The Lightning Tree

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    THE LIGHTNING TREE

    Patrick Rothfuss

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    Equipe de tradução:Daniela Cajado, Felipe Bertoldo, Lucas Dias

    Revisores:Bárbara Nery, Vagner Stefanello, Marlon

    “A Árvore Relâmpago”

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    Bestseller do New York Times, Patrick Rothfuss ganhou grande popularidade e aclamaçãona crítica com a publicação de seu romance de estreia, O Nome do Vento. O segundo romance

    da série, O Temor do Sábio, foi recebido com o mesmo sucesso e aclamado novamente em todo

    o mundo. Outros projetos de Patrick incluem um livro infantil de humor negro, The Adventuresof the Princess and Mr. Whife, e Worldbuilders, um projeto benecente que arrecadou mais que2 milhões de dólares para a Heifer International desde que ele a fundou em 2008.

      Aqui ele nos leva para a icônica Pousada Marco do Percurso am de acompanhar um dia típico

    na vida de um dos personagens mais populares da Crônica do Matador do Rei, o misterioso Bast,ostensivamente um ajudante, o qual é muito mais do que aparenta ser – um dia no qual Bast

    aprende muitas lições, e também ensina algumas.

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    THE LIGHTNING TREE “A Árvore Relâmpago” 

    M  ANHÃ – A Estrada Estreita  Bast quase saiu pela porta dos fundos da pousada Marco do Percurso. Elena verdade já havia saído, ambos os pés estavam fora da soleira e a porta estavaquase completamente fechada atrás dele antes que escutasse a voz do seu mestre.Bast deteve-se, com a mão no trinco. Ele franziu o cenho ao atravessar a porta,a um palmo de ser fechada. Ele não fez nenhum barulho. Ele sabia. Ele erafamiliarizado com todas as partes silenciosas da estalagem, quais assoalhosrangiam, quais janelas emperravam... As dobradiças da porta dos fundos rangiam

    às vezes, dependendo do seu estado, mas isso era fácil de resolver. Bast dirigiuseu punho ao trinco, levantando-o para que o peso da porta não ficasse tãogrande, para que fechasse facilmente. Sem rangido. A porta giratória estavamais leve que um suspiro.  Bast pôs-se de pé e sorriu. Seu rosto era doce, astuto e selvagem. Ele pareciauma criança malcriada que acabara de roubar a lua e a comera. Seu sorriso eracomo o último pedaço da lua remanescente, um fragmento branco e perigoso.

    “Bast!“

      O chamado veio de novo, mais alto desta vez. Nada tão grosseiro quantoum grito, seu mestre nunca se rebaixaria a berros. Mas quando ele queria serouvido, seu barítono não seria parado por alguma coisa tão insignificantequanto uma porta de carvalho. Sua voz foi transportada como uma buzina, eBast sentiu seu nome sendo tragado como uma mão ao redor de seu coração.Bast suspirou, então abriu a porta suavemente e caminhou de volta para dentro.Ele era escuro, alto e amável. Quando caminhava parecia que estava dançando.

    “Sim, Reshi? “ ele falou.

      Após um momento o hospedeiro entrou na cozinha, ele usava um aventalbranco e limpo e seus cabelos eram vermelhos. Além disso, ele era dolorosamentebanal. Seu rosto mantinha a serenidade dos hospedeiros entediados de todasas partes. Apesar de ser cedo, ele parecia cansado. Ele entregou um livro decouro a Bast.

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      “Você quase esqueceu isto “ ele disse sem nenhum vestígio de sarcasmo.Bast pegou o livro e fingiu estar surpreso.

      “Oh! Obrigado, Reshi ““  O hospedeiro deu de ombros e sua boca tomou a forma de um sorriso.

    “Sem problemas, Bast. Enquanto você se ausenta para realizar seus afazeres, seimportaria de pegar alguns ovos?” Bast assentiu, pondo o livro embaixo do braço.  “ Mais alguma coisa?“ perguntou obedientemente.

    “Talvez algumas cenouras também. Estou pensando em fazermos ensopadonesta noite. É tempo de colheita, então precisamos estar prontos para umagrande clientela.” Sua boca curvou-se um pouco quando disse isso.  O hospedeiro começou a voltar, então parou.

    “Oh, o garoto dos Willyams veio aqui procurando por você nesta última

    noite. Não deixou nenhum tipo de mensagem.”  Ele ergueu uma sobrancelha para Bast. O olhar falou mais do que fora dito.“Não tenho a mínima ideia do que ele queria.“ disse Bast.O hospedeiro fez um barulho evasivo e se virou de volta em direção ao saguão.

      Antes que ele desse três passos, Bast já estava porta afora, correndo atravésdos raios de sol matutino.  No momento em que Bast chegara, havia duas crianças esperando. Elasbrincavam no enorme monólito cinzento que estava meio caído na parte inferior

    da colina, escalando por seu declive, e pulando na grama alta.No topo ficava o que as crianças chamavam de árvore relâmpago, emboraatualmente era um pouco mais do que um tronco sem ramificações quasetão alto quanto um homem. A casca havia tempo que tinha caído, e o sol tinhaesbranquiçado a madeira, que ficara tão branca quanto um osso. Toda a árvoreexceto o topo, onde mesmo após todos estes anos a madeira era carbonizadanum preto áspero .  Bast tocou o tronco com as pontas dos dedos e circulou lentamente a árvore.

    Ele foi no sentido horário, na mesma direção que o sol se movia. A maneiracorreta de se fazer. Então virou-se e trocou de mãos, fazendo três círculos lentosanti-horários, opostos ao movimento do sol. Essa virada foi contra o mundo.Era a forma de contrariar. Indo e voltando, ele foi, como se a árvore fosse umcarretilho e ele o enrolava e desenrolava..  Finalmente, ele sentou-se com suas costas contra a árvore e colocou o livroem uma pedra perto. O sol brilhou nas letras douradas como ouro, CelumTinture. Então ele se distraiu jogando pedras no córrego vizinho que cortava

    abaixo da encosta do morro em frente a um monólito cinzento.  Depois de um minuto, um menino louro e rechonchudo marchou até acolina. Ele era o filho mais novo do padeiro, Brann. Ele cheirava como suor epão fresco e....algo mais. Algo que não se encaixava.  A abordagem lenta do menino tinha um ar ritualístico. Ele subiu a pequena

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    colina e ficou ali por um momento em silêncio, o único barulho que vinha eradas outras duas crianças brincando ali embaixo.  Finalmente Bast virou para examinar o rapaz. Ele não tinha mais que oitoou nove anos, bem vestido e mais encorpado do que a maioria das crianças dacidade. Ele carregava um chumaço de pano branco na mão. O garoto engoliunervosamente.  “Eu preciso de uma mentira.”  Bast assentiu com a cabeça.  “Que tipo de mentira?”  O rapaz cautelosamente abriu a mão, revelando que o chumaço de pano eraum curativo improvisado, salpicado com vermelho brilhante. Ligeiramentepreso na mão dele. Bast assentiu com a cabeça; Isso foi o que ele tinha sentido

    o cheiro antes.  “Eu estava brincando com as facas da minha mãe” disse Brann.  Bast examinou o corte. O corte era superficial na carne perto do polegar.Nada de grave.

    “Doi muito?”  “Nada comparado a surra que vou tomar se ela descobrir que eu estavabrincando com suas facas.”  Bast assentiu com simpatia

      “Você limpou a faca e a colocou de volta ?”  Brann assentiu com a cabeça. Bast tocou seus lábios, pensativamente.  “Você pensou que viu um grande rato preto. E se assustou. Você atirouuma faca nele e acabou se cortando. Ontem, uma das outras crianças contouuma história sobre ratos mastigando as orelhas e os dedos dos pés dos soldadosenquanto dormiam. Isso lhe causou pesadelos.”  Brann deu um arrepio. “Quem me contou a história?”  Bast encolheu os ombros. “Escolha alguém que você não goste.”

      O menino sorriu cruelmente.  Bast começou a indicar as coisas com os dedos.“Coloque um pouco de sangue na faca antes de jogá-la.” Ele apontou para

    o pano que o rapaz tinha embrulhado dentro da sua mão.  “Livre-se disso, também. O sangue é seco, obviamente velho. Você conseguefingir um bom choro?”  O rapaz abanou a cabeça, parecendo um pouco envergonhado pelo fato.  “Coloque um pouco de sal em seus olhos. Fique ranhento e choroso antes

    de você ir até eles. Lamente e chore. Então, quando eles te perguntarem sobresua mão, diga a sua mãe que se lamenta por ter quebrado sua faca.”  Brann escutava, abanando a cabeça lentamente no início e depois maisrápido. Ele sorriu.  “ Isso é bom.” Ele olhou ao redor nervosamente. “O que eu devo a você?”

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      “Algum segredo?” Bast pediu.  O menino do padeiro pensou por um minuto. - Velho Lant está cercado de viúvas... ele disse em um tom esperançoso  Bast acenou com a mão. - Há anos. Todo mundo sabe.  Bast esfregou seu nariz então disse. “ Você pode me trazer dois pães docehoje mais tarde?”  Brann assentiu com a cabeça.  “Este é um bom começo,” falou Bast. “O que você tem em seus bolsos? “  O rapaz cavou ao redor e ergueu ambas as mãos. Ele tinha duas arruelas deferro, uma pedra lisa esverdeada, um crânio de pássaro, um emaranhado decorda, e um pouco de giz.Bast pediu a corda. Assim, tomou cuidado para não tocar nas arruelas, pegou

    a pedra esverdeada entre dois dedos e arqueou uma sobrancelha para o garoto.  Após hesitar por um momento, o garoto assentiu.  Bast pôs a pedra em seu bolso.  “E se, de qualquer forma, eu for castigado? ” Brann perguntou.  Bast deu de ombros. “Isso é problema seu. Você quis uma mentira. Eu te deiuma decente. Se deseja que eu te livre desse problema, isso é algo completamentediferente. ”  O filho do padeiro pareceu desapontado, mas ele assentiu e desceu a colina.

      Próximo à colina havia um garoto um pouco mais velho em uma mantaesfarrapada. Um dos garotos dos Alard, Kale. Ele tinha um corte nos lábios euma crosta de sangue ao redor de uma das narinas. Ele estava tão furioso quantoum garoto de dez anos poderia estar. Sua expressão era de uma tempestade.  “Eu peguei meu irmão beijando Gretta atrás do velho moinho!” ele faloulogo quando ia em dispara para a colina, não esperando Bast falar. “Ele sabiaque eu tava a fim dela!”  Bast estendeu as mãos, impotente, encolhendo os ombros.

      “Vingança,” o garoto cuspiu.  “Vingança pública?” Bast perguntou. “Ou vingança secreta?”  O garoto tocou seu lábio cortado com a língua. “Vingança secreta,” ele disseem voz baixa.  “Quanto de vingança?” Perguntou Bast.  O garoto pensou um pouco, então posicionou suas mãos cerca de 60centímetros de distância “ Este tanto “  “ Hmmm” Disse bast. “ Quanto, em uma escala de um rato a um touro?”

      O garoto esfregou seu nariz por um instante. “ O equivalente a um gato,”ele disse. “ Talvez um cachorro. Não tipo o cachorro do Martin Maluco. Tipo ocachorro dos Bentons.”  Bast assentiu e inclinou sua cabeça de forma pensativa. “Certo,” ele disse. “Mije nossapatos dele.”

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      O garoto parecia cético. “Isto não soa como uma vingança no nível de umcachorro.”  Bast chacoalhou a cabeça. “Você mija num copo e o guarda. Deixe em repousopor um dia ou dois. Então numa noite quando ele por seus sapatos perto dofogo, despeje o mijo neles. Não faça uma poça, apenas deixe-os úmidos. Pelamanhã eles estarão secos e provavelmente não estarão tão fedidos...”  “Então qual é o sentido disso?” o garoto o interrompeu colericamente. “Issonão equivale nem a uma pulga!”  Bast ergueu a mão de forma pacificadora. “Quando os pés dele ficarem suados,ele vai começar a cheirar a mijo. Quando ele caminhar na neve, ele vai cheirara mijo. Vai ser difícil pra ele saber de onde vem exatamente este cheiro, mastodos saberão que o seu irmão é aquele que fede.” Bast sorriu para o menino.

    “Eu suponho que a sua Gretta não vai querer beijar o garoto que não para dese mijar.”  Uma admiração genuína se espalhou pelo rosto do jovem garoto como onascer do sol nas montanhas. “Isto foi a coisa mais maliciosa que eu já ouvi,”ele disse, boquiaberto.  Bast tentou parecer modesto e falhou. “Você tem algo pra mim?”  “Eu encontrei uma colmeia desabitada,” o garoto disse.  “Isto vai servir para o começo,” disse Bast. “Onde?”

      “ Foi bem distante dos Orissons. Passando o Pequeno Riacho” O meninoagachou-se e desenhou um mapa na terra. “Vê?”  Bast assentiu. “Algo mais?”  “Bem... Eu sei onde Martin Maluco esconde sua destilaria...”  Bast ergueu suas sobrancelhas ao ouvir isto. “Sério?”  O garoto desenhou outro mapa e deu algumas direções. Então ele levantou-se e tirou o pó dos joelhos. “Estamos quites?”  Bast esfregou seus pés na terra, destruindo o mapa. “Estamos quites.”

      Os garoto espanou os joelhos, “Eu tenho uma mensagem também. Rike quer vê-lo.”  Bast balançou sua cabeça firmemente. “Ele conhece as regras. Diga a ele quenão.”  “Eu já o avisei,” o garoto falou com um encolher de ombros comicamenteexagerado. “Mas falarei novamente se o vir...” 

    Não haviam mais crianças esperando depois de Kale, então Bast colocou o

    livro de couro sob seu braço e partiu numa grande caminhada sem rumo. Eleencontrou algumas framboesas e comeu-as. Ele bebeu do poço do Ostlar.  Eventualmente Bast subiu até o topo de uma ribanceira próxima onde eledeu uma grande espreguiçada, antes de esconder a cópia de capa de couro doCelum Tinture em um espinheiro disperso onde um largo ramo fez um recanto

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    aconchegante de frente ao tronco.Então ele olhou para o céu, limpo e brilhante. Sem nuvens. Com pouco vento.Cálido, mas não quente. Não havia chovido por um bom tempo. Não era umdia de mercado. Horas depois do meio-dia no Abate...  A sobrancelha de Bast ergueu-se um pouco, como se ele estivesse resolvendoum cálculo complexo. Então ele assentiu para si mesmo.  Logo Bast desceu pela ribanceira, passando pela casa do Velho Lant e emtorno das framboesas que limitavam a fazenda do Alard. Quando ele veio parao Pequeno Riacho, cortou alguns juncos e preguiçosamente talhou-os com umapequena e brilhante faca. Então pegou o barbante do bolso e os juntou, fazendoassim uma bem trabalhada flauta pastoril.Ele soprou por cima dela e inclinou sua cabeça para escutar sua doce dissonância.

    Sua faca brilhante aplainou mais um pouco, e ele soprou novamente. Dessa veza afinação estava próxima, o que fez um chiado irritante.  A faca de Bast moveu-se novamente, uma, duas, três vezes. Então ele a pôslonge e trouxe a flauta para perto de seu rosto. Ele respirava pelo nariz, sentindoo orvalho que vinha deles. Então ele lambeu a ponta dos juncos recém cortados,da sua língua brotou um súbito vermelho cintilante.  Então suspirou e soprou na flauta. Dessa vez o som era resplandecente comoo luar, vívido como um peixe saltitante, doce como uma fruta furtada. Sorrindo,

    Bast dirigiu-se para a parte de trás das colinas dos Bentons, e não demoroupara que ouvisse o baixo e estúpido balido de uma ovelha ao longe.  Um minuto depois, Bast veio sobre o cume de uma colina e avistou duasdúzias de ovelhas gordas e patéticas cortando a grama no vale verde abaixo.A umbra e o isolamento tomavam conta deste lugar. A falta de chuva recenteindicava que o pastoreio seria melhor ali. Os lados íngremes do vale denotavamque as ovelhas não estavam propensas a afastarem-se e isso não precisava demuita atenção.

      Uma jovem mulher sentou-se à sombra de um olmo disperso que dividiao vale. Ela havia tirado seus sapatos e sua boina. Seus cabelos longos e cheiostinham a cor de trigo maduro.Em seguida, Bast começou a tocar. Uma melodia perigosa. Ela era doce ebrilhante, vagarosa e astuta.  A pastora animou-se ao ouvir o som, ou assim ela aparentava. Ela levantou acabeça, empolgada... mas não. Ela não olhou em sua direção. Ela simplesmenteestava erguendo-se com os pés para se esticar, levantando-se alto sobre seus

    dedos, com as mãos entrelaçadas acima da cabeça.  Ainda assim, aparentemente sem ter percebido que estava sendo tocadauma serenata para ela, a jovem mulher pegou uma manta que estava próxima,espalhando-a por baixo da árvore, e sentou-se. Era um pouco estranho, comoela sentava-se antes sem a manta. Possivelmente ela havia sentido frio.

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      Bast continuou a tocar conforme andava pela encosta do vale em direçãoa ela. Ele não estava apressado, e a música que ele fez era doce, divertida elangorosa ao mesmo tempo.

    A pastora não mostrou nenhum sinal de que notara a música ou o próprioBast. Na verdade ela desviou o olhar dele, em direção à extremidade do pequeno vale, como se estivesse curiosa sobre o que a ovelha fazia ali. Quando ela viroua cabeça, expôs a amável linha que ia do seu pescoço à sua perfeita orelha emforma de concha, até a suave ondulação de seus seios que eram expostos porcima de seu corpete.  Com os olhos atentos na jovem mulher, Bast pisou numa pedra solta e tropeçoudesajeitadamente pela colina. Ele emitiu um forte guincho, e então soltou maisum pouco de sua música enquanto atirava um braço descontroladamente para

    conseguir se equilibrar.  A pastora então riu, mas ela estava olhando incisivamente para a extremidadedo vale. Talvez a ovelha tenha feito algo engraçado. Sim. Sem dúvidas foi isso.Elas poderiam ser animais engraçados algumas vezes.  Ainda assim, pode-se olhar para as ovelhas por tanto tempo. Ela suspiroue relaxou, recostando-se contra o tronco inclinado da árvore. O movimentoacidentalmente puxou a bainha da saia até um pouco além de seus joelhos. Suaspanturrilhas eram redondas e bronzeadas, cobertas com o tom mais claro de

    seu cabelo cor de mel.  Bast continuou descendo a colina. Seus passos eram delicados e graciosos.Ele parecia um gato furtivo. Ele parecia que estava dançando.  Aparentemente satisfeita de que as ovelhas estavam a salvo, a pastora suspirounovamente, fechou os olhos e repousou a cabeça no tronco da árvore. Seu rostoinclinado pra cima para poder pegar um sol. Ela parecia prestes a dormir, apesarde todos seus suspiros, sua respiração parecia vir rapidamente. E quandomoveu-se inquietamente para ficar mais confortável, uma mão caiu de tal

    maneira que acidentalmente puxou a bainha de seus vestido ainda mais longe,até que mostrou uma pálida extensão de sua coxa.  É difícil sorrir enquanto toca uma flauta pastoril. De alguma forma, Bastconseguiu.

      O sol estava subindo ao céu quando Bast voltou para a árvore relâmpago,agradavelmente suado e levemente desgrenhado. Não havia crianças esperandoperto do monólito cinzento desta vez, o que lhe convinha perfeitamente.  Ele rapidamente fez um círculo da árvore novamente quando alcançou otopo da colina, um em cada direção para garantir que seus pequenos trabalhosainda estavam no lugar. Em seguida ele afundou-se, e ao pé da árvore encostou-se no tronco. Menos de um minuto depois.

    Seus olhos estavam fechados e ele roncava suavemente.

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      Após passar a maior parte de uma hora, o som de passos quase silenciososo despertou. Ele deu uma grande esticada e avistou um garoto magricelo, comsardas e roupas que iam um pouco além do que pode-se ser chamado de “bem vestido”.  “Kostrel!” Bast disse alegremente. “Como está o caminho para Tinuê?”  “Parece ensolarado o suficiente para mim hoje,” o garoto disse enquantochegava ao topo da colina. “E eu achei um lindo segredo na beira da estrada.Algo que acho que você poderia estar interessado.”  “Ah,” Bast disse. “Venha e sente-se então. Em que tipo de segredo vocêtropeçou?”  Kostrel sentou-se de pernas cruzadas na grama. “Eu sei onde Emberlee tomaseu banho.”

      Bast ergueu uma sobrancelha, meio interessado. “É mesmo?”  Kostrel sorriu. “Você finge. Não finja que não se importa.”  “Claro que me importo,” disse Bast, “Ela é a sexta garota mais graciosa nacidade, apesar de tudo.”  “Sexta?” o garoto disse, indignado. “Ela é a segunda e eu sei disso.”  “Talvez a quarta,” Bast admitiu. “Após Ania.”  “As pernas de Ania são finas como as de uma galinha.” Kostrel observoucalmamente.

      Bast sorriu para o garoto. “Cada um com a sua. Mas sim. Estou interessado.O que gostaria em troca? Uma resposta, um favor, um segredo?”  “Eu quero um favor e uma informação,” o garoto disse com um pequenosorriso. Seus olhos escuros era afiados em seu rosto fino. “Eu quero boas respostaspara três perguntas. E vale a pena. Porque Emberlee é a terceira garota maisbela da cidade.”  Bast abriu sua boca como se fosse protestar, então encolheu os ombros esorriu. “Sem favor. Mas eu lhe darei três respostas de um tema escolhido de

    antemão,” ele contrapôs. “Qualquer assunto exceto sobre meu chefe, cuja aconfiança eu não posso trair em sã consciência.”  Kostrel assentiu em concordância. “Três respostas completas,” ele disse. “Semusar frases equivocadas ou enrolações.”  Bast assentiu. “Desde que as perguntas sejam diretas e específicas. Sem tolicescomo conte-me tudo que você sabe a respeito.”  “Isto não seria uma pergunta,” Kostrel frisou.  “Exato” disse Bast. “E você concorda em não contar a mais ninguem onde

    Emberlee está tomando seu banho?”  Kostrel fez uma careta por conta disso, e Bast riu. “Seu pentelinho, você teria vendido essa informação umas vinte vezes, não é mesmo?  O garoto deu de ombros com facilidade, não negando isto, e também semficar envergonhado.

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      “ É uma informação valiosa.”  Bast soltou um riso abafado. “Três respostas completas e sérias em um únicoassunto com a condição de que sou o único a quem você contará.”  “Você é,” o garoto disse repentinamente. “Eu vim aqui primeiro.”  “E compreende que não deve contar a Emberlee que alguém sabe sobre isso.” Kostrelpareceu tão ofendido enquanto Bast não se incomodava de esperar que ele concordasse.“E com a condição de que você não vai aparecer.”  O garoto de olhos negros cuspiu algumas palavras que surpreenderam Bastmais do que o uso anterior de “equivocadas”.  “Certo,” Kostrel rosnou. “Mas se você não souber a resposta para a minha pergunta,eu farei outra.  Bast pensou por um instante, então assentiu.

      “E se eu selecionar um tema que você não saiba muito a respeito, irei escolheroutro.”  Outro assentimento. “Justo.”  “E você me emprestar um outro livro,” o garoto disse, seus olhos escuros brilhando.“E uma moeda de cobre. E você terá que descrever os seios dela para mim.”  Bast jogou a cabeça pra trás e riu. “Feito”.Eles apertaram as mãos para fechar negócio, a mão fina do menino era delicadacomo uma asa de um passarinho.

      Bast inclinou-se contra a árvore relâmpago, bocejando e esfregando a partede trás de seu pescoço. “Então. Qual é o assunto?”  O olhar sombrio de Kostrel projetou-se, e ele sorriu animadamente. “Euquero saber sobre os Fae”.  É significativo notar que Bast terminou seu grande ruído de um bocejo comose não se importasse com a pergunta. É bastante difícil bocejar e espreguiçar-sequando sua barriga sente como se você tivesse engolido um pedaço de ferroamargo e sua boca subitamente ficara seca.

      Mas Bast era uma espécie de um dissimulado profissional, então bocejou eespreguiçou-se, e foi ao ponto de poder coçar-se preguiçosamente debaixo dobraço.  “E aí?”, perguntou o menino, impaciente. “Você sabe o suficiente sobre eles?”  “Uma quantidade razoável”, falou Bast, fazendo o melhor possível paraparecer modesto desta vez. “Mais do que a maioria das pessoas, eu imagino.”Kostrel inclinou-se para frente, com seu rosto fino atento. “Eu pensei que vocêsoubesse. Você não é daqui. Você sabe coisas. Você já viu o que realmente está

    mundo afora.”  “Algumas coisas,” Bast admitiu. Ele olhou para o sol. “Faça logo as suasperguntas. Eu tenho que estar em algum lugar ao meio-dia.”O garoto assentiu seriamente, então olhou para a grama em frente dele por ummomento, pensando.

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      “Como eles se parecem?”  Bast piscou por um momento, tomado de surpresa. Então ele riu impotentee ergueu as mãos. “Tehlu misericordioso. Você tem noção de quão louca foiessa pergunta? Eles não se parecem com nada. Eles são eles mesmo.”  Kostrel pareceu indignado. “Você tá tentando me tapear!” ele disse, levantandoum dedo para Bast. “Eu disse sem enrolações!”  “Eu não estou. Honestamente não estou.” Bast ergueu suas mãos defensivamente.“É apenas uma questão impossível de se responder. O que você diria se euperguntasse a você como as pessoas se parecem? Como responderia isto? Hátantos tipos de pessoas, e elas são tão diferentes.”  “Então é uma grande pergunta.” Kostrel disse. “Dê-me uma grande resposta.”  “Não é apenas grande,” falou Bast. “Preencheria um livro.”

      O garoto deu de ombros, profundamente rude.Bast franziu o cenho. “Pode-se argumentar que a sua pergunta não é focadanem específica.”  Kostrel ergueu uma sobrancelha. “Então estamos argumentando agora?Achei que nós estivéssemos trocando informações? Completa e livremente.Se você perguntar onde Emberlee vai para tomar seu banho, e eu disser, “emum córrego” você iria se sentir como se eu estivesse medindo as palavras, nãosentiria?”

      Bast suspirou. “Justo. Mas se lhe dissesse todos os rumores e trechos que já ouvi, ia levar dias. A maior parte seria inútil, e alguns nem sequer seriam verídicos porque foram apenas de histórias que ouvi.”  Kostrel franziu o cenho, mas antes que pudesse protestar, Bast ergueu umamão. “Eis o que vou fazer. Apesar da natureza sem foco de sua pergunta, voulhe dar uma resposta que cobre de forma geral as coisas...” Bast hesitou. “... umaresposta secreta sobre o assunto. Certo?”  “Dois segredos.” Kostrel falou, seus olhos escuros cintilando de empolgação.

      “Justo.” Bast profundamente respirou. “Quando você diz fae, você está falandosobre qualquer coisa que vive no Fae. Isso inclui um monte de coisas que são...apenas criaturas. Tipo animais. Aqui você tem cachorros e esquilos e ursos.No Fae, eles têm raum e dennerlings e...”  “E trols?”  Bast assentiu. “E trols. Eles são reais.”  “E dragões?”  Bast balançou a cabeça. “Sobre isto eu não ouvi. Não mais...”

      Kostrel parecia desapontado. “E sobre o povo faérico? Como latoeiros fadase tal?” O garoto estreitou seus olhos. “Pense, esta não é uma nova pergunta,apenas uma tentativa de concentrar o avanço da sua resposta.”  Bast riu, impotente. “Senhor e senhora. O avanço? A sua mãe tomou um sustode um juíz quando estava grávida? De onde você tira esse tipo de conversa?

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      “Eu fico acordado na igreja.” Kostrel encolheu os ombros. “E algumas vezesPadre Leodin me permite ler seus livros. Como eles se parecem?”  “Como pessoas comuns,” falou Bast.  “Como você e eu?”, indagou o garoto.  Bast forçou um sorriso. “Assim como você ou eu. Você dificilmente nãonotaria se eles passassem por você pela rua. Mas há outros. Alguns deles são...Eles são diferentes. Mais poderosos.”  “Como Varsa nunca-morto?”  “Um pouco,” Bast admitiu. “Mas alguns são poderosos em outras formas.Como o prefeito é poderoso. Ou como um agiota.” A expressão de Bast passoua ficar azeda. “Muitos deles... não são bons de se estar por perto.  Eles gostam de enganar as pessoas. Brincar com elas. Machucá-las.”

      Muito da empolgação de Kostrel se esvaiu ao ouvir isto. “Eles parecem demônios.”  Bast hesitou, então assentiu relutantemente. “Alguns deles são muito parecidoscomo demônios,” ele admitiu. “Ou tão próximo que nem chega a fazer diferença.”  “Alguns deles são como anjos também?” perguntou o garoto.  “É legal pensar nisso,” Bast retrucou. “Eu espero.”  “De onde eles vieram?”  Bast ergueu sua cabeça. “Então esta é a sua segunda pergunta?” ele perguntou.“Suponho que seja, uma vez que não tem nada a ver com como eles se parecem...”

      Kostrel fez uma careta, parecendo um pouco embaraçado, mas Bast não sabiadizer se ele estava envergonhado ou se estava satisfeito com as suas perguntas,ou envergonhado por ter sido pego tentando ganhar uma resposta extra.“Desculpe-me,” ele disse, “É verdade que um encantado nunca pode mentir?”  “Alguns não podem,” Bast respondeu. “Alguns não gostam. Alguns ficam felizesde mentir mas nunca voltam atrás em suas promessas ou quebram sua palavra.”Ele deu de ombros. “Outros mentem tão bem, e em todas as oportunidades.”  Kostrel começou a perguntar mais alguma coisa, mas Bast pigarreou. “Você

    tem que admitir,” ele disse. “É uma resposta muito boa. Eu até te dei algumasperguntas grátis, para ajudar a manter o foco das coisas, por assim dizer.”  Kostrel deu um aceno mal humorado.  “Eis o seu primeiro segredo.” Bast ergueu um único dedo. “A maioria dos Faenão vem para este mundo. Eles não gostam. Este mundo é um tanto áspero paraeles, como se vestissem uma camisa de estopa. Mas quando eles vem, gostamde alguns lugares mais do que outros. Eles gostam de lugares ermos. Lugaressecretos. Lugares estranhos. Há muitos tipos de fae, como tribunais e casas. E

    todos eles são regidos de acordo com seus próprios desejos...” 

    Bast continuou num tom leve de conspiração. “Mas algo que agrada a todosos encantados são lugares com conexões brutas, coisas verdadeiras que dãoforma ao mundo. Lugares que são tocados com fogo e pedra. Lugares que estão

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    próximos à água e o ar. Quando os quatro unem-se...”  Bast parou para ver se o garoto iria interromper. Mas o rosto de Kostrel haviaperdido a astúcia latente que possuía antes. Ele parecia uma criança novamente,ligeiramente boquiaberto, seus olhos arregalados de admiração.  “Segundo segredo,” Bast disse. “O povo encantado se parece um poucoconosco, mas não exatamente. A maioria tem algo que os torna diferentes. Seusolhos. Suas orelhas. A cor de seus cabelos ou pele. Algumas vezes eles são maisaltos que o normal, ou mais baixos, ou mais fortes, ou mais bonitos.”  “Como Feluriana.”  “Sim, sim,” Bast falou irritadamente. “Como Feluriana. Mas qualquer um doFae que tenha a habilidade de viajar pra cá, terá astúcia suficiente para escondercoisas” Ele se inclinou, assentindo para si mesmo. “Este é um tipo de mágica

    que os encantados comungam entre si.”  Bast expeliu os comentário final como um pescador arremessando uma isca.  Kostrel fechou sua boca e engoliu à seco. Ele não lutou contra a linha. Elesequer sabia que havia sido fisgado. “Que tipo de magia eles podem fazer?”Bast revirou os olhos dramaticamente. “Oh, vamos, há outro livro inteirinhodigno da questão.”  “Bem, talvez você devesse escrever um livro, então,” Kostrel dissecategoricamente. “Aí você pode me emprestar e matar dois pássaros com uma

    única pedra.”  O comentário pareceu pegar Bast de jeito. “Escrever um livro?”  “É o que as pessoas fazem quando elas sabem toda maldita coisa, não é?”

    Kostrel disse sarcasticamente.  “Eles escrevem para então mostrar.”Bast olhou pensativo por um instante, então sacudiu a cabeça para desanuviá-la. “Está bem. Eis o que eu sei. Eles não pensam nisso como magia. Eles nuncausariam este termo. Eles chamariam de arte ou ofício. Eles falam de parecer

    ou dar forma.”  Ele olhou para o sol e franziu os lábios. “Mas se eles estavam sendo francos, oque raramente são, lembre-se, diriam que quase tudo que fazem é glammouriaou grammaria. Glammouria é a arte de fazer algo parecer. Grammaria é a artede fazer algo ser.”  Bast apressou-se antes que o garoto pudesse interrompê-lo. “Glammouria é fácil.Eles podem fazer uma coisa parecer o que não é. Eles poderiam fazer uma camisabranca parecer ser azul. Ou uma camisa rasgada parecer estar inteira. A maioria

    do povo tem pelo menos uma pequena fração desta arte. Suficiente para que seescondam dos olhos mortais. Se seus cabelos forem de um branco prateado, a suaglammouria poderia fazer com que parecessem escuros como a noite.”  Novamente, o rosto de Kostrel estava disperso em admiração. Mas não era umaadmiração supérflua, escancarada como antes. Era uma admiração ponderada.

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    Uma admiração inteligente, curiosa e faminta. Era o tipo de admiração queconduziria um garoto para uma pergunta que havia começado com um por quê.  Bast podia ver as formas destas coisas se movendo nos olhos escuros do menino.Seus malditos olhos sagazes. Muitos sagazes pela metade. Logo esses pensamentos vagos começaram a se cristalizarem em perguntas do tipo “Como elas fazem suaglammouria?” ou até pior. “Como um jovem garoto pode quebrá-lo?”  E então, com uma pergunta assim suspensa no ar? Nada bom poderia provirdisto. Quebrar uma promessa honestamente feita e mentir descaradamente iacontra sua vontade. Até seria pior fazer isto neste lugar. Seria muito mais fácildizer a verdade e, em seguida, certificar-se de que algo acontecesse com o garoto...  Mas sinceramente, ele gostava do garoto. Ele não era tapado ou fácil. Não eramesquinho ou baixo. Ele empurrou de volta. Ele era engraçado, cruel, faminto

    e mais lívido do quaisquer três pessoas da cidade juntas. Ele era brilhante como vidro quebrado e afiado o bastante para cortar a si mesmo. E Bast também,aparentemente. Bast esfregou o rosto. Isto nunca acontecera. Ele nunca haviaestado em conflito com seu próprio desejo antes de chegar aqui. Ele odiavaisto. Isto era unicamente simples. Querer e ter. Ver e tomar. Correr e perseguir.Sedento e saciado. E se ele houvesse se frustrado em busca de seu desejo... edaí? Este era simplesmente o modo das coisas. O desejo em si continuaria seu,continuaria puro.

      Não foi assim agora. Agora seus desejos ficaram complicados. Eles estavamconstantemente em conflito uns com os outros. Sentia-se infinitamente voltadocontra si mesmo. De nenhuma forma nada era mais simples, ele foi arrancadode diversas maneiras...  “Bast?”, Kostrel disse, sua cabeça inclinada para o lado, com preocupaçãoem seu rosto. “Você está bem?” ele perguntou. “Qual é o problema?”Bast sorriu um sorriso sincero. Ele era um garoto curioso. De fato. Este era ocaminho. Este era o estreito caminho entre desejos. “Eu só estava pensando.

    Grammaria é muito mais difícil de explicar. Eu não posso afirmar que entendodisto tão bem.”  “Apenas faça seu melhor,” Kostrel disse gentilmente. “Qualquer coisa queme diga será mais do que eu sei.”  Não, ele não podia matar este garoto. Isto seria um tanto quanto difícil.  “Grammaria é mudar uma coisa.” Bast disse, fazendo um gesto indistinto.“Fazendo disto algo diferente do que é.”  “Como transformar chumbo em ouro?”, indagou Kostrel. “É assim que eles

    fazem ouro feérico?”  Bast fez questão de sorrir perante a pergunta. “Boa tentativa, mas isso églammouria. É fácil, mas não o bastante. É por isso que as pessoas que pegamouro faérico acabam com os bolsos cheios de pedras ou bolotas pela manhã.  “Eles podem transformar cascalho em ouro?” Perguntou Kostrel. “Se eles

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    realmente quiserem?” “Não é este tipo de mudança.” Interpôs Bast, embora aindatenha rido e assentido para aquela questão. “Isto é muito grande. Grammariaé sobre... mudança. É sobre transformar algo em mais do que realmente é”.  O rosto de Kostrel se retorceu com a confusão.  Bast respirou fundo e expirou de vez pelo nariz. “Deixe-me tentar outracoisa. O que você tem em seus bolsos?”  Kostrel vasculhou-o e estendeu as mãos. Havia um botão de bronze, umpedaço de papel, uma ponta de lápis, uma pequena faca dobrável... e uma pedracom um buraco. É claro.  Bast passou sua mão vagarosamente sobre a coleção de trecos, eventualmenteparando acima da faca. Ela não era particularmente fina ou elegante, apenasum pedaço de madeira plana do tamanho de um dedo com uma ranhura onde

    uma lâmina pequena e dobrável fora escondida.  Bast pegou-a delicadamente entre dois dedos e colocou-a no chão entre eles.  “O que é isto?”  Kostrel enfiou o resto de seus cacarecos em seu bolso. “É a minha faca.”  “É isto mesmo?” Questionou Bast.  Os olhos do garoto estreitaram-se desconfiadamente. “O que mais poderia ser?”  Bast sacou sua própria faca. Ela era um pouco mais larga, e ao invés demadeira, ela foi entalhada em em um pedaço de chifre de veado, polido e bonito.

    Bast a abriu, e a lâmina brilhou ao sol.  Ele deitou sua faca próxima a do garoto. “Você trocaria sua faca pela minha?”  Kostrel olhou para a sua faca, enciumado. Não obstante, não houve nem umrastro de hesitação antes que ele abanasse a sua cabeça.  “Por que não?”  “Porque é minha,” disse o garoto, seu rosto se turvando.  “A minha é melhor,” Bast falou com naturalidade.  Kostrel aproximou-se e pegou sua faca, fechando a mão possessivamente.

    Seu rosto estava carregado como uma tempestade. “Meu pai me deu isto.” Eledisse. “Antes que ele recebesse o soldo do rei e passasse a ser um soldado e paranos salvar dos rebeldes.” Ele olhou para Bast, como se o desafiasse a dizer umaúnica palavra que contrariasse isso.  Bast não desviou o olhar dele, apenas assentiu seriamente. “Então é maisque uma faca.” Ele disse. “É especial para você.”  Ainda segurando a faca, Kostrel assentiu, piscando rapidamente.  “Para você, é a melhor faca.”

      Outra concordância.  “É mais importante do que as outras facas. E não é apenas aparentemente.”Bast falou. “É algo que a faca é.”  Houve um lampejo de compreensão nos olhos de Kostrel.  Bast assentiu. “Isto é grammaria. Agora imagine se alguém pegasse uma faca

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    e a fizesse mais do que uma faca realmente é. A transformasse na melhor faca.Não apenas para eles, mas para alguém.” Bast pegou a sua faca e fechou-a. “Seeles realmente são capazes, eles podem fazer isso com qualquer outra coisa alémde uma faca. Eles podem fazer um fogo mais do que realmente é. Mais faminto.Mais quente. Alguém realmente poderoso pode até fazer mais. Eles podem pegaruma sombra...” Ele parou gentilmente, deixando uma lacuna no ar.  Kostrel espirou e liberou para preencher com uma pergunta. “ComoFeluriana!” ele disse. “Foi isso que ela usou para fazer a capa das sombras doKvothe?”  Bast assentiu seriamente, feliz pela pergunta, odiando que aquela fosse apergunta. “Parece plausível pra mim. O que uma sombra faz? Ela oculta, elaprotege. A capa das sombras do Kvothe faz o mesmo, só que mais.”

      Kostrel assentia em compreensão, e Bast o pressionou rapidamente, ansiosopara deixar para trás este assunto em particular. "Pense na própria Feluriana...”  O garoto sorriu, ele parecia não ter problema algum para fazer isso.  “Uma mulher pode ter um pouco de beleza,” disse Bast vagarosamente. “Elapode ser uma fonte de desejo. Feluriana é isso. Como uma navalha. A mais bela.A maior fonte de desejo. Para todos…” Bast deixou a ultima frase terminarsuavemente mais uma vez.  Os olhos de Kostrel estavam longe, obviamente dando ao assunto uma

    completa reflexão. Bast lhe deu tempo para isso, e depois de um momentooutra questão surgiu para o garoto. “Isso não poderia ser meramente umaGlammouria?”, ele perguntou.  “Ah,” disse Bast, sorrindo. ”Mas qual é a diferença entre ser bonita e parecerbonita?”  “Bem...” Kostrel parou por um momento, depois se reestabeleceu. ”Umaseria real e a outra não.” Ele parecia ter certeza, mas isso não refletiu em suaexpressão. “Uma seria falsa. Você poderia perceber a diferença, não poderia?”

    Bast deixou a questão ao vento. Era próximo, mas não exatamente isso. “Qualé a diferença entre uma blusa que parece branca e uma blusa que é branca?”contrapôs.  “Uma mulher não é a mesma coisa que uma blusa.”, Kostrel disse com um vasto desdém. “Você saberia ao tocá-la. Se ela parecer macia e rosada comoEmberlee, mas seu cabelo parecesse como uma cauda de cavalo, você saberiaque não é real.”  “Glammouria não é apenas enganar os olhos” disse Bast. “É para tudo.

    Ouro de fada parece pesado. E um porco glammourado cheiraria como rosasquando você o beijasse.” Kostrel visivelmente refletiu sobre isso. A mudançade Emberlee para um porco glammourado obviamente o fez se sentir mais doque um pouco chocado. Bast esperou um momento para ele se recompor.  “Não seria mais difícil glammourar um porco?” ele perguntou, por fim.

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      “Você é esperto.” Encorarou Bast. “ Você está certo. E glammourar uma belagarota para ser ainda mais bonita não seria muito trabalho. É como colocarcobertura no bolo.”  Kosbrel esfregou suas bochechas pensativamente. “Pode-se usar glammouriae grammaria ao mesmo tempo?”  Bast ficou mais genuinamente impressionado desta vez. “Foi o que eu ouvi.”  Kostreu assentiu para si próprio. “Deve ser isso que Feluriana faz.” Ele disse.“Como creme na cobertura do bolo.”  “Eu acho que sim” disse Bast. “O que eu conheci...”, ele parou abruptamente,sua boca se fechou.  “Você conheceu um Fae?”  Bast sorriu como uma armadilha de urso. “Sim”

      Nesse momento Kostrel fisgou tanto o gancho quanto a linha. Mas era tardedemais. “Seu bastardo!”  “Eu sou”, Bast admitiu, contente.  “Você me enganou para eu perguntar isso.”  “Eu enganei”, disse Bast. “Era uma questão relacionada ao assunto, e eurespondi por completo sem nenhum equívoco.”  Kostrel ficou de pé e saiu irritado, voltando apenas um tempo depois. “Medê meu centavo!”, ele exigiu.

      Bast enfiou a mão no bolso e tirou o centavo de cobre. “Onde Emberlee tomaseu banho?”  Kostrel o encarou furiosamente, depois disse: “Para depois da ponte da PedraAntiga, em direção das colinas a cerca de meia milha. Há um pequeno buracocom um olmo ".  “E quando?”  “Depois do almoço na fazenda Boggan. Logo após ela termina de lavar ependurar a roupa.” Bast jogou o centavo, sorrindo como um doido.

    “Espero que seu pinto caia!” O menino disse venenosamente antes de descerdo morro.  Bast não pode evitar em rir. Ele tentou fazê-lo silenciosamente para pouparos sentimentos do menino, mas não obteve sucesso.  Kostrel chegou até a base do morro e gritou. “E você ainda me deve um livro!”  Bast parou de rir como algo tivesse fugido de sua memória. Ele entrou empânico por um momento quando percebeu que o exemplar de Celum Tinturenão estava no lugar de costume.

      Então ele se lembrou de ter deixado o livro no topo da árvore de cima daribanceira relaxou. O céu limpo não mostrava sinal de chuva. Ele estaria seguroo suficiente. Além disso, era quase meio dia, talvez um pouco mais tarde. Entãoele voltou e se apressou para baixo do morro, não querendo se atrasar.  Bast correu a maior parte do caminho para o pequeno vale arborizado, e na

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    hora que chegou, estava suando como um cavalo de corrida. Sua blusa grudounele de um modo tão desagradável que, enquanto ele andava pelo banco deágua inclinado, ele a retirou e a usou para limpar o suor de seu rosto.  Uma longa e plana saliência de pedras prolongava-se dentre o PequenoRiacho de lá, formando uma calma piscina lateral onde o fluxo retornava parasi. Um estande de salgueiros que pendiam sobre da água o tornavam um localprivado e sombreado.  A margem estava cheia de arbustos grossos e a água era suave e calmae clara. Com o peito nu, Bast saiu pela saliência áspera de pedra. Com roupas,seu rosto e mãos o faziam parecer um pouco magro demais, mas sem camisaseus ombros largos eram surpreendentes, sendo mais esperado de se ver em umtrabalhador do campo do que em um tipo indolente que nada mais faz do que

    ficar em uma estalagem vazia durante o dia todo. Quando ficou fora da sombrados salgueiros, Bast ajoelhou-se para afundar a camisa na piscina. Então, elepressionou-a sobre a cabeça, tremendo um pouco por conta do frio da água. Elea esfregou no peito e nos braços rapidamente, sacudindo as gotas de água de seurosto. Ele colocou a camisa de lado, se apoiou na beirada da pedra da borda dapiscina, em seguida, respirou fundo e mergulhou sua cabeça. O movimento fezos músculos de suas costas e de seus ombros flexionarem. Um tempo depois,ele tirou a cabeça para fora, ofegando um pouco e sacudindo a água do seu

    cabelo. Bast então se levantou, alisando seu cabelo com as duas mãos. A aguaescorreu pelo seu peito, fazendo filetes em seu cabelo escuro, escorrendo todapela superfície plana de seu estômago. Ele se sacudiu um pouco, então saiupelo nicho escuro produzido por uma plataforma pontiaguda de uma rochapendendo. Ele apalpou por um tempo antes de puxar a saliência do sabão cor-de-manteiga. Ele se ajoelhou novamente na borda da água, molhando sua blusa várias vezes, em seguida, esfregando-a com o sabão. Demorou um pouco, jáque ele não tinha nenhuma placa de lavar e ele, obviamente, não queria roçar a

    camisa contra as pedras ásperas. Ele ensaboou e enxaguou a blusa várias vezes,torcendo-a com as mãos, fazendo com que os músculos de seus braços e ombrosse tencionassem e se entrelaçassem. Ele fez uma limpeza completa, embora nomomento em que ele terminou, ele estava completamente encharcado e sujode espuma.  Bast colocou sua camisa em uma pedra de sol para secar. Ele começou a sedesfazer de suas calças, então parou e inclinou a cabeça para um lado, tentandoretirar a água de seu ouvido. Talvez por causa da água em seu ouvido Bast

    não ouviu os gorjeios animados vindo dos arbustos que cresciam próximos amargem. Um som que poderia ser, possivelmente, de pardais batendo-se entreos galhos. Um bando de pardais. Vários bandos, talvez. E se Bast não tivesse

     visto os arbustos se movimentando também? Ou notado que dentre as folhagempendurada entre os ramos de salgueiro não havia as cores que normalmente

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    são encontradas em árvores?  Hora um rosa pálido, hora um vermelho corado. De vez em quando, umamarelo irrefletido ou um centáurea-azul.  E embora seja verdade que os vestidos viessem nessas cores...bem... as avestambém. Tentilhões e gralhas. E, além disso, era de conhecimento popular entre asmoças da cidade que moreno que trabalhava na pousada era terrivelmente míope.  Os pardais piaram nos arbustos a medida que Bast começou a desamarraro cordão de suas calças novamente. O nó aparentemente estava dando-lhetrabalho. Ele atrapalhou-se com ele por um tempo, então ficou frustrado e deuuma grande esticada felina, com seus braços em arco sobre a cabeça, o corpodobrando como um arco. Finalmente ele conseguiu deixar o nó frouxo e ficoulivre de suas calças. Ele não usava nada por baixo.

      Ele as jogou em um canto e do salgueiro veio um grito do tipo que poderiater vindo de um pássaro maior. Uma garça-real, talvez. Ou um corvo. E se umramo tremeu violentamente, ao mesmo tempo, bem, talvez um pássaro tivessese inclinado para muito longe de seu ramo e quase caiu. E, além disso, foi nomomento em que Bast estava olhando para outro lado.  Bast mergulhou na água, em seguida, respingou água como um menino eofegante com o frio. Depois de alguns minutos partiu para uma parte mais rasada piscina, onde a água subiu até quase alcançar sua cintura estreita. Debaixo

    da água, um observador atento poderia notar as pernas do rapaz parecia umpouco... estranhas. Mas estava sombreado lá e todos sabem que a agua dobra aluz de forma estranha, fazendo as coisas parecerem diferentes do que elas são.E, além disso, pássaros não são os observadores mais cautelosos, especialmenteporque sua atenção estava concentrada em outro lugar.

      Uma hora mais tarde, ligeiramente úmido e com cheiro doce de sabão demadressilva, Bast escalou a ribanceira onde tinha certeza de ter deixado o

    livro de seu mestre. Foi a terceira ribanceira que ele escalou na última meiahora. Quando chegou no topo, Bast relaxou com a visão de um espinheiro.Caminhando para mais perto, ele viu que era a árvore certa, com a brecha ondeele se lembrava. Mas o livro tinha desaparecido. Uma volta em torno da árvoremostrou que ele não tinha caído no chão. Então o vento se agitou e Bast viualgo branco. Ele sentiu um calafrio instantâneo, temendo ser uma pagina soltado livro. Poucas coisas irritavam tanto seu mestre como um livro mal cuidado.Mas não, se aproximando, Bast não viu o papel. Era uma extensão lisa de casca

    de bétula. Ele a retirou e viu as letras riscadas com uma inclinação tosca. Eu prciso fala com vc. Eh emportante. Rike

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    THE LIGHTNING TREE “A Árvore Relâmpago” 

    T  ARDE – PÁSSAROS E ABELHAS  Sem saber onde poderia encontrar Rike, Bast fez seu caminho de volta paraa Árvore Relâmpago. Ele se estabeleceu no lugar de costume quando umamenininha veio até ele.  Ela não parou no monólito e, ao invés disso, marchou direto morro acima.  Ela era mais nova do que os outros, com seis ou sete anos. Ela usava um vestidoazul brilhante e tinha lacinhos roxos amarrados em seu cabelo cuidadosamenteenrolado. Ela nunca tinha ido a árvore relâmpago antes, mas Bast já a havia visto.Mesmo se não tivesse, poderia supor por suas roupas finas e seu cheiro de água derosas que era Viette, a filha mais nova do prefeito. Ela escalou o pequeno morro vagarosamente, carregando algo peludo na dobra de seu braço. Quando ela cheiono topo ela ficou parada, um pouco inquieto, mas ainda esperando.  Bast olhou para ela silenciosamente por um momento. “Você conhece asregras?” ele perguntou.  Ela se ficou de pé, com fitas roxas em seu cabelo. Ela obviamente pareciaamedrontada, Mas seu lábio inferior estava tenso, desafiador. Ela assentiu.“Quais são elas?”  A garotinha lambeu os lábios e começou a recitar com uma voz cantada.“Não ser mais alto que a pedra.” Ela apontou para o monólito caído na parteinferior do morro. “Quando vier para a árvore preta, venha sozinha.”  Ela colocou o dedo nos lábios, imitando o som de “chiu”.  “Não dizer-“  “Espere” Bast interrompeu. “Você não disse as duas ultimas frases enquantotocava na árvore.”  A menina empalideceu um pouco por conta disso, mas deu um passo a frente

    e colocou a mão contra a madeira desbotada pelo sol da árvore que já estavamorta há muito tempo. A garota pigarreou novamente, então parou, seus lábiosse movimentando silenciosamente percorrendo desde o inicio do poema atéencontrar onde tinha parado. ”Não dizer a nenhum adulto o que foi dito aqui,senão, que um relâmpago te acerte e te mate.”

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      Quando ela disse a ultima palavra, Viette engasgou e puxou a mão para trás,como se algo tivesse queimado ou mordido seus dedos. Seus olhos ficarammaiores a medida que ela olhava para as pontas dos seus dedos e viu que estavamintocados, com um rosa saudável. Bast escondeu um sorriso por trás de sua mão.  “Muito bem então,” Bast disse. “Você conhece as regras. Eu guardo seussegredos e você guarda os meus. Eu posso responder suas perguntas ou ajudoa solucionar algum problema.” Ele se sentou novamente, suas costas contra aárvore, deixando-lhe na altura dos olhos da menina. “O que você quer?”  Ela se estendeu a pequena nuvem de pelos brancos que ela carregava nadobra do seu braço. Ele miou.  “Esse é um gatinho mágico?” ela perguntou.  Bast pegou o gatinho em sua mão e olhou para ele. Era uma coisa dorminhoca,

    quase inteiro branco. Um olho era azul e o outro verde. “De fato, é sim” ele disse,um pouco surpreso. “Pelo menos um pouco” Ele entrou o gato de volta a ela.  Ela assentiu séria. “Eu quero chama-la de Princesa Glacê”  Blast simplesmente ficou olhando para ela, perplexo. “Está bem.”  A menina fez uma careta para ele. “Eu não sei se ela é menina ou menino!”  “Oh” disse Bast. Ele estendeu a mão, pegou o gatinho, em seguida, acariciou-oe entregou-o de volta. “É uma menina”.  A filha do prefeito estreitou os olhos “Você está mentindo?”

      Bast piscou para a menina, então riu “Por que você acreditaria em mim naprimeira vez e não na segunda?” ele perguntou.  “Eu sabia que ela era uma gatinha mágica.” Disse Viette, revirando os olhos,irritada. “Eu só queria ter certeza. Mas ela não está usando um vestido. Ela nãotem fitas ou laços. Como você pode saber que ela é uma menina?”  Bast abriu sua boca. Então fechou novamente. Ela não era uma filha defazendeiro qualquer. Ela tinha uma governanta e um armário cheio de roupas.Ela não passava o tempo entre ovelhas e porcos e cabras. Ela nunca viu um

    cordeirinho nascer. Ela tinha irmãs mais velhas, mas nenhum irmão...  Ele hesitou. Ele preferiria não mentir. Não aqui. Mas ele não tinha prometidoresponder a pergunta, não fez nenhum tipo de acordo com ela. Isso fez as coisasserem mais fáceis. Muito mais fácil do que ter o prefeito raivoso visitando naMarco do Percurso exigindo saber porque sua filha repentinamente conheciaa palavra “pênis”.  “Eu fiz cócegas na barriga da gatinha” Bast disse com facilidade. “E se elapisca para mim, eu sei que é uma menina.”

      Isso satisfez Viette e ela balançou a cabeça solenemente. “Como eu faço meupai me deixar ficar com ela?”  “Você já pediu gentilmente a ele?”  Ela assentiu. “Papai odeia gatos.”  “Implorou e chorou?” acenou com a cabeça.

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      “Gritou e deu um ataque histérico?”  Ela revirou os olhos e deu um suspiro irritado. “Eu já tentei tudo isso, ou eunão estaria aqui.”  Bast pensou por um momento. “Está bem, primeiro você deve conseguirum pouco de comida que possa se manter boa por dois dias. Biscoitos, salsicha,maçãs. Esconda isso no seu quarto onde ninguém possa ver. Nem mesmo suagovernanta. Nem a empregada. Você tem um lugar assim?”  A garotinha assentiu.  “Então você vai perguntar ao seu papai mais uma vez. Seja gentil e educada. Seele ainda disser não, não fique brava. Só diga a ele que você ama a gatinha. Digaque se você não ficar com ela, você tem medo de ficar tão triste que você morrerá.”  “Ele ainda dirá não” disse a garotinha.

    Bast deu os ombros. “Provavelmente. Então ai vem a segunda parte. Hoje a noite, você cutuca o seu jantar. Não coma. Nem mesmo a sobremesa” A garotinhacomeçou a dizer algo, mas Bast levantou a mão.  “Se alguém lhe perguntar, somente diga que você não está com fome. Nãomencione a gatinha. Quando você estiver sozinha em seu quarto, coma umpouco da comida que você escondeu.”  A garotinha parecia pensativa. Bast continuou.  “Amanhã, não tome café da manhã. Não almoce. Você pode beber um pouco

    de água, mas só golinhos. Fique só deitada na cama, quando ele perguntar qualé o problema-“  Ela se animou “Eu digo que quero minha gatinha!”  Bast balançou a cabeça com uma expressão severa. “Não. Isso vai estragar oplano. Apenas diga que você está cansada. Se eles lhe deixarem sozinha, vocêpode comer, mas seja cuidadosmãea. Se eles a descobrirem, você nunca terá agatinha.”  A garota escutava atentamente agora, com a testa franzida por causa de sua

    concentração.  “Lá pela hora do jantar eles estarão preocupados. Eles lhe oferecerão maiscomida. Suas preferidas. Continue dizendo que você não tem fome. Que vocêsó está cansada. Apenas fique deitada. Não fale. Faça isso o dia todo.”  “Posso levantar para fazer xixi?”  Bast assentiu. “Mas lembre-se de parecer cansada. Não brinque. No próximodia, eles estarão assustados. Vão lhe levar ao médico. Vão tentar lhe dar caldopara comer. Eles tentarão de tudo. Em algum momento, seu pai estará do seu

    lado e ele lhe perguntará qual é o problema.”  Bast sorriu para ela. “É nessa hora que você começa a chorar. Não berrando.Nem choramingando. Apenas lágrimas. Basta deitar lá e chorar. Depois digaque você sente muita falta da sua gatinha. Você sente tanta falta que não querestar mais viva.”

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      A garotinha pensou sobre isso por um longo minuto, acariciando sua gatinhadistraidamente com uma mão. Finalmente ela assentiu. “Está bem” ela se viroupara ir.  “Espere ai!” Bast disse rapidamente. “Eu te dei o que você queria. Você medeve algo.”  A menininha virou-se, sua expressão era de uma estranha mistura de surpresae de um constrangimento ansioso. “Eu não trouxe nenhum dinheiro” ela disse,não olhando nos olhos dele.  “Não é dinheiro.” Disse Bast. “Eu lhe dei duas resposta e uma maneira de você ficar com sua gatinha. Você me deve três coisas. Você paga com presentese favores. Você paga com segredos…”  Ela pensou por um momento. “Papai esconde sua chave do cofre dentro do

    relógio da cornija.”  Bast assentiu em aprovação. “Esse é um”  A garotinha olhou para o céu, ainda acariciando seu gato. “Eu vi a mamãebeijar a empregada uma vez.”  Bast levantou sua sobrancelha diante disso. “São dois...”  A garotinha colocou o dedo na orelha e o mexeu. “Isso é tudo, eu acho.”  “Que tal um favor então?” Bast disse. “Eu preciso que você me busque duasdúzias de margaridas com hastes longas. E uma fita azul. E duas braçadas de

    Tesouro de Donzela “  O rosto de Viette enrugou-se em confusão. “O que é um Tesouro de Donzela?”  “Flores” disse Bast, olhando intrigado consigo mesmo. “Talvez você as chamede balsamos? Elas crescem na natureza por todo canto.” Ele disse, fazendo umamplo gesto com as duas mãos.  “Você quer dizer gerânios?” Ela perguntou.  Bast balançou sua cabeça. “Não. Elas têm pétalas frouxas e são mais oumenos desse tamanho.” Fez um circulo com o polegar e o dedo médio “Elas

    são amarelas e laranjas e vermelhas...”  A garota o fitou sem expressão.  “A viúva Creel as deixa na jardineira da janela” Bast continuou “Quando você toca nas vagens, elas estalam...”  O rosto de Viette se iluminou “Oh! Você quer dizer as Não-Me-Toques” eladisse, seu tom de voz mais do que um pouco paternalista. “Eu posso te trazerum monte delas. Isso é fácil.” Ela virou para correr morro abaixo.  Bast a chamou antes de ela dar o sexto passo. “Espere!” Quando ela se virou,

    ele perguntou a ela. “O que você vai dizer quando alguém lhe perguntar paraquem está pegando as flores?”  Ela revirou os olhos novamente. “Eu digo que não é da conta deles.” Eladisse. “Porque meu papai é o prefeito!”  Depois que Viette saiu. Um alto assobio fez Bast olhar para baixo do morro

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    pelo monólito. Não havia criança lá esperando. O assobio veio novamente e Bastse levantou, se esticando de forma longa e árdua. Teria surpreendido a maioria das

     jovens mulheres da cidade o quão fácil ele visualizou uma figura parada nas sombrasda árvore na borda da clareira que estava a quase duzentos metros de distância.  Bast caminhou descendo a colina, através de um campo gramado, e emdireção a sombra das árvores. Havia um menino mais velho com o rosto sujoe um nariz achatado. Ele talvez tivesse uns doze anos e tanto sua blusa comocalças eram muito pequenas para ele, mostrando muita sujeira em seu pulsopelo punho e um tornozelo nu embaixo. Estava descalço e havia um cheiroligeiramente azedo nele.  “Rike” A voz de Bast não trazia nada de amigável, fazendo um tom que eleusaria com as outras crianças da cidade. “Como está a estrada para Tinuë?”

      “É um maldito caminho longo.” O menino disse com amargura, não olhandonos olhos de Bast. “Nós vivemos na bunda de lugar nenhum”  “Eu vejo que você tem meu livro.” Bast disse.  O rapaz o estendeu. “Eu num queria tentar roubá-lo” ele murmurourapidamente. “Eu só precisava falar com você.”  Bast pegou o livro silenciosamente.  “Eu não violei as regras” disse o garoto. “Eu nem fui para a clareira. Mas eupreciso da sua ajuda. Eu lhe pagarei por isso.”

      “Você mentiu para mim, Rike” Disse Bast, sua voz severa.  “E eu num paguei por isso?” O rapaz exigiu com raiva, olhando-o pelaprimeira vez. “Num paguei por isso dez vezes mais? A minha vida num é umamerda o suficiente sem ter mais merda empilhada no topo dela?”  “E isso tudo é irrelevante porque você é muito velho agora”, disse Bastcategoricamente.  Em seguida, o garoto lutou e respirou fundo, visivelmente tentando controlarseu temperamento. “Tam é mais velho qui eu e ele ainda pode ir a árvore! Eu

    só sou mais alto qui ele!”  “Essas são as regras” disse Bast.  “Essas são regras de merda!” O rapaz gritou, fazendo um punho com as mãos.“E você é um bastardo de merda, que merece mais cintadas do que recebe.”  Houve um silêncio então, quebrado apenas pela respiração irregular dogaroto. Os olhos de Rike se voltaram para o chão, os punhos cerrados ao ladodo corpo, ele estava tremendo.  Bast estreitou os olhos ligeiramente.

      A voz do menino era áspera. “Só um” disse Rike. “Só um favor só essa vez.É um dos grandes. Mas eu pagarei. Pagarei o triplo.”  Bast respirou fundo e soltou o ar como um suspiro. “Rike, eu-”  “Por favor, Bast?” Ele ainda estava tremendo, mas Bast percebeu que a vozdo garoto não estava mais com raiva. “Só...por favor?” Estendeu a mão e apenas

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    ficou ali à toa, como se não soubesse o que fazer com ela. Por fim, ele pegou amanga da blusa de Bast e puxou-a uma vez, debilmente, antes de deixar a mãocair de volta para seu lado. “Eu não posso consertar isso sozinho”.  Rike olhou para cima, seus olhos cheios de lágrimas. Seu rosto foi torcidoem um nó de raiva e medo. Um menino muito jovem para evitar chorar, masainda velho o suficiente para ele se odiar por fazer isso.  “Eu preciso que você se livre do meu pai” ele disse com uma voz partida.“Eu não sei como. Eu poderia furá-lo enquanto ele dormia, mas assim minhamãe descobriria. Ele bebe e bate nela. E ela chora o tempo todo e então ele vailá e bate mais nela.”  Rike olhava para o chão novamente, as palavras derramavam dele emerupção. “Eu poderia pegá-lo enquanto ele estivesse bêbado em algum lugar,

    mas ele é muito grande. Não poderia movê-lo. Eles encontrariam o corpo e o juíz me pegaria. Eu não poderia olhar para minha mãe nos olhos então. Nãose ela soubesse. Eu não posso pensar o que isso faria com ela, se ela soubesseque eu sou o tipo de pessoa que mataria seu próprio pá.”  Ele olhou para cima então, seu rosto furioso, seus olhos vermelhos de tantochorar. “Embora eu faria. Eu o mataria. Só me diga como fazer.”  Houve um momento de silêncio.  “Está bem” disse Bast.

      Eles desceram para o córrego onde ele poderia tomar um gole de água e Rikepoderia lavar o rosto e se recompor um pouco. Quando o rosto do rapaz estavalimpo, Bast notou que nem toda imundice era sujeira. Era fácil de confundir,pois o sol havia o bronzeado em um rico marrom noz. Mesmo depois de ele terse limpado bastante era difícil de saber se eram os restos tênues de contusões.  Suposição ou não, os olhos de Bast eram penetrantes. Bochecha e mandíbula.Uma escuridão em torno de seu pulso magrelo. E quando ele se inclinou para

    tomar uma bebida do córrego, Bast vislumbrou as costas do rapaz...  “Então” disse Bast enquanto sentava ao lado do córrego. “O que exatamente você quer? Você quer que eu o mate ou quer que ele apenas vá embora?”  “Se ele for apenas embora, eu nunca dormiria novamente por me preocuparde ele voltar.” Disse Rike, então ele ficou um pouco em silêncio. “Ele foi emborapor um período uma vez.” Ele deu um leve sorriso. “Essa foi uma boa época,só eu e minha mã. Era como se fosse meu aniversário todos os dias quando euacordava e ele não estava lá. Eu nunca pensei que minha mãe pudesse cantar...”

      O menino ficou em silêncio novamente. “Eu pensei que ele tivesse caídobêbado em algum lugar e finalmente tivesse quebrado o pescoço. Mas ele tinhaapenas negociado um ano de peles em troca de dinheiro para beber. Ele sóestava em seu barraco de armadilhas, todo entorpecido de bebida por metadede um mês, e não um pouco mais de um quilômetro de distância.”

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      O rapaz sacudiu a cabeça, mais firmemente dessa vez. “Não, se ele for, elenão ficará longe.”  “Eu posso descobrir como fazer” disse Bast. “Isso é o que eu faço. Mas vocêprecisa me dizer o que você realmente quer.”  Rike sentou por um bom tempo, abrindo e fechando a mandíbula. “Longe”ele disse finalmente. Essa palavra parecia pegar em sua garganta. “Desde queele permanece longe para sempre. Se você puder realmente fazer isso.”  “Eu posso fazer isso.” Disse Bast.  Rike olhou para suas mãos por muito tempo. “Longe então. Eu o mataria.Mas esse tipo de coisa num é certa. Eu não quero ser esse tipo de homem. Umrapaz não deve matar seu próprio pai ”.  “Eu posso fazer isso para você.”, disse Bast com facilidade.  Rike se sentou por um tempo, então balançou sua cabeça. “É a mesma coisa,

    num é? De qualquer forma, sou eu. E se for eu, seria mais honesto se eu fizessecom minhas próprias mãos do que com minha boca.”Bast assentiu. “Certo então. Longe para sempre”  “E logo” disse Rike.  Bast suspirou e olhou para o sol. Ele já tinha coisas para fazer hoje. Asengrenagens de seu desejo não pararam de girar só porque algum agricultorbebeu demais. Emberlee tomaria seu banho logo. Ele deveria pegar cenouras...Ele não devia nada ao garoto também. Era o oposto. O garoto tinha mentido

    para ele. Quebrado uma promessa. E enquanto Bast acertava as contas tãofirmemente que as outras crianças da cidade nem sonhavam em cruzar seucaminho daquele jeito... ainda era irritante de lembrar. A ideia de ajudá-lo agora,apesar disso, era completamente o oposto do que ele desejava.  “Tem que ser logo”, Rike disse. “Ele está ficando pior. Eu posso fugir, masminha mãe não. E o pequeno Bip também não… E...”  “Certo, certo...” Bast o cortou, sacudindo as mãos. “Logo.”  Rike engoliu. “O que isso vai me custar?” ele perguntou, ansioso.

      “Muito.” Bast disse amargamente. “Não estamos falando de fitas e botõesaqui. Pense o quanto você quer isso. O quão importante isso é.” Ele olhou nosolhos do garoto e não desviou o olhar. “Três vezes isso é o que você me deve.Mais um pouco pelo logo.” Ele encarou o rapaz.  “Pense bem sobre isso.”  Rike estava um pouco pálido agora, mas ele assentiu sem desviar o olhar.“Você pode ter o que você quiser de mim”, ele disse. “Mas nada de minha mãe.Ela num tem muito mais além que meu pai já não tenha bebido.”

      “Nós resolveremos isso.” Disse Bast. “Mas não será nada dela. Eu prometo.”  Rike respirou fundo. Em seguida, deu um aceno acentuado de cabeça. “Estábem. Quando começamos?”  Bast apontou para o córrego. “Encontre-me uma pedra do rio com um buracoe traga para mim.”

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      Rike deu a Bast um olhar estranho. “Ocê quer uma pedra de fada?”  “Pedra de fada.” Bast disse com um deboche fulminante tão grande que Rikecorou de vergonha.  “Você está muito velho para esse absurdo.” Bast deu uma olhada para ogaroto. “Você quer que eu te ajude ou não?” ele perguntou.  “Eu quero.”, disse Rike em voz baixa.  “Então eu quero uma pedra do rio.” Bast apontou para o córrego. “Você deveser a pessoa a achá-la.” Ele disse. “Não pode ser ninguém mais. E você precisaencontrá-la seca na margem.”  Rike assentiu.  “Está bem então.” Bast bateu palmas duas vezes. “Pode ir.”  Rike saiu e Bast retornou para a árvore relâmpago. Nenhuma criança estava

    esperando para falar com ele, portanto vadiou no tempo livre. Ele puloupedras no riacho próximo e folheou Celum Tinture, olhando para algumas dasilustrações. Calcificação. Titulação. Sublimação.  Bran, feliz sem castigo e com uma mão enfaixada, trouxe dois pães docesenrolados em um lenço branco. Bast comeu o primeiro e deixou o segundode lado. Viette trouxe as braçadas de flores e uma fita azul fina. Bast teceu asmargaridas em uma coroa, enfiando a fita através do caule.  Então, olhou para o sol e viu que estava quase na hora. Bast removeu sua blusa

    e a encheu com o rico amarelo e vermelho das Não-Me-Toques que Viette trouxepara ele. Ele adicionou o lenço e a coroa, em seguida, pegou um pedaço de paue fez uma trouxinha para que ele pudesse levar tudo muito mais facilmente.  Ele seguiu afora passando a ponte Pedra Antiga, então para cima em direçãoàs colinas e ao redor de um precipício até que achou o lugar descrito por Kostrel.Era escondido de maneira esperta, e o regato se encurvava e espiralava em umaamável pequena piscina perfeita para um banho privativo.  Bast sentou-se atrás de alguns arbustos, e passada meia-hora de espera

    ele caiu no sono. O estalo agudo de um galho e um pedaço de uma cançãopreguiçosa despertaram-no, e ele se empertigou para baixo para ver a jovemmulher cuidadosamente se dirigindo da íngreme vertente para a borda da água.Movendo-se silenciosamente, Bast apressou-se rio acima, carregando seu fardo.Dois minutos depois ele estava se ajoelhando na margem coberta de grama coma pilha de flores ao seu lado.  Ele pegou uma flor amarela e expirou nela geltilmente. Conforme suarespiração roçou nas pétalas, sua cor mudou gradualmente para um azul

    delicado. Ele soltou-a e a corrente a carregou lentamente rio abaixo.Bast juntou um punhado de ramalhetes, vermelhos e laranjas, e expirou nelesnovamente. Suas cores também mudaram e deslocaram para um pálido e vibrante azul. Ele os espalhou na superfície do regato. Fez isso duas vezes maisaté que as flores acabaram-se.

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      Então, pegando o lenço e a coroa de margaridas, ele correu de volta rioabaixo para o pequeno vazio aconchegante entre os olmos. Ele se moveu rápidoo bastante para que Emberlee estivesse a caminho da margem.  Suavemente, silenciosamente, ele se arrastou até o aglomerado de olmos.Mesmo com uma mão carregando o lenço e a coroa, ele seguiu o lado ágil comoum esquilo.  Bast deitou-se ao longo de um ramo, protegido pelas folhas, respirando rápido masnao forte. Emberlee estava removendo a meia-calça e dispondo-as cuidadosamenteem uma sebe. Seu cabelo brilhava dourado e vermelho, caindo em preguiçosascurvas. Sua face era doce e redonda, uma amável tom pálido e rosado.  Bast abriu um sorriso enquanto a via olhando ao redor, primeiro para aesquerda, então para a direita. Então ela começou a soltar o laço de seu corpete.

    Seu vestido era de um pálido centáurea-azul, com bordas amarelas, e ela esticou-ona sebe, chanfrado fulgorosamente de maneira que parecia a asa de um enormepássaro. Talvez alguma combinação fantástica entre um tentilhão e um gaio.  Vestida apenas com sua roupa de baixo branca, Emberlee olhou ao redordenovo: esquerda, depois direita. Então se remexeu para tirá-la, um movimentofascinante. Ela jogou a roupa de baixo de lado e lá estava ela, nua como a lua. Suacremosa pele estava incrível coberta de sardas. Seus quadris largos e amáveis.

    As pontas dos seios coradas como o mais pálido rosa.

      Ela se precipitou rapidamente para dentro d’água. Soltando uma série depequenos, consternados gemidos de frio. Eles eram, em consideração, nadaparecidos com um corvo afinal. No entanto, poderiam ser, talvez, com uma garça.  Emberlee lavou-se um pouco, salpicando água e tremendo. Ela se ensaboou,imergiu sua cabeça no rio, e veio a tona ofegante. Molhado, seu cabelo ficou dacor de cerejas maduras.  Foi então que os primeiros Não-Me-Toques chegaram, flutuando na água.Ela dirigiu seu olhar para eles curiosamente enquanto flutuavam ao redor e

    começou a ensaboar seu cabelo.  Mais flores seguiram o fluxo. Vieram corrente abaixo e fizeram círculos aoredor dela, pegas no pequeno rodamoinho da piscina. A garota olhou para elasmaravilhada. Então ergueu um punhado acima da água e as trouxe defrontesua face, inspirando para sentir seu perfume.  Ela riu encantada e mergulhou abaixo da superfície, emergindo no meio dasflores, a água escorreu por sua pele pálida, passando por seus seios nus. Floresse agarraram nela, como se relutantes em deixa-la.

      Foi então que Bast caiu da árvore.  Houve um breve, irritado arrastar de dedos contra a casca, uns poucosganidos, então ele bateu contra o chão como um saco de banha. Ele deitou decostas na grama e deixou sair um grave, miseravel rosnado.  Ouviu um som de chapinhar, e então Emberlee apareceu diante dele. Ela

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    segurava sua roupa de baixo branca à frente. Bast, deitado na grama alta, olhoupara cima.  Ele foi sortudo em aterrissar naquele trecho de relva, amortecido pela gramaalta e verde. Alguns metros para um lado, e ele teria se esborrachado de encontroas rochas. Dois metros para o outro lado e ele teria se afundado na lama.  Emberlee ajoelhou-se ao seu lado, sua pele pálida, seus cabelos escuros.Um ramalhete agarrado ao seu pescoço—era da mesma cor de seus olhos, umpálido e vibrante azul.  “Oh,” Bast disse feliz ao olhar para ela. Seus olhos estavam ligeiramenteofuscados. “Você é muito mais adorável do que eu imaginei.”  Ele levantou uma mão como se para roçar sua bochecha, mas viu-se segurandoa coroa e o lenço amarrado. “Ahh,” ele disse, lembrando. “Eu lhe trouxe algumas

    margaridas também. E um pão doce.”  “Obrigada,” ela disse, pegando a coroa de margaridas com as duas mãos. Elase livrou da roupa de baixo para fazê-lo, que caiu suavemente sobre a grama.  Basst piscou, momentaneamente sem palavras.  Emberlee inclinou a cabeça para olhar a coroa; a faixa era impressionantementede um azul safira, mas não era nem perto de ser tão amável como seus olhos.Ela a ergueu com as duas mãos e a posicionou orgulhosa em sua cabeça. Seusbraços ainda erguidos, ela inspirou lentamente.

      O olhar de Bast escorregou da coroa.  Ela sorriu para ele indulgentemente.  Bast puxou ar para falar, mas então parou e inspirou denovo pelo nariz.Madressilva.  “Por acaso você roubou meu sabonete?” ele perguntou incrédulo.  Emberlee riu e o beijou. 

    Um bom tempo depois, Bast pegou o caminho longo de volta para a árvore

    relâmpago, fazendo uma larga curva até as colinas ao norte da cidade. A paisagemera mais rochosa por aqueles lados, sem solo plano o bastante para o plantio,o terreno muito traiçoeiro para o pasto.  Mesmo com as indicações do menino, Bast levou um tempo para encontrara destilaria de Martin. O velho louco merecia certo reconhecimento afinal.Entre os espinheiros, barranco, e árvores caídas, não havia chance que ele teriatrombado com o esconderijo acidentalmente, espremido dentro de uma cavernasuperficial, em um insignificantemente pequeno vale.

      A destilaria não era nenhuma profusão de geringonças enroscadas a velhas jarras e fios emaranhados. Era uma obra de arte. Haviam barris e bacias eenormes espirais formadas por tubos de cobre. Uma enorme chaleira de cobrecom o dobro do tamanho de um tanque, e um fogão para aquece-la. Uma valade madeira se estendia ao longo de todo o teto, e somente depois de segui-la

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    até o lado de fora Bast percebeu que Martin coletava água da chuva para encherseus barris de refrigeração.  Observando a destilaria, Bast sentiu uma repentina necessidade de folhearo Celum Tinture e aprender como eram chamadas cada uma das peças, e paraque serviam. Somente então ele percebeu que havia deixado o livro na árvorerelâmpago.  Então ao invés disso ele explorou ao redor até que achou uma caixa preenchidacom uma maluca mistura de recipientes: duas dúzias de garrafas de todos ostipos, jarros de barro, antigas jarras de lata ... Uma dúzia delas estavam cheias.Nenhuma delas estavam rotuladas de forma alguma.  Bast ergueu a garrafa alta que obviamente conteve vinho um dia. Ele puxoua rolha, cheirou-a cautelosamente, então tomou um gole cuidadoso. Seu rosto

    desabrochou numa aurora de deleite. Ele quase que esperava aguarrás, mas issoera ... bem ... ele nao tinha total certeza. Bebeu outro gole. Havia um toque demaçãs na bebida, e ... cevada?  Bast entornou um terceiro gole, sorrindo. Qualquer coisa que fosse, eraadorável. Suave e forte e só um pouco doce. Martin pode até ser atormentado,mas claramente sabia destilar.  Já havia passado mais do que uma hora antes que Bast fizesse o caminho de volta para a árvore relâmpago. Rike não havia retornado, mas Celum Tinture

    permanecia intocado. Era a primeira vez que se encontrava feliz em ver o livro,pelo que se lembrava. Ele abriu o livro no capítulo de destilação e leu por meiahora, assentindo para si mesmo em vários pontos. Era chamada de bobina decondensação. Parecia importante, pensou ele.  Finalmente ele fechou o livro e emitiu um suspiro. Havia algumas nuvens seadensando, e nenhum bem seria feito ao deixar o livro abandonado de novo. Suasorte não duraria para sempre, e ele estremeceu ao pensar no que aconteceriase o vento tombasse o livro na grama e rasgasse algumas páginas. Se houvesse

    uma chuva repentina....  Então Bast caminhou de volta para a Pousada Marco do Percurso e seesgueirou silenciosamente pela porta de trás. Pisando com cuidado, ele abriuum armário e enfiou o livro dentro. Ele estava fazendo seu silencioso caminhode volta para a porta antes de ouvir passos atrás de si.“Ah, Bast,” o hospedeiro disse. “Você trouxe as cenouras?”  Bast estagnou, pego embaraçosamente no meio de sua fuga. Ele ficou eretoe alisou as roupas constrangido. “Eu... eu ainda nao cheguei nessa parte, Reshi.”

    O hospedeiro suspirou profundamente. “Eu não peço uma...” Ele parou echeirou, então estreitou os olhos para o homem de cabelos escuros.”Você estábêbado, Bast?”  Bast pareceu ofendido. “Reshi!”  O hospedeiro virou os olhos. “Está bem então, você esteve bebendo?”

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      “Eu estive investigando,” Bast disse, enfatizando a palavra. “Você sabia queo Martin Maluco tem uma destilaria?”  “Eu não.” o hospedeiro disse, seu tom deixando claro que não achava ainformação particularmente emocionante. “E Martin não é louco. Ele só temum punhado de fortes afetações compulsivas infelizes. E um toque de maluquicemilitar de quando ele era soldado.”  “Bem, sim...” Bast disse vagarosamente. “Eu sei, pois ele atiçou seu cachorroem mim e quando eu escalei uma árvore para fugir, ele tentou derrubar a árvorea machadadas. Mas também, fora essas coisas, ele também é louco, Reshi. Muito,muito louco.”  “Bast.” O hospedeiro olhou-o com olhar de reprovação.  “Eu não estou dizendo que ele é mau, Reshi. Não estou nem dizendo que não

    gosto dele. Mas acredite. Eu conheço loucura. Ele não tem a cabeça no lugar,como uma pessoa normal.”  O hospedeiro assentiu conformadamente, senão impaciente. “Eu notei.”  Bast abriu a boca, então pareceu ligeiramente confuso. “Sobre o que estávamosfalando?”  “Sobre seu estado avançado em tal investigação,” disse o hospedeiro, dirigindoo olhar para a janela. “Apesar do fato de ainda estarmos antes da terceirabadalada.”

      “Ah. Certo!” Bast disse animado. “Eu sei que Martin tem adicionado boa partedos gastos desse ano na conta dele até agora. E que você anda com problemaspara ajustar as contas porque ele não tem dinheiro.”  “Ele não usa dinheiro,” o hospedeiro corrigiu gentilmente.  “Mesma coisa, Reshi,” Bast suspirou. “E isso não muda o fato de que nãoprecisamos de outro saco de cevada. A despensa está transbordando cevada!Entretanto, já que ele tem uma destilaria...”  O hospedeiro já estava balançando a cabeça. “Não, Bast,” ele disse. “Eu não

     vou envenenar meus clientes com vinho das colinas. Você não tem ideia doque poem nessa coisa ...”  “Mas eu sei, sim, Reshi,” Bast disse melancolicamente. “Acetatos de etila emetanos. E estanho diluído. Não tem nada disso.”  O hospedeiro piscou, obviamente surpreendido. “Você... você tem mesmolido o Celum Tinture?”  “Eu estive, Reshi.” Bast declarou orgulhoso. “Em nome do aperfeiçoamentoda minha educação e do meu desejo de não envenenar as pessoas. Eu degustei

    um pouco, Reshi, e posso dizer com alguma autoridade que Martin nao estáfazendo vinho das colinas. O produto é encantador. Sua qualidade equivale ametade de um Rhis, e isso não é o tipo de coisa que eu digo à toa.”  O hospedeiro afagou o lábio superior pensativo. “Onde você conseguiu umpouco disso para experimentar?”, ele perguntou.

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    algo. “Agora precisamos de uma agulha. Mas tem que ser emprestada de umacasa onde não haja homens habitando.”  Rike pareceu pensativo por alguns segundos, então se iluminou. “Possopedir uma para a tia Sellie!”  Bast se esforçou para não praguejar. Tinha se esquecido da Sellie. “Pode serque sirva ...” ele disse, relutante, “Mas vai funcionar melhor se a agulha vier deuma casa com muita mulheres morando nela.“  “Rike olhou para cima por mais alguns segundos. “A viúva Creel então. Elatem uma filha.”  “Ela tem um filho também” Bast apontou. “Tem que ser de uma casa ondenão haja homens ou meninos morando.”  “Mas onde habitem moram muitas mulheres ...” Rike disse. Ele teve quepensar por um longo período de tempo. “A velha Nan não gosta nem um pouco

    de mim, “ ele disse. “Mas acredito que ela me daria um alfinete.”  “Uma agulha,” Bast salientou. “E você tem que emprestá-lo. Não pode roubá-lo ou comprá-lo. Ela tem que emprestar-lhe”  Bast achava que o garoto poderia reclamar sobre certos detalhes, como o fatode que a velha Nan vivia bem longe do outro lado da cidade, tanto quanto vocêpoderia ir sentido oeste sem sair da cidade propriamente dita. Ele levaria meia-hora para chegar lá, e mesmo assim, a velha Nan talvez não estivesse em casa.Mas Rike não fez mais do que suspirar. Simplesmente assentiu seriamente,

     virou-se, e decolou em uma corrida, quase voando descalço.  Bast continuou até a árvore relâmpago, mas quando alcançou-a ele viu umbocado de crianças brincando no marco do percurso, claramente esperandopor ele. Eram quatro crianças.  Coberto pelas sombras das árvores, à margem da clareira, Bast espreitou-ashesitante, então olhou em direção ao Sol antes de se embrenhar de volta nafloresta. Ele havia outro peixe para fritar.  A fazenda dos Williams na verdade não era nenhuma fazenda. Ao menos

    por décadas. Por estar a tanto tempo infértil, o solo não parecia ter sido umdia destinado ao plantio, sarapintado com espinheiros e mudas de árvores. Oceleiro alto carecia de reparos e metade do teto era um buraco aberto ao céu.  Percorrendo o longo caminho através dos campos, Bast virou em uma curva e

     viu a casa de Rike. Sua aparência contava uma história diferente à do celeiro. Erapequena mas ajeitada.As telhas precisavam de um pequeno conserto, mas foraisso, tudo parecia bem cuidado e cheio de propósito. Cortinas amarelas estavamesvoaçando para fora da janela da cozinha, e havia uma floreira transbordando

    de cravos amarelos e filodendros.  De um lado da casa havia uma baia com três cabras, e um jardim bem cuidadodo outro. Estava densamente cercado por gravetos amarrados, no entanto Bastconseguia vislumbrar linhas estreitas de verde dentro. Cenouras. Ele continuavaprecisando de cenouras.

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      Empinando um pouco seu pescoço, Bast viu várias caixas grandes atrás dacasa. Deu mais alguns passos para o lado e olhou-as antes de descobrir queeram colméias de abelha.  No exato momento ouviu-se uma tempestade de latidos e dois grandescachorros pretos, com orelhas de abano, contornando a casa e indo em direçãoa Bast, ladrando com todas suas forças. Quando chegaram perto o bastante, Bastse apoiou em um joelho e, de maneira brincalhona lutou com eles. Coçandosuas orelhas e a parte de trás de seus pescoços.  Depois de alguns minutos de brincadeira, Bast continuou em direção à casa,os cachorros correndo e pulando a sua frente antes que eles avistaram algumtipo de animal e correram para debaixo de um arbusto. Ele bateu à porta dafrente polidamente, no entanto depois dos latidos sua presença dificilmenteseria uma surpresa.

      A porta abriu-se alguns centímetros, e por um momento tudo o que Bastconseguia ver era uma longa fatia de escuridão. Então a porta abriu-se umpouco mais, revelando a mãe de Rike. Ela era alta, e seus cacheados cabeloscastanhos saltando livres da trança que caia em suas costas.  Ela abriu totalmente a porta, segurando um pequeno bebê semi-nu na curvade seu braço. A face redonda pressionada em seu seio, que estava ocupadasugando o leite materno, fazendo pequenos grunhidos.  Olhando para baixo, Bast sorriu acolhedoramente.

      A mulher olhou afetuosamente para a criança, e então favoreceu Bast comum sorriso cansado. “Olá Bast, no que posso ajudá-lo?”  “Ah, bem,” ele disse embaraçosamente, levantando seu olhar para os olhosdela. “ Eu estava pensando, madame. Digo, Senhora Williams...”  “Pode me chamar de Nettie, Bast,” ela disse indulgente. Mais do que algumaspessoas da cidade consideravam Bast um tanto simplório na cabeça, um fatodo qual Bast não se importava.  “Nettie,” Bast disse, com seu sorriso mais cativante.

      Houve uma pausa, e ela se inclinou no batente da porta. Uma meninapequena espiou ao redor da saia azul desbotada, nada mais do que um par deolhos sérios.  Bast sorriou para a menina, que desapareceu novamente atrás de sua mãe.  Nettie olhou para Bast coma r de expetativa. Finalmente ela impeliu. “Vocêestava pensando ...”  “Ah sim.” Bast disse. “Eu estava pensando se o seu marido estaria em casa.”  “Temo que não está,” ela disse. “Jessom está fora, checando suas armadilhas.”

      “Ah,” Bast disse, desapontado. “ Sabe se ele vai voltar logo? Eu não meimportaria de esperar ...”  Ela balançou a cabeça, “Sinto