90

Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

  • Upload
    others

  • View
    2

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa
Page 2: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

Coordenação editorial: Juçara Benvenuti,

Mauro Augusto Burkert Del Pino, Simone Valdete dos Santos,

Tania Beatriz Iwaszko Marques.

Supervisão editorial: UFPEL

Design editorial, capa e diagramação: Nativu Design

Revisão: Juçara Benvenuti

Page 3: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa
Page 4: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

Obra publicada pela Universidade Federal de Pelotas  Reitor: Prof. Dr. Antonio Cesar Gonçalves Borges Vice-Reitor: Prof. Dr. Manoel Luiz Brenner de Moraes Pró-Reitor de Extensão e Cultura: Prof. Dr. Luiz Ernani Gonçalves Ávila Pró-Reitora de Graduação: Prof. Dra.Eliana Póvoas Brito Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Prof. Dr. Manoel de Souza Maia Pró-Reitor Administrativo: Eng. Francisco Carlos Gomes Luzzardi Pró-Reitor de Planejamento e Desenvolvimento: Prof. Ms. Élio Paulo Zonta Pró-Reitor de Recursos Humanos: Admin. Roberta Trierweiler Pró-Reitor de Infra-Estrutura: Mario Renato Cardoso Amaral Pró-Reitora de Assistência Estudantil: Assistente Social Carmen de Fátima de Mattos do Nascimento  CONSELHO EDITORIAL Profa. Dra. Carla Rodrigues Prof. Dr. Carlos Eduardo Wayne Nogueira Profa. Dra. Cristina Maria Rosa Prof. Dr. José Estevan Gaya Profa. Dra. Flavia Fontana Fernandes Prof. Dr. Luiz Alberto Brettas Profa. Dra. Francisca Ferreira Michelon Prof. Dr. Vitor Hugo Borba Manzke Profa. Dra. Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa. Dra. Vera Lucia Bobrowsky Prof. Dr. William Silva Barros

 

EDITORA E GRÁFICA UNIVERSITÁRIA R Lobo da Costa, 447 – Pelotas, RS – CEP 96010-150

Fone/fax: (53) 3227 8411 e-mail: [email protected]

Diretor da Editora e Gráfica Universitária: Carlos Gilberto Costa da Silva Gerência Operacional:João Henrique Bordin

 

Impresso no Brasil Edição: 2010 ISBN: 978-85-7192-751-3 Tiragem: 1000 exemplares Dados Internacionais de Catalogação na Publicação: Bibliotecária Daiane Schramm – CRB-10/1881 P962 Proeja Quilombola /

Organizado por Simone Valdete dos Santos e Paulo Sérgio da Silva. – Pelo-

tas: Editora Universitária/UFPEL, 2010. 90p. ; 21 cm. (Cadernos Proeja II- Especialização-Rio Grande do Sul. Vol. III) Organização Geral: Juçara Benvenuti, Tania Beatriz Iwaszko Marques, Simone

Valdete dos Santos, Mauro Augusto Burkert Del Pino. ISBN 978-85-7192-751-3 1. Educação. 2. Memórias. 3. Formação. I. Santos, Simone Valdete dos; org.

II. Silva, Paulo Sérgio da; org.

CDD 540

Page 5: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

 

APRESENTAÇ‹O

Simone Valdete dos Santos e Tania Beatriz Iwaszko Marques ....................... 7

APRESENTAÇ‹O - SETEC/MEC

Caetana Juracy Rezende Silva e Vânia do Carmo Nóbile Silva ...................15

PRŁLOGO

Paulo Sérgio da Silva............................................................................................19

SABERES TRADICIONAIS E EDUCAÇ‹O PROFISSIONAL NA COMUNIDADE QUILOMBOLA DO LIMOEIRO

Simone Ramos Almeida e Paulo Sérgio da Silva ............................................25

UMA PEDAGOGIA DIFERENCIADA NA COMUNIDADE QUILOMBOLA CAMBAR˘

Taise Tadielo Cezar Atarão e Paulo Peixoto Albuquerque ...........................45

A PERSPECTIVA DO PROEJA NA COMUNIDADE QUILOMBOLA DE CASCA

Laiz Cristina da Silva Wediggen e Paulo Sérgio da Silva ..............................65

Page 6: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa
Page 7: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

APRESENTAÇ‹O

Simone Valdete dos Santos1 Tania Beatriz Iwaszko Marques2

A viagem não começa quando se percorrem distâncias,

mas quando se atravessam as nossas fronteiras interiores.

Mia Couto. O outro Pé da Sereia, p.65.

A Especialização PROEJA do Rio Grande do Sul de 2008 a 2010 per-correu distâncias geográficas de Porto Alegre a Bento Gonçalves, a Júlio de Castilhos, a Alegrete; distâncias institucionais articulando a Universidade Federal do Rio Grande do Sul aos Institutos Federais de Educação Profissio-nal, Ciência e Tecnologia Rio Grande do Sul e Farroupilha (IFs Rio Grande do Sul e Farroupilha) e foram atravessadas distâncias interiores ao reunirmos, na gestão e execução das quatro turmas envolvidas, professores e técnicos

                                                       1 Doutora em Educação pela UFRGS. Coordenadora Geral da Especialização PROEJA/RS. Professora da Faculdade de Educação da UFRGS. Professora e Orientadora do PROEJA. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Educação pela UFRGS. Coordenadora Geral da Especialização PROEJA/RS. Professora da Faculdade de Educação da UFRGS. E-mail: [email protected]

Page 8: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  8

administrativos da Faculdade de Educação da UFRGS, do campus Bento Gonçalves do Instituto Rio Grande do Sul e dos campi Alegrete e Júlio de Castilhos do Instituto Farroupilha.

Desse nosso encontro das fronteiras interiores, desde a primeira edição do curso em 2006, cerca de seiscentos especialistas em PROEJA foram forma-dos, nas treze turmas que certificamos, dos quais, hoje, vários estão atuando como gestores, professores do curso e diretores de campus, como docentes e como equipe administrativa junto às pró-reitorias dos campi instituídos recentemente.

Ocupar esses espaços de gestão constitui um jeito de ser e de fazer a Educação Profissional e a Educação de Jovens e Adultos do interior da Uni-versidade para o interior dos Institutos, em constante movimento que rever-bera para o já constituído grupo de pesquisa CAPES/PROEJA, para a organi-zação e execução do segundo seminário da especialização PROEJA ocorrido em Bento Gonçalves dias 23 e 24 de abril de 2010, que a exemplo do I Semi-nário em Santa Maria de 2009, também subsidiou os alunos e alunas das turmas de Alegrete, Júlio de Castilhos, Bento Gonçalves e Porto Alegre na elaboração dos trabalhos de conclusão de curso, visibilizados na maioria dos artigos desta coleção.

Este conjunto de livros representa uma continuidade aos sete volumes decorrentes da segunda edição da especialização PROEJA, já lançados, publi-cados pela Editora da Universidade Federal de Pelotas, realizados pela coorde-nação da Especialização PROEJA Rio Grande do Sul edição 2007-2009, envol-vendo a Universidade Federal do Rio Grande do Sul com duas turmas em Porto Alegre, o campus São Vicente do Sul do Instituto Farroupilha com duas turmas, o campus Bento Gonçalves do Instituto Federal Rio Grande do Sul com uma turma, o Colégio Técnico Industrial vinculado à Universidade Federal de Santa Maria com duas turmas, todas elas tendo em média 50 alu-nos-professores das redes pública municipal, estadual ou federal, nas áreas de

Page 9: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  9

Educação de Jovens e Adultos, Educação Profissional, dos níveis Médio ou Fundamental.

Esta nova coleção, então nomeada: Cadernos PROEJA II Especializa-ção Rio Grande do Sul, conta com nove volumes. Os primeiros volumes estão diretamente vinculados aos trabalhos de conclusão de curso dos alunos das quatro turmas da Especialização PROEJA, sendo realizada uma seleção de artigos pelos organizadores de cada volume considerando a originalidade, a relevância social e epistemológica presente em cada texto.

Destacamos o trabalho de orientação dos trabalhos de conclusão de cursos já presente na primeira edição da especialização PROEJA, pois desde aquela obra Reflexões sobre a Prática e a Teoria em PROEJA – Produções da Especialização PROEJA RS, passando pelos sete cadernos já publicados da segunda edição da Especialização, colocamos o orientador como segundo autor do artigo, considerando seu trabalho de iniciação à pesquisa de muitos professores especialistas, uma vez que em vários cursos de licenciatura pelos quais nossos alunos – professores passaram não ocorreram momentos de autoria. O trabalho de orientação tem reflexos diretos na prática docente, sobretudo dos professores que atuam com Ensino Médio, nível de ensino que passa por profunda crise no Brasil, denotando a fragilidade das pesquisas realizadas com o envolvimento dos jovens, cujas experiências possuem valor inestimável para os processos de ensino e de aprendizagem.

Assim, a nova coletânea ora apresentada tem a seguinte estrutura: o volume I inaugura uma reflexão sobre o PROEJA FIC – Educação Inicial e Continuada, programa inédito para os campi, no convênio com prefeituras, outras entidades de formação profissional que impõe novos arranjos para os campi envolvidos, seja na formação de professores, seja na organização do currículo, seja na perspectiva de atividades de extensão com estes trabalhado-res pouco escolarizados, na possibilidade de frequência ao Ensino Médio dentro dos IFs. Neste volume foram selecionados artigos das turmas de Bento Gonçalves, Júlio de Castilhos e Alegrete, campi que estão realizando experiên-

Page 10: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  10

cias de PROEJA FIC dentro da rede federal de Educação Profissional e Tecno-lógica, sendo organizadoras do volume as também executoras do PROEJA FIC em suas instituições: Mariglei Severo Maraschin, Fernanda Zorzi e Greice Gonçalves Girardi, contando com a participação das professoras Simone Valdete dos Santos e Juçara Benvenuti.

O volume II intitulado Educação Indígena em Diálogo apresenta o Trabalho de Conclusão de Curso de um professor indígena kaingang3 da turma de Porto Alegre, que concluiu a terceira edição da Especialização PROEJA e atualmente é aluno em nível de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGS, com bolsa da Fundação Ford e um artigo de Caetana Juracy Rezende Silva coordenadora geral de Políticas de Educação Profissional e Tecnológica na Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica – SETEC/MEC, a qual fala deste lugar importante da gestão do PROEJA sobre educação escolar indígena.

O volume III, intitulado PROEJA Quilombola, organizado por Simo-ne Valdete dos Santos e Paulo Sérgio da Silva, apresenta os Trabalhos de Conclusão de Curso de três alunas da Especialização PROEJA, a partir de pesquisas feitas nos quilombos de Limoeiro, Cambará e Casca, todos no Rio Grande do Sul.

Nos quatro volumes sob o título Refletindo Sobre PROEJA constam outros Trabalhos de Conclusão do Curso, das turmas 2008/2010. O volume

                                                       3 As produções dos quatro alunos professores Kaingang (Zaqueu Key Claudino, Andila Nĩvyg-sãnh Inácio, Maria Inês de Freitas, Márcia Gojtẽn Nascimento) das duas turmas de Especiali-zação PROEJA, motivaram a Faculdade de Educação da UFRGS a propor para SETEC uma turma específica de professores indígenas e gestores da Educação Indígena para execução da Especialização PROEJA proposta diferenciada Indígena iniciando a turma ao final de 2010 até primeiro semestre de 2012, no intuito de implementar o PROEJA Indígena no Rio Grande do Sul. Este curso está sendo protagonizado pela UFRGS, tendo outras turmas de especialização com início em 2010: Santa Maria, executada pela Universidade Federal de Santa Maria; Passo Fundo, executada pelo campus Passo Fundo do IF Sul- Rio-grandense; Alegrete, executada pelo campus Alegrete do IF Farroupilha; e Bento Gonçalves, executada pelo campus Bento Gonçalves do IF Rio Grande do Sul.

Page 11: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  11

IV foi organizado pelas professoras Fernanda Zorzi e Juraciara Paganello Peixoto e é constituído pelas produções de Bento Gonçalves. No volume V, os professores Juçara Benvenuti, Rafael Arenhaldt e Tania Beatriz Iwaszko Marques reuniram os trabalhos de Porto Alegre. Já a turma de Júlio de Casti-lhos foi organizada por Mariglei Severo Maraschin e Fábio Azambuja no volume VI. E, a professora Greice Gonçalves Girardi fez a coletânea dos arti-gos de Alegrete no volume VII. Encerrando os quatro volumes, apresentamos o texto Orientações no PROEJA de autoria da professora Tania Beatriz Iwasz-ko Marques.

O volume VIII, organizado por Fábio Azambuja Marçal, Mariglei Se-vero Maraschin, Greice Gonçalves Girardi e Simone Valdete dos Santos relata a organização e resultados do I Seminário dos Estudantes do Ensino Médio do PROEJA em Santa Maria nos dias 22 e 23 de maio, que envolveu a coor-denação da Especialização PROEJA. Além disso, apresenta o material didático Cartilha das Mulheres, que foi elaborado por professores e alunos do PROEJA Ensino Médio Informática do campus Júlio de Castilhos. Além disso, dá visibilidade ao trabalho desenvolvido em Bento Gonçalves e apresen-tado pela professora Fernanda Zorzi, com os alunos/professores da Especiali-zação PROEJA sobre o relato dos alunos do Curso Técnico em Comércio, ambos como atores dessa política, abordando a estreita relação entre a teoria e a prática, na luta por sonhos possíveis: a articulação da Educação Profissional, Educação de Jovens e Adultos e Educação Básica. Para finalizar, o volume apresenta uma carta dos estudantes e dos gestores do PROEJA da rede federal de educação profissional, científica e tecnológica, reunidos em Santa Mari-a/RS em maio de 2010. O título desse volume é Refletindo sobre PROEJA: Produções do PROEJA Médio.

O volume IX, intitulado Estudos sobre a Implantação do PROEJA, organizado por Simone Valdete dos Santos, reúne duas pesquisas de mestrado e um artigo sobre os movimentos constituintes da Implantação do PROEJA na rede federal de Educação Profissional e Tecnológica. As pesquisas que estão

Page 12: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  12

vinculadas aos programas de Pós-Graduação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Universidade de Brasília (UNB), analisam os processos de implantação do PROEJA na rede federal, em cinco campi dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, quais sejam: Charquea-das no Rio Grande do Sul; Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro; Flori-anópolis, em Santa Catarina; Boa Vista, em Roraima; e Pelotas, no Rio Gran-de do Sul. O artigo da professora Jaqueline Moll apresenta algumas reflexões sobre os desafios para a construção da Educação Profissional e Tecnológica na EJA como política pública.

Por certo, as fronteiras interiores das Universidades, dos Institutos, dos professores, dos alunos, dos gestores envolvidos com a Especialização PROEJA, tanto no cuidado com sua execução, como na frequência às aulas, ou na realização de seus seminários ultrapassou enormes distâncias. Ocorreu também aproximação entre pesquisadores e estudos realizados no grupo CAPES/PROEJA, na Especialização, em nível de Mestrado ou Doutorado, nos cursos de PROEJA FIC, PROEJA Médio, nas propostas de Educação Indígena diferenciada Guarani ou Kaingang e no PROEJA Quilombola.

Houve trocas de experiências nas funções de docência e gestão dos Ins-titutos e da Universidade, vinculadas à Educação Profissional, à Educação de Jovens e Adultos e/ou ao PROEJA, bem como preocupação com a formação de professores inseridos nestas modalidades de Educação.

Além de tudo isso, todo o grupo, protagonista ou não, da Especializa-ção PROEJA foi envolvido nas amizades, nos conflitos que tivemos ao longo destes dois anos e na efetivação de mais esta coleção, que agiu sobre nossos interiores e, sem dúvida alguma, nos fizeram pessoas melhores.

A parceria iniciada na coleção anterior com a editora da Universidade Federal de Pelotas, intermediada pelo professor Mauro Augusto Burkert Del Pino, professor da Especialização PROEJA, integrante do grupo de pesquisa CAPES/PROEJA se mantém na atual publicação, assim como a revisão e a

Page 13: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  13

formatação, de cada volume, feita pela professora da Especialização PROEJA e orientadora de TCCs Juçara Benvenuti.

Encerramos com as belas palavras do professor Dr. Balduíno Andreol-la, que foi nosso diretor da Faculdade de Educação da UFRGS, na apresenta-ção do livro Formação de Educadores, lançado recentemente pela editora da UNIJU¸: „Nunca apreciei muito as estrelas que brilham sozinhas e distantes do firmamento. ¤ luz ofuscante e solitária das estrelas de primeira grandeza, preferi sempre a luz mansa e fraternal das constelações‰.

A coleção que aqui se apresenta é obra de constelações que brilharam para organizar a Especialização PROEJA e brilham continuamente para o pleno êxito das turmas de PROEJA FIC e PROEJA Médio, acreditando no brilho maior que é ofertar Educação Profissional de qualidade integrada à Educação Geral para jovens e adultos trabalhadores do Brasil.

Page 14: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa
Page 15: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

APRESENTAÇ‹O - SETEC/MEC

 4 Mestre em Música. Técnica em Assuntos Educacionais do Ministério da Educação. Coorde-nadora-Geral de Políticas de Educação Profissional e Tecnológica SETEC/MEC. E-mail: [email protected] 5 Mestre em Educação. Coordenadora Nacional do PROEJA – Diretoria de Políticas de Educação Profissional e Tecnológica da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação – DPEPT/SETEC/MEC. E-mail: [email protected].

Caetana Juracy Rezende Silva4 Vânia do Carmo Nóbile Silva5

Eu me declaro culpado de não ter feito, com estas mãos que me deram,

uma vassoura.

Por que não fiz uma vassoura? Por que me deram mãos?

Pablo Neruda

A questão da formação de profissionais – docentes, gestores, técnicos – para a educação básica tem se colocado na pauta de grande parte das dis-cussões sobre a qualidade e universalização deste nível educacional. Nas diversas instituições, redes e sistemas de ensino, estes profissionais encontram

                                                      

Page 16: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

 6 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Art. 205, sobre os objetivos da educação.

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  16

dificuldades frente aos inúmeros desafios decorrentes de uma realidade com-plexa, envolvendo grandes desigualdades sociais, aceleradas modificações científico-tecnológicas, mudanças no campo produtivo e nas relações de trabalho, entre outras.

Em 2006, a formulação de uma proposta geral para o desenvolvimen-to de cursos de pós-graduação lato sensu, visando à formação de especialistas em educação profissional integrada com a educação de jovens e adultos – circunscrita nas ações de estruturação do PROEJA – buscou responder parci-almente à demanda das redes de ensino frente aos desafios de proporcionar a jovens e adultos escolarização e profissionalização alicerçadas na compreen-são do direito de todos à educação e na concepção de formação omnilateral, na perspectiva do pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho6. O financiamento dessa ação foi pensado como forma de promover as condições necessárias para o desenvolvimento de outras propostas formativas e produção de co-nhecimentos nesse campo educacional, passando a compor o quadro geral de iniciativas de formação de profissionais para a educação básica.

A Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, por inter-médio de sua Faculdade de Educação, desde o primeiro convite, ainda em 2006, tem coordenado o polo constituído juntamente com outras instituições federais desse estado. Tem promovido uma das melhores experiências de integração entre as ações de formação e de pesquisa (grupo em que partici-pam também os Institutos Federais, a Universidade Federal de Pelotas e a UNISINOS) com a oferta dos cursos PROEJA desenvolvidos nos Institutos Federais Farroupilha, Sul Rio-Grandense e do Rio Grande do Sul e nas esco-las técnicas vinculadas à Universidade Federal de Santa Maria, além de outras

                                                      

Page 17: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  17

experiências de EJA, o polo do Rio Grande do Sul é responsável pelo maior conjunto de publicações sobre PROEJA em todo o país.

A proposta de se oportunizar aos educadores e demais profissionais da educação, inseridos ou que venham a se inserir no desenvolvimento dos cursos PROEJA, uma formação continuada a partir da sua experiência do-cente tem mostrado a importância de que esta formação surja da identifica-ção e da reflexão sobre sua prática pedagógica, no sentido da formação pes-soal e profissional que o faz educador.

Assim, o currículo do curso de pós-graduação lato sensu do polo co-ordenado pela UFRGS, com seus projetos integradores e com a construção dos memoriais formativos tem possibilitado a discussão de temáticas funda-mentais para o fortalecimento do PROEJA como as concepções, financia-mento, formação de professores, currículo, material didático, articulação entre as esferas de governo, acesso e permanência, gestão e estrutura da escola para implementação do PROEJA, bem como da reflexão sobre os educandos e suas trajetórias escolares e profissionais.

As temáticas escolhidas para a reflexão proposta aos leitores nesta co-letânea dos Cadernos PROEJA II – Especialização Rio Grande do Sul reve-lam um olhar para a implantação e o desenvolvimento dos cursos PROEJA Técnico e de Formação Inicial e Continuada no contexto dos Institutos Federais, mas também um olhar sensível para as temáticas específicas como a indígena e a quilombola ao revelar as possibilidades da integração da educa-ção profissional e educação básica para jovens e adultos a partir das particu-laridades dessas comunidades.

O cuidado na escolha e organização dos artigos revela ainda a preo-cupação com a escuta e consideração do que têm a dizer àqueles que consti-tuem o PROEJA, direta ou indiretamente, ao apropriarem-se de sua essência para recriá-lo nos espaços escolares e na sociedade em geral.

Page 18: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  18

Refletindo a partir das palavras do poeta Pablo Neruda sobre a pro-dução do polo de Especialização PROEJA no Rio Grande do Sul, evidencia-se o esforço de estudantes, pesquisadores e educadores em recolher o fio da vassoura verde ainda na terra, colocar para secar os talos ternos e unir num feixe áureo, juntando um caniço de madeira à saia amarela até dar uma vassoura aos caminhos.

Page 19: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

PRŁLOGO

Paulo Sérgio da Silva1

A reflexão sobre os processos que abarcam perspectivas distintas das formas tradicionais de conceber a educação são elementos significativos nos processos de transformação social. Contemplar interesses e necessidades diversas tem sido preocupação constante de educadores comprometidos com as mudanças necessárias que objetivam a construção de uma sociedade mais equânime. Desta maneira, a luta é para que o direito à educação de qualidade seja uma conquista de fato e não apenas retórica. No que diz respeito às comunidades remanescentes de quilombos, a educação tem sido vista, pelas próprias comunidades, como um dos elementos fundamentais para a supera-ção das relações desiguais, discriminatórias e preconceituosas que se estabele-cem no meio rural.

A perspectiva educacional, na qual se insere a proposta do PROEJA, apresenta uma contribuição nesse sentido à medida em que

                                                       1 Doutorando em Educação. Coordenador Pedagógico do Curso Procedimentos Didáticos Pedagógicos Aplicáveis em História e Cultura Afro-Brasileira da UFRGS. Integrante do Instituto de Assessoria às Comunidades Remanescentes de Quilombos - IACOREQ. E-mail: [email protected]

Page 20: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  20

Como formação humana, o que se busca é garantir ao adoles-cente, ao jovem e ao adulto trabalhador o direito a uma for-mação completa para a leitura do mundo e para a atuação como cidadão pertencente a um país, integrado dignamente à sua sociedade política (Ciavatta, 2005, p. 85).

No entanto, é necessário que tenhamos a consciência e a compreen-são que essa perspectiva não se consolidará se não houver intervenções pro-positivas que procurem fazer com que essas leituras de mundo venham a emergir dos mais distintos lugares.

Este livro aponta essa possibilidade ao trazer para o debate a discus-são sobre educação nas comunidades quilombolas.

A partir de reflexões acadêmicas construídas in loco durante as pes-quisas de conclusão do Curso de Especialização em Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrada ao Ensino Médio na Modalidade de Edu-cação de Jovens e Adultos, as autoras especialistas e seus orientadores aden-tram em um universo quilombola pouco conhecido pelo mundo acadêmico, mas que, paulatinamente vai conquistando seu espaço.

O livro apresenta um caráter inovador ao apontar a relação possível entre educação quilombola e o PROEJA, haja vista que no Rio Grande do Sul não existe publicação bibliográfica tratando desta temática. Também contribui para dar visibilidade sobre a necessidade de contemplar, a partir dos interesses, dos conhecimentos e dos saberes predominantes nas comuni-dades remanescentes de quilombos, o ensino técnico-profissionalizante inte-grado à educação de jovens e adultos.

No Rio Grande do Sul, conforme dados do Instituto Nacional de Co-lonização e Reforma Agrária (INCRA), existem mais de 160 comunidades remanescentes de quilombos, distribuídas por todos os recantos do Estado. Tais comunidades enfrentam uma série de dificuldades, algumas das quais são comuns aos trabalhadores e aos camponeses em geral; outras tem no estrato

Page 21: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  21

étnico a sua especificidade, resultado de uma sociedade que, por meio do ra-cismo e da percepção etnocêntrica de desenvolvimento, gera um intenso pro-cesso de exclusão social. Os estudos aqui apresentados abordam de maneira intensa essa problemática, dando ênfase ao papel fundamental do processo educativo, bem como localiza os atores e agentes que dele participam.

O texto intitulado Saberes Tradicionais e Educação Profissional na Comunidade Quilombola do Limoeiro de Simone Ramos Almeida, por mim orientado, realiza uma reflexão sobre a articulação entre a Academia, através de projetos de extensão e pesquisa realizados por alunos e professores junto aos membros da referida comunidade, localizada na zona rural de Palmares do Sul. Desta maneira, para os autores, o que se coloca como grande desafio é fazer com que estas formas de conhecimento tradicional, também possam ser apropriadas enquanto ferramentas pedagógicas na perspectiva do PROEJA e da educação das relações étnico-raciais.

O artigo desenvolvido pela aluna Taise Tadielo Cezar Atarão, orienta-do pelo Professor Paulo Peixoto Albuquerque intitulado Uma Pedagogia Diferenciada na Comunidade Quilombola Cambará, apresenta um estudo de caso que resulta em uma análise da possibilidade de implementação da propos-ta do PROEJA FIC na comunidade Remanescente de Quilombos de Cambará. Mediante a articulação do IFET Farroupilha, Campus São Vicente de Sul e a Prefeitura Municipal de Cachoeira do Sul, o artigo constata os entraves institu-cionais que se apresentam diante da tentativa de implementação de uma pro-posta educacional verticalizada e conclui que os processos de escuta e de valori-zação dos interesses dos comunitários, neste caso, dos moradores da Comuni-dade Remanescente de Quilombos de Cambará, são imprescindíveis.

Para fechar este caderno, apresentamos o texto A perspectiva do PROEJA na Comunidade Quilombola de Casca, escrito pela pedagoga Laiz Cristina da Silva Wediggen, também orientado por mim. Com narrativa fluente e bem amarrada, o texto relata fatos importantes de trajetórias pes-

Page 22: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  22

soais e da história da comunidade, desencadeando uma interessante reflexão sobre a importância da permanência dos jovens na comunidade. Finalizando propõe que a educação voltada a esse grupo respeite as suas especificidades e possa contribuir, entre outras questões, para a preservação do meio ambiente e para a valorização da vida e aponta para a viabilidade que se descortina na relação entre a Escola Técnica Agrícola de Viamão e a Comunidade Rema-nescente de Quilombos de Casca, localizada no município de Mostardas.

Se consideramos o trabalho como um „processo no qual os seres humanos atuam sobre as forças da natureza, submetendo-as ao seu controle e transformando os recursos naturais em formas úteis à vida‰, conforme nos ensina Marx, ao modificar a natureza, os homens que trabalham colocam em ação, as suas energias físico-musculares e mentais, transformando-se a si mesmos. Desta forma, a construção destes estudos que ora apresentamos compreende um pouco dessa relação, pois temos a convicção de que ao realizarem e publicarem estes artigos, os autores, oferecem aos leitores, ele-mentos que podem contribuir para transformar suas acepções e auxiliar na consolidação deste desafio que é afirmar uma perspectiva educacional, que além de inovadora realmente seja transformadora das relações sociais.

Abordar a temática da educação nas comunidades remanescentes de quilombos e a relação que pode se estabelecer com a perspectiva do PROEJA, é também uma importante contribuição para a educação das relações étnico-raciais e ajuda a tirar da invisibilidade educacional, parte significativa da comunidade negra que experimenta e vivencia de forma constante e perma-nente os efeitos de um sistema socioeconômico excludente.

Assim se fez o livro.

Page 23: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  23

Referências

CIAVATTA, Maria. A formação integrada: a escola e o trabalho como lugares de memória e de identidade. In: RAMOS, Marise; FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria. (Orgs.). Ensino Médio Integrado: Concepção e Contradições. São Paulo: Cortez, 2005.

Page 24: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa
Page 25: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

SABERES TRADICIONAIS E SABERES TRADICIONAIS E EDUCAÇ‹O

PROFISSIONAL NA COMUNIDADE QUILOMBOLA DO LIMOEIRO

Simone Ramos Almeida1 Paulo Sérgio da Silva2

Resumo

Este artigo é fruto de observações, discussões, questionamentos, refle-xões e vivências em uma comunidade remanescente de quilombos conhecida como comunidade do Limoeiro. A intenção do artigo é realizar uma reflexão sobre o que vem sendo realizado na comunidade em termos de educação co-

                                                       1 Especialista em Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrada ao Ensino Médio na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos. Pedagoga/Orientação Escolar. Participante do Projeto Saberes tradicionais e educação profissional na Comunidade Quilombola do Limoeiro: uma articulação viável. E-mail: [email protected] 2 Doutorando em Educação. Coordenador Pedagógico do Curso Procedimentos Didáticos Pedagógicos Aplicáveis em História e Cultura Afro-Brasileira da UFRGS. Integrante do Instituto de Assessoria às Comunidades Remanescentes de Quilombos - IACOREQ. Orientador do Trabalho de Conclusão de Curso da autora desse artigo. E-mail: [email protected]

Page 26: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  26

munitária, viabilizado principalmente na articulação entre a Academia e os comunitários, algumas vezes mediados por professores ou estudantes universi-tários envolvidos em projetos de extensão e pesquisa, por agentes do movimen-to social e pelos agentes da associação comunitária. Desta forma, o principal objetivo deste artigo destaca os saberes e fazeres da comunidade quilombola do Limoeiro. Saberes e fazeres estes que são resgatados através da socialização de conhecimentos, habilidades e motivações relacionados especialmente às plantas medicinais e aos alimentos, enquanto recursos utilizados em beneficio comuni-tário, visto que estão perfeitamente integrados ao cotidiano de famílias rema-nescentes quilombolas no Limoeiro. O desafio, no entanto é fazer com este conhecimento tradicional, objeto de intenso interesse acadêmico e científico, também possa ser apropriado enquanto ferramenta pedagógica no âmbito da educação escolar considerando a perspectiva da Educação de jovens e adultos, do PROEJA e da educação das relações étnico raciais.

Palavras-chave

Quilombos – Alimentação – Ervas medicinais – Educação das rela-ções étnico-raciais – EJA – PROEJA.

A Comunidade do Limoeiro como comunidade tradicional

Paulo Freire (1980) nos orienta que pensar em educação nos faz acre-ditar que o homem não é um ser vazio, a quem a escola ou a sociedade vai encher de conteúdos. Este ser que não é completo, é inacabado, carrega sabe-res, aptidões e capacidade de discernimento e de ação e constitui o funda-mento de uma relação que resulta na construção de um conhecimento reno-vado, ressignificado estimulando o necessário diálogo entre diferentes atores sociais, como é o caso deste estudo.

Page 27: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  27

A comunidade do Limoeiro está localizada no Distrito de Bacupari, ao sul do município de Palmares do Sul, litoral do Rio Grande do Sul, dis-tando 35 km da sede municipal, próximo ao limite com o município de Mostardas e a 120 km de Porto Alegre, capital do Estado. Palmares do Sul situa-se na planície costeira do Rio Grande do Sul, entre a Lagoa dos Patos e o Oceano Atlântico numa distancia média de 72 km e possui superfície territorial de 946 km², com altitude variando entre 2 e 18 m.

As áreas de terras da comunidade remanescente de quilombos de Li-moeiro e a própria formação da comunidade, tem sua origem histórica em heranças deixadas na chamada „Rota dos Tropeiros‰, conforme estudo reali-zado pelas pesquisadoras Márcia Kuniochi e Claudia Garcia durante o relató-rio técnico para o reconhecimento da área da comunidade remanescente de quilombos do Limoeiro.

O Limoeiro é composto por aproximadamente 100 famílias, em sua maioria afro-descendentes, constituindo uma comunidade remanescente de quilombos e que pode ser considerada também como uma comunidade tradicional. Estão ligados por laços sociais e de parentesco com outras cinco comunidades quilombolas da região litorânea, quais sejam: as comunidades de Casca, Olhos dÊágua, Beco dos Coloidianos, Teixeiras e Capororocas3,

Normalmente, quando se fala em populações tradicionais brasileiras remete-se a questões inerentes às comunidades indígenas. No entanto, a medida em que os estudos foram se ampliando e foi aumentando a abran-gência de compreensão da realidade em torno dessas comunidades, passou-se também a identificar outros grupos sociais como tradicionais, além das

                                                       3 Na região do litoral norte do estado do Rio Grande do Sul, entre os municípios de Palmares do Sul, Mostardas e Tavares, situam-se diversas comunidades negras rurais, que se autoi-dentificam como comunidades remanescentes de quilombos e estabelecem uma intensa rede de articulação.

Page 28: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  28

comunidades indígenas. Dentre eles destacam-se os caboclos, os ribeirinhos, os sertanejos, os caiçaras, os pescadores artesanais e os quilombolas.

O decreto-lei 6040, que reconheceu essas comunidades tradicionais, as define do seguinte modo:

São grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas geradas e transmitidas pela tradição (2007).

O artigo 68 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988 estabeleceu que "aos remanescentes das comu-nidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos". A norma legal, vigente na Constituição Brasileira, entretanto, não ficou limita-da somente a ordenar o Estado Brasileiro para que adotasse medidas que tivessem por intenção garantir posse às comunidades quilombolas: reconhe-ceu diretamente o direito à propriedade definitiva sobre as terras dos rema-nescentes de quilombos.

O estudo que desenvolvemos trata de uma reflexão sobre as alternati-vas viáveis de implementação de uma proposta educacional alicerçada nos saberes e fazeres da comunidade quilombola do Limoeiro. Tal perspectiva começa a se desenhar a partir dos estudos realizados pelo Instituto de Ciên-cias e Tecnologia dos Alimentos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em parceria com a Comunidade do Limoeiro. Desta forma uma das importantes referências utilizadas neste artigo é a produção acadêmica desen-volvida pelo Professor José Maria Wiest4.

                                                       4 José Maria Wiest é pesquisador do CNPQ, professor Pós-Doutor e Coordenador do Instituto de Ciências e Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Page 29: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  29

Sempre que analisamos a situação das comunidades quilombolas, muitas questões ficam em aberto justamente por ser esta temática ainda pouco explorada no âmbito acadêmico. Neste texto, nossa intenção é tam-bém abrir espaço para novas reflexões acadêmicas sobre a importância da educação nas comunidades quilombolas, neste caso, diante da perspectiva do PROEJA. Para tanto, consideramos importante recuperar o significado de quilombo e como a questão se coloca nos dias atuais.

A construção identitária do Quilombo

Convém que tenhamos a percepção de identificar como se dá a cons-trução do termo quilombo, por que esta terminologia vem sendo utilizada de forma frequente nas discussões sobre o tema das relações étnico-raciais no Brasil. Aliada a essa questão, se analisa também qual a viabilidade da cons-trução de propostas pedagógicas que trabalhem com a possibilidade de uma leitura multicultural do processo educativo, tomando o segmento denomina-do como quilombola neste cenário de articulações.

A antropóloga Ilka Boaventura Leite em artigo intitulado „Os Qui-lombos no Brasil: questões conceituais e normativas‰ diz que a expressão quilombo vem sem usada desde o período colonial. A autora faz uma recons-tituição acerca do termo, trazendo contribuições como a de Ney Lopes, que afirma o quilombo como sendo um „conceito próprio dos africanos e que vem sendo modificado através dos séculos, o termo significa também acam-pamento guerreiro na floresta, sendo entendido ainda em Angola, como uma divisão administrativa‰ (Lopes, Siqueira e Nascimento, 1987, p. 27-28).

Já em 1740, conforme orientação do Conselho Ultramarino portu-guês, quilombo foi definido como „toda habitação de negros fugidos que

                                                                                                       ICTA/UFRGS e coordenador de pesquisas financiadas pelo CNPQ que tem como temática principal os saberes e fazeres da comunidade quilombola do Limoeiro.

Page 30: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  30

passem de cinco, em parte desprovida, ainda que não tenham ranchos levan-tados nem se achem pilões neles. A expressão quilombo indica uma reação guerreira a uma situação agressiva‰. Os estudos do inglês David Birmigham (1974) indicam que o quilombo se originou na tradição mbunda5, através de organizações clânicas, e que suas linhagens chegaram até o Brasil através dos portugueses.

Ao recuperar a relação do quilombo com a ˘frica, Kabengele Mu-nanga, tratando dos quilombos brasileiros, afirma que este

é, sem dúvida, uma cópia do quilombo africano reconstituído pelos escravizados para se opor a uma estrutura escravocrata, pela implantação de uma outra estrutura política na qual se encontravam todos os oprimidos (1995).

Segundo Munanga, a fonte de inspiração provém de um intenso pro-cesso de amadurecimento ocorrido na área cultural bantu6 nos séculos XVI e XVII, da constituição de instituições políticas e militares, centralizadas, tran-

                                                       5 “Este grupo ocupa um vasto espaço a meio da metade centro-oeste de Angola. Eles consti-tuem uma síntese dos povos angolanos. Foram viajantes incansáveis do sub-continente e ainda hoje mantém grande tendência migratória. Dizem-se originários das terras a nordeste, mas, segundo alguns entendidos, terão vindo mais provavelmente do sudoeste do Congo. Do ponto de vista sócio-político possuíam os Mbundos notáveis organizações e construíram fortes muralhas defensivas, algumas delas inexpugnáveis para a época (Quissanje e Queque-te).São características comuns à parte dos grupos mbundos uma grande propensão para actividade agrícolas e pecuária. Nas artes, foi relevante a sua escola de escultura animalísti-cas. São tidos como os povos que melhor aceitam os padrões da cultura ocidental, sendo na atualidade, aliás, desta etnia, o maior número dos sacerdotes de Angola.” Fonte: www.consuladodeangola.org acesso em 28.05.2010. 6 A palavra BANTU tem sido definida como conjunto de pessoas que se serve da raiz NTU para designar o ser humano. Associado ao prefixo do plural BA forma a palavra BANTU, ou pessoas. O mundo bantu é todo o sul de uma linha imaginária que parte de Douala (Cama-rões) até Mombasa (Quênia), ocupando um terço da superfície de África e 30% do peso demográfico africano. Os seus usos e costumes, a própria língua e a sua cultura em geral, suscitaram a criação do CICIBA – Centro Internacional de Civilizações Bantu, com sede em Libreville/Gabão. Existem entre 400 a 500 línguas bantu. Os bantu estão divididos em onze grupos, entre os quais o grupo Zulu e o grupo Kilimanjaro. Fonte: http://www.opais.net/pt/opais. Acesso em 26.05.2010.

Page 31: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  31

sétnicas, e constituída por guerreiros cujos rituais de iniciação tinham a função de unificar as diferentes linhagens (Munanga, 1995/6, p. 57-63).

Ainda conforme Leite, na tradição popular brasileira há muitas vari-ações com relação ao significado da palavra quilombo, ora o termo está associado a um lugar („quilombo era um estabelecimento singular‰), ora a um povo que vive neste lugar („as várias etnias que o compõem‰), ou a mani-festações populares, („festas de rua‰), ou ao local de uma prática condenada pela sociedade („lugar público onde se instala uma casa de prostitutas‰), ou a um conflito (uma „grande confusão‰), ou a uma relação social („uma uni-ão‰), ou ainda a um sistema econômico („localização fronteiriça, com relevo e condições climáticas comuns na maioria dos casos‰) (Lopes, Siqueira e Nascimento, 1987, p.15).

As diversificações dos significados do termo, como concluem vários estudiosos da questão, beneficia o uso da terminologia para expressar uma grande quantidade de experiências, constituindo o que Leite considera como „um verdadeiro aparato simbólico a representar tudo o que diz respeito à história das Américas‰ (2010). A partir dos anos 70, as abordagens sócio-antropológicas procuram enfatizar os aspectos organizativos e políticos dos quilombos.

Essas comunidades constituídas por ex-escravos, tinham suas formas de organização articuladas de diversas maneiras com proporções e distribui-ção temporal distintas umas das outras.

A singularidade dos quilombos, desde o período colonial até os dias atuais, conforme a análise de Clóvis Moura (1981), decorre do fato de que todas as experiências já conhecidas revelam determinada capacidade de orga-nização entre os grupos. Mesmo que tenham sido destruídos algumas dezenas de vezes, eles tem a capacidade de reaparecer em novos lugares, constituindo-se como verdadeiros focos de defesa contra inimigos que se encontram sem-pre ao lado. Serem possuidores de uma base econômica que lhes permita a

Page 32: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  32

produção de víveres para a sobrevivência de um grupo expressivo significou, desde o surgimento destas formas coletivas de organização, uma maneira de organização sócio-política alicerçada em posições e estruturas de poder muito bem definidas, isto porque o inimigo exterior, caracterizado pelas frequentes invasões ao território da comunidade impôs, ao longo da história, a organi-zação competente de defesa da área ocupada como resistência.

Com o advento da abolição da escravidão, este caráter defensivo e as investidas bélicas começam a se transformar, mudam-se também os nomes e as táticas de expropriação. A partir deste momento a situação dos grupos corresponde a outra dinâmica, a da territorialização étnica como modelo de convivência com os outros grupos na sociedade nacional. Mas por outro lado, inicia-se, a longa etapa de construção da identidade destes grupos, seja pela formalização da diferenciação étnico-cultural no âmbito local, regional e nacional, ou na consolidação de um tipo específico de segregação social e residencial dos negros, chegando até os dias atuais (Clóvis Moura, 1981).

Para Munanga (1995), o ato de aquilombar-se, ou seja, de se organizar contra qualquer atitude ou sistema opressivo, passa a ser, portanto, nos dias atuais a chama reacesa para, na condição contemporânea, dar sentido, esti-mular, fortalecer a luta contra a discriminação e seus efeitos, iluminando uma parte do passado: aquela que salta aos olhos pela enfática referência contida nas estatísticas, nas quais os negros são a maioria dos socialmente excluídos. Aquilombar-se vem a ser, portanto, o mote principal para se discu-tir uma parte da cidadania negada.

Nos últimos vinte anos, os remanescentes das comunidades de qui-lombos, descendentes de africanos escravizados, em todo o território nacio-nal, organizados através de Associações Quilombolas reivindicam o direito à permanência e ao reconhecimento legal de posse das suas terras ocupadas e cultivadas para moradia e sustento, bem como o livre exercício de suas práti-cas, crenças e valores considerados em sua especificidade. Nessa nova condi-

Page 33: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  33

ção, é importante considerar os ensinamentos de Freire ao asseverar que a concepção de existência humana, como humanização e busca de libertação, ou conquista do Âser maisÊ, confere um sentido que inova na compreensão de nosso ÂserÊ no mundo.

Para além de uma identidade negra que esteja colada ao sujeito ou por uma cultura que se vê congelada no tempo, a noção de coletividade que aqui se expressa é o que efetivamente pode conduzir ao reconhecimento de um direito histórico desconsiderado, um esforço para a conquista de um lugar de direito, tomado absolutamente pelo uso sistemático da força da violência.

Coletividade que se entende no sentido de uma reivindicação comum a todos, que se expressa numa luta cotidiana por uma existência que propug-na respeito e dignidade. Neste interregno conceitual é a cidadania pode deixar de ser uma palavra bonita e passar a produzir efeito no atual quadro de desigualdades sociais no Brasil. Desigualdades estas que se acentuam especialmente quando o componente étnico é utilizado como forma de distinção entre as pessoas e os grupos.

A especificidade na construção dos saberes quilombolas da comunidade do Limoeiro

Ao observar os movimentos da comunidade quilombola do Limoeiro foi possível perceber, que os moradores da Comunidade Remanescente de Quilombos do Limoeiro, no município de Palmares do Sul, apresentam uma série de conhecimentos específicos considerados peculiares. Também se percebeu que os quilombolas do Limoeiro apresentam significativas distin-ções com relação às comunidades envolventes em relação ao trato de plantas medicinais, ao cultivo da terra, à produção e à feitura de seus alimentos para o consumo, aos cuidados com os animais e ao seu próprio modo de vida.

Page 34: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  34

Portanto ao nos decidirmos por esta proposta de ensaio reflexivo, consideramos que esses saberes distintos apresentam resultados significativos, devido a sua especificidade, pois não se encontrando em outros lugares, podem ser considerados com uma peculiaridade quilombola. Este fato já faz parte de importantes estudos, como os que vem sendo coordenados pelo Professor José Maria Wiest, o qual afirma que „a cultura que emana das comunidades, muitas vezes é repleta de conhecimentos cuidadosamente resguardados‰.

São estes conhecimentos, „cuidadosamente resguardados‰, que toma-remos como referência no desenvolvimento deste trabalho, já que se conside-ra na atualidade, que uma parcela significativa da sociedade está cada vez mais à procura de uma vida saudável. No campo alimentar, produtos sem agrotóxicos e produzidos de maneira orgânica, são cada vez mais exigidos pela população. No trato da saúde, produtos originados de plantas e conhe-cidos como fitoterápicos, ocupam cada vez mais espaço no processo terapêu-tico e no tratamento preventivo de algumas enfermidades.

Alguns estudos indicam que com esse tipo de plantas, as contra-indicações e os efeitos colaterais resultantes do uso de medicamentos sintéti-cos, podem vir a ser evitados. Cada vez defende-se mais a idéia de que a utilização de plantas medicinais, pode apresentar a mesma eficácia que os medicamentos convencionais produzidos em alta escala pelos laboratórios da indústria farmacêutica.

Segundo Wiest (2008), a comunidade quilombola do Limoeiro é mais uma dentre outras tantas comunidades de afro-descendentes, marcada por contratos e conflitos entre diferentes modos de organização da sua vida social, que ao se apropriar dos recursos naturais e transformá-los, concebem a realidade e a expressam. Nesse sentido, suas formas de utilização dos conhe-cimentos tradicionais contribuem para que a identidade sócio-cultural do grupo étnico se constitua como elemento agregador. Ao preservar e manter

Page 35: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  35

elementos característicos do modo de vida dos seus antepassados, além de procurar sob diversas maneiras garantir a defesa de seu território como ele-mento aglutinador de uma ancestralidade escrava, a comunidade remanescen-te de quilombos do Limoeiro inscreve sua marca em um espaço em que a identidade é tida como um forte elemento de afirmação sócio-política.

Desta forma, a organização comunitária que se estabelece ao longo de mais de um século de duração, hoje se traduz em uma organização política reconhecida através da organização da associação comunitária quilombola. Tal organização é um elemento que demonstra a capacidade e a necessidade que as comunidades remanescentes de quilombos apresentam para defender suas propostas e seus interesses coletivos.

A realidade das comunidades remanescentes de quilombos é conside-rada dura, pois se deve levar em conta que, em um estado em que o racismo e o preconceito são a tônica do desenvolvimento, a população negra, descen-dentes de escravos, carrega a imposição de um estigma cruel e excludente ao máximo. Isso somente poderá ser superado a partir de um intenso processo educativo das relações étnico raciais.

Identidade e educação na Comunidade Quilombola do Limoeiro

Ao tratar a educação das comunidades remanescentes de quilombos em uma perspectiva que trabalhe com a afirmação da identidade da popula-ção negra, é que a educação tem uma possibilidade consistente de interven-ção. Conforme Hall (1999), na perspectiva do jogo das identidades, afirmar-se enquanto grupo diferenciado se constitui como um imperativo, afirmando a possibilidade de se construir como homens e mulheres e em nosso caso, homens e mulheres quilombolas

Page 36: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  36

A identidade cambiante em que a mesma, ao não ser fixa está sempre em mutação, transforma-se em conformidade com as experiências vividas e com a representação social do que se pode / deve ser ou não ser (Hall, 1999).

Com um olhar que vá para além das visões estereotipadas e que re-almente valorize a questão da intensa diversidade cultural constituinte da população brasileira é que iniciativas como a Lei n… 10639/037 tendem a fortalecer as pertenças identitárias dos agrupamentos étnicos, trazendo outras versões do que significou e significa o continente africano na relação com o povo brasileiro de todas as matizes.

Desta maneira, é importante considerar, como orienta Silva (2005), que os conhecimentos de matriz africana permanecem nos modos de filoso-far, nas manufaturas, nas artes, na matemática, enfim em vários campos de saber que estão subsumidos em densas relações de poder, inclusive nas ciên-cias e nas diversas expressões de trato das questões relativas à saúde, à educa-ção e ao cultivo da terra, dentre outras. Ocorre que estas formas de conheci-mento dificilmente são utilizadas sob a perspectiva de uma pedagogia que contemple os interesses das diferenças.

Nossos modelos de ensino são calcados em uma visão etnocêntrica de conhecimento, na qual os principais referenciais, tanto do ponto de vista acadêmico, quanto das práticas que se revelam no cotidiano das escolas, são orientados pelos detentores do poder socioeconômico, a quem também é destinada a primazia na construção dos saberes. Assim, sobra pouco espaço nas redes escolares e nas próprias instituições acadêmicas para a reflexão e o estudo sob a perspectiva de uma educação que contemple a pluralidade e a diversidade dos saberes de comunidades consideradas tradicionais, como é o caso da comunidade remanescente de quilombos do Limoeiro.

                                                       7Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências.

Page 37: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  37

Ao analisarmos a questão da escolarização é importante salientar que o currículo escolar, enquanto artefato cultural, é forjado no seio de constan-tes disputas pelo poder, atuando no governo da subjetividade das pessoas e ditando

qual o conhecimento é legitimo e qual é ilegítimo, quais for-mas de conhecer são validas e quais não o são, o que é certo e o que é errado, o que é moral e imoral, o que é bom e o que é mau, o que belo e o que é feio, quais vozes são autorizadas e quais não o são. (Silva, 1995).

Neste intrincado jogo de disputas por poder, os conhecimentos de origem dita popular são constantemente negados, em detrimento de formas consideradas „mais cultas‰ e distanciam os estudantes, das classes considera-das populares, do acesso à educação e à escola.

No caso específico das comunidades remanescentes de quilombos, a própria escola, por não apresentar um currículo que se oriente para as neces-sidades e experiências locais, é vista como um dos elementos que pode ser responsabilizado pelas altas taxas de evasão escolar de jovens e crianças qui-lombolas. Desta forma, surge um contingente de mão de obra para abastecer o mercado de trabalho de forma precária e não qualificada, gerando uma intensa rede de exploração do trabalho no meio rural.

Como alternativa a estas formas de exploração do trabalho, se colo-cam experiências construídas que consideram os saberes locais. Tais experiên-cias podem vir a se tornar o embrião de possibilidades de agregação de valor a formas de produção que tem a sabedoria ancestral e comunitária como principal fonte de produção de conhecimento. Assim, o que se discute é a possibilidade de transformar os saberes e fazeres da comunidade quilombola em práticas pedagógicas na perspectiva da educação de jovens e adultos.

Page 38: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  38

Transformar o conhecimento das comunidades, especialmente no que diz respeito às formas que tradicionalmente são utilizadas como garantia da preservação de uma tradição secular, aliado aos modernos conhecimentos introduzidos pelas novas técnicas de gestão de processos educacionais, é um desafio que se coloca especialmente ao refletirmos sobre a questão do PROEJA e a busca de novas alternativas em educação de jovens e adultos. Para isso a organização comunitária é imprescindível no sentido de efetuar cobranças junto aos organismos institucionais:

(...) é preciso ter claro que os movimentos sociais, ao exerce-rem pressão sobre o poder público em defesa de suas deman-das educacionais, tornam-se sujeitos indispensáveis ao proces-so de planejamento e formação teórico-epistemológica sobre educação profissional integrada ao ensino médio, por gera-rem, também, conhecimento em seus campos de atuação. En-fim, as concepções de currículo, a construção e a atualização de projetos pedagógicos, as condições e o tamanho da oferta dos cursos são aspectos para os quais muito têm a contribuir os movimentos sociais, a exemplo do que se tem reivindicado e avançado no âmbito do Movimento dos Trabalhadores Ru-rais Sem Terra e das comunidades indígenas, que identificam o ensino médio integrado como uma necessidade coerente com sua realidade (PROEJA, Documento Base, 2007, p. 32).

Ao principiarem os processos pedagógicos de formação dos integran-tes da comunidade, mesmo que não propriamente ligados à escolarização formal, como no caso do aprimoramento e da catalogação de suas técnicas de cultivo de ervas medicinais, as comunidades remanescentes de quilombos, e neste caso específico, a comunidade quilombola do Limoeiro, indicam cami-nhos por onde se pode iniciar a construção de uma proposta pedagógica, na qual os interesses da comunidade sejam contemplados de maneira efetiva.

Page 39: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  39

Os saberes e fazeres da Comunidade Quilombola do Li-moeiro

Observa-se que o desenvolvimento de atividades geradoras de renda no Limoeiro pode ser pensado de forma a não repetir o modelo tecnológico convencional, direcionado às grandes propriedades. Assim, os experimentos realizados através dos pesquisadores que realizaram ações de implantação de algumas lavouras orgânicas, que incluíam cebola, morango e mamona, culti-vo consorciado de arroz e peixe, mostraram-se viáveis. O principal objetivo dessas primeiras lavouras era demonstrar, na prática, a possibilidade da produção sem o uso de adubos químicos e venenos. Para que isso fosse pos-sível houve o resgate de técnicas agropecuárias tradicionais, como o cultivo simultâneo de diferentes espécies e a fertilização, através do esterco e ciclagem de nutrientes com plantas.

Através dos trabalhos que vem sendo desenvolvidos pelo grupo de pesquisadores liderados pelo Professor José Maria Wiest em parceria com a comunidade, pudemos perceber que os cultivos e as novas técnicas de produ-ção respondem à necessidade alimentar das famílias e que esta se completa com as formas locais de preparação de pratos e armazenagem dos alimentos. Tal situação é descrita nos relatórios de pesquisa desenvolvida pelo professor e tivemos a oportunidade de comprovar a campo a partir de conversas e entrevistas informais com moradores da comunidade.

Outro aspecto diz respeito às oficinas de artesanatos que promove-ram, além da valorização da cultura negra e melhoria da autoestima, a cria-ção de uma nova fonte de renda, especialmente para as mulheres da comuni-dade, que só viam as roças como opção de trabalho e rendimento. Algumas integrantes da comunidade aproveitaram esta nova fonte de saber, como alternativa de trabalho e procuraram abrir novos espaços de comercialização dos produtos característicos da comunidade, participando de feiras de artesa-nato, no Estado do Rio Grande do Sul e em outros lugares da Federação.

Page 40: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  40

Quando se fala em saberes e fazeres da comunidade quilombola do Limoeiro lembramos imediatamente da agricultura e do artesanato, mas não podemos deixar de falar das plantas medicinais, que os moradores cultivam em suas chácaras. Outra constatação do trabalho desenvolvido pelo professor José Maria Wiest e sua equipe, e por nós constatada, é de que as plantas medicinais são recursos terapêuticos historicamente utilizados pelas famílias do Limoeiro. Com o advento da modernidade, os serviços públicos de saúde chegaram à comunidade. Com ação centrada no médico, na doença e no remédio, a comunidade foi, aos poucos, desacreditando na eficácia e cura das plantas medicinais, mesmo que tal eficácia tenha sido comprovada através de estudos terapêuticos sobre a maioria das plantas cultivadas no quilombo.

Conclusão

Ao constatar a riqueza dos saberes e fazeres da comunidade quilom-bola do Limoeiro, pensei de que forma se poderia levar para dentro da escola esses conhecimentos. Muitas são as alternativas em todas as disciplinas, sejam elas do currículo por atividade ou áreas de conhecimento. Algumas situações práticas, por exemplo, quando falamos em chás, podemos pedir para que cada aluno traga uma relação de chás que tenham em casa e trabalhar quan-tidades, as diversidades, os nomes, classificando cada palavra, seus significa-dos, para que servem e inúmeras outras atividades. Com relação à alimenta-ção, o mesmo poderia ser feito. O artesanato, com produtos característicos da comunidade poderia ser incentivado em sala de aula, como forma de manter e disseminar os conhecimentos locais.

Com isso, acredito que poderemos incentivar um processo de apren-dizagem que desperte maior interesse nos alunos, pois estaremos tratando de uma educação voltada para a realidade concreta dos sujeitos no processo de educação e poderemos intensificar a integração entre a família e a escola. Este tipo de atividade contribui para valorizar o que o aluno tem a nos oferecer

Page 41: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  41

no processo de construção do conhecimento. Paulo Freire diz que „um dos grandes pecados da escola é desconsiderar tudo com que a criança chega a ela. (...) A escola secreta que antes dela não há nada‰ (1980).

Nessa afirmação Freire coloca a importância da escola de se apropriar dos saberes que a comunidade possui, podendo ir além de atividades em sala de aula e partindo para um processo de inclusão efetiva da escola no âmbito da comunidade. Na atualidade, a escola apresenta modelos educacionais que estão distante das realidades locais. Não é raro encontrar propostas educacio-nais em escolas situadas em plena zona rural, em que o projeto político-pedagógico orienta para o êxodo do campo, contribuindo para que se inten-sifique o processo de migração do campo para as cidades. No caso das co-munidades remanescentes de quilombos, esse distanciamento da escola do mundo real é considerado um poderoso instrumento de desagregação comu-nitária, pois ao incitar a migração, afasta os jovens de seus locais de referên-cia identitária.

Com relação ao PROEJA, penso na possibilidade de implementação de uma perspectiva na qual as pessoas dessa comunidade pudessem aprofun-dar seus conhecimentos escolares, tendo como referência os saberes e fazeres locais. Assim, poderiam concluir o ensino fundamental ou ensino médio, conforme as necessidades individuais, ao mesmo tempo em que estariam qualificando tecnicamente estes saberes através de cursos que possibilitassem a formação de técnicos em fitoterapia ou em gastronomia, por exemplo. Para isso torna-se fundamental que o espírito de colaboração descrito no Docu-mento Base seja posto em prática:

Nesse processo, a Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica, além de oferecer o máximo de vagas possíveis no ensino médio integrado, pode cumprir um papel fundamental de articulação entre os entes federados, visando à efetivação do regime de colaboração. Portanto, um plano estratégico e estruturante da política de ensino médio integrado à educação

Page 42: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  42

profissional implica, necessariamente, a cooperação, a colabo-ração e a interação com os sistemas estaduais e municipais, quando for o caso, no sentido de contribuir para que tais sis-temas construam e implementem seus currículos a partir de suas próprias realidades (PROEJA, Documento Base, 2007, p. 31).

Ao efetivar este tipo de articulação proposta, a título de perspectiva viável de execução, torna-se necessário, no entanto, que a educação realizada no âmbito do PROEJA desenvolva olhares diferenciados para realidades distintas, que tenham a capacidade de compreender as especificidades que se apresentam em determinados contextos sociais, como é o caso das comuni-dades remanescentes de quilombos. Compreender estas realidades complexas é imperativo no sentido de desconstituir o etnocentrismo que contribui para que as práticas discriminatórias na construção do conhecimento ainda este-jam presentes no campo educacional e não contemplem saberes e fazeres que são significativos na manutenção da vida de grupos e comunidades tradicio-nais.

Investir na qualificação das comunidades remanescentes de quilom-bos, através de uma formação educacional qualificada, contribuirá para que todos nós possamos aprofundar nossos horizontes de conhecimento, ampli-ando nossa compreensão de mundo e realizando aquilo que há muito as comunidades esperam e reivindicam: a reparação e o reconhecimento de sua importância, enquanto responsáveis por boa parte do desenvolvimento do Estado Brasileiro, mesmo que sob os infames desígnios da escravidão.

Referências

BIRMIGHAM, David. A Conquista Portuguesa em Angola. Lisboa, Ed. A regra do Jogo/História, 1974.

Page 43: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  43

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica. Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrada ao Ensino Médio. Docu-mento Base. Brasília. 2007. Mimeo.

FREIRE, Paulo. Conscientização: teoria e prática da libertação: uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Moraes, 1980.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 1999.

KUNIOCHI, Marcia Naomi; GARCIA, Claudia Daiane. Uma comunidade qui-lombola na rota dos tropeiros: quilombolas do Limoeiro. Trabalho apresentado no 4… Encontro Escravidão e Liberdade no Brasil Meridional. Curitiba. 13 e 14 de maio 2009. Curitiba (PR). Disponível em http://www.labhstc.ufsc.br/ivencontro/ pdfs/comunicacoes/MarciaKunuochiClaudiaMolet.pdf . Acessado em 25/05/2010.

LEITE, Ilka Boaventura. Os Quilombos no Brasil: questões conceituais e normati-vas. Disponível em http://www.nuer.ufsc.br/artigos/osquilombos.htm. Acessado em 28/06/2010.

LOPES, Helena Theodoro; José Jorge SIQUEIRA; Beatriz NASCIMENTO. Negro e cultura Negra no Brasil. Rio de Janeiro: UNIBRADE/UNESCO, 1987.

MOURA, Clóvis. Rebeliões na senzala, quilombos, insurreições, guerrilhas. São Paulo, Ed. Ciências Humanas, 1981.

MOURA, Clóvis. O negro - de bom cidadão ao mau escravo. Rio de Janeiro: Con-quista, 1977.

MOURA, Clóvis. Quilombos, resistência ao escravismo. São Paulo: Ed. ˘tica, 1987.

MUNANGA, Kabengele. Identidade, Cidadania e Democracia: algumas reflexões sobre os discursos anti-racistas no Brasil. In: QUINTAS, Fátima (Org.). O negro: identidade e Cidadania. Anais do IV Congresso Afro-Brasileiro. Fundação Joaquim Nabuco. Recife: Ed. Massangana, 1995.

Page 44: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  44

MUNANGA, Kabengele. Origem e histórico do quilombo na ˘frica. Revista da USP, n. 28. São Paulo: USP, 1995/1996.

SILVA, Petronilha Beatriz Gonçalves. Aprendizagem e ensino das africanidades. In: MUNANGA, Kabengele (Org.). Superando o racismo na escola. 2. ed. Brasília: MEC, 2005, pp. 155-172.

SILVA, Petronilha Beatriz Gonçalves. Anotações sobre Ética, Movimentos Sociais, Pesquisas. In: JACQUES, Maria da Graça C. (Org.). Relações Sociais e Ética. Porto Alegre: ABRAPSO-Regional Sul, 1995. pp. 233-239.

SILVA, Petronilha Beatriz Gonçalves. Diversidade étnico-Cultural e currículos Escolares - dilemas e possibilidades. Cadernos CEDES. Campinas, Centro de Estu-dos Educação e Sociedade, n. 32, 1993. pp. 25-34.

SILVA, Tomaz Tadeu. Currículo e Identidade social, territórios contestados. In: SILVA, Tomaz Tadeu (org.). Alienígenas na Sala de aula - uma introdução aos estudos culturais em educação. Petrópolis, Vozes, 1995.

WIEST. José Maria, (Org.). Alimentos e Alimentação... enquanto saberes e fazeres quilombolas no Limoeiro do Bacupari. Porto Alegre: Ed. Evangraf Ltda, 2008.

Page 45: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

UMA PEDAGOGIA DIFERENCIADA NA COMUNIDADE QUILOMBOLA CAMBAR˘

Taise Tadielo Cezar Atarão1 Paulo Peixoto Albuquerque2

Resumo

Este artigo é um estudo de caso que busca analisar como a proposta de PROEJA FIC está sendo implementada na Comunidade Quilombola Cambará. Tem por objetivo analisar como o projeto educativo do PROEJA FIC, nos seus modos de operacionalização, reconhece os tempos e espaços da Comunidade Quilombola Cambará, do município de Cachoeira do Sul. Resulta de uma pesquisa realizada a partir da observação participante regis-trada que possibilitou uma vivencia fundamental para a apropriação de documentos e para construir diálogos com a comunidade.

                                                       1 Especialista em Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrada ao Ensino Médio na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos. Pedagoga do Instituto Federal de Educa-ção Ciência e Tecnologia Farroupilha, Campus São Vicente de Sul. E-mail: [email protected] 2 Doutor em Sociologia. Professor adjunto da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Orientador do Trabalho de Conclusão de Curso da autora desse artigo. E-mail: [email protected].

Page 46: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  46

Palavras-Chave:

PROEJA FIC – Inclusão social – Educação Quilombola.

Introdução

O mundo, no qual se vive, impulsiona os profissionais da educação interessados nos movimentos de transformação humana e social a pensar intensamente sobre o contexto educativo. Sente-se a cada dia os reflexos de uma sociedade que desvela histórias e realidades diversas, no que se refere aos processos fundamentais da vida dos seres humanos que a constituem. Sob este cenário encontra-se o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação e Jovens Adultos (PROEJA), como uma proposta educativa para a sociedade adulta, que teve por algum tempo seu direito à escolarização negado por motivos diversos da vida, refletidos pela história social.

Neste sentido, buscou-se inserção nas discussões relacionadas ao PROEJA, por meio da participação em eventos, seminários e demais encon-tros no Estado do Rio Grande do Sul, os quais enfocam debates sobre o assunto. Buscou-se formação acadêmica especificamente sobre tal tema, razão esta que motivou o ingresso no curso de Especialização em PROEJA, no Instituto Federal Farroupilha, Campus de Alegrete/RS.

A intenção de fazer um „estudo de caso‰, como trabalho de conclu-são de curso, surgiu mais intensamente, com a implantação do PROEJA FIC3, sendo uma nova e desafiadora proposta de educação a ser desenvolvida, pois considera-se primordial investigar e refletir sobre o que irá compor este

                                                       3 Programa de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos - Formação Inicial e Continuada, Integrado ao Ensino Fundamental.

Page 47: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  47

novo projeto de ensino-aprendizagem, que valores, atitudes e conhecimentos estão implicados nos objetivos deste processo.

Assim, este trabalho foi produzido a partir da intenção de verificar a coerência entre proposta do projeto educativo na modalidade de PROEJA FIC e a sua implementação, na tentativa de analisar seus modos de operacio-nalização com as necessidades da Comunidade Quilombola Cambará, do município de Cachoeira do Sul. Tem-se, então, como problemática de estudo a seguinte questão: Como a proposta do PROEJA FIC está sendo implemen-tada na Comunidade Quilombola Cambará?

A metodologia de estudo, foi fundamentalmente um trabalho de campo, realizado a partir da observação participante na comunidade, tendo como instrumento para a coleta e registro de dados o diário de campo. Ain-da, foi realizada análise documental (documentos oficiais dos MEC – Docu-mento Base e Ofício n…40/2009 da SETEC/MEC e a legislação pertinente ao PROEJA), bem como buscou-se bibliografia sobre o assunto para melhor sustentar as compreensões em torno do tema em questão.

É relevante mencionar nesta introdução que, ao iniciar esta pesquisa existia um dado cenário, e que, a partir deste, foi proposto um projeto de pesquisa, prevendo roteiro de ações e passos a serem dados. No entanto, foi constatado que a incerteza estava presente e surgiram dificuldades de contro-lar todas as variáveis principalmente, pois há sujeitos sociais envolvidos, e eles têm suas próprias lógicas sociais e seus modos de pensar a vida.

O tempo e o espaço em que esta pesquisa aconteceu apresentaram va-riáveis interessantes e determinantes para o processo de reflexão e que conse-quentemente impactou num resultado inédito, o qual levou a significativas reflexões acerca do objeto de estudo.

Page 48: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  48

Um breve relato sobre a aproximação entre o Campus de São Vicente do Sul e a Comunidade Quilombola Cambará

Para melhor explicitar a trajetória transcorrida até chegar à constru-ção deste trabalho acadêmico, cabe fazer uma breve retrospectiva do surgi-mento do PROEJA FIC na referida instituição.

O programa surgiu com mais intensidade para as instituições da rede federal em abril do ano de 2009, com o Ofício n… 40 da Secretaria de Educa-ção Profissional e Tecnológica, o qual convida a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica para a implantação do Programa Na-cional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na modalidade de Educação para Jovens e Adultos, na Formação Inicial e Con-tinuada com Ensino Fundamental – PROEJA FIC.

Mediante esta nova proposta de PROEJA, o Campus de São Vicente do Sul, iniciou um processo de intenso diálogo, articulação e parceria com os municípios da região, construindo neste movimento duas proposições de cursos para esta modalidade de ensino, a Formação Inicial e Continuada em Panificação e Produção em Base Ecológica.

O município de Cachoeira do Sul, estreitou a comunicação com o Campus de São Vicente do Sul e na representatividade da Secretaria Munici-pal de Agricultura e Secretaria Municipal de Educação, buscou-se espontane-amente a parceria com o Campus ao ter o conhecimento destas possibilida-des educativas, pois já tinham a intenção de desenvolvê-lo em uma Comuni-dade Quilombola Rural e assim logo se iniciaram as tratativas para a elabora-ção do projeto inicial.

Conforme o Ofício n… 40, era preciso considerar que:

Nos projetos apresentados em parceria com os municípios, a-lém do público geral de jovens e adultos, ressalta-se a possibi-lidade de apresentação de propostas que contemplem públicos

Page 49: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  49

específicos da educação especial, da educação do campo, da educação escolar indígena ou do sistema socioeducativo (2009).

Sob este contexto foi possível, ainda, perceber a existência de muitos sujeitos que percorreram um processo histórico de exclusão social, econômi-ca, política, cultural, entre outras. Dentre estes „excluídos‰, o olhar de pes-quisa é direcionado para esta comunidade rural do Quilombo Cambará, localizada entre Cachoeira do Sul/RS e Caçapava/RS, comunidade esta na qual se propunha, pelos gestores do município, desenvolver o Curso de Produção de Alimentos em Base Ecológica.

Segundo os gestores do município a justificativa pela escolha desta comunidade, era a de que esta, vinha ganhando maior visibilidade no muni-cípio pela conquista de seus direitos, devido a sua organização política e social local (tendo como marco a constituição da associação dos quilombo-las). Direitos estes relacionados à habitação, água potável, luz, educação, geração de renda, dentre outras possibilidades existentes no que tangem às políticas sociais.

O projeto inicial foi elaborado, mediante algumas argumentações dos gestores do município e estudo do Documento Base referente ao PROEJA – Formação Inicial e Continuada/Ensino Fundamental. Após foi encaminhado para a aprovação da SETEC/MEC.

Dada a aprovação do projeto pela SETEC/MEC, as Secretarias do Desenvolvimento e da Agricultura do município de Cachoeira, realizaram os contatos com as lideranças da comunidade para uma conversa inicial. Tinha-se a tensa preocupação de conhecer os sujeitos desta comunidade tão especial, em que a curiosidade era revelada, com a expectativa de como seria apresen-tada esta proposta de escolarização e profissionalização para os sujeitos.

Page 50: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  50

(...) não tínhamos ao certo a ciência do ritmo e de como viviam os sujeitos desta comunidade, nem mesmo se era desejo deles participar do projeto, não sabíamos ao certo suas histórias nem seus anseios, não tínhamos o conhecimento do tipo de atividade produtiva que eles desenvolviam, somente era sabido que a co-munidade pertencia a um território rural (Gestor A).4

Em conversas com a equipe responsável pelo projeto no Campus, pôde-se perceber que muitas indagações e inquietações começam a disparar, havendo a preocupação com a legitimidade do projeto do curso, antes mes-mo de iniciar sua execução, uma vez que não se tinha clareza das intenciona-lidades reais da própria proposta, dos gestores do município e nem da co-munidade.

Nesse sentido, emergem neste trabalho um ponto de estudo e uma reflexão com relação às dimensões: política, ética, social e metodológica desta possibilidade escolar que representa o PROEJA FIC, na comunidade em questão. É importante compreender à luz de referenciais teóricos, como se processam os movimentos de mudanças sociais, por meio dos processos educativos.

Se a mudança faz parte necessária da experiência cultural, fora da qual não somos, o que se impõe a nós é tentar entendê-la na ou nas suas razões de ser. Para aceitá-la ou negá-la devemos compreendê-la, sabendo que, sabendo que se não somos puro objeto seu, ela não é tampouco o resultado de decisões volun-taristas de pessoas ou grupos. Isto significa sem dúvida que em face das mudanças de compreensão, de comportamento, de gosto, de negação de valores ontem respeitados, nem po-demos simplesmente nos acomodar, nem também nos insur-gir de maneira puramente emocional (Freire, 2000).

                                                       4 Transcrição literal de parte da fala da Coordenadora da Ação 04 - Implantação do Curso, que está registrada no Diário de Campo sobre a preocupação da Gestão Administrativa do Campus São Vicente do Sul.

Page 51: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  51

Compreendendo o fragmento acima citado, o qual dá fundamental sustentação a esta parte do trabalho, pode-se compreender que Paulo Freire emprega um sentido legitimo à mudança, elemento imprescindível aos pro-cessos de educação, especialmente quando se deseja a inclusão social. Enten-dendo que a ela precede toda prática de reconhecimento, compreensão e entendimento prévio da realidade. A tomada de decisões, assim como a projeção social e pedagógica da educação, não pode de forma alguma ser caracterizada pelos agentes externos da comunidade, nem somente pela indi-vidualidade dos sujeitos.

Para tanto, é necessário pensar a luz do aspecto da inclusão social, preconizada pelo PROEJA FIC, assim é válido questionar: A proposta do programa pode provocar mudança na Comunidade Quilombola Cambará, localizada no município de Cachoeira do Sul? Ela atende às necessidades do grupo como comunidade? Ela atende a que necessidades da comunidade quilombola?

Considera-se estas perguntas diretamente ligadas à seguinte hipótese de trabalho: A Escola como locus privilegiado de oportunidades de aprendi-zagem é e desencadeia ações coletivas no sentido da autonomia permitindo na proposta do PROEJA FIC outras formas de aprendizagem.

A partir daqui, faz-se uma análise desta política pública de educação em que se constitui o PROEJA FIC, considerando as dificuldades e entraves encontrados na implementação do projeto na comunidade em questão, uma vez que o curso neste município ainda não teve início.

Tempo e Espaço das Políticas Públicas de Educação

O percurso deste trabalho impulsionou a necessidade de refletir so-bre a constituição das políticas públicas em educação, direcionadas para os sujeitos jovens e adultos. Foi preciso analisar as dimensões técnico-

Page 52: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  52

normativas, trazidas pelo Ofício Circular n… 40 de 2009, reconhecendo a formalidade em que tal política se implementa e a partir daí confrontar com a dimensão prático-pedagógico-social, para reconhecer o tempo e o espaço da Comunidade Quilombola do Cambará, no âmbito social e cultural.

Os processos de inclusão político-econômico-social, e, via educação profissionalizante, que, além de uma formação no/para o trabalho, objetivam a aceleração na escolarização das pessoas, que vivem em determinadas comu-nidades, são propostos e desenvolvidos – ou por vezes nem chegam a sua efetivação. Estas intenções frequentemente são impulsionadas por entidades de diversas e diferentes naturezas, podendo ser da iniciativa privada, como pequenas e grandes – empresas, cooperativas, grupos de economia solidária, até mesmo multinacionais, bem como por órgãos públicos – os governos nas esferas: municipal, estadual, federal, ou ainda por organizações não governa-mentais.

Assim, a dinâmica acima descrita é caracterizada por anseios e finali-dades que não são legítimas dos próprios sujeitos, público central de tais propostas, pois não existe uma escuta das reais necessidades de uma dada comunidade. São objetivos que, possivelmente, atendem uma demanda capi-talista, mercadológica, não humanizadora e que nada revela sobre as questões do „mundo do trabalho‰.

Nesse sentido, os movimentos em busca desta inclusão, por meio da educação, são extremamente problemáticos, no caminho da mudança, pois eles se preocupam demasiadamente com os aspectos técnicos formais, ao pensar a operacionalização e registro de cargas horárias, dos processos de ensino-aprendizagem, entre outros que tornam os fazeres inflexíveis, intransi-gentes e que desta forma nem sempre provocam transformação, seja no participante, seja na comunidade, principalmente quando estas comunidades tem outros ritmos, outros tempos e outros saberes que nem sempre vão ao encontro dos saberes propostos pela escola.

Page 53: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  53

Paro (2010) faz uma importante consideração quanto ao sentido da Educação, que perante o senso comum não se diferencia da ideia de Ensino, a qual traz uma compreensão de instrução, com foco nos conteúdos e méto-dos, sendo estes desarticulados e não se apropria de tudo que é pertinente aos sujeitos. Já, este autor, traz à tona o sentido científico da Educação:

(...) a educação consiste na apropriação da cultura. Esta, en-tendida também da forma ampla, envolve conhecimentos, in-formações, valores, crenças, ciência, arte, tecnologia, filosofia, direito, costumes, tudo enfim que o homem produz em sua transcendência da natureza (Idem).

Pode ser uma problemática expressiva, quando se tem por foco as comunidades periféricas e marginais como os quilombolas, porque são seg-mentos sociais historicamente excluídos, dificilmente ouvidos, em que as possibilidades de acesso às informações de cunho social, político, econômico e cultural são mais complexas, o que gera condições de desfavorecimentos em diversas questões, como na produção, no trabalho, na relação com a educa-ção, dentre outras.

A Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica, do Ministério da Educação, ao publicar o Ofício Circular n… 40, dá uma importante abertu-ra para as Instituições quando apresentou no documento o seguinte objetivo:

O presente documento tem como objetivo apoiar, por intermédio das instituições da rede federal de educação profissional, científica e tecnoló-gica, a implantação de cursos de formação inicial e continuada integrados com o ensino fundamental na modalidade da educação de jovens e adultos:

6 Nos municípios brasileiros.

7 Nos estabelecimentos penais (Abril de 2009).

Este objetivo traz explícito, ainda que, as propostas deveriam consi-derar a implementação de algumas ações para a efetividade do projeto, sendo:

Page 54: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  54

A – Formação continuada de profissionais para implantação dos cur-sos PROEJA FIC:

Docentes, profissionais da educação, técnicos e gestores que estarão envolvidos na implantação e desenvolvimento dos cursos nas escolas muni-cipais.

Docentes, profissionais da segurança pública, técnicos e gestores que estarão envolvidos na implantação e desenvolvimento dos cursos nos estabe-lecimentos penais.

B – Implantação dos cursos PROEJA FIC.

C – Produção de material pedagógico para os cursos PROEJA FIC.

D – Monitoramento, estudo e pesquisa com vista a contribuir para a implantação e consolidação de espaços de integração das ações desenvolvidas, bem como de investigação das questões atinentes ao PROEJA, considerando a realidade das escolas municipais ou, conforme o caso, da educação em estabelecimentos penais (Ofício Circular n… 40 GAB/SETEC/MEC, 2009).

As ações acima citadas, para a implementação do PROEJA FIC, são de fato muito relevantes, uma vez que as compreende articuladamente desde a formação continuada dos profissionais, a implementação do curso até a produção de materiais pedagógicos, prevendo também a possibilidade de estudo e investigação dos processos e constatações desencadeadas.

Tal documento, ainda, estabelece alguns critérios e prazos para a construção das propostas de cursos de formação inicial e continuada, na modalidade de PROEJA. É crucial destacar aqui, uma questão importante quanto ao prazo pré-estabelecido pelo Ofício em relação à legitimidade do processo de construção do projeto. Conforme coordenação do projeto no Campus, é considerado que o elemento tempo influenciou negativamente a dinâmica dialógica necessária com os sujeitos da comunidade. Uma vez que este é um tempo precioso para conhecer e „enamorar‰, construir uma pro-

Page 55: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  55

posta pedagógica na coletividade, no encontro com as pessoas, ao conversar e vivenciar sentimentos, ritmos, histórias de vida, dentre outros aspectos im-portantes a este movimento.

(...) a preocupação da educação tomada num sentido rigoroso é com o homem na integralidade de sua condição histórica, não se restringindo a fins parciais de preparação para o traba-lho, para ter sucesso em exames ou para qualquer aspecto res-trito da vida das pessoas (Paro, 2010, p. 26).

Nesse sentido, pergunta-se: As formalidades das Políticas Públicas de Educação, que pressupõem a inclusão social, respeitam a dinâmica das rela-ções necessárias para a constituição de um projeto coletivo que respeite a legitimidade das comunidades? Esta é uma indagação necessária de se fazer em contraponto ao forte pensamento Freiriano, abaixo citado:

Somente quando os oprimidos descobrem, nitidamente, o opressor, e se engajam na luta organizada por sua libertação, começam a crer em si mesmos, superando, assim, a sua „conivência‰ com o regime opressor. Se esta descoberta não pode ser feita em nível puramente intelectual, mas da ação, o que nos parece fundamental, é que esta não se cinja a mero ativismo, mas esteja associada a sério empenho de reflexão, para que seja práxis.

O diálogo crítico e libertador, por isto mesmo que supõe a ação, tem de ser feito com os oprimidos, quaisquer que seja o grau em que esteja a luta por sua libertação (Freire, 1983, p. 29).

Seguindo a análise do documento propositivo do PROEJA FIC, em paralelo ao cenário social a que ele se destina, considera-se a possibilidade de escolarização integrada à Educação Profissional de jovens e adultos, primando pelo atendimento de públicos específicos como, a educação especial, a educação do campo, a educação escolar indígena ou do sistema socioeducativo.

Page 56: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  56

Inicialmente, analisando esta proposição, pode-se considerar que, a-inda, existe uma discrepância na legitimação do próprio direito à educação para estes sujeitos, uma vez que é pontuada uma possibilidade específica de escolarização e formação profissional para as comunidades que compõem tais especificidades. Nesse sentido, o público-alvo deste PROEJA FIC são as comunidades rurais, compreendendo, então, os quilombolas.

Apple destaca que: „Ver o mundo de forma mais política, através dos olhos dos oprimidos, é uma condição necessária, mas não é suficiente para a transformação social‰ (2003, p. 26). Percebe-se que o elemento „raça‰ se constitui num movimento de opressão, independente da redução que se possa fazer em relação à „classe‰. Pontuando, ainda, que:

Não seria possível ainda compreender a história, a situação corrente e os múltiplos efeitos da política educacional sem co-locar a raça como um elemento essencial da análise. Para deter essas dinâmicas é necessário o confronto direto também com o poder da raça. (Idem).

Outro ponto analisado, e que não deixa de estar ligado à questão „raci-al‰ é o importante espaço que o princípio do „trabalho‰ tem no bojo da Edu-cação Básica, na modalidade de Educação de Jovens e Adultos, integrada à Educação Profissional, considerando que estes dois elementos constituem cenários de diferenças e desigualdades sociais. O PROEJA tenciona uma impor-tante relação entre educação e trabalho, fazendo pensar em questões referentes às particularidades dos sujeitos, para além de uma mera escolarização.

É preciso, entretanto, refletir e ponderar sobre o delineamento que propõe as políticas e propostas pedagógicas que trazem no ápice um discurso socialista, e que demonstram ambiguidades na sua efetivação, ou seja em sua prática. Kuenzer estabelece que:

Page 57: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  57

Essa apropriação tem levado muitos a imaginar que, a partir das novas demandas do capital no regime de acumulação do flexível5 as políticas e propostas pedagógicas passaram a con-templar os interesses dos que vivem do trabalho, do ponto de vista da democratização (2005, p. 78).

Nesse sentido a autora, faz referência a um discurso pedagógico, que traz o entendimento da formação humana na integralidade, a qual tem vistas ao desenvolvimento de todas as dimensões pertinentes à politecnia, buscando a superação da fragmentação do trabalho de uma maneira geral, resgatando a relação entre teoria e prática.

Posto isto, a perspectiva do PROEJA, constitui-se numa proposta de integração da educação profissional à educação básica, a qual busca a supera-ção da dualidade entre o trabalho manual e intelectual, assumindo a educa-ção sua perspectiva criadora e não alienante. Isto remete a compreensão de um cenário tomado de diversos desafios, tais como: a formação dos profis-sionais docentes, a construção curricular integrada, a utilização de metodolo-gias e mecanismos de assistência que favoreçam além do acesso, a permanên-cia e a efetiva aprendizagem do estudante, a existência de infraestrutura adequada para oferta dos cursos, o próprio respeito pelas particularidades dos sujeitos e suas comunidades, dentre tantos outros tão específicos de cada localidade.

                                                       5 Kuenzer compreende por “Acumulação Flexível”, a educação em suas relações com o trabalho, na compreensão do impacto das mudanças nas categorias conteúdo, método, espaços, atores e formas de controle (2005).

Page 58: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  58

Comunidade Quilombola: um tempo, um espaço

O tema de reflexão se insinua e está presente nos extratos/ segmentos de fala que seguem: 6

(...) eu me sinto que nem laranja, que tem branco que chupa e gospe o bagaço fora [...] é, nóis semu esse bagaço [...] tem mui-ta gente que humilha nóis, como se nóis não fosse gente (...) nóis conseguimo participa só de umas coisa da associação quilombola, que é nossa, então não é tudo, porque tem aque-les que se provalécim quando fazem as coisa aí (...)(Quilombola A).

(...) a terra é importante para nóis, porque ela significa poder, mais não aquele poder que aqueles fazendero, os donos de grande extensão de terra tem, quando eles usam as suas rique-za pra domina os outros, os pobres (...) Pra nóis a terra signi-fica pode faze as coisa, produzi e gera alguma coisa pra nóis mesmu. (Quilombola B – líder da comunidade).

Os segmentos de fala apresentados acima dão uma idéia do horizon-te cultural e do cenário social de dois sujeitos que vivem em uma Comuni-dade Quilombola Rural; a importância deles está diretamente relacionada ao fato deles traduzirem uma dada realidade política, social, econômica e cultu-ral específica, caracterizada por intensos movimentos históricos de conquis-

                                                       6 Estas falas dão fundamental sustentação às inquietações desencadeadas neste trabalho, ainda que seja muito difícil abreviar a riqueza de sentidos que tem cada palavra dita por estes sujeitos. Tais falas ganharam destaque significante no decorrer de conversas, especialmente com duas pessoas que desempenham um papel de liderança na comunidade quilombola, assim as pessoas que aqui participam com suas vozes são identificadas pelas terminologias Quilombola A, e Quilombola B, sendo preservadas na íntegra as suas formas, e registradas em Diário de Campo. As notas do Diário de Campo foram realizadas no Instituto Federal Farroupilha – Campus de São Vicente do Sul e no Quilombo Cambará durante o período Setembro a Novembro de 2009 e Março a Maio de 2010.

Page 59: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  59

tas, reconhecimento, manifestações, negações, dentre outras vivencias dos sujeitos negros.

O curso acontecerá na comunidade quilombola Cambará, que está localizada às margens da BR 290, na região de divisa entre Cachoeira do Sul e Caçapava do Sul. Possui aproximadamente 140 famílias que sobrevivem da produção agrícola de subsistência e de trabalhos sazonais nas safras agrícolas. A falta de escolaridade e de qualificação profissional são os maiores obstácu-los à geração de trabalho e renda para aqueles moradores. Este curso será um diferencial para a transformação da realidade socioeconômica dessas famílias, trazendo novas possibilidades de diversificação e de agregação de valor à produção local, melhorando a qualidade de vida de todos. (Gestor B)7.

Ao pensar num projeto educativo legítimo dos jovens e adultos desta comunidade quilombola, é primordial reconhecer em que tempo e espaço estas pessoas se encontram. E além deste processo, deve-se considerar a rele-vância de constituir um olhar mais acadêmico perante o espaço rural, negro, que é o quilombo.

Originalmente, no período escravista, Século XIX e XX, os quilombos foram restringidos a condição de „reduto de escravos fugitivos‰, o que, no entanto, tinha na verdade a intencionalidade de buscar dinamicamente um espaço legítimo, para a construção de um território, mantendo e reproduzin-do um modo de vida cultural e socialmente próprio (Nascimento, 1989). Para tanto, este espaço representa uma „reação‰ à organização e ao envolvi-mento individual e coletivo dos negros que impulsionaram importantes conquistas, revelando uma referência ideológica, cultural e política, mas que ainda hoje não representam a totalidade de direitos efetivados.

                                                       7 Extrato de uma conversa, registrada em Diário de Campo, com represente da Gestão do município, onde está localizada a Comunidade Quilombola, sendo que este depoimento representa a justificativa pela escolha da comunidade, para implantação do PROEJA FIC.

Page 60: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  60

As comunidades negras historicamente tiveram seus direitos negados, pois não se reconhecia as pessoas em sua cidadania plena, e assim, a dignida-de dos sujeitos era desvalorizada, dada a negação dos saberes da ancestralida-de negra e ao processo civilizatório proposto por um tipo de escolarização. Esta percepção é melhor entendida mediante a citação abaixo:

Para todo o segmento negro e para os quilombolas em especi-al, os vínculos entre educar e formar são ancestrais, não são atributos exclusivos das escolas; ancestralidade é tudo o que antecede ao que somos, por isso ela nos forma. Existe um pas-sado e um presente de populações negras que vêm se educan-do secularmente através de uma resistência que não é passiva, que apenas reage às diversidades, mas que é, igualmente, pro-vocadora de reações (Nunes, 2006, p. 142).

Esta realidade precisa ser melhor entendida por aqueles educadores comprometidos com um tipo de educação emancipatória, que tenha como princípio norteador o reconhecimento da ancestralidade e do lugar dos sujeitos negros. Assim, é preciso ainda, constituir um movimento dinâmico, dado pela práxis (ação – reflexão – ação), que crie as condições necessárias para construir conhecimento agregador de saberes sociais e científicos.

Para isso é necessário que se tenha clareza da concepção de educação que se fala, quando se tem por foco a formação de sujeitos que não se desen-raizarão da sua cultura, da sua história: entendendo o lugar, os conceitos que sustentam uma proposta de Educação de jovens e Adultos, a base didático-pedagógica de educação emancipatória, e ainda reconhecendo as estruturas reais existentes e as necessárias.

Tais entendimentos e vivências advindas dos momentos iniciais da implementação do PROEJA FIC, na comunidade quilombola do município de Cachoeira do Sul, geraram fundamentais reflexões. Pois é neste momento

Page 61: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  61

que se percebem as incoerências com as características sociais e culturais daquele território.

Conforme os sujeitos do Campus, que vivenciaram o início do pro-cesso de implantação, relataram foi estabelecido um dia de inscrições para as pessoas da comunidade quilombola que tivessem interesse em retornar aos estudos, sendo estas realizadas em uma escola que se encontra desativada naquela localidade e que atualmente funciona como um espaço para as ceri-mônias religiosas e ponto de encontro da comunidade.

Percebe-se que esta ação não contribuiu para o envolvimento das pes-soas neste projeto educativo, uma vez que não reconheceu o próprio tempo da comunidade quilombola, um tempo que é próprio de uma cultura, de uma dinâmica do campo. Considerando, ainda, as características do local proposto para a inscrição e realização das aulas, a qual é muito distante das pessoas, tendo dificultada a possibilidade de transporte e em vista também das más condições das estradas.

É demonstrado assim, que não se tem compreensão suficiente para atender as necessidades técnicas e subjetivas, político–pedagógicas, do proces-so de inclusão daqueles sujeitos que fazem parte de uma população em con-dições marginais, fragilizadas, vulneráveis aos dissabores e desamores de uma sociedade consumista, capitalista, injusta.

É valido observar o que suscita Kuenzer(2005), ao expor sua compre-ensão referente à terminologia „inclusão excludente‰, que são as estratégias utilizadas de inclusão dos sujeitos nos mais diversos níveis e modalidades da educação escolar aos quais não correspondam necessariamente condições qualitativas que proporcionem „a formação de identidades autônomas inte-lectual e eticamente, capazes de responder e superar as demandas do capita-lismo‰.

Page 62: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  62

Assim, através dos processos de inclusão excludente, a educa-ção escolar e escolar se articula dialeticamente aos processos de exclusão includente existentes no mundo do trabalho, for-necendo ao cliente – o capital – a força de trabalho discipli-nada técnica e socialmente na medida das suas necessidades, como reza a boa cartilha do toyotismo (Idem).

É fundamental identificar e reconhecer os sujeitos participantes das discussões e das tomadas de decisões na construção de um projeto educativo, tendo como ponto de partida o campo dos saberes da própria comunidade. Tendo clareza e respeito pela especificidade histórica do homem, na condição de sujeito histórico, capaz de criar o que não existe naturalmente.

No entanto, é constado que assumir este compromisso perante tal comunidade no desenvolvimento do PROEJA FIC, ainda carece de muito estudo, e acima de tudo diálogo para conhecer e compreender as necessida-des, as características, o tempo e espaço de constituição dos sujeitos e da coletividade da comunidade.

A análise do PROEJA FIC, enquanto uma política de educação que traz prerrogativas legais, sociais e pedagógicas de um universo cultural especí-fico, parece em certos momentos não conceber a legitimidade histórica e subjetiva dos sujeitos na íntegra, como é o caso da Educação Quilombola. Isso acaba tencionando um grotesco e mascarado movimento de integração social, e não de inclusão.

Considerações Finais

Ultimamente tem-se intensificado o cenário das mudanças econômi-cas, políticas e sociais; com elas, a educação vem sendo impactada significati-vamente, diante da necessidade de responder aos desafios de forjar condições para a formação e exercício da cidadania.

Page 63: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  63

Assim, a constituição e consolidação de políticas públicas de educa-ção vem sendo crescente a cada dia, considerando a realidade brasileira que apresenta significativas demandas, especialmente para o público jovem e adulto. Nesse contexto, é compreendida a população negra que vive no cam-po, a qual historicamente é excluída pela sociedade, e ainda, nos dias de hoje luta por ser escutada, respeitada e reconhecida.

No entanto, é necessário que este reconhecimento passe não só pela via histórica, é urgente tratar da presença legítima dos sujeitos negros no mundo, pela via da ação política. E esta via só pode ser possibilitada por meio da educação.

Porém, esta educação necessita de uma pedagogia diferenciada, que prime pela „ação‰, voltada para a reflexão, escuta e transformação. É impres-cindível a esta ação, conhecer o território rural quilombola, reconhecendo o tempo, o espaço e as temáticas que coloquem a educação da população negra como ponto central. Tal pedagogia deve ser pensada e validada a partir de uma realidade concreta para a construção coletiva de projeto político-pedagógico, que não fique no campo do ideal, mas do possível.

A legitimação de uma educação forjada para contribuir com a inclu-são social, só será possível de ser constituída se houver uma escuta densa e participação efetiva dos sujeitos, para orientar o entendimento de educação: para que e para quem, pensando que o conhecimento deve servir para trans-formar uma realidade, e que as práticas educativas devem levar a um movi-mento intenso de agregar saberes.

Referências

APPLE, Michael. Paulo Freire e a Política racial na Educação. In: LINHARES, Célia; TRINDADE, Maria de Nazaret (orgs.). Paulo Freire e a política racial na educação.

Page 64: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  64

Compartilhando o mundo com Paulo Freire. (Biblioteca freiriana, v.7). São Paulo: Cortez. Instituto Paulo Freire, 2003.

BRASIL. SETEC/MEC. Ofício n… 40 de abril de 2009.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Indignação: Cartas Pedagógicas e outros escritos. São Paulo: Editora UNESP, 2000.

______. Pedagogia da Autonomia - Saberes Necessários à Prática Educativa. 36. ed. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1996.

______. Pedagogia da Esperança – Um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1997.

______. Cartas à guiné-Bissau: registros de uma experiência em Processo. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.

______. Pedagogia do oprimido. 9. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

KUENZER, Acácia Zeneida. Exclusão Includente e Inclusão Excludente, a nova forma de dualidade estrutural que objetiva as novas relações entre educação e traba-lho. In: LOMBARDI, José Claudinei; SAVIANI, Demerval; SANFELICE, José Luis (orgs.). Capitalismo, Trabalho e Educação. 3. ed. Campinas (SP): Autores Associa-dos, 2005.

NASCIMENTO, Beatriz. Texto e Narração do filme Ori. São Paulo: Angra Filmes, 1989.

NUNES, Giorgina Helena Lima. Educação Quilombola. In: Ministério da Educação / Secretaria da Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. Orientações e Ações para a Educação das Relações Étnico-Raciais. Brasília: SECAD, 2006.

PARO, Vitor Henrique. Educação como exercício do poder: crítica ao senso comum em educação. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2010.

Page 65: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

A PERSPECTIVA DO PROEJA NA COMUNIDADE QUILOMBOLA DE CASCA

Laiz Cristina da Silva Wediggen1 Paulo Sérgio da Silva2

Resumo

Com este trabalho pretendemos refletir sobre a perspectiva de um PROEJA Quilombola, através da observação das urgências socioculturais da comunidade quilombola de Casca e de como a educação profissionalizante pode vir a contribuir para o desenvolvimento das Comunidades remanescentes de quilombos. A história nos mostra que as comunidades quilombolas, organizadas através de suas associações, iniciam movimentos autônomos para reivindicar seus interesses e direitos com consciência jurídica. Esta organização coletiva

                                                       1 Especialista em Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrada ao Ensino Médio na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos. Pedagoga. Coordenadora Pedagógica do Projeto Social de Alfabetização de Jovens e Adultos Quilombolas - BBEducar (Fundação Banco do Brasil em parceria com a ONG Instituto de Assessoria às Comunidades Remanes-centes de Quilombos - IACOREQ). E-mail: [email protected] 2 Doutorando em Educação. Coordenador Pedagógico do Curso Procedimentos Didáticos Pedagógicos Aplicáveis em História e Cultura Afro-Brasileira da UFRGS. Integrante do Instituto de Assessoria às Comunidades Remanescentes de Quilombos - IACOREQ. Orientador do Trabalho de Conclusão de Curso da autora desse artigo. E-mail: [email protected]

Page 66: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  66

revela processos contínuos da aprendizagem, exercitando formas de pensar e planejar em equipe, o que oferece condições para que as comunidades principi-em a análise de projetos educacionais a elas apresentados, indo à busca de pro-cessos educativos que privilegiem sua capacidade produtiva, sustentável e de autogerenciamento. Propostas de educação profissionalizante, nas quais a orien-tação pedagógica é a de uma educação crítica, construída a partir da realidade local e nas quais os conteúdos tenham a realidade como elemento gerador das demandas educativas, poderão se constituir na plataforma para a construção de uma nova realidade de vida para esta população, continuamente colocada à margem de projetos de desenvolvimento, devido ao preconceito e ao racismo, entre outros fatores. Neste sentido, o artigo revela a importância de refletir sobre a possibilidade de uma proposta político-pedagógica, levando em conta a pers-pectiva da constituição de um PROEJA quilombola, enquanto programa que pretende oferecer acesso à educação profissionalizante, possibilitando a perma-nência dos jovens na escola e na comunidade, além do desenvolvimento social, econômico e cultural do quilombo.

Palavras-chave

PROEJA – Comunidades remanescentes de quilombos – EJA – Educa-ção quilombola.

Introdução

Este artigo apresenta uma reflexão sobre a Comunidade remanescente de quilombos de Casca e sua relação com o ensino profissionalizante. De modo mais específico, a relação com as propostas de educação que apresen-tam perspectivas relacionadas com a constituição de um PROEJA quilombola e com a possibilidade de extensão da proposta de formação de jovens e adul-tos. Desta maneira, considera-se que as propostas deverão estar direcionadas para a realização de intervenções pedagógicas que contemplem o contexto

Page 67: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  67

local, colocando a educação a serviço dos interesses comunitários e conectan-do a proposta de uma educação profissional com as reais necessidades locais.

O texto parte de observações sobre as distintas formas de organização social a partir da minha inserção, enquanto moradora da comunidade e descendente direta dos escravos que se tornaram herdeiros dos campos da Casca.

Inicialmente, tento resgatar da memória, através da lembrança dos momentos de infância e juventude, nos quais testemunhei, à época sem com-preender muito bem, discussões a respeito da disputa sobre a titulação das áreas de terras da comunidade e que hoje se corporificam na reivindicação assumida pela comunidade de Casca.

Hoje compreendo perfeitamente o que a comunidade de Casca busca: a titulação definitiva de suas áreas de terras a partir do artigo 68 dos ADCT3 da Constituição Federal do ano de 1988, que diz: „aos remanescentes das comunidades de quilombos que estejam ocupando suas terras é garantida a titulação de suas áreas‰.

Para garantir a legalização do seu pleito, a comunidade de Casca inten-sificou seus processos de organização a partir da constituição da Associação Comunitária Dona Quitéria, a primeira associação quilombola no Estado do Rio Grande do Sul. Também é nesse âmbito de articulação coletiva e do estudo de possibilidades distintas que começo a refletir sobre as perspectivas educacio-nais dos jovens da comunidade, diante da proposta educacional do PROEJA.

Minha relação com a comunidade de Casca

Nasci em Porto Alegre em dezembro de 1956. Sou neta da Dona Francisca, a Chiquinha, como é conhecida minha avó na Comunidade Qui-

                                                       3 Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Page 68: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  68

lombola de Casca4. Minha avó, assim como minha mãe, já faleceram e eu sou a conexão delas com a Comunidade remanescente de quilombos de Casca. Lembro-me da infância, quando passava férias, participava de festas, visitava parentes junto com minha avó e tia Ieda, irmã da minha mãe e moradora da comunidade.

Após o falecimento da minha mãe, em 1979, estreitei laços com mi-nha família e comecei a frequentar com mais intensidade a comunidade. Minhas duas filhas também começaram a passar suas férias lá e construímos uma casa para podermos estar mais próximos da comunidade.

Quando menina, acompanhava as conversas da minha mãe com pes-soas que discutiam possibilidades de solucionar os problemas relativos aos „campos da Casca‰. Destas conversas fiquei sabendo que o assunto vinha sendo abordado desde a época do meu bisavô5 que buscava, junto com outros moradores, uma forma correta de garantir aos descendentes de escravos a permanência, o direito de estar e sobreviver naquelas terras que haviam sido deixadas, em testamento, por Quitéria Pereira do Nascimento, para seus 23 escravos.

Disputas judiciais envolvendo advogados, posseiros, integrantes das comunidades, empresários da construção, além de divergências internas de forte intensidade, são alguns dos elementos que envolveram, e ainda envol-vem, as diversas tentativas de regularização fundiária das áreas de terras da Casca e fazem parte da história da comunidade.

                                                       4 A Comunidade de Casca dista 70 km da sede do município de Mostardas e é uma área de aproximadamente 2400 hectares de terras pertencentes à antiga Fazenda da Casca. Esta região abriga um contingente populacional descendente de um grupo de 23 escravos que pertenciam a Quitéria Pereira do Nascimento e que, por ocasião do seu testamento em 1826, alforria os escravos deixando-lhes a propriedade da terra, sob a condição de que esta não poderia jamais ser vendida, servindo como espaço de reprodução social dos herdeiros. 5 Gaspar Lopes de Matos, filho de Bebianna,um dos 23 escravos alforriados em testamento por Quitéria Pereira do Nascimento, árvore genealógica IV, p. 125 do Livro: O Legado do Testamento, edição 2002 NUER/NUFSC.

Page 69: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  69

Adulta, e já tomando parte nas conversas, soube que uma das primei-ras tentativas de regularização do campo se deu de forma individual. Orienta-dos por advogados, alguns moradores da comunidade foram em busca do direito legal através do usucapião de suas chácaras. O processo de usucapião é uma forma individual de garantir a posse da terra e buscar, junto às institui-ções bancárias, auxílio financeiro para a realização de benfeitorias e para o estímulo do plantio de suas culturas.

Posteriormente, quando ocorreu a organização da Associação Comu-nitária, os moradores da comunidade, com o apoio do Ministério Público Federal e de outras organizações públicas, que tinham processos de usucapião em trâmite, retiram suas solicitações individuais e aderiram à perspectiva de titulação coletiva das áreas de terras da comunidade remanescente de quilom-bos de Casca, diante da perspectiva apontada pelo Artigo 68.

Organização coletiva e articulação de parcerias

Na tentativa de solucionar a questão das terras, no ano de 1996, hou-ve uma intensa mobilização da comunidade. Foi aberto um inquérito civil público pela Procuradoria da República do Rio Grande do Sul. Este inquérito foi instaurado com o propósito de averiguar a procedência, usos e frutos das terras da Comunidade de Casca e deu início a uma perícia técnica realizada pelo NUER (Núcleo de Estudos e Relações Interétnicas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), reunindo antropólogos, historiadores, juristas além de militantes do movimento negro. O inquérito resultou na construção de um laudo sócio-histórico-antropológico da comunidade de Casca.

A partir deste momento, a Comunidade começou um intenso proces-so de inclui. Em um primeiro momento, a comunidade teve que compreender que a luta pela titulação das terras, enquanto comunidade remanescente de quilombos, não poderia se tratar de um movimento individual, e sim, deveria

Page 70: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  70

ser uma articulação de caráter coletivo. A Comunidade precisava de unidade e consenso para poder conquistar a titulação das terras, pois o cenário que se desenhava estava a contemplar uma proposta ímpar de associação para a garantia de direitos6.

Nesse sentido, a comunidade iniciou um processo de articulação de parcerias para a qualificação da sua organização política. Houve a aproxima-ção com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com o Ministério Público Federal (MPF), com o IACOREQ - Instituto de Assessoria às Comunidades Remanescentes de Quilombos, uma organização do movi-mento negro que iniciava seus trabalhos de ação e intervenção militante junto com as comunidades remanescentes de quilombos no Rio Grande do Sul -, com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mostardas, e outras organiza-ções sociais.

Com a aproximação destas parcerias, a comunidade realizou um tra-balho de formação política, partindo dos pressupostos da organização comu-nitária, em que o foco estava centrado na conscientização dos moradores, sobre o que é ser quilombola. Quais as vantagens, garantias e conseqüências que a Comunidade teria ou sofreria a partir da sua autoidentificação como comunidade remanescente de quilombos?7 Essas parcerias acompanharam e assessoraram as discussões sobre a formação da Associação Comunitária dos Moradores da Comunidade de Casca.

                                                       6 As iniciativas de organização comunitária estavam geralmente relacionadas ao sindicato dos trabalhadores rurais, à igreja e aos produtores. 7 Necessário é destacar que a relação de parceria entre estes atores e a comunidade rema-nescente de Quilombos de Casca não se estabeleceu de uma forma perene, cabendo ressaltar que houve momentos nos quais as convicções e “orientações” das organizações foram dura-mente questionadas pela Comunidade.

Page 71: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  71

Em Junho de 1999 foi eleita a primeira diretoria da Associação Co-munitária Dona Quitéria8. A primeira Associação Comunitária Quilombola do Rio Grande do Sul reunia somente os Casqueiros, como se autodenomi-nam os moradores da comunidade de Casca. Tal situação configurou o sur-gimento de um novo ator social na região de Mostardas e alçou, nos cenários estadual e nacional, os quilombolas da Comunidade Remanescente de Casca.

A partir da organização da Associação Comunitária Quilombola de Casca, deslanchou no Estado do Rio Grande do Sul um intenso processo de articulação entre as populações negras no meio rural, que passaram a se reco-nhecer enquanto comunidades remanescentes de quilombos e a organizar as suas entidades representativas. Também em decorrência dessa articulação os representantes das comunidades foram convidados a participar de intensas articulações no país inteiro, sobre a temática dos quilombos no Brasil.

Nesse meio tempo, quilombolas, que nunca teriam saído de suas localidades para fora do Estado, foram chamadas a parti-cipar de uma comissão de elaboração de um decreto adminis-trativo para regulamentar o artigo 68 das Disposições Transitó-rias da Constituição; também foram convocados a participar de outras dezenas de reuniões de considerável importância em Brasília, Recife, Maranhão, entre outros estados da Federação. Ao todo, mais de 50 quilombolas se deslocaram para fora do Estado do Rio Grande do Sul, sendo que alguns deles, em dois anos, participaram de mais de quinze reuniões em Brasília. (Anjos, 2008, 156).

A condição de protagonista na questão de organização associativa o-portunizou a comunidade remanescente de quilombos de Casca ocupar espa-ços que não tinham sido jamais pensados em ser compartilhados com a co-

                                                       8 O nome da associação é uma homenagem dos moradores à Quitéria Pereira do Nascimento, dona da Fazenda da Casca, que alforriou seus escravos e deixou as terras em testamento para os escravos herdeiros.

Page 72: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  72

munidade negra, especialmente por parte de organismos e instituições públi-cas. O ápice deste reconhecimento pode ser expresso na entrega da medalha do Negrinho do Pastoreio, aos representantes da comunidade quilombola9.

A educação na comunidade remanescente de quilombos de Casca

Nestes anos de organização coletiva através da associação comunitária, a Comunidade de Casca vive um processo contínuo de aprendizagem, exerci-tando formas de pensar em equipe com a intenção de alcançar objetivos traçados. Sabe-se que no passado os moradores da Casca se ajudavam por meio da cooperação e da produção solidária. Por exemplo, quando chegava a época do plantio e da colheita da cebola uns iam às casas dos outros para ajudar. Com o passar do tempo, a cebola deixou de ter força no mercado econômico e de ser a principal cultura local, mesmo assim os moradores da Casca continuaram se ajudando, através de regimes de mutirão em outras atividades produtivas. Os grandes fazendeiros do entorno passaram a plantar arroz e, com isso, os moradores da comunidade foram trabalhar fora de suas propriedades, nas grandes lavouras de monocultura orizícola. Em suas cháca-ras, os moradores da Casca priorizaram a produção doméstica de subsistência, realizando pequenas plantações para consumo familiar.

Ao longo do período em que acompanho as trajetórias da comunida-de remanescente de quilombos da Casca, percebo o desenvolvimento de al-guns projetos relacionados com a educação, especialmente nos últimos anos. Dentre esses Projetos, destacam-se dois programas desenvolvidos como ativi-dades de Extensão Universitária, que têm por objetivo complementar a for-mação dos estudantes universitários através da troca de saberes entre a comu-

                                                       9 A Medalha do Negrinho do Pastoreio é a mais alta comenda destinada pelo Governo do Rio Grande do Sul e foi entregue para as lideranças da Comunidade Remanescente de Quilombos de Casca como reconhecimento à luta em defesa dos direitos das comunidades quilombolas.

Page 73: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  73

nidade e a Academia: O Projeto Convivência, desenvolvido pelo Departamen-to de Extensão e Desenvolvimento Social da Pró-Reitoria de Extensão, e o Projeto Musical, desenvolvido pelo Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

A proposta central destes dois projetos é aproximar e conscientizar jovens e adultos da Universidade e da comunidade sobre a realidade e as necessidades locais, oferecendo aos envolvidos, sejam eles professores ou estudantes universitários, sejam membros da comunidade quilombola, opor-tunidades de convívio em realidades distintas. Esses projetos chamam a aten-ção pelo caráter participativo e de envolvimento direto entre estudantes e moradores das comunidades, com integração e troca de saberes que ocorrem diante de uma perspectiva horizontal, democrática.

Alguns projetos de educação de adultos também têm se desenvolvido na comunidade. No entanto, estes projetos apresentam problemas de continu-idade, com resultado restrito ao período de realização dos mesmos, ocasio-nando momentos de frustração coletiva, devido à incerteza da conclusão das atividades de alfabetização, quando é o caso. Para ilustrar, cito duas propostas de alfabetização de adultos, as quais foram implementadas de maneira vertical e encerradas quando a comunidade demonstrava um significativo envolvi-mento. Uma delas foi um projeto de educação de adultos – MOVOA – desen-volvido pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul, no início dos anos 2000, e a outra foi o um projeto de alfabetização desenvolvido e organizado pela Central Ðnica dos Trabalhados, na sua seção rural – CUT Rural – em 2005. Os projetos iniciaram com um movimento intenso de propaganda e divulgação na comunidade, mas não concluíram o seu intento, qual seja, a alfabetização efetiva de adultos da comunidade.

Os motivos pelos quais os projetos foram suspensos encontram justi-ficativas em questões de caráter político, externos aos interesses e disposições da comunidade, que, até a presente data, não foram apresentados para os quilombolas da Casca. Tais instituições – a CUT e o Estado – nunca apresen-

Page 74: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  74

taram alternativas que possibilitassem a continuidade dos estudos escolares de adultos na comunidade. Isso revela descaso com as denominadas minorias, por parte de instituições públicas ou corporativas, que pode ser considerado como trato de políticas sociais sob a ótica dos interesses políticos personalis-tas10.

A escola pública que atende as crianças da comunidade de Casca está situada em terras vizinhas às terras da comunidade de Casca. Atendendo a maioria das crianças em idade escolar, a Escola de Ensino Fundamental In-completo Quitéria Pereira do Nascimento, tem 21 alunos regularmente matri-culados e é atendida por 02 professores municipais. No que diz respeito ao trabalho pedagógico, tratando das questões relacionadas às relações étnico-raciais, consoante com a Lei 10639/0311, o movimento que acontece na escola é considerado carente de subsídios pedagógicos no sentido de aprofundar junto com os professores e com a comunidade do entorno a significativa contribuição que as histórias de vida da população quilombola pode apresen-tar. Tal contribuição para incorporar a questão quilombola como suporte na construção de uma proposta pedagógica é fundamental para que se valorize a perspectiva multicultural em educação, ou seja, que se destaque a importância de pensar sobre a diversidade e sobre as distintas identidades culturais dos sujeitos em educação.

                                                       10Um aspecto que contribui para essa realidade é a elevada taxa de rotatividade dos dirigentes educacionais nos municípios, nos estados e, inclusive, no âmbito federal. Essa elevada alter-nância associada à falta de uma política de estado para a educação contribui para que alguns dirigentes, ao assumirem os cargos, promovam sua própria política educacional ou a do grupo político-partidário ao qual pertencem. Some-se a isso o fato de que dentro de cada ciclo de quatro anos de governo, costuma haver mudanças entre os dirigentes educacionais. (PROEJA, Documento Base 2007). 11 A Lei 10639/03 diz que nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira e que o conteúdo programático incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política, pertinentes à História do Brasil.

Page 75: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  75

Para a promoção de uma educação intercultural numa perspectiva crí-tica e emancipatória, entre os desafios que enumera, Candau(2008) aponta a importância do resgate dos processos de construção das identidades culturais, tanto no nível pessoal, quanto no nível coletivo. Nessa condição considera como fundamental as histórias de vida e a construção de diferentes comuni-dades socioculturais. A autora considera muito importante que as histórias de vida possam ser contadas, reconhecidas e valorizadas como parte do processo educacional, o que corrobora as possibilidades presentes na relação entre a comunidade remanescente de quilombos de Casca e a Escola Municipal de Ensino Fundamental Quitéria Pereira do Nascimento, ainda não exercitadas na sua plenitude.

Educação e respeito ao meio ambiente: a perspectiva emancipatória da Educação na comunidade remanescente de quilombos de Casca

Uma das interessantes discussões do século XXI trata da intensificação da relação homem-natureza e sua importância, a qual aponta para a necessi-dade do desenvolvimento de maior harmonia e preocupação para que essa questão seja uma constante.

Aliar a perspectiva do desenvolvimento econômico com a possibilida-de de preservação dos recursos naturais tem sido pauta permanente nos deba-tes sobre questões ambientais. Esta preocupação também permeia reflexões no interior da comunidade remanescente de quilombos de Casca. Convém rela-tar, a título de informação, que a Comunidade de Casca procura realizar seus projetos de desenvolvimento diante de perspectivas que contemplem a susten-tabilidade ambiental. Nesse sentido, diversos projetos foram e são desenvolvi-dos na comunidade com o apoio de organismos ligados a Extensão Rural e a ONGÊs que apresentem uma vertente de orientação que não agrida o ambiente natural. Projetos de produção que apresentam posições contrárias à perspecti-va agro-ecológica e premiam a sua implementação, a partir de possibilidades

Page 76: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  76

que têm por objetivo incrementar iniciativas voltadas para o agronegócio e a monocultura são de difícil implementação no interior da comunidade de Casca. Vejamos o caso do avanço da indústria madeireira.

O avanço dessa indústria pelo interior do Rio Grande do Sul faz com que os campos próximos aos da Comunidade estejam sendo invadidos pelas plantações do pinus elliot e da acácia negra. Este fato tem sido motivo de preocupação constante para os interesses da comunidade. Devido à forte sedução econômica que esta alternativa oferece em curto prazo, os quilombo-las ficam tentados a fazer este tipo de plantio, especialmente dada a facilidade de ganho financeiro com o comércio da madeira.

Aliado a esse fator de ordem econômica, existe uma preocupação am-biental na comunidade e diz respeito ao avanço das dunas de areia que, por um fenômeno geofísico, avançam de maneira constante e permanente, da praia em direção às áreas de terras produtivas na comunidade12. O plantio do pinus ou da acácia oferece a possibilidade de contenção do avanço destas dunas. No entanto, é quase consenso na comunidade de Casca a conscientiza-ção sobre a brutalidade do plantio destas culturas, pois a terra que recebe o pinus e a acácia tem a grande possibilidade de tornar-se imprópria para o cultivo de outras culturas, gerando o que se chama de „Deserto Verde‰13.

                                                       12 O avanço das dunas é causado pelos ventos fortes existentes no litoral do Rio Grande do Sul e é motivo de constante preocupação ambiental na costa gaúcha. 13 A expressão deserto verde é utilizada pelos ambientalistas para designar a monocultura de árvores em grandes extensões de terra para a produção de celulose, devido aos efeitos que esta monocultura causa ao meio ambiente. As árvores mais utilizadas para este cultivo são, sobretudo, o eucalipto, o pinus e a acácia. Fonte: http://pt.wikipedia. org/wiki/Deserto_verde. Acessado em 19/05/2010.

Page 77: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  77

Educação profissional e alternativas para uma proposta de educação na comunidade quilombola de Casca

Uma das alternativas para o desenvolvimento local de comunidades rurais tem sido o ensino profissionalizante realizado por algumas instituições de ensino que oferecem formação voltada para as questões do campo, procu-rando especificamente considerar as condições locais. Assim, instituições como a FUNDEP e o ITERRA, relacionado com o Movimento dos Trabalha-dores Sem Terra e a Via Campesina, são algumas das experiências educativas que têm procurado trabalhar de maneira mais intensa sob a perspectiva de uma Educação do Campo, que assim pode ser definida:

A educação do campo, tem um significado que incorpora os espaços da floresta, da pecuária, das minas e da agricultura, mas os ultrapassa ao acolher em si os espaços pesqueiros, caiça-ras, ribeirinhos e extrativistas. O campo nesse sentido, mais do que um perímetro não urbano, é um campo de possibilidades que dinamizam a ligação dos seres humanos com a própria produção das condições da existência social e com as realiza-ções da sociedade humana. (Diretrizes Operacionais Para a E-ducação Básica nas Escolas do Campo, 2002).

Os movimentos desenvolvidos entre estas instituições de educação e organizações do movimento social têm por objetivo a perspectiva de constru-ção de um modelo pedagógico que privilegie a intensificação de vínculos entre o estudante, sua realidade local e a proposta pedagógica da instituição, fazendo com que o processo educativo sirva de maneira efetiva e prática aos interesses do educando. Assim, a chamada Pedagogia da Alternância tem um papel muito forte na construção de propostas para as escolas do campo.

Ribeiro (2010) nos ensina que a Pedagogia da Alternância consiste na articulação entre Tempo-Escola e Tempo-Comunidade. No Tempo-Escola os alunos permanecem por um período, em regime de internato, no espaço da

Page 78: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  78

escola. No Tempo-Comunidade, os estudantes retornam para a comunidade para colocarem em prática aquilo que aprenderam no Tempo-Escola. Assim, a Pedagogia da Alternância articula teoria e prática, tendo o trabalho como princípio educativo de uma educação humana integral.

Embora a alternativa da Pedagogia da Alternância seja muito interes-sante sob o viés didático-pedagógico e uma estratégia necessária sob o ponto de vista da organização dos interesses dos agricultores, nas comunidades remanescentes de quilombos ela não se verifica, porque esta possibilidade jamais foi oferecida aos quilombolas. Os jovens estudantes das comunidades quilombolas não têm acesso a escolas que adotem essa perspectiva pedagógica.

É notório o fato de que o aumento do número de vagas ofertadas pela rede de ensino público tem ampliado as oportunidades de acesso dos jovens à escola14 e na rede de formação profissional, o fato também se repete, em que pesem as políticas de ordem neoliberal, implementadas nos últimos anos, pelo Estado do Rio Grande do Sul.

No ensino fundamental, a universalização do acesso está sendo alcançada, mas problemas como a qualidade dos processos e-ducacionais, a dualidade público versus privado, a repetência e a evasão persistem. Aproximadamente, 97% das crianças de 7 a 14 anos têm acesso ao ensino fundamental, entretanto defici-ências dos sistemas de ensino que se refletem na escola termi-nam provocando a evasão das crianças das classes populares do ensino fundamental. (Documento Base PROEJA/FIC, 2007).

                                                       14 Dados de 2005: no Brasil 92,5% das crianças e jovens entre 07 e 17 anos estão matricula-dos no ensino fundamental. Nas cidades, o percentual chega a 95%. O objetivo de universali-zar o ensino básico de meninas e meninos foi praticamente alcançado, mas as taxas de frequência ainda são mais baixas entre os mais pobres e as crianças das regiões norte e nordeste. PNUD Brasil. Disponível em http://www.pnud.org.br/odm/objetivo_2/. Acessado em 05/07/2010.

Page 79: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  79

No campo de gestão educacional estadual, o debate local tem centrado seu foco de análise em discursos que remetem à questão da meritocracia e da eficiência, baseada em receitas de processos de modernização administrativa. Estes discursos resumem suas ações a tentativas de terceirização de serviços essenciais e o compromisso cada vez menor do Estado com setores estratégi-cos para o desenvolvimento, como é o caso da educação. Nesse cenário, que se mostra adverso aos interesses de uma educação de qualidade, uma das institu-ições técnicas de responsabilidade do Estado do Rio Grande do Sul, com reconhecida capacidade de formação técnica voltada para a educação de jo-vens que tem suas vidas ligadas à realidade campeira, a Escola Técnica Agríco-la de Viamão15 (ETA), consegue manter-se como referência em educação técnica voltada para as questões rurais.

Na Escola Técnica Agrícola de Viamão, alguns alunos são oriundos da Comunidade de Casca e optaram por realizar formação profissionalizante, além de cursar o ensino médio. Embora exista escola de nível médio próxima da comunidade, os estudantes resolveram buscar sua formação em outro espaço. A ETA tem acolhido esses alunos, aprovados mediante prova de sele-ção, hospedando-os na escola em regime de internato ou semi-internato, como acontece com todos os estudantes que necessitam. Na atualidade, cinco jovens moradores da Casca estão na ETA e sua disposição para contribuir com a comunidade pode vir a ser significativa aos interesses comunitários e os seus pleitos diversos, especialmente no que diz respeito às possibilidades de desen-volvimento relacionado com as questões de produção sustentável.

Um dos fatos que justificam a pertinência e a importância do acesso de jovens oriundos de comunidades quilombolas de Casca à Escola que ofere-

                                                       15 Fundada em 1910, a Escola Técnica de Agricultura (ETA) está localizada em uma área de 407 ha, no interior do município de Viamão/RS, entre a RS 040 e a antiga estrada que leva ao Passo do Vigário. Na área de ensino a ETA conta com biblioteca, laboratórios de biologia, física e química, auditório, área esportiva com pista atlética, 11 mil metros de área construída e um centro de treinamento para cursos, além de um grande número de professores altamente especializados.

Page 80: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  80

ça formação técnica, diz respeito à possibilidade de efetivação de propostas concretas de intervenção local, nas quais os estudantes tenham a possibilidade de experimentar seus conhecimentos de forma empírica. Mobilizados por uma conscientização das necessidades da comunidade quilombola, estão a se organizar junto com os professores da ETA para iniciar um projeto que tem como objetivo encontrar, através de estudos e pesquisas, maneiras sustentáveis do ponto de vista ecológico para conter o avanço das dunas de areia.

A perspectiva de uma educação crítica, voltada aos interesses da cole-tividade, que tenha seus projetos e propostas construídas a partir de formula-ções horizontais, e que, tenha por objetivo beneficiar os interesses da comuni-dade remanescente de quilombos de Casca, pode coadunar com o sugerido por Di Pierro, quando trata dos objetivos da educação de pessoas jovens e adultas:

Os debates atuais sobre os objetivos da educação para a cida-dania privilegiam a formação de sujeitos livres, autônomos, crí-ticos, abertos à mudança, capazes de intervir em processos de produção cultural que tenham alcance político. Os conteúdos propostos para a formação são afetados por reconstruções dos ideais da modernidade elaborados por diferentes correntes do pensamento social contemporâneo, que valorizaram sobretudo a horizontalidade do vínculo pedagógico, a comunicação inter-subjetiva e o reconhecimento multicultural, a preservação de uma cena pública que permita a expressão de uma pluralidade de teses e discursos estratégicos provisórios, a resolução pacífica de conflitos e a elaboração democrática de consensos perante os dilemas éticos que afetam a sociedade contemporânea. É nesta sugestiva direção de formação política para a cidadania democrática que parece fecundo caminhar na reelaboração de currículos de educação de pessoas jovens e adultas (2009).

Dessa maneira, a importância de refletir sobre uma proposta político-pedagógica que leve em conta a perspectiva do Programa Nacional de Integra-ção da Educação Profissional à Educação Básica na Modalidade de Educação

Page 81: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  81

de Jovens e Adultos – PROEJA, como um programa que pretende oferecer acesso à educação a parcela significativa da população, nos remete a pensar na possibilidade de articular uma intenção de formação, expressa pelas comuni-dades remanescentes de quilombos, vislumbrando a possibilidade prática de implementação do Programa na Comunidade.

A possibilidade de implementação de uma proposta nestes moldes a-presenta elementos que nos permite pensar que a educação de jovens e adultos na modalidade PROEJA, numa comunidade remanescentes de quilombos, é oportunidade ímpar de refletir acerca de uma proposição que inexiste no cenário das políticas públicas institucionais, qual seja, a reflexão sobre o PROEJA Quilombola.

Pela novidade que pode vir a representar tal proposta, torna-se insti-gante pensar em torno de uma alternativa pedagógica que avance na direção da construção de uma educação integradora e inovadora. Uma perspectiva de educação quilombola pode oferecer, aos moradores das comunidades rema-nescentes de quilombos, possibilidades de construir uma educação escolar a partir de suas realidades concretas, em que os conteúdos ensinados tenham a vida cotidiana como elemento gerador de suas demandas. Assim, estas pers-pectivas estariam em consonância com o proposto pelas diretrizes do PROEJA, que:

tem seus alicerces na convergência de três campos da Educação que consideram: a formação para atuação no mundo do traba-lho (EPT); o modo próprio de fazer a educação, considerando as especificidades dos sujeitos jovens e adultos (EJA); e a for-mação para o exercício da cidadania (Educação Básica). (PROEJA/FIC, Documento Base, 2007).

Pensar a possibilidade de construção de uma proposta de educação a partir dessas premissas concorre também para a realização de um movimento que tende a considerar a importância de ações diferenciadas no sentido de

Page 82: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  82

garantir direitos elementares, que foram negados de forma sistemática especi-almente para a comunidade negra. A universalização do acesso à educação escolar poderá contribuir para diminuir os vergonhosos números que engros-sam os dados e colocam a população afro-brasileira nos mais baixos índices estatísticos de escolarização. Uma perspectiva de educação escolar a ser pro-posta no âmbito das comunidades remanescentes de quilombos deve trabalhar com a intenção de superar discursos, como o que surgem em conversas com moradores da comunidade, os quais afirmam:

- Não vejo necessidade em aprender a ler, até agora me virei. Tudo que eu faço aprendi olhando (João).

- Pra voltar a estudar agora to muito velho, acho que não con-seguiria (Zeca).

Paulo Freire (1980) nos orienta que pensar em educação nos faz acre-ditar que o homem não é um ser vazio a quem a escola ou a sociedade vai encher de conteúdos, este ser que não é completo, inacabado, carrega os seus saberes, as suas aptidões e a capacidade de discernimento e de ação. Desta forma, o papel da escola é o de problematizar levando o aluno-sujeito à cons-ciência do mundo. A educação tem um intenso compromisso com o conhe-cimento científico, com a cidadania e com a libertação e se realiza através do diálogo nas suas dimensões técnica, política, ética e humanista. A educação é componente fundamental na construção, que ocorre de forma continuada, da pessoa humana.

A educação como é hoje, realizada de maneira formal, desagrega e di-ficulta a construção de um sentimento de identificação ao criar um sentido de exclusão para o aluno que não consegue ver qualquer relação entre os conteú-dos ensinados e a sua própria experiência. Desta forma, a perspectiva de reflexão e de exercício sobre a possibilidade de trabalhar a construção de uma proposta baseada na realidade local e que tenha vínculos com a intencionali-dade do PROEJA constitui o cerne deste trabalho.

Page 83: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  83

Há um lastro significativo que pode orientar a construção de uma proposta pedagógica seguindo uma linha articulada, contemplando o Docu-mento Base do PROEJA, o qual considera imprescindível que, em cada estado da Federação, os sistemas educacionais públicos interajam nas diferentes esferas, a fim de tornar realidade essa política pública educacional.

Desta forma, é incumbência da Rede Pública Federal, incluindo-se aí as instituições universitárias, os CEFETÊs, as escolas técnicas e agrotécnicas federais buscar oferecer o máximo possível de vagas, sem perder de vista o plano mais estratégico e estruturante da proposta, qual seja: a cooperação, a colaboração e a interação com os sistemas estaduais e municipais, no sentido de contribuir para que tais sistemas construam e implementem seus currículos nesse campo educacional (Moura, 2006).

Dentre as ações estruturantes que podem ser desenvolvidas em regime de colaboração entre as universidades públicas, a Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica e os sistemas estaduais e municipais, merece desta-que a formação de profissionais para atuar nessa esfera educacional, princi-palmente, a formação docente.

A construção de uma proposta que trabalhe com a implementação de um PROEJA voltado para a questão quilombola é uma realidade premente desde que a disposição político-institucional alinhe suas vontades e desejos, o que destacamos como uma tarefa muito difícil na atual conjuntura política. No caso do estado do Rio Grande do Sul, mantenedor da Escola Técnica Agrícola de Viamão (ETA-Viamão) a perspectiva reside na possibilidade de abertura institucional para um diálogo mais amplo com as instituições do Governo Federal para a implementação da proposta. Nos últimos anos, as relações político-institucionais entre os dois entes federados (Estado e União) foram relações políticas difíceis, marcadas por polêmicas diversas e na defesa de posições ideológicas que se contrapunham.

Page 84: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  84

Se, de um lado, havia a possibilidade que se mostrava generosa diante de um Estado que se proclamava inclusivo e agia no sentido de fortalecer esta estrutura, de outro, a posição dos governantes gaúchos apontava de maneira constante para um discurso que trabalhava com a possibilidade de enxuga-mento da máquina, reduzindo a estrutura de funcionamento do sistema público como forma de racionalizar o uso da máquina pública. Tal forma de atuação é digna de uma perspectiva liberal de entendimento político de ges-tão, em que os investimentos públicos são, na sua maioria, destinados aos ditos setores produtivos da economia privada, em detrimento dos interesses sociais da maior parte da população ou da população visivelmente colocada às margens dos processos de desenvolvimento sócio-econômico.

Considerações finais

É interessante destacar o descaso do Estado em relação à educação voltada às comunidades quilombolas. Embora as autoridades responsáveis pelas políticas de gestão pública se manifestem politicamente, através dos discursos de ocasião, em favor de uma educação de qualidade para as comu-nidades remanescentes de quilombos, a realidade educacional em tais comu-nidades tem sido o retrato da precariedade da educação brasileira no meio rural. A imensa maioria das escolas não reconhece as múltiplas formações culturais da sociedade brasileira e as necessidades urgentes de comunidades distintas, especialmente dos remanescentes das comunidades de quilombos, o que constitui um dos entraves para a permanência dos estudantes na escola.

Tal condição, excludente em sua concepção, é um dos motivos pelos quais se inviabiliza o crescimento social e cultural das comunidades, além de reificar o preconceito e a discriminação racial presentes na nossa sociedade contemporânea.

Durante esse estudo, constatamos que existe a necessidade de ações que tenham por finalidade modificar o panorama educacional gaúcho, no

Page 85: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  85

qual se descortine uma perspectiva de construção de saberes, para que a reali-dade de vida das pessoas seja efetivamente considerada sob a perspectiva do respeito à diferença e da valorização da diversidade étnico-racial. Os projetos e programas educacionais cumprem um papel importante no sentido de trans-formar a realidade local, de acordo com a sua perspectiva política, nem sem-pre voltada para os interesses das classes populares16. A proposta contida na formatação do PROEJA apresenta um pouco desse caráter transformador da realidade, pois:

...é um tipo de ensino médio que garanta a integralidade da educação básica, ou seja, que contemple o aprofundamento dos conhecimentos científicos produzidos e acumulados histori-camente pela sociedade, como também objetivos adicionais de formação profissional numa perspectiva da integração dessas dimensões. Essa perspectiva, ao adotar a ciência, a tecnologia, a cultura e o trabalho como eixos estruturantes, contempla as bases em que se pode desenvolver uma educação tecnológica ou politécnica e, ao mesmo tempo, uma formação profissional s-tricto sensu exigida pela dura realidade socioeconômica do pa-ís. (PROEJA, Ensino Médio, Documento Base).

A perspectiva de implementação de uma proposta pedagógica que re-sulte na constituição de um PROEJA QUILOMBOLA poderá trazer para essas comunidades possibilidades de uma formação sociocultural que tende a consolidar os processos de transformação em curso nas comunidades rema-nescentes de quilombos, em especial na comunidade remanescente de qui-lombos de Casca. A questão da formação profissional no âmbito das comuni-dades remanescentes de quilombos constitui importante demanda política das

                                                       16 Importante lembrar que durante o Governo de Fernando Henrique o Estado Brasileiro foi impedido de investir na criação de novas escolas técnicas através do PROEP, Programa de Expansão da Educação Profissional e da portaria 646/67, que reduzia o número de vagas para o Ensino Médio e limitava a expansão do ensino técnico no Brasil. Sob a gestão do Governo Lula houve um acréscimo de mais de uma centena de escolas técnicas no País.

Page 86: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

VOLUME III | PROEJA QUILOMBOLA

  86

comunidades e pode resultar em uma proposta educacional, alternativa aos moldes de um modelo educacional, que necessita ser transformado para poder transformar.

Referências

ANJOS, José Carlos dos; SILVA, Paulo Sergio da. A Rede Quilombola como espaço de Ação Política. In: NEVES, Delma Pessanha. (Org.). Desenvolvimento social e Mediadores Políticos. Porto Alegre: Ed. UFRGS, 2008. p. 155-172.

BRASIL. Diretrizes Operacionais Para a Educação Básica nas Escolas do Campo CNE. Resolução CNE/CEB 1/2002. Diário Oficial da União, Brasília, 9 de abril de 2002. Seção 1, p. 32. Disponível em http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/ CEB012002.pdf. Acesso em 30 de jun de 2010.

BRASIL. Documento Base Proeja / Ensino Médio. Disponivel em http://portal. mec.gov.br/setec/arquivos/pdf/documento_base.pdf. Acesso em 05 de jul de 2010.

BRASIL. Documento Base Proeja / FIC 2007. Disponivel em http://portal.mec.gov.br /setec/arquivos/pdf2/proeja_fundamental_ok.pdf. Acesso em 05 de jul de 2010.

CANDAU, Vera Maria. Direitos humanos, educação e interculturalidade: as tensões entre igualdade e diferença. Revista Brasileira de Educação. v. 13, n. 37. Jan./abr. 2008. p. 45-55.

DI PIERRO, Maria Clara; JOIA, Orlando; RIBEIRO, Vera Masagão. Visões da Educação de Jovens e Adultos no Brasil. Cadernos CEDES. v. 21. n. 55. Campi-nas, 2001. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-32622001000300005 &script=sci_abstract.

FREIRE, Paulo. Conscientização: teoria e prática da libertação: uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Moraes, 1980.

Page 87: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

CADERNOS DA ESPECIALIZAÇ‹O PROEJA II | RIO GRANDE DO SUL  

  87

LEITE, Ilka Boaventura. O Legado do Testamento: a Comunidade de Casca em perícia. Florianópolis: NUER/UFSC, 2002.

MOURA, D. H. Reflexões sobre ética, estado brasileiro e educação. IN: HOLOS Revista eletrônica do CEFET-RN. Ano XXII. n. 2. Set de 2006. Disponível em < http://www.cefetrn.br/dpeq/holos/> Acesso em 10 de maio de 2006.

RIBEIRO, Marlene. Movimento Camponês, Trabalho e Educação: Liberdade, auto-nomia, emancipação: princípios/fins da formação humana. São Paulo: Expressão Popular, 2010.

Page 88: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa
Page 89: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa
Page 90: Tania Beatriz Iwaszko Marques. Revisão: Juçara Benvenutiblog.aai.ifrs.edu.br/arquivos/proeja_quilombola.pdf · Luciane Prado Kantorski Prof. Dr. Volmar Geraldo da Silva Nunes Profa

Esta obra foi composta nas fontes Garamond-Normal Condensed e Arial Narrow e impressa em papel polen bold 90 grs [miolo]

e Triplex 250 grs [capa] pela Gráfica e Editora Copiart Ltda.