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TERAPIA NUTRICIONAL NA
DOENÇA INFLAMATÓRIA INTESTINAL
NUTRITIONAL THERAPY IN INFLAMMATORY BOWEL DISEASES
Joana Filipa Sampaio dos Santos
Orientado por: Mestre Isabel Luísa Gomes Ferraz Pinto
Tipo de documento: Monografia
Porto, Fevereiro 2009
i
Dedicatória
Dedico a todos aqueles que compõem o meu coração…
Aos meus irmãos que Amo muito e aos quais desejo o melhor do mundo.
Espero que a Vida vos transforme um dia em adultos felizes e vos conserve sempre esses
sorrisos lindos!
À minha irmã, que apesar de por vezes, não o quer deixar parecer, é uma pessoa muito
bonita por dentro.
À minha avó materna que me Criou e me mostrou que existem pessoas que são a
personificação do Amor e da Luta.
Aos meus avós paternos por serem muito especiais.
Aos meus pais por me darem liberdade para escolher o meu caminho.
À minha Amiga Tânia por me ter ajudado a crescer e a tornar naquilo que sou hoje. Como
disseste um dia: “Podemos passar anos sem nos vermos, mas eu sei, que se um dia
precisar de ti, tu estarás lá, e tu sabes, que se precisares de mim, eu estarei contigo…”
Às minhas Amigas Ana Lourenço, Isabel, Carona, Natália, Márcia, Fabíola, Ceomara, muito
Obrigada me terem ajudado com a vossa amizade a ultrapassar este capítulo… Ficaram
comigo para sempre!
À Verinha por conseguir sempre chegar onde quer!
…
Ao meu namorado, por todo o Amor, Carinho, Afecto e Apoio que tornam todos os dias da
nossa Vida em dias felizes. Eu sei… Eu sinto… Vou Amar-te para sempre.
ii
Agradecimentos
Agradeço a toda a equipa do Serviço de Nutrição e Alimentação da ULSM pela
forma como me receberam e acolheram. Agradeço em especial à minha
orientadora, Isabel Pinto, e à coordenadora do SNA, Dulce Senra.
Agradeço também ao Gonçalo que me motivou a escolher este tema desejando
do fundo do coração poder contribuir, por muito pouquinho que seja, de alguma
forma para a sua Vitória!
iii
Índice
Dedicatória .......................................................................................................... i�
Agradecimentos ..................................................................................................ii�
Lista de Abreviaturas.......................................................................................... v�
Resumo..............................................................................................................vi�
Palavras-Chave..................................................................................................vi�
Abstract .............................................................................................................vii�
Key-words .........................................................................................................vii�
Introdução .......................................................................................................... 1�
Revisão da Literatura ......................................................................................... 3�
1.� Doença Intestinal Inflamatória ..................................................................... 3�
1.1 Doença de Crohn versus Colite Ulcerosa..................................................... 4�
2.� Implicações nutricionais na DII .................................................................... 5�
2.1 Especificidades da desnutrição calórica-proteíca na DII .............................. 7�
2.2 Deficiências de Fluidos e Electrólitos ........................................................... 9�
2.3 Lípidos e Hidratos de Carbono..................................................................... 9�
2.4 Deficiências de micronutrientes.................................................................. 10�
2.4.1 Cálcio e Vitamina D................................................................................. 10�
2.4.2 Ferro........................................................................................................ 11�
2.4.3 Zinco........................................................................................................ 12�
2.4.4 Magnésio................................................................................................. 13�
2.4.5 Folato ...................................................................................................... 14�
2.4.6 Vitamina B12 ........................................................................................... 15�
2.5 Interacção Fármaco-Nutriente.................................................................... 15�
3.� Outras complicações associadas .............................................................. 16�
iv
4.� Terapia nutricional na DII........................................................................... 16�
4.1� Considerações dietéticas específicas..................................................... 18�
4.1.1� Fibra .................................................................................................... 18�
4.1.2 Lactose.................................................................................................... 19�
4.1.3 Diarreia Infecciosa:.................................................................................. 20�
4.2� Terapia nutricional na fase remissiva da DII........................................... 20�
4.3 Terapia nutricional em fase aguda ............................................................. 21�
4.4 Alimentação entérica Versus Alimentação parentérica .............................. 22�
4.5 Suporte nutricional versus Corticóides ....................................................... 24�
5.� Nutrientes imunomodeladores ................................................................... 26�
6.� Crianças..................................................................................................... 27�
Análise crítica e Considerações finais.............................................................. 28�
Referências Bibliográficas................................................................................ 33�
v
Lista de Abreviaturas
AG n-3 – Ácidos Gordos Poliinsaturados ómega-3
AGCC – Ácidos Gordos de Cadeia Curta
CU – Colite Ulcerosa
DC – Doença de Crohn
DII – Doença Inflamatória Intestinal
IMC – Índice de Massa Corporal
Mg – Magnésio
NE – Alimentação Entérica
AP – Alimentação Parentérica
APT - Alimentação Parentérica Total
SIC – Síndrome do Intestino Curto
SRO – Solução de re-hidratação oral
vi
Resumo
A Doença Inflamatória Intestinal (DII) - Doença de Crohn (DC) e a Colite
Ulcerosa (CU) - é uma doença crónica de etiologia desconhecida. A DII associa-
se frequentemente a distúrbios nutricionais significativos, que podem acarretar
consequências graves. Assim, a atenção dada aos aspectos nutricionais nestes
doentes deve considerar-se de extrema importância. O suporte nutricional pode
revelar-se necessário para corrigir a malnutrição energética ou de macro ou
micronutrientes específicos. Tendo em conta os efeitos adversos da terapêutica
a longo-prazo com corticóides, a alimentação entérica (AE) pode apresentar-se
como uma alternativa de terapia primária no tratamento da DC. A consideração
individualizada do estado nutricional de cada doente com DII é essencial para
promover a melhoria da sua qualidade de vida, e evitar o aparecimento de co-
morbilidades.
Palavras-Chave
Doença Inflamatória Intestinal, distúrbios nutricionais, terapia nutricional,
alimentação entérica, alimentação parentérica.
vii
Abstract
Inflammatory Bowel Diseases (IBD) - Crohn’s Disease and Ulcerative Colitis- are
chronic diseases with unknown etiology. IBD are often associated with significant
nutritional disturbances which can cause severe consequences. As so, the
attention given to patient’s nutritional aspects is of great importance. Nutritional
support can be necessary to address malnutrition in terms of calorie intake or
specific macro or micronutrients. Given the adverse side-effects of
corticosteroids’ long-term use, enteral nutrition can be considered an alternative
to Crohn’s disease primary treatment. The individual attention to IBD patients’
nutritional status is crucial to improve their quality of life and prevent co-
morbidities.
Key-words
Inflammatory Bowel Disease, nutritional disturbances, nutritional therapy,
parental nutrition, enteral nutrition.
1
Introdução
A Doença Inflamatória Intestinal (DII) é uma doença crónica de etiologia
desconhecida que possui duas formas principais de apresentação: a Doença de
Crohn (DC) e a Colite Ulcerosa (CU).(1-3) Dados epidemiológicos sugerem que a
sua taxa de incidência tem vindo a aumentar a nível mundial, sobretudo nos
países desenvolvidos, sugerindo que os factores ambientais possam ter um
papel na DII.(4)
Embora a DC e a CU partilhem algumas características clínicas,
apresentam diferenças em relação aos factores genéticos, à apresentação
clínica e ao tratamento.(5)
A DII encontra-se comummente associada a deficiências nutricionais que
podem variar desde alterações discretas dos oligoelementos até estados óbvios
de desnutrição grave.(1) Estas deficiências têm origem multifactorial(6), e
dependem da actividade da doença - fase activa ou fase remissiva.(1) Embora os
distúrbios nutricionais sejam experimentados nas fases activas das DC e CU,
demonstram-se mais frequentes na DC.(1, 6) Por outro lado, por vezes, as
terapias farmacológicas usadas no tratamento da DII agravam o estado
nutricional ao interagirem com a “normal” absorção de nutrientes.(7, 8)
As consequências nutricionais mais comuns são a perda de peso,
hipoalbuminémia, balanço azotado negativo, anemia, deficiências vitamínicas
(Folato, B12, D) e minerais (Ferro, cálcio, zinco e Magnésio),(9) podendo também
ocorrer com frequência deficiências a nível hidroelectrolítico.(10) Durante a
infância ou no início da adolescência a DII tem um grande impacto sobre o
estado nutricional e crescimento. Estudos indicam para estes casos uma
prevalência do atraso do crescimento entre os 36 a 88%.(6) A DII encontra-se
2
positivamente associada a algumas patologias, tais como a osteoporose, tendo
em conta o seu impacto no estado nutricional e os tratamentos farmacológicos
que implica.(6, 10, 11)
A atenção para as questões nutricionais relacionadas com a alimentação
deve ser considerada fundamental na monitorização de doentes com DII.(11)
Contudo, não existe ainda consenso sobre as indicações e normas de terapia
nutricional, para os doentes que sofrem desta patologia.(6) Na tomada de decisão
devem levar-se em conta as necessidades nutricionais individuais, as
intolerâncias e as alergias alimentares, bem como, a fase de actividade da
doença.(10)
A terapia nutricional oral, entérica ou parentérica pode ser necessária,
sendo a via oral a de eleição sempre que esta se mostre adequada e eficaz.(1, 6)
No que diz respeito à comparação da alimentação entérica (AE)(1, 6) com a
alimentação parentérica (AP), embora estas demonstrem impactos nutricionais
semelhantes(6), na literatura, verifica-se uma tendência favorável à utilização da
AE(1, 6) em portadores de DII, reservando-se a AP total para situações
específicas, ou em que a AE não seja possível.(1, 6, 11)
O uso do suporte nutricional como tratamento primário na DC tem sido
motivo de discussão devido aos efeitos secundários do tratamento a longo-prazo
com corticóides.(11) O tratamento da DII com nutrientes imunomodeladores é
uma nova modalidade terapêutica baseada nas suas propriedades
farmacológicas que se tem apresentado de forma promissora.(1)
Neste contexto, e uma vez que se trata de um tema em que existem ainda
muitas informações contraditórias torna-se importante e relevante perceber de
3
que forma é que a nutrição pode influir na actividade da DII e na qualidade de
vida dos doentes.
Revisão da Literatura
1. Doença Inflamatória Intestinal
A Doença Inflamatória Intestinal (DII) é uma doença gastrointestinal que
possui duas formas principais de apresentação: a Doença de Crohn (DC) e a
Colite Ulcerosa (CU),(1, 3, 12) cujos diagnósticos dependem de uma combinação
de sinais clínicos, radiológicos, endoscópicos e histológicos.(13) Tanto a DC como
a CU são processos inflamatórios crónicos, que cursam de maneira imprevisível
com períodos de actividade e remissão variáveis.(9, 14) Estudos retrospectivos
sobre a epidemiologia da DII realizados sobretudo a partir de 1980, firmam a
noção de que actualmente existe uma tendência mundial para o aumento da
incidência, mesmo em países anteriormente considerados como de baixo risco,
embora os estudos sobre a ocorrência de CU e DC sejam escassos nos países
em desenvolvimento.(1, 4, 9) Esta tendência parece de facto representar um
aumento da frequência e não apenas estar ligada a uma maior identificação.(4, 9)
As últimas décadas têm testemunhado um progresso significativo na
compreensão da etio-patogénese, genética e terapêuticas das DII.(11) Apesar
disso, a causa da DII não é ainda completamente conhecida, parecendo envolver
a interacção de factores ambientais, microflora entérica, predisposição genética
e uma resposta imune anormal ou auto-imune na parede intestinal.(5, 13, 15)
Acredita-se que a dieta e vários factores dietéticos podem desempenhar um
papel na modelação no processo da doença.(5, 16, 17)
4
A DII instala-se com maior frequência nos indivíduos com idades
compreendidas entre os quinze e trinta anos, embora o 1º surto da doença possa
ocorrer mais tarde na vida adulta. Ambos os sexos são igualmente afectados. A
ocorrência encontra-se aumentada em familiares dos doentes, particularmente
em parentes de 1º grau.(5)
1.1 Doença de Crohn versus Colite Ulcerosa
A DC e a CU partilham algumas características clínicas, tais como:
intolerâncias alimentares, diarreia, febre, perda de peso, anemia, desnutrição,
comprometimento do crescimento em crianças e adolescentes, e manifestações
extra-intestinais - artrite, problemas hepáticos e dermatológicos. No entanto
estas patologias apresentam características distintas em relação aos factores
genéticos, apresentação clínica e tratamento.(2, 5)
A diarreia aguda sanguinolenta é a manifestação dominante na CU, enquanto
que na DC os principais sintomas são a diarreia e perda de peso.(1) A DC pode
ocorrer em qualquer parte do tracto gastrointestinal de forma segmentada, sendo
mais frequente no íleo e no cólon. (5, 14, 18) O íleo distal é a zona de eleição para o
aparecimento da doença, com inflamação que atinge desde a mucosa até à
serosa.(5, 19) A CU é um processo de doença contínuo que começa no recto e
progride de forma retrógrada para envolver comprimentos variáveis de cólon,
que atinge geralmente apenas a mucosa.(1, 5, 18)
Em ambas as DII o risco de doença maligna é maior com a doença de longa
duração. As razões para o risco aumentar não estão firmemente estabelecidas,
mas podem estar associadas com um estado proliferativo maior e factores
nutricionais. (5) Apesar da desnutrição poder ocorrer em ambas as formas de DII
é provável que tenha um maior impacto em doentes com DC.(3, 5, 20) Existem
5
diferenças fundamentais no padrão de desnutrição entre DC e CU. A DC quando
afecta o intestino delgado tende a conduzir a uma maior incidência de
desnutrição proteico-energética, e de nutrientes específicos do que a doença que
atinge apenas o cólon e do que a CU.(11) Além disso, os doentes com DC
geralmente desenvolvem desnutrição durante um longo período de tempo,
enquanto que os doentes com CU tendem a ser relativamente bem nutridos em
remissão, podendo desenvolver deficiência nutricional precipitada durante a fase
aguda da doença.(11)
2. Implicações nutricionais na DII
A desnutrição é frequente na DII, atingindo até 83% dos doentes que se
apresentam em fase aguda. As deficiências nutricionais podem variar desde
alterações discretas dos níveis dos oligoelementos até estados óbvios de
desnutrição grave, com grande perda de peso.(1, 6, 18, 20, 21)
A desnutrição proteico-energética e a deficiência de nutrientes específicos têm
origem em múltiplos factores, que incluem a actividade e duração da doença(6),
as interacções fármaco-nutriente, a localização da inflamação, os sintomas e as
restrições dietéticas, ou mesmo o sobrecrescimento bacteriano.(7)
A redução da ingestão alimentar é considerada a principal causa da
desnutrição, surgindo muitas vezes como o resultado do medo de provocar dor
abdominal ou diarreia, ou da imposição de restrições alimentares ou realização
de “jejum terapêutico”, durante as fases activas da doença. A anorexia aguda
poderá estar relacionada com o aumento dos níveis de citocinas de resposta
inflamatória, IL-1 e TNF. A diminuição da ingestão, da absorção e perda de
massa muscular aparecem também associadas à obstrução intestinal, à
presença de fístulas, ou à inflamação intestinal extensa.(6, 10) A absorção de
6
nutrientes poderá estar também prejudicada pelo sobrecrescimento bacteriano,
devido a fístulas ou estreitamentos do segmento intestinal.(6) A perda proteica
exudativa ocorre nas áreas de inflamação e ulceração da mucosa, sendo
proporcional à actividade da doença. Os distúrbios hidroelectróliticos podem
surgir como consequência da presença de diarreia.(10)
Os défices nutricionais associam-se com a evolução clínica adversa(6),
afectando a imunidade humural e celular, as fístulas e sua cicatrização, o
balanço azotado e a calcificação óssea.(18) Além disso, reduzem a tolerância às
perdas sanguíneas, gerando maiores taxas de morbilidade no pós-operatório, e
recuperação funcional mais lenta.(6, 9)
Os défices nutricionais ocorrem com incidências variáveis. Os mais
comuns são a anemia, a hipoalbuminémia, o défice de oligoelementos (ferro,
cobre, selénio, magnésio, zinco), o défice de vitaminas (A, B, D, E, K) e a
redução de antioxidantes enzimáticos (dismutase do superóxido, catalase,
peroxidase da glutationa) e não enzimáticos (vitamina C, E, B, caroteno,
glutationa e taurina)(1, 6, 9)
A maior susceptibilidade a danos tecidulares oxidativos parece estar
relacionada com uma menor capacidade antioxidante nestes doentes. Alguns
estudos têm demonstrado que o stress oxidativo se manifesta com uma redução
do ácido ascórbico (vitamina C) plasmático e com um aumento das
concentrações da peroxidase da glutationa, glutationa e �-tocoferol (vitamina
E).(8)
Encontra-se descrito na literatura que a maioria das compilações da DII
severa, tais como, a má cicatrização, a caquexia e a susceptibilidade à infecção
ocorrem mais frequentemente em doentes desnutridos.(18) Deste modo, revela-se
7
importante que os clínicos tenham um alto índice de suspeição para a
desnutrição nestes doentes, quer estejam em fase remissiva ou em fase activa
da doença(11), uma vez que mesmo doentes com DC em fase inactiva podem
sofrer várias deficiências nutricionais.(14)
A correcta gestão clínica da DII exige a identificação dos défices
nutricionais a fim de escolher a terapia nutricional mais ajustada a cada situação.
O Índice de Massa Corporal (IMC), a história de peso, a presença de edema e os
estudos da albumina sérica e ferro fornecem uma indicação rápida para a
detecção de risco nutricional. A avaliação do estado nutricional não deve basear-
se apenas num indicador, mas resultar do estudo conjunto da história alimentar,
exame físico, parâmetros laboratoriais e análise clínica.(7)
2.1 Especificidades da desnutrição proteico-energética na DII
A desnutrição proteico-energética é comummente associada à DII(9)
encontrando-se descrita na literatura uma prevalência de 20-85%.(11) A
Hipoalbuminémia é encontrada em 25-80% e 25-50% dos doentes hospitalizados
com DC e CU, respectivamente.(11, 22)
A manifestação mais comum da desnutrição proteico-energética é a perda
de peso. Embora existam excepções, a perda de peso é geralmente mais
comum em doentes com DC, sobretudo nos com doença severa, do que nos
com CU. A perda de peso ocorre em mais de 62% dos casos, durante a
exacerbação dos sintomas. No entanto, ao contrário do que acontece na CU, na
DC a perda de peso pode ocorrer mesmo na fase inactiva da doença. (18)
Actualmente, não existe consenso sobre o quanto se encontra aumentada
a taxa metabólica basal na DII. Na DC, o aumento do dispêndio energético em
repouso, o aumento de peroxidação lipídica, a redução da oxidação de glicose e
8
a diminuição da termogénese induzida pelos alimentos têm sido relatados quer
na fase activa quer na fase inactiva da doença.(11) Scheneeweiss et al, mostrou
que doentes com DC activa manifestavam alterações no substrato de oxidação
similares àqueles que eram observados durante jejum prolongado (menor
oxidação de proteínas e glicose, e maior metabolismo de gorduras), sem
alteração da taxa metabólica basal. Estes dados indiciam que a perda de peso
nestes doentes poderá surgir como resultado da anorexia, má absorção intestinal
e perdas, ao invés de hipermetabolismo.(6)
Os resultados de vários estudos presentes na literatura sugerem um
aumento ligeiro da energia para além do que é previsto na equação de Harris-
Benedict, para doentes com DII activa sem abcesso ou sepsis. Em 2002, Barak
et al sugeriu a utilização de um factor de stress de 1,05 – 1,10 em doentes
hospitalizados com DII activa.(11)
Assim, não há evidências sólidas para apoiar a suplementação energética
sobre a necessidade metabólica prevista pela fórmula de Harris-Benedict,
excepto nos doentes com menos de 90% do peso de referência durante a fase
activa da doença. Portanto a estimativa adequada das necessidades situar-se-á
nas 25 a 35 kcal / kg / dia para a maioria dos adultos com DII.(6, 11)
No que às proteínas diz respeito as suas necessidades parecem estar de
facto aumentadas. As perdas causadas pela inflamação do tracto intestinal, o
catabolismo que ocorre na presença de infecção e possivelmente a maior
necessidade para a cicatrização no caso dos doentes pós cirurgia justificam este
aumento das necessidades.(7, 18) Assim, estudos apontam para adequar a
estimativa das necessidades proteicas a 1,0-1,5 g / kg / dia para adultos, e a 2,0
g / kg / dia para doentes desnutridos ou com sépsis. (6, 11)
9
2.2 Deficiências de Fluidos e Electrólitos
As deficiências de fluidos e electrólitos são comuns e associam-se à
presença de diarreia. Os doentes submetidos a recessões cirúrgicas e que
desenvolveram no pós-operatório, síndrome do intestino curto (SIC) encontram-
se muito susceptíveis a este tipo de deficiências. (10)
A correcção pode ser feita com a utilização de soluções de re-hidratação
oral (SRO) que foram primeiramente descritas por Harrison para tratamento de
diarreia infantil. Desde então, a sua composição evoluiu e actualmente a sua
composição aproximada consiste em: 90mmol/l glicose, 45mmol/l cloreto de
sódio, 45mmol/l citrato de sódio, 20mmol/l cloreto de potássio. As concentrações
de compostos de sódio não devem ser inferiores a 90 mmol/l. As bebidas
desportivas são muitas vezes inapropriadamente prescritas como substitutos das
SROs. Estas bebidas apresentam uma baixa concentração de sódio, são ricas
em açucares simples e têm alta osmolaridade, características que poderão
provocar um aumento do volume e do número de dejecções diarreicas.(10)
2.3 Lípidos e Hidratos de Carbono
A esteatorreia é encontrada apenas na DC e sua incidência situa-se nos
30%.(10, 18) A extensão e gravidade da doença no intestino delgado pode
determinar o grau de esteatorreia na DC, sendo que a extensão da recessão
cirúrgica também tem influência.(10, 18)
O metabolismo dos ácidos biliares apresenta-se perturbado nos doentes
com DC severa, tal como nos que foram submetidos a recessão intestinal. Os
ácidos biliares são absorvidos no ileo distal, sendo que a sua lesão ou recessão
poderá resultar na má absorção destes e consequentemente na má absorção de
lípidos e vitaminas lipossolúveis.(1)
10
Os hidratos de carbono (HC) da dieta são normalmente assimilados no
intestino delgado proximal. A sua absorção neste local não é completa, e os que
não foram absorvidos passam para o cólon onde sofrem fermentação bacteriana
transformando-se em ácidos gordos voláteis e gás.(18) A má absorção de HC
pode ser determinada pelo teste da absorção de D-xilose.(1, 18)
2.4 Deficiências de micronutrientes
Na DII ocorrem com diferentes graus de significado clínico e incidências
variáveis uma vasta gama de deficiências vitamínicas e minerais, que
seguidamente serão discutidas. (11, 18)
2.4.1 Cálcio e Vitamina D
A ocorrência da doença metabólica do osso é comum em doentes com
DC,(8) sendo geralmente resultado da deficiente ingestão ou má absorção de
Cálcio e Vitamina D.(10, 23) Nos doentes com DII, os níveis plasmáticos de Cálcio
encontram-se normais pois são mantidos pelo Hiperparatiródismo secundário,
que espolia o cálcio do esqueleto.(11) Por outro lado, a osteoporose induzida por
corticóides é um fenómeno comum sobretudo nos doentes submetidos a
tratamento anti-inflamatório prolongado. A corticoterapia interfere com a
homeostasia do cálcio, uma vez que, inibe a sua absorção intestinal e actua a
nível renal diminuindo a sua reabsorção tubular.(7) Em adição, a ingestão
diminuída de produtos lácteos como resultado de dietas restritivas em lactose
pode potenciar estas deficiências. (7)
Todos os doentes com DII devem ser aconselhados a consumir uma dieta
rica em Cálcio, como meio eficaz de profilaxia contra a osteopenia e
osteoporose.(11) A suplementação com cálcio e vitamina D deverá ser utilizada se
11
o consumo alimentar não for adequado.(24) Os suplementos de Cálcio consistem
geralmente em Carbonato de Cálcio.(10)
No entanto, em doentes com DII e osteoporose induzida pelos corticóides,
a literatura evidencia que o uso isolado de suplementação oral de Cálcio e
vitamina D não tem demonstrado um efeito benéfico sobre a densidade mineral
óssea, após um ano de tratamento.(11) Assim, nestes casos, a suplementação
com cálcio e vitamina D deverá ser combinada com o uso de outras terapias de
impacto metabólico, tais como os bifosfonatos e os diuréticos tiazidicos, entre
outras.(11, 24)
2.4.2 Ferro
A deficiência em ferro ocorre em 25 a 50% dos casos de DC, e em mais
de 2/3 dos doentes com CU.(18)
Na DII, a deficiência de ferro pode ocorrer pela diminuição do aporte
alimentar e por perdas sanguíneas adicionais, mais comummente observadas na
CU.(8, 25) Encontra-se também descrito na literatura, que os doentes com DC para
além de um baixo consumo de ferro alimentar, evitam alimentos de alto teor de
fibra fortificados com este mineral, por exemplo cereais fortificados, por temerem
que estes agravem os sintomas da doença.(8, 26, 27)
A correcção desta deficiência pode ser difícil apenas com a dieta, sendo
que a suplementação com ferro se apresenta como uma prática adicional. A
deficiência de ferro é tratada com suplementos de Ferro, como o sulfato ferroso
ou o gluconato ferroso. As fontes alimentares ricas em vitamina C podem ser
utilizadas como promotoras do aumento da biodisponibilidade de ferro.(7)
Os doentes com DII frequentemente não toleram a suplementação oral de
ferro. Existem evidências de que, uma vez no cólon, o ferro aumenta o stresse
12
oxidativo e pode exacerbar a inflamação. Por esta razão, é por vezes necessário
administrar o ferro através de infusão intravenosa ou de injecção
intramuscular.(10)
Mesmo que o ferro oral seja tolerado, o grau de deficiência dos níveis de
ferritina podem não melhorar e os níveis de hemoglobina permanecerem baixos.
Assim, se ao fim de um mês, nestas circunstâncias, não se observarem
alterações na hemoglobina deverá fornecer-se o ferro por via parenteral.(10)
2.4.3 Zinco
Na DII, os doentes podem ver as suas necessidades em zinco
aumentadas por aumento do volume e/ou frequência das dejecções, e pelo
desenvolvimento de fístulas. É estimado que, por cada litro de fezes, podem ser
espoliados cerca de 15mg de Zinco. Assim, apesar das dificuldades do
diagnóstico bioquímico, as deficiências de zinco ocorrem tipicamente em doentes
com diarreia inflamatória e número/volume de dejecções aumentados.(7) Estudos
sugerem que esta deficiência se encontra presente em mais de 40% dos doentes
com DC.(18)
A maioria dos estudos demonstra nos doentes com DC, níveis de zinco
plasmático diminuídos quando comparados com controlos, apesar de não se
detectarem sintomas de deficiência. Assim, todos os doentes que tenham
diarreia significativa (+ 300g fezes/dia) devem receber suplementação de Zn, até
a diarreia terminar. Esta suplementação é normalmente realizada com glutamato
de zinco na dose de 20-40mg/dia.(10)
A sua suplementação, tendo em conta que o zinco é fundamental para a
cicatrização de feridas deve ser um factor a considerar em doentes que
apresentam fístulas persistentes. Para além disso, e tendo em conta que o zinco
13
é um co-factor da dismutase do superóxido a sua suplementação poderá
constituir uma protecção contra dano celular mediado por radicais livres.(11)
2.4.4 Magnésio
A deficiência de magnésio (Mg) é uma complicação frequente na DII (7, 8)
estando presente em 13 a 88% dos doentes.(8, 28) A deficiência de Mg é comum
na DC, especialmente em doentes que foram submetidos a recessão cirúrgica do
intestino. (10)
A diminuição da ingestão, a má absorção intestinal e perdas aumentadas
são as principais causas da deficiência de Mg.(8, 28) Os doentes com Síndrome do
Intestino Curto apresentam-se mais susceptíveis ao aparecimento desta
deficiência.(7)
O Mg pode ser reposto quer por via entérica quer por via parentérica. O pH
do tracto gastrointestinal, o tempo de trânsito intestinal e o conteúdo em gordura
da refeição podem afectar a absorção do Mg. Por outro lado, a suplementação
entérica com altas doses de Mg pode causar diarreia, principalmente se for
administrada num curto período de tempo. (7, 10)
A suplementação com gluconato de Mg parece ser a melhor escolha para
a suplementação por via entérica pelo seu elevado grau de solubilidade, uma vez
que os sais menos solúveis poderão causar diarreia. A dissolução da
suplementação na SRO e a sua distribuição ao longo do dia parece contribuir
para evitar a diarreia.(10)
Em doentes de Crohn com suporte parentérico a dose recomendada é de
pelo menos 120mg/dia. Quando por via oral a suplementação pode atingir os
700mg/dia dependendo da gravidade da má absorção.(8, 28)
14
2.4.5 Folato
A depleção de ácido fólico ocorre em cerca de 1/3 dos doentes com DII e
varia com actividade da doença.(18) A deficiência de folato pode ser resultado do
aporte alimentar insuficiente, de perdas intestinais aumentadas ou, menos
frequentemente, da inibição competitiva causada por alguns fármacos usados no
tratamento da doença.(7, 11)
As melhores fontes dietéticas de folato (ex. hortaliças e legumes) são
muitas vezes difíceis de tolerar por alguns doentes com DII. Assim, em alguns
casos a suplementação poderá ser benéfica.(18)
Historicamente, a DII de instalação prolongada, principalmente a CU, está
associada à carcionogénese.(5, 7) Apesar da dificuldade de estabelecer
associações entre o risco de cancro e os factores dietéticos o folato tem-se
revelado um dos nutrientes anti-carcinogénicos mais promissores. A deficiência
de folato está associada a danos no DNA o que se supõe ser um dos
mecanismos responsáveis na patogénese do cancro associado à CU. Dados
epidemiológicos têm demonstrado uma relação inversa entre o consumo de
folato e cancro colo-rectal.(7, 10, 11)
Outro efeito adverso da deficiência de folato é o aumento da homocisteína
sérica, um conhecido indutor de estados de hipercoagulação. A
hiperhomocisteinemia tem sido relatada em 26,5% dos doentes com DII, em
comparação com apenas 3,3% dos controlos.(11)
A suplementação oral de folato deve ser recomendada para doentes com
DII, como um agente anti-neoplásico e anti-trombótico.(7, 11) Contudo, não
existem ainda estudos prospectivos que demonstrem o impacto da
suplementação com folato na incidência de cancro e na ocorrência de eventos
15
trombóticos, associados à DII.(11) Os doentes com DII devem fazer por rotina
1mg/dia de ácido fólico. A sua monitorização periódica, revela-se necessária
dado que a suplementação em ácido fólico poderá dissimular possíveis
deficiências de Vitamina B12. O melhor indicador nutricional do folato orgânico é
o folato eritrocitário.(7)
2.4.6 Vitamina B12
A deficiência de vitamina B12 está presente em 1/3 dos doentes com DC
em fase aguda não tratados. Contudo, cerca de 50 a 75% dos doentes
apresentam diminuição da absorção de vitamina B12. O défice de vitamina B12
poderá estar presente nos doentes que fizeram recessões de estômago, por não
produção do factor intrínseco, e nos doentes submetidos a recessões do ileo
distal, por diminuição da absorção. Os doentes com recessões ileais requerem
geralmente suplementação com vitamina B12 por via parentérica, uma vez que o
complexo factor intrínseco –vit B12 é apenas absorvido no íleo distal.(1, 7, 10, 18)
A Homocisteinemia é um indicador de deficiência de vitamina B12, com
baixa especificidade, uma vez que também é afectada pelo folato e a vitamina
B6. Embora a via intra-muscular seja a escolha mais comum, a suplementação
oral é possível com altas doses de Vitamina B12 sintética.(7)
2.5 Interacção Fármaco-Nutriente
Algumas das deficiências nutricionais da DII estão relacionadas com a
interacção Fármaco-Nutriente.(7, 8) Alguns dos medicamentos comummente
utilizados podem ocasionar alteração da absorção de cálcio, das vitaminas
lipossolúveis (A,D,E e K) e do folato. A homeostasia do cálcio pode ver-se
alterada pela utilização de corticóides (tal como referido anteriormente); o folato
16
pela utilização de sulfassalazina, e as vitaminas lipossolúveis pela
colestiramina.(1, 6, 7, 11)
3. Outras complicações associadas
Nos doentes com DII, o impacto das várias deficiências nutricionais na
densidade mineral óssea, na carcinogénese e na trombofilia(29) possui uma
especial relevância. A Osteopenia e a Osteoporose são cada vez mais
reconhecidas como morbilidades extra-intestinais líderes na DII. Os dados sobre
a sua prevalência na DII são pouco consistentes pois variam de acordo com a
heterogeneidade das coortes, e com a falta de uniformidade dos critérios
metodológicos e de diagnóstico. O uso de corticóides aparece também
associado à Diabetes Mellitus e à perda muscular. A anemia e a
hipoalbuminémia aparecem também frequentemente associadas à DII.(1, 6, 7, 11)
4. Terapia nutricional na DII
A diminuição da ingestão, a má absorção, as perdas aumentadas de
nutrientes, o aumento das necessidades, e as interacções fármaco-nutriente
podem causar deficiências nutricionais e funcionais que exigem correcção
adequada com terapia nutricional. (6) Os objectivos da dietoterapia na DII são os
seguintes: (1)
• Aplicar a dietoterapia adequada de acordo com o tipo e actividade da doença;
• Utilizar dietas que diminuam a actividade da doença;
• Manter e/ou recuperar o estado nutricional do doente;
• Aumentar o tempo de remissão da doença;
• Reduzir as indicações cirúrgicas;
• Reduzir as complicações pós-operatórias.
17
A atenção para as questões nutricionais relacionadas com a alimentação
deve ser considerada fundamental na monitorização de doentes com DII. (11)
Embora sejam vários os aspectos partilhados pela DC e CU, é
fundamental considerá-las como 2 patologias distintas, no que à terapia
nutricional diz respeito.(1) De facto, embora muitas das implicações destas
patologias possam ser analisadas em conjunto, o seu tratamento,
particularmente do ponto de vista nutricional requer considerações isoladas.(10)
Existem três indicações principais para o suporte nutricional intensivo em
doentes com DII: A primeira corresponde à terapia auxiliar para corrigir ou evitar
a desnutrição e favorecer o crescimento em crianças. A segunda refere-se ao
tratamento primário da inflamação intestinal aguda na DC, mas não na CU. A
terceira inclui uma pequena percentagem de doentes com DC que podem exigir
suporte nutricional de longa duração devido ao Síndrome do Intestino Curto ou
doença activa severa.(1)
Contudo, ainda não existe consenso sobre as indicações e normas de
terapia nutricional para estes doentes, logo não existe um protocolo único,
uniforme e efectivo para doentes com DII descrito na literatura. (6) As decisões
sobre a reabilitação de doentes malnutridos com DC requerem a avaliação da
situação gastrointestinal do doente. Torna-se necessário perceber qual é a
extensão da doença, se existe obstrução intestinal, e história de cirurgia
intestinal prévia(30). Na toma desta decisão devem também levar-se em conta as
necessidades energéticas e proteicas do doente, bem como as suas
intolerâncias e alergias alimentares.(10)
18
4.1 Considerações dietéticas específicas
4.1.1 Fibra
Na literatura internacional não existe consenso sobre os benefícios da fibra
alimentar na DII.
Alguns estudos em doentes com DC têm demonstrado a associação do
aumento do teor de fibra da dieta com a diminuição dos riscos de doença, da
sintomatologia, das taxas de ataque agudo, bem como um aumento no tempo de
remissão. Heaton e tal., mostrou que as taxas de internamentos hospitalares e
de obstrução intestinal foram significativamente menores em doentes com DC,
que tinham uma dieta rica em fibras e hidratos de carbono complexos. No
entanto, estudos posteriores, tal como o de Ritchie et al., não conseguiram
reproduzir esses resultados. Do mesmo modo, um estudo com doentes de DC
relatou uma diminuição dos sintomas com consumos alimentares de baixo teor
em fibra e carnes brancas.(8)
Em adição, uma dieta de baixo teor em fibra é frequentemente
aconselhada para doentes que apresentam estenose do intestino delgado ou
síndromes oclusivos do intestino grosso. (8, 11)Durante surtos caracterizados por
diarreia é também prudente que os doentes reduzam temporariamente a sua
ingestão de fibra alimentar, embora não existam estudos que o demonstrem. (11)
Uma dieta baixa em fibra pode também ser benéfica no subgrupo de doentes
com co-existência de DII e síndrome do intestino irritável, nos quais os sintomas
abdominais são atribuídos à fermentação bacteriana da fibra alimentar
insolúvel.(11) Actualmente, não existem estudos prospectivos do efeito da
restrição da quantidade ou do tipo de fibra alimentar sobre os sintomas
abdominais em indivíduos com doença inflamatória do intestino em remissão.
19
Assim, o papel de fibra precisa de ser elucidada em maior pormenor através de
ensaios clínicos controlados. (8)
4.1.2 Lactose
Na gastrenterologia é prática comum banir produtos lácteos durante
erupções da DII. De facto, os estudos têm demonstrado um aumento da
prevalência da malabsorção da lactose em doentes com DC. Num estudo que
analisou 260 doentes com doença inflamatória intestinal, Mishkin et al.,
encontrou-se uma prevelência de malabsorção de lactose de 40% em doentes
com DC, em comparação com 29,2% nos controlos de baixo risco étnico para
malabsorção de lactose, e 13,3% em doentes com CU.(1, 11)
Os doentes com DC confinada ao íleo distal são mais susceptíveis a
sofrerem de malabsorção da lactose do que são aqueles com CU. Do mesmo
modo, os estudos parecem indicar que malabsorção é mais frequente nos
doentes em fase activa. Um estudo alemão encontrou uma prevalência de
malabsorção de lactose em 83,3% em doentes com DC em fase activa.(11)
A malabsorção de lactose na DC parece poder ser independente da
actividade da lactase no duodeno, encontrando-se mais relacionada com o
resultado do sobrecrescimento de bactérias no intestino delgado e com o
aumento do tempo do trânsito intestinal.(1)
Independentemente da etnia, a malabsorção da lactose deve ser estudada
em doentes com DC envolvendo o intestino delgado e que apresentem diarreia
persistente. A malabsorção da lactose pode ser facilmente detectada pelo teste
do hidrogénio expirado.(11)
A restrição da lactose deverá ser equacionada nos doentes com CD
envolvendo o intestino delgado, um estudo caso-controlo demonstrou que uma
20
dieta entérica polimérica isenta de lactose melhorava significativamente a
composição da massa corporal em doentes com DC intolerantes à lactose.
Poderão ser utilizadas nas dietas restritas em lactose bebidas de soja
enriquecida com cálcio ou leite de vaca semi-digeridos ou isentos em lactose.(1, 7)
Não existe nenhuma evidência para apoiar a utilização de uma dieta pobre
em lactose em doentes com CU, ou nos doentes com doença de Crohn em que
a inflamação esteja confinada ao intestino grosso.(11)
4.1.3 Diarreia Infecciosa:
A diarreia infecciosa conduz frequentemente a recidivas na DII. Assim,
doentes com DII deverão ser aconselhados a evitar alimentos que são
associados com um risco aumentado de transmissão de patogénios conhecidos
por causarem gastroenterite. Especificamente, deverão evitar-se carnes mal
cozinhadas, ovos crus, produtos hortícolas crus não desinfectados, entre outros.
Devem também, ser tomadas precauções dietéticas durante viagens para áreas
com padrões de baixa higiene alimentar.(11)
4.2 Terapia nutricional na fase remissiva da DII
A qualidade de vida dos doentes em remissão é significativamente melhor
do que a daqueles que se encontram em fase aguda, podendo até ser
comparada à da população em geral. (14, 31)
Normalmente, a maioria dos doentes em fase de remissão da doença
podem adoptar uma alimentação liberalizada, com ingestão de ingestão calórica
e proteica suficiente para manter e/ou restaurar a massa corporal.(1, 6) Algumas
restrições poderão ser necessárias com base em intolerâncias individuais,
auxiliando na diminuição da ocorrência de flatulência, diarreia e estenose
21
intestinal. (1, 32) Doentes com intolerância à lactose beneficiam de sua restrição, o
que diminui a produção de gás intestinal e a diarreia. Os doentes que tenham
sido sujeitos a recessão cirúrgica do intestino, devem adoptar dietas com baixo
teor de gordura. Doentes com estenose intestinal devem evitar alimentos ricos
em fibras, tais como cereais integrais, sementes, frutas e legumes crus.(1, 10, 11) A
substituição da gordura comum por triglicerídeos de cadeia média (TCMs) é
necessária na presença de esteatorreia. Alguns doentes também devem
restringir a ingestão de oxalato para prevenir a formação de cálculos de oxalato
de cálcio ao nível do tracto urinário. (6)
Na literatura é recomendado o uso de dietas de exclusão, especialmente
para doentes que estão constantemente com a doença em actividade. A dieta
de exclusão consiste em identificar e excluir alimentos que afectam a actividade
da doença ou exacerbam os sintomas, de forma a promover menos surtos de
activação da doença que a dieta normal, e aumentar a albumina sérica.(1)
Contudo, embora as intolerâncias alimentares tenham sido demonstradas em
pequenas séries de doentes com DC, este problema não é reprodutível e o papel
das dietas de exclusão na DII não está ainda esclarecido. (10)
4.3 Terapia nutricional em fase aguda
A terapia nutricional especializada está indicada nas fases de
exacerbação aguda, grave e recorrente da doença, preparação pré-operatória de
doentes desnutridos, fístulas do aparelho digestivo, SIC (anatómico ou
funcional), e crescimento comprometido. Habitualmente, muitas destas
indicações baseiam-se em conhecimentos clínicos, e não, propriamente em
resultados de ensaios clínicos. A lógica destas indicações reside, muitas vezes,
22
no facto dos doentes desnutridos terem feridas não cicatrizadas e
comprometimento imunológico. (6)
A terapia nutricional entérica ou parentérica pode ser necessária durante a
DII. (1, 6) Quando o doente consegue uma ingestão proteico-energética adequada
por via oral, esta deve ser a via de eleição. Porém, se o doente for incapaz de
atingir as suas necessidades nutricionais diárias por via oral, estas poderão ser
completadas com suplementos comerciais ou com a introdução de alimentação
entérica ou parentérica.(1)
4.4 Alimentação entérica Versus Alimentação parentérica
A DC e a CU exibem diferentes respostas ao suporte nutricional entérico e
parentérico. (6) Estudos comparativos em relação à alimentação entérica (AE) e
alimentação parentérica (AP) mostram resultados nutricionais semelhantes entre
si, tanto para a DC como para a CU. (6) No entanto, verifica-se na literatura, a
tendência favorável à utilização da AE nos portadores de DII (1, 6), devido ao seu
baixo índice de complicações associadas e custos mais baixos.(6) Sendo assim,
a alimentação parentérica total (APT) deve ser reservada apenas para situações
onde a AE esteja contra-indicada ou em situações clínicas específicas (1, 6, 11) ,
como a hemorragia maciça, a perfuração intestinal ou a obstrução, o megacólon
tóxico, e alguns casos extremos de síndrome do intestino curto. (6)
A APT tem-se demonstrado um eficaz promotor da melhoria do estado
nutricional e crescimento, e importante na melhoria da qualidade de vida de
doentes com CD severa e Síndrome do Intestino curto seguidos no domicílio. (6)
Esta parece ter também um papel benéfico na cicatrização de fístulas no pós-
operatório que surgem a partir de anastomoses cirúrgicas, ou de fistulas mais
complicadas na D. Crohn.(6, 11) No entanto, é difícil defendê-la como terapia
23
dietética única (8), já que esta está associada a um aumento significativo dos
custos(1) e do tempo de internamento hospitalar, e a muitas complicações
relacionadas ao uso dos acessos venosos centrais, tais como a sepsia e a
trombose venosa. (11)
A APT, como terapia primária para a DII, tem sido utilizada para descanso
intestinal e na correcção de deficiências nutricionais. No entanto, a hipótese de
que o “descanso intestinal” que ocorre na APT pode permitir a cicatrização da
mucosa tem sido contestada (11) pois, o descanso total do intestino parece não
ser essencial para a cicatrização da mucosa. (6) Para além disso, as
complicações associadas à APT não justificam a sua utilização para fins de
indução de remissão na DC. (11)
Estudos que compararam a AE versus a AP, como adjuvantes
terapêuticos para a terapia com corticóides em doentes com CU, mostraram
maior frequência de infecções pós-operatórias em doentes com AP, sugerindo a
AE como mais segura e nutricionalmente efectiva em ataques de CU. (1) A AE
além de fornecer os nutrientes para a recuperação e manutenção do estado
nutricional, oferece vantagens tais como a melhoria dos mecanismos de defesa
imunológica e preservação da mucosa intestinal, previne a translocação
bacteriana (1), e pode ter um papel essencial na monitorização da doença. (10)
Apesar de frequentes, as complicações da AE, como a diarreia, a flatulência, as
cólicas, o refluxo gastroesofágico e a aspiração são menos graves do que as
causadas pela APT. (8)
O consenso parece existir sobre a via de administração da dieta, contudo,
o mesmo não ocorre em relação ao tipo de dieta a ser administrada.(1, 33) Têm
sido testados diferentes tipos de dietas – dietas elementares; dietas poliméricas;
24
e dietas peptídicas contendo péptidos de tamanhos variáveis.(8) Meta-análises
não conseguiram mostrar benefício de qualquer um dos tipos de alimentação
entérica sobre os outros. (1) No entanto, um estudo de Verma et al. descobriu que
uma dieta polimérica é tão eficaz como uma dieta elementar na indução da
remissão clínica na DC activa. Os autores concluíram que a fonte de azoto, seja
ela aminoácidos na dieta elementar ou a proteína intacta na dieta polimérica, era
improvavelmente relevante para a eficácia terapêutica da AE, quando utilizado
como terapia primária na DC aguda. (8) Do mesmo modo, os resultados de
alguns estudos causaram dúvidas sobre a teoria hipoalergénica da reduzida
carga antigénica das dietas elementares e sobre a teoria do descanso intestinal,
que poderia ser promovido pelo fornecimento de nutrientes pré-digeridos. Assim,
uma melhoria no quadro geral do estado nutricional continua, portanto, a ser uma
explicação plausível para a eficácia terapêutica da AE na DC. (8)
4.5 Suporte nutricional versus Corticóides
Na DII existe justificadamente um sentimento de mal-estar crescente entre
clínicos e doentes no que diz respeito à utilização de corticóides a longo prazo.
Este factor deve ser o catalisador para revisitar o uso da alimentação entérica
como tratamento primário na DC.(11)
Em 1984, foi relatado que a substituição da alimentação de doentes com
DC em fase activa por uma dieta entérica elementar produziu taxas de remissão
comparáveis às obtidas com corticóides, abrindo caminho para uma abordagem
alternativa ao tratamento convencional de imunomodulação farmacológica. (11)
Mais tarde, a conclusão de que os corticosteróides são mais eficazes que a AE
na indução de remissão foi confirmada, após uma análise que incluiu estudos
inéditos concordantes com as meta-análises anteriormente publicadas. (7, 11)
25
Contudo, existem várias ressalvas à aplicação destas observações e para
a renúncia da AE, tendo como pressuposto que ela é menos eficaz do que os
corticosteróides. Alguns autores alertam que as conclusões das meta-análises
favoráveis à utilização de corticoterapia apresentam viéses, e que os doentes
que completaram com sucesso a AE alcançaram taxas de remissão comparáveis
aos que receberam corticosteróides. (11) É de salientar que a taxa global de
remissão observada com AE foi de cerca de 60%, que é 20-30% superior à taxa
de resposta observada com placebo.(1) Um potencial factor confundidor das
meta-análises é a heterogeneidade das formulações estudadas. Um estudo
retrospectivo a partir de um único centro no Reino Unido, que usou uma
formulação elementar específica em 113 doentes com DC durante 10 anos,
refere uma taxa de remissão de 85% com AE, que é um valor de eficácia bem
próximo dos encontrados para a terapêutica farmacológica.
Em adição, uma comparação de eficácia isolada entre AE e
corticosteróides é insuficiente, já que os dois tratamentos possuem perfis de
segurança inteiramente contrastantes. A AE não tem efeitos negativos
conhecidos a longo prazo, considerando que a morbilidade associada com
corticóides é multifactorial.(11) Estudos demonstram que a associação simultânea
das duas terapias é mais eficaz do que a sua aplicação isolada.(1)
Apesar dos benefícios da AE no tratamento da DC, a simplicidade do
tratamento farmacológico faz com que este seja a escolha mais imediata.(6) Do
mesmo modo, embora exista um consenso geral sobre a necessidade de evitar o
uso de corticóides em crianças devido ao seu efeito sobre o crescimento, há um
irracional sentimento de complacência sobre o uso de corticosteróides em
adultos. (11) A palatabilidade da dieta entérica, a monotonia do uso de fórmulas
26
líquidas e a frequente necessidade de recorrer à entubação têm vindo a ser
apontados como factores que tornam a AE pouco atraente. (6)
5. Nutrientes imunomodeladores
Os doentes procuram terapias complementares que possam ajudar na
gestão das suas patologias, e é importante que os clínicos se encontrem
informados sobre as mesmas.(34) Embora a patogénese da DII não seja ainda
completamente conhecida, muitos suspeitam que a dieta e vários factores
dietéticos possam ter um papel na modulação do processo da doença. (34)
O tratamento da doença DII com nutrientes imunomodeladores é uma
nova modalidade terapêutica baseada nas suas propriedades farmacológicas,
que têm apresentado perspectivas interessantes e promissoras. Estes nutrientes
actuam modulando a resposta imuno-inflamatória, mantendo a integridade da
mucosa intestinal e melhorando o estado clínico e, consequentemente o estado
nutricional destes doentes. Assim, o plano nutricional tem que incluir nutrientes
para fornecer energia, reduzir a indução do estímulo do antigénio, regular a
resposta inflamatória e imunológica estimulando o trofismo da mucosa. (1)
A glutamina (1, 6, 7, 10, 11), os ácidos gordos de cadeia curta (AGCC) (1, 6, 35) ,
os ácidos gordos ómega3 (AG n-3) (1, 6, 7, 11), os pré e os probióticos,(1, 6, 13, 14, 19)
são alguns imunomodeladores a serem estudados. A glutamina parece ser o
menos promissor pelo menos até que se encontre a sua possível “dose óptima”
de utilização. Os AGCC, sobretudo o butirato que é o mais extensamente
estudado, parecem demonstrar-se benéficos na gestão da CU. Os AG n-3 têm
demonstrado um efeito positivo sobre a DII, sendo este atribuído a alterações do
perfile dos mediadores inflamatórios. Os probióticos são possivelmente aqueles
que demonstram maior relevância para a terapia clínico-nutricional a longo prazo
27
na DII. Mesmo assim e embora existam já alguns estudos sobre o tema, ainda
não existem evidências concretas do efeito destes “nutrientes
imunomodeladores” na DII.(1)
6. Crianças
A DII durante a infância ou início adolescência tem um grande impacto
sobre o estado nutricional e crescimento.(23, 36-38) A prevalência do atraso do
crescimento linear em estudos de grande dimensão tem variado entre os 36 a
88%.(6) O crescimento retardado tem etiologia multifatorial, e está relacionado
principalmente com baixa ingestão alimentar e efeitos anorexigénios devidos ao
aumento da expressão de citocinas TNF-�. (39) As alterações nos níveis da
hormona crescimento plasmáticos também têm sido implicados.(37)
Os tratamentos que visem reverter o fracasso no crescimento necessitam
de ter em conta a nutrição e também os alvos subjacentes ao processo
inflamatório. A AE está indicada como um adjuvante para corrigir e prevenir a
desnutrição, na promoção o crescimento, e como terapia principal para a
inflamação activa, especialmente na DC.(6, 37, 39, 40).
Embora existam evidências de conflito quanto à eficácia da alimentação
entérica, em comparação com corticosteróides para induzir remissão, há um
baixo nível de evidência que sugere o benefício da abordagem nutricional na
população pediátrica. (34) A resposta à alimentação entérica (AE) em crianças é
semelhante à observada em adultos, e os doentes do sexo masculino são mais
vulneráveis ao crescimento impróprio uma vez que este ocorre num período mais
tardio.(6)
Em doentes pediátricos, a infusão de soluções dietéticas durante a noite é
uma prática comum, evitando maiores interferências com as actividades
28
quotidianas. (1) A utilização da AE em crianças deve tomar em conta a sua
aceitação e tolerância uma vez que muitos produtos têm gostos desagradáveis e
são fornecidos através de sonda nasogátrica. Estes problemas são parcialmente
controlados através do uso de dietas poliméricas em detrimento de dietas
elementares, sem redução da eficácia do tratamento.(6)
Análise crítica e Considerações finais
A DC e a CU são processos inflamatórios crónicos que cursam de forma
imprevisível com períodos de actividade e remissão variáveis, sendo vários os
défices nutricionais que podem ser experimentados, quer ao nível dos macro
como dos micronutrientes.(7, 9, 34)
A DII tem impacto sobre o estado nutricional dos doentes e este, por sua
vez, interfere com a evolução da própria doença, afectando a imunidade humoral
e celular, o crescimento corporal linear e a maturação sexual em crianças, a
cicatrização de fístulas, o balanço azotado e a descalcificação óssea. Além
disso, os défices nutricionais reduzem as tolerâncias às perdas sanguíneas,
gerando maiores taxas de morbilidade no pós-operatório, o que pode causar
recuperação funcional mais lenta. Sabe-se também que complicações, como a
sepsis e perda de massa muscular, afectam sobretudo os doentes severamente
desnutridos.(6)
Neste contexto, a atenção às questões nutricionais deve ser considerada
fundamental. A avaliação do estado nutricional requer a combinação de vários
indicadores - físicos, laboratoriais, história de peso, ingestão alimentar,
sintomatologia e actividade da doença.(7) Os objectivos da terapia nutricional
29
nestes doentes vão depender do tipo, da actividade da doença, do estado
nutricional, da história clínica intestinal e da idade.
A DC e a CU apresentam progressão e desenvolvimento de défices
nutricionais diferentes. De facto, na DC os défices nutricionais desenvolvem-se
de forma lenta e progressiva, mesmo durante as fases remissivas da doença,
enquanto que na CU o estado nutricional se mantém frequentemente preservado
nas fases inactivas da doença, precipitando-se drasticamente durante as fases
de actividade da mesma.(11)
As terapêuticas farmacológicas usadas na DII podem ter impacto na
biodisponibilidade de alguns nutrientes sendo necessário ter este factor em linha
de conta. Algumas das patologias associadas à DII podem ver-se melhoradas
com a associação da suplementação com nutrientes específicos, que pode ser
também usada como medida profilática.
São muitos os factores envolvidos na malnutrição destes doentes. A
localização da doença, pode ser factor determinante no tipo e gravidade das
deficiências nutricionais encontradas. Talvez, por isso, doentes com DC cuja
inflamação se localiza a nível do intestino delgado tenham maior probabilidade
de sofrer de défices nutricionais, do que aqueles cuja inflamação esteja
confinada ao cólon, o que acontece na CU.(7) De facto, este tipo de factores
transformam a DII numa doença que não pode ser encarada de forma
transversal necessitando de ser avaliada individualmente.
Existem algumas considerações dietéticas que devem ser feitas, embora
continuem a gerar controvérsia, e existam nesta área estudos com resultados
contraditórios. As dietas ricas em fibra associam-se a taxas de internamento
hospitalares e de obstrução intestinal mais baixas, no entanto, em casos de
30
estenose ou obstrução do intestino, em surtos de diarreia, ou na presença de co-
existência de síndrome do intestino irritável, é aconselhada uma dieta com baixo
teor em resíduos.(8, 11) A lactose parece apresentar uma prevalência de
intolerância aumentada na DC localizada no intestino delgado, principalmente
durante as fases activas da doença.(1, 11) Os doentes com DII devem também
evitar alimentos e situações propícias às toxinfecções alimentares, uma vez que
a diarreia infecciosa é um potente indutor das recidivas da doença.(11)
A manutenção das fases remissivas revela-se de extrema importância
para os doentes com DII uma vez que representa melhoria na sua qualidade de
vida.(14) A maioria dos doentes em remissão deve ser incentivada a adoptar uma
alimentação liberalizada, podendo ser necessárias algumas restrições no caso
de intolerâncias individuais, de forma a auxiliar a diminuição da ocorrência de
flatulência, de diarreia e de estenose intestinal, desde que haja cooperação do
doente.(1, 6) Embora o benefício do uso de dietas de exclusão permaneça ainda
não totalmente esclarecido ele é recomendado na literatura, já que tem
demonstrado eficácia na manutenção do período de remissão na DC, sendo
especialmente recomendado nos doentes com DII em constante actividade. (1)
Em fases agudas da DII a terapia nutricional especializada está indicada.
A via de eleição deve ser a oral, contudo manter uma oferta calórico-protéica
adequada durante a fase aguda da doença por esta via é difícil, devido ao
quadro de anorexia e sintomas desagradáveis experimentados por estes doentes
após a ingestão dos alimentos, entre outros factores. No caso da ingestão do
doente se demonstrar insuficiente para atingir as suas necessidades nutricionais
diárias deve ser completada com suplementação, ou poderá ser introduzido
31
suporte nutricional entérico ou parentérico. A DC e a CU exibem respostas
diferentes ao suporte nutricional.
O suporte nutricional intensivo pode ser indicado como terapia primária da
inflamação intestinal aguda na DC mas não na CU, ou como adjuvante na
indução e manutenção da remissão da doença. Embora a eficácia da APT seja
comparável à da AE, devido às suas complicações e custos associados deve ser
reservada apenas para doentes em que a AE esteja contra-indicada ou para
situações clínicas específicas. No que diz respeito ao tipo de AE a ser utilizada,
os estudos demonstram que tanto as dietas elementares como as poliméricas
são eficazes na indução de remissão a curto-prazo e na melhoria do estado
nutricional dos doentes, não existindo diferenças significativas entre elas.(6)
Como consequência dos seus efeitos secundários, têm sido debatidas
alternativas ao uso da terapêutica farmacológica a longo-prazo com corticóides.
Embora a eficácia deste tratamento se tenha demonstrado superior à da AE na
diminuição da actividade da doença em DC, na AE não são conhecidas
complicações a longo-prazo. Este factor, mais do que a própria eficácia do
tratamento deve ser motivo para se ponderar o seu uso como tratamento
primário na DC, de forma a evitar o uso de corticóides, tal como acontece no
tratamento de crianças com DII. Em adição, Lindor et al mostrou que a
associação destas duas terapias é mais eficaz que a sua aplicação isolada,
podendo acrescentar-se que a AE pode assim, ter um efeito atenuante dos
efeitos catabólicos dos corticóides.
Os nutrientes com efeitos imunomodeladores são tema actual e gerador
de controvérsia, mais estudos são ainda necessários para que se possam
afirmar como mais-valias no tratamento da DII.
32
Sendo assim, podemos concluir que cada um dos pontos abordados neste
trabalho poderia constituir, por si só um tema para ser trabalhado
individualmente. A nutrição é de facto, e mais uma vez, um tema de extrema
relevância na gestão de uma patologia, neste caso da DII. De facto, embora a
etiologia da DII não seja ainda totalmente conhecida, sabe-se que está
associada a diversas deficiências nutricionais. Os profissionais de saúde devem
estar atentos para que estas possam ser detectadas e tratadas o mais
precocemente possível. A DII não deve ser encarada de forma transversal,
devendo existir sempre uma avaliação caso-a-caso. Se assim for, a nutrição
poderá ser de importante relevância na recuperação e/ou manutenção do estado
nutricional do doente, tal como na gestão da actividade da doença e na melhoria
da qualidade de vida.
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