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Versão para impressão 1 Sala Ambiente Currículo, Cultura e Conhecimento Escolar Apresentação Prezado cursista, Esta Sala Ambiente tem como objetivo aprofundar a compreensão e as possibilidades de atuação dos coordenadores pedagógicos relativas à área curricular, de fundamental importância para a organização do trabalho pedagógico da escola. Pretende possibilitar a você, que atua na coordenação pedagógica, avaliar o impacto das propostas curriculares na prática escolar, bem como orientar propositivamente os professores para o desenvolvimento do seu trabalho. Entende-se que cabe ao coordenador pedagógico promover o debate sobre as definições curriculares e o que isso implica para a potencialização do papel da escola. A compreensão de que a natureza humana não é dada ao homem, mas é por ele produzida, leva ao entendimento do trabalho educativo como “o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens” (SAVIANI, 2008, p.7). Assim, se o homem não se faz homem naturalmente, o saber pensar e sentir, o saber querer, agir ou avaliar precisa ser aprendido, e a isso responde o ato educativo intencional. Para tanto, a educação precisa de referências como matéria-prima de sua atividade: encontra-se aí o papel central das definições curriculares. Essas definições vinculam-se à existência de diretrizes que orientam uma base nacional comum para o que se ensina na escola. O Artigo 210 da Constituição Federal de 1988 determina como dever do Estado fixar “conteúdos mínimos para o Ensino Fundamental, de maneira a assegurar a formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais”. Mas não basta ter uma referência nacional comum: “Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a

Sala Ambiente Currículo, Cultura e Conhecimento Escolarcoordenacaoescolagestores.mec.gov.br/uft/file.php/1/coord_ped/sala... · Versão para impressão 3 preocupações e indicações

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Sala Ambiente Currículo, Cultura e Conhecimento Escolar

Apresentação

Prezado cursista,

Esta Sala Ambiente tem como objetivo aprofundar a compreensão e as possibilidades de

atuação dos coordenadores pedagógicos relativas à área curricular, de fundamental

importância para a organização do trabalho pedagógico da escola. Pretende possibilitar

a você, que atua na coordenação pedagógica, avaliar o impacto das propostas

curriculares na prática escolar, bem como orientar propositivamente os professores

para o desenvolvimento do seu trabalho. Entende-se que cabe ao coordenador

pedagógico promover o debate sobre as definições curriculares e o que isso implica

para a potencialização do papel da escola.

A compreensão de que a natureza humana não é dada ao homem, mas é por ele

produzida, leva ao entendimento do trabalho educativo como “o ato de produzir, direta

e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida

histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens” (SAVIANI, 2008, p.7). Assim, se o

homem não se faz homem naturalmente, o saber pensar e sentir, o saber querer, agir

ou avaliar precisa ser aprendido, e a isso responde o ato educativo intencional. Para

tanto, a educação precisa de referências como matéria-prima de sua atividade:

encontra-se aí o papel central das definições curriculares.

Essas definições vinculam-se à existência de diretrizes que orientam uma base nacional

comum para o que se ensina na escola. O Artigo 210 da Constituição Federal de 1988

determina como dever do Estado fixar “conteúdos mínimos para o Ensino Fundamental,

de maneira a assegurar a formação básica comum e respeito aos valores culturais e

artísticos, nacionais e regionais”. Mas não basta ter uma referência nacional comum:

“Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a

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ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma

parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da

cultura, da economia e da clientela” (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –

LDB nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, no seu Artigo 26). É preciso, pois, o

envolvimento de todos os que participam do ato educativo intencional na sua

construção.

A base curricular nacional está hoje expressa em diversos documentos normativos

elaborados à luz da LDB/1996. Desde então, foram produzidos pareceres e aprovadas

resoluções referidas às diferentes etapas e modalidades da educação básica,

complementadas com orientações relativas à formação dos professores e aos planos de

carreira e de remuneração do magistério.

Padrões fixados nacionalmente, no entanto, não significam a ausência de

responsabilidade dos sistemas, das escolas e dos docentes na tomada de decisões

acerca do planejamento e da prática do ensino. Projetos Políticos-Pedagógicos (PPPs)

das escolas e particularmente docentes têm um papel fundamental ao traduzir para a

prática concreta as diretrizes formuladas em âmbito nacional, estadual ou municipal. E

cabe aos gestores o importante papel de mediar as discussões curriculares destinadas

ao esclarecimento da função que os docentes desempenham na produção do currículo

que as escolas colocam efetivamente em ação. Quais as possibilidades e limites das

ações dos docentes e da escola nas definições, decisões e inovações curriculares? Como

entrecruzar as determinações estruturais, as definições dos sistemas com as ações

concretas dos sujeitos na escola?

Com a perspectiva de atender, não só aos desafios postos pelas orientações e normas

vigentes, mas principalmente ao compromisso com o direito de todos à educação, é

preciso olhar de perto a escola, seus sujeitos, suas inúmeras variáveis e rotinas e fazer

indagações sobre suas condições concretas, sua história, seu retorno e suas

possibilidades. Cabe perguntar, então, como as definições curriculares condicionam o

trabalho pedagógico em cada escola?

Esta Sala tem por objetivo debater questões que auxiliem você, coordenador

pedagógico, a pensar o planejamento curricular da sua instituição a partir da legislação

nacional, mas considerando sempre os sujeitos da sua instituição, o contexto no qual

ela se insere e as questões que são pertinentes à sua realidade. Com essas

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preocupações e indicações elaboramos a Sala Ambiente Currículo, Cultura e

Conhecimento que você passa a conhecer agora e que dá continuidade aos estudos que

você fez até aqui nas Salas Ambiente Realidade Escolar e Trabalho

Pedagógico e Projeto Político-Pedagógico e Organização do Ensino. Agora você estará

estudando, concomitantemente, por um período de 12 (doze) semanas, os conteúdos

desta sala e da sala de Avaliação Escolar. Tais conteúdos relacionam-se diretamente à

estrutura do ato educativo no espaço escolar e possuem inter-relações importantes que

permitem otimizar o seu aproveitamento!

Vejamos, então, como está estruturado o conteúdo da Sala Ambiente Currículo, Cultura

e Conhecimento. São quatro unidades perpassadas por um eixo central ou uma intenção

que se pretende estar sempre presente seja na leitura dos textos, seja na execução das

atividades propostas: a compreensão do currículo como fator importante para a

viabilização do direito de todos à educação. Como tal, ele precisa ser compreendido na

dinâmica de relações em que está inserido.

Os objetivos desta Sala Ambiente podem ser assim explicitados:

a. compreender o currículo como um importante instrumento de viabilização do

direito de todos à educação;

b. conhecer as modificações geradas pelas reformas dos anos de 1990 na

organização curricular da educação básica;

c. identificar as atuais tendências da organização curricular;

d. compreender os conceitos de trabalho, ciência e cultura como mediação

fundamental no processo de orientação da organização curricular,

particularmente no que diz respeito ao Ensino Médio;

e. perceber a necessidade de estabelecer um diálogo curricular frente às

orientações nacionais, estaduais e municipais;

f. atualizar o conhecimento dos coordenadores a respeito das alterações

curriculares em andamento e do seu significado para a organização do

trabalho pedagógico escolar.

A sala está estruturada em quatro unidades:

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Unidade I

O currículo escolar

como instrumento de

viabilização do direito

à educação

Esta primeira unidade proporciona uma reflexão sobre o

currículo como um campo de estudo da área educacional e

sua importância para a viabilização do direito à educação.

Focaliza especialmente o papel do currículo na tarefa de

garantir a todos o direito ao conhecimento, tendo em vista

a especificidade da escola como instituição social voltada a

esta função. Cabe, no entanto, evidenciar as mediações que

estão presentes na transposição do conhecimento

desenvolvido socialmente para os conteúdos escolares. Há

um percurso teórico neste campo do conhecimento que

permite hoje uma compreensão mais ampla das inúmeras

relações que se colocam para o desenvolvimento curricular.

Unidade II

A reforma educacional

dos anos 1990 e sua

proposta curricular

para a Educação Básica

Esta unidade apresenta as mudanças curriculares

implementadas na educação básica como parte da reforma

do sistema educacional brasileiro que vem ocorrendo desde

a década de 1990. Você encontrará também nesta unidade

uma reflexão sobre os processos de inovação curricular e

seus reflexos na prática docente; elementos para

diferenciar o caráter dos Parâmetros Curriculares Nacionais

(PCNs) daquele das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs);

e ainda um estudo sobre as novas orientações presentes nas

DCNs.

Unidade III

Tendências atuais na

organização

curricular: o currículo

em movimento

São apresentados nesta unidade alguns dos principais

programas e ações que o Governo Federal formulou para os

diversos níveis da educação básica, buscando a sua melhoria.

São discutidas algumas dessas ações – as mais recentes - cuja

influência pesa significativamente na organização do trabalho

escolar.

Unidade IV

Indagações sobre

currículo

Por último, são apresentadas de forma sucinta reflexões que

constam do material publicado pelo Ministério da

Educação/Secretaria de Educação Básica, no conjunto de

cadernos intitulado “Indagações sobre Currículo”, do ano de

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2008. As “Indagações” compõem um conjunto de reflexões

apresentadas por diversos autores nacionais sobre

concepções educacionais implícitas no currículo, visando

sempre a busca de respostas às questões postas pelos

coletivos das escolas e das redes de ensino, a reflexão sobre

elas, assim como a busca de seus significados, seja na

reorientação do currículo e/ou nas práticas educativas.

Ao final de cada unidade, você encontrará as atividades que compõem a avaliação da

sala, assim como indicações de filmes e referências quando pertinentes. Esperamos que

você aproveite este momento para discutir articuladamente com seus colegas a

organização curricular da sua instituição! Boa leitura!

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O currículo escolar como instrumento de viabilização do direito à educação

Apresentação

Prezado cursista,

Nesta primeira unidade da Sala Ambiente Currículo, Cultura e Conhecimento faremos

inicialmente uma reflexão sobre o currículo como um campo de estudo da área

educacional e sua importância para a viabilização do direito à educação. A reflexão

sobre o currículo é hoje um tema fortemente instalado nos projetos político-

pedagógicos das escolas e nas propostas dos sistemas de ensino, assim como nas

pesquisas, na teoria pedagógica e na formação inicial e continuada dos educadores e

gestores. O que se entende, afinal, por currículo?

Num segundo momento focalizaremos, como dimensão central do currículo, a

especificidade do conhecimento escolar tendo em vista o papel da escola como

instituição social voltada à tarefa de garantir a todos o acesso aos saberes científicos e

culturais. Mais recentemente, os estudos curriculares passaram a preocupar-se de

forma mais intensa com as relações entre currículo e culturas, demonstrando a

necessidade de reconhecer a multiculturalidade e a diversidade como elementos

constitutivos do trabalho educativo. Procuramos, então, evidenciar as mediações

presentes na transposição do conhecimento desenvolvido socialmente para o

conhecimento escolar, organizado pelos currículos oficiais direcionados aos sistemas de

ensino e suas escolas.

As relações de poder que permeiam todo o relacionamento social também se fazem

presentes na organização curricular. Desvendar esse emaranhado complexo e visualizar

com maior clareza aquilo que é necessário para uma sociedade mais justa é um desafio

para os educadores. É preciso, portanto, abrir os olhos também para o que alguns

estudos denominam de currículo oculto, isto é, aquilo que a escola ensina

subliminarmente e não consta das ementas ou dos programas de ensino. São conteúdos

que participam da formação dos alunos sem serem explicitados nos projetos político-

pedagógicos das escolas ou nos programas das diversas disciplinas. Estão presentes, por

exemplo, nos rituais escolares, nas metodologias de trabalho dos professores e

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gestores, nas normas que orientam o cotidiano das escolas, nas diversas ênfases que

perpassam o dia a dia escolar.

Esta unidade introdutória visa a orientar os coordenadores pedagógicos a elaborar um

patamar teórico para a compreensão das questões curriculares. Permitirá, por

exemplo, olhar para os currículos oficiais e suas diversas normatizações, de forma a

compreender, por um lado, a necessidade de padrões nacionais para a escolarização

básica e o contexto em que tais padrões foram elaborados; por outro, estabelecer as

suas possibilidades de ação nas mediações entre as orientações externas e aquilo que a

realidade de cada situação traz de específico e de desafiador para a efetiva

democratização do conhecimento.

É por meio do currículo que se organizam os conteúdos e as atividades que permitirão

aos alunos o alcance desse conhecimento, produzido e legitimado socialmente ao longo

da história, como resultado da busca, pela humanidade, de compreensão e

transformação dos fenômenos naturais e sociais. Com o estudo que aqui realizará,

você, certamente, terá oportunidade de ampliar o seu entendimento a respeito desse

desafio e assim poderá abrir novas possibilidades para a sua prática.

Para que alcancemos esse objetivo, nossa unidade está composta por dois tópicos:

1. O papel do currículo como espaço de formação humana

2. Um pouco de teoria curricular

Para o estudo dessas temáticas, você deverá realizar também a leitura dos seguintes

textos, que estão depositados na Biblioteca do curso:

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LEITURAS COMPLEMENTARES

SAVIANI, Dermeval. Sobre a Natureza e Especificidade da Educação.In: ________

10ª ed. Pedagogia Histórico-Crítica. Campinas,SP: Autores Associados, 2008,p. 11-22.

MOREIRA, Antonio Flavio Barbosa e CANDAU, Vera Maria. Educação escolar e

cultura(s): construindo caminhos. Rev. Bras. Educ. [online]. 2003, n.23.

SANTOS, Lucíola L. de C. P.. História das disciplinas escolares:outras perspectivas

de análise. Educação e Realidade, [S.l.], v. 20, n.2, p. 60-68, jul./dez. 1995.

Esta unidade possui uma atividade obrigatória e outra optativa. A atividade optativa

poderá ser escolhida por você dentre as opções disponibilizadas

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ATIVIDADE 1 - OBRIGATÓRIA

Tomando como referência o texto básico desta unidade

e ainda os três artigos lidos para aprofundamento das

temáticas, escreva um breve texto respondendo as

seguintes questões:

1. Qual o entendimento sobre currículo salientado

por Saviani no texto indicado? Você considera

que as ênfases dadas pelo autor trazem maior

esclarecimento para a discussão curricular em

sua escola?

Faça uma síntese do que entendeu a respeito da

transposição dos conhecimentos construídos

socialmente pela humanidade (culturais,

científicos, artísticos...) para o conhecimento

ou o conteúdo escolar.

Na realidade de sua escola ou sistema de ensino,

você identifica traços de um “currículo oculto”?

Dê alguns exemplos vinculados a seu cotidiano

escolar.

Não são necessárias mais do que duas laudas para esta

tarefa.

Envie seu texto para a Base de Dados “Atividade 1”.

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ATIVIDADE 3 - COMPLEMENTAR

Dentre os autores estrangeiros citados no texto básico,

escolha um cuja teorização se aproxime mais do seu

trabalho. Faça uma breve pesquisa a respeito da teoria

deste autor, justificando sua escolha.

Envie a pesquisa para a Base de Dados “Atividade 3”.

ATIVIDADE 2 - COMPLEMENTAR

Após a leitura do texto de SAVIANI, Demerval. Sobre a

natureza e especificidade da educação. In: ________.

Pedagogia histórico-crítica. Campinas,SP: Autores

Associados, 2008,p. 11-22, disponível

na Biblioteca,discuta com seus colegas a natureza e a

especificidade da educação, tentando identificar os

principais elementos que devem estar presentes no

trabalho educativo.

Utilize o Fórum “Atividade 2”, tópico “Natureza e

Especificidade da Educação”, para postar sua

contribuição.

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ATIVIDADE 4 - COMPLEMENTAR

Procure na bibliografia didática elementos

enriquecedores para a compreensão do que

denominamos de “currículo oculto”. Alguns autores que

trabalham com essa temática poderão ser utilizados

nesse estudo, o que certamente enriquecerá a

atividade.

Para conceituar o termo sugerido, utilize a

ferramentaWiki “Atividade 4”.

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O papel do currículo como espaço de formação humana

A palavra currículo é muito familiar a todos nós que trabalhamos nas escolas e nos

sistemas educacionais. A familiaridade com o termo, no entanto, faz com que quase

não nos dediquemos a refletir sobre o seu sentido. Há entendimentos mais amplos ou

mais restritos daquilo que denominamos ou entendemos por currículo, que vão desde os

conteúdos a serem ensinados e aprendidos; experiências de aprendizagem escolares a

serem vividas pelos alunos; planos pedagógicos elaborados por professores, escolas e

sistemas educacionais; objetivos a serem alcançados por meio do processo de ensino;

até os processos de avaliação que terminam por influenciar os conteúdos e os

procedimentos selecionados nos diferentes graus da escolarização.

Distintas concepções sobre a educação e o papel da escola podem ser associadas a

diferentes entendimentos ou ênfases a respeito do currículo. Cabe retomá-las, no

entanto, para não perder de vista na sua definição aquilo que é central: a

especificidade da escola. Cabe, portanto, à escola cumprir o objetivo antropológico de

garantir a continuidade da espécie humana, socializando para as novas gerações o que

resulta do seu desenvolvimento cultural, como base para essa continuidade (LIMA,

2006). O currículo é o elemento orientador da organização do trabalho escolar.

Em determinado momento da evolução da humanidade, tornou-se necessária a

introdução de uma nova instituição social para garantir a transmissão dos saberes.

Criaram-se, então, um espaço e um tempo separados da vida cotidiana para realizar tal

objetivo: a escola e o tempo escolar.

Em texto clássico “Sobre a Natureza e a Especificidade da Educação”, Saviani (2008,

p.13) ressalta que o mundo humano é o mundo da cultura e que a natureza humana é

produzida pelo homem, sobre a base da natureza biofísica. Conseqüentemente, afirma

o autor, “o trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada

indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo

conjunto dos homens”.

A humanização se refere, portanto, diretamente ao desenvolvimento cultural da

espécie. A partir dessa compreensão histórico-crítica da educação, podemos inferir

que o seu objeto diz respeito, por um lado, à identificação daqueles elementos

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culturais que precisam ser assimilados pelos homens para que se tornem humanos; e

por outro, à descoberta das formas mais apropriadas para atingir esse objetivo.

Como campo de estudo na área da educação, o currículo representa uma forma de

aprofundamento da compreensão do trabalho educativo. Estudos voltados

especificamente para o currículo podem ser encontrados desde o início do século XX.

Um dos marcos nestes estudos data do ano de 1918, com a publicação do livro The

Curriculum, de F. Bobbit, nos Estados Unidos. A sociedade americana vivia um

momento marcado pelas transformações de ordem econômica, política e cultural, o

que explica o seu interesse no sentido de oferecer a escolarização para as massas. Os

princípios defendidos por Bobbit para a organização curricular buscavam, sobretudo,

maior eficiência no ensino, apoiando-se nos mesmos princípios postulados por F. W.

Taylor para o trabalho em geral.

Outro teórico, também americano, que marcou os estudos sobre o currículo foi R. Tyler

(1974). Esse autor teve a sua obra muito divulgada no Brasil e buscava a eficiência

como critério de organização curricular. Ele apontou, como questões básicas para

orientar o currículo escolar, a definição dos objetivos educacionais a serem atingidos; a

escolha das experiências a serem oferecidas para alcançar os objetivos; a forma de

organizar eficientemente essas experiências; e a maneira de avaliar se os objetivos são

alcançados (SILVA, 2000). Associava-se, portanto, o currículo à organização técnica dos

conteúdos de ensino e das experiências pedagógicas.

A partir da segunda metade da década de 1970, as proposições curriculares com tal

ênfase tecnicista passaram a ser alvo de críticas. A teoria curricular abriu-se para novas

reflexões que dizem respeito a um julgamento mais generalizado dos modelos

educacionais vigentes e do seu papel frente à desigualdade social e à justiça na escola.

O modelo escolar, suas práticas e seus conteúdos, passaram a ser relacionados de

forma mais enfática à ordem social vigente, vista como uma perspectiva a ser

combatida. As perspectivas críticas vão evidenciar o quanto uma organização curricular

predominantemente técnica e instrumental esconde o papel reprodutor desempenhado

pela escola na perpetuação da sociedade de classes, reforçando assim o modo de

produção capitalista, discriminador e repressivo.

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Autores críticos brasileiros como Paulo Freire e Dermeval Saviani, mesmo que com

distintas ênfases nos referenciais de análise, abriram fortes debates educacionais no

país, influenciando a teoria pedagógica particularmente a partir dos anos de 1980. Suas

críticas a respeito da educação e do trabalho pedagógico escolar influenciaram os

estudos posteriores de forma indelével. Outros estudiosos passaram a tomar a

especificidade curricular como base de estudos, preocupados com a democratização da

educação e o direito à educação das classes subalternas. Acrescentou-se a essa

abordagem a preocupação com as questões relacionadas à alteridade e à diferença.

Outras ordens de diversidade que permeiam o trabalho escolar foram trazidas à tona,

com reflexões esclarecedoras sobre os aspectos que pesam nas decisões que envolvem

a seleção dos conhecimentos curriculares.

Os estudos curriculares se complexificaram e ao mesmo tempo foram amplamente

enriquecidos a partir do que se denomina de “perspectiva multicultural”. Segundo

Moreira e Candau (2008), tal perspectiva trouxe a necessidade de uma nova postura

diante dos conteúdos curriculares, que deveriam incorporar os preceitos dos direitos à

educação e justiça social. Para tanto, precisariam levar em conta as diferentes

identidades culturais tendo em mente não só as condições socioeconômicas da

população escolar, mas também suas raízes étnicas e culturalmente diferenciadas. O

currículo como um campo de desenvolvimento de pesquisas é hoje fundamental para

que visões estereotipadas sejam banidas, para que questões atuais do desenvolvimento

da humanidade sejam enfrentadas, para que a escola efetivamente participe de uma

construção mais humana da sociedade.

Assim, pode-se perceber que a crítica que tem denunciado articulações da escola ao

desenvolvimento de condições perpetuadoras da desigualdade social (por meio de uma

organização voltada à adequação da escola a um sistema social desigual e

discriminador) trouxe também amplo movimento de resistência e de renovação

curricular. Segundo Giroux (1983), abordagens curriculares predominantemente

tecnicistas e instrumentais, que ignoram a dimensão histórica, ética e política do

currículo e do conhecimento, precisavam ser revistas. Tal constatação levou ao

redirecionamento dos estudos acerca do currículo, evidenciando que se ele comporta a

possibilidade de adaptação dos indivíduos à sociedade tal como a mesma se apresenta,

também pode ser um elemento de resistência às formas de dominação política,

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econômica, ideológica. Trata-se, segundo esse autor, de voltar a ação educativa para

uma outra hegemonia, na qual deve pesar a emancipação humana, a sua desalienação.

É preciso entender melhor e cada vez mais a respeito das relações de poder que se

estabelecem na sociedade e que atravessam de alguma forma o trabalho escolar. O

currículo, como instrumento que organiza o conteúdo do ensino escolar, constitui-se

num processo de seleção da cultura com vistas à formação das gerações mais novas.

Assim, vale sempre interrogar sobre a sua direção.

REFERÊNCIAS

APPLE, M. Ideologia e currículo. São Paulo: Cortez, 1986.

GIROUX, H. Pedagogia Radical. Subsídios.Trad. ZIBAS, D. M. L. São Paulo: Cortez,

1983.

LIMA, E. S. Indagações sobre currículo: currículo e desenvolvimento humano .

Organização do documento Jeanete Beauchamp, Sandra Denise Pagel, Aricélia

Ribeiro do Nascimento. – Brasília : Ministério da Educação, Secretaria de Educação

Básica, 2008. 56 p.

MOREIRA, Antonio Flavio Barbosa e CANDAU, Vera Maria. Educação escolar e

cultura(s): construindo caminhos. Rev. Bras. Educ. [online]. 2003, n.23.

SANTOS, Lucíola L. de C. P.. História das disciplinas escolares: outras perspectivas

de análise. Educação e Realidade, [S.l.], v. 20, n.2, p. 60-68, jul./dez. 1995.

SILVA, T.T. Teorias do currículo. Portugal: Porto Editora, 2000.

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Um Pouco de Teoria Curricular

O conhecimento como centro do currículo

O conhecimento é a “matéria prima” do trabalho pedagógico escolar. Mas todo o

conhecimento, por ser produto histórico-cultural.

Na medida em que a produção, elaboração e disseminação do conhecimento não são

neutras, planejar a ação educativa, assim como educar, são ações políticas que

envolvem posicionamentos e escolhas articulados aos modos de compreender e agir no

mundo. Há conhecimentos, como nos explicita o texto já lido de Saviani (2008), que são

imprescindíveis para a vida na sociedade contemporânea, mas mesmo assim têm a sua

história e o seu contexto a serem revelados.

O conhecimento escolar, conforme visto no no texto de Moreira e Candau (2008), não

foge às premissas apresentadas, mas conta com uma construção específica. Não se

trata simplesmente de uma simplificação dos conhecimentos produzidos fora da escola.

Ele tem origem nos saberes e nas práticas socialmente construídas, mas não se pode

imputar uma correspondência direta entre o conhecimento dos vários campos do saber

científico e artístico e as disciplinas escolares. Há um complexo processo de mediação

que faz a sua transposição tanto no que diz respeito aos conteúdos das diversas

disciplinas, quanto na própria seleção de disciplinas ou áreas de conhecimento que

compõem o currículo.

Os saberes e as práticas socialmente construídas, que dão origem aos conhecimentos

escolares, provêm, segundo Terigi (1999), de saberes e conhecimentos produzidos nos

chamados“âmbitos de referência dos currículos”. Segundo a autora, tais âmbitos

correspondem: (a) às instituições produtoras do conhecimento científico (universidades

e centros de pesquisa); (b) ao mundo do trabalho; (c) aos desenvolvimentos

tecnológicos; (d) às atividades desportivas e corporais; (e) à produção artística; (f) ao

campo da saúde; (g) às formas diversas de exercício da cidadania; (h) aos movimentos

O conhecimento é produzido e elaborado pelos homens, por meio da interação que

travam entre si para encontrar respostas aos desafios que se interpõem entre eles e

a produção da sua existência material e imaterial, articula-se aos mais variados

interesses.

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sociais. Para tornarem-se conhecimentos escolares, os conteúdos provindos desses

diversos âmbitos de produção do conhecimento, são selecionados e de certa forma

reestruturados, o que segundo Moreira e Candau (2008) se trata de um processo de

recontextualização dos conteúdos.

Compreender esse processo de recontextualização pelo qual passa o conhecimento

escolar tem sido um desafio para os educadores e para a formação dos professores,

particularmente nas licenciaturas de conteúdos específicos. Todos nós sabemos o

quanto tem sido difícil integrar o conteúdo e a prática nesses cursos de formação

docente, que, em sua maioria, desarticulam no seu percurso formativo as disciplinas de

conteúdo específico daquelas denominadas pedagógicas.

O que o estudante aprende é o produto, o resultado de um processo que não inclui,

muitas vezes, o percurso de construção dos conhecimentos apresentados. Essa exclusão

pode ser considerada representativa do processo de descontextualização que ocorre nos

conteúdos escolares. Como reduzir a descontextualização para não perder o sentido dos

conteúdos? Eis o desafio.

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As contribuições da nova sociologia da educação para os estudos curriculares

As investigações sobre o currículo e sobre as disciplinas escolares ocupam cada vez

mais espaço nos estudos educacionais. Segundo Moreira (2003, p. 35), “para os

sociólogos das disciplinas escolares, a história do currículo tem por meta explicar por

que certo conhecimento é ensinado nas escolas em determinado momento e local e por

que ele é conservado, excluído ou alterado”. A contribuição internacional para estas

investigações, particularmente dos estudos que promoveram rupturas epistemológicas

importantes, tem sido focalizada pelos nossos autores, tais como as reflexões teóricas

vinculadas às seguintes abordagens:

a. A sociologia do currículo desenvolvida na Grã-Bretanha;

b. A abordagem norte-americana;

c. A abordagem francesa referente à sociologia da educação.

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As contribuições da nova sociologia da educação para os estudos curriculares

A sociologia do currículo desenvolvida na Grã- Bretanha

Nos anos de 1960, os sociólogos britânicos preocuparam-se em explicar as funções

sociais da escolarização e os limites dos modelos meritocráticos predominantes. Estes

modelos atestavam que a escola era acessível aos “melhores alunos”,

independentemente da origem social e do sexo, justificando assim uma organização

escolar diferenciada segundo as aptidões individuais e as classes sociais. Foi nesse

contexto que surgiu, na Inglaterra, a nova sociologia da educação ou a também

chamada sociologia do currículo, que rejeitou desde o início aabordagem

funcionalista então predominante nos estudos sociológicos da educação.

A nova sociologia da educação interessou-se pelos processos que ocorrem nas escolas e

salas de aula, pelos conteúdos e saberes incorporados nos programas e cursos, pelas

interações que os atores estabelecem no cotidiano escolar. As reflexões teóricas e

empíricas de Basil Bernstein, que analisa as formas de controle veiculadas na escola, e

de Michael Young, que se interessa pelos planos de ensino e pelas formas de avaliação,

são centrais nessa nova perspectiva científica.

Bernstein inicia sua reflexão definindo curriculum como os princípios que regem a

seleção das matérias escolares e as relações entre elas. Para ele, o plano de ensino é o

reflexo da distribuição do poder numa sociedade que procura assegurar o controle

social e determinar o comportamento dos indivíduos.

Partindo de uma perspectiva muito próxima, Young (1973) julga os planos de ensino

como insuficientes ou inadequados à complexidade dos sistemas de ensino. Sua

preocupação com o que se sucede no interior da “caixa-preta” contribuiu para

consolidar uma crítica cultural e política sobre a estruturação da escola e a circulação

dos saberes escolares. Young (1973) coloca a questão dos saberes escolares no centro

de sua construção teórica, distinguindo quatro modalidades principais:

1. os saberes de tipo alfabético, que repousam sobre uma tradição acadêmica e

livresca;

2. os saberes que privilegiam o individualismo intelectual;

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3. os saberes abstratos, que obedecem a uma lógica de estruturação

independente da experiência subjetiva dos indivíduos;

4. os saberes que se distanciaram da vida e da experiência cotidiana.

A abordagem norte-americana

Sob a influência das teorias críticas (marxistas e neomarxistas), que qualificaram a

educação como instrumento de reprodução das relações de dominação, e das teorias da

resistência, a perspectiva norte-americana desenvolve, também desde a década de

1960, uma análise crítica inspirada principalmente nos trabalhos de Bowles e Gintis.

Segundo Silva (1992, p. 67), esses autores ressaltam “a contradição entre a ênfase nos

aspectos democráticos existentes na esfera política e o caráter autoritário e despótico

da produção [...], entre as necessidades de legitimação e as necessidades de

acumulação do capitalismo, processos nos quais a escola está centralmente implicada”.

Aos olhos das teorias críticas, todos os estudos sobre o currículo ou sobre as mudanças

na organização escolar devem considerar as perspectivas subjetivas dos professores

concernentes aos saberes que ensinam, à pedagogia que colocam em prática, ao

engajamento na carreira e às perspectivas constitutivas de sua identidade profissional.

As teorias da resistência, por sua vez, têm contribuído para ampliar a reflexão crítica

sobre os conteúdos “ocultos” veiculados na escola. O termo “currículo oculto” foi

empregado para designar certas características da vida escolar suscetíveis de marcar,

em profundidade, a personalidade do aluno.

Além disso, teóricos como Michael Apple (que estabelece um vínculo entre

“ideologia ecurrículo”, entre “educação e poder”) e Henry Giroux (que reivindica um

uso mais dialético e heurístico do conceito de resistência) procuram correlacionar as

ideias de contradição, de luta e de resistência observadas no interior das instituições

educacionais a uma reflexão sobre os mecanismos de dominação ideológica,

vislumbrando uma prática pedagógica crítica voltada à emancipação.

Segundo Moreira (2003, p. 75), “tanto Apple como Giroux rejeitam o discurso do

planejamento e do controle e os modelos de organização curricular a eles associados”,

propondo um discurso que vê a pedagogia como uma forma de política cultural. Esses

autores não elegeram os saberes escolares como foco principal de suas reflexões, como

o fizeram os sociólogos do currículo na Grã-Bretanha. Sua perspectiva de análise é mais

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geral e reafirma a necessidade de engajamento na luta política. A questão do

conhecimento aparece de forma mais pontual nos textos publicados mais

recentemente.

A perspectiva emancipatória e engajada, que caracteriza as reflexões dos teóricos

críticos e da resistência, supõe a “possibilidade da criação, pelos educadores radicais,

de uma linguagem capaz de fazer com que os professores levem a sério o papel que a

escolarização desempenha na vinculação de conhecimento e poder” (GIROUX e

MACLAREN, 2002, p. 127-128). Eles devem se preparar para lidar com um discurso que

oferece novas alternativas para o desenvolvimento de relações sociais democráticas,

que estabelece elos entre o político e o pedagógico, a fim de incentivar o aparecimento

de “contra-esferas públicas” implicadas seriamente em articulações e práticas da

democracia radical. Ao visar subverter os processos de socialização, essas esferas são

consideradas contra-hegemônicas, permitindo um entendimento mais político, teórico

e crítico da dominação e do tipo de “oposição ativa” que deve ser engendrada.

A abordagem francesa referente à sociologia da educação

Os pensamentos de autores clássicos são fundamentais para entender a teoria curricular

na França. Destacam-se entre esses autores: Bourdieu e Passeron, Isambert-Jamati e

Forquin, Dubet e Martuccelli, Bernard Charlot.

Os trabalhos de Bourdieu e Passeron, especialmente nas obras “Os Herdeiros” e “A

Reprodução”, são uma referência fundamental aos estudos sobre a escola e a cultura

escolar. Segundo estes autores, para exercer a função de legitimação delegada pelo

grupo dominante, a escola transmite conteúdos selecionados segundo os interesses

desse grupo. A cultura transmitida pela escola se apresenta, então, como objetiva e

inquestionável, embora seja arbitrária e de natureza social (portanto, resultante de

relações de força). A cultura escolar difunde uma cultura de classe fundada na primazia

de certos valores, favorecendo uma relação de cumplicidade e de comunicação

específica.

O conceito de “habitus” está no centro da teoria de Bourdieu e de seus colaboradores,

tendo sido empregado desde os primeiros trabalhos para designar um “sistema de

disposições duráveis e transmissíveis, estruturas estruturadas predispostas a funcionar

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como estruturas estruturantes”; isto é, como princípios geradores e organizadores de

práticas e de representações.

O termo “habitus” tem uma longa tradição (de Aristóteles a Norbert Elias), tendo sido

utilizado por Durkheim para designar o estado profundo que existe em cada um de nós,

donde derivam, e encontram sua unidade, os outros estados. É sobre esse estado que o

educador deve exercer uma ação durável. A educação visa, nessa perspectiva,

constituir um estado interior e profundo, que define um sentido para toda a vida do

indivíduo. O conceito de habitus foi construído ao longo da produção teórica de

Bourdieu e de seus colaboradores (1964, 1970, 1979, 1980, 1997) e se constitui num dos

seus conceitos fundamentais, tendo sido sistematicamente requalificado e

ressignificado.

Os conteúdos curriculares transmitem regras morais e maneiras de perceber o mundo,

dotando os alunos de uma lógica intelectual comum, que constitui o “habitus culto” de

sua época. O conjunto dessas disposições funda a constância e a relativa coerência dos

comportamentos e determina o modo pelo qual cada grupo social lê, avalia a realidade

e se move na sociedade. Ohabitus se manifesta no dia a dia, correspondendo ao “senso

prático”, e permite aos indivíduos adaptar sua vida cotidiana às exigências sociais de

maneira automática, sem precisar recorrer a uma reflexão consciente.

Motivados pela compreensão dos efeitos perversos da escolarização – pois a oferta

escolar não é homogênea e não tem sempre a mesma eficácia – e pela possibilidade de

desvelar a prática docente visando enfrentar o poder das estruturas organizacionais, os

estudos de Isambert-Jamati (1990) e de Forquin (1990) introduziram novos elementos

ao debate educacional, reorientando o panorama intelectual dos anos seguintes.

Para Isambert-Jamati (1990, p. 41), “afirmar globalmente que a escola é ao mesmo

tempo o reflexo da sociedade e o meio de consolidar sua ordem é fácil. Mas é bem mais

árduo ir além das correspondências aproximativas e colocar em dia as mediações”.

Considerando que a escola legitima as hierarquias e que não se pode negligenciar seu

papel na reprodução social, Isambert-Jamati reafirma sua atuação no progresso das

nações (segundo a concepção funcionalista) sem deixar de reconhecer o lugar

inequívoco que a educação ocupa nos projetos de emancipação política. Por essa razão,

a questão do fracasso escolar se torna central nos meios pedagógicos, especialmente

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em contextos de massificação do acesso, tal como o debate sobre os saberes escolares

e as práticas de ensino. A autora sublinha que uma vez que um nível de escolaridade

bem além do primário se torna a norma, percebe-se que prever novas vagas não é mais

suficiente. Torna-se necessário modificar a maneira de proceder, as referências

culturais, as condutas esperadas, pois se estas continuarem exatamente como antes,

uma parte importante do novo público enfrentará muitas dificuldades na instituição

escolar e será rapidamente eliminado, sob a justificativa de sua inaptidão.

Forquin edifica uma “sociologia da cultura escolar” em sua obra “Escola e cultura”

(publicada no Brasil em 1993) e se torna referência incontestável nas Ciências da

Educação. Cultura escolar significaria, segundo ele, “o conjunto dos conteúdos

cognitivos e simbólicos que, selecionados, organizados, ‘normalizados’, ‘rotinizados’,

sob o efeito dos imperativos da didatização, constituem habitualmente o objeto de uma

transmissão deliberada no contexto das escolas”.

Dubet e Martuccelli (1996) esboçam uma “sociologia da experiência escolar” que

procura caracterizar a heterogeneidade das experiências construídas pelos alunos em

relação à atividade escolar, tendo como referência um estudo sócio-histórico minucioso

do sistema educacional francês (abrangendo desde a escola elementar até o liceu).

Visando a produção de uma leitura crítica da escolarização, esses autores reformulam a

hipótese clássica de que a escola não funciona em benefício de todos, acrescentando o

fato de que sua natureza varia muito significativamente de um ponto a outro do

sistema. No centro de um quadro administrativo homogêneo, a escola se diversifica

tanto que pode ser considerada como referência de socialização e de subjetivação para

uns, e como um obstáculo à ascensão social para outros. A distância entre a cultura

escolar e a cultura social (ou as culturas sociais) é tão grande que os alunos têm o

sentimento de viver em dois mundos completamente distintos.

Essa perspectiva, que pode ser vista como um dos desdobramentos da teoria da

reprodução, supõe que a escola não é apenas um instrumento dócil da reprodução

social e procura demonstrar que a construção do sentido do saber está diretamente

ligada a uma determinada experiência social (decorrente do meio de origem do aluno),

mas depende também de uma experiência pessoal (que não pode ocultar-se num

fatalismo sociológico).

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Numa obra consagrada ao estudo da “relação com o saber”, considerada como uma

maneira de se relacionar com o mundo, Charlot (1997) assinala que a aquisição do

saber permite obter certo domínio do mundo em que se vive, comunicar-se com os

outros seres e dividir com eles o próprio mundo, além de tornar possível viver uma

gama de experiências e se tornar melhor, mais seguro de si, mais independente.

A relação com o saber pode, portanto, ser definida como uma forma de relação com os

processos (ato de aprender), com os produtos (os saberes são vistos como competências

adquiridas, como objetos institucionais, culturais e sociais) e com situações de

aprendizagem.

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REFERÊNCIAS

CHARLOT, B. Du rapport au savoir; elements pour une théorie. Paris: Anthropos,

1997.

DUBET, F. e MARTUCCELLI, D. À l’école. Sociologie de l’expérience scolaire. Paris:

Seuil, 1996.

FORQUIN, J-C Escola e cultura; as bases sociais e epistemológicas do conhecimento

escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993 (Publicação original em francês, 1990).

GIROUX, H.A. e McLAREN, P. Formação do professor como uma contra-esfera

pública: A pedagogia radical como uma forma de política cultural. In MOREIRA, A.F.

e SILVA, T.T. (Orgs.) Currículo, cultura e sociedade. São Paulo: Cortez (1994), 6ª ed.

2002, pp. 125-154.

ISAMBERT-JAMATI, V. Les saviors scolaires; enjeux sociaux des contenus

d’enseignement et de leurs réformes. Paris: Éditions universitaires, 1990.

MOREIRA, A.F.B. Currículos e programas no Brasil. Campinas: Papirus (1990), 10ª

ed., 2003.

MOREIRA, A. F. B e CANDAU, V. M. Indagações sobre currículo: currículo,

conhecimento e cultura. Organização do documento Jeanete Beauchamp, Sandra

Denise Pagel, Aricélia Ribeiro do Nascimento. – Brasília: Ministério da Educação,

Secretaria de Educação Básica, 2008. 48 p.

SILVA, T.T. O que produz e o que reproduz em educação; ensaios de sociologia da

educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.

TERIGI, Flavia. Curriculum. Itinerarios para aprehender un territorio. Buenos Aires,

Santillana, 1999.

YOUNG, M. Les programmes scolaires consideres du point de vue de la sociologie

de la connaissance (1973). In FORQUIN, J.-C. (Org.) Les sociologues de l’éducation

américain et britanniques; présentation et choix des textes. Paris, Bruxelles: De

Boeck Université/INRP, 1997, pp. 173-199.

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A Reforma Educacional dos anos 1990 e sua proposta curricular para a Educação Básica

Apresentação

Prezado Cursista,

A educação escolar brasileira adquiriu novos contornos nos anos posteriores à

Constituição Federal de 1988. Uma série de mudanças foram então realizadas no

âmbito do que se convencionou denominar de Reforma Educacional dos Anos 1990,

particularmente pela profusão de normatizações que se seguiram à promulgação da Lei

de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 (9394/96). Essa lei organizou a

educação brasileira em dois grandes níveis: a Educação Básica (formada pela Educação

Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio) e a Educação Superior.

Nesta unidade focalizaremos as mudanças curriculares implementadas na Educação

Básica como parte do conjunto de medidas de reforma do sistema educacional

brasileiro que vêm ocorrendo desde a década de 1990. A abordagem desse tema tem

como objetivos:

• refletir sobre os processos de inovação curricular e a prática docente;

• diferenciar o caráter dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) daquele

das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs)

• caracterizar as novas orientações curriculares presentes nas DCNs

Os seguintes tópicos comporão a unidade:

1. As inovações curriculares e a prática docente

2. A questão curricular no plano político-institucional: Parâmetros Curriculares

Nacionais X Diretrizes Curriculares Nacionais

3. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica

Para o estudo da temática que compõe esta unidade consideramos como leitura

obrigatória o texto abaixo, que se encontra depositado na Biblioteca do curso:

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Outras leituras complementares poderão enriquecer o seu estudo, e outras ainda

poderão ser recomendadas pelo seu professor(a):

LEITURAS COMPLEMENTARES

LOPES, Alice Casimiro. Políticas curriculares: continuidade ou mudança de rumos?

Rev. Bras. Educ. [online]. 2004, no. 26

SANTOS, Luciola Licinio de C. P. Políticas públicas para o ensino fundamental:

Parâmetros Curriculares Nacionais e Sistema Nacional De Avaliação (SAEB). Educ.

Soc., Set 2002, vol.23, no.80, p.346-367

BONAMINO, Alicia and MARTÍNEZ, Silvia Alicia. Diretrizes e Parâmetros Curriculares

Nacionais para o ensino fundamental: a participação das instâncias políticas do

Estado. Educ. Soc., Set 2002, vol.23, no.80, p.368-385

MOREIRA, Antonio Flavio B. Propostas curriculares alternativas: limites e

avanços. http://www.scielo.br/pdf/es/v21n73/4210.pdf

LEITURA OBRIGATÓRIA

CURY, Carlos Roberto Jamil. A Educação Básica no Brasil. Educ. Soc., set. 2002,

vol.23, no.80, p.168-20

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ATIVIDADE 6 - COMPLEMENTAR

Prepare um quadro apontando as principais diferenças

entre “Diretrizes Curriculares” e “Parâmetros

Curriculares Nacionais”. O que define o caráter dessas

duas disposições curriculares?

Disponibilize seu quadro no Fórum “Atividade

6”, tópico“Diretrizes Curriculares X Parâmetros

Curriculares Nacionais”.

ATIVIDADE 5 - COMPLEMENTAR

Escolha uma modalidade ou etapa da educação básica

que esteja mais próxima da sua atuação na escola. A

partir da leitura de um dos textos disponíveis na

Biblioteca, que diz respeito à modalidade ou etapa

escolhida, redija um texto, em até três páginas,

comentando as principais ideias apresentadas pelo

autor(a) relativas às diretrizes curriculares.

Utilize a ferramenta Tarefa Online “Atividade 5 ”para

enviar seu texto.

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ATIVIDADE 8 - COMPLEMENTAR

Após a leitura do texto “Políticas Públicas para o ensino

fundamental: parâmetros curriculares nacionais e

sistema nacional de avaliação (SAEB)”, de Lucíola

Licinio de C. P. Santos, disponível

emhttp://www.scielo.br/pdf/es/v23n80/12936.pdf,

discuta as principais ideias apresentadas pela autora.

Utilize o Fórum “Atividade 8”, tópico “Políticas

Públicas para o ensino fundamental”.

ATIVIDADE 7 - COMPLEMENTAR

Escolha alguns(mas) professores(as) da sua escola e faça

junto a eles(as), através da metodologia do “grupo

focal”, uma investigação a respeito da atitude que

apresentam frente às inovações curriculares para a sua

prática docente. Redija um pequeno texto mostrando as

relações que os docentes estabelecem com as inovações

curriculares.

Poste o seu texto no Fórum “Atividade 7”, tópico

“Inovações curriculares para a prática docente”.

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As inovações curriculares e a prática docente

O currículo escolar assumiu centralidade nas políticas educacionais que foram se

constituindo no interior do movimento das reformas educacionais dos anos de 1990.

Embora estas reformas se constituam de ações e mudanças legislativas nas mais

diversas áreas da educação, as modificações nas políticas curriculares assumiram papel

de destaque, como se fossem em si a reforma educacional.

Ocorre, no entanto, que o processo de elaboração curricular é uma dinâmica constante

de construção e reconstrução do currículo. Os diversos sistemas e as escolas não se

apresentam como tábulas rasas, prontas a assimilar tudo que lhes é apresentado.

Parâmetros e normatizações elaboradas centralmente e externamente confrontam-se

com inovações singulares, gerando muitas vezes conflitos com as práticas em

desenvolvimento nas escolas.

Estudos têm mostrado que muitos professores, mesmo quando aderem às novas

propostas curriculares, buscam interpretá-las e adaptá-las, de acordo com o contexto

institucional do seu local de trabalho, dando características específicas aos conteúdos e

práticas de ensino. Há, contudo, situações em que as novas propostas trazem

insegurança e inquietação aos docentes porque rompem com práticas já estabelecidas.

Como decorrência, resistem às novas propostas curriculares e cristalizam práticas

tradicionais, revitalizando-as.

É importante salientar que são necessárias diretrizes curriculares nacionais para a

constituição de um sistema público de educação básica. Importa, porém, que estas

sejam suficientemente indicativas e ao mesmo tempo acolhedoras da diversidade que o

país contempla na sua formação cultural e social.

Para este item, que problematiza a questão das reformas curriculares e sua ingerência

na prática docente, você deverá realizar a leitura do texto de Lucíola Licinio de C. P.

Santos “Políticas Públicas para o ensino fundamental: parâmetros curriculares nacionais

e o sistema nacional de avaliação (SAEB)”, depositado na Biblioteca do curso.

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SAIBA MAIS

Para concluir o item 1.2, faça a leitura do texto de Antonio Flavio Barbosa Moreira,

intitulado “Propostas curriculares alternativas: limites e avanços”, disponível na

biblioteca ou no endereço: http://www.scielo.br/pdf/es/v21n73/4210.pdf.

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A questão curricular no plano político-institucional: Parâmetros Curriculares Nacionais X Diretrizes Curriculares Nacionais

A reforma curricular que vem sendo implementada desde os anos 1990 vem se

constituindo num embate constante entre as diversas forças impulsionadoras que visam

ao desenvolvimento da nossa sociedade. Saviani (2004) entende que a concepção

produtivista marcou fortemente a nova LDB e suas normatizações. Tal concepção, já

presente nas décadas de 1960 e 1970, recobrou, a partir dos anos 1990, novo vigor no

contexto do denominado neoliberalismo, acionada como instrumento de adequação e

ajustamento da educação às demandas do mercado numa economia globalizada.

O embate sinalizado ocorre também junto às instâncias político–institucionais

responsáveis pelo ordenamento e execução da educação. Exemplo disso, no campo

curricular da educação básica, é o confronto entre os principais documentos

norteadores oficiais que orientam as práticas escolares: os Parâmetros Curriculares

Nacionais (PCN) e as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN).

Pretendemos aqui, de forma breve, apresentar o contexto que explica a existência de

Parâmetros Curriculares Nacionais e de Diretrizes Curriculares Nacionais para a

Educação Básica.

Para iniciar, é importante destacar que diretrizes curriculares nacionais são uma

exigência constitucional. Veja-se o que está disposto no art. 22 e no art. 210 da

Constituição Federal de 1988, que dizem:

A intenção é que você, cursista, possa diferenciar essas duas instâncias orientadoras

dos currículos no nosso país.

Compete privativamente à União legislar sobre: (...) diretrizes e bases da educação

nacional; (...) Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de

maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e

artísticos, nacionais e regionais.

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Diretrizes Curriculares são linhas gerais que “assumidas como dimensões normativas,

tornam-se reguladoras de um caminho consensual, conquanto não fechado a que

historicamente possa vir a ter um outro percurso alternativo, para se atingir uma

finalidade maior. Nascidas do dissenso, unificadas pelo diálogo, elas não são uniformes,

não são toda a verdade, podem ser traduzidas em diferentes programas de ensino e,

como toda e qualquer realidade, não são uma forma acabada de ser” (CURY, 2002, p.

194).

Por decisão da Lei nº 9.131/95, que (re)criou o Conselho Nacional de Educação (CNE),

atribuiu-se à Câmara de Educação Básica (CEB) a função de deliberar sobre as diretrizes

curriculares para este nível de ensino. Contudo, após 1994, a equipe do governo então

empossado tomou a iniciativa de trazer à agenda política a discussão do que denominou

Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs).

Para entender melhor os PCNs – apontamentos históricos e conceituas

Elaboração e socialização: Os Parâmetros Curriculares Nacionais foram elaborados pelo

MEC (Secretaria de Educação Fundamental, SEF, Secretaria de Educação Média e

Tecnológica) ao longo do período de 1995 a 1998, com a finalidade de expor à

comunidade educacional a política de formação governamental. Após uma versão dos

documentos elaborados junto às Secretarias do MEC, com a participação de consultores

especialistas, tais documentos foram submetidos ao debate junto às Secretarias

Estaduais da Educação e outros setores acadêmicos, para uma análise do material

apresentado e seu aperfeiçoamento. Surgiram apoios e também muitas contestações,

particularmente no que se referia à metodologia utilizada para a sua elaboração,

vinculada essencialmente a grupos escolhidos pela administração federal. Após amplo

debate, os documentos tiveram sua versão final apresentada formalmente ao Conselho

Nacional de Educação.

A análise: A Câmara de Educação Básica, ao analisar o conjunto dos Parâmetros

(verdadeiros programas curriculares), buscou depreender destes as suas diretrizes.

Deliberou então não sobre os programas, mas sobre os princípios e as diretrizes neles

presentes.

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O conceito: os PCNs são propostas detalhadas de conteúdos que incluem

conhecimentos, procedimentos, valores e atitudes no interior de disciplinas, áreas e

matérias articulados em temas que se vinculam às várias dimensões da cidadania.

Abrigam os componentes curriculares, tais como língua portuguesa, ciências,

história/geografia, matemática, artes e educação física. Ao lado desses componentes,

foi introduzida uma inovação na forma de temas transversais(saúde, ecologia,

orientação sexual, ética e convívio social, pluralidade étnica, trabalho e economia)

com a finalidade de abrir espaço para tais conteúdos no âmbito do currículo.

Os PCNs desencadearam amplo debate tanto no que dizia respeito ao processo de

elaboração da proposta, quanto sobre aspectos de seu produto.

A Câmara de Educação Básica do CNE percebeu que se tratava de uma política

construída num movimento invertido, no qual um instrumento normativo de caráter

mais específico como os PCNs foi elaborado e encaminhado de forma a orientar um

instrumento de caráter mais geral, como as DCNs. Então, esta Câmara declarou os PCNs

não obrigatórios. Esse caráter não-obrigatório dos PCNs foi a solução encontrada pelo

CNE para firmar a sua competência de estabelecer as diretrizes curriculares.

A análise desse processo nos permite verificar as tensões provocadas pelas diferentes

perspectivas político-institucionais, sustentadas pelo MEC e pelo CNE a respeito do

papel que cabe ao Estado na elaboração curricular. Ao afirmar o "caráter não-

obrigatório" dos PCNs, o CNE tomou posição política de exclusão dos PCNs das

Segundo Cury (2002), o MEC buscou, por intermédio dos PCNs, preencher o disposto

na Constituição e no Plano Decenal de Educação. No entanto, os PCNs não

representam o conjunto de conteúdos mínimos e obrigatórios para o ensino

fundamental e também não chegam a ser uma proposta de diretrizes. Antes,

apresentam-se como “um complexo de propostas curriculares em que se mesclam

diretrizes axiológicas, orientações metodológicas, conteúdos específicos de

disciplinas e conteúdos a serem trabalhados de modo transversal e sem o caráter de

obrigatoriedade próprio da formação básica comumdo art. 210 da CF/88”

(CURY,2002,p. 192).

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referências mediadoras da definição de princípios e diretrizes curriculares para o

conjunto do ensino fundamental.

Compreende-se, assim, ser importante conceber os parâmetros como uma proposta

curricular dentre outras possíveis, retirando-se dos seus textos a marca de referência

padrão. É crucial tal postura para a construção de novos sentidos para as políticas

curriculares. Isso permitirá que outras propostas com princípios diversos, nos estados e

municípios, e mesmo nas escolas, tenham espaço para produzir novos sentidos para as

políticas curriculares, valorizando o currículo como espaço da pluralidade de saberes,

de valores e de racionalidades.

LEITURA COMPLEMENTAR

CURY, Carlos Roberto Jamil. A Educação Básica no Brasil. Educ. Soc., set. 2002,

vol.23, no.80, p.168-200.

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As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica

Ao definir Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica, o Conselho Nacional

de Educação estabeleceu conjuntos articulados de princípios, critérios e procedimentos

a serem observados na organização, no planejamento, na execução e na avaliação dos

diversos cursos e projetos pedagógicos dos sistemas de ensino e das escolas de todo o

Brasil.

As atuais Diretrizes Curriculares Nacionais pretendem diferenciar-se de uma sistemática

de fixação de currículos mínimos para cada curso ou modalidade de ensino, como

ocorria no passado. Assim, apresentam-se como uma referência a ser utilizada com

flexibilidade para dar conta da complexidade da estrutura federativa do país e da sua

diversidade econômica e social, bem como das diferenças regionais, pluralidade das

características e possibilidades das unidades escolares e dos educadores brasileiros.

É necessário, todavia, que nós, educadores do país, estejamos atentos ao conjunto das

políticas que estão sendo implementadas pela reforma educacional. Por um lado, a

flexibilização curricular significa possibilidades de diferenciação e diversificação no

ensino e da organização escolar para um melhor ajustamento da educação às demandas

do mercado numa economia globalizada e centrada no que alguns autores denominam

de “sociedade do conhecimento”(CHAUÍ, 2003); por outro lado, organiza-se de forma

cada vez mais aprimorada, um “sistema nacional de avaliação” centralizado no MEC,

responsável pelo controle do rendimento escolar em todos os níveis, desde a educação

infantil até a pós-graduação.

Segundo Bonamino e Martinez (2002), três documentos elaborados pela Câmara de

Educação Básica do CNE são fundamentais para a análise das Diretrizes Curriculares

Nacionais (DCNs):

Evidencia-se com isso uma ambiguidade na política educacional referente aos

currículos? A legislação flexibiliza o currículo, possibilita a diferenciação e

diversificação no ensino e na organização escolar; ao mesmo tempo, aprimora o

controle por meio da avaliação, de forma centralizada.

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• a Exposição de Motivos ao encaminhamento das DCNs (Brasil, 1997);

• o Parecer CNE/ CEB 4/1998: Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino

Fundamental (Brasil, 1998 a).

• a Resolução CNE/CEB 2/1998: Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais

para o Ensino Fundamental (Brasil, 1998 b).

Na sua Exposição de Motivos às Diretrizes Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997), é

possível perceber que para deliberar sobre as diretrizes e fixar os conteúdos

considerados mínimos para a formação básica comum, a Câmara de Educação Básica

apoiou-se numa série de referências que ultrapassam os Parâmetros Curriculares

Nacionais e incluem tanto as atribuições fixadas pela Constituição Federal, pela LDB e

pela Lei nº 9.131/95 quanto as "orientações significativas" oferecidas pelo Programa

Nacional de Direitos Humanos - PNDH, Decreto nº 1.904/96 e pelo Estatuto da Criança e

do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069/90 (Brasil, 1997).

O Parecer CNE/CEB nº 4/98, preparatório à Resolução sobre as DCNs, realça a questão

do federalismo como perspectiva na função deliberativa sobre as Diretrizes Curriculares

Nacionais, assumida pelo CNE, que reserva para os entes federativos e para as escolas

as tarefas de planificação e implementação curriculares. O CNE assume que suas

funções normativas e de supervisão se apóiam na descentralização, na articulação

entre União, Distrito Federal, estados e municípios e na flexibilidade

teórico/metodológica das ações pedagógicas, considerando estas dimensões como

sinônimo de responsabilidades compartilhadas em todos os níveis. Na perspectiva

federalista, o CNE considera também que a definição de Diretrizes Curriculares

Nacionais pela Câmara de Educação Básica marca o início do processo de colaboração

entre estados e municípios, em torno de esforços conjuntos e articulados de

planejamento, desenvolvimento e avaliação dos processos educacionais (p. 2).

A Resolução nº 2, de abril de 1998, da Câmara de Educação Básica, instituiu as

Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. Segundo Bonamino e

Martinez (2002), esse documento e o Parecer que o antecedeu (Parecer da CNE/CEB nº

4/98) propõem como referência para a organização do currículo desse nível escolar

sete grandes orientações, que podem ser assim anunciadas:

1. As escolas deverão fundamentar suas ações pedagógicas em princípios éticos,

políticos e estéticos. Tais princípios são complementares e relacionam-se com

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a autonomia, responsabilidade e solidariedade, com a cidadania e a vida

democrática.

2. Deve haver o reconhecimento da identidade pessoal de alunos, professores e

demais profissionais que atuam na educação escolar, bem como da identidade

institucional das escolas e dos sistemas de ensino. Aponta-se para a

necessidade de acolhida pela escola das diversidades e peculiaridades de

gênero, étnicas, etárias, regionais, socioeconômicas, culturais, psicológicas e

físicas dos sujeitos escolares.

3. Há a necessidade de considerar o processo educacional como uma relação

indissociável entre conhecimentos, linguagem e afetos. A afirmação dessa

perspectiva conduz à valorização do diálogo e à adoção de metodologias

diversificadas em sala de aula, isto é, de múltiplas interações alunos/alunos,

professores/alunos, alunos/livros, vídeos, mídia, materiais didáticos etc, que

permitam a expressão de níveis diferenciados de compreensão, de

conhecimentos e de valores éticos, políticos e estéticos.

4. É fundamental estabelecer conteúdos curriculares mínimos e a parte

diversificada dos conhecimentos, articulados à cidadania. A "vida cidadã" diz

respeito a aspectos relacionados com saúde, sexualidade, vida familiar e

social, meio ambiente, trabalho, ciência e tecnologia, cultura e linguagens. Já

as "áreas de conhecimento" se referem à Língua Portuguesa, Língua Materna

(para populações indígenas e migrantes), Matemática, Ciências, Geografia,

História, Língua Estrangeira, Educação Artística, Educação Física e Educação

Religiosa (Brasil, 1998b, p. 7). Estabelece-se assim uma estrutura curricular

básica, na qual os aspectos mais inovadores estão relacionados à "vida cidadã"

e evocam os Temas Transversais.

5. É necessário orientar as escolas no sentido de conduzir propostas curriculares

e processos de ensino capazes de articular os conhecimentos e valores da Base

Nacional Comum e da Parte Diversificada ao contexto social (Brasil, 1998b, p

11).

6. Dar ênfase na autonomia escolar. A diretriz apóia-se na LDB (art. 9º, IV) para

reafirmar a competência de estados, municípios e estabelecimentos escolares

no sentido de complementarem os currículos mínimos com uma parte

diversificada.

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7. Destacar as propostas pedagógicas capazes de zelar pela existência de um

clima escolar de cooperação e de condições básicas para planejar os usos do

espaço e do tempo escolar. Diz respeito à interdisciplinaridade e

transdisciplinariedade, do sistema seriado ou por ciclos, do currículo.

Como você viu até aqui, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica são

um conjunto de princípios, critérios e procedimentos a serem observados na

organização e planejamento das atividades, execução e avaliação dos cursos e projetos

pedagógicos das escolas e sistemas de ensino.

Com a aprovação das primeiras Diretrizes Curriculares Nacionais data de 1998. A partir

dessa data foram sendo produzidas as demais Diretrizes Curriculares, por meio de

pareceres e resoluções, das diferentes etapas e modalidades da educação básica.

A seguir, você acompanhará um pequeno esboço dos pareceres e resoluções que

promulgam as Diretrizes Nacionais para a Educação Básica para as diversas etapas e

modalidades de ensino.

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EDUCAÇÃO INFANTIL

Parecer CNE/CEB 22/98: Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil.

CNE/CEB n°1, de 07/04/1999: instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a

Educação Infantil. As Diretrizes Operacionais para a Educação Infantil forma

promulgadas pelo Parecer CNE/CEB 4/2000

ENSINO FUNDAMENTAL

Parecer 4/1998: Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental.

Resolução CNE/CED n.2: Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino

Fundamental

ENSINO MÉDIO

Parecer CNE/CEB 15/98: Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio.

Resolução CNE/CEB 3/98: Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino

Médio.

Parecer CNE/CP 11/2009: Proposta de experiência curricular inovadora do Ensino

Médio

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Parecer CNE/CEB 11/2000: Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de

Jovens e Adultos. Resolução CNE/CEB 1/2000: Estabelece as Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos

EDUCAÇÃO PROFISSIONAL DE NÍVEL TÉCNICO

Parecer CNE/CEB 16/99: As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação

Profissional de Nível Técnico. CNE/CEB 4/99 : Institui As Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico

EDUCAÇÃO ESPECIAL

O Parecer CNE/CEB 17/2001: as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na

Educação Básica. A Resolução CNE/CEB 2/2001, institui Diretrizes Nacionais para a

Educação Especial na Educação Básica.

EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA.

Parecer CNE/CEB 14/99: as Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação escolar

indígena. Resolução CNE/CEB 3/99: fixa Diretrizes Nacionais para o funcionamento

das escolas indígenas e dá outras providências.

EDUCAÇÃO BÁSICA NAS ESCOLAS DO CAMPO

Parecer CNE/CEB 36/2001: Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas

Escolas do Campo. Resolução CNE/CEB 1/2002: Institui Diretrizes Operacionais para

a Educação Básica nas Escolas do Campo.

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REFERÊNCIAS

SAVIANI, D. O Legado educacional do “Longo Século XX” Brasileiro.In:______.

Et.al. O Legado Educacional do Século XX no Brasil. Campinas, SP: Autores

Associados, 2004. p. 9-58.

BONAMINO, Alicia e MARTÍNEZ, Silvia Alicia. Diretrizes e Parâmetros Curriculares

Nacionais para o ensino fundamental: a participação das instâncias políticas do

Estado. Educ. Soc., Set 2002, vol.23, no.80, p.368-385.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Conselho Nacional de Educação.

Câmara da Educação Básica. Resolução n. 2, de 7 abril de 1998. Institui as Diretrizes

Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. Diário Oficial da União. Brasília,

DF, 15 abr. 1998a .

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Conselho Nacional de Educação.

Câmara de Educação Básica. Parecer CEB n. 4/98.Diretrizes Curriculares Nacionais

para o Ensino Fundamental. Brasília, DF: MEC/CNE, 1998b.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Conselho Nacional de Educação.

Conselho Pleno Parecer CNE/CP n. 11/2009. Proposta de experiência curricular

inovadora do Ensino Médio.

CHAUÍ, Marilena. A Universidade Pública sob nova perspectiva. In: Revista

Brasileira de Educação, set/out/nov/dez, 2003. p.5-15. n°24.

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Tendências atuais na organização curricular: o currículo em movimento

Apresentação

Prezad@ cursista,

Como você viu na unidade anterior, a partir da segunda metade do século XX ocorreram

importantes mudanças culturais e econômicas na sociedade brasileira, suscitando uma

grande quantidade de questões relacionadas ao direito, aos fins sociais e ao acesso à

escola. Pesquisadores brasileiros, tendo como referência os estudos internacionais já

relatados, também deslocaram o seu foco dos problemas macro-sociais para questões

próprias dos sistemas de ensino e da escola, mas sem perder de vista as dimensões

estruturais. A escola passou a ser vista como um espaço social complexo, caracterizado

por perspectivas divergentes, no qual se confrontam ou se harmonizam concepções

teóricas e posições político-pedagógicas.

Tendo sofrido influência dos mais diversos modelos de análise, o campo do currículo no

Brasil foi se estruturando e, com o tempo, buscando responder a demandas emanadas

do campo escolar, como vimos nas unidades anteriores. Cabe discutir aqui, entretanto,

quais os programas atuais do Governo Federal e seus órgãos vinculados, propostos para

a discussão do campo curricular no Brasil. Vejamos a seguir:

Tendo sido influenciada por diversos campos de análise, é preciso entender como

oficialmente tem se pensado o currículo das escolas no Brasil.

Como vimos até aqui, o Ministério da Educação e o Conselho Nacional de Educação são

os órgãos responsáveis pela normatização do campo educacional no Brasil, e vêm, nos

últimos anos, pensando programas e ações dedicados a estimular discussões e organizar

os currículos nas escolas de todo o país, a partir das diversas Diretrizes Curriculares

Nacionais agora em vigor.

Nos últimos anos, o Governo Federal formulou programas e planos para os diversos

níveis da Educação Básica, buscando contribuir para a constituição e redefinição dos

currículos nas escolas de todo o país.

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Após vários anos discutindo a efetividade dos Parâmetros e Diretrizes Curriculares o

MEC vem reconhecendo a necessidade de gerar novas discussões sobre o currículo nas

escolas mediante as diversas demandas sociais. O MEC passou a engendrar

nacionalmente ações de organização curricular. Esse debate, que hoje se constitui num

amplo programa, é denominado “Currículo em Movimento” e busca melhorar a

qualidade da Educação Básica através da discussão do desenvolvimento do currículo da

Educação Infantil, do Ensino Fundamental e Ensino Médio nas escolas. São objetivos

específicos do programa:

• Identificar e analisar propostas pedagógicas e a organização curricular da

Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio implementadas nos

sistemas estaduais e municipais;

• Elaborar documento de proposições para atualização das Diretrizes

Curriculares Nacionais da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e Ensino

Médio;

• Elaborar documento orientador para a organização curricular e referências de

conteúdo para assegurar a formação básica comum da Educação Básica no

Brasil (Base nacional comum/Base curricular comum);

• Promover o debate nacional sobre o currículo da Educação Básica através de

espaços para a socialização de estudos, experiências e práticas curriculares

que possam promover o fortalecimento da identidade nacional

(www.mec.gov.br).

Dentre as principais metas do programa está a construção de documentos de orientação

curricular para todos os níveis da Educação Básica. Tais documentos norteadores estão

sendo discutidos e construídos, ao mesmo tempo em que outras políticas vão tomando

corpo na tentativa de reorganizar a Educação Básica no Brasil: a implementação do

Ensino Fundamental de Nove Anos, as reformulações que integram o currículo do Ensino

Médio à Formação Profissionalizante, além de projetos como o Ensino Médio Inovador e

as mudanças no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).

Nessa unidade, buscaremos apresentar algumas dessas propostas – as mais recentes -

cuja influência pesa significativamente na organização do trabalho escolar. Para

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compreender essas formulações que estão sendo propostas pelos órgãos oficiais,

organizamos a nossa reflexão da seguinte forma:

1. Educação Infantil

2. Ensino Fundamental: o acolhimento de crianças de 6 anos.

3. Ensino Médio: Trabalho, Ciência e Cultura

Todos os textos que você estudará a seguir são baseados nos documentos oficiais que

publicizaram as novas propostas do governo federal e estão disponíveis no site do

Ministério da Educação (www.mec.gov.br).

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REFERÊNCIAS

BRASIL. CNE/CEB. Parecer CEB nº 04/98 - Diretrizes Curriculares Nacionais para o

Ensino Fundamental.

BRASIL. CNE/CEB. Parecer CEB nº 15/98 - Diretrizes Curriculares Nacionais Para o

Ensino Médio.

BRASIL. CNE/CEB. Parecer CEB nº 22/98 - Diretrizes Curriculares Nacionais para a

Educação Infantil.

BRASIL. CNE/CEB. Resolução CEB Nº 01/99 - Institui as Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Educação Infantil.

BRASIL. CNE/CEB. Resolução CEB Nº 02/98 - Institui as Diretrizes Curriculares

Nacionais para o Ensino Fundamental.

BRASIL. CNE/CEB. Resolução CEB Nº 03/98 - Institui as Diretrizes Curriculares

Nacionais para o Ensino Médio.

BRASIL. Decreto n. 5.154, de 23 de julho de 2004. Regulamentaçao § 2º do art. 36 e

os arts. 39 a 41 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as

diretrizes e bases da educação nacional, e dá outras providências. In: MINISTÉRIO DA

EDUCAÇÃO.Programa de Legislação Educacional Integrada. Disponível em:

<http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf/dec5154.pdf>

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica e Tecnológica.

Educação Profissional Técnica e de Nível Médio integrado ao Ensino

Médio. Documento Base. Brasília, 2007.

MEC/SEB. Ensino Fundamental de nove anos – orientações gerais. 2004.

MEC/SEB. Ensino Médio Inovador. 2009.

MEC/SEB. Indicadores da Qualidade na Educação Infantil / Ministério da

Educação/Secretaria da Educação Básica – Brasília: MEC/SEB, 2009a.

MEC/SEB. BARBOSA. Maria Carmem Silveira . MEC/UFRGS. Práticas Cotidianas na

Educação Infantil - bases para a reflexão sobre as orientações curriculares. 2009b.

MEC/SEB. Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil. Brasília:

MEC/SEB, 2006.

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ATIVIDADE 9 - OBRIGATÓRIA

Nesta unidade, você conheceu uma série de programas,

ações e projetos que o MEC possui que visam a estimular

o debate sobre o currículo e a sua implantação nos mais

diferentes níveis de ensino.

A partir dos estudos desenvolvidos nesta unidade,

escreva um texto mostrando como a sua escola tem

debatido o currículo, com quais instâncias ela tem

mantido relação (Parâmetros Curriculares Nacionais,

Proposta Curricular Municipal ou Estadual) e quais

inovações curriculares podem ser operacionalizadas na

sua instituição.

Inicie respondendo as seguintes questões:

• Quais níveis a sua instituição atende?

• Ela dialoga com algumas dessas discussões?

Envie seu texto para a Base de Dados “Atividade 9”.

MEC/SEB. Política Nacional de Educação Infantil: pelo direito das crianças de zero

a seis anos à Educação. Brasília: MEC/SEB, 2006.

MEC/SEB. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília:

MEC/SEF, 1998.

MOREIRA Antonio Flavio Barbosa e CANDAU, Vera Maria. Educação escolar e

cultura(s): construindo caminhos. Rev. Bras. Educ. [online]. 2003, no. 23 [citado

2007-03-18], pp. 156-168.

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LEITURA COMPLEMENTAR

1) O texto a seguir, de Alice Casemiro Lopes, tem como foco o Estado e a sua

relação com as políticas de currículo. Como você sabe, o Estado tem buscado

regulamentar uma série de ações nesse campo. A autora apresenta, porém,

diversos discursos que estão presentes nas políticas curriculares. A partir deste

texto, produza um comentário crítico, de até duas laudas, e poste na Base de

Dados. Será uma leitura instigante no sentido de compreender as diversas

determinações da organização curricular.

LOPES, A. C. Discursos nas Políticas Curriculares. Currículo sem Fronteiras, v.6,

n.2, pp.33-52, Jul/Dez 2006.

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Educação Infantil

Enfrenta-se hoje o desafio de ampliar as políticas para a educação das crianças de zero

a cinco anos, de refletir sobre as diferentes formas de viver a infância (indígenas,

quilombolas, ribeirinhas, urbanas, do campo, da floresta) e de definir as bases

curriculares nacionais para essa fase da vida escolar que passou a ser parte da

educação básica. Projetos pedagógicos específicos para essa etapa são necessários,

bem como a redefinição do trabalho docente para atuar em creches e pré-escolas,

considerando as três funções indissociáveis da Educação Infantil:

• Função social: para educar e cuidar, crianças entre 0 e 5 anos e 11 meses.

• Função política: contribuir para que as crianças pequenas usufruam de seus

direitos sociais e políticos e exerçam seu direito de participação, tendo em

vista a sua formação na cidadania.

• Função pedagógica: articular a convivência, a ampliação de saberes e os

conhecimentos de diferentes naturezas entre crianças e adultos.

A necessidade de articular essas três funções coloca uma série de indagações, tais

como: como deve ser uma instituição de Educação Infantil de qualidade? Quais são os

critérios para se avaliar a qualidade de uma creche ou de uma pré-escola? Como as

equipes de educadores, os pais, as pessoas da comunidade e as autoridades

responsáveis podem ajudar a melhorar a qualidade das instituições de Educação

Infantil?

No ano de 2009, visando a discussão dessa questão, elaborou-se um instrumento de

autoavaliação intitulado “Indicadores de Qualidade da Educação Infantil”. O objetivo

do documento foi traduzir e detalhar os parâmetros publicados em 2006 em indicadores

operacionais, no sentido de oferecer às equipes de educadores e às comunidades

atendidas pelas instituições de Educação Infantil um instrumento adicional de apoio ao

seu trabalho.

Essa iniciativa pretendeu contribuir com as instituições de Educação Infantil no sentido

de encontrar seu próprio caminho na direção de práticas educativas que respeitem os

direitos fundamentais das crianças e ajudem a construir uma sociedade mais

democrática.

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Como sabemos, há várias concepções implicadas no conceito de qualidade. A qualidade

pode ser concebida de forma diversa, conforme o momento histórico, o contexto

cultural e as condições objetivas locais. Segundo o documento citado, por essa mesma

razão, o processo de definir e avaliar a qualidade de uma instituição educativa deve ser

participativo e aberto, possibilitando a reflexão e a definição de um caminho próprio

para aperfeiçoar o trabalho pedagógico e social das instituições.

O documento “Indicadores de Qualidade da Educação Infantil” aponta para sete

dimensões que devem ser levadas em conta, quais sejam: o planejamento institucional;

a multiplicidade de experiências e linguagens; as interações; a promoção da saúde;

espaços materiais e mobiliários; formação e condições de trabalho das professoras e

demais profissionais; cooperação e troca com as famílias e participação na rede de

proteção social.

O documento organiza também as formas de avaliar cada uma das dimensões e cada

indicador de qualidade na Educação Infantil, com a participação de toda a comunidade

escolar, impulsionando as mudanças necessárias. Como norteador das ações soma

esforços a outros documentos anteriores como o Referencial Curricular Nacional para a

Educação Infantil (1998), os Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação

Infantil (2006) e a Política Nacional de Educação Infantil: pelo direito das crianças de

zero a seis anos à Educação (2006).

Ainda, no âmbito do projeto Currículo em Movimento, foi firmado um convênio de

cooperação entre o MEC e a UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), que

resultou em propostas para a organização curricular de creches e pré-escolas. Os

documentos gerados a partir de então auxiliam a pensar a gestão das creches e pré-

escolas buscando aperfeiçoar as práticas cotidianas realizadas nos estabelecimentos

educacionais de Educação Infantil.

Quais são as funções específicas de uma instituição que atende bebês e crianças bem

pequenas? Quais os eixos que deveriam compor a organização curricular para as

crianças pequenas? Que possibilidades de conhecimento podem ser propiciadas para as

crianças?

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Dado que as características da faixa etária das crianças da Educação Infantil exigem

conceber um outro tipo de estabelecimento educacional, é preciso também que a

gestão da instituição se baseie numa revisão de conceitos sobre o que é a escola, a

infância, o conhecimento e o currículo!

O documento, que objetiva pensar as práticas na Educação Infantil (MEC/SEB, 2009b),

afirma que os campos de aprendizagem dessas crianças são as práticas sociais e as

linguagens, expressos em inter-relação com o cotidiano. Nesse contexto, deve-se

repensar o currículo compreendendo os elementos constituintes das práticas na

Educação Infantil, quais sejam:

• Organização do espaço

As instituições de Educação Infantil devem oferecer espaços e organizar os

ambientes a fim de proporcionar condições educacionais. Deve propor um

ambiente que favoreça o êxito das ações das crianças e daquelas

desencadeadas pelo professor, incitando a confiança no ambiente em que se

encontra. Preparar um ambiente físico que convide ao lúdico, às descobertas

e à diversidade, e que seja ao mesmo tempo seguro, limpo e confortável,

propiciando atividade e o descanso, o movimento e a exploração minuciosa.

• Registro das atividades

Um importante elemento do planejamento na Educação Infantil é o

“registro”. Baseado na observação, o registro visa a construção de perguntas

para a prática e a reorganização da dinâmica proposta pelo professor à

medida que constrói conhecimentos em colaboração. Registrar as atividades,

as ações e as brincadeiras é uma forma de documentar a prática e engendrar

novas atividades.

• Cuidar e Educar

Uma instituição de Educação Infantil é um estabelecimento de educação e

cuidado em todos os seus espaços e relações. A expectativa de que todas as

pessoas envolvidas no processo educacional, independente de seus cargos ou

funções, tenham respeitado seu direito à participação no ambiente em que

O currículo na Educação Infantil é aquilo que se constrói no diálogo entre crianças,

famílias e docentes e se manifesta em todas as interações do dia a dia.

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vivem tem como intenção enfrentar o desafio de tanto garantir a diversidade

pessoal, social e cultural o de preservar e constituir um espaço de

pertencimento e construção de singularidade.

• Construção da linguagem

As linguagens são “saberes da ação”: simbólicos, expressivos, científicos,

artísticos e tecnológicos que demonstram a capacidade humana para falar,

escrever, manipular, expressar e produzir um número ilimitado de

pensamentos e experiências independentemente do conhecimento formal das

disciplinas sistematizadas, hierarquizadas e lineares. Assim, outras formas de

linguagens como o desenho, a modelagem e a matemática estão presentes no

mundo como significação, expressão, comunicação e produção devendo ser

estimulados e disponibilizados para todas as crianças.

• Autonomia e Flexibilização da Rotina

As rotinas da instituição de Educação Infantil devem visar o bem-estar da

criança e favorecer a aquisição da autonomia, de modo que elas se sintam

seguras e orientadas. A chegada das crianças, a alimentação, o sono, as

brincadeiras devem ser organizadas com intencionalidade pedagógica e, ao

mesmo tempo, devem dar o direito de escolha às crianças (de praticar as

atividades e de ficar sozinha quando desejar).

• Trabalhar com a diversidade e a desigualdade

As ações da instituição devem estar pautadas na garantia de iguais

oportunidades. Precisam ainda estar atentas às questões de igualdade de

gênero, etnia etc, evitando que a diversidade acarrete em desigualdade em

modos de exclusão e segregação. Ao lidar cotidianamente com as

singularidades a instituição, deve-se disponibilizar, às crianças, pequenas

oportunidades de desenvolver características que lhe são únicas e investir em

metodologias que respeitem os ritmos. Deve-se também propor trabalhos

diversificados que contemplem diferenciados modos de pensar e operar sobre

o mundo, propondo práticas educativas que integrem a atenção e o respeito

às particularidades das crianças em seus modos de produzir significados no e

com o grupo.

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SUGESTÃO DE FILMES:

1. Título: Ponette (1996)

Diretor: jacques doillon

Elenco: Victoire Thivisol, Marie Trintignant, Xavier Beauvois, Daire Nebout,

Aurélie Verillion, Matiaz Bureau Caton, Delphine Schiltz

World sales: Le Studio Canal+ col

Participação em festivais: Veneza

Duração: 97 min.

2. Título : A Invenção da Infância (2000)

Direção: Liliana Sulzbach

Tipo: Documentário

Origem: Brasil (Rs)

Duração: 26 min

3. Título : Quando tudo começa (1999)

Título Original: Ça Commence Aujourd'hui

Diretor: Bertrand Tavernier País: França

Elenco: Philippe Torreton, Dominique Sampiero, Maria Pitarresi, Nadia Kaci,

Françoise Bette, Christine Citti, Emmanuelle Bercot

Duração: 105min

É imprescindível, no dia a dia com as crianças pequenas, criar oportunidades para que

as professoras possam refletir sobre a intencionalidade educativa dos seus fazeres.

[...] Uma das características que acentua a intencionalidade pedagógica é poder

explicar e compreender os motivos para a seleção das atividades, dos materiais,

das brincadeiras – seus modos de apresentação e realização – e das formas de

preparação dos recursos e dos grupos. [...] Ressignificar o currículo é aprender a

construir perguntas para a prática, compreendê-las, interrogá-las e reconstruir,

com as crianças e a comunidade escolar, outras respostas pertinentes mesmo que

provisórias.

(MEC/SEB, 2009, p.88)

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Ensino Fundamental: o acolhimento das crianças de 6 anos

No início do ano de 2004, a Secretaria de Educação Básica do MEC promoveu sete

encontros regionais para discutir com estados e municípios como implementar a

ampliação do Ensino Fundamental, que passou a contar com nove anos, incluindo as

crianças de seis anos de idade no primeiro ano. Dessa maneira, pensar a organização

curricular do novo ensino fundamental deve levar em conta dois aspectos: os nove anos

de trabalho escolar e a nova idade que integra esse ensino.

Conforme o PNE, a determinação legal (Lei nº 10.172/2001, meta 2 do Ensino

Fundamental) de implantar progressivamente o Ensino Fundamental de nove anos, pela

inclusão das crianças de seis anos de idade, tem duas intenções: “oferecer maiores

oportunidades de aprendizagem no período da escolarização obrigatória e assegurar

que, ingressando mais cedo no sistema de ensino, as crianças prossigam nos estudos,

alcançando maior nível de escolaridade”.

O PNE estabelece, ainda, que a implantação progressiva do Ensino Fundamental de

nove anos, com a inclusão das crianças de seis anos, deve se dar em consonância com a

universalização do atendimento na faixa etária de 7 a 14 anos. As Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Educação Infantil fornecem elementos importantes para a

revisão da Proposta Pedagógica do Ensino Fundamental que incorporará as crianças de

seis anos, até então pertencentes ao segmento da Educação Infantil. Entre eles,

destacam-se:

• As propostas pedagógicas (....) devem promover em suas práticas de educação

e cuidados a integração entre os aspectos físicos, emocionais, afetivos,

cognitivo, lingüísticos e sociais da criança, entendendo que ela é um ser total,

completo e indivisível. Dessa forma, sentir, brincar, expressar-se, relacionar-

A ampliação do Ensino Fundamental para nove anos está prevista na Lei nº 9.394/96,

a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), e em uma das metas do Ensino

Fundamental no Plano Nacional de Educação (PNE). Seu objetivo é que todas as

crianças de seis anos, sem distinção de classe, sejam matriculadas na escola.

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se, mover-se, organizar-se, cuidar-se, agir e responsabilizar-se são partes do

todo de cada indivíduo (....).

• Ao reconhecer as crianças como seres íntegros que aprendem a ser e a

conviver consigo mesmas, com os demais e com o meio ambiente de maneira

articulada e gradual, as propostas pedagógicas (...) devem buscar a interação

entre as diversas áreas de conhecimento e aspectos da vida cidadã como

conteúdos básicos para a constituição de conhecimentos e valores. Dessa

maneira, os conhecimentos sobre espaço, tempo, comunicação, expressão, a

natureza e as pessoas devem estar articulados com os cuidados e a educação

para a saúde, a sexualidade, a vida familiar e social, o meio ambiente, a

cultura, as linguagens, o trabalho, o lazer, a ciência e a tecnologia.

• Tudo isso deve acontecer num contexto em que cuidados e educação se

realizem de modo prazeroso, lúdico. Nessa perspectiva, as brincadeiras

espontâneas, o uso de materiais, os jogos, as danças e os cantos, as comidas e

as roupas, as múltiplas formas de comunicação, de expressão, de criação e de

movimento, o exercício de tarefas rotineiras do cotidiano e as experiências

dirigidas que exigem que o conhecimento dos limites e alcances das ações das

crianças e dos adultos estejam contemplados.

• (....) as estratégias pedagógicas devem evitar a monotonia, o exagero de

atividades “acadêmicas” ou de disciplinamento estéril.

• As múltiplas formas de diálogo e interação são o eixo de todo o trabalho

pedagógico, que deve primar pelo envolvimento e pelo interesse genuíno dos

educadores em todas as situações, provocando, brincando, rindo, apoiando,

acolhendo, estabelecendo limites com energia e sensibilidade, consolando,

observando, estimulando e desafiando a curiosidade e a criatividade, por meio

de exercícios de sensibilidade, reconhecendo e alegrando-se com as

conquistas individuais e coletivas das crianças, sobretudo as que promovam a

autonomia, a responsabilidade e a solidariedade.

• A participação dos educadores é mesmo participação e não condução absoluta

de todas as atividades e centralização dessas em sua pessoa. Por isso, desde a

organização do espaço, móveis, acesso a brinquedos e materiais, aos locais

como banheiros, cantinas e pátios, até a divisão do tempo e do calendário

anual de atividades, passando pelas relações e ações conjuntas com as

famílias e os responsáveis, o papel dos educadores é de legitimar os

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compromissos assumidos por meio das propostas pedagógicas. (SEB/MEC,

2004).

Inserir crianças de seis anos no ensino fundamental, evidentemente, não garante por si

só uma aprendizagem de maior qualidade. Isso depende, sobretudo, de um uso mais

eficaz do tempo, baseado na organização qualitativa do trabalho pedagógico e dando

atenção às características etárias, sociais e psicológicas das crianças.

Organizar a escola a fim de incluir as crianças de seis anos no Ensino Fundamental é

dever da instituição e garante a qualidade do ensino a ela oferecido. A escola deve

reorganizar a sua estrutura, as formas de gestão, os ambientes, os espaços, os tempos,

os materiais, os conteúdos, as metodologias, os objetivos, o planejamento e a

avaliação, de forma que as crianças se sintam inseridas e acolhidas num ambiente

prazeroso e propício à aprendizagem.

Como assegurar a transição da Educação Infantil para o Ensino Fundamental? Essa

passagem deve ocorrer da forma mais natural possível, não provocando nas crianças

rupturas e impactos negativos no seu processo de escolarização. Dessa maneira, as

escolas que estiverem organizadas pela estrutura seriada não podem acrescentar mais

uma série, com as características e a natureza daquela que era a primeira série. Os

seus projetos político-pedagógicos devem ser propostos no sentido de permitir a

flexibilização dos tempos, a fim de contribuir para o desenvolvimento da criança,

possibilitando-lhe, efetivamente, uma ampliação qualitativa do seu tempo na escola.

Trabalhar com as crianças de seis anos na escola envolve compreender o fato de que

elas vivem numa sociedade cuja cultura dominante é a letrada. Desde que nascem, as

crianças constroem conhecimentos prévios sobre o sistema de representação e o

significado da leitura e da escrita que se transformam em valorização social da

aquisição de habilidades de ler e escrever. No entanto, a entrada na escola para essas

crianças não pode representar uma ruptura completa com o estágio de vivência

anterior, em casa ou na instituição de Educação Infantil, mas é preciso ser uma

Sendo assim, como organizar o trabalho pedagógico tendo em vista as crianças de

seis anos?

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continuidade das suas experiências anteriores para que sistematizem gradualmente os

conhecimentos sobre a língua escrita. (MEC/SEB, 2004).

(MEC/SEB, 2004, p.23)

Assim, a escola deve elaborar estratégias de formação continuada dos professores que

atuam no Ensino Fundamental para que sejam encontradas novas ações pedagógicas,

sendo indispensável o desenvolvimento de atitudes investigativas, de alternativas

pedagógicas e metodológicas na busca de uma qualidade social da educação.

[...] de suma importância que os sistemas induzam e estimulem as linhas de ação

coletiva nas escolas, intencionalmente voltadas para a construção de um projeto

pedagógico que reflita o desejo e o planejamento de cada comunidade escolar.

Nessa perspectiva, caberá ao conjunto da comunidade escolar, impulsionado pelos

sistemas, a sistematização do comprometimento de todos com aquilo que se

elencou como relevante para orientar as ações da escola em busca de um ensino

de qualidade, inclusive a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos. Os

princípios, objetivos e metas de cada projeto originam-se do diagnóstico da escola

e são estabelecidos pelo coletivo. Refletem o que este realmente deseja e pode

realizar. Para um diagnóstico mais aproximado da realidade, uma primeira ação a

ser recomendada é a utilização de procedimentos de avaliação para conhecer a

comunidade, explicitando o grupo constituinte da escola: alunos, pais,

comunidade vizinha e profissionais da educação.

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Ensino Médio: trabalho, Ciência e Cultura

O Ensino Médio Integrado

A partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Naciona (1996), o Ensino Médio passou

a ser visto como etapa da Educação Básica, com diretrizes e finalidades expressas nos

seus artigos 35 e 36. A Secretaria de Educação Básica (SEB), prevendo a

universalização do Ensino Médio presencial, preocupa-se hoje particularmente com esse

nível de ensino. Como parte da estratégia para a sua ampliação e melhoria, investiu no

sentido de já em 2006, transformar oFundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento

do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério) em Fundeb (Fundo de

Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais

da Educação), que passa a financiar toda a Educação Básica, da Educação Infantil ao

término do Ensino Médio.

A reforma educacional da década de 1990, no entanto, trouxe no seu bojo a

desarticulação entre o ensino regular e o ensino profissionalizante.

O Decreto nº 2.208/97, que regulamentou o § 2º do Art. 36, da LDB, que trata da

educação profissional em nível médio em seu Art. 5º, dispôs que “a educação

profissional de nível técnico terá organização curricular própria e independente do

Ensino Médio, podendo ser oferecida de forma concomitante ou seqüencial a este”.

Não era permitida, portanto, a sua integração.

Um grande desafio para o Ensino Médio continuou sendo a dualidade entre

o propedêutico e o profissionalizante. A busca de um modelo unitário, que integrasse

os conceitos de trabalho, ciência e cultura como conceitos que estruturam as

finalidades do Ensino Médio e orientam a sua organização curricular e as práticas

pedagógicas do seu processo formativo, mais uma vez foi adiada e depende ainda hoje

de experiências que possibilitem tal organização.

A mobilização dos educadores, no entanto, e uma maior sensibilidade governamental,

permitiu um passo importante para a superação da dualidade apontada no ano de 2004

com o Decreto 5.154/2004, que legislou sobre a formação profissional técnica de

nível médio, revogando o Decreto 2.208 de 1997, que extinguia a modalidade curricular

de ensino médio integrado à educação profissional técnica de nível médio. A nova

legislação indicou três formas de articulação entre a educação profissional técnica de

nível médio e o ensino médio: a integrada, a concomitante e a subseqüente.

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Veja o que está afirmado no Artigo 4º do Decreto 5.154/2004:

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Art. 4o. A educação profissional técnica de nível médio, nos termos dispostos no §

2o do art. 36, art. 40 e parágrafo único do art. 41 da Lei no 9.394, de 1996, será

desenvolvida de forma articulada com o ensino médio, observados:

I - os objetivos contidos nas diretrizes curriculares nacionais definidas pelo

Conselho Nacional de Educação;

II - as normas complementares dos respectivos sistemas de ensino; e

III - as exigências de cada instituição de ensino, nos termos de seu projeto

pedagógico.

§ 1o A articulação entre a educação profissional técnica de nível médio e o

ensino médio dar-se-á de forma:

I - integrada, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino

fundamental, sendo o curso planejado de modo a conduzir o aluno à habilitação

profissional técnica de nível médio, na mesma instituição de ensino, contando

com matrícula única para cada aluno;

II - concomitante, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino

fundamental ou esteja cursando o ensino médio, na qual a complementaridade

entre a educação profissional técnica de nível médio e o ensino médio pressupõe

a existência de matrículas distintas para cada curso, podendo ocorrer:

a) na mesma instituição de ensino, aproveitando-se as oportunidades

educacionais disponíveis;

b) b) em instituições de ensino distintas, aproveitando-se as

oportunidades educacionais disponíveis; ou

c) c) em instituições de ensino distintas, mediante convênios de

intercomplementariedade, visando ao planejamento e ao

desenvolvimento de projetos pedagógicos unificados;

III - subseqüente, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino

médio.

§ 2o Na hipótese prevista no inciso I do § 1o, a instituição de ensino deverá,

observados o inciso I do art. 24 da Lei no 9.394, de 1996, e as diretrizes curriculares

nacionais para a educação profissional técnica de nível médio, ampliar a carga horária

total do curso, a fim de assegurar, simultaneamente, o cumprimento das finalidades

estabelecidas para a formação geral e as condições de preparação para o exercício de

profissões técnicas. (DECRETO n.5.154/2004, grifos nossos).

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A alternativa de organização curricular coibida pelo Decreto 2.208/97 foi, portanto,

restabelecida com o advento do Decreto 5.154 em 2004. Os sistemas de ensino

encontram-se, agora, com a oportunidade de conceber, implantar e desenvolver o

ensino médio integrado à educação profissional técnica de nível médio.

O que significa o Decreto 5.154/2004, para a definição de uma identidade para o Ensino

Médio? Significa o primeiro passo em direção a um projeto unitário no qual o trabalho

configura-se como princípio educativo para o Ensino Médio, nele condensando-se as

concepções de ciência e cultura. Essa perspectiva possibilita a adoção da ciência, da

tecnologia, da cultura e do trabalho como eixos estruturantes na formação,

contemplando assim as bases em que se pode desenvolver uma educação tecnológica ou

politécnica, integradora.

A reforma estabelecera a separação das duas redes de ensino, uma destinada à

formação acadêmica e outra, à formação profissional, que ganhou um capítulo

específico na LDB. Os frágeis mecanismos de articulação previstos reforçaram a

dicotomia histórica que tem marcado o Ensino Médio: de um lado, a educação voltada

para a formação das elites e, de outro lado, aquela voltada aos que ingressam

precocemente no mundo do trabalho.

O principal instrumento jurídico dessa reforma foi o Decreto nº 2.208/97 e o principal

instrumento de implantação da reforma foi o Programa de Expansão da Educação

Profissional (PROEP/MEC), que se constituiu mediante a utilização de recursos da

ordem de 500 milhões de dólares para o período 1997-2003, com financiamento parcial

do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

O Decreto nº 2.208/97 e o Programa PROEP, que deram materialidade à reforma da

educação profissional, trouxeram como conseqüências a fragmentação do sistema

nacional de educação, o desmonte da rede pública e, em decorrência, a expansão da

oferta de educação profissional pela esfera privada e a submissão da educação à lógica

e às práticas do mundo dos negócios.

A revogação do Decreto 2.208/97 e a promulgação do Decreto 5.154/04 possibilitou

conceber propostas curriculares considerando a necessária articulação entre as

diferentes dimensões do trabalho de formação profissional do cidadão/aluno, na

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perspectiva da oferta pública da educação profissional técnica de nível médio,

enfatizando o trabalho, a cultura , a ciência e a tecnologia, como princípios fundadores

da organização curricular integrada ao ensino médio.

Com a aprovação do Decreto 5.154/04 instaurou-se uma nova modalidade de oferta de

Ensino Médio denominada Ensino Médio Integrado a Educação Profissional (EMIEP), que

hoje já está disseminada nos diversos Estados do país.

Pensar o Ensino Médio, diante dessa perspectiva, é um grande desafio. A proposta do

Ensino Médio Integrado à Educação Profissional é diferente do Ensino Médio meramente

propedêutico, é diferente também da proposta do Ensino Médio Técnico e ainda do que

preconizavam todas as legislações até então existentes. Esta modalidade pretende

oportunizar a formação de trabalhadores com formação cidadã e superar a dualidade

estrutural histórica do Ensino Médio.

O EMIEP é um curso planejado que conduz, simultaneamente, a um diploma e a um

certificado com base em uma única matriz curricular, uma única matrícula por aluno, e

uma carga horária que pretende assegurar o cumprimento das duas finalidades –

formação geral e profissional. Para tanto, há convergência de objetivos do ensino

médio e do ensino técnico, buscando-se uma sólida e atualizada formação científica,

tecnológica, cultural e ética.

De acordo com Ramos (2005), são eixos da organização do currículo dos cursos de

EMIEP: o trabalho, a ciência e a cultura. O propósito de tais eixos é a superação da

dicotomia formação para a cidadania versus formação para o trabalho produtivo. A

partir desses eixos, pressupõe-se tanto a superação das limitações do currículo dualista

e fragmentado em disciplinas e disponibilizado ao aluno através da transmissão dos

conteúdos, como a substituição das disciplinas por competências. A pretensão do

currículo integrado é a apreensão do sentido dos conteúdos de ensino, reconhecendo-os

como conhecimentos construídos historicamente e a partir dos quais o trabalhador

constrói novos conhecimentos no processo de investigação e compreensão do real.

Esta organização curricular é sem dúvida um dos grandes desafios educacionais para o

Século XXI.

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Programa Ensino Médio Inovador

No ano de 2009, o governo federal lançou um programa viabilizando outras inovações

para o currículo do ensino médio, de forma articulada aos programas e ações já em

desenvolvimento nos âmbitos federal e estadual. O programa possui “linhas de ação”

que envolvem diversos aspectos que permeiam o contexto escolar, tais como:

fortalecimento da gestão escolar e dos sistemas; melhoria das condições de trabalho

docente e sua formação inicial e continuada; apoio às práticas docentes;

desenvolvimento do protagonismo juvenil e apoio ao aluno jovem e adulto trabalhador;

infra-estrutura física e recursos pedagógicos; elaboração de pesquisas relativas ao

ensino médio e à juventude, entre outros.

Nesse sentido, o ensino médio deve ser planejado em consonância com as

características sociais, culturais e cognitivas do sujeito humano referencial desta

última etapa da Educação Básica: adolescentes, jovens e adultos. Cada um desses

tempos de vida tem a sua singularidade, como síntese do desenvolvimento biológico e

da experiência social condicionada historicamente. Por outro lado, se a construção do

conhecimento científico, tecnológico e cultural é também um processo sócio-histórico,

o ensino médio pode configurar-se como um momento em que necessidades, interesses,

curiosidades e saberes diversos confrontam-se com os saberes sistematizados,

produzindo aprendizagens socialmente e subjetivamente significativas. Num processo

educativo centrado no sujeito, o ensino médio deve abranger, portanto, todas as

dimensões da vida, possibilitando o desenvolvimento pleno das potencialidades do

educando (www.mec.gov.br)

A proposta do Programa Ensino Médio Inovador tem como objetivo a melhoria da

qualidade do ensino médio nas escolas públicas, buscando principalmente desenvolver

nos alunos a promoção da capacidade de pensar, refletir, compreender e agir sobre as

determinações da vida social e produtiva, articulando trabalho, ciência e cultura na

perspectiva da emancipação humana, de forma igualitária a todos os cidadãos.

O programa propõe, além das orientações metodológicas estabelecidas no seu interior,

percursos formativos organizados pelas unidades escolares envolvidas seguindo a

legislação em vigor e as diretrizes curriculares dos Estados. Permite a ampliação da

carga horária, além da mínima anual de oitocentas horas, distribuídas em duzentos dias

letivos, como está previsto na Lei 9.394/96.

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Os objetivos formativos do projeto Ensino Médio Inovador estão assim colocados:

• Contemplar atividades integradoras de iniciação científica e no campo

artístico-cultural;

• Incorporar, como princípio educativo, a metodologia da problematização

como instrumento de incentivo a pesquisa, a curiosidade pelo inusitado e o

desenvolvimento do espírito inventivo, nas práticas didáticas;

• Promover a aprendizagem criativa como processo de sistematização dos

conhecimentos elaborados, como caminho pedagógico de superação a mera

memorização;

• Promover a valorização da leitura em todos os campos do saber,

desenvolvendo a capacidade de letramento dos alunos;

• Fomentar o comportamento ético, como ponto de partida para o

reconhecimento dos deveres e direitos da cidadania; praticando um

humanismo contemporâneo, pelo reconhecimento, respeito e acolhimento da

identidade do outro e pela incorporação da solidariedade;

• Articular teoria e prática, vinculando o trabalho intelectual com atividades

práticas experimentais;

• Utilizar novas mídias e tecnologias educacionais, como processo de

dinamização dos ambientes de aprendizagem;

• Estimular a capacidade de aprender do aluno, desenvolvendo o autodidatismo

e autonomia dos estudantes;

• Promover atividades sociais que estimulem o convívio humano e interativo do

mundo dos jovens;

• Promover a integração com o mundo do trabalho por meio de estágios

direcionados para os estudantes do ensino médio;

• Organizar os tempos e os espaços com ações efetivas de interdisciplinaridade

e contextualização dos conhecimentos;

• Garantir o acompanhamento da vida escolar dos estudantes, desde o

diagnóstico preliminar, acompanhamento do desempenho e integração com a

família;

• Ofertar atividades complementares e de reforço da aprendizagem, como meio

para elevação das bases para que o aluno tenha sucesso em seus estudos.

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• Ofertar de atividade de estudo com utilização de novas tecnologias de

comunicação;

• Avaliação da aprendizagem como processo formativo e permanente de

reconhecimento de saberes, competências, habilidades e atitudes. (MEC/SEB,

2009)

As ações de reorganização curricular do Ensino Médio visando à melhoria da qualidade

do ensino estão assentadas na possibilidade de formações específicas diversificadas: no

trabalho, como formação profissional; na ciência, como iniciação científica; na cultura,

como ampliação da formação cultural. Pressupõem uma perspectiva de articulação

interdisciplinar, voltada para o desenvolvimento de conhecimentos - saberes,

competências, valores e práticas, articulando as disciplinas com atividades

integradoras, a partir das inter-relações existentes entre os eixos constituintes do

ensino médio, ou seja, o trabalho, a ciência, a tecnologia e a cultura.

Compreender o mundo do trabalho e o aprimoramento da capacidade produtiva e

investigativa dos estudantes; explicitar a relação desses processos com o

desenvolvimento da ciência e da tecnologia e formá-los culturalmente, tanto no sentido

ético – pela apreensão crítica dos valores da sociedade em que vivem – quanto estético,

potencializando capacidades interpretativas, criativas e produtivas da cultura nas suas

diversas formas de expressão e manifestação, são finalidades que devem estar

presentes e organicamente integradas no ensino médio.

Deve então o currículo do ensino médio ser modificado? Devem ser acrescentados

componentes técnicos no currículo do ensino médio?

Tais componentes podem existir, mas devem ser necessariamente desenvolvidos de

forma integrada aos diversos conhecimentos. Por isso mesmo não é uma proposta fácil

e precisa ser construída processualmente pelos sistemas e instituições de ensino,

visando a práticas curriculares e pedagógicas que levem à formação plena do educando

e possibilitem construções intelectuais.

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Outras modificações que vêm sendo pensadas e implementadas para o Ensino Médio no

Brasil também precisam ser conhecidas. Destacam-se aquelas impulsionadas pela

admissão do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) como critério de seleção para o

ingresso em Universidades.

A modificação do formato do Exame Nacional do Ensino Médio com a realização das

provas de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias (incluindo redação); Ciências

Humanas e suas Tecnologias; Ciências da Natureza e suas Tecnologias, e Matemática e

suas Tecnologias, e a conseqüente valorização dos conteúdos acadêmicos próprios do

ensino médio, gera a possibilidade de utilização dos resultados desse exame para a

seleção dos ingressantes no ensino superior.

O Comitê de Governança do Novo ENEM, constituído pelas representações da ANDIFES e

do MEC reunidas em 13 de maio de 2009, aprovou a Matriz de Referência para o ENEM

2009, em conjunto com a relação de objetos de conhecimento a ela associados. A

Matriz de Referência se pauta por habilidades consideradas essenciais aos estudantes

que concluem esse nível de ensino.

Estabelecida a Matriz de Referência, os objetos de conhecimento associados poderão

ser aprimorados nas edições seguintes do ENEM. Por recomendação da reunião, a partir

da edição de 2010, os conhecimentos de Física, Química e Biologia, associados à matriz

de referência de Ciências da Natureza e suas Tecnologias, devem expressar integração

crescente entre as três áreas, adequando-se à perspectiva interdisciplinar das

competências e habilidades adotadas na matriz de referência correspondente.

Deliberou-se, ainda, que a competência de conhecimento e uso da língua estrangeira

moderna só deverá ser objeto de avaliação a partir do Exame de 2010

O ensino médio deverá se estruturar em consonância com o avanço do conhecimento

científico e tecnológico, fazendo da cultura um componente da formação geral,

articulada com o trabalho produtivo. Isso pressupõe a vinculação dos conceitos

científicos com a prática relacionada à contextualização dos fenômenos físicos,

químicos e biológicos, bem como a superação das dicotomias entre humanismo e

tecnologia e entre a formação teórica geral e técnica-instrumental.

(MEC/SEB, 2009, p.04)

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(www.mec.gov.br). Cada uma das matrizes possui conteúdos relacionados como

específicos, mas todos eles devem passar pela avaliação dos seguintes eixos cognitivos:

I. Dominar linguagens (DL): dominar a norma culta da Língua Portuguesa

e fazer uso das linguagens matemática, artística e científica e das

línguas espanhola e inglesa.

II. Compreender fenômenos (CF): construir e aplicar conceitos das várias

áreas do conhecimento para a compreensão de fenômenos naturais, de

processos histórico-geográficos, da produção tecnológica e das

manifestações artísticas.

III. Enfrentar situações-problema (SP): selecionar, organizar, relacionar,

interpretar dados e informações representados de diferentes formas,

para tomar decisões e enfrentar situações-problema.

IV. Construir argumentação (CA): relacionar informações, representadas

em diferentes formas, e conhecimentos disponíveis em situações

concretas, para construir argumentação consistente.

V. Elaborar propostas (EP): recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na

escola para elaboração de propostas de intervenção solidária na

realidade, respeitando os valores humanos e considerando a

diversidade sociocultural

SAIBA MAIS:

Caro coordenador! Você já conhece as Orientações Curriculares para o Ensino Médio?

Se ainda não as conhece, clique aqui e faça o download dos três volumes que o

compõe:http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&i

d=13558

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Indagações sobre currículo

Apresentação

Prezado cursista,

Temos visto até aqui como o Governo Federal, por meio de suas diversas instâncias

reguladoras, promove a atualização da legislação, incorporando debates e questões

pertinentes à melhoria da qualidade na educação básica.

O currículo tem sido objeto de atenção das medidas governamentais, seja pela

promulgação de parâmetros e diretrizes curriculares, seja pela publicação de materiais

destinados à discussão nas escolas do país. Assim, em 2008, foram publicados em

diversos cadernos temáticos pelo Ministério da Educação/Secretaria de Educação

Básica, textos compondo um conjunto denominado “Indagações sobre Currículo”.

Esses textos compõem um conjunto de reflexões sobre concepções educacionais e

visam a busca de respostas às questões postas pelos coletivos das escolas e das Redes, a

refletir sobre elas, buscar seus significados seja na reorientação do currículo seja nas

práticas educativas.

Os cinco cadernos que compõem as “Indagações” são temáticos e dizem respeito ao

cotidiano escolar. O que eles têm em comum é a compreensão da escola como espaço

do conhecimento, do convívio e da sensibilidade, condições imprescindíveis para a

constituição da cidadania.

Você pode acessar as “Indagações sobre currículo” no sítio do Ministério da Educação

(www.mec.gov.br). Mas esta unidade dedica-se a sintetizar as reflexões presentes nos

cinco cadernos temáticos, que podem auxiliar você, coordenador pedagógico, a pensar

o currículo na sua escola.

Assim, esta unidade foi organizada seguindo exatamente as cinco temáticas dos

cadernos e estão diretamente baseadas nos seus textos:

• Currículo e desenvolvimento humano

• Currículo, educandos e educadores

• Currículo, conhecimento escolar e cultura

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• Currículo e diversidade

• Currículo e avaliação

Na tentativa de estimular a discussão e a construção coletiva de um currículo para as

instituições de ensino de todo o país, a SEB/MEC lançou os cinco cadernos que

compõem as “Indagações sobre Currículo” intitulados: Currículo e Desenvolvimento

Humano; Educandos e Educadores: seus direitos e o currículo; Currículo, Conhecimento

e Cultura; Diversidade e Currículo; Currículo e Avaliação.

Cada caderno possui autoria diferente e, segundo a SEB, são objetivos desse material:

• Propor a reflexão curricular por meio do estudo e debate de eixos

organizadores que o constituem;

• Subsidiar os estudos sobre concepção curricular com a finalidade de que

professores, gestores e demais profissionais da área educacional ampliem seus

conhecimentos e a compreensão sobre a concepção de currículo que ora o

Ministério coloca em debate;

• Subsidiar a análise e a elaboração das propostas curriculares dos sistemas de

ensino e dos projetos pedagógicos das unidades escolares;

• Fortalecer na escola a constituição de espaços e ambientes educativos que

possibilitem a aprendizagem, reafirmando a escola como espaço do

conhecimento, do convívio e da sensibilidade, condições imprescindíveis para

a constituição da cidadania;

• Subsidiar a reflexão sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação

Infantil e as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de

nove anos.

As Indagações sobre o currículo foram propostas objetivando aprofundar as concepções

de currículo e rever proposições que estão naturalizadas nas escolas. Assim, na

apresentação deste material de estudo, há a seguinte consideração em relação ao que

comumente se considera como currículo: é visto como um programa, uma organização

de conteúdos numa determinada seqüência.

E é essa a única possibilidade de se conceber o currículo? Quais saberes podem

constituir o currículo? Há possibilidade de considerar os saberes que os alunos trazem

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do seu grupo social? Quais seriam os critérios e a seqüência dos conteúdos listados?

Como avaliar a aquisição dos saberes?

Difícil responder a todas essas perguntas. No entanto, é possível questionar qual

aprendizagem tem sido proporcionada por um currículo que muitas vezes fragmenta a

realidade e se institui como um instrumento disciplinar direcionado para a transmissão

de conteúdos específicos, organizados em tempos rígidos e centrados num trabalho

docente individual.

É, portanto, com o objetivo de pensar a forma como o currículo vem sendo executado

e outras perspectivas para o modelo curricular das escolas do país que os cadernos das

“Indagações sobre Currículo” levantam importantes questões, muitas delas expostas a

seguir.

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Currículo e desenvolvimento humano

Um currículo que se pretende democrático deve visar à humanização de todos e ser

desenhado a partir do que não está acessível às pessoas. Se a escola é um espaço de

ampliação da experiência humana ele deve, portanto, não se limitar às experiências

cotidianas da criança. Deve ir além dos referentes presentes em seu mundo cotidiano,

assumindo-o e ampliando-o, transformando o educando em um sujeito ativo na

mudança de seu contexto. Deve trazer conhecimentos novos, metodologias e as áreas

de conhecimento contemporâneas, transformando-se assim num instrumento

de formação humana.

Dessa maneira, a escola deve atuar como uma facilitadora do acesso dos alunos aos

bens culturais proporcionados, por exemplo, pela literatura, pelos livros técnicos e de

atualização científica, pelos conhecimentos teóricos de uma maneira geral, pela

produção artística. Um currículo destinado a cumprir sua função formativa introduz

novos conhecimentos e não se limita aos conhecimentos relacionados às vivências do

aluno, às realidades regionai, ou com base no assim chamado conhecimento do

cotidiano. Partir desse conhecimento é um caminho metodológico importante que

permite atender ao maior número de experiências na escola, encontrando o espaço no

currículo para a diversidade1.

O respeito à experiência individual é fator central no desenvolvimento da

aprendizagem do aluno. Segundo Lima (2008, p.23)

Um currículo que se pretende democrático deve visar à humanização de todos e ser

desenhado a partir do que não está acessível às pessoas. A humanização se refere,

assim, ao desenvolvimento cultural da espécie. O desenvolvimento cultural é

função do momento histórico pelo qual passa a humanidade e do quanto cada país

participa do acervo de cultura, tecnologia, ciências e bens disponíveis a um

momento dado.

(LIMA, 2008, p.18)

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O conteúdo das diversas áreas do conhecimento tem um papel central na formulação

dos currículos e na formação de cada um dos alunos. No entanto, esses conteúdos

encontram na mediação de algo que se aproxima da experiência do indivíduo no

mundo, possibilidade de uma aprendizagem efetiva. Daí, a importância de partir do que

está disponível para ele e pelo qual ele terá o acesso facilitado.

Assim, devem ser considerados no processo ensino-aprendizagem a maturação orgânica

da criança e as possibilidades que o meio lhe oferece: “ela não poderá realizar uma

ação para a qual não tenha o substrato orgânico, assim como não fará muitas delas,

mesmo que biologicamente apta, se a organização do seu meio físico e social não

propiciar sua realização ou se os adultos não a ensinarem” (LIMA, 2008, p.25).

A cultura é parte importante dos processos de desenvolvimento e de aprendizagem,

pois cada aluno se constitui como membro de um grupo cuja cultura não pode ser

ignorada.

É necessário superar [...] a concepção de que o conhecimento seja apenas

informação. O conhecimento resulta da “organização” de informações em redes de

significados. [...]. Quando ao ser humano é ensinado algum conteúdo de alguma

área de conhecimento formalmente organizado, ele estabelece formas de

pensamento (conceitual) muito diversas das que constitui nas atividades da vida

cotidiana. [...]. Traça-se aqui uma diferença fundamental no funcionamento da

memória de longa duração, pois ela não é feita somente de informações, mas de

padrões de integração, de classificação e de organizações das informações. São

criados, assim, internamente, padrões possíveis de serem utilizados em outras

situações de aprendizagem e de exercício do pensamento.

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1 Segundo Lima (2007): “Entendemos diversidade na concepção de que ela é a norma da espécie

humana: seres humanos são diversos em suas experiências culturais, são únicos em suas

personalidades e são diversos em suas formas de perceber o mundo. Seres humanos apresentam,

também, diversidade biológica. Algumas delas provocam impedimentos de natureza distinta no

processo de desenvolvimento das pessoas, as comumente chamadas de ‘portadoras de necessidades

especiais’”.

Segundo Lima (2007): “Entendemos diversidade na concepção de que ela é a norma

da espécie humana: seres humanos são diversos em suas experiências culturais, são

únicos em suas personalidades e são diversos em suas formas de perceber o mundo.

Seres humanos apresentam, também, diversidade biológica. Algumas delas provocam

impedimentos de natureza distinta no processo de desenvolvimento das pessoas, as

comumente chamadas de ‘portadoras de necessidades especiais”.

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Currículo, educandos e educadores

É possível inverter o foco do currículo do conteúdo a ser ensinado, para o educando?

Como isso pode ser feito? Como podemos inverter a relação predominantemente

estabelecida no currículo escolar e valorizar o educando como o ponto de partida?

Quais são as lógicas e os valores que estruturam o currículo? Para responder essas

questões, segundo Arroyo (2008), é preciso buscar entender quais as imagens e

concepções de aluno(a) que nos são mais familiares e tentar problematizá-las.

Uma visão comum é a dos alunos como recursos humanos destinados ao mercado de

trabalho segmentado e seletivo e partir do qual privilegiamos e selecionamos as

habilidades e competências que devem ser ensinadas, segundo a mesma lógica

segmentada, hierarquizada e seletiva. O autor afirma que não se deve sustentar essa

estreita relação entre o domínio das competências escolares e a empregabilidade.

Na contramão dessa perspectiva mercadológica do currículo, a alternativa é equacionar

o conhecimento e as competências, comunicando às novas gerações a produção cultural

da humanidade.

A mudança de perspectiva em relação aos conteúdos de ensino e às intencionalidade

O ordenamento dos conteúdos por séries, níveis, disciplinas, gradeado e precedente,

por lógicas de mérito e sucesso nada mais é do que a tradução curricular dessa

lógica do mercado e da visão mercantilizada que nós fazemos dos educandos.

(ARROYO, 2008,p. 24)

Um currículo que não secundarize, antes inclua com destaque, mas como direito, a

oralidade, a escrita, a matemática, as ciências e as técnicas de produção, o

domínio dos instrumentos e equipamentos culturais produzidos para qualificar o

trabalho como atividade humana”, ampliará o direito ao conhecimento, “inclusive

ao conhecimento dos significados de suas vivências do trabalho e também da

negação do trabalho

(ARROYO, 2008).

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educativas do currículo, no entanto, obriga a repensar a visão sobre os alunos que ainda

predomina entre os educadores. A construção curricular não é neutra, afirma o autor, é

condicionada por uma pluralidade de imagens sociais a respeito dos alunos que provêm

da sociedade:

São essas imagens sobre os alunos que conformam o currículo e, consequentemente, a

ação docente. Daí, a necessidade de reflexão coletiva para aprofundamento dessas

questões num processo de repensar os currículos. É preciso problematizar as imagens

sobre os educandos, especialmente as que dizem respeito às desigualdades perante o

conhecimento e a aprendizagem: por exemplo, alunos inteligentes e acelerados x

lentos e desacelerados, normais x “deficientes”.

A cultura escolar que classifica e ordena (classes, séries, grupos, tempos, didáticas)

condiciona a lógica e a estrutura da instituição. Essa visão está enraizada. É preciso

reconhecer, por um lado, que a sociedade cria desiguais e como profissionais do

conhecimento e dos processos de aprendizagem devemos partir do entendimento de

que toda mente humana é igualmente capaz de aprender.

Aos repensar os currículos nessa direção seremos obrigados a flexibilizá-los ou adaptá-

los a ritmos e tempos distintos e ver os educandos como sujeitos em complexos

processos de apropriação de saberes, conhecimentos, valores, culturas, dos

instrumentos e das técnicas.

Se a escola e especificamente o ordenamento curricular são constituintes de

protótipos de alunos, as imagens sociais que projetamos sobre eles nos chegam de

fora, dadas pela cultura social, pela divisão de classes, pelas hierarquias sócio-

étnico-raciais, de gênero e território, pela visão negativa que a sociedade tem das

pessoas com “deficiências”.

(ARROYO, 2008, p.25)

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Essas identidades dos educandos e nossas, tendo como referencial os direitos, nos

obrigarão a fazer escolhas sobre o que ensinar e aprender a partir do

conhecimento e da cultura, dos valores, da memória e identidade na diversidade a

que os educandos têm direito. Significará inverter prioridades ditadas pelo

mercado e definir prioridades a partir do imperativo ético do respeito ao direito

dos educandos. Somente partindo do reconhecimento dos educandos como sujeitos

de direitos, estaremos em condições de questionar o trato seletivo e segmentado

em que ainda se estruturam os conteúdos.

(ARROYO, 2008, p.37)

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Currículo, conhecimento escolar e cultura

Construir uma nova forma de organização curricular, de intervir nos currículos é um

trabalho eminentemente coletivo, que envolve rever os conteúdos da docência e da

ação educativa, escolher e planejar prioridades e atividades, reorganizar os

conhecimentos, entre outros aspectos.

Na discussão sobre a problemática que acompanha as indagações curriculares Moreira e

Candau (2008) defendem que são indispensáveis conhecimentos escolares que facilitem

ao aluno uma compreensão da realidade em que está inserido, que possibilitem uma

ação consciente no mundo e que promovam a ampliação de seu universo cultural.

Segundo os autores, o currículo representa um conjunto de práticas que propiciam a

produção, a circulação e o consumo de significados no espaço social e que contribuem,

intensamente, para a construção de identidades sociais e culturais.

O currículo constitui, nessa perspectiva, um dispositivo no qual se concentram as

relações entre a sociedade e a escola, entre os saberes e as práticas socialmente

construídos e os conhecimentos escolares.

Podemos dizer que os primeiros constituem as origens dos segundos. Em outras

palavras, os conhecimentos escolares provêm de saberes e conhecimentos socialmente

produzidos nos chamados “âmbitos de referência dos currículos”. Que são esses

âmbitos de referência? Podemos considerá-los como correspondendo: (a) às instituições

produtoras do conhecimento científico (universidades e centros de pesquisa); (b) ao

mundo do trabalho; (c) aos desenvolvimentos tecnológicos; (d) às atividades

desportivas e corporais; (e) à produção artística; (f) ao campo da saúde; (g) às formas

diversas de exercício da cidadania; (h) aos movimentos sociais (MOREIRA e CANDAU,

2008, p.22).

Esses espaços constituem lugares de construção de saberes e conhecimentos que são

formalizados no currículo escolar. No entanto, para que sejam incorporados eles sofrem

umadescontextualização, já que os saberes e as práticas produzidos nos âmbitos de

referência do currículo não podem ser ensinados tal como funcionam em seu contexto

de origem e são posteriormente recontextualizados, constituindo a dinâmica própria da

construção do conhecimento escolar.

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A tomada de consciência desse processo pode auxiliar a equipe escolar a pensar e

repensar os conteúdos e a estrutura sob a qual são ensinados. As seguintes questões,

apontadas pelos autores, também devem considerar:

• a subordinação dos conhecimentos escolares ao que se conhece sobre

odesenvolvimento humano. Ou seja, os conhecimentos escolares costumam

ser selecionados e organizados com base nos ritmos e nas seqüências

propostas pela psicologia do desenvolvimento.

• os conhecimentos escolares que tendem a se submeter aos ritmos e às rotinas

que permitem sua avaliação. Ou seja, tende-se a ensinar conhecimentos que

possam ser, de algum modo, avaliados.

• o processo de construção do conhecimento escolar que sofre, inegavelmente,

efeitos de relações de poder.

É nesse sentido que os autores reconhecem no currículo um espaço de produção de

significados, um conjunto de práticas que propiciam a produção, a circulação e o

consumo de significados no espaço social e que contribuem para a construção de

identidades sociais e culturais. Fica evidente, assim, a relação entre currículo e

cultura. Esta relação se expressa no fato de ser o currículo um campo no qual os

conflitos da cultura estão refletidos.

Conhecimentos totalmente descontextualizados não permitem que se evidencie como

os saberes e as práticas envolvem, necessariamente, questões de identidade

social, interesses, relações de poder e conflitos interpessoais. Conhecimentos

totalmente descontextualizados desfavorecem, assim, um ensino mais reflexivo e

uma aprendizagem mais significativa.

(MOREIRA e CANDAU, 2008, p.24).

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Ao mesmo tempo em que se operam discriminações e seleções no currículo, apontando

diferenças e classificando os sujeitos escolares, há, em contrapartida, esforços no

sentido de construir experiências multiculturalmente orientadas. A fim de reelaborar o

conceito de currículo e suas relações com o conhecimento e a cultura, os autores

propõem o debate baseado nos seguintes princípios:

• A necessidade de uma nova postura: estar aberto às distintas manifestações

culturais e atentar para a pluralidade.

• O currículo com um espaço em que se reescreve o conhecimento escolar,

tendo-se em mente as diferentes raízes étnicas e os diferentes pontos de vista

envolvidos em sua produção.

• O currículo como um espaço em que se explicita a ancoragem social dos

conteúdos: como e em que contexto social um dado conhecimento surge e se

difunde, sua construção histórica e sua apropriação pela sociedade.

• O currículo como espaço de reconhecimento de identidades culturais.

• O currículo como espaço de questionamento das representações de cada um

sobre os “outros”.

• O currículo como um espaço de crítica cultural, que permite a abertura às

diversas formas culturais, como a popular, além da erudita.

• O currículo como um espaço de desenvolvimento de pesquisas.

Pode-se dizer que no currículo se evidenciam esforços tanto por consolidar as

situações de opressão e discriminação a que certos grupos sociais têm sido

submetidos, quanto por questionar os arranjos sociais em que essas situações se

sustentam. Isso se torna claro ao nos lembrarmos dos inúmeros e expressivos

relatos de práticas, em salas de aulas, que contribuem para cristalizar

preconceitos e discriminações, representações estereotipadas e desrespeitosas de

certos comportamentos, certos estudantes e certos grupos sociais.

(MOREIRA e CANDAU, 2008, p.28).

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Currículo e diversidade

Como se vê, um dos eixos que têm perpassado as indagações curriculares propostas é a

possibilidade de contemplar nos currículos das escolas o tema da diversidade.

Então, que indagações o trato pedagógico da diversidade traz para o currículo? Como a

questão da diversidade tem sido pensada nos diferentes espaços sociais,

principalmente, nos movimentos sociais? Como podemos lidar pedagogicamente com a

diversidade?

O texto de Nilma Lino Gomes (2008) lembra que existem várias relações estabelecidas

com a diversidade que podem fundamentar o debate nas escolas:

• Diversidade biológica e currículo;

• Diversidade cultural e currículo;

• A luta política pelo direito à diversidade;

• Diversidade e conhecimento;

• Diversidade e ética;

• Diversidade e organização dos tempos e espaços escolares.

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A autora afirma que conhecer a construção histórica das desigualdades não implica um

trato igualitário e democrático em relação àqueles considerados diferentes. No

entanto, o currículo escolar pode ser o espaço para a inserção da diversidade,

compreendendo as causas políticas, econômicas e sociais de fenômenos como

etnocentrismo, racismo, sexismo, homofobia e xenofobia.

A autora alerta para o fato de vivermos no contexto da diversidade cultural, razão pela

Para tal, todos nós precisaremos passar por um processo de reeducação do olhar. O

reconhecimento e a realização dessa mudança do olhar sobre o “outro” e sobre

nós mesmos a partir das diferenças deve superar o apelo romântico ao diverso e ao

diferente e construir políticas e práticas pedagógicas e curriculares nas quais a

diversidade é uma dimensão constitutiva do currículo, do planejamento das ações,

das relações estabelecidas na escola.

(GOMES, 2008, p. 26).

Podemos indagar que histórias as narrativas do currículo têm contado sobre as

relações raciais, os movimentos do campo, o movimento indígena, o movimento

das pessoas com deficiência, a luta dos povos da floresta, as trajetórias dos jovens

da periferia, as vivências da infância (principalmente a popular) e a luta das

mulheres? São narrativas que fixam os sujeitos e os movimentos sociais em noções

estereotipadas ou realizam uma interpretação emancipatória dessas lutas e grupos

sociais? Que grupos sociais têm o poder de se representar e quais podem apenas

ser representados nos currículos? Que grupos sociais e étnico/raciais têm sido

historicamente representados de forma estereotipada e distorcida? Diante das

respostas a essas perguntas, só nos resta agir, sair do imobilismo e da inércia e

cumprir a nossa função pedagógica diante da diversidade: construir práticas

pedagógicas que realmente expressem a riqueza das identidades e da diversidade

cultural presente na escola e na sociedade. Dessa forma poderemos avançar na

superação de concepções românticas sobre a diversidade cultural presentes nas

várias práticas pedagógicas e currículos.

(GOMES, 2008, p.24).

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qual ela deve ser um elemento presente e indagador do currículo. Não como um tema e

nem como disciplina, mas como um eixo orientador das experiências e práticas

curriculares.

Nessa perspectiva, a diversidade precisa ser recontextualizada como conhecimento

escolar, não como uma ilustração. Deve ser compreendida no campo político e tenso no

qual as diferenças são produzidas e deve ser vista como um direito. “Conviver com a

diferença (e com os diferentes) é construir relações que se pautem no respeito, na

igualdade social, na igualdade de oportunidades e no exercício de uma prática e

postura democráticas” (GOMES, 2008, p.30).

Para estimular o debate, a autora interroga o currículo sob o olhar da diversidade:

• Diversidade e conhecimento: a relação entre currículo e conhecimento nos

convida a um exercício epistemológico e pedagógico de tornar os saberes

produzidos pelos movimentos sociais e pela comunidade em “emergências”,

uma vez que a sua importância social, política e pedagógica, por vezes, tem

sido colocada no campo das “ausências” resultando no “desperdício da

experiência social e educativa”.

• Diversidade e ética: O reconhecimento do aluno e do professor como sujeitos

de direitos é também compreendê-los como sujeitos éticos, rever posturas,

valores, representações e preconceitos.

o Diversidade e organização dos tempos e espaços escolares: os(as)

educandos(as) são diversos também nas vivências e controle de seus

tempos de vida, trabalho e sobrevivência, gerando uma tensão entre

tempos escolares e tempos da vida, entre tempos rígidos do aprender

escolar e tempos não controláveis do sobreviver.

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Currículo e avaliação

O texto final da publicação Indagações sobre Currículo retoma um tema muito debatido

em todo o país pela dificuldade de definir critérios que dêem conta da sua

complexidade: a avaliação, seja ela dos alunos, da instituição ou do sistema escolar.

Segundo os autores, a avaliação é uma atividade que implica legitimidade técnica ( a

legitimidade que a formação profissional oferece) e legitimidade política (respeitando

princípios e critérios refletidos coletivamente, referenciados no projeto político-

pedagógico, na proposta curricular e em suas convicções acerca do papel social que

desempenha a educação escolar).

Dentre as diversas formas de avaliação, a avaliação da aprendizagem ainda remete à

A avaliação, como parte de uma ação coletiva de formação dos estudantes, ocorre,

portanto, em várias esferas e com vários objetivos. Há a avaliação da

aprendizagem dos estudantes, em que o professor tem um protagonismo central,

mas há também a necessária avaliação da instituição como um todo, na qual o

protagonismo é do coletivo dos profissionais que trabalham e conduzem um

processo complexo de formação na escola, guiados por um projeto político-

pedagógico coletivo. E, finalmente, há ainda a avaliação do sistema escolar, ou do

conjunto das escolas de uma rede escolar, na qual a responsabilidade principal é

do poder público. Esses três níveis de avaliação não são isolados e necessitam

estar em regime de permanentes trocas, respeitados os protagonistas, de forma

que se obtenha legitimidade técnica e política.

(FERNANDES e FREITAS, 2008, p. 18)

Se a escola é o lugar da construção da autonomia e da cidadania, a avaliação dos

processos, sejam eles das aprendizagens, da dinâmica escolar ou da própria

instituição, não deve ficar sob a responsabilidade apenas de um ou de outro

profissional, é uma responsabilidade tanto da coletividade, como de cada um, em

particular.

(FERNANDES e FREITAS, 2008, p.18)

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posturas mensuradoras que precisam ser problematizadas. Avaliar significa estabelecer

objetivos para a ação educativa, levando em conta os métodos, os conteúdos e os

ritmos e tempos diferentes dos alunos.

Dessa maneira, é possível instituir na perspectiva de uma escola democrática, inclusiva,

dedicada a construir a autonomia, uma avaliação que parte do príncipio de que todos

são capazes de aprender e de que as ações educativas, as estratégias de ensino, os

conteúdos das disciplinas devem ser planejados a partir dessas infinitas possibilidades

de aprender dos estudantes. Deve-se transformar, assim, num instrumento que auxilia

os professores e os alunos a compreenderem de forma mais organizada seus processos

de ensinar e aprender. Instituindo uma avaliação formativa, as informações sobre a

aprendizagem são colhidas ao longo do processo e não ao final dele.

A perspectiva dessa avaliação é manter ou melhorar a atuação no futuro, refletindo

sobre as informações obtidas com vistas a planejar as próximas ações.

Destaca-se a importância dada pelos autores em relação à coerência no processo de

avaliação, de acordo com métodos e objetivos. Se o professor adota estudos em grupo

em sala de aula, deve avaliar também de acordo com a metodologia utilizada. Os

estudantes são mobilizados a identificar informações e promover situações de análise e

reflexão, competência que não poderá ser cobrada no momento da avaliação. Há

distintas formas de avaliar e cada uma pode requerer instrumentos diferentes, tais

A avaliação formativa é aquela em que o professor está atento aos processos e às

aprendizagens de seus estudantes. O professor não avalia com o propósito de dar

uma nota, pois dentro de uma lógica formativa, a nota é uma decorrência do

processo e não o seu fim último. [...]. Por fim, podemos dizer que avaliação

formativa é aquela que orienta os estudantes para a realização de seus trabalhos

e de suas aprendizagens, ajudando-os a localizar suas dificuldades e suas

potencialidades, redirecionando-os em seus percursos. A avaliação formativa,

assim, favorece os processos de auto avaliação, prática ainda não incorporada de

maneira formal em nossas escolas.

(FERNANDES e FREITAS, 2008, p.22)

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como provas, testes, portfolios, trabalhos, seminários que devem ser pensados a fim de

acompanhar o processo de aprendizagem.

Os autores também destacam que deve estar sempre presente para o professor, a

constatação de que o processo de avaliação envolve esferas que estão além da aferição

da aquisição de conteúdos e do julgamento sobre o valor da aprendizagem. O processo

avaliativo usa também recursos informais de qualificação e quantificação do

conhecimento e do estudante, de forma que juízos de valor interferem (para o bem ou

para o mal) neste processo. Em muitas situações os professores orientam suas

estratégias metodológicas em função de seus juízos de valor sobre os estudantes. Isso

pode ser prejudicial quando juízos negativos passam a dar o tom da ação metodológica

do professor. Nesses casos, há um contínuo prejuízo do estudante, pois o preconceito

que se forma sobre ele termina por retirar as próprias oportunidades de aprendizagem

do estudante.

A avaliação é, portanto, uma dimensão importante do currículo. Os autores chamam a

atenção para a importância de trabalhar na perspectiva da avaliação formativa,

observando e registrando os percursos dos alunos durante as aulas, a fim de analisar as

possibilidades de aprendizagem de cada um e do grupo como um todo. Dessa forma, é

O acompanhamento dessas situações revela que, ao agirem assim, esses professores

terminam por afetar negativamente a auto-imagem do estudante, o que

representa um fator contrário à motivação do aluno para a aprendizagem.

Podemos dizer que a reprovação oficializada em uma prova, por exemplo, é de

fato, apenas a conseqüência de uma relação professor-aluno mal sucedida durante

o processo de ensino-aprendizagem. Quando o estudante é reprovado em uma

situação de prova, de fato, ele já havia sido reprovado, antes, no processo. Foi a

relação professor-aluno que o reprovou. Isso deve alertar o professor para a

necessidade de uma relação bem sucedida, motivadora e positiva para com o

estudante durante o processo de aprendizagem, no qual se evite o uso de

procedimentos e ações que contribuam para a criação de uma auto-imagem

negativa.

(FERNANDES e FREITAS, 2008, p.25).

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possível planejar e replanejar os processos de ensino e as possibilidades de intervenção

junto às aprendizagens dos estudantes.

Um instrumento explorado pelos autores é o “Caderno de Aprendizagens”, que pode

ser utilizado em duas situações:

1. Atividades de acompanhamento dos conteúdos escolares.

são atividades com o propósito de superar as dificuldades e dúvidas que

tenham ficado dos conteúdos já estudados nas aulas. podem ser atividades de

áreas variadas, bem como de apenas uma área. Essa prática pode orientar

uma maior reflexão quanto ao conteúdo estudado e quanto às aprendizagens

que o estudante vem realizando.

2. Registros Reflexivos

Os registros reflexivos têm por objetivo servir de auto avaliação para os

estudantes. Podem ser registrados os caminhos que o estudante fez para

sanar suas dúvidas, para compreender aquilo que ainda não sabia e agora já

sabe e as dúvidas que ainda permanecem. Acreditamos que refletir sobre sua

própria aprendizagem faz com que o estudante adquira uma maior

responsabilidade sobre sua escolaridade. Porém, responsabilidades são

aprendidas, construídas. Somente uma prática constante de reflexão e

incorporada como algo natural ao processo pode, com o tempo, levar a uma

mudança de postura por parte dos estudantes. (FERNANDES e FREITAS, 2008,

p.33-34)

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ATIVIDADE 10 - OBRIGATÓRIA

Após a leitura, nesta unidade, das sínteses de cada

caderno temático do Projeto “Indagações sobre

currículo”, disponíveis na sua escola ou no sítio do

Ministério da Educação (www.mec.gov.br), escolha

aquele que mais lhe interessar (talvez o tema mais

emergente na sua escola neste momento) e o apresente

na reunião pedagógica ou discuta as ideias nele contidas

com um pequeno grupo de professores.

Após fazê-lo, redija um texto com os principais

questionamentos ou reflexões acerca do tema levantado

pelo grupo. Não ultrapasse o limite de três laudas.

Envie seu texto para a Tarefa Online “Atividade

10” para enviar suas respostas.

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ATIVIDADE 11 - OBRIGATÓRIA

Após os estudos realizados nesta unidade acerca dos

temas referentes à diversidade, avaliação, cultura,

conhecimento, entre outros, elabore um texto de até

três páginas comentando questões da sua escola frente

aos diversos temas apresentados e que podem subsidiar

novas investigações sobre as práticas curriculares.

Envie sua produção para a Tarefa Online “Atividade

11”.

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REFERÊNCIAS

ARROYO, M. G. Indagações sobre currículo: educandos e educadores : seus direitos

e o currículo. Organização do documento Jeanete Beauchamp, Sandra Denise Pagel,

Aricélia Ribeiro do Nascimento. – Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de

Educação Básica, 2008. 52 p.

FERNANDES, C. de O; FREITAS, L. C. Indagações sobre currículo: currículo e

avaliação. Organização do documento Jeanete Beauchamp, Sandra Denise Pagel,

Aricélia Ribeiro do Nascimento. – Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de

Educação Básica, 2008. 44 p.

GOMES, N. L. Indagações sobre currículo: diversidade e currículo. Organização do

documento Jeanete Beauchamp, Sandra Denise Pagel, Aricélia Ribeiro do

Nascimento. – Brasília : Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica,

2008. 48 p.

LIMA, E. S. Indagações sobre currículo: currículo e desenvolvimento humano .

Organização do documento Jeanete Beauchamp, Sandra Denise Pagel, Aricélia

Ribeiro do Nascimento. – Brasília : Ministério da Educação, Secretaria de Educação

Básica, 2008. 56 p.

MOREIRA, A. F. B e CANDAU, V. M. Indagações sobre currículo: currículo,

conhecimento e cultura. Organização do documento Jeanete Beauchamp, Sandra

Denise Pagel, Aricélia Ribeiro do Nascimento. – Brasília: Ministério da Educação,

Secretaria de Educação Básica, 2008. 48 p.