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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO Douglas Ferreira Goios Potencialidades didático-pedagógicos de um objeto para aprendizagem: Uma análise através da Teoria da Cognição Corporificada para o ensino de trigonometria. Mestrado Acadêmico UNIBAN-SP 2010

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UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO

Douglas Ferreira Goios

Potencialidades didático-pedagógicos de um objeto p ara

aprendizagem: Uma análise através da Teoria da Cogn ição

Corporificada para o ensino de trigonometria.

Mestrado Acadêmico

UNIBAN-SP 2010

UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO

Douglas Ferreira Goios

Potencialidades didático-pedagógicos de um objeto p ara

aprendizagem: Uma análise através da Teoria da Cogn ição

Corporificada para o ensino de trigonometria.

Dissertação apresentada ao programa de pós-graduação Stricto Sensu em Educação Matemática da UNIBAN, para defesa, sob orientação da Profª. Dra. Janete Bolite Frant. Linha de pesquisa: Tecnologias Digitais e Educação Matemática

Mestrado Acadêmico

UNIBAN-SP 2010

G556pGoios, Douglas Ferreira.

Potencialidades didático-pedagógicos de um objeto para aprendizagem: Uma análise através da Teoria da Cognição Corporificada para o ensino de trigonometria / Douglas Ferreira Goios - São Paulo: [s.n.], 2010.

132f. ;il. 30 cm. Dissertação de Mestrado - Programa de Pós Graduação em Educação Matemática, Universidade Bandeirante de São Paulo, Curso de Educação Matemática.

Orientadora: Profa. Dra. Janete Bolite Frant. 1.Trigonometria 2.Metáforas 3.Objetos de Ensino 4.Cenário para Investigação I. Título

CDD 510

FOLHA DE APROVAÇÃO Aprovado em:1 de Setembro de 2010

Banca examinadora

Profa. Dra. Janete Bolite Frant Instituição: UNIBAN Assinatura: ______________________ Profa. Dra. Nielce Meneguelo Lobo da Costa Instituição: UNIBAN Assinatura:______________________ Profa. Dra Rosana Giaretta Sguerra Miskulin Instituição: UNESP Assinatura: ______________________

Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos. Assinatura: _________________________

Aos meus pais Darlan e Heloisa que sempre estiveram presentes e me apoiaram em todas as minhas realizações e as minhas filhas Bárbara e Beatriz, minha inspiração para viver.

Agradecimentos A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização

desse trabalho, meus sinceros agradecimentos.

À minha orientadora Profa. Dra. Janete Bolite Frant, pela paciência,

dedicação, incentivo e por acreditar no meu trabalho. Mais do que

orientadora, uma amiga.

À minha esposa Patrícia, pelo incentivo, amor, carinho e cumplicidade.

À minha tia Célia, especialmente pelas várias correções desse texto.

Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Educação

Matemática, pelo apoio, incentivo, dedicação e presença sempre

constantes.

Aos colegas do Programa de Mestrado e Doutorado da Universidade

Bandeirante de São Paulo, pelos bons momentos que vivemos juntos.

Aos professores da Banca Examinadora: Profa. Dra. Nielce Meneguelo

Lobo da Costa e Profa. Dra Rosana Giaretta Sguerra Miskulin, por

aceitar o convite para participar da banca examinadora deste trabalho e

pela avaliação cuidadosa que fizeram, pelas sugestões e críticas que me

ajudaram a alcançar os resultados aqui apresentados.

Resumo Esta pesquisa tem por objetivo investigar e analisar que aspectos são ou não favorecidos no processo de ensino de trigonometria, no Ensino Médio, especificamente sobre conceitos de trigonometria, em um ambiente utilizando recursos digitais. A partir da Teoria da cognição corporificada (LAKOFF & JOHNSON, 2001; LAKOFF & NUÑEZ, 2000) busca analisar a produção de significados e as metáforas apresentadas pelos alunos durante as aulas de trigonometria. Para o desenvolvimento do cenário de aprendizagem utiliza o conceito de Cenário para Investigação (Skovsmose, 2008), que tem como princípio fundamental a aprendizagem dos alunos através da investigação. Este cenário foi construído a partir dos materiais disponibilizados para um professor de matemática da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, tais como livros didáticos, Proposta Curricular do Estado de São Paulo e Objetos de Aprendizagem disponibilizados pelo Ministério de Educação e Cultura – MEC. Como resultados desta pesquisa podemos dizer que o Objeto de Ensino (OE) elaborado colaborou com a aprendizagem dos alunos, e entre as características positivas do OE também podemos acrescentar a qualidade visual do círculo trigonométrico, que não é possibilitada no uso do papel e lápis, também acrescento que o OE permite inúmeras interações entre o aluno e o círculo trigonométrico. Nesta pesquisa também surgiram exemplos de metáforas de ligação, onde através de outros conhecimentos matemáticos os alunos construíram um novo conhecimento. Isto é evidenciado quando os alunos fazem a montagem de seus conhecimentos de plano cartesiano, conforme sugere Lakoff & Núñez (2000) na montagem do círculo trigonométrico e nas metáforas do movimento fictivo. Sobretudo, a dinâmica possibilitada pelos OEs criou um movimento no círculo trigonométrico, onde esta percepção visual é evidenciada pelas metáforas dos alunos como o “seno subiu” o “seno desceu”. Assim o movimento, inicialmente fictivo do seno de um ângulo torna-se factivo, via o dinamismo proporcionado pela representação virtual do OE. Isto é, o seno de um ângulo é a razão entre as medidas do cateto oposto e da hipotenusa, cujo valor é expresso por um número que “evidentemente” não se move e a função e seu gráfico idem. Mas quando o aluno fala sobre o OE o dinamismo se sobrepõe ao estático auxiliando a compreensão deste conceito.

Palavras-chave: Trigonometria, Metáforas, Objetos de Ensino, Cenário para

Investigação.

Abstract

This research aims to investigate and analyze the aspects which are or are not favored in the teaching of trigonometry in high school, specifically on the concepts of trigonometry in an environment using digital resources. From the theory of embodied cognition (Lakoff & Johnson, 2001; LAKOFF & NUÑEZ, 2000) analyzes the production of meanings and metaphors presented by the students during classes in trigonometry. To develop the learning scenario uses the concept of Scenario for Research (Skovsmose, 2008), which has as its basic principle the students' learning through research. This scenario was constructed from the materials made available as a mathematics professor at the Department of Education of the State of São Paulo, such as didactic books, curricular proposal of the State of São Paulo and the objectives of learning available by MEC. The results of this research we can say that the object of education (OE) prepared collaborated with students' learning, and between the positive characteristics of the OE can also add the visual quality of the trigonometric circle, which is not made possible the use of paper and pencil, also add that the budget allows countless interactions between the student and the trigonometric circle. This research also appeared examples of metaphors of connection, where other means of mathematical knowledge students have constructed a new knowledge. This is evidenced when students are assembling their knowledge of the Cartesian plane, as suggested by Lakoff & Núñez (2000) in the assembly of the trigonometric circle and the metaphors of fictive motion. Above all, the dynamics made possible by OEs created a stir in the trigonometric circle, where the visual perception is evidenced by the metaphors of the students as the "sine rose" the "sine fell." So the movement, initially fictive sine of an angle becomes feasible, through the dynamism provided by the virtual representation of OE. That is, the sine of an angle is the ratio between measurements of the leg opposite and hypotenuse, whose value is expressed by a number that "obviously" does not move and function, its graph Ibid. But when a student talks about the dynamism OE overlaps the static aiding the understanding of the concept.

Keywords: Trigonometry, Metaphors, Learning Objects, Scenario for

Investigation.

Índice de Figuras

Figura 1: Tela de abertura para acesso ao OA – “Trigonometria com Molas” do RIVED .............................................................................................................. 20

Figura 2: Os espaços de uma Montagem Conceitual ....................................... 30

Figura 3: 1º estágio da montagem do círculo trigonométrico (Lakoff & Núñez, 2000, p.390) ..................................................................................................... 32

Figura 4: 2º estágio da montagem do círculo trigonométrico. (Lakoff & Núñez, 2000, p.391) ..................................................................................................... 32

Figura 5: 3º estágio da montagem do círculo trigonométrico. (Lakoff & Núñez, 2000, p.392) ..................................................................................................... 33

Figura 6: Papiro Rhind, Museu de Londres. (fonte: http://www.archaeowiki.org/ Image: Rhind_Mathematical_Papyrus.jpg – acesso 10/09/2009) .................... 57

Figura 7: Tela de abertura para acesso ao OA – “Mundo da Trigonometria” ... 72

Figura 8: Círculo Trigonométrico ...................................................................... 74

Figura 9: Localização de um ponto P sobre o círculo ....................................... 74

Figura 10: Determinação do ângulo ................................................................ 75

Figura 11: Projeção ortogonal do ponto P sobre o eixo y ................................. 75

Figura 12: Determinação do valor do seno....................................................... 76

Figura 13: Tela do gráfico da função seno ....................................................... 77

Figura 14: Tela do jogo do AO “Mundo da Trigonometria” ............................... 78

Figura 15: Tela da atividade do OA “Trigonometria com Molas” ...................... 80

Figura 16: Tela das questões da atividade do OA “Trigonometria com Molas” 80

Figura 17: Tela da atividade 2 do OA “Trigonometria com Molas” ................... 81

Figura 18: Layout da sala – Encontro 1 ............................................................ 89

Figura 19: Grupo 1 - Sequencia de Atividades ................................................. 93

Figura 20: Grupo-2 iniciando atividade ............................................................. 94

Figura 21: Grupo-2 – desenvolvendo atividade ................................................ 95

Figura 22: Layout da sala 2º e 3º encontro ...................................................... 97

Figura 23: Texto confuso para Renan ............................................................ 100

Figura 24: Leitura da função seno por Gabriela ............................................. 104

Figura 25: Entendimento do valor do Seno pelo Grupo 2 .............................. 106

Figura 26: Grupo 2 Sequencia de Atividades ................................................. 106

Figura 27: Movimento das mãos de Renan .................................................... 108

Figura 28: Resposta grupo 1 .......................................................................... 108

Figura 29: Resposta grupo 2 .......................................................................... 109

Figura 30: Applet Círculo Trigonométrico ....................................................... 110

Figura 31: 1º estágio da montagem do círculo trigonométrico ....................... 116

Figura 32: OE Função Seno ........................................................................... 127

Índice de Tabelas

Tabela 1 – Metáfora VIAGEM É VIDA .............................................................. 26

Tabela 2 – Metáfora: PONTOS SÃO COISAS FÍSICAS .................................. 28

Tabela 3 – Domínio fonte para o Círculo Trigonométrico ................................. 31

Tabela 4 – Metáfora para o Círculo Trigonométrico ......................................... 33

Tabela 5 – Ambientes de aprendizagem (Skovsmose, 2008, p.23) ................. 37

Tabela 6 – Nativos e Imigrantes Digitais .......................................................... 41

Tabela 7 – Metas IDESP .................................................................................. 46

Tabela 8 – Indicador de desempenho IDESP .................................................. 46

Tabela 9 – Desempenho Português e Matemática IDESP 2009 ...................... 47

Tabela 10 – Análise Livros Didáticos ............................................................... 67

Tabela 11 – Atividade 1º Encontro ................................................................... 86

Tabela 12 – Análise dos resultados do 1º Encontro ......................................... 90

Tabela 13 – Transcrição 1 – 2º Encontro ......................................................... 99

Tabela 14 – Metáfora: Círculo Trigonométrico é Relógio ............................... 101

Tabela 15 – Transcrição 2 – 2º Encontro ....................................................... 102

Tabela 16 – Respostas do 2º encontro .......................................................... 104

Tabela 17 – Comparação de resultados OE / Applet ..................................... 110

Tabela 18 – Transcrição 3 – 3º Encontro ....................................................... 111

Tabela 19 – Metáfora COSSENO É SENO .................................................... 117

Tabela 20 – Transcrição 4 – quarto encontro ................................................ 117

Sumário

1. Introdução .................................................................................................... 13

1.1 - Objetivo ................................................................................................ 14

1.2 - Justificativa ........................................................................................... 14

1.3 - Problema .............................................................................................. 21

2. Fundamentação Teórico Metodológica ........................................................ 23

2.1 - Teoria da Cognição Corporificada ........................................................ 24

2.2 - Linguagem ............................................................................................ 34

2.3 - Cenário para investigação .................................................................... 36

2.4 - Ambientes Virtuais e Objetos de Aprendizagem - OAs ........................ 39

2.5 - Procedimento Metodológico e desenvolvimento da pesquisa. ............. 45

2.5.1 - Local e Participantes ...................................................................... 45

2.5.2 - Experimento de ensino ou Design experiment ............................... 48

2.5.3 – Coleta e Análise dos Dados .......................................................... 49

2.5.4 - Fases de desenvolvimento da pesquisa ........................................ 51

3. Primeira Fase ............................................................................................... 53

3.2 - Análise dos livros didáticos / Proposta Curricular SP ........................... 65

3.3 - Análise dos OAs – Objetos de Aprendizagem / Apllet .......................... 71

3.3.1 - Objeto de aprendizagem “Mundo da Trigonometria” ...................... 71

3.3.2 - Objeto de aprendizagem “Trigonometria com Molas” .................... 79

3.3.3 – Applets .......................................................................................... 82

3.4 - Primeira investigação junto a um grupo de professores/ pesquisadores

...................................................................................................................... 84

3.5 - Desenvolvimento das Atividades para o 1º encontro ............................ 85

4. Segunda Fase .............................................................................................. 88

4.1 – Primeiro encontro ................................................................................ 89

4.2 – Segundo encontro ............................................................................... 97

4.3 – Terceiro encontro ............................................................................... 109

4.4 – Quarto encontro ................................................................................. 112

5. Discussões e Considerações Finais ........................................................... 120

Referências Bibliográficas .............................................................................. 128

Esta dissertação é parte do projeto LOVEME Lab/Tidia Ae da Fapesp #60655-4

Capítulo 1

Introdução

Capítulo 1 – Introdução 14

Neste primeiro capítulo descrevo o principal objetivo desta pesquisa e quais

os fatores que me motivaram para sua realização. No final deste capítulo apresento

o problema de pesquisa e qual questão espero responder ao seu final.

1.1 - Objetivo

Esta pesquisa visa investigar e analisar aspectos que são ou não favorecidos

nos processo de ensino e de aprendizagem em aulas de trigonometria, em um

cenário elaborado para o Ensino Médio incluindo recursos digitais. Em particular,

busco analisar a produção de significados e as metáforas apresentadas pelos alunos

durante as aulas de trigonometria para o círculo trigonométrico.

O cenário proposto, para estas aulas, foi construído utilizando-se os recursos

disponíveis para um professor da escola pública do estado de São Paulo, tais como

livros didáticos, a proposta curricular do Estado de São Paulo e programas

fornecidos pela Secretaria da Educação, bem como recursos disponíveis na internet,

privilegiando os OA - Objetos de Aprendizagem disponibilizados pelo MEC.

Este trabalho se insere na linha de pesquisa “Tecnologias Digitais e Educação

Matemática”, e o que me levou a escolher esta linha foi, em grande parte, minha

trajetória como professor de matemática, até chegar neste momento como

mestrando em educação matemática.

1.2 - Justificativa

Os motivos que me levam a direcionar essa pesquisa para o ensino da

trigonometria são vários, dentre eles estão: a dificuldade que, enquanto professor de

matemática, encontrei no ensino e aprendizagem da trigonometria no círculo

trigonométrico, as dificuldades evidenciadas por pesquisadores, em diferentes

países como Weber (2005) e Tall (2000) e a grande ênfase que os currículos atuais

dão a este tema.

Os livros didáticos analisados, com mais detalhes no capítulo 3, dedicam

grande número de suas páginas à trigonometria. Na proposta curricular do Estado

Capítulo 1 – Introdução 15

de São Paulo também vemos que o quarto bimestre do primeiro ano do Ensino

Médio e o primeiro bimestre do segundo ano do Ensino Médio são totalmente

voltados a este tópico. A ênfase dada a este tema pode ser justificada também pela

importância das aplicações das funções trigonométricas em diversas áreas, por

exemplo, física e engenharia.

Sou graduado em Engenharia Industrial Modalidade Mecânica, com certeza

esta escolha foi feita pelo gosto pelas ciências exatas na minha vida de estudante. E

foi durante o primeiro ano de engenharia que iniciei minha carreira de professor de

matemática. Nesta época ministrei minhas primeiras aluas de matemática para

alunos de 5ª, 6ª e 7ª séries, como professor substituto em uma escola da rede

estadual, o que perdurou durante todo meu primeiro ano de engenharia.

Nos anos seguintes iniciei minha breve carreira de engenheiro, e foi como

estagiário de engenharia que tive meu primeiro contato com computadores. Era

início dos anos 90 e as empresas iniciavam o processo de informatização, em pouco

tempo o computador começou a fazer parte do meu trabalho o que me levou, após

alguns anos, a deixar minha carreira de engenheiro para trabalhar como instrutor de

informática ministrando cursos de informática básica. Foi quando voltei a ministrar

aulas de matemática na rede estadual, e retornei a estudar fazendo o curso de

Licenciatura Plena em Matemática.

Como professor da rede estadual fui convidado a ministrar cursos de

informática básica para os professores da rede. Na época (1998 a 2000), o governo

estadual estava começando a implantar laboratórios de informática dentro das

escolas, e surgiram vários cursos de capacitação para os professores. Eu trabalhei

como instrutor de informática, ministrando vários destes cursos, que tinham como

base alguns softwares educacionais e os softwares Windows, Word, Excel.

Até então, embora a informática já fizesse parte de meu cotidiano, ainda não

utilizava os recursos tecnológicos em minhas aulas de matemática e foi durante

estes cursos que comecei a me interessar pelo uso de novas tecnologias em sala de

aula.

Durante os anos de 1999 a 2004 trabalhei com diversos cursos de informática

para professores, além dos cursos da rede estadual, ministrei cursos de inclusão

Capítulo 1 – Introdução 16

digital gerenciado pela Fundação Vanzolini, fornecido para qualquer funcionário

público, e o Programa de Educação Continuada para Municípios - PEC Municípios,

que se tratava de um curso de formação universitária (Normal Superior) para

professores de educação fundamental – ciclo I, da rede municipal, que tinham

apenas o magistério.

Este curso era realizado em pólos onde as aulas eram ministradas através de

vídeo conferência e as atividades eram entregues e realizadas pelos alunos em um

laboratório de informática com acesso a internet. Neste curso, apenas a primeira

etapa, com a qual eu trabalhei, de introdução à Informática não era realizado através

de vídeo conferência, mas sim de forma presencial, realizada no laboratório de

informática de cada pólo.

No decorrer da minha carreira como professor de matemática, algumas

dificuldades dos alunos durante minhas aulas de trigonometria me chamaram a

atenção. Uma aluna perguntou-me quando voltaríamos a usar “números normais”,

pois os números irracionais encontrados como 2π, 22 , 33 , que eram resultados

freqüentes nestas aulas, isso me levou a refletir sobre suas dificuldades.

Entre as dificuldades que percebi entre os alunos destaco algumas que

considero importantes, pois foram dificuldades apresentadas por vários deles pelas

questões que apresentavam nas aulas, são elas:

� Relacionar medidas de arcos em graus e em radianos.

� Softwares de geometria dinâmica ou plotadores de gráficos não utilizam

radianos, mas sim os sistemas decimais, o que se torna uma linguagem

diferente da utilizada pelos livros didáticos que priorizam o radiano.

� Utilizar as razões trigonométricas como valores que não têm unidade de

medida, que são adimensionais.

Em um artigo publicado no “Mathematics Education Research Journal” Keith

Weber (2005) fala da importância da trigonometria no currículo escolar. Para Weber,

compreender funções trigonométricas é um pré-requisito para a compreensão de

temas da física Newtoniana, arquitetura, agrimensura, e muitos ramos da

Capítulo 1 – Introdução 17

engenharia. Além disso, como a trigonometria é um dos primeiros temas da

matemática que faz a ligação entre a álgebra linear, a geometria e os gráficos, ela

pode servir como um importante precursor para a compreensão do pré-cálculo e do

cálculo.

Alguns pesquisadores já identificaram dificuldades encontradas no

aprendizado das funções trigonométricas, “Infelizmente, as fases iniciais de

aprendizado sobre funções trigonométricas são repletas de dificuldade.”. (Blackett &

Tall,1991 apud Weber, 2005).

O aprendizado das funções trigonométricas, a meu ver, se diferencia de

outros aprendizados da matemática, a forma de raciocinar é bastante peculiar e

exige do aprendiz além de coordenar diferentes representações - a gráfica, algébrica

e geométrica - coordenar as mesmas com uma linguagem que inclui números

racionais na forma fracionária, na forma decimal e números irracionais o que, em

geral, não é muito fácil para o aluno.

Segundo Blackett & Tall, (apud Weber, 2005) “Os alunos também precisam

relacionar diagramas de triângulos com relações numéricas e de manipular os

símbolos envolvidos nessas relações.”. E na minha prática verifico que muitos

estudantes não estão habituados com este tipo de raciocínio. Senti a necessidade

de investigar mais sobre o modo de raciocinar dos estudantes para que como

professor pudesse elaborar um cenário propicio para o ensino de trigonometria.

Além disso, Weber (2005) em seu artigo aponta que a pesquisa e a literatura

nesta área ainda são escassas. E hoje em 2010, encontro dificuldade para encontrar

pesquisas realizadas sobre este tema.

Dentre algumas pesquisas realizadas no ensino e aprendizagem da

trigonometria, podemos citar a pesquisa realizada por Blackett e Tall (1991, apud

Weber, 2005), onde foram analisados dois grupos de estudantes que tiveram aulas

de modo diferente: o primeiro grupo fez uso de computadores e de maneira

interativa e permitiu a exploração das propriedades numéricas e geométricas; o

segundo grupo foi ensinado por um professor da mesma escola que ensinava

trigonometria tradicionalmente. As conclusões de Blackett e Tall foram que os alunos

do primeiro grupo superaram significativamente os estudantes do segundo grupo,

Capítulo 1 – Introdução 18

tanto em testes com modelos convencionais quanto em testes atípicos para este

tema.

Como mostra esta pesquisa de Blackett e Tall (1991, apud Weber, 2005), o

uso de computadores facilitou o aprendizado de trigonometria, mas após 19 anos

desta pesquisa, com uma geração de “Nativos Digitais”, como detalhado no capítulo

2, e toda a evolução tecnológica ocorrida neste período, como devemos utilizar

estes recursos digitais em um cenário de aprendizagem?

Outra pesquisa, realizada por Kendal e Stacey (1997), onde dois grupos

distintos foram submetidos a aulas de trigonometria, constatou que os alunos que

aprenderam funções trigonométricas usando o triângulo retângulo foram melhores

em um pós-teste do que aqueles que aprenderam trigonometria usando o círculo

trigonométrico. Com este indício de dificuldade com o círculo trigonométrico, gostaria

de verificar se em um cenário construído com os recursos digitais atuais, é possível

superar esta dificuldade.

No Brasil uma pesquisa realizada por Costa (1997), que construiu uma

seqüência didática usando o “mundo experimental” e um ambiente computacional

mostrou a importância de se trabalhar nos dois contextos, com resultados mais

significativos com o grupo que trabalhou primeiro o “mundo experimental” e depois o

ambiente computacional. No “mundo experimental” foram utilizadas experiências

com simulador do alarme óptico, roda com a caneta laser e pêndulo de areia. Para

as atividades do mundo computacional foram utilizados os softwares Cabri II e

Graphmatica.

Como apresentado por Blackett e Tall (1991) e Costa (1997), o uso de

computadores colaborou com o ensino e aprendizagem da trigonometria, Kendal e

Stacey (1997) mostram a dificuldade dos alunos com o círculo trigonométrico. Então

estes indícios levam esta pesquisa a fazer o uso de programas de computadores

direcionados a aprendizagem da trigonometria no círculo trigonométrico, procurando

assim preencher esta lacuna.

Embora ainda sejam poucos os resultados de pesquisa sobre o ensino e

aprendizagem das funções trigonométricas a realidade atual é bastante diferente de

quando iniciei minha carreira. Com certeza atualmente os ambientes escolares são

Capítulo 1 – Introdução 19

mais ricos do que os encontrados nos anos 90, onde tínhamos apenas giz e lousa.

Hoje, os livros didáticos estão presentes nas escolas públicas, nos anos 90 este uso

se restringia na maioria das vezes ao livro didático do professor, que era utilizado

como um guia para o professor que repassava um resumo na lousa do que achava

mais importante e selecionava alguns exercícios para serem realizados pelos

alunos.

Em 2008 começou a ser implantada uma nova proposta curricular para o

Estado de São Paulo e a partir de 2009 os alunos e o professor receberam apostilas

denominadas “Caderno do Aluno” e “Caderno do Professor”, respectivamente, com

orientações e roteiros de aprendizagem. Esta proposta apresenta uma perspectiva

diferente para a trigonometria das apresentadas nos livros didáticos e que serão

comentadas mais adiante no capítulo 3.

Em relação às tecnologias, as escolas públicas do Estado de São Paulo

possuem laboratório de informática, possuem disponível para os professores um

notebook e projetor de imagens para usar em suas aulas. Na sala dos professores

existe um computador com impressora e internet em banda larga e podemos

encontrar na internet inúmeros aplicativos conhecidos como applets desenvolvidos

para o ensino de matemática, sítios oficiais de educação, como os disponibilizados

pelo MEC (Ministério de Educação e Cultura) que oferece um Banco Internacional

de Objetos Educacionais onde encontramos diversos aplicativos, softwares ou

vídeos em várias áreas de conhecimento. Também temos disponibilizado pelo MEC

o RIVED1 - Rede Internacional Virtual de Educação, onde se encontra muito

material.

Especificamente o RIVED disponibiliza no sítio www.rived.mec.gov.br o que

chama de “Objetos de aprendizagem”, apresentados conforme mostra a figura

abaixo. Para o Ensino Médio o RIVED disponibiliza 14 objetos de aprendizagem de

matemática, sendo 3 deles orientados para a aprendizagem da trigonometria.

1 RIVED é um programa da Secretaria de Educação a Distância do MEC.

Capítulo 1 – Introdução 20

Figura 1: Tela de abertura para acesso ao OA – “Trigonometria com Molas” do RIVED

Mais adiante no capítulo referente à fundamentação teórico metodológica

será descrito o conceito de OA – objeto de aprendizagem, adotado nesta pesquisa,

mas para o RIVED um OA, é definido como:

Um objeto de aprendizagem é qualquer recurso que possa ser reutilizado para dar suporte ao aprendizado. Sua principal idéia é "quebrar" o conteúdo educacional disciplinar em pequenos trechos que podem ser reutilizados em vários ambientes de aprendizagem. Qualquer material eletrônico que provém informações para a construção de conhecimento pode ser considerado um objeto de aprendizagem, seja essa informação em forma de uma imagem, uma página HTM, uma animação ou simulação. (www.rived.mec.gov.br/site_objeto_lis.php - acesso 14/04/2009)

Embora o RIVED apresente esta definição de OA, a maneira que estes

objetos de aprendizagem são disponibilizados parece não atender a esta definição.

Pois, estes OAs acompanham um guia de utilização que, segundo os autores, deve

ser útil para professores que pretendem iniciar um trabalho com OAs, mas as

sugestões deste guia parecem levar o professor a “reproduzir” a atividade do mesmo

modo que fazia com o livro Didático, não fica explícito para o professor como ele

pode “reutilizar pequenos trechos do conteúdo” como sugere a definição utilizada

para OA.

Além disso, dificilmente um professor na escola da rede é também

programador ou conta com uma equipe que o ajudaria a modificar para reutilizar um

Capítulo 1 – Introdução 21

OA. Para conhecer e entender melhor os OAs utilizados, apresento uma análise

destes OAs, em capítulo dedicado à análise dos materiais disponíveis para professor

e aluno. No capítulo 3 apresento uma análise dos livros didáticos, da nova proposta

curricular do Estrado de São Paulo e dos Objetos de Aprendizagem.

Com o propósito de compreender como os alunos produzem significados e

metáforas para os conceitos de trigonometria, utilizo a Teoria da Cognição

Corporificada (Lakoff & Johnson (2001), Lakoff & Núñez (2000)). Tais processos tem

um impacto na análise do objeto de aprendizagem escolhido.

As Metáforas Conceituais são construtos que podem ajudar essa

compreensão, pois segundo Lakoff e Johnson (2001) “nosso sistema conceptual

ordinário, em termos do qual não só pensamos, mas também agimos, é

fundamentalmente metafórico por natureza.” Estes autores acrescentam que

A metáfora é, para a maioria das pessoas, um recurso da imaginação poética e um ornamento retórico – é mais uma questão de linguagem extraordinária do que de linguagem ordinária. Mais do que isso, a metáfora é usualmente vista como uma característica restrita à linguagem, uma questão mais de palavras do que de pensamento ou ação. Por essa razão, a maioria das pessoas acha que pode viver perfeitamente bem sem a metáfora. Nós descobrimos, ao contrário, que a metáfora está infiltrada na vida cotidiana, não somente na linguagem, mas também no pensamento e na ação. Nosso sistema conceptual ordinário, em termos do qual não só pensamos, mas também agimos, é fundamentalmente metafórico por natureza. (Lakoff; Johnson, 2001, p.39)

No capítulo 2 será detalhada a Teoria da Cognição Corporificada e as teorias

que vão compor o encaminhamento desta pesquisa.

1.3 - Problema

O foco desta pesquisa reside em investigar e analisar que aspectos são ou

não favorecidos no processo de ensino de trigonometria, no Ensino Médio,

especificamente sobre o círculo trigonométrico, em um ambiente utilizando recursos

digitais.

Pretendo ao final desta pesquisa responder algumas questões:

Capítulo 1 – Introdução 22

Questão 1 - Quais são os argumentos e metáforas utilizados pelos alunos

nesse cenário que podem influenciar na manutenção ou modificação do

mesmo?

Questão 2 - Que aspectos podem ser considerados mais ou menos

relevantes, para a construção de um cenário para a aprendizagem do

círculo trigonométrico, utilizando como recursos tecnológicos applets e

objetos de aprendizagem disponíveis na internet?

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 23

Capítulo 2

Fundamentação Teórico Metodológica

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 24

Para embasar esta pesquisa descrevo a seguir os aspectos mais importantes

das teorias que auxiliaram tanto na elaboração do cenário quanto na análise deste

cenário partindo da compreensão dos estudantes. Primeiro descrevo alguns

aspectos da Teoria da Cognição Corporificada (Lakoff & Johnson, 2001, Lakoff &

Núñez, 2000), posteriormente trago um pouco sobre linguagem segundo Lev

Vygotsky com a contribuição do Círculo de Baktin. Em seguida apresento uma

análise sobre os ambientes virtuais e também o que entendo por OA - Objeto de

Aprendizagem.

Para o desenvolvimento do cenário de aprendizagem vamos utilizar o

conceito de Cenário para Investigação, que tem como princípio fundamental a

aprendizagem dos alunos através da investigação. (Skovsmose, 2008)

Encerro este capítulo com a descrição dos processos metodológicos desta

pesquisa, na qual caracterizo o local, os participantes e os instrumentos para coleta

e análise de dados.

2.1 - Teoria da Cognição Corporificada

Buscamos na lingüística cognitiva o papel da linguagem cotidiana na

construção do conhecimento, encontramos que para Lakoff e Johnson (2001) o

pensamento é metafórico e em sua maioria é concebido de forma inconsciente.

Cabe notar que segundo Bolite Frant2 (prelo) não se trata do inconsciente freudiano3

mas de ações que realizamos sem “esforço” do pensamento. Por exemplo,

levantamos da cama e caminhamos para a cozinha dificilmente pensamos sobre que

pé pisou primeiro a entrada na cozinha, podemos dizer que foi uma ação

inconsciente, ou seja de maneira automatizada.

Assumindo com Rabello e Bolite Frant (ver Boletim GEPEM) que pensamento

e linguagem são inseparáveis, um modo de investigar o pensamento metafórico é

através da linguagem utilizada pelos alunos.

2 Bolite Frant, J. (prelo) Linguagem, tecnologia e corporiedade: Produção de significados para o Tempo em gráficos cartesianos. 3 Inconsciente Freudiano: não é um trauma.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 25

Concordamos com vários pesquisadores da Teoria da Cognição Corporificada

(Lakoff e Johnson (2001), Lakoff e Núñez (2000)), que os processos cognitivos não

dependem somente da atividade cerebral, mas estão vinculados também às

diversas partes do corpo humano. São as experiências de nosso cotidiano, nossa

interação com o meio ambiente e meio cultural, que estruturam nosso pensamento,

assim existe uma relação indissociável entre corpo e mente. A dicotomia mente

corpo é inexistente. “A natureza detalhada e dinâmica de nossos corpos, nosso

cérebro e nosso funcionamento cotidiano no mundo, estruturam os conceitos e a

razão humana. Isto inclui os conceitos matemáticos e o raciocínio matemático.”

(Núñez, 2000, p.6). Sendo assim recorro à Teoria da Cognição Corporificada para

melhor entender os mecanismos que nos permitem pensar sobre um determinado

conceito e como aprendemos conceitos novos.

Lakoff & Johnson (2001) afirmam que as metáforas são partes integrantes de

nosso pensamento, elas não são apenas recursos da linguagem poética, mas

também pensamento e ação. “A essência da metáfora é compreender e experienciar

uma coisa em termos de outra”. (p. 41). Eles também afirmam que a maioria de

nossos pensamentos ocorrem de forma metafórica e inconsciente.

Todos nós temos sistemas conceituais que usamos ao pensar, mas não podemos, conscientemente, inspecionar nosso inventário conceitual . Todos nós tiramos conclusões instantaneamente numa conversação, mas não podemos olhar, conscientemente, para cada inferência nem para os nossos próprios mecanismos de inferir enquanto estamos no ato de inferir em larga escala segundo por segundo. Todos nós falamos em uma língua que tem uma gramática, mas não colocamos as frases juntas palavra por palavra checando conscientemente se estamos seguindo as regras de nossa língua em cada frase. Para nós, isto parece fácil: apenas falamos, ouvimos e tiramos conclusões sem esforço. Mas o que ocorre em nossas mentes, no pano de fundo, é enormemente complexo e amplamente não disponível para nós. (Lakoff & Núñez, 2000, p. 27).

Segundo esses autores a Metáfora Conceitual é um mecanismo cognitivo que

nos permite fazer inferências num domínio desconhecido (alvo) partindo de

inferências que são possíveis e válidas em um domínio conhecido (fonte). Em outras

palavras, o conhecimento de algo novo não acontece no vazio, não vem do nada,

mas das relações inferenciais que fazemos sobre o que conhecemos e projetamos

para este domínio alvo.

Para exemplificar apresento o conceito de vida entendido através de

inferências possíveis a partir das realizadas para o conceito de viagem. Podemos

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 26

entender uma vida como uma viagem, não que ela seja um tipo de viagem, mas o

modo como caracterizamos uma vida pode partir do modo pelo qual caracterizamos

uma viagem.

Já conheço os passos dessa estrada

Sei que não vai dar em nada

Seus segredos sei de cor

Já conheço as pedras do caminho

E sei também que ali sozinho

Eu vou ficar, tanto pior

Metáfora: VI DA É VIAGEM Domínio Fonte

VIAGEM Domínio Alvo

VIDA Pedras Dificuldades Estrada, caminho Linha da vida Passo Atitudes

Tabela 1 – Metáfora VIAGEM É VIDA

Nestes versos Chico Buarque utiliza da metáfora “VIDA É VIAGEM”, assim

quando cita passos faz referência a nossas atitudes, pedras as dificuldades

encontradas e estrada ou caminho o decorrer da vida. Repare que uma dificuldade

não é exatamente uma pedra mas as inferências que podemos fazer como tropeçar

na pedra e cair nos levam a pensar que podemos enfrentar e sair de dificuldades na

vida.

Nos exemplos abaixo estão grifados vários termos que caracterizam uma

viagem onde para entendermos a vida utilizamos de nossos conhecimentos de

viagem, ou seja entendemos uma coisa “abstrata” em termos de outra mais tangivel.

Não sei qual caminho seguir

Ele teve uma vida longa

Demorou para chegar este momento

Encontrei muitos obstáculos para chegar até aqui

Foi uma longa jornada

Ele vai chegar lá

Vamos seguir em frente

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 27

Podemos perceber que nestes casos não apenas falamos de vida com os

mesmos termos de uma viagem, mas nossas ações durante a vida também são as

mesmas de uma viagem, escolhemos caminhos, seguimos em frente, superamos

obstáculos. Mesmo para uma pessoa que nunca tenha viajado, o conceito de uma

viagem está impregnado na cultura social, conhecemos vários tipos de viagens

através de relatos de outras pessoas, filmes, documentários, reportagens, internet,

ou seja, mesmo sem ter participado de uma viagem estes conceitos fazem parte de

nossa cultura. Este tipo de metáfora é concebido como metáfora estrutural, pois

estrutura nosso sistema conceitual.

Lakoff & Johnson (2001, p.44) nos apresentam outro exemplo que é a

metáfora “TEMPO É DINHEIRO”, neste exemplo concebemos o tempo como sendo

dinheiro.

“Você está desperdiçando meu tempo.

Esta coisa vai te poupar horas.

Eu não tenho tempo para te dar.

Como você gasta seu tempo hoje em dia?

Aquele pneu furado me custou uma hora.”

Em nossa cultura o tempo é algo muito valioso. Para nós o tempo é limitado

assim como o dinheiro e as expressões gastar, investir, poupar, dar, custou são

expressões que não apenas se aplicam ao tempo, mas são atitudes que temos

diante do tempo e do dinheiro.

Em uma cultura onde não se utilize o dinheiro, como uma tribo indígena, com

certeza não se aplicaria estas expressões e o conceito de tempo deve ser diferente

das culturas capitalistas. Assim, as ações diante do tempo também serão

provavelmente diferentes.

Cabe observar, portanto, que a teoria da corporeidade engloba também o

contexto sócio-cultural. O que não poderia ser diferente, uma vez que se trata de

uma teoria que leva em conta o ser humano que tem seu lugar na história, na

sociedade e no contexto cultural.

Além das metáforas estruturais que são as usadas para entender uma

estrutura através de outra, existem as metáforas orientacionais, que recebem este

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 28

nome por ter relação com nossas orientações espaciais; acima/abaixo, dentro/fora,

profundo/superficial.

Expressamos um estado de espírito, muitas vezes, através de metáforas

orientacionais, por exemplo FELIZ É PARA CIMA, TRISTE É PARA BAIXO, quando

estamos tristes ou deprimidos podemos dizer que “Estou para baixo hoje”, quando

nos referimos a alguém feliz dizemos “Ele esta para cima hoje”, ou usarmos o

polegar PARA CIMA ou PARA BAIXO. Observe que a linguagem engloba os gestos,

assim enunciar “Estou para baixo” ou mostrar o polegar PARA BAIXO são

expressões sinônimas.

Quando falamos de afeição usamos muitas vezes das inferências que

fazemos para temperatura para caracterizá-la, vejamos os exemplos: “Eles me

acolheram calorosamente”; “Você foi frio comigo hoje”. Nestes casos a temperatura

é o domínio fonte e a afeição é o domínio alvo. Outro exemplo é a importância

conceitualizada como tamanho: “Tenho um grande problema para resolver”, “Ele foi

um grande homem”, “Não me abato com pequenas coisas”.

Também podemos nos utilizar de várias fontes diferentes para conceber um

novo conceito, sendo assim teremos mais de um domínio fonte para um único

domínio alvo, neste caso temos as montagens conceituais.

Um exemplo de metáfora conceitual dentro da matemática é dado por Bolite

Frant et al (2004) onde temos a metáfora PONTOS SÃO COISAS FÍSICAS.

Metáfora: PONTOS SÃO COISAS FÍSICAS

Domínio Fonte

COISAS FÍSICAS

Domínio Alvo

PONTO

Um corpo físico no espaço. Um ponto no plano cartesiano.

Um carro se movendo ao longo de uma trajetória.

Um ponto que se "move" ao longo de uma curva que representa uma função real.

Um carro que viaja através de um túnel é o mesmo quando ele entra e sai do túnel.

Um ponto que se "move" ao longo de uma curva é sempre a mesmo.

A trajetória representa o movimento. O gráfico na tela é a trajetória do ponto. Tabela 2 – Metáfora: PONTOS SÃO COISAS FÍSICAS (in Bolite Frant)

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 29

Lakoff & Nuñez (2000) distinguem dois tipos de metáforas conceituais as

Metáforas Básicas e as Metáforas de Ligação.

A diferenciação se dá por conta de que o pensamento metafórico não ocorre

apenas entre domínios distintos, mas também entre domínios de mesma natureza.

O exemplo acima trata de uma Metáfora Básica já que o domínio fonte e o domínio

alvo são distintos.

As Metáforas Básicas relacionam a matemática com os conhecimentos do

cotidiano, logo o domínio fonte está relacionado, geralmente, com nossas

experiências sensoriais, são nossas experiências do cotidiano, e o domínio alvo é o

conhecimento matemático. Os mapeamentos do tipo metáforas básicas geralmente

não requerem esforços e são realizados de maneira inconsciente.

As Metáforas de Ligação nos ajudam a entender melhor as idéias mais

avançadas da matemática, e os dois domínios são iguais, como veremos a seguir

para o caso do círculo trigonométrico. No nosso caso, são mapeamentos que

possuem domínio fonte e alvo na matemática, permitindo deste modo conceitualizar

um domínio matemático através de outro domínio matemático. Segundo Lakoff e

Núñez (2000) estas metáforas exigem um esforço maior e um grau de instrução

maior e mais explícito.

Para este trabalho ressalto as metáforas orientacionais, onde criamos uma

linguagem de movimento para coisas estáticas. Talmy (2000) tratou estas metáforas

como movimento fictivo onde, pela análise de expressões lingüísticas do cotidiano,

cenas estáticas são descritas em termos dinâmicos. Ele mostra o uso e ocorrência

do movimento fictivo na linguagem falada, sua representação mental, e do

seqüenciamento dos componentes do caminho na representação mental. Isso

constrói um interessante par contrastivo transformando cenas estáticas em cenas

descritas mentalmente em termos dinâmicos.

Estas metáforas aparecem com freqüência, quando indicamos um caminho

para alguém, falamos “desça esta rua e quando ela cruzar com a outra rua você

vira”, estas duas ruas não vão se cruzar, elas estão estáticas e continuarão assim,

mas usamos termos que sugerem o movimento das ruas. E isto facilita a

compreensão do que estamos falando.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 30

O movimento fictivo também aparece no pensamento matemático, segundo

Lakoff e Núñez (2000) e Núñez (2004), ao falar de determinados objetos

matemáticos com propriedades estáticas, por exemplo funções de uma variável real,

utilizamos uma linguagem dinâmica dando a idéia de movimento, a função cresce.

Perceba que ao falar, por exemplo, de limite de uma função usamos uma linguagem

próxima ao nosso cotidiano, tende, se aproxima de equivale a limx→∞ (x²+1). Para os

autores a manifestação de movimento para expressar as idéias matemáticas é

genuína e constitutiva, no entanto, esses movimentos não são capturados pelos

formalismos e sistemas axiomáticos da matemática. Nossa hipótese é a de que com

o dinamismo de applets e OAs este movimento fictivo pode ser capturado de modo a

torná-lo factivo.

Ampliando as possibilidades propostas pela teoria das metáforas conceituais,

a teoria das montagens conceituais, segundo Fauconnier & Turner (1998), propõe

que além dos mapeamentos do tipo das metáforas conceituais realizado entre um

domínio fonte e um domínio alvo, podemos ter um mapeamento que integre

diferentes espaços mentais. Uma das possibilidades é o mapeamento entre quatro

espaços mentais: Domínio Fonte, Domínio Alvo, Espaço Genérico e o Espaço de

Montagem. Conforme apresenta a figura 2 o espaço genérico representa uma

estrutura conceitual que é compartilhada pelo domínio fonte e domínio alvo, e o

espaço de Montagem é onde os objetos dos domínios são combinados e integrados.

Figura 2: Os espaços de uma Montagem Conceitual

Espaço Genérico

Entrada 1 Entrada 2

Montagem

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 31

Em “Where Mathematics – Comes From”, Lakoff e Núnez (2000) sugerem

como pode ser a compreensão do círculo trigonométrico seguindo uma perspectiva

da teoria da cognição corporificada. Para eles a construção do círculo trigonométrico

pode ser compreendida a partir de três estágios. Estes estágios mostram um pouco

da complexidade da construção do círculo trigonométrico.

A metáfora ÂNGULOS SÃO NÚMEROS, fundamental ao campo da

trigonometria, segundo Lakoff e Nuñez (2000), conceitualiza ângulos como números.

Em primeiro lugar há a montagem conceitual do Círculo Unitário. Tal montagem

possui três estágios que apresentamos a seguir.

No primeiro estágio temos a montagem de dois elementos em dois domínios:

um círculo no plano euclidiano combinado com o plano cartesiano de modo a gerar o

círculo unitário - um círculo cujo centro está no ponto (0,0) do plano cartesiano e que

tem raio 1. Quando esta montagem é feita, são atribuídos números aos

comprimentos das cordas do círculo dado que a combinação metafórica Números

são Pontos é inerente ao Plano Cartesiano. Lakoff & Núñez (2000) descrevem mais

detalhadamente, dividindo esta metáfora em três estágios conforme mostramos a

seguir.

Primeiro Estágio:

Domínio I

Um círculo no plano euclidiano com centro e raio

Domínio II

O plano cartesiano com os eixos x e y, origem em (0,0)

Plano Euclidiano Plano Cartesiano

Centro Origem

Raio Distando 1 unidade da origem

Tabela 3 – Domínio fonte para o Círculo Trigonométrico - Fonte: Lakoff & Núñez, 2000, p.390.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 32

Figura 3: 1º estágio da montagem do círculo trigonométrico (Lakoff & Núñez, 2000, p.390) Segundo Estágio:

O segundo momento desta construção é a combinação do resultado do

primeiro estágio com o ângulo qualquer de medida α com o vértice na origem do

eixo cartesiano, o ponto (0,0), e um de seus lados sobre o eixo x.

Figura 4: 2º estágio da montagem do círculo trigonométrico. (Lakoff & Núñez, 2000, p.391)

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 33

Terceiro Estágio

No terceiro momento temos a combinação do segundo estágio com o

triângulo retângulo, onde a hipotenusa é o raio do círculo o vértice do ângulo α esta

sobre a origem do eixo cartesiano e o cateto adjacente esta sobre o eixo x.

Figura 5: 3º estágio da montagem do círculo trigonométrico. (Lakoff & Núñez, 2000, p.392)

Dada a Combinação Metafórica do Círculo Trigonométrico Unitário, é possível

enunciar de forma mais simples a Metáfora da Trigonometria:

Domínio Fonte

Círculo trigonométrico Unitário

Domínio Alvo

Funções Trigonométricas

Comprimento do Arco definido pelo Ângulo α Número associado ao Ângulo α

Comprimento do Lado a Função sen α

Comprimento do Lado b Função cos α

Tabela 4 – Metáfora para o Círculo Trigonométrico

Uma vez que, para levantarmos as metáforas e/ou montagens realizadas

pelos alunos, iremos investigar suas interações neste ambiente, é necessário

também colocar de que modo estaremos tratando da linguagem nesse estudo.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 34

2.2 - Linguagem

Procurando compreender melhor as relações dos processos de ensino e de

aprendizagem, descrevo a seguir algumas definições do que são o pensamento e a

linguagem segundo Vygotsky (2001) e algumas contribuições de Bakhtin (apud, Brait

2005) a compreensão do uso da linguagem.

Para Vygotsky (2001) os processos de ensino e de aprendizagem são

concebidos pela presença do outro social, portanto a linguagem é um elemento

fundamental nesse processo.

Para Vygotsky (2001) pensamento e linguagem são indissociáveis, a relação

entre o pensamento e a palavra se estabelece por um movimento contínuo de vai e

vem, do pensamento para a palavra e vice versa, assim, o pensamento não é

simplesmente expresso em palavras, é por meio delas que ele passa a existir

A relação entre pensamento e linguagem é uma característica tipicamente

humana, mas essa relação não nasce com o sujeito, ela não aparece pronta, ela é

estabelecida ao longo do desenvolvimento psicológico. Num determinado momento

do desenvolvimento humano essas duas potencialidades se unem e não se separam

mais.

Para Vygotsky (1987, apud Oliveira, 1999, p. 60), o sentido da palavra é:

...complexo, fluido, estando em constante mudança. Até certo ponto ele é único para cada consciência e para a mesma consciência em circunstâncias diversas. Quanto a isso, o sentido da palavra é inesgotável. A palavra adquire seu sentido na frase. A frase, entretanto, adquire seu sentido somente no contexto do parágrafo, o parágrafo no contexto do livro, e o livro no contexto das obras completas do autor. Em última instância, o verdadeiro sentido da palavra é determinado por tudo aquilo que, na consciência, se relaciona com o que apalavra expressa. (...) Em última instância, o sentido de uma palavra depende da compreensão que se tenha do mundo como um todo e da estrutura interna da personalidade.

Para também auxiliar minha pesquisa recorro aos estudos do Círculo

Bakhtiniano, que possui uma extensa obra sobre a concepção de linguagem.

Segundo Brait (2005) o Círculo de Bakhtin enxerga a linguagem como um constante

processo de interação mediado pelo diálogo.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 35

A língua materna, seu vocabulário e sua estrutura gramatical, não conhecemos por meio de dicionários ou manuais de gramática, mas graças aos enunciados concretos que ouvimos e reproduzimos na comunicação efetiva com as pessoas que nos rodeiam. (Bakhtin, apud Brait,2005, p.95)

Segundo Brait (2005) para Bakhtin o enunciado é resultado não apenas do

locutor, mas de uma interação de locutor e interlocutor, quem fala ou escreve

sempre o faz para alguém e sendo assim este diálogo sofrerá influencia do contexto

social, histórico, cultural e ideológico em que ele está envolvido. Neste contexto

todos que estão envolvidos com o enunciado participam em condições de igualdade.

Quando alguém enuncia o faz de maneira a ser compreendido, para isto seleciona o

tipo de discurso e quais palavras são as mais adequadas para aquele enunciado.

Com base nesta seleção de palavras e tipos de discurso o Círculo de Bakthin

faz uma reflexão sobre os gêneros de discurso, na qual realiza uma classificação

destes gêneros quanto às esferas de uso da linguagem. Temos dois tipos de

discursos os primários e os secundários. Os discursos primários são os utilizados de

forma espontânea em nossa vida cotidiana, já os discursos secundários são mais

elaborados e seguem um padrão cultural de acordo com a esfera na qual ele está

contido. Por exemplo, um palestrante fará seu discurso com o gênero apropriado de

acordo com o público, uma vez que cada esfera cultural possui seus códigos e

acordos. Como explica Di Fanti (2003):

A linguagem do ponto de vista bakhtiniano tem vida em um espaço enunciativo-discursivo e, com isso, amplia-se mais ainda ao ser considerada não como um privilégio do verbal, ou seja, todas as manifestações que tenham a interferência do homem constituem-se como linguagem, enunciado, texto. Essa posição é clara em O problema do texto (BAKHTIN, 1992 [1959-1961]) já que todo texto tem sujeito, é enunciado, e aglutina o verbal e o extraverbal. Além disso, a constituição em texto é uma condição para haver objeto de estudo e de pensamento. (p.100)

Segundo Bakthin o conhecimento é do domínio da enunciação. Assim,

afirmam Rabello e Bolite Frant (2002) que não existe conhecimento em livros, pois

ali há apenas enunciados. O que está enunciado no livro é um texto, acabado, por

isso é preciso a enunciação efetiva daqueles enunciados para que eles tomem parte

na produção de conhecimentos.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 36

As interações e a linguagem que devemos analisar ocorrem num cenário que

elaboramos para tal. A seguir comentamos sobre o embasamento do mesmo.

2.3 - Cenário para investigação

O conceito de cenário para investigação que será utilizado nesta dissertação

é o apresentado por Skovsmose (2008), onde ele diz que:

Um cenário para investigação é aquele que convida os alunos a formular questões e procurar explicações. O convite é simbolizado por seus “Sim, o que acontece se...?”. Dessa forma os alunos se envolvem no processo de exploração. O “Por que isto?” do professor representa um desafio, e os “Sim, por que isto...?” dos alunos indicam que eles estão encarando o desafio e que estão em busca de explicações. Quando os alunos assumem o processo de exploração e explicação, o cenário para investigação passa a constituir um novo ambiente de aprendizagem. (Skovsmose, 2008, p.20)

Para a constituição de um cenário de investigação Skovsmose destaca a

importância do convite do professor aos alunos para sua participação. Este convite

pode ser feito de muitas maneiras pelo professor, mas sua aceitação depende

somente do aluno, pois ele é o responsável pelo seu processo de aprendizagem,

mas cabe ao professor tentar tornar a situação atrativa aos alunos. Também é

importante ressaltar que para determinado grupo de alunos um cenário de

investigação pode ser perfeitamente atrativo e este mesmo cenário não ser

adequado a outro grupo de alunos. A determinação deste cenário é uma questão

empírica que apenas a prática do professor e dos alunos envolvidos pode respondê-

la.

Segundo Skovsmose (2008) a prática em sala de aula que predomina hoje

em dia é a resolução de exercícios. Dentro desta prática temos referencias a três

segmentos do ensino da matemática, referência a matemática pura, a semi-

realidade e a realidade. A proposta não é de acabar com a prática de exercícios,

mas a de também utilizar cenários de investigação dentro destas três referências,

criando novas alternativas de ambientes de aprendizagem. Embora a utilização de

um cenário para investigação em sala de aula diferencie em muito a prática da

resolução de exercícios a utilização dos diversos caminhos podem otimizar a

produção de significados matemáticos pelos alunos. Em nenhum momento

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 37

Skovmose defende a substituição das práticas atuais pelos cenários de

investigação, mas aponta estes cenários como uma alternativa de prática em sala de

aula.

Skovmose resume os ambientes de aprendizagem em seis grupos, três deles

tendo como base a prática de resolução de exercícios e três tendo como base um

cenário para investigação, conforme mostra a tabela a seguir:

Exercícios Cenários para investigação

Referências a matemática pura (1) (2)

Referências à semi-realidade (3) (4)

Referência à realidade (5) (6) Tabela 5 – Ambientes de aprendizagem (Skovsmose, 2008, p.23)

A sugestão de Skovsmose é a de tentarmos migrar de práticas como

exercícios para práticas de cenários de investigação. No ambiente (1) caracterizado

pela resolução de exercícios onde o enunciado quase sempre diz “resolva as

equações”, “efetue”, “calcule”, assim de maneira quase automática e seguindo

determinadas regras, os alunos chegam ao resultado. Pode se tentar converter

estes exercícios em um cenário de investigação quando possibilitamos que os

alunos descubram algumas regras através de investigações realizadas por eles, por

exemplo, podemos convidar os alunos a experimentarem outras maneiras de

resolver os mesmos exercícios, perguntar “o que acontece se...?”, estimular os

alunos a questionar os resultados, perguntas do tipo “porque sempre acontece...?”

são questões que devem aparecer quando um cenário de investigação é criado.

O cenário de investigação criado nesta pesquisa tenta seguir estas

sugestões, assim utilizamos de questionamentos durante a aplicação dos cenários

para guiar os alunos a uma investigação dos estudos em trigonometria, mas também

como é proposto, não eliminamos os exercícios deste cenário, uma vez que fazem

parte da realidade dos alunos. Buscamos iniciar com exercícios e seguir cada vez

mais na direção da criação de um cenário de investigação.

O ambiente (3) é muito comum na prática docente, desde os primeiros anos

de estudo da matemática. Nele os alunos convivem com problemas de referência à

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 38

semi-realidade. Um exemplo desta semi-realidade muito comum nos livros didáticos

quando abordado o tema trigonometria é:

- Um edifício forma uma sombra de 10 m sobre o solo, formando um ângulo de

30º com o solo, determine a altura do edifício.

Com certeza nenhum autor de livro didático foi medir o comprimento da

sombra ou o ângulo que esta forma com o solo, mas os alunos aceitam estas

condições para resolver o exercício. Nenhum outro aspecto é levado em

consideração, e o que parece acontecer é que existem padrões de semi-realidade e

se criam técnicas para a resolução destes problemas. Assim toda vez que temos um

problema envolvendo sombras de árvores ou edifícios, utiliza-se das razões

trigonométricas para resolvê-lo.

Esta semi-realidade também pode ser utilizada em um cenário para

investigação, desde que se tente explorar as características matemáticas que

circundam este problema. A abordagem que o professor pode realizar dentro desta

semi-realidade pode levar o aluno a transformá-lo em um cenário de investigação,

perguntas do tipo “o que acontece se...?” pode ser muito útil para a construção deste

cenário. Esta que é a situação (4), sugerido por Skovsmose, pode ser muito rica

para a construção de um cenário de aprendizagem, pois a simulação de uma

situação hipoteticamente real poderá facilitar o entendimento e contextualização da

matemática pelos alunos.

Podemos construir cenários com semi-realidade bastante próxima da

realidade, um exemplo poderia ser a de construir maquetes de edifícios e expô-las

ao sol para medir sua sombra, assim podemos explorar outras situações que

poderão aparecer, os alunos, por exemplo, poderão indagar quanto ao horário e o

tamanho da sombra, perguntas sobre escalas ou qualquer situação não prevista.

Para um cenário de investigação a curiosidade é um fator muito importante, levando

o aluno a ser protagonista em seu processo de aprendizagem.

Skovsmose sugere que o cenário de investigação seja propiciado aos alunos

antes mesmo de demonstrar ou trabalhar as propriedades matemáticas que são

pertinentes ao problema. Utilizando o exemplo anterior, se já foi trabalhado com os

alunos as razões trigonométricas, dentro de um cenário de investigação, eles

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 39

provavelmente irão tentar utilizar as fórmulas ou exemplos desenvolvidos nas aulas

anteriores, mas se a primeira aula for dentro do cenário de investigação, este poderá

trazer outras contribuições para o processo de aprendizagem e a partir deste cenário

de investigação poderemos chegar aos conceitos matemáticos desejados.

Os ambientes de aprendizagem (5) e (6) fazem referência a situações reais,

mesmo assim estas podem ser implementadas simplesmente como um exercício se

as possibilidades que forem oferecidas não forem trabalhadas e isolarmos apenas

alguns valores reais para desenvolvermos alguns cálculos.

Para que tenhamos em situações reais um cenário para a investigação,

Skovsmose diz que o professor tem que assumir a possibilidade de sair de uma

zona de conforto indo a uma zona de riscos4 (Penteado 2001), onde alunos podem

explorar áreas não esperadas pelo professor e assim tendo que assumir um papel

também de investigador, como seus alunos. O professor pode guiar todos os passos

dos alunos, evitando assim sair da zona de conforto, e transformando o que seria

um cenário de investigação em um exercício, mas é a possibilidade de entrar na

zona de risco que pode nos levar a novas possibilidades de aprendizagem para

ambos: alunos e professores.

Nesta pesquisa será proposto aos alunos participantes um cenário de

investigação que inclui applets e OAs. Propomos aos alunos uma investigação

sobre o círculo trigonométrico, para melhor entendermos como eles produzem

significados para as funções seno e cosseno, levantando assim algumas

possibilidades para o ensino em trigonometria.

2.4 - Ambientes Virtuais e Objetos de Aprendizagem - OAs

Os ambientes virtuais, hoje, são uma realidade em muitos setores da

sociedade, seja para diversão ou para grandes transações comerciais. Os recursos

tecnológicos que utilizamos hoje através dos computadores, celulares, calculadoras

4 Segundo Penteado (2001), a zona de conforto é uma situação vivida pelo professor na qual quase tudo é previsível, conhecido e controlável em suas aulas. Na zona de risco, por sua vez, imperam a imprevisibilidade e a incerteza, o surgimento de situações inesperadas é uma constante e o professor deve estar preparado para enfrentá-las.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 40

ou qualquer outro dispositivo tecnológico, podem ter superado as expectativas de

muitas pessoas, mas para as gerações que nasceram e cresceram com esta

tecnologia estes são recursos muito simples de manipular e quase corriqueiros. Mas

esta tecnologia ainda sofre resistência para entrar na sala de aula.

Prensky (2001) nomeia esta nova geração, que nasceu e cresceu utilizando

computadores, controles remotos, celular e toda esta tecnologia que nos cerca

atualmente, como sendo “Nativos Digitais” e nomeia a geração de pessoas que

embora não tenha nascido com toda esta tecnologia, faz uso constante dela, como

sendo os “Imigrantes Digitais”.

Justificando o nome atribuído para estas gerações Prensky diz que como

imigrantes, sempre manteremos um sotaque da língua materna, ou seja, por mais

que utilizemos as novas tecnologias sempre temos em nossas atitudes vestígios de

um passado onde ela ainda não existia. Como exemplo de atitudes de um “Imigrante

Digital” podemos citar que muitos destes imigrantes ainda imprimem um texto para

sua leitura enquanto poderiam simplesmente lê-lo na própria tela do computador, ou

ainda um “imigrante”, com menor grau de adaptação ao novo ambiente, se utiliza do

telefone para confirmar o recebimento de um email.

...o maior problema que a educação enfrenta hoje é que os nossos instrutores são “Imigrantes Digitais”, que falam uma língua desatualizada (a da idade pré-digital), e que estão se esforçando para ensinar a população que fala uma língua inteiramente nova. (Prensky, 2001)

Para diferenciar as duas gerações Prensky apresenta algumas características

que diferenciam os nativos dos imigrantes digitais.

“Nativos Digitais” Imigrantes Digitais

Recebem informações muito rápido. Recebem informações lentamente.

Realizam atividades em paralelo e multi-tarefas.

Realizam atividades passo a passo e uma coisa de cada vez.

Gostam de gráficos antes de seu texto. Gostam de textos antes dos gráficos.

Preferem acesso aleatório das informações (tipo hiperlink).

Preferem acesso linear das informações.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 41

Funcionam melhor quando ligados em rede.

Funcionam melhor individualmente.

Gostam de jogos de trabalho. Preferem trabalhos a sério.

Prosperam com a gratificação instantânea e recompensas freqüentes

Prosperam com gratificação estáveis e duradouras.

Tabela 6 – Nativos e Imigrantes Digitais

Hoje não precisamos mais discutir se o uso de novas tecnologias irá alterar o

modo que as pessoas vivem ou se estas tecnologias irão trazer benefícios para a

educação, pois a verdade é que estas modificações já fazem parte de nossas vidas,

e a competitividade do mercado em todas as áreas impulsiona cada vez mais estas

mudanças e cada vez mais a sociedade necessita de tecnologias cada vez mais

sofisticadas. Nenhum de nós consegue conviver na sociedade atual sem a influência

das evoluções tecnológicas, e nossos alunos também estão envolvidos nesta

mudança. Muitos destes alunos são tão familiarizados com vários tipos de

ambientes virtuais que nem podem imaginar como seria viver sem estas tecnologias.

Sendo assim o uso de ambientes virtuais faz parte da linguagem cotidiana de

nossos alunos e a utilização desses ambientes em sala de aula não me parece ser

apenas mais uma ação motivadora para uma determinada aula, mas sim uma

conseqüência natural da evolução tecnológica em que todos, professores e alunos,

estamos inseridos.

Compartilho da idéia de Miskulin (1999) que educar em uma Sociedade da

Informação é muito mais do que “treinar” pessoas no uso das novas tecnologias;

trata-se de formar os indivíduos para "aprender a aprender" de forma a prepará-los

para a contínua e acelerada transformação do conhecimento tecnológico.

A escola em que realizo esta pesquisa, é uma escola na periferia de uma

cidade do interior de São Paulo. Os alunos, na sua maioria, tem familiarização com

computadores, celulares de última geração e outros equipamentos tecnológicos.

Então, nós professores, não temos mais porque perguntar se devemos utilizar um

ambiente virtual, mas sim, perguntar como elaborar um cenário de investigação que

utilize tecnologia computacional.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 42

Nós podemos observar que nas escolas onde a tecnologia está demorando a

chegar em suas salas de aula, seja por políticas educacionais conservadoras, seja

por resistência dos profissionais da educação ou por dificuldades econômicas,

vemos que os próprios alunos estão fazendo com que a tecnologia invada as salas

de aula de alguma forma, quer seja pelo celular ou por trabalhos realizados no

computador e internet ou qualquer outro tipo de intervenção que eles mesmos

utilizam em seus aprendizados.

Os alunos utilizam este ambiente como uma prótese cognitiva (Bolite Frant,

2010). A metáfora “TECNOLOGIA É PRÓTESE” propõe que o uso da tecnologia nos

permite fazer de forma diferente, forma esta que não seria possível realizar sem o

uso da tecnologia, fazendo-nos assim produzir um conhecimento diferente daquele

que produziríamos sem o uso da tecnologia.

Portanto o uso da tecnologia não apenas torna possível realizar alguma

atividade, mas também modifica a forma de agir e pensar sobre algo. Não adotamos

a tecnologia apenas como uma ferramenta facilitadora, muito mais que isto, a

tecnologia modifica e cria novas possibilidades e formas de pensamento.

Nesta pesquisa a tecnologia utilizada são os Objetos de Aprendizagem (OA).

Cabe observar que a palavra objeto utilizada tanto no contexto cotidiano quanto no

contexto acadêmico traz diversas significações. Deste modo faz-se necessário

colocar, já que concordamos com Bakhtin e outros acima citados, para nós os

objetos devem ser constituídos na e pela linguagem. Então no máximo poderíamos

falar em Objeto de Ensino – que seria utilizado e escolhido pelos professores e/ou

Objeto Para Aprendizagem (OPA) que podem ser aprimorados pelos

alunos/aprendizes.

No entanto, herdando da ciência da computação a idéia de “programação

orientada objeto” surgem os Objetos de Aprendizagem e como veremos a seguir

algumas definições que os caracterizam.

Algumas definições tratam os aspectos técnicos como a manipulação dos

objetos e armazenamentos, outras tratam os aspectos educacionais e pedagógicos.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 43

A definição mais utilizada é a de Wiley (2000) que define um OA “como

qualquer recurso digital que possa ser reutilizado e ajude na aprendizagem”. Para

nós, esta definição por ser tão ampla não caracteriza adequadamente, isto é, ela é

pouco operacional.

Uma definição bastante técnica (Downes, 20001 apud Handa, 2003) é dada

pelo Instructional Management Systems (IMS) - consórcio de especificações dos

fabricantes de softwares em que apresenta Objetos de Aprendizagem segundo a

idéia de “programação orientada objeto” e define OA como:

“um conjunto de informações que contém rotinas e estruturas de dados que interagem com outros objetos. Nos Objetos de Aprendizagem, o “objeto” serve para encapsular ou “armazenar” materiais digitais, transformando-os em módulos reutilizáveis de fácil manipulação.” (p.116).

Weller, et al. (2003) também apresentam uma definição bastante ampla para

o objeto da aprendizagem definindo-o como “a parte digital de um material didático

que aborda um tema claramente definido ou resultados de aprendizagem e tem o

potencial para ser reutilizado em diferentes contextos.”

A definição utilizado pelo Ministério da Educação e Cultura – MEC é a

seguinte:

Um objeto de aprendizagem é qualquer recurso que possa ser reutilizado para dar suporte ao aprendizado. Sua principal idéia é "quebrar" o conteúdo educacional disciplinar em pequenos trechos que podem ser reutilizados em vários ambientes de aprendizagem. Qualquer material eletrônico que provém informações para a construção de conhecimento pode ser considerado um objeto de aprendizagem, seja essa informação em forma de uma imagem, uma página HTM, uma animação ou simulação. (www.rived.mec.gov.br/site_objeto_lis.php - acesso 14/04/2009)

Embora ainda não se tenha uma definição consensual para Objetos de

Aprendizagem algumas características são comuns em muitas de suas definições.

Destaco a reusabilidade e portabilidade como duas de suas principais

características.

Em relação a reusabilidade dos Objetos de Aprendizagem, estes devem

permitir seu uso em diversas situações diferentes, não apenas para a que eles foram

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 44

inicialmente desenvolvidos, isto é, possibilitar a sua incorporação em múltiplas

aplicações, podendo serem usados em um determinado contexto e depois

reutilizados em outro contexto.

A portabilidade é a característica dos Objetos de Aprendizagem de permitir

seu uso em diversas plataformas. Para isto é desejável que eles tenham sido

projetados com padrões já consolidados e amplamente conhecidos para facilitar sua

utilização a qualquer usuário.

Observamos, mais uma vez, que um professor da rede formado em um curso

de licenciatura onde a tecnologia, quando foi abordada, aparece apenas em um uso

“imediato”, nunca aprendeu a programar; este professor, portanto, não tem

condições de sozinho reutilizar um OA.

Nesta pesquisa ao invés de OA chamaremos esses objetos disponíveis na

internet de Objeto de Ensino. Nosso Objeto de Ensino poderá ser escolhido pelo

professor para aplicação em sua sala de aula, ele compõe um cenário de

aprendizagem, pois o estudo não se limita e nem pretende que apenas com um

Objeto de Ensino tenhamos todo um processo de ensino e aprendizagem da

trigonometria.

Os Objetos de Ensino utilizados nesta pesquisa, assim como qualquer objeto

virtual ou não, que seja utilizado para compreender algo, não são apenas

ferramentas mediadoras de nossos pensamentos. Segundo Radford (2006) os

objetos que compõem o ambiente de aprendizagem são parte integrante dos

pensamentos e de como produzimos conhecimento. Nosso olhar se voltará a

emergência destes objetos no cenário elaborado.

“Uma das fontes de aquisição de saber resulta de nosso contato com o mundo material, o mundo de artefatos culturais em torno de nós (objetos, instrumentos, etc.) e que se encontra depositada a sabedoria histórica da atividade cognitiva das gerações passadas.” (Radford, 2006, p.113)

Uma das diferenças entre Objetos de Ensino e Objetos de Aprendizagem,

para esta pesquisa, é que este objeto a princípio é utilizado pelo professor em um

curso presencial. Os alunos além dos recursos tecnológicos possuem todo um

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 45

cenário de ensino e aprendizagem composto por alunos, professor, material

impresso, giz, lousa e outros componentes que fazem parte de uma aula para

alunos do Ensino Médio. Diferente dos objetos de Aprendizagem que possuem a

característica de serem utilizados principalmente em cursos de educação a distância

em um ambiente web.

Os Objetos de Ensino utilizados nesta pesquisa são reutilizações de Objetos

de Aprendizagem já existentes e disponibilizados pelo RIVED. Todavia apenas

partes destes objetos são utilizados, ou applets que foram desenvolvidos pelo

pesquisador no decorrer da pesquisa, como veremos posteriormente neste texto, na

analise os Objetos de Aprendizagem e os Applets.

Para nós, nesta pesquisa, caracterizamos Objetos de Ensino como sendo

objetos digitais utilizados em um processo de ensino e aprendizagem, onde um

professor pode se utilizar destes objetos ou de partes destes para compor um

cenário de aprendizagem de um tópico definido. Deste modo, o fantasma da

programação do OA desaparece e o professor escolhe o que e como usar um OE,

pois a programação de softwares não é uma habilidade exigida para um professor

de matemática e poucos deles saberiam como fazê-la.

2.5 - Procedimento Metodológico e desenvolvimento d a pesquisa

2.5.1 - Local e Participantes

As atividades desta pesquisa foram aplicadas em uma escola pública, situada

na periferia de Bragança Paulista, cidade do interior do estado de São Paulo que se

localiza a 80 km da capital paulista. Esta escola atende principalmente alunos de

classe sócio-econômica de baixa renda. Funciona em três períodos, sendo que no

período da manhã atende alunos do Ensino Médio, no período da tarde alunos do

Ensino Fundamental e no período noturno alunos do Ensino Médio e EJA,

totalizando aproximadamente 900 alunos. A escola possui oito salas de aulas que

são utilizadas durante os três períodos.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 46

Esta escola nas últimas avaliações externas tem apresentado desempenho

insatisfatório dos alunos, principalmente quando avaliado as competências em

matemática, segundos os critérios da Secretaria de Educação do Estado de São

Paulo.

O IDESP – Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo

é um indicador de qualidade das séries iniciais (1ª a 4ª séries) e finais (5ª a 8ª

séries) do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. Na avaliação de qualidade das

escolas, para a obtenção do valor do IDESP são considerados dois critérios, o

desempenho dos alunos nos exames do SARESP – Sistema de Avaliação do

Rendimento Escolar de São Paulo e o fluxo escolar.

A secretaria de Educação do Estado de São Paulo definiu metas de qualidade

estabelecidas a partir dos índices dos IDESPs das séries iniciais e finais do EF e do

EM. As metas de longo prazo, definidas para todas as escolas da rede estadual,

para 2030 são:

METAS DE LONGO PRAZO – 2030

4ª SÉRIE EF 8ª SÉRIE EF 3ª SÉRIE EM

7,0 6,0 5,0 Tabela 7 – Metas IDESP <http://idesp.edunet.sp.gov.br/o_que_e.asp> - acesso 28/01/2010

O IDESP 2008 desta escola é de 2,14 e a média estadual é de 2,60; em 2007

o IDESP da escola era de 2,00 enquanto que a média estadual era de 2,54. No

indicador por desempenho da escola onde se tem o valor por disciplina esta escola

possui em matemática os seguintes indicadores:

Indicador de desempenho em Matemática

2007 2008 2009

8ª Série EF 1,16 2,4242 2,5600

3º Serie EM Não avaliado 1,3492 1,4667

Tabela 8 – Indicador de desempenho IDESP

Como apresentado, o IDESP desta escola é baixo, principalmente quando

avaliado na disciplina de matemática, outro valor significativo é o baixo índice do 3º

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 47

ano do Ensino Médio, todos os valores se encontram muito longe da meta

estabelecida para 2030 e também abaixo da média estadual, caracterizando assim

seus alunos em um nível abaixo do satisfatório.

O relatório do IDESP 2009, também apresenta outra tabela que caracteriza o

conhecimento dos alunos em português e matemática desta escola, na tabela de

distribuição por nível de desempenho, apresenta 58% dos alunos do 3º ano do

ensino médio com um desempenho abaixo do básico em matemática, o que é

considerado insuficiente segundo os critérios da Secretaria da Educação do Estado

de São Paulo. Ressalto também que apenas 2% se encontram em nível considerado

adequado e no nível avançado o índice é de 0%.

Abaixo do Básico

Básico Adequado Avançado

8ª série EF Português 0,2735 0,6068 0,1197 0,0000

Matemática 0,2960 0,6400 0,0640 0,0000

3ª série EM Português 0,1702 0,5745 0,2553 0,0000

Matemática 0,5800 0,4000 0,0200 0,0000

Insuficiente Suficiente Avançado Tabela 9 – Desempenho Português e Matemática IDESP 2009

Participam desta pesquisa oito alunos escolhidos aleatoriamente visando a

possibilidade de sua participação, que ocorre fora do horário de suas aulas.

Os alunos que participaram desta pesquisa são alunos matriculados no

primeiro ano do ensino médio desta escola, no período da manhã. Nenhum destes

alunos participou de grupos de recuperação, e apresentam um desempenho médio

ou bom nas aulas regulares de matemática. Até o momento da pesquisa o

conhecimento que eles possuem de trigonometria é as razões trigonométricas no

triângulo retângulo.

Todos os encontros com os alunos são realizados na sala da coordenação da

escola, onde é disponibilizada uma mesa retangular com dois computadores. Esta

sala fica localizada de frente para o pátio da escola, sendo necessário manter a

porta fechada para que o som externo, como o intervalo dos alunos do período da

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 48

tarde, não atrapalhe o encontro com os alunos. Mas mesmo tomando estes

cuidados por alguns momentos o som externo dificulta identificação de algumas

falas da filmagem.

2.5.2 - Experimento de ensino ou Design experiment

Para desenvolver esta pesquisa adotamos a metodologia de design

experiment, que permite que o pesquisador-professor possa analisar de forma

detalhada a Matemática desenvolvida pelos estudantes através de atividades

matemáticas propostas por ele. Algumas pesquisas se referem à Metodologia de

Projeto, no entanto optamos por manter a palavra design no inglês concordando

com Drisóstes:

O termo design não tem tradução para o português. O design envolve atividades como planejar, desenhar, esboçar, projetar, esquematizar, criar, inventar e executar. (Drisostes, 2005, p.38).

Segundo Cobb, Confrey, DiSessa, Lehrer e Schauble (2002) o design

experiment tem como ideal obter uma maior compreensão da ecologia de

aprendizagem que envolve uma determinada situação; a utilização da metáfora da

ecologia se justifica pelos inúmeros fatores que cercam uma situação de

aprendizagem. Dentre os elementos que constituem esta ecologia encontramos os

problemas propostos para os alunos, a dinâmica em sala de aula, as ferramentas

disponíveis utilizadas e todo o sistema interativo que envolve vários elementos de

diferentes tipos e níveis, concebendo assim elementos e antecipando a forma como

esses elementos funcionam em conjunto para apoiar a aprendizagem.

Como a pretensão desta pesquisa é de criar um cenário de investigação para

aulas de trigonometria, para cada etapa de experimentação segue uma fase de

desenvolvimento, assim, esta metodologia parece a mais indicada.

Uma das características mais importante do design para a educação é a

responsabilidade do aluno no processo de aprendizagem, o aprendiz é um

participante ativo em todo o processo e tem responsabilidade sobre este; o objeto do

design que está sendo desenvolvido deve levar à reflexão e discussão do aprendiz.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 49

Também é importante ressaltar que nesta metodologia é fundamental a

negociação entre professor e alunos para que os conhecimentos matemáticos sejam

conjuntamente construídos não deixando com que apenas a visão do professor

quanto aos conhecimentos matemáticos seja predominante.

Outro fator importante no experimento de design é a característica do

professor-pesquisador e alunos, onde todos eles são vistos como colaboradores do

processo de design.

O design experiment sugere vários tipos de cenários em que ele pode se

desenvolver, para esta pesquisa destaco o cenário “one-on-one” (professor e aluno)

onde são realizadas várias aulas com um número reduzido de alunos, tendo como

objetivo “criar uma pequena versão de uma ecologia de aprendizagem para que

possa ser estudado em profundidade e pormenor” (Cobb & Steffe, 1983; Steffe &

Thompson, 2000).

2.5.3 – Coleta e Análise dos Dados

A coleta de dados incluiu a filmagem dos encontros com os alunos e os

materiais produzidos por eles nestes encontros. A escolha pela utilização deste tipo

de mídia para coleta de dados é pelo fato da flexibilidade que ele permite para a

análise de dois tipos de informações, auditiva e visual, onde capturamos gestos,

falas, comportamentos que apenas com as anotações do observador poderiam se

perder.

“... o vídeo supera a limitação humana de observação por ser capaz de capturar não apenas “parte do retrato integral” e é superior às notas do observador, uma vez que não envolve edição automática”. (Martin, 1999, apud Powell)

O vídeo embora tenha inúmeras vantagens sobre a observação ao vivo ou da

análise de áudios e documentos criados pelos participantes de uma pesquisa, ele

também está sujeito a problemas, Bottorff (1994, apud Powell 2004) cita três razões

pelas quais considera o vídeo incompleto:

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 50

“... a capacidade de ser seletivo devido a limitações mecânicas; a incapacidade de discernir o conteúdo subjetivo do comportamento que está sendo gravado; e, usualmente, a incapacidade de carregar o contexto histórico do comportamento capturado.”

Para a análise de dados gravações de vídeo com trabalhos escritos dos

estudantes, além do referencial teórico, é necessário o uso de algumas técnicas

para análise destes vídeos. Mesmo reconhecendo as limitações colocadas por

Bortoff (1994, apud Powell 2004) da coleta de dados através de vídeos, sua

utilização ainda oferece muitas vantagens à análise de dados. Dentre algumas

vantagens podemos citar com Powell (ibid 2004) a possibilidade da análise posterior

diminuir as interpretações antecipadas e prematuras do observador; poder rever

inúmeras vezes a mesma cena permite que acontecimentos que tenham passado

despercebido em uma análise prévia seja revisto e analisado; a flexibilidade de

visualização com recursos de parar a imagem, câmera lenta, passo a passo,

avançar vídeo, retroceder vídeo permite uma análise mais detalhada; análise

posterior dos vídeos por outros pesquisadores e não restringindo-se apenas ao

observador presente, permitindo múltiplas visões sobre o mesmo acontecimento.

A transcrição de dados de vídeo também é tarefa árdua e não existe

consenso quanto ao que devemos transcrever, o vídeo todo ou apenas eventos

críticos. A transcrição também pode se tornar difícil, pois como cita Martin (1999,

apud Powell 2004) com o videoteipe, ironicamente, pode se produzir dados demais.

Por isso alguns pesquisadores como Pirie e Martin defendem a análise dos dados

apenas trabalhando exclusivamente sobre os vídeos em vez de transcrevê-los.

Uma opção metodológica utilizada para análise de vídeos surgi com o grupo

de pesquisa no RBDIL (The Robert B. Davis Institute for Learning) em que Arthur B.

Powel propõe um modelo analítico que consiste em sete fases não lineares, que têm

por objetivo estudar o desenvolvimento do pensamento matemático em aprendizes.

As fases deste método são:

1. Observar atentamente os dados do vídeo.

2. Descrever os dados do vídeo.

3. Identificar eventos críticos.

4. Transcrever.

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 51

5. Codificar.

6. Construir o enredo.

7. Compor a narrativa.

Os vídeos nesta pesquisa são analisados da seguinte forma, primeiro a

observação dos vídeos de forma integral sem interrupções, após isto os vídeos

passam por uma segunda observação onde são levantados os eventos críticos.

Estes eventos são discutidos com outra pesquisadora e em uma terceira fase cada

evento crítico é observado cuidadosamente com a utilização dos recursos de pausa,

retroceder, passo a passo. Não há transcrição integral dos vídeos, pois isto

demandaria muito tempo e um número muito grande de informações, e como já

relatado por alguns pesquisadores, pouco eficaz. Para os pontos críticos há

transcrição facilitando e ampliando as possibilidades de análise, para posteriormente

permitir a composição das narrativas.

2.5.4 - Fases de desenvolvimento da pesquisa

Esta pesquisa está subdividida em duas fases, a primeira destinada à análise

dos objetos de aprendizagem e outros materiais disponíveis que poderiam ser

utilizados, onde percebemos a necessidade de um levantamento histórico para

complementar os materiais e elaborarmos um cenário para o ensino do círculo

trigonométrico. A segunda fase consta da implementação deste cenário junto aos

alunos e suas modificações.

Fase 1 – Análise de Materiais

Esta fase é destinada à análise dos materiais que estão disponíveis para

qualquer professor de ensino médio da rede estadual de ensino do estado de São

Paulo e a elaboração da proposta de atividade para implementá-la na segunda fase

da pesquisa.

Buscando entender melhor o que é oferecido ao professor e

conseqüentemente ao aluno iniciamos com o levantamento do histórico sobre a

trigonometria, depois nos voltamos para os livros didáticos de matemática que estão

Capítulo 2 – Fundamentação Teórico Metodológica 52

disponíveis no PNLEM 2009, dos “Cadernos do Aluno” e “Cadernos do Professor” da

Proposta Curricular do Estado de São Paulo, estes cadernos são distribuídos a

todos os alunos e professores da rede estadual de ensino de São Paulo.

Os Objetos de Aprendizagem disponíveis gratuitamente também fizem parte

desta fase. Assim são analisados os OAs que estão disponibilizados pelo RIVED,

sob o tema trigonometria. Além dos OAs estuda-se a possibilidade de uso de outros

aplicativos disponíveis na internet conhecidos como “applet”. Um applet é um

aplicativo que é executado no contexto de outro programa (como por exemplo um

web browser), um applet geralmente executa funções bem específicas. O termo foi

introduzido pelo AppleScript em 1993.

Na intenção de verificar algumas hipóteses e evidências sobre o ensino e

aprendizagem de trigonometria, que levantei, realizamos uma primeira investigação

junto ao grupo de pesquisa “Tecnologias Digitais e Educação Matemática” da

UNIBAN, formado por professores e/ou pesquisadores, onde colaboram em muito na

construção do Cenário para Investigação de trigonometria no círculo trigonométrico

como veremos no capítulo 3.

A seguir partimos para a montagem do cenário de investigação e elaboramos

a primeira atividade proposta para os alunos no primeiro encontro. As demais

atividades, também são desenvolvidas neste momento, mas elas sofrem

modificações, de acordo com o retorno dos alunos em atividades anteriores,

conforme sugere o design experiment.

Fase 2 - Implementação e Análise do Cenário

A segunda fase se destina à implementação do cenário sugerido com suas

respectivas atividades para os alunos. Neste momento realiza-se também, após

cada encontro com os alunos uma análise parcial dos resultados destes encontros e

quando necessário são feitas alterações nas atividades subseqüentes, conforme

previsto pela metodologia de Design Experiment.

Capítulo 3 – Primeira Fase 53

Capítulo 3

Primeira Fase

Capítulo 3 – Primeira Fase 54

Descrevo a 1ª fase da pesquisa onde foi realizado o levantamento histórico da

trigonometria a analise dos livros didáticos, da proposta Curricular do Estado de São

Paulo e dos OAs/Apllet´s. Também é descrito a primeira análise do grupo de

professores / pesquisadores do problema de pesquisa e levantamento de algumas

hipóteses e o desenvolvimento da primeira atividade para sua aplicação junto com

os alunos.

3.1 - História da Trigonometria

Neste tópico procuro através da história da trigonometria compreender como

surgiu a trigonometria e sua evolução até os dias atuais, buscando um suporte para

melhor analisar os materiais disponíveis, livros didáticos, Proposta Curricular do

Estado de São Paulo, OA e applets.

Em particular esta pesquisa procura entender alguns pontos relevantes para o

estudo atual da trigonometria no círculo trigonométrico, entre estes pontos destaco:

as medida de ângulo em grau na base sexagesimal e em radiano; os números

negativos, racionais e irracionais; triângulo retângulo e o círculo trigonométrico.

Segundo Caraça (2005) a origem e desenvolvimento das noções matemáticas

seguem um movimento ora por motivos pragmáticos ora dentro da própria ciência,

sempre num processo dialético.

A trigonometria também segue estes momentos citados por Caraça,

observamos seu surgimento pragmático e posteriormente temos seu

desenvolvimento dentro da própria matemática, sempre em busca da economia, do

menor esforço, facilitando os processos matemáticos que envolvem o assunto.

O homem tem tendência a generalizar e estender todas as aquisições do seu pensamento, seja qual for o caminho pelo qual essas aquisições se obtém, e a procurar o maior rendimento possível dessas generalizações pela exploração metódica de todas as suas conseqüências. (Caraça, 2005, p.9)

Este levantamento histórico da trigonometria teve como fonte inspiradora o

trabalho de Costa (1997), Cajori (2007), Kennedy (1992), Boyer (1974) além de

informações disponíveis nos sítios da internet http://www-history.mcs.st-

Capítulo 3 – Primeira Fase 55

andrews.ac.uk/HistTopics/Trigonometric_functions.html e http://ecalculo.if.usp.br

/historia/historia _trigonometria.htm.

A etimologia da palavra Trigonometria vem do grego TRI – três, GONO -

ângulo e METRIEN - medida, significando Medida de Triângulos. Trata-se, assim,

do estudo das relações entre os lados e os ângulos de um triângulo.

A origem da trigonometria é incerta, mas é anterior à era cristã, e nos remete

a séculos de história e interação humana até ser conhecida como é hoje. Sua maior

fonte motivadora e impulsionadora foi o fascínio do homem pela astronomia. Sua

relação da trigonometria com a astronomia é tão estreita que apenas no século XIII

os dois assuntos foram considerados tópicos separados.

Uma idéia primitiva da trigonometria surgiu com a invenção do relógio de sol,

os mais antigos relógios de Sol teriam surgido no Egito ou na Mesopotâmia, desde

3000 a.C, mas a China ou as civilizações Maia, Inca e Asteca também nessa época,

ou um pouco mais tarde, desenvolviam instrumentos semelhantes. As tábuas de

sombra, utilizadas para marcar as horas do dias, encontradas possuem marcações

imprecisas, não seria de grande utilidade procurar conhecimentos matemáticos mais

profundos nas seqüências numéricas demonstradas nessas tábuas.

Tanto no Egito quanto na Babilônia temos rudimentos da trigonometria que

aparecem a partir do cálculo de razões entre números e entre lados de triângulos

semelhantes, realizando estudos relativos a fenômenos astronômicos e geográficos

como, a determinação de eclipses, fases da lua, estimar equinócios, estabelecerem

calendários, distâncias inacessíveis e rotas de navegação.

Já podemos observar que o homem fazia uso das funções periódicas, mesmo

sem o formalismo matemático de hoje e também apresenta seus primeiros estudos

dos triângulos, mostrando assim um surgimento na necessidade do homem de sua

época.

Os babilônicos nos deixaram um valioso registro de sua cultura, foram

desenterrados cerca de meio milhão de placas com manuscritos, datados de 1800 –

1600 a.C.. Estas placas eram feitas de argila mole e impressas com um estilete de

junco, posteriormente estas placas eram colocadas a secar ao sol ou fornos. Deste

Capítulo 3 – Primeira Fase 56

meio milhão de placas, algumas centenas estão relacionadas a conhecimentos

matemáticos.

Nestas placas temos indícios que nos mostram que o teorema de Pitágoras já

era conhecido pelos babilônicos. A área de um círculo era dada por 3r², mas o valor

de π era dado por 3 1/8. Em placas de 1700 a.C. encontram-se tabelas de cordas no

sistema sexagesimal sumeriano, o que atualmente equivaleria ao seno. A origem do

sistema sexagesimal atribui-se ao fato de que os babilônicos utilizavam como

unidade de medida para avaliar a prata o talento valendo 60 vezes o valor e peso da

mana, e a mana valendo 60 vezes o valor do sequel. Esta razão de 1 para 60

provavelmente se estendeu para outras unidades e também os números. Acredita-

se também que foram os babilônios que fizeram a divisão da circunferência em

graus, minutos e segundos.

Como veremos a seguir os gregos mais tarde também fazem o uso da base

sexagesimal para as medidas dos ângulos, provavelmente sobre a influência

babilônica, e o uso da medida em grau se mantém como principal unidade de

medida do ângulo por muitos anos até o surgimento dos radianos.

Os egípcios nos deixaram indícios de conhecimentos em trigonometria que

aparecem no Papiro Ahmes, também conhecido como Papiro Rhind, este é o mais

extenso documento egípcio em matemática que chegou aos nossos dias, sua data é

aproximadamente 1700 a.C., embora seu conteúdo tenha sido descoberto em outra

fonte datado por volta de 3400 a.C., este papiro é conhecido como o mais antigo

manual de matemática. Nele não se encontram teoremas, mas sim algumas regras

gerais de como calcular áreas e algumas propriedades dos triângulos, trapézios e

círculos onde o π é dado por (16/9)² = 3,1604....

Capítulo 3 – Primeira Fase 57

Figura 6: Papiro Rhind, Museu de Londres. (fonte: http://www.archaeowiki.org/Image:

Rhind_Mathematical_Papyrus.jpg – acesso 10/09/2009)

Os escritores gregos como Platão, Aristóteles, Heródoto, Diódoro, Diógenes

atribuem aos egípcios à invenção das ciências matemáticas e da geometria.

Com a expansão do intercambio comercial muitos estudiosos gregos

visitaram o Egito a procura de conhecimento. Thales, Pitágoras, Cenópides, Platão,

Demócrito e Eudoxo foram alguns dos que foram ao Egito a procura de sacerdotes

egípcios para os instruírem. Trazendo assim para a Grécia conhecimento e novas

linhas de pensamento formando uma base para se começar a trabalhar.

No que se diz respeito à trigonometria, assim como diversos ramos da

matemática evoluíram gradualmente, e seu desenvolvimento está muito ligado ao

desenvolvimento da geometria. É atribuída a Thales de Mileto a introdução do

estudo da geometria pelos gregos. Foi durante seus estudos, no Egito, que ele fez

as medições das alturas das pirâmides através das sombras. Não se sabe ao certo

como ele realizou estes cálculos, acredita-se que foi comparando as razões das

sombras da pirâmide com as razões da sombra de um bastão. Outra hipótese foi a

de que, em determinado momento a sombra do bastão tinha a mesma medida da

altura do bastão, logo a neste momento a sombra das pirâmides teriam a mesma

altura de suas sombras. O mais provável é que ele tenha utilizado as duas técnicas

para medir as alturas das pirâmides.

Problemas parecidos como o de medir a altura das pirâmides, ainda são

muito utilizados em sala de aula, mudando-se apenas a pirâmide por um edifício ou

árvore. Outra utilização da trigonometria era na agrimensura, exemplos que também

Capítulo 3 – Primeira Fase 58

utilizamos atualmente. Exemplos de utilização como estas também são encontrados

na cultura chinesa.

Os historiadores consideram muito difíceis datar documentos matemáticos da

China, e acredita-se que o clássico mais antigo da matemática chinesa é “Chou Pei

Suang Ching”. Outra publicação também muito antiga é o livro de matemática “Chui

Chang Suan Shu” onde existem nove capítulos sobre a arte da matemática, datados

em torno de 1200 a.C.. Entre vários assuntos abordados, chama a atenção

problemas sobre mensuração de terras, agricultura, sociedades, engenharia,

impostos, cálculos, soluções de equações e propriedades dos triângulos retângulos.

Os gregos fizeram um estudo sistemático das relações entre ângulos ou arcos

numa circunferência e os comprimentos de suas cordas. Não se sabe ao certo se o

conceito da medida de ângulo surgiu com os gregos. O mais provável é que eles,

por contato com a civilização babilônica, tenham adotado suas frações

sexagesimais.

Pitágoras foi de extrema importância para a matemática dos gregos, foi o

fundador da escola pitagórica, que era mais do que um local para o estudo da

filosofia, matemática, astronomia e ciência natural, era uma irmandade onde seus

membros tinham condutas parecidas com as sociedades maçônicas.

A teoria dos números irracionais é creditada segundo Eudemo aos

pitagóricos, o que para época era um pensamento extremamente audacioso. Os

pitagóricos viram os irracionais como um grande mistério e guardavam esta teoria

em absoluto segredo. Consta que o primeiro a divulgar esta teoria, em conseqüência

disto, foi vítima de um naufrágio, devido a esta revelação.

Destaco neste momento a dificuldade que os matemáticos, ao longo da

história, tiveram em aceitar os números negativos e principalmente os números

irracionais. Mostra a história que estes números, muitos utilizados na trigonometria

para o Ensino Médio, tiveram muita resistência da sua existência. Será que

atualmente nossos alunos conseguem compreender o significado destes números?

Capítulo 3 – Primeira Fase 59

Hipsicles (200-100 a.C.) que deve ser o autor do décimo quarto livro de

Euclides, onde apresenta um tratado de Hipsicles sobre o Nascer dos Astros que

apresenta a divisão da circunferência em 360 graus, seguindo o modelo babilônico.

Hiparco (190-126 a.C.) foi astrônomo, construtor, cartógrafo e matemático

grego da escola de Alexandria, influenciado pela Matemática babilônica,

desenvolveu métodos para a determinação de locais na superfície terrestre e

introduziu o sistema de localização por latitude e longitude.

Ele é considerado “o pai da Trigonometria", pois desenvolveu o que deve ter

sido a primeira tabela trigonométrica, uma tábua de cordas, evidentemente, Hiparco

fez esses cálculos para usá-los em seus estudos de astronomia. Embora estas

tabelas não sobrevivam, reivindica-se que doze livros das tabelas das cordas foram

escritos por Hiparco em aproximadamente 140 a.C.. Provavelmente ele utilizou a

idéia da representação por coordenadas, anteriormente apresentada por Apolônio.

A matemática desenvolvida por Hiparco tinha forte influência dos babilônios,

acreditando que 60 era a melhor base de contagem. Assim como os babilônicos ele

também dividiu a circunferência em 360 graus, e atribuído a ele a divisão de cada

arco de 1 grau em 60 partes obtendo o arco de 1 minuto. A "Trigonometria" era

então baseada no estudo da relação entre um arco arbitrário e sua corda. Apesar da

corda de um arco não ser o seno, uma vez conhecido o valor do seu comprimento,

pode-se calcular o seno da metade do arco, pois a metade do comprimento da corda

dividido pelo comprimento do raio do círculo é justamente esse valor.

Como podemos observar o maior interesse dos matemáticos era o de

determinar o comprimento da corda de um arco e assim muitos matemáticos se

dedicaram a isto, mas hoje o comprimento da corda de um arco não é contemplado

nos currículos atuais do ensino médio, mas é um importante momento pois a partir

das cordas do círculo que a trigonometria tem seu encaminhar as razões

trigonométricas.

Ptolomeu (90-165 d.C) nasceu no Egito e foi um renomado astrônomo,

reconhecido também pelos seus trabalhos em matemática, astrologia, geografia e

cartografia. É autor da mais influente e significativa obra trigonométrica da

Antigüidade foi a Syntaxis Mathematica, obra que contém 13 livros. Este tratado é

Capítulo 3 – Primeira Fase 60

famoso por sua compacidade e elegância, e para distingui-lo de outros foi associado

a ele o superlativo magiste ou "o maior". Mais tarde na Arábia o chamaram de

Almajesto, e a partir de então a obra é conhecida por esse nome.

O Almagesto constitui os fundamentos de toda ciência astronômica utilizada

por árabes, indianos e europeus até o surgimento da teoria heliocêntrica, de Nicolau

Copérnico. O Livro I do Almagesto intitulado “Princípios da Astronomia Esférica” traz

o capítulo “Avaliação das cordas inscritas no círculo” onde descreva tabela de

cordas que diferem de meio em meio grau, com demonstrações de seus cálculos.

O objetivo de Ptolomeu era tabelar todas as cordas de meio em meio grau de

0º a 180º, o restante seria determinado por interpolação. Mas este objetivo não foi

completamente atingindo, ele não conseguiu, por exemplo, determinar a corda de

um arco de 1º com precisão, embora tenha determinado a corda de grau e meio.

Ptolomeu aproximou o valor da corda de 1º a 1,047222, não esquecendo que ele

dividia o diâmetro em 120 partes, para compararmos esta aproximação com valores

atuais podemos determinar o seno de meio grau em uma calculadora cientifica e

multiplicarmos por 120.

Assim como os babilônicos e Hiparco, Ptolomeu também optou pela divisão

da circunferência em 360 graus e o diâmetro em 120 partes, o que facilitaria seus

cálculos. Nota-se também na obra de Ptolomeu muito cuidado com os cálculos e

para evitar o embaraço das frações ele faz a opção pelo sistema sexagesimal.

Neste momento destaco que conforme sugere Caraça (2005) os matemáticos

procuram sempre facilitar os processos matemáticos e Ptolomeu não o fez diferente,

optando pelo sistema sexagesimal, as frações foram evitadas, mostrando que este

tipo de representação numérica não era a forma mais produtiva de se trabalhar.

Os hindus também deram sua contribuição para o desenvolvimento da

trigonometria, embora eles não tenha tido muito êxito em geometria na trigonometria

eles tiveram alguns avanços principalmente durante o século VI d.C..

O matemático Varaha Mihira descreve em sua obra Pañcha Siddhântikâ,

algumas interessantes passagens de trigonometria, com tabelas de cordas,

provavelmente de Ptolomeu. Mas diferente dos gregos os hindus dividiram o raio em

Capítulo 3 – Primeira Fase 61

120 partes e não em 60. O círculo também aparece dividido em quadrantes de 90

graus. Mas diferente dos gregos, para determinar a corda, eles contavam com o

seno e não com a corda toda.

Partindo do seno de 90º ter o valor igual ou raio e do seno de 30º ser metade

do seno de 90º, eles aplicando a fórmula sen² + cos² = r² determinaram o seno de

45º e 60º. Tendo os senos de 90º, 60º, 45º e 30º como pontos iniciais eles

calcularam o seno da metade destes ângulos seus senos complementares. Assim

conseguiram determinar uma tabela de senos com intervalos de 3º45’.

Entre os árabes o primeiro matemático que se destacou foi Mohammed ibn

Musa Al-Khowarizmi (790 – 840), que realizou um importante trabalho em álgebra e

aritmética, mas também foi designado pelo califa Al-Mamun a revisar as tabelas de

Ptolomeu e medir o comprimento de um grau do meridiano terrestre. As tábuas

astronômicas de Al-Khowarizmi, foram revisadas posteriormente por Maslama al-

Majrîtî, onde além da função seno, apareceria uma provável ampliação sua, a

função tangente.

Durante o século IX destacou-se na Arábia o matemático Al-Battani (850-929

d.C.) chamado de Albategnius pelos latinos, seus estudo foram de alta relevância

para a matemática e astronomia e era conhecido como o Ptolomeu de Bagdá.

Pela tradução de suas obras deu-se origem a palavra “sinus” para o nome da

função trigonométrica. A palavra árabe para “seno”, jiba foi derivada do sânscrito

jiva, que se assemelha à palavra árabe jaib, significando um recorte ou golfo, daí,

portanto, a razão da palavra latina “sinus”. (Cajori, 2007, pag. 160).

Al-Battani foi um grande estudante de Ptolomeu, mas fez grandes melhorias

para a trigonometria. Ele utilizou metade da corda para a função seno criando o

seno indiano, criou tabelas para a cotangente e a tangente. Também e atribuído a

ele a utilização do círculo de raio unitário e com isso demonstrar que a razão seno é

válida para qualquer triângulo retângulo, independentemente do valor da medida da

hipotenusa.

Outro trabalho importante entre os árabes é a obra de Nasir-Eddin (1201-

1274 d.C.), realizou uma tradução dos Elementos de Euclides fez estudos em

Capítulo 3 – Primeira Fase 62

geometria, álgebra e aritmética. Destacam-se também seus escritos em

trigonometria que pela primeira vez aparece independente da astronomia e foi

realizado com extrema perfeição que estes estudos continuaram a ser utilizados no

século XV pelos europeus, que pouco puderam alterá-los. Podemos creditar aos

árabes avanços em varias áreas da matemática, mas destaca-se a trigonometria

que foi aperfeiçoada até elevados níveis de conhecimento.

Durante o século XVI, no período da renascença, são os estudiosos alemães

e italianos que dão as melhores contribuições para a matemática. Na Alemanha se

dá o renascer da trigonometria, por Regiomontanus (1436-1476 d.C.).

Regiomontanus enfatizou o uso das tangentes e construiu tábuas

trigonométricas com maior precisão. Deixou para os estudiosos alemães o fascínio

pela trigonometria que após sua morte construíram instrumentos astronômicos

extremamente refinados que junto com suas tábuas trigonométricas obtinham alto

grau de precisão.

Em 1613 Bartolomeu Pitiscus (1561-1613 d.C.) republicou as obras de

Rgiomontanus e provavelmente foi o primeiro a usar a palavra trigonometria. Na

mesma época em que Rhaeticus (1514-1574 d.C.) usou pela primeira vez o triângulo

e fazê-lo depender diretamente de seus ângulos, foi ele também o precursor a

planejar uma tábua das secantes.

Outro trabalho relevante foi do francês François Viète (1540-1603 d.C.), que

foi um grande defensor do uso das frações decimais em vez das sexagesimais

sendo também reconhecido pelos significativos avanços quanto ao uso de símbolos

para representações matemáticas, utilizava em suas obras uma vogal para

representar as grandezas desconhecidas e uma consoante para um número ou

grandeza conhecida, o que significava uma grande inovação para a época.

Em 1579 Viète publicou Canon mathematicus seu ad triangula cum

appendicibus, onde apresentava de forma sistemática métodos para os cálculos

triângulos planos e esféricos utilizando-se das seis funções trigonométricas. Ele

estabeleceu a forma atual dos teoremas dos co-senos e provavelmente o primeiro a

usar a lei das tangentes. Usou o recurso sistemático do círculo trigonométrico e a

aplicação da trigonometria à resolução de problemas algébricos.

Capítulo 3 – Primeira Fase 63

Na Inglaterra William Oughtred (1574-1660 d.C.), juntamente com outros

matemáticos como Richard Norwood, John Speidell e outros, deram suas

contribuições para a trigonometria desenvolvendo sistemas simbólicos. Na época

ainda se tinha um sistema de simbolismo algébrico desenvolvido para a matemática,

portanto estes símbolos não foram muito utilizados pelos matemáticos da época.

Mais tarde Euler acata e desenvolve uma série de símbolos algébricos utilizados até

hoje.

Oughtred foi o inventor da régua de cálculo reta e circular e também devemos

a ele a utilização da notação π = 3,14159..., que foi usada pela primeira vez por

William Jones em 1706 e também acatado por Euler que disseminou o seu uso.

A trigonometria tem um novo marco pelas mãos de Leonhard Euler (1707–

1783 d.C.). Nenhum outro matemático o superou na produção de trabalhos

matemáticos, e muito do que usamos hoje devemos a ele.

A obra de Euler é extremamente abrangente, percorrendo quase todos os

ramos da matemática, conhecida até a época. Para ressaltar sua extrema habilidade

matemática o acadêmico francês François Arago fez o seguinte comentário: “Euler

calculava sem qualquer esforço aparente como os homens respiram e as águias se

sustentam no ar.” De fato ele mereceria muitas páginas para descrever um pouco de

sua obra, mas vou me conter a citar apenas alguns pontos que fundamentais para o

desenvolvimento da trigonometria.

Pode ser dito com justiça que Euler fez pela análise infinita de Newton e Leibniz (e por áreas importantes da Matemática) o que Euclides fizera pela geometria de Eudoxo e Teaetetus, ou o que Viète fizera pela álgebra de al-Khowarizmi e Cardano. (Boyer, 1974, p.326)

Para a trigonometria Euler deu diversas contribuições, ele a tratava como um

ramo da análise e considerava os valores trigonométricos de seno, co-seno e de

tangente como números ou razões e não mais como um segmento de reta; começou

a utilizar sistematicamente o círculo de raio um; utilizou para as funções

trigonométricas as respectivas notações sen x, cos x, tg x, cotg x.

Capítulo 3 – Primeira Fase 64

Mas mesmo Euler que realizou um trabalho muito extenso não encerrou a

história do desenvolvimento da trigonometria. No final do século XIX, surge o

radiano, com uma história bastante diferente do restante da trigonometria.

O radiano, que hoje é a unidade de medida angular do sistema internacional

(SI), tem sua origem no quando apareceu impresso pela primeira vez apenas em

1873, em um exame escrito aplicado por Thomson e posteriormente em Algebra

identified with Geometry (Londres: 1874) de Ellis.

Consta que o matemático Thomas Muir e o físico James T. Thomson,

independentemente, consideraram a necessidade de uma nova unidade de medida

angular. Sendo assim, encontram-se para discutir a necessidade e definiram o nome

para a nova medida para os ângulos, criando o radian (radiano), pois os estudiosos

discutiam uma "expressão" do ângulo em termos de π, que primeiramente foi

chamada "π-medida", "circular" ou "medida arcual". Nenhum autor explica por que

fizeram uso dessa unidade, o que parece justificar a nova unidade de medida talvez

tenha sido a simplificação de fórmulas matemáticas e físicas, especialmente as

derivadas e integrais de funções trigonométricas.

Destaco que durante quase toda a história, a unidade de medida do ângulo

como grau, dividindo a circunferência em 360 partes, foi a melhor maneira de

trabalhar com a trigonometria. O radiano que surgiu muito mais tarde nasce da

necessidade de facilitar cálculos mais avançados.

Eu acredito que esta dupla maneira de se medir um ângulo é um fator

dificultador de seu aprendizado, sendo utilizada aleatoriamente nas atividades

propostas nos livros didáticos. Também acredito que o grau é uma medida mais

amigável para quem esta iniciando seus estudos em trigonometria. Sendo assim no

decorrer da pesquisa houve a preocupação, com as atividades propostas, de utilizar

inicialmente apenas medidas em graus e posteriormente introduzir as medidas dos

arcos em radianos.

Percebemos também que a trigonometria, tanto no seu uso como na sua

forma, modificou-se muito de sua origem até os dias atuais. As aplicações atuais das

funções trigonométricas não lembram as primeiras aplicações de Thales, quando

media as pirâmides.

Capítulo 3 – Primeira Fase 65

Se é fácil criar problemas, para nossos alunos, parecidos como o das

sombras das pirâmides, para procurar concretizar o conceito das razões dos lados

do triângulo, esta mesma facilidade não se encontra para justificar o uso das

funções trigonométricas, mesmo sabendo que ela é utilizada na física, na mecânica,

acústica e em muitas áreas da engenharia. Como percebemos no rumo da história

da trigonometria, depois que a trigonometria teve uma história independente da

astronomia, seu desenvolvimento foi dentro da própria matemática, ou em cálculos

mais avançados de física.

Podemos notar que algumas dificuldades encontradas hoje no aprendizado

da trigonometria, também foram problemas para os matemáticos anteriores, só que

hoje eles já nos deram as repostas. Foram séculos de história e desenvolvimento e

cabe a nós hoje propagar estes conhecimentos a nossos alunos. Acredito que a

dúvida seja quais conhecimentos e de forma devemos apresentá-los aos nossos

alunos.

3.2 - Análise dos livros didáticos / Proposta Curri cular SP

Para entender melhor como é tratado o tema trigonometria no Ensino Médio,

faço neste capítulo, uma avaliação de alguns dos livros didáticos aprovados pelo

MEC que participaram do PNLEM 2009. Também faço uma análise da Proposta

Curricular do Estado de São Paulo apresentada em 2008 para a rede estadual de

ensino e atualmente em vigor.

Para a proposta pedagógica analiso o “Caderno do Professor” e o “Caderno

do Aluno”, referentes ao 1º Bimestre de 2009 do 2º ano do Ensino Médio e também

referente ao 4º Bimestre de 2009 da 1º série do Ensino Médio.

Estes cadernos foram escolhidos, pois a Proposta Curricular do Estado de

São Paulo localiza no 4º bimestre do 1º ano do Ensino Médio o tema “Razões

trigonométricas nos triângulos retângulos” e “Resolução de triângulos não

retângulos: lei dos senos e lei dos co-senos” e para o 2º ano do Ensino Médio

propõe para o 1º bimestre o tema “Trigonometria: Fenômenos periódicos; Funções

trigonométricas; Equações e inequações; Adição de arcos”. Além de estar presente

Capítulo 3 – Primeira Fase 66

no currículo do Ensino Médio, a Proposta do Estado de São Paulo também trabalha

com Razões Trigonométricas no 4° Bimestre da 8ª Sér ie do Ensino Fundamental.

De maneira geral os livros didáticos dedicam em média 13% de suas páginas

para a trigonometria, o que sugere um trabalho médio de 4 meses ou dois bimestre

de todo ensino médio dedicado a este tema. Segue uma tabela sintética sobre

alguns aspectos analisados nos livros.

Livro Didático Volumes Total de Páginas

Páginas dedicadas a trigonometria / %

Tópico

Matemática Completa

Giovanni & Bonjorno

3

Vol.1 – 400

Vol.2 – 384

Vol.3 – 400

Total – 1184

Vol.1 – 65 / 16%

Vol.2 – 69 / 18%

Vol.3 – 0 / 0%

Total- 134 / 11%

História: Origem da trigonometria e utilização de razões trigonométricas no antigo Egito.

Uso da Calculadora.

Instrumentos de medição de ângulos.

Problemas do tipo sombra.

Ciclo Trigonométrico, resolução pela álgebra.

Matemática Ensino Médio

Katia Stocco Smole – Maria Ignez Diniz

3

Vol.1 – 432

Vol.2 – 480

Vol.3 – 352

Total – 1264

Vol.1 – 125 / 29%

Vol.2 – 62 / 13%

Vol.3 – 12 / 3%

Total -199 / 16%

Uso da Calculadora.

Elos da Matemática com a História, música, topografia, arte e astronomia.

Instrumentos de medição de ângulos.

Problemas do tipo sombra.

Ciclo Trigonométrico, resolução pela álgebra.

Matemática

Dante 1 504 52 / 10%

Importância histórica.

Desafios em equipe.

Problemas do tipo sombra.

Ciclo Trigonométrico, resolução pela álgebra

Matemática aula por aula

Xavier & Barreto

3

Vol.1 – 416

Vol.2 – 400

Vol.3 – 336

Total – 1152

Vol.1 – 78 / 19%

Vol.2 – 81 / 20%

Vol.3 – 0 / 0%

Total – 159 / 14%

História: Origem da trigonometria e utilização de razões trigonométricas no antigo Egito.

Problemas do tipo sombra.

Contextualização em fatos científicos e tecnológicos.

Ciclo Trigonométrico, resolução pela álgebra.

Matemática

Manoel Paiva 1 551 72 / 13%

História: Origem da Trigonometria.

Problemas do tipo sombra.

Contextualização em fatos astronômicos

Ciclo Trigonométrico, resolução pela álgebra.

Matemática e suas 3 Vol.1 – 312 Vol.1 – 107 / 34% História: Origem da trigonometria.

Capítulo 3 – Primeira Fase 67

tecnologias

Angel Panadés Rubió – Luciana Maria Tenuta de Freitas

Vol.2 – 224

Vol.3 –272

Total – 808

Vol.2 – 0

Vol.3 – 0

Total – 107 / 13%

Problemas do tipo sombra.

Ciclo Trigonométrico, resolução pela álgebra.

Tabela 10 – Análise Livros Didáticos

A importância dada a este tema fica nítida não apenas pelas páginas

dedicadas a ele nos livros didáticos como também na Proposta do Estado de São

Paulo também dedica um bimestre inteiro do 1° e do 2° ano para a trigonometria.

Os livros didáticos analisados apresentam uma seqüência parecida no trato

da trigonometria, de modo geral apresentam primeiro a trigonometria no triângulo

retângulo, normalmente aplicada na 1ª Série, seguido da trigonometria no ciclo

trigonométrico e as funções trigonométricas, que são introduzidas na 1ª Série e

aprofundadas na 2ª Série.

A Proposta do Estado de São Paulo também segue este padrão, tendo como

diferencial a abordagem do tema, pois esta apresenta os fenômenos naturais

periódicos como tema norteador para a introdução das funções trigonométricas, este

enfoque não se apresenta em nenhum livro didático analisado.

Quanto aos livros didáticos analisados, todos apresentam algum contexto

histórico, quase sempre mencionando a origem da trigonometria, a origem da

palavra trigonometria e algumas utilizações de razões trigonométricas na

antiguidade. Todos os fatos históricos apresentados nestes livros estão reportados a

trigonometria no triângulo retângulo. Quando se trata da trigonometria no círculo

trigonométrico e suas funções nenhum fato histórico é apresentado, assim como

também não é contextualizado o uso destas funções. Como já mencionado no

levantamento histórico esta falta de contextualização em situações reais se deve,

talvez ao fato que a evolução das funções trigonométricas ter ocorrido dentro da

própria matemática e sendo aplicadas em situações mais avançadas da física, ou

seja que depois de seu surgimento pragmático, desenvolveu-se dentro da própria

matemática, seguindo os três momentos citados por Caraça: surgimento pragmático,

desenvolvimento dentro da própria matemática e a busca da economia, ou seja,

facilitar os processos matemáticos que envolvem o assunto.

Capítulo 3 – Primeira Fase 68

Os problemas apresentados pelos livros didáticos, quando tratam a

trigonometria no triângulo, são em sua maioria variações dos problemas envolvendo

a sombra de um objeto e os ângulos do triângulo formado pela sombra e o objeto.

Na tentativa de contextualizar o conteúdo matemático com situações que podem ser

pertinentes ao cotidiano do aluno os livros didáticos utilizam-se de argumentos

quase sempre superficiais a realidade do aluno, como havia detectado Arcavi que

enfatiza:

“É muito comum afirmar que todo currículo em Matemática deve conter problemas realistas que permitam usar instrumentos matemáticos para resolver situações da vida diária. De fato, encontramos este tipo de problema em quase todos os livros-texto, porém na maioria das vezes uma observação crítica dos mesmos revela que muitos deles são apenas disfarces para os alunos fazerem mais exercícios e sua conexão com o real é totalmente superficial. Desta maneira, a metamensagem desses problemas leva o aluno a perceber a atividade matemática como algo esotérico e artificial.” (Arcavi, 2000, p.90)

Nos Livros “Matemática Completa de Giovanni & Bonjorno”; “Matemática aula

por aula de Xavier & Barreto Matemática” e “Matemática Ensino Médio de Katia

Stocco Smole – Maria Ignez Diniz”, encontramos recortes falando sobre

instrumentos de medição de ângulos como o astrolábio, grafômetro e teodolito,

alguns citam a utilização da trigonometria na agrimensura. Mas estes recortes

contextualizando a importância da trigonometria são pouco explorados nos

exercícios e problemas encontrados nesses livros, que dedicando mais espaço para

a sistematização de resoluções de problemas relacionados à trigonometria no

triângulo retângulo.

Os livros didáticos não apresentam contextualização da trigonometria no ciclo

trigonométrico e suas funções. Pouco se encontra sobre fatos históricos, onde se

aplica ou como chegamos a necessidade das funções trigonométricas.

Segundo Weber (2005) a trigonometria é muito valorizada nos cursos técnicos

de mecânica, eletricidade e eletrônica, mas em nenhum momento suas aplicações

aparecem nos livros didáticos.

Revisitando os livros que utilizei em minha graduação em Engenharia

Mecânica, notei que nos livros de “Mecânica Vetorial para Engenheiros: Estática”

dos autores Beer e Johnston (1990) e “Mecânica Vetorial para Engenheiros:

Capítulo 3 – Primeira Fase 69

Cinemática e Dinâmica” dos autores Beer e Johnston (1990) o uso da trigonometria

é constante. Era também constante o uso das funções trigonométricas nas aulas de

eletricidade e de eletrônica. É fato que os cursos de engenharias utilizam-se muito

da trigonometria, mas isto sequer é citado nos livros didáticos que analisei ou até

mesmo pela proposta curricular do Estado de São Paulo.

Outro fato que me chama a atenção nos livros didáticos que analisei é a

valorização de exercícios e nestes das resoluções algébricas, enquanto resoluções

geométricas são bem menos solicitadas ou até inexistentes.

Sugestões para o uso de softwares de geometria dinâmica ou aplicativos

computacionais sequer são citados em qualquer um dos livros didáticos. Na

Proposta Curricular do Estado de São Paulo existe uma atividade onde é sugerido o

uso de plotadores de gráficos para a comparação das variações gráficas das

funções seno e cosseno.

A Proposta Curricular do Estado de São Paulo nos mostra uma perspectiva

diferente daquelas dos livros didáticos. A Proposta é estruturada em cadernos

bimestrais, e, ao longo do bimestre, as atividades são distribuídas em quatro

situações de aprendizagens apresentadas, que, ao serem desenvolvidas pelos

alunos procuram levar a compreensão do tema proposto.

Cada situação de aprendizagem possui um tema gerador no qual são

desenvolvidas as atividades propostas para os alunos. Este é o grande diferencial

da Proposta Curricular do Estado de São Paulo, onde para a trigonometria são

valorizados os fenômenos periódicos da natureza, como a sombra de uma estaca

durante o decorrer do dia e os movimentos das marés. Embora eu também

considere interessante a associação dos movimentos das marés como fenômeno

periódico, será que para os alunos do interior, onde muitos deles nunca viram o mar,

esta é uma situação significativa para eles?

Um exemplo da diferença entre os livros didáticos analisados e a Proposta

Curricular do Estado de São Paulo é o modo como tratam o mesmo tema, neste

exemplo a medida dos arcos em radianos. Os livros didáticos definem o que é um

radiano e após isto sugere a conversão de graus para radianos ou vice versa,

através de uma regra de três. A Proposta Curricular do Estado de São Paulo, tenta

Capítulo 3 – Primeira Fase 70

demonstrar que uma semi-circunferência mede pouco mais de três radianos, e

depois apresenta que ela mede π radianos. No lugar de propor a conversão de graus

para radianos ela propõem exercícios nos quais o aluno é levado a medir em

radianos pelo fracionamento da semi-circunferência, ou seja, medindo arcos da

circunferência em frações de π radianos.

Sem dúvida a Proposta Curricular do Estado de São Paulo tenta

contextualizar com muito mais intensidade a utilização da trigonometria, mas como

ela não é uma seqüência didática e não tem a pretensão de esgotar o assunto,

assim muitos dos conhecimentos desejáveis para o desenvolvimento das atividades

propostas necessitam de um elo entre o livro didático e a proposta, o que fica por

conta do professor.

Um ponto importante encontrado no Caderno do Aluno são as várias

atividades de construção de gráficos para verificação da periodicidade, pouco

comum nos livros didáticos que apresentam apenas os gráficos das funções já

prontos.

Podemos observar que os livros didáticos, assim como na história da

trigonometria, apresentam para a trigonometria no triângulo retângulo, situações

práticas e contextualização, muito parecida com os problemas que os matemáticos

gregos já nos apresentavam, estudos como o de Thales de Mileto, com as medições

das alturas das pirâmides no Egito através das sombras ainda se apresenta em

todos os livros didáticos analisados, muitas vezes modificando apenas de pirâmides

para edifícios.

Também observamos que, assim como nos livros didáticos, não se apresenta

contextualização em situações práticas para os estudos das funções

trigonométricas.

A Proposta Curricular do Estado de São Paulo, na busca da contextualização

das funções trigonométricas, também traz da história sua referencia, e apresenta os

fenômenos periódicos da natureza sua primeira contextualização, assim como os

primórdios da trigonometria, as relações com a sombra e o movimento entre a Terra

e o Sol, introduzem os primeiros estudos das funções trigonométricas.

Capítulo 3 – Primeira Fase 71

Não foi encontrado em nenhum livro didático analisado assim como na

Proposta Curricular do Estado de São Paulo e também nos OA´s do RIVED que

foram analisados, uma justificativa prática para o uso das funções trigonométricas,

mesmo sabendo que ela é utilizada na física, na mecânica, acústica e em muitas

áreas da engenharia.

3.3 - Análise dos OAs – Objetos de Aprendizagem / A pllet

Neste capítulo faço uma descrição e análise de dois OAs – Objetos de

Aprendizagem, disponibilizado pelo RIVED, o primeiro OA será “O Mundo da

Trigonometria” e o segundo “Trigonometria com Molas”.

Destaco em primeiro lugar algumas características do RIVED, em seu sítio na

internet encontramos vários OAs que podem ser localizados de acordo com o nível

de ensino e a disciplina, além de um filtro, possibilitando a busca por palavras

chaves.

Quando definido o nível de ensino como “Ensino Médio” a disciplina

“Matemática” e palavra chave “Trigonometria” o RIVED nos disponibiliza três OAs.

Todos os OAs apresentam uma tela padrão com informações inicias, conforme

mostra a figura 7, ele também oferece um “Guia do Professor” detalhando como este

OA pode ser utilizado pelo professor com seus alunos. Outro item importante é a

opção “Comentar” onde os usuários do OA podem enviar suas sugestões ou críticas

para o RIVED, possibilitando assim o desenvolvimento e melhoria destes OAs.

O Guia do Professor de cada OA mostra os objetivos do software, os pré-

requisitos que os alunos deverão possuir, o tempo previsto para as atividades

propostas e os procedimentos que se deve ter em sala de aula e no ambiente

computacional.

3.3.1 - Objeto de aprendizagem “Mundo da Trigonomet ria”

O objeto de aprendizagem “Mundo da Trigonometria” é destinado a trabalhar

com as funções seno, cosseno e tangente. Ele apresenta as três funções no círculo

trigonométrico, possibilitando seu movimento em até duas voltas no círculo

trigonométrico.

Capítulo 3 – Primeira Fase 72

Figura 7: Tela de abertura para acesso ao OA – “Mundo da Trigonometria”

Neste OA devo destacar algumas características quanto a seu

funcionamento. Quando acessado sua tela de abertura nos mostra uma animação

com imagens e frases nos sugerindo o uso da trigonometria no cotidiano, as

imagens são de descida em botes a cachoeiras, lances de jogos de futebol

sugerindo o movimento da bola e jogos de sinuca.

As imagens são muito bonitas e entendo a tentativa do OA de mostrar aos

alunos o uso da trigonometria, mas será que realmente existe uma relação da

trigonometria com estas sugestões? Algum jogador de sinuca ou de futebol realiza

algum cálculo para realizar suas jogadas, antes de dar sua tacada ou chutar uma

bola? Não acredito que possamos ter resultados favoráveis, na tentativa de

concretizar o uso da matemática, utilizando exemplos de uma pseudo matemática

do cotidiano. Nestes exemplos citados, talvez o conhecimento matemático possa ser

utilizado para a criação de um software de jogo de sinuca ou jogo de bilhar, mas no

cotidiano do aluno estes exemplos eu acredito que não são muitos significativos.

Depois da abertura temos uma tela de introdução explicando como funciona o

software “Mundo da Trigonometria” e qual conteúdo ele possui, ressaltando a

necessidade de conhecimentos prévios com a seguinte mensagem “Mas

ATENÇÃO!!! Para o bom uso do módulo é importante que você já tenha visto em

sala de aula os conceitos aqui abordados”. Como todos os OAs oferecidos pelo

RIVED em seu guia do professor ele apresenta quais os conhecimentos prévios que

os alunos devem possuir para o seu uso.

Capítulo 3 – Primeira Fase 73

No menu nomeado de Noções Básicas, o OA apresenta alguns conceitos

fundamentais da trigonometria, com uma breve introdução, um pouco de história da

trigonometria e também são definidos e apresenta arcos côngruos e o círculo

trigonométrico.

Até este item este OA poderia ser substituído por algum material impresso,

mas os itens a seguir, que serão as partes deste OA, que iremos aproveitar e

transformá-lo em um Objeto de Ensino, são mais interessantes e oferecem uma

abordagem dinâmica no círculo trigonométrico. O que vai ao encontro de nossa

hipótese, de que existe uma diferença entre usar um material impresso que é

estático e um objeto virtual dinâmico.

Chamo a atenção neste ponto para o movimento circular oferecendo uma

leitura linear, ou seja, ao mesmo tempo o aluno deverá observar o ponto que se

move sobre a circunferência para determinar o ângulo ou comprimento do arco e

outro ponto que se movimenta sobre o eixo dos senos e cossenos para determinar a

razão trigonométrica.

Como veremos os dois movimentos coordenados/sincronizados na tela, é

nossa hipótese que tal representação venha a enriquecer o domínio fonte dos

estudantes como ocorreu em uma pesquisa com sensores e calculadoras gráficas

(para maiores detalhes ver Bolite Frant, 2009b) (SIPEM).

Seguimos este OA com as funções seno, cosseno e tangente que são

desenvolvidas em cinco passos. Para a função seno eles se apresentam da seguinte

maneira.

• Apresentação do Círculo Trigonométrico; (fig.8)

• Localização de um ponto P sobre o círculo; (fig.9)

• Determinação do ângulo formado do centro do círculo até o ponto na

circunferência; (fig.10)

• Projeção ortogonal do ponto P sobre o eixo y; (fig.11)

• Determinação do valor do seno. (fig.12)

Capítulo 3 – Primeira Fase 74

Figura 8: Círculo Trigonométrico

Figura 9: Localização de um ponto P sobre o círculo

Capítulo 3 – Primeira Fase 75

Figura 10: Determinação do ângulo

Figura 11: Projeção ortogonal do ponto P sobre o eixo y

Capítulo 3 – Primeira Fase 76

Figura 12: Determinação do valor do seno

As demais funções seguem o mesmo padrão de apresentação. Logo após a

definição da função seno no círculo trigonométrico, temos a construção da função y

= sen x. Neste momento é solicitado para que o usuário do sistema digite um ângulo

entre -720º e 720º e observe a linha construída no plano cartesiano. Ressalto que

embora se peça para digitar o ângulo em graus o plano cartesiano apresentado para

a construção do gráfico da função apresenta o ângulo em radianos. Como já

observado também nos livros didáticos existe uma alternância entre o uso de graus

e radianos, sem nenhuma justificativa aparente. Como também podemos observar

na imagem da fig.14, ele apresenta em uma mesma tela a unidade de medida para

um ângulo em graus e radianos e ainda para os radianos apresenta uma

representação decimal e outra em forma de fração.

Capítulo 3 – Primeira Fase 77

Figura 13: Tela do gráfico da função seno

Depois da definição da função seno no círculo trigonométrico e construção do

gráfico da função y = sen x , o OA propõe uma atividade que consiste em definir o

sentido horário ou anti-horário no círculo trigonométrico e movimentar com o mouse

o ponto P sobre o círculo observando a construção do gráfico da função y = sen x.

As construções dos gráficos e atividades propostas para as funções cosseno

e tangente seguem também o mesmo padrão da função seno.

Por último é apresentado um jogo de sinuca para a aplicação da

trigonometria. Neste jogo encontramos uma incoerência com as atividades

trabalhadas anteriormente, pois o jogo apresenta apenas a necessidade de

conhecer como calcular as razões no triângulo retângulo.

Com o desenho de parte da mesa de bilhar (fig.15), sugere um triângulo

retângulo fornecendo os valores dos catetos e solicita que o usuário calcule o valor

do ângulo α e depois o valor da hipotenusa.

Neste jogo se o usuário simplesmente clicar sobre o botão que calcula o

ângulo e depois clicar sobre o botão “Dar Tacada”, a bola se movimenta até a

caçapa e apresenta o resultado da hipotenusa. Portanto o jogo além de não

apresentar ligação com as atividades do círculo trigonométrico apresentadas

Capítulo 3 – Primeira Fase 78

anteriormente o também não exige do usuário nenhuma interação com algum

conhecimento de trigonometria que se tenha apresentado no OA.

Figura 14: Tela do jogo do OA “Mundo da Trigonometria”

Apenas parte deste OA foi utilizado nesta pesquisa, pois conforme foi

sugerido nesta pesquisa, este OA- objeto de aprendizagem foi utilizado como OE –

objeto de ensino. Assim podemos dividir o OE em duas partes, a primeira que

poderia ser substituída por algum material impresso ou livro didático onde utilizamos

a tela de abertura, sua contextualização histórica e as páginas onde se apresentou

os conceitos de trigonometria no círculo trigonométrico.

A segunda parte deste OE é composta pelos recursos dinâmicos fornecidos

por ele, assim as telas de onde apresentam a definição das funções seno e cosseno

no círculo trigonométrico e as telas onde apresentam os gráficos das funções seno e

cosseno, onde os alunos podem interagir, completam a segunda parte deste OE.

O jogo de bilhar apresentado no final do AO “Mundo da Trigonometria” não foi

utilizado, pois para nós se trata de exercícios e como sugere Skovsmose (2008)

para a criação de um cenário de investigação devemos substituir os exercícios por

situações onde os alunos possam investigar a matemática, portanto é na utilização

Capítulo 3 – Primeira Fase 79

da segunda parte deste OE que temos a possibilidade de criação deste cenário de

investigação, mesmo porque somente quando e se os alunos assumirem o papel de

investigadores é que realmente este cenário irá existir.

3.3.2 - Objeto de aprendizagem “Trigonometria com M olas”

O objeto de aprendizagem “Trigonometria com Molas” apresenta os conceitos

relacionados a funções trigonométricas através do movimento de vai e vem que a

mola realiza após fixarmos um peso em sua extremidade e puxá-lo para baixo a uma

certa distância. Este OA é indicado no guia do professor, para trabalhar com os

alunos a Teoria do Movimento Harmônico Simples .

Este objeto é composto de duas atividades, a primeira oferece um peso

pendurado em uma mola e na segunda atividade temos dois pesos pendurados em

duas molas com movimentos independentes.

Na primeira atividade é apresentado ao usuário um peso preso em uma mola

e o plano cartesiano com o eixo x representando o tempo e o eixo y representado a

altura do peso em relação a um ponto inicial. Quando acionado o botão para iniciar a

animação este peso segue um movimento contínuo para cima comprimindo a mola

até sua altura máxima e depois este peso desce até um ponto mínimo esticando a

mola. Acompanhando o movimento do peso no plano cartesiano forma-se o gráfico,

da altura da mola pelo tempo do movimento. Nesta primeira atividade faço algumas

observações, primeiro o eixo do tempo utiliza uma escala em radianos e não uma

escala com alguma unidade de medida de tempo. Segundo, embora o peso se

localize no ponto inicial zero, seu gráfico inicia do ponto 10 e o eixo que representa a

altura da mola não possui nenhuma unidade de medida.

Capítulo 3 – Primeira Fase 80

Figura 15: Tela da atividade do OA “Trigonometria com Molas”

Após a manipulação e observação o OA sugere a seguinte atividade: “Caro

aluno, após a manipulação e interação com o objeto, tente explicar a relação do

movimento da mola com o gráfico. Discuta com seus colegas e faça um relatório.”

Para direcionar o trabalho dos alunos o OA oferece algumas dicas, são elas:

a) Qual é o período da função, ou seja, em qual instante o gráfico da função começa

a se repetir? Explique o que isto significa. (Dado: ω = 4 e T = ωπ2

)

b) Segundo o gráfico, quantas vezes o movimento se repete?

c) Qual é a freqüência do movimento? Explique o que isto significa. (Dado: f = 1/T)

d) Qual é a amplitude do movimento, ou seja, qual é o deslocamento máximo e

mínimo que a mola faz em relação à origem?

Figura 16: Tela das questões da atividade do OA “Trigonometria com Molas”

Capítulo 3 – Primeira Fase 81

Na atividade 2 existem duas molas com pesos, o usuário determina a

amplitude do movimento de cada mola e observa a construção do gráfico. Nesta

segunda atividade não existe uma escala de tempo no eixo x e a amplitude pode ser

definida de 0 a 6, novamente sem escala de medida.

Após a manipulação e observação o OA sugere a seguinte atividade: “Caro

aluno, após a manipulação e interação com o objeto, tente explicar a relação entre

as duas molas com amplitudes diferentes. Discuta com seus colegas e faça um

relatório.”

Novamente são oferecidas para direcionar o trabalho dos alunos algumas

dicas, são elas:

a) Qual é a amplitude da mola Amarela? E da Vermelha?

b) As duas molas alcançam os extremos no mesmo instante? Discuta com seus

colegas.

Este OA apresenta sempre exercícios para que os alunos resolvam, como a

resolução de exercícios não é a maneira como pretendemos construir um cenário de

investigação, para a sua utilização como OE a abordagem deverá ser diferente da

proposta. No lugar das perguntas objetivas que o OA apresenta como “Qual é...?”,

“quantas...?” deverão ser substituídas por perguntas ou desafios do tipo “Por que

isto?”.

Figura 17: Tela da atividade 2 do OA “Trigonometria com Molas”

Capítulo 3 – Primeira Fase 82

Fazendo uma comparação com outros OAs oferecidos pelo RIVED o OA

“Trigonometria com Molas” segue o padrão da maioria dos OAs, são softwares de

utilização bastante simples, baseados em animações seguidos de sugestões de

atividades. Neste tipo de objeto é comum que o usuário explore suas possibilidades

antes mesmo de fazer uma leitura de suas instruções.

O OA “Mundo da Trigonometria” apresenta um padrão diferente, se

assemelhando a uma página de internet, com muitas informações apresentadas em

textos exigindo do usuário a leitura de suas páginas para o uso.

Quanto a linguagem utilizada nos dois objetos, podemos dizer que é muito

parecida com as encontradas nos livros didáticos, mas o fato de poder oferecer uma

dinâmica nos movimentos de construção dos gráficos e manipulação do círculo

trigonométrico, temos a hipótese que estes objetos podem auxiliar na aprendizagem

dos alunos, pois conforme já apresentado por Blackett e Tall (1991, apud Weber

2005) e Costa (1997) a utilização de recursos computacionais colaboraram para a

construção de conhecimentos em trigonometria em participantes de suas pesquisas.

Algumas instruções encontradas nos OAs como a “movimente o ponto P

sobre o círculo” também são utilizadas pelo professor em sala de aula quando utiliza

giz e lousa ou o livro didático, mas ele necessita modificá-la um pouco e diz “imagine

o ponto P se movimentando pelo círculo”. Com a utilização dos OAs o aluno não

necessita imaginar ele pode realmente ver este movimento e mais ele mesmo pode

manipular este movimento. Acredito que esta interação do aluno com os OAs

colabore com sua aprendizagem.

3.3.3 – Applets

Durante a aplicação das atividades no segundo encontro com os alunos, onde

fizeram o uso do OE “Mundo da Trigonometria”, verificamos a necessidade de

algumas modificações nos OAs disponíveis.

Para os eixos do seno e cosseno no círculo trigonométrico pereceu

necessário a criação de uma escala decimal, inexistente no OA “Mundo da

Trigonometria”, também observamos que em um primeiro momento a apresentação

Capítulo 3 – Primeira Fase 83

do gráfico da função seno ou cosseno junto com a primeira experiência com o

círculo trigonométrico pareceu inadequada, pois os alunos estavam com muitas

informações novas e simultâneas para serem compreendidas, e como já sugerido

por Lakoff e Núnez (2000) a compreensão do círculo trigonométrico é complexa.

Assim buscou-se algum applet para auxiliar nas dificuldades encontradas

pelos alunos. Após uma busca minuciosa pela internet decidi desenvolver um apllet

com as características que no momento apresentavam-se importante. Isso foi feito

com a utilização do software GeoGebra, que se trata de um software livre disponível

no sitio www.geogebra.com.br.

Nesta pesquisa iremos tratar um applet também como um Objeto de Ensino

(OE), pois entendemos que ele também pode ser utilizado pelo professor como

ferramenta para sua aula e este objeto de ensino em conjunto com as atividades ou

outras ferramentas proposta pelo professor pode gerar um cenário de

aprendizagem.

Através do software GeoGebra foi desenvolvido um círculo trigonométrico

com algumas características não encontradas nos OAs e apllet´s pesquisados. Entre

as principais características estão à visualização de uma escala decimal no eixo dos

senos e cosseno, maior destaque para o triângulo retângulo formado pelo raio do

círculo (hipotenusa) e as projeções do seno e cosseno (catetos), destaque ao arco e

sua medida em graus e radianos, criação de uma escala no eixo x em graus e

também em radianos, exibição do gráfico da função somente quando solicitado.

Este apllet funciona da seguinte maneira, sobre o círculo trigonométrico

encontre-se um ponto B, onde pode ser movimentado por toda a circunferência. Um

segmento de reta liga o ponto O ao ponto B, tendo assim o segmento OB como o

raio da circunferência. Sobre a circunferência existe o ponto A na posição de zero

graus, assim o arco AB é destacado com a cor roxa e área formada pelos pontos

delimitados pelo ângulo AOB também é diferenciada pela cor roxa em um tom mais

claro. O ângulo AOB também está representado pela letra grega α.

Para representar o valor do seno existe um segmento de reta perpendicular

ao eixo dos cossenos (eixo x), ligando o ponto B sobre a circunferência a este eixo,

Capítulo 3 – Primeira Fase 84

a projeção deste segmento de reta é destacada sobre o eixo dos senos com um

vetor na cor vermelha indicando o valor do seno do arco AB.

O eixo dos senos possui uma escala decimal com incremento de um décimo

para facilitar a leitura dos valores do seno, logo sobre o círculo encontra-se a medida

do arco AB ou ângulo α, esta medida se apresenta em graus e radianos, os valores

em radiano são mostrados em uma escala decimal. Embora tivesse o desejo de que

os valores em radianos fossem apresentados na forma fracionária em uma

representação do tipo “a/b.π rad”, a limitação do software utilizado, neste caso o

GeoGebra, não permitiu esta opção.

Outro acréscimo neste apllet foi a opção de visualização do gráfico da função,

apenas quando selecionado a opção “visualizar gráfico”, neste caso um cuidado que

se teve foi quanto a escala utilizada no eixo x, onde foi representado os valores em

graus e radianos e para a escala do eixo y foi utilizado a mesma escala do círculo

trigonométrico, portanto a medida utilizado pelo raio da circunferência é a mesma

medida representada para o seno igual a uma unidade.

3.4 - Primeira investigação junto a um grupo de pro fessores/ pesquisadores

Foi discutido com grupo de pesquisa de “Tecnologias Digitais e Educação

Matemática” da UNIBAN algumas evidências e algumas hipóteses sobre o ensino e

aprendizagem de trigonometria e também foi apresentado o OA “Mundo da

Trigonometria” oferecido pelo RIVED.

Entre as evidências e hipótese destacou-se:

- Números irracionais, frações e números decimais – Apresentei ao grupo

que os livros didáticos trabalham indistintamente com frações ou números decimais

e também é muito comum encontrar notações de todos os tipos em um único

exemplo ou exercício de trigonometria nos livros didáticos.

O grupo de professores observou que pela primeira vez os alunos do Ensino

Médio iriam lidar com uma quantidade muito grande de números irracionais e

acreditando que este é um fator complicador, sugere que as primeiras atividades

Capítulo 3 – Primeira Fase 85

deverão trazer apenas os números decimais, o que me parece ser mais familiar aos

alunos.

- Graus ou Radianos – Este também pareceu ser uma das dificuldades de

compreensão, não se tem um padrão na utilização de graus ou radianos, acredito

que o uso dos radianos que sempre vem em notações com frações dificulta o

processo de ensino-aprendizagem. Mesmo quando os alunos compreendem o que é

o radiano, sua notação é pouco familiar, e sendo assim as primeiras atividades

também irão trabalhar apenas com graus.

- Triângulo Retângulo – É comum nos livros didáticos, iniciarem as funções

trigonométricas com demonstrações das razões no triângulo retângulo. Depois este

triângulo é inserido no círculo trigonométrico no primeiro quadrante e quando

mudamos para o segundo, terceiro ou quarto quadrante do círculo o triângulo

retângulo desaparece. Sendo assim acredito que obteremos maior sucesso se não

mencionarmos o triângulo retângulo no círculo trigonométrico.

- Círculo trigonométrico estático ou dinâmico – Quando expomos o círculo

trigonométrico é comum falarmos do movimento do ponto sobre o círculo, para

determinarmos o ângulo, mas a lousa ou o livro são estáticos, então será proposto

atividades com o uso de recursos digitais par dar movimento ao círculo

trigonométrico, acreditando que isto poderá facilitar o processo de ensino-

aprendizagem da trigonometria.

Quanto a utilização do OA “Mundo da Trigonometria” o grupo a apresentou a

crítica de que parte deste OA se parecia muito com um livro didático eletrônico, mas

concordaram com a hipótese de que a dinâmica apresentada pelo OA poderia trazer

benefícios no processo de ensino e aprendizagem da trigonometria no círculo

trigonométrico.

3.5 - Desenvolvimento das Atividades para o 1º enco ntro

Para o primeiro encontro com os alunos foram criadas duas tarefas, uma lista

de exercícios (Atividade 1- Trabalhando com números racionais e irracionais) onde

os alunos responderam questões para verificar se algumas das hipóteses

Capítulo 3 – Primeira Fase 86

levantadas por mim e pelo grupo de professores e pesquisadores se confirmava.

Procuramos neste primeiro encontro verificar se realmente os alunos apresentavam

dificuldades com racionais e irracionais.

Atividade 1 – Trabalhando com números racionais e irracionais. 1 – Complete com os sinais de > (maior) ou < (menor):

a- 4/5 ______ 1/2

b- 3/2 ______ 4/5

c- 5/2 ______ 4

d- 8/7 ______ 3

e- 3 _______ 2

f- 2 ______ 3

g- 3 ______ 3/4

h- 3/4 ______ 2

2- Associe a primeira coluna com o valor mais próximo na segunda coluna:

A - 2 3 ( ) 0,75

B - 2 2 ( ) 3,46

C – ¾ ( ) 0,71

D - 3 /2 ( ) 2,83

E - 2 /2 ( ) 0,86

3 – Sabendo que π ≅ 3,14, determine:

a- 2π = ______ b- π/2 = ______ c- 3/4 π = ______ d- 4/3 π = ______

4- Escreva abaixo alguns números que você conhece que são maiores que -1 e menores que

1.

Para esta primeira tarefa optei pela resolução de exercícios, pois ainda não se

pretendia criar o cenário de investigação para a trigonometria, mas sim verificar

algumas hipóteses para subsidiar a construção deste cenário.

Além de resolver esta lista de exercícios foi proposto uma segunda tarefa na

qual os alunos, divididos em grupos, organizaram vários números em ordem

crescente. Os números foram entregues a eles recortados em pedaços de papéis

em uma ordem aleatória, estes números seguem na tabela abaixo:

7/8 -7/8 ¾ -3/4 1/2 -1/2 1/4 -1/4

Capítulo 3 – Primeira Fase 87

1/3 -1/3 11/12 -11/12 0,6 -0,6 0,8 -0,8

1 -1 2 -2 3 -3 0

Tabela 11 – Atividade 1º Encontro

Esta segunda tarefa teve a finalidade de verificar as dificuldades que

poderiam existir com o tratamento de frações e criar condições para que os alunos

expusessem suas dificuldades através das falas entre eles e o professor. E mesmo

não sendo o objetivo desta pesquisa, esta atividade poderia ajudar a sanar

eventuais dificuldades que estes alunos tivessem com frações.

Capítulo 4 – Segunda Fase 88

Capítulo 4

Segunda Fase

Capítulo 4 – Segunda Fase 89

Neste capítulo descrevo como ocorreram os encontros com os alunos,

fazendo uma análise sobre os pontos mais relevantes. Estão descritos também as

alterações e o desenvolvimento das atividades realizadas nos encontros seguintes.

4.1 – Primeiro encontro

Este encontro teve duração de aproximadamente uma hora e trinta minutos e

foi realizado na sala da coordenação da escola, pois como foi realizada fora do

horário regular das aulas dos alunos participantes não foi possível fazer uso da sala

de aulas. Os alunos ficaram dispostos em uma mesa retangular, de forma que fosse

possível enquadar todos os participantes na filmagem, conforme o layout

apresentado a seguir.

Figura 18: Layout da sala – Encontro 1

Para o primeiro encontro a filmadora ficou primeiramente fixa e

posteriormente móvel, permitindo a filmagem mais detalhada de algumas atividades

realizadas pelos alunos.

Filmadora

Estante de livros

Cadeiras

Mesa com 2 Computadores

Janela para o pátio da escola

Porta de entrada

Campo visual da filmadora

Grupo 1 de Alunos

Grupo 2 de Alunos

Mesa

Layout da sala – Encontro 1

Estante de livros

Capítulo 4 – Segunda Fase 90

Haviam sido convidados oito alunos mas apenas seis compareceram. Deste

modo contamos com a presença de Angeline, Renan, Gabriela, Marcella, Maiara e

Tais. Nesta pesquisa estamos utilizando os nomes reais dos participantes.

Iniciei expondo aos alunos sobre o que se tratava a pesquisa na qual eles

participariam. Em seguida foi entregue a primeira tarefa (atividade-1) para verificar

se a hipótese da dificuldade com números racionais e irracionais se confirmava. Não

foi mencionado se era permitido o uso de calculadora, e no primeiro momento esta

não foi utilizada.

Atividade 1 – Trabalhando com números racionais e irracionais. 1 – Complete com os sinais de > (maior) ou < (menor):

i- 4/5 ______ 1/2

j- 3/2 ______ 4/5

k- 5/2 ______ 4

l- 8/7 ______ 3

m- 3 _______ 2

n- 2 ______ 3

o- 3 ______ 3/4

p- 3/4 ______ 2

2- Associe a primeira coluna com o valor mais próximo na segunda coluna:

A - 2 3 ( ) 0,75

B - 2 2 ( ) 3,46

C – ¾ ( ) 0,71

D - 3 /2 ( ) 2,83

E - 2 /2 ( ) 0,86

3 – Sabendo que π ≅ 3,14, determine:

e- 2π = ______ f- π/2 = ______ g- 3/4 π = ______ h- 4/3 π = ______

4- Escreva abaixo alguns números que você conhece que são maiores que -1 e menores que

1.

Os alunos respondiam individualmente as questões em silêncio, após alguns

minutos me ausentei da sala. Analisando posteriormente o vídeo observei que após

minha saída eles trocavam informações para responder as questões propostas,

embora soubessem que estavam sendo filmados. Uma hipótese para que estes

Capítulo 4 – Segunda Fase 91

alunos não tenham se intimidado com a câmera de vídeo é o fato de estarmos

lidando com uma geração acostumada a ter foto e vídeo no celular, geração youtube

e blog.

Para analisar as dificuldades encontradas pelos alunos na resolução da

primeira tarefa tabulei os resultados dos alunos na tabela a seguir.

Questão Item Acertos Erros Comentários

1 a- 4/5 ______ 1/2 b- 3/2 ______ 4/5 c- 5/2 ______ 4 d- 8/7 ______ 3

e- 3 _______ 2

f- 2 ______ 3

g- 3 ______ 3/4

h- 3/4 _____ 2

1

4

3

3

5

2

4

4

5

2

3

3

1

4

2

2

Dificuldades em entender fração como quociente. Algumas vezes parecem inverter denominador com numerador.

2 Todos: A – E 6 0 Valores utilizados em sala de aula.

3 a- 2π = ______ b- π/2 = ______ c- 3/4 π = ______ d- 4/3 π = ______

6

4

1

3

0

2

5

3

Erros quando trabalham com frações, o π não parece ser um dificultador.

4 Nº > -1 e <1 6 0 Apenas nº na representação decimal

Tabela 12 – Análise dos resultados do 1º Encontro

No primeiro item onde o aluno teria que comparar dois números e ordená-los,

nenhum deles obteve 100% de acerto. O erro mais frequente, foi na ordenação das

frações 4/5 e 1/2 e o maior número de acertos ocorreu na comparação entre 3 e 2.

Uma hipótese para o maior acerto é que o número 3 foi trabalhado com os alunos

em suas aulas regulares e definido como aproximadamente igual a 1,7 ou igual a

1,73. O número 2 também foi trabalhado em sala de aula e definido

aproximadamente como igual a 1,4 ou a 1,41 e no item onde compara 2 e 3

houve quatro erros e dois acertos.

Capítulo 4 – Segunda Fase 92

Então uma hipótese para os erros e acertos do item 1 desta tarefa é que os

alunos possuem dificuldades em entender as frações como quociente, e quanto aos

números representado na forma decimal pode existir uma dificuldade quanto a

expansão decimal.

No segundo item houve 100% de acerto, o que pode ser interpretado como

sendo o item onde eu, professor, saí da sala e a interação entre os alunos se

estabeleceu. Ou pelo fato de que este item abordou números que estes alunos

estavam mais familiarizados, pois os mesmos já haviam sido tratados recentemente

nas aulas regulares do ensino médio quando abordado o tema trigonometria no

triângulo retângulo.

No terceiro item no qual os alunos deveriam efetuar cálculos com π, nos dois

primeiros cálculos houve quase totalidade de acertos. Para os cálculos 3/4 π e 4/3 π

houve uma grande quantidade de erros, para o valor 3/4.π a resposta mais comum

foi 4,18 e para 4/3π a resposta mais presente foi 2,35, nitidamente houve uma

inversão do numerador com o denominador quando eles efetuaram os cálculos. A

aluna Maiara apresentou 3/4 π = 3/12,56 e 4/3 π = 4/9,42 , neste caso a forma como

foi apresentado estes dois números a levou a um equívoco multiplicando o

denominador por π. Quanto aos outros erros a hipótese é que a dificuldade não foi a

presença do π mas novamente, como apresentado no primeiro item, a dificuldade

em entender a fração como quociente ou em operar frações

No quarto item no qual foi pedido para que eles apresentassem valores

maiores do que -1 e menores do que 1, as respostas foram corretas, mas destaco

que foram apresentados apenas valores na forma decimal com uma ou duas casas

decimais. Os valores mais comuns que apareceram foi 0,1; 0,2; 0,3; 0,10 e 0,20.

Nota-se a aluna Marcella inseriu em sua resposta os valores 0,2 e 0,20 e Maiara

inseriu 0,1 e 0,10, dando a entender que estes valores são diferentes, novamente

apresentando dificuldade na expansão decimal.

Quando os alunos terminaram a primeira tarefa foram divididos em dois

grupos para a segunda tarefa. O grupo-1 formado pelas alunas Gabriela, Marcela e

Maiara e o grupo-2 formado pelos alunos Renan, Tais e Angeline, recebendo assim

Capítulo 4 – Segunda Fase 93

23 pedaços de papéis, cada um deles com um número diferente, conforme a tabela

a seguir, para serem organizados em ordem crescente.

7/8 -7/8 3/4 -3/4 1/2 -1/2 1/4 -1/4

1/3 -1/3 11/12 -11/12 0,6 -0,6 0,8 -0,8

1 -1 2 -2 3 -3 0

Tabela 11 – Atividade 1º Encontro

O grupo-1 começou a organizá-los pelos números inteiros, colocando-os em

um a linha horizontal, iniciou pelo número zero e simetricamente organizou os outros

números inteiros. Isto feito, procurou colocar os números na representação decimal,

colocando-os na posição correta. Até este momento trabalhando com os números

inteiros e representações decimais com apenas uma casa decimal o grupo-1 não

apresentou dificuldade.

Grupo-1 – iniciando a atividade Grupo-1 – organizando os números

Figura 19: Grupo 1 - Sequencia de Atividades O grupo-2 iniciou com os valores decimais, após centralizar o número zero de

maneira simétrica organizava os outros valores, ou seja para cada número positivo

colocado em ordem também era adicionado seu oposto negativo. No primeiro

momento o grupo organizou os valores decimais entre -1 e 1, deixando as frações

1/2, 1/3 e 1/4 após o número 1.

Capítulo 4 – Segunda Fase 94

Figura 20: Grupo-2 iniciando atividade

Uma hipótese para que os dois grupos iniciarem a organização dos números

pelo zero e distribuir os valores negativos e positivos simetricamente é a

familiaridade que estes alunos possuem na construção de gráficos das funções de

primeiro e segundo grau e funções exponenciais, no qual costumam representar no

eixo das abscissas e das ordenadas os valores positivos e negativos.

Após alguns instantes o segundo grupo organizava parte dos números na

seguinte sequência (1/4; 3; 2; 1/3; 7/8; 1; 3/4; 0,8; 1/2; 0,6; 0; -1/2; -0,6; -3/4; -0,8; -

1/3; -1/4; -1; -7/8; -2; -3) nota-se que as frações 11/12 e -11/12, conforme apresenta

a imagem a seguir, estão fora do agrupamento organizado pelos, para eles estas

frações parecer ser mais difíceis que os outros números.

A aluna Tais, após fazer alguma conta diz que acha que 7/8 é igual a “um e

alguma coisinha”, logo após uma aluna pergunta se temos que dividir 11 por doze ou

12 por 11, e Angeline responde que se divide 11 por 12, mas mesmo assim existem

alguns momentos de silencio para a decisão do que fazer com este número, e a

aluna afirma que é difícil, até que chegam a conclusão que 11/12 é igual a 1,09. Este

fato corrobora com a hipótese levantada na primeira tarefa em que os alunos estão

trocando o numerador e o denominador e também aponta a dificuldade desses

alunos escreverem a expansão decimal que representa um número fracionário.

Capítulo 4 – Segunda Fase 95

Figura 21: Grupo-2 – desenvolvendo atividade

O grupo-2 trabalhando com poucas conversas chegou a seguinte sequência (-

3; -2; -1; -0,8; -0,6; -1/2; -1/4; -1/3; -3/4; -7/8; -11/12; 0; 11/12; 7/8; 3/4; 1/4; 1/3; 1/2;

0,6; 0,8; 1; 2; 3), podemos notar nesta sequência que se retirarmos as frações o

restante dos números se encontraram em ordem crescente. O que podemos concluir

que a dificuldade se encontra, como no grupo-1, no tratamento com as frações.

Após os alunos apresentarem estas seqüências, eu falei para os grupos quais

eram os números que se encontrava fora de ordem, e como todos eles eram frações

solicitei para que estes números fossem retirados da seqüência, para uma melhor

análise destes. Indagados de como eles poderiam refazer a leitura destes números,

houve a sugestão de transformá-los em valores decimais, onde mostraram

incertezas de como fazê-lo, após a confirmação de que poderiam dividir o

numerador pelo denominador, os alunos fizeram os cálculos para transformar estes

números em decimais e recolocá-los em ordem crescentes junto aos outros

números.

Neste momento o primeiro grupo fazendo uso de uma calculadora

rapidamente verificou os valores e recolocou estes em seus lugares, mas apareceu

neste momento outra dúvida que até então não havia aparecido e para este grupo a

valores como 0,25 são maiores do que 0,8, apresentando assim mais um problema

quando ocorre uma expansão decimal.

Capítulo 4 – Segunda Fase 96

O grupo-2 mostrou dificuldade para a divisão dos valores apresentados, mas

obteve êxito para colocá-los na ordem correta. Neste grupo não houve problemas

com a expansão decimal.

No momento em os alunos conseguiram colocar todos estes valores na forma

de números decimais o trabalho se apresentou bem mais fácil, mesmo o grupo que

teve problemas com a expansão decimal, com poucas informações foi possível a

compreensão e entendimento do que estavam errando e rapidamente conseguiram

corrigir seus erros.

Destaco o momento em que os alunos puderam interagir em grupo e

manipular suas combinações de seqüência, onde puderam investigar formas de

organizar alguns números em ordem crescente, foi algo próximo ao que Skovsmose

chamaria de um cenário para a investigação com referência a matemática pura.

Como apresentado anteriormente um grupo inicialmente organizou as frações

como sendo 1/4 maior que 1/3, e 1/3 maior que 1/2 e somente quando eles dividiram

o numerador pelo denominador da fração eles corrigiram isto. Assim eles puderam

testas suas hipóteses e depois as conferiram com o recurso da divião do numerador

e denominador transformando estas frações em números decimais para facilitar sua

compreenção. Com certeza não foram exploradas todas as possibilidades, mas os

alunos apresentaram indicios de estarem desenvolvendo um processo de

aprendizagem.

Observo que uma das hipóteses levantadas anteriormente, pelo grupo de

professores e pesquisadores, dos fatores que dificultam o aprendizado do aluno no

estudo da trigonometria se confirma. Esta hipótese é que os alunos apresentam

dificuldades na utilização de valores racionais em forma de fração ou decimal e na

utilização de números irracionais.

Confirmado esta hipótese da dificuldade com os valores fracionários e

irracionais durante as próximas atividades foram monitorados os momentos onde

será necessário o uso destes valores, verificando se estas dificuldades realmente

poderiam trazer prejuízos para a aprendizagem dos alunos.

Capítulo 4 – Segunda Fase 97

4.2 – Segundo encontro

Neste encontro foi utilizado o Objeto de Aprendizagem “Mundo da

trigonometria”, que nesta fase será tratado como Objeto de Ensino (OE), conforme

apresentado neste texto anteriormente, então nota-se que para esta pesquisa o OA

“Mundo da Trigonometria” será chamado de OE “Mundo da Trigonometria”. Para

este encontro foi previsto a exploração deste OE e após isto foi proposto que

fizessem uma estimativa sobre o seno de alguns ângulos.

Participaram deste encontro seis alunos, a aluna Maiara que participou do

primeiro encontro não pode comparecer e para o seu lugar esteve presente a aluna

Débora, estes alunos foram divididos em dois grupos de 3 alunos, o grupo-1

formado por Renan, Angeline e Débora e o grupo-2 por Gabriela, Marcella e Tais.

Este encontro teve a duração de uma hora e quarenta minutos.

Para o segundo e terceiro encontro a filmadora ficou fixa, capturando as

imagens de frente para os grupos. A intenção foi a de capturar melhor os diálogos

dos alunos e permitir que eu enquanto professor pudesse interagir melhor com os

alunos.

Figura 22: Layout da sala 2º e 3º encontro

Grupo de Alunos 1

Grupo de Alunos 2

Mesa e computadores

Layout da sala – Encontro 2 e 3

Estante de livros

Cadeiras

Mesa com 2 Computadores

Janela para o pátio da escola

Porta de entrada

Campo visual da filmadora

Filmadora

Capítulo 4 – Segunda Fase 98

Para a exploração deste OE, os alunos tiveram minha orientação, neste

momento acompanhei os alunos para a visualização das telas do software,

aproveitando o momento fiz uma pequena contextualização histórica da

trigonometria, após continuei acompanhando e direcionando os primeiros passos

dos alunos até a apresentação da função seno pelo OE.

Logo no primeiro contato com o software, visualizando a imagens de abertura

do programa, a aluna Gabriela sorri ao ver as imagens, que são fotos de descida em

botes a cachoeiras, lances jogos de futebol sugerindo o movimento da bola e jogos

de sinuca, e pergunta “O que isto tem a ver com trigonometria?”, prontamente o

aluno Renan responde “triângulos, geometria, contas.”, até o momento o único

contato dos alunos com a trigonometria foi em suas aluas regulares onde já haviam

trabalhado a trigonometria no triângulo retângulo, o que deve ter motivado a

resposta do aluno Renan. No final da apresentação das imagens iniciais o OE

apresenta uma jogada de bilhar onde a bola entra na caçapa, e o aluno Renan

apresenta empolgação com a jogada.

Faço uma observação neste momento, quanto ao OE “Mundo da

Trigonometria”, a tela de apresentação sugere através de fotos que a trigonometria

esta ligada a várias ações do cotidiano, mas em nenhum momento o OE mostra

como algumas de suas sugestões estão ligadas a trigonometria. A pergunta da

aluna Gabriela “O que isto tem a ver com trigonometria?”, fica sem uma resposta

explicita no OE, embora o aluno Renan tenha respondido “Triângulo, geometria,

contas”, não acredito que esta pseudo matemática sugerido pelas imagens na

tentativa de concretizar o uso da matemática, traga resusltados positivos.

O sorriso de Gabriela e a empolgação de Renan, mostra a animação e euforia

por utilizar um software em uma aula de matemática, o que não é comum para eles,

pois suas aulas de matemática são sempre realizadas em sala de aula com a

utilização de livros, caderno do aluno da Proposta Curricular do Estado de São

Paulo, giz e lousa.

Após esta apresentação os alunos começam a explorar o OE, no início faço a

leitura junto com eles da apresentação histórica da trigonometria. No momento que o

OE apresenta a função seno no círculo trigonométrico eles fazem a leitura silenciosa

Capítulo 4 – Segunda Fase 99

destas páginas, após a leitura dos alunos perguntei o que eles tinham entendido do

que acabaram de ler e nenhum aluno respondeu e tinham neste momento uma

expressão de dúvida e um pouco tímidos por não saber explicar, assim expliquei os

itens que o OE apresentava para definir a função seno no círculo trigonométrico.

Podemos citar duas hipóteses para esta reação dos alunos, a primeira seria a

inibição inicial dos alunos ao falar de um tema novo para eles e a outra é fato de

realmente eles não terem entendido o que estava sendo exposto pelo OE. Observo

que neste momento o OE apresenta uma explicação formal dos significados das

funções trigonométricas, o que poderia ter dificultado o entendimento dos alunos.

Seria interessante se neste momento que o OE apresentasse este tópico de maneira

mais dinâmica com possíveis interações dos alunos, facilitando e tornando esta

parte do OE mais acessível aos alunos.

Neste momento os alunos fizeram a primeira interação com o OE, testando

como se comportava o software com a inserção de vários ângulos diferentes,

positivos e negativos, assim observavam ao mesmo tempo o movimento do ponto

sobre o círculo trigonométrico, sua projeção sobre o eixo dos senos e depois sobre o

eixo dos cossenos e também observavam a formação do gráfico de suas funções.

Ao testar pela primeira vez o OE com o ângulo de 120º, valor sugerido por

mim, a aluna Angeline fala sorridente “Olha! que legal!” referindo-se ao movimento

do ponto sobre o círculo trigonométrico e a formação do gráfico da função seno.

Outras falas também apareceram logo em seguida enquanto eles testavam

aleatoriamente alguns valores de ângulos, Renan disse “Parece um relóginho”,

Angeline disse “Professor... muito louco ein!”. Mais uma vez podemos observar a

animação pelo uso de um software com as falas da aluna Angeline.

Tempo Fala/ Descirção Comentário / Imagem

0:18:50 O professor pede ao aluno, para que eles avancem a tela seguinte para mostrar como o OE funciona, apresentando aos alunos a tela ao lado

0:19:20 Prof : coloquem o ângulo de 120° e clique em traçar.

Angeline: Olha que legal! (risos)

Capítulo 4 – Segunda Fase 100

0:19:51 Prof: Agora testem alguns ângulos, dentre aqueles que ele (OE) indicou. O ângulo pode ser negativo é só acrescentar o sinal de menos e prestem atenção no quadro que aparece depois de traçar o ângulo.

0:20:00 Angeline: Olha lá professor muito loco ein!!

Renan: Parece um relóginho.

Renan: (após a leitura do quadro verde) Que conta é essa?!

Tabela 13 – Transcrição 1 – 2º Encontro

Também foi pedido para que eles lessem o quadro verde que aparece no final

da execução de cada ângulo que é inserido, e após a leitura deste quadro Renan

diz: “Que conta é essa?”, com uma expressão de dúvida e indignação.

Figura 23: Texto confuso para Renan

Capítulo 4 – Segunda Fase 101

O texto encontrado no quadro em destaque pareceu bastante confuso para

Renan. Quando o aluno se referiu a qual conta era aquela, ele se referia como

mostra o exemplo na figura acima, quando inserido o ângulo de 680º e o OE diz que

o gráfico apresenta um valor de C≅11.868 radianos, mas como observamos (Figura

23) no gráfico o valor de C está entre 7π/2 e 4π.

Neste momento são utilizadas três formas simultâneas para se referir ao

mesmo ângulo, em graus (680°), em radianos acompanh ados de valores em forma

de fração (7π/2 e 4π) e em radianos acompanhados de valores em forma de

decimais com 3 casas decimais (11.868 radianos). Para a representação em decimal

também podemos notar que o OE utiliza o ponto em vez da vírgula para separar as

casas decimais, podendo levar o aluno a entender que 680° é igual a onze mil

oitocentos e sessenta e oito radiano enquanto que o valor deveria ser onze inteiros e

oitocentos e sessenta e oito milésimos. Neste momento esta compreensão não foi

possível para Renan.

Uma possível justificativa para o uso do ponto no lugar da vírgula é que

provavelmente o software utilizado para a elaboração deste OE seja se origem

americana e como ponto é usado nos Estados Unidos ao invés da vírgula e talvez o

programador não tenha prestado atenção para este fato.

A dificuldade encontrada por Renan neste momento reafirma a hipótese da

dificuldade dos alunos em compreender os números racionais e irracionais,

principalmente quando se encontram na forma fracionária.

Quando Renan se referiu ao círculo trigonométrico como um relóginho

podemos entender sobre a perspectiva das metáforas que o relógio foi o domínio

fonte e o círculo trigonométrico o domínio alvo, fazendo-se entender o círculo

trigonométrico através de seu conhecimento de relógio. Sendo assim encontramos a

metáfora “CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO”. As inferências que ele

poderá ter feito em seu processo de aprendizagem foram:

Capítulo 4 – Segunda Fase 102

Metáfora: CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO

Domínio Fonte

Relógio

Domínio Alvo

Círculo Trigonométrico

Ponteiros do relógio Ângulos

Movimento dos Ponteiros Variação do ângulo

Eixo do relógio Ponto de origem do plano cartesiano

Ângulo de 360º Uma volta completa dos ponteiros

Tabela 14: Metáfora: CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO

Para explorar algumas das possibilidades do OE foi pedido para que os

alunos analisassem apenas o tamanho do segmento de reta vermelho sobre o eixo y

que representa o valor do seno, assim eles testaram estes tamanhos com os

ângulos de 90º, 180º e 360º.

A seguir, fiz algumas perguntas aos alunos, procurando trazer algumas

características do cenário para investigação, conforme sugere Ole Skovsmose.

Primeiro perguntei o que aconteceu com o segmento de reta vermelho, quando eles

indicaram 360º.

Tempo Fala/ Descirção Comentário / Imagem

0:22:00 Prof: o que acontece com o tamanho da seta vermelha que é o valor do seno entre 0 e 90, digitem 90º e vejam onde vai parar,

Renan: Vai curvando (movimentando a mão para cima e curvando)

Professor: só a seta vermelha?

Renan: sobe

Prof: então até 90 ela sempre subiu

Renan; é

0:22:45

Professor: digita agora 180º

Gabriela: Ela sobe e desce.

Prof: Coloca agora 360°

Gabriela : Ela vai dar a volta inteira

Prof.: Como vocês conseguem descrever para mim só a seta vermelha. O que aconteceu com ela do 0° ao 360°. Podem

Capítulo 4 – Segunda Fase 103

contar errado.

Renan: Subiu e desceu, todo o seno.

Gabriela: Duas vezes.

Renan: Eixo y

Prof.: subiu e desceu até onde?

Angeline: subiu e desceu, desceu e subiu.

Tela apresentada pelo OE após o teste com 360º.

0:24:00

Prof.: Para ela subir foi de quanto a quanto?

Renan: de 0 a 1.

Prof: pensando nos ângulos, de 0 a 90 a reta do seno sempre?

Alunos: Subui:

Prof: do 90 ao 180

Angeline: desceu

Renan: (movimenta as mãos para baixo), desceu.

0:24:30 Prof: Quando chega no 180° ela fica de que tamanho?

Renan: zero

Gabriela: π radianos.

Prof: Vamos pensar no tamanho da setinha vermelha.

Angeline: Ela não tem tamanho

Prof: Ela não tem tamanho?

Angeline: A gente não pode ver?

Prof: Não sei você que esta olhando para a tela.

Prof.: Então quando você digita 180° ela fica de que tamanho:

Renan: zero

Prof.: Digita agora 270. A seta do 270 é do mesmo tamanho da seta do 90?

Alunos: sim

Prof: qual a diferença entre elas.

Renan: 0 foi positivo e 270 negativo.

Neste momento o aluno Renan mantém a mão levantada fazendo o movimento de subir e descer de acordo com as indagações do professor.

Tabela 15 – Transcrição 2 – 2º Encontro

Neste momento podemos observar que para os alunos a função seno tem

“movimento”, ou seja ela sobe e desce o ângulo gira como os ponteiros de um

Capítulo 4 – Segunda Fase 104

relógio. Este é um movimento fictivo, nós sabemos que a função é estática, o ângulo

não se movimenta em torno de um círculo, mas o OE está possibilitando tornar este

movimento fictivo em factivo.

Voltaremos a esta discussão nas considerações finais pois entendemos que

tal fato é uma característica relacionada a este tipo de dinamismo oferecido pela

tecnologia. A definição matemática para função avançou historicamente quando foi

possível descrevê-la analiticamente do modo que hoje conhecemos. Por exemplo a

definição para continuidade de que uma função seria continua quando fosse

possível traçar seu gráfico sem tirar a mão do papel deu lugar a uma nova onde a

função pode ser continua se determinado ponto é retirado de seu domínio. Assim,

as definições para funções reais “independem” do movimento. No entanto, as

metáforas utilizadas pelos matemáticos as utilizam, por exemplo ao falar de limite

embora tenhamos a definição estática limx→∞ (x²+1) falamos de x tendendo a ou se

aproximando a um determinado valor.

No caso da trigonometria este dinamismo parece auxiliar a compreensão dos

alunos.

Gabriela estava observando a formação do gráfico da função seno, conforme

apresenta o OE, e π radianos é a unidade do eixo x para as medidas dos ângulos.

E, como vimos por sua resposta, ela não estava associando o eixo x como sendo o

valor dos ângulos.

Figura 24: Leitura da função seno por Gabriela

Continuando a exploração deste OE foi pedido para que os alunos fizessem

uma estimativa de quanto deveria ser o seno de alguns ângulos, o valor destes

Capítulo 4 – Segunda Fase 105

ângulos foram determinados por mim e pelos alunos assim os ângulos escolhidos e

a respostas dos alunos seguem na tabela abaixo:

Ângulo 30º 45º 52º 60º 77º 80º 120º 137º 225º 300º

Grupo1 0,6 0,75 0,76 0,85 0,98 ≅1 0,90 0,68 -0,75 -0,85

Grupo2 0,5 0,75 0,77 0,80 0,98 0,99 1,05 1,73 -2,75 -3,03

Correto 0,5 0,7 0,79 0,86 0,97 0,98 0,86 0,68 -0,7 -0,86

Tabela 16 - Respostas do 2º encontro.

Dentre os ângulos escolhidos por mim estão os ângulos de 30º, 45º, 60º, 120º

225º e 300º, que foram escolhidos devido ao fato de aparecerem com freqüência

nos livros e matérias didáticos, conhecidos como ângulos notáveis e alguns

simétricos a eles, já os ângulos de 52º, 77º, 80º e 137º foi escolhidos pelos alunos,

por iniciativa deles mesmos, assim podemos observar que para eles o que acontece

com estes valores fora dos padrões didáticos pode ser mais ou tão interessantes e

curiosos do que os valores normalmente apresentados a eles. Outra observação é

quanto ao uso da tecnologia, não apenas a deste OE, mas também os alunos no

uso diário da calculadora e outros recursos tecnológicos ajuda a quebrar “padrões”

estabelecidos numa época onde seria mais fácil calcular valores múltiplos como por

exemplo 30, 60, 120.

Como podemos observar na tabela 16 o grupo-1 teve todas as respostas

bastante satisfatórias e próximas aos valores corretos, o grupo-2 acertou os valores

dos ângulos do primeiro quadrante, já os ângulos dos outros quadrantes eles

erraram. Procurando compreender o erro ocorrido, ao ser indagada, a aluna Taís

explicou como chegaram aos resultados. Observando o gráfico a seguir ela mostrou

que o seno de 120º seria a soma do valor 1 que seria o tamanho do segmento AB

mais o segmento BC, que deveria ser algo próximo de 0,05, chegando assim ao

valor 1,05. O grupo imaginou que o seno de 120º seria a medida da linha do gráfico

da função e não a projeção do ponto sobre o eixo y, assim eles somavam 1 mais

0,05. Quando o ponto se acima do eixo x, o valor era dado como positivo e quando

se encontrava abaixo do eixo x o valor era negativo.

Capítulo 4 – Segunda Fase 106

Figura 25: Entendimento do valor do Seno pelo Grupo 2

Neste momento podemos perceber que o grupo2 estava tentando relacionar a

imagem da linha do gráfico no plano cartesiano ao valor do seno e para ela naquele

momento o seno era o comprimento da linha representada no gráfico, que eles

entendiam como o tamanho do percurso da linha vermelha que representa o seno

no círculo trigonométrico ao lado do gráfico. Em conversa entre as alunas Marcela e

Tais para definirem o seno dos ângulos Marcela diz: “é só esticar esta linha...

(fazendo um movimento com as mãos, como se puxasse a linha da tela do

computador para esticá-la no ar) esticou!”.

Grupo-2 – Discutindo a atividade (1º momento) Grupo-2 – Discutindo a atividade (2º momento)

Figura 26: Grupo 2 Sequencia de Atividades Entendo que aqui poderia estar ocorrendo uma metáfora com a reta numérica

que de certo modo também “estica” os números reais de modo a acomodá-los numa

reta. Além disso eles “somam 1+0,05 = 1,05”, como adicionam números reais.

Não percebendo no calor das discussões e no imediatismo a qual um

professor deve atuar, minha atitude neste momento foi a de auxiliar os alunos.

BC=0,05

AB=1,005

A

B

C

Capítulo 4 – Segunda Fase 107

Sendo assim mostrei para o grupo que eles deveriam observar naquele momento

apenas a projeção do ângulo sobre o círculo trigonométrico e deixasse para mais

tarde a compreensão do gráfico da função seno.

Pedi para os dois grupos que explicassem e escrevessem como o valor do

seno se comportava durante o movimento do ponto sobre a circunferência, quando

ele partisse de 0º e fosse até 360º.

O grupo2 estava com dificuldade para responder esta pergunta e

conversando com o grupo para elucidar a questão, indaguei sobre a variação do

valor do seno entre 0º e 90º, quando a aluna Tais referindo-se ao eixo y diz: “é como

uma régua” movimentando suas mãos para cima e para baixo, e assim continuei a

pergunta variando o ângulo de 90º a 180º, 180º a 270º e 270º a 360º. Quando

indagados sobre a variação do seno entre 180º e 270º a aluna Gabriela disse:

“Desceu só que aumentou”.

Neste momento podemos perceber que a aluna Tais usa da metáfora “EIXO

CARTESIANO É RÉGUA” para associar a escala do eixo y, ela possui um domínio

fonte que é a régua e sua escala e a associa a outro conhecimento que é a escala

do eixo y. Gabriela também se utiliza de uma metáfora de movimento quando diz

“desceu só que aumentou”, ela se refere a um movimento antes apenas fictivo do

valor do seno.

Nesta frase de Gabriela pudemos perceber que também surgiu outra situação

complicada, pois como ela estava analisando o seno de um ângulo de acordo com o

tamanho do segmento vermelho sobre o eixo y e embora utilizasse como referência

o tamanho do segmento vermelho o que realmente queríamos era a projeção do

arco sobre o eixo y, portanto os valores poderiam ser negativos.

Assim quando utilizado este OE ao falarmos que seno é o tamanho do

segmento vermelho, o seno de 90º e 180º deveria ser o mesmo, mas devemos nos

atentar que o seno não é este tamanho, mas sim a projeção do ponto sobre a

circunferência ao eixo y.

O grupo1 enquanto tentava entender o que acontecia com a função seno

entre 0º e 360º, podemos ressaltar que em muitos momentos eles utilizavam-se dos

Capítulo 4 – Segunda Fase 108

movimentos das mãos e de uma linguagem com expressões que indicavam

movimento, o aluno Renan para explicar ao o grupo que o valor do seno diminuía

entre os ângulos de 90º e 270º graus faz o movimento das mãos para baixo

acompanhado de um assovio, como se algo estivesse caindo, Renan diz: “Até o

noventa só sobe, depois desce (assovio)”, podemos ressaltar que em muitos

momentos eles utilizavam-se dos movimentos das mãos e de uma linguagem com

expressões que indicavam movimento. O que corrobora com a teoria utilizada de

que na compreensão de idéias abstratas ou novas o corpo como um todo e não

apenas a mente está envolvido.

Renan movimenta sua mão (1º momento) Renan movimenta sua mão (2º momento)

Figura 27: Movimento das mãos de Renan

Grupo1: Percebe-se que do 0º a 360º sai do ponto de origem (O), vai até 1

positivo; decai até o 1 negativo e volta ao seu ponto de origem. A partir de

90º à 180º o valor no gráfico se mostra positivo, de 180º à 360º o valor passa

a ser negativo.

Figura 28: Resposta grupo 1

Grupo2: De 90º ela sobre 1; de 180º ela desceu diminuiu e chegou a 0; de

270º ela saiu do 0 a ficou a -1; de 360º ela voltou ao eixo 0.

Capítulo 4 – Segunda Fase 109

Figura 29: Resposta grupo 2

A explicação dos grupos mostra que a coordenação da linguagem com a

percepção visual proporcionada pelo dinamismo do OE ajudou no entendimento.

Também podemos perceber que a utilização de termos que indicam movimento,

conforme grifado nas respostas dos alunos, apareceram várias vezes para a

elaboração de suas respostas. A utilização destes termos é entendido pela Teoria da

Cognição Corporificada como movimento fictivo. Ocorrência parecida com esta

também aparece com Dall´Anese (2006), onde cita que a utilização do computador

permitiu criar um cenário onde foi possível transformar um movimento fictivo,

intrínseco da linguagem, em um movimento factivo.

4.3 – Terceiro encontro

Para este terceiro encontro compareceram os mesmos alunos do segundo

encontro. Após uma primeira análise do vídeo do segundo encontro desenvolvi um

apllet que pudesse suprir algumas dificuldades encontradas pelos alunos no

entendimento da função seno.

Após ver os vídeos detectamos que entre as dificuldades apresentadas pelos

alunos no uso do OE “Mundo da Trigonometria” encontra-se a falta de uma escala

decimal no eixo y para facilitar a leitura do seno como projeção sobre o eixo y e não

como módulo de sua projeção sobre o eixo; a escala também se propõe a facilitar a

leitura dos valores dos senos permitindo uma estimativa mais precisa de seus

valores.

Baseado na complexidade que envolve a compreensão do círculo

trigonométrico, já relatada por Lakoff e Núnez (2000) onde a construção do círculo

trigonométrico pode ser compreendida a partir de três estágios, elaborei e utilizei um

applet onde apresentava apenas o círculo trigonométrico e a projeção do valor do

Capítulo 4 – Segunda Fase 110

seno, sobre o eixo dos senos, não apresentando assim o gráfico da função seno

simultaneamente com o círculo trigonométrico como no OE “Mundo da

Trigonometria”.

O applet apresentado aos alunos foi desenvolvido por mim no Geogebra, que

é um software livre de geometria dinâmica. Este applet apresentada o círculo

trigonométrico, conforme a figura 30, onde P2 é a projeção do ponto P1 da

circunferência sobre o eixo dos senos, neste caso o eixo do seno possui uma escala

de um décimo e o usuário do applet pode movimentar o ponto sobre o círculo

trigonométrico obtendo o ângulo desejado.

Figura 30: Applet Círculo Trigonométrico

Após a exploração do applet pelos alunos, foi pedido para que eles,

organizados nos mesmos grupos do encontro anterior, respondessem novamente o

valor dos senos dos ângulos, que eles já tinham respondido anteriormente, só que

agora utilizando este applet.

30º 45º 52º 60º 77º 80º 120º 137º 225º 300º

Gru

po1

Mundo da Trigonometria

0,6 0,75 0,76 0,85 0,98 ≅ 1 0,90 0,68 -0,75 -0,85

Applet 0,5 0,7 0,79 0,88 0,98 0,99 0,87 -0,68 -0,7 -0,88

Capítulo 4 – Segunda Fase 111

Gru

po2

Mundo da Trigonometria

0,5 0,75 0,77 0,80 0,98 0,99 1,05 1,73 -2,75 -3,03

Applet 0,5 0,7 0,8 0,85 0,98 0,99 0,85 -0,69 -0,71 -0,81

Valores Correto 0,5 0,7 0,79 0,86 0,97 0,98 0,86 0,68 -0,7 -0,86

Tabela 17 – comparação de resultados OE / Applet

Neste momento os alunos diziam que era bem mais fácil determinar os

valores do seno com o applet, porque ele tinha uma escala para orientá-los. Como

vemos na tabela anterior as respostas foram muito próximas e o grupo2 não errou

os dos ângulos do segundo, terceiro e quarto quadrante, mas esta dúvida já tinha

sido esclarecida anteriormente. O que podemos concluir é que o fato de não termos

neste momento a presença do gráfico da função junto do círculo trigonométrico o

foco da atenção dos alunos foi apenas na projeção do ponto sobre a circunferência

no eixo dos senos.

O fato dos alunos considerarem mais fácil a utilização do applet se deve a

escala existente no eixo y, assim não foi necessário eles estimarem os valores do

seno, ou quando necessário a estimativa seria apenas para os centésimo do seno,

facilitando sua compreensão.

Conversando com o grupo um para entender melhor se eles teriam

compreendido como determinar o seno no círculo trigonométrico, e sabendo que

eles também já conheciam o valor da razão seno no triângulo retângulo, pois estes

alunos também são meus alunos do 1º ano do ensino médio, perguntei a eles se era

mais fácil determinar o seno de um ângulo no triângulo retângulo ou no círculo

trigonométrico, obtive as seguintes respostas:

Tempo Fala/ Descirção Comentário / Imagem

1:18:00 Prof: Onde é mais fácil determinar o seno de um ângulo, no triângulo retângulo ou no círculo trigonométrico?

Renan: aqui. (referindo-se ou círculo trigonométrico)

Angeline: Os dois são fáceis, só que aqui é bem mais fácil, vem na hora... (estalando os dedos) assim, porque você bate o olho

Neste momento o professor esta conversando com o grupo-1

Capítulo 4 – Segunda Fase 112

e já tem uma noção.

Professor: No triângulo retângulo vocês não conseguem bater o olho e ter esta noção?

Renan: não.

Angeline: eu não

1:20:00 Prof: Onde é mais fácil determinar o seno de um ângulo, no triângulo retângulo ou no círculo trigonométrico?

Grupo2- o círculo

Gabriela: Principalmente quando tem estes números (apontando na tela do computador a escalo do applet utilizado)

Tais: é fica mais fácil, agente olha para ele e já sabe.

Gabriela: o triângulo a gente olha e fica meio assim... aqui não, agente olha e já sabe mais ou menos.

Neste momento o professor esta conversando com o grupo-1

Tabela 18 – Transcrição 3 – 3º Encontro

Podemos perceber na fala da aluna Angeline, que a utilização dos OEs dando

uma dinâmica para o círculo trigonométrico, permitiu que eles conseguissem estimar

valores do seno de qualquer ângulo, devido a percepção visual que o OE fornecia.

Pudemos observar o uso de diferentes metáforas utilizadas para a

compreensão do círculo trigonométrico com as metáforas do movimento fictivo,

“CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO” e “EIXO CARTESIANO É RÉGUA”.

Estas metáforas ajudam a produzir o conhecimento matemático. Observamos ainda

que os alunos na produção de novos conhecimentos matemáticos utilizam como

domínio fonte conhecimentos tanto do cotidiano quanto conhecimentos anteriores de

dentro da própria matemática.

4.4 – Quarto encontro

Para o quarto encontro foi utilizado novamente o OE “Mundo da

Trigonometria”, foi preparado uma atividade onde os alunos responderiam questões

sobre seno e cosseno, de modo que pudessem, também, explorar a função

cosseno, pois no encontro anterior eles exploram apenas a função seno.

Capítulo 4 – Segunda Fase 113

Para este encontro compareceram os mesmos alunos do encontro anterior,

com exceção do aluno Renan que não pode comparecer, mais em seu lugar

compareceu a aluna Mayara. Este encontro teve a duração de uma hora e trinta

minutos.

Neste momento os alunos foram divididos em duplas e após uma explicação

do que era a função cosseno, comparando com o que eles já conheciam da função

seno, eles exploraram o OE e responderam a atividade3. Assim como no segundo e

terceiro encontro para a medida dos ângulos utilizei o grau nesta atividade.

Atividade-3 - Função Seno

1) Utilizando o OA “Mundo da Trigonometria”, faça uma estimativa dos valores do seno dos

seguintes ângulos:

a) 30° = _________ b) 140° = _________ c) 270° = __ _______

d) 80° = _________ e) 210° = _________ f) 330° = __ _______

g) 90° = _________ h) 360° = _________ i) 180° = __ _______

2) Complete com os sinais de maior (>), menor (<) ou igual (=):

a) sen 40° ______ sen 60° b) sen 60° ______ sen 160 ° c) sen 140° _____ sen 200°

d) sen 260° ______ sen 170° e) sen 75° ______ sen 2 30° f) sen 80° ______ sen 300°

g) sen 290° ______ sen 40° h) sen 70° ______ sen 10 0° i) sen 150° _____ sen 210°

3) Observando os círculos trigonométricos abaixo responda:

A B C

a) Determine os valores aproximados dos ângulos:

A - __________ B - __________ C - ___________

b) Determine os valores aproximados do seno dos arcos:

A - __________ B - __________ C - ___________

Capítulo 4 – Segunda Fase 114

Função Cosseno

4) Utilizando o OA “Mundo da Trigonometria”, faça uma estimativa dos valores do cosseno dos

seguintes ângulos:

j) 30° = _________ k) 140° = _________ l) 270° = __ _______

m) 80° = _________ n) 210° = _________ o) 330° = __ _______

p) 90° = _________ q) 360° = _________ r) 180° = __ _______

5) Complete com os sinais de maior (>), menor (<) ou igual (=):

a) cos 40° ______ cos 60° b) cos 60° ______ cos 160 ° c) cos 140° _____ cos 200°

d) cos 260° ______ cos 170° e) cos 75° ______ cos 2 30° f) cos 80° ______ cos 300°

g) cos 290° ______ cos 40° h) cos 70° ______ cos 10 0° i) cos 150° ______ cos 210°

6) Observando os círculos trigonométricos abaixo responda:

A B C

c) Determine os valores aproximados dos ângulos:

A - __________ B - __________ C - ___________

d) Determine os valores aproximados do cosseno dos arcos:

A - __________ B - __________ C - ___________

Esta atividade foi desenvolvida para percebermos a capacidade de estimativa

dos valores de seno, cosseno e medida dos arcos, que os alunos teriam com a

utilização do OE Mundo de Trigonometria. Ainda não se tinha falado aos alunos

sobre os ângulos simétricos no círculo trigonométrico, portanto alguns exercícios

poderiam levar a assunto, pois em alguns momentos eles poderiam perceber que

alguns ângulos possuem os mesmos valores de seno ou cosseno.

Como os alunos já conheciam o OE “Mundo da Trigonometria”, e a função

seno, pedi para que os alunos explorassem as páginas do OE relacionadas a função

Capítulo 4 – Segunda Fase 115

cosseno. Após esta exploração dos alunos pelo OE, pedi pare que eles testassem o

valor de 60º, onde os alunos chegarão a conclusão que o valor do cosseno de 60º

deveria ser 0,5, também sugeri o teste do ângulo de 120º e indagados de qual era o

cosseno de 120º, as respostas vieram aos poucos, primeiro Gabriela diz: “é

negativo?” Após minha confirmação de que o valor era negativo a aluna Angeline

diz: “zero vírgula alguma coisa” e Marcela concluí: “meio.”

Analisando posteriormente o vídeo noto que poderia ter explorado melhor a

primeira dúvida quanto as valor negativo do cosseno de 120º, apesar de ser um

professor que acredita nos cenários de investigação, em sala de aula, está tão

incorporado o papel do professor como facilitador que também assumo este papel e

só na hora da análise, ou seja, pós-facto posso observar que numa próxima vez

poderia perguntar aos outros no grupo se concordam ou não com a resposta do tipo

da Gabriela podendo assim entender melhor como eles estão pensando para

resolver a tarefa.

Quando perguntei para os alunos porque o valor era negativo, Marcela diz:

“porque está do outro lado”; e logo em seguida Marcela conclui: “é igual ao gráfico”,

gesticulando as mãos para a direita e esquerda, referindo-se ao plano cartesiano e

dos gráficos que eles conheciam das funções de primeiro e segundo grau que viram

durante o primeiro ano do ensino médio.

Neste momento fica claro que Marcela fez uso de uma metáfora orientacional

quando falou que o valor negativo está do outro lado, e também fez uma montagem

como já sugerida por Lakoff e Núnez (2000). No primeiro estágio da compreenção

do círculo trigonométrico existe o Domínio I, que é um círculo no plano euclidiano

com centro e raio e o Domínio II que é o plano cartesiano com os eixos x e y, origem

em (0,0). E culmina na montagem do Domínio III do Ciclo Trigonométrico.

Capítulo 4 – Segunda Fase 116

Figura 31: 1º estágio da montagem do círculo trigonométrico

Os alunos foram convidados a continuar explorando o OE, utilizando ângulos

quaisquer e posteriormente respondessem a atividade-3. Para responder as

questões desta atividade os alunos poderiam utilizar o OE, e assim o fizeram, na

maioria das vezes antes de responder uma questão consultava o OE para

verificação dos valores encontrados.

A falta de uma escala no eixo dos senos e eixo dos cossenos representou

uma dificuldade para os alunos. E apesar de orientados para trabalhar com valores

aproximados, com uma casa decimal, os alunos sempre tentaram utilizar os

centésimos, duas casas, isto poderia se explicar pela familiaridade que possuem

com o dinheiro, onde utilizamos os centavos.

As maiores dificuldades surgiram quando os alunos tinham que identificar o

seno ou cosseno dos ângulos 0º, 90º, 180º, 270º ou 360º. Para estes ângulos foram

constantes as trocas dos valores de seno e cosseno, embora as respostas fossem

sempre 0, 1 ou -1. Ao estimarem os valores do seno e cosseno de outros ângulos, a

referência dos alunos sempre foi projeção do raio sobre os eixos, e quando este raio

se encontrava sobre o eixo x ou eixo y, a referência se perdia provocando os erros.

Capítulo 4 – Segunda Fase 117

Uma hipótese para este erro podemos encontrar no domínio fonte destes

alunos, que é a trigonometria no triângulo retângulo, onde não é possível construir

um triângulo retângulo com um ângulo de 0º ou dois ângulos de 90º.

Como já mencionamos anteriormente é muito comum nos livros didáticos e

também na prática do professor os problemas envolvendo a sombra de alguma

coisa para determinar sua altura, mas nestes problemas sempre estão inseridos

dentro de uma semi-realidade, assim como sugere Ole Skovsmose, se a prática do

professor migrar para uma situação dentro da realidade, os problemas envolvendo

sombra também iriam abordar situações onde não seria possível o cálculo de alturas

através do tamanho de sombra, pois teriamos as sombras do meio dia ou do

entardecer onde estariamos próximos das situações onde não seria possível a

construção de um triângulo retângulo com estas medidas.

Notamos que no encontro anterior, quando os alunos tiveram o primeiro

contato com a Trigonometria no círculo trigonométrico e o OE “Mundo da

Trigonometria” a necessidade de se utilizar de metáforas básicas para produzir

novos conhecimentos foi muito maior do que a encontrada neste encontro. Talvez

aqui uma explicação seja que, de acordo com a teoria da cognição corporificada,

para entender algo novo utilizamos inferências que podemos fazer num domínio

fonte conhecido, assim para entender o círculo trigonométrico foi possível destacar

as metáforas, “CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO” e “EIXO CARTESIANO

É RÉGUA”, fazendo inferências do que se conhece de relógio e régua para o

entendimento do círculo trigonométrico.

Podemos entender também, que estes alunos no segundo momento onde

tinham que entender a função cosseno, utilizaram-se dos conhecimentos da função

seno, já conhecida anteriormente, para o seu processo de aprendizagem. Segundo

a teoria da cognição corporificada, estes alunos buscaram dentro da matemática

suas inferências para produzir novos conhecimentos. Sendo assim utilizaram uma

metáfora de ligação “COSSENO É SENO”.

Capítulo 4 – Segunda Fase 118

Metáfora: COSSENO É SENO

Domínio Fonte: SENO Domínio Alvo: COSSENO

Eixo dos senos (eixo y) Eixo dos cossenos (eixo x)

Projeção sobre o eixo y Projeção sobre o eixo x

Os valores negativos do seno estão abaixo do eixo x.

Os valores negativos do cosseno estão a esquerda do eixo y

Tabela 19: Metáfora COSSENO É SENO

No final do encontro conversei com os alunos perguntando o que eles

acharam dos encontros, onde a aluna Angeline se manifestou dizendo que seria

muito mais fácil estudar este conteúdo com o uso do computador, e a aluna Gabriela

concorda e acrescenta que o fato de não necessitar desenhar no caderno onde os

desenhos não ficam tão perfeitos.

Tempo Fala/ Descirção Comentário / Imagem

1:00:00 Prof: O que vocês acharam destes encontros, sobre o que vocês aprenderam?

Angeline: É tipo assim quando a gente for estudar isto se tiver o computador vai ser

super fácil.

Professor: Com o computador vai ser fácil?

Angeline: É ajuda mais.

Referência de Angeline as aulas regulares do Ensino Médio.

1:01:00 Gabriela: a... é melhor do que ficar fazendo o desenho no caderno.

Angeline: não precisa fazer o círculo com o compasso.

Gabriela: é sai meio torto, nem com o compasso sai perfeito.

O computador facilita o entendimento dos desenhos.

Tabela 20 - Transcrição 4 – quarto encontro

Então podemos dizer que o OE colaborou com a aprendizagem dos alunos, e

entre as características positivas do OE também podemos acrescentar a qualidade

visual do círculo trigonométrico, que não é possibilitada no uso do papel e lápis,

também acrescento que o OE permite inúmeras interações entre o aluno e o círculo

Capítulo 4 – Segunda Fase 119

trigonométrico, ou seja, o OE torna possível o aluno testar vários ângulos em um

espaço de tempo muito pequeno, tornando a aula mais dinâmica.

Uma observação técnica que teve impacto na análise teórica é que para este

quarto encontro, no qual as duplas trabalharam para responder as questões

propostas pela atividade, talvez fosse melhor ter filmado apenas uma dupla. Deste

modo seria possível analisar melhor a interação entre eles, interação que se perdeu

com a filmagem atual, que focou todo o grupo dificultando o entendimento do diálogo

entre as duplas, perdendo assim algumas falas relevantes para esta pesquisa.

Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais 120

Capítulo 5

Discussões e Considerações Finais

Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais 121

O objetivo desta pesquisa foi o de investigar e analisar que aspectos são ou

não favorecidos no processo de ensino de trigonometria, no Ensino Médio,

especificamente sobre o círculo trigonométrico em um ambiente utilizando recursos

digitais. Investigando as dificuldades e facilidades encontradas por um professor ao

longo deste processo.

Antes de retomar as questões iniciais desta pesquisa faço uma análise

observando os procedimentos metodológico utilizados. Assim descrevo quais de

suas etapas ocorreram conforme o esperado e quando os resultados ou situações

não eram esperadas.

Quanto ao tipo de pesquisa, quero ressaltar que o design experiment permitiu,

com análise de cada encontro, o ajuste necessário para um melhor aproveitamento

das informações coletadas e analisadas.

A filmagem dos encontros permitiu uma análise posterior detalhada,

permitindo a compreensão dos acontecimentos, que sem ela teriam se perdido.

Também relato que a filmagem poderia ter tido um resultado melhor, principalmente

no terceiro encontro onde o trabalho dos alunos foi desenvolvido em duplas. Como a

filmagem focou todas as duplas ao mesmo tempo não foi possível identificar todas

as falas entre os alunos de cada dupla. Caso esta filmagem tivesse tido o foco em

apenas uma dupla, talvez tivéssemos um número maior de falas para analisar nesta

pesquisa.

Quanto ao som capturado também tivemos alguns problemas, pois estes

encontros foram realizados em horário de funcionamento da escola. O horário

escolhido coincidiu com o horário de intervalo do período da tarde, algumas falas

não foram possíveis de ser identificadas, principalmente quando alguns alunos

falaram mais baixo.

Quanto à formação do grupo de alunos participantes, alguns imprevistos

também ocorreram. Foram convidados oito alunos para participar da pesquisa,

destes somente seis apareceram nos encontros e a cada encontro houve a

alteração de um dos participantes. Mas mesmo com estes imprevistos foi possível

um levantamento importante de informações, que podem auxiliar para o

desenvolvimento de outras aulas de trigonometria.

Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais 122

Retomando minhas questões inicias, procurando analisar como esta pesquisa

pode responder estas questões.

Quais são os argumentos e metáforas utilizados pel os alunos nesse cenário

que podem influenciar na manutenção ou modificação do mesmo?

Vou iniciar minha análise pela segunda questão, pois foi através das

metáforas utilizadas pelos alunos que pude responder à primeira questão. Uma vez

que através das metáforas utilizadas pelos alunos foi possível comprender algumas

de suas dificuldades e suas formas de produção de conhecimento.

Estas metáforas foram fundamentais para que os alunos desenvolvessem

seus conceitos sobre trigonometria, fazendo uso de conhecimentos prévios para

inferências que permitiram a produção de um conhecimento novo.

As metáforas “CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO” e “EIXO

CARTESIANO É RÉGUA” são metáforas básicas em que os alunos trazem de suas

vidas cotidianas inferências para construção de um conhecimento matemático.

“CÍRCULO TRIGONOMÉTRICO É RELÓGIO”.

Quando o aluno Renan disse “parece um reloginho” aparece esta metáfora

onde o aluno fez algumas inferências sobre o círculo trigonométrico a partir do que

ele conhece sobre um relógio com ponteiros. Assim o movimento dos ponteiros de

um relógio infere sobre os ângulos ou arcos, 360º é igual a 60 segundos e o eixo do

relógio é a origem do plano cartesiano.

“EIXO CARTESIANO É RÉGUA”

Para produzir conhecimento sobre o eixo cartesiano a aluna Tais se refere a

escala do eixo y dizendo “é igual a régua” e utilizou-se desta metáfora para

produção de conhecimento, assim a os números inteiros são os centímetros e os

números decimais são os milímetros de uma régua.

Nesta pesquisa também surgiram exemplos de metáforas de ligação, onde

através de outros conhecimentos matemáticos os alunos construíram um novo

conhecimento. Isto é evidenciado quando os alunos fazem a montagem de seus

Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais 123

conhecimentos de plano cartesiano, conforme sugere Lakoff & Núñez (2000) na

montagem do círculo trigonométrico e nas metáforas do movimento fictivo e

metáfora “COSSENO É SENO”.

“COSSENO É SENO”

Quando apresentada a função cosseno aos alunos, eles fizeram uso da

metáfora acima, assim a projeção sobre o eixo y é igual a projeção sobre o eixo x e

os valores negativos do seno, que estão abaixo do eixo x é igual aos valores

negativos do cosseno, que estão a esquerda do eixo y.

Movimento Fictivo que se torna Movimento Factivo

Destaco aqui a importância que os Objetos de Ensino utilizados no estudo,

pois estes OEs possibilitaram aos alunos uma maneira de construção do

conhecimento de trigonometria diferente da que eles teriam construído apenas com

papel e lápis. Sobretudo, a dinâmica possibilitada pelos OEs criou um movimento no

círculo trigonométrico, onde esta percepção visual é evidenciada pelas metáforas

dos alunos como o “seno subiu” o “seno desceu”. Assim o movimento, inicialmente

fictivo do seno de um ângulo torna-se factivo, via o dinamismo proporcionado pela

representação virtual do OE. Isto é, o seno de um ângulo é a razão entre as medidas

do cateto oposto e da hipotenusa, cujo valor é expresso por um número que

“evidentemente” não se move e a função e seu gráfico idem. Mas quando o aluno

fala sobre o OE o dinamismo se sobrepõe ao estático auxiliando a compreensão

deste conceito.

Através desta análise das metáforas que surgiram nos encontros com os

alunos, sob o olhar da Teoria da Cognição Corporificada, respondo à segunda

questão desta pesquisa.

Observo que para esta pesquisa os Objetos de Aprendizagem - OAs do

RIVED e o applet utilizados no encontro com os alunos, são Objetos de Ensino –

OEs, portanto foram utilizados parcialmente, onde através de suas análises prévias

deterimamos quais as partes destes objetos iriamos utilizar.

Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais 124

Que aspectos podem ser considerados mais ou menos relevantes, para a

construção de um cenário para a aprendizagem do círculo trigonométrico, utilizando

como recursos tecnológicos applets e objetos de aprendizagem disponíveis na

internet?

Para responder a primeira questão é necessário ressaltar alguns pontos que

considero relevante nesta pesquisa. Primeiro quanto à dificuldade dos alunos com

os números racionais e irracionais, o que era uma hipótese levantada por mim e o

grupo de professores e pesquisadores da UNIBAN se confirmou no primeiro

encontro, sendo assim se esta dificuldade foi encontrada com este grupo de alunos

é possível que tenhamos também esta dificuldade com um número muito maior de

alunos e se isto for confirmado este é um fator dificultador não apenas para o

aprendizado da trigonometria mas para muitos outros conteúdos trabalhados na

matemática do ensino médio.

Quanto aos OEs utilizados nesta pesquisa “Mundo da Trigonometria” e o

Applet, podemos citar alguns aspectos relevantes para a sua utilização dentro de um

cenário para aprendizagem.

Aspectos Positivos dos OEs

1. A motivação gerada entre os alunos, pudemos observar no vídeo o sorriso

e demonstração de satisfação ao utilizar o computador em uma aula de matemática.

2. A percepção visual e o dinamisno que possibilita o OE. Para o Objeto de

Aprendizagem do RIVED “Mundo da Trigonometria”, podemos notar que sua parte

mais relevante para esta pesquisa foi a dinâmica apresentada no círculo

trigonométrico, a possibilidade de testar vários ângulos em um pouco espaço de

tempo.

3. O Applet que desenvolvi, devido a escala decimal no eixo y, facilita a leitura

e entendimento dos valores do seno, principalmente quando estes valores são

negativos.

Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais 125

Aspectos Negativos dos OEs

1. Para o OE “Mundo da Trigonometria” em suas telas de apresentações das

noções básicas com alguns conceitos fundamentais de trigonometria, a

apresentação histórica, a demonstração dos arcos côngruos e o círculo

trigonométrico poderiam ser substituídas por outro material impresso, mas uma

possível melhora para este OE seria a inserção de objetos dinâmicos também para

esta parte do OE, permitindo maior interação entre o usuário e o aplicativo.

2. Padrão nas unidades e falta de escala nos eixos do círculo trigonométrico.

Para o OE “Mundo da Trigonometria” a falta de uma escala decimal nos eixos x e y,

foi um fator dificultador para a produção de conhecimento dos alunos

3. Também para o OE “Mundo da Trigonometria” outros fatores negativos que

apareceram foram a leitura do gráfico da função simultaneamente com a leitura do

círculo trigonométrico; a escala do eixo x do gráfico da função está em radianos e na

forma fracionária, mas os alunos inserem valores em graus para a construção deste

gráfico; a mensagem exposta na tela onde apresentavam valores em radianos mas

utilizando uma notação decimal e no padrão norte americano trocando o ponto pela

vírgula.

Para futuras modificações ou criações de Objetos de Ensino para

tigonometria deixo a proposta de se apresentar primeiro aos alunos o círculo

trigonométrico com uma escala interna decimal para os eixos do seno e do cosseno,

isto poderá ajudar os alunos na construção de seus conhecimentos, já que tivemos

como exemplo o grupo que para determinar o valor do seno utilizava do

comprimento da linha do gráfico da função seno para determimar o valor do seno.

Trago como proposta apresentar o gráfico das funções trigonométricas no OE em

um segundo momento, após a compreenção dos valores do seno e cosseno dentro

do círculo trigonométrico.

Quanto aos valores dos ângulos devemos trabalhar em graus e radianos de

maneira a levar os alunos a construir o conceito de ângulo com as duas formas. É

aceitável que os alunos prefiram trabalhar com as medidas dos ângulos em graus já

que esta é bem mais familiar para ele, pois além de já conhecer préviamente os

ângulos medidos em graus estes utilizam quase sempre números inteiros para

Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais 126

representá-los, não aparecendo os números racionais em forma de fração ou

decimais e irracionais como na medidas em radianos, mas as aplicação das funções

trigonometricas nos dias atuais são de grande importância e não podemos ignorar

as medidas em radianos, mas sim ajudar os alunos a sua compreensão.

Uma sugestão para minimizar a dificuldade dos alunos com as medidas em

radianos, seria os objetos de ensino apresentarem de forma conjunta as medidas

em graus e radianos, para que os alunos pudessem se familiarizar com estes

valores. Também é necessário um trabalho anterior com os números racionais e

irracionais, pois a dificuldade com estes números impacta a compreenção dos

alunos dos valores em radianos.

Conforme apresentado anteriormente as medidas em radianos apresentam

alguns problemas para compreenção dos alunos o primeiro é o próprio conceito de

radianos e o segundo é o fato dos materias didáticos impressos trazem as medidas

em radianos sempre em forma de frações ou números inteiros acompanhados do π

e os objetos de ensino devido a limitação dos softwares trazem alguns valores em

frações e para a maioria dos valores eles estão representados por números

decimais, aumentado ainda mais a dicficuldade de compreenção dos alunos.

Observando as dificuldades apresentadas pelos alunos assim como os

beneficios encontrados na utilização dos OEs nesta pesquisa, apresento um applet,

construído por mim através do software Geogebra, com algumas sugestões para um

modelo de OE para aulas de trigonometria. Conforme a figura a seguir o OE para a

função seno deverá ter as seguintes caracteristicas:

- Escala decinal para o eixo dos seno;

- Linha tacejada para o acompanhamento da projeção do cateto sobre o eixo y;

- Arco AB, apresentando suas medida em graus e radianos;

- Destaque para área do ângulo formado pelo arco AB;

- Escala em graus e radianos para o eixo x, quando apresentado o gráfico da função

seno;

- Mesma escala para o gráfico da função e para o círculo trigonométrico;

- Opção para exibir ou ocultar o gráfico da função seno.

Capítulo 5 – Discussões e Considerações Finais 127

OE – Interpretação para a Função Seno

Figura 32: OE interpretação para a Função Seno

Como já era esperado não apareceu nenhuma dificuldade no uso dos

computadores pelos alunos, confirmando que esta é uma tecnologia em que o aluno

esta preparado para utilizar, pois eles já fazem partem da geração “Nativo Digital”,

portanto cabe aos professores, que ainda na sua maioria pertencentes a uma

geração de “Imigrantes Digitais”, a incumbência de aprender como se utilizar dos

recursos digitais em suas aulas.

Concluindo, esta pesquisa apresenta que o uso de recursos digitais nas aulas

de trigonometria é uma prática que trouxe pontos positivos, mesmo quando estes

recursos apresentam itens que podem ser aperfeiçoadas. Pois a utilização destes

recursos além de ser uma fonte motivadora traz também novas possibilidades para a

construção do conhecimento da trigonometria, possibilidade estas diferentes das

que se apresentam em uma aula com papel e lápis, que não seriam possíveis sem a

utilização do computador, Assim como sugere a metáfora “TECNOLOGIA É

PRÓTESE” (Bolite Frant, 2010) onde a tecnologia é uma prótese cognitiva,

permitindo aos alunos produzir um conhecimento diferente daquele que produziriam

sem o uso da tecnologia.

128

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