25
TECTÓNICA PUO-PLEISTOCÉNICA DO NOROESTE- PENINSULAR POR CARLOS TEIXEIRA NATURALISTA DO MUS. E LAB. MIN. E GEOL. DA UNIV. DO PÔRTO BOLSEIRO DO INSTITUTO PARA A ALTA CULTURA o Noroeste hispânico constitui,'sob variadíssimos aspectos, um dos territórios mais característicos da Península. O Minho e a Galiza formam, neste recanto da Europa, uma região natural, com seus caracteres próprios, bem individualiza- dos e distintos. As afinidades das duas províncias, desde a constituição geológica do solo e a morfologia dos relevos, aos aspectos da paisagem e à orientação dos rios, à flora e à fauna, que para ambas são as mesmas, ou às características antropoló- gicas e etnográficas, das gentes que as povoam e à própria lingua que falam, não permitem traçar, entre elas, outras fron- teiras que não sejam as meramente artificiais, relacionadas apenas com o facto político. Sob o aspecto tectónico e dos movimentos que no decurso das Eras geológicas afectaram a Península, não deixa, também, de verificar.:se na região galaico-minhota a mesma unidade, o mesmo paralelismo, o mesmo conjunto estrutural. Os fenóme- nos que atingiram uma, atingiram a outra; os efeitos devem ser procurados em ambas. Não vou, nesta altura, abordar o capitulo da tectónica antiga, analisar o debatido problema da orogenia hurónica, ou, buscar explicação, para o rumo que tomaram as dobras hercíni- cas; não vou, tão - pouco, referir-me à acção dos movimentos mesozóicos, nem à dos da primeira parte do Cenozóico. Por agora, apenas quero ocupar-me das modificações produzidas nos últimos tempos do Cenozóico e no decorrer do Antropozóico antigo, isto é, apenas me deterei na análise da tectónica moderna. O meu propósito é o de estudar, em especial, alguns aspectos

TECTÓNICA PUO-PLEISTOCÉNICA DO NOROESTE … · constituição geológica do solo e a morfologia dos relevos, aos aspectos da paisagem e à orientação dos rios, à flora e à fauna,

Embed Size (px)

Citation preview

TECTÓNICA PUO-PLEISTOCÉNICA DO NOROESTE- PENINSULAR

POR

CARLOS TEIXEIRA NATURALISTA DO MUS. E LAB. MIN. E GEOL. DA UNIV. DO PÔRTO

BOLSEIRO DO INSTITUTO PARA A ALTA CULTURA

o Noroeste hispânico constitui,'sob variadíssimos aspectos, um dos territórios mais característicos da Península.

O Minho e a Galiza formam, neste recanto da Europa, uma região natural, com seus caracteres próprios, bem individualiza­dos e distintos. As afinidades das duas províncias, desde a constituição geológica do solo e a morfologia dos relevos, aos aspectos da paisagem e à orientação dos rios, à flora e à fauna, que para ambas são as mesmas, ou às características antropoló­gicas e etnográficas, das gentes que as povoam e à própria lingua que falam, não permitem traçar, entre elas, outras fron­teiras que não sejam as meramente artificiais, relacionadas apenas com o facto político.

Sob o aspecto tectónico e dos movimentos que no decurso das Eras geológicas afectaram a Península, não deixa, também, de verificar.:se na região galaico-minhota a mesma unidade, o mesmo paralelismo, o mesmo conjunto estrutural. Os fenóme­nos que atingiram uma, atingiram a outra; os efeitos devem ser procurados em ambas.

Não vou, nesta altura, abordar o capitulo da tectónica antiga, analisar o debatido problema da orogenia hurónica, ou, buscar explicação, para o rumo que tomaram as dobras hercíni­cas; não vou, tão - pouco, referir-me à acção dos movimentos mesozóicos, nem à dos da primeira parte do Cenozóico. Por agora, apenas quero ocupar-me das modificações produzidas nos últimos tempos do Cenozóico e no decorrer do Antropozóico antigo, isto é, apenas me deterei na análise da tectónica moderna. O meu propósito é o de estudar, em especial, alguns aspectos

jck
Referência bibliográfica
Boletim da Sociedade Geológica de Portugal, Vol. IV, Fasc. I-II, 1944.

20

inéditos da tectónica minhota, procurar explicação para diver­sos factos observados, construir ou actualizar hipóteses que me parecem mais de acôrdo com êsses factãs, tendo, em conta não só o conhecimento da tectónica galega e cantábrica, como aproveitando dados estratigráficos que até agora o não tinham sido.

Tanto no litoral cantábrico, como no da Galiza, podem observar-se, conforme é sabido, indícios de nítido fenómeno de abaixamento. O Prof. E. Hernandez Pacheco, entre outros, com clareza o descreveu e focou em publicações diversas.

Um movimento posterior ao estabelecimento darêde hidrográfica actual, levou o mar a penetrar nos vales -fluviais da Galiza 'e da costa cantábrica, formando as tão típicas rias galegas e os estuários profundos, pouco e pouco açoreados pelos depósitos terrígenos (em que as sondagens acusam, por vezes, espessuras de mais de 50 metros) dos rio~ cantábricos. Cavernas situadas ao nível do mar, pelas pinturas que, segundo alguns autores, contêm ou pelo material pré-histórico que nelas se encontrou, mostram que, desde o início do' PaleoHtico superior, ou da última glaciação antropozóica, a costa, nesta última região, não sofreu qualquer movimento em relação com o nivel actual do mar.

Quanto à época em que se' teria produzido esta sub­mersão das zonas litorais da Galiza e da costa cantábrica, julga o Prof. Hernandez Pacheco que, apesar de não haver dados para a precisar com nitidez, ela deverá datar do Pliocénico, sendo, incontestàvelinente, anterior ao Antropozóico antigo (I). O estudo do relêvo e da rêde fluvial galega indicam que o fenómeno é de época geológica recente (I).

Tal submersão seria, ainda segundo Hernandez Pacheco,

(1) E. HERNANDEZ PACHECo-Mouvements et dépôts sur les côtes d'Es­-pagne pendant le Pliocene et Pleistocene. DeuxÍI!me rapport de la Comission des Terrasses Pliocenes et Pleistocenes -Florença, 1930.

(2) E. HERNANDEZ PACHECO - Significacion geológica dei relieve subma­rino dei Cantdbriço. Las Ciências, Ano 1, n.O 3-Madrid, 1934.,

21

devida - a fenómeno com todos os -caracteres de movimento isostático, apresentando-se a região galaico-cantábrica como pertencente a um grande bloco continental, com- movimentos e oscilações independentes dos compartimentos vizinhos. Êste abaixamento do litoral teve conseqüências diversas.

O relêvo submarino da Galiza corresponde, também, pelas suas carac­terísticas topográficas ao que se observa na parte emersa- (8); . Quanto à costa -por-

tuguesa, manifesta Hernan­dez Pacheco a opinião de que ela parece afectada por um movimento de abaixa­mento análogo ao da Ga-1i2;a, mas atenu,ado, pro­gressivamente, quando se caminha de Norte para Sul, até à Nazaré «(). Tal abai­xamento litoral seria reve­lado, até certo ponto, pela presença de estuários im­portantes, como o do Lima, e mesmo o do Douro.

As modificações de

Fig. 1 - Carta que acompanha um dos trabalhos do Prof. Bourcart sôbre Portugal (cit. em (9)). A linha cheia indica flexuras mediterrânicas; a linha a traço e ponto indica flexuras atlân­ticas. Notar a posição do chamado ceixo de Vigo>.

altitude de alguns terraços do Minho indicam, para o ilustre geólogo, acções recentes de movimentos lentos do solo (6).

Para o Prof. J. Bourcart, as rias galegas explicam-se pela existência de uma flexura, que acompanha tôda a costa leste do Atlântico e é cortada por falhas transversais (Fig. 1).

(3) E. HERNANDEZ PACHECO - Trab. cito em (2) ( 4) E. HERNANDEZ PACHECO - Las costas de la Penlnsula Hispânica y

sus movim.ientos. Assoe. Esp. para el Progr. de Ias Ciências-Madrid, 1932. (5) E. HERNANDEZ PACHECO - Trab. eit. em (2).

22

Êstes movimentos de f1exura, extremamente recentes, tra­duzir-se-iam pelo levantamento do interior do pais e pelo' abai­xamento das zonas litorais

1::: à linha que separa a zona com movimento positivo da zona com movimento negativo que Bourcart deu o nottle de flexura continental. O Prof. Carrington da Costa julga, porém, preferivel usar a designação de zona de desntvel marginal à. de flexura, pois, pode não haver dobramento mas, por exemplo, um conjunto de blocos separados por falhas (6) (7). .

Na opinião de J. Bourcart, como na de outros autores, os relevos actuais de Portugal são relevos extremamente jovens (I). Para aquêle geólogo; a partir de Espinho, o litoral pliocénico (lo anticlinal dúrico-minhoto-galego ficaria situado ao largo, para­lelo à costa actual. A ausência total de qualquer depósito marinho do Quaternário entre o Cabo Finisterra e o Bidassoá, é invocada por êste autor como argumento indicativo do abai-xamento do litoral cantábrico (9) (to). .

Estudando a linha de depressões Barcelos-Montalegre, o Eng. C. Freire de Andrade conclui, por outro lado, que parece ter existido uma série de movimentos tectónicos relativamente recentes no Norte de Portugal. Deve encontrar-se neste facto, diz, a razão de os rios de uma parte desta região serem, pràtica­mente, perpendiculares às velhas plicaturas hercinicas

O desvio do curso inferior do Cávado, atribui-o Freire de Andrade à erosão fluvial relacionada com a direcção das camà­das silúricas, considerando-o relativamente recente. Na sua

(6) J. CARRfNGTON DA COSTA - Evoluçllo do meio geogrd/ico na Pre-histó­ria de Portugal. Mem. apreso ao 1.° Congro do Mundo Portugu~s-Lisboa,l940.

(7) i. CARRfNGTON DA COSTA - A carta geológica do Pôrto. Com. apreso ao I Congro Nae. de Ciências Naturais~Lisboa, 1941.

(8) J. BOURCART - Sur l'évolution du littoral de lá Peninsule Ibérique de la presqu'lle de Peniche (Portugal) au Cap Finisterre (Gatice Espagnole). C. R. Ae. Se. 202-Paris, 1936 (Pág. 1.448).

(9) J. BOURCART - Résulidts d'ensemble d'une étude du Quaternaire et du Pliocene marin du littoral atlantique du Maroc et du Portugal. C. R. du Iv.ml Congro des Géographes et des Ethnographes Slaves-Sófia, 1936.

(10) J. BOURCART - La marge continentale. Éssai sur les régressions ei transgréssions marines. BuU. de la Soe. Géol. de Fr. (5), VIII, 1938.

23

oplnlaO, é de crer que o Cávado seguisse, antig:amente, a- direc­ção da povoação de Talhos e fôsse desaguar no mar entre Estela e a Apúlia. Ao atingir qualquer maciço rochoso com linhas de menor resistência orientadas noutra direcção, a própria erosão fluvial. motivara o desvio. Mereceu, também, reparo ao Eng. Freire de Andrade o facto de os depósitos considerados pliocé­nicos, que marginam o rio, se encontrarem sempre na margem direita, a montante de Barcelos, mas passando para a margem esquerda a jusante desta cidade (II) (fi). ,

Muitos autores admitem que à deslocação negativa do litoral da Galiza se contrapõe o movimento ascensional da costa portuguesa do Norte, revelado pela existência de terraços litorais e de praias levantadas (1S).

O ponto de .inflexão entre êste levantamento e o abaixa­mento recente da zona costeira situar~se·ia nas proximidades do rio Minho, na Galiza, numa zona estreita denominada por Lau­tensach. /I eixo de Vigo" (Fig. 1) (li).

Em abono desta hipótese, cita-se o facto, que Falcão Machado diz ter observado na região a norte do Rio Minho, da existência de uma falha, perpendicular à costa, cujos lábios funcionariam como braços de balança: os terrenos a norte da falha teriam' movimento positivo, submergindo-se e .originando as rias gale­gas; as regiões ao sul erguer-se-iam, dando motivo à formação de praias levantadas. O litoral minhoto seria cortado, além disso, por uma série de fracturas, que se articulam como um teclado - dispositivo que Falcão Machado denominou teclado minhoto (Ir.) - •

(11) C. FREIRE DE ANDRADE- Os Vales Submarinos portugueses' e o diastrofismo das Berlengas e da Estremadura. Servo GeoI. de Portugal­Lisboa;-1937.

( 12) C. FREIRE DE ANDRADE - Consideraç{Jes slibre a linha de depres­sDes Barcelos-Montalegre. BoI. do Mus. de Min. e Geol. da Univ. de Lisboa, n.O 4,1935.

(18) CIr. por exemplo: AMORIM GIRÃO - Geografia de Portugal (Por­tucalense Editora) (Pág. 97).

(14)' CIr.: J. BOURCART - (Carta anexa ao trabalho cito em (9) ). (15) FALCÃO MACHADO - O teclado minhoto. Alto Minho - Viana-do­

-Castelo. 1935.

24

Para E. Cueto y Rui-Diaz (III) as rias do Iitoralda€iafiza e Portugal podem ter sido originadas por fracturas (radiais na costa ocidental, longitudinais na setentrional) produzidas pelos últimos movimentos alpinos, post-miocénicos.

De facto, os rios do Noroeste peninsular . orientam-se segundo linhas tectónicas provocadas ou rejuvenes'cidas p'elos movimentos alpinos. Seguem a direcção bética e devem ser contemporâneas da formação da falha do Ouadalquibir.

As diversas e s,ucessivas acções orogénicas levaram, como o frisa o Doútor Orlando Ribeiro, o velho bloco hespérico à fragmentação em compartimentos limitados por falhas (11). ' Para êste autor, a morfologia do norte de Portugal é influenciada por um levantamento epirogénico da região e por umafracturação geral do terreno, que parece ser mais densa, e importante que no sul. Como resultado,·a erosão apresenta-se vigorosa e sem­pre crescente e as depressões e .alinhamentos tectónicos valori­zados ao máximo.

O conhecimento das formações litorais que revestem a costa a Norte de Espinho e o estudo de alguns depósitos sedimentares do interior da região minhota podem fornecer preciosos elementos para a interpretação da tectónica recente do N oroeste peninsular~

Assim, é de salientar a existência, no litoral do Pôrto, de um depósito, com cêrca de 10 metros de espessura, a uma altitude que não desce abaixo de 100 metros, escalonando-se, inferiormente a êste, outros depósitos, em niveis sucessivos de 80-90 metros, 45-60 metros, 20-30 metros e 5-6 metros. Mais para o interior, nas margens do Douro, observam-se terraços, um dos quais à altitude de 80-85 metros e outro, mais baixo, a 20-30 metros (18).

(16) E. CUETO Y RUI-DIAZ - Algunas consideraciones sôbre la tectó­nica de la Península Ibérica. Resefias Cientif. de la Soe. Esp. de Hist. Natural. Tomo Vil, n.O 2, 1932.

(17) ORLANDO RIBEIRO - Problemas morfológicos do Maciço Hespérico português. Las Ciências-Ano VI, n.O 2, Madrid.

(18) Cfr.: ORLANDO RIBEIRO, J. M .. COTELO NEIVA e CARLOS TEIXEIRA­

Depósitos e nlveis pliocénicos e quaternários dos arredores do Pôrto. BoI. da Soe. GeoI. de Portugal. VoI. lil, fase. l-il - Pôrto, 1943.

2S

" Para Norte, júnto deSão-Félix-de-Laundos," encontra-se, também, um depósito litoral, marinho, à altitude dê cêrca de 100 metros, cobrindo antiga praia. Abaixo dêste, aparece largamente desenvolvido o nível de 30 metros, com depósito ligeiramente inclinado para o mar, e ligando-se, para o interior, ao longo do vale do Cávado, com um terraço da mesma altjtude (lS)~

A Norte. da foz do Cávado, porém, o depósito mais ele­vado que se encontra não ultrapassa 50-60 metros de altitude e, mesmo assim, mal representado. Abaixo dêste, a 20-30 metros, observa-se uma antiga praia bem "desenvolvida (110). . "

Ao longo do rio Lima nota-se a existência de dois terraços, o mais elevado dos quais apresenta 30 metros de.cota. No rio Minho, além de um terraço idêntico, observa-se outro, o mais alto, à altitude de 60 metr~s (III).

A presença de depósitos litorais à altitude de mais de 100 metros na região entre Espinho e Fão e, sucessivamente, descendo para o mar, a existência de níveis e depósitos mais baixos, e, além disso, o facto de se observar um terraço do Douro, ' a pouca distância da foz, à altitude de 80-90 metros, represen­tado nas duas .margens, parece mostrar que nesta zona não houve qualquer deformação' costeira, importante, nos tempos mais che­gados. Se se atribuir, como julgo lógico, ao Pliocénico o depósi.to litoral de cota superior a 100 metros, observado com larga representação nos arredores do POrto e de São-Félix, conclui-se que, pelo menos a partir dêste período, não houve qualquer movimento sensível na região, considerada nocon­junto. A confirmá-lo está a sucessão que se verifica nas ime-

(19) Cfr.: ORLANDO RIBEIRO, J. M. COTELO NEIVA e CARLOS TEIXEIRA­

Depósitos detriticos da bacia do Cdvado. Bot da Soe. GeoI. de Portugal. Vol. III, fase. I-II - Pôrto, 1943. .

(20) G. ZBYSZEWSKI - La classificatlon du Paléolithique ancien ei la chronologie du Quaternaire de Portugal en 1942. BoI. da Soe. GeoI. de Portugal. Vol. II, fase. II-III - Pôrto, 1943.

(21) G. ZBYSZEWSKI - Contribution à I' étude du litoral quaternaire au Portugal. Publ. do Mus. e Lab. Min. e. GeoI. da Fac. de Ciên. do Pôrto, n.o XV. Pôrto, 1940.

26

diações do POrto, segundo o esquema clássico ("), dos níveis e depósitos atrás citados, talhados pelo mar nas suas oscilações até ao nível actual. Ao depósito pliocénico,. possIvelmente calabriano, sucede uma larga plataforma e depósito à cota de 80-90 metros, que deve corresponder ao Siciliano; abaixo dêste, relativamente mal representado, constituído por retalhos dis-

. persos mas,. nitidamente observável, existe um outro depósito, correspondente ao Milaziano; a êste, segue-se, com grande e~tensão e continuidade, o nível e depósito de 30 metros, que representa o Tirreniano; em alguns pontos, um depósito mais baixo, com 5-6 ,metros de altitude, tem sido considerado como resultante da oscilação grimaldiana.

Compare-se; agora, esta imobilidade relativa da: zona que compreende e litoral do Rôrto com o que se observa na zona a norte de Fão. Aqui, os depósitos rlitor·ais mais altos não ultrapassam 50-60 metros (colina dOe Montedor) e, do mesmo modo, o mais alto térraço de Minho atinge apenas esta cota.

Se se atender ã que, ria 'Galiza, a mai~ alta formação lito­ral parece' ser a que se encontra a 45 metros (La Guardia) e

, que os depósitos dêste tipo faltam por completo na costa cantá­brica, não pode deixar de concluir-se que a região litoral do Minho acompanhou o movimento de submersão do território costeiro galaico-cantábrico. Tal submersão aparece, assim, como produzida por um movimento duplo, para Ocidente e para Norte, progressivamente mais acentuado no sentido do Cabo Finisterra e da costa cantábrica.

O facto de ' os depósitos litorais mais elevados serem os do nível de 60 metros, dada a larga representação que apresentam os depósitos tirrenianos em tOda a costa duriense e minhota, leva a concluir que o movimento de submersão é anterior à formação do primeiro daqueles depósitos, isto é, anterior ao Antropozóico médio.

É, talvez, possivel, quanto a Portugal, encontrar um limite, posteriormente ao qual se deu o movimento. São as forma-

(22) Cfr. por exemplo: A. C. BLANC - Lo studio stratigrafico di pianure costlere. BolIet. delI a Soe. Geol. Italiana. Vol. LlV, fase. 2 - Roma, 1935.

27

ções cenozóicas do vale do Cávado que vão fornecer elementos para isso.

Na região de Cabanelas, e estendendo-se até além de Prado, encontram-se formações sedimentares relativamente espês­sas e desenvolvidas, classificadas na carta de 1899 como pliocé­nicas, constituídas, em profundidade, por leitos de argilas, alguns dos quais lignitosos. São estas argilas que alimentam a indús­tria cerâmica de Prado, Barcelos, etc. (IIS). Em çertos pontos, como em Cruto e nos Carvalhinhos (fig. 2), recolheram-se

Fig. 2 - Um aspeeto dos barreiros dos Carvalhinhos, onde se tira o chamado «barro de cavacos,

fósseis vegetais. Embora as espécies encontradas sejam em número reduzido, o seu conhecimento assume grande impor­tância para a classificação estratigráfica da formação.

figura em primeiro lugar o feto Lygodium Oaudini Heer, muito abundante, representado por pínulas (formadas por quatro lobos (Est. I, fig. 2), compridos, percorridos por uma nervura média, donde nascem, obliquamente, as nervura~ secundárias, uma ou duas vezes bifurcadas) e por espiguilhas de arqufdeos, agru­padas por quatro, com os arquideos dispostos alternadamente ao

(!li) Vid.: ROCHA PEIXOTO - Olarias de Prado - • Portugália", vol. 1.

28

longo do eixo médio, como noutro logar referi já (ti). Ao lado dêste, encontra-se outro feto, mas, do género Pteris. Pelas pínu­las compridas, com 6 ou 7 cm. de comprimento e 1 ou 2 de largura (Est. I, figs. 1 e 2), lanceoladas, terminadas em ponta, arredondadas na base (Est. II, figs. 3 e 4), não decorrentes, unifor­memente serreadas em todo o comprimento do limbo, com dentes

Fig. 3 - Tirando barro neg ro nos barreiros dos Car valhinhos

fortes e bem desenvolvi­dos (fig. 4), nervura princi­pal robusta e nervuras se­cundáriás bifurcadas uma ou duas vezes, mais nume­rosas que os dentes da mar­gem, (cêrca de 30 nervuras por cada cm. de bordo do limbo) aproxima-s~ muito de Pteris parschlugiana Vng. (95), de que parece ser uma variedade regional. Não logrei, até hoje, en­contrar pfnulas com soros. A análise microscópica da massa Iignitosa mostra, con­tudo, grande abundância de arquídeos de polipodiáceas e esporos de Lygodium. Além dos dois fetos, notei restos abundantes de fôlhas de monocotiledóneas e im­

pressões de fôlhas de dicotiledóneas (Est. II, figs. 1 e 2), talvez de Fraxinus e Populus. Encontrei, também, numerosos frutos (Est. II, figs. 5 e 6), mas cuja atribuição específica seria dificí­lima, pela deformação produzida pela incarbonizacão.

'-

(24) C. TEIXEIR A - Présence du Lygodium Gaudini Heer dans les formations tertiaires du Portugal. C. R. Som. des Séances de la Soe. GéoI. de Fr. n." 9, pág. 63 -1942. Publicado também nas PubI. do Mus. e Lab. Min. e GeoI. da Fac. de Ciências do Pôrto, n." XXV - Pôrto, 1942.

( 25) Cfr. : W. P. SCHIMPER - Traité de Paléontologie végétale ­Paris, 1869.

29.

Sôbre a madeira Iignitizada aparecem, com freqüência, ves-. tfgios de fungos saprófitas do grupo dos Ascomicetas, que me. parecem pertencer ao género Sphaerites. Têm a forma de ' pequenas taças; distribuem-se irregularmente sôbre os caules (Est. II, fig. 7). Por outro lado, a análise polínica revelou a existência de grãos de pólen de Pinus (Est. II, fig. 8), mas com dimensões que excluem a possibilidade de tratar-se de P. sylvestris.

Embora diminuta, esta flora permite tirar conclusões de grande interêsse.

Os fetos do género Lygo­dium não existem hoje no conti­nente europeu. A espécie atrás citada é conhecida no Oligocé­nico de Célas, na França, no Miocénico da Suíça, etc., sendo considerada das mais tfpicas do Cenozóico da Europa.

O outro feto - Pteris cf. parschlugiana - é o mesmo que se encontra na flora do diatomito de Rio-Maio'r, onde se assina­lam, também, grãos de pólen de Pinus. idênticos aos da forma­ção minhota. Pteris parschlu­giana, acompanha o Lygodium Oaudini nas formações de Célas

a b

c eZ

F ig. ! - Diversos pormenor es de Pleris cf. l'al'schlugiana das argilas de Cru to .

onde, segundo Laurent, é muito abundante ( '6 ). Contudo, aquêle autor não observou uma única pínula com vestígios de soros.

Laurent acentua, em especial, a extraordinária semelhança desta espécie com o Blechnum Ooepperti EU. (= B. dentatum Ooepp.) de Bilin. Das formas actuais , a espécie mais próxima é o P. longi/olia Lin. que vive nas Canárias, Antilhas, Amé-

(26 ) L. LAuRENT-Flore des calcaires de Célas. Ann. du 1I1us. d'Hist. Nat. de 1I1arseille - Tômo I, 1899.

30

rica-Central, África, Ásia e em alguns pontos do Sul da Europa (17). As fo~mações de Rio-Maior classificam-se, hoje, depois de estudos re,centes de O. Zbyszewski, como do Pliocé­nico superior. Na minha opinião, as argilas lignitosas de Prado devem ser contemporâneas daqueles depósitos ou de idade muito próxima.

O facto do L. Oaudini e do P.' parschlugiana caracteri­zarem, em França, .na Suíça, etc., terrenos mais antigos está absolutamente de acOrdo com o que se verifica na distribuição

1

Fig. 5 - Aspecto de' um dos barreiros de Cl'uto

dos vegetais fósseis do Cenozóico. Com a evolução climática, verifica-se a deslocação das espécies no sentido do equador e, assim, a mesma flora encontrada em latitudes diferentes não indica sincronismo das formações que a contêm: é em geral mais jovem a que está mais próxima do equador. Nesta emi­gração das espécies, o território português deve ter represen­tado, no fim do Cenozóico, o recanto onde vieram extinguir-se os últimos representantes europeus de géneros tais como Lygo­dium, Sabal, Sequoia, etc~ . O seu desaparecimento parece coin- ,

(2'1) Cfr.: C. R. V. ETTlNGSHAUSEN - Die Farnkriiuter der Jetztwelt -Viena, 1865.

31

cidir com a mudança climática do início do Antropozóico. Não é, pois, de estranhar que o L. Oaudini e outras espécies se encontrem nas formações portuguesas do Pliocénico.

Os caracteres do lignito das argilas dos Carvalhinhos, pe1a sua incarbonização acentuada, indicam antiguidade e diferem em absoluto dos Iignitos das formações antropozóicas, como os dos terraços do Minho.

Tais depósitos sedimentares, largamente explorados, como disse, pàra o fabrico de cerâmica, apenas se encontram na margem direita do Cávado. Em alguns pontos os leitos de argila devem estar abaixo do nível actual do rio. Às camadas argilosas, inferiores, sucedem formações mais grosseiras, com leitos de calhaus e estratificação entrecruzada. Estas últimas, observam-se com tôda a nitidez no lugar do Cru to . . É aqui, também, que a formação atinge a maior espessura, pois chega a ter cotas de 75 metros acima do nivel do mar. Para atingirem as argilas, os barreireiros têm. de cavar poços de 18 e 20 metros de profundidade (II).

Foi nestas formações, hoje muito erodidas e esca'vadas, que o Cávado veio ' talhar um terraço de 30 metros de cota, extenso e bem observável entre Cab'anelas e Prado.

Dada a altitude a q1.te se encontram os depósitos citados, bastaria que o mar subisse 80 metros para que ficassem comple-

(\li) Não escapou a Wenceslau de Lima o conhecimento destas camadas fossilíferas, pois, embora as não tivesse estudado em particular, encontro nos seus apontamentos manuscritos, que recentemente me foram facultados por seu neto, o Ex.mo Sr. Dr. José de Lima, estas notas: • Em S. Romão da Ucha e em Cruto, perto de Barcelos, numas lentilhas de argila, que aí se exploram entre depósitos de calhaus provàvelmente pliocénicos, encontram-se plantas fósseis.

A exploração é feita nalguns pontos por meio de poços (indicação forne­cida por Paulo Choffat): 1894.

Em Setembro de 1895 mandei a esta localidade J •• de Oiiv.a. Encontrou depósitos modernos desde as proximidades de Barcelos até Cruto (v.a Verde). Em S. Veríssimo, junto de Barcelos e no Cruto tirou alguns vegetais ordinários ••

Muito mais tarde, o Prof. Castro Portugal, convidado a emitir opinião sôbre o valor industrial das argilas de Cabanelas, durante uma visita a êste local, em companhia do actual preparador-conservador do Museu Minera­lógico e Geológico da Faculdade de Ciências do Pôrto, Sr. José Lopes da Costa,

32

tamente submersos. Ora, e vista. a sua idade cenozóica, êles deviàm estar fá formados ou em vias de formação durante o Vilafranquiano. As areias e leitos de calhaus que se encontram sobrepostos às argilas lignitosas são, talvez, sincrónicos dos depósitos, mais altos do litoral do Pôrto, cuja cota atinge, como disse, mais de 100 metros. Com mais razão ficariam cobertos pelo mar quando êste originou tais depósitos e banhava os flancos da colina de São-Félix. Contudo, não se encontrou até hoje nestas formações o mínimo vestigio de depósitos ou intercalações marinhas. São formações tipicamente continentais, lagunares .. Fácil é de encontrar a explicação do facto.

É que, quando se originaram, estavam a um nivel muito mais elevado. Deve ter sido por um movimento posterior ao Pliocénico e anterior ao Antropozóico médio que se deu a descida até à posição actual. Enquanto o bloco da margem esquerda do Cávado permaneceu mais ou menos imóvel, o bloco da margem direita mergulhou, sofreu um movimento vertical, abaixando.;se.

A zona de fractura, segundo a qual se produziu o desliga­mento, coincide com o vale do Cávado. A demonstrar que se trata de uma zona de fractura estão, não só a sismicidade que a càracteriza, como as numerosas nascentes termais que se distri­buem ao longo desta linha, desde Barcelos até Montalegre. Barcelinhos, Mosqueiro, Castanheirinhos, Caldelas, Dossãós,

recolheu ali alguns fósseis e restos lignitosos, os quais se conservam nesta Faculdade. Infelizmente, o local exacto desta colheita é desconhecido:· o Sr. José Lopes da Costa apenas pôde informar que ficava para Sul da pirâmide do Cruto.

Recentemente,. neste mesmo local, notou-se a existência de gases combus­tíveis em profundidade, tendo-se chegado a pensar na sua utilização industrial.

Em repetidas visitas que tenho feito a estas formações, consegui obter numerosos restos de vegetais fósseis, em especial nos poços dos Carvalhinhos, no. cruzamento da estrada de Parada-de-Gatim com a de Barcelos. A camada fossilífera é a do barro de cavacos - assim chamado pelos fragmentos de madeira lignitizada que contém, misturados com pesados nódulos de pirite - que, 'aqui, fica situada a 7 ou 8 metros de profundidade, e cuja espessura, pelos informes que obtive, é de cêrca de 30 palmos.

Os: fósseis mais vulgares neste ponto são os de Lygodium e de fôlhas de dicotiledóneas.

33

Gestal, Gradouro, Águas-Santas, Gerez,São-Pedro-do-Rio, etc., pertencem a êsse número. Se algumas delas se afastam um pouco do eixo do vale, não é, contudo,· difícil verificar a sua

(

f I

V~"/ \J j ~

~' """" , , . , ..... ' ÂBcniI ~

Fig. 6 - DistribuIção das fontes termais na região de entre Douro e Minho

relação com fracturas transversais, intimamente ligadas com a fractura principal (Fig. 6).·

Anteriormente ao movimento, a região deCruto, até Prado, era ocupada por um lago, alimentado pelas águas do Cávado e do Homem, com escoamento para o mar. O dispositivo devia

34

corresponder, mais ou menos, ao que hoje se observa no rio Lima, na parte espanhola, com a lagoa de Antela e a extensa planície alagadiça de Oinzo-de-Lima.

Formações idênticas, mais pequenas, sucediam-se dali até Barcelos. As espécies encontradas indicam um clima úmido.

O facto de ter sido o bloco da margem direita que desceu, explica que seja dêste lado que se tenham conservado os depó­sitos sedimentares pliocénicos, pois os que ficaram na outra margem, mais altos, foram lambidos pela erosão. É o fenó­meno habitual em dispositivos semelhantes.

Fig. 7 - o vale do Cávado e a posição dos depósitos sedimentares . . Notar a dessimetria do vale.

A partir de Barcelos, os depósitos passam para o lado da margem esquerda .. São, porém, de tipo muito diferente dos anteriores. Trata-se deformaçõ~s de estuário, que indicam o antigo curso do rio, o qual ia perder-se no litoral correspon­dente à plataforma de 30 metros, entre Estela e Apúlia.

Êste facto, cuja possibilidade fôra já apresentada por Freire de Andrade e 'por Zbyszewski, pôde ser. comprovado por inves­tigações recent~s, realizadas em conjunto por Orlando Ribeiro, J. M. Cotelo Neiva e por mim próprio.

O leito actual do rio a partir de Barcelos, num vale rela­tivamente encaixado, deve relacionar-se com a zona de fractura.

35

o movimento de abatimento do bloco da margem direita parece, ainda, ser revelado pela dessimetria do vale do rio. A montante de Barcelos é nitida a diferença: do lado direito o vale é mais largo e são mais profundas as reentrâncias das curvas de nível (Fig. 7). Para jusante observa-se o· contrário, em relação com o antigo estuário.

Os -Cavalos de Fão:t, por outro lado, indicam, talvez, a permanência do bloco da margem esquerda, que ficou, como esporão, penetrando pelo mar dentro - e foi pouco e pouco destruído pela erosão, até ao quási reajustamento 'que hoje apresenta -, enquanto o litoral contíguo se submergia.

.lu! 51:

Fig. 8 - Perfil transversal de NO. para SE., entre o Minho e o Tâmega

(Segundo o Prof. Amorim Girão).

Seguindo o curso do Cávado, para montante de Prado, notar-se-á o profundo encaixe do vale. O fenómeno é, sobre­tudo, magestoso ao atingir a região gereziana, em frente de Ruivães. O Oerez apresenta, ali, o aspecto de imponente escarpa de falha. O vale, profundo, estreito, mostra na margem direita, o flanco quási vertical, talhado a pique (Fig. 8). É sabido que, em rochas como o granito, as escarpas de falha conservam por muito tempo o seu alcantilado (S9).

Ao mesmo tempo que se deu o afundimento do bloco litoral, deve ter-se produzido um levantamento no interior. Como conseqüência, o relêvo foi rejuvenescido e acentuado.

O vale do Cávado define, dêste modo, uma importantís­sima zona tectónica, com a qual está intimamente ligada a morfologia actual da.s regiões do Norte do Pais. É a linha de depressões Barcelos-Montalegre, estudada por Freire de Andrade. .

O bloco minhoto, dentre Cávado ~ Minho, parece conser-

(29) Cfr.: ORLANDO RIBEIRO, trab. cito em (15).

36

var-se, até certo ponto, solidário. Contudo, o vale do Lima, paralelo ao do Cávado, é, também, uma zona de fractura. O profundo encaixe dêste vale e a localização de algumas.fon­tes termais ao longo das suas margens parecem confirmá-lo. Uma das linhas sismo-tectónicas, de certa importância, do Minho passa por Ponte-do-Lima, Arcos-de-Valdevez e Pedreiros, onde se encontram as termas da Fonte-das-Virtudes.

Importantíssima é, incontestàvelmente, a zona tectónica definida pelo curso do rio Minho, ao longo da qual se distri­buem, igualmente, numerosas nascentes termais. Esta região representa a zona sismogénica principal do distrito e tem

como pontos de maior intensidade sísmica Mel­gaço, Monção, Valença, Vila-Nova-de-Cerveira e Viana PO).

O fenómeno verificado por Lauten­sach (SI) (ali) do • ondulamento" da superfície dos terraços dês te rio, deve ter origem em movimentos segundo planos de fractura trans­versais.

Fig.9-Regiões Esta deformação observa-se, também, nos sísmicas do No- terraços do Lima, entre Ponte-da-Barca e Lin­roeste peninsular.

doso, O que parece confirmar aquela hipótese. O movimento deformante dos terraços só

teria terminado, segundo Lautensach, depois da formação do terraço médio, relacionado com o período interglaciário de Riss-Würm.

Reparando bem, ver-se-á que as deformações dos terraços podem relacionar-se com linhas de fractura importantes, defi­nidas não só por vales tectónicos, como por nascentes termais. Os afluentes do Minho e os do Lima seguem, quási todos, direcções normais às daqueles rios, com largos percursos recti-

(30) R. DE MIRANDA - Introdução à Sismologia. Biblioteca {( Cosmos» - Lisboa, 1942.

(31) H. LAUTENSACH - Portugal, in .Petermans Mitteilungen» .n.OS 213 e 230 - Gotta, 1932-37. .

(32) H. LAUTENSAcH·-Interglaziale Terrassenbildung in NordPortu­gal und lhre Beziehungen zu den allgemeinen Problems des Eiszeilalters. Petermans Geographischen Mitfeilungen, Heft 9-1941.

37

líneos, alinhados uns com os outros, sem dúvida em relação com estas linhas de fractura, ao passo que os dos restantes rios minhotos se orientam, em geral, no sentido NE-SO. Olhando para uma carta hidrográfica do Norte de Portugal, imediatamente saltará à vista essa diferença. Um dos alinhamentos mais nftidos é o que contém o percurso final do rio Vez.

Os afluentes do Minho e os do Lima indicam, assim, linhas de fractura transversais, paralelas umas às outras e para­lelas à notável linha tectónica Régua - Verin, ao II graben" da Vilariça, à falha do sopé do Caramulo, etc., cuja orientação é NNE-SSO.

Relativamente ao bloco minhoto, o bloco galego parece ter sofrido um movimento de submersão da zona litoral mais· acentuado, resultando dai as diferenças de aspecto das costas das duas regiões.

O Noroeste peninsular apresenta-se, dêste modo, como uma região onde a tectónica moderna desempenha papel impor­tante na formação dos relevos e na morfologia das costas.

Uma série de linhas de fractura, de orientação bética, para­lelas à grande falha do Guadalquivir, cortadas por outras, trans­versais (segundo Freire de Andrade, a rêde de falhas compreende linhas de direcção NE-SO., NO-SE. e NNE-SSO.), resultantes da compressão provocada pela orogenia alpina e com as quais se liga a rêde hidrográfica, divide o vasto território em blocos, cuja movimentação é diferente de uns para outros. A hipótese não é nova, pois o Prof. Hernandez-Pacheco dela se lembrou já em 1931 (3S) e o Prof. Carríngton da Costa, mais recente­mente (84), a considerou como possível.

Tais blocos como que se dispõem em escaleira, subindo de Norte para Sul.

O afundimento dos compartimentos litorais foi acom-

(33) E. HERNANDEZ-PACHECO - El problema de las terrazas pliocenas y pleistocenas en 1931. (Mem. apreso ao Congro de Geogr. de Paris). Publ. de la Soe. Geogr. Nacional- Madrid, 1931.

(94) J. CARRINGTON DA COSTA - Trab. cito em (6).

38

panhado pela elevação dos compartimentos interiores, origi­nando-se, assim, uma estrutura em horst, mais ou menos instável.

A "culminação principal ibérica" de R. Staub, que no Noroeste hispânico é representada por uma linha que vai desde li Corunha, com direcção NO-SE., passa a Ocidente de Vila-Real e se dirige para a Guarda, Cáceres, etc., está intimamente rela­cionada com êste fenómeno. Basta reparar no paralelismo com a linha de costa.

i .

1: , .

., ~

A ! . ~ • "i

m .. r

Fig. 10 - Os três blocos principais que podem considerar-se na região dúrico-minhoto-galaica e a sua disposição em escaleira.

No conjunto, podem considerar-se três blocos litorais, sem que isso signifique que dentro de cada um dêles não possam ter existido movimentos de menor amplitude. O Prof. Rosas da Silva, por exemplo, fala da possibilidade de movimentos de báscula no litoral do rio Leça (Só). O Eng. C. Freire de Andrade julga ter-se dado, recentemente, na mesma região (Leixões), um abaixamento importante do litoral (86).

Dêstes três blocos, aparece 'em primeiro' lugar o bloco duriense, limitado ao Norte pela linha do Cávado, e sôbre cujo litoral o mar talhou degraus sucessivos, nas suas oscilações até ao nível actual. Caracteriza-se por relativa imobilidade.

Encontra-se, a seguir, o bloco minhoto, compreendido entre Cávado e Minho, que, posteriormente ao depósito das argilas pliocénicas de Prado e anteriormente à formação do nivel e depósito litoral de 60 metros de altitude, sofreu um movi-

(35) D. ROSAS DA SILVA - Movimentos de báscula (?) da costa portu­guesa. Comun. apreso ao Congresso Luso-Espanhol do Pôrto. 1942.

(36) C. FREIRE DE ANDRADE - Trab. dt. em (10).

39

mento vertical, que fêz mergulhar a zona litoral e levantou as zonas interiores. Falhas transversais provocaram no comparti­mento abaixado movimentos de menor amplitude que deforma­ram a superffcie dos terraços do Minho e do Lima, posterior­mente à sua formação.

Por último, desta<;a-se o bloco galego, compreendido entre o Minho e a costa cantábrica, que sofreu um movimento em tudo idêntico ao do anterior, mas mais acentuado. Assim se originaram as rias galegas .

. O contraste que parece existir entre o litoral minhoto, rectilíneo, e o litoral galego mordido pelas rias, deve-se a esta diferença de amplitude de movi­mento. Bastaria que a zona costeira mi­nhota descesse 30 ou 40 metros para apresentar o mesmo franjado do litoral galego (Fig. 11).

O movimento principal deve ter-se produzido no final do Pliocénico, talvez durante a regressão vilafranquiana, como o pensaram os Profs. A.' Girão, H. Lau­tensach e Carrington da Costa. Podem relacionar-se com êste movimento as nas­centes termais do Norte de Portugal. É, sem dúvida, da mesma data o afundi- ']'ig. 11- Aspecto do li-mento do vale de Chaves, onde se encon- torai minhoto se o

tram formações semelhantes às de Prado, também anteriores ao movimento, e, cuja origem deve ser idêntica (51) (8S). .

nivel do mar subisse 50 m em relação ao nível actual.

São muitíssimo mais recentes os movimentos que produ­ziram as deformações dos terraços.

É esta estrutura em compartimentos separados por falhas e fracturas que dá à região galaico-minhota a sua sismicidade

(37) Cfr.: PAUL CHOFFAT - La ligne de dépréssions Regoa-Verin et ses sources carbonatées. Remarques et considerations. Com. Servo Geol. de Portugal- Tômo XII, 1917.

(38) PAUL CHOFFAT - Noticia s6bre a carta hypsométrica de Portu­gal-Lisboa, 1907.

40

muito acentuada. O Minho figura, com efeito, entre as provín­cias portuguesas do Norte de maior sismicidade. . Ao mesmo tempo, cita-se como facto averiguado que das costas das rias galegas partem sismos de carácter epirogénico (S~).

Pelo contrário, Trás-os-Montes aparece como região quási completamente assfsmica, especialmente o distrito de Bragança, facto que está de acôrdo com a instabilidade da zona marginal e a maiôr solidez da zona interior.

Esta tectónica, que parece tão simples e fácil de explicar, é, no fundo, complexa e comandada por factores diversos. Reduzindo-a a esquemas, mais fácil se torna interpretá-la. Estudando-a em regiões pouco extensas conseguem-se, muitas vezes, elementos de grande interêsse para o conhecimento geral dos movimentos de um vasto território.

Quanto ao Noroeste peninsular, se é incontestável que a sua tectónica é dominada por movimentos próximos da vertical, pela existência de compartimentos, erguidos uns, outros abaixa­dos, isso não exclui a possibilidade de outras deformações, antes pelo contrário, nalguns casos, as podem justificar.

Pôrto, Janeiro de 1944 .

• :" I j

- r 1

, . '!

( 39 ) R. DE MIRANDA - Trab. cito em (30).

C. TEIXEIRA - Tectónica plio-pleistocénica

Fig. 1 - Pie)is cf. pa)'schlu{/iana Ung. . Argila fossilífera

de Cruto, Cabanelas.

Fig. 2 - Pteris cf. pa"schlugiana Ung. e Ly{/odimn GaulZin'i Reer.

Argila fossilífera (Ie Cruto, Cabanelas.

EST. I

Boi. Soe. Geoi. d. Porlugnl- V.I. IV -1944.

C. TEIXEIRA - Tectónica plio-pleistocénica EST. II

X2

X2