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ELAINE DE SOUZA OLIVEIRA TERCEIRIZAÇÃO SOB A ÓTICA DO SINDICATO: O CASO DO SINDICATO DOS TRABALHADORES NAS INDÚSTRIAS E EMPRESAS PETROQUÍMICAS, QUÍMICAS E AFINS DA BAHIA (1990-2005) Salvador 2006

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ELAINE DE SOUZA OLIVEIRA

TERCEIRIZAÇÃO SOB A ÓTICA DO SINDICATO: O CASO DO SINDICATO DOS TRABALHADORES NAS INDÚSTRIAS E EMPRESAS PETROQUÍMICAS,

QUÍMICAS E AFINS DA BAHIA (1990-2005)

Salvador 2006

ELAINE DE SOUZA OLIVEIRA

TERCEIRIZAÇÃO SOB A ÓTICA DO SINDICATO: O CASO DO SINDICATO DOS TRABALHADORES NAS INDÚSTRIAS E EMPRESAS PETROQUÍMICAS,

QUÍMICAS E AFINS DA BAHIA (1990-2005)

Monografia apresentada no curso de graduação de Ciências Econômicas da Universidade Federal da Bahia como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Ciências Econômicas. Orientador: Prof. Dr. Wilson Ferreira Menezes

Salvador 2006

Elaine de Souza Oliveira Terceirização Sob a Ótica do Sindicato: O Caso do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias e Empresas Petroquímicas, Químicas e Afins da Bahia (1990-2005). Aprovada em dezembro de 2006. Orientador: ___________________________________ Prof. Dr. Wilson Ferreira Menezes

_______________________________________________ Luiz Chateaubriand Cavalcanti dos Santos

Técnico da Pesquisa de Emprego e Desemprego Da RMS e Mestre em Sociologia pela UFBA

_______________________________________________ Leormínio Moreira Bispo Filho

Técnico da Pesquisa de Emprego e Desemprego da RMS e Mestre em Economia pelo CME - UFBA

DEDICATÓRIA

Ao meu amado esposo, Ney, pelo apoio, cumplicidade e amor que sempre me encorajaram a

prosseguir nessa jornada e por demonstrar que mesmo os momentos mais difíceis podem ser

superados com serenidade e bom humor.

Aos meus pais, Edenilza e Ubirajara, por serem o que são, pelo carinho e amor sempre

dedicados.

Ao meu irmão Júnior pela amizade e companheirismo e ao meu irmão Milton que, apesar da

distância, esta sempre presente em meu coração.

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a Deus por iluminar meus caminhos.

Em segundo lugar, a todos os professores da Faculdade de Economia/UFBA. Em particular,

ao professor Luiz Filgueiras, por quem tenho grande admiração e por ter estado presente na

etapa inicial de orientação deste trabalho, com comentários sempre pertinentes deu-me idéias

que me fizeram delinear a temática. Ao professor Lielson Coelho que ao ministrar as

disciplinas de TPE e MONO contribuiu de forma pontual para a entrega deste trabalho. E, em

especial, ao professor Wilson Menezes que, quando consultado sobre a possibilidade de

prosseguir com a orientação deste trabalho aceitou prontamente dando-me estímulo e

liberdade de ação.

Em terceiro lugar, ao pessoal do Memorial do Sindicato dos Trabalhadores do Ramo Químico

e Petroleiro da Bahia que me possibilitou o acesso ao acervo e aos periódicos da entidade,

para que eu pudesse fazer o levantamento de dados para minha pesquisa.

Em quarto lugar, a todos os colegas da Faculdade de Economia que de forma direta ou

indireta estiveram presentes ao longo de minha graduação. A todos os funcionários da

faculdade e, em particular, aos atendentes da biblioteca que estão sempre dispostos a ajudar

no que for preciso.

Por fim, sou extremamente grata a todas as pessoas queridas de minha família, aos quais já

citei na dedicatória, que me ajudaram a concluir esta etapa de minha vida.

“Os sindicatos constituem um momento fundamental de organização da classe operária

contra as usurpações do capital, na medida em que eles representam a possibilidade de

garantir o equilíbrio do antagonismo entre a classe patronal e a classe trabalhadora. Mas a

luta sindical é limitada na medida em que é uma luta constante pela melhoria salarial e não

diretamente contra o sistema capitalista que gera o sistema de salários. A luta sindical é uma

luta contra os efeitos do capitalismo e não contra as suas causas.”

Ricardo Antunes.

O que é sindicalismo, 1984.

RESUMO

A presente monografia tem como objetivo analisar o debate e a ação sindical em torno do processo de terceirização na indústria petroquímica baiana, no contexto de amplas transformações no mundo do trabalho, decorrentes do processo de globalização e de reestruturação produtiva que se desenvolveram no país sob o prisma do ideário neoliberal. Apresenta os principais dados de levantamento feito nos boletins do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias e Empresas Petroquímicas, Químicas, Plásticas e Afins da Bahia – SINDIQUIMICA contemplando as mudanças no tempo do pensamento sindical a respeito da terceirização; os impasses, desafios e práticas que o movimento sindical tem enfrentado em função do avanço da terceirização e, por último, analiso a experiência de unificação deste Sindicato com o Sindicato Único dos Petroleiros o que gerou a formação do Sindicato dos Trabalhadores do Ramo Químico e Petroleiro da Bahia. PALAVRAS-CHAVE: Neoliberalismo, reestruturação produtiva e globalização; Flexibilidade; Industria Petroquímica – Bahia; Terceirização; Sindicatos.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 9 2 BREVE PANORAMA DA DÉCADA DE 90 13 2.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE O FORDISMO E A ASCENÇÃO DO TOYOTISMO 13 2.2 EVOLUÇÃO DOS PROCESSOS DE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA, GLOBALIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO 17 2.3 REFLEXOS DESTES PROCESSOS NO BRASIL 20 2.3.1 Ideário Neoliberal, Abertura Comercial e Especificidades da Reestruturação Produtiva no Brasil 20 2.3.2 Flexibilização do Mercado de Trabalho no Brasil 24 3 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E TERCEIRIZAÇÃO NA INDUSTRIA PETROQUIMICA BAIANA 28 3.1 CONCEITO E DIFERENTES ABORDAGENS SOBRE A TERCEIRIZAÇÃO 28 3.2 TRAJETÓRIA DA PETROQUIMICA NA DÉCADA DE 90: TERCEIRIZAÇÃO E DESEMPREGO 36 3.2.1 A indústria petroquímica na Bahia 36 3.2.2 A terceirização na indústria petroquímica Baiana: flexibilização e desemprego 39 4 DINAMICA SINDICAL DOS QUIMICOS/PETROQUIMICOS NA RMS FACE AO PROCESSO DE TERCEIRIZAÇÃO 41 4.1 BREVE ANÁLISE DO DESENVOLVIMENTO E CRISE DO SINDICALISMO BRASILEIRO 41 4.2 DESAFIOS DA DÉCADA DE 90: O DEBATE E A AÇÃO SINDICAL EM TORNO DA TERCEIRIZAÇÃO 45 4.2.1 Análise do posicionamento sindical face à terceirização 45 4.2.2 Reflexões sobre a situação atual: a experiência de unificação 53 5 CONCLUSÃO 56 REFERENCIAS 58

1 INTRODUÇÃO

A realidade atual do mundo do trabalho apresenta mudanças significativas na relação entre

empresas e trabalhadores, reflexo de uma conjuntura sócio-econômica marcada pela

reestruturação produtiva, avanço de políticas neoliberais e abertura da economia às

importações. Tais fatos geraram o acirramento da competitividade e a flexibilização da

produção e do emprego, produzindo novos desafios a trabalhadores, empregadores e

sindicatos.

Assim, ao longo das duas últimas décadas, assistimos a um processo de mudanças sucessivas

no interior das empresas relacionadas à adoção de inovações tecnológicas e organizacionais.

Estas mudanças nas relações produtivas estão dando origem a um novo trabalhador e, por

isso, é preciso repensar o sindicalismo e as relações capital-trabalho.

O início da reestruturação da indústria, nos anos 80, ocorreu em um contexto de crise

econômica marcado pela recessão e pelo crescimento do desemprego e, ao mesmo tempo, de

redemocratização política e fortalecimento do movimento sindical no país, na contramão das

tendências de enfraquecimento e crise do sindicalismo internacional. Nos anos 90, a adoção

de políticas neoliberais, que promoveram a abertura comercial e a internacionalização da

economia, aprofundou o processo de reestruturação produtiva no país com a introdução de

novos métodos de gestão da força de trabalho. Tais aspectos acabaram por ampliar a

fragmentação dos trabalhadores e tiveram forte impacto sobre as organizações sindicais.

No setor mais dinâmico da economia regional, a indústria petroquímica, as empresas

passaram, desde o final da década de 80, por uma intensa reestruturação. Dentro deste

contexto, os trabalhadores presenciaram, durante o decorrer da década de 90, uma acelerada

redução nos postos de trabalho fruto tanto de inovações tecnológicas e organizacionais como

da política neoliberal implementada pelo Governo Collor e aprofundada no Governo FHC. A

política desses dois governos preconizava a modernização da indústria nacional para atender a

competitividade ocasionada pela abertura comercial da economia.

Dentro deste quadro de reestruturação produtiva e de implementação de novas formas de

gestão da força de trabalho surge o debate sobre a terceirização, como prática amplamente

difundida no cenário produtivo do país, e suas implicações para o movimento sindical. No

âmbito regional, este processo assumiu grande importância no modelo de ajuste adotado pelas

empresas químicas/petroquímicas da RMS.

A terceirização faz parte de um conjunto de mudanças introduzidas no mundo do trabalho. No

Brasil esta prática difunde-se, a partir dos anos 90, com o objetivo de, fundamentalmente,

reduzir custos. Significa que, ao precarizar o trabalho, ao promover uma piora nos salários,

nos benefícios, nas condições de trabalho e intensificando e prolongando a jornada, a

terceirização fragilizou a organização coletiva ao dividir e diferenciar os trabalhadores,

dificultando o desenvolvimento de uma identidade de interesses comuns. Por outro lado, a

terceirização também significou uma forma das empresas tornarem-se mais enxutas para

poderem competir dentro de uma economia mais globalizada e competitiva.

Dentro desta perspectiva, o objetivo desta monografia é discutir os impactos que o processo

de terceirização na indústria petroquímica baiana, no decorrer da década de 90, tiveram sobre

os trabalhadores e sobre a atuação do sindicato que os representa, enfocando principalmente o

debate e a ação sindical em torno deste processo, no contexto destas amplas transformações

no mundo do trabalho.

O trabalho busca avaliar como o sindicato1 que representa os trabalhadores do ramo químico e

petroquímico baiano posicionou-se ao longo da década em relação a este processo que tanto

se difundiu na indústria petroquímica baiana e que ocasionou o desemprego de muitos

trabalhadores. A hipótese a ser trabalhada nesta pesquisa é que o sindicato, do ponto de vista

do posicionamento em relação à terceirização, não pode colocar-se inteiramente contra o

processo, mas sim buscar estratégias para sobreviver dentro da nova dinâmica do processo

produtivo. Pois, ser contra a terceirização é negar a tendência mundial de gestão que envolve

qualidade e capacidade de competir no mercado internacional.

É certo que o corte de trabalhadores efetivos ocorrido na petroquímica baiana ao longo da

década de 1990 resulta tanto da terceirização como de outros fatores de ordem econômica, a

exemplo da conjuntura do mercado nacional e internacional para os produtos petroquímicos e

da conjuntura política do país. No entanto, é consenso entre muitos autores (Rezende (1997);

Giosa (1997); Amaro Neto (1995), Borges e Druck (1993); Druck (1999b); Faria (1994), entre

1 No terceiro capítulo deste trabalho será explicada a trajetória deste sindicato na década de 90 até o processo de unificação com o Sindicato Único dos Petroleiros

outros) que, dentro do processo de reestruturação produtiva, a terceirização foi a prática que

mais se difundiu nas empresas do país e, na Bahia, o setor mais dinâmico e de ponta da

economia baiana – o Pólo Petroquímico de Camaçarí – é quem difundiu de forma rápida e

muito intensa as transformações organizacionais.

Ou seja, tanto em função da importância do setor de atividade em termos econômicos para a

região e pelo volume de empregos, em que está mais avançado o processo de reestruturação

produtiva e terceirização, quanto pelo grau de organização do sindicato, é que foi escolhido

para a pesquisa o Ramo Químico e Petroquímico da indústria baiana.

A fim de atender os objetivos propostos, a metodologia contemplou as seguintes etapas:

1) Levantamento e fichamento da bibliografia existente;

2) Análise critica da bibliografia com o objetivo de sistematizar o pensamento dos diversos

autores que trabalham com tal temática;

3) Coleta de dados: visitas à sede sindical com o objetivo de ler e extrair informações dos

boletins, divulgados pelo sindicato, a respeito dos impactos que o processo de terceirização

causou aos trabalhadores e ao movimento sindical, com enfoque ao debate em torno do tema.

A pesquisa das matérias foi feita nos arquivos do Memorial do Sindicato, na Rua Marujos do

Brasil, 20 – Nazaré, Salvador/Ba. A periodicidade dos boletins é semanal e a pesquisa

contemplou desde o ano de 1990, quando os efeitos da terceirização começam a ser discutidos

pelo sindicato, até o ano de 2005, justamente para detectar a mudança de posicionamento em

relação ao tema que ocorreu durante este período. Cabe especificar que no período de 1990-

1996 os boletins do sindicato entitulam-se GRAVE, de 1997-2004 entitulam-se Boletim

Unificado dos Químicos e Petroleiros e as edições a partir de 2005 entitulam-se NA BASE. 2

4) Padronização dos dados coletados com a organização das opiniões e argumentos

encontrados nos periódicos do sindicato.

2 No capitulo IV será discutido o porquê desta divisão.

O debate sobre dinâmica sindical e a prática da terceirização remete-nos à discursão sobre o

mundo do trabalho num contexto de reestruturação produtiva, globalização e vigência de

políticas neoliberais que, no Brasil, se consolidaram no plano de estabilização de Fernando

Henrique Cardoso. Neste sentido, a monografia está estruturada em cinco capítulos que

constam desta introdução, três capítulos de desenvolvimento e da conclusão. Neste primeiro

capítulo faz-se uma apresentação do trabalho, da metodologia utilizada e algumas

considerações gerais sobre o tema.

No segundo capítulo, faz-se uma breve análise do panorama internacional com considerações

a respeito do surgimento dos processos de reestruturação produtiva, globalização e

neoliberalismo. Por conseguinte, são feitas algumas considerações a respeito dos reflexos que

estes processos tiveram no Brasil na década de 1990, em particular sobre os trabalhadores e o

mercado de trabalho.

No terceiro capítulo, discorre-se sobre a reestruturação produtiva no âmbito da indústria

petroquímica baiana e, em particular, a questão da terceirização por tratar-se do processo que

mais se difundiu nas empresas do setor. Serão levantados o conceito e algumas abordagens da

terceirização, bem como os motivos pelos quais as empresas implementam esta prática,

fazendo uma análise de como se deu este processo na petroquímica e enfatizando suas

principais particularidades e características.

No quarto capítulo, será feita uma breve análise do desenvolvimento e crise do sindicalismo

brasileiro para posteriormente tratar da dinâmica sindical na petroquímica baiana em face do

processo de terceirização. Será apresentado, com base na pesquisa realizada nos periódicos do

sindicato, o posicionamento sindical com relação ao processo de terceirização bem como as

alternativas de combate do sindicato e algumas perspectivas. Neste sentido, o presente

capítulo irá contemplar as mudanças no tempo do pensamento sindical a respeito da

terceirização; os impasses, desafios e práticas que o movimento sindical tem enfrentado em

função do avanço da terceirização e, por último, será analisada a experiência de unificação do

Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias e Empresas Petroquímicas, Químicas, Plásticas e

Afins da Bahia – SINDIQUIMICA.

Por fim, o último capítulo do trabalho refere-se à conclusão onde será abordado o desfecho do

tema buscando-se delinear os principais pontos desenvolvidos ao longo do trabalho.

2 BREVE PANORAMA DA DÉCADA DE 90: CONSIDERAÇÕES PONTUAIS

SOBRE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA, NEOLIBERALISMO E

GLOBALIZAÇÃO.

Neste capítulo busca-se analisar, brevemente, o panorama internacional desde a crise do

fordismo até a ascensão do Toyotismo, fazendo considerações a respeito do surgimento dos

processos de reestruturação produtiva, globalização e neoliberalismo que, no plano mundial,

remodelaram o padrão de desenvolvimento capitalista. Por conseguinte, são feitas algumas

considerações a respeito dos reflexos que estes processos tiveram no Brasil na década de

1990, em particular sobre os trabalhadores e o mercado de trabalho.

2.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE O FORDISMO E A ASCENSÃO DO TOYOTISMO.

Neste fim do século XX, o mundo assistiu a uma verdadeira revolução na organização da

produção. Nos últimos vinte anos, o sistema capitalista caminhou para uma nova dinâmica de

acumulação que se processou em âmbito mundial e que acabou por sobrepor o padrão de

desenvolvimento capitalista que imperou durante o pós-guerra.

As profundas transformações assistidas no interior do sistema capitalista, no final do século

XX, processaram-se tanto no âmbito econômico e social quanto no político, o que colocou em

questão as formas de organização das sociedades contemporâneas (FILGUEIRAS, 2003).

Estas transformações estão ancoradas no esgotamento de uma determinada forma de

organização da produção.

O padrão de desenvolvimento e acumulação capitalista que prevaleceu durante o Pós-Guerra,

pautado em processos específicos de organização e de gestão, é conhecido na literatura como

Fordismo. Este padrão, que se expandiu a partir da indústria automobilista dos EUA e

assumiu diferentes formas nacionais, estava pautado num modelo que se apoiava na base

técnica da Segunda Revolução Industrial e em práticas tayloristas de organização do trabalho.

Segundo Ferreira (1993), o termo fordismo possui diferentes interpretações por parte dos

diversos autores que trabalham com tal temática, no entanto, o conceito de fordismo tem dois

níveis de abrangência. Num nível mais global, ainda de acordo com o autor, o fordismo

significou um modo de desenvolvimento que marcou uma determinada fase do capitalismo e,

num nível menos global, compreende um princípio geral de organização da produção com

destaque para a forma de organização do trabalho, paradigma tecnológico e estilo de gestão.

Com respeito aos princípios constitutivos do paradigma fordista, quatro itens podem ser

destacados:

a) racionalização taylorista do trabalho: profunda divisão – tanto horizontal (parcelamento das

tarefas) quanto vertical (separação entre concepção e execução) – e especialização do

trabalho;

b) desenvolvimento da mecanização através de equipamentos altamente especializados;

c) produção em massa de bens com elevado grau de padronização;

d) a norma fordista de salários: salários relativamente elevados e crescentes – incorporando

ganhos de produtividade – para compensar o tipo de trabalho predominante. (FERREIRA,

1993, p.3).

Dentro de uma outra perspectiva, segundo Filgueiras (1997), o modelo fordista também pode

ser considerado como um modo de organização marcado pela racionalidade através da

imposição de sua disciplina sobre o trabalho e os trabalhadores. É neste sentido que Harvey

(1992) discute que esse modo de organização cria “um novo tipo de homem e um novo tipo

de trabalhador”, em virtude dos métodos de trabalho serem inseparáveis de um modo

específico de viver e de pensar a vida3. Conforme afirma Filgueiras, o fordismo compreende:

Uma organização do trabalho que transcende os limites da fábrica e acaba por se constituir num modo de vida, implicando a construção de um “novo homem” adaptado às exigências e à disciplina do sistema fabril. (FILGUEIRAS, 1997, p.16)

Desta forma, de acordo com Filgueiras (2003), esse modelo de desenvolvimento do

capitalismo ia além de um modo de organização da produção, pois, se por um lado, houve o

aumento da produtividade, por outro os trabalhadores têm o seu poder aquisitivo elevado,

portanto, há uma melhora nas condições de vida. Textualmente:

No plano político-social, essas novas circunstâncias se expressaram através de um pacto social entre capital e trabalho, dirigidos pelos partidos social-democratas de base operária, que resultou na criação do Welfare-state. Este pacto, impulsionado,

3 Harvey (1996) ao citar o líder comunista italiano Antonio Gramsci.

decisivamente, pelo crescimento do movimento operário e pela existência da guerra fria e ameaça do comunismo implicou, pelo lado dos capitalistas, o reconhecimento dos sindicatos como legítimos representantes da classe trabalhadora e elemento essencial do processo de barganha salarial (...) (Ibid, p. 50).

Constitui-se, assim, num modelo de desenvolvimento legitimado pela sociedade e que num

determinado momento reconheceu os sindicatos enquanto representantes da classe

trabalhadora. De fato:

O acúmulo de trabalhadores em fábricas de larga escala sempre trazia, no entanto, a ameaça de uma organização trabalhista mais forte e do aumento do poder da classe trabalhadora... As corporações aceitaram a contragosto o poder sindical, particularmente quando os sindicatos procuravam controlar seus membros e colaborar com a administração em planos de produtividade em troca de ganhos de salário que estimulassem a demanda efetiva da maneira originalmente concebida por Ford. (HARVEY, 1992, p. 129)

Pelo exposto, configura-se que o Estado de Bem-Estar foi legitimado por um pacto social

entre trabalhadores organizados e patrões, em que os primeiros abdicaram de suas

reivindicações políticas mais radicais, e os segundos de parte de seus lucros, favorecendo,

assim, alguma distribuição de renda e uma cobertura social às classes trabalhadoras.

Este modelo de acumulação caracterizado pelas práticas fordistas começou a entrar em crise

entre o final da década de 60 e início da década de 70, na medida em que a sua organização

não consegue conter as contradições existentes dentro do próprio capitalismo (HARVEY,

op.cit., p.141). De acordo com Menezes (2003), a organização fordista encontrou seu

esgotamento na confluência de três fatores: na desaceleração dos ganhos de produtividade da

indústria; no esgotamento das possibilidades de consumo e no desenvolvimento da economia

dos serviços. Ou seja, a partir da década de 70, é observado um lento crescimento da

produtividade com redução do crescimento de mercado acompanhado do envelhecimento do

paradigma tecnológico e padrão de gestão. (HARVEY, op. cit.,132)

Nesse período também se evidencia o acirramento da competição internacional, com o

desenvolvimento da indústria de países como Japão e Alemanha, e os choques do petróleo

(1973 e 1979). Segue-se também a crise fiscal do Estado de Bem-Estar e a desvalorização do

dólar em virtude da quebra do tratado firmado em Bretton Woods4.

4 Conferência Monetária e Financeira das Nações Unidas, realizada em 1944, em Bretton Woods, para planejar a estabilização da economia internacional e das moedas nacionais prejudicadas pela Segunda Guerra mundial, na

Assim, a crise do modelo fordista de acumulação configurou-se num quadro mais complexo

que exprimia uma crise estrutural da acumulação capitalista. É dentro desta perspectiva que

Ferreira (1993) considera como primeiro ponto a ser destacado em relação à crise é que ela

deve ser considerada como uma crise estrutural, na medida em que esta foi uma crise

profunda, que afetou o regime de acumulação, marcando, desta forma, uma profunda ruptura

do sistema vigente.

Nesse sentido, o cerne da crise fordista deveu-se a fatores tanto de limitação técnica, pois se

revelava numa excessiva rigidez do sistema frente às necessidades da conjuntura econômica

que exige soluções dotadas de maior flexibilidade, quanto de ordem sócio-econômica em

virtude da crescente desmotivação dos operários (altos índices de abandono do trabalho, de

rotatividade e absenteísmo). (Ibid., p.9)

Dentro de todo este cenário, de mudanças na acumulação no âmbito estrutural, foi preciso

reagir e implementar mudanças que preservassem o nível de acumulação de capital. As

respostas começam a surgir. Na tentativa de superar esta crise, abandona-se a rigidez adotada

na era industrial fordista para modelos mais flexíveis.

As corporações começaram a adotar processos de racionalização, reestruturação e intensificação no controle do trabalho. Isto significa mudança tecnológica, automação, a busca de novas linhas de produto e nichos de mercado, a dispersão geográfica para zonas de controle mais fácil, as fusões e medidas para acelerar o tempo de giro do capital. (HARVEY, op. cit., p.301)

De acordo com Menezes (2003), todo este ambiente econômico e social exigiram

transformações que acabaram por imprimir um novo paradigma social e tecnológico. Sendo

assim, num contexto de acirramento competitivo entre as nações, tornou-se patente a

utilização de novos padrões de gestão, com práticas que incentivaram a desregulamentação

dos direitos trabalhistas, a flexibilização dos contratos de trabalho e a aceleração das variadas

práticas de subcontratação e a terceirização, o que não favoreceu de forma alguma a classe

operária.

Na visão de Harvey, diante deste contexto, passam a existir os trabalhadores centrais, que são

empregados em tempo integral, que tem uma maior segurança e estabilidade; e a periferia,

qual ficou estabelecido que o dólar passaria a ser a principal moeda de reserva mundial, abandonando-se o padrão-ouro. (Sandroni, 1999, p.120)

que se divide em duas categorias: a primeira formada por trabalhadores integrais com

habilidades facilmente encontradas no mercado, por exemplo, funções rotineiras. E a segunda,

constituída por trabalhadores flexíveis (parciais, temporários e terceirizados). “A atual

tendência do mercado é reduzir o número de trabalhadores centrais e empregar cada vez mais

uma força de trabalho que entra facilmente e é demitida sem custos.” (HARVEY, 1992, p.

144).

Desta forma, o capitalismo caminhou para uma nova forma do processo de acumulação,

adotando práticas e modos de gestão que tendem a flexibilizar ao máximo a produção e o

mundo do trabalho. São adotados métodos toyotistas de gestão5 que se apóiam na

flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de

consumo.

Segundo Menezes (2003) os princípios orientadores do toyotismo podem ser sintetizados em

cinco tópicos:

1 – Integração entre pesquisa, desenvolvimento e industrialização; 2 – Integração das funções

de marketing, concepção, fabricação e controle; 3 – Aparecimento da empresa rede,

assegurando uma melhoria nas relações entre empresas principais e seus respectivos agentes

fornecedores; 4 – Produtividade organizacional da empresa, mais precisamente as funções de

fabricação e de montagem dos produtos, que procuram reagir da melhor maneira possível às

variações da demanda; 5 – Crescimento das qualificações e da elevação do estímulo dos

trabalhadores.

2.2 EVOLUÇÃO DOS PROCESSOS DE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA,

GLOBALIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO NO PLANO MUNDIAL.

Essas transformações, explicitadas na seção anterior, estão aliadas a novos processos que

acabaram por anunciar um outro momento da acumulação capitalista e, de acordo com

Filgueiras (2003), podem ser sintetizados na caracterização de três fenômenos: reestruturação

produtiva, globalização e neoliberalismo.

5 Denominado de “modelo japonês” por Hirata (1993)

Portanto, é dentro deste contexto que surgem os conceitos de reestruturação produtiva (na

década de 70) e globalização (na década de 80). Ao lado destas transformações, ao

considerar-se também uma redefinição do papel do Estado, surge o neoliberalismo como

legitimador destes processos no plano político ideológico. Filgueiras (2003), ancorado na

concepção de Harvey (1992), afirma que esses três fenômenos possuem um denominador

comum, resumido na idéia de acumulação flexível, que pode ser alcançada de forma com que

o capital tenha total liberdade de movimento, contratação e exploração da força de trabalho.

A reestruturação produtiva, de um lado, correspondeu à reorganização dos setores industriais

e implementação de novas tecnologias como, por exemplo, setores de ponta alavancados pela

informática, química fina, biotecnologia, dentre outros. De outro lado, está associada a novos

modos de gestão e organização do trabalho (“o modelo japonês”) tais como a subcontratação,

automatização dos processos, especialização nas tarefas e principalmente terceirização das

atividades. Esse processo acaba por individualizar as relações capital/trabalho, com o

conseqüente enfraquecimento dos sindicatos. (FILGUEIRAS, 2003, p.53).

De acordo com Druck (1999a, p.39), em resposta a crise do fordismo, a difusão do modelo

japonês6 no ocidente assume lugar central. No entanto, este é adaptado às realidades locais e

nacionais, levando em conta os fatores econômicos, culturais e políticos. O genuíno modelo

japonês é composto por quatro grandes dimensões: 1 – sistema de emprego adotado pelas

grandes empresas (emprego vitalício, promoção por tempo de serviço, admissão do

trabalhador para a empresa e não para um determinado posto de trabalho); 2 – sistemas de

organização e gestão do trabalho; 3 – sistemas de representação sindical e 4 – sistemas de

relações inter-empresas.

Para Zarafian (1993, p.26) “o modelo japonês é subentendido pela busca gerencial de maior

eficiência do aparelho industrial em um contexto de produção flexível, com séries curtas e

crescente diversificação”.

No que se refere à globalização, esta tem uma característica essencial que é a de proporcionar

a total mobilidade de recursos com a ampliação e maior articulação entre os mercados. Sendo

assim, a globalização também se caracteriza por ser um dos aspectos da acumulação flexível

6 Em Hirata (1993) são discutidos com profundidade os aspetos conceituais a respeito das formas de gestão de trabalho que compõem o modelo japonês.

na medida em que, segundo Druck (1997), constata-se uma radicalização dos processos de

concentração e descentralização de capitais, assim como se difundem micro e pequenas

empresas, com a formação de redes de subcontratação/terceirização.

É nesta medida que o cenário atual foi sendo modelado pelo avanço da globalização, na esfera

econômica, financeira ou comercial, defendida pelos organismos internacionais (FMI, Banco

Mundial e Organização Mundial do Comércio) e com base na ideologia neoliberal. “O projeto

neoliberal assume nova direção e consegue articular os países do centro redefinindo as suas

relações com os países periféricos. Através das principais instituições financeiras

internacionais – FMI e Banco Mundial”. (DRUCK, 1999b, p. 27)

Desta forma, a globalização trata-se de um processo comandado pelas grandes corporações

transnacionais, que procuram abrir novos mercados para sua produção. Ao mesmo tempo,

estas corporações buscam realizar estes objetivos reduzindo seus custos pelo aumento da

exploração dos trabalhadores, via redução de salários, aumento das jornadas de trabalho e

eliminação dos direitos dos trabalhadores, atacando as conquistas sindicais e trabalhistas

obtidas na era de ouro do sistema.

É justamente dentro desta perspectiva que Ianni (1998) constata que a globalização do

capitalismo implica sempre, e necessariamente, em desenvolvimento desigual. Segundo o

autor, a globalização tem representado o aumento do desemprego, a precarização dos

contratos de trabalho, a informalidade e crescentes ataques aos direitos de organização

sindical.

Dentro de todo esse contexto temos, na esfera política e econômica, o neoliberalismo

constituindo-se no plano ideológico como legitimador dos passos do capital em direção à

maior subordinação das relações de trabalho. Nessa perspectiva, Druck (1997) sustenta que:

Se esses dois movimentos estruturais – a globalização e a reestruturação produtiva – estabelecem as condições materiais e objetivas dessa fase do capitalismo neste final de século, o neoliberalismo oferece as condições subjetivas necessárias para realizar de forma plena o entrelaçamento e articulação entre esses três movimentos. (DRUCK, 1997, p. 23)

A proliferação da ideologia neoliberal questionou o tamanho das estruturas estatais e o caráter

de intervencionismo do Estado na sociedade. Esse ideário começou a expandir na segunda

metade da década de 70, com a crise do modelo de acumulação anteriormente citado, tornou-

se hegemônico na década de 80 e inspirou vários governos na década de 90. Foi

implementado inicialmente pela Inglaterra (Governo Thatcher – 1979), sendo logo em

seguida pelos Estados Unidos (Governo Reagan – 1980).

De acordo com Anderson (1995) o poder excessivo dos sindicatos, com a pressão sobre os

salários e sobre o Estado para aumentar os gastos sociais, acabaram por corroer os níveis

necessários de lucros das empresas e desencadearam processos inflacionários que não podiam

deixar de terminar numa crise generalizada das economias de mercado.

Desta forma, a saída se daria através de um Estado forte para romper o poder dos sindicatos,

no entanto, ausente em todos os gastos sociais e nas intervenções econômicas. Sob a ótica de

um balanço do neoliberalismo segue-se que:

Qualquer balanço atual do neoliberalismo só pode ser provisório. Este é um movimento ainda inacabado (...). Economicamente, o neoliberalismo fracassou, não conseguindo nenhuma revitalização básica do capitalismo avançado. Socialmente, ao contrário, o neoliberalismo conseguiu muito dos seus objetivos, criando sociedades marcadamente mais desiguais, embora não tão desestatizadas como queria. Política e ideologicamente, todavia, o neoliberalismo alcançou êxito num grau com o qual seus fundadores provavelmente jamais sonham, disseminando a simples idéia de que não há alternativas para os seus princípios, que todos, seja confessando ou negando, têm de adaptar-se a suas normas. (ANDERSON, 1995, p.23)

2.3 REFLEXOS DESTES PROCESSOS NO BRASIL:

2.3.1 Ideário Neoliberal, Abertura Comercial e Especificidades da Reestruturação

produtiva no Brasil.

No Brasil, como reflexo destas transformações que se processaram a nível mundial,

observaram-se profundas reformulações na organização da produção e do trabalho, bem como

transformações no âmbito político e social, estas fortemente apoiadas no projeto neoliberal

implementado no país. A implementação das políticas de cunho neoliberal teve início com a

prática das diretrizes firmadas no Consenso de Washington7 que objetivavam a redefinição

7 Matoso (1999, p.24) explica o Consenso de Washington como um conjunto de propostas elaboradas em um seminário do Banco Mundial em Washington e destinadas a países periféricos, visando a redução do Estado, a liberalização dos mercados e a desregulamentação financeira.

das relações de dominações entre os países centrais e os ditos periféricos, bem como a

imposição de diretrizes e reformas no âmbito político e econômico para os últimos.

A doutrina neoliberal vai emergir, no Brasil, embora ainda timidamente em virtude da força

dos movimentos trabalhistas em sua fase de ascensão durante toda a década de 1980, a partir

do Governo Collor, como estratégia de superação da crise vivenciada na década de 80:

O liberalismo que já havia adentrado na maior parte da América Latina, implanta-se no Brasil com toda força, a partir do Governo Collor. O discurso liberal radical, combinado com a abertura da economia e o processo de privatizações inauguram o que poderíamos chamar da ‘Era Liberal’ no Brasil. (FILGUEIRAS, 2003, p. 83-84).

No entanto, é a partir do Governo de Fernando Henrique Cardoso que esta doutrina consolida-

se de vez no país:

Os Governos FHC, em dois momentos distintos, soldaram as diversas frações do capital, através da implantação negociada (arbitrada) do projeto neoliberal sob a hegemonia (restrita) e a lógica do capital financeiro. No primeiro governo, com a implementação do Plano Real, a lógica de valorização e a política econômica do capital financeiro se impuseram de forma cabal – com a estabilização monetária apoiada na valorização cambial e em taxas de juros elevadas, acompanhadas de desregulamentação e abertura comercial e financeira, privatização e desregulação do mercado de trabalho (FILGUEIRAS, 2003, P.201)

Sendo assim, a década de 1990 teve como uma de suas principais características a abertura

comercial externa que representou a volta do país ao circuito financeiro mundial. Dentro desta

perspectiva, iniciou-se no Brasil o processo de privatização das empresas estatais, uma maior

abertura da economia aos capitais externos com a diminuição das alíquotas de importação,

desregulamentação das relações de trabalho e um programa de estabilização dos gastos

governamentais.

Desta forma, o panorama político e econômico do Brasil, ao longo na década de 90, foi

marcado pelo avanço e concretização das políticas neoliberais, pautadas na contenção dos

gastos públicos e dos salários. Tais medidas tiveram como conseqüências mais alarmantes o

agravamento dos problemas sociais e aumento progressivo das taxas de desemprego

observadas no período.

Fonte: ALVES, 2002, p. 82

Taxa média anual de desemprego aberto no Brasil (1989-2001)

Na visão de Boito (1996), o Brasil não chegou a constituir um Estado de bem-estar, no

sentido europeu do termo. Apesar disso, os direitos sociais restritos, excludentes e

precarizados que ainda existem são um alvo importante da ofensiva neoliberal. Nesta

perspectiva, tem-se como objetivo abrir novas áreas de acumulação para o capital privado

(previdência, educação, saúde, transporte, etc.), reduzir os investimentos em política social e

diminuir os impostos que incidem sobre as empresas.

Neste sentido, a abertura da economia brasileira resultou em mudanças peculiares, visto que,

este processo, aliado à modificação do papel do Estado na economia, contribuiu para redefinir

as relações entre capital e trabalho.

O programa de abertura comercial e financeira teve como objetivo promover a modernização

do parque industrial brasileiro, bem como integrar a economia brasileira ao mercado mundial.

Dentro desta perspectiva, Lacerda (1998, p.90) afirma que a abertura intensificada a partir dos

anos 90 provocou uma profunda reestruturação industrial no Brasil, com impactos diretos no

emprego, embora tenha trazido benefícios para os consumidores pela maior disponibilidade

de bens e serviços, melhores preços e tecnologia.

No entanto, a crença de que o esvaziamento do Estado possibilitaria o reforço do setor

privado, a ponto de conduzir ao crescimento econômico desejado e duradouro, não se

confirmou nos anos 1990 em virtude da crença equivocada de que o padrão de intervenção

estatal anterior evitava a modernização e a eficiência econômica (POCHMANN, 2001, p.11).

De fato:

O governo Collor implantou uma política econômica recessiva. Em1989, a economia crescera 3,3%. Collor assumiu o governo em 1990 e empurrou a produção para baixo: - 4,4%, em 1990, +1,1% em 1991 e – 0,9% em 1992. Em 1993, já então sob Itamar Franco, vem a recuperação: a economia cresceu 5,0%. No triênio 1990-92, o desemprego cresceu bruscamente. Os salários também foram para baixo na conjuntura recessiva do governo Collor. Portanto, em 1990, 1991 e 1992 caíram a produção, o emprego e os salários. Em 1993, todos esses três indicadores iniciaram uma pequena recuperação, sendo que o significativo crescimento do PIB em 1993 não foi acompanhado de uma redução digna de nota na taxa de desemprego – fato indicador de que as empresas aumentaram a produção sem aumentar o pessoal empregado. (BOITO, 1996, p.7)

Em sistematização explicitada em Mattoso (1999) constata-se que a abertura comercial

indiscriminada, a ausência de políticas industriais e agrícolas, a sobrevalorização do real e os

elevados juros introduziram um freio ao crescimento do conjunto da economia e uma clara

desvantagem da produção doméstica diante da concorrência internacional.

Em virtude destas transformações de ordem política e econômica, a empresas do país

apresentaram uma tendência à desverticalização da produção industrial e o comportamento

destas direcionou-se no sentido de buscar se aproximar dos padrões de organização e gestão

do trabalho predominante nos países centrais. Sendo assim, buscaram formas de reorganizar a

produção e a gestão do trabalho adotando redução de custos via enxugamento da mão-de-

obra, abandono de linhas de produção, fechamento de unidades, racionalização da produção,

busca de parcerias e terceirização, para tentar fazer frente à menor competitividade diante dos

concorrentes externos.

Desta forma, foi a partir do "choque de competitividade" da "década neoliberal" que ocorreu o

desenvolvimento da reestruturação produtiva. Esse processo que se caracterizou, por um lado,

pela introdução de novas tecnologias microeletrônicas na produção, e por outro lado, pelo

desenvolvimento de novas formas de organização da produção capitalista, caracterizadas

como sendo o toyotismo sistêmico com seus nexos contingentes, tais como just in time,

terceirização, trabalho em equipe, programas de qualidade total, sistemas de remuneração

flexível, etc. (ALVES, 2002, p. 80).

A reestruturação produtiva no Brasil se difundiu a partir da disseminação do modelo japonês

pautado em novos padrões de gestão e organização do trabalho que, assim como o fordismo,

possui especificidades nacionais e regionais. De acordo com Druck (1999b), no caso

brasileiro, a implementação do modelo japonês é passível de periodização. A primeira fase

ocorre na passagem dos anos 70 para os anos 80 e tem na prática dos Círculos de Controle de

Qualidade (CCQs) a sua forma mais difundida. Ainda nos anos 80 ocorre a adoção de novas

tecnologias de automação, do just in time e dos Programas de Qualidade Total. Na década de

90 intensifica-se os Programas de Qualidade Total e terceirização.

Em sistematização feita por Druck (1999b), a reestruturação produtiva que estava em curso no

país apresentou três importantes especificidades: 1- O seu aprofundamento está sustentado nas

políticas de conteúdo neoliberal; 2- A singularidade de uma reestruturação produtiva que, no

plano geral da atividade industrial, foi constituída muito mais pelas inovações organizacionais

- novos padrões de gestão/organização do trabalho inspirados no modelo japonês - e muito

menos por transformações/inovações tecnológicas; 3- A rapidez com que se instituiu a

desregulamentação do mercado de trabalho, através da modificação do aparato legislativo e de

fiscalização do Estado.

Dentro desta perspectiva, observa-se que no Brasil todas essas mudanças que se processaram

tanto no âmbito político quanto econômico, provocaram impactos profundos na estrutura

produtiva do país, bem como no contexto social e no mundo do trabalho. Assim, observou-se

no país, ao longo dos anos 90, uma profunda flexibilização do mercado de trabalho

acompanhada de elevados níveis de desemprego e precarização das condições de trabalho. Ao

lado disso, acentuou-se a assimetria de poder entre capital e trabalho, esta com tendência

evidentemente para o lado do capital o que acaba por induzir a classe trabalhadora a

individualizar-se, pulverizando, assim, a ação coletiva.

2.3.2 Flexibilização do mercado de trabalho no Brasil

A integração competitiva da economia brasileira à economia global, explicitados na seção

anterior, influenciou estruturalmente o funcionamento do mercado de trabalho do País. Foram

registradas, na década 1990 e ao longo dos últimos anos, dinâmicas particularmente

relevantes nos quesitos emprego, formalidade e renda dos trabalhadores, o que refletiu

substancialmente na qualidade e quantidade do total de empregos no país.

Pochmann (1998) identifica quatro diferentes fatores explicativos dos novos problemas no

mercado de trabalho no Brasil:

1- Alterações na composição da demanda agregada, provocada pela revisão do papel do

Estado na economia, pela desregulamentação financeira e econômica e pela estabilização

monetária;

2- Natureza da reinserção externa marcada pela abertura comercial, pela desregulamentação

financeira e pela integração regional (Mercosul);

3- O processo de reestruturação das empresas privadas decorrente da introdução de novos

fundamentos competitivos, marcados pelo aumento da produtividade do trabalho e pela maior

inserção externa, com alteração dos preços relativos e elevação dos investimentos

especificamente nas grandes empresas;

Nesse contexto, surge a discussão sobre a necessidade de flexibilização das relações do

trabalho, onde o ideário neoliberal sustenta ser a rigidez das instituições responsável pela crise

nas empresas retirando delas as possibilidades de adaptarem-se a um mercado em constante

mutação. Portanto, a idéia de tornar mais flexível a contratação e a dispensa de trabalhadores

estão ancoradas neste pensamento neoliberal que tem buscado a eliminação de grande parte

das normas trabalhistas.

De acordo com Krein (2003), a desregulamentação de direitos e a flexibilização das relações

de trabalho apresentaram-se como tendência durante toda a década de 1990, especialmente a

partir do Plano Real (1994) 8. Ainda de acordo com o autor, o processo de aprofundamento da

flexibilização/precarização do mercado de trabalho foi facilitada por diversos aspectos

referentes a mudanças na legislação. Sendo assim, ao lado da reestruturação da indústria e de

sua conseqüente perda de importância como geradora de empregos, houve, nos anos 90, o

crescimento da flexibilização na contratação de mão-de-obra.

Krein (2003) analisa que as medidas de flexibilização das relações de trabalho no Brasil,

contribuíram para alterar a forma de contratação e a determinação do uso do tempo e da

remuneração do trabalho que se configuram numa flexibilização numérica e funcional do

mercado de trabalho.

8 Para um estudo mais detalhado sobre o Plano Real ver Filgueiras (2003)

Por flexibilidade numérica entende-se como a ampliação da liberdade das empresas para

empregar e despedir de acordo com as suas necessidades de produção, dentro de uma

estratégia de redução de custos (contrato por prazo determinado, cooperativas de trabalho,

ampliação do trabalho estágio e extensão da terceirização para atividades-meio). Por

flexibilidade funcional entende-se como as medidas que mexem na determinação do tempo de

trabalho (banco de horas e liberação do trabalho aos domingos) e na determinação da

remuneração, particularmente a PLR (Participação nos lucros ou resultados) e a desindexação

dos índices de reajuste salarial. (KREIN, op. cit., p. 3)

Diante do exposto, pode-se afirmar que esta década foi marcada pela presença de sinais de

desestruturação do mercado de trabalho. No entanto, Krein (2003, p. 9-10) analisa que estas

novas formas de contratação tiveram pouca efetividade na medida em que:

1 – Depois da aprovação destas medidas, agravou-se a recessão econômica, com desestimulo

à contratação de novos trabalhadores;

2 – O sistema de contratação e despedidas já é bastante flexível no Brasil;

3 – Além das medidas legais, a flexibilização do trabalho também vem ocorrendo através da

terceirização e do trabalho autônomo para a empresa, na medida em que isto contribui para a

eliminação de obrigações relativas aos direitos trabalhistas da empresa contratante do serviço

ao repassar a responsabilidade para uma outra empresa, que geralmente não está enquadrada

na mesma categoria econômica.

Além disso, essas novas formas de contratação surtiram pouco efeito no mercado de trabalho

brasileiro na medida em que houve o aparecimento de elevado desemprego aberto9 e geração

de postos de trabalho precários, em virtude do comportamento geral da economia na década

de 1990, que registrou uma taxa média anual de expansão do produto de apenas 1,9% - a mais

baixa do século XX. “Entre 1989 e 1999, a quantidade de desempregados ampliou-se de 1,8

milhão para 7,6 milhões, com aumento da taxa de desemprego aberto passando de 3,0% da

População Economicamente ativa para 9,6%”. (POCHMAN, 2001, p.48)

9 Desemprego aberto é a condição da pessoa desempregada que se encontra à procura de trabalho.

Somando a isso, tivemos um elevado número de trabalhadores fora do mercado formal de

trabalho. De fato:

Considerando-se exclusivamente o movimento de liberalização comercial e de internacionalização da economia brasileira nos anos 1990, pode-se perceber seus efeitos negativos sobre o trabalho na medida em que, em relação ao emprego formal no setor industrial, nota-se que entre 1990 e 1998, ocorreram cerca de 1,2 milhão de demissões influenciadas pela ampliação do grau de exposição externa do parque produtivo nacional. (POCHMAN, 2001, p.49)

A redução do mercado formal de trabalho, isto é, aquele regulamentado pelas leis trabalhistas

e integrado aos mecanismos institucionais que garantem proteção ao trabalhador, tais como a

Previdência Social, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e o seguro-

desemprego, pode ser observado pelo crescimento dos trabalhadores sem carteira de trabalho

assinada e por conta própria. (MATTOSO, 1999, p.16)

É dentro desta perspectiva que o mercado de trabalho nos anos 1990 no Brasil também se

caracterizou pelas condições de trabalho tornando-se crescentemente informais, precárias,

com trabalhos e salários descontínuos, de curta duração e sem contribuir para a previdência e,

portanto, sem acesso à aposentadoria.

3 A REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E A TERCEIRIZAÇÃO DA INDÚSTRIA

PETROQUÍMICA DA BAHIA

No presente capítulo, será discutida a reestruturação produtiva no âmbito da indústria

petroquímica baiana e, em particular, a questão da terceirização por tratar-se do processo que

mais se difundiu nas empresas do setor. Desta forma, pretende-se levantar o conceito e

algumas abordagens da terceirização e os motivos pelos quais as empresas implementam esta

prática, fazendo uma análise de como se processou a terceirização na petroquímica e

enfatizando suas principais particularidades e características.

3.1 CONCEITO E DIFERENTES ABORDAGENS SOBRE A TERCEIRIZAÇÃO.

Como visto no capitulo anterior, o processo de terceirização fez parte de um amplo conjunto

de modificações das relações de trabalho em busca da flexibilização deste mercado e, foi

sendo incorporada paulatinamente à vida econômica das empresas. O debate em torno do

tema da terceirização foi adquirindo importância nesse contexto de acirramento das condições

advindas dessa nova ordem econômica mundial.

Pesquisa realizada pelo DIEESE (1993) define a terceirização como sendo “o processo pelo

qual as empresas transferem uma determinada atividade, que seria desenvolvida pelos

trabalhadores de uma empresa, para uma outra empresa, então, chamada de terceira”.

Ou seja, esta empresa terceira recebe as atividades externalizadas da empresa-origem e pode

operar tanto dentro dos limites do espaço físico da empresa-origem quanto pode operar em

seu próprio espaço físico. O essencial é que a empresa terceira tenha total independência

administrativa da empresa-origem e que opere com seu próprio capital, visando, dessa forma,

uma flexibilização, tanto da produção quanto do trabalho. Sendo assim, a relação de emprego

se faz entre o trabalhador e a empresa prestadora de serviço, e não diretamente com o

contratante da atividade.

Ainda de acordo com a pesquisa DIEESE (1993, p.5) a terceirização é um processo que pode

ter duas faces independentes, mas não excludentes:

1) a desativação, parcial ou total, de setores produtivos. A empresa que terceiriza deixa de

produzir e passa a comprar produtos de outras empresas;

2) a contratação de uma ou mais empresas terceiras que alocam trabalhadores para execução

de algum serviço no interior da empresa do cliente. Os casos típicos são: vigilância, limpeza,

serviços médicos e certos tipos de manutenção.

Um dos trabalhos pioneiros a considerar a rede de contratações da empresa foi a publicação

do artigo de Ronald Coase10 intitulado “A Natureza da Firma” 11 de 1937. Neste trabalho,

Coase (1937 apud. Zylberzstajn, 2005) discute que as firmas de fato existem e produzem, ao

invés de existirem apenas mercados. Esta questão originou a discussão sobre os custos de

transação, explicando porque as firmas estabelecem sistemas de organização que substituem a

ação do mercado, mostrando até que ponto ocorrem processos de verticalização. É justamente

dentro desta nova visão institucional da economia que surge o conceito de firma como uma

instituição que vem a ampliar o conceito da firma estudado pelos neoclássicos como uma

função de produção.

Muito mais do que uma relação mecânica entre um vetor de insumos e um vetor de produtos,

associada a uma determinada tecnologia, a empresa é uma relação orgânica entre agentes, que

se realiza através de contratos, sejam eles explícitos, como os contratos de trabalho, ou

implícitos, como uma parceria informal. Com essa crítica, Coase não rompe com a tradição

neoclássica, posto que o comportamento maximizador é mantido, mas a amplia, passando a

considerar outro tipo de custos, além dos custos de produção. A firma Coasiana é um

conjunto de contratos coordenados, que levam à execução da função produtiva.

(ZYLBERZSTAJN, 2005)

Desta forma este trabalho de Coase é extremamente importante ao abordar a expansão dos

limites da firma sob a ótica da flexibilização da produção. Além disso, analisa os fundamentos

econômicos que levam a empresa a decidir entre manter uma relação de produção ou de

trabalho interna ou externa à firma, sendo assim, a análise implica no contraste entre formas

alternativas de organização desde a realização da produção via mercado, até o outro extremo

da integração vertical pura.

10 Economista Inglês considerado um dos fundadores da Nova Economia Institucional. 11 Título original "The Nature of the Firm" (1937) citado no trabalho de Zylberzstajn (2005)

Pelo exposto configura-se que, em sua essência, a terceirização não é um fenômeno atual. No

curso da história do capitalismo esta prática se fez presente, evidentemente com diferentes

denominações e características, sendo um recurso utilizado diferentemente a depender da

natureza do processo produtivo. No Brasil, a terceirização chegou nos anos 50 junto com as

montadoras de automóveis, no entanto, sua grande arrancada só pode ser sentida mais

recentemente. “A terceirização é uma possibilidade infinitamente mais adequada para uma

série de situações enfrentadas pelas empresas, mas não pode ser tratada como um novo

dogma”. (REZENDE, 1997, p.2)

Entretanto, a atualidade imprimiu à terceirização determinados atributos, ao ponto que alguns

autores afirmam tratar-se de um fenômeno novo. De peça acessória, periférica, complementar

na arquitetura produtiva, ela se transforma em elemento central, em condição de flexibilidade,

portanto, fundamental do ponto de vista da produtividade e da competitividade das empresas.

A terceirização anuncia um novo momento da acumulação de capitalista, no qual os chamados novos paradigmas tecnológicos e gerenciais incorporam mudanças nos padrões de uso da força de trabalho... A terceirização, no Brasil, pode ser vista como um processo que integra amplas mudanças, voltadas para a adaptação da economia à reestruturação industrial e empresarial em curso a nível internacional. Integra estratégias empresariais de sustentação de margens de lucro, numa conjuntura de grave crise econômica e política, marcada por mudanças radicais na competição internacional e divisão internacional do trabalho que tendem a colocar o país num a posição extremamente desvantajosa. (BORGES; DRUCK, 1993, p. 41) Estes têm resultado numa crescente exclusão social que atinge largos segmentos incorporados à “sociedade de bem-estar” na etapa anterior da acumulação. (BORGES; DRUCK, 1993, p.23)

Sendo assim, a terceirização com esse perfil emerge, conforme já comentado no capítulo

anterior, no contexto das mudanças que se processaram a partir da crise do sistema fordista

em meados da década de 70, crise que, tratando-se do caso brasileiro, Borges e Druck (1993)

atribuem como uma melhor expressão de crise do “fordismo periférico” 12 pelas

especificidades deste modelo no país.

No caso brasileiro, ainda de acordo com Borges e Druck (1993) a crise do fordismo periférico

se manifesta, no esgotamento da capacidade de financiamento do Estado e na perda de

competitividade da indústria brasileira, em decorrência de sua defasagem tecnológica

provocada, entre outras razões, pela política de fechamento da economia e a recessão

vivenciada da década de 1980.

12 Segundo Borges e Druck (1993), esta expressão é proveniente da “Escola de Regulação” (Lipietz)

O processo de terceirização no Brasil começa a se acentuar na década de 90 quando, por

implementação de uma política que visava a abertura da economia, as empresas começam

uma busca por se adequarem a nova realidade de mercado extremamente competitiva. Druck

(1999b) analisa que a terceirização no Brasil pode ser distinguida de acordo com estas

principais vertentes13:

1. Trabalho doméstico ou trabalho domiciliar: utilizado mais frequentemente nas empresas

dos setores mais tradicionais da produção industrial, consiste na subcontratação de

trabalhadores autônomos em geral, sem contrato formal;

2. Empresas fornecedoras de componentes e peças: com produção voltada, quase

exclusivamente para as grandes empresas contratantes, consiste na subcontratação na forma

de redes de fornecedores, que produzem independentemente, ou seja, tem a sua própria

instalação, maquinaria e mão-de-obra;

3. Subcontratação de serviços de apoio: consiste na subcontratação de empresas

especializadas para prestação de serviços a ser realizado, em sua maioria, no interior da planta

da empresa contratante;

4. Subcontratação de empresas ou trabalhadores autônomos nas áreas produtivas/nucleares:

este tipo de prestação de serviço pode ocorrer tanto dentro da empresa contratante como o

trabalho pode ser realizado fora, na empresa contratada;

5. Quarteirização: as empresas são contratadas apenas para gerir os contratos com as empresas

terceiras.

Ou seja, a partir da década de 1990 observou-se uma desintegração vertical nas empresas

nacionais. De acordo com Amaro Neto (1995) o termo desintegração vertical corresponde a

um movimento de redução do tamanho da cadeia de atividades da empresa, tanto no nível

administrativo (redução de níveis hierárquicos) como no da produção, pela via da redução ou

13 No trabalho de Borges e Druck (2002) são acrescentadas mais duas novas modalidades representativas de terceirização: 1 – cooperativas; 2 – Empresas filhote (empresas administradas por ex-funcionários que preferem montar o seu próprio negócio).

eliminação de alguns processos (seções produtivas/de apoio ou até mesmo postos de

trabalho).

Contudo, Rezende (1997) chama a nossa atenção para o fato de que o movimento de

terceirização só pode ser considerado desverticalização se aplicado ao eixo da cadeia

produtiva. Do contrário, existem outras denominações mais apropriadas, a exemplo de

desburocratização, enxugamento, entre outras. Textualmente:

... nem todo movimento de terceirização significa desverticalização. Terceirização como sinônimo de desverticalização só ocorre no eixo da cadeia produtiva e eventualmente no eixo de atividades complementares. Terceirização no eixo de atividades de apoio não é sinônimo de desverticalização, podendo ser chamada de desburocratização, enxugamento, etc. (REZENDE, op. cit, p.7)

Por outro lado, Faria (1994) enfatiza que a terceirização tem a ver com três dimensões

fundamentais para a sobrevivência das empresas hoje: qualidade, competitividade e

produtividade. É o mecanismo pelo qual a empresa passa a concentrar-se no que ela sabe

fazer melhor, nas suas competências centrais, destinando as outras tarefas, secundárias e

auxiliares, para empresas especializadas.

Paralelamente a esta idéia, Amaro Neto (1995) e DIEESE (1993) complementam que próximo

a este conceito de terceirização está a idéia de focalização, a qual baseia-se nos princípios da

simplicidade, da repetição, da experiência e da homogeneidade de tarefas geradas pela

competência específica da empresa. Ou seja, “a empresa concentra suas atividades naquilo

que a diferencia perante a concorrência e passa para terceiros o que não é foco na sua

atividade”. (DIEESE, 1993, p.6)

Desta forma, a terceirização evoluiu cada vez mais de atividades de apoio como limpeza,

segurança, alimentação, manutenção predial, transporte, apoio jurídico, assistência social,

recepção, comunicação, entre outras, em direção a etapas cada vez mais importantes do

processo produtivo. Como discute Borges e Druck (2002), em pesquisa para avaliar a

evolução da terceirização depois de uma década, os dados mostraram que, em 2000, do total

de empresas, 100% no setor industrial, 83% no agrobusiness, 94% nos serviços e 44% no

comércio, trabalhavam com terceirizados.

Na terceirização "o fabricante tradicional abandona suas linhas industriais em favor de

fornecedores mais preparados em termos de custos" (FARIA, 1994, p.43). Em função disso, a

atenção da empresa é redirecionada para funções como a gerência da qualidade da produção

de terceiros, do marketing e da distribuição. Entre os objetivos mais comuns que Faria (1994)

associa aos processos de terceirização estão: redução de encargos sociais; promoção de

mudanças organizacionais; racionalização produtiva (fixar-se no estratégico); especialização

flexível (contratante apenas administra a relação fornecedor, produção e mercado) e quebra do

movimento sindical.

Amaro Neto (1995) por sua vez, nos lembra que o fundamento da terceirização se encontra no

Modelo Japonês, da produção enxuta, da qualidade total e da produção just-in-time. Portanto,

a introdução da terceirização deveria se dar juntamente com os princípios de gestão do

genuíno modelo japonês (promoção por antiguidade e por mérito, estabilidade no emprego,

trabalho em grupo) que lhe dão sustentação e sentido conforme foi explicitado no capítulo 2

deste trabalho. No entanto, o que se tem observado, em nível de Brasil, é a implantação

isolada e oportunista da terceirização, num quadro que em nada se assemelha ao das empresas

japonesas.

È neste sentido que Faria (1994) analisa que, no Brasil, pode-se identificar dois tipos de

terceirização – um considerado autêntico, que integra uma estratégia relacional, com

tecnologias gerenciais de qualidade, buscando a parceria em todo fluxo produtivo, e outro

denominado “espúrio” que busca apenas reduzir custos, mantendo o antagonismo entre os

empregados e o movimento sindical.

Com relação aos fatores que levam as empresas a terceirizarem suas atividades, no documento

do DIEESE (1993), estes estão sintetizados da seguinte forma:

1 – Uma forma de adequar a relação volume produzido e retorno obtido;

2 – Através de unidades “focalizadas” a empresa pode atingir o volume de produção ideal de

cada processo, na medida em que não produz apenas para o consumo interno à fábrica;

3 – Focalizando as atividades, tende a haver uma diminuição da diversidade das formas

organizacionais, facilitando a gestão empresarial;

4 – As empresas que terceirizam tendem a suportar melhor as crises econômicas em virtude

de ser mais fácil cortar encomendas que se desfazer de ativos. O capital fixo (investimentos)

passa a ser variável (compras) no ponto de vista da empresa que terceiriza;

5 – A terceirização, se implementada num sistema de parceria comprador e fornecedores,

pode significar um aumento do montante total investido em pesquisa, reduzindo os gastos da

empresa cliente;

6 – Ao terceirizar e, desse modo, reduzir o número de processos, tem-se como resultado um

melhor controle de custos, desempenho e qualidade, facilitando a gestão da produção e da

força de trabalho, reduzindo os custos administrativos e intensificando os fluxos de

informação;

7 – Mecanismo para controlar movimentos de trabalhadores;

8 – Tentativa de burlar conquistas sindicais de categorias mais organizadas.

Em contraposição, Rezende (1997) esclarece que também existe fatores que se constituem

como entraves para a prática da terceirização, entre eles: 1 – a dificuldade de estabelecer

parcerias; 2 – resistências internas (a exemplo da questão sindical); 3 – características do

processo produtivo e 4 – dependência do fornecedor.

Conforme o exposto, na tentativa de caracterizar o processo de terceirização que foi

implementado no país, a literatura existente sobre o assunto divide-se em linhas de

pensamentos entre autores que possuem opiniões divergentes. De um lado, uma corrente de

pensamento acredita que adotar estas formas flexíveis de gestão da produção irá tornar a

cadeia produtiva mais eficiente, tornando a empresa mais competitiva no mercado

(Rezende(1997); Giosa (1997); Amaro Neto (1995), entre outros ). De outro lado, uma outra

corrente de pensamento, por sua vez, analisa a terceirização como sendo um processo voltado

para a redução dos custos sustentando-se no trabalho precário (Borges e Druck (1993); Druck

(1999); Faria (1994), entre outros ).

Dentro da primeira linha de pensamento, Giosa (1997) acredita que a sobrevivência das

empresas passa por um processo natural de busca pelo aperfeiçoamento, pela prática de

modelos de gestão, pela utilização de tecnologia e pelo aprimoramento do corpo funcional das

empresas, sendo a terceirização um processo essencial para este aperfeiçoamento, fazendo

assim uma abordagem positiva deste processo.

Sob outro ponto de vista , por sua vez, Borges e Druck (1993) assinalam que a terceirização é

claramente um processo voltado para a redução dos custos de mão-de-obra das empresas para

a simplificação de sua administração. Além desses elementos é considerado que este processo

fraciona os trabalhadores e implica numa redução de poder dos sindicatos.

Para Borges e Druck (1993) o estudo do processo de terceirização no Brasil passa,

necessariamente, pela discussão sobre a crise da sociedade do trabalho tornando-se

imprescindível analisar os impactos da terceirização do mercado de trabalho, avaliando como

este processo desorganiza os trabalhadores e precariza as relações de trabalho. Dentro desta

ótica entende-se que a terceirização provoca mudanças na estrutura organizacional das

empresas, porque conduz, no mínimo, à redistribuição do trabalho, o que provoca tanto a

criação de empregos precários e eventuais, como a redução salarial e eliminação de benefícios

sociais diretos ou indiretos.

Pode-se extrair do exposto que o processo de terceirização não se trata apenas de uma nova

forma de gestão do trabalho ou de modernização da economia a nível mundial. Mas, estende-

se também à analise de que “trata-se sim de uma expressão de um momento de crise profunda,

onde as condições econômicas e políticas vigentes no país têm sido enfrentadas por uma

estratégia empresarial que busca transferir suas perdas para os trabalhadores”.

(BORGES;DRUCK,1993, p. 41).

O universo de opiniões que envolvem o tema, mesmo conformado por divergências e

convergências, deixa à mostra alguns elementos comuns que se mostram praticamente como

consenso:

1 - São cada vez mais raros os casos de empresas que não terceirizem pelo menos algumas de

suas atividades;

2 – A terceirização é uma das técnicas de administração do trabalho que têm maior

crescimento, tendo em vista a necessidade que a empresa moderna tem de concentrar-se em

seu negócio principal;

3 – A terceirização pode ser considerada como a principal política de gestão e organização do

trabalho no interior da reestruturação produtiva;

4 – A terceirização está inserida num contexto muito mais amplo que remete ao conjunto de

transformações ocorridas na organização do capitalismo, bem como, configura-se como

elemento essencial da divisão social do trabalho;

5 – Este processo apresentou-se como um desafio para o movimento sindical.

3.2 TRAJETÓRIA DA PETROQUÍMICA NA DÉCADA DE 90: TERCEIRIZAÇÃO E

DESEMPREGO

3.2.1 A indústria petroquímica na Bahia

A partir da década de 50, no contexto da política do Governo Federal de substituição de

importações, a Bahia foi contemplada com vários projetos industriais que tinham por objetivo

a produção de bens intermediários (intensivos em capital e tecnologicamente modernos)

visando complementar a matriz de produção já desenvolvida na região Sudeste do país.

Tais projetos, desde a implantação da Refinaria Landulfo Alves (1950) até a chegada do Pólo

Petroquímico de Camaçarí, propiciaram uma elevação da importância da indústria na

economia baiana. Sendo assim, a dinâmica de acumulação de capital na Bahia passou a ser

condicionada pela atividade industrial que gradativamente substituiu a agricultura exportadora

na função de impor dinamismo à economia baiana.

O Pólo Petroquímico do Estado, situado no município de Camacarí, que teve sua implantação

iniciada na década de 70, com a maior parte das empresas entrando em operação entre 1978 e

1985, concretiza esta dinâmica na medida em que possibilita a integração da economia baiana

com a matriz industrial nacional através da produção de produtos intermediários. Conforme

afirma Teixeira e Guimarães:

Esse complexo industrial, localizado na Região Metropolitana de Salvador é a principal atividade econômica do Estado da Bahia. Entre 1974 e 1989, a indústria petroquímica tinha trazido para a região investimentos da ordem de US$ 6 bilhões. As transformações na economia baiana, decorrentes da implantação do seu Pólo Petroquímico são evidentes: em poucas palavras, pode-se dizer que ela significou a definitiva industrialização do estado. Essas mudanças foram acompanhadas por importantes transformações sociais. Fortaleceu-se a classe média profissional, composta por técnicos, gerentes e prestadores de serviços. (TEIXEIRA; MAGALHÃES, 2000, p.10)

A origem do Pólo Petroquímico foi uma diretriz do Governo Federal, fundamentada em três

princípios básicos: descentralização industrial, atenuação dos desníveis de desenvolvimento e

fortalecimento do empresariado nacional. Guerra (1994) enfatiza que o papel do Estado é

crucial ao promover e articular a implantação de vários setores industriais, utilizando-se para

isto de concessão de diversos estímulos tributários e financeiros. Textualmente:

Em 1972, ao definir a instalação do segundo pólo petroquímico brasileiro na Bahia e ao criar a Companhia Petroquímica do Nordeste (COPENE) para produzir os petroquímicos de primeira geração e coordenar essa instalação, o Estado, de fato, assumiu explicitamente a formulação de uma política industrial que, além de procurar consolidar o setor, buscava incentivar o desenvolvimento regional. Desse modo, ficava clara a disposição do Estado brasileiro em liderar a dinâmica de crescimento na estrutura do mercado petroquímico brasileiro. (GUERRA, 1994, p. 139-140)

O trabalho de Guerra e Teixeira (2000) analisa que a inserção da Bahia na matriz industrial

nacional como estado fornecedor de produtos intermediários para os setores de bens finais

instalados do eixo Sul/Sudeste do país ocorreu através da chamada “especialização regional”.

Ainda de acordo com o autor, o direcionamento da industrialização baiana para o ramo

petroquímico deveu-se tanto ao fato do estado, à época, já possuir uma refinaria e ser o maior

produtor nacional de petróleo como também pelo motivo de haver na década de 70 uma

carência na produção nacional de insumos utilizados pela indústria de transformação no

Centro-Sul.

O crescimento do setor secundário contribuiu de forma positiva para a dinâmica da RMS na

medida em que possibilitou o aquecimento das atividades comerciais e de serviços. Em 1980,

com dois anos de operação a petroquímica começou a mostrar os resultados ao contribuir

fortemente para a liderança do setor industrial na composição do PIB setorial: o setor primário

alcançou uma queda de 40% para 16,40% entre 1960 e 1980, sendo que o setor secundário

quase triplicou sua participação passando de 12% para 31,6% no mesmo período. (GUERRA;

TEIXEIRA, 2000)

A consolidação deste Complexo Petroquímico mudou, aos poucos, a feição da Bahia na

medida em que a grande demanda pessoal, dividida em fases distintas de implantação e

operação, gerada por este empreendimento teve forte impacto social na região. Na visão de

Silva e Pereira (1987) um dos aspectos mais importantes referentes à implantação do setor

petroquímico evidencia-se pela geração de emprego que em 1986 girava em torno de 45.000

pessoas distribuídas em 47 unidades industriais com vínculos empregatícios diretos e

indiretos.

É fato conhecido que a indústria petroquímica se caracteriza por ser expressamente de capital

intensivo, já que utiliza tecnologia altamente sofisticada. Sendo assim, o efeito positivo

causado pela implantação do pólo em termos de desenvolvimento de mão de obra já é restrito

por suas características tecnológicas. Contudo, apesar do setor químico/petroquímico ser

intensivo em capital e em função disso ter baixa absorção de mão-de-obra, deve ser salientado

o expressivo efeito multiplicador que esta atividade gerou na RMS ao impor modernização e

ampliação ao comércio, serviços e construção residencial com reflexos positivos na geração

de renda e empregos indiretos. (GUERRA; TEIXEIRA, 2000)

Pelo exposto, a instalação do complexo petroquímico de Camacarí significou um

extraordinário esforço da economia brasileira (dada a grandiosidade da obra e a substancial

demanda por recursos dela decorrentes) que se justificou pela necessidade de se substituir

importações de produtos petroquímicos intermediários, bem como pelos efeitos

multiplicadores esperados.

Na década de 1980, de acordo com Guerra e Teixeira (2000), a economia em âmbito nacional

experimentou um período de grande retração, mas apesar na indústria local estar

correlacionada com a matriz produtiva do centro-sul, a petroquímica baiana consegue atenuar

estes efeitos na medida em que, ao aproveitar a conjuntura internacional favorável, busca o

mercado externo para escoar sua produção. No início da década de 1990, devido à conjuntura

do país em função do Plano Collor, a Petroquímica Baiana passa por um momento de

reestruturação produtiva com as empresas buscando melhor se inserir no mercado mais

competitivo.

3.2.2 A terceirização na indústria Petroquímica Baiana: flexibilização e desemprego.

Como foi anteriormente destacado no capitulo 2 deste trabalho, o fenômeno da globalização e

da emergência de novos paradigmas tecnológicos levou, e ainda estão levando, a grandes

mudanças institucionais em todas as esferas da sociedade, criando restrições à preservação de

velhas formas de organização, e gerando novos desafios para o progresso e o avanço social.

Na visão de Druck (1999b), o surto de competitividade que se deu em escala mundial

amplificou-se e atingiu a Bahia e, para o empresariado do complexo Petroquímico do Estado

tratou-se de recuperar a perda de competitividade internacional e nacional usando para este

fim a redução de custos e aumento da produtividade. Em relação a este processo, a autora

salienta que as principais mudanças implementadas estão centradas na organização do

trabalho, sustentadas num processo de enxugamento da empresa. Desta forma, verifica-se que

desde o início da década de 90, as empresas localizadas no Pólo Petroquímico de Camacarí

vêm passando por uma intensa reestruturação produtiva.

Teixeira (1993) enfatiza que os principais impactos das mudanças gerenciais e tecnológicas

na indústria química baiana se refletiram mais intensamente na força de trabalho. Dentro desta

perspectiva, o autor analisa que três fenômenos exercem papel importante dentro desta nova

conjuntura. São eles: - os efeitos da crise recessiva que se instala a partir de 1990; - a

implantação da Qualidade Total e o processo de terceirização.

De acordo com Barreto et. al. (2001) desde então, as demissões têm estado sempre presentes

no quotidiano dos trabalhadores, que têm presenciado uma acelerada redução nos postos de

trabalho. Isto tem ocorrido face às inovações organizacionais, somadas aos efeitos da atual

política econômica, sob o argumento de que as empresas precisam estar preparadas para

enfrentar a política de abertura comercial e financeira da economia. De fato:

O impacto do ajuste estrutural sobre o emprego na petroquímica baiana é refletido nos seguintes números. Em março de 1991, havia 8.081 pessoas trabalhando no conjunto de doze empresas de Camacarí, sendo que, deste total, 6.756 eram empregados diretamente (pessoal próprio) e 1.325 eram terceirizados, com vínculo empregatício com firmas prestadoras de serviços. Já em dezembro de 1997, havia um total de 5.180 empregados, sendo 3.285 pessoal próprio e 1.895 terceirizados. No ano seguinte, o número de empregados decresceu ainda mais, atingindo 4.085. Porém, houve uma redução maior entre os terceirizados, que somavam 840, do que de pessoal próprio, que atingiu 3.245, evidenciando uma mudança na política de pessoal das empresas. Houve, portanto, de 91 a 98, uma redução de 3.996 postos de trabalho, significando 49,5% do total. Quanto ao percentual de terceirizados, ele

passou de 16,3%, em 1991, para 36,5% da força de trabalho, em 1997, diminuindo para 20,5%, em 1998. (TEIXEIRA E MAGALHÃES, 2000, p.10)

Ao analisar as áreas mais atingidas pelo processo de terceirização nas empresas do Complexo

Petroquímico Baiano, Druck (1999b) destaca que, em primeiro lugar, estão as atividades de

apoio como serviços de limpeza, alimentação e serviço de vigilância e segurança patrimonial.

Em segundo lugar a área mais atingida é a de manutenção. Outra característica relevante é o

fato das empresas do Pólo terem sofrido reclamações trabalhistas por partes dos empregados

das terceiras na reivindicação do vínculo empregatício, condições salariais e de proteção

social.

Como observado, com o processo de terceirização, o contingente de empregos diretos passa a

ter redução durante toda a década de 90 e, como destacam Borges e Druck (1993), tal

processo, no Brasil, vem a apresentar características peculiares tais como: atinge não apenas

atividades consideradas não estratégicas como limpeza, segurança, restaurante, etc., mas

também se estende à produção de elementos essenciais ao processo produtivo e a área de

manutenção; além de apresentar as seguintes conseqüências: ampliação dos excluídos no

mercado de trabalho, precarização das relações de trabalho, ampliação da imensa

desigualdade de poder, existente entre a oferta e a demanda no mercado de trabalho, etc.

De acordo com Nascimento (2003), os aspectos econômicos que levam à crescente prática de

terceirização das atividades exercidas pela empresa devem ser considerados não só pela ótica

econômica, mas, também, na sua visão juridico-trabalhista. Nessa perspectiva, os argumentos

contrários à terceirização podem ser resumidos, na visão do autor, na redução dos direitos do

empregado no que tange à promoções, salários, fixação na empresa e vantagens decorrentes

de convenções e acordos coletivos.

... ao invés de agir coletivamente, o trabalhador é seduzido a agir por conta própria, repassando seu conhecimento para a empresa, que dele se apropria a baixíssimo custo, em troca de promoções, melhorias salariais diretas e indiretas. Fragmenta-se a ação coletiva e o trabalhador acaba por desenvolver a “parceria” sonhada pelo capital. (...) Bem sucedida a sedução, a ação sindical fica desnorteada e continua a perder espaços significativos para o adversário. (DIAS, 1995, p. 21)

4 DINÂMICA SINDICAL DOS QUÍMICOS/PETROQUÍMICOS NA RMS FACE AO

PROCESSO DE TERCEIRIZAÇÃO

Neste capítulo, será feita uma breve análise do desenvolvimento e crise do sindicalismo

brasileiro para posteriormente tratar da dinâmica sindical do Sindicato dos Trabalhadores nas

Indústrias e Empresas Petroquímicas, Químicas, Plásticas e Afins da Bahia –

SINDIQUIMICA em face do processo de terceirização. Serão apresentados, com base na

pesquisa realizada nos periódicos do sindicato (1990-2005), o posicionamento sindical com

relação ao processo de terceirização. Neste sentido, o presente capítulo irá contemplar as

mudanças no tempo do pensamento sindical a respeito da terceirização; os impasses, desafios

e práticas que o movimento sindical tem enfrentado em função do avanço da terceirização e,

por último, será analisada a experiência de unificação do sindicato.

4.1 BREVE ANÁLISE DO DESENVOLVIMENTO E CRISE DO SINDICALISMO

BRASILEIRO

De acordo com Antunes (1985) a origem do sindicalismo no Brasil remonta do início do

século XX, no entanto, é com a entrada de Vargas no poder em 1930 que inicia-se uma nova

fase do sindicalismo brasileiro. Nessa época, surge a figura do sindicato pelego/

assistencialista usado pelo Estado para controlar a classe trabalhadora. Ou seja, o estado

varguista promoveu uma política de conciliação entre capital e trabalho, trazendo o

movimento sindical para dentro do aparelho do Estado. Os sindicatos estavam sujeitos à

interferência do governo, a lei limitava o tamanho da diretoria do sindicato e para existir, o

sindicato precisava de uma autorização formal do Ministério do Trabalho com a Carta

Sindical.

Ainda de acordo com o autor, os sindicatos podiam organizar e representar trabalhadores

pertencentes a uma categoria profissional ou por setor econômico, tendo como referência

geográfica mínima o município. A lei concedeu aos sindicatos a exclusividade de

representação, conhecida como unicidade sindical, onde apenas um sindicato reconhecido por

lei tem o direito de representar determinada categoria profissional no município, e criou o

imposto sindical, que se refere a um pagamento compulsório descontado em folha de

pagamento de todos os trabalhadores da categoria, mesmo os que não são sócios do sindicato.

A legislação também proibia, até 1988, a existência das centrais sindicais.

A partir de 1978 o sindicalismo brasileiro passa por uma fase de renovação. Na visão de

ALVES (2000), esta data é extremamente significativa na medida em que temos o

ressurgimento do movimento sindical no país, na luta pela resistência operária à

superexploração da força de trabalho. As greves de 1978/79, no ABC paulista, marcaram este

ressurgimento, na medida em que foi a primeira grande manifestação de descontentamento e

insatisfação dos trabalhadores em relação aos baixos salários e a ditadura imposta pelo

Regime Militar.

A partir de 1978, o cenário político e social é rico em experiências de organização e luta da classe trabalhadora no Brasil, numa perspectiva de unidade e luta contra o governo e contra os patrões. É uma luta salarial, de caráter generalizante, que envolve uma série de categorias assalariadas. Surge uma série de fóruns intersindicais (...). É possível salientar ainda uma série de eventos de greves gerais e de greves por categorias, e ainda greves por empresas, que atingem as mais diversas expressões da classe trabalhadora e uma série de manifestações que indicam, no decorrer dos anos 80, o espírito de luta e resistência operária e popular, de um Brasil que clamava por democracia política e social. Era uma “explosão do sindicalismo”, ou ainda, de um “novo sindicalismo”... (ALVES, 2000, p. 112)

Desta forma, observou-se no país, durante toda a década de 80 uma ação sindical combativa e

de confronto, sendo também neste período que nasce a Central Única dos Trabalhadores

(CUT), “uma das centrais mais duradouras e talvez com maior capacidade de mobilização da

história do sindicalismo brasileiro” (ALVES, 2000).

Em 1988 a Nova Constituição Federal amplia direitos trabalhistas, prevê direito à greve,

consagra o princípio de liberdade sindical, sem tutela estatal e permite a criação das centrais

sindicais, mas mantém o imposto sindical obrigatório. Os trabalhadores empregados

formalmente são representados por algum sindicato que, pelo menos uma vez por ano,

participam de negociações coletivas com o sindicato patronal e, os resultados destas

negociações são automaticamente estendidos a todos os trabalhadores da categoria, não

importando se o trabalhador é associado ou não ao sindicato da categoria.

Amadeo e Camargo (1996, p.70) enfatizam que “um ponto importante deste “novo

sindicalismo” é que, ao contrário do antigo vínculo entre líderes sindicais e o governo, da

ausência de organização no nível da fábrica e da pouca importância atribuída aos problemas

cotidianos dos trabalhadores, neste é adotada uma estratégia para organizar os trabalhadores

no nível da fábrica”.

Ou seja, durante os anos 80, no Brasil, a forte presença sindical nas fábricas garantia um

poder de barganha importante aos representantes sindicais. Contudo, a partir de meados dos

anos 90 isso começou a se modificar. As políticas neoliberais implementadas no país aliadas à

reestruturação produtiva levaram à redução dos postos de trabalho, acarretando uma

diminuição do nível de emprego nos setores econômicos onde havia uma maior penetração do

chamado "novo sindicalismo".

Apesar do número de greves continuarem elevados, as mobilizações passam a efetivar a nível

da empresa e não com paralisações de toda a categoria. Percebe-se que as mudanças pelas

quais vem passando a economia brasileira nos últimos anos, com a reestruturação das

empresas e os elevados índices de desemprego, tiveram reflexos no comportamento do

movimento sindical do país, levando-o a alterar suas formas de pressão com vistas a

conquistar melhores condições de vida e trabalho.

Observa-se que as reivindicações de hoje não são as mesmas de alguns anos atrás. Os

sindicatos não lutam mais por campanha salarial, mas campanha reivindicatória. Isso porque a

reposição salarial não é mais ítem principal da pauta em virtude, principalmente, da

estabilidade inflacionária, o centro das negociações passa a não ser apenas a questão salarial,

mas entram em pauta outras formas de remuneração como a PLR (Participação de Lucros e

Resultados) e os ganhos com produtividade. Por outro lado, os trabalhadores estão sendo

contratados sob condições precárias: sem carteira, jornadas extensas. As empresas buscam

uma reestruturação e a terceirização provoca a diminuição da base sindical. (DIEESE, 2000)

De acordo com dados do boletim DIEESE 2000 as estatísticas sobre as greves constituem-se

em bom exemplo destas modificações. Os dados sobre as paralisações realizadas durante a

década de 90 apontam um redireciomento da ação sindical, tanto no que se refere às

reivindicações apresentadas pelos trabalhadores quanto às estratégias de mobilização. Essas

mudanças consolidaram-se a partir de 1994, com a introdução do Plano Real, e são

conseqüências, fundamentalmente, de dois fatores: a redução dos patamares inflacionários e a

elevação das taxas de desemprego. (DIEESE, 2000, p.1)

Motivos das Greves 1993 1994 1995 1996 1997

Remuneração 61,5 76,8 49,3 40,1 32,4

Direito 23,7 18,6 36,8 42,2 43,0

Emprego 11,6 9,7 10,2 9,8 14,4

PLR (Participação de Lucros e Resultados) n/d n/d 9,2 17,7 15,1

Condições de trabalho 11,8 8,6 9,6 9,8 11,6

Sindical 5,4 8,2 7,4 2,8 4,5

Protesto contra medidas do governo 6,3 2,9 4,4 0,7 3,2

Jornada 3,4 3,3 4,5 11,5 7,6 Fonte: DIEESE, 2000 Distribuição das reivindicações no Brasil (1993-1997)

Ainda de acordo com DIEESE (2000), o período pós 94 marcou uma mudança nas

motivações das greves. As reivindicações sobre remuneração, apesar de ainda manterem

grande importância, deixaram de ser a principal causa das greves, que passou a ser o

descumprimento de obrigações trabalhistas por parte do empresariado.

Sendo assim, o sindicalismo da década de 90 no Brasil, apesar de chegar nesta década como

um ator político reconhecido pelo Estado e pelo empresariado, tende a não demonstrar a

mesma vitalidade política da década de 80. Os sindicatos vão perdendo o potencial para

unificar e representar os trabalhadores mantendo uma postura defensiva ao buscar apenas

manter os direitos conquistados ao longo da década de 80.

Essas transformações têm fortes impactos sobre os trabalhadores e os sindicatos, levando a

uma precarização e um enfraquecimento da ação coletiva, pulverizando o poder sindical e

colocando os sindicatos numa posição defensiva. É o que se evidencia com o Sindicato dos

Petroquímicos, considerado a vanguarda do movimento sindical de Salvador, que se tornou a

referência para as demais categorias profissionais em toda a década de 80. No decorrer da

década de 90, e ainda hoje, verifica-se uma verdadeira “migração” de trabalhadores – ex-

petroquímicos – para outras categorias, principalmente de serviços industriais e da construção

civil, cujos sindicatos são mais frágeis. (DRUCK, 1999b)

Esta postura defensiva dos sindicatos está ancorada na incapacidade estratégica do

sindicalismo brasileiro em adotar uma postura de confronto diante da nova ofensiva do

capital, que se caracteriza pelo enfraquecimento do coletivo do trabalho organizado,

principalmente através do desemprego e da terceirização. (ALVES, 2000)

A crise do sindicalismo deu-se em escala mundial. Enquanto no Brasil esta crise se faz

presente a partir da década de 90, os países centrais já estavam enfrentando este fato desde a

década de 80. Antunes (1995, p. 59) ao buscar analisar a crise dos sindicatos, identifica nos

ítens seguintes os contornos e dimensões desta crise: 1. uma nítida tendência de diminuição

das taxas de sindicalização; 2. um abismo que se amplia entre os trabalhadores "estáveis", de

um lado, e os trabalhadores vinculados ao trabalho precarizado, de outro, o que enfraquece o

poder sindical ; 3. avanços na organização sindical dos assalariados médios; 4. intensificação

da tendência neocorporativa, que procura preservar os interesses do operariado estável,

vinculado ao sindicato, contra os segmentos que compreendem o trabalho precarizado; 5.

fragmentação e heterogeneização dos trabalhadores afetando as ações grevistas e 6. em razão

dos itens anteriores, obstaculizam-se as possibilidades de desenvolvimento e consolidação de

uma consciência de classe dos trabalhadores.

4.2 DESAFIOS DA DÉCADA DE 90: O DEBATE E A AÇÃO SINDICAL EM TORNO DA

TERCEIRIZAÇÃO14

4.2.1 Análise do posicionamento sindical face à terceirização

É fato, entre os diversos autores analisados anteriormente, que o processo de terceirização

colocou para o movimento sindical vários problemas relacionados com a degradação das

condições de trabalho, a redução das conquistas sindicais, a diminuição do número de

empregos e a diferenciação de direitos entre os trabalhadores diretos e os terceirizados.

Dentro desta perspectiva, foi observado, através do levantamento de informações nos boletins

do sindicato dos químicos e petroquímicos da Bahia, que este sindicato demonstrou, ao

decorrer da década de 90, uma crescente preocupação com a proliferação do processo de

terceirização nas empresas químicas/ petroquímicas da RMS. As denúncias feitas nos boletins

semanais são constantes e expressam esta preocupação, na medida em que a ação sindical tem

14 Os dados e informações analisados neste item foram obtidos através dos boletins fornecidos pelo sindicato referentes a 1990/2006. No sub-item 4.2.2 também foram utilizadas informações do site do sindicato na internet: www.sind.org.br .

o papel essencial no sentido de intervir numa dinâmica da implantação de mudanças na

organização da produção, como é o caso da terceirização.

NOVA FORMA DE EXPLORAR. Um fantasma começou a rondar o pólo e trazer sérios problemas: a terceirização. A terceirização hoje coloca-se como um desafio para os trabalhadores. Para os patrões ela chegou como uma verdadeira dádiva, pois, ao contrário dos países de primeiro mundo, onde os direitos dos trabalhadores são iguais tanto para o empregado direto como para o de empreiteiras, aqui só há a ampliação da exploração: - maior rotatividade da mão-de-obra; - enfraquecimento do movimento sindical; - favorecimento dos donos das terceirizadas, geralmente diretores, acionistas ou gerentes de empresas. Por outro lado devemos questionar também a “qualidade” tão propagandeada pelos empresários. Será que os trabalhadores, já tão explorados no dia a dia, vão se empenhar pela qualidade e produtividade, num emprego indireto, onde são mais explorados e discriminados? (BOLETIM GRAVE, 14/08/1992).

Desta forma, percebe-se que a idéia veiculada pelo sindicato no início da década é a de que a

terceirização, na medida em que fragmenta a classe trabalhadora, coloca sérias dificuldades a

uma luta conjunta. Por essa razão, a posição sindical, expressa nessa matéria, é de rejeição

não apenas à terceirização em si, mas a tudo o que envolve a chamada flexibilização das

relações de trabalho, aí incluído os Programas de Qualidade Total.

O sindicato demonstra uma noção específica dos prejuízos trazidos pela terceirização,

entendida como prática da gestão do trabalho que leva a uma precariedade das condições de

trabalho, à redução de direitos trabalhistas, desemprego, etc. É o que indica as informações

coletadas nos boletins do sindicato sobre a prática da terceirização, no período de 1990 a

2005. Em todos os anos, estes sindicalistas sempre tiveram uma percepção política clara da

terceirização como principal problema enfrentado pela categoria embora, como será analisado

adiante, percebe-se uma mudança de posicionamento do sindicato em relação ao processo de

terceirização a partir de meados da década de 90.

De acordo com o posicionamento do sindicato, a terceirização é um processo que esconde

armadilhas e trouxe efeitos danosos para os trabalhadores e para o movimento sindical.

Dentro desta visão, a terceirização faz parte de um amplo processo de reestruturação

administrativa com o intuito de reduzir custos, aumentar o controle sobre os trabalhadores e

incrementar a produtividade, aumentando o lucro. Ao serem distribuídos por diversas

empresas, os trabalhadores têm dificuldade de adquirir identidade de classe, fundamental pela

luta de melhores salários e condições de trabalho. Há uma considerável perda do nível de

salários e vantagens, além da drástica redução do número de empregos, pois grande parte dos

trabalhadores não é absorvida pelo mercado, dado que as empreiteiras já são criadas com

estruturas enxutas.

Hoje dos 20 mil empregos, restam apenas 6 mil. O processo de terceirização veio para intensificar a exploração da mão de obra com salários reduzidos, mais jornada de trabalho e sem quase nenhum benefício. Aliás, são os terceirizados que mais morrem no Pólo, em 10 anos já são 26 mortes! (BOLETIM UNIFICADO DOS QUIMICOS E PETROLEIROS, 26/06/1998).

Segue-se que as demissões receberam destaque nas pautas sindicais, o que colocava a

terceirização como um risco na visão do sindicato. A rejeição dos sindicalistas à terceirização

é sustentada normalmente pelo argumento de que ela provoca a descentralização das

atividades e pulveriza a representação dos trabalhadores. Além da precarização das condições

de trabalho, assiste-se a uma fragmentação das identidades coletivas, causadas pela ameaça

constante do desemprego, pela discriminação sofrida e pela individualização nas relações de

trabalho. Esse quadro contribui para o enfraquecimento da organização do trabalhador, pois

no espaço da fábrica convivem trabalhadores com estatutos diferentes e direitos diferenciados:

são os trabalhadores contratados diretamente e os trabalhadores das empreiteiras.

Este fato é expresso na medida em que o trabalhador, ao ser terceirizado, muitas vezes muda

de categoria profissional, saindo da base de representação do sindicato dos

químicos/petroquímicos, passando a fazer parte de outro sindicato (de limpeza, vigilância,

alimentação, engenheiros, etc.) que não tem o mesmo poder de mobilização. Além disso, o

sindicato também enfatiza os prejuízos causados pelo processo de terceirização em termos de

deterioração financeira para a entidade:

As demissões em massa que tem ocorrido em todas as categorias, em função das

mudanças na estrutura empresarial, acabam afetando diretamente os recursos para

sustentar as entidades, fazer campanhas públicas, publicações periódicas e

especializadas. Em 1990 nossa receita era o dobro dos nossos gastos. A categoria era

composta de 16 mil trabalhadores e o numero de associados estava num patamar que

refletia o grau de consciência dos químicos/petroquímicos da Bahia, cerca de 8300

sindicalizados em 1992. As demissões iniciadas em 1990 reduziram o quadro de

trabalhadores diretos a um terço, enquanto centenas de empreiteiras foram criadas

oferecendo péssimas condições de trabalho. Como conseqüência, o numero de

associados também diminuiu drasticamente, apesar de manter a proporção dentro do

universo de contratos diretos. Ao mesmo tempo, assistimos nos últimos sete anos a

queda da segurança dentro das fábricas, o surgimento de múltiplas funções, o

arrocho salarial e, o pior de tudo, dezenas de acidentes com trabalhadores

terceirizados, na maioria dos casos por falta de treinamento e qualificação

profissional. (BOLETIM UNIFICADO DOS QUIMICOS E PETROLEIROS,

16/04/1997)

Diante desta realidade o sindicato apresentou um discurso de combate às demissões e à

terceirização, estando a luta do movimento sindical dos químicos /petroquímicos, no início da

década de 90, ancorado nestes termos:

Temos que combater as demissões e a contratação de empreiteiras; lutar por direitos iguais no local de trabalho; formação de sindicato único ou ação conjunta dos sindicatos envolvidos; batalhar por leis que regulamentam o trabalho temporário e terceirizado. (BOLETIM GRAVE, 05/08/1992).

De acordo com a visão do Sindicato extraída dos boletins, este considera que a terceirização

foi feita de forma desordenada e sem critérios, fazendo com que a maior parte das empresas

contratadas não cumprisse a legislação, nem oferecessem boas condições de trabalho.

Alguns aspectos da precarização do trabalho terceirizado encontrados principalmente em

áreas como Manutenção Industrial, de acordo com os boletins do sindicato são: a falta de

equipamentos de proteção individual (EPI) (Capacete, protetores contra ruídos, cinto de

segurança, botas etc.); condições insalubres e perigosas de trabalho; péssima alimentação;

ausência de assinatura na carteira profissional; dobra de turno sem transporte de volta para

casa; desgaste físico; na maioria dos casos não há assistência médica; exploração com excesso

de trabalho; salários baixíssimos; exploração com aumento de jornada, principalmente para os

vigilantes; contrato irregular de trabalho como o fato de contratar o pessoal como ajudante de

limpeza, mas colocar todo mundo para trabalhar na linha de produção; não pagamento do

FGTS - quando da dispensa -; empregados com férias vencidas; algumas empresas não

oferecem contra-cheque; até casos mais graves, como lesões e mortes nas plantas das

contratantes.

Com a conversa fiada de que a contratação de terceiros visa melhorar a qualidade, uma vez que as empresas contratadas são especializadas no serviço, eles (os empresários) vão fazendo o que querem. Se a terceirização aumenta a qualidade, então porque os salários dos terceirizados são reduzidos à metade ou até 1/3 do que os trabalhadores das empresas recebiam para fazer o mesmo serviço? Porque os encargos não são mantidos? Porque alguns terceirizados não têm sequer a carteira assinada? Porque as jornadas de trabalho são elevadas? As empresas submetem os terceirizados a precárias condições de trabalho sem proteção coletiva ou individual e sequer mandam realizar os exames médicos. As empresas não enxergam que a alta

rotatividade tem aumentado consideravelmente o numero de acidentes, porque os trabalhadores, com medo de demissão trabalham sob tensão e num clima de instabilidade emocional. Vale notar que hoje o numero de terceirizados é maior que o numero de trabalhadores com vinculo de trabalho direto! (GRAVE, 14/07/1993).

Outros aspectos dizem respeito à condição de trabalho mesmo para os trabalhadores diretos

que permanecem na empresa. Trabalhadores que ficam na empresa são obrigados a exercer,

além de suas funções, as atribuições dos demitidos o que gera sobrecarga de trabalho em

decorrência do enxugamento e deteriorização dos salários sob a ameaça do desemprego:

Tratados como “sub-trabalhadores” os terceirizados são considerados iguais aos diretos apenas na hora do cumprimento do deveres. Na hora de usufruírem os direitos adquiridos pela nossa convenção coletiva, são discriminados. Com drástica eliminação dos postos de trabalho, os trabalhadores diretos, por sua vez, permanecem na fábrica desempenhando papéis múltiplos, fazendo serviço de 2 ou 3 pessoas. Em contrapartida, o salário pago a eles é 5 vezes menor do que recebiam em abril de 1990. (BOLETIM GRAVE, 10/10/1995)

Desta forma o sindicato considera a terceirização como um sinônimo de exploração, ao tratar-

se de um processo selvagem que só tira as vantagens conquistadas:

Aqui a terceirização serve apenas como redução de custos, seja pelo corte de pessoal ou pelo achatamento dos salários, com o fim de algumas conquistas, como a quinta turma, jornada de trabalho e assistência médica. (BOLETIM GRAVE, 31/05/94)

Outro tipo de denuncia bastante freqüente nos boletins diz respeito às condições de saúde e

segurança dos trabalhadores terceirizados. As áreas terceirizadas, atualmente, como visto no

capitulo 3 deste trabalho, são as nucleares da empresa. Essa mudança não transfere, na

maioria das vezes, a tecnologia para as empreiteiras, ocasionando com isso o aumento dos

riscos para o trabalhador na medida em que aumentam as possibilidades de acidentes no

processo de trabalho, pois, em casos cada vez mais freqüentes trabalhadores terceirizados se

acidentam por não conhecerem os mecanismos de funcionamento das máquinas que operam.

A terceirização selvagem e a redução irresponsável dos postos de trabalho que hoje se verifica nas empresas do ramo químico/petroquímico não vem colocando em dificuldades apenas a classe trabalhadora com a redução de conquistas, achatamento dos salários e perda de direitos adquiridos. Põe em risco também a integridade física dos trabalhadores e a preservação do meio ambiente. Vazamentos, explosões e todo o tipo de acidentes estão se tornando cada vez mais comum no setor. (BOLETIM GRAVE, 04/12/1995).

Em virtude desta preocupação do Sindicato com a crescente incidência de acidentes, que

afetaram principalmente os trabalhadores terceirizados, esta entidade lançou em janeiro de

2000 a campanha intitulada por “ Em defesa da vida” . Esta campanha tinha como objetivo

tanto chamar a atenção da sociedade para o assunto como conscientizar os trabalhadores para

o risco da degradação das condições de trabalho e o risco para o meio ambiente na indústria

química/petroquímica da Bahia. Na campanha o Sindicato chama a atenção para o fato de que

na maioria dos acidentes ocorridos no Pólo as vítimas mais freqüentes são os trabalhadores

terceirizados:

Os trabalhadores do Pólo estão morrendo vítimas de acidente de trabalho. Os constantes vazamentos de petróleo estão poluindo o meio ambiente. Para tentar reverter esta situação, o Sindicato iniciou 2000 lutando pela segurança e defesa da vida. De acordo com as estatísticas da entidade, em 12 anos foram 41 companheiros mortos. Em 1999, foram mais de 40 acidentes com 14 feridos e 6 mortos. A vítima mais comum é o trabalhador terceirizado. (BOLETIM UNIFICADO DOS QUIMICOS E PETROLEIROS, 25/01/2000). (...) Destas 40 mortes, 30 eram de trabalhadores terceirizados. O Sindicato diante da avalanche de acidentes ocorridos no pólo, nos setores de plásticos e petróleo, tomou a iniciativa de desenvolve r uma Campanha Universitária em Defesa da Vida com o objetivo de mostrar à sociedade baiana a verdadeira realidade e condições de trabalho dos petroquímicos e petroleiros. (BOLETIM UNIFIACDO DOS QUIMICOS E PETROLEIROS, 28/02/2000).

Para divulgar a campanha o Sindicato usou de diversos recursos áudio/visuais tais como a

instalação de outdoors em locais estratégicos com os seguintes temas: Não há lucro que pague

uma vida – “O Pólo Mata” e a “Indústria do Petróleo Mata”; além disso, o sindicato convocou

uma coletiva com a imprensa para denunciar os constantes acidentes e mortes nesta área.

Com relação ao posicionamento do Sindicato em relação ao processo de terceirização

observou-se que desde o inicio da década de 90 até meados desta (94/95), o Sindicato

vinculava em seus boletins frases que explicitavam rejeição total a implantação do processo

de terceirização: ‘É preciso protestar e dizer NÃO à terceirização’. Essa rejeição à

implantação do processo de terceirização também era muito discutida em assembléias e

congressos da categoria:

A campanha unificada vai ter como prioridade o reajuste mensal com reposição de 100% da inflação, aumento real dos salários, manutenção do turno de 6 horas, O FIM DA TERCEIRIZAÇÃO15 e das horas extras. Principais propostas aprovadas em assembléia: campanha salarial unificada, reajuste mensal de salários; recuperação das perdas desde 85; adicional de turno de 95%; manutenção da 5º turma; comissões de saúde; ; absorção de mão de obra das empreiteiras e FIM DA TERCEIRIZAÇÃO. (BOLETIM GRAVE, 19/07/1993).

15 Grifos meus que não constam no boletim.

È importante ressaltar que a bandeira defendida pelo sindicato de fim da terceirização, no

inicio da década de 90, pôde ser encontrada, inclusive, nas pautas reivindicatórias do período,

a exemplo da seguinte:

PAUTA REIVINDICATÓRIA JUNHO/ 94. CLAUSULA 25ª. TERCEIRIZAÇÃO. As empresas extinguirão os processos de terceirização de mão de obra, incorporando os trabalhadores terceirizados ao seu quadro pessoal. (BOLETIM GRAVE ESPECIAL, 28/06/94).

No entanto, a partir de meados da década (95/96) o movimento sindical parece já reconhecer a

nova realidade de que a terceirização faz parte de uma tendência mundial e parte importante

da divisão do trabalho. Em conseqüência, vem alterando as pautas de reivindicações,

incluindo aspectos contemporâneos como a participação dos colaboradores nos resultados da

empresa, ao mesmo tempo em que abandonam os velhos discursos contrários à terceirização.

Ao invés de se posicionar radicalmente contra o processo de terceirização, o sindicato passa a

ter um discurso na direção de negociar com as empresas a melhor forma de implantação desse

processo sem prejuízo para os trabalhadores:

PAUTA DE REIVINDICAÇÕES AGOSTO/95. Definição de parâmetros e regras gerais para a terceirização, investigação de empreiteiras contratadas que descumprem a legislação trabalhista. CLAUSULA 2º - TERCEIRIZAÇÃO (CONTRATAÇÃO DE MÃO DE OBRA DE TERCEIROS). “Em caso de contratação de mão de obra de terceiros nas forma previstas em lei, a empresa deverá negociar com o sindicato”. Parágrafo 1º - A negociação do processo de terceirização deverá garantir a preservação dos postos de trabalho com a readaptação e reaproveitamento dos trabalhadores atingidos. Parágrafo 2º - Os trabalhadores das empresas terceirizadas tem garantidos todas as cláusulas do acordo coletivo dos empregados diretos. Parágrafo 3º - A empresa respeitará a opção de representação sindical dos trabalhadores. (BOLETIM GRAVE, 28/06/1994) CAMPANHA REIVINDICATÓRIA AGOSTO- 1999/2000. – Garantia e geração de emprego; - redução de 10% da jornada de trabalho; - efetivo mínimo nas unidades operacionais; - Fim da discriminação antigo-novos e efetivos/terceirizados. (BOLETIM UNIFICADO DOS QUIMICOS E PETROLEIROS, 17/08/1999)

Com isso chega-se à conclusão de que apesar de o sindicato continuar se posicionando contra

o aspecto “espúrio” da terceirização, com as denúncias freqüentes de irregularidades por parte

das empreiteiras, abandona-se o discurso de “É preciso combater e dizer não a terceirização”.

Nesse sentido, acredita-se que não é inteligente ser meramente contra a terceirização. O

movimento sindical deve debruçar-se sobre a questão e analisar os reflexos que tal processo

acarreta às conquistas dos trabalhadores. O Sindicato deve ter a atenção voltada para a relação

que as empreiteiras vão estabelecer com os funcionários, qual será o salário, a jornada, os

benefícios e as demais conquistas sindicais.

Com vista disso, trajetória deste Sindicato caminha neste sentido e, em notícia divulgada no

boletim de setembro de 2005, propõe aos sindicatos que representam os trabalhadores

terceirizados (Sittican – Sindicato de Trabalhadores da Construção Civil; Simdilimp –

Sintercoba – Sindicato dos trabalhadores em empresas de alimentação, entre outros) que

elaborem uma lista de empreiteiras problemáticas, e que não pagam os direitos dos

trabalhadores, para protocolar nas empresas como recurso para transferir às empresas a

responsabilidade pelos problemas que venham a acontecer. (BOLETIM NA BASE,

10/09/2005).

Em suma, a percepção sobre a reestruturação produtiva pelo Sindicato tem importantes

avanços, como a denúncia das práticas da terceirização; a denúncia sobre a conivência das

contratantes com a precarização das condições de trabalho e saúde causada pelas empreiteiras,

etc.

No entanto, as formas de mobilização do Sindicato se dão apenas através de denúncias nos

boletins periódicos, campanhas áudio/visual, de paralisações nas fábricas e passeatas pela

cidade. Apesar de o Sindicato ter uma diretoria especifica para Empreiteiras responsável por

desenvolver uma política de apoio aos terceirizados, tentando diminuir a exploração,

principalmente daqueles que não têm sindicatos organizados, não foi percebida muitas ações

práticas na luta por melhores condições de trabalho. O que serve para confirmar a afirmação

feita por ALVES (2000), explicitada na seção anterior, de que o defensivismo dos sindicatos

está ancorado na incapacidade estratégica do sindicalismo brasileiro em adotar uma postura

de confronto diante da nova ofensiva do capital.

Apesar disso o sindicato dos Químicos/Petroquímicos buscou o seguinte passo como

alternativa e perspectiva de uma maior mobilização:

Os últimos congressos do Sindiquimica têm definido a clara opção da categoria pela organização por ramo de produção, como define a CUT. A partir daí, o sindicato vem trabalhando no sentido de promover fusões com outras entidades. Quanto ao segmento de petróleo, a decisão do nosso congresso e da atual diretoria é pela unificação do Sindiquimica, Stiep e Sindipreto dentro do principio do ramo de produção. (BOLETIM GRAVE, 23/01/1996).

4.2.2 Reflexões sobre a situação atual: a experiência de unificação

A ASPETRO (Associação dos Trabalhadores das Indústrias Petroquímicas, Químicas e Afins

da Bahia), fundada em 15 de abril de 1963, foi organizada como prolongamento das

atividades do SINDIPETRO (Sindicato da Indústria do Petróleo). Em 1984, por decisão do

Congresso dos Trabalhadores, delibera-se pela criação do PROQUÍMICOS, entidade que

reunia os trabalhadores das indústrias de produtos químicos para produção de materiais

plásticos, farmacêutico, inseticidas e fertilizantes. Em 1989, aponta-se o fim do

PROQUÍMICOS e a reunificação destes trabalhadores no SINDIQUÍMICA, inaugurando um

único sindicato para representar todos os trabalhadores nas empresas petroquímicas, químicas,

plásticas e afins do Estado da Bahia.

Sendo assim, O Sindiquimica, filiado à CUT, representava os trabalhadores das indústrias

químicas petroquímicas e afins, localizadas no pólo petroquímico de Camacarí, CIAS, Região

Metropolitana de Salvador e Feira. Alguns momentos são marcantes na atuação do

Sindiquímica, como a Greve de 1985, primeira paralisação de um Pólo Petroquímico no

mundo, que conquistou a elevação dos Adicionais de Turno para 88,5 % e a implantação da 5ª

Turma em 1988.

Em meados da década de 90 diante da nova conjuntura política do país de ajuste neoliberal e

abertura comercial, bem como, com o advento da globalização e a reestruturação do setor

petroquímico, o Sindicato do ramo químico/petroquímico começa a colocar em suas pautas de

discussões a possibilidade de unificar o Sindicato por ramo de produção, como define a CUT.

23/01/96 UNIFICAÇÃO JÁ. É fundamental que a categoria e as diretorias das três entidades envolvidas neste processo compreendam que a unificação é uma questão importante, principalmente nesta atual conjuntura, na qual o governo tenta a todo custo enfraquecer os movimentos organizados e em especial o movimento sindical. Porém é fundamental compreender também, que a unificação não pode ser tratada apenas como uma bandeira política ou cogitar que havendo unificação pode-se a qualquer momento promover o fracionamento. Juntos somos mais fortes. (BOLETIM GRAVE, 23/01/1996)

Entre os objetivos defendidos pelo Sindicato para a unificação estão a redução de custos

operacionais e a mobilização conjunta. O sindicato também colocava a Unificação como uma

questão de sobrevivência:

UNIDOS, FORTES, RUMO AO FUTURO. Aglutinar, reduzir custos, tornar o sindicato mais ágil, mais eficiente, com maior poder de pressão. Estes são os objetivos da unificação que orientam a idéia da unificação entre sindicatos com atividades fins. No caso dos petroleiros e petroquímicos esta se tornou uma questão de sobrevivência. Estamos diante de um governo que é inimigo do movimento sindical. Um presidente que tem projetos políticos onde a organização dos trabalhadores é considerada entrave para as ações neoliberais como privatizar estatais, reduzir conquistas, etc. Mas do que nunca unificar agora é um desafio que pode abrir as portas para uma nova era do sindicalismo brasileiro. (BOLETIM GRAVE, 17/04/1996)

O Sindicato realizou um plebiscito em 15/01/1996 com toda a categoria para definir a questão

da unificação do Sindiquimica, Sindipetro e Stiep. O resultado do plebiscito demonstrou que,

dos trabalhadores que votaram, 77,7% optaram pela unificação por ramo de produção e

apenas 22,3% foram contrários à unificação.

Em maio de 1997 o Congresso da Categoria unificou Petroleiros e Petroquímicos o que deu

inicio ao processo de fusão das estruturas físicas das entidades:

Com a reestruturação produtiva, a terceirização, as demissões em massa e a redução de trabalhadores do setor, a fusão das entidades afins tornou-se uma necessidade urgente. Além de uma estratégia política, unificar os trabalhadores por ramo de produção significa reduzir custos na estrutura sindical tornando a máquina mais ágil e eficiente e, portanto, apta a responder a todos os desafios desta conjuntura.. Mesmo com bons desempenhos, as empresas tem concedido reajustes salariais pouco satisfatórios, sentindo-se à vontade num momento em que os trabalhadores temem perder seus empregos. É preciso barrar este processo de demissões e pressionar o governo a criar uma política de geração de empregos. A unificação por si só não faz milagres, mas é um grande passo em direção ao futuro. Unificar sindicatos afins é uma tendência mundial que se acelera a cada ano. (BOLETIM GRAVE, 03/03/1997)

Alguns setores do SUP e Sindiquimica começam o processo de fusão em 1997 com a gráfica

e o setor de imprensa, incluindo a biblioteca passando a funcionarem juntos. Com essa fusão

administrativa os Boletins do Sindicato deixaram de entitular-se GRAVE e passaram a

entitular-se BOLETIM UNIFICADO DOS QUIMICOS E PETROLEIROS. Em avaliação de

um ano de fusão administrativa o sindicato colocou-se nos seguintes termos:

Após um ano da unificação administrativa dos dois sindicatos avaliamos que a estratégia política da fusão foi acertada. Estamos ainda em meio ao processo, unificando gradualmente os setores num ritmo bastante estimulante. Aos poucos vamos cumprindo o objetivo de reduzir custos e tornar a estrutura sindical mais ágil e eficiente, apta a responder aos desafios que permeiam a luta da categoria. A política neoliberal do governo piora a cada dia a qualidade de vida do trabalhador. O alto índice de desemprego, a legalização do contrato temporário de trabalho e a reestruturação industrial são alguns dos ataques do Governo. A unidade é resposta a esta conjuntura. Vamos continuar, portanto a caminhada em direção a um sindicato

único e forte. (BOLETIM UNIFICADO DOS QUIMICOS E PETROLEIROS, 15/03/1998)

Em 25 de abril de 2000 foi reconhecida, oficialmente, a união do Sindiquímica com o SUP

(Sindicato Único dos Petroleiros - fruto da união do STIEP e o Sindipetro). Neste momento,

surgiu o maior Sindicato do Norte/Nordeste, o Sindicato dos Trabalhadores do Ramo

Químico e Petroleiro do Estado da Bahia que representa mais de 20 mil trabalhadores em

atividades do ramo químico e petroleiro, plástico, fertilizante, produção de sabão e vela e

materiais plásticos e farmacêuticos no Estado da Bahia. A partir de 2005, o Boletim do

Sindicato Unificado passa a ser impresso com o seguinte nome: NA BASE.

O Sindicato conta com duas sedes e mais 13 sub-sedes distribuídas por cidades do interior do

Estado. O Sindicato do Ramo Químico e Petroleiro conta hoje com 10 departamentos. Entre

eles está o de saúde que faz um trabalho de prevenção e orientação e atende aos trabalhadores

com doenças ocupacionais.

Em suma, o processo de unificação do Sindicato dos Químicos e Petroquímicos com o

Sindicato Único dos Petroleiros fez parte de uma estratégia para tentar tornar os movimentos

organizados mais fortes e unidos diante das diversas mudanças ocorridas tanto no cenário

político do país como na estrutura de organização empresarial. O Sindicato posicionou-se da

seguinte forma em relação à unificação:

Chegamos à conclusão que a unificação seria a única saída para sobrevivermos em um país que adotou uma política de massacre dos trabalhadores e de desmanche dos sindicatos. Temos certeza de que agora estamos mais fortalecidos! (BOLETIM UNIFICADO DOS QUIMICOS E PETROLEIROS, 28/11/2001)

5 CONCLUSÃO

Conforme foi analisado ao longo do texto, nesta virada de século surgiram novos paradigmas

de produção impulsionados pelo aumento da competitividade entre os blocos econômicos.

Nesse cenário, o fenômeno da terceirização é defendido como um novo padrão de

descentralização/externalização da produção pautado em relações de qualidade e cooperação

inter-empresas, constituindo-se assim numa nova estratégia do capital. Dentro desta

perspectiva, o contexto dos anos 90 mostrou-se adverso à ação sindical em função da

pulverização da classe trabalhadora impulsionada pelo processo de terceirização.

Esta monografia buscou evidenciar as mudanças no tempo do pensamento sindical, mais

especificamente do Sindicato dos trabalhadores químicos e petroquímicos da Bahia, a respeito

da terceirização; os impasses, desafios e práticas que o movimento sindical tem enfrentado em

função do avanço da terceirização. A título de conclusão verificou-se uma mudança de

posicionamento do sindicato em relação ao processo de terceirização na medida em que o

sindicato abandonou os discursos do início da década que preconizavam a extinção deste

processo, passando a buscar um diálogo sobre este processo através das pautas

reivindicatórias. Contudo, o Sindicato continua denunciando em seu periódico os efeitos

danosos deste processo.

A terceirização está inserida num contexto muito mais amplo, que remete ao conjunto de

transformações ocorridas na organização do capitalismo, bem como, configura-se como

elemento essencial da divisão social do trabalho. Ser contra a terceirização é negar a tendência

mundial de gestão que envolve qualidade e capacidade de competir no mercado internacional.

De acordo com Cardoso (1999), a renovação dos processos de produção tem como

conseqüência imediata a redução de efetivos de operários. No curto prazo, interessa aos

trabalhadores tentar impedir as demissões, o que levou vários sindicatos a resistir pura e

simplesmente à modernização como um todo no inicio da década.

No entanto, esta resistência pode levar à perda de competitividade de algumas ou de todas as

empresas de um determinado setor em modernização. No limite, isso pode redundar em mais

desemprego do que seria gerado pela própria renovação produtiva. Em conseqüência, os

sindicatos vêem-se na contingência de incorporar, entre seus objetivos e interesses, os

interesses próprios do capital relativos à reestruturação, interesses que redundarão no

sacrifício de parte de sua base de sustentação. O sindicato sobreviverá, mas muitos

trabalhadores perderão o emprego. (CARDOSO, 1999, p. 165)

Contudo, o sindicato não pode aceitar de forma passiva a implementação de práticas que estão

precarizando as condições de trabalho. Os sindicatos se vêem diante de um desafio de dupla

dimensão. Em primeiro lugar, intrumentar-se técnica e politicamente para intervir nesse

processo, e, em segundo lugar, buscar negociar as condições para evitar que a terceirização se

constitua num fenômeno de enorme prejuízo para os trabalhadores. Assim, cabe aos

sindicatos lutar para que ela se instale em sua forma autentica, com feição moderna, onde a

redução de custos da empresa viria, principalmente, pela melhoria da produtividade e da

qualidade, tentando afastar do cenário do país a chamada terceirização espúria.

Neste aspecto, o sindicato analisado mostrou-se atuante, na medida em que denuncia

constantemente os abusos impostos pelo processo e ao procurar diálogo com os sindicatos das

empresas terceirizadas na busca de definir objetivos conjuntos. Neste sentido, o sindicato em

questão vem atuando no sentido de tentar dar respostas aos novos desafios trazidos pelas

mudanças no mundo do trabalho, como a terceirização. A unificação com o Sindicato Único

dos Petroleiros, o que criou o Sindicato do Ramo Químico e Petroleiro da Bahia, revelou uma

estratégia de ação para amenizar os efeitos danosos da reestruturação produtiva na medida em

que a união por Ramo de Produção acaba por aumentar a base do sindicato e sua capacidade

de mobilização.

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Ficha catalográfica elaborada por Valdinéia Veloso CRB 5-1091

Oliveira, Elaine de Souza O48 Terceirização Sob a Ótica do Sindicato: o caso do sindicato dos

trabalhadores nas indústrias e empresas petroquímicas, químicas e afins da Bahia (1990-2005) / Elaine de Souza Oliveira. __ Salvador, 2006.

61 f. Monografia (Graduação em Ciências Econômicas) Universidade

Federal da Bahia, Faculdade de Ciências Econômicas , 2006. Orientador: Profº. Dr. Wilson Ferreira Menezes 1. Indústria Petroquímica - Bahia 2. Terceirização 3. Sindicatos I.

Menezes, Wilson Ferreira II.Título CDD – 338.7661804