares e o seu controle pelo Executivo
Federal, assim caracterizadas como espécies das transferências
intergovernamentais Voluntárias. Essas são consideradas transferências de recursos
públicos federais não vinculados e executadas pelos ministérios do Poder Executivo
Federal aos outros entes da Federação para o atendimento de demandas de
membros da Coalizão que ocupam cadeiras no Congresso Nacional.
As transferências intergovernamentais são caracterizadas por Filellini
(1989:62) como uma parcela das transferências governamentais que ocorrem entre
os entes da Federação e que explica grande parte dos gastos do Governo. Segundo
o autor, transferências intergovernamentais são representadas por pagamentos que:
3
não têm contrapartida direta na forma de mercadorias e serviços e
não são somados à equação do PIB. Explicam grande parte dos
gastos do Governo, mesmo porque incluem as transferências entre
diferentes níveis administrativos (da União para os Estados e de
ambos para os municípios), como também as coberturas dos déficits
de empresas públicas, autarquias e fundações.
Dessa caracterização, alguns aspectos levariam ao entendimento de que
essas transferências não se enquadrariam em nenhum tipo de relação econômica
que envolva um trade-off : a) falta de contrapartida direta sob forma de mercadorias
e serviços, não ensejando um fluxo correspondente de produção desses bens; b)
grande parte desses gastos ocorrem entre os próprios entes da Federação, ou seja,
representam transferências intergovernamentais sem, aparentemente, demanda ou
oferta.
Todavia, independentemente dessa leitura, verifica-se que parte das
transferências intergovernamentais, caracterizadas Voluntárias contêm as emendas
orçamentárias individuais sendo freqüentemente utilizadas como “moeda” em um
processo de “alienação” em um tipo de mercado específico e com agentes bem
definidos. Esse mercado é a arena política do Congresso Nacional e os agentes são,
de um lado, o “Núcleo” do Poder Executivo Federal, representado pelos Ministérios
da Fazenda, do Planejamento e da Casa-Civil e, do outro lado, os membros de
partidos políticos que compõem a coalizão com o Governo Federal, ocupando
cargos nos ministérios do Executivo ou cadeiras nas Casas Legislativas. Em linhas
gerais, esse processo de “alienação” entre esses agentes tem como “moeda” a
governança e a governabilidade, retratadas por Bresser Pereira (1997:45) da
seguinte forma:
4
A capacidade política de governar ou governabilidade deriva da
relação de legitimidade do Estado e do seu governo com a
sociedade, enquanto que governança é a capacidade financeira e
administrativa em sentido amplo de uma organização de implementar
suas políticas. Sem governabilidade é impossível governança, mas
esta pode ser muito deficiente em situações satisfatórias de
governabilidade.”(grifo nosso).
A “moeda” de troca é bem representada pela realização orçamentária e
financeira das emendas orçamentárias dos parlamentares, classificadas como um
das transferências intergovernamentais voluntárias, cuja negociação implica cessão
de bens entre os agentes. O “Núcleo” do Executivo Federal cede parte de sua
governança administrava, ao possibilitar a execução dessas emendas pelos aliados
que ocupam pastas ministeriais ou ao autorizar a execução delas diretamente. Tais
emendas são propostas pelos membros da coalizão que se encontram (titulares de
cadeiras) no Congresso em troca de governabilidade política. Por outro lado, os
membros aliados são ofertantes de boa parte de sua governabilidade política ao
Presidente, no Congresso Nacional com seus votos, e esperam receber parte da
governança administrativa, concretizada pela realização orçamentária e financeira
de emendas parlamentares, classificadas como transferências intergovernamentais
voluntárias do Executivo Federal aos outros entes da Federação, emendas em
benefício a seus redutos eleitorais.
A possibilidade de se controlar ou não a realização dessas emendas
depende da dotação institucional do País. Essa dotação, constituída por conjunto de
instituições formais, com normas gerais, regras específicas e procedimentos
definidos, pode tanto restringir como ampliar a atuação dos agentes públicos. Cada
País possui um conjunto de elementos que compõem sua dotação, com
características inerentes, constituindo um arcabouço institucional peculiar que pode
5
favorecer ou prejudicar a estabilidade do País. Seus componentes podem aumentar
ou reduzir a capacidade política de governabilidade ou a capacidade financeira e
administrativa de governança. O poder de realização dessas transferências é
autorizado ao Executivo pelo Legislativo, que se apropria dele justificando
adjetivações de “monopolista” e/ou “discriminador” a ele dirigido em face da
“perfomance” da realização orçamentária e financeira delas.
O capítulo 2 demonstra como a realização das emendas orçamentárias
individuais dos parlamentares, como transferências intergovernamentais voluntárias,
podem ser controladas, apontando a questão para seus reais motivos. Além disso,
evidencia que o controle da execução orçamentária e financeira, a partir de decretos
de contingenciamentos, possibilita o Executivo Federal utilizar-se estrategicamente
dessas emendas como “moeda” caracterizando-o como responsável direto pelo
direcionamento dado a sua execução. Ressalta, ainda, de modo a ficar inequívoca a
utilização de normativos (decretos de contingenciamento) para implementar o
controle sobre a execução orçamentária e financeira de emendas parlamentares.
O capítulo 3 desenvolve a metodologia e trata de apresentar o estudo
empírico, especificando os procedimentos metodológicos adotados, a partir da
hipótese. Neste capítulo é confirmada proposta voltando-se para a configuração dos
fatores que dão sustentação à hipótese do trabalho de que é possível o controle pelo
Executivo da realização orçamentária e financeira de emendas orçamentárias
individuais de parlamentares. Além disso, busca-se estabelecer uma correlação
entre esses fatores, por meio de um indicador, denominado de Índice de
(In)Fidelidade, de que o “Núcleo” do Executivo Federal realmente dispõe de
mecanismos efetivos para controlar a execução dessas emendas.
6
A conclusão, além de ressaltar a confirmação dos resultados da
hipótese, salienta as principais contribuições deste estudo, lança algumas questões
para discussão e sugere uma proposição de aperfeiçoamento para a execução
orçamentária e financeira.
II – O CONTROLE DA EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA.
A existência de um conjunto de normas gerais referentes ao Orçamento
Público, ao Direito Financeiro e às Finanças Públicas, evidencia se as instituições
orçamentárias se encontram estruturadas em relação à execução orçamentária e
financeira. Isto porque as normas dão sustentação a um arcabouço de regras
específicas para a execução orçamentária e financeira, e, se interligadas, voltam-se
para o disciplinamento de procedimentos orçamentários com finalidades precípuas.
O conjunto dessas regras e procedimentos ao lado de outras regras
também endereçadas a questões orçamentárias, e respectivos procedimentos,
compõem o aparato institucional normativo da execução do orçamentário no País,
de acordo com Alesina et al. (1996:256) para quem “Budgetary institutions are all the
rules and regulations according to which budgets are drafted, approved and
implemented.”
Instituições orçamentárias bem estruturadas são as resultantes de
arranjos institucionais harmônicos. Essa harmonia das normas, por seu turno, é
reflexo da não invasão de uma no objeto da outra ou, mesmo havendo, que se
chegue a um entendimento final que se sobreponha aos anteriores. Além disso, as
regras não podem ser conflitantes, da mesma forma que os procedimentos gerados
7
não podem ser incoerentes. O respeito a esse pressuposto requer uma interação
conceitual estreita que não dê margem a entendimentos ambíguos.
Para serem consideradas harmônicas, as normas gerais de um arranjo
institucional orçamentário devem ser predeterminadas e utilizadas, sobretudo, como
premissas invioláveis, no que tange ao alcance dos resultados orçamentários
pretendidos. Sem serem endógenas ao processo orçamentário, podem possibilitar o
estabelecimento de regras específicas e procedimentos que, se não conflitantes e
coerentes, tornam o processo ainda mais eficaz.
No Brasil, regras específicas e com procedimentos orçamentários
endógenos são utilizados na execução orçamentária e financeira, tanto nas
instituições orçamentárias privadas, quanto nas públicas, independentemente da
natureza jurídica das instituições, privada ou pública. Regras e procedimentos para
a execução dizem respeito à forma de obtenção, distribuição, funcionamento,
operacionalização e controle dos recursos indispensáveis à satisfação de objetivos
específicos. A diferença entre as instituições orçamentárias privadas e públicas
reside no fato de as regras e procedimentos das primeiras se voltarem para buscar
lucros, enquanto as utilizadas nas públicas, visam à satisfação de necessidades
coletivas.
Nas instituições orçamentárias públicas - diferentemente das privadas
onde o que não é vedado pode ser realizado - para que os objetivos sejam atingidos,
as regras e procedimentos orçamentários devem ser elaborados e determinados de
acordo com o previsto em lei. As duas leis que dispõem sobre o funcionamento
específico da execução orçamentária e financeira no setor púbico são a Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA). Ambas dão
abertura para os procedimentos que são regrados por decretos de programação
8
orçamentária e financeira, denominados de contingenciamentos, publicados a cada
exercício.
Em relação às normas gerais - referencial teórico das regras específicas
que por sua vez dão sustentação a procedimentos orçamentários para a execução
orçamentária e financeira - como instrumento da implementação da atividade
financeira do Estado, elas podem ser objeto de estudo do Direito Econômico, no
caso de pertencerem ao setor privado, ou do Direito Financeiro, caso seja públicas,
ou ainda, das Ciências das Finanças. Bastos (1998:17), diferenciando Ciência das
Finanças de Direito Financeiro, preconiza que:
Há, sem dúvida, uma diferença de enfoques entre a Ciência das
Finanças e o Direito Financeiro. O Direito Financeiro tem por objeto o
estudo das normas que compõem a organização e a estrutura
financeira do Estado. É necessariamente referido a um País sobre
cujo ordenamento jurídico se erige. É sempre individualizado. A
Ciência das Finanças tem por objeto os fenômenos financeiros, e a
sua metodologia é fundamentalmente descritiva e especulativa. Visa
também a formular leis, mas não ao modo das leis jurídicas.
Quando estudadas como ordenamento jurídico, regulamentando a
organização e estrutura financeira do Estado, essas normas, pertencem ao Direito
Financeiro; quando têm por objeto os fenômenos financeiros, baseados em
metodologia fundamentalmente descritiva e especulativa, pertencem à Ciência das
Finanças.
Em relação à Ciência das Finanças vale citar diferença entre as Finanças
Privadas e as Finanças Públicas, conforme aponta Miranda Gomes (2000:40):
9
Nas Finanças Privadas, o comando está sempre vinculado ao
binômio receita-despesa. Nas Finanças Públicas é o inverso, o
comando é o da despesa, porque esta representa a gama de
dispêndios utilizados pelo Estado para o atendimento das
necessidades públicas, ou seja, para a realização de seus próprios
fins. Por isso, a despesa é que determina a receita que será
necessária ao cumprimento de suas metas”. (grifo nosso)
Como o objeto deste estudo não se correlaciona nem com o Direito
Econômico1 nem com as Finanças Privadas a ênfase volta-se para as normas gerais
das instituições orçamentárias públicas que servem de suporte para regras e
procedimentos orçamentários relacionados com a execução orçamentária e
financeira.
No Brasil, o arranjo institucional orçamentário compõe-se de normas
gerais predeterminadas e de regras e procedimentos orçamentários endógenos ao
sistema e processo orçamentário. As normas gerais predeterminadas são aquelas
de natureza mais rígida, valendo a priori para qualquer orçamento que venha a ser
publicado, inclusive os que orientam e possibilitam o estabelecimento de regras e
procedimentos por todos os entes da Federação.
Além de dispositivos constitucionais2 relacionados com o Orçamento
Público, Direito Financeiro e Finanças Públicas que contribuem para a melhoria do
arranjo institucional orçamentário brasileiro, atualmente, duas leis dispõem sobre
normas gerais relativas a essas matérias: uma trata especificamente de Orçamento
e Direito Financeiro - a Lei nº. 4.320, de 17 de março de 1964; a outra trata de
1 Expressamente tratado pelos art. 170 a 181 da CF/88. 2 Arts. 163 a 169 da CF/88.
10
Finanças Públicas, a Lei Complementar nº. 101, de 04 de maio de 2000,
denominada de Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
A primeira “estatui normais gerais de direito financeiro para a elaboração
e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do
Distrito Federal” 3; a segunda “estabelece normas de finanças públicas voltadas para
a responsabilidade na gestão fiscal”.4
Mesmo com as matérias intimamente correlacionadas, não se pode
confundir essas leis, em seus objetos de estudo e campos de atuação. Ressalte-se,
no entanto, que apesar de a LRF não ter sido criada com o propósito de substituir a
Lei nº. 4.320/64, o fato de ser ela uma Lei Complementar, publicada posteriormente,
pode revogar essa naquilo que for contrário. Isso pode ocorrer ainda que o
dispositivo constitucional que trata das Finanças Públicas (art. 163) seja diverso
daquele que deu à Lei nº. 4.320/64 um status de lei complementar. Especificamente,
o dispositivo constitucional que permite alterar a Lei 4.320/64 por outra lei
complementar está previsto no art. 165, § 9º da Constituição Federal. Essas duas
leis e os dispositivos constitucionais regem as normas gerais das instituições
orçamentárias, válidas para todos os entes da Federação. Além disso, dão suporte
às várias regras e procedimentos orçamentários, estruturando o arranjo institucional
orçamentário do Brasil e dando sustentabilidade normativa para a execução
orçamentária e financeira.
Em relação a dispositivos dessas normas gerais relacionados à execução
orçamentária e financeira ocorreu uma extrapolação do objeto de estudo, já que um
dos dispositivos da LRF substituiu outro da Lei n.º 4.320/64. O art. 47 da Lei n.º
3 Ambas no artigo 1º das suas respectivas leis. 4 Ambas no artigo 1º das suas respectivas leis.
11
4.320/64 dispunha que “imediatamente após a promulgação da Lei de Orçamento e
com base nos limites nela fixados, o Poder Executivo aprovará um quadro de cotas
trimestrais da despesa que cada unidade orçamentária fica autorizada a utilizar”;
complementava com o art. 48, dispondo que
[...] a fixação das cotas a que se refere o artigo anterior atenderá aos
seguintes objetivos: a) assegurar às unidades orçamentárias, em
tempo útil a soma de recursos necessários e suficientes a melhor
execução do seu programa anual de trabalho; b) manter, durante o
exercício, na medida do possível o equilíbrio entre a receita
arrecadada e a despesa realizada, de modo a reduzir ao mínimo
eventuais insuficiências de tesouraria. (grifos do autor).
Observe que essa Lei, mesmo estabelecendo normas gerais de Direito
Financeiro para todas as esferas de governo, deixa uma subjetividade implícita
quanto à execução orçamentária e financeira, tanto que destina um poder amplo ao
Executivo, ensejando várias interpretações. Termos como “melhor” e “na medida do
possível” dão margem a possíveis ações discricionárias, já que sua medida vai
depender de conotações particulares.
Apesar de a LRF ter abrangido uma área além da sua - sem suprir a
lacuna de subjetividade deixada pela Lei nº. 4.320/64: criar algum critério ou
parâmetro para a execução orçamentária e financeira, principalmente, de despesas
não vinculadas, por exemplo - não se observou qualquer desarmonia entre elas. Isso
se deve ao fato de a LRF, mesmo sem buscar resolver aquela subjetividade, ao
estabelecer um novo procedimento geral para a execução orçamentária e financeira,
válido para todos os entes da Federação, aumentou, ao mesmo tempo, a rigidez da
12
operacionalização e a preponderância de controle dos Executivos sobre os
Legislativos nas três esferas de governo.
O art. 8º da LRF sobrepôs-se ao art. 48 da lei nº. 4.320/64, - que
apresentava o quadro de contas trimestrais -, revogando-o e definindo o comando
que sustenta a elaboração das regras e procedimentos específicos para a execução
orçamentária e financeira em toda a Federação. O antigo quadro foi substituído por
um cronograma de execução de desembolso e o prazo de operacionalização passou
de trimestral para mensal, observando-se uma maior rigidez do processo, como
vinculação a dispositivos da Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO. Porém, não
estabeleceu critérios para a alocação e distribuição dos recursos não vinculados.
Mas se a LRF não estabelece parâmetros relativos à alocação e distribuição de
recursos, por um lado, por outro possibilita a criação de regras específicas nos
termos dispostos pela LDO, no que tange à execução orçamentária e financeira,
aumentando a rigidez da execução orçamentária, bem como facilitando o controle
sobre ela pelo Executivo, conforme dispõe art. 8º da LRF,
Até trinta dias após a publicação dos orçamentos, nos termos em
que dispuser a lei de diretrizes orçamentárias e observado o disposto
na alínea c do inciso I do art. 4º, o Poder Executivo estabelecerá a
programação financeira e o cronograma de execução mensal de
desembolso [...].
Ressalte-se que a intenção de se criar algum critério objetivo para a
alocação e distribuição desses recursos estava respaldado no disposto na alínea “c”
do inciso I do art. 4º, da LRF, vetado pelo próprio Poder Executivo Federal. A
referida alínea expressava que a LDO, além de outros assuntos, também deveria
13
dispor sobre parâmetros para os Poderes, com vista à fixação, no
Projeto de lei orçamentária, dos montantes relativos a despesas com
pessoal e outras despesas correntes, inclusive serviços de terceiros,
com base na receita corrente líquida (grifo nosso).
Analisando a razão do veto, fica patente a intenção: o Executivo não
queria, na LRF, nenhum parâmetro que pudesse engessar a distribuição e alocação
de recursos públicos, já que assim justificou seu veto,
Estabelecer a priori parâmetros para a fixação de despesas, segundo
a sua natureza de gasto, sem levar em consideração as prioridades
da programação a ser atendida, contraria o interesse público, por
inflexibilizar a alocação dos recursos, dificultando o atendimento das
demandas da sociedade” (grifos nossos).
O veto e sua justificativa levantam os seguintes questionamentos: Não
flexibilizar a alocação dos recursos contrariaria o interesse público, dificultando o
atendimento das demandas da sociedade, ou contraria o interesse do “Núcleo” do
Poder Executivo Federal, dificultando o atendimento de sua cesta particular de
preferências?
Para fins deste estudo, considerar-se-á que o segundo questionamento –
não flexibilizar a alocação dos recursos contraria interesses do “Núcleo”, dificultando
o atendimento de sua cesta de preferências – tem como resposta, em tese, aquilo
que se busca demonstrar aqui: de que é possível o controle pelo Executivo da
realização orçamentária e financeira de emendas orçamentárias individuais de
parlamentares, configuradas como transferências intergovernamentais voluntárias
(ou alocação e distribuição de recursos não vinculados às fontes de recursos) e a
14
sua utilização como “moeda” de troca entre o Núcleo do Executivo e os membros da
Coalizão, na negociação pelas respectivas preferências.
As transferências intergovernamentais voluntárias, consideradas não
vinculadas, em linhas gerais, têm sido executadas em determinadas rubricas
orçamentárias, de acordo com as modalidades de aplicações específicas, sem
praticamente, seguir qualquer critério objetivo de distribuição ou alocação de
recursos. A falta de critérios ou parâmetros em normas gerais não significa que as
instituições orçamentárias não estejam estruturadas em relação à execução
orçamentária e financeira.
Pelo contrário, a abertura dada para o estabelecimento desses critérios
em regras específicas endógenas ao processo orçamentário exige que as
instituições orçamentárias estejam mais bem estruturadas ainda, para operarem
dentro do cronograma de execução mensal requerido e para atender ao comando da
norma geral de programação financeira observados pela LRF. Em relação a essas
duas leis pode-se afirmar que, apesar desse descompasso, atualmente, elas são
harmônicas entre si.
A conjugação do novo comando geral que dá sustentabilidade à
execução orçamentária e financeira, por meio de regras específicas publicadas em
cada exercício financeiro pela LDO e pela LOA, com os respectivos procedimentos,
detalhados nos decretos presidenciais que as regulamentam, propicia um ambiente
estruturado do ponto de vista da execução orçamentária e financeira. Essas leis
serão sempre palco de disputas, principalmente na Câmara dos Deputados, arena
política onde se iniciam e terminam as discussões sobre os projetos de lei de
iniciativa do Presidente da República. Isso porque as leis citadas estabelecem regras
15
específicas que influenciam o planejamento, elaboração, aprovação e,
principalmente, a execução do orçamento.
Uma vez aprovado o Plano Plurianual de Investimentos o PPA, a LOA
e a LDO ficam vinculadas a ele, já que tanto as emendas ao projeto de lei do
orçamento anual ou a projetos que o modifiquem, quanto as emendas ao projeto de
lei de diretrizes orçamentárias não poderão ser aprovadas se apresentarem
incompatíveis com ele. O PPA é também palco reforçador do cenário de
negociações, permitindo que se façam vinculações indiretas entre ele e as LDO e
LOA, com reflexos na execução orçamentária e financeira. Nessa ótica, o PPA
constitui, efetivamente, a primeira arena de negociações a ser controlada pelo
Executivo Federal. Por meio dos programas aprovados, ele cerceia e mapeia,
estrategicamente, a utilização da execução orçamentária e financeira, já visando
futuros orçamentos. Entretanto, os grandes palcos de negociações são quando das
propostas e aprovações das LDO e LOA.
2.1 - A LDO E A EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA.
A LDO é um instrumento de Planejamento Governamental como o
PPA, porém de menor repercussão, pois apenas tem validade para o exercício
financeiro subseqüente ao qual se refere. É considerada, atualmente, uma das
principais legislações relacionadas com a matéria orçamentária, pelo fato de suprir
lacunas de matérias orçamentárias existentes entre a Lei 4.320/64 e a LRF. Essas
lacunas são especialmente ocasionadas pela ausência de uma lei complementar
efetiva que regulamente o § 9 º do art. 165.
Em relação especificamente à execução orçamentária e financeira, as
últimas leis de diretrizes orçamentárias têm desempenhado um papel relevante. A
16
LDO para o exercício de 1999, Lei n.º 9.692,de 27 de julho de 1998, tendo por base
ainda o art. 48 da Lei. 4320/64, concedeu em seu corpo (art. 66) competência ao
Poder Executivo para:
elaborar e publicar cronograma anual de cotas bimestrais de
desembolso financeiro, consolidando as despesas classificadas em
"Outras Despesas Correntes", "Investimentos" e "Inversões
Financeiras" à conta de recursos do Tesouro, por órgão, agrupando-
se fontes vinculadas e não vinculadas a projetos e atividades.
Ainda no parágrafo único, ressalta que o cronograma e suas alterações
deverão explicitar os valores fixados na lei orçamentária e em seus créditos
adicionais, bem como os valores liberados para movimentação e empenho.
A LDO para 2000, Lei n.º 9.811,de 28 de julho de 1999 praticamente
ratificou em seu art. 77, o disposto na LDO anterior. Entretanto, expressou uma
maior preocupação com os restos a pagar, uma vez que o cronograma e suas
alterações deverão explicitar os restos a pagar relativos ao exercício de 1999. Da
mesma forma, explicitar-se-ão os fixados na lei orçamentária e em seus créditos
adicionais, bem como os valores liberados para movimentação e empenho.
Todavia, a partir de um dispositivo para a LOA de 1999, observou-se uma
inovação na LDO para o exercício de 2000. O art. 18 estabelece que a elaboração
do projeto, a aprovação e a execução da lei orçamentária de 2000 deverão levar em
conta a obtenção de superávit primário e que o Poder Executivo tomará as
providências necessárias para o cumprimento das metas de que trata o caput do
artigo, mediante ajuste do cronograma e dos limites para movimentação e empenho.
A partir da LDO para 2001, Lei n.º 9.995, de 25 de julho de 2000, todas
as LDO deveriam se ajustar às regras e procedimentos gerais da LRF. A LRF, por
17
meio do art. 9º, reforçou o disposto citado no art. 18, sobre a necessidade de
obtenção de superávit primário. Já o art. 75 dispõe, para os Poderes, sobre a
necessidade de elaboração e publicação, até trinta dias após a publicação da LOA
para 2001, de cronograma anual de desembolso mensal, por órgão, nos termos do
art. 8º da LFR, visando-se ao cumprimento da meta de resultado primário
estabelecida. Os atos deverão conter cronogramas de pagamentos mensais à conta
de recursos do Tesouro e de outras fontes, por órgão, contemplando limites para a
execução de despesas não financeiras.
A LDO para 2002, Lei n.º 10.266, de 24 de julho de 2001, também ratifica,
no art. 18, a necessidade de obtenção de superávit primário. Já o art. 72 dispõe que
os poderes deverão elaborar e publicar, até trinta dias após a publicação da LOA
para 2002, cronograma anual de desembolso mensal, por órgão, nos termos do art.
8, com vistas ao cumprimento da meta de resultado primário estabelecida nesta Lei.
A novidade da LDO para o exercício de 2002, decorrente também do expresso
inclusive na LOA para 2001, está no art. 34. § 9, quando se refere ao exercício de
2002, estabelecendo que a execução orçamentária e financeira das ações relativas
à programação de trabalho, executáveis na forma prevista neste artigo, e cujos
créditos orçamentários não identifiquem, nominalmente, a localidade beneficiada -
inclusive aquelas destinadas genericamente a Estado da Federação - fica
condicionada à prévia publicação, em órgão oficial de imprensa, dos critérios de
distribuição e respectivas alterações.
Apesar de essa ter sido a primeira tentativa de instituição de parâmetros
objetivos antes e durante a execução de recursos públicos federais, observe-se que
a execução orçamentária e financeira, regrada pelas LDO, estão voltadas para a
obtenção de superávites primários. Se esse é um motivo para que se estabeleça
18
inúmeros procedimentos de contingenciamento, por meio de decreto presidenciais,
não se pode enganar. Entretanto, sem esses contingenciamentos, a utilização pelo
“Núcleo” do Executivo Federal da execução orçamentária e financeira fica
fragilizada. O contingenciamento, ao estabelecer subtetos orçamentários e
financeiros, permite ao “Núcleo” do Executivo executar o que considerar prioritário
de seu ponto de vista.
2.2 - A LOA E A EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA.
A Lei Orçamentária Anual – LOA concorre para as grandes disputas
políticas do País. No período que será abordado, 51ª Legislatura foram quatro leis
orçamentárias anuais, dispondo sobre execução orçamentária e financeira. A LOA
para 1999, Lei n.º 9.789, de 23 de fevereiro de 1999, estimou a receita e fixou a
despesa da União para o exercício financeiro desse ano. Determinou, em seu art. 9º,
o atingimento de um superávit primário mínimo implícito nos Orçamentos Fiscal e da
Seguridade Social, para a execução orçamentária e financeira do exercício de 1999.
O Poder Executivo recebeu determinação de tomar as providências necessárias
para o cumprimento do disposto no caput desse artigo, mediante ajuste do
cronograma de desembolso financeiro e controle dos limites para movimentação e
empenho, de que trata o art. 66 da Lei no 9.692/98, LDO para 1999, observado o
que dispõe o respectivo parágrafo único.
A LOA para 2000, Lei n.º 9.969, de 11 de maio de 2000, nada
acrescentou do ponto de vista de regras para a execução orçamentária e financeira.
Entretanto, a Lei n.º 10.171, de 5 de janeiro de 2001, veio observar o que a LDO
estabeleceu, no art. 19, o condicionamento de empenho de despesas relativas a
ações - de localidades não identificadas nominalmente - à prévia publicação de
19
critérios de distribuição e respectivas alterações, principalmente no que ser refere
às transferências consideradas como Voluntárias. A principal inovação estava
expressa no art. 20, vedando a execução dos créditos orçamentários e suas
respectivas dotações, constantes dos anexos desta Lei, com o objetivo de influir
direta ou indiretamente na apreciação de proposições legislativas em tramitação no
Congresso Nacional. Houve uma disposição expressa no sentido de que a execução
orçamentária e financeira não pudesse influir na apreciação de proposições
legislativas.
A LOA para 2002, Lei n.º 10.407, de 10 de janeiro de 2002, não somente
ratificou a necessidade de deixar explícito que a execução orçamentária e financeira
não poderia influenciar na apreciação de proposições legislativas, como aprofundou
na questão; dispôs, no art. 14, que a execução dos créditos orçamentários
constantes dos anexos a essa Lei obedecerá aos princípios constitucionais da
impessoalidade e moralidade na Administração Pública, não podendo ser utilizada
com o objetivo de influir, direta ou indiretamente, na apreciação de proposições
legislativas em tramitação no Congresso Nacional.
Vale salientar que se a execução orçamentária e financeira não estivesse
sendo utilizada estrategicamente controlada pelo “Núcleo” do Poder Executivo
Federal não haveria necessidade de os legisladores deixarem expressa uma forma
rígida de utilização na própria peça orçamentária de maior disputa na arena
legislativa.
20
2.3 - CONTROLE DA EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA E FINANCEIRA.
Para o objetivo deste trabalho, a possibilidade de o Poder Executivo
controlar a execução orçamentária e financeira de recursos públicos não vinculados
representa um importante procedimento a investigar. A utilização da execução
orçamentária e financeira de emendas de parlamentares pelo “Núcleo” do Poder
Executivo como uma espécie de “moeda” não seria possível se ele não pudesse
controlar a respectiva realização orçamentária e financeira. Não adiantaria, apenas,
existirem normas gerais bem definidas em leis complementares, regras dispostas em
leis específicas e procedimentos em relação a matérias orçamentárias que
dispusessem sobre a classificação, realização e operacionalização da execução
orçamentária e financeira, se não existissem mecanismos capazes de permitir o seu
controle e o direcionamento de sua realização.
No Brasil, tais mecanismos e procedimentos existem e são publicados
anualmente por meio de decretos de contingenciamentos, nos termos da LRF e da
LDO. Os diversos decretos do Poder Executivo, visando contingenciar os recursos
públicos, têm pretextos diversos: inicialmente eram para cobrir o déficit das contas
públicas para equilibrar o orçamento; recentemente (nos últimos quatro anos), são
para atingir o superávites primários e também para equilibrar as contas públicas.
Por meio de contingenciamentos pelo “Núcleo” do Executivo Federal,
tendo em vista as regras e procedimentos orçamentários das instituições
orçamentárias, fixa-se um conjunto de preço/limites para a execução de tais
transferências intergovernamentais.
21
No início da década de 90, a execução orçamentária financeira anual
girava em torno de 50% do orçado5, o que evidenciava uma grande distorção entre o
orçado e o realizado; a diferença dos números expressava a irreal condução do
processo orçamentário. Diante da magnitude de um déficit potencial que se
vislumbrava e com o objetivo de evitar a sua materialização, a inflação e o
contingenciamento foram apontados como mecanismos para a solução de
problemas, apesar de tecnicamente não serem eficazes.
Em relação ao contingenciamento, porém, os motivos para a publicação
de tantos decretos anuais nesse sentido levam ao seguinte questionamento: ou não
existem métodos adequados para fixar as despesas de acordo com as estimativas
de arrecadação, ou as razões são outras, podendo-se, inclusive, citar a necessidade
de sua utilização, bem como do processo inflacionário, para reprimir despesas
orçadas. Segundo Bacha (1994:5),
A inflação ajuda de duas formas na redução do déficit orçamentário
ao valores efetivamente observados no fim do ano fiscal. Primeira, o
orçamento embute um previsão inflacionária bem menor do que a
inflação efetivamente observada. Isso reduz o valor real das
despesas executadas, mesmo sem controle do caixa. Já as receitas,
por estarem indexadas, pouco sofrem com a inflação maior do que a
orçada. Segunda, através do controle do caixa, o Ministério da
Fazenda adia a liberação das verbas orçamentárias para o final do
ano ou mesmo para os restos a pagar no ano seguinte, desse modo
fazendo com que o valor real dessas despesas seja adicionalmente
reduzido pela inflação. Todo o processo é eventualmente legalizado
5 Fonte: SIAFI
22
por um decreto de contingenciamento, uma lei de reprogramação
orçamentária. (grifo do autor).
A utilização desses mecanismos – decretos de contingenciamento, para
coibir/reprimir déficits orçamentários e inflação, para corroer dotações orçamentárias
não perfeitamente indexadas – possibilitava a manutenção das despesas em níveis
administráveis. Por outro lado, a sobrevivência desses mecanismos e ainda a
utilização do imposto inflacionário – oriundo da emissão de moeda para financiar
déficit remanescentes - mascarava e agravava o arranjo institucional do País.
O custo de utilização da inflação como mecanismo ficou patente para a
sociedade; mas o custo do contingenciamento continuou desconhecido até os dias
atuais, embora o respectivo mecanismo não tenha sido extinto. Nesse período de
utilização, o “Núcleo” do Executivo Federal não somente aprendeu a utilizá-lo
estrategicamente - como um instrumento eficaz -, como transformou-o no principal
instrumento de controle para atingir superávites primários.
Entre outros motivos que se enumeram para a adoção desses
procedimentos, um tem sido apontado como principal, atualmente: para não
somente atender o disposto no art. 8º da LRF, conforme visto, mas podendo ser
baixado para cumprir metas de resultado primário ou nominal.
Art. 9º Se verificado, ao final de um bimestre, que a realização da
receita poderá não comportar o cumprimento das metas de resultado
primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais, os
Poderes e o Ministério Público promoverão, por ato próprio e nos
montantes necessários, nos trinta dias subseqüentes, limitação de
empenho e movimentação financeira, segundo os critérios fixados
pela lei de diretrizes orçamentárias.
23
§ 1o No caso de restabelecimento da receita prevista, ainda que
parcial, a recomposição das dotações cujos empenhos foram
limitados dar-se-á de forma proporcional às reduções efetivadas.
§ 2o Não serão objeto de limitação as despesas que constituam
obrigações constitucionais e legais do ente, inclusive aquelas
destinadas ao pagamento do serviço da dívida, e as ressalvadas pela
lei de diretrizes orçamentárias. (grifo do autor).
A LRF veio para resolver várias questões relacionadas às Finanças
Públicas. Todavia, trouxe, em seu bojo, algumas conseqüências em suas normas
gerais que passaram a ser utilizadas para outras finalidades, extrapolando a
finalidade principal. É exatamente nesse contexto, ante a repressão fiscal
orçamentária - também denominada de contingenciamento -, que a execução
orçamentária e financeira pode ser largamente utilizada para a obtenção de
superávites primários.
Utilizar o mesmo instrumento para a repressão fiscal - a fim de evitar
déficits orçamentários - e como limitador de recursos para atingir superávit primário
pode parecer antagônico, mas não é. O contraponto situa-se em relação à perda de
transparência. De acordo com Castro Santos & Machado(1995 :31),
[...] o controle do Executivo sobre a execução orçamentária implica
em aparente ganho de eficácia no que se refere à compressão dos
gastos públicos, por outro, tem como conseqüência a perda de
transparência das ações governamentais, dificultando sua avaliação.
24
O controle do Executivo, por meio de contingenciamentos - para conter
gastos ou para alcançar superávites - é eficaz para esses dois objetivos, razão pela
qual seu apontamento é essencial neste trabalho.
Por outro lado, os motivos são outros, o que gera várias distorções no
orçamento, conforme critica Franco (1994:214), ao referir-se à utilização do
contingenciamento como mecanismo de repressão fiscal:
[...] O contingenciamento de despesas, isto é, a imposição de limites
quantitativos às despesas, tem sido a medida mais típica de
repressão fiscal. Várias são as distorções que provoca: (i) cria-se um
paradoxo de inversão de prioridades, através do qual uma unidade
de despesa procura inicialmente efetuar a menos importante de suas
despesas, de modo a pleitear, mais adiante no exercício, a liberação
de recursos adicionais para suas despesas realmente
indispensáveis; (ii) não podendo deixar de efetuar despesas de
custeio, a unidade se endivida através de “atrasados” que são, na
verdade, créditos de fornecedores cuja “rolagem” resulta em prejuízo
para estes, que freqüentemente recorrem a sobrepreços para
compensar essas perdas; (iii) uma unidade de despesa procura
tipicamente iniciar diversas atividades de modo a tornar os seus
programas “irreversíveis”, no sentido de que é mais barato completar
uma obra que interrompê-la; (iv) como o Ministério da Fazenda
dispõe de poder discricionário para reter ou liberar as verbas
orçamentárias, fica sobremodo favorecida a prática do clientelismo
através do uso político deste poder e, por fim; (v) como em qualquer
atividade que envolve “racionamento”, há uma tendência para a
proliferação de “mercados negros”
25
Apesar de ciente dessas distorções, o “Núcleo” do Poder Executivo
federal continua a fazer uso do contingenciamento. Nos quatro exercícios financeiros
(de 1999 a 2002), foram publicados 27 decretos tratando da execução orçamentária
e financeira e enfocando limites de contingenciamento, entre outros assuntos
correlacionados, como: classificação, operacionalização e alterações de rubricas
orçamentárias. Em 1999, foram oito decretos; em 2000, nos meandros da LRF,
foram somente três; em 2001, foram nove; em 2002, foram sete decretos. Ao final do
segundo mandato de FHC, observou-se uma média de 6,5 decretos por ano, ou
seja, pelo menos um regramento da execução orçamentária e financeira a cada dois
meses. Na ampliação das distorções, também se considera que cada Pasta termina
por priorizar aquilo que lhe é mais conveniente, dentro dos limites impostos para
liberação.
Numa outra perspectiva menos subjetiva, a razão maior dos decretos
de contingenciamento pode ser a necessidade de prudência, justificável pela falta de
sincronia entre arrecadação e dispêndios previstos na LOA, em face de o Poder
Executivo ter que cumprir com despesas não discricionárias – como as
determinações constitucionais ou legais. Pereira & Mueller (2003:8) explicam que
Além do mais, o executivo brasileiro tem sistematicamente se valido
da não sincronização entre a arrecadação efetiva e dispêndios
previstos na LOA para contingenciar a execução orçamentária em
relação a disponibilidade de recursos ou para solicitar créditos
adicionais. Isto significa um situação por demais privilegiada para o
Executivo nas suas negociações com o Legislativo uma vez que
estes dispositivos institucionais lhe garantem alto grau de
discricionariedade e flexibilidade na execução do orçamento”.
26
Por outro lado, surge uma situação bastante privilegiada para o Executivo
em relação às despesas discricionárias, uma vez que se garante a essas um alto
grau de discricionariedade.
Atualmente, o “Núcleo” não somente detém o comando de controle de
operacionalização desse contingenciamento, como está sob a proteção da Lei de
Responsabilidade Fiscal. Isso o dota de mais poder para agir como “monopolista”
frente aos membros da Coalizão, no que se refere aos bens negociáveis:
governança e governabilidade.
Independente da justificativa, deve-se ressaltar que, com esse
instrumento, torna-se possível transferir o “locus” orçamentário para o financeiro,
deixando à discricionariedade dos Ministros de cada Pasta, dentro de seu limite
financeiro e ao orçamento proposto, escolher o que será liquidado e pago.
2.4 - O “NÚCLEO” COMO MONOPOLISTA
Independentemente de quais sejam os reais motivos para o uso de
decretos de contingenciamento, a prerrogativa de estabelecimento desses decretos
pelo “Núcleo” do Executivo, representado pelos ministérios da Fazenda, do
Planejamento e da Casa-Civil, dando-lhe poderes para controlar limites fixados,
transforma os respectivos procedimentos normativos em importante mecanismo
institucional e político à disposição dele próprio, na busca de fazer valer suas
preferências diante do Congresso Nacional, conforme se vem demonstrando.
Protásio & Bugarin (2001:5) apontam esse poder dos órgãos competentes que
compõem o Núcleo, além da Casa-Civil, da seguinte forma:
Destaca-se que contingenciamento é um corte nas dotações
orçamentárias dos diversos órgãos. Em geral, parte do
27
contingenciamento efetuado logo após a aprovação do orçamento é
mantida até o fim do exercício, configurando-se em perda de
orçamento para órgão. Mas, parte desse corte orçamentário acaba
sendo descontingenciada no decorrer do período, à medida que os
órgãos competentes (Ministério da Fazenda e Planejamento)
acompanham a arrecadação e o atendimento das metas de superávit
e cedem à pressão de gastos dos órgãos.
Deve-se observar, no entanto, que a pressão feita pelos órgãos para o
descontingenciamento orçamentário, em face de suas despesas, reforça a
necessidade de existir um “Núcleo” do Executivo como “monopolista”, uma vez que o
poder para decidir unilateralmente sobre o que será executado ou não, em relação
às emendas orçamentárias, é suficiente para que ele não ceda às referidas pressões
de órgãos, partidos e políticos, ensejando sua comparação a um “monopolista”. Ao
baixar decretos para o contingenciamento das despesas, fixando limites para a
execução orçamentária e financeira, bem como para descontingenciá-la, o “Núcleo”
define logo o percentual de execução que caberá a cada Pasta. Ressalte-se que é
nesse momento de descontingenciamento orçamentário que se desenvolvem as
negociações com base na “moeda” em questão.
Além desse poder, o fato de o “Núcleo” conhecer a curva de demanda do
outro agente envolvido – membros da coalizão - também contribui para sua posição
como “monopolista” na arena legislativa. Tal curva de demanda é revelada quando
da proposta e fixação da despesa na LOA em cada Pasta, incluídas as propostas de
emendas orçamentárias individuais. Considerando, ainda, que praticamente todas
as ações de governo estão expressamente consignadas na LOA, o “Núcleo”, a partir
da análise dessas dotações e das circunstâncias que elas envolvem, fixa um
28
conjunto de limites por meio dos decretos de contingenciamento. A intenção é, a
partir do início do exercício financeiro, atingir diretamente as preferências dos
membros da Coalizão, de maneira que somente o Ele (o “Núcleo”) fique tão bem
quanto possível, dado o comportamento da demanda dos membros dessa Coalizão.
Por outro lado, é também em decorrência desse tipo de destinação
“discricionária” de recursos públicos que se observam as maiores distorções da
alocação de recursos públicos, prejudicando a eficiência alocativa dos respectivos
gastos públicos, bem como reduzindo a efetividade da aplicação. No caso, tais
destinações podem gerar efeito agregado diretamente a seu autor – fazendo-o
ganhar votos em futuras eleições – ou efeitos indiretos – o favorecimento a grupos
de interesse retorna ao autor sob forma de apoio financeiro à sua campanha
eleitoral.
No tocante ao cerne da questão, o assunto se volta para o controle da
execução dessas emendas. Como esse controle é inerente ao Executivo, na escolha
do que será liquidado, inicia-se a cada ano, em cada novo exercício, um processo
de trocas entre os agentes envolvidos, de modo que cada um busca maximizar sua
cesta de preferências.
Vale ressaltar que grande parte da execução orçamentária e financeira do
Governo Federal é registrada no Sistema Integrado de Administração Financeira do
Governo Federal - SIAFI. Em face disso, há um controle quase total sobre a
execução, controle este representado pelo rito ordinário estabelecido no próprio
SIAFI, para controlar qualquer tipo de empenhamentos, liquidações ou pagamentos.
Tal rito visa auxiliar a tomada de decisões e a atender demandas de planejamento,
orçamento, contabilidade e auditoria, enfim, demandas administrativas e financeiras
que melhorem a capacidade de governança da Administração Pública Federal.
29
Paralelamente, o sistema também pode ser utilizado para controlar o atendimento de
demandas políticas, melhorando a capacidade de governar, ou seja, aumentando a
governabilidade. Com apenas alguns lançamentos contábeis, viabilizam-se os limites
estabelecidos nos decretos de contingenciamento; por meio de outros poucos
lançamentos contábeis, permite retirar os limites (descontingenciando) na forma que
o Núcleo do Executivo determinar.
Além desses motivos, o controle da execução orçamentária e financeira
no SIAFI foi implementado com uma finalidade principal. Considerando o fato de a
estrutura do orçamento da Administração Pública Federal apresentar múltiplas
funções (de planejamento, administrativa, contábil, financeira e de controle) e as
despesas possuir classificações orçamentárias , o controle foi implementado com a
finalidade de fazer a interação dessas múltiplas funções entre si e com as
classificações contábeis, por meio de um único plano de contas.
Para que isso fosse possível, foi necessário que o SIAFI propiciasse, de
maneira homogênea e sistematizada, o registro de atos e fatos contábeis e
orçamentários praticados em todos os órgãos do Governo Federal. Para tanto,
escolheu-se um método universalmente aceito: o das partidas dobradas, adotado
quando da implantação do Sistema. Por ele, permite-se interagir toda a
multiplicidade de funções com as contas contábeis de um único Plano de Contas.
Esse método, no SIAFI, tendo por elemento básico as contas contábeis,
permite realizar a interação entre planejamento, orçamento, finanças, contabilidade e
controle no Sistema. A interação da classificação das contas contábeis com as
classificações orçamentárias é fundamental, principalmente quando se trata do
controle da execução orçamentária e financeira das despesas, conforme será
observado na análise empírica deste estudo.
30
III – Análise Empírica
As questões se voltam para a configuração fatores que dão sustentação à
hipótese do trabalho de que é possível o controle pelo Executivo da realização
orçamentária e financeira de emendas orçamentárias individuais de parlamentares.
Nesse sentido, busca-se estabelecer uma correlação entre esses fatores, por meio
de um indicador, denominado de Índice de (In)Fidelidade, de que o “Núcleo” do
Executivo Federal dispõe de mecanismo institucional efetivo.
3.1 - PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS EM RELAÇÃO À HIPÓTESE.
Considerando que a hipótese aventada foi testada em momentos
diferentes e por meio de instrumentais também distintos, o procedimento
metodológico observa particularidades, sendo necessário detalhá-los.
3.1.1 - UNIVERSO E AMOSTRA
Visando confirmar a hipótese, a pesquisa teve como universo das
informações a 51ª Legislatura (anos de 1999, 2000, 2001 e 2002), referentes às
observações das proposições de emendas orçamentárias individuais às Leis
Orçamentárias Anuais (LOA), por modalidades de aplicação.
Cada observação possui um conjunto de informações relativas às
emendas parlamentares. Entre essas informações destacam-se informações
referentes ao autor, partido do autor, UF do Autor, nº. da emenda para onde foram
concedidas (UF, e em alguns casos, municípios), Poder, órgão, unidade
orçamentária, programa de trabalho, descrição da ação governamental, grupo de
despesa, modalidade de aplicação, os valores das propostas de emendas e valores
de empenhos liquidados e outros valores relativos à LOA.
31
Quanto à amostra, o processo de sua determinação considerou a
existência de fatores que “sujam” a base de dados. Análises já feitas ou que venham
ainda a ser realizadas podem induzir a erros de interpretação, quando da avaliação
da execução de emendas à LOA, caso não sejam adotadas medidas que visem
“limpar” a referida base. Dos dados da população até a obtenção da amostra, alguns
critérios foram observados para obtenção de uma base de dados segura, para se
trabalhar o modelo.
3.1.2 – COLETA DE DADOS
Foi feita no Sistema Informações Orçamentárias (INFORCA) do Senado
Federal, onde se obtiveram as informações relacionadas com os autores das
emendas e as respectivas proposições que serviram de base à análise das emendas
individuais.
Do Sistema de Votação Eletrônica da Câmara dos Deputados (SVE)
foram extraídos dados relativos às votações nominais dos deputados federais,
permitindo gerar informações para a elaboração de uma das mais importantes
variáveis explicativas do modelo econométrico, o índice de (in) fidelidade (Ind_Fid).
Ressalte-se que o INFORCA aglutina informações da execução
orçamentária e financeira do SIAFI, referente a informações relativas a propostas de
emendas orçamentárias.
3.1.3 – TRATAMENTO DOS DADOS E CRITÉRIOS DE SELEÇÃO
32
Partindo de indícios, montou-se uma série de variáveis explicativas para a
construção de um modelo econométrico, objetivando não só ratificar a hipótese,
como também agregar informações que dessem mais consistência.
Se a “chave” das observações residisse em somente olhar o número das
emendas, não seria possível a caracterização das emendas parlamentares
individuais como transferências intergovernamentais voluntárias. Por isso, optou-se
por trabalhar com as observações, via modalidades de aplicação, tendo em vista a
necessidade de se identificar, preliminar e precisamente, o valor executado para a
UF ou municípios, isto é, o valor executado nas modalidades de aplicação, cujas
dotações estariam sendo executadas nas rubricas orçamentárias 30 ou 40, ou seja,
transferências intergovernamentais a Estados ou intergovernamentais a Municípios,
respectivamente.
Total das Observações
Ano Quantidade Soma dos Liquidados
Soma das Propostas Perc. Exec.
1999 11.283 52.033.268.928,00 12.312.864.887,00 422,59%
2000 10.939 95.515.772.455,00 19.384.903.820,00 492,73%
2001 10.891 253.615.769.386,00 78.656.160.477,00 322,44%
2002 10.318 366.147.760.094,00 35.144.347.298,00 1041,84%
Total 43.431 767.312.570.863,00 145.498.276.482,00 527,37%
Tabela 1 - Total das Observações. Valores em Unidades Fonte e Método: elaborado pelo autor a partir de dados do INFORCA.
Dos dados obtidos no Senado Federal, referentes às emendas
orçamentárias, chegou-se a um total de 43.431 observações (Tabela 1). Essas
observações se referem aos quatro exercícios financeiros citados da 51ª legislatura
(1999 a 2002). Quando se observa o percentual médio de execução no período,
33
verifica-se que a soma dos valores liquidados é 527,37% da soma dos valores das
propostas.
Trata-se de uma situação esdrúxula que pode gerar distorções e
equívocos de interpretação se não for depurada. Como se poderiam ter valores
liquidados maiores que os propostos?
O fato de algumas proposições de emendas orçamentárias de valores
insignificantes serem feitas para Programas de trabalho já existentes no Projeto de
Lei Orçamentária Anual (PLOA) de valores expressivos pode gerar problemas, se
forem considerados esses valores expressivos como liquidados no referente
Programa de Trabalho do Governo.
Outro exemplo, que pode contribuir para distorções de interpretação é a
ocorrência de retificação de Programas de Trabalho consignados na LOA, por meio
dos créditos adicionais. As distorções se verificam ao serem considerados como
liquidados os valores dessas retificações em relação aos valores das propostas de
emendas orçamentárias.
Desde o universo da pesquisa até o modelo final, buscar-se-á tratar
somente as emendas individuais propostas por deputados e executadas nas duas
modalidades de aplicação a que se referem as transferências intergovernamentais
voluntárias, considerando ainda somente aquelas que puderam ser identificadas sua
localização, por UF ou por Municípios, no mínimo.
Diante disso, utilizou-se, preliminarmente, um critério geral de exclusão, a
partir da CF/88 que estabelece condições para as emendas aos projetos de Lei do
Orçamento Anual ou projetos que os modifiquem visando à aprovação. Segundo o §
3º do art.166 da Constituição:
34
[...] as emendas ao projeto de lei do orçamento anual ou aos projetos
que o modifiquem somente podem ser aprovados caso:
I – sejam compatíveis com o plano plurianual e com a lei de diretrizes
orçamentárias;.
II – indiquem os recursos necessários, admitidos apenas os
provenientes de anulação de despesas, excluídas as que incidam
sobre:
a) dotações para pessoal e seu encargos;
b) serviços da dívida;
c) transferências tributárias constitucionais para Estados,
Municípios e o Distrito Federal; ou.. ”
III – sejam relacionadas :
a) com a correção de erros ou omissões; ou
b) com os dispositivos do texto do projeto de lei.
Ao se analisar o critério determinado pela CF/88, observa-se uma
semelhança dele com a identificação das transferências intergovernamentais
voluntárias. Na medida em que há necessidade de indicar os recursos para a
aprovação de emendas, admitindo-se somente os provenientes de anulação de
despesas, restringe-se o orçamento a uma parcela relativamente baixa para fins de
emendas individuais. Isso porque é preciso anular recursos de um programa de
trabalho para alocá-los em outro. Verifique-se que não poderão ser anulados as
despesas provenientes de pessoal e encargos, serviços da dívida e transferências
compulsórias, ensejando que o restante das despesas seriam, a princípio,
negociáveis, discricionárias ou não vinculadas, enquadrando nessas as
transferências intergovernamentais voluntárias.
35
Assim, para se chegar ao montante dessas transferências
intergovernamentais voluntárias, excluiu-se o grupo de despesas de pessoal e
encargos sociais. A alínea “a” do Inciso II § 3º do art.166 dispõe que os recursos
necessários para emendas não podem ser oriundos de anulação de despesas de
pessoal nem seus encargos.
Da mesma forma, os serviços da dívida (alínea “b”) , identificados pelos
grupos de despesas juros e encargos da dívida e a amortização da dívida,
executados na modalidade de aplicação direta, não são considerados, uma vez que
são excluídos.
As transferências intergovernamentais voluntárias, conforme dito, são
executadas nas modalidades de aplicação 30 e 40. Todavia, as transferências
constitucionais tributárias para os estados/DF e municípios (conforme alínea “c”)
ainda estariam sendo contempladas, já que são também executadas nas
modalidades 30 e 40. Logo, observou-se que o Programa 903 – que trata das
Constitucionais e Legais - o FUNDEF e boa parte do SUS - na modalidade de
aplicação direta - são excetuados, visando excluir as que são consideradas
compulsórias, vinculadas ou não discricionárias.
Selecionada a amostra, seguiu-se à depuração dos dados a serem
utilizados no modelo econométrico.
Critério 1 – Exclusão de Proposições Não Individual
Este critério visa excluir propostas não consideradas como individuais, de
determinado congressista, independentemente do cargo que ocupava na Casa.
Dessa forma, foram excluídas as observações de propostas de emenda feitas pelas
36
Bancadas dos Estados, pelas Comissões Temáticas do Senado Federal e da
Câmara dos Deputados; pelo Relator Geral; e pelas Sub-Relatorias Temáticas.
As proposições vindas dessas instituições prejudicariam uma plausível
análise da intenção individual do congressista. Isso porque a destinação dessas
instituições é de grande volume e bastante abrangente para as localidades do tipo:
Nacional, Região Norte e Nordeste.
Critério 2 - Proposições que não permitem identificar a intenção individual
Para se excluírem as proposições que não permitem evidenciar a
intenção individual do congressista, utilizou-se outro um critério um pouco diferente
do Critério 1; excluíram-se as emendas de congressistas, mesmo individuais,
realizadas sobre Programas de Trabalho que - quando da aprovação da LOA
(dotação inicial) – já possuíam valores significativos.
A título de exemplo, no exercício de 2002, a Deputada Almerinda de
Carvalho – PPB/RJ, por meio da emenda nr. 35480012, apresentou uma proposta
de R$10.000,00 para a localidade Nacional. Essa proposta foi feita em um
Programa de Trabalho (código 10.302.0023.4299.0001) no Ministério da Saúde.
Este Programa de Trabalho já existia no Projeto de Lei Orçamentária original
encaminhado pelo Executivo, num montante de R$245.000.000,00. Quando
aprovada a LOA, passou para R$ 281.628.000,00. Posteriormente, sua dotação
autorizada foi reduzida para R$ 274.310.400,00, uma vez que houve um
cancelamento de R$ 7.327.600,00. Chegado o final do exercício, o montante
liquidado era de R$ 249.000.600,00.
Praticamente, a emenda de R$ 10.000,00 desaparece no meio desse
fluxo orçamentário. Dessa forma, o critério visa excluir os valores quando a diferença
37
entre o valor do Programa de trabalho na dotação inicial da LOA e o Programa de
Trabalho na emenda for positiva, depurando a base para uma análise individual. Por
isso, esse segundo filtro desconsidera observações que tenham essa diferença
maior que zero.
Critério 3 – Créditos Adicionais
Além desses dois critérios, há que se considerarem, ainda, os créditos
adicionais aprovados posteriormente. Com a aprovação da LOA, ocorrem
mecanismos que a retificam, por meio de créditos adicionais, permitindo alterar
valores e classificações na dotação inicial, seja suplementando, remanejando ou
cancelando dotações. Como no segundo critério, um valor maior do Programa de
Trabalho, via crédito adicional, prejudica a análise individual do parlamentar, uma
vez que a identificação do valor liquidado emendado fica prejudicada.
Por exemplo: no exercício de 2001, o Deputado Aloízio Mercadante do
PT/SP, por meio da emenda nr. 1796.0001, apresentou uma proposição de R$
2.000.000,00 para a localidade Nacional, no Programa de Trabalho
12.243.0040.0615.0003 no Ministério da Educação. Apesar de essa funcional não
ter vindo do projeto de lei do Executivo, tendo dotação inicial para ela aprovada na
LOA, posteriormente, por meio de um remanejamento de R$ 570.795.279,00,
passou a ter uma dotação autorizada nesse mesmo montante. Ao final do exercício,
foi liquidada por um valor de R$ 218.799.836,00.
Observe que o valor da proposta inicial do parlamentar e a dotação
autorizada com valores distantes evidenciou a existência de “algo mais”, além da
própria vontade do parlamentar. Houve forte vontade também do próprio Executivo
Federal em remanejar a dotação de outro lugar para alocá-la nessa funcional.
38
Dessa forma, não se podem conceder os méritos exclusivamente ao parlamentar.
Em face disso, exclui-se também do universo de dados para fins de analisar as
proposições/observações individuais, quando a diferença entre o crédito autorizado
e a proposta do parlamentar for positiva.
Critério 4 – Seleção das Modalidades de Aplicação 30 e 40 – Transferências a
Estado/DF e Municípios
Este critério está especificamente relacionado com as transferências
intergovernamentais voluntárias. Excluindo-se as outras emendas, a princípio,
negociáveis, mas em outras modalidades de aplicação, obtêm-se as Voluntárias.
39
Diante do exposto e após utilizados esses critérios, obtém os seguintes
dados, conforme Tabela 2 a seguir:
Critério 1
Ano Quant. Soma Liquidados Soma Propostas Perc.Exec
1999 1.608 13.174.820.884,00 9.168.423.205,00 143,70%
2000 1.596 70.596.658.329,00 14.041.234.959,00 502,78%
2001 1.353 227.656.657.624,00 71.587.088.820,00 318,01%
2002 1.781 341.242.823.180,00 33.491.047.798,00 1018,91%
Total 6.338 652.670.960.017,00 128.287.794.782,00 508,76%
Após Critério 1
Ano Quant. Soma Liquidados Soma Propostas Perc.Exec
1999 9.675 38.858.448.044,00 3.144.441.682,00 1235,78%
2000 9.343 24.919.114.126,00 5.343.668.861,00 466,33%
2001 9.538 25.959.111.762,00 7.069.071.657,00 367,22%
2002 8.537 24.904.936.914,00 1.653.299.500,00 1506,38%
Total 37.093 114.641.610.846,00 17.210.481.700,00 666,12%
Critério 2
Ano Quantidade Soma dos Liquidados Soma das Propostas Perc. Exec.
1999 1.984 37.829.051.541,00 766.387.000,00 4936,02%
2000 1.178 23.580.890.196,00 447.245.918,00 5272,47%
2001 1.321 23.929.284.672,00 407.897.643,00 5866,49%
2002 2.018 23.849.062.516,00 534.543.000,00 4461,58%
Total 6.501 109.188.288.925,00 2.156.073.561,00 5064,22%
Após Critério 2
Ano Quantidade Soma dos Liquidados Soma das Propostas Perc. Exec.
1999 7.691 1.029.396.503 2.378.054.682 43,29%
2000 8.165 1.338.223.930 4.896.422.943 27,33%
2001 8.217 2.029.827.090 6.661.174.014 30,47%
2002 6.519 1.055.874.398 1.118.756.500 94,38%
Total 30.592 5.453.321.921,00 15.054.408.139,00 36,22%
Critério 3
Ano Quantidade Soma dos Liquidados Soma das Propostas Perc. Exec.
40
1999 72 297.130.092,00 70.904.000,00 419,06%
2000 143 296.821.949,00 211.554.080,00 140,31%
2001 153 487.954.930,00 115.717.641,00 421,68%
2002 249 481.761.606,00 94.110.000,00 511,91%
Total 617 1.563.668.577,00 492.285.721,00 317,63%
Após Critério 3
Ano Quantidade Soma dos Liquidados Soma das Propostas Perc. Exec.
1999 7.619 732.266.411 2.307.150.682 31,74%
2000 8.022 1.041.401.981 4.684.868.863 22,23%
2001 8.064 1.541.872.160 6.545.456.373 23,56%
2002 6.270 574.112.792 1.024.646.500 56,03%
Total 29.975 3.889.653.344,00 14.562.122.418,00 26,71%
Critério 4
Ano Quantidade Soma dos Liquidados Soma das Propostas Perc. Exec.
1999 1.159 245.953.273,00 1.211.239.858,00 20,31%
2000 996 383.899.172,00 2.443.769.027,00 15,71%
2001 1.028 640.549.666,00 3.543.535.505,00 18,08%
2002 1.028 84.584.804,00 284.319.000,00 29,75%
Total 4.211 1.354.986.915,00 7.482.863.390,00 18,11%
Após Critério 4
Ano Quantidade Soma dos Liquidados Soma das Propostas Perc. Exec.
1999 6.460 486.313.138 1.095.910.824 44,38%
2000 7.026 657.502.809 2.241.099.836 29,34%
2001 7.036 901.322.494 3.001.920.868 30,02%
2002 5.242 489.527.988 740.327.500 66,12%
Total 25.764 2.534.666.429,00 7.079.259.028,00 35,80%
Tabela 2 – Observações Após Critério 1 a 4 Valores em Unidades Fonte e Método: elaborado pelo pesquisador partir de dados do INFORCA
Critério 5 – Exclusão da Localização Nacional, abrangentes ou genéricas.
O último critério utilizado está intimamente vinculado à especificação da
localidade. É necessário identificar exatamente para qual Unidade da Federação-
41
UF, pelo menos, estão sendo direcionadas as transferências intergovernamentais
voluntárias. Com base nisso, ainda foram excluídas mais 329 observações (Tabela
3) consideradas de direcionamento abrangente, que beneficiaram localidades do tipo
Nacional, região Norte ou Nordeste.
Após Critério 5
Ano Quant. Soma Liquidados Soma Propostas Perc.Exec
1999 46 45.898.292 52.665.182 87,15%
2000 155 267.707.260 1.535.588.310 17,43%
2001 98 301.764.541 2.091.110.368 14,43%
2002 30 1.605.642 8.770.000 18,31%
Total 329 616.975.735 3.688.133.860 16,73%
Após Critério 5
Ano Quant. Soma Liquidados Soma Propostas Perc.Exec
1999 6.414 440.414.846 1.043.245.642 42,22%
2000 6.871 389.795.549 705.511.526 55,25%
2001 6.938 599.557.953 910.810.500 65,83%
2002 5.212 487.922.346 731.557.500 66,70%
Total 25.435 1.917.690.694 3.391.125.168 56,55%
Tabela 3 – Observações Após Critério 5 Valores em Unidades Fonte e Método: elaborado pelo pesquisado a partir de dados do INFORCA
3.2. - BASE DE DADOS PARA O MODELO FINAL
Observe-se que depois de aplicados os cinco critérios, a base de dados
passou a conter 25.435 observações (Tabela 3), e o percentual de execução entre a
soma dos liquidados e a soma das propostas passou a ser de 56,55% no período
analisado, percentual mais próximo da realidade. Esses dados se referem somente
às modalidades de aplicação de transferências intergovernamentais voluntárias - a
Estados/DF e municípios (códigos 30 e 40) - com pelo menos a UF identificada.
42
Entretanto, para testar a hipótese - há necessidade de se consolidarem os dados,
ainda por parlamentar, uma vez que a idéia da variável dependente do modelo está
relacionada com a execução de emendas orçamentárias individuais, por
congressistas, no caso Deputados.
A aglutinação resultou em 2.379 observações. Entretanto, estão aí
incluídas 585 observações relativas a emendas que não possuem dados sobre a
variável explicativa que á a chave do modelo, o índice de In(Fidelidade) - (Ind_Fid).
São 355 autores entre deputados de legislatura anterior e senadores.
No exercício de 1999, ainda foram executadas emendas de congressistas
da legislatura anterior, propostas no exercício de 1998. Isso é possível, uma vez
que há respaldo legal no § 2º do art. 167 da CF/88, dispondo que os créditos
especiais e extraordinários terão vigência no exercício financeiro em que foram
autorizados, salvo se o ato de autorização for promulgado nos últimos quatro meses
daquele exercício. Nesse caso, reabertos nos limites de seus saldos, serão
incorporados ao orçamento do exercício financeiro subseqüente. Como os
congressistas podem emendar tanto o projeto de lei orçamentária, quanto os
projetos de lei que o modifiquem, podem ocorrer emendas sobre os créditos
adicionais que modificam a Lei Orçamentária Anual - LOA. O ato de autorização
sendo promulgado após 30 de agosto de cada ano, elas são incorporadas ao
exercício subseqüente, podendo-se executar emenda de congressista no primeiro
ano de legislatura para a qual não foi reeleito.
Além dessas, não foi considerada, para o modelo, a execução de
emendas propostas por senadores. Optou-se por trabalhar somente com o
percentual de execução de emendas dos deputados. A justificativa para essa
escolha está relacionada com o fato de a Câmara dos Deputados ser a principal
43
arena política de negociações das matérias orçamentárias. O parágrafo único do
artigo 61 da CF/88 preconiza que é de iniciativa privativa do Presidente da República
as leis que disponham sobre matéria orçamentária (alínea b). Segundo, ainda, o art.
64, a discussão e votação dos projetos de lei de iniciativa do Presidente da
República que tenham início na Câmara dos Deputados, caso sejam emendados
pela outra Casa Legislativa, voltarão à Casa iniciadora (parágrafo único art.65). Isso
significa que caso o Senado emende o projeto de lei orçamentária aprovado
inicialmente pela Câmara, o referido projeto voltará para a Câmara dos Deputados e,
após revisão por essa Casa, será concluído e enviado ao Presidente que,
aquiescendo, o sancionará (art. 66).
Como uma das principais variáveis explicativas do modelo é o índice de
In(Fidelidade) - (Ind_Fid) que medirá a intenção dos votos dos deputados na
Câmara, foi necessário identificar quantos deputados federais votaram pelo menos
uma vez na 51ª legislatura. Sabe-se que o número de cadeiras na Câmara é de 513,
mas isso não significa que somente 513 Deputados Federais votaram no período. Ao
final de 1999, 526 deputados tinham votado pelo menos uma vez haja vista as
alterações nas cadeiras entre titulares e suplente. A média de proposições votadas
nesse ano foi de 78,82. Em 2000, acumulavam-se 563 deputados que ao menos já
tinham votado uma vez nessa legislatura, enquanto que a média de proposições
votadas acumulava 183,40. Já em 2001, 604 deputados votaram em média 221,14
proposições, acumuladas até esse exercício. Com isso, ao final da legislatura em
2002, acumulou-se um número de 624 deputados que pelo menos tinham votado
uma vez, sendo que a média de votações por deputado alcançou a 232,79.
44
Ressalte-se que o deputado federal que mais votou nesse período, o fez
359 vezes (apenas dois deputados). Da mesma forma, apenas dois deputados
votaram uma única vez nessa 51 ª legislatura6.
Se todos esses deputados tivessem feito pelo menos uma proposta de
emenda orçamentária em cada exercício de 1999 a 2002, o número de observações
aglutinadas não somente alcançaria 2.496 (4 vezes 624), como o ultrapassaria, haja
vista, o quantitativo de propostas de deputados de legislatura anterior que estava na
base de dados de 1999 e das propostas de senadores. Todavia, esse fato não
ocorreu. Além de ter que excluir as observações de deputados da legislatura anterior
e dos senadores, nem todos os deputados propuseram pelo menos uma emenda
orçamentária em cada exercício.
Diante dessa situação, o resultado de 2.379 observações foi reduzido
para 1.794, isso somente em relação a deputados federais da 51ª legislatura, ou
seja, para os 4 anos, objeto deste estudo, gerando um conjunto de dados bastante
especial. Esse conjunto de dados é do tipo “dados combinados”, em que há
elementos tanto de séries temporais (os quatro exercícios), quanto de dados de
corte (para o mesmo conjunto de unidades seccionais). Os dados levantados
referem-se a um tipo especial de dados combinados, denominado painel (ou
longitudinal). Este tipo possibilita pesquisar a mesma unidade de cross-section (o
deputado federal, no caso), durante um período de tempo (os quatro anos da 51ª
legislatura, por exemplo).
Além desses aspectos e considerando que há deputados que não fizeram
propostas de emendas em todos os quatro exercícios últimos, o conjunto de dados
torna-se ainda mais complexo, sendo denominado de “dados de painel não
6 Fonte: Sistema Eletrônico de Votação (SEV) da Câmara dos Deputados.
45
equilibrados”. Tal fato levou à exclusão de mais 60 observações que apareceram
somente em um exercício. Como se trata de série temporal, não justifica aparecer
apenas em um período; isso reduziu a base final do modelo para 1.731
observações. Ainda três observações foram descartadas pelos sistemas utilizados7,
consideradas por eles como “observações que desvirtuariam o modelo”.
Vale ressaltar que foi descartada também a alternativa de se rodar
regressão do tipo “Probit” ou “Logit”, dado que a variável dependente, percentual de
execução (Perc_Exec), foi medida por um percentual de execução e não pela
medida de ter sido ou não executada.
Em face do exposto, o teste consiste em rodar uma regressão sobre
esses dados de painel não equilibrados no período indicado, a fim de comprovar a
hipótese de que é possível o controle da realização orçamentária e financeira de
emendas orçamentárias individuais de parlamentares, por meio da explicitação de
uma correlação, quando se pretende priorizar a execução de propostas de emendas
orçamentárias individuais de membros da Coalizão que ocupam cadeiras na Câmara
dos Deputados.
O teste mais importante dessa hipótese – consubstanciado no modelo – é
quando se faz a comparação de dados de votações nominais de cada membro da
Câmara dos Deputados acumulados no período, em relação ao percentual de
execução entre as emendas orçamentárias individuais liquidadas e as propostas.
Dessa forma, será rodada a regressão sobre o Percentual de Execução
de emendas parlamentares individuais, configuradas como transferências
intergovernamentais voluntárias (Per_Exec), usando, além de uma variável
7 Sistemas Lindep e SAS.
46
explicativa chave, o Índice de (in) Fidelidade (Ind_Fid), o total de emenda por
deputado (TOT-EMEN ) e uma série de variáveis qualitativas dummies.
A hipótese, representada pelo modelo econométrico prevê uma relação
entre o Per_Exec e essas variáveis, de forma que quanto mais significativo forem os
regressores mais estrategicamente essas emendas são utilizadas.
A variável explicativa chave, (Ind_Fid), controla a (in)fidelidade do
deputado federal em relação às preferências do Executivo, nas várias votações de
propostas de emendas constitucionais ou projetos de lei. Para este estudo, o
deputado que mais participou das votações o fez 359 vezes. Um coeficiente
significativo e positivo para essa variável sugere que “Núcleo” do Executivo, para
executar sua emenda orçamentária, considere o seu modo de votar.
Essa fidelidade (ou não) foi medida pela comparação entre os votos de
cada deputado em cada projeto de lei e votos do líder do governo na Câmara. Antes
de iniciar as votações nominais, cada líder pode se manifestar para orientar sua
bancada ou indicar um deputado para fazê-lo em nome da Liderança, pelo tempo
não excedente a um minuto (art.192, parágrafo segundo do Regimento Interno).
Então, o líder do governo anuncia a sua orientação e vota. Caso o
deputado tenha votado muito favoravelmente ao Governo durante o período, seu
índice será positivo e alto; caso contrário, gera um índice negativo. Esse índice
segue a mesma lógica do índice apresentado por Mueller & Pereira (2000:56) e foi
construído a partir de um Logaritmo Neperiano da relação desejada.
O índice estabelece o Logaritmo Neperiano da relação “R”, que é a
relação entre o total das votações nominais de cada deputado que votou
favoravelmente à orientação do Governo (r) e a diferença entre o total das votações
47
nominais de cada deputado (n) e as votações nominais favoráveis (r) conforme a
seguir:
ÍNDICE = Ln de “R” , em que “R” = ( r + 0,5 )
( n – r + 0,5)
Quando o índice for igual a zero, fazendo na expressão “R” = 1, significa
que a partir desse momento, os deputados passaram a votar mais favoravelmente
ao “Núcleo”, ou seja, mais de 50% do total de suas votações nominais foram
favoráveis ao Presidente da República, na 51ª legislatura (1999-2002).
Além desse índice - que é uma variável explicativa quantitativa - foi
introduzia no modelo outra variável quantitativa: o total de emendas por deputado –
(TOT-EMEN); essa variável foi inserida mais para controlar a equação da regressão.
Para se esperar o resultado dessa variável relacionado com o modelo, dever-se-ia
construir outra relação percentual entre a soma do quantitativo da emenda liquidada
e a soma do quantitativo proposto. Porém, optou-se por não trabalhar com essa
relação, porque isso poderia desconfigurar o modelo, devendo, entretanto, o estudo
dessa relação ser estendido a outro trabalho.
Outras seis variáveis dummies também foram adicionadas ao modelo
para auxiliar em sua explicação. Essas variáveis, que assumem valores 0 ou 1,
possuem a característica de extrair uma resposta “SIM” ou “NÃ
O”. Isso permite relacioná-las com a hipótese do modelo deste estudo, de maneira
que, se as respostas convergirem para a hipótese do modelo, a resposta aceitável
será “sim” ou valor “um”. De forma análoga, caso as respostas sejam contrárias à
hipótese do modelo, a resposta será “não” ou de valor “zero”.
Equação 1
48
A primeira variável dummy, denominada de AUT_PRS, mede a relação
entre o partido político do autor da emenda e o partido político do Presidente da
República. Se o partido político do autor da emenda for o PSDB, então a variável
receberá o valor 1, caso contrário zero. Espera-se que os membros do PSDB votem
com a orientação do líder do Governo na Câmara e, em conseqüência, esperem ter
suas emendas executadas
A segunda variável dummy, denominada de AUT_ALD, mede a
relação entre o partido político do autor da emenda e os partidos políticos dos
membros da Coalizão. Se o partido político do autor da emenda for o PMDB, PFL,
PPB ou PTB, então a variável recebe o valor 1, caso contrário será zero. Espera-se
que os membros da Coalizão votem com a orientação do líder do partido e, em
conseqüência esperem ter suas emendas executadas.
A terceira variável dummy, denominada AUT_GDR, mede a relação
entre o partido político do autor da emenda e o partido político do governador da
unidade da federação beneficiada pela Emenda. Caso o autor da emenda e o
governador da federação beneficiada sejam do mesmo partido político, então a
variável recebe o valor 1, caso contrário, zero. Essa variável foi introduzida para
medir a relação entre esses dois aspectos, podendo estar ou não relacionada com o
modelo.
A quarta variável dummy, denominada UFB_GPRS, mede a relação
entre a unidade da federação beneficiada pela execução da emenda e o partido
político dos governadores do partido do Presidente da República. Se o partido
político do governador da unidade da federação que teve a emenda executada for
do PSDB, então a variável recebe o valor 1, caso contrário, será zero. Espera-se que
49
haja uma execução maior de emendas orçamentárias para as unidades da
federação nas quais o PSDB possua o governador nesse período.
A variável dummy, denominada UFB_GALD, mede a relação entre a
unidade da federação beneficiada pela execução da emenda e o partido político dos
governadores que são também membros da Coalizão do Presidente da República.
Caso os partidos políticos dos governadores da unidade da federação da emenda
executada seja da base de coalizão governista, ou seja, do PFL, PMDB, PPB ou
PTB, então a variável recebe o valor 1, caso contrário, recebe zero. Espera-se que
haja uma execução maior de emendas para as unidades da federação nas quais os
membros da Coalizão possuem governador nesse período.
A sexta variável dummy, denominada UFB_UFAUT, mede a relação
entre a unidade da federação beneficiada pela execução da emenda e a unidade da
federação do autor da emenda. Quando a unidade da federação da emenda
executada for igual à unidade da federação do autor da emenda então a variável
recebe o valor 1, caso contrário, zero. Essa variável foi introduzida para medir a
relação entre esses dois aspectos, podendo estar ou não relacionada com o modelo.
Logo, a especificação da análise que será desenvolvida é representada
da seguinte forma:
PERC_ EXEC = β0 + β1 IND_FIDi + β2 TOT-EMENi + β3 AUT_PRSi + β4 AUT_ALD i
+ β5 AUT_GDR i + β6 UFB_GPRS i + β7UFB_GALD i + β8 UFB_UFAUT i + εi
3.3 – RESULTADOS DA REGRESSÃO
50
Um primeiro resultado alcançado foi obtido da regressão por mínimos
quadrados ordinários (OLS). Como essa regressão trata das 1.731(N) observações
como se fossem observações de indivíduos diferentes, ignorando a estrutura de
painel de dados, não será utilizada, embora tenha apresentado coeficientes positivos
e significativos. Em se tratando de dados combinados de painéis, devem ser
consideradas as observações por indivíduo em cada um dos quatro anos. Com base
nisso, o principal resultado recomendado (Tabela 4) trata de um Modelo de Efeitos
Aleatórios:
Variáveis Explicativas e
Grau de Significância Estatística
Variável Dependente:
Percentual de Execução – PER_EXEC
Constante
t-Value
0,3923 a
(11,679)
IND_FID
t-Value
0,4532 a
(5,609)
TOT-EMEN
t-Value
0,2101 b
(2,077)
AUT_PRS
t-Value
0,1128 a
(3.684)
AUT_ALD
t-Value
0,1256 a
(5,125)
AUT_GDR
t-Value
-0.3153 b
(-2.001)
UFB_GPRS
t-Value
0,4222 b
(2,110)
UFB_GALD
t-Value
0,4156 b
(2.227)
UFB_UFAUT
t-Value
0,9609
(0,353)
51
R2 0,1987
N 1.731
Tabela 4 - Random Effects Model Fonte: SIAFI, SVE e INFORCA. Obs: Estimativa de variáveis instrumentais t-stat. Os valores entre parênteses referem-se ao grau de significância estatísticas: a (1%) , b (5%).
O “Teste de Hausman” foi aplicado sobre os resultados, sendo
encontrado para o valor de H do teste um número próximo a 0.00. Como esse teste
recomenda o Modelo de Efeito Randômico ou Aleatório para valores pequenos de H,
a Tabela 4 retrata o resultado da regressão mais recomendável para este estudo,
apesar do coeficiente de determinação (R2) ser baixo.
Todavia, alguns dos resultados encontrados possuem estimadores
consistentes e eficientes, bem próximos da realidade. O R2 relativamente baixo
deve-se ao fato de outros fatores, além dos incluídos nessa regressão, influírem
bastante na execução das emendas orçamentárias. Espera-se, pelo menos em
parte, que esses outros fatores sejam de cunho mais técnico que os apontados
neste estudo.
Analisando-se então os resultados a partir dos dados dessa Tabela,
verifica-se que um dos principais resultados obtidos é o coeficiente positivo e
estatisticamente significativo para o Índice de Fidelidade (Ind_Fid). Isso significa
que, ceteris paribus, quanto mais fiel for o deputado ao Poder Executivo, maior será
o percentual de execução de suas emendas parlamentares, configuradas como
transferências intergovernamentais voluntárias.
De acordo com o modelo, quanto maior e mais positivo for o Ind_Fid,
maior deverá ser o percentual de execução dessas emendas e, em conseqüência,
maior sua utilização como “moeda”, já que elas são trocadas por votos favoráveis
52
aos pleitos do Executivo. Em momentos de aprovação de reformas importantes, não
é difícil verificar os que são mais fiéis ou infiéis, nem identificar os que são
recompensados por serem fiéis. Segundo Josias (2003):
Preocupado em manter no Congresso um grupo parlamentar que lhe
fosse fiel, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ajudou a
angariar fundos eleitorais para 24 políticos durante a campanha de
2002. Valendo-se da intermediação de um ex-consultor da CNI
(Confederação Nacional da Indústria), recorreu a nove empresas.
Foram amealhados cerca de R$ 7 milhões [...]
6) dos 24 preferidos de FHC, apenas quatro fracassaram nas urnas.
Para o Senado: Artur da Távola (PSDB-RJ), José Aníbal (PSDB-SP)
e Geraldo Melo (PSDB-RN); para a Câmara: Osmar Terra (PMDB-
RS).
7) todos os demais foram bem-sucedidos. Entre eles os senadores
Arthur Virgílio (PSDB-AM) e Renan Calheiros (PMDB-AL) e os
deputados Alberto Goldman (PSDB-SP), Aloysio Nunes Ferreira
(PSDB-SP) e Arnaldo Madeira (PSDB-SP) [...]
Sem entrar no mérito da reportagem, mas analisando-a imparcialmente e
com base no Ind_Fid apurado neste estudo, desses quatro deputados citados vale
salientar, coincidentemente ou não, que todos obtiveram um resultado positivo,
significando que votaram com o Presidente, durante a 51ª legislatura.
O primeiro deputado, Osmar Terra (PMDB-RS) participou de apenas 69
votações nominais e votou favoravelmente ao governo 62 vezes, obtendo um índice
bem positivo de 2,12 pontos. O segundo deputado, Alberto Goldman (PSDB-SP), foi
mais assíduo; participou de 309 votações nominais, votando favoravelmente ao
53
governo 292 vezes e obtendo um índice de fidelidade ainda maior de 2,81 pontos. O
terceiro, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), com um índice positivo, porém menor,
talvez pelo fato de ter participado menos que os outros, votou 56 vezes e
favoravelmente em 49 delas. Mas, ainda obteve um índice positivo, ao final do
mandato, de 1,88 pontos. O quarto, Arnaldo Madeira, além de ser bastante assíduo,
participou de 347 votações nominais e votou favoravelmente em 338 delas, obtendo
um índice de 3,57 pontos.
Outros resultados importantes encontrados foram os relativos às variáveis
dummies AUT_PRS e AUT_ALD . Essas variáveis tiveram coeficientes positivos e
bastante significativos (1%), podendo dizer que as emendas dos parlamentares são
executadas para membros da Coalizão, na medida em que, a princípio, esses
membros votarem com a orientação do líder do Governo na Câmara que acorda com
cada líder dos partidos membros da Coalizão.
Da mesma forma, os resultados encontrados relativos aos coeficientes
das variáveis dummies UFB_GPRS e UFB_GALD foram positivos e significativos
estatísticamente, comprovando que há forte execução de emendas que beneficiam
as Unidades da Federação em que tanto o governador é do partido do presidente
quanto unidades da Federação em que os governadores são membros da Coalizão.
Isso significa a utilização estratégica dessas emendas para receber também apoio
de governadores membros da coalizão.
Em relação às outras três variáveis explicativas do modelo, cabe frisar
alguns aspectos. Quanto à TOT_EMEN, apesar de ter apresentado um coeficiente
positivo e significante, isso não ajuda a inferir quanto ao resultado. Ela foi colocada
no modelo como uma variável de controle da equação da regressão. Quanto a
AUT_GDR , o coeficiente foi significativo, comprovando que há uma relação entre o
54
partido político do autor da emenda e o partido político do governador. Pode-se
esperar desse coeficiente negativo uma indicação de forte relação entre o autor da
emenda e do governador, maior inclusive que a relação com o Poder Executivo.
Quanto à UFB_UFAUT, esperava-se mesmo um coeficiente não significativo, pois
como é conhecido, praticamente a maioria dos deputados propõem emendas para
seus redutos eleitorais.
Esses resultados ratificam o modelo que Alston e Muller (2003)
desenvolveram para demonstrar que o uso estratégico da execução das emendas
de congressistas é uma importante “moeda” para incentivar esses atores a
cooperarem. Além desse, também confirma parte do que foi defendido e
evidenciado por Pereira (2000) de que os congressistas são bastante interessados
em terem suas emendas orçamentárias individuais executadas pelo Presidente,
votando com a orientação dos seus líderes, dado que esse fato está intimamente
ligado à sua reeleição na arena legislativa.
E, por último, comprova as evidências, de uma maneira ainda mais
peculiar, que as já apresentadas por Pereira & Mueller (2002:274) quando observam
que:
[...] O presidente da República recompensa os parlamentares que
sistematicamente votam a favor dos projetos de interesse do
governo, autorizando a execução de suas emendas individuais, e, ao
mesmo tempo, pune os que não votam nesses projetos
simplesmente não executando as emendas propostas por eles.
55
IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho evidencia, por meio da confirmação da hipótese, de que é
possível o controle pelo Executivo da realização orçamentária e financeira de
emendas orçamentárias individuais de parlamentares. Por meio de um indicador,
denominado de Índice de (In)Fidelidade, conjugado com as instituições
orçamentárias no que se refere propriamente a possibilidade de controlar a
realização da execução orçamentária e financeira, pode-se afirmar categoricamente
que o “Núcleo” do Executivo Federal dispõe de um mecanismo institucional efetivo
para direcionar a execução orçamentária e financeira dessas emendas.
Como se pôde observar, a execução dessas emendas, nos casos
analisados, distancia-se de uma alocação e distribuição eficiente de recursos
públicos. A efetividade do mecanismo institucional é patente, como se demonstrou
quando os membros da Coalizão votam, no Congresso, de acordo com as
preferências do Executivo Federal. Em troca, recebem a execução orçamentaria de
suas propostas de emendas orçamentárias individuais. Não há governabilidade sem
governança, embora esta possa ser deficiente em situações satisfatórias de
governabilidade, a execução dessas emendas entra, neste contexto, como o
principal instrumento a ser utilizado para que a capacidade administrativa e
financeira de governar - governança - não se torne deficiente, em prol de situações
satisfatórias de governabilidade, servindo assim para minimizar um plausível alto
custo de governabilidade.
O cerne da questão se volta para os objetivos desse controle
orçamentário pelo “Núcleo” do Poder Executivo Federal. Ele até poderia se utilizar e
permitir a utilização da execução dessas emendas, visando a redução do custo da
56
governabilidade, para atender preferências de membros da Coalizão. Entretanto,
entre essa abertura - e a permissão de desvios de finalidades dos recursos públicos
há um hiato muito grande. O custo de governabilidade gerado pelo desvio de
finalidade é muito alto para a sociedade, uma vez que esse desvio torna deficiente
qualquer técnica para controlar administrativamente e financeiramente a capacidade
de governar.
A execução desse tipo de transferência intergovernamental vem se
mostrando um excelente mecanismo de controle institucional e até social, podendo,
ainda, ser vista como uma espécie de recompensa para o parlamentar que estiver
“cumprindo” seus compromissos para com a sociedade. Outro fator preponderante a
ser destacado neste estudo é que partir do controle da execução orçamentária e
financeira outorgado pelas instituições orçamentárias brasileiras fica patente a
preponderância do Poder Executivo sobre o Legislativo, uma vez que aquele
praticamente controla toda a execução de dessas transferências
intergovernamentais voluntárias, por meio dos decretos de contingenciamento.
Diante disso, as regras instituídas para a execução orçamentária e financeira, além
de centralizar e dar mais respaldo ao controle da execução orçamentaria e financeira
pelo Executivo, amplia a preponderância do mesmo sobre o Congresso Nacional.
A idéia de que essas transferências são utilizadas como “moeda” de troca
de governança por governabilidade, fica reforçada, valendo observar que, na 51ª
Legislatura, a oposição foi bastante crítica em relação aos cortes feitos pelo
Presidente da República; no entanto, ao se inverter o papel (agora situação na 52ª
Legislatura), passou a utilizar-se dos mesmos mecanismos. Segundo Sucursal da
Folha de São Paulo, retratando palavras do líder do PT na Câmara, João Paulo
Cunha (SP), em 31 de outubro de 2002: “contingenciamento é um instrumento que
57
todo mundo usa. Só não posso dizer de quanto será.” No ano subseqüente veio se
confirmar o que disse:
[...] O corte de R$ 14,1 bilhões promovido pelo governo Luiz Inácio
da Silva no orçamento deste ano não vai poupar nenhum ministério e
deverá afetar, principalmente, Transportes, Integração Nacional,
Cidades, Meio Ambiente e Esporte.(Freire,2003)
Em face do exposto, sugere-se, com o objetivo de minimizar a
interferência do “Núcleo” do Executivo sobre o Congresso Nacional e o grau de
subjetividade da execução dessas emendas, que as propostas de leis orçamentárias
anuais e, consequentemente, o próprio orçamento público brasileiro não permita
mias Subtítulos - assim entendida a localização geográfica ou espacial da
classificação orçamentária da despesa - com configurações genéricas ou
abrangentes do tipo Nacional ou para direcionado às Regiões do País.
58
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