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UNIVERDIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
TÍTULO DO TRABALHO:
AA IINNSSTTIITTUUCCIIOONNAALLIIZZAAÇÇÃÃOO DDEE AADDOOLLEESSCCEENNTTEESS
EEMM CCOONNFFLLIITTOO CCOOMM AA LLEEII NNOO RRIIOO DDEE JJAANNEEIIRROO
POR:
ZENITH ZANIN DE ALAH MACIEL VINAGRE
ORIENTADOR:
EDUARDO BRANDÃO
2
RIO DE JANEIRO – RJ
ANO 2011
UNIVERDIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
TÍTULO DO TRABALHO:
“A INSTITUCIONALIZAÇÃO DE ADOLESCENTES
EM CONFLITO COM A LEI NO RIO DE JANEIRO”
Monografia apresentada à UNIVERSIDADE CÂNDIDO
MENDES como requisito parcial para obtenção do grau
de especialização em psicologia jurídica.
POR : ZENITH ZANIN DE ALAH MACIEL
VINAGRE
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço a equipe interprofissional os meus professores e o
campo de estagio, rico em aprendizagem e conhecimento.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a alguém que não mais se encontra
neste plano espiritual - minha mãe, que transformou meu
sonho em objetivo real. Também a minha família e amigos
que não desistiram de mim, compreendendo minha
ausência.
5
RESUMO
Abusos dos direitos humanos são cometidos diariamente. Quando falamos em
crianças e adolescentes institucionalizados esses abusos são ainda maiores.
Os adolescentes em conflito com a lei são em grande maioria originários das
classes mais pobres, excluídos das escolas e marginalizados pela maioria da
população, dessa forma acabam por viver à margem da sociedade. Os
sistemas de internação que vemos ainda hoje são o reflexo das instituições de
caráter correcional-repressivo do século XVIII.
Embora as condições variem significativamente de um estado para outro, e de
uma instituição para outra, as condições das instituições para o cumprimento
das medidas sócio-educativas são inadequadas e nada eficazes. Justifica-se,
assim, a realização deste estudo que nos leva a uma maior compreensão de
interesse tanto para cientistas quanto para o homem comum. Essa pesquisa é
de grande relevância, pois através dela podemos compreender melhor todo o
aparato herdado de instituições como o SAM (Serviço de Assistência ao
Menor) e a FUNABEM (Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor). Um
problema a ser pesquisado e estudado é de que forma as instituições
contribuem nas perspectivas relacionadas à vida desses adolescentes em
conflito com a Lei? Este trabalho se constitui de levantamento bibliográfico e de
reflexões, a partir do Projeto Reinserção Social, que consiste numa parceria
entre a Comunidade Tijuquinha e uma universidade.
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................ 08
1. BREVE HISTÓRICO DA INSTITUCIONALIZAÇÀO NO BRASIL.............. 09
2. O ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI........................................ 19
3. PROJETO DE ESTAGIO NA COMUNIDADE TIJUQUINHA..................... 26
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................... .31
REFERÊNCIAS.......................................................................................... 34
7
INTRODUÇÃO
A motivação que me fez abordar sobre este tema a partir desta vivencia
singular foi possível observar o sofrimento através da fala de cada um e sentir
a relação interpessoal que envolve a família do adolescente com a instituição,
ou seja, o relacionamento com os maus-tratos existentes no sistema.
A dificuldade de trabalhar com estes familiares me fez buscar
aprofundamento na pesquisa teórica para conhecer um pouco mais deste
universo e contexto dos adolescentes.
Segundo (Goffman), o estigma é um sinal utilizado pela sociedade para
descriminar os indivíduos portadores de determinadas características.
O fato de o adolescente ter cometido o ato delituoso faz com que ele
adquira um estigma que irá enquadrá-lo numa dinâmica existencial, onde seus
atos anteriores, com relação a família e com os amigos,a liberdade de ir e vir
dentre outras coisas irão se transformar frente a realidade reclusão em um
abrigo.
A proposta deste trabalho é abordar o tema Adolescentes em Conflito
com a Lei, institualizado, na cidade do Rio de Janeiro, será desenvolvido em
três capítulos.
No primeiro capítulo intitulado “BREVE HISTÓRICO DA
INSTITUCIONALIZAÇÃO NO BRASIL” a intenção é examinar a construção
da institucionalização(abrigo) como meio central das medidas sócio-educativas.
No segundo capítulo intitulado ”O ADOLENCENTE EM CONFLITO
COM A LEI”, abordarei alguns aspectos jurídicos e uma breve introdução às
medidas sócio-educativas.
8
É visto que os adolescentes recebem ao longo de várias décadas
nomenclaturas pejorativas e carregadas de preconceitos como as de
“delinquentes”, “trombadinhas”, ”marginais” e ”de menor”.
Um pouco da história da criança brasileira institucionalizada e das
organizações voltadas para o seu atendimento a partir do século XVII, até os
nossos dias atuais faz parte desta monografia.
No terceiro capítulo, abordo o Projeto NA COMUNIDADE DA
TIJUQUINHA SITUADA NA BARRA DA TIJUCA, em parceria com uma
UNIVERSIDADE DO RIO DE JANEIRO.
Utilizamos como metodologia, relatos dos familiares dos adolescentes
em conflito com a lei, e também, pesquisas bibliográficas em revistas jornais e
leitura de livro, durante o meu período de estágio.
9
1. BREVE HISTÓRICO DA INSTITUCIONALIZAÇÃO NO BRASIL
HISTÓRIA SOCIAL DA INFANCIA E DA FAMÍLIA
O que conhecemos hoje sobre a infância, evoluiu e se desenvolveu
desde o século XV, ocorrendo o começo das mudanças na sociedade. O que
denominamos de primeira infância (três ou quatro anos), a criança mantinha
seus momentos infantil isolado ou brincando com outras crianças,
acompanhada pela mãe ou ama. Depois, começam a se integrar nos jogos
com os adultos, participando inclusive das festas ate o fim das festas sem
restrição de horários. Não havia afeto, nem interesse em cuidar das crianças
com sentimentos fraternos.
O período da idade média, a infância termina por volta dos 6 anos de
idade, passando então a viver definitivamente entre os adultos, reproduzindo
seu comportamento no que diz respeito ao trabalho, freqüência em ambientes
noturno, bares etc.
Nesta época ainda não havia conceito de escolas, existiam salas de
estudos livre, onde era freqüentada por qualquer pessoa com a necessidade
de aprender a ler e escrever seja criança, adolescentes ou adultos. Não
existindo nesta época nenhum trabalho pedagógico diferenciado em relação a
idade. Nas salas de estudos poderiam freqüentar mais ou menos 200 alunos.
Estudavam qualquer pessoa e de qualquer classe social, não havendo
distinção entre eles. Sendo normal este convívio em qualquer lugar da
sociedade.
As meninas não freqüentavam estas salas, sendo educadas dentro de
suas próprias casas por seus responsáveis, costumava-se enviar seus filhos
para casa de amigos que tinham habilidade ou nobreza para adquirir o
10
aprendizado da vida adulta e a prática de suas funções, na verdade enviam
seus filhos e outras famílias os criavam.
Alguns afazeres eram realizados por aprendizes, crianças, e não por
empregados tendo como o exemplo servir a mesa. Ate completar 18 anos
moravam em outras casas. Sendo que as meninas por estarem também com
outras famílias aprendiam a serem verdadeiras donas de casa para o
casamento que acontecia por volta dos 13 a 14 anos.
Entre o final do século XV e XVI surgiu na sociedade a cobrança com o
cuidado da criança e também o seu desenvolvimento no que diz respeito a
fraternidade e afeto pelos seus filhos. Tendo sido um processo lento onde
ocorreu a mudança da presença mais próxima aos seus pais. Surgiu então as
escolas populares onde todos do gênero masculino teve sua freqüência, sem
restrições de classe social. Com a freqüência dos meninos, começa o trabalho
pedagógico, separando as crianças por idades.
Surgiram os internatos onde os alunos moram e freqüentam a escola, mas, a
necessidade de estar perto de seus filhos se fazia presente, e começaram a existir os
externatos.
No entanto estas escolas mantinham muita rigidez, não se preocupando com a
formação integral das crianças, sendo o foco principal a moral e os bons costumes,
para tornarem bons trabalhadores.
A partir do princípio do século XX, a escola começa a obter postura
diferenciada na educação das crianças, trazendo a importância como ser humano para
o seu desenvolvimento.
Surgiu a infância através das idéias de proteção, amparo, dependência. A
criança era vista apenas como um ser biológico, para depois de muita rigidez e
disciplina serem transformados em adultos trabalhadores aceitos socialmente.
De certo modo, houve uma demora no trabalho das ciências sociais e
humanas, no que diz respeito ao foco sobre a criança e a infância como objeto central
de suas pesquisas. Maior demora ocorreu nas pesquisas sobre as relações entre a
sociedade, infância e escola, entendendo a criança como sujeito histórico de direitos.
11
Transformou-se a historia e a educação em campos distintos e inconciliáveis.
nos meados da década de sessenta é onde começaram a serem publicados através
de estudos sobre a historia social da infância e da família. E na década seguinte a
evolução da família. Historiadores encararam um novo processo, que foi o de
reconstruir uma nova definição da infância em seu campo de pesquisa.
A falta de uma historia da infância e seus respectivos registros histográficos
tardios, são indícios da incapacidade por parte dos adultos de verem, a criança em
sua perspectiva histórica.
OS MODELOS DE INSTITUIÇÕES
As instituições que serão vistas no decorrer deste trabalho foram
denominadas das mais variadas formas ao longo dos anos. Instituições
denominadas de orfanatos, abrigos, internato de menores, casas de passagem,
asilos, escolas para meninos, escolas para meninas, casas de educandos
artífices, roda dos expostos e muitas outras denominações.
Para falarmos das origens das instituições o ponto de partida será o ano
de 1550, pouco tempo após a colonização do Brasil, o chamado Brasil Colônia.
Nosso país como é sabido era habitado por nativos indígenas e por esse
motivo o governo de Portugal, orientado pela igreja católica, enviou jesuítas
com a finalidade de catequizar e evangelizar a população indígena. Eles
acreditavam que enviando missionários e pessoas ligadas diretamente à igreja,
os nativos abandonariam suas crenças e seguiriam a partir daí os preceitos do
catolicismo. As crianças e jovens eram os que podemos chamar de os mais
"almejados" para ganhar a "evangelização". A evangelização na verdade
significava para eles a "salvação" das crianças. Acreditava-se que apenas
sendo cristão e seguindo os mandamentos da igreja é que a alma poderia ser
"salva".
12
Os Índios eram educados pelos princípios do Cristianismo, dessa forma
acreditava-se que administrariam uma colônia mais organizada e religiosa.
Em 1551, foram fundados no Brasil os primeiros colégios internos. A
história mostra que os fundadores destes colégios foram Padres (Inacianos).
Em 1551 inaugurava-se então a política de internamento de crianças e
adolescentes.
Michel Foucault (2003) pesquisou e descreveu o papel do poder na
formação histórica das instituições (presídio, hospital, escola e a fábrica). Para
o autor "vivemos hoje em uma sociedade programada, no fundo, por Bentham,
uma sociedade panóptica, sociedade onde reina o panoptismo". (pag.12)
O panoptismo é um poder que se exerce através da vigilância individual
e contínua sobre os indivíduos.
O panoptismo é um dos traços característicos da nossa sociedade. É
uma forma que se exerce sobre os indivíduos em forma de vigilância
individual e contínua, em forma de controle e punição e recompensa e
em forma de correção, isto é de formação e transformação dos
indivíduos em função de certas normas. Esse tríplice aspecto do
panoptismo - vigilância, controle e correção - parece ser uma dimensão
fundamental e característica das relações de poder que existem em
nossa sociedade. (FOUCAULT, 2003, p.103).
A finalidade inicial dos colégios internos era a de abrigar crianças
abandonadas pelos pais, crianças órfãs e crianças moradoras de rua.
O papel da Igreja Católica é decisivo para podermos entender melhor o
desenvolvimento da institucionalização de crianças e adolescentes. A igreja
católica era a grande responsável pela infância abandonada, além de também
ser responsável pela manutenção dos colégios.
A história mostra ter sido o séc. XIX, o tempo de surgimento e de
proliferação de orfanatos, asilos, escolas, enfim, instituições de
13
atendimento à criança abandonada, geralmente voltadas para uma
educação agrícola e artesanal. Tais instituições, em sua maioria,
possuíam cunho religioso, eram de caridade ou filantrópicas, e
raramente tinham subvenção governamental (FERNANDES, 1998, p.
21).
A finalidade inicial dos colégios eram o de "salvar" e recolher. Com o
passar dos anos essa finalidade foi se perdendo e as casas começaram a
servir de abrigo para os filhos de escravas, os filhos de prostitutas e as
crianças pobres. Crianças que por um motivo ou outro não precisavam estar
ali.
As instituições existentes eram conhecidas como asilares, cujo objetivo
principal era a caridade e a assistência. As Santas Casas de Misericórdia são
exemplos de tais instituições. Elas também foram criadas pelo governo de
Portugal e a Igreja Católica.
Citarei aqui uma importante instituição que ficou conhecida não só no
Brasil, mas também na Europa. A instituição a que me refiro é a Roda dos
Expostos, ou Casa da Roda, como também era chamada. A Casa da Roda foi
criada na Europa no século XVII e trazida para o Brasil no século XVIII. A
implementação da Casa da Roda aqui no Brasil se deu pelo aumento
significativo de crianças abandonadas e com isso surgiu o momento "propicio"
para a sua criação. A Roda era mantida pela Santa Casa da Misericórdia e
após a sua fundação, as Casas foram se espalhando rapidamente por todo o
país. As Rodas mais conhecidas eram as da cidade do Rio de Janeiro,
Campos, Salvador, São Paulo, Porto Alegre, Mariana e Recife.
A "Roda" consistia num cilindro giratório dividido em duas partes, sendo
uma para rua e a outra para o interior da instituição, e dessa maneira as
pessoas que "depositavam" as crianças na Roda permanecia no anonimato,
pois era impossível ver quem estava do outro lado. O nome Casa da Roda se
deu por isso, pois realmente havia uma roda para depositar as crianças.
14
A Casa da Roda recebia apenas bebês e crianças ainda pequenas e
depois ofereciam essas crianças para adoção. A criança ao completar sete
anos de idade sem ser adotada era levada para outra instituição.
De acordo com Leite (2001) "O nome Roda dos Expostos foi por muito
tempo sinônimo de lugar dos abandonados pela família, rejeitados, desvalidos,
ingênuos ou enjeitados, nomes também empregados para designar essas
crianças".(LEITE, 2001, p.1O).
A família Brasileira por volta do século XVIII, era constituída de valores
rígidos; a moral, a honra e o nome da família deveriam ser preservados e o que
pudesse ameaçar essa harmonia deveria ser escondido e encoberto. O que
mais importava era defender o nome da família e em meio a isso os filhos
gerados pelas escravas, as mães solteiras e os filhos ilegítimos eram
abandonados ou "doados". As mães escondiam a gravidez das filhas solteiras,
as esposas ignoravam as traições dos maridos com escravas e prostitutas, que
daí nasciam os chamados "filhos ilegítimos", tudo permanecia em sigilo para
que fosse mantida a paz familiar e para preservar o "nome" diante da
sociedade.
A identidade das mães dos bebês entregues a Roda eram mantidos no
anonimato, assim como a identidade dos pais e a identidade dos depositantes
das crianças, dessa maneira, direta ou indiretamente, acabou servindo de
estímulo para o abandono.
A cidade transborda de amásia e bastardos [...] Quase nada se arranja.
O casamento continua difícil. E a população crescendo, crescendo [...]. E
a Roda da Santa Casa a receber as crianças abandonadas que de toda
parte vinham [...] Verdade que, no Brasil, para que a instituição da Roda
fizesse parte das cogitações governamentais [...] impressionado pelo
número de crianças que via morrer abandonadas ao relento [...] Na
melancolia da cidade colonial, a Roda, quando caíam às sombras da
noite, não parava de girar recebendo com os suspiros das mães,
centenas de corpos e vidas. Lá ficavam, lá cresciam. Eram os enjeitados.
(PARANAGUÁ, 1981, p.51, 52, apud FERNANDES, 1998, p.11O).
15
No início da criação das Rodas os bebês eram alimentados através da
amamentação artificial, mas como a mortalidade das crianças era um grande
problema a ser enfrentado, as Rodas passaram a contratar amas de leite. As
amas iam até a Roda e amamentavam os bebês. Existia um aluguel pelas
amas de leite e era pago aos proprietários o aluguel de suas escravas. As
amas eram em grande maioria escravas.
Devido à precariedade física das Rodas, os bebês passaram a serem
levados para fora da instituição para serem alimentados. Ocorreu que as amas
de leite passaram a ser vistas como um negócio rentável pelos seus
proprietários.
Alguns anos após sua criação, a Casa da Roda começou a sofrer
denúncias.
Denúncias estas sobre a mortalidade das crianças, a prostituição infantil,
a ausência de escolaridade, os delitos, a delinqüência precoce e os maus
tratos. As condições físicas das Casas eram precárias e como era elevado o
número de crianças e jovens, não havia os cuidados necessários para
resguardar a vida de seus moradores.
É válido ressaltar que quando a Roda dos Expostos chegou ao Brasil,
nos países da Europa ela já estava sendo banida. Os higienistas, médicos e
doutorandos da época, alertavam toda a população e aos governantes o
quanto as Casas agravavam a mortalidade infantil e aumentavam o abandono
de crianças.
Ainda no século XVIII, foi criada outra conhecida instituição, o internato
"Recolhimento de Órfãs" por Marçal Magalhães Lima e o Capitão Francisco
dos Santos. É importante destacar aqui os nomes dos fundadores, por eles
serem considerados os precursores das idéias dos internatos de "menores"
aqui no Brasil. A intenção deles era que os internatos fossem mantidos pela
caridade pública, para que fossem cortados os vínculos, que ainda existiam,
com o governo de Portugal, no que diz respeito à sustentação e manutenção
das instituições.
16
As instituições em sua grande maioria eram divididas em relação ao
sexo dos jovens. Existiam instituições apenas para meninas e outras somente
para meninos, separadamente. O rigor nas casas para meninas era muito
grande. Eram raros o contato das internas com o mundo exterior. As jovens
recebiam aulas de bordado, costura e de formação como empregada
doméstica. As instituições eram divididas também a partir da cor e dos laços
sanguíneos das meninas. Jovens órfãs de pai e mãe ou somente órfãs de pai
iam para instituições diferentes das jovens negras, índias e "ilegítimas". Essas
jovens só iam embora das casas se caso fossem adotadas por alguma família
ou se fossem casar. Se estas fossem "escolhidas" para casar, o rapaz deveria
pagar o dote para a instituição, podendo então levar a menina e colhida.
O final do século XIX e início do século XX foi marcado pelos novos
padrões sociais, culturais e econômicos na sociedade Brasileira. As
conseqüências dessas mudanças foi o agravamento do abandono infantil, o
aumento da ocorrência de crimes e altíssimo índice de moradores de rua.
Nesta época as crianças Brasileiras começaram a "incomodar" grande parte da
sociedade. A solução encontrada foi a de retirar as crianças das ruas. "Limpar"
as ruas era a maneira mais conveniente de solucionar os problemas, pois desta
forma os "abandonados", "moradores de rua", "delinqüentes", "desvalidos" e
"órfãos" não incomodariam mais. A "grande sociedade Brasileira" poderia
assim passear livre e confortavelmente pelas ruas, pelas grandes avenidas e
não teriam mais que cruzar com os "desprovidos de lar". O Estado passou a
ser o "responsável" pelos jovens, e era papel dele determinar o que seria feito
com eles.
Apesar dos discursos defenderem a proteção do menor, tais entidades,
na prática, davam proteção à sociedade contra essas crianças,
consideradas potencialmente criminosas devido a sua origem cultural e
social. Por isso, nada melhor que recolher e retirar as crianças e jovens
do convívio social. (LEITE, 2001, p. 31)
17
As propostas e antigas concepções de "solução de problemas" e de
"salvação" ainda continuavam em vigor. Na prática tais propostas eram
sinônimo de reclusão e de internação e pouco a pouco esse modelo de
instituição-prisão foi aumentando consideravelmente e se espalhando portados
os cantos do país. Os métodos adotados pelas instituições, em sua grande
maioria eram repressivos, de correção através da violência e de castigo. Estes
nos mostram que não havia nenhum tipo de proposta pedagógica ou
planejamento educacional e ainda assim estas instituições aumentavam em
número de moradores.
Em 1899 foi criada a Escola XV de Novembro e é válido evidenciá-Ia,
pois esta é conhecida por seus métodos educacionais, se tornando um modelo
nesta área. A Escola tentou suprir as falhas existentes nas instituições
conhecidas como filantrópicas, religiosas e as supervisionadas pelo Estado.
Era totalmente administrada pelo Estado, o que não ocorria antes. Dessa
maneira passou a ser o responsável integral pelas instituições, isso significou o
fim dos vínculos e obrigatoriedades de cunho religioso.
Na mesma época também são criados os Institutos de Atenção a
Criança na cidade do Rio de Janeiro e o Instituto Disciplinar de São Paulo, com
a mesma finalidade de todas as outras instituições: abrigar crianças pobres,
órfãs e moradores de rua.
Durante anos crianças e adolescentes ficaram sobre a tutela do governo
de Portugal, da igreja católica, da filantropia, do Estado e durante esse período
não haviam leis específicas de proteção a crianças. Não eram formuladas leis
que pudessem resguardar suas vidas, ou mesmo, leis que determinassem que
na ausência dos pais ou de algum responsável, esses jovens seriam
amparados. Expandiu-se a criação de instituições filantrópicas, religiosas e
administradas por médicos e juristas, mas soluções efetivas não eram
pensadas para melhorar o atendimento nas instituições.
As instituições asilares aceitavam os jovens até determinada idade, que
variava de acordo com a instituição. Conforme os jovens iam crescendo eles
eram enviados para outros lugares. Os que não fossem adotados ou que não
18
conseguiam ser aceitos em escola como a de marinheiros, educandos artífices
ou de outros tipos, acabavam que por perambular nas ruas, sendo esta
permanência um fator de ingresso na prática de delitos. O crescente número de
adolescentes "delinqüentes" fez com que fosse elaborado um Código para a
"penalização" de atos infracionais cometidos por esses jovens. Esse foi o
surgimento do Serviço de Assistência ao Menor, o SAM.
O SAM utilizava-se de métodos correcional-repressivos e era comparado
a sistemas penitenciários, devido a sua prática de internação e isolamento. Sua
proposta inicial era a de regulamentar os diversos internatos que desenvolviam
ações com crianças e adolescentes. Este órgão não obteve resultados
positivos, ao contrário disso recebeu inúmeras denúncias de maus tratos contra
seus internos. Devido a todas as falhas encontradas foram observadas
algumas mudanças para melhorar o atendimento da instituição. Desta forma foi
criada a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor, a FUNABEM.
Em verdade a FUNABEM "herdou" toda a estrutura do SAM e também
de outras instituições. Ocorria que quando uma casa estava prestes a fechar,
pelos mais variados motivos, os diretores ou responsáveis pela casa se
reuniam, traziam novas propostas e mudavam o nome da instituição, com isso
as "novas" instituições incorporavam toda a estrutura das instituições anteriores
e acabam por reproduzir os mesmos erros. Foi o que aconteceu com o SAM e
com a FUNABEM, que herdaram as estruturas do Abrigo de Menores do
Distrito Federal, que virou o Instituto Sete de Setembro, transformando-se no
SAM que passou a ser a FUNABEM, que após 25 anos foi nomeada de CBIA
(Centro Brasileiro para a Infância e Adolescência).
A CBIA apesar de ter recebido todos os métodos repressores das
décadas anteriores, formulou novas normas e seguindo uma experimental linha
de trabalho iniciou um movimento de incentivo as ONGS (Organizações Não
Governamentais). As responsabilidades deixaram de ser exclusivas dos
poderes públicos ou das entidades filantrópicas e assim passou a existir uma
nova forma de atuação nessa área. As Ongs são entidades que dão apoio a
movimentos sociais dos mais variados.
19
[...] a partir de 1982, houve um aumento considerável de ongs criadas
para atender à infância e à adolescência, com objetivos diversos. A
grande maioria visava "ocupar" os jovens, algumas delas enfocando
atividades de lazer, esportes e artes; outras buscando a geração de
renda ou a capacitação profissional e a iniciação no trabalho.[...] Essas
ONGs atuavam no vazio deixado pelos poderes públicos e pelas
entidades filantrópicas [...]. (LEITE, 2001, p. 34).
A FUNABEM veio a se tornar uma das instituições mais conhecidas no
atendimento a crianças e jovens infratores e moradores de rua. Por volta de
1982 a direção da casa iniciou um projeto para promover mudanças no
atendimento aos jovens.
Esse projeto envolveu entidades como a UNICEF (Fundo das Nações
Unidas para a Infância), a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil), além de estudiosos no assunto. Desse projeto foi estruturado o
primeiro texto do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).
A FEBEM (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor) foi criada
paralelamente a criação da FUNABEM. Uma das unidades da FEBEM, na
cidade de São Paulo se tornou conhecida pela sua política de reclusão e
encarceramento, as suas unidades superlotadas, rebeliões feitas pelos seus
usuários e pela prática de torturas.
A história da institucionalização no Brasil é longa e já atravessa um
período de mais de um século. Como vimos no inicio deste capítulo, por volta
de 1550 inaugurava-se aqui a prática da reclusão e internamento. Anos se
passaram e essas práticas ainda continuam em vigor. Na realidade instalou-se
no Brasil o que Rizzini chama de "cultura de institucionalização”.
No Brasil a condição de pobreza sempre foi motivo para a internação. As
mães que não tinham condições de criar seus filhos por razões econômicas e
que iam procurar algum tipo de ajuda tinham os seus filhos entregues a
instituições asilares e lá essas crianças permaneciam, perdendo todo o vínculo
com a família.
20
[...] a análise da documentação histórica sobre a assistência à infância
dos séculos XIX e XX revela que as crianças nascidas em situação de
pobreza e/ou em famílias com dificuldades de criarem seus filhos tinham
um destino certo quando buscavam apoio do Estado: o de serem
encaminhados para instituições como se fossem órfãos ou
abandonados.(RIZZINI, 2004, p. 13)
O ECA prevê que toda criança tem o direito ao convívio com a sua
família e com a comunidade. O Estatuto da Criança e do Adolescente foi criado
em 1990, aparti de projetos e do debate de idéias de pessoas ligadas ao tema
da infância. O ECA surgiu com a necessidade de regulamentar as situações
irregulares em que viviam criança e jovens. Essas situações irregulares são: o
abandono, a ausência de escolaridade o "morar" na rua, a criminalidade e a
prostituição.
O Estatuto é claro ao definir os direitos a crianças e adolescentes. Ele
afirma que é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do
Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos
referentes à vida, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, a dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária (Título I, das disposições preliminares, art.
4°.).
Com a criação do ECA o termo "menor" foi banido. Essa classificação
estigmatizada ainda é utilizada, mas a Lei não reconhece mais esse termo. O
"menor" passou a ser criança, adolescente ou jovem.
O Estatuto implantou leis específicas para o adolescente em conflito com
a lei e determinou a criação de instituições próprias para o cumprimento de
medidas sócio-educativas. Para operacionalizar tais medidas foram criados o
DEGASE (Departamento Geral de Ações Sócio-Educativas) e o CRIAM
(Centro de Recursos Integrados de Atendimento ao Menor).
O DEGASE funciona da seguinte maneira: recebe o jovem apreendido,
ele fica sob sua guarda até o juiz determinar a sentença, depois disso
21
encaminha-o para uma de suas unidades. O DEGASE possui
aproximadamente 29 unidades, sendo, um centro de triagem e recepção (CTR)
e 17 CRIAMS.
A INSTITUIÇÃO PRISIONAL
O processo histórico de implantação da Instituição Prisão e de seus
mecanismos de poder, a reconstrução do que já aconteceu e que está morto,
definido, mas que a história consiste em localizar, o que teve início no passado
e está vivo, presente e pode determinar ou já esta determinando o futuro.
(BAREMBLITT, 1996).
A prisão ocupa um lugar de destaque não só no imaginário como
também no funcionamento da sociedade capitalista ocidental atual. Ela possui
caráter multifacetário no universo social: está relacionada à legislação, ao
crime, ao controle de criminalidade e intimidação, e também, a ressocialização
dos criminosos, e recentemente com a idéia de direitos humano.
A prisão não é recente na história da humanidade, até a idade moderna
vai servir como local de custódia para criminosos que seriam submetidos, à
aplicação de pena como castigos corporais ou pena de morte, ela é
apresentada como instituição total eficaz, não só para reparar os danos
causados à sociedade pelo crime, como também, disciplinar e administrar o
criminoso, seja pela via de correção ou via de neutralidade às classes
perigosas de acordo com a legislação e funcionamento da sociedade. Ao
estudar a metamorfose dos métodos, punitivos, Foucault, descreve três
modalidades do poder de punir: o suplício, a punição e a disciplina. Os
suplícios e a pena capital foram às penas preferenciais no período feudal,
atingindo aos mais pobres, elas correlacionavam o tipo de ferimento físico, a
qualidade, a intensidade, o tempo dos sofrimentos com a gravidade do crime, a
22
pessoa do criminoso e o nível social de suas vítimas, que também, atacavam o
soberano. Desta forma, o suplício tinha função jurídico-poilítica de reconstruir o
poder de soberania lesada, e enfatizar a superioridade do soberano.
(Ouverney, 2007)
Segundo FOUCAULT (1975, p.32) o poder através do suplício é uma
produção diferenciada de sofrimentos.
O suplício penal não corresponde a qualquer punição corporal: é uma
produção diferenciada de sofrimentos um ritual organizado não para
marcação das vítimas e manifestações do poder e que pune; não é
absolutamente a exasperação de uma justiça que esquecendo seus
princípios perdesse todo o controle. Nos “excessos” dos suplícios se
investe toda a economia de poder.
Esse tipo de punição acontecia porque se acreditava que o homem
somente se tornaria obediente se tivesse o seu corpo castigado, uma vez que
sua alma seria objeto de Deus e este se encarregaria de julgá-la. No suplício o
povo era chamado como espectador: era convocado para assistir às
exposições às confissões públicas, às forças, os cadáveres dos supliciados
muitas vezes, eram colocados em evidência, perto do local de seus crimes. As
pessoas somente tinham que saber e ver com seus próprios olhos, porque era
necessário que tivessem medo, mas também porque deviam ser testemunhas
e garantias da punição e até certo ponto deviam tomar parte dela.
Assim o corpo dos condenados tornava-se um bem social útil à medida
que servia como lição, como exemplo para os outros. Neste cenário o povo
servia de testemunha e garantia de punição. Mas esta intervenção popular no
suplício trouxe um problema político, pois o povo reivindicava e protestavam,
alguns condenados acabavam tornando-se heróis, santos, de memória
venerada.
23
Com a máquina de enforcamento aperfeiçoado e adotado em 1783
objetivou-se a lenta agonia dos suplícios. Em 1791 entra em cena o carrasco
da guilhotina, todo condenado teria a cabeça decepada fazendo com que a
morte fosse igual para todos os condenados, um acontecimento visível, mas
instantâneo, onde o contato físico era reduzido. Conforme (FOUCAULT 1975,
p.13) a punição vai se transformando deixando o campo da percepção visual
para utilizar outras artimanhas:
A punição vai se tornando, pois, a parte mais velada do processo penal,
provocando várias consequências: deixa o campo da percepção quase
diária e entra no da consciência abstrata; sua eficácia é atribuída a sua
fatalidade não a sua intensidade visível; a certeza de ser punido é que
deve desviar o homem do crime e não mais o abominável teatro; a
mecânica exemplar da punição muda às engrenagens.
Na Metade do século XVIII filósofos, teóricos do Direito, juristas e
magistrados protestam pelo movimento de reforma. Há necessidade de punir
de outra forma, era preciso eliminar o confronto físico. (FOUCAULT, 1975,
p.14) afirma que o castigo visaria outros objetivos:
O castigo passou a uma arte das sensações insuportáveis a uma
economia dos direitos suspensos. Se a justiça ainda tiver que manipular
e tocar o corpo dos justiçáveis, fará a distância, propriamente segundo
regras rígidas e visando um objetivo bem mais elevado.
Este afrouxamento da penalidade deu-se concomitantemente à
diminuição dos crimes de sangue e das agressões físicas, prevalecendo
o roubo e os crimes de fraude, fato este desencadeado pelo
desenvolvimento da produção, pelo aumento das riquezas, pela
valorização da propriedade privada e pelo forte crescimento
demográfico.
24
Mudanças sociais ocorreram no fim do século XVIII e princípio do século
XIX que levaram a alteração do jogo do poder que foram gradativamente
segundo ele, o afirmar-se da prisão como forma generalizada da sanção para
todo tipo de crime é resultado do desenvolvimento da disciplina que cria
“corpos dóceis”, ideais para as exigências modernas. A disciplina fabrica assim
corpos submissos e exercitados, corpos “dóceis”, ela aumenta as forças do
corpo e diminuem essas mesmas forças. Se a exploração econômica
separa a força e o produto do trabalho, a coerção disciplinar estabelece no
corpo o elo coercitivo entre uma aptidão aumentada e uma dominação
acentuada. Procede em primeiro lugar à distribuição dos indivíduos no
espaço, à medida que se concentram as forças de produção, o importante é
tirar delas o máximo de vantagens e neutralizar seus inconvenientes, de
proteger os materiais e ferramentas e de dominar as forças de trabalho. Cada
indivíduo no seu lugar, e cada lugar em um indivíduo. Procedimento, portanto,
para conhecer, dominar e utilizar. A disciplina individualiza os corpos por uma
localização que não os implanta, mas os distribui e os faz circular numa rede
de relações. O corpo, do qual se requer que seja dócil até em suas mínimas
operações, opõe e mostra as condições de funcionamento próprias a um
organismo. O poder disciplinar tem por correlato uma individualidade não só
analítica e “celular”, mas também natural e “orgânica”.
As grandes reformas da legislação penal na França e Europa no século
XIX são circunstâncias atenuadas e faz nascer novo período do Direito Penal –
o humanismo – com a modificação do sistema penal na elaboração das leis,
ela vai procurar ajustar o indivíduo às reformas legislativas e não desviá-lo da
utilidade social, diferente de afastar os que são nocivos à sociedade
impedindo-os de recomeçar como defesa a sociedade. O controle e reforma
psicológico século XVIII – Beccaria – não haveria punição sem a lei explícita,
sem um comportamento violado a lei, toda penalidade não é controlada em
cima do indivíduo pelo que fez de conformidade com a lei, mas o que podem
ou são capazes de fazer em cima da teoria da periculosidade – o que significa
que o indivíduo deve ser considerado pela sociedade ao nível de suas virtudes
25
e não de seus atos – os delitos, infrações. Para assegurar o controle do
indivíduo em seu comportamento à instituição penal não pode mais estar
inteiramente em mãos de um poder autônomo – o poder judiciário – o juiz já
não julgará sozinho, há uma contestação entre eles – judiciário executivo e
legislativo – passando para uma rede de poderes institucionais que irão
responder a esses mandatos que emergem de diversas instâncias laterais:
polícia, psiquiatria, psicologia criminológica, vigilância e correção pedagógica
com as funções não mais de punir o indivíduo e sim corrigir sua virtualidade.
Segundo (Foucault, 1993 p. 219-220).
Todo aquele “arbitrário” que no antigo regime penal, permitia aos juízes
modular a pena e aos príncipes eventualmente dar fim a ela, todo
aquele arbitrário que os códigos modernos retiraram do poder judiciário,
vemo-lo se reconstituir, progressivamente, do lado do poder que gere e
controla a punição.
Em 1946 surge um novo sistema prisional denominado progressivo, este
dependia da boa conduta do preso, permitia três períodos no cumprimento de
sua condenação. A partir deste surge outro, de preparação para a vida livre,
através das prisões intermediárias, onde a vigilância era suave e se tinha
trabalho externo no campo objetivando o preparo para o retorno à vida em
sociedade. A utilidade do trabalho penal não está em preparar o indivíduo para
o retorno à sociedade, nem num aprendizado de este ou daquele ofício, mas
sim no aprendizado da própria virtude de trabalhar. O trabalho penal é a
constituição de uma relação de poder, de um esquema de submissão individual
e de seu ajustamento a um aparelho de produção. (FOUCAULT, 1975).
Estas mudanças ocasionaram uma grande transformação onde o
sofrimento da dor física foi substituído pela dor da alma na forma de poder da
sociedade disciplinar diferente das sociedades penais – idade de controle
social. A prisão aparece como instrumento de modulação de pena, adquire um
poder onde o castigo é decidido e um saber sobre o criminoso é produzido de
acordo com as normas disciplinares vigentes em cada estabelecimento, novas
26
punições serão acrescentadas às leis. (FOUCAULT 1975, p. 230) traduz o
objetivo da prisão da seguinte maneira:
A prisão ao aparentemente “fracassar”, não erra seu objetivo; ao
contrario, ela o atinge na medida em que suscita no meio das outras uma
forma particular de ilegalidade, que permite separar, por em plena luz e
organizar como um meio relativamente fechado, mas penetrável. Ela
contribuiu para estabelecer uma ilegalidade visível, marcada, irredutível
a certo nível e secretamente útil – rebelde e dócil ao mesmo tempo; ela
desenha, isola e sublinha uma forma de ilegalidade que parece resumir
simbolicamente todas as outras, mas que permite deixar as que se quer
ou deve tolerar.
O fenômeno da reincidência permite ver o fracasso da prisão em seus
objetivos de corrigir o criminoso e prevenir os crimes, a reincidência passa a
ser cada vez mais debatida nos meios jurídicos e afins, logo essa falha será
atribuída ao próprio delinqüente, visto como um tipo natural: “o efeito
delinqüente, ao qual a prisão deve dar uma resposta adequada”, Foucault
(1993, p.3).
Percebemos, assim que a produção e as estratégias do poder ao longo
da história utilizaram como instrumento os mais variados métodos de punição.
É importante ressaltarmos que as técnicas utilizadas para o remanejamento do
poder de punir servem para aprimorar e adestrar o corpo humano. Portanto o
que interessa realmente para o poder não é expulsar os homens do convívio
social ou impedir que roubem ou matem, mas sim gerir suas vidas
aproveitando suas potencialidades, diminuindo sua capacidade de revolta, de
resistência, de luta, para assim utilizá-los, pois a delinquência controlada
apresenta suas vantagens, é possível orientá-la para que seja um agente em
benefício dos grupos dominante.
Este novo exercício de poder trouxe grandes transformações, como por
exemplo, os reajustes institucionais que implicaram a mudança de regime
político, a maneira pela qual as delegações de poder no ápice do sistema
estatal foram modificadas. As transformações estavam presentes em várias
27
esferas sociais, como nas escolas, hospitais e outros. Mas será a
transformação na esfera da prisão que iremos nos reter.
A prisão exprime o ato pelo qual se priva a pessoa de sua liberdade de ir
e vir, recolhendo-a a um lugar seguro e fechado, de onde não poderá sair, ela
se veste de um paradigma do panóptico onde os presos serão observados dia
e noite, avaliados, punidos ou compensados, e quando a tortura, muito usada
no período feudal para fins de prova será ressignificada e se oferece a forma
ideal de punição moderna. Segundo Foucault, este é o motivo pelo qual a
punição generalizada “gentil” das correntes e trabalhos forçados teve que ceder
lugar ao cárcere que era a modernização ideal de punição e parte mais ampla
do “sistema, carcerário”, o sistema cria carreiras disciplinares para quem aceita
permanecer “na linha” predeterminada. (Foucault, 1996, p.88).
Um novo saber, de tipo totalmente diferente, um saber de vigilância, de
exame, organizado em torno da norma pelo controle dos indivíduos ao
longo de sua existência. Essa é a base do poder, a forma de saber-poder
que vai dar lugar não as grandes ciências de observação como no caso
do inquérito, mas ao que chamamos de ciências humanas: psiquiatria,
psicologia, sociologia, etc.
Durante vários séculos a prisão serviu de contenção nas civilizações
mais antigas como Egito, Babilônia, Grécia, etc., a sua finalidade era lugar de
custódia e tortura.
No direito eclesiástico, a penitenciária era a melhor forma de punição e
com isso, foram então construídas. Prisões denominadas penitenciárias, onde
os acusados cumpririam penitência e esperariam o momento em que seriam
guiados para a fogueira.
Na idade média os sansões estavam submetidos ao arbítrio dos
governantes, que as impunham em função do status social a que pertencia o
réu. A amputação dos braços, a força, a roda e a guilhotina constituem o
espetáculo favorito das multidões deste período histórico.
28
Neste mesmo período, assistia-se ao poder da igreja em punir. A punição foi
pelos tribunais de inquisição, período em que a pena ensejava o
arrependimento do infrator.
Na idade moderna, durante os séculos XVI e século XVII a pobreza se
abate e se estende por toda a Europa. No mesmo período, as guerras, as
expedições militares, as devastações de países, a extensão de núcleos
urbanos, etc., contribuíram para o aumento da criminalidade.
Ante tanta delinqüência, a pena de morte deixou de ser uma solução
adequada na metade do século XVII iniciou-se um movimento de grande
transcendência no desenvolvimento das penas privativas de liberdade, na
criação e construção de prisões organizadas para correção dos apenados. A
suposta finalidade das instituições consistia na reforma dos delinqüentes por
meio do trabalho e da disciplina. Tinham objetivos relacionados com a privação
geral, já que pretendia desestimular a outros da vadiagem e da ociosidade.
A mais antiga arquitetura carcerária em 1596 foi o modelo de Amsterdã
Rasphuls para homens, que se destinavam em princípio a mendigos e jovens
malfeitores. As penas eram leves e longas com trabalho obrigatório. Existia a
vigilância contínua exortação e leituras espirituais. As técnicas penitenciárias
imaginadas no fim do século XVII deram direcionamento às atuais instituições
primitivas.
Antes das casas de correção propriamente ditas, surgem casa de
trabalho na Inglaterra, no ano de 1677, Worcester e em Lenblin no ano de
1707, ao passo que em fins do século XVII já havia vinte e seis. Nessas casas,
os prisioneiros estavam divididos em quatro classes: os explicitamente
condenados ao confinamento solitário, os que cometeram faltas graves na
prisão, os bem conhecidos e os velhos delinquentes.
Em 1597 e 1600, criou-se também em Amsterdã a Spinhis, para
mulheres e uma seção especial para meninas adolescentes, respectivamente.
Já as raízes do direito penitenciário começaram a formar-se no século XVII,
com os estudos de BECCARIA e HOWARD. Durante muito tempo o
29
condenado foi objeto de execução penal e só recentemente é que ocorreu o
reconhecimento dos direitos da pessoa humana do condenado, ao surgir à
relação de direito público entre o estado e o condenado.
O direito penitenciário resultou na pretensão do condenado. Esses
direitos se baseiam na exigência de se respeitar a dignidade do homem como
pessoa moral.
A PRISÃO NO BRASIL
Segundo REGINA CÉLIA PEDROSO, a primeira menção à prisão no
Brasil foi dada no Livro V das Ordenações Filipinas do Reino, Código de leis
portuguesas que foi implantado no Brasil durante o período Colonial. O Código
decretava a Colônia como presídio de degredados. A pena era aplicada aos
alcoviteiros, culpados de ferimentos por arma de fogo, duelo, entrada violenta
ou tentativa de entrada em casa alheia, resistência a ordens judiciais,
falsificação de documentos, contrabando de pedras e metais preciosos. O
território colonial foi utilizado como local de cumprimento das penas até o ano
1808.
Segundo os rumos da jurisprudência em todo o mundo, a implantação
de um sistema prisional se fazia necessário no Brasil. A assimilação da nova
modalidade penal fez-se pela constituição de 1824 que estipulou as prisões
adaptadas ao trabalho e separação dos réus.
Na época, a opinião pública também tomou parte nos debates sobre a
implantação do regime penitenciário em nosso país e missões especiais foram
enviadas a países como Estados Unidos, Inglaterra e França, com o objetivo
de verificar as verdadeiras circunstâncias do aprisionamento e gerenciamento
das prisões-modelo.
A Constituição de 1824 estabelecia que as prisões deveriam ser
seguras, limpas arejadas, havendo a separação dos réus conforme a natureza
30
de seus crimes. Mas as casas de recolhimento de presos do início do século
XIX mostravam condições deprimentes para o cumprimento da pena por parte
do detento.
No início do século XX a legitimidade social da prisão ganhou variações
para um melhor controle da população carcerária com a reforma do sistema
penal do início de 1940, a partir da nova Legislação Penal, com os novos textos
do Código Penal, do Código de Processo Penal e das Leis das Contravenções
Penais, ouve uma profunda modificação na estrutura. Do Estado Brasileiro, que
se inaugura com a revolução de 1930 e se consolida durante o Estado Novo.
Surgiram tipos modernos de prisões adequadas à qualificação do preso
segundo categorias criminais: contraventores, menores, processados, loucos e
mulheres.
Os asilos de contraventores tinham por finalidade o encarceramento dos
ébrios, vagabundos, mendigos, em suma, os considerados antissociais.
Os asilos de menores se propunham a empregar uma pedagogia corretiva à
delinquência infantil. Pressupondo a inocência do réu, foi proposta uma prisão
de processados, considerando-se não convenientes já condenados ou
provavelmente criminosos.
Os mecanismos criminais foram idealizados para aqueles que sofriam
alienação mental e requeriam um regime ou tratamento clínico. Enquanto que
os cárceres de mulheres seriam organizados de acordo com as indicações
especiais determinadas por seu sexo.
Com implicação da reforma penal, põe-se em prática um programa de
concentração carcerária, que tem no projeto da penitenciária agroindustrial na
penitenciária de mulheres e no sanatório penal em Bangu, no Rio de Janeiro,
seu modelo. Na época, tratava-se de um programa amplo, de caráter nacional,
para atender as modificações impostas pelo novo Estatuto Penal sendo
realizado simultaneamente nos principais Estados da União.
Em julho de 1984 é sancionada a Lei nº 7.210, Lei de Execução Penal,
que tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e
31
proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do
internado.
Atualmente, existem várias instituições penais em todo o território
brasileiro. No Rio de Janeiro, onde foi idealizado o programa de concentração
carcerária, encontra-se o complexo de Gericinó, antigo complexo Bangu. Este
complexo reúne nove penitenciárias. Sendo uma feminina, dois presídios,
quatro casas de custódia, um hospital. Um sanatório penal, dois institutos
penais e um centro de tratamento em dependência química.
Penitenciária Industrial Esmeraldino Bandeira localiza-se neste complexo. A
mesma foi fundada em 16 de setembro de 1957. Ela é uma penitenciária
masculina, de regime fechado, que tem capacidade para 992 presos.
32
2. O ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA):
ART.l Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à Criança e ao
adolescente.
ART.2 Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa
até doze anos de idade incompletos, e adolescentes aquela
entre doze e dezoito anos de idade.
PARÁGRAFO ÚNICO - Nos casos expressos em lei, aplica-se
excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e
um anos de idade.
ART.3 A criança e o adolescente gozam de todos os direitos
fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da
proteção integral de que trata esta Lei. Assegurando-se-
Ihes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e
facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,
mental, moral, espiritual e social, em condições de
liberdade e de dignidade.
ART.4 É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral
e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a
efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária.
PARÁGRAFO ÚNICO - A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer
circunstâncias;
b) precedência do atendimento nos serviços públicos ou de
relevância pública;
c) preferência na formulação e na execução das políticas
sociais públicas:
33
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas
relacionadas com a proteção à infância e à juventude.
ART.5 Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer
forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer
atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos
fundamentais.
ART.6 Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins
sociais e a que ela se dirige, as exigências do bem comum,
os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição
peculiar da criança e do adolescente como pessoas em
desenvolvimento.
ART.7 A criança e o adolescente têm direitos a proteção à vida e
à saúde, mediante a derivação de políticas sociais públicas
que permitem o nascimento e o desenvolvimento sadio e
harmonioso, em condições dignas de existências.
O adolescente é aquele que se encontra na faixa etária de 12 a 18 anos.
São inúmeras as classificações referentes aos adolescentes que praticam atos
infracionais.
Sob o aspecto jurídico, o Estatuto, atualmente, utiliza o termo
Adolescente em Conflito com a Lei. A denominação anterior a esta era
adolescente infrator. Algumas expressões "populares" utilizadas para
denominar estes jovens são: "marginais", "vagabundos", "pivetes",
"trombadinhas", etc.
Muito se fala a respeito de adolescentes que praticam atos infracionais,
mas na verdade, pouco se sabe sobre as verdadeiras causas do ingresso de
milhões de jovens na criminalidade. Para poder falar sobre as possíveis causas
da prática de delitos é importante entender a construção da subjetividade e
identidade desses jovens e não apenas afirmar que a condição de pobreza ou
o meio social é o determinante para tais práticas. Cavallieri1978) diz:
34
"[...] o menor teve ingresso no Direito através de atos de
delinqüência, não foi a sua pobreza que o conduziu até aqui, mas
sim a sua conduta danosa". (1978, apud FERNANDES, 1998,
p.19).
A construção da identidade de qualquer indivíduo e está relacionada aos
conceitos de família, infância, adolescência e sexualidade. Sabemos que o
universo da maioria dos adolescentes em conflito com a lei, é um universo de
perspectivas fragmentadas e com rupturas o que acaba gerando
conseqüências negativas no desenvolvimento pessoal dos mesmos. A família
representa a maior fonte de aprendizado, é nela que nos espelhamos e nos
apoiamos. Acontece que o papel da família muitas vezes para o jovem infrator
é inexistente. Os reforços negativos que eles vão recebendo ao longo do tempo
seja pela família que não o apóia, seja pela sociedade que o rotula e o exclui,
faz com que sua identidade e subjetividade se torne empobrecida. Lane (1995,
apud GIACOMONI, 2000) refere-se que a identidade é a categoria síntese na
qual a mediação das outras pessoas seria predominante, sendo constituída
historicamente no conjunto das relações sociais do indivíduo.
As representações sociais que acompanham os adolescentes em
conflito com a lei são representações negativas, são representações que
excluem. A sociedade, ao mesmo tempo em que os exclui traz o discurso de
que eles fazem parte dela. Para o adolescente fica muito difícil vencer toda
essa negatividade que o acompanha.
Erikson (1987, apud GIACOMONI,2000) afirma que a crise de identidade
individual ocorre paralelamente à crise do desenvolvimento histórico que nos é
contemporâneo e assim ambas estão relacionadas, definindo-se uma pela
outra.
A construção social desses adolescentes além de estar relacionada ao
contexto social da pobreza e desamparo, também é afetado pelas políticas
públicas de exclusão, que negligenciam os direitos básicos da sobrevivência,
como saúde, educação e lazer.
35
LEGISLAÇÃO
Como vimos no primeiro capítulo, os resultados das políticas públicas
brasileiras destinadas a atender os "menores abandonados", os "órfãos", os
"filhos ilegítimos" e os "desvalidos", desde o Brasil colônia, não foram
satisfatórios. Os poderes públicos, a igreja católica e a filantropia jamais
conseguiram solucionar e resolver os problemas relacionados à infância e
adolescência, pois as técnicas utilizadas sempre foram inadequadas.
As pesquisas feitas sobre Leis para criança e jovens desde o inicio do
século nos mostram que a partir da constituição de 1988 foram definidos os
primeiros "direitos" das crianças brasileiras e que somente em 1921 o assunto
foi enfocado de maneira ampla e objetiva. Em 1924, foi criado no Rio de
Janeiro, o primeiro "Juizado de Menores" e em 1926 foram criados juizados
específicos para cuidar dos menores de 18 anos. Ainda em 1926, um juiz da
cidade do Rio de Janeiro, chamado Mello Mattos foi nomeado para elaborar o
primeiro Código de Menores, que somente foi aprovado no ano de 1927. O
Código de Menores de 1927 se tornou conhecido como Código Mello Mattos,
recebendo o nome do seu criador. O Código Mello Mattos criou as Leis de
assistência e proteção ao "menor". O Código deu inicio ao atendimento através
de políticas específicas e diferencias, pois os adolescentes que praticavam
atos infracionais passaram a receber a advertência através da liberdade
vigiada, o perdão cumulado ou a remissão. O Código teve o importante objetivo
de proporcionar tratamentos de proteção diferentes das dispensadas aos
adultos, no entanto, com o decorrer dos anos, as medidas foram pouco a
pouco esquecidas, além de dividir e classificar os jovens como: "expostos"
(menores de 7 anos), "abandonados" (menores de 18 anos), "vadios" (meninos
de rua), "mendigos" (que pedem esmolas ou vendem coisas nas)ruas) e
"libertinos" (que freqüentavam prostíbulos). Podemos dizer, que se baseando
36
nas classificações citadas, os juízes "escolhiam" as sentenças, só que dentro
das instituições todos os internos recebiam a mesma forma de tratamento, não
importando as razões que o levaram até ali. Citando LEITE (2001, p. 37),
"Durante quase cinqüenta anos as medidas do Código Mello Mattos foram
utilizadas até que um novo Código de Menores foi sancionado, em 1979,
substituindo todas as leis anteriores".
O novo Código de Menores foi criado para normalizar as condições
irregulares em que viviam milhões de jovens. Condições estas de pobreza e de
delinqüência precoce. Este Código abandonou as expressões "abandonados" e
"delinqüentes" e passou a utilizar a expressão "menor em situação irregular".
Com a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990 é que
as Leis passaram a resguardar e proteger os adolescentes em conflito com a
lei. O ECA introduziu medidas de caráter sócio-educativos, substituiu o modelo
punitivo pelo da reabilitação psicossocial e da reinserção na sociedade e aboliu
o termo "menor", como foi dito anteriormente.
Sobre as entidades de atendimento a jovens infratores, o Estatuto
determina sete tipos de regime. São eles: orientação e apoio sócio familiar;
apoio sócio-educativo em meio aberto; colocação familiar; abrigo; liberdade
assistida; semiliberdade e internação. É determinado pelo ECA que a privação
de liberdade só pode ser determinada após audiência frente ao juiz da vara
representante.
Em relação à internação diz o Artigo 121 (Seção VII):
A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de
brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento.
§ 1° - Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe
técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário.
37
§ 2° - A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção
ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis
meses.
§ 3° - Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três
anos.
§ 4° - Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá
ser liberado, colocado fim regime de semiliberdade ou de liberdade assistida.
§ 5° - A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade.
§ 6° - Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização
judicial, ouvido o Ministério Público.
Para cumprir algumas políticas de atendimento dos direitos da criança e
do adolescente, o ECA criou o CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da
Criança e do Adolescente ).
Art. 3. O CONANDA é integrado por representantes do Poder Executivo,
assegurada a participação dos órgãos executores das políticas sociais básicas
na área de ação social, justiça, educação, saúde, economia, trabalho e
previdência social e, em igual número, por representantes de entidades não-
governamentais de âmbito nacional de atendimento dos direitos da criança e
do adolescente.
(FERNANDES, 1998, p. 58).
AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS
As medidas sócio-educativas são aplicadas aos adolescentes em
conflito com a lei, após a sentença estabelecida pelos juizados e/ou varas da
infância. As medidas consistem em: advertência, obrigação de reparar o dano,
prestação de serviços a comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e
38
medida de internação. As medidas são aplicadas levando em consideração as
características dos delitos e as circunstâncias familiares do jovem.
A advertência tem caráter informativo e serve para comunicar ao
adolescente e seus familiares sobre a prática e envolvimento no ato infracional.
A obrigação de reparar o dano é a medida para o jovem ressarcir ou
compensar o mal causado a alguma vítima. É uma medida quase que
educativa, se assim podemos dizer, pois sua função é fazer com que o
adolescente reconheça o seu erro e repare o dano cometido.
A prestação de serviços à comunidade constitui uma medida de cunho
educativo, assim como a obrigação de reparar o dano, se diferenciando apenas
pelo fato que os serviços são todos prestados a comunidade. É uma medida
que permite a aproximação do jovem e a comunidade.
A liberdade assistida é uma medida coercitiva que está vinculada ao
acompanhamento do jovem. É feito o acompanhamento da vida social do
adolescente (escola, trabalho e família). A liberdade assistida é
responsabilidade do DEGASE (Departamento Geral de ações sócio
educativas), através dos CRIAMS (Centro de Recursos Integrados de
atendimento ao menor) e também, em alguns casos, pela equipe da Vara da
Infância e Juventude. A LA, como também é conhecida, pode ser desenvolvida
por grupos comunitários e orientadores voluntários, caso os mesmos sejam
capacitados e supervisionados.
A semiliberdade é a única medida sócio-educativa em que somente o
Estado é o responsável, ao contrário de todas as outras medidas, que podem
ser operacionalizadas além do Estado, por Municípios e ONGS, como descreve
o ECA. As opiniões a cerca da semiliberdade são as mais variadas. Alguns
estudiosos acreditam que a medida afasta o adolescente de seu convívio
familiar e da sua comunidade. Esta é uma medida que permite ao jovem o ir e
vir. Mesmo tendo que permanecer na instituição nos dias e horários
determinados, ele tem acesso ao mundo exterior.
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A última medida é a de internação. A internação é utilizada em casos de
delitos mais graves. O jovem permanece no CRIAM durante o tempo
estabelecido pelo juiz. O ECA é claro ao afirmar que nenhum menor pode ficar
mais de seis meses em instituições fechadas.
Os CRIAMs são gerenciados pelo DEGASE. Os CRIAMs são aonde a
grande maioria dos adolescentes infratores cumprem suas medidas sócio-
educativas. A equipe do CRIAM limita o trabalho ao seguir somente as
orientações propostas pelo DEGASE. Os adolescentes institucionalizados não
desenvolvem nenhum tipo de atividade educativa dentro dos CRIAMs.
A Idade Penal, hoje, no Brasil, é a partir dos dezoito anos. Em 2001,
passaram a circular no Congresso Nacional alguns projetos de Lei que
propõem a redução da idade penal de dezoito anos para dezesseis. Se estas
leis forem aprovadas os jovens passarão a ser julgados pela justiça comum e
irão cumprir pena em sistema penitenciário.
As conseqüências desses projetos de Lei acarretariam em problemas
gravíssimos para milhares de crianças e adolescentes. Na realidade eles
estariam passando por uma "escola do crime", vivenciando e aprendendo todo
o tipo de violência e marginalidade. As pessoas confundem, às vezes, a
impunidade com a não redução da idade penal. O ECA é claro ao definir as
medidas de privação de liberdade e de semiliberdade para jovens que praticam
atos infracionais.
Não restam dúvidas que a aprovação da lei seria uma irresponsabilidade
política e o que aparentemente pareceria uma solução de problemas, na
verdade, seria uma grande ocultação, resultado de anos, de políticas sóciais
que não dão emprego, nem educação, nem esporte e nem alimentação
adequadas.
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3. PROJETO COMUNIDADE TIJUQUINHA
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA):
Dá Apuração de Irregularidades em Entidade de Atendimento
ART.191- O procedimento de apuração de irregularidade em entidade
governamental e não-governamental terá início mediante portaria
da autoridade judiciária ou representação do Ministério Público ou
do Conselho Tutelar, onde consiste, necessariamente, resumo dos
fatos.
PARÁGRAFO ÚNICO - Havendo motivo grave poderá a autoridade
judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar liminarmente o
afastamento provisório do diligente da entidade, mediante decisão
fundamentada.
ART.192 - O dirigente da entidade será citado para, no prazo de dez dias,
oferecer resposta escrita, podendo juntar documentos e indicar as
provas a produzir.
ART.193 - Apresentada ou não a resposta, e sendo necessário, a autoridade
judiciária designará audiência de instrução e julgamento, intimando
as partes.
PARÁGRAFO 1°_ Salvo manifestação em audiência, as partes e o
Ministério Público terão cinco dias para oferecer alegações finais,
decidindo a autoridade judiciária em igual prazo.
PARÁGRAFO 2°_ Em se tratando de afastamento provisório ou definitivo
de dirigente de entidade governamental, a autoridade judiciária oficiará à
autoridade administrativa imediatamente superior ao afastado, marcando
prazo para a substituição.
PARÁGRAFO 3°_ Antes de aplicar qualquer das medidas, a autoridade
judiciária poderá fixar prazo para a remoção das irregularidades
verificadas. Satisfeitas as exigências, o processo será extinto, sem
julgamento de mérito.
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PARÁGRAFO 4°_ A multa e a advertência serão impostas ao dirigente da
entidade ou programa de atendimento.
Da Apuração de Infração Administrativa às Normas de Proteção à
Criança e ao Adolescente
ART.194 - O procedimento para imposição de penalidade administrativa por
infração às normas de proteção à criança e ao adolescente terá
início por representação do Ministério Público, ou do Conselho
Tutelar, ou auto de infração elaborado por servidor efetivo ou
voluntário credenciado, e assinado por duas testemunhas, se
possível.
O Projeto consistia em um trabalho de parceria com uma Faculdade do
rio de Janeiro. Participei ativamente no projeto como estagiaria do Serviço
Social durante 1 ano e a partir da minha vivencia neste estagio surgiu o
conteúdo para a confecção da presente monografia.
Os adolescentes que participavam desse Projeto eram moradores da
comunidade Tijuquinha, na maioria filhos dos “criminosos” locais, onde viviam
em liberdades cometendo delitos de pequeno e grande porte, tendo muitas
vezes como conseqüência a morte de algum cidadão.
A escolha destes adolescentes para participar do projeto dói feita
através do nível de pobreza, marginalização e ociosidade dos mesmos.
Enquanto estavam no projeto estavam sobre a responsabilidade dos
profissionais envolvidos no projeto.
Durante o processo do projeto, promoviam-se várias reuniões com a
supervisão de professores para os estagiários e nessas reuniões eram
esclarecidas duvidas quanto ao trabalho e a sua realização.
O principal objetivo do projeto era proporcionar aos adolescentes
assistidos a participação em atividades profissionalizantes, bem como as aulas
de preservação da natureza, cidadania, curso de informática, trabalhos
manuais, corte e costura, fotografia. Como também parceria com o Instituto
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Felix Pacheco na confecção de carteiras de identidades dos adolescentes, a
fim de obter acesso às suas futuras atividades laborativas.
Igualmente, a finalidade em preencher o tempo ocioso dos adolescentes
e reintegrá-los a sociedade evitando assim que voltem a praticar delitos e
finalmente obter a inserção social.
A experiência rica obtida com os adolescentes institucionalizados me
motivaram a escrever esse trabalho, me fizeram tentar ousar problematizar
toda a política atual instalada nas instituições e todo o processo de reclusão
estabelecido para os adolescentes infratores. Nesse difícil e desafiador
trabalho ouvi relatos, queixas e desabafos que me fizeram pensar e questionar
tais instituições e o papel dos profissionais que ali atuam.
Os relatos dos adolescentes eram desde maus tratos por parte dos
cuidadores (supervisor de disciplina), passando por "nada para fazer o dia
todo", até "nos CRIAMS a coisa mais fácil que tem é fugir, se você quiser pular
o muro ninguém vai atrás de você, os supervisores vêem e não fazem nada"
(fala dos jovens do projeto).
Que instituição é essa em que adolescentes ficam sem nada para fazer
durante o dia todo?
Que funcionários são esses de tais instituições que permitem que
adolescentes fujam e nada fazem?
Que profissionais são esses que usam de força bruta e violenta contra
as crianças e adolescentes?
Com as questões que foram colocadas acima, pergunto: Como não
pensar no papel fundamental e determinante que o psicólogo, os especialistas
e técnicos em geral desempenham no período no qual a criança e o
adolescente se encontram em reclusão?
A equipe interdisciplinar definida pelo Estatuto é composta de
assistentes sociais, de psicólogos, de educadores, de psiquiatras e outros
especialista.
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Há a necessidade de recursos, alocados pelo Poder Judiciário,
destinados a prover os cargos desses técnicos que são o 'braço direito' da
autoridade judiciária. (1991, apud FERNANDES, 1998).
A conclusão mesmo que precipitada a que chego é que há falta de
definição de papéis, preparo, interesse, incentivo e motivação por parte dos
profissionais.
Também não posso deixar de citar aqui um fator real das instituições
que é a falta de organização interna e a falta de infra-estrutura, que acaba por
propiciar o trabalho inadequado dos técnicos.
É preciso identificar o que de fato vem sendo feito e produzido por toda a
equipe técnica para que se possam viabilizar maneiras de organização
adequada do grupo.
Em relação à família é visto que a relação e estrutura familiar da maioria
dos adolescentes em conflito com a lei, participantes do projeto, era bastante
empobreci da, existindo uma desestruturação em seu meio.
Segundo Carvalho (1995) a crescente interdependência e os
conseqüentes ajustes econômicos, ocorridos nos últimos dez anos em nosso
país, têm colocado a família brasileira em acelerado processo de
empobrecimento, alterando profundamente a sua estrutura, seu sistema de
relações, papéis e formas de reprodução social.
Para falar sobre a estrutura familiar ou a falta dela, não posso deixar de
colocar a situação de pobreza em que essas famílias se encontram. A causa
imediata do problema das crianças e adolescentes em situação de risco é a
pobreza material das suas respectivas famílias, ao lado de desajustes
familiares.
Sobre os desajustes familiares, na maioria dos casos o que ocorre são
pais que tem problemas com o álcool e acabam "abandonando" seus filhos.
Outros pelo álcool agridem e maltratam; É comum também o padrasto ou
madrasta que passam a "assumir" o papel da mãe ou pai dentro de casa e
violentam e/ou agridem; Os pais que trabalham e passam a maior parte do
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tempo fora de casa e ainda aqueles que realmente abandonam, sem nenhuma
razão ou motivo; Alguns jovens são criados por parentes ou avós; há ainda
aqueles pais que obrigam as crianças a trabalhar e trazer dinheiro para casa.
Todas essas questões citadas acima e que fazem parte da estrutura
familiar de muitos, são peças chaves para melhor entender o processo de
desvio de crianças e adolescentes.
Com a ausência dos pais, seja pelo alcoolismo, por trabalhar o dia todo
ou simplesmente por terem sido abandonadas, as crianças acabam tendo que
cuidar de si próprios desde muito cedo, ficando a mercê da sua própria sorte.
Nessa difícil, mas real sobrevivência eles passam "a se virar", o que ocorre
com isso é a conseqüente situação de risco e marginalização.
A presença da violência doméstica faz com que eles fujam de casa.
Muitos acabam virando moradores de rua, outros permanecem durante o dia
na rua e só retomam para sua residência à noite. O abuso sexual é outro fator
que faz com que eles fujam de casa e abandonem suas famílias.
Alguns são obrigados por seus pais ou responsáveis a trabalhar e só
retomar para casa com um valor já pré-determinado por eles, são os chamados
Menores em situação de rua, que trabalham nas ruas, diferentemente da
designação Menor de rua que são os que vivem nas ruas. Quando os menores
em situação de rua retomam a casa sem terem alcançado o valor estabelecido
sofrem algum tipo de castigo ou punição. Com isso o que ocorre é que este
passa ainda mais tempo na rua para chegar ao valor determinado e/ou com o
medo da punição e castigo passa a não ir para casa, então, ele já permanece
mais tempo na rua, passa a dormir nela quando necessário. A rua vai
ganhando espaço na vida do menor. E daí, para o menor em situação de rua
virar menor de rua é um passo bem curto.
Em todo esse contexto, crianças e adolescentes deixam de freqüentar a
escola, até porque, para sobreviver, a grande maioria das famílias pobres
brasileiras, necessitam inserir todos os seus membros em atividades para gerar
alguma renda, que ajude no orçamento familiar.
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Essa criança e futuro adolescente não tiveram e não tem incentivo à
escola e nem a educação.
Sabe-se que no Brasil, aproximadamente, oito milhões de crianças e
adolescentes de 7 a 17 anos deixam precocemente as escolas para estar no
mercado de trabalho.
No projeto, os adolescentes em sua maioria estavam freqüentando
novamente a escola. Era alto o número de repetência e atraso escolar e bem
visível aos olhos às dificuldades que estes tinham de realizar leituras, escrever,
elaborar textos, e até a própria fluência verbal dos mesmos, o que mostrava
que a escola era algo bem distante de suas realidades.
Quando eram realizadas atividades que exigiam a leitura e a escrita,
havia resistência por parte dos adolescentes. As expressões mais comuns
eram: "Escrever?"; "PÔ, tem que ler isso tudo?".
Ficava claro que a resistência não se tratava apenas de falta de vontade
(de realizar as atividades), a resistência estava ligada à vergonha, a baixo auto-
estima.
Na realização de tarefas que exigiam leitura, escrita e comunicação,
havia certo desconforto e constrangimento nítido para realização das práticas.
A resistência e o desconforto inicial, com o decorrer do tempo, foi dando
lugar à participação e iniciativa, que nos mostrava que a confiança constituída,
aliada a incentivos, a reforçadores positivos, a reconhecimento dos seus
trabalhos trouxe resultados.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
São inúmeros, no Brasil, os problemas Sociais: a questão da violência, o
tráfico de drogas, a prostituição infantil, a pobreza, etc. Os adolescentes em
conflito com a lei são apenas mais um problema, em um país marcado pelas
desigualdades.
Todas essas questões, no entanto, resultam de uma nação que tentou,
sem sucesso, excluir as etnias e culturas que não se encaixavam em um
"modelo idealizado" e "preestabelecido". A exclusão está presente desde que o
Brasil era colônia de Portugal.
A análise dos documentos e da literatura produzidos sobre a infância
pobre no Brasil revela que o tratamento dispensado a esses adolescentes tem
sido repressivo e discriminatório.
Como citado no primeiro capítulo, foram instituídos sistemas de
atendimento como a Roda dos Expostos, para "salvar" da morte crianças
pobres e "enjeitadas", e asilos para órfãos visando à regeneração dos pobres e
"vagabundos. As instituições, em verdade, tinham o objetivo de controle social
dessa população.
O resultado das políticas de reclusão, instaladas por mais de um século,
hoje, podem ser vistas claramente na degradação da qualidade de vida das
crianças e adolescentes institucionalizados.
Para os adolescentes em conflito com a lei sujeitos à aplicação de
medidas sócio-educativas, os programas continuaram vigorando sob a ótica da
doutrina da "situação irregular". As instituições e os profissionais que ali se
encontram deveriam patrocinar meios para o cumprimento das medidas de
resgate da sua condição integral de cidadania, mas isso não ocorre.
A atual Lei é clara ao estabelecer que os adolescentes devem cumprir
as medidas sócio-educativas privativas de liberdade, em espaços, condições e
circunstâncias que garantam o seu desenvolvimento sadio e adequado, com
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programas pedagógicos e com atividades de educação escolar,
profissionalização, esporte, artes e saúde.
O atendimento com tais propostas pedagógicas poderia permitir a
reflexão do adolescente sobre o ato infracional cometido e a busca de novos
rumos à sua trajetória de vida, mas não há no interior da instituição,
profissionais aptos para realizar mudanças na gestão administrativa e
pedagógica. A convivência com a diversidade e a diferença deveria ser a tônica
para repensar novas propostas e metodologias durante o processo de reclusão
dos adolescentes infratores.
A aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente trouxe inovações,
mas não conseguiu resolver questões primordiais como: soluções para
promover a escolaridade, a profissionalização e a inserção social de milhões de
adolescentes brasileiros que permanecem excluídos e em situações de risco.
A expansão dos investimentos públicos nos programas de bem-estar
não tem sido suficientes para atender aos problemas que, com gravidade
crescente vêm afetando as crianças e adolescentes. Os investimentos públicos
na área de bem estar mostram um grande contraste com as condições de vida
nas quais estão expostas centenas de crianças.
As políticas públicas, não atendem aos padrões mínimos de qualidade
de vida, e os resultados dessas omissões se configuram em pobreza e
exclusão social.
A pobreza e as condições de existência, que favorecem a degradação
pessoal e social da maior parte da população brasileira, decorrem das opções
políticas, econômicas e sociais, sejam de forma direta ou indireta. A pobreza
em que se insere a sociedade brasileira é conseqüência também da
manutenção de privilégios das elites, que tendem a se firmar no poder, através
de relações de exploração, dominação e assistencialismo.
Neste contexto, é que se origina a vivência de crianças e adolescentes
pelas ruas, sendo obrigados a dedicar-se a múltiplas atividades temporárias,
expostos à exploração, violência, drogas e a prática de delitos. Pode-se
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perceber, portanto; que o processo de desorganização social e familiar, o
crescimento da pobreza, e a conseqüente situação de risco e marginalização
dos adolescentes, muitas das vezes, não é produzido por sua própria família e
nem por eles mesmos. Ambos são vítimas da falta de políticas sociais básicas
(como as de saúde, educação, moradia, geração de emprego e ele renda).
O rebaixamento da maioridade penal tem sido defendido por alguns
segmentos da sociedade, que atribuem ao Estatuto da Criança e do
Adolescente a responsabilidade pelo aumento da delinqüência em decorrência,
sobretudo do sentimento de insegurança frente à ineficácia dos poderes
públicos no combate à criminalidade, como se resolvesse a questão. Prisões?
Retirá-Ios da sociedade? Eliminá-los como os únicos culpados? O que querem
com isso? A quem querem enganar?
Esta monografia não objetivou fechar respostas e soluções e, sim
apresentar o contexto da institucionalização e das Leis que norteiam a visão
que se tem do adolescente infrator.
Finalizando com dois questionamentos: O adolescente infrator é uma
produção? Quem os produz?
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ANEXO 1
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA):
ART.94 - As entidades que desenvolvem programas de
internação têm as seguintes obrigações, entre outras:
I - observar os direitos e garantias de que são titulares os adolescentes;
II - não restringir nenhum direito que não tenha sido objeto de restrição na
decisão de internação;
III - oferecer atendimento personalizado, em pequenas unidades e grupos
reduzidos;
IV - preservar a identidade e oferecer ambiente de respeito e dignidades ao
adolescente;
V - diligenciar no sentido do restabelecimento e da preservação dos
vínculos familiares;
VI - comunicar à autoridade judiciária, periodicamente, os casos em que se
mostre inviável ou impossível o reatamento dos vínculos familiares;
VII - oferecer instalações físicas em condições adequadas de habitabilidade,
higiene, salubridade e segurança e os objetos necessários à higiene
pessoal;
VIII - oferecer vestuário e alimentação suficientes e adequados à faixa etária
dos adolescentes atendidos;
IX - oferecer cuidados médicos, psicológicos, odontológicos e
farmacêuticos;
X - propiciar escolarização e profissionalização;
XI - propiciar atividades culturais, esportivas e de lazer;
XII - propiciar assistência religiosa àqueles que desejarem, de acordo com
suas crenças;
XIII - proceder a estudo social e pessoal de cada caso;
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XIV - reavaliar periodicamente cada caso, com intervalo máximo de seis
meses, dando ciência dos resultados à autoridade competente;
XV - informar, periodicamente, o adolescente internado sobre sua situação
processual;
XVI - comunicar às autoridades competentes todos os casos de
adolescentes portadores de moléstias infecto-contagiosas;
XVII - fornecer comprovante de depósito dos pertences dos adolescentes;
XVIII - manter programas destinados ao apoio e acompanhamento de
egressos;
XIX - providenciar os documentos necessários ao exercício da cidadania
àqueles que não os tiverem;
XX - manter arquivo de anotações onde constem data c circunstâncias do
atendimento, nome do adolescente, seus pais ou responsável,
parentes, endereços, sexo, idade, acompanhamento de sua formação,
relação de seus pertences e demais dados que possibilitem sua
identificação e a individualização do atendimento.
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REFERÊNCIAS BILBLIOGRÁFICAS
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